Música | Orquestra Colégio Moderno ao vivo na Igreja Nossa Senhora de Fátima

No próximo dia 29, a orquestra do Colégio Moderno actua em Macau na Igreja de Nossa Senhora de Fátima, seguindo-se um concerto, a 3 de Janeiro, com a Orquestra Juvenil de Macau. O pianista Adriano Jordão, fundador do Festival Internacional de Música de Macau, salienta a importância da partilha musical entre as duas orquestras

 

Depois de um Verão de intensa partilha musical em Lisboa, a Orquestra Juvenil de Macau e a orquestra do Colégio Moderno preparam-se para actuar em Macau nas próximas semanas. No próximo dia 29 às 20h, a Igreja de Nossa Senhora de Fátima acolhe o “Concerto do Colégio Moderno”, protagonizado pelo grupo de orquestra da escola fundada em 1936. Depois, a 3 de Janeiro, é a vez de os dois grupos subirem ao palco do Centro Cultural de Macau para o “Concerto de Ano Novo de Macau 2026”.

O pianista Adriano Jordão, fundador do Festival Internacional de Música de Macau (FIMM), tem acompanhado a parceria dos dois grupos e o trabalho feito pelo grupo do Colégio Moderno. O músico destaca ao HM aquilo que poderá ser ouvido no concerto de 29 de Dezembro: a composição “Stabat Mater”, de Giovanni Battista Pergolesi, que fez parte da programação da primeira edição do FIMM.

“Tem um lado simbólico, porque foi a actuação presente no primeiro Festival Internacional de Música, em 1987. Foi feita para o encerramento do festival, de modos que há um lado psicológico na repetição desta obra”, destacou. “Tudo isto foi ideia minha, não faz mal um pouco de nostalgia”, acrescentou Adriano Jordão. “Esta é uma obra com todas as características para se fazer dentro de uma igreja, e tem também esse lado simbólico muito importante para mim.”

“Stabat Mater” é uma oração cantada, central num programa de concerto para cerca de uma hora, pensado para “um grupo relativamente pequeno de instrumentistas, com duas solistas”.

Adriano Jordão realça o grande entusiasmo dos membros da orquestra do Colégio Moderno em relação à viagem a Macau. “Vejo a excitação dos miúdos por irem a Macau, há sempre um fascínio pelo Oriente, como é evidente. E vejo o interesse histórico que tudo isto tem, nomeadamente para Portugal. Existe realmente um interesse cultural em mantermos uma marca portuguesa em Macau, que é território chinês. [Estes concertos] servem para acelerar esses vínculos culturais.”

Um trabalho de qualidade

Não é a primeira vez que Adriano Jordão colabora com a Orquestra Juvenil de Macau, que no Verão deste ano esteve em Portugal para actuações conjuntas com o grupo do Colégio Moderno. O Colégio Moderno foi fundado em 1936 por João Soares, pai de Mário Soares, antigo Presidente da República portuguesa já falecido, ele próprio uma figura bastante ligada a Macau. Desta vez, Isabel Soares, actual directora do Colégio Moderno, estará presente no território para os concertos.

Apesar de o grupo de orquestra da escola portuguesa ter mais anos de existência do que a formação da orquestra juvenil local, isso não invalida a qualidade de ambos os projectos, tendo sido enfrentados alguns desafios para trazer este grupo a Macau. “É sempre difícil levar um grupo de pessoas [para uma viagem deste tipo], sendo preciso encontrar os meios financeiros de um lado e de outro. Isso foi feito com apoios privados e conseguiu-se. Estou muito contente que os jovens de Macau tenham feito tão boa figura em Portugal. Espero que essa boa figura seja agora recíproca nesta ida a Macau.”

A Orquestra Juvenil de Macau considera, em comunicado, que o intercâmbio e a colaboração de Isabel Soares e Adriano Jordão, no acompanhamento da orquestra do Colégio Moderno, representam “uma demonstração concreta do compromisso contínuo da Orquestra Juvenil de Macau em promover o intercâmbio cultural internacional”. Os concertos em questão constituem também “uma nova página no intercâmbio cultural sino-português, particularmente no intercâmbio musical entre os jovens da China e de Portugal”, é referido.

Questionado sobre a importância do FIMM nos dias de hoje, Adriano Jordão não deixou de lembrar que aquilo que “parecia uma ideia louca na altura” teve, na verdade, pernas para andar.

“Não havia em Macau, em termos culturais, rigorosamente nada: não havia um centro cultural, e as primeiras coisas [espectáculos] que se fizeram foi num pavilhão desportivo. Não havia meios, não havia uma orquestra de Macau. Tudo foi feito a partir do zero e ver que, anos depois, valeu a pena fazer… Estive na última edição, no ano passado, e fiquei impressionado por ver que foi mantida uma grande qualidade artística”, rematou.

21 Dez 2025

Direito | Vitalino Canas apresenta novo livro sobre Lei Básica

Vitalino Canas, jurista e antigo chefe de gabinete do governador Rocha Vieira, é co-coordenador da obra “Lei Básica da RAEM: 30 anos”, lançada esta sexta-feira no Centro Científico e Cultural de Macau. Em declarações ao HM, fala de um diploma que foi “uma espécie de balão de ensaio e demonstração daquilo que a RPC estava disposta a fazer em termos de abertura” a certas questões jurídicas

Foi apresentado, esta sexta-feira, o livro “Lei Básica da RAEM: 30 anos”, projecto editorial que nasce de uma conferência sobre este tema e que tem coordenação de Vitalino Canas, jurista e antigo chefe de gabinete do governador Vasco Rocha Vieira, e Carmen Amado Mendes, presidente do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM). Esta entidade foi também responsável pela edição da obra.

Em declarações ao HM, Vitalino Canas recordou alguns momentos da discussão e produção da Lei Básica, defendendo que este diploma, à semelhança da Lei Básica de Hong Kong, “foram uma espécie de balão de ensaio e também de demonstração daquilo que a República Popular da China (RPC) estava disposta a fazer em termos de abertura a determinadas questões relacionadas com [outros] ordenamentos jurídicos, como a separação de poderes e organização do poder político, ou direitos fundamentais”.

Para Vitalino Canas, a Lei Básica da RAEM, que este sábado celebrou 26 anos de existência, foi ainda “uma espécie de cartão de visita sobre até onde a RPC estava disposta a ir, em Macau e Hong Kong, mas até numa evolução futura”.

“Conheço algumas controvérsias e dúvidas que têm surgido em alguns sectores da comunidade sobre se a Lei Básica estará a ser totalmente cumprida ou não, se haverá aspectos em que há retrocessos ou limitações. Fazendo a apreciação do exterior, creio que a Lei Básica tem sido cumprida, sem prejuízo de alguns aspectos que têm sido notícia”, disse ainda.

Questionado sobre os desafios que se colocam à implementação da Lei Básica até 2049, e se poderá ocorrer uma eventual revisão do diploma, Vitalino Canas afasta essa possibilidade. “Não sou muito adepto nem de revisões constitucionais, nem na revisão de documentos básicos. Se olharmos para algumas experiências, a Constituição norte-americana tem quase 240 anos, já foi revista algumas vezes, mas as revisões são sempre muito pouco profundas, e ocorrem até mais para aditamentos do que, propriamente, para se fazerem modificações.”

O responsável considera “mais importante” olhar para “as estruturas que têm responsabilidade na aplicação [da Lei Básica], designadamente os tribunais, e para a doutrina e jurisprudência”, que são estruturas jurídicas “com melhores condições para actualizar a interpretação da Lei Básica”.

Vitalino Canas defendeu também uma “conjugação de esforços entre as comunidades académicas de Portugal e de Macau, e de outros sectores que se pronunciam sobre a Lei Básica, sobre o que ela contém e como está a ser aplicada”. “Se houver circunstâncias em que essa aplicação eventualmente suscite dúvidas, ninguém melhor que a academia, a doutrina, especialistas e juristas, para apontarem caminhos de aperfeiçoamento desse cumprimento”, frisou.

Estudar é preciso

“Lei Básica da RAEM: 30 anos” nasce de uma conferência realizada no CCCM, trazendo artigos sobre a natureza jurídica da Lei Básica, direitos ou sobre a estrutura judiciária do território, entre outras temáticas do Direito.

Trata-se de uma obra que pretende dar uma resposta e um contributo à área do Direito sobre Macau. “Pensámos, eu e a Carmen Amado Mendes, que seria importante para o panorama doutrinário português haver este tipo de contributos disponível para o público, porque escreve-se muito pouco sobre as questões jurídicas relacionadas com Macau.”

“Quando falo de nós, académicos em Portugal, não estamos a cumprir o nosso papel de actualizar o nosso ‘know-how’ e o nosso quadro de investigadores, que era grande quando tínhamos a administração do território de Macau. Portugal tem todo o interesse em manter conhecimento, informação e capacidades sobre o que se passa em Macau, designadamente do ponto de vista jurídico. E aqui também, dentro da nossa academia, não considerando essas temáticas longínquas e que já não interessam a Portugal.”

Este livro é, ainda assim, “um contributo modesto”, estando a ser preparado “outro livro com mais artigos” sobre temas relacionados com a Lei Básica.

No caso do ensino superior local, Vitalino Canas destaca que existem “muitos juristas portugueses que tratam de temas relacionados com o regime jurídico em Macau, mas digamos que a interligação entre o que se faz em Macau e Portugal não tem sido eficaz”.

“Na qualidade de vice-presidente do Instituto para a Cooperação da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa tenho procurado mobilizar e encorajar alguns investigadores, sobretudo alguns os jovens, para que se interessem pelas temáticas jurídicas de Macau, até porque continua a haver uma relação estreita entre Portugal e Macau por vários motivos”, disse.

Vitalino Canas viveu em Macau entre os anos de 1986 e 1991 e foi membro do Governo português entre 1995 e 2002, tendo estado ligado ao chamado Gabinete de Macau. Olhando hoje para trás, numa altura em que a RAEM celebra 26 anos de existência, o jurista destaca que, no processo de transição, “o grande desafio foi pôr uma cultura jurídica chinesa” em conjugação com a cultura jurídica portuguesa e “tornar as duas entendíveis uma em relação à outra”.

21 Dez 2025

Turismo | Visitantes do Japão sobem quase 40%

Dados estatísticos oficiais revelam que Macau recebeu, em termos anuais, mais turistas internacionais em Novembro, sendo que uma das maiores subidas, de 38,1 por cento, se refere a turistas oriundos do Japão. Novembro, representou o ultrapassar da fasquia dos três milhões de turistas, uma subida anual de 18,1 por cento

O Japão foi o país de origem de turistas internacionais com uma das maiores expressões nos dados estatísticos relativos a Novembro, sendo apenas ultrapassado pela Tailândia.

Dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) revelam que, no mês de Novembro, Macau recebeu 16.187 pessoas do Japão, uma subida de 38,1 por cento face a igual mês do ano passado. No caso da Tailândia, de onde vieram 15.140 turistas, a subida foi de 49,4 por cento.

De destacar os cancelamentos recentes de concertos de artistas japoneses no território, não obstante os números positivos do turismo oriundo do país. Um deles, foi da cantora pop japonesa Ayumi Hamasaki, agendado para o dia 10 de Janeiro, e que ocorreu depois do cancelamento da actuação da mesma artista em Xangai, marcada para o dia 29 de Novembro. Também cancelado, foi o espectáculo de Natal com a banda Say My Name, que integra as artistas japonesas Hitomi Honda, a líder do grupo, e Terada Mei.

O Governo negou qualquer interferência nestes cancelamentos por questões políticas, tendo a presidente do Instituto Cultural (IC), Deland Leong Wai Man, referido que “diferentes partes têm os seus factores de ponderação”. “É normal ter ajustamento sobre concertos ou diferentes eventos. Situações de cancelamento por força maior, é algo corrente”, acrescentou.

No que diz respeito a outros países de origem de visitantes internacionais, no caso da Indonésia registou-se também uma subida de 23,1 por cento, enquanto que relativamente aos turistas vindos de Singapura foram de 12.920 em Novembro, uma quebra de 6,6 por cento. No caso dos turistas oriundos da Índia, a subida foi de 3,1 por cento, num total de 8.766 visitantes.

Em termos gerais, e ainda relativamente a Novembro, o número de entradas de visitantes internacionais totalizou 273.950, mais 13,6 por cento, em termos anuais.

Mais turistas de Zhuhai

Olhando para os restantes números do turismo, os dados da DSEC mostram a vinda de 3.345.683 de turistas em Novembro, mais 18,1 por cento em termos anuais. Realça-se que o número de entradas de excursionistas (2.035.555) e de turistas (1.310.128) aumentaram 31,5 e 2,1 por cento, respectivamente, em termos anuais.

Os turistas oriundos do Interior da China foram 2.397.043, mais 21,9 por cento, em termos anuais, destacando-se o número de entradas de visitantes com visto individual, 1.262.722, com uma subida de 36,1 por cento.

Outro número positivo, prende-se com a subida de 33 por cento nas entradas de visitantes oriundos de nove cidades da região da Grande Baía, num total de 1.279.819, em relação a Novembro de 2024. Para este número, contribuiu o aumento de 71,2 por cento de entradas com origem em Zhuhai, descreve a DSEC. Nos 11 meses do ano, Macau recebeu 36.489.230, mais 14,4 por cento face a igual período de 2024.

20 Dez 2025

Alfredo Gomes Dias, historiador, sobre Rocha Vieira: “Uma figura histórica, quer quisesse ou não”

Lançado na quinta-feira no Porto, com a chancela da Guerra e Paz, “Macau: A Última Transição – Vasco Rocha Vieira (1991–1999)” é o resultado de um trabalho de 20 anos do historiador Alfredo Gomes Dias. A obra contém testemunhos pessoais de Rocha Vieira e detalhes documentados da última Administração portuguesa de Macau

Acaba de lançar mais um livro sobre Rocha Vieira e a última Administração portuguesa de Macau. Fale-me do início deste projecto.

Este projecto tem mais ou menos 20 anos, e começou quando conheci Rocha Vieira, em 2005, para fazer um texto para o livro “Governadores de Macau” [editado pela Livros do Oriente em 2013]. No meio disso, descobri que havia um fundo documental pessoal do general Rocha Vieira, enquanto governador. Como historiador, fiquei entusiasmado com a ideia. Ofereci-me para fazer, juntamente com ele, um projecto, a que chamámos “relatório”. Todos os documentos estavam em casa dele, em Lagoa, de onde era natural. Depois foram depositados num espaço cedido pela Câmara Municipal de Mafra e entre 2007 e 2013 trabalhei nessa documentação. Foi um trabalho solitário e prolongado, porque tive de organizar 1.700 caixas de documentação e conciliar com o meu trabalho de docente. Rocha Vieira foi adiando o projecto, dizendo que não, mas em 2016 disse-me para avançarmos com o “relatório”, o livro. Terminei a primeira versão em 2021. É um livro comprometido, no sentido em que pretende dar a visão do general Rocha Vieira do que foi o seu Governo. Não se trata de um trabalho académico.

Teve acesso completo ao arquivo pessoal.

Deu-me luz verde para consultar a documentação toda, não tive qualquer restrição. Rocha Vieira foi-me contando uma ou outra história com pormenor, deu-me linhas de orientação e revelou-me as preocupações dele durante a governação. Disse-me algumas posições que teve e depois os caminhos diferentes que se tomaram, e todo o livro é construído em torno das muitas conversas que tive com o general, em que recorro também à documentação. Temos a visão de tudo o que aconteceu entre 1991 e 1999 e as acções do governador nas diferentes dimensões da Administração, a nível económico, social e político, nas relações com a China e Lisboa, com Hong Kong, e depois tudo o que foi o trabalho relacionado com a transformação do território, como o nascimento do Cotai e as grandes obras que se foram fazendo. Fala-se também da fase da transição e os grandes temas, como a entrada das tropas chinesas em Macau, a cerimónia e como esta se organizou. Hoje vivemos num mundo imediato, e à velocidade de hoje é sempre estranho dizer que este livro demorou 20 anos a fazer-se.

Podemos dizer que é a primeira vez que temos um testemunho tão completo da visão de Rocha Vieira sobre o seu Governo?

A biografia editada [Vasco Rocha Vieira – Todos os Portos a que Cheguei] já dá muitas ideias das suas preocupações. O que acabei por fazer foi não me focar tanto na vida toda do general, mas apenas nos anos do Governo e desenvolver ao máximo muitos dos assuntos que Pedro Vieira colocou nessa biografia.

Que assuntos estão então mais desenvolvidos nesta nova obra?

Descrevo muito bem todos os processos ligados à transição de Macau, como a questão das leis e da localização, a necessidade de as traduzir para chinês. Esse foi um trabalho gigantesco. Depois abordo a construção de grandes obras, o nascimento do Cotai. Tudo isso com base nas plantas e planos originais pensados para o Cotai, onde se conhece o início da ideia para essa zona. Qualquer historiador que, no futuro, queira estudar o processo de transição, tem, necessariamente de passar por este livro. Não quero dizer que o que lá está é definitivo, porque nunca é. Mas é importante ter esta base e testemunho, que é enriquecido e fundamentado na documentação.

Imagino que as polémicas do Governo de Rocha Vieira também estejam no livro. A quezília com Jorge Sampaio, a criação da Fundação Oriente em Portugal. Qual o testemunho de Rocha Vieira sobre estes dois momentos?

Ele sempre manteve o mesmo discurso face ao que já tinha dito publicamente. Há um capítulo específico sobre a Fundação Oriente, onde se tenta, com o apoio da documentação, explicar o processo e porque é que Rocha Vieira, quando chega a Macau, tem a necessidade de resolver um problema que se arrastava e que era importante ultrapassar. Descreve-se a forma como ele o conseguiu resolver, pois era uma questão que estava a dificultar o diálogo com as autoridades chinesas. Está explicada a forma como Rocha Vieira se foi relacionando com os diferentes Governos da República [Portuguesa] e os diferentes Presidentes, as posições que foi tomando a fim de garantir o que era da sua responsabilidade. Enquanto esteve à frente do Governo, Rocha Vieira tentou sempre fazer vingar as suas visões, e uma das coisas interessantes é que tive acesso a cópias de actas de reuniões do Conselho de Estado, nas quais Rocha Vieira apresentava a sua visão sobre a situação de Macau. É um contributo interessante. Mas ele explica que a forma como dialogava com o Presidente Mário Soares era completamente diferente da forma como dialogava com Jorge Sampaio. A relação institucional alterou-se, a forma de estar numa reunião também era diferente. Isso é explicado, mas sem entrar pelo lado pessoal da quezília.

Rocha Vieira saiu de Macau com a sensação de dever cumprido?

Acho que ele saiu de Macau muito convicto, e toda a cerimónia da transferência acaba por nos dar um pouco essa imagem de que Portugal saiu da melhor maneira possível. Temos também de pensar que falamos de dois países completamente diferentes, e que um deles é gigante. E que, apesar dessa diferença, foi possível manter um diálogo quase de igual para igual entre dois Estados para resolver, da melhor maneira, uma questão específica que era Macau. O que mais me surpreendeu na visão de Rocha Vieira foi ele ter alterado a centralidade da visão para Macau.

Em que sentido?

De uma maneira geral os portugueses e as autoridades falavam de Macau pensando em garantir o processo de transição sem pôr em causa os interesses de Portugal. E o general Rocha Vieira inverte os termos da questão, ou seja, para se garantir os interesses de Macau, com a ideia de que garantir os interesses de Macau seria o mesmo de garantir os interesses de Portugal. Parece a mesma coisa, mas não é. Essa visão, para mim, é que foi surpreendente.

Porquê?

Porque ia contra o que era o discurso mais comum entre as autoridades e as pessoas responsáveis pela administração portuguesa [de Macau]. Esta ideia central acaba por mudar a forma como ele organiza o seu Governo, como age e o tipo de acções que desencadeia. Todas tinham a ver com esta convicção profunda, de que, nos anos que restavam, fosse garantido um grande desenvolvimento de Macau, a afirmação da cultura portuguesa, apoiando instituições, ou até com a Escola Portuguesa de Macau (EPM), cuja solução acabou por não ser a que ele propunha. Acabou por ser uma opção minimalista.

Qual era, concretamente, a posição de Rocha Vieira?

Era garantir que o antigo Liceu de Macau era a EPM, o que daria uma dimensão completamente diferente à escola face [à localização actual]. Não tem nada a ver. Ele não queria só uma escola portuguesa, mas também um espaço onde fosse possível desenvolver actividades culturais, criar um pólo cultural em Macau ligado a Portugal, e com uma opção muito mais digna do que aquela que foi, depois, a opção do Ministério da Educação, na figura de Marçal Grilo, que optou [pela localização] da antiga Escola Comercial. Portanto, o foco sempre foi garantir e desenvolver os interesses de Macau, a sua autonomia, e a questão do aeroporto era fundamental para garantir a autonomia de Macau. Pretendia-se também que Macau aderisse aos acordos internacionais relativamente ao respeito pelos direitos humanos. A ideia era que, conseguindo garantir os interesses de Macau, pensando o território como fazendo parte do segundo sistema da China, e que se investíssemos muito em Macau, estávamos, naturalmente, a defender os interesses portugueses e a deixar um grande legado.

Qual foi o dossier mais complexo para Rocha Vieira?

Acho que ele tinha uma grande mágoa relativamente à opção do Ministério da Educação para a escola portuguesa. Das conversas que fui tendo com ele [foi o que me pareceu]. Havia depois as questões de segurança, com as seitas, que acabaram por se resolver. Nos anos de 1997 e 1998 foram momentos muito críticos em Macau, mas como ele sempre foi tendo boas relações com as autoridades chinesas, isso levou a que a China tenha percebido a situação, passando a colaborar mais com as autoridades portuguesas em Macau, no sentido de controlar o problema.

Sobre o Cotai, como surge a ideia?

Surge no contexto das obras para o aeroporto, quando se percebe que seria relativamente fácil mobilizar as terras que estavam associadas às obras do aeroporto, aproveitando-se esse momento para fazer uma ligação e criar, no fundo, uma segunda centralidade urbana em Macau. Os planos iniciais do Cotai tinham a ver com o espaço urbano, espaços verdes, industriais. Todo o plano estava concebido para agregar diversas áreas, espaços sociais, como escolas ou a saúde, como se o Cotai fosse uma mini-cidade, digamos assim, no território.

Mas quem teve, concretamente, a ideia?

Foi uma ideia do Executivo de Rocha Vieira desenvolvida com secretários. A ideia partiu dele, quando se viu perante a questão das obras, e depois foi sendo desenvolvida com a equipa. Ele tinha sempre a preocupação de desenvolver as coisas com a equipa, garantindo também uma continuidade com o que se tinha feito antes. Quando conversava comigo, tinha o cuidado de dizer: “isto não começou comigo”, ou que para determinado trabalho tinha sido fundamental este ou aquele secretário. Nunca quis ficar com os louros que não eram dele, e isso também é um grande reconhecimento dos governadores anteriores.

Portanto, o Cotai não era para ter tanta área destinada ao jogo.

Pelo que analisei nos documentos, não havia a ideia de ceder um espaço tão grande para o entretenimento, com casinos. Penso que a visão inicial para o Cotai era um pouco mais equilibrada, com habitação, escolas, centros de saúde, espaços verdes. Era para ser um novo espaço urbano que ia nascer com todos os serviços necessários para funcionar, não era para ser só jogo.

Ficaram para a história os momentos em que Rocha Vieira agarra a bandeira ao peito, comovido. Ele recordou consigo esses momentos?

Sim, mas apesar da dimensão histórica do papel dele, Rocha Vieira não tinha propriamente noção do papel histórico que estava a desempenhar. Ele estava ali com uma missão e objectivos claros, sem pensar propriamente no protagonismo que podia ter no futuro. Uma vez, quando estávamos a almoçar, disse-lhe que podíamos relativizar o nosso trabalho, mas que ele ia tornar-se numa figura histórica para a história de Portugal, quer quisesse ou não. E o engraçado é que ele ficou a olhar para mim com uma cara de quem nunca tinha pensado nisso, com um ar muito surpreendido. De facto, é impensável tirar-lhe esse estatuto de último governador português em Macau em centenas de anos de história. Ainda por cima, ele esteve um período longo [9 anos], quando a maioria dos governadores esteve lá três ou quatro anos.

20 Dez 2025

CCM | Banda local Ghostly Park apresenta novo álbum

“Mirror Sea” é o nome do terceiro e novo álbum da banda Ghostly Park, com membros de Macau e Hong Kong. O duo de música electrónica sobe ao palco da “Black Box” do Centro Cultural de Macau amanhã, num concerto com entrada gratuita, para apresentar as oito faixas deste trabalho, onde colabora MC Yan, uma lenda do hip-hop de Hong Kong

O palco da “Black Box” do Centro Cultural de Macau (CCM) acolhe amanhã o concerto de apresentação do novo álbum de uma banda local, os Ghostly Park. “Mirror Sea” é o terceiro trabalho discográfico do duo de música electrónica, composto por DJ Saiyan e Alok Leung, naturais de Macau e de Hong Kong. O concerto está agendado para as 19h45 até às 21h.

Segundo uma nota oficial, o nome deste novo trabalho, que traduzido para português é “Espelho de Mar”, “inspira-se no antigo nome de Macau, já esquecido”, nomeadamente Hou Keng, que significa “Ostra Espelho”, ou até Keng Hoi, “Mar de Espelho”.

Em “Mirror Sea” disponibilizam-se oito faixas de música electrónica “pura”, tratando-se de um trabalho com a colaboração “da lenda do hip-hop de Hong Kong”, MC Yan. Em relação ao concerto de amanhã, haverá um trabalho visual em palco da autoria de Essahqi.

Para recordar

Os Ghostly Park descrevem “Mirror Sea” como fazendo referência ao tal “nome esquecido de Macau”, sendo um projecto que nasceu “de inúmeras caminhadas solitárias pela cidade velha, contemplando o mar”.

“Ondas escuras batem contra a costa; uma única ondulação torna-se o oceano, surgindo e cessando na impermanência. Os Ghostly Park trouxeram essa contemplação sombria para o estúdio, usando o som para pintar as muitas formas da água reflectidas no ‘Mirror Sea’, transformando o silêncio esquecido em ritmos electrónicos pulsantes”, refere a banda.

Além disso, “esquecemos que o mar já foi o único espelho”, acrescenta a banda, lembrando que “quando nenhum pensamento surge, a água não deixa vestígios”.

Em estreia

No concerto de amanhã, as oito faixas de “Mirror Sea” “serão tocadas pela primeira vez, sendo acompanhadas pelas imagens musicais criadas especialmente para ‘Mirror Sea’ pelo designer visual Essahqi”, descreve-se ainda na mesma nota. O álbum arranca com a faixa “Moving Minds”, seguindo-se “Mirror Sea”, “Black Sand”, “Muddy Water”, “Against The Current”, “Whirlpool”, “A Wave In The Ocean” e “Like Water”.

Os Ghostly Park formaram-se em 2017 procurando misturar sonoridades como a música techno, jungle, Dub e Breaks, sem esquecer a música electrónica. Em 2019, saiu o álbum de estreia, “Identify”, que já contava com trabalho gráfico e visual de MC Yan. Neste primeiro trabalho, o duo explorou “as contradições de identidade e cultura entre Hong Kong e Macau”, tendo actuado no festival Clockenflap, um dos maiores de Hong Kong e da região, sem esquecer o Sónar, evento especialmente dedicado à música electrónica.

No ano seguinte seria lançado “The Remix Project”, no qual os Ghostly Park colaboram com músicos de várias regiões para “reflectir a experiência colectiva do reconhecimento facial e do isolamento durante a pandemia”. Mas o segundo álbum propriamente dito seria editado depois, em 2024, intitulando-se “Leaf”, tendo recebido uma nomeação para o prémio do júri dos “Golden Melody Awards”, de Taiwan.

19 Dez 2025

Diocese | Novo Centro Católico inaugurado em 2026

A Diocese de Macau anunciou ontem, em comunicado, que o novo Centro Católico deverá ser inaugurado no próximo ano. No âmbito do anúncio das actividades de celebração dos 450 anos da fundação da Diocese de Macau, foi explicado que “o novo Centro Católico (com 17 pisos) deverá ser inaugurado ao longo do ano, em data a anunciar oportunamente”.

O novo projecto inspira-se no conceito “O Encontro entre Deus e a Humanidade”, integrando espaços de exposição e funcionando como “ponto central de recolha e difusão da informação religiosa a nível local”.

Serão também disponibilizados “serviços de acolhimento para visitantes e peregrinos” e organizadas duas exposições para a inauguração do Centro, intituladas “Honrar o Passado Criar o Futuro” e “Testemunha do Património Missão no Mundo”. A Diocese foi oficialmente fundada em 1576, sendo esta data celebrada com um novo logotipo, uma missa a 23 de Janeiro e um concerto em Fevereiro, entre outros eventos.

19 Dez 2025

Urbanismo | Sugeridas medidas para evitar turismo em excesso

Chan Chio I, urbanista, defende que se deve evitar que as seis zonas históricas, alvo de requalificação, fiquem todas iguais, alertando também para o impacto negativo que o turismo de massas pode trazer a locais antigos, podendo contribuir para a sua descaracterização

No contexto da revitalização de seis zonas históricas do território, numa parceria entre Executivo e as operadoras de jogo, a urbanista Chan Chio I defendeu, segundo o jornal Ou Mun, que se deve evitar uma homogeneização, ou seja, deve manter-se as características tradicionais de cada zona, sem esquecer a procura de mercado e a respectiva estratégia urbanística.

A responsável chamou também a atenção para os perigos do excesso de turismo, alertando que pode “ofuscar” as características de cada zona, devendo executar-se um planeamento a ser partilhado por residentes e turistas. Assim sendo, Chan Chio I pensa que as zonas históricas não devem ser usadas apenas para a organização de festivais, devendo também servir para acolher infra-estruturas comunitárias, como centros de convívio, espaços artísticos e educativos ou ainda zonas verdes. Tudo para a utilização diária de residentes e turistas.

No essencial, a urbanista considerou que o projecto da revitalização das seis zonas não se trata de uma simples remodelação de espaço, devendo ser dada atenção à questão urbana, à melhoria das condições de vida e da economia comunitária.

O seu a seu dono

À mesma publicação, a urbanista defendeu que devem ser preservadas as características em locais com património. Assim, no caso dos Estaleiros Navais de Lai Chi Vun ou na Antiga Fábrica de Panchões Iec Long, sítios que reflectem a história e a existência destas indústrias, deve dar-se prioridade à preservação da estrutura dos estaleiros e da fábrica, aproveitando-se o interior para outras finalidades.

Quanto à Rua da Felicidade ou à Rua Cinco de Outubro, deve manter-se o mesmo ambiente, nomeadamente com a preservação das tabuletas e fachadas de lojas antigas, e com mudanças mínimas ao nível das placas comerciais, a fim de evitar decorações excessivas.

Chan Chio I, que também pertence ao Conselho Consultivo do Trânsito, declarou que a revitalização das seis zonas não deve ignorar as questões do tráfego, sendo necessário um planeamento eficaz para resolver problemas como a falta de desvios e congestionamentos em algumas zonas. Como tal, fica a sugestão de mais e melhores ligações entre espaços próximos, como é o caso da zona da Barra junto à Doca D. Carlos I, que está ligada à cultura religiosa e marítima do Templo de A-Má, podendo haver conexão com o Centro Modal de Transportes da Barra para desviar os visitantes através de meios de transporte públicos.

Chan Chio I referiu ainda a necessidade de melhorar os passeios, na zona de Lai Chi Vun, a partir do parque de estacionamento provisório no local original do Centro de Formação das Águias Voadoras, para fazer ligação ao Cais de Coloane.

19 Dez 2025

Música | Mariza em Macau para concerto de Ano Novo

Integrado na temporada de concertos 2025-2026, o concerto entre a fadista portuguesa Mariza e a Orquestra de Macau está agendado para o último dia do ano, no grande auditório do Centro Cultural de Macau. Eis uma oportunidade única para ver, ou rever, um dos grandes nomes do Fado, numa mescla com música clássica

A fadista Mariza irá actuar em Macau num concerto que assinala a chegada de um novo ano. “Mariza, a Rainha do Fado e a Orquestra de Macau (OM)” é o nome atribuído a este concerto que acontece no grande auditório do Centro Cultural de Macau (CCM) no dia 31 de Dezembro, a partir das 20h.

Segundo uma nota do Instituto Cultural (IC), Mariza vai interpretar, “com a sua voz profundamente emotiva, uma selecção de fados icónicos, proporcionando ao público uma experiência musical que transcende géneros e fronteiras espaciais e temporais”. A fadista é descrita “como uma das maiores estrelas internacionais do Fado, sendo reconhecida pelo seu estilo musical próprio, que incorpora elementos do soul, do jazz e do gospel”.

“Com a sua voz poderosa, tem comovido públicos nos palcos mais prestigiados do mundo. Neste concerto, Mariza apresentará com a OM um repertório que combina fado tradicional e contemporâneo, enriquecido pelos ritmos das mornas de Cabo Verde, ‘rhythm and blues’ e sonoridades do Brasil, de Espanha e de Moçambique”, tratando-se de “uma celebração do fado com um estilo pessoal e diversificado”.

Mariza estreou-se ao mundo em 1999, tendo lançado, desde aí, diversos álbuns de Fado, com vendas superiores a um milhão de cópias em todo o mundo, conquistando legiões de admiradores. Foi três vezes distinguida como Melhor Artista Europeia de Música do Mundo pela BBC Radio 3. Os álbuns “Terra” e “Mundo” valeram-lhe nomeações para os Latin Grammy Awards, consolidando o seu estatuto de estrela mundial e a sua influência musical.

O concerto terá uma duração aproximada de 1h30 sem intervalo, sendo que os bilhetes já estão à venda, com preços que variam entre 180 e as 400 patacas.

Novos sons a caminho

Depois de lançar “Mariza Canta Amália”, em 2020, a artista tem-se dedicado aos palcos. Mas no ano passado lançou um novo single, “Casa”, em 2024, canção integrante do novo álbum, “Amor”. A fadista lançou também o single “Desamor”, que também faz parte desse trabalho discográfico, e no qual Mariza colabora com outro músico bem diferente de si – GSON, da banda Wet Bed Gang, um grupo português de rap.

Citada pela revista Blitz, aquando da apresentação de “Desamor”, Mariza disse que “seria improvável dois músicos de quadrantes completamente diferentes encontrarem-se, mas os nossos quadrantes encontram-se no outro lado da história”. Já GSON referiu que “o facto de sermos de pólos diferentes é o que traz a diferença ao que se está a fazer aqui”.

Sobre o novo álbum, Mariza disse à mesma publicação que se inspirou nas várias formas de amor que existem. “Amor de saudade, amor de mãe, amor de família… o amor, para mim, não é só físico, vai muito além disso.”

Entretanto, a OM anunciou outra iniciativa musical, planeada para acontecer no próximo ano. Trata-se do concerto “Esperança do Futuro”, agendado para 16 de Maio, e cujo programa de recrutamento de jovens músicos locais terminou no passado dia 12 de Dezembro.

18 Dez 2025

UCM | Livro Branco sugere métodos para acelerar diversificação económica

O “Livro Branco sobre a Cooperação Científica e Tecnológica entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, produzido na Universidade Cidade de Macau, refere desigualdades no relacionamento entre países e conclui que “a diversificação económica tem avançado a um ritmo lento”. Bárbara Morais, redactora principal do documento, explica as principais conclusões da análise

Foi lançado, no passado dia 3 de Dezembro, um Livro Branco que traça um olhar e análise à forma como a cooperação nas áreas científicas e tecnológica entre a China, Macau e os países de língua portuguesa tem decorrido, traçando algumas críticas, não apenas neste tema, mas também no rumo económico que a RAEM está a tomar.

O documento, intitulado “Livro Branco sobre a Cooperação Científica e Tecnológica entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, foi produzido pela Universidade Cidade de Macau (UCM) e teve Bárbara Morais, aluna de doutoramento da instituição, como redactora principal.

Esta descreve, em entrevista ao HM, que, em Macau, “a diversificação económica tem avançado a um ritmo mais lento do que o desejado, mantendo a economia estruturalmente dependente do jogo e do turismo”.

“A mensagem central do Livro Branco é clara: Macau precisa de acelerar a transição para funções de maior valor acrescentado. No entanto, o contexto actual oferece uma janela de oportunidade renovada. Com o apoio da Grande Baía e, muito especificamente, da Zona de Cooperação Aprofundada em Hengqin, Macau dispõe agora de novas oportunidades estruturais para recuperar o ritmo perdido e reposicionar-se, não apenas como uma ponte cultural, mas como uma verdadeira plataforma de inovação”, é referido.

Ainda sobre o território, mas a propósito do Fórum Macau, é referido o “sucesso na institucionalização do diálogo político”, mas o Livro Branco “aponta o dedo à insuficiência dos mecanismos de execução”. “Para agilizar o papel do Fórum e transformá-lo numa ferramenta de resultados tangíveis, o Livro Branco preconiza uma mudança de paradigma: é necessário passar das declarações de intenções para a tecnicidade”, descreve Bárbara Morais. A doutoranda sugere “a criação de grupos técnicos de trabalho especializados, sobretudo na esfera tecnológica, e a definição rigorosa de indicadores de desempenho, como o número de patentes registadas, startups criadas ou projectos de investigação conjuntos”.

“Paralelamente, sugere-se o estabelecimento de uma agenda comum focada em áreas de futuro, como a energia verde, a saúde, a economia do mar e a inteligência artificial, sujeita a uma avaliação periódica de progressos”, disse ainda.

O lugar da arbitragem

Tendo em conta estes parcos desenvolvimentos, o Livro Branco sugere que Macau se afirme “como centro de arbitragem tecnológica e governação de propriedade intelectual”.

O HM questionou Bárbara Morais sobre o que deve ser feito em termos efectivos, tendo em conta a existência, há vários anos, de um centro de arbitragem, e de ser um tópico na agenda política do território há muito tempo. A aluna de doutoramento destaca que “para que estas ideias, debatidas há anos, deixem de ser retórica e passem a realidade, a RAEM necessita de criar um quadro legal especializado em litígios tecnológicos alinhado com os padrões internacionais mais exigentes”.

“É fundamental atrair peritos e árbitros internacionais através de incentivos competitivos e estabelecer um centro de arbitragem que goze de reconhecimento tanto nos países lusófonos como na Grande Baía. O objectivo é desenvolver serviços de mediação, certificação e gestão de activos de propriedade intelectual, posicionando Macau como um ‘porto seguro’, neutro e eficiente, para a resolução de disputas tecnológicas internacionais”, acrescentou.

Cooperação desigual

Em termos globais, e no que diz respeito à cooperação entre a China e os Países de Língua Portuguesa (PLP), o Livro Branco refere o “planeamento de topo” por parte de Pequim para a cooperação nas universidades e em investigação científica. Porém, o planeamento “não se traduz, linearmente, em mecanismos de execução igualmente eficazes no terreno, nem garante resultados homogéneos entre os nove países lusófonos”.

O planeamento implica “directrizes claras, prioridades definidas e instrumentos diplomáticos mobilizados para orientar esta cooperação”, com políticas como “Made in China 2025” ou a “Rota Digital da Seda”, que “integram a cooperação tecnológica com os PLP na própria medula da política externa e de inovação nacional chinesa”, destaca a autora.

Porém, verificam-se “desigualdades, que são, porventura, o traço mais marcante desta relação”, conforme explica Bárbara Morais. “O cenário actual revela uma profunda assimetria, caracterizada por uma ‘bicefalia’ na cooperação. (…) As principais capacidades científicas, a infra-estrutura tecnológica robusta e o volume de cooperação efectiva estão esmagadoramente concentrados em Portugal e no Brasil”. Pelo contrário, “os países africanos de língua portuguesa (PALOP) e Timor-Leste apresentam uma participação significativamente menor”.

Segundo Bárbara Morais, a “disparidade não decorre de falta de vontade política, mas sim de limitações estruturais de financiamento, escassez de recursos humanos qualificados e fragilidade das instituições de investigação locais”. Verifica-se, assim, “uma cooperação a duas velocidades, muito assimétrica dentro da própria comunidade lusófona”.

O Livro Branco realça a “encruzilhada histórica” em relação à cooperação entre a China e os PLP, o que significa “a urgente necessidade de passar do potencial à concretização” nesta matéria.

“Existem visões ambiciosas e planos estratégicos, mas os resultados práticos permanecem aquém do possível. Para resolver esta encruzilhada, o caminho proposto passa por fortalecer mecanismos de execução, investir massivamente em talento e educação técnico-científica, criar ecossistemas de inovação colaborativa genuína entre a China, Macau e os PLP, e, acima de tudo, ter a coragem de medir resultados e reformular estratégias com base na evidência empírica, abandonando o discurso de circunstância em favor do pragmatismo económico e científico.”

Lacunas em África

Outra das conclusões do Livro Branco é a “tenuidade” das ligações académicas com o continente africano, que Bárbara Morais descreve como “cenário de fragilidade”. “Há uma tríade de factores: a escassez de capacidade científica instalada, a falta crónica de financiamento e programas de mobilidade consistentes”, sem esquecer “a ausência de estruturas estáveis de investigação conjunta”.

“Para colmatar este fosso e criar uma massa crítica duradoura, o Livro Branco não se limita ao diagnóstico, sugerindo medidas concretas como o reforço robusto de bolsas de investigação, a criação de programas de doutoramento conjunto, a implementação de laboratórios colaborativos e o desenho de mecanismos de mobilidade académica especificamente orientados para a realidade africana”, acrescenta.

O documento fala ainda do impacto negativo das “assimetrias geopolíticas”, tal como as “restrições tecnológicas da União Europeia e NATO a Portugal”. Segundo referiu Bárbara Morais, estão em causa “impactos reais e restritivos”. “Estas limitações condicionam a participação de Portugal e, por extensão, de outros actores lusófonos que cooperam em rede com Lisboa, em projectos de alta tecnologia que envolvam a China. O impacto é particularmente sensível em áreas nevrálgicas como as telecomunicações 5G, a defesa, a inteligência artificial e a ciber-segurança, criando barreiras que exigem uma navegação diplomática complexa.”

Novas estratégias

O Livro Branco foi desenvolvido no Instituto de Investigação sobre os Países de Língua Portuguesa da UCM, e redigido por Bárbara Morais com a participação do académico João Simões. O projecto baseia-se na revisão de literatura académica sobre o tema e ainda nos resultados do “Seminário do Lançamento da Cooperação Tecnológica”, realizado a 22 de Julho de 2025 na UCM.

A obra analisa áreas como a “evolução estratégica”, “mecanismos institucionais”, “marcos tecnológicos” e “desafios estruturais”, pretendendo “fornecer estratégias baseadas em evidências para transformar o potencial da parceria China-PLP numa realidade concreta, criando um novo modelo de cooperação tecnológica para o Sul Global”, refere um comunicado da UCM.

18 Dez 2025

Docomomo | Documentário de José Maneiras regista carreira do arquitecto

Chama-se simplesmente “Maneiras” e faz o registo audiovisual de uma obra única que não só marcou uma geração de arquitectos como deixou a sua marca no modernismo em Macau. O documentário de António Sanmarful, produzido pela Docomomo em memória de José Maneiras, começou a ser pensado em 2018 e contém testemunhos do próprio sobre aquilo que projectou

Falecido no passado dia 24 de Novembro, com 90 anos, José Maneiras, arquitecto macaense, fez muito mais do que simplesmente projectar edifícios num território exíguo e cheio de particularidades. Foi também uma figura com relevante participação cívica.

Mas a fim de deixar um registo audiovisual da sua obra como arquitecto, a Docomomo Macau começou a pensar e a planear, a partir de 2018, a produção de um documentário sobre o legado de José Maneiras, tendo convidado o realizador local António Sanmarful para o fazer. Maneiras não viveu já tempo suficiente para assistir ao documentário sobre si, apresentado esta terça-feira no auditório Stanley Ho, no Consulado-geral de Portugal, mas deixou registados bastantes testemunhos sobre aquilo que projectou.

Ao HM, Rui Leão, presidente da Docomomo Macau, diz ter trabalho de forma estreita com António Sanmarful neste projecto, a partir da exposição dedicada a José Maneiras apresentada em 2018 no jardim Lou Lim Ieoc.

“Nessa altura fizemos um levantamento das suas obras. Tratava-se de uma exposição simples, em que pretendíamos mostrar o conjunto dessa obra construída em Macau e perceber a sua importância, e percebemos que estava pouco estudada. Fazia sentido deixar o registo porque, no caso de Macau, por causa da escala da cidade e da falta de massa crítica, é praticamente inexistente o estudo de obras construídas.”

Há muito que Rui Leão se debruça a estudar e olhar a arquitectura modernista que se fez em Macau, de que José Maneiras foi um dos autores. Chama, por isso, de “ingrato” ao território, devido a essa ausência de auto-análise. “As pessoas têm um desconhecimento quase total sobre a arquitectura modernista de Macau, e nesse sentido acho que é um sítio bastante ingrato, porque não há uma cultura que celebre a memória.”

Imperava, pois, a importância de fazer este documentário, por não existir essa “diferenciação” entre as coisas boas e más que se vão fazendo, por não existir uma catalogação e análise. “Foi com essa perspectiva, e com um sentimento de uma certa tristeza por parte do arquitecto Maneiras [que se fez o documentário]”, disse ainda Rui Leão, acrescentando que “pelo facto de a obra estar tão danificada, e não se falar dela, apercebemo-nos de que era importante fazer algo que tivesse um carácter de maior permanência”.

Algumas amarguras

Formado na Escola de Belas Artes do Porto, José Maneiras trouxe maneiras diferentes de fazer arquitectura ao território. “O documentário baseia-se nas filmagens de algumas das suas obras e nos seus depoimentos. Percebemos o que um arquitecto, chegado de fresco a Macau, e com formação feita em Portugal, via de importante nas obras. Havia, digamos, uma formação modernista e coisas que Maneiras trouxe [à prática da arquitectura] de forma bastante científica, e que tinha a ver com a exposição solar [dos edifícios]. Isso era mais urgente em Macau, em relação a Portugal, por estarmos num sítio subtropical.”

Um dos primeiros projectos foi o edifício residencial São Francisco, em frente ao Clube Militar, destacando Rui Leão a preocupação de Maneiras em deixar um espaço livre em conjugação com o edifício histórico em frente.

“Ele fala um pouco sobre essa intervenção no documentário, e que de certa maneira salvaguarda o Clube Militar, ao permitir que haja ali um espaço não construído à frente [do edifício São Francisco]. Isso tem a ver com a dimensão cívica que ele também teve, de ter a preocupação com o património. Aí ele foi chamado para resolver um problema que ninguém sabia como tratar, que era aquele confronto com o Clube Militar.”

José Maneiras “teve o cuidado de rodar a torre para não ocupar a frente do Clube Militar, criando uma abertura visual e um bloco mais pequeno do outro lado, pelo que se fez ali uma praceta”, o que constitui “uma preocupação cívica notável”, defendeu Rui Leão.

O presidente da Docomomo confessou ainda algumas amarguras com que partiu José Maneiras, por ver muita da sua obra já danificada ou sem a manutenção devida. No caso do edifício São Francisco, pode ser alvo de demolição ou de obras, e “ele viveu um bocado infeliz com isso”.

“Não sei muito bem como está a situação, mas falei com o José Maneiras sobre a possibilidade de os blocos mais baixos desse edifício estarem na iminência de ser demolidos, e ele estava muito triste com isso”, acrescentou Rui Leão.

Ainda assim, “há outros edifícios dele que foram recuperados, como as residências junto ao Centro Hospitalar Conde de São Januário”, ou a residência para invisuais na zona da Areia Preta.

Projectar com pouco

José Maneiras começa a projectar em Macau ainda nos anos da administração portuguesa, quando em Portugal vigorava o regime do Estado Novo e o território estava sujeito, tal como os restantes territórios ultramarinos, aos Planos de Fomento para as questões orçamentais. O dinheiro era, por isso, pouco e controlado.

“No documentário ele fala também de coisas que eram importantes na altura, como o começar a construir em altura, o que era uma novidade, e também a economia de construção, porque nos anos 50 e 60 não havia muito dinheiro e havia uma necessidade muito maior se fazer essa economia de construção.”

José Maneiras pertenceu ao rol de arquitectos macaenses que deixaram marca, como Canavarro Nolasco da Silva e Aureliano Guterres Jorge, apesar da formação de base destes ser em engenharia; ou ainda José Lei.

“Eram pessoas integradas na sociedade de uma maneira completamente diferente [em relação a quem vinha de fora], e que entendiam as questões, estando mais perto do cliente, partilhando o mundo e modos de criar. Não digo que, teoricamente, a arquitectura de uns e outros fosse estilisticamente diferente, mas falo do facto de fazerem propostas e colocarem questões diferentes”, rematou Rui Leão.

17 Dez 2025

Christian Montag, Instituto de Inovação Colaborativa da UM: “A IA não consegue imitar o toque humano”

Pode a inteligência artificial ajudar a combater a solidão? A questão foi analisada num estudo da Universidade de Macau, dirigido pelo académico Christian Montag. O director do Instituto de Inovação Colaborativa sublinha que as ferramentas de IA “não são soluções a longo prazo” a nível psicológico

De que forma a inteligência artificial (IA) pode ajudar a contornar sensações de solidão, se as redes sociais não conseguem atingir esse fim?

A “teoria das necessidades e gratificações” afirma que a tecnologia só pode ter sucesso se o seu uso satisfizer necessidades humanas, como, por exemplo, a necessidade de interação social. Com os companheiros de IA, quer como produtos autónomos, quer integrados em plataformas de redes sociais, atingimos um novo patamar, porque os seres humanos passam a conversar com uma pessoa artificial e não com outra pessoa humana, como acontece nas redes sociais. Surgem problemas específicos com estes novos companheiros de IA, em que há sistemas de IA excessivamente agradáveis e encantadores que não desafiam as visões enviesadas do mundo de uma pessoa. Além disso, muitas pessoas em todo o mundo já se tornaram excessivamente dependentes destes produtos, utilizando-os sem reflexão crítica.

Uma das conclusões do vosso estudo é que a IA não consegue, por si só, resolver sentimentos de solidão. Que passos na investigação foram seguidos para chegar a esta conclusão?

Existem estudos bem conduzidos que mostram que as interações com companheiros de IA podem, de facto, reduzir sentimentos de solidão. Não duvidamos destes resultados nem negamos o potencial que pode advir dessas interações entre o ser humano e a IA, desde que tais sistemas sejam concebidos de forma segura e quando não há um humano disponível. Dito isto, acreditamos que essas interações entre humanos e IA não representam uma solução a longo prazo.

Porquê?

Isso deve-se à ausência de contacto social e da presença real de outro ser humano quando se recorrem a companheiros de IA baseados em modelos de linguagem de grande escala, especialmente em momentos de desespero. Revimos uma vasta literatura que demonstra que precisamos levar a sério a nossa herança evolutiva, com a necessidade real de outros seres humanos, particularmente na era da IA. A nossa perspectiva baseia-se em muitos anos de investigação na área da neurociência afectiva. Ainda assim, é claramente necessário desenvolver mais estudos empíricos novos que abordem directamente as interações com IA e sustentem esta visão.

Corremos o risco de a IA provocar mudanças cognitivas profundas nas pessoas. Em que medida? Podemos mudar enquanto seres humanos, especialmente no que diz respeito à necessidade que temos dos outros?

A mesma discussão surgiu com o aparecimento dos smartphones. Importa notar que essa discussão mais antiga ainda não foi resolvida: o que acontece ou aconteceu às nossas capacidades cognitivas quando passámos a externalizar permanentemente a aprendizagem de números de telefone, a orientação de A para B, entre outras tarefas, para uma máquina? Uma investigação recente do MIT [Massachusetts Institute of Technology] sugere que o cérebro fica menos activado quando é utilizado o ChatGPT para tarefas de escrita, em comparação com a escrita sem esse apoio. Para mim, isto não é surpreendente e também não deveria conduzir a pânicos morais. Temos outros problemas mais urgentes, como quando surgem dificuldades reais quando aumentam as desigualdades na sociedade, isto porque algumas pessoas utilizam a IA e outras não investem nesta área.

Quais os impactos concretos?

Algumas pessoas poderão tornar-se muito, muito produtivas em breve, enquanto aquelas que não forem educadas para usar a IA adequadamente não conseguirão acompanhar [o ritmo]. Curiosamente, observámos em investigações recentes que pessoas com um estilo de aprendizagem profundo estão mais dispostas a envolver-se com a IA para se tornarem mais produtivas. Quanto à pergunta sobre se mudamos em relação à nossa necessidade dos outros, duvido muito disso, pois estes impulsos evolutivos estão geneticamente ancorados na nossa espécie e não podemos simplesmente eliminá-los. As necessidades sociais são uma parte essencial do que significa ser humano.

Estas mudanças cognitivas, a ocorrer, podem ser mais significativas nos jovens do que nos adultos, por exemplo?

Questão interessante. Sabemos, a partir de alguns estudos sobre atitudes em relação à IA, que os utilizadores mais jovens tendem a ter visões mais positivas sobre a IA e, por isso, são mais propensos a adoptá-la no quotidiano. No entanto, actualmente observamos algo bastante problemático, como o facto de a IA estar frequentemente a eliminar empregos para jovens que acabam de sair da universidade. Assim, a IA parece dificultar a entrada no mercado de trabalho após a obtenção de um diploma universitário. Em outras palavras, a falta de experiência profissional torna as coisas difíceis para muitos jovens. No final, isso também pode levar a que a perceção dos jovens sobre a IA se torne mais negativa, em breve.

Como devem os governos legislar ou adoptar políticas para promover uma aceitação e utilização saudável da IA na sociedade e nas escolas?

Observamos abordagens muito diferentes em todo o mundo para responder à revolução da IA. Sou alemão e, na Europa, assistimos a fortes esforços regulatórios com o chamado Regulamento da Inteligência Artificial (Artificial Intelligence Act). Pessoalmente, não estou convencido de que o actual esquema regulatório europeu esteja bem planeado, pois penso que é demasiado rigoroso e que, em alguns pontos, utiliza termos juridicamente indefinidos, embora aplauda o objectivo de promover uma IA fiável e de tentar reduzir danos. Penso que a actual regulamentação da IA na União Europeia pode ir longe demais e acabar por prejudicar a economia europeia, ao sufocar uma inovação muito necessária. Mas há perigos reais associados à IA e é necessária alguma regulamentação.

Que perigos?

Falo, por exemplo, da fusão não regulamentada entre biotecnologia e IA que poderia resultar em danos, caso as pessoas passem a “criar” novos vírus nos seus quintais. Considero muito interessante a abordagem de Singapura baseada na aprendizagem ao longo da vida como resposta à revolução da IA. O Governo de Singapura oferece aos seus cidadãos a possibilidade de obter um grau académico em IA a partir dos 40 anos, com apoio financeiro do próprio Estado. O que gosto nesta abordagem é que precisamos de lembrar às pessoas que também é sua responsabilidade adquirir novas competências ao longo da vida. Esta mentalidade deve ser incutida desde cedo nas escolas.

Em que áreas das nossas vidas os modelos de linguagem de grande escala (LLMs) podem trazer mais benefícios do que prejuízos?

Existem muitas tarefas rotineiras e repetitivas em que a IA será realmente útil para os seres humanos. No entanto, sabemos pela literatura científica que os humanos experienciam o que se chama “aversão aos algoritmos”: em algumas áreas das nossas vidas, as pessoas não gostam que a IA desempenhe um papel. Por exemplo, quando falamos de terapia de casal, as pessoas preferem claramente falar com um ser humano do que com um sistema de IA. Talvez quanto mais nos aproximamos da nossa herança evolutiva em termos de cuidar uns dos outros, mais o papel da IA deva ser cuidadosamente monitorizado e reflectido, se quisermos que ela tenha um lugar aí. Pessoalmente, não gostaria de ver o meu filho a ser cuidado no jardim de infância por um robô alimentado por IA.

Como deve a psicologia adaptar-se à IA, tendo em conta o número crescente de pessoas que a utilizam para esse fim?

Existem diferentes perspectivas sobre este tema. Em primeiro lugar, nem toda a gente sabe que a psicologia é uma disciplina que depende fortemente de dados. Por isso, os estudantes de psicologia são treinados para se tornarem excelentes cientistas de dados. Nesse contexto, é lógico que a nossa disciplina adopte a IA como ferramenta de análise de dados. No entanto, penso que se refere à forma como os psicólogos veem o uso crescente da IA nas relações humanas. Como acontece com muitas coisas, isto é complexo. Se a IA permitir uma melhor comunicação humana, como, por exemplo, melhorando aparelhos auditivos para pessoas com problemas de audição, isso é muito bem-vindo. Se a IA substituir relações humanas, na minha perspectiva isso causará problemas. Como expusemos no nosso trabalho mais recente, neste momento a IA não consegue imitar com sucesso o toque social humano nem a presença real de outra pessoa.

No Centro de Ciência Cognitiva e Cerebral da Universidade de Macau, quais são os principais projectos desenvolvidos nesta área?

Dispomos de oportunidades únicas de investigação na Universidade de Macau para estudar interações entre humanos e IA, com técnicas neurocientíficas. Espero que possamos divulgar descobertas muito interessantes num futuro próximo.

A humanidade ainda mora aqui

Publicado recentemente na revista científica “Trends and Cognitive Sciences”, o artigo “Can AI really help solve the loneliness epidemic?” [Pode a IA realmente ajudar a resolver a epidemia da solidão?] conta com Christian Montag, director associado do Instituto de Inovação Colaborativa da Universidade de Macau (UM) como autor principal, seguindo-se os académicos Michiel Spapé, professor associado do Centro de Ciências Cognitivas e Cerebrais da UM, e Benjamin Becker, professor do Departamento de Psicologia da Universidade de Hong Kong, como co-autores.

Segundo uma nota de imprensa divulgada pela UM a propósito desta investigação, uma das principais conclusões é de que a IA “provavelmente não será solução de longo prazo para a solidão humana”. Citado nesta nota, Christian Montag declarou que “se uma pessoa está solitária, anseia pela presença física de alguém próximo”, sendo que isso “é muito difícil de imitar com os chatbots disponíveis”.

“Os grandes modelos de linguagem operam principalmente por meio da comunicação por texto. Claramente, isso não é suficiente para fornecer às pessoas solitárias a melhor cura para a solidão: o apoio directo em pessoa”, declarou. Segundo a Organização Mundial de Saúde, “a solidão afecta uma em cada seis pessoas em todo o mundo”, tendo sido “identificada como uma preocupação de saúde pública global”.

Apesar do sinal, o estudo aponta para um lado positivo deste universo, referindo-se que “a tecnologia de IA tem um potencial significativo para apoiar os seres humanos em momentos de crise psicológica, especialmente quando a intervenção humana não está disponível”. Porém, “os investigadores defendem que a tecnologia deve ser tornada mais segura antes de poder ser utilizada neste contexto”, enfatizando “a importância de recordar a nossa herança evolutiva e a necessidade de conexões interpessoais genuínas”.

17 Dez 2025

Cinemateca Paixão | Clássico de Kubrick para ver no dia de Natal

Um clássico distópico sobre comportamento e sociedade, pela mente criativa de Stanley Kubrick, é o que propõe a Cinemateca Paixão para o dia de Natal. O filme “A Laranja Mecânica” será exibido nos dias 25 e 27 de Dezembro. Mas, até lá, há muitos filmes para ver, como “Köln 75”, “Girl” ou “Ressurection”

Stanley Kubrick, um dos mais aclamados realizadores de cinema, fez em 1971 aquele que será um dos mais polémicos filmes da sua carreira, e que pode agora ser visto, ou revisto, na Cinemateca Paixão. Trata-se de “A Laranja Mecânica”, lançado em 1971, que será exibido no dia 25 de Dezembro, a partir das 19h30, e também no dia 27.

Para quem quer fugir ao espírito natalício da época e apostar em histórias bem distantes desse panorama, pode ver de novo a obra-prima de Kubrick que se passa na sociedade de Inglaterra, mas em cenários completamente marcadamente exagerados face à realidade que conhecemos.

“A Laranja Mecânica” centra-se em torno de um jovem sociopata, violento, que é sujeito a uma terapia de reabilitação experimental, alterando o seu comportamento. Sobre este filme, o próprio Kubrick descreveu-o como “uma obra de arte”.
“Nunca nenhuma obra de arte causou danos sociais, embora aqueles que pretendem proteger a sociedade contra as obras de arte que eles próprios acham perigosas, esses sim, têm provocado enormes danos sociais”, disse.

O realizador, que deu nome a tantos outros clássicos bem conhecidos do cinema, como o filme de terror e suspense “Shining” ou, bem mais actual, “De Olhos Bem Fechados”, inspirou-se, para esta produção de 1971, na obra do escritor Anthony Burgess. O livro “A Laranja Mecânica” foi lançado em 1962 atingindo estatuto de livro de culto sem escapar à polémica, tal como o filme anos depois. Nascido em Manchester em 1917, Burgess viria a falecer em Londres, em 1993, tendo feito carreira militar e dado aulas na Ásia, em lugares como Malásia ou Brunei.

Aqui, o leitor acompanha uma sociedade futurista em que a violência se torna muito presente, gerando respostas também agressivas por parte de um Governo totalitário que domina a sociedade.

Amizade e animais

A programação da Cinemateca Paixão traz também “Encantos de Dezembro”, a habitual secção mensal de filmes pautada pela diversidade. Muitos dos filmes escolhidos exibem-se nos próximos dias, como é o caso de “Paws Land”, película de Hong Kong exibida amanhã, a partir das 19h30, e depois nos dias 21, 23 e também no dia de Natal.

“Paws Land” é um documentário do realizador Au Cheuk-man que aborda a temática dos animais abandonados, focando-se nas histórias de voluntários locais que, durante quatro anos (de 2019 a 2023), acompanharam mais de 40 animais abandonados na região vizinha.

Segue-se “Girl”, uma produção deste ano oriunda de Taiwan, com uma única exibição na quinta-feira a partir das 19h30. Trata-se da apresentação, em Macau, do filme que ganhou o prémio de “Melhor Realizador” no Festival Internacional de Cinema de Busan, na Coreia do Sul, neste caso atribuído a Shu Qi.

Este é um filme sobre amizade, em que uma jovem se torna amiga de outra com um nome parecido, e que personifica os sonhos que ela própria escondeu. É então que o passado da sua mãe desafia as suas aspirações, levando-a a um ciclo de desespero.

Da Europa chega “Köln 75”, exibido esta sexta-feira, na véspera de Natal, às 21h30, e domingo, dia 28, a partir das 16h30. Indicado ao Prémio Alemão de Cinema deste ano, nas categorias de “Melhor Filme”, “Melhor Actriz Principal”, “Melhor Edição” e “Melhor Actor Secundário”, o filme passa-se em Colónia, cidade alemã, em 1975, contando a história verídica de Vera Brandes.

Esta, contra tudo e todos, reservou a Ópera de Colónia para levar à cidade um concerto de Keith Jarrett, lutando até contra os pais conservadores. A improvisação que Jarrett fez ao piano acabaria por ficar para a história, surpreendendo a própria Vera, culminando na gravação do histórico disco ao vivo “The Köln Concert”.

Outro destaque da Cinemateca Paixão para este mês é “Ressurrection”, uma co-produção da China e França, deste ano, que ganhou o “Prémio Especial do Júri” do Festival de Cinema de Cannes. Tem uma única exibição, a 21 de Dezembro, às 19h30, e foca-se na figura de um monstro agarrado a visões que mais ninguém consegue ver, até que aparece uma mulher que entra nos seus sonhos e visões, procurando descobrir a sua verdade. A realização está a cargo de Bi Gan.

Ainda na véspera de Natal exibe-se “Die, My Love”, com Jennifer Lawrence e Robert Pattinson nos papéis principais. Estes desempenham os papéis de um casal que, depois de uma vida agitada em Nova Iorque, decide mudar-se para a zona rural de Montana. O isolamento a que ficam sujeitos leva a que as suas vidas se tornem psicologicamente desafiantes.

16 Dez 2025

Documentário sobre José Maneiras exibido amanhã no Consulado

A DOCOMOMO Macau apresenta amanhã no auditório Stanley Ho, no Consulado-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, o novo documentário de António Sanmarful sobre a vida do arquitecto José Maneiras, recentemente falecido. A sessão começa às 18h45 e visa recordar uma “figura incontornável do modernismo em Macau”. Apresenta-se neste filme “uma visão aprofundada sobre o contributo singular de José Maneiras para a arquitectura moderna no território”.

Com recurso a entrevistas, imagens de arquivo e visitas às obras mais emblemáticas, o documentário produzido pela DOCOMOMO “regista e valoriza o legado de um criador cuja influência permanece visível na paisagem urbana de Macau”.
Segundo uma nota da DOCOMOMO, José Maneiras, macaense nascido em 1935, formado na Escola de Belas Artes do Porto, “destacou-se pela sua abordagem inovadora, pela integração sensível entre forma e função e pela capacidade de interpretar o espírito do modernismo num contexto multicultural e em rápida transformação”.

“A sua obra constitui hoje um testemunho fundamental da evolução arquitectónica de Macau na segunda metade do século XX”, defende ainda a DOCOMOMO, que, com este documentário, pretende “reforçar o compromisso com a documentação, conservação e divulgação da arquitectura moderna, promovendo o debate público sobre a importância do património construído e da memória colectiva”.

Uma vida preenchida

Além da actividade profissional como arquitecto, Maneiras foi, ainda antes do 25 de Abril de 1974, uma figura ligada à política local, tendo depois estado ligado à criação do Centro Democrático de Macau. Foi também presidente da então Câmara Municipal do Leal Senado, entre os anos de 1989 e 1993. Na sua área de formação, integrou o grupo de fundadores da Associação de Arquitectos de Macau, em 1987, de que também foi presidente.

Colaborou, anos mais tarde, com nomes como Carlos Marreiros, e o engenheiro José Chui Sai Peng, nomeadamente na requalificação da praça do Tap Seac. Em termos de obra feita, destaca-se um dos primeiros conjuntos habitacionais com a sua assinatura, de 1964, o São Francisco, em frente ao Clube Militar; ou ainda o bloco Fon Wong, de 1966, junto às Ruínas de São Paulo. Na Areia Preta existe ainda a “Casa para Cegos”, construída em 1971.

16 Dez 2025

AMCM | Compras online sem autorizações com códigos por SMS

A Autoridade Monetária de Macau anunciou ontem o fim dos códigos enviados por SMS para autorizar transacções online e pediu aos bancos que criem autorizações nas aplicações de telemóvel. Para aceder aos novos métodos basta actualizar as aplicações

A Autoridade Monetária de Macau (AMCM) alterou as regras de segurança para as transacções online, seja transferência de dinheiro ou compras digitais. Até agora o cliente recebia, por SMS, um código para autorizar essa transferência de fundos da conta, mas agora cabe aos bancos criar um mecanismo de autorização na própria aplicação de telemóvel.

Segundo um comunicado divulgado ontem pela AMCM, as novas funções visam aumentar “a segurança das transacções online mediante cartão bancário” e “salvaguardar os direitos dos titulares de cartões”. Assim, fica determinado que os bancos devem “introduzir uma funcionalidade de autorização de transacções online nas suas aplicações de ‘banco móvel’ a partir do final deste mês”, que vai substituir “os códigos de verificação SMS únicos para autorizar tais transacções”.

Ainda assim, os clientes que não tenham activado o serviço de “banco móvel” podem continuar a receber códigos por SMS para autorizar compras online.

Para a AMCM, as novas regras vão dar aos clientes dos bancos “informações mais claras sobre as transacções”, além de proporcionar “um canal mais seguro para autorizar transações online mediante cartão bancário, ajudando a impedir que fraudadores realizem transacções não autorizadas por meio do roubo de códigos de verificação por SMS”. Reduz-se, assim, “o risco de perdas financeiras para os titulares de cartões”, num território onde as burlas informáticas são um crime comum.

Sem links ou códigos

Face às novas regras de segurança, é explicado que os titulares dos cartões apenas necessitam actualizar as aplicações dos bancos para terem acesso às novas funcionalidades, sem terem de fazer novos registos.

“No futuro, quando os titulares dos cartões introduzirem os dados dos seus cartões bancários no site de um comerciante, a página irá solicitar que abram e acedam à sua aplicação do ‘banco móvel’ para concluir a verificação de identidade necessária”, apresentando-se depois “as informações da transacção, incluindo os últimos quatro dígitos do cartão de crédito, o nome do comerciante, a moeda da transação e o montante”.

A AMCM revela preocupação a travar casos de burla, tendo referido na mesma nota que desde Junho do ano passado que instruiu a banca a fornecer “canais convenientes, como linhas directas e serviços bancários online ou móveis” a clientes, permitindo que “activem ou desactivem funções de transacções online, ajustem limites de crédito e congelem ou comuniquem imediatamente o extravio dos seus cartões bancários”.

Fica ainda determinado que os bancos não enviam aos clientes “qualquer tipo de ‘hyperlinks ou códigos QR para estes clicarem ou digitalizarem em SMS, ou emails enviados a clientes, a partir de Dezembro” deste ano. Além disso, no combate aos crimes de burla, é descrito que “as instituições financeiras também são obrigadas a reforçar as suas campanhas de sensibilização”.

16 Dez 2025

Trânsito | Deputado quer sinais adaptados a carros com volante à esquerda

Chan Lai Kei interpelou o Governo sobre a necessidade de reorganizar o planeamento do trânsito porque os veículos do Interior têm o volante do lado esquerdo. O deputado justificou a necessidade de mudança com a integração na Grande Baía e o reconhecimento das cartas de condução

A futuro do trânsito passa pela esquerda. É esta a ideia deixada por Chan Lai Kei numa interpelação escrita enviada ao Governo, onde descreve que esta será uma tendência tendo em conta a integração de Macau no projecto da Grande Baía, sem esquecer o reconhecimento mútuo das cartas de condução com o Interior da China.

Por esta razão, o deputado ligado à comunidade de Fujian espera que os veículos com o volante do lado esquerdo sejam tidos em conta no futuro planeamento do trânsito e na instalação de infra-estruturas urbanas, como por exemplo a colocação de sinais de trânsito e de espelhos rodoviários nas ruas.

Na interpelação escrita o deputado cita dados oficiais relativos aos últimos anos, que demonstram que o número de veículos com volante do lado esquerdo tem aumentado. Até Dezembro deste ano houve 5.731 inscrições de automóveis ligeiros e de 435 automóveis pesados com as características mencionadas. No entanto, o deputado argumenta que as ruas de Macau são estreitas e que, ao longo dos anos, as infra-estruturas têm-se focado na condução à direita. “Com o ambiente de condução do lado direito os condutores que conduzem do lado esquerdo podem cometer mais erros de avaliação”, disse.

A direita é um risco

Para o deputado, as infra-estruturas que só favorecem quen conduz com o volante do lado direito não só arriscam os condutores, mas também os peões, afectando todo o sistema de segurança rodoviária.

“Se o Governo fizer uma avaliação, para 2026, dos riscos de segurança no que diz respeito aos ângulos da condução à esquerda, tendo em conta as vias nos bairros antigos, será que pode aumentar a sensibilização dos condutores para os potenciais riscos, a fim de ser assegurada a segurança dos peões”, questionou.

Chan Lai Kei defendeu ainda que, a fim de garantir que todos os condutores sujeitos à política do mútuo reconhecimento das cartas de condução se adaptam ao ambiente e regras de trânsito de Macau, as autoridades devem obrigá-los a realizar testes e frequentar sessões educativas sobre o panorama do trânsito e regras de segurança rodoviária do território.

Tendo em conta que o planeamento dos novos aterros e demais construções ainda estão em curso, o deputado espera que o Governo inclua concepções de segurança que tenham também em consideração os veículos com volante do lado esquerdo.

16 Dez 2025

Governo cria centro para gerir revitalização de seis zonas antigas

Foi ontem inaugurado o Centro de Desenvolvimento Local, uma plataforma de planificação e gestão de projectos relacionados com a revitalização das seis zonas históricas, e que vai ser gerido pela União Geral das Associações de Moradores de Macau (Kaifong). Recorde-se que estes projectos de renovação urbana, cultural e turística serão desenvolvidos em parceria com as operadoras de jogo.

Segundo um comunicado oficial ontem divulgado, o Executivo pretende, através do centro, a “supervisão e coordenação governamental do investimento de recursos por parte das empresas de lazer”, bem como promover “o planeamento e organização pela sociedade civil”. As operações do centro ficam sob alçada dos Kaifong.

O Centro de Desenvolvimento Local terá um comité de orientação, composto por 14 representantes do Governo, associações e de círculos empresariais e industriais, “sendo responsável pela apreciação e orientação dos projectos de desenvolvimento local”. Por sua vez, haverá um grupo de consultores, com 18 representantes das empresas de lazer, sectores empresarial e industrial, turístico, cultural e de comunicação, planeamento urbano e académico. No caso deste grupo, a responsabilidade será fornecer “sugestões profissionais e apoio técnico para o desenvolvimento local”.

Cabe ao centro a realização de tarefas como a investigação sobre actividades comunitárias, “a concepção e execução de projectos, a promoção da cooperação multissectorial, o incentivo à participação da sociedade civil”, tudo a pensar na revitalização das seis áreas e numa maior conexão com os moradores.

Passo a passo

Numa primeira fase de funcionamento do centro, será criado “um estudo de planeamento do desenvolvimento local” a fim de lançar um “plano de cooperação, actividades emblemáticas” e a execução de uma “estratégia de promoção”. Serão depois “optimizadas as instalações das [seis] áreas, reforçada a sua articulação e criadas zonas comerciais características, visando um desenvolvimento sustentável”.

Yau Yun Wah, director dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico (DSEDT), explicou que o centro constitui “uma importante iniciativa do Governo para promover a economia comunitária”, numa “conjugação de esforços entre o Governo, empresas de lazer e sociedade civil”.

Caberá ao Governo aprovar projectos, coordenar recursos e fiscalizar resultados, explicou, sendo que as “empresas de lazer investem os recursos conforme comprometido e executam, conforme necessário, alguns projectos de revitalização”. A sociedade civil, através do novo centro, “agrega forças dos vários sectores, planeia e organiza diversas actividades, impulsionando em conjunto o desenvolvimento local”, disse ainda.

16 Dez 2025

Livraria Portuguesa | “Macau’s Reflections – Now and Then” até ao fim do mês

A Livraria Portuguesa acolhe, até ao final do mês, a exposição “Macau’s Reflections – Now and Then”, de Pedro Ramos, um fotógrafo muito ligado ao território, onde viveu em criança. Nesta mostra, observa-se o seu olhar particular atrás da lente sobre um território em grande mudança, tendo como ponto de partida o livro do jornalista José Pedro Castanheira, “Macau – Os Últimos Cem Dias do Império”

Dezembro é sempre um mês de memória. Foi nesse mês que Macau mudou de rumo e passou a ter administração chinesa a partir do dia 20 de Dezembro de 1999, transformando-se na Região Administrativa Especial de Macau (RAEM). Em jeito de memória desse momento histórico, mas não só, apresenta-se até ao final do mês a exposição “Macau’s Reflections – Now and Then”, na Livraria Portuguesa. A iniciativa, com organização e curadoria das 10 Marias – Associação Cultural, mostra o trabalho do fotógrafo Pedro Ramos.

Segundo uma nota, trata-se de um projecto que “oferece um olhar profundo e sensível sobre Macau num período decisivo da sua história: desde a transição do final da administração portuguesa para a integração na China, a partir de 1999, até aos dias de hoje”.

A mostra é uma “reflexão e um olhar muito pessoal sobre Macau”, captando-se “a essência de uma cidade em fluxo, preservando visualmente o seu caráter híbrido único”.

Aqui, as fotografias “funcionam como um portal para o passado, documentando a arquitectura histórica, os mercados vibrantes, o quotidiano das ruas e as tradições culturais que definiram Macau no crepúsculo do seu estatuto anterior”. Porém, esta mostra é também “um portal para um futuro ‘colorido'”, tratando-se, para as 10 Marias, de um “trabalho esteticamente cativante” e que serve “como um registo histórico e cultural de valor inestimável, destacando o delicado equilíbrio entre a tradição e a modernidade”.

Do livro nasce a mostra

Nascido em 1976, Pedro Ramos viveu em Macau, onde fez o ensino básico e secundário. Depois de se formar em fotografia em Portugal, Pedro Ramos procurava trabalho na área, até que se deparou com a oportunidade de colaborar com o livro “Macau – Os Últimos Cem Dias do Império”, da autoria do jornalista José Pedro Castanheira, que se encontrava no território para escrever a reportagem sobre a passagem de testemunho de Portugal para a China.

“Algumas foram publicadas no livro, outras não. Fiquei com este arquivo fotográfico dos últimos dias da presença portuguesa em Macau. Desde o início de 2000 só voltei a Macau em 2024, fui de férias, e como ando sempre com a máquina resolvi fazer uma cobertura daquilo que gosto em Macau, mas nos tempos mais modernos”, confessou ao HM.

Um contacto com Mónica Coteriano, fundadora das 10 Marias, foi suficiente para trazer cá para fora este projecto, espelhado “na vontade de mostrar um pouco o antes e o depois” do território. Ainda assim, Pedro Ramos explica que esta não é “uma exposição comparativa do antes e depois de determinada zona, ou edifício, não é um trabalho de comparação em que as pessoas vêm uma fotografia do antes e do depois”.

“A exposição está organizada com um grande conjunto de imagens da altura da transição, de 1999. No dia da inauguração senti que estas foram as fotografias que mais tocaram grande parte das pessoas que estiveram presentes, porque puderam rever uma Macau que já não existe da mesma forma. Há depois uma parte com fotografias tiradas no meu regresso”, frisou.

Pedro Ramos diz voltar sempre aos lugares onde foi feliz, e aqui existem “muitos paralelismos visuais”, nomeadamente com sítios mais icónicos como o Hotel Lisboa e Ruínas de São Paulo.

Rever imagens, olhar de novo para alguns momentos e organizar esta mostra constituiu “um dos grandes desafios”. “Tinha todo o trabalho de 1999 impresso, e custou olhar para algumas imagens e, por um lado, houve um acto muito sentimental, mas foi bom poder viajar um bocadinho no tempo.”

Pedro Ramos destaca uma fotografia “muito forte e marcante”, de quando o antigo Liceu de Macau tinha sido transformado numa base militar. “Ainda hoje, quando olho para a imagem, sinto estranheza. Não digo que foi difícil, mas foi estranho, e é uma imagem que me diz muito.”

Vínculo com Macau

Apesar de ter vivido parte da infância e adolescência em Macau, Pedro Ramos mantém um vínculo afectivo ao território desde esses anos. “Sinto sempre que estou de volta a casa e posso dizer que me sinto macaense, porque cresci em Macau e vivi lá um período importante. Quando as pessoas me perguntam como vejo as mudanças, digo que para quem conhece Macau há 30 ou 40 anos como eu, o centro de Macau não mudou assim tanto. O mercado vermelho, as Ruínas de São Paulo, o jardim Lou Lim Ieoc, são locais que continuam a ser muito familiares e se mantêm semelhantes. Acho que, nesse sentido, Macau continua a ser muito igual à cidade que conhecia, embora esteja maior e mais moderna.”

Pedro Ramos disse ainda que a exposição pode prolongar-se um pouco mais em Macau, estando nos planos uma extensão a Portugal. “Estou a tentar apresentar este trabalho em Portugal, mas ainda não iniciei os contactos necessários. Fui incentivado a fazer isso porque a comunidade macaense a viver em Portugal é grande e muitas pessoas, que souberam da exposição, tiveram pena de não conseguir ver.” Destaque ainda para o facto de as imagens estarem disponíveis para venda.

15 Dez 2025

Crime | Governo não divulga dados sobre suicídios e tentativas

Depois de os Serviços de Saúde, também a tutela da Segurança deixou de divulgar os dados de suicídio e tentativas, ao fim de dez anos de publicação. A ausência foi notada na divulgação dos dados da criminalidade relativos aos meses de Janeiro a Setembro deste ano, que mostram o aumento de abusos sexuais de menores para quase o dobro

 

O Governo deixou de divulgar os dados sobre os casos de suicídio ocorridos em Macau, assim como as tentativas. A ausência destes números foi notada pelo jornal Cheng Pou aquando da divulgação na sexta-feira dos dados da criminalidade entre os meses de Janeiro e Setembro deste ano.

A publicação questiona mesmo se “os dados sobre o suicídio se tornaram ‘no segredo que não se pode dizer’ das autoridades, empenhadas em construir uma Macau feliz”, lembrando ainda que estes dados começaram a ser divulgados em 2015. Destaque para o facto de os Serviços de Saúde também terem deixado de divulgar a estatística, algo que era feito a cada três meses. No caso da secretaria para a Segurança, os dados eram mensais e era feita a discriminação por sexo, grupo etária e métodos utilizados.

A ausência de números surge depois de Macau ter batido os recordes em termos de casos de suicídio em 2024, registando 90 mortes, mais 2,27 por cento em relação aos casos de 2023. Face a 2022, o aumento foi de 12,5 por cento. Dos 90 casos, 48 diziam respeito a vítimas do sexo masculino e 42 feminino, com idades compreendidas entre 12 e 76 anos. Os dados mais recentes, relativos ao primeiro semestre deste ano, revelam 41 mortes por suicídio e 101 tentativas.

Na divulgação das estatísticas de crime, na sexta-feira, surge apenas um caso de morte por suicídio em relação a um episódio de homicídio entre irmãos, ocorrido em Agosto deste ano, na zona norte. Aqui, o irmão mais velho terá saltado da varanda, sendo suspeito de ter morto o irmão mais novo devido a disputas financeiras.

Quebra no crime

Olhando para o panorama da criminalidade em termos gerais, regista-se uma queda de 7,1 por cento nos meses em análise, em comparação com o mesmo período do ano passado. As autoridades do território sublinharam a queda acentuada dos delitos informáticos. O secretário para a Segurança, Chan Tsz King, disse que a quebra se deve à “tendência de diminuição” dos “crimes que despertam mais atenção da sociedade”, incluindo criminalidade violenta grave, furto, roubo, burla e crimes informáticos.

Nos primeiros nove meses do ano, foram contabilizados 187 crimes violentos, o que traduz uma queda de 11 por cento face ao período homólogo de 2024 (210). Já os furtos, roubos, burlas caíram 7,7, 5,9 e 23,6 por cento, respectivamente. A criminalidade informática, que contou nos nove primeiros meses de 2024 com 770 casos, apresentou no período em análise uma descida de 52,1 por cento, com 369 casos.

A descida nos casos das burlas com recurso às telecomunicações, burlas cibernéticas e burlas informática, referiu Chan Tsz King, “reflecte a eficácia dos trabalhos de prevenção e combate desenvolvidos pela polícia, e o aumento significativo da consciência do público sobre a prevenção de burla”, disse.

O Governo sinalizou também que a criminalidade relacionada com jogo ilícito disparou entre Janeiro e Setembro deste ano 985 por cento, com mais 394 casos em relação ao mesmo período de 2024. A subida deve-se à entrada em vigor, em Outubro do ano passado, da lei de combate aos crimes de jogo ilícito, que introduziu “o novo crime de ‘exploração de câmbio ilícito para jogo’ e alargou o âmbito de cobertura de alguns crimes conexos com o jogo ilícito”.

Pela mesma razão, disse o secretário, dispararam nos três primeiros trimestres de 2025 os crimes relacionados com o jogo – 1.737 casos, mais 70,1 por cento do que no período homólogo. No passado, referiu o responsável, burlas cometidas por pessoas que trocam ilegalmente dinheiro fora dos casinos “não podiam ser identificadas como relacionadas com o jogo”. “No entanto, com a criminalização da ‘troca ilegal de dinheiro’ e o aperfeiçoamento das disposições legais”, estes casos “são agora incluídos nas estatísticas de crimes de jogo, aumentando assim o número de crimes”, indicou.

Mais abusos de menores

Chan Tsz King, que entrou em funções em Outubro e apresentou na sexta-feira pela primeira vez o balanço da criminalidade, referiu ainda uma subida de 6,1 por cento dos crimes contra a pessoa, com o abuso sexual de crianças a aumentar 86,7 por cento, de 15 casos nos primeiros nove meses de 2024 para 28 casos no mesmo período deste ano.

O secretário explicou que se tratam, essencialmente, de “actos sexuais voluntários entre pessoas da mesma idade”, ocorrendo ainda a “transmissão de fotografias e imagens pornográficas”, sem esquecer casos de “importunações sexuais de gravidade menor”.

Foram ainda “identificados casos que envolveram pessoas com relações familiares, o que merece a atenção da sociedade”, referiu Chan Tsz King, que divulgou os dados das acções de sensibilização para este problema: mais de 70 actividades realizadas pela polícia, que contaram com a participação de mais de 12.000 pessoas, incluindo alunos, encarregados de educação e pessoal docente.

O tráfico e venda de drogas e o consumo de estupefacientes registaram, por sua vez, um aumento de 37,1 por cento, com mais 13 casos, e 72,7 por cento, mais oito casos, respectivamente. Segundo a apresentação do secretário, os 48 casos registados nos três trimestres e o respectivo aumento deve-se “à descoberta de vários casos de tráfico transfronteiriço de droga através do reforço da cooperação policial interna e externa”, destacando-se um caso ocorrido em Setembro, quando foram apreendidos 31 quilos de flor de canábis no valor de 31,77 milhões de patacas. Chan Tsz King referiu que este foi “o maior caso de contrabando de canábis apreendido na história de Macau”.

Entre paredes

No caso do crime de violação, assistiu-se a um recuo do número crimes de violação, para um total de 24 casos, menos 40 por cento do que no mesmo período do ano anterior.

O secretário para a Segurança adiantou que “mais de 70 por cento das vítimas não eram residentes de Macau”, sendo que “a maioria destes crimes ocorreu em quartos de hotel”, enquanto “uma parte destes envolveram conflitos pecuniários entre as vítimas e os suspeitos, não sendo de afastar a hipótese de que alguns dos casos tenham ocorrido num contexto de transacção sexual”.

Neste contexto, o secretário esclareceu que as autoridades policiais têm estado “em comunicação estreita com o sector hoteleiro”, tendo sido reforçados “os dispositivos policiais e inspecções nas zonas periféricas de hotéis e casinos”. Entre Janeiro e Setembro foram realizadas mais de 160 acções policiais de combate à prostituição, tendo sido interceptadas 192 pessoas suspeitas da prática de actividade de prostituição.

Além disso, no período em causa foram resolvidos 17 casos da prática dos crimes de lenocínio ou de exploração de prostituição, com a detenção de 26 suspeitos.

Silêncio de sempre

Questionado pela Lusa durante a conferência de imprensa sobre o primeiro caso a ser investigado em Macau no âmbito da segurança nacional, o secretário não fez comentários. “O caso (…) está a ser tratado pelas entidades judiciais e, devido ao sigilo, não seria adequado ao secretário da Segurança comentar”, completou Chan Tsz King, que era Procurador do Ministério Público quando o ex-deputado Au Kam San foi detido.

A polícia do território anunciou, no final de Julho, a detenção de Au Kam San, a primeira ao abrigo da lei de defesa da segurança do Estado, que entrou em vigor em 2009, tendo o âmbito sido alargado 14 anos depois. Ainda não é conhecida a acusação e não há informações sobre quem vai defender o ex-deputado. Com Lusa

15 Dez 2025

ZAPE | Comerciantes temem pelo futuro

A pouco mais de duas semanas do encerramento total dos casinos- satélite, os comerciantes da Zona de Aterros do Porto Exterior continuam a demonstrar preocupação sobre o futuro dos seus negócios, dado o decréscimo de turistas naquela área. A queda de vendas tem-se acentuado nos últimos meses, segundo testemunhos dados ao jornal Ou Mun

O encerramento gradual dos casinos-satélite na Zona de Aterros do Porto Exterior (ZAPE), que decorre até ao final do ano, está a deixar os comerciantes dessa área da península muito preocupados quanto ao futuro dos seus empreendimentos. Os testemunhos ouvidos pelo jornal Ou Mun falam de quebra nos negócios e de um sentimento de incerteza quanto ao futuro, isto apesar de o Governo e uma associação comercial já terem organizado actividades para dinamizar aquela zona.

Uma das pessoas ouvidas, foi um proprietário de um restaurante, que não quis ser identificado, tendo destacado que, nos últimos meses, o volume de negócios caiu cerca de 30 a 40 por cento face ao passado. Este homem, apontou como uma das principais razões a quebra de clientes com grande poder de compra dos casinos-satélites situados nas proximidades.

O comerciante confessou que a capacidade de compra de residentes locais é limitada, pagando entre 30 a 50 patacas por um pequeno-almoço ou almoço, ou 50 a 80 patacas por um jantar. Disse ainda que os apostadores dos casinos é que sustentam a economia do ZAPE, sobretudo depois das 22h.

O proprietário de um restaurante frisou que mesmo que o Governo coloque no ZAPE decorações sazonais para melhorar o ambiente de negócio e atrair visitantes, ou mesmo com o trabalho realizado por associações comerciais com plataformas locais e da China, os comerciantes da zona continuam pessimistas quanto ao futuro.

Isto porque, na prática, não vêm a tendência de quebra de negócios alterar-se, acreditando que quando todos os casinos-satélite da zona fecharem portas, a perda de clientes será ainda maior. Outro problema que têm de enfrentar, é o custo da renda, pois nesta fase a única discussão que pode ser feita com os proprietários dos espaços comerciais é no sentido de uma redução do valor.

Quebra para metade

Outro dono de restaurante na zona, confessou que também viu o negócio baixar em cerca de 50 por cento nos últimos meses, mostrando-se igualmente pessimista. Porém, garante que consegue manter o negócio caso o Governo conceda apoios.

Este proprietário espera, por isso, que as autoridades concedam mais recursos para atrair os visitantes ao ZAPE, desejando ainda mais actividades realizadas pelo Governo ou pela associação comercial que representa a zona. Caso o volume de receitas continue a sofrer reduções, só lhe resta desistir do negócio, confessou ao Ou Mun.

Numa área de actividade diferente, desta vez um supermercado, um funcionário apontou que o dono já demonstrou a intenção de trespassar o negócio devido à queda das vendas. O entrevistado reconheceu que o ZAPE vai receber, no futuro, diversas actividades e eventos, mas entende que não vão trazer muito impacto no negócio porque o ambiente da zona não é atractivo, não existindo atracções para que os turistas tirem fotografias. Além disso, o funcionário do supermercado lembrou que também não existem lojas com características próprias, ou mais tradicionais.

12 Dez 2025

IN SITU | Seis instalações para pensar o uso de espaços públicos

Chama-se “IN SITU Placemaking Biennale” e, até domingo, traz diversas perspectivas de utilização de espaços públicos em Macau, em locais como o Pátio da Claridade ou a Praça Ponte e Horta. A iniciativa do CURB – Centro de Arquitectura e Urbanismo apresenta, a partir de hoje, workshops e seis instalações: “Letters to Macau”, “UnPlan”, “Multi-Place”, “Resonatorium”, “Furniture Where Life Begins” e “Where Time Crystalizes”

Num território exíguo como Macau, onde turistas e a população local deambula entre a história e o fulgor diário, nem sempre é possível imaginar outras utilizações do espaço público e comum a todos. Mas é precisamente isso que propõe o CURB – Centro de Arquitectura e Urbanismo, com uma nova bienal. A “IN SITU Placemaking Biennale” decorre entre hoje e domingo, trazendo seis instalações desenvolvidas por arquitectos ou artistas locais, bem como workshops que visam a conexão do público com estes projectos.

O programa é variado, mas as seis instalações centram-se na zona mais antiga da península de Macau. Depois de um período de submissão de projectos, não apenas de Macau, mas do estrangeiro, a curadoria da IN SITU decidiu-se por “Letters to Macau”, apresentado na Travessa do Aterro; “UnPlan”, no Largo de Santo Agostinho; “Multi-Place”, que pode ser visto no Largo do Lilau; “Resonatorium”, perto da praça Ponte e Horta; “Furniture Where Life Begins”, no Largo do Aquino; e “Where Time Crystalizes”, no antigo Pátio da Claridade.

O que esta bienal propõe é explorar o conceito de “placemaking”, ou seja, o debate em torno das várias opções para planear e gerir espaços públicos. Segundo uma nota do CURB, trata-se de um “projecto pioneiro” que não é “apenas um festival”, mas sim “uma conversa que envolve toda a cidade”.

O “placemaking” não é mais do que uma teoria em torno das ideias de melhoria da gestão do espaço público com uma abordagem multifacetada, em que a ideia é que todos se sentam e discutem o que é melhor para determinado lugar ou o que poderia ser feito face a uma realidade menos boa.

Durante este fim-de-semana, o IN SITU pretende que “as ruas e praças icónicas de Macau se transformem numa tela viva para o design, diálogo e imaginação colectiva”, com as seis instalações que “irão ligar e activar espaços públicos icónicos”, transformando-os em “espaços para reunir, reflectir e interagir”.

Projectos locais e não só

A bienal foi oficialmente inaugurada ontem, mas só hoje abre portas com diversas actividades. As sessões arrancam às 10h30 com “Where Time Crystalizes”, no Pátio da Claridade, seguindo-se, a partir das 11h, uma actividade de “placemaking”, no mesmo local, intitulada “Time Crystal Lab”.

No caso desta instalação, é desenvolvida por uma equipa local, oriunda do programa de mestrado em Design de Comunicação da Faculdade de Humanidades e Artes da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. Trata-se de um grupo composto por Lei Mei Ian, Wang Shumeng, Jiang Xintong e Xu Huiyao.

“Where Time Crystalizes” é uma instalação “composta por nove formas cristalinas espelhadas e um tapete ondulante que evoca um rio de tempo”, sendo que cada cristal contém fotografias, fragmentos de vídeo e objectos do quotidiano, recolhidos na documentação da autoria de Jason Lei sobre o bairro, ainda antes da saída dos moradores.

Além disso, nesta instalação, as partes exteriores “reflectem a rua actual e os transeuntes, enquanto os interiores encerrados convidam os espectadores a espreitar vestígios do passado”. Pretende-se, com esta obra, conduzir “os espectadores a sentir o fluxo do espaço e a sedimentação da memória”, promovendo “a reflexão sobre a transformação do Pátio da Claridade, de comunidade habitada a espaço vazio, reconsiderando a relação entre pessoas, lugar e tempo”.

Hoje à tarde, a partir das 15h30, apresenta-se “Multi-Place”, no Largo do Lilau, da autoria de Yik Sze Wong, de Hong Kong. Esta instalação apresenta-se como “uma experiência espacial em resposta à mudança urbana”.

“Como podemos questionar e renovar os modelos estabelecidos dos espaços públicos? E como podemos incentivar o público a participar mais activamente na construção e na prática desses espaços? Durante muito tempo, o planeamento e a distribuição dos espaços públicos foram predominantemente conduzidos por designers. No entanto, as cidades são organismos dinâmicos e em constante evolução”, descreve a organização da bienal.

Com “Multi-Place” propõe-se “explorar como os espaços públicos podem responder de forma eficaz às mudanças dinâmicas nas actividades urbanas e nas necessidades da sua utilização”, sendo que a instalação pretende servir “como um terreno experimental para explorar novas formas de espaços públicos, procurando utilizar modelos espaciais flexíveis para estimular a interação comunitária”.

Explorar o centro histórico

Amanhã, o dia da bienal começa também às 10h30, mas desta vez com a apresentação de “Resonatorium”, no Porto Interior, instalação da autoria de Lau Josephn On King e Lawrence Liu.

Tratando-se de uma equipa local, mas com ligações a Hong Kong, em “Resonatorium” a dupla resolveu inspirar-se “nos ecos e reverberações no interior das igrejas, bem como na imagem histórica da capela de madeira que outrora se erguia no local da Igreja de São Lourenço”.

Trata-se, assim, de uma obra que “constrói uma ressonância pertencente exclusivamente ao passado e ao presente do sítio”, sendo composta por módulos sonoros em madeira, “formando um espaço arquitectónico semi-aberto, no qual a própria estrutura se torna um corpo ressonante”. As sonoridades e a estrutura acarretam simbolismos ligados à Igreja de São Lourenço, o cais do Porto Interior, o bairro do Largo de Santo Agostinho, a Avenida de Almeida Ribeiro, sem esquecer “o futuro de Macau”.

A tarde de sábado fica reservada para uma instalação oriunda de Portugal, “UnPlan”, do atelier FAHR 021.3, criado por Filipa Frois Almeida e Hugo Reis. A partir das 15h30 pode ser visitada esta instalação temporária “concebida para oferecer uma nova perspectiva sobre o espaço público”, estando inserida “num tecido urbano denso, marcado pela circulação, vigilância e rotina”.

Desta forma, é uma “peça que introduz um momento de pausa, como um objecto simultaneamente familiar e estranhamente deslocado”, em que “em vez de prescrever comportamentos, propõe uma superfície aberta que convida a novas formas de planear, ocupar e imaginar”.

Domingo, é dia de explorar “Letters to Macau”, um projecto internacional da Chaal Chaal Agency (CCA), um colectivo de design e investigação fundado pelos arquitectos e investigadores Kruti Shah, da India, e Sebastián Trujillo-Torres, de Espanha.

Aqui pretende-se reinterpretar “o marco de correio tradicional da cidade como um dispositivo urbano de reflexão, correspondência e imaginação cívica”. Descreve a organização da bienal que “Letters to Macau” inspira-se “no vocabulário espacial estratificado de Macau, com portas lunares, pátios, becos e passagens de jardim, para criar uma estrutura simultaneamente familiar e reinventada”.

Desta forma, “os visitantes são convidados a escrever cartas dirigidas à cidade, partilhando memórias, desejos ou propostas de renovação”, sendo que “cada carta é depositada na estrutura, acumulando-se ao longo da Bienal e transformando gradualmente a instalação num arquivo cívico colectivo”.

Esta instalação foi construída a partir de dez painéis de contraplacado cortados por CNC, sendo a estrutura fabricada através de métodos simples e reversíveis, como o encaixe, a fixação e o empilhamento, que permitem uma montagem, desmontagem e reutilização rápidas. “Os seus planos interligados geram diferentes graus de abertura e de encerramento, enquadrando vistas longitudinais e transversais em resposta à verticalidade estreita do tecido urbano do Porto Interior”, descreve-se ainda.

Além das seis instalações centrais, esta bienal traz diversos eventos complementares. Hoje à tarde, entre as 16h e as 17h, decorre, na Ponte 9, o “Pressed Echoes of the Inner Harbour – Urban Flora Workshop”, sendo que entre as 18h e as 19h acontece, na praça Ponte e Horta, o “AAFK x Resonatorium Sound & Paint”. Amanhã, entre as 16h e as 17h, é tempo de acontecer o “Three Lamps of Inclusion: Culture Experience and Dialogue Workshop”, no Largo de Santo Agostinho, seguindo-se o evento “The City Breathes”, no Largo do Lilau. À noite, entre as 20h30 e as 21h20, é tempo de música e meditação com uma performance dos NÁV, no Largo de Santo Agostinho.

No domingo, tem lugar uma actividade de “placemaking” entre as 11h e as 12h no Largo do Aquino, intitulada “Love Me? Destroy Me!”, seguindo-se uma leitura colectiva em torno da instalação “Letters to Macau” entre as 16h e as 17h, na Travessa do Aterro Novo. A bienal termina com a actividade, entre as 18h e as 18h30, intitulada “Furniture Adoption”, no Largo do Aquino. O programa inclui ainda diversas visitas guiadas.

12 Dez 2025

Salários | Patrões queriam aumento no “mínimo possível”

O patronato defendeu a manutenção do actual valor do salário mínimo, de 34 patacas por hora, e no caso de ter de haver uma actualização, que esta ocorresse no mínimo valor possível. Já os trabalhadores, pediam um aumento de três patacas, para 37 patacas por hora.

Estas informações constam no parecer da Assembleia Legislativa (AL) relativo à revisão da lei do salário mínimo, que será votada na especialidade na quinta-feira da próxima semana, juntamente com o Orçamento para 2026. Em Novembro, os deputados aprovaram na generalidade, com três abstenções, a actualização do salário mínimo em apenas uma pataca, de 34 para 35 patacas à hora. Trata-se de um aumento de 2,9 por cento, o que, por mês, perfaz 7.280 patacas.

As informações fornecidas pelo Governo aos deputados, sobre as posições demonstradas em sede de concertação social, mostram que os representantes dos trabalhadores defenderam que “o valor sugerido [pelo Executivo] era demasiado baixo e não conseguia garantir o rendimento dos trabalhadores com baixos salários”. Por isso, “o mesmo deveria ser aumentado três patacas, passando o salário mínimo, por hora, a ser de 37 patacas”.

Pelo contrário, “a opinião dos representantes da parte patronal era de que, nesta fase, não era adequado aumentar o nível do salário mínimo, e se o Governo acabasse por considerar necessária a actualização, os mesmos esperavam que o aumento fosse mínimo”.

Ainda do lado dos trabalhadores, apontou-se que “a actualização do salário mínimo não consegue acompanhar a evolução real do custo de vida, pelo que os procedimentos da revisão devem ser aperfeiçoados, com a implementação de uma verdadeira ‘revisão bienal’ e o estabelecimento de um mecanismo de actualização baseado em fórmulas”.

Defendeu-se também “que o aumento do salário mínimo tem um efeito de reacção em cadeia, podendo contribuir para impulsionar a actualização da remuneração dos trabalhadores que não auferem salários baixos”.

O medo das PME

Ainda face ao que foi dito na concertação social, os patrões “consideraram que, devido à recuperação desequilibrada da economia, as Pequenas e Médias Empresas enfrentam pressões significativas ao nível de custos”, pelo que, com o aumento do salário “as empresas podiam precisar de transferir custos, levando ao aumento dos preços”.

“Não se excluía a possibilidade de as mesmas diminuírem o número de trabalhadores não permanentes para reduzir as despesas, resultando na redução de oportunidades de emprego e no aumento da carga de trabalho dos trabalhadores a tempo inteiro”, foi defendido pelo patronato.

Da parte dos deputados da primeira comissão permanente, responsável pela análise do diploma na especialidade, pediu-se que o Governo “tome como referência a prática das regiões vizinhas para aperfeiçoar o mecanismo de revisão” do salário mínimo, definindo-se “critérios quantitativos e fórmulas de cálculo mais científicas para a actualização do valor”.

O Governo explicou aos deputados que “passaram apenas cinco anos desde a implementação da lei” do salário mínimo, pelo que é “preciso tempo para observar as alterações trazidas pela sua implementação”. “No futuro vai ser ponderado o aperfeiçoamento do mecanismo de revisão do valor do salário mínimo de acordo com a situação real” de Macau.

Na prática, 18.200 trabalhadores serão abrangidos por este aumento salarial, o que, excluindo os trabalhadores domésticos, representa 4,4 por cento do total da força laboral de Macau. Desta fatia, 2.200 são trabalhadores locais e 16.000 não residentes, ligados a actividades imobiliárias, hotelaria. “Os principais grupos de beneficiários são os trabalhadores que exercem funções de segurança e limpeza”, descreve o parecer.

12 Dez 2025

Albergue SCM | Trabalhos de Zhang Lanpo, um dos maiores fotógrafos da China, em exposição

“Above the Abyss” [Acima do Abismo] apresenta em Macau o trabalho fotográfico de Zhang Lanpo, tido como um dos maiores fotógrafos da actualidade na China. A abertura ao público deu-se ontem, no Albergue da Santa Casa da Misericórdia de Macau, e as imagens podem ser vistas até Fevereiro do ano que vem. Mas nem só de imagens captadas se faz esta exposição, que inclui também trabalhos de pintura

A programação cultural do Albergue da Santa Casa da Misericórdia (SCM) inclui nova exposição a semanas de o ano de 2025 chegar ao fim. Trata-se de “Above the Abyss – Exposição Individual de Zhang Lanpo”, considerado um dos maiores fotógrafos da China, apesar desta exposição trazer também obras de pintura.

A inauguração decorreu ontem, podendo esta mostra ser vista na Galeria A2 do Albergue SCM até 15 de Fevereiro. Trata-se de um projecto que visa celebrar os 26 anos de criação da RAEM, e também da transferência de administração portuguesa de Macau para a China.

Zhang Lanpo nasceu em Lanzhou, possui um mestrado em Belas-Artes pela Academia de Belas-Artes de Guangzhou e reside em Zhaoqing, Guangdong. O comunicado do Albergue SCM destaca que este é “reconhecido entre os 20 melhores fotógrafos contemporâneos emergentes da China”, sendo também “considerado uma das figuras mais representativas no campo da fotografia conceptual chinesa”.

“A sua prática distingue-se pela sua profunda profundidade intelectual e pela sua ampla investigação sobre os limites da existência e da consciência humanas. Indo além da estética pura, as obras de Zhang envolvem-se em discursos críticos e filosóficos que as posicionam no centro do debate sobre a arte contemporânea chinesa”, lê-se ainda.

Os temas do seu trabalho fotográfico centram-se na morte, mas sempre “com o objectivo de reconstruir uma visão da vida”. No Albergue SCM, podem ver-se 16 trabalhos de Zhang, pintura e fotografia, apresentando “uma linguagem visual única”, em que “o artista conduz o público numa viagem flutuando acima do abismo”.

“A obra não é meramente uma apresentação visual, mas uma reflexão profunda sobre a história, a memória e a humanidade, reexaminando criticamente a realidade percebida pelo público”, descreve-se.

Vida Vs Morte

A carreira de Zhang Lanpo já vai longa e foram muitos os espaços museológicos onde expôs, nomeadamente no Museu Internacional de Design da China, o Museu YOUART de Suzhou, o Museu de Arte Times de Chengdu ou ainda o Museu de Arte de Guangdong.

Numa nota biográfica sobre o artista e fotógrafo, refere-se que em cada peça de grande escala, tendo em conta que alguns projectos podem demorar até oito meses a ficar concluídos, Zhang “incorpora um trabalho meticuloso e camadas intricadas de metáforas e detalhes visuais”.

Ainda sobre as temáticas do seu trabalho, a morte e a vida, é referido que “num mundo de vida eterna, que é muito mais distante e extenso do que o mundo da vida, ele enfrenta uma escolha difícil ao reexplorar as profundezas da natureza humana”.

No seu trabalho, observa-se “a história contraditória da funcionalidade e do excesso, do crime e da punição, da humanidade e da divindade, do pensamento e do julgamento, da ocultação e da revelação”, sendo “esta série de contradições que o leva a continuar a reflectir e a descobrir este tema”.

11 Dez 2025

Pagamentos online | Crescimento anual de 2,4% em restaurantes

O sector da restauração registou, em Outubro deste ano, um aumento de 12 por cento em termos mensais e 2,4 por cento em termos anuais no que diz respeito a pagamentos electrónicos.

Segundo os dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), tal deve-se aos dias de feriados da Semana Dourada de Outubro. O montante das transacções neste sector foi, em Outubro, de 1,16 mil milhões de patacas, sendo que apenas nos dez primeiros meses deste ano se gastaram em restaurantes 11,26 mil milhões de patacas, um aumento anual de 2,2 por cento.

Ainda em Outubro, o volume de transacções dos proprietários de todos os sub-ramos da restauração subiu face a Setembro de 2025. Destaca-se que o volume de transacções dos restaurantes ocidentais e o dos restaurantes chineses aumentaram 25,3 e 20,7 por cento, respectivamente. Em comparação com Outubro de 2024, o volume de transacções dos proprietários de todos os sub-ramos da restauração também subiu.

De realçar que o volume de transacções dos restaurantes de comida rápida e o dos restaurantes ocidentais cresceram 13,5 e 7,3 por cento, respectivamente. Por sua vez, as transacções digitais no sector do retalho aumentaram ainda mais em termos mensais, 27 por cento, mas, em termos anuais, o aumento foi menor, de apenas 0,6 por cento.

11 Dez 2025

Burlas | TSI mantém pena de quatro anos de prisão

O Tribunal de Segunda Instância (TSI) decidiu manter a pena de quatro anos de prisão efectiva, sem possibilidade de suspensão na sua execução, de um homem que causou um prejuízo de 300 mil patacas a idosos pela prática de burla telefónica, ao fazer-se passar por familiar das vítimas.

O caso remonta a Junho do ano passado, quando o arguido ” e demais parceiros planearam telefonar a idosos em Macau, fingindo ser familiares, a fim de lhes pedir dinheiro, com o fundamento na necessidade urgente de fundos para pagamento de uma indemnização”.

O acórdão do TSI, ontem divulgado, dá conta que o homem foi condenado, em primeira instância, pela prática, na forma consumada, de um crime de burla de valor elevado, um crime de burla de valor consideravelmente elevado e um crime de usurpação de funções. Foi também condenado, “na forma tentada, de um crime de burla de valor consideravelmente elevado”, com o cúmulo jurídico de quatro anos de prisão. O homem foi ainda condenado a pagar 200 mil patacas e 100 mil dólares de Hong Kong a duas pessoas como indemnização por danos patrimoniais. O acusado recorreu da decisão, mas o TSI rejeitou o recurso, mantendo a pena inicial.

11 Dez 2025