Casinos | Novos inspectores sujeitos a estágios de seis meses

Foi ontem publicado em Boletim Oficial o novo regulamento que cria estágios de seis meses para novos inspectores de casinos da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos. Associação que representa estes trabalhadores concorda com a nova medida

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s novos funcionários públicos que desempenham funções de inspectores nos casinos, ao serviço da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), passam a estar obrigados à frequência de um estágio de seis meses antes de entrarem ao serviço.

O novo regulamento de estágios da DICJ foi ontem publicado em Boletim Oficial (BO) e determina que o estágio inclui duas fases, com dois cursos de formação teórica e prática. No que diz respeito ao curso teórico, o formando deve assimilar “conhecimentos teóricos”, bem como frequentar “seminários, encontros, palestras, congressos, conferências e visitas de estudo”. O estagiário é também sujeito à realização de trabalhos de pesquisa e investigação na área da inspecção dos casinos.

Já a formação prática tem como objectivo “inteirar os estagiários do ambiente real de trabalho, no âmbito dos métodos de trabalho das respectivas funções, por forma a prepará-los para o desempenho da acção inspectiva”. O regulamento determina que “a frequência do curso de formação teórica com aproveitamento é condição necessária para a passagem à fase de curso de formação prática”.

O estagiário deve ainda realizar o respectivo relatório, tendo direito a cinco dias para o fazer.

Associação concorda

Contactado pelo HM, António Lopes, ex-candidato às eleições legislativas, ex-inspector de jogo e um dos dirigentes da Associação Sindical dos Inspectores de Jogo, ligada ao universo da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), disse concordar com esta medida.

“Concordo com estas novas regras. Durantes esse período os estagiários podem ter contacto com todos os trabalhos e informações ligados aos casinos, e isso é bom para os funcionários.”

António Lopes contou que, até à publicação deste regulamento, os novos inspectores eram apenas sujeitos a um período de teste com duração entre um a dois meses.

“O pessoal ia às entrevistas e depois, caso passasse no teste, podia começar a fazer os trabalhos de inspecção. Depois, havia uma formação de um ou dois meses e entravam de imediato ao serviço.”

Segundo António Lopes, isso gerava constrangimentos e falhas no trabalho do dia-a-dia. “Os funcionários tinham de aprender muitas coisas da área administrativa, relacionadas com os crimes, regulamentos dos jogos. E quando começavam a trabalhar não percebiam muito bem como funcionavam as coisas. Iam aprendendo todos os dias durante o trabalho.”

“Caso houvesse casos que não compreendessem, tinham de ligar aos inspectores mais antigos para saber como podiam resolver os casos. Aí a culpa caía na inspecção porque não havia a devida formação”, frisou do ex-inspector de jogo.

27 Mar 2018

Rota das Letras | O lugar da família Assumpção no romance de Isabel Valadão

Em “O Rio das Pérolas” lê-se a história de Luísa e Mei Lin, duas mulheres chinesas abandonadas à nascença pelas famílias que acabam por ter dois percursos de vida diferentes, sempre com a sobrevivência como força motriz. Convidada do festival Rota das Letras, que chegou ontem ao fim, a autora, Isabel Valadão, contou como a ligação à família de Carlos D’Assumpção a ajudou a escrever o romance

 

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oram dois anos intensos, em que o corpo existiu em Portugal mas a mente e o coração estiveram de forma permanente em Macau. Esse foi o tempo que Isabel Valadão, licenciada em História da Arte, demorou a escrever “O Rio das Pérolas”, o romance sobre o lugar onde morou durante três anos mas que retrata uma outra época, a de uma sociedade onde meninas eram abandonadas à nascença apenas por carregarem consigo a condição feminina. Cuidadas por freiras, acolhidas por ordens religiosas, estas meninas acabariam por se dedicar à prostituição, a servir em casas de famílias macaenses, a serem sujeitas às boas maneiras para que, um dia, o casamento com homens ricos pudesse ser a salvação para uma vida difícil.

No último dia do festival literário Rota das Letras, Isabel Valadão esteve no edifício do Antigo Tribunal a falar do seu romance que fala da Macau dos anos 40 e 50. Viveu no território entre 983 e 1985, tendo conhecido muitas famílias macaenses. A de Carlos D’Assumpção, ex-presidente da Assembleia Legislativa e um dos mais importantes juristas do território, foi fundamental para o seu processo de absorção da cultura local.

“A família Lobo Vicente [retratada no livro] foi inspirada em famílias que conheci aqui, famílias antigas. A família do Carlos D’Assumpção deu-me muito conhecimento de como funcionavam as coisas”, revelou ontem. “A família de Carlos D’Assumpção ajudou-me a perceber como funcionava uma família macaense e luso-portuguesa. Além da origem chinesa também tinha outras origens, havia sempre uma grande mistura de sangues. Não gostavam muito do sangue chinês, porque achavam que ia manchar um pouco o sangue português, no qual tinham muito orgulho.”

Isabel Valadão só agora regressou a Macau, e notou diferenças em relação ao passado histórico e aquele que presenciou. “Tenho visto a comunidade chinesa muito mais aberta e com uma abertura grande às pessoas, embora continuem a não falar português. Penso que está tudo diferente.”

A importância da mulher

Antes de escrever sobre Macau, Isabel Valadão escreveu sobre personagens reais, históricas, da Angola onde viveu a partir dos seis anos e até 1976, na altura em que se mudou para Portugal. Quando chegou a Macau esperava encontrar um pouco de África, mas não conseguiu, apesar de se ter deparado com um ambiente exótico.

“Quando chegamos a Macau encontrei uma realidade muito diferente da que estava à espera. Pensava encontrar um bocadinho de África quando cheguei, mas encontrei outra realidade muito exótica, muito sui generis. Foi um choque grande no início, porque não estava bem habituada à civilização chinesa. Mas a cidade começou a cativar-me.”

Desde que se licenciou, aos 49 anos, que a autora se tem dedicado a escrever sobre mulheres. Identifica-se com elas, mas não põe de parte escrever um romance onde os homens sejam protagonistas.

“Talvez me identifique mais com o papel das mulheres, ou porque encontre histórias interessantes. Talvez seja capaz no futuro de encontrar um personagem marcante masculino. Sim, acho que sim [que as mulheres estão perdidas na história].”

“Normalmente vou à história buscar personagens reais, que existiram, e estas personagens são reais, existiram. A Luísa foi de uma família de Macau. Nesse estudo sobre as ordens religiosas em Macau e as órfãs encontrei dois casos específicos. Foi nelas que me inspirei, dei outros nomes, e ficcionei de outra maneira. Em relação a Angola também fui buscar personagens históricas e são essas que eu desenvolvo na minha ficção, que eu gosto de chamar de ficção histórica”, acrescentou a autora.

A escrita de romances apareceu tarde na vida de Isabel Valadão. “Sou formada em História da Arte e só comecei a escrever depois de me licenciar. Sou uma escritora tardia. Mas fiquei sempre com o gosto pela investigação histórica e comecei a gostar de escrever.”

Escrever o “Rio das Pérolas” surgiu quando a autora de deparou com um artigo sobre a sociedade dos anos 40 e 50. O nome do livro já existia desde sempre. “Comecei a ler todas as revistas culturais de Macau, aprendi muito mais do que quando cá tinha estado. Surgiu-me a ideia da história porque encontrei um artigo que me impressionou muito, sobre o papel da mulher chinesa em Macau e na China. Encontrei nesse artigo o que é que acontecia às órfãs em Macau. Na China eram afogadas à nascença. Em Macau eram abandonadas à porta da Santa Casa da Misericórdia e depois esse papel começou a passar mais para as ordens religiosas. A sua vida era ditada por aquilo que conseguiam ou não fazer.”

Existia então as noivas portuguesas, meninas chinesas que acabavam por chegar às comunidades portuguesa e macaense da altura. “Muitas enveredavam pela prostituição, e havia o fenómeno das noivas portuguesas. As órfãs chinesas que eram educadas pelas freiras e que acabavam por fazer um percurso e ser integradas na comunidade macaense, como afilhadas para servir, mas muitas delas depois casavam com portugueses que vinham da metrópole.”

“Fui deixar a Mei Lin”

No regresso a Macau, tantos anos depois, Isabel Valadão foi aos lugares que leu nos artigos históricos e naqueles que conheceu na década de 80. Hoje o Hotel Central está em obras, os edifícios do Porto Interior estão degradados. Ainda assim, a autora deambulou pela avenida Almeida Ribeiro, subiu até ao Seminário de São José. “Ontem fui deixar a Mei Lin”, confessou no Antigo Tribunal.

O curso de História de Arte levou-a a ser descritiva nos seus livros, quase como por acaso. “Através disso comecei a adquirir as ferramentas para o ofício, a fazer investigação. Gosto de caracterizar os ambientes, as pessoas. Sou muito visual, porque eu própria quando estou a escrever, visualizo.”

Escreveu sempre sobre os sítios por onde passou. As suas histórias são aquelas que ela ainda não leu. “Escrevo os livros que eu gostava de ler e acho que os devo passar a outras pessoas, são temas que devem passar a outras pessoas”, rematou.

26 Mar 2018

Rota das Letras | Presidência da Assembleia da República afirma prestar atenção a Macau

O gabinete de Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República portuguesa, recusa a ideia de que não existe “um acompanhamento regular da situação” de Macau. Ainda assim, o Grupo de Amigos de Macau, com cariz informal, deixou de existir. Sobre o caso Rota das Letras, ministro dos Negócios Estrangeiros português disse que “China sabe qual o sistema que deve vigorar em Macau”

 

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] certo que a sétima edição do festival literário Rota das Letras chegou ontem ao fim, mas o caso da suspensão dos três escritores cuja visita ao território não seria oportuna continua a gerar reacções. Depois das declarações do ex-deputado e historiador Rui Tavares, sobre a necessidade da Assembleia da República (AR) prestar mais atenção à RAEM, eis que o gabinete do presidente do parlamento português, Eduardo Ferro Rodrigues, garantiu ao HM que nunca houve esquecimento face a Macau.

“O gabinete de imprensa do presidente da AR está em condições de lhe adiantar que, em relação a Macau, não se confirma que ‘não haja um acompanhamento regular da situação’”, disse apenas o assessor José Pedro Pinto. Ferro Rodrigues não pôde responder às restantes questões colocadas pelo HM por se encontrar a recuperar de uma cirurgia.

Apesar disso, o HM confirmou junto do deputado Vitalino Canas, ligado ao Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-China, que o Grupo de Amigos de Macau, criado pela ex-deputada do Partido Social Democrata (PSD) Mónica Ferro, deixou de existir. Este grupo existia de forma informal na AR e desconhecem-se as razões para o seu fim. O HM questionou Mónica Ferro sobre este assunto, mas não recebeu qualquer resposta.

O deputado à Assembleia Legislativa José Pereira Coutinho sempre esteve ligado a esta iniciativa, na qualidade de membro do Conselho das Comunidades Portuguesas, tendo adiantado que o grupo chegou mesmo ao fim por “desinteresse de ambas as partes”.

Em 2013 o jornal Ponto Final escrevia mesmo que responsáveis governamentais de Macau teriam dito a Mónica Ferro que haveria um certo incómodo pela existência deste grupo, criado em 2012. De acordo com o jornal, os assuntos de Macau, sendo uma região administrativa especial chinesa, deveriam ser “tratados através do Grupo de Amizade Portugal-China, que tem uma existência formal e reconhecida por Pequim.

Nas entrevistas que deu em Macau, Rui Tavares, convidado do festival Rota das Letras, defendeu um maior acompanhamento da parte da AR, com a criação de uma comissão especializada e elaboração de relatórios anuais sobre a implementação prática da Declaração Conjunta e da Lei Básica.

Santos Silva reagiu

Entretanto, e de acordo com a agência Lusa, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Santos Silva, disse que “a China sabe qual é o sistema que deve vigorar em Macau”, comentando a polémica à volta da retirada do convite a três escritores.

“Os termos são muito claros, e foram acordados entre Portugal e a China para a passagem de Macau para a plena soberania chinesa; seguem estritamente o princípio ‘um país, dois sistemas’, e todos os nossos amigos chineses sabem bem qual é o sistema que deve vigorar em Macau”, disse o chefe da diplomacia portuguesa aos jornalistas, à margem de uma conferência sobre a Nova Rota da Seda, que decorreu em Lisboa.

O Ministério já tinha reagido ao caso Rota das Letras através de uma resposta escrita enviada ao nosso jornal. “O Festival Literário de Macau, Rota das Letras, é uma iniciativa muito meritória da sociedade civil da Região Administrativa Especial de Macau, que conta com o patrocínio do Instituto Português do Oriente, com o objectivo de desenvolver a cultura e a promoção dos escritores”, pelo que se “lamenta a eventualidade do cancelamento desta iniciativa”, frisou ao nosso jornal.

26 Mar 2018

Governo defende criação de bairros só para idosos nos arredores de Macau

Alexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, garantiu ontem que o Governo está a ponderar a criação de bairros nos arredores de Macau para albergar os idosos que vivam sozinhos, ou que necessitem de vaga num lar. O projecto estará dependente do desenvolvimento do plano da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau.

“Podemos aproveitar a ilha de Hengqin para a construção de um bairro para idosos, e não apenas aqui. Ainda estamos à espera do plano da Grande Baía, e depois da sua implementação poderemos ter mais espaços nas províncias chinesas para o desenvolvimento [deste projecto]. No futuro, se os idosos quiserem viver no Interior da China, nas nove regiões da Grande Baía, poderão optar por viver nestas zonas.”

Os deputados mostraram-se preocupados com a falta de vagas nos lares de idosos e também com os elevados valores cobrados nas instituições privadas. Contudo, o secretário garantiu que ainda há margem para acolher mais pessoas. “Em Macau existem 21 lares de idosos, sendo que dez são pagos pelos utentes e os restantes são subsidiados. Há mais de duas mil camas disponíveis e há 1514 idosos em lares, uma taxa de 71 por cento. Nos lares privados, a taxa de ocupação é de 85 por cento, por isso há margem para acolher mais. Esperamos que se encoraje a que mais idosos procurem os serviços destes lares.”

Alexis Tam adiantou ainda que este mês será criado um projecto piloto de apoios em lares. “Iniciámos este mês o serviço na Taipa, vamos destacar médicos especialistas e enfermeiros para lares subsidiados pelo Governo e depois estes serviços vão ser expandidos a outros lares. No futuro, [o projecto piloto] não será destinado apenas aos lares subsidiados pelo Governo”, frisou.

Os deputados mostraram preocupações quanto ao elevado tempo de espera para entrar num lar, de cerca de um ano. Os governantes garantiram que estão a tentar resolver esse problema. Celeste Vong, presidente do Instituto de Acção Social, adiantou que, até 2020, vão existir mais lares disponíveis. “Há projectos para três lares, que vão proporcionar 300 vagas, e até 2020 vai surgir mais um lar. Estamos a fazer todos os possíveis para encontrar espaços para novos lares e aumentar o número de vagas. Penso que o tempo de espera vai ser encurtado, mas nesse período prestamos apoio às famílias.”

23 Mar 2018

AL | Governo quer facilitar processos para abertura de estabelecimentos comerciais

 

A Assembleia Legislativa poderá receber ainda nesta legislatura a proposta de lei que revê o actual regime de actividade hoteleira e similar. O Governo espera atribuir licenças provisórias a estabelecimentos com o prazo de um ano, ao invés de seis meses, e criar uma plataforma digital de submissão de requerimentos

O Governo continua a tentar resolver a saga das licenças atribuídas a estabelecimentos comerciais que demoram anos a ser atribuídas e que criam constrangimentos aos pequenos empresários. O assunto foi ontem discutido na Assembleia Legislativa (AL), no seguimento de uma interpelação oral apresentada pelos deputados Si Ka Lon e Kou Hoi In.

Os membros do Executivo garantiram que o regime de actividade hoteleira e similar, em vigor desde 1996, deverá ser revisto este ano, estando prevista uma simplificação de processos para quem deseja abrir um estabelecimento comercial. As medidas passam pela atribuição de licenças provisórias de um ano, ao invés dos actuais seis meses, além da submissão de documentos pela via electrónica.

“Está na lista das propostas de lei para este ano, o texto está a ser ajustado”, frisou Helena de Senna Fernandes, directora dos Serviços de Turismo. “Actualmente, cabe aos nossos serviços tratar dos processos dos restaurantes localizados em hotéis. Estamos a pensar simplificar os procedimentos, para que os empresários possam ter uma noção mais clara de quando terão a licença. Estamos a pensar se a licença terá a validade de um ano e se existirão regras mais flexíveis.”

“Não existe actualmente um regime de licença provisória. Com a revisão da lei, vamos introduzir uma nova norma para isso. Vai designar-se como licença para restaurantes e hotéis”, acrescentou Helena de Senna Fernandes.

A director dos Serviços de Turismo deixou ainda claro que será criado um website para a submissão de requerimentos online, para que os pequenos empresários não tenham de entregar documentação em mãos em vários serviços públicos.

“No que diz respeito à informatização do procedimento, estamos a trabalhar para isso, tendo em conta a promoção do Governo Electrónico. No futuro vamos disponibilizar uma plataforma uniformizada para a entrega de documentos e para acompanhamento dos procedimentos e evitar atrasos na emissão de licença”, frisou a responsável.

Kou Peng Kuan, director dos Serviços de Administração e Função Pública, frisou que, o ano passado, a maior parte dos pedidos de licenças ficaram resolvidos em dois meses. “Foram elaboradas instruções para a emissão de licenças. Em 2017, mais de 80 por cento das licenças foram emitidas no prazo de 60 dias”, acrescentou.

Papelada sem fim

A lentidão na obtenção de licenças, que obriga a um grande investimento por parte dos empresários enquanto esperam pela abertura do espaço, tem sido um dos temas mais debatidos pelos deputados, muitos deles ligados ao sector empresarial. Chan Chak Mo, director-executivo da Future Bright Holdings, empresa que detém vários espaços de restauração, foi um dos intervenientes.

“O problema não tem a ver com a licença provisória, mas com o tempo de espera para ter essa licença. Tem a ver com a capacidade de resposta dos serviços públicos. As Obras Públicas emitem uma licença de construção que demora um ano e meio. É este o problema, tudo leva tempo. Há hotéis que têm de cumprir vários requisitos, e os serviços de turismo, que emitem as licenças não vão analisar todas as questões técnicas”, frisou.

Kou Peng Kuan garantiu que já existe um grupo com representantes de vários serviços públicos a analisar as licenças, tendo prometido uma melhor utilização da licença provisória.

“Sabemos que as PME têm dificuldades de financiamento e estamos a levar a cabo a revisão do decreto-lei. Vamos aumentar a eficiência da comunicação entre serviços, para que as informações sejam transmitidas de forma precisa. Temos algumas restrições e, no futuro, vamos aproveitar melhor o meio da licença provisória”, adiantou. De frisar que, além dos serviços de turismo, que atribuem as licenças a espaços localizados em hotéis, cabe ao Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais a atribuição das licenças a espaços comerciais localizados fora dos pontos de interesse turístico.

23 Mar 2018

AL | Governo garante autonomia financeira de associações de cariz social

O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, garantiu ontem que serão revistos os subsídios atribuídos a associações para pagamento de salários e equipamentos. O secretário adiantou ainda que as associações privadas já possuem autonomia financeira com o novo regime de apoio

A deputada Chan Hong quis saber quais as medidas que o Governo tem adoptado para resolver os eternos problemas relacionados com a falta de dinheiro e recursos humanos sentidos pelas associações sociais. Dias depois da Associação para o Desenvolvimento Infantil de Macau (MCDA, na sigla inglesa) se ter queixado da falta de meios e de subsídios insuficientes, o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, foi ontem à Assembleia Legislativa (AL) garantir que os subsídios vão ser revistos.
“Iniciou-se o trabalho de revisão sobre a actualização dos subsídios para as despesas correntes e para as despesas administrativas. Vai ser elaborada uma proposta específica que visa alcançar o efeito de precisão na concessão de subsídios aos equipamentos sociais”, apontou na sua resposta.
O actual regime de apoio financeiro concedido às associações foi implementado em 2015, mas, de acordo com a deputada Chan Hong, as entidades que prestam serviços sociais continuam a deparar-se com falta de dinheiro para pagar bons salários aos funcionários e terapeutas.
Alexis Tam adiantou ainda que os apoios financeiros não só vão ser revistos como têm mesmo vindo a aumentar. “Comparando com o apoio financeiro concedido pelo Instituto de Acção Social (IAS) para todo o ano de 2017, no valor aproximado de 1200 milhões, e tendo em conta o respectivo apoio no valor de mais de 700 milhões em 2014, altura em que o novo regime não estava em vigor, verifica-se um aumento de mais de 67 por cento”, contextualiza.
Desta forma, o secretário considera que o novo regime de apoio financeiro veio trazer mais autonomia às associações e uma maior flexibilidade financeira auxiliadas pelos cofres públicos. “O novo regime trouxe mais recursos aos equipamentos sociais em diversos aspectos e está a exercer efeitos positivos.”
“Sobre a questão de estabilização do pessoal, é de referir que, no novo regime de apoio financeiro, foi fixado um subsídio destinado à atribuição do duplo salário, permitindo um aumento de 8,3 por cento do subsídio de pessoal em relação ao passado, o que foi suficiente para compensar a inflação dos últimos dois anos”, acrescentou. Alexis Tam frisou ainda no plenário da AL que o IAS “procedeu a um aumento de dez por cento aquando da determinação do subsídio para este pessoal, o que não acontece com os profissionais de outras áreas.”
Desta forma, “a medida conduziu a um notável aumento e melhoria do nível financeiro e do salário do pessoal”, referiu o secretário.
O novo regime financeiro abrange 50 profissões. A partir de Fevereiro registou-se um aumento do subsídio do pessoal e dos equipamentos apoiados IAS. O incremento “corresponde a 2,5 por cento” e beneficiou “cerca de 4.100 trabalhadores de serviços sociais, aumentando o orçamento no valor de 27 milhões de patacas”.

Situação de desequilíbrio

A deputada Chan Hong defendeu também que grande parte das associações de cariz social estão localizadas em edifícios de habitação pública, pelo que também precisam de apoio financeiro para pagar as despesas de condomínio, que são elevadas. Contudo, o secretário garantiu que esse apoio já é concedido.
O financiamento de associações sociais privadas foi um dos temas mais debatidos no plenário de ontem, destinado a responder a interpelações orais dos deputados. Vários membros do hemiciclo defenderam que existe um desequilíbrio entre o sector público e privado e que devem ser asseguradas condições a terapeutas e profissionais que prestam serviços nestas organizações.
“Quanto ao plano de vida dos trabalhadores, há que criar espaços de promoção, pois é preciso criar mais níveis de postos de trabalho para estes trabalhadores. As regalias são diferentes face a um trabalhador do serviço público e estamos a ver uma situação desequilibrada, porque se o Governo contratar muitos trabalhadores vai concorrer com estas associações”, disse a deputada Song Pek Kei.
“Será que os assistentes sociais do sector público e privado têm as mesmas regalias”, questionou o deputado Zheng Anting. Alexis Tam lembrou que o regime de credenciação dos assistentes sociais está actualmente a ser analisado na especialidade na Assembleia Legislativa (AL), o que dará mais condições de trabalho a estes profissionais.

 

 

 

Alexis Tam responde a Eliana Calderon

No debate de ontem, o secretário aproveitou ainda alguns minutos para garantir que nenhuma criança com necessidades educativas especiais fica sem apoio, numa resposta às críticas recentes proferidas por Eliana Calderon, presidente da MCDA. “Com a coordenação de diversos serviços, acredito que as crianças que necessitam de um serviço específico, com necessidades especiais, poderão ter apoio da parte do Governo. O Governo já disse que nenhuma criança fica fora do âmbito de aplicação dos nossos regimes. Os serviços prestados pelo Governo não são piores do que noutras regiões”, rematou. Na semana passada, a MCDA organizou uma conferência de imprensa onde acusou o Governo de não atribuir apoios suficientes para a abertura do novo centro infantil destinado a crianças com necessidades educativas especiais. No entanto, o IAS garantiu que os apoios financeiros têm vindo a aumentar ano após ano.

23 Mar 2018

Governo autoriza construção de duas torres residenciais e passagem pedonal na Areia Preta

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, assinou um despacho que revê a concessão de um terreno localizado na Rua dos Pescadores, zona da Areia Preta. De acordo com um despacho publicado ontem em Boletim Oficial (BO), o terreno irá servir para habitação e comércio, sendo a Companhia de Investimento e Desenvolvimento Predial Trust Art, Limitada a concessionária.

O despacho aponta para a futura “construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com seis pisos, sobre o qual assentam duas torres com 13 pisos cada uma, destinado a habitação, comércio e estacionamento”. Haverá também lugar para uma área de estacionamento de veículos.

Além disso, o projecto inclui a construção de uma infra-estrutura pública. “Sobre [uma] parcela de terreno é constituída servidão pública, destinada à construção da passagem pedonal pública e instalação de respectivo equipamento, para o livre trânsito de pessoas e bens sem quaisquer restrições, não podendo ser objecto de qualquer tipo de ocupação, temporária ou definitiva”, pode ler-se no BO. Caberá ao Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) a gestão desta infra-estrutura, bem como a sua manutenção e reparação.

A primeira vez que este terreno foi concessionado a esta empresa foi em 1993. Depois de duas revisões da concessão datadas de 1996 e 2004, a empresa veio agora entregar na Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes uma proposta para o aproveitamento do mesmo.

A proposta foi apresentada a 15 de Janeiro de 2014, tendo “o respectivo projecto de alteração de arquitectura, por despacho do director destes serviços, de 16 de Junho de 2014, considerado passível de aprovação, condicionada ao cumprimento de alguns requisitos técnicos”. De acordo com o BO, a empresa pediu a modificação do aproveitamento do terreno novamente a 28 de Agosto do mesmo ano.

“Reunidos os documentos necessários à instrução do procedimento, a DSSOPT procedeu ao cálculo das contrapartidas devidas e elaborou a minuta do contrato de revisão da concessão que mereceu a concordância da concessionária, expressa em declaração apresentada em 5 de Dezembro de 2014”, lê-se ainda.

Anualmente, a concessionária terá de pagar 7,749 mil patacas, sendo que o reaproveitamento do terreno deverá ser feito no prazo de 36 meses.

22 Mar 2018

Lei Básica | Ideia defendida na APN considerada “bizarra” e “intimidatória”

Tam Yiu Chung, deputado à Assembleia Popular Nacional por Hong Kong, defendeu em Pequim que, caso os candidatos à AL e LegCo estejam contra o sistema de partido único na China, não poderão participar nas eleições por violarem a Constituição chinesa. O subdirector do Gabinete de Ligação apoiou. Analistas políticos dizem estarmos perante uma ideia “bizarra” e uma tentativa de intimidação

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s habituais encontros da Assembleia Popular Nacional (APN) terminaram e de Pequim chegaram vários recados para as duas regiões administrativas especiais. De acordo com o jornal Tribuna de Macau e Ponto Final, Tam Yiu Chung, deputado à APN por Hong Kong, defendeu que os candidatos às eleições legislativas de Macau e Hong Kong não deverão poder concorrer caso incluam nos seus programas que não apoiam o sistema de partido único em vigor no continente.

Na visão de Tam Yiu Chung, estará em causa uma violação da Constituição da República Popular da China. Confrontado com esta ideia, Chen Sixi, subdirector do Gabinete de Ligação do Governo Central em Macau, disse estar de acordo com a mesma interpretação do membro da APN. De acordo com o Ponto Final, Chen Sixi disse que, tendo em conta a recente revisão da Constituição chinesa, os candidatos que apoiam um regime democrático na China não podem concorrer aos órgãos legislativos e devem perder o seu mandato.

Tam Yiu Chung, deputado à APN por Hong Kong. Foto: D.R.

Questionado sobre esta ideia, Arnaldo Gonçalves, especialista em ciência política e académico, disse estarmos perante uma sugestão “bizarra”. “Macau tem um sistema político de Direito e de liberdades fundamentais que é completamente diferente do sistema que existe na China. Como tal, não há parecença nenhuma com o sistema que existe no continente. As diferenças entre o primeiro e segundo sistemas estão claramente definidas na Lei Básica e apontam para uma clara autonomia do segundo sistema em relação ao primeiro.”

O académico defende mesmo que, se há insatisfação por parte de Pequim relativamente a este assunto, os dirigentes devem sentar-se à mesa e propor uma revisão da Lei Básica.

“Nunca se pôs na discussão da Lei Básica que Macau e Hong Kong aceitassem o regime do partido único. No que concerne ao funcionamento das duas regiões administrativas especiais, até 2049, no caso de Macau, há uma absoluta independência de funcionamento e de organização. Se as autoridades de Pequim estiverem desagradadas com a actual situação, o que têm a fazer é propor aos governos das duas regiões uma iniciativa político-jurídica de alteração da Lei Básica no sentido de introduzir esta interdição.”

Na visão de Eric Sautedé, também docente na área da ciência política, Tam Yiu Chung está a misturar noções. “Há uma diferença entre liberdade de expressão e o impedimento de um candidato colocar isso no seu programa político ou no seu juramento, com o argumento de que se deve manter a integridade ou a segurança nacionais. Não me parece que a declaração de Tam seja juridicamente vinculativa, mas visa criar medo e um certo nível de intimidação”, contou ao HM.

Foram feitas várias tentativas de contacto com actuais deputados da Assembleia Legislativa e ex-membros do hemiciclo, mas até ao fecho da edição não foi possível chegar à fala com nenhum deles.

“Falta de bom senso”

Antes de Chen Sixi apoiar a ideia do deputado de Hong Kong à APN, já tinha afirmado publicamente de que há “forças externas” a influenciar a sociedade civil de Macau, referindo-se a uma intromissão do movimento independentista de Hong Kong na RAEM.

Contudo, Arnaldo Gonçalves recorda que o Gabinete de Ligação do Governo Central em Macau não tem poder político para alterar a autonomia que existe na RAEM e em Hong Kong.

“Não é o Gabinete de Ligação, que é um mero staff de apoio, como a secretaria geral de um chefe de gabinete, não tem mais poder do que isso [que vai alterar as coisas]. Quando o presidente chinês ou o primeiro-ministro querem dar instruções, chamam o Chefe do Executivo dos dois territórios a Pequim para lhes dar directamente instruções.”

O académico acrescentou também que o próprio Gabinete de Ligação já foi alvo da campanha anti-corrupção da China, nomeadamente com a suspensão do ex-director, Li Gang, de quaisquer funções do PCC, pelo período de um ano.

“Acho falta de bom senso, porque nesta campanha anti-corrupção, o Gabinete de Ligação de Macau e Hong Kong têm algumas situações que precisavam de ser clarificadas num passado recente. É absurdo e precipitado estar a tomar estas posições. Gostam de falar, mandar recados, mas em Macau temos de manter a serenidade e tenho a certeza que as pessoas mais esclarecidas em Macau, os que governam e estão nas instituições, não querem saber.”

22 Mar 2018

Jockey Clube de Macau deve 150 milhões de patacas ao Governo

O secretário para a Economia e Finanças desconhece se o Executivo pode exigir juros de mora perante uma dívida que chegou a atingir a cifra de 200 milhões, em 2015. Apesar de já terem sido recuperados 50 milhões, Lionel Leong admitiu que não sabe se o valor vai ter de ser ajustado à inflação e pago com juros

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Jockey Clube de Macau tem um dívida de 150 milhões de patacas ao Governo, que vai ter de pagar num prazo de três anos. A garantia foi deixada, ontem, pelo secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, que veio a público explicar a polémica em torno das dívidas da concessionária.

O secretário, que assumiu o cargo em Dezembro de 2014, afirmou ainda que só em 2015 teve conhecimento do “problema” e que, desde essa altura, já recuperou 50 milhões patacas de uma dívida que chegou a atingir o valor de 200 milhões de patacas.

“Em 2015, descobri este problema e, desde então, temos exigido à empresa que pague a dívida. Actualmente, as dívidas ao Governo são de 150 milhões de patacas, mas antes eram de 200 milhões, quando detectámos o problema, em 2015”, disse Lionel Leong, ontem.

O montante em causa diz respeito ao imposto sobre o jogo, pagamentos ao Fundo de Pensões e prémios não reclamados, entre outros. Os atrasos foram autorizados pelo Governo, uma vez que desde 2002 que a empresa sempre apresentou perdas.

Apesar dos atrasos, o secretário para a Economia e Finanças não garante que o montante seja restituído com juros de mora.

“Se vai haver o pagamento de taxas de atraso, se vai ser tida em conta a inflação ou vão ser pagos juros de mora, ainda não sabemos. Temos de questionar a Direcção de Serviços de Finanças se existe base legal para recuperar o dinheiro”, admitiu. “Mas, claro, se eles não conseguirem pagar as dívidas no prazo de três anos a concessão vai ser anulada”, frisou.

Dívida conhecida

Apesar do problema, segundo as palavras do Lionel Leong, ter sido detectado em 2015, o mesmo não quer dizer que não fosse do conhecimento de Francis Tam, anterior secretário para a Economia e Finanças. Isto porque, como explicou Lionel Leong, ao longo dos anos foram sendo recebidas cartas da empresa, que é formalmente conhecida como Companhia de Corridas de Cavalos de Macau.

Ontem, o secretário explicou igualmente outros pormenores do contrato com a empresa. Entre 1997 e 2005, a empresa pagava uma renda anual ao Governo de 25 milhões de patacas. No entanto, as quebras dos lucros fizeram com que o contrato passasse a prever um pagamento mais reduzido de 15 milhões por ano.

“Na altura foi ponderada a diversidade do jogo e o facto do Jockey Clube de Macau contribuir para a oferta de pontos turísticos no território”, explicou Lionel Leong.

Quanto ao facto da concessão ter sido renovada, em Fevereiro, durante mais 24 anos e seis meses, o actual secretário para a Economia e Finanças recordou que a empresa está obrigada a investir 1,5 mil milhões patacas.

 

 

 

Lionel Leong responde Ho Iat Seng

Na corrida ao lugar de Chefe do Executivo, dois dos nomes mais falados têm sido os de Lionel Leong e Ho Iat Seng, presidente da Assembleia Legislativa. Ontem, o actual secretário para a Economia e Finanças não quis deixar Ho sem resposta, após o presidente da AL ter criticado os secretários por se encontrarem com os ministros da China durante a Assembleia Popular Nacional. “Agradeço-lhe [a Ho Iat Seng] a atenção prestada. Mas como um dos titulares de alto cargo tenho de manter o diálogo e aprender e saber mais sobre situação nacional”, começou por dizer Lionel Leong. “Seguimos o Chefe do Executivo. Os contactos foram feitos através do Gabinete do Chefe do Executivo, que é quem comunica com os vários ministérios para organizar os encontros. Só a partir desse momento é que participamos nas reuniões”, acrescentou.

22 Mar 2018

Fórum Macau, 15 anos | Necessária aposta nas empresas e mais meios

Além do papel institucional que o Fórum Macau tem tido nos últimos 15 anos, há ainda muito a fazer como, por exemplo, aprofundar ligações com empresas e associações do sector e disponibilizar “mais meios”, defendeu Jorge Costa Oliveira. Um seminário fez a radiografia de um organismo que, anos depois da sua criação, ainda não coordena o fundo financeiro criado por Pequim e que só no próximo ano deverá ter uma sede própria

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Fórum Macau encarou-se a si próprio em dois seminários que contaram com a presença dos actuais e antigos dirigentes, incluindo o ex-Chefe do Executivo, Edmund Ho e do ex-secretário para a Economia e Finanças, Francis Tam, que se fez acompanhar de Echo Chan, secretária-geral adjunta do Fórum.

Jorge Costa Oliveira, ex-secretário de Estado da Internacionalização do Governo português e antigo membro do primeiro Executivo da RAEM (foi membro do extinto Gabinete para os Assuntos do Direito Internacional), recordou os tempos em que, na Administração portuguesa, o Fórum Macau era apenas uma ideia.

“Foi no período posterior à transição que houve a coragem de lançar o Fórum Macau. A ideia de Macau como plataforma para promover a ligação nas áreas económica e comercial entre a China e os países de língua portuguesa já existia, mas a verdade é que nenhuma ideia é interessante se não houver vontade de a concretizar. Na China houve essa vontade.”

Em 15 anos houve muitas acções de formação para quadros de Macau e dos países de língua portuguesa, nas mais diversas áreas, além da promoção de eventos empresariais. Pequim criou um fundo financeiro para grandes projectos de infra-estruturas, chamado de Fundo de Cooperação para o Desenvolvimento que, anos depois, continua a ser gerido por Pequim.

A sede do Fundo deverá ser transferida para a RAEM, onde já trabalha uma equipa de profissionais oriunda do continente. Ainda assim, Xu Yingzhen, secretária-geral do Fórum Macau, continua a não ter certezas do número de projectos que estão por aprovar e quais os montantes envolvidos. Há, para já, apenas quatro projectos aprovados para receber o dinheiro do Fundo, localizados em Moçambique, Angola e dois no Brasil.

Vários anos depois da sua criação, o Fórum Macau continua a não ter um espaço próprio. O edifício, localizado próximo do lago Nam Van, está actualmente em construção e só deverá abrir portas no próximo ano.

À margem do evento, Xu Yinghzen disse aos jornalistas que o futuro passa por uma maior aproximação aos empresários, uma sugestão que foi, aliás, defendida por vários oradores presentes nos seminários.

A voz às empresas

“Foi afirmado que deve haver uma orientação dos trabalhos para o sector empresarial e que essa ligação se deve aprofundar ainda mais para que o Fórum ofereça serviços e para que o sector empresarial possa aproveitar mais informações e oportunidades de investimento. Isso coincide com o nosso propósito, pois o corpo principal é o sector empresarial. Temos de trabalhar mais para que o sector empresarial de cada país possa aproveitar mais o nosso Fórum”, adiantou.

Para dar uma melhor resposta aos anseios dos empresários no futuro, Xu Yingzhen promete mudanças. “Nos últimos anos, o secretariado investiu muitos esforços neste tipo de contactos com associações e firmamos alguns memorandos com associações locais e com o interior da China e todos os anos participámos em encontros empresariais. No futuro vamos investir mais esforços.”

A secretária-geral garantiu que o Fórum tem trabalhado em parceria com o Fundo de Cooperação para o Desenvolvimento e com o Instituto de Promoção do Investimento e Comércio de Macau (IPIM), mas que é necessário fazer mais.

“Acho que trabalhamos algumas vezes para o mesmo propósito, que é o de fornecer mais serviços ao sector empresarial. Participamos em muitas actividades organizadas pelo IPIM e este também nos apoia em algumas actividades. Em relação ao Fundo, eles têm os seus próprios procedimentos de avaliação dos projectos e, nesse sentido, o Fórum nunca intervém. Somos um canal para que o Fundo se possa apresentar.”

Omoletes com mais ovos

Uma das vozes que defendeu uma maior aproximação ao sector empresarial foi Jorge Costa Oliveira, actualmente CEO da empresa de consultadoria JCO Consulting.

“Uma das áreas de grande potencial para o futuro do Fórum Macau é a cooperação ao nível das associações empresariais. O Fórum tem feito um trabalho notável de promoção da China e das suas oportunidades, a todos os níveis, dando a conhecer as oportunidades que existem nos PALOP junto dos empresários chineses. É uma tarefa difícil, porque, no resto do mundo, todos sabemos que existem grandes oportunidades na China, mas a verdade é que na China há grandes oportunidades dentro do país, à volta dele e agora na Rota da Seda.”

Contudo, “há muito trabalho a fazer ainda”, frisou. “O trabalho que o Fórum tem feito é, sobretudo, institucional. Há uma tentativa grande de envolver entidades e agências públicas a nível central, provincial e local. Mas o seu grande objectivo é contribuir para aumentar as relações comerciais entre a China e os PALOP. E a verdade é que quem importa, exporta e investe, são as empresas.”

Na prática, Jorge Costa Oliveira defendeu uma concentração da acção do Fórum Macau nas principais cidades dos países envolvidos nesta iniciativa do Governo Central. “Faz sentido haver uma concentração nas principais áreas metropolitanas e trabalhar com associações comerciais dessas áreas. Conhecer as oportunidades e sectores para que se deve olhar. O próximo salto qualitativo, que é importante que o Fórum faça, sem prejuízo do trabalho que já faz hoje, é uma maior proximidade em relação às associações empresariais, para poder chegar de forma mais directa ao mundo das empresas.”

Para Jorge Costa Oliveira, “ambição” é a palavra que interessa para os próximos anos. “Todos nós queremos um Fórum mais ambicioso e achamos importante que possa continuar a progredir, mas este tem de ter mais meios e não se podem pedir mais omoletes com os mesmos ovos”, frisou.

“Deve existir articulação entre o Fórum e as novas possibilidades que foram atribuídas a Macau, e estou a pensar na plataforma financeira, onde temos de trabalhar mais. Grande parte do capital que esteve disponível nas últimas décadas, de entidades públicas chinesas, vai diminuir e vão existir mais exigências em termos de análise de risco.”

Chegar a mais países

Chen Jian, ex-vice-ministro do comércio da China, defendeu que o Fórum Macau “tem de ser um mecanismo aberto”, tendo apontado a necessidade de chegar a “países terceiros”.

“Temos de ter inovação na nossa actuação e agir de acordo com as necessidades dos países. Podemos colocar todos os projectos nas instalações do Fórum, para que as pessoas saibam quais as situações actuais dos países, tal como o nosso novo membro, São Tomé e Príncipe. Se os projectos não forem divulgados atempadamente as pessoas não os vão conhecer”, frisou Chen Jian.

Henrique Horta Santos, representante da Guiné-Bissau no Comité de Estabilidade Financeira na União Monetária Oeste Africana, falou da necessidade de maior conhecimento entre países, em termos de panorama económico, cultura e idioma.

“Existem empresários chineses que não conhecem bem a realidade dos países. Sem pôr de parte os riscos envolventes, terá de haver uma campanha séria de sensibilização para que os países possam estar interessados. Tanto a Guiné-Bissau como a China e Macau têm interesse em aprofundar o conhecimento, porque o capital só vai onde se sabe que o risco é controlado. Não deixa de ser preocupante o desconhecimento, o factor língua e as realidades de cada país.”

 

Embaixador da Guiné-Bissau fala num maior empenho do Fórum

O embaixador da Guiné-Bissau em Pequim defendeu ontem “um maior empenho e envolvimento pleno de todos os países de língua portuguesa” no Fórum de Macau para reforçar a cooperação multilateral.

Malam Sambu intervinha na sessão de abertura do seminário do Fórum Macau, por ocasião do 15.º aniversário da sua criação e da plataforma entre Pequim e o bloco lusófono. “A pretendida cooperação multifacetada, em ambiente político-económico internacional complexo e com desafios de tão grande dimensão, impõe um maior empenho e envolvimento pleno de todos os países de língua portuguesa”, declarou.

O decano dos embaixadores lusófonos em Pequim referia-se à iniciativa chinesa “Uma Faixa, Uma Rota”, a cooperação da capacidade produtiva e a construção da zona da Grande Baía de Guangdong, Hong Kong e Macau.

Malam Sambu sublinhou a necessidade de “um maior nível de organização e operacionalização” dos países-membros – China e os oito países de língua portuguesa (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste).

“Uma melhor coordenação futura” dos países-membros, com a “definição de objectivos e metas comuns” com o secretariado permanente do Fórum, é fundamental para aumentar a cooperação entre a China e o bloco lusófono, disse.

“A cooperação entre a China e os países de língua portuguesa atingiu já um patamar que pode ser considerado relevante, mas podemos antever a expressiva dimensão que poderá ter no futuro”, considerou.

No início da sessão, o secretário para a Economia e Finanças da Macau, Lionel Leong, afirmou que o Governo do território “vai continuar a apoiar os trabalhos do Fórum e a empenhar-se na cooperação entre a China e os países de língua portuguesa”. “A cooperação e o intercâmbio económicos obtiveram resultados notáveis”, destacou o responsável, sobre o papel de Macau como plataforma entre a China os países lusófonos.

Na sua intervenção, o director do departamento para os assuntos de Taiwan, Hong Kong e Macau do Ministério do Comércio chinês, Sun Tong, sublinhou que “as trocas comerciais entre Pequim e o bloco lusófono aumentaram mais de dez vezes nos últimos 15 anos”. “A China insiste na cooperação internacional através da iniciativa ‘Uma Faixa, Uma Rota’ e procura um novo padrão de abertura, ao mesmo tempo que pretende aprofundar a cooperação com os países de língua portuguesa em vários domínios”, afirmou.

 

São Tomé e Príncipe, um ano de adesão

Um dos novos passos dados pelo Fórum Macau foi a adesão de São Tomé e Príncipe, depois do corte de relações diplomáticas com Taiwan. Hélio Almeida, Governador do Banco Central e ex-ministro do Plano e Finança do país, defendeu que o Fórum Macau “está numa fase de consolidação”, sendo “importante trilhar novos caminhos”. “[Existe] a questão da imagem e credibilidade, a questão financeira e encontrar o que cada um dos membros do Fórum tem de melhor. No caso de São Tomé, é um país pequeno, temos de ver o que é possível fazer de diferente. E depois passa-se para uma expansão que é natural e incontornável.”

22 Mar 2018

Rota das Letras | Exposição retrata relação entre cidade e o rio

[dropcap style=’circle’] M [/dropcap] aria José de Freitas é a curadora de uma exposição que conta pedaços da história de Macau e do o rio que rodeia o território. “Rivercities crossing borders: history and strategies” está patente no edifício do Antigo Tribunal até domingo, mas poderá deslocar-se a outros países

A exposição “Rivercities crossing borders: history and strategies”, com curadoria da arquitecta Maria José de Freitas, desaguou no edifício do Antigo Tribunal. Inserida no programa deste ano do festival literário Rota das Letras, a mostra apresenta em imagens parte da relação do território com o delta do Rio das Pérolas, e está relacionada com uma palestra que decorreu a semana passada, também no âmbito do festival.

Ao HM, Maria José de Freitas explicou a ideia por detrás de uma exposição que mostra a visão de fotógrafos como Carmo Correia, Gonçalo Lobo Pinheiro, António Mil-Homens e João Miguel Barros. Estão também incluídos desenhos de Guilherme Ung Vai Meng sobre os estaleiros de Lai Chi Vun, sem esquecer os esboços do plano da Baía da Praia Grande, da autoria dos arquitectos Manuel Vicente e Adalberto Tenreiro.

“Estamos cá há cinco séculos e pensei que Macau poderia ser um bom ponto de partida para esta reflexão conjunta, daí ter convidado diversos artistas locais e fotógrafos para nos fazerem uma apresentação do seu trabalho. Os fotógrafos que contactei são residentes de Macau, que têm esta perspectiva muito contemporânea da relação cidade-rio e que procuram recantos onde ela ainda ocorre.”

A exposição, que pode ser visitada até ao próximo Domingo, estende-se até à sala onde decorrem as palestras, revelando imagens que mostram uma panorâmica de Macau e a sua relação com a China, incluindo os novos aterros em construção.

Na visão de Maria José de Freitas, tratam-se de imagens exemplares “do ponto de vista da ligação entre margens, porque tudo isto é território chinês, embora esteja sujeito a uma administração diferente”. “É interessante perceber até que ponto esta ligação entre margens se pode fazer e manter alguma diferenciação relativamente a Macau, no que diz respeito ao seu passado histórico. Como forma de intervenção, pareceu-nos interessante mostrar o trabalho que permitiu uma nova frente de desenvolvimento para a cidade”, acrescentou a arquitecta.

Maria José de Freitas lamenta que um território que se foi desenvolvendo a partir da sua relação com o rio esteja hoje em dia distante dele, graças aos inúmeros tapumes espalhados pela cidade. “Há zonas em que há um divórcio, ou porque são zonas de novos aterros, ou porque estão ainda em vias de desenvolvimento, cobertas com tapumes, em que o rio é uma fronteira que nos separa da outra margem. Eu, os artistas que participam na exposição e os oradores da conferência, procuramos esbater essas fronteiras, como se esse rio pudesse transbordar e ser mais comunicativo e culturalmente mais válido e interessante.”

 

Imagens mais além

“Rivercities crossing borders: history and strategies” pode vir a cruzar fronteiras, embora a sua curadora ainda não tenha planos concretos para tal. Contudo, há um desejo de mostrar estes desenhos e imagens em países de língua portuguesa, por exemplo.

“Seria interessante levar a exposição a outros locais, mas ainda estou a averiguar”, contou. “Quando lancei o tema para a mesa procurei que se realizasse a conferência e a exposição, porque elas são complementares entre si. É um primeiro passo numa situação que gostaria de desenvolver no futuro. Depois da realização da conferência, e na sequência da inauguração da exposição, tenho encontrado artistas, pessoas associadas às artes plásticas que trabalham com elementos ligados à água, e que mostraram interesse em participar em futuras conferências e exposições que se venham a realizar. Da parte dos arquitectos e urbanistas de Macau a resposta também foi positiva”, rematou Maria José de Freitas.

A conferência que está ligada a esta exposição decorreu na passada Sexta-feira e teve como objectivo “analisar o papel dos rios como rotas, espaços de comunicação e diálogo, tendo como ponto de partida a cidade de Macau e outras cidades asiáticas”, explicou Maria José de Freitas à agência Lusa.

Os oradores, todos provenientes de cidades costeiras, analisaram os desafios e oportunidades históricas e a projecção futura, tendo em vista o projecto do Pan-delta do rio das Pérolas, entre nove províncias da região (Fujian, Jiangxi, Hunan, Guangdong, Guangxi, Hainan, Sichuan, Guizhou, Yunnan) e as duas regiões administrativas especiais chinesas, criado em 2004.

“É importante situar Macau neste contexto, que não é apenas económico, mas também cultural, e perspectivar o futuro”, disse a organizadora, destacando a intervenção de Wallace Chang Ping Hung, professor associado da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Hong Kong, sobre aquele projecto.

Maria José de Freitas destacou ainda a intervenção de Xu Ying sobre a experiência da cidade de Wuhan, na província chinesa de Hubei (centro), focada na protecção do património e da sua reutilização em termos contemporâneos.

“Wuhan está no delta de quatro rios e está a recuperar o património e herança de influência francesa, o que nos pode levar a reflectir sobre as zonas do porto interior e exterior de Macau”

21 Mar 2018

Mercado de arte: China é número dois a nível mundial e lidera na Ásia

O relatório “UBS Global Art Market”, divulgado pela organização da Art Basel de Hong Kong, aponta para um crescimento de 12 por cento nas vendas de arte em todo o mundo, contrariando uma tendência negativa que se vinha registando há dois anos. A China é o segundo maior mercado mundial, mas de acordo com Margarida Saraiva, curadora do Museu de Arte de Macau, nem assim o território tira vantagens: há poucos dealers e nenhuma galeria financeiramente sustentável

 

[dropcap style≠‘circle’]O[/dropcap] aparecimento de uma nova vaga de milionários e bilionários na China nos últimos anos fez com que o país tenha começado a dominar o mercado de arte a nível mundial. De acordo com o mais recente relatório divulgado pela organização da feira Art Basel de Hong Kong, intitulado “UBS Global Art Market Report”, a China é o segundo maior mercado de arte do mundo, com 21 por cento de vendas, enquanto que os Estados Unidos continuam a liderar. O continente ultrapassou mesmo o Reino Unido, que registou apenas 20 por cento das vendas. Sem surpresas, a China foi o país com mais vendas na Ásia.

O relatório elaborado pela economista Clare McAndrew, especialista na área cultural, revela também que o mercado de arte global contrariou uma tendência de quebra que se vinha verificando nos últimos anos, ao ter sido registado um aumento global de vendas na ordem dos 12 por cento face a 2016. O ano passado o sector deu trabalho a três milhões de pessoas em todo o mundo, com a operacionalização de 310 mil negócios com transacções comerciais na ordem dos 19.6 biliões de dólares.

Margarida Saraiva, fundadora da plataforma cultural BABEL e curadora do Museu de Arte de Macau (MAM), refere que o novo posicionamento da China neste mercado “é notável”, mas “não surpreendente, porque é uma extensão do desenvolvimento económico geral”.

Países asiáticos como o Japão, Coreia do Sul, Índia e Indonésia representaram, em conjunto, 23 por cento do mercado, o que revela o verdadeiro sucesso da China neste sector. Os números da China e da Ásia mostram “uma forte dinâmica de riqueza e de mercado, o que sugere que esta fatia de mercado pode vir a aumentar no futuro”.

O relatório aponta ainda para um enorme crescimento das vendas de arte online, que representam hoje em dia oito por cento do valor total de vendas, atingindo os 5.4 biliões de dólares americanos. Um aumento de dez por cento por ano e de 72 por cento nos últimos anos.

Para Margarida Saraiva, “este facto é absolutamente extraordinário” e mostra que houve um “aumento muito significativo de coleccionadores à escala global”. “Não se trata aqui de grandes coleccionadores, museus, galerias, mas novos coleccionadores que apresentam também comportamentos novos, capazes de prescindir de um contacto directo com a obra de arte, antes da sua aquisição”, apontou ainda.

O documento indica ainda a grande representatividade das vendas a cargo dos “dealers”, ou negociantes de arte, que constituíram 53 por cento do valor de mercado, um aumento de quatro por cento. Estas vendas representaram, em 2017, um total de 33.7 biliões de dólares.

Já os leilões representaram apenas 47 por cento das vendas em todo o mundo. De acordo com Margarida Saraiva, “esta alteração inverte uma tradição muito antiga, segundo a qual as vendas em leilões eram normalmente superiores”.

Mesmo com a existência do mercado da Internet, as feiras de arte “continuam a ser uma parte central do mercado global de arte”, refere o relatório, uma vez que as vendas agregadas se cifraram nos 15.5 biliões de dólares o ano passado, mais 17 por cento. As feiras contaram com a participação de 46 por cento dos negociantes de arte a nível mundial, cujo custo de participação também aumentou 15 por cento em relação a 2016.

Macau sem benefícios

Apesar de ser uma região administrativa especial chinesa, Macau, é um pequeno território em termos de mercado de arte, onde não existem leilões, os coleccionadores são raros e não existem galerias de arte financeiramente auto-sustentáveis sem o apoio de subsídios do Governo.

Para Margarida Saraiva, é difícil que o território venha a tirar partido deste posicionamento da China no mercado global de arte, porque é um posicionamento “que tem a ver com as vendas”. “Quem é que em Macau poderá beneficiar deste novo posicionamento da China? Naturalmente, os ‘dealers’ que se dedicam à venda de obras de arte podem beneficiar, porque havendo mais potenciais compradores, haverá mais hipóteses de venda. Mas quais são? Que eu conheça não passam de uma dezena.”

Além disso, “não há registo de galerias bem sucedidas ou sequer sustentáveis. Depois é preciso ver o que é que se compra na China para ajustar a oferta. Não vejo, nenhuma razão em particular que possa levar os compradores a virem comprar em Macau”, apontou ao HM.

Margarida Saraiva refere que, para colmatar esta situação, é fundamental fazer “um trabalho mais de fundo e sério, através da realização de exposições que possam participar dos principais debates contemporâneos e por essa via atrair jornalistas, especialistas, curadores, críticos e coleccionadores”.

No que diz respeito aos artistas locais, estes devem “encontrar dealers em Hong Kong, em Xangai, em Pequim, participar em feiras, expor e ainda procurar fazer uso nas grandes plataformas de venda online, capaz de lhes abrir um mercado em todo o mundo”. Só assim poderão beneficiar do posicionamento da China no que diz respeito às vendas, descreve Margarida Saraiva.

Nesse sentido, a curadora do MAM deposita algumas esperanças na primeira edição da Macau Photo Fair, que inaugura já esta sexta-feira no Venetian, e que se dedica exclusivamente ao mundo da fotografia.

“No essencial, parece-me reunir mais condições para desenvolver um trabalho interessante do que a feira que se tentou fazer há uns anos. Primeiro porque encontrou um nicho, que a distingue da Art Basel, ao escolher dedicar-se apenas à fotografia, vídeo e novos media. Depois porque estabeleceu o seu calendário por forma a beneficiar do público da Art Basel, tendo garantido a presença de alguma importantes galerias internacionais.”

Arte online: os riscos

Como mostra o relatório divulgado pelos organizadores da Art Basel, a venda de arte online é cada vez mais uma tendência e pode passar, a título de exemplo, pelo download pago de fotografias. Margarida Saraiva destaca ainda a possibilidade de se realizarem bases de dados sobre as preferências dos coleccionadores.

“A novas grandes plataformas de venda de obras de arte online oferecem aos consumidores opções como fazer o upload da fotografia da sua sala de estar, do seu escritório, e testar diferentes obras colocadas virtualmente nesse espaço, oferecendo simultaneamente consultoria artística e de decoração de interiores, como serviços complementares personalizados. Além disso, registam os interesses dos coleccionadores, através de cada clique que se faz no site, desenvolvendo bases de dados sobre cada indivíduo que permitem campanhas de marketing altamente dirigidas para os gostos e preferências do potencial comprador.”

Apesar de estarmos perante uma “verdadeira democratização do mercado da arte”, Margarida Saraiva alerta para a banalização da mesma com as vendas online. “O risco para a arte é ver-se transformada em objecto decorativo ou em bibelô”, frisou a curadora, lembrando que “esta abordagem permite um aumento muito significativo dos coleccionadores e pode favorecer os artistas menos bem sucedidos nos círculos mais académicos ou nos museus. Algo que, em geral, traz outras preocupações em relação à arte e as práticas artísticas, favorecendo um entendimento segundo o qual uma obra de arte expande os horizontes de um certo tempo, o que não é compatível com as intenções do mercado ou dos coleccionadores menos informados”.

Falar de mercado de arte é também sinónimo de falar de milionários. Em 2017 um total de 35 por cento de milionários em todo o mundo “eram coleccionadores de arte activos”, sendo que, a nível global, as suas fortunas não pararam de crescer. O preço médio comum para a compra de obras de arte foi, no mínimo, de cinco mil dólares (de acordo com 79 por cento dos inquiridos), sendo que 93 por cento diz ter adquirido obras com um valor abaixo dos 50 mil dólares. Menos de um por cento dos compradores admitiu ter gasto mais de um milhão de dólares em obras de arte. Cerca de 86 por cento afirmou nunca ter vendido uma peça de arte da sua colecção particular, sendo que 32 por cento, comprou obras de arte como forma de investimento.

21 Mar 2018

Rui Tavares, sobre período pós-Brexit: “Nesse cenário deveríamos prestar mais atenção a Macau”

O historiador e político acredita que Macau tem muito a ganhar quando for oficializada a saída do Reino Unido da União Europeia. Rui Tavares defende ainda que o projecto europeu deve continuar a lutar contra a fuga de capitais para offshores, que todos os anos representa perdas de um bilião de euros
FOTO: Eduardo Martins / Rota das Letras

[dropcap]H[/dropcap]á pouco defendeu que o projecto europeu tem de se democratizar mais, mas continua a acreditar nele.
Não é muito popular nesta fase ser pró-europeu [referindo-se à posição que o partido que fundou, o LIVRE, assume]. O que paga mais neste momento é inventar razões para deitar fora o projecto europeu, e seria um erro enorme abandoná-lo. Quando olhamos para o resto do mundo ainda ficamos mais convictos de que o projecto europeu tem defeitos, que há boas razões para muita gente estar frustrada e insatisfeita com ele, mas a atitude correcta a ter é refundar o projecto europeu e democratizá-lo, legitimá-lo mais junto dos cidadãos, e dotá-lo de instrumentos, através dos recursos próprios da UE, que permitam à UE ser mais forte nos tempos que aí vêm. Há que proteger mais os seus cidadãos, investir mais no futuro, nas universidades, na juventude, no combate à fuga de cérebros. Seria um erro estratégico crasso, neste cenário de que já falamos, com Trump de um lado, Putin do outro, Erdogan às portas da Europa, a China numa trajectória ambivalente, porque em alguns aspectos, nos últimos dois anos, a China tem-se tornado numa aliada valiosa da UE.

Em que áreas?
Pelo menos em duas coisas importantes: o combate às alterações climáticas e a luta pela preservação do sistema internacional à volta da ONU. É importante para a UE ter relações com todas estas partes do mundo e tê-las com elementos pragmáticos. Mas enfraquecermo-nos a nós mesmos, numa altura em que o mundo está a ficar multipolar e concentrado em homens fortes…seria um erro não contarmos com um projecto mais plural, que não deve ser imperialista e hegemónico, mas deve preservar numa parte do mundo o que eu chamo um patriotismo dos direitos humanos e um referencial para quem defende a democracia e os direitos humanos.

Relativamente à era pós-Brexit, qual deve ser o papel de Macau nesta matéria?
Se [o território] vai tirar partido, ou não, não sei, depende da maneira como souber gerir essa nova fase. Nitidamente é uma coisa que vai mudar uma espécie de paridade política que, de certa forma, existe, apesar da diferença de dimensões entre Macau e Hong Kong. Os embaixadores de Hong Kong no Parlamento Europeu e no Conselho vão deixar de existir, porque eram os representantes britânicos. O Reino Unido também vai perder peso dentro do Conselho de Segurança da ONU, porque há sempre quatro ou cinco países que são da UE. Portugal e Macau não perdem isso. Portugal e Macau, e dentro de Macau a comunidade portuguesa, passam a ter um papel de representante da UE nesta parte do mundo, um papel mais singular, e que só teria a ganhar em ser reforçado com a sua correspondência de representação junto de instituições europeias. Há muito caminho a fazer e acho que num cenário pós-Brexit deveríamos prestar mais atenção a Macau, pois pode representar um sítio privilegiado de uma relação com a UE, único após-Brexit de uma relação diferenciada com a UE, e na própria UE prestar-se também muita atenção a Macau como plataforma, que já o é, para a lusofonia. O Governo de Macau também tem muito para fazer. Há muitas cidades e regiões que têm uma representação junto da UE, e isso faz sentido.

A inclusão de Macau na lista negra de paraísos fiscais gerou alguma polémica [o território já foi retirado]. Houve um erro que gerou tensão com a China?
Acho que a UE deve trabalhar cada vez mais para garantir que os sistemas fiscais funcionam, que os Estados não ficam sem recursos e que o dinheiro que faz falta aos nossos hospitais e escolas não nos foge entre os dedos. E isso também é importante para os países terceiros, com um sistema fiscal mais justo que beneficia toda a gente. Há espaço para acordos internacionais à escala global que permitam fazer uma redistribuição de recursos. Acho natural que outros Estados possam ter algo a dizer em relação às listas que são elaboradas sobre legislações opacas. Devemos preparar-nos para uma maior actividade interna e externa da UE relativamente à evasão fiscal, sobretudo depois dos Panama Papers. Perde-se, na UE, todos os anos, um bilião de euros. Isto é tanto dinheiro que é mais do que todo o orçamento da UE para sete anos. Se recuperássemos uma fracção do que se perde, isso iria significar a resolução de problemas ligados ao endividamento externo e uma segurança maior para os cidadãos em termos do Estado social.

continue a ler a entrevista a Rui Tavares
20 Mar 2018

Rui Tavares, historiador e político, sobre Macau: “Até 2049, Portugal tem responsabilidades”

Historiador, político, ex-deputado europeu, Rui Tavares teme que as alterações à Constituição chinesa possam “vir a fazer escola” no mundo. Sobre Macau, o convidado do festival Rota das Letras lamenta que não haja um maior acompanhamento da parte da Assembleia da República e que Portugal ainda tem “obrigações morais e políticas importantes, enquanto garantia da autonomia de Macau dentro do Direito Internacional”

[dropcap]H[/dropcap]Há muitas vozes que dizem que a alteração à constituição chinesa é um retrocesso relativamente à revisão da constituição feita por Deng Xiaoping na década de 80. Concorda?
Concordo que há um retrocesso, que aliás é global. Estamos a assistir a um endurecimento dos regimes no mundo, e aqueles, como na União Europeia (UE), que não o estão a fazer, têm dentro de si regimes que têm estado a endurecer, como os EUA, Turquia, Rússia, Brasil. Há uma série de fenómenos muito preocupantes. E a China foi, de certa forma, mexer num processo que tem sido vantajoso para a China, e isso pode ser problemático para o país. O processo que, apesar de não ter correspondido a uma abertura generalizada, permitiu uma rotação de quadros políticos no topo da hierarquia chinesa, foi muito benéfico para a China nas últimas décadas. Substitui-lo por um processo em que o mesmo líder político pode ficar [no poder] indefinidamente não só pode ser problemático como coloca a seguinte questão: qual é o problema para que esta decisão propõe ser a solução? Ou seja, qual era exactamente o problema que a China tinha que necessitava de ser resolvido através de uma emenda constitucional como esta? Não se vê nenhum.

É uma questão de ideologia?
É uma questão de concentração de poder. Os Executivos têm uma propensão para concentrar poder que, normalmente, só é contida pelas constituições ou pela força da sociedade civil. Em casos que estudei, como o da Hungria, faltaram esses dois elementos, pois o poder podia mudar a Constituição e a sociedade civil não foi suficientemente forte para o conter. Depois do poder ter a concentração de autoridade que pretende, em geral, não a larga. Na Hungria não largaram.

No último congresso do Partido Comunista Chinês (PCC) foi afirmado que estamos numa nova era para o socialismo com características chinesas. Que socialismo é este? O que vem aí em termos de ideologia política?
Parece-me claro que há a assunção oficial de uma doutrina, segundo a qual a grande diferença que interessa não é entre autocracias e democracias, é entre a boa e má governança, e que é muito conveniente para as autoridades chinesas. Esta destina-se a minimizar a importância da existência de liberdades cívico-políticas e da capacidade de escolha, e a maximizar aquilo a que os cientistas políticos chamam de “output legitimacy”. Ou seja, o regime é legítimo quando produz, de acordo com esta doutrina, que me parece errada, consequências desejáveis para a população. Se a economia está a crescer, se há emprego, estabilidade e segurança nas ruas, o regime é legítimo. Eu não vou negar que todas estas coisas são importantes, mas os regimes não podem utilizar essa legitimidade dos resultados como forma para ter uma legitimidade dos resultados, como se fosse desculpa para desconsiderar a legitimidade dos processos, nomeadamente os processos democráticos. O que é preocupante não é só para a China, mas também para o resto do mundo.

Que exemplos pode referir?
O regime da RPC, ao contrário da Rússia, é um regime desejável do ponto de vista em que há muitos outros países que desejam ser como a China, ter o seu tipo de performance. Ao passo que, quando se olha para a Rússia, tem uma posição mais retórica, com traços de uma paranóia geopolítica, o que faz com que gere as suas próprias resistências. O modelo chinês é mais exportável. Esta ideia de dizer que esta distinção entre autocracia e democracia não importa, porque o que importa é se produz boa ou má governança, é uma ideia perigosa porque é sedutora para muitos governos, incluindo no Ocidente. Não é um discurso assim tão diferente do que têm alguns burocratas da UE, que dizem que a UE não tem de ser mais democrática, porque o que é preciso é crescer mais e produzir mais emprego. Ninguém nega isso, mas é evidente que a falta de democracia na UE nos levou a onde estamos hoje. No mundo em que olhamos para os grandes blocos, e grande parte deles são liderados por regimes que estão em vias de se tornar mais autoritários, se a UE, se quer legitimar mais junto dos seus cidadãos e manter a sua credibilidade para o resto do mundo, tem de se democratizar. O que mais me preocupa é que parece que essa doutrina [da China] vai fazer escola.

Uma notícia apontava mesmo para o facto de muitos países africanos estarem a ponderar alterar as suas constituições para reforçar o poder presidencial e até Donald Trump fez elogios a Xi Jinping. Vêm aí tempos perigosos e de alguma inquietação?
Vêm. Temos uma situação muito ambivalente: existem ferramentas, acesso à informação, tecnologia e níveis educacionais altos que nos permitiriam gerir os nossos Estado-nações e organizações de forma mais democrática, dando mais respostas aos anseios das populações, mas não há como negar que este combate vai ser difícil nos próximos anos. Numas partes do mundo será mais arriscado do que noutras. O que é importante é que a sociedade civil à escala global seja capaz de criar redes de solidariedade que transcendam as fronteiras do Estado-Nação. Preocupar-se mais com o que está a acontecer na China e também em Macau e Hong Kong. Estarmos mais preparados para ajudar os nossos co-cidadãos de outras partes do mundo, porque os próximos anos vão ser difíceis e precisamos de deter a regressão no Estado de Direito e na democracia noutras partes do mundo, porque regressa sempre às zonas do mundo onde estamos. A sociedade civil portuguesa pode achar que não tem importância o que se está a passar do outro lado do mundo, mas tem, e isso acaba por reverter para Portugal. No caso específico de Macau, Portugal tem obrigações morais e políticas importantes enquanto garante da autonomia de Macau dentro do Direito Internacional.

Em relação a esse ponto, Hong Kong tem um movimento independentista que não se verifica em Macau. O Reino Unido tem opinado muito sobre a questão de Hong Kong, mas Portugal tem evitado fazer comentários. À luz dessas obrigações de que fala, considera que o país deveria ter uma posição mais forte relativamente a Macau?
Portugal deve ter uma posição mais atenta e mais activa. O Ministério dos Negócios Estrangeiros ou o Governo podem agir de forma mais discreta, e às vezes nem sempre pública. Mas acho que o devem fazer. A Assembleia da República (AR) tem a obrigação de agir de uma forma mais política e mais pública. É pena que não haja um acompanhamento regular da situação de Macau, com uma comissão parlamentar que reúna regularmente, que produza relatórios anuais. É uma pena também que os parlamentares portugueses no Parlamento Europeu não façam em relação a Macau aquilo que eu e a Ana Gomes fizemos em relação a Timor, de servirem de quase embaixadores de Macau junto do Parlamento Europeu. De facto, a comunidade política portuguesa não tem estado tão atenta quanto as obrigações morais e cívicas de Portugal em relação a Macau justificariam. São obrigações que estão plasmadas em instrumentos bilaterais de Direito Internacional, como é o caso da Declaração Conjunta. No caso específico de Macau, não estamos a falar de ingerência, de interferência nos assuntos internos da China, desde que nos mantenhamos nos limites que Portugal sempre soube respeitar.

Só se olha para a questão económica e esquecem-se as questões sobre os direitos, liberdades e garantias, e o sistema político?
Acho natural que o Governo português tenha uma visão marcada por um certo pragmatismo em relação ao que são os interesses económicos do investimento directo chinês em Portugal e do papel que empresas portuguesas possam ter no mercado chinês. Mas é importante que a AR não se sinta limitada por esse papel. O Parlamento deve ter capacidade de ter uma posição política, de acompanhar e recolher factos acerca da situação dos direitos, liberdades e garantias em Macau, onde vive uma comunidade portuguesa muito grande e diversa. Se há coisa que retiro das minhas conversas com portugueses em Macau é que estes têm vontade que esta informação passe para Portugal, de que estão atentos, preocupados também, e que gostariam que houvesse de Portugal uma atenção em relação à questão de Macau nos próximos tempos, para que o desenvolvimento harmónico desta sociedade, da sua autonomia e das suas liberdades, seja garantido. Até 2049, Portugal tem as suas responsabilidades e deve cumpri-las. Mas isso não passa pela política do megafone, passa por fazer perguntas. De cada vez que haja uma questão que possa pôr em causa a garantia dos direitos e liberdades, deve perguntar-se o que se passou. Passa também por ouvir mais a sociedade civil de Macau, com mais fóruns em que esse esforço seja feito. Esse papel deve ser feito pela nossa diplomacia, de uma forma mais discreta, mas também pela nossa AR.

O Gabinete de Ligação teme que haja influências do movimento independentista de Hong Kong em Macau. Acredita que essa influência possa, de facto, acontecer?
O movimento independentista de Hong Kong acaba, muitas vezes, por ser usado como uma forma de condicionar o movimento democrático. Não me queria pronunciar sobre as veleidades independentistas, porque está para lá de um limite que é preciso respeitar em relação à soberania e integridade territorial da China. Hong Kong e Macau pertencem à China. Acho natural que os movimentos, pela representação política, pelo pluralismo, se reforcem mutuamente de um sítio para o outro, na medida em que isso for a demonstração de um anseio político que cabe dentro da Lei Básica e dentro dos pressupostos da Declaração Conjunta. Ninguém deve declarar-se preocupado ou ameaçado pelo facto de as sociedades quererem viver de acordo com os compromissos que os Estados tiveram perante elas. E que acreditam que, até 2049, serão cumpridos.

continue a ler a entrevista a Rui Tavares
20 Mar 2018

Carlos Damas faz digressão na China com um pé em Macau

[dropcap style =’circle’] É [/dropcap] uma digressão feita de estreias: não só será a primeira vez do violinista português Carlos Damas na China, como será também a primeira vez que os chineses poderão conhecer melhor o trabalho do compositor António Fragoso, falecido há 100 anos. A digressão de Damas na China decorre entre os dias 13 e 23 de Abril, estando previstos concertos nas cidades de Dalian, Jilin, Dongguan e Pequim, entre outras.

 

Em declarações ao HM, o músico, que viveu em Macau entre 1995 e 2000, falou do que o público chinês poderá esperar dos concertos desta tournée.

 

“Toquei pela primeira vez na China no ano de 1997, tive o privilégio de ser o único ocidental a actuar como solista no Festival de Artes da República Popular da China. Lembro-me que na altura o público parecia não saber como reagir ou agir perante uma performance musical, passaram-se bastantes anos e espero vir a ter nesta tournée um público mais participativo e vibrante.”

 

Sem concertos agendados, para já, em Macau, o violinista espera vir ao território no próximo ano. “Curiosamente recebi há cerca de um mês um contacto do Instituto Cultural de Macau, que me pediu para enviar uma proposta para o Festival internacional de Música de Macau de 2019, espero realmente poder voltar a tocar em Macau em 2019”, adiantou ao HM.

 

A homenagem a Fragoso

 

António Fragoso entrou na vida de Carlos Damas apenas em 2010. “Os descendentes do compositor ofereceram-me as partituras das obras para violino. Adorei a música e um ano depois estava a gravar essas obras para uma editora Holandesa. Essa gravação foi muito apreciada pela crítica internacional.”

 

A homenagem que será feita na China aconteceu um pouco por acaso. “Os concertos que vou realizar não foram programados para serem dedicados a António Fragoso. Como vem sendo meu hábito, faço questão de incluir uma obra portuguesa em todos os concertos que realizo, como este ano se comemoram 100 sobre a morte de António Fragoso, em tom de homenagem, decidi incluir no programa a sua sonata para violino que por sinal foi a última obra que escreveu.”

 

Para Carlos Damas, o compositor “foi um prodígio”, apesar de ter morrido com apenas 21 anos. “Segundo fontes que consultei, Fragoso nunca foi tocado na China continental (toquei em Macau obras suas em 2012). Estou curioso por sentir a reacção do público nos vários concertos que irei dar, na realidade a linguagem de Fragoso é distinta do habitual. O restante programa dos concertos é preenchido com obras de L. V. Beethoven e J. Turina”, contou.

 

A digressão de Carlos Damas no continente acontece numa altura em que o país começa a despertar para a música clássica. “Nos últimos anos a China assistiu a um boom na música clássica. Foram criadas muitas instituições de ensino, abriram muitas novas orquestras, e têm hoje em dia muitas excelentes salas de concerto, salas de primeira linha. Na minha tournée a sala mais pequena onde tocarei tem 1500 lugares, a maior 3000”, rematou o músico.

20 Mar 2018

Activismo | Na China, a censura tira poder ao movimento #metoo

Lijia Zhang trabalhou numa fábrica e aprendeu inglês sozinha até se tornar escritora. A autora do romance “Lotus”, que fala sobre a prostituição na China, disse ontem no Rota das Letras que a censura na internet faz com que o movimento #metoo não tenha ainda grande expressão no país. Zhang lamenta a fraca participação das mulheres na política

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] sua avó foi prostituta e foi sujeita à prática dos pés de lótus, a tradição chinesa de amarrar os pés para moldar a sua forma. A sua mãe passou a adolescência no período da Revolução Cultural e trabalhou numa fábrica estatal. Ela, Lijia Zhang, teve melhor sorte, num destino construído com as suas próprias mãos. Trabalhadora numa fábrica, como tantas outras mulheres, esforçou-se por aprender inglês e conseguiu lançar-se na carreira de escritora e é, hoje em dia, uma das autoras chinesas que mais colabora com os media internacionais. O seu romance de estreia, intitulado “Lotus”, fala da prostituição na China.

Convidada do festival literário Rota das Letras, Lijia Zhang falou ontem sobre o papel da mulher chinesa na sociedade contemporânea, e não teve dúvidas em afirmar de que o movimento #metoo, surgido na internet após as acusações de assédio sexual em Hollywood, não tem mais expressão no continente porque a censura na internet não deixa.

“Devido às restrições impostas pelo Governo não há um grande movimento #metoo na China. Algumas mulheres têm falado muito sobre isso, têm levantado a questão.” Além de muitos websites não estarem disponíveis na China, há também o facto do assédio sexual e igualdade entre sexos não estar, sequer, na agenda política.

“O Governo não quer implementar este assunto, quer ter a sua própria agenda com assuntos onde se sente confortável. Há alguns anos, cinco mulheres tentaram protestar contra o assédio sexual em locais públicos, e foram presas pela polícia”, exemplificou a autora, que não esquece o facto das mulheres terem uma baixa presença na política, incluindo nos principais órgãos do Governo e do Partido Comunista Chinês (PCC).

“Um dos problemas é a baixa participação das mulheres na política. Nas aldeias é possível votar, mas apenas dois a três por cento dos que ocupam cargos de topo são mulheres. Há ainda uma grande confusão em relação a esse assunto e pensa-se que as mulheres não devem ter um papel além da família, e que não têm visão. Na Assembleia Popular Nacional há uma baixa participação de mulheres, e no Politburo só existem as vozes dos homens. Infelizmente, na sociedade civil, esse tema também não tem estado na agenda”, apontou.

Apesar disso, a escritora afirmou que têm surgido alguns movimentos sociais em torno desta questão. “Há muitas questões relacionadas com a igualdade de género na China, graças à reforma e à abertura, e também se nota um activismo relacionado com esta matéria. Em 2012, houve um protesto contra a violência doméstica, por exemplo. Os movimentos activistas vêm de baixo, são espontâneos.”

Natalidade baixa

No que diz respeito à igualdade entre sexos, a autora foi questionada sobre o impacto que a abolição da política do filho único poderá ter nas famílias, numa altura em que é cada vez mais difícil, para as mulheres na China, terem trabalho durante a gravidez.

“Um dos problemas é que antes o Governo tinha essa responsabilidade [de controlo da natalidade], mas agora depende de cada empresa. As mulheres grávidas têm muito mais dificuldade em obter emprego, porque algumas empresas não querem assumir essa despesa da licença de maternidade no futuro. Essa é uma das razões pelas quais as mulheres agora não querem ter um segundo filho.”

Além disso, há também um maior anseio pela independência. “Não só é mais caro ter filhos como há também o facto de as mulheres de classe média quererem viver para si mesmas, não querem ter uma vida de servidão como teve a minha avó. Já não encaram o casamento e os filhos como a única via.”

Lijia Zhang recordou que as mulheres passaram a ter mais oportunidades nos anos 80, na época de abertura e reformas económicas levadas a cabo pelo presidente Deng Xiaoping. No período da Revolução Cultural havia uma espécie de igualdade entre sexos, à luz de doutrina maoísta. Foi neste período que a mãe de Lijia foi educada.

“O PCC trouxe uma maior esperança ao país, e uma das primeiras medidas adoptadas neste período foi o fim da prática dos pés de lótus, o fim das concubinas e maior acesso das mulheres à educação e ao emprego. A minha mãe teve a sorte de obter um trabalho numa empresa estatal, onde desempenhava um trabalho essencialmente masculino. Mas havia uma espécie de igualdade entre sexos, que negava a diferença entre homens e mulheres. A mulher modelo deveria vestir-se como um homem, parecer um homem.”

Avó inspiradora

Não foi por acaso que Lijia Zhang decidiu começar a escrever sobre prostituição. Tudo começou quando, em 1998, soube pela mãe que a sua avó tinha sido vendida, aos 14 anos, para um prostíbulo.

À semelhança de muitas outras meninas da sua idade, a avó de Lijia Zhang havia sido submetida à prática dos pés de lótus [em que os pés eram dobrados até terem um máximo de dez centímetros de comprimento, ficando deformados para sempre e com os ossos partidos]. Enquanto prostituta conheceu o marido, que a comprou.

Em 1949, os comunistas instauram a República Popular da China (RPC) e a prostituição passa a ser proibida, algo que se mantém até aos dias de hoje.

“Desde então que me tornei algo obsessiva com o tema da prostituição porque sempre imaginei como teria sido a vida da minha avó nesse período. Alguns meses depois de descobrir esse segredo viajei para Shenzen em trabalho e descobri um grupo de raparigas e percebi que vinham de zonas pobres na China e que muitas delas trabalhavam em fábricas. Foi uma importante janela para perceber as mudanças sociais, porque esse é uma das grandes problemáticas que a China enfrenta nos dias de hoje: a migração do campo para as grandes cidades e a crescente desigualdade entre homens e mulheres.”

Lijia Zhang descobriu que muitas das prostitutas na China são-no porque são obrigadas ou porque precisam de dinheiro. “A minha avó foi vendida para ser prostituta, e hoje em dia muitas das mulheres são prostitutas por opção, mas muitas vezes são forçadas a fazê-lo, ou porque são trabalhadoras com baixos salários, ou porque são vítimas de violência doméstica.”

O trabalho de Lijia Zhang confunde-se muitas vezes com o de Leslie Chang, autora do livro “Factory Girls: From Village to City in a Changing China”. Zhang foi, ela própria, uma dessas “factory girls”, e durante o processo de pesquisa para o seu livro percebeu que muitas delas acabam por recorrer à prostituição por não terem outra escolha.

“Algumas das prostitutas também trabalham na linha de produção e têm vidas muito duras, com salários baixos. Então também trabalham em casas de massagens, onde ganham muito mais. Há uma tentação pelo dinheiro.”

Na fase em que trabalhava na fábrica, e em que “odiava” a sua vida, Lijia Zhang conseguiu lutar em prol de uma existência melhor. “Comecei sozinha a aprender inglês, foi um processo bastante lento. Aprender outro idioma mudou a minha vida, porque de certa forma abriu-me os horizontes, e actualmente vivo da escrita.”

“Um ponto interessante é que falar diferentes línguas trouxe ao de cima vários aspectos da minha personalidade. Quando estava na fábrica via a BBC de forma obsessiva, para tentar falar com sotaque e para fingir que era sofisticada (risos). Costuma dizer-se que quando aprendemos uma nova língua ficamos com uma nova alma, e acho que foi isso que aconteceu”, rematou.

19 Mar 2018

Ferdinand Choi, músico e compositor

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ascido e criado em Macau, Ferdinand Choi é um guitarrista e compositor que faz questão de mostrar a terra onde nasceu nos seus videoclips. Exemplo disso é o vídeo promocional da música “When I Have You”, gravado nas tradicionais palafitas de Coloane.

Arranha no inglês mas faz dele o seu instrumento de trabalho. O gosto pela música começou cedo, pouco depois de terminado o ensino secundário. “Acabei a escola secundária e comecei a aprender a tocar guitarra. Numa primeira fase não cantava, mas depois como gostava muito de tocar guitarra passei a fazer parte de uma banda. Nessa banda eu já fazia algumas canções mas não cantava, havia outra pessoa a fazê-lo.”

Hoje Ferdinand Choi vive da música e toca três vezes por semana no bar Mugs, um pequeno espaço localizado na zona da Praia Grande. “Toco algumas canções chineses, em inglês também, canções pop. Numa noite posso tocar uma ou duas canções minhas”, explicou.

Mas não só: o músico já tocou em vários bares de Macau e até participou, em 2016, num concurso de música na China.

Apesar de ter gostado da experiência, no continente deparou-se com a competição, uma vez que há muitos talentos nas mais diversas áreas musicais.

“Na China há muitos músicos e muita competição. Mas foi uma boa experiência, porque nunca tinha participado em nenhum concurso antes. Há muitos músicos na China, bastante diferentes dos de Macau. É mais difícil ser músico na China. Macau é um território pequeno e não há muitos músicos e compositores, então não há essa competição. Na China há uma grande variedade de bons músicos.”

Afirmando que deve ser um dos poucos músicos de Macau que consegue sustentar-se com os concertos, Ferdinand Choi considera que, no território, “é difícil ser músico a tempo inteiro”. “Neste momento vivo da música, talvez seja um dos poucos que em Macau vive só disso. Tenho vindo a compor algumas canções nos últimos tempos”, frisou.

O primeiro disco

O músico de Macau já se aventurou no mundo dos álbuns, tendo apostado na gravação de “Meet”. O projecto foi feito em Taiwan, dada a diversidade e maturidade do mercado musical da Ilha Formosa.

“Já tinha muitas canções escritas nessa altura e queria gravar um disco. Muitos incentivava-me a fazê-lo. Então decidi ir para Taiwan gravar o álbum. Lá é mais barato e o mercado está mais desenvolvido, temos muitas escolhas de locais onde possamos gravar, há mais produtores e engenheiros de som, com mais experiência do que em Macau.”

Macau começa agora a despertar para o mundo da música e há uma nova geração de músicos e cantores a nascer, bem como de estúdios de gravação. Ainda assim, Ferdinand Choi assegura que as empresas ligadas às indústrias do jogo e do entretenimento desconhecem os talentos locais do mundo da música.

“Os casinos, por exemplo, não sabem que em Macau também há músicos, e muitas vezes acabam por contratar cantores de Taiwan, Singapura e Malásia. Só agora é que começam a ter noção de que em Macau também há muitos músicos. Muitas vezes estas empresas trabalham em parceria com agências de artistas e nós não trabalhamos com elas.”

Ferdinand Choi aposta tudo na sua página de Facebook para mostrar o seu trabalho. Aliás, para quem começa uma carreira, as redes sociais podem ser uma boa ajuda, assegura. “Actualmente o Facebook é uma boa ferramenta para mostrarmos o nosso trabalho, as redes sociais no geral. Além disso acabamos por não gastar dinheiro com a promoção do nosso trabalho.”

Nos próximos tempos Choi sabe que quer continuar a tocar e a cantar, sendo que a aposta numa carreira mais internacional está nos seus planos.

“Quero participar em mais festivais de música na China ou em Taiwan, e até no estrangeiro. Quero tocar as minhas próprias canções. Talvez no próximo ano estarei a trabalhar no meu próximo álbum”, rematou.

16 Mar 2018

Património | Novo Macau teme que Nam Van seja um novo NAPE

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Associação Novo Macau entregou um novo relatório à UNESCO onde alerta para a necessidade de maior protecção entre a zona B dos Novos Aterros e as zonas C e D junto ao lago Nam Van, para que não haja construção em altura como houve no NAPE.

A UNESCO voltou a receber das mãos da Associação Novo Macau (ANM) um novo relatório em que a entidade revela preocupação sobre a falta de preservação na zona envolvente da Igreja da Penha.

Sulu Sou, deputado suspenso temporariamente do hemiciclo e vice-presidente da ANM, defendeu ontem que o Governo deve estabelecer um corredor visual protegido, com regras claras sobre a altura dos edifícios, entre a zona B dos Novos Aterros e as zonas C e D situadas próximas do lago Nam Van. Caso contrário, esta zona “irá tornar-se no próximo NAPE (Novos Aterros do Porto Exterior)”, apontaram ontem os pró-democratas.

“O público está preocupado com o facto de, se o Governo insistir nesta posição ou se simplesmente adoptar gestos superficiais, a zona entre a Igreja da Penha e a zona B dos Novos Aterros vai estar completamente obstruída. Vai também ser o contrário daquilo que o comité da UNESCO publicou em 2017”, aponta o comunicado da ANM.

Outro dos riscos apontados pela associação prende-se com os novos edifícios construídos em Zhuhai e Ilha de Hengqin, cujo excesso de iluminação pode vir a prejudicar a paisagem nesta zona da península de Macau. Para isso, foi pedida uma maior cooperação com as autoridades do continente.

“A ANM tem vindo a observar o rápido desenvolvimento em Zhuhai e também na Ilha de Hengqin, e têm surgido muitos projectos de edifícios cheios de luz. Estamos preocupados que esses projectos possa danificar a paisagem do centro histórico de Macau. Exigimos que o Instituto Cultural possa participar na criação de um mecanismo de coordenação com o Governo de Zhuhai”, adiantou Sulu Sou, que se fez acompanhar do ex-deputado e candidato às legislativas Paul Chan Wai Chi.

Sulu Sou disse mesmo que a Novo Macau tem vindo a receber queixas sobre este assunto. “A poluição visual tem um efeito negativo e vários cidadãos fizeramnos queixas sobre esse impacto. Por isso pedimos ao Governo que faça uma maior coordenação com as autoridades de Zhuhai.”

Rever o despacho

A ANM lembrou que, em 2006, o Governo revogou as restrições de altura para as construções na zona do NAPE, localizada próxima da Colina da Guia. “Como resultado, a actual zona do NAPE tem vindo a desaparecer no meio de edifícios altos. Há riscos para a paisagem tendo em conta a abundância de edifícios situados ao longo da avenida Dr. Rodrigo Rodrigues, mesmo que as associações se tenham queixado junto da comunidade internacional, e mesmo depois do Governo ter sido alertado pela UNESCO.”

Na visão dos pró-democratas, “é inegável que o corredor visual entre a Igreja da Penha e a zona B é tão importante como aquele que se situa entre a Igreja da Penha e o lago Sai Van, e que é proposto pelo Governo”.

“O Governo deveria incluir a área entre a Igreja da Penha e a Zona B dos Novos Aterros (e a ponte Governador Nobre de Carvalho) como um corredor visual sujeito a uma protecção especial. Neste momento não existem quaisquer restrições para os edifícios que serão construídos na Zona B”, acrescentam os responsáveis da Novo Macau.

Um dos projectos que irá nascer na zona é o novo edifício do Fórum Macau, cuja construção já está em curso. Há também projectos privados que aguardam aprovação das Obras Públicas.

A associação defendeu também a necessidade de rever o despacho assinado pelo Chefe do Executivo em 2008, para que sejam determinados limites de altura dos edifícios construídos próximos da Colina da Guia. A Novo Macau acredita que não há regras claras, tendo em conta os projectos na Doca dos Pescadores e na Calçada do Gaio.

 

16 Mar 2018

Photo Macau Fair | A primeira vez de Marina Abramovic

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] primeira edição da Photo Macau Fair, idealizada pela artista Cecília Ho, promete trazer não apenas os melhores trabalhos de fotografia artística mas também revelar a obra de artistas internacionais que nunca viram o seu trabalho exposto no território.

Um dos nomes mais sonantes da Photo Macau Fair, que acontece no Venetian entre os dias 24 e 26 de Março, é o de Marina Abramovic, uma artista conhecida pelas suas polémicas performances que esteve recentemente em Hong Kong.

A colecção de vídeos de Mike Steiner, um dos percursores do movimento minimalista na Europa, nos anos 60, realizados em conjunto com Marina Abramovic, fazem parte do programa da exposição, que foi apresentado esta terça-feira. De acordo com um comunicado, tratam-se de “vídeos raros e icónicos” feitos na década de 70 que pouca ou nenhuma exposição pública tiveram.

Na área da fotografia, a Photo Macau Fair vai destacar o trabalho de um dos primeiros fotógrafos de moda, Horst P. Horst, alemão que durante décadas trabalhou para a revista Vogue e que faleceu em 1999. Na exposição serão reveladas mais de 60 fotografias que mostram a diversidade do mundo da moda e das modelos da época, sem esquecer várias figuras do meio e da alta sociedade, como a estilista Coco Chanel. Ao longo da sua vida, Horst P. Horst fotografou nomes como Andy Warhol, Yves Saint Laurent, Salvador Dali ou Jacqueline Kennedy Onassis.

A cultura chinesa terá também destaque com a instalação de video intitulada “Corpo de Confúcio (Instalação 4), de Jeffrey Shaw, Peng Lin, Chang Tsong-Zung, Sarah Kenderdine. “Este projecto usa a última tecnologia digital para reeditar a ‘cerimónia de abertura, o ritual de etiqueta e o uso de vasos cerimoniais’ do Livro de Li (Etiqueta e Rituais) através de uma aplicação interactiva e três vídeos de de Paul Nichola, da Universidade Cidade de Hong Kong”. Este trabalho foi iniciado, pesquisado e produzido por Jia Li Hall da Universidade Tsinghua.

Segundo a organização da Photo Macau Fair, este trabalho multimedia “reflecte as mudanças que afectaram a sociedade moderna chinesa bem como o papel da arte enquanto linguagem comum com vista à promoção da harmonia”.

Durante a apresentação do programa oficial do evento, Cecília Ho revelou estar satisfeita por voltar à terra que a viu nascer e por conseguir trazer algo novo às suas comunidades.

“Estou muito feliz depois de 35 anos de ter deixado Macau. Tive a oportunidade de voltar e quis fazer algo no lugar onde nasci. A única coisa que sei fazer é arte, porque sou artista. A ideia de fazer esta exposição é porque a Ásia e a zona da Grande Baia. A China é um existem os maiores compradores de arte, e o mundo da arte inclui fotografia, escultura”, apontou.

15 Mar 2018

Fotografia | Website 1884.com transformado em galeria

[dropcap style≠’circle’]”P[/dropcap]assado é o Futuro” (Past is Future)” é o nome da exposição que marca o arranque da Galeria 1884, que até agora funcionava apenas como um website de fotografias. Ben Ieong Man Pan, director artístico, aposta tudo na primeira galeria exclusivamente dedicada à fotografia no território.

São imagens de momentos que estão na memória de muitos mas que os mais jovens já não conhecem. Do tempo em que os riquexós serviam de transporte de moradores e não apenas de turistas, do tempo em que nas Portas do Cerco não havia multidões e em que as zonas antigas do território estavam cheias de bicicletas no fervilhar da cidade.

Há muito que as fotografias disponíveis para venda no website 1884.com mostravam uma outra Macau, mas agora podem ser observadas de perto na primeira galeria exclusivamente dedicada ao mundo da fotografia em Macau. Hoje é inaugurada a Galeria 1884, com a exposição “Passado é Futuro (Past is Future)”, uma ideia de Ben Ieong Man Pan, director artístico, Yoyo Wong, coordenadora de curadorias de exposições e Kim Chan, director de operações.

Ao HM, Yoyo Wong falou dos objectivos primordiais deste projecto diferente, que visa fazer com o que o passado perdure no tempo. “Tudo começou quando o Ben [Ieong Man Pan] teve a ideia de reunir fotografias antigas de Macau. Ele começou por colaborar com o website 1884.com e também tem vindo a fazer o trabalho administrativo com o seu colega Kim Chan. Foram eles que desenvolveram o website e já tinham reunido mais de 500 registos fotográficos de Macau e também de outros lugares, de mais de 30 fotógrafos que fazem parte das primeiras gerações de profissionais.”

O ano de 1884 dá nome aos dois projectos por ter sido a data em que a fotografia chegou ao Oriente, tendo Macau como porta de entrada. A escolha acabou por ser consensual e óbvia.

“Este foi o primeiro lugar a receber a fotografia vinda do Ocidente para o Oriente, então este é um marco histórico muito importante para Macau. Foi uma porta e explica como a fotografia se espalhou no Oriente através do território. Queremos enfatizar este ponto e trazer a história, é muito significativo e tem um grande simbolismo para nós, e também para os fotógrafos. Foi por isso que decidimos atribuir esta data ao nome do website e da galeria.”

Segundo explicou Yoyo Wong, o extenso trabalho de recolha teve como objectivo mostrar imagens que continuavam guardadas em gavetas. “Queremos que este espaço físico promova estes recursos e as fotografias que restaram das primeiras gerações de fotógrafos. A maior parte deles mantém colecções incríveis de imagens que nunca foram mostradas ao público. Então tivemos a ideia de promover o seu trabalho num espaço online e físico também.”

Aposta documental

A exposição “Past is Future” vai começar por ser uma mostra generalizada do trabalho de cada um dos fotógrafos que se uniu a este projecto online, mas a ideia é fazer depois exposições mais focadas no trabalho que cada um deles desenvolveu ou tem vindo a desenvolver.

“Esta exposição vai dar uma visão geral da sua obra. Alguns dos autores que temos no website nunca mostraram o seu trabalho ao público, e nos próximos meses vamos apostar nesse ponto”, adiantou Yoyo Wong.

Ben Ieong Man Pan explicou ao HM que o objectivo não passa por mostrar apenas fotografias de época. “Queremos ser uma plataforma para mostrar o trabalho destes fotógrafos. Além disso, a galeria não visa apenas mostrar imagens contemporâneas, mas também fotografia documental.”

Além disso, o território não será o único foco neste projecto. “Temos algumas colaborações com galerias na Ásia, então vamos mostrar fotografias de Macau e da Ásia também. Esta é a primeira galeria de fotografia em Macau mas não queremos que o nosso público seja apenas composto pelos locais, mas também por pessoas de fora”, frisou o director artístico da Galeria 1884.

 

15 Mar 2018

Tailândia | Voluntárias de Macau vestiram crianças refugiadas

As voluntárias do projecto “Dress a girl around the world – Macau” foram à zona Mae Ai, no norte da Tailândia, entregar roupas e material escolar a tribos de refugiados, oriundos do Myanmar e China, que vivem sem documentos e numa situação de escravatura. Ana Cristina Vilas não esquece a enorme pobreza que viu

 

[dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]agueiam por ali, com roupas velhas e chinelos nos pés. Não têm documentos que os identifique, não sabem a sua idade, e os pais, devido ao facto de não terem cidadania, vivem numa condição de quase escravatura, trabalhando a terra dos outros e vivendo daquilo que ela dá. Os vegetais são a base da sua alimentação.

Esta é a vida das tribos que habitam na zona de Mae Ai, localizada entre Chiang Mai e Chiang Rai, no norte da Tailândia, composta por pessoas que saíram do Myanmar e China e que ali encontraram uma espécie de refúgio, sem possibilidade de fuga.

Foi por estas crianças refugiadas que o grupo de voluntárias do projecto “Dress a girl around the world – Macau” se deslocaram à Tailândia. O objectivo foi levar vestidos, calções e material escolar a quem não tem quase nada. A acompanhá-las esteve Eliza Vilaça, da Casa de Portugal em Macau (CPM), que levou o teatro de marionetas a estas tribos.

Ana Cristina Vilas, mentora do projecto “Dress a girl around the world – Macau”, voltou da Tailândia no domingo e as emoções ainda estão à flor da pele. Registou os rostos de cada criança perante os presentes dados, o primeiro contacto com um mundo de brincar que provavelmente não mais voltarão a ver.

Tudo começou com os primeiros contactos com os missionários do projecto Tree of Life, que está presente na Tailândia, Cambodja e Laos. “Toda a gente me perguntava ‘Tailândia? Mas porquê? Há lá pobres?’. É difícil explicar, não há palavras, não há fotografias, não há nada que explique o que vimos e sentimos ali. A Tailândia não é só praias, compras, tem outra parte, e há tanta prostituição por algum motivo. Fomos encontrar uma pobreza total, de pessoas, de crianças sem documentos, que atravessam as montanhas, que vivem de um lado do rio da vila Mae Ai, e vivem no máximo da pobreza”, contou ao HM.

Quatro aldeias, dois dias

Nos dois dias em que o grupo esteve no terreno foram feitas visitas a quatro aldeias. Na primeira mora a tribo La Hu, composta por pessoas que saíram da China e que atravessaram o Myanmar. “São pessoas muito fechadas, que não permitem que toquemos nelas. Havia uma senhora, sentada no meio, com a expressão muito fechada, e eu dizia que era a matriarca. As crianças eram de difícil acesso quando chegamos.”

Com a apresentação do teatro de marionetas, tudo mudou. “Aí começamos a ver uns sorrisos e umas gargalhas e conseguimos quebrar a barreira da comunicação.”

Seguiu-se a segunda aldeia, que serve de abrigo à tribo Palaung, oriunda do Myanmar, que tem seis mil pessoas a viver na Tailândia e 600 mil em todo o mundo. Na terceira tribo, que Ana Cristina Vilas descreve como sendo a mais pobre de todas, residem pessoas das tribos Chane e La Hu, também do Myanmar. Na quarta aldeia as voluntárias já encontraram uma ou outra casa, uma antena parabólica, telemóveis. São pessoas que pertencem à divisão da tribo Chan, que passou a chamar-se Thai Luuh.

Quem chega a este local dificilmente consegue sair, pois a escola acaba por volta do sexto ano. Não há posses para mais e a nova escola fica a quase uma hora de caminho. Ana Cristina Vilas descreve que não só as autoridades tailandesas nada fazem para dar cidadania a estas pessoas como as perseguem.

“Sabemos que nestas aldeias os pais, quando há rusgas da polícia, pelo facto de não terem documentos, fogem para as florestas e as crianças ficam sozinhas nas aldeias, e são os mais crescidos que tomam conta dos mais novos. Às vezes são roubados, as raparigas são vendidas para prostituição e os rapazes para trabalhos escravos, desde pequenos. Não conhecia essa realidade e não estávamos à espera.”

Ana Cristina Vilas conta o caso de um menino cuja origem todos desconhecem, incluindo os missionários do projecto Tree of Life. Os pais fugiram às autoridades e ele ficou numa das aldeias, sem lugar onde dormir, completamente sozinho. As crianças não sabem que idade têm mas, ainda assim, foi fácil deixar uma peça de roupa para cada um.

“Levamos também umas bonecas e uns carrinhos. Parte do coração ainda está lá e é difícil. Não podemos salvar o mundo, mas durante o tempo em lá tivemos, cerca de uma hora em cada aldeia, pelos menos levamos alguma coisa”, adiantou Ana Cristina Vilas, visivelmente emocionada.

O grupo Tree of Life tem representações no Cambodja e no Laos e, para este ano, já está a ser pensada outra viagem do género. “Sei que o Laos é considerado o sítio mais difícil para entrar, a todos os níveis. O facto de eles [Tree of Life] quererem evangelizar parte da população, os que estão dispostos a isso, torna as coisas mais difíceis. Talvez o próximo destino será o Myanmar ou o Cambodja.”

“Dress a girl around the world – Macau” existe em vários lugares do mundo, e no território celebra um ano de existência no próximo dia 4 de Abril. Nas instalações da CPM já foram costurados 280 vestidos e 110 calções. Em Junho está prevista uma nova campanha para recolha de materiais que vão vestir crianças pobres desta zona do mundo.

15 Mar 2018

Rota das Letras | Duncan Clark apresentou biografia de Jack Ma, fundador do Alibaba

“A Casa que Jack Ma construiu” é o livro que conta a história do menino pobre que falhou duas vezes até construir o gigante do comércio electrónico Alibaba. Duncan Clark, consultor a viver em Pequim desde os anos 90, escreveu a história do visionário com quem trabalhou. O livro foi ontem apresentado no festival literário Rota das Letras

 

[dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uando ainda ninguém percebia o impacto da Internet nas nossas vidas, Jack Ma percebeu que ali estava uma oportunidade de negócio. Falhou duas vezes até investir, juntamente com 18 pessoas, no grupo Alibaba, hoje um gigante do comércio electrónico que tem vindo a investir no sudeste asiático, Europa, África, sem esquecer Macau e Hong Kong.

A história do menino que nasceu pobre e se tornou milionário, o protagonista do “sonho americano na China” foi contada no livro de Duncan Clark, intitulado “A Casa que Jack Ma construiu” e que foi ontem apresentada no edifício do Antigo Tribunal, no âmbito do Festival Literário Rota das Letras.

À margem do evento, o HM conversou com o autor que, em 1994, estava a viver em Pequim e que teve a oportunidade de trabalhar com aquele que, décadas mais tarde, se tornou um dos milionários chineses mais conhecidos em todo o mundo.

“Há muito tempo que queria escrever um livro sobre a Internet na China, onde vivo desde 1994, que foi o ano em que a Internet chegou à China. A tecnologia pode ser muito aborrecida se só falarmos de tecnologia, e ultimamente as pessoas têm vindo a gostar muito de ler sobre outras pessoas. Depois da Oferta Pública de Aquisição (OPA) [do Alibaba] nos Estados Unidos em 2014, houve muita discussão sobre a empresa e sobre ele próprio, e ouvi muita coisa errada nesse período.” De frisar que a OPA levada a cabo pelo grupo Alibaba, no valor de 25 mil milhões de dólares, foi considerada a maior alguma vez feita a nível mundial.

Foi aí que Duncan Clark resolveu sair do mundo da economia empresarial para se tornar escritor. Sem grandes orientações de como escrever um livro, Clark fez muita pesquisa online para uma obra que não teve qualquer interferência de Jack Ma ao nível dos conteúdos.

“Tive acesso ao grupo Alibaba, mas felizmente não controlaram nada do que escrevi, o que foi óptimo. Isso não é habitual, porque normalmente os empresários tentam controlar a sua própria imagem. Gostei da experiência.”

O livro já está traduzido para 20 línguas, incluindo o português, e tem feito sucesso pelo mundo fora. “A verdade é que esta área dos negócios também está muito ligada à comunicação, é como a escrita. No meu caso tinha 12 meses para escrever o livro, então dividi-o em 12 capítulos. Foi escrito de forma rápida, mas já tinha metade da história na minha cabeça, e depois tive de fazer muita pesquisa.”

O carisma e a loucura

Quem é Jack Ma, o homem que é dono de uma fortuna avaliada em 41,3 mil milhões de dólares? Apesar de ter trabalhado como um mero consultor no grupo, Duncan Clark privou de perto com ele.

“Já era consultor em Pequim desde 1994 e conheci-o no verão de 1999, em Guangzhou, quando ele estava a começar a empresa com a sua mulher e mais 18 pessoas. Na verdade, 16 dessas pessoas eram mulheres, o que é um ponto interessante. Havia um espírito muito familiar e havia a loucura da Internet, mas naquela altura pareceu-me um projecto diferente. Escrevia uma coluna de opinião para o jornal South China Morning Post, entrevistei-o, ficamos amigos e ele convidou-me para trabalhar com ele”, recordou Clark. Ironicamente, Jack Ma é hoje dono do diário de Hong Kong.

O autor fala do milionário como tendo “uma enorme ambição” e que dizia coisas diferentes de todos os outros empresários. “As pessoas achavam que ele era louco, mas tinha um grande sentido de humor e charme, tinha a capacidade de atrair as pessoas e o capital para o seu lado. Não esperava que tudo atingisse esta dimensão, mas sabia que era algo interessante.”

Na visão de Duncan Clark, o sucesso do grupo Alibaba deve-se ao facto de Jack Ma ter falhado muitas vezes e nunca ter desistido. “Ele falhou duas vezes e sabia que a Internet era importante. Porque se tornou tão bem sucedido? Penso que foi o primeiro a apostar nesta área, também falhou e conseguiu regressar, devido ao seu carisma e determinação. Teve a capacidade de aumentar o capital, a equipa. A maior parte das pessoas que trabalham com ele no Alibaba trabalharam com ele antes, então seguiram-no, confiaram nele.”

“Ele tem uma maneira muito própria de te convencer a fazeres algo, e teve um foco muito próprio no futuro e nos clientes, nessa altura ele foi um visionário”, acrescentou o autor da biografia.

A relação com o poder

Questionado sobre a relação que Jack Ma tem com o Governo Central, Duncan Clark assume que nenhum grande grupo empresarial chinês, daquele que consegue fazer fortunas, é totalmente independente face ao Partido Comunista Chinês.

“Não é possível, nos dias de hoje, afirmar que nenhuma grande empresa chinesa é totalmente independente do Governo. Nos primeiros tempos Jack Ma trabalhou para o Governo, antes de fundar a Alibaba trabalhou como administrativo. Hoje o grupo tem tido um enorme impacto em muitas áreas da sociedade e também na política ultimamente.”

Contudo, o autor lembrou que Jack Ma não marcou presença nas reuniões da Assembleia Popular Nacional (APN), ao contrário do milionário Robin Li, fundador do grupo Baidu. “Muitos dizem que Jack Ma é demasiado grande para ser apanhado”, frisou Duncan Clark.

“Neste momento, com Xi Jinping a tornar-se presidente sem que haja uma limitação de mandatos, e com uma perspectiva ambiciosa em relação aos empresários, há um grande debate sobre o papel do sector privado na China.”

No último capitulo de “A Casa que Jack Ma construiu”, Duncan Clark lança perguntas para o futuro, ao atribuir o título “Ícone ou Ícaro?”.

“Isto no sentido em que se ficar [Jack Ma] muito próximo do sol pode ser perigoso. Essa onda de elevada confiança pode gerar problemas. Por outro lado, há muitas áreas com as quais têm de lidar diariamente com imensos representantes do Governo chinês. No meu livro eu falo que num ano houve encontros com 45 mil representantes”, explicou.

No fundo, os milionários têm, em relação ao Governo chinês, a ideia de “não te cases, mas não vivas longe”. “Os empresários sabem que se derem tudo ao Governo vão perder inovação e uma certa independência, e o Governo também sabe disso.”

Na visão do consultor, o Governo Central quer que haja iniciativa privada, para aproveitar o know-how em prol do país. “Há uma grande tradição na China de falhas na área tecnológica por empresas estatais, então eles encorajam os empresários a fazer o seu negócio, dando-lhes algum espaço. É melhor do que fazerem por eles próprios, mas claro que há limites, especialmente no que diz respeito às redes sociais”, concluiu.

13 Mar 2018

Mudanças na lei levam senhorios a procurar fugir aos impostos

Há senhorios que oferecem condições de arrendamento mais favoráveis aos inquilinos que concordam com a prática de não ter os contratos reconhecidos por um notário. O objectivo passa por fugir ao impostos

[dropcap style≠‘circle’]C[/dropcap]om a entrada em vigor das alterações à lei das rendas há senhorios que oferecem condições mais favoráveis aos inquilinos que os ajudem a fugir aos impostos. Em causa estão ofertas mais baratas para os contratos que não são reconhecidos por notários e que permitem evitar o pagamento de um montante de 10 por cento.

Ao HM, uma residente, que preferiu não ser identificada, relatou a experiência de procurar casa, numa altura em que os contratos têm de ser reconhecidos por um notário e ter uma duração de três anos: “Andei à procura de casa durante cerca de um mês e umas semanas e, nas duas ou três vezes em que me mostrei interessada, os agentes e senhorios mostraram-se igualmente interessados. No entanto, quando chegou a hora de negociar os preços e foi referida a necessidade de ir ao notário, mostraram-se reticentes em fazê-lo”, começou por contar.

“Alegavam que a ida ao notário os obrigava a pagar o imposto, algo que, diziam, ‘muitos nunca tiveram de fazer’. Sempre que insisti em formalizar no notário o contrato, pediram uma renda mais alta, justificando servir para cobrir o valor do imposto”, acrescentou.

Este é um cenário confirmado por Elda Lemos, agente imobiliária da JML Property, que reconheceu ter conhecimento de casos em que os senhorios fazem questão de pedir que os contratos não sejam reconhecidos por um notário. Este é um pedido prontamente negado pela agência.

“Sei que algumas agências locais estão a aceitar os pedidos para não haver reconhecimento notarial, mas nós seguimos a lei. Quem não quiser seguir a lei não pode trabalhar connosco, até porque a qualquer momento podemos ter uma fiscalização”, afirmou Elda Lemos, ao HM.

“Nós sabemos que essas situações estão a acontecer. E claro que isso dificulta as condições do mercado. Se há um agência imobiliária que não segue o que está definido na lei, está a concorrer de forma desleal”, apontou a agente.

Boas práticas

No entanto, também há quem esteja a levar as mudanças na lei a sério. Foi este o caso do residente Tony Lai, que recentemente esteve à procura de habitação.

“Encontrei uma casa em menos de duas semanas. Não fui a muita agências imobiliárias, limitei-me a fazer buscas online para saber que casas estariam disponíveis. Depois de encontrar o que me interessava entrei em contacto com agentes e vi as casas que quis”, contou Tony Lai, jornalista, ao HM.

“No meu caso foi tudo feito dentro da lei. A senhoria foi muito simpática e deixou-me à vontade quanto à duração do contrato, dentro dos três anos previstos”, acrescentou.

Neste momento o residente está à espera do reconhecimento de um notário para que o contrato de arrendamento se torne efectivo. Em relação à conversa com os agentes imobiliários, diz que se limitaram a falar do preço e se as casa estavam ou não mobiladas.

Em relação à existência de queixas sobre pedidos para os contratos não sejam reconhecidos, a Direcção dos Serviços de Finanças não avançou com números ao HM. Porém, recordou que “no prazo de 15 dias depois de ser assinado o contrato ou ter começado a relação de arrendamento” que o contrato tem de ser declarado.

A mesma fonte da DSF explicou que a Repartição de Finanças de Macau faz inspecções diárias e que cruza diferentes informações. Quando encontram anomalias, entram em acção.

Menos casas no mercado

A entrada em vigor da nova lei e a duração mínima de três anos para os contratos de arrendamento fez com que muitos proprietários tenham tirado as casas do mercado. O cenário do mercado é traçado por Suzanne Watkinson, proprietária da agência imobiliária Ambiente. “Temos uma senhora que é detentora de várias casas na zona da Taipa Central. Após a aprovação da lei, ela pediu para retirar todas as casas do mercado. Simplesmente não queria que as casas tivessem arrendadas durante três anos. É muito tempo”, explicou. Também Elda Lemos, da JML Property, traça um cenário semelhante: “Nota-se que há donos a tirar os imóveis do mercado. Muitos querem ver como é que a situação vai evoluir”, frisou.

13 Mar 2018

Alteração à Constituição chinesa | Gabinete de Ligação destaca Lei Básica

O director do Gabinete de Ligação do Governo Central comentou as alterações à constituição chinesa aprovadas este domingo em Pequim. Zheng Xiaosong, destacou a importância da manutenção da Lei Básica e da política ‘Um País, Dois Sistemas”

[dropcap style≠‘circle’]X[/dropcap]i Jinping pode muito bem vir a ser presidente da República Popular da China (RPC) até querer, segundo muitos analistas políticos. Tal está previsto depois das alterações feitas à constituição chinesa terem sido aprovadas no domingo numa sessão plenária da Assembleia Popular Nacional.

De acordo com um comunicado enviado às redacções, Zheng Xiaosong, director do Gabinete de Ligação do Governo Central na RAEM, enalteceu a proposta de alteração à constituição chinesa, que reflecte a intenção do Partido Comunista Chinês e o desejo de todo o povo chinês, o que mostra um alto grau de uniformização. As alterações são também uma mostra viva de que o PCC governa todos os territórios chineses de acordo com a constituição.

Zheng Xiaosong disse ainda que, durante o processo de apreciação de proposta de alteração da constituição, foi desenvolvida de forma suficiente a democracia. Nesse sentido, foram mostradas as vantagens da política democrática socialista com as características próprias da China, pois estão traduzidas as práticas do povo chinês de tomar decisões de existência de uma governação nos termos da lei.

Para o director do Gabinete de Ligação, as alterações à constituição visam melhorar o seu conteúdo, além de que concretiza melhor aquilo que foi aprovado no último congresso do PCC, bem como a linha de pensamento de Xi Jinping sobre o socialismo com características chinesas numa nova era.

O responsável acredita que a revisão pode fomentar o desenvolvimento da constituição, para que esta possa acompanhar a evolução dos tempos, no sentido de garantir o desenvolvimento do socialismo com características chinesas.

Olha a Lei Básica

No que diz respeito às duas regiões administrativas especiais, Zheng Xiaosong deixou claro que é preciso aplicar o princípio de “Um País, Dois Sistemas”, e que é necessário governar de forma rigorosa de acordo com a constituição chinesa e a Lei Básica de Macau e de Hong Kong.

Zheng Xiaosong disse ainda que deve aproveitar-se os 25 anos do aniversário da promulgação da Lei Básica para continuar a divulgar a mini-constituição nos dois territórios, bem como promover actividades educativas e de promoção.

O responsável lembrou que deve ser incutido o respeito, aprendizagem,

obediência, protecção e a aplicação da constituição chinesa, para que a população de Macau saiba que a base constitucional da RAEM é composta pela constituição da RPC e Lei Básica.

É também importante, adiantou, que sejam defendidos os poderes de ambos os diplomas, com o intuito de garantir que a política “Um País, Dois Sistemas” prossiga de acordo com a constituição e a Lei Básica.

Um corte com Deng Xiaoping

De acordo com a agência Lusa, a sessão plenária da APN de domingo uma emenda constitucional que estabelece uma presidência indefinida para o actual chefe de Estado, Xi Jinping. As alterações foram aprovadas com um único voto um conjunto de 21 emendas constitucionais propostas, entre as quais a eliminação do limite de dois mandatos consecutivos de cinco anos para os presidentes do país.

O resultado da votação foi de 2.958 votos a favor, dois contra e três abstenções. Outra das alterações aprovadas foi a que inclui as teorias políticas de Xi Jinping sobre o desenvolvimento do “socialismo com características chinesas numa nova era” na Carta Magna chinesa. Numa intervenção após a votação, o presidente da ANP, Zhang Dejiang, destacou a importância de “defender a liderança centralizada e unificada” com Xi Jinping “no seu núcleo”.

A actual Constituição chinesa, que entrou em vigor em 1982, foi alterada pela última vez em 2004. A aprovação das emendas constitucionais supõe uma consolidação ainda maior do poder de Xi Jinping, que acaba de terminar o seu primeiro mandato de cinco anos e atinge assim um poder indefinido que os analistas comparam ao de Mao Zedong.

Além disso, o retorno a uma liderança indefinida supõe uma ruptura com o sistema criado por Deng Xiaoping, que estabeleceu um poder mais colegiado, com limites temporais para os altos cargos, a fim de evitar os excessos que causaram a acumulação do poder pessoal desmedido durante a época de Mao Zedong (1949-1976). A abolição do limite de mandatos permitirá a Xi Jinping, um dos mais fortes líderes na história da República Popular, ficar no cargo depois de 2023, quando termina o seu segundo mandato.

13 Mar 2018