Andreia Sofia Silva Política10 de Junho | Ministra da justiça destaca presença de juristas portugueses A ministra portuguesa da Justiça, Rita Alarcão Júdice, destacou a presença de uma comunidade jurídica de matriz portuguesa “antes e depois do estabelecimento da RAEM”, algo “determinante para o pleno cumprimento da Declaração Conjunta Luso-Chinesa sobre Macau, a Lei Básica e o acervo legislativo”. A ministra garantiu que existe “o compromisso do Governo português e de Portugal para com a comunidade portuguesa em Macau e Hong Kong” e prestou “homenagem a todos os portugueses que aqui vivem e trabalham e que contribuem no seu saber e capacidades para o crescimento económico da RAEM”. Rita Alarcão Júdice lembrou que o 10 de Junho “não é apenas mais um dia de feriado [em Portugal] ou no calendário”, mas “o dia em que nos sentimos como país, nação e povo que desbravou caminhos e uniu continentes”.
Andreia Sofia Silva Manchete Política10 de Junho | Ho Iat Seng destaca “profissionalismo” dos portugueses No retorno da celebração do 10 de Junho à residência consular, o Chefe do Executivo lembrou as relações seculares entre chineses e portugueses, bem como “os esforços incessantes das comunidades portuguesas em Macau” e o seu “profissionalismo”. O cônsul português disse que o “ruído” em torno das demissões na EPM não ajuda a comunidade Foi mais um dia de festa no seu local habitual, já terminadas as obras na residência consular, o antigo Hotel da Bela Vista, e com as memórias da pandemia longínquas. As comunidades portuguesa, macaense e chinesa celebraram ontem o 10 de Junho – Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas na residência consular, com vista para o lago Nam Van. O Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, fez o habitual discurso onde destacou o “profissionalismo” das comunidades lusas e a contribuição permanente no contexto das relações económicas e culturais entre Portugal, Macau e China. “O desenvolvimento da RAEM tem-se concretizado de forma saudável com múltiplos aspectos, a diversificação das indústrias começou a produzir efeitos, a integração entre Macau e Hengqin e a construção da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau foram aceleradas de forma constante, dando-se início a uma nova conjuntura de recuperação económica”, começou por frisar. Neste contexto, Ho Iat Seng frisou que “estas realizações são inseparáveis dos esforços incessantes das comunidades portuguesas de Macau”, que comprovam “a sua tenacidade, dedicação e profissionalismo”. “Gostaria de aproveitar esta ocasião para agradecer sinceramente às comunidades portuguesas pelo seu apoio e cooperação no trabalho do Governo da RAEM, bem como o seu contributo para a promoção do desenvolvimento económico e social de Macau”, referiu o governante. O Chefe do Executivo não esqueceu “a cooperação amistosa mantida entre a China e Portugal” enquanto “modelo exemplar de cooperação e intercâmbio entre dois países que têm um diferente sistema social, contexto histórico e dimensão territorial”. Ho Iat Seng afirmou que “têm sido continuamente reforçados” a “cooperação e o intercâmbio entre as duas partes nos domínios da economia e do comércio, inovação científica e tecnológica, recursos humanos, cuidados médicos e de saúde, educação e cultura”, com destaque para a realização, em Abril, da sexta Conferência Ministerial do Fórum Macau. O governante lembrou também que este ano se celebram não só os 75 anos da fundação da República Popular da China, mas também os 25 anos da criação da RAEM. Assim, espera a “participação activa das comunidades portuguesas” enquanto “componente importante da sociedade de Macau” nas actividades comemorativas das duas efemérides que se vão realizar. Menos barulho Alexandre Leitão, cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, destacou o apoio e bom relacionamento com as autoridades locais, mas não desperdiçou a oportunidade de fazer um esclarecimento sobre a polémica em torno das demissões de docentes da Escola Portuguesa de Macau (EPM). “A EPM tem, há menos de um ano, uma missão, um mandato e corpos sociais renovados que têm a competência exclusiva nas opções de gestão, e a responsabilidade exclusiva dos resultados. Neste momento, importa reafirmar a confiança nas administrações, direcção, nos professores que irão leccionar no próximo ano e nos funcionários da escola.” Deve, assim, existir “concentração no trabalho e nos resultados necessários”, importando um alheamento “do ruído que não ajuda quem quer regularizar, reformar e resolver e que pode ter consequências mais graves do que se possa imaginar para toda a comunidade escolar”, frisou Alexandre Leitão. Consulado mais célere Alexandre Leitão falou ainda de uma melhoria do panorama do período de espera para a resolução de questões burocráticas no consulado. “Num ano, a lista de espera para o atendimento para a renovação de cartões de cidadão e passaportes passou a ser de seis meses para um ou dois dias. Qualquer um de vós pode marcar um atendimento que começa esta semana. Estamos felizes, mas não descansados, e queremos fazer mais e melhor.” O responsável anunciou a introdução, no segundo semestre, do sistema de pagamento electrónico para trâmites burocráticos. Além disso, pretende-se “reduzir as listas de espera em todas as secções, resolver qualquer email em menos de 48 horas e informar melhor através dos suportes físicos e digitais”. Alexandre Leitão pediu, contudo, tempo e paciência à comunidade. “Não será amanhã, mas queremos que ainda seja no nosso mandato. Esperamos iniciar as obras no consulado há muito previstas e que são indispensáveis para a segurança e conforto colectivos. Teremos, assim, mais um desafio, o de compatibilizar as obras com o normal funcionamento do consulado.” Barrados à porta Durante os discursos na residência consular, houve relatos de pessoas que, com convite, não tiveram permissão para entrar na festa de celebração do 10 de Junho. Além de relatos transmitidos ao próprio HM, o residente Marcelino Marques escreveu no Facebook uma publicação com o título “VERGONHOSO, em Macau”. “Os PORTUGUESES residentes em Macau, depois de serem convidados pelo CÔNSUL, foram impedidos de entrar na recepção do DIA DE PORTUGAL, por ordens do PRÓPRIO CÔNSUL. Inacreditável!… Miserável!…”, pode ler-se. O HM confrontou o consulado com esta situação, mas, até ao fecho desta edição, não foram obtidos esclarecimentos.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteManuel Palha e Salvador Seabra, Capitão Fausto: Música, a linguagem universal Os Capitão Fausto actuam hoje no MGM Cotai Theatre às 20h, partilhando o palco com o músico chinês David Huang. Fica a promessa da partilha de sonoridades diferentes e dos grandes êxitos da banda. Em entrevista ao HM, os Capitão Fausto, pelas vozes de Manuel Palha, guitarrista e teclista, e do baterista Salvador Seabra, falam da sua essência, do início tímido e quase por acaso e da escalada até à construção coesa de um colectivo de músicos e amigos Chegaram a Macau há poucos dias e actuam hoje. É a vossa primeira vez no território. Como está a ser a experiência? Manuel Palha (MP): Chegámos muito curiosos para ver como é este sítio tão longe de Portugal, mas tão próximo ao mesmo tempo. Estamos a gostar imenso, ainda estamos a achar estranho este mundo diferente, mas de uma forma positiva, de andarmos pela calçada portuguesa, termos a cultura portuguesa e chinesa misturada. É uma experiência bastante fora do comum. O que poderemos esperar do concerto com David Huang? MP: Na primeira parte vai ser um concerto normal dos Capitão Fausto. Depois o David Huang a meio do espectáculo junta-se a nós e vai cantar uma música connosco, o “Amor, a nossa vida”, e nós iremos cantar uma música dele. Depois, o David Huang fecha o espectáculo com músicas dele. Como vai a vossa música enquadrar-se com a de David Huang? MP: São sonoridades bem distintas, mas, apesar disso, a parte que é divertida é que, apesar de estarmos em sítios completamente diferentes do mundo, com culturas diferentes, temos sons e abordagens diferentes, há muita coisa que nos liga. A música tem um lado universal, e esse é o lado que estamos a celebrar. Temos uma música que não é necessariamente o nosso estilo e tipo de som, mas rapidamente nos inteirámos dela. Ainda não tocámos com David Huang, mas tocamos amanhã [quinta-feira] e aí vamos poder trabalhar a ideia do que é a nossa vinda cá, de um certo intercâmbio e viver uma coisa que não é nossa. Essa é a parte divertida de tudo isto. Têm um novo álbum, “Subida Infinita”, lançado em Março. O que há de novo neste trabalho? MP: Sentimos sempre que, nem que seja em termos cronológicos, os nossos discos aparecem sempre em fases diferentes das nossas vidas. Este não foi excepção. Salvador Seabra (SS): À medida que vamos crescendo inevitavelmente vamos mudando um bocado a maneira de fazermos as coisas, mas ainda bem. Para nós é mais interessante. Apesar de haver coisas que se mantêm de disco para disco, e processos de composição que se vão mantendo, há sempre coisas que mudam. MP: Mudou muita coisa, apareceram filhos, o Francisco Ferreira saiu da banda. Todas estas coisas culminam neste disco, que acho que é diferente dos outros, de várias formas. São uma das bandas mais sonantes do actual pop-rock português. Consideram que trouxeram uma nova sonoridade a este género musical que se faz em Portugal? MP: Sabemos, pelo menos, que fizemos o nosso som. Ainda bem que as pessoas têm vindo a ouvir ao longo do tempo, mas é difícil avaliar o impacto que isso possa ter no panorama nacional. Sabemos que há uma verdade de nós os quatro. Sempre que nos juntamos sabemos que sai qualquer coisa que é nossa. O que é bom e interessante. SS: Toda a nossa música é também influenciada por outra música portuguesa e outra coisa que já foi feita. Fazemos as coisas à nossa maneira e penso que não nos cabe a nós dizer se influenciámos, ou não [o panorama da música portuguesa]. Que influências são essas? MP: Quando começámos a tocar havia editoras como a “FlorCaveira” e “Amor Fúria”, e havia bandas do norte de que gostávamos muito. Já tocávamos, mas não fazíamos canções em português e essas bandas até nos serviram de inspiração para fazermos canções em português. Quando começaram a haver bandas como os “2008”, “Peixe-Avião”, e em Lisboa tínhamos os “Diabo na Cruz” e o “B-Fachada”, isso levou-nos a ter vontade de fazer música em português e foi uma onda inspiradora. Os “Capitão Fausto” têm letras que falam de amores, desamores, muitas vezes com um cunho de ironia. Os temas do dia-a-dia são as vossas grandes influências na hora de escrever? MP: Sim. O Tomás [Wallenstein] é que escreve as letras, sempre. As letras são praticamente sempre sobre nós e a nossa vida, que é aquilo que conhecemos melhor. Sobre lidar com as coisas que nos acontecem. Mas há uma ideia que transparece bastante ao longo dos nossos discos que é o cantar a tristeza. A felicidade que está por detrás da tristeza, que vem depois, que se entrelaça com ela. As coisas que nos acontecem são fortes, mas há sempre qualquer coisa para cantar e a ideia de um novo dia a seguir. Isso tem estado patente nos últimos trabalhos. Lançaram o primeiro disco em 2011 [“Gazela”]. O que sentiram quando lançaram esse trabalho? MP: Foi uma fase diferente, éramos jovens na faculdade. Era muito divertido e gravar um disco era algo novo para nós. SS: Era tudo novo e entusiasmante. Sempre foi, desde que começámos a tocar no liceu, um sonho lançar um disco. Quando aconteceu foi algo extraordinário. Actuam em Macau no âmbito das celebrações do 10 de Junho. Sentem a responsabilidade de levar, com a vossa música, a cultura portuguesa? MP: Independentemente do sítio onde vamos tocar, sentimos sempre alguma responsabilidade de darmos o nosso melhor e fazermos o melhor espectáculo possível. Não costumamos tocar fora de Portugal, é muito raro, e esse concerto é entusiasmante também por esse motivo. Sentimos alguma responsabilidade. A internacionalização é um objectivo vosso? SS: De certa forma sentimos que a palavra, o idioma, não deveria ser um entrave, porque a música é forte o suficiente para ultrapassar essa barreira da língua. Pelo menos, nós gostamos de pensar assim. Gostávamos de, eventualmente, quebrar essa barreira, sair de Portugal e tocar mais. Não sabemos se vai ser possível, mas o tempo o dirá. Sempre houve um debate em Portugal sobre bandas portuguesas que cantam e compõem em inglês. Está nos vossos planos compor em inglês, por exemplo? MP: Não faz parte dos nossos planos. Em inglês iríamos contra aquilo que pensamos e juntamos ao longo do tempo, de ao dizermos uma coisa ela ser verdadeira. Sabermos exactamente o que se está a dizer, com que nuances e palavras. A nossa língua-mãe é a única que nos permite fazer isso de forma que consideramos honesta. O Tomás [Wallenstein] estudou a vida toda num liceu francês, e por isso, quanto muito, teríamos algumas canções em francês, porque o Tomás teria algo de verdadeiro a dizer com aquelas palavras, mais do que em inglês. [Usar o inglês] só com vista à internacionalização, ou para chegar a mais pessoas, é uma coisa que nunca faremos. Porquê o nome “Capitão Fausto”? MP: É apenas um nome. Criámos a banda em 2009. SS: Éramos miúdos e fizemos a banda para tocar no casamento de um tio do Tomás e tínhamos de arranjar um nome. Não há uma história associada ao nome. MP: Não há uma mensagem propriamente dita, ela surge depois com os nossos discos. Tendo em conta que têm alguns anos de carreira, como olham para a evolução da banda, como músicos, tendo em conta que saiu um elemento e atravessaram a pandemia? SS: Fizemos o primeiro disco em 2011, mas já tínhamos a banda há mais tempo. Na verdade, nunca tivemos muitas mudanças, sempre foi uma coisa de nós os cinco a fazer música da mesma forma. Sempre tivemos os mesmos objectivos, que era fazer música e tocar ao vivo. Tivemos a grande mudança com a saída do Francisco, e quando isso aconteceu foi uma coisa muito forte. Ponderámos se a banda deveria continuar ou não, se fazia sentido continuarmos sem ele. Continuámos e ainda bem. Penso que a mudança não foi tão drástica como pensávamos. Fizemos bem essa mudança, todos a aceitaram bem, temos agora novos músicos connosco a tocar ao vivo e tem sido óptimo. A mudança faz parte e quando as pessoas crescem, às vezes dividem-se. MP: A nossa história também tem a ver com a ideia de termos começado miúdos, cheios de sangue na guelra, a aprender a tocar juntos. Criámos as nossas primeiras bandas juntos. Fizemos um primeiro disco sem pensar muito bem no que estava a acontecer, houve uma recepção minimamente boa que nos levou a querer continuar. Fizemos o segundo disco, fomos para o terceiro e aí começámos a equacionar viver disto. Estávamos a acabar a faculdade e houve ali um momento em que todos nos atirámos e decidimos fazer isto até ao fim. Agora temos um percurso e o que nos liga é o facto de sermos só nós, e a nossa amizade, e como conseguimos meter o trabalho no meio de tudo isto.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeMTC | Académico defende criação de curso superior internacional em Macau Diogo de Brito Calado defende que Macau deveria ter um curso superior público, de cariz internacional, em medicina tradicional chinesa para os alunos beneficiarem da política de reconhecimento automático dos cursos e, assim, exercerem em Portugal. O académico defende que Macau deveria ter apostado primeiro na internacionalização da profissão e não de medicamentos Em Macau para participar na cerimónia de assinatura de um protocolo na área da medicina tradicional chinesa (MTC), Diogo de Brito Calado conversou com o HM a propósito da sua tese de doutoramento defendida a 30 de Maio na Universidade de Tianjin, onde apresenta um plano de internacionalização da MTC. Diogo Calado, ex-professor de acupuntura no Instituto Politécnico de Setúbal (IPS), defende que Macau deveria criar uma licenciatura em MTC de cariz internacional no ensino superior público para os graduados beneficiarem da política de reconhecimento automático dos cursos e, assim, poder exercer em Portugal. “Falta Macau ter um curso internacional, de preferência numa instituição pública, para que os graus académicos possam ser reconhecidos. A partir do momento em que haja cursos com vários graus, da licenciatura a doutoramento, passa a existir uma ponte para a ciência, tecnologia e boas práticas”, defendeu. Questionado sobre a existência, há vários anos, de uma licenciatura em MTC na Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau (MUST na sigla em inglês), uma instituição privada, Diogo Calado entende que este “não é um curso internacional” e que é ministrado, na maioria, em chinês. “A introdução de novas profissões na União Europeia (UE) sempre foi feita através da via pública, até por uma questão de conflito de interesses. Não quer dizer que não haja oportunidade de uma instituição privada actuar no mercado, e as privadas podem ter um papel fundamental. Mas Portugal, e a própria UE, tendem a valorizar mais o ensino superior público.” De frisar que, além da MUST, há também formação superior em MTC no Instituto de Ciências Médicas Chinesas da Universidade de Macau. Diogo Calado defende que a MTC “modernizou-se na China, mas não tem hoje uma via directa do país para a sua entrada na UE, porque os graus académicos não são reconhecidos”. Desta forma, o académico entende que Macau poderia ser a porta ideal para esta “transferência de conhecimento” por ser a única região que, via Portugal, permitiria a entrada de profissionais com cursos reconhecidos. “Enquanto os graus académicos concluídos na China não são reconhecidos na UE, os graus académicos feitos em Macau são reconhecidos desde 2019 devido a um protocolo bilateral com Portugal. Isso permite que Macau sirva de ponte para a transferência de ciência e tecnologia, evidência e boas práticas da China para Portugal”, frisou. Apoio precisa-se O académico recorda a importância de pensar na “sustentabilidade” da futura licenciatura internacional. “Para que o curso seja criado numa área clínica precisa de ser apoiado, numa primeira fase, pela entidade governamental. Para Macau ter o seu papel na internacionalização da MTC é necessário envolver a academia, com o apoio do Governo. O financiamento também poderia vir da própria indústria. Foi isso que aconteceu com a medicina ocidental na China, que antes não existia”, defendeu. Diogo Calado destaca que “Macau tem-se focado muito na internacionalização de produtos de MTC”, tendo em conta que existem, actualmente, “cerca de 200 empresas farmacêuticas em Hengqin”. “A internacionalização da profissão está em segundo plano. Como se internacionalizam os produtos se depois, fora de Macau, não há quem os possa prescrever?”, questiona. O autor recorda que a MTC entrou no ensino superior chinês a partir de 1956, fazendo-se, nessa fase, “a sistematização do conhecimento e a estrutura do ensino formal que existe nas profissões”. Porém, a MTC aparece no Ocidente à boleia do movimento “New Age”, que também transportou práticas como o yoga, explicou o autor. Desde então que tem havido uma demora no licenciamento das práticas de MTC como profissão autónoma, algo que já acontece em Portugal. “Na área da MTC, neste momento, existem em Portugal profissões independentes e com autonomia técnica e tecnológica.” Persiste, porém, a lacuna legal ao nível do ensino da profissão. Cursos a fechar em Portugal A tese de doutoramento de Diogo Calado, que é também vice-presidente do Observatório da China, tem como título “Um Plano de Acção para a Internacionalização da Acupuntura e da Medicina Tradicional Chinesa para os Países da União Europeia e da Comunidade de Países de Língua Portuguesa”. O autor estabeleceu um ponto de comparação com a internacionalização da medicina dentária no século XIX, a partir dos EUA para a Europa. Licenciado em Ciências do Desporto e mestre em Medicina Integrativa pela Universidade de Medicina Tradicional Chinesa de Tianjin, deu aulas na licenciatura em acupuntura no Instituto Politécnico de Setúbal. Porém, devido ao facto de não haver docentes com doutoramento reconhecido na área da MTC não é possível manter as formações superiores. “O curso no IPS vai encerrar este ano. Os doutoramentos feitos na China não são reconhecidos em Portugal. Existem cursos superiores na área da MTC em Portugal, mas depois a equipa docente não tem qualificações necessárias para que os cursos vinguem como áreas independentes. Não há pessoas doutoradas”, confessou. De destacar que o grau de doutoramento é exigência na maioria dos casos para dar aulas no ensino superior português. “O curso [de acupuntura] também vai encerrar na Escola Superior da Cruz Vermelha”, acrescentou Diogo Calado, explicando que “a agência de acreditação [de cursos superiores] em Portugal olha com grande desconfiança para os cursos nesta área porque as pessoas não detém qualificações para leccionar nesta área específica, daí a importância de Macau.” O protocolo assinado na quarta-feira entre a Associação Comercial Internacional para os Mercados Lusófonos e a Associação de Medicina Chinesa de Macau visa, precisamente, a internacionalização da MTC através de Macau, com aposta nos mercados lusófonos.
Andreia Sofia Silva EventosExposição | O regresso do pintor Diogo Muñoz a uma terra que tanto ama “Macau Forever” é o nome da nova exposição do pintor português Diogo Muñoz inteiramente dedicada a Macau, aos seus personagens e figuras por vezes tão peculiares. A mostra, inaugurada hoje no Albergue SCM, é um tributo a uma terra que continua a fascinar o artista que, para este projecto, se inspirou em figuras da literatura, sociedade e política, como Henrique de Senna Fernandes, Camilo Pessanha ou Carlos D’Assumpção Diogo Muñoz já expôs várias vezes em Macau, mas nunca antes tinha realizado uma obra inteiramente dedicada a um território que continua a apaixoná-lo como da primeira vez que o pisou. A exposição hoje inaugurada, “Macau Forever” [Macau para Sempre], no Albergue da Santa Casa da Misericórdia de Macau (SCM), é uma ode a um território com uma secular presença portuguesa que foi criando figuras ímpares, bem conhecidas de todos. “A ideia de fazer esta exposição foi lançada há uma série de anos por Carlos Marreiros”, declarou Diogo Muñoz ao HM já em Macau, para onde levou esquissos e tintas para criar novos projectos durante a estadia por terras orientais. “Sou apaixonado por Macau desde o primeiro dia e [Carlos Marreiros] pensou na possibilidade de dedicar uma exposição a Macau, aos seus costumes e tradições. A primeira ideia era fazer algo monumental, muito maior, mas não me foi possível porque temos quase 500 anos de história. É difícil pegarmos em toda a gente e há muitos que ficam pelo caminho.” Assim, os quadros desta mostra estão repletos de algumas das personagens favoritas do pintor. “Tive de me cingir ao meu gosto pessoal. Macau tem uma história tão rica que as pessoas, muitas vezes, nem se dão conta disso. É curioso, porque não é um território muito grande. É um enclave metido na Ásia para onde de repente tanta gente foi, em alguns períodos da história, por sentirem segurança, procurando uma espécie de abrigo. Há tantas histórias e mitos. Recebi muito encanto de alguns escritores, por exemplo, Henrique de Senna Fernandes, que tem [nos romances] algo de tão colorido, que me levou para o mito e a imaginação.” Diogo Muñoz confessa que esta “foi a exposição mais difícil” que fez até à data, tendo demorado “muito tempo” até que ficasse pronta. Confessa que bloqueou, ainda no atelier em Lisboa, quando já tinha uma série de trabalhos feitos. Tantos que foi o próprio Carlos Marreiros que lhe disse: “Tens a exposição feita”. Além dos rostos “Não queria ofender, longe disso, quis ser agradável. Há duas culturas que não são iguais, e não queria que fosse meramente uma galeria de retratos, como o que vemos nos corredores do edifício da Presidência da República portuguesa, algo que me chateia imenso.” Assim, em “Macau Forever”, Diogo Muñoz apresenta “abordagens completamente distintas, entre as cores planas aos retratos propriamente ditos”. “Para mim, Macau é isso. Quando falo dela falo aos meus olhos, por constituir um manancial de informação, exotismo, história e diferença, ou mesmo deslumbramento. Visualmente, é impressionante.” “Macau Forever” apresenta referências a Sun Yat-sen, o republicano que exerceu medicina em Macau e que foi um dos responsáveis pela revolução republicana de 1911, na China, o monsenhor Manuel Teixeira, José Vicente Jorge, Chui Tak Kei, Ho Yin ou George Chinnery, “um pintor com tantas coisas bonitas”. “Isolei algumas figuras de quadros que fui pintando, que foram transeuntes. Macau também é pessoas, e quando venho cá tenho a sensação de que há coisas que se vão passando que não vemos”, referiu. Paixão ancestral Diogo Muñoz gosta tanto do território que acredita, quase como uma superstição, que “a relação com Macau é anterior a mim, uma coisa quase ancestral”. “Tenho sempre a sensação de ‘dejá vu’. Talvez porque a minha avó tivesse uma grande amiga macaense, houve sempre histórias na minha família, porque os meus avós e bisavós conheciam bem Macau. Talvez tenha sido essa a primeira informação que se entranhou em mim.” Diogo Muñoz deixou que Macau se entranhasse nele: prova comidas desconhecidas “à confiança”, tem uma rede de amigos de todas as comunidades, vai a sessões de karaoke. “Macau é sempre diferente. Vou trabalhar imenso aqui porque é informação a mais para eu desperdiçar. Vou desenhando, pintando. Há dias em que simplesmente fico no jardim a olhar”, confessou. Para o artista, “Macau Forever” é “uma homenagem, um abraço, um beijo, um tributo” ao território. “Não tenho pretensões de fazer um retrato, pois trata-se de uma coisa muito mais pessoal do que isso. São escolhas muito pessoais as que fiz para a exposição, por isso seria um retrato incompleto”, conclui. A exposição pode ser visitada a partir das 18h30 de hoje na galeria A2 do Albergue SCM, estando patente até ao dia 15 de Julho. A iniciativa insere-se nas comemorações oficiais do 10 de Junho – Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteJogo | Tailândia acelera leis, mas Macau lidera nas receitas brutas, diz analista A Tailândia está a preparar leis para regular o jogo. O analista de jogo Daniel Cheng defendeu ao HM que o país poderá liderar em termos de EBITDA [lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações], mas Macau continuará a ganhar nas receitas brutas. O analista abordou este tema na conferência G2E Asia, que termina hoje no Venetian Macau é a Las Vegas da Ásia, mas cada vez mais há países no continente à espreita para desenvolver projectos de jogo e apostarem no mercado dos casinos, trazendo maior competitividade e desafios ao mercado de jogo local. Da Tailândia têm chegado notícias quanto à aproximação da legislação sobre o jogo, que deverá ser implementada no primeiro trimestre do próximo ano. Qual poderá ser o impacto para Macau do espoletar deste mercado? Para Daniel Cheng, analista de jogo e antigo executivo do sector, Macau vai continuar a liderar nas receitas brutas, mas as operadoras de jogo na Tailândia poderão estar à frente no mercado em termos de EBITDA, ou seja, lucros obtidos antes do pagamento de juros, impostos, depreciações e amortizações. “A forma e a dimensão do mercado tailandês, e a sua competitividade relativa na região, dependem de factores como a estrutura legislativa, o enquadramento e modelo do sector ou ainda o plano de execução das licenças. Se estes três factores forem optimizados, a Tailândia pode tornar-se o novo líder do mercado regional em termos de EBITDA, embora Macau continue a liderar no capítulo das receitas brutas. A dimensão do mercado poderá ser superior a 10 mil milhões de dólares com oito sociedades de investimento”, declarou ao HM. O antigo executivo em empresas de jogo entende que “o mercado tailandês de exploração de infra-estruturas de jogo tem todos os fundamentos para criar uma verdadeira indústria” e que “na pior das hipóteses, caso um, dois ou três factores não forem bem aplicados, o mercado tailandês poderá aproximar-se do modelo filipino e talvez ultrapassar os cinco mil milhões de dólares, se forem emitidas oito licenças”. Para Daniel Cheng, “embora a Tailândia possa retirar alguma quota de mercado aos operadores regionais, a nova oferta também aumentará a procura do mercado e contribuirá para uma maior dimensão do mercado regional”. Desta forma, “Macau será a região mais isolada em comparação com os outros países, uma vez que o Governo chinês pode facilmente ajustar a torneira da oferta de turistas de Guangdong e de outras províncias para Macau”. Daniel Cheng abordou este tópico no painel sobre mercados emergentes de jogo na convenção G2E Asia, uma das maiores do sector na Ásia, que termina hoje no Venetian e que teve início na terça-feira. Turbulência política As autoridades tailandesas estão a trabalhar a todo o gás para que o país venha a ter um sector do jogo que complementará a já bem-sucedida indústria turística tailandesa. O relatório de mais de 200 páginas foi aprovado “quase por unanimidade” em Março pelo parlamento local, e foi enviado para o Conselho de Ministros e depois submetido ao Ministério das Finanças para revisão do conteúdo e formalização de algumas recomendações contidas no relatório da comissão parlamentar. Daniel Cheng destaca que “a revisão está prevista para este mês”, sendo que “o primeiro-ministro [Srettha Thavisin] está a dar um forte impulso no sentido de se acelerar o processo”. “Com o amplo apoio da Câmara [parlamento], e uma vez redigida e revista a legislação, espera-se que a nova lei seja aprovada já no primeiro trimestre de 2025”, destacou o antigo executivo em empresas de jogo. A Inside Asian Gaming (IAG) citou a posição apresentada por Daniel Cheng no painel da G2E Asia, onde este afirmou que “o actual Governo – com o qual não concordo muito – gostaria de ver os frutos desta legislação e a abertura dos primeiros resorts de jogo tailandeses enquanto ainda está em funções”. A IAG citou também o analista sénior da Seaport Research Partners, Vitaly Umansky, participante do mesmo painel da G2E Asia, que alertou para o facto de as autoridades tailandesas olharem para o desenvolvimento da indústria do jogo em Macau e Singapura, tentando replicar um dos dois modelos. “Penso que a dificuldade de abordar a legalização e o desenvolvimento desta forma reside no facto de tanto Macau como Singapura serem construções geográficas e políticas únicas que são muito difíceis de reproduzir na maioria dos outros países da Ásia e do resto do mundo”, declarou Umansky. O analista alertou ainda para os desafios que as autoridades tailandesas podem esperar para implementar em pleno uma indústria deste tipo, nomeadamente em termos de questões políticas. “Para ter os meios necessários para criar uma indústria de grande escala, ou seja, com capacidade para atrair investimentos estrangeiros com uma escala suficientemente grande, que acabem por construir propriedades com investimentos multimilionários e ter um bom ambiente de regulação, o maior problema vai ser mesmo a parte regulatória.” Para Vitaly Umansky há “risco político, porque pedir a uma empresa pública, um operador e promotor internacional de jogo que invista quatro ou cinco mil milhões de dólares americanos num país que está politicamente em risco de ter mudanças de Governo ou agitação política, é um pedido muito grande”. Jogo até 5% Na mesma sessão na G2E Asia, Vitaly Umansky frisou que esta inconstância política pode afastar potenciais investidores do futuro mercado de jogo tailandês. “Qual é a situação de risco político num país como a Tailândia, onde a canábis é legalizada num ano e criminalizada no ano seguinte? O Governo muda, as coisas mudam. Este não é um ambiente político estável em que um operador esteja disposto a investir milhares de milhões de dólares.” O analista de jogo deu o exemplo do Sands Macao, inaugurado em 2004 com um investimento de 265 milhões de dólares americanos e que abriu caminho para o desenvolvimento da Cotai Strip. “Se o Governo mudasse de opinião e dissesse: ‘Olha, nós compreendemos que isto é difícil’, então poderiam começar por construir uma Sands Macao para ver como corre e utilizar esses fluxos de caixa para reinvestir, e só depois construir um mercado adequado ao longo do tempo. Mas ordenar desenvolvimentos de vários milhares de milhões de dólares sem um quadro regulamentar que sabemos que pode funcionar, penso que será quase uma impossibilidade”, rematou Umansky. Citado pelo jornal Bangkok Post, Chai Wacharonke, porta-voz do Governo tailandês, declarou que a futura indústria do jogo no país poderá crescer até aos 2,2 biliões de dólares até 2028, descrevendo que a Tailândia terá de “acelerar os planos para obter a sua quota parte de receitas globais” tendo em conta a expansão do mercado de jogo a nível regional e global. O porta-voz do Executivo citou o relatório elaborado pelo parlamento local que determina que o projecto de resorts deverá gerar o mínimo de 12 mil milhões de Baht em impostos no primeiro ano de execução. O estudo determina ainda que os casinos não devem ocupar mais do que cinco por cento nos resorts integrados, a fim de garantir um equilíbrio entre os segmentos jogo e não-jogo, composto pelas áreas de entretenimento e lazer. Espera-se que o tecido de resorts na Tailândia se desenvolva em Banguecoque, com dois empreendimentos, um no chamado “Corredor Económico Oriental (EEC)” e mais dois em Chiang Mai e Phuket, zonas bastante turísticas. Ainda segundo o Bangkok Post, o estudo foca-se em três aspectos, nomeadamente “as implicações para as políticas económicas, sociais, educativas e culturais da existência de um recinto deste tipo na Tailândia; a estrutura empresarial e a cobrança de receitas e a legalidade e os critérios para as leis relativas ao entretenimento e ao jogo”.
Andreia Sofia Silva Grande Plano“PÁTRIA” | Diogo Vilhena faz documentário sobre viagem aérea entre Portugal e Macau O realizador Diogo Vilhena está em Macau a filmar um documentário que celebra os 100 anos do Raid Aéreo Portugal-Macau, a viagem que Brito Pais e Sarmento de Beires fizeram no avião “PÁTRIA” entre Vila Nova de Milfontes e Macau. A ideia da produção é reunir memórias e juntar pedaços de uma história pautada por heroísmo Chama-se “Milfontes-Macau: Um retrato de 100 anos de histórias inspiradas por uma viagem” e é o projecto de documentário que o realizador Diogo Vilhena tem desenvolvido nos últimos meses para celebrar a viagem centenária do “PÁTRIA”, nome dado ao avião que percorreu mais de 16 mil quilómetros entre Portugal e Macau, num tempo em que eram escassos os conhecimentos técnicos para uma viagem daquela natureza. Se à época a história da aviação portuguesa já tinha dois heróis (Gago Coutinho e Sacadura Cabral), Brito Pais e Sarmento de Beires quiseram também percorrer os céus levando o nome de Portugal para bem longe. A eles juntou-se Manuel Gouveia. Porém, a longa jornada aérea acabou por ficar esquecida na historiografia portuguesa pelo facto de Sarmento de Beires ter sido opositor ao regime do Estado Novo. Mas este ano, em jeito de celebração dos 100 anos da viagem, são várias as iniciativas que tentam resgatar da sombra das memórias o feito. Uma das iniciativas é, assim, de Diogo Vilhena, realizador que cresceu em Vila Nova de Milfontes a ouvir a história destes “heróis”. “Esta história é contada em família e em contexto da memória local, quase como se eles fossem uma espécie de super-heróis que conseguiram fazer a viagem”, conta ao HM. Aos 16 anos, Diogo Vilhena percebeu que não era mito, e que os portugueses tinham mesmo voado para terras longínquas. “Comecei a perceber que sempre foi algo apagado pelo Estado Novo e depois, sucessivamente, a nível institucional e corporativo. Na verdade, se a viagem tivesse sido um desastre, havia a informação de que tinha sido de Vila Nova de Milfontes a Macau, mas como foi um sucesso, passou a ser designada como tendo sido feita de Lisboa a Macau, e assim fez escola. Houve uma espécie de vergonha do sucesso da viagem, assumiu-se que já havia dois heróis, o Gago Coutinho e Sacadura Cabral, e não valia a pena ter mais heróis.” A viagem é importante não apenas do ponto de vista dos feitos para a aviação, mas também por questões políticas. Em 1924 Portugal vivia sucessivas crises políticas com a I República, instaurada em 1910, mas este raid conseguiu receber o apoio do público. Mesmo sem apoio do Estado, os três aviadores viajaram até ao Oriente com o apoio popular. Foram concedidos donativos recolhidos em campanhas e eventos públicos, nomeadamente um “rally” que fechou Lisboa só para este fim. Alguns actores famosos participaram para que a venda de bilhetes fosse mais bem-sucedida. A revista “Seara Nova” também deu apoio à viagem, comprando uma edição do livro de poesia de Sarmento de Beires, intitulado “Sinfonia do Vento”. Com estes fundos foi possível adquirir o avião Breguet XVI B2, chamado “PÁTRIA”. O início da viagem deu-se a 7 de Abril de 1924 e foram vários os desafios, tendo obrigado Brito Pais e Sarmento de Beires a escalas em países como Espanha, Tunísia, Líbia, Egito, Síria, Iraque, Irão, Índia, Birmânia, Tailândia, Vietname e China. Na Índia enfrentam uma tempestade, aterram no deserto e foram forçados a adquirir um segundo avião, o “PÁTRIA II”. Uma espécie de milagre Diogo Vilhena, que tem realizado nos últimos meses diversas entrevistas para o documentário, diz continuar intrigado sobre o facto de “ter sido possível a estes homens, que viajavam numa casca de noz com asas, realizar este feito, numa altura em que não havia equipamentos, protecção, comunicações”. Os aviadores só tinham autorização para voar entre Vila Nova de Milfontes e Málaga, em Espanha, sendo que, a partir daí, estavam por sua conta. “Para mim, esta é uma das aventuras mais épicas da história de Portugal, porque quiseram fazer a viagem e concretizaram-na mesmo. Acreditaram numa espécie de irmandade que ali foi criada, com uma estrutura militar, pois tratava-se de forma hierárquica, com o ‘Sim, meu capitão'”. Até nas celebrações eles estiveram sempre unidos, destaca o realizador. “Brito Pais era um sujeito mais bem visto pelo regime, mas nunca permitiu que fosse homenageado sozinho. Sempre disse que, para o ser, tinham de ser os três homenageados. Infelizmente, o Brito Pais morreu dez anos depois da guerra [II Guerra Mundial].” Colar memórias Assumindo ser difícil contar uma história com 100 anos, em que os seus protagonistas há muito faleceram, ou até familiares mais directos, Diogo Vilhena tem-se concentrado em estabelecer ligações e contar uma história de forma una, que ensine algo a cada pessoa que participa. “O documentário está a ser montado pela relação da memória. A ideia é revisitar a memória que existe nos espaços e pessoas, mas não de forma directa, muitas das vezes. Há pessoas entrevistadas que foram generais e pilotos de F-16, mas que fizeram a escola primária em Macau e tiveram sempre esta imagem um pouco turva sobre a viagem. Não percebiam bem a história, porque era contada de diversas formas. São memórias que distam 17 mil quilómetros umas das outras.” Assim, explica Diogo Vilhena, “a ideia é viajar para que, no final, o filme fique montado de forma que todas as memórias sejam importantes para a narrativa”. “Como esta história não faz parte da história oficial do país, passa a ser um informativo de fragmentos, em que cada pessoa ensina qualquer coisa a outra”, frisou. Em Macau, o realizador pretende entrevistar o jornalista e autor João Guedes, por este “conhecer o território”, onde reside há dezenas de anos. Nos planos está também uma conversa com Santos Pinto, proprietário do Restaurante O Santos na Taipa que foi para Macau pela Marinha portuguesa, e que por lá ficou. “A ideia é mostrar o que é ir de Portugal quase aos trambolhões e ficar em Macau para sempre, estabelecendo um paralelismo com o que aconteceu há 100 anos.” Embaixadores da nação Diogo Vilhena destaca também o facto de Sarmento de Beires, Brito Pais e Manuel Gouveia terem funcionado um pouco como embaixadores da cultura portuguesa, “por levarem sempre a bandeira de Portugal”. “A ideia era que transportavam Portugal, porque tinham viajado com o apoio da pátria, das pessoas, ricas ou pobres, e não do Estado.” O autor do documentário confessa que “é sempre um processo complicado trabalhar com memórias”. “Há pequenos detalhes que muitas pessoas conhecem, e é nisso que me estou a concentrar. Entrevistámos o sobrinho-neto do mecânico [Manuel Gouveia], que é engenheiro da Airbus, e, de repente, transportei-o para a sua infância, em que fala das memórias da avó, que era irmã deste mecânico. Aí consigo ter, na primeira pessoa, a memória de gente que inspirou uma geração.” As pessoas entrevistadas “ainda hoje ficam loucas a pensar como eles [Brito Pais e Sarmento Beires] conseguiram fazer determinadas coisas, como andar em altitude na Birmânia. O ar era rarefeito e podiam desmaiar”. “Tinham muito desconhecimento técnico, fizeram alguns erros sem noção, mas o que é certo é que chegaram lá. Houve um tufão que os impediu de aterrar em Macau, tendo aterrado em Hong Kong, perto de um cemitério”, aponta Diogo Vilhena. A chegada a Macau aconteceu a 23 de Junho de 1924. O regresso foi feito por terra e mar, com trechos da viagem de comboio ou a bordo de navios e ferries, com passagens entre o Japão, Canadá, Nova Iorque, Londres e Lisboa. Chegados à capital portuguesa, perguntaram ao comandante do navio que os transportara de Londres se havia conhecimento da travessia aérea que tinham feito. O comandante disse saber de algo, por andar a navegar, mas que em Portugal ninguém sabia de nada. “Aí Brito Pais disse: ‘Ainda bem. Chegamos da mesma forma que partimos. Indigentes’.”, recorda Diogo Vilhena. O realizador diz-se surpreendido também com o “conhecimento que determinadas pessoas têm sobre alguns pontos da viagem, sabendo muito sobre cartografia, a forma como funcionava o avião, como conseguiram apoios”. “Não há ninguém que tenha o domínio completo da história no seu todo. Não há uma visão global, e espero que com este projecto construir essa ideia global”, rematou. A estreia do documentário deverá acontecer dia 21 de Setembro deste ano, precisamente o dia em que Manuel Gouveia, Sarmento de Beires e Brito Pais chegaram a Lisboa. O regresso a Vila Nova de Milfontes foi seis dias depois.
Andreia Sofia Silva EventosHalftone | Exposição de fotografia foca-se na matriz portuguesa “A presença da matriz portuguesa em Macau, nas imagens entre tempos” é o nome da exposição de fotografia da responsabilidade da associação Halftone inaugurada este sábado. A mostra, integrada no cartaz das comemorações oficiais do 10 de Junho – Dia de Portugal, Camões e Comunidades Portuguesas, mostra imagens de 12 artistas e fotógrafos, revelando a presença lusa no território É inaugurada este sábado, às 17h, na residência oficial consular, no edifício Bela Vista, mais uma iniciativa cultural desenvolvida pela comunidade portuguesa para celebrar o 10 de Junho – Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas, cujo feriado se celebra esta segunda-feira em Portugal. Trata-se da mostra “A presença da matriz portuguesa em Macau, nas imagens entre tempos” e conta com imagens da autoria de 12 pessoas que integram a associação Halftone, com mais ou menos experiência na fotografia. A mostra, que pode ser visitada gratuitamente até ao dia 30 de Junho, na galeria da residência consular, visa “aprofundar o conhecimento do contributo secular da Matriz Portuguesa na RAEM”, descreve-se num comunicado. Com esta exposição colocam-se questões sobre a presença portuguesa e macaense há vários séculos. “Sob o prisma do olhar da fotografia enquanto prática de arquivo diacrítico, subordinado ao tema da memória e identidade, faz sentido olhar a cidade hoje e reflectir sobre os seus traços identitários de Matriz Portuguesa? Quais os marcos históricos e patrimoniais, os registos culturais e persistências humanas nela existentes?” As imagens pretendem ainda responder à forma como “as diversas comunidades têm olhado para a presença do ‘outro’ neste território em constante transição e transformação” e que marcas são essas, “físicas ou imagéticas, entendidas por outras comunidades”. Será que “essas marcas também parte integrante da sua memória coletiva e individual, ou apresentam-se como extemporâneas?”. Mudanças constantes Criada em 2021, a associação de fotografia Halftone pretende mostrar o trabalho dos que adoram estar atrás da lente a capturar traços, vivências e cenários de Macau ou de outros locais, mostrando o trabalho de profissionais e amadores das várias comunidades. Esta é mais uma iniciativa da associação que traz outro olhar de Macau como um lugar que “historicamente é um território em transição”. “Na sua cartografia constrói lugares novos, desdobra-se, aprofunda, concentra novas camadas de memórias colectivas no mapa da cidade. Estas ‘imagens entre tempos’ revelam-se na afirmação da identidade do exercício da memória individual de cada um de nós”, descreve a associação. Revela-se uma “memória colectiva” que todos vivenciam, mesmo “de forma subjectiva, através do exercício da “pós-memória”, bem como “as memórias e registos visuais que outros nos convocam”. Macau é, assim, “o dragão aparentemente tranquilo, mas sempre acordado”, destaca a organização.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteDiogo Pereira, académico: “O cargo de procurador jesuíta era muito polivalente” Diogo Pereira defendeu recentemente a tese de mestrado “Procuradores Jesuítas em Macau: redes de contacto e transferências materiais na primeira metade do século XVII”. O académico da Universidade Nova de Lisboa refere que os procuradores, coordenando vastas redes de influências, foram fundamentais para o sucesso das missões no Oriente Qual a importância da figura do procurador jesuíta no contexto das missões da Companhia de Jesus? O cargo de procurador era muito polivalente em termos de funções. Há, inclusivamente, um perfil que se vai esboçando, com base nos documentos legais escritos para guiar linhas de actuação do procurador. Este deveria ser dedicado ao seu ofício, naturalmente, garantindo as condições materiais e financeiras das missões, além de ser capaz de trabalhar em múltiplos ambientes, nomeadamente na área de negócios e contabilidade da Companhia de Jesus. O procurador deveria ser também um homem de confiança para a administração, pois seria ele a coordenar o dinheiro das diversas províncias. Era uma figura central, embora tenha sido negligenciada nos últimos anos pela historiografia. Os procuradores estavam mais próximos das autoridades portuguesas face aos restantes missionários jesuítas? Em comparação aos missionários teriam, certamente, uma proximidade maior, até porque o procurador respondia a uma tipologia multifacetada. Os que estavam em Lisboa respondiam aos procuradores provinciais, sediados em Goa, Malaca, Macau e nas missões na China e Japão. Depois existiam os procuradores dos colégios que assumiam as responsabilidades materiais de cada residência. Esta era uma rede de carácter global, em que os procuradores estavam estreitamente ligados a Macau. A correspondência que existe prova que havia circulação de materiais e de cartas, bem como de produtos e pessoas, nomeadamente missionários, que passavam por Lisboa em direcção às missões para as quais tinham sido destacados. Macau era fundamental e foi o ponto de partida para as missões jesuítas na China e Japão. Sim. Em Macau o procurador jesuíta estava sediado no Colégio de Madre Deus, até 1620 [nas actuais Ruínas de São Paulo] e era alguém que lidava com todo um intercâmbio de cultura, tecnologia e materiais. Era a partir de Macau que tentava adquirir os produtos que vinham do Reino, de Lisboa ou de Malaca, e que iam para a China ou Japão. Dessa forma tentava-se mitigar as necessidades estruturais existentes ao nível das pessoas e do provimento financeiro e material para o sustento dos missionários. Houve uma adaptação em termos de organização, muito em resposta às necessidades que foram aparecendo, sobretudo no Japão, onde a missão jesuíta teve um grande peso até ao início do século XVII, mas que depois se deteriorou. No caso da China, a missão jesuíta estava ligada a Macau por terra, sobretudo a partir de Cantão. Essa missão foi sempre muito complicada, teve sempre actores importantes com contactos locais, tal como mandarins ou a população comum, que às vezes fazia contactos oficiais. [Os jesuítas] tiveram sempre de se adaptar e reger pelo que foi permitir actuar nesses territórios. Havia, assim, um objectivo religioso e logístico com a actuação dos procuradores jesuítas. O objetivo da Companhia de Jesus sempre foi a disseminação, à escala global, do catolicismo. A China e o Japão eram dois territórios com uma grande densidade populacional, bastante longínquos, e com um peso muito simbólico a nível geográfico. Os dois países representavam a chegada do catolicismo ao Oriente e a sua disseminação num lugar que, 200 anos antes, não teria sido possível. Mais do que gerir trocas comerciais ou a própria missão religiosa, o procurador jesuíta também era importante para governar a província em consonância com os Governadores locais. O procurador sediado em Macau foi fundamental. Um traço disso é o documento que analisei na minha tese que fala na procuratura de Macau instalada no Colégio da Madre de Deus e que saiu, em 1620, para um local exterior. A ideia era que se dissociasse na Companhia de Jesus as esferas espiritual e comercial. Esse documento, escrito pelo padre Manuel Barreto, mostra que havia uma grande interdependência estabelecida pelo procurador jesuíta com os Governadores ou Capitães-Mor de Macau, ou ainda com os próprios mercadores que ganhavam peso nas naus que saíam de Goa para o Japão. Em Macau havia, assim, uma grande estrutura e uma rede de interdependências a nível regional e global. A sua investigação conclui que os procuradores jesuítas foram fundamentais para o alcance que as missões tiveram no século XVII. Eu e a minha equipa de trabalho percebemos que os procuradores foram agentes fundamentais e coordenaram uma larga estrutura de produtos e materiais. Todas estas actividades eram estruturais para as províncias e vice-províncias. No Reino, as subvenções régias chegavam facilmente, mas o dinheiro enviado do Reino para Goa e Macau chegava poucas vezes, segundo vários relatos, e quando chegava era insuficiente para as necessidades que se sentiam à época. Cremos que o procurador jesuíta era o grande responsável pelas missões nas províncias. A comunidade macaense era protagonista desta rede de apoio aos jesuítas? Sim, sem dúvida, por falarem as duas línguas. Muitas vezes tinham contactos locais que ajudavam o procurador a estabelecer negócios, a conseguir produtos mais baratos e de melhor qualidade. Não podemos esquecer que estes procuradores eram também mercadores e não apenas padres, para que a Companhia conseguisse atingir o máximo dos objectivos das missões. Portanto, a comunidade macaense era imprescindível para o trabalho do procurador e era uma rede de apoio fundamental. Existem ainda referências a homens que enganaram o procurador em negócios, produtos, compras, nomeadamente de sedas ou outro tipo de mercadorias. Houve pessoas que ajudaram a Companhia, assumindo um papel de benfeitores, em Macau e em Lisboa. Em Lisboa funcionava a “casa-mãe” da Companhia de Jesus, mas no caso de Macau os procuradores eram agentes da companhia que tinham de se adaptar aos espaços e às especificidades desses locais desde há séculos. Houve contacto destas figuras com a corte imperial chinesa? Há o exemplo perfeito do padre João Rodrigues Tçuzu, que foi criado no Japão. Ele chegou, aliás, a afirmar que falava e escrevia melhor japonês do que português. Depois viveu na China. No Japão esteve na corte e foi próximo de um dos imperadores. João Rodrigues Tçuzu foi não apenas o procurador da Companhia em Nagasaki, mas também procurador da corte em Nanquim em diversos assuntos, neste caso dos assuntos materiais da corte. O padre acabou por ser expulso do Japão, e uma das razões foi por se intrometer demasiado, enquanto padre, nos assuntos seculares [do império]. Em Macau teve contacto permanente com as autoridades de Cantão e, já nos últimos anos de vida, faz três viagens a Pequim, entre os anos de 1620 até 1633, ano da sua morte. Certamente que reuniu com os imperadores.
Andreia Sofia Silva EventosCinema | “The Ballad of a Small Player”, de Edward Berger, será rodado em Macau É uma das grandes notícias para o cinema local: o realizador Edward Berger resolveu pegar no romance do britânico Lawrence Osborne, “The Ballad of a Small Player”, e fazer um filme em Macau, onde os casinos são peça principal da trama. As rodagens começam este Verão e contam com estrelas maiores da sétima arte como Colin Farrell e Tilda Swinton Macau vai receber, a partir deste Verão, as rodagens do filme que será uma das estreias da plataforma de streaming “Netflix”. Nada mais nada menos do que “The Ballad of a Small Player”, algo como “A Balada do Pequeno Jogador”, projecto do realizador Edward Berger que resolveu pegar no romance, com o mesmo nome, do romancista britânico Lawrence Osborne, e lançado em 2014. A escrita do argumento do filme está a cargo de Rowan Joffé. A produção, que arranca ainda este mês e que se deverá prolongar até Agosto, conta com estrelas maiores de Hollywood como Tilda Swinton, que ganhou o Óscar para Melhor Actriz Secundária pelo filme “Michael Clayton”, ou Colin Farrell, actor irlandês detentor de um Globo de Ouro e protagonista do filme “Minority Report”, de Steven Spielberg. A notícia é avançada pelo portal “Tudum”, ligada à “Netflix”, e já foi avançada pelos media locais. Além das estrelas internacionais bem conhecidas dos amantes do cinema, “The Ballad of a Small Player” contará ainda com a actriz Fala Chen, actriz sino-americana nascida em Chengdu. A produção do filme, a cargo da “Lumiere Film Production”, lançou ainda uma campanha para a escolha de figurantes para papéis tão variados como dealers, croupiers, hóspedes de hotel, jogadores em casinos e paquetes. Dá-se preferência a quem tenha experiência no sector hoteleiro e de jogo. Apostas e fuga “The Ballad of a Small Player” conta a saga de um advogado inglês que foge para Macau depois de ser acusado por corrupção. Este advogado chama-se “Lord Doyle” e, em Macau, dedica-se a jogar no seu casino favorito, passando as noites como fugitivo, a beber e a apostar tudo o que tem, assombrado pelo passado. O destino deste advogado é decidido conforme ganha ou perde dinheiro, até que tudo muda quando conhece a chinesa Dao-Ming, que parece rondar as mesas de jogo tal como ele o faz. O que, à partida, parecia o nascer de uma relação verdadeira, depressa se transforma em algo complexo. Sobre o livro, Neel Mukherjee, da New Statesman, disse ser um “thriller existencial escrito na perfeição”, com “uma leitura assustadora, arrebatadora, que nos deixa com o coração na boca e que tem coisas profundas a dizer sobre o único deus que governa os assuntos humanos – o acaso”. Já o jornalista Paul French, também autor de muitos livros sobre a história da China, defendeu, no Los Angeles Times Book Review, que o livro de Osborne “é o melhor romance contemporâneo sobre a China desde o tempo de Malraux”. A história de Lawrence Osborne está, assim, repleta de ingredientes de suspense e com uma atmosfera bastante rica com o exotismo próprio de Macau e do Oriente. Um dos trabalhos mais conhecidos de Edward Berger é o filme “All Quiet on the Western Front”, filme também realizado para a “Netflix” que recebeu vários prémios, incluindo quatro Óscares.
Andreia Sofia Silva Manchete Sociedade“Maliksi” | Quatro pessoas feridas no primeiro “sinal” do ano A passagem do “Maliksi” por Macau não provocou estragos de maior, mas gerou o impacto habitual: quatro pessoas feridas, aulas suspensas e turistas avisados de eventuais perigos Na passagem do tufão “Maliksi” pelo território, este fim-de-semana, era fraca a possibilidade de ser içado o sinal 8, a partir do qual a grande maioria das actividades diárias é suspensa e os estabelecimentos fecham portas. Ainda, assim, o “Maliksi” obrigou os Serviços Metereológicos e Geofísicos (SMG) a içar o sinal 3 de tempestade tropical, o primeiro do ano, tendo originado quatro feridos e levado à suspensão das aulas do ensino infantil, primário e especial no sábado. A tempestade teve origem numa depressão tropical a nordeste do Mar do Sul da China que acabou por se intensificar para uma tempestade tropical. Entre a noite de sexta-feira e manhã de sábado atingiu a costa de Guangdong e do Delta do Rio das Pérolas, trazendo ventos fortes e chuvas. O sinal 3 esteve içado entre as 16h de sexta-feira e as 18h de sábado, sensivelmente. Tendo em conta que a chegada da tempestade obrigou, decerto, a mudanças nos planos dos turistas, a Direcção dos Serviços de Turismo (DST) emitiu um conjunto de medidas preventivas, comunicando ainda com os operadores turísticos “sobre os aspectos a ter em atenção durante a passagem do tufão”, apelando “à formulação de planos de resposta adequados”. Foi ainda solicitado “a todos os estabelecimentos da indústria hoteleira de Macau a colocação no átrio de entrada ou outro local visível de informação sobre o sinal de tempestade tropical em vigor e as alterações aos transportes durante o período de influência do tufão, para permitir aos visitantes ajustar atempadamente o seu itinerário e sofrerem o mínimo de transtorno possível”. Também os Serviços de Polícia Unitários deram o alerta para a maior atenção de residentes e comerciantes a fim de “tomarem medidas de prevenção contra o vento, reforçarem a segurança das janelas e dos objectos fáceis de serem arrastados pelo vento”, ajustando ainda as demais actividades. Artes canceladas Com o aviso da chegada do “Maliksi” ao território, foi cancelado um espectáculo por decisão do Instituto Cultural, nomeadamente por se realizar ao ar livre. Um deles, o programa “Impressões de Iec Long”, integrado no 34.º Festival de Artes de Macau, agendado para as 20h de quinta-feira, na antiga Fábrica de Panchões Iec Long, não se realizou. O mesmo programa, que acontecia na sexta-feira à mesma hora, foi também cancelado. Foram igualmente anuladas as duas sessões do programa “Ao Teu Lado – Para sempre aqui contigo”, agendadas para sábado no Estúdio II do Centro Cultural de Macau. Passada a tempestade, fica o mau tempo. Para hoje os SMG prevêem a ocorrência de céu nublado e aguaceiros “ocasionais”, além de “dispersos, com períodos de trovoada”. O vento será fraco e os níveis de humidade relativa no ar podem chegar aos 99 por cento.
Andreia Sofia Silva EventosLivros | Martin Zeller e Debby Sou Vai Keng lançam “The Passenger” em Lisboa “The Passenger” é um livro desdobrável de fotografias sobre a passagem do tufão Mangkhut sobre uma pequena ilha de Hong Kong. Ao lado dos cenários de destruição, capturados pelo fotógrafo Martin Zeller, revelam-se histórias ficcionadas e poemas de Debby Sou Vai Keng, artista e autora de Macau. A obra será lançada amanhã em Lisboa No início nem era para ser um livro. Martin Zeller, fotógrafo alemão que durante muitos anos esteve radicado em Hong Kong, estava de visita à ilha de Peng Chau, na região vizinha, na companhia de Debby Sou Vai Keng, pintora e escritora natural de Macau. A trabalharem juntos na área das artes plásticas e fotografia há vários anos, enfrentaram, em 2018, a passagem do tufão Mangkhut por Hong Kong. Martin Zeller começou a fotografar a tempestade e o que dela restou. Depois, Debby Sou Vai Keng resolveu escrever histórias ficcionadas e poemas que remetem para a ideia de alguém de fora que observa a ilha com a natural curiosidade de um desconhecido. Assim nasceu “The Passenger”, um pequeno livro de fotografias, textos e poemas, desdobrável, em inglês e chinês, que será lançado amanhã em Lisboa na galeria Imago. Ao HM, Debby Sou explicou que esta obra é produto do acaso, porque quando foram para Peng Chau tinham um projecto diferente. “Pretendíamos desenvolver um projecto sobre montanhas e mares. Mas não tínhamos nenhuma ideia sobre o que queríamos fazer exactamente. Queríamos trabalhar juntos recorrendo à fotografia e, talvez, à pintura, com pequenos contos e poemas. Então, quando chegámos, enfrentámos o tufão.” Na preparação da casa para enfrentarem juntos a tempestade em segurança, Martin Zeller começou, subitamente, a fotografar. “Estando em casa podíamos ver a tempestade, o que se tornou interessante, víamos o mar agitado, o vento. Fiquei muito entusiasmado e comecei a fotografar.” Foi aí que os dois artistas decidiram avançar para a edição do livro, que não pretende ser um retrato documental de mais um tufão, de entre muitos que passam por esta zona do globo. Trata-se também de um retrato “da comunidade que vive na ilha, do que aconteceu”. “Não estávamos interessados em fazer algo documental”, recorda Martin Zeller. Escrita da observação Debby Sou descreve que, à medida que iam passeando pela ilha depois da passagem do Mangkhut, ajudando os moradores a recompor o que restou da destruição, lhe surgiram ideias para escrever. “Quando escrevo, escrevo ficção, não faço escrita documental. Misturo coisas e imagino-as. [O livro] tem uma espécie de passageiro e as histórias são totalmente ficcionais, com personagens criadas. Mas claro que baseio muitas das minhas histórias em experiências pessoais.” A autora confessa que não escreve histórias como uma residente, mas sim revelando impressões como se fosse turista. Debby Sou referiu ainda que o facto de ser de Macau não lhe dá uma perspectiva de proximidade à realidade de Hong Kong. Ou seja, quando escreve, e quando escreveu para o “The Passenger”, conseguiu ter o distanciamento necessário. “Tenho de dizer que, como alguém que é de Macau, sempre olhei para Hong Kong como se me fosse estranha. São vivências completamente diferentes. No caso desta ilha, as pessoas têm formas de comunicar completamente diferentes, e há até diferenças em termos de mentalidade. Em cada ilha de Hong Kong há uma vivência diferente. Por isso, para mim, foi fácil ver as coisas como se fosse mesmo uma passageira, uma verdade estranha”, disse. Convidada a falar mais da sua escrita, a autora mostra-se retraída. “Não sou muito boa a descrever as minhas histórias. É algo difícil de expressar. Quando escrevo, o processo é semelhante do que quando pinto. Simplesmente pego num pedaço de papel e começo. Às vezes o papel e as cores dizem-me como continuar, e eu simplesmente prossigo. Quando decido, páro, e às vezes tenho de trabalhar no quadro. Com as histórias é um processo muito semelhante, simplesmente começo [a escrever].” As inspirações para os textos de Debby Sou surgem-lhe das caminhadas que tanto gosta de fazer, e das observações que daí surgem. “Muitas vezes falo com pessoas, mas não sou muito boa nisso. Prefiro observar, simplesmente, e imaginar coisas.” Um projecto diferente “The Passenger” não tem rostos de pessoas. Não tem os moradores da ilha a braços com a destruição. Só um homem corajoso que decidiu sair de casa e correr bem junto à costa para observar a violência do mar. De resto, persistem imagens dos cacos caídos, das árvores dobradas. Havia uma ou duas fotografias de rostos, que Martin Zeller decidiu retirar por se afastarem do conceito original. “Estava mais focado em captar o ambiente. Mas tenho a dizer que, hoje em dia, é difícil fotografar pessoas, que muitas vezes ficam ofendidas quando apontamos a câmara. Sobretudo numa situação especial como esta, com a passagem do tufão. Não querem lidar com fotografias e estão preocupadas em limpar as suas casas. Mas, para mim, foi muito interessante fazer este projecto, pois percebemos até que ponto o carácter documental se transforma em arte.” Martin Zeller e Debby Sou estão habituados a criar juntos. Actualmente vivem em Almada, onde têm o estúdio “StudioZeller”, que recorrentemente desenvolve exercícios de arte multidisciplinar. Ele fotografa, ela escreve e pinta por cima das suas imagens, numa interconexão constante. Inspiram-se mutuamente. “The Passenger” é algo diferente de tudo o que já fizeram. “O primeiro projecto que fizemos juntos foi em 2013, em que pintei por cima das fotografias dele, tiradas em Berlim, e que foram impressas em papel de arroz. Consegui pintar recorrendo a técnicas da pintura tradicional chinesa. Mas desta vez [com ‘The Passenger’] foi uma decisão bastante espontânea, porque há muito tempo que queríamos fazer algo e não sabíamos mesmo o que fazer com este material. Depois surgiu a covid e não conseguíamos ir a Hong Kong e pensei que seria uma pena deixar as imagens numa gaveta. Discutimos o formato da publicação, chegámos a pensar publicar em forma de mapa desdobrável, mas depois ficava algo complicado. Então ficou assim, como se fosse um acordeão”, explicou Debby Sou. Lançar “The Passenger” em Lisboa foi fruto do acaso, mas os dois autores garantem que o projecto vai também ser lançado em Macau e Hong Kong, embora ainda não haja datas concretas. Martin Zeller e Debby Sou estão também a planear o regresso, por uma temporada, a Hong Kong, a fim de desenvolverem novos projectos.
Andreia Sofia Silva EntrevistaPedro Costa Ferreira, Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo | No Oriente, o céu é o limite O presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT) fala da relação de enorme proximidade com as autoridades de Macau em promoção turística. Em entrevista ao HM, Pedro Costa Ferreira defende que Macau, como destino turístico para a Europa, tem mais a ganhar se for associado a regiões do sudeste asiático Foi anunciada a realização do congresso da APAVT em Macau no próximo ano. O que poderemos esperar deste encontro? Não lhe vou adiantar grandes detalhes porque ainda vamos ter o congresso deste ano em Huelva, Espanha. Mas posso dizer que escolhemos Macau para um congresso muito especial, sobretudo porque vai fazer de Macau o território que mais vezes acolheu o congresso da APAVT, em 1982, 1990, 1996, 2008 e 2017. Dá a ideia da solidez da nossa relação com o território ao longo deste tempo. Além disso, será no ano em que fazemos 75 anos de existência, além de ser o nosso 50º congresso. Queremos, assim, que este congresso seja especial a nível de conteúdos, figuras presentes, que costuma ser o sector do turismo português todo, e talvez europeu e espanhol. Algumas linhas de cooperação especiais com Macau que serão lançadas no evento? Mais do que termos algo específico a desenvolver, o congresso é o final de uma etapa importante no nosso relacionamento, tendo em conta que vamos desenvolver também outras etapas. Temos feito um trabalho metódico e plurianual com Macau. Julgo que Macau pode ser considerado, juntamente com a Madeira, o local que tem o melhor relacionamento e trabalho feito com as agências de viagens em Portugal. 2025 será certamente o ano de ouro para Macau no seio da APAVT. Vamos ter a presença de Macau na FITUR [Feira Internacional de Turismo], onde iremos aprofundar o nosso relacionamento com o mercado espanhol, depois teremos a presença da APAVT muito significativa na BTL [Feira de Turismo de Lisboa]. Teremos certamente uma presença multifacetada e dinâmica no MIT [Macau International Travel (Industry) Expo, ou Exposição Internacional de Viagens (Indústria) de Macau]. Tudo o que é liderança turística europeia vamos levar a Macau em 2025. Depois tudo culminará com o congresso, onde passaremos a uma nova agenda e acções. Como explica essa ligação de Macau com as agências de viagens em Portugal? As agendas que são formadas, e que definem o relacionamento entre a APAVT e os diversos destinos turísticos, dependem da atenção que é dada por esses destinos às dinâmicas de relacionamento. O que tem acontecido com Macau, antes e depois da pandemia, é a existência de um historial importante e um relacionamento que se foi intensificando. No pós-pandemia tivemos uma etapa nova e muito produtiva. Julgo que há uma vontade muito grande de Macau de voltar à procura europeia e a internacionalização da procura turística pela região. Da nossa parte estamos sempre disponíveis e recebemos de braços abertos todos os destinos turísticos que queiram trabalhar connosco. Depende da iniciativa dos destinos. Madeira tem tido um trabalho de proximidade que só é, de facto, comparável, a Macau. Considera que será desafiante a tentativa de internacionalização de Macau como destino turístico, uma vontade do Governo que persiste há muitos anos? Não quero responder como algo que será difícil ou fácil. Há determinadas características no relacionamento das agências de viagens com o destino. Temos uma primeira dificuldade a recuperar, que é o facto de termos dado um grande passo atrás na pandemia e todo o Oriente foi a região que mais tarde abriu. Portanto, há um maior atraso, dos mercados emissores, em relação à recuperação de valores de antes de 2019 no Oriente do que no Ocidente. Há essa primeira dificuldade. Recuperámos mais cedo os fluxos turísticos no Ocidente. Depois, do ponto de vista do mercado português, temos de pensar que Macau nunca vai ser ‘mass market’ [mercado de massas]. Temos de olhar para o destino de acordo com as suas valências e capacidade de procura. Em relação a Portugal temos uma dificuldade acrescida, que é a inexistência de voo directo. Isso tem sido falado e parece-me importante. Vejo com bons olhos as notícias de uma eventual ligação da Air Macau a Istambul, uma excelente ‘gateway’ para o Oriente, e isso pode facilitar as viagens. Devemos perceber quais as valências de Macau e como as podemos desenvolver. E quais são elas? Existem valências específicas em Macau, que é um excelente momento de encontro de culturas, com uma oferta turística muito moderna. Macau tem excelentes condições de acolhimento, uma gastronomia que pode ser considerada das melhores do mundo, tem é de ser descoberta. É diversa e de grande qualidade. Tem ainda uma indústria de entretenimento que, não sendo a sua principal característica, não deixa de se desenvolver. Temos de acrescentar a capacidade de gerar produto mais global, que podem ser oportunidades para Macau. Para o mercado emissor ocidental, Macau tem de estar estruturado com mais alguma coisa. O mais óbvio é a China, mas também se pode juntar o território à Tailândia, Filipinas, Camboja mais o Vietname. Há muitas possibilidades. Os turistas quando fazem estas viagens de longa distância têm a apetência para ficar mais tempo e juntar as valências de Macau a mais destinos a Oriente pode levar a uma recuperação e desenvolvimento dos fluxos turísticos. O turismo de Macau está gradualmente a transformar-se desde as novas licenças de jogo, que trouxeram novas exigências às operadoras. Julgo que se está a diversificar e muitas das transformações recentes podem, eventualmente, ser associadas às novas concessões. Sentimos que há uma necessidade, vontade e óbvia estratégia de diversificação da oferta, e do ponto de vista dos mercados emissores ocidentais, é o que faz sentido. Portanto, a abordagem de Macau aos principais factores de desenvolvimento [do sector] é muito correcta e perceptível. Isso é bom para quem trabalha com destinos turísticos, porque dá confiança ao relacionamento. Que análise faz à evolução do turismo do território desde o período da Administração portuguesa, quando a APAVT começou a fazer as primeiras acções em Macau? Parece-me óbvio que os últimos anos foram de explosão em termos de desenvolvimento económico e de capacidades de acolhimento de turistas, disso não tenho dúvidas. É uma oferta mais complexa e diversificada, acompanhando também o desenvolvimento de várias ofertas e destinos. Talvez Macau estivesse mais centrada na história portuguesa, e agora parece-me mais evidente e importante para mercados emissores europeus, não portugueses, é que seja vendido como um local de encontro entre culturas, história, modos de vida ocidental e oriental. O Chefe do Executivo esteve em Portugal em 2023. Como tem sido a comunicação com as autoridades de Macau desde a visita? Essa visita foi, para nós, simbólica e muito motivadora. Expressou uma aposta do destino que sentimos no nosso trabalho diário e que acabou por nos ser transmitido a um nível superior. De resto, a relação com a Direcção dos Serviços de Turismo é quase perfeita. Temos uma comunicação próxima porque a agenda é complexa e dinâmica, além de contínua. Os nossos agentes de viagens sentem-se muito apoiados. Macau está progressivamente a integrar-se na Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau e Hengqin. Como pode o mercado turístico português tirar partido disso? Não se trata de um botão em que se carrega e começa a funcionar. É mais um processo e uma estratégia. Ganhamos todos com a clarividência e transparência da comunicação que é feita pela região. Fomos a Hengqin e observámos as novas oportunidades e interesse que Macau tem em criar novas capacidades de estruturação do produto [turístico] além do território. É alargar a região em termos de destino turístico. É preciso criar condições de acolhimento. Tem gerado debate público o facto de a China ainda não ter incluído Portugal na lista de países isentos de visto. É um entrave ao turismo? A abolição de vistos é sempre bem-vinda para quem trabalha em turismo. Aqui não é excepção. Há afirmações de responsáveis políticos que abrem a porta à nossa inclusão. Temos de nos concentrar na tentativa de sermos incluídos o mais cedo possível, e as vantagens são óbvias. Quando falamos em estruturação de produto, juntamente com outros territórios a Oriente, o mais natural é com a China. Necessitar de visto quando se vai de Macau para a China perturba a construção da oferta [turística]. Esperamos com optimismo. Como é hoje o perfil do turista chinês que visita Portugal? Neste momento, o mercado emissor chinês não é de elevada importância para Portugal, nem tem números que mostrem que seja um dos primeiros, ou mais importantes. O mercado chinês tem características que podem ser relevantes no futuro, por ser um mercado que não visita as regiões turísticas mais sazonais em Portugal, por não ser virado para a praia, por exemplo. Assim, é um mercado que nos pode ajudar a diminuir a nossa sazonalidade e a ter mais território turístico. É um mercado que trabalha bem com o Alentejo, centro do país, o Porto. O melhor estará para vir. Do que aprendi na relação com o Oriente é que o início é mais demorado, é preciso formar confiança, mas depois é um mercado em que o céu é o limite. Ainda estamos na fase de obtenção de confiança.
Andreia Sofia Silva Eventos10 de Junho | Nova exposição de Francisco Ricarte inaugurada sábado Francisco Ricarte, arquitecto e fotógrafo, está envolvido num novo projecto. Trata-se da exposição “Para os olhos dos jovens (de espírito)”, inaugurada este sábado na Casa Garden, a partir das 17h, numa iniciativa organizada pela CPM – Casa de Portugal em Macau e que se integra no programa de comemorações do 10 de Junho – Dia de Portugal, Camões e Comunidades Portuguesas. Segundo um comunicado da organização, a mostra “é dedicada a um público mais jovem, em termos de idade, mas também ‘jovens de espírito'”, sendo ainda complementada por dois workshops, a decorrer na CPM, onde será explorada “a prática da observação e registo visual” a partir das imagens expostas. Segundo Ricarte, a fotografia possui “uma imensa abrangência e possibilidades criativas”, sendo “um instrumento fundamental no desenvolvimento das artes visuais”. “Sob variadas abordagens estéticas e tecnológicas, esta forma de expressão artística tem-nos dado a conhecer facetas tão fascinantes e diversificadas, como o meio natural e construído que nos rodeiam, bem como das nossas aspirações e manifestações culturais, entre muitas outras facetas da condição humana”, refere ainda o mesmo comunicado. Imagens com humor A exposição inclui 22 imagens captadas em Macau “em situações inesperadas ou insólitas com uma certa ironia ou humor, e em performances de grande intensidade coreográfica e visual”. Estas imagens pretendem, assim, “cativar diversos níveis de público mais jovem (bem como os ‘jovens de espírito’) para apreciar imagens expressivas de mensagem inesperada e intensidade visual, que possam apelar à ‘frescura no olhar’ e cativar a sua observação e compreensão”. Procura-se ainda “sensibilizar para a importância e valor da fotografia como meio de expressão e criação visual, procurando-se realçar a sua importância no registo e observação do quotidiano que nos rodeia”. É esse quotidiano que está cheio de “situações inesperadas e acontecimentos singulares” como os registados na exposição, e que “também pode ser visto de uma forma incomum e plena de ironia”. Os workshops decorrem este domingo, com duas turmas. A primeira turma terá o workshop entre as 10h30 e as 12h30, com jovens dos 8 aos 11 anos, enquanto a segunda turma irá trabalhar das 15h às 17h, destinando-se a jovens com mais de 12 anos. As máquinas fotográficas disponibilizadas pela organização. A CPM destaca que Francisco Ricarte “é arquitecto e fotógrafo residente em Macau, destacando-se por uma presença muito activa no cenário cultural e artístico do território e participando com regularidade em exposições de fotografia, quer num registo a solo, quer num formato colectivo”.
Andreia Sofia Silva EventosIPOR | Ciclo de cinema sobre o 25 de Abril até Julho No ano em que se celebram os 50 anos da chamada “Revolução dos Cravos”, o 25 de Abril de 1974, o Instituto Português do Oriente (IPOR) exibe até ao dia 2 de Julho vários filmes sobre o golpe que derrubou a ditadura, os seus protagonistas e resistentes, onde se incluem nomes como Salgueiro Maia ou Álvaro Cunhal Um momento tão marcante para a história de Portugal como o 25 de Abril de 1974, que acabou com a ditadura do Estado Novo, de Salazar e Marcelo Caetano, já marcou presença em muitas narrativas cinematográficas ao longo dos últimos anos. Tendo em conta que este ano se celebra meio século da revolução, o Instituto Português do Oriente (IPOR) exibe, até 2 de Julho, vários filmes, muitos do género documentário, no auditório do Consulado-geral de Portugal em Macau e Hong Kong. O ciclo de cinema “50 anos – 25 de Abril” arrancou no dia 21 com o filme “As Mãos Invisíveis”, de Hugo dos Santos, um documentário sobre as vivências numa casa em Paris que, nos anos 70, acolhia diversos portugueses que fugiram do regime fascista que então se vivia em Portugal. Foi também exibido esta terça-feira o filme “Cartas a uma Ditadura”, de Inês de Medeiros. Na próxima terça-feira, será exibido o filme “O Jovem Cunhal”, do realizador João Botelho, datado de 2022. Trata-se de um retrato do mais carismático líder do Partido Comunista Português (PCP), Álvaro Cunhal, e da resistência ao fascismo que marcou toda a sua vida. Cunhal esteve preso várias vezes, estava sempre na mira da PIDE, a polícia política do Estado Novo, e foi central para definir a oposição política ao fascismo na clandestinidade. Na sinopse da película pode ler-se que João Botelho conseguiu criar “um filme detectivesco, em que se exploram os primeiros anos da vida do histórico dirigente do PCP”, sendo que, pelo meio, são “encenados excertos dos seus próprios livros”. Imagens e memórias No dia 11 de Junho, é altura de exibir “Outro País”, de Sérgio Tréfaut, documentário de 1999 que relata a revolução, no período mais conturbado que se seguiu ao 25 de Abril, nos anos de 1974 e 1975. A sinopse revela que se trata de um filme baseado em muita documentação histórica guardada em arquivos, além de revelar os olhos e sonhos de fotógrafos e cineastas que, na época, testemunharam o evento. “Salgueiro Maia, O Implicado”, da autoria de Sérgio Graciano, exibe-se no dia 18, mostrando a intervenção de um dos homens que ficou para a história como um dos “Capitães de Abril”, por ter ajudado, com outros militares, a planear e a fazer o golpe nas ruas de Lisboa. Segundo a síntese do filme, trata-se do “primeiro retrato” do militar feito para cinema. “Fernando Salgueiro Maia, o anti-herói não ocasional, produto de uma formação académica e militar, foi um homem que soube pensar o futuro, seguir as ideias, contestando-as, vivendo uma vida cheia, alegre e fértil, solidária e sofrida – se não tem morrido prematuramente aos 47 anos, teria agora 75”. O realizador fez, assim, “uma abordagem moderna, intimista e emocional” da vida deste militar, já falecido, sendo esta “uma história de ficção baseada em factos históricos, relatos pessoais, revelações íntimas, emoções reais de quem acompanhou o capitão ao longo de toda a vida”. A 25 de Junho são apresentadas várias curtas-metragens na sessão “50 anos do 25 de Abril”, nomeadamente “Antes de Amanhã”, de Gonçalo Galvão Teles; “O Casaco Rosa”, de Mónica Santos; “Lugar em Parte Nenhuma”, de Bárbara Oliveira e João Rodrigues; “Estilhaços”, de José Miguel Ribeiro, e ainda “Menina”, de Simão Cayatte”. O ciclo de cinema encerra-se a 2 de Julho com “48”, documentário de Susana de Sousa Dias. Este filme fala das histórias dos presos políticos do Estado Novo e de como sofreram as torturas às mãos da PIDE. O filme, de 2010, vai revelando algumas das fotografias que a PIDE tirava a todos os presos, a preto e branco, de perfil ou com o rosto apontado para a câmara. Estão lá as imagens de Conceição Matos, antiga funcionária do PCP presa duas vezes e torturada, e de tantos outros homens e mulheres. “São 16 imagens para contar 48 anos de fascismo – tudo fala da sociedade, os rostos, as roupas, a forma de estar. Não estão identificados por nomes nem idades porque valem por todos os presos políticos da ditadura”, refere a sinopse. As expressões eram de medo, as vozes que se ouvem em off traçam memórias negras de sofrimento e resistência na dor.
Andreia Sofia Silva SociedadeSuicídio | Registada quebra de quatro casos No primeiro trimestre deste ano 22 pessoas cometeram suicídio, o que contabiliza uma redução de quatro casos face ao último trimestre de 2023 e menos um caso face ao mesmo período do ano passado. É o que dizem os Serviços de Saúde de Macau (SSM) em dados ontem divulgados, que mostram que, dos 22 casos, 12 dizem respeito a homens e dez a mulheres com idades compreendidas entre os 17 e 75 anos. Deste grupo, 95,5 por cento das pessoas eram residentes, ou seja, 21, enquanto apenas um não residente cometeu suicídio. Os SSM apontam como potenciais causas para o suicídio “a doença mental, crónica ou física”, descrevendo ainda que “as causas para o suicídio são complexas, envolvendo doença mental, factores psicológicos, sócio-económicos, familiares, interpessoais e biogenéticos”. As autoridades dizem ainda estar preocupadas “com a saúde mental dos residentes”, procurando reduzir os números através de uma “comunicação e colaboração interdepartamental eficaz”. “Tem sido melhorada a acessibilidade dos serviços e expandida a rede de apoios sociais”, sendo considerada “elevado” o grau de acesso aos serviços de saúde mental.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaTrabalho | Coutinho pede celeridade em processos urgentes O deputado Pereira Coutinho interpelou o Executivo sobre a importância de tornar mais céleres os processos laborais considerados urgentes, nomeadamente que comprovam incapacidades de trabalho ou determinam pagamento de indemnizações Pereira Coutinho interpelou ontem o Executivo alertando para a necessidade de acelerar os processos judiciais da área laboral, em especial os casos em que o trabalhador esteja em situação de incapacidade total ou parcial de trabalho ou tenha direito a indemnização compensatória pelo tempo em que não pode trabalhar devido a doença ou acidente de trabalho. Estes processos demoram “muitos anos a ser resolvidos, não obstante o carácter de natureza urgente e oficiosa previsto no Código do Processo do Trabalho”, declarou o deputado. O também presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM) diz que as queixas no gabinete de atendimento ao cidadão sobre a lentidão dos casos têm sido frequentes. Segundo Coutinho, “a situação torna-se mais morosa e complexa quando uma das partes do litígio é trabalhador não-residente que deixou a RAEM”, pelo que “há necessidade de melhorar o actual sistema de representatividade processual por parte das entidades privadas que representam direitos e interesses laborais dos trabalhadores”. Rever leis Assim, para o deputado, a solução passa pela revisão “dos diversos regimes e dispersa legislação quanto a processos laborais, nomeadamente os que dizem respeito a acidentes de trabalho e doenças profissionais”. São estes que, por norma, são “morosos, com complexa formalidade processual”. Coutinho questiona ainda o Governo sobre “medidas concretas que vão ser implementadas pelas autoridades competentes que intervêm nos processos classificados como urgentes e oficiosos”, que estejam relacionados com términos de contrato por denúncia de uma das partes ou rescisões com justa causa da parte dos patrões. Pede-se ainda a simplificação de processos ligados a acidentes de trabalho e doenças do foro profissional que “envolvam fases conciliatórias, discussão dos resultados dos exames médicos para a confirmação do grau de incapacidade para o trabalho” e ainda na classificação do tempo de recuperação. Tudo para que os trabalhadores não estejam demasiado tempo sem receber o que lhes é devido sem poderem, ao mesmo tempo, trabalhar.
Andreia Sofia Silva EventosLivro | Filipa Simões lança guia que faz levantamento de arte urbana em Macau É hoje lançado no CURB – Centro de Arquitectura e Urbanismo o livro “Guide to Street Art in Macau”, da autoria da designer Filipa Simões. A obra faz um mapeamento dos seis pontos do território onde existe arte urbana, como o graffiti, mas não só. A autora fala de um “crescente interesse” do Governo sobre esta área nos últimos anos “Guide to Street Art in Macau” [Guia para a Arte de Rua em Macau] é o nome do livro da autoria de Filipa Simões, designer e docente, lançado hoje, a partir das 18h, no CURB – Centro de Arquitectura e Urbanismo, na Ponte 9. Trata-se da primeira obra que apresenta um mapeamento exaustivo, com curadoria, em seis zonas do território onde existe arte de rua, nomeadamente o graffiti. Trata-se de quatro zonas na península, uma na Taipa e outra em Coloane. A arte de rua não é ainda algo banal em Macau, mas tem vindo a fazer-se notar nos últimos anos. Filipa Simões descreve ao HM que “o cluster mais prolífico e diverso centra-se à volta da Praça de Ponte e Horta, no Porto Interior, onde está sediado o ‘Outloud!’, o festival de graffiti de Macau”, cuja influência “se estende até à zona de A-Ma, que se divide entre becos na zona do Manduco e zona industrial do porto”. Por sua vez, na zona central da península, “as obras encontram-se dispersas em pequenos grupos, com maior frequência nas zonas históricas”. Já na zona norte, em locais como o Fai Chi Kei ou Iao Hon, “as obras reflectem o carácter mais denso e opressivo da paisagem urbana”, enquanto nas ilhas são “mais bucólicas e pitorescas”. Filipa Simões frisa que a publicação desta obra “é um convite para descobrir Macau através da ‘street art’, de forma mais atractiva e acessível para uma audiência abrangente”, além de ser “uma celebração do entusiasmo e interesse em Macau da parte dos artistas e promotores que estão por trás destas obras”. O livro não pretende ser “uma obra final, até pelo carácter transitório desta forma de arte, que está sempre em mutação”. A ajuda do “Outloud!” A autora dá conta de que este livro não apresenta “um levantamento exaustivo de toda a arte de rua de Macau, mas sim uma selecção curada”. “Começámos por fazer um levantamento abrangente das obras por todo o território. Estivemos também em contacto com artistas locais e organizadores do festival ‘Outloud!’, que nos ajudaram a descodificar o universo da ‘street art’ em Macau. Seguiu-se um trabalho de selecção, onde procurámos criar uma narrativa com as obras escolhidas, agrupando-as depois em percursos que fossem mais interessantes de descobrir”, acrescentou. Filipa Simões destaca que a intenção foi “evidenciar cada obra, mas também mostrar o diálogo com a vida quotidiana da cidade”. As imagens são da autoria de David Lopo. Se noutras cidades do mundo a arte de rua assume, muitas vezes, um carácter marginal, por ser realizada em locais proibidos, em Macau o posicionamento da “street art” é bem mais equilibrado, existindo “um diálogo forte com o mundo do graffiti na China Continental, mesmo pelas limitações de espaço no território”. Assim, destaca Filipa Simões, “o modelo da obra encomendada é visto de uma forma mais positiva do que no panorama de ‘street art’ ocidental. Mesmo que na sua génese seja uma arte ‘marginal’, em Macau este equilíbrio entre a mensagem do artista e o interesse do Governo tem sido profícuo. No entanto, não é algo definidor do panorama de ‘street art’ local.” A designer refere, neste ponto, o facto de já se encontrarem diversos exemplos de obras encomendadas por privados, além das iniciativas de grupos de artistas locais que têm fomentado esta área, nomeadamente a organização do festival “Outloud!”. Potencial turístico Filipa Simões entende que, nos últimos anos, se tem notado “maior abertura e interesse do Governo” em relação à arte de rua, pelo “potencial” que tem “na promoção cultural e do turismo”. “Vários sectores do Governo têm tirado vantagens disso, apropriando-se da narrativa de forma positiva. As iniciativas do Governo na qualidade de promotor ou financiador têm contribuído muito para a expansão da ‘street art’ em Macau”, disse ainda. A designer não tem dúvidas de que a arte de rua “é uma ferramenta poderosa para promover a identidade cultural das cidades e activar zonas urbanas mais delapidadas e esquecidas”. Neste sentido, nota-se que já existe “um interesse natural por parte dos turistas em fotografar as obras icónicas de graffiti”, o que demonstra que a arte de rua “adiciona mais uma ‘layer’ [camada] a Macau, que já de si é culturalmente muito densa e fascinante”. Olhando para a história da arte de rua no território, a autora do livro refere que esta tem vindo a ser feita nos últimos 25 anos, apesar de estar ainda “numa fase inicial quando comparada com outras cidades da região ou mesmo internacionais”. O facto de, no período da covid-19, Macau ter estado praticamente fechada ao mundo, com poucas saídas e entradas, espoletou a veia artística de muitos. “A evolução nos últimos anos, mesmo em contexto condicionado pela covid-19, tem dado sinais de uma evolução muito rápida e positiva. O impacto é notório no ‘feedback’ que se obtém nas redes sociais, tanto da população local como de visitantes.”
Andreia Sofia Silva SociedadeExcursões | Aumento anual superior a 100% em Abril O mês de Abril registou um aumento significativo, de 142,3 por cento, no número de excursões realizadas no território. O aumento é em termos anuais, sendo que, no total, Macau recebeu 216.000 excursionistas, dos quais 194.000 foram visitantes oriundos do interior da China, um aumento de 123,3 por cento. Deste grupo, 20.000 excursionistas vieram de outros países, tratando-se aqui de um aumento mais significativo, de 979,8 por cento em relação a Abril de 2023. Os dados, da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, indicam também as principais nacionalidades de turistas estrangeiros que visitam o território: os coreanos foram oito mil, uma grande subida de 2.382,3 por cento, seguindo-se os malaios, 2.000, mais 1.402,2 por cento. A DSEC mostra ainda os números das excursões relativos aos primeiros quatro meses deste ano, que também são animadores: o território recebeu 720.000 turistas em excursões, mais 257,9 por cento em relação aos primeiros quatro meses do ano passado. Deste grupo, 643.000 eram visitantes do Interior da China e 70.000 visitantes internacionais, tendo subido 226,3 e 2.292,5 por cento, respectivamente. Destaca-se que o número de entradas de visitantes em excursões da Coreia do Sul. Nos primeiros quatro meses do ano os coreanos em excursões representaram 31.000 pessoas, um notório crescimento de 7.896,4 por cento, enquanto os turistas da Tailândia foram 7.000, mais 449,2 por cento. No que diz respeito aos residentes, 47 mil recorreram a agências de viagens para se deslocar ao exterior em Abril, mais 38,9 por cento em termos anuais. Já nos primeiros quatro meses do ano, 162 mil residentes viajaram desta forma, um aumento de 61,9 por cento em relação a 2023.
Andreia Sofia Silva SociedadeHotelaria | Crescimento significativo de trabalhadores face a 2023 O número de trabalhadores no ramo da hotelaria era, no final do primeiro trimestre deste ano, 56.414, o que constitui um “aumento significativo” de 23,2 por cento em relação ao primeiro trimestre do ano passado. Dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) revelam que “as necessidades de mão-de-obra cresceram, impulsionadas pelo acréscimo substancial do número de entradas de visitantes no ano passado e pela recuperação estável dos ramos de actividade económica relacionados com o turismo”. Por sua vez, o número de trabalhadores a tempo inteiro no sector da restauração era, no mesmo trimestre, de 24.005, mais 6,2 por cento também em relação ao período homólogo de 2023. Relativamente aos salários, a remuneração média dos trabalhadores da hotelaria e restauração também cresceu. A remuneração média nos hotéis foi de 20.470 patacas, mais 2,6 por cento, enquanto dos restaurantes, bares e cafés foi de 10.610 patacas, mais 3,5 por cento. Quanto ao número de vagas nos dois sectores de actividade, registou-se uma diminuição. No primeiro trimestre deste ano havia nos hotéis 1.455 vagas, menos 1.156, enquanto nos restaurantes as vagas eram 1.525, menos 574, “devido ao facto de as vagas destes ramos terem sido preenchidas gradualmente”, explica a DSEC. Neste contexto, a procura por mão-de-obra nestas áreas abrandou, diz o mesmo organismo.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteÓbito | “Armandinho”, o músico que deixa saudades ao jazz local Armando Araújo, o brasileiro que escolheu Macau e a Ásia para viver e deambular pelos palcos, começou por tocar baixo, mas depressa passou para a bateria. A sua figura era uma referência para a cena do jazz local e muitos da nova geração aprenderam com ele. Armandinho morreu na madrugada de segunda-feira, depois de anos com problemas de saúde Era tão importante para os palcos locais e para a cena do jazz que lhe fizeram um concerto de homenagem em 2020. Armando Araújo, mais conhecido por “Armandinho”, morreu na madrugada de segunda-feira, com 74 anos, depois de vários anos a lidar com diversos problemas de saúde que o afastaram dos palcos. Ainda assim, de vez em quando, voltava a sentar-se atrás da bateria, apesar da visível fragilidade. O músico brasileiro veio viver para Macau nos anos 70 e percorreu vários palcos, incluindo no Japão. Foi uma das grandes presenças do Clube de Jazz de Macau que existiu na década de 90 na Rua das Alabardas, além de fazer parte dos “The Bridge”, outra banda icónica do território que actua há várias décadas. Deixa saudades a organizadores de eventos e músicos com que partilhou palcos. Quem o conheceu fala do lado genial para a música que lhe permitia tocar quase tudo, e da magia com que tocava cada nota. Rui Simões, organizador de muitos eventos de jazz e ligado à plataforma NOYB (None Of Your Business), diz ao HM que a partida de “Armandinho” constitui “uma enorme perda para Macau”. “Todas as reacções que tenho recebido são de enorme tristeza e de grande respeito por um músico que era uma referência para todos os outros. Como pessoa, tinha uma simpatia e um sorriso constante”, disse. Rui Simões esteve por detrás do concerto de homenagem ao músico e destaca “a oportunidade de recordar em palco a forma como dominava a bateria, sempre em grande cumplicidade com os restantes músicos em palco e com o público, a quem gostava de explicar tudo o que se estava a passar, sempre com uma atitude muito pedagógica”. “Armandinho” explicava “os diferentes ritmos e estilos musicais de forma muito divertida e sempre com boa disposição”, lembra. Também José Sales Marques realça o carisma de Armando Araújo ainda dos tempos do Clube de Jazz de Macau, que dirigiu, e que nos anos 90 era juntava grande parte da comunidade portuguesa, mas não só. “Foi com imensa tristeza que soube da morte de Armando Araújo. Um músico excepcional, um jazzista de excelência, cujo contributo para a afirmação do jazz em Macau jamais será esquecido”. Sales Marques salienta “a forma singular de dar vida à música, acariciando a bateria com uma mestria contida e brincando com os ritmos mais complexos da forma mais simples possível. Quem teve o privilégio de o ver tocar sabe de que estou a falar. Em nome do Jazz Club de Macau e em meu próprio apresento condolências à sua família e amigos mais próximos. A sua memória estará para sempre presente entre nós, com uma batida muito especial, enquanto ele descansa em paz.” Tocar com as estrelas Zé Eduardo, outro músico e educar incontornável na cena do jazz de Macau, retorna ao final dos anos 70 quando conheceu o baterista em Macau. “Toquei muitas vezes com o Armando, que conheci em 1979 quando fui, com o Rão Kyao ao segundo Festival de Jazz de Macau. Toquei posteriormente com ele sempre que era convidado pelos ‘The Bridge’ e no contexto de algumas visitas que fui fazendo a Macau. Era uma personagem importante da ‘cena’ musical em Macau e que deixa marca”, apontou. Quem também se recorda desse concerto longínquo, e de outros, é José Chan, companheiro na banda “The Bridge”, com a qual sempre tocou, primeiro de forma irregular, e depois permanente, a partir dos finais dos anos 90 e inícios dos anos 2000. “Ele era como um membro da família, pois já nos conhecíamos desde que cheguei a Macau, em 1988. Foi um dos primeiros músicos do Clube de Jazz de Macau e quando eles fizeram os primeiros festivais já participava, nomeadamente com Rão Kyao. Depois tocou no Japão com Lisa Ono.” Aliás, a cantora e compositora de raízes japonesas nascida no Brasil também partilhou palco com Armando Araújo. “Se ele não tivesse um certo nível [como músico], jamais o convidariam para tocar no Japão, sobretudo em clubes de renome”, frisa outro membro dos “The Bridge”, Humphrey Cheong, saxofonista. O Japão foi, aliás, o que trouxe Armando Araújo para a Ásia, onde acabou por ficar toda a vida. “O ponto de partida foi o Japão, mas ele vinha muitas vezes a Macau porque era o sítio mais perto onde se falava português. Mais tarde casou com uma senhora macaense e ficou por cá. Ele contou-me que foi convidado por músicos brasileiros para vir para a Ásia. Naquela altura ganhava-se bem como músico, no Japão e havia um grande intercâmbio cultural com o Brasil”, explicou José Chan. Um génio A doença começou a fazer parte do dia-a-dia de “Armandinho”, obrigando-o a deixar de tocar regularmente com os “The Bridge” a partir de 2017. “Depois só tocava connosco quando se sentia bem e podia, nomeadamente no LMA (Live Music Association)”, disse José Chan, recordando que estas experiências permitiam o contacto com as gerações mais novas. “Ele podia tocar qualquer coisa. Era baterista, mas inicialmente até começou por ser baixista. Também cantava e tocava guitarra. Era um bom músico e vai-nos fazer muita falta, mas a vida é mesmo assim”, frisou José Chan. Humphrey Cheong não tem dúvidas em denominá-lo como “uma espécie de génio”, pois “podia tocar qualquer coisa”. “Há cerca de dez anos, quando o ‘Armandinho’ ainda estava em melhor forma, aconteceu um episódio interessante. Um músico profissional que veio a Macau sem a sua banda habitual viu-se ‘forçado’ a tocar com músicos locais. Depois do concerto perguntou o que Armando fazia profissionalmente, e disse que estava interessado em tocar com ele de forma regular, levando-o em digressão. Ele estava nesse patamar de profissionalismo.” A união é outro dos pontos que o saxofonista dos “The Bridge” destaca da passagem de “Armandinho” pela banda. “Quando tocávamos juntos, independentemente do que tinha acontecido no passado, ele comunicava com todos e juntava-nos mesmo que estivéssemos a tocar as nossas partes a solo. Conseguia captar o melhor de nós quando tocávamos juntos, com o seu estilo forte, muito próprio.” Mars Lei, músico e presidente da Associação de Promoção do Jazz de Macau, destaca que as gerações mais novas “podem não ter muitas memórias dele, por ser mesmo de outra geração mais antiga”. “Mas no meu caso, que vivi a cena musical de Macau nos anos 90, recordo-me bem de vê-lo tocar. Foi uma grande influência para mim, na ligação com o jazz. Mesmo depois da transição, íamo-nos cruzando em vários locais e concertos, mas nunca tivemos a oportunidade de tocar juntos. Ele era uma espécie de referência para todos nós.” Terminadas todas as notas, fica a lembrança. “Claro que é uma pena a partida dele, mas poderemos sempre lembrá-lo. Mesmo que os ‘The Bridge’ deixem de tocar com ele, a verdade é que esta ligação ficou para sempre”, rematou Humphrey Cheong.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteArte pública | Estudo aponta desenvolvimento “tardio” e falta de “políticas claras” Um estudo académico publicado na revista E3S Web of Conferences conclui que a arte pública em Macau está numa fase inicial de desenvolvimento, carecendo de público e de uma “política clara” de fomento. Destaca-se ainda o facto de o processo de decisões estar centralizado no Executivo, o que dificulta a conexão com o público Macau tem ainda um longo caminho a percorrer no que diz respeito ao desenvolvimento da arte pública urbana, pois não só são poucos os projectos erguidos na malha urbana como apresentam pouca ligação com quem cá vive e com turistas. Esta é a conclusão do estudo “Research on Public Art Planning in Macao from the Perspective of Urban Cultural Communication” [Investigação sobre o Planeamento da Arte Pública em Macau na Perspectiva da Comunicação Cultural Urbana], publicado em Abril na publicação académica “ERS Web of Conferences”. Os autores do estudo são Zhu Hui, do Departamento de Arquitectura da Universidade de Soochow, em Suzhou, China; António Cadeias, do Departamento de Química da Universidade de Évora; e Marcello Pelillo, da área de ciências computacionais da Ca’ Foscari – Universidade de Veneza. O estudo nasceu de uma apresentação feita na “International Conference on Urban Construction and Transportation” em Janeiro deste ano, na cidade de Harbin, China. O trabalho realizado pela equipa de académicos destaca que “Macau ainda se encontra numa fase relativamente inicial do desenvolvimento da arte pública”, devendo este “ser combinado com as próprias características” do território e com “o modo de desenvolvimento das regiões” vizinhas. Para os três académicos, a arte pública em Macau apresenta como problemas a existência de “menos obras de artistas locais, o insuficiente sentido de participação pública” ou ainda “a falta de planeamento global [da parte do Governo]”, sem esquecer “apoio jurídico e político” para o desenvolvimento de actividades culturais deste tipo. Além disso, a arte pública sofre de “insuficiente manutenção e gestão numa fase posterior”, além de que é necessário apresentar determinadas características, como “singularidade, funcionalidade, historicidade e interactividade”, sem esquecer a publicidade dos projectos, para que haja uma difusão “da cultura urbana e se estabeleça a imagem da cidade”. Relativamente à participação do público, os autores destacam que “o Governo é o principal responsável pelo planeamento, construção e gestão da arte pública em Macau, e que o público apenas pode visitá-la, sem ter um poder de decisão efectivo”. Desta forma, “sem a participação do público, a arte pública carece também da sua natureza básica de ‘publicidade'”, além de que a sua localização “também afecta o sentido da participação do público”. Tendo em conta a pequena dimensão do território nas zonas mais antigas, nomeadamente na península, os autores do estudo referem que “muitas obras de arte pública são colocadas em faixas à beira da estrada, e que o público apenas as pode apreciar de pé ou junto à estrada”. No que diz respeito à ausência de planeamento do Executivo, o estudo destaca que “a distribuição da arte pública na cidade é desigual e o seu desenvolvimento é lento”, sendo que “a distribuição da arte pública nas novas zonas urbanas, como a Taipa e o Cotai, é menor, o que contrasta claramente com a Península de Macau”. Um início tardio Os académicos dividem a evolução da arte pública urbana de Macau em três fases, com a transferência de administração portuguesa de Macau para a China a representar o ponto intermédio. Em termos gerais, a expressão da arte pública urbana no território “começou tarde”, sendo que “a verdadeira arte pública apareceu [graças] aos monumentos de amizade sino-portuguesa construídos pelo Governo português de Macau após a década de 1990”. Antes dessa década, “as principais obras de arte pública urbana eram sobretudo esculturas religiosas e decorações arquitectónicas de importância histórica na cidade”, é referido. A ligação da arte pública com a religião, bastante visível na Macau do período pré-transição, é semelhante “ao desenvolvimento da arte pública no [período] da Idade Média, no Ocidente”. Trata-se de “um rico património histórico e cultural que simbolizam o espírito de Macau”, situando-se “nas atracções históricas mais importantes de Macau”, pelo que “a maioria não pode ser deslocada”. O estudo refere vários monumentos públicos que fazem referência às relações bilaterais históricas entre chineses e portugueses, num total de dez trabalhos, como é o caso das Portas do Entendimento, junto à Torre de Macau e da autoria do escultor Charters de Almeida, ou ainda o Arco do Oriente, na zona do NAPE. “Este tipo de obras de arte pública é instalado, sobretudo, em praças e nós de tráfego importantes”, cuja instalação é “relativamente bem feita, mas há problemas, como o volume demasiado grande das obras, o facto de serem abstractas”, ou seja, “difíceis de compreender”, além de ser “controverso o seu significado”. Se a religião e a diplomacia pautaram a arte pública feita antes da transição, após a liberalização do jogo surgiram novos projectos em zonas como o Cotai, com estilos diversos e que “realçam o luxo destes grandes empreendimentos [de jogo] e que atraem turistas”. Porém, nestas obras, “a história e cultura locais de Macau raramente são mostradas”. A importância dos festivais O estudo em questão destaca também o facto de a arte pública que se vê em Macau nos dias de hoje estar dependente de festivais que, na sua maioria, são organizados pelo Governo, nomeadamente o Instituto Cultural ou a Direcção dos Serviços de Turismo. “Uma grande parte da arte pública de Macau está relacionada com eventos festivos importantes”, sendo a sua expressão “inovadora e tradicional em simultâneo”. “Sempre que há uma variedade de festivais tradicionais chineses e ocidentais, o mais atractivo é a grande instalação de iluminações artísticas em frente à sede do Governo” [junto ao lago Nam Van], assim como “luzes decorativas em estradas importantes e nós paisagísticos da cidade”, bem como a realização de actividades e espectáculos. O estudo destaca ainda a organização anual de eventos como o Festival da Luz, mais recente, ou o Festival Fringe, que acontece há vários anos, que vieram “injectar uma nova vitalidade na cultura urbana”. Embelezar e educar Entre os problemas enunciados no estudo, os autores defendem que, mais do que embelezar a cidade, “a arte pública de Macau deve ligar os comunicadores a vários públicos no processo de comunicação cultural urbana”, sempre numa ligação próxima à cidade, reparando “o contexto urbano e reforçando o seu posicionamento”. Além disso, a arte pública urbana possui também a função de “reforço das funções educativas, sociais e práticas”, contribuindo para “melhorar a impressão negativa que a arte pública causa a Macau”. Os académicos recordam que o pequeno enclave foi o primeiro local, em território chinês, onde a cultura ocidental entrou, fazendo com que Macau tenha hoje “um encanto cultural único e uma coexistência harmoniosa das culturas chinesa e ocidental”. Desta forma, “o desenvolvimento da arte pública urbana não é apenas um meio de divulgar a longa história e cultura de Macau, mas também uma forma eficaz de Macau se transformar num centro mundial de turismo e lazer” e “uma base de intercâmbio e cooperação com a cultura chinesa”. Estas ideias vão de encontro à “corrente principal, de coexistência multicultural”, patentes no projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, ressalva o estudo.
Andreia Sofia Silva EventosMagia | Macau é primeira paragem na digressão de Louis Yan Louis Yan, natural de Hong Kong e um mágico mundialmente famoso, está na estrada com a digressão “My Faith Magic Tour 2024” e Macau será o primeiro ponto de paragem. Nos dias 7 e 8, e também 14 e 15 de Junho, o público local poderá desfrutar das artes mágicas do homem que detém um recorde do Guiness para a “Maior Lição de Magia”, ultrapassando o recorde de David Copperfield Não canta, não dança, nem sequer representa. As artes de Louis Yan, natural de Hong Kong, são outras: ele faz magia e encanta quem o vê com o mistério associado a este tipo de espectáculo. Mundialmente conhecido e detentor de um recorde do Guiness, Louis Yan escolheu Macau para a primeira paragem da sua digressão, intitulada “My Faith Magic Tour 2024”. Assim, nos dias 7 e 8, bem como 14 e 15 de Junho, o público de Macau poderá ver de perto a “fé” do mágico, que actua no Wynn Palace, no Cotai. Segundo um comunicado da operadora de jogo, que promove o evento, os dois espectáculos de Louis Yan prometem revelar as suas “extraordinárias habilidades, levando o público a uma viagem cativante cheia de transformações mágicas impressionantes”, numa experiência que promete ser “inesquecível”. O tema da digressão, “A Minha Fé”, está relacionado com o facto de o mágico ter transformado a sua grande paixão numa “fé de vida”, que o tem guiado “numa viagem em todo o mundo que alcança milagres, um após o outro, e que deslumbra o público com magia e surpresa num piscar de olhos”. Pelo mundo Louis Yan obteve a distinção do Guiness com a “Maior Lição de Magia”, ultrapassando assim o recorde já atingido pelo mundialmente famoso David Copperfield. Ganhou ainda o “Merlin Award”, um importante prémio nesta área, que se pode considerar como os “Óscares da Magia”. O mágico de Hong Kong já actuou ao lado dos actores chineses Leo Wu e Peng Yuchang, nomeadamente na gala do Festival da Primavera do canal de televisão CCTV, em 2020, além de ter realizado espectáculos em cidades como Los Angeles, Toronto e Sidney. Louis Yan foi também o primeiro mágico de Hong Kong a exibir as suas lides a solo em Las Vegas, uma das grandes capitais do jogo, a par de Macau. Os bilhetes para os espectáculos já estão à venda, sendo que uma mesa para quatro pessoas custa 1.688 patacas. A viagem de Louis Yan pelo mundo da magia começou a sério em 2010, ano em que começou a conquistar os primeiros prémios da sua carreira. Nesse ano, tornou-se no primeiro profissional de magia de Hong Kong a vencer o concurso Abbott dos EUA, considerada a capital mundial da magia. Além disso, Louis Yan sagrou-se vencedor, também em 2010, do 6.º Concurso Internacional de Magia de Palco Joker Magic da Hungria. No ano seguinte, Louis Yan actuou no “Magic Castle” em Hollywood, EUA, além de ter representado Hong Kong, a convite do Governo, em quatro cidades europeias, nomeadamente Paris, Bruxelas, Hamburgo e Haia. Em Junho de 2011, Louis Yan ficou ainda mais conhecido do grande público por prever com sucesso o resultado da lotaria do Mark Six. Na estação televisiva TVB, da região vizinha, Louis Yan é uma presença constante, tendo sido juiz e convidado do programa “Magic Battle”, além de ter sido o mágico convidado do programa “King of Street Magic” entre os anos de 2013 e 2017. Louis Yan é também o primeiro e único mágico de Hong Kong que realizou um espectáculo de magia com venda de bilhetes no KITEC StarHall.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteARTM | Defendidas alternativas a prisão para consumidores de drogas O presidente da Associação de Reabilitação dos Toxicodependentes de Macau reiterou que pesadas penas de prisão não são respostas eficazes na luta contra a droga. Por sua vez, a directora executiva da Agência das Nações Unidas para os Assuntos de Droga e de Crime defendeu uma postura “equilibrada” para lidar com a toxicodependência Com agência Lusa O presidente da Associação de Reabilitação dos Toxicodependentes de Macau (ARTM) defendeu na sexta-feira que devia existir uma “maior vontade” de quem julga casos relacionados com droga em Macau de encontrar alternativas à prisão. Deveria haver “maior vontade de quem sentencia, de dar oportunidade às pessoas para entrarem para o tratamento, sem ter que enviar para a prisão”, disse Augusto Nogueira, rejeitando, no entanto, necessidade de mexidas legislativas. O consumo de droga em Macau é criminalizado e punido com pena de prisão até um ano ou até 240 dias de multa, mas desde 2009, a legislação prevê, em alguns casos, a suspensão da pena a quem se sujeite voluntariamente a tratamento ou internamento. “Qualquer lei que coloca as pessoas que consomem drogas na prisão é uma lei dura, porque não há necessidade, pode haver sempre outras alternativas para as pessoas que consomem drogas”, constatou. Questionado sobre a possível descriminalização do consumo, à semelhança do que acontece em Portugal desde 2001, Augusto Nogueira disse não “haver uma necessidade actualmente em Macau”, visto serem contextos diferentes. “Portugal fê-lo porque estava numa situação diferente nessa altura. No final dos anos 1980 e nos anos 1990 era uma situação pandémica, em que quase todas as famílias tinham pessoas a consumir drogas. Era uma situação muito complicada, o número de pessoas que consomem drogas é completamente diferente do número em Macau”, considerou. Em 2023, no território de cerca de 680 mil habitantes, foram contabilizados 119 consumidores, mais 34 do que no ano anterior e menos 112 do que em 2021, de acordo com o Sistema de Registo Central dos Toxicodependentes de Macau. Importa realçar que este registo apenas contabiliza as pessoas que estão em tratamento ou a contas com a justiça por terem sido apanhadas pelas autoridades a consumir estupefacientes. No entanto, apesar de indicar uma “situação bastante estável” no consumo local, Nogueira admite haver “casos escondidos” e considera imperativo persistir nos trabalhos de prevenção e de proximidade para incentivar ao tratamento: “Quando existe uma lei que criminaliza as pessoas, obviamente tem que haver, as pessoas consomem drogas às escondidas”, realçou. O responsável da ARTM falava aos jornalistas à margem de um encontro com a directora executiva da Agência das Nações Unidas para os Assuntos de Droga e de Crime (UNODC), Ghada Waly. De frisar que, recentemente, foi publicado na revista académica Asian Journal of Addictions (AJA) o estudo de uma técnica superior da Polícia Judiciária de Macau, Connie Lok Cheng, que defende precisamente o contrário, ou seja, o aumento das penas para os crimes de relacionados com drogas, além da reabilitação obrigatória. O trabalho intitula-se “Research on Optimization of Adolescent Drug Abuse Prevention Policies in Macao” [Investigação sobre a Optimização das Políticas de Prevenção da Toxicodependência na Adolescência em Macau], que cita os exemplos mais duros, em matéria de legislação anti-droga, do mundo, nomeadamente a aplicação da pena de morte na China ou Singapura. “Na perspectiva da prevenção da toxicodependência entre adolescentes, é necessário reforçar as penas para o tráfico, transporte e fabrico de drogas, de forma a reduzir a oferta de drogas no mercado e, assim, diminuir o risco de os adolescentes entrarem em contacto com as drogas”, lê-se. A autora escreveu ainda que “em comparação com as regiões vizinhas, as penas para os crimes de droga são mais leves”, sendo referido os casos do Interior da China, Taiwan ou Singapura onde “a pena máxima para o tráfico de droga é a pena de morte”. Pelo contrário, destaca a autora, “em Macau há apenas uma pena de prisão de duração determinada”. Connie Lok Cheng defendeu também que uma reabilitação opcional contribui para reduzir “a severidade e a gravidade das penas”, dando como exemplo o de Hong Kong e China, onde se aplica “um modelo obrigatório de reabilitação de toxicodependentes para aumentar a severidade das penas”. Assim, a técnica da PJ sugere, no referido estudo, “um modelo de reabilitação faseada se a reabilitação voluntária não mostrar eficácia dentro de um determinado período, e depois fazer a transição para a reabilitação obrigatória para reforçar os efeitos do tratamento e da dissuasão”. Equilíbrio precisa-se Em Macau apenas por umas horas para conhecer o trabalho da organização não-governamental, Ghada Waly indicou, em conferência de imprensa, a importância de uma visão equilibrada por parte dos governos no controlo da droga. “A minha mensagem para os governos é que tenham sempre uma abordagem equilibrada, em que observem as convenções, onde haja espaço para o tratamento, para tratar a dependência da droga como um desafio da saúde pública, mas também olharem para como o sistema judicial pode ser mais eficiente”, disse. Waly notou que o facto de as autoridades financiarem uma organização como a ARTM, “a trabalhar simultaneamente na prevenção, tratamento, reabilitação e formação profissional, ” é um “passo positivo”. Natural do Egipto, Ghada Waly é a primeira mulher a liderar este organismo da ONU e conta com 28 anos de experiência na área do alívio da pobreza e protecção social. Antes de ocupar o cargo na ONU Ghada Waly foi Ministra da Solidariedade Social do Egipto. A Agência das Nações Unidas para os Assuntos de Droga e de Crime (UNODC) foi criada em 1997, mas desde 1946 que a ONU tem em funcionamento a Comissão de Estupefacientes, um dos principais organismos desta entidade para lidar, a nível global, com os fenómenos de consumo e tráfico de droga. Em Março deste ano decorreu a 67ª sessão desta comissão, tendo sido abordado, segundo o website oficial da ONU, um “cenário cada vez mais complexo” que passa pela existência de “redes de tráfico de droga, uma oferta recorde de drogas ilícitas e opções limitadas de tratamento para os consumidores de droga”, descreveu a UNODC. Nesta ocasião, Ghada Waly destacou o facto de os “desafios relacionados com as drogas estarem a evoluir rapidamente”, devido à rápida entrada e dissimulação das drogas sintéticas no mercado. “As redes de tráfico têm evoluído no que diz respeito aos modelos de negócio, além de que os mercados ilícitos se sobrepõem aos conflitos e instabilidade”, declarou a directora-executiva da UNODC. Ghada Waly apelou à Comissão de Estupefacientes que sejam encontradas “respostas equilibradas que protejam as nossas comunidades, promovam a saúde pública e defendam os direitos humanos”, defendendo que “nenhuma medida de policiamento e aplicação da lei vai acabar com o mercado de drogas ilícitas enquanto houver uma enorme procura”. Além disso, acrescentou que “nenhuma medida de prevenção, tratamento e redução de danos irá acabar com a dependência e distúrbios generalizados enquanto substâncias perigosas continuarem a inundar as comunidades”. Lembrando a crescente tendência do tráfico de droga transfronteiriço, Ghada Waly destacou que “nenhum país pode proteger as suas fronteiras e cidadãos sozinho”. Destaque ainda para o facto de a ARTM ter sido uma das 130 signatárias de uma carta aberta a Ghada Waly aquando da realização da 66ª Comissão de Estupefacientes, no ano passado, enviada pela Federação Mundial contra as Drogas [World Federation Against Drugs]. Nesta carta aberta foi lançado um apelo “para a promoção de serviços de saúde que não sejam discriminatórios, baseados em provas, informações sobre o trauma” e que sejam também “sensíveis ao género, à cultura e idade” de consumidores. Foi salientada “a necessidade de continuar a promover a prevenção baseada em provas, o acesso a tratamento e recuperação”, bem como o incentivo “à monitorização e avaliação com dados separados por género”.