Refugiados | Requerente de asilo aguarda resposta há mais de cinco anos

Os dedos das mãos já quase não chegam para contar os anos de espera. Sem poder trabalhar e muito menos sair de Macau, Antoin (nome fictício) vive num limbo, enquanto anseia por uma resposta que o liberte do actual estado de indefinição. Apesar da longa demora, tem esperança de que o dia em que lhe vai ser concedido o estatuto de refugiado vai chegar, mesmo quando a realidade mostra que tal seria inédito

[dropcap]Q[/dropcap]uando Antoin partiu não foi apenas a perseguição política que deixou para trás. Foi tudo o resto: a família, os amigos, até o negócio que tinha. Já fugira do país por diversas vezes, procurando refúgio durante largas temporadas em nações vizinhas, mas daquela vez foi diferente. Depois de décadas a travar “uma luta por um país melhor e sobretudo democrático” decidiu pôr termo ao activismo político.

“Senti que não podia apoiar mais a causa, sair do país acabou por ser uma emergência”, conta, em entrevista ao HM. “Perdemos muitos membros. Uns foram mortos, outros raptados, outros desapareceram sem deixar rasto tal era a repressão”, relata Antoin, que diz ter perdido a conta ao número de vezes em que foi espancado em esquadras. “Fui torturado e enfrentei mesmo a morte”, diz. Macau surgiu no mapa após uma conversa com um líder religioso da sua terra natal: “Ele sugeriu-me Macau dado que na altura não havia tempo para tratar de vistos e em Macau não era preciso. Foi ele que me orientou”.

Antoin chegou como turista, entre os milhões que todos os anos escolhem Macau como destino, mas tinha tido um lamiré sobre como se mover por cá, graças ao líder religioso do qual fala com especial carinho. Os primeiros contactos em Macau foram com a Caritas. O passo seguinte foi contactar o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) em Hong Kong que, após uma conversa ao telefone, o remeteu para a Comissão para os Refugiados, organismo com competência para dirigir a instrução dos processos de reconhecimento do estatuto de refugiado e elaborar as respectivas propostas de decisão, cabendo a última palavra ao Chefe do Executivo.

Após a apresentação do pedido deu-se o contacto formal com a Comissão. Antoin recorda-se do primeiro encontro, no qual esteve presente uma intérprete para fazer a ponte entre o inglês e o chinês. Poucos dias depois, “disseram que iam começar a analisar o meu caso”, lembra Antoin, enquanto retira da carteira uma folha de papel dobrada em quatro que serve de título provisório de identificação. Esse documento – que “não parece uma identificação a sério” – substitui o passaporte, que tem de ser retido e junto ao processo. Também, como manda a lei, ficou obrigado a apresentar-se periodicamente no Serviço de Migração. “Primeiro, tinha de ir de duas em duas semanas e depois passou a ser de mês a mês, mas é muito chato”, partilha.

Apesar das imposições, salienta que sempre foram gentis e que até havia quem lhe perguntava pelo andamento do caso. Contudo, do ponto de vista formal, as diligências ficaram-se por esses primeiros dias, não tendo havido qualquer contacto posterior: “Até hoje nunca mais ninguém me disse nada, nada”, lamenta. “Só me resta ir perguntando às pessoas que encontro [se há novidades]. A resposta é que [o pedido] está ainda a ser apreciado”, realça.

Pelo meio, foi mantendo diálogo com o ACNUR em Hong Kong. A última vez foi este ano por ocasião da vinda a Macau de um representante da organização internacional que lhe indicou que iriam voltar a falar com o Governo para que algo fosse feito.

Um pouco de liberdade

Antoin vive do apoio do Instituto de Acção Social (IAS) que lhe providencia um lugar para dormir e garante apoio financeiro mensal equivalente ao índice mínimo de subsistência, actualmente fixado em 4.050 patacas. Antoin diz que tem quase tudo: “Tenho um sítio onde dormir, tenho apoio financeiro. Mas há uma coisa que não tenho: liberdade. Não posso sair de Macau nem trabalhar. Não sei se todos os governos têm [esta política], mas ir até Zhuhai, por exemplo, já seria bom”, enfatiza, sem esconder o desejo de um dia vir a ter “a oportunidade de conhecer a grande China”.

A grande parte do tempo passa no que chama de “escritório”, porque “é como se fosse um trabalho a tempo inteiro”. É, aliás, ali que o encontramos, em frente a um computador, do qual se serve para ver as notícias do seu país e do mundo. O espaço em questão pertence à Caritas, uma das organizações às quais se dedica como voluntário desde que chegou a Macau. O leque de tarefas é extenso: tanto ajuda em reparações, como acompanha idosos ao hospital ou ajuda na distribuição de arroz e em campanhas de recolha de donativos. “Se não me organizar, morro!”, graceja.

Antoin sente, no entanto, que “podia ser mais útil na comunidade” se lhe fosse possível ter uma vida por inteiro: “Por exemplo, se pudesse conduzir podia ajudar mais”. As portas fechadas também chegam ao ensino superior, tendo Antoin visto ser-lhe vedado acesso a cursos face à condição em que se encontra. O espartilho das circunstâncias não lhe tirou, porém, a vontade e até se aventurou por aulas de cantonense.

“Tenho que me educar de algum modo”, realça. “Gostava de fazer tantas coisas. Ter um sítio para dormir e o que comer não é vida. Ter uma vida é alguém se lembrar de ti quando te vais”, aponta, num fôlego só. “Queria que me adoptassem por completo e não pela metade, que é como sinto na realidade”, diz, comparando-se repetidamente a uma criança que aguarda pelo desfecho do processo de adopção.

A sua família está espalhada por diferentes continentes. O parente mais próximo – a mãe – continua na terra natal: “Sinto receio por ela, claro. Às vezes não consigo dormir, mas falamos frequentemente ao telefone e fico feliz quando ouço a voz dela”. Na Alemanha tem quatro irmãos, todos mais novos, um dos quais chegou inclusive a visitá-lo em Macau. A Europa até foi uma possibilidade, numa fase mais tardia, mas acabou por desvanecer-se com a vaga de oposição ao intenso fluxo migratório da altura. “Antes não tinha essa ideia e, como já cá estava, tinha confiança de que o Governo ia tramitar o meu caso rapidamente. Nunca pensei que ia ficar por tanto tempo sem resposta”.

Expectativa vs realidade

“Anos não são meses” e Antoin sabe-o melhor que ninguém. O que desconhecia é que Macau jamais aprovou o estatuto que almeja. “Nunca?” – pergunta. O franzir de sobrancelha repete-se quando se apercebe, com “muita frustração”, que o facto de estar há muito à espera não lhe garante uma resposta afirmativa. Mas, novamente, o ânimo vem ao de cima. “Esperançosamente, acredito que o Governo pode fazer algo para resolver isso. Estou aqui há muitos anos e penso que o Governo estará consciente – esse é pelo menos o meu desejo”. “O Governo devia pensar que o requerente de asilo é basicamente alguém que tem ou teve um problema no seu país de origem – razão pela qual não está em condições de voltar. Devia ser compreensível. Não estamos a falar de alguém que cometeu um crime e fugiu”, sustenta.

O nome verdadeiro, a idade, a origem ou mesmo o tempo exacto de espera de Antoin não são referidos por razões de confidencialidade.


Um estatuto miragem, dois pedidos pendentes

Apesar de, no passado, Macau ter figurado como porto de abrigo para milhares de deslocados, o estatuto de refugiado continua a ser uma miragem, dado que a RAEM nunca aprovou nenhum pedido. É o que atesta um relatório do ACNUR, datado de Março, e a garantia dada ao HM pela Direcção dos Serviços de Identificação (DSI) de que nunca emitiu o título de identidade de refugiado, destinado a quem tinha visto reconhecida essa qualidade.

Até Junho, eram dois os casos pendentes, ambos entrados antes de 2013, ou seja, há mais de cinco anos. Isto a avaliar por dados facultados pelo Instituto de Acção Social (IAS) ao HM que deu conta de que, em 2017, prestou apoio financeiro a três indivíduos/famílias, num montante superior a 220 mil patacas, além de lhes proporcionar acesso a equipamentos com serviço de internamento. Entretanto, o número de beneficiários diminuiu para dois, com o registo de “um caso de regresso ao local de origem”, explicou o IAS.

Ao abrigo da lei, a RAEM tem de assegurar “condições de dignidade humana até à decisão final do pedido” sobre o reconhecimento ou não do estatuto de refugiado, sendo prestado auxílio pelo IAS aos requerentes em situação de carência económica e social e aos membros do seu agregado familiar.

29 Nov 2018

Refugiados | Família síria que viu tribunal dar-lhe razão vive hoje no Canadá

Foi há sete anos que o Tribunal de Segunda Instância (TSI), numa decisão sem precedentes, deu razão a uma família síria que recebeu uma carta de deportação como resposta ao pedido de reconhecimento do estatuto de refugiado. Maysoun Darweesh vive hoje no Canadá, onde conquistou a nacionalidade, com o marido e as duas filhas. Em entrevista ao HM, relata os cinco anos vividos em Macau que quis o destino que fosse a primeira, mas não a derradeira etapa de uma longa jornada em busca de um lugar para poder chamar de casa

[dropcap]Q[/dropcap]uando o telefone tocou e do outro lado deram conta de que tinham de ir ao Serviço de Migração a expectativa era grande. Não era caso para menos, porquanto ficara a promessa deixada pelas autoridades meses antes, na presença de um representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), de que ser-lhes-ia autorizada residência em Macau. “Pensávamos que nos iam dar bilhetes de identidade, mas quando o meu marido foi lá deram-lhe, na verdade, uma carta de deportação. Eu fiquei chocada”, conta Maysoun Darweesh, com a memória fresca daquela quinta-feira negra.

A esperança alimentada ao longo de meses a fio de que iam ter os direitos equiparados a um residente permanente esfumou-se com o papel timbrado, com carimbo da China, que os obrigava a sair de Macau, onde, por obra do caso, acabaram a procurar refúgio da perseguição política sofrida na Síria. “Tínhamos 15 dias para recorrer da decisão e não tínhamos dinheiro para contratar um advogado mas, por outro lado, não podíamos arriscar ser deportados, porque não sabíamos o que nos podia acontecer no regresso. Não sabíamos o que fazer”. Seguiu-se um contacto para o ACNUR em Hong Kong a dar conta do sucedido. Igualmente surpreendido com o inesperado desfecho do processo do casal, com duas filhas menores, “o ACNUR contactou um advogado em Macau, mas que recusou ficar com o caso, dizendo que não queria ter problemas com o Governo”, revela.

No dia seguinte, Maysoun procurou conforto junto de uma amiga missionária em Macau que lhe disse que ia tentar falar com uma freira que tinha bons contactos de advogados ligados a casos de direitos humanos, embora advertindo que, por ser sexta-feira, o mais provável era ter que esperar pelo fim-de-semana. Porém, no mesmo dia, Maysoun recebe uma chamada de um escritório de advogados. “Foi um milagre honestamente, porque na altura a irmã Juliana decidiu ficar até mais tarde a trabalhar, por nenhuma razão aparente, e recebeu a mensagem de pedido de ajuda”, descreve, com um entusiasmo tal que parece estar a viver o momento. “Abençoado seja o doutor Mário Paz, onde quer que ele esteja”, repete Maysoun, referindo-se ao homem que aceitou o desafio de a defender. “A assistente, Lisa, levou-nos até ele, explicámos a situação, entregámos os documentos e ele aconselhou-nos a tentar encontrar outro lugar, pois não estávamos seguros em Macau. Ele garantiu-nos que ia ganhar tempo para nós, que ia fazer o melhor que podia e foi o que fez”.

Decisão sem precedentes

O caso seguiu para tribunal, em Junho de 2010, com a defesa a interpor recurso contencioso do despacho do Chefe do Executivo que negou a concessão do estatuto de refugiado. O Tribunal de Segunda Instância (TSI) vem dar razão à família síria, numa decisão rara – e talvez mesmo inédita –, dado que não se encontra outra do tipo entre os acórdãos publicados. Desconhece-se, no entanto, quantos processos foram levados à justiça.

A defesa contestou desde logo o relatório da Comissão para os Refugiados, que serviu de base à decisão do Chefe do Executivo, por ter sido elaborado com base em informações que não correspondiam à realidade dos factos nem eram corroboradas por agências internacionais e organizações não governamentais, como o próprio ACNUR ou a Amnistia Internacional, ao dizer, por exemplo, que a Síria não discriminava a minoria de etnia curda que vivia dentro das suas fronteiras, que lhes garantia a nacionalidade síria, respeitava a sua cultura e tradições e liberdade de movimentos. Também contestou a ausência de qualquer diligência útil por parte da Comissão para os Refugiados durante os 16 meses de instrução do processo para avaliar a situação do casal de activistas enquanto alegadas vítimas do regime de Damasco. Sobretudo o facto de ter rejeitado a recomendação da representação do ACNUR em Hong Kong, que advogou estarem preenchidos os critérios para a atribuição do estatuto de refugiado.

De acordo com o acórdão, o Chefe do Executivo começou por contra-argumentar que todas as situações foram narradas pelos próprios e que não havia provas, designadamente de perseguição política, racial ou religiosa. O líder do Governo alegou ainda que a proposta do Comité Executivo do ACNUR tinha “valor de referência para o Governo, mas não valor vinculativo”, bem como que a consulta da opinião do Comissariado do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China na RAEM, referida no despacho, era também “uma mera referência”, não tendo servido de fundamento de base ao ‘não’.

“No fundo o que se verifica é que a decisão foi tomada com base em pressupostos cuja base probatória é o relatório do ACNUR em Hong Kong e a audição da Delegação dos Negócios Estrangeiros da RPC na RAEM”, sendo que “só o primeiro consta dos autos e vai exactamente em sentido contrário à matéria de facto que a Administração deu como assente”, observaram os juízes. “Fica-se assim sem saber em que elementos probatórios se baseou para concluir como concluiu, sendo que nem sequer se apuraram os elementos que estiveram na base do relatório do ACNUR”, o que constituiu “um défice de instrução”, diz o veredicto, que concluiu haver “uma contradição entre os elementos probatórios existentes e factos assentes” e anulou, por fim, a decisão do Chefe do Executivo.

O presidente da Comissão para os Refugiados, Kong Chi, reagiu então ao caso, deixando claro, em declarações ao Macau Daily Times, que o veredicto não significava a concessão automática do estatuto de refugiado. “Este é um caso muito raro e vamos ter que seguir um padrão muito cauteloso”, respondeu o também procurador-adjunto, quando questionado pelo mesmo jornal se a Comissão para os Refugiados iria ter em conta a decisão do TSI e os recentes desenvolvimentos na Síria, onde a guerra civil estalara meses antes, em Março de 2011. “Talvez o tribunal não compreenda totalmente as implicações do nosso trabalho”, comentou ainda.

Entre o hiato de sensivelmente um ano e meio entre o recurso e a decisão judicial, o conselho de Mário Paz – que o HM tentou contactar, mas que se encontra reformado há vários anos em Portugal – foi seguido à risca. Maysoun escreveu uma carta às amigas de um grupo internacional de que fazia parte a pedir para partilharem o caso da sua família na expectativa de encontrar um outro lugar para viver, por não restar esperança em Macau. “Uma amiga que estava de visita ao Canadá levou a missiva à minha igreja [actual], explanou o caso e instou-os a patrocinar a nossa família. Eles aceitaram e começaram a tratar dos documentos. Representantes do ACNUR vieram inclusive, por várias vezes, falar com o nosso advogado e, finalmente, recomendaram o nosso caso ao Consulado do Canadá em Hong Kong”, pormenoriza.

Enquanto aguardavam dá-se uma reviravolta: “O nosso caso estava a ser processado, quando o doutor Mário Paz nos telefonou a dizer que tínhamos ganhado em tribunal. Fiquei incrédula”. Esperar por Macau ou seguir em frente com a possibilidade do Canadá não chegou a ser, contudo, um verdadeiro dilema: “Vimos que o responsável da Comissão [para os Refugiados] afirmou à comunicação social que a decisão judicial não queria dizer absolutamente nada e depois também pensei no futuro, nomeadamente nas minhas filhas que, como requerentes de asilo, não podiam ir estudar para a universidade”.

A vida em Macau

O ‘sim’ do Canadá acaba por chegar finalmente e, em Dezembro de 2012, a família síria instala-se em Winnipeg, capital da província de Manitoba, a sensivelmente 11 mil quilómetros de distância de Macau, terra que foi, na verdade, fruto de um acaso. É que o marido de Maysoun fugiu da Síria rumo à China. Estávamos em Junho de 2007 quando o activista – que se dedicava à luta pela democracia e pelos direitos dos curdos e que diz ter estado preso por três vezes e sido alvo de tortura – deixou a terra-natal, sem informar a mulher, na altura grávida, que ficaria sem ver por aproximadamente um ano. A China foi – explica Maysoun – o destino que lhe pareceu conveniente, dado que mantinha válido o visto de uma viagem de negócios recente.

Ora, Macau surge como a primeira hipótese quando teve de sair de Pequim, dado que o visto estava prestes a expirar e precisava de o renovar, uma vez que à entrada dar-lhe-iam um mês como turista. Com os papéis tratados, visto da China estendido e o plano de ir para a Europa apalavrado com a mulher, estava pronto a deixar o território. Eis senão quando o inesperado acontece. Após fazer o ‘check-out’ do hotel, o activista decide ir à casa-de-banho e percebe, no regresso, que desaparecera a bagagem que tinha deixado junto da recepção à confiança. “Ele confia muito nas pessoas, mas não acreditaram nele até que as imagens das câmaras de videovigilância mostraram o ladrão. Ele gastou dinheiro em anúncios a pedir apenas que lhe devolvessem o passaporte, mas em vão. Mandei-lhe dinheiro e ele tentou de tudo para obter documentos de viagem para simplesmente voltar à China, mas nada funcionou”, conta Maysoun que, com duas meninas pequenas, de três anos e oito meses, e sob “crescentes ameaças por parte da polícia secreta síria”, decide vir finalmente ao encontro do marido.

Após a longa viagem – Damasco-Dubai-Hong Kong e Macau –, contacta o ACNUR em Hong Kong que os remete para Comissão para os Refugiados. Após a visita aos Serviços de Migração receberam uma espécie de guia – que tinham de carimbar mensalmente. Um ano depois, o casal interpela as autoridades a respeito do andamento do processo, informados que estavam de que esse era o prazo máximo para apreciação do pedido por parte da Comissão para os Refugiados. “Nada aconteceu. Fomos lá, demos conta de que tínhamos lido a lei, que traduzimos para inglês, mas eles ficaram estupefactos. Assim como nós, porque eles não sabiam nada da sua própria legislação. Não estávamos a pedir nada mais do que o previsto na lei de Macau”. O casal mantinha contacto permanente com o ACNUR e, posteriormente, tem lugar uma entrevista nos Serviços de Migração, na presença de um representante do ACNUR, que “correu muito bem”. “As autoridades afirmaram que nos iam dar residência permanente, que tínhamos apenas que esperar”, relembra Maysoun que hoje, com o devido distanciamento do episódio, confirma a “sensação” que teve na altura de que a promessa fora feita para “agradar ao organismo internacional”.

Mas se há algo que o Governo nunca falhou foi na assistência, atesta Maysoun. Após a entrega do pedido de reconhecimento do estatuto de refugiado, a família foi colocada num edifício social no Fai Chi Kei, onde ocupou um quarto durante oito meses. Um cenário que mudou quando descobriu que uma das filhas sofria de um problema cardíaco. “Ela precisava de cuidados e ali partilhávamos a cozinha e a casa-de-banho com outros, pelo que o ambiente não era muito saudável e, por essa razão, expusemos o caso ao IAS, dando conta de que precisávamos de um lugar seguro como família”. A resposta foi positiva. “Deram-nos muito apoio, foram sempre muito prestáveis. Disseram-nos para procurar um apartamento na zona e assim foi”, descreve Maysoun, que ainda se lembra do nome das “atenciosas” funcionárias do IAS.

Maysoun era jornalista e o marido empresário, mas em Macau estavam impedidos de trabalhar, por força da sua condição de requerentes de asilo: “Não podíamos estar simplesmente sem fazer nada, pelo que éramos voluntários a tempo inteiro, enquanto as meninas frequentavam a escola, onde aprenderam português e chinês”. “De certa maneira, até tenho saudades, porque as pessoas eram muito boas e éramos tratados justamente por toda a gente”, enfatiza, incluindo o Governo no pacote. “Tenho de ser justa. Eles tentaram o máximo que podiam, mas tinham o seu limite. Compreendo totalmente que não foi culpa deles, que não lhes cabia tomar decisões políticas e que havia pressão da China”.

Sentimento agridoce

Quando a família deixou Macau o sentimento foi “um pouco agridoce”: “Chorei muito e sinto muitas saudades porque, ao fim e ao cabo, foi a nossa casa durante cinco anos. Embora tenhamos sofrido imenso, também vivemos bons tempos, conhecemos muita gente bondosa, fizemos amigos e, por isso, guardamos memórias felizes”. “Realmente gosto muito de Macau e quero voltar numa próxima viagem”, realça Maysoun, para quem a experiência na RAEM foi uma espécie de treino para a nova vida no Canadá, onde recomeçaram do zero.

“O Canadá é casa. Sou canadiana agora. Eu devia ter nascido aqui, tem tudo a ver com a minha mentalidade e com o meu trabalho. Tudo o que fazes é valorizado. É um excelente país e Manitoba é um província extremamente agradável para se viver. Não foi uma escolha, mas acredito que Deus planeou tudo isto de modo a hoje estar aqui e sou grata a toda gente que nos ajudou”, sublinha Maysoun, de 40 anos, que trabalha para uma agência que tem como missão precisamente ajudar a integração dos refugiados na sociedade canadiana. “Como especialista na área do voluntariado, o meu trabalho é fazer ponte, fazer com que se conheçam uns aos outros, criando uma conexão entre a comunidade local e os recém-chegados, sobretudo refugiados”. O marido tem a sua própria empresa hoje, enquanto as filhas, Rose e Nya, com 14 e 9 anos, respectivamente, prosseguem os estudos. “Infelizmente, o português e o chinês, que aprenderam na escola em Macau, ficou para trás, já só se lembram de palavras como ‘obrigada’ e ‘adeus’”, diz, na língua de Camões.

O verdadeiro adeus foi à Síria, onde Maysoun não planeia regressar, embora lá tenha deixado familiares tão próximos como a mãe. “Ficarias surpreendida se dissesse que sinto mais falta de Macau do que da minha terra natal, o que é verdade, porque Macau foi uma forma de casa, sem perseguição ou discriminação. A Síria é um bom país, as pessoas são realmente fantásticas, mas infelizmente o sistema é muito mau e, a menos que haja, de facto, uma verdadeira mudança, não penso em lá voltar tão cedo”.

29 Nov 2018

Edifício GCS | Governo comete gafe e diz que vai contactar arquitecto já falecido

Tai Kin Ip, director dos Serviços de Economia, disse ontem no hemiciclo que o Governo vai contactar o arquitecto que fez o projecto do antigo edifício do Gabinete de Comunicação Social por motivos de direitos de autor. Contudo, Eduardo Lima Soares faleceu há seis anos

Com João Santos Filipe

 

[dropcap]O[/dropcap] responsável máximo pela Direcção dos Serviços de Economia (DSE), Tai Kin Ip, parece não ter feito bem o seu trabalho de casa para o segundo dia de debate das Linhas de Acção Governativa na área da Economia e Finanças. Ontem, em resposta a deputados sobre o reaproveitamento do edifício que albergou em tempos o Gabinete de Comunicação Social (GCS), Tai Kin Ip cometeu uma gafe ao prometer contactar o arquitecto autor do edifício.

Contudo, o HM confirmou junto de três profissionais do sector, residentes em Macau, que Eduardo Lima Soares faleceu em Lisboa há seis anos, depois de ter tido um intenso percurso profissional no território.

Na sua intervenção, Tai Kin Ip prometeu o contacto por respeito a direitos de autor do edifício, construído nos anos 80. “Temos de fazer os trabalhos de concepção [do novo projecto] e ainda vamos ouvir o arquitecto que desenhou este edifício para ver como o novo projecto vai ser desenvolvido”, apontou o governante, que resumiu os entraves que o Governo tem tido até aqui para reabilitar um edifício há muito devoluto.

“Em 2015 a DSE recebeu a gestão do edifício e tiveram início os trabalhos de reparação. Nesse período, houve chuvas torrenciais e muitas infiltrações e aí notificámos a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT). Em 2017 recebemos uma notificação da CEM pelo facto do edifício estar localizado no centro histórico e ser necessária articulação com a nova subestação de abastecimento”, apontou. Tai Kin Ip adiantou ainda que “em Fevereiro vai ser aberto o concurso público para as obras”.

Projectos do ZAPE e Cotai

Apesar de falecido, Eduardo Lima Soares tem ainda em sua posse os direitos de autor do prédio em causa, uma vez que o regime de direitos de autor e direitos conexos determina que a autoria de uma obra permanece 50 anos após o falecimento, e que os descendentes devem ser contactados caso haja uma intenção de alteração do projecto original.

Além disso, a mesma lei obriga à colocação do nome do autor no edifício, o que não é o caso. “No caso da obra de arquitectura, é obrigatória a identificação do autor, por forma bem legível, não só em cada cópia dos estudos e projectos, como ainda junto ao estaleiro da construção e na própria construção, depois de concluída”, lê-se no diploma que data de 1999.

Nascido em 1945, em Lisboa, Eduardo Lima Soares formou-se na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, e viveu em Macau a partir de 1977.

Além de ter desenhado o edifício que serviu de casa ao GCS, o arquitecto português participou na concepção da Zona Aterros do Porto Exterior (ZAPE) entre 1978 e 1979, um trabalho que desenvolveu em parceria com Jon Prescott, de acordo com um artigo académico da autoria de Bruce Taylor, da Universidade de Macau, intitulado “Planing for High Concentration Development: Reclamation Areas in Macau”.
Num artigo publicado na revista Macau Business, é também referido o papel que Eduardo Lima Soares teve nas primeiras concepções dos aterros que deram origem ao Cotai.

Em 1992 a DSSOPT abriu um concurso público para a concepção da “Nova Cidade do Cotai”. A equipa vencedora era composta por Eduardo Lima Soares, Jon Prescott e Mário Neves e “produziu um plano urbano que juntava habitação e infra-estruturas sociais, quatro centros de saúde, 13 escolas do ensino preparatório e cinco escolas secundárias” e área recreativa, com muitas zonas verdes e reservatórios de água”. Este mesmo plano contabilizava também o número de residentes e não residentes que ali iriam viver e trabalhar.

De acordo com o artigo da revista Macau Business, o projecto contemplava também “áreas mais pequenas destinadas a actividades turísticas, sobretudo na parte ocidental, de frente para a ilha de Hengqin e fisicamente ligadas à nova ponte Flor de Lótus”.

28 Nov 2018

LAG 2019 | Governo estuda novo modelo de contratações no exterior

[dropcap]L[/dropcap]ionel Leong, secretário para a Economia e Finanças, avançou ontem que está a ser estudado um novo modelo de contratação de trabalhadores no exterior, que passa pela criação de um novo instituto que fará uma aprovação prévia dos quadros qualificados. Os visados podem depois procurar emprego sem um contrato de trabalho ou abrir uma empresa no território.

A ideia foi ontem anunciada no hemiciclo pelo secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, no segundo dia de debate das Linhas de Acção Governativa (LAG) da sua tutela.

“Os trabalhadores não residentes (TNR) precisam de uma empresa que os contrate, e quem deseja o BIR tem de responder a muitas exigências. Podemos considerar em atrair os talentos que precisamos sem estas limitações”, apontou.

Lionel Leong lembrou que em Hong Kong existe um instituto destinado apenas à aprovação dos pedidos de residência para quadros qualificados, medida que poderá ser realidade em Macau. “Achamos que com a criação de um instituto podemos atrair mais pessoas na área da tecnologia ou ciência. Neste novo instituto os talentos não precisam de ser contratados por uma empresa, e os que forem autorizados podem optar por procurar um emprego ou apostar no empreendedorismo”, frisou o secretário.

Lionel Leong não conseguiu, contudo, explicar como será feita a aprovação dos pedidos de forma mais rápida, mas a via do despacho assinado pelo Chefe do Executivo poderá ser uma solução.

“Temos de pensar mais sobre este novo regime, ainda temos de contactar empresários e analisar quais serão as condições. Será preciso determinar uma quota anual para a importação de quadros qualificados”, adiantou. “Este plano para a importação de quadros qualificados e a introdução de elites é um meio encontrado para responder às necessidades de Macau”, concluiu o secretário.

27 Nov 2018

Casas desocupadas | Governo vai consultar população sobre criação de imposto

[dropcap]O[/dropcap]Governo vai lançar uma consulta pública sobre a criação de um imposto a pagar por aqueles que são proprietários de casas desocupadas. A informação foi avançada hoje por Iong Kong Leong, director dos Serviços de Finanças, na Assembleia Legislativa (AL), no segundo dia de debate das Linhas de Acção Governativa (LAG) na área da Economia e Finanças.

“Macau está a acompanhar esta medida e que impacto pode ter”, começou por dizer. “Temos como referência o caso de Hong Kong mas a sociedade tem opiniões diferentes sobre a introdução deste imposto, e há pessoas que estão contra a medida. Achamos que é necessária uma consulta pública antes da criação do imposto e no futuro vamos lançar essa medida”, referiu.

Iong Kong Leong adiantou que o território tem cerca de dez mil fracções desocupadas, a maioria construída antes de 2000 e que não servem como primeira habitação dos seus proprietários.

27 Nov 2018

Lei sindical | Estudo encomendado em curso, apesar de estar fora da agenda do Governo

Tem de ser concluído até ao final do ano o estudo para medir o pulso à sociedade sobre a lei sindical, adjudicado por mais de 800 mil patacas à associação do empresário Kevin Ho. Isto apesar de o Chefe do Executivo, Chui Sai On, ter sido peremptório ao afirmar que o Governo não vai avançar com uma proposta, falhando em cumprir uma responsabilidade prevista na Lei Básica e em pactos internacionais

 

[dropcap]“O[/dropcap] Governo não tem intenção de tomar a iniciativa para apresentar uma proposta de lei sindical” – foi o que afirmou o Chefe do Executivo, Chui Sai On, no dia em que apresentou as Linhas de Acção Governativa para 2019, o seu último ano de mandato. Regulamentar o artigo 27.º da Lei Básica nunca foi uma prioridade – como prova a ausência de qualquer menção nas LAG dos últimos nove anos –, mas até ao final do ano tem de ser concluído o estudo para medir o pulso à sociedade a este respeito, adjudicado pelo valor de 837 mil patacas, à associação do empresário Kevin Ho.

“Isto prova que, de facto, o Governo encomendou o estudo para sacudir a água do capote, para atrasar e passar as mãos pelo pelo dos trabalhadores de que a lei sindical estava a ser estudada. Para que serve fazer esse estudo se o Governo nem espera pelo resultado [para tomar uma posição]?”, questionou Pereira Coutinho, em declarações ao HM. O deputado criticou ainda o Executivo “por fazer troça dos trabalhadores” ao encomendar um estudo sobre a lei sindical e a negociação colectiva a uma entidade ligada ao patronato.

“O principal objectivo de se ter encomendado o estudo de lei sindical ao empresário Kevin Ho tem a ver com o facto de quererem adiar a regulamentação da lei sindical e da negociação colectiva”, apontou o deputado, prometendo voltar a apresentar um projecto de lei em 2019, caso os seus pares da Federação das Associações dos Operários de Macau não o façam no início do próximo ano.

O “estudo das condições sociais necessárias para se iniciar a discussão da lei sindical” anda a ser debatido no Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS) pelo menos desde finais de 2016. Em Maio do ano seguinte, o CPCS convidou instituições a apresentarem propostas para o projecto de investigação. Em Janeiro último, a notícia da vitória da Associação de Estudo de Economia Política de Macau, do empresário Kevin Ho, foi dada por um despacho do secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, a delegar poderes no coordenador da Comissão Executiva do CPCS para a celebração do contrato.

Deputados, sobretudo ligados aos Operários, têm interpelado o Governo a propósito do atraso na adjudicação que, como adiantou a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) em resposta escrita ao HM, apenas foi efectivada em Abril.

Ao abrigo das exigências do concurso, a Associação de Estudo de Economia Política de Macau deve concluir o estudo no prazo de 240 dias (oito meses), contados a partir da data da assinatura. Portanto, a organização dirigida por Kevin Ho tem até ao final do ano para o fazer. Nos 30 dias seguintes ao prazo de conclusão tem de entregar a versão final do relatório do estudo e, após confirmação da versão final, submeter as versões em chinês e em português, dispondo de mais um mês para o efeito. Ou seja, na prática, será preciso esperar até Fevereiro para serem conhecidos os resultados da investigação em causa. A pesquisa tem de contemplar duas vertentes: deve incluir pelo menos um método comparativo e um inquérito social, bem como apresentar uma comparação entre países ou regiões vizinhos.

Escasseiam informações públicas sobre a Associação de Estudo de Economia Política de Macau, designadamente do ponto de vista da investigação académica. Pelo Boletim Oficial sabe-se que foi criada em 2015 e que recebeu um total de 300 mil patacas de apoio financeiro da Fundação Macau para custear parcialmente as despesas com o plano anual de actividades de 2017. Em Maio, Kevin Ho era o presidente da assembleia-geral, enquanto Samuel Tong Kai Chung o presidente da direcção.

O artigo 27.º da Lei Básica determina que “os residentes de Macau gozam da liberdade de expressão, de imprensa, de edição, de associação, de reunião, de desfile e de manifestação, bem como do direito e liberdade de organizar e participar em associações sindicais e em greves”, mas nunca foi regulamentado, ao contrário de outros como o 23.º, relativo à defesa da segurança do Estado.

“Está na ponta da língua dos secretários que a Lei Básica deve ser cumprida rigorosamente, pelo que é uma pena que, nos últimos anos, o Governo tenha escolhido cirurgicamente os artigos a cumprir”, lamentou Pereira Coutinho, recordando que também estão a ser ignorados pactos e convenções internacionais. “O não cumprimento da regulamentação do artigo 27.º traz diariamente problemas e conflitos laborais, que têm sido resolvidos com anestésicos para aliviar as dores e para desviar as atenções”, sustentou.

O caso dos nadadores

Não é todos os dias que em Macau trabalhadores reivindicam o direito à greve, muito menos não residentes, como sucedeu recentemente com nadadores-salvadores que foram despedidos, por justa causa, devido a faltas injustificadas. No entanto, também são cobertos pela Lei Básica, mais não seja por força do artigo 43.º que estipula claramente que “as pessoas que não sejam residentes de Macau, mas se encontrem na Região Administrativa Especial de Macau, gozam, em conformidade com a lei, dos direitos e liberdades dos residentes de Macau”.

Em termos práticos, dado que o artigo 27.º da Lei Básica nunca foi regulamentado, como pode o direito à greve ser invocado? António Katchi, professor de Direito no Instituto Politécnico de Macau (IPM), não tem dúvidas. “O artigo 27.º da Lei Básica é juridicamente suficiente para se considerar justificada uma falta por motivo de greve”, dado que “esse artigo contém uma norma auto-exequível, produzindo, portanto, efeitos directamente na esfera jurídica dos destinatários, sendo, por isso, directamente invocável por qualquer interessado”.

Embora reconheça que a falta de regulamentação do direito à greve “pode criar dificuldades práticas” à realização das mesmas, o constitucionalista entende, porém, que “não bloqueia o efeito jurídico de reconhecimento desse direito e legitimação do seu exercício que decorre do artigo 27.º da Lei Básica”.
Sérgio de Almeida Correia subscreve a interpretação. “A falta de regulamentação do exercício do direito à greve não tem a virtualidade de transformar em ilegal o que é admitido como legal ao ser acolhido por uma norma de natureza para-constitucional [artigo 27.º da Lei Básica], que está numa posição superior no ordenamento legislativo à ocupada pela Lei das Relações de Trabalho”. “A invocação e o exercício do direito à greve terá natureza excepcional e como tal deve ser tratado”, complementou o advogado, também em declarações ao HM.

Em paralelo, ambos recordam que se encontra em vigor em Macau o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, ao abrigo do qual os Estados se comprometem a assegurar o direito à greve, o direito de todas as pessoas de formarem sindicatos e de se filiarem, bem como o direito dos sindicatos a exercerem livremente a sua actividade.

Relação de forças

Olhando para a lei laboral, Sérgio de Almeida Correia recorda que o diploma não inclui o reconhecimento ou respeito pelo exercício do direito à greve nos deveres do empregador. Isto apesar de estipular, no âmbito das garantias do trabalhador, a impossibilidade do empregador se poder opor, “por qualquer forma”, a que o trabalhador exerça os seus direitos, bem como prejudicá-lo pelo exercício desses. Por outro lado, explica o advogado, o diploma define quais os tipos de faltas que podem ser dadas e como devem ser tratadas no âmbito da relação laboral, sem incluir então as motivadas pelo exercício do direito à greve que uma vez “não estando reconhecidas como justificadas se terão, para o patrão, como injustificadas”.

Ora, no caso dos nadadores-salvadores, como sublinha o causídico, “convém não esquecer que os trabalhadores saíram em defesa dos seus direitos [e] que não podem ser prejudicados por isso”, pelo que “alguém devia ser responsabilizado pelo sucedido, tanto mais que a Administração reconheceu, em sede laboral e ao que parece por via da aplicação de coimas, a justeza das reivindicações dos trabalhadores”.

De recordar que, no início do mês, a DSAL anunciou a conclusão de uma parte da investigação relativa ao conflito laboral e penalizou a empresa em 230 mil patacas por ter falhado em proporcionar aos trabalhadores tempo de descanso suficiente. A DSAL reitera que não recebeu qualquer queixa nem pedido de assistência por parte dos nadadores-salvadores despedidos após terem feito greve e, apesar de garantir que tem mantido contacto com ambas as partes e ter tentado inteirar-se da situação junto do empregador “para que os direitos e interesses dos trabalhadores sejam protegidos nos termos da lei”, não foram divulgadas mais informações desde então.

“Este é o exemplo de uma situação em que a ausência de regulamentação acaba, pelo menos por agora, por beneficiar o prevaricador, entidade patronal, deixando mal a parte mais fraca e a própria RAEM, que tinha a obrigação de protegê-los e de lhes dar os meios necessários à defesa dos seus direitos”, apontou Sérgio de Almeida Correia. A falta de regulamentação “pode ilibar o empregador, mas todavia não desresponsabiliza a RAEM quanto à sua obrigação, interna e internacional, de regulamentar o exercício do direito à greve, isto sob pena de “se estar a esvaziar de sentido e conteúdo útil da norma da Lei Básica, o que não me parece aceitável. O direito de greve podia ter ficado fora da Lei Básica se lá está por alguma razão foi”, observou, admitindo que, em último caso, “a questão deverá ser dirimida pelos tribunais”.

Desde a transferência do exercício de soberania, em 1999, foram apresentados nove projectos de lei sindical, mas todos foram chumbados pela Assembleia Legislativa.

27 Nov 2018

Grande Prémio | Sophia Floersch quer regressar a Macau

Sophia Floersch foi operada à coluna vertebral na semana passada depois de um aparatoso acidente no Grande Prémio de Macau, mas a piloto alemã está a recuperar e pretende voltar ao Circuito da Guia já em 2019. Floersch foi ainda nomeada Embaixatriz do Turismo de Macau pelos Serviços de Turismo

[dropcap]A[/dropcap] piloto alemã de F3 Sophia Floersch teve alta ontem, e regressou a casa depois da intervenção a que foi submetida à coluna vertebral, na sequência do aparatoso acidente na prova final do Grande Prémio (GP).

Em franca recuperação, a piloto pretende estar de volta às corridas, e especificamente ao GP de Macau, já no próximo ano. “Estou muito grata por estar aqui e ter uma boa recuperação. Estou a andar. Tenho que trabalhar nos próximos meses, mas com certeza voltarei a correr aqui no próximo ano”, disse Sophia Floersch ontem em conferência de imprensa realizada para actualização do seu estado de saúde.

De acordo com o chefe do Serviço de Ortopedia do Hospital Conde de São Januário, Lau Wai Lit, a piloto, apesar de necessitar ainda de algum tempo para recuperar totalmente, irá estar em forma daqui a alguns meses. “Depois da cirurgia teve uma boa recuperação”, referiu Lau, e “já pode andar sozinha, mas a coluna ainda necessita de tempo para recuperar. Vai demorar alguns meses, mas não vai afectar a forma como andará no futuro”, assegurou o especialista.

Seis meses de fisioterapia foi o tempo necessário apontado pelo médico ortopedista Chan Hong Mou para uma recuperação plena, sendo que dentro de um ano Floersch poderá voltar às competições.

Circuito seguro

Questionada sobre se as condições do circuito local poderiam estar na origem do acidente que sofreu, a piloto alemã foi clara “foi uma questão de azar e foi um acidente que acontece uma vez na vida. Não há insegurança nesta pista” disse. A piloto destacou ainda que Macau é um circuito que “todos os pilotos adoram”.

O acidente protagonizado por Sopfia Floersch envolveu mais cinco pessoas. Entre as que ficaram sob os cuidados hospitalares, o comissário de pista teve alta na passada sexta-feira, e o fotógrafo continua internado mas “terá alta muito em breve”.

No final da conferência de imprensa de ontem a piloto alemã foi ainda distinguida como Embaixatriz do Turismo de Macau pela directora dos Serviços de Turismo Helena de Senna Fernandes. “Sophia Floersch tem uma boa impressão de Macau e por isso, queremos manter esta ligação e esperamos que ela nos ajude a promover o Grande Prémio e também o Turismo de Macau”, disse a responsável.

26 Nov 2018

Macau Jockey Club | Governo não espera novos pedidos de isenção de renda em 2019

[dropcap]P[/dropcap]aulo Martins Chan, director da Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), garantiu que a isenção de renda atribuída ao Macau Jockey Club, no valor de 15 milhões de patacas, se deveu aos prejuízos registados pela concessionária.

O governante disse ontem, na Assembleia Legislativa (AL), que no próximo ano não são esperados novos pedidos de isenções. “Registaram-se prejuízos na receita pelo que a empresa podia pedir ao Governo a isenção da renda. Para o próximo ano não nos apresentaram ainda qualquer pedido de isenção. De acordo com o plano do Macau Jockey Club serão investidas 1,5 mil milhões de patacas. Como há um investimento com um valor tão elevado não há razão para a isenção da renda”, garantiu Paulo Martins Chan.

A notícia da isenção da renda de 15 milhões de patacas, relativa a este ano, foi transmitida na passada sexta-feira pela Rádio Macau. Este é um valor que a concessionária está obrigada a pagar de acordo com o contrato de concessão, renovado o ano passado por mais 24 anos e seis meses.

26 Nov 2018

Lionel Leong em silêncio sobre candidatura a Chefe do Executivo

O deputado Sulu Sou fez a pergunta esta tarde no hemiciclo, mas o secretário para a Economia e Finanças optou por ignorar o assunto

 

[dropcap]N[/dropcap]o primeiro dia de debate sobre as Linhas de Acção Governativa (LAG) na área da economia e finanças, o secretário da tutela foi questionado sobre uma possível candidatura ao cargo de Chefe do Executivo, nas eleições do próximo ano.

“Vai ou não candidatar-se ao cargo de Chefe do Executivo no próximo ano? Se quiser candidatar-se tem de deixar o cargo e tem, pelo menos, dois problemas para resolver, o caso do Instituto de Promoção do Comércio e Investimento de Macau e do empréstimo concedido à Viva Air”, defendeu Sulu Sou, deputado do campo pró-democrata.

Lionel Leong optou por ficar em silêncio, tendo dito que esses casos estão a ter o devido acompanhamento por parte do Executivo.

26 Nov 2018

Biblioteca Central | IC recusa violação de regras do concurso público

Caso resolvido. O IC diz que não há indicações de que o projecto apresentado pelo arquitecto Carlos Marreiros viole o concurso público e tem intenção de prosseguir com os trabalhos

 

[dropcap]O[/dropcap] Instituto Cultural (IC) considera que não há indícios de violação das exigências do concurso público no caso do projecto da futura Biblioteca Central. Por esta razão, os trabalhos vão prosseguir normalmente com o objectivo de tornar a obra uma realidade tão depressa quanto possível.

O projecto do atelier de Carlos Marreiros foi colocado em causa nas redes sociais, nomeadamente através de acusações de plágio do Auditório da Cidade de León, trabalho dos arquitectos Emilio Tuñón Álvarez e Luís Moreno Mansilla. Contudo, o IC questionou o arquitecto sobre o caso e ficou satisfeito com a explicação dada.

“Tendo em conta a explicação da empresa seleccionada e as opiniões do júri, o IC considera que actualmente não existe informação que possa indicar a violação dos requisitos previstos no documento do concurso público e dos termos legais”, pode ler-se num comunicado emitido pelo Instituto Cultural, escrito em chinês e que até ontem à noite ainda não tinha tradução para português. “Por isso, o IC vai dar seguimento aos trabalhos posteriores, e tenciona fazer com que a nova Biblioteca Central entre em funcionamento na data prevista”, é acrescentado.

Confrontado com a posição do IC, Carlos Marreiros destacou a rapidez da decisão, que considerou benéfica para a população.

“A posição do Governo da RAEM, através do IC, é correcta porque a população, as instituições, os membros do júri [do concurso público], a classe profissional dos arquitectos, em geral, e os projectista vencedores, em particular, merecem todo o respeito”, afirmou Carlos Marreiros, ao HM. “Por fim, ganha a verdade e a população de Macau”, acrescentou.

Elogios a Álvarez

O arquitecto macaense aproveitou igualmente para elogiar as declarações do arquitecto espanhol Emilio Tuñón Álvarez, um dos autores do Auditório da Cidade de León. Ao HM, Tuñón reagiu à possibilidade de cópia do projecto com uma citação do poeta Frederico García Lorca: “as ideias não são de ninguém… estão a flutuar no ar à espera que alguém as apanhe”. “A citação utilizada foi de uma grande elegância”, reagiu Marreiros.

Também o presidente da Associação dos Arquitectos de Macau, Jonathan Wong, tinha comentado o caso ao HM, e considerou a possibilidade de ambos os autores terem tido a Capela de Notre Dame du Haut em Ronchamp como inspiração. Além disso, Wong explicou que o concurso público só poderia ser repetido caso existissem problemas técnicos, algo que não conseguiu descortinar. Para Carlos Marreiros, o presidente da Associação dos Arquitectos foi “correcto e justo” nas afirmações.

Resposta a Leão

Por último, Marreiros respondeu ao colega Rui Leão. O último tinha dito ao HM que “dá muito trabalho ter ideias de raiz”, e que o projecto da sua equipa era “autêntico” e que, do seu ponto de vista, era “muito mais interessante e bonito do que o [projecto] vencedor”.

Para o arquitecto macaense, Leão perdeu uma oportunidade para defender a classe de Macau. “Nem é o caso de me defender, nem o caso de defender o colega, trata-se de defender um colega de Macau perante uma acusação grave e infame, a que em qualquer momento ele, Rui Leão, ou qualquer outro projectista, podem estar sujeitos, em Macau, em qualquer parte do mundo”, começou por dizer. “A Era da informação é, afinal, a era da desinformação e das fake news [notícias falsas].

Todas as pessoas estão sujeitas a ataques cobardes, vis, abjectos sob anonimato. Esta era uma oportunidade de ouro para ele defender a classe […] mas, não. O arquitecto Rui Leão preferiu concluir que o seu colega copiou, não foi autêntico e que até não merecia ganhar, porque o seu projecto era mais interessante e bonito. E estou a citar”, frisou.

Carlos Marreiros revelou ainda que se sentiu quase vítima de um julgamento público por parte de Rui Leão. “Ele fez um quase julgamento em praça pública e com sentença. Isto é muito triste, assim prestou um péssimo serviço à classe dos arquitectos, a que ele pertence. Prestou um péssimo serviço à deontologia profissional, à criatividade, à decência e à cidadania”, afirmou. “Por aqui me fico. Mais do que tudo é meu colega, triste colega, sim, mas meu colega”, concluiu.

26 Nov 2018

Polytex | Leonel Alves comparou artigos do jornal Son Pou à época da Revolução Cultural

A sentença do caso que põe frente a frente a Polytex e o jornal Son Pou será lida a 17 de Dezembro. Na sexta-feira foram apresentadas as alegações finais e Leonel Alves, advogado da empresa, defendeu que os artigos de opinião escritos por Lei Kong sobre o Pearl Horizon contêm “invenções e juízos de valor negativos” que expuseram a empresa em praça pública

 

[dropcap]E[/dropcap]stá prestes a chegar ao fim um dos raros casos em Macau que originou debate sobre o papel da comunicação social e que colocou dois jornalistas no banco dos réus. Será a 17 de Dezembro que o cronista do jornal chinês Son Pou, Lei Kong, e o director da publicação, Chao Chon Peng, vão saber se têm ou não de pagar os dois milhões de patacas de indemnização que a Polytex exige pela publicação de artigos de opinião que considera difamatórios e injuriosos.

Contudo, as publicações, que incidem sobre o caso Pearl Horizon, não foram encaradas pelo Ministério Público como criminosas. Na sexta-feira foram apresentadas as alegações finais no Tribunal Judicial de Base (TJB), tendo Lei Kong lamentado que a acusação de que é alvo se faça em redor do significado e forma de algumas palavras que usou.

“Primeiro pensei que a condenação poderia acontecer por um ou dois aspectos, mas depois das sessões percebi que a divergência vai além disso, porque houve sempre o foco na questão dos 12 caracteres considerados injuriosos. O que é importante para o futuro é provar se há difamação e injúria. São nestas questões que se deve focar a decisão, não na questão dos 12 caracteres e na referência à alteração do número de pisos, de 25 para 50”, apontou.

Lei Kong, que durante a sessão teve algumas falhas de memória e fez várias pausas, mostrando nervosismo, referiu-se ao caso Pearl Horizon como “o maior caso de burla com valor elevado desde a transição”. “Os infelizes compradores tinham acesso a informações insuficientes e eles corriam um risco. Era uma questão que, mais tarde ou mais cedo, iria acontecer (a não conclusão do projecto). Havia um grande desequilíbrio de informações entre as duas partes.”

Em tribunal, Lei Kong acusou ainda as testemunhas da Polytex e o advogado da empresa, Leonel Alves, de terem levantado “falsos testemunhos” contra si. “Apresentaram provas falsas e mentiras. Baixo os braços perante o doutor Leonel Alves que é extremamente qualificado e que deturpou tudo o que eu disse”, frisou.

Lei Kong admitiu a possibilidade de os seus artigos de opinião conterem “erros”. Contudo, defendeu que a condenação “será uma notícia bombástica em Macau”. “Essa é a minha preocupação. Entendo que nesses artigos não há qualquer crime de difamação e injúria. O objectivo dos artigos é directo, claro, verdadeiro”, acrescentou.

Chao Chon Peng, director da publicação, apontou a sua responsabilidade como jornalista para a publicação dos artigos. “Nestes seis anos aconteceram tantas coisas ligadas a este caso e os jornais de Macau divulgaram muitas informações. O Son Pou publicou artigos para acompanhar o assunto e o objectivo nunca foi acusar ninguém. A Polytex não conseguiu entregar as fracções no prazo fixado e não se pode imputar as responsabilidades ao jornal Son Pou. A publicação desses artigos foi feita apenas tendo em conta o interesse público e estávamos apenas a cumprir as nossas responsabilidades.”

O responsável disse ainda que “havia indícios de que os prazos (do projecto do Pearl Horizon) não iriam ser cumpridos” e que foi com base nessas fontes que os artigos de opinião foram escritos.

“Os promitentes compradores não perguntaram e eles (Polytex) não tomaram a iniciativa de informar, mas não sei se isto constitui uma violação à lei. Só um ano depois da publicação dos artigos é que a Polytex veio invocar a lei de imprensa”, explicou.

Pontos nos is

Na hora de apresentar as alegações finais, o advogado da Polytex, Leonel Alves, descreveu os artigos como um ataque ao bom nome da empresa e defendeu que os jornais não devem ser o meio usado para esse fim.

“Esta acção é muito importante porque permite a todos nós ver o que é Macau e como os direitos individuais consagrados na Lei Básica devem ser exercitados, é muito importante para os cidadãos e os jornalistas. Permitir-se insultar impunemente num jornal é um crime”, começou por dizer, tendo feito uma referência ao uso de armas nos Estados Unidos.

“Há uma canção portuguesa que diz que ‘a cantiga é uma arma’, e a imprensa, se for mal usada, é uma arma perigosa tal como as armas que são usadas nos EUA. Se isso for permitido, não sei como poderemos viver em sociedade. Não é com prazer que estamos aqui, mas existe a obrigatoriedade de defender o bom nome de uma empresa que precisa desenvolver as suas actividades comerciais.”

Leonel Alves rebateu ponto por ponto tudo o que foi escrito por Lei Kong. Para si, todos os artigos de opinião em causa “contém um forte teor difamatório, com juízos de valor negativos e sem base factual”.
Além disso, o causídico, defendeu que este caso “faz lembrar a Revolução Cultural da década de 60, quando se puniam pessoas em praça pública”. “Não voltemos a esse período”, disse ainda.

Em tribunal foram descritas informações contidas nos artigos de opinião, que faziam referência às responsabilidades da Polytex e aos prazos e planta do projecto do Pearl Horizon. Num dos artigos, Lei Kong escreveu que a empresa terá tido ligações pouco claras a figuras do sector imobiliário e a empregados bancários. Tudo isso foi refutado por Leonel Alves.

“No segundo artigo que escreveu fala de burla e suborno, dois crimes muito graves na nossa sociedade. Fala em conluios e armadilhas com pessoas do mercado imobiliário e funcionários bancários, e contém, pelo menos, quatro falsidades e ficções. A primeira é que a empresa fez a venda sem ter o projecto aprovado e isso não foi provado em tribunal. Depois escreve que houve alterações várias com fins especulativos”, apontou Leonel Alves.

Num terceiro artigo, Lei Kong “enfatizou que só com acção penal se resolveria a situação”. “Escreveu ainda que a promotora foi favorecida com as cláusulas do contrato. Isto é um milagre, porque se houvesse favorecimento a concessão do terreno não teria sido considerada nula”, acrescentou Alves.

O causídico mencionou também o efeito nefasto destes artigos junto dos lesados, “já emocionalmente perturbados”. “A imagem que passa é que vocês investigaram e que o director depois permitiu a publicação”, argumentou Alves, que defendeu que Lei Kong deveria ter feito uma investigação antes de escrever as suas opiniões, nomeadamente através da busca de informações junto da própria Polytex ou Obras Públicas.

“O autor deveria ter procurado informações mais correctas para o seu artigo ao invés de transmitir mensagens erradas para a opinião pública.”

“Falou como um político”

Paulo Ramalho, advogado de defesa dos dois jornalistas do Son Pou, começou a sua intervenção acusando Leonel Alves de ter tido uma “atitude de político” em tribunal. “Falou como um político e fez uma interpretação própria de um político que, como disse, tem as suas bases. Ficou claro que a sua visão não corresponde a esta visão negra (dos acontecimentos) apresentada pelas testemunhas. Trata-se, portanto, de um discurso político e não é uma conclusão correcta.” Leonel Alves, que foi deputado à Assembleia Legislativa (AL) e que, em 2013, votou na sessão plenária que aprovou a lei de terras, negou estas acusações.

“Trabalhei muitos anos na AL mas intervindo sempre como jurista nos trabalhos legislativos, dando o meu contributo. Não trouxe inputs políticos para esta audiência”, disse.
Paulo Ramalho lembrou que “a imagem da Polytex já estava prejudicada” antes da publicação dos artigos de opinião, algo que várias testemunhas, incluindo o deputado Au Kam San, confirmaram. “Não ficou aqui demonstrado que qualquer artigo do senhor Lei Kong tenha levado a uma acção política. Ele não foi o primeiro a falar de burla.”

Além disso, para o advogado de defesa, a Polytex “agiu com dolos maus e isso levou as pessoas, e não os artigos, a reagirem e sentirem-se enganados graças à atitude da empresa antes, durante e depois dos contratos”.

Em resposta à posição de Leonel Alves, de que Lei Kong deveria ter investigado previamente antes da redacção dos artigos, Paulo Ramalho lembrou o quão difícil é ter acesso a dados da Administração.
“Os artigos emitem juízos de valor porque são opinativos. Portanto, o senhor Lei Kong não tem de fazer uma investigação como se fosse um órgão de polícia criminal, mas tem de confiar nas suas fontes.”

“A Polytex queria que o senhor Lei Kong escrevesse os artigos de opinião com dados que só em tribunal conseguimos obter. Muitas vezes os interessados não conseguem obter informações junto da Administração e a acusação acha que o senhor Lei Kong é um ser superior, que vai às Obras Públicas e consegue as informações”, ironizou Paulo Ramalho.

 

“Polytex quis passar uma mensagem à comunicação social”, diz defesa

A apresentação das alegações finais acabou por dar lugar a um intenso debate sobre a ausência de auto-regulação dos jornalistas em Macau e a importância da protecção das fontes. Lei Kong, com uma carreira com cerca de quatro décadas como repórter, admitiu ter ficado “com medo” e ter deixado de escrever opinião nos jornais. E deixou um alerta: “Demos as nossas opiniões e, mesmo assim, somos acusados.

A situação está cada vez pior para a comunicação social, mais abusiva, e parece que os que têm maior influência na sociedade querem calar a comunicação social. Esta é uma acção contra os media e tem muito a ver com poderes pessoais. Isto é relevante para os trabalhadores da comunicação social que devem estar atentos.”

O advogado de defesa dos arguidos, Paulo Ramalho, lembrou o facto do sector da comunicação social não ter um código deontológico e dos repórteres apenas poderem contar com a sua consciência na hora de informar. Além disso, argumentou que “um jornalista de opinião não é funcionário de nenhuma autoridade com as competências de investigação de que fala a acusação”.

“O que a acusação queria é que o senhor Lei Kong trabalhasse para a Polytex e branqueasse as suas acções. Lei Kong é jornalista há 40 anos e nunca teve este problema. Ele não cometeu nenhum crime e o que a Polytex quis foi, estrategicamente, passar uma mensagem para a comunicação social, para que não se fale deles. Já conseguiram, pois o senhor Lei Kong deixou de escrever”, frisou.

A lei de imprensa e o direito à liberdade de expressão e de pensamento, regulados pela Lei Básica, foram pontos centrais da sessão. Leonel Alves lembrou que chegou a trabalhar na elaboração da lei de imprensa, um diploma que considera “equilibrado”, mas que aponta limites a essas liberdades.

“A liberdade de expressão e de pensamento são importantes tendo em conta o conceito ‘Um País, Dois Sistemas’, que faz parte do código genético de Macau, mas a lei de imprensa também regula os seus limites. Falei com chineses e portugueses e todos acham estranho que não haja código deontológico em Macau. Mas aqui o senhor Lei Kong violou, pelo menos, sete deveres do jornalista.”

Paulo Ramalho lembrou que “um jornalista de opinião não tem de ser isento, pode ser parcial, o que ajuda ao pluralismo” e acusou Leonel Alves de fazer “um discurso tendencioso e com alguma malícia”. O advogado congratulou ainda o facto do MP não pedir qualquer acusação e exigiu a absolvição dos seus clientes, “sem condenação cível, pois não há danos patrimoniais”, apontou.

26 Nov 2018

Emilio Tuñón Álvarez cita Lorca: “As ideias não são de ninguém”

[dropcap]A[/dropcap]o HM, Emilio Tuñón Álvarez, um dos arquitectos do Auditório da Cidade de León, a par de Luís Moreno Mansilla, afirmou não estar “minimamente preocupado” com um eventual plágio. O arquitecto espanhol de 59 anos citou também o compatriota Frederico García Lorca.

“Tenho de confessar que não estou preocupado com todo este tipo de questões de cópia de trabalhos”, disse Emilio Tuñón Álvarez, ao HM. “Frederico García Lorca, o famoso poeta espanhol, costumava dizer: ‘as ideias não são de ninguém… estão a flutuar no ar à espera que alguém as apanhe’”, citou.

O também vencedor do prémio Mies van der Rohe de Arquitectura Contemporânea da União Europeia, em 2007, com o Museu de Arte Contemporânea de Castela e León, deu ainda exemplos de “edifícios bizarros”, na União Europeia e nos Estados Unidos inspirados no auditório que concebeu, nomeadamente o edifício Mission Bay Parking Structure, em São Francisco, e a Escola Burntwood, em Londres.

23 Nov 2018

Polytex | Sentença do caso contra jornal Sou Pou conhecida a 17 de Dezembro

O desfecho do caso em que a Polytex acusa um jornalista e o director do jornal Sou Pou de difamação será conhecido no próximo mês. Ministério Público não encontrou indícios de crime; antiga concessionária do terreno do Pearl Horizon pede dois milhões de patacas de indemnização

 

[dropcap]E[/dropcap]sta manhã decorreu no Tribunal Judicial de Base (TJB) a leitura das alegações finais do caso em que a Polytex acusa o jornal Sou Pou de difamação, devido à publicação de oito artigos de opinião da autoria do jornalista Lei Kong sobre o caso Pearl Horizon. A Polytex exige uma indemnização de dois milhões de patacas por difamação, enquanto que o Ministério Público não detectou indícios de crime.

Lei Kong admitiu em tribunal “ter medo” de escrever opinião e disse que os artigos de opinião tinham apenas como objectivo “o interesse público” e que estavam a ser cumpridas “as responsabilidades enquanto jornal”.

O jornalista destacou a importância que este caso inédito tem para o panorama da comunicação social em Macau e para a questão da manutenção da liberdade de imprensa.

“Admito que possa ter errado mas se isso constitui esse crime que me é imputado…se eu for condenado será uma notícia bombástica para Macau e essa é a minha preocupação.”

Leonel Alves, advogado da Polytex, acusou Lei Kong de ter escrito artigos de opinião que transmitiram “mensagens erradas para a opinião pública”, cheios de “delírios”. Assumindo-se como um defensor da liberdade de expressão e de imprensa, o advogado recordou que há limites quando está em causa o bom nome de outrem.

“O jornal tem o dever de informar correctamente e aí está o valor da informação”, assegurou. Paulo Ramalho, advogado de defesa dos arguidos, lembrou, entre muitos outros argumentos, que a credibilidade da Polytex já tinha sido posta em causa muito antes da publicação dos artigos de opinião no jornal Sou Pou. Além disso, acusou Leonel Alves de demonstrar uma “atitude de político” na sua intervenção.

“Falou como um político e fez uma interpretação própria de um político que, como disse, tem as suas bases.” Leonel Alves, que foi deputado na Assembleia Legislativa (AL), e que votou no processo legislativo relativo à lei de terras, refutou esta acusação. “Trabalhei muitos anos na AL mas interferi sempre como jurista nos trabalhos legislativos, dando o meu contributo. Não trouxe inputs políticos para esta audiência”, frisou.

23 Nov 2018

Grande Prémio | Pun Weng Kun nega intenção de encobrir acidentes

O coordenador da Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau garante que há indicações para que todos os acidentes sejam transmitidos, à excepção das imagens do trabalho das equipas de socorro. Pun admitiu ainda que é a comissão que define os conteúdos transmitidos

 

[dropcap]O[/dropcap] coordenador da Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau (COGPM), Pun Weng Kun, nega que tenha havido qualquer intenção de esconder dos telespectadores o acidente da piloto Sophia Floersch, durante a corrida de Fórmula 3, que decorreu no domingo passado. Em declarações ao HM, o também presidente do Instituto do Desporto (ID) admite que há instruções da organização para não se filmar os trabalhos de salvamento, mas que há luz verde para mostrar os acidentes, os momentos dos impactos e repetições.

“Ficou a sensação a quem assistiu à prova pela televisão que houve intenção de esconder as imagens do acidente. Mas nunca nos passou pela cabeça esconder os acidentes”, afirmou Pun Weng Kun, ontem, ao HM.

O responsável pela prova explicou que existem instruções para não se mostrar os trabalhos de salvamento porque as imagens podem ferir susceptibilidades e também para proteger a imagem dos pilotos. Pun contou ainda que estas instruções foram tomadas em consenso com a Federação Internacional do Automóvel (FIA), mas que a decisão coube à COGPM. Segundo o coordenador do COGPM, a maior parte dos pilotos e as famílias também estão de acordo com que não se mostrem os momentos de salvamento.

“Há um consenso há vários anos. Quando ocorre este tipo de acidentes existe a possibilidade de haver imagens que podem ferir as susceptibilidades dos telespectadores. A COGPM considera que se devem proteger os mais sensíveis”, afirmou. “Não nos passou pela cabeça esconder as imagens dos acidentes, até porque hoje em dia sabemos que as pessoas que estão nas bancadas têm os telemóveis e conseguem gravar e divulgar o que se passa”, justificou.

Por outro lado, Pun Weng Kun diz que quando aconteceu o acidente com a piloto alemã que a total prioridade da COGPM estava focada em garantir que a jovem era salva o mais depressa possível e não em controlar as imagens: “Honestamente quando ocorre um acidente deste tipo, no centro de controlo a nossa maior preocupação é garantir que as equipas de salvamento chegam ao local o mais depressa possível”, defendeu.

Efeito surpresa

Em relação ao facto de durante a corrida de Fórmula 3 nunca terem sido mostradas imagens do impacto, nem repetições, Pun diz acreditar que até o operador ficou surpreendido. “Talvez por ter sido um acidente com uma dimensão que já não se verificava há vários anos, ninguém conseguiu reagir a tempo. Mas a verdade é que no sábado os acidentes foram transmitidos, todos”, vincou.

No sábado a corrida de motociclos foi interrompida algumas voltas mais cedo depois de um acidente entre os concorrentes Ben Wylie e Phillip Crowe. A transmissão televisiva apenas mostrou as motos dos pilotos no chão.

O coordenador do COGPM diz que tal ficou a dever-se ao facto das câmaras terem tendência para acompanhar os pilotos da frente. “Temos que perceber que as imagens também estão mais focadas na frente da corrida e que pode acontecer os operadores não captarem esses momentos, porque são pilotos que vêm mais atrás. Mas posso garantir que não há instruções para que os operadores não transmitam as imagens dos acidentes”, realçou. “Agora pode acontecer que a certa altura os operadores não consigam filmar todos os momentos dos acidentes”, concluiu.

Pun Weng Kun afirmou também que se no futuro houver acidentes, o que disse não desejar, que vão continuar a ser transmitidas as imagens, como aconteceu até aqui.

22 Nov 2018

Carlos Marreiros nega ter copiado edifício no projecto da futura biblioteca

[dropcap]O[/dropcap] arquitecto Carlos Marreiros nega ter copiado o Auditório da Cidade de León na elaboração do projecto da futura biblioteca de Macau, que vai ser construída no edifício do Antigo Tribunal. Ontem surgiram várias publicações em diferentes grupos de conversa nas redes sociais, nas línguas chinesa e portuguesa, a comparar os dois projectos e houve mesmo alguns utilizadores a avançar a possibilidade de plágio.

Em declarações ao HM, o arquitecto negou haver qualquer cópia e admitiu não ter conhecimento do edifício que fica situado em Espanha. “Não sei que edifício é este. Eu posso ir investigar e mais tarde falar […] Uma coisa posso dizer para já: estou de consciência tranquila. Não imitámos edifício nenhum quando fizemos o projecto”, disse Carlos Marreiros. “Quem me conhece sabe que sou uma pessoa extremamente afirmativa, independente, criativa e original para não fazer uma coisa destas. Por amor de Deus!”, acrescentou.

Em termos geométricos, na “composição do bloco de cima” da nova biblioteca, Carlos Marreiros foi buscar inspiração à Capela de Notre Dame du Haut em Ronchamp (França), do arquitecto Le Corbusier. Uma obra que, explicou, se destaca por ter “uma parede muito espessa, com muitas janelas, com muitos buracos e os vãos com aquelas inclinações”.

O Auditório da Cidade de León foi inaugurado em 2002 e teve como arquitectos os espanhóis Luís Moreno Mansilla, já falecido, e Emilio Tuñon Álvarez. Em 2003 foi galardoado com o Prémio de Arquitectura Espanhola e foi finalista do Prémio Mies van der Rohe de Arquitectura Contemporânea da União Europeia. Este último foi um prémio que Siza Vieira conquistou em 1988, com a sede do Banco Borges e Irmão, em Rio Ave.

O ateliê do arquitecto Carlos Marreiros foi o escolhido para desenhar a nova biblioteca central de Macau, que vai ocupar o edifício do Antigo Tribunal (na Avenida da Praia Grande) e a ex-sede da Polícia Judiciária (na Rua Central).

Por este projecto, o arquitecto vai receber 18,68 milhões de patacas e terá um prazo de execução de sensivelmente nove meses. A futura biblioteca, de 11 andares e 45 metros de altura, vai ter capacidade para acolher até um milhão de livros, oferecendo 1.125 lugares sentados nos espaços dedicados à leitura. Estão também previstos espaços lúdicos, como um anfiteatro, sala de exposições e um café, com aproximadamente 800 lugares.

22 Nov 2018

Investigação ao acidente de Sophia Flörsch levará semanas, diz FIA

[dropcap]A[/dropcap] investigação ao acidente de domingo no Grande Prémio de Fórmula 3 de Macau, em que cinco pessoas ficaram feridas, “levará várias semanas”, disse hoje Charlie Whiting, director de corridas de Fórmula 1 da Federação Internacional de Automobilismo (FIA).

“É muito cedo para tentar estabelecer a causa. Nós sabemos porque [a piloto alemã Sophia Flörsch) perdeu o controlo do carro, mas temos que nos dar a uma análise muito mais cuidada”, disse Charlie Whiting à agência France-Presse.

Lançado a mais de 270 km/hora a quase 300 metros de uma curva em ângulo recto, a mais apertada do circuito de Macau, o monolugar de Sophia Flörsch bateu na traseira de um outro, que estava a desacelerar inesperadamente, e voou contra uma bancada com repórteres fotográficos e comissários de pista.

“Levará várias semanas para analisar os dados e as imagens do carro o mais cuidadosamente possível para determinar como os dois monolugares se tocaram, as consequências desse contacto, o que se passou e como”, disse Charlie Whiting.

O director da Fórmula 1 para a área de segurança acredita que as barreiras, mesmo partidas, diminuíram um pouco o ritmo do carro e a solidez da célula de segurança também protegeu a piloto alemã, de 17 anos, que foi submetida a um enxerto ósseo para reparar uma fractura na coluna vertebral.

O piloto do carro atingido, o japonês Sho Tsuboi, dois repórteres fotográficos e um comissário de pista também ficaram feridos na sequência do despista do monolugar da alemã Sophia Flörsch.

21 Nov 2018

Memória | Urso Bobo morreu aos 35 anos e vai ser embalsamado

Era para ter terminado no prato de um restaurante, mas quis o destino que fosse salvo e colocado no Jardim da Flora. Ao longo de mais de 30 anos, o urso Bobo foi uma das principais atracções dos passeios de domingo para várias gerações. Mas ontem, com 35 anos, foi declarado morto devido à degradação da sua saúde

 

[dropcap]O[/dropcap] urso Bobo morreu ontem de manhã, depois de quase 35 anos a viver no Jardim da Flora, onde era a principal atracção para as crianças. Na segunda-feira à noite o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) já tinha emitido um comunicado a alertar para a degradação de saúde do animal, que já mal conseguia comer, e ontem confirmou a sua morte, que ocorreu por volta das 11h00.

“O nosso urso-asiático Bobo morreu esta manhã [ontem] às 11h00 e tal. O urso-asiático normalmente vive 30 anos, mas o nosso morreu com 35”, disse Isabel Jorge, administradora do Conselho de Administração do IACM. “Nos últimos dias a situação de saúde dele piorou e ficou mais fraco. Os nossos tratadores e veterinários acompanharam de perto a situação, mas esta manhã faleceu”, acrescentou.

Em cima da mesa está agora a possibilidade de Bobo ser embalsamado, numa medida para sublinhar a importância das espécies em vias de extinção. O urso-preto asiático é uma espécie considerada vulnerável, a categoria menos grave das espécies ameaçadas.

“Queremos continuar com o trabalho da protecção e conservação dos animais, e em princípio o corpo do nosso urso vai ser embalsamado. Depois vamos colocá-lo num jardim, mas ainda não sabemos qual”, explicou a responsável.

Em relação ao Jardim da Flora, o espaço vai continuar a receber animais, mas de pequeno porte. Segundo Isabel Jorge entre as espécies consideradas para continuar a levar as crianças ao jardim está o porquinho-da-índia.

Muito bem acolhido

Foi em 1984, segundo os registos do IACM, que o urso Bobo foi salvo. Na altura, o ursinho tinha menos de um ano e estava numa pequena jaula, à porta de um restaurante, na Rua da Felicidade. Harald Bruening, director do jornal Macau Post Daily, deu o alerta às autoridades.

“Nos meados dos anos 80, estava com um grupo de jornalistas, o ex-director do Va Kio, Chiu Iu Nang, e Adam Lee, que na altura era o correspondente no South China Morning Post. Estávamos a passar na Rua da Felicidade e a certa altura vimos uma concentração de pessoas à frente de um restaurante, porque estava ao pé da porta uma jaula muito pequena com um ursinho bebé”, recordou Bruening, ao HM. “Era uma atracção, mas todos sabíamos que o destino dele ia ser a cozinha. Por isso, e devido às condições em que estava a ser mantido, havia muita gente chocada”, relatou.

Como o alemão domina a língua portuguesa, na altura Chiu e Adam pediram-lhe para falar com as forças de segurança locais. Foi o que Bruening fez, embora o que se seguiu não tivesse sido simples. Isto porque em 1984 não havia uma lei de protecção dos animais, e Bobo só pode ser apreendido devido ao facto do restaurante não ter licença para importar animais daquele género.

“Falei com as forças de segurança, que me explicaram que não podiam fazer nada. Só que no mesmo dia prometeram-me que iam falar com o Leal Senado. Depois disso, não houve novidades nos dias seguintes, mas mais tarde o ursinho foi colocado no Jardim da Flora”, contou. “Se bem me recordo, o animal pode ser apreendido pelo IACM porque o restaurante não tinha licença de importação”, recordou.

Foi também no Jardim da Flora que o pequeno urso ganhou o nome de Bobo. Era esta a forma de tratamento das crianças que o visitavam e que com o tempo foi adoptada.

Jaula maior e companheira

Com o passar dos anos, as condições para o urso Bobo melhoraram, principalmente em 2000. Além de um espaço maior, com um lago para nadar, o urso recebeu igualmente uma companheira vinda do Interior da China. O casal nunca procriou e a fêmea acabaria por morrer após alguns anos, devido a dificuldades em adaptar-se às condições do clima de Macau.

Agora, com 35 anos, foi a vez do urso-negro asiático morrer, numa altura em que já muito raramente aparecia no exterior da sua jaula. A partir de hoje, o IACM vai manter uma zona junto à jaula de Bobo para que as pessoas façam as suas despedidas. Já ontem tinham sido instaladas flores brancas junto à estátua de Bobo.
Após ter sido revelada a morte do urso, o HM ouviu alguns residentes que se encontravam no Jardim da Flora. “Quando era nova via sempre o Bobo, agora como tenho uma filha também costumava levá-la de vez em quando para o ver”, disse Cheang, funcionária, com cerca de 30 anos, de uma loja de roupa à entrada do jardim, ao HM. “Não posso dizer que tenha um sentimento muito especial em relação ao Bobo, mas claro que lamento a sua morte. Também acho que a população costumava visitá-lo, mas não se pode dizer que o apreciasse verdadeiramente”, acrescentou.

Para Lei, moradora local com 50 anos, o urso Bobo está muito presente no imaginário de Macau. “É verdade que ele nos últimos tempos já não aparecia muito do lado de fora da jaula. Mas muita gente fazia questão de visitá-lo, quando passavam no jardim. Acho que faz parte da memória das pessoas que vivem em Macau”, considerou.

Opinião semelhante foi partilhada pelo jovem Wong, com cerca de 30 anos: “É uma notícia triste. O Bobo faz parte das memórias de infância das pessoas que cresceram em Macau. Ele acompanhou o crescimento de várias gerações e eu não fui excepção”, contou, ao HM. “Quando era pequeno vinha sempre aqui para visitá-lo e por isso hoje sinto-me triste com esta notícia”, finalizou.

21 Nov 2018

Metro Ligeiro | Deputados questionam poderes dos agentes de fiscalização

O Governo vai ter de justificar aos deputados da 3ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa as razões para a concessão do estatuto de autoridade pública aos agentes de fiscalização do Metro Ligeiro. Uma situação inédita em Macau. Há também dúvidas sobre a entidade que decide o valor das tarifas

[dropcap]O[/dropcap]s deputados da 3ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa voltaram ontem a insistir numa questão que já tinha sido abordada na reunião plenária que aprovou, na generalidade, a proposta de lei de sistema de transporte do metro ligeiro: os poderes dos futuros agentes de fiscalização.

Desta forma, o Executivo terá de se deslocar ao hemiciclo para prestar esclarecimentos adicionais sobre esta matéria. “A assessoria chamou-nos a atenção para os poderes concedidos aos agentes, que gozam do estatuto de autoridade pública. Isso significa que eles podem deduzir e notificar a acusação ao infractor. Estamos atentos a isso”, disse Vong Hin Fai, deputado que preside à comissão.

De acordo com o deputado, trata-se de uma situação inédita no território. “Em Macau, no terminal marítimo ou no aeroporto, os seguranças ou fiscais não dispõem deste tipo de poderes e não há uma lei que atribua esse estatuto de autoridade pública. Houve algumas dúvidas por parte dos deputados quanto ao estatuto que esses agentes de fiscalização vão passar a ter.”

Além disso, os membros da comissão permanente desejam saber qual será a entidade responsável pela credenciação dos agentes. “É necessário ter pré-requisitos ou que frequentem acções de formação? Precisamos pedir informação ao Governo, para saber porque é que foram concedidos grandes poderes aos agentes”, apontou Vong Hin Fai.

O Executivo terá também de explicar as futuras funções dos fiscais. “O que vão fiscalizar ao certo? Vão ver se os passageiros têm bilhete? A proposta de lei não regula as funções principais dos agentes e, por isso, vamos pedir informações detalhadas.”

Quanto custa?

O valor dos bilhetes do Metro Ligeiro será decidido através de um despacho complementar, mas os deputados desejam saber qual a entidade responsável pela fixação do valor. “Será a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) ou a própria concessionária? Os deputados querem saber porque se trata de um valor de interesse público”, adiantou Vong Hin Fai.

Outra falha apontada na actual proposta de lei prende-se com o facto do diploma não regular as várias modalidades de pagamento existentes. “Quanto ao pagamento electrónico dos bilhetes, sabemos que há países que utilizam cartões SIM e também se utiliza o sistema Alipay. Em Macau também existem essas modalidades de pagamento mas a proposta de lei não regula isso.” Além disso, é necessário regular as medidas preventivas de acidentes na proposta de lei, lembraram os deputados, uma vez que as normas existentes “são simples”.

Outro ponto abordado na reunião de ontem prende-se com o facto do Governo ter copiado, sem qualquer alteração, algumas normas da lei da investigação de acidentes e incidentes da aviação civil e da protecção da informação de segurança aérea, implementada em 2013.

“Muitos artigos são transpostos das normas contidas nessa lei. Vamos questionar o Governo, porque há aspectos da aviação civil que são semelhantes ao transporte de Metro Ligeiro, mas será que todas são semelhantes? O Governo quase uniformizou as normas”, rematou Vong Hin Fai.

21 Nov 2018

Grande Prémio | Piloto Sophia Florsch diz que vai voltar

[dropcap]A[/dropcap] piloto alemã Sophia Florsch, que sofreu um violento acidente na curva do Hotel Lisboa no passado domingo, na corrida de fórmula 3 do Grande Prémio de Macau, escreveu ontem uma mensagem nas redes sociais depois de uma operação à coluna.

“Sobrevivi a uma operação que demorou 11 horas e que foi bem sucedida. Espero que a partir de agora as coisas melhorem. Terei de ficar mais uns dias em Macau até conseguir ser transportada. Quero agradecer a todos os meus fãs pelas mensagens de apoio que só agora vou começar a ler”, começou por escrever.
Sophia Florsch disse ainda que as mensagens que recebeu nestes dias lhe deram “motivação e coragem”.
A piloto deixo também uma palavra de apoio aos restantes quatro feridos no acidente. “Os meus pensamentos estão também com todos aqueles que estiveram envolvidos no acidente. Espero que todos estejam bem.”

Os dois fotógrafos, o comissário de pista e o piloto japonês Sho Tsuboi também estão internados em observação, estando numa situação estável.

Tendo garantindo que “vai voltar”, Sophia Florsch agradeceu à sua equipa, bem como à equipa de salvamento da Federação Internacional de Automobilismo (FIA). A piloto agradeceu também às pessoas que lhe prestaram apoio nos primeiros minutos após o acidente.

“Houve pessoas muito simpáticas que ainda recordo. Obrigada pelo encorajamento e palavras de conforto nos primeiros minutos que estive no carro após o acidente. Os meus maiores agradecimentos para a equipa médica de Macau pelo tratamento profissional e amigável”, escreveu.

21 Nov 2018

Formador suspeito de abuso sexual de menores em centro de explicações

Um homem, de 35 anos, oriundo de Hong Kong, foi detido pela suspeita de abuso sexual de cinco menores de idade num centro de explicações, onde era formador

 

[dropcap]C[/dropcap]inco menores de idade terão sido vítimas de abusos sexuais por parte de um formador do centro de explicações que frequentavam no Fai Chi Kei. O homem, detido na segunda-feira pela Polícia Judiciária (PJ), é suspeito da prática de violação, coacção sexual e abuso sexual de crianças. O HM contactou o Ministério Público (MP) para saber as medidas de coacção aplicadas, mas até ao fecho desta edição não obteve resposta.

O caso – tornado ontem público – foi reportado à PJ por uma das alegadas vítimas no domingo. Segundo a PJ, o rapaz, de 14 anos, que fez a participação, afirmou que o formador o obrigou a fazer sexo oral, por seis vezes, desde Outubro, sob a ameaça de que revelaria aos seus pais que tinha uma namorada. Na sequência da investigação, a PJ chegou a outros quatro menores – também todos do sexo masculino – que também terão sido forçados a práticas como sexo oral e masturbação. Segundo a PJ, o explicador, de 35 anos e oriundo de Hong Kong, tê-los-á intimidado, dizendo que contaria aos seus progenitores que não estavam atentos nas aulas ou que os seus resultados académicos eram fracos.

A PJ entrou em contacto com os pais dos quatro meninos, todos com mais de 10 anos, bem como com a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) que convocou uma conferência de imprensa para prestar mais esclarecimentos relativamente ao caso.

Actividades suspensas

Os alegados crimes ocorreram dentro do centro de explicações, localizado no Fai Chi Kei e com alvará desde 2015, cujas actividades foram entretanto suspensas. Segundo o chefe do Departamento de Ensino da DSEJ, Kong Ngai, o organismo tentou ontem contactar o proprietário da instituição particular, mas sem sucesso. A última vistoria ‘in loco’ levada a cabo ao centro de explicações, com capacidade máxima para 24 alunos, foi realizada em Outubro.

Relativamente ao formador, trabalhador não residente de Hong Kong, a DSEJ indicou que o suspeito, que não está inscrito noutras instituições de ensino, vai ver o seu nome suspenso do registo. Existem, no entanto, divergências relativamente à data em que o formador começou a trabalhar no centro de explicações: a PJ diz que foi em 2016, enquanto DSEJ referiu 2017. Um cenário que levou Wong Chi Iong, chefe da Divisão de Extensão Educativa da DSEJ, a colocar a possibilidade de o suspeito ter trabalhado ilegalmente durante um período.

Após ter sido informada pela PJ, a DSEJ iniciou uma investigação administrativa para apurar “mais detalhes” sobre o formador e os alunos, no âmbito da qual serão convidados a prestar declarações os demais tutores do centro de explicações. De resto, a DSEJ – que “censura veemente” o caso – garante que irá prestar “todo o apoio necessário” aos estudantes e promete mais acções de sensibilização no quadro da educação sexual, colocando a tónica na importância de se ensinar às crianças a auto-protecção.

Na conferência de imprensa, a DSEJ sublinhou que actua com base no regime do licenciamento e fiscalização dos centro de apoio pedagógico complementar particulares, um decreto-lei de 1998 que, segundo adiantou, se encontra actualmente a ser revisto.

20 Nov 2018

Mulheres | Traições no casamento cada vez mais aceitáveis

A maioria ainda acha que o homem deve ser o pilar económico da família, mas são muito poucas as que acham que deve ser ele a pedir a conta e a pagar, nos jantares e almoços nos restaurantes. Há também maior abertura para que seja o pai a ficar em casa, sem emprego, a tomar conta das crianças

[dropcap]O[/dropcap] número de mulheres que considera aceitáveis “actividades sexuais extraconjugais” aumentou 6 pontos percentuais para 19,1 por cento de 13 por cento, entre 2012 e 2017. Os dados fazem parte do relatório de 2017 sobre a Condição da Mulher em Macau. O documento ainda não foi publicado, o que só acontecerá no final do ano, mas ontem o Conselho para os Assuntos das Mulheres e Crianças divulgou alguns dos dados.

Para este relatório foram ouvidas 1001 mulheres, pelo que a taxa de resposta “aceitável”, representa um número de aproximadamente 191 mulheres. O último relatório do género foi apresentado em 2012, ano que serve de comparação para as actuais conclusões.

Como os dados avançados são ainda preliminares, o chefe do Departamento de Serviços Familiares e Comunitários do Instituto de Acção Social, Tang Yuk Wa, não quis abordar as conclusões e as explicações ficaram prometidas o documento final.

No que diz respeito ao casamento, há cada vez menos mulheres a concordar que o matrimónio deve ser para sempre. Assim, 69,2 por cento das inquiridas concordam que o nó é para toda a vida, mas houve uma redução de 11,6 por cento face 2012 por cento.

Por outro lado, há cada vez mais mulheres que consideram que ser mãe solteira é uma vergonha. Enquanto que em 2012, 65,4 por cento das mulheres afirmavam que “ser mãe solteira não é uma vergonha”, em 2017 o número caiu para 60,3 por cento, o que corresponde a uma diminuição de 5,1 pontos percentuais.

Pouco tradicional

Os números avançados demonstram igualmente uma nova tendência em algumas das ideias mais tradicionais e a maior aceitação do papel do homem, como membro do casal que fica em casa a tratar das crianças. Assim, 36,8 por cento das mulheres concordam com a ideia que os “homens podem cuidar da família e não ter emprego”, o que representa um aumento de 11,4 pontos percentuais. Já sobre a obrigação das mulheres terem filhos e casarem-se, 37,2 por cento deram o aval à frase, uma redução de 18,7 por cento face a 2012.

Uma quebra semelhante registou-se face à ideia de que “as mulheres devem deixar os estudos/carreira profissional por amor à família”, em que apenas 13,3 por cento se mostraram de acordo, uma percentagem que encolheu 18,7 pontos percentuais.

No entanto, a maioria das inquiridas ainda considera que os homens têm de ser o pilar económico da família, uma vez que 51,1 por cento concordaram com a frase. Porém, também aqui há uma quebra de 11,2 pontos percentuais. Mas se elas esperam que sejam os homens a suportar as despesas em casa, o mesmo não acontece quando os casais comem fora. Em relação à “obrigação” de serem eles a pedir e pagarem a conta, 14,9 por cento disseram concordar com esta ideia, o que significou uma quebra de 6,4 pontos percentuais em relação a 2012.

20 Nov 2018

Operação da piloto Sophia Floersch demorou nove horas. Sinais vitais estão estáveis

A piloto alemã é a acidentada que está na situação mais complicada, mas as indicações são animadoras. Comissário de Macau vai continuar internado cerca de quatro dias e depois terá alta

[dropcap]S[/dropcap]ophia Floersch foi operada ontem durante nove horas e a equipa médica do Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ) responsável pelo tratamento da jovem de 17 anos acredita que existem fortes possibilidades da piloto voltar a andar e até retomar a carreira. Nesta altura, ainda não há certezas, mas durante a operação a alemã mostrou sinais de mobilidade nos membros, está livre de perigo, pelo que as perspectivas são positivas.

O cenário foi traçado durante uma conferência de imprensa organizada ontem, pelo Serviços de Saúde, para fazer um ponto de situação sobre os feridos durante a 65.ª edição do Grande Prémio. Em relação a Sophia Floersch foi explicado que a piloto fracturou a vértebra cervical C7 e que foi necessário um disco para reconstruir a parte da coluna afectada pelo acidente, que aconteceu quando o carro da alemã seguia a mais de 276 quilómetros de hora.

“Durante a operação ela mostrou ter sinais de mobilidade nos membros. No futuro penso que poderá continuar com a carreira. Mas ainda não há garantias, porque apesar de poder haver sinais iguais, a recuperação varia de caso para caso”, disse Chan Hong Mou, médico consultor do Serviço de Ortopedia do CHCSJ. “Tem de ficar deitada durante algum tempo mas no futuro não terá grandes problemas, pensamos que poderá voltar a andar”, acrescentou.

O mesmo médico explicou também que para a alemã de 17 anos vai ser fundamental o tempo de recuperação e que depois ainda terá realizar fisioterapia, o que poderá acontecer já na Alemanha. De acordo com um comunicado emitido na manhã de hoje, os médicos prevêem que a piloto poderá estar ainda mais uma ou duas semanas em observação. O mesmo comunicado explica que os sinais vitais de Sophia Floersch estão estáveis e que os quatro membros de movimentam.

Decisões difíceis

Chan Hong Mou revelou também que a família teve de decidir se transportavam Floersch para a Alemanha para fazer a operação, ou se o tratamento era feito em Macau. No final, os riscos evolvidos no transporte, que poderiam causar ainda mais danos à saúde da piloto, levaram a que a operação fosse feita em Macau.

Além da equipa, Floersch tem sido acompanhada pelo seu pai.

Quanto ao comissário de pista de Macau, foi revelado que é do sexo masculino e tem 34 anos. O residente local partiu o maxilar direito e foi alvo de uma cirurgia plástica, mas não apresenta complicações e deve ter alta dentro de três ou quatro dias. Já o fotógrafo do Interior da China, de 25 anos, também vai continuar internado devido a uma hemorragia no fígado, mas não preciso de transfusões de sangue, pelo que o internamento se deve à necessidade de o manter em observação. Ambos não correm perigo de vida.
Em relação aos outros envolvidos no acidente, o piloto Sho Tsuboi já recebeu alta ontem. O mesmo aconteceu com o fotógrafo japonês, que tinha uma concussão na cabeça.


Raul Torras saiu do hospital

Ontem também foi feito o ponto da situação dos outros três pilotos de motos envolvidos em diferentes acidentes. As perspectivas da equipa médica são para que as carreiras dos três não sejam interrompidas. Quanto a Andrew Dudgeon, o homem das Ilhas de Man foi operado à Vértebra Lombar L2 e está a recuperar. Já Ben Wylie foi submetido a uma operação de sete horas, teve uma fractura no pescoço e está em observação. Finalmente Raul Torras, que tinha a clavícula e algumas constelas partidas, deixou ontem o hospital.

20 Nov 2018

Grande Prémio | Piloto Sophia Floersch na sala de operações desde manhã

[dropcap]O[/dropcap] Centro Hospitalar Conde de São Januário emitiu esta tarde um comunicado onde aponta que a piloto alemã Sophia Floersch, que sofreu ontem um acidente quando competia na prova de Fórmula 3 do Grande Prémio de Macau, ainda está na sala de operações. A piloto sofreu uma fractura na coluna.

“A piloto alemã está a ser submetida a uma operação cirúrgica desde as 10h00. A operação ainda decorre”, pode ler-se. Esta tarde deverão ser fornecidas mais informações sobre o estado de saúde de Sophia Floersch após a operação, apontam os Serviços de Saúde de Macau. Na sua conta no Twitter, foi publicada uma mensagem em alemão onde se lê que a equipa médica “tem deliberadamente trabalhado devagar para evitar riscos”, sendo que a cirurgia “tem decorrido sem complicações”.

Sophia Floersch teve um acidente na curva do Hotel Lisboa que causou ferimentos a mais quatro pessoas: o piloto Sho Tsuboi, dois fotógrafos e um comissário de pista. Todos estão ainda em observação no hospital público.

19 Nov 2018

Biblioteca Central | Projecto do ateliê de Carlos Marreiros vence concurso

A nova biblioteca central vai ser desenhada pelo ateliê de Carlos Marreiros. O projecto, com “um discurso simplista e sóbrio” e “dimensão amiga do ambiente”, no valor de 18,68 milhões, foi escolhido entre nove propostas admitidas ao concurso público

 

[dropcap]E[/dropcap]stá escolhido o projecto da nova biblioteca central que vai ocupar o edifício do antigo tribunal (na Avenida da Praia Grande) e a ex-sede da Polícia Judiciária (na Rua Central). A proposta do ateliê do arquitecto Carlos Marreiros, com um valor de 18,68 milhões de patacas e prazo de execução de sensivelmente nove meses, foi a vencedora do concurso público ao qual foram admitidas nove propostas. O anúncio foi feito no sábado pelo Instituto Cultural (IC) em conferência de imprensa.

O edifício do antigo tribunal, obra de 1951 representativa do tempo de Salazar, classificado pelo seu interesse arquitectónico, tem de ser preservado na íntegra, incluindo a fachada e o interior. Assim sendo, a solução apresentada pelo ateliê de Carlos Marreiros passa pela introdução de dois pilares enormes no pátio existente que vão permitir suspender um novo pautado, nas palavras do arquitecto, por “um discurso simplista e sóbrio”. “Estávamos um pouco cansados de excessos, de formas muito vistas por todo o lado, de muita cor e muita luz”, explicou Carlos Marreiros, sublinhando que o conceito do novo edifício figura como a metáfora do saber. “No fundo, representamos um bloco com compartimentos/caixinhas de conhecimento, que pode ser entendido como uma estante com livros abertos”, realçou o arquitecto.

A par da componente simbólica, Carlos Marreiros destaca a dimensão amiga do ambiente do projecto que, além de privilegiar a entrada de luz natural, inclui jardins verticais e painéis fotovoltaicos, a pensar na conservação de energia, estando em aberto ainda a possibilidade de introdução de outros dispositivos nas zonas de transição. “Os terraços são cobertos de forma significativa por jardins porque queremos que as pessoas possam vir para os espaços ao ar livre” desfrutar, por exemplo, de tertúlias, observou.

Do ponto de vista dos materiais, a preferência vai para “um pétreo artificial aligeirado”. “Não queria nada muito pesado, porque as paredes vão ter 90 a 1,20 de espessura, o que é bastante alargado, com inclinações para entrar o sol e volume suficiente por dentro para haver um bom isolamento – acústico e térmico”, especificou. “Queremos fabricar a parte de cima [do novo prédio] com betão de cimento branco. É uma tradição que sei existe em certas partes da China, bem como em Portugal e em Espanha, mas temos de investigar no sentido de confirmar se o podemos fazer”, partilhou.

Novas valências

A nova biblioteca central vai dividir-se em três zonas (uma dedicada ao acervo, outra ao público e outra ao apoio técnico), sendo que uma vai estar aberta todo o dia, uma das exigências do caderno de encargos do concurso público. “Há um vão do átrio que sobe até ao terraço e tem luz natural e dividimos claramente o edifício que é utilizado ao longo das horas de expediente e a parte do edifício para a utilização durante 24 horas”, cuja entrada tem lugar pela Rua Central, detalhou Carlos Marreiros.

O futuro complexo, de 11 andares e 45 metros de altura, vai ter capacidade para acolher até um milhão de livros, oferecendo 1.125 lugares sentados nas salas de leitura. Estão também previstos espaços lúdicos, como um anfiteatro, sala de exposições e um café, com aproximadamente 800 lugares, de acordo com o projecto.

“A nova biblioteca central será um espaço sustentável abrangendo várias áreas funcionais, incluindo espaços para o intercâmbio cultural, salão urbano, memória urbana, sala de exposições, criação artística, lazer, etc. Não pretende ser apenas um centro de intercâmbio público, que fortalece os laços comunitários, mas também uma base para cultivar uma cultura de leitura, promover o desenvolvimento de uma cidade inteligente, inspirar a criatividade e construir uma sociedade de aprendizagem”, realçou a vice-presidente do Instituto Cultural, Leong Wai Man.

O projecto de Carlos Marreiros foi escolhido entre nove candidatos, incluindo dos ateliês dos arquitectos Rui Leão e Maria José de Freitas. As propostas apresentavam valores entre 9,8 e 43 milhões de patacas e prazos de execução entre 210 e 320 dias.

Após concluída a fase de projecto (268 dias), terá lugar o lançamento do concurso público para a adjudicação da empreitada, estimando-se que as obras possam arrancar em 2020, indicou a vice-presidente do IC, adiantando a possibilidade de a biblioteca central ser aberta parcialmente antes do termo de toda a obra, dado que a parte do edifício do antigo tribunal vai ser mantida. Relativamente ao orçamento global, a mesma responsável remeteu informações mais detalhadas para a etapa seguinte.

A adjudicação do projecto tem lugar uma década depois da anulação do primeiro concurso, em 2008, na sequência de uma investigação do Comissariado Contra a Corrupção (CCAC).

 

Principais dados da nova biblioteca central

Altura do edifício: 45,80 metros
Número de pisos: 11 (incluindo um em cave)
Número de lugares sentados: aproximadamente 1.125
Número de assentos para outras actividades (anfiteatro, sala de exposições, café): aproximadamente 800
Capacidade: 810 mil a 1 milhão de livros

19 Nov 2018