João Luz Entrevista Eventos MancheteRui Reininho, músico: “Vim para Macau afinar o meu diapasão a Oriente” Há muitos anos, da última vez que cá esteve, o território deu-lhe uma música para construir. Agora, a convite dos Balla, regressa para um concerto no Bazar, ao final da tarde de hoje. Espera levar daqui outras perspectivas, porque o Oriente lhe faz bem. Rui Reininho está aqui [dropcap]A[/dropcap] última vez que o Rui esteve em Macau para um concerto foi em 1990. Eu tenho isso bem fresco porque temos uma página na biografia dos GNR, a que chamamos as impressões orientais, onde estão as fotos de Macau, indesmentível. Estava escrito no palco “Rock Macau – 90”, e encontrei uma t-shirt que levei de recuerdo que diz, precisamente, GNR Rock Macau 90. Portanto, 26 anos depois regresso a convite do “homem Balla”. Vim numa bala. Qual é a sensação de regressar a Macau passado tanto tempo? É preciso coragem, especialmente na circunstância em que estava. A viagem é longa, custa um bocadinho, mas vale a pena quando se chega e se vêem aqui coisas tão interessantes. Há indícios de Portugal em todo o lado, os autocarros dizem “seja cordial”, é muito interessante ver o registo linguístico de Portugal. Depois começam as estórias todas, parece que estão a querer limpar todos os símbolos do colonialismo português, mas depois esquecem-se de outras coisas como a esfera armilar que ainda está ali. É bonito, de uma certa maneira, há uma certa violência num sítio que foi ganho aqui ao mar. Em 1990 não havia sequer aeroporto. Mas há coisas que são impressionantes. Nós ontem viemos no jetfoil e passámos sob aquela ponte enorme. Pronto, são cidades que apostam muito na engenharia, na construção. Isto devia ser um paraíso para a Mota Engil e para a Soares da Costa. Para mim, é só um espanto. Qual a sensação de estar prestes a voltar pisar o palco em Macau? Macau é daqueles sítios que nos ficam, sem prejuízo para o Bombarral e Trancoso, terras que eu guardo com saudade. Mas, de facto, os espectáculos aqui foram tão marcantes quanto aqueles que as pessoas nos atribuem como emblemáticos, por exemplo o do Estádio de Alvalade. Há uma história de cumplicidade com o Armando Teixeira. Tornou-se numa grande amizade. Contactamos há muitos anos, a partir de um projecto pequenino a convite da Fnac para fazer uma versão do “Once in a lifetime” dos Talking Heads. Depois surgiu o convite da Sony para fazer um disco a solo, e eu convidei o Armando para produtor. Para mim, ele é o produtor mais brilhante da música pop nacional, mas ecléctico, sem comparação com mais ninguém. O Armando é completo. Além de dar muito atenção ao som, corta e cose muito bem, é um mestre em editing. Tem uma visão muito global e específica. Ainda por cima, trabalhar com um amigo é extraordinário, e tem ascendência sobre mim, sim. É aquela pessoa que me ralha. Mesmo em termos de comportamento, ele é muito mais disciplinado. Eu tenho aquele lado infantilópide que mantive e o Armando disciplina e diz “não, tens de fazer outro take”, é daquelas pessoas que vai buscar o melhor de mim e conhece-me bem. Vocês fizeram uma colaboração num livro com música, o “Chá, café e etc”… Sim, nós vamos começar o espectáculo com um intro de quatro chás seguidos. É um início difícil, espero que as pessoas não pensem que o espectáculo é só isso. Depois temos os Balla. Aí vem a minha parte como artista convidado, vamos tocar também o “Vídeo Maria” dos GNR. Como é ver outros artistas pegarem nos temas dos GNR? Nós, os grandes, como a dona Amália, não gostamos muito de ver os outros a fazer interpretações dos nossos temas. Estou a brincar (risos). Por acaso, não é coisa que me agrade muito, aquelas versões televisivas ou em concursos. Não é pensar que tenho mais mérito, mas acho estranho, esquisito. Espero que me poupem nas exéquias, porque eu, como na música “Valsa dos detectives”, dou uma volta no caixão. Não darei porque uma das minhas vontades é ser “cromado” (risos) ali na Rua da Torrinha numa cromagem de pára-choques (risos). Curiosamente, gostei da chamada homenagem no disco “Revistados” porque era outra geração com gente ligada ao R&B e Hip Hop, e acho que tem ali versões muito engraçadas. O que é que o público de Macau pode esperar hoje? Será surpreendente e acho muito interessante que este festival aconteça numa zona da cidade que é de grande incidência da cultura chinesa. Recordando o concerto de 1990, a reacção foi um bocado fria, até porque as pessoas não conheciam as músicas. Também havia os sorridentes mas eles, na altura, estavam mais interessados numa banda pop rock de Hong Kong. Chegou há pouco tempo a Macau, como têm sido estes primeiros tempos? Ainda não aterrámos, mas estamos num sítio maravilhoso, a Casa Garden, a cinco minutos do Jardim Camões. É uma casa colonial, tropical, com bambus. Acredito muito nas vibrações dos sítios, portanto, é um sítio com uma portugalidade muito intensa e antiga, mercantil. É interessante este toque colonial, gosto muito da decadência dos impérios e de os visitar. Aliás, um dos próximos países que hei-de visitar são os Estados Unidos da América do Norte. Acho que nos próximos anos vamos ter ali surpresas. Os GNR celebraram agora 35 anos… Estamos sempre a celebrar porque nunca parámos. Foi um ano cheio de espectáculos e vamos fazer um prolongamento. Para o ano sou eu a fazer 35 anos de GNR – como entrei um ano a seguir, temos mais uma desculpa. Vamos também fazer um espectáculo no Porto. O Porto fica sempre assim com aquela pedra no sapato, “foram a Guimarães e não vieram aqui?”, parece o Porto a rosnar. Começamos por Coimbra, na passagem de ano. Voltar a estúdio está nos vossos planos? O estúdio é nosso, o selo é nosso. Mesmo agora, quando fizemos a biografia, eu e o Toli juntámo-nos e acabou por nascer o “Arranca coração”, que é o chocolatinho no café. Há sempre a necessidade e o prazer de estar a funcionar e a trabalhar, porque temos de investir em nós próprios. A música em Portugal, infelizmente, não é uma indústria, o que tem para oferecer agora é pouquinho, exige mais do que dá. Voltando ao DVD… Quando já não se usam DVDs vamos fazer um objecto obsoleto, vintage, porque temos aqueles fãs teimosos que perguntavam, sem parar, “para quando um DVD dos GNR”. Foi um problema que tivemos com as editoras, nunca nos fizeram um DVD. Agora é o máximo de liberdade. Este DVD foi baseado no concerto do Campo Pequeno, está agora a ser editado e deve sair em Fevereiro. Fez anotações numa edição do “Alice no país das maravilhas” do Lewis Carrol, e as letras dos GNR sempre tiveram algo de poético e surreal. Alguma vez pensou em experimentar a literatura? Não posso disparar em todas as direcções, se não mandam-me internar (risos). As “Dunas” deixo para o povo. Às vezes digo, por graça, que apesar da pretensão de ser um liricista, ou poeta, vou ficar mais conhecido na minha pequena história como o homem que inventou o “paptchiuariauá”. É quase o meu “obladiobladá” dos Beatles. Tenho um esboço de romance, e alguns convites, mas acho que já vou um bocado tarde. Mas da última vez que estive em Macau surgiu-me a “Ana Lee”, e ali ao lado saiu o “Tóquio Joe”. O que é que o Rui gostava de fazer no futuro? O libretto que estou a fazer, maior que estes edifícios em termos de gigantismo, será o meu Godzilla. Tenho o sítio, referências e as pessoas indicadas para o projecto. Neste domínio é muito bom viajar, ter recuo. Para mim, a maior felicidade era que me despoletasse assim uma coisa, um livro de sonetos por aí fora, à Byron. Que música é que o Rui ouve em casa? Muito pouca, tenho ouvido o “Substance” dos Joy Division, mas também posso ir ao “Out of the blue”, do Miles Davis, ou a um Mahlerzinho. Infelizmente, já não tenho aquelas incidências vínicas que me permitam beber uma taça de espumoso. (ouve-se, em plano de fundo, um piano a ser afinado) Ele toca o “tim tim tim”, o afinar de um piano, é um momento perturbante. Digamos que vim aqui a Macau afinar pelo diapasão oriental. Vai ser bom para perspectivar, e de certeza que esta semaninha vai trazer mudança na minha vida. Vou afinar as minhas frequências com o Oriente, há aqui outro comprimento de onda.
Sofia Margarida Mota EventosJane Camens | Macau pode vir a acolher encontro internacional de escritores e tradutores A escritora australiana Jane Camens esteve em Macau numa sessão na Livraria Portuguesa que assinalou o final do encontro anual da associação que dirige. Ao HM falou dos desafios da escrita e da tradução, e do desejo de que a iniciativa venha a acontecer no território [dropcap style≠’circle’]M[/dropcap]acau pode vir a acolher o encontro anual promovido pela Asia Pacific Writers & Translators Inc (APWT). A iniciativa, que tem como objectivo promover o contacto entre profissionais do meio literário, nomeadamente escritores e tradutores da região asiática, vê o território como especialmente atractivo para o efeito. O desejo foi manifestado por Jane Camens, directora da entidade, que vê na possível realização da iniciativa em Macau uma forma de ter presentes mais autores portugueses, ao mesmo tempo que considera que é um lugar especial no que respeita às competências da tradução. Para Jane Camens, Macau é um lugar isolado no que respeita à internacionalização literária. O facto não se deve à falta de autores ou de tradutores, mas porque as obras dos escritores locais, na sua maioria, não estão traduzidas. “Em Macau vejo muito poucos trabalhos a serem traduzidos para inglês, quer escritos em língua portuguesa, quer em língua chinesa”. A falta de acesso a trabalhos em inglês faz com que se sinta “bloqueada”. “Parece que Macau é um mundo privado e essa também é uma das características que me fascina aqui.” Mas é também em Macau que Jane Camens vê a profissão do tradutor como uma das mais bem desenvolvidas. A autora e ex-residente do território considera que, dada esta característica de “excelência na tradução”, a cidade reúne condições para receber o encontro internacional da associação que dirige. “Estivemos aqui e conversámos com representantes da Universidade de Macau acerca da possibilidade de organizar o encontro no território. Pode ser uma oportunidade de trazer mais escritores portugueses e, francamente, penso que, aqui, existem profissionais com capacidades de tradução incríveis”, explica ao HM. A coexistência de duas línguas e as consequências profissionais que isso traz podem ter benefícios para aprendizagem da própria APWT: “Penso que, a esse nível, também podemos aprender muito do que é feito aqui em Macau ao nível da tradução”. A tradução não é preguiçosa O trabalho de tradutor não é o de um transcritor numa outra língua. Jane Camens salvaguarda que esta não é a sua área mas, enquanto autora, vê o tema da tradução profundamente debatido nos encontros que organiza e fala do seu passado. “Tive uma experiência com profissionais que traduziram textos meus para espanhol e o conselho dado por um poeta italiano presente foi de que os tradutores não se devem sentir obrigados a ficar presos ao texto. Também são criadores e o texto final é de alguma forma deles, pelo que é necessário que se sintam livres para trabalhar isso mesmo”, ilustra Jane Camens. No entanto, a missão não é simples, especialmente no que respeita a traduções literárias. A função exige um trabalho árduo e merecedor de mais reconhecimento. Jane Camens refere que “a escolha e o leque de vocabulário são os elementos mais importantes quando se fala de tradução literária. Um tradutor não pode ser preguiçoso no seu trabalho nem com as palavras que utiliza e a correspondência entre palavras tem de ser muito clara”. Já Sanaz Fotouhi, assistente executiva da APWT, diz ao HM que um dos maiores desafios enfrentados pelos tradutores, até há pouco tempo, foi a falta de reconhecimento. “Muitas vezes as pessoas, ao lerem um trabalho traduzido, fazem-no como se estivessem a ler o original e não têm noção de que existe um tradutor que transpôs e recriou aquela obra para que pudesse ser lida por outras pessoas, noutras línguas”, explica. Para Sanaz Fotouhi, “quando um livro é traduzido, é transformado numa outra obra e é por isso que agora os grandes prémios literários consideram a tradução”. Da China para a China No final do encontro anual que teve lugar em Cantão, Janes Camens não podia estar mais satisfeita. “Este encontro foi surpreendentemente gratificante. Teve a presença de muitos escritores internacionais e foi um sucesso tremendo. Tivemos participações da Islândia, de Itália e mesmo de Portugal. Mas o que mais surpreendeu foi a adesão de escritores chineses”, referiu ao HM. Relativamente à presença de literatura feita na China Continental e dos seus autores nas iniciativas promovidas pela APWT, a participação ainda não é muita, mas já se começa a fazer sentir. A iniciativa de Cantão “proporcionou um espaço para que os autores chineses comunicassem com outros de outras origens porque achamos que isso não acontece com frequência”, apontou Jane Camens. A autora considera ainda que não existem muitas plataformas internacionais de encontro de autores do Continente porque “já existe um mercado interno massivo na China e, por isso, os autores podem tender a dizer que não precisam de sair do país. No entanto, qualquer escritor gosta de ser lido o mais alargadamente possível”.
Sofia Margarida Mota EventosEmily Chan, realizadora de “Our Seventeen”, destacada nos filmes asiáticos do MIFF Emily Chan estreia “Our Seventeen” na secção dedicada ao cinema asiático do Festival Internacional de Cinema de Macau. A realizadora local, que divide o tempo e a profissão entre Pequim e Macau, fala acerca das expectativas, da película e do futuro [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] estreia de “Our Seventeen”, de Emily Chan, está agendada para dia 9 na Torre de Macau. O filme integra a secção “Hidden Dragons”, que aborda a produção asiática. Emily Chan, realizadora e produtora de Macau, não deixa de manifestar satisfação com o acontecimento. “Estou feliz porque é um evento internacional e é bom fazer parte dos dois filmes realizados por autores locais e que vão estar em exibição”, explica ao HM. O convite para a participação foi súbito. “Cheguei a pensar que o filme não estaria pronto a tempo, visto ter sido acabado este Verão, mas conseguimos, apesar de passar muito tempo em Pequim”, explica. Também foi devido a um encontro em Pequim que soube do festival. E foi assim que o ex-director do evento, Marco Muller, a desafiou a participar. A realizadora, que já passa grande parte do tempo dividida entre a capital chinesa e Macau, considera que é necessário que as produções locais se dividam entre filmes artísticos e filmes comerciais. Apesar de referir que o Governo se mostra empenhado em apoiar a indústria, acha que “o que é realmente necessário é que exista público para ver os filmes”. Por outro lado, e de forma a dar lugar à profissionalização, “os artistas locais também precisam de sair e fazer coisas fora de Macau”. “Our Seventeen”, que se passa na altura da transferência de Administração, trata de um grupo de jovens que procuram a concretização do sonho de serem músicos, ao mesmo tempo que exploram os seus processos de auto-descoberta e de definição de valores. A realizadora diz que é uma película que trata sobretudo da ausência. “Neste filme estamos perante qualquer coisa que falta. As pessoas não estão satisfeitas, há sempre alguma coisa que não está presente”, menciona. Para Emily Chan, a questão da ausência é uma característica de Macau. “O território está a evoluir demasiado rápido e, neste contexto, o meu objectivo é chamar a atenção para a necessidade de as pessoas pararem um pouco e se encontrarem a si mesmas.” Emily Chan opta por uma abordagem com uma baixa intensidade emocional, transversal à película. “Na verdade, a emoção do filme nunca é demasiado alta ou baixa e a ideia é que a atmosfera seja sempre caracterizada por uma calma relativa, porque a vida em Macau também tem uma certa calma, sendo que falta sempre qualquer coisa.” As expectativas para a estreia de “Our Seventeen” não são exacerbadas. “É uma boa oportunidade para ter mais um filme em portfólio e dar a conhecer o meu trabalho, visto que o evento pode atrair muitas pessoas, nomeadamente ligadas à indústria internacional. Não tenho qualquer expectativa em especial, estou calma e receptiva ao que aparecer”, ilustra, até porque “enquanto realizadora, o que há a fazer é sempre dar o melhor que se pode”. Uma oportunidade aos locais Tal como a realizadora de Macau Tracy Choi (ver texto nestas páginas), a inclusão de artistas de Hong Kong na produção deste trabalho de Emily Chan acontece porque, “dada a sua experiência, são muito profissionais”. No entanto, a realizadora fez questão de “incluir e proteger a participação de elementos locais na equipa”, sendo a maioria. O orçamento de cerca de três milhões de patacas que, apesar de situar a película numa produção de baixo custo, poderia contribuir para a contratação de mais gente da China Continental ou mesmo de Hong Kong, foi essencialmente usado para “a construção de uma equipa constituída em 90 por cento por pessoas de Macau, porque são estas que precisam de uma oportunidade, nomeadamente de poderem participar num filme dito a sério”. “Algumas das pessoas que acabaram por financiar este filme são da China e também pediram para integrar mais elementos de Hong Kong, mas fiz questão de proteger a minha equipa maioritariamente constituída por profissionais locais”, refere ao HM. Rebelde e contadora de histórias O cinema apareceu na vida de Emily Chan quando ainda era muito nova. “Era muito rebelde, mas fui-me apercebendo que conseguia escrever histórias e expressar-me através de meios ligados à imagem”, recorda. Ainda na faculdade, onde tirava um curso em Comunicação, começou por fazer alguns documentários mas, com o tempo, começou a criar histórias de ficção. Com a paixão pela realização acordada percebeu que Macau não era o lugar para a desenvolver. “Descobri que aqui não existia espaço para poder ser realizadora. Fui para Pequim e, até agora, a minha vida é de idas e vindas entre Pequim e Macau”, refere. No geral, a maior inspiração para as histórias que conta “é a vida do quotidiano, no presente”. “Considero-me uma escritora e realizadora de histórias de amor”, diz, enquanto adianta que já está a trabalhar num novo guião que trata a história de um homem natural da China Continental que vive em Macau. TRAILER https://www.iffamacao.com/wp-content/uploads/2016/11/ourseventeen_22nov.mp4 • MAIS INFORMAÇÕES NO SITE OFICIAL DO MIFF
Sofia Margarida Mota EventosTracy Choi, realizadora: “É um filme acerca de memórias” “Sisterhood”, a primeira longa-metragem da realizadora de Macau, estreia na edição inaugural do Festival Internacional de Cinema. Tracy Choi mostra-se especialmente satisfeita por ser o público de Macau o primeiro a ver a obra que entra na secção de competição do evento [dropcap]C[/dropcap]Como é ter a estreia do primeiro filme no Festival Internacional de Cinema de Macau, logo na primeira edição? É uma situação que me deixa especialmente feliz. Além de ser a minha cidade natal, é um filme que também teve parte das rodagens no território e que fala dele. Também tenho aqui os meus amigos e família, e é uma oportunidade de assistirmos juntos à estreia. Estou muito contente que isso tenha acontecido. É um dos filmes que está em competição na principal secção do festival. Sim. Ainda não vi os restantes filmes em competição, mas já vi os trailers. Parecem ser filmes muito bons e é uma honra poder partilhar esta secção com eles. Quais são as expectativas que tem para esta competição? Nenhumas. Porquê? Porque, apesar de não ter visto ainda os filmes, penso que já têm um carácter muito internacional. Parecem todos muito bons. Vai apresentar “Sisterhood”. Como é que apareceu este trabalho? Foi o projecto do meu mestrado em Hong Kong. Já tinha esta história na cabeça e quando me graduei candidatei-me a um fundo de apoio do Governo de Macau. Na altura não tinha ainda este nome, penso que se chamava “Sweet Home”, mas a história era muito idêntica. Acabei por ter um financiamento de 1,5 milhões de patacas e fui bater à porta de outras produtoras em Hong Kong para acabar de financiar o filme. Consegui, juntamente com o meu orientador de mestrado, produtoras interessadas e começámos por contratar um guionista para tratar melhor da história e escrevê-la de uma forma mais complexa e densa. Depois, o resto do processo foi acontecendo. E que história conta? É sobre uma mulher natural de Macau que foi para Taiwan onde viveu 15 anos. Acaba por regressar ao território, mas já não consegue dizer que se sente em casa porque não sente uma ligação à terra. Macau também tinha mudado muito ao longo desses 15 anos de ausência, pelo que não mais reconhecia a “casa”. Mas o filme também se chama “sisterhood” porque aborda a história de uma relação entre a personagem principal e uma amiga antes de ir para Taiwan, ainda nos anos 90, e da percepção de como essa relação tinha mudado ao longo do tempo. Um paralelismo entre as mudanças de Macau e das relações? Sim. A história começa quando a personagem principal, que se chama Sisi, mas é sempre tratada com o número 19, o número de massagista que tinha antes de ir embora, recebe a notícia de que a sua melhor amiga de juventude tinha morrido. É então que regressa a Macau no intuito de “rever” a companheira pela última vez. No regresso, encontra amigos em comum e o filho da tal amiga, que tinha ajudado a cuidar enquanto bebé. São estes encontros que lhe trazem as memórias da relação e da vida antes da partida. É um filme acerca de memórias. Que assuntos motivam os seus filmes? São essencialmente questões acerca de mulheres e de género. Acabam por ser os temas que mais me atraem. A escolha de Gigi Leung, a conhecida actriz de Hong Kong, foi uma estratégia? Sim, para atrair outro público, mas foi também uma coincidência. Enviámos o guião e ela gostou muito, pelo que aceitou fazer o papel sem pedir o cachet normal. No início foi estranho para mim trabalhar com ela, sentia-me nervosa. Mas ela é muito profissional e vinha sempre muito bem preparada para as filmagens. Passou de uma produção muito independente para um filme de uma maior produção. Teve de fazer alguma alteração significativa ao que queria inicialmente? No geral, não. Tive acima de tudo oportunidade de trabalhar numa escala maior e contar com profissionais de Hong Kong. Mas, e tal como pretendia, consegui envolver na equipa pessoas de Macau. Sempre quis que fosse uma produção partilhada com Macau. Qual é o problema da indústria cinematográfica em Macau? Penso que o maior deles é não ter audiências. Por exemplo, se foram filmes mais independentes é muito difícil conseguir algum retorno em Macau porque nunca há público suficiente. Daí a necessidade de que o filme seja vendido para outros mercados. Mas, se pensarmos no mercado continental, ficamos limitados, porque nem todos os temas são aceites. Se pensarmos em Hong Kong, temos sempre de conseguir a presença de uma estrela da indústria local de modo a que tenha público. Taiwan é outra alternativa. Mas é muito difícil o cinema de Macau encontrar um caminho. No entanto, e à semelhança da realizadora Emily Chan, a colaboração com a China Continental pode ser uma opção para o cinema de Macau. Considera que o festival pode vir a contribuir para a indústria do cinema em Macau? Ainda não sabemos. Claro que é uma boa oportunidade para encontrarmos profissionais de outras partes do mundo. Mas, na verdade, ainda não sabemos o que vai acontecer no festival. Estamos também ansiosos por ver o que vai acontecer. Planos para o futuro? Estou a trabalhar em novos projectos. A concretização de “Sisterhood” acabou por abrir muitas portas. Estou também a escrever um novo guião. A história vai ser sobre Macau e sobre a vida de uma mulher que trabalha num casino. Quero trabalhar acerca do mundo actual, e dos constrangimentos e preconceitos que ainda se vivem em Macau, especialmente por parte das mulheres. TRAILER https://www.youtube.com/watch?v=-XRxCyyuq54 • MAIS INFORMAÇÕES NO SITE OFICIAL DO MIFF
Isabel Castro EventosShee Va, autor de “Espíritos”: “As comunidades não interagem” É apresentado hoje ao final da tarde o primeiro romance de Shee Va. Depois de um livro em que assumia a ideia de fazer a ponte entre Ocidente e Oriente, o médico recorre agora a outro género literário para descodificar, em português, uma realidade chinesa que não se vê [dropcap]C[/dropcap]omo é que surgiu a ideia de escrever um livro de ficção? É uma ideia que vem de há muito tempo. Os espíritos acompanham-nos e estes, à moda chinesa, acompanham-me desde criança, porque ouvi falar deles pela primeira vez – ainda por cima, a povoar Macau – por um amigo de infância. Nessa altura eu vivia em Moçambique, esse rapaz chegou de Macau e contava as histórias todas sobre os espíritos e fantasmas que habitavam as casas antigas de Macau, de modo que isso fez o meu imaginário. Entretanto, quando aqui cheguei, em 2012, conheci um médium, que me contava histórias. Foi a partir do imaginário de infância e das histórias do mestre que resolvi escrever este livro. São crenças e superstições do povo chinês. Vem na linha daquilo que pretendo transmitir com os livros: dar a conhecer ao mundo lusófono – porque escrevo em português – a cultura chinesa. No meu primeiro livro, “Uma Ponte para a China”, tinha mesmo essa intenção. Neste caso, optou por um romance para fazer passar a mensagem. Sim, e há ainda a minha faceta de médico. O espírito deste livro é o de uma criança que morreu com uma doença genética. Cinco anos depois, os pais decidem refazer a vida e terem outro filho. Procuram ajuda junto da medicina ocidental e dos espíritos, porque a mãe da criança sentiu um espectro na altura em que o filho faleceu. Guardou o segredo durante cinco anos, nunca contou nada ao marido, mas quando decidem refazer a vida revelou que viu esse espírito, pelo que quer descobrir quem é. Macau tem uma sociedade extremamente pragmática, consumista. É uma cidade que não pára. A vivência espiritual encontra espaço aqui? Sempre. Os espíritos fazem parte da cultura chinesa, tanto que existem duas festividades chinesas relacionadas com os antepassados: uma no quarto mês lunar e outra no nono. O culto dos mortos é muito importante para os chineses. Uma das coisas que este mestre que conheci me disse – e que está também na base do livro – foi que se eu quisesse conhecer o futuro dos meus filhos poderia consultar um médium, que através da condução dos antepassados se pode prever a vida futura. Ou seja, há uma ideia na cultura chinesa de que os entes falecidos, que moram no firmamento, são espíritos bons que conduzem a nossa vida. Por isso é que, na cultura chinesa, é prestado culto a esses antepassados, para que nos protejam. Isto existe muito mesmo nesta população que é citadina e não tem que ver com o facto de haver muitos imigrantes que vêm de zonas rurais. Faz parte da educação, faz parte da cultura chinesa. Tendo vivido grande parte da vida no Ocidente – primeiro em Moçambique, depois em Portugal, com algumas passagens por Macau –, mas tendo um contexto familiar chinês, sente que está numa posição privilegiada para desdobrar este tipo de códigos culturais? Julgo que sim. Por poder fazer essa ponte é que pretendo fazer isso, mesmo que seja através de um romance. Consigo interpretar aquilo que os chineses sentem e transmitir ao mundo ocidental. Na apresentação que Beatriz [Basto da Silva] fez em Lisboa deste livro, achou interessante ter, pela primeira vez, uma pessoa chinesa a falar destes aspectos, porque normalmente os chineses são muito fechados, não se revelam muito. Eu, provavelmente sendo um aculturado, consigo revelar algumas coisas que os outros eventualmente não revelariam. Acho que posso ser essa ponte que liga o mundo ocidental ao mundo oriental. Como é que lida com o facto de ter influência de tantas culturas diferentes? A minha cultura é ocidental e a forma de pensar será ocidental. Mas não posso deixar de ter as raízes chinesas e elas chamam. Esta forma de revelar as coisas é talvez um chamamento. Tenho a necessidade de aprender – porque para mim também é uma aprendizagem – com a cultura chinesa e verificar que tem aspectos interessantes, mesmo que sejam no oculto. Por exemplo, há aspectos da medicina tradicional chinesa que são interessantes. Enquanto médico, devo compreendê-los. Outros, provavelmente, nunca chegarei a compreender, porque são conceitos fora do parâmetro ocidental. Quando se pergunta se a medicina ocidental se poderá ligar à oriental, penso que há aspectos em que sim. Em relação à cultura, penso o mesmo. Vivendo eu com um sentir ocidental, também sinto algumas coisas da cultura chinesa. Este sentir poderá ser raiz ou é genético? Isso não sei explicar. Este livro é também a procura da vida além da morte – podemos ir buscar as explicações conforme as religiões ou conforme as culturas. Talvez esta seja a minha pesquisa para o lado oriental. Acho que tem muito interesse quando se lida com uma cultura diferente poder compreendê-la. Talvez seja isso que quero transmitir. Portugal, neste momento, tem muitos chineses, o mundo inteiro tem muitos chineses. As populações não podem viver fechadas. Uma coisa que sinto em Macau é que foi durante muito tempo – e hoje em dia também – um sítio multicultural, mas em que as comunidades não interagem. Para mim, isso é mau – podia ganhar-se muito mais com a comunicação. É médico, é amante de música clássica e faz estas incursões pelo mundo das letras. Como é que funciona o exercício da escrita? É um hobby, tenho um prazer enorme em escrever. O trabalho é enorme, o trabalho de médico é stressante, talvez isto seja uma maneira de fugir ao stress. Para mim, o acto de escrever é muito individual, preciso de estar muito isolado para poder escrever e reflectir. É uma necessidade – é como se formasse um jardim meu e, quando estou a escrever, estou sozinho. Normalmente aproveito para escrever de madrugada, porque já descansei o suficiente: quando acordo tenho a cabeça e as ideias arrumadas. Poder-se-á dizer que o exercício da escrita é um escape, mas também é um prazer. Depois de Lisboa, Macau O livro de Shee Va, “Espíritos”, é apresentado hoje, às 18h30, na Fundação Rui Cunha, depois de ter sido lançado em Lisboa, no Fórum do Livro de Macau. À semelhança do que aconteceu na capital portuguesa, a sessão de hoje conta com a apresentação da historiadora Beatriz Basto da Silva. A obra é editada pela Livros do Oriente. As receitas da venda revertem integralmente para a Associação Amigos do Livro em Macau. Uma semana, dois livros “Espíritos” não é o único livro da autoria de Shee Va a ser apresentado esta semana em Macau. Amanhã, ao final da tarde, também na Fundação Rui Cunha, o médico lança uma obra sobre ópera: trata-se do primeiro tomo de dois acerca das óperas que fizeram parte dos cartazes do Festival Internacional de Música ao longo dos seus 30 anos de existência. O primeiro volume aborda as óperas até 1999. O lançamento do livro encerra a última sessão do ciclo “Conversas ilustradas com música”, sob o tema “Os sete pecados mortais na ópera”. O último pecado abordado é a ira, com a “Elektra” de Richard Strauss. A sessão começa às 18h30.
Sofia Margarida Mota EventosCurtas | Migrações pelo olhar dos alunos da UM [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] tema “As Migrações” dinamizou os alunos da Universidade de Macau (UM) e deu origem a 20 filmes que vão participar na terceira edição do concurso de curtas-metragens. A iniciativa é do Programa Académico da União Europeia para Macau, em colaboração com o departamento de Comunicação da Faculdade de Ciências Sociais da UM. “Os alunos da disciplina de produção de vídeo são convidados a fazerem curtas-metragens de cinco minutos acerca de um tema seleccionado”, explica ao HM Rui Flores, elemento da organização e do júri do concurso. No ano passado, o tema foi “O Desenvolvimento”, em que a escolha teve por base “o alinhamento com o ano europeu do desenvolvimento”. A edição de 2016 teve em conta a situação actual da Europa e do que se passa um pouco por todo o mundo. “Achámos que seria interessante sugerir aos alunos que falassem sobre migrações também sob a perspectiva de Macau”, explica o organizador. Para Rui Flores, o tema é actual e encaixa no próprio contexto da região. “É um território que ao longo dos anos tem sido construído com migrantes e a sua presença é extremamente importante para o seu próprio desenvolvimento.” As razões do sucesso do número de filmes recebidos podem ter que ver, segundo o organizador, com a visibilidade que os alunos sentem que os trabalhos têm com a sua participação. Por outro lado, o tema em si poderá ter contribuído para a grande participação até porque “mesmo a grande parte dos nossos alunos chineses têm pais que não são de Macau, pelo que é uma temática que acaba por lhes dizer muito”. “Segundo sei, a técnica que foi mais usada foi a do documentário em que os alunos recorreram a familiares e amigos que são migrantes em Macau”, refere. As películas vão ser exibidas na quinta-feira pelas 19h e o prémio para o vencedor será de cinco mil patacas, com a oportunidade de ver o filme exibido na extensão de Macau do conhecido festival Doclisboa. O júri é constituído por Timothy Simpson, director adjunto da Faculdade de Ciências Sociais da UM, Patrícia Ribeiro, do Instituto Português do Oriente, João Francisco Pinto, da TDM e Rui Flores, gestor executivo do Programa Académico da União Europeia para Macau.
Sofia Margarida Mota EventosDebate propõe reflexão sobre o rumo da imprensa portuguesa [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] estado actual e o futuro da imprensa portuguesa em Macau são o foco do debate agendado para a próxima sexta-feira no Clube Militar. A iniciativa integra a comemoração dos 25 anos do jornal Ponto Final e este é o primeiro grande tema que a publicação se propõe debater. Apesar de ter como conteúdo principal a imprensa, dada a sua pertinência social, a iniciativa é dirigida a todos. “É um momento não só para o encontro de jornalistas, como também da comunidade civil, até porque a questão da liberdade de imprensa é uma questão que acaba por ser transversal àquilo que é o segundo sistema de Macau”, explica Marco Carvalho, director do Ponto Final, ao HM. A data escolhida não foi ao acaso e teve como fim poder integrar a presença de João Figueira. O professor da Universidade de Coimbra é também o autor da obra que “passa em revista os últimos 15 anos da imprensa portuguesa na região”. Da análise que fez, João Figueira conclui que, ao contrário do que teria sido de esperar, o jornalismo português em Macau está cada vez mais dinâmico. Marco Carvalho recorda que a imprensa em língua portuguesa de Macau tinha sido “praticamente condenada à morte” ainda em 1999, num artigo publicado pelo jornal Público. “No entanto, 17 anos depois, o que vemos é o contrário”, refere. “Não só mostra uma dinâmica própria e que era difícil de prever, mas também tem vindo a multiplicar-se.” O director do jornal ilustra a situação actual que, para além dos três diários, apareceram recentemente novas publicações, como é o caso do semanário Plataforma Macau e de uma série de projectos que, apesar de não serem em língua portuguesa, são feitos por jornalistas portugueses. “Possivelmente, nunca como neste momento, quase 17 anos depois da transferência de administração, se abordou tanto e de uma forma tão científica o estado da imprensa de língua portuguesa em Macau”, sublinha, enquanto faz referência aos apontamentos dispersos acerca do assunto que existiam no passado. O terceiro elemento do debate é José Carlos Matias, representante da Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau e que está a organizar um inquérito local acerca da liberdade de imprensa. “É um tema que está na ordem do dia e que começa a ter alguma pertinência tendo em conta a evolução em termos políticos que sucede em Hong Kong e mesmo em Macau”, defende Marco Carvalho. Em suma, “é para saber o rumo da imprensa portuguesa que o Ponto Final organiza este debate”.
Sofia Margarida Mota EventosIPM | Lançado primeiro concurso internacional de tradução O primeiro concurso mundial de tradução de português-chinês vai acontecer pela mão do Instituto Politécnico de Macau. A ideia é motivar alunos de todo o mundo para a aprendizagem do par linguístico e chamar a atenção para a importância de Macau como plataforma bilingue [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Instituto Politécnico de Macau (IPM) vai promover o primeiro concurso mundial de tradução português-chinês. A iniciativa, que conta com o apoio do Gabinete para o Ensino Superior de Macau (GAES), pretende usar o território enquanto plataforma para preconizar uma das características de Macau – a coexistência e entendimento entre duas línguas. “O tema da tradução é uma constante desde a chegada dos portugueses ao território e actualmente assume especial importância não só no que respeita à Administração e à área jurídica, como também para um melhor entendimento do quotidiano da cidade”, explicou ontem Lei Heong Iok, presidente do IPM, na conferência de imprensa de apresentação do concurso. Já para Sou Chio Fai, coordenador do GAES, a iniciativa tem como principal função a atracção de estudantes interessados no par linguístico em causa e chamar a atenção para o território. O dirigente alerta ainda para a constante necessidade de tradutores, sendo que “é preciso formar mais quadros bilingues não só na área da tradução, mas com experiência em algum tipo e especialização. Por exemplo, pessoas com experiência na área empresarial, financeira, em engenharia ou em arquitectura”, referiu ao HM, à margem da conferência. São todos bem-vindos O concurso é dirigido às instituições de todo o mundo que façam parte da Associação de Megadados Linguísticos (LBDA, na sigla inglesa), às instituições de ensino superior de Macau e de Portugal, e àquelas que integrem cursos de tradução ou de áreas afins. A distinção dos vencedores tem uma recompensa que se espera apetecível. O primeiro prémio leva para casa 100 mil patacas, o segundo 80 mil e o terceiro 50 mil. Foi ainda criado um prémio especial para as equipas das instituições de Macau em que o primeiro classificado tem direito a 50 mil patacas e o segundo a metade do valor. Para participar, os alunos interessados deverão constituir uma equipa que poderá ter dois ou três estudantes e devem ter um orientador da sua escola. O professor que irá orientar os trabalhos premiados tem também direito a um prémio. As inscrições podem ser feitas até 31 de Janeiro no site do IPM, sendo que vão ser dados três meses para a concretização dos trabalhos de tradução. Os vencedores são conhecidos no próximo mês de Agosto.
Isabel Castro EventosFestival | This is My City 2016 arranca na sexta-feira com Balla e Rui Reininho Música, ideias, imagens. O This is My City chegou bem de saúde à edição número 10, mas quem o organiza pensa em mudanças para o futuro. Até lá, vive-se Macau [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]asceu de forma espontânea, entre duas lojas, no coração da cidade chinesa, para além da muralha. Manuel Correia da Silva e Clara Brito, ambos designers, tinham um espaço no Beco da Melancia; o fotógrafo António Falcão era o proprietário da livraria Bloom, no Largo do Pagode do Bazar. A Macau dos festivais era sobretudo institucional, com os cartazes do costume. Fazia falta outro tipo de cultura – a dos livros, a de uma certa música, a das ideias, a dos conceitos. A vontade de um punhado de gente resultou num acontecimento que, logo nos primeiros anos, contou com a adesão de muito público. O interesse de quem se juntava aos finais de tarde e noites no bazar levou a uma maior organização: o This is My City (TIMC) foi crescendo, chamando gente de fora, e assim passaram dez anos, ocupando diferentes espaços, sempre na cidade. A edição que assinala a década prolonga-se ao longo de duas semanas e arranca com música, que chega de Portugal. É talvez o ponto mais forte do programa, aquele que mais público será capaz de captar: a organização traz à cidade o projecto Balla, “num formato inédito”, com um convidado especial: Rui Reininho, a voz dos GNR. “Tem algumas figuras que fazem também parte desta cidade”, destaca Manuel Correia da Silva, responsável pelo evento. A abrir o concerto da próxima sexta-feira, dia 2 de Dezembro, vai estar o trio de Macau “Turtle Giant”, constituído por Beto, Frederico Ritchie e António Conceição. O palco escolhido para o início desta edição é um regresso ao início de tudo: o TIMC volta ao Largo do Pagode do Bazar. “O This is My City tem sempre tentado ocupar o espaço da cidade: o que acontece não é dentro de paredes. Mesmo aqueles que não pensam em participar passam por nós, e podem usufruir e experienciar daquilo que oferecemos”, aponta Correia da Silva. O concerto no bazar começa às 18h30. Ainda na sexta-feira, mas já no Kampek, outro tipo de música: DJ Balla e Rui Reininho, promete a organização, vão proporcionar aos que se juntarem à festa “uma noite para não esquecer”. O japonês DJ Shintaro também vai actuar. Imagens e ideias A 6 de Dezembro, o TIMC aproveita a passagem por Macau do projecto “No Trilho dos Naturalistas”, um documentário constituído por quatro episódios coordenador por António Gouveia. Na Casa Garden vai ser mostrada uma parte deste projecto: “Angola 58’” é realizado por André Godinho. O projecto conta com a participação de Alexandra Cook, uma professora de Filosofia da Universidade de Hong Kong com um forte interesse em estudos ambientais. Três dias depois, a 9 de Dezembro, o regresso do PechaKucha: um formato de intervenção pública que junta a projecção de imagens às ideias deixadas por vários oradores, num tempo fixo que permite um maior dinamismo. O TIMC trouxe este tipo de palestras a Macau pela primeira vez em 2010. O Albergue SCM recebe de novo a edição de 2016, a partir das 18 horas. À mesma hora, no mesmo espaço, são projectadas várias curtas-metragens do realizador Maxim Bessmertny. À semelhança do que já tinha acontecido no ano passado, também em 2016 o This is My City organiza um Instameet. O tema é a cidade – o evento do TIMC vai ter uma página própria. O encontro acontece no dia 10, entre as 12h e as 18h, no Macau Design Center. Pensar ao lado De regresso à Casa Garden, no dia 13 de Dezembro, para uma exposição e uma palestra sobre um projecto de pesquisa acerca de uma cidade que nos é próxima: Shenzhen. “Unidentified Acts of Design”, de Luisa Mengoni e Ole Bouman, explora a ideia do design que surge fora das quatro paredes de um estúdio. Os autores vão estar presentes para uma discussão sobre “actos de design fora do formato”. Manuel Correia da Silva desdobra o conceito: nesta sessão, vai debater-se “aquilo que se tem passado em Shenzhen com o impacto da tecnologia”. “O tecido industrial de Shenzhen absorveu muito do topo da tecnologia. Há franjas que se estão a construir em torno dessa tecnologia, com criativos de todo o mundo que vão para lá para criarem os seus produtos e as suas start-ups, com todo o impacto que tem tido naquela cidade”, refere. Esta palestra vai ao encontro de um dos objectivos do TIMC – pensar Macau no contexto dos vizinhos. “Acho que é importante. Macau tem de ser uma cidade mais para fora. Temos de começar no Delta e achamos que Shenzhen deverá ser o primeiro passo, a conhecer e a ligar, para que possamos estar mais actualizados, regionalizados e internacionalizados”, defende Correia da Silva. O fim de um ciclo Dez anos depois dos encontros espontâneos no bazar, Manuel Correia da Silva faz um balanço “muito positivo” do evento. “São dez anos na cidade pós-99, que tem 17. Fazemos parte desta nova cidade. Não somos muito mais novos do que ela”, nota. “Fomos capazes de fazer algo que, de espontâneo, se tornou parte de um espaço que fomos capazes de ocupar, com um festival que tem um formato diferente, que se propôs apresentar um conteúdo diferente”, continua o designer e responsável por um evento que nunca quis ser mainstream. “Não queríamos esse papel, já está ocupado e não é o nosso. Mas em Macau, não se sendo mainstream, às vezes é muito difícil sobreviver. Fomos capazes de o fazer, estamos cá, fazemos um óptimo saldo, mas sentimos que se fecha um ciclo”, continua o presidente da +853, a associação que organiza o festival. Numa década, assinala Correia da Silva, “a cidade mudou muito e, por isso, não faz sentido manter o festival como ele é hoje em dia”. O público não sentirá a necessidade de reflexão que os organizadores entendem ser necessária. “Não sabendo exactamente o que vai acontecer no futuro, há algo que é certo: as coisas não vão continuar a ser como foram, achamos que temos de revitalizar-nos, adaptar-nos e, por isso, estamos a trabalhar com essa ideia, pelo que queremos que esta edição sirva para marcar esse ponto”.
Sofia Margarida Mota EventosNjo Kong Kie, director musical: “Estamos a sair das fronteiras da arte” “Um Piquenique no Cemitério” é o nome da peça que vai estar no Centro Cultural de Macau a 2 e 3 de Dezembro. O espectáculo conta com a direcção musical de Njo Kong Kie que, apesar de radicado em Toronto, aproveita as vindas a Macau para trabalhar em projectos locais. O compositor falou ao HM do espectáculo, dos desafios que enfrentou e do mundo da arte alternativa local O que é que vamos ver neste “Um Piquenique no Cemitério”? A peça é, na sua essência, um concerto. Por isso vamos ouvir música. Numa outra camada do espectáculo temos diferentes elementos que incluem vídeos e interpretação dramática e, por último, é uma peça em que tivemos o cuidado de incluir o público. Contracenam com a audiência? Quando começámos esta peça, há três anos no LMA, enquanto parte do Festival de Artes de Macau, tivemos o cuidado de desenhar um espaço em que o público e os artistas partilhassem a mesma área, o que possibilita a interacção e a integração de novos elementos. Agora, estamos a transferir a ideia para o pequeno auditório do Centro Cultural de Macau (CCM) em que a sala, dadas as suas características, implica uma certa separação dos espectadores mas, ainda assim, queremos manter o espírito de partilha do espectáculo entre as duas partes. Há vários aspectos que estamos a tentar contornar com novas escolhas cénicas em que as interacções com a audiência serão mantidas, e vamos tentar fazer com que o público sinta que estamos a dialogar e que está no mesmo espaço. Mas, acima de tudo, esperamos que as pessoas tenham oportunidade de assistir a um bom espectáculo e de ouvir boa música. Que música é que foi, especificamente, concebida para o espectáculo? Vamos ter um conjunto de composições que integram a música clássica e contemporânea com um toque experimental, misturadas com alguns sons mais comerciais e populares. Gosto de pensar que, algures neste espaço musical, estamos perto da música clássica, mas não demasiado perto. Tem raízes clássicas, o que faz parte da minha formação, mas algumas pessoas poderão pensar que é música minimalista e não estarão erradas. Temos também tido feedback de que o som se assemelha a música para cinema, o que quer que isso seja. Acho que, possivelmente, é porque o som desta peça, de alguma forma, evoca algumas imagens e, por isso, o mais próximo dos adjectivos que as pessoas encontram para a descrever é a de ‘música para cinema’. Certamente que tem muito ritmo e ao mesmo tempo é muito lírica. É um instrumental para piano, violino e violoncelo, que são o coração da orquestra, mas também temos guitarra clássica e eléctrica, por exemplo. Qual foi o maior desafio na concepção desta peça? Penso que o maior desafio foi enquadrar as interpretações dramáticas num espectáculo musical. Muitos dos temas saíram de um álbum que criei há uns anos e escrevi as peças enquanto estava em digressão. Estivemos na estrada durante dois anos e a fazer sempre o mesmo repertório. Depois de alguns meses, comecei a tentar encontrar formas de manter a orquestra motivada, de modo a combater a rotina, e comecei a escrever pequenas peças para que nos divertíssemos. Incorporei essas peças nos ensaios para manter as pessoas entusiasmadas e isso foi um sucesso. Após um tempo, tinha acumulado uma dúzia de pequenas peças musicais em que cada uma tinha a sua própria personalidade. A parte musical acabou por ser relativamente simples na medida em que estava praticamente composta. Mas os músicos não estavam muito habituados a tocar música mais minimalista. É um género em que é difícil manter a concentração e alguns dos músicos acharam, por exemplo, difícil a precisão rítmica que tinha de ser mantida quase como se se tratasse de uma máquina para que a peça se mantivesse una. Isto foi um desafio nos ensaios: manter a peça coesa. No entanto, sem dúvida que o maior dos desafios foi manter esta coesão em formato teatral. Incorporar todos os elementos, os músicos com os actores com quem estou a trabalhar e toda a encenação. É como conceber toda uma história nova porque apenas a música seria uma abordagem muito abstracta. Um piquenique no cemitério não é uma imagem ou tema comum… Quando temos um título, especialmente um título como este, as pessoas esperam encontrar algum tipo de respostas no espectáculo. Quando estamos a apresentar a peça num espaço alternativo, é mais fácil as pessoas sentirem a peça e enquanto a sentem não fazem perguntas que poderiam, eventualmente, fazer. Apesar de a peça ser, muitas vezes, pouco clara, essa característica também permite às pessoas terem a liberdade de sentir. “Um Piquenique no Cemitério”, apesar de ser acerca da morte é, acima de tudo, acerca da vida e de como é que pode ser abordada num cenário como o sugerido pelo nome. A peça acaba por ser irónica e questiona um pouco o que é que fazemos durante a viagem que nos leva da vida à morte. A peça tem andado em digressão há três anos. Sim, temos estado em vários sítios e estivemos em Portugal também, por exemplo. Penso que a recepção em Portugal foi muito especial por termos estado em diferentes tipos de espaços – desde espaços convencionais, como a Fundação Oriente e o Centro Cultural de Famalicão, a um restaurante em Vila Real. Estivamos também no Maus Hábitos, no Porto. Cada um destes espaços era muito diferente e tinha características próprias, e com audiências também características. No restaurante, por exemplo, o público que tínhamos era de pessoas que iam lá regularmente. Era um público muito pequeno e em que estávamos todos muito próximos e correu muito bem. Por outro lado, quando estivemos no Maus Hábitos, o ambiente era muito idêntico ao do LMA, muito independente e correu tudo muito bem, acabámos por integrar objectos que apareciam no espaço na própria encenação, o que também resulta. Esta é uma peça muito dinâmica. Gostamos de transferir a energia que sentimos no espaço para o espectáculo e queremos estar relaxados. Afinal, estamos a falar de um piquenique num espaço inusitado: o cemitério, por não se saber o que se passa além da morte, é sempre um lugar do desconhecido. É uma espécie de humor negro. Uma peça para todos e em todo o lado? Sim, até porque não tem um idioma. É universal. É uma coisa que tem, acima de tudo, que ver com tempo. Há um sentimento de nostalgia na peça. Usamos em alguns pontos legendas idênticas às que se usam no cinema mudo com pequenos trechos de texto, em inglês e chinês que, basicamente, servem para guiar o pensamento consoante o que se vai ouvindo. Tem sido um grande caminho até ao CCM… Agora sentimos que já podemos ir a esta sala sem correr o risco de sermos mal entendidos. Já é uma peça conhecida e temos alguma experiência em preparar o público antes da sua entrada, para que não entendam mal o nosso trabalho. O que têm planeado para o futuro? Vamos continuar com “Um Piquenique no Cemitério”. Já temos um espectáculo agendado para o Japão na continuação das nossas apresentações internacionais. Estamos na presença de um espectáculo alternativo e experimental. Da sua experiência, como é que Macau olha para este tipo de criações? Quando comecei a colaborar mais regularmente com artistas locais, em 2008, fiquei logo surpreendido com a quantidade de pessoas ligadas a trabalhos experimentais. Parece existir um grande fosso entre os clássicos tradicionais, que já não fazemos muito, e aquilo que muitos artistas contemporâneos estão a fazer e que são as suas próprias criações. Por exemplo, em Macau não há muita gente a fazer Shakespeare ou, tirando um ou dois que tenha visto, peças do Tchekhov. As pessoas estão a apostar em trabalhos contemporâneos e o público está na mesma linha. Temos ainda, no mundo da dança, coisas muito interessantes a ser feitas. A Comuna de Pedra, por exemplo: desloca-se aos bairros antigos de Macau para apresentar coreografias contemporâneas. O público olha para eles com um ar intrigado, mas eles fazem-no e é uma forma de mostrar o desejo de que a arte chegue a todos. O público, mesmo sem saber muito do assunto, acaba por se aproximar, ver e falar disso. Podem não entender mas acabam por gostar. Da mesma forma, fizemos uma apresentação desta peça em Taiwan num mercado, o que é também um cenário inesperado. Quando estávamos a actuar, as pessoas deixavam o que estavam a fazer e vinham ver-nos. Ter este tipo de proximidade com o público é muito especial. Aquilo que fazemos com a arte, às vezes, é tão limitado demograficamente que sabe muito bem podermos expandir-nos e chegar a mais pessoas. Por exemplo, quando pensamos no CCM não estamos a pensar que estas pessoas – dos mercados e da rua – venham ver o nosso trabalho e, com apresentações alternativas, estamos a sair das fronteiras da arte.
Isabel Castro EventosPalestra | João Ó fala sobre renovação de edifícios na USJ Os edifícios de acesso público devem reflectir as necessidades da comunidade. A ideia é defendida amanhã, pelo arquitecto João Ó, numa palestra que tem como ponto de partida a renovação do edifício Ritz, ao Largo do Senado [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á coincidências felizes e esta, diz João Ó, foi uma delas. O arquitecto foi convidado, no ano passado, para dar aulas na Universidade de São José (USJ), no módulo de Design de Interiores. As aulas práticas de Ó na instituição de ensino superior coincidiram com um convite da Direcção dos Serviços de Turismo, que desafiou três universidades do território para um concurso de ideias sobre a renovação do interior do edifício Ritz, localizado no Largo do Senado. A USJ lançou um concurso interno junto dos estudantes. Durante um semestre, discutiram-se conceitos e trabalharam-se ideias. Os resultados deste projecto são conhecidos amanhã, durante uma sessão em que vão ser atribuídos prémios às três melhores ideias, mas em que também se vai falar da reconversão de edifícios e dos desafios que a sociedade de hoje coloca a esta tarefa. O pretexto é o Ritz. Ritz com pouca vida “O edifício foi renovado pela equipa de Manuel Vicente, Carlota Bruni e Rui Leão. Foi finalizado em 2004, com um programa muito específico: áreas de exposições no rés-do-chão e o resto dos pisos – são cinco, incluindo o rés-do-chão – seriam arrendados a associações de Macau”, contextualiza João Ó. “Não sei qual foi a dinâmica que houve estes anos todos, mas a verdade é que o edifício está meio fechado.” O único piso aberto ao público é o rés-do-chão, que “tem algumas exposições, mas que está um pouco abandonado”. Aquando da intervenção, “manteve-se a fachada e criaram-se mais pisos do que era possível”, aponta o arquitecto. “Foram acrescentados dois pisos aos três da fachada, o que implica que os pés direitos diminuíram muito e tornam o espaço, a meu ver, bastante claustrofóbico. É um dos problemas que encontro no edifício.” Na palestra, o arquitecto vai falar sobre a forma como estas estruturas poderão ser renovadas – não só as classificadas, mas também outras que foram originalmente projectadas com finalidades diferentes. O objectivo é discutir “como é que podem ter uma nova vida com um novo programa e que tipo de programas é que a sociedade de hoje em dia precisa, porque não tem as mesmas necessidades de há dez anos”. A velocidade com que se alteram os interiores das casas de acesso público é ainda mais visível em Macau. História da Casa Amarela “Todos os anos há uma necessidade nova, as lojas abrem e fecham de um dia para o outro, e esta necessidade de mudança, muito intensa, reflecte-se na utilização de estruturas antigas”, assinala João Ó. Na sessão da Universidade de São José, o arquitecto vai dar dois exemplos bem diferentes sobre a reconversão de edifícios, uma questão que pode ser “bastante complicada” se não for feita uma boa gestão e se, no caso dos proprietários privados, os lucros rápidos e avultados forem o único aspecto a ser tido em consideração. João Ó participou na renovação da Casa Amarela, no sopé das Ruínas de São Paulo. O cliente era a Direcção dos Serviços de Turismo e o objectivo da renovação compreendia finalidades distintas. “A semicave era um espaço para o Instituto Cultural, os restantes três pisos variavam entre recepção e informação do público, havia uma casa de chá, depois foi também o Lusitanus, o restaurante português. Era uma variedade de programa que, infelizmente, pelos vistos não resultou”, recorda. Detida por um privado, a Casa Amarela estava a ser arrendada pelo Governo. Mas o proprietário decidiu mudar de inquilino, arrendou o espaço a uma loja de roupa, que acabou por desistir do negócio. “O cliente – neste caso os empresários – também tem a necessidade de saber qual é a melhor forma de explorar um espaço destes, sendo que estamos no coração da cidade”, aponta Ó. O arquitecto defende que, quando se mexe no interior de um edifício, é preciso pensar no que é que a cidade precisa, “em termos comerciais, lúdicos e turísticos”. O lucro tem sido o grande objectivo, mas “tem que haver um balanço qualquer”. O segundo exemplo escolhido por João Ó contrasta com a história da Casa Amarela: trata-se do Macau Design Centre, que está instalado na zona da Areia Preta. O arquitecto conhece bem este edifício fabril utilizado pela Associação de Designers de Macau, uma vez que a empresa que detém – a Impromptu Projects – está lá instalada. “Estando aqui e vivenciando o espaço, percebe-se que a estrutura funciona muito bem e a criação de sinergias entre estúdios com diferentes objectivos é bastante feliz”, anota. O espaço é um “um projecto a longo prazo”, tem por enquanto fins criativos, os fins lucrativos poderão surgir mais tarde. “Para as pequenas e médias empresas resulta bastante bem.” Destes dois exemplos, João Ó conclui que os empresários não devem pensar apenas “em lucros imediatos de grande valor, mas sim numa perspectiva muito mais localizada – e não globalizada – para explorar um espaço que poderá ter um rendimento a longo prazo, e poderá ser vantajoso para a comunidade local”. As ideias de João Ó e os projectos dos alunos da USJ começam a ser apresentados às 18h30, amanhã, no “Speakers’ Hall” da universidade. A iniciativa é aberta a todos os que se interessem pelo tema.
Isabel Castro EventosPrograma “Vinhos na Rádio” organiza curso João Paulo Martins é crítico e jornalista vinícola [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] uma iniciativa que partiu de solicitações de ouvintes da Rádio Macau, que desafiaram a produção do programa “Vinhos na Rádio” para uma partilha de conhecimentos que fosse além da antena. O curso de vinhos vai já na terceira edição, conta com a parceria da Fundação Oriente e é da responsabilidade do crítico João Paulo Martins, jornalista que trabalha na imprensa vinícola desde 1989. Arrancou ontem ao final da tarde, na Casa Garden, e termina hoje, com a participação de 15 pessoas. “Tenho vindo a Macau com alguma regularidade, gosto de cá vir. As pessoas daqui têm interesse em relação a vinhos, têm acesso a bons vinhos portugueses – porque se vendem cá todos –, e a vinhos de outras partes do mundo, até mais do que temos em Portugal”, assinala João Paulo Martins. “São pessoas com algum conhecimento e interesse, com algum poder de compra, são interessadas e isso é o melhor que podemos ter quando estamos a dar um workshop de vinhos”, explica acerca dos seus formandos. Num curso deste género, começa-se pelo princípio de tudo: a uva. “Como é que ela cresce e se desenvolve, até chegar à altura da vindima, como é que se faz o vinho”, indica o jornalista. “É importante perceber quais são as etapas determinantes de todo o processo evolutivo do ciclo da uva até chegar à vindima.” Depois, João Paulo Martins deixa algumas noções sobre como é que se faz o vinho e “como é que, com as mesmas uvas, se fazem vinhos com diferentes perfis, para percebermos como é que cada produtor organiza o seu vinho no sentido de corresponder aquilo de que gosta”. Numa outra fase, “perante um vinho no copo”, o responsável pelo curso fala sobre “o que tem de se aprender a ler: os aromas, a prova de boca, as texturas, a acidez, o prolongamento do vinho no final, tentar perceber se é um vinho novo ou velho, conforme o tipo de aromas que tem, conforme a cor, se mostra um potencial bom para guardar em casa”. A preocupação de João Paulo Martins, vinca, “é que o consumidor tente tirar o máximo partido do vinho que tem à frente para provar”. Quanto mais souber do assunto, “mais prazer pode ter em beber” o que tem no copo, refere o autor da obra “Histórias com vinho & outros condimentos”, livro recentemente lançado. Assunto de mulheres Há algumas décadas, a vinha e o vinho era assuntos tipicamente masculinos. Hoje, arrisca o jornalista, “50 por cento dos enólogos portugueses são mulheres, o que é uma situação de facto nova em relação ao que existia há 30 anos”. Não há estatísticas oficiais, mas são cada vez mais as mulheres a trabalhar nesta área. No entanto, já se fizeram as contas aos consumidores e chegou-se à conclusão de que são as mulheres que fazem as compras em casa, diz o jornalista: “São as mulheres que compram o açúcar e o arroz, e que compram também o vinho”. O facto de serem as mulheres a escolher fez com tenha passado a haver “um interesse crescente pelo vinho que, felizmente, deixou de ser um assunto masculino”. Esta vontade de saber mais reflecte-se nas acções de formação sobre a matéria e Macau não é excepção – a presença feminina tem aumentado a cada edição do curso organizado pelo “Vinhos na Rádio”. A designer Sofia Bobone é uma das participantes na iniciativa. Depois de dois pequenos cursos dados por Luís Herédia, em que ficou “com algumas noções que não tinha”, decidiu juntar-se ao grupo que se reúne por estes dias na Casa Garden. “Bebo socialmente e encaro estas formações como algo com um aspecto mais mais lúdico. É sempre bom saber mais, para poder apreciar os vinhos”, diz. O conhecimento ajuda no momento da escolha. “Pode ser tudo mais fácil na compra, na escolha de vinhos nos restaurantes, até aprender a combinar quais são aqueles que ficam melhor com certos tipos de comida. Isso faz bastante diferença”, refere Sofia Bobone. Para a designer, os vinhos deixaram de ser um tema masculino, apesar de continuar a haver mais críticos nesta área. “Há muitas mulheres que têm interesse, gostam e são apreciadoras. Na altura dos nossos pais, as mulheres bebiam muito menos, hoje em dia já não há essa diferença.”
Sofia Margarida Mota EventosCurtas | Sound & Image Challenge com a maior adesão de sempre O Sound & Image Challenge volta a marcar o final do ano, desta feita com um número recorde de participações. A organização destaca não só a quantidade de filmes recebidos, como a qualidade que coloca a iniciativa local na corrida dos melhores festivais independentes do mundo [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] festival Sound & Image Challenge 2016 já tem cartaz e vai mostrar curtas-metragens entre 6 a 11 de Dezembro. A edição deste ano integra temas do quotidiano actual e, além das películas em competição, conta com filmes da China Continental, Taiwan, Macau, Singapura, Filipinas, Tailândia e Portugal, numa secção extra. No total são 64 curtas a ser exibidas no Teatro Dom Pedro V e 50 filmes que vão ocupar a tela da Cinemateca Paixão. Lúcia Lemos, responsável pela Creative Macau – a entidade organizadora do evento – mostra-se excepcionalmente satisfeita com a quantidade e a qualidade das curtas-metragens que foram recebidas pela entidade, tanto na secção extra, como para as secções “Shorts” e “Volume”. “Além das 1650 inscrições que deram entrada no Centro das Indústrias Criativas, a iniciativa conta ainda com 41 filmes, além dos candidatos”, sublinha. “Embora as curtas-metragens nas duas categorias de competição não devam exceder 15 ou 30 minutos, recebemos um número recorde de trabalhos vindos de todo o mundo”, diz Lúcia Lemos, na nota de apresentação do festival. A responsável frisa ainda a qualidade que marca a edição deste ano. “Gostaríamos de realçar a tremenda qualidade dos filmes que recebemos e de destacar o tratamento de temas globais actuais, como é o caso dos campos de refugiados em várias regiões do mundo”, menciona Lúcia Lemos na mesma nota. Fará também parte do programa uma masterclass e a participação de profissionais do cinema. A master estará a cargo de Cheng Liang, que apresentará a sua curta-metragem “City of Black and White”, um filme composto por três histórias mudas. Filmes do mundo Os filmes selecionados para as competições “Shorts” e “Volume” vieram dos Estados Unidos, Europa, Médio Oriente, América do Sul, Sudeste Asiático, China e Macau o que, segundo Lúcia Lemos, “mostra que um número crescente de realizadores tem interesse por um festival de cariz independente e sem ser convencional”. Para a responsável, a adesão poderá ter que ver com as particularidades do território anfitrião: “Um festival possivelmente inspirado pelos sedutores 450 anos de história que Macau possui enquanto ponto de encontro entre o Oriente e o Ocidente”. Lúcia Lemos não deixa de mencionar o papel do cinema enquanto forma de comunicação. “O cinema é o tipo de entretenimento mais democrático, porque nos permite a ligação a outras culturas sem as invadirmos e tem o poder de mudar vidas alterando a percepção do mundo real”. O Festival Internacional Sound & Image Challenge tem como objectivo, nas palavras de organização, “tornar-se uma referência no âmbito de festivais deste género”. Programa 6 de Dezembro Cerimónia de Abertura no Teatro D. Pedro V – 19h 7 de Dezembro Projecção de filmes extra com conversa depois da exibição – 14h às 22h Masterclass do realizador Cheng Liang – 19h 8 de Dezembro Projecção dos filmes nomeados para a secção “Shorts” – 9h30 às 22h 9 de Dezembro: Projecção dos filmes nomeados para a secção “Volume” com conversa depois da exibição – 14h às 15h Projecção de filmes extra com entrevistas após a exibição – 15h30 às 17h Cerimónia de gala de entrega de prémios – 19h às 21h30 Cinemateca Paixão 10 de Dezembro Projecção de filmes nomeados das secções “Shorts” e “Volume” – 14h às 22h 11 de Dezembro Projecção de filmes extra – 14h às 15h30 Projecção de filmes nomeados da secção “Shorts” – 15h30 às 22h
Andreia Sofia Silva EventosMais de 60 artistas participam na “6075 Macau Hotel Art Fair” Começa esta quinta-feira a segunda edição do evento “6075 Macau Hotel Art Fair”, que vai mostrar obras de arte de mais de 60 artistas pelas paredes dos quartos do Hotel Regency. Pela primeira vez, a Fundação Stanley Ho participa ao patrocinar um prémio [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] habitual verem-se obras de arte em galerias ou em espaços maiores de exposição, como feiras, mas desta vez os amantes da pintura poderão vivenciar a arte de outra forma. A partir desta quinta-feira e até domingo, o Hotel Regency, na Taipa, acolhe a segunda edição da “6075 Macau Hotel Art Fair”, onde quadros de cerca de 60 artistas, vindos de várias regiões da Ásia, estarão expostos nas paredes dos quartos e nos corredores. Após a primeira edição, organizada em Janeiro deste ano, os promotores decidiram apostar nas obras de arte de artistas nascidos após 1975 – daí os números “6075”. De Macau participam 11 entidades, sejam galerias de arte ou artistas em nome individual, incluindo a AFA – Art for All Society. De Hong Kong chegam trabalhos de quatro galerias, enquanto a China domina em termos de participações, com 15 entidades. Além de Taiwan, que também esteve representada na primeira edição, a Macau Hotel Art Fair contará com a presença dos trabalhos da Myanmar Ink Art Gallery, constituindo uma estreia no território. A segunda edição fica também marcada pelo lançamento de uma nova área artística, intitulada “Special Discovery”, e que se dedica a abordar apenas uma forma de arte. Esta conta este ano com a participação da Academia de Arte da China. Outra das novidades prende-se com a participação da Fundação Stanley Ho, que patrocina o prémio “Dr. Stanley Ho Foundation Art”. Este visa “seleccionar potenciais artistas com performances excepcionais por forma a apoiar o seu futuro desenvolvimento e encorajar novas criações”. O Governo faz-se representar através do apoio concedido pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) na divulgação de jovens artistas de Macau. Terra dinâmica “Os artistas vão trazer vitalidade a cada quarto de hotel ao apresentar os seus projectos a solo. Ao exibir trabalhos de artistas emergentes e ao colaborar com galerias, tal como curadores e críticos, a segunda edição da 6075 Macau Art Fair irá estabelecer-se como uma plataforma de trocas culturais e de ligação com agentes e artistas de grande potencial”, apontam os organizadores. O facto de o evento se realizar num hotel constitui “uma forma inovadora de mostrar a arte ao público, para que a audiência possa observar a arte de diferentes ângulos e perspectivas e estimular mais as emoções e a imaginação”. A organização deste evento está a cargo da leiloeira Poly Auction e da entidade SOCIL cultural, criada este ano para “expandir o desenvolvimento das indústrias da arte e cultura”, que pertence a Sabrina Ho, filha de Stanley Ho. O objectivo da exposição no Hotel Regency é proporcionar “uma plataforma para as trocas culturais e a conexão de coleccionadores de arte com obras de grande potencial”, além de tentar “promover o turismo local” e mostrar Macau como uma “capital artística jovem e dinâmica”. Quanto à primeira edição, os organizadores falam de “sucesso” em termos de vendas, tendo sido vendidas cerca de 500 obras, sendo que atraiu “um notável número de visitantes, incluindo coleccionadores e entusiastas da arte”.
Andreia Sofia Silva EventosMercado de Natal no Albergue mostra trabalho de 16 artesãos locais [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] já no próximo dia 3 de Dezembro que o Albergue acolhe a primeira edição do Mercado de Natal, uma ideia que partiu de Cátia Silva, gestora da empresa de eventos Bad Bad Maria. São 16 os artesãos locais que vão mostrar os seus produtos, seja comida, artigos de decoração, roupas ou acessórios. “Este evento nasce precisamente da paixão que tenho por artesanato. Juntando três factores, a época do ano, um sítio lindíssimo como é o Albergue e esta vontade de fazer coisas novas, pensei em promover um evento que pudesse proporcionar um dia diferente”, contou ao HM Cátia Silva, que tem a responsabilidade da organização de toda a iniciativa, que tem o patrocínio do Albergue SCM. “O projecto serve para apoiar os artesãos locais que fazem coisas à mão, quer seja roupa, comida, acessórios, decoração. Tentámos apoiá-los e promover um evento ligado à época natalícia, e aí surge esta sinergia. Espero que haja mais edições. O projecto foi apresentado há algum tempo e tem sido uma loucura (em termos de organização). Mas é efectivamente uma coisa que gosto de fazer”, disse ainda. A primeira edição não pretende, para já, apoiar projectos de cariz social, mas poderá fazê-lo um dia, confirmou a mentora do Mercado de Natal. “Enquanto projecto inicial não pensámos em acções de caridade, mas temos um participante, o Le Petit Chef, e os lucros dos produtos que venderem vão para uma obra de caridade. O projecto inicial foi feito só para apoiar os artesãos locais e promover um evento de Natal. Mas nas próximas edições podemos pensar nisso.” Para Cátia Silva, são necessárias mais iniciativas deste género para promover o trabalho artesanal que é feito por muitas mãos, sem grande conhecimento do público. “É necessário este tipo de eventos para envolver a comunidade. Todas as pessoas que fazem estes trabalhos, a maior parte, não têm negócios, uma loja. É uma oportunidade única de mostrarem o trabalho que fazem ao longo do ano.” O Mercado de Natal tem entrada gratuita e as portas estão abertas entre as 11h e as 19h.
Hoje Macau EventosVídeo | Festival experimental com edição dedicada a Portugal O EXiM 2016 olha para Portugal. O evento selecciona, em cada edição, um país ou região para poder mostrar o que de melhor na área do vídeo por lá se faz. Este ano traz de Portugal o vídeo experimental, com destaque para o trabalho feito no feminino [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] “um festival diferente”, classifica José Drummond, um dos curadores, a par com Bianca Lei, de mais uma edição do festival dedicado ao vídeo experimental, o EXiM 2016. “É um festival diferente no sentido em que não tem candidaturas e os filmes projectados são uma escolha. É ainda um evento que tem como alvo o que se faz a nível experimental, como indica o próprio nome”, explica ao HM. Tem a direcção de Bianca Lei, que nesta edição divide com José Drummond a curadoria. “As projecções de Macau ficaram a cargo da Bianca Lei e eu com as de Portugal.” Na origem da iniciativa está a ideia de que cada ano seja dedicado a um país que irá dividir a participação com Macau. Esta edição é dedicada a Portugal. O critério de escolha das apresentações que vão acontecer no Armazém do Boi é essencialmente a diversidade. “Em vez de fazer três screenings semelhantes, a nossa aposta de imediato foi em ter uma sessão mais variada e ter uma maior diversidade de práticas, que pudesse, de alguma forma, fazer um bocadinho o panorama do que se tem feito nos últimos cinco ou dez anos com artistas realmente diferentes ou a trabalharem o vídeo de uma forma diferente”, explica José Drummond. A título de exemplo, o curador refere os trabalhos de Rui Calçada Bastos, José Carlos Teixeira, Bruno Campo e Carla Carreira e António Júlio Duarte. O evento é marcado, após a sessão de abertura de sexta-feira que junta artistas locais e portugueses, por uma aposta no trabalho feito no feminino, com as projecções de Tatiana Macedo e de Mariana Viegas. A razão é, segundo o curador, a necessidade de dar mais espaço a que os trabalhos feitos por mulheres sejam apresentados. “Tenho insistido muito em que, de algum modo, a presença feminina se destaque, de modo a poder dar contextos associados a esse mundo que é particular”, explica. José Drummond considera que “as mulheres têm de ter mais espaço”. “Ainda não é suficiente porque, além do modo e sensibilidade de abordagem das mulheres ser especial, essas coisas têm de começar a ter a mesma presença e balanço também no vídeo para podermos ser mais justos”, diz. Ao falar das escolhas que fez, em particular para a edição de 2016 do EXiM, o curador explica “Mariana Viegas está a viver na Dinamarca e Tatiana Macedo tem estado numa residência em Berlim. Enquanto ponto de ligação é o facto de serem ambas artistas portuguesas que não estão no seu país”. Além da mulher As duas artistas partilham ainda o facto de terem trabalhado anteriormente em fotografia. Mas, no que respeita ao vídeo, apresentam abordagens nada semelhantes, apesar de nenhuma das duas se centrar na questão do género ou de assuntos relacionadas. “São trabalhos diferentes e o que acho curioso é que, no trabalho delas, não há uma tentação do feminino no sentido em que as artistas não demonstram preocupações mais directamente ligadas ao mundo das mulheres: a maternidade, por exemplo. No caso destas autoras isso não acontece, sendo que a sensibilidade feminina está lá.” Para Drummond, “quando se vê um trabalho feito por uma mulher, percebe-se isso mesmo”. Mariana Viegas, segundo Drummond, já na sua obra fotográfica mostra uma paixão muito intensa de contraste entre ruínas e seres vivos. “O trabalho dela estabelece essa relação entre um espaço em geral de ruínas e a continuação de uma outra qualquer existência. Sem que se note que seja forçado, há um olhar sobre a morte, sobre uma ideia qualquer de um apocalipse que, mesmo assim, deixará que continue a existência.” No entanto, “esta é uma leitura pessoal e feita no vazio”, salvaguarda o curador. O trabalho da Tatiana Macedo aparece como um trabalho “muito interessante” que pega no título de uma canção do Leonard Cohen – “Seems So Long Ago, Nancy”. É um vídeo de 45 minutos, é uma visão, sobre um museu em especial, o Tate Gallery, e é feito a partir do olhar dos seguranças e funcionários do espaço. “O protagonista não é o público ou as obras, mas sim as pessoas que trabalham no museu, aquelas pessoas que estão ali chateadas num canto, sentadas numa cadeira. É um trabalho com uma poética muito interessante na forma como aborda temas como o tédio e o vazio, é uma visão depurada do que é um museu a partir da perspectiva dessas pessoas.” A experiência As projecções encerram no serão de domingo com o trabalho de José Maçãs de Carvalho, que também faz a transição da fotografia para o vídeo, embora o trabalho que tem vido a desenvolver seja essencialmente marcado pelo carácter experimental. “Na fotografia de José Maçãs de Carvalho existe sempre um lado conceptual muito forte, enquanto no vídeo há uma tentativa de experimentar caminhos que o vídeo proporciona.” O autor tem várias pequenas peças em que apresenta coisas diferentes de como trabalhar este meio e, “ao longo da sua carreira, foi apontando caminhos diversos de como o fazer”. Programa EXiM 2016- Portugal and Macao Experimental Video Festival Local: Armazém do Boi | 25, 26 e 27 de Novembro Sexta-feira 19h – Artistas: Natercia Chang Sio Weng, Joein Leong, Ella Lei, Yves Etienne Sonolet, Ray Chu, Carla Cabanas, Nuno Cera Sábado 16h – Trabalhos de Tatiana Macedo e Mariana Viegas 19h – Trabalhos de Ray Sun Ruey Horng, Lei Cheok Mei, Ieong Kun Ieng , Suki Chan , Ivy Choeng , Fish Leong Ka Ian, Sam Kin Hang, Jack Yau, William Kwok, Napx, Leong Hou Un, Paula Lo, Natercia Chang Sio Weng e Ray Chu Domingo 16h – Trabalhos de Nuno Cera, Bruno Ramos, José Carlos Teixeira, António Júlio Duarte, Carla Cabanas & Rui Calçada Bastos 19h – Trabalhos de José Maçãs de Carvalho
Isabel Castro Eventos MancheteDocLisboa | O Chá Gordo de Catarina Cortesão Terra e Tomé Quadros Fazem documentários sobre Macau porque é neste exercício onde a realidade toca a ficção que vão, também eles, pensando na cidade onde vivem. Catarina Cortesão e Tomé Quadros encontraram no chá gordo a formação de uma comunidade de fusão, o tempo do território. Para que a memória, que ainda existe, se viva já. [dropcap]“C[/dropcap]há Gordo de Memórias” é apresentado hoje ao final da tarde no âmbito da extensão a Macau do DocLisboa, uma iniciativa organizada pelo Instituto Português do Oriente. Não é o vosso trabalho mais recente. Catarina Cortesão (C.C.) – Não, não é. Este documentário foi feito no âmbito do Macau DocPower, com o apoio do Centro Cultural, em 2013/2014. Pelo facto de haver tempos muito curtos para a apresentação da ideia, filmagem e edição, dentro dessas limitações e do apoio que nos deram, iniciámos o projecto sobre o chá gordo. Começámos a fazer a nossa pesquisa, começámos a falar com vários intervenientes da comunidade macaense para nos informarmos sobre quem eram os grandes cozinheiros. Munimo-nos do nosso conselheiro, Fernando Sales Lopes, que estuda a gastronomia macaense há vários anos – tem uma tese de mestrado, é um investigador ligado a essa área, na vertente da gastronomia macaense como sinal identitário da própria comunidade. Tivemos várias conversas com ele, foi-nos apontando caminhos, também construímos os nossos. Fomos vendo quem eram os cozinheiros mais emblemáticos – Aida de Jesus, Graça Pacheco Jorge, Rita Cabral, Carlos Cabral, Cíntia Conceição Serro. Destas conversas que fomos tendo, mais questões foram surgindo em relação à gastronomia macaense e o projecto cresceu. E cresceu numa determinada direcção. E que direcção foi essa? C.C. – Não queríamos fazer uma mera peça jornalística, esclarecedora do que é o chá gordo dentro da gastronomia macaense – pelo contrário, queríamos fazer uma narrativa fílmica a partir da mesa do chá gordo, onde estão os principais pratos da gastronomia macaense. Olhamos para a mesa do chá gordo, que é extensa, e nela vemos definidos não só o percurso e o que é a comunidade macaense, mas também o percurso dos portugueses até chegarem a Macau. Verifica-se o uso de ingredientes de Malaca, de Goa, de Angola, de Moçambique, e modos de confecção que, por sua vez, reflectem a aliança entre a cultura portuguesa gastronómica com a cultura chinesa, que também é bastante marítima. Daqui nasceu a primeira gastronomia de fusão, que é a gastronomia macaense. Dizia que, quando se olha para a mesa do chá gordo, vê-se a comunidade. C.C. – Vê-se a comunidade e a história de Macau dos últimos 300 ou 400 anos. Isso é muito notório logo na primeira percepção e mais ainda quando se tenta saber de onde vêm os pratos e se fala com as cozinheiras, quando elas apresentam os livros de receitas. São autênticos tesouros, na medida em que vão circulando entre as melhores cozinheiras ou são cedidos às pessoas da família com mais apetência para continuar esse espólio e dar bom nome à família através dessa mesa. Quando as pessoas achavam que não havia alguém que pudesse continuar com esse testemunho de uma forma destacada na comunidade macaense, levavam os livros de cozinha para a cova. Ou seja, não transmitiam as receitas, não as partilhavam. Há receitas da Graça Pacheco Jorge, do livro que era da tia, em que está escrito em baixo ‘não partilhar esta receita com qualquer pessoa’. Como é que se faz uma abordagem mais cinematográfica a um tema que facilmente pode cair, em termos de tratamento, num documentário do género jornalístico? Tomé Quadros (T.Q.) – Procuramos, de alguma forma, seguir a máxima de John Grierson, quando diz que o documentário deve ser abordado de uma forma criativa – isto dito no final da década de 20 do século passado. Significa que pretendemos fugir do documentário como uma peça jornalística e encará-la como narrativa fílmica tout-court. Procuramos com isso introduzir mecanismos da ficção no documentário, procuramos dirigir os nossos entrevistados, na medida do possível, como se de actores se tratassem, procuramos ter um cuidado estético bastante grande – e não só, em termos de continuidade, de racord também –, para que tudo faça sentido. Desta forma, introduzimos um narrador presente – a Nair Cardoso, uma jovem macaense – que, no fundo, conduz o espectador pelas diferentes estórias que fecham este todo que é a narrativa fílmica acerca do chá gordo. Temos um fio condutor, uma história, que coincide com a realidade: a Nair regressa a Macau passados alguns anos de ter ido para Portugal e vem à procura de um livro de receitas que era do avô macaense. O livro tinha sido escrito pela avó chinesa, que tinha aprendido para que toda esta gastronomia macaense existisse em casa. Há um dia em que encontra este livro no sótão da casa e guarda-o. Vai procurar, através do livro, as raízes da identidade, memória e cultura macaenses. Claro que houve uma transformação muito grande da simbiose homem-cidade, mas essa memória, a cultura e a identidade perduram. É um documentário para memória futura? T.Q. – No fundo, o que procurámos com o documentário é que sirva como um espelho, que a própria comunidade se veja ao espelho. Por exemplo, na questão das receitas, é muito complicado ter acesso e foi um dos maiores obstáculos, mais do que até ganhar confiança da parte dos intervenientes. Assistimos a um momento talvez único: a Cíntia Conceição Serro cedeu aos arquivos do Instituto Cultural todo o espólio que tinha herdado em termos de receitas e manuscritos escritos. Temos isso no documentário. É interessante ver que também há uma tomada de consciência por parte dos intervenientes, de que afinal esta memória deve ser mantida. Não são realizadores profissionais, na medida em que têm outras ocupações. Há vários anos que fazem documentários sobre a cultura de Macau. Como é que conseguem ir trabalhando nesta área, que exige todo um processo de pesquisa? Sentem muitas dificuldades? C.C. – Temos bastantes dificuldades pelo facto de sermos uma equipa muito pequena. Eu e o Tomé fazemos 80 por cento do trabalho. Depois contamos com o Daniel Saraiva para o som e agora temos uma nova pessoa que nos está a ajudar, o João Cordeiro. Temos ajuda nas filmagens e coloração. Nestes processos temos arranjado sempre alguém que nos ajuda por ser especialista na matéria. É muito difícil porque temos vidas profissionais exigentes e as nossas famílias. Isso faz com que exista alguma pressão, e de alguma forma, o tempo nos escape. O tempo que é dado aos projectos no Centro Cultural é muito pequeno, em seis meses temos de fazer tudo, o que cria muita pressão, mas são opções que fazemos. Temos de gerir muito bem o tempo. Somos bastante curiosos e gostamos de ter a percepção daquilo que acontece. Em Macau ainda não existe essa memória construída em termos de narrativas fílmicas. Sobre o chá gordo não há nada, apenas alguns episódios em que as pessoas descrevem o que poderá ser, mas algo muito insípido. O grande desafio é que adoramos filmar e editar, e apreciamos o produto final. Depois de estar feito, passamos para outro, porque queremos fazer cada vez mais. Já estou a pensar no projecto seguinte. T.Q. – O cinema foi o lugar que nos deu a conhecer um ao outro e foi onde a memória futura teve lugar. A Catarina tinha alguma formação e trabalho feito em fotografia, com uma grande base no teatro, e com grande desejo de desenvolver algo na área do cinema. Partilhávamos o mesmo olhar e as mesmas preocupações, e procurávamos fazer cinema em conjunto. Eu trazia a formação da Escola das Artes do Porto, em som e imagem. Se calhar trazia um olhar mais formatado e menos livre, e a simbiose com um olhar mais livre e outro mais técnico resultou. O documentário surgiu como o modelo de pensar o cinema mais apropriado porque nós, além da questão do cinema, tínhamos a vontade muito própria de falar de Macau, que nos apaixona. Sentimos que havia um vazio por preencher. Havia que começar a trabalhar sobre a memória, cultura e identidade de Macau, e encontrámos o formato certo. Já estão a pensar no próximo documentário? T.Q. – Temos o “Time of Bamboo”, que está quase terminado, foi o projecto deste ano, que vem na sequência da memória de Macau. Há um paralelismo com o chá gordo em termos do conhecimento que passa de geração em geração. Não há um livro do saber do bambu, como as estruturas são calculadas. Tentamos fazer uma ponte entre o legado e aquilo que pode vir a ser o futuro do bambu. C.C. – Em relação a projectos de futuro, ando interessada sobre a questão linguística. Ando a reflectir porque é que é difícil ao estrangeiro falar chinês e as crianças não têm acesso à aprendizagem da língua. Não são apenas os portugueses, mas os estrangeiros em geral. Porque é que isso não acontece nas escolas? Qual é a questão, o problema? Tem que ver com uma questão de vivência? Acho que seria um tema interessante para fazer um documentário. Apetece-me fazer um documentário sobre crianças e jovens dentro dessa questão linguística, das diferenças das línguas, o ‘lost in translation’. Comecei a escrever um guião, embora seja para uma curta-metragem, que reflecte essa faixa etária. Mas é uma história que tem algumas aventuras, à volta dos portugueses, chineses e macaenses. É sempre esse o meu ponto de reflexão.
Sofia Margarida Mota EventosArnaldo Gonçalves organiza ciclo de palestras sobre religião “Há um regresso do sagrado à preocupação das pessoas” [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] “Sagrado e o Profano – Diálogos no Delta do Rio” é o lema do ciclo de palestras que tem início no próximo dia 25, pelas 18h30, na Livraria Portuguesa. Uma iniciativa do Fórum Luso Asiático que pretende discutir a religião e o seu papel na sociedade contemporânea. Arnaldo Gonçalves fala ao HM da motivação que deu origem à iniciativa De onde partiu a ideia para o tema do ciclo “O Sagrado e o Profano – Diálogos no Delta do Rio”? A ideia de fazer um ciclo de palestras acerca da religião veio de um sentimento que se foi acumulando ao longo do tempo. Achei interessante pegar numa temática que ainda não foi tratada em Macau mas, sobretudo, porque se sente que há uma grande inquietação. Enquanto cientista social, sinto que há um regresso do sagrado à preocupação das pessoas. Durante muito tempo, desde Weber no século XIX, que se começou a acreditar que as pessoas não precisavam da religião para nada e que a religião era uma coisa já acabada, de séculos anteriores, e que só através da ciência e do uso da razão é que as pessoas podiam descobrir a felicidade. Esta ideia, de alguma forma, revelou um mito com pés de barro, porque as pessoas procuram sempre algo. Que encontram na religião? Nesse aspecto assistimos, um pouco por todo o mundo, ao regresso das preocupações de foro religioso – num sentido diferente em relação a outros períodos, porque não é tanto um retorno às chamadas religiões institucionais que têm igreja, um corpo hierarquizado, um clero ou um dogma, mas sim um regresso a múltiplas formas de espiritualidade. Achei que era interessante trazer este tema que, no fundo, se trata do confronto entre o sagrado e o profano, isto é, o confronto entre o apelo à religião e um mundo material que é o que nos rodeia. É no cruzamento de ambos que foi associada uma outra ideia que, pessoalmente, sempre achei curiosa no budismo, e que é a questão do “rio”. O budismo é uma religião que acredita na reencarnação e que nós vamos num rio a atravessar de uma margem à outra. As próprias escolas do budismo são definidas de acordo com esta analogia da jangada pequena e da grande jangada. Aqui temos o Rio das Pérolas e, por outro lado, a metáfora ao rio também representa um caminho. Um rio é uma coisa que não pára, é uma fluência que não é estática porque nunca voltamos a repetir a mesma secção do trajecto e experimentamos sempre partes novas. Vamos também abordar as grandes religiões monoteístas que são as que se impõem à nossa cultura, mas também outras não monoteístas e que estão muito enraizadas, especialmente aqui na Ásia, sem esquecer outras formas de espiritualidade que, se tivermos tempo e houver público, iremos tratar. Falou de um regresso às preocupações religiosas e ao sagrado. O que é que está a acontecer socialmente para que se esteja a assistir a essa transformação? Penso que é uma resposta, de certa forma, a uma instabilidade que se sente no mundo. O mundo nunca esteve tão instável como agora. Neste momento somos confrontados com surpresas praticamente todas as semanas acerca de coisas que acontecem e põem em causa o que podemos chamar de uma certa normalidade. Isto traduz-se na tal intranquilidade vivida pelas pessoas. As pessoas não se sentem seguras, estão preocupadas com os problemas que possam ter. Por exemplo, quando viajam estão mais preocupadas com isso, no contacto com outras comunidades que desconhecem também não se sentem seguras e essa intranquilidade não é resolvida pelos governos, não é resolvida pelos sistemas políticos. E é uma coisa que fica no coração das pessoas. É aí que a religião tem um papel? Sim, acho que esse apelo à religião representa a procura de uma iluminação e de uma paz interior. É algo que as pessoas pouco a pouco têm descoberto enquanto forma de usufruírem daquilo que têm, de se conhecerem a si próprias e de terem uma relação de abertura em relação ao outro que desconhecem e de que desconfiam, porque é diferente, porque ora diferente ou porque pensa diferente. Acho que esse apelo é consistente. O ciclo de palestras vai abrir com a temática do Islão. Alguma razão em particular? Não foi intencional, mas é a religião da maioria da população asiática. Por outro lado, há uma grande curiosidade pessoal em relação ao Islão que também passa pela formação em estudos internacionais e pelos actuais estudos que estou a desenvolver há três anos que abordam os estudos religiosos. O Islão é a religião mais praticada na Ásia, tem um bilião de seguidores nesta região do mundo. Acabou por se juntar o útil ao agradável e começar por tentar perceber o que é o Islão, como é que é uma doutrina que dá resposta à intranquilidade das pessoas, como é que o apelo ao divino pode preencher uma parte desta inquietude. A seguir ao Islão o que é que vem? A segunda palestra vai debruçar-se no judaísmo. Vai ser dada por um professor da Universidade de Macau, judeu praticante e um fervoroso conhecedor do Antigo Testamento. Prevemos ter o evento no início de Janeiro, mas depende da disponibilidade do espaço. Depois seguem-se o cristianismo, o budismo e por aí fora. Como é que se vai organizar cada palestra? Queremos que seja uma conversa em que o convidado faz a exposição acerca da forma como vê a religião e em que há espaço para que o público coloque as suas questões, de modo a suscitar um debate. Qual é a sua relação com a religião? Não tenho qualquer religião. Mas por exemplo o professor James D. Frankel, que vai abrir este ciclo de palestras, é uma pessoa muito interessante. Tem formação em Estudos Comparados na religião e é um convertido ao Islão. Pessoalmente acho curiosíssimo que um americano, formatado pela cultura em causa, branco, caucasiano, tenha sentido este apelo. O que é que o Islão lhe terá trazido para que se tivesse convertido? Comecei a viajar muito cedo por uma série de países islâmicos e, da experiência que tenho, a imagem que nos dão do Islão, nebulosa e bélica, não corresponde à realidade que vi nestes países. É uma religião doce. Nunca senti a pressão de que tanto se fala. Como vê a religião em Macau? Em Macau, a religião cristã tem um peso muito forte e somos levados a pensar que é a única que existe, até porque é o fio ideológico da comunidade macaense. Mas também temos o budismo que é a doutrina praticada pela maioria. O Islão aqui é praticado por uma pequena comunidade que nem templos tem e é pouco visível, mas que integra pessoas de várias comunidades. Esta palestra só é possível com a ajuda da associação muçulmana local que me auxiliou na escolha do perito orador e nos contactos que fiz.
Hoje Macau EventosMIFF – Seis dias para a sétima arte Filmes em competição e fora dela, bailarinas que sonham maior, prémios e estatuetas, masterclasses e galas. Aqui fica uma ideia do que vai poder ver entre 8 e 13 de Dezembro [dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão 11 os filmes que vão estar em competição na primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau (MIFF, na sigla inglesa). Divididas as projecções entre o Centro Cultural e a Torre de Macau, as películas vão disputar nove prémios, entre os quais o melhor filme, o melhor realizador, os melhores actor e/actriz e o melhor argumento. O júri é presidido por Shekhar Kapur, cineasta indiano que conta com um vasto currículo, de onde se destaca “Elisabeth”, nomeado para sete Óscares e vencedor de dois, e galardoado com cinco BAFTA, entre os quais o prémio para melhor filme. Da secção de competição fazem parte “150 miligrams” (França); “Free Fire” (Reino Unido); Gurgaon (Índia); “Hide and Seek” (China); “Queen of Spades” (Rússia); “Survival Family” (Japão); “The Winter” (Argentina) e “Trespass Against Us” (Reino Unido). Os filmes juntam-se a “Elon não acredita na morte”, do brasileiro Ricardo Alves Jr, em estreia internacional e que tem como protagonistas Rômulo Braga e Clara Choveaux, e a “São Jorge”, do realizador Marco Martins, que valeu a Nuno Lopes o Prémio Especial de Melhor Actor atribuído pelo júri da secção “Orizzonti” do Festival Internacional de Cinema de Veneza, em Setembro. É a primeira vez que “São Jorge”, que conta a história de um pugilista desempregado que se vê obrigado a trabalhar em cobranças de dívidas para sobreviver, pode ser visto na Ásia. De destaque nesta secção é ainda a realização da local Tracy Choi, “Sisterhood”, que tem agora a sua estreia marcada. Estreia a dançar “Polina”, filme francês realizado por Valérie Müller e Angelin Preljocaj, marca a abertura do Festival Internacional de Cinema de Macau. O filme conta a história de uma jovem russa que sonha desde a infância com uma oportunidade no Bolshoi. Cansada da disciplina a que está submetida, a bailarina vai para França onde abandona o ballet clássico para se aventurar no mundo da dança contemporânea. “Polina” conta com as interpretações de Juliette Binoche e Anastasia Shevtsova. O MIFF é composto por mais quatro secções de competição: “Gala”, “Dragões Escondidos”, “Crossfire” e “Cinefantasy”. Momento de oportunidade Ainda no programa está o “Crouching Tigers Project Lab” que integra, entre 9 e 11 de Dezembro, palestras, oficinas e painéis destinados ao debate entre profissionais do sector. É aqui que poderão ser criadas alianças para avançar com projectos cinematográficos. As ideias em cima da mesa são 12 e estão divididas em três categorias: género, autor e parceiros associados. Os vencedores serão distinguidos com prémios monetários: um no valor de 20 mil dólares — atribuído pela Fox International Productions — e outro de 10 mil, concedido pela Ivanhoe Pictures e Huace Media. Entre os candidatos estão dois projectos portugueses, “Peregrinação”, de João Botelho, e “San Ma Lo 270”, de João Pedro Rodrigues e Rui Guerra da Mata. Para os jovens talentos, essencialmente os locais, o MIFFA tem, desde segunda-feira, as inscrições abertas para um concurso de curtas-metragens. Os candidatos interessados têm até 30 de Novembro para enviar os seus projectos. A conversar é que se aprende Não há festival de cinema sem masterclasses e Macau não é excepção. Apesar da tímida estreia com duas sessões agendadas, consta do programa a master com Gianni Nunnari, e outra com Tom McCarthy e Bobby Cannavale. Ambas agendadas para 10 de Dezembro, sabe-se já que o tema abordado por McCarthy será o uso de histórias pessoas na arte de contar, enquanto Cannavale irá abordar a relação entre realizadores e actores. O MIFF é organizado pela Direcção dos Serviços de Turismo de Macau e pela Associação de Cultura e Produções de Filmes e Televisão de Macau (MFTPA). Conta com um orçamento de 55 milhões de patacas, dos quais 20 milhões são garantidos pelo Governo.
Sofia Margarida Mota EventosHelena de Senna Fernandes: “A minha responsabilidade é dar continuidade aos trabalhos” Helena de Senna Fernandes assumiu a representação da primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau. Uma posição repentina que vem na sequência da demissão de Marco Mueller da direcção do evento. A também directora dos Serviços de Turismo fala da sua “inesperada” função e do acontecimento pelo qual dá a cara [dropcap]H[/dropcap]erdou a representação repentina da primeira edição do Festival de Cinema Internacional de Macau. Como é estar neste papel? É verdade. Foi uma situação inesperada mas, depois de termos recebido a notícia da demissão de Marco Mueller na noite de sexta-feira, impunha-se a manutenção da estabilidade da organização. A demissão do director não é positiva, nesta altura do campeonato, sobretudo numa altura em que estamos na fase final de preparação do evento. Depois de falarmos com os consultores internacionais do festival, era necessário transmitir confiança aos nossos parceiros e ao nosso público. Era necessário alguém que substituísse Mueller na direcção e não seria justo convidar outro director para continuar o trabalho que outra pessoa já tinha feito. Não seria agora que iríamos mudar alguns dos conceitos que foram deixadas por Marco Mueller. Neste sentido, a melhor solução foi a presidência da comissão organizadora assumir a representação do evento. Não tenho experiência na área do cinema, mas considero que a minha responsabilidade é dar estabilidade e continuidade aos trabalhos que ainda têm de ser realizados de modo a garantir o sucesso do projecto. Quais são, agora enquanto representante, as expectativas para o MIFF? Para já, o mais importante é dar continuidade ao evento, principalmente no que respeita à promoção dos jovens de Macau que têm o sonho de fazer os seus próprios filmes. A intenção é avançar com a ideia de tornar a iniciativa numa plataforma em que os cineastas locais consigam ter uma oportunidade para darem a conhecer ao exterior os seus trabalhos. Penso que esta é uma forma privilegiada de dar a conhecer as indústrias criativas de Macau. Também tencionamos, através do festival, dar uma oportunidade para que seja criado um público local, ou seja, para que os residentes possam ter acesso a mais géneros de cinema. A ideia é que o público conheça, não só o cinema comercial, mas que também tenha acesso e comece a apreciar filmes mais artísticos. Esta é uma altura em que as pessoas de Macau podem abrir mais os olhos para que, eventualmente, esteja aberta a possibilidade de criar uma indústria nesta área. Queremos também criar os consumidores destes produtos que são os filmes. Tem de existir gente que assista e compre, nós temos de criar esta componente referente às audiências de Macau. Falou de indústria do cinema mas Macau não tem essa dinâmica. Em que é que o MIFF vai ajudar, concretamente? Acho que essa ajuda não se vai verificar já. Esta é a primeira edição e não se pode esperar esse tipo de retorno imediatamente. Quando olhamos para este festival, temos de estar conscientes de que não estamos só a projectar filmes ou a dar prémios. Estamos também a criar espaço para que a indústria internacional venha a Macau e possa conhecer o território. Existe também uma componente formativa e que é concretizada pela realização, por exemplo, de masterclasses. Para que haja uma indústria a funcionar tem de existir conhecimento e faz parte do evento promover isso também. Os jovens locais não devem ter apenas o sonho em ser realizadores, têm de ter conhecimento. Por outro lado, esta é uma indústria que deve desenvolvida passo a passo e não de um dia para o outro. Como estamos a iniciar este caminho, temos ainda de ter em conta que é importante trabalharmos muito com a China e mesmo com Hong Kong. A China, por exemplo, representa uma grande parcela de público de cinema e como tal, ao pensar na criação da indústria em Macau, temos de ter em atenção as perspectivas de entrada no mercado chinês e as colaborações que possamos vir a ter com cineastas da China Continental. É lá que está o grande público que irá consumir os produtos do cinema de Macau. É a directora do Turismo de Macau. Qual é o impacto do MIFF no sector? Claro que é importante utilizar este evento enquanto plataforma para promover Macau. Uma das questões é a promoção do território internacionalmente de modo a que seja mais conhecido e que mais pessoas queiram vir de visita. Por outro lado, e de muita importância, é a promoção da terra enquanto espaço de produção de cinema, ou seja, que Macau se torne capaz de chamar os cineastas internacionais para que cá venham fazer, por exemplo, a rodagem das películas. É fundamental esta aposta no sentido de que realizadores internacionais escolham a região para os seus cenários e, desta forma, projectar Macau para audiências internacionais. O embaixador do MIFF é Jang Keun Suk, um actor coreano essencialmente conhecido pelo seu trabalho em novelas. Qual foi o critério para esta escolha? Também estamos a falar de turismo e, desse ponto de vista, a Coreia é o nosso mercado mais importante. É uma estratégia de marketing turística? Sim. É uma estratégia para atrair os olhos dos coreanos para Macau. Na óptica do turismo, e agora falo enquanto directora do organismo, é importante ter um forte representante coreano porque é que aí que está o nosso grande alvo internacional. Neste momento, é um mercado que está a crescer na ordem dos dez por cento e, como tal, não foi ao acaso que escolhemos Jang Keun Suk como embaixador. Cannes ou Locarno são conhecidas precisamente devido aos festivais de cinema que acolhem. Poderiam ser desconhecidos, mas estão nas bocas do mundo e são destinos por muito apetecidos por serem uma referência da sétima arte. Acha que Macau pode vir a fazer parte dos destinos culturais associados ao cinema e com o contributo do MIFF? Locarno, Cannes e mesmo Hong Kong já são festivais com uma forte afirmação no mercado e já existem há muitos anos. Sim, acho que podemos pensar nisso como um objectivo a atingir no futuro. Não vamos pensar nisso como um objectivo que se atinge dentro de pouco tempo, mas podemos começar agora a criar um nicho próprio. Espero que com o tempo e com a continuação do trabalho possamos conseguir um lugar de relevo. Disse na conferência de imprensa de apresentação que o MIFF ainda iria ter algumas surpresas… Não posso ainda dizer quais serão porque a comissão ainda está em fase de contactos e negociações. Mas estamos a falar de convidados especiais que, esperamos, vão fazer do festival um evento mais completo. Gosta de cinema? Infelizmente não tenho possibilidade nem tempo para ir ao cinema. Vejo essencialmente através da internet, mas a altura em que dedico mais tempo a ver filmes é, realmente, dentro dos aviões. E sim, gosto de filmes e de diferentes géneros de cinema. Quais são os filmes da sua vida? O primeiro filme que me lembro de ver é o “Música no Coração” e este é realmente um filme de que gosto. É um filme que tenho sempre presente. Como é que vê este festival no futuro? Penso que vai ser estabelecido como um dos festivais de referência a nível mundial. Espero que seja, num primeiro passo, um festival obrigatório, primeiro dentro da Ásia, e com o tempo vá ganhando terreno ao nível internacional.
Hoje Macau EventosSemana da Bélgica traz artistas do país até Hong Kong [dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]ários artistas belgas têm obra exposta na região vizinha durante esta semana. Alguns são consagrados; outros são menos conhecidos. Há espaço ainda para o debate sobre as colecções e o investimento em obras de arte. São vários artistas que expõem pela primeira vez em Hong Kong, em dois espaços diferentes – o KEE Club e o ArtOne. As exposições têm a curadoria de Emilie Rolin Jacquemyns, uma cidadã belga residente na região vizinha. Sendo um dos países com mais coleccionadores de arte per capita, a Bélgica tem vindo a desenvolver-se como um centro importante para a divulgação do trabalho de artistas contemporâneos. A organização das exposições em Hong Kong destaca que as obras levadas até à antiga colónia britânica mostram não só artistas consagrados, mas também novos talentos da Bélgica, que espelham um país “rico em cultura e expressão artística”. Dos 13 nomes com trabalhos representados no KEE Club encontram-se Harold Ancart, Ann Veronica Janssens e Sophie Whettnall. Ancart foi recentemente distinguido pelo Financial Times como um dos artistas mais importantes do ano. Nascido em Bruxelas, vive e trabalha em Nova Iorque. A Hong Kong leva um único trabalho, sem nome. “Utilizando o espaço e a repetição nas suas instalações de arquitectura e nas obras em papel, o trabalho de Harold Ancart é frequentes vezes minimalista, com recurso a motivos como papagaios, a selva e palmeiras”, descreve a organização. Ann Veronica Janssens “utiliza a distribuição da luz, da cor e superfícies reflectoras para revelar a instabilidade da percepção do tempo e do espaço através de instalações, projecções e esculturas”. Nascida no Reino Unido, a artista vive em Bruxelas. Em Hong Kong, apresenta o trabalho “Espelho Mágico”. Sophie Whettnall, que vive e trabalha em Bruxelas, foca-se na luz mas também na sua ausência, bem como na paisagem – um tema recorrente nas suas obras, marcadas por “elementos naturais que reflectem conceitos e percepções contraditórias”. Quem passar pelo KEE Club pode ver “Border Lines #26”, numa mostra que foi inaugurada ontem e que termina na próxima sexta-feira. Imagens e ideias No ArtOne, a exposição é da responsabilidade do fotografo Yves Ullens de Schooten, com o trabalho “O Teatro das Luzes”. Trata-se de fotografia abstracta “para expressar a emoção e a energia da luz e da cor”. A exposição – “Materiais e Contraste” – pode ser visitada até sábado. Sobre as exposições que agora organiza, a curadora Emilie Rolin Jacquemyns explica que quis levar até Hong Kong um conjunto variado de artistas para que o público pudesse ficar com uma ideia do que é a Bélgica. “De cada vez que olho para o trabalho deles, está ali uma parte da nossa cultura, da nossa história e do nosso modo de vida. A luz está no centro de todos estes trabalhos, até mesmo quando é subtil e minimalista. Para mim, existe uma sensação de calma que une todas estas peças, uma noção de brilho e uma expressão de cor que fazem com que a Bélgica fique mais perto de mim, aqui em Hong Kong.” Além das exposições, amanhã, no KEE Clube, há um debate sobre colecções e investimento em arte, a cargo do consultor de arte Jehan Chu, a partir das 19h.
Sofia Margarida Mota Eventos MancheteMIFF | Evento sem Marco Mueller avança com transtornos, mas confiante A primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau é marcada pela saída repentina de Marco Mueller da direcção. Mais do que para a apresentação do cartaz, a conferência de imprensa realizada ontem foi marcada pela ausência do italiano de renome que prometia levar o território ao mundo [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] conferência de imprensa destinada à apresentação do programa da primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau (MIFF, na sigla inglesa) ficou essencialmente marcada pela ausência de Marco Mueller. O italiano que, até ao passado domingo, era o director do evento e que apresentou demissão é agora substituído pela directora dos Serviços do Turismo e representante da Comissão Organizadora, Maria Helena de Senna Fernandes. A iniciativa, que vai ter lugar entre os dias 8 e 13 de Dezembro, irá, à partida, decorrer sem grandes alterações, afirma Senna Fernandes, não deixando de sublinhar que o MIFF vai sofrer contratempos. “Não posso dizer que não há transtornos com a saída de Marco Mueller, mas estamos confiantes, porque um festival não é feito por uma só pessoa mas da junção do trabalho de várias partes.” Tudo na mesma Até ontem, o programa previsto para a primeira edição do MIFF não tinha sofrido qualquer alteração apesar da saída do director. “A maioria dos filmes foi escolhida por Marco Mueller, mas também há convidados especiais que a Comissão Organizadora contactou por achar que podiam ter um ângulo diferente, de modo a construir um programa mais completo”, explica Senna Fernandes. A actual responsável pelo evento justifica que, das reuniões a que assistiu em que pudessem ter existido divergências quanto à inclusão de obras, nunca os diferendos deixaram de ser resolvidos, sendo que, na sua perspectiva, não foi por discordâncias de programação que Marco Mueller terá pedido a demissão. Encontrar um substituto para o demissionário director está, nesta altura, fora de questão. Para Helena de Senna Fernandes, “não seria justo colocar outra pessoa para de repente assumir esta tarefa, sem mais nem menos, e que já tem a assinatura de outra pessoa”. No entanto, e tendo em conta edições futuras, a Comissão Organizadora admite que já está à procura de quem assuma o cargo – ainda assim, é uma tarefa que, de momento, exige calma. “Há pessoas em todo o mundo que têm este tipo de experiência e há pessoas qualificadas para assumir este tipo de tarefas. Não é altura para precipitar a situação, mas sim para acalmar os ânimos”, diz Helena de Senna Fernandes. Tudo indica que a programação prevista para a primeira edição do MIFF não vai sofrer alterações e, até ontem, nenhum dos convidados declinou os convites. “Quando publicámos a notícia da demissão de Marco Muller, fizemos saber a informação a todos os contactos associados ao festival, e até à data, ainda não recebemos nenhuma recusa por parte dos nomes até agora confirmados”, explica a directora dos Serviços de Turismo. “Os filmes que estão divulgados também já assinaram acordo com evento pelo que, caso não queiram prosseguir com a sua participação, terão as consequências previstas”. Estreias mundiais e asiáticas em destaque O cartaz da primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau é composto por 49 filmes. A informação foi adiantada ontem na conferência de imprensa promovida pela comissão organizadora do evento. Do programa relativo à competição internacional, a mais prestigiada do evento, constam 11 películas, todos eles estreias, mundiais ou asiáticas. As origens são diversas e os filmes vêm de França, Inglaterra, Índia ou Japão. Ainda em competição oficial está a estreia no grande ecrã de “Sisterhood”, da realizadora local Tracy Choi, ou “São Jorge”, do português Marco Martins, metragem que valeu a Nuno Lopes o prémio de melhor actor da secção “Horizontes” do Festival de Veneza. Os 11 filmes em competição concorrem a nove prémios dos quais se destacam os de melhor filme, melhor realizador ou melhores actores de ambos os géneros. Do júri fazem parte cinco elementos presididos pelo produtor e realizador indiano Skekhar Kapur, que já viu as suas obras nomeadas para os Óscares e Baftas. O festival inclui ainda várias rubricas e em competição há uma secção especialmente dedicada à Ásia, a “Hidden Dragons”. A comissão organizadora sublinhou a importância das “masterclasses” – duas – que vão ser levadas a cabo por Gianni Ninnari, Tom McCarthy e Bobby Cannavale. Do programa consta ainda uma secção de competição de curtas-metragens de modo a incentivar a produção e divulgação local. As inscrições abriram ontem e fecham a 30 de Novembro. O MIFF abre o ecrã com “Polina”, a 8 de Dezembro, uma produção francesa que conta a história que junta a sétima arte e a dança contemporânea na personagem que dá nome à película. A realização está a cabo de Angelin Preljocaj e Valérie Muller, e o elenco conta com Anastasia Shevtsova e Juliette Binoche. Os bilhetes estão à venda a partir da próxima segunda-feira e os preços são de 50 patacas para as sessões normais e de 80 para as sessões em 3D. Mueller em tribunal? A Associação de Cultura e Produção de Filmes e Televisão de Macau, co-organizadora do MIFF, fez saber ontem, em nota de imprensa, que “irá exigir a Marco Mueller todas as responsabilidades decorrentes do incumprimento contratual, por todos os meios ao seu alcance, incluindo a via judicial”. Helena de Senna Fernandes admite a possibilidade de abertura de um processo contra o director demissionário, dadas as circunstâncias da sua saída. Para a associação, o que está em causa é o incumprimento do compromisso assinado pelo director italiano. “Marco Mueller faltou ao compromisso assinado como director do Festival conforme acordo assinado com a Associação de Cultura e Produção de Filmes e Televisão de Macau [sic]”, lê-se na mesma nota. É a segunda vez que se anuncia uma primeira edição de um festival internacional de cinema de Macau organizado por esta associação. No ano passado, o evento também terá estado para acontecer, sem ter sido realizado. Helena de Senna Fernandes, confrontada com a situação, não adiantou as razões que levaram a iniciativa a ficar pelo caminho e os representantes da associação não se pronunciaram em conferência de imprensa, nem avançaram com mais informações acerca de um eventual processo contra Marco Mueller.
Isabel Castro EventosDespedida | Morreu o músico Leonard Cohen É um ano negro para quem gosta de música – de música a sério. Leonard Cohen morreu na passada sexta-feira, aos 82 anos. Tinha músicas e poemas para acabar, mas dizia-se preparado para ir embora [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á menos de um mês contava que só pensava na família, nos amigos e no trabalho que tinha em mãos. “Tive uma família para alimentar. Nunca vendi o suficiente para ser capaz de deixar de pensar em dinheiro. Tive dois filhos e a mãe deles para apoiar durante toda a vida. Tornou-se um hábito”, explicava à New Yorker, numa longa entrevista publicada a 17 de Outubro. “Depois há a questão do tempo, que é poderoso, com o seu incentivo para acabar. Estou longe de conseguir acabar. Acabei algumas coisas. Não sei quantas mais conseguirei acabar, porque neste momento sinto uma grande fadiga… Há alturas em que tenho de me deitar”, desabafava. “Já não consigo tocar.” Leonard Cohen morreu aos 82 anos e a notícia chegou pelo Facebook. Na página oficial de Cohen alguém anunciou, “com profundo pesar, que morreu o legendário poeta, escritor de canções e artista”, para depois acrescentar que “perdemos um dos visionários mais prolíficos da música”. Não foram dados detalhes sobre o que aconteceu – apenas que estava planeada uma cerimónia em Los Angeles, onde o músico viveu durante muitos anos. No artigo de Outubro, a New Yorker contava que Cohen tinha poemas para terminar, letras de músicas que ainda não tinha acabado, outras que não tinha gravado e outras prontas mas ainda por lançar. Estava a pensar, na altura, fazer um pequeno livro de poemas. “A grande mudança é a proximidade com a morte”, dizia. “Eu sou o tipo de pessoa arrumada. Gosto de acabar as coisas que comecei. Se não puder, tudo bem. Mas a minha natureza é essa.” Leonard Cohen sabia que não seria capaz de acabar as canções que tinha a meio. “Acho que não vou conseguir. Talvez, quem sabe? Mas não me atrevo a ficar preso a uma estratégia espiritual. Jamais o faria. Tenho algum trabalho para fazer. Estou pronto para morrer. Espero que não seja muito desconfortável. Chegou a minha hora.” Uns dias depois, foi lançado o 14o. e último álbum do cantor, “You Want it Darker”. Na música que abre o disco – a música que dá o nome ao disco – ouve-se “I’m ready my Lord”. Cohen estava pronto. Da simplicidade O que é que tinha Cohen de especial? “Para mim tudo. As palavras que tocam no mais íntimo de nós, na esperança, no amor, na sua constante beleza. A voz que nos envolve como nenhum outro, que ecoa dentro do nosso corpo. A música que se eleva em arranjos de uma simplicidade espiritual tão difícil de conseguir.” José Drummond, artista plástico, recebeu a notícia do desaparecimento de Leonard Cohen com profunda tristeza. “É uma estupidez por certo mas, tal como com David Bowie, sinto-me órfão”, diz. “São aqueles que estiveram sempre ao meu lado. Em quem sempre me refugiei em momentos de dor ou de alegria. É tão difícil escolher uma música apenas”, admite. Cohen foi transversal – atravessou gerações, países, chegou à fama sem nunca ter sido o artista que mais discos vendeu. Educou os sentimentos de muitos, com letras em que se fundiram imagens religiosas, temas de redenção e desejo sexual. E o amor, pois, o amor. “Cohen foi sempre o meu preferido para sonhar, para namorar, para acordar, para adormecer”, diz Drummond, sobre este homem “enigmático, uma estrela que se ocultava, que deixava a música falar por ele, que embora nascido judeu se dedicou ao budismo zen e que, nos seus poemas, incorporava todo um sentido cristão”, resume. “Podemos falar tanto sobre ele e o que quer que digamos é sempre bom.” Natural do Quebeque, Leonard Cohen já era um poeta e um novelista conceituado quando, em 1966, se mudou para Nova Iorque. Tinha 31 anos quando entrou no mundo da música. Não foi preciso muito tempo para que a crítica começasse a comparar o seu trabalho ao de Bob Dylan, pela força lírica das canções que escrevia. Apesar de ter influenciado muitos músicos e de ter sido distinguido das mais diversas formas – celebrado pelo mundo do espectáculo, mas também pelas autoridades oficiais do Canadá, por exemplo – Cohen raras vezes atingiu os tops com o folk-rock (rótulo talvez curto) que foi gravando. Escreveu, no entanto, músicas que foram revisitadas por centenas de artistas. “Hallelujah”, lançada em 1984, é talvez o melhor exemplo do modo como o escritor de canções marcou gerações de cantores. Do sagrado ao profano Muitas das canções que Leonard Cohen escreveu tornaram-se famosas pela voz de outros músicos – no início dos anos 1960, Judy Collins ajudou à projecção do compositor ao gravar alguns dos seus primeiros temas. Os admiradores de Cohen comparam os seus trabalhos a uma espécie de profecia espiritual. Escreveu sobre religião, mas também sobre amor e sexo, política, arrependimento e acerca daquilo que um dia disse ser a procura por “uma espécie de equilíbrio no caos da existência”. As letras das suas músicas eram muito pessoais – e às vezes assemelhavam-se a preces, como “Bird on the Wire”, de 1969. Entre os temas mais conhecidos estão “Suzanne”, “So Long, Marianne”, “Famous Blue Raincoat” e “The Future”. “So Long, Marianne” nasce do relacionamento com Marianne Ihlen, uma mulher que foi namorada – e musa – de Cohen nos anos 1960, depois de se terem conhecido na Grécia. No artigo da New Yorker, depois de ter ficado a saber que Marianne teria poucos dias de vida, conta-se que Leonard Cohen lhe escreveu um email: “Bem Marianne, chegou a altura em que somos mesmo velhos e em que os nossos corpos já não aguentam, e eu acho que te vou seguir muito em breve”. Dois dias depois, o cantor ficou a saber que ela morreu depois de ter lido o email que lhe enviou. So Long, Marianne. Dos livros aos discos A voz anasalada e grave – muito grave – de Cohen nem sempre foi bem recebida pela crítica e por outros músicos, como o britânico Paul Weller, que chegou a considerar que se estava perante um estilo melancólico “de cortar os pulsos”. Mas a verdade é que o trabalho de Leonard Cohen também é marcado pela ironia e por um sentido de humor muito próprio. Nascido em 1934, filho de judeus, o poeta, novelista e escritor de canções cresceu em Montreal, num bairro onde se falava inglês. Na adolescência, leu Federico García Lorca, aprendeu a tocar guitarra e formou uma banda de country que se chamava “Buckskin Boys”. Frequentou a McGill University, em Montreal, tendo publicado o seu primeiro livro de poesia pouco depois de se ter formado. A viver com apoios do Governo do Canadá e com dinheiro que herdou da família, Cohen publicou, na década de 1960, as colecções de poesia “The Spice-Box of Earth” e “Flowers for Hitler”, e os romances “The Favourite Game” e “Beautiful Losers”. Mas, desiludido com o modo de vida que tinha, decidiu começar a escrever canções e acabou por fazer uma audição em 1967 com John Hammond. O produtor conseguiu um contrato com a Columbia Records, a discográfica com que Cohen viria a ter uma relação de cinco décadas. Deu centenas e centenas de concertos, mas também passou por períodos de isolamento, de meditação, longe dos públicos. Durante os anos 1990, esteve num mosteiro budista zen nas Montanhas de São Gabriel, perto de Los Angeles. Entre 2008 e 2013, voltou a palco com muita regularidade, depois de ter sido incapaz de recuperar grande parte dos nove milhões de dólares que dizia terem-lhe sido tirados por Kelley Lynch, antiga manager e companheira. Apesar da relação por Marianne – e das outras mulheres que fizeram parte da sua vida – Leonard Cohen não casou. Deixou dois filhos, milhares de fãs e uma obra para durar até ao fim do amor. LER AINDA: A alquimia de transformar a escuridão
Sofia Margarida Mota EventosA alquimia de transformar a escuridão O último álbum de Leonard Cohen [dropcap]U[/dropcap]m mês depois de completar 82 anos, Leonard Cohen ofereceu ao mundo o seu, agora confirmado, último álbum. “You Want it Darker” não é só mais uma viagem do compositor, poeta e cantor canadiano, à melancolia da existência. Agora, visto à luz da sua recente despedida, é o adeus sóbrio e sublime de um dos grandes nomes da canção dos últimos 50 anos. Leonard Cohen abre o disco com o tema que lhe dá nome e faz antever a morte, em que o “I´m ready my lord” não é só mais um verso, mas sim a assinatura da canção. A playlist que se segue, faixa a faixa, não é menos consciente. “Treaty” é uma verdadeira metáfora de amor e angústia perante a vida. Um tema de cansaço que, agora, se pode associar ao seu debilitado estado de saúde e à impotência perante o inevitável. O tão almejado “tratado” regressa na última faixa de “You Want it Darker”, agora num frenesim de cordas que marcam o abrir de portas do fim do disco e de 50 anos embalados pelos temas de Leonard Cohen. A voz grave, que mais parece vinda das entranhas da melancolia, continua pelo álbum fora. Limpa, como a verdade que Cohen aponta tema a tema, e cortante em cada palavra que entoa. “I´m travelling light, it´s au revoir” é só um verso que abre mais uma canção, já com “You Want it Darker” a meio. Uma canção entre bandolins e coros, que o cantor tanto honrou ao longo da carreira, num convite a uma dança harmoniosa com a despedida de um amor, de uma vida. Não é possível escolher o melhor tema dos nove que compõem o último disco de Cohen. Mas é imperativo um tirar de chapéu, grato e humilde, como também ele ensinou a fazer nos concertos que deu nos últimos anos de vida. “You Want it Darker” é mais um reflexo daquele que conseguiu dotar a escuridão da existência de uma beleza doce, capaz de fazer os outros entenderem melhor o que levam no coração. “You Want it Darker” é um álbum, como todos os outros de Leonard Cohen, de amor, esperança, desilusão e, agora, de um verdadeiro adeus. LER AINDA: Morreu o músico Leonard Cohen