É a FIA quem manda aqui

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stá aí mais um Grande Prémio de Macau, um motivo de orgulho para os locais que, ao longo de gerações, construíram um dos maiores, se não mesmo o maior, cartaz automobilístico do Sudeste Asiático. O 63º Grande Prémio será o primeiro sob a batuta da recém-criada Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau (COGPM), com o Instituto do Desporto à cabeça, aproveitando o que absorveu à defunta Comissão do Grande Prémio de Macau e assessorado, na parte desportiva, pela Associação Geral do Automóvel de Macau-China (AAMC).

Se, em termos organizativos, nada de especial transpirou cá para fora, já o mesmo não se pode dizer em termos desportivos. Este início de funções da COGPM, que tem os mesmos 200 milhões de patacas de orçamento para o evento deste ano, tem sido atribulado.

Primeiro, o histórico Barry Bland bateu com a porta e a imprensa internacional, principalmente a de língua inglesa, não perdeu tempo para crucificar Macau e as suas gentes. A COGPM foi apanhada de calças na mão e não foi capaz de dar uma resposta construtiva a tempo e horas. Depois, foi a troca de pneus Yokohama pelos Pirelli na prova de F3, numa manobra da exclusiva responsabilidade da FIA e em que a inocente RAEM apanhou novamente por tabela, sem saber mais uma vez defender-se na praça pública. Por fim, nos bastidores, é cozinhada a saída do TCR International Series da Corrida da Guia no final deste ano e, para não variar, a resposta da COGPM foi um mutismo frouxo.

João Costa Antunes já cá não está, pelo menos numa função tão visível. Gostasse-se ou não da personagem, uma coisa é certa: dava o corpo às balas e não se escondia atrás de ninguém. Não era um homem dos automóveis mas, ao fim de décadas à frente do evento, aprendeu como o sistema funcionava e sabia como jogar nos bastidores.

Agora, o homem do leme é o presidente do Instituto do Desporto, Pun Weng Kun, que, pelas entrevistas já dadas, pouco sabe da matéria-prima do evento, está a tentar aprender e refugia-se em respostas evasivas quando o assunto não domina. Pun está assessorado, em termos desportivos, pelo AAMC, uma associação envelhecida que sempre se pautou por uma postura austera, fechada, adversa à imprensa e a qualquer tipo de opinião do exterior. Também ela, para fugir a qualquer responsabilidade gorda, se esconde atrás de alguém – neste caso dos homens das camisas azuis e sotaque francês.

Bland é há muito uma “persona non grata” pela FIA de Jean Todt. Saiu Bland e a FIA deu um rebuçado a Macau, chamou “Taça do Mundo” à corrida de F3, algo que, a bem da verdade, não traz nenhuma mais-valia à corrida, mas que fica bem na fotografia. Lotti, outra “persona non grata” na Praça da Concórdia, e o seu TCR estão de saída e o FIA WTCC parece que é novamente bem-vindo a Macau. Em 2017, as três maiores corridas de automóveis do Grande Prémio de Macau poderão estar entregues à FIA e aos seus desejos. Ficam à mercê do AAMC duas corridas de suporte, apenas duas, a Macau Road Sport e a Taça CTM. Isto porque a Taça da Corrida Chinesa só visita o Circuito da Guia porque “outro valor mais alto se levanta”, como diria o poeta.

No meio disto tudo, salve-se o 50º Grande Prémio de Motociclismo que, parecendo passar pelos pingos da chuva, festeja um Jubileu de Ouro em plena forma. Num circuito pensado para corridas de automóveis, a única corrida de motociclismo de velocidade de estrada no continente asiático continua de boa saúde e este ano apresenta-se como uma das corridas mais interessantes de seguir. Não é por acaso que é a corrida favorita do público.

Mas como o que realmente importa para o espectador e será lembrado daqui a 50 anos são os episódios que se passarão nestes próximos quatro dias dentro de pista, vamos todos torcer para que o São Pedro também ajude e que a 63ª edição seja memorável pela positiva, por todos aqueles que anonimamente tornam este evento possível todos os anos, e por todos os que hoje e no passado lutaram e lutam para o que o Grande Prémio de Macau chegasse ao patamar de reputação em que hoje está.

17 Nov 2016

Magistrados | Portugal diz que comissões “devem ser limitadas”. Procuradora vem a Macau

A licença de magistrados fora de Portugal deve ter um limite temporal. É o que defende o Conselho Superior do Ministério Público, que justifica assim a decisão de fazer regressar magistrados portugueses na RAEM ao país. Não implica que não possam vir outros, diz o organismo, que confirma a chegada a Macau de Joana Marques Vidal

[dropcap style=’circle’]P[/dropcap]ortugal quer que as comissões de serviço de funcionários públicos portugueses na RAEM sejam limitadas. Isso mesmo foi o que deu origem, segundo resposta do Conselho Superior do Ministério Público português ao HM, à exigência do regresso de magistrados que trabalhavam em Macau a Portugal.
Mais de um mês depois do HM ter avançado com a notícia de que magistrados portugueses a exercer na RAEM teriam de regressar a Portugal, por não verem a sua autorização de trabalho renovada, as autoridades lusas esclarecem a decisão. O nosso jornal transcrevia o exemplo de Vítor Coelho, magistrado que trabalhava no território há 16 anos e que acabou por regressar a casa, ao contrário do que desejava tanto o profissional, como o Ministério Público de Macau. A questão está, afinal, na questão do tempo.
“O Conselho Superior do Ministério Público tem entendido que as comissões de serviço devem ter uma duração limitada no tempo, tendo mesmo deliberado no sentido da duração da comissão de serviço ser, por regra, de três anos”, começa por explicar o organismo português. “[Essa comissão] pode ser renovada por igual período e pode ainda ser autorizada, depois, por motivos de excepcional interesse público, nova renovação até ao limite máximo de três anos.”

[quote_boxleft]“O Conselho Superior do Ministério Público tem entendido que as comissões de serviço devem ter uma duração limitada no tempo, tendo mesmo deliberado no sentido da duração da comissão de serviço ser, por regra, de três anos”[/quote]

A renovação foi o que aconteceu, aliás, no caso de magistrados portugueses na RAEM. A decisão seria sempre do organismo português, mas no caso de Vítor Coelho e dos outros três magistrados na mesma situação, não era esperada, devido não só ao longo período em que estão em Macau, como ao facto de ter sido tão repentina. Ainda assim, o Conselho assegura ao HM que há sempre disponibilidade para virem mais profissionais para o território. Só não serão os mesmos.
“Respeitando integralmente o Acordo de Cooperação no âmbito da Declaração Conjunta Luso Chinesa sobre a questão de Macau, [o Conselho] sempre manifestou empenho em aprofundar a cooperação estabelecida entre os dois Ministérios Públicos. E, consequentemente, empenho também na manutenção de magistrados do MP português na RAEM, como forma de salvaguarda da cultura e do sistema judiciário português [no] território. Assim, e como os magistrados do MP português que exercem funções no MP da RAEM se encontram em comissão de serviço, entende o Conselho que, como acontece em todos os outros casos, tais funções devem ter limitações temporais. Isto, sem prejuízo da total disponibilidade do Conselho para autorizar outros magistrados, com iguais qualificações, para o exercício dessas funções”, explica o organismo ao HM, numa resposta escrita.

Sem licença

A falta de magistrados na RAEM é uma das queixas mais ouvidas pelos profissionais da área e o facto de a licença especial – autorização que a maioria das pessoas ligadas a Portugal que trabalha nos vários organismos da Função Pública de Macau possui – estar a ser negada faz com que os contratos que cheguem ao fim não possam ser renovados. Esta licença permitia aos trabalhadores com vínculo a Portugal exercerem em Macau com as mesmas regalias de lá e, porque não estava a ser renovada, passou a não ser a única via utilizada pelos magistrados para cá ficarem. No entanto, essas outras vias – como as “licenças de longa duração” e a licença sem vencimento – deixaram de poder ser usadas. Os magistrados que optaram por cá ficar sem a licença especial não foram promovidos e não tiveram qualquer progresso na carreira e, actualmente, estarão dois magistrados com licenças sem vencimento e um ainda com a licença especial, renovada antes da decisão de Portugal – e estes deverão seguir o mesmo caminho de regresso.

Procuradora-geral em Macau “nos próximos meses”

O MP de Macau já tinha dito ao HM que convidou Portugal a vir falar do assunto à RAEM, algo que o organismo português diz ter aceite. O assunto vai fazer com que Joana Marques Vidal venha a Macau nos próximos meses. “Na sequência de um convite, que já aceitou, a Procuradora-Geral da República realizará, nos próximos meses, uma visita oficial à RAEM, constando como assunto a abordar no decurso da referida deslocação a prestação de serviço de magistrados do Ministério Público português no Ministério Público da RAEM”, confirma o organismo ao HM.

25 Jan 2016

Especialistas analisam primeiro semestre do novo Governo

Celebram-se amanhã os seis meses da tomada de posse do novo Governo. O fumo nos casinos, a área das Obras Públicas e os 3% de limite às mesas de Jogo são apontadas as grandes questões de um Executivo que, para muitos, ainda tem problemas para resolver, mas que se tornou mais próximo da população. Raimundo do Rosário e Alexis Tam são consideradas as “estrelas” do Executivo. E também Li Gang

[dropcap type=’circle’]A[/dropcap] 20 de Dezembro de 2014, cinco novos rostos do Executivo da RAEM levantavam a mão e prestavam juramento perante Xi Jinping, Presidente chinês. Seis meses depois, o que foi alterado em Macau com um Governo que herdou uma pesada herança? Se para o jurista António Katchi pouco mudou, Albano Martins, economista, Leonel Alves, deputado, e Eilo Yu, académico, falam de um Governo que está a tentar executar e a arrumar a casa.

“Há pastas que – em seis meses, no cenário em que [os Secretários] as tomaram – é muito difícil dizer se as coisas estão ou não a correr bem. Há outras em que se nota que as coisas estão a andar para a frente. Ainda é preciso fazer-se muito trabalho de casa e só ao final de um ano é que podemos dizer se o balanço é ou não positivo”, referiu ao HM o economista Albano Martins.

O especialista defende, contudo, que a tutela das Obras Públicas é a área onde é bem mais difícil encontrar resultados em seis meses. “O Secretário vai ter de reconstruir uma equipa toda, que domine as quatro áreas de gestão. A casa está profundamente desorganizada dos tempos do Lau Si Io, que meteu pessoas que desconheciam a cultura da sua unidade de trabalho”.

Para Eilo Yu, o novo Executivo começou a seguir um plano e a mobilizar os directores dos departamentos para discutir as políticas. “Penso que têm estado a levar a cabo uma boa estratégia”, diz ao HM.

O deputado Leonel Alves considera que, no final de seis meses de governação, estamos perante um Executivo que é “realmente executivo”. “Na área social, ao nível do hospital, nota-se que há um ritmo bastante acelerado, para a resolução das questões mais prementes. A questão dos transportes, habitação, hospital e a questão social foram onde o Governo tem vindo a dar o seu melhor, quer com medidas administrativas, quer com um diálogo bastante intenso com a Assembleia Legislativa (AL), através das comissões de acompanhamento”, referiu ao HM.

Apenas António Katchi traça uma análise mais negativa. “Nestes primeiros seis meses do Governo de Li Gang/Chui Sai On, não observo qualquer mudança significativa. Sei que alguns jornalistas consideram que a postura dos novos Secretários perante a comunicação social é melhor que a dos anteriores; se assim for, congratulo-me evidentemente por isso. Poderá ter havido também um ou outro gesto positivo da parte dos novos Secretários, mas isso está longe de implicar ou sequer prenunciar uma mudança substancial de políticas, até porque as políticas seguidas ao longo dos últimos anos 15 anos – e mesmo antes – têm sido tão más que deveriam ser globalmente invertidas e não simplesmente ajustadas”, referiu por email ao HM.

As estrelas políticas

Do grupo dos cinco Secretários, estas personalidades destacam as prestações de Raimundo do Rosário, Secretário das Obras Públicas e Transportes, e Alexis Tam, da pasta dos Assuntos Sociais e Cultura.

“O Secretário das Obras Públicas, quer pela sua maneira de se expressar, quer pela acuidade das questões em que toca, parece-me que tem sido bastante inovador. Destaco-o pela diferença, sem prejuízo dos outros”, disse ao HM Leonel Alves.

Eilo Yu destaca, “obviamente”, Alexis Tam, “que tem sido bastante comunicador com o público” e que também “tem estado a lidar com diversas questões”, como a Universidade de Macau (UM) ou os cuidados de saúde. “Parece-me que é aquele que está mais no centro das atenções em relação aos restantes Secretários. Mas tanto Alexis Tam, como Rosário têm uma imagem mais positiva junto do público, apesar do público não estar satisfeito com as questões da sua tutela. Sónia Chan e Wong Sio Chak não estão a receber tanto o alvo dos média”, referiu o docente de Ciência Política da UM.

António Katchi prefere nomear Li Gang, director do Gabinete de Ligação do Governo Central em Macau, como a figura principal do novo Executivo. “A figura que se destaca é a sua eminência parda, Li Gang. Aliás, nas primeiras semanas do segundo mandato de Chui Sai On, praticamente não passava um dia sem que Li Gang aparecesse na televisão a emitir afirmações interpretáveis como directivas políticas. Entre outras coisas, ele afirmou que os chineses de Macau não eram patriotas e que, por isso, tinham de ser reeducados num sentido ‘patriótico’ e que Macau só teria uma economia diversificada daqui a 20 ou 30 anos.”

O jurista, docente do Instituto Politécnico de Macau (IPM), considera que a 20 de Dezembro não houve apenas uma mudança de Secretários, mas também um “reforço da intervenção das autoridades centrais” na governação de Macau. “Um dos instrumentos dessa intervenção foi, aliás, a própria escolha dos Secretários: tem sido dito por muitas pessoas que eles foram escolhidos (e não apenas nomeados) pelo Governo Central e tem sido igualmente observado que o percurso pessoal e escolar de alguns deles tem estado muito mais ligado à China continental do que sucedia com os seus antecessores”, ultimou.

Fumo nos casinos, essa “pedra no sapato”

António Katchi não só não encontra mudanças no semestre político que passou, como vê uma continuidade “dos problemas mais candentes de Macau”, como a “monocultura do jogo, a carestia dos imóveis, o terceiro mundismo laboral, a bagunça no ensino e o regime político oligárquico”. Para o jurista, para nada disto “o Governo de Li Gang/Chui Sai On apresentou, até ao momento, vias de solução”.

Já Albano Martins prefere destacar a medida do fim do fumo nos casinos como a “pedra no sapato” de Alexis Tam e do Executivo. “Tem de ser prudente. Há vícios com os quais não podemos ser moralistas e os nossos concorrentes, mesmo em Singapura, não estão a tomar as medidas draconianas que estamos a tomar. Em termos económicos não me parece que essa seja a medida mais correcta a tomar”, disse o economista.

Na área da Administração e Justiça, Albano Martins defende que “é muito difícil fazer-se pior do que fez Florinda Chan”, sendo que “Sónia Chan vai ter de fazer uma aposta na resolução de questões na sua área, tem de fazer uma análise e tentar fazer até que ponto não será mais vantajoso ter mais técnicos recrutados por três ou quatro anos para resolver as questões jurídicas”. Os custos que serão mais agora terão mais benefícios no futuro, repara.

Na Segurança, Albano Martins considera que a tutela de Wong Sio Chak está a funcionar bem, já que o Secretário tem outra formação e é um indivíduo que está actuar. “Estou a ver tendências meio moralistas de intervenção mas acho que dominará melhor a máquina”.

Face ao trabalho do Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, Albano Martins volta a pedir flexibilidade quanto ao limite máximo de 3% para as mesas de jogo. “[Lionel Leong] tem uma política que não se consegue ver livre dela e que surgiu para que os competidores não ganhassem mercado no jogo, mas neste momento isso afecta toda a indústria e a economia de Macau profundamente. Lionel Leong vai ter de ser mais flexível, a não ser que isso seja imposição de Pequim e ele não possa fazer nada, mas aí o segundo sistema devia ter autonomia necessária. De resto tudo na sua secretaria funciona razoavelmente bem.”

Criticando a forma como o Governo quer diversificar a economia, por via do entretenimento, António Katchi fala ainda da questão do imobiliário, cujo arrefecimento dos preços não se deve, na sua óptica, a medidas do Governo. “Isso, além de ser completamente insuficiente para a resolução do grave problema da carestia dos imóveis, não resultou de qualquer medida do Governo de Macau destinada a isso, antes representando um efeito colateral da chamada ‘campanha anti-corrupção’ em curso na China”, concluiu.

Olhando para o quadro no geral, Leonel Alves acredita que este é o mandato “em que a população deposita mais confiança, no sentido dos governantes executarem todas as acções governativas que interessam à população”.

Fórum Macau “não funciona”, diz Albano Martins

Um dos pontos negros do mandato de Lionel Leong à frente da tutela da Economia e Finanças é o funcionamento do Fórum Macau, o qual, para o economista Albano Martins, simplesmente “não funciona”. “A verdade tem de ser dita, custe o que custar. O Fórum não tem autonomia nenhuma, parece mais uma feira de vaidades em que as pessoas andam de um lado para o outro do que um local onde se juntam compradores e vendedores, empreendedores. Quem de facto sabe utilizar o Fórum é a China, mas a China tem os recursos necessários. O Fórum ainda tem muito que andar e Lionel Leong tem de conseguir dar o pontapé de saída.” Questionado sobre se o Fórum Macau pode funcionar melhor com Echo Chan, que substituiu Rita Santos no cargo de secretária-geral adjunta, Albano Martins afirma não querer “pessoalizar as questões”, mas acredita que Echo Chan “por experiência, tem outra perspectiva em relação ao que o Fórum deve ser”. Ainda assim, o economista diz que a própria estrutura do Fórum “não funciona”.

19 Jun 2015

Doação de Órgãos | Serviços de Saúde “não estão preparados” para processo

Mais de duas dezenas de pessoas saíram de Macau para poderem receber transplantes, mas nem esse número leva a que os SS reúnam “condições” para activar o sistema de transplante de órgãos na RAEM. O organismo não se mostra aberto a isso, não diz quantos dadores existem e não desvenda se Macau tem médicos especialistas para o efeito. Ainda que sem solução à vista, os SS continuam a permitir a existência de um grupo que tem “efectuado estudos e pareceres” desde 1999

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s Serviços de Saúde (SS) ainda não estão preparados para levar a cabo transplante de órgãos, nem para implementar um regime de doação. É o que confirma o director do organismo ao HM, que indica ainda que, até hoje, nunca foi possível efectuar qualquer transplante em Macau. Mais de duas dezenas de pessoas foram para o estrangeiro para o efeito.

Apesar de existirem uma lei e um decreto que “regulam claramente o acto de doação de órgãos”, como se pode ler numa resposta dos SS ao HM, a verdade é que um regime sobre a doação e transplante de órgãos tem vindo a ser pedido há vários anos pelos deputados da Assembleia Legislativa. Ainda recentemente Leong Veng Chai voltou a frisar a necessidade de se implementar este tipo de legislação na RAEM.

Contudo, para os SS há muito a fazer e a questão do transplante de órgãos ainda não é bem recebida na sociedade. “A legislação de Macau que se encontra em vigor regula que a morte cerebral é a condição relevante da doação de órgãos de origem humana. No entanto, a definição de morte cerebral é um processo rigoroso. Considerando não haver nenhum mecanismo e condição que evite eventuais e desnecessárias controvérsias relativas à doação, os SS ainda não efectuam este tipo de procedimentos”, pode ler-se na resposta do organismo ao HM.

Também numa resposta a uma interpelação sobre o tema, Lei Chin Ion explica que a definição de morte cerebral é um dos motivos para que existam obstáculos – já que este “é um tema rigoroso e altamente científico, cheio de controvérsia e [que conta] com os impactos de vários factores, como ciência, tecnologia, religião, cultura e região”. Contudo, o HM sabe que, em Macau, a doação de órgãos ainda é encarada como tabu pela cultura chinesa, algo que poderá estar relacionado com a decisão dos SS em não activar este sistema.

“Em Macau, presentemente, ainda não há nenhuns critérios e regras a respeito da morte cerebral. Quer dizer, na prática, ainda não existiu qualquer autorização para a colheita de órgãos em cadáver”, escreve o director dos SS.

[quote_box_right]”Considerando não haver nenhum mecanismo e condição que evite eventuais e desnecessárias controvérsias relativas à doação, os SS ainda não efectuam este tipo de procedimentos” – Resposta dos SS[/quote_box_right]

Fígados e dadores

Nos últimos cinco anos, de 2009 ao ano passado, os SS enviaram 23 pessoas para serem submetidas à transplantação de órgãos no exterior. O fígado é o órgão mais procurado.

“No caso de existirem doentes com necessidades de transplante de órgãos, os SS, através de deliberação legal em regime de diagnóstico e terapêutica no exterior, a efectuar pela Junta para Serviços Médicos no Exterior, enviam os utentes para tratamento no exterior de modo a que os casos elegíveis possam obter o tratamento mais adequado. Desde 2009 e até 2014, foram enviados e submetidos à transplantação de órgãos no exterior 23 casos. Entre estes, 16 casos referem-se a situações de transplantação de fígado e sete casos a transplantação de rim”, diz o organismo ao HM.

Apesar da lei que existe desde 1996 e de um decreto-lei de 1998, que regula o registo de dadores e implementa a emissão individual de dador, os SS não desvendam ao HM quantos dadores estão inscritos no REDA, o registo de dadores de órgãos em Macau, ou sequer se este sistema ainda está activo.

Quase quatro meses depois do HM ter enviado as perguntas ao organismo, fica ainda outra pergunta por responder: se a RAEM dispõe de profissionais médicos especializados para proceder ao transplante de órgãos, tal como pede a lei.

De acordo com o que o HM conseguiu apurar, a licença existe, mas nenhum médico na RAEM é licenciado para que não seja possível efectuar transplantes.

Comissão para que te quero?

Considerando não haver nenhum mecanismo e para evitar uma eventual controvérsia ao doar, os SS ainda não estão em condições para prestar o serviço relacionado.” Em resposta ao HM, o organismo admite então não estar ainda preparado para que este tema seja regulado e activado. Contudo, ainda continua a existir um grupo de trabalho responsável pela emissão de pareceres e estudos sobre o assunto. Grupo que viu entrarem novos membros no ano passado e que existe desde 1999.

Mas, se ainda não é possível levar a cabo transplantes em Macau, porque é que está activa a Comissão de Ética para as Ciências da Vida? E porque é que esta ainda se mantém a estudar as regras para a morte cerebral desde que foi criada? E emite pareceres sobre quê, se não é possível o transplante em Macau?

Os SS não conseguiram responder. “No passado mês de Outubro de 2014, o Governo nomeou os novos membros da Comissão de Ética para as Ciências da Vida. Esta Comissão irá discutir as matérias relacionadas com o transplante, estudar os critérios e as regras de cada um dos temas, emitir os pareceres para legislação a respeito da dádiva, colheita e a transplantação de órgãos de origem humana”, dizem apenas em resposta ao HM.

Deste grupo fazem parte representantes dos serviços públicos, associações religiosas, sector jurídico e de saúde e representantes de universidades. Entre eles, estão o próprio director dos SS, Lei Chin Ion, o ex-Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Cheong U, que preside e o advogado e deputado Vong Hin Fai.

16 Jun 2015

Amores mais baixos se levantam

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]entrevista que Konstantin Bessmertny deu ontem a este jornal coloca o dedo numa ferida muito importante deste Macau do crescimento desenfreado: o Governo deixa as concessionárias do Jogo fazerem tudo o que lhes apetece e assim inundar a RAEM de cópias baratas do que têm em Las Vegas, sem lhes exigir nada, sem controlar nada, sem dizer uma palavra sobre o que por aqui é erguido.

E assim temos um Venetian (já decadente), igual ao americano, bem diferente do que a Sands fez em Singapura, ou seja, uma reprodução ao invés de um edifício singular que já se tornou num marco turístico da Ásia. E assim casinos Wynn iguaizinhos aos que existem no Nevada. E assim vamos ter uma ridícula Torre Eiffel, também copiada da que existe em Las Vegas. O mau gosto e a avareza (compreensível) dos casineiros inundou esta cidade perante a indiferença governamental.

É difícil compreender a apatia do Governo perante a destruição estética da cidade. Não lhe terão amor? Ou nem sequer o assunto lhes passou pela cabeça? É certo que, numa primeira fase, os novos casinos deram muito dinheiro. Mas será que o dinheiro e só o dinheiro é a coisa mais importante do mundo? <

Não será que para a qualidade de vida e do turismo de Macau, bem como para o seu renome internacional, não seria importante construir uma cidade esteticamente original, irrepreensível, e não a cópia de um sítio decadente e ultrapassado como Las Vegas?

Macau, enquanto Monte Carlo do Oriente, era uma cidade charmosa, com qualidade de vida, excessiva e libertária. Esta Las Vegas da Ásia é kitsch, é foleira, não tem glamour nem mistério. Não é nada. Porque deixou de ser original. E isto perante a passividade governamental, entretido que estava a contar as patacas e a fazer maus investimentos.

Espera-se que o actual Governo siga por outros caminhos, que se interesse mais pela cidade em si, que mostre realmente amor por ela, até porque “amar Macau” é também “amar a Pátria”. O problema é que, bem sabemos, pelo menos no Conselho Executivo, amores mais baixos se levantam…

16 Jun 2015

Konstantin Bessemertny: “O dinheiro não nos faz ter mais consciência cultural”

Um dos maiores artistas de Macau e da Ásia tem optado por trabalhar na sombra, aparecendo pontualmente com alguns trabalhos. Konstantin Bessemertny defende que para Macau é suficiente uma exposição a cada cinco anos, condenando os governantes que não consomem cultura. Para o artista, a política do território, no que diz respeito à arte, arquitectura e espaços públicos, deveria ser decidida por um órgão totalmente independente

[dropcap style=’circle’]F[/dropcap]ez a última exposição individual em Macau em 2012. Porquê este tempo todo sem uma mostra individual em Macau?
O mundo artístico está a mudar quanto à democratização da criatividade. E não só em Macau, em todo o mundo. Agora qualquer pessoa é artista, e o problema dos artistas contemporâneos é mostrarem-se e produzirem demasiado. Há tanta arte disponível nos dias de hoje! Então a maneira mais lógica é tornarmo-nos como monges que ficam no seu mosteiro, e é isso que estou a fazer. Apareço raramente, em ocasiões específicas. Mudei o meu pensamento em relação a alguns eventos, como feiras de arte, porque penso que são apenas plataformas, como os media, o Instagram. São plataformas para uma arte algo imatura, na sua forma de expressão.

Mas não tem nenhum projecto para expor em Macau?
Não disse isso. Primeiro, temos de nos limitar a nós próprios, para um certo número de exposições, por um certo período de tempo. Penso que Macau é um bom sítio para uma exposição a cada cinco anos. Consegue imaginar uma exposição todos os anos? Tenho vindo a trabalhar em alguns quadros, sim, mas comecei a gastar mais tempo em cada trabalho, em vez de produzir sob pressão. Estou a tentar adaptar-me à nova realidade.

De que forma?
Estou a tentar focar-me, também devido a essa questão da excessiva produção artística. Há tanta arte destruída. Numa bienal, 95% da arte que lá está exposta vai para contentores. Tudo o que vai para o lixo não é arte, então estou a tentar focar-me em sítios que possam ter algo interessante, ou em coisas que as pessoas me pedem. É difícil, porque temos de convencer pessoas, instituições, mudar as mentalidades de certos meios, quando as pessoas pensam actualmente nas tendências a curto prazo. A arte acaba por ir para o caminho da “cultura da celebridade”.

[quote_box_left]“Mudei o meu pensamento em relação a alguns eventos, como as feiras de arte, porque penso que são apenas plataformas, como os media, o Instagram. São plataformas para uma arte algo imatura, na sua forma de expressão”[/quote_box_left]

Em que os artistas são como estrelas pop.
Sim. Claro que isso começou nos anos 60, com o Andy Wharol e o movimento pop-art. Mas acho que isso não é arte, é design. Então essa arte pode ir para museus, mas quem disse que ia lá ficar para sempre? Mas respondendo à sua questão, tenho vindo a trabalhar em coisas específicas. Continuo a trabalhar em Macau, com algumas pessoas, em galerias. As galerias de arte estão a morrer, porque já chegaram a um ponto de exaustão.

Em todo o mundo.
Não estou apenas a falar da pequenina Macau. Aqui tudo acontece em pequena escala, mas as questões (do mundo artístico) são iguais às dos restantes países do mundo. Os problemas são os mesmos, a questão é que em Macau as coisas são mais visíveis e podemos tirar conclusões mais rápidas. Mas de cada vez que há algum tipo de iniciativa em Macau, eu tento contribuir. Tive agora dois trabalhos meus no Armazém do Boi, depois dei um trabalho a uma galeria junto às Ruínas de São Paulo, o que já é bastante (risos). Mas se me pedirem “por favor, faça uma grande exposição”. Direi que não.

Mas vive em Macau há 23 anos, como olha para a arte que tem vindo a ser produzida neste pequeno território?
Não há arte. A arte é a procura, e qual é a procura aqui? Pela Hello Kitty? Há mau gosto. Para compreender o que é a arte, temos de ser educados, ter a nossa própria motivação, sermos curiosos. Infelizmente o público aqui não é assim. Para qualquer coisa que se produza em Macau não há procura, mas não é uma questão de preço. Porque é que as pessoas de Macau não compram as obras de arte locais? Porque preferem ter posters na parede, coisas criativas que compram em Bali. Tem tudo a ver com questões de gosto, educacionais, de cultura. É como aquela máxima de “nós somos o que comemos”, e somos também os livros que temos na estante e os quadros que temos na parede. É um pouco perturbador.

[quote_box_right]“A arte é a procura, e qual é a procura aqui? Pela Hello Kitty? Há mau gosto. Para compreender o que é a arte, temos de ser educados, ter a nossa própria motivação, sermos curiosos. Infelizmente o público aqui não é assim”[/quote_box_right]

Em relação aos museus, galerias ou entidades públicas. Pensa que o Governo poderia investir na criação de mais espaços como estes?
Esse é um conceito socialista. Ajudar os artistas? O problema é que, se as pessoas não tiverem experiência no meio, não souberem a melhor forma de se tornarem artistas, isso é um erro. Temos esse problema com as políticas públicas. A arte transforma-se numa coisa preguiçosa, que não é desafiante. Quando ajudamos os artistas não criamos qualidade. Recentemente falei com várias pessoas do meio cultural de Macau e disse que a melhor forma é abrir concursos ou comissões para espaços públicos, em que uma vez por ano qualquer artista poderia concorrer para um apoio. Temos muitas construções aqui, mas podemos ver o quão tudo é horrível. E não estou apenas a falar da arte, mas a arquitectura também é muito má.

Está a referir-se ao Cotai?
A todo o lado. E porquê? Porque não queremos saber. Chega aqui alguém e deixamo-lo construir um projecto, e não dizemos “não faça esta imitação da escultura” ou “não revista isto de plástico”. O conceito é muito pobre. Recentemente estive em Singapura no Marina Bay Sands. O casino pode não estar a ter muitos lucros, mas é um edifício bonito. Ao menos podem orgulhar-se daquele esforço. Se há 15 anos me dissessem que iríamos ter uma Torre Eifeel em Macau…é horrível. Não é apenas o facto de não envolver os artistas locais, mas tudo deveria ser feito por concurso e aprovado pelas instituições e pessoas de Macau. Porque é que Macau deixa que essas coisas feias sejam aqui construídas?

Pensa então que deveria haver um novo modelo para o Cotai? Um espaço que poderia servir para promover os artistas locais?
A questão dos artistas locais é similar a um jardim de infância, “acabei o meu curso, dêem-me um espaço para poder mostrar o meu trabalho”. O que poderíamos fazer agora? Criar um órgão independente, composto por artistas ou arquitectos, que não esteja envolvido com o sector do imobiliário, do Jogo ou da construção. Esse órgão deveria decidir o que é bom ou mau para Macau. Tudo deveria ser aprovado por este órgão. Em Guangzhou, o Governo deu responsabilidades a um grupo deste género para fazer uma cidade bonita. Estas pessoas não têm interesses no dinheiro, porque são professores, artistas… simplesmente ditam o que é bom ou mau para a cidade. Então vemos que a arquitectura e os espaços são bonitos, existe bom gosto. O problema aqui é que os lucros não trazem o bom gosto, o dinheiro não nos faz ter mais consciência cultural.

Em Macau parece que o Governo tem de estar em todo o lado, concedendo subsídios. Pensa então que deveria ser criado um novo modelo de apoio?
Quando cheguei a Macau, fiquei impressionado. Porque antes era melhor do que agora. Macau era melhor do que Hong Kong. E porquê? Porque no Governo, todos os secretários adjuntos, tinham interesse por arte. Construíam casas em Portugal, gostavam do design chinês, da mobília, visitavam galerias e estúdios de arte. Estes governantes ajudavam mais o mercado da arte do que qualquer outra pessoa. As pessoas que temos actualmente no Governo podem apoiar a cultura e a arte, mas individualmente não vão a concertos, nunca foram a uma galeria, e falo de Hong Kong também. Este é um problema. As pessoas que querem ajudar os artistas são apenas funcionários públicos ignorantes que tentam ser uma espécie de pais destes alunos de arte que acabam os seus cursos, para que sejam felizes.

[quote_box_left]“Se há 15 anos me dissessem que iríamos ter uma Torre Eifeel em Macau…é horrível. Não é apenas o facto de não envolver os artistas locais, mas tudo deveria ser feito por concurso e aprovado pelas instituições e pessoas de Macau”[/quote_box_left]

Mas acredita que o Governo de Macau, em concreto, está a seguir esse caminho?
Não estou a criticar apenas aqui, porque na verdade o nosso Instituto Cultural (IC) ou o museu funcionam muito melhor do que poderíamos pensar. Claro que ainda há melhorias a fazer. Mas as pessoas deveriam ser nomeadas não porque falam cantonense, se são locais ou não, mas sim por mérito e conhecimento. Para cada projecto deveria haver uma selecção, e se for o melhor, mesmo que não fale cantonense, não deve constituir um problema. Macau poderia ser um modelo para a multi-culturalidade. Tudo deveria ser feito por pessoas com coragem e conhecimento para melhorar as coisas.

Ajudou a criar a AFA – Art for All Society. Como olha para a entidade nos dias de hoje? Que desafios encontram?
A AFA foi uma solução encontrada para se fazer e promover a arte. Mas diminuí a minha participação há cerca de dois ou três anos. Vamos mantendo o contacto, mas percebi que ficar lá mais tempo não iria ser benéfico para mim, porque sou uma pessoa ocupada, viajo muito. E não quero fazer esse tipo de trabalho de pedir patrocínios. A minha ideia inicial era de que a AFA não era apenas para os artistas locais, mas seria uma plataforma para as pessoas produzirem e consumirem arte, e seria a primeira do género em Macau. Mas há leis e regras que temos de seguir, então tornou-se uma entidade muito virada para Macau. Percebi que o que fazemos é algo anti-marca, porque um artista faz um trabalho, o Governo apoia-o, muito bem. Mas dou-lhes apoio sempre que é necessário.

Qual o caminho que Macau está a tomar, com os casinos e as réplicas?
Penso que já não é apenas o Jogo que domina, mas podemos atrair as famílias, com as crianças, e temos de pensar como dar-lhes o divertimento e fazer com que isso seja lucrativo, com eventos ou apostar na área da restauração. Penso que nesse sentido Macau está a ir no caminho certo. Há algumas questões, como o facto do Governo querer acabar com o fumo nos casinos. Não sou fumador, mas um turista vem a Macau para jogar, fumar e comer. Concordo em não fumar em restaurantes, ao pé de crianças…mas nos casinos? Estas pessoas jogam, bebem e fumam. Eles vêm cá para se divertir, então onde está o divertimento?

[quote_box_right]“O que poderíamos fazer agora? Criar um órgão independente, composto por artistas ou arquitectos, que não esteja envolvido com o sector do imobiliário, do Jogo ou da construção. Esse órgão deveria decidir o que é bom ou mau para Macau”[/quote_box_right]

O Governo já mostrou a vontade de criar mais museus. Qual deveria ser o modelo a implementar?
Macau já foi o primeiro território na Ásia a ter uma bienal, no tempo dos portugueses, e ninguém fala disso. Macau poderia transformar-se num centro de arte na Ásia e dizer que desde os anos 90 (que promove esse tipo de eventos). Hong Kong era um deserto cultural, Pequim e Xangai não tinham arte, de todo. E Macau já tinha uma bienal de arte. Então deveríamos promover isso sem fazer esse corte entre a Administração portuguesa e o Governo chinês. Macau sempre foi Macau e deve ter orgulho desses pequenos detalhes, para além das diferenças. Nessa altura Macau não tinha nada, tirando um ou outro problema com um Governador, mas era um lugar engraçado e interessante.

Para si, ainda é assim?
Vejo este lugar como uma continuação da cultura da Europa, e que ainda mistura outras formas, como essas coisas americanas que agora existem. Penso que é uma boa plataforma para a arte e cultura, e Macau poderia ser de novo um centro de arte. Temos dois modelos: a feira de Singapura, apoiada pelo Governo, ou a Art Basel em Hong Kong, totalmente privada. Poderíamos fazer uma mistura, com um pouco de apoio do Executivo. Os casinos também poderiam participar, mas a questão é que eles só promovem os artistas de topo, as grandes marcas. Macau deveria ditar um pouco as regras, criando esse órgão, com 30% de artistas locais, e mais um grupo de artistas convidados, para decidir quais seriam os projectos certos.

15 Jun 2015

Visita | Secretário de Estado da Justiça reúne hoje com Sónia Chan

Podem vir aí mais oportunidades de alargar a cooperação judiciária e judicial entre Macau e Portugal. Sem discutir pormenores, António Costa Moura frisou a possibilidade de as duas regiões poderem colaborar no que à adopção de crianças diz respeito. Ideias que ainda não passam disso, mas que estarão hoje em debate

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Secretário de Estado da Justiça, António Costa Moura, vai debater hoje com Sónia Chan diversas ideias no âmbito da cooperação judicial e judiciária, onde se encaixam algumas que já estão em andamento, mas também novas, como é o caso da cooperação no âmbito da adopção.

Realçando o facto de não se querer adiantar às entidades de Macau, Costa Moura disse ao HM que poderá haver a possibilidade de cooperar para que seja possível agilizar o processo de adopção de crianças dos dois locais. “A ideia é eventualmente [discutir] a área da adopção, através da qual podemos enriquecer o relacionamento bilateral. Temos uma lei da adopção que é aberta ao mundo e é uma ideia, mas não é algo que queria lançar sem falar com as entidades [de Macau]”, frisou em declarações ao HM, à margem da recepção oferecida pelo Consulado de Portugal à comunidade portuguesa, que ontem teve lugar.

Costa Moura realça que “não há qualquer acordo firmado” ainda sobre este assunto, sendo que no encontro com Sónia Chan se vai fazer um balanço sobre os acordos que estão, esses sim, já em vigor.

O Secretário de Estado fez questão de deixar firme “a ideia de que o Governo de Portugal quer seguir o trabalho na área dos serviços prisionais, formação de magistrados, segurança pública e no cumprimento escrupuloso dos dois acordos de cooperação”, que versam sobre a transferência de pessoas condenadas e na cooperação em matéria jurídica e judiciária.

Questionado pelo HM sobre se há algo mais que pode ser aprofundado nesses acordos, Costa Moura foi peremptório: há sempre.

[pull_quote_left]O Governo de Portugal quer seguir o trabalho na área dos serviços prisionais, formação de magistrados, segurança pública e no cumprimento escrupuloso dos dois acordos de cooperação[/pull_quote_left]

“A cooperação tem de ser um exercício de dois movimentos, não pode ser imposta por um ou outro lado. Tem de ser querida e tem de resultar em vantagens para ambas as partes. Temos algumas áreas, nomeadamente a prisional – como formação e técnicas de reinserção social – em que estamos já a fazer coisas em conjunto. Mas não há nada que impeça que este quadro de cooperação possa ser alargado a outras áreas do sistema prisional. Mas ainda é prematuro, antes de falar com entidades, isto são [apenas] ideias que temos”, ressalva.

Costa Moura encontra-se também hoje com a Associação dos Advogados de Macau (AAM) e assegura ao HM “estar aberto para discutir” o que os advogados quiserem. O Secretário, que representou Portugal no Dia 10 de Junho, afirma que haverá “uma franca troca de ideias”.

Sereno elogiado, Sónia elogia

António Costa Moura fez ainda questão de agradecer ao cônsul Vítor Sereno pela competência na representação de Portugal em Macau. Sem esquecer “as autoridades locais e a comunidade”, o “profundo agradecimento” mais destacado foi para o cônsul “pelo profissionalismo, competência e dedicação” na sua carreira e na causa pública que é servir os interesses do Estado português no exterior. “Confirmei ao longo desta tarde [ontem] o cumprimento disso mesmo”, disse.

Entre mais de 200 pessoas que ontem encheram a residência consular, discursou ainda Sónia Chan, Chefe do Executivo interina – já que Chui Sai On está fora de Macau. Chan referiu, novamente, a utilização de Macau como plataforma entre a China e os PLP, elogiando os “resultados positivos” das diversas entidades criadas para esse efeito.

Caso disso é o Fórum Macau, que “contribuiu para elevar a influência internacional de Macau e promoveu uma diversificação adequada das indústrias de Macau”, como disse no seu discurso.

[pull_quote_right]A cooperação tem de ser um exercício de dois movimentos, não pode ser imposta por um ou outro lado. Tem de ser querida e tem de resultar em vantagens para ambas as partes[/pull_quote_right]

A também Secretária para a Administração e Justiça assegurou que o Governo da RAEM vai continuar empenhado na promoção do “desenvolvimento dos empreendimentos dos PLP em Macau e no interior da China”, bem como vai “incrementar, em conjunto com o [continente], a cooperação com os PLP, a União Europeia e os países latinos”.

Promessas ainda de que o Executivo vai continuar a respeitar a “multiculturalidade, a promover a economia e a melhorar a qualidade de vida, criando melhores condições de vida e de trabalho para toda a população, incluindo os portugueses residentes em Macau”.

Vítor Sereno, que se fazia acompanhar no palco pelos Conselheiros das Comunidades Portuguesas José Pereira Coutinho e Fernando Gomes – que faltaram às comemorações da manhã por “motivos de trabalho”, segundo a Rádio Macau – prometeu melhorar o trabalho no Consulado.

 


 

Alexis Tam e a importância da comunidade lusa
“Uma coisa é certa. Todos nós pensamos [no Governo] que os portugueses são elementos essenciais para Macau”, afirmou Alexis Tam, em declarações à Rádio Macau, ontem, durante a recepção à comunidade na Residência Consular. Destacando ainda o contributo da comunidade portuguesa para a história e para o património do território, o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura garantiu que o Governo tem criado “as condições” para a comunidade portuguesa se “sentir bem” no território e que a ideia é promover o uso do Português no território. “Estou com esperança que mais tarde a língua portuguesa ainda vai ser muito falada em Macau. É este o meu trabalho e eu faço o melhor possível para chegar a este objectivo”, disse à rádio.

Banda da PSP toca o hino
A banda do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) voltou a tocar o hino português durante o hastear da bandeira de Portugal, nas cerimónias oficiais do dia 10 de Junho. “Pela primeira vez, em 15 anos, tivemos a banda ao vivo. Estou muito grato ao senhor Secretário para a Segurança e ao senhor comandante do CPSP por este gesto de cortesia, de boa vontade, que evidencia claramente o nível de excelência que a RAEM tem com Portugal. Estou muito satisfeito com isso”, afirmou o cônsul-geral de Portugal, Vítor Sereno, aos microfones da Rádio Macau. O Grupo de Escuteiros Lusófonos também marcou presença, bem como seis escolas chinesas e portuguesas.

11 Jun 2015

Português | Mais de metade dos discursos de Chui Sai On sem tradução integral

Desde que assumiu funções como Chefe do Executivo que Chui Sai On nunca fez um discurso em Língua Portuguesa e mais de metade do que disse em público só mereceu uma tradução “do conteúdo essencial”. Agnes Lam mostra-se “surpreendida” com esse facto, enquanto que Amélia António defende uma tradução completa das palavras do governante

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Gabinete do Chefe do Executivo confirmou ao HM que, em mais de cinco anos à frente dos destinos da RAEM, Chui Sai On fez um total de 202 discursos em público, tendo 192 sido proferidos em Chinês. Mais de metade, 116, não mereceram contudo a tradução integral para o Português, a segunda língua oficial do território. Apenas 76 discursos foram traduzidos para Português na sua totalidade.

Por discursos oficiais contam-se não apenas as vezes em que Chui Sai On discursou perante uma audiência específica, mas também as ocasiões públicas em que respondeu a perguntas da imprensa chinesa em eventos públicos. O facto de 116 discursos não terem sido traduzidos na sua totalidade para a língua de Camões significa que as informações passaram por uma selecção prévia antes de serem divulgadas junto da comunicação social.

Segundo a nota oficial enviada ao HM, “o Gabinete de Comunicação Social (GCS) traduziu o conteúdo essencial dos mesmos, publicando-os sob forma de comunicados de imprensa”.

No que diz respeito ao Inglês, “do total de 202 discursos, ao considerar as exigências ditadas pela ocasião, o Chefe do Executivo proferiu dez discursos directamente em língua inglesa (não incluídas as traduções feitas da língua chinesa)”.

A resposta enviada ao HM surge no seguimento do artigo “Isto aqui não é Hong Kong”, que analisava o uso do Português por parte do Governo, com base num artigo publicado no South China Morning Post. Este jornal denunciava uma descriminação face ao Inglês na região vizinha, mas analistas locais consideram que o Português não sofre este tipo de problemas em Macau, sendo que representantes de altos cargos do Governo o usam em situações públicas.

Apesar da inexistência de traduções integrais de algumas palavras de Chui Sai On em público, o Governo considera que “sempre respeitou o uso da Língua Portuguesa na RAEM, atribuindo-lhe alto valor”.

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[quote_box_right]“Isto surpreende-me bastante, porque nunca pensei que não fosse providenciada a tradução integral. Penso que o Chefe do Executivo tem de ser mais consciente em relação a este aspecto” – Agnes Lam, docente da UM[/quote_box_right]

Confrontada com os números, Agnes Lam, docente da Universidade de Macau (UM) na área da Comunicação Social, e ex-candidata às eleições legislativas, mostrou-se surpreendida com a situação.

“Isto surpreende-me bastante, porque nunca pensei que não fosse providenciada a tradução integral. Penso que o Chefe do Executivo tem de ser mais consciente em relação a este aspecto, porque o fornecimento de informações à comunidade deve ser uma prioridade. Há recursos para isso e deveria ser feito, não é justo que não seja providenciada a versão integral.”

A docente lembra, contudo, que a existência de constrangimentos ao nível dos recursos humanos pode ditar que muitas palavras cheguem mais tarde à comunidade portuguesa.

“Claro que a melhor solução seria providenciar toda a informação em Chinês e Português ao mesmo tempo, uma vez que são ambas as línguas oficiais e é esse o protocolo. Compreendo que podem haver constrangimentos ao nível da tradução, mas mesmo que não haja uma tradução integral no momento, os meios de comunicação social portugueses deveriam ter acesso à versão completa mais tarde”, disse Agnes Lam.

Amélia António, presidente da Casa de Portugal em Macau (CPM), refere que a língua mais importante “é, obviamente, o Chinês, dado que a população em geral é o público a que se destinam [os discursos]” e defende que é compreensível que o líder do Executivo fale em Chinês. Contudo, aponta que “fazer a tradução integral em Português seria simpático e era um contributo e uma afirmação do estatuto de língua que o Português tem”.

Uma das representantes da comunidade portuguesa em Macau salienta, no entanto, que não se podem estabelecer comparações com o anterior Chefe do Executivo, Edmund Ho, que dominava o Português. “Estamos perante pessoas com personalidades e maneiras de estar diferentes. Não se pode avaliar o interesse pela comunidade dessa forma. Edmund Ho é uma pessoa com um grande à vontade e com um temperamento muito amigável e expansivo e sempre teve um modo de lidar com a comunidade muito franca e aberta. O actual Chefe do Executivo é uma pessoa mais reservada e com uma forma de estar mais formal”, concluiu Amélia António.

11 Jun 2015

Património | Nova lista sai em breve

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] presidente do Instituto Cultural (IC), Guilherme Ung Vai Meng, anunciou ontem que a população vai saber “brevemente” quais os dez monumentos que estão seleccionados para integrar a lista de património cultural da RAEM. No entanto, a nova lista – que está para ser publicada há vários meses – só deverá ser oficialmente conhecida em 2016.

A justificação, dada ontem por Ung Vai Meng à margem de uma conferência sobre o Centro Histórico, é que falta “tratar das formalidades, tradução e descrição das obras”, algo que, confessa, é “parece fácil, mas não é”. Aos média, o responsável explicou ainda que “dos cem [monumentos] inicialmente escolhidos, encontraram-se 70 que têm mais valor históricos” e que especialistas vieram a Macau ver as peças quatro vezes para fazer uma avaliação através da visita a estes monumentos, tendo escolhido os “dez que reúnem condições mais maduras”.

O mesmo representante disse que a entidade está agora na fase final, pelo que falta apenas preencher algumas formalidades e preparar os documentos para pedir a inscrição destes dez na lista já existente. “Depois do requerimento estar pronto, são 12 meses até [a lista final] estar pronta”, sublinhou.

Contas feitas, serão 138 os itens incluídos na lista de património cultural da cidade. No entanto, a escolha não se fica por aqui. É que a selecção de itens para integrar a lista é uma actividade em constante mudança. “Depois vamos procurar os potenciais e outros novos”, contou Ung Vai Meng aos média. Antes da inclusão destes na lista, o IC vai proceder à realização de uma consulta pública.

11 Jun 2015