Dois por quatro

[dropcap]1[/dropcap] Macau tem um ritmo estranho. Às tantas os outros sítios também têm um ritmo estranho, mas quem vive aqui não está neles e, por isso, não sabe de certeza vivida. Ficamos por cá a fazer a contabilidade de um tempo bastante parvo, em que os dias são sempre muito compridos e, em simultâneo, demasiado curtos, até porque o sol foge cedo, muito cedo, nos dias em que se digna a aparecer.

São dias compridos, mas curtos, que teimam em ser extraordinariamente repetitivos para quase todos nós, emoldurados que estamos entre afazeres profissionais, familiares, pessoais, sociais. Dias curtos, mas compridos, que se condensam em ciclos, sempre mais ou menos iguais. Quem veio de fora faz as contas não aos anos, mas ao número de edições deste ou de determinado acontecimento. A partir de certa altura, o tempo começa a mingar. Ainda ontem era grande prémio e está quase aí outra vez, deixem o Verão acabar e vão vê-lo em auditivas acelerações.

Por entre estes compassos repetitivos de Macau, que se escreveram para serem dois por quatro, andante, andam fusas e semifusas que, de tão rápidas, se nos escapam ao entendimento. Damos por elas, mas não sabemos que leitura fazer das coisas que não aparecem escritas. O que nos mostram não chega a ser. Não nos resta mais do que esperar pelo tempo, esse conceito que alguém inventou para evitar que vida e morte se juntassem demasiado depressa.

[dropcap]2[/dropcap] Vêm aí as legislativas, assunto que, muito provavelmente, não empolgará por aí além a maioria dos que me lêem. Para este ano há mais do mesmo, com mais diversidade, mas com o grau de interesse de sempre: pouco. Ainda assim. Faz parte desta coisa de ser cidadão estarmos informados das nossas opções, mesmo sabendo, de antemão, que dificilmente nos servirão. É um direito dever, um dever direito, não há mais e é o que temos.

No início era complicado perceber isto, lembro-me bem. Fui assistir ao meu primeiro plenário na Assembleia Legislativa com uma útil revista na mão que me dizia quem era quem, na medida em que é possível perceber-se quem é quem, e lembro-me de pensar que seria difícil algum dia entender o que verdadeiramente se dizia por ali. Não me enganei redondamente, apesar de, com o tempo, ter conseguido fixar os rostos e algumas das ideias, uma conquista que, feitas bem as contas, serve de pouco, de muito pouco. Sei quem são mas não sei quem são, ainda hoje, apesar de tudo. Ainda bem. Ainda assim.

Várias legislaturas depois, com mais mudanças pelo meio do que seria de esperar, apesar do tédio que marca o tempo político, continuo a surpreender-me com este sistema e com quem faz parte dele. Os grandes e os pequenos, os grandes que estão ali de pedra e cal, com raízes na alcatifa fofa, e os pequenos, aqueles que não chegam lá mas que, por algum motivo quase sempre pouco ligado a uma irresistível vontade de participação cívica, querem lá estar também. Por norma, não conseguem.

Ainda assim. Surpreendem-me os nomes e a falta de ideias e também o excesso de monotemáticas lutas. Listas que têm apenas um único objectivo, como se fosse um disparate ter mais do que um. Ou como se fosse de todo impossível dez cabeças produzirem dez ideias diferentes. Listas que se dizem cor-de-rosa, o que quer que isso signifique. Candidatos que continuam no século XX, na primeira metade do século XX. Candidatos que não saíram do século XVIII. Candidatos que ainda não perceberam que já não há cavalos e burros nas ruas, que dos agricultores resta apenas uma associação com o nome, que as mulheres não carregam cântaros na cabeça e que as crianças não andam descalças, barrigudas de fome, nas ruas enlameadas da terra, e que os mandarins agora são outros, com menos sedas e talvez menos mulheres.

O tempo tem um ritmo estranho. Compassos de dois por quatro, andante, 60 por minuto, como manda o tempo, talvez 80 em caso de crise, fusas e semifusas que não encaixam, corre tudo tão depressa e tudo fica no mesmo sítio.

14 Jul 2017

Eleições | Coutinho entrega lista de candidatos e faz defesa da língua de Camões

O líder da Nova Esperança entregou a lista de candidatura à comissão eleitoral e argumentou a favor do trabalho a tempo inteiro dos deputados. Pereira Coutinho aproveitou a ocasião para defender o uso do português, como garante do segundo sistema, e criticou o clientelismo existente na Assembleia Legislativa

[dropcap style≠’circle’]“O[/dropcap] português para mim é um trunfo.” Quem o diz é José Pereira Coutinho, deputado e cabeça de lista da Nova Esperança na corrida às eleições legislativas. As palavras foram proferidas à margem da entrega da lista e programa político junto da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa.

O deputado criticou a falta de acção política que se esconde por detrás dos discursos de “pompa e circunstância” que se repetem acerca da importância da comunidade portuguesa em Macau. Porém, Pereira Coutinho interroga-se sobre onde estão os substitutos quando juízes, magistrados do Ministério Público e médicos portugueses abandonam as suas funções no território.

O líder da Nova Esperança destaca a saída do hemiciclo de Leonel Alves, como “uma grande perda, algo que não é bom para Macau”. Coutinho entende que “a comunidade portuguesa deve estar cada vez mais unida e ter voz independente, livre”, que marque “a diferença entre o segundo sistema e o primeiro”.

No que diz respeito ao uso da língua portuguesa, Pereira Coutinho recorda um episódio na AL, quando interpelava a ex-secretária para a Administração e Justiça durante um debate das Linhas de Acção Governativa. Nessa altura, de acordo com o deputado, a resposta à interpelação feita em português foi em chinês, sem qualquer relação com a questão levantada pelo deputado.

Para não ser mal interpretado, ou permitir a desculpa da má tradução de intérpretes, o tribuno viu-se forçado a dirigir-se à ex-secretária em chinês.

Macau reduzida

Pereira Coutinho considera que a língua é um trunfo, uma vez que lhe permitir “vender o peixe” à comunidade portuguesa e macaense sem dificuldades. Sobre o facto de haver ressentimento por parte da comunidade chinesa por ter concorrido à Assembleia da República em Portugal, o deputado não tem meias palavras. “Não me interessa se não me perdoam, sou residente permanente de Macau e gozo dos meus direitos políticos e de cidadania”, comenta.

Um dos focos da crítica de Pereira Coutinho é a forma como a cidade “está reduzida a casinos e função pública, os dois maiores empregadores”. Esta realidade laboral bicéfala é, de acordo com o deputado, um factor de estrangulação económica. “Quando os casinos espirram, as outras actividades económicas ficam a soro”, comenta.

Além disso, o clientelismo é outro dos problemas elencados pelo candidato. “Há meia dúzia de empresários super influentes que controlam a AL, outra meia dúzia que controla o Conselho Executivo e outra meia dúzia que controla o jogo”, explica o deputado. A sobreposição de interesses leva o deputado a dizer que “Macau está entregue à bicharada”. Pereira Coutinho considera que esta situação representa um grande problema para os jovens e para o futuro do território.

No entender do deputado, “Macau está a fechar-se em si própria e isso cria grandes problemas ao nível de competitividade económica”. Nesse capítulo, o candidato à AL deixa uma crítica feroz à falta de qualidade do sistema de ensino do território, que não consegue corresponder às necessidades de um mercado de trabalho exigente, num contexto de forte competitividade com as regiões vizinhas.

Pereira Coutinho deixou ainda uma crítica ao facto de a AL permitir que haja deputados que exerçam as funções de deputados a tempo parcial. “Aproveitam-se do tacho de deputado e arranjam mais-valias para os seus interesses”, comenta. O candidato da Nova Esperança entende que é urgente que os deputados sejam obrigados a fazer uma declaração de interesses. “A forma como defendem os interesses da clientela é descarada e inadmissível, não podemos continuar a trabalhar assim”, remata.

7 Jul 2017

Lei de Terras | AL está pronta para resolver problemas

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Assembleia Legislativa (AL) dará seguimento a uma eventual alteração à Lei de Terras quando houver – se houver – autorização do Governo nesse sentido. A ideia foi deixada ontem por Ho Iat Seng, presidente da AL, à margem da apresentação da sua candidatura às eleições legislativas de Setembro próximo.

Em declarações reproduzidas pelo canal chinês da Rádio Macau, Ho Iat Seng recordou que o Governo recebeu de vários grupos de deputados propostas concretas para resolver o caso do Pearl Horizon, pelo que a questão depende da atitude e da conclusão dos estudos que o Executivo está a fazer.

Quanto aos dois projectos de lei que esperam por autorização do Chefe do Executivo para que possa haver iniciativa legislativa da AL, o presidente do órgão observou que, caso não haja uma decisão na actual legislatura, o assunto terá de ficar para depois das eleições, mas deu a entender que a Assembleia dará seguimento ao caso mal possa.

Também Pereira Coutinho se pronunciou ontem sobre a matéria. Citado igualmente pela Ou Mun Tin Toi, o deputado disse que a resolução do caso Pearl Horizon é muito simples, porque só depende do Governo. O cabeça de lista da Nova Esperança entende que o Executivo tem mecanismos para proteger os lesados do empreendimento, sendo que pode utilizar o montante do prémio de concessão para controlar os preços, deixando a empresa promotora completar a sua “missão”.

7 Jul 2017

Eleições | Ho Iat Seng entra na corrida

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]unca deu certezas, mas resolveu mesmo voltar a candidatar-se às eleições legislativas pela via do sufrágio indirecto. Ho Iat Seng, actual presidente da Assembleia Legislativa, volta a encabeçar a lista da União dos Interesses Empresariais de Macau, ao lado do empresário Kou Hoi In e de José Chui Sai Peng, engenheiro civil e primo do Chefe do Executivo. Ip Sio Kai, director-geral do Banco da China, candidata-se pela primeira vez, em substituição de Cheang Chi Keong.

De um universo de 102 eleitores legalmente registados e ligados aos sectores industrial, comercial e financeiro, a União dos Interesses Empresariais de Macau obteve 97 votos.

Ho Iat Seng disse que é preciso prestar atenção ao desenvolvimento do território, defendendo que não se podem dar benefícios a um só sector, mas a todas as camadas da população. O número dois, Kou Hoi In, assegura que vai defender os interesses dos sectores industrial e comercial, bem como trabalhar para que sejam atenuadas as dificuldades sentidas pelas pequenas e médias empresas (PME).

Quem também vai continuar a dar atenção às PME é José Chui Sai Peng, que defende que um melhor funcionamento deste sector pode ajudar à construção de Macau como um centro de turismo e lazer. Já Ip Sio Kai promete efectuar trabalho em prol do desenvolvimento do sector financeiro de Macau, sem esquecer a cooperação com outros mercados.

7 Jul 2017

Agnes Lam, candidata às eleições: “O Governo é muito bom a gastar dinheiro”

As patacas não compram tudo e é por isso que Macau se depara hoje com mais problemas do que nas últimas legislativas. Agnes Lam, investigadora e docente, volta a liderar o Observatório Cívico nas eleições de Setembro. O resultado de 2013 ajudou-a a perceber que não pode ter apenas como alvo o eleitorado da classe média, uma fatia de eleitores demasiado pequena. Defensora de mudanças no método de conversão de votos em mandatos, entende que a sua grande vantagem é conseguir analisar a sociedade em que vivemos

[dropcap]C[/dropcap]andidata-se pela terceira vez este ano. Depois do resultado de 2013, aquém do que estaria à espera, o que a leva a tentar mais uma vez?
Sinto que tenho de voltar a fazê-lo. Da última vez, apesar de sentir que trabalhei muito, tomei a decisão demasiado tarde. Não planeei muito bem. O resultado foi bom, mas claro que se esperava mais. Quando olho para trás, percebo que não tive tempo para fazer uma série de coisas que queria fazer, para falar com as pessoas. Tenho de fazer isto como julgo que deve ser feito. Da primeira vez que me candidatei, achei que devia seguir por um caminho, mas acabei por escolher uma forma que não era aquela em que acreditava. Depois das eleições, a lista fez um grande trabalho de avaliação à nossa participação. Tivemos reuniões muito duras, criticámos o que fizemos mal e também tivemos sessões muito calmas, em que olhámos para os resultados das eleições, analisámos os votos que tivemos em cada mesa, analisámos todos esses detalhes, para percebermos quais são foram as grandes diferenças entre 2009 e 2013.

E que diferenças foram essas?
A principal diferença é que conseguimos melhores resultados junto das zonas onde vota a classe média. Tivemos mais votos na Taipa, na Praia Grande, no Tap Seac. Mas tivemos uma prestação pior na zona norte, não fizemos o suficiente nesta área da cidade. Mais tarde percebemos que, mesmo que quiséssemos representar a classe média ou os eleitores com mais formação, tínhamos de fazer mais em simultâneo, porque não tivemos votos suficientes. Não há apenas uma lista que representa este tipo de pessoas, há mais a fazê-lo. Desta vez, parti do princípio de que tenho de olhar para o panorama em geral. Aquele conjunto de pessoas era demasiado pequeno.

O trabalho que fez nestes últimos quatro anos foi suficiente para que as pessoas fora do grupo da classe média tenham ficado a perceber quem é Agnes Lam?
Acho que fiz melhor. Não consigo fazer uma sondagem acerca de mim própria, mas tenho os dados da minha presença nas redes sociais e parece que a minha popularidade é maior agora do que era há quatro anos. Quanto a estarmos a fazer o suficiente para o público em geral, lidei com alguns casos, como a da menina cega, em que ajudei à recolha de fundos para que fosse operada. Tive vários casos desse género, em que ajudei minorias e pessoas que precisam de ajuda sistemática ou de apoio urgente. De alguma forma, isso talvez tenha ajudado. E espero poder ajudar mais e melhor. Mas este envolvimento terá contribuído para chegar a um público mais abrangente.

Em termos eleitorais, a competição é grande na zona norte de Macau. Em 2013 já era difícil mas, este ano, a equipa de Chan Meng Kam partiu-se em duas e há mais uma lista oriunda de Fujian. Há várias listas que se dividiram, por causa do sistema de contagem de votos. Macau deve reconsiderar a forma como os votos são convertidos em mandatos?
Sim, acho que o método que utilizamos é errado. Um cenário seria aquele que se utiliza em Hong Kong, com a representação por distritos, mas as três freguesias da zona norte representam 70 por cento dos votos. É impossível desistirmos daquela área, onde não vivem apenas as classes mais baixas – também há pessoas da classe média, estudantes universitários, professores… Não posso pensar que não tenho de trabalhar naquela zona. Tenho, isso sim, de ter uma estratégia melhor. Ainda estou a trabalhar nela. Mas chegou a altura de repensarmos todo o sistema político para as eleições por via directa. Porque é que utilizamos estas listas? No boletim de voto, o eleitor poderia votar em 14 candidatos, o número de assentos. Na China Continental está a fazer-se isto. Se optássemos por este método, dávamos aos eleitores a possibilidade de decidirem como é que a Assembleia Legislativa (AL) deveria ser constituída. Por exemplo, se eu quiser que a sociedade seja mais estável, dou dez votos a candidatos mais tradicionais, mas como também quero alguma inovação, escolho dois com essas características, e como também quero alguma oposição para contrabalançar, escolho outros dois dessa ala. Neste momento, não é possível fazer essa escolha.

No dia em que formalizou a comissão de candidatura, fez referência ao facto de hoje termos problemas diferentes daqueles que existiam em 2013. O que é que a preocupa?
O Governo é muito bom a gastar dinheiro para resolver os problemas. A maioria das questões que podiam ser resolvidas através de dinheiro está solucionada. Agora temos muitos mais problemas que o dinheiro não pode resolver. Temos tanto dinheiro, mas por que é que temos tanto trânsito? Os transportes não são bons. O mesmo acontece com a habitação: está toda a gente descontente. Quem arrenda casas tem de pagar um custo muito elevado, quem quer comprar não tem perspectivas de quando é que vai poder fazê-lo. Depois, há questões sociais emocionais. Ganhamos mais, viajamos mais – muitas pessoas vão com frequência a Taiwan, ao Japão. E quando voltam sentem-se insatisfeitas com a cidade. Por mais que o Governo Central nos elogie, as pessoas não estão contentes, temos uma carga negativa grande na sociedade. Por quê? Porque nos dão nove mil patacas? Não é sequer um Panadol. No início era uma espécie de analgésico, agora já nem sequer isso é.

Sente que a cidade piorou desde 2013?
Em termos gerais, as emoções estão em baixo. Temos mais problemas, quando devíamos ter muitas hipóteses. Temos a política “Uma Faixa, Uma Rota”, devíamos estar à espera de podermos abraçar essas novas possibilidades. Mas depois não vemos ninguém que consiga comunicar de forma clara com o público em geral. O que é que está a acontecer? Sentimos que há qualquer coisa especial, parece que há muitas oportunidades para os países lusófonos, mas quais são as verdadeiras possibilidades para as pessoas de Macau?

Há demasiados chavões e slogans na política local, em comparação com o que existe na realidade?
Sim. A propósito da Grande Baía Guandong-Hong Kong-Macau, fui a uma palestra em que nos perguntaram o que podemos nós fazer. Houve uma pessoa que sugeriu que deveria existir uma espécie de gabinete de ligação para ajudar as pessoas jovens a poderem entrar nesta grande área e encontrarem oportunidades. Fiquei a pensar sobre que oportunidades são essas e cheguei à conclusão de que não sei. Talvez consigam os investidores, os profissionais liberais que possam arranjar emprego na sua área, aqueles que estão a fazer negócios. Parece que temos um enorme potencial, mas ninguém sabe o que fazer com ele. Talvez demore algum tempo a perceber. Mas, a partir do momento em que tivermos essa política a funcionar, espero que haja ideias concretas. Não me parece que haja suficiente informação.

Vem da área da Comunicação. Tem muito trabalho de pesquisa social feito. Se for eleita, qual pode ser a grande diferença em relação a outros deputados? Em que medida pode a AL mudar se estiver lá?
Um dos aspectos tem que ver com a capacidade de ver questões que não são abordadas, estudadas ou defendidas por outras pessoas. Fomos a primeira – e única – lista a defender os direitos dos animais em 2009. Nesse ano, quando organizámos actividades na Taipa com cães e gatos, houve pessoas que gozaram connosco nas redes sociais. Diziam que a lista não ia a lado algum, que não sabíamos o que estávamos a fazer. Mas a verdade é que foi feita legislação nessa área. Vimos que havia essa necessidade, Macau estava a mudar muito. Também fomos dos poucos a defender que a violência doméstica deveria ser considerada crime público. Fomos a primeira lista a defender políticas que protejam as famílias. Percebemos essas necessidades e acho que isso se deve ao facto de ser investigadora, fui capaz de observar a sociedade como um sistema e perceber que há aspectos que não funcionam. Se for eleita, farei pressão em relação a mudanças no sistema. Também propusemos regulamentação acerca das finanças públicas. Quando o fizemos éramos os únicos e o Governo avançou agora nesse sentido.

Independentemente da sua candidatura, o que gostaria de ver acontecer no dia 17 de Setembro?
Uma mudança positiva. Tivemos uma mudança nos últimos anos, mas não foi muito positiva. Desta vez, espero que possa ser diferente. É muito importante para a AL e para Macau, para toda a estrutura e vida política, para o poder e o equilíbrio.

“O fenómeno das listas regionais irá desaparecer”

Há quem entenda que as eleições de Setembro poderão ficar fortemente marcadas pelas chamadas listas regionais. Quais são as suas expectativas?
Se olharmos para a AL como um todo – incluindo os sete deputados nomeados e os dez eleitos pela via indirecta – a fatia para estas listas regionais vai ser maior, vão conseguir mais assentos. Fujian tem três listas este ano: a equipa de Chan Meng Kam dividiu-se e há mais uma da mesma província. Que consequências terá para Macau? Haverá uma ligação maior às políticas do Continente. Se as pessoas utilizam a influência do Continente para conquistarem assentos, então precisam de devolver algo. No grupo de deputados eleitos por via directa, acredito que consigam mais um lugar.

Este fenómeno será uma tendência no futuro?
Julgo que não, porque as pessoas vão mudando. Se olharmos de uma perspectiva histórica, a comunidade de Fujian chegou a Macau sobretudo nos anos 1980, pelo que são pessoas entre os 40 e os 50 anos. A próxima geração sentir-se-á mais enraizada. Os jovens não irão votar como os pais. Este fenómeno irá desaparecer.

Na passada semana ficámos a saber que vários deputados não se recandidatam, entre eles Leonel Alves, o deputado com mais experiência na AL. Como é que vê estas saídas?
É o deputado com mais experiência e exerce o cargo com muito profissionalismo. É muito importante para a AL. Por um lado, é advogado, pelo que utiliza as leis; por outro, é deputado há muitos anos. Conhece o jogo, sabe que problemas poderão ser levantados, o que deve ser feito quando se está a desenhar uma lei. Por isso, considero que se trata de um membro da AL muito importante. Não tenho a certeza de que possamos ter outro com tantas capacidades, com tanta diplomacia, com tanto profissionalismo como ele. Olhando para todas as listas, pelos membros que conheço, não vejo ninguém com qualificações que fiquem perto das dele. Ao mesmo tempo, tem todo o direito de afastar-se. O facto de não termos mais ninguém como ele também me leva a pensar que temos de ter alguém que cresça como ele. É uma pena não contarmos com ele desta vez, mas espero que possa ajudar a AL de outra forma: como uma espécie de consultor, por exemplo, não sei se tal será possível. Seria muito importante se pudesse escrever sobre a sua experiência, se escrevesse um livro sobre todos estes anos na AL.

26 Jun 2017

As eleições do nosso contentamento

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stamos em ano de eleições e a coisa promete alguma confusão. Trata-se de um momento especial na RAEM, não tanto por causa do acto eleitoral em si mas por desvelar algumas das características nem sempre à superfície deste território à beira do Rio das Pérolas pespegado.

Começaremos então, porque assim nos arrasta a mão, por desvalorizar as eleições enquanto tal, ou seja, como eleições cujo objectivo é, normalmente, a escolha dos representantes que nos governam. Aqui é precisamente o contrário. O povo escolhe os representantes que o desgoverna. Na realidade – pura, crua e fedorenta – quem governa serão outros ou, pelo menos, assim parece. Os nossos ilustres deputados, quando muito, na maior parte dos casos, governam-se a si mesmo. E isto que poderia parecer estranho ou até despropositado, aqui faz todo o sentido.

É que em Macau é difícil implantar o conceito de bem comum. Cada um puxa a brasa à sua sardinha e a ver se fica com o fogareiro. Cada família, cada clã, cada etnia, está fundamentalmente preocupada consigo e os outros pouco existem. A teoria (selvagem e não dita) é que cada um tome conta de si e ninguém de todos que isso – grunhem – é o comunismo e isso é lá para o continente e não serve para estes exemplares capitalistas que por aqui pululam e fazem fortuna entre o imobiliário e os derivados do jogo.

No acto eleitoral, a populaça vai votar para uma dúzia de lugares eleitos de forma directa (mais ou menos um terço da coisa), a ver se se entretém. Mas, nesta realidade de antanho, as pessoas só vão realmente votar porque são arrebanhadas, conduzidas, alimentadas e, finalmente, despejadas junto às urnas com indicações precisas e irrevogáveis. Por elas ficavam em casa ou no trabalhinho que é muito bonito. Mas o melhor é ir botar o voto, não vá o chefe zangar-se. Depois os resultados são o que se sabe. Enfim, adiante.

O que realmente interessa neste acto –  nos preliminares que tanta discussão acendem – é o que vem à tona, assim como que empurrado por anos ou décadas de omissão. É ver, por exemplo, a reacção impulsiva de Pereira Coutinho perante o discurso de Jorge Valente no jantar anual do Gabinete de Ligação. O homem forte da ATFPM não resistiu ao protesto, tal como o jovem empresário não resistiu ao apelo do palco e do microfone, ainda que certamente sabendo estar a cometer um acto passível de crítica. Ambos fizeram bem: a política é mesmo assim.

Contudo, se pensarmos estrategicamente no assunto, o que Pereira Coutinho fez foi algo contrário aos seus interesses, na medida em que Jorge Valente é praticamente um desconhecido nestas andanças e o protesto do deputado emprestou-lhe pública notoriedade. Aquele que era um jovem macaense, parceiro de Melinda Chan, transformou-se num político de futuro interessante, de quem se fala, que Coutinho teme (?!), eventualmente bem visto no Gabinete de Ligação, e até ficámos a saber que fala mandarim!

Mas o que é interessante neste caso é a emergência de um potencial debate, a esperança que luza uma ideia, que se destaque uma opinião, que se revele uma estratégia, quiçá uma visão.

Sim, queremos sangue e queremos pombas. Queremos a comunidade dividida nas opiniões mas unida num óbvio rumo. Queremos que se esgadanhem por nós. Que se empenhem na demonstração da extrema utilidade do nosso voto. E, acima de tudo, que nos falem ao coração. É disso que a malta gosta… quando não desgosta que esta gente é muito difícil…

Outro canto deste micro-universo eleitoral é aquele onde se desenrola o combate de boxe entre velhos e novos “democratas”. Ng Kuok Cheong e Au Kam San partiram definitivamente a bilha onde se acumulavam pessoas com agendas muito diferentes. Pelos vistos, pretender “directas já!” não chega para juntar os cacos. Poder-se-ia argumentar que o choque é geracional, mas o argumento cai por terra quando damos por homens como Paul Chan Wai Chi, um sexagenário, do lado dos jovens e os “tradicionais” do lado dos outros.

A questão é certamente outra. Os problemas de Hong Kong, as ligações específicas de cada membro e mesmo uma ideia diferente de sociedade estarão por detrás desta implosão da Novo Macau. É com alguma curiosidade que se aguarda por eventuais debates entre Scott Chiang, o homem a quem maltrataram o coração, e a dupla Ng-Au, de modo a compreendermos a dimensão da ruptura e o sentido de novas filiações.

Enfim, isto promete. Não o que devia prometer, mas promete. Dá para escolher o lugar, preparar o lanche e esperar para ver. O espectáculo promete ser divertido.

19 Jun 2017

Gabinete de Ligação | CAEAL diz que não há irregularidades

A Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa considera que não há indícios de que tenha sido violada a lei eleitoral com a realização de um jantar promovido pelo Gabinete de Ligação. A ocasião serviu para Jorge Neto Valente, candidato às eleições, fazer um discurso
Jorge Neto Valente discursou num jantar promovido pelo Gabinete de Ligação.

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]orge Neto Valente, o número dois de Melinda Chan na corrida às eleições, discursou num jantar promovido pelo Gabinete de Ligação do Governo Central em Macau. Segundo o jornal Ponto Final, o jantar destinou-se às comunidades portuguesa e macaense, mas José Pereira Coutinho e Rita Santos, rostos conhecidos desta comunidade, não foram convidados.

O deputado à Assembleia Legislativa (AL) disse ao mesmo jornal que houve uma atitude tendenciosa por parte do Gabinete de Ligação, mas Tong Hio Fong, presidente da Comissão de Assuntos Eleitorais da AL (CAEAL), negou uma eventual violação à lei eleitoral em vigor.

“Não proibimos as pessoas de participar em actividades de associações, como jantares, por exemplo. Temos de avaliar se isso está directamente relacionado com as eleições e, até agora, ainda não há indícios que apontem para a existência de uma relação directa”, defendeu.

Tong Hio Fong disse que soube do caso pelo jornal. “Se houver a possibilidade de se constituir uma infracção, têm de haver factos em concreto”, apontou.

Mais assinaturas repetidas

A CAEAL esteve ontem reunida para analisar os pedidos de reconhecimento de candidaturas. No total, já foram entregues 21 pedidos, além de dois pedidos de reconhecimento de candidaturas pelo sufrágio indirecto. O organismo aprovou seis candidaturas até ao momento.

Sobre o caso das assinaturas repetidas em várias listas candidatas, Tong Hio Fong falou de um grande aumento de casos em relação à semana passada.

“Segundo os dados, temos 92 subscrições múltiplas. Nesses casos iremos contactar as pessoas envolvidas para verificar em que circunstâncias fizeram as subscrições múltiplas. E vamos verificar quais são as intenções dessas pessoas”, explicou.

O presidente da CAEAL não exclui a possibilidade de se verificarem mais casos de repetição de assinaturas. “Enquanto estivermos dentro do prazo vamos recebendo mais subscrições, e aí vamos ver se há mais casos. Já contactamos mais de dez pessoas e temos de ver caso a caso para saber se constituem uma irregularidade. Depois publicaremos os resultados.”

Sem violações

Tong Hio Fong falou também do número de queixas que a CAEAL tem recebido. “Temos contacto com o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) e recebemos um total de 16 queixas, sendo que todas dizem respeito à nossa comissão. Estas queixas já foram encaminhadas para o CCAC”, frisou.

O também juiz garantiu que, até ao momento, não foram detectados casos que violem a lei eleitoral.

“Há uma preocupação por parte dos cidadãos de que alguns participantes das eleições estejam a antecipar a campanha eleitoral, ou que a comissão tenha conhecimento de irregularidades mas não divulgue as informações. Pelo que temos até agora, ainda não detectamos qualquer irregularidade ou conflitos com a lei eleitoral”, adiantou.

Ontem foi também divulgado o número de locais onde será permitida a realização de actividades de campanha eleitoral. Serão 19 no total: 13 em Macau, cinco na Taipa e um em Coloane.

15 Jun 2017

Jorge Neto Valente, empresário e candidato às legislativas: “A lei de não residentes é muito arcaica”

Jorge Neto Valente tem o mesmo nome do pai, mas seguiu um rumo diferente. Empresário ligado a várias associações, como a Associação dos Jovens Macaenses, Jorge Valente vai enveredar pela política como número dois da lista de Melinda Chan. Em entrevista, defende uma mudança profunda no sector empresarial e na contratação ao exterior, uma aposta no português e uma subida dos salários dos médicos

[dropcap]E[/dropcap]sta semana foi noticiado que vai integrar a lista candidata às eleições, encabeçada por Melinda Chan. Por que decidiu aceitar este desafio?
Há várias razões. Quem decidir candidatar-se à Assembleia Legislativa (AL) pode direccionar o rumo que entender melhor. Na AL, neste momento, há uma falha em termos de escolha e vou acrescentar um equilíbrio que não existe.

Refere-se ao número de deputados eleitos pela via directa?
Há uma falha na representatividade da população. No meu caso e no de Melinda Chan, falamos da eleição pela via directa. Tenho alguns pontos em comum com Melinda Chan, sobretudo na parte das Pequenas e Médias Empresas (PME) e da classe média. Trago alguns pontos que Melinda Chan já está a tratar, mas que posso abordar de uma maneira mais forte, que é a representação dos jovens, dos funcionários públicos, dos funcionários aposentados. Da parte macaense e portuguesa. Todas as associações das quais faço parte têm três pontos em comum: ou porque é a juventude, a ligação luso-chinesa, e isso engloba a plataforma de Macau e também a ligação a Portugal, e ainda as PME, onde engloba as startups. Tenho três empresas que são startups.

Além da questão da representatividade na Assembleia, que outras falhas pode apontar?
Há outra componente que é a forma de atingir os objectivos. Uma é através da representatividade, outra é termos um fim para chegar lá. Há diferentes deputados e diferentes maneiras de fazer a mesma coisa. Não falando de forma específica, neste momento na AL não há muita representatividade de jovens, dos deputados que defendem os interesses luso-chineses. Vê-se pela falha na educação, porque apenas ao fim de 15 anos, e é uma geração, se lembraram que, afinal, é importante o português. Mas recomeçar uma coisa é difícil, porque só daqui a 15 anos é vem outra geração que fala português e chinês. Ninguém se lembrou de defender essa componente de Macau, que é muito importante, não só para representar a parte macaense e portuguesa, mas há 500 anos de história que se esqueceram. Quem é bilingue tem vantagens competitivas para ir para os países de língua portuguesa. Se não fosse o primeiro-ministro chinês [Li Keqiang], que veio a Macau e que lembrou as pessoas que o português é importante, hoje em dia continuávamos na mesma. Tenho vindo a fazer esse trabalho, mas de um ponto de vista mais local, porque estou ligado a várias associações. Já tínhamos falado deste ponto com a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude, há cerca de cinco anos.

A sua candidatura pretende responder a um vazio no hemiciclo, que é a representação da comunidade macaense. O que tem falhado para que uma comunidade tão importante não esteja mais representada?
Houve um esquecimento quando foi a transição. Ninguém se lembrou que era importante. Ainda bem que neste momento existem dois deputados, mas a verdade é que um deputado não pode apenas representar uma pequena comunidade. Ser macaense apenas faz que a pessoa tenha uma perspectiva diferente. Na parte que toca aos deputados macaenses e portugueses, é a forma de trabalho diferente. Sou mais novo e sou de outra geração. Daquilo que se vê na AL, acho que devemos ir sempre pela diplomacia e pela via do diálogo antes de começarmos a bater em todos e a criticar. No caso do secretário para os Transportes e Obras Públicas, não acho que se possa pedir logo que ele se demita. Há outras formas de trabalhar. Serei mais apto a encontrar compromissos através do diálogo.

Falemos da acção governativa. Que análise faz ao trabalho da tutela da Economia e Finanças?
O Governo tem muito dinheiro, é mais fácil governar quando se tem muito dinheiro. Mas também tem de ser bem gasto. Fala-se na diversificação económica há bastante tempo, os resultados não são satisfatórios, e é preciso haver mais diversificação, com resultados. Não chega incentivar jovens e empresários a começarem as suas empresas se depois eles falharem. Vemos muito os restaurantes a abrir e a fechar, e alguns com o subsídio do Governo acabam por fechar, porque não tinham um negócio sustentável. É preciso criar um ambiente onde as PME possam competir.

É preciso ir além da política do subsídio? Criar competitividade?
Sim. O que é que uma empresa precisa? Precisa de capital, pessoal e de uma ideia. Se os custos são altos, é preciso mais capital. Se a mão-de-obra não é qualificada, é preciso contratar mais pessoas para fazerem o mesmo trabalho, que são mais caras. Temos um ambiente que não favorece as PME e ninguém que não seja da área do jogo.

Tem sido muito debatida a questão dos trabalhadores não residentes. Defende uma flexibilização nessa área?
Defendo uma reforma. Temos uma lei de trabalhadores não residentes que é muito arcaica. Temos trabalhadores não residentes qualificados e não qualificados. A quota dos não qualificados claramente foi feita para a construção civil e os restaurantes. E depois as quotas para os qualificados não foram feitas para uma sociedade digital como é a do século XXI. Uma pessoa que seja boa no seu trabalho, e que venha de fora, arranja emprego em Macau. Em Macau precisamos de três a seis meses para ver aprovada a quota dessa pessoa e, em 20 dias, essa pessoa vai dizer que arranjou um emprego melhor, a ganhar mais. Quando voltei de Inglaterra, fiquei com a ideia de que as leis tinham parado nos anos 80. Não houve uma actualização.

O Governo não tem interesse em fazer isso? Ou é a classe empresarial que faz o seu lobby para que essa mudança não aconteça?
Não. O sector empresarial também não gosta do que tem agora. Quando se fala de flexibilidade, o problema é que temos talvez um sistema base que não está a funcionar. Mudando pequenas partes nada vai mudar. Tem de ser uma reforma quase total. Se calhar não houve ainda um plano que agrade a todos, além de que é preciso coragem para mudar em algo que toca a todos.

Acredita na diversificação económica? Que tecido económico teremos daqui a cinco ou dez anos?
Acredito, mas tendo como base a indústria dos casinos. Uma coisa não invalida a outra. Dá-nos jeito os casinos, porque não pagamos muitos impostos. Há muita coisa que se pode fazer. Podemos optar por negócios com países de língua portuguesa para a China, mas não só. A partir daí, quando essa plataforma estiver sólida, podemo-nos expandir para todos os países de “Uma Faixa, Uma Rota”.

Conseguimos ser competitivos para responder a isso?
Depende. Por que não? Há tantos territórios pequenos que conseguem fazer muito mais. Hong Kong é um caso, como centro financeiro é muito importante. Macau pode fazer muitos negócios com os países de língua portuguesa, numa primeira fase, e depois expandir. Acredito também nos locais, mas o que é preciso para criar um ambiente competitivo? Uma boa educação e isso passa não só pelo ensino das duas línguas, mais o inglês, mas também por investir mais na educação, começando pelo início. No ensino superior, poderiam ser criadas mais bolsas para cursos mais necessários, na área do comércio ou línguas. Ainda há muito por fazer: nos últimos 16 anos, muita coisa continuou como antes, embora quase tudo tenha mudado. A maneira de governar não mudou, as leis não mudaram. Por isso é que há muita coisa que fazemos no dia-a-dia em Macau que é incompatível com o resto do mundo.

O ensino superior de Macau poderia melhorar e desenvolver-se ainda mais?
Macau tem um bom ensino superior na área do Direito, mas depois nunca vai ter um curso para médicos.

Não concorda então com a criação de uma Faculdade de Medicina.
Não. Porque uma faculdade de Medicina precisa de ter um hospital universitário também. E não temos. Vamos criar turmas para médicos e, ao fim de poucos anos, Macau vai estar sobrelotado de médicos. O que vamos fazer com os restantes recém-formados? Temos de olhar para o tamanho de Macau. O que resta é saber como encaminhar os jovens para tirarem Medicina lá fora, e incentivá-los a voltar. Falta ainda outra componente: não temos doentes suficientes, casos raros para serem analisados. 

Além disso, não temos ainda o novo hospital concluído.
O actual secretário herdou essa batata quente. Mas tenho visto que os Serviços de Saúde (SS) melhoraram. Nos últimos três anos, talvez. Eu tinha um ramo de saúde nos negócios [foi sócio da Malo Clinic], de onde saí há um ano e meio. À medida que os SS melhoram, as pessoas vão menos para o privado. Mais pessoas são atendidas, melhorou a eficácia interna dos hospitais e centros de saúde. Da parte dos prestadores de saúde privados há a ideia de que o Governo não devia fazer mais, porque tira o negócio. Mas acho que o Governo deveria fazer mais, tem é de melhorar a qualidade. O Governo tem tentado abrir vagas para especialistas, mas acho que nem todas foram preenchidas, e por alguma razão é. Aí voltamos à questão da classificação dos médicos como funcionários públicos. O mundo lá fora evoluiu, e qualquer médico de fora olha para os salários de Macau e pensa “eu ganho melhor noutro sítio”. Aí também é precisa uma reforma do sistema. Quando estava na área da saúde, verificávamos que era difícil contratar médicos de fora.

O seu pai foi deputado há muitos anos. Isso influenciou a sua decisão? Sentiu que tinha de continuar algum legado?
Comparar-me com o meu pai é injusto porque ele já fez tanto, e de uma maneira tão boa, que se fosse um professor a dar nota, ele levava cem por cento. Eu se calhar só consigo 50 por cento, e já fico contente. O mundo mudou e gostaria de fazer tanto como ele. Aceitei juntar-me à Melinda, e quis fazê-lo porque estou a ver que Macau está a encaminhar-se para um rumo que, se calhar, não é o melhor. E nós podemos fazer a diferença. Vamos tentar.

18 Mai 2017

Ho Chio Meng | Governo exortado a dar explicações na AL

Os deputados José Pereira Coutinho e Ng Kuok Cheong entregaram interpelações orais sobre o telefonema que Sónia Chan fez ao antigo procurador da RAEM, sugerindo a contratação de um familiar. O Governo vai ter de dar justificações no hemiciclo

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ónia Chan, secretária para a Administração e Justiça, e Chui Sai On, Chefe do Executivo, já falaram publicamente sobre o caso do telefonema que a governante fez a Ho Chio Meng sobre a contratação de familiares para o Ministério Público (MP) mas, para os deputados José Pereira Coutinho e Ng Kuok Cheong, os argumentos apresentados não bastam.

O dia do debate não está ainda marcado, mas o Governo vai ter mesmo de ir à Assembleia Legislativa (AL) dar explicações sobre o assunto, pois os dois deputados querem quais as medidas a adoptar para evitar casos de abuso de poder.

“Que medidas vão ser adoptadas pelo Governo para apurar responsabilidades das ex-secretária e actual secretária [Sónia Chan] na ‘colocação de pessoas’ dentro do MP e eventualmente noutros serviços públicos, violando os deveres de isenção e abuso de poderes derivado dos cargos que ocupam?”, questionou Coutinho.

O deputado quer ainda saber se o Governo “vai apurar a extensão do abuso de poderes derivados dos cargos públicos que ocupam, bem como a eventual banalidade da violação dos deveres de isenção e abuso de poder pelos titulares de importantes cargos”.

O deputado considera que está em causa uma violação directa do Estatuto dos Trabalhadores da Função Pública (ETFPM).

“No inicio do julgamento do ex-procurador do MP, o mesmo declarou publicamente que fez ‘favores’ às ex-secretárias para a Administração e Justiça, incluindo a actual, nomeadamente na colocação de pessoas dentro do MP. Posteriormente, a secretária [Sónia Chan] confirmou, enquanto responsável máximo por um serviço público [Gabinete de Protecção dos Dados Pessoais], ter efectuado um telefonema para recomendar um familiar, e o familiar conseguiu obter um emprego dentro do MP. Esta conduta viola directamente o dever de isenção previsto no ETFPM.”

Que regulamentação?

Por sua vez, o deputado Ng Kuok Cheong fala da necessidade de regulamentação destes casos. “O Governo deve regulamentar os actos de apresentação ou recomendação de familiares entre altos dirigentes, por forma a salvaguardar os princípios da legalidade, protecção dos direitos e interesses dos residentes, igualdade, justiça e imparcialidade, definidos no Código do Procedimento Administrativo. Como vai fazê-lo?”, questiona.

Para Ng Kuok Cheong, “para salvaguardar a justiça e a imparcialidade, o Governo deve regulamentar as situações em que altos dirigentes propõem determinado candidato aos seus subordinados, ou seja, aos membros do júri do processo de recrutamento e selecção”.

O deputado quer ainda saber se o Chefe do Executivo “chegou a imputar as devidas responsabilidades aos altos dirigentes, incluindo os titulares dos principais cargos na área da Administração e Justiça”.

Para o deputado do campo pró-democrata, “dirigentes de alta categoria a aproveitarem-se dos seus poderes para ajudar familiares a obter emprego na Função Pública é uma situação que se tem agravado desde a transferência de administração.”

 

6 Jan 2017

Lei eleitoral | Juramento de fidelidade preocupa pró-democratas

Os deputados da Assembleia Legislativa aprovaram, na passada sexta-feira, a lei eleitoral. Sem ser consensual, o diploma obteve elogios da maioria dos tribunos e as reservas foram manifestadas pela ala pró-democrata

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stão aprovadas na especialidade as alterações à lei eleitoral. O diploma, apesar de reunir o consenso da maioria dos deputados, acrescenta um novo juramento de fidelidade à pátria que foi mote do debate entre pró-democratas e restantes membros da Assembleia Legislativa.

Para Ng Kuok Cheong, as mudanças não contribuem para a democratização do sistema político porque não se prevê a possibilidade de sufrágio directo universal. Por outro lado, para o deputado, as novas disposições sobre o juramento de fidelidade acontecem como “consequência das posições independentistas vizinhas, o que não faz sentido em Macau”. Para o tribuno pró-democrata, “não há necessidade de apertar mais o cerco”. “Não devemos aplicar do mesmo modo o que se está a fazer no outro lado: se há disputas lá não devíamos transferi-las para Macau”, sublinhou.

Au Kam Sam concordou com o colega de bancada. “Não é preciso definir por escrito o cumprimento da Lei Básica e a fidelidade à RAEM.” O deputado, que considera que este é um juramento já está previsto na Lei Básica, frisa o carácter desnecessário da medida. “Estamos a estragar o princípio ‘um país, dois sistemas’. É uma situação redundante. Não é preciso colocar isto na nossa lei eleitoral”, afirmou. Au Kam San questiona ainda o Executivo se “este não será um trabalho desnecessário e porque é que se tem de interpretar, à força, a Lei Básica”.

O novo juramento de fidelidade surgiu na sequência da polémica em torno da tomada de posse de dois deputados eleitos pró-independentistas de Hong Kong e prevê que a fidelidade dos futuros deputados de Macau seja avaliada pela Comissão dos Assuntos Eleitorais.

Aprender com os vizinhos

Kwan Tsui Hang integra o grupo de tribunos que concorda com a medida. “Manifesto a minha concordância total”, disse a deputada. “Estamos a absorver os ensinamentos do que se passa em Hong Kong, devemos aprender com eles e é ainda importante mostrar que Macau não os pretende repetir”, referiu.

“Prevenir uma doença contagiosa” foram as palavras do deputado Mak Soi Kun para mostrar a sua concordância com o aditamento à lei eleitoral aprovada. “É bom saber o que se passa nas regiões vizinhas para nos podermos precaver: se houver nos vizinhos uma doença contagiosa, temos de nos prevenir aqui também”, afirmou.

Tommy Lau, por seu lado, frisou que Macau é um território inalienável da China e o mais importante é ser fiel ao país. Para o deputado, “este aditamento reflecte o princípio ‘um país, dois sistemas’”.

A seriedade com que deve ser visto o juramento de fidelidade foi também sublinhada por Chui Sai Peng. “Podemos evitar que isto se torne uma brincadeira. Claro que a democracia e a liberdade têm os seus limites, não são direitos absolutos, temos de ter uma atitude muito séria em relação a esta questão”, disse.

A secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, justificou o juramento tratando-se de uma medida para evitar que aconteça em Macau o que se passou em Hong Kong. “Trata-se de evitar que se verifique uma situação caótica da sociedade na eventualidade da ocorrência de casos semelhantes a Hong Kong”. Desta forma, “Macau tem enquadramento jurídico para lidar com a situação”, sublinhou.

Candidatos com depósito

Outra das questões levantadas por alguns deputados foi a obrigatoriedade de um depósito de 25 mil patacas para os candidatos à AL. O montante é devolvido caso consigam um mínimo de 300 assinaturas que apoiem a sua candidatura.

Para Au Kam San, a medida pode ser um obstáculo à candidatura dos interessados “com menos posses”. “Ao estipular esse requisito de depósito, claro que estamos a colocar um entrave ao acesso das pessoas interessadas em participar na eleição. Contesto veementemente esta posição”, disse.

O deputado José Pereira Coutinho também manifestou reservas quando ao depósito monetário obrigatório. “A fixação deste montante deixa-me com muitas reservas. Se todos os residentes podem ser candidatos, esta é uma restrição”, sublinhou, não deixando de dizer que “25 mil patacas é uma quantia exagerada”.

O Executivo explicou que o depósito serve de confirmação de credibilidade da própria candidatura e previne que “candidaturas menos sérias avancem”. “Isto visa evitar brincadeiras na participação nas eleições. Se as candidaturas tiverem menos de 300 assinaturas é uma eleição a sério? É um montante simbólico. O conceito é elevar a consciências das pessoas”, justificou o Governo.

Foi também aprovada, na especialidade, a proposta de orçamento de 2017, que prevê receitas de 102,944 mil milhões de patacas, menos 0,3 por cento face ao Orçamento previsto para este ano, e despesas de 95,725 mil milhões de patacas, que representam mais 12,6 por cento na comparação anual.

19 Dez 2016

FAOM | Plenário dita o futuro no seguimento do passado

Aperfeiçoar a lei laboral, aprofundar os mecanismos de concertação social e preparar as eleições legislativas são os objectivos dos Operários para 2017. A FAOM fez o balanço dos últimos três anos: salienta o sucesso no trabalho para o futuro salário mínimo e o empenho na defesa dos direitos dos trabalhadores

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a reunião plenária da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), organismo que representa a classe laboral local, o destaque andou entre os sucessos dos últimos três anos e os planos para o futuro.

Chiang Chong Sek, secretário-geral da federação, fez questão de salientar as metas definidas para os trabalhos a começar em 2017. “Impulsionar o aperfeiçoamento da lei laboral, estabelecer mecanismos de negociação entre os lados patronal e laboral, publicar uma análise da situação actual do mercado laboral e preparar as eleições para a Assembleia Legislativa (AL) são alguns dos objectivos do próximo ano”, disse ontem, no discurso apresentado na 34.ª Assembleia de Representantes da FAOM.

Os representantes dos trabalhadores, através do secretário-geral, fizeram saber que, nos próximos três anos, a organização vai continuar a ter como base o aperfeiçoamento da lei laboral de modo a ter “sempre em conta o seu interesse”. Para concretizar este objectivo, Chiang Chong Sek enumerou “a definição do salário mínimo, a recompensa da sobreposição dos feriados com folgas semanais, a licença de paternidade remunerada, o aumento do tempo da licença da maternidade e o empenho na garantia de prestação de serviços de saúde aos trabalhadores”.

No que respeita à comunicação entre patronato e o sector laboral, o secretário-geral dos Operários pretende, no próximo ano, aperfeiçoar os mecanismos de coordenação entre o Governo, patronato e trabalhadores.

Para manter a informação actualizada, é ainda objectivo da FAOM a publicação de um relatório anual que analise o desenvolvimento da protecção dos interesses dos trabalhadores, as suas reivindicações e o trabalho da própria associação.

No que diz respeito à formação profissional, Chiang Chong Sek garantiu que vai alargar a cobertura da formação profissional e aumentar a sua qualidade de modo a promover a progressão nas carreiras e a mobilidade horizontal. A meta é pensada tendo em conta possíveis colaborações com os sectores do jogo e dos transportes, bem como com empresas da China Continental.

Quanto às legislativas, que se realizam no próximo ano, Chiang Chong Sek sublinhou a intenção de “participar plenamente no processo eleitoral tendo como tarefa principal a consolidação e expansão dos seus eleitores”. O secretário dos Operários pretende assegurar o contacto directo entre os membros da FAOM e os eleitores para auscultar as reivindicações públicas, classificar os potenciais votantes e estabelecer uma rede de comunicação eficaz.

Do passado reza a história

Ao fazer um balanço do trabalho realizado nos últimos tês anos, Chiang Chong Sek salientou o sucesso obtido no andamento da lei laboral, destacando a importância da definição do salário mínimo para os sectores predial, da segurança e da limpeza.

A defesa dos interesses dos Operários, ao longo dos últimos três anos, foi marcada por sete mil casos relacionados com conflitos entre patrões e trabalhadores que contaram com o apoio da FAOM.

O Dia Internacional do Trabalhador foi ainda assinalado duas vezes com protestos pela defesa dos direitos da classe laboral, sendo que as manifestações contaram com mais de mil participantes.

Em relação à estrutura actual da federação, Chiang Chong Sek referiu que, nos últimos três anos, foi estabelecida uma nova associação que se dedica à função pública e houve a adesão de novos membros, entre eles a Associação dos Operários da Companhia Nova Era e a Associação dos Empregados de Aviação Civil. Actualmente, a FAOM está ligada a 78 organismos, o que representa que tem associadas mais de 20 mil pessoas.

 

15 Dez 2016

Lei eleitoral | ANM quer que deputados recusem pré-análise aos candidatos

A Associação Novo Macau entregou ontem uma petição na Assembleia Legislativa a exigir que os deputados recusem a análise prévia aos candidatos, medida proposta pelo Governo. Jason Chao diz que a eleição directa livre vai ficar comprometida

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] aditamento feito pelo Governo à proposta de lei eleitoral, que visa uma pré-análise aos candidatos às eleições, levou ontem a Associação Novo Macau (ANM) a entregar uma petição na Assembleia Legislativa (AL) que exige aos deputados que recusem esta proposta feita pelo Governo. Na semana passada, foi anunciada a obrigatoriedade de uma declaração de fidelidade à RAEM e à Lei Básica por parte dos candidatos a deputados. O aditamento surgiu na sequência da interpretação que o Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional (APN) da China fez recentemente sobre Hong Kong e que impediu dois deputados independentistas de assumir o cargo.

Para Jason Chao, vice-presidente da ANM, a eleição dos deputados pela via directa poderá ficar comprometida. “O facto de existir um mecanismo de análise aos candidatos vai fazer com que a eleição directa para a AL se torne numa eleição falsa. Se esse mecanismo ficar incluído na futura lei eleitoral, isso irá permitir ao Governo analisar e desqualificar candidatos com base nas suas crenças políticas”, disse ao HM.

O vice-presidente da ANM alertou para o facto de a lei não determinar critérios para a desqualificação dos candidatos às eleições. “Se um fax, por exemplo, provar que determinado candidato não respeita a Lei Básica ou o Governo Central, essa pessoa pode ser desqualificada e simplesmente não pode concorrer às eleições. Se alguém, por exemplo, não cantar o hino nacional, ou se for convidado para as celebrações do dia nacional da RPC e não aparecer todas as vezes, pode-se considerar que essa pessoa não está a respeitar o país e não tem elegibilidade. Não há critérios claros para essa análise e para uma possível desqualificação. A lei só faz referência à existência de provas, mas não é claro como é que o Governo vai fazer esse juízo”, explicou ainda Jason Chao.

Esta semana, a Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, levantou a ponta do véu quanto a esta nova medida. “Se alguém teve opiniões pró-independência anteriores, a Comissão para os Assuntos Eleitorais vai avaliar e perguntar se [o candidato] tem vontade de renunciar a essas ideias.”

Sem confiança

Apesar da petição, o vice-presidente da ANM admitiu existir pouca confiança na recusa do hemiciclo quanto ao aditamento feito pelo Governo. “Pedimos que os deputados recusem a adoptar estas alterações, mas não temos muita confiança, porque até Ng Kuok Cheong concordou com essa medida do Governo. Ele não acredita que esta seja uma grande questão.”

Em declarações à Rádio Macau, o deputado Ng Kuok Cheong fez um discurso optimista quanto a este caso, apesar de ter dito que a medida do Governo é “completamente desnecessária” e “contraproducente”. “Não estou preocupado. É muito óbvio que o Governo de Macau só quer mostrar lealdade ao Governo Central. É um pequeno gesto para mostrar que fazem o trabalho de casa. Não me parece que a realidade social de Macau venha a criar uma força política que, realmente, queira desafiar a Lei Básica. Mas, se esta cláusula é incluída de uma maneira tão forte na lei, então, é provável que alguém use isto para fazer um jogo político negativo contra o sistema político. Podem, intencionalmente, violar a declaração para fabricar um acontecimento”, defendeu o deputado.

1 Dez 2016

Linhas de Acção Governativa para 2017               

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omo habitualmente o Chefe do Executivo, Chui Sai On apresentou na Assembleia Legislativa o Relatório das Linhas de Acção Governativa (LAG) para o ano financeiro de 2017. Seguidamente as várias áreas administrativas serão analisadas e os debates vão prolongar-se até 6 de Dezembro. Mas que ninguém inveje a sorte dos jornalistas encarregados de cobrir as discussões plenárias, porque serão inevitavelmente maçadoras e vai ser muito difícil encontrar temas que valha a pena destacar.

Como já era esperado o documento não contém nada de inovador ou surpreendente, para além da habitual menção à distribuição de dinheiros e aos aumentos de salários. O Governo da RAEM continua a colocar em primeiro lugar a defesa da estabilidade e da prosperidade, especialmente porque convém levar as coisas com calma, atendendo à proximidade das eleições para a Assembleia. Quanto à criação do Novo Órgão Municipal, aparentemente antes de 2018 não haverá novidades. Mas se olharmos para assuntos como a eleição directa de 50% dos deputados e o sufrágio universal na escolha do Chefe do Executivo, chegamos à conclusão que estas matérias nunca passarão de slogans e “agendas” para matar o tempo na Assembleia Legislativa, a menos que muitas vozes populares se ergam para as fazer valer.

Os debates da Área de Administração e Justiça limitam-se a ser sessões de interpelação oral, resumindo-se a infindáveis sequências de perguntas e respostas. Os leitores mais curiosos podem verificar que as próximas sessões justificam o que acabei de dizer. Macau é um lago de águas estagnadas com umas pequenas ondulações. A loiça suja é tanta que não fica a dever nada à do 16º Festival de Gastronomia! Ultimamente tem-se ouvido dizer que o Mar Morto pode secar um dia. E este lago de águas estagnadas, será que um dia destes começa a cheira mal?

Nos últimos anos a economia de Macau tem lucrado com as reformas verificadas na China e com a política dos “Vistos Individuais”. No entanto a taxa de câmbio entre o yuan e o HKD caiu recentemente de 1000 HKD = 830 Yuans, durante Agosto de 2015, para 1000 HKD = 883 Yuans. Quando as pessoas se apercebem que o dinheiro que possuem está constantemente a desvalorizar, quem é que tem vontade de o guardar?

O crescimento anormal do mercado imobiliário, a emissão descontrolada de dinheiro em papel e o aumento do crédito mal-parado, são fenómenos prejudiciais que, a manter-se, podem fazer com que a economia chinesa decaia à medida que a americana dispara.

Depois da 6ª Sessão Plenária do 18º Comité Central do Partido Comunista Chinês, o Presidente tem-se deslocado constantemente para tratar de assuntos de política interna e de crescimento financeiro. Em Hong Kong, o Chefe do Executivo movido pelo desejo de ser reeleito, utilizou a questão da “independência do território”, um conceito sem pernas para andar, para levar o Comité Permanente do Partido a interpretar a Lei Básica. Talvez, do seu ponto de vista, o Governo Central não esperasse que os tumultos fossem uma ameaça de mudança e quantas mais facções e desentendimentos houver em Hong Kong, mais hipóteses terá de ser reeleito. Já o Chefe do Executivo de Macau só quer que as coisas se mantenham o mais sossegadas possível até ao fim do seu mandato, e o resultado das eleições do próximo ano vai certamente assegurar que assim seja. No que respeita à eleição de 2019 para a chefia do governo, os candidatos que se vão apresentar serão aqueles que forem aprovados pelo Governo Central já que não há muitas opções no pequeno círculo político de Macau.

É possível que o Governo Central saiba mais sobre Hong Kong e Macau do que os seus habitantes. Se Leung Chun Ying for sensato retira-se de cena enquanto mantiver a boa forma. Em Macau, com o início do julgamento do antigo Procurador do Ministério Público – que, alegadamente, cometeu muitíssimos crimes -, espera-se que ainda saiam muitos coelhos da cartola. O que está para vir dos desenvolvimentos do “caso da permuta do terreno da Fábrica de Panchões Iec Long” pode funcionar como um detergente para desinfectar as nódoas da corrupção espalhadas por Macau. Oxalá possa lançar uma luz de esperança sobre as sombras que cobrem a cidade.

É certo que as Linhas de Acção Governativa para 2017 não trazem surpresas, mas é possível que grandes surpresas estejam à vista num futuro não muito distante.

25 Nov 2016

Transexualidade e casamento gay debatidos na UM

Assuntos como a transexualidade, a união entre pessoas do mesmo sexo ou planeamento familiar estão a ser abordados, desde ontem, na Universidade de Macau. A ideia é perceber a necessidade de novos enquadramentos jurídicos

[dropcap]T[/dropcap]ransexualidade ou casamento entre pessoas do mesmo sexo são temas que poderão em breve fazer parte de propostas de revisão jurídica de modo a ajustar os regimes à sociedade contemporânea. São questões que se encontram em debate na nona edição da Conferência Internacional sobre as Reformas Jurídicas de Macau no Contexto Global, que decorre entre ontem e hoje na biblioteca da Universidade de Macau.

Em foco, está o papel do direito na regulação de assuntos ligados à família e à sexualidade, num espaço que pretende ser palco de discussão de matérias como o casamento e união de facto entre casais do mesmo sexo, a transexualidade, a adopção por pessoas do mesmo sexo ou a reprodução assistida, tendo em conta a família e os seus direitos fundamentais.

Para a organização, esta é uma temática que já começou a ser discutida no ano passado. “Optámos por propor a continuidade do tema este ano, até porque recentemente a questão da mudança de sexo tem vindo a ser cada vez mais premente e sensível”, afirma ao HM.

Outro assunto a considerar é se se deve ou não reconhecer a união de facto. “Houve já uma proposta colocada à Assembleia Legislativa (AL) no sentido de considerar as uniões civis que pretendiam reconhecer a união do mesmo sexo”, recorda o porta-voz da organização ao HM. A ideia foi discutida na generalidade, mas não teve pernas para andar. Por outro lado, a própria questão do casamento entre pessoas do mesmo sexo tem vindo a ser recorrentemente chamada a discussão, sendo que em regiões próximas de Macau têm existido avanços nesse sentido.

Sendo a temática geral as reformas, é intenção da organização abordar alguns destes temas na perspectiva jurídica de forma a perceber se é, ou não, necessária alguma revisão nesse sentido.

Alterações equilibradas

João Paulo Remédio Marques, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, foi convidado para apresentar aspectos ligados à transexualidade. Considera que “a alteração do Código Civil no que respeita à mudança de sexo terá que ponderar as especificidades da cultura local”.

“As particularidades de Macau são muito diferentes da restante China”, afirma ao HM. Nesse sentido, espera que o regime jurídico possa ser alvo de “uma alteração bastante equilibrada que vá satisfazer as situações de confiança da aparência física externa do cidadão e, por outro lado, satisfaça o seu íntimo, independentemente de aconselhamento médico no que respeita à alteração dos órgãos sexuais, e de vir a ter uma aparência externa diferente”.

“Mesmo sem intervenção legislativa, e à semelhança do que se regista noutros países, ou mesmo em Portugal desde finais dos anos 80, o direito é suficientemente maleável para permitir que princípios gerais levem os juízes a permitir e conceder a mudança de sexo”, explica o catedrático.

Quanto à situação de Macau, João Paulo Remédio Marques considera que “o Governo já está a pensar, há pelo menos um ano, no enquadramento jurídico no que respeita à mudança de sexo” até porque, no ano passado, presidiu a um estudo sobre o tema tentando pensar as soluções estrangeiras e a sua adaptação ao território.

Discursos divergentes

“As narrativas médicas e as narrativas jurídicas são muitas vezes discursos impenetráveis, e esse é o grande problema”, declara o professor de Coimbra, depois de uma sessão em que Chen Cham Hang, médico chefe de psiquiatria do Centro Hospitalar Conde de São Januário, baseado na sua experiência clínica, nomeadamente em Taiwan, fez saber que a mudança de sexo que inclua alteração de órgãos, dada a irreversibilidade, é uma opção que “não deve ser tomada”.

João Paulo Remédio Marques, por seu lado, considera que a perspectiva apresentada foi “estritamente médica”. “O diagnóstico da transexualidade tem de demorar pelo menos dois anos e tem de englobar uma equipa multidisciplinar, para que a opção seja tomada em consciência”, considera.

Rui Cunha, fundador da fundação que apoia a iniciativa, aponta ao HM que “estas discussões são fundamentais de modo a encontrar as soluções na área do direito que depois governam a sociedade”. Para o advogado, “sem esta reflexão há sempre o risco de se distorcerem valores e não se darem soluções condutoras para uma sociedade harmoniosa”.

Para o presidente da Fundação Rui Cunha, “não é benéfico existirem mudanças das leis conforme os ventos sopram”. O advogado considera que estes e outros temas devem ser “devidamente pensados para que se possa realmente ver se vale a pena prosseguir com uma revisão jurídica”.


É preciso mudar, diz Associação Arco-íris

Iniciativas que discutam o enquadramento jurídico de temáticas como a sexualidade e a família são bem vindas a Macau. A ideia é expressa ao HM pelo presidente da Associação Arco-Íris de Macau, Anthony Lam, que considera que é “uma iniciativa que marca o inicio da discussão académica acerca dos diversos aspectos de temáticas que integram a sociedade actual”. Por outro lado, é um evento que dá relevo a questões importantes como é a homossexualidade ou a transexualidade, de um ponto de vista contemporâneo. Para o activista, a prioridade é a liberdade de amar. “Podemos ainda ver pais chineses a proibirem os seus filhos de ter uma relação amorosa com um companheiro do mesmo sexo e o que está em causa, na verdade, é uma questão de amor.” Relativamente à importância de enquadrar juridicamente a transexualidade, Anthony Lam reforça a urgência, afirmando que no ano passado a associação a que preside recebeu dois pedidos de pessoas interessadas em proceder à mudança de sexo.

28 Out 2016

Ng Kuok Cheong volta a pedir debate sobre implementação do sufrágio universal

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Ng Kuok Cheong apresenta hoje uma moção para a realização de um debate sobre a reforma do sistema político e a implementação do sufrágio universal directo para a eleição do Chefe do Executivo. O pedido será feito ao presidente da Assembleia Legislativa (AL), Ho Iat Seng, antes do arranque do plenário desta tarde.

A moção refere que, “segundo a decisão do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional (APN) e as explicações relativas, se for necessário, e no enquadramento da Lei Básica, é possível ser realizada a eleição do Chefe do Executivo através do sufrágio universal”.

Posto isto, o “Chefe do Executivo deve lançar a reforma do sistema político o mais rapidamente possível para garantir que todos os procedimentos possam ser concluídos a tempo de, no ano de 2019, se possa realizar a eleição do Chefe do Executivo através do sufrágio universal, permitindo aos cidadãos de Macau elegerem o dirigente máximo com o seu voto, para que se possa cumprir o bem-estar social”, refere o pedido de moção.

O deputado do campo pró-democrata tem lutado nos últimos anos, ao lado do parceiro de bancada Au Kam San, pela reforma política, no que diz respeito à eleição de deputados e do Chefe do Executivo. Em 2014, ambos os deputados entregaram uma proposta para a realização de um debate sobre o tema, mas esta seria chumbada em plenário com apenas três votos a favor.

O mesmo tema foi ontem abordado por Ng Kuok Cheong no período de interpelações antes da ordem do dia. Citando um estudo feito, que mostra que 60 por cento dos inquiridos desejam que o Chefe do Executivo possa ser eleito pela via do sufrágio universal, Ng Kuok Cheong pediu que Chui Sai On, actualmente em funções, “respeite a opinião pública e concretize o desejo da maior parte dos inquiridos e melhore o regime eleitoral”, e ainda para “assumir uma atitude de abertura em relação à forma de propositura”.

18 Out 2016

AL | Deputados com maior e participação e mais pedidos de debate

[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]o geral, os deputados estão mais participativos nos trabalhos da Assembleia Legislativa (AL), tendo sido até apresentado nesta sessão legislativa mais pedidos de debates que no período de 1999 a 2013. É o que consta dos números fornecidos no Relatório de Actividades da V Legislatura da AL, onde se verifica contudo que a taxa de assiduidade diminui, bem como a das pessoas que quiseram encontrar-se com os legisladores.
Entre 1999 e Outubro de 2013, os deputados apresentaram 20 pedidos de debate. Estes – que versam sobre temas de interesse público e que obrigam o Governo a deslocar-se ao hemiciclo para prestar contas sobre um determinado assunto, se aprovados – foram mais do que os apresentados pelos deputados desde 2013 até este ano.
Só nesta sessão legislativa, a terceira – que durou de Outubro de 2015 até agora – os deputados apresentaram dez pedidos de debate. Segundo o relatório analisado pelo HM, seis deles viram ser-lhes dada luz verde para que os representantes do Executivo tivessem de comparecer no plenário. Ainda assim, cinco deles foram reprovados, já que os votos contra venceram aqueles que queriam debater questões como os terrenos revertidos ao Governo, as construções em Coloane, a concessão de obras públicas e a remodelação do Museu do Grande Prémio.
Os números mantêm-se altos na entrega de interpelações orais, com a V Legislatura – de 2013 a 2016 – a bater o recorde de participações deste género dos deputados, quando comparado com todos os anos anteriores. Esta terceira sessão não conta ainda com o mês de Outubro, mas atingiu já a entrega de 619 interpelações escritas (a média da primeira e segunda sessões é de 685) e de 77 interpelações orais (mais 14 do a sessão anterior).

Na média

Durante esta sessão legislativa foram admitidas na AL 11 propostas de lei – apresentadas pelo Governo – e quatro projectos de lei, estes apresentados por deputados. Aqui, os números não batem os diplomas apresentados pelo Executivo na primeira sessão, quando 16 propostas de lei foram submetidas para aprovação, nem a segunda sessão, quando o Governo apresentou 14 propostas e os deputados oito projectos de lei. A segunda sessão viu ainda chegarem seis propostas de lei da primeira, um a menos do que este terceiro período de AL.
Ainda assim, o número de diplomas que foram realmente aprovados fica na média: nove leis viram ser-lhes dada luz verde pelos deputados, o mesmo número que na primeira sessão da AL e só menos dois do que segunda.
Esta terceira sessão tem ainda pendente a admissão de um projecto de lei: o polémico pedido de Gabriel Tong para alterar a interpretação da Lei de Terras.
Nesta sessão, mais uma vez, José Pereira Coutinho não consegui a aprovação da Lei Sindical. Mas ficam gravadas como tendo sido aprovadas neste período de AL diplomas como o contra a violência doméstica, o erro médico e de execução de bens.

Gazeteiros mas não muito

A média de plenários foi semelhante aos anteriores (42), ainda que os deputados tenham demonstrado menos presença na AL face às duas sessões legislativas anteriores (de 2013 a 2015). A taxa média de assiduidade dos 33 deputados foi de 94,16% e foi Cheung Lap Kwan quem faltou mais. O deputado eleito pelo sufrágio indirecto faltou a dez plenários e só esteve numa das 26 Comissões que analisam as leis na especialidade e numa das dez que acompanham os assuntos da Administração Pública. Chan Chak Mo é o senhor que se segue no que às faltas ao plenário diz respeito: perdeu oito das reuniões, ficando apenas atrás de Melinda Chan, que não foi a sete das reuniões plenárias.
“Realizaram-se nesta sessão legislativa 154 reuniões das Comissões e a taxa média de assiduidade situou-se nos 84,55%”, indica ainda o relatório.

Menos de fora

O nível de participação dos cidadãos e o de entrega de petições desceu nesta sessão legislativa. De 2013 a 2014 houve 99 pessoas atendidas nas instalações da AL, onde falaram com deputados, número que cresceu de 2014 a 2015, para 115. Nesta sessão, foram apenas 68 os cidadãos que se apresentaram nos dias de encontro com os legisladores.
O número de petições também desceu da segunda para a terceira sessões legislativas: se, no período passado foram oito as petições entregues por associações, estas desceram para metade nesta última sessão.

30 Ago 2016

AL | Lei Eleitoral aprovada na generalidade debaixo de críticas

Apenas quatro deputados votaram contra as alterações à Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa. Pereira Coutinho acusou o Governo de elaborar um diploma que vai trazer “eleições sem liberdades”

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]rol de acusações foi longo e, no final, culminou com a entrega das mesmas à Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, para uma leitura posterior. O deputado José Pereira Coutinho teceu ontem duras críticas no plenário que aprovou na generalidade as alterações à Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa (AL), falando de um diploma que se irá transformar numa “lei da mordaça”.
“Esta proposta de lei vai muito mais longe, adulterando o processo eleitoral genuíno e vai comprometer os direitos e liberdades fundamentais dos residentes. Nunca trocaremos umas eleições supostamente livres de corrupção por umas eleições sem liberdades”, começou por dizer Pereira Coutinho.
Falando da existência de graves violações à Lei Básica, o deputado e presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM) frisou que o diploma pretende “controlar as candidaturas eleitorais ou pelo menos os seus aspectos mais relevantes”.
E não faltaram mesmo comparações com o regime da Coreia do Norte. Isto porque a proposta de lei prevê que candidatos e apoiantes tenham, junto da Comissão para os Assuntos Eleitorais da AL (CAEAL) de declarar todo o conteúdo e meios de propaganda eleitoral, incluindo o conteúdo através dos meios de comunicação digital, para se reforçar o controlo. “Repito: reforçar o controlo. Isto só poderia acontecer na Coreia do Norte”, acusou. “Nem as pessoas que se vão apresentar como candidatos se podem assumir como tal, nem as pessoas que pretendam apoiar essa candidatura poderão falar em abono dela ou criticar outras, nem nós. Ficaremos amordaçados e não poderemos dizer nada. Isto é como uma suspensão da liberdade de expressão”, disse Pereira Coutinho, frisando: “aproxima-se de todos nós o lápis vermelho da censura política, das ideias e do seu debate”.
Um assessor da Secretária considerou estas declarações como sendo “acusações graves”. “De acordo com a Lei Básica, a população de Macau tem o direito de eleger e de ser eleita. Não estamos a limitar a liberdade de expressão por parte da população”, disse.
Sónia Chan referiu apenas que o Governo apenas pretende que as actividades eleitorais sejam justas, transparentes e íntegras. “Esta proposta mereceu o apoio do Governo Central e acolhemos as opiniões da população. Não estamos a limitar a liberdade das pessoas e as soluções que propõem tem como objectivo tornar a propaganda mais imparcial, justa e integra”, acrescentou.

Sim às incompatibilidades

Se Pereira Coutinho lançou farpas durante o debate, também as recebeu de volta, já que os seus colegas afirmaram concordar com a introdução do regime de incompatibilidades. Coutinho, sendo deputado à AL, esteve quase a ser eleito para ser deputado à Assembleia da República, na qualidade de cidadão português.
“Apoio esta matéria da dupla fidelidade. Se já assumimos cargos políticos no nosso país como podemos ter cargos noutro país?”, questionou Kwan Tsui Hang. Já Sio Chio Wai considerou que “os deputados, enquanto têm o seu mandato, não podem exercer cargos em países estrangeiros”.
O diploma acabaria por ser aprovado na generalidade com apenas quatro votos contra, de Pereira Coutinho e do seu número dois, Leong Veng Chai, para além dos democratas Ng Kuok Cheong e Au Kam San. Estes não deixaram de defender que o desenvolvimento do sistema político em prol de uma maior democracia não foi sequer contemplado nesta proposta de lei, uma bandeira que há muito tentam levantar. Os deputados da bancada democrata acrescentaram mesmo não perceber por que não se propõe a entrada de mais deputados directos, dizendo que “quando houve esse aumento, não houve instabilidade social”. A lei vai agora para análise na especialidade.

CAEAL permanente? Secretária diz que não

A Secretária para a Administração e Justiça disse ainda que a CAEAL não poderá transformar-se num órgão permanente, dada a falta de recursos humanos nos tribunais. “Esta comissão abrange magistrados e, se for um órgão permanente, vai afectar o funcionamento dos órgãos judiciais”, disse Sónia Chan.

10 Ago 2016

Lei Eleitoral | Proposta de revisão entregue em processo urgente

A nova versão da Lei Eleitoral para a AL vai entrar até Agosto no hemiciclo, para que possa estar em vigor em 2017. Sónia Chan disse ontem que a maioria das pessoas ouvidas na consulta pública concorda com a revisão, mas também houve quem pedisse mudanças na estrutura da AL

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Governo anunciou ontem que vai submeter a proposta para a revisão da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa (AL) em modo urgente. Assim, o diploma revisto deverá chegar ao hemiciclo até ao fim da actual sessão legislativa, que termina em meados de Agosto.
“Pretendemos submeter a proposta de lei à AL antes das férias, antes do fim desta sessão legislativa, porque sabemos que no próximo ano já é o ano das eleições e por isso vamos envidar os maiores esforços para finalizar a proposta”, disse ontem a Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan.
A responsável falava na apresentação do relatório da consulta pública sobre a revisão da lei, que foi realizada entre 7 de Maio e 5 de Junho e que, segundo o Governo, registou uma maioria de opiniões concordante com a orientação da revisão.
Na nova proposta, o Governo pretende apertar as regras para evitar a repetição dos casos de corrupção eleitoral verificados no passado. Para tal, define mais estritamente o que é uma campanha eleitoral, acções de promoção, quem as pode fazer e quando.

Quantos são?

Apesar de estar fora dos objectivos da revisão, foram registadas opiniões durante a consulta no sentido da alteração da metodologia para a constituição da AL. Mas, questionada sobre o número de pessoas que pediram essa alteração e sobre o conteúdo destas opiniões, nomeadamente se foi pedido mais deputados eleitos por sufrágio universal, a Secretária para a Administração e Justiça remeteu para “mais tarde” a apresentação dos dados.
“Queremos é alterar o regime eleitoral e não mexer nos anexos da Lei Básica (que incluem a metodologia para a escolha do Chefe do Executivo e a metodologia para a constituição da AL)”, tinha afirmado antes Sónia Chan.

Campanha controlada

As propostas submetidas à consulta visam, especialmente, a questão das associações, através das quais são eleitos 12 dos deputados de Macau, cujas actividades associativas se podem confundir com acções de campanha.
Assim, o Executivo quer, por exemplo, introduzir a declaração obrigatória das actividades eleitorais, a auditoria obrigatória das despesas nas campanhas ou a criação de uma entidade de apoio às campanhas.
Segundo o documento de consulta, “só os candidatos ou aqueles que forem declarados como apoiantes das candidaturas pelos candidatos podem fazer propaganda eleitoral”, e as despesas terão o limite máximo de quatro milhões de patacas, o mesmo montante para todas as listas.
No que toca ao “reforço do combate ao acto ilícito nas eleições”, o Executivo propõe a introdução de um regime de responsabilidade penal colectiva de modo a garantir que os responsáveis de associações possam ser condenados por ilícitos eleitorais, quando até aqui eram apenas as associações que estavam sujeitas a multas, e que abranja actos cometidos também fora do território.

MP na Assembleia

Entre as propostas do Governo estão ainda alterações no regime de criação e funcionamento da Comissão de Assuntos Eleitorais da AL, como a obrigatoriedade de passar a integrar um elemento do Ministério Público.
Outros dados revelados ontem incluem a criação de um regime de caução da eleição, que deverá prever o pagamento de 25 mil patacas pelos interessados em candidatar-se a um lugar de deputado.
A proposta de lei prevê também que um deputado que renuncie ao mandato não poderá candidatar-se à eleição suplementar. Além disso, proíbe expressamente os deputados de assumirem cargos políticos noutros países, na sequência de uma candidatura à Assembleia da República portuguesa em 2015, pelo deputado José Pereira Coutinho.
Nas sessões da consulta pública foram ouvidas 963 pessoas, tendo sido recolhidas 225 opiniões, segundo referido ontem na apresentação do relatório.

29 Jul 2016

Filhos Maiores | Lei Yok Lam condenada a três meses de prisão com pena suspensa

A Líder da Associação foi ontem condenada prisão com pena suspensa e pagamento de multa. A mulher de 64 anos diz estar a analisar se “vale a pena” interpor recurso num caso “contra o Governo”

[dropcap style=’circle’]L[/dropcap]ei Yok Lam, líder da Associação dos Pais dos Filhos Maiores, foi ontem condenada a três meses de cadeia por desobediência qualificada. A pena decidida pelo Tribunal Judicial de Base (TJB) é suspensa por um ano, mas a responsável pondera pedir recurso.
O caso remonta ao ano passado, quando a mulher foi detida quando tentava entrar na Assembleia Legislativa (AL) quando Chui Sai On, Chefe do Executivo, estava no plenário. Mais de uma centena de idosos da Associação estavam cá fora por, alegadamente, não lhes ter sido permitida a entrada no hemiciclo. Lei Iok Lan, de 64 anos, foi acusada pelas autoridades de não só ter convocado uma manifestação ilegal para o local, como por ter tentado entrar à força na AL. A defesa argumentou que o “único objectivo” do grupo era entrar para assistir ao plenário, como ficou patente no depoimento das testemunhas e no visionamento de imagens em julgamento. Ontem, na leitura na sentença, a juíza disse que ficou provado que a arguida e as pessoas presentes no local receberam uma mensagem de advertência da polícia no sentido de se afastarem da AL, por se tratar de uma manifestação para a qual não tinham pedido autorização, mas que não cumpriram a ordem.

Erro fatal

Lei Yok Lam disse que o seu “maior erro” foi dizer, em voz alta, que entraria à força no hemiciclo se lhe fosse vedado o acesso. Ainda assim, a líder considerou a sentença injusta e, ao HM, afirmou já imaginar este desfecho porque o caso era “contra o Governo”, que deveria querer “que a Associação ficasse sem líder”. Lei Yok Lam ainda vai ponderar interpor recurso da decisão, justificando que precisa de saber se vale a pena gastar mais dinheiro num caso contra o Executivo. A mulher foi ainda condenada a pagar mil patacas de multa no espaço de um mês.
A Associação dos Pais dos Filhos Maiores é composta por idosos cujos filhos nasceram na China. À data da apresentação do pedido para se reunirem com os pais, preenchiam os requisitos, mas durante a apreciação do requerimento, ultrapassaram a idade permitida para a autorização de fixação de residência em Macau.

26 Jul 2016

Democratas interpõem recurso para debate sobre Coloane

[dropcap style=’circle’]A[/dropap]u Kam San e Ng Kuok Cheong interpuseram um recurso ao plenário depois da Mesa da Assembleia Legislativa ter rejeitado uma proposta de audição sobre um projecto de construção no pulmão da cidade. Esse raro recurso para o plenário da Assembleia Legislativa (AL), apresentado a 4 de Julho, ainda não tem data para ser apreciado.
A iniciativa surge depois da proposta de audição que submeteram a 8 de Abril ter sido “liminarmente rejeitada” pelo presidente do hemiciclo, dias depois do plenário ter chumbado uma proposta para a realização de um debate relativo à proposta de audição sobre o projecto de construção de edifícios com cem metros de altura em Coloane.
A 31 de Maio, os deputados apresentaram um recurso dessa decisão à Mesa, que, a 15 de Junho, o rejeitou. Os democratas decidiram então avançar com a apresentação de um recurso ao plenário, que esperam que seja “tratado com justiça”.
“É de facto incrível que o poder de audição da Assembleia Legislativa nunca tenha sido exercido, desde o estabelecimento da RAEM”, refere o recurso.
Para os deputados, “a composição da própria AL e a existência de demasiadas restrições e limitações inadequadas é que impedem” o hemiciclo de “cumprir este poder de grande importância”. “O objecto da audição que propomos tem também a ver com um problema de grande relevância, ao qual a sociedade está altamente atenta e até mesmo com a preservação da zona verde de Coloane”, salientam, recordando que, por via da audição, podem ser convocados membros do Governo e pessoas relacionadas a testemunhar e apresentar provas.
Para os dois deputados, o facto de “lamentavelmente” os seus pares terem chumbado a proposta de debate sobre o assunto, resultado de “falta de informações e de uma votação apressada”, “torna ainda mais importante o mecanismo de audição”.
O presidente da AL, Ho Iat Seng, rejeitou a proposta sob o fundamento de que “o poder de desencadear um processo de audição só pode ser exercido no âmbito das competências da AL” previstas na Lei Básica.

22 Jul 2016

Eleições AL | Chan Meng Kam nega candidatura a duas listas

Uma notícia avançada na semana passada dava conta da candidatura de Chan Meng Kam à AL a duas listas, com o deputado a “ponderar” ser nomeado pelo Chefe do Executivo. Todos os envolvidos dizem que isso não vai acontecer

[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]ão. “Não há qualquer intenção de candidatura a duas listas” de Chan Meng Kam às eleições da Assembleia Legislativa (AL). É o que garante o deputado, que diz que tal notícia é falsa. Os restantes membros da lista assinam por baixo e Ung Choi Kun, que alegadamente iria encabeçar uma das listas, diz-se “chocado”.
Na sexta-feira, o semanário O Clarim anunciava a candidatura de Chan Meng Kam com duas listas para as eleições do hemiciclo de 2017. Uma delas, segundo o jornal, seria encabeçada por Si Ka Lon, número três de Chan Meng Kam actualmente, e Ung Choi Kun, ex-deputado, que foi número dois até 2013. Os dois negam a notícia.
“Fiquei chocado com a pergunta e depois fui confirmar”, começa por dizer Si Ka Lon ao HM, depois de uma segunda chamada. “É um rumor. De facto, ainda nem tivemos sequer qualquer reunião ou discussão aberta sobre  as eleições. E isto é tudo o que posso revelar, porque não sei mais nada”, disse, acrescentando que agora quer “continuar a concentrar-se no actual trabalho de deputado”.
Já Ung Choi Kun acusa o órgão de comunicação social “de ter fabricado” a notícia. “Não existe tal coisa”, frisou. Questionado sobre gostaria de regressar ao trabalho de deputado, o ex-legislador garante que não. “Depois de acabar o meu último trabalho de deputado, já não mostrei vontade de continuar a participar nas eleições à Assembleia Legislativa. Claro que acho que, mesmo não sendo deputado, ainda posso continuar a contribuir para a sociedade, ajudar à formação dos jovens de Macau, apoiar o Governo a fazer os trabalhos de melhor forma. Estou sempre a acompanhar essa situação”, mas não pretende voltar ao hemiciclo.
Chan Meng Kam, que respondeu às questões do HM pela secretária, mostrou-se incomodado com o que diz serem “rumores”. O deputado, que segundo O Clarim “ponderava assumir o cargo de deputado nomeado caso recebesse convite de Chui Sai On”, não descortinou mais pormenores.
“Só podemos dizer pelo deputado que essa notícia é totalmente feita de rumores e é falsa. O deputado não quer responder agora às vossas perguntas sobre as eleições da AL, neste momento, porque ainda está a decidir o que vai fazer. Depois, quando a lista for entregue, sabe-se tudo”, frisou.
Chan Meng Kam sempre foi um candidato eleito directamente pela população, tendo na corrida passada, conseguido ocupar três assentos no hemiciclo. Além de Si Ka Lon, Song Pek Kei é uma das outras deputadas na lista de Chan Meng Kam. O semanário O Clarim, que não citava fontes para a notícia, dava conta que a deputada iria ser a número dois de Ung Choi Kun. O HM tentou também chegar à fala com a deputada, mas não foi possível.

* com Angela Ka

19 Jul 2016

Filhos Maiores | Líder da Associação nega acusações em tribunal

O Tribunal Judicial de Base recebeu ontem Lei Yok Lam, do grupo Pais dos Filhos Maiores. Acusada de desobediência qualificada, a idosa nega ter convocado uma manifestação para a AL sem autorização

[dropcap style=’circle’]C[/dropcap]omeçou ontem a ser julgada Lei Yok Lam, secretária-geral da Associação Pais dos Filhos Maiores, acusada de desobediência qualificada. A acusação diz que a responsável estava a bloquear as portas da Assembleia Legislativa (AL) juntamente com vários outros membros da Associação, mas esta nega.
O caso remonta a Agosto de 2015, quando se realizava na AL uma reunião plenária com Chui Sai On, Chefe do Executivo. Centenas de idosos encontravam-se em frente ao edifício da AL: a Associação diz que era para assistirem à reunião, mas que lhes foi barrada a entrada; o Ministério Público (MP) assegura que os idosos estavam a manifestar-se. O problema gerou conflitos entre a PSP e a Associação, tendo Lei Yok Lam sido detida.
Ontem, a acusação voltou a dizer que os idosos estavam a fazer um protesto sem autorização do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) e que até empunhavam um cartaz. Na sessão de audiência, a responsável explicou que chegou à AL para assistir ao plenário, porque gostaria de saber se o Chefe do Executivo iria falar sobre os pedidos da Associação, que há anos pede ao Governo a autorização de residência em Macau para os filhos maiores de 18 anos que se encontram no continente, de forma a que o agregado familiar possa estar junto.

Troca de acusações

Lei Yok Lam diz que foi impedida de entrar pela polícia que, na altura, lhe disse “que tinham deixado entrar 50 idosos no plenário”. A responsável diz que é mentira e afirma que o caos se instalou quando um idoso desmaiou por se sentir mal. A idosa ameaçou então a PSP de que entraria à força às 15h00, hora do plenário começar, se os agentes não a deixassem entrar antes.
Uma das testemunhas ontem ouvidas, um chefe da PSP, assegurou ontem no Tribunal Judicial de Base que tinha alertado os idosos “duas vezes” para que saíssem do local, mas que estes “nunca aceitaram”. O agente diz que os idosos forçaram a entrada, quebrando a barreira da polícia, incitados por Lei Yok Lam, pelo que foi esta responsável que foi detida.
Lei Yok Lam nega que o tenha feito, tal como nega que tenha convocado os idosos. Diz que só soube da presença do Chefe do Executivo através dos telejornais e outros três idosos, testemunhas, também disseram que chegaram à AL com o mesmo intuito da colega: ver se o líder do Governo iria falar sobre o seu caso.
O caso continua hoje, sendo que vai ser disponibilizada uma gravação sobre o momento.

19 Jul 2016

Previdência | Deputados aprovam regime com três votos contra

Três votos contra de José Pereira Coutinho, Leong Veng Chai e Kou Hoi In não foram suficientes para chumbar a proposta do regime de previdência central não obrigatório. Debaixo de críticas, Alexis Tam promete melhorar lei quando for analisada na especialidade

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s comentários do hemiciclo davam a entender que o regime de previdência central obrigatório iria ser chumbado, mas a verdade é que o diploma acabou aprovado na generalidade com apenas três votos contra. Kou Hoi In, deputado nomeado, manteve a sua palavra até ao fim e votou contra um diploma que prevê contribuições de 10% para a segurança social por parte de patrões e empregados, mas que não obriga as empresas a fazê-lo.
José Pereira Coutinho e Leong Veng Chai, o seu número dois, ainda referiram que podiam votar a favor com mais explicações por parte do Governo, mas o voto final foi vermelho. “O Governo continua a não ter coragem para assumir o princípio da responsabilidade social, para que todos os trabalhadores possam ter dignas condições de vida. Em Macau é tudo à vontade do freguês. Não havendo uma calendarização para o regime obrigatório não votámos a favor, porque os trabalhadores não podem ficar à espera”, disse Coutinho na sua declaração de voto. 22616P4T1-A
Quem votou a favor garantiu que o diploma terá de ser alvo de muitas mudanças. “Este regime já devia ter sido instituído, mas esta proposta é melhor do que nada, embora esteja aquém das expectativas”, disse Song Pek Kei. Angela Leong, que também é administradora da Sociedade de Jogos de Macau (SJM), foi clara. “Este diploma contem aspectos polémicos mas temos que dar o primeiro passo, senão as garantias de aposentação dos trabalhadores ficaram sem uma data, por isso votei a favor. O Governo precisa de negociar com as grandes empresas.”
Chui Sai Cheong, deputado indirecto e irmão de Chui Sai On, alertou para a necessidade de incluir as “empresas privadas que têm o seu próprio regime de pensões”. “Esta lei tem problemas de operacionalidade em relação às empresas que já dispõem de fundos de pensões, há matérias que precisam de ser melhoradas especialmente porque há situações injustas para essas empresas e estas não podem tornar-se vítimas desta lei.”

Empresas a fechar?

O deputado Fong Chi Keong alertou para o risco de Pequenas e Médias Empresas (PME) poderem fechar por não conseguirem suportar os custos com a segurança social. “Em Macau existem mais de 14 mil PME, e a maior parte destas empresas vão fechar por causa do regime de contribuições obrigatório e não obrigatório”, alertou.
Já Kou Hoi In garantiu que o patronato não fica protegido com este regime. “Os empregadores não estão salvaguardados, não fazem parte da população? Quando entra em falência ou quando se reformar, como vai ficar protegido? O patrão contribui mas depois o dinheiro fica todo para o trabalhador. Esta política deve ser para toda a população. Porque é que os empresários têm de assumir esta responsabilidade, em vez do Governo? O empregador pode contribuir para o primeiro nível, mas não para o segundo. Não pode usufruir da protecção deste regime. Tem de contribuir mas depois não pode beneficiar, será isto justo? Neste momento o empregador tem de assumir alguns encargos com regalias”, defendeu o deputado nomeado. 22616P4T1-C
Alexis Tam, Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, decretou que o Executivo já injectou elevadas somas nos actuais regimes de pensões. “A contribuição do Governo representa 85%. Em relação ao segundo nível, já injectamos 49 mil patacas para cada conta individual de previdência (para residentes permanentes). Temos investido bastante na saúde e áreas sociais. Este regime visa sensibilizar os patrões para que possam disponibilizar garantias após a aposentação.”

Captar empresas

O Governo deixou ainda a promessa de rever a lei daqui a três anos para que se implemente o regime de contribuições obrigatório, para além de começar a falar com as grandes empresas do ramo do Jogo, finanças e concessionárias, que já têm os seus regimes privados de pensões.
“O Governo já tem um plano e vamos dialogar com as concessionárias de jogo e as empresas de grande dimensão para aderirem a este regime. Estamos confiantes de que nos próximos três anos seremos capazes de convencer as concessionárias, empresas do sector financeiro e associações que recebem subsídios, pois estas também têm a obrigação de aderir a este regime não obrigatório. Vamos criar condições para que estas associações e empresas possam aderir”, prometeu Alexis Tam.
Após a votação, os três deputados da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), Kwan Tsui Hang, Ella Lei e Lam Heong Sang, pediram, em comunicado, um calendário para a implementação de contribuições obrigatórias.

22 Jun 2016

AL | Exigidos mais assentos para classe média, Jogo e ambiente

Vários deputados deixaram o alerta: a Assembleia Legislativa necessita de ter mais deputados eleitos pela via directa e indirecta para que possa acompanhar o desenvolvimento da sociedade. Mas quais as novas áreas que devem estar representadas? Especialistas pedem mais assentos para o Jogo, classe média ou ambiente

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]última sessão de auscultação aos deputados sobre a revisão da Lei Eleitoral resultou num apelo ao Executivo. Vários deputados pediram mais assentos para a Assembleia Legislativa (AL) pela via directa e indirecta.
“Nos últimos anos verificou-se uma maior participação da população e devem ser aumentados os assentos no sufrágio directo. A falta de assentos directos originou actos de corrupção que carecem de uma investigação profunda”, disse José Pereira Coutinho.  Angela Leong, também administradora da Sociedade de Jogos de Macau (SJM), falou da necessidade de uma maior representatividade do hemiciclo.
“Tendo em conta o crescimento demográfico há mais solicitações por parte da sociedade e deve ser aumentado o número de vagas do sufrágio indirecto e directo. O sufrágio indirecto tem como objectivo representar os diversos sectores da sociedade e estão a surgir mais sectores. Actualmente o sufrágio indirecto apenas representa quatro sectores e isso é insuficiente. Temos de aumentar o profissionalismo e a representatividade na AL”, disse a deputada.

Em falta

Mas quais os sectores que deveriam ser mais representados no hemiciclo? Larry So, politólogo e ex-docente do Instituto Politécnico de Macau (IPM), alerta para a necessidade de mais deputados que representem o sector do Jogo.
“Deveríamos ter mais assentos no sufrágio directo”, disse ao HM. “Há diferentes sectores que representam interesses que não representam verdadeiramente a sociedade de Macau. Não temos uma única pessoa que represente verdadeiramente a indústria do Jogo. Sabemos que há muitos deputados que estão relacionados com a indústria do Jogo, mas isso não significa que tenham sido eleitos por pessoas que pertencem a esse sector”, acrescentou Larry So.
Para o ex-docente do IPM, Angela Leong não é suficientemente representativa deste sector. “Cerca de um quarto da população trabalha na indústria do Jogo então como é possível que não tenhamos um representante? Sem dúvida que precisamos de mais um assento. Se eu votasse na Angela Leong votava não por ela fazer parte da indústria do Jogo, mas porque fez algum trabalho junto da comunidade, sobretudo na zona norte.”
Larry So referiu ainda que há necessidade de uma maior representatividade dos profissionais liberais ligados à classe média. “Deveríamos também ter outro assento para representar as profissões liberais, como médicos ou assistentes sociais. Tratam-se de grupos de pessoas qualificados e as suas vozes não têm sido ouvidas. Há novos profissionais na comunidade, fazem parte da classe média e estão mais preocupados com os problemas da sociedade.”

Um máximo de 40

O líder da Macau Union Green Student, Joe Chan, defende que é preciso eleger pelo menos um ambientalista para o hemiciclo. “Os deputados devem representar os diferentes sectores da sociedade, então penso que um dos maiores problemas actualmente é a poluição ambiental e conflitos em termos de ambiente e desenvolvimento. Seria bom ter alguém na AL que pudesse chamar a atenção para estas questões.”
Joe Chan pensa que o “que tem sido feito na AL (sobre essa matéria) não tem sido suficiente”, apesar dos inúmeros pedidos de debate que já foram feitos em prol da preservação de Coloane. “Não há uma representatividade completa em termos de todos os problemas ambientais existentes.”
Para Scott Chiang, presidente da Associação Novo Macau (ANM) e ex-candidato às eleições legislativas, o actual modelo de eleição e de assentos no hemiciclo está completamente ultrapassado.
“Definir assentos para representar vários sectores da sociedade é um modelo obsoleto. Deveríamos pensar em frente e dar o poder à sociedade para decidir o tipo de pessoas que são eleitas para a AL. Dessa forma os deputados eleitos poderiam representar uma maior variedade de problemáticas e questões. Temos um número indefinido de grupos de interesses e é impossível representar todos tendo em conta a dimensão do nosso hemiciclo. O sufrágio indirecto é uma coisa do passado, pertence a um museu e temos de ter mais assentos directos para que possamos escolher as pessoas que queremos colocar na AL”, defendeu ao HM.
“O próprio Chefe do Executivo pode eleger sete deputados e precisamos de mais assentos que possam pertencer à sociedade e aí poderemos eleger mais pessoas capazes de nos representarem”, disse ainda.
Larry So acredita que daqui a cinco ou seis anos seria ideal ter um máximo de 40 deputados, a maioria eleita pela via directa. Scott Chiang exige que todos eles sejam deputados directos.

Representação de não residentes pouco provável

Os portadores de blue card (trabalhadores não residentes) acabam por representar uma grande fatia da população (mais de 200 mil) mas não estão representados no hemiciclo local por não serem eleitores. Para Paul Pun, secretário-geral da Cáritas e ex-candidato às eleições legislativas, essa possibilidade só existe se for o próprio Chefe do Executivo a nomear um deputado com esse objectivo.
“Os TNR não têm direito de voto, então não têm direito a essa representatividade. O Chefe do Executivo deveria nomear alguém que tivesse a mente aberta para representar os não residentes, ou através do sufrágio indirecto. Mas no sufrágio indirecto não há qualquer espaço para uma representatividade dos não residentes, no sector empresarial ou do trabalho. Todos eles são residentes. O Governo pode seguir o desenvolvimento da sociedade e nomear alguém mais preocupado com as minorias e com os não residentes, que fale Chinês ou não. Alguém com a mente aberta para fazer isso, que não apoie apenas o Governo mas também a população”, defendeu.
Larry So afasta por completo essa possibilidade. “Eles não podem votar, então como podem constituir um sector para a eleição? Não são um grupo de moradores permanentes, há uma grande mobilidade neste grupo de pessoas que vivem em Macau. Tenho reservas quanto à representatividade de um grupo com tanta mobilidade na AL. Mas eventualmente podemos pensar naqueles TNR que ao fim de sete anos se podem tornar residentes e que com isso se tornam eleitores.”
Scott Chiang prefere que seja dada uma maior atenção às minorias. “Quanto a ter um assento específico para os não residentes, a melhor solução seria melhorar a nossa capacidade, enquanto sociedade, de cuidar dos direitos das minorias. Não podemos ter pessoas na AL que apenas falem pela maioria, temos de ter mais pessoas que representem a minoria. Isso é o mais importante.”

25 Mai 2016