Hugo Teixeira, fotógrafo | O bambu e os mestres

No próximo dia 13 é inaugurada a exposição “Transcience: Daredevils and Towering Webs”, um conjunto de fotografias que retratam andaimes de bambu e os mestres que os montam, pela lente de Hugo Teixeira, na sua primeira exposição em Macau. O HM foi falar com o homem atrás da câmara

O que podemos esperar desta exposição?
Podem ver cianotipia e ambrotipia, são os dois processos de fotografia que prefiro usar. Na cianotipia tiro fotografias num tom azul sob papel de aguarela, que é um processo antigo, enquanto a ambrotipia é fotografia a preto e branco sobre vidro. São ambos processos do século XIX. As cianotipias são imagens de diversos edifícios em Macau cobertos por andaimes em bambu, um projecto que comecei há algum tempo só por interesse pessoal. Depois, a ambrotipia são retratos dos mestres que montam esses andaimes em bambu. A ideia foi unir os dois processos num mesmo tema mas, ao mesmo tempo, ter duas vertentes diferentes para se poder perceber o valor e as diferenças entre ambos.

De onde veio a ideia de fotografar andaimes?
Quando cheguei a Macau adorava andar pela cidade, perdia-me durante horas. Vivo aqui há seis anos. Quando cheguei houve diversos temas que me interessaram, que me chamaram a atenção e que comecei a fotografar, só por brincadeira. Depois, mais tarde, explorei com tempo e cuidado. Os andaimes foi um tema que permaneceu até hoje, e que acabou por interessar o João Ó, que me convidou para fazer uma exposição. Ele também trabalha em bambu, fez várias instalações e estruturas com esse material. Foi um tema em que pude ligar os dois processos fotográficos, no fundo, a fotografia que eu gosto de fazer.

Como começa o seu interesse pela fotografia?
Comecei por roubar a máquina da minha mãe, tirar umas fotografias e depois levar nas orelhas por cortar cabeças, pernas, etc. Mais tarde, fui atraído pela tecnologia. Tinha um amigo que comprou uma daquelas primeiras máquinas automáticas, DSLR. Gostava de ver como aquilo funcionava. Foi um interesse partilhado com outros amigos, isto com 17, 18, 19 anos, e começámos a fotografar como hobby. Nesse tempo, claro, ainda analógico, o digital ainda estava a começar, mas foi aí o princípio.

O gosto aprofundou-se…
Depois de acabar o curso universitário fui para Portugal e interessei-me mais pelo lado de fotojornalismo e da fotografia documental. Nos Estados Unidos tinha começado o curso de Belas-Artes, mas depois vi que não teria emprego, e virei-me mais para a linguística. Fui criado com duas línguas e tinha o interesse por línguas e comunicação. Quando fui para Portugal, fiz o curso de fotojornalismo e fotografia documental na ETIC e depois vim para a China. Comecei a explorar temas de uma forma mais documental, mas ficou-me o interesse por estes processos antigos que aprendi nas Belas-Artes. Tinha um professor que até o papel produzia, fazia as fotografias de raiz. Naquela altura fiquei curioso, mas acabei por não explorar logo as técnicas. Aí fazia mais fotografia a preto e branco, papel, mais tradicional. Mas aquilo ficou.

Alguma ideia porquê?
Estas técnicas antigas já tinham sido a última tecnologia de há muito tempo. Gosto da ideia de pegar numa tecnologia ultrapassada e explorá-la como alternativa.

Curiosa forma de viver a fotografia na era do Instagram.
O Instagram, as selfies, toda essa cultura não me parece que tenha vindo substituir nada do que era feito antes, mas é uma nova vertente. Pessoalmente não me interessa, não gosto muito de partilhar nas redes sociais, mas aprecio como outro meio, outra opção.

Quais são as suas principais influências?
Toda a escola de Dusseldorf, adoro tipografias, repetir o mesmo tema para explorar uma estrutura. Ultimamente, Mark Klett e Trudy Smith. Eles começam do arquivo fotográfico e tentam colocar essas imagens no contexto contemporâneo. O Mark, por exemplo, fez um grande trabalho com fotografias de arquivo de São Francisco em 1906, depois do grande terramoto que destruiu a cidade. Depois fotografou os mesmos locais em 2006, um século depois. Trudy fotografa temas mais sociológicos. Gosto muito do trabalho que fez sobre a forma como se criou a identidade canadiana. Partiu daquelas primeiras imagens dos territórios não povoados, novos territórios recém-colonizados do Canadá.

As suas influências são só fotógrafos?
Não, também cineastas, como por exemplo Wes Anderson. Gosto daqueles enquadramentos direitinhos, tudo muito simétrico, de frente, ou de cima. Os andaimes em bambu são estruturas grandes, muito simétricas. É uma forma diferente de olharmos para os edifícios, são coisas muito temporárias, mas permitem-me focar-me apenas na forma, em vez de ser o edifício tal, ou a igreja tal. Fica simplesmente a forma, depois resta-me procurar um ângulo que permita captar aquele retrato do edifício. Acho um desafio interessante.

Como é o seu processo criativo?
Por exemplo, quando vou a caminho do trabalho, dou uma volta a pé, vejo uma coisa e capto com o telefone. Ah, porque eu sou professor de Inglês, trabalho no Instituto de Formação Turística, já estive no Politécnico, no Externato de São José. A fotografia sempre foi um hobby. Mas gosto de andar e procurar coisas para fotografar, excepto no Verão, em que não dá para andar por aí com a máquina. Depois volto, com mais tempo, porque estou a fotografar com máquinas de grande formato. Normalmente, cativam-me estruturas, enquadramentos, não sei por que me chamam a atenção, mas há algo diferente a que quero voltar, que quero ver com mais cuidado. Primeiro ando à procura dos ângulos certos, como são edifícios enormes, para variar o ângulo, por vezes tenho de me deslocar um quilómetro. Depois volto com a máquina, com o filme, com tripé, e capto quatro ou cinco fotogramas. O passo seguinte é ir para casa revelar, tentar não deixar cair os negativos no meio do chão, tentar não abrir a máquina com as luzes ainda acesas. Metades das vezes tenho de voltar e fotografar outra vez (risos). Depois da revelação vem a digitalização. Grande parte das imagens que vou mostrar já tirei há um ano ou dois. Vivo algum tempo com as imagens, depois faço ampliações digitais sobre acetato, assim como algumas pequenas provas para ver se realmente resulta. Só posteriormente é que faço o formato maior.

E o retrato dos mestres de bambu?
A ambrotopia teve um processo completamente diferente. Convidámos os mestres lá para minha casa, para o terraço. Foi um processo mais simples, fiz uma ou duas imagens, eles perderam a paciência e foram-se embora. Fica aquilo, porque uma imagem é final, é o positivo sobre vidro. Digitalizei mais tarde porque aquilo ainda leva verniz. É um processo mais rápido. Na cianotipia faço grande, depois repito três, quatro vezes até acertar o contraste.

Como surgiu esta oportunidade de retratar os mestres?
Os retratos foram com a ajuda do João Ó, que é o curador da exposição. Ele trabalha já há algum tempo com os mestres do bambu, inclusive convidou alguns para ir a Portugal montar bambu no Museu de História Natural e Ciência de Lisboa. Aproveitei esses elos que ele estabeleceu para fazer a parte dos retratos. Nós partimos da ideia de querer mostrar os processos, não queria apenas mostrar fotografias aleatoriamente. Peguei nos edifícios que já tinha fotografado há algum tempo e tentei com a ambrotipia. Acho que retrata as pessoas de uma forma muito interessante, muito diferente. Como o João já tem estas relações estabelecidas, aproveitámos para convidar os mestres para irem lá a casa. O processo demorava muito tempo, e nalguns casos os senhores já tinham alguma idade, eram reformados, mas porque um amigo de um amigo convidou, eles apareceram. Fazia uma imagem, revelava, e eles perguntavam: ‘Está tudo bem, posso ir embora?’, ‘Pode ir embora, muito obrigado senhor Ho’. Outros que conheciam melhor o João ficavam. Bebiam umas cervejinhas, fumavam um cigarrinho e conversávamos um pouco. Mas foi o João que permitiu fazer a ligação. Porque eu, embora esteja cá há seis anos, não falo chinês para poder estabelecer aqueles elos.


As teias e os mestres

O nome da exposição é “Transience: Daredevils and Towering Webs”, e estará patente na Taipa Village Art Space, entre 13 de Janeiro e 31 de Março. Usando técnicas que remontam ao séc. XIX, o luso-americano Hugo Teixeira foca uma das características de Macau: os andaimes de bambu que enchem a cidade, assim como os mestres que os construíram. As estruturas assemelham-se a gigantescas teias, e são o suporte das aranhas que ousam desafiar a gravidade para construir os prédios de Macau. Também os mestres que montam estas estruturas foram alvo da lente de Hugo Teixeira, em retratos com uma força que só uma técnica cuidada consegue captar.

5 Jan 2017

Desejos em Confronto 中俄边境的一些镜头

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o Verão de 2014, Davide Monteleone iniciou uma viagem ao longo da fronteira da Rússia com a China em busca de algo que fosse real e fizesse sentido. Nessa altura o fotógrafo italiano vivia em Moscovo há mais de uma década. As imagens dos locais remotos, capturadas pela sua objectiva, trazem-me à ideia as palavras de Marcel Proust: “Não conseguimos alterar a realidade em função dos nossos desejos, mas aos poucos os nossos desejos vão-se alterando.”

Juntei aqui quatro fotografias cujo significado, tal como um desejo secreto sem pretensões a tornar-se realidade, não se altera nunca.

Monteleone: “Num local remoto como este os russos ficam à espera que algo aconteça, ao passo que os chineses tentam fazer qualquer coisa.”

Réplica da Catedral de São Basílio. A original, mandada construir no séc. XVI por Ivan O Terrível, está na Praça Vermelha em Moscovo. A réplica que aparece na foto foi construída pelos chineses em Jalainur. As torres pintadas e as cúpulas em forma de cebola são ocas; dentro do edifício aloja-se um museu dedicado à Ciência. © Davide Monteleone
Yu Shi está a estudar em São Petersburgo para vir a ser padre ortodoxo. A foto foi tirada em Harbin, na China. © Davide Monteleone
Um vendedor de comida espera os clientes na margem do rio Songhua, em Harbin, sob as duas pontes ferroviárias – a velha e a nova – pertencentes à Linha Chinesa do Leste. A ponte antiga, à esquerda, foi construída pelos russos no início do séc. XX. A nova, à direita, foi construída pelos chineses. © Davide Monteleone
Passageiros no terminal ferroviário da cidade de Manzhouli, uma pequena cidade chinesa junto à fronteira com a Rússia. © Davide Monteleone
21 Dez 2016

José Drummond na lista final do Sovereign Asian Art Prize

É a terceira vez que José Drummond, artista plástico português radicado em Macau, é nomeado para o prémio mais importante da região vizinha na área das artes. O reconhecimento lá fora não acompanha o que se passa em casa

[dropcap]T[/dropcap]rata-se de uma nomeação directa, conquistada pela presença este ano no Sovereign Asian Art Prize. José Drummond foi finalista na edição de 2016, tendo o seu trabalho sido mostrado na Christie’s, garantindo um lugar na competição do próximo ano. Regressa ao mais importante prémio das artes em Hong Kong com três trabalhos, todos eles feitos com caixas de luz. É a terceira vez que o artista português, a viver em Macau há mais de 20 anos, entra na lista daqueles que a organização entende serem os melhores da Ásia. “É sempre bom. Não acho que os prémios sejam completamente reveladores do trabalho que as pessoas fazem no trajecto da sua carreira, mas são veículos de reconhecimento que acabam por ser importantes, especialmente nos dias de hoje”, comenta José Drummond ao HM. “Nesse sentido, é óptimo.”

Organizado anualmente, o Sovereign Asian Art Prize convida artistas contemporâneos, que estejam a meio da carreira, para submeterem três trabalhos online. As obras são depois avaliadas por um júri da região constituído por especialistas em arte, que escolhem os 30 melhores trabalhos.

É esta selecção que vai estar ex- posta num local público em Hong Kong, sendo que se segue depois uma nova apreciação. O artista vencedor recebe 30 mil dólares norte-americanos. À excepção da obra vencedora, os restantes trabalhos são leiloados durante a gala de atribuição dos prémios. Além da obra seleccionada pelo júri, é ainda distinguido o trabalho que mais votos recebeu do público que foi ver a exposição.

“É um dos prémios mais importantes da região Ásia-Pacífico”, contextualiza José Drummond. “Já começo a ser um repetente, é a terceira vez que estou nesta fase. Penso que será a primeira vez que acontece a um artista de Macau.” O artista português foi o único do território presente na fase final da iniciativa.

DA NOITE E DO DIA

Na edição de 2017, Drummond concorre com um media que tem uma presença importante na sua obra: as caixas de luz. “Tem que ver com o meu interesse em espelhar todos estes conceitos à volta da luz e da sombra. Depois, embora sejam fotografias tiradas no momento, há sempre nos meus trabalhos uma condição teatral, cenográfica, quase encenada. É por isso que tenho optado, para estas séries, pelas caixas de luz.”

As três obras a concurso resultam de fotografias tiradas à noite, um momento em que a cidade se transfigura. Na sequência de um trabalho que tem vindo a fazer, as imagens obedecem a uma narrativa poética, que “tem que ver com o estado de desassossego, com a insónia”.

No primeiro trabalho, “Think of the saddest thing in your life”, vê-se uma fotografia tirada num lago. “É só água. Digo, a determinada altura no texto, como a água pode ser tão opaca quanto a vida. Temos esta ideia de que a água é transparente, mas não é”, observa. “Mais uma vez, tem que ver com a teoria da luz, com as cores. Nesse trabalho usei luz que transformasse a cor normal do lago. Ficou azul porque forcei a que casse assim.”

“All those moments at night when you’re not with me”, a segunda fotografia, “é mais próxima de um instantâneo” e está relacionada com uma investigação que o artista plástico tem estado a fazer, associada à ideia da “ausência do outro, que nos leva a deambular pelas ruas”.

Trata-se de uma série em que José Drummond procurou captar situações que entende serem interessantes na cidade. A imagem em questão mostra o recanto de uma pessoa que “colecciona coisas inúteis que recolhe do lixo”. “Colecciona garrafas de plástico e pendura-as à entrada de casa. Tem as portas de casa abertas e consegue-se ver tudo o que se passa lá dentro.” Há uma certa organização no espaço fotografado, explica: “Tem uma cadeira pendurada, há uma lógica muito pessoal que nos faz confusão. Esta pessoa em especial tem sido objecto da minha investigação há algum tempo, com fotografias em diferentes momentos do dia e com objectos diferentes”.

“Não acho que os prémios sejam completamente reveladores (…), mas são veículos de reconhecimento que acabam por ser importantes.”
JOSÉ DRUMMOND, ARTISTA PLÁSTICO

A fotografia enviada para Hong Kong tem “um ar quase de ficção científica”. “Não tenho qualquer intervenção na imagem, a não ser clicar”, refere. No entanto, o lado cénico mantém-se. “Tudo aquilo é encenado, mas por outra pessoa.” A fotografia insere-se numa série em que Drummond vai à procura de pessoas que estão, de certa forma, fora do que é convencional, “personagens que são deixadas para trás” na sociedade.

O último trabalho, “When my hands make your heads spin”, tem a morte como subtexto. “É uma reflexão. São dois ravers no final de uma festa. O final da festa significa também quase o final do corpo. A paz é quase morte, naquele sentido. Depois de toda a excitação e do excesso que possa ter havido, há depois este momento, completamente oposto”, mostra. “Esta dualidade entre vida e morte é um lado que tenho andado a explorar. É muito difícil falar sobre a morte e registá-la. Nunca conseguimos fazer uma boa representação da morte porque não sentimos a nossa; só a sentimos através da morte dos outros.”

LÁ FORA

Nos últimos anos, José Drummond tem sido mais valorizado fora de Macau do que em casa. “De algum modo, parece que o meu trabalho vai sendo mais reconhecido fora de Macau do que aqui”, diz.

Além do lugar conquistado entre os finalistas da edição de 2016 do Sovereign Asian Art Prize, o artista teve o seu trabalho exposto na Berlin Transart Trienalle, em Agosto passado.

Durante este ano, participou em festivais de vídeo de Portugal, Espanha e Áustria. Juntamente com a artista Peng Yun, teve uma obra no Rosalux Project Space em Berlim. Por cá, fez um trabalho especificamente para a última edição do Festival Literário Rota das Letras.

José Drummond teve ainda um ano muito activo enquanto curador. Foi responsável por mais uma edição do VAFA e do festival de vídeo experimental EXIM, além do papel desempenhado na selecção de obras para a exposição que assinala o nono aniversário da Art For All, cuja inauguração está marcada para esta semana.

O ano do artista plástico termina com uma projecção de um trabalho na Cinemateca Paixão, no próximo dia 28, que serve de introdução à obra que, em Janeiro de 2017, vai apresentar.

20 Dez 2016

Des-fotar: contra o vórtice das imagens

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]conteceu em Maputo. Dois casais. Um deles tinha uma teleobjectiva e entretinham-se a tirar fotos em grupo. Estranho, faziam tudo para tapar a cara. Intrigava-me esse gesto de antepor um punho, três dedos abertos, a mão cerrada entre o clic e o rosto. Punham-se em pose para, afinal, ocultar a cara. Às duas por três, uma transpôs o murete que separa a esplanada do passeio e pediu à amiga, tira-me uma foto. E um segundo antes da outra carregar no botão ela disparou o braço para a frente com os dedos em vê a tapar o rosto e nomeou a coisa: Des-foto. Era um gesto pensado e por desconcertante que pareça tem atrás de si um conceito.

A Des-foto é o oposto da Selfie ou a sua simétrica paródia?

Não imagino se a Des-foto é invenção deles ou a imitação de uma vaga que pela primeira vez vi aflorar em solo moçambicano. A Des-foto organiza uma tensão na imagem: o sujeito aderiu à representação mas suspendendo-a, antepondo à sua imagem algo que a trunca. É uma espécie de burka da fotografia?

Por outro lado, se isto for uma moda, corresponderá este novo rito a uma reacção epidérmica, contra-fóbica, à saturação de imagens em que naufraga o mundo – ainda que usando o pêlo do cão agressor para curar a mordidela?

Gosto da foto que encima esta crónica. É de um fotógrafo moçambicano e chama-se….. O visado reage, como se avisasse: “eh, sou pobre mas resta-me o direito à minha imagem!”. E contra a imagem da sua pobreza contrapõe a dignidade de manter isso em reserva, exige o recato do silêncio.

Uma vez viajei pelo Yémen com um realizador que para disfarçar o seu mal-estar, naquele mundo distintíssimo do nosso, se armava com duzentas máquinas a tiracolo. Por milhares de livros que tenhamos lido, por fotos que tenhamos visto, por volumosa que tenha sido a informação digerida, quando estamos no terreno é o corpo quem reage e não a nossa armação racional. Ele defendia-se com a brutalidade do seu aparato tecnológico. E só conseguia lidar com a fobia que o tomava através da mediação da imagem, do antídoto da distância.

Atravessávamos Hadramouth, um longo oásis ligado às antigas rotas das especiarias, e vimos um grupo de pedreiros a amassar tijolos com a mesma técnica dos tempos bíblicos. Eu dispunha-me a fazer uma reportagem e parámos o carro. Ele correu, para despachar o serviço, e antes de qualquer conversa, do mínimo protocolo, rondou os pedreiros como um urubu e clic, clic, zás, catrapás, colheu duas dúzias de imagens em cima dos atónitos iemanitas. Instalou-se um clima de hostilidade que impediu qualquer conversa útil: os pedreiros dispensavam ser souvenires, e como tínhamos agido sem consentimento saímos dali de mãos vazias e, por sorte, vivos.

Sem consentimento: é assim que mais de metade das imagens percorrem o mundo, através das redes sociais, das revistas, dos canais televisivos, formatando opiniões a partir de simulacros destituídos de contexto. É o modo mais perigoso de sobrepormos à realidade “um banco de irreais” que deformam a nossa percepção e a embaraçam em estereótipos e lugares-comuns que nos coarctam o raciocínio. Temos de reaprender a pensar para-além das imagens, a desnaturalizá-las, mais ainda quando com o advento das imagens digitais se torna suspeita a velha máxima de que “uma imagem vale mil palavras”.

Pior, não apenas proliferam as imagens em que não há nada que ver, como assistimos, como insinuou Braudillard, a uma escalada do politeísmo que tem agora nos objectos e nas suas imagens o seu avatar: «Hoje, todas as coisas querem manifestar-se. Os objectos técnicos, industriais, mediáticos, os artefactos de toda a classe, querem significar ser vistos, ser lidos, ser gravados, ser fotografados. Cremos fotografar tal ou qual coisa por prazer e em realidade é ela que quer ser fotografada nada mais somos que a figura que os põe em cena, secretamente movidos pela perversão auto-publicitária de todo o mundo circundante. (…) Já não é o sujeito quem representa o mundo (i will be your mirror!): é o objecto quem refracta o sujeito e, subtilmente, por meio de todas as nossas tecnologias, e lhe impõe a sua presença e a sua forma aleatória.»

Dir-se-ia, estamos possessos.

Será por isso que uma democracia apoiada sobretudo na retórica das imagens é uma democracia enlanguescida, que já não reflecte no significado das suas emoções colectivas e se limita a traduzi-las em espectáculo? Eis o triste ensinamento que nos trazem os “talk-shows”, cujo formato impede o raciocínio de desenvolver-se e obriga à lógica redutora do slogan, os “reality shows”, os últimos episódios da democracia-capturada-pelos-media, no Brasil, e a deprimente campanha para as eleições nos EUA.

Temo que Des-fotar não passe de mais uma moda idiota, mas se trouxer a alguns a necessidade de reflectir sobre o que é uma imagem, o que é uma representação, e se os levar em conformidade a proceder a uma espécie de “economia das imagens”, constituirá, afinal, um acto ecológico. E talvez ajude aqui um dito de Blanchot, que podemos usar como lema: “todos os dias há uma coisa para não ver”.

17 Nov 2016

Instagram | Encontro no território pretende promover turismo internacional

Macau no Instagram e fotografado pelos “melhores”. Foi a ideia do Turismo para trazer à região os melhores “iggers” de Portugal e juntá-los com os da terra, para que as imagens, para além dos casinos, possam circular pelo mundo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] primeiro “Instameet Macau” aconteceu no passado sábado. O encontro que normalmente convida os mais prestigiados “iggers” foi agora aberto ao público numa iniciativa do Turismo de Macau em Lisboa. No total, a iniciativa contou com 15 participantes entre locais, oriundos da China continental, portugueses e até de Marrocos que, com o seu olhar, contribuíram para dar a conhecer a terra além dos casinos.

Em época de “diversificação do turismo da região, este foi um encontro que, aliado às novas tecnologias e tendências, pretendeu dar a conhecer a RAEM ao mundo”, afirma o organizador e representante dos escritórios do Turismo de Macau em Lisboa, Gonçalo Magalhães. Neste sentido, convidou duas referências portuguesas para uma semana no território de modo a que este fosse documentado de “outra forma”. A estadia de Ana Morais e Kitato, os “iggers” convidados, terminou com aquele encontro aberto que deixou nos participantes a sensação de “acontecimento a repetir”.

Recepção ventosa

Da semana que recebeu os instagrammers de Portugal, Gonçalo Magalhães faz um balanço “muito positivo”. “Apesar das adversidades que encontraram à chegada de Portugal, porque não só apanharam um, mas sim dois tufões, considero que não parámos de fotografar, de descobrir sítios e de procurar sempre mais coisas em Macau”.

O encontro que marca o final da viagem, ao contrário do que tem sido feito pelo mundo fora, foi pela primeira vez, aberto a todos, o que resultou numa mistura de culturas que “não se esquece”.

“O Turismo de Macau deu-nos a oportunidade de trazer aqui este encontro de “iggers” que, aliado ao P3 através do Luís Octávio Costa, proporcionou um bonito encontro cultural” descreve Ana Morais, convidada e representante da associação Gerador, ao HM, ainda profundamente impressionada com Macau. “Esta é a minha primeira experiência na Ásia e acho tudo maravilhoso”, explicou enquanto comentou que não se sentiu num país estranho. Outro ponto que a responsável pelos encontros refere é “forma simpática das pessoas acolherem os que vêm de fora”.

Já Luís Octávio Costa vai de regresso a casa com a sensação  de que Macau é a verdadeira terra de misturas e contrastes. “Vim, enquanto Kitato,  e fui convidado pelo Turismo de Macau para fazer o que faço no instagram, ou seja, mostrar a minha perspectiva dos sítios por onde passo e não fazer os postais que normalmente se fazem das cidades” sendo esta a característica “mais interessante deste tipo de iniciativas”. Como também é editor do P3, as coisas acabam por se confundir e acaba por mostrar as galerias dentro da publicação.

Para o “igger” um dos motivos a explorar na RAEM “são os prédios e os seus recortes e há muitas pessoas que vêm aqui para fotografar isso mesmo”. Por outro lado, “o que atrai em Macau a nível visual, e para o instagram, é a vida nas ruas e as suas pessoas, sendo que a plataforma obriga a descobrir estas coisas”.

Ligados à cidade

No encontro participou também o arquitecto residente Nuno Assis, já reconhecido pela actividade no instagram. “Este tipo de eventos é importante para a promoção das cidades”, diz. Apesar de não serem muito conhecidas na China, as promoções das cidades através do instagram, na Europa, já começam a ser uma opção tomada por muitas cidades”. Nuno Assis considera que “é importante a cidade e o Governo entenderem que este tipo de eventos são fundamentais para a promoção da cidade e para a aproximação com as pessoas”.

Já Sam, vem da China continental a convite dos colegas que conhece via instagram. Ao saber do evento, não hesitou e juntou-se ao grupo . Para o “igger”, “é um evento muito positivo, não só como promoção do presente mas como “memória para o futuro porque Macau está a mudar muito e é bom ir registando os momentos para que fiquem nas recordações”, considera.

As fotografias e os vídeos resultantes do encontro podem ser acompanhados no Instagram a partir das “hastags” #osfabulososinstameetsgerador, #gerador, #experiencemacaoyourownstyle, #wowmacau e #macau.

25 Out 2016

Core Studio, estúdio de fotografia | Nuno Veloso, director

Pouco mais de um ano depois de ter aberto a empresa de audiovisual Core Productions, o fotógrafo Nuno Veloso cansou-se de ter uma enorme sala vazia e decidiu abrir o Core Studio, que pretende proporcionar diferentes experiências no mundo da fotografia

[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]uno Veloso sempre fotografou modelos, actores e o fabuloso mundo da moda e do entretenimento. Um ano após ter aberto uma empresa de fotografia e vídeo, a Core Productions, o fotógrafo português decidiu ir mais além e abrir o Core Studio, um espaço que faz lembrar o velhinho fotógrafo, virado para as pessoas.
“O Core Studio é um estúdio aberto ao público. Fotografamos pessoas individuais, não é para clientes ou negócios, no sentido de fotografar produtos ou serviços, mas fotografamos pessoas para fazerem os seus retratos, famílias, crianças, bebés, recém-nascidos. Aqui na Ásia as pessoas gostam muito de fotografar os seus cãezinhos e gatinhos, então o Core Studio é como um estúdio de produção, mas para pessoas”, disse ao HM Nuno Veloso.
A inauguração do espaço aconteceu na passada sexta-feira e o fotógrafo garantiu que no Core Studio não há lugar à fantasia. “É mesmo focado nas pessoas e é quase voltar ao fotógrafo antigo. Nós no Core Studio não queremos colocar as pessoas a serem retratadas na fantasia, mas queremos tirar o retrato delas próprias. Não vamos ter os vestidos e mil e quinhentas coisas em que a pessoa fica escondida no meio daquilo tudo. Se os nossos clientes quiserem ser fotografados assim, não vamos dizer que não, mas estamos mesmo a apostar no retrato da sua própria identidade e não de uma fantasia.” core studio2
O Core Studio apresenta-se como um filho da Core Productions, mas é uma espécie de prenda que Nuno Veloso quer dar a Macau, a terra onde cresceu. “A Core Productions, como produtora de audiovisual, só precisa de uma sala e já não aguentava estar sentado numa secretária e ter ali um espaço com tanto potencial e não fazer nada dele. E foi por aí que decidi abrir o Core Studio, sendo algo onde eu já tenho alguma experiência. Cresci aqui, considero-me uma pessoa de Macau e é uma forma de eu poder dar alguma coisa a Macau, tendo um serviço profissional para as pessoas serem fotografadas”, apontou.

Packs e cocktails

No Core Studio fazem-se retratos de pessoas, mas também de namorados e de famílias, de mulheres grávidas ou dos seus filhos recém-nascidos. Há até a possibilidade de fotografar animais de estimação. Tudo isso com base em pacotes com um preço pré-definido.
“O que eu quero que aconteça no Core Studio é um sítio onde as pessoas vão para serem fotografadas mas que para elas seja uma experiência também. Vai ser divertido de certeza absoluta, porque é essa a nossa forma de trabalhar, e vamos ter pequenas ofertas conforme os packs que vão escolher. Vão poder ter cocktails à entrada, alcoólicos ou não. Têm pequeninos luxos e vão sentir-se quase como estrelas durante aquele tempo em que estão ali para ser retratadas”, contou Nuno Veloso.
O Core Studio pretende ainda ser um espaço de partilha de experiências, já que serão feitos convites a outros fotógrafos para trabalhos. “Sou o dono do estúdio, mas conheço fotógrafos muito melhores do que eu, a fotografar mulheres grávidas ou recém-nascidos, por exemplo. O meu background é mais ligado ao mundo da moda e a fotografar actores e dançarinos e isso vai ser fotografado por mim. Mas nem tudo vai ser fotografado por mim.”
Nas paredes do estúdio de fotografia há ainda lugar para a exposição das fotografias de outros. “
Também temos uma área a que chamo de micro galeria para todos os outros fotógrafos que queiram expor as suas fotografias. De tempos a tempos vamos mostrando outros trabalhos”, explicou Nuno Veloso.
Com o Core Studio, Nuno Veloso quis aproveitar um nicho de mercado e proporcionar momentos diferentes na hora de fotografar, algo que não se consegue com um simples smartphone. core studio4
“Todos somos fotógrafos hoje em dia, e até podemos ter uma máquina muito boa, mas é uma experiência diferente ir a um estúdio profissional de fotografia. Eu chego a dizer que é como uma pessoa ir ao cinema, passar lá uma hora e meia e ficar com as imagens e o filme na memória. E ir a um estúdio de fotografia passa lá uma hora e o que traz consigo, além das memórias, são as fotografias para as poderem ver um dia mais tarde”, rematou.
O Core Studio tem uma página do Facebook com o mesmo nome e fica na Alameda Carlos de Assumpção, Kin Heong Long, 5A.

11 Nov 2015

Casa Garden | World Press Photo 2015 acontece em Outubro

Este ano, as problemáticas contemporâneas estão no centro do World Press Photo, o maior concurso de fotojornalismo do mundo. A 58.ª edição conta com transsexualidade, relações amorosas e trabalho fabril no pódio. A mostra vai estar em Macau entre 10 de Outubro e 1 de Novembro na Casa Garden

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Casa Garden é novamente palco da exposição itinerante do World Press Photo 2015, mostra de fotografia a nível mundial. O vencedor desta 58.ª edição é o dinamarquês Mads Nissen, um jornalista do jornal diário Politiken, representado pela Panos Pictures.
A exposição, organizada pela Fundação Oriente, acontece entre 10 de Outubro e 1 de Novembro. Este “concurso anual de fotografia jornalística” conta com o apoio da Casa de Portugal. Este ano, participaram na competição quase 5700 fotógrafos profissionais de 131 países, incluindo Austrália, Bangladesh, Dinamarca, China, Bélgica, Eritreia, França, Irlanda, Polónia, EUA, Reino Unido, Turquia e Suécia. world press photo
A fotografia vencedora mostra Jon e Alex, um casal homossexual, num momento íntimo em São Petersburgo, na Rússia. “As minorias sexuais enfrentam discriminações de ordem social e legal, assédio e mesmo ataques violentos de ódio por parte de grupos conservadores nacionais e religiosos”, explica a Fundação em comunicado. A fotografia seleccionada está integrada num projecto pessoal de Nissen, destinado à Scanpix. O dinamarquês ganhou ainda o primeiro lugar no prémio Contemporary Issues.
As películas premiadas são apresentadas em exposições numa centena de cidades por mais de 45 países. As pessoas têm ainda direito a fazer download de uma aplicação móvel gratuita, através da qual é possível aceder às fotografias em nove línguas, conhecer a história de cada uma delas, ter acesso a testemunho dos fotógrafos e outros trabalhos dos autores.

Mundo contemporâneo

As três obras principais inserem-se na temática da presente edição – “Problemáticas Contemporâneas”. Na exposição são assim abordados conceitos relacionados com a orientação sexual ou a fuga de países em guerra.
O segundo prémio foi atribuído ao fotógrafo chinês Ronghui Chen, por ter captado um trabalhador fabril em Yiwu, munido de um chapéu de Pai Natal. A cor encarnada do adereço funciona como acessório à própria fotografia, que coloca o jovem trabalhador numa luz também ela vermelha, junto ao material que utiliza.
O terceiro galardão foi parar às mãos do italiano Fulvio Bugani, fotógrafo há mais de 15 anos e com uma série de trabalhos feitos em associação com organizações não governamentais e de ajuda aos desfavorecidos, incluindo a Amnistia Internacional. A fotografia que valeu o prémio a Bugani faz parte de uma série que versa sobre a problemática da transsexualidade na Indonésia, onde este grupo é apelidado de “waria”, nome que aglutina “homem” e “mulher” na mesma frase. A película em questão não tem cor e mostra várias mulheres originárias daquele país à porta da Pesantren Waria Al Fatah, uma escola inteiramente dedicada aos transsexuais, em Java.

8 Set 2015

Fotografia | Artista paquistanês em galeria de Hong Kong

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] artista de fotografia paquistanês Mo Shah expõe uma série dos seus mais recentes trabalhos na galeria Fabrik de Hong Kong. “Test Pattern” é inaugurada hoje e fecha portas a 21 de Setembro, com oportunidade para conhecer o artista às 18h30 desta tarde. Actualmente a viver na RAE vizinha, tem desenvolvido obras com conceitos alicerçados na adoração, na fé, em fragmentos da cultura pop e simbolismo obscuro. De acordo com a organização, esta trata-se de uma exposição de “composições que consolidam um sem número de interesses do artista nas narrativas que exploram a procura desesperada pela beleza”.

Vida errática

Mo Shah nasceu na cidade da Karachi, no Paquistão, mas cedo começou a sua jornada interior e artística, tendo estado na Coreia do Norte, no Bangladesh e vivido em Nova Iorque, Bruxelas, Londres e Hong Kong.Mo Shah O fotógrafo e artista visual licenciou-se na Universidade de Nova Iorque e foi nessa cidade que começou a fazer as suas experiências na área. “O extenso arquivo de viagens de Shah está bastante presente na sua arte, que explora a relação entre indivíduos e instituições enquanto representações da sociedade”, esclarece a organização. Há, ainda, uma clara adoração pelo mundo do cinema nos trabalho do paquistanês, com várias homenagens à sétima arte a tomarem forma junto de locais icónicos. “No seu trabalho prevalecem o fascínio pelo cinema, história, existencialismo, surrealismo, iconografia e o oculto”, frisa.

Técnicas televisivas

“Transmission Eternal” foi a primeira exposição a solo do artista e teve lugar em 2013 na sua terra-natal, na cidade de Lahore. Foi no mesmo ano que venceu o Prémio de Escolha dos Críticos na Exposição Nacional de Arte Fotográfica. Mais recentemente, Shah esteve presente para integrar a Exposição de Arte Contemporânea da Ásia, incluindo na edição deste ano. Três das suas produções podem ainda ser apreciadas no Museu de Arte Contemporânea de Seul, na Coreia do Sul. O museu adquiriu recentemente estas três peças para a sua exposição permanente.
A mostra que estreia amanhã deve o seu nome a uma técnica utilizada nos primórdios da televisão para testar a qualidade do sinal de transmissão, graficamente conhecido como uma série de risco paralelos de diferentes cores primárias. “A minha mais recente colecção de trabalhos vai buscar esta relíquia à história e transmite um mundo de possibilidades e realidades infinitas”, explica o próprio autor.

26 Ago 2015

Bruno Saavedra expõe fotografias em Portugal

O brasileiro, ex-residente em Macau, apresenta pela primeira vez em Portugal uma mostra do seu trabalho com a máquina fotográfica. “Flavors” chega à zona de Almeirim em Setembro

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] fotógrafo luso-brasileiro Bruno Saavedra, ex-residente de Macau, expõe pela primeira vez em Portugal, em Setembro, apresentando fotografias de corpos envolvidos em ingredientes culinários. A mostra, constituída por 30 fotografias, intitula-se “Flavors” (Sabores), e é inaugurada no dia 5 de Setembro, na Galeria Municipal de Almeirim, no Ribatejo, ficando patente até ao final o mês.
Em declarações à Lusa, Bruno Saavedra afirmou que apresenta “fotografias de corpos envolvidos em ingredientes culinários, que se movem em torno do universo que cada modelo escolheu, naquele momento, para o tempero da sua carne”. “O seu olhar, a expressão do rosto, das mãos, do corpo são a apresentação de um ser feito alimento”, reforçou o artista.
“Num espaço branco como uma janela de luz, cada um e cada uma sente a sua pele – toca-lhe, cheira-a, prova-a. Com ela combina odores, texturas, sabores que a temperam e a transformam num objecto novo, sedutor ou apenas provocador, manchado ou abjecto, mas sempre sensual”, explicou o fotógrafo, de 28 anos.
A exposição desenvolve-se em torno dos sabores e alimentos do dia-a-dia, procurando “chamar à atenção, de uma forma artística, para todos desperdícios alimentares no mundo”. Na composição das fotografais foram utilizados alimentos como leite condensado, caldo verde, borras de café, mostarda ou puré de batata.

Fora de prazo

Todos “os alimentos utilizados estavam fora do prazo de validade”, realçou o fotógrafo à Lusa. “O projecto ‘Flavors’ começou a ser desenvolvido em Janeiro com pessoas de vivência comum que se mostraram disponíveis para fazer algumas experiências”, disse o fotógrafo.
“Numa tentativa de quebrar barreiras, convidei duas pessoas com deficiência auditiva para fazer parte do projecto – para mim foi um desafio e uma experiência inesquecível poder fotografar essas pessoas e perceber que a arte pode ultrapassar qualquer forma de linguagem”, contou Saavedra.
Questionado sobre a escolha de Almeirim para a sua primeira exposição, o fotógrafo, natural de Itamaraju, no Estado brasileiro da Bahia, afirmou que foi a primeira localidade que o acolheu quando chegou a Portugal, em 2004, e “daí fazia todo o sentido apresentar ali a primeira exposição”.
Para a cerimónia de inauguração, o fotógrafo afirmou que se realizará uma “performance” surpresa, “envolvendo sensações sabores e sons”. Em 2010, a convite da Casa de Portugal em Macau, Bruno Saavedra colaborou com a instituição nas programações cultural e artística, e, no ano seguinte, começou a estudar fotografia com o fotógrafo António-Mil-Homens.
Regressado a Portugal em 2014, e depois de uma formação em maquilhagem, na Make Up School, começou a desenvolver vários projectos artísticos. Em Maio último desenvolveu o projecto artístico para o espectáculo de homenagem à fadista Argentina Santos, “Gosto da Parreirinha”, levado à cena no Centro Cultural de Belém.

21 Ago 2015

Creative | Exposição de fotografia “Cities” inaugurada hoje

Trazer um olhar sobre outras cidades ao território é o objectivo máximo da exposição que começa hoje na Creative Macau. Cinco fotógrafos locais escolheram uma cidade e mostram-na em fotos muito pessoais

[dropcap style=’circle’]I[/dropcap]naugura hoje às 16h30 na Creative Macau a exposição “Cidades: Fotografias a Preto e Branco”, que reúne o olhar de cinco fotógrafos locais sobre cinco cidades à sua escolha. Carmo Correia, Wilson Caldeira, Tang Kuok Ho, Marina Carvalho e Ieong Man Pan foram os fotógrafos convidados para mostrar um pouco mais “de outras cidades que não são Macau”.
“Queríamos quebrar um bocadinho o ciclo das exposições sempre sobre Macau e as coisas de Macau”, disse ao HM a directora da Creative, Lúcia Lemos.
A única imposição colocada ao artistas foi a de efectivamente não escolherem Macau como cidade a apresentar. “Quando se fala em exposição e fotografia pensa-se logo em Macau e ultimamente tem havido imensas exposições sobre Macau e o que envolve. Esta exposição serve para quebrar isso e oferecer ao público outras cidades”, rematou.

Foto de Marina Carvalho
Foto de Marina Carvalho

A maioria dos fotógrafos está representado por cinco fotografias, mas no todo são cerca de 28 as imagens em grande formato que compõem a mostra. Até 20 de Agosto, os interessados podem conhecer o olhar do outro sobre estes locais, que vão da Ásia aos EUA.
“Esta é uma partilha do que os fotógrafos querem mostrar, não só de tema, porque os fotógrafos foram livres de escolher o que queriam expor, respeitando o facto de ser a preto e branco”, continua Lúcia Lemos, indicando que da mostra fazem parte imagens “muito interessantes”, compostas por “retratos, detalhes, paisagens ou ruas”.

Contar uma história

Ao HM, o fotógrafo Wilson Caldeira explicou que escolheu a cidade de Melbourne, na Austrália, porque viveu lá nove meses. “As fotografias não contam nada de especial, eu fazia a minha rotina no subúrbio onde vivia e esse é mesmo o meu interesse: criar rotinas sem hierarquia a fotografar”, explicou. Sem disciplina, o trabalho de Wilson Caldeira é um “misto de qualquer coisa”. As cinco fotografias escolhidas fazem parte de um trabalho “com várias dezenas de imagens” que contam a narrativa da sua passagem pela cidade australiana.

Foto de Carmo Correia (Nova Iorque)
Foto de Carmo Correia (Nova Iorque)

Carmo Correia abraçou o convite e, juntando o útil ao agradável – porque partia numa viagem para Nova Iorque e Chicago – , decidiu fotografar a pensar na exposição.
“Tinha a hipótese de [escolher] estas duas cidades, mas como já conhecia Chicago e estava com vontade de fazer qualquer coisa nova, numa cidade que também para mim era nova, escolhi Nova Iorque”, contou ao HM.
As cinco fotografias pretendem mostrar a cidade mais conhecida do Estados Unidos. “Escolhi cinco imagens que no seu conjunto dizem: isto é Nova Iorque, é esta cidade. Que não pudesse ser outra coisa, ou seja, acabam por não ser monumentos, como a torre A ou B. Não quis que fosse óbvio”, justifica.
Para a fotógrafa é inquestionável a necessidade de Macau ver além de si próprio. “Acho que Macau devia olhar muito mais lá para fora, o território está sempre muito focado para olhar para dentro. É giro mostrar Macau para fora, mas nós devíamos olhar muito mais para o que está lá fora”, remata.
A capital portuguesa, Lisboa, está representada pelo olhar de Marina Carvalho. Já Ieong Man Pan escolheu a cidade chinesa Sichuan-Meigu e Tang Kuok Ho representa Nanquim. A exposição é de entrada livre e termina a 20 de Agosto.

23 Jul 2015