João Santos Filipe Manchete PolíticaMetro Ligeiro | Preço de renda por terreno em Zhuhai ainda por negociar O Governo da RAEM aguarda pela data de transferência do exercício da jurisdição dos terrenos no outro lado das Portas do Cerco para começar a negociar a renda a pagar ao Governo Popular Municipal de Zhuhai As autoridades de Macau só vão negociar o valor da renda ao pagar Governo Popular Municipal de Zhuhai, pelo terreno e área marítima no lado sudeste do Posto Fronteiriço de Gongbei, depois do Conselho de Estado indicar o dia de transferência de jurisdição. Os esclarecimentos foram prestados pela Direcção dos Serviços de Estudo de Políticas e Desenvolvimento Regional (DSEPDR), ao HM. Segundo a DSRPDR, que cita a decisão do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional sobre a delegação de poderes à RAEM, o “dia de transferência de jurisdição das referidas áreas terrestre e marítima e as coordenadas e áreas concretas serão determinados pelo Conselho de Estado”. Contudo, até agora, o Conselho de Estado ainda não determinou a data da delegação de poderes. “Deste modo, o Governo da RAEM só poderá iniciar as negociações com o Governo Popular Municipal de Zhuhai da Província de Guangdong sobre os termos concretos do contrato de arrendamento, incluindo o montante de arrendamento após o Conselho de Estado determinar o dia de transferência de jurisdição das referidas áreas terrestre e marítima e as coordenadas e áreas concretas”, foi explicado. Desde o ano passado que foi tornado público que a RAEM vai ficar responsável pelas áreas terrestre e marítima “do lado sudeste do Posto Fronteiriço de Gongbei da Cidade de Zhuhai da Província de Guangdong”, onde vai ser construída a ligação do Metro Ligeiro com o Interior. Arrendamento até 2049 A decisão do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional foi tomada a 29 de Dezembro, e publicada no Boletim Oficial da RAEM de 9 de Fevereiro. Segundo a decisão, o “Governo da RAEM adquire, por arrendamento, o direito de uso das respectivas áreas terrestre e marítima. O prazo de arrendamento iniciar-se-á a partir do dia da transferência de jurisdição das referidas áreas até 19 de Dezembro de 2049”. No documento, consta igualmente que “após expirar o prazo do arrendamento, este poderá ser renovado por decisão do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional”. A informação revela que o terreno fica situado no “lado norte do cruzamento entre a Praça das Portas do Cerco e a Avenida Norte do Hipódromo”, “no lado a sul do Túnel de Gongbei na Cidade de Zhuhai da Província de Guangdong”, “no lado leste do Posto Fronteiriço das Portas do Cerco”, e “no lado oeste da delimitação marítima entre” a cidade de Zhuhai e a RAEM. Quando anunciou a transferência do exercício da jurisdição sobre a área do Metro Ligeiro de Macau em Zhuhai, o Comité Permanente considerou que vai contribuir “para tirar pleno proveito dos benefícios económicos e sociais do projecto”, impulsionar “a interligação das infra-estruturas entre Macau e o Interior da China” e promover “uma melhor integração de Macau na conjuntura do desenvolvimento nacional”.
João Santos Filipe PolíticaComércio | Macau na Parceria Económica Regional Abrangente A vice-ministra do Comércio do Governo Central, Guo Tingting, afirmou que vai tratar dos preparativos para Macau aderir ao maior acordo de livre comércio do mundo A vice-ministra do Comércio afirmou ontem que o Governo Central gostaria de ver Macau a aceder à Parceria Económica Regional Abrangente (RCEP, na sigla em inglês), o maior acordo de livre comércio do mundo. “Iremos fazer os preparativos para que Macau possa entrar na RCEP o mais cedo possível”, disse Guo Tingting, num discurso transmitido na cerimónia de abertura da Conferência Industrial e Comercial para o Desenvolvimento da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. A RCEP foi assinada em Novembro de 2020 por 15 países da Ásia e da Oceânia, incluindo a China, o Japão, a Coreia do Sul, a Austrália e a Nova Zelândia, e entrou em vigor em Janeiro do ano passado. A RCEP vai eliminar cerca de 90 por cento das tarifas de importação dentro de duas décadas e estabelecer regras comuns em matéria de investimento, comércio electrónico e propriedade intelectual. O PIB dos países signatários é equivalente a 30 por cento da economia mundial, enquanto que o acordo representa cerca de 28 por cento do comércio mundial e um mercado de cerca de 2,2 mil milhões de pessoas, cerca de um terço da população mundial. O tratado é visto como uma plataforma para apoiar a ascensão da China como potência económica na região Ásia-Pacífico. Cooperação monetária Por sua vez, Edmund Ho destacou ontem a vitalidade e a abertura da Zona da Grande Baía, tanto a nível interno, como externo, durante o discurso de abertura da Conferência sobre o Desenvolvimento Industrial e Comercial na Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. No entanto, Ho não deixou de destacar que o Sul da China tem actualmente três moedas diferentes, no que considerou “um caso único”. Esta realidade é uma consequência dos acordos do retorno das soberanias de Macau e Hong Kong à China, e está prevista nas respectivas leis básicas. O primeiro Chefe do Executivo da RAEM sublinhou ainda que a Grande Baía é mais um exemplo de como a China “sempre apresentou oportunidades de crescimento económico para todo mundo”. Por outro lado, Edmund Ho vincou ainda a importância da Baía, como uma força de união da economia mundial, numa altura em que considerou que as forças da globalização encontram cada vez mais desafios e o ambiente internacional é cada vez “mais complexo”. (Com Lusa)
Hoje Macau SociedadeBanco de Portugal | Macau mantém-se como jurisdição terceira relevante O Banco de Portugal manteve a Região Administrativa Especial de Macau e a República de Moçambique como jurisdições terceiras relevantes para efeitos de reconhecimento e definição das percentagens de reserva contracíclica. A informação foi divulgada na sexta-feira. Em comunicado, o regulador bancário indica que a lista – que não se alterou face ao ano anterior – é valida a partir de 1 de Julho 2023 até 30 de Junho 2024. O regulador bancário adianta que a lista actual é divulgada na sequência da decisão do Conselho de Administração do Banco de Portugal (BdP) de 20 de Junho de 2023, que teve por base os resultados do exercício de avaliação para identificar países terceiros relevantes. “Este exercício é realizado pelo Banco de Portugal em conformidade com a Recomendação do CERS (CERS/2015/1) no que respeita ao reconhecimento e fixação de percentagens da reserva contracíclica de fundos próprios para as posições em risco sobre países terceiros”, refere. A reserva contracíclica de fundos próprios é um instrumento macroprudencial que tem como objectivo aumentar a resiliência do sector bancário perante o risco sistémico cíclico decorrente de um crescimento excessivo do crédito no sector privado não financeiro, recorda o BdP. Desta forma, o supervisor bancário aquando desta avaliação, apenas tem em conta as posições em risco directas do sistema bancário português sobre o sector privado não financeiro de países terceiros. “Esta avaliação não inclui posições em risco directas sobre entidades do sector público ou instituições financeiras de países terceiros, nem posições em risco do sistema bancário português, através da concessão de crédito em Portugal a sociedades não financeiras situadas em Portugal, mas cuja actividade dependa, em alguma medida, de países terceiros”, detalha.
Hoje Macau PolíticaReserva financeira | Ano com melhor arranque desde pandemia A reserva financeira da RAEM fechou o mês de Abril com 571 mil milhões de patacas em “caixa”, valor que representa um acréscimo mensal de 1,3 mil milhões de patacas. O registo dos primeiros quatro meses de 2023 reflectem o melhor arranque de ano desde o início da pandemia A reserva financeira da RAEM ganhou 1,3 mil milhões de patacas em Abril, continuando em terreno positivo pelo segundo mês consecutivo, após uma queda em Fevereiro, indicam dados divulgados ontem pela Autoridade Monetária de Macau (AMCM). A reserva financeira da Região Administrativa Especial de Macau cifrou-se em 571 mil milhões de patacas no final de Abril, de acordo com a informação publicada em Boletim Oficial. Apesar da queda de 4,5 mil milhões de patacas em Fevereiro, a reserva financeira acumulou uma subida de 11,8 mil milhões de patacas nos primeiros quatro meses de 2023. A reserva financeira está a ter o melhor arranque de ano desde o início da pandemia, mas o seu valor permanece longe do recorde de 669,7 mil milhões de patacas, atingido em Fevereiro de 2021. O valor da reserva extraordinária no final de Abril era de 404,4 mil milhões de patacas e a reserva básica, equivalente a 150 por cento do orçamento público de Macau para 2022, era de 152,1 mil milhões de patacas. A reserva financeira de Macau é maioritariamente composta por depósitos e contas correntes no valor de 262,9 mil milhões de patacas, títulos de crédito no montante de 127,4 mil milhões de patacas e até 176,1 mil milhões de patacas em investimentos subcontratados. Apesar da chuva A reserva financeira tinha terminado 2022 com 559,2 mil milhões de patacas, o valor mais baixo desde Janeiro de 2019, justificado pela AMCM com “a crise geopolítica, o bloqueio de cadeia global de fornecimentos causado pela epidemia e a subida significativa das taxas de juros”. Mesmo no cenário de crise económica criada pela pandemia, a reserva financeira de Macau tinha crescido em 2020 e 2021, apesar de o Governo ter injectado mais de 90 mil milhões de patacas no orçamento. No ano passado, o Governo voltou a transferir 68,2 mil milhões de patacas da reserva financeira para o orçamento público, que incluiu dois planos de apoio pecuniário à população. A Assembleia Legislativa de Macau aprovou em Novembro o orçamento da região para 2023, prevendo voltar a recorrer à reserva financeira em 35,6 mil milhões de patacas.
Hoje Macau EntrevistaEmbaixador Santana Carlos recorda as dificuldades para manter o português A questão “mais sensível” na conclusão das negociações entre Portugal e a China sobre a transferência da administração de Macau foi a regulamentação oficial das duas línguas, segundo o embaixador António Santana Carlos, que liderou o processo. O diplomata jubilado destaca ainda a forma como a contestação em Hong Kong fortalece a posição de Taiwan [dropcap]O[/dropcap]s chineses sabem muito bem o que querem e para alterarem uma decisão é extremamente complicado, porque há vários centros de decisão: no partido, no Governo, e muitas vezes na Presidência”, afirmou. Em entrevista à Lusa, em Lisboa, o diplomata jubilado recordou as 39 viagens que fez para Macau durante os três anos e meio em que chefiou o Grupo de Ligação Conjunto (GLC) em representação de Portugal, a partir de 1996. “Tenho um razoável conhecimento da maneira de ser dos nossos amigos chineses, não só porque vivi intensamente o final do processo de transição, como depois estive quatro anos em Pequim”, referiu. Actualmente conselheiro diplomático na Câmara Municipal de Lisboa, Santana Carlos considerou que, apesar das dificuldades, os objectivos foram cumpridos, no processo de transição. “Como é habitual, aqueles assuntos mais complicados ficam, normalmente para o fim”, reconheceu, referindo-se à insistência da parte portuguesa para que o português e o mandarim ficassem ambos consagrados como línguas oficiais, por forma a assim vigorarem na Assembleia Legislativa, na administração e nos tribunais. A medida, defendeu, foi “muito importante para a defesa da língua portuguesa”, uma premissa “fundamental”. Este foi o assunto “mais sensível” que teve em mãos, dada a oposição da China: “Foi um processo difícil”. Preferindo valorizar o resultado final, o embaixador admitiu que foi necessária “alguma combatividade” e que a discordância entre as partes levou à suspensão de uma reunião plenária do GLC, devido à falta de acordo quanto à agenda. “A China opunha-se à regulamentação oficial das duas línguas. Nós queríamos incluir esse ponto na agenda para começar a ser debatido e a China não tinha instruções e, portanto, dizia que não ou, pura e simplesmente – que é uma boa maneira que os chineses têm de manifestar uma opinião negativa – não respondia e o assunto ficava pendurado”, lembrou. “Não foi fácil de conseguir, foi preciso insistirmos muito e mantermos uma coerência ao longo de todo esse processo”, sublinhou, considerando positivo o resultado, já que mais tarde viria a ser criado o Fórum Macau, uma plataforma que acabou por ligar a China aos países de expressão portuguesa. Entre poderes António Santana Carlos deparou-se com a diferença de culturas e de regimes. “Nós, ocidentais, por vezes temos consultas duplas Governo – Presidência, mas não com essa linha tradicional que é o partido”. Na China, prosseguiu, o partido “pronuncia-se sobre tudo. Sobre tudo o que é importante. E é preciso conciliar esses três centros de decisão no processo. Portanto, houve alguns assuntos que demoraram um pouco mais de tempo a resolver”. Para Portugal, era importante “preservar a identidade e a singularidade” de Macau para que não fosse “absorvido de uma forma total e rápida” pela China. “Era fácil! Macau não é um território muito grande. Esses assuntos foram, talvez os de mais difícil resolução”, constatou. Apesar de já não ter acompanhado o processo, o diplomata destacou também a construção do aeroporto de Macau como um passo importante para “dar uma maior autonomia” ao território administrado por Portugal até Dezembro de 1999. “Esse foi um dossier importante, já estava resolvido quando cheguei a Macau”, declarou. Questionado sobre o cumprimento das bases que ditaram o acordo entre Portugal e a China fez um balanço positivo, com uma ressalva: “É claro que Macau não tem uma lei da greve, mas com a administração portuguesa essa lei também não existia”. Portugal conseguiu também que não vigorasse a pena de morte em Macau e que as forças militares chinesas não entrassem no território logo à meia-noite do dia 20 de Dezembro de 1999, mas no dia seguinte. “Entraram oito horas depois, mas a transição foi completamente civil. Como não existiam forças militares em Macau, esse foi o nosso argumento para não ser uma coisa simultânea, com o final do processo de transição”, relatou. Questão de opinião As manifestações em Hong Kong estão a “dar força a Taipé”, segundo António Santana Carlos que considera que a China tem “efectivamente um problema” com a situação na antiga colónia britânica, algo que não se estende a Macau. “Para já o território é muito diferente de Macau, a região tem outra dimensão, outra economia. Tem um peso muito importante, os grandes trunfos da área financeira de Pequim são Xangai e Hong Kong”, afirmou. Questionado sobre as diferenças verificadas ao nível da consciência política nos dois territórios, Santana Carlos respondeu: “Hong Kong tem uma massa crítica que às vezes cria problemas à China, como agora está a acontecer, porque tem uma opinião pública – até por ser maior – que não tem a atitude da opinião pública de Macau”. “Não quero dizer que há interferências, mas eles criaram uma situação complicada para a República Popular da China em Hong Kong”, acrescentou. O problema, está a “reflectir-se nas relações entre Pequim e Washington”, porque “quer o Senado, quer a Câmara dos Representantes norte-americana aprovaram decisões apoiando o lado de manifestações em Hong Kong e criticando a China”, observou. “E essa posição foi posteriormente utilizada pelo Presidente Donald Trump, o que criou dificuldades à China”, acrescentou. Na análise do diplomata, a China não só pensa na estabilidade de Hong Kong e Macau, como essa estabilidade é “muito importante para aplicar o objectivo de ‘Um País, Dois Sistemas’ a Taiwan”. “Essas manifestações, no fundo, acabam por dar força a Taipé, porque é fácil perceber, não é? A República Popular da China tem, efectivamente, um problema com a situação que decorre neste momento em Hong Kong”, declarou. Festas inclusivas Já em Macau, “a opinião pública é muito mais pequena, a massa crítica é menos activa”, disse o ex-responsável pelo Grupo de Ligação, frisando que Portugal conseguiu manter uma “relação de amizade e cooperação” com as autoridades chinesas diferente. “Tanto no processo de Macau, como no de Hong Kong, houve primeiro uma festa portuguesa antes da meia-noite, depois da cerimónia de transição, com as duas partes presentes ao mais alto nível e depois, finalmente, uma festa chinesa”, recordou. Em Hong Kong, contou, “nem nenhum representante da China foi à despedida britânica, nem nenhum representante do Reino Unido foi à festa chinesa, depois da transição”. Em Macau, o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês foi à despedida portuguesa e o homólogo português, Jaime Gama, também esteve presente na celebração dos chineses. “Conseguiu-se um entendimento que julgo que é mais do que simbólico”, considerou Santana Carlos, para quem a postura das duas partes “valorizou e continua a valorizar o relacionamento Portugal – China”.
Paul Chan Wai Chi Um Grito no Deserto VozesUm conto de duas cidades revisitado [dropcap]H[/dropcap]ong Kong e Macau regressaram à soberania chinesa há cerca de 20 anos. Macau pode não estar a passar a sua melhor fase e Hong Kong, está seguramente a passar uma das piores. O que acontecerá a estas duas cidades em 2020, irão melhorar ou piorar? Apenas os seus Governos e populações podem dar resposta a estas perguntas. O Artigo 2 do Capítulo 1 das Leis Básicas de Hong Kong e de Macau são iguais e estipulam “A Assembleia Popular Nacional da República Popular da China autoriza a Região Administrativa Especial de Macau/Hong Kong a exercer um alto grau de autonomia e a gozar de poderes executivo, legislativo e judicial independente, incluindo o de julgamento em última instância, de acordo com as disposições desta Lei”. Em nenhuma das duas Leis Básicas vem mencionado que o Governo Central tenha jurisdição global nas Regiões Administrativas Especiais de Macau e de Hong Kong. Mas o Artigo 1 do Capítulo 1, que estipula “As Regiões Administrativas Especiais de Macau/Hong Kong são parte inalienável da República Popular da China”, define a relação entre o Governo Central e as Regiões Administrativas Especiais. Se as Leis Básicas precisassem de realçar a jurisdição da China sobre estas regiões, de que é que serviria estabelecer o conceito de Região Administrativa Especial com um alto grau de autonomia, regida pelo princípio “Um País, Dois Sistemas”? As Leis Básicas de Hong Kong e Macau são semelhantes, mas no capítulo onde se lê Estrutura Política, nos Artigos 45 e 68 da Lei de Hong Kong vem claramente mencionado que o objectivo político a atingir é eleger o Chefe do Executivo e os membros do Conselho Legislativo através do sufrágio universal. É de lamentar que, quando o Governo de Hong Kong avançou com a reforma constitucional, a sociedade tenha levantado objecções à proposta do Executivo para “a escolha do Chefe do Executivo por sufrágio universal, após nomeação dos candidatos por um comité largamente representativo, de acordo com os procedimentos democráticos”. Devido às divergências, a questão acabou por ficar pendente da interpretação dos termos da Lei Básica pelo Comité Permanente do Congresso Nacional do Povo e, desde então, toda a sociedade de Hong Kong tem disputado vários pontos de vista sobre a forma certa de obter “o sufrágio universal genuíno”. A luta de longa data entre os dois Chefes do Executivo de Hong Kong, Leung Chun-ying e Carrie Lam, e os dissidentes, fez com que a sociedade ficasse cada vez mais dividida e os recentes episódios e violência e confrontação, mergulharam Hong Kong no caos. Apesar de tudo isto, os eleitores da cidade participaram em massa nas eleições distritais do passado dia 24, que funcionaram como uma espécie de referendo. Os resultados eleitorais são uma mensagem clara para o Governo Central, expressando a insatisfação da população quanto à actuação do Governo da RAE de Hong. Se os Governos central e local escutarem a voz da população e resolverem os conflitos sociais apropriadamente, Hong Kong libertar-se-á dos motins e do caos. Caso contrário não haverá forma de ultrapassar as fissuras sociais. A situação de Macau é oposta à de Hong Kong. O Chefe do Executivo designado, Ho Iat Seng, acabou de anunciar a lista dos dez principais dignatários, na qual se incluem seis novos nomes e quatro que vão ser reencaminhados nas suas funções. Aparentemente esta nova equipa vem com outras aspirações. Mas, segundo os números da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, a economia de Macau registou uma contracção anual de 4,5% em termos reais e nos primeiros três trimestres de 2019, a economia de Macau registou uma retracção homóloga de 3,5%, em termos reais. Os números da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos indicaram que a Receita bruta mensal dos jogos de fortuna ou azar, referentes ao Novembro de 2019 foi 22,877 milhões de patacas, apontando um decréscimo de 13.5% em relação a Outubro passado, e um decréscimo anual de 8.5%. Segundo as estatísticas de 2018, o peso do sector secundário (que inclui o sector da construção e da indústria de manufactura) no valor acrescentado bruto de todos os ramos de actividade económica (4,2%) diminuiu 0,9 pontos percentuais e o peso do sector terciário (que inclui lotarias, outros jogos de aposta e actividade de promoção de jogos e dos “hotéis e similares) cresceu 0,9 pontos percentuais, de 94,9% em 2017 para 95,8% em 2018. Por outras palavras, a estrutura sectorial de Macau está a tornar-se cada vez mais uniforme e está a ser progressivamente afectada por factores externos. Quando todos os esforços e todos os recursos estão concentrados numa área única, pode deitar-se tudo a perder quando sobrevém uma crise. Embora Hong Kong esteja actualmente submerso no caos, os problemas vieram à superfície todos de uma vez, o que realmente pode ser benéfico em termos futuros. As autoridades competentes deverão lidar com estas questões de forma correcta, que passará pela criação de um comité de investigação independente, por medidas que ponham fim à violência, pela substituição de altos funcionários inaptos e pela reabilitação da credibilidade do Governo. Acredito que desta forma a insatisfação da população irá desaparecendo e a tensão entre a polícia e os cidadãos também. Nessa altura, Hong Kong poderá ombrear com as maiores economias da Ásia. Quanto a Macau, poderá aproveitar a oportunidade apresentada pela mudança de Chefe do Executivo para solucionar os problemas de fundo, que se foram acumulando uns atrás dos outros ao longo 20 anos, e poderá evitar um possível desabamento sócio-económico.
Pedro Arede VozesÀ sombra do Cavalo-Dragão [dropcap]M[/dropcap]acau vive uma época extemporânea por tudo aquilo que se passa em Hong Kong e por não haver nenhum paralelismo directo da situação, no seu dia a dia. Ainda para mais, numa altura em que se aproxima um cocktail de comemorações muito peculiar que vai ser o mês de Dezembro, onde o aniversário dos 20 anos da RAEM coincide com a tomada de posse do novo Executivo. No passado fim de semana, no mesmo dia em que Hong Kong viu os candidatos pró-democracia conquistarem quase 90% dos assentos do Conselho Distrital nas eleições do passado domingo, em Macau o candidato único da eleição suplementar por sufrágio indirecto para a Assembleia legislativa, Wang Sai Man falava com a comunicação social à saída da assembleia de voto, podendo ter violado a lei eleitoral. Enquanto tudo isto acontecia um espantoso Cavalo-Dragão mecânico, que tive a oportunidade de ver com os meus próprios olhos, desfilava em tourné pela RAEM, em celebração dos 50 anos das relações diplomáticas entre a China e França. As reacções de espanto e ovações foram intensas (e não era para menos) quando o animal mecânico passou às frente das pessoas que assistiam à parada, fazendo sombra à sua passagem. Mas não deixa de vir à ideia, se aquela sombra não ajudou, de forma ínfima obviamente, a desviar atenções de uma realidade que talvez peça mais vozes e contributos activos, ponderados e perspicazes de todos. E claro que a cultura e os espectáculos de entretenimento têm um papel fundamental e não vejo, à excepção da origem do seu financiamento, diferenças de fundo para uma partida de futebol, por exemplo. Só tenho receio que possam ajudar Macau a ficar em silêncio quando o dragão passar por cima das nossas cabeças outra vez. E tanta coisa a acontecer à volta.
João Luz VozesRAEM é RAEM [dropcap]A[/dropcap] pretexto dos tumultos em Hong Kong, em que só se pode ter uma opinião preta ou branca, sem nuance ou racionalidade, tenho ouvido/lido muitas vezes “Macau é China” ou “Hong Kong é China” vindo de portugueses e macaenses. Permitam-me beliscar a vossa bolha de privilégio e o conforto de ter um passaporte português na algibeira. Macau e Hong Kong são Regiões Administrativas Especiais da República Popular da China, não são Fujian, Guangdong ou Yunnan. Pelo menos, por enquanto. Macau e Hong Kong acordaram com Pequim um período de transição durante o qual mantêm as suas jurisdições, um elevado grau de autonomia, governo constituído pelas suas gentes e um segundo sistema que blinda os territórios e os seus ordenamentos jurídicos da selvajaria legal do interior. A RAEM é a RAEM da China, mas é, fundamentalmente, a RAEM. Não é um bairro de Zhuhai. Não abdiquem de algo que durante séculos tornou Macau numa cidade única, com características vantajosas para as suas gentes. Também se ouve muito o “se não gosta, vá para a sua terra”, um argumento tão convincente como a emanação QI dois dígitos “Atão e os amaricanos, ãh?!”. Curiosamente, a lógica mantém-se. Se não gostam da RAEM e o amor à pátria é assim tão grande que a libertinagem do segundo sistema vos magoa, há uma solução para isso: Vão para Fujian, Sichuan ou Yunnan, onde a realidade em muito suplanta o idílico paraíso descrito pelo China Daily. Não têm de esperar até 2049. Ou então calem-se e respeitem os tratados assinados e a Lei Básica. Aliás, por favor, não se calem enquanto podem falar. Usem dessa magnífica capacidade que o sistema em que cospem vos permite. Irónico, não é?
Sofia Margarida Mota PolíticaSegurança | Chui sublinha reforço legal para defender autoridade de Pequim A defesa da autoridade do Governo Central e os interesses dos residentes justificam o reforço da legislação no âmbito da segurança nacional. A ideia foi deixada ontem por Chui Sai On na cerimónia de abertura da exposição “Educação sobre a segurança nacional” [dropcap]O[/dropcap] Chefe do Executivo, Chui Sai On, salientou ontem o reforço das medidas legais e de segurança que visam a defesa da autoridade de Pequim e os interesses dos residentes. A informação foi dada durante o discurso da cerimónia de inauguração da exposição “Educação sobre a segurança nacional”, organizada em conjunto com o Gabinete de Ligação. A mostra está patente no Museu das Ofertas sobre a Transferência de Soberania de Macau. “O Governo da RAEM tem vindo a reforçar os regimes e mecanismos e desenvolvido o seu sistema legal, tendo como finalidades últimas a defesa da autoridade do Governo Central e os interesses fundamentais dos residentes”, apontou o Chefe do Executivo. Chui Sai On admitiu mesmo a criação de “um novo contexto para o trabalho de defesa da segurança nacional”, sem, no entanto, ter adiantado quaisquer pormenores acerca desta matéria. O representante máximo do Executivo salientou que a exposição inaugurada ontem é “orientada pelo pensamento do Presidente Xi Jinping sobre o socialismo com características chinesas da nova era” acrescentando que “a defesa da segurança nacional é uma responsabilidade constitucional” de Macau. “Assim, para a RAEM existe somente o dever para com ‘um país’ sem distinção dos ‘dois sistemas’”, apontou. A bem da sociedade “Para a RAEM existe somente o dever para com ‘um país’ sem distinção dos ‘dois sistemas.’” Chui Sai On, Chefe do Executivo Assegurar a defesa nacional é uma garantia de bem-estar social, de acordo com o Chui Sai On, traduzindo-se na prática de “um conceito de desenvolvimento em que a garantia da qualidade de vida é central” e “resolvendo as questões sobre os interesses vitais dos residentes”. Por outro lado, “a promoção da construção de uma cidade segura em Macau é condição indispensável do desenvolvimento socioeconómico e é um contributo relevante para a grande obra ‘um país, dois sistemas’”, especialmente no momento actual em que “a conjuntura mundial é complexa e o país, este ano, continua a enfrentar desafios, em termos de segurança”. Chui Sai On recordou ainda a criação, há cerca de um ano, da Comissão de Defesa da Segurança do Estado da RAEM e dos “mecanismos de coordenação desta área”, com o intuito de “melhor defender a segurança nacional”. A este respeito, o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, também salientou as iniciativas legislativas que Macau tem levado a cabo para o reforço da segurança nacional. À margem do mesmo evento, o secretário recordou os trabalhos legislativos avançados no ano passado e apontou a produção de novos diplomas, dando como exemplo o regime do segredo de Estado. O filho pródigo Macau é um exemplo na aplicação de medidas para a segurança nacional. A ideia foi deixada ontem pelo director do Gabinete de Ligação do Governo Popular Central na RAEM, Fu Ziying. O responsável sublinhou que “Macau foi a primeira região fora da China interior a realizar uma exposição evocativa da segurança nacional”. A criação da Comissão de Defesa da Segurança do Estado da RAEM no ano passado foi também evocada como “um grande sucesso na regulamentação destas matérias (…) tornando-se num modelo de referência na concretização do princípio ‘Um País, Dois Sistemas’”. Na mesma ocasião, o subdirector do Gabinete para os Assuntos de Hong Kong e Macau, Song Zhe, defendeu que “o Executivo e os diversos sectores da sociedade têm defendido com firmeza a soberania, segurança e os interesses do país”. Estudantes preocupados com a segurança nacional, mas sem noção de ameaças “Os jovens como nós precisam de saber mais sobre o nosso país, especialmente na área da segurança e do desenvolvimento nacional” estas são as palavras de Carrie, aluna de 17 anos da Escola Choi Nong Chi Tai, que participou ontem, com outras colegas, numa visita à exposição “Educação sobre a Segurança Nacional” no Museu das Ofertas sobre a Transferência de Soberania de Macau. A iniciativa, a segunda realizada no território, tem como intuito dar mais informação aos estudantes locais além da que é dada nas escolas no âmbito do patriotismo, acrescentou. “Sabemos pouco acerca destas áreas do que aprendemos na escola e se tivermos exposições como esta podemos saber cada vez mais sobre o nosso país”, disse. A opinião é partilhada pela colega Shirley, de 16 anos, que admite que “as pessoas ignoram este tipo de coisas relacionadas com a segurança”. Para a estudante trata-se de um evento “muito importante” para trazer um acréscimo de experiências, resultando numa maior “conecção” com o país. Questão tranquila Shirley considera ainda que “as pessoas estão preocupadas com a segurança”, principalmente ao nível do país. Para a estudante, a questão nacional é de relevo. “Não podemos conceber a sociedade com os seus indivíduos ou só sobre nós próprios, mas tendo em conta todo o país. Penso que precisamos de saber mais acerca disso. Temos a responsabilidade de proteger estes assuntos”, disse. No entanto, quando questionadas acerca de possíveis ameaças actuais à China, não houve respostas. “Tenho que pensar nisso com mais calma”, respondeu. A acompanhar a turma destas alunas estava o professor de música, Ng Si Un. Para o responsável este tipo de exposições permite que “alunos possam aprender e perceber melhor que são chineses, que amam o país e que têm responsabilidade sobre a segurança nacional”. Ng salientou ainda o facto de a segurança nacional ser dizer respeito a todos, e ser essencial para “o desenvolvimento do país.”
Hoje Macau PolíticaLi Keqiang confiante no sucesso e desenvolvimento de Macau O primeiro-ministro chinês entende que Macau deve aproveitar as oportunidades trazidas pelos planos estratégicos de Pequim e estreitar parcerias com o Interior da China. Li Keqiang demonstrou ainda o total apoio à administração de Chui Sai On [dropcap style≠‘circle’]D[/dropcap]urante a apresentação do relatório anual perante a Assembleia Popular Nacional (APN), Li Keqiang referiu que Macau e Hong Kong devem aproveitar as oportunidades nascidas dos planos estratégicos traçados por Pequim e estreitar a cooperação com o Interior da China. O discurso do primeiro-ministro chinês, proferido na abertura da sessão de ontem das reuniões magnas, referia-se aos planos “Uma Faixa, Uma Rota” e à Grande Baía. “Temos de continuar a implementação completa e certeira da política ‘Um País, Dois Sistemas’, de Hong Kong governado pelas suas gentes, Macau governado pelas suas gentes, com alto grau de autonomia, no estrito cumprimento da Constituição e da Lei Básica.” Depois de não ter mencionado no discurso do ano passado o princípio que estabelece a governação das regiões administrativas especiais “pelas suas gentes”, Li Keqiang Outro dos aspectos de salientar no discurso do alto dirigente do Executivo de Pequim prende-se com a sucesso partilhado entre as regiões administrativas especiais e o Interior, de forma a garantir “a prosperidade e estabilidade a longo prazo”. É a primeira vez que esta formulação é proferida, a par da expressão “progredir em conjunto com o Interior”. Fé nos chefes Em referência à liderança política das duas regiões administrativas especiais, Li Keqiang reiterou que ambos os governos e os respectivos chefes dos executivos das duas regiões têm o total apoio de Pequim no exercício da governação baseada na lei. Ao longo do discurso, o primeiro-ministro não mencionou, ao contrário do que aconteceu nos últimos dois anos, a expressão “promover a democracia”. Em paralelo, enquanto prometeu resolução e eficácia na protecção da soberania nacional, Li Keqiang fez a habitual menção ao combate a movimentos separatistas que procuram a independência de Taiwan. Desta feita, o líder político deixou de fora qualquer referência ao movimento pró-independência de Hong Kong. Algo que não passou ao lado de Wang Yang, presidente da Conferência Política Consultiva do Povo Chinês, que ao abordar a questão de Hong Kong fê-lo sob o tema unidade e solidariedade. “Encorajamos os delegados de Hong Kong e Macau a apoiarem os seus governos e chefes dos executivos de acordo com a lei. Estamos, inequivocamente, em oposição à independência de Hong Kong”.
Diana do Mar Manchete PolíticaSegurança do Estado | Anunciado órgão de alto nível liderado pelo Chefe do Executivo Um novo órgão vai ser criado para prestar apoio ao Chefe do Executivo na tomada de decisões relativas à defesa da segurança do Estado [dropcap]C[/dropcap]hama-se Comissão de Defesa da Segurança do Estado. A missão? Prestar apoio ao Chefe do Executivo na tomada de decisões. O novo órgão, a ser criado em breve, foi apresentado ontem pelo porta-voz do Conselho Executivo, Leong Heng Teng. A Comissão de Defesa da Segurança do Estado, que deve reunir-se “pelo menos de seis em seis meses”, vai ter como presidente o próprio Chefe do Executivo, enquanto o cargo de vice-presidente será exercido pelo secretário para a Segurança. “Organizar e coordenar os trabalhos da RAEM relativos à defesa da soberania, da segurança e dos interesses do desenvolvimento do Estado” e “estudar a implementação da respectiva programação e das orientações e solicitações do Chefe do Executivo” figuram entre as atribuições do novo órgão. Compete-lhe ainda, entre outros, “proceder à análise, estudo e avaliação da conjuntura da RAEM relacionada com a segurança do Estado e com a estabilidade da sociedade” ou “colaborar na formulação das políticas” e “organizar o tratamento de demais assuntos” ambos relativos à defesa da segurança do Estado. Instado a dar um exemplo concreto em que o novo órgão seja chamado a intervir, Leong Heng Teng respondeu que as suas atribuições “são muito claras”. “Isto não é vago”, reiterou o porta-voz do Conselho Executivo, apontando apenas que o novo órgão não tem natureza executória nem consultiva. A secretária para a Administração e Justiça, o comandante-geral dos Serviços de Polícia Unitários, o director dos Serviços de Assuntos de Justiça e o da Polícia Judiciária (PJ) também vão integrar a Comissão de Defesa da Segurança do Estado. Igualmente na qualidade de vogais participarão os chefes de gabinete do Chefe do Executivo e do secretário para a Segurança e um assessor de cada um deles. Em paralelo, vai ser criado o Gabinete da Comissão de Defesa da Segurança do Estado (GCDSE), “um serviço permanente de execução e apoio”, ao qual compete principalmente “executar ou dar apoio ao acompanhamento do cumprimento das deliberações” da nova Comissão de Defesa da Segurança do Estado. Também lhe cabe “coordenar os trabalhos realizados pelos serviços públicos e pelas outras entidades relativos à produção legislativa complementar e à execução da lei para a defesa da segurança do Estado”. O funcionamento do novo serviço, que vai ser técnica e financeiramente apoiado pela PJ, não representa encargos adicionais, ressalvou Leong Heng Teng. Este gabinete vai ser dirigido por um chefe e um subchefe que são, por inerência, o secretário para a Segurança e o director da PJ, respectivamente. Sem ameaças A nova comissão é mais uma iniciativa relacionada com a Lei Relativa à Segurança do Estado, em vigor desde 2009, isto apesar de não haver actualmente qualquer ameaça palpável à segurança nacional. “De acordo com os dados, por enquanto, não temos casos de ameaças”, afirmou o porta-voz do Conselho Executivo, deixando, porém, a ressalva: “Temos de estar alerta”. A nova comissão surge em linha com um artigo publicado recentemente no portal do gabinete do Secretário para a Segurança, em que era defendido o estabelecimento de “um sistema de organização de topo” no âmbito da defesa da segurança do Estado à semelhança de outras jurisdições, como China, Estados Unidos ou França. Contudo, esse artigo, que colocava a tónica na ideia de que a segurança do Estado deixou de estar circunscrita às tradicionais áreas política e militar, apontava que “existem forças hostis a aproveitar Macau como um trampolim para conduzir actividades de infiltração e intervenção” contra a China. Um cenário que “faz com que os problemas de segurança do país e de Macau enfrentem muitos desafios”, dizia o texto, publicado, no dia 15, no ‘site’ do gabinete de Wong Sio Chak. O regulamento administrativo que estabelece a Comissão de Defesa da Segurança do Estado entra em vigor 30 dias após publicação em Boletim Oficial. O secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, afirmou, em Maio, que esperava concluir até ao final do ano, ou início do próximo, os diplomas complementares à Lei Relativa à Defesa da Segurança do Estado. Essa lei penal avulsa tipifica sete crimes contra a segurança do Estado enumerados no artigo 23.º da ‘miniconstituição’ da RAEM, como traição à pátria, secessão ou sedição. No mesmo mês, Wong Sio Chak indicou que esperava ainda concluir o documento de consulta sobre o Regime Jurídico de Intercepção e Protecção de Comunicações até Agosto. Já a lei antiterrorismo estava pronta, aguardando consenso da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça para ser submetida a consulta pública.
António Conceição Júnior VozesO Segundo Renascimento [dropcap]T[/dropcap]alvez esta reflexão pudesse começar com “era uma vez”. Porém, a história da China é demasiado longa e neste caso interessa-me revisitar o seu passado recente, quando por volta de 1977 Deng Xiaoping tornou ao poder, consolidando-o desta vez. O ex-estudante em França, agora solidamente sentado na cadeira do poder, trazia em si um olhar pragmático para a sua China. Para trás ficavam os dogmas e excessos da Revolução Cultural. Deng queria uma China moderna, passo a passo. Primeiro permitiu que os camponeses viessem vender os seus produtos nas cidades. Com o crédito alcançado por esse sucesso, o pragmatismo desenvolve-se. Uns anos mais, diria que “o socialismo não significa pobreza”. Isso recorda-me quando, ainda nos finais do anos 70, para chegar a Guangzhou, tive de atravessar de jangada quatro ou cinco braços de rio. Hoje a viagem faz-se de comboio rápido. Deng, fazendo uso de máximas chinesas, definiu as primeiras medidas de abertura interna que conduziriam à emergência de uma economia socialista de mercado. Nesse pragmatismo, em que o socialismo fica salvaguardado, afirmou que não lhe importava que um gato fosse branco ou preto, mas sim que caçasse ratos. Citam-se frases deste líder da abertura da R.P. da China. Premonitoriamente afirmou:”quando os nossos milhares de estudantes regressarem a casa, irão assistir à transformação do País”. Crítico, comentou que “os jovens quadros sobem de helicóptero. Precisam de subir passo a passo”. Afirmaria também “procura a verdade nos factos”. A China do século XIX trazia a todos os patriotas más recordações. Era preciso consolidar uma política de firmeza quanto ao território chinês. Deng Xiaoping formula a sua máxima de “Um País, dois Sistemas” com o intuito de, pacificamente e através de acordos, retomar os territórios de Hong Kong e de Macau, recebendo estes a classificação de “Segundo Sistema”. O intuito era de que, através de um fenómeno de capilaridade, e no período de meio século, o desenvolvimento das Regiões Administrativas Especiais pudesse contaminar o continente. Não foi porém preciso, porque o pragmatismo de Deng virou-se para o interior onde aos poucos nascia um mercado produtor e consumidor interno. Nas últimas décadas a prosperidade bateu à porta de muitos. Em 2002 a classe média era de apenas 3 por cento, mas uma década depois, em 2012, já correspondia a 31 por cento, ou seja, 420 milhões!!! Se as assimetrias ainda existem, não estarão esquecidas e a solução vem com a emergência dos novos heróis, os milionários e bilionários chineses, homens como Wang Jianlin (31.3 mil milhões USD), Jack Ma (28.3 mil milhões USD) no topo de uma lista dos vinte mais ricos cuja mais baixa fortuna é de 6.3 mil milhões de USD. É assim que, com visão a longo prazo, uma característica do Primeiro Sistema, os milionários se tornam também nos motores de desenvolvimento do País, em sintonia com o Estado. Deng é já uma memória reverenciada. As novas lideranças seguem o trajecto. A afirmação política como potência internacional é importante. Em 2008 as Olimpíadas são o cenário ideal para uma dessas afirmações. Zhang Yimou encena um espectáculo belíssimo de abertura que ficou na minha e terá ficado na memória de muitos. Os tempos de Li Ning já vão longe. A afirmação da R.P. da China é total. 51 medalhas de ouro, 21 de prata e 28 de bronze. A velocidade de transformação da China é enorme. A economia, nos anos 1990, tinha chegado a um crescimento inaudito de dois dígitos. O mundo assustava-se. Aliás, a China actual tem mostrado, à semelhança do Renascimento dos Tang (618-904), uma ampla abertura ao exterior. É assim que, tal como Deng regressou de França, milhares de quadros foram estudar na Europa Ocidental, municiando-se, bebendo do Ocidente, imperativo para a globalização, muito provavelmente inteiramente apoiados pelo Estado Chinês. Mas se a excelência da apresentação e dos resultados olímpicos foram uma incontornável afirmação política que já vinha sendo preparada desde os tempos de Li Ning, cada vez com maior excelência, é fundamental que Macau aprenda não apenas com a China mas com o mundo, sem medo, sem preconceitos, porque os quadros locais estão longe de terem capacidades e abertura ao mundo, que só poderão adquirir lá fora. Mas, mais do que isso, é importante que o Governo de Macau lhes suporte por inteiro estudos de especialização e de línguas estrangeiras no exterior, e que estes se integrem , sem se acolherem na companhia de colegas, o que seria refúgio indesejável. Os grandes projectos internos de arquitectura na China decorrem de concursos ou convites internacionais sem que se tenha de concessionar a arquitectos chineses, só porque sim. Que o digam Siza Vieira, arquitecto Português prémio Pritzker, com o seu edifício sobre a água na cidade de Huai’an, província de Jinan. Nunca a excelência, venha de onde vier, constitui um erro. Os líderes chineses sabem-no. O desenvolvimento da China está em todo o lado e faz empalidecer as R.A.Especiais. Com efeito, em Guangzhou, o Guangzhou Evergrande Taobao, verdadeiro gigante do futebol, assinou há anos com o Real Madrid um protocolo para se criar a maior academia de futebol do mundo, desporto tanto do agrado de Xi Jingping. E eis que, assim, em mais de 75 campos, se planeiam desde já as estrelas de amanhã, enquanto a importação de técnicos se faz descomplexadamente, porque um dos paradigmas do conhecimento é o reconhecimento das próprias limitações. A busca da excelência é total, e a Evergrande aliada à Tao Bao são um colosso financeiro. Trabalha-se, como se imagina, para o médio prazo. No campo das Artes, há uma cidade que me tocou profundamente. Trata-se da histórica cidade de Hangzhou, próxima de Xangai, mas possuidora de uma Academia de Arte que mostra bem o nível de abertura cultural, cultura que se estende ao modus vivendi. E desta Academia, sediada numa cidade conhecida pelo seu lago ocidental, o Shi Wu, pela sua placidez, pela proibição das buzinas dos automóveis, respira-se um ambiente propício a tudo o que é reflexão, estudo, criação. Tê-la visitado, constituiu para mim uma experiência enriquecedora da existência de outros mundos que não precisam da nossa circunstância, e que produzem coisas brilhantes. E a cidadania é tudo isto, é a busca permanente da excelência que só existe com a abertura das mentes, com o recurso a quem sabe em alternativa à ignorância – esse não saber que não se sabe – independentemente da sua situação ou origem, para que se possam formular projectos credíveis para que a R.A.E.M. possa corresponder às expectativas que a Mãe Pátria tem, quando fala de diversificação, que não se fará nunca sem um suporte cultural, que urge ser dado aos quadros locais. E porque a expressão cultural e artística são o espelho da vida de uma sociedade, aqui se deixam alguns exemplos provenientes de Hangzhou. O estádio “ninho de andorinha” As mulheres Tang do Renascimento Chinês Os seguidores de Confúcio A invenção dos tipos móveis Academia do Guangzhou Evergrande: 75 campos de futebol Academia de Arte de Hangzhou por Albert Parsons prémio Pritzker Pan Gong Kai Wang Dongling Chao Guo Biblioteca do distrito cultural de Binhai, em Tianjin UM OUTRO RENASCIMENTO Sendo o homem uma circunstância, perceber-se-á que o ambiente envolvente é de extrema importância, condicionador ou potenciador do desenvolvimento humano. Mas para que tudo isto se realize com o nível de excelência que a R.P. da China nos habituou é preciso que se insira também no movimento integrador da Grande Baía traçado pelo Presidente Xi Jingping. Agora que o crescimento interno é uma realidade em contínua consolidação, Xi Jingping volta-se para o exterior, formulando pela política da Faixa e da Rota – a Faixa económica da Rota da Seda do século XXI – que propõe ao mundo em geral e aos países emergentes em particular, o usufruto da cooperação e do usufruto das vantagens da conectividade. Curiosamente Portugal, país dito periférico, mas o mais antigo da Europa, tem vindo a erguer-se através de grandes personalidades, desde António Damásio, neurocientista autor do “Erro de Descartes” e director do Brain and Creative Institute da Universidade da Califórnia até Horta Osório, o salvador do Lloyds Bank, ou o recém-falecido Belmiro de Azevedo, que estimulava os seus subordinados a terem as suas próprias empresas. Do primeiro Secretário-Geral das Nações Unidas unânimemente eleito, António Guterres, até ao Presidente da República Portuguesa que está em todo o lado, conferindo com a sua presença a atenção aos mais necessitados, enquanto o Ministro das Finanças Mário Centeno, recém-eleito Presidente do Eurogrupo por unanimidade à segunda volta. Há ainda Cristiano Ronaldo, cinco vezes o melhor jogador do mundo e José Mourinho, o treinador especial e tantos outros que brilham por vários continentes, e diversos campeões mundiais, além de artistas, de Júlio Pomar a Paula Rego, provenientes de um país pequeno que é o primeiro destino turístico da Europa. Por causa da memória portuguesa, Macau foi designado, como Plataforma para os países Lusófonos. A grande China não tem complexos com a história de Macau. Os grandes líderes caracterizam-se pela visão ampla e assim, o legado da portugalidade em Macau, os seus elementos conjugadores deveriam ser ainda mais valorizados pela sua inimitável singularidade. É e será sempre através das capacidades de conjugação e articulação cultural que se procederá à transformação das mentalidades, sobretudo para quem precisa de substituír certezas por dúvidas. E a partir delas procurar a exigência em desfavor da ignorância, a excelência em alternativa à mediocridade. Todo o desenvolvimento requer um trajecto. E todo o trajecto um ideário, uma linha de pensamento coerente, fundamentada, a curto e médio-prazo, expressa com os pés bem assentes na terra. Numa cidade multi-milionária como a R.A.E.M., super-excedentária, apenas a excelência faz sentido, não a má tradução, por exemplo, para o termo “talentos”. É que qualquer tradutor (universalmente tradutore-traditore)precisa de vivenciar a cultura da língua que procura interpretar, porque é na interpretação que a tradução se clarifica. E sem verdadeira interpretação não há comunicação fiel. É assim que em todo este contexto, emerge a consciência de que a fantástica biblioteca do distrito cultural de Binhai, em Tianjin ameaça tornar-se uma vulgaridade na China, à medida que o País progride cultural e civilizacionalmente neste novo Renascimento. O meu receio porém é que, em certos lugares, a vulgaridade seja a pouca importância que certos protagonistas dão a bibliotecas, quanto mais à cultura ou a distritos culturais…
Isabel Castro PolíticaO casaco preto [dropcap]L[/dropcap]embro-me tão bem. Estava frio, muito frio, e eu usava um casaco preto, o primeiro que comprei cá em Macau. Tinham-me dito que aqui estava sempre calor e, quando fiz a mala, só coube lá dentro o Verão. Na altura a Internet era uma coisa pequena e Macau, Macau tão longe, eram alguns textos sobre acontecimentos históricos e pouco mais, sem qualquer meteorologia. As televisões em Portugal, Portugal tão longe, mostravam ainda uma terra com uma água de tancares e tancareiras. Naquela manhã de frio, tanto frio, ouvi o hino da mãe pátria e assisti a bandeiras a subir ao vento, rostos cinzentos em vermelhos palanques, o verde RAEM, a festa sem sorrisos. As coisas oficiais não se prestam à felicidade. E eu estava ali porque me tinham dito para estar, porque estava a trabalhar, a pensar que chego sempre atrasada a tudo porque não nasci a tempo. A RAEM fazia dois anos. Eram tempos ainda de alguma incerteza, como de incertezas tinham sido alguns dos livros que se tinham publicado na antecipação de 1999. Em 2001, as incertezas eram já diferentes, conseguia perceber que eram outras, mas isto tudo era frio, mesmo quando o Verão cabia na cidade. Havia um vento agreste que soprava de algumas bocas mais dadas a esgares do que a considerações políticas de alto nível. Entretanto o tempo passou e toda a gente se esqueceu de tudo, do medo, da novidade, dos primeiros dias, dos dias que seguiram aos primeiros dias. Eu, que tinha cá chegado sem saber ler nem escrever, tentava aprender as palavras da terra, quantas vezes em vão, com a sensação, no entanto, que podia deixar o casaco preto em casa, que o tempo estava a mudar, que agora era tudo mais normal. Que éramos todos mais normais. Macau tem pressa em chegar a 2049, quer tudo ao mesmo tempo e não quer nada, não se sabe bem quem lhe traça o destino, quem lhe toca no rosto Os dias na cidade fizeram-se, à semelhança dos dias noutras cidades do mundo. Os anos atropelaram-se, a terra cresceu, eu nunca tinha visto terra a crescer, só conhecia terra onde crescem coisas. Eu ainda à procura de saber ler e escrever, numa cidade tão arrebatadora, que nos esmaga na pequenez que se sente nos prédios, nas ruas, nas luzes. Em tudo o que, de um dia para o outro, se ergue em direcção ao céu. Um território que constrange de pequeno que é, mas que não pára, não deixa descansar, não deixa pensar porque tudo é demasiado rápido, era para ontem se faz favor. E de repente chegámos aqui, com certezas acumuladas sobre o que queremos e o que não queremos. E com dúvidas acumuladas também. Macau tem pressa em chegar a 2049, quer tudo ao mesmo tempo e não quer nada, não se sabe bem quem lhe traça o destino, quem lhe toca no rosto, quem lhe dá a mão. Macau não está quase a entrar em 2017, já voou no tempo, os 17 anos do passado são muitos mais, a memória é fraca, tão fraca, há quem fale na RAEM como se ela fosse Macau, a RAEM não é Macau, é sé a RAEM. Temos certezas acumuladas e devidas acumuladas também. Das dívidas nem vale a pena falar: ninguém paga o que deve aos mortos, sobretudo quando fazem parte de um passado distante. O presente, de certa maneira, também já lá vai. Está tudo de olhos postos no que vai acontecer daqui a dois anos, quem são eles, quem é ele, mandas tu ou mando eu, 2049 está já aí e ninguém quer saber, o futuro pertence sempre a quem acha que manda mais.
Sofia Margarida Mota PolíticaAniversário da RAEM | Cooperação com o Continente marca discurso de Chui Sai On Foram palavras viradas para Norte, com o Chefe do Executivo a defender a importância de Macau desempenhar o papel de plataforma de acordo com as políticas nacionais e a ideia “Uma faixa, uma rota”. Para os de cá, o líder do Governo deixou promessas de bem-estar Um bom lar na Grande China [dropcap]S[/dropcap]olidificar Macau enquanto plataforma de acordo com o projecto “Uma faixa, uma rota” foi a ideia que marcou a intervenção de Chui Sai On na celebração oficial do 17.º Aniversário da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM). O objectivo, sublinhou o Chefe do Executivo, é responder “às necessidades nacionais e às vantagens específicas de Macau”. Na cerimónia que decorreu na manhã de ontem na Torre de Macau, Chui Sai On salientou que o território está em fase de ajustamento económico, sendo que as perspectivas locais são encaradas com cautela. “Apesar das previsões para 2017 apontarem muitas incertezas na economia mundial, continuamos a encarar com optimismo cauteloso a perspectiva do desenvolvimento económico de Macau. Acre- ditamos que, no próximo ano, a economia local terá um desenvolvimento estável, e estamos confiantes de que será alcançado um crescimento positivo”, afirmou o líder do Governo. Para desenvolver acções que façam convergir as políticas nacionais e as particularidades de Macau, Chui Sai On fez referência ao primeiro plano quinquenal do território. Com a iniciativa pretende-se, “através de um planeamento de alto nível, projectar o quadro-geral do desenvolvimento socio-económico local para os próximos cinco anos e serve de orientação para o desenvolvimento nos próximos tempos”, disse. O discurso não passou sem menção à recente visita do primeiro-ministro, Li Keqiang, no âmbito da V Conferência Ministerial do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. Chui Sai On optou por destacar “a cooperação absoluta” com a China Continental. “Iremos, de acordo com as necessidades do nosso país e com as vantagens específicas de Macau, articular estreitamente a construção do princípio “Um centro, uma plataforma” com a construção da “Uma faixa, uma rota”, apontou o Chefe do Executivo. Chui Sai On não deixou de sublinhar que o bem-estar da população é a sua maior prioridade: “O desenvolvimento de iniciativas relacionadas [com a população] tem sido, desde sempre, uma das nossas prioridades governativas”. O Chefe do Executivo sublinhou que vão continuar a ser feitos trabalhos “em benefício do bem-estar dos cidadãos, aperfeiçoando os diversos regimes, coordenando o planeamento urbano e a construção urbana, e atenuando os problemas quotidianos com que os cidadãos se deparam, designadamente o trânsito e a habitação, de forma a elevar o reconhecimento social de que Macau é um bom lar”. PEREIRA COUTINHO FLEXIBILIZAR PARA CIRCULAR “É um discurso de ocasião e virado para o futuro”, reagiu o deputado Pereira Coutinho ao HM após a cerimónia de celebração do 17.o aniversário da RAEM. Para Pereira Coutinho, “é evidente que a integração de Macau na China Continental é extremamente importante”. O início da circulação de carros entre Macau e a Ilha da Montanha é uma medida muito significativa para o deputado, no sentido do território “se virar mais para o exterior”. Pereira Coutinho não deixou de reiterar a importância que o Governo deve dar à função pública, às questões relacionadas com a saúde e com o trânsito, tendo em conta as obras que estão a ser feitas em Macau. As medidas anunciadas na passada segunda-feira, para atenuar dos trabalhos nas vias são, para o deputado, insuficientes: “Não acredito que deixem de criar complicações e transtornos na vida das pessoas”. Para o deputado, a solução passa por investir em soluções de transporte entre Macau e o Continente. “Há muita gente a viver no interior da China e há muita gente que vem para Macau diariamente, portanto, há que flexibilizar a deslocação das pessoas. A livre circulação entre Macau e zonas do interior da China poderia atenuar a sobrecarga de trânsito local”, concluiu. RITA SANTOS PORTUGUÊS ACIMA DE TUDO Para Rita Santos, foi fundamental a referência do Chefe do Executivo à presença de Li Keqiang em Macau e às medidas que o Governo Central apontou para o território. “Entre essas medidas o meu grande desejo é que a nossa língua portuguesa seja utilizada plenamente”, disse ao HM. “Quando os nossos visitantes de língua portuguesa chegarem a Macau, o primeiro contacto a terem num táxi, por exemplo, deveria ser em português e respondido pelo condutor na mesma língua”, ilustrou a presidente da assembleia-geral da Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau. As medidas a serem tomadas devem começar no ensino nos jardins-de-infância para que todas as crianças possam ter um contacto diário com a língua. Rita Santos justi ca a pertinência deste ensino com o alargamento de oportunidades de emprego e com o facto de, através da língua portuguesa, as pessoas poderem vir a ter mais facilidade em aprender outros idiomas. Rita Santos mostrou-se ainda preocupada com as dificuldades sentidas pela população na questão da habitação, uma vez que os preços continuam “impossíveis”.
Angela Ka SociedadeAniversário da RAEM | Cerca de 600 pessoas saíram ontem à rua O número é da polícia: não chegaram a seis centenas as pessoas que saíram à rua neste aniversário de transferência de administração. As reivindicações não são novas. Os protestos foram pacíficos [dropcap]D[/dropcap]iferentes palavras de ordem, mas todas elas antigas. Cerca de 600 pessoas marcharam ontem pela cidade, na já tradicional manifestação por altura do 20 de Dezembro. Os protestos, organizados por seis associações, partiram da zona norte da cidade, com destino à sede do Governo, onde chegaram de forma espaçada. Os manifestantes deixaram petições ao Executivo. Segundo dados da PSP, foram mobilizados 100 agentes para as manifestações, que decorreram de forma pacífica e seguiram o itinerário proposto. Marcha das lamentações O grupo mais numeroso, e também um dos mais barulhentos, com várias pessoas a ‘baterem’ pratos, foi o da Associação Reunião Familiar de Macau, formado quase exclusivamente por pessoas idosas, que deixou ainda uma petição no Gabinete de Ligação do Governo Central. Trata-se dos pais dos chamados “filhos maiores” nascidos na China. À data da apresentação do pedido para se reunirem com os pais, preenchiam os requisitos mas, durante a apreciação do requerimento, ultrapassaram a idade permitida para a autorização de fixação de residência em Macau. Lei Yok Lam, líder do grupo, voltou a pedir a autorização da fixação de residência no território dos filhos maiores que estes imigrantes deixaram no Interior da China. Outras cinco associações e dois cidadãos mobilizaram-se por motivos tão diferentes como em protesto contra a corrupção, para pedir aumentos salariais para a construção civil As manifestações decorreram de forma pacífica e seguiram o itinerário proposto e reivindicar restrições à importação de mão-de-obra, para exigir a demissão de dirigentes – entre elas a do secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, ou apelar para que haja mais habitação social nos novos aterros. O DRAMA DOS MOTORISTAS A Associação da Garantia dos Interesses de Emprego dos Operários Locais quer que seja definido um salário mínimo para o sector: 800 patacas diárias para os auxiliares de construção civil, e entre 1500 a 1700 patacas para os trabalhadores especializados. A este movimento juntou- -se outra associação – a Poder do Povo – que teve como reivindicação principal do protesto de ontem a alteração ao modelo de eleição do Chefe do Executivo. Na carta que entregou ao Governo, salientaram-se ainda “as ameaças e a dificuldade de obtenção de emprego” sentidas pelos operários de construção civil “devido aos trabalhadores não residentes”. Foi ainda expressa a “oposição firme” à importação de motoristas. Também a Associação de Activismo para a Democracia, a Associação de Armadores de Ferro e Aço, e a Associação da Linha da Frente dos Povos de Macau deixou palavras de ordem contra a contratação de condutores profissionais no exterior. O tema é, aliás, a razão pela qual é pedida a demissão de Lionel Leong, sendo que também se exigiu a saída do director dos Serviços para os Assuntos Laborais. “Segundo um estudo da Associação do Ramo de Transportes, existem actualmente 40 mil titulares de carta de condução de veículos ligeiros e oito mil com licença para conduzirem autocarros. Já são su cientes”, argumentou um dos organizadores do protesto. * com LUSA PEARL HORIZON | COMPRADORES LESADOS NÃO DESISTEM [dropcap]U[/dropcap]m grupo de pessoas que adquiriu fracções no empreendimento Pearl Horizon esteve ontem reunido junto à sede da Polytec, a empresa responsável pelo projecto. Trata-se do primeiro protesto organizado após uma conferência de imprensa em que os pequenos proprietários anunciaram que iam deixar de pagar os empréstimos contraí- dos aos bancos. Em declarações ao HM, Wang Dongmei, representante dos proprietários, referiu que, na passada segunda-feira, foi entregue uma petição ao Gabinete da Ligação do Governo Central em Macau, pedindo apoio na solução do problema. Questionada sobre se os bancos já reagiram à anunciada suspensão das prestações mensais dos empréstimos, Wang explicou que, “como os proprietários fazem os pagamentos em alturas do mês diferentes”, o impacto ainda não significativo. Assim sendo, acrescentou, até agora os bancos ainda não tomaram quaisquer medidas. A concentração de ontem serviu para contabilizar quantas pessoas já deixaram de pagar os empréstimos. Dos cerca de 500 participantes, mais de 100 já estão em falta para com as entidades bancárias. “Os proprietários não conseguem aguentar os empréstimos e também não sabem o que estão a pagar”, argumenta Wang Dongmei. A associação que junta os pequenos proprietários do Pearl Horizon diz que esta forma de protesto é para manter até o problema estar resolvido. As obras do empreendimento na Areia Preta estão suspensas há um ano.
Hoje Macau Manchete PolíticaÀ beira da maioridade: Trânsferência de Administração foi há 17 anos Faz hoje 17 anos que Rocha Vieira entregou a administração de Macau a Pequim. Fê-lo abraçado a uma bandeira portuguesa, numa transição emocionada. O HM ouviu vários testemunhos que nos fizeram o balanço da vida da RAEM [dropcap]O[/dropcap] início eram as descobertas. O espírito aventureiro dos navegadores portugueses chegou aos Mares do Sul da China, e aqui ficaram a administrar o território durante mais de quatro séculos. Até 1999, quando se deu a transferência de administração para a República Popular da China, nascendo a Região Administrativa Especial de Macau. Em dia de aniversário, ouvimos as opiniões de quem aqui vive, para um balanço destes 17 anos. O designer Manuel Correia da Silva considera que podemos olhar para a idade da RAEM como olhamos para o crescimento de uma pessoa. Houve uma infância e, hoje em dia, estamos à beira da maioridade mas ainda a atravessar uma fase tardia da adolescência. “Espero que a maturidade chegue a todas as figuras de poder desta cidade, não só ao Governo local, mas também à sociedade civil”, comenta. “Espero que a maturidade chegue a todas as figuras de poder desta cidade, não só ao Governo, mas também à sociedade civil.” MANUEL CORREIA DA SILVA, DESIGNER A ideia de chegar à idade adulta é intimamente ligada a um sentido de autonomia, “já podemos sair sozinhos”, como comenta Correia da Silva. A ideia é uma maior capacidade de auto- gestão que permita a internacionalização, o envolvimento com a região. O designer não se refere apenas a factores comerciais. Nesse aspecto houve, realmente, maior abertura ao exterior, mas a um novo olhar político, uma nova forma de pensar o território. Nesse sentido, considera que a RAEM devia “olhar para as lusofonias como um bom canal de internacionalização”, na forma como a marca Macau se pode instituir lá fora. Para tal, será necessário projectar uma imagem mais graúda, “e isso tem que ver com responsabilidade”. Hoje em dia, Macau é uma cidade mais cosmopolita, que oferece maior liberdade de movi- mentos aos cidadãos, mais ligada ao que se passa em seu redor. “Nós já estávamos envolvidos neste Delta, uma zona do mundo especialmente activa nestes últimos 10 anos”, algo que melhorou com “as políticas de abertura da China para o resto do mundo”. Factos políticos com impacto, e que forçaram a competitividade e inovação. BOOM VERTIGINOSO Portugal entregou Macau à China com os cofres em situação modesta. “Quando passou a administração tínhamos apenas um fundo de 10 biliões de patacas, o que não dava para alimentar sequer um ano de Orçamento”, lembra o economista Albano Martins. Neste momento, o Governo tem os cofres cheios. Facto que é incontornável neste balanço de aniversário, assim como os números do desemprego. Aquando da transferência, Macau tinha uma taxa de mais de sete por cento, hoje em dia está abaixo dos dois por cento, um número que representa pleno emprego. Au Kam San, deputado à Assembleia Legislativa, aponta a óbvia “liberalização do jogo de grau limitado e a política de visto individual oferecida pelo Governo Central”, como “factores decisivos para o desenvolvimento a grande velocidade”. Estes foram os pilares que enriqueceram a administração da RAEM, e que possibilitaram o investimento numa série de infra- -estruturas que enriqueceram o nível de vida dos habitantes de Macau. “As comunidades portuguesa e macaense continuam dinâmicas, são partes fortes do sistema, e merecem o reconhecimento devido pelos Governos Central e local.” CARLOS MARREIROS, ARQUITECTO Albano Martins acrescenta que “os grandes desenvolvimentos se deram durante a administração de Edmund Ho que foi, de facto, a grande dinamizadora”. O economista considera que durante esse período houve coragem para tomar decisões mas, infelizmente, o segundo mandato ficou manchado pelo escândalo Ao Man Long. “Nesta última administração pouca coisa se fez, tirando uma ligeira acção neste último mandato, embora sempre com um atraso que não era expectável dadas as capacidades financeiras que a administração de Macau hoje tem”, comenta o economista, que vive há quase 40 anos no território. O arquitecto Carlos Marreiros reforça este ponto, acrescentando que “a administração não soube acompanhar a dinâmica do investimento, a uma escala gigantesca, à qual não estávamos acostumados”. Também no panorama regional, a inacção governativa levou à perda de competitividade. A inércia administrativa é algo palpável, a que a população reage. “A população tem um relacionamento muito crispado com a administração. O que a administração faz é sempre mau, o que não é verdade, também há coisas muito positivas”, acrescenta. Nesse aspecto, salienta a classificação pela UNESCO do centro histórico de Macau como património mundial e o investimento recente na educação. “O acesso ao ensino melhorou bastante, é gratuito e estendido a todas as idades com um apoio pecuniário para quem queira continuar a estudar.” Apesar destas melhorias, a apatia generalizada do poder local é sentida pelo povo, levando a “um processo de pré-divórcio, como uma comunicação impossível, alicerçada no conflito que não resulta em consenso, mas numa sociedade fracturante”. “Isso não é bom numa terra pequena, é mau para a criação de soluções e para o diálogo”, acrescenta o arquitecto nascido em Macau. Para a deputada Melinda Chan, “uma das vantagens que vieram com a transição foi a melhoria na segurança”. Chan elenca ainda nos aspectos positivos o reconhecimento da RAEM ao nível internacional, “que se sentiu com a entrada de grandes empresas e investimento, e com o aumento de turistas”. NEM TUDO SÃO ROSAS A prosperidade trouxe por arrasto alguns problemas, particularmente no que diz respeito à poluição, ao crescimento desordenado, ao trânsito e à habitação. Este último capítulo é destacado por Lam U Tou que considera que, anterior- mente, “a população mais pobre conseguia com algumas poupanças ter as suas próprias casas”, algo que o boom no mercado do imobiliário veio dificultar. Para o membro do Conselho Consultivo dos Serviços Comunitários da Zona Central, esta é a maior falha do Executivo e o factor de maior desagrado da população. Já o deputado Au Kam San vê na corrupção o pior efeito secundário do boom económico, com consequências muito nefastas para a sociedade. “Durante a administração portuguesa havia problemas de corrupção, mas eram de menor dimensão. Hoje, o problema cresceu à medida que o Governo ficou mais rico, como exemplificou o caso Ao Man Long”. O pró-democrata acha que a promiscuidade entre o ciais da administração e grupos empresariais atinge maiores proporções. Uma das razões apontadas por Au Kam San prende-se com o défice de democracia, com os quadros governativos a ocupar muito tempo o poder. Este é um problema que “sacrifica o interesse dos pequenos cidadãos”, acrescenta. “Durante a administração portuguesa havia problemas de corrupção, mas eram de menor dimensão. Hoje, o problema cresceu à medida que o Governo ficou mais rico, como exemplificou o caso Ao Man Long.” AU KAM SAN, DEPUTADO No rol de aspectos negativos, Albano Martins destaca a ausência de “um sistema de reformas digno desse nome, adequado aos rendimentos do Governo”, não esquecendo as problemáticas questões do trânsito, cultura e a poluição. Para o economista, é como se a administração da RAEM não soubesse lidar com o crescimento exponencial. “A solução encontrada parece ser parar esse crescimento.” Carlos Marreiros olha para este quadro socioeconómico com alguma preocupação, num panorama em que “as pequenas e médias empresas têm dificuldade em se imporem”. Para tal, tem contribuído um desenvolvimento mal distribuído, “nem sempre para benefício do povo”. Mas o arquitecto também vê o copo meio cheio, e faz “um balanço globalmente positivo”. “As comunidades portuguesa e macaense continuam dinâmicas, são partes fortes do sistema, e merecem o reconhecimento devido pelos Governos Central e local. Nestes 17 anos não deixámos de participar, fomos fazedores do passado de Macau, um passado com mais de quatro séculos, estamos a fazer o presente e a projectar o futuro de todos nós”, comenta o arquitecto. Neste aspecto, o sabor diferente que a portugalidade oferece à região torna Macau num local diferente do resto da China, sendo que “uma das principais razões é a existência desta universalidade que é a cultura portuguesa, miscigenada localmente a vários níveis, e que cria originalidade na ponta desta enorme China”. Foi há 17 anos que o Governador Vasco Rocha Vieira levou a bandeira ao peito e partiu para Portugal Não obstante os 17 anos da transferência de administração de Macau para a China, a alma lusitana ainda se faz sentir na universalidade de que Carlos Marreiros fala. Um bom exemplo desse aspecto fluido culturalmente é a própria vida de Manuel Correia da Silva. Há três anos, o designer viu-se na iminência de ter de mudar de cidade, empurra- do pelo desconforto que sentia, pela deterioração da qualidade de vida e a subida vertiginosa da in ação. As circunstâncias empurraram-no para lá das Portas do Cerco e a procurar outra vida em Zhuhai. “Para mim isto também já é Macau, apesar de existir aqui uma fronteira administrativa que é preciso ultrapassar. Macau vem comigo para este lado da fronteira e o mesmo acontece no sentido inverso. É uma fronteira um bocado orgânica, ela vai e volta comigo”, explica. Uma fluidez que parece ser a metáfora perfeita para simbolizar Macau.
Isabel Castro Manchete PolíticaAnálise | Wong Sio Chak é visto como potencial candidato a Chefe do Executivo Antes de todos era Lionel Leong, depois juntou-se Alexis Tam. O homem do momento, deste momento, chama-se Wong Sio Chak e é o secretário para a Segurança. O que aconteceu esta semana na Assembleia Legislativa não deixa margem para dúvidas: foi dado um sinal. Resta saber se vem de Pequim ou se vai para Pequim [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] um momento raro no modo de fazer política local, sobretudo se atendermos à natureza de uma tutela que, ao longo de 15 anos, pouco ou nada deu que falar. Nas duas tardes de debate das Linhas de Acção Governativa para 2017 da área da Segurança, multiplicaram-se os elogios a Wong Sio Chak. O secretário responsável pela pasta ouviu de tudo, do melhor que há: foi-lhe elogiada a competência e até o seu rasgo para a diplomacia mereceu uma menção. Contra factos, não há argumentos: Wong Sio Chak agrada a certos sectores do território. Na Assembleia Legislativa, o apoio foi manifestado por deputados ligados ao Chefe do Executivo, mas também por alguns eleitos por sufrágio directo. São sobretudo tribunos com ligações a comunidades da China Continental. Há várias questões que se colocam, a começar por que razão caiu o governante, com dois anos de experiência no Executivo, na graça de alguns políticos e de algum povo. Depois, o que significam estes aplausos? A resposta para a última questão parece óbvia: há quem queira sinalizar Pequim de que Wong Sio Chak é uma opção para quando, em 2019, Chui Sai On deixar vazia a cadeira de Chefe do Executivo. Em terra de cegos Para o analista Larry So, falta a Wong Sio Chak experiência governativa, um problema que poderá ser difícil de resolver nos dois anos e meio que falta até à altura de se perfilarem os candidatos às próximas eleições para o Chefe do Executivo. “Está ainda ‘verde’ para assumir o cargo”, defende, admitindo, no entanto, que o modo como o secretário para a Segurança comunica transmite conforto com o poder que tem nas mãos. Não são só os deputados que se manifestaram esta semana que têm elogiado Wong. Também os media chineses se têm encarregado de contribuir para a folha de louvores, contextualiza o professor do Instituto Politécnico de Macau. “A população em geral está a gostar do trabalho que tem vindo a fazer”, refere. Quando se olha para o grupo dos cinco secretários, “é visto como sendo persistente, muito directo e cumpridor da lei”. Na análise à postura de Wong Sio Chak, Larry So faz ainda referência ao facto de saber divulgar o trabalho das forças de segurança, “com respostas directas aos deputados”. Mas o analista encontra-lhe características menos favoráveis para uma eventual candidatura a Chefe do Executivo: “Tem falhas no modo como gera a empatia que um responsável político de topo deve causar”. Há outras arestas que Wong Sio Chak, se quiser mesmo suceder a Chui Sai On, terá de limar. Eilo Yu, politólogo da Universidade de Macau, não tem dúvidas: depois de, no passado, se ter falado de Lionel Leong e de Alexis Tam para o cargo de Chefe do Executivo, é óbvio que agora há um novo nome na ribalta: Wong Sio Chak. “Parece existir a vontade de mudar o foco das atenções para outro secretário”, afirma. O comportamento dos vários deputados que elogiaram o governante vem confirmar a teoria. Ventos do Norte O nome de Lionel Leong para Chefe do Executivo começou a ser veiculado muito antes ainda de ter chegado ao Palácio. Empresário na altura ligado à indústria têxtil, ganhou protagonismo político quando, há coisa de 10 anos, foi o vencedor surpresa das eleições locais para a Assembleia Popular Nacional. Durante muito tempo, argumentou ser demasiado novo e inexperiente para chegar ao Governo – quanto mais a Chefe do Executivo. Mas o tempo foi passando e o outrora empresário é um político com um decisivo caderno de encargos nas mãos: a revisão intercalar do sector do jogo. Noutras contas, Lionel Leong é quatro anos mais velho do que Wong Sio Chak. Já Alexis Tam passou a ser candidato a candidato a partir do momento em que ganhou visibilidade como braço direito do Chefe do Executivo, na qualidade de chefe de gabinete de Chui Sai On. A ascensão a secretário para os Assuntos Sociais e Cultura – herdando as tarefas que o líder do Governo um dia teve – foi um indicador da progressão na carreira política, não obstante a complexidade do trabalho. As críticas a que foi sujeito, vindas dos mais variados sectores sobre os mais diversos projectos que foi apresentando, dão pano para mangas no exercício de especulação do poder real que neste momento terá. “No caso de Macau, é interessante observar que as pessoas tendem a pensar no próximo Chefe do Executivo como sendo alguém que faz já parte do Governo. Aconteceu com Chui Sai On, que era o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, e parece ser isso que vai acontecer”, assinala Eilo Yu. Mas houve uma mudança recente de clima em Pequim que, diz o politólogo, se justifica com a situação – caótica – da política em Hong Kong. “Julgo que Pequim quer ajustar a política em relação às duas regiões administrativas especiais”, diz. Pereira Coutinho faz uma leitura semelhante: “As condicionantes estão a mudar consoante os ventos que sopram do Norte. Neste momento, não há dúvidas que o combate à corrupção e o tráfico de influências têm sido uma temática muito desenvolvida no interior do Continente e que está a alargar-se para fora”. O deputado entende que “estes ventos do Norte se sentem com mais intensidade e mais na pele em Hong Kong e em Macau”. “É nesse sentido que as coisas se vão desenvolvendo”, afirma, justificando assim os aplausos que Wong Sio Chak recebeu no hemiciclo. Eilo Yu avisa que, neste momento, “não se pode utilizar a experiência do passado para perceber a política de Pequim, especialmente em relação às eleições para o Chefe do Executivo”. Porque “o clima está a mudar, há pessoas que começam a falar na necessidade de alguém que traga algo de novo a Macau, que não venha das duas áreas representadas por Lionel Leong e Alexis Tam”. Sob o signo dos quatro? Pereira Coutinho diz que este jogo já não se faz a dois, mas também não terá só três intervenientes. “Penso que há da parte dos quatro secretários uma apetência e uma esperança de virem a desempenhar este cargo [de Chefe do Executivo] a médio ou a longo prazo”, afirma. Cinco fora quatro, sobra um – Raimundo do Rosário, o secretário para os Transportes e Obras Públicas, que avisou no início da partida que faria um mandato e deixaria o Governo. Nunca Macau teve tantos putativos candidatos: além de Lionel Leong, Alexis Tam e Wong Sio Chak, há ainda Sónia Chan, a mulher que saltou dos Dados Pessoais para o Governo e que terá boas relações com Pequim. É isso que Pequim quer para Macau, porque é isso que quer também para Hong Kong, onde tudo é mais difícil: um Chefe do Executivo que se dê bem com o poder central. “C.Y. Leung [o líder do Governo de Hong Kong] não é uma pessoa muito popular em Hong Kong, mas tem boas ligações a Pequim”, anota Eilo Yu. Voltamos quase ao início. Sobre a postura de alguns colegas, Pereira Coutinho não deixa de admitir surpresa, por entender que a Assembleia Legislativa deveria servir para “equilibrar os pratos da balança” do sistema. E não tem dúvidas de que se tratou de um manifesto apoio a um possível candidato. Do campus na Ilha da Montanha, Eilo Yu lê os aplausos a Wong Sio Chak sem fazer uma afirmação definitiva: “Talvez haja pessoas que queiram mostrar que Wong Sio Chak é uma opção, que pode ser candidato em 2019”. E não é cedo para se fazer o aquecimento para uma corrida que ainda vem longe? O politólogo diz que não. “Pode ser o momento para testar as águas para algumas pessoas que apoiam o secretário. Não me parece que seja muito cedo. Mas isto significa que temos mais um potencial candidato.” A política tem os seus tempos. A pele dos outros Natural da província de Guangdong, Wong Sio Chak é doutorado em Direito pela Universidade de Pequim. Começou a carreira em Macau na Polícia Judiciária (PJ), estudou para juiz, foi magistrado do Ministério Público e director da PJ, cargo que ocupava antes de chegar ao Governo. Aquando da nomeação para a segunda equipa de Chui Sai On, foi apontado como sendo um homem mais próximo do primeiro sistema do que do segundo. “Será mais próximo da ideologia de Pequim”, arrisca Eilo Yu, voltando a fazer referência ao que está a acontecer em Hong Kong e à preocupação que existe, neste momento, na capital. Larry So concorda que, até certo ponto, Wong Sio Chak é um homem mais ao estilo continental. “Tem a sua agenda e é o tipo de pessoa que segue a sua agenda. Não é o tipo de pessoa que fica à espera da reacção da população e, em função disso, faz mudanças ou altera os planos todos”, observa. “Tem uma personalidade muito forte.” O facto de ser um governante com posições claras agrada junto de certos sectores. Mas o analista do Politécnico alerta para o que se diz noutros meios, nas redes sociais: Wong é “muito rígido, muito determinado, olha para as coisas do sítio onde está e nunca tenta pôr-se na pele dos outros”. Para Larry So, há um dado que é certo: o secretário para a Segurança gostaria de reforçar a equipa que lidera não só para cumprir as metas que definiu, mas também porque “está a tentar colocar-se numa posição em que tenha muita força”. Pereira Coutinho acredita que, se quiser, Wong Sio Chak “poderá vir a ser mais flexível, mais moderado”. O deputado dá um exemplo recente, do debate desta semana: “Quando Cheang Chi Keong levantou a questão da parada das forças policiais, relativamente a algumas ordens de comando que se mantêm em português, deu uma resposta bastante ponderada e estabilizadora”. O secretário afirmou que as ordens de comando “são algumas heranças da cultura ocidental – não usou o termo ‘portuguesa’ – mas não tenho dúvidas que poderá ser mais experiente à medida que os anos forem.
Sérgio Fonseca Desporto Grande Prémio de Macau VozesÉ a FIA quem manda aqui [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stá aí mais um Grande Prémio de Macau, um motivo de orgulho para os locais que, ao longo de gerações, construíram um dos maiores, se não mesmo o maior, cartaz automobilístico do Sudeste Asiático. O 63º Grande Prémio será o primeiro sob a batuta da recém-criada Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau (COGPM), com o Instituto do Desporto à cabeça, aproveitando o que absorveu à defunta Comissão do Grande Prémio de Macau e assessorado, na parte desportiva, pela Associação Geral do Automóvel de Macau-China (AAMC). Se, em termos organizativos, nada de especial transpirou cá para fora, já o mesmo não se pode dizer em termos desportivos. Este início de funções da COGPM, que tem os mesmos 200 milhões de patacas de orçamento para o evento deste ano, tem sido atribulado. Primeiro, o histórico Barry Bland bateu com a porta e a imprensa internacional, principalmente a de língua inglesa, não perdeu tempo para crucificar Macau e as suas gentes. A COGPM foi apanhada de calças na mão e não foi capaz de dar uma resposta construtiva a tempo e horas. Depois, foi a troca de pneus Yokohama pelos Pirelli na prova de F3, numa manobra da exclusiva responsabilidade da FIA e em que a inocente RAEM apanhou novamente por tabela, sem saber mais uma vez defender-se na praça pública. Por fim, nos bastidores, é cozinhada a saída do TCR International Series da Corrida da Guia no final deste ano e, para não variar, a resposta da COGPM foi um mutismo frouxo. João Costa Antunes já cá não está, pelo menos numa função tão visível. Gostasse-se ou não da personagem, uma coisa é certa: dava o corpo às balas e não se escondia atrás de ninguém. Não era um homem dos automóveis mas, ao fim de décadas à frente do evento, aprendeu como o sistema funcionava e sabia como jogar nos bastidores. Agora, o homem do leme é o presidente do Instituto do Desporto, Pun Weng Kun, que, pelas entrevistas já dadas, pouco sabe da matéria-prima do evento, está a tentar aprender e refugia-se em respostas evasivas quando o assunto não domina. Pun está assessorado, em termos desportivos, pelo AAMC, uma associação envelhecida que sempre se pautou por uma postura austera, fechada, adversa à imprensa e a qualquer tipo de opinião do exterior. Também ela, para fugir a qualquer responsabilidade gorda, se esconde atrás de alguém – neste caso dos homens das camisas azuis e sotaque francês. Bland é há muito uma “persona non grata” pela FIA de Jean Todt. Saiu Bland e a FIA deu um rebuçado a Macau, chamou “Taça do Mundo” à corrida de F3, algo que, a bem da verdade, não traz nenhuma mais-valia à corrida, mas que fica bem na fotografia. Lotti, outra “persona non grata” na Praça da Concórdia, e o seu TCR estão de saída e o FIA WTCC parece que é novamente bem-vindo a Macau. Em 2017, as três maiores corridas de automóveis do Grande Prémio de Macau poderão estar entregues à FIA e aos seus desejos. Ficam à mercê do AAMC duas corridas de suporte, apenas duas, a Macau Road Sport e a Taça CTM. Isto porque a Taça da Corrida Chinesa só visita o Circuito da Guia porque “outro valor mais alto se levanta”, como diria o poeta. No meio disto tudo, salve-se o 50º Grande Prémio de Motociclismo que, parecendo passar pelos pingos da chuva, festeja um Jubileu de Ouro em plena forma. Num circuito pensado para corridas de automóveis, a única corrida de motociclismo de velocidade de estrada no continente asiático continua de boa saúde e este ano apresenta-se como uma das corridas mais interessantes de seguir. Não é por acaso que é a corrida favorita do público. Mas como o que realmente importa para o espectador e será lembrado daqui a 50 anos são os episódios que se passarão nestes próximos quatro dias dentro de pista, vamos todos torcer para que o São Pedro também ajude e que a 63ª edição seja memorável pela positiva, por todos aqueles que anonimamente tornam este evento possível todos os anos, e por todos os que hoje e no passado lutaram e lutam para o que o Grande Prémio de Macau chegasse ao patamar de reputação em que hoje está.
Joana Freitas Manchete SociedadeMagistrados | Portugal diz que comissões “devem ser limitadas”. Procuradora vem a Macau A licença de magistrados fora de Portugal deve ter um limite temporal. É o que defende o Conselho Superior do Ministério Público, que justifica assim a decisão de fazer regressar magistrados portugueses na RAEM ao país. Não implica que não possam vir outros, diz o organismo, que confirma a chegada a Macau de Joana Marques Vidal [dropcap style=’circle’]P[/dropcap]ortugal quer que as comissões de serviço de funcionários públicos portugueses na RAEM sejam limitadas. Isso mesmo foi o que deu origem, segundo resposta do Conselho Superior do Ministério Público português ao HM, à exigência do regresso de magistrados que trabalhavam em Macau a Portugal. Mais de um mês depois do HM ter avançado com a notícia de que magistrados portugueses a exercer na RAEM teriam de regressar a Portugal, por não verem a sua autorização de trabalho renovada, as autoridades lusas esclarecem a decisão. O nosso jornal transcrevia o exemplo de Vítor Coelho, magistrado que trabalhava no território há 16 anos e que acabou por regressar a casa, ao contrário do que desejava tanto o profissional, como o Ministério Público de Macau. A questão está, afinal, na questão do tempo. “O Conselho Superior do Ministério Público tem entendido que as comissões de serviço devem ter uma duração limitada no tempo, tendo mesmo deliberado no sentido da duração da comissão de serviço ser, por regra, de três anos”, começa por explicar o organismo português. “[Essa comissão] pode ser renovada por igual período e pode ainda ser autorizada, depois, por motivos de excepcional interesse público, nova renovação até ao limite máximo de três anos.” [quote_boxleft]“O Conselho Superior do Ministério Público tem entendido que as comissões de serviço devem ter uma duração limitada no tempo, tendo mesmo deliberado no sentido da duração da comissão de serviço ser, por regra, de três anos”[/quote] A renovação foi o que aconteceu, aliás, no caso de magistrados portugueses na RAEM. A decisão seria sempre do organismo português, mas no caso de Vítor Coelho e dos outros três magistrados na mesma situação, não era esperada, devido não só ao longo período em que estão em Macau, como ao facto de ter sido tão repentina. Ainda assim, o Conselho assegura ao HM que há sempre disponibilidade para virem mais profissionais para o território. Só não serão os mesmos. “Respeitando integralmente o Acordo de Cooperação no âmbito da Declaração Conjunta Luso Chinesa sobre a questão de Macau, [o Conselho] sempre manifestou empenho em aprofundar a cooperação estabelecida entre os dois Ministérios Públicos. E, consequentemente, empenho também na manutenção de magistrados do MP português na RAEM, como forma de salvaguarda da cultura e do sistema judiciário português [no] território. Assim, e como os magistrados do MP português que exercem funções no MP da RAEM se encontram em comissão de serviço, entende o Conselho que, como acontece em todos os outros casos, tais funções devem ter limitações temporais. Isto, sem prejuízo da total disponibilidade do Conselho para autorizar outros magistrados, com iguais qualificações, para o exercício dessas funções”, explica o organismo ao HM, numa resposta escrita. Sem licença A falta de magistrados na RAEM é uma das queixas mais ouvidas pelos profissionais da área e o facto de a licença especial – autorização que a maioria das pessoas ligadas a Portugal que trabalha nos vários organismos da Função Pública de Macau possui – estar a ser negada faz com que os contratos que cheguem ao fim não possam ser renovados. Esta licença permitia aos trabalhadores com vínculo a Portugal exercerem em Macau com as mesmas regalias de lá e, porque não estava a ser renovada, passou a não ser a única via utilizada pelos magistrados para cá ficarem. No entanto, essas outras vias – como as “licenças de longa duração” e a licença sem vencimento – deixaram de poder ser usadas. Os magistrados que optaram por cá ficar sem a licença especial não foram promovidos e não tiveram qualquer progresso na carreira e, actualmente, estarão dois magistrados com licenças sem vencimento e um ainda com a licença especial, renovada antes da decisão de Portugal – e estes deverão seguir o mesmo caminho de regresso. Procuradora-geral em Macau “nos próximos meses” O MP de Macau já tinha dito ao HM que convidou Portugal a vir falar do assunto à RAEM, algo que o organismo português diz ter aceite. O assunto vai fazer com que Joana Marques Vidal venha a Macau nos próximos meses. “Na sequência de um convite, que já aceitou, a Procuradora-Geral da República realizará, nos próximos meses, uma visita oficial à RAEM, constando como assunto a abordar no decurso da referida deslocação a prestação de serviço de magistrados do Ministério Público português no Ministério Público da RAEM”, confirma o organismo ao HM.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaEspecialistas analisam primeiro semestre do novo Governo Celebram-se amanhã os seis meses da tomada de posse do novo Governo. O fumo nos casinos, a área das Obras Públicas e os 3% de limite às mesas de Jogo são apontadas as grandes questões de um Executivo que, para muitos, ainda tem problemas para resolver, mas que se tornou mais próximo da população. Raimundo do Rosário e Alexis Tam são consideradas as “estrelas” do Executivo. E também Li Gang [dropcap type=’circle’]A[/dropcap] 20 de Dezembro de 2014, cinco novos rostos do Executivo da RAEM levantavam a mão e prestavam juramento perante Xi Jinping, Presidente chinês. Seis meses depois, o que foi alterado em Macau com um Governo que herdou uma pesada herança? Se para o jurista António Katchi pouco mudou, Albano Martins, economista, Leonel Alves, deputado, e Eilo Yu, académico, falam de um Governo que está a tentar executar e a arrumar a casa. “Há pastas que – em seis meses, no cenário em que [os Secretários] as tomaram – é muito difícil dizer se as coisas estão ou não a correr bem. Há outras em que se nota que as coisas estão a andar para a frente. Ainda é preciso fazer-se muito trabalho de casa e só ao final de um ano é que podemos dizer se o balanço é ou não positivo”, referiu ao HM o economista Albano Martins. O especialista defende, contudo, que a tutela das Obras Públicas é a área onde é bem mais difícil encontrar resultados em seis meses. “O Secretário vai ter de reconstruir uma equipa toda, que domine as quatro áreas de gestão. A casa está profundamente desorganizada dos tempos do Lau Si Io, que meteu pessoas que desconheciam a cultura da sua unidade de trabalho”. Para Eilo Yu, o novo Executivo começou a seguir um plano e a mobilizar os directores dos departamentos para discutir as políticas. “Penso que têm estado a levar a cabo uma boa estratégia”, diz ao HM. O deputado Leonel Alves considera que, no final de seis meses de governação, estamos perante um Executivo que é “realmente executivo”. “Na área social, ao nível do hospital, nota-se que há um ritmo bastante acelerado, para a resolução das questões mais prementes. A questão dos transportes, habitação, hospital e a questão social foram onde o Governo tem vindo a dar o seu melhor, quer com medidas administrativas, quer com um diálogo bastante intenso com a Assembleia Legislativa (AL), através das comissões de acompanhamento”, referiu ao HM. Apenas António Katchi traça uma análise mais negativa. “Nestes primeiros seis meses do Governo de Li Gang/Chui Sai On, não observo qualquer mudança significativa. Sei que alguns jornalistas consideram que a postura dos novos Secretários perante a comunicação social é melhor que a dos anteriores; se assim for, congratulo-me evidentemente por isso. Poderá ter havido também um ou outro gesto positivo da parte dos novos Secretários, mas isso está longe de implicar ou sequer prenunciar uma mudança substancial de políticas, até porque as políticas seguidas ao longo dos últimos anos 15 anos – e mesmo antes – têm sido tão más que deveriam ser globalmente invertidas e não simplesmente ajustadas”, referiu por email ao HM. As estrelas políticas Do grupo dos cinco Secretários, estas personalidades destacam as prestações de Raimundo do Rosário, Secretário das Obras Públicas e Transportes, e Alexis Tam, da pasta dos Assuntos Sociais e Cultura. “O Secretário das Obras Públicas, quer pela sua maneira de se expressar, quer pela acuidade das questões em que toca, parece-me que tem sido bastante inovador. Destaco-o pela diferença, sem prejuízo dos outros”, disse ao HM Leonel Alves. Eilo Yu destaca, “obviamente”, Alexis Tam, “que tem sido bastante comunicador com o público” e que também “tem estado a lidar com diversas questões”, como a Universidade de Macau (UM) ou os cuidados de saúde. “Parece-me que é aquele que está mais no centro das atenções em relação aos restantes Secretários. Mas tanto Alexis Tam, como Rosário têm uma imagem mais positiva junto do público, apesar do público não estar satisfeito com as questões da sua tutela. Sónia Chan e Wong Sio Chak não estão a receber tanto o alvo dos média”, referiu o docente de Ciência Política da UM. António Katchi prefere nomear Li Gang, director do Gabinete de Ligação do Governo Central em Macau, como a figura principal do novo Executivo. “A figura que se destaca é a sua eminência parda, Li Gang. Aliás, nas primeiras semanas do segundo mandato de Chui Sai On, praticamente não passava um dia sem que Li Gang aparecesse na televisão a emitir afirmações interpretáveis como directivas políticas. Entre outras coisas, ele afirmou que os chineses de Macau não eram patriotas e que, por isso, tinham de ser reeducados num sentido ‘patriótico’ e que Macau só teria uma economia diversificada daqui a 20 ou 30 anos.” O jurista, docente do Instituto Politécnico de Macau (IPM), considera que a 20 de Dezembro não houve apenas uma mudança de Secretários, mas também um “reforço da intervenção das autoridades centrais” na governação de Macau. “Um dos instrumentos dessa intervenção foi, aliás, a própria escolha dos Secretários: tem sido dito por muitas pessoas que eles foram escolhidos (e não apenas nomeados) pelo Governo Central e tem sido igualmente observado que o percurso pessoal e escolar de alguns deles tem estado muito mais ligado à China continental do que sucedia com os seus antecessores”, ultimou. Fumo nos casinos, essa “pedra no sapato” António Katchi não só não encontra mudanças no semestre político que passou, como vê uma continuidade “dos problemas mais candentes de Macau”, como a “monocultura do jogo, a carestia dos imóveis, o terceiro mundismo laboral, a bagunça no ensino e o regime político oligárquico”. Para o jurista, para nada disto “o Governo de Li Gang/Chui Sai On apresentou, até ao momento, vias de solução”. Já Albano Martins prefere destacar a medida do fim do fumo nos casinos como a “pedra no sapato” de Alexis Tam e do Executivo. “Tem de ser prudente. Há vícios com os quais não podemos ser moralistas e os nossos concorrentes, mesmo em Singapura, não estão a tomar as medidas draconianas que estamos a tomar. Em termos económicos não me parece que essa seja a medida mais correcta a tomar”, disse o economista. Na área da Administração e Justiça, Albano Martins defende que “é muito difícil fazer-se pior do que fez Florinda Chan”, sendo que “Sónia Chan vai ter de fazer uma aposta na resolução de questões na sua área, tem de fazer uma análise e tentar fazer até que ponto não será mais vantajoso ter mais técnicos recrutados por três ou quatro anos para resolver as questões jurídicas”. Os custos que serão mais agora terão mais benefícios no futuro, repara. Na Segurança, Albano Martins considera que a tutela de Wong Sio Chak está a funcionar bem, já que o Secretário tem outra formação e é um indivíduo que está actuar. “Estou a ver tendências meio moralistas de intervenção mas acho que dominará melhor a máquina”. Face ao trabalho do Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, Albano Martins volta a pedir flexibilidade quanto ao limite máximo de 3% para as mesas de jogo. “[Lionel Leong] tem uma política que não se consegue ver livre dela e que surgiu para que os competidores não ganhassem mercado no jogo, mas neste momento isso afecta toda a indústria e a economia de Macau profundamente. Lionel Leong vai ter de ser mais flexível, a não ser que isso seja imposição de Pequim e ele não possa fazer nada, mas aí o segundo sistema devia ter autonomia necessária. De resto tudo na sua secretaria funciona razoavelmente bem.” Criticando a forma como o Governo quer diversificar a economia, por via do entretenimento, António Katchi fala ainda da questão do imobiliário, cujo arrefecimento dos preços não se deve, na sua óptica, a medidas do Governo. “Isso, além de ser completamente insuficiente para a resolução do grave problema da carestia dos imóveis, não resultou de qualquer medida do Governo de Macau destinada a isso, antes representando um efeito colateral da chamada ‘campanha anti-corrupção’ em curso na China”, concluiu. Olhando para o quadro no geral, Leonel Alves acredita que este é o mandato “em que a população deposita mais confiança, no sentido dos governantes executarem todas as acções governativas que interessam à população”. Fórum Macau “não funciona”, diz Albano Martins Um dos pontos negros do mandato de Lionel Leong à frente da tutela da Economia e Finanças é o funcionamento do Fórum Macau, o qual, para o economista Albano Martins, simplesmente “não funciona”. “A verdade tem de ser dita, custe o que custar. O Fórum não tem autonomia nenhuma, parece mais uma feira de vaidades em que as pessoas andam de um lado para o outro do que um local onde se juntam compradores e vendedores, empreendedores. Quem de facto sabe utilizar o Fórum é a China, mas a China tem os recursos necessários. O Fórum ainda tem muito que andar e Lionel Leong tem de conseguir dar o pontapé de saída.” Questionado sobre se o Fórum Macau pode funcionar melhor com Echo Chan, que substituiu Rita Santos no cargo de secretária-geral adjunta, Albano Martins afirma não querer “pessoalizar as questões”, mas acredita que Echo Chan “por experiência, tem outra perspectiva em relação ao que o Fórum deve ser”. Ainda assim, o economista diz que a própria estrutura do Fórum “não funciona”.
Joana Freitas Manchete SociedadeDoação de Órgãos | Serviços de Saúde “não estão preparados” para processo Mais de duas dezenas de pessoas saíram de Macau para poderem receber transplantes, mas nem esse número leva a que os SS reúnam “condições” para activar o sistema de transplante de órgãos na RAEM. O organismo não se mostra aberto a isso, não diz quantos dadores existem e não desvenda se Macau tem médicos especialistas para o efeito. Ainda que sem solução à vista, os SS continuam a permitir a existência de um grupo que tem “efectuado estudos e pareceres” desde 1999 [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s Serviços de Saúde (SS) ainda não estão preparados para levar a cabo transplante de órgãos, nem para implementar um regime de doação. É o que confirma o director do organismo ao HM, que indica ainda que, até hoje, nunca foi possível efectuar qualquer transplante em Macau. Mais de duas dezenas de pessoas foram para o estrangeiro para o efeito. Apesar de existirem uma lei e um decreto que “regulam claramente o acto de doação de órgãos”, como se pode ler numa resposta dos SS ao HM, a verdade é que um regime sobre a doação e transplante de órgãos tem vindo a ser pedido há vários anos pelos deputados da Assembleia Legislativa. Ainda recentemente Leong Veng Chai voltou a frisar a necessidade de se implementar este tipo de legislação na RAEM. Contudo, para os SS há muito a fazer e a questão do transplante de órgãos ainda não é bem recebida na sociedade. “A legislação de Macau que se encontra em vigor regula que a morte cerebral é a condição relevante da doação de órgãos de origem humana. No entanto, a definição de morte cerebral é um processo rigoroso. Considerando não haver nenhum mecanismo e condição que evite eventuais e desnecessárias controvérsias relativas à doação, os SS ainda não efectuam este tipo de procedimentos”, pode ler-se na resposta do organismo ao HM. Também numa resposta a uma interpelação sobre o tema, Lei Chin Ion explica que a definição de morte cerebral é um dos motivos para que existam obstáculos – já que este “é um tema rigoroso e altamente científico, cheio de controvérsia e [que conta] com os impactos de vários factores, como ciência, tecnologia, religião, cultura e região”. Contudo, o HM sabe que, em Macau, a doação de órgãos ainda é encarada como tabu pela cultura chinesa, algo que poderá estar relacionado com a decisão dos SS em não activar este sistema. “Em Macau, presentemente, ainda não há nenhuns critérios e regras a respeito da morte cerebral. Quer dizer, na prática, ainda não existiu qualquer autorização para a colheita de órgãos em cadáver”, escreve o director dos SS. [quote_box_right]”Considerando não haver nenhum mecanismo e condição que evite eventuais e desnecessárias controvérsias relativas à doação, os SS ainda não efectuam este tipo de procedimentos” – Resposta dos SS[/quote_box_right] Fígados e dadores Nos últimos cinco anos, de 2009 ao ano passado, os SS enviaram 23 pessoas para serem submetidas à transplantação de órgãos no exterior. O fígado é o órgão mais procurado. “No caso de existirem doentes com necessidades de transplante de órgãos, os SS, através de deliberação legal em regime de diagnóstico e terapêutica no exterior, a efectuar pela Junta para Serviços Médicos no Exterior, enviam os utentes para tratamento no exterior de modo a que os casos elegíveis possam obter o tratamento mais adequado. Desde 2009 e até 2014, foram enviados e submetidos à transplantação de órgãos no exterior 23 casos. Entre estes, 16 casos referem-se a situações de transplantação de fígado e sete casos a transplantação de rim”, diz o organismo ao HM. Apesar da lei que existe desde 1996 e de um decreto-lei de 1998, que regula o registo de dadores e implementa a emissão individual de dador, os SS não desvendam ao HM quantos dadores estão inscritos no REDA, o registo de dadores de órgãos em Macau, ou sequer se este sistema ainda está activo. Quase quatro meses depois do HM ter enviado as perguntas ao organismo, fica ainda outra pergunta por responder: se a RAEM dispõe de profissionais médicos especializados para proceder ao transplante de órgãos, tal como pede a lei. De acordo com o que o HM conseguiu apurar, a licença existe, mas nenhum médico na RAEM é licenciado para que não seja possível efectuar transplantes. Comissão para que te quero? Considerando não haver nenhum mecanismo e para evitar uma eventual controvérsia ao doar, os SS ainda não estão em condições para prestar o serviço relacionado.” Em resposta ao HM, o organismo admite então não estar ainda preparado para que este tema seja regulado e activado. Contudo, ainda continua a existir um grupo de trabalho responsável pela emissão de pareceres e estudos sobre o assunto. Grupo que viu entrarem novos membros no ano passado e que existe desde 1999. Mas, se ainda não é possível levar a cabo transplantes em Macau, porque é que está activa a Comissão de Ética para as Ciências da Vida? E porque é que esta ainda se mantém a estudar as regras para a morte cerebral desde que foi criada? E emite pareceres sobre quê, se não é possível o transplante em Macau? Os SS não conseguiram responder. “No passado mês de Outubro de 2014, o Governo nomeou os novos membros da Comissão de Ética para as Ciências da Vida. Esta Comissão irá discutir as matérias relacionadas com o transplante, estudar os critérios e as regras de cada um dos temas, emitir os pareceres para legislação a respeito da dádiva, colheita e a transplantação de órgãos de origem humana”, dizem apenas em resposta ao HM. Deste grupo fazem parte representantes dos serviços públicos, associações religiosas, sector jurídico e de saúde e representantes de universidades. Entre eles, estão o próprio director dos SS, Lei Chin Ion, o ex-Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Cheong U, que preside e o advogado e deputado Vong Hin Fai.
Carlos Morais José EditorialAmores mais baixos se levantam [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]entrevista que Konstantin Bessmertny deu ontem a este jornal coloca o dedo numa ferida muito importante deste Macau do crescimento desenfreado: o Governo deixa as concessionárias do Jogo fazerem tudo o que lhes apetece e assim inundar a RAEM de cópias baratas do que têm em Las Vegas, sem lhes exigir nada, sem controlar nada, sem dizer uma palavra sobre o que por aqui é erguido. E assim temos um Venetian (já decadente), igual ao americano, bem diferente do que a Sands fez em Singapura, ou seja, uma reprodução ao invés de um edifício singular que já se tornou num marco turístico da Ásia. E assim casinos Wynn iguaizinhos aos que existem no Nevada. E assim vamos ter uma ridícula Torre Eiffel, também copiada da que existe em Las Vegas. O mau gosto e a avareza (compreensível) dos casineiros inundou esta cidade perante a indiferença governamental. É difícil compreender a apatia do Governo perante a destruição estética da cidade. Não lhe terão amor? Ou nem sequer o assunto lhes passou pela cabeça? É certo que, numa primeira fase, os novos casinos deram muito dinheiro. Mas será que o dinheiro e só o dinheiro é a coisa mais importante do mundo? < Não será que para a qualidade de vida e do turismo de Macau, bem como para o seu renome internacional, não seria importante construir uma cidade esteticamente original, irrepreensível, e não a cópia de um sítio decadente e ultrapassado como Las Vegas? Macau, enquanto Monte Carlo do Oriente, era uma cidade charmosa, com qualidade de vida, excessiva e libertária. Esta Las Vegas da Ásia é kitsch, é foleira, não tem glamour nem mistério. Não é nada. Porque deixou de ser original. E isto perante a passividade governamental, entretido que estava a contar as patacas e a fazer maus investimentos. Espera-se que o actual Governo siga por outros caminhos, que se interesse mais pela cidade em si, que mostre realmente amor por ela, até porque “amar Macau” é também “amar a Pátria”. O problema é que, bem sabemos, pelo menos no Conselho Executivo, amores mais baixos se levantam…
Andreia Sofia Silva Entrevista h | Artes, Letras e Ideias MancheteKonstantin Bessemertny: “O dinheiro não nos faz ter mais consciência cultural” Um dos maiores artistas de Macau e da Ásia tem optado por trabalhar na sombra, aparecendo pontualmente com alguns trabalhos. Konstantin Bessemertny defende que para Macau é suficiente uma exposição a cada cinco anos, condenando os governantes que não consomem cultura. Para o artista, a política do território, no que diz respeito à arte, arquitectura e espaços públicos, deveria ser decidida por um órgão totalmente independente [dropcap style=’circle’]F[/dropcap]ez a última exposição individual em Macau em 2012. Porquê este tempo todo sem uma mostra individual em Macau? O mundo artístico está a mudar quanto à democratização da criatividade. E não só em Macau, em todo o mundo. Agora qualquer pessoa é artista, e o problema dos artistas contemporâneos é mostrarem-se e produzirem demasiado. Há tanta arte disponível nos dias de hoje! Então a maneira mais lógica é tornarmo-nos como monges que ficam no seu mosteiro, e é isso que estou a fazer. Apareço raramente, em ocasiões específicas. Mudei o meu pensamento em relação a alguns eventos, como feiras de arte, porque penso que são apenas plataformas, como os media, o Instagram. São plataformas para uma arte algo imatura, na sua forma de expressão. Mas não tem nenhum projecto para expor em Macau? Não disse isso. Primeiro, temos de nos limitar a nós próprios, para um certo número de exposições, por um certo período de tempo. Penso que Macau é um bom sítio para uma exposição a cada cinco anos. Consegue imaginar uma exposição todos os anos? Tenho vindo a trabalhar em alguns quadros, sim, mas comecei a gastar mais tempo em cada trabalho, em vez de produzir sob pressão. Estou a tentar adaptar-me à nova realidade. De que forma? Estou a tentar focar-me, também devido a essa questão da excessiva produção artística. Há tanta arte destruída. Numa bienal, 95% da arte que lá está exposta vai para contentores. Tudo o que vai para o lixo não é arte, então estou a tentar focar-me em sítios que possam ter algo interessante, ou em coisas que as pessoas me pedem. É difícil, porque temos de convencer pessoas, instituições, mudar as mentalidades de certos meios, quando as pessoas pensam actualmente nas tendências a curto prazo. A arte acaba por ir para o caminho da “cultura da celebridade”. [quote_box_left]“Mudei o meu pensamento em relação a alguns eventos, como as feiras de arte, porque penso que são apenas plataformas, como os media, o Instagram. São plataformas para uma arte algo imatura, na sua forma de expressão”[/quote_box_left] Em que os artistas são como estrelas pop. Sim. Claro que isso começou nos anos 60, com o Andy Wharol e o movimento pop-art. Mas acho que isso não é arte, é design. Então essa arte pode ir para museus, mas quem disse que ia lá ficar para sempre? Mas respondendo à sua questão, tenho vindo a trabalhar em coisas específicas. Continuo a trabalhar em Macau, com algumas pessoas, em galerias. As galerias de arte estão a morrer, porque já chegaram a um ponto de exaustão. Em todo o mundo. Não estou apenas a falar da pequenina Macau. Aqui tudo acontece em pequena escala, mas as questões (do mundo artístico) são iguais às dos restantes países do mundo. Os problemas são os mesmos, a questão é que em Macau as coisas são mais visíveis e podemos tirar conclusões mais rápidas. Mas de cada vez que há algum tipo de iniciativa em Macau, eu tento contribuir. Tive agora dois trabalhos meus no Armazém do Boi, depois dei um trabalho a uma galeria junto às Ruínas de São Paulo, o que já é bastante (risos). Mas se me pedirem “por favor, faça uma grande exposição”. Direi que não. Mas vive em Macau há 23 anos, como olha para a arte que tem vindo a ser produzida neste pequeno território? Não há arte. A arte é a procura, e qual é a procura aqui? Pela Hello Kitty? Há mau gosto. Para compreender o que é a arte, temos de ser educados, ter a nossa própria motivação, sermos curiosos. Infelizmente o público aqui não é assim. Para qualquer coisa que se produza em Macau não há procura, mas não é uma questão de preço. Porque é que as pessoas de Macau não compram as obras de arte locais? Porque preferem ter posters na parede, coisas criativas que compram em Bali. Tem tudo a ver com questões de gosto, educacionais, de cultura. É como aquela máxima de “nós somos o que comemos”, e somos também os livros que temos na estante e os quadros que temos na parede. É um pouco perturbador. [quote_box_right]“A arte é a procura, e qual é a procura aqui? Pela Hello Kitty? Há mau gosto. Para compreender o que é a arte, temos de ser educados, ter a nossa própria motivação, sermos curiosos. Infelizmente o público aqui não é assim”[/quote_box_right] Em relação aos museus, galerias ou entidades públicas. Pensa que o Governo poderia investir na criação de mais espaços como estes? Esse é um conceito socialista. Ajudar os artistas? O problema é que, se as pessoas não tiverem experiência no meio, não souberem a melhor forma de se tornarem artistas, isso é um erro. Temos esse problema com as políticas públicas. A arte transforma-se numa coisa preguiçosa, que não é desafiante. Quando ajudamos os artistas não criamos qualidade. Recentemente falei com várias pessoas do meio cultural de Macau e disse que a melhor forma é abrir concursos ou comissões para espaços públicos, em que uma vez por ano qualquer artista poderia concorrer para um apoio. Temos muitas construções aqui, mas podemos ver o quão tudo é horrível. E não estou apenas a falar da arte, mas a arquitectura também é muito má. Está a referir-se ao Cotai? A todo o lado. E porquê? Porque não queremos saber. Chega aqui alguém e deixamo-lo construir um projecto, e não dizemos “não faça esta imitação da escultura” ou “não revista isto de plástico”. O conceito é muito pobre. Recentemente estive em Singapura no Marina Bay Sands. O casino pode não estar a ter muitos lucros, mas é um edifício bonito. Ao menos podem orgulhar-se daquele esforço. Se há 15 anos me dissessem que iríamos ter uma Torre Eifeel em Macau…é horrível. Não é apenas o facto de não envolver os artistas locais, mas tudo deveria ser feito por concurso e aprovado pelas instituições e pessoas de Macau. Porque é que Macau deixa que essas coisas feias sejam aqui construídas? Pensa então que deveria haver um novo modelo para o Cotai? Um espaço que poderia servir para promover os artistas locais? A questão dos artistas locais é similar a um jardim de infância, “acabei o meu curso, dêem-me um espaço para poder mostrar o meu trabalho”. O que poderíamos fazer agora? Criar um órgão independente, composto por artistas ou arquitectos, que não esteja envolvido com o sector do imobiliário, do Jogo ou da construção. Esse órgão deveria decidir o que é bom ou mau para Macau. Tudo deveria ser aprovado por este órgão. Em Guangzhou, o Governo deu responsabilidades a um grupo deste género para fazer uma cidade bonita. Estas pessoas não têm interesses no dinheiro, porque são professores, artistas… simplesmente ditam o que é bom ou mau para a cidade. Então vemos que a arquitectura e os espaços são bonitos, existe bom gosto. O problema aqui é que os lucros não trazem o bom gosto, o dinheiro não nos faz ter mais consciência cultural. Em Macau parece que o Governo tem de estar em todo o lado, concedendo subsídios. Pensa então que deveria ser criado um novo modelo de apoio? Quando cheguei a Macau, fiquei impressionado. Porque antes era melhor do que agora. Macau era melhor do que Hong Kong. E porquê? Porque no Governo, todos os secretários adjuntos, tinham interesse por arte. Construíam casas em Portugal, gostavam do design chinês, da mobília, visitavam galerias e estúdios de arte. Estes governantes ajudavam mais o mercado da arte do que qualquer outra pessoa. As pessoas que temos actualmente no Governo podem apoiar a cultura e a arte, mas individualmente não vão a concertos, nunca foram a uma galeria, e falo de Hong Kong também. Este é um problema. As pessoas que querem ajudar os artistas são apenas funcionários públicos ignorantes que tentam ser uma espécie de pais destes alunos de arte que acabam os seus cursos, para que sejam felizes. [quote_box_left]“Se há 15 anos me dissessem que iríamos ter uma Torre Eifeel em Macau…é horrível. Não é apenas o facto de não envolver os artistas locais, mas tudo deveria ser feito por concurso e aprovado pelas instituições e pessoas de Macau”[/quote_box_left] Mas acredita que o Governo de Macau, em concreto, está a seguir esse caminho? Não estou a criticar apenas aqui, porque na verdade o nosso Instituto Cultural (IC) ou o museu funcionam muito melhor do que poderíamos pensar. Claro que ainda há melhorias a fazer. Mas as pessoas deveriam ser nomeadas não porque falam cantonense, se são locais ou não, mas sim por mérito e conhecimento. Para cada projecto deveria haver uma selecção, e se for o melhor, mesmo que não fale cantonense, não deve constituir um problema. Macau poderia ser um modelo para a multi-culturalidade. Tudo deveria ser feito por pessoas com coragem e conhecimento para melhorar as coisas. Ajudou a criar a AFA – Art for All Society. Como olha para a entidade nos dias de hoje? Que desafios encontram? A AFA foi uma solução encontrada para se fazer e promover a arte. Mas diminuí a minha participação há cerca de dois ou três anos. Vamos mantendo o contacto, mas percebi que ficar lá mais tempo não iria ser benéfico para mim, porque sou uma pessoa ocupada, viajo muito. E não quero fazer esse tipo de trabalho de pedir patrocínios. A minha ideia inicial era de que a AFA não era apenas para os artistas locais, mas seria uma plataforma para as pessoas produzirem e consumirem arte, e seria a primeira do género em Macau. Mas há leis e regras que temos de seguir, então tornou-se uma entidade muito virada para Macau. Percebi que o que fazemos é algo anti-marca, porque um artista faz um trabalho, o Governo apoia-o, muito bem. Mas dou-lhes apoio sempre que é necessário. Qual o caminho que Macau está a tomar, com os casinos e as réplicas? Penso que já não é apenas o Jogo que domina, mas podemos atrair as famílias, com as crianças, e temos de pensar como dar-lhes o divertimento e fazer com que isso seja lucrativo, com eventos ou apostar na área da restauração. Penso que nesse sentido Macau está a ir no caminho certo. Há algumas questões, como o facto do Governo querer acabar com o fumo nos casinos. Não sou fumador, mas um turista vem a Macau para jogar, fumar e comer. Concordo em não fumar em restaurantes, ao pé de crianças…mas nos casinos? Estas pessoas jogam, bebem e fumam. Eles vêm cá para se divertir, então onde está o divertimento? [quote_box_right]“O que poderíamos fazer agora? Criar um órgão independente, composto por artistas ou arquitectos, que não esteja envolvido com o sector do imobiliário, do Jogo ou da construção. Esse órgão deveria decidir o que é bom ou mau para Macau”[/quote_box_right] O Governo já mostrou a vontade de criar mais museus. Qual deveria ser o modelo a implementar? Macau já foi o primeiro território na Ásia a ter uma bienal, no tempo dos portugueses, e ninguém fala disso. Macau poderia transformar-se num centro de arte na Ásia e dizer que desde os anos 90 (que promove esse tipo de eventos). Hong Kong era um deserto cultural, Pequim e Xangai não tinham arte, de todo. E Macau já tinha uma bienal de arte. Então deveríamos promover isso sem fazer esse corte entre a Administração portuguesa e o Governo chinês. Macau sempre foi Macau e deve ter orgulho desses pequenos detalhes, para além das diferenças. Nessa altura Macau não tinha nada, tirando um ou outro problema com um Governador, mas era um lugar engraçado e interessante. Para si, ainda é assim? Vejo este lugar como uma continuação da cultura da Europa, e que ainda mistura outras formas, como essas coisas americanas que agora existem. Penso que é uma boa plataforma para a arte e cultura, e Macau poderia ser de novo um centro de arte. Temos dois modelos: a feira de Singapura, apoiada pelo Governo, ou a Art Basel em Hong Kong, totalmente privada. Poderíamos fazer uma mistura, com um pouco de apoio do Executivo. Os casinos também poderiam participar, mas a questão é que eles só promovem os artistas de topo, as grandes marcas. Macau deveria ditar um pouco as regras, criando esse órgão, com 30% de artistas locais, e mais um grupo de artistas convidados, para decidir quais seriam os projectos certos.
Joana Freitas Manchete PolíticaVisita | Secretário de Estado da Justiça reúne hoje com Sónia Chan Podem vir aí mais oportunidades de alargar a cooperação judiciária e judicial entre Macau e Portugal. Sem discutir pormenores, António Costa Moura frisou a possibilidade de as duas regiões poderem colaborar no que à adopção de crianças diz respeito. Ideias que ainda não passam disso, mas que estarão hoje em debate [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Secretário de Estado da Justiça, António Costa Moura, vai debater hoje com Sónia Chan diversas ideias no âmbito da cooperação judicial e judiciária, onde se encaixam algumas que já estão em andamento, mas também novas, como é o caso da cooperação no âmbito da adopção. Realçando o facto de não se querer adiantar às entidades de Macau, Costa Moura disse ao HM que poderá haver a possibilidade de cooperar para que seja possível agilizar o processo de adopção de crianças dos dois locais. “A ideia é eventualmente [discutir] a área da adopção, através da qual podemos enriquecer o relacionamento bilateral. Temos uma lei da adopção que é aberta ao mundo e é uma ideia, mas não é algo que queria lançar sem falar com as entidades [de Macau]”, frisou em declarações ao HM, à margem da recepção oferecida pelo Consulado de Portugal à comunidade portuguesa, que ontem teve lugar. Costa Moura realça que “não há qualquer acordo firmado” ainda sobre este assunto, sendo que no encontro com Sónia Chan se vai fazer um balanço sobre os acordos que estão, esses sim, já em vigor. O Secretário de Estado fez questão de deixar firme “a ideia de que o Governo de Portugal quer seguir o trabalho na área dos serviços prisionais, formação de magistrados, segurança pública e no cumprimento escrupuloso dos dois acordos de cooperação”, que versam sobre a transferência de pessoas condenadas e na cooperação em matéria jurídica e judiciária. Questionado pelo HM sobre se há algo mais que pode ser aprofundado nesses acordos, Costa Moura foi peremptório: há sempre. [pull_quote_left]O Governo de Portugal quer seguir o trabalho na área dos serviços prisionais, formação de magistrados, segurança pública e no cumprimento escrupuloso dos dois acordos de cooperação[/pull_quote_left] “A cooperação tem de ser um exercício de dois movimentos, não pode ser imposta por um ou outro lado. Tem de ser querida e tem de resultar em vantagens para ambas as partes. Temos algumas áreas, nomeadamente a prisional – como formação e técnicas de reinserção social – em que estamos já a fazer coisas em conjunto. Mas não há nada que impeça que este quadro de cooperação possa ser alargado a outras áreas do sistema prisional. Mas ainda é prematuro, antes de falar com entidades, isto são [apenas] ideias que temos”, ressalva. Costa Moura encontra-se também hoje com a Associação dos Advogados de Macau (AAM) e assegura ao HM “estar aberto para discutir” o que os advogados quiserem. O Secretário, que representou Portugal no Dia 10 de Junho, afirma que haverá “uma franca troca de ideias”. Sereno elogiado, Sónia elogia António Costa Moura fez ainda questão de agradecer ao cônsul Vítor Sereno pela competência na representação de Portugal em Macau. Sem esquecer “as autoridades locais e a comunidade”, o “profundo agradecimento” mais destacado foi para o cônsul “pelo profissionalismo, competência e dedicação” na sua carreira e na causa pública que é servir os interesses do Estado português no exterior. “Confirmei ao longo desta tarde [ontem] o cumprimento disso mesmo”, disse. Entre mais de 200 pessoas que ontem encheram a residência consular, discursou ainda Sónia Chan, Chefe do Executivo interina – já que Chui Sai On está fora de Macau. Chan referiu, novamente, a utilização de Macau como plataforma entre a China e os PLP, elogiando os “resultados positivos” das diversas entidades criadas para esse efeito. Caso disso é o Fórum Macau, que “contribuiu para elevar a influência internacional de Macau e promoveu uma diversificação adequada das indústrias de Macau”, como disse no seu discurso. [pull_quote_right]A cooperação tem de ser um exercício de dois movimentos, não pode ser imposta por um ou outro lado. Tem de ser querida e tem de resultar em vantagens para ambas as partes[/pull_quote_right] A também Secretária para a Administração e Justiça assegurou que o Governo da RAEM vai continuar empenhado na promoção do “desenvolvimento dos empreendimentos dos PLP em Macau e no interior da China”, bem como vai “incrementar, em conjunto com o [continente], a cooperação com os PLP, a União Europeia e os países latinos”. Promessas ainda de que o Executivo vai continuar a respeitar a “multiculturalidade, a promover a economia e a melhorar a qualidade de vida, criando melhores condições de vida e de trabalho para toda a população, incluindo os portugueses residentes em Macau”. Vítor Sereno, que se fazia acompanhar no palco pelos Conselheiros das Comunidades Portuguesas José Pereira Coutinho e Fernando Gomes – que faltaram às comemorações da manhã por “motivos de trabalho”, segundo a Rádio Macau – prometeu melhorar o trabalho no Consulado. Alexis Tam e a importância da comunidade lusa “Uma coisa é certa. Todos nós pensamos [no Governo] que os portugueses são elementos essenciais para Macau”, afirmou Alexis Tam, em declarações à Rádio Macau, ontem, durante a recepção à comunidade na Residência Consular. Destacando ainda o contributo da comunidade portuguesa para a história e para o património do território, o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura garantiu que o Governo tem criado “as condições” para a comunidade portuguesa se “sentir bem” no território e que a ideia é promover o uso do Português no território. “Estou com esperança que mais tarde a língua portuguesa ainda vai ser muito falada em Macau. É este o meu trabalho e eu faço o melhor possível para chegar a este objectivo”, disse à rádio. Banda da PSP toca o hino A banda do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) voltou a tocar o hino português durante o hastear da bandeira de Portugal, nas cerimónias oficiais do dia 10 de Junho. “Pela primeira vez, em 15 anos, tivemos a banda ao vivo. Estou muito grato ao senhor Secretário para a Segurança e ao senhor comandante do CPSP por este gesto de cortesia, de boa vontade, que evidencia claramente o nível de excelência que a RAEM tem com Portugal. Estou muito satisfeito com isso”, afirmou o cônsul-geral de Portugal, Vítor Sereno, aos microfones da Rádio Macau. O Grupo de Escuteiros Lusófonos também marcou presença, bem como seis escolas chinesas e portuguesas.