Transportes | Bandeira dos táxis é actualizada para 19 patacas

A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego anuncia hoje o aumento da bandeirada de 17 para 19 patacas. A tarifa aumenta a cada 240 metros, em vez dos anteriores 260 metros. Os aumentos não agradam à maioria dos representantes do sector

[dropcap style≠’circle’]“S[/dropcap]egundo o que sei, a tarifa aumenta para as 19 patacas e a distância de aumento da tarifa foi cortada para 240 metros”, conta ao HM Tony Kuok, presidente da Associação de Mútuo Auxílio dos Condutores de Táxi. A decisão, que vai de encontro ao proposto pela Direcção dos Serviços para os Assuntos do Tráfego (DSAT), será anunciada hoje em conferência de imprensa.

Há dois meses, o director da DSAT, Lam Hin San, dizia os serviços que dirige haviam tomado “em consideração vários dados estatísticos, incluindo a inflação registada nos últimos anos”. A ideia seria sugerir aos representantes do sector um aumento de duas patacas na bandeirada.

Pois, dito e feito. A proposta avança, apesar da discordância algo resignada de algumas entidades de taxistas, tais como a Associação Geral dos Proprietários de Táxis de Macau. O presidente da associação, Leng Sai Hou, em declarações ao Jornal do Cidadão, diz que a maior parte dos taxistas não está satisfeito com o valor do aumento que foi sugerido pela DSAT no final de Maio, mas que a única saída é a aceitação da proposta.

Um desconto

Este aumento do preço das viagens não agrada à maioria dos taxistas, uma vez que é inferior aos valores sugeridos pelos representantes do sector nas negociações com o Governo. Leng Sai Hou considera que com a taxa de inflação verificada em Macau e os crescentes custos de manutenção e funcionamento dos táxis, a insatisfação perante ao aumento de duas patacas é mais que óbvia. Em declarações ao Jornal do Cidadão, o presidente da Associação Geral dos Proprietários de Táxis de Macau categorizou esta actualização de tarifa como “apenas um desconto”.

O dirigente associativo enumerou ainda as dificuldades que o sector enfrenta devido à alta concorrência em termos de transportes de passageiros. Leng Sai Hou considera que um dos maiores problemas é o excesso de licenças de táxi emitidas pelas autoridades e a fraca fiscalização a serviços como a Uber.

No que diz respeito ao serviço de Rádio Táxi, que entrou em funcionamento há mais de três meses, Leng Sai Hou acha que não fez grande mossa em termos de concorrência, já que o serviço é diferente em termos de função e clientes.

O dirigente associativo, ainda em declarações ao Jornal do Cidadão, revelou que não está surpreendido face ao anúncio de que o regulamento dos táxis não será apreciado ainda durante este mandato da Assembleia Legislativa. Leng Sai Hou prevê que a entrada em vigor do diploma não mude significativamente as regras que regulam as infracções praticadas por taxistas.

17 Jul 2017

Eleições 2017 | Sufrágio indirecto com vários rostos novos

São 15 candidatos para 12 lugares, num sufrágio que diz pouco ao eleitorado em geral. Mas é neste grupo de deputados que se verificam, para já, as maiores alterações. E é também neste conjunto de membros da Assembleia Legislativa que está o maior poder interno

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]êm uma importância que, muitas vezes, escapa à opinião pública. São, por norma, os menos interventivos, o que pouco ou nada significa. Há muito trabalho de bastidores nisto da política. Não são escolhidos pela generalidade dos eleitores, mas sim pelos seus pares, por serem os mais bem posicionados para defenderem os interesses corporativos a que pertencem.

A figura do deputado eleito por via indirecta é uma herança do passado, do tempo da Administração Portuguesa, em que era necessário garantir, na Assembleia Legislativa (AL), a representatividade das diferentes comunidades. À época, a política era dominada sobretudo por quem falava português e era preciso chamar para o hemiciclo pessoas do mundo chinês de Macau.

Apesar de haver quem entenda que, hoje em dia, a ideia de ter deputados indirectos já não se justifica, as mexidas na lei eleitoral não tiveram consequências nesta organização peculiar do sistema legislativo do território. Os críticos desta via de acesso falam ainda de uma certa desadequação dos interesses representados à realidade actual da RAEM. Tomando como exemplo o sector do trabalho, observamos que os deputados eleitos por esta via são oriundos da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM). Houve tempos em que a FAOM congregava uma parte importante dos trabalhadores da cidade, mas hoje, atendendo à evolução do tecido económico e social, essa ideia é altamente questionável.

Havendo ou não uma real correspondência com o que é hoje Macau, certo é que este grupo de 12 deputados tem uma forte ligação ao poder, mais ou menos assumida. O mesmo acontece interinamente: os principais cargos da AL estão entregues a quatro deputados eleitos por sufrágio indirecto. Ho Iat Seng é o presidente, Lam Heong Sang é o vice-presidente, Chui Sai Cheong e Kou Hoi In são os 1.o e 2.o secretários, respectivamente.

Um dos nomes da Mesa da AL está de saída – Lam Heong Sang não se recandidata, pelo que na próxima legislatura será necessário encontrar quem o substitua. Mas esta será apenas uma das várias mudanças dentro deste grupo de tribunos: são vários aqueles que não vão permanecer na AL, a começar por Leonel Alves, deputado com 33 anos de experiência, o mais antigo de todos eles.

Também Cheang Chi Keong decidiu que tinha chegado a hora de abandonar o órgão legislativo. Será necessário fazer mais uma substituição em termos internos, uma vez que o deputado é, há já várias legislaturas, presidente da 3.a Comissão Permanente da AL. A 1.a Comissão Permanente irá ter, igualmente, um novo comando, uma vez que a actual presidente, Kwan Tsui Hang, eleita pela via directa, decidiu afastar-se da vida política.

Comedida concorrência

Já houve eleições que não havia qualquer expectativa em relação aos resultados do sufrágio indirecto, por o número de candidatos corresponder exactamente aos assentos disponíveis. No dia 17 de Setembro, o nível de emoção será igualmente fraco, mas há um colégio eleitoral que terá duas opções no momento do voto: foram apresentadas duas listas para o sector profissional.

Mas já lá vamos. Antes, importa recordar alguns números. O sistema eleitoral contempla quatro lugares para o sector industrial, comercial e financeiro, os chamados interesses empresariais; três lugares para o sector profissional; dois lugares para o sector do trabalho; dois lugares para o sector cultural e desportivo; e um lugar para o sector dos serviços sociais e educacional.

 

Os empresários

Porque há apenas uma lista – a União dos Interesses Empresariais de Macau – a eleição está garantida. É neste grupo que se encontra o influente Ho Iat Seng, presidente da AL, o empresário Kou Hoi In e o engenheiro civil José Chui Sai Peng, ambos deputados. Cheang Chi Keong é substituído por Ip Sio Kai, antigo líder do Banco da China e presidente da Associação de Bancos, um estreante nestas andanças legislativas.

A União dos Interesses Empresariais de Macau foi a escolhida pelo colégio a que pertence quase por unanimidade: num universo de 102 eleitores legalmente registados e ligados aos sectores industrial, comercial e financeiro, obteve 97 votos.

Na apresentação da candidatura, Ho Iat Seng – que, volta e meia, mostra ser crítico em relação ao modo como a RAEM é governada – defendeu que é preciso prestar atenção ao desenvolvimento do território. Afirmou que não se podem dar benefícios a um só sector, mas a todas as camadas da população. O número dois, Kou Hoi In, assegurou que vai defender os interesses que representa, bem como trabalhar para que sejam atenuadas as dificuldades sentidas pelas pequenas e médias empresas, sector que também merece a atenção de José Chui Sai Peng. Já Ip Sio Kai prometeu efectuar trabalho em prol do desenvolvimento do sector financeiro de Macau.

Nas últimas eleições, a lista então igualmente liderada por Ho Iat Seng arrecadou 99,57 por cento dos votos.

Os profissionais

É o único sector onde vai existir alguma competição interna. Ao contrário do que aconteceu em 2013, em que a União dos Interesses Profissionais de Macau fez uma corrida solitária, este ano há mais uma lista: a União dos Interesses de Medicina de Macau. Este novo grupo é liderado por Chan Iek Lap, deputado eleito há quatro anos ao lado de Chui Sai Cheong e Leonel Alves. Desta vez, parte para o processo com uma equipa onde cabem Kuok Cheong Nang e Wong Chin Kit.

Há três lugares para preencher. Resta saber como é que os votos se vão dividir, mas é altamente improvável que Chui Sai Cheong, empresário influente e com muitos anos de experiência legislativa, perca o lugar. Com a saída de Leonel Alves, o irmão do Chefe do Executivo concorre acompanhado por Vong Hin Fai, figura muito próxima de Chui Sai On que, neste momento, ocupa um assento na AL por ter sido por ele nomeado.

A substituição de Leonel Alves por Vong Hin Fai não convence quem se interessa por estas matérias. Apesar de serem ambos advogados, Alves é tido como sendo um jurista com muita mais experiência; depois, tem três décadas de passado político e legislativo que o colocam numa posição ímpar no território.

Da lista de Chui Sai Cheong faz ainda parte Ben Leong, uma figura bem conhecida de um sector profissional que reúne muitos portugueses: a arquitectura. Leong é presidente da Associação dos Arquitectos de Macau.

Quanto à União dos Interesses de Medicina de Macau, Chan Iek Lap é um médico sem papas na língua que não tem, no entanto, marcado o seu percurso político através de uma intervenção pública regular. Em entrevista recente a este jornal, demonstrou ter preocupações políticas sobretudo na área em que trabalha, optando por não tecer grandes considerações sobre outros domínios sociais.

Os operários

Para os interesses laborais, o sistema reserva dois assentos, sendo que já se sabe, a mais de dois meses das eleições, quem é que vai ser eleito: Lam Lon Wai e Lei Chan U. São os herdeiros políticos de Lam Heong San e Ella Lei, actuais representantes do sector na AL, que saem ambos deste campeonato. Lam Heong San deixa o hemiciclo; Ella Lei decidiu atirar-se ao sufrágio directo, depois de uma primeira legislatura que ficou marcada por uma intervenção activa.

Todos estes nomes surgem do mesmo contexto político: a Federação das Associações dos Operários de Macau. A Comissão Conjunta da Candidatura das Associações de Empregados, nome escolhido para lista, decidiu este ano fazer eleições internas para escolher os candidatos a deputados. São dois nomes sem experiência na matéria que já prometeram seguir os passos dos antecessores.

Lam Lon Wai é subdirector da Escola para Filhos e Irmãos dos Operários e lidera a lista. Pretende defender os direitos dos residentes, sobretudo dos trabalhadores, fomentando a diversificação económica do território. Quer ainda impulsionar o desenvolvimento do sistema democrático e contribuir para a reorganização da máquina administrativa. Dos seus objectivos políticos fazem ainda parte “os assuntos ligados aos jovens”, com destaque para os que dizem respeito à ascensão na carreira.

Lei Chan U leva com ele para a AL o que aprendeu como membro do Conselho Permanente de Concertação Social. Tem como principais preocupações problemas que afectam os trabalhadores: a sobreposição de férias com feriados e a necessidade de atribuir uma compensação aos trabalhadores, a implementação da licença de paternidade e o aumento dos dias de licença de maternidade. Garante que o ano não vai chegar ao fim sem apresentar sugestões para a revisão da lei laboral.

Os desportistas culturais

Trata-se de um sector sem novidades, sem concorrência, com dois candidatos para outros tantos lugares, figuras bem conhecidas de quem acompanha as lides legislativas do território: Cheung Lup Kwan e Chan Chak Mo. É mais um caso em que existem dúvidas sobre a verdadeira equivalência entre o nome do sector que representam e o meio de onde são oriundos, atendendo a que, em ambos os casos, se distinguem essencialmente no meio empresarial.

Da biografia oficial de Vítor Cheung Lup Kwan no site da AL não consta o exercício, neste momento, de qualquer cargo ligado nem ao desporto, nem à cultura. Ocupa funções de topo em empresas ligadas ao investimento. Deputado à AL há muitos anos, é também membro do Conselho para o Desenvolvimento Económico da RAEM. Tem 79 anos.

Chan Chak Mo tem uma visibilidade pública bastante maior, desde logo pelo facto de ser presidente da 2.a Comissão Permanente da Assembleia Legislativa. Com formação académica em Gestão de Empresas, o homem forte da Future Bright, deputado desde 2001, tem um longo currículo político e uma ligação ao Comité Olímpico de Macau.

Os dois veteranos da AL candidatam-se com uma lista que se chama Associação União Cultural e Desportiva Excelente. O programa político inclui vários pontos relativos às directrizes do futuro desenvolvimento das áreas da cultura e do desporto, incluindo o Desporto para Todos, a formação para atletas de elite e o desenvolvimento da indústria cultural. Em 2013, os deputados foram eleitos com 96,36 por cento dos votos do colégio a que pertencem.

A educadora

O sufrágio de Setembro também não vai trazer surpresas no que toca ao sector dos serviços sociais e educacional. Chan Hong, presidente da Associação de Educação de Macau, ligada também aos órgãos sociais das Mulheres, volta a candidatar-se sem concorrência. Em 2013, foi eleita com mais de 98 por cento dos votos. Este ano, o resultado não deverá ser substancialmente diferente.

A comissão de candidatura de Chan, a Associação de Promoção do Serviço Social e Educação, tem como metas a melhoria dos serviços sociais, o desenvolvimento da qualidade da educação e o aumento da qualidade da vida dos residentes.

No âmbito dos serviços sociais, a deputada e candidata destaca a necessidade de aumentar o apoio aos cuidadores dos idosos e a acessibilidade. Quanto à educação, gostaria de ver um ritmo mais acelerado no projecto das escolas de Céu Azul e o aumento dos espaços para fins educativos.

14 Jul 2017

Eleições | Poder de Sinergia tem candidatos que já foram jornalistas

Johnson Ian e Ikei Che foram jornalistas durante vários anos, mas decidiram mudar de profissão e passar para a política, ao serem membros da lista ligada à Associação Sinergia de Macau. Pedem mais opinião pública, mais benefícios para os cidadãos e reconhecem que existe autocensura nos media chineses

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]ercorreu, durante vários anos, os corredores da Assembleia Legislativa (AL) como jornalista do jornal Ou Mun. Falava pessoalmente com os deputados, até que decidiu que podia tentar ser um deles. Johnson Ian foi jornalista durante 15 anos e é um dos membros da lista Poder da Sinergia, ligada à Associação Sinergia de Macau, que este ano participa nas eleições legislativas.

Ikei Che foi um dos rostos da informação do canal MASTV e também pensou que poderia estar no lugar onde a política acontece. Ambos deixaram as suas redacções para não mais voltar. Mesmo que não sejam eleitos, assumem que querem continuar a ser vozes activas na sociedade.

Johnson Ian não estudou sequer jornalismo. Licenciou-se em Economia na Universidade de Macau e trabalhou na Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM) como croupier. A experiência durou apenas dois meses, porque o trabalho era “muito aborrecido”. Decidiu então ser jornalista, tendo começado por escrever sobre economia.

“Como jornalistas somos parte da sociedade, e fui jornalista durante 15 anos. Com esta profissão pude conhecer com mais detalhe os problemas existentes”, disse ao HM.

Ikei Che achava que, antes de ser jornalista, sabia muito sobre Macau, mas percebeu que, afinal, havia muito mais para descobrir. “Conheci coisas com que nunca tinha tido contacto. Nos dois anos em que fui jornalista percebi que, às vezes, é possível avançar com a resolução dos problemas das pessoas, mas ninguém fala. Além disso, o Governo não ouve os dois lados de uma questão. Se Lam U Tou conseguir ser eleito, vamos conseguir ajudar as pessoas e apresentar soluções, e foi por isso que me candidatei”, conta.

Que objectivos têm como candidatos? O problema da habitação vem logo ao de cima. “Queremos um fornecimento estável de habitação pública, como havia durante a Administração portuguesa. Mas desde 1999 que o fornecimento de casas públicas diminuiu bastante”, referiu Johnson Ian.

Além disso, a lista Poder de Sinergia pede “uma melhor qualidade de vida e a implementação de melhores políticas”, sobretudo relacionadas com os novos aterros. É ainda pedido “um novo sistema de transportes públicos, porque os contratos vão expirar no próximo ano”, disse o candidato.

Desapontamento geral

Johnson Ian puxa do seu lado de economista para dizer que, tendo em conta o Produto Interno Bruto de Macau, um dos melhores do mundo, a população poderia viver muito melhor. “As pessoas de Macau não estão satisfeitas e sentem-se desapontadas com o Governo, e com os problemas existentes ao nível da habitação e do sistema de transportes.”

O desapontamento existe em relação ao trabalho do Executivo e dos próprios deputados. “As pessoas sentem-se desapontadas com o Governo, mas temos de criticar também os deputados, porque eles têm o papel de monitorizar o trabalho do Executivo.”

Quais são, então, os deputados preferidos da população? Na visão de Johnson Ian, os preferidos são Ng Kuok Cheong e Kwan Tsui Hang, que está de saída da AL. E José Pereira Coutinho? “Não tanto, porque se concentra nos funcionários públicos e esquece um pouco o resto da população.”

Na visão do ex-jornalista do Ou Mun, “não há muita discussão sobre economia e jogo na AL”. “É preciso focar este tópico, porque a economia é muito importante em Macau”, apontou Johnson Ian, que reiterou que “o desempenho dos deputados está abaixo das expectativas das pessoas”.

Apesar do descontentamento, Johnson Ian diz que ainda há pouca expressão da opinião pública. “As pessoas querem uma mudança, mas quem é que vai chegar cá fora e pedir essa mudança? Ainda temos uma sociedade chinesa muito tradicional, mas isso não é muito positivo para o desenvolvimento de Macau.”

“Muitos mantêm-se em silêncio, e para serem ouvidos têm de fazer parte das associações mais tradicionais”, defendeu ainda.

 

A autocensura e a falta de formação

Questionada sobre se foi alvo de censura no seu trabalho jornalístico, Ikei Che responde que “mais ou menos”. “Não tinha toda a liberdade, mas essa é uma situação compreensível. Mas a maioria dos casos, relacionados com os problemas com que se deparam os cidadãos, ou que estão ligados ao trabalho do Governo, podíamos noticiar”, apontou a jornalista.

Johnson Ian afirma que existe autocensura nos media chineses, à semelhança do que têm apontado vários relatórios internacionais sobre liberdade de imprensa.

Tendo sido jornalista do Ou Mun, um dos diários mais lidos em Macau e considerado próximo de Pequim, Johnson Ian ressalvou que, “na maioria das vezes”, pôde escrever tudo o que quis.

“Porque é que a sociedade pensa que há constrangimentos? Porque o maior problema está nos repórteres. Há auto-censura e eles optam por não escrever, por não reportar. A maior parte dos jornalistas quer notícias, mas não tem fontes.”

Para o antigo jornalista, que teve de corrigir textos vezes sem conta até aprender a escrever notícias, o maior problema é a falta de formação nos media de língua chinesa. “Os jovens jornalistas não têm formação e não sabem escrever notícias. Vão para as conferências de imprensa e pensam que basta o comunicado de imprensa, mas não chega.”

Johnson Ian conta casos de outros tempos, em que o jornalista ligava directamente para os números de telemóvel dos membros do Governo, sobretudo antes de 1999. “Tudo mudou. Não querem falar mais, querem manter as coisas em segredo”, remata.

14 Jul 2017

Costa Nunes | Marisa Peixoto é a nova directora da escola

Está escolhido o nome que vai substituir Lola Flores Couto do Rosário na direcção do Jardim-de-Infância D. José da Costa Nunes. Chama-se Marisa Peixoto e há quatro anos que é educadora na instituição. Não domina o chinês, mas Miguel de Senna Fernandes confia agora na estabilidade da escola

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á um ano entrava Lola Flores do Rosário, bilingue, que prometia trazer um novo rumo ao Jardim-de-Infância D. José da Costa Nunes e, sobretudo, responder ao aumento dos alunos chineses. A directora acabou por não ficar mais do que um ano lectivo, sendo que Marisa Peixoto é o nome que se segue.

A educadora está há quatro anos no jardim-de-infância de matriz portuguesa e, segundo referiu Miguel de Senna Fernandes, é o nome ideal para ficar à frente da instituição.

“Neste momento ela reunia as melhores condições para desempenhar o cargo, a escolha foi natural. Há cerca de quatro anos que está no Costa Nunes e conhece bem a escola, bem como os colegas. Havia outros nomes que reuniam boas condições, mas julgámos que a Marisa seria uma boa aposta”, disse o presidente da Associação Promotora da Instrução dos Macaenses (APIM).

Miguel de Senna Fernandes quis ir à prata da casa buscar um nome e não pensou sequer em recorrer a currículos de fora do Costa Nunes. Marisa Peixoto não domina a língua chinesa, ao contrário da sua antecessora, mas para o presidente da APIM isso não constitui um problema de maior.

“[Marisa Peixoto] Não domina o chinês, isso seria ouro sobre azul. Continuamos a esperar por uma directora que domine várias línguas, mas muitas vezes as coisas não acontecem. Mas não é por causa disso que não se gere um jardim-de-infância. O bilinguismo é um factor importante, mas não é decisivo. A actual directora domina o chinês, era uma aposta bastante boa.”

Quanto a Lola Flores Couto do Rosário, não ficará a trabalhar no jardim-de-infância. Vera Gonçalves, a directora que a antecedeu, chegou a ser convidada para ficar na escola como educadora, mas declinou o convite.

“A Lola não vai ficar no Costa Nunes, não sei onde vai ficar. Ela melhor o dirá”, explicou Miguel de Senna Fernandes.

Contrato de um ano

Marisa Peixoto assinou contrato como directora por um ano. Tal como explicou o presidente da APIM, isso não revela falta de confiança no novo nome. “É normal, todos os contratos com todo o pessoal docente foram sempre de um ano. Todos os anos renovamos os contratos e corresponde a uma prática tradicional. No espaço de um ano veremos se tem condições para continuar.”

Miguel de Senna Fernandes referiu ainda que sempre quis o melhor para a escola em todas as decisões que tomou. “Estivemos sempre à espera de uma maior estabilidade, as escolhas foram sempre feitas nesse sentido. É uma esperança renovada, com certeza. Tudo indica que será um nome bem aceite, se bem que é sempre uma incógnita. Mas, segundo o que conhecemos da pessoa em causa, vai dar-nos estabilidade”, rematou.

14 Jul 2017

Liu Xiaobo (1955-2017) | A morte de um Nobel

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] dissidente chinês Liu Xiaobo morreu ontem aos 61 anos, anunciaram as autoridades da província de Liaoning, onde o Nobel da Paz de 2010 estava hospitalizado com cancro do fígado. Liu Xiaobo esteve detido mais de oito anos por “subversão”.

Foi o primeiro Prémio Nobel a morrer privado de liberdade desde o pacifista alemão Carl von Ossietzky, que morreu em 1938 num hospital quando estava detido pelos nazis. Liu Xiaobo foi condenado em 2009 a 11 anos de prisão por subversão, depois de ter exigido reformas democráticas na China e um dos autores de um manifesto, a “Carta 08”, que defendia o respeito pelos direitos humanos e a realização de eleições livres.

Pedido de libertação de Liu Xiaobo num protesto em Hong Kong. Foto: HM

Em 2010 foi distinguido com o Nobel da Paz e na cerimónia de entrega do prémio, em Oslo, uma cadeira vazia representou Liu, já sob detenção. A 26 de Junho último, o dissidente foi colocado em liberdade condicional e hospitalizado, devido a um cancro no fígado em fase terminal, diagnosticado em maio.

Os últimos exames realizados em Shenyang mostravam que o tumor tinha aumentado de tamanho. Liu sofria ainda de insuficiência renal, de acordo com o hospital, que a 8 de Junho, declarou que o doente não podia ser transferido para o estrangeiro, contrariando a vontade de Liu Xiaobo de ser tratado fora da China. Os médicos norte-americano e alemão que observaram o dissidente chinês tinham pedido que fosse transferido “o mais depressa possível”.

Várias organizações de defesa dos direitos humanos e próximas de Liu criticaram Pequim por ter esperado por uma deterioração do estado de saúde para colocar o dissidente em liberdade condicional, mas as autoridades afirmaram que ele estava a ser tratado por médicos especialistas reputados.

Longe de ser um gesto humanitário, a libertação de Liu foi decidida para evitar uma imagem desastrosa para Pequim: a morte de um dissidente famoso atrás das grades, de acordo com a associações de defesa dos direitos humanos.

Liu Xiaobo foi detido pela primeira vez por ligação aos protestos de 1989 na praça de Tiananmen. Na altura professor em Pequim, participou em 1989 no movimento pró-democracia da praça Tiananmen, desencadeado pelos estudantes, e foi detido após a repressão violenta do movimento, tendo passado um ano e meio na prisão sem nunca ter sido condenado.

Encarcerado num campo de reeducação “pelo trabalho” entre 1996 e 1999 e afastado da universidade, Liu tornou-se um dos animadores do Centro Independente Pen China, um grupo de escritores.

A China era há muito criticada pelo tratamento dado aos militantes e opositores políticos, mas desde a chegada ao poder do Presidente Xi Jinping, no final de 2012, que a pressão sobre a sociedade civil aumentou. Em Julho de 2015, mais de 200 advogados e defensores dos direitos humanos foram interpelados pela polícia. A maioria foi posteriormente libertada, mas seis foram condenados no ano passado a penas de até sete anos de cadeia. Os tribunais chineses têm uma taxa de condenações de 99,92% e os inquéritos avançam muitas vezes com base em confissões obtidas sob tortura.

A mulher de Liu Xiaobo continua, desde 2010, sob detenção domiciliária. De acordo com Patrick Poon, da organização Amnistia Internacional, Liu Xia nunca foi acusada formalmente de qualquer crime.

14 Jul 2017

Legislativas |  Os candidatos e as principais propostas para o sufrágio directo

As contas ainda não estão fechadas, porque se está em período de reclamações, mas para já tudo indica que as eleições de Setembro próximo vão ser mais concorridas do que o sufrágio em 2013. Deixamos-lhe aqui as principais ideias de quem quer ser – ou continuar a ser – deputado à Assembleia Legislativa

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]andidaturas de pendor regionalista, pequenos grupos ligados às classes mais desfavorecidas, defensores do sufrágio directo e universal. Listas com o apoio de associações tradicionais, candidatos oriundos de movimentos acabados de criar. Há assumidos protectores de causas muito específicas, há quem prometa lutar para além do bairro onde vive. Uns tentam a reeleição, outros querem experimentar a vida política. As eleições legislativas deste ano ficam, desde já, marcadas pela diversidade: há de quase tudo e para quase todos os gostos.

A Comissão de Assuntos Eleitorais para a Assembleia Legislativa (CAEAL) publicou ontem a relação completa das 25 candidaturas que recebeu. Há casos de irregularidades para resolver, pelo que serão necessários mais alguns dias para se perceber quem é efectivamente candidato.

Para já, fazemos as contas com os dados que temos. Destaca-se, para começar, o facto de haver alguns pesos pesados que não se recandidatam: deixam o lugar para os mais novos, sendo que os sucessores não são propriamente inexperientes na matéria. É o caso de Chan Meng Kam, o grande vencedor das eleições de 2013, e também o da histórica Kwan Tsui Hang, que passa a bola a outra mulher, Ella Lei. Tanto no caso do grupo político de Fujian, como na candidatura oriunda dos Operários, os cabeças-de-lista das candidaturas já ocupam, neste momento, um assento no edifício do Lago Nam Van.

Outro facto de relevo tem que ver com o desdobramento de listas, um fenómeno que se justifica com o método de conversão de votos em mandatos utilizado em Macau. Há várias famílias políticas que decidiram separar-se na esperança de conseguirem reforçar a presença na Assembleia Legislativa (AL). A estratégia não é nova, mas encontra neste sufrágio uma expressão mais forte. É do entendimento geral que vai aumentar a competição entre os concorrentes aos 14 lugares disponíveis. A probabilidade de saírem beneficiadas as candidaturas com estruturas fortes é grande.

Os regionalistas

Há quem entenda que é um fenómeno que tem os dias – ou os anos – contados, dependente das alterações do tecido social de Macau. Para já, enquanto os filhos dos migrantes da China Continental não crescem para renovar o eleitorado, há um segmento forte da população que tem tendência a escolher candidatos que são seus conterrâneos.

O sentimento de pertença a determinado grupo não é, claro está, o único a contribuir para esta opção. É sabido que deputados como Chan Meng Kam têm uma forte presença social, com gabinetes junto do seu eleitorado que prestam os mais diversos serviços de apoio durante a legislatura. Vieram, de algum modo, seguir o modelo desenvolvido por associações tradicionais como os Kaifong e os Operários.

É a contar com o trabalho desenvolvido nos últimos anos que Si Ka Long e Song Pek Kei partem para as legislativas com boas perspectivas de serem reeleitos. Em 2013, tinham na liderança Chan Meng Kam, que agora se retira. A principal família política de Fujian decidiu dividir-se: Si Ka Lon fica à frente da Associação dos Cidadãos Unidos de Macau, com um total de dez candidatos; a Associação dos Cidadãos para o Desenvolvimento de Macau é encabeçada pela jovem Song Pek Kei, contando também com uma dezena de aspirantes a deputados. Esta separação de equipas tem um único objectivo: garantir que se conquistam mais assentos.

Si Ka Lon

Em 2013, a lista liderada por Chan Meng Kam conseguiu um resultado histórico, sobretudo atendendo a que, à época, andava nestas lides há apenas oito anos, sem uma estrutura com um passado político na retaguarda. Conquistou mais de 26 mil votos, o suficiente para eleger três deputados. Numa perspectiva política, vai ser interessante somar os votos das duas listas de 2017 e perceber até que ponto conseguem Si Ka Lon e Song Pek Kei manter a herança de Chan Meng Kam, sendo certo que, não obstante a saída de cena, continuará presente no trabalho de bastidores.

Si Ka Lon já garantiu que tentará manter o espírito do ainda líder. Há metas que ficaram por alcançar: a proposta para a renovação urbana, a verificação de infiltrações de água, o sistema de responsabilização dos funcionários públicos e a habitação pública. O candidato promete continuar a trabalhar para que haja melhorias nestas áreas.

Song Pek Kei está sobretudo preocupada com a responsabilização dos funcionários públicos, a habitação, os serviços médicos, as questões ligadas à administração de condomínios, os jovens e o funcionamento das pequenas e médias empresas.

Os dois descendentes políticos de Chan Meng Kam não são os únicos oriundos de Fujian. A candidatura de defesa dos União dos Promitentes-Compradores do Pearl Horizon para Defesa dos Direitos, liderada por Kou Meng Pok, também tem ligações à província, assim como o advogado Hong Weng Kuan, da Associação dos Cidadãos Unidos para a Construção de Macau. Sze Lee Ah, um homem de cabelo comprido ligado ao serviço social, comanda a Poder dos Cidadãos, também de Fujian. Estas três candidaturas são estreias na corrida legislativa.

Ainda no âmbito das listas ditas regionalistas, destaque para a União de Macau-Guangdong. O grupo de Mak Soi Kun juntou 16.251 votos em 2013, tendo eleito dois deputados. Mak e Zheng Anting decidiram, este ano, chamar jovens para a equipa. Têm como grande objectivo “unir poderes diferentes, servir as várias classes sociais de Macau e fiscalizar as acções do Governo”. Tudo indica que não terão problemas na reeleição.

Os democratas

É o campo que mais dúvidas suscita se tentarmos fazer previsões acerca do que Setembro ditará. Há alguns anos, seria difícil imaginar um cenário como aquele que hoje se apresenta. Basta ver que, em 2009, as duas listas saídas da Associação Novo Macau (ANM) conseguiram eleger três deputados: Ng Kuok Cheong, Paul Chan Wai Chi e Au Kam San. Chan Wai Chin fez apenas uma legislatura mas, em 2013, também com duas candidaturas diferentes, os dois deputados mais antigos ligados à pró-democracia conseguiram um resultado expressivo: somando os votos de um e do outro, reuniram o apoio de mais de 19.800 eleitores.

Das últimas eleições para cá, tudo mudou: as forças pró-democratas conheceram profundas alterações no modo como estão organizadas. A ANM fracturou-se, com Au Kam San a bater a porta por divergências com os elementos mais novos da associação. Ng Kuok Cheong ainda manteve um pé no gabinete da Calçada de Santo Agostinho, mas parece estar agora completamente fora do grupo de Scott Chiang. Paul Chan Wai Chi foi o único dos mais velhos a ficar. 

Para 17 de Setembro, Au Kam San e Ng Kuok Cheong voltam a apresentar-se em listas diferentes. Partilham, no entanto, o mesmo programa político. Voltam a insistir na necessidade de implementação do sufrágio universal para a eleição do Chefe do Executivo e de todos os deputados à AL. Querem lutar contra a corrupção e que sejam abertos mais concursos para a atribuição de habitações públicas aos residentes. Defendem também a renovação dos bairros antigos, o adequado aproveitamento dos recursos financeiros e a diminuição do número de trabalhadores não residentes. Há ainda a defesa de uma melhoria do sistema de transportes públicos e de maiores apoios para grávidas, idosos e residentes com dificuldades financeiras.

Ng Kuok Cheong lidera a lista Associação Próspero Macau Democrático. Au Kam San mudou o nome à candidatura, para a desvincular da ANM, e encabeça o grupo Associação Novo Democrático.

E os que ficaram na Novo Macau? Estão, para efeitos eleitorais, na Associação do Novo Progresso de Macau. O jovem Sulu Sou é o número um e tem, como braço direito, o menos jovem Paul Chan Wai Chi.

A lista quer trazer “novas forças e ideias ao movimento democrático, e revitalizar o estagnado sistema político”. Entre os objectivos contam-se ainda o reforço dos mecanismos de fiscalização do Governo, a abertura das comissões da AL que funcionam à porta fechada, o desenvolvimento sustentado de Macau e o “estabelecimento sério de princípios democráticos” que tornem o sufrágio universal uma realidade.

O português que resta

Há quatro anos, conseguiu quase nove por cento dos votos, ou seja, 13.130 pessoas votaram nele. Este apoio do eleitorado permitiu a José Pereira Coutinho contar com a companhia de Leong Veng Chai na AL. Este ano, a concorrência é forte, diz. Por isso, não se mostra sequer confiante em relação à sua reeleição.

Coutinho entrou na AL em 2005 e não é fácil defini-lo em termos políticos, por não encaixar em nenhuma das famílias políticas tradicionalmente representadas no hemiciclo. É uma voz defensora dos direitos laborais, um pró-democrata menos intempestivo do que a bancada oriunda da velha Novo Macau. Porque Leonel Alves não se recandidata pelo sufrágio directo, se o líder da Nova Esperança for reeleito será o único deputado a comunicar em português. 

Defensor do trabalho a tempo inteiro dos deputados, Pereira Coutinho entende que a língua portuguesa é uma garantia do segundo sistema e critica o que diz ser o clientelismo existente na AL. Gostaria que fosse criada uma provedoria de justiça com competências que hoje pertencem ao Comissariado contra a Corrupção. O acesso à habitação e a situação das mulheres no mercado de trabalho fazem parte do caderno de promessas políticas deste ano.

Os tradicionais

Foi o grande trambolhão das últimas eleições. A União para o Desenvolvimento, liderada por Kwan Tsui Hang, teve 11.960 votos em 2013. Quatro anos antes, tinha conseguido mais de 21 mil, o suficiente para que, na altura, fosse eleito também Lee Chong Cheng. Kwan foi, nestes últimos quatro anos, a única deputada eleita por via directa com ligações à Federação das Associações dos Operários de Macau, mas não esteve sozinha: na bancada dos indirectos sentou-se Ella Lei, a mulher que, ao que tudo indica, será a sua sucessora.

A herdeira de Kwan Tsui Hang tem tido uma participação pública muito activa, pouco ao estilo de quem foi eleito por base corporativa. É bastante improvável que a líder da União para o Desenvolvimento não consiga ser eleita, mas as eleições de Setembro são um teste também à força política de um dos movimentos mais tradicionais de Macau. Com a transformação do tecido industrial do território, os Operários tiveram de se reajustar. Resta agora saber até que ponto consegue Ella Lei puxar pelo rejuvenescimento que tem sido apontado como sendo uma das principais necessidades desta força política.

Ella Lei tem, como objectivo, garantir que os Operários voltam a ocupar dois assentos, mas reconhece as dificuldades. Melhorar as políticas da habitação, fomentar a diversificação adequada da economia, partilhar os frutos do grande desenvolvimento económico e trabalhar em prol dos cidadãos são os objectivos anunciados na candidatura.

Do campo tradicional político do território vem também Ho Ion Sang, líder da União Promotora para o Progresso, ligada à União Geral das Associações de Moradores de Macau. Em 2013, a lista dos Kaifong teve 15.815 votos, tendo conseguido eleger também Wong Kit Cheng, oriunda da também tradicional Associação das Mulheres de Macau.

Na comparação com os resultados de 2009, nas últimas eleições verificou-se uma ligeira melhoria. Ainda assim, desta vez, a estratégia passa pela divisão de listas: Ho Ion Sang concorre sem Wong Kit Cheng, que encabeça a Aliança de Bom Lar.

O homem dos Kaifong tem, entre as prioridades, temas como a habitação, a diversificação económica, a fiscalização da acção governativa, o trânsito e a economia de bairro. Já Wong Kit Cheng, consciente da tarefa difícil que é a manutenção do lugar que ocupa, tem os benefícios das mulheres e das famílias como principais cavalos de batalha.

As mulheres que mandam

Têm ambas ligações ao jogo, apesar de serem de diferentes intensidades, e uma presença já enraizada na AL, mas estilos e objectivos bem distintos. São de novo candidatas e acredita-se que poderão ser reeleitas, não obstante o contexto de incerteza com que partem para o sufrágio de Setembro.

A Nova União para Desenvolvimento de Macau, comandada por Angela Leong, teve mais de 13 mil votos em 2013. A quarta mulher de Stanley Ho nunca conseguiu ter um número dois na AL. Este ano, a tentativa faz-se com a presença de William Kuan, empresário do sector imobiliário. 

Para Leong, basta a criação de um programa de arrendamento para que os jovens possam resolver os problemas da falta de habitação. A lista defende ainda licenciaturas gratuitas para residentes.

Melinda Chan é a mulher ao leme da Aliança Pr’a Mudança. Deputada há oito anos, a mulher do empresário David Chow tem este ano, na sua lista, um elemento da comunidade portuguesa: Jorge Valente. Ocupa a terceira posição, o que faz com que tenha poucas probabilidades de ser efectivamente eleito, atendendo ao método de conversão de votos em mandatos de Macau. Em 2013, a Aliança Pr’a Mudança não foi além dos 8755 votos.

A habitação é a prioridade de Melinda Chan, ligada à Sin Meng, uma associação de beneficência. Outro objectivo da lista passa pelo desenvolvimento do aeroporto, para que tenha um maior papel no transporte de mercadorias. O movimento acredita ainda ser necessária uma flexibilização na contratação de trabalhadores não residentes.

 

As tentativas

Talvez à terceira seja de vez. Agnes Lam, académica ligada à área da comunicação, conseguiu 5225 votos nas últimas eleições. Estreou-se nestas lides em 2009, com uma forte aposta na classe média e nos profissionais liberais, aquela fatia do eleitorado que sentirá mais dificuldades em se sentir representada na AL. Desta vez, decidiu alargar o âmbito de intervenção para sensibilizar eleitores de outros quadrantes e geografias eleitorais do território.

A líder da lista Observatório Cívico tem preocupações em áreas como a habitação, a necessidade de salvaguarda da cultura local e o desenvolvimento do sistema político. Para Agnes Lam, há vários problemas em Macau que poderiam ser solucionados caso houvesse um melhor regime político, como é o caso do aumento excessivo de multas, implementado no início deste ano.

FOTOS: Sofia Margarida Mota

Estreante nestas andanças, Lam U Tou lidera a Poder da Sinergia, uma lista nascida no seio da Associação Sinergia de Macau. Com passado activo numa associação ligada aos Operários, o candidato apresenta um programa político que tem como principal objectivo o aumento da qualidade de vida dos residentes.

A Poderes do Pensamento Político, encabeçada pelo antigo funcionário público Kot Man Kam, tem como número dois o macaense António Lopes, inspector de jogo. A defesa dos direitos dos funcionários públicos é um dos princípios defendidos pela candidatura, que também defende o aumento do número das licenças de jogo.

À frente da Associação dos Cidadãos Unidos para a Construção de Macau, o advogado Hong Weng Kuan tenta de novo um assento na AL, depois de, em 2013, não ter ido além dos 848 votos. Do programa político fazem parte a realização de eleições livres de corrupção, bem como o desenvolvimento do sistema democrático. Hong quer ainda lutar por mais habitação e uma melhoria do sistema de trânsito.

A Ajuda Mútua Grassroots tem como principal candidato Wong Wai Man, que não define uma meta concreta para as eleições deste ano, atendendo à forte concorrência. O programa político da lista dá ênfase a questões como a habitação, os direitos e interesses dos trabalhadores, os serviços de saúde e a educação.

Lee Kin Yun, um activista quase tradicional do território, volta à carga este ano com a sua Activismo para a Democracia. Fomentar o processo democrático em Macau, lutando pelo sufrágio universal nas eleições para a Assembleia Legislativa e para o Chefe do Executivo, é a prioridade. Do rol de objectivos fazem também parte a implementação do sistema de responsabilização dos funcionários públicos, a protecção da liberdade de imprensa, a definição da lei sindical, a diversificação adequada da economia e a ascensão profissional dos jovens.

A lista Nova Ideais de Macau, encabeçada por Carl Ching, também tem na implementação do sufrágio universal uma das principais metas. O cabeça-de-lista tem um passado como activista em Hong Kong e já foi candidato em Macau, sendo esta a primeira vez que lidera uma lista. A criação de cursos de formação ligados à cultura e à protecção ambiental, bem como a fiscalização das despesas públicas pela AL, também constam do programa da lista agora criada.

A Justiça de Macau, que dá pelo nome oficial de Ou Mun Kong I, procura representar eleitores de classes sociais desfavorecidas e grupos mais vulneráveis. Lei Sio Kuan, o líder da lista, quer que o Governo preste atenção à questão da habitação para os jovens e aumente o montante da pensão para os idosos.

Na Linha de Frente dos Trabalhadores de Casinos está Cloee Chao, uma mulher que se tem destacado na luta pelos direitos dos funcionários da principal indústria do território. Os dez candidatos são todos trabalhadores de casinos e têm um programa político a pensar apenas neste sector: aumentar o número de férias e os benefícios dos funcionários, a lei sindical, a redução do número de trabalhadores não residentes e a proibição total de fumo nos casinos.

Com um nome, no mínimo, invulgar, a lista Cor de Rosa Amar a População reúne cinco pessoas, lideradas por Lei Kit Meng. Educação, emprego, habitação, idosos, fiscalização administrativa e responsabilização dos funcionários públicos são as grandes linhas orientadoras da candidatura.

A terminar o rol de candidaturas temos a Aurora dos Trabalhadores de Nível Básico, sendo que se desconhecem detalhes sobre os candidatos e o programa político.

13 Jul 2017

Lei de Terras | Leonel Alves fala de inviabilização da proposta

O deputado Leonel Alves afasta a possibilidade de a Assembleia Legislativa votar, ainda nesta legislatura, o projecto de alteração à Lei de Terras que apresentou em parceria com Zheng Anting. Ainda assim, o número dois de Mak Soi Kun poderá apresentar o mesmo projecto depois das eleições

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m mês é um período temporal demasiado curto para que o projecto de alteração à Lei de Terras, apresentado pelos deputados Leonel Alves e Zheng Anting, chegue à Assembleia Legislativa (AL) para votação na generalidade, após a aprovação da iniciativa por parte do Chefe do Executivo.

Quem o diz é um dos proponentes do articulado, Leonel Alves. “Estamos em meados de Julho, os trabalhos da AL vão encerrar a 15 de Agosto, e tratando-se de um diploma relativamente complexo, julgo que este compasso de espera que tivemos de algumas semanas inviabiliza por completo qualquer possibilidade de aprovação na AL nesta legislatura.”

De saída do hemiciclo, onde é deputado há 33 anos, Leonel Alves acredita que o seu parceiro nesta iniciativa irá apresentar novamente o mesmo projecto no arranque da nova legislatura, depois das eleições de Setembro, caso garanta a continuidade no órgão. “Julgo que se o deputado Zheng Anting for reeleito irá dar continuidade a este projecto. Não há razões para não acreditar neste cenário.”

A possibilidade de o projecto de lei de alteração à Lei de Terras não chegar à AL foi levantada esta terça-feira, após a realização de uma reunião da 2.ª Comissão Permanente da AL. O seu presidente, Chan Chak Mo, referiu que os deputados não teriam tempo suficiente para acolher um novo diploma.

“Acho que não [que a Assembleia Legislativa não teria tempo], a não ser que se trate de um caso urgente, como os impostos sobre veículos, por exemplo. Acho que, com tantas discussões e conflitos, o Governo não vai apresentar nesta altura esta proposta de lei”, defendeu.

Chan Chak Mo referiu ainda acreditar que o hemiciclo “vai ter um diálogo com o Governo”.

“Já nada me frustra”

Questionado sobre o facto de ver este projecto cair por terra, Leonel Alves recorda o tempo de experiência na AL, para uma resposta directa: “Já nada me frustra”.

“Foi a minha última tentativa e, também no seguimento de solicitações de diversos sectores, nomeadamente junto do deputado Zheng Anting. Foi um acto essencialmente político”, disse, lembrando o período de espera que tiveram desde que apresentaram o projecto ao Chefe do Executivo, que tem de dar o aval para que a iniciativa legislativa aconteça de forma efectiva.

“O projecto já estava quase pronto há bastante tempo, mas sozinho achava que não teria condições políticas para andar. Mas, face ao apoio e à vontade do deputado Zheng Anting, resolvemos no mês passado solicitar a autorização do Chefe do Executivo”, lembrou.

Além deste projecto de lei, que visava uma revisão do diploma, o Governo tem recebido várias sugestões dos deputados para que haja uma nova interpretação da Lei de Terras, sem que tenha havido, até agora, respostas concretas.

No passado dia 23, a secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, referiu que o processo legislativo estaria a “seguir os trâmites normais”, sendo que Chui Sai On acrescentou ser “necessário fazer uma análise profunda”. Caberá a Sónia Chan “entregar um relatório”, disse ainda o Chefe do Executivo.

13 Jul 2017

IPM | Congresso internacional está pela primeira vez no Oriente

É a estreia no Oriente do congresso que reúne intelectuais de todo o mundo que se dedicam à língua portuguesa e às culturas a ela associadas. O local escolhido foi Macau e, para Carlos André, é uma opção lógica: o território tem uma história de língua e cultura que o justifica

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] 12.º Congresso da Associação Internacional de Lusitanistas realiza-se pela primeira vez no Oriente e o local eleito foi Macau. De 23 a 28 deste mês, o território é o palco para troca de conhecimento acerca da língua portuguesa e das culturas dos países que a falam.

A candidatura do território para acolher o evento foi feita em 2014, na passada edição do congresso em Cabo Verde, e a sua realização em Macau é, para Carlos André, uma escolha evidente. “O território tem no seu ADN 400 anos de diálogo de culturas. Portugal reconhece isso, Macau também e a China também, mas é a primeira vez que este reconhecimento é feito por intelectuais do mundo inteiro e isto é um dado muito importante”, disse ontem o académico, na apresentação do congresso.

Carlos André reforça: “É a primeira vez que universidades internacionais vêm ao território para afirmar com muita clareza que Macau tem um papel a desempenhar e que a história do território tem um significado muito especial neste diálogo cultural em que o português é, claramente, um elemento marcante”.

O evento, que conta na organização com o Instituto Politécnico de Macau (IPM), concretiza ainda “a confirmação da estratégia de ensino que o instituto já desenvolve há muitos anos e, com este congresso, vai continuar a desenvolver”, diz.

Conhecimento do Continente

De Macau vão participar entre oito a dez académicos, um da Universidade de Macau e os restantes docentes do IPM. No entanto, a maior novidade é a quantidade de professores chineses que se dedicam ao estudo da língua portuguesa. Este ano estão inscritos 16 académicos do Continente sendo que, quase todos, diz Carlos André, vão apresentar comunicações.

“Conheço os congressos da associação desde 1984 e é a primeira vez que há professores chineses”, explica. O destaque dado à participação dos académicos da China é inevitável. “O facto de, na sua maioria, participarem com apresentações do seu trabalho significa que estes jovens da China já evoluíram academicamente, e já têm conhecimentos e investigação realizada para poderem apresentar uma comunicação”, refere.

O também director do Centro Pedagógico e Científico de Língua Portuguesa explica a importância e o mérito que implica fazer apresentações neste evento. “Não apresenta comunicações quem quer, mas quem quer e é aceite”, sendo que os trabalhos são sujeitos a um processo de selecção através da revisão por pares e revisão cega. Ou seja, apenas os melhores são seleccionados. “É um processo muito exigente e que existe nas melhores organizações do mundo”, sublinha Carlos André.

O desenvolvimento dos estudos acerca do português na China revela a relevância que a língua começa a ter no Continente. “Se há um grande número de professores chineses com comunicações aprovadas, significa algo de muito importante: os estudos de português já evoluíram muito no interior da China”.

Semana de conhecimento

Os temas em destaque na edição deste ano são as literatura portuguesa, brasileira e africanas.

Vai ter lugar uma mesa redonda de escritores com a presença de Carlos Morais José, em representação do território. De Moçambique vai estar João Paulo Borges Coelho e do Brasil Ana Miranda. Fazem ainda parte do programa duas sessões plenárias e 48 sessões paralelas.

Os temas são muitos, mas Carlos André destaca alguns. A língua portuguesa em Macau, na China e no Mundo, é um deles, mas a literatura no cinema, trabalhos acerca dos estudos feministas presentes na literatura e na sociologia vão também ser alvo de apresentações.

O Congresso da Associação Internacional de Lusitanistas tem uma periodicidade trienal. Este ano, o evento tem 142 inscrições formalizadas. A organização contava com cerca de 180, mas alguns dos académicos vindos do Brasil não podem comparecer dada a situação de crise económica daquele país.

Estarão representadas 80 instituições de ensino superior de 15 países. Entre elas, Carlos André destaca algumas por serem consideradas das melhores do mundo. Oxford, Bolonha, a Beida de Pequim ou a Universidade de São Paulo são apenas alguns dos exemplos dados.

O evento está aberto a todos os que queiram assistir.

13 Jul 2017

Mário Costa, presidente da União de Exportadores da CPLP: “Podemos ser uma potência económica mundial”

Proporcionar o encontro entre empresários dos quatros cantos do mundo, tendo a língua portuguesa com factor unificador, é um dos propósitos de Mário Costa. O presidente do União de Exportadores da CPLP considera que, nos próximos 40 anos, o espaço lusófono pode tornar-se num dos grandes blocos económicos. A entrada na China faz-se, agora, através de Macau

[dropcap]Q[/dropcap]ual o papel da União de Exportadores da CPLP?
Fazemos parte da Confederação Empresarial da CPLP, somos reconhecidos como a representação do sector privado que veio introduzir um novo pilar económico na CPLP. O nosso objectivo é aproximar as empresas deste espaço e promover negócios. Como é óbvio, cada um destes países pertence a sub-regiões onde se pode fazer comércio livre. E ninguém é alheio ao peso de Macau como plataforma para a China, não só na colocação de produtos, como também na captação de investimento para estes países que têm grandes recursos naturais, tecnologia, know-how, mas falta capital. Falta alguma liquidez para pôr em prática os projectos. Temos países com recursos, como os países africanos e Timor-Leste, enquanto no Brasil e Portugal há tecnologia e know-how. Portugal e Brasil têm necessidade de sair para fora porque estão estagnados internamente; como tal, têm necessidade de ir para estes países onde estão os recursos. Mas falta o capital e sabemos que a China tem excedentes, não aplica todo o capital que tem.

Nesse contexto, a China é um gigante económico incontornável.
Queremos vir cá para mostrar todas as oportunidades que existem no mundo lusófono. Os empresários chineses têm boas oportunidades de negócio, não só ao nível de grandes infra-estruturas como portos e aeroportos, mas também ao nível de agricultura e indústria. Se juntarmos o know-how, os recursos naturais e a capacidade de investimento que a China tem, podem sair daqui projectos gigantescos. Se a CPLP conseguir introduzir este factor de liquidez em todo o processo, pode ser uma potência global, na nossa opinião. Em três ou quatro décadas, se continuarmos no percurso que estamos agora, a CPLP pode tornar-se numa potência económica mundial, tem tudo para isso. Estamos nos quatro cantos do mundo. Brasil na América, Portugal na Europa, os países africanos e Timor-Leste. Existe mercado, não só dos países da CPLP, como nas regiões onde estão inseridos, estamos a falar de quase 31 por cento da população mundial, são dois mil milhões de consumidores. Se juntarmos a isso liquidez, acho que isto é explosivo.

Macau servirá como plataforma para esta aproximação ao mercado chinês.
Sim, a minha vinda cá é para criar esse laço entre a parte chinesa e a parte dos países da CPLP, ou seja, uma perspectiva mais empresarial. Existem, neste momento, grandes contactos políticos, institucionais, e estamos a tentar passar isso para o mundo das empresas. Esta é a primeira aproximação, estamos a conhecer o mercado, a falar com as instituições oficiais para que, no futuro, tenhamos aqui um núcleo em Macau que possa servir todos os países da CPLP. A relação empresarial com a China é bastante importante, mas também abrimos delegações, por exemplo, nos Estados Unidos, na Rússia. Como costumo dizer, é preciso primeiro percorrer o caminho de pedras. Assim sendo, quis vir cá desbravar terreno. Este é um grande mercado de colocação de produtos e de captação de investimento. Macau é a estratégica plataforma para a China. Por cá já reunimos com o Fórum Macau e com o IPIM.

Como se escolhem empresas com capacidade de internacionalização?
É preciso avaliar muito bem os empresários porque estamos a falar de culturas muito diferentes, formas de pensar diferentes e é preciso que as pessoas saibam dialogar. Há muitos empresários que são bons no seu próprio terreno, na sua região ou país, e sair pode ser algo muito complicado. Esse trabalho é complexo. Muitos empresários também pecam porque fazem o negócio, mas depois esquecem-se da parte logística, da parte financeira, da parte da segurança jurídica dos negócios. Nós temos parceiros que podem ajudar nesses detalhes, temos dimensão para isso.

Como funciona a rede de núcleos da União de Exportadores da CPLP?
Temos núcleos em todos os países da CPLP, já estamos em 21 países. Normalmente, o coordenador do núcleo, que é vice-presidente, é um empresário de referência, que é o modelo de empresário que queremos para esse espaço. Depois temos o coordenador do núcleo e delegados, pessoas técnicas, que trabalham com os empresários. Se uma empresa quer ser associada avaliamos a empresa, o empresário. Os nosso especialistas, que conhecem muito bem a realidade dos outros países, avaliam se aquela companhia e pessoa estão preparadas para ter relações com estes países. Depois aceitamos a candidatura, ou não. A partir daí desenhamos o perfil deles. Os empresários têm de dizer o que é que têm, a experiência que têm para os darmos a conhecer ao mundo. Depois, os nossos núcleos vão procurar, junto dos nossos parceiros e associados, empresas que cumpram requisitos daquilo que eles pretendem, que tenham apetência de internacionalização e fazemos o match entre a oferta e a procura. A partir daí, quem faz os negócios são os empresários, nós somos apenas a plataforma de encontro.

Estes projectos também têm alcance social. Pode dar-nos um exemplo?
Temos o projecto da União de Exportadores para o Desporto, em que queremos aproveitar o desporto como factor de desenvolvimento do ser humano. Em África abrangemos seis milhões de crianças nas escolas e usamos o desporto como forma de educação. Só para ter uma ideia, havia uma grande necessidade de fazer o teste de HIV a crianças. O Governo montou tendas e ninguém apareceu. Então, fizemos um torneio de futebol e as crianças tinham de fazer o teste antes de participarem no torneio. Eram filas e filas de crianças. Neste momento estamos a organizar a maior competição juvenil em África, a Copa Coca-Cola. Queremos pegar nesses talentos para desenvolver o desporto, estamos a ajudar na organização dos clubes, de competições, fazer clubes link, ou seja, clubes portugueses, ou brasileiros, que possam ajudar a desenvolver clubes mais pequenos que tenham potencial. Estamos a criar centros de alto rendimento para desenvolver os jovens com maior talento.

Até que ponto as barreiras nacionalistas são empecilhos à cooperação económica?
Estou em países da CPLP todos os meses, fico uma semana em Portugal e uma semana fora, e sinto que há uma vontade muito grande de pertencer à CPLP, mas também há muita vontade de vincar que “este é o meu país”. Nesse aspecto estamos, agora, a fazer a diferença. Quando chegarmos ao cidadão comum e ele perceber que para ele a CPLP é importante, ele vai ter força sobre o seu próprio Governo. É isso que estamos a fazer. Estivemos na Guiné Bissau e levámos 80 empresários de Portugal, Brasil e Angola, entre outros países, para investirem lá. Não imagina a quantidade de pessoas que estavam no evento e que quiseram fazer negócio, que disseram: “Isto é uma luz ao fundo do túnel para nós. Pessoas que falam a mesma língua e que querem ser nossos parceiros?”. É uma lógica win-win. Queremos juntar tudo, capital, recursos, know-how, essa é a nossa lógica, criar empresas CPLP, não portuguesas, nem brasileiras, queremos empresas com a bandeira da CPLP, que falem todas a mesma língua, que formem um bloco. Já temos muitos casos mas, à escala mundial, são precisos muitos mais. Quando tivermos um nível forte de envolvência, vai ser o orgulho da própria pessoa a dizer que pertence à CPLP, que resultou disto.

Não teme dificuldades surgidas dos fantasmas do colonialismo?
Esse é um grande obstáculo que temos agora, mas que as novas gerações vão resolver. Eu próprio tive dificuldades com os angolanos por ser português e estar a liderar este projecto. Mas agora tenho grandes amigos angolanos, pessoas de topo que viram o trabalho que está a ser feito. As novas gerações em todos estes países já esqueceram um bocado o colonialismo, os mais velhos ainda têm alguma resistência, mas isso desaparece. Fala-se agora em livre circulação de pessoas e capitais, em cidadania CPLP, porque os empresários estão a exigir e os políticos vão atrás. A cooperação económica é estratégica e a lusofonia tem de se afirmar no mundo, se não a francofonia passa-nos à frente, assim como os ingleses. Nós temos mais afinidades entre os países lusófonos do que os países francófonos, eles têm uma relação mais fria e distante. Nós queremos cooperar, culturalmente somos muito mais afáveis, temos mais coração.

Quantos membros tem a União de Exportadores da CPLP?
A União de Exportadores tem quatro anos e tem mais de 600 associados, mas representamos milhões de empresas através de protocolos de parceria, e era esta dimensão económica que a comunidade precisava. A própria CPLP, em si, estava a ficar velha, ultrapassada quando estava a completar 20 anos. Não se sabia para que servia. Tivemos de introduzir o pilar da cooperação económica, se não nada faz sentido. Houve necessidade de renovar a CPLP, em 2010 deram estatuto à Confederação Empresarial. Nós consideramos que os empresários têm de andar sempre à frente dos políticos.

12 Jul 2017

Kwan Tsui Hang faz balanço de mais de 20 anos de vida política

É uma figura de peso da Assembleia Legislativa que decidiu não se recandidatar nas eleições de Setembro próximo. Ontem, Kwan Tsui Hang fez um balanço do trabalho de mais de duas décadas enquanto deputada. Recordou os tempos da Administração portuguesa e falou do impacto do caso Ao Man Long

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão tem planos para projectos políticos ou cívicos. Kwan Tsui Hang entende que, por ser deputada, dedicou pouco tempo à família, pelo que a saída da cena política vai ser aproveitada para colmatar essa falha. Tem ainda planos de viagens que deixou por fazer. “Quero conhecer o mundo”, disse ontem a mulher que, desde 1996, ocupa um assento na Assembleia Legislativa (AL).

Kwan Tsui Hang chamou a imprensa para fazer uma espécie de balanço das mais de duas décadas ao serviço do órgão legislativo do território. Traçou ainda algumas expectativas em relação ao futuro da AL.

Com ligações aos Operários, a ainda deputada entrou na Assembleia pela porta do sufrágio indirecto. Eram outros tempos, o território estava sob Administração portuguesa, e a mulher que é, há já vários anos, presidente de uma das comissões permanentes, não tinha qualquer experiência na política.

A prioridade foi “aprender sobre o funcionamento do Governo e sobre direito porque, no início, não tinha conhecimentos suficientes sobre essas áreas”. Dos anos anteriores à transferência recorda ainda as dificuldades que sentia por a língua portuguesa ser a mais usada na AL.

Veio 1999 e, no final de 2006, o mega escândalo de corrupção protagonizado pelo antigo secretário para os Transportes e Obras Públicas. Kwan fez referência ao caso Ao Man Long, para confessar que sentiu uma maior necessidade de “melhorar a fiscalização dos trabalhos do Governo”. O estado de graça da RAEM tinha chegado ao fim.

A deputada nota que foi precisamente depois deste processo que a AL decidiu criar as comissões de acompanhamento, estruturas que contam com “os esforços dos colegas” e que servem para uma fiscalização mais regular daquilo que o Executivo vai fazendo.

Na análise à relação do hemiciclo com o Executivo, Kwan Tsui Hang observa ainda uma utilização cada vez maior dos mecanismos de interpelação escrita e oral, o que permitiu “reforçar o modo como o Governo é supervisionado”.

O lado amargo

Kwan Tsui Hang é presidente da 1.a Comissão Permanente há já várias legislaturas. Sobre a função que exerce, reconhece que “não é nada fácil”. As reuniões do grupo de deputados, que acontecem à porta fechada, exigem a conciliação de opiniões e interesses dos seus membros. A missão de quem lidera passa sobretudo por conseguir juntar ideias para que se chegue a uma conclusão mais ou menos consensual.

“Não se pode apenas representar o sector a que se pertence”, explica a voz dos Operários, admitindo que foi alvo de críticas por não haver, por parte de alguma opinião pública, a noção de que o exercício deste tipo de funções obriga a uma postura diferente daquela que se tem enquanto apenas deputada. “Mas é necessário que alguém assuma esta responsabilidade”, ressalva.

Também foi necessário passar por cima de críticas e de momentos desagradáveis. As eleições de 2013 não foram um momento fácil da vida de Kwan Tsui Hang, marcadas por difamações. “Recebi o apoio da minha equipa, de amigos e de cidadãos, que me encorajaram”, recorda, visivelmente emocionada.

As difamações de que foi alvo também em 2009 levam-na a pedir às autoridades que se mantenham atentas, para que se garanta que o processo de Setembro decorre sem problemas. Kwan sente que, no seu caso, não chegou a ser feita justiça, uma vez que, um ano depois das penúltimas eleições, ainda não se tinha feito prova acerca do autor de panfletos em que tinha sido difamada.

Em Setembro de 2011, a deputada voltou a ser alvo de um processo complicado, com a presença de manifestantes em frente ao seu escritório que tiveram, sublinha, atitudes igualmente difamatórias. Só ano passado é que o caso foi levado a julgamento mas, diz Kwan Tsui Hang, até ao momento ainda não foi executada a sentença do tribunal. São memórias agrestes que leva da vida pública que teve nas últimas duas décadas.

 

Para os vindouros

São mensagens para os que vêm a seguir: Kwan Tsui Hang espera que os deputados eleitos em Setembro possam aproveitar melhor os mecanismos de fiscalização do Executivo, para que se possa assistir a um aumento da eficiência da governação.

A deputada deixa também um apelo ao consenso: apesar de os membros da Assembleia Legislativa terem diferentes preocupações e posturas perante a sociedade, não é de todo impossível, nalguns casos de cariz social, encontrar-se uma solução. Basta que haja colaboração entre todos, diz.

Kwan Tsui Hang sai da vida política com uma pedra no sapato: a inexistência de uma lei sindical, prevista pela Lei Básica. Lamentando que os vários projectos de lei tenham sido chumbados, a deputada diz-se, no entanto, confiante de que, no futuro, Macau terá este tipo de legislação. “Os que vierem a seguir, os deputados das associações dos Operários, vão continuar a lutar por esse objectivo.”

Prestes a chegar a hora da despedida, Kwan sublinha que é normal a passagem de testemunho para os mais novos. É essa a ordem natural da vida, aponta. “Com as experiências que se passam às próximas gerações, os nossos descendentes vão fazer muito melhor do que as gerações anteriores. Por isso, não estou preocupada com nada depois da minha saída”, remata.

12 Jul 2017

Lei das rendas | Economistas expectantes quanto aos resultados

Contratos com o mínimo de três anos, aumentos das rendas a serem controlados pelo Chefe do Executivo. Dois economistas estão expectantes quanto aos resultados práticos da nova lei de rendas. Trata-se de medidas “correctivas”, mas há “dúvidas”, uma vez que os interesses envolvidos “podem ser maiores”

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] proposta de lei relativa à alteração do regime jurídico de arrendamento previsto no Código Civil, ou lei das rendas, demorou a ver a luz do dia, mas os nove deputados que apresentaram o diploma conseguiram finalmente chegar a um acordo com o Governo.

Os contratos terão de ter, no mínimo, três anos em vez dos dois anos actualmente definidos por lei, sendo que o Chefe do Executivo poderá implementar um mecanismo de controlo dos aumentos das rendas, quando bem entender.

Dois economistas com quem o HM falou estão expectantes quanto aos resultados, na prática, deste diploma. Para José Sales Marques, trata-se de “uma boa medida”. “Uma coisa importante é o aumento do prazo de arrendamento para três anos. Sabemos que proprietários nem sempre respeitam o período de arrendamento de dois anos, já previsto na lei, mas é uma boa medida.”

O mecanismo a implementar pelo Chefe do Executivo terá sempre um carácter provisório, consoante o desempenho do mercado imobiliário. Na visão de Sales Marques, não deveria ser criado um mecanismo permanente para o controlo das rendas, por ser “um pouco contraproducente”.

“Não me parece que estaria de acordo com os princípios do mercado. Esta é uma medida correctiva, que integraria como uma política pública, que está sujeita a alterações consoante as necessidades e um conjunto de circunstâncias. Deve ser encarada como uma medida que deve entrar em funcionamento como um mecanismo correctivo”, apontou ainda.

Não chega

Para Albano Martins, estas novas medidas são “melhores do que nada”, mas não chegam para controlar os aumentos excessivos das rendas. “Coloca nas mãos do Chefe do Executivo uma decisão que deveria ser de política económica. O Governo deveria dizer que não autoriza que as rendas cresçam acima de determinado valor e as pessoas estariam protegidas.”

O economista alerta para os interesses no sector da parte de quem apresentou o diploma na Assembleia Legislativa. “Essa lei foi feita por deputados e alguns deles dificilmente não estarão em colisão de interesses com os seus próprios interesses, e teremos de ver a lei antes de ela sair”, diz.

Albano Martins lembra mesmo que, caso houvesse a ideia de aplicar, neste momento, o mecanismo de controlo das rendas, o Chefe do Executivo poderia alegar que não era necessário.

“Dizem que o Chefe do Executivo se vai basear nos dados da inflação, mas neste momento poderia dizer que não seria preciso coeficiente nenhum, porque, segundo as estatísticas do Índice de Preços do Consumidor, verificamos que os valores estão a baixar nas rendas, mas na prática sabemos que não é bem assim.”

“As rendas estão a subir, os imóveis também, mas o Chefe do Executivo pode dizer que a inflação está a cair. Ninguém acredita que as rendas estão, portanto, a baixar, e por isso o Chefe do Executivo pode dizer que não é necessário qualquer coeficiente, porque a inflação está em queda”, exemplificou ainda o economista.

Mais transparência

Albano Martins confessa ter “dúvidas” sobre o lado prático deste diploma. “Vamos aguardar para ver como é que as coisas vão correr. Parece-me que esta não é a melhor solução, porque vai passar a resolução do problema para as mãos do Chefe do Executivo, que não fixa, à partida, o tecto máximo de subida das rendas. Vai tomar a decisão em função daquilo que acha [ser o mais correcto].”

O economista considera que é necessária uma maior transparência num processo que demorou cerca de dois anos a ficar concluído.

“Vê-se que as pessoas não estão muito à vontade em relação ao que estão a propor, e acho que os interesses são maiores. As forças que movem o mercado fazem com que a especulação seja enorme e, como os imóveis vão sempre subindo, as rendas vão acompanhando o mercado”, defendeu Albano Martins.

12 Jul 2017

Pátio da Eterna Felicidade | Governo continua sem planos para espaço

O Instituto Cultural já concluiu os trabalhos de reparação das velhas estruturas do Pátio da Eterna Felicidade, mas ainda não sabe que tipo de projecto vai ali desenvolver. O Governo continua sem “planos específicos” para outros pátios semelhantes

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]utrora albergou pessoas, até que estas foram saindo aos poucos, à medida que as paredes das suas casas iam envelhecendo. Já ninguém reside no Pátio da Eterna Felicidade, localizado perto da Rua dos Mercadores, nas imediações das Ruínas de São Paulo.

O HM deslocou-se ao local e viu as portas cerradas e barras de aço a segurar as velhas paredes. Segundo explicou o Instituto Cultural (IC), os trabalhos de reparação das estruturas dos edifícios estão concluídos.

Não há, contudo, ideias sobre os projectos culturais ou artísticos que ali poderão ser desenvolvidos. Nem para o Pátio da Eterna Felicidade, nem para todos os outros espaços semelhantes, que guardam ainda a arquitectura chinesa de outros tempos. “Quanto a esse pátio e a outros pátios ou becos, o IC ainda não tem planos específicos”, apontou.

Interligações

Em 2014, o IC referiu que os trabalhos de reparação das estruturas neste local eram de extrema importância, por estarem relacionados com outros projectos culturais que iriam nascer no mesmo bairro. Um deles era a renovação de um edifício que deu casa à Cinemateca Paixão, entretanto inaugurada.

A renovação das casas do pátio foi mesmo considerada pelo IC como um projecto que seria “um exemplo de defesa do património”. No total, foram recuperados oito edifícios dentro do Pátio da Eterna Felicidade, tendo sido mantidas as estruturas originais, além do reforço que foi feito às colunas e na zona das telhas.

Na zona envolvente, permanecem vários edifícios antigos que correm o risco de ruína. Há meses, ocorreu mesmo a queda de parte de um edifício localizado bem ali ao lado, na Rua da Tercena, sem que tenha havido vítimas ou feridos. Enquanto isso, a zona tem florescido com a abertura de novos espaços comerciais.

Já há poucos pátios de arquitectura chinesa que permanecem habitados, sendo que a maioria continua a ter moradores que residem lá desde sempre e que, já idosos, temem em permanecer. São velhas estruturas que continuam sem um plano definido pelo Governo.

12 Jul 2017

AL | Antigos rostos pedem renovação e dizem que há mais populismo

Quase tudo mudou desde que a Assembleia Legislativa da era RAEM começou a operar. Antigos deputados como Jorge Fão e João Manuel Baptista Leão falam das práticas populistas levadas a cabo por alguns tribunos, por culpa de Hong Kong. Iong Weng Ian defende a substituição dos velhos pelos mais novos

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi há tanto tempo que João Manuel Baptista Leão foi deputado que a memória falha. É hoje mais difícil recordar os momentos de quando esteve na Assembleia Legislativa (AL), a partir da legislatura de 1999/2000. Esta foi uma das antigas vozes do hemiciclo que aceitou recordar o passado e falar do trabalho desempenhado pela AL nos dias de hoje.

João Manuel Baptista Leão é membro da comissão que elege o Chefe do Executivo, além de ser dirigente de uma associação que organiza cursos de formação contínua para adultos, em parceria com a Universidade Cidade de Macau.

A AL que deixou já não é a mesma mas, na sua visão, isso não é necessariamente mau. “Tudo mudou. Antes da transferência de soberania, a AL podia, por própria iniciativa, produzir uma lei. Depois deixou de ter este direito e cabe ao Chefe do Executivo autorizar previamente.”

Foto: HM

Este é o primeiro exemplo de mudança apontado pelo antigo deputado, mas João Manuel Baptista Leão fala ainda da maior representatividade social que hoje existe, pelo facto de o hemiciclo ter 33 deputados. Há, contudo, falhas a apontar.

“A AL deveria analisar melhor as leis, ter mais tempo para os seus trabalhos. Os deputados deveriam trabalhar a tempo inteiro e não a tempo parcial, porque precisam de mais tempo para analisar as leis”, disse ao HM.

Ao olhar de fora para a casa política que já foi sua, João Manuel Baptista Leão considera que é altura de os jovens assumirem a dianteira do poder legislativo.

“Já é altura de dar oportunidade aos jovens para se candidatarem. Há pessoas que estão na AL há muitos anos e é altura de alterar o elenco. Os mais velhos têm de entregar os seus lugares.”

Jorge Fão, que foi deputado há 12 anos, diz que nunca foi homem de querer ficar na AL por muito tempo. “Há quem goste de ficar ali eternamente, não foi o meu caso, porque fiquei ali uns anos, conheci os cantos à casa e não me encostei.”

Hoje é dirigente da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau, sem nunca ter deixado de ser uma voz activa nesta área.

Foto: Sofia Margarida Mota

Estabelecendo uma comparação com o seu tempo, Jorge Fão, que foi número dois de David Chow, acredita que hoje o hemiciclo é mais populista, muito por culpa de actos de alguns deputados, como a apresentação de cartazes nos debates.

“No meu tempo havia debates mais sérios, com menos fogos-de-artifício, por assim dizer”, apontou. “Hoje em dia está na moda o populismo, que se verifica em toda a parte, como em Hong Kong. Em Taiwan este populismo existiu uns tempos, mas verificam-se hoje menos debates desse género. De Hong Kong alastrou para Macau.”

Jorge Fão recorda que alguns deputados “começaram a levar cartazes para os debates, a levar bonecos para cima da mesa”. “Nunca vi uma coisa semelhante nos parlamentos em Portugal ou no Reino Unido. Isto está aliado a uma certa imaturidade política e ao facto de as pessoas quererem fazer um pouco de show-off. Algumas declarações não têm fundamento e não passam de um embuste eleitoral para enganar os eleitores menos informados ou atentos.”

Menos debates, mais leis

Jorge Fão e David Chow chegaram a ser autores de um projecto de lei sindical que, à semelhança de todos os outros que se seguiram, não foi aprovado. Para Fão, antes a AL tinha mais iniciativa legislativa, algo que faz falta nos dias de hoje.

“A AL tem realizado um trabalho inquestionável, mas não vejo muito trabalho legislativo a partir da própria Assembleia. A entidade que legisla praticamente não tem apresentado qualquer projecto digno de registo. A esmagadora maioria dos articulados são propostos pela própria Administração”, diz, falando “num certo desequilíbrio.”

“No meu tempo conseguimos apresentar os nossos projectos, e não foram poucos. Nem todos foram aprovados, como é natural, mas muitos foram apresentados, e subscritos por vários deputados”, recorda.

Hoje há mais pedidos de debates apresentados pelos deputados mas, para Jorge Fão, isso não é um sinal de amadurecimento político do hemiciclo.

“Verificam-se mais debates, há uma maior participação por parte dos deputados, nomeadamente no ano em que estão marcadas eleições. Isto é uma questão de visibilidade e tem a intenção de caçar votos. Todo este tipo de show-off não passa de populismo. Não tem qualquer interesse para a comunidade ou sociedade”, acusa.

Tal como João Manuel Baptista Leão, também Jorge Fão considera importante chamar mais jovens para a política, algo que se verifica nas próximas eleições legislativas, agendadas para 17 de Setembro.

“Vão participar pessoas mais jovens, que querem lançar-se na vida política. Isto é muito saudável, até porque temos de rejuvenescer. Vai haver caras novas e faço votos para que se possam inteirar das questões de Macau e encontrar as melhores soluções para a sociedade.”

Da AL para a APN

Iong Weng Ian foi deputada com ligações à Associação Geral das Mulheres de Macau (AGMM). Actualmente é mandatária da lista de Wong Kit Cheng para as eleições deste ano e desempenha o cargo de deputada por Macau à Assembleia Popular Nacional onde, junto de Pequim, apresenta algumas ideias em prol do desenvolvimento do território.

Além disso, a ex-deputada fala de um intenso trabalho desenvolvido junto das comunidades que mais precisam. “Quando tomei a decisão de sair da AL já tinha o objectivo de deixar o lugar aos mais jovens. Continuei a participar nos serviços sociais, sobretudo nos assuntos ligados às mulheres.” 

Hoje olha para a AL como um local onde “há vários aspectos por desenvolver”. “Os diferentes grupos têm diferentes tópicos a que dão destaque mas, como membro da AGMM, quero que a AL trabalhe mais na área dos assuntos familiares, que legisle sobre as garantias dos idosos e dos inválidos, e que aborde a questão da habitação”, aponta.

Convidada a fazer um comentário sobre as eleições deste ano, Iong Weng Ian lembra que, este ano, a concorrência é muito grande na eleição pelo sufrágio directo, pelo facto de existirem 25 listas. “Não será fácil a reeleição, mas queremos dar o nosso melhor e os esforços nas eleições.”

“Macau é uma sociedade democrática, quantas mais comissões de candidatura houver melhor, e todos contribuem para o desenvolvimento de Macau com os seus conhecimentos e experiências. É bom haver muitas comissões de candidatura. Espero que as eleições deste ano decorram de forma justa e limpa”, declarou a antiga deputada.

Iong Weng Ian faz ainda algumas críticas ao trabalho do Executivo. “Acho que a sociedade se desenvolveu nos últimos anos, tal como o Governo. Mas o Governo pode fazer melhor em relação às políticas de apoio à família, tendo em conta o desenvolvimento dos jovens e dos idosos.”

 

 

Sistema de contagem de votos para continuar

Num ano em que vários grupos optaram por apresentar listas separadas, na expectativa de conseguirem melhores resultados eleitorais, os antigos deputados consideram que não é necessário alterar o actual sistema de conversão de votos em mandatos. “Neste momento, há várias opiniões sobre este assunto, mas podemos continuar com este sistema. Tentamos lutar pelos votos dos eleitores com base neste método”, referiu Iong Weng Ian. Para Jorge Fão, não é aconselhável alterar o sistema nesta fase. “Este é um método de Hondt adulterado, mas traz vantagens, porque o território é pequeno e não temos partidos políticos. Como tal, este tipo de método serve para aqueles que querem participar na vida pública. Os grupos mais pequenos têm hipótese de ser eleitos. Não é oportuno mudar o sistema”, defendeu o antigo deputado.

Mais juristas e tradutores precisam-se

Se no tempo de Jorge Fão a AL tinha falta de tradutores e de juristas, hoje esse problema é ainda mais visível. “Todos os deputados têm estado muito atarefados, porque as propostas de lei do Governo são mais. Acho que o número de juristas que trabalham na AL é pouco, e deveriam pensar em recrutar mais pessoal de apoio, com experiência e que perceba a legislação local. Quanto aos intérpretes-tradutores, o grupo também deve estar desfalcado, pois já no meu tempo sentia a falta de tradutores. Estou a ver que continua a existir essa situação”, frisou.

11 Jul 2017

Jogo | Lionel Leong pondera revisão à lei de concurso de concessão

O secretário para a Economia e Finanças admite a possibilidade de rever a legislação que regula os concursos públicos de concessão de jogo. Fica em aberto se a figura das subconcessionárias será para manter, assim como o número de concessionárias

[dropcap style≠’circle’]“E[/dropcap]stamos a ponderar vários aspectos quanto ao concurso público mas queremos, primeiro, ouvir as opiniões da sociedade”, explicou Lionel Leong. O secretário para a Economia e Finanças debruçou-se ontem sobre o fim dos contratos de concessão do jogo, que terminam em 2020 e 2022. As declarações foram feitas à margem de uma reunião da 2.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa.

Para já, o secretário explicou que ainda não existem decisões, mas que o importante será o “desenvolvimento do sector do jogo da forma mais saudável possível” e que, para tal, é essencial auscultar e analisar opiniões de vários quadrantes da sociedade.

Um dos aspectos de maior relevância é se as concessões vão manter a mesma configuração, com três concessões e três subconcessionárias. Nesse aspecto, Lionel Leong explicou que tudo está em aberto. “Na altura da liberalização do jogo, o concurso público foi feito com uma conjuntura económica completamente diferente da que temos hoje em dia”, recorda.

O secretário explica que actualmente há mais concorrência e um panorama económico diferente que deverá ser tido em conta na altura do concurso. A indefinição parece ser o ponto de partida. “O Governo tem de responder e pensar em novas formas de desenvolvimento em termos de concurso público, não eliminamos qualquer possibilidade”, perspectiva Lionel Leong.

Maduro Junho

Caso se altere o número de operadoras de jogo em Macau, um dos aspectos que terá de ser adequado para prever este novo paradigma é uma mudança ao regime legal. Mais especificamente, no concurso público “se as propostas não corresponderem à legislação em vigor, será necessário revê-la”, revelou Lionel Leong.

Para já, o governante adianta que o Executivo está a analisar várias possibilidades, na antecipação de 2020. O número de licenças, assim como os respectivos requisitos de concurso terão de se adequar ao desenvolvimento do mercado dos casinos, assim como às “várias expectativas que a sociedade tem”.

De modo a aferir se haverá necessidade de alterar os moldes do concurso, o Governo está a realizar “um estudo pormenorizado”.

Lionel Leong não escapou à evidência de que “o jogo é o pilar da economia de Macau, portanto, é necessário que tenha um desenvolvimento saudável”.

O secretário para a Economia e Finanças ainda mencionou os lucros do sector em Junho. No mês passado, os casinos do território obtiveram receitas de quase 20 mil milhões de patacas, o que representou um aumento de 25,9 por cento em relação ao período homólogo do ano passado. Os dados oficiais, porém, são um pouco enganadores. Lionel Leong explicou que, devido aos péssimos resultados de Junho de 2016, o crescimento dos lucros desta ordem “não é um aumento real”, sendo necessário ter em atenção “os dados estatísticos dos próximos meses”.

Noutro aspecto, Lionel Leong ainda destacou o bom comportamento das pequenas e médias empresas do território. “Os serviços terciários tiveram um aumento de 20,9 por cento”, explica. Esta vitalidade económica que, apesar de estar fora do sector do jogo é intimamente conexa com o mesmo, é encarada pelo secretário como um bom indicador da economia de Macau.

11 Jul 2017

Lei das rendas | Contratos vão passar a ter o mínimo de três anos

Os deputados chegaram a acordo sobre a lei das rendas, que será votada ainda nesta legislatura. Os contratos de arrendamento terão o mínimo de três anos e será o Chefe do Executivo a decidir quando e qual será o limite máximo a cobrar por uma renda. Esse mecanismo será sempre “provisório”

[dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]á há luz verde sobre o projecto de lei apresentado por nove deputados da Assembleia Legislativa (AL) em 2015, intitulado “alteração do regime jurídico de arrendamento previsto no Código Civil”.

Segundo explicações do presidente da 3.ª Comissão Permanente da AL, Cheang Chi Keong, os contratos de arrendamento, quer sejam de habitação ou para fins comerciais, terão um mínimo de três anos de duração, mais um do que está previsto na legislação em vigor.

“Decidimos passar os contratos de arrendamento para habitação também para três anos, para sermos justos. Nesses três anos o senhorio não pode mexer no contrato e, segundo o Código Civil, o inquilino pode mexer. Isto serve para proteger os inquilinos, em especial os que vêm temporariamente para Macau”, explicou Cheang Chi Keong.

O diploma vem, sobretudo, introduzir o mecanismo de definição do coeficiente máximo da renda a cobrar ao inquilino. Este será implementado por despacho do Chefe do Executivo, que passa a decidir quando é que os aumentos das rendas devem ter um travão, e por quanto tempo. O Chefe do Executivo também vai determinar quais os tipos de contrato onde se aplica este controlo.

Foto: Tiago Alcântara

“O mecanismo de coeficiente de actualização das rendas será uma medida excepcional e transitória, e só pode ser usado em determinados contratos”, adiantou o deputado.

Isto significa que a definição de um tecto máximo para os aumentos das rendas terá a duração que o Chefe do Executivo entender, dependendo da situação do mercado imobiliário.

A definição deste coeficiente terá em conta os índices económicos como o Índice de Preços do Consumidor, a taxa de inflação ou a média salarial.

“Não é que não se possam aumentar as rendas. As rendas podem ser aumentadas, desde que não se vá além deste coeficiente máximo definido pelo Governo. Quando o Governo quiser implementar este mecanismo tem de ter em conta os vários índices existentes. O Governo passa a ter uma arma para controlar os aumentos”, acrescentou Cheang Chi Keong.

Segundo o deputado, nunca houve a ideia de criar um mecanismo permanente de controlo dos aumentos das rendas.

“O Chefe do Executivo é que vai decidir quando implementa e quando cancela essa medida. É uma medida, digamos, picante, e será boa porque o Chefe do Executivo pode intervir a qualquer momento”, frisou.

Mais um centro de arbitragem

O projecto de lei prevê ainda que o Governo venha a criar um centro de arbitragem para a resolução dos conflitos de arrendamento, ainda que existam actualmente quatro centros a operar.

Cheang Chi Keong recorda que os casos poderão ser reencaminhados para os centros de arbitragem que já funcionam junto da Associação dos Advogados de Macau e do World Trade Center. “Podemos utilizar os actuais mecanismos, mas o Governo pode, segundo o projecto de lei, criar um centro de arbitragem. Cabe ao Governo decidir”, apontou o presidente da 3.ª Comissão Permanente.

Outra das regras instituídas será a do reconhecimento das assinaturas dos contratos através das assinaturas feitas noutros documentos. Tal vai permitir, na visão dos nove proponentes, a redução dos casos de pensões ilegais, pois “muitos dos documentos apresentados aquando das assinaturas dos contratos são ilegais”.

Um “consenso geral”

Cheang Chi Keong falou ainda das razões para a demora na análise deste diploma na especialidade. Nestes meses, a comissão apreciou as opiniões apresentadas pelo sector imobiliário e associações, no âmbito de uma consulta pública.

A versão final do diploma reúne, hoje, um “consenso geral”. “Poderemos assinar o parecer em breve e, de acordo com os trabalhos, é totalmente possível finalizar o trabalho até ao final do mês”, disse o deputado, que acredita que, com este diploma, o mercado imobiliário ficará numa situação mais estável.

“No futuro, o Governo poderá manter os valores do mercado mais estáveis, uma vez que as rendas ainda são elevadas. Até agora o Governo não podia mexer nas rendas, porque não tinha armas para isso”, concluiu Cheang Chi Keong.

 

“Não estamos a interferir no mercado”

À margem da reunião de ontem, a deputada Song Pek Kei, uma das signatárias do projecto de lei, garantiu aos jornalistas que não se está a intervir no mercado. “Pensamos que seria necessário ajustar o mercado privado de arrendamento com vista a um desenvolvimento mais saudável. O projecto de lei está mais detalhado e tem um elevado grau de operacionalidade, que corresponde à nossa intenção inicial de avançar com esta política”, frisou.

11 Jul 2017

Timor-Leste | A campanha mais profissional de sempre para as legislativas

Timor-Leste prepara-se para ir a votos já no dia 22 de Julho. No país, a campanha eleitoral já ferve e, pela primeira vez, há ferramentas mais profissionais usadas pelos candidatos para fazer passar a mensagem política
António Sampaio, Agência Lusa

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]o marketing político ao uso de ‘drones’, de debates em estúdios de última geração à intensa intervenção nas redes sociais, a campanha para as legislativas de 22 de Julho em Timor-Leste está a ser a mais profissional de sempre.

Uma profissionalização que se nota em particular nos maiores dos partidos – o Congresso Nacional da Reconstrução de Timor-Leste (CNRT) de Xanana Gusmão e a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), de Mari Alkatiri.

Em Díli, por exemplo, onde os dois partidos ainda praticamente não estiveram desde o início da campanha, que começou a 20 de Junho, a sua presença já se nota de forma significativa com ‘outdoors’ de grandes dimensões a decorarem as principais avenidas.

Cartazes em que CNRT e Fretilin dominam, mas que incluem também outros, quer do partido timorense mais antigo, a União Democrática Timorense (UDT, quer do mais recente, o Partido da Libertação Popular (PLP), liderado pelo ex-Presidente Taur Matan Ruak.

Do lado do CNRT as imagens apostam na figura do seu líder, Xanana Gusmão, que aos 71 anos de idade ainda não falhou um ato de campanha, percorrendo Timor-Leste de uma ponta a outra para os comícios do partido.

“Vota CNRT, vota no futuro” é o ‘slogan’ do partido que, desde o sorteio do seu lugar no boletim de voto, aposta também nas referências futebolísticas: o C e o R e o 7 a serem referências a Cristiano Ronaldo.

Dionísio Babo, presidente do Conselho Directivo Nacional – e que é também ministro da Coordenador dos Assuntos da Administração do Estado e da Justiça e ministro da Administração Estatal – diz que o profissionalismo se nota tanto nas estratégias dos partidos como na forma como funcionam as autoridades eleitorais, STAE e CNE.

Mais informação

Uma profissionalização que reflecte ao mesmo tempo as melhorias que se vivem em Timor-Leste mas também a necessidade de responder a uma população mais informada em que “mais de 20% são novos votantes, sem tanta relação emocional com o legado do passado”.

Para estes jovens, disse, a aposta é na publicidade nas redes sociais, com mensagens “mais profissionais” que ajudem a dar a conhecer o partido.

O CNRT, por exemplo, usou ‘drones’ para gravar imagens de vários pontos de Timor-Leste, mostrando novas infra-estruturas e o desenvolvimento que o país viveu. O vídeo passa agora nas redes sociais mas também em tempos de antena na televisão pública RTTL ou no recém inaugurado canal privado GMN TV.

Babo reconhece o impacto que a diferente capacidade financeira dos partidos tem na sua promoção mas nota que mesmos os mais pequenos conseguem fazer chegar a sua mensagem nas redes sociais, por exemplo.

Também a Fretilin mostra uma máquina de campanha profissional e sofisticada com imagens que recorrem a anónimos para promover o slogan “fazer mais” e vídeos que mostram um país vibrante e activo sob o lema “Ba Timor-leste Ida Buras Liu (para um Timor-Leste mais desenvolvido).

José Teixeira, um dos arquitectos da campanha, aponta o elevado grau de profissionalização e sofisticação da campanha, resultado da evolução do país, da aposta da Fretilin na formação dos seus jovens e no apoio de organizações internacionais como a Labour International ou o International Republican Institute que “deram formação a todos os partidos” em aspectos como o uso das redes sociais.

“A aposta nos jovens foi uma das melhores coisas que fizemos. A Juventude Fretilin, jovens qualificados e emergentes, aproveitam toda a tecnologia e tudo o que temos disponível, permitindo uma campanha diferente”, explicou.

“Em vez de ter só os líderes a falar, temos os jovens que vão aos mercados, aos parques, a todo o lado e montam um ponto de promoção para dar a conhecer os nossos planos, os nossos programas.”

O ‘estreante’ PLP, com menos dinheiro que os dois grandes, faz valer a sua promoção num grupo de jovens intensamente activos nas redes sociais, muitos deles ex-jornalistas que estiveram no gabinete de imprensa da Presidência.

Imagens, vídeos, comentários, intervenções políticas marcam o debate diário num espaço onde já estão, segundo as estimativas mais recentes, mais de 400 mil timorenses (um terço da população).

Taur Matan Ruak é a figura central do partido ainda que outros nomes, como Fidelis Magalhães, surjam também a representar o PLP, inclusive em debates televisivos que têm, nas últimas semanas marcado a programação televisiva.

Este fim-de-semana, por exemplo, o Conselho de Imprensa conduziu, nos estúdios da GMN TV, um debate com sete dos 21 partidos. O tema: o Estado da Comunicação do Estado. A campanha para as legislativas termina a 19 de Julho.


Interpretações abusivas?

O Partido Socialista de Timor (PST) acusou as autoridades eleitorais de impedirem, em alguns municípios de Timor-Leste, algumas acções de campanha para as legislativas deste mês, no que considerou “uma abusiva” interpretação da lei.

“A base da nossa queixa fundamenta-se no facto de em alguns municípios os militantes estarem a ser impedidos de fazer campanha porta a porta, dentro do horário estipulado para a campanha”, disse à Lusa, Azancot de Menezes, secretário-geral do PST.

“No nosso ver há uma interpretação errada da lei. Num Estado livre e democrático não se pode impedir elementos dos partidos de andarem nas ruas a distribuir folhetos ou a dialogar com os cidadãos”, disse.

A base da polémica está na interpretação dada a um dos artigos do decreto de Maio deste ano que regula as regras da campanha eleitoral para as legislativas de 22 de Julho e que, segundo o PST, alguns elementos das delegações municipais da Comissão Nacional de Eleições (CNE) usam para “criar obstáculos a todos os partidos políticos”.

O artigo em causa determina que todos os partidos têm que fornecer o calendário de actividades de campanha à CNE até cinco dias antes do início da campanha.

“Caso houver coincidência de local e horário para os partidos políticos ou coligações partidárias, a CNE notifica os partidos políticos ou as coligações coincidentes para concordância mútua sobre o horário e local”, refere o decreto.

O PST insistiu que esta questão abrange apenas situações de comícios ou outros actos de campanha de maior dimensão e que, nesses casos, “a CNE deve ser informada atempadamente para evitar a realização de encontros simultâneos, no mesmo local e hora, de vários partidos políticos”.

Não pode, considerou o PST, “haver limitação à campanha, nem necessidade de autorização prévia e muito menos que se possa proibir as campanhas” noutros casos.

Contra as notícias falsas

A comissão eleitoral tem, entretanto, alertado para a publicação de notícias falsas em formatos digitais. Recentemente o presidente da Comissão Nacional de Eleições disse estar em estudo uma eventual denúncia junto do Ministério Público para investigar ‘sites’ e páginas digitais de noticias falsas sobre a campanha para as legislativas.

“Estamos preocupados com esta situação e estamos a estudar apresentar uma denúncia junto do Ministério Público ou da polícia para investigar quem são os autores deste tipo de actos”, disse à agência Lusa Alcino Baris.

“Consideramos que este tipo de actos prejudicam a estabilidade própria desta fase da campanha e, por isso, estamos a pensar apresentar uma denúncia para apurar os autores” afirmou.

Pela primeira vez, numa campanha política em Timor-Leste, as redes sociais têm sido inundadas de notícias falsas, muitas alegando apresentar informação sobre declarações que líderes dos principais partidos, CNRT e Fretilin, teriam feito em comícios ou encontros.

As notícias sugerem ter havido críticas mútuas entre os líderes dos partidos – cujo relacionamento é hoje mais próximo do que nunca – com os internautas em redes como o Facebook a partilharem os textos centenas de vezes. Em muitos casos, os textos são partilhados por militantes de outras forças políticas.

Timor-Leste é um dos países onde as redes sociais, nomeadamente o Facebook, e plataformas de comunicação como o Whatsapp têm mais importância, com o acesso à internet a existir já em todos os municípios do país.

O acesso à internet é mais fácil do que aos órgãos de comunicação social convencionais, levando a que as redes sociais, ou outras plataformas, se tornem espaços privilegiados de diálogo e debate, inclusive político.

A empresa Timor Social, que trabalha no desenvolvimento de estratégias de comunicação nas redes sociais, estima que um terço da população do país (cerca de 400 mil timorenses) tenham perfis activos nas redes sociais, em particular, no Facebook.

10 Jul 2017

AL | Mak Soi Kun propõe debate sobre prédios antigos

A Assembleia Legislativa decide na próxima sexta-feira sobre a realização de um debate acerca da degradação dos prédios com mais de 30 anos e a necessidade de legislação sobre vistorias regulares. A iniciativa é de Mak Soi Kun, que teme o pior caso nada seja feito

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado eleito por via directa Mak Soi Kun alertou que os edifícios com mais de três décadas estão cada vez mais degradados, com “infiltrações de água e envelhecimento da estrutura”, o que os torna “uma bomba-relógio que permanece oculta em Macau”, já que nalguns casos há mesmo o “perigo de desabamento a qualquer momento”.

Mak Soi Kun afirmou que nos últimos anos registou-se “uma série de situações caóticas decorrentes do envelhecimento de prédios” e lista vários exemplos, com base em notícias, de incidentes como o desprendimento de reboco ou gesso, queda de fragmentos da cobertura de um edifício, que chegaram a causar feridos.

Com base nos casos relatados na imprensa, a equipa de Mak compilou informação que indica que em 2016 registaram-se oito incidentes envolvendo prédios antigos, o mesmo número verificado apenas na primeira metade deste ano.

O deputado sublinhou que o aumento dos incidentes está em linha com o crescimento do número de edifícios com mais de 30 anos: de 3403 em 2008 passou para 4654 em Março deste ano.

Por um lado, os proprietários desconhecem a legislação ou não tomam a iniciativa de a executar; por outro, “os locatários dos prédios pertencem às camadas sociais mais baixas e, tendo em conta que não são os proprietários, é natural que não procedam à vistoria dos prédios”, considerou.

“Porque é que o Governo não adopta medidas preventivas?”, questionou. “Pelo exposto, em prol do interesse público, apresento ao presidente da Assembleia Legislativa (AL) esta proposta de debate, chamando a atenção para se proceder à vistoria obrigatória dos edifícios antigos de Macau, com mais de 30 anos, desejando ainda que se proceda à desmontagem desta ‘bomba-relógio’”, indica a nota justificativa.

Mak sugeriu ao Governo que acelere a legislação de modo a definir “regras sancionatórias” para obrigar a vistorias regulares aos edifícios antigos.

Coutinho não desiste

Também na sexta-feira, a AL vai votar na especialidade a revisão da lei do tabaco que prevê a existência de salas de fumo nos casinos, contrariando o que tinha sido levado a votação na generalidade, há dois anos, em que o fumo seria totalmente proibido.

No dia 14, o hemiciclo vai ainda votar um projecto simples de deliberação relativo ao recurso interposto pelo deputado José Pereira Coutinho, que viu um projecto de lei seu rejeitado pela AL.

Relativo à protecção da reserva natural de Coloane, o articulado foi rejeitado por necessitar da autorização prévia do Chefe do Executivo, e também por já ter sido apresentado nesta sessão legislativa e chumbado. Coutinho, juntamente com o colega Leong Veng Chai, argumentou que o projecto foi apresentado em Junho de 2016 – ou seja, na anterior sessão legislativa – apesar de o hemiciclo só o ter inviabilizado em Novembro.

O deputado defendeu também que a decisão de rejeitar por não ter tido autorização prévia de Chui Sai On atribui aos artigos da Lei Básica sobre o assunto “um alcance que claramente não é correcto”, já que não estão “expressamente consagrados os limites da iniciativa legislativa de um deputado quanto ao âmbito de uma norma interpretativa”.

Prova disso é que quando o mesmo projecto foi apresentado anteriormente, em Março de 2013 e Abril de 2015, não foi “colocada a hipótese de uma eventual necessidade de consentimento prévio por parte do Chefe do Executivo para que o mesmo fosse admitido”, disse.

A Assembleia vai ainda votar outro projecto de Pereira Coutinho para promoção, sensibilização e divulgação dos tratados de Direitos Humanos e Convenções da Organização Internacional do Trabalho.

10 Jul 2017

Eleições 2017 | Lista ligada à Função Pública quer mais casinos e mais jogo

António Lopes, inspector de jogo desde 1989, é pela primeira vez candidato às eleições legislativas, na qualidade de número dois da lista Poderes do Pensamento Político. A defesa dos direitos dos funcionários públicos é um objectivo, sem esquecer o aumento das licenças de jogo, das actuais seis para nove

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s eleições legislativas deste ano contam com mais uma lista candidata em defesa dos direitos dos funcionários públicos, além da Nova Esperança.

A Poderes do Pensamento Político é liderada por Kot Man Kam, antigo funcionário público, e tem como número dois António Lopes, macaense e inspector da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ) desde 1989.

Em entrevista ao HM, António Lopes referiu que um dos objectivos da lista que integra é o aumento das licenças de jogo que, no seu entendimento, deveriam passar das actuais seis (três concessões e três subconcessões) para “oito ou nove”.

“Gostaríamos que o Governo desse mais licenças”, apontou. “Actualmente há seis, mas gostaríamos que fossem atribuídas oito ou nove. Haveria mais concorrência e mais pessoas teriam emprego”, disse António Lopes, que acredita que, desta forma, os trabalhadores locais poderiam ter mais oportunidades de subirem na carreira.

“Os locais poderiam subir de categoria profissional nesse sector. Os actuais cargos de direcção ou de chefia nos casinos nunca são atribuídos aos locais, mas sim aos estrangeiros”, acrescentou.

Foto: HM

António Lopes entrou para a lista por ser falante de português e para representar a comunidade macaense no hemiciclo. É ainda membro da Associação Sindical de Inspectores de Jogos que, em Novembro do ano passado, pedia um estatuto próprio para a profissão. Esta é uma associação que tem também ligações com a Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau, presidida pelo também candidato às eleições José Pereira Coutinho.

Leis e idiomas

“Queremos apoiar os funcionários públicos. Se conseguirmos entrar na Assembleia Legislativa (AL), pelo menos teremos mais uma voz para nos ajudar a defender os trabalhadores”, disse António Lopes.

A lista Poderes do Pensamento Político quer também chamar a atenção para a “legislação desactualizada” no seio da Administração. “Queremos que o Governo altere alguns diplomas que não estão actualizados, relacionados com várias áreas”, referiu, sem esquecer as diferenças em termos de atribuição de reformas.

Além disso, a lista em que António Lopes é número dois quer que sejam atribuídas mais habitações aos funcionários públicos.

“Os funcionários não conseguem comprar casas em Macau. Queremos que o Governo construa mais casas para atribuir aos funcionários públicos. Há muitos terrenos por aproveitar e queremos que o Governo reserve alguns terrenos”, adiantou.

António Lopes afirma ainda que no seio da Administração continua a não ser aplicada a política do bilinguismo na publicação de informações ou documentos.

“Em muitas direcções de serviços não há o cumprimento das duas línguas oficiais, com excepção de alguns serviços. Muitas vezes só há indicações em português ou chinês. Nunca há nas duas línguas em simultâneo, sobretudo no nosso serviço. Queremos que o Governo tome mais atenção a este assunto.”

Competição cerrada

Com a saída de Leonel Alves do hemiciclo e tendo em conta que José Pereira Coutinho já referiu não ter garantias de ser reeleito deputado, António Lopes considera que a sua lista pode mudar o paradigma. “Dentro da AL não há muitos macaenses ou portugueses, e queremos aumentar o número de vozes dentro do hemiciclo”, apontou.

Num ano em que há o maior número de listas a concorrer às eleições pelo sufrágio directo, num total de 25, António Lopes assume que é muito difícil ganhar votos suficientes para chegar à AL.

“Este ano há muitas oportunidades de escolha e é difícil, porque há 25 listas. Para conseguir o número de votos suficiente, vai ser muito difícil. Este ano há muita competição. Nós não somos uma lista experiente, somos novos, e as listas mais antigas talvez já tenham os seus apoiantes. Como somos novos, é muito difícil obter o número de votos.”

Questionado sobre se tem receio de sofrer represálias por ser um candidato às eleições, António Lopes prefere não responder. Mas afirma que há medo no seio da Função Pública.

“Alguns funcionários não têm medo de represálias. Quando temos de enfrentar, enfrentamos. Mas há funcionários que têm medo e não querem fazer para enfrentar os problemas. Mas aí as coisas nunca avançam”, conclui.

10 Jul 2017

Centro histórico | UNESCO aprova relatório sem discussão

O Comité do Património Mundial da UNESCO aprovou sem discussão o “projecto de decisão” sobre Macau, em que expressou preocupações sobre o centro histórico. A RAEM continua a ter 2018 como prazo para a entrega de um novo relatório

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m comunicado, o Instituto Cultural informa que o comité apreciou, na quarta e na quinta-feira da passada semana, os projectos de decisão sobre o estado de conservação de 99 locais, mas apenas 16 – os casos mais preocupantes, como o do centro histórico de Viena e o complexo de pirâmides de Gizé – geraram discussão.

Os restantes 83, incluindo Macau, “não foram discutidos pelo comité, dado que os respectivos projectos de decisão foram aprovados directamente na sessão”.

À Lusa, a Organização da ONU para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) confirmou esta informação e esclareceu que nenhum membro do comité expressou necessidade de discutir o documento durante a 41.ª sessão, que decorre na Polónia até quarta-feira.

No documento, divulgado em Maio, o comité criticou o Governo no que diz respeito à protecção do património e apontou que “o possível impacto de empreendimentos de grande altura nas paisagens do Farol da Guia e da Colina da Penha, assim como as crescentes preocupações sobre a falta do Plano de Salvaguarda e Gestão poderão ter sérias consequências” para a “Declaração de Valor Universal Excepcional” do Centro Histórico, classificado desde 2005.

Exigido pela UNESCO em 2013, o Plano de Salvaguarda e Gestão do Centro Histórico devia ter sido entregue até 1 de Fevereiro de 2015.

O comité sublinhou também que as actuais questões sobre as restrições em altura de um projecto na Doca dos Pescadores, as propostas sobre os novos aterros e possíveis desenvolvimentos que envolvem edifícios em altura “levantam todos grandes preocupações”.

Cumprir o prazo

O comité definiu que Macau tem até 1 de Dezembro de 2018 para apresentar um “relatório actualizado sobre o estado de conservação do património”.

Numa conferência de imprensa, em Junho, o presidente do Instituto Cultural, Leung Hio Ming, justificou o atraso do Plano de Salvaguarda e Gestão do Centro Histórico com “os trabalhos complexos” necessários para elaborar o plano de gestão e por a Lei de Salvaguarda do Património só ter entrado em vigor em 2014.

Leung Hio Ming, que se deslocou à Polónia para participar na sessão da UNESCO, disse que o Governo pretende lançar uma nova consulta pública até ao final do ano para elaborar o documento do Plano de Salvaguarda e Gestão do Centro Histórico e entregá-lo à organização em meados de 2018.

 

Novo Macau exige que Governo siga recomendações da UNESCO

A Associação Novo Macau (ANM) alerta o Governo para que siga à risca as recomendações contidas no relatório que a UNESCO aprovou na sexta-feira, relativas à protecção do centro histórico.

Em declarações ao HM, Scott Chiang, presidente da ANM, falou dos projectos que mais geram preocupações à associação pró-democrata. Um deles é o edifício embargado na Calçada do Gaio, próximo do Farol da Guia, que deverá manter a actual altura, de 81,32 metros. Contudo, a ANM considera que o edifício deveria ter, no máximo, 55 metros.

Scott Chiang fez ainda referência ao projecto de construção de um hotel na Doca dos Pescadores, que deverá ter 90 metros de altura e que também poderá influenciar a vista do Farol da Guia.

Apesar do Governo já ter garantido que o complexo judicial, a construir na zona B dos novos aterros, irá cumprir os limites de altura apontados pela UNESCO, a ANM exige que a paisagem não fique em risco. Tudo para “garantir que as construções à volta dos aterros C e D não afectem a zona da Igreja da Penha”, apontou Scott Chiang.

“Nos próximos três anos tem de ser implementado o plano director do território e é também necessário garantir a protecção de Coloane. É isso que pedimos ao Executivo”, rematou.

10 Jul 2017

Atropelamento de TNR na Ilha Verde motiva interpelação e carta ao Governo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] caso de um atropelamento mortal causado por um camião de transporte de combustível conduzido por um trabalhador não residente (TNR) voltou a colocar na agenda a questão da falta de licenças dos motoristas vindos de fora. Ontem a Associação Macao Drivers Will Win Rights fez uma conferência de imprensa para sensibilizar o Governo e a sociedade, para o caso em questão.

Thomas Chan Kin Tong, director da associação em causa, referiu que o motorista que provocou o atropelamento não tinha autorização legal para conduzir em Macau. O dirigente associativo entende que os empregadores precisam assumir responsabilidades e garantir a segurança pública para evitar que se repitam casos semelhantes. Chan Kin Tong acrescentou ainda que apesar das garantias do Executivo de que o sector dos motoristas não teria mais mão-de-obra importada, a realidade é bem diferente, aumentando a concorrência para os locais. O subdirector da associação, Chan Man Chak, sublinhou a falta de fiscalização do Governo no controlo de condutores que trabalham sem habilitação legal para o fazerem.

A associação entrega hoje uma carta ao responsável máximo da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais a pedir explicações para esta situação.

Au Kam San, interpelou o Executivo a dar uma explicação sobre o caso em questão. O deputado considera que os serviços têm conhecimento de que existem motoristas TNR, mas que optam por ignorar a situação. Nesse sentido, Au Kam San exige que o Governo peça responsabilidades aos empregadores e se existem lacunas nas leis que permitam que a situação continue.

10 Jul 2017

Irmãos Gao, artistas plásticos: “As nossas criações, para o público, não passam de crítica política”

Chamam-se Gao Zhen e Gao Qiang e são conhecidos como os irmãos Gao. Os seus trabalhos já passaram por Nova Iorque, Berlim e Londres. Considerados uma referência da arte contemporânea chinesa, além de políticas, as suas obras são uma reflexão da sociedade actual na China

 

Como é que se começaram a interessar pela criação artística?

Foi nas décadas de 60 e 70, no século passado. Quando éramos miúdos já gostávamos de pintar juntos. Fomos directamente influenciados pela nossa mãe que nos questionava acerca do que víamos e do que desenhávamos. Ela era muito boa a recortar papel e os trabalhos que fazia pareciam que lhe saíam naturalmente do coração. O que ela fazia diferenciava-se da cultura folclórica, eram recortes de uma beleza primitiva original. Sem dúvida que, se temos algum talento, o herdámos da nossa mãe.

O vosso trabalho é contemporâneo, mas tiveram formação em arte tradicional chinesa.

No liceu tínhamos de estudar pintura tradicional. Naquela altura, devido às dificuldades económicas, não pudemos continuar a estudar. Passámos seis anos a trabalhar arduamente ainda muito novos. Na mesma altura começámos a aprender pintura tradicional chinesa de paisagem e a fazer cópias de trabalhos das dinastias Song, Yuan, Ming e Qing, e de alguns autores famosos mais contemporâneos. Acabou por ser uma aprendizagem muito forte e intensa, apesar de não ser académica. Mas porque fazíamos livremente aquilo que nos interessava, acabámos por criar várias obras contemporâneas ainda nessa altura. 

Como é que essa aprendizagem influencia o vosso trabalho actual?

Se olharmos superficialmente para a arte tradicional, podemos dizer que não terá grande influência no que fazemos hoje em dia. Mas na nossa estética há uma ligação, que podemos considerar livre, entre os caminhos da arte tradicional e da arte contemporânea. Esta ligação acaba por ter sempre um papel, mesmo que subtil, no que fazemos. Por exemplo, em 2008, com o trabalho “Never Finished Building, n.º 4”, apesar de não usarmos uma nítida influência no resultado final da imagem, no processo criativo e no efeito criado pela peça, tivemos em conta um trabalho da dinastia Song. Escolhemos uma peça do pintor Zhang, o “Qingming River”, e a experiência que este trabalho nos proporcionava enquanto espectadores. Ambas as peças, a nossa e a tradicional, são um registo do estatuto social e da paisagem cultural na vida de um artista. Ambas reflectem o espírito de uma era. Parece que nós, agora, tal como há 800 anos, não estamos satisfeitos com o papel que o artista tem e queremos deixar um texto visual histórico com o que criamos para as gerações futuras. 

Os irmãos Gao são uma referência internacional, com trabalhos nas galerias e museus do mundo. Na China, algumas das vossas obras são alvo de censura, mas continuam em Pequim. Já pensaram mudar de país?

Estamos na cena artística de Pequim há mais de dez anos. Às vezes sentimo-nos um pouco cansados e pensamos em mudar para Nova Iorque para começar uma nova vida e com ela novas criações. No entanto, também estamos muito conscientes da nossa inseparabilidade da nossa terra e história. São a nossa carne e o nosso sangue, e temos algumas dificuldades em demitir-nos dessa responsabilidade. Por isso, andamos sempre num estado de hesitação entre estes dois lugares, mas continuamos na China.

Os vossos trabalhos têm uma componente de intervenção, nomeadamente política. Quais são, para vocês, os aspectos mas pertinentes para abordar na China contemporânea?

No Velho Testamento, Isaías já dizia que “a manhã virá e a noite também”. A situação na China não é mais optimista. A nossa criação artística é um meio de expressarmos livremente a nossa resistência política, uma forma de manter a nossa dignidade básica e a nossa salvação. É também a forma de nos envolvermos com o mundo.

Uma das vossas obras icónicas é a série de esculturas “Miss Mao”.

Criámos a primeira escultura “Miss Mao” em 2006. Foi inspirada num trabalho em vídeo que tínhamos feito em 1998 denominado “BeiBei Mao”. Aliás, no fundo, a nossa desconstrução e crítica da ideologia e do sistema de Mao já tinha começado em 1989. Na altura fizemos várias imagens, não só de Mao, mas também de Marx e Lenine, produzidas em fotocopiadoras. Mas a polémica realmente foi instalada com a imagem de “Miss Mao” que já passou por Londres, Paris, Moscovo, Nova Iorque e Singapura. Nunca foi exibida na China devido à censura. De certa forma, “Miss Mao” é uma metáfora política da sociedade pós-Mao. Superficialmente, parece que, na China, a figura de Mao Zedong já está ausente há muito tempo e muitos dos aspectos que lhe são associados já estão irreconhecíveis mas, de facto, a natureza do sistema e as regras não sofreram grandes mudanças. Infelizmente, as pessoas olham mais para a superfície e conseguem ver algumas mudanças sociais, mas não estão cientes de que a natureza totalitária do sistema continua a mesma. É essa a mensagem da “querida” “Miss Mao”. Criámos também várias séries que podem ser divididas em duas categorias. Uma delas tem uma figura sorridente, quase amorosa e com algum humor. Na segunda categoria acrescentámos um pouco de maldade. No entanto, e comparadas com a brutalidade do regime, estas imagens não se podem considerar ultrajosas. O peito que acrescentámos a Mao tem que ver com a propaganda política que lhe está associada de que alimenta o povo. Há mesmo uma canção de propaganda que diz: “Ponho o partido à frente da minha mãe”. É a mãe Mao que amamenta os seus filhos. Por outro lado, é um Mao mentiroso, daí o nariz da obra. “Miss Mao” não é só uma piada visual, mas sim uma crítica política carregada de ironia.

A “Execução de Cristo” também é um trabalho relevante. Porquê esta metáfora?

Na “Execução de Cristo” inspirámo-nos numa obra de Manet, por sua vez inspirado na “Noite de 3 de Maio de 1808”, de Goya. O massacre é um tema que também percorre a história da arte. A composição deste trabalho é inspirada nestes autores e a escolha dos personagens, Cristo e Mao Zedong, teve que ver com a nossa experiência pessoal de sobrevivência. Mao foi um dos grandes tiranos do século XX. Mais de dez milhões de chineses morreram devido à perseguição política que fez. O nosso pai foi uma dessas pessoas. Este trabalho revela a violência do ditador contra a natureza humana. O confronto entre Mao e Jesus Cristo corresponde à situação real de oposição aos valores do Ocidente, à liberdade e aos direitos humanos. 

Na vertente fotográfica, o vosso trabalho é marcado, entre outras obras, pela série “Sense of Space”.

É um trabalho em fotografia que aborda o comportamento. Foi feito em 2000 e, através de um armário, metaforizámos a forma como as pessoas se encaixam no seu espaço, no seu isolamento. Um estado de solidão, de depressão e muitas vezes de sufoco. Tem que ver com o viver num estado totalitário, mas também é relativo à forma de viver nas grandes cidades em que as pessoas são espremidas espiritualmente para poderem sobreviver.

São multifacetados e trabalham sempre em equipa. Como é que corre esta colaboração?

A nossa colaboração é, de facto, muito simples. Se um de nós tem uma ideia, discutimo-la para tentar perceber se tem algum valor. Se ambos sentimos que sim, depois começamos a pensar como é que a podemos concretizar. Se ambos sentimos que não tem valor, normalmente desistimos. Se um de nós acredita muito na ideia, pode avançar individualmente.

Estão no 798 Art District, um espaço privilegiado da cena artística de Pequim. Como é que foram para o bairro das artes?

Em 2004, juntamente com outros artistas, alugámos um estúdio no 798. Estávamos a criar um espaço inovador de criação artística. Fizemos ainda algumas exposições mas, devido à pesada crítica política, as autoridades alarmaram-se e o projecto acabou por não avançar. Mais tarde, acabámos por arrendar, sozinhos, o estúdio onde ainda nos encontramos. A nossa casa é aqui, é aqui que criamos e este é o espaço onde os nossos trabalhos de maior relevo foram produzidos.

Ainda no que respeita ao vosso aspecto interventivo. Como é que lidam com as reacções, tanto do país como do mundo, sendo que são bem diferentes?

Quer na China, quer em qualquer outra parte do mundo, pensamos que as pessoas entendem mal o nosso trabalho e a parte da crítica política acaba por parecer que é a sua totalidade. Às vezes sentimos que as nossas criações, para o público, não passam disso, de crítica política. Na realidade, achamos que somos pensadores que expressam as suas ideias através das artes visuais. A política real é apenas uma parte do nosso pensamento e até mesmo uma pequena parte, mas, claro, uma parte importante. Por esta vertente fazer parte do nosso trabalho, tem causado muita controvérsia. Na realidade, criamos trabalhos de géneros muito diferentes. Prova disso é por exemplo a expressão da mudança na paisagem urbana em fotografia presente na série “Never Completed Buidings”. Foi um trabalho que passou por várias cidades mundiais e que explora a relação entre comunicação e comportamento. Com o bloqueio da Internet, criámos a performance “Broken Wall”. Abordamos ainda as mudanças sociais como “In Beijing, One Day Can Go Far”. Fazemos documentários, pintura e fotografia abstracta também.

Como vêem o futuro da China? E como gostariam que fosse?

Para olhar para o futuro da China temos de fazer uma passagem pela história do país. Temos ainda de construir a história contemporânea das principais forças políticas de modo a conseguir fazer julgamentos de valor realistas. A história provou que a introdução da ditadura soviética e a construção de um sistema totalitário que ainda permanece no comunismo chinês foram um erro. Sun Yat-sen defendia o princípio do povo para um governo constitucional republicano, era o objectivo deste país. Seria o fim dos milhares de anos de história ditatorial imperial e o estabelecimento da primeira república da Ásia – a República da China. Em 1945, depois da guerra, poderíamos ter a construção de um sistema constitucional com eleições democráticas e uma constituição partidária. É lamentável que uma tão prometedora república tenha sido também “rasteirada” pelas conjunções geopolíticas do final da Segunda Guerra Mundial, em 1949, quando o partido comunista soviético apoiou o homónimo chinês. A subversão aconteceu a partir daí. A China embarcou num sistema despótico de um partido único. Foi o caminho para a escravatura. Lamentavelmente, o círculo intelectual ainda não consegue avaliar verdadeiramente esta situação e permanece obcecado com a disputa entre a perspectiva reformista e a “Grande Prosperidade da Revolução Cultural”. Estamos convencidos de que o futuro da China poderá, um dia, passar pelo restauro de alguma justiça histórica, retornar à República da China, criar uma verdadeira soberania do povo e percorrer o caminho de uma democracia constitucional.

10 Jul 2017

Coreia do Norte | EUA dizem-se preparados para usar força caso seja necessário

Os Estados Unidos alertaram que estão prontos para usar a força caso seja necessário para interromper o programa de mísseis da Coreia do Norte, mas dizem preferir uma acção diplomática global contra Pyongyang e mais sanções. China e Rússia estão contra e preferem a via diplomática, que passará pela cessação imediata de todas as acções militares dos dois lados.

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] embaixadora dos EUA na ONU, Nikki Haley, disse em encontro do Conselho de Segurança que as acções da Coreia do Norte estavam “a acabar rapidamente com a possibilidade de uma solução diplomática” e que os EUA estavam preparados para se defender e defender seus aliados. “Uma das nossas capacidades está nas nossas consideráveis forças militares. Iremos usá-las caso precisemos, mas preferimos não ter que seguir este caminho”, disse Haley.

Dando um significativo passo no seu programa de mísseis, a Coreia do Norte testou na terça-feira o lançamento de um míssil balístico intercontinental que alguns especialistas acreditam poder alcançar os Estados norte-americanos do Hawai e do Alasca e talvez o noroeste do Pacífico norte-americano. A Coreia do Norte afirma que o míssil pode carregar uma grande ogiva nuclear, mas os militares norte-americanos garantiram que são capazes de defender os EUA contra o míssil balístico intercontinental norte-coreano.

Kim Jong-un, o presidente norte-coreano, dissera que o míssil foi um “presente” para os EUA na data em que os norte-americanos festejavam o 4 de Julho, o Dia da Independência e que irá a continuar a enviar “prendas”.

Haley disse que os EUA irão propor novas sanções da ONU sobre a Coreia do Norte nos próximos dias e alertou que se a Rússia e a China não apoiarem as medidas, então “seguiremos o nosso próprio caminho”.

O embaixador da China na ONU, Liu Jieyi, disse na reunião do Conselho de Segurança que o lançamento do míssil foi uma “violação evidente” das resoluções da ONU e “inaceitável”. “Pedimos a todas as partes interessadas para exercitarem a prudência, evitarem acções provocativas e retóricas agressivas, demonstrarem a vontade por diálogos incondicionais e trabalharem activamente juntas para desarmar a tensão”, disse Liu.

Rússia e China contra mais sanções

Mas, no entanto, a China e a Rússia discordaram da proposta dos Estados Unidos de impor sanções mais duras à Coreia do Norte e pediram ao governo norte-americano para trabalhar em uma solução negociada para a actual crise. Os dois países formaram no Conselho de Segurança da ONU uma frente comum contra a proposta dos EUA, que anunciou que apresentará um projecto de resolução para endurecer as sanções à Coreia do Norte.

“Todos devemos saber que as sanções não vão resolver a questão”, disse o embaixador-adjunto da Rússia na ONU, Vladimir Safronkov, durante uma reunião de emergência do Conselho de Segurança. Safronkov classificou como “inaceitável” qualquer tentativa de estrangular economicamente a Coreia do Norte, lembrando que milhões de pessoas têm grandes necessidades humanitárias no país.

Contra a postura da Casa Branca, a China e a Rússia voltaram a defender a proposta de que a Coreia do Norte suspenda seus testes nucleares e de mísseis em troca de que os EUA e a Coreia do Sul façam o mesmo com as manobras militares conjuntas na região. Os dois países consideraram o teste norte-coreano como inaceitável, mas também criticaram a instalação de um escudo antimísseis dos EUA na Coreia do Sul.

No fim do debate no Conselho de Segurança, Haley respondeu às declarações de russos e chineses, dizendo que se opor às sanções é “dar as mãos para Kim Jong-un”.

Ameaças americanas

Quando Donald Trump e Xi Jinping se cruzarem em Hamburgo, na Alemanha, para a reunião do G20 que decorre na sexta-feira e no sábado, entre os dois haverá uma espécie de enorme elefante na sala chamado Coreia do Norte. Nos últimos tempos, a relação entre os presidentes dos EUA e da China arrefeceu substancialmente. Ainda ontem, Trump voltou a usar a rede social Twitter para beliscar Pequim. “O comércio entre a China e a Coreia do Norte cresceu quase 40% no primeiro trimestre [do ano]. Lá se vai a possibilidade de a China colaborar connosco – mas tínhamos de tentar”, escreveu o líder norte-americano.

Apesar de haver poucas certezas sobre os números invocados por Trump, não restam dúvidas de que Washington e Pequim estão cada vez mais distantes. Na semana passada a administração Trump impôs sanções a um banco chinês devido às relações que esta entidade mantém com a Coreia do Norte, referiu-se à China como um dos piores países em matéria de tráfico de seres humanos e concluiu um negócio de venda de armas a Taiwan no valor de 1,4 mil milhões de dólares (1,2 mil milhões de euros).

Rex Tillerson, secretário de Estado norte-americano, sublinhou o discurso do presidente:. “Qualquer país que receba trabalhadores norte-coreanos, que favoreça [Pyongyang] com benefícios económicos e militares ou que não implemente as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas está a ajudar e apoiar um regime perigoso”, sublinhou o responsável pela política externa dos EUA.

Medo de novo teste nuclear

O ministro da defesa da Coreia do Sul afirmou que a probabilidade de um sexto teste nuclear por parte de Pyongyang é alta. “O objectivo da Coreia do Norte é reforçar o seu poderio nuclear, por isso é bastante possível que tal venha a acontecer”, referiu Han Min-koo. Até hoje foram cinco os testes de armamento nuclear levados a cabo pelo regime norte-coreano. O primeiro aconteceu em 2006 e os dois últimos no ano passado, em Janeiro e em Setembro.

Até que ponto o conflito diplomático pode descambar para guerra aberta? Jim Mattis, secretário de estado da Defesa dos EUA, já avisou que as consequências de uma acção militar seriam “trágicas numa escala difícil de imaginar”. Esse deverá ser sempre o último dos últimos recursos

O presidente norte-americano tem tentado convencer a China a fazer todos os esforços para resolver a questão norte-coreana, mas o tom dos seus tweets, mesmo tratando-se de Donald Trump, mostram que estará a perder a paciência com Pequim. “A Coreia do Norte acaba de lançar outro míssil. Será que este tipo [Kim Jong-un] não tem nada melhor para fazer na vida. É difícil acreditar que a Coreia do Sul e o Japão vão aturar isto durante muito mais tempo. Talvez a China faça um gesto forte em relação à Coreia do Norte e ponha fim a este absurdo de uma vez por todas”, escreveu no Twitter o líder norte-americano.

 

EUA e Seul respondem e a dobrar

Anteontem, em resposta a Pyongyang, EUA e Coreia do Sul dispararam uma barragem de mísseis ao longo da costa leste da península coreana. “[Esta reacção] é apenas uma demonstração de força, uma espécie de olho por olho, dente por dente, mas não irá dissuadir os norte-coreanos de continuar a desenvolver mísseis de longo alcance e de investir no programa nuclear”, sublinha o analista Robert Kelly, da Universidade Nacional de Busan, na Coreia do Sul, citado pela Al Jazeera. Já ontem, o exército sul-coreano realizou novas manobras com fogo real, que incluíram o lançamento de vários mísseis guiados numa nova demonstração de força para responder ao mais recente ensaio de míssil pela Coreia do Norte. O exercício, realizado nas águas do Mar do Japão, envolveu a marinha e força aérea, disse à agência espanhola Efe um porta-voz do Ministério de Defesa sul-coreano. Foi simulado um ataque por mar e no decurso das manobras foram disparados mísseis anti-navio “Haeseong” e “Harpoon” e mísseis terra-ar “AGM-65 Maverick”. Estes exercícios foram realizados dois dias depois de a Coreia do Norte ter lançado o primeiro míssil balístico intercontinental (ICBM) e um dia depois de os exércitos sul-coreano e norte-americano terem realizado também testes de mísseis para responder a Pyongyang.

Seul apela a aumento de sanções

O Presidente sul-coreano apelou ontem à Alemanha para que aplique sanções reforçadas contra a Coreia do Norte, na sequência do anúncio de Pyongyang de que lançou um míssil balístico intercontinental (ICBM), que Seul qualificou de “provocação”. “A Coreia do Norte deve pôr um fim a isto e, por esta razão, nós devemos trabalhar no sentido de sanções mais intensas” contra este país, declarou Moon Jae-In no decorrer de uma conferência de imprensa com a chanceler alemã, Angela Merkel.

O chefe de Estado sul-coreano sublinhou que serão lançadas negociações sobre esta matéria com alguns governos à margem da cimeira do G20 que decorrerá na sexta-feira e no sábado em Hamburgo, Alemanha.

“Trata-se de uma grande ameaça” para a Península coreana e para o mundo inteiro”, bem como “uma provocação”, disse o novo chefe de Estado da Coreia do Sul. No entanto, Moon Jae-In mostrou-se mais aberto ao diálogo com a Coreia do Norte do que o seu antecessor, afirmando-se favorável a uma “solução pacífica” para o conflito.

A chanceler alemã também deu apoio à ideia de impor sanções mais duras contra Pyongyang. Merkel indicou que pretende discutir com o Presidente sul-coreano “a melhor forma de manter a pressão, e ver como se poderá continuar a aumentar as sanções”.

“É uma questão que nos toca o coração, porque nós sabemos, por experiência própria, o que significa a divisão de um país”, afirmou Merkel, referindo-se ao período entre 1949 e 1989, durante o qual a Alemanha comunista, a República Democrática Alemã, coexistiu com a Alemanha ocidental, a República Federal da Alemanha.

7 Jul 2017

José Eduardo Martins, especialista em direito do ambiente: “A liderança chinesa é inevitável”

Paris já não seria Paris sem a China, que mudou muito nos últimos anos e percebeu que, sem um maior respeito pelo ambiente, o desenvolvimento não será sustentável. Mas a saída dos Estados Unidos do acordo internacional abre portas a um maior protagonismo de Pequim, analisa José Eduardo Martins, advogado, ex-secretário de Estado do Ambiente de Portugal. Quanto a Macau, tem um papel importante a desempenhar, porque tudo conta no trabalho de luta contra o aquecimento global

[dropcap]V[/dropcap]eio a Macau falar do Acordo de Paris, que voltou a estar recentemente na ordem do dia com a saída dos Estados Unidos. Ainda é cedo para avaliar o impacto real desta desistência norte-americana ou podemos já adivinhar consequências graves?
Para responder com franqueza, não sei. Como é que isso se vai avaliar? Hoje não estamos como há 20 ou 30 anos. O Acordo de Paris é absolutamente único no direito internacional porque, apesar de haver poucas normas imperativas – tirando as que obrigam à transparência e ao conhecimento, à monitorização das emissões –, permitiu vencer a barreira que existia no Protocolo de Quioto. O que é diferente em Paris é que, com excepção da Síria, da Nicarágua e agora dos Estados Unidos, todos os países do mundo têm consciência de que o trabalho de combater as alterações climáticas é um trabalho de cada país, um trabalho nacional. Não há uma coisa etérea chamada comunidade internacional, porque continua a haver terra onde pôr os pés, indústrias baseadas neste ou naquele país, modos de vida, de consumo, de produção de energia baseados neste ou naquele país – o que é muito importante em Paris é este consenso quase universal para a acção. Isso nunca tinha acontecido. É muito raro haver acordos internacionais sequer subscritos por maioria de Estados das Nações Unidas, quanto mais aprovados unanimemente. O primeiro efeito de Paris foi levar, de facto, um conjunto de Estados a avançar qualquer coisa nas suas políticas domésticas, e isso é importante. Anunciaram-se muitas iniciativas domésticas em muitos estados cruciais para o cumprimento do protocolo a seguir a Paris. Nessa medida, a desistência dos Estados Unidos é sobretudo grave pelo exemplo e pelo retrocesso. Mas não é só no ambiente que esta circunstância fatídica, de se ter eleito Presidente da América um homem que nunca terá lido um livro até ao fim, está a fazer os Estados Unidos perderem liderança e andarem para trás.

A questão do exemplo será então, para já, a principal preocupação.
O principal efeito que tem é os decisores políticos menos comprometidos com o futuro poderem dizer ‘se aqueles não fazem, eu também não faço’ ou usarem o argumento farisaico de que se os Estados Unidos não fazem, nada disto vai funcionar, porque eles são dos maiores poluidores. Este é o lado negativo. Mas voltando ao princípio: para quem trabalha nestas coisas, a primeira reacção tem de ser, apesar de tudo, um bocadinho mais optimista. Depois do Acordo de Paris, não há nenhum Trump que consiga fazer isto voltar atrás, nem na América. E nem na América porquê? As empresas americanas que estão pelo mundo inteiro não deixaram de estar sujeitas às regras que o Acordo de Paris fará das políticas domésticas de cada Estado. Dentro dos Estados Unidos, como muito do que se consegue é o que se faz efectivamente, uma grande maioria de Estados e de cidades continuam comprometidos com o Acordo de Paris, e vieram dizer ‘este senhor pode dizer o que quiser que nós, aqui, vamos continuar’. Não sabendo, tenho a esperança de que vamos chegar ao fim disto e, na matéria do clima, como noutras, terá havido aqui um momento sobretudo embaraçoso para os Estados Unidos, consequência de terem eleito este populista. Mas esse momento embaraçoso é um lapso de tempo num processo que ganhou uma consciência global que já não volta atrás.

É mais uma área em que a China pode ter um papel importante ao nível internacional, sendo que o país nos últimos anos tem feito um trabalho importante nesta área?
Um senhor que não estimo particularmente e que foi o mentor de Tony Blair, Anthony Giddens, escrevia a propósito do clima uma coisa simples: houve aqui um sonho de uma ordem internacional, de agências, supraestadual. Isso não é o mundo, nem é a normalidade. A normalidade é a competição entre Estados soberanos. Se há coisa que mudou no mundo nos últimos 20 anos é a passagem da China pelo mundo com a globalização. Imediatamente após as declarações de Trump, a União Europeia – que sempre quis ter um papel liderante nisto, mas que tem uma dificuldade enquanto bloco, de serem muitas vozes, muitas políticas diferentes e não tanta moral como a que se apregoa – voltou-se imediatamente para a China. A natureza não permite o vazio. A política também não permite o vazio. A geopolítica não permite o vazio. Quando os Estados Unidos se fecham sobre si próprios, a China aproveita – e bem – para tomar a liderança. Da última vez que falámos, tinha havido um congresso do Partido Comunista Chinês. E esse congresso fez com que os mais velhos do Comité Central tivessem como grande objectivo na vida voltar a ver o céu de Pequim, começar a despoluir a China. Perceberam que tinha havido uma fase de crescimento que atropelou as regras internacionais e que tinha de haver um esforço de ser liderante também como produção mais limpa. O que mudou essencialmente entre Quioto e Paris já vem muito da liderança chinesa, já vem muito da China arrastar os países desenvolvidos para a ideia de que todos temos obrigações e que não vale a pena imaginar que são uns quantos países industrializados do hemisfério norte que vão cortar as suas emissões, e que isso vai travar o aquecimento global. Não haveria Paris com a força que houve se não houvesse China dentro; com a saída dos Estados Unidos, acho que a liderança chinesa é inevitável.

Poderemos ter então um reforço positivo, estando a China num contexto internacional que os Estados Unidos não estão, numa questão tão importante como as alterações climáticas? Poderá ser um impulso adicional para o trabalho que a China tem estado a fazer?
É e de várias formas, também porque é interessante economicamente. A China quer ser líder mundial das renováveis e quer exportar tecnologia de energias renováveis, nomeadamente do solar fotovoltaico – em que está na crista da onda –, para imensos países com quem tem relações. Há um conjunto de acordos de investimento bilaterais da China com muitos países em África, por exemplo, e a esperança que tenho é que boa parte desses acordos bilaterais, além de protegerem o investimento, também criem regras para o investimento cada vez mais saudáveis. No fundo, depois de Paris, há uma tensão entre três mundos de normas internacionais. O Acordo de Paris, que nos diz basicamente que temos de tomar a acção doméstica porque o pior problema da Humanidade é o aumento da temperatura; depois temos as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), cujo objectivo último é liberalizar o comércio mundial. Como é que se casa a liberalização do comércio mundial com alguma protecção do ambiente? Por exemplo, quando os Estados Unidos dizem que não querem importar camarão da Tailândia porque as redes dos pescadores dão cabo de uma série de espécies protegidas, estão a fazer uma norma proteccionista ou estão verdadeiramente a alegar uma excepção em favor do ambiente? Como é que vão evoluir os acordos da OMC? É uma área em que falta fazer muita coisa. Mas o terceiro mundo de normas internacionais, e que diz respeito sobretudo à China, são as normas destinadas ao investimento estrangeiro. Hoje, muitos países, para competirem pelo capital chinês, estariam disponíveis a baixar todos os standards de tratamento dos recursos naturais, e deixar que, nos seus países, se fizessem coisas que a China já não faz na China. É um modelo predatório do século passado. Neste século, aquilo que já vamos vendo é que boa parte dos acordos bilaterais de investimento têm uma previsão de protecção também dos modos e das regras de produção. A maior influência de Paris na vida real é que essa competição pelas trocas comerciais e pelo capital estrangeiro pode começar a ter algumas regras. Se não, não há esforço nacional que valha a um mundo em que agora, pela primeira vez, todos têm obrigações.

Veio a Macau para uma formação no âmbito do programa de cooperação na área jurídica entre a RAEM e a União Europeia. O que é que se ensina, numa perspectiva mais técnica?
Nesta formação, procuramos ver o que se pode fazer no cruzamento destes três mundos de normas – comércio, protecção de investimento estrangeiro, regras ambientais de Paris. Sobre o Acordo de Paris não se diz nada de extraordinário, porque o que conta é a acção local. Ao longo destes três dias, eu e o Prof. Julian Chaisse vamos procurar dizer que Paris convida que cada um faça a sua parte. A China é muito grande, mas não podemos começar a dizer que Macau é pequeno dentro da China. Tudo conta. O António Lobo Antunes gosta muito de citar um provérbio húngaro que eu uso muito para o tema das alterações climáticas, que é o do ratinho que foi até à beira do mar e fez chichi porque todos os bocadinhos acrescentam. Em Macau, não estamos a falar de um bocadinho pequeno; estamos a falar de uma concentração brutal num espaço exíguo, o que leva a fenómenos de concentração de emissões, especialmente no sector residencial, no tratamento do lixo, numa série de matérias. É isso que estamos a tentar dizer: Paris significa o compromisso da Humanidade com o modelo de vida para o futuro para a própria sobrevivência da Humanidade. Isso determina um conjunto de regras ao nível local para disciplinarmos a nossa vida em relação ao consumo de energia, à produção industrial, à produção alimentar, ao tratamento de resíduos. E todas essas coisas têm importância, todas essas coisas contam. No hotel onde estou, precisei de vestir uma camisola para tomar o pequeno-almoço – é nas coisas simples que temos de perceber isto. Precisamos de regras sobre utilização de energia que expliquem que não é confortável uma diferença térmica de 20o C entre o interior do edifício e o exterior, e que o conforto não é este consumo brutal de energia e de desperdício de energia. Se quisermos climatizar todos os hotéis a 20o C, quando estão 35o C na rua, e se acharmos isso certo, então só estamos a dizer que vamos ter de extrair e queimar mais carvão, aquecer mais a atmosfera e piorar mais a situação do clima. Se acharmos que não vale a pena tratar o lixo convenientemente e com ele produzir electricidade, evitando a extracção de carvão, não vamos conseguir fazer grande coisa. Se não quisermos regular o trânsito, de maneira a que as emissões sejam um bocadinho diferentes e os carros funcionem de maneira diferente, não vamos lá. O futuro não pode só esperar que todos os carros sejam eléctricos, precisa que algumas coisas aconteçam já.

7 Jul 2017

Eleições | Coutinho entrega lista de candidatos e faz defesa da língua de Camões

O líder da Nova Esperança entregou a lista de candidatura à comissão eleitoral e argumentou a favor do trabalho a tempo inteiro dos deputados. Pereira Coutinho aproveitou a ocasião para defender o uso do português, como garante do segundo sistema, e criticou o clientelismo existente na Assembleia Legislativa

[dropcap style≠’circle’]“O[/dropcap] português para mim é um trunfo.” Quem o diz é José Pereira Coutinho, deputado e cabeça de lista da Nova Esperança na corrida às eleições legislativas. As palavras foram proferidas à margem da entrega da lista e programa político junto da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa.

O deputado criticou a falta de acção política que se esconde por detrás dos discursos de “pompa e circunstância” que se repetem acerca da importância da comunidade portuguesa em Macau. Porém, Pereira Coutinho interroga-se sobre onde estão os substitutos quando juízes, magistrados do Ministério Público e médicos portugueses abandonam as suas funções no território.

O líder da Nova Esperança destaca a saída do hemiciclo de Leonel Alves, como “uma grande perda, algo que não é bom para Macau”. Coutinho entende que “a comunidade portuguesa deve estar cada vez mais unida e ter voz independente, livre”, que marque “a diferença entre o segundo sistema e o primeiro”.

No que diz respeito ao uso da língua portuguesa, Pereira Coutinho recorda um episódio na AL, quando interpelava a ex-secretária para a Administração e Justiça durante um debate das Linhas de Acção Governativa. Nessa altura, de acordo com o deputado, a resposta à interpelação feita em português foi em chinês, sem qualquer relação com a questão levantada pelo deputado.

Para não ser mal interpretado, ou permitir a desculpa da má tradução de intérpretes, o tribuno viu-se forçado a dirigir-se à ex-secretária em chinês.

Macau reduzida

Pereira Coutinho considera que a língua é um trunfo, uma vez que lhe permitir “vender o peixe” à comunidade portuguesa e macaense sem dificuldades. Sobre o facto de haver ressentimento por parte da comunidade chinesa por ter concorrido à Assembleia da República em Portugal, o deputado não tem meias palavras. “Não me interessa se não me perdoam, sou residente permanente de Macau e gozo dos meus direitos políticos e de cidadania”, comenta.

Um dos focos da crítica de Pereira Coutinho é a forma como a cidade “está reduzida a casinos e função pública, os dois maiores empregadores”. Esta realidade laboral bicéfala é, de acordo com o deputado, um factor de estrangulação económica. “Quando os casinos espirram, as outras actividades económicas ficam a soro”, comenta.

Além disso, o clientelismo é outro dos problemas elencados pelo candidato. “Há meia dúzia de empresários super influentes que controlam a AL, outra meia dúzia que controla o Conselho Executivo e outra meia dúzia que controla o jogo”, explica o deputado. A sobreposição de interesses leva o deputado a dizer que “Macau está entregue à bicharada”. Pereira Coutinho considera que esta situação representa um grande problema para os jovens e para o futuro do território.

No entender do deputado, “Macau está a fechar-se em si própria e isso cria grandes problemas ao nível de competitividade económica”. Nesse capítulo, o candidato à AL deixa uma crítica feroz à falta de qualidade do sistema de ensino do território, que não consegue corresponder às necessidades de um mercado de trabalho exigente, num contexto de forte competitividade com as regiões vizinhas.

Pereira Coutinho deixou ainda uma crítica ao facto de a AL permitir que haja deputados que exerçam as funções de deputados a tempo parcial. “Aproveitam-se do tacho de deputado e arranjam mais-valias para os seus interesses”, comenta. O candidato da Nova Esperança entende que é urgente que os deputados sejam obrigados a fazer uma declaração de interesses. “A forma como defendem os interesses da clientela é descarada e inadmissível, não podemos continuar a trabalhar assim”, remata.

7 Jul 2017