David Chan Macau Visto de Hong Kong VozesEstacionamento inteligente [dropcap]N[/dropcap]o passado dia 25 de Março, o Departmento de Transportes do Governo de Hong Kong apresentou uma proposta ao Conselho Municipal do Distrito de Sham Shui, para a construção de um parque de estacionamento inteligente, em Sham Shui Po. A área destinada ao parque tem cerca de 3.400 metros quadrados. As instalações terão a forma de uma espiral e os espaços de estacionamentos vão ser circulares. O estacionamento será inteiramente controlado por um sistema informático automatizado que incluirá uma rede de “paletes automáticas”. Este design permite maior facilidade e rapidez de estacionamento. No rés do chão do complexo prevê-se a construção de jardins, parques infantis e ginásios. Dia 7 deste mês, a Autoridade de Renovação Urbana de Hong Kong fez novas propostas para a construção do primeiro parque inteligente de Hong Kong, administrado por um sistema de estacionamento informatizado, responsável pelo controle das “paletes automáticas”. As paletes automáticas efectuam o estacionamento dos veículos. Primeiro o condutor pára o carro à entrada do parque e depois faz o seu registo no sistema. Quando este processo está concluído, a palete automática vai buscar o carro, introduzindo-se na parte de baixo do veículo e depois eleva-o para proceder ao transporte. O espaço de estacionamento é detectado automáticamente, bem como a trajectória até ao local. Este mecanismo de transporte está equipado com um sensor que lhe permite desviar-se dos obstáculos e evitar colisões. A Autoridade de Renovação Urbana alertou para o facto de não existir qualquer tipo de legislação que regule este sistema automatizado. Esta falha vai criar algumas dificuldades à aprovação do projecto por parte do Governo de Hong Kong. O conceito de parques de estacionamento inteligentes foi importado de Singapura. De forma a evitar o congestionamento do tráfego e as emissões de dióxido de carbono, Singapura tem encorajado o uso de bicicletas. Mas, tal como os carros, as bicicletas também necessitam de locais para estacionar. Se forem deixadas na rua, podem bloquear a circulação e, além disso, podem ser roubadas. Por causa disso, o Governo de Singapura criou um parque inteligente para estacionar bicicletas, com capacidade para albergar 500 unidades. Antes de entrar, o utilizador tem de se registar no sistema informático do parque, recebendo de seguida a password que lhe permite estacionar a bicicleta. O processo de estacionamente automático leva menos de um minuto a efectuar-se. Este sistema de estacionamento inteligente foi inventado no Japão, onde está em funcionamento já há algum tempo. É pois expectável que o novo parque de Hong Kong venha a funcionar às mil maravilhas. E que lições pode tirar Macau desta experiência? A 17 de Maio de 2018, o Governo da RAEM publicou a “Estratégia para o desenvolvimento da cidade inteligente de Macau e a construção nas áreas principais – Consulta Pública” . As plataformas automáticas de Singapura podem vir a ser tomadas em linha de conta para a implementação deste projecto em Macau. Macau tem imensos habitantes e, desde há muito tempo, que se sente a falta de parques de estacionamento na cidade. À noite, sobretudo, vêem-se bastantes carros estacionados na estrada. Este estacionamento desordenado provoca o caos, dificultando a circulação de veículos e de peões. Todos sabemos que durante a passagem dos super tufões Hato e Mangkhut em Macau, em 2017 e em 2018, muitos carros estacionados em parques subterrâneos ficaram literalmente desfeitos, devido às cheias. É urgente construir na cidade mais parques de estacionamento, em estruturas acima do solo. Quer do ponto de vista da vida do dia a dia, quer do ponto de vista do desenvolvimento urbano, os parques inteligentes são indispensáveis. Para estabelecer uma rede de parques inteligentes, são necessárias leis que os regulamentem. Embora exista em Macau muita legislação rodoviária, não existem leis que tenham em consideração as questões levantadas pelos parques inteligentes. Por isso, se quisermos construir parques inteligentes, temos de criar a respectiva legislação e agir antecipadamente.
Hoje Macau SociedadeUrbanismo | Quatro edifícios em zona de protecção vão ser reconstruídos [dropcap]S[/dropcap]ão dez os projectos de Planta de Condições Urbanísticas que entraram ontem em procedimento de divulgação, exposição e consulta pública, quatro deles localizados na zona de protecção de património cultural, de acordo com a Rádio Macau. O Plano inclui o edifício de propriedade privada sito no número 51 da na Rua dos Mercadores e nos 30-32 da Rua Oeste do Mercado de S. Domingos. De acordo com o projecto em consulta, a construção com finalidade não industrial, tem 9,8 metros de altura, mas admite-se o limite máximo de 20,5 metros bem como o aumento de dois pisos recuados. Recorde-se que o Instituto Cultural, em Outubro de 2018, impôs restrições de utilização de materiais e que “o desenho das novas fachadas deve ter em consideração a tipologia arquitectónica dos edifícios existentes ao longo da Rua dos Mercadores”, revela a mesma fonte. Outro projecto em zona de protecção situa-se no número 360 da Avenida de Almeida Ribeiro com 16,4 metros e no número 2 do Beco do Paralelo com quatro metros. Trata-se de uma construção com uma fachada a preservar sem aumento de cércea e com a preservação das características espaciais da arcada. Aqui, o IC admite a possibilidade de aumentar a altura para 18 metros no plano interior da arcada e determina restrições no uso de materiais e tipologia arquitectónica que terá de ser “harmonizada com as características do edifício original como um todo”. Já o número 43 da Rua dos Faitiões está dividido em duas parcelas, sendo que o IC num parecer emitido em 2018 admite a sua reconstrução segundo a fachada original. O quarto projecto integrado em zona de protecção é uma vivenda na Estrada da Penha e o IC exige que a construção tenha características de habitação unifamiliar com um máximo de nove metros, preserve a vegetação e a manutenção de árvores de grande porte, bem como restrinja materiais e cores. A consulta termina a 25 de Fevereiro.
Sofia Margarida Mota EntrevistaSofia Pinto Ribeiro, jurista: “O mercado do jogo não é fidedigno nem objectivo” A criação de um Observatório da Cidade é a proposta defendida pela jurista Sofia Pinto Ribeiro na sua tese de mestrado que vai ser editada online pela Fundação Rui Cunha. A ideia é simples, reverter parte das contribuições financeiras das concessionárias para a criação e uma Fundação que reuniria especialistas mundiais para pensar a cidade e sugerir acções ao Governo. Esta contribuição para a fundação seria uma contrapartida a exigir nos próximos contratos de exploração da indústria do jogo [dropcap]C[/dropcap]omo surgiu a ideia de fazer esta tese de mestrado em que avalia o impacto do jogo na construção e dinâmica da cidade e propõe que as concessionárias participem na construção de um território sustentável? Penso que o facto de ter vivido em Macau nos anos 80 e de ter regressado em 2012 me influenciou muito, isto porque me espantou a gigantesca transformação e o impacto extraordinário que a indústria do jogo tem na cidade. Andei muito tempo a pensar numa forma de abordar esta massiva transformação, associar as duas coisas – jogo e cidade – e procurar traçar um caminho e uma aposta para o futuro. Na tese, a par com a indústria, acabei por historiar o urbanismo de Macau desde a instalação dos portugueses no séc. XVI até agora, e fui um bocadinho mais longe porque acabei por investigar todos os organismos que podem ter algum tipo de poder a este nível. Ainda que estes organismos sejam pouco eficazes porque têm basicamente poderes consultivos, têm também imensos poderes que se sobrepõem. São várias comissões, conselhos, etc. Acho que tudo isto leva a uma certa entropia no desenvolvimento urbano. Portanto, a tese culmina com uma proposta de participação das concessionárias na construção da cidade. Qual é essa proposta? Proponho a criação de uma fundação. É muito curioso observar a evolução do contrato de concessão com a STDM de 1961 e que só termina em 2001. Neste contrato, e detendo a STDM o monopólio da concessão, há um conjunto muitíssimo expressivo de obrigações para a concessionária que tradicionalmente até seriam obrigações dos poderes públicos. A STDM tinha um conjunto de contrapartidas previstas nos seus contratos que não são meramente financeiras e estão muito além disso porque têm um impacto grande para a cidade. Exemplo disso é a elaboração do plano de elaboração dos novos aterros do Porto Exterior, o financiamento de metade do Centro Cultural, a sua participação em parte do aeroporto, ou seja ajuda em projectos públicos de grande impacto. Além daquelas contrapartidas típicas de manter um casino, um hotel de luxo, etc., tem outras. Outro exemplo foi o facto da STDM ter que assegurar os transportes marítimos entre Macau e Hong Kong. Gera um monopólio, é certo, mas independente desta outra consequência, estas são obrigações tradicionalmente atribuídas aos poderes públicos. Inspirada na história, e nos primeiros contratos com a STDM em que o Governo ganhava imenso com o dinheiro, a STDM ganhava com outro tipo de vantagens e a cidade em si também saía a ganhar, proponho aquilo que seria uma parceria “win-win”, com a criação de uma fundação. E em que é que consta essa fundação? Andei muito tempo a pensar como é que havia de casar estes dois assuntos: concessionárias e desenvolvimento urbanístico. Um dia tomei conhecimento de um projecto que funciona na London School of Architecture – LSA Cities – em que o objectivo é estudar em grandes urbes a ligação entre as pessoas e o espaço urbano que é um espaço em permanente transformação. Ora, este projecto é patrocinado pelo Deutch Bank. Um banco é talvez a organização económica mais capitalista que existe e se um banco pode fazer isto, porque não um casino fazer uma coisa inspirada nesta ideia tendo em conta o passado dos contratos com a STDM. Neste sentido, o que pensei foi que, de entre as contrapartidas que se podem exigir às concessionárias e tendo em conta que os resorts já estão feitos, não parece que faça sentido continuar a exigir, na renovação de contratos, mais resorts integrados. O que resta? Obrigações financeiras? As obrigações financeiras não têm que esgotar o pacote e acho, aliás, que dada a presença hegemónica das concessionárias na cidade, o impacto extraordinário que tiveram e a forma como conseguiram modificar a cidade, é de todo legítimo exigir que participem activamente do seu desenvolvimento. Daqui nasce a sugestão que acabei por desenvolver na tese: nos novos contratos de concessão deve constar a obrigação por parte das concessionárias de fundarem uma fundação em que todas tenham participação e em que o Governo participe através de um conselho e curadores. Isto seria uma forma de influenciar o funcionamento desta fundação. Esta fundação, a que chamei de Observatório da Cidade, teria como objectivo pensar a cidade em todas as suas dimensões e em todas as suas refracções. Para isso deveria chamar, não talentos, mas especialistas mundiais nas mais diversas áreas: arquitectura, demografia , geriatria, sociologia, trânsito, tudo o que de facto possamos imaginar que tem um impacto na urbe. A cidade está a envelhecer, não está pensada para deficientes, tem problemas de trânsito e de infra-estruturas. Seria uma espécie de “think tank” que pensaria a cidade para propor políticas públicas ao Governo. É evidente que aqui entraria depois o poder discricionário do Governo, ou seja, o de aceitar ou não aceitar estas sugestões, mas pelo menos este teria informação que lhe permitisse tomar melhores decisões. FOTO: Sofia Margarida Mota Como é que este observatório funcionaria, por exemplo a nível de financiamento? A fundação seria financiada pelas concessionárias. Nem acho que tenha que haver alteração ao status quo ou seja, as concessionárias já contribuem com 1,6 por cento para a Fundação Macau e com 2,4 por cento para o desenvolvimento urbanístico. O que acho é que este dinheiro pode ser fraccionado. É evidente que isto vai causar celeumas. Mas, como também digo na tese, o poder político serve para tomar decisões. Portanto, em vez de 1,6 por cento para a Fundação Macau, passa a ir outra percentagem e divide-se o valor, de alguma forma, entre a Fundação Macau e este observatório. Mesmo assim estamos a falar de uma barbaridade de dinheiro. Por outro lado, o dinheiro que vai para o desenvolvimento urbanístico também pode ser dividido porque, de facto, esta fundação tem tudo que ver com este sector e, nessa medida, faz todo o sentido que esse dinheiro seja canalizado para o observatório. Claro que também acho que esta ideia é virtualmente geradora de uma grande reacção por parte da Fundação Macau, mas nem sequer implica, para as concessionárias, uma maior obrigação financeira do que aquela que já existe. Implica, claro, outro tipo de envolvimento mas que acho que é perfeitamente justo de se exigir. Como é que isso se operacionaliza, por exemplo, na renovação de contratos que está prestes a acontecer? Os primeiros contratos terminam já em 2020 – a concessão da SJM e a subconcessão do MGM. A contribuição para a nova fundação deveria ser um requisito para se avançar com os novos contratos de concessão. Por outro lado, penso que o problema das subconcessões é um problema que tem que ser resolvido, até porque ao contrário do que defendem outros juristas, para mim as subconcessões são ilegais. Agora em 2020 temos uma questão a resolver primeiro e que é como tratar o final dos contratos de concessão e de subconcessão. A lei tem uma disposição que permite que, caso os contratos não tenham todos o mesmo prazo, que o prazo seja igualado. Isso é o que acho que vai acontecer. É uma solução inteligente colocar estes contratos em paridade uns com os outros. A proposta que faço é uma proposta que terá força nos contratos de renovação, ou seja se o Governo renovar tem alguma força negocial porque naturalmente as concessionárias terão interesse na renovação o que faz com que o Governo tenha outra capacidade de fazer exigências. No entanto, esta exigência também é perfeitamente legítima, e até se calhar mais eficaz, no âmbito de novos contratos. Isto porque são contratos a ser negociados de raiz e provavelmente com prazos muito mais longos do que se houver uma renovação que não sabemos em que termos vai acontecer. Acha que vai haver mais concessões? Não tenho exactamente uma opinião sobre isso. O que de facto acho é que não sabemos muito bem com quantas operadoras lidamos actualmente. Oficialmente temos três concessionárias e três subconcessionárias. Depois temos parcerias entre as concessionárias e outras operadoras de jogo que não sabemos muito bem o que são. Aliás, há um especialistas americano do sector que vem algumas vezes a Macau, Nelson Rose , que chama muitas vezes a atenção para isso: não sabemos com o que estamos a lidar. O mercado do jogo não é fidedigno nem objectivo. Ao abrigo destas parcerias que são admitidas não se sabe com base em quê, desconhecemos quantos operadores de facto estão no mercado. O que acho é era precisa que pelo menos uma situação mais rigorosa. Há uma referência na sua tese a Berlim enquanto exemplo de aproveitamento de espaço. “Ao contrário de Berlim, que soube usar a oportunidade de ocupar o espaço deixado pelo muro com a melhor arquitectura e urbanismo do mundo, Macau ainda não soube e não quis chamar os melhores a desenhar a cidade”, aponta. O que quer dizer com isto, quando se fala de Macau? O que justifica a necessidade de especialistas é o estado a que a cidade chegou e a necessidade de ter um plano integrado. A referência a Berlim é um apontamento que encontrei numa revista portuguesa de arquitectura que foi inteiramente dedicada aos 10 anos da transferência de administração e essa passagem está aí como ilustração de uma oportunidade que se perdeu. Ou seja, enquanto Berlim, quando caiu o muro, aproveitou a oportunidade para construir ali uma zona de referência na cidade em termos arquitectónicos, Macau quando se abriu ao Jogo, deixou as operadoras fizessem o que quisessem. Acho que Macau se deixou capturar pelos interesses privados. Um exemplo, apontado por um conferencista, Charles Landry, há uns tempos aqui em Macau é o caso do Venetian. Depois de mostrar um slide de Veneza e um slide do Venetian em Las Vegas diz “este é uma cópia do outro, e em Macau o Venetian é uma copia do Venetian que é uma cópia de Veneza”. Portanto, houve uma admissibilidade ou tolerância à repetição e à cópia. Não houve preocupação com aquilo que aí ser construído e com a identidade da cidade. Neste momento temos um Cotai que não é coisa nenhuma, é uma coisa perfeitamente descaracterizada que até tem uma Strip à semelhança de Las Vegas. Já é tarde de mais para voltar atrás? Acho que em certa medida é tarde de mais, de facto. Mas apesar de tudo e como sou esperançada proponho precisamente esta fundação. Claro que não sou ingénua. Senti muito entusiasmo com esta ideia, e acho de facto que é exequível embora seja ambiciosa. Mas também tenho a noção que ela não vai interessar a muita gente. A ideia parte de uma esperança que é a esperança que ainda se possa fazer algo de positivo para a comunidade. Tenho esta convicção de que as pessoas perderam o direito à cidade e acho que isso não é aceitável. Não é aceitável receber milhares de turistas todos os dias e os locais não poderem circular, não é aceitável o custo de vida ter chegado aos valores que chegou. Há uma série de coisas que são reflexo desta hegemonia das concessionárias que, se não puder ser revertida, porque isso dificilmente será, tem que ser minimizada e trabalhada de modo a contemplar a cidade, a sua identidade, o seu património, a sua população com os seus idoso, as suas crianças, todas as suas camadas. A partir do momento em que exigem resorts integrados, porque é que não exigem coisas que no fundo projectem Macau a outros níveis, no mundo. Não temos que ter só uma indústria do jogo. A cidade tem que ser ambiciosa e tem que estar motivada para ser melhor. Macau tem-se degradado nas suas condições e na sua sustentabilidade. Precisamos de uma cidade vivível, transitável, equilibrada e a fundação que proponho vai no sentido de proporcionar, ou pelo menos de tornar possível a adopção de políticas públicas que favoreçam outro modelo de cidade. Acho sobretudo que temos que ser mais ambiciosos, mais capazes e mais arrojados. O poder público tem que ter essa ambição. O facto de querermos apenas ser a cidade mais rica do mundo não me parece que seja suficiente. A RAEM é muito rica mas depois está cheia de problemas que têm urgência em ser resolvidos.
Andreia Sofia Silva EventosExposição | “Cidade Ilustrada” para ver no espaço Ponte 9 até Janeiro O Centro de Arquitectura e Urbanismo, localizado no espaço Ponte 9, recebe até 4 de Janeiro a exposição da artista Winky Lam, intitulada “Cidade Ilustrada”. O objectivo é estabelecer uma interacção com o público, que pode pintar um painel de 18 metros de comprimento [dropcap]P[/dropcap]or estes dias a realidade é transformada pela via da imaginação no espaço Ponte 9, localizado na zona da Barra e que serve de casa ao Centro de Arquitectura e Urbanismo (CURB). Nuno Soares, arquitecto e presidente desta associação de cariz cultural, é o curador de “Cidade Ilustrada”, a exposição de Winky Lam que estará aberta ao público até ao próximo dia 4 de Janeiro. Lam, licenciada em artes visuais pelo Instituto Politécnico de Macau (IPM) e docente no Colégio Diocesano de São José, criou um painel de 18 metros de comprimento que pode ser pintado por todos aqueles que visitem a exposição. “Tinha esta ideia desde o início do ano de fazer uma exposição que fosse aberta a todas as idades e que trouxesse famílias ao CURB para participar nesta obra colectiva”, começou por contar Nuno Soares ao HM. O arquitecto queria mostrar o trabalho de um artista de Macau “que fizesse um panorama urbano da cidade e que depois os participantes viessem e editassem esse panorama”. A inauguração aconteceu no passado sábado e contou com a presença de 50 pessoas, que pintaram o mercado vermelho de cor verde e transpuseram para o painel elementos de diferentes culturas que coexistem no território. “Há intervenções imprevistas, como um espaço que a Winky desenhou de Macau em que foi feito um telhado, semelhante aos que existem nos templos, e depois alguém desenhou um relógio tradicional com ingredientes de mercearia chinesa.” Apesar de todas as transformações a que a obra estará sujeita até Janeiro, Nuno Soares garante que o traço original do artista se mantém. “Acho que o trabalho da artista está muito evidente. A ideia não é que as outras pessoas pintem a ideia da Winky, mas sim que haja mesmo uma colaboração. Há um traço marcante que organiza toda a exposição, pois vê-se a mão do artista, mas vê-se muito outras coisas por cima disso.” Uma questão de respeito A ideia por detrás de “Cidade Ilustrada” é que Macau é um território feito e construído a várias mãos e com diferentes perspectivas. Nuno Soares quis promover “um diálogo entre o artista, o CURB e a população em geral, tendo esta ilustração como base”. “Foi a primeira vez que organizamos um evento deste género. Foi muito surpreendente e muito agradável. Passamos a tarde com a artista e surpreendeu-nos muito o resultado, porque há um desenho base e depois as pessoas vão pondo a sua interpretação por cima, os seus pormenores e cores. É uma ilustração muito longa e colorida, tem zonas diferentes mas fica coerente”, acrescentou Nuno Soares. Para o arquitecto, a presença de várias mãos a editar a obra mantém “o respeito, a colaboração e uma interacção muito interessante”. “Cidade Ilustrada” é uma exposição que conta com o apoio do Instituto Cultural e da Associação para Desenvolvimento de Mulher Nova de Macau, recentemente criada. A iniciativa encerra o plano de actividades do CURB para este ano, que recentemente trouxe para o território o Open House Macau, um evento mundial que levou a população aos principais monumentos e espaços arquitectónicos da cidade.
João Santos Filipe Manchete PolíticaCooperação | Raimundo do Rosário lança política de grandes obras em prol da integração Qualquer cidade da Grande Baía à distância de uma hora, uma maior cooperação entre as polícias de Macau, Hong Kong e Cantão e oportunidades, principalmente para os mais jovens. Foram estas as mensagens deixadas pelos secretários do Governo no fórum sobre o projecto nacional de cooperação regional [dropcap]T[/dropcap]odas as onze cidades da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau a uma hora de distância. É este um dos grandes objectivos dos governos envolvidos na iniciativa e Macau vai investir nas grandes infra-estruturas para completar o seu papel. O cenário foi traçado pelo secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, durante o “Fórum de Juventude sobre Construir em Conjunto a Grande Baía”, no sábado. Na sua intervenção, Raimundo do Rosário destacou o objectivo de construir vias de comunicação para que “as ligações entre as várias cidades da Grande Baía se façam apenas em uma hora”. Neste sentido, o secretário prometeu que a RAEM vai “construir várias infra-estruturas e proceder aos respectivos estudos com o objectivo de uma coordenação conjunta, incluindo a construção de um novo posto fronteiriço Macau-Guangdong”. No entanto, não foi especificada a localização desta futura fronteira. Por outro lado, o secretário avançou com a possibilidade de serem construídas ligações ferroviárias de alta velocidade, interurbanas ou de metro ligeiro, com a condição de antes serem realizados estudos. Por sua vez, o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, defendeu que a zona da Grande Baía traz novos desafios ao nível da segurança e que as polícias de Macau, Hong Kong e Cantão lançaram um novo programa de cooperação nesse sentido. Segundo Wong, esta é a forma encontrada para modernizar as polícias das três regiões, assim como “o intercâmbio, a comunicação e a coordenação”, ao mesmo tempo que se implementam mecanismos de resposta conjunta para crises. Wong Sio Chak diz que esta alteração vai contribuir para “um ambiente melhor de segurança para a prosperidade e de condições de vida e de emprego para os jovens que estão interessados em integrar o desenvolvimento da Grande Baía”. Finalmente, o secretário fez questão de frisar que a segurança exige consciência e responsabilidade dos habitantes da RAEM. Toca a aproveitar No que diz respeito aos discursos dos restantes secretários, Sónia Chan, Alexis Tam e Lionel Leong, a tónica foi a mesma: oportunidades. A secretária para a Administração e Justiça pediu aos jovens que reforcem os conhecimentos dos diferentes sistemas jurídicos para aproveitarem “as oportunidades da integração regional”. Também o secretário para a Economia e Finanças destacou que a Grande Baía “oferece muitas oportunidades” e que os jovens devem confiar nas suas capacidades, “quando vão à procura de emprego ou realizam inovação”. Se para Sónia Chan e Lionel Leong dizem que vão ser criadas oportunidades, Alexis Tam considera que já foram desenvolvidas. Um feito que para o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura foi alcançado com “a cooperação de todos os sectores sociais” e que poderão ser aproveitadas pelos que forem “quadros qualificados com sentimentos patrióticos, responsabilidades social e competitividade”. Com a chancela de Xi O projecto da Grande Baía é tido como uma iniciativa apadrinhada por Xi Jinping e Chui Sai On destacou esse facto logo no discurso de abertura do evento. Segundo o Chefe do Governo local, a “Grande Baía é uma estratégia nacional projectada, planeada e promovida pessoalmente pelo Presidente Xi Jinping, e é uma iniciativa importante para executar correcta e plenamente”. Ainda de acordo com Chui, a “Grande Baía traz para Macau oportunidades de desenvolvimento sem precedentes”.
Leocardo VozesO meu jardim [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão vou falar da entrada de Portugal no Festival da Eurovisão este ano, “O Jardim”. Se bem que podia muito bem, e já agora vamos apoiar a nossa canção, cum camano, nem que seja abstendo-se de dizer mal. Adiante. Do que queria falar era do “jardim” onde moro, o meu edifício. Ao contrário do que acontece com a generalidade dos prédios de habitação em Portugal, que têm um número de polícia numa qualquer rua, avenida, praceta ou pátio, em Macau estes têm além do número um nome, e é pelo nome que são mais conhecidos. O meu chama-se “Jardim Real”, e com toda a certeza que muitos dos leitores vivem também num “jardim” qualquer, apesar de às vezes não se ver no raio do prédio uma única flor. Ás vezes há uma planta no rés-do-chão, junto ao condomínio. Isto explica-se facilmente pelo facto da designação para “edifício” e “jardim” serem a mesma: “fa yuen” (花園) . Isto tem ainda outra história, mas fica para outra altura. O meu “jardim” (portanto…) tem vinte andares, e vivo num dos mais altos. Não vou aqui dizer qual, porque parece mal, e ainda pensam que estou a convidar para uma visita domiciliária, mas todos os meus vizinhos sabem. Ser o único português a viver num destes “jardins” é o mesmo que ser um elefante cor-de-rosa. Toda a gente sabe onde moro, a composição de todo o meu agregado familiar, e chego mesmo a ter quem no elevador carregue no botão do meu andar, sem que eu lhe peça nada. A mais engraçada é a senhora do condomínio, que por vezes quando chego diz-me “a tua mulher já está em casa”. Um dia destes o meu filho chegou perto da hora da almoço, e a senhora informou-o prontamente que “o teu pai saiu há cinco minutos”. E garanto que não pago extra de condomínio por este serviço de secretariado! Adorável é também quando ela nos vê a sair carregados de malas e pergunta “ah, vão viajar?”. Que perspicácia! Repito: é uma querida. Do que é me que estou a queixar, se tenho tratamento VIP? Deveria eu pavonear-me deste estatuto de ave rara, ou de último moicano? E será que sinto…tchan tchan tchan…”racismo”?!?! Não, nada disso, pode-se dizer que é um “choque cultural”, pronto. E é mesmo, apesar de também se poder dissertar muito sobre este assunto. Fica igualmente para outra altura. Escusado será dizer é que não me resta senão ser discreto. Sim, tenho a certeza que se acontecer alguma coisa cá em casa, toda a gente fica a saber que foi na jaula do elefante rosa. Foi por esse motivo também que não exagerei nos festejos do título do FC Porto no último fim-de-semana, que marcou o regresso à normalidade e repôs alguma justiça no atribulado futebol português. Muitos tentam, mas só um é penta. Pois, mas então a conclusão. Ah sim, é uma maravilha viver aqui neste jardim sem flores, junto da gruta de Ali-Babá.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteJosé Dias, arquitecto e ex-funcionário do Instituto da Habitação: “Corrupção começa nas obras públicas” Chegou a Macau em 1990 e trabalhou até 2008 no Instituto de Habitação. O arquitecto José Dias lamenta que a qualidade das habitações públicas tenha piorado, sobretudo ao nível da área reduzida dos apartamentos. Em relação ao campus da Universidade de Macau, José Dias defende que o projecto está longe de ser moderno, além das fragilidades ao nível de esgotos, água e electricidade [dropcap]F[/dropcap]alou do ambiente artificial que existe em Macau. Quando aqui chegou, alguma vez pensou que o território iria desenvolver-se desta maneira, ou que os arquitectos teriam de trabalhar, na sua maioria, com este tipo de ambiente artificial? Estava em Moçambique e recebi uma oferta para trabalhar em Macau. Nessa altura a presença portuguesa era mais acentuada. Não é que não se soubesse o que ia acontecer. E depois da transição as coisas mudaram instantaneamente. Lembro-me de ter alugado um apartamento que estava à venda por 500 mil patacas, um T4. Em 2000 a casa valia uns quatro ou cinco milhões de patacas. É curioso que tudo isso se está agora a debater. Hong Kong está, neste momento, a debater a injustiça dos ricos elevarem os preços das rendas e pede-se que o Governo interfira, porque pode interferir, controlar o crescimento. Isto nasce do sistema democrático, que é livre, mas depois verificamos que a liberdade é fictícia, porque é livre à custa dos que estão bem instalados e que até fizeram os seus negócios e se sacrificaram, mas são ricos. Há outros que não o são e cada vez têm menos possibilidades. Em Hong Kong há também o debate em torno da dimensão reduzida dos apartamentos, e há cada vez mais pessoas a viver em gaiolas. ade levarem os preços das rendas e pede-se que o Governo interfira, porque o Governo. Acredita que o mesmo pode acontecer em Macau? Já existe esse problema. Há muita pouca racionalização, tanto em Hong Kong como em Macau, no que diz respeito ao crescimento. Não há controlo deliberado, age-se por emergência e não há um plano que controle o desenvolvimento do jogo, por exemplo. FOTO: Sofia Mota Tem alguma expectativas positivas em relação aos novos aterros? Acredita que poderá trazer algum desenvolvimento sustentável? Vai acontecer o mesmo que já aconteceu: tudo começa por estar regularizado e depois começa a ser empolado. Isso tudo vai diminuir a disponibilidade de área livre. Em primeiro lugar começam por ocupar o mar, mas nunca sabemos até onde vai esta tentação, e há uma perspectiva de agravamento. As coisas não vão mudar e podem até agravar-se, porque vai permitir-se mais população, e os mesmos espaços de Macau vão ser ocupados pelo dobro das pessoas, e isso tem consequências imprevisíveis. Macau é uma cidade com muitas fragilidades e a construção em altura não está a ser ponderada devidamente. É um paraíso artificial, digamos assim. Em que sentido? Estamos constantemente sujeitos a surpresas. Veja isto [referindo-se ao campus da Universidade de Macau]. É um quilómetro quadrado entregue a Macau, mas aparentemente, porque está a ser manipulado pela China. Não se percebe, porque se as pessoas tivessem mais discernimento, fariam com que isto tivesse uma maior apetência. [Macau] é um tesouro que se vai extinguir, como Hong Kong. Considera então que Macau vai desaparecer. O mais natural é que seja absorvido, porque são apenas 700 mil pessoas perante mais de um bilião de pessoas [a residir na China]. Isto não é nada e desaparece, de um momento para o outro. Basta uma perspectiva diferente, um plano de acção diferente para se extinguir, pura e simplesmente. Refere-se também à extinção da cultura e do património? Sim, com prejuízo para a China. Portugal é a Europa e para a China é um relacionamento fácil. Podemos ficar num cantinho a pensar em Macau, mas é uma coisa temporária. Das duas uma: ou há uma perspectiva criativa, optimista, ou então há uma perda de toda a identidade criada. Ainda sobre a altura dos edifícios. O Governo português soube travar muitas das situações que o Governo chinês não está a conseguir travar? Penso que não. A China tem de intervir para que se cumpra a Lei Básica, porque entregar passivamente [projectos] a novos profissionais sem assegurar a qualidade da intervenção é um pouco perigoso. Refiro-me a questões técnicas e à competência profissional, que é preciso salvaguardar. Não houve nenhuma intervenção de Macau neste projecto, por exemplo [referindo-se ao campus da Universidade de Macau]. Lamenta que este campus… Não seja mais moderno. Não se vincula à modernidade, na sua linguagem é um projecto neoclássico. Mas fundamental seria o respeito pelas regras da construção, sobretudo ao nível do fornecimento de água, esgotos e electricidade. São coisas fáceis de fazer se houver uma fiscalização íntegra. Voltemos à sua vinda para Macau. Foi convidado pelo Instituto da Habitação e acompanhou o processo de construção de habitações públicas. Habitação económica, sobretudo. Comparando essa altura com a actual, acha que… Agravou-se a qualidade das habitações. O espaço foi reduzido e hoje é possível ocupar uma sala se estendermos os dois braços. Na altura, havia uma lei portuguesa, já ultrapassada, que estabelecia as áreas, mas esse decreto-lei foi alterado, para pior, e as áreas foram diminuídas. Havia um risco de manipulação que se agravou depois da transferência de soberania e não há nenhuma perspectiva de melhoria da habitação. Posso concluir que não lhe agrada o empreendimento de Seac Pai Van. É pior em termos de área. Mas isto também tem o consentimento das pessoas, porque a população em geral não tem uma consciência. Mas os que acompanham as questões da Administração Pública sabem. E não se perspectiva nenhuma melhoria das condições. Aqui [no campus da UM], por exemplo, estamos numa criação nova. Há espaço desafogado, mas se formos ver as habitações lá dentro, não têm, por exemplo, sifões nas casas de banho, e isso leva a que haja maus cheiros. A qualidade da construção deste campus tem sido, aliás, bastante questionada. Poderia ter-se feito muito melhor? É evidente, sobretudo nestes aspectos que podem ser subvertidos. Quais eram as directrizes para a construção de habitação pública quando chegou a Macau? Actualmente, há muitas queixas sobre o planeamento do Governo a esse nível. Na altura, esse planeamento era melhor? Era, simplesmente porque havia menos procura. Era mais fácil dominar a situação e o corrupto não intervinha, ficava calado na sua secretária. As ofertas em termos de corrupção são sempre feitas na altura de [elaboração do projecto]. Observou casos em concreto? Nunca observei nenhum caso porque sempre que via alguma situação que estava contra a lei eu não aprovava, chamava a atenção e mandava alterar. A corrupção não é facilmente visível, e começa logo nas obras públicas, que não fazem o controlo do projecto. Vejo o projecto, corrijo o que está errado e segue, mas ele não vai ser feito como está, vai ser alterado e é aí que se dá a corrupção. O construtor alinha com as obras públicas e arranja maneira de subverter a situação. Mas isso acontece em todas as áreas. Há uma crítica constante em relação ao funcionamento das obras públicas. Acredita que algo pode mudar ao nível da celeridade de aprovação de projectos? É sempre possível, e isso começa nas hierarquias. Se há fenómenos exteriores que denunciam situações extremamente graves, as pessoas entram em pânico e tomam medidas. Ninguém faz a denúncia porque é lesado por isso. Esta é uma situação generalizada. Macau e Hong Kong sofrem as consequências de uma alta pressão da China, a que esta está sujeita também. A China alterou-se profundamente nos últimos anos e o que acontece é que está sob alta pressão de 1.4 bilião de pessoas. FOTO: Sofia Margarida Mota Como era ser arquitecto na altura em que chegou? Apesar de ter estado na Função Pública, fazer arquitectura era mais desafiante? Claro. O arquitecto português vem de fora e vem com uma cultura e experiência determinada. Alguns primam pela isenção e há outros que aproveitam as oportunidades de singrarem e ganharem mais dinheiro. Isso agravou-se desde essa altura para cá e o arquitecto passou a ter menos influência. Ainda agora houve uma exposição sobre o trabalho de José Maneiras, e ele seguiu as regras da escola do Porto, e procurou fazer o melhor possível dentro das suas possibilidades. Mas teve de enfrentar desafios, nomeadamente de quererem alterar coisas nos seus projectos indevidamente. Mas isso não quer dizer que as novas gerações sejam piores. Actualmente é difícil fazer arquitectura de autor, fora destes grandes projectos ligados ao jogo? É difícil intervir quando já estão estabilizados certos núcleos. Há uma série de equipas que trabalham e que são independentes e que têm fornecimento de trabalho de forma regular. E essas equipas são sempre as mesmas, as que se estabilizaram e encontraram formas de sobreviver. Falo do Bruno Soares, Maneiras, Carlos Marreiros, o Rui Leão e a esposa. Cada vez há menos construção mas, por outro lado, isso não é bem assim, porque ela surge pelos novos aterros ou pelas alterações que são solicitadas. Agora solicitei junto das obras públicas um cartão para exercer a actividade, e tenho esse cartão, mas até agora procurei trabalho e tenho tido alguma dificuldade. Tem, portanto, vontade de regressar. Do que tem mais saudades? Talvez agora nesta altura fosse mais aliciante fazer acompanhamento de obra. Há sempre inovações e realizações no processo de construção. Considera que faltou planeamento para o futuro, ao nível de habitação pública, tendo em conta o crescimento populacional que se verificou em Macau? Está em curso a construção dos novos aterros, sobretudo o mais importante para a habitação pública [zona A]. Isso vai estabilizar e proporcionar mais habitação económica, mas penso que este assunto poderia ser resolvido de outra maneira, negociando a remodelação dos edifícios no chamado casco velho, ou zona antiga da cidade. Há uma comissão que regula essa intervenção, mas penso que é pouco eficaz e não se tem feito quase nada para a reabilitação da construção antiga. Que projectos da sua carreira destaca? Fiz sobretudo muita obra em Moçambique, onde nasci, em Nampula, e também Maput e Lourenço Marques. Aliás, a minha última obra foi aí, com um projecto de nove habitações de rés-do-chão e primeiro andar. Era mais fácil fazer arquitectura nas ex-colónias? Claro que era, mas não havia muito trabalho a fazer. Este trabalho foi pedido por um serviço de manutenção de estradas. Em Nampula construí alguns edifícios em altura, mas apenas com três andares. Precisava de um novo desafio na sua carreira, e foi por isso que aceitou Macau? Sim, estava tudo muito paralisado e as condições de manutenção não eram fáceis. A Associação de Arquitectos de Macau e outras entidades têm feito o suficiente para preservar a memória da arquitectura portuguesa em Macau? Deve-se salvaguardar, de uma forma geral, os empreendimentos e chegou a fazer-se algo sobre o trabalho de Manuel Vicente, e agora sobre José Maneiras. É sempre possível fazer um levantamento urbano. Pode-se sempre fazer mais alguma coisa. Cheguei a escrever sobre a [importância] da intervenção e preservação no casco velho [zona antiga da península].
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeEfeméride | Há 25 anos, a cidade muralhada de Kowloon era demolida O arquitecto Mário Duque e o secretário-geral da Cáritas, Paul Pun, recordam a sua experiência como visitantes na cidade muralhada de Kowloon. Era um “labirinto” de apenas 2,7 hectares onde chegaram a residir 50 mil pessoas. A ilegalidade fez do local um problema para o Governo britânico que só foi resolvido em 1994. A demolição dos 500 edifícios aconteceu há 25 anos [dropcap style≠‘circle’]E[/dropcap]m chinês era conhecida como a “cidade da escuridão”. Não havia recolha de lixo, muito menos elevadores, água potável ou instalações eléctricas legais. Um frágil sistema de esgotos foi instalado quando as autoridades perceberam que os dejectos estavam a contaminar a água que era consumida. A construção foi sendo feita ao longo de décadas, sem mão de arquitectos ou engenheiros, sem inspecções ou fiscalizações. A cidade muralhada de Kowloon, casa de 50 mil pessoas que viviam em 500 edifícios construídos em pouco mais de 2,7 hectares, tornou-se numa mancha negra na história da administração britânica em Hong Kong. Essa mancha foi definitivamente apagada há 25 anos, com a demolição de todos os edifícios. As pessoas foram realojadas nas habitações sociais dos Novos Territórios, além de terem recebido uma indemnização. Em lugar do vazio deixado pelo território, que foi o mais densamente povoado do planeta, existe hoje um parque que conta as memória de um lugar que muitos recordam com saudade. FOTO: Hong Kong Lands Department Mário Duque, arquitecto, visitou a cidade muralhada de Kowloon, mas não foi sozinho. Levou um amigo que lhe mostrou como entrar num espaço cheio de becos e ruelas escuras. “Era um espaço de uma enorme densidade e percebia-se que tinha alguma organização, porque as coisas funcionavam. Era uma espécie de colmeia e não se percebia muito bem como é que aquilo tudo funcionava, porque toda a gente corria de sítio para sítio, sabia de onde vinha e sabia para onde ia e desenvolviam funções lá dentro. Era um sítio de trabalho e de habitação também. Tinha uma organização com alguma informalidade, mas que, na realidade resultava. Havia ares condicionados, a água corria pelo chão e paredes, havia electricidade.” Mário Duque recorda-se da sensação de se estar num “território estranho, para o qual não temos um mapa, não sabemos por onde se entra, nem por onde vamos”. “Tínhamos de ir com alguém que conhecesse minimamente o espaço. Não sabíamos sequer por onde entrar e por onde circular. Ninguém estava disponível para falar, porque estava toda a gente muito atarefada. Não devo ter passado do rés-do-chão, a zona dos pódios dos edifícios. Ali eram casas de comida, oficinas, fábricas e também habitações em simultâneo.” Mesmo sem ter conseguido falar com trabalhadores ou moradores, Mário Duque percebeu que havia ali uma certa estrutura social. “Notava-se que havia sítios onde as pessoas não estavam propriamente a trabalhar. Reuniam à volta da mesa, conversavam, pareciam os administradores do local. Toda a gente corria, todos tinham uma função, e não era propriamente uma cooperação, era cada um por si.” A cidade muralhada de Kowloon tinha a presença de algumas tríades da China e de Hong Kong e era comum a existência de bordéis e consumo de estupefacientes. Muitos trabalhavam sem documentos, em fábricas que não eram inspeccionadas pelas autoridades, em longas jornadas de trabalho que aconteciam todos os dias da semana, sem folgas. Nos andares de baixo funcionavam várias lojas, restaurantes onde se consumia comida de cão e dentistas sem qualquer tipo de licença. O arquitecto, a residir há décadas em Macau, recorda-se de que os espaços disponíveis para circulação dentro da cidade eram reduzidos ao essencial. “Em tempos, deveria ter tido uma construção organizada, mas depois foi apropriada. Houve um crescimento tão grande, e com uma intensidade tal, que tínhamos a sensação de estar dentro de uma colmeia, com tudo a funcionar, com muito pouco espaço. Era um labirinto, mesmo ao nível das circulações. Uma das coisas a que estamos habituados em Macau nos edifícios antigos é que muitas vezes as pessoas ocupam os espaços comuns de circulação e transformam-nos, e ali estava tudo ocupado.” “Senti-me seguro” Paul Pun, secretário-geral da Cáritas, já fazia trabalho de apoio social quando visitou pela primeira vez a cidade muralhada de Kowloon. Nunca se sentiu inseguro, apesar da existência omnipresente de consumidores e traficantes de drogas e da ausência de autoridades policiais. “Naquela altura, na cidade muralhada, viviam apenas chineses, e havia uma ligação às tríades. Eles não estavam presentes apenas na cidade, mas em vários pontos de Hong Kong. Lá havia mais liberdade para as tríades levarem a cabo as suas actividades, porque não havia câmaras.” O secretário-geral da Cáritas foi, durante dois anos, estudante da Universidade de Hong Kong. Na altura optava por andar a pé, evitando autocarros ou eléctricos, para sentir mais de perto o pulsar da cidade. Mais tarde, visitaria a cidade muralhada de Kowloon, sem ajuda de ninguém. “Não tinha ligações a ninguém, ou a qualquer associação. Cheguei a trabalhar com portadores de deficiência, que muitas vezes tinham de ir fazer tratamentos a Hong Kong, e algumas pessoas vinham a Macau pedir apoio e tínhamos de os ajudar nos contactos. Antes, as pessoas de Hong Kong perdiam dinheiro no jogo e nós fazíamos esse trabalho de apoio”, contou. Paul Pun recorda a ligação que existia entre as muitas famílias que tinham de partilhar pequenos espaços. Várias gerações nasceram e morreram na cidade muralhada de Kowloon que, originalmente, era um forte militar chinês. A sua população aumentou drasticamente com a ocupação japonesa de Hong Kong durante a II Guerra Mundial. “O espaço era gerido por eles próprios e tinha uma coisa boa: as pessoas mantinham a harmonia lá dentro, as pessoas não olhavam para ti, faziam com que te sentisses acolhido. Eu senti-me normal lá dentro, não me senti um estranho”, acrescentou Paul Pun, que, quando questionado sobre as condições das estruturas dos edifícios e do ambiente, recordou uma curiosidade. “Não sei se cheirava mal, porque na altura tive um problema de saúde e não conseguia ter cheiro. Por isso, é que quando caminhei lá não senti problemas a esse nível, mas garanto que era um lugar seguro.” Na cidade muralhada de Kowloon, Paul Pun recorda-se de existir uma ligeira diferenças no modo de estar das pessoas de Macau e Hong Kong. “Eu não me vestia como alguém de Hong Kong. Naquela altura, havia uma maior diferença na forma de vestir e até de andar, porque as pessoas de Hong Kong andavam mais depressa, por exemplo. Quando entrei num supermercado da cidade muralhada perceberam que eu não era de Hong Kong, porque andava mais devagar. Mas senti-me bem acolhido.” Densidade de hoje Na cidade muralhada de Kowloon, os apartamentos eram minúsculos e poucos tinham o luxo de morar numa casa exposta à luz do sol e ao ar da rua. Quem vivia nos apartamentos cá em baixo precisava subir vários andares a pé para o terraço do edifício, onde o espaço era dominado por um vasto campo de antenas de televisão desorganizadas. Uma escultura em bronze da maquete da “Cidade Muralhada” foi colocada à entrada do Kowloon Walled City Park, em Hong Kong. Hoje em dia, permanece o problema da falta de espaço em Hong Kong e é cada vez mais visível a realidade dos que são obrigados a viver em gaiolas ou em apartamentos. Em Macau nunca existiu um espaço tão densamente povoado como a cidade muralhada de Kowloon, mas Paul Pun alerta para a situação em que vivem hoje muitos trabalhadores migrantes. “Se compararmos com Hong Kong, sempre tivemos numa melhor situação, com a diferença dos trabalhadores migrantes, que vivem em espaços mais apertados. Estamos a falar de um espaço que era mais pequeno do que Seac Pai Van”, frisou o secretário-geral da Caritas. Mário Duque fala de uma predisposição cultural para que os asiáticos se organizem na cidade de uma forma mais densa, uma vez que os europeus, pelo contrário, precisam de espaço para comunicar uns com os outros. Ainda que a uma escala diferente, e sem a dimensão da cidade muralhada de Kowloon, o arquitecto dá exemplos de aglomerados urbanos que se mantiveram imunes ao desenvolvimento urbano, com uma organização própria. “Em escalas muito pequenas encontramos isso em Macau, quando determinado núcleo urbano tradicional foi incorporado numa estrutura urbanística geral, como as ilhas que permaneceram lá dentro, com a sua própria organização. Encontramos isso nas zonas viradas para o Patane e Porto Interior.”
Victor Ng PolíticaUrbanismo | Au Kam San exige melhorias nas instalações em Seac Pai Van [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Au Kam San defende que nos últimos cinco anos as insuficiências das instalações comunitárias em Seac Pai Van não foram resolvidas e que continuam, todos os dias, a incomodar as dezenas de milhares de residentes. Segundo o legislador, além da escola não ter uma data definida para a conclusão de obras, há várias instalações que estão por arranjar, assim como a estrada ao lado do escola que não oferece as condições para circulação de carrinhos de bebé e cadeiras de rodas. O deputado apela a que as autoridades arranjem forma de melhorar a zona e prevê que os problemas se prolonguem, devido às obras. Sobre a recente entrada em funcionamento de um supermercado no auto-silo público, o deputado considera necessário que se crie uma passadeira entre as duas passagens superiores para peões naquela zona.
João Santos Filipe SociedadeProjecto de Centro Comercial na Praça do Senado vai ser vendido por 800 milhões O fundo de investimento Macau Property Opportunities, gerido pela Sniper Capital, chegou a um acordo para vender o projecto na Praça do Senado por 800 milhões de dólares de Hong Kong. O edifício tinha sido comprado em 2007 por 124,8 milhões [dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] fundo de investimento Macau Property Opportunities (MPO) chegou a um princípio de acordo para vender o projecto para um centro comercial junto à Praça do Senado por 800 milhões de dólares de Hong Kong. As empresas compradoras são a Ardent Sucess Limited e a City Universe Limited e o acordo foi revelado, na sexta-feira ao final da noite, num comunicado do fundo gerido pela Sniper Capital à bolsa de Londres. “O preço de venda representa um prémio de 14 por cento face à valorização do imóvel de 703 milhões de dólares de Hong Kong (90 milhões de dólares americanos), segundo o valor a 31 de Dezembro de 2017, e um ganho de 541 por cento face ao valor da aquisição de 15,96 milhões de dólares americanos, em Outubro de 2017”, explicou a empresa sobre os montantes envolvidos. De acordo os termos do princípio de acordo, os compradores vão pagar até amanhã uma caução de 15 milhões de dólares de Hong Kong. Depois, até 29 de Março, o fundo vai receber 705 milhões de dólares de Hong Kong, caso os investidores concordem com os moldes do negócio. Após as duas primeiras tranches, o MPO só recebe a totalidade do montante restante, ou sejam 80 milhões de dólares de Hong Kong, se nos seis meses seguintes não surgirem pagamentos relacionados com dívidas anteriores ao negócio. Os retornos da venda serão distribuídos pelos investidores do fundo, com a condição do mesmo manter dinheiro suficiente para continuar a operar dentro da normalidade. Projecto parado Com uma área aproximada de 6,3 mil quadrados, o projecto comercial Senado Square, na intercepção entre a Travessa do Roquete e a Rua da Sé, está em fase de concepção há vários anos, sem que as obras tenham avançado. O projecto aposta na renovação do edifício em causa para a construção de vários espaços comerciais, num área que está classificada pela UNESCO como Património Mundial. Segundo o portal do fundo MPO o projecto está agora em planeamento avançado. Porém, na última actualização do fundo, constava que o fundo estava em conversações com o Governo local para conseguir cumprir os passos necessários para começar as obras. Já nessa altura, o fundo admitia que estava à procura de uma solução para vender o projecto. • VEJA O PROJECTO NO SITE DA MPO
Jorge Rodrigues Simão Perspectivas VozesO turismo e a cidade “There can be little doubt that tourist areas are dynamic, that they evolve and change over time. This evolution is brought about by a variety of factors including changes in the preferences and needs of visitors, the gradual deterioration and possible replacement of physical plant and facilities, and the change (or even disappearance) of the original natural and cultural attractions which were responsible for the initial popularity of the area.” “The Tourism Area Life Cycle, Vol. 1: Applications And Modifications” – Richard Butler [dropcap]O[/dropcap] turismo está a passar por mudanças fundamentais em relação ao mercado, à estrutura da indústria e ao produto em si, sendo transformações impulsionadas por uma fundamental transição para padrões pós-modernos de consumo, tornando o turismo, uma das marcas de referência dos modos de produção e consumo na economia do conhecimento. Os modelos tradicionais de gestão do turismo e planeamento estão a adaptar-se rapidamente a uma nova realidade em que o turismo joga, quantitativa e qualitativamente, um papel sem precedentes na formação do desenvolvimento económico. Tendo em consideração as interconexões entre o turismo e a cidade do ponto de vista da pesquisa orientada para as políticas, o turismo penetra e influencia cada vez mais as decisões políticas em todas as áreas do desenvolvimento da cidade, tais como o uso da terra, desenvolvimento de locais, regulamentos de construção, infra-estruturas, inovação, qualidade ambiental, inclusão social, empreendedorismo e governança urbana, o que torna urgente incluir perspectivas de turismo nos modelos implementados para enfrentar questões e desafios urbanos. O turismo pode apoiar as cidades na construção da sua reputação, promoção do seu capital relacional na arena global, ao propor e apoiar um modelo de qualidade do desenvolvimento urbano. Além disso, o turismo urbano é, por si, um fenómeno multifacetado. Os diversos tipos de viajantes chegam a uma cidade com propósitos muito diferentes, e as suas múltiplas interacções com os moradores e com as atracções e infra-estruturas da cidade, dão origem a uma variedade de tipos de turismo, daí a existência de uma ampla gama de modelos de turismo sobreposto (e modelos de negócios) que coexistem. O turismo é uma função essencial de contextos urbanos contemporâneos. O potencial e as limitações da integração do turismo nas políticas urbanas são realizados por meio de uma variedade multifacetada e multidisciplinar de contribuições. A partir de diferente perspectivas, pode ser analisada a forma como a procura do desempenho do turismo pode contribuir para qualidade da vida urbana e para o bem-estar das comunidades locais (qualidade dos espaços, emprego, acessibilidade, inovação e aprendizagem), mas também pode criar riscos, tensões e conflitos, como é atestado pelo aumento de acções anti-turismo em reacção à mercantilização cultural e ao turismo de gentrificação induzida. A esse respeito, a integração do turismo na agenda urbana é condição (tanto intelectual e política), por abordar de forma crítica e positiva as assimetrias produzidas pelo fenómeno do turismo urbano. Tais assimetrias levam a uma (manejável) troca entre os interesses dos residentes e os dos turistas ou desencadeiam um jogo positivo, para o bem-estar dos residentes permanentes e temporários. É de considerar que um ressurgimento do interesse no fenómeno do turismo urbano deve ser conectado com uma variedade de factores de natureza contingente e estrutural. O turismo tem vindo a crescer e a diversificar-se na última década, e num contexto global em rápida mudança, a indústria de viagens tem-se vindo a transformar. As previsões da “Organização Mundial de Turismo (OMT) ”, apontam que o número de chegadas internacionais de turistas no mundo aumentará 3,3 por cento anualmente, em média, até 2030, enquanto, o “Fórum Económico Mundial”, que se realiza anualmente em Davos, prevê que o sector de viagens e turismo crescerá 4 por cento anualmente, a uma velocidade maior do que outros sectores económicos, como a produção, transportes e serviços financeiros. Além das tendências crescentes, a diversificação e a transformação global do fenómeno do turismo tem estado a ser observado e questionado. Os tipos de inovação devem ser analisados, como resumindo os campos em que a novidade e as trajectórias emergentes podem ser procuradas; a inovação a novos nichos de mercado, concentrando-se na abertura de novas oportunidades de mercado através do uso de tecnologias; a inovação regular que segue padrões históricos de acréscimo de mudança; a inovação revolucionária, que deriva do uso intensivo de tecnologias em produtos ou serviços específicos, ainda não envolvendo toda a indústria do turismo; e, finalmente, a inovação arquitectónica que afecta a indústria do turismo como um todo. É importante considerar que um dos desafios actuais no domínio da pesquisa do turismo consiste na identificação de inovações turísticas e na análise dos seus aspectos sociais, efeitos económicos e culturais, bem como da sua capacidade de mudar profundamente a forma como os viajantes, por um lado, e os operadores turísticos se envolvem com desenvolvimento do turismo. O turismo é um fenómeno situado e ao longo da sua evolução na sociedade global, não foi um insignificante factor nas trajectórias evolutivas das cidades. E, no entanto, o turismo urbano parece persistir à margem do debate sobre as cidades, pois raramente é estudado como parte de uma economia, sendo principalmente confinado como um agente de gentrificação e como resultado directo (e quase aceite) da regeneração liderada por processos de cultura. Quais são os motivos da marginalização do turismo em estudos urbanos? A resposta tem em parte a ver com uma história intelectual de que o turismo é relegado a desempenhar o papel de alternativa fácil por atraso das regiões periféricas que permaneceram fora dos processos de industrialização. Têm sido propostos dois tipos ideais, como sejam o turismo de urbanização e a urbanização do turismo, sendo ambos destinados a sinalizar a incorporação do turismo em processos de urbanização. O último (urbanização do turismo), identifica o turismo como o principal motor de moldagem física, social e económica da cidade. O turismo urbano e o lazer desempenham um papel predominante na produção local. O turismo de urbanização não prevalece na economia urbana, e é uma das muitas dimensões para explicar a trajectória evolutiva das cidades. Existe consciência do crescimento no discurso global do turismo, sobre a necessidade de convergir em um caminho do turismo sustentável que parece coincidir com o turismo de urbanização racional, onde o turismo não assume a liderança na economia local, mas contribui para a diversidade urbana, lazer e cultura atmosférica de consumo. A conceitualização sustentável do turismo urbano é a principal resposta aos efeitos negativos que o seu rápido crescimento tem provocado. Todavia, esforços significativos de pesquisa devem abordar o turismo de urbanização, as suas formas, políticas e práticas que o caracterizam e os seus efeitos e limites. O papel do turismo na formação do desenvolvimento social, económico e tecido físico das cidades, faz pressupor a necessidade da existência de aprofundamento de muitas formas intermediárias que o turismo carrega em contextos urbanos. O desenvolvimento do turismo global está intimamente interligado com a trajectória de transformação urbana e urbanização. A população residente deve ser articulada com uma população temporária e oscilante de visitantes, com impacto no tecido físico e socioeconómico urbano. O crescimento desproporcionado em números, aumento de receitas e expansão da presença de turistas em várias áreas urbanas analisados por estudos de vizinhança, instam ao tratamento do turismo como facto urbano significativo. As cidades não são apenas os principais destinos ou pontos de atenção dos itinerários dos viajantes, mas também são a origem da maioria dos viajantes, dado que 80 por cento dos turistas são provenientes das cidades, e esta é uma das razões fundamentais para a reconsideração do turismo como um factor crucial no desenvolvimento da cidade, como afirma a “Declaração de Istambul de 2012”, promovida pelo OMT, que é a agência da ONU encarregada da promoção turística sustentável e universalmente acessível. Muitos são os países que aceitam que o turismo é um recurso fundamental para as cidades e seus residentes, porque pode contribuir para o rendimento local, bem como para a manutenção de infra-estruturas e prestação de serviços públicos. A “Declaração de Istambul” descreveu o turismo como a maior indústria do mundo, criadora de benefícios económicos e promoção da cultura e bem-estar, bem como da coesão e preservação do património. A OMT enfatizou a importância das políticas públicas que impulsionam os impactos positivos do turismo urbano, enquanto evitam ou mitigam os efeitos negativos, ou seja, se a maioria das políticas de turismo forem concebidas como estratégias autónomas de mercadologia e promoção, em tempo, realizarão uma reflexão estruturada sobre as políticas urbanas integradas. A questão crucial é a de saber em que medida as instituições de ensino superior podem ajudar a comprovar estas afirmações e orientar o debate para a definição de base teórica e acção empírica, responsável, sustentável e acessível ao turismo. Os impactos das viagens nas cidades de destino que recebem visitantes são significativos das perspectivas comerciais, sociais e culturais do turismo. Os gastos dos visitantes constituem uma fonte de negócios cada vez mais importante, constituindo receitas para as cidades de destino, abrangendo a hospitalidade, vendas a retalho, transportes, desporto e indústrias culturais. É um importante motor económico para o emprego e fonte de rendimento para as cidades, e conjuntamente com o fluxo de visitantes, agrega o conjunto de novas ideias e experiências que beneficiam os visitantes e as cidades de destino. Se, por um lado, o turismo é representado como uma panaceia panglossiana para muitos (em alguns casos, até para todos), os problemas de desenvolvimento (como fonte de receita, ideias, emprego, conexão e dinamismo), por outro lado, a consciência dos muitos efeitos negativos do turismo tem alimentado interpretações cada vez mais críticas dos seus impactos e papel nas áreas urbanas, marcando o fim da lua-de-mel das cidades com o turismo urbano, com o surgimento de movimentos anti-turismo pela reivindicação dos moradores ao seu direito à cidade. É de considerar os argumentos esgrimidos na descrição dos efeitos desiguais de aumento de rendimento e deslocamento induzido pela dinâmica urbana associada ao turismo, lazer e consumo, com as consequentes implicações sociais, económicas e exclusão política. O turismo urbano continua a ser um campo imaturo de pesquisa simplista e as descrições sobre o fenómeno turístico da cidade são o resultado, e não se entende como é possível a feitura de legislação sem suporte científico. A falta de estudos científicos sobre o turismo abundam, e desde logo ressaltam os estudos de negligência do turismo nas cidades e das cidades que negligenciam o turismo. É evidente que tem havido uma espécie de consenso implícito sobre a negligência do turismo no processo de urbanização e desenvolvimento económico. A imaturidade do turismo urbano como domínio analítico tem raízes históricas, pois até à década de 1980, a literatura académica sobre o turismo urbano era muito limitada para não dizer quase inexistente, posteriormente, o turismo urbano começou a tornar-se parte integrante dos estudos de turismo, embora como um fenómeno bastante distinto e consequente área de pesquisa, pois uma profunda visão rural continuou a caracterizar o turismo por longo tempo. O preconceito anti-urbano caracterizou especialmente o contexto anglo-americano, onde o turismo estava principalmente ligado à ideia de recreação ao ar livre, no campo, onde o contacto directo com a natureza podia ser experimentado, e por contraste, na visão industrial, as cidades foram concebidas como lugares para o trabalho árduo, para as tarefas sérias dos serviços, comércio e governo. Desde a década de 1980, o interesse no turismo urbano cresceu rapidamente, em paralelo com a crescente atenção dada à necessidade de regular e contrariar as externalidades negativas do turismo em cidades históricas. O modelo de férias marinhas ao sol que surgiu na década de 1960 começou a diminuir, enquanto o turismo urbano cresceu. Esta tendência foi impulsionada pelo surgimento e fortalecimento do transporte aéreo de baixo custo, conjuntamente com a melhoria da conectividade das cidades europeias. A liberalização do transporte aéreo na União Europeia significou uma revolução no turismo, uma vez que afecta fortemente os fluxos de viajantes, tanto quantitativamente quanto qualitativamente. As “Transportadoras de Baixo Custo (LCCs na sigla na língua inglesa)” estão a deslocar viajantes para fora das rotas tradicionais, criando novos destinos. Os destinos emergentes são muitas vezes cidades pequenas, geralmente não famosas, onde as companhias aéreas de baixo custo pagam tarifas e taxas aeroportuárias mais baixas. O entusiasmo por um cenário turístico radicalmente dinâmico levou à concepção das LCCs como uma oportunidade não só para expandir a geografia do turismo, mas também para reposicionar destinos bem estabelecidos. O governo de Malta, por exemplo, em 2006, ofereceu incentivos às companhias aéreas de voos baratos em uma tentativa de favorecer curtas férias urbanas e expandir o turismo cultural/patrimonial na despesa do modelo sol e praia. O resultado foi um aumento no número de chegadas, mesmo que não tenham ocorrido mudanças estruturais na procura turística. Ao mesmo tempo, as LCCs desencadearam uma nova onda de discussão sobre a contribuição do turismo para o desenvolvimento local. Tem sido defendido que o facto de o maior número de turistas fluírem, como os permitidos pelas LCCs, nem sempre significam desenvolvimento do turismo local e que nos negócios do destino turístico, sendo necessários modelos que maximizem os benefícios e mitiguem as externalidades negativas.
Carlos Morais José A outra faceUma permanente obsessão [dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uando vejo um filme passado em Macau, independentemente da sua qualidade, fico sempre fascinado pelas imagens, quase estupidificado e, ao mesmo tempo, submerso numa catadupa inenarrável de emoções. A coisa agrava-se quando a história retrata gente de Macau e o seu quotidiano. Tenho então um prazer quase voyeurista em entrar na casa das pessoas, dar pelos seus objectos, pelas fotografias sobre móveis de fórmica, as músicas trauteadas, os restos das vidas espalhados pelas mesas, pelas cadeiras, pelo chão. Produz-se em mim um estranho reconhecimento de algo que realmente nunca presenciei, uma familiaridade com o que nunca vivi, um estranho sentimento de pertença, de partilha, meramente imaginário da minha parte. Terei alguma vez entrado num apartamento parecido com aquele? Seria tarde e agora não me lembro. Ou talvez isso nunca tenha realmente acontecido. Isto ocorreu-me ao ver o filme “Sisterhood”, da realizadora de Macau Trace Choy. Independentemente da história ou do tema, a mim bastariam as imagens para me manterem agarrado ao ecrã, invadido por uma catarata de emoções. Por quê? Afinal, os ambientes retratados não são meus conhecidos mas algo dotado de uma existência pressentida. Não são sítios onde vivi mas espaços ocultos ou inacessíveis, que fazem parte do quotidiano de toda esta gente que me rodeia, mas aos quais o meu acesso é basicamente nulo. São os milhares de vidas à minha volta, envoltas sempre no mistério da sua cultura e na abissal diferença do seus desejos. Então por que razão isto me perturba tanto? Que tenho eu a ver com isto? O filme em si é excelente, a história transporta-nos entre a cidade pré e pós crescimento desmesurado do Jogo. Existe a nostalgia do que existiu e desapareceu e um enorme vazio, unicamente colmatado pelas relações que restam do passado, mas que os novos ritmos tornam obsoletas. Tudo isto bastaria para tornar este um bom filme. Mas, para mim, é a presença da cidade, dos perfis e dos contornos, das pessoas e dos lugares, reais, imaginários e ou desaparecidos, que realmente me fascinou e com certeza me vai obrigar a rever várias vezes. Por quê esta minha tão estranha e permanente obsessão, que me faz ir da lágrimas ao riso, da estupefacção à euforia, da saudade à tristeza e ao desespero?
Andreia Sofia Silva PolíticaConstrução | Deputada questiona ausência de diploma sobre seguro [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] deputada Song Pek Kei interpelou o Governo sobre a falta de implementação do regulamento administrativo relativo ao seguro de responsabilidade civil nos domínios da construção urbana e do urbanismo. A ausência deste diploma faz com que “os profissionais deste sector estão a correr sérios riscos”. “Qual o ponto da situação do processo legislativo relativamente a este regulamento? Como é que os profissionais deste sector podem defender-se e garantir os seus direitos, nomeadamente se existem ou não directrizes para que eles possam adquirir este tipo de seguro?”, questionou Song Pek Kei. A deputada lembrou que o regime de qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo foi implementado em 2015, que obriga os profissionais do sector à aquisição de um seguro de responsabilidade civil. “Até à data o respectivo regulamento administrativo complementar ainda não foi publicado e, caso aconteça algum erro nas obras, as responsabilidades para com terceiros serão suportadas pelo próprio profissional. Isto é: terá de pagar na totalidade as indemnizações”, concluiu a deputada.
Jorge Rodrigues Simão PerspectivasMegacidades, urbanização e desenvolvimento sustentável “For better or worse, megacities – by virtue of their resources, their size and their impact – are at the leading edge of change in many countries. Reading the social science literature seems to tell us that this is for the worse. A very broad current in urban sociology has associated economic globalisation with the creation of a wider spectrum of jobs and with a challenge to traditional social ties, leading to more segregated societies. Many urban scientists and urban geographers continue to condemn gigantism” “Governing Megacities in Emerging Countries” – Dominique Lorrain [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] “Conferência Internacional sobre a Água, Megacidades e Mudança Global” da “Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO na sigla inglesa)” foi um evento que fez parte da programação da “21.ª sessão anual da Conferência das Partes (COP 21, na sigla inglesa)” da “Convenção – Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (CQNUAC ou UNFCCC, na sigla inglesa)” e da “11.ª sessão da Conferência das Partes enquanto Reunião das Partes no Protocolo de Quioto (CMP 11, na sigla inglesa)”, que se realizou em Paris, entre 30 de Novembro e 12 de Dezembro de 2015. A “COP 21” reuniu cento e cinquenta chefes de estado e de governo de todo o mundo. que aprovaram o “Acordo de Paris” sobre redução de emissões com vista a travar as alterações climáticas, e que entrou em vigor a 4 de Novembro de 2016. A “Conferência”, mostrou o papel fundamental que as cidades desempenham na prossecução dos “Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)”, especialmente o “Objectivo 6” da “Agenda de 2030”, que é o direito humano e fundamental de acesso à água e saneamento. A visão geral da ONU, de quinze megacidades emblemáticas, como são Buenos Aires, Cidade do México, Chicago, Ho Chi Minh, Istambul, Lagos, Londres, Los Angeles, Manila, Mumbai, Nova Iorque, Paris, Pequim, Seul e Tóquio é simultaneamente o resultado de apresentações científicas concretas e um apelo à mobilização geral, para elaborar as políticas urbanas sustentáveis de que carece o mundo. Todos esses centros urbanos partilham um conjunto de características comuns, como o tamanho colossal, disparidades entre zonas ricas e pobres, procura ambiental e industrial que afecta os recursos naturais de uma região inteira, sem mencionar o peso económico do país, como um todo, e uma ampla gama de recursos culturais, científicos e educacionais. A ONU designou Nova Iorque e Tóquio como as duas primeiras megacidades, tendo em 1975 acrescentado a Cidade do México, passando em 2000, a ser dezoito, em 2005, vinte e em 2015, vinte e duas megacidades, todas com populações de dez milhões de habitantes ou superiores. As previsões indicam que existirão quarenta e uma megacidades até 2030, muitas delas localizadas nos países menos desenvolvidos do mundo. Ao longo da história constatou-se, que a essas cidades muitas vezes faltam quer o tempo como os meios para desenvolver os imprescindíveis serviços urbanos, inclusive os relacionados com o acesso à água, saneamento e drenagem de águas pluviais como direitos humanos e fundamentais. Tal situação cria vulnerabilidades profundas e desafios complexos. É crucial que as megacidades compartam as suas experiências, de modo a desenvolver serviços capazes de atender às expectativas dos seus habitantes. A gestão inclusiva dos recursos hídricos, também é solução para uma variedade de desafios sociais, em particular, as desigualdades de género, dado que as mulheres são frequentemente mais atingidas por dificuldades de acesso à água, e estão na linha de frente quando se trata de uma melhor gestão dos recursos. As áreas urbanas, globalmente consideradas, crescem rapidamente, sendo de esperar que mais de dois terços da população mundial viva em cidades até 2050. A urbanização influencia o meio ambiente e pode contribuir, por exemplo, para as alterações climáticas, degradação do solo e redução da biodiversidade. Ao mesmo tempo, os ecossistemas urbanos são muito sensíveis às mudanças globais, e a sua adaptação é necessária para sustentar a funcionalidade e os importantes serviços dos ecossistemas. A urbanização, historicamente, foi estudada principalmente, como uma potencial ameaça ambiental, resultando na degradação do solo, água, atmosfera, floresta e perda de biodiversidade. O estado ecológico desfavorável dos ambientes urbanos, foi documentado no início do século XXI, e um ecossistema urbano estabelecido difere fortemente de um ecossistema natural ou agrícola. Os ecossistemas urbanos são caracterizados pelas paisagens humanas modificadas e muitas vezes artificiais com distúrbios antropogénicos consideráveis como, por exemplo, a poluição ambiental, selagem do solo e eliminação de resíduos. As cidades geralmente consomem muito mais energia do que fornecem, resultando em emissões de calor, poluentes do ar, água e gases de efeito estufa. O aumento contínuo da população urbana global fez surgir novos conceitos como as cidades sustentáveis. O conceito de sustentabilidade urbana resultou no projecto de cidades modelo ou ideais como, por exemplo, cidades livres de emissões e cidades adaptadas ao clima que consideram as áreas urbanas como fonte de recursos únicos naturais e urbanos específicos e não como uma ameaça ambiental. A “Conferência” teve assim como objectivo encontrar soluções para problemas ambientais das megalópoles modernas, tendo introduzido ecossistemas urbanos, considerando a sua variabilidade espacial, dinâmica temporal, riscos ambientais e que fossem potenciais para fornecer funções importantes e serviços ecossistémicos. O conceito geral de megacidades como ecossistemas diversos e complexos foi apresentado e defendido. Manter a qualidade do ar, sequestro do carbono e mitigação do aquecimento global e as alterações climáticas por meio de emissões reduzidas de gases com efeito de estufa, são os principais serviços prestados pelos ecossistemas urbanos. Os solos urbanos são fundamentais para regular os ecossistemas urbanos saudáveis. Os serviços e funções dos ecossistemas fornecidos pelos solos urbanos afectam o meio ambiente, a saúde humana e o bem-estar. Os solos urbanos que formam condições e características diferem principalmente, dos solos naturais e agrícolas, mas as suas funções e serviços permanecem pouco quantificados. A atenção e o interesse em entender a capacidade dos solos urbanos para suportar funções e serviços específicos, tem aumentado. Actualmente, os solos urbanos enfrentam um paradoxo onde, por um lado, é o valor mais alto para o desenvolvimento da propriedade e, por outro, é quase totalmente ignorado no que diz respeito ao ecossistema que podem fornecer. É importante considerar os diferentes aspectos da monitorização e avaliação de solos urbanos em escalas múltiplas, desde o nível local até a escala regional e global, bem como os problemas semelhantes, como por exemplo, a poluição com metais pesados que foram apresentados para solos urbanos localizados em diferentes climas e zonas de vegetação, proporcionando uma oportunidade única para avaliações comparativas. As infra-estruturas verdes são as principais ferramentas para integrar soluções baseadas na natureza do desenho e gestão urbana, bem como promover um conjunto de tecnologias para monitorizar e gerir ecossistemas urbanos, incluindo biotestes, sistemas de apoio à decisão e engenharia ecológica. A “Conferência” recebeu comentários de uma audiência ampla e multidisciplinar, incluindo a comunidade científica, os serviços municipais, os serviços de protecção ambiental e outras partes interessadas dos países e que trabalham na gestão urbana e flora. A discussão multidisciplinar é um passo essencial para o desenvolvimento urbano sustentável, porque a implementação de tecnologias inovadoras e soluções baseadas na natureza, depende de uma colaboração de todas as partes interessadas, tendo como objectivo a gestão urbana inteligente. Ainda que, os pesquisadores tentem encontrar soluções para os problemas enfrentados pela humanidade, durante as últimas décadas do século XX, o tratamento dessas situações continuam a existir, bem como as respectivas perguntas e respostas. Apesar de não ter aparecido um novo paradigma, o empresário italiano Aurelio Peccei que, conjuntamente com o cientistas escocês Alexander King, fundou em 1966 o “Clube de Roma” que é constituído por um grupo de pessoas ilustres, que se reúnem para debater um vasto conjunto de assuntos relacionados com a política, economia internacional e, sobretudo, o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável, e que foi igualmente, fundador do “Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados (IIASA na sigla inglesa)”, que é uma organização internacional de investigação científica multidisciplinar, localizada no Luxemburgo e na Áustria, e considerado um dos melhores laboratório de ideias do mundo. Aurelio Peccei, a propósito do tema, afirmou que seriam necessários argumentos convincentes para prever uma potencial catástrofe nas próximas décadas e que existe a necessidade de uma grande mudança da direcção das actividades humanas As predições não foram aceitas. A ciência moderna não pode prever mudanças evolutivas na biosfera, que garantirão a segurança da população humana. É necessário precisar o significado social, científico e profissional das cidades sustentáveis. O conceito de “EcoPólis” como estratégia de urbanização e experiência, iniciou-se em 1980 na União Soviética, desenvolvendo comunidades que são coerentes com a capacidade de transporte de ecossistemas regionais. A ciência começou com a determinação de metas e termos e tenta monitorizar e modelar a dinâmica, enquanto os filósofos e outros pensadores tentam entender as tendências para definir os limites da urbanização. Após o projecto urbano de Leonardo da Vinci e da sua “Cidade Ideal”, elaborado em 1488, vários projectos utópicos foram realizados e desenvolvidos. A “Cidade Jardim”, que é um modelo de cidade elaborado no século XIX, abriu uma nova área para os seres humanos, o eco-retorno para um meio natural razoável. A industrialização, desde o século XIX, levou à expansão populacional, enorme densidade urbana, engolindo florestas e áreas agrícolas no interior dos países, o que trouxe impactos na biosfera que não foram previstos. A nova profissão de “Eco-urbanista” surgiu através do projecto de pesquisa e prática de projectos ecológicos. Durante as últimas décadas na Rússia, por exemplo, foi eliminado o planeamento e a estratégia de longo prazo na política de assentamentos humanos. A direcção da urbanização em geral não foi clara e actualmente é necessário revisitar os valores a longo prazo e apoiar a estratégia dos países nos projectos de urbanização. Os modelos devem ser seguidos pelo desenvolvimento de cenários de baixo risco na capacidade de ecossistemas regionais e no contexto etnocultural local. Assim, surgiram importantes projectos como bio-regionalismo, “EcoPólis” e “Ecocidades”, como assentamentos auto-sustentados. Na Rússia, por exemplo, vários projectos em larga escala, foram realizados a partir do início do século XX nas proximidades de Moscovo. A aproximação “EcoPólis”, foi testada em uma antiga estação de metro de Moscovo e numa outra cidade vizinha. As megacidades, como outro tipo de assentamento humano, sugerem um certo metabolismo social, onde a matéria e a energia fluem. O problema da ecologia humana não está numa pequena lista do progresso moderno. Devido a alguns cenários de crescimento populacional, podem ser esperados novos limites de gestão centralizada, dado que os sistemas desenvolverão um nível muito complexo com riscos de desastres imprevistos e acidentes normais. A estratégia de urbanização global está lentamente a dirigir-se para uma nova política integrada que é influenciada pelas alterações climáticas, mudança para a energia alternativa, aumento do nível do mar, diminuição do solo per capita no planeta, abastecimento limitado de água potável para os cidadãos a nível mundial e “stress” ambiental. Os diferentes riscos exigiram a integração de um sistema com menores riscos integrativos por meio do novo modo de urbanização, a “EcoPólis”, que é uma unidade multifuncional no planeamento e que produz parcialmente recursos vitais, como água potável, alimentos como peixe, produtos de caça, gado, legumes, trigo e frutas, bagas naturais, cogumelos e plantações adicionais de espécies de plantas locais. O serviço ecológico da cidade é realizado através da monitorização ambiental e de assentamentos, restauração de ecossistemas, conexão da rede ecológica entre ecossistemas regionais e a “EcoPólis”. A “EcoPólis” como um projecto começou com a “Cidade da Ciência” da capital russa, na era da União Soviética e que seria de alguma forma a cidade do futuro, pois não havia impacto industrial, apenas recreativo. O impacto foi cuidadosamente estudado em todas as áreas e mostrou que as necessidades recreativas como por exemplo, andar, pescar, caçar e correr usam uma superfície seiscentas vezes maior que a superfície da cidade. O treino e a educação dos líderes locais podem melhorar a visão oficial do planeamento e, possivelmente, expandi-lo para a escala de tempo geológico. Apenas e após a participação em experiências de criação de modelos de longo prazo e projectos participantes como por exemplo, com voluntários, políticos e cientistas locais, é que foi possível serem motivados e preparados para pensar e discutir futuras mudanças da paisagem, cidade e hábitos humanos, e modelar a visão comum do futuro desejado. Os valores do desenvolvimento sustentável devem começar pela mente humana e as reservas naturais da cidade devem ser planeadas e a força de trabalho deve ser dedicada a cuidar delas. A experiência da “Ecopólis” deve estabelecer um vínculo entre a filosofia académica e a prática humana diária para que se possa perceber os primeiros passos do desenvolvimento coerente dos ecossistemas regionais e do meio urbano. Esse será o novo significado das cidades modernas, a recuperação da biodiversidade e dos ecossistemas deve tornar-se o centro da criação de modelos da dinâmica do sistema urbano no caminho da satisfação sustentável das necessidades humanas.
Victor Ng PolíticaSi Ka Lon pede revisão de regime de classificação dos profissionais [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]alta de transparência, ausência de avaliações justificadas e de definição de categorias são algumas das falhas apontadas pelo deputado Si Ka lon ao regime de qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo. Criado em 2015, o diploma, diz Si Ka Lon, tem sido alvo de críticas, nomeadamente por não estar a ser seguido. As queixas vêm dos próprios engenheiros que não encontram justificação no juízo das suas qualificações. É com esta avaliação que os profissionais percebem em que categoria se encontram dentro do próprio regime e que deveria ser promovida pelo Conselho de Arquitectura, Engenharia e Urbanismo (CAEU). Com avaliações menos positivas e sem saberem porquê, os engenheiros vêm as suas possibilidades de emprego reduzidas”, aponta Si Ka Lon. O deputado dá exemplos: “alguns engenheiros, apesar de terem experiência profissional na área de engenharia electromecânica, acabam por ser avaliados como engenheiros mecânicos, o que limita gravemente o seu trabalho”, refere. Tempo de revisões Com estas situações presentes, Si Ka Lon sublinha que, decorridos dois anos da criação do regime de qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo, está na altura de proceder à sua revisão. Tendo em conta as críticas dos engenheiros, Si Ka Lon exige em interpelação, a divulgação dos critérios usados pelo CAEU para avaliar e classificar as qualificações dos engenheiros. No caso de quem já recorreu à avaliação do CAEU, o deputado sugere que se passe a ter em conta a experiência profissional de modo a alargar as possibilidades de trabalho. Si Ka Lon considera ainda que estão em falta algumas categorias na classificação dos engenheiros locais e aponta como exemplo a área da geotécnica que, existe em vários países mas não é considerada em Macau. Para que este tipo de situações não se repita, Si Ka Lon solicita ao Governo que faça uma revisão detalhada das categorias de modo a incluir aquelas que se encontram em falta. O objectivo é garantir o reconhecimento profissional no sector.
Sofia Margarida Mota Manchete SociedadePlano Director | Arquitectos questionam concurso público O Plano Director parece estar a sair da gaveta. Ainda tímido e sem qualquer definição está sujeito aos seus executores. A primeira fase do concurso público já é conhecida. São cinco as empresas e consórcios que estão na corrida. Falar de previsões é sinónimo de silêncios e anonimatos. O vencedor parece adivinhar-se e há quem fale de falta transparência [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi dado a conhecer esta semana o resultado da primeira fase do concurso publico do Plano Director. São cinco as empresas e consórcios implicados, sendo que um dos nomes se destaca. É a CAA, Planeamento e Engenharia Consultores Limitada, dirigida por Chui Sai Peng e que tem arrecadado um sem número de projectos públicos. Há quem diga que “a montanha pariu um rato” e que deveria ser o Governo a assegurar o cumprimento do Plano. A tarefa não deveria ser deixada a cargo de empresas porque “trata-se de um grande poder”. No entanto, “existindo uma CAA nos nomes da primeira fase, é quase certo quem vai avançar”. A ideia, dada por um arquitecto que preferiu não ser identificado, é partilhada por um outro colega que também optou pelo anonimato. “É um concurso que não tem em conta a maioria das empresas locais”, refere, ao mesmo tempo que salienta que “até hoje praticamente só uma empresa tem sido considerada no que respeita a urbanismo”, disse ao HM . “É essa empresa que vai continuar a ter trabalhos nesse sentido quando há no território várias pessoas qualificadas para o fazer”, diz. Já Miguel Campina, também arquitecto, apenas refere que “têm vindo a ser feitas algumas coisas na área do urbanismo, encomendadas pelo Governo de uma forma não muito transparente”. Por outro lado, Campina já não mostra muita esperança neste plano e lamenta que o trabalho já feito possa não ser sequer considerado. “Se só agora estão a lançar um concurso público para a elaboração do plano director, significa que tudo o que esteve a ser feito nos últimos dez a 15 anos não era aquilo que me disseram que era”, refere, salientando que foram feitas consultas no sentido de se falar das linhas gerais. Hoje, não sabe o que é feito desses trabalhos. Francisco Viseu Pinheiro, por sua vez, questiona porque é que “o Governo, que tem todos os dados na mão, de repente entrega a concepção do plano a uma empresa privada”. China controversa O facto de os consórcios apresentados incluírem empresas da China continental é visto de formas diferentes pelos profissionais do território. Para Miguel Campina a possibilidade de uma empresa do continente vir a ter a seu cargo o Plano Director local não significa mais qualidade. “As empresas da China têm as mesmas capacidades e aqueles que têm vindo a intervir em Macau nos últimos anos não são referência para ninguém e não deixaram aqui nada do ponto de vista das ideias que tenha sido exemplo”, explica. Já para o também arquitecto Viseu Pinheiro, a situação pode ser exactamente a inversa. É lá, considera, que estão os maiores construtores de cidades. “Metade do que se constrói no mundo é feito na China”, refere. E se “há 20 ou 30 anos a qualidade podia ser duvidável, neste momento o continente está a fazer coisas muito mais avançadas”. Para o profissional, o problema é outro: em Macau as pessoas já estão habituadas à má qualidade. No entanto, a presença de empresas continentais não poderá ser vista como um passo em frente na integração. “Não tem que ver com o futuro da integração, porque esta está feita”, afirma peremptoriamente. Para o arquitecto, “2049 já passou”, o que se pode constatar “do ponto de vista da cultura e das orientações políticas”. “Até de um ponto de vista físico isso está concretizado”, aponta. População esquecida A opinião entre arquitectos é unânime. Para existir um Plano Director há que dar corpo a uma visão de futuro do território. Para Viseu Pinheiro é a população que tem o papel principal na definição e cidade em que pretende viver. O arquitecto considera assim que esta premissa deveria existir antes mesmo do lançamento de um concurso para a elaboração do Plano Director de Macau. “Seria um dado a ter à priori e que serviria de orientação até para os requisitos do concurso”. Viseu Pinheiro explica: “A população deveria ser mais chamada a intervir no sentido daquilo que se quer. Ou seja, se se pretende uma cidade mais verde, mais amiga do ambiente e com melhor qualidade de vida, ou se se pode construir em todo o lado à custa de espaços verdes e de zonas públicas”. Por outro lado, a monitorização do projecto e da sua implementação tem, não só de ser feita pelo Governo, mas, e acima de tudo, pela própria população. “Não é só o Governo mas sobretudo as pessoas que habitam a cidade. O Plano deve ser sujeito a uma monitorização social regular”, afirma. Para sustentar a ideia, Viseu Pinheiro dá como exemplo a situação de Singapura: “Normalmente o plano é feito para um total de 20 anos mas a cada cinco anos é revisto para para que seja possível adaptar o estipulado aos novos desafios que surgem”. O exemplo de Singapura pode ser aplicado ao território. Um local que à semelhança de Macau, mudou muito nos últimos 20 anos e que passou de um lugar “sem qualquer interesse turístico e arquitectónico para ser a cidade número um na Ásia em muitos aspectos, nomeadamente no que respeita a qualidade e eficiência”. Por outro lado, considera, há que ter em conta a capacidade do próprio território. “Trata-se de uma das cidades mais densas mundialmente, factor que também deve ser de relevo no seu planeamento”. “O que falta é isso, é uma consulta pública e uma consulta a especialistas na área para definir objectivos e prioridades que depois dariam corpo ao próprio Plano Director”, remata. Onde estão os especialistas? A realização de uma consulta às opiniões de especialista é também a ideia defendida pelo presidente dos Arquitectos sem Fronteiras de Macau, Dominic Choi. “O Governo deveria ter aberto o processo a mais corpos profissionais e deveriam ter sido feitos mais workshops com a participação de profissionais do sector: arquitectos, urbanistas e engenheiros de Macau e também do estrangeiro, onde há uma maior experiência em termos de planeamento”, sugere o responsável. Esta troca de conhecimento deveria, de acordo com Dominic Choi, trazer ao território especialistas internacionais, até porque Macau não tem a experiência que a China, por exemplo, tem, e teria sido interessante um debate a nível internacional sobre o planeamento do território”. Já há também estudos que podem contribuir para uma melhor concretização do plano director. Viseu Pinheiro aponta a pesquisa sobre o mapa climático de Macau, feita pela Universidade de Hong Kong. “É um trabalho que nos diz onde estão os corredores de ventilação para a cidade e as zonas em se deve construir menos e mais. Esses elementos dão informação e, tendo em conta o tipo de cidade que se pretende no futuro, deveriam dar origem a qualquer Plano Director”, aponta Viseu Pinheiro. Mal ou bem, o concurso para a elaboração do Plano Director de Macau parece estar a avançar e os profissionais do território dividem-se no que respeita às esperanças no futuro. “Não sei se nesta altura faz sentido termos alguma ansiedade com aquilo que possa advir de novo com esse Plano Director. O prazo de realização está por determinar, diz Miguel Campina. Já Viseu Pinheiro autodefine-se como “um optimista” no que respeita ao ao futuro deste planeamento do território. A corrida dos cinco A primeira fase do concurso para a elaboração do Plano Director de Macau tem pré-seleccionadas cinco consócios e empresas. Da lista fazem parte o Consórcio Companhia de Construção de Obras Portuárias Zhen Hwa, Limitada, Shenzhen LAY-OUT Planning Consultants Ltd. e CCCC-FDHI Engineering Co., Ltd., o Consórcio Shanghai Tongji Urban Planning & Design Institute e Companhia de Consultadoria de Engenharia Kit & Parceiros, Limitada, o Ove Arup & Partners Hong Kong Ltd., o Consórcio CAA, Planeamento e Engenharia, Consultores Limitada, China Academy of Urban Planning and Design (CAUPD) Planning & Design Consultants Co. e CONSULASIA — Consultores de Engenharia e Gestão, Limitada e o Consórcio Beijing Tsinghua Urban Planning and Design Institute (THUPDI) e King Honor International Design Consultancy Limited. O Consórcio CAA, Planeamento e Engenharia, Consultores Limitada é presidida pelo deputado Chui Sai Peng enquanto que a Kit & Partners Consulting Engineering Limited tem à frente também deputado Wu Chou Kit.
Isabel Castro Entrevista Manchete PolíticaEntrevista | José Tavares, presidente do conselho de administração do IACM A criação de órgãos municipais sem poder político será uma oportunidade para reestruturar o IACM e torná-lo mais compatível com a realidade de Macau, mas não deverão ser introduzidas alterações significativas ao que hoje é feito. José Tavares, presidente do instituto, acredita que, apesar de a casa ser grande, é possível dar conta do recado sem a multiplicação de organismos. Em entrevista, confessa que não estava à espera de dirigir o sucessor do Leal Senado, casa onde começou a trabalhar há mais de 30 anos [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stá há mais de um ano na presidência do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM). Como é que está a ser a experiência? É uma experiência nova de gestão. Estamos a falar de um serviço público que é o terceiro maior em termos de pessoal, são mais de 2600 funcionários, com 11 departamentos e 33 divisões. Engloba muitas áreas e cada uma com a sua especificidade. É um desafio e, ao mesmo tempo, uma experiência aliciante, apesar de já conhecer a casa – o meu primeiro emprego na Função Pública foi no Leal Senado, num cargo entretanto extinto, o de secretário-dactilógrafo. Regressou então a casa, mas com uma responsabilidade completamente diferente, o que é um desafio. Sempre gostei de desafios. Venho do desporto. Estou habituado a desafios. “Reduzir o número de obras não é uma solução – leva a apenas a uma acumulação de pedidos. A cidade obriga a estas transformações.” Quais são as áreas que considera prioritárias no IACM? Para mim, são todas prioritárias, mas posso destacar algumas, como a segurança alimentar. É uma área que temos tratado com maior intensidade nos últimos tempos. Temos acertado alguns parâmetros e índices alimentares para que Macau possa estar de acordo com as práticas internacionais. Em 2016, foram publicados quatro novos índices e normas, incluindo os relativos ao leite em pó, e nove novas orientações. Agora, estão em fase de elaboração várias normas, sobre os limites máximos de metais pesados e de resíduos de pesticidas nos géneros alimentícios, e para a utilização de conservantes e antioxidantes. Isto quer dizer que estamos cada vez mais a elevar os nossos padrões e exigências para os alimentos importados. Macau é uma cidade de turismo e de lazer – temos toda a preocupação de fazer a protecção logo na primeira linha. Tudo isto é uma prevenção para reforçar a nossa segurança alimentar. Depois, há o investimento feito nos nossos laboratórios. Há uma atenção acrescida no que diz respeito a esta área. No início deste ano, foi feita aqui uma conferência internacional sobre aditivos alimentares, com mais de 300 participantes de mais de 50 países. Isso significa alguma coisa. São organizações internacionais que conseguimos trazer, através do apoio da China. É um sinal de que Macau quer elevar os seus padrões ao nível internacional. A par da segurança alimentar, que outras áreas é que o preocupam? Muitas áreas. As vias públicas são uma realidade que temos de enfrentar. O crescimento acelerado da cidade obriga a ter valas sempre abertas. É uma consequência da realidade do crescimento da cidade. Reduzir o número de obras não é uma solução – leva a apenas a uma acumulação de pedidos. A cidade obriga a estas transformações. O que pode ser feito é reforçar a coordenação, que tem que ver com os diversos serviços e também com os concessionários. A coordenação poderá ser melhorada. Juntamente com a secretária para a Administração e Justiça e com o secretário para os Transportes e Obras Públicas, conseguimos melhorar esta coordenação. Antes de tudo, é preciso haver um aviso prévio da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) para podermos emitir uma licença. Sem o parecer deles, não há emissão de licença, isto para presumir, logo à partida, que a montagem e o percurso da obra sejam delineados conforme a indicação da DSAT. “[As duas câmaras] tinham posturas diferentes e isso torna bastante difícil a execução de algumas políticas. Esta fusão faz todo o sentido.” Para garantir mais fluidez no trânsito? Sim, e para reduzir ao máximo os distúrbios que possam afectar a cidade durante as obras. Foi uma melhoria conseguida. O assunto foi abordado pelo Comissariado da Auditoria (CA), uma chamada de atenção feita acerca do período 2014-2015. Vimos o relatório. Achamos que há partes em que existe margem para melhorar e estamos a trabalhar nesse sentido. Outra preocupação tem que ver com os mercados e os vendilhões. Queremos alterar as leis sobre esta matéria porque já são muito antigas, vêm ainda da Administração Portuguesa. É um assunto urgente para resolvermos. As duas câmaras – o Leal Senado e a Câmara das Ilhas – tinham posturas diferentes. Nas ilhas fazia-se de uma maneira, aqui fazia-se de outra. Até hoje continua a ser assim porque a lei não foi mudada. Para nós, é muito difícil essa gestão. Depois, há ainda as zonas de lazer, que também foram alvo de um relatório do CA, que apontou algumas deficiências nos jardins e também nos espaços destinados às crianças. Tivemos essa preocupação e tudo foi composto em oito meses, conforme aquele relatório. Só que, durante este tratamento, verificámos outros problemas que não constavam da auditoria. Estamos agora a resolvê-los e espero que, até ao final do ano, o trabalho esteja concluído. Mas é um trabalho constante, porque a casa é grande. Estamos a falar de Macau inteiro. Em 2001, quando acabaram as Câmaras Municipais Provisórias, o Cotai não existia, era apenas um istmo. Faria algum sentido voltar a ter duas câmaras, atendendo a que hoje a Taipa e o Cotai têm uma dimensão muito maior do que quando foi pensado o IACM? Ou é preferível ter só uma estrutura? Acho que faz sentido ter só uma estrutura. Outrora, quando existiam duas câmaras, isso trouxe alguns problemas para a Administração, como referi. Tinham posturas diferentes e isso torna bastante difícil a execução de algumas políticas. Esta fusão faz todo o sentido. O IACM tem uma postura para todo o território. A nossa população e a nossa dimensão não justificam ter duas câmaras. Aliás, o IACM já não é uma câmara – a figura da câmara era um poder local que, agora, já não existe. O IACM precisa de ter maior autonomia, atendendo às funções de proximidade com a população? O IACM consegue satisfazer todas as necessidades da população com a sua estrutura actual. Temos uma grande proximidade com a população. Temos reuniões regulares com o Conselho Consultivo do IACM, colóquios nas freguesias, com os Conselhos Consultivos de Serviços Comunitários por Zonas, sessões abertas com a Administração, temos Centros de Prestação de Serviços ao Público, Postos de Atendimento e Informação, linhas telefónicas de atendimento ao público, com sistema de gravação de mensagens fora do horário de expediente, contas no Wechat, etc.. Não há outro serviço que tenha uma abertura junto da população como o IACM. Achamos que a actual estrutura do IACM é suficiente para dar resposta à realização de uma relação de proximidade com a população. Nos últimos tempos, o IACM perdeu competências em duas áreas – no desporto e na cultura. O desporto é uma área que lhe é muito próxima, trabalhou muitos anos neste campo. Que balanço faz destas alterações em termos orgânicos? Atendendo à complexidade de Macau, uma cidade muito densa, fez sentido libertar o IACM destas duas pastas? Fez e não fez. Fez, em certo sentido, por temos funções amplas e contacto próximo com a população. Mas também por isso os eventos culturais e desportivos podiam servir de elo de ligação com a população. Davam uma margem de manobra para o IACM poder ter um papel mais interventivo nas actividades recreativas, numa ligação mais imediata com a população. O que é que deverá ser o IACM no futuro? Acho que o IACM não deverá ser muito diferente do que é agora. O trabalho vai ser sempre feito por alguém. A criação de órgãos municipais sem poder político está prevista pela Lei Básica. São órgãos incumbidos pelo Governo de servir a população, designadamente nos domínios da cultura, recreio e salubridade pública, bem como dar pareceres de carácter consultivo ao Governo da RAEM em relação a essas matérias. Ou seja, o IACM, no futuro, não deverá ser muito diferente daquilo que conhecemos hoje. Julgo que essa mudança não traz grandes alterações em termos de prestação de serviços. Pode mudar o nome, pode mudar internamente alguns aspectos mas, por fora, o trabalho será o mesmo. Haverá um nome diferente, com uma estrutura eventualmente diferente, poderão ser feitos alguns pequenos ajustes, até porque já passaram 15 anos, aproveitando também para se adaptar à nova realidade de Macau. Com a introdução dessa figura poderemos então esperar que haja um aproveitamento do que é hoje o IACM? É uma reestruturação do IACM, porque já passaram 15 anos desde a sua criação. É preciso ter-se também em conta a nova realidade de Macau. “[A criação de um órgão municipal] pode mudar o nome, pode mudar internamente alguns aspectos mas, por fora, o trabalho será o mesmo.” Voltando ao trabalho que tem estado a desenvolver. Há planos para mais colaborações com entidades de fora de Macau, à semelhança da que estabeleceu com a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) de Portugal? Temos colaborações com várias entidades, quer aqui em Zhuhai, Cantão, Pequim, China e também em Portugal. É uma colaboração estreita, sobretudo na área da segurança alimentar. Isto é muito importante porque esta integração permite a troca de informações, há uma colaboração muito próxima em termos de tecnologias que estão a ser implementadas para a detecção de problemas. Além da segurança alimentar e do CEPA, temos uma colaboração constante com outras organizações internacionais, como na área da importação de animais e plantas em vias de extinção – que é muito importante, porque há muita prática de contrabando nesta área –, e Macau é obrigada a cumprir estas normas porque faz parte dos tratados neste âmbito, e nas áreas de inspecção fitossanitária e sanitária, e de prevenção e controlo de epidemias animais. Isto também está dentro do nosso pelouro. A colaboração com a ASAE está a ser muito frutífera, porque mal a secretária para a Administração e Justiça assinou o protocolo com o ministro, foi logo desencadeada uma série de iniciativas. O inspector-geral da ASAE esteve aqui comigo, traçámos metas, logo a seguir fizeram-se três seminários, para o ano vamos lá para acertar outras coisas, pelo que acho que está a resultar. Mas há mais ideias deste género para o futuro? A colaboração não pára aí. Estamos agora a implementar uma plataforma de transacções electrónicas online do Centro de Distribuição de Produtos Alimentares dos Países de Língua Portuguesa. É muito importante, quer para nós, quer para eles. Vem na linha da política “Uma Faixa, Uma Rota”. Iremos criar um mecanismo permanente, sincronizado e mútuo, de inspecção para produtos lusófonos que passam por Macau. Vai permitir que os produtos sejam colocados à venda no mercado com maior brevidade. É macaense, presidente do conselho de administração do IACM, um órgão com uma importância grande na cidade. Há uns anos, esperava que isto fosse possível? Sempre foi possível. O secretário Raimundo do Rosário é macaense. É nomeado pelo Governo Central. Tudo é possível. Só que eu não esperava. Foi uma surpresa para mim – agradeço o convite feito pelo Chefe do Executivo, agradeço à secretária para a Administração e Justiça, pela confiança que me foi depositada, porque nunca pensei que um secretário-dactilógrafo do Leal Senado fosse, um dia, presidente do IACM. Comecei a minha carreira aqui, tenho 33 anos de serviço, tive esta grande oportunidade. Para retribuir, vou dar o meu máximo. Sente saudades do Instituto do Desporto? Sou um homem do desporto. Continuo a ser um homem do desporto.
Sofia Margarida Mota Manchete SociedadeEntrevista | Maria José de Freitas, arquitecta Doutoranda em património de influência portuguesa, Maria José de Freitas tem tido um papel activo na preservação da herança local. Macau é um lugar com características particulares que reflectem o intercâmbio cultural de séculos. Para a arquitecta, os jovens locais estão atentos e interessados em manter a história [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]steve recentemente em Lisboa com uma comunicação acerca do património de Macau. O que é que o distingue? Falou-se neste congresso da herança transcultural. A herança que foi vivida e executada por diversos povos em diversas épocas e que, hoje em dia, é também vivida por estas culturas. É um pouco o que se passa em Macau. O território é um ponto de chegada dos portugueses no séc. XVI. Quando cá chegaram já traziam múltiplas influências, já tinham passado por África e pela Índia, por exemplo, e Macau acabou por apanhar todas estas influências que se transmitiram na sua arquitectura. Temos exemplares híbridos com as influências de Goa e da Indonésia. Quando se fala em Macau e se percebe a herança miscigenada do território, nessa simbiose cultural entre o Oriente e o Ocidente, é porque, de facto, isso é visível e quem cá chega percebe essa situação. Está presente no vocabulário e, claro, na arquitectura que é escrita na pedra. Hoje em dia, se se quer continuar a manter alguma diferenciação de Macau relativamente a algumas cidades da região, é importante preservar estes traços de cultura miscigenada. Está a falar de um cartão de visita da cidade? Sim. Já tem vindo a ser utilizado este aspecto como tal. Macau, além de ser conhecida como a cidade do jogo, é também uma cidade cultural, nomeadamente no que respeita a esta mistura. Ao longo da minha carreira, tenho trabalhado com a paisagem urbana e construída. Sendo arquitecta em Macau, o facto de ter tido alguma intervenção nalguns edifícios que estão incluídos na lista da UNESCO é extremamente gratificante, sendo que destaco o Teatro D. Pedro V e as Ruínas de São Paulo. Neste momento, estou a fazer um trabalho acerca de identidade e centros históricos. O meu estudo de caso é o Leal Senado porque foi um sítio muito importante do séc. XVI até à vinda dos governadores. Tem sido também o sítio emblemático onde as pessoas quando têm qualquer coisa a dizer se reúnem. É o local onde há manifestações culturais e políticas. Tem vários edifícios e igrejas, está no caminho das Ruínas de São Paulo. É um sítio de convergência e é o nosso centro histórico. Actualmente está a ser descaracterizado. Há alguns fenómenos de gentrificação, mas também é interessante saber até que ponto é que a população de Macau reage a isso. Como é que está a acontecer esta reacção? Os jovens e os arquitectos estão a reagir. Se reparamos, estão a ocorrer algumas alterações interessantes, por exemplo, na Rua dos Ervanários e na Rua dos Mercadores, ligadas às indústrias criativas. Há também associações de moradores interligadas com a dinâmica destes lugares porque querem manter aquilo que herdaram, escapar a estes circuitos turísticos e também manter um sentido de identidade e de pertença. Mas não estamos num paradoxo se falarmos da promoção de Macau enquanto destino cultural por um lado e, por outro, receamos os fenómenos de gentrificação que cada vez mais se registam no centro histórico? É difícil escapar à gentrificação, mas também acho que a situação é controlável. Têm de existir medidas fortes por parte do Governo, neste caso através do Instituto Cultural, e especificamente com a criação do Plano de Gestão do Centro Histórico, o tal plano que está prometido desde que a lei do património saiu, em 2013, e que já devia estar cá fora. Outro aspecto importante é que este plano deveria surgir em articulação com o plano director, que também não temos. Aliás, as duas leis foram publicadas na mesma altura porque estão intrinsecamente ligadas. Já trabalhei na elaboração de um plano de gestão em Sintra, e foi possível ser feito em dois anos. Aqui também há toda uma recolha de dados que tem de ser feita e em que podemos utilizar a georeferenciação. Já há muito património classificado, desde o Centro Histórico ao Porto Interior. Há uma classificação feita durante a administração portuguesa, o mapa de 1992, que ainda está em vigor. Graças a estas classificações, parte do património local está protegido e isso é uma grande vantagem para a cidade de Macau e para quem está a trabalhar neste plano de gestão: terem existido uma série de situações em que as diversas leis ao longo do tempo permitiram que certos locais fossem preservados. Tudo isso dá confiança ao trabalho. Foi também feito o Plano da Almeida Ribeiro pelo arquitecto Távora, que é valiosíssimo. Tudo isto em conjunto poderia permitir que, rapidamente, fosse feito o tal plano de gestão. Mas, como disse, tem de ser articulado com o plano director e penso que é aqui que reside a situação mais difícil, mas que tem de se concretizar. Na sua opinião, quais os edifícios que falta classificar em Macau? Há muitos edifícios, por exemplo, no Porto Interior, que deveriam ser classificados e não estão. Aliás, acho antes que deveriam ser definidas zonas de tampão mais alargadas e que, nestas zonas, devia seguir-se alguma restrição em termos urbanísticos. Estas restrições não deveriam ser tão exaustivas como para os edifícios classificados. Não falo em edifícios. Gosto mais de falar em zonas, em ruas e becos porque é de tudo isto que se faz a cidade. Não é o edifício em si, é também o espaço que está à volta e que permite que o edifício seja vivido, seja visto, seja usufruído pela população. São estes conjuntos que fazem um todo. Acho que toda a península de Macau deveria ser uma zona tampão e deveria ser preservado o seu interior da melhor forma possível passando, inclusive, pelo controlo do tráfico viário. Tem de haver um plano pensado em conjunto. Tem de ser um plano global e que passe pelas necessidades em termos culturais, sociais, espaços verdes e em articulação viária. E tem de dar oportunidade aos comerciantes locais, aos jovens e às indústrias criativas. Como é que sente que a população local se está a relacionar com o seu património? Tive a sorte de ter sido convidada pela Universidade de São José para dar aulas no curso de Arquitectura. Fiz um trabalho em que usámos como caso de estudo o Hotel Central e o objectivo foi perceber até que ponto qualquer alteração naquele edifício poderia ter impacto na envolvente. Teve muita receptividade por parte destes alunos. Passa por aí a preservação e divulgação do património local? Sim, penso que é por aqui, por estes jovens que se empenham nesta situação e que têm de protagonizar aquilo que vai ser o futuro. Os estudantes de Arquitectura têm muito interesse. Também tenho de dizer que, em algumas conferências em que tenho participado, nomeadamente em Lisboa, curiosamente aparecem grupos de pessoas de Macau de etnia chinesa que se manifestam interessados. No ano passado, no “Heritage 2016”, apareceu um grupo de quase dez pessoas que apresentaram trabalhos muito fundamentados acerca do património local. Continuo a colaborar com este grupo. Há ainda a Associação Embaixadores do Património que também se foca nesta matéria e promove várias actividades ligadas ao turismo cultural com base nesta herança do território. Divulgam ainda este conhecimento junto das camadas mais novas. Recordo uma conferência que fiz aqui em Macau acerca da reutilização dos espaços que são classificados ou com características ligadas ao património, e que vão tendo alterações de forma a que possam ser utilizados hoje em dia. Há que ter também em conta o papel social e cultural que os espaços podem ter nestas circunstâncias. Mas estou a dizer isto essencialmente porque a sala estava completamente cheia. Eram todos muito novinhos. Qual a reacção das pessoas ao terem mais conhecimento acerca de Macau e do seu património, quando o divulga através das suas comunicações? As pessoas ficam maravilhadas, e querem saber e conhecer mais. Já me perguntaram inclusivamente porque é que não se organiza um fórum internacional dedicado ao património aqui, ligado a esta herança. No entanto, ainda nesta minha última participação em Lisboa, de Macau estava só eu e, enquanto os outros conferencistas aparecem ligados a instituições do seu país, eu apareço com o património de cá. Sou portuguesa e não estou representar nenhuma entidade de Portugal nem de Macau. Sou uma “independente”. Não seria pertinente fazer-se acompanhar por uma instituição oficial do território dado ser um dos aspectos muito falados por cá? Sim. Em 2006 houve uma primeira conferência promovida em Coimbra acerca do património classificado de origem portuguesa. Na altura representei Macau. Este ano, conheci também um grupo de chineses bastante forte de Wuhan. Este lugar fica no meio da China e está numa zona de convergência de rotas comerciais. É um grupo bastante forte, tem uma universidade e está a fazer um trabalho interessante no que respeita ao património transcultural. Wuhan tem edifícios com influências culturais de diversos povos e de diversas épocas, e estão interessados em manter a sua preservação. Sendo chineses e estando eu em Macau, faz sentido existir uma colaboração e, eventualmente, promover um encontro cá ou em Portugal para que eles também possam expor o seu trabalho, de modo a que todos possamos encontrar uma linguagem transversal com diversas influências culturais.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaNovos aterros | Zona A concluída até final do ano O Governo foi ontem à Assembleia Legislativa dar explicações sobre a construção dos novos aterros. A zona A ficará concluída até ao fim deste ano e a habitação pública na zona norte do aterro já está a ser pensada. As ligações à zona A também serão concluídas em breve A Zona A dos novos aterros [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s trabalhos de construção e planeamento dos novos aterros estão a decorrer a bom ritmo. Foi esta a ideia deixada ontem após a reunião que o Executivo teve com a Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Terras e Concessões Públicas da Assembleia Legislativa. A zona A dos novos aterros deverá estar concluída até ao final deste ano, com alguns projectos paralelos, como a ponte de ligação com a península e a ligação com a ilha artificial, a ficarem prontos entre Setembro e Dezembro. Segundo referiu o deputado Ho Ion Sang, que preside à comissão, o Governo já está a pensar no planeamento das habitações públicas da zona norte do aterro A. “Vai ser criada na zona A uma zona subterrânea de esgotos e canalizações. Só em 2019 é que será elaborado o plano director de Macau e o Governo vai, antes disso, realizar gradualmente as obras de habitação, sendo que os projectos ainda têm de passar pelo Conselho do Planeamento Urbanístico”, disse o deputado. As obras do aterro A, que tem uma dimensão de 138 hectares, vão ficar concluídas “em paralelo com a abertura ao trânsito da nova ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau”, adiantou ainda Ho Ion Sang. Questionado sobre os problemas ocorridos com o fornecimento de areia, Raimundo do Rosário, secretário para os Transportes e Obras Públicas, garantiu que já está tudo resolvido. O aterro da zona A terá um total de 32 mil habitações, sendo 28 mil delas públicas e as restantes destinadas ao mercado privado. O Governo não adiantou mais informações sobre a possibilidades de os restantes aterros virem a ter habitação privada. Faltam estudos Perto da zona A ficará ainda a quarta ligação entre a península e as ilhas da Taipa e Coloane, que também estará situada junto ao aterro E1. Sobre este projecto, Ho Ion Sang adiantou que o Executivo “ainda está a efectuar estudos ecológicos e que só depois é que pode activar os planos”. Apesar de ainda não haver certezas sobre se a quinta travessia entre Macau e as ilhas será feita através de um túnel ou de uma ponte, as Obras Públicas também já começaram a estudar este assunto. Segundo explicou o presidente da comissão, a quinta travessia deverá ficar localizada junto à ponte Governador Nobre de Carvalho, perto dos aterros D e B, onde estará localizada a zona destinada aos edifícios da Administração e dos tribunais. Edifícios da zona B vão respeitar regras da UNESCO Os novos aterros Raimundo do Rosário não soube precisar a altura que os edifícios administrativos e judiciais vão ter mas, diz Ho Ion Sang, os projectos vão estar de acordo com as directrizes da UNESCO. “O Governo não disse qual será a altura dos edifícios do campus judiciário, mas penso que as exigências da UNESCO vão ser mantidas e que os prédios não vão ser muito altos.” O aterro B vai ficar localizado junto ao casino MGM e os trabalhos de planeamento já estão a decorrer. “Estamos em reuniões com os utilizadores dessa área e esperamos este ano retomar esses projectos”, disse Raimundo do Rosário. Os outros aterros Segundo Raimundo do Rosário, os restantes aterros também deverão ver a sua construção concluída no próximo ano. A zona C termina este ano, enquanto a zona D deverá estar concluída em 2018. Já a zona E, localizada junto à Ponte da Amizade, também fica concluída este ano. Aqui vai nascer um posto de manutenção de helicópteros e algumas zonas para a instalação de postos policiais. E depois da Barra? A construção do metro ligeiro na península continua a ser uma incógnita e, para já, só há novidades sobre o acesso até à zona da Barra. O deputado Ho Ion Sang avançou a informação de que o concurso público para a construção da estação nessa zona será iniciado este ano, sendo que a ligação será feita através da Ponte Sai Van. “O Governo está a fazer tudo de acordo com o que já tinha revelado e vai rever os itinerários. Tudo depende dos prazos das propostas apresentadas e dos valores, e só depois é que o Governo consegue ter um calendário”, explicou.
Isabel Castro VozesOs coelhinhos [dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]ensar sobre coisa nenhuma é um exercício tramado. Assim como é difícil escrever sobre coisa nenhuma, mesmo para quem está habituado à folha em branco e às ideias no vazio. Anos de desertos ideológicos não nos habituam necessariamente ao nada, à inexistência. Temos esta mania insuportável de querermos pensar em algo, de precisarmos de um objecto para inventarmos outro, de necessitarmos de um conceito para o podermos avaliar. Somos uns tontos. Pois bem. Esta semana, o Governo de Chui Sai On lançou à população um desafio metafísico de elevado grau de dificuldade: quer o Executivo que a gente pense no que deverá ser a presença do território no megalómano plano da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. Sucede, porém, que não foi dado ao povo um ponto de partida para tamanha reflexão. Na apresentação da consulta pública, que dura apenas 15 dias, não foi divulgado um plano, uma proposta ou meia dúzia de ideias. Foi lida a lista de chavões que todos conhecemos e que inclui palavras tipo plataforma, lazer, centro, mundial, lusófonos e afins. Ideias concretas: zero. Pensem vocês, dizem eles. Penso eu, respondo. Se tiver tempo, porém. Reconheçam, senhores que mandam, que 15 dias é coisa nenhuma para se pensar sobre coisa nenhuma. Não chega para se sair da abstracção para a realidade. Quando nos encontramos mergulhados no alheamento colectivo, encontrar uma ideia por semana é tarefa árdua. O objecto da consulta é vasto, extraordinariamente gigante no tamanho e de natureza ultra-diversificada. Vós pedis o impossível. Mas eu tento, dentro das minhas limitações. E isto apesar de não saber sequer se sou destinatário deste vosso pedido. Por certo quereis, senhores que mandam, que as opiniões a serem enviadas em correio rápido sejam redigidas por ilustres cabeças, cérebros mais iluminados do que o meu, uma humilde jornalista. São as elites pensantes do território que, em 15 dias, conseguem conceber um plano de integração económica, outro ao nível das infra-estruturas viárias, um terceiro sobre infra-estruturas rodoviárias e outro ainda sobre questões de harmonização jurídica, isto sem descurar, claro está, a sintonização das mais diversas manifestações culturais e linguísticas das três jurisdições em análise, os negócios, os negociantes e os negociadores. Não obstante saber que há quem tenha disponíveis 15 vezes 24 horas pela frente para vos fornecer ideias a preço de desconto – que por aqui é caro, porque tudo custa os olhos da cara e outras partes do corpo –, agradeço o facto de me terem incluído, a mim e aos meus semelhantes, em tão nobre tarefa. Há dias em que sabe bem sentirmos que somos parte da engrenagem, e não a pedra que se afasta com a biqueira pontiaguda do sapato italiano. Apesar de nos ser pedido o impossível e de, muito sinceramente, saber que não estais à espera do meu inútil contributo, aqui fica ele: há alturas em que mais vale estar calado do que atirar areia para os olhos de quem ainda vê para além do capacete local. O projecto em análise é de nível nacional. Pequim, sabe quem lê os jornais, incumbiu as partes de dizerem o que pensam. Aqui ao lado, naquela China que achamos ser densa e opaca, há já algumas semanas que se fala publicamente dos estudos que foram encomendados e das propostas concretas que contêm. Aqui dentro, nada. Os senhores que mandam sentam-se a uma mesa e dizem: povo, pensai por nós, pecadores, para Pequim ver que estamos aqui todos ouvidos, todos olhos, todos receptivos às vossas ideias sobre coisa nenhuma. Entretanto, os amigos de sempre sacam da cartola um rolo com propostas e estudos preparados de anteontem para ontem, de tão geniais que são. Eu quero uma grande baía cor-de-rosa. Uma Hello Kitty gigante que se visse da lua, mais expressiva do que a muralha. Cheia de ouro e diamantes, para respeitar a cultura transversal da província e das duas regiões. Macau deve afirmar-se pela diferença: passeios rolantes com ventoinhas penduradas em nuvens por causa do suor e dos maus cheiros, estradas revestidas a material fofo e absorvente para reduzir o barulho e amortecer as quedas em caso de acidente, hordas de turistas nipónicos com os telemóveis no silêncio e as gargantas em ‘mute’, livros a nascerem das árvores, árvores a nascerem dos livros, sofás imaculados espalhados pela cidade com música conforme o meu estado de espírito, crianças de uniformes brancos, bem-comportadas, velhinhos sorridentes a saltar à corda e coelhinhos aos pulos nos imensos jardins relvados do Leal Senado. E também me apetece que 2049 não seja amanhã, porque amanhã é um sábado de 2017, e pode ser que, nos anos que faltam, apareça alguém que não queira apenas brincar aos políticos.
Isabel Castro Manchete SociedadePlaneamento Urbanístico | Consulta pública sobre vários projectos na cidade Vários projectos foram ontem tornados públicos para que os interessados se manifestem acerca do que se pretende construir em diferentes locais do território. A maioria das plantas diz respeito à zona antiga da cidade, mas há também ideias para a área nobre. Está a ser planeado um parque de estacionamento junto à Assembleia Legislativa [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão 13 projectos de planta de condições urbanísticas que foram tornados públicos para que possam ser apreciados por quem se interessa pela matéria. Até ao próximo dia 21, as Obras Públicas recebem opiniões sobre projectos tão diferentes como edifícios classe M na zona antiga da cidade ou um parque de estacionamento subterrâneo junto à Assembleia Legislativa (AL). É o projecto de maior dimensão, a ser construído num terreno junto a Praça da AL, com uma área total de 2656 metros quadrados. O lote pertence à RAEM e o projecto submetido prevê um parque de estacionamento subterrâneo e uma área verde. O edifício a construir no local não poderá ter mais de 18 metros de altura. Na mesma zona, numa parcela igualmente detida pelo Governo, serão construídas instalações de fornecimento de energia eléctrica. O espaço junto à Avenida Panorâmica do Lago Sai Van tem 1712 metros quadrados e não será possível uma construção em altura com mais de 14 metros. Os restantes projectos submetidos a apreciação pública dizem respeito a terrenos de propriedade privada ou concessionados. Vários projectos destinam-se à construção de edifícios em lotes que, neste momento, estão votados ao abandono na zona antiga da cidade ou ocupados por edifícios em avançado estado de degradação. No Beco do Cisne há uma parcela com 65 metros quadrados na qual se pretende construir, sendo que não se admite ocupação vertical. Há condicionamentos urbanísticos definidos pelo Instituto Cultural, que determinam uma altura máxima de 20,5 metros. Também o proprietário de um terreno na Rua do Teatro terá de observar várias regras nos 56 metros de área que tem disponível. A altura das fachadas dos edifícios situados ao longo da rua deve ser mantida, ou seja, os prédios não podem ter mais de 17,8 metros. Além disso, as fachadas confrontadas com a Rua do Teatro são para preservar; caso se encontrem muito degradadas, será necessário proceder à sua reconstrução com a forma original. O revestimento tem de ser feito com telha chinesa. No n.˚ 60D da Rua da Barca, há um projecto que não poderá ultrapassar os 20,5 metros, a altura da chamada classe M. O lote em causa tem 56 metros quadrados. Na Rua de Cinco de Outubro e na Rua do Pagode, há 188 metros quadrados que vão ser alvo de uma intervenção, mas também neste caso a fachada tem de ser preservada, admitindo-se o aumento de cércea. É mais um caso de um edifício classe M. Ainda na península, estão pensadas obras para o Pátio da Tercena, num espaço de 74 metros quadrados onde não vai ser possível construir um prédio com mais de 17,8 metros. Na Travessa da Porta, há 23 metros quadrados para uma casa de 12,4 metros de altura, sendo que o construtor está obrigado a utilizar reboco pintado nas fachadas. Escolas e Cheoc Van Da lista de projectos fazem ainda parte duas escolas. Uma delas está projectada para um terreno de 8675 metros quadrados na Estrada de Coelho do Amaral e na Avenida do Coronel Mesquita. A outra deverá ser edificada numa parcela de menores dimensões, com 271 metros quadrados, na Rua do Almirante Costa Cabral e na Rua de Jorge Álvares. Há também planos para um terreno na Rua dos Açores, na Taipa, com 1980 metros quadrados, onde deverá ser construída habitação, e para um edifício em Cheoc Van, em Coloane, destinado a comércio, restaurante e clubes. As Obras Públicas explicam que, a fim de conservar a integridade desta zona de moradias unifamiliares, não é permitida a alteração do plano director anteriormente aprovado. O futuro prédio não poderá ser maior do que o actual.
Hoje Macau EventosUrbanismo | Arquivo de Macau mostra crescimento da cidade [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] partir do dia 9 de Junho, quem for ao Arquivo de Macau poderá ficar a saber mais sobre a evolução do território, com a exposição “Macau Ilustrado – Exposição de Plantas Urbano-Arquitectónicas”. A mostra é constituída por uma selecção de cerca de 60 plantas urbanas e desenhos arquitectónicos conservados no Arquivo de Macau que, organizados tematicamente, permitem aos visitantes compreender a evolução do padrão urbano da cidade, através das mudanças concretas desenvolvidas dos finais do século XIX até meados do século XX. Em nota à imprensa, explica-se ainda que a exposição revela as características de design dos edifícios de Macau, em que se nota a linguagem de variados estilos adoptada por diferentes desenhadores, que “exploraram possibilidades da fusão entre elementos ocidentais e orientais, enquanto captaram as tendências internacionais”. Durante o período da exposição serão realizadas diversas palestras abertas ao público. A primeira está agendada para o dia 17 de Junho e é da responsabilidade do arquitecto Lui Chak Keong, que vai fazer uma retrospectiva sobre o desenvolvimento urbano e arquitectónico de Macau. A palestra será conduzida em cantonense. Desconhece-se se há tradução.
Andreia Sofia Silva PolíticaUrbanismo | Seguro profissional começa a ser definido em 2019 O Governo aponta 2019 como a data em que começa a ser preparada a legislação que vai definir o seguro para profissionais ligados ao sector do urbanismo. Muitos arquitectos, engenheiros ou urbanistas terão de renovar as suas licenças sem ter um seguro profissional, apesar de ser obrigatório por lei [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stá resolvido o mistério. A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Justiça (DSAJ) afirma que só em 2019 é que começam a ser definidas as directrizes para o estabelecimento de um seguro profissional para o sector da construção civil. Em resposta a uma interpelação escrita da deputada Kwan Tsui Hang, Liu Dexue, responsável máximo da DSAJ, avança que, “como o regulamento administrativo nesta área envolve a área dos seguros, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) precisa de discutir o assunto com o sector e com vários departamentos”. “O regulamento administrativo só vai entrar em processo legislativo em 2019”, lê-se. A obrigatoriedade de engenheiros, arquitectos ou urbanistas de serem portadores de um seguro profissional consta no regime de qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo, que entrou em vigor em 2015. Desde essa data que a legislação sobre seguros está por concretizar, sendo que o seguro é uma das componentes necessárias para a renovação das licenças profissionais. Numa interpelação escrita entregue ao Executivo em Fevereiro, Kwan Tsui Hang questionava a ausência desta legislação. “O regime das qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo entrou em vigor em 2015 mas, até agora, ainda não foi publicado o seu respectivo regulamento administrativo complementar que regula a matéria do seguro, e já passou mais de um ano.” O arquitecto Rui Leão chegou mesmo a chamar a atenção para as consequências negativas desta lacuna. “Cria vários problemas ao nível da responsabilidade e acautelamento dos profissionais”, alem de colocar “o Governo numa situação de grande fragilidade, através das obras públicas, mas também os donos das obras privadas”. Ao mesmo tempo Na resposta à deputada ligada à Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), Liu Dexue garante que a DSAJ vai levar a cabo uma melhor coordenação dos regulamentos administrativos, para que entrem em vigor na mesma altura das leis correspondentes. “Será implementado um calendário para os diplomas complementares, para executar os trabalhos legislativos conforme o plano. A DSAJ vai seguir o ponto de situação das propostas de acordo com os calendários já definidos, por forma a preparar a entrada em vigor dos regulamentos de forma atempada”, apontou. O responsável pela DSAJ acrescentou ainda que está a ser elaborado um plano de curto e médio prazo “com vista a definir as directrizes dos trabalhos legislativos entre 2017 e 2019”. Neste plano entram não apenas as propostas de lei, mas também os regulamentos administrativos complementares. Na visão de Liu Dexue, no caso do regime do ensino superior e do regime de previdência central não obrigatório a “entrada em vigor atempada” da legislação complementar será uma realidade. O dirigente máximo da DSAJ adianta ainda que os departamentos públicos já reuniram para debater as razões por detrás destes atrasos. “Os funcionários [dos departamentos] confirmaram que, durante o planeamento da proposta de lei, devem ser definidos o mais cedo possível os diplomas complementares, para que possam entrar em vigor ao mesmo tempo”, rematou.
Andreia Sofia Silva Manchete ReportagemLai Chi Vun | Os projectos e as ideias antes das demolições Muito antes de o Governo decidir deitar abaixo os estaleiros, a povoação de Lai Chi Vun foi alvo de vários projectos vindos do sector privado. A muitos deles, o Governo nunca deu uma resposta, chegando a rejeitar outros. O HM revela três projectos propostos por dois amantes da indústria naval, sem esquecer as ideias de estudantes de Arquitectura [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]ouve uma altura em que se pensou além do vazio virado para o mar. Sobre Lai Chi Vun já muito se criou antes de se decretar a demolição dos velhos estaleiros. Alunos de Arquitectura e amantes de barcos feitos com madeira dedicaram tempo pessoal a estudar e a apresentar sugestões para revitalizar a povoação. Muitas propostas foram entregues ao Governo, explicadas ao detalhe, ou então foram discutidas em debates públicos nos quais membros do Executivo estiveram presentes. Para Lai Chi Vun pensaram-se edifícios multiusos, ligações ao Cotai ou ao campus da Universidade de Macau, museus, um parque temático ligado à indústria naval, pequenas moradias. Muitos destes projectos acabaram por ficar na gaveta, pendentes, à espera de uma resposta que nunca chegou. Noutros casos, houve recusas. Um dos projectos partiu de Henrique Silva. O seu amor pelos barcos levou-o a preparar um projecto conceptual em parceria com uma empresa que se dedica à construção de empreendimentos navais virados para o turismo. A proposta foi apresentada ao Governo no ano passado. “Este projecto contemplava a existência de oficinas, que é uma coisa que não existe em Macau para quem precisa de manutenção de barcos, um museu e um clube para iates. E ainda uma escola de vela”, explicou ao HM. Além disso, “na zona onde ficaria a marina colocar-se-iam vivendas”, para dar uma oportunidade de investimento ao sector imobiliário. “Criava-se ali uma zona privilegiada, porque o turista que chega de barco não é propriamente uma pessoa pobre, e ficaria ainda com acesso privilegiado ao Cotai. Todos ganhavam, porque o projecto também ajudaria a desenvolver a economia tradicional de Coloane, sem ter de a destruir. Desenvolvia-se um núcleo diferente, com outro tipo de animações”, apontou Henrique Silva. A ideia era, assim, criar um complexo náutico “de nível internacional”, uma vez que a Doca de Lam Mau, localizada na zona do Fai Chi Kei, é de mais difícil e longínquo acesso. “Mantinha-se a memória do espaço e depois poderiam ser incorporados mais pormenores”, disse ainda. Parque temático à beira-mar Tam Chon Ip estudou arqueologia, é freelancer e um apaixonado pela cultura de um território que o viu nascer. Também ele teve ideias que gostaria de ver implementadas em Lai Chi Vun. A abertura de uma espécie de parque temático foi uma delas. “O nosso plano visava a preservação dos estaleiros para serem mostrados ao público, com a implementação de uma zona de teatro, um espaço público e outro tipo de infra-estruturas. Teríamos elementos não comerciais, com a conservação da arte e cultura. A parte mais importante seria um parque temático com workshops sobre a construção de barcos. Os participantes poderiam vivenciar a experiência da cultura tradicional de Macau”, resumiu ao HM. Um dos pontos centrais do projecto seria o estaleiro Liuhe, onde foi construída a Lorcha Macau. “Sempre pensei que indústria de construção de barcos se poderia transformar em algo cultural e criativo, em que o lado tradicional e inovador poderiam combinar. É possível optimizar a povoação para os turistas, moradores e residentes. A própria povoação de Lai Chi Vun é um museu ao ar livre.” Apesar do esforço, Tam Chon Ip acabou por ver algumas das suas ideias recusadas, ao nível de pedido para financiamento. “Temos vindo a promover o projecto e também nos candidatámos a vários apoios, mas alguns projectos não foram aceites, o que criou dificuldades.” Este amante da história e da cultura chegou a promover uma pequena exposição sobre os estaleiros em Lai Chi Vun, “mas não houve qualquer novidade depois da visita das autoridades”. Ligação a Hengqin Em 2013, a povoação de Lai Chi Vun obteve projecção internacional ao ter sido alvo de um projecto desenvolvido por alunos de Arquitectura do Instituto Politécnico de Milão, no âmbito do Prémio Compasso Volante. José Luís Sales Marques, presidente do Instituto de Estudos Europeus de Macau (IEEM), presidiu ao júri, que contou também com a presença do arquitecto Carlos Marreiros. “Foi feito um concurso aberto a estudantes de pós-graduação de várias universidades, nomeadamente o Politécnico de Milão, a Universidade de Palermo, uma universidade de Singapura e outra do Japão. Nesse concurso os alunos vieram a Macau, estiveram alguns dias cá e fizeram vários levantamentos sobre a zona de Lai Chi Vun e a história de Macau”, contextualizou. Os estudantes foram orientados pelos professores, fizeram os projectos e apresentaram-nos primeiro em Palermo, e depois em Milão. “Foi uma oportunidade para expor questões importantes do ponto de vista de reabilitação urbana, e procurar soluções arquitectónicas para problemas que existiam e continuam a existir na cidade”, indicou José Luís Sales Marques. O presidente do IEEM recorda que foram apresentadas “várias soluções”, incluindo a possibilidade de construir uma ligação entre Lai Chi Vun e a Ilha da Montanha, no pedaço de terreno onde funciona o campus da Universidade de Macau. “Foi um exercício muito válido e interessante, que envolveu muita gente, uma comunidade internacional bem informada. Os trabalhos estão bem fundamentados, há pormenores, e descrição do ambiente e do local. As soluções apresentadas eram destinadas sobretudo ao lazer, que é muito aquilo que o Governo pretende para aquela zona.” A importância das técnicas Numa entrevista concedida o ano passado ao HM, Carlos Marreiros revelou alguns detalhes sobre as propostas que o Governo viu, mas sobre as quais nunca reagiu. Foi pensada “a construção de residências de luxo, com apenas três andares, integradas na colina”, sem esquecer a edificação de “uma pequena marina e um museu, incluindo uma super cobertura integrada com a actual estrutura dos estaleiros. A iniciativa privada fazia as suas contas, o Governo adquiria isto e geria-o”. À data, Marreiros confessou que sobre Lai Chi Vun não havia nada de concreto. “Fizemos estudos, propusemos ao Governo, não há resposta. Havia uma parte para viabilizar a construção, para construir e ganhar dinheiro”, apontou. Sales Marques entende que já não é possível deixar os estaleiros como eles estão, mas fala sobretudo da necessidade de manter vivas as técnicas de outrora. “São construções lacustres, que têm uma grande beleza. São estruturas industriais mas feitas com grande plasticidade, e isso também é importante, porque pode servir de inspiração para outras coisas. Os alunos que vieram de Milão ficaram maravilhados com aquela plasticidade, as soluções, o tipo de construção, como se resolviam problemas de arquitectura, com recurso a meios bastante simples.” As exposições do Prémio Compasso Volante levaram à organização de um debate no Albergue SCM, mas poucas respostas foram obtidas. “A nossa ideia era fazer uma exposição com a associação de moradores da zona, mas não conseguimos encontrar um local para isso [em Lai Chi Vun]. Fizemos então um debate ao ar livre nas instalações do Albergue, em que estiveram responsáveis do Instituto Cultural. Apresentamos as ideias todas na altura”, concluiu Sales Marques. O presidente do IEEM frisou que “a questão que se coloca é que não há qualquer resposta”. “É importante perceber o que existe na cabeça de quem manda nestas coisas.” Sales Marques, que se debruçou sobre o estudo de uma importante indústria naval, recorda que nos idos anos 50 e 60 chegaram a morar cerca de 50 mil pessoas na zona do Porto Interior, nas chamadas aldeias flutuantes. Nos dias de hoje parece não haver vontade de preservar essas memórias. “O que é triste em Macau é que as pessoas não dão valor a essas coisas, ao simbolismo, às coisas que nós fazemos. É pena que, por inacção, tenhamos de chegar ao ponto em que parece que não há alternativa se não a demolição. Aquele deve ser um espaço público, e não deve ser privatizado para a construção de luxo”, defendeu Sales Marques.