O erro ontológico de Machado de Assis na análise de O Primo Basílio

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] que vou dizer agora, em verdade não foi dito em O Primo Basílio, mas só o amor poderia estancar de vez essa multiplicação contínua do desejo. Aliás, amar a Deus é o amor por excelência, é isso que Leopoldina muito bem vê, já que não acredita no amor entre um homem e uma mulher. No mesmo sentido que em Santo Agostinho: só se pode amar aquilo que não muda. Tudo aquilo que muda, pela sua própria condição de mutabilidade não é solo seguro para fincarmos o amor ou um projecto de amor. O amor é, em si mesmo, a possibilidade da permanência, da imutabilidade. A imutabilidade é o horizonte de sentido do amor. Por isso, Santo Agostinho dizia que só se pode amar a Deus.

Há ainda uma característica fundamental no estrutura do desejo, tal como ele é apresentado em O Primo Basílio, que não só passou completamente ao lado do espírito do senhor Machado de Assis, como ainda fez questão de afirmá-lo: “Luísa resolve fugir com o primo; prepara um saco de viagem, mete dentro alguns objectos, entre eles um retrato do marido. Ignoro inteiramente a razão fisiológica ou psicológica desta precaução de ternura conjugal: deve haver alguma; em todo caso, não é aparente.” Ora, trata-se de um dos vários toques de génio de Eça, onde não só nos mostra mais acerca da operacionalidade do desejo, mas também de como a sua multiplicação está intimamente ligada ao nada. Porque o desejo tem muitas dificuldades de deixar aquilo que experimentou e que gostou. Luísa pode não querer Jorge, querer Basílio, mas o desejo dela tem muita dificuldade em deixar Jorge, em deixar de ter Jorge. O desejo quer tudo. Uma vez despertado, consciente do seu objecto, o desejo não quer deixar nada para trás, não quer abdicar do que já teve. O desejo transforma tudo em possibilidade de se vir a ter. Nada mais difícil para o desejo do que fechar possibilidades. Para o desejo de Luísa, o retrato de Jorge significava o não fechamento da possibilidade de Jorge ser seu objecto. Não se pode querer entender o desejo com moral. O desejo é do foro do natural, e se quisermos compreendê-lo temos de esquecer os deuses modernos, as convenções sociais. Páginas atrás, que remetem para a manhã desse mesmo dia que produz indignação no senhor Machado, há uma outra passagem muito mais esclarecedora em relação a este ponto. Quando decide fugir, nessa manhã, Luísa pensa em Jorge e, depois de lembrar os cuidados extremos que ele teve quando ela esteve doente de cama, com pneumonia, pensa ainda: “E agora, quando ele soubesse, quando ele voltasse! Quando ao entrar ali na alcova – visse as duas almofadas, ainda! Ela iria longe, com outro, por caminhos estranhos, ouvindo outra língua. Que horror! E ele ali estaria, naquela casa só, chorando, abraçado a Sebastião. Quantas memórias dela para o torturar! Os seus vestidos, as suas chinelinhas, os seus pentes, toda a casa! Que vida triste, a dele! Dormiria ali só! Já não teria ninguém para o acordar de manhã com um beijinho, passar-lhe o braço pelo pescoço, dizer-lhe: “É tarde, Jorge!” Tudo acabará para ambos. Nunca mais! – Rompeu a chorar, de bruços sobre a cama…” Ela não chora pela antecipação da dor dele. É o seu desejo que chora, por ter de deixar algo que lhe pertence. O seu desejo também quer aquilo que já teve, os cuidados de Jorge, o seu amor, mesmo o amor dela por ele, embora não abdique do amor de Basílio. É esta a miséria. O poder sobre nós começa a perder-se em nós pela fome do nosso desejo. O desejo impele-nos a querer tudo o que queremos. E este querer tudo não se dá com a vida. O desejo é  selectivo, mas não o suficiente. Luísa quer o amor aventuroso de Basílio e quer o amor cuidadoso de Jorge, mas certamente não quer o amor de Julião, por exemplo. Mas este querer tudo-selectivo do desejo implica ter de escolher, ter de perder alguma coisa do que se quer. E isso dói-nos muito no desejo. Quem aqui é que já não experienciou isto em si mesmo? Quem ao deixar para trás uma relação, muitas vezes complicada, não mantém consigo, no seu computador, as fotografias de um outro tempo, a imagem daquele ou daquela que já deixámos, do tempo em que o desejo era efectivo? É o querer tudo do desejo a fazer-se sentir em nós. E este querer tudo do desejo, a sua impossibilidade ou dificuldade de deixar o que já foi seu, está intimamente ligado à experiência do nada pelo humano. É neste querer tudo do desejo, a um mesmo tempo – e não uma coisa a seguir à outra e outra, como é normalmente compreendido como sendo característica dele –, que o nada se tornar uma experiência e uma verbalização humana. O querer tudo do desejo, a um mesmo tempo, traz o nada à boca. Veja-se a cena:

– Al pallido chiarore

Dei ostri d’oro…

Luísa, através das últimas vibrações dos seus nervos, ia entrando na realidade; os seus joelhos tremiam. E então, ouvindo aquela melodia, uma recordação foi-se formando no seu espírito, ainda estremunhado: era uma noite, havia anos, em São Carlos, num camarote com Jorge; uma luz eléctrica dava ao jardim, no palco, um tom lívido de luar legendário; e numa atitude extática e suspirante o tenor invocava as estrelas; Jorge tinha-se voltado, dissera-lhe: “Que lindo!” E o seu olhar devorava-a. Era no segundo mês do seu casamento. Ela estava com um vestido azul-escuro. E à volta, na carruagem, Jorge, passando-lhe a mão pela cinta, repetia:

– Al pallido chiarore

Dei astri d’oro…

E apertava-a contra si…

Ficara imóvel à beira do divã, quase a escorregar, os braços frouxos, o olhar fixo, a face envelhecida, o cabelo desmanchado. Basílio então veio sentar-se devagarinho junto dela. Em que estava a pensar?

– Nada.

É o desejo a exigir o que lhe pertence, a exigir o que é dele. O desejo – com a ajuda da memória – expondo à consciência de Luísa que não quer perder o que é dele, que não pode perder Jorge. Jorge e Basílio fazem sentido, a um mesmo tempo, para o desejo de Luísa. É neste preciso momento, ao escutar a terceira ária do Fausto, que Luísa passa a ser refém da multiplicação do desejo. Pois até aqui o desejo ainda não se multiplicara, esta singular experiência não se fazia realmente sentir, ela e o desejo só tinha olhos para Basílio, mas a partir de agora ela entende que Basílio não chega. O desejo quer Basílio, mas nem por isso quer perder Jorge. O desejo quer tudo o que tem. E o desejo de Luísa já teve Basílio. Teve Basílio e teve Jorge. É extraordinária a frase que Eça põe na boca de Luísa para responder à pergunta de Basílio, acerca do que ela está a pensar: “Nada.” Precisamente. Ela não está a pensar em nada, ela está em nada, centrada no nada, na consciência do finito nada humano. Nesse momento ela é nada, é um imenso nada que se verbaliza a si próprio, um imenso nada a dizer o seu nome. Quando em situações semelhantes nós respondemos às nossas parceiras ou parceiros, nada, para além disso querer dizer que não queremos contar, é também um reflexo daquilo que verdadeiramente se está a passar em nossa alma: nada, isto é, o nada a aumentar através da multiplicação do desejo. Nesse momento ficamos melancólicos, porque estamos reféns de nós mesmo, reféns do imenso nada que nos habita e que subiu até à boca, verbalizado. A melancolia advém da suspeita – para não dizer mais – de que nada nos chegue. Se aprendêssemos a escutar o desejo nas suas múltiplas apresentações, talvez não fossemos mais felizes, mas seríamos seguramente mais capazes de entender o que nos acontece e o que poderíamos esperar que venha a acontecer. Não podemos evitar o desejo, mas podemos aprender a interpretá-lo e agir em concordância a essa mesma interpretação.

È fundamental que se entenda a diferença desta passagem do livro de uma outra, que apresentaremos em seguida, passada no dia seguinte nos aposentos de Luísa:

Todavia a lembrança de Jorge não a deixava; tivera-a sempre no espírito, desde a véspera; não a assustava, nem a torturava; estava ali, imóvel mas presente, sem lhe fazer medo, nem lhe trazer remorso; era como se ele tivesse morrido, ou estivesse tão longe que não pudesse voltar, ou a tivesse abandonado! Ela mesma se espantava de se sentir tão tranquila. E todavia impacientava-a ter constantemente aquela ideia no espírito, impassível, com uma obstinação espectral; punha-se instintivamente a acumular as justificações: não fora culpa sua. Não abrira os braços a Basílio voluntariamente!…

Aqui, o desejo não se faz sentir, o desejo não age. Luísa está antes tomada pela necessidade de justificativa para o seu acto de impiedade social. Há aqui uma tentativa de reduzir o nada da noite anterior, há um esforço para racionalizar o que se está a passar com ela, o que lhe aconteceu, que foi à sua revelia, ou, como ela mesma diz, não caiu nos braços do primo voluntariamente. Ela tenta encontrar no desejo um destino, tenta inverter o nada da noite anterior.

25 Jul 2017

A narrativa do crescimento

“Pinóquio: um livro paralelo”, Giorgio Manganelli, Cavalo de Ferro, 2004. Todas as citações da obra “As aventuras de Pinóquio, história de um boneco”, de Carlo Collodi, foram extraídas da edição portuguesa.

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] preocupação de crescer é subjacente a tudo, já que somos se crescermos, já que se conquista expandido, toda a vida se impulsiona nesse domínio de tal modo acelerado que umas coisas expandem matando hospedeiros de finitudes variáveis que levam no aluvião os vitoriosos com eles.

Se está ordenado para viver, a desordem da expansão é cega e sempre expandido exerce a força contrária. E a morte alarga ainda o mecanismo mas só o da modificação, dado que o tempo se torna não urgente na vaga das transformações. De resto, estamos em aceleração constante na casual forma que nos é dada viver com velocidades tais que nem damos conta do quanto existe em nós de fabulosa urgência. É de tal ordem que até a dor se torna sinónimo de crescimento: não queremos perder nada da sua essência e, por isso, se para tanto passarmos por vicissitudes, elas são fixadas como lutas “crescimentistas”.

Crescer! Eis o slôgane. Multiplicar em abundância, eis a vontade que orienta o organismo vivo, mas, dado que a função não pode pôr em causa a duração, temos mecanismos de defesa como a contenção, a economia do esforço e até a hibernação, que é uma morte terna e faz da permanência um sonho e está unido a uma ordem vital. Não podemos estilhaçar-nos em milhões de átomos inundantes e fecundadores do mundo sem colidir com os milhões de outras vontades, todas voltadas para o mesmo lado: seria insustentável. Por isso e dado o gigantismo de cada ser, existe nele a vontade de resistir a um domínio cósmico que traz certamente de uma qualquer estrela.

Dir-se-ia que mesurar estes aspectos faz o Homem. Sem eles não teríamos chegado até aqui, tantos, e com tantas ideias e tão elaborados. Teríamos sido engolidos pela volúpia da expansão. Esta constante ordem que inscrevemos na defesa do nosso vazio circundante é uma manobra que aprendemos a cultivar, deitar fora o excesso, não nos deixarmos invadir, tomar conta do que restou de uma funda memória que só a quietude pode levar ainda pela mão.

Esvaziarmos os cálices, ficar em sóbrio imobilismo, ter a liberdade de não querer saber, e estarmos a centralizar a esfera que nos foi prometida desde o princípio dos tempos. Mas independentemente disto e a ver pela carga que existe em expandir, há neles, expansionistas, formas terríveis de serem vítimas de encantamentos, pois que eles se esgueiram para todos os lados de onde lhes parece vir a força e, como súbditos de um sol menor, entram em órbitas desgovernadas, que só pode ser o lastro de uma magia aplicada às suas febris e famintas condições.

O mito de Pinóquio é verdadeiramente actual, muito embora o seu autor não o tivesse adocicado como a «Disney» até porque era um homem que não gostava de crianças. Carlo Collodi, nascido em 1826, pessimista, mas um grande pedagogo, não teve tanta energia a fazer crescer, a denunciar a protuberância do apêndice nasal, a procurar o ventre da baleia por antítese à fada azul. Ele foi descrevendo a relação da criatura com o criador e pondo nas personagens femininas arquétipos de forças várias que assomavam ao herói como as aparições. Senhora, menina, irmã…

Pinóquio é aqui uma figura desgovernada criada por uma mente saturnina em busca do seu humano que tarda, uma vez que não se revê em nenhum dos trabalhos da espécie. Há mesmo uma passagem deveras inquietante:

Nesta metrópole da euforia não há alegria (queria ele dizer do crescimento); na verdade tinha escrito matrópole; e não sei se esta cidade é mais notável pela recusa de acesso a todas as mães, ou pela contínua presença negativa; esta cidade esta cheinha de fantasmas de mães. A solidão masculina desvenda a manipulação que se exerce nesta cidade ruidosa, projectada pelo falsificador do mundo.

O herói passa por metamorfoses, sim, mas o mito do crescimento quase se esconde. O aprendizado da dor como manobra de crescimento não tem aqui significado. A sê-lo, será mais por aquilo que vai fazer dele um ente sociabilizado, que é o crescimento das orelhas e do nariz e que embora sem espelho – uma cautela vigilante da providência da Cidade – ele vai buscar uma bacia com água e fica horrorizado e conhece então três sentimentos: dor, foi alvo de violência que o deformou de si; vergonha, pela metamorfose a que dá um significado; e desespero, porque sente o terror de ter ido demasiado longe ao rejeitar o humano. Todos estes apêndices eram à partida elementos harmoniosos. Ele também se censura por ter abandonado a Fada que era para ele uma mãe.

Vemos aqui o quanto andamos à volta do mito do crescimento sem estrutura para nos engradecermos, sair do plano da manobra; observamos como a dureza do pai é um martelo de bigorna na ascensão do filho, oscilamos entre temores de uma Cidade cinzenta em que criamos a imagem e não damos forma à plástica tenacidade da alma. Então ela cresce de descontroladamente, de modo a não ser reconhecida no invólucro. É um longo desenrolar de conceitos quase filosóficos e sem dúvida absolutamente poéticos, nevrálgicos como as auroras que estão sempre do mesmo tamanho em qualquer latitude do mundo.

Se a grandeza de um nariz associada à mentira desse frutos, nós seríamos os grandes herdeiros da falsa questão a ver por onde correram as verdades todas a partir de um ponto tão reduzido, mas que alguns têm tão grande. E que não se pega um ser pelo nariz como não se toca na barba de ninguém. Há subtis intenções que são disfarces pois que subtilmente nos fazem ir até anatomias bem desenvoltas nesta matéria. Podem ter produzido grandes mitos e talvez pais temíveis mas não se lhes nota uma grande ausência de verdade.

Creio por isto tudo e muito mais que a aceleração “crescimentista” possa ser uma super- masculinização do tecido social que se vê impulsionado para a conquista sem freio de quase tudo o que mexe e trespassa de morte organismos e vidas inteiras na mesma escala de valores que faz disparar a sua proliferação em massa. O crescimento conquistado pela perda de vidas é um naufrágio que só a quimera do movimento dá ensejo e encoraja. De resto creio que tudo está bem.

Aquele que acabou de levar a termo uma criação é acusado de ser um torturador, um matador. A acusação é socialmente contraditória, mas filosoficamente não é senão a repetição de uma denúncia de que todos são alvo: aceitou ser pai. Finalmente, por um instante faz-se luz sobre o parentesco entre «crianças» e «bonecos».

Um grande tratado ontológico, portanto. E talvez o momento de nos firmarmos na nova substância em crescimento de uma ideia humana que é um propósito intermédio na longa e ainda crescente marcha da sua transformação.

25 Jul 2017

Fronteira fora de portas

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 21 ficou a saber-se pelo site noticioso de Hong Kong “scmp”, que as autoridades continentais estão a preparar a instalação de um posto fronteiriço conjunto, dentro do terminal de comboios de alta velocidade de West Kowloon.

A notícia vem levantar algumas questões de ordem jurídica devido à localização de um posto alfandegário chinês em território de Hong Kong. A linha ferroviária que liga West Kowloon, Hong Kong, com Shenzhen e Guangzhou, China, começou a ser construída em 2010. Os trabalhos deverão estar concluídos no próximo mês de Outubro. Este projecto vai trazer grandes melhorias ao nível das ligações entre as regiões para lá do Rio das Pérolas e as zonas em torno de Guangdong. As deslocações serão mais rápidas e mais facilitadas.

A implementação deste projecto requer cooperação. Desde o início que, quer a China quer Hong Kong, pensaram localizar postos de controle fronteiriço conjuntos, serviços de imigração e quarentena na estação terminal de West Kowloon. O controle de fronteira, efectuado por funcionários chineses e por funcionários de Hong Kong permitirá aos passageiros residentes em Hong Kong concluir os procedimentos de saída e de entrada na China antes de apanharem o comboio, sem terem de passar pelo mesmo processo na chegada ao destino.

Os passageiros continentais também poderão desembarcar em qualquer estação chinesa sem terem de passar por mais nenhum controle aduaneiro. Até aqui parece simples. Sem este posto de controle conjunto no terminal de West Kowloon, os passageiros teriam de ser submetidos ao mesmo processo na chegada à China, pelo que parece ser um procedimento que só traz vantagens.

No entanto, para seguir este plano parte das instalações do terminal de West Kowloon terá de ser cedida aos serviços de fronteiras, de imigração e de quarentena da China continental. As leis e os regulamentos continentais vão poder ser aplicados em território de Hong Kong. A proposta desencadeou preocupações ao nível da segurança da legislação aduaneira entre a China e Hong Kong. Simplificando, este procedimento fará com que o cais da estação, bem como o interior das carruagens, fique sob a alçada da jurisdição da China continental. Os detractores desta ideia temem que os funcionários chineses possam vir a prender pessoas mesmo fora da estação.

O Secretário da Justiça de Hong Kong, Rimsky Yuen Kwok-keung, prestou declarações sobre o assunto em Pequim, a 14 de Março último.

“As responsabilidades legais dos passageiros não aumentarão, e o seu estatuto legal não será afectado de forma alguma.”

“Foi este o espírito que orientou o projecto de localização de um posto de fronteira avançado, assegurando que esteja de acordo com a Lei Básica e que venha a ser conveniente e eficaz para os passageiros.”

Esta terça-feira, 25, ficaremos a saber todos os pormenores do acordo. Para um residente de Hong Kong, é importante estar a par da forma como as leis da China continental podem vir a ser implementadas Hong Kong. No fundo é uma forma de ficar a saber como opera o princípio “Um país, dois sistemas”, tanto na China como em Hong Kong.

Se Hong Kong permitir que os funcionários governamentais do continente apliquem a lei chinesa no terminal ferroviário, território de Hong Kong, estar-se-á a infringir o principio “um país, dois sistemas”. À luz da Lei Básica de Hong Kong, a cidade implementa a sua própria lei. O Artigo 18 da mesma lei, estipula que a lei chinesa só será aplicável em circunstâncias excepcionais. O acordo para a criação de um posto fronteiriço chinês dentro de terminal não cabe nessa excepção.

Aparentemente uma forma de resolver o problema da aplicação da lei, é fazer passar uma nova resolução no Comité Permanente do Congresso Nacional Popular (SCNPC – sigla em inglês) que permita a aplicação da lei chinesa no posto fronteiriço do terminal e no comboio, enquanto este percorrer território de Hong Kong. Esta lei não irá regular apenas questões alfandegárias, terá de ter em consideração questões como operações de socorro a vítimas, em caso de acidente com algum comboio.

Também se ficou a saber pelas notícias que os funcionários alfandegários chineses não têm autorização para pernoitar em Hong Kong enquanto estiverem de serviço. Não têm permissão para circular fora das áreas onde a lei da China continental é aplicável. Resumindo, de dia trabalham, à noite regressam a casa. Se esta ideia for para a frente, os funcionários alfandegários chineses vão ter uma vida difícil. Vão gastar imenso tempo nas viagens. Depois do trabalho, não podem sair da zona circunscrita e desfrutar de uma boa refeição, nem mesmo de uma bebida estimulante. Podemos desde já prever o quanto se vão aborrecer em Hong Kong. Seja como for, o comboio expresso vai ser bom para todas as Regiões Administrativas Especiais da China. Vai estabelecer mais ligação e promover o mútuo conhecimento entre a China e as suas RAEs. Se, futuramente, surgir outro posto fronteiriço avançado, a experiência de Hong Kong pode vir a ser útil.

25 Jul 2017

Poliamor

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] poliamor é um estado de relação que não se rege por expectativas monogâmicas. A palavra de ordem é a do amor livre – amor livre de pre-concepções socialmente (biologicamente?) impostas. Uma forma de amor entre mais do que duas pessoas que partilham de forma consensual, ética e honesta, um relacionamento. Mas o conceito tem sido uma ideia difícil de encaixar porque mexe com as narrativas do amor e do sexo vigentes. Afinal o que é que é natural para a nossa espécie? Amor a dois, a três ou a quatro? Será que podemos estender o nosso relacionamento para uma constelação mais numerosa?

Desde a invenção da agricultura que se lida com o amor como uma troca comercial. Eu (homem) tenho interesse em ter uma mulher para dar-me os filhos e eu (mulher) preciso de um homem para garantir que quando estiver mais vulnerável (com uma barriga gigante de oito meses) alguém vai poder ajudar-me. Na altura dos caçadores-recolectores parece que a história era ligeiramente diferente, as formas sexuais eram muito mais livres e a comunidade não se limitava a parelhas. Todos estavam em movimento à procura de recursos e, por isso, davam-se a outro tipo de práticas (e de liberdades). Isto só prova que até somos bastante flexíveis na forma como vivemos o sexo e o amor. Ora, hoje em dia, não estamos tão limitados por mecanismos de sobrevivência ou por exigências culturais (que estão sempre em transformação). Nós somos agora capazes de propor e negociar as formas amorosas e sexuais que nos trazem mais felicidade como por exemplo, um relacionamento a três.

Não se trata de uma prática, mas de uma identidade sexual onde se estabelecem relacionamentos profundos, íntimos e carinhosos com mais do que uma pessoa. Não se enganem se pensam que o poliamor se rege pelos mesmos processos do que vulgarmente chamamos de traição, nada disso. O poliamor pressupõe um conjunto de pessoas que consente o seu envolvimento, e que se assumem como felizes e ‘poliamorosos’. Se o poliamor não for esclarecido nem discutido, garanto-vos que não vai funcionar. Porque, como devem saber, há algo de humano e emocional que poderá lixar um pouco a expectativa de se puderem ter múltiplos relacionamentos ao mesmo tempo: os ciúmes.

Considero os ciúmes um mecanismo sintomático de uma relação pouco comunicada, uma coisa que acontece quando há insegurança. Nada de bom poderá sair da expressão ciumenta normalizada – nunca foi nem será uma forma genuína de amor (coisa que acontece regularmente).  Mas de alguma forma os ciúmes não são um problema em relacionamentos poliamorosos porque simplesmente não existem. Por isso, mesmo que se queira achar o conceito do poliamor esquisito, talvez casais monogâmicos possam aprender alguma coisa, nem que seja perceber que os ciúmes são uma fabricação de necessidade possessiva, e não amorosa. Já que chegámos tão longe no nosso desenvolvimento e auto-descoberta (ao ponto de negociarmos significados sexuais em conjunto!) talvez não fosse má ideia de todo focarmo-nos na inutilidade que é o ciúme. Só mesmo porque isso faz-nos mais felizes, e aos relacionamentos também.  Aliás, podemos permitir-nos criatividade e honestidade  na busca do que queremos num relacionamento íntimo e no sexo – e podemos sair do armário do tabu sexual para aquilo que nos dá mais prazer.

25 Jul 2017

TUI declara impedimento de juiz

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Tribunal de Última Instância (TUI) decidiu que um juiz do Tribunal de Segunda Instância (TSI) está impedido de intervir num recurso por ter participado no julgamento do mesmo processo na primeira instância.

De acordo com um comunicado do TUI, numa acção para efectivação de responsabilidade extracontratual intentada por três autores contra os Serviços de Saúde e um outro réu, o Tribunal Administrativo (TA) não deu razão à pretensão. Os autores recorreram da decisão e, entretanto, suscitaram o impedimento de um juiz, com o fundamento de que o mesmo magistrado judicial tinha tido uma intervenção no processo no TA: foi o juiz titular que proferiu a sentença e foi juiz-adjunto do tribunal colectivo.

O juiz em questão proferiu um despacho em que alegou ter proferido a primeira sentença do caso referido no TA, que viria a ser anulada, pelo que tinha deixado de existir na ordem jurídica. O magistrado alegou ainda que também não interveio no segundo julgamento da matéria de facto, concluindo não aceitar o impedimento.

Os autores reclamaram para a conferência do TSI que, por acórdão do passado dia 9 de Março, indeferiu a reclamação. Inconformados, os autores interpuseram recurso para o TUI, que conheceu do caso.

Ultimas notas

A Última Instância nota que “a lei veda a participação do juiz que, no processo em causa, tomou posição sobre questões suscitadas no recurso”. Assim, “independentemente de o primeiro julgamento ter sido anulado, por anulação de processado, isso não anula o comprometimento intelectual do juiz referido com esse julgamento, em que decidiu que quatro factos que os autores queriam ver provados não se provaram e um outro apenas se provou parcialmente”.

O TUI lança ainda uma questão, para lhe dar resposta: “Como pode estar este juiz em condições de apreciar o recurso da matéria de facto, que já julgou, no mesmo processo, enquanto membro do tribunal colectivo de primeira instância? É evidente que não reúne condições mínimas de imparcialidade para o fazer, visto ter tomado posição sobre questões suscitadas no recurso”.

O TUI sublinha ainda que o magistrado judicial proferiu a primeira sentença em que “discorreu largamente sobre questões suscitadas no recurso, tendo concluído, na sentença, que não se provou um nexo de causalidade entre a morte da paciente e a sua não transferência para a unidade de cuidados intensivos, ao contrário do que defendem os autores no recurso”. Ou seja, “este juiz está também comprometido intelectualmente quanto às questões jurídicas suscitadas no recurso, pelo que não tem as condições de imparcialidade necessárias para participar no julgamento do recurso”.

25 Jul 2017

Adiada leitura de sentença de casal português retido em Díli

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] leitura da sentença de um casal de portugueses retido em Díli há quase três anos foi ontem adiada pelo tribunal, que introduziu, na sessão de leitura do acórdão, o que definiu como alterações não substanciais dos factos.

O adiamento, para a próxima sexta-feira, faz prolongar um caso que se arrasta desde Outubro de 2014 quando Tiago e Fong Fong Guerra foram detidos em Díli, cidade de onde estão proibidos de sair desde então.

Numa decisão que surpreendeu a defesa, a juíza Jacinta Correia iniciou a sessão que deveria ser de leitura da sentença com a apresentação do que disse serem novas provas, valendo-se de um artigo do código do processo penal sobre “a alteração não substancial de factos”.

“Dizemos facto novo porque estes factos não estão na acusação”, insistiu a juíza.

“Não se preocupem que não vamos adiar isto até Setembro”, garantiu a juíza à defesa.

Os documentos em causa, que já constavam dos autos do processo, referem-se a um conjunto de transferências realizadas de e para a conta da empresa gerida pela arguida num banco em Macau.

Depois de ouvir a informação do tribunal, o Ministério Público disse que precisava de cinco dias para os avaliar, com a defesa a manifestar “surpresa e desacordo” e a insistir que não se trata de factos novos e que o próprio tribunal tinha declarado encerrada a discussão de matéria de facto.

“Não estamos perante factos novos. E não são novos até porque estão documentalmente provados nos autos que não são novos”, insistiu o advogado Álvaro Rodrigues.

“A defesa não percebe o pedido de cinco dias por parte do MP para responder a esta alteração não substancial dos factos. Conhecemos abundantemente os factos. Conhecemos isso em nove audiências, analisámos isto abundantemente”, afirmou.

O julgamento do caso ficou visto para sentença no passado dia 27 de junho, depois de Ministério Público e defesa terem feito as alegações finais.

Presenças de peso

A sessão de ontem tinha suscitado bastante interesse e na sala principal do Tribunal Distrital de Díli estavam várias individualidades, incluindo o ex-Presidente timorense José Ramos-Horta, a eurodeputada portuguesa Ana Gomes, representantes do corpo diplomático, incluindo das embaixadas de Portugal e da União Europeia, do Banco Mundial e das Nações Unidas, entre outros.

Tiago e Fong Fong Guerra foram julgados pelos crimes de peculato, branqueamento de capitais e falsificação documental sendo central ao caso uma transferência de 859 mil dólares, feita em 2011 por um consultor norte-americano, Bobby Boye.

Nas alegações finais, e para os crimes de peculato e branqueamento de capitais, o Ministério Público pediu penas de prisão de oito anos para cada um dos dois arguidos, além do pagamento de uma indemnização no valor de 859.706 dólares com juros desde 2011.

A defesa, por seu lado, pediu a absolvição, considerando que depois das sete sessões do julgamento “a acusação não conseguiu provar factos que possam incriminar e conduzir à condenação” dos arguidos.

Tiago Guerra foi detido para interrogatório a 18 de outubro de 2014, passou três dias numa esquadra e a 21 do mesmo mês foi ouvido no Tribunal de Díli, quando o juiz ordenou a sua prisão preventiva na cadeia de Becora, onde ficou preso até 16 de Junho de 2015.

Desde então está, como a mulher, com Termo de Identidade e Residência (TIR) e impossibilitado de sair do país.

25 Jul 2017

Timor-Leste – Eleições | Diferença entre os dois maiores partidos será mínima

 

O partido de Xanana (CNRT) e o de Mari Alkatiri venceram as eleições. A diferença entre os dois será mínima. Resta saber como serão feitos os arranjos para governar o país.

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] diferença de votos entre os dois maiores partidos timorenses nas eleições legislativas de sábado vai ser mínima e o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) ainda pode vencer a Fretilin, que continua à frente na contagem.

Na sede do CNRT, em Díli, os números do partido apontam a uma vitória em Díli – o último município onde ainda não terminou a contagem – que poderá permitir reverter a liderança que a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) manteve durante toda a contagem.

A diferença de votos entre os dois partidos vai ser mínima – podendo não chegar a 3.000 votos – o que pode implicar que tenham o mesmo número de lugares no Parlamento Nacional, que elege um total de 65 deputados.

Quando estavam contabilizados 97,27% dos votos, a Fretilin lidera a contagem com 155.438 votos (29,72%), à frente do CNRT que tem 149.871 votos ou 28,55%, o que representa uma diferença de apenas 5.567 votos.

Em Díli, o único município onde ainda decorre contagem (estão contabilizados 72,29% dos votos) o CNRT tem 28.239 votos (38,62%) contra os 21.529 da Fretilin (29,44%).

Francisco Kalbuadi, secretário-geral do CNRT, indicou à Lusa números que apontam para uma ligeira vitória do seu partido, afirmando porém que vão “esperar pela contagem” que esperam estar concluída até ao final da noite.

Questionado sobre se o CNRT, caso vença, negociará ou não com a Fretilin para a formação de Governo, Kalbuadi remeteu uma decisão para mais tarde, depois de uma reunião do partido.

“Depois dos resultados, amanhã, há uma reunião da comissão política e vamos ouvir a orientação do presidente do partido, Xanana Gusmão e talvez uma conferência para decidir qual ai ser a nossa posição”, disse.

“Neste momento não posso dizer nada. A decisão é coletivamente do partido”, afirmou.

 

Primeiro-ministro | “Veredicto sábio”

O primeiro-ministro timorense, Rui Maria de Araújo, considerou ontem que os resultados preliminares das eleições legislativas, que colocam a Fretilin e o CNRT como os dois partidos mais votados, são um “veredicto sábado e eloquente” dos eleitores. “Os resultados preliminares demonstram um veredicto sábio e eloquente do Povo de Timor-Leste: querem que Mari Alkatiri e a Fretilin liderem o processo de mudança rumo a um desenvolvimento mais sustentável nos próximos 5 anos, mas sem relegar para segundo plano o líder histórico Xanana Gusmão”, disse à Lusa em Díli.

“E contam sempre com a participação do outro líder histórico Taur Matan Ruak, dos mais jovens do PD e de outras franjas significativas da sociedade”, sublinhou. Rui Araújo destacou ainda a “maturidade cívica e política” que o povo de Timor-Leste mostrou “durante as campanhas eleitorais e, ao acorrer em massa às urnas, provando que está ciente da importância do seu papel na participação do desenvolvimento do país”.

 

Mari Alkatiri promete diálogo com Xanana

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] secretário-geral da Fretilin agradeceu ontem a “grande responsabilidade” que o eleitorado timorense depositou no seu partido, provavelmente o mais votado nas legislativas de sábado, comprometendo-se a dialogar com Xanana Gusmão e com quem queira apoiar o desenvolvimento do país.

“Tudo faremos para abraçar todos mas vamos continuar a trabalhar com Xanana Gusmão, essa figura incontornável desse país, no sentido de responder a esta mensagem clara do nosso povo”, afirmou Mari Alkatiri, num discurso na sede da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) em Díli.

Na primeira declaração de um líder partidário depois das eleições de sábado – e quando a Fretilin lidera a contagem dos votos – Alkatiri disse que houve “uma luta renhida entre os dois grandes partidos” mas recordou que a Fretilin e o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) de Xanana Gusmão “são partidos aliados”.

Agora, contados os votos, “o povo transmitiu uma mensagem clara, de que quer que se continue a consolidar a paz e a estabilidade e que se continue com o programa de desenvolvimento para tirar o povo dessa situação de pobreza”.

Questionado pela Lusa se a abertura ao diálogo se limita a Xanana Gusmão ou se aceita falar com os restantes partidos, incluindo o PLP do ex-Presidente Taur Matan Ruak, o secretário-geral da Fretilin disse que todos são bem vindos.

De braços abertos

“Agora a campanha acabou. Não existem adversários, existem só compatriotas que quiserem trabalhar juntos”, disse. “Estar de braços abertos para incluir todos no processo de governação e de construção do país não significa que todos devem entrar para o governo. Por mim o Governo mais eficaz é sempre um governo pequeno”, disse.

Questionado sobre se vai ou não ser primeiro ministro, Alkatiri disse que já solicitou ao secretário-geral adjunto do partido, José Reis, a marcação de uma reunião do Comité Central da Fretilin (CCF) a quem caberá tomar a decisão, dando-lhe a liberdade de escolher se aceita ou não liderar o executivo.

Mais do que uma declaração de vitória o discurso de Mari Alkatiri, em tétum e português, foi um convite “de braços abertos” às restantes forças políticas que, disse, queiram juntar-se ao projeto de desenvolvimento do país.

Rodeado por centenas de dirigentes e apoiantes do partido, que depois o saudaram num misto de celebração e emoção – muitos choraram num momento que para a Fretilin marcar o regresso ao controlo do Governo, 10 anos depois – Alkatiri agradeceu a “maturidade” do povo timorense.

“Estas responsabilidade que o povo agora nos entrega será tratada com o maior sentido de responsabilidade. Por isso obrigado a todos”, disse, explicando que em breve conversará com Xanana Gusmão com quem espera, no momento oportuno, fazer uma conferência de imprensa conjunta.

Alkatiri disse que o voto do eleitorado na Fretilin é um sinal do que o partido fez na campanha mas é também uma declaração de apoio “aos que trabalharam muito para garantir a estabilidade e a paz em Timor-Leste” e para “permitir o desenvolvimento do país”.

“Tentámos convencer o povo e o povo ouviu-nos. O povo não deu a maioria absoluta a ninguém e temos que respeitar a vontade do povo”, disse.

“Deu maioria simples à Fretilin, reconhecendo a capacidade, os valores e os princípios da Fretilin”, disse ainda.

Diáspora | Fretilin vence, PLP em 2.º à frente do CNRT

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Fretilin obteve a maioria dos votos dos eleitores timorenses na diáspora, com 345 dos 1.086 votos expressos (31,77%), à frente do PLP e do CNRT, segundo dados finais provisórios dos centros de votação fora de Timor-Leste.

Os dados, compilados ontem pela Lusa com base em informação do Secretariado Técnico de Assistência Eleitoral (STAE), mostram que o quarto partido mais votado foi o PD e o quinto o Khunto.

Nas eleições legislativas de sábado foi possível votar em centros de votação instalados em três cidades australianas – Darwin, Melbourne e Sydey -, na Coreia do Sul, Portugal e Reino Unido.

No total votaram 1.086 eleitores de um universo de recenseados de 2.124, com a abstenção a ser de 49%

Os dados totais da votação nesses centros mostram que a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) obteve 345 votos (31,77%), o Partido Libertação Popular (PLP) obteve 255 votos ou 23,48%, e o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) obteve 218 votos ou 20,07%.

O Partido Democrático (PD) obteve 42 votos ou 3,87% e o Kmanek Haburas Unidade Timor Oan (Khunto).

A cidade australiana de Melbourne foi o local onde a participação foi mais elevada (74,20%) e Londres a cidade onde foi mais baixa (42,31%).

24 Jul 2017

Entrevista | Angela Leong, deputada e candidata às legislativas

 

É deputada à Assembleia Legislativa há 12 anos e uma das empresárias de maior sucesso do território. Mas Angela Leong não esquece as origens, que a ajudam a perceber as dificuldades de quem menos tem. A preparar-se para uma nova corrida eleitoral, afasta ter uma lista oriunda do jogo. A candidatura é feita de pessoas dos mais variados sectores que têm ideias e objectivos em comum

 

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] deputada à Assembleia Legislativa (AL) há 12 anos. O que a leva a recandidatar-se?

O Dr. Stanley Ho tem-me dito que todos temos de ter presente a fonte que nos enriquece. Por isso, quando alcancei algum sucesso no sector comercial, candidatei-me à AL, em 2005, com o intuito de dar o meu melhor e contribuir para a sociedade. Cresci na classe baixa. Compreendo bem as solicitações dos residentes que são da classe baixa, percebo as dificuldades que essas pessoas enfrentam. Por isso, no futuro, vou fazer o meu melhor, dar atenção à situação dos residentes e representar as suas vozes, trazendo os assuntos deles à AL, para pedir ao Governo melhorias na vida dos cidadãos. Nem me apercebi de que tinham passado 12 anos da minha primeira eleição. Sinto-me muito contente porque os meus trabalhos conquistaram o reconhecimento e apoios de uma parte dos residentes. Eu própria ganhei várias coisas com o facto de ser deputada à AL. É toda esta dinâmica que faz com que me recandidate, sendo também uma missão que vem dos 12 anos na AL.

 

Quais são os seus principais objectivos para as eleições deste ano?

Só tenho um único objectivo: executar as ideias da nossa comissão de candidatura da maneira mais ampla possível, para resolver os problemas dos cidadãos e contribuir para a sociedade.

 

Este ano há também outras candidaturas ligadas ao sector de jogo. Espera uma maior competição?

A nossa lista chama-se Nova União para o Desenvolvimento de Macau, cujo significado é unir profissionais de vários sectores que têm ideias idênticas. Esperamos juntar a nossa inteligência e experiência para avançarmos com medidas e políticas em prol do desenvolvimento diversificado de Macau. A nossa equipa conta com representantes de vários sectores: do jogo, de instituições ligadas aos serviços sociais, jovens, médicos e também macaenses. Não é só do sector do jogo. Além disso, ao longo de todos estes anos, a nossa equipa só se tem candidatado pela via directa, porque o objectivo é lutar pelos benefícios dos residentes, em vez de estar limitada a um determinado sector e expressar a voz de apenas uma parte da sociedade. Só deste modo é que o desenvolvimento económico geral se vai fazer com equilíbrio e harmonia. Por isso, mesmo que haja outras comissões de candidatura ligadas ao jogo, para nós é igual.

 

Há 25 comissões de candidatura para as eleições de Setembro. Vai ser mais difícil assegurar a reeleição?

É do conhecimento geral que as eleições para a AL são muito competitivas. Mas é óbvio que estou contente por haver cada vez mais grupos a candidatarem-se às eleições legislativas, sobretudo os jovens, porque isso demonstra que há cada vez mais jovens que dão atenção à política e ao desenvolvimento de Macau. Isso é bom e pode levar o Governo a ouvir vozes diferentes da sociedade.

 

William Kuan candidata-se ao seu lado. É um empresário do sector imobiliário, além de estar ligado à responsabilidade social do sector do jogo. São assuntos que deverão ser abordados na AL?

O jogo responsável, área em que William Kuan trabalha, é o que defendo desde o início, numa altura em o Governo ainda não tinha começado a prestar atenção ao jogo responsável. Como o Dr. Stanley Ho tem insistido no princípio de “ser importante contribuir para a sociedade onde tiramos os seus recursos”, tenho desejado que se fomente o jogo responsável. Numa sociedade como Macau, em que a indústria dos casinos é uma indústria pilar, este tipo de trabalho tem como objectivo reduzir os impactos negativos do jogo. Neste contexto, William Kuan tem as mesmas ideias da nossa equipa de candidatura. Além disso, é representante de vários grupos, incluindo de jovens, ligados à religião e a uma associação de serviços sociais sem fins lucrativos. Como referi, a nossa equipa tem insistido em candidatar-se pelo sufrágio directo. Em vez de representarmos só um determinado grupo ou profissão, queremos aproveitar a experiência em cada área profissional para ajudarmos e representarmos as vozes dos residentes oriundos de classes sociais e sectores diferentes, e também transmitir ao Governo medidas e sugestões construtivas, que sejam exequíveis.

 

A sua comissão de candidatura defende que o ensino superior deve ser gratuito para os residentes de Macau. Como é que olha para a qualidade do ensino superior do território? O que deve ser feito para que seja promovida?

Se se quiser alcançar as metas de diversificação adequada da economia e do desenvolvimento sustentável, é necessário haver uma reserva de talentos suficiente e diferenciada. Por isso, esperamos que o Governo acrescente mais quatro anos na sua política de educação gratuita, de modo a contemplar o ensino universitário, e alargue o âmbito dos beneficiários de bolsas de mérito especial e da cobertura de cursos. O objectivo é recompensar os alunos universitários de qualidade para que consigam elevar a sua capacidade académica e ter boas notas, aumentando a cobertura do ensino superior em Macau. Em relação à qualidade do ensino superior, sugerimos – e está também previsto no nosso programa político –, que se façam actualizações adequada às estruturas dos cursos de todas as instituições de ensino superior para que reúnam os requisitos internacionais em termos académicos, fazendo com que os cursos possam responder às necessidades de desenvolvimento diversificado de Macau e estejam ao nível internacional. Além de poder elevar a qualidade dos residentes, isso poderá aumentar a competitividade de Macau.

 

Tem havido algumas críticas sobre propaganda eleitoral dirigida aos trabalhadores dos casinos. Que comentário faz a estas afirmações?

A nova lei eleitoral da Assembleia Legislativa entrou em vigor no início do ano. Foi aditada uma disposição em que se prevê que os responsáveis das sociedades concessionárias da exploração de jogos de fortuna ou azar e das sociedades promotoras de jogos, bem como os seus trabalhadores, quando no exercício de funções no interior dos casinos, têm os deveres de imparcialidade e neutralidade. Eu, enquanto deputada à AL, sendo também uma empresária do sector do jogo, tenho apoiado estas disposições e tenho cumprido as políticas do Governo. Por isso, desde a entrada em vigor da nova lei eleitoral, a nossa comissão de candidatura e as minhas empresas têm executado rigorosamente as leis em vigor. No entanto, geralmente é normal encontrarem-se dificuldades em termos da execução após a entrada em vigor de novas leis. Assim sendo, sugiro à CAEAL que esclareça o mais cedo possível a parte que foi revista na lei eleitoral e unifique os padrões de execução em todos os casinos, para assegurar a justiça e imparcialidade nas eleições. Por exemplo, será que os bancos, as companhias de electricidade, o aeroporto, a companhia de fornecimento de água e as companhias de telecomunicações, assim como as outras concessionárias de serviços públicos, precisam de cumprir a referida disposição, o que está previsto na lei eleitoral?

 

O Governo está a trabalhar na revisão dos contratos do jogo e coloca-se a possibilidade de aumentar o número de concessões de três para seis. É uma boa solução para o sector?

Temos de ver quais serão as políticas a adoptar pelo Governo nesse sentido e qual o desenvolvimento da sociedade. O Executivo ainda está a estudar esta questão e devemos esperar pelo planeamento. Só depois da divulgação dos planos é que poderemos dar uma resposta. Como uma das operadoras, claro que esperamos poder continuar a ter esta oportunidade de manter o negócio (a Sociedade de Jogos de Macau assinou o contrato de subconcessão com a MGM em 2005). Como directora-executiva de uma operadora, prefiro não comentar mais nada, uma vez que o Governo ainda não anunciou um plano neste sentido. Mas, tendo em conta que todas as empresas têm as suas licenças e investiram muito dinheiro, que levou ao desenvolvimento da economia de Macau e do turismo, esperamos que todos tenham a oportunidade de continuar as operações. O mais importante é a divulgação dessa política, mas antes penso que o Executivo deveria colocar este assunto sob consulta pública.

 

Existem empreendimentos do sector do jogo que ainda não foram inaugurados. O sector vai ter de enfrentar a escassez de recursos humanos? O Governo precisa de definir uma política de trabalhadores não residentes mais flexível?

Em relação ao mecanismo de apreciação para a importação de trabalhadores não residentes, tenho pedido ao Governo que insista no princípio de que este tipo de mão-de-obra serve apenas para preencher a falta de recursos humanos locais no mercado. Por isso, acredito que se o Governo continuar a adoptar este princípio na importação de trabalhadores não residentes, é capaz de assegurar os benefícios de emprego dos trabalhadores locais e garantir um equilíbrio em relação à necessidade de recursos humanos entre os sectores. Nos últimos anos, a economia de Macau avançou, as indústrias passaram a ser gradualmente mais diversificadas, pelo que a necessidade de recursos humanos está a aumentar. Mas a dependência excessiva do mecanismo de importação de trabalhadores não residentes não será uma solução que funcione a longo prazo. Considero que se deve começar por formar talentos locais, analisar profundamente a estrutura demográfica de Macau e a distribuição da população activa em cada profissão, bem como a necessidade de trabalhadores em cada área, com base numa investigação científica, e definir um planeamento de recursos humanos a médio e longo prazo, em conjugação com a realidade do desenvolvimento de indústrias, actualizando as directrizes e políticas para o desenvolvimento geral dos trabalhadores em Macau.

 

Em que ponto está o projecto para o parque temático da Hello Kitty, que quer construir no Cotai?

Têm existido muitos problemas com a política que o Governo quer implementar. Sendo nós uma das concessionárias do terreno, gostaríamos de desenvolver mais parques temáticos, mas ainda não estamos autorizados a continuar o desenvolvimento do terreno, uma vez que o Governo decidiu suspender a política. Como concessionária gostaria de começar este projecto, para que haja uma maior diversificação no sector do turismo, mas não podemos avançar. O problema não é nosso e espero que nos ajude a descobrir o que se passa. Tudo depende do Governo, porque alterou o plano.

 

Não deu apoio directo para nenhuma das soluções apresentadas recentemente em relação à Lei de Terras? Porquê? Concorda com alguma das ideias que foram propostas ao Chefe do Executivo pelos seus colegas da AL?

Como o disse anteriormente, eu basicamente apoio e conjugo as leis e as políticas que entraram em vigor. Em relação à Lei de Terras, apoio muito a legislação, porque Macau é uma terra pequena com muita população, e a construção urbana e o desenvolvimento são restringidos pelos recursos de solos que temos. Como desenvolver, atribuir e utilizar os terrenos de modo eficaz tem sido um assunto a que a sociedade está atenta, sendo também um ponto essencial para o desenvolvimento de Macau. Entretanto, após ter entrado em vigor a Lei de Terras, surgiram problemas com a aplicação, devido às suas imperfeições – o caso do Pearl Horizon é um exemplo típico. Os proprietários do Pearl Horizon não cometeram qualquer erro, foram confrontados com um prejuízo grande por causa da alteração à lei e à política de terras. Sem dúvida que tal situação contraria a intenção legislativa da Lei de Terras. Sugiro que o Governo estude o mais rápido possível como aperfeiçoar a lei, para garantir os benefícios legítimos dos cidadãos, evitando o sofrimento dos cidadãos devido à implementação de políticas.

24 Jul 2017

AL | Lei de administração de condomínio regressa ao hemiciclo para voto na especialidade

 

A 1ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa assinou a parecer sobre a lei que regulamenta a actividade comercial de administração de condomínios. A proposta prevê o aumento da cauções por condutas ilícitas e condiciona o exercício da actividade a licença concedida pelo Instituto da Habitação

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]epois de 17 reuniões, 14 das quais com presença de membros do Governo, a 1ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL) assinou o parecer da proposta de lei que regula o ramo das empresas de gestão de condomínios.

De acordo com o parecer assinado pelo presidente da comissão, Kwan Tsui Hang, a versão do documento que o Governo apresentou a 26 de Junho “reflecte as opiniões veiculadas no seio da comissão.” No fundo, ficam limadas as arestas que representavam desentendimentos entre os deputados e os membros do Executivo.

Uma das novidades trazidas pelo diploma é o agravamento das cauções, que passam para valores entre as 100 mil e as 700 mil patacas. Os valores variam consoante o número de fracções administradas.

As empresas têm de prestar estas cauções que funcionam como uma garantia dos condóminos em casos de prática de “condutas ilícitas graves como prestação de declarações falsas”, ou elementos falsos. Segundo o despachado assinado por Kwan Tsui Hang, estas medidas têm um “caracter dissuasor, sancionatório, não tem carácter compensatório”.

Ainda no regime sancionatório, a proposta de lei estabelece a possibilidade de interdição do exercício de funções entre dez meses e um ano.

Baptismo IH

O diploma que vai regressar à AL para votação na especialidade faz depender o reconhecimento de uma empresa de administração de condomínio de concessão de licença por parte do Instituto da Habitação (IH).

Hoje em dia, 90 por cento das edificações registadas em Macau são em regime de propriedade horizontal. De forma a dirimir os normais conflitos que advém das relações jurídicas criadas por esta realidade, urge à AL aprovar uma lei que regulamente este sector de actividade.

Outra das medidas constantes na proposta de lei é a fixação do valor mínimo de 250 mil patacas de capital social das empresas que pretendem competir no mercado da gestão de condomínios. A medida não agradou aos representantes do sector, que consideraram que pode ficar em causa a competitividade de pequenas e médias empresas do ramo.

De forma a “assegurar um nível de profissionalismo e salvaguardar a qualidade dos serviços de administração”, a presente lei cria a figura jurídica do Director Técnico. Uma empresa que queira pedir, ou renovar, a concessão de licença para operar precisa de ter nos quadros um técnico qualificado que dê a cara pela pessoa colectiva.

Neste domínio, o parecer salienta que a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais levou a cabo cursos de formação para directores e chefias da área da administração predial. Nesses cursos participaram 400 formandos, sendo que 80 por cento exercem funções profissionais no sector em apreço. Tendo em conta que Macau tem 160 empresas de gestão de condomínios, os serviços entendem que a mão-de-obra é suficiente para responder às exigências do mercado.

O documento assinado por Kwan Tsui Hang explica os atrasos na apreciação deste diploma pela sua natureza complexa. Além disso, o processo legislativo teve de ser articulado com a aprovação do “regime jurídico de administração das partes comuns dos condomínios”. Por isso a comissão pediu, várias vezes a prorrogação do prazo para a apreciação na especialidade, solicitação a que o Presidente da AL acolheu sempre positivamente, sem excepção.

Grande Baía | Angela Leong pede a mais informação

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] deputada Angela leong pede ao Executivo mais informação aos residentes acerca do projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. De modo a garantir uma implementação com sucesso do projecto no território é necessário, para Angela Leong, que as opiniões favoráveis sejam convergentes até porque, salienta, “Macau é um lugar de pequenas dimensões e precisa da força de todos”. Para unir as tendências, a deputada pede ao Governo que proceda a mais esclarecimentos junto da população para que “os residentes possam entender o projecto em causa e alargar a sua perspectiva desta política regional”, lê-se em interpelação. Angela Leong considera que, neste momento, o importante é a definição de estratégias diversas e que tenham em conta as características dos públicos-alvo a quem se dirigem. A deputada dá exemplos: “os meios de informação multimédia devem ser utilizados para informar os mais jovens e deve existir uma cooperação com o ensino secundário para chegar aos alunos adolescentes”.

24 Jul 2017

IACM | Medidas tomadas para as obras na via pública

O deputado Zheng Anting pediu mais fiscalização nas obras a cargo do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais e o organismo afirma que a implementação de medidas já está em prática. Uma colaboração mais próxima com os Assuntos de Tráfego no acompanhamento de trabalhos e o adiamento de obras para o ano que vem são alguns dos aspectos referidos pelo Governo

 

[dropcap style≠’circle’]”A[/dropcap]s obras são indispensáveis na via pública” diz o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) enquanto garante que está a tomar medidas de optimização de procedimentos para que os trabalhos que estão a ser realizados causem menos problemas no quotidiano da população. A ideia é deixada em resposta à interpelação do deputado Zheng Anting que questionava o Executivo acerca das fiscalização do andamento das construções e do das situações irregulares de trabalho denunciadas pelo Comissariado Contra a Corrupção (CCAC).

O IACM fala de medidas concretas, nomeadamente no que respeita à “optimização dos procedimentos de avaliação, autorização e de supervisão do início das obras assim como do condicionamento do trêfego”, lê-se no documento do Governo. O Instituto não seixa de referir que estes procedimentos estão a ser feitos de forma interdepartamental contando com a participação da Direcção para os Assuntos de Tráfego (DSAT).

No âmbito da optimização dos procedimentos, o IACM exige, actualmente, “a apresentação dos planos das obras mais concretos, incluindo os recursos humanos, informações sobre os equipamentos e máquinas, o parecer da DSAT e o respectivo condicionamento do tráfego, sendo considerado com fundamental, a conclusão da obra dentro do prazo previsto”, sublinha o organismo.

Obras intercaladas

O IACM sublinha ainda que, nas reuniões que tem com a DSAT, existe uma análise, agora, “da viabilidade do número de obras requeridas para execução, impedindo de forma temporária a execução de obras sem condições favoráveis”.

Por seu lado a DSAT, também tomou medidas em concreto. Em causa está o adiamento de parte dos trabalhos de grande dimensão para o próximo ano, e a categorização das via públicas locais. A medida, esclarece o executivo, tem o objectivo de “proceder e assegurar a supervisão dos trabalhos nas vias, coordenando melhor a realização de diferentes obras para execução conjunta a fim de reduzir a interferência das obras, no tráfego citadino”.

De acordo com Lam Hin San, director dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, em declarações dadas após a reunião do Conselho Consultivo do Trânsito, na semana passada, as obras de grande escala a decorrer no território associadas aos serviços de tráfego, foram reduzidas de 99 no ano passado para cerca de dez, neste ano. O objectivo, apontou, é “causar menos impacto ao público”.

No que respeita às irregularidades referentes aos funcionários, o IACM afirma que já estão em andamento os processos disciplinares respectivos de modo a “apurar a sua responsabilidade jurídica”.

Transportes | Au Kam San pede melhores condições das paragens nas Portas do Cerco

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado pró-democrata interpela o Governo para prestar atenção ao terminal subterrâneo de autocarros nas Portas do Cerco.  Au Kam San espera uma intervenção que possa atenuar os efeitos do trânsito no local, assim como proporcionar condições aos passageiros.

“Devido ao mau design da paragem terminal das Portas do Cerco, quer como se faça, quer quanto dinheiro se gaste, não se consegue compensar as falhas do seu design congénito”, comenta. O deputado refere que os passageiros que esperam pelos autocarros 27, 51 ou 59 têm de se sujeitar aos caprichos da meteorologia. Com uma paragem que tem uma coberta demasiado pequena, no entender do pró-democrata os utentes ficam à mercê da chuva e do sol.

As três carreiras referidas têm ali a sua paragem terminal, no espaço subterrâneo do lado da Unidade Táctica de Intervenção da Polícia. O deputado mostra-se particularmente preocupado com a carreira 51 por ser, de acordo com Au Kam San, muito frequentada por residentes de idade avançada da zona de Seac Pai Van.

Apesar da promessa das autoridades de fazerem um estudo para apurar uma forma viável de melhorar as condições dos passageiros em espera, o deputado não se encontra satisfeito. Au Kam San pede o resultado do referido estudo, assim como um ponto de situação sobre o estudo para o novo plano da via exclusiva para autocarros.

Finalmente, o deputado exige que seja ligada a cobertura da paragem das carreiras 27, 51 e 59 até à cobertura de paragem de táxis.

24 Jul 2017

Lei de branqueamento de capitais com revisões regulares

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] legislação referente ao branqueamento de capitais vai ser revista periodicamente. A garantia foi dada pelo próprio secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, em declarações à comunicação social no passado sábado.

Lionel Leong não adianta a periodicidade mas afirma claramente o objectivo da medida: “continuar a corresponder às necessidades exigidas pelo Grupo Ásia/Pacífico contra o branqueamento de Capitais (APG, na sigla inglesa) e aperfeiçoar conforme as novas conjunturas trazidas pelo desenvolvimento da indústria”, lê-se no comunicado enviado à comunicação social. Em causa está o sector do jogo.

O secretário adiantou ainda que, apesar da avaliação positiva dada a Macau no encontro do APG realizado na semana passada, em Colombo, o Executivo considera que há espaço para vários melhoramentos.

No que respeita às necessidades apontadas pela organização no sentido de aumentar a eficácia na acusação e julgamento de crimes contra o branqueamento de capitais, a recente revisão da legislação já indica um passo no sentido de melhorar o desempenho do território nesta matéria.

Nota positiva

Na semana passada, Macau recebeu uma nota positiva no encontro da APG em Colombo e foi classificado com “Eficácia Substancial” no domínio da supervisão. De acordo com o Gabinete de Informação Financeira (GIF), esta atribuição “não é muito frequente entre as jurisdições avaliadas a nível mundial”.

O relatório referente ao território que obteve aprovação do APG, aponta que “os requisitos de licenciamento no sector do jogo para as concessionárias, subconcessionárias e promotores de jogo é robusto”.

Além disso, o mesmo documento refere que Macau tem vindo a aplicar medidas respeitantes ao “licenciamento e avaliação de idoneidade” que incluem “os promotores de jogo e os seus colaboradores”.

O relatório dá ainda uma nota positiva ao trabalho da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), por esta possuir “uma equipa de auditoria experiente e adequadamente qualificada” para a supervisão das medidas adoptadas.

“A qualidade dos relatórios de auditoria analisados durante o processo de avaliação foi considerada bastante satisfatória”, assinalava, na semana passada, o comunicado do GIF.

DSAL continua a inspeccionar

Também no sábado, Lionel Leong fez referência aos acidentes de trabalho que têm ocorrido no território. O secretário destacou o trabalho recente da Direcção Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) em que foi feita a fiscalização a mais de 550 estaleiros. O resultado foi a suspensão de obras em 31, a ordem de multa a mais de 100 e 150 recomendações de melhoramento. De acordo com Lionel Leong, a DSAL vai continuar com as acções de fiscalização de modo a levar as entidades envolvidas ao cumprimento das regras de segurança no trabalho.

Polícia sem recursos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Divisão de Investigação de Crimes Relacionados com o Jogo queixa-se que não tem recursos para trabalhar eficazmente. A informação é dada pelo deputado Ng Kuok Cheong que afirma ter recebido uma carta de um grupo de agentes da autoridade a revelar a falta de recursos humanos no terreno. Consequentemente, e de acordo com a missiva, Ng Kuok Cheong apela ao Governo para tomar medidas. Em causa, está o devido tratamento dos crimes relacionados com o jogo.

“Os trabalhos na Divisão de Investigação de Crimes Relacionados com o Jogo são constantes, quer seja dia ou de noite, porque os casos são muitos e não conseguimos tratar de tudo”, diz a carta, segundo o deputado. O incumprimento do tratamento dos casos deve-se ao número insuficiente de polícias que, de acordo com Ng Kuok Cheong, têm diariamente de lidar com mais de uma dezena de casos. “Em muitos casos, mesmo saindo de madrugada, o trabalho é reiniciado às nove da manhã do dia seguinte”.

Para os agentes queixosos, a falta de profissionais pode também colocar em causa a integridade física de quem está de serviço. “Num caso de sequestro há, muitas vezes, apenas dois a três polícias a trabalhar e, caso os suspeitos ofereçam resistência, estes agentes podem estar em perigo”, adiantam os queixosos.

Os remetentes da carta enviada a Ng Kuok Cheong referem ainda que este tipo de tratamento é desumano. A razão, apontam, tem que ver com o facto de terem um horário excessivo de trabalho, e, salientam, “há mesmo casos de perda de consciência”.

Ng Kuok Cheong quer saber junto do executivo a veracidade das declarações que recebeu, sendo que apela à tomada de medidas nesta matéria. O deputado considera que a indústria do jogo é um pilar importante para a economia de Macau e, como tal, cabe ao Governo mobilizar recursos para a segurança de quem nela trabalha.

24 Jul 2017

Lei do metro | Divulgados resultados sobre consulta pública

Os futuros utentes do metro que participaram na consulta pública sobre a lei a aplicar pronunciaram-se, sobretudo, sobre os deveres dos passageiros. E fizeram-no para dizer que estão contra as multas para quem não ceder os lugares prioritários. O Governo cede e deixa cair as penalizações

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo recuou na intenção de aplicar multas a quem não ceder os lugares prioritários no futuro metro ligeiro. É que os cidadãos não concordam com a medida, indica um relatório divulgado no final da semana passada.

“Considerando que esse acto não constitui impactos à segurança da operação, este Gabinete vai propor, na futura legislação, que não seja necessário introduzir as penalidades sobre a situação de ocupação irrazoável dos lugares sentados prioritários”, pode ler-se no relatório final da consulta pública à lei do sistema de transporte do metro ligeiro, elaborado pelo Gabinete para as Infra-estruturas de Transportes.

De acordo com o documento, “a maior parte dos cidadãos não concorda com a aplicação de sanção quando não sejam cedidos os lugares prioritários”. “Houve opiniões que consideraram que é difícil definir o critério de ocupação dos lugares sentados prioritários, como por exemplo, é difícil identificar as pessoas que não têm características físicas mas necessitam realmente de utilizar os lugares, isso vai causar outros problemas sociais, pelo que a cultura de ceder os lugares sentados prioritários deve começar pela educação cívica”, pode ler-se no capítulo dedicado aos deveres dos passageiros, aquele que mais recebeu opiniões em toda a consulta.

No documento de consulta são sugeridas multas entre 400 e cinco mil patacas para quem violar os deveres dos passageiros, “consoante a gravidade do acto praticado e dos danos dele resultantes, da culpa do infractor e da respectiva capacidade económica”.

A ocupação de lugares reservados encontra-se nesta lista, bem como outras ofensas como abrir as portas do comboio sem permissão, não ter bilhete, fazer peditórios ou manifestações sem autorização da operadora, fumar ou transportar animais (à excepção de cães-guia).

Este é um ponto quase excepcional de discordância, com a maioria das 379 opiniões recolhidas a manifestar acordo com o que foi proposto sobre o metro ligeiro.

Selfies e dinheiro público

Os participantes na consulta questionaram o motivo por que o Governo optou por constituir uma empresa de direito privado com capitais exclusivamente públicos, em vez de subcontratar ou conceder a empresas privadas experientes, ao que o Executivo respondeu que o regime de concessão de serviço público é “mais adequado para a actual realidade de Macau”.

Algumas opiniões consideraram o valor do seguro obrigatório de responsabilidade civil baixo, fixado num limite mínimo de 200 milhões de patacas por ano para indemnização por eventuais acidentes do metro.

Entre opiniões individuais destacadas no relatório consta uma para que seja criada uma carruagem exclusiva para, por exemplo, mulheres ou alunos, e outra para que sejam limitadas as ‘selfies’ dentro das carruagens.

A consulta sobre a lei do sistema de transporte de metro ligeiro decorreu entre 13 de Fevereiro e 13 de Abril, recolheu 379 opiniões, e incidiu sobre seis aspectos: operação, segurança, deveres, títulos de transporte, regime tarifário e regime de responsabilidade e investigação técnica de acidentes.

O metro tem tido sucessivos atrasos e derrapagens. O projecto está dividido entre a linha da Taipa e a da península de Macau. A primeira deverá estar concluída em 2019, mas a segunda ainda não tem data.

Metro | Kwan Tsui Hang pede esclarecimentos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] deputada Kwan Tsui Hang quer saber o trajecto de metro na península de Macau. O pedido é feito ao Executivo que, até à data, ainda não adiantou mais informações acerca desta matéria. Em interpelação escrita, a depurada solicita o ponto da situação relativo às obras do metro ligeiro e pede ainda um novo planeamento para a política geral de transportes e de trânsito terrestre do território. A razão, aponta, é a interferência do atraso no metro na boa execução das políticas actuais.

A deputada recorda que a política geral de trânsito e transportes terrestres de Macau prevê um sistema de trânsito verde, com base no princípio de “primazia aos transportes públicos”, no metro ligeiro, e em outros meios de transportes públicos adoptados no território. Na pática, Kwan Tsui Hang não vê resultados.

“O funcionamento do metro ligeiro esteve previsto para 2015”, afirma para salientar os atrasos da obra. No entanto, apesar de o segmento da Taipa poder começar a funcionar em 2019, não está ainda nenhuma proposta feita sobre o itinerário e o custo para a secção de Macau.

Na mesma interpelação, Kwan Tsui Hang acrescenta: “a política geral de trânsito e de transportes terrestres de Macau para o período de 2010 até 2020 prevê metas na melhoria do transito local”, obejctivo que, diz, não será atingido, precisamente “porque o metro ligeiro está muito atrasado”. Dada a situação, a deputada solicita ao Governo um novo plano para o trânsito local tendo em conta a não existência de metro.

Por outro lado, Kwan Tsui Hang salienta as mudanças que vão ocorrer em sequência da ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, sendo que, aponta, é necessária uma restruturação da rede de transportes públicos de forma a dar resposta às novas necessidades do território.

24 Jul 2017

Ng Lap Seng | Terminou inquirição à principal testemunha da acusação

Francis Lorenzo, o intermediário entre Ng Lap Seng e John Ashe nas remessas de dinheiro, diz ter-se limitado a fazer o que lhe pediam. Durante mais de uma semana explicou em tribunal em que situações o empresário de Macau enviou dólares para os Estados Unidos. Sempre aos milhares

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] a principal testemunha da acusação do processo que tem Ng Lap Seng como arguido e foi ouvido ao longo de mais de uma semana no tribunal federal de Manhattan. Francis Lorenzo, embaixador das Nações Unidas, aceitou a transacção de culpa que lhe foi proposta. Em sede de audiência, disse que não sabia o que eram “subornos”.

De acordo com a AFP, Francis Lorenzo explicou em tribunal que o empresário de Macau lhe pagava mais de 50 mil dólares por mês para que fosse avante a construção de um centro de convenções das Nações Unidas em Macau. Além disso, canalizou mais 300 mil dólares para o antigo presidente da Assembleia Geral da ONU John Ashe, acusado no caso, mas que não chegou a ser julgado – morreu no ano passado vítima de um acidente em casa.

Ao longo de várias sessões, descreve a agência de notícias, a acusação arrancou do diplomata dominicano uma explicação nada simpática da facilidade com que Lorenzo e Ashe aceitaram – e, por vezes, solicitaram – dezenas de milhares de dólares como complemento aos salários de embaixadores.

De acordo com o depoimento feito, no final de 2009, Francis Lorenzo concordou em reforçar o vencimento mensal de 72 mil dólares nas Nações Unidas com um salário de 20 mil dólares pago por Ng Lap Seng, na qualidade de presidente da publicação sem fins lucrativos South South News. Questionado pela acusação sobre a experiência que tinha, à data, em comunicação social, a testemunha concedeu que não tinha qualquer passado profissional na área.

Lorenzo revelou que, a pedido de John Ashe, ajudou a arranjar um emprego para a mulher do diplomata, emprego esse que não obrigava à comparência no local de trabalho, mas que lhe rendia 2500 dólares mensais. Ashe terá também pedido a Ng Lap Seng que financiasse uma viagem de família a Nova Orleães e que pagasse pela construção de um recinto de basquetebol na sua casa. Em 2014, o antigo líder da Assembleia Geral da ONU pediu ao empresário de Macau um contributo para ajudar à sua presidência e Ng enviou-lhe 200 mil dólares, acrescentou a testemunha.

Já depois destas remessas, John Ashe solicitou a Ng Lap Seng 20 mil dólares para financiar uma recepção da ONU, mas Lorenzo só lhe entregou 16 mil. “Por que ficou com os quatro mil dólares?”, perguntou a acusação. “Fiquei com eles para mim”, respondeu o intermediário entre o empresário de Macau e John Ashe.

Suborno, palavra desconhecida

Francis Lorenzo, que admitiu a culpa nos crimes de corrupção e arrisca-se a uma pena de 78 anos de prisão, acrescentou que, mais tarde, Ng Lap Seng começou a pagar-lhe mais 30 mil dólares por mês na esperança de conseguir obter luz verde da ONU para a construção do centro em Macau. Depois de o projecto ter sido aprovado, o empresário comprou um apartamento em Manhattan, no valor de 3,2 milhões de dólares, onde o diplomata dominicano planeava viver.

A testemunha, que tem cidadania norte-americana, confessou que fugiu ao fisco dos Estados Unidos através de contas bancárias do irmão e da irmã na República Dominicana, onde viveu até meados dos anos 1980.

O advogado de Ng Lap Seng, Tai Park, perguntou a Lorenzo por que razão, nas dezenas de inquirições feitas pela acusação, jamais se referiu ao dinheiro dado pelo empresário de Macau como sendo subornos. “Não estava familiarizado com o termo”, respondeu a testemunha.

No início deste mês, na sessão dedicada às alegações introdutórias, a defesa de Ng Lap Seng descreveu o arguido como sendo uma vítima de diplomatas agressivos e gananciosos. Park insistiu que o seu cliente não subornou ninguém, mas deu emprego a Lorenzo e fez contribuições quando lhe eram solicitadas.

Polícia fecha casino ilegal

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Polícia Judiciária de Macau deteve 19 pessoas que operavam um casino ilegal num hotel, informou a TDM. Segundo a emissora pública, a sala VIP operava há dois anos num hotel da zona do NAPE, tendo sido descoberta pelas autoridades na segunda-feira, depois de antigos jogadores se queixarem que as mesas de póquer estariam manipuladas. “Cada vez que eles iam começar os jogos, iam buscar uma mesa de jogo e outros materiais a um pequeno armazém na Areia Preta e levavam para a suite do hotel. Depois instalavam tudo no quarto e traziam clientes para começar a jogar”, disse Ieong Sal Cheng, porta-voz da Polícia Judiciária, citada pela TDM. Os detidos, todos da China continental, atuavam como trabalhadores dos casinos. O alegado chefe do grupo foi detido, mas ainda há suspeitos a monte.

Gases | Maioria dos veículos com emissões aprovadas

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] grande maioria dos veículos sujeitos a verificação no que respeita à emissão de gases passaram com sucesso. Foram 81 por cento do total dos carros inspeccionados pelo grupo de trabalho composto pela Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) e pela Polícia de Segurança Pública (PSP). No primeiro semestre deste ano, a inspeccção compreendeu 55 acções relativas à emissão de gases de tubos de escape. A informação divulgada pelo canal chinês da Rádio Macau, adianta ainda que os referidos testes abrangeram 297 automóveis a gasóleo, sendo que 240 obtiveram a aprovação das autoridades. A DSAT diz também que a maioria dos veículos que não reuniu os requisitos definidos são carros de transporte de mercadorias, que representam 74 por cento do total de veículos não aprovados.

 

24 Jul 2017

Entrevista | Anabela Leal de Barros, investigadora

 

No modo como se fala estão muitas vidas, muitas centenas de anos, muitos barcos que chegam e partem. Anabela Leal de Barros, docente e investigadora, vai atrás da história das palavras, mas também das histórias das pessoas. De casa em casa, de escola em escola, fixou contos e lendas de Timor-Leste. Hoje, é lançado em Macau “Rumando de Lés a Leste – Contos e Lendas de Oecusse”, um livro cheio de gente

 

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omo é que surgiu o interesse por Timor-Leste?

Para além do facto de todos os portugueses nascerem com o gene “amigo de Timor-Leste” e terem andado anos a sonhar com a sua libertação?… Quando lá cheguei pela primeira vez, em 2002, e vi tudo o que havia a fazer para a implementação real do português como uma das duas línguas oficiais, e vi aquelas montanhas relvadas a cair a pique sobre aquele mar turquesa bordado de búzios, e vi aqueles sorrisos sempre a radiar, seja por rios secos ou caminhos pedregosos, percebi que ou ia de vez ou ia muitas vezes.

Antes deste livro há um trabalho no país. Que percurso foi este que levou à decisão de recolher contos e lendas de Oecusse?

Começou por ser a lecionação, enquanto docente da Universidade do Minho, de disciplinas de Linguística na Universidade de Timor Lorosa’e (UNTL), em 2002 e 2003, no curso de Português (uma das licenciaturas que a Fundação das Universidades Portuguesas então oferecia em Timor), e mais tarde no Mestrado em Formação de Professores, ramo de especialização em Língua Portuguesa, com orientação de mestrandos e participação em júris de provas, que a Universidade do Minho leccionou no INFORDEPE (Instituto Nacional de Formação de Docentes e Profissionais da Educação) e na UNTL (2012 a 2015). Nesses 14 anos percebi que os professores timorenses que frequentavam esses cursos guardavam pelo menos dois tesouros em situação precária e a merecer estudo: o português de Timor, com traços locais, asiáticos e antigos, e a literatura timorense de tradição oral. Eram maioritariamente os mais velhos, que frequentaram a escola em língua portuguesa, antigos guerrilheiros e membros da Resistência que antes a tinham usado como código, dificilmente decifrável pelos indonésios, e por fim tinham passado a ensiná-la, ainda sem habilitações superiores, quase generalizadamente. Comecei a sensibilizá-los e prepará-los para a recolha desse material, publiquei os “Contos e Lendas de Timor-Leste” (2014), deixei metade dos textos de 2002 para outro livro e, com o lançamento de uma edição revista e ampliada daquele, a 27 de Novembro de 2015, no âmbito das Comemorações dos 500 anos da Chegada dos Portugueses a Timor-Leste, no enclave de Oecusse, inaugurei uma nova fase: instalado o “vício” da recolha e salvaguarda dos contos e lendas, passei a dedicar-lhe períodos exclusivos ‘in loco’, de casa em casa e de escola em escola. Daí o novo livro, e mais dois, um deles em co-autoria com um antigo orientando de mestrado.

Oecusse é o único município isolado do resto do país. Até que ponto esta localização geográfica específica se repercute nos contos e também na oralidade?

Em todos os municípios de Timor-Leste abundam ainda os contos e lendas por recolher e registar, e quando contados em português, a partir de uma das dezenas de línguas maternas timorenses, trazem traços antigos e locais ainda não devidamente recolhidos e descritos. Contudo, Oecusse é aquele onde essa aventura impõe mais desafios; para se imaginar o quanto esteve isolado no passado basta sabermos que no século XXI o enclave ainda fica fechado por terra das cinco da tarde às nove da manhã; por mar, o barco leva meio dia a chegar de Díli e não é diário; pelo ar, o avião também folga um dia, quando não mais, ao sabor do tempo atmosférico. ‘Isolado’ no meio da ‘ilha’ (do latim ‘insula’), ‘ilhado’ no meio da Indonésia, Oecusse e os seus mais velhos são os depositários de um português que fascina escutar e investigar, à medida que se escavam os contos. O indonésio envolvente, o baiqueno materno, o tétum veicular e oficial, o inglês, outras línguas importadas dos municípios timorenses de leste, entrelaçam-se e confluem de algum modo nesse português que muitos guardam e nos entregam com um sorriso a seguir a um “Tardi!”, “Noiti!”, às vezes “Boa tarde”, “Boa Noite”, mas sobretudo “Bom dia/Dia!” apenas na voz dos mais puristas. Com os progressos cada vez mais evidentes do inglês, e em inglês, começamos a ouvir “Morning, sir!”… Quanto à repercussão nos contos, para além dos “bordados” que exibem nessas línguas, pois as palavras vão afluindo (quem conta em baiqueno prefere por vezes nomear certas realidades em tétum, ou até em indonésio, língua de desambiguação mesmo entre timorenses) e enquanto linguista é minha obrigação mantê-las no texto (com anotações em rodapé), também os contos são por vezes de fonte ou influência indonésia, tal como outros viajaram há muito de Portugal e acabaram adaptados e adoptados como locais; ou então migraram de outros municípios. Contos leva-os o vento, seguem os contadores para onde quer que vão e, a certo momento, passam a ser cidadãos do mundo. Daí que faça sentido começarmos por conhecê-los no seu lugar de nascimento, e depois, se possível, irmos seguindo as suas passadas, pois mal começam a andar, ensaiam caminhos e voos mais altos e cada vez mais longos.

A recolha das histórias que compõem este livro foi feita casa a casa. Como é que foi o trabalho de campo?

Foi no campo. Atravessei leitos de rio onde quase só corriam pedras e poeiras, subi montes, desci vales (tomo este isocolo à poesia barroca), bem devagarinho (que não haveria sinalização que valesse a tanto abismo, derrocada, área esburacada, charco, porco, galináceo e caprino a fazer-se à estrada). Foi à queima-roupa. Sem marcações, iam-me levando de casa em casa; cada contador acompanhava-me ou indicava-me a casa ou a escola de outro — de moto, de microlete, em longas caminhadas a pé; por vezes começava por fotografar as flores de um jardim e acabava a registar um conto e a provar fritos de coco. Os contadores, desprevenidos, muniam-se logo de um sorriso e de uma cadeira, mal me viam à distância, entregavam-me o seu tempo sem nunca regatear, íamos buscando palavras nos dicionários de todos os que arriscavam estar presentes (em baiqueno, em tétum, em indonésio, em português), e ora a ferros, ora com ventosas, ora de parto fácil e natural, lá vinha o conto, com o café de Timor bem docinho. No fim, valia sempre a pena; o conto aflorava limpo, provando, afinal, que o português não é assim tão difícil, e a satisfação geral quado lhes lia o resultado “final” é a minha melhor memória.

Procura-se com esta obra não só fixar a tradição oral de Oecusse, mas também o “português timorense” que, no enclave, tem características especiais. Que características são estas e como foi o processo de escrita dos contos e lendas recolhidos?

As eventuais características exclusivas do português deste distrito só serão discerníveis quando todos os traços específicos do português timorense estiverem descritos; sem ambicionar já a fazer essa destrinça, sem efectuar essa joeira, posso contar que, enquanto investigadora e docente de História da Língua Portuguesa, há mais de 20 anos, vibrei ao ouvir falantes de Oecusse lamentarem hospitaleiramente não terem mais a oferecer-me para além de ‘água cozida’ (hoje, em português europeu, sempre ‘água fervida’): o adjectivo/particípio passado presente nos dicionários antigos (logo desde o vocabulário manuscrito de português-chinês de Ricci e Ruggieri, do século XVI, e também nos manuscritos lexicográficos em chinês-português dos sécs. XVII e XVIII). Ou ainda ver e fotografar em Padiae uma ‘sintina < sentina’ (‘sanitários públicos, casa-de-banho’), ler nas ementas ‘assadura’ (‘carne grelhada’), ouvir dizer ‘chumaço’ (‘almofada, cheia’), ‘lapiseira’ (‘caneta, esferográfica’), ‘baliza’ (‘fronteira’). Em termos morfossintácticos, diz-se em Timor sempre ‘ribeira’ (não ‘ribeiro’), ‘pequeninho’ (não ‘pequenino’), ‘gémeos de três’ (decalque do tétum para o cultismo ‘trigémeos’, desconhecido), ‘pente de bananas’ (mais específico, pois ‘cacho’ é todo o “braço coberto de pentes” dado por uma bananeira), ‘tempo da chuva’ (não ‘das chuvas’); ‘tempo da colheita’ (não ‘das colheitas’). No âmbito dos intercâmbios linguísticos, achei no baiqueno (ainda sem norma ortográfica) ‘teto/tetu’ (indicando também o ‘telhado’ e o ‘forro’ das cabanas com uma parte ao ar livre onde se sentam os vigilantes dos pássaros no meio das várzeas), ‘parinseza/parincesa’ (‘princesa’), ‘cantareiros’ (‘canteiros’, os vários patamares ou pedaços de terra alagada que compõem uma várzea ou arrozal, com pequenas “paredes” para conter a água). Neste momento, os professores timorenses mais conhecedores do português manifestam certas perplexidades a esse nível. Por exemplo, por que está a televisão a preferir somente a palavra ‘arroz’, quando todos sabem que em Timor se distingue o ‘néli’ ou ‘néle’ (‘grão cru, planta, semente, grão por descascar’) e o ‘arroz’ (‘grão pilado, descascado ou já cozinhado’). A verdade é que é preciso urgentemente legitimar essas distinções locais, que Sebastião Rudolfo Dalgado já tinha registado, sem esquecer que os termos asiáticos viajaram e foram partilhados; esse veio da Índia, permite uma distinção lexical e semântica de crivo mais fino, justificável numa área geográfica em que o arroz é a base da subsistência, e muitas vezes prato único, ainda hoje. Enfim, os traços são muitos, todos os dias me aparece e fascina algo novo que conheço dos dicionários e manuscritos antigos — mas que aí me aparece ainda falado. Depois, surgem-me os termos locais e de línguas vizinhas que chegaram ao português europeu no período dos Descobrimentos: sobretudo palavras do malaio-indonésio, como ‘areca’, ‘arequeira’, ‘gamute’, ‘gamuteira’, ‘tuaca’, ‘tuaqueira’, ‘gondão’, ‘gondoeiro’, ‘gundieiro’, ‘casuarina’, ‘bétel’, ‘canária’, ‘parão’, ‘tuaca’, ‘lorico/louro’ (antes ‘loro’, o ‘papagaio’), ‘suco’, ‘cacatua’ (em português europeu, hoje, só ‘catatua’, mas sendo aquela a forma etimológica), ‘barlaque’, ‘catupa’. Algumas chegaram-nos já através do tétum. Outras são mesmo do tétum, como ‘tais’ (os lindíssimos panos tradicionais de algodão colorido tecidos pelas timorenses). Vou anotando essas formas nos livros de contos e investigo-as depois em artigos científicos, mas seria aborrecido impor o meu entusiasmo nas já longas listas que agora me ocorrem, embora assim ‘de cor’ (e é mesmo ‘de coração’), e mereceria então ‘que me enfiassem uma peúga pelas goelas abaixo’, como diz o Woody Allen para explicar que “o mal é o bem em excesso”.

As histórias que os mais velhos sabem têm uma importância especial em Timor-Leste, certo?

Timor-Leste é tão rico de histórias como pobre de livros. Os livros permanecem ainda nas memórias dos falantes, mas todos os dias vão falecendo e falhando com elas e eles. Com os contos, falece o português. Não só o de outrora, que me interessa tanto, mas também o do futuro, que nos deveria interessar a todos, porém, não somente para enfeitar discursos políticos e camuflar interesses económicos. O meu oásis são as escolas. Os professores sabem o que os contos valem e já sabem a importância de os fixar e guardar em português. Trabalham comigo, num intervalo das aulas, no seu pouco tempo livre, juntos, um falando baiqueno, e depois tétum, e entretanto indonésio, e algum inglês (entre os mais novos), e por fim português. Os timorenses são multilingues. Daí, também, o valor de, no meio de tantas línguas, ainda guardarem espaço de cor, de coração, para a portuguesa. E para as histórias que ela mesma conta. Por exemplo, em Oecusse existe uma Lagoa a que chamam, mesmo em baiqueno, ‘Lagoa Sina’, mesmo ao lado do lugar onde aportaram pela primeira vez os portugueses em 1515: a praia de Lifau. ‘Lagoa Sina’ inclui, não o substantivo ‘China’, como parece a um leigo do século XXI, mas o adjectivo ‘chino, -a’, a forma antiga exclusiva para se dizer em português ‘chinês, -a’, como ainda hoje em castelhano (‘yo soy chino/ella es china’). Essa palavrinha conta uma história: os comerciantes chineses foram-se instalando muito cedo nesse sítio, onde hoje já se desmoronaram as construções que os abrigaram, mas a língua, essa, não esquece a história e continua a dar-lhe abrigo.

 Quais são os próximos projectos?

Para além de meia dúzia de livros já prontos sobre outros assuntos, que vão sofrendo há anos (fechados no computador) a prioridade que dou aos de Timor (mas também aos manuscritos e impressos antigos de Macau e da China, em vias de publicação), da literatura timorense de tradição oral sairão em breve mais dois livros de contos, e outro de Oecusse que recolhi em Junho-Julho deste ano, enquanto aguardava que chegasse de Macau (em quatro dias), mas sobretudo de Díli (em mais 15 dias), o livro “Rumando de Lés a Leste. Contos e Lendas de Oecusse”, para o lançamento. Outros projectos incluem contributos para a definição de normas ortográficas e a construção de dicionários para certas línguas locais, ou o estudo do intercâmbio e das interferências dessas línguas maternas no ensino-aprendizagem do português, para o que a colaboração dos estudantes, docentes e orientandos de mestrado e doutoramento timorenses serão cada vez mais indispensáveis.

24 Jul 2017

Industrialização selvagem levou à contaminação de solos e águas

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s colheitas dos agricultores chineses correm um grande risco de estarem contaminadas devido à poluição provenientes das grandes indústrias. Além de contaminarem nascentes, rios e o solo, os fumos químicos libertados na queima de chumbo, ferro e cobre, contamina os organismos dos agricultores locais, causando doenças articulares, ósseas e, quando inalados em grandes quantidades e por muito tempo, cancro.

Foram feitas amostragens da produção de arroz nas regiões das províncias onde se instalaram algumas das maiores indústrias, e descobriu-se que há uma quantidade maior do que a permitida de substâncias perigosas nos produtos finais, que são distribuídos para toda a região Sul da China.

A contaminação do solo e da água nesta região causa grande preocupação, pois além de contaminar uma comunidade que produz e distribui comida para outros países, este tipo de poluição também afecta o meio ambiente de forma irreversível. A quantidade de poluentes chamou atenção de alguns órgãos, o que fez com que as indústrias chinesas fizessem um acordo de diminuir a queima de carvão de modo minimizar os danos no meio ambiente. São acções que no decorrer dos anos poderão fazer a diferença.

Foram feitas alguns testes em solos chineses e descobriu-se que muitos dos poluentes encontrados são proibidos e perigosos para o consumo da população. Por causa disso foram criadas algumas regulamentações, que determinaram a construção de novas indústrias numa espécie de parque industrial que monitorado e supervisionado de forma mais rigorosa.

Além de poluir diariamente o solo, ocorreram muitos acidentes que resultaram no vazamento de produtos químicos que poluíram directamente o solo e rios, afetando a produção e também a saúde dos camponeses.

Devida à quantidade de pessoas no país, a procura e a oferta de produção aumentou em larga escala, fazendo com que o solo se encontre não só de cheio de poluentes industriais, mas também de fertilizantes e pesticidas.

O dano causado pela poluição do solo tornou-se algo muito grave, pois a ingestão dos metais pesados encontrados no solo são excepcionalmente prejudiciais para a segurança alimentar e a saúde. Devido às incidências destes casos o governo chinês preocupa-se agora com a opinião pública, com a saúde da população e com o rendimento da produção agrícola, já que esta abastece grande parte da economia do país.

O governo determinou algumas medidas para diminuir a poluição e proteger as áreas que ainda não foram contaminadas e emitir multas para os responsáveis pelos poluentes lançados em solos e rios. Estas novas medidas adoptadas são um começo, mas dão esperança para uma produção mais saudável e limpa de alimentos e também um tratamento diferenciado do meio ambiente deste país.

Pequim lança plano para liderar na Inteligência Artificial

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo chinês lançou um plano para converter o país em líder no campo da Inteligência Artificial (IA) até 2030, visando aplicar aquela tecnologia na indústria, planificação urbana, agricultura ou defesa do país, informou ontem a imprensa oficial.

A estratégia, aprovada pelo Conselho de Estado chinês, estabelece que a produção de tecnologia classificada como IA alcançará os 147.000 milhões de dólares, em 2030. Isto colocará a China “ao nível dos países líderes neste sector e na sua aplicação”, aponta o jornal oficial Diário do Povo.

Segundo a consultora PricewaterhouseCoopers, este plano poderá contribuir para um aumento de 26% no Produto Interno Bruto da China, a segunda maior economia do mundo.

O anúncio levou a que as acções de empresas que operam com IA subissem 1,25%, na bolsa de Xangai, a principal praça financeira do país, informou a agência noticiosa oficial Xinhua. Nos últimos meses, a imprensa chinesa difundiu várias notícias sobre inteligência artificial, como o desenvolvimento de veículos sem condutor ou robôs.

Os líderes chineses consideram a IA chave para tornar a China uma “potência económica”, afirma um comunicado do Conselho de Estado.

A IA é uma das áreas emergentes, junto com a energia renovável, robótica e carros elétricos, em que a China quer assumir a liderança, visando transformar o país numa potência tecnologia, com capacidades nos sectores de alto valor agregado, de acordo com o plano “Made in China 2025”. As fábricas do país têm-se automatizado rapidamente, de forma a enfrentar a subida dos custos laborais e aumentar a eficiência.

 

24 Jul 2017

Funcionários punidos por violações ambientais nas Montanhas Qilian 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China puniu funcionários de alto nível na província de Gansu, no noroeste do país, por cometerem infracções ambientais na Reserva Natural Nacional das Montanhas Qilian, “mostrando a determinação do país pelo desenvolvimento verde”, revelou a Xinhua.

Um grupo de inspeção descobriu diversas irregularidades na área, incluindo a exploração excessiva de recursos minerais, a construção e operação ilegais de instalações hidroeléctricas, e emissões excessivas de empresas locais. Além disso, os funcionários locais não rectificaram os problemas ambientais existentes, assinala um documento emitido pelo Comité Central do Partido Comunista da China e do Conselho de Estado.

Altos funcionários, entre eles Yang Zixing, vice-governador de Gansu, assumiram a responsabilidade por não terem evitado nem fiscalizado as questões ambientais. Os chefes de departamentos provinciais e municipais foram advertidos e alguns punidos de forma administrativa.

Segundo o documento, “as violações são fundamentalmente um resultado da falta de consciência ambiental dos funcionários locais e da falha na implementação das políticas de proteção ambiental”. Por exemplo, apesar de proibida a operação de uma mina dentro da reserva natural, o órgão de segurança da província aprovou a produção e renovou o seu alvará.

Segundo a Xinhua, “os funcionários locais não entendiam a importância de um modelo de crescimento sustentável, apresentando normas não favoráveis à proteção ambiental”.

Os funcionários e as autoridades da reserva natural não conseguiram cumprir seus deveres e foram acusadas pela negligência, deixando a operação sujeita a numerosos projectos ilegais. “Muitas disposições de gestão na reserva natural só existem nominalmente”, apontou o documento.

As violações ambientais na reserva natural das Montanhas Qilian eram uma questão de longo prazo. Sendo uma reserva natural localizada na fronteira das províncias de Gansu e Qinghai, as Montanhas Qilian foram listadas como lugar de protecção nacional em 1988, mas centenas de minas na área e muitos tipos de projectos de construção continuam a danificar o meio ambiente.

O desenvolvimento excessivo e desordenado, desde a década de 1960, deixou a área numa crise profunda, com os recursos hídricos contaminados e os pastos degradados, até que os funcionários receberam ordem para resolver os problemas ambientais. Embora alguns esforços tenham sido feitos para corrigir os problemas referidos em diversas inspeções locais, a situação basicamente não melhorou.

De 2013 a 2016, a Província de Gansu não puniu ninguém por negligência ou má administração, segundo o documento. Mesmo encontrando muitos problemas durante as inspecções, os funcionários locais costumavam emitir documentos para rectificá-los em vez de os resolver de forma prática, escreve a Xinhua.

Segundo a agência oficial, “mais funcionários públicos chineses enfrentarão auditorias sobre o impacto ambiental do seu trabalho, à medida o governo central aprofunda a reforma para promover os funcionários com forte consciência ambiental”.

A nova reforma foi endossada na 36ª reunião do Grupo Dirigente Central para o Aprofundamento Integral da Reforma em 26 de Junho. O regulamento esclarece que, se o impacto ambiental negativo for revelado pela auditoria, será tomado em consideração até depois da mudança de cargos dos funcionários, e a auditoria afectará promoções futuras. A avaliação inclui o dano tanto ambiental como ecológico e o consumo local de recursos naturais, que devem ser supervisionados dentro dos deveres dos funcionários.

Na quinta-feira, o Ministério da Proteção Ambiental anunciou planos de inspecionar questões ambientais em 446 reservas naturais nacionais entre Julho e Dezembro deste ano. Intituladas “Escudo Verde 2017”, as inspeções incluem investigações abrangentes de violações dentro das reservas e de progressos em retificações de problemas existentes.

24 Jul 2017

Justin Bieber não entra

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s autoridades chinesas anunciaram ontem que fecharam as portas a futuras actuações do cantor canadiano Justin Bieber, de 23 anos, devido ao “mau comportamento” do ídolo pop fora deste país. “Não é adequado que entrem no país artistas que têm comportamentos inadequados”, indicou o Centro Municipal de Cultura de Pequim em comunicado publicado esta semana, numa resposta a uma petição de um fã para que Justin Bieber pudesse actuar na China.

Na nota, é explicado, que “Bieber é um jovem cantor com muito talento, mas também polémico e, como figura pública, teve uma série de comportamentos pouco adequados na sua vida social, tanto no estrangeiro como na China”.

A China já vetou a entrada de numerosos artistas internacionais no passado, pelo que é habitual que as autoridades justifiquem as razões, como fizeram agora com Justin Bieber.

Artistas como a islandesa Bjork (que gritou a favor de um Tibete independente num concerto em Xangai), Bom Jovi, Oasis ou Guns N’Roses já tiveram problemas com as autoridades chinesas, que lhes cancelaram concertos por desavenças políticas.

Justin Bieber nunca actuou na China, mas visitou o país para promover os seus discos e, em 2013, causou polémica ao tirar fotografias a percorrer a Grande Muralha levado às costas de um segurança.

Museu oferece milhões a quem conseguir decifrar carateres antigos

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m museu da China pediu a peritos de todo o mundo que ajudem a decifrar carateres com 3.000 anos de antiguidade e ofereceu milhões de dólares a quem o conseguir, informou o diário South China Morning Post. O Museu Nacional de Escritos Chineses, na cidade de Anyang, no centro da China, promete na sua página de Internet, pagar 100.000 yuan (cerca de 12.000 euros) por cada caracter antigo ainda não decifrado pelos investigadores e metade desse valor se forem caracteres sobre os quais há várias teorias sobre o seu significado.

Nesses textos, sobre temas que variam desde a meteorologia aos impostos, há cerca de 5.000 carateres dos quais os peritos apenas conseguiram decifrar 2.000, pelo que os restantes, muitos deles relacionados com nomes de lugares e de pessoas da época, continuam a ser um mistério para historiadores e paleógrafos.

O museu de Anyang incentiva os investigadores de todo o mundo a utilizar novas técnicas, como metadados, para procurar a solução para os enigmas colocados pelos escritos chineses antigos.

A oferta de recompensas foi uma prática iniciada em outubro de 2016, devido ao impasse atingido pelos investigadores do museu, escreve o South China Morning Post.

24 Jul 2017

China compra um quarto de todas as exportações brasileiras

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China nunca teve tanta importância para o comércio exterior brasileiro. Nos primeiros seis meses deste ano, 25% de tudo o que o Brasil exportou teve como destino o país asiático. Esta percentagem é um recorde e é mais uma marca da ascensão da segunda maior economia mundial no Brasil. No primeiro semestre de 2007, a fatia chinesa nas exportações brasileiras era de 6,7% – os EUA eram líderes, com 16,4%. Alimentada pela procura de soja, minério de ferro e petróleo, a compra chinesa de bens brasileiros somou US$ 26,9 mil milhões de Janeiro a Junho, um aumento de 36% em relação ao mesmo período do ano passado.

Sozinhos, os chineses compraram mais ao Brasil do que os três outros principais compradores: EUA, Argentina e Holanda, respectivamente.

Há mais de dez anos que nenhum país era tão preponderante na compra de produtos brasileiros. No início do século, os EUA chegaram a responder por mais de um quarto das exportações. Mas, enquanto os americanos eram grandes clientes de produtos manufacturados (que tem preços mais estáveis), o que os chineses preferem matérias-primas e alimentos, cujas cotações costuma flutuar mais.

Ter um cliente tão poderoso tem os seus benefícios, já que há um mercado quase cativo para os produtos, porém, os riscos são mais expressivos. Uma desaceleração forçada da China teria um forte impacto nas exportações e seria muito difícil encontrar um mercado que conseguisse dar conta de tamanha oferta: 45% da soja comprada pelos chineses vem do Brasil, além de 21% do minério de ferro.

Cantão | Queda de grua mata setembro

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] queda de uma grua num estaleiro de obra de uma empresa de infraestruturas no sul da China causou a morte de sete pessoas e ferimentos noutras duas, informaram hoje as autoridades. O incidente ocorreu na noite de sábado no local da sede da empresa estatal China Communications Construction, na cidade de Guangzhou, segundo as autoridades citadas pela agência noticiosa Associated Press. Os dois feridos estão em situação estável, segundo as autoridades do distrito de Haizhu daquela cidade. Apesar de ter havido melhorias nos anos recentes, a segurança nos trabalhos de construção continua a ser fonte de preocupação na China, com os regulamentos a serem frequentemente ignorados, em parte por atitudes casuais e por causa da corrupção.

 

24 Jul 2017

China e Rússia realizam exercício militar na Europa

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omeçaram as primeiras etapas dos exercícios “Joint Sea 2017” das forças navais russas e chinesas, marcando a primeira vez que ocorrem na Europa. À medida que os navios chineses entraram no porto russo de Baltiysk na sexta-feira passada, iniciou-se a primeira fase, com a fase activa a 24 de Julho. Os exercícios estão definidos para durar até 28 de Julho. A segunda fase das manobras conjuntas será realizada no Extremo Oriente russo, no Mar do Japão e no Mar de Okhotsk em Setembro.

Este é um momento que entra para história das relações russo-chinesas, como o primeiro exercício conjunto da esquadra chinesa com a armada russa em águas europeias, algo que deve gerar ondas nos meios geopolíticos, sendo um claro sinal da crescente actividade naval chinesa e da sua capacidade operacional.

Participam do “Joint Sea 2017” os mais avançados meios navais da China, incluindo o destroyer de mísseis Type 052D Changsha, a fragata de mísseis Yungchen e o navio de abastecimento de Luomahu, que concluíram exercícios de incêndio no Mediterrâneo semana passada.

A Marinha russa irá participar com as últimas corvetas “Steregushchiy” e “Boiky”. Além destes meios, devem participar um significativo contingente aéreo composto por aeronaves e helicópteros de ambas marinhas.

Segundo uma declaração do Ministério da Defesa da Rússia: “Os principais objectivos dos exercícios são aumentar a eficiência na cooperação entre as duas frotas na luta contra as ameaças à segurança no mar, para formar a integração das tripulações dos navios de guerra russos e chineses, para fortalecer a amizade e a cooperação entre a Marinha russa e as Forças Navais do Exército de Libertação do Povo da China “. O “Joint Sea 2017” incluirão exercícios anti-submarinos e de defesa aérea.

A esquadra chinesa não passou despercebida quando se dirigia para o Báltico, tendo sido escoltada por navios britânicos, holandeses e dinamarqueses. Embora faça “parte da vigilância normal”, a reacção parece ser resultado da “campanha de propaganda nos media ocidentais que procuram sinalizar a Rússia e a China como uma espécie de impérios do mal”, comentaram os russos.

Explosão mata 2 e fere 55

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]elo menos duas pessoas morreram ontem e 55 ficaram feridas na sequência de uma explosão numa loja em Hangzhou, no leste da China, noticiou a agência oficial Xinhua. A explosão, de origem ainda desconhecida, ocorreu numa loja próxima do Lago do Oeste, na capital da província chinesa de Zhejiang, onde decorreu a cimeira dos líderes do G20 em 2016. Doze pessoas ficaram gravemente feridas, acrescentou a Xinhua. Imagens difundidas nas redes sociais mostram uma explosão que provoca a queda de destroços sobre os veículos em circulação numa estrada.

 

 

24 Jul 2017

Os objectos estranhos

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ou um apaixonado por ficção científica. É provavelmente o género literário que leio há mais tempo e foi através da ficção científica que me iniciei na leitura. A minha primeira ida ao cinema, ainda em França, foi para ver o ET. Sou um leitor ávido de curiosidades e notícias da física. Quando foi anunciada a descoberta do bosão de Higgs, em Julho de 2012, festejei como se o Benfica tivesse ganhado um campeonato. Para além de geek, sou um nerd. Um mal nunca vem só, dizia-se acertadamente lá em casa.

A minha paixão pela física tem a mesma natureza da minha paixão pela filosofia ou pela literatura; as três áreas são vastos laboratórios onde cada um pode construir coisas que não existem no mundo ou mesmo mundos inteiramente diversos. Liliput nasce da imaginação de Swift. A alegoria da caverna é a imagem que Platão usa para ilustrar as limitações do ponto de vista. O Matrix, dos irmãos – entretanto tornados irmãs – Wachowski mostra-nos o que poderia ser a experiência de despertar do mundo enquanto sonho. E tudo isto funciona porque apenas uma regra (isto é, um sentido cuja regularidade torna o mundo previsível e pelo qual nos orientamos) é quebrada. Tudo o resto decorre de acordo com regras lógicas do pensamento pela qual a coerência do Gedankenexperiment se mantém.

Este território infindo de possibilidades permite-nos ter acesso – mesmo e ainda que mediado – a uma multiplicidade de universos alternativos. As fronteiras do território coincidem com as fronteiras da imaginação. Se é possível, é. Podemos simular a extinção humana, a vida extraterrestre, podemos imaginar uma realidade alternativa na qual existem dragões e magos ou uma inteligência artificial cujo propósito se tenha corrompido e nos tente destruir, podemos entrar dentro de um buraco negro. E podemos fazer isto em completa segurança. Ao contrário da realidade e da sua brutal inflexibilidade física, como diz o meu amigo Luís Gouveia Monteiro, a imaginação é tão generosa quanto segura. É a praia infinita onde nunca deixamos de ser crianças. Só não podemos lá viver. No continente da imaginação nunca deixamos de ser turistas.

Os melhores livros e filmes de ficção científica que conheço não se esgotam no plano estético ou no prazer da leitura. Fazem perguntas sobre a natureza fundamental do humano, colocando-o para isso em situações impossíveis ou improváveis. Criam labirintos, colocam as personagens dentro do puzzle, observam e relatam. O Alien do Ridley Scott alimentando a nossa neurose claustrofóbica com o medo supremo de sermos apenas pasto para criaturas infinitamente mais fortes e ágeis, para o superpredador que no planeta Terra, somos nós, mas cujo arquétipo inconsciente não deixou, por isso, de existir. O delírio genial que é o Donnie Darko na sua ambiguidade de Cassandra, pondo em relevo a possibilidade de sermos o único sujeito com um acesso adequado à realidade e ao futuro mas estarmos condenados à incompreensão geral. Os exemplos abundam e o séc. XXI tem sido generoso no que concerne a ficção científica no cinema.

Escrevo esta crónica logo após ter revisto o Sunshine, do Danny Boyle. É um filme tão intenso como inteligente na gestão que faz do espaço diminuto onde as personagens, com a pressão de terem de salvar o planeta de uma era glacial e da extinção da vida humana devido ao sol estar a morrer, vão mostrando o que a ficção científica tem de mais generoso: a natureza humana, a sua grandeza e as suas abissais falhas, a nossa pequenez microscópia relativamente ao universo que habitamos, a possibilidade aterradora de seremos apenas um intervalo de que não haverá qualquer rasto ou notícia do seu acontecimento, um intervalo entre eternidades de inabitáveis, um intervalo na forma de pó. “Stardust”, como diz um dos protagonistas. Desta feita, estou contente pelo facto de ser apenas turista.

24 Jul 2017

“Há material para saciar todo o tipo de sede”, Luís Gouveia Monteiro

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]rabalhaste em muitos lugares da chamada comunicação social, desde os jornais até à televisão, e nesta em diversas posições. Vens ainda de um período em que fazer directos implicava uma boa soma de dinheiro e de recursos, contrariamente aos dias de hoje. Queres falar-nos destes diversos momentos da tua vida profissional e apontar-nos as diferenças que encontras entre o início e hoje (sendo tu ainda um jovem de 40 anos)?

Se compararmos com a década de 90, há duas diferenças fundamentais. A primeira é tecnológica. Mudaram radicalmente – e para melhor – as condições de produção, distribuição e consumo de comunicação e informação. Estão-se a cumprir muitas das promessa que então se faziam, como a possibilidade de cada um de nós produzir ou consumir exactamente e apenas os conteúdos que desejam. Lembro-me de pensar, quando estive pela primeira vez na SIC, em 1997, que se quisesse trabalhar em televisão por conta própria, comprar uma câmara e montar uma sala de edição, precisaria de vender a casa. Hoje tenho no escritório condições técnicas superiores às com que trabalhávamos nessa altura. Basta-me uma pequena câmara e o computador que tenho em casa. A comunicação já não precisa de um grupo económico. Ora nós ainda somos do tempo em que se comia o que nos punham no prato. As vantagens cognitivas de uma dieta de conteúdos que já depende quase só dos nossos gostos e interesses e não dos do poder político ou económicos são imensas. E já são muito evidentes nos alunos que passam pelas universidades e que trazem no bolso, dentro do telemóvel, várias bibliotecas de Alexandria. Por enquanto a grande curiosidade das massas tem estado especialmente centrada em vídeos de gatos irrequietos e de hipopótamos a comer melancias. Mas há cada vez mais oferta e, no mercado global e hiper-segmentado da internet há material para saciar todo o tipo de sede. Vive-se muito melhor assim e é preciso muita má vontade para uma pessoa se aborrecer.

A segunda diferença grande diferença é de clima económico. Nos anos 90, em Portugal, vivia-se uma fase eufórica com a explosão da televisão privada, com redacções de jornal vibrantes e prósperas (Público, Independente, Expresso) e com muito dinheiro a circular. Hoje, em todo o mundo, o jornalismo ainda está a aprender as novas regras da vida em rede. Ainda está a aprender como é que se ganha a vida online. Nesta espécie de infância de um novo modelo negócio os media têm corrido mais atrás dos vídeos de gatinhos do que das bibliotecas de Alexandria. Mas uma vez mais há muitos sinais de que estão a caminho coisas novas e excitantes. O jornalismo de dados é um bom exemplo da procura pelas respostas que se escondem na floresta de números que a realidade produz em constante aceleração. Outro bom exemplo é o cada vez mais enérgico jornalismo lento que está a surgir como resposta ao jornalismo light (aquele que pratica o copy/paste, anda obcecado com os gatinhos e publica artigos de investigação sobre as 50 maneiras de aumentar a auto-estima). São jornalismos que procuram a criação de públicos a longo prazo por oposição à actual lógica de tráfico de atenção, que corre atrás da remuneração rápida de curtos picos de entusiasmo, e depois o olvido.

 

 

Neste momento estás a ensinar, na Universidade de Coimbra, e em Lisboa, na Nova, na Faculdade de Ciências Sócias e Humanas. É um trabalho mais recompensador?

Sim, muito recompensador, mais do que nas redacções. Nos últimos anos em que fiz jornalismo comecei a sentir com uma frequência preocupante que teria sido mais ecológico ficar em casa. A grande fatia do trabalho passou a ser sobre o efémero insignificante, sobre aquilo que passa e não sobre aquilo que fica. Em cima disso comecei a sentir-me a perder tempo e a perder faculdades. Voltando à metáfora da dieta: quando se trabalha todos os dias usando o efémero como principal alimento do espírito, corre-se o risco de estar apenas a engordar uma espécie de vazio, cujo exemplo podem ser aqui os despachos das agências noticiosas, cujos prazos de validade são muito curtos, por vezes desactualizam-se em quinze minutos. Sentia-me a transformar-me numa daquelas pessoas que falam com facilidade e energia sobre todo e qualquer assunto, nada sabendo de coisa nenhuma, um especialista em banalidades, dono de uma competência apenas performativa, mas sem capacidade de transformar informação em conhecimento. É claro que há grandes jornalistas, tanto especialistas como generalistas, que fazem de facto a diferença, melhoram a vida da gente. Mas eu comecei a sentir que era quase sempre melhor para o ambiente ficar em casa. E a grande verdade é que desde os primeiros passos na redacção do Público em 1993 – com dezoito anos, ainda de calções e muito vagamente alfabetizado – o que eu queria era escrever, era dar um ar da minha graça. Informar era um ganho colateral. Isso foi-se tornando claro ao longo dos anos e julgo que esteve numa lenta deriva que começou há mais de uma década e que me está a levar da realidade para a ficção.

 

Podes explicar melhor, essa deriva da realidade para a ficção?

Acho que tudo se resume a esse pecado original de, desde o início, ter estado sempre mais comprometido com o artesanato de contar histórias (com texto, com imagens) do que com o direito e o dever de informar. Ora o jornalismo é demasiado importante para ser entregue a diletantes. E eu sinto-me melhor neste lado civil da ficção e acho que sou mais útil aqui, na companhia dos filósofos e dos poetas.

E como está hoje a universidade em geral e em particular as de comunicação?

A universidade está muito bem e recomenda-se, sobretudo por causa dos alunos. Têm as tais bibliotecas no bolso e são hoje pessoas mais avançadas do que éramos, exactamente naqueles cursos, há vinte anos. Quanto ao resto da instituição, como em todos os universos, há dias bons e dias maus, mas em todos eu sei porque não fico em casa. Mesmo quando as condições de trabalho são duras e há um dramático subfinanciamento o que se sente de forma muito dura nos cursos que precisam de aparato tecnológico, como é o caso. O João César Monteiro dizia que a maturidade lhe tinha ensinado que o cinema não precisa de equipamento, precisa apenas de um pouco de luz dentro de uma cabeça. Digamos que nos últimos anos temos levado este conceito às últimas consequências, mas sempre vão existindo umas câmaras e uns estúdios, tanto em Coimbra como na FCSH. E há cada vez mais luzes dentro de cabeças e, César tinha razão, isso é o fundamental.

24 Jul 2017

Promotor do WTCC agradece compreensão da COGPM

 

Os organizadores do Campeonato do Mundo FIA de Carros de Turismo (WTCC) ficaram satisfeitos pela confirmação que a penúltima ronda da temporada de 2017 será mesmo disputada no Circuito da Guia.

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]pós dois anos de ausência e de um impasse em que a Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau não dava a prova como certa nas ruas do território, uma situação justificada por estarem em curso negociações com a FIA, ficou decidido que o WTCC terá um formato diferente este ano. Em vez das duas corridas disputadas na manhã de domingo, com um intervalo de 15 minutos para reparações, a primeira corrida será realizada no sábado e a segunda, aquela que será considerada a Corrida da Guia, acontecerá no domingo.

Agradado com o acordo conseguido com as entidades responsáveis pelo maior evento automobilístico da RAEM, François Ribeiro, o director do Eurosport Events, a empresa responsável pela promoção do WTCC, reagiu na sexta-feira passada, dizendo que: “Nós esperamos que Macau seja o ponto alto da temporada do WTCC. Estou agradecido à Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau por ter acomodado o nosso pedido de realizar a Corrida de Abertura no sábado à tarde”.

Quando saiu de Macau no final da edição de 2014, o dirigente francês não escondeu que o horário que a competição mundial de carros de Turismo tinha no Grande Prémio de Macau era extremamente desfavorável para as audiências europeias, tendo na altura ambicionado ficar com o horário do Grande Prémio de Motas na tarde de sábado. Ribeiro acredita que esta nova posição no programa do evento “irá trazer uma audiência mais vasta na Ásia, Europa e Médio Oriente”.

O facto das duas corridas do WTCC não serem disputadas no mesmo dia é igualmente favorável ao espectáculo e foi bem recebido no seio das equipas. Dadas as características do Circuito da Guia, cujo mínimo erro ou exagero é pago caro, um acidente na primeira corrida, comprometia a participação na segunda corrida.

Com esta nova disposição do horário, as equipas terão tempo para reparar, ou pelo menos tentar consertar, as viaturas acidentadas de um dia para o outro. “Macau será talvez decisivo para ambos os campeonatos de pilotos e construtores. Todos os pontos irão contar, e nós sabemos quanto difícil é a pista de Macau para as equipas e para os pilotos”, salientou Ribeiro.

O WTCC visitou Macau de 2005 a 2014, sendo sempre a última prova do campeonato. Contudo, este ano, o campeonato agora liderado pelo português Tiago Monteiro será a penúltima prova da temporada, terminando no Qatar duas semanas depois.

Uma questão de números?

Depois da prova ter aparecido no calendário internacional da FIA pela primeira vez em Novembro de 2016, surpreendentemente na cerimónia de apresentação do patrocinador principal do evento de 2017, no passado mês de Maio, as entidades de Macau surpreenderam ao anunciar que a prova do WTCC não estava confirmada.

A demora na confirmação da prova foi justificada a semana passada por Pun Weng Kun, o Presidente do Instituto do Desporto do Governo da RAEM e Coordenador da Comissão Organizadora do Grande Prémio de Macau. “O Grande Prémio de Macau é uma marca de reputação e várias corridas querem participar no evento. Como Comissão Organizadora, temos de ponderar quais são as corridas ou as provas que trazem mais vantagens para este evento”, disse.

Do lado do Eurosport Events não houve qualquer comentário sobre esta matéria, tendo a organização francesa se recusado a comentar publicamente sobre o assunto numa atitude inédita e propensa a criar desnecessárias especulações num campeonato que vive um período periclitante da sua história.

Apesar de carecer de confirmação oficial, no paddock do WTCC dizia-se à boca cheia que uma das razões para este impasse nas negociações esteva relacionado com o número de participantes. O WTCC tem apenas dezasseis carros garantidos para todas as provas do campeonato, um número muito baixo para uma grelha de partida de uma qualquer corrida do Grande Prémio de Macau.

A organização local terá requerido um número mínimo de vinte viaturas, o que já motivou a Eurosport Events a puxar pelos cordelinhos para colocar mais carros em pista para os eventos asiáticos. A empresa de organização de eventos do canal televisivo pan-europeu terá já encetado negociações com as partes interessadas, tendo inclusive alguns conhecidos pilotos portugueses e de Macau sido abordados com propostas tentadoras para a prova do mês de Novembro.

24 Jul 2017

O Jogador

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]unca me tinha sentido assim, juro que por momentos acompanhei a rotação da Terra. Acabara de perder a minha estimada bicicleta num lance de dados e senti uma elação tão intensa na derrota que ultrapassou em muito a alegria de a receber. O meu corpo foi trespassado por um sentimento torcido de dever cumprido. Aceitei a ruína com gratidão, como algo natural, como uma argamassa especial que solidifica o carácter. Esta sensação de demente e errónea invencibilidade, de patológico optimismo, havia de tomar o controlo da minha vida.

Regressei a casa tecendo malhas de desculpas para justificar a perda da bicicleta, mas já antecipando no lombo as iniciáticas repercussões do azar. Porém, o que me ocupava a cabeça era a imagem futura da vitória, o acto de chance que atribui glória aos que arriscam e imortalidade aos que se expõem aos caprichos do acaso.

Passei a amar o risco, a sentir-me confortável na inquietação. Sempre escolhi os becos mais escuros movido pelo poder magnético do perigo.

Não descansei até que a sorte me bateu à porta, não fui um daqueles apaixonados que teve de provar a sorte de principiante para sentir o chamamento. Não, eu perdi e aprendi a apreciar a derrota como algo nobre e inevitável. Persisti, entreguei-me despido, sem pedir recompensa ou qualquer tipo de gratificação. Devoção incondicional, como deve ser.

O triunfo abriu-me as portas de um mundo onde sou Rei e Soberano. 20 moedas que, em larga escala, compensaram todos os prejuízos, sararam todas as chagas que fui acumulando. Até provar a sorte tudo o que tinha era frio, fome e pouca roupa em cima do pêlo. Fui fiel depositário das minhas dores até ao momento em que o esplendor retiniu nos meus bolsos.

A vitória ainda me viciou mais, foi o golpe de misericórdia, a revelação de que os meus dias seriam entregues à volúpia. Estava fadado a perseguir a sensação de ganhar aquelas 20 moedas até ao fim. Toda a minha vida era um empecilho, um vazio de excitação, apenas agravação, tempo perdido, unhas roídas e cigarros a abarrotar num cinzeiro improvisado.

Sempre que pressentia acção o meu coração disparava, ainda dispara. Seja o que for, eu quero entrar com algum. Todas as corridas e combinações de jogos de cartas, dados, lutas de toda a espécie, eventos normais da vida que tiverem um ângulo de aposta, tudo serve, vou a todos os jogos.

Entrar no Casino foi como sentir revelação divina, um momento de claridade, a profana anunciação. A primeira vez que pisei a alcatifa deixei-me engolir por todo o ambiente e mergulhei fundo nos bons presságios pintados a vermelho e dourado. Foi avassalador, o excesso de estímulos deixou-me num estado de leve catatonia, congelado num delicioso estupor. Senti imediatamente que era ali que pertencia. Hipnotizado pela coreografia de mãos dos croupiers, confortado na indiferença com que jogavam a vida das pessoas.

Ganhei a capacidade de reconhecer os meus pares, aqueles que também perseguiam a primeira e arrebatadora vitória, desta vez em grande. Olhos como hienas famintas, a farejar onde se esconde a sorte, sustentados em esquemas e artimanhas várias, a viver de expedientes em máxima rotação nas margens da probabilidade. Deambulam pelas mesas, de olhos vazios, em busca de um temporário vencedor, procuram essa proximidade como lapas da fortuna que tentam apanhar algumas migalhas de sorte.

Nunca fui assim. Desde o começo entreguei-me ao acaso, como uma alma libertada por redenção divina. Joguei a minha vida, rompi todos os laços humanos com empréstimos que nunca tive a intenção de pagar e acumulei mentiras para as próximas quatro gerações.

Cai, ciente do perigo, nas garras do crime que se alimenta do desespero dos jogadores e agora tenho de fugir desta cidade de mãos a abanar, deixando apenas a memória de estratosféricos altos e abismais baixos. Sou um exilado da sorte. Para trás deixo uma existência insolvente, ainda assim livre de arrependimentos. Sinto que só perdi duas vezes: perdi a minha bicicleta nos dados e perdi as chances de voltar a jogar outra vez. Só não perdi a sensação vertiginosa de tudo jogar numa mão. Aposto que isso ficará comigo para sempre.

24 Jul 2017

Coreia do Norte arrisca uma grave escassez de alimentos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Coreia do Norte poderá sofrer uma grave escassez de alimentos devido à pior seca dos últimos 15 anos no país, advertiu onde a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

As culturas foram penalizadas devido à falta de chuvas, num país onde a desnutrição já é um flagelo, referiu a FAO num relatório.

“A chuva que caiu entre Abril e Junho nas principais regiões agrícolas do país foi muito abaixo da média a longo prazo, o que causou graves perturbações nas atividades de plantio e danos às culturas na principal estação”, indicou o documento.

Isso poderá traduzir-se em “uma forte deterioração da segurança alimentar para uma grande parte da população”, de acordo com Vincent Martin, representante da FAO para China e para a Coreia do Norte.

“É necessário implementar ações agora para ajudar os agricultores afetados e para prevenir que os mais vulneráveis se voltem para estratégias de adaptação não sustentáveis, como reduzir a sua ingestão diária de alimentos”, acrescentou.

“É vital que esses agricultores beneficiem agora de uma assistência agrícola adequada, incluindo ferramentas e equipamentos de irrigação”, sublinhou Martin.

“Um aumento nas importações de alimentos (…) também será necessário durante os próximos três meses (…) para garantir um abastecimento alimentar adequado para os mais vulneráveis, incluindo crianças e idosos”, referiu a FAO.

Desgoverno

A Coreia do Norte experimentou na década de 1990 uma falta de alimentos que deixou várias centenas de milhares de mortos.

Mesmo em anos sem a seca, mais de 40% da população norte-coreana sofre de subnutrição, segundo a ONU.

Segundo especialistas, a escassez alimentar resulta de uma má gestão por parte do Governo norte-coreano, que consagra uma importante parte do seu orçamento aos programas balísticos e nucleares.

As entregas internacionais de alimentos, nomeadamente pelos norte-americanos e sul-coreanos, diminuíram fortemente com a escalada da tensão ligada aos programas militares de Pyongyang.

Um outro relatório da FAO sobre a Coreia do Norte estimou que em 2016 a produção agrícola foi penalizada pela falta de terras aráveis, pela degradação do solo devido a exploração intensiva, a falta de sementes, pesticidas e fertilizantes de qualidade.

A FAO, que tem um escritório permanente no país asiático, estima que 50.000 hectares de terras agrícolas foram afetados este ano pela seca, nomeadamente as culturas de arroz, milho, batatas e soja.

“A produção ligada às culturas do início da safra de 2017 caiu mais de 30% em relação ao ano anterior, passando de 450.000 para 310.000 toneladas”, advertiu ainda a FAO.

Duterte diz que não visita Estados Unidos porque “não prestam”

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Presidente das Filipinas declarou que nunca irá visitar os Estados Unidos enquanto for chefe de Estado, afirmando que “já viu a América e não presta”. Rodrigo Duterte fez o mais recente ataque verbal contra os Estados Unidos quando foi instado, numa conferência de imprensa na sexta-feira, a reagir às declarações do congressista Jim McGovern. McGovern afirmou que irá liderar um protesto se o Presidente filipino aceitar um convite do Presidente norte-americano, Donald Trump, para visitar a Casa Branca. “O que o leva a pensar que eu vou à América?”, questionou Duterte. “Em nenhum momento durante a minha administração irei à América, ou depois… Eu já vi a América e não presta”, afirmou. O porta-voz de Duterte disse, em Abril, que Trump tinha convidado, durante um telefonema, o Presidente filipino a visitar Washington, o que causou protestos de ativistas dos direitos humanos, que pediram a Trunp para não receber um líder acusado de violações dos direitos humanos e de execuções extrajudiciais.

24 Jul 2017