Hoje Macau PolíticaSAFP | Novos cacifos permitem levantar documentos 24 horas Entraram ontem em funcionamento os pontos de “Recolha Fácil”, que são cacifos inteligentes onde os residentes podem levantar os documentos certificados requisitados aos serviços públicos. A directora dos Serviços de Administração e Função Pública (SAFP), Ng Wai Han, revelou ontem que entraram em funcionamento 1.021 cacifos espalhados por seis centros de serviços de atendimento automático, que estão abertos ao público 24 horas por dia. Numa primeira fase, os pontos de recolha apenas vão permitir levantar documentos das áreas da justiça, assuntos municipais, administração pública e identificação, incluindo documentos de identificação, registos de serviços emitidos pelos Assuntos de Justiça e alvarás ou licenças do registo de estabelecimentos emitidas pelo Instituto para os Assuntos Municipais. Segundo a TDM – Rádio Macau, a directora dos SAFP adiantou que os utentes podem recolher os documentos através de um código QR criado na aplicação da Conta Única ou na Plataforma para Empresas e Associações. Os cacifos inteligentes estão instalados nos centros de serviços de atendimento automático de Nam Van, Areia Preta, Fai Chi Kei, Centro de Serviço das Ilhas (na Taipa), Seac Pai Van e Edifício do Lago. Ng Wai Han anunciou ainda que as autoridades estão a construir um Centro de Serviços de Auto-Atendimento de 24 horas, em Hengqin. A conclusão do projecto está prevista para o período entre Julho e Setembro deste ano, adianta a emissora pública.
João Luz Manchete PolíticaHabitação pública | Moradores de Seac Pai Van responsáveis por reparações O Instituto de Habitação apelou aos moradores dos edifícios Ip Heng e Koi Nga, ambos de habitação económica, para se responsabilizarem pelas reparações. O Edifício Ip Heng esteve dois dias sem electricidade e das paredes exteriores do Koi Nga soltam-se azulejos sempre que há mau tempo O Instituto de Habitação (IH) apelou aos moradores dos edifícios de habitação económica Ip Heng e Koi Nga, em Seac Pai Van, para começarem a tomar responsabilidade pela manutenção e reparações nos prédios. A posição foi tomada em resposta a uma interpelação escrita do deputado Nick Lei. No mês passado, o bloco 8 do Edifício Ip Heng ficou sem luz durante dois dias, obrigando a que, pelo menos, três pessoas fossem retiradas do prédio, uma delas devido à necessidade de estar ligada a um ventilador. O deputado ligado à comunidade de Fujian elencou uma série de queixas dos moradores do prédio de habitação económica que alegaram que a má qualidade da construção esteve na origem da infiltração de água que levou ao corte de luz. Nick Lei perguntou ao Governo se iria “adoptar medidas para acompanhar e apurar as causas do incidente”, e consequentes responsabilidades. O presidente do IH, Iam Lei Leng, declarou que “relativamente às causas da avaria do sistema de abastecimento de electricidade do Bloco 8 do Edifício Ip Heng, devem ser os interessados a ponderar a contratação de uma instituição profissional para investigá-las”. Chuva de cerâmica Sobre a situação recorrente de queda de azulejos no Edifício Koi Nga, Nick Lei perguntava se o Governo teria medidas mais eficazes para “resolver radicalmente o problema e salvaguardar um ambiente comunitário seguro para os residentes”, em vez da “atitude passiva de colar os azulejos para estes voltarem a desprender-se”. Em relação a esta questão, o presidente do IH garantiu que o Governo irá colaborar nos trabalhos posteriores quando a administração e os condóminos do referido Edifício tiverem deliberado o projecto de reparação e manutenção”, sem especificar quem ficará responsável pelos custos do projecto. No entanto, Iam Lei Leng indicou em relação às reparações no Koi Nga, “, o empreiteiro inicial concluiu, a título gratuito, os trabalhos de reparação, de acordo com os resultados de ensaio por infravermelhos das paredes exteriores realizado pelo Laboratório de Engenharia Civil de Macau em 2022”. Mais de uma década depois da emissão da licença de utilização dos três empreendimentos de habitação económica de Seac Pai Van, o Governo aponta que “a administração e os condóminos devem cumprir as suas responsabilidades legais de inspecção e reparação. Podem ainda, através da solicitação de planos de apoio financeiro do Fundo de Reparação Predial, dar início aos trabalhos de inspecção e reparação das partes comuns”. Apesar de os prédios em questão terem evidenciado problemas praticamente desde que foram ocupados, o IH menciona o envelhecimento das estruturas. Para “diminuir os riscos de segurança que possam surgir nos edifícios com o decorrer do tempo, os condóminos dos edifícios com mais de 10 anos de utilização deverão, por sua própria iniciativa, proceder às inspecções periódicas das partes comuns, incluindo as paredes exteriores, as estruturas, as instalações de prevenção contra incêndios e de electricidade”.
Hoje Macau EventosEscritor e tradutor João Barrento recebe hoje Prémio Camões 2023 O escritor e tradutor português João Barrento recebe hoje, em Lisboa, o Prémio Camões 2023, que lhe foi atribuído no ano passado pela sua “obra relevante e singular”, em particular as traduções da literatura alemã. “João Barrento foi reconhecido pelo júri como autor de uma obra relevante e singular em que avultam o ensaio e a tradução literária. Em particular, as suas traduções de literatura de língua alemã, que vão da Idade Média à época contemporânea, e em todos os géneros literários formam o mais consistente corpo de traduções literárias do nosso património cultural e constituem indubitavelmente um meio de enriquecimento da língua e de difusão em português das grandes obras da literatura mundial”, lia-se no comunicado divulgado em outubro do ano passado. João Barrento nasceu a 26 de abril de 1940 em Alter do Chão. Licenciou-se em Filologia Germânica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tendo publicado diversos livros de ensaio, crítica literária e crónica. Foi leitor de Português na Universidade de Hamburgo e leitor de Alemão na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e professor de Literatura Alemã e Comparada na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Como tradutor de língua alemã, transpôs para português dezenas de autores, particularmente de poesia, da expressão mais antiga à mais moderna e contemporânea, além de obras de ficção, filosofia e teatro. Foi distinguido com os prémios Calouste Gulbenkian da Academia das Ciências de Lisboa, o Grande Prémio de Tradução do PEN Clube Português/Associação Portuguesa de Tradutores, pela obra de Goethe e pela tradução integral de “Fausto”, o Prémio de Ensaio Jacinto do Prado Coelho, o Prémio D. Diniz, da Casa de Mateus, e o Grande Prémio de Crónica da Associação Portuguesa de Escritores (APE), pelo livro “A Escala do Meu Mundo”. Em 2022, recebeu o prémio Vida Literária Vitor Aguiar e Silva da APE. João Barrento, vencedor da edição de 2023 do Prémio Camões, sucedeu ao brasileiro Silviano Santiago, que conquistou o prémio em 2022. O Prémio Camões de literatura em língua portuguesa, instituído pelos Governos de Portugal e do Brasil, foi atribuído pela primeira vez em 1989, ao escritor português Miguel Torga. Segundo o texto do protocolo constituinte, assinado em Brasília, em 22 de junho de 1988, e publicado em novembro do mesmo ano, o prémio consagra anualmente “um autor de língua portuguesa que, pelo valor intrínseco da sua obra, tenha contribuído para o enriquecimento do património literário e cultural da língua comum”.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadePolytex condenada a pagar indemnização maior a comprador do Pearl Horizon O Tribunal de Segunda Instância (TSI) condenou a Sociedade de Importação e Exportação Polytex, anteriormente responsável pela construção do complexo habitacional Pearl Horizon, na Areia Preta, a pagar uma indemnização maior a um promitente-comprador de um apartamento, considerando que o valor anteriormente decidido é “demasiado baixo”. O valor decretado pelo TSI é de total de 5.690.000,00 dólares de Hong Kong. O acórdão, ontem divulgado, dá conta que tanto a Polytex como a pessoa a quem vai ser paga a indemnização já recorreram da decisão para o Tribunal de Última Instância (TUI), por não concordarem com os valores decretados. O caso remonta a 2011, quando a Polytex celebrou com uma mulher casada um contrato-promessa de compra e venda de uma casa no Pearl Horizon pelo valor de 5.668.000,00 dólares de Hong Kong. A empresa, explica o acórdão, “fez um desconto de 20 por cento através do rebate de bens”, pelo que o valor pago pela mulher foi de apenas 4.534.400,00. Em 2015, a mulher e o marido celebraram com outra pessoa um contrato de cessão da posição contratual pelo preço de 7.670.000,00 dólares de Hong Kong, que passou a ser promitente-comprador da casa. A Polytex consentiu este negócio, sendo que as casas estavam ainda em construção. Essa terceira pessoa pediu um empréstimo e pagou a totalidade do valor ao casal, além dos juros, no valor superior a 242 mil dólares de Hong Kong, entre os anos de 2015 e 2018. Problemas da concessão Como o Governo declarou nula a concessão do terreno onde seria construído o Pearl Horizon, pelo não aproveitamento no prazo definido por lei, a Polytex nunca conseguiu acabar a construção. Em 2018, pagou ao banco 3.466.997,00 dólares de Hong Kong, precisamente a parte do empréstimo que faltava pagar pelo novo promitente-comprador. Foi então que, em 2021, este, junto do Tribunal Judicial de Base (TJB), que fosse declarada a resolução do contrato-promessa de compra e venda da casa, exigindo à Polytex o pagamento de 8.105.072,16 dólares de Hong Kong. Este valor equivalia “ao dobro da quantia recebida, a título de sinal, após deduzidas as quantias pagas pela Polytex ao banco”. Caso fosse entendido que não havia sinal, a pessoa exigia à Polytex o pagamento de 5.838.040,00 patacas “a título de preço”, mais os juros dos empréstimos e de mora já pagos por si. Caso o incumprimento do contrato não fosse imputável à Polytex, pedia-se que a empresa pagasse 5.838.040,00 patacas, um valor equivalente ao preço recebido após a dedução das quantias pagas pela Polytex ao banco, mais os juros de mora. O TJB condenou a Polytex a pagar a esta terceira pessoa 4.000.000,00 patacas, bem como os juros legais contados desde a data da sentença até ao integral pagamento. Ambos recorreram. O TSI entendeu agora que o valor justo da indemnização seria “o valor efectivamente pago” pela terceira pessoa mais os juros de oito anos “calculados com base numa taxa de juro anual média de 3,5 por cento”, ou seja, no montante total de 5.690.000,00 dólares de Hong Kong, com juros de mora calculados.
Jorge Rodrigues Simão Perspectivas VozesO uso ilimitado da força (I) “A ideia mais extravagante que pode surgir na cabeça de um político é acreditar que basta a um povo ir armado a uma nação estrangeira para a fazer adoptar as suas leis e a sua constituição” General François Lecointre Em outro tempo houve uma guerra política contínua por outros meios. O que resta sem a política? A guerra autónoma, dirigida a si própria. Violência ilimitada. Irracional. Chamar-lhe-íamos besta se nas espécies animais não existissem hierarquias de dominação, de modo que a competição pela superioridade é geralmente resolvida por ameaças e não pelo exercício da força. Em rigor, deveríamos deixar de chamar guerra ao que há muito deixou de corresponder ao cânone estabelecido em 1832 por Carl von Clausewitz. O seu tratado sobre a guerra, um tratado de antropologia e de arte da política em que as armas são apenas o seu instrumento, foi utilizado por gerações de oficiais, de tal forma que passa por um manual técnico de combate. É digno de figurar ao lado da “Fenomenologia do Espírito” do seu contemporâneo igualmente prussiano, Georg Wilhelm Friedrich Hegel, só que lhe subverte o sentido porque não expõe a realização da história como um projecto divino, mas anuncia talvez inconscientemente a sua subversão. A fractura que diante dos nossos olhos liquida a dimensão política da guerra, emancipando-a da primeira, reduzida a um estado larvar, produziu-se a partir da época napoleónica. O fim da “guerre en dentelles”, dos torneios em tributo regidos por uma etiqueta cavalheiresca de costumes, o início das mobilizações de massa e dos movimentos revolucionários que culminam no triplo suicídio das hegemonias europeias (1914-1945-1991). Hegel e Clausewitz estavam ambos em Jena, a 14 de Outubro de 1806, quando Napoleão derrotou o exército prussiano. Clausewitz ficou prisioneiro daquele Bonaparte em quem Hegel, olhando pela janela, queria ver a alma do mundo a cavalo. Duas perspectivas fisicamente opostas, a do oficial que caiu nas mãos do inimigo experimentou o clima e os modos de um grandioso exército do povo, e depois passou de cobaia a investigador dessa revolução, que não era apenas militar; o filósofo demasiado sistemático para admitir as aporias que o impediriam de encerrar a sua dialéctica trinitária, viu em Napoleão o anúncio simbólico do desígnio de Deus ao afirmar “É uma sensação maravilhosa ver um indivíduo que concentrado num ponto, irradia sobre o mundo e o domina”. Clausewitz rejeita, na introdução, a necessidade de reduzir as suas observações a um sistema, um sinal do destino, dado que não poderá terminar de corrigir a sua obra-prima: “Em vez de uma doutrina abrangente, temos apenas fragmentos para oferecer. Tal como muitas plantas não dão frutos se os seus caules forem demasiado altos, é necessário que, nas artes práticas, as folhas e as flores teóricas não se desenvolvam demasiado. É preciso não se afastar muito do terreno que lhes convém, isto é, da experiência. Talvez surja em breve um espírito mais esclarecido, que substitua estes grãos isolados por um todo fundido num só molde como um metal sem escória”. Clausewitz acabaria então por ser desviado pelas ciências militares e políticas. Até que um antropólogo e crítico literário muito original, René Girard, revelou o seu núcleo oculto. Uma fórmula que torna o seu pensamento actual, ou seja, a cisão entre política e a guerra. Clausewitz já a tinha, de facto, intuído, só que recuou quase temeroso perante a descoberta e assumiu o papel de técnico de armamento, decididamente diminuto. Eis a passagem-chave, que no texto precede o postulado, agora ultrapassado, sobre a relação política/guerra: “Confirmemos, portanto – a guerra é um acto de força, cujo uso não tem limites – os beligerantes impõem a lei uns aos outros; o resultado é uma acção recíproca que logicamente deve levar ao extremo”. Girard lê neste fragmento a confirmação da sua tese sobre o mimetismo, retirada do estudo dos clássicos da literatura, de Cervantes a Proust e Dostoievski em que a imitação é o motor das relações entre os humanos na medida em que se reconhecem como semelhantes. Leva-nos a aprender, mas também a lutar pelo desejo do objecto do outro. Mais radicalmente, pelo desejo do desejo do outro. Daí a dinâmica da violência como um jogo de espelhos que torna os inimigos cada vez mais semelhantes. O uso ilimitado da força é um sintoma da “tendência ao extremo” que acelerou o curso da história desde o final do século XVIII. E determina uma continuidade do confronto bélico através da “acção recíproca” impulsionada pelo desejo mimético dos contendores. “Bump and grind”. Extensível ao infinito, por imitação na qual a violência chama a violência. Ao ponto de se perder o próprio sentido de defesa e de ataque, de agressor e de vítima. Exemplo, o “ódio misterioso” entre a França e a Alemanha que constitui “o alfa e o ómega da Europa”. Neste sentido, a Guerra é apocalíptica. Pois estamos sempre em guerra, uma vez que a guerra enquanto instituição capaz de produzir sentido e determinar equilíbrios de paz já não existe. Um fenómeno que, segundo Girard, afecta todas as instituições. O que resta da política persegue a guerra como Aquiles, a tartaruga. A abolição determinativa da guerra é intencional. Aqui estamos interessados tanto no fim da guerra como no fim da paz. A ausência do primeiro exclui a paz. Para a conseguirmos, temos de saber porque lutamos e, sobretudo, com que objectivos os nossos adversários nos confrontam. É para isso que serve a geopolítica. Obriga-nos a contemplar o conflito a partir do alto (perspectiva de arbitragem) e, a partir daí, a descer por graus e escalas crescentes até ao terreno em disputa (olhar conflitual), medindo o que está em jogo – o objecto do desejo mimético – as intenções e os recursos dos protagonistas. O exercício geopolítico educa até ao limite. Refreia os impulsos mais imprudentes dos contendores, incluindo-os mimeticamente na mesma equação, em respeito pelo princípio da realidade. Prepara a paz. Exercício fora de tempo? Não pensamos assim. Pelo contrário, pensamos que compensa a “tendência para os extremos”. Entusiasmado com o teatro de papel machê que pinta efectivamente o mundo inexistente das regras universais, eleva o não-direito internacional a direito. Uma receita para acabar com a guerra, sim, mas através de uma colisão definitiva capaz de erradicar a humanidade deste planeta. Quem tranquiliza não cura. Contribui para a catástrofe. Traduzamos a tendência para o extremo em geopolítica. O que é que ela nos diz, senão da ocidentalização do mundo, filha da Revolução Francesa? Desencadeadas pelas campanhas de Napoleão, desenvolvidas com as guerras do ópio britânicas, as empresas coloniais das potências europeias vestiram-se de civilização das raças inferiores, culminando na formação de um mercado mundial de bens e capitais sob a égide americana. Previamente antecipado em 1848 por Karl Marx e Friedrich Engels como o estigma da sociedade burguesa no “Manifesto do Partido Comunista” em que “A burguesia não pode existir sem revolucionar continuamente os instrumentos de produção, logo as relações de produção, portanto o conjunto das relações sociais. A incerteza e o eterno movimento distinguem a época burguesa de todas as anteriores. A necessidade de um escoamento cada vez mais vasto dos seus produtos impele a burguesia para o outro lado do mundo. Em todo o lado tem de se impor, estabelecer, constituir relações”. Se substituirmos “burguesia” por “Ocidente”, descobrimos a dinâmica geopolítica que se mantém desde então e cuja crise vivemos actualmente. A tendência para o extremo que deveria ter acabado com a história descarrilou das pistas economicistas engenhosamente traçadas pelos dois jovens renanos. Os estudos antropológico-culturais que se seguiriam à expansão colonial estavam a dar os primeiros passos. As raízes e as múltiplas funções das guerras modernas, estimuladas pela tecnologia, começavam a alargar o seu alcance. Para investir todas as dimensões competitivas das relações entre grupos humanos, o comércio como cultura, a força militar como esfera do direito, as finanças como desporto. Um processo do qual emana a miragem da ocidentalização do mundo como o fim (masculino e feminino) da história humana. Descarrilamento da teleologia hegeliana. A ideia um tanto bizarra de universalizar o Ocidente, uma ofensa ao princípio de não-contradição, expõe os limites da tendência ao extremo que se pretende ilimitada. Síndroma de Clausewitz-Girard em que a ocidentalização da humanidade é tanto filha da imitação dos não ocidentais, consciente ou não, como do nosso beligerante impulso ecuménico. Não se trata de um movimento unilateral do centro do poder para as periferias impotentes, mas de um duplo movimento. Aproximação mútua em vista do duelo. As periferias procuram o centro, sobretudo quando não o admitem a si próprias, oferecendo alternativas a um paradigma que introduziram, tal como o centro visa as periferias. Dialéctica sem síntese possível, em aceleração contínua. Desalinhada. Se, em vez de avançar para o triunfo, a história marcha ao acaso ou em círculos, a tendência para o extremo radicaliza-se até ao paroxismo. E produz guerras potencialmente intermináveis. Num duplo sentido, sem objectivo e sem fim. Dançamos à beira do vulcão. Estamos na era da proliferação das armas de destruição maciça, não apenas nucleares. É preciso um formidável acto de fé para nos convencermos de que milhares de bombas atómicas na posse de actores cada vez mais imprevisíveis e numerosos, lançadas a partir de vectores hipersónicos capazes de atingir o alvo em minutos e de tornar inabitáveis continentes inteiros são produzidas para os respectivos stocks. E o que dizer da fábula segundo a qual a inteligência artificial nunca será autónoma dos seus criadores? A tendência para o extremo perturba o cartesianismo dos estrategas de gabinete. Viúva da dissuasão, o “Ancien Régime” desmoronou-se com a demolição do Muro. Os historiadores, uma espécie em vias de extinção devido à abolição progressiva da disciplina, não estão muito melhor, pois o desporto do século é a marcha frenética a partir de um impasse. Sem passado, sem futuro, sem nada para fazer senão para consumo imediato. A improvável ocidentalização do mundo expande-se para a desocidentalização do Ocidente. Sobretudo, para a desocidentalização da América. À força de exportar a liberdade e a democracia com guerras preventivas-educativas regularmente mal sucedidas e sofridas, se nalgum canto da nossa memória prezamos o princípio de que lutamos para vencer, quantos restam em casa? Se muitas democracias residuais são menos populares do que várias autocracias, porque é que os chineses ou os russos nos hão-de imitar? Talvez pensemos que uma campanha para libertar um povo de um tirano, ao estilo da invasão estrelada da Mesopotâmia, transformará de um momento para o outro o sujeito num fanático do modelo de Westminster? Prestemos homenagem a Thomas Friedman, o ideólogo do terrapianismo, a quem, num suspiro inconscientemente autocrítico, escapou a pergunta proibida: “O Iraque é como é hoje porque Saddam é como é, ou Saddam é como é porque o Iraque é como é?”. Por fim, quanto à globalização consensual de Washington, paradigma económico do Ocidente americano, o que fazer se uma grande parte do mundo discorda e se dedica cada um a acercar o seu próprio estilo de produção e de troca, para adaptações posteriores? No entanto, no Ocidente, continuamos a conceber as guerras como o recurso último do progresso de que reclamámos a exclusividade. Cada vez mais fracos e menos convencidos, somos ainda prisioneiros de um síndroma do membro fantasma. Colaterais da tendência para o extremo, por definição avessos à reflexão. De medir a realidade e o lugar que provisoriamente ocupamos nela. Quase como se o Ocidente fosse uma categoria meta-histórica. E a guerra a parteira da história, dixit Marx, ocidentalizador não convencido. O hiato entre a ideologia e a correlação global de forças induz a depressão na América, que se identifica com o Ocidente como protectorado de confiança divina e comunidade de valores. Mas a profundidade da sua própria crise impede-a de abjurar a ideia universal de progresso que justifica a sua existência e promove o seu poder superior. A história não pode acabar em glória, é certo, mas a auto consciência fundadora sem a qual a América não existe pode confrontá-la com a alternativa do diabo que é a guerra civil ou a guerra mundial. Ou ambas. Em nome dos direitos humanos, mais vale suicidar-se com todo o planeta. A aproximação à encruzilhada faz-se por um conflito sem objectivo nem conclusão. Alimentado pelo ilimitismo americano. E demarca os Estados Unidos e os seus associados das potências não ocidentais, onde persiste alguma forma de racionalidade, ainda que peculiar. A anti-estratégia em esteróides praticada dentro e à volta da Casa Branca exprime a “geopolítica para as classes médias” que o “Estado Profundo” em confusão postula inspirar-se. Anátema aos olhos dos hiper-capitalistas estrelados, para quem nem o céu é o limite. Pensemos em Elon Musk e Jeff Bezos, o segundo e o terceiro homens mais ricos da Terra, que imaginam exportar a humanidade para além deste planeta, um lugar demasiado estreito para nós. Podemos acabar de o destruir e começar a colonizar o universo. Musk quer-nos em Marte. Bezos eleva a fasquia pois triliões de seres humanos flutuarão em enormes estações espaciais no espaço interplanetário. Tudo se pode esperar do homem (Musk) que foi castigado pela História por ter gerado uma filha comunista e do seu rival que, em criança, treinou o seu talento tecnológico instalando um alarme eléctrico para impedir os irmãos mais novos de entrarem no seu quarto. Visões proféticas do futuro? Como bons vetero-europeus, preferimos a receita do social-democrata vienense Franz Vranitzky, antigo chanceler austríaco que disse “Quem tem visões deve consultar um médico”. Mas quanto mais velhos ficamos, nós, ocidentais, mais sofremos de mimetismo diacrónico. Imitamos os nossos grandes líderes de outrora, sem medo do ridículo. É o caso de Emmanuel Macron, com o seu manto napoleónico, pronto para uma campanha militar contra a Rússia. E dos dirigentes polacos, bálticos e escandinavos que gostariam de riscar a Federação Russa do mapa, para dar origem a um colorido festival de miudezas “pós-coloniais”. Um clima de higiene mundial neo-futurista, exclusivamente bélico, que enevoa tanto os comentadores “mainstream” insuspeitos como os militares no activo e no passivo. Assim, Janan Ganesh, colunista do Financial Times, estabelece a equação paz=estagnação e convida-nos a saborear a guerra como um “estimulante”. Uma droga poderosa, cujos efeitos Ganesh descreve em três fases; “Primeiro, o trauma obriga-nos a imaginar lugares novos e estranhos. Em segundo lugar, as ideias resultantes vendem-se mais facilmente porque as ideias dominantes estão agora manchadas de sangue. Em terceiro lugar, a violência provoca muitas vezes alguma inovação técnica”. Faz eco do general François Lecointre, antigo chefe do Estado-Maior das Forças Armadas francesas, certo de que dentro de dez anos nós, europeus, teremos de recolonizar África porque não podemos continuar a aceitar “fazer fronteira com o caos”. Em todo o caso, “só podemos matar pela França, não pela democracia”. Aqui Lecointre imita o Robespierre aprendido na escola de que “A ideia mais extravagante que pode surgir na cabeça de um político é acreditar que basta a um povo ir armado a uma nação estrangeira para a fazer adoptar as suas leis e a sua constituição”. O ilimitismo do limitado que somos gera monstros.
Hoje Macau China / ÁsiaFilipinas | Sara Duterte demite-se de ministra da Educação A vice-presidente das Filipinas, Sara Duterte, vai demitir-se do governo do Presidente Ferdinand Marcos, no qual ocupava o cargo de ministra da Educação, anunciou ontem o palácio presidencial, em Manila. Sara Duterte “apresentou a demissão como membro do governo”, declarou à imprensa o porta-voz da Presidência das Filipinas, Cheloy Garafil, acrescentando que vai manter o cargo de vice-presidente do país. Numa conferência de imprensa, Sara Duterte, filha do antigo Presidente Rodrigo Duterte, declarou que formalmente vai deixar de exercer funções como ministra da Educação no próximo dia 19 de Julho. Esta demissão ocorre no momento em que se acentua a fratura entre a família Duterte e o clã Marcos, que se tinham aliado para as eleições presidenciais de 2022. Num comício político perante apoiantes, a 28 de Janeiro, Rodrigo Duterte acusou Marcos de ser um “toxicodependente” e o filho mais novo, Sebastian Duterte, apelou à demissão do actual chefe de Estado. Ferdinand Marcos respondeu no dia seguinte, afirmando que o antecessor “tomava fentanil”, um opiáceo potente, “há muito tempo”, o que tinha repercussões na saúde. Nenhum dos dois apresentou provas sobre o alegado consumo de drogas.
Hoje Macau China / ÁsiaSeul cria medidas para solucionar baixa natalidade O Presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, disse ontem que o país se encontra numa situação de “emergência demográfica” e prometeu um plano global para aumentar a taxa de natalidade, a mais baixa do mundo desenvolvido. “Declaro oficialmente uma ‘emergência demográfica nacional’. Vamos activar um sistema de resposta governamental abrangente até que o desafio da baixa taxa de natalidade seja resolvido”, afirmou Yoon durante uma reunião com um comité presidencial em Seongnam, a sul de Seul. A Coreia do Sul regista actualmente a mais baixa taxa de natalidade do mundo desenvolvido, de acordo com dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico). O Presidente sul-coreano delineou três grandes áreas para o plano: equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada, melhoria dos serviços de acolhimento de crianças e melhor acesso à habitação para as famílias. Na sequência da pesada derrota do partido conservador de Yoon, o Partido do Poder Popular, nas eleições legislativas de Abril, o chefe de Estado, que se encontra gravemente enfraquecido no Parlamento durante os três anos que restam de mandato, anunciou a criação de um novo ministério para resolver o problema da baixa taxa de natalidade. O ministro desta nova pasta, inicialmente designada por Ministério do Planeamento Estratégico da População, vai desempenhar também as funções de vice-primeiro-ministro para os assuntos sociais. O ministério vai ser responsável pelo desenvolvimento de estratégias relacionadas com o problema populacional da Coreia do Sul, incluindo a taxa de natalidade, o envelhecimento da população e as políticas de migração. Caminho suavizado As medidas delineadas ontem por Yoon incluem o aumento dos subsídios para a licença de paternidade e o alargamento da licença de paternidade para que 50 por cento dos pais sul-coreanos façam uso da lei (actualmente apenas 6,8 por cento cumpre o período de baixa). O Presidente da Coreia do Sul falou também de um trabalho mais flexível, do aumento dos programas pós-escolares nas escolas primárias, da prioridade às famílias com recém-nascidos no acesso à habitação e a hipotecas com juros baixos e de mais isenções fiscais para as famílias com menores de idade.
Hoje Macau China / ÁsiaEquador | País volta a exigir vistos a cidadãos chineses O Equador anunciou na terça-feira que suspendeu um acordo com a China que dispensava a concessão de vistos a cidadãos chineses que quisessem viajar para o país sul-americano, alegando um aumento “preocupante” da migração irregular. O ministro dos Negócios Estrangeiros especificou, em comunicado, que a suspensão do acordo bilateral é temporária e começa a 1 de Julho. Acrescentou que a medida foi tomada depois de as autoridades terem constatado que cerca de metade dos chineses que entravam no país não saiam “pelas rotas regulares” nem dentro dos 90 dias a que estavam autorizados a permanecer no Equador. A novidade significa que o Equador vai reinstituir a concessão de vistos para os cidadãos chineses. Desde 2023, os chineses estão entre as principais nacionalidades das pessoas que chegam aos EUA. O Equador, que era um dos dois Estados do continente americano a dispensar de vistos os cidadãos chineses, tornou-se um popular ponto de partida para os migrantes chineses, que depois seguiam através da América Central antes de alcançarem os EUA. O outro Estado é a República do Suriname. O Centro Niskanen, baseado em Washington, citou estatísticas oficiais do governo equatoriano para comparar as 48.381 entradas de cidadãos chineses no país em 2023 com apenas 24.240 saídas. Esta diferença, de 24.141, é a maior de todas as nacionalidades, segundo o Niskanen. O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Lin Jean, disse ontem que Pequim “se opõe firmemente a todas as formas de tráfico humano” e que as forças da lei do país “têm actuado com firmeza contra todos os tipos de tráfico humano e indivíduos envolvidos em migrações ilegais”. Lembrou ainda que o acordo de isenção mútua de vistos entre a China e o Equador entrou em vigor em 2016.
Hoje Macau China / ÁsiaUcrânia | Pequim rejeita acusações dos EUA e NATO sobre apoio à Rússia A República Popular da China acusou ontem os Estados Unidos de “difundir informações falsas”, depois de o secretário de Estado norte-americano ter instado Pequim a “deixar” de apoiar o esforço de guerra russo na Ucrânia. “Opomo-nos veementemente a que os Estados Unidos divulguem informações falsas sem qualquer prova e culpem a China”, afirmou Lin Jian, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, em conferência de imprensa, em Pequim. “No que diz respeito à crise ucraniana, a China nunca deitou ‘achas para a fogueira’ nem procurou tirar partido da situação e sempre se dedicou às conversações de paz”, respondeu o porta-voz da diplomacia chinesa, questionado pelos jornalistas. “A China não fornece armas a nenhuma das partes em conflito, controla rigorosamente a exportação de bens civis e militares e tem sido elogiada pela comunidade internacional”, acrescentou Lin Jian. Terça-feira, numa conferência de imprensa conjunta, em Washington, com o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, Antony Blinken denunciou o apoio da República Popular da China à guerra da Rússia na Ucrânia. “A China fornece um apoio essencial ao complexo militar e industrial da Rússia”, afirmou, acrescentando que “70 por cento das máquinas importadas pela Rússia são provenientes da China” e “90 por cento da microelectrónica” chinesa. “Permite à Rússia manter uma base militar e industrial, manter a máquina de guerra, manter a guerra. Portanto, isto tem de acabar”, disse. A República Popular da China não fornece armas directamente à Rússia, mas os Estados Unidos acusam as empresas chinesas de fornecerem componentes e equipamento à indústria de armamento russa. A China absteve-se de participar na cimeira sobre a paz na Ucrânia, realizada no passado fim de semana na Suíça, devido à ausência de Moscovo.
Hoje Macau China / ÁsiaCoreias | Seul pede a Pequim para mediar aproximação entre Pyongyang e Moscovo A visita de Putin à Coreia do Norte vem adensar as preocupações de Seul que pede a intervenção do Governo chinês para garantir a paz regional A Coreia do Sul está “profundamente preocupada” com a visita do Presidente russo à Coreia do Norte e pediu à China que actue como mediador na aproximação entre Pyongyang e Moscovo, declarou ontem o Governo sul-coreano. “As tensões na península coreana resultantes do reforço da cooperação militar entre a Rússia e a Coreia do Norte são contrárias aos interesses da China e pedimos à China que desempenhe um papel construtivo em prol da paz, da estabilidade e da desnuclearização da península”, de acordo com um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros sul-coreano. O texto é um resumo de uma reunião, na terça-feira, entre funcionários dos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, da Coreia do Sul e da China, em Seul, e foi publicado horas antes do encontro entre o Presidente russo, Vladimir Putin, e o líder norte-coreano, Kim Jong-un. Em resposta, a China disse que “não haveria qualquer mudança na sua política em relação à península coreana e que iria desempenhar um papel construtivo na resolução da questão da península”, referiu ainda o Ministério dos Negócios Estrangeiros sul-coreano. Pouco depois da publicação deste texto, Putin e Kim reuniram-se na capital norte-coreana, com o objectivo de assinar um novo tratado de parceria estratégica. Proximidade e afastamento Outro dos objectivos da viagem é a criação de um “sistema recíproco de comércio e pagamentos não controlado pelo Ocidente”, de acordo com um editorial publicado na terça-feira pelo diário norte-coreano Rodong. As trocas entre Pyongyang e Moscovo intensificaram-se desde a cimeira, na Rússia, em Setembro, e acredita-se que, desde então, Pyongyang forneceu milhares de contentores de armas a Moscovo, utilizadas na Ucrânia. Em troca, o regime terá obtido assessoria para o programa de lançamento de satélites espiões.
José Simões Morais Via do MeioTravessia aérea de Portugal a Macau Foto: Blogue Macau Antigo Faz hoje 100 anos que o Major de Infantaria António Jacinto da Silva Brito Paes ao comando do avião Pátria II e o Major de Engenharia José Manuel Sarmento de Beires como piloto, em 1924, sobrevoavam Macau, concluindo o propósito da viagem a espelhar os novos tempos aéreos e assim homenagear os navegadores portugueses chegados à China desde 1513 e estabelecidos em Macau em meados do século XVI. Mas em 1924, na então colónia portuguesa, os hidroaviões existentes precisavam apenas de usar o rio ou o mar para aterrar ou levantar. O maior problema dos aviadores portugueses foi a aterragem, pois a cidade sem ter uma pista de terra não estava preparada para os receber. Daí, o plano programado logo à partida era poder evolucionar sobre Macau e poisar em Cantão. O raide aéreo iniciado a 7 de Abril de 1924 em Vila Nova Milfontes com destino a Macau foi o 1.º de responsabilidade da Aeronáutica Militar e teve como protagonistas os aviadores, Capitão Brito Pais, Capitão-tenente Sarmento de Beires e o mecânico sargento-ajudante Gouveia. Esta viagem era também a segundo na ordem da aviação portuguesa, pois a primeira fora incontestavelmente a de Lisboa-Rio de Janeiro realizada por Gago Coutinho e Sacadura Cabral com partida de Lisboa a 30 de Março de 1922 e chegada ao Rio de Janeiro a 17 de Junho de 1922. Segundo declarações de Brito Pais no fim da viagem de 1924, numa conferência proferida no Clube de Macau: . Já anteriormente, em Outubro de 1920, Brito Pais e Sarmento Beires fizeram a travessia aérea Lisboa–Funchal, mas o denso nevoeiro a envolver a ilha da Madeira impedira a aterragem do Cavaleiro Negro, um avião Breguet 14-A42, e daí terem dado meia volta e regressado a Lisboa. O combustível acabou e amararam no Atlântico, afundando-se a 400 km de Lisboa, sendo salvos por um navio inglês. Para o raide Vila Nova Milfontes – Lisboa – Macau de 1924, “um grupo de amigos” Capitães Jardim da Costa, P. Correia e o alferes Bensabat, adquiriram por subscrição um avião, oferecendo-o para a longa viagem programada, desde a Península Ibérica, passando ao longo da costa do Norte de África (na parte francesa e italiana) até chegar ao Egipto. A entrada na Ásia fez-se pelo Médio Oriente, seguindo para o Norte da Índia Britânica, percorrendo a parte Central da Ásia e o Sudeste até alcançar Macau. O bombardeiro comprado em França, um Breguet XIV, n.º 2 [BR16-Bn2], equipado com um motor Renault de 300 cavalos (CV), chegou às oficinas da Amadora em Junho de 1921 a fim de ser preparado para o raide. O aparelho sob a supervisão do então sargento-ajudante Manuel Gouveia começou a ser transformado, sendo-lhe instalado depósitos suplementares de combustível. Levado a 27 de Setembro de 1923 da Amadora para Vila Nova de Milfontes, na parte inferior foi-lhe pintada a Cruz de Cristo e as insígnias d’ Aviação Militar Portuguesa. Na fuselagem, toda de alumínio, lia-se um verso dos Lusíadas: ‘Esta é a ditosa Pátria minha amada’. No leme iam as cores nacionais com a esfera armilar e o escudo das quinas. O baptismo do avião Pátria realizou-se com toda a imponência a 3 de Abril pelas 12 h, acto celebrado pelo Bispo de Beja D. José do Patrocínio, sendo apadrinhado por D. Maria do Céu Brito Pais, irmã do aviador Brito Pais e pelo o major aviador Cifka Duarte, director da Aeronáutica Portuguesa [e por Decreto exonerado das funções pelo ministro da Guerra a 30 de Maio de 1924]. “As damas de Odemira ofereceram a flâmula para o aparelho levar.” Assim refere o P. Manuel Teixeira, de quem provem partes de textos desta crónica, a servir de informação para ser complementada e a trabalhar. Cem anos atrás O raide estivera planeado para ser apenas de Lisboa à Índia, parecendo ser esse o destino pois aí terminará a primeira fase da viagem, após 77 horas e 51 minutos de voo e percorridos em 30 dias 10.960 km. Na 15.ª etapa, partindo de Karachi para Agra a 7 de Maio de 1924, próximo de Jodhput na Índia, devido a um intenso vento são forçados a aterrar no deserto, junto à povoação de Bhudana, partindo-se as longarinas da fuselagem, e ficando o avião irremediavelmente inutilizado sem qualquer possibilidade de recuperação. A população do oásis conduz os aviadores portugueses até à linha férrea e assim conseguem chegar de comboio a Jodhpur, de onde entram em contacto com o governo português, recebendo autorização à compra de um novo aparelho. Após demoradas negociações com o Governo britânico da Índia conseguiu-se um De Haviland D.H.9A., preparado durante alguns dias e a 29 de Maio, após o vôo de ensaio, é baptizado Pátria II. Terminava a 30 de Maio de 1924 o interregno de 23 dias e retomavam de Lahore o voo para fazer a restante viagem para Macau. Até aí chegar, na primeira parte do Raide Vila Nova Milfontes–Macau, Pais e Beires após em Vila Nova de Milfontes, terra natal de Pais, fazerem experiências com bons resultados, recolhem a 23 de Outubro de 1923 o avião num hangar da Amadora para a 2 da Abril de 1924 ir outra vez a Milfontes numa viagem de 50 minutos. Daí, devido ao mau tempo, apenas a 7 de Abril às 6 horas da manhã Brito Pais e Sarmento Beires ocupam os seus lugares no Pátria e levantam voo rumo ao Oriente. As etapas da viagem, segundo relatório apresentado pelos aviadores, eram: Lisboa-Oran (Argélia); Oran-Karaman (Tunísia); Karaman-Tripoli (Tripolitania); Tripoli-Benghasi (Tripolitania); Benghasi-Cairo (Egipto); Cairo-Damasco (Síria); Damasco-Bagdad (Mesopotâmia, Iraque); Bagdad-Basra (Iraque); Basra-Bendes Abbas (Pérsia, Irão) e Bendes Abbas [em frente à ilha de Ormuz]-Karatchi (Índia Inglesa). A aterragem seria em Cantão, para poder evolucionar sobre Macau, visto a cidade não ter campo de aterragem. Seguem dia 8 para Málaga (Andaluzia, Espanha) e dali para Oran (a segunda maior cidade d’ Argélia), onde os espera o mecânico Manuel Gouveia, aí chegado de barco. Em Oran, inicia-se a 3.ª etapa da viagem ao longo da costa africana do Mediterrâneo percorrendo os 1230 km até Tunes (capital da Tunísia), onde Gouveia embarca, passando a voar com eles e finalizam essa etapa a 15 de Abril em Tripoli (então Tripolitania, hoje Líbia). A 19 de Abril, percorridos 3.105 km em 28 h 40 m e gastando no percurso doze dias, chegam a Benghasi (a segunda maior cidade da Líbia). Os aviadores dali pedem dinheiro para poder continuar a viagem, visto o Estado não ter concorrido para as despesas de tal aventura. “O pai do aviador Brito Pais em presença destes factos dispôs de todo o dinheiro que podia e o Aero Club nomeia uma comissão para angariar donativos composta pelos major-aviador Cifka Duarte, cap. de fragata Afonso Cerqueira, ten. Aníbal Paixão e José Júlio de Brito Pais Falcão. Tanto subscrições, como festas surgem logo em todo o país – revertendo o produto a favor do raide Lisboa – Macau.” Quando de Benghasi chegam ao Cairo a 20 de Abril, os aviadores tinham já percorrido 4.600 km. A etapa Cairo-Damasco (Síria) passa por Rayak (Riyaq, no Líbano) e a 23 estão em Damasco. Daí a Bagdad (Mesopotâmia, Iraque) onde a 27 se encontram para seguir até Basra (Baçorá, actual Iraque, antigamente pertencente à Mesopotâmia e desde 1 de Outubro de 1919 fora do Império Otomano, estava então na dependência do Reino Unido). Após 600 km, a 28 chegam a Bushire (Bushehr) no Irão, onde há demora por impedimento dos persas, que não ficam satisfeitos com os passaportes. Partem a 3 de Maio para Bender-Abas e de Chahbahar, no extremo sueste do Irão, chegam a 4 de Maio a Karachi, na Índia inglesa. Está-se na 15.ª etapa: Karachi-Agra. Dia 7 de Maio de 1924, um terrível vento força-os a aterrar no deserto e devido às condições difíceis, o avião parte-se, ficando irremediavelmente inutilizado, saindo ilesos os passageiros. Chegam de comboio a Jodhpur e seguem para Lahore. Conseguem um avião, preparado durante alguns dias e o voo de ensaio fazem-no a 29 de Maio. II FASE DA VIAGEM No Pátria II, retomam o voo a 30 de Maio para realizar a segunda parte da viagem entre Lahore, então Índia e hoje Paquistão até à China, a Macau. Devido ao espaço acanhado da carlinga desse avião, Gouveia não segue com eles, usando o comboio e barco para tentar sempre que possível acompanhar as escalas, segundo refere Fernando Mendonça Fava na Revista de Cultura de 2016. Agora num De Haviland DH9 baptizado Pátria II, a viagem a partir de Lahore, cerca de 500 km a Norte do local do acidente, no novo avião efectuarão mais 11 etapas, durante 21 dias totalizando mais 40 horas e 30 minutos de voo, percorrendo mais 6.610 km. De Lahore tocam sucessivamente Ambala, Allahabad, Calcutá, Atkyab, Rangoon, Bangkok, Oubon e Hanói. Aqui demoram-se devido às grandes chuvas e inundações. Apanhando uma aberta propícia, levantam voo às 10 horas da manhã de 20 de Junho, com céu limpo e entrando na China, segue o avião numa velocidade de cruzeiro de 170 km/h. “Mas vão ao encontro de trovoadas, que lhes queima o gerador. Que fazer? Retroceder para o primeiro aeroporto, que lhes ficava atrás (Fort Bayard), ou avançar para Macau? Decidem avançar, conseguindo sobrevoar Macau e avistar a Lapa, a Ilha Verde e Portas do Cerco; três vezes desceram a menos de 100 m, mas uma chuva torrencial barra-lhes a passagem, forçando a dirigirem-se para Cantão, quando conseguem avistar o caminho-de-ferro Kowloon-Cantão e resolvem segui-lo. Passados dois minutos sobre a linha férrea, o motor começa a falhar e obriga a uma aterragem forçada de emergência” [o motor parou antes do piloto alinhar o avião com o vento, para estabelecer uma abordagem final ao reduzido campo de aterragem]. Aos comandos, o piloto Sarmento de Beires efectua uma aterragem de emergência sobre o que julga ser um terreno aberto no meio dos arrozais. Num espaço curto, aos solavancos devido à irregularidade do solo, o aparelho acaba por embater num buraco escondido por água, partindo o trem de aterragem e a hélice. Afinal tinham aterrado num cemitério chinês, a dois quilómetros de Sâm-Tchan (Shum-Chum), próximo de Kowloon, Hong Kong e a cerca de 90 km de Cantão. Eram 14:48 horas e o tempo total de voo fora de 117 horas e 41 minutos, tendo percorrido 17.570 km. É o fim. Caminhando, seguem para a cidade de Sâm-Tchan, numa zona onde decorriam confrontações militares entre as forças nacionalistas do federalismo anarquista de Chen Jiongming e do exército republicano de Sun-Wen, conhecido por o nome de baptismo Sun Yat-sen. REGISTO DO DESEMBARQUE Vêm de comboio para Kowloon, sendo em Hong Kong calorosamente recebidos por residentes portugueses, à frente dos quais o cônsul de Portugal, Cerveira de Albuquerque. “Os portugueses de Hong Kong com manifestações de regozijo: recepções, almoços, jantares e cocktails no Clube Lusitano, no Clube Recreio e ainda a bordo do Pátria sob o Com. do Almirante Magalhães Correia, que levou os aviadores a todos esses locais. Ofereceram a hélice ao Cônsul Português de H.K., Cerveira de Albuquerque, sugerindo alguém ser leiloada e o dinheiro entregue aos aviadores, contanto ficar ela na posse do Clube Lusitano. Logo um anónimo ofereceu $500,00. A hélice, autenticada com as assinaturas dos aviadores, lá continua ainda, sobrevivendo ao vandalismo da ocupação japonesa de H.K. (1941-1945)”. À colónia britânica, a cidade de Macau enviou para receber os heróis a lancha-canhoeira Macau, que sob o comando do primeiro-tenente Santos Pedro fez durante a noite as 50 milhas de mar revolto, fundeando na manhã de 21 de Junho. Ainda nessa tarde aportava também em Hong Kong a canhoneira Pátria, da Marinha de Guerra Portuguesa, para levar a Macau os aviadores, que do barco realizaram a primeira comunicação telegráfica. Ao desembarcar em Macau a 25 de Junho, a população festivamente lhes atirou uma chuva de flores, entusiásticos vivas, estrepitoso estralejar de panchões e de música, dirigindo-se todos ao Leal Senado, para numa recepção cívica serem em sessão solene recebidos pelo governador Dr. Rodrigo José Rodrigues (1923-1925). “Houve ainda um Te Deum na Sé, discursos, poesias, banquetes, saraus, festas, cortejos, enfim, a exuberância latina a desbobinar todo o seu entusiasmo. Macau esteve em festa durante dias seguidos”, com homenagens e constantes aclamações por parte da população portuguesa, a precisar de festas para desopilar e esquecer a turbulência do dia a dia, com a chegada de muitos refugiados devido a tumultos em Cantão. A recepção do desembarque ficou registada em película por a Empresa Cinematográfica Macaense, criada em 1924 por Lucrécia Maria Borges, que em filme de propaganda realizou o documentário “O Voo Audaz das Águias Portuguesas”. Devido à tempestade, a passagem dos aviadores sobre Macau não foi captada. A Lei n.º1609 de 27 de Junho de 1924 promove-os por distinção ao posto imediato, segundo os dados de Beatriz Basto da Silva, adicionados neste artigo com muito texto do P. Manuel Teixeira e a complementar, os acrescentos de Fernando Mendonça Fava. Mais tarde, já em Lisboa serão os aviadores condecorados com o Grande Colar da Ordem Militar da Torre e Espada, pelo Presidente da República em cerimónia pública e muito concorrida no Terreiro do Paço. O Governador de Macau providenciou o regresso por mar dos aeronautas à Metrópole, via Estados Unidos. A 5 de Julho de 1924 partiram de Macau para visitar as comunidades portuguesas de Hong Kong, Cantão e Xangai, onde entusiasticamente foram saudados, assim como pelos portugueses residentes no Japão, Califórnia e na costa Leste dos EUA, de onde seguem para o Brasil. No Rio de Janeiro inauguram o estádio do Clube de Regatas Vasco da Gama. Já em Londres, são recebidos na Câmara Portuguesa de Comércio, com a presença do embaixador de Portugal Norton de Matos e por fim, seguem de Southampton no paquete inglês Arlanza para Lisboa, onde no dia chuvoso de 8 de Setembro de 1924 ninguém os esperava, pois o telegrama que anunciava a sua chegada extraviou-se.
Hoje Macau EventosCentenário da primeira viagem Portugal-Macau celebrado hoje Celebra-se hoje, em Macau e Hong Kong, o centenário da viagem aérea do “PÁTRIA”, nome do avião que transportou os pilotos Brito Pais e Sarmento de Beires de Portugal a Macau em 1924. As actividades comemorativas decorrem com a presença de uma comitiva da comissão organizadora dos eventos do centenário, nomeadamente do Município de Odemira, Universidade do Porto e Força Aérea Portuguesa. A sessão de Macau acontece hoje, a partir das 16h45, no consulado-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, e no Clube Lusitano de Hong Kong a partir das 18h30. Estes eventos estão integrados nas comemorações do 10 de Junho, Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas, e Mês de Portugal na RAEM. Além da realização de conferências, será apresentado o livro, já lançado em Portugal, “De Portugal a Macau – A Viagem do Pátria”, além de ser inaugurada a mostra itinerante “Portugal Na Aventura de Voar”. O programa de celebração do centenário decorre até Setembro e reúne esforços da Câmara Municipal de Odemira, de onde é natural Brito Pais, a Força Aérea Portuguesa e a Universidade do Porto, a que pertence uma das maiores estudiosas desta viagem, a historiadora Isabel Morujão, co-autora, aliás, do livro apresentado. Aquela que foi a primeira viagem aérea entre Portugal e Macau teve início em Vila Nova de Milfontes a 7 de Abril de 1924, tendo terminado a 20 de Junho. Na viagem participou também o mecânico Manuel Gouveia. Destaque para o facto de esta viagem sempre ter ficado à sombra de outra bem mais reconhecida do grande público, nomeadamente a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, protagonizada por Gago Coutinho e Sacadura Cabral. Acidente na Índia O “PÁTRIA” era um avião modelo Breguet XVI, antigo bombardeiro nocturno de guerra com capacidade para um máximo de 550 quilos de bombas. Porém, após cerca de dois terços do percurso feito, houve um acidente que levou a uma aterragem de emergência na Índia, tendo sido adquirido outro avião. Sem apoios do Estado português, a viagem realizou-se graças a uma intensa campanha de recolha de fundos que, à data, mobilizou a população portuguesa e foi destaque nos jornais. Segundo uma nota, os aviadores “foram apoteoticamente recebidos pelas comunidades portuguesas de Macau, Hong Kong e Xangai, tendo regressado de barco para Portugal com paragens em várias comunidades portuguesas na América, onde foram festejados”. Chegados a Lisboa, “houve festa durante dias, tendo os três aviadores sido aclamados como heróis”, recebendo a Ordem de Torre Espada de Valor, Lealdade e Mérito pelo Presidente da República.
Andreia Sofia Silva EventosCCM | Espectáculo de dança e ópera revela obra de Su Dongpo O Grupo de Artes da China Oriental apresenta este fim-de-semana no Centro Cultural de Macau um espectáculo de dança e ópera centrado na obra e vida de Su Dongpo, o grande poeta, calígrafo e pintor chinês que viveu no período da dinastia Song. A coreografia está a cargo de Shen Wei numa iniciativa que promete mostrar uma das muitas perspectivas da cultura tradicional chinesa É apresentado amanhã e sábado, a partir das 20h, um espectáculo inteiramente dedicado à vida e obra do poeta Su Dongpo. “Dongpo: Vida em Poemas” sobe ao palco do Centro Cultural de Macau (CCM) pela mão do Grupo de Artes da China Oriental. Trata-se de um espectáculo com coreografia e encenação de Shen Wei e composição e direcção musical de Chen Qigang. Segundo um comunicado do Instituto Cultural (IC), este é um espectáculo baseado na poesia e experiências de Su Dongpo, que viveu entre os anos de 1037 e 1101, período em que reinou na China a dinastia Song. Su Dongpo é um dos poetas mais conhecidos actualmente no país, sendo que esta produção “incorpora as características distintas da cultura chinesa expressadas através de um olhar internacional”. “Dongpo: Vida em Poemas” é mais do que uma representação literal da vida do poeta, indo além de “acontecimentos específicos e emaranhados de emoções e conflitos que lhes estão associados, alargando a linguagem da dança contemporânea através da profunda integração da ópera chinesa, do tai chi e das artes visuais”. Combina-se ainda os sons do Guqin, instrumento musical chinês, com música contemporânea. Segundo o IC, a peça “evidencia a alma, o afecto, a melancolia e a nostalgia do poeta, utilizando múltiplos efeitos visuais resultantes de diversas formas de expressão artística, como poesia, caligrafia, pintura e gravação de sinetes”. Trata-se ainda de um espectáculo adequado a um público que pode não conhecer a história mais antiga da China ou o universo patente na poesia de Su Dongpo, condensando “as emoções do poeta ao longo da vida através de 12 dos seus poemas”. “A contemplação, a indagação, o sonho, a embriaguez, a tristeza, a delonga e as emoções desenfreadas expressas nestes escritos são facilmente experienciadas pelo público nas suas diversas vidas, independentemente das suas origens orientais ou ocidentais. Emoções prontas a serem apreendidas, suscitando reflexão contemplativa”, aponta a organização do espectáculo. Peça em seis actos O Grupo de Artes da China Oriental é muito antigo, tendo sido criado a partir da Trupe de Música e Dança da China, fundada em Dezembro de 1952, e da Trupe de Música e Dança Orientais, fundada em Janeiro de 1962. Trata-se, segundo o IC, da “companhia de artes de maior prestígio a nível nacional e representa as maiores conquistas da música e dança do país, formando inúmeros artistas de renome mundial”, além de criar e interpretar “inúmeras obras de arte”. O espectáculo que sobe ao palco do CCM este fim-de-semana está dividido em seis actos, começando com o poema em que Su Dongpo reflecte sobre as estações do ano em conjugação com sentimentos pessoais. “Quais gansos no Outono, as pessoas vão e vêm deixando atrás de si o seu rasto / Mas o passado, qual sonho de Primavera, não deixa vestígios. / Quem disse que não se pode voltar à juventude? / Eis que o rio que diante de ti fluía para leste flui agora para oeste!” Já o segundo acto é preenchido com base no poema intitulado “Inúmeros Heróis Antigos”. “Junto à balaustrada oriental, a flor da pereira, nívea, inspira melancolia / Quão clara se afigura a existência mundana. / Ininterruptamente, o rio Yangtzé flui para leste, / Trazendo inúmeros heróis antigos ao sabor da ondulação / Numa paisagem bela como um quadro, / Os heróis emergem no abraço transitório do tempo.” Su Dongpo foi registado como Su Shi, mas também ficou conhecido como Zizhan ou ainda pelo pseudónimo Dongpo Jushi. Teve uma vida repleta de frustrações, mas “conseguiu reconciliar-se com o seu infortúnio, convivendo com o mundo com calma e naturalidade, tendo expressado os seus sentimentos através da poesia, de forma tão espontânea quanto intrínseca”. Deixou mais de 2.400 poemas escritos e é hoje “um dos poetas mais populares e um símbolo cultural monumental, epítome dos eruditos do país”. O reconhecimento fora da China é tal que o jornal francês Le Monde incluiu Su Dongpo como um dos doze Heróis do Milénio, ou seja, entre os anos de 1001 e 2000, sendo o único chinês a constar na lista. Coreógrafo famoso Shen Wei, coreógrafo, encenador e ainda responsável pela direcção visual desta peça, é também reconhecido internacionalmente, tendo sido elogiado pelo jornal Washington Times como “um dos grandes artistas do nosso tempo”. Fundou, em 2000, a Companhia de Dança Artística Shen Wei, tendo sido curador e produtor da pintura em rolo apresentada na cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008. Esta personalidade foi ainda autor das coreografias para companhias de bailado de renome, incluindo Os Grandes Bailados Canadianos de Montreal, o Ballet de Monte-Carlo, o Ballet Nacional da Holanda e o Ballet do Teatro da Ópera de Roma.
Hoje Macau SociedadeBurla | Preso por enganar amigo em 1 milhão de HKD Um residente foi detido por burlar um amigo que conhece há mais de 20 anos em cerca de um milhão de dólares de Hong Kong com o pretexto desse montante servir para um investimento que nunca chegou a ser feito. Segundo o jornal Ou Mun, o caso remonta a Março de 2022, quando o suspeito, de 37 anos, convenceu o amigo a hipotecar a casa e retirar um milhão de dólares de Hong Kong para investimento, a fim de aplicar o dinheiro futuramente nas obras de remodelação da mesma, com a promessa de vir a obter juros mensais no valor de 20 mil dólares de Hong Kong. Porém, até Julho do ano passado a vítima teve de começar a pagar os juros relativos à hipoteca da casa e percebeu que não tinha recebido quaisquer juros do valor investido, tendo denunciado o caso à Polícia Judiciária (PJ). Esta terça-feira a PJ deteve o suspeito em casa, na zona norte da península, tendo este confessado que perdeu o dinheiro no jogo. No processo de investigação as autoridades descobriram ainda fotos de falsas transferências bancárias feitas para a vítima, como se tivessem sido pagos os juros mensais prometidos. O caso já foi encaminhado para o Ministério Público, existindo a suspeita da prática dos crimes de burla de valor consideravelmente elevado e falsificação informática.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeCasa de Macau | Edifício em Lisboa alvo de reparações Há muito que a sede da Casa de Macau em Lisboa necessita de obras de reparação, as quais deverão arrancar este ano. Na calha estão novas actividades para dinamizar a associação que, no ano passado, voltou a sofrer perdas financeiras no valor de 16 mil euros A Casa de Macau em Lisboa vai, finalmente, ter obras de reparação. A garantia foi dada ao HM pelo seu presidente, Carlos Piteira. “Iniciámos, após aprovação da Fundação Casa de Macau (FCM), a recuperação do anexo multiusos onde se realizam a maior parte dos nossos eventos, estando prevista para este ano a pintura do edifício principal.” A FCM é a entidade tutelar da Casa, que, no ano passado, voltou a ter perdas financeiras na ordem dos 16 mil euros, após os cálculos que comprovam pagamentos de cerca de 74 mil euros e receitas de 58 mil euros. Carlos Piteira explicou ao HM que há cerca de dez anos que as perdas da Casa têm sido suportadas pelo fundo de maneio da entidade, o qual corre o risco de chegar ao fim, levando a um cenário de falência técnica. “A aposta tem-se concentrado em iniciativas que permitam um aumento de receitas a fim de atingir um saldo positivo no final do ano, [algo] em contra-ciclo dos últimos anos, em que temos tido permanentes saldos negativos.” Porém, Carlos Piteira denota que, neste primeiro trimestre, verifica-se “o aumento significativo do número de sócios, com tendência a deslocar a idade média para um intervalo mais jovem”, ou ainda a realização de eventos com possibilidades de retorno financeiro e “acções solidárias com donativos pontuais”. Minchi e companhia Nos últimos meses a Casa tem-se pautado por apresentar uma série de eventos novos, como “Há Minchi na Casa de Macau”, cuja primeira edição teve 105 pessoas e contou com a presença do músico Beto, da banda local Turtle Giant. Realiza-se ainda “Tardes de Chá com Conversa e Livros” e ainda a criação de um podcast “Macau, Memórias e Vivências”, com a participação de macaenses que tenham histórias para contar sobre a terra que os viu nascer. No início do próximo mês arrancam as “Tardes da Mahjong na Casa de Macau”, para manter vivo o célebre jogo chinês, sem esquecer as sessões do “Chá Gordo”. Para acertar as contas, Carlos Piteira pondera ainda “um reposicionamento dos sócios beneméritos”, a fim de obter mais apoios e donativos financeiros.
Hoje Macau PolíticaImobiliário | Sector pede regresso de residência por investimento A Associação Geral do Sector Imobiliário de Macau defende, segundo o jornal Ou Mun, que deveria voltar a medida da atribuição de residência por investimento, sobretudo para não residentes que comprem imóveis para fins comerciais no valor mínimo de 30 milhões de patacas. A ideia é que, com este programa, se possam atrair quadros qualificados e capital para o território. A proposta foi feita pelo presidente da associação, Chong Sio Kin, à margem da cerimónia de aniversário da associação. Este justificou que as transacções de imóveis comerciais permanecem fracas devido aos elevados juros na banca e reduzido consumo por parte de residentes, ainda que o Executivo tenha alterado a lei que acabou com os limites à procura de casa, com redução de impostos. Chong Sio Kin disse que as empresas necessitam de mais tempo para recuperarem da crise económica causada pela pandemia, sugerindo que a banca mantenha as políticas de apoio ao sector empresarial, com avaliação flexível dos imóveis ou mais facilidade para empresas que pedem dinheiro emprestado.
Hoje Macau SociedadeStudio City | Cinemas abrem a 26 de Junho Os cinemas do Studio City, empreendimento no Cotai da Melco Resorts, abrem ao público já na próxima semana, dia 26, sendo a primeira sala com o sistema “Dolby”, que combina o som “Dolby AtmosÒ” com a imagem “Dolby VisionÒ”, com capacidade para 770 pessoas. A sala de cinema inclui também cinco suites VIP e espaços para projecções especiais. Citado por um comunicado da operadora, Kevin Benning, vice-presidente sénior e director-geral do Studio City, declarou que a operadora pretende “continuar a contribuir para as iniciativas de diversificação económica e apoiar o Governo na promoção de Macau como o Centro Mundial de Turismo e Lazer”, tudo “através da oferta de experiências de entretenimento e hospitalidade inovadoras e de classe mundial”.
Hoje Macau PolíticaMNE/Português | Escolas no estrangeiro são prioridade O ministro dos Negócios Estrangeiros português afirmou ontem que a língua portuguesa é “fundamental”, dentro ou fora da CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa], e que as escolas portuguesas no estrangeiro são uma prioridade. Perante os deputados da Comissão dos Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, Paulo Rangel indicou que, desde que o actual Executivo tomou posse, foram resolvidas, ou estão em vias de resolução, várias questões relacionadas com as escolas portuguesas no estrangeiro. “Havia questões com a Escola Portuguesa de Luanda, que estão todas resolvidas ou em vias de resolução. Há questões no Brasil, em São Tomé e Príncipe. Muitas vezes nem são problemas, são pontos para resolver”, disse. E assegurou: “A questão da língua portuguesa é fundamental, seja na CPLP ou fora da CPLP. Estamos em contacto direto e permanente com o Ministério da Educação, que está a dar uma prioridade tão grande a isso”.
Hoje Macau SociedadeRestauração | Abril com quebra anual de quase 12% No passado mês de Abril, o volume de negócios da restauração desceu 11,8 por cento, face ao mesmo mês do ano passado, indicou ontem a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) justificando a quebra com o facto de este ano os feriados da Páscoa terem calhado em Março e em 2023 terem sido em Abril. A DSEC destaca que os restaurantes ocidentais foram os que mais sofreram, com quebras de 22,8 por cento, enquanto os restaurantes de noodles e canjas aumentaram os negócios em 0,3 por cento. Em termos mensais, o panorama não foi muito mais animador, com os restaurantes a facturarem menos 7,5 por cento face a Março. Neste capítulo, os restaurantes chineses tiverem um volume de negócios 13,9 por cento inferior em termos mensais, enquanto os restaurantes japoneses e coreanos facturaram mais 2,1 por cento em termos mensais. A situação no comércio a retalho foi ainda pior no período em análise, com o volume de negócios a cair 32,3 por cento, em termos anuais, com as lojas de venda de relógios e joalharia a registarem a maior quebra, com os negócios a caírem 44,6 por cento, face a Abril de 2023. Numa comparação mensal, o volume de negócios dos retalhistas desceu 12,4 por cento face ao registo de Março, mais uma vez com as lojas de relógios e joalharia com a maior queda (21,7 por cento). Por outro lado, em Abril venderam-se mais 13,2 por cento automóveis do que no mês anterior.
João Luz Manchete PolíticaUE | Passaporte de Macau sujeito a autorização em 2025 A União Europeia volta a indicar uma data, meio do próximo ano, para a entrada em funcionamento do sistema autorização e informações de viagens, que tem estado na gaveta desde 2016. A medida dita que portadores de passaporte da RAEM têm de pedir autorização para entrar na União Europeia, incluindo Portugal, e pagar sete euros Os portadores de passaporte da RAEM vão ter de pedir autorização para entrar em países da União Europeia, incluindo Portugal, a partir de meados de 2025, altura em que entrará em funcionamento o Sistema Europeu de Autorização e Informações de Viagens (ETIAS na sigla em inglês). A construção do sistema foi concluída em Novembro de 2016 e a sua implementação tem sido sucessivamente adiada. Aliás, em Agosto de 2023 foi anunciado que iria entrar em funcionamento no início deste ano. A medida aplica-se a 59 países e territórios, incluindo Macau, Hong Kong, Estados Unidos, Reino Unido, Brasil, Canadá, Coreia do Sul, Austrália, Timor-Leste, Japão e Singapura. Vão estar isentos do pedido de autorização menores de 18 anos, pessoas com mais de 70 anos e familiares de cidadãos da União Europeia. A autorização pressupõe a recolha de informações como nome, data e local de nascimento, nacionalidade, morada, nomes dos pais, contactos (e-mail, número de telefone), informações do documento de viagem, habilitações académicas e profissão. É também pedida uma descrição da razão da viagem, duração da estadia, informação sobre registo criminal, historial de viagens em zonas de conflito armado, e se foram recentemente deportados de algum território. Tempo de validade As autoridades europeias apontam que a maioria dos requerimentos será submetida automaticamente e processada em minutos. O processamento manual só será necessário caso as informações fornecidas estivejam erradas ou se o requerente for suspeito de representar um risco para a segurança. De acordo com declarações prestadas pela porta-voz da Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira, também conhecida como Frontex, responsável pelo sistema ETIAS, os pedidos de autorização não vão criar mais dificuldades do que as práticas usadas nos Estados Unidos, Canadá e Austrália no controlo alfandegário e de identificação antecipado. As autorizações permitem a entrada em todos os países da União Europeia por períodos entre 90 e 180 dias. A porta-voz do Frontex, Izabella Cooper, prevê que o sistema entre em funcionamento em meados de 2025, seguido de um período de transição de pelo menos seis meses durante o qual não será recusada a entrada a visitantes sem um ETIAS. Terminado o período de transição, haverá ainda um período de graça separado de seis meses para viajantes que visitem a Europa pela primeira vez desde o início do ETIAS. Em separado, a União Europeia vai começar a recolher informação de viagem e dados biométricos de visitantes de fora da União Europeia a partir deste Outono. As autoridades garantem que estes dados serão armazenados entre três e cinco anos.
Hoje Macau PolíticaFSS | Quase 400 mil vão receber repartição de saldos orçamentais Foi hoje publicada a lista de residentes que vão receber a repartição extraordinária de saldos orçamentais do regime de previdência central não obrigatório de 2024, no valor de 7.000 patacas. Segundo o Fundo de Segurança Social (FSS), este ano a verba será atribuída a 389.346 pessoas, enquanto 183.181 foram excluídos da lista de atribuição deste ano. Os titulares que têm direito à atribuição de verba pela primeira vez este ano, 9.178 pessoas, vão receber 17.000 patacas no total devido à inclusão da verba de incentivo básico. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, a vice-presidente do Conselho de Administração do Fundo de Segurança Social, Chan Pou Wan, apontou que entre as 389.346 pessoas qualificadas, 93.314 são idosos com a idade de 65 anos ou superior, e que 71.591 destes idosos vão receber o montante na conta bancária onde são depositadas as pensões para idosos e/ou invalidez. Os beneficiários da verba a título de repartição extraordinária de saldos orçamentais deste ano são os residentes permanentes que tenham completado 22 anos de idade no ano de 2023, e permanecido, pelo menos, 183 dias em Macau.
Hoje Macau PolíticaSeac Pai Van | Propostas para corredor aéreo entre 2,1 e 1,2 milhões O Governo recebeu três propostas de empresas consultadas para o projecto do “corredor aéreo pedonal na Avenida da Harmonia em Seac Pai Van”. A empresa que apresentou a proposta mais barata foi Bahh Consultoria Engenharia, com 1.250.000 patacas, seguido da CAA, Planeamento e Engenharia, Consultores, com 1.438.000 patacas. A proposta mais elevada foi apresentada pela Companhia de Arquitectura JWCC, com 2.126.000 patacas. O Governo convidou cinco empresas para o processo, mas duas não submeteram propostas. A obra tem como objectivo reordenar “as passagens superiores para peões existentes e em curso em Seac Pai Van, por forma a ligar essas instalações num sistema integral de travessia pedonal tridimensional”, aponta a Direcção dos Serviços de Obras Públicas. Concluída a construção das travessias pedonais áreas na Avenida da Harmonia e na Avenida de Ip Heng e, em conjunto com as instalações de travessia em tridimensional da zona, o sistema pedonal da travessia aérea em Seac Pai Van terá um total de cerca de 1.085 metros de comprimento.
João Luz Manchete PolíticaHengqin | Abertas inscrições para 90 residentes de Macau As autoridades de Hengqin querem recrutar 90 residentes de Macau para as áreas jurídica, desenvolvimento industrial, engenharia civil, entre outras. Os salários variam entre 11 mil e 32 mil renminbis mensais. Os candidatos devem respeitar o sistema socialista com características chinesas e salvaguardar a unidade, segurança e honra da pátria Abriram ontem as inscrições para 90 vagas de emprego destinadas a residentes permanentes de Macau para serviços públicos em Hengqin para as áreas jurídica, gestão, engenharia civil, serviços sociais, desenvolvimento industrial, entre outras. Segundo a Comissão Executiva da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin, o prazo de inscrição termina no próximo dia 27 de Junho. As autoridades salientam que os salários brutos, antes de impostos e compostos pelo salário base, bónus de desempenho e subsídio de residência, variam entre 32 mil renminbis mensais para profissionais de topo (sénior), 19 mil renminbis para quadros intermédios e 11 mil renminbis para funcionários juniores. Os funcionários terão ainda direito a um bónus no fim do ano, correspondente a dois meses de salário e 22 dias de férias pagas. Além disso, o empregador garante a subscrição de “cinco seguros” (seguro de pensão, seguro de saúde, seguro de desemprego, seguro de maternidade e seguro de acidentes de trabalho), assim como “dois fundos” (caixa de previdência da habitação, pensão vitalícia da empresa). Durante o período experimental, os profissionais recebem 80 por cento do salário base, calculado pelos dias de trabalho, sem subsídios ou outros benefícios. Em busca do super-funcionário No capítulo dos requisitos que os candidatos devem cumprir para poderem aceder ao recrutamento, a primeira condição é o “respeito pela Constituição, leis e regulamentos da República Popular da China, defender o sistema socialista com características chinesas e o princípio ‘Um País, Dois Sistemas’”. Os candidatos devem “salvaguardar e não praticar actos que ponham em perigo a unidade, segurança, honra e interesses da pátria”. Devem ter uma boa conduta, obedecer e respeitar a ordem pública e a moral social. Em quarto lugar, surge a exigência de possuir qualificações académicas e profissionais, assim como competência e condições físicas, para desempenhar as funções que o cargo acarreta. Ficam de fora candidatos com registo criminal, que estejam listados como devedores desonestos ou que tenham relações próximas com chefias. As autoridades estabeleceram também limites de idades para os candidatos aos empregos, dependendo da posição hierárquica. Para funcionários juniores e quadros intermédios, os candidatos devem ter entre 18 e 35 anos feitos até ontem. Para administradores e quadros especializados, as idades podem variar entre 18 e 45 anos. O plano de recrutamento anunciado ontem pela Comissão Executiva da Zona de Cooperação Aprofundada em Hengqin tem como objectivo criar um ambiente profissional e empresarial internacional de alto nível.
Hoje Macau Manchete SociedadeRefugiados | Camaronês aguarda há 13 anos por definição do estatuto Há 13 anos que Kennang Ferdinand espera para que as autoridades de Macau se decidam quanto ao seu pedido de estatuto de refugiado apresentado em 2011. À agência Lusa, o responsável conta a saga destes anos desde que fugiu da perseguição política então vivida nos Camarões Kennang Augustin Ferdinand espera há 13 anos por uma resposta das autoridades de Macau ao pedido de asilo que entregou em 2011, após escapar à perseguição política do regime dos Camarões, contou à Lusa. Este passa os dias na biblioteca, sozinho, ao fundo da sala dos computadores, onde lê as notícias que chegam de casa. No dia em que fala à Lusa, traz vestida uma camisola de futebol dos Camarões, verde, um leão dourado ao peito. “Já nem isso anda bem no país”, diz sobre a prestação da seleção, que ainda na semana passada empatou com Angola. O envolvimento, a partir dos anos 1990, no movimento estudantil Parlamento na Universidade Yaoundé, ligado à oposição camaronesa, levou este activista dos direitos humanos, hoje na casa dos 50, a fugir para Macau, cidade da qual nunca tinha ouvido falar. Chegou em 2011 pelas mãos de um amigo bispo, que conhecia o padre jesuíta Luis Ruiz Suárez, fundador da Cáritas Macau. A organização contactou então o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), em Hong Kong, que, por sua vez, apresentou o caso à Comissão para os Refugiados de Macau. Mas foram necessários 12 anos até Kennang ser recebido pela comissão. Aconteceu em 2023: “Perguntaram-me a razão de não poder voltar para os Camarões, e eu expliquei que posso ser morto por razões políticas, que fui acusado, entre outros crimes, de rebelião e insurreição”. Vontade de ficar Da reunião, diz, nasceu esperança. “Sinto que depois de [quase] 14 anos, eles começaram a processar o pedido”, continua. E refere que lhe foi perguntado se teria interesse em ir para outro país. Kennang falou na Alemanha, onde se encontram os irmãos, embora tenha manifestado vontade de permanecer no território e “oferecer o que sabe à comunidade”: “Já estou aqui há tanto tempo, conheço as tradições, hábitos, estudei português”, diz o camaronês, que fala também um pouco de cantonês. A Lusa fez vários pedidos de entrevista à presidente da Comissão para os Refugiados, delegada do procurador do Ministério Público Leong Weng Si, mas sem sucesso. Uma solicitação semelhante à ACNUR, em Hong Kong, ficou sem resposta. O advogado José Abecasis acompanhou, em 2010, um caso com contornos semelhantes. Tratava-se de um cidadão indiano que pediu protecção a Macau, mas que acabou “derrotado pelo cansaço” e optou por abandonar o território. “Esteve preso num limbo, por não lhe ser concedido nem negado o estatuto de refugiado. Este hiato precário, que por natureza e por lei deveria ser temporário, acabou por transformar-se num modo de vida, dependendo de um apoio de subsistência do Governo para suprir as necessidades mais elementares”, diz o advogado português. Enquanto esperam por uma resposta, os requerentes de asilo em Macau estão impedidos de trabalhar ou de sair do território, sendo obrigados a visitas mensais aos serviços de Migração. O Instituto de Acção Social disse que, neste momento, dois candidatos ao estatuto de refugiado em Macau – um deles é Kennang – recebem um subsídio mensal do Governo de 4.350 patacas. A estes são garantidos ainda alojamento e cuidados de saúde. Questionado sobre se a espera de 13 anos para o reconhecimento do estatuto de refugiado é legal, Abecasis responde que “no sentido procedimental não deverá ser”. Explica que o prazo máximo de instrução previsto por lei “é de um ano”, a contar da primeira entrevista ao requerente, que deve ocorrer “no espaço de cinco dias depois da apresentação do pedido”. Após o período de instrução, “deve ser apresentada, no espaço de 10 dias, uma proposta de decisão ao chefe do Executivo”. Neste sentido, considera o advogado, “a espera de mais de uma década por uma decisão consubstanciaria uma manifesta desconsideração pelos prazos estabelecidos pela lei local da Assembleia Legislativa que tem por finalidade assegurar o cumprimento” em Macau “das normas da Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, assinada em Genebra em 1951, e do protocolo relativo ao Estatuto dos Refugiados, adoptado em 31 de Janeiro de 1967”. A apoiar Kennang Augustin Ferdinand, o secretário-geral da Cáritas Macau, Paul Pun, espera “que a avaliação do caso seja feita em breve”. A reunião com a comissão, em 2023, afirma Pun, “é um sinal positivo”. “Isto comparado com o passado é uma melhoria”, sublinha.