Timor-Leste | Lu-Olo diz que tribunal confirma cumprimento Constituição

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Presidência timorense disse ontem que um acórdão do Tribunal de Recurso, agora divulgado, confirma que o chefe de Estado cumpriu “escrupulosamente” os deveres constitucionais quando decidiu dissolver o Parlamento Nacional.

Em causa está uma queixa levada ao Tribunal de Recurso pelo Provedor dos Direitos Humanos e Justiça (PDHJ) que solicitava a fiscalização abstracta da constitucionalidade do decreto 5/2018, ao abrigo do qual o Presidente timorense, Francisco Guterres Lu-Olo, dissolveu o Parlamento Nacional.

“A 23 de Abril de 2018, o colectivo de juízes do Tribunal do Recurso veio a decidir que o requerimento do PDHJ a pedir a declaração da inconstitucionalidade do decreto que dissolve o Parlamento Nacional, era improcedente, ou seja, não tinha razão de ser”, declarou o chefe da Casa Civil da Presidência timorense, Francisco Maria de Vasconcelos.

O responsável indicou que o acórdão foi recebido na Presidência na passada sexta-feira.

“Assim, o Presidente da República cumpriu e fez cumprir escrupulosamente os seus deveres constitucionais quando decidiu, como lhe competia, dissolver o PN”, sublinhou. O chefe da Casa Civil lembrou que “a decisão do Tribunal de Recurso vincula a todos”, e acrescentou que o “Presidente da República espera dos demais órgãos o mesmo rigor no cumprimento da Constituição e das leis” do país.

A queixa da PDHJ baseia-se numa primeira queixa apresentada a este organismo por um grupo de 16 cidadãos que entendeu que o decreto de dissolução não tinha fundamento legal. Na queixa, o PDHJ “assumiu” que o decreto de dissolução parlamentar “era inconstitucional porque não tinha fundamento”, mas “não apresentou em processo, nem matéria de facto e de direito”.

Francisco Guterres Lu-Olo dissolveu o Parlamento Nacional para resolver o impasse político que se vivia há vários meses em Timor-Leste, com um Governo minoritário e a oposição a bloquear o programa e o orçamento do Governo.

3 Mai 2018

Timor-Leste | Bispo de Baucau tenta acalmar tensões de campanha eleitoral

Os debates sobre a história da luta timorense, na campanha eleitoral, são, para a nova geração, como o Antigo Testamento e podem não ser uma “opção feliz”, disse ontem o presidente da Conferência Episcopal de Timor-Leste

 

[dropcap style≠’circle’]”R[/dropcap]eescrever a história de Timor à base de comício é uma forma de fazer lembrar as coisas, mas interrogo-mo sobre se será a mais feliz”, disse Basílio do Nascimento, no final de um encontro com o Presidente timorense, Francisco Guterres Lu-Olo.

“Para a população nova, tudo aquilo que aconteceu no passado, – e perdoem-me a expressão bíblica – faz parte do Antigo Testamento. E as gerações antigas que participaram na criação disso, não é novidades para elas”, considerou.

Basílio do Nascimento, presidente da Conferência Episcopal e bispo de Baucau, a segunda cidade timorense, participou com o bispo de Díli, Virgílio do Carmo da Silva, e com o bispo de Maliana, Norberto do Amaral, num encontro de cerca de 70 minutos com Lu-Olo. À saída do encontro, Basílio do Nascimento referiu-se à tensão que marcou a primeira metade da campanha para as legislativas, em que parte do discurso de líderes e militantes da Aliança de Mudança para o Progresso (AMP, oposição), incluindo Xanana Gusmão e Taur Matan Ruak, foi marcado por duras críticas à Fretilin e aos seus dirigentes, especialmente a Mari Alkatiri.

Muitos dos comentários referiam-se à luta contra a ocupação indonésia e pela independência de Timor-Leste, com tentativas de alguns dirigentes de politizarem os diferentes braços da resistência: armada, clandestina e diplomática. “É uma forma de reescrever, de rememorar, se calhar nem sempre com as expressões mais felizes. É uma forma de lembrar às gerações novas aquilo que aconteceu”, considerou o prelado. “Não sei se valerá a pena pôr a descoberto tudo o que constituiu o passado, sobretudo as partes negativas, que também fazem parte, mas que se calhar é preferível ficar nos livros do que espalhar na campanha. Mesmo que haja situações com razão, as palavras podem ferir e penso que é preferível evitar feridas”, disse.

Este é um “momento importante na vida da nação” e o crucial é que, apesar da tensão, se trata apenas de “violência linguística” sem passar para a violência física, o que é positivo, considerou. Basílio do Nascimento mostrou-se ainda optimista sobre um aumento da taxa de participação relativamente ao passado.

Palavras aos actos

Um jovem ficou ligeiramente ferido, na quarta-feira, num incidente que envolveu uma caravana de apoiantes da Aliança de Mudança para o Progresso (AMP, oposição), após um comício, no leste do país, informou o comandante da polícia.

O comandante da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL), Julio Hornay, disse à Lusa que o incidente ocorreu na quarta-feira, depois de militantes da AMP terem realizado um acto de campanha em Laga, a cerca de 40 quilómetros a leste de Baucau, segunda cidade timorense. Hornay afirmou que não se tratou de um confronto entre partidos.

“Alguns jovens da caravana da AMP, quando estavam a regressar, depois do comício passaram numa zona e começaram a lançar pedras contra um ou dois quiosques. Alguns residentes responderam e um rapaz ficou ferido na boca quando foi atingido por uma pedra”, disse.

“A polícia interveio de imediato, usou gás lacrimogéneo e dispersou o grupo e a calma foi restabelecida de imediato. Estamos nesta altura a ouvir testemunhas para completar a investigação”, afirmou. O responsável policial acrescentou que este era o único incidente a registar até agora durante a campanha eleitoral para as legislativas antecipadas de 12 de Maio e que a situação no país permanece calma.

27 Abr 2018

Timor-Leste/Eleições: Fretilin não viabilizará eventual Governo AMP com cheque em branco, diz Mari Alkatiri

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] líder da Fretilin, maior partido timorense, disse que não passará “um cheque em branco” para viabilizar um eventual Governo da AMP, se a coligação da oposição vencer as eleições de Maio sem maioria absoluta.

“A Fretilin quer que este país vá para a frente, mas não vamos apoiar um Governo do CNRT que falhou durante 10 anos, com um cheque em branco. Para viabilizar tem que ser claro quais são os limites”, disse Mari Alkatiri, secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) e atual primeiro-ministro, em entrevista à Lusa.

Questionado sobre se isso leva a supor que a Fretilin considera ter dado esse cheque em branco nos últimos anos ao Governo liderado pelo CNRT, Alkatiri admite que “de certa forma sim, foi um cheque em branco” considerando que a governação “durante 10 anos foi negativa”.

Alkatiri falava à Lusa numa pausa da campanha para as legislativas antecipadas de 12 de maio, marcadas por uma reviravolta nas alianças do passado, com Xanana Gusmão e o seu anterior rival, Taur Matan Ruak, juntos na Aliança de Mudança para o Progresso (AMP).

Num cenário de derrota da Fretilin, Alkatiri considera ainda “muito pouco provável” que continue com as suas funções de presidente da Zona Especial de Economia Social de Mercado (ZEESM) no enclave de Oecusse-Ambeno.

“Com este clima que se esta a gerar durante a campanha, não haverá mais ambiente para o entendimento. Só que é uma pena. Não quero dizer que sou o melhor dos melhores, mas fundamental na ZEESM é o modelo de gestão que eu ainda não deixei”, afirmou.

Os comentários de Mari Alkatiri confirmam a degradação do relacionamento entre si e Xanana Gusmão e entre os dois partidos, o CNRT que liderou os últimos três Governos e a Fretilin que ajudou a viabilizar o executivo entre 2015 e 2017.

Os dois partidos estiveram juntos na candidatura do presidente da Fretilin Francisco Guterres Lu-Olo a Presidente da República em 2017 mas a relação começou a degradar-se depois da formação do VII Governo, liderado por Mari Alkatiri.

Na campanha de 2017, em que Xanana Gusmão se mostrava convicto de uma vitória por maioria absoluta do seu partido, o líder timorense disse à Lusa, sobre o futuro e a relação do CNRT com a Fretilin, que os dois partidos continuam com “excelentes relações, de respeito” e que “não terão êxito” tentativas de outros partidos “provocar distúrbios ou problemas entre os dois”.

Para Mari Alkatiri a aliança acabou por falta do “respeito mutuo” que é necessário “para que ambos sejam iguais mas que, neste caso, não existiu verdadeiramente”.

“Éramos aliados, entendíamo-nos num projeto nacional e entre nós parecia que havia uma aliança entre iguais, mas a tendência do Xanana é que se pode aliar com todos, mas ele tem que estar sempre acima dos outros”, defendeu.

“Não aceita resultados democráticos. Baseia-se na legitimidade dita histórica para dizer que está sempre acima dos outros, a comandar”, referiu.

Questionado sobre o facto de muitos fazerem a mesma avaliação quanto à atuação de Mari Alkatiri, o ainda primeiro-ministro é enfático: “mas eu ganhei as eleições e se era para consolidar esta mesma aliança ele devia aceitar isso”.

“Era isso mesmo que o povo queria, que passasse a Fretilin a liderar mas com a consolidação da aliança”, afirmou, mostrando-se convicto de que a situação atual não aconteceria num cenário inverso, da vitória, ainda que por margem curta, do CNRT.

“Não, porque a Fretilin teria respeitado, para manter a estabilidade no país”, afirmou.

Questionado sobre o falhanço das negociações para conseguir um Governo maioritário – e em particular as críticas de que esse falhanço se deve ao facto de ter tentado negociar modelos diferentes com todos – Alkatiri diz que lidou com a realidade e o caráter de cada partido, tendo havido demasiadas exigências do Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO).

“As pessoas entendem que a aliança não deve ter como base o respeito pelos resultados eleitorais. E então pedem demais. Como pode um partido com 5 deputados querer 7 lugares no Governo e querer lugares chave, segurança e defesa”, disse.

“Como pode um que diz que vai fazer incidência parlamentar, o CNRT, porque não quer participar no governo, mas quer manter elementos da sua confiança nas áreas fundamentais da governação: infraestruturas, finanças, petróleo, solidariedade e de certa forma mantendo a influência sobre educação? Seria eu o primeiro-ministro mesmo num cenário destes?”, questiona.

Sobre o seu próprio futuro na Fretilin e se se demitiria em caso de derrota, Alkatiri disse que “Xanana perdeu e não se afastou” da liderança do CNRT, afirmando que os querem a sua saída pretendem enfraquecer o partido.

“Mas já tenho uma nova geração com coragem para enfrentar Xanana Gusmão, Taur Matan Ruak. Mas isso foi formado. Levou tempo”, disse.

Timor-Leste/Eleições: Ataques da campanha são tentativa de passar esponja na história

O líder da Fretilin, no Governo em Timor-Leste, afirmou que os ataques de que tem sido alvo durante a campanha para as eleições antecipadas de 12 de maio são uma tentativa de “passar uma esponja pela história”, a que não vai responder à letra.

“É uma tentativa de passar uma esponja pela história, para se afirmar o culto da personalidade. Isso não é de agora, a tentativa de matar a Fretilin e as Falintil que são os capitais simbólicos da resistência, para aparecer o culto da personalidade”, afirmou Mari Alkatiri, secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin).

Alkatiri referia-se assim a várias críticas que têm marcado a primeira metade da campanha, insistindo que não está a responder a “insultos” e que prefere explicar ao eleitorado e o programa do partido.

“Não há troca de insultos porque não insultei ninguém. O insulto é num sentido só. Não faço campanha contra ninguém, faço campanha para tirar o povo da pobreza e da pobreza extrema que existe aqui. Essa é a única campanha”, afirmou.

Os líderes e militantes da Aliança de Mudança para o Progresso (AMP), incluindo Xanana Gusmão e Taur Matan Ruak, têm marcado parte do seu discurso por duras críticas à Fretilin, ao ex-Presidente e atual ministro, José Ramos-Horta e a Mari Alkatiri.

Muitos dos comentários referem-se ao passado da luta contra a ocupação indonésia e pela independência de Timor-Leste, com tentativas de alguns dirigentes de politizarem os diferentes braços da resistência: armada, clandestina e diplomática.

“As pessoas querem afirmar-se matando outros pela segunda ou pela primeira vez porque sabem que não conseguem afirmar-se sem matar outros, no sentido figurado, claro. Mas têm que se convencer que não vão conseguir isso”, afirmou.

Questionado sobre o regresso de José Ramos-Horta ao partido – tem feito ativamente campanha pela Fretilin – Alkatiri diz que traduz uma “consciência nacional, da nação toda, de que é tempo de se fazer justiça, de não se deixar que uma pessoa só se afirme como dono deste país”.

E recua ao passado, reiterando o reconhecimento pelos que lutaram no mato, mas insistindo que se deveu à Fretilin a formação da rede clandestina nacional que apoio os guerrilheiros e os laços com a rede externa.

“Se as populações nas zonas ocupadas, depois de 1981, 82, 83 se organizaram e se criou a frente clandestina, para servir de base de apoio às Falintil e de trampolim de informação para o exterior, foi porque esta gente teve três anos a ter uma edução patriótica intensiva nas zonas controladas pela Fretilin. Não nasceu pela cara bonita de A, B ou C”, disse.

“Os guerrilheiros quando estavam a ser perseguidos nas montanhas refugiavam-se nas populações. Já nos anos 90 Xanana escreveu uma carta para nós em que disse: “os indonésios perguntam à Fretilin se viu a Fretilin e a Fretilin responde que não viu a Fretilin”, explicou.

Ainda que seja necessário par ao país escrever a sua história, Alkatiri discorda que isso se tente fazer em campanha, quando há posições extremadas em que cada um quer vencer “e falseia a história”.

“Eu não tenho interesse nenhum nisso. Fiz o meu trabalho. Dentro das limitações que todos tínhamos. E acho que cumprir a minha missão. Mas não me declaro herói. Cada um fez o seu trabalho e tudo juntos é que conseguimos levar o pais a restaurar a independência”, afirmou.

“Tudo o que eu já fiz podem levar, dizer que é vosso. Mas o que eu ainda vou fazer só me pertence a mim, porque sai da minha cabeça, do meu coração e do meu pensamento”, disse.

Sobre as eleições, insiste que a Fretilin está “muito mais forte que em 2017”, com muitas organizações divididas a regressar ao partido e que a vantagem matemática com que a AMP parte – os três partidos tiveram, juntos, 85 mil votos mais que a Fretilin – não se manterá.

“Esta coligação é para subtrair não para adicionar, porque é contranatura. Não existe vantagem. Por isso sempre lhes disse que eles dançam com os 35 [deputados] no salão [do Parlamento Nacional] que nós vamos cantar e dançar com o povo”, disse.

A AMP é formada pelos três partidos da oposição – CNRT, PLP e KHUNTO – que em conjunto controlam 35 dos 60 lugares do parlamento e que bloquearam o programa e orçamento do Governo.

“Eles estão a descer cada dia, porque têm reagido de forma emocional, pouco racional. Espero que parem por aí, porque se não isso é prejudicial para eles. Especialmente para figuras como Xanana e Taur Matan Ruak que são figuras incontornáveis da luta, são património da luta. E eu não nego o papel de ninguém na história da luta”, afirmou.

E mostra-se convicto de que a aliança entre Fretilin e PD, no atual Governo, continuará depois das eleições, rejeitando o que dizem que o partido liderado por Mariano Sabino facilmente voltará a apoiar um executivo liderado por Xanana Gusmão.

O PD, disse, é um “partido de futuro”, não quer repetir o “fracasso” da Governação com o CNRT e tem com a Fretilin “uma aliança sólida” que vai permitir que “os dois partidos com raízes no povo se mantenham”.

“O CNRT sem Xanana não existe. O PD perdeu o seu líder e manteve-se, mostrou isso. A Fretilin, é parte da historia, da cultura da Fretilin que cai um e outro aparece”, disse.

25 Abr 2018

Austrália abre período de submissões sobre tratado fronteiriço com Timor-Leste

O Comité de Tratados do parlamento australiano abriu o período de submissões públicas de cidadãos ou organizações sobre o novo acordo de fronteiras marítimas com Timor-Leste, no âmbito do processo de ratificação do documento

 

 

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] processo de ratificação pelo parlamento é necessário para a entrada em vigor do histórico tratado que os dois governos assinaram a 6 de Março em Nova Iorque e que delimita de forma permanente a fronteira marítima entre Timor-Leste e Austrália.

A legislação australiana prevê um prazo anterior ao processo de ratificação, que neste caso termina a 20 de Abril, para submissões públicas sobre o documento, que foi entregue ao parlamento pela ministra dos Negócios Estrangeiros australiana, Julie Bishop, no final de Março.

A vontade do governo australiano é que o parlamento possa votar o tratado “ainda este ano”, segundo Bishop, tendo já iniciado o processo de preparação “da legislação de implementação” e a trabalhar com Timor-Leste e com as empresas que operam no Mar de Timor para finalizar o processo transitório relacionado com as alterações impostas pelo documento.

Em concreto, o tratado implica, por exemplo, que Timor-Leste passa a receber 100 por cento – agora recebe 90 por cento e a Austrália 10 por cento – das receitas dos poços activos na região, nomeadamente o Bayu Undan.

Na altura em que apresentou o tratado ao parlamento, Bishop disse que a Austrália está empenhada em que o futuro de Timor-Leste seja “estável e próspero”, apoiando por isso as suas aspirações de “alcançar o seu potencial económico”.

 

Ouro negro

 

Julie Bishop referiu-se em concreto à maior questão ainda pendente, nomeadamente o desenvolvimento do campo petrolífero de Greater Sunrise, sobre o qual continua sem haver um acordo.

“Reconhecemos que o desenvolvimento do [Greater Sunrise] trará benefícios significativos a Timor-Leste em particular. Estamos ansiosos por colaborar com Timor-Leste, enquanto trabalha com as empresas da ‘joint venture’ para encontrar um caminho comercialmente viável para desenvolver o Greater Sunrise”, disse a governante.

Para a ministra, “O tratado é uma conquista histórica para a Austrália e Timor-Leste”.

“Resolvemos uma longa disputa, estabelecemos limites marítimos permanentes e lançámos as bases para um novo capítulo no relacionamento com um de nossos vizinhos mais próximos”, explicou Julie Bishop na sua declaração ao parlamento. Segundo a chefe da diplomacia australiana, “é um exemplo do valor e da importância do direito internacional na resolução de disputas e divergências entre estados através de negociações pacíficas”. “Como dissemos no documento da Austrália sobre Política Externa divulgado no ano passado, a Austrália acredita que a ordem internacional baseada em regras é fundamental para a nossa segurança e prosperidade colectivas”, frisou ainda.

Destacando a “boa vontade e compromisso dos dois países durante as negociações”, Bishop saudou ainda o “papel vital” da comissão de conciliação independente que conduziu as negociações que levaram ao tratado.

O processo de ratificação do tratado pelo Parlamento Nacional de Timor-Leste só deverá ocorrer depois da tomada de posse dos deputados que vão ser escolhidos nas eleições antecipadas de 12 de Maio.

10 Abr 2018

Lu Olo pede campanha em Timor-Leste sobre programas e sem ataques pessoais

O Presidente timorense apelou no fim-de-semana aos líderes políticos do país para que na campanha para as eleições de 12 de Maio debatam programas, evitando ataques pessoais, com propostas de consolidação do desenvolvimento e da paz em Timor-Leste

 

[dropcap style≠‘circle’]”O[/dropcap]s cidadãos querem ouvir falar do programa político para desenvolver Timor-Leste. Vamos fazer uma campanha eleitoral livre, honesta e útil para melhorar o país”, afirmou Francisco Guterres Lu-Olo num discurso perante os principais líderes nacionais.

“Apelo aos líderes, aos candidatos todos, aos activistas e simples cidadãos: não insultem. Apresentem políticas para o desenvolvimento. Para o bem do país, vamos trabalhar para tornar esta eleição um acontecimento importante no caminho do desenvolvimento, no processo de construção desta terra amada e no combate à pobreza em Timor-Leste”, frisou.

O chefe de Estado falava na sede da Comissão Nacional de Eleições (CNE) no encerramento da cerimónia de assinatura de um pacto de unidade nacional por representantes dos oito partidos e coligações candidatos às eleições legislativas antecipadas de 12 de Maio.

Centenas de pessoas, incluindo os titulares dos órgãos de soberania, líderes políticos, sociais e religiosos do país e representantes do corpo diplomático, acompanharam o evento, que começou com rituais conduzidos por chefes tradicionais (lian nain). A cerimónia decorreu dias antes da campanha eleitoral que começa na terça-feira com os partidos políticos espalhados em acções em praticamente todo o território timorense.

 

Busca de estabilidade

 

Falando directamente aos líderes partidários, “mais velhos ou mais novos”, Lu-Olo pediu que as críticas e os debates na campanha se foquem “nas políticas e nos programas eleitorais que propõem” e “não no ataque às pessoas”.

“Não tenho dúvida de que as críticas podem ser necessárias e úteis para fazer o debate político avançar e apontar caminhos para o desenvolvimento”, afirmou. “Mas, agora, quando conquistámos a paz pelo sacrifício do nosso povo – do povo todo – os cidadãos não querem ouvir mais ataques às pessoas. Os cidadãos não querem sentir-se atacados por serem do partido A ou B ou C. Não”, enfatizou.

Para Lu-Olo, as eleições de 12 de Maio devem servir para ajudar a “aprofundar a determinação dos cidadãos” com o trabalho focado “nas prioridades de desenvolvimento para melhorar as condições de vida do povo”.

Frisando a importância do pacto de unidade nacional dos partidos e coligações, o Presidente da República disse que compete a todos os líderes políticos “garantir a paz, a estabilidade e as condições para o exercício dos direitos dos cidadãos, incluindo o direito ao desenvolvimento”. “Promover condições favoráveis ao desenvolvimento é um dever de todos e, em primeiro lugar, dos que querem estar na vanguarda do povo, para servir melhor Timor-Leste e os timorenses”, afirmou.

O voto de 12 de Maio, relembrou, é uma oportunidade para dar “uma nova demonstração da cultura democrática do país e conquistar o reconhecimento e admiração da comunidade internacional”, transformando a política “num instrumento de desenvolvimento e melhoria do bem-estar para todo o povo”.

Deixando apelos à máxima participação eleitoral para “reforçar a democracia” timorense, Lu-Olo sublinhou a importância do pacto de unidade nacional, vincado em tradições ancestrais que são a “raiz” do país mas que podem e devem ser “harmonizadas” com a inovação necessária para o futuro.

“Juntos, em paz e em estabilidade, podemos contribuir para Timor-Leste dar um salto em frente. Juntos podemos continuar a desenvolver a nossa terra amada para que todos possamos viver com mais bem-estar – agora e nos próximos cinco anos”, afirmou.

Lu-Olo recordou que mais do que apenas simbólicas, os rituais tradicionais estão profundamente enraizados e trazem consigo um factor de obrigatoriedade, com ‘sanções’ próprias a quem não os respeitar e cumprir. “Se o prevaricador julga que fica impune engana-se, porque fica propenso a um agravo de consciência, mais cedo ou mais tarde”, disse, relembrando que a lei formal também prevê sanções para quem não cumprir as regras eleitorais. “Os que hoje assinaram este Pacto de Unidade Nacional prometeram obediência. Acredito que o irão cumprir, porque o fizeram com maturidade política e sinceridade, com um só objectivo: servir o país e o povo que todos nós amamos”, afirmou.

A qualidade da democracia do país, disse, “é uma conquista” da sociedade timorense, que perante a crise dos últimos meses demonstrou grande “maturidade política”, aspecto que deve nortear a ação da liderança política.

9 Abr 2018

Timor-Leste/Eleições: Quatro coligações vão concorrer às eleições antecipadas de 12 de maio

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Comissão Nacional de Eleições validou quatro coligações pré-eleitorais que se vão apresentar às eleições parlamentares de 12 de maio em Timor-Leste, estando agora a decorrer o prazo para apresentação de listas de candidatos, disse o presidente do órgão eleitoral.

O presidente da Comissão Nacional de Eleições, Alcino Baris, confirmou hoje à Lusa que na reta final do prazo de registo de coligações, que terminou no domingo, se apresentou uma quarta coligação, o Movimento Social Democrata (MSD).

Segundo explicou, o MSD é composto pelo Partido Social Democrata (PSD), Partido Socialista de Timor (PST), Partido Centro Ação Social Democrata Timorense (CASDT) e Partido Democrata Cristão (PDC).

O MSD junta-se à Frente de Desenvolvimento Democrático (FDD) – a primeira a completar todos os requisitos para poder concorrer às eleições antecipadas de 12 de maio – e que integra quatro partidos políticos que se apresentaram separadamente nas eleições parlamentares de 2017: o Partido de Unidade e Desenvolvimento Democrático (PUDD), a União Democrática Timorense (UDT), a Frente Mudança (FM) e o Partido Desenvolvimento Nacional (PDN).

Foi também validada a Aliança de Mudança para o Progresso (AMP), que reúne as três maiores forças da oposição, o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), o Partido Libertação Popular (PLP) e o Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO).

A outra coligação é o Movimento de Desenvolvimento Nacional (MDN), que reúne quatro partidos que também se apresentaram separadamente em 2017.

Em concreto, agrupa a Associação Popular Monarquia Timorense (APMT), o Partido Liberta Povo Aileba (PLPA), o Partido Movimento Libertação Povo Maubere (MLPM) e a Unidade Nacional Democrática da Resistência Timorense (Undertim).

As coligações formadas reúnem 15 dos 21 partidos que se apresentaram nas eleições do ano passado em que apenas existiu uma única coligação, o Bloco de Unidade Popular (BUP), que reuniu o Partido Milenium Democrático (PMD), o Partido Democrática República de Timor (PDRT) e o Partido Liberta Povo Aileba (PLPA), este último integrado agora no MSD.

Além da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) – a mais votada em 2017 – e do Partido Democrático (PD) – quarta força em 2017 -, que se devem apresentar separadamente mas com um acordo pré-eleitoral, os únicos outros partidos que foram a votos em 2017 e que não estão agora coligados são o PEP, o PDP, o PR e o PTD.

Recorrendo à calculadora disponibilizada pela Comissão Nacional de Eleições, a Lusa fez uma simulação da eventual distribuição de lugares, aplicando o número de votos obtidos pelos partidos políticos nas eleições de 2017 e a barreira de 4% dos votos válidos, mínimo necessário para eleger deputados.

Se os partidos e coligações obtivessem os mesmos votos que em 2017, então a AMP teria 46,88% dos votos, o que lhe daria 33 lugares no Parlamento Nacional e maioria absoluta.

A Fretilin passaria a ser o segundo mais votado com 29,91% e 21 lugares (menos dois que atualmente) e o PD ficaria em terceiro com 9,87% e seis cadeiras, também menos duas que atualmente.

A FDD seria a única outra força no parlamento com 7,07% dos votos, suficiente para cinco lugares. Nenhuma outra coligação ou partido conseguirá superar a barreira de 4% dos votos válidos.

O sorteio do boletim de voto para as eleições deverá ser feito entre 03 e 04 de abril e a campanha eleitoral decorre entre 10 de abril e 09 de maio.

14 Mar 2018

Fronteiras | Timor-Leste acredita que tratado com Austrália reduz riscos para investidores

O novo tratado de fronteiras marítimas entre Timor-Leste e a Austrália, assinado ontem, reduz os riscos para investidores e abre a porta a benefícios significativos para os timorenses, afirmou o ministro timorense que assinou o documento

 

[dropcap style≠’circle’]”E[/dropcap]ste é um dia histórico. Um capítulo muito importante que começa com os nossos líderes a serem conscientes das responsabilidades ligadas a este tratado. Sabemos que muito tem que ser feito depois de hoje mas o que queríamos alcançar quando iniciámos este processo de reconciliação foi alcançado: uma fronteira marítima permanente”, disse o ministro Adjunto do primeiro-ministro timorense para a Delimitação de Fronteiras, Agio Pereira numa conferência de imprensa na sede da ONU.

“Este acordo tornou claro para as duas nações onde está a fronteira. O tratado define as fronteiras permanentes e isso reduz os riscos de investir nos recursos da região”, considerou ainda.

Agio Pereira falava numa conferência de imprensa conjunta com a ministra dos Negócios Estrangeiros australiana, Julie Bishop, depois de ambos assinarem o “Tratado entre a Austrália e a República Democrática de Timor-Leste que estabelece os seus limites marítimos no mar de Timor”.

O ministro timorense sublinhou a presença na cerimónia do secretário-geral da ONU, António Guterres, um “amigo muito próximo” de Timor-Leste que “deu grandes passos para ajudar a independência de Timor-Leste” e que esteve presente num “acontecimento histórico tão importante” para os timorenses.

Sobre o desenvolvimento do campo petrolífero Greater Sunrise – aspecto ainda não acordado – Julie Bishop disse que qualquer das opções, trará “grandes benefícios a Timor-Leste”, disponibilizando-se para que Austrália continue a apoiar Timor-Leste nas negociações com as petrolíferas.

“Estamos a falar de milhares de milhões de dólares durante a vida do projecto”, disse Bishop.

Indonésia à espreita

“As opções devem ter em conta a viabilidade económica a longo prazo. O interesse da Austrália é garantido com o desenvolvimento do recurso para benefícios de Timor-Leste. É do nosso interesse que Timor-Leste seja um vizinho estável e próspero, e por isso queremos ver um projecto que seja economicamente viável a longo prazo para dar os máximos benefícios a Timor-Leste”, considerou.

Agio Pereira, por seu lado, reiterou a vontade de que a opção seja a de um gasoduto para o sul de Timor-Leste, considerando que terá um impacto “transformativo, económica e socialmente”, para a população maioritariamente jovem e para construir confiança no país.

“Se investidores virem que Timor-Leste consegue gerir uma indústria complexa como ‘downstream’, construir gasoduto e unidade de LNG, confiarão que Timor-Leste conseguirá fazer mais do que isso”, disse o ministro timorense.

A chefe da diplomacia australiana disse que o tratado com Timor-Leste não afecta o previamente existente tratado com a Indonésia, explicando que falou com a sua homóloga em Jacarta que “congratulou Timor-Leste e a Austrália sobre o tratado”.

“O tratado entre a Austrália e a Indonésia mantém-se. Este tratado abre caminho para Timor-Leste e a Indonésia negociarem fronteiras. Isso terá impacto imediato de adaptar as fronteiras a leste e oeste do tratado, o que está previsto”, afirmou.

Bishop saudou o “acordo histórico” de ontem, importante tanto a nível bilateral como “em termos do direito internacional” faltando agora chegar a acordo sobre o Greater Sunrise.

Agio Pereira referiu que, apesar dos sobressaltos nas negociações, o acordo mostra o êxito das negociações, tendo Bishop afirmado que a “Austrália rejeita qualquer sugestão de ter actuado de qualquer forma que não seja em boa fé”.

8 Mar 2018

Timor- Leste | Um país perdido à procura de estabilidade. Eleições são em Maio

País soberano desde 2002, Timor-Leste está ainda longe da estabilidade. Depois das eleições de Julho terem resultado numa minoria parlamentar sem sucesso, Timor vai novamente a votos em Maio. As coligações já estão em andamento e, entre esperança e relutância, há quem considere que com tudo isto quem sofre é o povo

Com agências

A 26 de Janeiro, o presidente timorense Francisco Guterres Lu-Olo anunciou a dissolução do Parlamento e a realização de eleições antecipadas. A Fretilin não conseguiu fazer passar os programas governamentais e a instabilidade, disse Francisco Guterres, não podia continuar.

“Quem vai sofrer com isso é o povo”. A opinião é do timorense Agostinho Martins, fundador de duas associações ligadas ao seu país e a viver há 15 anos em Macau, que lamenta a decisão. Em causa está o povo e o seu bem-estar, referiu ao HM.

Mas o mal não é de agora, já vem de Julho quando se deixou que a Fretilin assumisse o poder mesmo sem maioria, apontou.

De acordo com Agostinho Martins, foi um “avanço para o abismo”. O timorense acrescenta que “o governo não conseguiu estabelecer nenhuma coligação nem tinha condições nenhumas para o fazer e, como tal, não podia ir avante”.

A solução seria ter conseguido uma coligação antes de se começar a governar. “Se estamos a favor do povo, para que não volte a passar mal como já passou, deviam aceitar estas coligações ou ter uma equipa de académicos bem preparados para governar o país enquanto não se chegasse a consenso”, sugeriu o timorense.

“Estamos a falar de um país que nem tem um hospital bem equipado para poder dar resposta às necessidades da população”. A isto, Agostinho Martins chama de “brincar com o povo”.

Acto falhado

Numa declaração ao país, no passado dia 26 de Janeiro, o presidente timorense Francisco Guterres Lu-Olo explicou que Timor-Leste não podia continuar numa situação de grave crise institucional.

O chefe de Estado criticou os políticos timorenses por terem virado costas uns aos outros e por não terem sabido interpretar a vontade do povo. Francisco Guterres lembrou que “o povo não deu a maioria absoluta a nenhum dos partidos”, o que interpreta como “um convite aos líderes partidários para se empenharem no aprofundamento da democracia”. O presidente considerou que essa mensagem não foi devidamente interpretada. “Em vez do diálogo sereno, no respeito pela vontade do povo, assistimos, ao virar de costas uns aos outros”, disse.

Francisco Guterres decidiu, por isso, convocar eleições para pôr fim ao que diz ser uma “grave crise institucional” e deixa um apelo ao voto nas próximas eleições já marcadas para 12 de Maio.

“A independência, a democracia e a paz foram por nós conquistadas. Não vamos abrir mão das nossas conquista! Todos juntos vamos construir Timor-Leste, garantir a paz e o desenvolvimento para todos. (…) O presidente conclama todo o povo a votar, em eleições parlamentares antecipadas. Vamos todos, votar pelo reforço da democracia, pelo Estado de direito!”.

Os líderes partidários já saudaram as eleições antecipadas, esperando que resolva o impasse político em Timor, que se arrasta há seis meses.

O primeiro-ministro, Mari Alkatiri, ouvido pela agência Lusa, espera que seja o primeiro passo para um acordo no país.

Já o líder do Partido Democrático (PD), Mariano Sabino, garantiu que o Executivo vai governar o país até às eleições, num momento difícil.

A oposição timorense saudou também a decisão de Francisco Guterres, enquanto o líder da Conferência Episcopal, o bispo Basílio do Nascimento, falou da solução mais equilibrada e menos dolorosa.

Nas eleições de Julho do ano passado, a Fretilin, liderada por Mari Alkatiri, venceu com uma vantagem de apenas mil votos em relação ao CNRT de Xanana Gusmão.

Entretanto, o actual Governo é constituído por um Executivo de gestão até à tomada de posse do novo Governo, sendo que durante o período em que o Parlamento Nacional estiver dissolvido, funcionará a Comissão Permanente do Parlamento Nacional, presidida pelo Presidente do Parlamento Nacional e composta pelos vice-presidentes e deputados indicados pelos partidos políticos com assento parlamentar, respeitando o princípio da representatividade.

Coligações póstumas

Os três partidos da oposição maioritária em Timor-Leste já formalizaram uma pré-coligação para avançar nas eleições de Maio, a Aliança de Mudança para o Progresso (AMP).

“O Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), o Partido Libertação Popular (PLP) e o Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO) decidiram formar uma coligação de partidos políticos com fins eleitorais, a Aliança de Mudança para o Progresso (AMP)”, refere o texto da resolução conjunta.

“Os partidos políticos que assinam este acordo decidem a sua abertura e disponibilidade para acolher outros partidos políticos na coligação desde que aceitem aderir aos princípios e objetivos enumerados”, confirma o texto.

A resolução conjunta foi assinada em Díli pelo secretário-geral do CNRT, Francisco Kalbuadi Lay, pelo presidente do PLP, Taur Matan Ruak e pelo fundador do KHUNTO, José Naimori.

Posteriormente, poderão associar-se à coligação vários outros partidos, tendo as resoluções aprovadas separadamente pelo CNRT e pelo PLP referido pelo menos nove outras forças políticas.

Separadamente e antes da declaração conjunta, cada um dos três partidos aprovou resoluções idênticas que confirmam a constituição da AMP.

Promessas de estabilidade

A formação de coligações, defendem os partidos nas suas resoluções, “contribuirá para a menor dispersão de votos e menor fragmentação de mandatos no Parlamento Nacional, favorecendo a formação de uma maioria parlamentar que garanta a estabilidade governativa”.

Os partidos dizem que com a coligação pretendem responder “de forma construtiva aos apelos que nesse sentido têm sido dirigidos pelo povo”, comprometendo-se a promover um espaço “abrangente, inclusivo e aberto à sociedade civil e outros partidos políticos”.

Em concreto, as duas resoluções referem o Partido Milenium Democrático (PMD), o Partido Liberta Povo Aileba (PLPA), o Partido Socialista de Timor (PST), o Partido Social Democrata (PSD), o Partido Democrata Cristão (PDC) e o Partido de Desenvolvimento Popular (PDP).

Referem ainda o Partido Movimento Libertação Povo Maubere (MLPM), o Partido do Desenvolvimento Nacional (PDN) e o Partido Democrático República Timor (PDRT).

Mais curto foi o texto da resolução do Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO), que confirmou apenas a decisão de aderir à AMP.

A campanha para as eleições antecipadas para eleger o novo Parlamento Nacional de Timor-Leste decorrerá entre 10 de Abril e 9 de Maio.

 

 

Caça ao voto

A campanha para as eleições antecipadas em Timor-Leste decorrerá entre 10 de Abril e 9 de Maio, com os eleitores a terem dois dias de reflexão, a 12 de Maio, para eleger o novo Parlamento Nacional.

O calendário das operações eleitorais, preparado pelo Secretariado Técnico da Administração Eleitoral (STAE) foi publicado no Jornal da República, dois dias depois da entrada em vigor do decreto do Presidente, Francisco Guterres Lu-Olo que marcou as eleições antecipadas de 12 de Maio.

Segundo o documento, a certificação dos resultados finais das eleições pelo Tribunal de Recurso deverá ser publicada no Jornal da República até 28 de Maio, o que deixa antever que a tomada de posse dos 65 deputados da 5.ª legislatura ocorra em Junho.

Só depois disso será formado o VIII Governo, que terá que depois levar o seu programa e o Orçamento Geral do Estado de 2018 ao Parlamento.

 

Problemas no horizonte

O impacto das chuvas nos acessos aos centros de votação, a compra de material eleitoral e o aumento da participação dos eleitores são algumas das preocupações dos responsáveis eleitorais timorenses antes das eleições antecipadas de 12 de Maio.

O director-geral do Secretariado Técnico da Administração Eleitoral Acilino Manuel Branco sublinhou o impacto que a actual época da chuva pode vir a ter nos acessos aos locais de votação, alguns particularmente remotos.

“Estamos na época das chuvas e há muitas preocupações sobre acesso a alguns centros de votação e ao transporte de materiais”, disse.

“Outra questão é como podemos acelerar o processo de aquisição de materiais que temos que comprar de forma acelerada para responder ao processo”, frisou ainda.

Na mente dos responsáveis eleitorais está ainda a questão da participação eleitoral, tanto no que toca à abstenção – a participação foi de 76,74 por cento nas eleições de 2017 – como ao número de votos inválidos e nulos (mais de 2 por cento).

“Precisamos de desenvolver um esforço grande para garantir uma maior participação. Temos que reforçar a educação dos votantes porque tivemos também muitos votos nulos”, explicou o responsável do STAE.

No estrangeiro – os timorenses podem votar na Austrália, Coreia do Sul, Reino Unido e Portugal. Em Macau, os timorenses não têm forma de votar.

 

O apelo de Xanana
Líder histórico apela a entendimento

O líder do CNRT, segundo partido timorense, Xanana Gusmão, pediu “confiança e esforço colectivo” para fortalecer a AMP, a coligação “histórica” de três partidos formalmente criada e que se vai apresentar às eleições antecipadas.

O apelo de Xanana Gusmão foi feito numa mensagem em vídeo endereçada aos membros dos três partidos que assinaram a formalização da Aliança de Mudança para o Progresso (AMP) – o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), o Partido Libertação Popular (PLP) e o Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO).

Dirigindo-se aos responsáveis, militantes e simpatizantes dos três partidos, Xanana Gusmão, que está ausente de Timor-Leste desde Setembro do ano passado, saudou a “maturidade” do povo timorense e o seu compromisso com a estabilidade e tolerância. Para o responsável tratam-se de aspectos importantes num momento em que Timor-Leste ainda tem um Estado frágil, onde continua viva a memória e a “grande lição” da crise de 2006 e 2007 e onde convivem o “aspecto negativo que é a situação que o Estado enfrente, sem estabilidade” e o “aspecto positivo que é a estabilidade social”.

Xanana Gusmão disse ainda que os “ganhos políticos pertencem ao povo” e que este momento “histórico” de coligação pré-eleitoral de três grandes partidos “não é complexo mas também não é fácil” sendo essencial que “os quadros dos três partidos interiorizem os objectivos da coligação, dando-lhe personalidade”.

Essencial, defendeu, é acordar a “estratégia e a matéria da campanha”, avançar com a “mobilização de quadros dos três partidos para socializar o programa” e coordenar todas as estruturas”.

O líder timorense deixou recados para todos os militantes, afirmando que não devem “intimidar ou ameaçar a população ou militantes de outros partidos” e que não devem distribuir ou receber dinheiro.

Instruções de comportamento

Xanana Gusmão recordou questões “fundamentais” no imediato, nomeadamente cumprir os prazos para apresentação da AMP aos órgãos eleitorais competentes, definir o acordo de coligação e propósito político e determinar a composição da “lista única”.

Um processo de “quotas ou percentagens dos partidos”, reflectindo a composição do Parlamento Nacional de 65 lugares – o CNRT tem 22 lugares, o PLP tem oito e o KHUNTO tem cinco – e que deve ser concluído com “honestidade, humildade, determinação e confiança”, disse.

Xanana Gusmão deixou a sua recomendação sobre os três primeiros lugares na lista: “número 1, Xanana Gusmão, número 2 Taur Matan Ruak [presidente do PLP] e número três a mana [Armanda] Berta [dos Santos, presidente do KHUNTO].

De fora fica quem tem sido uma das caras da coligação – está no símbolo do partido – o conselheiro especial e fundador do KHUNTO, José Naimori.

A mensagem do líder timorense foi transmitida depois do texto da resolução que formaliza a coligação ter sido assinado num encontro no Centro de Convenções de Díli.

26 Fev 2018

Timor-leste | CNRT acusa Fretilin de espiar negociação com Austrália para fixar fronteiras

O maior partido da oposição timorense, o CNRT, acusou hoje o partido do Governo, a Fretilin, de ter um espião como “agente duplo” para obter informação confidencial das negociações sobre fronteiras marítimas com a Austrália, lideradas por Xanana Gusmão

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] acusação foi publicada na página oficial do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) no Facebook num texto intitulado “desconfia-se da instalação de espião para monitorizar equipa do ‘irmão’ Xanana – membros da equipa negociadora não se sentem seguros”.

O CNRT, que é presidido por Xanana Gusmão, diz que a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), que lidera a coligação do Governo, está a usar este “agente duplo” para obter “informação confidencial” das negociações para divulgar no Comité Central da Fretilin.

Xanana Gusmão está ausente de Timor-Leste desde 11 de Setembro do ano passado, tendo estado desde aí envolvido quase exclusivamente nas negociações.

A publicação do CNRT surgiu numa semana em que decorre em Kuala Lumpur, na Malásia, uma derradeira ronda de negociações entre Timor-Leste, a Austrália e o consórcio responsável pelos campos de Greater Sunrise, para procurar uma solução para o desenvolvimento deste recurso.

Questionado sobre a acusação, Arão Noé, chefe da bancada do CNRT no Parlamento Nacional, disse à Lusa não ter qualquer conhecimento sobre o caso afirmando que eram os serviços de media do partido que tinham a informação.

“São os serviços de media que têm essa informação. Não tenho conhecimento sobre este assunto. Não me quero pronunciar sobre este assunto”, disse.

Questionado sobre quem é responsável pela gestão da página na rede social – o administrador não está identificado – Arão Noé disse que a gestão era feita “em termos rotativos”, sem revelar mais informação.

Verdade escondida

Segundo a publicação do CNRT a informação confidencial estará a ser passada por um quadro técnico que “talvez tenha afiliação radical ao partido Fretilin” e que está a atuar como “agente duplo para passar informação em segredo ao CCF em Díli” o que leva a que a equipa de negociação “não se sinta segura”.

“O partido Fretilin tem um espião para monitorizar a situação das negociações e os movimentos do irmão Xanana”, refere o CNRT, que argumenta que responsáveis da Fretilin têm feito comentários nas redes sociais e declarações sobre a negociação.

José Reis, secretário-geral adjunto da Fretilin e ministro Adjunto do primeiro-ministro para Assuntos de Governação, considerou a publicação uma “acção de propaganda falsa” que pretende tentar distanciar Xanana Gusmão do atual primeiro-ministro, Mari Alkatiri.

“Neste processo o primeiro-ministro está a trabalhar com o homem de maior confiança de Xanana Gusmão, que é o ministro Adjunto do primeiro-ministro para a Delimitação das Fronteiras Marítimas, Agio Pereira”, disse à Lusa José Reis.

“Eles que denunciem quem é porque eu não conheço mais ninguém. Nunca tivemos ninguém na equipa nem nomeamos ninguém para pedir informações a Xanana Gusmão”, sublinhou.

Militante do CNRT e homem de confiança de Xanana Gusmão, Agio Pereira é o número dois da equipa de negociação das fronteiras e será quem, em nome de Timor-Leste, assinará no próximo dia 6 de Março o novo tratado com a Austrália.

Afirmando que é mais uma “tentativa de politizar um assunto de Estado” como as fronteiras marítimas, José Reis afirmou que as redes sociais estão a ser usadas como “instrumento de ataque político”.

“É tudo absolutamente falso”, afirmou José Reis.

22 Fev 2018

Partido no Governo timorense saúda comportamento da população durante crise política

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] partido timorense mais votado, a Fretilin, aprovou hoje um conjunto de resoluções em que saúda o comportamento da população de Timor-Leste na crise política do país, apelando à participação dos eleitores no voto antecipado de 12 de Maio.

As resoluções foram aprovadas depois de dois dias de deliberações na 3.ª Conferência Nacional do partido, na vila de Maliana, a sudoeste de Díli, em que participaram centenas de dirigentes e militantes do partido.

A Conferência Nacional ficou marcada por intervenções tanto dos dirigentes máximos do partido, incluindo o secretário-geral e atual primeiro-ministro, Mari Alkatiri, como de Mariano Sabino, presidente do Partido Democrático (PD), parceiro da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) no Governo.

Uma conferência, como explicou à Lusa Mari Alkatiri para reafirmar o que será a linha da campanha do partido para as eleições parlamentares: “um referendo ao programa do VII Governo”.

“O impacto na sociedade tem sido grande e a Fretilin está a recuperar apoios. Espero que as pessoas tenham aprendido que a política faz-se respeitando uns aos outros. A democracia não significa ditadura da maioria no parlamento. Se há um Governo têm que deixar um Governo governar primeiro”, afirmou.

“O que se pretendeu aqui foi afirmar a ditadura de uma maioria fabricada pós-eleitoralmente. E isso não é democracia”, afirmou Alkatiri.

O partido aprovou oito resoluções, entre as quais se destacam saudações pelas negociações de fronteiras marítimas com a Austrália, cuja delegação timorense foi liderada por Xanana Gusmão, que preside ao maior partido da oposição, o Congresso Nacional ´da Reconstrução de Timor-Leste (CNRT).

A pensar nas eleições de 12 de maio, o partido deixa um apelo aos eleitores para que vão votar “para reafirmar a liberdade e a democracia” usando este “mecanismo de legitimação real do eleitorado” num “momento singular de expressão política, sobretudo neste momento de impasse político”.

Numa das resoluções, a Fretilin destaca a “forma exemplar” como a população timorense se comportou “perante a crise política institucional, primando e contribuindo para que a democracia seja um processo em constante crescimento e aprofundamento.

Um comportamento ao longo dos últimos meses em que a população “tem dado mostras inegáveis de que todos juntos somos e seremos capazes de contribuir de forma construtiva para o aprofundamento da Democracia em Timor-Leste”, refere a resolução, considerando que os timorenses saberão “continuar a dar mostras de um crescimento democrático e demonstrar de forma inequívoca o seu comportamento político exemplar”.

Os participantes na 3.ª Conferência nacional reiteraram “legitimidade à liderança do partido e à CPN [Comissão Política Nacional] para tomar decisões estratégicas”.

O texto considera que os líderes do partido têm “demonstrado sentido de responsabilidade, firmeza nos princípios, espírito de abnegação e capacidade de liderança”.

Noutras das resoluções, a Fretilin louva a “decisão do Presidente da República Democrática de Timor-Leste na solução do impasse político”, numa referência ao facto de Francisco Guterres Lu-Olo ter decidido dissolver o parlamento e convocar eleições antecipadas, saudando os partidos políticos pelo “total respeito” por essa deliberação.

12 Fev 2018

Timor-Leste | De “parcialmente livre” para “livre”

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]imor-Leste passou de país “parcialmente livre” para “livre”, após “eleições justas que levaram a uma suave transferência de poder e possibilitaram a novos partidos e candidatos a entrada no sistema político”, segundo a organização não-governamental (ONG) Freedom House.

No seu relatório anual sobre direitos políticos e liberdades civis no mundo, ontem divulgado, a ONG refere que, ao realizar eleições livres e transparentes, “Timor-Leste, uma das nações mais pobres do Sudeste Asiático, contrariou a tendência de declínio da liberdade na região”.

“O processo [eleitoral] ajudou a consolidar o desenvolvimento democrático no país, além de permitir que novos partidos e políticos mais jovens conquistassem assentos no parlamento”, indicaram os relatores.

No documento, intitulado “Freedom in the World 2018: Democracy in Crisis” (“Liberdade no Mundo 2018: A Democracia em Crise”), a organização não-governamental centra-se sobretudo na crise da democracia a nível global sublinhando que “a democracia está sob ataque e a recuar em todo o mundo”, numa crise que se intensificou com “a erosão, a ritmo acelerado, dos padrões democráticos dos Estados Unidos da América”.

Segundo a Freedom House, 2017 foi o 12.º ano consecutivo de queda da liberdade global, com 71 países a sofrerem “claros declínios” nos domínios dos direitos políticos e liberdades civis e apenas 35 a registarem avanços.

Dos 195 países avaliados neste estudo, 88 (45%) foram classificados como “livres”, 58 (30%) como “parcialmente livres” e 49 (25%) como “não livres”.

Dos 49 países designados como “não livres”, estes 12 foram os que se posicionaram no fundo da tabela, com uma pontuação abaixo de dez numa escala de 100 (começando pelo menos livre): Síria, Sudão do Sul, Eritreia, Coreia do Norte, Turquemenistão, Guiné Equatorial, Arábia Saudita, Somália, Uzbequistão, Sudão, República Centro-Africana e Líbia.

“Estados outrora promissores como a Turquia, a Venezuela, a Polónia e a Tunísia estão entre aqueles que experimentaram declínios nos padrões democráticos; a recente abertura democrática em Myanmar (antiga Birmânia) ficou permanentemente arruinada por uma chocante campanha de limpeza étnica contra a minoria Rohingya”, lê-se no relatório.

Para o presidente da Freedom House, Michael J. Abramowitz, “a democracia enfrenta a sua mais grave crise em décadas”, com os seus “princípios básicos – entre os quais a garantia de eleições livres e justas, os direitos das minorias, a liberdade de imprensa e o Estado de direito – sob ataque em todo o mundo”.

O estudo refere como “a China e a Rússia aproveitaram o recuo das maiores democracias não só para aumentar a repressão a nível interno, como para exportar a sua influência maligna para outros países”. “Para manter o poder, estes regimes autocráticos estão a actuar além das suas fronteiras para silenciar o debate livre, perseguir dissidentes e comprometer instituições assentes em normas consagradas”, apontam os relatores.

Um grande desenvolvimento em 2017 foi, segundo o relatório, “o recuo dos Estados Unidos como defensor e como exemplo de democracia”. Enquanto, nos últimos sete anos, a Freedom House identificou um lento recuo nos direitos políticos e liberdades civis no país, esse declínio acelerou em 2017, “devido às crescentes evidências de ingerência russa nas eleições [presidenciais norte-americanas] de 2016, à violações de princípios éticos básicos pelo novo Governo e a uma redução da transparência governamental”.

“Embora instituições norte-americanas como a imprensa e a justiça tenham resistido perante ataques sem precedentes do Presidente [Donald] Trump, tais ataques poderão enfraquecê-las, o que terá graves implicações na saúde da democracia norte-americana e no lugar dos Estados Unidos no mundo”, sustentam os relatores. Além disso, prosseguem, “a abdicação dos Estados Unidos do seu tradicional papel de maior defensor da democracia causa grande preocupação e tem potenciais consequências na luta em curso contra autoritarismos modernos e suas ideias perniciosas”. “As principais instituições da democracia norte-americana estão a ser maltratadas por uma Administração que tem tratado a tradicional separação de poderes do país com desdém”, declarou Abramowitz.

Noutro “desenvolvimento significativo”, a Turquia passou do grupo dos países “parcialmente livres” para o dos “não livres” quando o Presidente, Recep Tayyip Erdogan, “alargou e intensificou a perseguição aos seus alegados opositores, iniciada após uma tentativa falhada de golpe de Estado em Julho de 2016, com consequências extremas para os cidadãos turcos”, indica o relatório. De acordo com a ONG, no período de 12 anos desde que o recuo de liberdade começou, em 2006, foram 113 os países que assistiram a um claro declínio dos direitos políticos e liberdades civis, e só 62 registaram um claro aumento.

17 Jan 2018

Macau e Timor-Leste vão trocar informações financeiras

[dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau vai assinar um memorando de entendimento para a troca de informação financeira com Timor-Leste. O acto destina-se a combater crimes como o branqueamento de capitais e o financiamento de terrorismo.

A informação consta de um despacho do secretário para a Economia e Finanças de Macau, Lionel Leong, publicado em Boletim Oficial, que subdelega na coordenadora do Gabinete de Informação Financeira (GIF), Chu Un I, “todos os poderes necessários para representar a Região Administrativa Especial de Macau na celebração do memorando de entendimento”.

Esse memorando visa “a troca de informação financeira relativa à prevenção e repressão dos crimes de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo”, segundo o mesmo despacho. O acordo com a Unidade de Informação Financeira da República Democrática de Timor-Leste ainda não tem data de assinatura prevista.

Macau tem firmados mais de duas dezenas de memorandos de entendimento e/ou acordos de cooperação para a troca de informação financeira relativos à prevenção e repressão dos crimes de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo.

Em 5 de Dezembro último, a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) foi incluída numa “lista negra” de 17 paraísos fiscais, consideradas jurisdições não cooperantes, adoptada pelos ministros das Finanças da UE. Macau contestou a “decisão unilateral e parcial”, por “não corresponder à situação real”, apontando que o território “não é um alegado ponto de fuga e evasão fiscal ou um paraíso fiscal”.

Resposta de Lionel

As autoridades da RAEM reagiram à posição da instituição europeia através de um comunicado. “Macau tem vindo a cooperar de forma activa com a sociedade internacional, incluindo a UE e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), no sentido de combater, em conjunto, a fuga e evasão fiscal transfronteiriça e de promover a justiça tributária”, reagiu então o Governo da RAEM, em comunicado.

O Executivo enalteceu ainda o facto de ser membro do “Fórum Global sobre Transparência e Troca de Informações para Fins Fiscais” e do “Quadro Inclusivo da Base Tributária e a Transferência de Lucros”, ambos da OCDE, indicando que, através da revisão da mesma, foi reconhecida a correspondência da transparência fiscal e da troca de informações da RAEM aos últimos critérios internacionais.

“Macau participou, ainda, nos projectos de cooperação internacional da OCDE, promovendo, em conjunto com as autoridades fiscais de todo o mundo, a reforma fiscal e o combate às actividades no âmbito da fuga e evasão fiscal, com vista a atingir o objectivo da justiça tributária”, acrescentou.

Também invocou a aprovação, em Maio, de uma nova lei sobre a troca de informações em matéria fiscal e indicou que o Governo se encontra a trabalhar na extensão da Convenção Multilateral sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal a Macau, explicando que, depois da aplicação ao território, Macau poderá efectuar com os Estados-membros da UE a troca automática de informações.

A par disso, o Governo revelou estar a estudar o aperfeiçoamento do regime jurídico aplicável à actividade offshore.

4 Jan 2018

Austrália acorda assinar novo tratado de fronteiras marítimas com Timor-Leste

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] Governo australiano acordou esta semana assinar o tratado de fronteiras marítimas com Timor-Leste, documento cujo conteúdo está concluído e que vai ser assinado na presença do secretário-geral da ONU, disseram à Lusa fontes próximas ao processo.

“A Austrália acordou assinar o tratado. O calendário vai ser agora acordado com o secretário-geral da ONU para definir exactamente quando será a assinatura”, disse a fonte, que destacou o progresso conseguido nas negociações esta semana.

As fontes explicaram que essa era a notícia mais positiva saída da ronda negocial mantida na última semana em Singapura por delegações de Timor-Leste e da Austrália, sob auspícios de uma Comissão de Conciliação das Nações Unidas.

Presente esta semana em Singapura, confirmaram as fontes, estiveram ainda representantes das petrolíferas que fazem parte da Joint Venture que controla o importante poço de Greater Sunrise.

“Foi a quinta vez que os representantes da Joint Ventura participaram nas rondas negociais”, explicou a fonte ouvida pela Lusa, que referiu que houve reuniões a sós da Comissão de Conciliação com as petrolíferas e reuniões informais das delegações.

O tratado é um dos elementos centrais do acordo negociado ao longo do último ano que além “elementos centrais” da delimitação de fronteiras marítimas entre os dois países – centrada, tudo indica, na linha mediana sempre reivindicada pelos timorenses -, inclui o estatuto legal para o desenvolvimento do poço de gás de Greater Sunrise no Mar de Timor.

O único assunto pendente tem a ver com a forma como o gás será explorado: se com um gasoduto para Darwin, no Território Norte da Austrália, se para a costa sul de Timor-Leste. O destino desse gasoduto determinará a forma como as receitas serão divididas entre os dois países.

As fontes ouvidas pela Lusa explicaram que a comissão solicitou às duas partes informação “detalhada” sobre as opções que defendem para que se possa avançar e concluir este aspecto mais “bicudo” do diálogo.

Nesse sentido, e para reforçar a informação, o negociador principal da delegação timorense, Xanana Gusmão, viaja ainda este fim de semana para a Papua Nova Guiné onde vai conhecer o projecto de gás natural do país.

Ausente de Timor-Leste desde 11 de Setembro, Xanana Gusmão tem estado a liderar as negociações com a Austrália sobre esta questão, crucial para o futuro de Timor-Leste e que merece consenso nacional entre os timorenses.

Recorde-se que as reuniões decorrem no âmbito do processo de conciliação entre Timor-Leste e Austrália, conduzida por uma Comissão de Conciliação, nos termos da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar e sob os auspícios do Tribunal Permanente de Arbitragem (TPA) em Haia.

A comissão está a avançar na preparação do seu relatório sobre o processo negocial que deverá ser finalizado e publicado no início de 2018.

Recorde-se que a comissão de conciliação, constituída em 25 de Junho de 2016, iniciou-se em 11 de Abril de 2016, através do envio por Timor-Leste da “Notificação de Instituição da Conciliação, nos termos da Secção 2 do Anexo V da Convenção” à Austrália. A comissão é composta por cinco membros, dois escolhidos por cada um dos países e presidida pelo embaixador Peter Taksøe-Jensen.

18 Dez 2017

Fong Fong Guerra: “A vida é para ser recomeçada em Portugal”

A macaense Fong Fong Guerra chegou no passado dia 25 a Lisboa, com o marido Tiago Guerra, depois da fuga de Timor-Leste. O casal, que foi condenado por peculato em Díli, espera agora conseguir que o processo seja transferido para Portugal. Para, acima de tudo, limpar a imagem e reorganizar a vida

 

Como é que está a ser este regresso a Portugal?

Ainda estamos muito emocionados com o facto de, finalmente, estarmos em casa. Voltar a reencontrar a nossa família está a ser muito bom, mas também muito intenso, dadas as circunstâncias que temos vivido. Mas não quero deixar de prestar o nosso agradecimento a quem nos acompanhou nos últimos três anos. Não teríamos sobrevivido sem a amor das pessoas que nos rodeiam. Estamos muito agradecidos ao apoio que recebemos sempre dos nossos familiares e amigos. Pessoalmente, agradeço, em particular, à presença da minha família e amigos de Macau, que, apesar de longe, estiveram sempre ao meu lado, e não posso esquecer a ajuda dos nossos advogados. A equipa que nos tem acompanhado em nossa defesa tem sido incansável e estão a fazer tudo o que podem para que possamos continuar a lutar pela nossa inocência, dentro de um sistema judicial injusto e que tem dado mostras de que não funciona.

Tem sido um problema da justiça de Timor-Leste?

A inoperância e ineficácia do sistema judicial de Timor não é nova. A situação é conhecida pelos próprios líderes do país que reconhecem as suas limitações. Mas, desejamos que esta situação possa vir a melhorar, até porque o nosso caso é apenas um no meio de muitos que estão a ser injustamente tratados. Nós tivemos sorte por termos uma forma de expressar o que nos aconteceu e de dar voz às experiências inacreditáveis por que passámos. Mas, quem lá está, quem é de Timor, não pode fazer o mesmo. A população local, muito provavelmente nem conhece os seus direitos básicos.

O processo continua em Timor. O que pretendem fazer?

Estamos muito agradecidos ao governo português, especialmente pelo que tem feito por nós no último ano. Neste momento, ainda estamos a explorar as possibilidades de conseguir transferir o caso judicial para Portugal para que possamos limpar os nossos nomes. Mas é uma situação que não depende de nós. Para já, a nossa maior prioridade é a de reestabelecer novamente as nossas vidas em Portugal e aproveitar o tempo para podermos estar perto dos nossos filhos e parentes que já sofreram o suficiente.

Como foi a viagem e a estadia na fuga para a Austrália?

Estivemos sempre muito ansiosos e quando ficámos no centro de detenção dos serviços de emigração, em Darwin, a tensão foi sempre muita. Mas as autoridades australianas foram muito simpáticas e contámos com o apoio do cônsul-geral que estava em Sidney e que se deslocou a Darwin para monitorizar a situação. A Austrália é completamente diferente de Timor-Leste em tudo e nos centros de detenção também. As instalações que tínhamos eram eram melhores do que aquelas que tínhamos no apartamento em que estávamos em Díli: tinham camas e ares condicionados melhores, por exemplo. Também fomos o primeiro caso na Austrália de detenção pelas autoridades fronteiriças de alguém que entrou no país para de lá sair o mais rápido possível. 

Como está a ser a reacção, em Portugal, ao vosso regresso?

Os nossos filhos não podiam estar mais felizes. Desde que chegámos que pulam de alegria. Estão extasiados. Agora, temos de, calmamente retomar as nossas rotinas pessoais e familiares em que todos estamos a reaprender a viver, outra vez, juntos.

Quais as vossas expectativas para um futuro próximo?

O que mais queremos neste momento é limpar os nossos nomes e a nossa reputação. Mas, no que diz respeito ao processo legal, trata-se de uma situação que não depende de nós. Temos também, dentro da reorganização das nossas vidas, de encontrar emprego e começar a pagar as nossas dívidas.

Relativamente a um regresso a Macau, equaciona essa possibilidade?

Esse era o nosso grande desejo em 2014 e era o plano que tínhamos para a nossa família quando decidimos ir para Macau. Mas, infelizmente, já não o é agora. Os nossos filhos já se adaptaram a Portugal e seria muito injusto para eles voltar a tirar as crianças de um ambiente a que já se habituaram. Já têm aqui amigos e precisam, acima de tudo, de estabilidade. Nestes últimos anos também se afeiçoaram muito aos avós paternos e no que respeita à língua, já praticamente não falam cantonês. Seria muito cruel para eles. Agora a nossa vida é para ser recomeçada em Portugal.

Mas não sente a falta de Macau?

Sim, sinto muito a falta de Macau. Tenho muitas saudades dos meus pais e espero que os possa visitar o mais cedo possível.

Relativamente à empresa que tinham, pensam voltar a ela?

Quando criámos a empresa, a ideia era que fosse um projecto para nos acompanhar na mudança de vida que estávamos a efectuar com a ida para o território. Mas, com tudo o que se passou em Timor, todos os nossos planos foram mudados e foi tudo muito confuso. O que se passou afectou-nos muito enquanto família, e prejudicou a nossa vida toda, no geral. Tudo mudou. É uma pena, mas agora a empresa não é uma prioridade e não faço ideia do que vamos fazer relativamente a isso. É um assunto que para já está parado e que representa mais uma consequência muito negativa de toda a situação.

 

Saga internacional

Tiago e Fong Fong Guerra são o casal português que, desde 2014, está a braços com um processo judicial em Timor. Acusados de peculato, branqueamento de capitais e falsificação de documentos, o casal acabou por ser condenado pelo colectivo de juízes do Tribunal Distrital de Díli, a oito anos de prisão e ao pagamento de 859 mil dólares no passado mês de Agosto.

Foram acusados de “prejudicar as finanças e a economia do Estado” de Timor-Leste, por alegadamente se terem apropriado de fundos oriundos da indústria petrolífera, que pertencem ao país. A condenação foi apenas pelo crime de peculato, tendo sido absolvidos das restantes acusações.

Os portugueses recorreram da sentença. O argumento utilizado tinha que ver com lacunas no próprio processo. Na altura, Tiago Guerra defendia que o caso padecia “de nulidades insanáveis” comuns em “regimes não democráticos”. Para o português, as provas que sustinham as acusações eram mesmo manipuladas e até proibidas.

Apesar de em Díli terem os passaportes confiscados e estarem sujeitos ao termo de identidade e residência, na semana passada, recuperaram os documentos de viagem. De acordo com o ministro dos Negócios Estrangeiros português a embaixada em Díli respeitou a legislação portuguesa ao atribuir passaportes ao casal.

A caminho da Austrália

De passaportes na mão, Tiago e Fong Fong Guerra fugiram de barco para Darwin, na Austrália, onde foram novamente detidos por não terem autorização de entrada no país. De acordo com Fong Fong Guerra, a ideia era mesmo a de conseguir, a partir da Austrália, regressar a Portugal.

Na sequência da fuga para a Austrália, o chefe da diplomacia portuguesa, Augusto Santos Silva, ordenou a realização de um inquérito urgente à Inspeção Geral Diplomática e Consular, cuja conclusão foi entregue quinta-feira da semana passada.

Independentemente da situação jurídica, Tiago e Fong Fong Guerra, “enquanto cidadãos portugueses têm direito a documentos de identificação como cidadãos portugueses, desde que não violem certas disposições legais”, referiu Santos Silva relativamente ao facto de terem sido renovados também os respectivos cartões de cidadão do casal.

Entretanto, e durante a detenção na Austrália, foi enviado um “pedido internacional de extradição para Portugal com detenção provisória” à Procuradora-Geral da República portuguesa, Joana Marques Vidal, com conhecimento para a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, e para o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva.

O casal chegou a Lisboa no passado dia 25 e, até agora, de acordo com a ministra da justiça portuguesa, não foi apresentado “qualquer pedido de intervenção”.

30 Nov 2017

Tiago e Fong Fong Guerra chegaram a Lisboa

Os portugueses Tiago e Fong Fong Guerra, que fugiram para a Austrália depois de condenados por peculato em Timor-Leste, chegaram no passado sábado a Lisboa, onde foram recebidos por uma dúzia de familiares, mas escusaram-se a falar aos jornalistas. Afirmando não ter problemas em falar à comunicação social, Tiago Guerra disse que não o faria naquele momento no aeroporto.

[dropcap style≠’circle’]À[/dropcap] chegada ao aeroporto Humberto Delgado (Lisboa), este sábado de manhã, o casal foi recebido com emoção por alguns familiares, incluindo os dois filhos, que estão à guarda dos avôs paternos e que não abraçavam os pais há três anos.

Tiago Guerra escusou-se a falar aos jornalistas, posição também pelo pai, Carlos Guerra, que, ainda assim, não escondeu a emoção do reencontro, vivido entre família e “dois ou três amigos chegados”. “Está tudo bem. (O Tiago) Chegou bem. Está felicíssimo. Isto é um Natal antecipado. É dia 25”, desabafou, aliviado. “Basta olhar para a cara dos filhos, dos meus netos”, continuou.

O casal foi detido na semana passada, em Darwin (Austrália), onde entrou ilegalmente de barco, no início do mês, com passaportes portugueses. Os Guerra pediram a extradição para Portugal, tendo o requerimento, que visava o accionamento da convenção existente entre Portugal e Austrália, dado entrada na Procuradoria-Geral da República dia 17 de Novembro.

Dois dias depois, os pais de Tiago, responsáveis pela petição que solicitava a extradição do casal e que foi entregue no Parlamento, foram recebidos pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de acordo com informação disponível no site da instituição.

Tensão diplomática

A fuga do casal casou tensão diplomática entre Portugal e Timor-Leste, com o assunto a suscitar críticas de dirigentes políticos e da sociedade civil, com artigos a exigir investigações à embaixada de Portugal em Díli.

Na semana passada, o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, garantiu que a embaixada em Díli respeitou a legislação portuguesa ao atribuir passaportes ao casal. Na sequência da fuga para a Austrália, Augusto Santos Silva ordenou a realização de um inquérito urgente à Inspecção Geral Diplomática e Consular, cuja conclusão foi entregue esta quinta-feira.

O casal Guerra renovou os respectivos cartões de cidadão no início deste ano e, mais recentemente, foram emitidos passaportes portugueses, o que motivou críticas na imprensa timorense. “Os cidadãos portugueses têm direito a documentos de identificação como cidadãos portugueses, independentemente da sua situação jurídica, desde que não violem certas disposições legais. Neste caso, não houve essa violação, segundo o inquérito a que procedemos, a legislação portuguesa aplicável foi cumprida e, portanto, os passaportes foram atribuídos, no cumprimento da lei”, referiu então Santos Silva.

Tiago e Fong Fong Guerra tinham sido condenados em Agosto por um colectivo de juízes do Tribunal Distrital de Díli a oito anos de prisão efectiva e a uma indemnização de 859 mil dólares por peculato (uso fraudulento de dinheiros públicos).

Os portugueses recorreram da sentença, considerando que esta padecia “de nulidades insanáveis” mais comuns em “regimes não democráticos”, baseando-se em provas manipuladas e até proibidas.

Um “pedido internacional de extradição para Portugal com detenção provisória” foi enviado à Procuradora-Geral da República portuguesa, Joana Marques Vidal, com conhecimento para a ministra da Justiça, Francisca Van-Dúnem, e para o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, segundo uma carta do advogado do casal à qual a Lusa teve acesso.

Álvaro Rodrigues confiante

O advogado do casal Guerra disse ao HM estar confiante num resultado favorável a Tiago e Fong Fong. “Estou confiante num bom resultado. Achei e continuo a achar que eles estão inocentes e aguardo uma decisão favorável da parte do tribunal de recurso de Timor.”

Apesar do recurso à sentença que condenou o casal já ter sido entregue em Díli, Álvaro Rodrigues não sabe a data da próxima sessão de julgamento.

“O recurso já deu entrada na Comarca de Díli, o Ministério Público timorense já respondeu ao recurso e penso até que já subiu para o tribunal de recurso”, acrescentou o advogado que afasta qualquer ilegalidade na concessão dos novos passaportes e cartões de cidadão a Tiago e Fong Fong Guerra, como tem sido afirmado pelas autoridades timorenses.

“Qualquer cidadão português tem direito a ver renovado o seu passaporte e cartão de cidadão. Julgo eu que a embaixada de Portugal em Díli fez [o que estava correcto]”, apontou.

O casal já está em Lisboa graças a um pedido de extradição apresentado por Portugal junto das autoridades australianas. O casal Guerra havia chegado a Darwin de forma ilegal, o que “motivou uma detenção por parte do Governo australiano”. “Em virtude dessa detenção que Portugal requereu a extradição e mais nada, e isso não tem nada a ver com o processo final”, rematou Álvaro Rodrigues.

Ana Gomes está contra a extradição

A eurodeputada Ana Gomes escreveu às autoridades australianas objectando à extradição para Timor do casal português que fugiu para a Austrália após condenação pela justiça timorense, por o crime que lhes é imputado não ter fundamento. “Tendo ontem [segunda-feira] sabido que eles estavam detidos na Austrália e que, possivelmente, iria haver – como se confirmou – um mandado de captura e eventualmente um pedido de extradição por parte de Timor, e tendo lido as leis australianas em matéria de extradição, vi que é possível serem levantadas objecções à extradição”, disse Ana Gomes à agência Lusa.

“Portanto, escrevi às autoridades australianas – ao Procurador-Geral e ao ministro da Justiça – dizendo que tendo acompanhado o processo desde Maio de 2015 e sendo, de resto, uma velha amiga de Timor, estou disponível para ser ouvida e apresentar toda a informação que tenho sobre o caso, para o efeito de ser levantada uma objecção à extradição e para que eles possam ser repatriados para Portugal”, relatou Ana Gomes.

Frisando que tomou esta iniciativa por estar “convencida da inocência deles e de que estão a ser vítimas de um erro de Justiça”, a antiga embaixadora de Portugal na Indonésia, uma observadora atenta da realidade de Timor-Leste, explicou que esse erro decorre das “dificuldades e incapacidades do próprio sistema timorense”, que é “um sistema judicial novo e pouco experiente”.

“Como conheço peças do processo, sei que as acusações não são minimamente consistentes: peculato é um crime de que só podem ser acusados funcionários do Estado timorense, ora, não é o caso. Só esse simples facto é, do meu ponto de vista, demonstrativo de que as acusações não têm fundamento e de que a sentença não tem fundamento, e compreendendo eu as debilidades do sistema judicial timorense e estando absolutamente convencida da inocência deles, acho que é minha obrigação ajudar quem está a ser vítima de uma grande injustiça”.

Ana Gomes vincou que, da mesma maneira em que o fez “em relação a muitos timorenses”, também o faz “em relação a estes dois nacionais portugueses, sem dúvida nenhuma”.

27 Nov 2017

Timor-Leste | Executivo de Alkatiri em risco depois da apresentação de moção de censura

O Governo minoritário liderada por Mari Alkatiri pode ter uma curta esperança de vida no poder, depois da indigitação pelo Presidente da República, Lu Olo. A oposição parlamentar apresentou ontem uma moção de censura como forma de protesto por o Governo da Fretilin ainda não ter apresentado um programa de governação. Do lado do Executivo fala-se em “assalto ao poder”

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] eventual aprovação da moção de censura ao Governo apresentada ontem pela oposição maioritária no Parlamento timorense implica necessariamente a queda do Executivo, segundo a Constituição e o regimento em vigor. A Constituição timorense define que o Parlamento Nacional “pode votar moções de censura ao Governo sobre a execução do seu programa ou assunto de relevante interesse nacional, por iniciativa de um quarto dos deputados em efectividade de funções”.

Caso não seja aprovada, nota o texto, “os seus signatários não podem apresentar outra durante a mesma sessão legislativa”.

A oposição, que controla 35 dos 65 lugares no Parlamento Nacional, apresentou ontem de manhã uma moção de censura ao Governo em contestação ao facto do Executivo não ter ainda apresentado, pela segunda vez, o programa do Executivo, que foi chumbado já no passado dia 19 de Outubro.

“O Governo não apresentou programa do Governo pela segunda vez e os deputados da Aliança de Maioria Parlamentar (AMP), com base no artigo 111 da constituição da República Democrática de Timor-Leste e artigo 140 do regimento do Parlamento Nacional, apresenta uma moção de censura ao VII Governo constitucional”, disse Patrocínio dos Reis, deputado do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), segundo partido timorense, que leu uma declaração política da oposição.

Corda ao pescoço

A Constituição timorense determina que a aprovação de uma moção de censura “por uma maioria absoluta dos deputados” em efectividade de funções é um dos actos que implica a demissão do Governo pelo chefe de Estado.

O regimento explica as circunstâncias em que a moção de censura é debatida e votada, com o debate a ser “aberto e encerrado por um dos signatários da moção”, com o primeiro-ministro a ter “o direito de intervir imediatamente após e antes das intervenções previstas no número anterior”.

Segundo o regimento, o debate não pode exceder três dias e começa com uma intervenção do Governo por um período máximo de 30 minutos, terminando com a votação da moção.

Numa declaração política em nome dos três partidos da oposição – CNRT, Partido Libertação Popular (PLP) e Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO) – a Aliança de Maioria Parlamentar contesta o facto do Executivo ter apresentado ao parlamento uma proposta de Orçamento Rectificativo sem antes ter apresentado pela segunda vez o programa do Governo. Recorde-se que no dia 19 do mês passado, os 35 deputados da oposição (no parlamento de 65 lugares) aprovaram uma moção de rejeição ao programa do Governo insistindo que pela “interpretação paralela” e análoga da lei em vigor, o executivo tinha 30 dias para voltar a apresentar o programa.

Esse prazo, refere a declaração, foi ultrapassado no domingo e o Governo não cumpriu trazendo novamente ao parlamento o seu programa. A aprovação de uma segunda moção de rejeição implica a queda do Governo.

Assalto ao poder

O chefe da bancada da Fretilin, que lidera o Governo minoritário timorense, Francisco Branco, criticou a “política de má fé” e a tentativa de “assalto ao poder” por parte da oposição. Intervindo no plenário, Francisco Branco disse que a oposição está a ignorar a “mensagem clara” da população nas urnas, no passado dia 22 de Julho que quis “uma mudança do status quo”.

“O povo votou pela mudança e a oposição actua com má fé. Esta é uma política de assalto ao poder, uma cultura que não respeita o povo timorense”, afirmou o responsável da Frente Revolucionária de Timor-Leste Independente.

Branco questionou ainda a legalidade da AMP, bloco acordado pelas três bancadas da oposição, e afirmou que a sua existência não foi ainda claramente formalizada nos congressos partidários.

Nurima Alkatiri, deputada da Fretilin, também contestou a acção da oposição afirmando que “respeitando ou não a constituição e a lei” a moção representa um golpe ao Governo liderado pela Fretilin. “Não é a primeira vez. Quem tem ambição pelo poder faz isto. O povo sabe e compreende. Isto é um golpe, um golpe de Estado”, afirmou.

Em reacção, Arão Noé Amaral, chefe da bancada do segundo partido mais votado, o CNRT, rejeitou que a oposição esteja a fazer qualquer assalto ao poder. “Isto não é um assalto ao poder porque o poder, e a competência, é do Presidente da República que tem de decidir o que fazer depois disso”, afirmou.

“Timor-Leste é um Estado de Direito e submetemo-nos à decisão do Presidente da República, mas queremos que sejam respeitadas as regras constitucionais”, afirmou. Arão Amaral reiterou que a oposição “não está a fazer qualquer assalto do poder”, considerando que este “é um processo normal, legal e constitucional”. O deputado pediu ainda desculpas “se a declaração ofendeu alguma parte”, mas reiterou que a força partidária que representa respeita “as regras do normal funcionamento de um Estado democrático”.

Alta tensão

A apresentação da moção de censura, numa sessão do plenário, que já se esperava difícil por causa do debate do orçamento rectificativo, elevou ainda mais a tensão, com deputados das bancadas do Governo e da oposição a trocarem críticas e gritos.

Pancadas nas mesas e troca de insultos levaram a apelos à calma tanto no plenário, como nas galerias.

A oposição timorense quer ver debatida e votada ainda “esta semana” a moção de censura que apresentou ontem de manhã, cabendo a decisão final de agendamento a uma reunião de líderes das bancadas, indicou um deputado das forças políticas proponentes da moção que incendiou uma situação política já bem quente.

“A oposição considera que este assunto deve ser debatido com cariz de urgência, em resposta ao facto do Governo não ter ainda apresentado o seu programa. A decisão depende da conferência das bancadas, mas a nossa expectativa é que o debate seja ainda esta semana”, disse à Lusa Adérito Hugo da Costa, ex-presidente do Parlamento Nacional e deputado do CNRT. Adérito Hugo da Costa disse que o seu partido e a oposição estavam preparados para aceitar qualquer decisão do chefe de Estado que tem que optar entre uma solução no actual cenário parlamentar ou convocar eleições antecipadas. “O CNRT está preparado para qualquer cenário e respeitaremos a decisão que o senhor Presidente da República venha a tomar. Começamos com contactos nas bancadas, conferências dos três partidos e agora vão falar os líderes”, disse.

O Presidente timorense recordou ontem a união que levou à vitória da resistência à ocupação indonésia para criticar, num discurso perante as forças de defesa, os que “derrubam irmãos” para ocupar cadeiras de poder.

“Nós não procurávamos cadeiras, não derrubávamos irmãos para ocupar cadeiras. Naquele tempo, nós que servíamos o país e o povo, sabíamos que a recompensa podia ser a prisão, ou perder a vida”, disse Francisco Guterres Lu-Olo. “Resistimos e ganhámos porque demos as mãos, entre irmãos, para servir o país. Os combatentes e o povo protegeram-se mutuamente. Foi assim que vencemos e foi assim que as Falintil (Forças Armadas de Libertação Nacional de Timor-Leste) e o povo elevaram bem alto a nossa identidade timorense”, afirmou.

Lu-Olo falava na abertura de um seminário sobre direitos humanos e a missão das Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL), organizado em conjunto com a Provedoria dos Direitos Humanos e Justiça, o comando das F-FDTL, o Ministério da Defesa e Segurança e a Casa Militar da Presidência da República.

O discurso, numa altura de grande tensão política, foi feito enquanto no Parlamento Nacional a oposição maioritária apresentava a moção de censura ao Governo cuja aprovação implica a demissão do Governo. “Acredito que os timorenses podem voltar a dar as mãos uns aos outros, para vencermos juntos o desafio do desenvolvimento e da eliminação da pobreza. Esta tem der ser a prioridade número um do nosso país”, disse Lu-Olo. “Acredito que, depois de restaurarmos a independência, somos capazes de reforçar o espírito nacionalista e a unidade para vencermos os combates da paz, como fomos capazes de vencer as batalhas da libertação”, considerou.

21 Nov 2017

Timor | Portugueses condenados escapam para a Austrália

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s portugueses Tiago e Fong Fong Guerra, condenados em Timor-Leste a oito anos de prisão por peculato, fugiram do país e estão detidos em Darwin, no Território Norte da Austrália onde entraram ilegalmente de barco, confirmou a Lusa.

Fonte do Australian Border Force (ABF) confirmou que dois portugueses tinham entrado ilegalmente no país, escusando-se a prestar informações adicionais.

Fonte consular portuguesa indicou que se trata do casal Tiago e Fong Fong Guerra, que viajaram com passaportes e cartões de cidadão portugueses, mas sem visto de entrada na Austrália.

O casal está detido no centro de acolhimento de estrangeiros próximo do aeroporto de Darwin, cidade a que Tiago e Fong Fong Guerra chegaram, de barco, na quinta-feira 9 de Novembro, segundo a ABF.

A mesma fonte consular portuguesa confirmou à Lusa que o assunto está a ser acompanhado pelas autoridades portugueses e que o processamento do caso pode “demorar até duas semanas”, segundo a lei em vigor.

Álvaro Rodrigues, advogado de defesa do casal, disse à Lusa que “até ao momento” não receberam qualquer informação ou contacto sobre o assunto, não tendo ainda confirmado sequer se o casal está de facto na Austrália.

“Não tenho confirmação nenhuma porque não tivemos ainda nenhum contacto. Não sabemos nada. Não tivemos qualquer contacto nem antes nem depois e aguardamos serenamente alguma informação”, disse o advogado contactado em Macau. “Até ao momento não tivemos qualquer contacto das autoridades timorenses, portuguesas ou australianas”, disse ainda.

A embaixada portuguesa em Díli recusou fazer qualquer comentário sobre o assunto, remetendo declarações para o Ministério dos Negócios Estrangeiros em Lisboa.

Caso bicudo

O casal foi preso pela polícia timorense, em Díli, a 18 de Outubro de 2014. Desde então, estavam impedidos de sair de Timor-Leste, com Tiago Guerra obrigado a comparências semanais na Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL).

A Lusa confirmou que se apresentou na passada segunda-feira, não tendo sido possível obter qualquer comentário oficial da PNTL ontem, dia em que em Timor-Leste se marca uma tolerância de ponto por ocasião do feriado de domingo.

A 24 de agosto um colectivo de juízes do Tribunal Distrital de Díli condenou o casal a oito anos de prisão efectiva e uma indemnização de 859 mil dólares por peculato. O tribunal declarou os dois arguidos co-autores do crime de peculato e absolveu-os pelos crimes de branqueamento de capitais e falsificação documental de que eram igualmente acusados.

O casal recorreu da sentença, pedindo a absolvição e considerando que esta “padece de nulidades insanáveis” mais comuns em “regimes não democráticos”, baseando-se em provas manipuladas e até proibidas.

Cerca de 3.500 pessoas assinaram uma petição, que já chegou ao parlamento português, a pedir ao Governo a extradição para Portugal do casal.

A petição, que chegou ao parlamento português em Outubro reclama que “o Governo de Portugal intime o Governo de Timor-Leste para que este processo seja transferido para Portugal, uma vez que o sistema judicial timorense tem provado ser incapaz de lidar com um caso como este”.

14 Nov 2017

Hong Kong | Morre multimilionário que ajudou a repatriar milhares de timorenses

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m multimilionário e filantropo de Hong Kong que em 1999 ofereceu a Timor-Leste um navio usado para repatriar da Indonésia milhares de refugiados leste-timorenses morreu na semana passada aos 91 anos, informou a família.

Eric Edward Ho Tung, que nasceu em 1926 e foi nomeado embaixador itinerante de Timor-Leste em 2002, era neto do empresário Robert Ho Tung e filho de Edward Ho Tung e da sua mulher a irlandesa Mordia O’Shea.

“Era um amigo de Timor-Leste que em 2000-2003 despendeu milhões de dólares para ajudar no repatriamento de mais de 100 mil refugiados timorenses de Kupang para Díli num navio que ele comprou para o efeito”, recordou à Lusa o ministro timorense José Ramos-Horta, que em 2002 o nomeou embaixador itinerante de Timor-Leste.

Neto de um conhecido filantropo, Robert Ho Tung, que no século passado ofereceu uma biblioteca a Macau, Eric Ho Tung ajudou a libertar bispos e padres que estavam detidos no Vietname e na China, tendo apoiado a Ordem de Malta e institutos de ensino em vários locais do mundo.

Através de uma fundação que criou, Eric Ho Tung começou a ter conhecimento do que se passava em Timor-Leste nos anos finais da ocupação indonésia – depois de contactos com o Duque de Bragança – tendo desde então apoiado vários projectos da resistência e da igreja timorenses.

Pai de cinco filhos e três filhas do seu casamento com a norte-americana Patricia Anne Shea, Eric Ho Tung ficou conhecido em Timor-Leste quando, em Dezembro de 1999, ofereceu um navio que permitiu repatriar mais de 15 mil refugiados que estavam na Indonésia.

A violência de Setembro de 1999, depois do anúncio do resultado do referendo em que os timorenses escolheram a independência, reavivou o interesse que Eric Ho Tung já tinha demonstrado para com a questão de Timor-Leste, tendo nessa altura voltado a contactar o Duque de Bragança para saber “qual era a melhor maneira de ajudar os timorenses”.

A ideia do navio surgiu para preencher as carências que se sentiam em questões de acesso à ilha, já que a maior parte dos transportes estavam nessa altura dependentes das forças militares australianas.

Comprado à marinha australiana e com plataforma para helicópteros, o navio, de 2.500 toneladas e cem metros de comprimento, tinha salas de assistência médica para poder circular a ilha e prestar apoio médico às populações costeiras.

À chegada a Díli a 11 de setembro de 1999 Hotung explicou à Lusa que a oferta do navio era “como um tributo à coragem dos timorenses” que apesar “de todas as ameaças e das consequências votaram pela independência”.

Os primeiros refugiados foram repatriados de Timor Ocidental a bordo do Patricia Anne Ho Tung, o nome do navio que um ano depois já tinha transportado mais de 10 mil pessoas.

Percurso de vida

Natural de Hong Kong, Eric Ho Tung foi viver para Xangai com o pai quando era criança, estudou no Colégio S. Francisco Xavier e regressou a Hong Kong na 2ª Guerra Mundial, altura em que trabalhou nas urgências do Hospital Tung Wah.

Quando Hong Kong foi ocupado pelos japoneses em Dezembro de 1941, Ho Tung foi enviado de novo para Xangai onde esteve em prisão domiciliária, acabando, em 1947, por viajar para os Estados Unidos para estudar.

Depois das mortes do avô em 1956 e do pai em 1957, Eric Ho Tung regressou a Hong Kong onde assumiu o controlo das empresas da família, especialmente nas áreas imobiliária, financeira e de importação e exportação.

Começou a trabalhar no mundo diplomático na década de 80 do século passado, aproveitando os contactos que tinha na China e nos Estados Unidos, ampliando vários programas de apoio que financiaram o estudo a muitos estudantes de Hong Kong no estrangeiro.

29 Set 2017

Timor-Leste | Retidos navios chineses que pescaram tubarão

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo timorense suspendeu ontem as licenças de uma frota de navios chineses apanhada a pescar tubarão em águas timorenses, enquanto conduz investigações para determinar se a empresa cumpriu todos os critérios legais.

O ministro da Agricultura e Pescas timorense, Estanislau da Silva, disse à Lusa que enquanto decorrem as investigações, conduzidas com base em informações fornecidas pelo Governo indonésio, “os navios estão proibidos de sair do porto de Carabela” na costa norte do país.

A decisão de suspensão deve-se, explicou, apenas a aspectos relacionados com a própria empresa e não ainda com a actividade de pesca em Timor-Leste, nomeadamente a captura de toneladas de tubarão confirmada numa rusga efetuada este mês.

“Recebemos informações detalhadas da Indonésia sobre a empresa e daí tomei a liberdade como ministro competente de suspender as actividades da companhia, no sentido de se fazer uma investigação detalhada sobre o registo dos barcos de pesca e a ligação da empresa com outros existentes que tenham estado envolvidos em actividades de pesca ilegal”, explicou o governante.

No essencial, disse, trata-se de determinar “se as embarcações estiveram envolvidas no passado em pesca ilegal”, algo que em Timor-Leste não é permitido, ou se “estão registadas em mais do que um país, algo que também não é permitido”.

Se os navios respeitaram, ou não, a licença que lhes foi concedida é outra questão que só será determinada depois de concluída uma investigação detalhada, que está actualmente a ser conduzida por técnicos do Ministério.

“Actualmente está no porto de Carabela a polícia de investigação juntamente com os responsáveis das pescas para averiguar com mais profundidade a veracidade das informações que recebemos. Se se tratar de crime serão tomadas outras medidas”, referiu.

Déjà vu

A acção do Governo surgiu depois da segunda polémica, este ano, com navios das empresas chinesas Hong Long Fisheries e Pingtan Marine Entreprises e que têm, desde meados de Novembro de 2016, uma licença de um ano para operar em águas timorenses.

No passado dia 8 de Setembro, os navios voltaram a ser apanhados a pescar tubarão durante uma operação conduzida em conjunto pela polícia timorense e pela organização ambiental Sea Shepherd.

A operação envolveu o navio Ocean Warrior da Sea Sheperd que com lanchas rápidas ajudou a transportar efectivos da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) que efectuaram a rusga no interior das embarcações.

Já em Fevereiro, a Lusa tinha noticiado que os navios estavam a pescar ilegalmente tubarão, o que levou o Governo timorense a anunciar uma investigação interministerial que, em Abril, deliberou aplicar aos 15 navios uma multa de 500 dólares  cada.

Estanislau da Silva reconheceu que o “licenciamento de pescas à companhia chinesa Hong Long tem sido polémico, objecto de comentários e de suspeitas”, mas quando a licença foi concedida tudo estava dentro da lei.

“Na altura concedemos as licenças mediante a informação que nos foi submetida e com base nessa documentação e declarações da própria companhia decidimos atribuir a licença, mas acautelando sempre que devia cumprir as leis”, disse.

“Agora recebemos informação detalhada da Indonésia e por isso mandei suspender as actividades da companhia para se aprofundar as investigações nesta área. Comuniquei o caso ao primeiro-ministro esta manhã e alertei o ministro da Defesa e Segurança para não deixar nenhum barco sair do porto de Carabela”, sublinhou.

O ministro disse que, no caso da pesca do tubarão, o Governo fará respeitar a lista de espécies protegida, que é “muito abrangente” e inclui espécies cobertas pela Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora (CITES) e ainda as listadas na Indonésia e na Austrália.

Sem dó

O governante reconheceu ainda não se saber ao certo o que está a bordo e que só agora está a ser feita uma “inspeção detalhada”. A lei prevê medidas que vão desde coimas à apreensão de navios ou suspensão da licença, estando igualmente em curso uma investigação adicional conduzida pelo Ministério Público, acrescentou.

“Estamos muito empenhados em proteger os nossos recursos marítimos e não tomaremos meias medidas se verificarmos que houve violação ou não foi cumprida a lei”, garantiu.

O ministro admitiu que este caso mostrou a necessidade de reforçar os meios de Timor-Leste para “inviabilizar a pesca ilegal” nas águas timorenses que, garantiu, se reduziu com a presença dos navios chineses licenciados.

“Precisamos de ter meios reforçados de patrulha. Espero poder acionar mecanismos com os nossos vizinhos na Austrália e na Indonésia sobre esta questão”, disse.

“Temos que diversificar a nossa economia, mas não o podemos fazer em detrimento dos recursos naturais de que o país dispõe. Isso é uma preocupação muito grande do Governo. Vamos a todo o custo encontrar soluções que acomodem esses dois aspectos”, referiu ainda.

25 Set 2017

Timor-Leste | Autoridades garantem que navios chineses não saem do país

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] primeiro-ministro timorense garantiu ontem que as forças de segurança timorenses têm instruções para garantir que os navios chineses apanhados a pescar tubarão em águas do país não saem da costa até estar concluída uma investigação.

“Neste monto a PNTL [Polícia Nacional de Timor-Leste] e a FDTL [Forças de Defesa de Timor-Leste] têm instruções para zelar por isso e garantir que os navios não fogem”, disse Rui Maria de Araújo em declarações à Lusa no Palácio Presidencial em Díli.

O chefe do Governo, que falava depois do encontro semanal com o chefe de Estado, Francisco Guterres Lu-Olo, referia-se ao caso de 15 navios chineses com licença para pescar em águas timorenses e que foram alvo de uma rusga no sábado.

A operação foi conduzida pela polícia timorense, com base no mandato do Ministério Público timorense, com o apoio da unidade marítima e a assistência da organização ambiental Sea Shepherd.

Gary Stokes, responsável desta acção da Sea Sheperd, disse à Lusa que os navios foram apanhados a pescar principalmente tubarão numa operação conduzida no sábado passado ao largo do porto de Com, na costa norte de Timor-Leste.

Os navios visados são das empresas chinesas Hong Long Fisheries e Pingtan Marine Entreprises e têm desde final de 2016 uma licença para operar em águas timorenses.

A operação envolveu o navio Ocean Warrior da Sea Sheperd que, com lanchas rápidas, ajudou a transportar efectivos da PNTL, que efectuaram a rusga no interior das embarcações, acompanhada e registada por ‘drones’ e por câmaras da organização ambiental.

O governante garantiu que a situação está a ser analisada por duas vertentes, por um lado ao nível do Ministério Público para apurar se houve ou não crime, e pelo Ministério da Agricultura para determinar se houve infracções às licenças.

17 Set 2017

Timor-Leste | Português condenado fala de incongruências na sentença

“Fomos todos enganados”

Tiago e a esposa, Fong Fong Guerra, foram condenados a oito anos de prisão pelo tribunal de Timor-Leste pela co-autoria do crime de peculato. Em entrevista, Tiago Guerra diz que há incongruências na sentença e muitas dúvidas sobre o paradeiro do dinheiro que o tribunal afirma estar nas contas do casal. O português, que aguarda a decisão do recurso, fala de entraves na sua defesa

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]erdeu 14 quilos enquanto esteve preso preventivamente em Díli. Tanto ele como a esposa necessitam de ser operados e de tratamento médico que não conseguem ter em Timor-Leste.

Do país não podem sai r por terem os passaportes confiscados e estarem sujeitos ao termo de identidade e residência. Os pedidos para que possam procurar ajuda médica no estrangeiro, foram entretanto recusados.

Eles são o casal português Tiago e Fong Fong Guerra, que desde 2014 se vêem a braços com um caso na justiça timorense. No passado dia 24 de Agosto foram ambos condenados pelo tribunal a oito anos de prisão pelo crime de co-autoria num caso de peculato, tendo sido absolvidos dos crimes de branqueamento de capitais e falsificação de documentos. O tribunal condenou-os ainda ao pagamento de 859 mil dólares.

Foram acusados de “prejudicar as finanças e a economia do Estado” de Timor-Leste, por alegadamente se terem apropriado de fundos oriundos da indústria petrolífera, que pertencerão ao país.

Tiago Guerra está na fase de recolha de mais provas para sustentar o seu caso. “Estes dias têm sido muito complicados. Somos condenados por um crime que não cometemos e estamos a ver as nossas vidas destruídas”, contou ao HM.

Tiago Guerra não faz a mínima ideia de quando será proferida a última de todas as decisões. “Aqui em Díli o tribunal de recurso pode demorar um ano ou dois a apreciar um caso. Aqui há dias houve uma decisão que tinha sido interposta em 2014, ainda estava preso. Pode demorar muito tempo.”

O português diz não aceitar a sentença e fala de entraves na apresentação de provas durante a preparação da sua defesa.

“A questão mais importante aqui é o direito à defesa. Os juízes tinham dúvidas, e isso está escrito no acórdão, sobre o paradeiro dos fundos. Queríamos chamar as testemunhas que fizeram a transferência, mas foram todas negadas, os juízes indeferiram esses pedidos. Depois tentamos ainda trazer uma testemunha do banco que fez a transferência, mas o pedido também foi indeferido”, contou.

O português adiantou que “sem direito à defesa, e sem cumprir os princípios básicos de justiça, tem sido muito complicado pensar em como podemos fazer isto”. “Estamos focados na apresentação do recurso e em garantir que está lá tudo”, acrescentou.

Onde está o dinheiro?

Em 2011, Tiago Guerra detinha a Olive Unipessoal, uma empresa sediada em Timor-Leste, a partir da qual efectuava negócios e recebia pagamentos por trabalhos de contabilidade, consultoria e auditoria. Desde 2010 que Fong Fong Guerra, a sua esposa, detinha em Macau uma outra empresa, a Olive Consultancy.

Segundo Tiago Guerra, foi esta empresa que serviu como intermediária no pagamento de 860 mil dólares norte-americanos entre uma sociedade de advogados norueguesa, em representação de uma empresa, a uma outra empresa norte-americana. O pagamento, feito através de um contrato de agente depositário (contrato escrow), foi feito a convite de Bobby Boye, nigeriano com nacionalidade americana.

Esse contrato valeu à Olive Consultancy o pagamento de dez mil dólares americanos, sendo que, a partir da transferência do dinheiro para os Estados Unidos, Tiago Guerra assume nunca mais ter tido contacto com Bobby Boye.

Boye, que chegou a desempenhar funções como assessor do Estado timorense no sector do petróleo, cumpre hoje pena nos Estados Unidos pela prática de vários crimes financeiros.

Tiago Guerra fala das diversas incongruências que encontrou na leitura da sentença que o condenou a si e à sua esposa, relativas ao paradeiro do dinheiro.

“Os juízes dizem que o dinheiro (860 mil dólares) foi enviado e saiu da conta, como ficou provado graças aos peritos do Banco Central, mas depois dizem que está em parte incerta. Há uma terceira afirmação de que o dinheiro está nas nossas contas em Macau. Quando têm estas dúvidas, penso que o principio da defesa não está a ser respeitado.”

Para descobrir o rasto do dinheiro, as autoridades timorenses enviaram cartas rogatórias, a pedir diligências e informações, às autoridades de Macau.

“Pediram cartas com informações sobre nós, e foi enviado um resumo, assinado pela Polícia Judiciária e Interpol, de todas as contas bancárias em nosso nome. O saldo de todas essas contas dá pouco mais de seis mil dólares. Dizem que estão congelados 860 mil dólares? Nessa altura estava preso, não tive nada a ver com esse pedido. [As autoridades timorenses] ignoraram todas essas informações”, clarificou Tiago Guerra.

O português, que foi condenado por alegadamente ter transferido dinheiro que pertence aos cofres públicos de Timor-Leste, afirma ainda que a sentença que ouviu não dá certezas sobre se os 860 mil dólares pertencem, de facto, ao país.

“As autoridades dizem que o dinheiro que foi transferido para a nossa conta lhes pertencia, mas essa é outra questão. Isso não ficou provado em tribunal. A lei diz que os pagamentos de quaisquer receitas do petróleo devem ser feitos directamente ao fundo soberano, que pertence ao Estado timorense e cuja conta está na Reserva Federal em Nova Iorque. Estamos a falar de um banco dessa dimensão”, referiu.

Tiago Guerra questiona: “a partir do momento em que o dinheiro não foi transferido para lá, alguém pensa que pertence ao Estado timorense?”

O português assegura que, quando fez a transferência do montante, em 2011, jamais poderia imaginar que esse dinheiro pertencia a Timor-Leste.

“Só em Dezembro de 2016, quando tivemos acesso aos autos, vimos que o dinheiro está em disputa entre a empresa norueguesa e o Estado timorense. Até então não tínhamos a mínima ideia de que o dinheiro poderia pertencer a Timor e muito menos que viesse dos impostos [da indústria petrolífera].”

Alguma ingenuidade

Tiago Guerra, licenciado em engenharia e com carreira feita na área das telecomunicações, chegou a Timor-Leste em 2010, depois de ter passado pelo Brasil e pela China. Trazia na bagagem uma proposta para abrir a Digicel, empresa irlandesa, em Timor-Leste, projecto que falhou.

“A empresa contratou-me para começar uma empresa de operações de telecomunicações, e quando cheguei não havia uma licença nem a legislação que permitisse ter a licença. Não havia nada.”

Na cabeça do casal Guerra começou a pensar-se a ida para Macau, e foi nessa altura que foi criada a Olive Consultancy. A ideia era colocarem os filhos na Escola Portuguesa de Macau, onde tinham uma reunião agendada que nunca chegou a acontecer, devido ao facto de terem sido detidos no aeroporto de Díli dois dias antes.

A ligação do casal Guerra com Bobby Boye surgiu pelo facto de serem vizinhos.

“Houve a necessidade de um agente depositário e na altura Boye era uma pessoa bem vista aqui. Sei que entretanto fomos todos enganados e ludibriados por ele. Na altura tinha uma óptima reputação aqui, eu diria que era o assessor mais visível em Timor-Leste. Era recebido por todos os ministros. Quando recebemos esta proposta decidimos avançar”, lembrou Tiago Guerra.

Hoje o português não tem duvidas de que foi algo ingénuo na hora de aceitar este contrato.

“Nunca pensei que alguém pudesse ser assim. Éramos vizinhos, quando cheguei a Díli a casa dele era mesmo ao lado da minha. Agora sabemos que é criminoso, está a cumprir a pena, e que já tinha estado antes na prisão. Mesmo assim conseguiu ser escolhido no processo de contratação de um assessor internacional.”

Tiago Guerra frisa ainda não compreender como é que o tribunal timorense nunca notificou Bobby Boye como co-arguido no crime de peculato.

“Não sei como é que estou a ser condenado de ser co-autor de um crime de peculato, quando o autor do crime nem sequer foi notificado pelas autoridades. Está a cumprir pena nos Estados Unidos e são conhecidas todas as informações sobre ele. Dizem que não o conseguem encontrar? Essa informação é difícil de aceitar”, remata.

5 Set 2017

Timor Leste | Língua portuguesa com muito para fazer no país

Timor Leste está a dar passos largos no que respeita ao ensino e divulgação da língua portuguesa, mas ainda há muito para fazer. A ideia foi deixada pela representante do país no Congresso de Lusitanistas que decorreu na semana passada no território, a professora de linguística da Universidade Nacional de Timor Lorosa’e, Benvinda da Rosa Lemos Oliveira

[dropcap style≠’circle’]”O[/dropcap]  português está no bom caminho em Timor Leste.” A afirmação é de Benvinda da Rosa Lemos Oliveira, professora de linguística da Universidade Nacional de Timor Lorosa’e, já no final do 12º Congresso de Lusitanistas que teve lugar na semana passada.

“Antes de 1975, apenas cinco por cento da população falava português”, diz ao HM. Hoje, sublinha com satisfação que a percentagem já ultrapassa os 40, o que representa quase metade da população falante da segunda língua oficial do país. “Ainda está a dar passos pequenos”, afirma, mas a evolução é inegável.

“Em 75, aquando da invasão indonésia, deixámos de falar completamente o português”, recorda. Mas Benvinda Oliveira tinha livros em casa que fizeram com que, de alguma forma, fosse continuando a ter contacto com a língua, apesar da proibição oficial por parte das autoridades indonésias. “Havia uma igreja que era autorizada a dar a missa ao domingo e era em português e, depois da independência, tem sido uma lenta reconquista”, explica.

A responsabilidade e o mérito, considera, estão no próprio ensino, mas os resultados práticos estão ainda muito aquém do desejável. “Temos falta de livros, não há quase nada”, conta.

Aliada à fraca oferta de manuais e de literatura, não há livrarias. “Só temos bibliotecas e mesmo assim as obras são muito poucas, havendo mesmo áreas em que são praticamente inexistentes”, diz.

Macau é um exemplo

Para a académica, que passou a última semana no território, Macau é um exemplo quando se fala de língua portuguesa.

“O Governo devia e podia dar mais atenção ao português”, afirma, enquanto exemplifica com o apoio dado à imprensa portuguesa da RAEM. Se existissem iniciativas do género em Timor Leste, a língua também estaria mais próxima da população, sublinha.

“Por exemplo, os jornais são escritos em tétum em cerca de 90 por cento da imprensa. Os restantes dez estão ocupados pelo Bahasa Indonésia, sendo que o português ou é totalmente ignorado, ou esporadicamente aparece num ou noutro conteúdo”, ilustra a professora.

Benvinda Oliveira considera ainda que a televisão deveria ter um papel mais activo na divulgação da língua portuguesa. De acordo com a académica, os media são o meio que mais facilmente chega aos jovens e, como tal, deveriam ser um investimento no que respeita ao português. “A maioria das antenas parabólicas ainda estão viradas para o país vizinho”, lamenta.

A sugestão da professora vai no sentido de, além de melhorar os aspectos associados aos meios, aumentar os cursos de português dirigidos aos jovens. A razão, aponta, é a necessidade de um espaço que abranja todas as áreas de ensino e onde os mais jovens possam praticar a língua. “Acabam por falar só entre as quatro paredes de uma sala de aula e num horário reduzido, mas o que há a fazer compete à política”, afirma.

Português para internacionalizar

“O português tem um papel predominante na actualidade e, como tal, deve servir de ferramenta para a própria internacionalização de Timor.” A ideia, defendida por Benvinda Oliveira, tem por base a insuficiência do tétum para levar Timor Leste mais longe. A professora deixa ainda a sugestão: “Timor Leste e Macau devem dar as mãos no sentido de afirmar ainda mais o português na Ásia”, refere.

“Fiquei cheia de inveja quando cheguei a Macau ao ver as placas na rua com as duas línguas”, conta ao HM. No entanto, Timor Leste tem outro tipo de vantagem: apesar de não estar escrita, a língua acaba por ser mais falada. A razão poderá ter que ver com algumas semelhanças entre o tétum e o português. “Um falante de português consegue perceber muito de tétum”, língua que, refere, tem mais de 50 por cento de empréstimo do português e que faz com que o entendimento oral seja facilitado. A união de forças entre as duas regiões é, de acordo com a professora, um passo em frente no desenvolvimento e afirmação no que respeita ao português.

Para Timor Leste, o futuro vai passar pelo marcar de posição da língua no território. “O país só tem a ganhar se o fizer, quer em termos económicos, quer políticos. Podemos ter acesso aos eventos internacionais. O tétum precisa do português para se alimentar. Precisamos do português para nos internacionalizarmos”, remata.

1 Ago 2017

Entrevista | Anabela Leal de Barros, investigadora

 

No modo como se fala estão muitas vidas, muitas centenas de anos, muitos barcos que chegam e partem. Anabela Leal de Barros, docente e investigadora, vai atrás da história das palavras, mas também das histórias das pessoas. De casa em casa, de escola em escola, fixou contos e lendas de Timor-Leste. Hoje, é lançado em Macau “Rumando de Lés a Leste – Contos e Lendas de Oecusse”, um livro cheio de gente

 

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omo é que surgiu o interesse por Timor-Leste?

Para além do facto de todos os portugueses nascerem com o gene “amigo de Timor-Leste” e terem andado anos a sonhar com a sua libertação?… Quando lá cheguei pela primeira vez, em 2002, e vi tudo o que havia a fazer para a implementação real do português como uma das duas línguas oficiais, e vi aquelas montanhas relvadas a cair a pique sobre aquele mar turquesa bordado de búzios, e vi aqueles sorrisos sempre a radiar, seja por rios secos ou caminhos pedregosos, percebi que ou ia de vez ou ia muitas vezes.

Antes deste livro há um trabalho no país. Que percurso foi este que levou à decisão de recolher contos e lendas de Oecusse?

Começou por ser a lecionação, enquanto docente da Universidade do Minho, de disciplinas de Linguística na Universidade de Timor Lorosa’e (UNTL), em 2002 e 2003, no curso de Português (uma das licenciaturas que a Fundação das Universidades Portuguesas então oferecia em Timor), e mais tarde no Mestrado em Formação de Professores, ramo de especialização em Língua Portuguesa, com orientação de mestrandos e participação em júris de provas, que a Universidade do Minho leccionou no INFORDEPE (Instituto Nacional de Formação de Docentes e Profissionais da Educação) e na UNTL (2012 a 2015). Nesses 14 anos percebi que os professores timorenses que frequentavam esses cursos guardavam pelo menos dois tesouros em situação precária e a merecer estudo: o português de Timor, com traços locais, asiáticos e antigos, e a literatura timorense de tradição oral. Eram maioritariamente os mais velhos, que frequentaram a escola em língua portuguesa, antigos guerrilheiros e membros da Resistência que antes a tinham usado como código, dificilmente decifrável pelos indonésios, e por fim tinham passado a ensiná-la, ainda sem habilitações superiores, quase generalizadamente. Comecei a sensibilizá-los e prepará-los para a recolha desse material, publiquei os “Contos e Lendas de Timor-Leste” (2014), deixei metade dos textos de 2002 para outro livro e, com o lançamento de uma edição revista e ampliada daquele, a 27 de Novembro de 2015, no âmbito das Comemorações dos 500 anos da Chegada dos Portugueses a Timor-Leste, no enclave de Oecusse, inaugurei uma nova fase: instalado o “vício” da recolha e salvaguarda dos contos e lendas, passei a dedicar-lhe períodos exclusivos ‘in loco’, de casa em casa e de escola em escola. Daí o novo livro, e mais dois, um deles em co-autoria com um antigo orientando de mestrado.

Oecusse é o único município isolado do resto do país. Até que ponto esta localização geográfica específica se repercute nos contos e também na oralidade?

Em todos os municípios de Timor-Leste abundam ainda os contos e lendas por recolher e registar, e quando contados em português, a partir de uma das dezenas de línguas maternas timorenses, trazem traços antigos e locais ainda não devidamente recolhidos e descritos. Contudo, Oecusse é aquele onde essa aventura impõe mais desafios; para se imaginar o quanto esteve isolado no passado basta sabermos que no século XXI o enclave ainda fica fechado por terra das cinco da tarde às nove da manhã; por mar, o barco leva meio dia a chegar de Díli e não é diário; pelo ar, o avião também folga um dia, quando não mais, ao sabor do tempo atmosférico. ‘Isolado’ no meio da ‘ilha’ (do latim ‘insula’), ‘ilhado’ no meio da Indonésia, Oecusse e os seus mais velhos são os depositários de um português que fascina escutar e investigar, à medida que se escavam os contos. O indonésio envolvente, o baiqueno materno, o tétum veicular e oficial, o inglês, outras línguas importadas dos municípios timorenses de leste, entrelaçam-se e confluem de algum modo nesse português que muitos guardam e nos entregam com um sorriso a seguir a um “Tardi!”, “Noiti!”, às vezes “Boa tarde”, “Boa Noite”, mas sobretudo “Bom dia/Dia!” apenas na voz dos mais puristas. Com os progressos cada vez mais evidentes do inglês, e em inglês, começamos a ouvir “Morning, sir!”… Quanto à repercussão nos contos, para além dos “bordados” que exibem nessas línguas, pois as palavras vão afluindo (quem conta em baiqueno prefere por vezes nomear certas realidades em tétum, ou até em indonésio, língua de desambiguação mesmo entre timorenses) e enquanto linguista é minha obrigação mantê-las no texto (com anotações em rodapé), também os contos são por vezes de fonte ou influência indonésia, tal como outros viajaram há muito de Portugal e acabaram adaptados e adoptados como locais; ou então migraram de outros municípios. Contos leva-os o vento, seguem os contadores para onde quer que vão e, a certo momento, passam a ser cidadãos do mundo. Daí que faça sentido começarmos por conhecê-los no seu lugar de nascimento, e depois, se possível, irmos seguindo as suas passadas, pois mal começam a andar, ensaiam caminhos e voos mais altos e cada vez mais longos.

A recolha das histórias que compõem este livro foi feita casa a casa. Como é que foi o trabalho de campo?

Foi no campo. Atravessei leitos de rio onde quase só corriam pedras e poeiras, subi montes, desci vales (tomo este isocolo à poesia barroca), bem devagarinho (que não haveria sinalização que valesse a tanto abismo, derrocada, área esburacada, charco, porco, galináceo e caprino a fazer-se à estrada). Foi à queima-roupa. Sem marcações, iam-me levando de casa em casa; cada contador acompanhava-me ou indicava-me a casa ou a escola de outro — de moto, de microlete, em longas caminhadas a pé; por vezes começava por fotografar as flores de um jardim e acabava a registar um conto e a provar fritos de coco. Os contadores, desprevenidos, muniam-se logo de um sorriso e de uma cadeira, mal me viam à distância, entregavam-me o seu tempo sem nunca regatear, íamos buscando palavras nos dicionários de todos os que arriscavam estar presentes (em baiqueno, em tétum, em indonésio, em português), e ora a ferros, ora com ventosas, ora de parto fácil e natural, lá vinha o conto, com o café de Timor bem docinho. No fim, valia sempre a pena; o conto aflorava limpo, provando, afinal, que o português não é assim tão difícil, e a satisfação geral quado lhes lia o resultado “final” é a minha melhor memória.

Procura-se com esta obra não só fixar a tradição oral de Oecusse, mas também o “português timorense” que, no enclave, tem características especiais. Que características são estas e como foi o processo de escrita dos contos e lendas recolhidos?

As eventuais características exclusivas do português deste distrito só serão discerníveis quando todos os traços específicos do português timorense estiverem descritos; sem ambicionar já a fazer essa destrinça, sem efectuar essa joeira, posso contar que, enquanto investigadora e docente de História da Língua Portuguesa, há mais de 20 anos, vibrei ao ouvir falantes de Oecusse lamentarem hospitaleiramente não terem mais a oferecer-me para além de ‘água cozida’ (hoje, em português europeu, sempre ‘água fervida’): o adjectivo/particípio passado presente nos dicionários antigos (logo desde o vocabulário manuscrito de português-chinês de Ricci e Ruggieri, do século XVI, e também nos manuscritos lexicográficos em chinês-português dos sécs. XVII e XVIII). Ou ainda ver e fotografar em Padiae uma ‘sintina < sentina’ (‘sanitários públicos, casa-de-banho’), ler nas ementas ‘assadura’ (‘carne grelhada’), ouvir dizer ‘chumaço’ (‘almofada, cheia’), ‘lapiseira’ (‘caneta, esferográfica’), ‘baliza’ (‘fronteira’). Em termos morfossintácticos, diz-se em Timor sempre ‘ribeira’ (não ‘ribeiro’), ‘pequeninho’ (não ‘pequenino’), ‘gémeos de três’ (decalque do tétum para o cultismo ‘trigémeos’, desconhecido), ‘pente de bananas’ (mais específico, pois ‘cacho’ é todo o “braço coberto de pentes” dado por uma bananeira), ‘tempo da chuva’ (não ‘das chuvas’); ‘tempo da colheita’ (não ‘das colheitas’). No âmbito dos intercâmbios linguísticos, achei no baiqueno (ainda sem norma ortográfica) ‘teto/tetu’ (indicando também o ‘telhado’ e o ‘forro’ das cabanas com uma parte ao ar livre onde se sentam os vigilantes dos pássaros no meio das várzeas), ‘parinseza/parincesa’ (‘princesa’), ‘cantareiros’ (‘canteiros’, os vários patamares ou pedaços de terra alagada que compõem uma várzea ou arrozal, com pequenas “paredes” para conter a água). Neste momento, os professores timorenses mais conhecedores do português manifestam certas perplexidades a esse nível. Por exemplo, por que está a televisão a preferir somente a palavra ‘arroz’, quando todos sabem que em Timor se distingue o ‘néli’ ou ‘néle’ (‘grão cru, planta, semente, grão por descascar’) e o ‘arroz’ (‘grão pilado, descascado ou já cozinhado’). A verdade é que é preciso urgentemente legitimar essas distinções locais, que Sebastião Rudolfo Dalgado já tinha registado, sem esquecer que os termos asiáticos viajaram e foram partilhados; esse veio da Índia, permite uma distinção lexical e semântica de crivo mais fino, justificável numa área geográfica em que o arroz é a base da subsistência, e muitas vezes prato único, ainda hoje. Enfim, os traços são muitos, todos os dias me aparece e fascina algo novo que conheço dos dicionários e manuscritos antigos — mas que aí me aparece ainda falado. Depois, surgem-me os termos locais e de línguas vizinhas que chegaram ao português europeu no período dos Descobrimentos: sobretudo palavras do malaio-indonésio, como ‘areca’, ‘arequeira’, ‘gamute’, ‘gamuteira’, ‘tuaca’, ‘tuaqueira’, ‘gondão’, ‘gondoeiro’, ‘gundieiro’, ‘casuarina’, ‘bétel’, ‘canária’, ‘parão’, ‘tuaca’, ‘lorico/louro’ (antes ‘loro’, o ‘papagaio’), ‘suco’, ‘cacatua’ (em português europeu, hoje, só ‘catatua’, mas sendo aquela a forma etimológica), ‘barlaque’, ‘catupa’. Algumas chegaram-nos já através do tétum. Outras são mesmo do tétum, como ‘tais’ (os lindíssimos panos tradicionais de algodão colorido tecidos pelas timorenses). Vou anotando essas formas nos livros de contos e investigo-as depois em artigos científicos, mas seria aborrecido impor o meu entusiasmo nas já longas listas que agora me ocorrem, embora assim ‘de cor’ (e é mesmo ‘de coração’), e mereceria então ‘que me enfiassem uma peúga pelas goelas abaixo’, como diz o Woody Allen para explicar que “o mal é o bem em excesso”.

As histórias que os mais velhos sabem têm uma importância especial em Timor-Leste, certo?

Timor-Leste é tão rico de histórias como pobre de livros. Os livros permanecem ainda nas memórias dos falantes, mas todos os dias vão falecendo e falhando com elas e eles. Com os contos, falece o português. Não só o de outrora, que me interessa tanto, mas também o do futuro, que nos deveria interessar a todos, porém, não somente para enfeitar discursos políticos e camuflar interesses económicos. O meu oásis são as escolas. Os professores sabem o que os contos valem e já sabem a importância de os fixar e guardar em português. Trabalham comigo, num intervalo das aulas, no seu pouco tempo livre, juntos, um falando baiqueno, e depois tétum, e entretanto indonésio, e algum inglês (entre os mais novos), e por fim português. Os timorenses são multilingues. Daí, também, o valor de, no meio de tantas línguas, ainda guardarem espaço de cor, de coração, para a portuguesa. E para as histórias que ela mesma conta. Por exemplo, em Oecusse existe uma Lagoa a que chamam, mesmo em baiqueno, ‘Lagoa Sina’, mesmo ao lado do lugar onde aportaram pela primeira vez os portugueses em 1515: a praia de Lifau. ‘Lagoa Sina’ inclui, não o substantivo ‘China’, como parece a um leigo do século XXI, mas o adjectivo ‘chino, -a’, a forma antiga exclusiva para se dizer em português ‘chinês, -a’, como ainda hoje em castelhano (‘yo soy chino/ella es china’). Essa palavrinha conta uma história: os comerciantes chineses foram-se instalando muito cedo nesse sítio, onde hoje já se desmoronaram as construções que os abrigaram, mas a língua, essa, não esquece a história e continua a dar-lhe abrigo.

 Quais são os próximos projectos?

Para além de meia dúzia de livros já prontos sobre outros assuntos, que vão sofrendo há anos (fechados no computador) a prioridade que dou aos de Timor (mas também aos manuscritos e impressos antigos de Macau e da China, em vias de publicação), da literatura timorense de tradição oral sairão em breve mais dois livros de contos, e outro de Oecusse que recolhi em Junho-Julho deste ano, enquanto aguardava que chegasse de Macau (em quatro dias), mas sobretudo de Díli (em mais 15 dias), o livro “Rumando de Lés a Leste. Contos e Lendas de Oecusse”, para o lançamento. Outros projectos incluem contributos para a definição de normas ortográficas e a construção de dicionários para certas línguas locais, ou o estudo do intercâmbio e das interferências dessas línguas maternas no ensino-aprendizagem do português, para o que a colaboração dos estudantes, docentes e orientandos de mestrado e doutoramento timorenses serão cada vez mais indispensáveis.

24 Jul 2017

Timor-Leste, eleições | A apoteose de Mari Alkatiri, secretário-geral da Fretilin, em Oecusse 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] secretário-geral da Fretilin, Mari Alkatiri, chegou sábado num cavalo castanho, rodeado de centenas de pessoas, ao campo de futebol da capital do enclave timorense de Oecusse, onde uma multidão o recebeu em apoteose, num comício do partido. A uma semana nas eleições legislativas, de 22 de Julho, o antigo primeiro-ministro timorense reconhece que a sua imagem, que antes transmitia austeridade, é hoje uma surpresa para as multidões que o partido tem vindo a reunir.

“As pessoas não esperavam. Tinham em mim a pessoa de confrontação, quase de conflito, antipático. Mas não. Agora, liberto de tudo, sou aquilo que sou e sei que tenho aos ombros a responsabilidade de representar os que começaram tudo isto comigo e agora já não estão vivos. Sinto que os represento assim”, disse.

No palco, discursa, interage com velhos e novos que ali estão e dança, fazendo vibrar os apoiantes que vieram de todo o enclave.

Desde o inicio da manhã que, um pouco por toda a zona de Pante Macassar, se viam passar camionetas amarelas, motas e carros, carregados de apoiantes do partido.

No comício unem-se o moderno e o antigo, com jovens de telemóvel na mão a registar o momento, enquanto katuas, velhos líderes tradicionais, vestidos com tais, passeiam a cavalo entre os veículos.

Um desses katuas entrega o bikase, cavalo em baikeno (a língua regional), a Mari Alkatiri, que depois percorre o curto percurso entre a sua casa e o comício.

No campo de futebol, um animador e um conjunto no palco põem todos a dançar. A pouco e pouco, Alkatiri consegue chegar à tribuna de honra onde, depois do hino timorense e da Fretilin, o candidato conduz um minuto de silêncio.

Na esquina do segundo andar de um hotel próximo, em posição privilegiada, observadores da União Europeia (UE), munidos até com um par de binóculos, acompanham a movimentação no campo e os discursos no palco principal.

Em redor, onde há sombra, muitos amontoam-se, ainda que a grande festa se faça, no meio de muitas bandeiras, no terreno em frente ao palco e à tribuna de honra onde Alkatiri está acompanhado de vários líderes nacionais e regionais do partido.

A Fretilin, considerada o partido com a melhor estrutura em Timor-Leste, tem um ‘posto de campanha’ em cada posto administrativo com representações ainda em cada suco e em cada aldeia. Alkatiri sobe ao palco, onde agora dança com um grupo de mulheres e homens.

17 Jul 2017