Flora Fong Manchete PolíticaLai Man Wa | PJ termina relatório. Susana Chou critica formato do funeral Susana Chou critica o pagamento pelo Governo do funeral de Lai Man Wa, bem como o formato da cerimónia. Considera não só que poderá passar a mensagem de que apoia o comportamento suicida, mas também que não se deveria utilizar o erário público para funerais de quem não morre em trabalho [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]ex-presidente da Assembleia Legislativa (AL), Susana Chou, considera irracional que o Governo tenha pago as despesas do funeral de Lai Man Wa, antiga directora dos Serviços de Alfândega (SA). Chou defende que a decisão pode passar a mensagem que o Executivo “aconselha o comportamento suicida”, mas não só. No mesmo dia em que a Polícia Judiciária (PJ) deu a conhecer que já concluiu o relatório de investigação da morte a Lai Man Wa – que terá cometido suicídio -, Susana Chou escreveu no seu blogue que o pagamento das despesas do funeral “para que este fosse de uma categoria mais elevada”, pode causar ilusões na população. Susana Chou não nega, contudo, que se sentiu ansiosa e triste com a notícia da morte da responsável. “O Governo falou das grandes contribuições de Lai Man Wa para Macau, mostrou-se triste com a perda de uma titular de um cargo principal, uma titular extraordinária, e decidiu usar o dinheiro público para fazer um funeral. Mas, essa pessoa suicidou-se – ter direito a um funeral com honras de Estado e com a bandeira dos SA sobre a tampa fechada do caixão, não foi uma decisão racional”, escreve Susana Chou. A ex-presidente da AL diz ainda que a forma como foi feito o funeral “pode aumentar a desconfiança da população” sobre a morte de Lai Man Wa, já que, explica, normalmente só os funcionários públicos que morreram no cumprimento de trabalho têm a honra de ter a tampa do caixão tapada pela bandeira dos países ou de organismos onde trabalhavam. “A decisão do Governo de Macau traz-me dificuldades em compreender” a morte da responsável, atira a ex/presidente da AL. “Outra questão que me faz alguma confusão é se poderá o Chefe do Executivo decidir usar o cofre público para realizar um funeral com honras de Estado para os titulares de cargos principais que morrem por doença, suicídio ou que são assassinados. Realizar um funeral neste modelo para alguém que se suicidou mostra falta de gestão apropriada e de princípios sobre o uso do dinheiro público, que pertence a toda a população de Macau”, avançou. Apesar de tudo, Susana Chou acredita na explicação do Governo sobre a morte de Lai Man Wa, que tem sido contestada na sociedade, devido à forma como foi anunciado e ao facto de ter sido encontrada com objectos que poderiam ser utilizados para cometer suicídio, mas que fazem suscitar dúvidas devido à complexidade do seu uso. Chou diz, no entanto, que “ouviu vários amigos mais próximos de Lai Man Wa a dizer que ela sentia uma grande pressão depois de assumir o cargo da directora dos SA”. Segundo eles, diz, a antiga responsável “sofria de neurastenia e depressão e estava numa situação constante de insónia já há um longo tempo”. Entretanto, a PJ afirmou que o inquérito da morte da antiga directora dos SA está concluído e foi já entregue ao Ministério Público.
Joana Freitas PolíticaCondecoração | Rocha Vieira “assegurou com êxito transferência para a China” Rocha Vieira recebeu uma condecoração das mãos do Presidente da República português devido, entre outras razões, ao seu papel na transferência de Macau para a China [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]General Vasco Rocha Vieira foi condecorado na sexta-feira com a Ordem da Torre e da Espada por Aníbal Cavaco Silva, Presidente da República. Cavaco Silva enalteceu os serviços prestados por Rocha Vieira, sublinhando a “brilhante carreira militar e de serviço público do último Governador de Macau”. Já Rocha Vieira diz-se honrado por receber uma condecoração “com o valor de uma vida”. O Presidente da República notou que Vasco Rocha Vieira é um “justo merecedor de ser distinguido com a Grã-Cruz da Ordem Militar da Torre e Espada”, lembrando como ao longo de “uma brilhante e multifacetada carreira militar e de serviço público, prestou relevantes e distintíssimos serviços às Forças Armadas e a Portugal”. Recordando as “excepcionais qualidades de comando” demonstradas enquanto Chefe do Estado-Maior do Exército e a “acção perseverante e avisada” desenvolvida as funções de Ministro da República para os Açores, o chefe de Estado destacou a forma como Rocha Vieira, como último representante da administração portuguesa em Macau, assegurou “de modo notável e com pleno êxito” a transição de poderes para a República Popular da China. Uma missão em que, frisou, “revelou um invulgar perfil de homem público, indefectível patriotismo e inteira devoção na defesa do interesse nacional e que concluiu com elevado brilhantismo, unanimemente reconhecido no país e no seio da comunidade internacional”. Ramalho Eanes fez também referência ao facto de (ver caixa) ser condecorado em conjunto com Rocha Vieira, sublinhando que isso poderá permitir que a sociedade civil olhe de outra forma para os militares e sinta que eles pertencem a uma instituição em que se pode confiar e onde existem homens que em todas as situações sobrepõem aos seus interesse pessoais os valores do patriotismo, liberdade, amor aos outros e interesse nacional. “Ao atribuir-me a Ordem Militar e Torre e Espada é uma grande honra para mim e tem um significado profundo e muito especial, tem para mim o significado e o valor de uma vida”, acrescentou, por outro lado, Rocha Vieira, que deixou um agradecimento especial a Ramalho Eanes por lhe ter confiado o comando do exército, a Cavaco Silva por o ter indicado para Representante da República nos Açores e a Mário Soares por o ter nomeado o último Governador de Macau. “Sinto poder dizer que ao longo da minha vida sempre cumpri com lealdade as funções que me foram confiadas”, vincou. Ramalho Eanes recebe Grande Colar da Ordem da Liberdade “Senhor general Ramalho Eanes, em Portugal, vossa excelência merece, como ninguém, ser distinguido com o Grande Colar da Ordem da Liberdade, em reconhecimento da grandeza do seu carácter e dos serviços que prestou para que Portugal seja hoje uma pátria de liberdade e de democracia”, afirmou o chefe de Estado, Aníbal Cavaco Silva, num discurso na cerimónia em que condecorou o antigo Presidente da República, em conjunto com Vasco Rocha Vieira. Atribuindo como traços marcantes da personalidade de Ramalho Eanes o “amor à pátria, a honestidade e seriedade de carácter, o sentido de Estado e a firmeza inabalável das convicções, a que sempre foi fiel”, Cavaco Silva lembrou a forma como se destacou como “um homem da liberdade” no período do 25 de Abril, considerando que “em momentos muito conturbados da História” o antigo Presidente da República “foi um lutador, um homem de coragem”. “Com invulgar serenidade e sentido de equilíbrio conduziu os destinos de Portugal com firmeza e determinação, colocando o interesse nacional e do povo português acima das várias tentativas de pressão e intimidação. Enquanto Presidente da República, demonstrou de novo o seu profundo apreço pela democracia e pela liberdade, mantendo-se integralmente fiel aos valores e aos mais nobres ideias de serviço a Portugal e aos portugueses”, acrescentou.
Tomás Chio PolíticaÁguas | Aquisição de mais área é “oportunidade” para convenções e exposições [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Associação de Convenções e Exposições de Macau prevê que o seu sector de actividades sofra uma queda de 20% no que concerne ao número de iniciativas a ter lugar em Macau, pelo que sugere o aproveitamento da recente aquisição de 85 quilómetros de águas pelo território para melhorar essa situação. O secretário da Associação, Ho Haiming, disse ao Jornal do Cidadão – à margem de um fórum que teve lugar na passada quinta-feira – que a nova zona administrativa da região pode ser tido em benefício desta área de negócios. “De acordo com os dados de membros da nossa associação, o número de eventos de convenções e exposições vai ter um declínio de 20% no próximo ano e as empresas do sector podem co-organizar-se quando os temas forem conducentes, criando assim exposições maiores para diminuir a competitividade do sector. Queremos que todas as empresas do sector façam uso das vantagens que Macau agora tem por ter uma nova área administrativa marítima”, disse. O responsável acrescentou que o sector tem a “grande vantagem” de Macau estar agora com mais uma zona para governar. “No passado, as empresas do sector sentiram-se aborrecidas quando faziam exposições sobre iates e outros barcos porque não era fácil arranjar um local ou porto para os atracar, tendo até pedido auxílio à Direcção dos Serviços de Assuntos Marítimos e de Água e aos departamentos congéneres de Zhuhai para escavar o lodo do mar e construir um porto temporário”, acrescentou. “Depois da delimitação, o sector pode expandir o plano das convenções, reduzir o orçamento dos exposições e encorajar a realização de convenções e exposições sobre a vida marítima em Macau”, concluiu. Ho Haiming sugeriu ainda a realização de viagens marítimas, de forma a atrair um novo tipo de visitantes comerciais. Além disso, mostrou-se confiante no crescimento deste sector se houver mais cooperação com Guangdong e com Zhuhai.
Leonor Sá Machado EventosSt. Regis | Novo hotel estreia conceito de Serviço de Mordomo em Macau A Sands China juntou-se ao nova-iorquino St. Regis para abrir em Macau mais um hotel de luxo da cadeia. Duas das novidades passam pelo revivalismo do Bloody Mary ou pela estreia, no território, do Serviço de Mordomo, que permite marcar actividades com 24 horas de antecedência [dropcap style=’circle’]J[/dropcap]á abriu o St. Regis Macau, situado no Cotai, o primeiro hotel a trazer à cidade o conceito de Serviço de Mordomo, que permite aos visitantes personalizarem a sua experiência de férias no território. “Para melhorar ainda mais a experiência do consumidor, o St. Regis Macau oferece o serviço exclusivo St. Regis Butler a todos os hóspedes – o primeiro num espaço em Macau – permitindo que estes reservem actividades com 24 horas de antecedência com base nos seus gostos, necessidades e preferências”, escreve o St. Regis em comunicado. Para quem aprecia um bom cocktail, este é o local onde ir, uma vez que faz parte da cadeia que primeiramente introduziu o conhecido “Bloody Mary” (com sumo de tomate) nos menus internacionais. A experiência teve lugar no primeiro St. Regis a ser inaugurado, na Nova Iorque do século XIX. Está ainda disponível um “Maria do Leste”, bebida feita com base na cultura portuguesa, que junta pimenta-rosa com piri-piri e canela. O St. Regis tem espaços para todos os gostos, feitios e idades, já que disponibiliza uma piscina de 2400 metros quadrados, ginásio e um spa cheio de opções para quem pretende um cuidado digno de cinco estrelas, classificação dada a esta cadeia. Este espaço vem assim juntar-se às dezenas de outros espalhados pelo mundo, sendo o sétimo em toda a China. O primeiro abriu em 1904 na cidade norte-americana que nunca dorme e o de Macau é agora a 36ª propriedade da marca. “Estamos muito contentes por continuar a parceria com o grupo Sands China, depois de uma muito bem sucedida colaboração com a Starwood na abertura do maior hotel da Sheration, o de Macau”, começou o presidente da Starwood Ásia-Pacífico, Stephen Ho, por dizer. Já o presidente da Las Vegas Sands optou, durante a abertura, por dizer que a inauguração do St. Regis “é outro passo significante para diferenciar Macau de outros destinos, colocando mapa no mapa de lazer e de viajantes em trabalho”. Hotelaria de excelência O St. Regis tem mais de 400 quartos e suites que podem ir dos 53 aos 477 metros quadrados com diferentes características. Além disso, dispõe ainda de cinco restaurantes que oferecem comida cosmopolita, de luxo e bistro, mas também um grande salão com 350 lugares sentados e cinco outras salas de reuniões com capacidade para cinco mil pessoas no total.
Joana Freitas PolíticaÁguas territoriais | Aumento para 85 km abre grandes expectativas Um dia depois do anúncio de que Macau vai passar a ter águas marítimas sob a sua jurisdição, foram muitas as mensagens de esperança num desenvolvimento diversificado da economia e do turismo [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]anúncio de que Macau vai ter 85 quilómetros de águas marítimas sob a sua jurisdição está a deixar diversos sectores em alvoroço, tendo ontem gerado diversas reacções. Não só os deputados, mas também figuras da sociedade e associações de Macau mostraram-se agradadas com o que dizem ser uma nova oportunidade para a RAEM se desenvolver. O tema foi alvo de conversa na Assembleia Legislativa (AL), onde Ho Ion Sang fez questão de apontar que a aposta nas áreas marítimas deve ser uma prioridade do Governo, devido ao pouco espaço existente em Macau. Para o deputado, esta é uma responsabilidade do Governo e a oportunidade para o território apostar na contribuição que estas águas vão ter para com questões relacionadas com a vida da população, tais como “o controlo da poluição do Canal dos Patos, as inundações do Porto Interior e a execução da lei nas áreas marítimas”, algo que o Executivo também garantiu – conforme avançado na edição de ontem do HM. Também Ho Iat Seng, presidente do hemiciclo, disse ao jornal Ou Mun que “apesar da área marítima ser um novo desafio para a RAEM, este não é um desafio muito grande”, já que, diz, “os Serviços de Alfândega e os departamentos relacionados com os assuntos marítimos estão já a planear aumentar as instalações e pessoal”. “Macau deve ser uma plataforma comercial marítima entre a China e os países lusófonos e um porto internacional os barcos possam atracar. A economia marítima de Macau tem um grande espaço para se desenvolver”, acrescentou. Sio Chio Wai fala na possibilidade de a RAEM se vir a tornar uma cidade costeira turística, algo com que Lao Ngai Leong, deputado de Macau à Assembleia Popular Nacional, concorda, já que diz que vai ajudar a indústria náutica e marítima em Macau. Chui Sai Cheong, deputado e membro do Comité Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, é um dos membros que entregou a proposta de delimitação das águas ao Governo Central. Para o deputado, a “clarificação vai permitir a Macau ter mais recursos, espaços e oportunidades no desenvolvimento a longo prazo” do território. Desenvolvimento que pode passar por ultrapassar um dos grandes obstáculos do território, como aponta Chan Meng Kam, que é a falta de terrenos. Já Ho Sut Heng, deputado da Assembleia Popular Nacional de Macau, considera que “a clarificação da área marítima é uma grande oportunidade para desenvolver a economia diversificada”, mas pede também que o Governo pondere bem um plano detalhado para o desenvolvimento da zona, “especialmente os trabalhos de protecção ambiental do mar e da água”. “Alguns mecanismos novos para a conservação são indispensáveis”, remata. Satisfeita está também a Associação de Auxílio Mútuo de Pescadores, que acredita que com jurisdição das águas, Macau pode ajudar os pescadores a conseguir mais negócio, não só na parte da pesca, mas também “promovendo o turismo de Macau no mar”. Dirigentes radiantes Lionel Leong confirmou ontem que os 85 quilómetros de águas recentemente adquiridos pelo Governo vão servir, em parte, para diversificar a economia e em cima da mesa está a promoção de actividades não-relacionadas com o Jogo. “Acredito que isto vá servir para incentivar outras áreas para diversificar a economia. Vamos caminhar nesse sentido (…), estabelecendo actividades marítimas, passeios de barco com vistos individuais”, exemplificou. Outra ideia é “aproveitar o acordo CEPA” para mexer com as indústrias transformadoras. O Secretário para a Economia frisa, no entanto, que ainda nada está definido, tal como já tinha sido defendido pelo Executivo na apresentação da novidade. “Tivemos já um encontro com Zhongshan e a cooperação regional também pode ser a base para levarmos a cabo [os planos]”. Questionado pelos média sobre se uma das hipóteses seria criar novos aterros, o responsável apenas lembrou aquilo que foi dito há dois dias: “na conferência de imprensa, disse-se que ainda não se sabe qual o destino que se quer dar às águas, mas há várias hipóteses em aberto”. O Chefe do Executivo, Chui Sai On, congratulou-se por a China ter definido a nova jurisdição, falando num “apoio de relevância” para a diversificação da economia. “Existe actualmente um vasto consenso na sociedade sobre a necessidade de acelerar o desenvolvimento da diversificação adequada da economia. É pelo facto de o Governo Central ter determinado as áreas marítimas sob nossa jurisdição que obtivemos, atempadamente, um apoio de relevância para a promoção acelerada do desenvolvimento da diversificação adequada da nossa economia”, afirmou Chui Sai On, numa mensagem divulgada pelo seu gabinete.
Leonor Sá Machado SociedadeTJB | Ex-consultora do IPIM perde em tribunal [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Tribunal Judicial de Base (TJB) decidiu a favor do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM) num caso em que a entidade foi processada por uma ex-funcionária que se sentiu injustiçada por, alegadamente, não receber aquilo que achava ser seu de direito. O caso remete a Abril de 2000, quando a trabalhadora foi contratada pelo IPIM para exercer funções de consultora, com um ordenado mensal de cerca de 60,7 mil patacas. O contrato foi sucessivamente renovado até Novembro de 2012, altura em que o IPIM decidiu não renovar mais a partir de Abril de 2013. De acordo com o contrato estabelecido há 12 anos, esta receberia, aquando da rescisão, uma determinada soma de indeminização pelo trabalho prestado. No entanto, a ex-consultora alega que deveria ter recebido o montante referente ao ordenado auferido, ou seja, às 60,7 mil patacas. Contudo, a indeminização atribuída foi de 121,3 mil patacas, valor calculado com base no limite das 14 mil patacas. “[Recebeu o equivalente a] 20 dias de remuneração de base por cada ano, para a relação de trabalho que tiver uma duração de 13 anos, sendo o montante da remuneração de base equivalente ao limite máximo de 14 mil patacas previsto na Lei das Relações de Trabalho, dividido por 30 dias por mês”, escreve o TJB em acórdão. No entanto, a ex-consultora do Conselho de Administração do IPIM argumentou que deveria receber o equivalente ao total recebido durante 13 anos de trabalho multiplicado pelas 60,7 mil patacas mensais. “Inconformada, intentou acção para o TJB, alegando que devia o IPIM utilizar a remuneração mensal efectiva de 60,7 mil patacas recebida por ela própria na altura da rescisão do contrato, em vez do limite de 14 mil patacas como o critério do cálculo da indemnização”, denota o tribunal. Com base na lógica de que nem a ex-funcionária, nem o IPIM poderiam alguma vez prever que a lei iria sofrer alterações, o Tribunal absolveu o Instituto de qualquer responsabilidade que a ex-consultora havia requerido, já que “o IPIM já cumpriu o seu dever da indemnização” previsto na legislação ainda em vigor aquando da assinatura do primeiro contrato de trabalho. “O Juiz entendeu que, na celebração do contrato, as partes nunca previam nem a alteração das leis, nem a conversão do respectivo contrato em contrato sem termo”, acrescentou o TJB.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeHepatite C | Afinal doente a ser tratado com Sofosbuvir está em Hong Kong Os Serviços de Saúde confirmam que, para já, apenas um doente de Hepatite C está a tomar o novo medicamento, mas em Hong Kong. o Sofosbuvir chega a Macau em Janeiro [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Sofosbuvir, o novo medicamento que promete uma cura total e sem efeitos secundários para a Hepatite C, já estará a ser administrado a um único doente, mas em Hong Kong. A confirmação foi feita ao HM pelos Serviços de Saúde (SS). “A Junta para os Serviços Médicos no Exterior do Centro Hospitalar Conde de São Januário autorizou um doente em quadro clínico grave a ser encaminhado para Hong Kong, onde irá receber o novo medicamento “Sofobuvir” para tratamento da Hepatite C. O doente em questão dispõe de indicações e foi sujeito a um período de tratamento, sendo as despesas do tratamento no valor de cerca de 800 mil patacas”, lê-se em resposta escrita. O novo medicamento, que promete uma cura de 90%, sem efeitos secundários, chega ao serviço público de saúde em Janeiro. “O Centro Hospitalar Conde de São Januário encontra-se de momento na fase de aquisição do referido medicamento, prevendo-se a sua utilização a partir de Janeiro do próximo ano. O Hospital irá elaborar um programa de tratamento para cada doente consoante o estado concreto do mesmo”, é referido na resposta. Na edição de ontem, o HM publicou a notícia com base em informações fornecidas pelo gabinete do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, que dava a entender que o medicamento já estaria em Macau. “O Governo presta muita atenção a esta situação e os pacientes devem ser primeiro consultados pelo corpo médico do Centro Hospitalar Conde de São Januário, para que seja decidido o melhor tratamento. No entanto, pacientes locais estão já a ser tratados com a hepatite C com o novo medicamento”, confirmou o Secretário. Antes de receber a confirmação final do Executivo, o HM contactou outros doentes que já estão a ser tratados em Portugal, tendo os mesmos feito um pedido de esclarecimento junto do São Januário. Na tarde de ontem, não foram avançadas informações a esses pacientes. “Fomos falar com os médicos da especialidade [de Infecciologia] e nenhum deles tinha conhecimento de que o medicamento está disponível. Ligou-se para a farmácia do hospital, mas foi-nos dito que não tinha sido feito um pedido do medicamento. Eles não dão mais informações porque são privadas, mas é um pouco estranho”, disse ao HM João Castro, doente de Hepatite C que está em lista de espera para receber o Sofosbuvir de Portugal. “Não percebo como é que já existe uma pessoa a ser tratada e nem na farmácia, nem os médicos têm conhecimento disso”, adiantou João Castro, em lista de espera para obter o Sofosbuvir em Portugal.
Leonor Sá Machado EventosEspectáculos | CCM abre 2016 com produções locais de luxo No Centro Cultural de Macau, o ano começa com três produções locais que envolvem mímica, teatro e fantoches. De preço acessível, os shows realizam-se entre os dias 19 e 27 de Fevereiro e permitem a entrada a crianças a partir dos seis anos [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Centro Cultural de Macau (CCM) acolhe, já em Fevereiro, espectáculos de três produções locais, iniciativa a que deu o nome de Open Box. Nesta incluem-se “Muted”, que alia a arte da mímica à temática do silêncio, dando a conhecer ao público o mundo visto por pessoas mudas. “Muted” vai subir ao palco duas vezes, nos dias 19 e 20 de Fevereiro, e a entrada, permitida a crianças a partir dos seis anos, custa 120 patacas sem lugares marcados. Da autoria da associação Route Arts, precede “Who Am I”, espectáculo da mesma produção com estreia em 2013. “Combinando mímica com teatro e efeitos sonoros, esta peça sem precedentes oferece à plateia a oportunidade para melhor compreender e sentir um mundo desconhecido”, refere a organização em comunicado. É no mesmo dia que o director e a artista do Stone Commune apresentam “Weaving Landscape”. Com a ajuda de Jenny Mok, o designer visual Nip Man Teng vai “explorar a noção de que todos os objectos são feitos de intersecções de pontos e linhas”. Os criativos surgem assim com esta peça, que promete debater em palco o conceito de desconstrução da figura humana e de novas texturas. Fantochadas A terceira produção intitula-se “Xiao An” e terá lugar nos dias 26 e 27 do mesmo mês, com o mesmo preço. Aqui, estão em foco os fantoches. Num teatro alternativo, surge uma adaptação de um conto de Yan Lianke, escritor chinês que venceu o Prémio Kafka no ano passado. “Através do uso de fantoches e multimédia, o grupo cria um espaço imaginário para mostrar a combinação entre teatro realista e de fantoches, onde algumas questões são mesmo deixadas em aberto”, revela o CCM. A série Open Box acontece com o intuito de dar aos residentes mais hipóteses de assistir ao talento local. Os bilhetes estão à venda por 120 patacas na bilheteira do CCM e na plataforma online de venda. A organização tem ainda disponível um pacote de descontos para quem quiser comprar bilhetes para os três espectáculos. Este fica a 300 patacas por pessoa. “Muted” terá lugar às 20h00 de sexta-feira e sábado, no palco ART, enquanto “Weaving Landscape” acontece às 21h30 no Pequeno Auditório.”Xiao An” será inteiramente desenvolvido em Cantonês e está marcado para as 20h00 de sexta-feira e sábado seguintes.
Leonor Sá Machado SociedadeTrânsito | Número de passageiros de autocarros cresce 9% O número de passageiros dos autocarros públicos aumentou quase 9%, situando-se nos 15,5 milhões no ano passado [dropcap style=’circle’]M[/dropcap]acau teve, em 2014, uma média mensal de 15,5 milhões de passageiros a viajar nos transportes públicos da cidade. A informação surge num relatório dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), que faz um balanço dos trabalhos, enquadrados na Política Geral do Trânsito e Transportes Terrestres, efectuados no ano passado. Em 2014, foram então “optimizadas” 45 carreiras de autocarros, com 27 destas a serem alteradas ou introduzidas. O mesmo documento avança ainda que foram concluídas uma série de passagens pedonais para facilitar a deslocação dos residentes e reduzir a quantidade de carros nas estradas. “É de referir que, com o Plano de Embelezamento da Rua da Encosta e do Acesso Pedonal de Ligação entre a ZAPE e a Colina da Guia, a distância e o tempo de circulação pedonal entre a ZAPE e a Zona da Colina da Guia foram encurtados significativamente, tratando-se de mais uma opção para deslocação da população”, refere a DSAT em comunicado. A política determina a conclusão, até 2020, de quatro planos de acção em oito domínios com 61 medidas de acção em causa. “Em retrospectiva aos anos mais recentes, o público, apesar de se identificar com a necessidade de controlar o crescimento do número de veículos particulares, foca-se, na sua maioria, na procura pela melhoria dos transportes públicos”, adianta a DSAT. Além disso, a mesma entidade prepara-se para criar a já anunciada via exclusiva de transportes públicos que vai da Barra à Doca do Lam Mau. Em termos de automóveis, a DSAT sublinha a abertura do novo parque de estacionamento no edifício Lok Kuan e na Ponte Negra da Taipa, mas também o aumento do número de lugares disponíveis para automóveis ligeiros no parque de Comendador Ho Yin. Fala-se ainda na “aplicação de modalidades diferentes de pagamento de tarifas devidas pela utilização de lugares de estacionamento nos horários diurnos e nocturnos no Auto-Silo Pak Leng e da Rua da Ponte Negra” e na “instalação de parquímetros para motociclos e ciclomotores em locais adequados”. O documento pode ser consultado no website oficial da DSAT e os residentes podem expressar a sua opinião no mesmo local.
Flora Fong Manchete SociedadeAeroporto | Mudanças, satisfação e melhorias no futuro são promessas do 20º aniversário O Aeroporto já viu algumas melhorias, mas tem de dar mais passos nesse sentido. A concorrência está aí e é preciso elevar a qualidade. É o que defendem entrevistados na análise aos 20 anos do aeroporto [dropcap style=’circle’]F[/dropcap]oi em Dezembro de 1995 que o Aeroporto Internacional de Macau foi inaugurado oficialmente. Este ano, faz 20 anos que a infra-estrutura está em funcionamento e, para a CAM – Sociedade do Aeroporto, o espaço actual satisfaz a necessidade dos passageiros, ainda que a expansão das instalações – a acontecer – seja “imprescindível”. Um analista do sector e passageiros esperam melhorias. Em Novembro de 1989 deu-se início àquele que foi considerado, na altura ainda da administração portuguesa, um dos grandiosos projectos de Macau. Seis anos depois, em Junho de 1995, consegue, com sucesso, fazer-se o primeiro voo. A cerimónia de inauguração acontece, então, no dia 8 de desse mesmo ano. “O que queríamos era construir um aeroporto de boa qualidade dentro de um curto prazo. Este foi um recorde: demorou menos de quatro anos para a construção, porque a maioria de trabalhos foi feita entre 1992 a 1995”, disse António Diogo Pinto, director da CAM na altura. Mudanças a acontecer Sandro Kou, director do Departamento do Desenvolvimento de Infra-estruturas, da Sociedade do Aeroporto, falou com o HM sobre as mudanças nas infra-estruturas do Aeroporto ao longo dos últimos 20 anos e aponta que estas tiveram em conta, sobretudo, as necessidades da sociedade. “As infra-estruturas do Aeroporto passaram por muitas mudanças, correspondendo às necessidades de funcionamento e desenvolvimento dos negócios desde 1995. Muitos equipamentos foram instalados e renovados. Em 2005, criámos um centro logístico e de transporte de bens e expandimos as portas do aeroporto. Até agora, existem 24 portas, que conseguem satisfazer o volume máximo de passageiros, que é de seis milhões por ano”. Desde 2009 que a CAM implementou o sistema “Comunicação, Navegação e Supervisão” (CNS). O director explica-nos que esta é uma instalação que ajudou e muito na gestão do transporte aéreo. Todo o plano ficou concluído entre 2012 a 2013, aumentando “de larga forma a eficácia do Aeroporto”, bem como a segurança da aviação. As obras não param por aqui. No próximo ano, a CAM vai construir um hangar de aviação comercial para desenvolver, estacionar e reparar mais jactos corporativos. Mas Sandro Kou prefere destacar a expansão da zona norte do Edifício do Terminal, que já começou em Novembro. O planeamento já começou há dois anos, mas é urgente até porque a CAM quer mais pessoas a passar por cá. “O actual Edifício do Terminal tem uma capacidade máxima de volume de seis milhões de passageiros por ano. Mas este ano o volume de passageiros já ultrapassou os 5,5 milhões. Nos futuros dois anos, quando os negócios se desenvolverem de forma estável, é possível ultrapassarmos o número máximo, o que vai fazer com que o edifício actual fique saturado.” Negócios e bens Sandro Kou já trabalha na CAM há nove anos e diz que, assim que houver a expansão do terminal – que termina no fim do próximo ano – a capacidade de volume de passageiros poderá atingir os 7,5 a 8,5 milhões por ano. Regressando ao passado, Samuel Tong Kai Chung, director da Associação de Estudo de Economia Política de Macau, explica que as funções do Aeroporto Internacional de Macau eram mais para serviços “políticos” do que económicos. “A primeira fase da aviação de Macau concentrava-se em actividades grandes para preparar a Transferência de Soberania de Macau. Na altura, como ainda não existia ligação directa entre a China continental e Taiwan, a maioria dos voos servia a comunicação indirecta de pessoas dos dois lados, bem como o transporte de bens”, disse ao HM. Tong explica que, antes da abertura do Aeroporto Internacional de Macau e dos voos directos entre Taiwan e China em 2008, muitos comerciantes de Taiwan ou as pessoas cujos familiares estavam na China continental tinham que fazer escala em Hong Kong. Mas depois muitos acabaram por escolher Macau. “Na altura já existia uma medida que permitia que os passageiros não tivesse de voltar a fazer check-in das bagagens na escala”, explica. O também membro do Centro de Estudos de Políticas de Aviação Ásia-Pacífico da Universidade Chinesa de Hong Kong relembra o porquê da necessidade de mudança do modelo de operação. “Devido ao desenvolvimento económico da China continental, a procura de viagens para o estrangeiro cada vez aumentou mais. Macau, sendo um destino de turismo, pôde ter um aeroporto que serve mais para os viajantes do continente”. Boas notícias para uns, mas nem tanto para outros. Três anos depois da inauguração do Aeroporto, em 1998, a Companhia de Transportes Aéreos de Portugal (TAP) suspende os voos directos entre Macau e Lisboa. A ideia principal mantinha-se, segundo António Barros, director do Aeroporto, que falou na semana passada à Lusa: “atrair voos internacionais de longo curso”. Algo que, diz, é muito difícil. “Normalmente as companhias têm tendência em procurar ‘placas giratórias’ regionais capazes de gerar tráfico para rentabilizar as rotas. Não é o nosso caso, somos um aeroporto muito pequeno. Os voos de longo curso são bem-vindos, mas não temos tido grande sucesso. Já houve e tem havido contactos com vários destinos e agências, estudos de mercado, mas o transporte aéreo é um negócio e ninguém vai operar se não tiver lucros”, acrescentou. Mesmo assim, Barros acredita que “com um bom estudo de mercado e uma boa política de marketing” seria possível a TAP regressar ao território. Problemas críticos Nem tudo são rosas. Samuel Tong já trabalhou numa companhia aérea de Taiwan e é assessor de estratégias da CAM há vários anos. Do seu ponto de vista, existem três elementos importantes que decidem o desenvolvimento do Aeroporto. “Primeiro, os hardware, incluindo o corredor, o espaço do terminal, movimentos de voo, a entrada e saída de passageiros e o movimento de bens.” Depois, os direitos de voar. “Mesmo que a Autoridade de Aviação Civil (AACM) já tenha assinado contrato de cooperação com mais de 40 regiões, na prática, todas as ‘liberdades do ar’ emitidas por Macau são monopolizadas pela Air Macau. Isto porque o contrato de exclusividade foi concedido pelo Governo, todos os voos que partem em Macau pertencem à mesma empresa, as empresas aéreas de outros países que assinaram contratos de voos bilaterais só podem chegar a Macau.” O analista aponta que existem investidores que querem criar empresas aéreas sediadas no território e criar voos com partida de Macau, mas tem sido “impossível” e acabaram por desistir, porque o direito de exclusividade está na Air Macau. “Não é uma boa situação”, defende. Samuel Tong considera que o Governo precisa de fazer melhor se quer atrair mais companhias que prestem serviços em Macau. A dificuldade em desenvolver voos de longo curso, contudo, está precisamente em não se quebrar o monopólio dos direitos do ar, porque não há competição. “Isso é uma restrição ao desenvolvimento de Macau”, aponta. O terceiro elemento importante tem a ver com a área de voos – a zona do Delta do Rio das Pérolas está tão densa que começa a haver engarrafamentos. Situação tal e qual como nas estradas, diz. “Os atrasos nas partidas ou chegadas de voo podem não ser um problema das empresas, mas dessa situação. Hong Kong, Macau, Zhuhai e Shenzen são tão perto que os movimentos de voo influenciam-se uns aos outros. A área aérea é limitada, é preciso coordenação de cada parte”, indicou. Competição e desafio “Raramente existe um aeroporto tão lotado numa cidade tão pequena na zona do Delta do Rio das Pérolas”, avança Samuel Tong, que considera que a competição em redor da região tem aumentado. Tanto que, avisa, se o aeroporto de Macau não tiver voos frequentes ou bilhetes mais baratos, os passageiros preferem passar a ir apanhar aviões a Hong Kong ou Shenzhen. Sandro Kou, director do departamento de infra-estruturas “Em 1995, o Aeroporto era pequeno, mas comparado com os das regiões vizinhas, já era mais moderno e confortável. E agora, se fizermos a comparação novamente com os outros do interior da China, de Hong Kong, de Singapura, de Incheon, na Coreia de Sul, onde a qualidade dos serviços aumentou muito rápido? Como é que fica Macau? No âmbito de hardware, é preciso satisfazer mais a necessidade dos movimentos de voo e de bens e, ao mesmo tempo, melhorar a experiência dos turistas, incluindo os serviços comerciais, os transportes dentro da cidade”, disse, explicando que tudo está interligado. “Se os passageiros chegarem a Macau mas demorarem muito tempo a esperar por autocarros, além dos autocarros de casinos, precisam de chamar táxis ou carros privados e isso afecta a sua experiência em Macau, levando a que eles não pensem no futuro vir a Macau. Escolhem outros aeroportos”. Além disso, Samuel Tong frisa ainda outro desafio que o aeroporto enfrenta: a conclusão da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau. “Quando as pessoas de Macau ou da China continental conseguirem chegar a Hong Kong em 30 minutos, em vez de apanharem ferry, ainda haverá mais competição para Macau”. O analista sugere uma separação de trabalhos entre vários aeroportos. “Fiz um estudo, acho viável fazer como se faz em Londres: os aeroportos da zona do Delta podem [formar sinergias]. Por exemplo, Hong Kong responsabiliza-se por voos internacionais, Macau pode fazer mais voos de baixo custo e voos comerciais que servem para as MICE e Jogo”. Tong admite que é difícil chegar a esse ponto, devido aos interesses de cada parte. Um mini-aeroporto O director do Departamento de Infra-estruturas da CAM assegura que uma das grandes preocupações da empresa são os passageiros. Macau, contudo, não é tão difícil de agradar como os grandes aeroportos na opinião do responsável, precisamente pelo tamanho. “A nossa vantagem é ser pequeno. Sendo um aeroporto de dimensão pequena conseguimos fornecer serviços facilitados e eficazes para os passageiros. Além disso, introduzindo um sistema informático para criar um Aeroporto mais tecnológico, diminuímos o tempo de espera dos passageiros. A criação de um “aeroporto verde” é também um dos trabalhos principais da CAM. Sandro Hou explicou que, no ano passado, a Associação Internacional de Aeroportos emitiu um certificado de redução de emissões. Samuel Tong “Melhorámos o sistema do ar-condicionado há vários anos. Utilizamos lâmpadas LED e uma parte dos carros eléctricos funcionam no hangar de aviação, assim como adquirimos uma máquina que transforma restos de comida em adubo. Tudo isso é para a protecção ambiental”. Na zona de Chegadas do Aeroporto, encontrámos Vivian e Lilian. São amigas, proveniente de Cantão. A primeira impressão do Aeroporto para elas? É pequeno, mas vale a pena vir a Macau para apanhar voos baratos para viajar para a Tailândia, por exemplo, até porque a diferença de preços face a Cantão é de centenas de patacas. Vivian elogia ainda o transporte entre o Aeroporto e as Portas do Cerco. Lilian considera que o Aeroporto de Macau é mais moderno, ainda que comparado com o de Cantão, “seja apenas um mini-aeroporto”. Falta é, dizem, adicionar um tapete rolante para facilitar o transporte de bagagens. Na fila de espera do check-in, encontrámos o senhor Ho, um comerciante local, que tem de viajar seis vezes por mês por causa do trabalho. Diz que o aeroporto de Macau é demasiado simples e não se mostra muito satisfeito com a segurança. “Os funcionários são mal-educados. Só verificam as bagagens mas parece que são superiores a nós. É preciso melhorar. Este residente de meia-idade considera que o Aeroporto de Macau não se pode comparar com o de Hong Kong, nem de Singapura. Ainda assim, elogia a zona de fumadores: o ventilador tem boas condições. O senhor Ho diz ainda que não gosta que existam poucos restaurantes. Além de lojas isentas de imposto no terminal, não há mais instalações, diz, tendo ainda outras queixas. “A Air Macau é famosa pel atraso de voos”, avançou Ho, que já teve várias experiências destas. Chon é também residente de Macau e não gosta do Aeroporto pela sua “impressão demasiado simples e por não ter quase nada”. Contudo, o facto do Aeroporto ser mais pequeno, faz com que seja mais fácil chegar ao avião. “Não é como noutros aeroportos, onde é preciso gastar muito tempo à procura da porta”. Mais lojas é um dos pedidos da jovem.
Leonor Sá Machado BrevesDeputados querem controlar o PIDDA trimestralmente Os deputados mostraram ontem vontade de que os gastos do Plano de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração (PIDDA) possam ser revistos trimestralmente. A notícia vem de Cheang Chi Keong, presidente da 3.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL), que ontem voltou a analisar o orçamento de 2014. Em termos de trabalhos futuros, a Comissão mostrou a Lionel Leong a vontade de estar mais por dentro das despesas do Governo. Além disso, Cheang Chi Keong anunciou ainda que “o Governo já está a fazer os trabalhos preparatórios” para apresentar a proposta da Lei do Enquadramento Orçamental, algo que já tinha sido anunciado. O diploma prevê a avaliação prévia, por parte dos deputados, dos montantes que cada obra pública vai custar, dando-lhes assim mais poder decisório. “O PIDDA tem sido alvo de atenção devido à sua baixa taxa de execução”, adiantou o presidente. Assim, acrescentou, “há necessidade de rever o Regime de Aquisição de Bens e Serviços, “em vigor há 26 anos”. Outra das questões tem que ver com a possibilidade que a actual legislação dá de transferir verbas de uma tutela para a outra. O Governo quer impedir esta tendência e a Comissão concordou. “O Governo quer orçamentos específicos para coisas exclusivas”, afirmou Cheang Chi Keong. Quanto à análise dos gastos efectuados em 2014, o mesmo deputado assegurou que o parecer da Comissão será assinado até 14 de Janeiro.
Andreia Sofia Silva BrevesGoverno | Criado Departamento de Produção Legislativa A fusão da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Justiça (DSAJ) com a Direcção dos Serviços de Reforma Jurídica e do Direito Internacional (DSRJDI) acontece em Janeiro e prevê a criação do Departamento de Produção Legislativa, com duas divisões. À primeira divisão caberá a elaboração e revisão dos grandes Códigos, bem como “dos outros principais diplomas legais relacionados com a vida quotidiana da população e a economia”. Já a segunda divisão fica responsável por assegurar “os trabalhos relativos à elaboração, avaliação e revisão dos diplomas legais” tratados na primeira Divisão. Ainda na área das leis, é criado o Departamento de Estudo do Sistema Jurídico e Coordenação Legislativa, com duas divisões, com o objectivo de reforçar “a execução dos trabalhos de centralização da coordenação legislativa”. Em relação à área do Direito Internacional, será criado o Departamento dos Assuntos de Direito Internacional e Direito Inter-regional. A nova DSAJ vai ter 250 trabalhadores. O Conselho Consultivo da Reforma Jurídica vai passar a debruçar-se sobre “os assuntos relacionados com a centralização da coordenação legislativa”, incluindo sugestões sobre melhorias a realizar ao nível do plano legislativo.
Filipa Araújo Manchete PolíticaVeículos | Aprovado aumento do imposto a partir de Janeiro de 2016 O hemiciclo aprovou o aumento do imposto sobre veículos motorizados, prevendo a diminuição do número de carros e motas nas estradas em 1%. Os autocarros de turismo perdem, a partir de Janeiro, a isenção do mesmo imposto [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]alteração ao Regulamento do Imposto sobre Veículos Motorizados foi ontem aprovada na generalidade e especialidade pelos deputados do hemiciclo, depois de pedido um processo de urgência. Alguns deputados não se mostraram adeptos do artigo correspondente às disposições de transição, que permite o pedido de isenção durante um determinado período, mas a subida de 10% a 20% foi aprovada. A possibilidade do aumento dos impostos, que entram em vigor em Janeiro, poderem não diminuir efectivamente o número de veículos – objectivo do Governo – foi também muito apontada pelos deputados, mas o fim da isenção deste imposto para os shuttle-bus dos casinos e agências de viagens foi o assunto mais debatido pelo hemiciclo. A deputada Melinda Chan quis saber se o Governo estudou de forma aprofundada as consequências desta aprovação. Helena de Senna Fernandes, Directora dos Serviços de Turismo (DST), admite que é possível que se sinta um impacto no custo das excursões, mas diz que as repercussões não vão ser graves, dado o aumento do número de visitantes do território. Em termos práticos, depois da entrada em vigor da lei agora aprovada são alteradas as Tabelas de Taxas de Imposto sobre Veículos Motorizadas, havendo um aumento entre 10% a 20%, com maior incidência nos veículos ciclomotores. São também, como anteriormente referido, revogadas as normas de isenção do imposto para veículos de transporte de passageiros destinados ao turismo, atendendo-se, argumentou o Governo, ao “princípio de igualdade tributária”. De acordo com o director dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, Lam Hin San, a ideia é que o aumento do imposto vá reduzir o número de veículos em 1%. Até ao final de Setembro havia 246.452 veículos em Macau, dos quais 52% de duas rodas. Só este ano, o aumento foi de 5,2% no primeiro trimestre comparativamente a 2014. Lam Hin San diz ser necessário “tomar medidas mais duras se quisermos uma maior redução”. Excepções Um dos artigos que mais polémica causou está relacionado com a norma transitória da lei, que indica que o diploma “não se aplica aos requerimentos para reconhecimento de isenção do imposto relativo à transmissão de veículos desde que estes sejam acompanhados de parecer vinculativo favorável da DST e apresentado na Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) dentro de 15 dias posteriores à data de entrada em vigor de presente lei. O parecer vinculativo favorável mencionado no número anterior deve ser requerido antes de entrada em vigor de presente lei”. Este foi o artigo que reuniu seis votos contra, ainda que tenha sido aprovado pelos restantes 25 deputados. O deputado Ng Kuok Cheong chegou mesmo a dizer que a norma não é justa, acompanhado de Kou Hoi In, que apontou a falta de clareza nas disposições transitórias. Um dos maiores problemas apontados prende-se com o facto de poderem vir a ser aceites isenções para veículos que não permitam, assim, a diminuição destes nas estradas. O Secretário para a Economia e Finanças reforçou o cunho de consenso. “Este artigo, sobre as disposições transitórias é resultado da troca de opiniões com a DST”, apontou.
Filipa Araújo Manchete PolíticaDeputada defende igualdade de género como assunto prioritário A deputada Wong Kit Cheng apelou ao hemiciclo o reforço na promoção à igualdade de género em Macau. Mais protecção e oportunidades para as mulheres devem ser prioridades do Governo [drpocap style=’circle’]M[/dropcap]esmo seguindo-se pela Declaração e Plataforma de Acção de Pequim, no âmbito da 20ª Conferência Mundial sobre a Mulher da Organização das Nações Unidas (ONU), “continua a ser difícil a completa concretização do desenvolvimento da igualdade de género”, em Macau. As palavras são da deputada Wong Kit Cheng, que falou ontem, em sessão plenária na Assembleia Legislativa, onde apontou o que diz serem inúmeros obstáculos encontrados pelas mulheres na participação dos assuntos sociais. “Os papéis tradicionais que o homem e a mulher desempenham são estereotipados, a taxa de participação das mulheres nos assuntos sociais continua baixa e existem ainda outros problemas, tais como os casais empregados, a pressão das mulheres que trabalham, a violência familiar, etc”, argumentou a deputada. Citando vários relatórios do sector, que demonstram que “os cuidados prestados às famílias e aos filhos continuam, na sua maioria, a ser efectuados pelas mulheres”, Wong Kit Cheng afirma ainda que “em comparação aos outros trabalhadores, as mulheres que trabalham e que têm filhos menores dão menos importância ao desenvolvimento da sua carreira profissional, pelo que directa, ou indirectamente, os seus rendimentos são menores do que os dos cônjuges”. Avante camaradas Perante as “evidentes” desigualdades, a deputada propõe que o Governo siga os princípios definidos na Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres e transformar os referidos princípios em lei locais que as protejam, nomeadamente, a proposta de Lei de Prevenção e Correcção da Violência Doméstica. A alteração da definição dos crimes sexuais do Código Penal, assim como as Leis das Relações de Trabalho e a Lei de Bases da Política Familiar, foram outros pontos defendidos pela deputada. “Há que acelerar a definição de leis e mecanismos de queixas para a protecção das mulheres contra actos de discriminação e assédio sexual no trabalho”, apontou. Como segundo ponto, a deputada defendeu que é necessário que o Governo assuma uma postura de adopção de medidas para diminuir o stress das mulheres. Esta promoção é possível através de políticas de conciliação trabalho-família, reforço dos serviços de creche e de apoio aos idosos, com vista a que as mulheres possam “dar o salto e saírem de casa e participarem na vida social”, assegura. Abaixo a tradição Por último, Wong Kit Cheng diz ainda que deve ser reforçada a sensibilização sobre o princípio de igualdade, alterando, gradualmente, os conceitos tradicionais quanto ao papel do homem e da mulher. Durante a apresentação das Linhas de Acção Governativa, o Governo garantiu que vai elaborar o Relatório-Meta do Desenvolvimento das Mulheres de Macau. Contudo, ainda está por apresentar o plano, também defendido pelo Governo, de desenvolvimento, metas, estratégias e medidas necessárias favoráveis à participação das mulheres na sociedade e no desenvolvimento económico do território. “Quanto à protecção jurídica e ao intercâmbio internacional das mulheres, nomeadamente, nas áreas de economia, educação, saúde, gestão, ambiente e igualdade de género, solicito ao Governo que apresse a conclusão do relatório, defina planos a curto, médio e longo prazo para o desenvolvimento das mulheres e reforce a promoção da igualdade de género”, rematou a deputada.
Leonor Sá Machado BrevesUM | Galardoados académicos de Ciências Sociais e Direito Doze académicos da Universidade de Macau (UM) foram galardoados pelo seu trabalho na área das Ciências Sociais e Humanas e do Direito, com 11 deles na primeira área e um no sector das leis. Este ano, foram premiados 56 documentos de investigação de autores da China, de Macau, de Taiwan e de Hong Kong. De entre 293, 94 eram monografias e outros 199 eram artigos. A entrega de prémios teve lugar no passado dia 14 e pretendeu mostrar os feitos da área de Ciências Sociais e Humanas. Entre os premiados está Arbitrariedade Comercial entre a China e o Mundo Lusófono, de Fernando Dias Simões, Ensaios sobre a História de Macau durante a Dinastia Ming, de Tang Kaijian, e Analisando Diferenças Culturais pela Tradução, de Zhang Meifang. Também a área do Direito teve o seu reconhecimento, com o professor Tu Guangjian, da Faculdade de Direito, a receber o bronze na categoria de Excelência Académica da Sociedade Chinesa de Direito Privado Internacional. O galardão teve em conta o seu artigo Forum non Conveniens na República Popular da China – Revisto.
Flora Fong BrevesInspector da PJ apanhado numa acção de burla Um inspector da Polícia Judiciária (PJ) está a ser acusado de ajudar a colocar mulheres do continente a trabalhar como empregadas de limpeza nos hotéis de Macau, trabalho pelo qual receberia comissões. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, o inspector, de apelido Ho, ganhou cerca de cinco mil renminbi por cada uma das 320 vítimas desde Julho deste ano, sendo que este terá prometido trabalhos em hotéis no Cotai com salários de oito a dez mil patacas. O porta-voz da PJ, Chan Cho Man, garantiu que foram feitas buscas à casa do inspector, onde foram descobertos vários cartões de residentes da China continental para a sua chegada a Macau. O responsável disse que a PJ está preocupada com este tipo de burlas, tendo já sido aberto um processo disciplinar com mais investigação.
Leonor Sá Machado BrevesJuros | Aumento nos EUA pode inflacionar prestações de casas O aumento de 0,25% dos juros de empréstimo pelo Banco Federal dos EUA pode provocar uma “grande pressão” nos residentes de Macau que estão a pagar prestações de casa. Segundo o Secretário para a Economia e Finanças, a subida deste juro pode ter consequências para a região. “Estamos indexados ao dólares de Hong Kong, que por sua vez está indexado ao dólar norte-americano. Os EUA aumentaram esse juro e é claro que temos que seguir a nossa Autoridade Monetária, seguir o ajustamento”, começou por dizer. “Entramos agora numa fase de aumento de juros e esse aumento vai decorrer de forma ordenada e vamos estar muito atento quer a nível do sector imobiliário, quer noutros sectores. Se os juros continuarem a subir, é claro que vai ter impacto para a população que paga prestação de casa, vai ser uma grande pressão”, anunciou o Secretário ontem, à margem de uma reunião da 3.ª Comissão Permanente da AL.
Anabela Canas de tudo e de nada h | Artes, Letras e IdeiasOnde moram as algas – Conto de quase natal [dropcap style=’circle’]À[/dropcap]procura daquela latinha de chá onde guardo o menino Jesus. A única figurinha do presépio que tenho minha. Há quase vinte anos já era vintage, agora continua, porque o menino não cresceu. Em minha casa, a dos meus pais, também o presépio toda a vida se guardou numa caixa de sapatos. Este ano o meu presépio, reduzido a esta única figura como sempre, tem um cenário diferente. Um asteroide. Cinza, queimado, de Raku. Penso nele como o pequeno planeta do principezinho. A sensação de não ter havido salvação é a mesma para um e para outro. Defraudada humanidade pela troca do ser transcendente que era imaterial, superior e triplo sem o ser, por um humano na arrogância do próprio deus, idêntico aos outros, mas com missão impossível. Por isso voltou. Morreu por amor, supostamente, e para aquilo que não conseguira em vida, a salvação dos mortais, que talvez não se reconhecessem na fé por um igual. Voltou aos céus para que a humanidade pudesse voltar interiormente o olhar para cima. Suponho que é mais ou menos a isto que Žižec chama a monstruosidade de Cristo. Morrer por amor é lindo, afinal. E difícil para além de todas as metáforas. Talvez ele fosse então superior. Não estou preparada para mais um Natal. De novo. E isto não é um conto de natal. Que não saberia escrever. É do lugar onde moram as algas. Na minha casa. E, a fazê-lo seria afinal muito curto, a começar na palavra não. Ou a acabar. Somos pessoas que precisam de vez em quando de sair de si. É o que farei mais uma vez. Arrastada para outro lugar. A pensar que talvez valha a pena ou a pensar que não tenho coragem e que depois vou decidir aliviada que será a última vez. E nunca é. Como nada do que pensamos ser. Vem este tempo que não vem de lado nenhum e que não tem nenhum lado bom. Sair à rua, e todos os desconfortos etéreos e fundos da alma ficam difusos por detrás de uma sensação mais urgente. Dominadora. A de um mal-estar exterior, físico, sem protecção de abafos que valha. Há sempre uma parte do corpo a receber o frio gelado. Há a crescente humidade a tomar conta da roupa a chegar lentamente ao mais interior. A luta contra o vento de frente, o chapéu que se vira. O nariz quase congelado. As mãos escondidas com força. Não há maneira de este tempo odioso de inverno ser suportável. Também porque a alma anda caída de pequenas alturas, é certo. A queda não é grande. Ou então é uma maneira de todo o transtorno das sensações, todo o desgosto omnipresente, se substitua, em parte, àquela infelicidade maior. O inverno há-de passar como sempre. Naquela noite, outras sensações, uma casa com gente que bebe até aos confins da alma, que dança e dança mesmo em cima da mesa, que despeja agruras, e ingredientes a cru, pelo meio das cartas. Do Tarot. Despindo-se de si como é urgente de vez em quando, e como se de um casaco pesado demais para se trazer em casa. Há momentos em que um adulto tem que se sentar no chão, ou subir para cima da mesa. Intervalos de si. Sair do lugar. E o caminho para casa, depois de vencido um sono quase mortal a certa altura. Caminho curto nas ruas já desertas. Quase desertas. É ainda a luta do corpo a querer despertar o suficiente para chegar ao desmaio na cama, no calor e no arrumar da noite. Os passos a tornar-se rápidos, a dor de cabeça a subir de tom, mal escondida por detrás daquele gelo de noite, como um saco de gelo natural sobre a fronte. A dor de cabeça a tornar-se insuportável à velocidade a que os passos se tornavam ritmados. Insuportável lá atrás, mas estancada pelo gelo. A perturbação das sombras inquietantes que se tornavam várias ou voltavam a uma só. A fazer querer olhar em volta, a sentir-me seguida. Que recuavam ou avançavam mais depressa do que os meus passos e sem descolarem deles. Como um grupo incerto a diferentes velocidades, que me acompanhasse. Solto de mim. Independente no seu móbil, mas ironicamente. E era. Nas luzes amareladas das ruas. O frio da noite a sobrepor-se à melancolia que volta a tomar conta da memória até ali entretida com outras vozes. É o que o frio tem de bom. Ser mais forte que outros males. O mesmo para males de qualquer coisa. E aos mal- de- amor ou mal de amar, e dos males do amor, há dias em que só nos acompanha o amor. Outros em que só nos acompanha o mal. Como duas sombras diferentes que por vezes se arrastam pelo chão, velozes ou a deixar-se ficar um pouco para trás. E que nunca se desprendem dos passos. Dependendo das luzes da cidade que percorro. Mesmo com o frio e mesmo enquanto dormem de pálpebras cerradas, são amareladas e quentes. A noite presta-se. E há aquilo sempre. Aquilo que sempre me aperta a alma de dentro. Ser com dúvidas de ser. De o ser. Momentos da noite. Uns são os meus e outros de ninguém. Que sou. O sono a vencer de novo. Boa noite ao candeeiro da mesa. Só umas palavrinhas sobre o trabalho, antes de dormir: o grande problema é quando o hoje parece não existir, mas somente o ontem, na sua etérea, progressiva diluição, e o amanhã na sua inultrapassável ainda não existência e imprevisibilidade. E, quando, neste mecanismo de resistência ao autoapagamento, apenas tenho como suporte cristalizar no eterno presente só meu. E aí, o que sobra são sentimentos. Os mais duradouros, apenas. E nesses, custo a ancorar os mais inseguros com tendências fugidias. Porque os resistentes são como o vírus, que instalado, simultaneamente se alimenta e destrói a partir de dentro. Primeiro a incerteza do que existe. Depois, quando a incerteza começa a ser substituída por formas ainda ambíguas, instala-se uma primeira fase de insegurança. A partir daí crescem na mesma razão e expressão as possibilidades de definição das formas, que tendem a assumir progressivamente com a maior clareza diferentes vocações, e as potencialidades de insegurança. E um dia, o culminar do lirismo. Momento seguinte: terror absoluto. O que no fundo poderiam ser metáforas para ontem e amanhã…E são duros e resistentes, ambos os sentimentos. É o que por agora existe, e o hoje é um nada só meu. Assim, termino como comecei. Ou não…porque na pintura, na vida, no jogo, os grandes jogadores são os que perdem e ganham grandes fortunas. E, perder e ganhar pode ser ainda uma outra maneira de dizer ontem e amanhã. A pensar no desabafo de Virginia Wolf: “Oh the delicacy and complexity of the soul”, quando deambula pelos escorregadios meandros da alma (“ the slipperiness of the soul”), e fantasia acerca de escrever um diálogo da alma consigo própria: “As for the soul…the truth is, one can’t write directly about the soul. Looked at, it vanishes; but look at the ceiling, (…) at the cheaper beasts in the Zoo which are exposed to walkers in Regent’s Park, and the soul slips in. It slipped in this afternoon.” A tentar pensar nas pequenas, muito pequenas coisas que trazem sempre agarradas metáforas possíveis. As coisas de nada, e de entre essas, a tentar fixar-me na mais pequena em cima da mesa. A tentar fugir a uma prévia definição de um tema, sempre algo triste. A tentar que algo venha por si. A enrolar um cigarro. O filtro. Já para não pensar na mortalha como a roupa que todos os dias vestimos para morrer mais um pouco e isso acontece. O filtro. Ou o filtro do café. Também. Às vezes sinto-me tão perdida. Tão, tão perdida nos labirínticos corredores. Que gostava que tudo fosse tão simples como as minhas latas de chá. Levantar pela manhã e começar o dia a abrir janelas. Estender a mão para a prateleira do meio. Aquela em que a caixa de lata do cacau tem café, a latinha dos biscoitos de limão tem bolacha-maria, a dos bombons tem orégãos, a do chá de Jasmim tem chá de três anos, a do Earl Gray, raiz de Valeriana, a do Pu-Erh, Camomila, a de Orquídea, Tília. E assim sucessivamente…E depois aquela mais nova de todas, oferecida. Decorada com rosas que tem dentro, simplesmente, chá preto com pétalas de rosa. Ao lado, o bule da avó, o da bisavó e o da tia- avó. Um outro de um mercado de rua em Cantão. Esta prateleira está em ordem. Ao lado, a caixa do pão vinda dos anos cinquenta, guarda chocolates e algas Wakame. Todos os dias, por assim dizer começo e acabo a estender a mão para aquela prateleira de enganos inofensivos. Pelo meio está o pior. Se tudo fosse tão simples. Como elas. Que basta abrir ou simplesmente abanar. Todas produzem um tsch tsch tsch diferente. Todos os meus dias começam e muitos deles acabam naquele estender da mão, para aquela prateleira. E com tudo o que trazem e levam pelo meio. Naquele dia, algo em mim se recusava a acordar. Nem mesmo porque o sonho fora mau. É mau sonhar com os anjos. De um modo geral o sonho é menos sonho e naquela noite teve a realidade que os sonhos têm, e que entristece não mais do que a realidade. Uma daquelas manhãs em que o olhar é mais lento e fixo. Fixado por momentos no filtro do café. Fixado nessa realidade tremenda. Depositar uma essência na fronteira de que passa só uma realidade líquida, imparável mesmo ao filtro. Que se bebe todos os dias. Igual, diferente. Nunca a mesma, mas sem uma identidade própria. Como se todos os dias se tomasse o mesmo café. Que passa. Sem deixar nada de específico. Talvez um dia, muito discretamente mais amargo. Num outro, um tanto excessivamente açucarado. Pequenas diferenças desprezáveis. Há um único café. E do pó nada mais a dizer, que não de que ao pó retorna. A origem, a essência, não permanece, é discreta e descartada sem se lhe sentir o sabor directo. Da realidade visível também. Algo fica preso no filtro do café. Mediatização existencial logo pela manhã. Ausência de corpo. De alma. Como um livro. E que mora em outro lugar. Como as algas.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeIAS | Jogo problemático sai da alçada da Toxicodependência A partir de Janeiro, o Instituto de Acção Social (IAS) vai passar a ter a Divisão de Prevenção e Tratamento do Jogo Problemático, saindo do actual departamento da Toxicodependência. Será ainda criada a Direcção dos Serviços Correccionais [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]fusão da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Justiça (DSAJ) com a Direcção dos Serviços de Reforma Jurídica e de Direito Internacional (DSRJDI) vai levar a mudanças internas no Instituto de Acção Social (IAS). A principal prende-se com a criação de uma divisão exclusiva para lidar com o vício do Jogo, que até então funcionava sob alçada do departamento que lida com casos de droga. Segundo a apresentação ontem feita em conferência de imprensa do Conselho Executivo, vai ser criada a Divisão de Prevenção e Tratamento do Jogo Problemático, incluída no Departamento de Prevenção e Tratamento da Dependência do Jogo e da Droga. O mesmo departamento vai ainda incluir a Divisão de Tratamento e Reinserção Social, bem como a Divisão de Educação para o Combate à Toxicodependência. O Governo entende que “com o desenvolvimento da indústria do Jogo e de entretenimento, os problemas causados [pelo vício do jogo] a indivíduos, a famílias e à sociedade tornam-se cada vez mais complexos, pelo que é necessário alargar a dimensão dos trabalhos de prevenção, aprofundar os trabalhos sobre aconselhamento para a abstenção, promover o jogo responsável, dar atenção à população de alto risco e prestar os serviços de apoio aos trabalhadores da indústria do Jogo”, lê-se num comunicado divulgado. O IAS vai ainda acolher o Departamento de Reinserção Social, que até então estava sob alçada da DSAJ, ficando com um total de seis departamentos e 17 divisões. O número de trabalhadores passará dos actuais 192 para 232. O Executivo também decidiu criar uma nova direcção de serviços onde ficarão integrados o Instituto de Menores (IM) e o Estabelecimento Prisional de Macau (EPM). É a Direcção dos Serviços Correccionais, que vai assegurar “a gestão dos serviços prisionais e a execução de medidas tutelares dos jovens internados”. A nova direcção ficará encarregue de gerir o Fundo Correcional, ficando com um total de 139 trabalhadores. Já o corpo de guardas prisionais da direcção vai contar com 617 profissionais. Esta alteração prevê ainda a revogação do regulamento administrativo sobre o EPM, que data de 2003.
José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasA mesa de pedra [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]ste dia 18 de Dezembro marca duas datas que os portugueses prefeririam nunca terem existido. A de 1582 é relativa ao reconhecimento oficial pelas autoridades de Macau de ser Filipe II de Espanha o Rei de Portugal. Já a de 1961 relaciona-se com a ocupação da Índia Portuguesa (Goa, Damão e Diu) pelo exército indiano. Portugal, país pequeno que no século XVI tinha uma população de aproximadamente um milhão e duzentas mil pessoas, construiu um Império Oceânico, expressão de Luís Filipe Thomaz, utilizada para marcar a diferença com os impérios territoriais clássicos, tendo os monarcas portugueses começado a usar o termo de Império só nos finais do século XVIII. “O mar já não era um limite, mas, antes, o nexo essencial de união dos pontos de apoio na terra firme, (…) o próprio corpo do Império”. Segundo António Hespanha, o Império português era “fortemente marcado pela dispersão territorial” numa “descontinuidade espacial” que se estendia “por um vasto mundo que não podia dominar nem controlar se empregasse os expedientes tradicionais de administração” e por isso, “a coexistência de modelos institucionais”. Referência como nota, “No século XVII o Império holandês vai seguir o mesmo modelo, pela ocupação dos entrepostos anteriormente dominados pelos portugueses. Mas os holandeses criaram formas inovadoras, como as grandes companhias comerciais, concedendo à iniciativa privada um papel que, em Portugal, a Coroa desempenhava preferencialmente por si.” Assim, os portugueses, os primeiros a chegar e os últimos a sair dos territórios por onde se estabeleceram além-mar, tiveram um vasto “Império onde o Sol nunca se punha, do Brasil à China, passando pela África, pela Índia e pela Insulíndia” como refere Hespanha. Sistemas de governação Na China, desde a dinastia Tang, havia a tradicional política de permitir aos grupos de estrangeiros a viver no território de se governarem com as suas próprias leis e costumes, se elas não fossem incompatíveis com a paz e ordem do país e foi assim que, as autoridades chinesas aceitaram a existência do Senado, criado pelos portugueses em Macau no ano de 1583. Trazia o Senado a herança do poder local originário de um conceito antiquíssimo de governação proveniente da reunião dos anciãos escolhidos pela maturidade do seu saber e ponderação e que à volta da mesa de pedra decidiam, tanto sobre questões de justiça, como tomavam as resoluções sobre os destinos da comunidade. Debatiam os problemas da povoação e da sua população, dando conselhos e explicando o porquê das decisões tomadas. Já na Índia, os portugueses quando chegaram a Goa em 1510 encontraram um sistema de governação local na forma de gancarias. “Perde-se na noite dos tempos as origem das gancarias, associações decalcadas sobre o modelo das patriarcais e que são o maior monumento social da civilização indiana.” Jornal Heraldo, 4 de Abril de 1916, publicado em Goa.” No livro Os Municípios de Macau de Avelino Rosa encontra-se explicado o termo , que corresponde ao município, “deriva de concilium e traduz a ideia de comunidade de vizinhos”. Quando as questões eram importantes havia que chamar os homens bons que pela sua idade, experiência e situação económica, fossem reputados, prudentes e sabedores, ou mesmo a assembleia de vizinhos, os chefes de família, que formavam o concelho propriamente dito. “Os municípios em Portugal, que parecem remontar ao século X, desempenharam um importante papel de apoio à realeza, pelo menos até meados do século XIII, quer em termos de estabilização da vida social a nível local, quer nas lutas contra a nobreza…”. “O traço mais importante da administração concelhia era o carácter autónomo da sua administração, concretizado no reconhecimento, pelo poder central, de uma certa ordem jurídica local (contida no foral e nas posturas) e na existência de magistrados eleitos pelo concelho.” Aceitação das gancarias A organização social que os portugueses vieram encontrar em Goa, segundo descreve o Padre A. Silva Rego na História do Padroado Português do Oriente era de uma ilha, dividida em aldeias, em que os habitantes não possuíam as terras, pois elas eram de todos. Gão, que significa aldeia, vem do sânscrito grama. Do gão derivam as palavras gãocare, membro de associação agrícola da comunidade da aldeia e gãocaria, associação de gancares, casa de sessão ou a gerência da aldeia. Gancaria é, segundo Francisco de Sousa, “o ajuntamento de todos os gancares de uma aldeia, ou pelo menos uma pessoa de cada vangor”. E continuando com Sebastião Dalgado: “É indispensável a presença de pelo menos um membro de cada vangor na gancaria, a fim de se tomar um nemo, ou assento de interesse geral”. O vangor compõe-se de um grupo de famílias que são, ou consideram-se ser, de um tronco cujas origens remontam à formação das aldeias e são eles quem tem voto nas gancarias. Em cada família é o mais velho o vangor que se acorda e assina assuntos da gancaria. “Os funcionários e artífices principais, porque se dedicavam ao bem de todos, eram pagos pelos gancares (gãocares), sendo em geral os seguintes: chefe de aldeia, escrivão guarda, brâmanes para serviço de templo e para a instrução das crianças, carpinteiro, barbeiro, alparqueiro, oleiro, lavandeiro, ourives, médico, poeta, músico e bailadeira.” D. António de Noronha, sobrinho de Albuquerque, conquistou sem batalha a fortaleza de Hidalcão (o Palácio do Governo, actual Secretaria em Panaji, Goa) em Fevereiro de 1510. Afonso de Albuquerque tomou posse do castelo de Panjim e ao falar à população que lhe oferecia flores, disse respeitar a organização das gancarias. Quando a reconquistou em Novembro de 1510 e a escolheu depois para capital administrativa do Estado português da Índia, manteve essa promessa. Os portugueses identificaram as comunidades da aldeia com os municípios portugueses, pois ascende a 1526 o Foral dos usos e costumes, promulgado pelo Vedor de Fazenda da Índia, Afonso Mexia, e que era como os forais de Portugal o diploma, donde constavam os direitos, privilégios e usos que o Soberano prometia guardar aos povos. As terras das gancarias pertencem aos gancares e cada uma tem as suas leis transmitidas pela oralidade e nas reuniões dos seus membros. Para ser gancare a idade tem que ser superior aos catorze anos e só se o pai for gancare, os filhos o são. As resoluções têm que ser tomadas por vinte e cinco gancares no mínimo e o Chaudi (nome também de uma aldeia em Canacona, Goa) é o centro da comunidade das respectivas aldeias. Pela tradição eram doze membros, os mais velhos da aldeia, os representantes dos gancares, no Corpo Geral da Comunidade. Actualmente são cinco os lugares ocupados pelos eleitos por três anos, sem olhar à idade e saber. “A terra é da comunidade, não é do Rei de Portugal”, frase que ao longo de cinco séculos os gancares foram lembrando aos governantes portugueses, quando se assistia à doação de terras a nobres e a outros reinóis que por aí se quedavam. O Rei de Portugal, na pessoa do Vice-Rei ou Governador da Índia, só tutelava as terras da Comunidade, como actualmente é o Governador de Goa o seu representante máximo. Pago pelo dinheiro das gancarias, é um cargo tutelar que alia uma protecção institucional das comunidades ao exterior, à resolução final dos problemas internos que a comunidade não consegue resolver. Como seu representante, não é gãocare. Não era o Estado quem financiava os gancares, mas ao contrário, eles remuneravam o cargo tutelar que os representava para fora da comunidade e ajudava nas questões internas, que não encontravam consenso na decisão. Este sistema comunitário das aldeias existia antes da chegada dos portugueses e a Administração portuguesa preservou-o como “Ordenanças das cidades, vilas e aldeias e Câmaras gerais agrárias” com poder judicial e municipal. Mais tarde ficaram conhecidas como Comunidades de Goa. O Senado Já Macau, devido ao desejo dos mercadores portugueses contarem com um lugar permanente para esperarem a abertura da época de comerciar no porto de Cantão, foi-lhes permitido tacitamente pelos mandarins chineses aí construírem habitações permanentes, começando assim em 1557 a formação de uma povoação definitiva. Esta encontrava-se em território da China, mas os portugueses aí residentes tinham como autoridade máxima o Capitão-mor da viagem do Japão, representante do Rei e do Vice-rei ou Governador da Índia Portuguesa, quando nos meses de monção aqui esperava para seguir viagem. Nos tempos em que se encontrava fora, era Macau governada por um conselho espontaneamente formado pelos habitantes mais importantes, que em 1560, consistia num Capitão da Terra, num Ouvidor e num Bispo. Em 1582 chegaram a Macau as notícias da derrota em Alcácer Quibir de D. Sebastião, a morte do Cardeal D. Henrique e de ser Filipe II de Espanha o novo Rei de Portugal, o que levou ainda nesse ano, a 18 de Dezembro, os residentes a terem que aclamá-lo e as autoridades da cidade a reconhecê-lo, mas com a condição desta cidade servir de intermediária obrigatória das Filipinas, nas suas relações com a China. Segundo Montalto de Jesus, “para colocar a colónia fora dos governadores espanhóis” e “por desejo do bispo Belchior Carneiro, os colonos reuniram-se em 1583 para deliberar sobre qual a forma de governo que melhor se adaptaria às novas circunstâncias. A assembleia, presidida pelo digno prelado”, que o Padre Manuel Teixeira diz ser o Bispo D. Leonardo de Sá, “decidiu a favor de uma administração senatorial baseada nos privilégios municipais adquiridos, nos dias de antigamente, por concessão real a várias cidades de Portugal.” Assim, para complementar a Administração de Macau, por iniciativa do Bispo D. Leonardo de Sá deu-se em 1583 a fundação do Senado, que era composto por três vereadores, dois juízes ordinários e um Procurador. O Senado governava Macau e possuía amplos poderes no político, judicial e administrativo. Era no Conselho de Homens Bons, presidido pelo Ouvidor, que ao povo competia a escolha de seis pessoas para seleccionarem os cidadãos considerados mais aptos a desempenharem estes cargos no Senado. No final de um longo processo, que deixaremos para outra altura, eram indicados os nomes dos eleitos. Como não havia presidente no Senado, era a um dos três vereadores, com a idade de quarenta ou mais anos, que em rotação cada mês presidia às sessões e aos Conselhos Gerais. Os juízes ordinários, com mais de trinta anos de idade, decidiam sumariamente as causas civis. O Procurador era a pessoa mais importante e representava a cidade perante as autoridades chinesas, tendo-lhe em 1584 o Imperador chinês Wan Li conferido o título de mandarim de segundo grau, sendo ele até 1738 também o tesoureiro do Senado. Se em 1616 foi designado para Macau um governador permanente, este só em 1623 apareceu para tomar posse, sendo o primeiro Francisco de Mascarenhas (1623-26). No entanto, tal como acontecia nas Comunidades de Goa com as gancarias, aos governadores de Macau nomeados por Goa apenas lhes cabia a função de comando na defesa da cidade e eram presidentes do Senado, mas sem direito a voto, o que aconteceu até 1834. A separação de Macau em relação a Goa deu-se em 1844 e Ferreira do Amaral (1846-1849) foi o primeiro governador de Macau que não foi nomeado por Goa. Já o foro, pago pelos portugueses aos chineses desde 1573 para arrendar Macau, deixou de ser pago em 1849. Trouxemos este tema devido a hoje, 18 de Dezembro, ser uma data marcadamente ingrata para Portugal e emocionalmente triste para muitos dos que nos territórios portugueses da Índia nasceram e a tinham como pátria. Em 1961, a Índia Portuguesa (Goa Damão e Diu) foi invadida pelo exército indiano, que viera libertar dos ocupantes os territórios que faltavam recuperar à União Indiana, pois a Grã-Bretanha já tinha deixado de governar a Índia em 1947. Nesta frase encontram-se traduzidas as duas opostas visões, que dependem da perspectiva de quem fala, se pelo lado português, se pela posição indiana. A História poderia ter sido diferente, não fosse a intransigência de Salazar e Goa, Damão e Diu teriam ficado com a posição actual que rege Macau.
Sérgio Fonseca DesportoAutomobilismo | Andy Chang e Luís Sá Silva com temporadas incompletas [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]ndy Chang e Luís Sá Silva são os únicos dois pilotos com licença desportiva de Macau a competir em corridas de monolugares além-fronteiras. Para ambos, 2015 foi um ano difícil e 2016 ainda é uma incerteza. Sem capacidade financeira para cumprir a totalidade do Campeonato da Europa FIA de Fórmula 3, Andy Chang, ou Chang Wing Chung como também é conhecido, fez as últimas cinco provas – 14 corridas – da temporada de 2015 com o intuito de preparar a sua participação na Taça Intercontinental FIA de Fórmula 3 do Grande Prémio de Macau, substituindo na equipa inglesa Fortec Motorsport o chinês Cao Hongwei. Chang não foi além de um 18º posto como melhor resultado em corridas do europeu este ano, um resultado obtido no Autódromo Internacional do Algarve. No entanto, o piloto de matriz chinesa obteve um satisfatório 14º lugar na corrida rainha da especialidade nas ruas do território, o que lhe certamente dará uma motivação extra para o que há de vir. Sobre a próxima época, o jovem de 18 anos que reside em Oxford disse ao HM, durante o fim-de-semana do Grande Prémio, que ainda é “cedo para saber o que fazer”, mas confirmou que “gostaria de voltar à F3 ainda que para isso seja preciso encontrar apoios”. ma temporada ao mais alto nível no europeu de Fórmula 3 nunca ficará por menos de oito milhões de patacas, segundo o que apurou o HM. Pela mesma razão – falta de apoios – o angolano Luís Sá Silva teve igualmente uma época incompleta. “O Luís teve uma temporada curta uma vez que os apoios no seu país de origem este ano escassearam”, explicou Nuno Pinto, o mentor da carreira do vice-campeão asiático de Fórmula Renault 2.0 em 2009 e da Fórmula Pilota China (Abarth) em 2011. “Ele estava a competir na AutoGP, uma competição interessante com monolugares de elevada performance, mas que foi interrompida a metade do ano por não ter o número de participantes que os organizadores esperavam”. O treinador de pilotos português, que no passado mês de Novembro esteve em Macau com a equipa vencedora da corrida de F3, a Prema Powerteam, explica que Sá Silva “estava a demonstrar a sua grande evolução e obteve excelentes resultados, acabando mesmo a vencer na última prova disputada em Silverstone”. Nuno Pinto salienta que o antigo aluno da Escola Portuguesa de Macau “precisa agora de tentar competir numa destas categorias de acesso à Fórmula 1 na próxima temporada” se quiser continuar a lutar pelo sonho de atingir o patamar mais alto do automobilismo, acrescentando que está “agora a trabalhar para que se voltem a reunir condições para que o Luís possa continuar a sua carreira nos monolugares, já que depois de ter passado pela F3 e GP3 e ter testado na Fórmula Renault 3.5 e GP2 com sucesso, para além dos bons resultados nas participações na AutoGP”.
Paul Chan Wai Chi Um Grito no Deserto VozesRegresso à soberania chinesa [dropcap style=’circle’]“F[/dropcap]im ao Conluio entre Empresários e Governo. Queremos o Sufrágio Universal”. Este é o slogan que traduz o propósito da manifestação promovida pela Associação de Novo Macau, a realizar no próximo dia 20. A escolha deste tema deve-se à necessidade da realização de eleições directas, através do sufrágio universal, sem as quais não haverá possibilidade de ultrapassar a estagnação política que se vive actualmente em Macau. Encorajada pela eleição de jovens para os Concelhos Distritais de Hong, Kong, a Associação de Novo Macau pretende incentivar a participação de um maior número jovens, e de cidadãos em geral, nas próximas eleições. O seu objectivo é incentivar a população a utilizar o seu voto e a participar na construção do futuro de Macau, em vez de deixar essa decisão nas mãos de um pequeno circulo que tem controlado os destinos da cidade. Uma outra Associação, recentemente formada, deverá também organizar uma manifestação, igualmente agendada para o dia 20. Prevê-se, pois, que nesse dia, o número de manifestantes aumente significativamente. Para além disso, o caso do Grupo Dore e a questão da “Declaração de Caducidade do lote P para o Edifício “Pearl Horizon” irão, de alguma forma, fazer com que mais pessoas se juntem aos protestos. É ainda de considerar que depois do “Desfile por Macau, Cidade Latina”, que teve lugar no passado dia 6, seja muito provável que a participação nas demonstrações seja ainda maior. Quem olhar para a situação que se vive actualmente em Macau, compreenderá que vai ser necessário travar uma luta difícil para conquistar o direito ao sufrágio universal. No entanto, o Governo Central poderia, em função do Artigo 23º da Lei Básica (relativo à defesa da segurança do Estado) permitir o sufrágio universal em Macau e dar um exemplo a Hong Kong, mas Macau ainda está muito longe do que deveria ser um verdadeiro regresso à soberania chinesa. A democracia não se efectiva apenas através de eleições directas, uma pessoa, um voto. O sufrágio universal é só um dos elementos que constroem uma democracia. Tomemos a Assembleia Legislativa de Macau como exemplo. Registaram-se casos de suborno durante as eleições. Embora o governo da RAEM pretenda rever a “Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa”, e esteja a fazer esforços para acabar com casos de corrupção, se a população não tiver uma maior consciência cívica e não se acabar com a velha prática de troca de favores entre associações, os méritos do sufrágio universal não se vão fazer sentir em pleno. Em resumo, para além de lutar pelo direito ao sufrágio universal, é necessário lutar para que haja um aumento de consciência cívica, sem o qual, o sufrágio universal corre o risco de se tornar uma manipulação e um jogo de interesses. Por outro lado, para realizar o projecto “Macau governado pelas suas gentes com ampla autonomia”, os macaenses têm de desenvolver a sua identidade local, sem perder de vista a sua identidade nacional. A identidade local consiste no reconhecimento das características únicas de Macau, da sua história e das suas especificidades culturais. Quanto ao futuro dos aspectos regionais, é importante que se pense devidamente o relacionamento entre Macau e a China continental, de forma a evitar mal-entendidos desnecessários. Macau não possui recursos naturais e tem sido desde sempre uma cidade de imigrantes. Antes da reintegração, muitas pessoas, vindas da China continental, imigraram para Macau durante o período das reformas. Se pensarmos no número de imigrantes que chegam regularmente da China, já depois da reintegração, e na quantidade de profissionais contratados, também oriundos da China, facilmente veremos que uma grande parte da população de Macau nasceu na China continental. Macau está, em muitos aspectos, a tornar-se mais “chinês” e as suas características mais autênticas vão desaparecendo aos poucos. Se esta situação se mantiver, Macau acabará por ser apenas mais um, dos muitos, municípios da China, em detrimento do seu progresso como centro urbano e democrático. Este cenário será desfavorável, quer para a China quer para Macau. E como a “regionalização” pode criar um estigma, o desenvolvimento democrático de Macau será prejudicado se a cidade não souber comunicar devidamente com a China e ajudar a eliminar desconfianças mútuas. Se isto não for feito, o acto eleitoral pode tornar-se um gesto rotineiro sem qualquer significado. Macau tem de concretizar o projecto “Macau governado pelas suas gentes com ampla autonomia”, se não quiser ser um fardo para o Governo Central. Mas, para que este projecto se torne realidade, vai ser necessário conjugar os esforços da sociedade em geral e, acima de tudo, realizar o sufrágio universal, um dos passos essenciais para o verdadeiro regresso de Macau à soberania chinesa.
Isabel Castro VozesUma terra para ninguém [dropcap style=’circle’]J[/dropcap]á não sei se foi em 2003 ou em 2004, mas lembro-me perfeitamente do cenário: uma espécie de estação de serviço na China, algures na província de Guangdong, um daqueles sítios em que se fazem paragens para esticar as pernas e fumar uns cigarros. Na altura ainda se fumavam cigarros alegremente e Edmund Ho era um Chefe do Executivo que gostava de conversar com os jornalistas sem os formalismos que hoje conhecemos. As estações de serviço e as pausas para os cigarros serviam para umas conversas que, sem cigarros, não fariam qualquer sentido. Foi aí que ouvi falar, pela primeira vez, da necessidade de melhorar a qualidade de vida da população. Fazia parte dos objectivos do Governo de então mas, por esses dias, não conseguia perceber exactamente o alcance do desejo: Macau era aquele sossego em que havia gente que, não vivendo bem, também não vivia propriamente mal. Macau era aquele sossego em que tudo ficava a cinco minutos de distância, em que tudo era acessível. Macau era outra coisa que não isto que hoje é. Os anos passaram e acabaram-se as paragens em estações de serviço na China para fumar cigarros e esticar as pernas. O Chefe que se seguiu não partilha da curiosidade do anterior, mas manteve o discurso da necessidade de melhorar a qualidade de vida das pessoas que estão em Macau (ou de parte delas). O discurso faz-me rir. Por razões agora completamente diferentes, não percebo o que se quer quando se fala em qualidade de vida. Não entendo o conceito que vai na cabeça de quem manda. Acredito que não serei a única. A qualidade de vida, para a maior parte das pessoas – as que aqui vivem e as dos outros sítios também – passa pelas pequenas coisas. O que nos irrita e o que nos satisfaz não são as grandes questões políticas, as decisões de vulto, os anúncios espampanantes, as grandes negociatas, as tramóias de quem passa a vida em jogos de poder. O que nos irrita mesmo são as dificuldades do dia-a-dia, a dificuldade em estacionar o carro, a impossibilidade de apanhar um autocarro, a hora a mais que se demorou a chegar a casa – aquela hora que tanta falta faz porque, quando passa, já tudo é diferente. Irritam-nos também os preços do supermercado, que não obedecem à inflação da China, os preços das casas, que não obedecem a qualquer regra de mercado. Irritam-nos ainda os serviços concessionados, lucrativos monopólios que chegam ao fim do ano com os bolsos cheios do que cobraram a clientes que andam ao engano, sempre ao engano, mas sem possibilidade de mudarem para qualquer coisa melhor. O trânsito. Já se percebeu que não há grande volta a dar. Há anos que percebemos isso. O metro é obra que será motivo para uma expedição a Macau, que muito provavelmente não estarei por cá para a inauguração. Os autocarros são o que se sabe: sardinhas em lata às várias horas de ponta da cidade, a falta de civismo de muitos (mulheres com crianças ao colo, idosos e grávidas podem ter a sorte de um lugar sentado, ou não), ex-condutores de betoneiras que subiram na vida e agora são motoristas, aceleram nas rectas como se o povo fosse cimento, vai para a direita, vai para cima, vai para a esquerda e vem para baixo. Quem quiser que se agarre ao que houver para agarrar. O estacionamento. Previsivelmente, esta semana os preços do parque privado onde guardo o carro todos os dias, para me dar a esse luxo imenso que consiste em ir trabalhar, subiram mais de 50 por cento, que esta malta precisa de dinheiro e não quis, de modo algum, ficar atrás da iniciativa governamental que tem como nobre objectivo libertar lugares de estacionamento. Uma semana de testes e a ideia não funcionou: sucede que há gente, boa gente, que precisa mesmo de se deslocar e não tem outra hipótese. As filas à porta do meu parque de estacionamento continuam a ser as mesmas. O tempo de espera também. Só a conta ao final do dia é que é bastante diferente. Para mim e para muita gente, em muitos outros parques de estacionamento. As cabeças quadradas. A falta de ideias para resolver as pequenas coisas que nos irritam. Por altura da promessa de qualidade de vida de Edmund Ho, eu morava no NAPE e não tinha carro, porque não precisava dele – ainda havia táxis e autocarros. O NAPE era, há uma dúzia de anos, um sítio pacífico com meia dúzia de restaurantes, outros tantos bares, dois cafés muito simpáticos e um supermercado. Havia um ou outro karaoke de miúdos que, de vez em quando, se metiam em maus lençóis. Mas a zona era pacífica. Quem tinha carro estacionava na rua e os autocarros ainda se davam ao trabalho de apanhar passageiros nas paragens, porque tinham espaço para eles. O NAPE mudou e vieram os casinos, as lojas de penhores, os karaokes com portas duvidosas em todas as esquinas. Como Macau é aquela cidade de permanentes contradições, no meio de toda esta confusão instalaram-se (ou já estavam instaladas) várias escolas, creches, uma universidade. E escritórios, negócios às claras e negócios por debaixo do tapete, lojas de vinhos caros e lojas de electrodomésticos, lojas de colchões, lojas de roupa manhosa. Durante os anos de atribulada expansão demográfico-empresarial desta zona, que um dia se pretendeu nobre, não houve uma única alma nos Serviços para os Assuntos de Tráfego que se tivesse lembrado de encetar conversações com uma alma homóloga da Polícia de Segurança Pública para facilitar a vida aos pais que, diariamente, vão deixar e vão buscar os filhos à escola. Como não há lugar para estacionar nos parques públicos, nos parques privados e nos lugares com parquímetro, quem vai ao NAPE diariamente fazer o exercício de tirar a criança do carro e deixá-la na escola não tem outro remédio que não seja parar nas linhas amarelas das várias paralelas e transversais à avenida principal. As soluções para este tipo de zonas foram há muito inventadas: abrem-se excepções para quem pára, à hora de entrada e de saída das escolas, em locais onde não é possível estacionar; destacam-se polícias que, em vez de terem como missão multar pais, ajudam na gestão do trânsito, na garantia de que as passadeiras são respeitadas. Facilita-se a vida a quem só está a tentar viver. Mas por aqui é tudo diferente: a polícia gosta de passar multas a mulheres grávidas com filhos ao colo, no momento em que estão a preparar-se para entrarem nos carros estacionados em linhas amarelas e seguir viagem. Já se fosse à noite, o problema não se colocava: o lobby dos restaurantes e karaokes conseguiu abrir excepções nas linhas amarelas. A malta que bebe uns copos pode parar o carro; aos miúdos de dois anos é melhor dar um MacauPass e eles que se façam à vida, para aprenderem que não é fácil. O que acontece hoje em dia no NAPE é apenas um exemplo do que se passa noutras zonas da cidade. Já que o conceito de qualidade de vida é algo que o Governo não consegue definir, para depois pôr em prática, que tenha em mente aquilo a que está obrigado: dar possibilidades às pessoas. A impossibilidade da normalidade mina qualquer ideia de vida. Talvez um dia perceba onde queria chegar Edmund Ho.
Sérgio de Almeida Correia VozesAinda faltava a cereja no topo do bolo [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] final do mandato do Prof. Cavaco Silva coincide, grosso modo, com a passagem do 16.º aniversário da transferência de administração de Macau para a R. P. da China, que se celebrará em 20 de Dezembro. Entendeu o Presidente da República (PR) aproveitar a ocasião para oito anos depois da saída de Jorge Sampaio, em jeito de despedida e ajuste de contas com o antecessor, atribuir ao último governador de Macau a mais elevada condecoração nacional. Contra o que o bom senso recomendaria. O PR, como os portugueses estarão recordados, tem condecorado, na esteira dos que o precederam, toda a gente e mais alguma. Muitos por méritos mais do que duvidosos, mas que têm em comum serem da sua cor política, terem trabalhado ou colaborado com ele, porventura terem-se com ele cruzado à entrada de uma estação de metro num dia de nevoeiro ou num café de Boliqueime. Não admira por isso que quisesse também condecorar Rocha Vieira, militar que para o bem e para o mal ficará eternamente ligado ao que de pior Portugal fez em Macau em matéria de nepotismo, favorecimento e alimentação de clientelas. Para banalização da Torre e Espada, ordem honorífica cuja atribuição deveria ser consensual e compreendida por toda a Nação, é o ideal. Quem desconhecer o passado e apenas conheça a propaganda da máquina que Rocha Vieira colocou ao serviço da sua promoção poderá pesquisar alguns livros que se publicaram, ver quem os pagou, e os milhares de páginas da imprensa local, incluindo do então Boletim Oficial, para perceber o que o senhor andou a fazer pelo Oriente rodeado pela sua gente, entre a qual se contavam alguns tipos pouco recomendáveis à luz de qualquer padrão de decência, dos que se orgulhavam de ter “andado a matar pretos em África” aos que assinavam contratos “por conveniência de serviço” em nome do Governo com as empresas de que eles próprios eram administradores. O próprio Fernando Lima, assessor do PR famoso no célebre caso das escutas do Público, foi um dos que por Macau se passeou, aproveitando para pernoitar em hotéis de cinco estrelas enquanto compilava, escrevia e publicava uns livros à custa dos patrocínios que directa ou indirectamente saíram dos cofres de Macau. Creio que o Conselheiro Macedo de Almeida, que foi Secretário-Adjunto para a Justiça de Rocha Vieira e é hoje assessor do PR, não contou nada disto ao Prof. Cavaco Silva para evitar que este se arrependesse a tempo. Depois de um final penoso mas bem encenado e melhor coreografado, onde o descontrolo da segurança se misturava com os milhões, os caixotes e os salamaleques a Stanley Ho e aos poderosos das suas relações, enquanto se condecoravam os amigos e se sugeriam medalhas a Lisboa, criavam-se as instituições onde seriam colocados os seus – não a Portugal – leais servidores, muitos deles ainda hoje vivendo à grande do que então se retirou dos fundos locais. Em matéria de favores nada ficou por pagar fosse em medalhas, contratos, prebendas várias ou viagens e passeatas. E do trabalho que por Macau deixou aos mais diversos níveis, seria bom que os portugueses soubessem que década e meia volvida não há quem não se queixe do que se fez da justiça e dos tribunais, a começar pelo presidente da Associação dos Advogados, e até o português já perdeu, na prática, o estatuto de língua oficial, havendo tribunais a notificarem em língua chinesa destinatários falantes do português e recusando-se a fornecer traduções de despachos e sentenças a esses destinatários, em clara violação da Declaração Conjunta e do estatuto de igualdade das línguas, como que numa antecipação do final do período de transição de 50 anos. Tivesse sido o trabalho bem feito e nada disto estaria agora a acontecer. O Presidente Jorge Sampaio, através de um gesto que teve tanto de ingénuo como de temerário, já tinha condecorado Rocha Vieira, embora nunca o devesse ter feito. A prova disso é que Rocha Vieira acedeu para logo depois fazer de conta que não tinha dado o seu aval à condecoração. O jornalista João Paulo Menezesrecordou-o recentemente: “Depois de ter aceitado a condecoração proposta por Jorge Sampaio (primeiro verbalmente, depois ao estar presente na cerimónia), Rocha Vieira protagonizou um dos episódios mais insólitos da história recente das condecorações em Portugal. Como é regra, depois da cerimónia pública é enviado para casa dos distinguidos um documento designado “compromisso de honra de observância da Constituição e da lei e de respeito pela disciplina das ordens”. Só depois dessa assinatura e da devolução do documento é que a condecoração passa a ser oficial. Mas Rocha Vieira não só não assinou como não devolveu o “compromisso de honra”. Resultado: o Anuário das Ordens Honoríficas – online, no site da Presidência da República – omite essa condecoração e no seu próprio currículo Rocha Vieira também não refere que recebeu em 2001 o Grande Colar da Ordem do Infante D. Henrique”. O general Rocha Vieira apresenta uma justificação no livro que o seu fiel e abnegado colaborador e editor publicou, dizendo que tal condecoração é “como se não existisse”, mas para dizer isto mais valia que tivesse logo recusado a oferta de Sampaio e esperasse que a história, ou quem àquele sucedesse, um dia reparasse a “injustiça”. Homens de valor e com feitos excepcionais não fazem o que ele fez a um Presidente da República por muito que não gostasse dele. Sobre os méritos do futuro titular da Ordem Militar da Torre e Espada, nada mais há a acrescentar, sabendo-se que a sua acção em Macau – e a dos portugueses, por tabela – valeu o gozo dos cartoonistas da imprensa internacional, da americana ao South China, pela forma como foi constituída a Fundação Jorge Álvares, onde estão acantonados os seus homens. E dos quadros dos ex-governadores retirados pela calada, como ainda há dias foi recordado por um ex-assessor de Sampaio, nem vale a pena falar. O que se estranha é ver o general Ramalho Eanes, um modelo de militar e cidadão, a quem os portugueses muito devem pela consolidação da sua democracia, associado a esta farsa que a Presidência montou para homenagear Rocha Vieira. Só vejo o general Eanes na cerimónia por ser um homem educado e bem formado. É que é difícil encontrar um paralelo, para além da farda, entre a acção de Ramalho Eanes e a de Rocha Vieira. Não consta que o general Eanes no exercício das suas funções públicas ou na sua vida de militar fosse cínico, falso, prepotente, que usasse o posto e a função para oferecer o que do seu bolso não pudesse pagar, distribuindo benesses, encaixando os amigalhaços, fazendo museus, fundações e institutos para sua glória, editando livros ilustrados com as suas próprias fotografias, dando o seu aval a indecorosas campanhas de promoção pessoal, esperando sempre ser devidamente bajulado em todas as esquinas. Ainda recentemente o general Eanes foi às Filipinas receber um prestigiado prémio internacional, fazendo-o com a maior discrição, como se a distinção que lhe foi concedida não fosse motivo de orgulho para todos os portugueses. A diferença entre os dois homenageados não está apenas no facto do general Ramalho Eanes ter dado o seu nome a um largo de Macau e sobre o outro haver hoje quem em Macau não saiba quem foi, tal a irrelevância do seu papel. A atribuição da Ordem da Liberdade ao general Ramalho Eanes, militar e homem de Estado a quem em matéria de ética e intenções não haverá um acto que suscite dúvida, é inteiramente merecida e não devia acontecer desta forma, à socapa, em final de mandato, sem brilho. Quanto à do outro cavalheiro a quem o PR resolveu agraciar com a Torre e Espada, a única coisa que se pode dizer é que não será pelo general Ramalho Eanes lá estar que deixará de ser um ultraje. Porque o homenageado será muito seu amigo, simpático e educado, mas faltará tudo o que a Torre e Espada pretende significar. Faltam os “feitos excepcionalmente distintos” à frente de órgãos de soberania ou no comando de tropas em campanha, faltam os “feitos excepcionais de heroísmo militar oucívico” e faltam os “actos ou serviços excepcionais de abnegação e sacrifício pela Pátria e pela Humanidade”.