Leitta para a Universidade dos Andes – acerca do riso e do livro La Enfermidad Feliz

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m Do Sentimento Trágico da Vida, Miguel de Unamumo escreve, logo nas primeiras páginas: “O homem, dizem, é um animal racional. Não sei porque não se diz que é um animal afectivo ou sentimental. Pois talvez o que nos diference dos outros animais seja muito mais o sentimento do que a razão. Já vi mais vezes um gato a raciocinar do que a rir ou a chorar. Talvez chore ou ria para dentro, mas para dentro talvez também o caranguejo resolva equações de segundo grau.” Estamos perante um definição de humano através do sentimento. Mas não é de um sentimento ou de sentimentos quaisquer que Unamuno fala. Pois ele não teria dificuldade em admitir que os animais sofrem ou sentem alguma espécie de contentamento. Os animais têm sentimentos, sem dúvida, mas aquilo que define o humano, segundo Unamuno, são as sensações ou sentimentos limite: o riso e o choro. Independentemente, e é aqui o que menos importa, da definição de humano, tentemos reflectir acerca do riso. Talvez o choro não seja tão difícil de definir, pois embora por vezes se possa rir de alegria ou de emoção por algo ou por alguém, a maioria das vezes o choro tem origem no sofrimento mais intenso, quer seja da perda de alguém até às nossas próprias dores físicas. E, por conseguinte, talvez também não nos seja difícil atribuir choro, ou alguma forma de choro, a alguns animais em sofrimento intenso. Mas o riso é mais difícil de entender e de explicar. Dito de outro modo: o choro tem quase sempre uma causa, o riso não. Em qualquer parte do planeta, um homem com uma bala no estômago chora, mas não podemos dizer que em qualquer parte do planeta nos rimos de uma anedota ou de um comentário engraçado. Luigi Pirandello, no seu ensaio Humorismo, escreve: “(…) é inegável que cada povo tem o seu humor; o erro começa quando este humor, naturalmente mutável em suas manifestações segundo os momentos e os ambientes, é considerado como humorismo (…)” A dor é universal, ou tende à universalidade, o riso não. Aliás, qualquer um de nós sabe bem que as relações pessoais ganham muito ao desenvolverem a sua própria linguagem de riso. As chamadas “private jokes” são do que melhor acontece entre os humanos, aquilo que mais liga os humanos. Isso e a partilha de sacrifícios. E uma vez mais temos como motor das ligações humanas o riso e o choro. Mas o riso, embora possa ser universal – no sentido em que todos se riem – tende para o particular. Muita amizade nasce no riso, na partilha do riso. Por outro lado, contrariamente ao choro, não sabemos de onde nasce o riso. De onde vem essa nossa necessidade de rir.

E reparem noutra coisa interessante: raramente nos rimos sozinhos; as vezes em que o fazemos, relembramos episódios passados, vemos filmes ou peças de teatro ou assistimos a um acontecimento; e em todos estes exemplos há sempre o outro (já o filosofo francês, Henri Bergson, nos alertara para a necessidade de eco do riso, o riso é sempre o riso de um grupo). No choro, não. A maioria das vezes choramos sozinhos. Aliás, quantas vezes não nos afastamos dos outros, precisamente para chorar, para chorarmos sozinhos. A relação entre riso e choro é estranha, e não poucas vezes nos leva a ficar diante do contraditório. Por exemplo, choramos sós, rimo-nos acompanhados, mas há mais metafísica no riso do que no choro. E é aqui que iremos lembrar Henri Bergson, que contrariamente ao filósofo espanhol, com que iniciámos esta leitura, diz que o riso é inteligência pura. Para o filósofo francês, para que o riso aconteça teríamos que anestesiar momentaneamente o coração. Para se rir há que não ter coração, por instantes, apenas inteligência (ainda que haja risos que nasçam sem qualquer migalha de inteligência, como se sabe). Independentemente de concordarmos ou discordarmos desta posição de corte entre riso e emoção, por parte de Bergson, o que parece não causar dúvidas é a ligação necessária entre inteligência e riso. E não se veja aqui em inteligência uma medida do uso do cérebro, mas tão somente a capacidade de separar o que se conta (ou que assistimos) da nossa vida. A inteligência, num primeiro momento, separa. E para rir temos de separar a anedota da nossa vida. Quando nos rimos de alguém bêbado, estamos a conseguir separar o que está acontecer da vida. Não só da minha vida, como se isso não me acontecesse, mas também como se quem faz aquelas figuras não fosse uma pessoa, mas apenas um personagem. A empatia acaba com o riso. Se, ao nos rirmos de alguém que está bêbado e faz figuras caricatas, nos lembrarmos que podíamos ser nós, ou que essa pessoa tem filhos e mulher e que eles sofreriam se o vissem assim, paramos de rir.

Ainda no seu ensaio Humorismo, Luigi Pirandello escreve: “Vejo uma velha senhora, com os cabelos retintos, untados não se sabe de qual pomada horrível, e depois toda ela torpemente pintada e vestida de roupas juvenis. Ponho-me a rir. Advirto que aquela velha senhora é o contrário do que uma velha e respeitável senhora deveria ser. Assim posso, à primeira vista e superficialmente, deter-me nessa impressão cómica. O cómico é precisamente um advertimento do contrário. Mas se agora em mim intervém a reflexão e me sugere que aquela velha senhora não sente nenhum prazer em vestir-se como um papagaio, mas que talvez sofra por isso e o faz somente porque se engana piamente e pensa que, assim vestida, escondendo assim as rugas e as cãs, consegue reter o amor do marido, muito mais jovem do que ela, eis que já não posso mais rir disso como antes, porque precisamente a reflexão, trabalhando dentro de mim, me leva a ultrapassar aquela primeira advertência, ou antes, a entrar mais em seu interior: daquele primeiro advertimento do contrário ela me fez passar a esse sentimento do contrário. E aqui está toda a diferença entre cómico e humorístico.” Contrariamente ao que Unamuno escreveu, o riso realmente não é sentimento. O riso é muito mais uma reacção contra o sentimento do que um sentimento em si. O riso nasce da nossa consciência de sentirmos demasiado. O riso nasce da nossa necessidade de esquecimento da vida, ainda que através do humor se possa alcançar uma consciência ainda mais elevada da consciência da nossa situação no mundo. Richter escreveu que aquilo que leva ao riso é “a melancolia de um espírito superior que chega até a divertir-se com aquilo que o entristece.” Como, por exemplo, naquela célebre tira de Quino, em que um homem está perdido no deserto, diante de uma placa que diz: “Agora, você está precisamente aqui.” [“En este momento usted se encuentra exactamente aquí”.] Imediatamente nos rimos. Mas se pensarmos que essa é a nossa situação na vida, o riso vai esmorecendo, como no exemplo dado atrás por Pirandello. Pois acerca do nossa vida, que sabemos nós, além de que “agora, estamos exactamente aqui”? E é agora, com a ajuda de Quino, que passamos a falar do absurdo. E de como o absurdo está inequivocamente ligado ao riso. No livro Sobre o Riso e a Loucura, do célebre médico da Grécia Antiga, é narrada uma suposta viagem de Hipócrates à cidade de Abdera para curar o filósofo Demócrito, que, rindo de tudo e de todos, é considerado louco pela população da cidade. Demócrito, no diálogo com Hipócrates, zomba da condição humana de seu tempo, especialmente da ganância e dos grandes vícios. Condição humana que continua igual, passados quase três milénios. O que estava em causa no riso de Demócrito era o sem sentido do mundo e da existência. Esse sem sentido levava-o a viver com o único propósito de estar bem disposto. Tudo o fazia rir, porque ele sabia que tudo era nada, que tudo conduzia a nada. Para Demócrito, a existência é um absurdo. E absurdo, como a palavra mesmo diz em latim, ab surdo, é algo que não se consegue escutar. É algo que está para além do entendimento, algo que não faz sentido. Mas o absurdo não é a existência, é antes que ela exista e nós não saibamos nada acerca dela, a não ser que se nasce e que se morre. Da existência, sabemos o mesmo que o homem perdido no deserto sabe, na tira do Quino: agora, estamos precisamente aqui. Este estar vivo e não saber nem porquê e nem para quê é que fez nascer o riso. O riso é filho da ignorância e do saber. Da ignorância, porque nós realmente não sabemos o que se passa; do saber, porque é a tomada de consciência desse não saber. E é daqui que nasce o riso.

Chegados aqui, entramos na minha novela. A Doença da Felicidade é uma alegoria acerca de um dos conceitos que menos sabemos e de que mais falamos: a felicidade. Assim, e para levar a ironia, porque é de ironia que se trata, a ironia é o veículo que transporta as palavras desta novela, ao extremo, fiz da felicidade um objecto de estudo das chamadas ciências exactas, criando inclusivamente toda uma história dessa ciência, a eudaimonologia. Eudaimonologia, ciência que na novela estuda a felicidade, deriva da palavra Grega Antiga “eudaimonia”, que quer dizer, um “bom deus”, “um bom daimon”, isto é, que alguém tinha um bom deus a interceder por ele, ou simplesmente ele tinha “felicidade”. Neste contexto, crio também a palavra “eudaimonina”, que deriva de “eudaimonia” e da partícula “ina”, que no Grego Antigo é indicativo de toxicidade, como por exemplo nas palavras “caféina”, “cocaína”, “heroína” e “nicotina”.  E a eudaimonina é a substância responsável por querer ser feliz ou ser feliz. E querer ser feliz é muito pior do que ser feliz, como se pode ver no livro. Toda esta alegoria pretende alertar-nos para o absurdo da existência e para o absurdo de se traçar uma vida segundo valores que não sabemos de todo em todo o que são, o que querem dizer. Que quer dizer ser feliz? O que é ser feliz? São muitas as tentativas filosóficas ao longo do tempo, de dizer o que é a felicidade, e algumas contraditórias. E são ainda mais as tentativas burlescas, teorias de trazer por casa e pelas mesas de café, que só a rir, se pode falar disso. Só com ironia se pode falar disso. A Doença da Felicidade, além de ser um livro irónico, é um livro que nasce da noção de que o absurdo é estar vivo, não saber nada sobre a existência, ainda que se saiba como fazer uma jangada para ir à Lua, e estar continuamente a viver segundo mandamentos, regras que são tão válidas como esta, que o narrador de A Doença da Felicidade escreve às páginas 51-2: “CANTAR PODER PREJUDICIAL? [a quem contraiu a doença] A actividade de cantar deve ser administrada com muito cuidado. E, tal como com fazer amor, muda de caso para caso. Se uma pessoa canta muito mal, cantar não prejudica o tratamento. Se canta muito bem, tal pode ser um entrave ao tratamento. No fundo, o mesmo se aplica para qualquer actividade artística. De modo geral, meu pai proibia aos seus pacientes envolverem-se nessas actividades durante o tratamento.” E eu, para terminar, diria: se está vivo, evite seguir regras, pois elas foram feitas por alguém que muito provavelmente não sabe mais acerca da existência do que você.

2 Mai 2017

A morte do gangster

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o passado dia 19 a televisão de Hong Kong difundiu a notícia da morte de Yip Kai Foon, conhecido como o Rei dos Ladrões. Yip morreu de cancro no Hospital Queen Mary.

Yip Kai Foon nasceu em 1961 em Haifeng, na China. Ganhou fama como gangster especializado no roubo de joalharias, que assaltava empunhando espingardas AK-47. Foi o primeiro assaltante a usar este tipo de armas em Hong Kong.

O seu primeiro assalto remonta a 1984. Yip e outros cinco cúmplices roubaram duas joalharias e arrecadaram 2 milhões de dólares de Hong Kong. Foi preso e considerado culpado de quatro acusações (duas de assalto, uma por cada uma das lojas, uma por posse de armas de fogo e outra por uso de arma para resistir à detenção). Foi condenado a 18 anos de prisão.

A 24 de Agosto de 1989 conseguiu evadir-se depois de ter simulado uma crise de apendicite e de ter sido transferido para o Hospital Queen Mary. Aí, atacou dois guardas na casa de banho com uma garrafa partida e conseguiu fugir numa carrinha estacionada à entrada do Hospital. Furtou o veículo e arrancou com os dois ocupantes lá dentro, um homem de 37 anos e o filho de seis. Depois obrigou o homem a tirar a roupa para ficar com ela. Saiu em Wong Chuk Hang e apanhou um autocarro. Presume-se que a seguir tenha apanhado um avião para a China continental.

A 9 de Junho de 1991, Yip e o seu bando, armados com AK-47s e com pistolas, assaltaram cinco ourivesarias situadas na “Dourada” Rua Mut Wah em Kwun Tong. Dispararam 54 tiros contra a polícia e fugiram com ouro e jóias no valor de 5,7 milhões de Hong Kong dólares.

Yip também esteve ligado ao roubo de duas joalharias em Tai Po Road e em Sham Shui Po, a 10 de Março de 1992. Dessa vez, o bando disparou 67 tiros contra a polícia e contra transeuntes. O produto desse assalto foi avaliado em 3 milhões de Hong Kong dólares.

Pensa-se que Yip também esteve envolvido no assalto a uma joalharia situada na Nathan Road, em Mong Kok. Neste assalto, na sequência de múltiplos disparos, uma mulher que ia a passar foi morta. Durante a perseguição que se seguiu, um dos assaltantes foi morto pela polícia; os outros lançaram o corpo para o meio da rua e conseguiram fugir de carro.

A polícia de Macau suspeita que Yip esteve envolvido no assalto ao Hyatt Regency Hotel, na Taipa, que ocorreu em Abril de 1994. Desta vez foram roubadas fichas de jogo no valor de 40 milhões de Hong Kong dólares.

Em 1995, Yip passou a actuar em Shenzhen e, em Janeiro desse ano, participou no rapto e no assassinato de um empresário de Tianjin e em Novembro na morte de um informador da polícia.

Estima-se que o total do produto dos seus furtos ascenda a 20 milhões de Hong Kong dólares (aproximadamente $2,576,920 de dólares americanos).

Mas a 13 de Maio de 1996 a carreira de Yip chegava ao fim, quando foi preso na sequência de um tiroteio na Kennedy Town. Nesta troca de tiros com a polícia Yip foi atingido na espinha dorsal e ficou paralisado da cintura para baixo. Dois polícias tinham surpreendido Yip e o seu bando numa travessa perto do cais. Tinham acabado de sair de um barco, e os agentes suspeitaram que fossem imigrantes ilegais e pediram-lhes a identificação. O resto do bando conseguiu fugir, mas Yip sacou de uma arma que trazia na mala e começou a disparar. Quando mais tarde testemunharam, os polícias disseram que o tinham exortado sem êxito a depor a arma. Yip continuou a disparar. Mas, de repente, a arma encravou. Um dos polícias disparou contra ele e a bala atingiu-lhe a coluna. Yip caiu de imediato e foi preso.

A bala que o atingiu nunca chegou a ser tirada porque os médicos perceberam que a remoção ainda ia provocar mais danos na espinha dorsal. Desde essa altura Yip ficou confinado a uma cadeira de rodas e a uma sentença para a vida. Foi condenado, no acumulado das acusações, a uma pena de 41 anos de prisão.

A detenção de Yip foi um caso espantoso. Como pudemos ver, cometeu vários assaltos e conseguiu sempre escapar. Mesmo quando foi preso em 84 acabou por se evadir. Nessa altura as pessoas achavam que era impossível prendê-lo. Acabaram por ser dois polícias, que não faziam ideia de ter perante si o Rei dos Ladrões, que o detiveram. E é preciso não esquecer que um destes agentes era um recém-graduado, acabado de sair da Escola de Polícia. Prender Yip nestas circunstâncias há-de ter sido qualquer coisa de inacreditável.

Depois do tiroteio Yip ficou paralisado. Mais tarde na prisão foi-lhe diagnosticado um cancro que o veio a matar. A fase final da vida de Yip foi muito triste. Preso, paralisado e a sofrer de cancro fatal. Nem sequer podia receber os cuidados da família. Duma certa forma, antes de morrer teve apenas por companhia a doença e os seus erros.   

Os chineses têm um ditado que diz, “O nosso destino decide-se numa dimensão invisível.” Talvez a forma como foi preso seja disso um sinal. O cancro, a solidão e o peso dos seus erros serão outro. Talvez, nas sombras onde vive, o destino ajude a lei a atingir o objectivo de manter a ordem e a justiça social.

Professor Associado do IPM

Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau

2 Mai 2017

Director da CIA em Seul para “reunião interna”, diz embaixada dos EUA

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] director da CIA, Mike Pompeo, estava ontem na Coreia do Sul para uma “reunião interna” e não para reunir com dirigentes sul-coreanos, afirmou a embaixada dos Estados Unidos, numa altura de tensão na península.

O jornal sul-coreano Chosun Ilbo tinha noticiado que Pompeo, que foi nomeado em Fevereiro para liderar os serviços secretos norte-americanos, tinha chegado durante o fim de semana a Seul e tinha participado em reuniões à porta fechada com o chefe dos serviços secretos sul-coreanos e representantes da presidência.

Citando várias fontes próximas dos serviços secretos, o jornal escreveu que o director da CIA informou os seus homólogos sobre a política norte-coreana da administração Trump e avaliou a situação interna da administração norte-coreana.

O Chosun Ilbo também refere que Pompeo falou sobre as perspectivas da relação americana-coreana na sequência das eleições presidenciais sul-coreanas agendadas para 9 de Maio.

Um responsável da embaixada dos Estados Unidos confirmou que o director da CIA estava na Coreia do Sul, mas informou que o seu programa era muito limitado.

“O director da CIA e a sua mulher estão em Seul para uma reunião interna com as forças norte-americanas na Coreia do Sul e responsáveis da embaixada”, disse.

“Ele não se vai encontrar com nenhum responsável da Casa Azul nem nenhum candidato”, acrescentou, sem adiantar detalhes sobre o programa de Pompeo. A Casa Azul é o local da presidência sul-coreana.

Tempos difíceis

Esta visita decorre num clima de tensão relacionado com os programas nuclear e balístico de Pyongyang, numa altura em que a Coreia do Norte, que voltou a lançar novo míssil no sábado, poderia estar a preparar um sexto teste nuclear.

Estas tensões são igualmente alimentadas pela retórica incendiária de Donald Trump, que disse estar preparado para “tratar” sozinho do problema norte-coreano se a China não controlasse o seu vizinho turbulento.

O Presidente norte-americano suscitou igualmente a consternação em Seul, ao indicar que a Coreia do Sul devia pagar pelo sistema antimísseis norte-americano actualmente em fase de instalação.

A implantação do THAAD suscitou a forte oposição de parte da opinião pública sul-coreana e a irritação da China, que vê o dispositivo como um atentado à sua própria soberania.

“Há questões bem mais importantes do que o dinheiro”, refere um editorial do Chosun Ilbo, que acusa Trump de “minar a confiança” com as suas exigências financeiras.

2 Mai 2017

Vacinação | Taxa em Macau ronda os 94 por cento

A grande maioria das crianças do território está vacinada. Nos últimos 29 anos, houve apenas um caso de sarampo. Há várias maleitas que, na última década e meia, foram tidas como erradicadas pela Organização Mundial de Saúde. Macau sai bem no retrato mundial da prevenção das doenças transmissíveis

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]ortugal tinha, à hora de fecho desta edição, 25 pessoas infectadas com sarampo, uma doença que tinha sido erradicada em 2016 depois de um longo período em que os únicos casos detectados tinham sido contraídos no estrangeiro. Só este ano, contaram-se já 95 doentes com o vírus. O país não é caso único: há um surto na Europa que atinge, pelo menos, outros 18 Estados.

A morte de uma jovem portuguesa de 17 anos, na semana passada, com complicações originadas pelo facto de ter sarampo, reacendeu uma polémica que, para a grande maioria, não faz qualquer sentido: há quem opte por não vacinar os filhos, temendo os efeitos secundários da administração de vacinas. Outros fazem-no por convicção de natureza religiosa. No caso da adolescente que morreu, as notícias dão conta de que não tinha sido vacinada por motivos de saúde.

A comunidade médica internacional não tem dúvidas sobre as vantagens das vacinas, desde que haja condições clínicas para a sua administração. Foi a aposta na prevenção que permitiu diminuir drasticamente o número de casos de sarampo, de tosse convulsa ou da devastadora poliomielite. Ainda assim – e à semelhança do que acontece com a administração de antibióticos e de outros medicamentos –, há quem ofereça resistência às vacinas que os governos disponibilizam. Nos Estados Unidos, a questão é muito discutida. A taxa global de vacinação do país ronda os 90 por cento. Nalguns Estados, são obrigatórias, mas há excepções para quem alega questões religiosas.

Em Macau, também há casos de pessoas que preferem não vacinar os filhos. Mas são poucos aqueles que Jorge Humberto, pediatra no território desde 1982, encontrou ao longo da sua vida profissional. “Tive um ou outro caso de um pai ou de uma mãe que mostraram desinteresse em vacinar os filhos, mas não uma verdadeira aversão”, conta ao HM. As reticências resolveram-se com uma conversa, “conseguiu-se que as crianças fossem vacinadas”.

Isabel Marreiros, educadora de infância e directora da Santa Casa da Misericórdia, tem a mesma experiência do pediatra. “Normalmente, em Macau, os pais são conscienciosos”, atesta.

Esta consciência em relação à importância da prevenção tem tradução numérica: de acordo com dados facultados ao HM pelos Serviços de Saúde de Macau (SSM), a taxa de vacinação das crianças do território anda perto dos 94 por cento, o que significa que “já atingiu o nível de vacinação estabelecido pela Organização Mundial de Saúde”.

Ainda assim, o Governo entende que a taxa deveria ser maior. Acontece, porém, que existe o factor mobilidade: alguns recém-nascidos que não são residentes locais regressam ao local de origem dos pais após o nascimento. Não se vacinam em Macau, mas mesmo assim estão incluídos no grupo de naturais da cidade, entrando directamente para as estatísticas.

Obstáculos do passado

Quando Jorge Humberto chegou a Macau, para vir trabalhar para o hospital público, já havia muitas das vacinas que hoje existem, mas faltava “uma determinação superior” em relação à matéria. “Houve até algumas vacinas que foram iniciadas nessa altura, que não faziam parte do programa, e que foram entrando, pouco a pouco, no que é hoje o plano actual.”

Os registos históricos sobre a matéria permitem perceber que a população do território – ou parte dela – começou a ser vacinada em 1840. A prática da imunização começou, na medicina ocidental, no final do séc. XVIII, com a invenção da vacina contra a varíola, que terá chegado aqui também. O programa de vacinação mais completo, explicam os SSM, data de 1982.

Jorge Humberto recorda, dos primeiros tempos de actividade profissional em Macau, certos obstáculos à inovação. “Tivemos alguns problemas da parte da direcção do hospital quando começámos a querer introduzir a vacina para a hepatite B. Tive algumas ‘pegas’ com o director do hospital para o convencer que era necessário institucionalizar a introdução desta vacina”, diz o pediatra, que conheceu muitas crianças com a doença.

O médico conseguiu ver a sua pretensão concretizada. “A partir de certa altura, tornou-se oficial e passámos a dar a vacina da hepatite B a todos os recém-nascidos, da mesma maneira que se dá a BCG contra a tuberculose.” Os dados oficiais explicam que, neste momento, a taxa de vacinação dos recém-nascidos é de 99,7 por cento.

“Guerrinhas houve sempre na aplicação das vacinas mas, pouco a pouco, as instituições foram tomando uma posição, assim como a própria população acaba por aceitar”, constata Jorge Humberto. “De vez em quando aparece um ou outro que se arma em valente, ‘eu não quero dar vacinas ao meu filho’. Mas isto tudo acaba por se vencer.”

Doenças erradicadas

Médico desde 1974, o pediatra lembra-se bem do tempo em que havia muitos casos de papeira, de tosse convulsa, de tuberculose – que “atacava meio mundo” –, de poliomielite também. “Depois foram desaparecendo de circulação. Não vejo uma poliomielite ou uma tuberculose porque as crianças estão vacinadas.” No que toca ao sarampo, os SSM contabilizaram um caso nos últimos 29 anos. “Quanto mais a medicina puder fazer no sentido de evitar esta ou aquela doença, melhor para a criança, melhor para o médico, melhor para todos nós”, afirma Jorge Humberto.

Macau obteve a certificação da erradicação da poliomielite, pela OMS, em 2000. Oito anos depois, foi emitida a acreditação de controlo da hepatite B em crianças, já que a taxa de infecção era inferior a um por cento entre a população com idade igual ou superior a cinco anos. Em 2014, a RAEM obteve a certificação da erradicação do sarampo.

Em 2001, “foi feito um reforço dos cuidados primários de saúde com a criação do Centro de Prevenção e Controlo da Doença”, indicam os SSM. É esta a entidade responsável pela prevenção de doenças transmissíveis e do planeamento do programa de vacinação, em articulação com os centros de saúde.

No ano passado, o programa de vacinação da RAEM resultou na administração de vacinas a 212.262 pessoas. O programa de vacinação antigripal de 2016 a 2017 chegou a 98.040 pessoas.

Serviços de Saúde dizem que plano é abrangente

As vacinas no território são gratuitas para as crianças residentes. As que têm de pagar para poderem ir ao encontro do que está definido no plano de vacinação são em “número muito reduzido”, garantem os Serviços de Saúde de Macau (SSM). “As pessoas que não sendo residentes ou sejam apenas visitantes de Macau podem aceder, por conta própria, à administração de vacinas”, esclarecem em declarações ao HM.

De acordo com as explicações do SSM, o programa de vacinação da RAEM “está no nível dos países mais avançados”. Na comparação com as regiões vizinhas, “verifica-se que os tipos de vacinas existentes em Macau são em maior número, além de que a cobertura, a título gratuito, é também mais abrangente”.

Neste momento, o programa de vacinação de Macau inclui 13 tipos de vacinas. Entre elas encontram-se as mais comuns – tuberculose, hepatite B, tosse convulsa, tétano, difteria, poliomielite, sarampo, rubéola e papeira –, e também vacinas para prevenir doenças como “streptococcus pneumoniae, haemophilus influenzae bacilos (que causa meningite infantil), varicela e cancro do colo do útero”.

As crianças que frequentam creches e estabelecimentos de ensino em Macau devem cumprir este plano de vacinação – à excepção daquelas que, por razões de saúde, não podem ser imunizadas. Isabel Marreiros, directora da Creche da Santa Casa da Misericórdia, explica que “existem instruções, através dos SSM, para que as crianças tenham o quadro vacinal em dia para poderem começar a frequentar a creche”.

A instituição recebe bebés com apenas seis meses de idade que “têm um quadro vacinal diferente de uma criança que entra com dois anos”. É aqui que adquire relevância a questão da imunidade de grupo: ao meio ano de vida, ainda não foi possível tomar uma série de vacinas que já terão sido administradas a crianças mais velhas. Quanto maior for a imunidade de grupo, mais garantias se oferece a quem ainda, por uma questão de idade, não pôde ser vacinado.

“Temos enfermeiras na creche que vão acompanhando a actualização do quadro vacinal da criança. No momento em que se detecta uma falha, avisamos os pais para a colmatarem”, acrescenta Isabel Marreiros, que não se tem deparado com casos em que os pais não cumpram as regras.

Segundo as explicações dos SSM, desde 2014 que os centros de saúde enviam anualmente às escolas técnicos que procedem à administração das vacinas. Mais recentemente, começaram a ser administradas vacinas contra o cancro do colo do útero às alunas do 12.o ano de escolaridade, sendo que a taxa de vacinação é de 92 por cento.

As novas doenças

Com uma vasta experiência no ensino, a trabalhar há quase 40 anos, Isabel Marreiros observa uma significativa evolução no cenário das doenças infecto-contagiosas que, por força da vacinação, foram desaparecendo. Apesar de haver falhas quando o programa de vacinação foi criado e de nem todas elas serem gratuitas, havia muitos pais que estavam dispostos a pagar precisamente por causa da saúde das crianças.

Nos primeiros anos de trabalho da educadora de infância, a dimensão da população ajudava a que o controlo fosse mais fácil. Hoje em dia, a situação é mais complicada, pelo que a vacinação adquire ainda uma maior importância. É que há todo um outro conjunto de doenças transmissíveis que ainda não é possível prevenir.

“As crianças vão de férias, trazem bactérias e vírus que ainda não se manifestaram, chegam à creche e transmitem-nos, proliferam de uma maneira incrível, porque não é controlável. Nestas doenças, o que acontece é que, logo no primeiro caso, avisamos imediatamente os pais, fazemos uma desinfecção total da sala, para não dar azo a que evolua mais”, refere.

Quanto ao que já é possível evitar, os Serviços de Saúde garantem que é para continuar a cumprir “o compromisso com a sociedade para a prestação de um serviço completo e de alta qualidade no âmbito da vacinação pública”, para que não regressem os fantasmas de doenças que, no passado, “eram muito comuns”, como a poliomielite, a difteria e a tosse convulsa.

1 Mai 2017

Relatório da União Europeia sobre Macau fala de aumento da autocensura nos media

O relatório anual da União Europeia para Macau fala de um aumento da autocensura por parte dos media chineses, alertando para o elevado número de pessoas de Hong Kong que foram proibidas de entrar no território. A UE recomenda ainda ao Governo o debate sobre o sufrágio universal

 

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á liberdade, mas também há mordaças. É esta a conclusão dos especialistas da União Europeia (UE) no mais recente relatório anual sobre Macau. No documento defende-se que “os direitos fundamentais e a liberdade dos cidadãos continuarem a ser respeitados”. Contudo, a UE considera que a autocensura no seio dos meios de comunicação social de língua chinesa tem aumentado.

“Os media de Macau continuaram a expressar uma variedade de opiniões, apesar de algumas preocupações sobre o aumento da autocensura. Parece haver um aumento da autocensura, particularmente no seio dos media chineses quando noticiam assuntos da China”, lê-se no relatório.

A UE baseia-se em relatos feitos pela Associação de Jornalistas de Macau sobre alegados constrangimentos de que terão sido alvo os jornalistas, aquando da cobertura de um protesto dos pequenos investidores do Pearl Horizon, no dia do aniversário da transferência de administração, em 2016.

“A associação disse estar muito preocupada com facto de alguns repórteres terem sido insultados e empurrados. (…) Trata-se de um comportamento que viola a liberdade de imprensa”, lê-se.

A mesma associação falou ainda da proibição de entrada em Macau de um jornalista do Apple Daily, título em chinês publicado em Hong Kong. “Não é a primeira vez que jornalistas e membros de grupos políticos de Hong Kong vêem a sua entrada recusada”, afirmam ainda os responsáveis pelo relatório.

Eleições com regras

Numa altura em que o território se prepara para receber mais um acto eleitoral para a Assembleia Legislativa (AL), o relatório da UE lembra que as campanhas eleitorais têm agora de obedecer a regras mais restritas. “A 9 de Agosto, os deputados aprovaram a revisão da lei eleitoral, que tem como objectivo o estabelecimento de regras mais apertadas para a campanha eleitoral”, aponta o documento.

A UE salienta, porém, que o Governo não aproveitou esta oportunidade para aumentar o número de deputados na AL eleitos pela via directa, bem como para começar o debate sobre o sufrágio universal para a eleição do Chefe do Executivo.

“O número de assentos eleitos pela via directa permaneceu inalterado. (…) Os deputados pró-democratas apontaram para a perda de oportunidade em termos de progresso democrático e falaram da necessidade de mais reformas, incluindo a discussão sobre a introdução do sufrágio universal”, pode ler-se.

Por essa razão, a UE recomenda que “as autoridades de Macau tenham em consideração as formas de promover um maior envolvimento da população nas eleições para o Chefe do Executivo, de modo a reforçar a legitimidade dessa posição e a contribuir para uma boa governação”.

O relatório da UE fala ainda de mais um chumbo do projecto de lei sindical, alertando para o facto de os trabalhadores verem reconhecido o direito de associação, embora “não estejam a salvo de retaliações”. Tal acontece pela ausência de legalização dos sindicatos.

 

 

 

Macau continua a ignorar ONU

O relatório da UE aponta o dedo ao Executivo por causa a falta de criação de um órgão independente para o tratamento de casos de tortura. “O Governo manteve a sua oposição face a uma proposta da Convenção contra a Tortura da Organização das Nações Unidas (ONU), que aponta para a necessidade de implementar um órgão independente ao nível dos direitos humanos. [O Governo] argumentou que esta recomendação não é aplicável a Macau por ser uma região administrativa especial da China”, lê-se. Em relação aos casos de tráfico humano, a UE aponta que o Executivo “fez esforços substanciais para combater o crime transfronteiriço, sobretudo ao nível do tráfico humano”. Contudo, “apesar do grande número de queixas, o número de acusações e condenações continua a ser baixo”.

UE alerta para discriminação sexual

Os especialistas da UE lembram que os casais do mesmo sexo continuam a não estar contemplados na lei de combate à violência doméstica, apontando que, em Macau, “persiste uma preocupação quanto à discriminação com base na orientação sexual e na identidade de género, particularmente em termos de emprego, educação e saúde”. “É necessária mais legislação para promover a igualdade de género, tal como na área do assédio sexual”, refere o relatório.

Mais para o combate à corrupção

Numa altura em que o ex-procurador da RAEM responde em tribunal, em mais um escândalo de corrupção a envolver uma figura de topo do sistema, a UE lembra que “medidas anticorrupção mais robustas continuam por implementar, apesar de terem ocorrido casos de relevo”. Além disso, Macau “continua vulnerável ao crime de branqueamento de capitais”, refere a UE, uma vez que “os casinos continuam a ter vários caminhos para a passagem de dinheiro que vem da China”. Apesar disso, o relatório destaca as últimas medidas adoptadas pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos.

Modernização no sector laboral precisa-se

Com a falta de recursos humanos no território e os discursos que vão contra a importação de trabalhadores não residentes, a UE lembra que “Macau continua a sofrer com a falta de trabalhadores”, recomendando ao Governo que seja “mais moderno e eficiente”, e que implemente novas reformas administrativas. “Como Macau sofre com a falta de trabalhadores, sobretudo qualificados, as empresas europeias têm de recorrer aos expatriados e trabalhadores estrangeiros, ainda que obter autorizações de trabalho se tenha tornado difícil”, alerta o relatório no capítulo referente às relações entre Macau e a UE.

1 Mai 2017

IC | Antigo e actual presidentes alvos de “procedimento disciplinar”

É para acabar com as dúvidas. Alexis Tam vai instaurar um procedimento disciplinar aos três homens que, aquando da contratação irregular de trabalhadores, mandavam no Instituto Cultural. O actual presidente diz que não teve nada que ver com o assunto, mas não escapa à decisão do secretário

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] antigo presidente do Instituto Cultural (IC) Ung Vai Meng e os actuais presidente, Leung Hio Meng, e vice-presidente, Chan Peng Fai, vão ser alvo de um “procedimento disciplinar” por irregularidades no recrutamento.

O gabinete do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, decidiu “instaurar um procedimento disciplinar aos membros da direcção do Instituto Cultural à época dos factos, a saber: Ung Vai Meng, Leung Hio Ming e Chan Peng Fai” por “indícios de violação de deveres gerais e específicos legais”, indica um comunicado oficial.

No mês passado, um relatório do Comissariado contra a Corrupção (CCAC) indicou que o Instituto Cultural (IC) “recorreu ao modelo da aquisição de serviços para contornar sistematicamente o regime legal de recrutamento centralizado e concurso público”, sem a autorização do secretário Alexis Tam.

Na segunda-feira, em conferência de imprensa, Leung Hio Ming, antigo vice-presidente do organismo e presidente desde Fevereiro, sucedendo no cargo a Ung Vai Meng, afirmou não ter existido “qualquer tipo de corrupção”, mas reconheceu os “erros cometidos” no período entre 2010 e 2015.

Chan Peng Fai é desde 2014 vice-presidente do IC, desempenhando antes disso, desde 2010, as funções de chefe do Departamento de Promoção das Indústrias Culturais e Criativas.

Leung Hio Ming apontou o dedo ao antecessor: “As chefias não aceitaram os pareceres jurídicos” dados sobre o assunto. O presidente do IC sublinhou que o anterior dirigente foi “responsável pela área de recursos humanos”.

O IC elaborou um relatório sobre a questão do recrutamento dos trabalhadores em regime de aquisição de serviços, que entregou a Alexis Tam que, por sua vez, “deu dele conhecimento ao CCAC”.

“O estudo realizado pelo grupo de trabalho do IC não encontrou qualquer tipo de corrupção, de troca de bens e interesses”, declarou Leung Hio Ming, na conferência de segunda-feira.

O presidente do IC sublinhou que o mesmo grupo de trabalho não “descobriu qualquer chefia ou dirigente que tenha cometido ilegalidades”, ao mesmo tempo que reconheceu e lamentou os “erros cometidos” devidos a “uma má interpretação e aplicação da lei”.

Entre 2010 e 2015, 94 pessoas foram admitidas irregularmente em regime de aquisição de serviços. Vão deixar de trabalhar no IC mas, para não haver repercussões no modo de funcionamento do instituto, Leung Hio Ming sugeriu à tutela a celebração de contratos individuais de trabalho a título temporário.

Alexis Tam vai apresentar esta solução aos Serviços de Administração e Função Pública, para que estes emitam um parecer, “por forma a garantir o respeito pelos princípios de legalidade e segurança jurídica no recrutamento público de pessoal”, acrescentou.

Não foi com ele

Na segunda-feira, Leung defendeu também a criação de um mecanismo de fiscalização permanente e a valorização dos pareceres jurídicos, lamentando que “a negligência na aplicação da lei tenha levado a uma situação caótica no IC”.

“O IC tem uma grande responsabilidade e o CCAC fez avisos em relação à situação entre 2012 e 2014, mas esta situação já se verifica desde que eu entrei para o Instituto, em 1995”, continuou o presidente, que recusou ter qualquer responsabilidade em relação ao assunto, apesar de ocupar, à data dos factos, o cargo da vice-presidência. “Sempre estive mais ligado à área das artes performativas e não estava directamente ligado ao recrutamento. Não tinha grandes conhecimentos sobre esta lei [regime de aquisição de bens e serviços]”, alegou.

No relatório, o CCAC refere que o IC “recrutou, por iniciativa própria, um grande número de trabalhadores em regime de aquisição de serviços sem a realização de concurso”.

“Além disso, o IC adoptou só a análise curricular e a entrevista na selecção dos candidatos, sem obter a necessária autorização daquele secretário para a dispensa das provas de conhecimentos”, o que constituiu “uma usurpação do poder do órgão superior no âmbito da gestão de pessoal”, acrescentou o documento do CCAC.

Na sexta-feira da passada semana, o Chefe do Executivo, Chui Sai On, tinha garantido aos deputados que vai deixar de autorizar a nomeação de pessoas sem experiência ou qualificações para cargos de direcção e chefia no Governo. A tomada de posição de Chui Sai On surgiu depois de, no relatório do CCAC, ter sido tornado público que o líder do Governo autorizou a nomeação de duas chefias do IC sem experiência de trabalho.

1 Mai 2017

Pereira Coutinho exige rapidez no debate sobre projectos de lei

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado José Pereira Coutinho entregou uma carta ao presidente da Assembleia Legislativa (AL), Ho Iat Seng, onde exige que seja feito um rápido agendamento do debate sobre os dois projectos de lei da sua autoria.

“Espero que os meus dois projectos de lei sejam agendados no plenário com a maior brevidade possível, evitando demoras como as que aconteceram com a minha anterior proposta [relativa à protecção ambiental em Coloane], que demorou cinco meses [a agendar], sem que tenha obtido qualquer explicação sobre o atraso”, pode ler-se.

Para o deputado, esse tipo de acções “prejudica a imagem exterior da AL em Macau”.

A carta entregue a Ho Iat Seng exige ainda um processo mais rápido de tradução das interpelações dos deputados por parte da AL. “Tenho recebido muitas queixas dos cidadãos que apenas dominam a língua portuguesa, informando que muitas informações e documentos que estão no website da AL demoram muito tempo a ter as versões portuguesas”, aponta Coutinho.

O membro do hemiciclo que garante ainda que nove interpelações escritas da sua autoria continuam sem respostas em português.

Perante estes problemas, o deputado propõe “a contratação de tradutores, a fim de acelerar a divulgação de informações no website e aumentar a eficiência da AL, com o intuito de garantir a oportunidade das respectivas informações divulgadas aos cidadãos”.

1 Mai 2017

Subsídio de rendimentos | Deficientes obtém maior acesso

Os portadores de deficiência têm agora maior flexibilidade no processo de candidatura ao subsídio complementar de rendimentos do trabalho. Para obterem o apoio basta apenas que trabalhem 128 horas por mês, sendo que os candidatos podem ter menos de 40 anos

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Conselho Executivo já concluiu as alterações ao regulamento administrativo sobre o subsídio complementar aos rendimentos do trabalho. O novo diploma prevê uma flexibilização das condições de candidatura para os portadores de deficiência, que até agora estavam em pé de igualdade em relação aos restantes trabalhadores.

As novas regras determinam que um portador de deficiência pode ser candidato com apenas 128 horas mensais de trabalho. O candidato pode ainda ter menos de 40 anos. De resto, as condições de acesso mantêm-se inalteradas para todos os que estão abrangidos por esta medida.

Os pedidos terão ser feitos entre os meses de Maio, Julho e Outubro deste ano, bem como até ao final de Janeiro do próximo ano, “referindo-se cada um deles ao período de trabalho do trimestre anterior”.

Leong Heng Teng, porta-voz do Conselho Executivo, explicou que o Governo necessitou de algum tempo para estudar as alterações necessárias. “O facto de termos feito o estudo [levou-nos] a adiar o projecto. Vamos tentar fazer uma melhor articulação em relação ao tempo”, disse.

O porta-voz acrescentou ainda que, actualmente, há cerca de sete mil portadores de deficiência que necessitam de apoio financeiro, por auferirem baixos salários. “Achamos que seria melhor alargar o âmbito [do regulamento administrativo] aos portadores de deficiência. Há 70 empresas que contratam quase 290 deficientes. Esta é uma boa medida [a implementar] neste momento”, acrescentou Leong Heng Teng.

Subsídio é necessário

O subsídio complementar aos rendimentos do trabalho é atribuído aos trabalhadores que tenham o bilhete de identidade de residente e que aufiram baixos salários. Este ano, o subsídio vai permitir que os candidatos recebam até cinco mil patacas mensais.

No ano passado, o número de pedidos para este subsídio registou uma descida drástica, tendo sido entregues apenas 329 candidaturas por trimestre. Em 2015, houve um total de 1119 candidaturas no mesmo período de tempo.

Para Leong Heng Teng, tal cenário deve-se à entrada em vigor do salário mínimo para os seguranças dos edifícios e empregadas de limpeza. Uma vez que o Governo deseja implementar o salário mínimo universal daqui a dois anos, o porta-voz do Conselho Executivo admite que o subsídio complementar de rendimentos poderá acabar, mas não agora.

“Conforme o desenvolvimento económico da sociedade é possível que possamos, no futuro, cancelar estas medidas provisórias. Mas em 2016 verificou-se que ainda há um grupo de pessoas que necessita deste apoio. Também achamos melhor alargar o âmbito aos portadores de deficiência”, concluiu Leong Heng Teng.

A conferência de imprensa de ontem serviu ainda para apresentar as alterações feitas à organização e funcionamento dos Serviços de Polícia Unitários (SPU), que passam a ter um comandante-geral e três adjuntos. Tal alteração surge no âmbito da lei que determina a integração dos serviços de protecção civil nos SPU, e que foi recentemente aprovada na Assembleia Legislativa.

Foram ainda aprovadas as normas de funcionamento do Conselho de Segurança, que passa a contar com o apoio administrativo e técnico dos SPU.

1 Mai 2017

1º de Maio | Protestos acontecem com algumas baixas

Os protestos deste ano do Dia do Trabalhador vão ter uma menor participação, pelo menos no que toca às organizações que chamam a população à rua. De fora ficam a ATFPM e a Juventude Dinâmica, que são presença habitual todos os anos. A associação Poder do Povo e os deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San vão estar presentes

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] realização dos habituais protestos do 1.º de Maio, que se celebra na próxima segunda-feira, conta este ano com uma diminuição de participações. Só a associação Poder do Povo garantiu, até agora, que vai sair à ruas e explicou o que reivindica.

Segundo o que o HM conseguiu apurar, ficam de fora muitas associações que todos os anos são presença habitual. É o caso da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), presidida pelo também deputado José Pereira Coutinho.

“Temos actividades desportivas e culturais este ano. Todos os anos temos as nossas actividades do 1.º de Maio, na área desportiva, que engloba futebol, corrida, ténis de mesa. Temos o jantar comemorativo do 1.º de Maio, em que participam mais de mil pessoas”, resumiu.

Para o responsável, “o Dia do Trabalhador é todos os dias, e podemo-nos manifestar, não tem de ser só no 1º de Maio”. O presidente da ATFPM garante que uma menor participação de associações não tem está relacionada com o acto eleitoral agendado para Setembro.

“Não tem nada quer ver com o facto de ser ano de eleições. Se todos se manifestarem no dia 1 de Maio, o impacto será menor. Se me manifestar num dia em que mais ninguém se manifesta, o impacto será maior”, defendeu.

Por sua vez, Lei Kuok Keong, coordenador da Juventude Dinâmica de Macau, entende que, por ser ano de eleições legislativas, é mais difícil realizar um protesto.

“Este é o ano de eleições e a situação política fica complicada”, defendeu. “Muitos membros da nossa associação não estão em Macau e o Governo não dá importância às queixas que são feitas nos protestos, então decidimos que não vamos fazer uma manifestação este ano”, disse ao HM.

Scott Chiang, presidente da Associação Novo Macau (ANM), mostrou-se surpreendido quando foi contactado pelo HM sobre este assunto. “Estamos ligados à Juventude Dinâmica e gostaríamos de os apoiar, mas não tenho informações sobre pedidos de protestos que estejam pendentes.”

“Provavelmente [não vão haver protestos na segunda-feira] porque, à semelhança do ano passado, já deveriam ter anunciado a lista dos participantes”, acrescentou o presidente da ANM.

Poder na rua

A associação Poder do Povo foi a única que, até ao momento, deixou a sua posição sobre a matéria bem vincada. “No ano passado, houve 14 grupos que realizaram o protesto e, como este ano não vejo nenhum grupo a fazer isso, decidi que vamos fazer a manifestação”, disse Cheang Weng Fat, vice-presidente da associação.

A Poder do Povo sai à rua para pedir uma fiscalização “rigorosa” em termos de importação de trabalhadores estrangeiros, exigindo ainda o planeamento da zona A dos novos aterros. A associação vai ainda reivindicar a implementação do sufrágio universal para a eleição do Chefe do Executivo e dos deputados à Assembleia Legislativa.

Ao HM, o deputado Ng Kuok Cheong também falou da sua presença, a título individual, juntamente com o seu colega de bancada Au Kam San. “Provavelmente outras associações irão participar e vou tentar juntar-me [ao protesto]. Vou participar, com o meu colega Au Kam San, mas apoiando outros grupos”, concluiu.

Até ao fecho desta edição, a Polícia de Segurança Pública (PSP) não tinha ainda divulgado a lista dos grupos participantes e dos percursos a realizar, como é habitual. O HM contactou a PSP e foi prometida a divulgação de um comunicado, mas não foi possível obter os dados até à hora de fecho desta edição.

 

Serviços de Turismo preparam-se para enchente de visitantes

Os feriados que celebram o 1.º de Maio estão à porta e isso significa um aumento do fluxo de turistas oriundos do Interior da China. Os Serviços de Turismo de Macau reforçam os apoios prestados a quem entra no território.

A partir de amanhã e até segunda-feira, os trabalhadores da China Continental gozam um período de miniférias. Como tal, a Direcção dos Serviços de Turismo (DST) prepara-se para receber uma enchente de turistas chineses, tendo encetado reforços em várias frentes para lidar com o afluxo de visitantes.

As medidas incluem o reforço de fiscalização, assim como o envio de recomendações para operadores turísticos sobre os principais aspectos a ter em consideração para o período que se avizinha. Os esforços para melhor acomodar o fluxo de visitantes estendem-se até 7 de Maio.

A antecipar a chegada dos turistas durante os feriados foi elaborado um guia de estabelecimentos de restauração e bebidas, o reforço dos pontos de informações e das actividades culturais que prometem agitar a cidade.

Neste sentido, é de realçar que a página de Internet da DST disponibiliza uma tabela de preços das várias categorias de quartos de hotel e pensões de Macau. Uma das sugestões principais dos serviços turísticos é a reserva antecipada de quartos de forma a melhor planear a chegada e permanência no território.

Este período terá um reforço de fiscalização no que diz respeito à prestação ilegal de alojamento. O pessoal dos balcões de informações turísticas será alargado, assim como a Linha Aberta para o Turismo que se manterá em funcionamento 24 horas.

Aplicações turísticas

“What’s On, Macau” é a app disponibilizada aos visitantes para que os turistas conheçam o que se passa na cidade durante os feriados que estão à porta. Além de ter informações sobre os principais locais turísticos de Macau, a aplicação elenca o cardápio de festividades, eventos, espectáculos e exposições a acontecer no território. Os turistas podem também descarregar as aplicações “Experience Macau” e “Step Out, Macau” para estarem perfeitamente informados do que fazer.

Quem visitar o território poderá ainda assistir a várias iniciativas no âmbito do “Anim´Arte Nam Van”, assim como aos espectáculos nas Casas da Taipa, que decorrem até dia 7 de Maio.

1 Mai 2017

Toi San | Construção da habitação pública arranca ainda este ano

O Governo recebeu 11 propostas no âmbito do concurso público para a construção de habitação pública na zona de Toi San. O projecto foi alterado por causa da natureza do terreno. As obras arrancam no fim deste ano

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] projecto de habitação pública no Bairro de Toi San, localizado na zona norte, vai finalmente avançar. Segundo um comunicado emitido pelo Gabinete de Desenvolvimento de Infra-estruturas (GDI), foram entregues 11 propostas de empresas candidatas ao concurso público para a construção do edifício.

As obras têm arranque previsto até ao final do ano, após um longo período de suspensão do projecto. O GDI explica que o plano de concepção do edifício teve de ser alterado devido à natureza do terreno onde vai ser construído.

“Na sequência de nova prospecção geotécnica e avaliação realizadas por uma terceira entidade em 2015, decidiu-se pela alteração do projecto, com a não construção da cave, de forma a avançar de novo com a empreitada de construção de habitação pública na Rua de Toi San”, lê-se no comunicado. O parque de estacionamento, que terá capacidade para 220 lugares, e que iria ser construído na zona da cave, será transferido para o pódio do prédio.

O futuro edifício de habitação pública em Toi San servirá, sobretudo, para providenciar “habitação social a idosos, equipamentos sociais e parque de estacionamento público”, aponta o comunicado. Com um total de 34 pisos, o edifício terá 510 apartamentos, sendo que 230 fracções terão a tipologia T1, enquanto as restantes serão construídas segundo um “modelo aberto”.

Prazos para cumprir

No comunicado, o GDI afirma querer cumprir o calendário de cerca de três anos para a finalização da empreitada, uma vez que as previsões iniciais apontavam para a inauguração do edifício em 2013.

“Foram estabelecidas metas obrigatórias de execução, com o objectivo de garantir o andamento dos trabalhos, sendo que o prazo máximo para conclusão do suporte periférico e melhoramento de solos é de 400 dias”, lê-se no comunicado.

Quanto aos prazos para a conclusão dos trabalhos de “betonagem das fundações por estacas até à laje do pavimento e da estrutura do pavimento até à estrutura da laje de cobertura são de 334 e 316 dias de trabalho”.

Após um longo período de espera, o Governo conseguiu cumprir o calendário a que se propôs para a abertura deste concurso público. Isto porque, no ano passado, numa resposta a uma interpelação escrita do deputado Chan Meng Kam, o Gabinete de Desenvolvimento de Infra-estruturas (GDI) garantiu que as obras começariam no final do terceiro trimestre deste ano.

1 Mai 2017

Mak Soi Kun pede solução para edifício Sin Fong Garden

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Sin Fong Garden é um problema sem resolução à vista. Nesse sentido, Mak Soi Kun pede ao Governo uma resposta sobre os trabalhos de reconstrução do prédio em questão. O deputado recorda que o incidente que houve com pilares danificados ocorreu há já mais de quatro anos, deixando aproximadamente 200 proprietários lesados à espera de resolução para o problema.

O prédio foi evacuado em 2012 por se encontrar em risco de derrocada, tendo sido muito discutida a questão dos meios de financiamento da reconstrução do imóvel. Foram abertos concursos públicos para o efeito mas, devido a processos a correr em tribunal, os trabalhos foram interrompidos. O deputado recordou que, no momento, em que foram pedidas as licenças de obras, o Executivo parou a reconstrução para se procederem à recolha de provas por razões processuais. O deputado considera que esta questão já deveria estar resolvida.

Mak Soi Kun mostra-se ainda preocupado com os proprietários lesados, em particular os idosos que, até hoje, vivem fora da sua casa.

Outra preocupação prende-se com a aproximação das épocas das chuvas e tufões. O estado da construção, neste contexto meteorológico, é um foco de inquietação para o deputado, uma vez que pode representar perigo para a segurança pública.

Nesse sentido, Mak Soi Kun interpela o Governo a agir com celeridade, a avançar com um calendário para demolição e posterior reconstrução do Sin Fong Garden, de forma a garantir que não ocorram incidentes, e a acudir à situação complicada vivida pelos proprietários.

1 Mai 2017

FAM | Companhia de Bill T. Jones pela primeira vez em Macau

O 29.º Festival das Artes de Macau começa hoje. O palco do Centro Cultural de Macau vai acolher a companhia Bill T. Jones/Arnie Zane numa coreografia dupla. Promete-se uma noite de música e movimento a abrir mais uma edição do evento

 

[dropcap style≠’circle’]“P[/dropcap]lay and Play” é o espectáculo que marca a abertura da edição deste ano do Festival da Artes de Macau (FAM). É com o espectáculo de estreia que, pela primeira vez, a companhia nova-iorquina Bill T. Jones/Arnie Zane pisa um palco do território.

O espectáculo vai mostrar ao público, num mesmo serão, duas peças em que os compositores escolhidos foram Ravel e Schubert.

À semelhança do que é habitual nos trabalhos da companhia nova-iorquina, trata-se de uma coreografia em que a música é interpretada ao vivo e os instrumentistas são convidados locais. Neste caso, sobe ao palco um quarteto com músicos da Orquestra de Macau. A ideia é trocar sinergias com as pessoas dos locais por onde os espectáculos vão passando.

“Play and Play” foi escolhido por ser um título capaz de dar às peças uma interpretação mais abrangente, “uma espécie de guarda-chuva que abarca vários trabalhos que fizemos a pensar no seu acompanhamento ao vivo com música de câmara”, explicou ontem a directora artística associada, Janet Wong.

Os bailarinos da Bill T. Jones/Arnie Zane vão dançar a peça de Maurice Ravel, “Quarteto de Cordas em Fá Maior”, sendo que o espectáculo de dança tem como nome “Paisagem ou Retrato”.

“O tema é composto por quatro movimentos com dinâmicas, sentimentos cores e vida própria, e a coreografia é o seu acompanhamento e interlocutor”, apontou a responsável.

O conceito do espectáculo é, de uma forma geral, a capacidade do repensar um trabalho feito. “Por detrás do ‘Play and Play’ há o conceito de ter alguma coisa, fazer alguma coisa com isso e depois fazer algo de novo mais uma vez”, referiu. Para conseguir alcançar o objectivo, a companhia foi à procura de material que já tinha produzido, sujeitou-o a uma nova análise e fez uma nova contextualização.

Schubert e John Cage

A história da segunda peça, “Story”, que conta com a música de Schubert, saiu de uma outra feita muito antes, tendo sido refeita com base na inspiração de um trabalho de John Cage. A dança, a forma de contar a história, a iluminação e os próprios adereços foram todos feitos de raiz.

“Quando decidimos fazer esta coreografia, que inicialmente se chamava ‘Story/Time’, decidimos tirar a parte do tempo e ir buscar o material de dança que tínhamos usado na peça inspirada pelo John Cage. Há material com mais de 37 anos e que fazia parte do nosso repertório, antes mesmo da companhia existir. [Esse repertório] inclui alguns duetos que acabaram por tornar Bill T. Jones e Arnie Zane famosos”, disse Janet Wong.

Dentro da história, o público pode encontrar quase um flash retrospectivo do trabalho da Bill T. Jones/Arnie Zane, com a introdução de peças mais antigas e de outras acabadas de preparar.

No entanto, e de acordo com a responsável artística, o que é feito ao nível da dança, neste espectáculo, não é o mais importante. Trata-se acima de tudo de um diálogo com a música que sustenta a parte do movimento.

Na primeira noite de espectáculo, “Play and Play” promete proporcionar um serão mais “tradicional” que inclui um concerto para que as pessoas tenham um momento de descanso e para que possam, também, olhar para o “vocabulário do movimento, para a composição, para a forma e para as pequenas sintaxes que entram e saem do próprio movimento”, sublinhou.

Um espectáculo diferente

O segundo espectáculo da companhia tem lugar a 1 de Maio. “A Letter to My Mathew” é, de acordo com a também bailarina, um espectáculo muito diferente do da abertura. “É muito mais desafiante. Estávamos no processo de produção de uma trilogia em que a segunda parte era sobre o sobrinho de Bill T. Jones”, conta.

Do trabalho resultou uma peça em que os bailarinos assumiam várias funções, entre elas, a de actores. “Era uma coreografia com texto e que ia além da dança”. No entanto, quando convidada a ir a Paris em 2015, a companhia teria de apresentar uma coreografia sem palavras. “Apercebemo-nos que não podíamos fazer esta parte da trilogia e decidimos usar o material que estava dentro desta peça, tirar-lhe o texto e voltar a olhar para ela sob um outro ângulo.” As palavras deram lugar à expressão musical: “Fomos também à procura de música mais pop e mesmo do hip hop como vocabulário ao movimento”, esclareceu Janet Wong.

Se, por um lado, é uma peça mais desafiante, por outro, e muito devido à música que a acompanha, a directora artística pensa que é um espectáculo mais acessível, principalmente a um público mais jovem.

É também uma referência ao trabalho homónimo de James Baldwin publicado no New Yorker, numa altura em que os direitos humanos, as questões raciais e a violência policial eram assuntos quentes, apontou.

1 Mai 2017

Pequim pede fim dos exercícios militares americanos na Coreia do Sul

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China voltou ontem a pedir aos Estados Unidos para pararem com os exercícios militares na Coreia do Sul, num momento em que existe um agravamento do clima de tensão entre Washington e o regime norte-coreano.

“A continuação dos testes nucleares viola as resoluções da ONU, mas as manobras militares em redor da península [coreana] também não respeitam as resoluções da ONU”, declarou ontem o chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi, reiterando o apelo para o fim dos exercícios militares conjuntos dos exércitos americano e sul-coreano.

O ministro dos Negócios Estrangeiros chinês falava numa conferência de imprensa em Berlim após um encontro com o seu homólogo alemão, Sigmar Gabriel.

As autoridades de Seul anunciaram exercícios conjuntos com um porta-aviões americano que é aguardado em breve naquela região.

Washington mobilizou o porta-aviões nuclear USS Carl Vinson e respectiva escolta para a península coreana, onde deverá chegar até ao final da semana.

“O perigo que novos conflitos ecludam a qualquer momento é grande, é por essa razão que apelamos a todas as partes que mostrem sangue frio e evitem qualquer acção ou palavra que possa levar a novas provocações”, declarou Wang Yi na capital alemã.

Questionado sobre os riscos de um eventual conflito armado, o ministro chinês considerou que “mesmo um risco de 1% não pode ser tolerado” porque uma guerra teria consequências “inimagináveis”.

Pára tudo

Pequim tem defendido nas últimas semanas uma solução que tem por base a ideia “suspensão contra suspensão”, ou seja, o regime de Pyongyang deve interromper as suas actividades nucleares e balísticas e Washington deve parar com as manobras militares comuns com a Coreia do Sul, exercícios anuais considerados pela ‘vizinha’ Coreia do Norte como uma provocação.

Os Estados Unidos rejeitaram o plano chinês e voltaram a insistir que a China, um aliado tradicional de Pyongyang, pressione o regime norte-coreano, que tem intensificado os avisos e as ameaças a Washington. Responsáveis norte-americanos já avisaram que todas as opções, incluindo militares, estão “em cima da mesa”.

Pequim, que continua a defender que a solução da mútua suspensão é “a única opção viável”, desafiou Washington a avançar com “uma melhor proposta”.

Sobre a influência de Pequim sobre o regime norte-coreano, o ministro chinês afirmou em Berlim que é limitada.

“A Coreia do Norte é um Estado soberano e deve decidir por si mesmo se quer ou não parar com as suas actividades nucleares”, argumentou Wang Yi.

“Naturalmente, também acreditamos que estas actividades não são do interesse da Coreia do Norte”, acrescentou o ministro, sublinhando que Pyongyang justifica as suas acções com a “ameaça americana”.

1 Mai 2017

Pedro Alexandrino da Cunha preso pelos miguelistas

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o artigo da semana passada, deixamos o nosso biografado Pedro Alexandrino da Cunha, nascido em Outubro de 1801, já como alferes do Exército a trabalhar no Arquivo Militar, então com vinte anos. Encontrava-se o Rei D. João VI ainda refugiado no Brasil, quando em Portugal o movimento revolucionário de 1820 instalou as Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa a 26 de Janeiro de 1821, que veio suspender a Monarquia Absolutista, entrando o regime numa Monarquia Constitucional. Esse parlamento liberal tinha como principal tarefa elaborar uma Constituição escrita.

“A revolução de 1820 aconteceu numa Europa onde a memória da Revolução Francesa de 1789 e o revivalismo religioso tinham criado um ambiente pouco propício a revoluções. As grandes potências prometiam intervir em qualquer país onde fosse ameaçado o poder das dinastias (era o princípio da legitimidade). Por isso, no seu manifesto à Europa, os novos governantes em Lisboa tiveram o cuidado de adoptar um ponto de vista tradicionalista, semelhante ao dos liberais espanhóis. Explicaram assim que não os movia um filosofismo absurdo, desorganizador da humanidade, nem sequer o amor de uma liberdade ilimitada, inconciliável com a verdadeira felicidade do homem. O seu único objectivo era melhorar a forma do governo em Portugal através da restituição das suas antigas e salutares instituições, embora, claro está, corrigidas segundo as luzes do século e as circunstâncias políticas do mundo civilizado. Desejavam o poder limitado por leis sábias, e repudiavam a tirania, fosse ela exercida por um ou por muitos. Daí a revolução não ter vertido uma só gota de sangue”, como refere Rui Ramos.

Com a chegada de D. João VI a Lisboa, logo nesse dia 4 de Julho de 1821 o Rei jurou as bases da Constituição e substituiu a regência por um novo ministério. “E assim começou em Portugal o exercício efectivo da monarquia constitucional, onde o rei é chamado a desempenhar um novo papel e os cidadãos passam a poder intervir mais activamente, através dos seus representantes nas cortes”, segundo Isabel Nobre Vargues.

Com a monarquia em França restaurada desde 1814, após Napoleão Bonaparte (com o título de Imperador Napoleão I, 1804-1814) ser derrotado por uma força aliada de ingleses, russos, austríacos e prussianos, subiu ao trono o monarca Louis XVIII, da dinastia de Bourbon e preparou-se uma intervenção militar para restabelecer em Espanha o governo de Fernando VII, o que ocorreu a 7 de Abril de 1823 e a ocupação sem resistência de Madrid em 23 de Maio. Os liberais em Lisboa enviaram um regimento de Infantaria para a fronteira, mas este revoltou-se e logo em Vila Franca de Xira o infante D. Miguel a ele se juntou, incitando os portugueses a libertar o rei de umas Cortes que <em lugar dos primitivos direitos nacionais, deram-vos a sua ruína>. A 31 de Maio, o Rei D. João VI chegou a Vila Franca e demarcou-se do regime que segundo ele <tinha despedaçado o Brasil, provocado uma guerra civil e com o envio de tropas para Espanha iria levar o reino a ser invadido>. Segundo Joel Serrão, “Em 1823, a Vila-Francada põe termo, com surpreendente facilidade, à primeira fase do liberalismo português, ou seja, impede que a prática da Constituição de 1822 vá além de um breve estertor de moribundo. Regressa-se, oficialmente, ao Antigo Regime, que, aliás, não chegara a ser abalado nos seus sólidos fundamentos, mas pensa-se, pela primeira vez, na hipótese de uma carta constitucional capaz de apaziguar tensões e de evitar o pior, mediante um compromisso entre a tradição e a inovação considerada possível”. Foi então D. Miguel (1802-1866) promovido a comandante-chefe do exército.

Abrilada

“D. João VI desconfiava de D. Carlota Joaquina [sua esposa] e de D. Miguel, muito chegado à mãe. Por isso, em Maio de 1823, tentara inicialmente manter as Cortes, e só as abandonou quando isso lhe pareceu o único meio de retirar a iniciativa ao infante. Para a Inglaterra, que não queria ver Portugal outra vez na órbita de Madrid, e também para a França, desgostada com a dureza de Fernando VII, o infante e a sua mãe pareciam demasiado sintonizados com a corte espanhola. Finalmente, era preciso contar com todos aqueles que esperavam ainda uma reconciliação com o Brasil. Sendo o Brasil uma monarquia <liberal>, um Portugal <absolutista> poria fim a essa esperança”, segundo refere Rui Ramos.

Quando D. Miguel, como comandante-chefe do exército, a 30 de Abril de 1824 levantou os regimentos de Lisboa e tomou o poder, sequestrando o pai, o Rei D. João VI, num golpe que ficou conhecido por Abrilada, encontrava-se Pedro Alexandrino da Cunha a estudar na Academia da Marinha. Por ser um convicto liberal foi nesse mesmo dia preso com outros oficiais no Forte de Peniche.

Pela acção dos embaixadores, inglês e francês, foi o D. João VI, O Clemente, libertado e a bordo de um navio inglês, em 9 de Maio demitiu D. Miguel do comando do exército. Após esses nove dias na prisão, devido à perseguição miguelista, Pedro Alexandrino foi libertado e voltando à Academia, terminou o curso de Matemáticas, inscrevendo-se logo de seguida na Academia de Fortificação. Aí se encontrava quando em Julho de 1827 foi promovido a Tenente para o Regimento 13 de Infantaria.

Tinha já D. João VI falecido, o que ocorrera a 10 de Março de 1826 e o sucessor, seu filho D. Pedro, no Brasil outorgou a 29 de Abril desse ano a Carta Constitucional, que seguia o modelo francês de Luís XVIII. O então Imperador do Brasil D. Pedro I abdicou do trono de Portugal a favor da sua filha D. Maria II, mas, como esta ainda só tinha oito anos, numa tentativa de reconciliação entre absolutistas e liberais, nomeou D. Miguel para lugar-tenente e Regente do Reino. No entanto, para tal acontecer teria D. Miguel de aderir ao regime constitucional, o que aceitou e assim, pôde regressar da Áustria onde se encontrava exilado. Chegou a Lisboa em 26 de Fevereiro de 1828 e teve uma estrondosa recepção, com muito povo e sobretudo pelos seus partidários. De referir que, os absolutistas controlavam as áreas rurais, sendo apoiados pela aristocracia e camponeses, enquanto os liberais tinham a sua base numa parte significativa dos militares e na classe média a viver nas cidades, sobretudo no Porto e Lisboa.

D. Miguel, segundo filho de D. João VI, logo a 13 de Março de 1828 dissolveu a Câmara dos Deputados e a 3 de Maio convocou os três Estados, declarando nulo o juramento da Carta Constitucional. A eleição em Santarém dos Procuradores às Cortes ocorreu a 16 desse mês e estas, a 11 de Julho reconheciam D. Miguel como rei absoluto. A violência do regime contra os liberais levou por razões políticas a milhares de portugueses emigrarem.

Segundo Joel Serrão, “De 1828 a 1832, dentro e fora do País, tudo se encaminha para a guerra civil, e ela eclode com a instalação no Porto de um pequeno exército de exilados e soldados açorianos. É então que Mouzinho da Silveira lança na fogueira da confrontação nacional os seus decretos destinados a desmontar a estrutura do Antigo Regime e a alicerçar o Portugal renovado com que sonhavam os liberais moderados que se reuniam em torno de D. Pedro: um país europeizado mediante as práticas de deixai produzir, deixai circular”.

1 Mai 2017

Karadeniz | “A democracia também chegou ao assassínio por encomenda!”

(continuação)

Não sei como é que se consegue viver bem consigo mesmo depois de se fazer mal a alguém?! Eu arrasto a culpa por males que fiz, e nada que se compare com isso…

Tu não vives bem contigo, não é pelo mal que fizeste ou deixaste de fazer, Paulo! Tu não vives bem contigo, porque é essa a tua natureza. Tu e as pessoas como tu vivem num mundo paralelo: um mundo onde se julgam responsáveis pelo que acontece.

E não somos todos responsáveis pelo que acontece?

Não! O facto de eu ter sido um assassino profissional, aconteceu apenas porque era uma possibilidade de profissão como outra qualquer. Se ninguém pagasse tanto dinheiro pelos meus serviços, eu não teria tido a vida que tive. É o mesmo que hoje se passa com os cantores pop, as top model e os jogadores de futebol. Ainda muito antes das crianças saberem quem são, já querem vir a ser cantores ou jogadores de futebol, porque ganham muito dinheiro e são reconhecidos por toda a gente.

Porque é que nunca se falou de si, como por exemplo se falou do Chacal?

Muito simplesmente porque nunca cometi um erro sequer! Nunca cheguei a ser procurado, porque nunca cheguei a pisar os calos de quem não devia. O mesmo já não se pode dizer do Chacal, como sabemos. O problema dele, e que acabou por derrotá-lo, era a sua vaidade. Quando se anda nesta profissão, tem de se ter a consciência de que o mundo não pode saber de nós. Era como se tu escrevesses um livro magnífico, mas que ninguém o fosse ler; ou então um grande cantor que nunca quisesse cantar para ninguém.

É portanto uma profissão ao contrário deste nosso tempo, em que toda a gente quer ser reconhecida pelo mundo, nem que seja por cantar pior do que todos os outros!

Exactamente! (risos)

Nessa profissão em que se tem necessariamente de ser o melhor e de não se ser reconhecido (e quanto melhor, menos reconhecido), o Karadeniz conheceu ou soube de alguns colegas seus, cujos nomes não tenham chegado a público, ao contrário do Chacal?

Claro! O melhor de todos nós era provavelmente o Jesuíta! Um belga que havia passado pela Legião Estrangeira, na sua juventude, e que falava na perfeição imensas línguas. Teve, tal como eu, uma educação privilegiada. E há que ver uma coisa, Paulo: o Chacal não era um assassino profissional, mas um terrorista, e nunca foi meu contemporâneo. Abandonei a actividade em meados dos anos 60 e ele começou no início ou em meados de 70. De qualquer modo, repito, o Chacal era um terrorista, não um profissional.

Mas então qual é realmente a diferença? O que é que faz com que o Chacal tenha sido um terrorista e não um assassino profissional?!

Já te disse que o terrorista mata indiscriminadamente e, também, muitas das vezes por convicções, sejam elas políticas, religiosas ou nacionalistas. O assassino profissional mata apenas aquele por que foi pago, embora as coisas hoje já estejam muito diferentes do meu tempo!

Diferentes, como?

Para além de toda a tecnologia que existe e que não existia no meu tempo, hoje também há muita gente a matar por cinco tostões. Hoje já qualquer um é assassino profissional, tem trabalhos encomendados por dá cá aquela palha! A democracia também chegou ao assassínio por encomenda! Toda a gente, hoje, à menor dificuldade com alguém, paga para que se mate. Dantes não era assim, só se mandava matar gente importante! E isto faz com que seja muito difícil distinguir entre terroristas, arruaceiros e assassinos profissionais.

Mas continua a haver os verdadeiros assassinos profissionais, como o Karadeniz?

Julgo que sim! Até porque a queda do comunismo pôs muita gente especializada no desemprego, e nem todos se devem ter dedicado aos tráficos e às máfias. Por outro lado, continua a haver pessoas importantes que têm de ser mortas, sem que se corra o menor risco de ficar implicado, e não tenhamos quaisquer dúvidas que estes trabalhos só podem ser levados a cabo por quem saiba ser eficiente e discreto.

(continua)

1 Mai 2017

A luta para passar o camelo pelo buraco da agulha      

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]pós o Chefe do Executivo ter anunciado a data para a realização das eleições para a Assembleia Legislativa, a Comissão de Assuntos Eleitorais da AL entrou imediatamente em funções, tendo promovido recentemente uma série de sessões de esclarecimento sobre as suas funções e tarefas. Entretanto, no seguimento do início da actividade das Comissões de Candidatura, os candidatos à Assembleia têm multiplicado os esforços de propaganda para conquistarem o voto dos eleitores.

Na sessão da Assembleia da semana passada, que contou com a presença do Chefe do Executivo, constava da ordem de trabalhos a resposta a questões levantadas pelos deputados. Muitos dos representantes eleitos por voto directo não deixaram fugir esta oportunidade para darem voz às inquietações das populações. O entusiasmo que demonstraram pode ter sido motivado pela proximidade do acto eleitoral. Foi uma oportunidade de ouro para poderem criticar publicamente a ineficácia e o mau funcionamento do Governo, uma forma eficiente para conquistar a simpatia do público. Sempre que estamos em ano de eleições, o Governo da RAEM podia candidatar-se ao título de maior “fábrica de votos”. Os candidatos que quiserem alinhar com o Governo, têm sem dúvida mais hipóteses de ser eleitos.

Aparentemente as próximas eleições serão as mais competitivas de sempre. Os media vão tomando partido e nos últimos meses, para não dizer nos últimos anos, têm vindo a “fabricar” notícias para promover os seus favoritos, garantindo, no entanto, que os conteúdos das “notícias” não sejam de cariz publicitário nem promocional. Embora a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa tenha repetidamente apelado à auto-disciplina dos media, os grupos de comunicação social mais poderosos não vêem nestas recomendações força de lei e por isso elas acabam por ser ineficazes.

Uma cultura política evoluída tem de ter como primeiro objectivo o fim da corrupção. A última revisão da Lei Eleitoral concede poder à Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa para rejeitar candidatos que provadamente não apoiem a Lei Básica, mas não lhe concede poder para rejeitar candidatos ou grupos parlamentares que provadamente se envolvam em actos de corrupção eleitoral. Estes casos são, quando muito, encaminhados para os tribunais. Nas últimas eleições para a AL alguns casos identificados de corrupção foram levados aos tribunais. No entanto as decisões do juiz não influenciaram o resultado eleitoral, porque a corrupção nestas situações actua a diversos níveis e de forma a que seja muito difícil provar as ligações dos candidatos a estes esquemas menos limpos.

Sem uma supervisão adequada, que garanta o equilíbrio, é muito difícil realizar “eleições transparentes”. Independentemente da vontade dos agentes da lei a qualidade dos eleitores é outro factor que pesa bastante. Desde o regresso de Macau à soberania chinesa, as relações entre o Governo a as diversas Associações têm vindo progressivamente a estreitar-se. Numa cidade de 600.000 habitantes, existem 7.000 Associações registadas, facto que faz de Macau a “metrópole das associações”. Refém das relações entre as várias comunidades de interesses, a Administração fica dependente da cooperação entre as diferentes associações que, por seu lado, dependem do apoio do Governo. No quadro destas relações simbióticas, torna-se difícil identificar a corrupção eleitoral. Na altura das eleições, ou o Governo reforça a vigilância, ou as acções que se desenrolam ao abrigo das áreas mais nebulosas da lei vão continuar a acontecer. A última revisão da Lei Eleitoral, enfatiza o respeito pela lei em vez de enfatizar um forte empenho na identificação da corrupção eleitoral.

Perante um eleitorado dividido por interesses pessoais e um Governo incapaz de realizar uma verdadeira monitorização deste processo, ter eleições justas e independentes vai ser mais difícil do que passar um camelo pelo buraco da agulha. Mas os que acreditam num mundo melhor têm de continuar a lutar para que a cultura política de Macau possa progredir para um patamar superior.

1 Mai 2017

O sudoku

[dropcap style≠’circle’]1.[/dropcap] Já cansa a polémica em torno do Instituto Cultural e do relatório do Comissariado contra a Corrupção que deu conta de irregularidades no método de contratação de parte dos seus funcionários. Esta semana houve mais um episódio que ficou marcado por bastante falta de jeito para a comunicação e ainda uma maior falta de pudor por parte de quem presidente ao Instituto. Ontem, a tutela abriu mais um capítulo. Mas não é isso que me leva a escrever estas linhas.

Sendo defensora de iguais condições de trabalho para quem tem o mesmo trabalho, não consigo deixar de duvidar seriamente dos métodos de recrutamento centralizado que o Governo encontrou, apresentados como se tivessem apenas virtudes. Aplicam-se a todos da mesma forma e a justiça não é isso: é tratar o igual de modo igual, mas garantir que, para aquilo que é diferente, há uma solução diferente também.

A Administração tentou acabar com situações de injustiça junto dos seus funcionários. Muito bem. Criou concursos, inventou normas em nome da transparência e disto e daquilo. Numa cidade em que há demasiados primos e ainda um maior número de amigos, fica bem ao Governo tentar demonstrar que não existem favorecimentos de natureza familiar ou social.

Mas, ao criar regras demasiado rígidas no processo de contratação, a Administração corre o risco de não ser capaz de garantir que tem gente que dá conta do recado. O Instituto Cultural e os Serviços de Cartografia e Cadastro têm naturezas diferentes, funções diferentes e objectivos diferentes. Olhar para a função pública e achar que é tudo o mesmo é um enorme erro.

O Instituto Cultural vai perder em breve quase uma centena de pessoas. Presume-se – é o que nos dizem – que são pessoas que fazem falta para o normal funcionamento da entidade. Quem manda nela queixa-se de que não tem pessoal suficiente, que o trabalho aumentou muito nos últimos anos.

Vamos ver no que isto dá, mas é preciso começar a pensar que nem toda a Administração funciona das nove às seis, carimba os mesmos papéis todos os dias, lida com os mesmos assuntos todas as semanas. Há organizações dentro do edifício administrativo que não podem ser condicionadas pela burocracia extrema que alguém inventou – e muitos alimentam – em nome de um rigor que, quase sempre, não corresponde à verdade.

Independentemente da razão que o Comissariado contra a Corrupção tem em relação ao método de recrutamento dos trabalhadores que, nos próximos meses, vão ser corridos, o assunto já cansa. Curiosamente, morreu mais cedo a polémica em torno das recomendações feitas ao Ministério Público pela secretária para a Administração e Justiça, numa altura em que tinha já poder na cidade. Curiosamente, o assunto foi rapidamente esquecido. Um dia saberemos porquê.

2. Ainda a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa. Esta semana tivemos mais um episódio estranho protagonizado por esta estranha comissão que, em termos práticos, quer obrigar jornalistas a permanecer em silêncio durante o mês em que é proibida a propaganda eleitoral, quer obrigar os candidatos a fazerem reuniões e manifestações em surdina, quer obrigar as empresas de telecomunicações a apagarem comentários nas redes sociais que sejam entendidos como propaganda eleitoral.

De cada vez que a comissão faz tentativas de esclarecimento ou profere declarações sobre o que se pode ou não fazer, aumentam as minhas dúvidas sobre o verdadeiro papel do organismo. E aumentam as minhas dúvidas sobre o que deverei fazer no mês de Agosto.

Há um moralismo em quase tudo que dali vem: é o discurso ‘não é ilegal, mas não deve ser feito’. Em relação ao papel da comunicação social, deixam-se uns conselhos vagos sobre problemas concretos. Na vida de quem escreve todos os dias num jornal, estas dicas abstractas de como se ser bem comportado não me dizem nada. Só sei ler leis, nunca tive paciência para paternalismos.

A coisa será assim: dentro do período de proibição de propaganda eleitoral cabe a recta final – 15 dias – da actual legislatura. De acordo com a comissão liderada por Tong Hio Fong, juiz de profissão, não é suposto a comunicação social dar mais destaque a um candidato do que a outro e fazer apelos implícitos ao voto. Há deputados que são candidatos, muitos deles. Há candidatos que, enquanto deputados, vão dizer na Assembleia Legislativa, de forma implícita, que eles é que são bons. Os jornais vão dar mais destaque a um deputado-candidato do que a outro deputado-candidato, porque os jornais não fazem actas dos plenários – filtram o que entendem ser mais relevante. Os jornais estão tramados.

Assim sendo, resta perguntar à comissão o que prefere: que as páginas de Agosto normalmente reservadas a assuntos políticos sejam preenchidas com palavras cruzadas ou com problemas de sudoku. Sempre dá para os leitores passarem o tempo num Verão que se quer matar antes de ter nascido.

1 Mai 2017

Ivo Vital: “Macau é um bom sítio para começar carreira”

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] macaense e está de regresso à terra. Ivo Vital é aluno finalista do curso de Tradução de Chinês-Português e participa no programa de desenvolvimento de tradução automática do Instituto Politécnico de Macau enquanto estagiário.

Saiu de Macau aos nove anos, depois do ensino primário. As recordações de infância são muitas. Lembra-se de ser bilingue e de “falar quase tão bem português, como cantonês”. A razão, aponta, era o estar muitas vezes ao cuidado da avó materna que só sabia falar chinês. Os pais trabalhavam no Centro Hospitalar Conde de São Januário. Se, para a maioria, uma instituição de saúde é um lugar a evitar, para Ivo Vital equivalia ao recreio. “Era para lá que ia muitas vezes brincar com a minha irmã, fazíamos fisioterapia e íamos para a piscina de reabilitação”, recorda. “Tínhamos uma vida pacata, tínhamos muita liberdade e até ia de autocarro para a escola”, ilustra.

A saída de Macau não foi feita de ânimo leve e o agora regressado à terra não esconde a zanga que o acompanhou na juventude. “Cresci sempre com alguma raiva dentro de mim. Foi uma decisão dos meus pais e claro que foi para o meu bem e o da minha irmã. Mas, na altura, não compreendi isso”, explica o estudante.

A adaptação a Portugal não foi fácil e as diferenças que registou, e que associa ao facto de ainda ser criança, foram sentidas com intensidade. “Em Macau não me interessava, por exemplo, por marcas de roupa, em Portugal toda a gente ligava àquilo e eu não entendia. Outra coisa que me fez impressão foi o facto de se dizerem muitas asneiras, coisa a que não estava habituado.”

Os mil ofícios

No horizonte profissional tem agora a carreira de tradução, mas os projectos foram mudando ao longo do tempo. Desde pequeno que queria seguir carreira na Marinha, “queria ser oficial”.

A ideia de miúdo, recorda, começou pelo fascínio que sentia quando via imagens antigas, de militares do séc. XVIII. “Na altura gostava de ver aqueles retratos com os oficiais fardados, gostava do azul que vestiam e queria ser como eles”, diz.

Fez os testes para seguir o sonho de infância e passou com sucesso. Ingressou na Academia Militar, mas mal entrou percebeu que aquele não era o seu lugar. “Vi logo que aquilo não era para mim”, diz, sem hesitação, ao recordar o cerca de mês e meio que lá esteve. “Uma pessoa que acha que as praxes da universidade são violentas é porque não faz ideia do que acontece ali.” A desilusão foi inevitável. Aliado às tormentas do “recrutamento” estava todo um ambiente, sublinha, “marcado pelo racismo”. Acabou por desistir e entrar no curso de Protecção Civil.

Ao finalista de tradução nunca faltaram objectivos ou ocupações. Ivo Vital fez carreira no atletismo profissional. “Apareceu por acaso. Sabia que era rápido, mas nunca pensei que pudesse ter algum futuro ou que viesse a ser uma actividade especial.” Começou a treinar, foi progredindo e acabou por chegar ao Benfica e integrar a selecção nacional. Depois vieram as lesões e os condicionamentos.

Foi também no Benfica que passou por umas das experiências que, considera, mais o enriqueceram. “Havia um atleta invisual que precisava de um guia, acabei por ser eu”, conta. A situação pareceu-lhe duplamente benéfica: ajudava alguém e viajava.

Aliar estudos e trabalho com desporto parece nunca ter sido problema. Apesar de não se considerar um exemplo de organização, conseguiu conciliar as duas horas diárias de treino que tinha seis dias por semana. “Ocupava bastante tempo e, às vezes, só queremos descansar mas, de certa forma, era na prática desportiva que sentia que descansava: como tinha trabalhos focados mais no esforço intelectual, os treinos acabavam por representar uma espécie de relaxamento para a cabeça.”

Está agora em Macau para ficar. “As oportunidades parecem muitas com a necessidade de tradutores. Macau é um bom sítio para começar uma carreira, tem bons ordenados, tenho aqui família, dá para viajar nas redondezas”, remata.

1 Mai 2017

Filipinas recusam abordar disputas territoriais na cimeira da ASEAN

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Presidente das Filipinas afirmou ontem que não levantará o tema da disputa territorial com Pequim relativa ao Mar do Sul da China na cimeira do Sudeste Asiático, levando os seus críticos a acusá-lo de subserviência.

A cimeira da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) decorre até domingo em Manila, capital das Filipinas, e contará com a presença dos chefes de Governo e de Estado de países como Birmânia (Myanmar), Brunei, Camboja, Filipinas, Indonésia, Laos, Malásia, Singapura, Tailândia e Vietname.

As Filipinas obtiveram no ano passado uma vitória num tribunal arbitral, que não reconheceu como válidas as pretensões históricas de Pequim quanto a territórios disputados no Mar do Sul da China.

O Presidente Rodrigo Duterte afirmou ontem que a decisão arbitral é uma questão que apenas diz respeito às Filipinas e à China, não aos outros membros da ASEAN.

Os críticos de Duterte consideram que o Presidente filipino deveria abordar o tema na cimeira, para pressionar Pequim a aceitar a decisão e a reconhecer o Estado de Direito. Vários outros membros da ASEAN – o Brunei, a Malásia e o Vietname – disputam também com a China o direito ao arquipélago Spratly, entre outras ilhas, no Mar do Sul da China. As Ilhas Spratly são muito ricas em recursos energéticos.

Na agenda do encontro da ASEAN – que celebra o seu 50.º aniversário – estará a integração comercial do bloco asiático com as grandes economias do continente, como a China, o Japão e a Índia, como resposta à saída dos Estados Unidos do Acordo Transpacífico de Cooperação Económica (TPP, na sigla em inglês).

Trata-se da primeira cimeira da ASEAN desde que os Estados Unidos anunciaram a retirada em definitivo do TPP, a 23 de Janeiro último.

Esta sexta-feira haverá uma reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros e no sábado realiza-se a cimeira de chefes de Estado e de Governo.

Bloco de peso

A perda de peso do TPP (ao qual pertencem o Brunei, a Malásia, Singapura e Vietname) trouxe um novo fôlego político à iniciativa chamada Associação Económica Regional Integral (RCEP), criada pela ASEAN em 2012 e apoiada pela China.

Na prática, a RCEP seria um tratado de livre comércio entre a ASEAN, a Austrália, a China, a Coreia do Sul, a Índia, o Japão e a Nova Zelândia, que juntos representam aproximadamente 40% do PIB mundial e quase metade da população do planeta.

Só os dez países da ASEAN formam um bloco de 625 milhões de habitantes (mais do que os cerca de 500 milhões da União Europeia), que pretende chegar a um PIB conjunto de 4,7 mil milhões de dólares em 2020 e tornar-se na quarta potência económica mundial dentro de 15 anos.

O próximo encontro dos líderes do bloco regional realiza-se em Novembro, estando prevista a presença do Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

As Filipinas, país no qual estão activos vários grupos terroristas e rebeldes, rodeou a cimeira da ASEAN de fortes medidas de segurança, num dispositivo que inclui 41 mil polícias e militares, bem como corte de estradas e restrições no espaço aéreo.

1 Mai 2017

Concertação Social | Exigida maior representatividade do mercado laboral

A composição do Conselho Permanente de Concertação Social não é alterada desde 1987. Nas vésperas da celebração de mais um Dia do Trabalhador, algumas vozes defendem uma maior representatividade de sectores como o jogo ou a Função Pública, sem esquecer os trabalhadores não residentes

 

[dropcap style≠’circle’]“C[/dropcap]hoi Kam Fu nunca trabalhou no sector do jogo.” A frase de Cloee Chao, presidente da Associação Novo Macau para os Direitos dos Trabalhadores do Jogo, espelha bem algumas das opiniões sobre o funcionamento do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS). Choi Kam Fu é um dos dois representantes do sector laboral neste órgão, sendo director-geral da Associação Geral dos Funcionários das Empresas de Jogo.

“Ele não tem a sua própria experiência e sempre ouviu os casos das outras pessoas”, acrescentou Cloee Chao ao HM. “O CPCS pode ter mais representantes que trabalham realmente nos casinos ou nas associações ligadas ao sector”, disse ainda.

Por ocasião do 1.º de Maio, Dia do Trabalhador, que se celebra na próxima segunda-feira, há quem defenda que o CPCS precisa de uma alteração profunda na sua composição, que vá muito mais além do equilíbrio numérico existente entre patrões e empregados. Faltam acção e decisões concretas, e é também preciso levar pessoas novas que representem as mudanças ocorridas no tecido laboral e económico.

No que diz respeito ao jogo, Cloee Chao alerta para os direitos que continuam a não ser garantidos. “Este é um sector importante para a economia, mas os benefícios ainda são bastante reduzidos se compararmos com a Função Pública.”

“Há casos de trabalhadores despedidos e há uma lista negra nos casinos, pois quando um trabalhador é despedido é difícil arranjar trabalho ou então não vai além do período de experiência”, apontou. Além disso, “há algumas garantias na lei laboral, mas são apenas sugestões e não são obrigatórias”.

José Pereira Coutinho, na qualidade de presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), defende que os funcionários públicos devem estar representados, mas não só.

“Há falta de representatividade das forças laborais, e falo de áreas como a construção civil, o jogo, a Função Pública. Não há ninguém a falar da Função Pública no CPCS”, defendeu ao HM. “Na ausência de uma lei sindical e de negociação colectiva, isso é ainda mais grave”, acrescentou.

“O CPCS, tendo como base a Associação Geral dos Operários de Macau [a AGOM, representada por Lei Chan U], peca por deficiência de representação e de opiniões. A ATFPM tem dois deputados na AL [Pereira Coutinho e Leong Veng Chai] e não tem voz no CPCS, sendo que as nossas opiniões são distintas da maioria das opiniões da FAOM. É altura de o Governo rever toda a estrutura e aumentar a representatividade do CPCS”, apontou Coutinho.

Patrões do passado

Um dos representantes do patronato é, a par de António Chui Yuk Lam, Wang Sai Man, director-geral da Associação de Comerciantes Têxtil de Macau. Para o economista Albano Martins, este é um exemplo flagrante da necessidade de uma mudança.

“A indústria têxtil não tem qualquer representatividade. Os têxteis eram a indústria mais forte, representavam 85 por cento da exportação, mas hoje praticamente não existem. Haverá outros sectores da entidade patronal que poderiam estar representados”, observa.

Albano Martins defende a permanência da AGOM, por ser “uma associação muito forte”, mas aponta que é “preciso encontrar uma organização mais representativa em relação ao jogo”. Quanto à construção civil, não precisa de uma representação especial, frisa o economista. “Com [as obras] dos casinos a terminar, a construção civil vai perdendo cada vez mais trabalhadores, e vai tornar-se um sector que só é importante no imobiliário, mas não na construção em si.”

“Eu desagregaria um pouco mais, mas não se pode ir mais longe, para não distorcer o equilíbrio. Em Portugal temos um representante de cada associação, e aqui poderia fazer-se assim. [Poderia introduzir-se no CPCS] três ou quatro representações mas, do lado dos trabalhadores, teria de haver também as associações mais representativas”, defendeu.

Actualmente, o CPCS garante a igualdade em termos numéricos. O Governo está representado por dois membros (directores dos Serviços para os Assuntos Laborais e dos Serviços de Economia), tendo sido a única alteração feita à composição do CPCS, em 1999.

Tanto o patronato, como os trabalhadores têm uma comissão executiva com três membros. Estas comissões executivas são representadas por apenas dois membros cada.

Todos os membros da comissão executiva de trabalhadores pertencem à Federação das Associações dos Operários de Macau (onde se inclui a AGOM). Estes têm ainda ligações com outras associações do sector do jogo ou da construção.

Sim aos não residentes

Uma grande fatia da força trabalhadora, os não residentes, não está representada no CPCS. Dados estatísticos de Março deste ano apontam para a existência de mais de 170 mil trabalhadores não residentes (TNR), que trabalham sobretudo na construção civil, sector hoteleiro e como empregados domésticos.

Albano Martins concorda que o CPCS deveria olhar para os TNR, mas fala da dificuldade do processo. “É muito difícil isso acontecer. Se acontecesse, dificilmente não haveria represálias contra esses trabalhadores. As associações devem deixar de ser xenófobas e absorver as preocupações das classes trabalhadoras que não são residentes. O problema é que, em Macau, acha-se que só se devem defender os direitos dos trabalhadores locais, mas não são estes que criam riqueza”, aponta.

O economista garante ainda que a lei não está a ser cumprida quando se verifica que os TNR ganham muito menos do que os trabalhadores de Macau.

“Não deveria ser permitido que um TNR entre no mercado só para fazer baixar os salários. As empresas funcionam com trabalhadores competentes e não com pessoas que são empregadas pela força da sua cor e etnia. O CPCS deveria representar todos os trabalhadores sem fazer essa distinção. Claro que o Governo tem uma política clara, e eu concordo, desde que não haja residentes com as mesmas qualificações”, disse ainda.

Adeus ao CPCS

O jurista António Katchi vai mais longe ao classificar o CPCS como um meio para o Governo “sacudir a água do capote” em relação à tomada de decisões.

“Perante as reivindicações dos trabalhadores, mesmo quando estas são amplamente partilhadas na sociedade – como acontece, por exemplo, com a reivindicação do aumento da duração da licença de paternidade –, o Governo vai protelando o mais possível qualquer iniciativa legislativa destinada a satisfazê-las, alegando a falta de consenso social e, mais concretamente, a falta de consenso no CPSC.”

Para Katchi, “a falta de consenso no CPCS significa simplesmente isto: o patronato é contra, logo o Governo, inteiramente identificado com os interesses da classe capitalista, também só pode ser contra, mesmo que ostente uma postura neutral”.

Dessa forma, o jurista avança com uma espécie de ultimato que a classe laboral deveria adoptar. “A única resposta que os trabalhadores podem dar com alguma garantia de êxito, ainda que parcial, é a luta de classes, que pode tomar diversas formas, incluindo manifestações e greves. As associações representativas dos trabalhadores deveriam mesmo abandonar o CPCS.”

Governo deve liderar

Outra crítica apontada ao CPCS prende-se com a demora na chegada a um consenso e na tomada de decisões. A contribuição das empresas para o Fundo de Segurança Social foi disso exemplo, uma vez que a ausência de consenso, ao fim de vários anos de reunião, levou o Governo a fixar a contribuição em 90 patacas mensais.

Albano Martins fala, portanto, de uma falta de eficiência deste órgão, afirmando que o Executivo deve decidir quando surgem impasses.

“O CPCS não pode levar anos a discutir o salário mínimo, porque essa é a função do Governo, que deve ouvir o CPCS e decidir. Não havendo um compromisso, o Governo tem de fazer política económica e impor. A lei sindical deveria ser discutida e decidida [dentro desse sistema], em vez de estar a ser avançada a proposta por deputados sem o apoio da Assembleia Legislativa. O Governo aí teria uma função de apoiar, porque está na Lei Básica.”

“A eficiência de um organismo não se vê pelo número de reuniões que faz, mas pelo número de decisões que toma. O Governo tem de assumir o ónus de ser Governo”, acrescentou o economista.

27 Abr 2017

Código Penal | Alterações na fase final de análise na Assembleia Legislativa

Se não houver qualquer imprevisto, lá para meados de Maio deve estar terminado o trabalho da comissão permanente que estudou as alterações ao Código Penal sobre os crimes de natureza sexual. Depois de aprovada, a lei vai demorar dois meses a entrar em vigor, para que a população conheça os novos delitos

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] período entre a publicação das alterações ao Código Penal e a entrada em vigor da nova legislação foi dilatado para que possa ser feita uma adequada divulgação das normas sobre os crimes de natureza sexual. Assim, vão ser necessários dois meses para que passe a valer, a contar da data de publicação em Boletim Oficial.

Esta é uma das principais novidades anunciadas ontem por Cheang Chi Keong, presidente da 3.a Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL), que tem estado a analisar o diploma. O deputado avisou, no início do encontro com a comunicação social, que não tinha muito a dizer aos jornalistas. A última reunião do grupo de trabalho tinha sido em Fevereiro e, já na altura, todas as questões relacionadas com a intenção legislativa do Executivo tinham ficado resolvidas. Havia apenas aspectos técnicos para apurar.

De Fevereiro para cá, a assessoria da AL teve várias reuniões com os assessores do Governo que, de acordo com Cheang Chi Keong, se tem mostrado “muito atento ao trabalho”. As pretensões da comissão foram, de um modo geral, atendidas e o proponente “teve em consideração as preocupações dos deputados”.

Exemplo da flexibilidade demonstrada pelo Executivo é o facto de ter sido alterada a redacção do artigo referente à pornografia de menor, um novo crime que esta proposta de lei irá introduzir no ordenamento jurídico do território. Houve deputados que se mostraram preocupados com a possibilidade de um vírus informático, por exemplo, deixar em maus lençóis pessoas que recebam e divulguem conteúdos proibidos sem que fosse essa a sua intenção. Segundo o presidente da comissão, a nova redacção do artigo em causa vem garantir que essa apreensão não terá razão de ser.

Teoria da perfeição

Depois da reunião de ontem, falta agora o Governo entregar à AL a versão final da proposta de lei, para que a comissão possa elaborar o parecer e o articulado regresse ao plenário, para apreciação na especialidade. Cheang Chi Keong diz que não arrisca uma data, porque tudo depende da capacidade de resposta do Executivo, mas acredita que será possível concluir o trabalho em meados de Maio.

Apesar das promessas de concisão do presidente da comissão, Cheang Chi Keong teve tempo para recordar que, em causa, estão oito aspectos fundamentais dos crimes de natureza sexual, entre eles a introdução de três novos delitos. A importunação sexual é um deles e, assegura o deputado, “a norma exclui o piropo”.

Questionado sobre eventuais receios dos membros da comissão permanente em relação a este crime e à capacidade que o sistema judicial terá para lidar com ele na prática – uma vez que se trata de um tipo de delito cuja prova poderá ser difícil de fazer – Cheang Chi Keong não escondeu que “muitos deputados estão preocupados”. Mas “é natural”, desdramatizou, “porque é um crime novo”.

“Do ponto de vista da produção legislativa, todas as partes tentaram tornar o texto o mais perfeito possível. O articulado é muito claro em relação ao crime de importunação sexual”, garantiu o presidente da comissão permanente. “Temos de ver que há casos em que há a parte da produção legislativa e, depois, há a parte de execução por via judicial. Temos um sistema muito aperfeiçoado ao nível jurídico e judicial”, afiançou.

27 Abr 2017

Conselheiros das Comunidades Portuguesas reunidos em Lisboa

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] novo plano de acção, o registo automático dos portugueses no estrangeiro, o trabalho dos órgãos regionais e as questões da rede consular são alguns dos temas da reunião do Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP), que começou ontem em Lisboa.

O encontro decorre até sexta-feira, na Assembleia da República. O círculo da China, Macau e Hong Kong está representado por Rita Santos. A presidente do Conselho Regional da Ásia e Oceânia tem encontros agendados os secretários de Estado dos Assuntos Fiscais e do Ambiente. Durante a estadia em Lisboa, Rita Santos vai ainda estar com dirigentes da Caixa Geral de Aposentações e com um grupo de empresários de Portugal e de Macau.

Quanto à reunião do Conselho Permanente, será apresentado o plano de acção do CCP para 2017/2020 e a eleição da mesa directora do Conselho Permanente – actualmente presidido por Flávio Martins, conselheiro do Brasil –, entre outras actividades.

Será também avaliado o trabalho dos conselhos regionais do CCP, o registo automático dos portugueses na diáspora, as questões mais prementes sobre a rede consular, entre outros assuntos, como a aprovação da lei da nacionalidade, que permitirá a concessão da nacionalidade aos netos de portugueses.

O Conselho Permanente é órgão máximo do CCP entre reuniões plenárias e é composto por 12 membros eleitos pelos vários conselhos regionais em que o CCP se compõe: dois conselheiros de África, um da Ásia/Oceânia, dois da América do Norte, três da América Central e do Sul e quatro da Europa.

O CCP é o órgão consultivo do Governo para as políticas relativas às comunidades portuguesas no estrangeiro. Compete ao CCP, em geral, emitir pareceres, produzir informações e formular propostas e recomendações sobre as matérias que respeitem aos portugueses residentes no estrangeiro e ao desenvolvimento da presença portuguesa no mundo.

O CCP conta actualmente com 63 conselheiros, que são eleitos por círculos eleitorais correspondentes a países ou grupos de países por mandatos de quatro anos, por sufrágio universal, directo e secreto.

São eleitores do CCP os portugueses inscritos no posto consular português da respectiva área de residência que tenham completado 18 anos de idade até 60 dias antes de cada eleição do CCP. O CCP, além do Conselho Permanente e dos conselhos regionais, tem ainda três comissões temáticas.

A reunião do Conselho Permanente ocorre depois de já terem tido lugar as reuniões ordinárias anuais dos conselhos regionais.

27 Abr 2017

Eleições | Tong Hio Fong apela a que denúncias sejam dirigidas à comissão

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] presidente da Comissão dos Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL), Tong Hio Fong, após a reunião de ontem, fez saber à comunicação social que recebeu a queixa da plataforma dirigida por Jason Chao, mas que a investigação não pode prosseguir. A razão, apontou, é a ausência de informação. “Não foram verificados factos objectivos. Não há uma identificação do queixoso e só constatamos que existiu uma terceira pessoa que reflectiu esta voz”, disse.

A comissão considera que a carta recebida não é suficiente, “não são conhecidos factos concretos, as pessoas visadas nem as escolas envolvidas”, explicou o presidente.

Por outro lado, o responsável da CAEAL considera que se a população pretende denunciar situações irregulares deve recorrer aos mecanismos oficiais, nomeadamente à CAEAL e ao Comissariado Contra a Corrupção (CCAC),  que, considerou, têm os meios para recolher as queixas e proceder à investigação. Tong Hio Fong não entende porque é que os queixosos que se dirigiram a Jason Chao.

O presidente da comissão aproveitou a ocasião para apelar aos residentes para que, caso se apercebam de irregularidades no processo eleitoral, não hesitem e “relatem de imediato à comissão ou ao CCAC e não recorram a terceiras pessoas” , referindo-se ao caso denunciado à “Just Macau”.

No que respeita às quatro queixas até à data recebidas pela CAEAL, Tong Hio Fong não adianta o conteúdo.

Assuntos que não interessam

Já Jason Chao considera que a CAEAL está a tentar evitar proceder a acções no que respeita às queixas enviadas pela “Just Macau”. As declarações do agora responsável pela plataforma civil que pretende monitorizar o processo eleitoral surgem em reacção ao tratamento que foi dado às denuncias que a plataforma recebeu e direccionou para a comissão.

Jason Chao considera que o destino da queixa não é de estranhar. Para o ex- dirigente da Associação Novo Macau, o comissário do Comissariado contra a Corrupção (CCAC), André Cheong e Tong Hio Fong desconhecem a realidade. “A ignorância de André Cheong e do presidente da CAEL relativa a medos de retaliação não interessa para o assunto – uma alegada existência de coacção”, disse ao HM.

A denúncia feita a CAEAL pela “Just Macao” alertava para a existência de casos em que as escolas estão a apresentar aos seus professores e funcionários formulários de apoio a determinados candidatos às legislativas, agendadas para 17 de Setembro.

27 Abr 2017

Eleições | Instruções da CAEAL podem ser ilegais

 

As instruções da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa são, de acordo com Tong Hio Fong, para ser cumpridas por todos, sem excepção. Há pareceres do órgão legislativo da RAEM que indicam o contrário

 

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]ara o presidente da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) Tong Hio Fong, as instruções emitidas pelo organismo, que ditam regras a cumprir durante o processo eleitoral, são idênticas a leis e são para serem cumpridas por todos.

A ideia foi deixada ontem, no final de uma reunião da CAEAL, em que o presidente considerou que qualquer parecer em contrário não passa de uma mera opinião. “É a opinião de algumas pessoas, mas a comissão entende que a lei permite que tenhamos este tipo de instruções”, disse.

Tong Hio Fong observa que, na lei, não há uma referência concreta aos destinatários das instruções da CAEAL. “Não faz qualquer estipulação concreta”, sublinhou.

De acordo com o juiz que preside a comissão, instrução e lei confundem-se, ou seja, aquando do incumprimento das directrizes da comissão, a matéria em causa representa uma violação à própria lei e, como tal, segue os trâmites adequados, ou seja, a via judicial.

Tong Hio Fong é peremptório: as instruções são para todos, “não abrangem só os candidatos e, no dia das eleições, qualquer pessoa que as infrinja, infringe a lei”.

O presidente da CAEAL dá como exemplo a regra que obriga as operadoras de telecomunicações a eliminarem conteúdos relacionados com as candidaturas durante o período de proibição da propaganda eleitoral, para avisar que “as pessoas que fornecem estas plataformas ou as entidades que se recusam a apagar os conteúdos podem estar a infringir a lei, e incorrem em desobediência qualificada.” De acordo com o Código Penal de Macau, a desobediência qualificada pode ser punida com até dois anos de prisão.

Orientações pouco consensuais

Em entrevista ao HM, na semana passada, o constitucionalista Paulo Cardinal, com 25 anos de trabalho como assessor na Assembleia Legislativa (AL), alertava precisamente para o facto de existirem pelo menos dois pareceres da AL que chamam a atenção para a questão das instruções, “que não poderão vincular terceiros”. “São instruções que deverão apenas vincular os membros da CAEAL e os funcionários públicos que para ela trabalham, mas não vincularão candidatos e mandatários, e muito menos a comunicação social”, esclareceu o jurista.

Na mesma entrevista, Paulo Cardinal mostra ter “algum desconforto” em relação a certas opiniões veiculadas pela CAEAL, admitindo que poderá “haver alguma confusão” resultante do facto de a comissão eleitoral estar ainda a dar os primeiros passos. “É importante para Macau ter uma comissão eleitoral que se saiba pautar pelo escrupuloso cumprimento do princípio da legalidade”, defendeu ainda o constitucionalista.

Com as eleições marcadas para 17 de Setembro, e depois da aprovação, no ano passado, de uma nova lei eleitoral, a CAEAL tem vindo a emitir orientações, nem sempre consensuais.

Em particular, alertou os jornalistas para a possibilidade de a sua cobertura do processo eleitoral, fora do período de campanha – duas semanas antes da eleição –, ser considerada propaganda e, nesse sentido, ser punida.

Segundo a lei, a propaganda eleitoral consiste numa actividade que “dirige a atenção do público para um ou mais candidatos” ou “sugere, de forma expressa ou implícita, que os eleitores votem ou deixem de votar nesse candidato ou candidatos”.

A comissão não definiu o que é tido como sugestão “implícita”, dizendo apenas que “exige à comunicação social que tome medidas para não chamar a atenção do público (…) e sugerir aos eleitores que votem nalgumas listas”.

27 Abr 2017