Rui Flores PolíticaGuerras de propaganda [dropcap]N[/dropcap]ão se fala muito dele, não tem a visibilidade de um canal de televisão internacional como a BBC, a CNN ou mesmo a Russia Today, mas existe no serviço de acção externa da União Europeia (UE) um departamento que tem como função denunciar, contrariar e refutar a propaganda russa. Chama-se East StratCom Task Force – um nome que parece saído de um filme de espionagem, à boa maneira de James Bond. Imbuído de uma lógica que se assemelha à da Guerra Fria, produz duas newsletters por semana, Disinformation Digest e Disinformation Review, quer em inglês quer em russo, em que não apenas elenca aquelas que terão sido as notícias falsas da semana produzidas pela Rússia, como também reforça os pontos de vista da União sobre assuntos prementes. Esta semana, por exemplo, as publicações, distribuídas online, falavam da propaganda “desconstruída” em torno de Aleppo, e da campanha contra as ONGs em curso na Rússia. Como se viu durante a recente campanha eleitoral para a presidência dos Estados Unidos da América (EUA), as notícias falsas vieram para ficar. Abundam nas redes sociais; no Facebook, por exemplo. Recordo-me particularmente de uma, posta a circular há pouco mais de seis meses, que iria arrumar com as hipóteses de António Guterres ser eleito secretário-geral das Nações Unidas. Tratava-se da alegada apresentação da candidatura de uma mulher – tal como preconizava o ainda secretário-geral Ban Ki-moon –, diplomata filipina, que receberia o apoio de toda a Ásia (China incluída). O pior destas “notícias”, melhor seria se lhes chamássemos boatos, é que são partilhadas e comentadas, passando a fazer parte do conhecimento comum de muitos cidadãos. São alcandoradas ao estatuto de facto. Como a suposta notícia de que Donald Trump teria dito há duas décadas, que a ser candidato presidencial sê-lo-ia pelo partido republicano – “informação” que seria desmentida mais tarde. A generalização destes boatos veio tornar a vida dos jornalistas ainda mais difícil. São apenas os profissionais da comunicação social se vêem forçados a proceder à verificação de um número cada vez maior de alegados factos, como também vão ter de relatar amiúde a própria existência do boato. A divulgação de que ele corre nas redes sociais pode permitir uma melhor compreensão das narrativas que se pretendem fazer passar e da realidade que se procura construir, isto sem se ter a certeza sobre quem está por detrás do processo, cuja origem é quase sempre impossível de determinar. Mais: os governos passaram a acusar-se uns aos outros – particularmente os Estados Unidos e a Europa, de um lado, e a Rússia, do outro – de “assaltos” informáticos e de ataques cibernéticos, com o objectivo claro de destruir a “imagem” do inimigo. É como se o Muro de Berlim não tivesse vindo abaixo. Contrariar a lógica de quem quer danificar a imagem de políticos da UE e afectar os valores que são tradicionalmente comuns a uma maioria dos Estados-membros não é uma tarefa fácil. Os ataques cibernéticos que se sucedem um pouco por todo o lado contribuem para ajudar a construir um inimigo – o que facilita a explicação da derrota. Foi assim nos EUA, tem sido assim nos países que se preparam para eleições em 2017, como a Alemanha, a França e a Holanda. É como se o Muro de Berlim não tivesse vindo abaixo Angela Merkel, por exemplo, disse há dias que vamos todos ter de nos habituar “a vi- ver com eles”. E são quase impossíveis de confirmar de uma forma independente. Os jornalistas limitam-se a citar os porta-vozes dos governos que acusam outros da autoria de roubo de informação e da autoria de notícias falsas. De serem criminosos, portanto. Os governos passaram a acusar-se uns aos outros de “assaltos” informáticos com o objectivo claro de destruir a “imagem” do inimigo. Foi assim no rescaldo das eleições nos EUA, em que as autoridades norte-americanas apontaram o dedo à Rússia de Putin de ter estado na origem do furto de informação ao responsável pela campanha eleitoral de Hillary Clinton à presidência dos EUA, John Podesta. Sublinhe-se Putin, pois a acusação dos serviços secretos norte-americanos foi clara: um ataque desta ordem não poderia ter sido feito sem uma ordem expressa do Kremlin. Dada a incapacidade de a comunicação social provar a fiabilidade das afirmações postas a circular pelos governos – saber-se-á alguma vez se foi Putin quem ordenou o ataque ou se a fuga dos e-mails da campanha de Clinton, divulgados pelo Wikileaks, partiu de dentro da própria estrutura de apoio à antiga secretaria de Estado? –, esta nova guerra torna impossível ao cidadão comum acreditar no quer que seja. É como se de repente tivéssemos passado a viver num mundo de realidades paralelas, saltando de uma para outra ao ritmo do zapping televisivo ou dos sítios que frequentamos na internet. Saúda-se naturalmente a liberdade de escolha, a liberdade de informação. O problema é que a informação nunca foi pura nem foi nunca totalmente objectiva. A informação sempre foi e sempre será enformada por quem a produz e obedece a uma lógica que escapa, em muitos casos, quer ao jornalista quer ao leitor. É como se o trabalho jornalístico estivesse ferido de morte. Parece que os tempos em que era possível acreditar num ou noutro jornalista fazem já parte da história. Há muitos anos, o relato independente do jornalista em cenário de guerra era essencial para se ter uma visão menos contaminada do que se estava a passar. Agora, acreditar que é possível acreditar não ajuda muito, pois torna-nos em simples receptores de informação, como se o processo comunicacional se resumisse à administração de um vacina, na sequência da qual passássemos todos a pensar o mesmo. Este estado de coisas aproveita a quem? Numa primeira leitura, a Putin. Ao pôr em evidência os podres da democracia “ocidental”, o Presidente russo estaria não apenas a vingar-se pela divulgação dos Panama Papers, que, ao porem em evidência o modo de funcionar dos oligarcas russos, terão sido percepcionados no Kremlin como um ataque proveniente de Washington, mas também a sublinhar uma equivalência moral entre o “ocidente” e a Rússia. Todo este caldo de cultura – a incerteza, as instituições frágeis – seria o enquadramento perfeito para justificar uma liderança autoritária do tipo da de Putin. Mas esta é apenas a leitura que é feita por alguns analistas “ocidentais”
Sérgio Fonseca Desporto Grande Prémio de MacauTCR China anuncia corrida no Grande Prémio de Macau [dropcap]N[/dropcap]o passado domingo, na Exposição da Indústria de Desportos Motorizados em Xangai, foi apresentado o campeonato de carros de turismo TCR China Series que, antecipando-se à Comissão Organizadora do Grade Prémio de Macau, anunciou uma corrida para o Circuito da Guia em Novembro do próximo ano. A China segue as pisadas de outros países, como a Alemanha, Itália, Portugal ou Espanha, ou regiões, como o Benelux e Ásia, e terá o seu próprio campeonato que segue o regulamento técnico de sucesso do TCR International Series. A organização do TCR China estará a cargo da empresa Shanghai Lisheng Racing Co. Ltd, que pertence ao empresário Xia Qing, o promotor do influente Campeonato Chinês de Carros de Turismo (CTCC). Marcello Lotti, o pai do conceito TCR, esteve em Xangai a abençoar a iniciativa, agradecendo à “Shanghai Lisheng Racing por concretizar uma ideia que juntos vínhamos a perseguir há dois anos”. O calendário do TCR Asia, que arranca em Ordos, na Mongólia Interior, conta com dois eventos em Zhejiang, um deles com concomitância com o TCR Asia Series e outro com o TCR International Series, um evento no circuito de Fórmula 1 de Xangai e por uma corrida de resistência de 12 horas em Zhaoqing. Isto, para além da prova de Macau. Corrida na RAEM? “Uma corrida extra campeonato e por convite será realizada em Macau”, diz o comunicado da organização do TCR China. Fontes ouvidas pelo HM clarificaram que esta corrida não se “trata de certeza da Corrida da Guia”. A Shanghai Lisheng Racing, que goza de relações privilegiadas com a federação chinesa de desportos motorizados, conhece bem Macau, tendo nos últimos três anos colocado o seu troféu monomarca “Taça da Corrida Chinesa” no programa do Grande Prémio. Sobre qual corrida se trata, fonte próxima da organização do campeonato disse ao HM que “haverá um anúncio com informação mais tarde”. Na apresentação de domingo os únicos detalhes conhecidos foram que a prova terá um treino-livre, uma qualificação e uma corrida de 60 km. Caso se materialize, esta corrida ou irá substituir uma das corridas do programa ou será uma prova adicionada ao programa, cenário pouco provável dado o congestionamento actual do programa do evento, como foi patente na última edição. Legado na região Após dois anos a dar corpo à Corrida da Guia, o TCR International Series abandonará o Grande Prémio de Macau em 2017, abrindo espaço ao regresso do Campeonato do Mundo FIA de Turismos (WTCC). Contudo, Marcello Lotti, ex-CEO do WTCC, vê com bons olhos a continuidade do seu conceito que criou em qualquer uma das corridas de carros de turismo que enchem o programa do fim-de-semana prolongado do Grande Prémio. “Eu acho que o TCR encaixava perfeitamente”, disse Lotti ao HM durante o evento do passado mês de Novembro. “Se virmos quantos pilotos e equipas de Macau e Hong Kong já compraram carros da categoria TCR para correr no TCR Asia Series e noutros campeonatos locais, temos a resposta. De facto, 30% dos nossos concorrentes este ano na Corrida da Guia eram de Hong Kong ou Macau”.
Sofia Margarida Mota China / Ásia PolíticaVeículos de Macau já podem circular na Ilha da Montanha Os veículos de Macau já podem andar na Ilha da Montanha. A ligação foi oficialmente aberta ontem e contou com a presença de Wong Sio Chak. O secretário frisou que a cooperação com os vizinhos está ainda no início, mas é já um marco na promoção da competitividade regional [dropcap]F[/dropcap]ontem oficialmente aberto o acesso de veículos de Macau à Ilha da Montanha. A cerimónia, que coincidiu com a comemoração do 17.º aniversário da transferência de administração, teve como representante oficial do Governo da RAEM o secretário para a Segurança. Para Wong Sio Chak, foi “uma medida muito bem ponderada”. A abertura da ligação rodoviária entre as duas zonas está ainda na primeira fase. O secretário explicou que poderão existir mais etapas dependendo dos trabalhos que venham a ser feitos no aperfeiçoamento da ligação. E a China aqui mais perto O reforço da cooperação regional e o alcance de uma melhor ligação com os mercados do Interior da China e internacionais foram alguns dos aspectos sublinhados pelo governante na cerimónia da entrada em circulação de veículos de Macau na Ilha da Montanha. O objectivo, reiterou, “é a ampliação de espaço de Macau, o fortalecimento de sinergias para o seu desenvolvimento e a promoção de uma diversificação moderada da economia local”. A abertura à circulação de veículos de Macau para este território da China Continental é fruto do incremento do mecanismo de cooperação entre a província de Guangdong, a cidade de Zhuhai e a RAEM. A ideia é promover “uma nova zona económica de classe mundial e uma comunidade com uma qualidade de vida elevada”. DEVAGAR SE VAI AO LONGE Se para já a medida é tomada com cautela, o objectivo das próximas fases tem objectivos mais alargados. “Acreditamos que, no futuro, esta liberdade de circulação facilitará o intercâmbio das populações de ambos os territórios, aperfeiçoando a aquisição de recursos para o desenvolvimento regional, promovendo a cooperação de complementaridade de Guangdong- -Macau, principalmente na economia de Zhuhai-Macau”, referiu o secretário. Em causa está o desejo de consolidar a cooperação, capacidade e competitividade regionais. A ideia é promover “uma nova zona económica de classe mundial e uma comunidade com uma qualidade de vida elevada”, diz Wong Sio Chak Para já, nem todos os veículos com matrícula de Macau vão poder circular livremente na Ilha da Montanha – têm de ter permissão das autoridades. Wong Sio Chak promete novidades para breve, sabendo-se já que o processo se vai desenrolar em diferentes fases e que terão prioridade condutores com ligações a Hengqin.
Sofia Margarida Mota PolíticaAniversário da RAEM | Cooperação com o Continente marca discurso de Chui Sai On Foram palavras viradas para Norte, com o Chefe do Executivo a defender a importância de Macau desempenhar o papel de plataforma de acordo com as políticas nacionais e a ideia “Uma faixa, uma rota”. Para os de cá, o líder do Governo deixou promessas de bem-estar Um bom lar na Grande China [dropcap]S[/dropcap]olidificar Macau enquanto plataforma de acordo com o projecto “Uma faixa, uma rota” foi a ideia que marcou a intervenção de Chui Sai On na celebração oficial do 17.º Aniversário da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM). O objectivo, sublinhou o Chefe do Executivo, é responder “às necessidades nacionais e às vantagens específicas de Macau”. Na cerimónia que decorreu na manhã de ontem na Torre de Macau, Chui Sai On salientou que o território está em fase de ajustamento económico, sendo que as perspectivas locais são encaradas com cautela. “Apesar das previsões para 2017 apontarem muitas incertezas na economia mundial, continuamos a encarar com optimismo cauteloso a perspectiva do desenvolvimento económico de Macau. Acre- ditamos que, no próximo ano, a economia local terá um desenvolvimento estável, e estamos confiantes de que será alcançado um crescimento positivo”, afirmou o líder do Governo. Para desenvolver acções que façam convergir as políticas nacionais e as particularidades de Macau, Chui Sai On fez referência ao primeiro plano quinquenal do território. Com a iniciativa pretende-se, “através de um planeamento de alto nível, projectar o quadro-geral do desenvolvimento socio-económico local para os próximos cinco anos e serve de orientação para o desenvolvimento nos próximos tempos”, disse. O discurso não passou sem menção à recente visita do primeiro-ministro, Li Keqiang, no âmbito da V Conferência Ministerial do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. Chui Sai On optou por destacar “a cooperação absoluta” com a China Continental. “Iremos, de acordo com as necessidades do nosso país e com as vantagens específicas de Macau, articular estreitamente a construção do princípio “Um centro, uma plataforma” com a construção da “Uma faixa, uma rota”, apontou o Chefe do Executivo. Chui Sai On não deixou de sublinhar que o bem-estar da população é a sua maior prioridade: “O desenvolvimento de iniciativas relacionadas [com a população] tem sido, desde sempre, uma das nossas prioridades governativas”. O Chefe do Executivo sublinhou que vão continuar a ser feitos trabalhos “em benefício do bem-estar dos cidadãos, aperfeiçoando os diversos regimes, coordenando o planeamento urbano e a construção urbana, e atenuando os problemas quotidianos com que os cidadãos se deparam, designadamente o trânsito e a habitação, de forma a elevar o reconhecimento social de que Macau é um bom lar”. PEREIRA COUTINHO FLEXIBILIZAR PARA CIRCULAR “É um discurso de ocasião e virado para o futuro”, reagiu o deputado Pereira Coutinho ao HM após a cerimónia de celebração do 17.o aniversário da RAEM. Para Pereira Coutinho, “é evidente que a integração de Macau na China Continental é extremamente importante”. O início da circulação de carros entre Macau e a Ilha da Montanha é uma medida muito significativa para o deputado, no sentido do território “se virar mais para o exterior”. Pereira Coutinho não deixou de reiterar a importância que o Governo deve dar à função pública, às questões relacionadas com a saúde e com o trânsito, tendo em conta as obras que estão a ser feitas em Macau. As medidas anunciadas na passada segunda-feira, para atenuar dos trabalhos nas vias são, para o deputado, insuficientes: “Não acredito que deixem de criar complicações e transtornos na vida das pessoas”. Para o deputado, a solução passa por investir em soluções de transporte entre Macau e o Continente. “Há muita gente a viver no interior da China e há muita gente que vem para Macau diariamente, portanto, há que flexibilizar a deslocação das pessoas. A livre circulação entre Macau e zonas do interior da China poderia atenuar a sobrecarga de trânsito local”, concluiu. RITA SANTOS PORTUGUÊS ACIMA DE TUDO Para Rita Santos, foi fundamental a referência do Chefe do Executivo à presença de Li Keqiang em Macau e às medidas que o Governo Central apontou para o território. “Entre essas medidas o meu grande desejo é que a nossa língua portuguesa seja utilizada plenamente”, disse ao HM. “Quando os nossos visitantes de língua portuguesa chegarem a Macau, o primeiro contacto a terem num táxi, por exemplo, deveria ser em português e respondido pelo condutor na mesma língua”, ilustrou a presidente da assembleia-geral da Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau. As medidas a serem tomadas devem começar no ensino nos jardins-de-infância para que todas as crianças possam ter um contacto diário com a língua. Rita Santos justi ca a pertinência deste ensino com o alargamento de oportunidades de emprego e com o facto de, através da língua portuguesa, as pessoas poderem vir a ter mais facilidade em aprender outros idiomas. Rita Santos mostrou-se ainda preocupada com as dificuldades sentidas pela população na questão da habitação, uma vez que os preços continuam “impossíveis”.
João Luz Manchete SociedadeNatal | Ser solidário na RAEM O Natal é a época do ano dedicada à família, à troca de prendas, às mesas cheias de iguarias. Em Macau, apesar do pleno emprego e do vigoroso crescimento económico, há quem passe por dificuldades nesta quadra festiva. O HM ouviu algumas organizações que acodem a quem mais precisa O próprio conceito de acção social evoluiu, “deixou de ser a esmola que se dava ao pobre”, explica António José de Freitas, provedor da Santa Casa da Misericórdia [dropcap]D[/dropcap]ar e receber são dois verbos que dominam a quadra natalícia. Ao mesmo tempo é também a época do ano em que mais se sente a falta da proximidade da família e de uma consoada abundante. Macau vive numa bolha de prosperidade que relativiza o conceito de solidariedade. O provedor da Santa Casa da Misericórdia de Macau, António José de Freitas, explica que como “a sociedade de Macau evoluiu muito, e como aqui a população é mais feliz, os benefícios sociais são vários”. O próprio conceito de acção social evoluiu, “deixou de ser a esmola que se dava ao pobre e cresceu para algo mais abrangente em termos de prestação de serviços”, explica. Ainda assim, existem pessoas em situações difíceis que recorrem aos serviços da Santa Casa para colmatar situações de carência. Foi nessa perspectiva que a instituição iniciou há quatro anos o projecto da distribuição de cabazes, de modo a ajudar famílias com baixos rendimentos. Apesar de trabalharem, ficaram numa situação precária com a subida do custo de vida, normalmente aliada a outras circunstâncias difíceis. “O projecto de distribuição de cabazes visa sobretudo apoiar famílias que têm em casa idosos doentes, famílias monoparentais, com crianças deficientes, ou idosos que vivem sozinhos e desamparados”, revela o provedor. Este é um tipo de pobreza escondida. António José de Freitas chama- -lhes agregados sanduíche, para designar os que recebem um pouco mais do limite que dá direito aos benefícios sociais do Instituto de Acção Social, ou outro apoio do Governo local. Apesar das dezenas de pedidos de auxílio que a Santa Casa recebe, a instituição não tem capacidade logística para fazer a triagem. É aí que entram em acção as associações dos Operários e dos Moradores, que submetem os pedidos de ajuda. De momento, o projecto dos cabazes apoia mensalmente cerca de 350 famílias. Neste âmbito, o provedor adianta que prestam auxílio a “um par de portugueses, mas a vastíssima maioria são chineses”. Facto que não é de estranhar, visto que a população de Macau é maioritariamente chinesa. No entanto, “a Santa Casa faz bem sem olhar a quem”, um princípio basilar da instituição nos quase 500 anos de acção no território. “Não interessa a nacionalidade, o credo ou a raça”, remata António Freitas. CONSOADA ATRÁS DAS GRADES Neste momento, o Estabelecimento Prisional de Macau tem dez reclusos portugueses, um número que cresceu nos últimos tempos, principalmente por processos li- gados a estupefacientes. Apesar de estarem privados da liberdade, não estão esquecidos. Recentemente, os reclusos portugueses tiveram uma visita especial de representantes da Casa de Portugal em Macau. Um serviço que também é prestado pelo Consulado-Geral de Portugal na região. Além do calor humano, os serviços diplomáticos costumam levar os sabores que, normalmente, animam uma consoada portuguesa. Levar prendas de Natal pode ser mais complicado, “porque [os reclusos] têm uma limitação de bens pessoais a possuir dentro de uma cadeia”, explica Ricardo Silva, chanceler do consulado. “Quando levamos uma prenda isso significa que têm de retirar algo que lhes pertence para fazerem a troca”, completa. “Vieram-me lágrimas aos olhos na primeira vez que fui [à prisão], sensibilizou-me ver aquela satisfação ao matar a saudade da comida portuguesa.” ISABEL DIAS, COORDENADORA DO SERVIÇO SOCIAL DO CONSULADO No entanto, a melhor prenda é o calor humano. Quando um familiar se encontra com um recluso, a comunicação faz-se através de um vidro e um telefone, sem contacto. As visitas pela via diplomática obedecem a outras regras. “Temos uma sala especial aberta, onde posso dar um abraço, cumprimentar com um beijinho. É diferente, eu passo um calor, posso dar apoio moral.” As palavras são de Isabel Dias, coordenadora do serviço social do consulado. É um trabalho duro emocionalmente, “alguns reclusos choram nas primeiras visitas”, confessa. A funcionária da casa diplomática adianta que ela própria por vezes se emociona. “Vieram-me lágrimas aos olhos na primeira vez que lá fui, sensibilizou-me ver aquela satisfação ao matar a saudade da comida portuguesa”, conta. Devido a uma odisseia burocrática, e à falta de recursos humanos do consulado, a festa de Natal acontecerá em Janeiro. Além dos afectos, estarão na ementa pastéis de bacalhau, rissóis, bolos e bebidas. PRENDA AFECTIVA Mas mesmo em liberdade a vida pode construir muros em redor do indivíduo. A migração é um factor de vulnerabilidade, terra nova, língua diferente e uma ideia errada de El Dorado podem ser a receita para o desastre. Há dois, três anos, ocorreram alguns casos de portugueses que vieram para Macau seduzidos pela fantasia da “árvore das patacas” e que acabaram a viver na rua. Isabel Dias explica que, mesmo com habilitações e domínio do chinês, “conseguir um BIR não é fácil, estabilizar a vida ca mais complicado”. Neste momento existe apenas uma pessoa em situação de carência e a receber auxílio. Trata-se de um homem de idade avançada que não consegue encontrar emprego, mas como tem BIR recebe subsídio de velhice pelo Governo local. Este fundo é atribuído a quem comprove que não tem capacidade para sobreviver, ou por motivo de doença, ou por não ter rede de apoio familiar. É o caso que o departamento de serviço social do consulado tem em mãos, tendo sido pedido um apoio ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. A terceira idade é, por excelência, uma fase da vida dada à vulnerabilidade. É neste âmbito que a Associação dos Aposentados de Macau (APOMAC) desenvolve a acção, principalmente nesta altura do ano. Com um serviço de apoio ao domicílio, e no espírito da época, as visitas têm sempre uma atenção especial. “Não vamos de mãos a abanar, há sempre uma prenda, seja um agasalho, uma peça de roupa, biscoitos, todos os anos levamos sempre algo diferente”, conta Jorge Fão, presidente da Assembleia-Geral da APOMAC. A instituição fornece consultas médicas em casa de quem precisa, sempre dentro das possibilidades que os recursos limitados permitem. “Temos um espaço exíguo e funcionamos mais como um centro comunitário de apoio à terceira idade”, explica Fão. Neste caso, as maiores carências são de saúde e isolamento, porque nem sempre os familiares conseguem fazer um trabalho de acompanhamento permanente. Diz o antigo deputado que são casos dramáticos: “Sem a APOMAC estas pessoas viveriam situações de apuros”. “Ouvimos as pessoas, temos uma conversa frente a frente, mostramos simpatia e, com todo o carinho, procuramos acalmar as angústias dos idosos.” JORGE FÃO, PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA-GERAL DA APOMAC A associação tem cerca de 1000 associados e, com os recursos disponíveis, as rondas domiciliárias de Natal começam logo em Outubro. “Em cada semana temos três dias de visitas, durante os quais vemos o maior número de associados que conseguimos. Ouvimos as pessoas, temos uma conversa frente a frente, mostramos simpatia e, com todo o carinho, procuramos acalmar as angústias dos idosos”, explica Jorge Fão. O dirigente salienta ainda que é necessária paixão, ou já teria abando- nado a associação, até porque não é pêra doce e é uma actividade muito exigente. Mas o mais importante é meter mãos à obra e resolver os problemas das pessoas, tanto pode ser numa deslocação ao hospital, no cuidado médico, ou mesmo ao dar um abraço. Ajudar quem mais precisa, humanizar quem sofre. Seja um idoso acamado, um recluso desterrado, ou um trabalhador a braços com uma situação que lhe tire o tapete debaixo dos pés. Quem aquece um coração também recebe algo de volta. Não é, portanto, de estranhar que Isabel Dias tenha cado amiga de algumas pessoas que ajudou nos momentos mais difíceis. Este é o espírito de Natal em acção.
João Paulo Cotrim PolíticaLíngua suja FACEBOOK, LISBOA, 13 DEZEMBRO [dropcap]N[/dropcap]os terrenos da minha infância cresciam unas ervas esguias com tons de primavera e sabores invernosos. Depois das corridas e outras ocupações suadas, espremíamos o seu suco entre dentes. A sabedoria científica do bairro chamava-lhe azedas, mas a palavra não contém o arco-íris de sabores agridoces. Este poema-raio da Rita Taborda Duarte, que espremi, entre afazeres, soube-me a azeda. E fez chorar um gajo que nunca será mãe, e dificilmente será mulher, também pela razão simples de que tem saudades de filhos que não chegou a parir. «QUANDO A MULHER SE TRANSFORMOU MÃE // As mães,/ azedas,/ transformam em leite/ tudo aquilo em que tocaram e/ aflitas / escavam uma cova funda no coração do útero.// Todos os meses têm mênstruos férteis/ e povoam o mundo com as saudades / dos lhos/ que não chegaram/ a parir// Só depois/ puxam como Arianes loucas/ o cordão dos lhos entrançado/ na meada da infância/ – dobam-no até à raiz do tempo –/ e guardam no ventre desabitado/ o novelo de uma imensa solidão» EL CORTE INGLÉS, LISBOA, 13 DEZEMBRO Mais uma sala cheia para ouvir Helder Macedo lançar preciosas pistas de navegação no alteroso oceano que é a obra de Shakespeare. Outro espectáculo subtil da inteligência, não apenas na análise das quatro obras, centrada em um conceito (culpa, em Hamlet; nada, para Rei Lear; traição, em Otelo; bond, i.e., vínculo, título de dívida, e mais…, para O Mercador de Veneza), mas nas múltiplas articulações com os nossos dias. Interessa-me, aqui e para já, cometer a inconfidência da conversa ajantarada e avantajada. O Helder foi Secretário de Estado da Cultura de uma breve e exaltante experiência de governação, capitaneada pela carismática e saudosa Maria de Lurdes Pintasilgo, nos finais de 1970. Isso, de par com a sua posterior candidatura à Presidência da República, marcou o fim da minha infância, de complexa e azeda maneira. Tê-lo, à mesa, a testemunhar de um tempo que fez um nó no tempo, derrubou as paredes da sala e colocou-nos, também ao José Anjos e à Susana Santos, no meio de um filme, misto de Buñuel com Pasolini e pitada de Fellini. Muito do que agora se dá por adquirido na cultura de Estado, apesar das ameaças constantes, teve então gestos primordiais, que valia a pena revisitar. Como esse estranho episódio de interrupção da democracia por razões técnicas à maneira do canal único de televisão, cometido pelo governo que se lhe seguiu, liderado por Sá Carneiro, com Vasco Pulido Valente no lugar de SEC e onde surge – nas Finanças, claro! – a sombria figura de Cavaco: cada uma das medidas tomadas pelo governo Pintassilgo foram suspensas, nalguns casos até ao nível do despacho. Um deles autorizava a resolução de problema eléctrico no Museu de Arte Popular, que acabou por estar na origem do célebre incêndio que destruiu preciosa obra colectiva (Vieira da Silva, Pomar, João Vieira, entre muitos outros), na qual se celebrava o primeiro aniversário da revolução. Shakespeare, sempre tão próximo. PASSEVITE, LISBOA, 17 DEZEMBRO A polémica que por aqui lavra confirma o peso das palavras. O Ricardo Araújo Pereira disse que hoje seria difícil hoje fazer uma velha rábula com «anões, coxos e mariconços», que incluía também vesgos, fanhosos e atrasados mentais. A provar que tinha razão, explodiu uma troca de argumentos muito interessante. Ou quase. Eduardo Pitta, no seu blogue armou que «Ricardo Araújo Pereira lamenta não poder achincalhar os mariconços. Eu não sei o que é um mariconço.» Paulo Corte-Real, da Ilga, fez o curto-circuito aos crimes de ódio. “Conhecendo a dinâmica dos crimes de ódio como conheço, também conheço a sua ligação aos insultos.” Hoje, no Expresso, a deputada Isabel Moreira acrescenta uma aula de ciência política. «Se achas mesmo que a liberdade de expressão não deve ter limites e que não devemos ceder à autocontenção do discurso, és de direita, sabias?». A liberdade, diz ela, embora com nuances, é valor de direita. A esquerda é mais igualdade. Defendo, como absolutamente basilar, o direito até à ofensa no contexto do humor, do jornalismo e da literatura. Tanto faz que candidata a guru de seita me exclua. Ainda tenho a fraternidade. A pele das palavras muda e é divertido imaginar que as conseguiremos limpar até ficarem brilhantes de tão puras. Velho tornou-se depreciativo? Chamemos-lhe sénior. Demos-lhe mais anos de vida? Anão passou a magoar? Tratemo-lo por indivíduo desproporcional ou de baixíssima estatura. Com isso cresceu? Uma amiga contou-me da dificuldade que teve, ao longo de meses, em passar a tratar por clientes os deficientes com quem trabalha. A bem do rigor, foi banido o uso de utente, paciente, etc. Hesitei na palavra deficiente, mas melhora se a substituir por pessoa portadora de deficiência? Não creio que o combate vital à descriminação se resolva assim. E perigosa me parece esta deriva, em gente tão atenta aos detalhes da língua, que lê insulto no humor. Obviamente, o humorista não está livre de crítica e pode ignorá-la, mas também desaparecer por falta de graça. Ora uma das grandes conquistas da civilização, a duras expensas, foi a liberdade de expressão e do grito, por exemplo, no espaço polémico do desenho de humor, da caricatura. Como em inumeráveis atitudes e leis censórias, o argumento de defesa dos assassinos dos desenhadores do Charlie Hebdo foi a defesa da honra perante terrível ofensa, no caso, religiosa. Defendo, como absolutamente basilar, o direito até à ofensa no contexto do humor, do jornalismo e da literatura. Tanto faz que candidata a guru de seita me exclua. Ainda tenho a fraternidade. André Carrilho, que inaugurou ex- posição de brutais serigrafias (Uppercut, na Passevite, até 5 de Janeiro) feitas a partir dos seus cartoons (o que ilustra a crónica foi capa do DN na sequência do Charlie Hebdo), que se acautele: vai ter que emagrecer muito gordo, revestir muita careca e corrigir narinas. Ele tem histórias para contar. HORTA SECA, LISBOA, 18 DEZEMBRO Acabo de saber que, segundo um colega editor, as edições da abysmo são «apanascadas». Deu-me uma alegria redentora que nem vos conto.
Angela Ka SociedadeAniversário da RAEM | Cerca de 600 pessoas saíram ontem à rua O número é da polícia: não chegaram a seis centenas as pessoas que saíram à rua neste aniversário de transferência de administração. As reivindicações não são novas. Os protestos foram pacíficos [dropcap]D[/dropcap]iferentes palavras de ordem, mas todas elas antigas. Cerca de 600 pessoas marcharam ontem pela cidade, na já tradicional manifestação por altura do 20 de Dezembro. Os protestos, organizados por seis associações, partiram da zona norte da cidade, com destino à sede do Governo, onde chegaram de forma espaçada. Os manifestantes deixaram petições ao Executivo. Segundo dados da PSP, foram mobilizados 100 agentes para as manifestações, que decorreram de forma pacífica e seguiram o itinerário proposto. Marcha das lamentações O grupo mais numeroso, e também um dos mais barulhentos, com várias pessoas a ‘baterem’ pratos, foi o da Associação Reunião Familiar de Macau, formado quase exclusivamente por pessoas idosas, que deixou ainda uma petição no Gabinete de Ligação do Governo Central. Trata-se dos pais dos chamados “filhos maiores” nascidos na China. À data da apresentação do pedido para se reunirem com os pais, preenchiam os requisitos mas, durante a apreciação do requerimento, ultrapassaram a idade permitida para a autorização de fixação de residência em Macau. Lei Yok Lam, líder do grupo, voltou a pedir a autorização da fixação de residência no território dos filhos maiores que estes imigrantes deixaram no Interior da China. Outras cinco associações e dois cidadãos mobilizaram-se por motivos tão diferentes como em protesto contra a corrupção, para pedir aumentos salariais para a construção civil As manifestações decorreram de forma pacífica e seguiram o itinerário proposto e reivindicar restrições à importação de mão-de-obra, para exigir a demissão de dirigentes – entre elas a do secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, ou apelar para que haja mais habitação social nos novos aterros. O DRAMA DOS MOTORISTAS A Associação da Garantia dos Interesses de Emprego dos Operários Locais quer que seja definido um salário mínimo para o sector: 800 patacas diárias para os auxiliares de construção civil, e entre 1500 a 1700 patacas para os trabalhadores especializados. A este movimento juntou- -se outra associação – a Poder do Povo – que teve como reivindicação principal do protesto de ontem a alteração ao modelo de eleição do Chefe do Executivo. Na carta que entregou ao Governo, salientaram-se ainda “as ameaças e a dificuldade de obtenção de emprego” sentidas pelos operários de construção civil “devido aos trabalhadores não residentes”. Foi ainda expressa a “oposição firme” à importação de motoristas. Também a Associação de Activismo para a Democracia, a Associação de Armadores de Ferro e Aço, e a Associação da Linha da Frente dos Povos de Macau deixou palavras de ordem contra a contratação de condutores profissionais no exterior. O tema é, aliás, a razão pela qual é pedida a demissão de Lionel Leong, sendo que também se exigiu a saída do director dos Serviços para os Assuntos Laborais. “Segundo um estudo da Associação do Ramo de Transportes, existem actualmente 40 mil titulares de carta de condução de veículos ligeiros e oito mil com licença para conduzirem autocarros. Já são su cientes”, argumentou um dos organizadores do protesto. * com LUSA PEARL HORIZON | COMPRADORES LESADOS NÃO DESISTEM [dropcap]U[/dropcap]m grupo de pessoas que adquiriu fracções no empreendimento Pearl Horizon esteve ontem reunido junto à sede da Polytec, a empresa responsável pelo projecto. Trata-se do primeiro protesto organizado após uma conferência de imprensa em que os pequenos proprietários anunciaram que iam deixar de pagar os empréstimos contraí- dos aos bancos. Em declarações ao HM, Wang Dongmei, representante dos proprietários, referiu que, na passada segunda-feira, foi entregue uma petição ao Gabinete da Ligação do Governo Central em Macau, pedindo apoio na solução do problema. Questionada sobre se os bancos já reagiram à anunciada suspensão das prestações mensais dos empréstimos, Wang explicou que, “como os proprietários fazem os pagamentos em alturas do mês diferentes”, o impacto ainda não significativo. Assim sendo, acrescentou, até agora os bancos ainda não tomaram quaisquer medidas. A concentração de ontem serviu para contabilizar quantas pessoas já deixaram de pagar os empréstimos. Dos cerca de 500 participantes, mais de 100 já estão em falta para com as entidades bancárias. “Os proprietários não conseguem aguentar os empréstimos e também não sabem o que estão a pagar”, argumenta Wang Dongmei. A associação que junta os pequenos proprietários do Pearl Horizon diz que esta forma de protesto é para manter até o problema estar resolvido. As obras do empreendimento na Areia Preta estão suspensas há um ano.
Isabel Castro Manchete SociedadeAstronomia | Ver o que este céu não mostra É um convite para uma viagem. A astrónoma Tânia Sales Marques está na sexta-feira no Centro de Ciência de Macau para explicar de que é feito este céu. A luz excessiva da cidade não deixa ver as estrelas, mas elas estão lá para serem vistas no planetário Tânia Sales Marques [dropcap]Q[/dropcap]uando Tânia Sales Marques decidiu ser astrónoma, já não era possível ver estrelas em Macau. Mas o céu era limpo em Coloane – “nas montanhas”, como dizia em miúda. O Cotai era um istmo e estava longe de se mascarar de luzes. Tânia Sales Marques interrogava-se sobre o que estaria no céu, que estrelas eram aquelas, de que seriam feitas. É esta curiosidade que a astrónoma pretende despertar em quem for, na próxima sexta-feira, ao planetário do Centro de Ciência de Macau. De passagem pelo território, Tânia Sales Marques foi convidada para uma apresentação do céu de Macau, em moldes semelhantes aos dos shows que faz em Londres. Trata-se de uma oportunidade única para quem se interesse por astronomia ou simplesmente para aqueles que nunca foram ao planetário de Macau. As apresentações que decorrem no Centro de Ciência são feitas em chinês; a astrónoma vai mostrar o céu de Macau em inglês. A apresentação será feita para o público em geral, sendo que as crianças são bem-vindas. Ao HM, a astrónoma explica que vai usar o sistema digital do planetário – que “é muito bom” – para fazer uma apresentação do céu de Macau como estará na noite de 23 de Dezembro. “Começa com o céu e com o que é que se poderia ver se não houvesse poluição e as possíveis nuvens desse dia. Depois, vou levar o público a fazer uma viagem pelo espaço, em que falamos das coisas que estão lá, apesar de não as conseguirmos ver com os nossos olhos”, diz. Tânia Sales Marques vai falar das constelações e dos planetas, e da mitologia associada ao tema. A viagem termina com “conceitos mais cosmológicos”. “O que decidi fazer, para haver uma espécie de narrativa, foi ligar os objectos de que vou falar à sua história observacional. Vou fazer uma ligação às culturas e civilizações que descobriram ou observaram esses objectos”, diz. “Não sou historiadora, nem antropóloga, mas a ideia é aproveitar o sistema digital que o planetário tem para mostrar coisas que não conseguiríamos ver num planetário mais tradicional, e relacionar esses objectos à nossa posição, de tempo e espaço, mas também ligá-lo à linha comum do Homem que é olhar para o céu, ver as estrelas e pensar no que é aquilo.” CURIOSOS À NASCENÇA Como é que se ensina a olhar para um céu que não se vê e querer saber-se mais sobre de que é feito? Tânia Sales Marques acredita que nasce- mos todos com vontade de perceber o que está acima de nós. Uma história bem contada pode ser o su ciente para despertar outro tipo de interesse, como aquele que a levou para uma universidade dos Estados Unidos para estudar astronomia. “Hoje olho para o céu intuitivamente, mas a verdade é que os astrónomos amadores olham mais”, arma, fazendo referência às pessoas de Macau que, por exemplo, viajam até à China com os binóculos na mala a procura da escuridão. “Um astrónomo profissional acaba por se sentar em frente a um computador e vê números.” “Espero que as pessoas, sobretudo as crianças, tenham vontade de explorar mais.” TÂNIA SALES MARQUES, ASTRÓNOMA A viver em Londres, Tânia Sales Marques conta que, “para manter a curiosidade” que a levou a escolher a profissão, começou a trabalhar no planetário da cidade. “Apresento shows para crianças e adultos. Londres acaba por ser um bocado como Macau: não tem tanta poluição de luz, mas o tempo faz com que não se consigam ver as estrelas.” À semelhança do que vai fazer na sexta-feira, a apresentação no planetário londrino começa sempre com o céu em estado puro. “As pessoas sabem que é verdade, mas ao mesmo tempo não acreditam no que estão a ver, porque é um céu fantástico. E isto mostra que as pessoas continuam a manter a curiosidade, que é quase intuitiva, que faz parte do ser humano, de sentir uma certa ligação ao espaço mesmo que não o veja”, constata. “Saem dos espectáculos com vontade de saberem mais sobre astronomia em termos gerais.” A experiência de Londres faz a astrónoma considerar que, na sexta-feira, terá uma boa oportunidade de “tentar tornar a ligação ao céu mais real”. “Espero que as pessoas, sobretudo as crianças, tenham vontade de explorar mais”, diz. A apresentação de Tânia Sales Marques começa às 17 horas. A entrada é livre.
Angela Ka PolíticaNg Kuok Cheong organizou fórum para debater sufrágio universal [dropcap]O[/dropcap]s deputados da ala pró-democrata, Au Kam San e Ng Kuok Cheong, voltam a insistir na eleição do Chefe do Executivo através de sufrágio universal. A medida, que tem vindo a ser proposta à Assembleia Legislativa (AL), foi ontem debatida numa acção promovida pela Associação Iniciativa de Desenvolvimento Comunitário de Macau. No fórum apresentado pela entidade da qual os deputados fazem parte, Ng Kuok Cheong recordou a promessa deixada pela secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, quando garantiu a concepção dos órgãos municipais sem poder político até ao final do ano. “Faltam ainda dez dias e vamos car à espera”, referiu o deputado pró-democrata, que comparou a situação às promessas para a revisão da lei eleitoral. “Não é possível ser optimista. Tal como não vamos ter órgãos municipais até ao final do ano, também a prometida revisão eleitoral que permita a eleição por sufrágio universal do próximo Chefe do Executivo, em 2019, não está a acontecer”, disse. O prometido (não) é devido No dia em que se assinalou o 17.º aniversário da transferência de administração, Ng Kuok Cheong fez referência às manifestações de ontem, salientando os protestos contra a importação de mão-de-obra não residente. Porque “os motoristas reagiram agora para pressionar o Governo, a situação vai acalmar temporariamente”, acredita o deputado. No entanto, o pró-democrata alerta para o futuro. “Após a renovação das licenças de jogo, as entidades patronais vão querer impor-se para contratar mão-de-obra estrangeira”, apontou. Ng Kuok Cheong lamenta ainda que, “devido a razões históricas, a geração mais jovem de Macau e aqueles que não se manifestam a favor de Pequim não consigam ascender politicamente”. No entanto, não deixa de se mostrar esperançoso num futuro diferente. “A sociedade vai mudar. Devem ocorrer reformas aos regimes no momento certo”, concluiu. Em Outubro, o deputado viu chumbada mais uma proposta de revisão eleitoral que previa a realização de sufrágio universal numa sessão de pedido de emissão de voto na AL. O pró-democrata contou com o apoio de Au Kam San e de José Pereira Coutinho mas, no momento de decisão, foram 24 votos contra o avanço da “moção” e apenas quatro a favor.
Hoje Macau China / ÁsiaMulher de advogado processa gabinete de segurança chinês A cor da revolta [dropcap]A[/dropcap] esposa de um advogado chinês dos Direitos Humanos disse na segunda-feira que vai processar o gabinete de Segurança Pública da China, por ter sido acusada num vídeo de propaganda de fomentar uma revolução colorida”. Wang Quanzhang, o marido de Li Wenzu, foi detido no Verão passado, após assumir vários casos envolvendo direitos civis e considerados sensíveis pelo Partido Comunista chinês. O escritório de advogados onde trabalhava, o Fengrui, esteve no centro da “campanha 709” – assim designada por ter ocorrido a 9 de Julho do ano passado – e que resultou na detenção de 200 pessoas. Um vídeo difundido na semana passada pelo gabinete chinês de Segurança Pública acusa os activistas de colaborarem com organizações internacionais, com o objectivo de minar a segurança nacional e fomentar uma “revolução colorida” contra o Governo. Por duas vezes, o vídeo utiliza imagens de Li, que apela à liberta- ção do seu marido e outros detidos. O termo “colorida” é utilizado pelas autoridades chinesas para descrever as revoltas durante a primavera árabe no Médio Oriente. Recorrendo a imagens de refugiados sírios, o vídeo afirma: “As revoluções coloridas conseguiram converter muitos países em zonas de guerra e conflito, e as garras afiadas do diabo estão a tentar atingir também a China”. A mensagem refere-se às “forças estrangeiras” e os chineses que acusa de servirem como seus peões. As organizações não governamentais (ONG) estrangeiras são “representantes que visam estabelecer uma base social para a revolução colorida”, afirma. O activistas na China continental e o movimento pró-democracia de Hong Kong são parte de uma conspiração para derrubar o Governo chinês, aponta. Entre as muitas “forças estrangeiras” incluídas no vídeo está o ex-embaixador dos Estados Unidos para a China Jon Huntsman, que prediz que os jovens cibernautas chineses vão derrubar a China”.’ SUSTO E INDIGNAÇÃO O filme mostra ainda imagens do julgamento de Zhou Shifeng, o director do escritório de advogados Fengrui, que foi condenado em Agosto passado a sete anos de prisão por “subversão do poder do Estado”, e fotografias suas com diplomatas e jornalistas estrangeiros. “O vídeo difama desnecessariamente advogados dos Direitos Humanos, distorcendo deliberadamente a verdade, e chama-me a mim também uma agente da revolução colorida – mas eu não sei sequer qual a cor de uma revolução”, afirmou Li à agência France Presse, contando que a sua família se sente assustada e revoltada. “A única coisa que fiz foi ir à procura do meu marido, depois de ele ter desaparecido, e eles referem-se a esta normal reacção como ‘revolução colorida’, dizendo que é o equivalente a opor-me ao partido, ao governo e a toda a sociedade.” LI WENZU, ESPOSA DE UM ADVOGADO CHINÊS DOS DIREITOS HUMANOS “A única coisa que fiz foi ir à procura do meu marido, depois de ele ter desaparecido, e eles referem-se a esta normal reacção como ‘revolução colorida’, dizendo que é o equivalente a opor-me ao partido, ao governo e a toda a sociedade”, nota. Li Wenzu apresentou queixa no domingo e saberá dentro de uma semana se um tribunal de Pequim aceita ou rejeita o caso. Se Li fosse mesmo uma agente da revolução colorida, “porque não condená-la em tribunal, em vez de sujar a sua imagem deliberadamente” nas redes sociais, refere a queixa. Desde que o Presidente chinês, Xi Jinping, ascendeu ao poder, em 2012, as autoridades reforçaram o controlo sob académicos, advogados e jornalistas, segundo organizações de defesa dos direitos humanos. Pequim devolve drone aos Estados Unidos A China devolveu ontem aos Estados Unidos o drone submarino capturado na semana passada por um navio militar chinês, nas águas do Mar do Sul da China, num episódio que causou tensão entre os dois países. Segundo um comunicado emitido pelo Ministério de Defesa chinês, o aparelho foi devolvido ao meio- dia de ontem, depois de “negociações amigáveis” com Washington. O ministério afirmou no domingo que a captura do drone se deveu a motivos de segurança e confirmou que este seria devolvido depois do pedido do Pentágono.
Hoje Macau China / ÁsiaPequim | Toca a pôr a máscara [dropcap]P[/dropcap] estava ontem coberto por um manto espesso e cinzento, com o nível de poluição dezoito vezes mais alto ao máximo recomendado pela Organização Mundial de Saúde, resultando no encerramento de escolas e voos cancelados. As autoridades chinesas emitiram um alerta vermelho, que abrange mais de vinte cidades do norte do país e 460 milhões de pessoas, pelas estimativas da organização ambientalista Greenpeace. Na capital chinesa, a concentração de partículas PM 2.5 – as mais finas e susceptíveis de se infiltrarem nos pulmões atinge os 450 microgramas por metro cúbico. Em várias cidades próximas a concentração das partículas superou os 500 microgramas e em Handan, na província de Hebei, chegou a atingir os 1000. O nível máximo de concentração recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) é 25 microgramas por metro cúbico. A imprensa estatal informou ainda que 169 voos com destino ou partida no Aeroporto Internacional de Pequim – o segundo mais movimentado do mundo – foram cancelados. Partes do sexto anel, a mais longa estrada em torno de Pequim, foram também encerradas. DE VAGA EM VAGA À semelhança de outras alturas em que uma vaga de poluição atinge a cidade, os hospitais registaram um ‘boom’ no fluxo de crianças com problemas respiratórios e prepararam equipas para lidar com os casos de alergias. Fotografias difundidas pela imprensa chinesa mostram salas de espera cheias de pais com os filhos, cujas faces estão cobertas com máscaras antipoluição. A China sofre frequentemente das piores vagas de poluição no mundo, devido à alta dependência do país da queima de carvão para produção de energia e produção fabril. Pequim e outras cidades têm aprovado medidas para melhorar a qualidade do ar, substituindo o uso do carvão por gás natural. O país continua, porém, a ser o maior emissor de gases poluentes do mundo e o principal produtor e consumidor de carvão. Os governos locais, que se deparam com o aumento dos preços da energia, aumentaram este ano os limites de produção diária de carvão por várias vezes. Desde que o alerta foi emitido, na sexta-feira passada, mais de 700 empresas pararam a produção em Pequim, enquanto os automóveis particulares circulam alternadamente, de acordo com o último número da respectiva matrícula: um dia pares; noutro ímpares. Infantários e escolas de ensino básico e médio estão também aconselhadas pelo Governo a suspender as aulas e as empresas a adoptar um horário de trabalho flexível”. O alerta vermelho, o mais alto de um sistema de quatro cores, dura até quarta-feira.
Sofia Margarida Mota PolíticaLionel Leong garante acompanhamento do mercado laboral [dropcap]O[/dropcap] acompanhamento das pequenas e médias empresas (PME) e as alterações do mercado laboral estão a ser acompanhados de perto pelo Executivo. A ideia foi deixada ontem pelo secretário para Economia e Finanças, Lionel Leong, em declarações à margem da cerimónia de celebração do 17.º aniversário da transferência de administração. “Vamos reforçar o apoio às PME e também reforçar o trabalho de formação, de modo a manter a taxa de desemprego nos níveis mais baixos”, disse Lionel Leong. O secretário frisou que não pretende car “de braços cruzados só porque as receitas do jogo e os dados económicos, dos últimos meses, registaram uma subida”. Apesar do crescimento verificado no ajustamento das receitas da principal indústria do território, Lionel Leong garantiu que os Serviços de Economia e os Serviços para os Assuntos Laborais irão estar atentos ao mercado de trabalho. Lado a lado com as PME Os serviços sob a alçada da tutela de Leong vão ainda ser “os primeiros a deslocarem-se aos bairros comunitários para se inteirarem do ambiente de negócios existente”. Fazem parte das preocupações do Executivo o aumento das rendas e dos capitais relativos a recursos humanos, os prejuízos que as PME têm sofrido, o que está na origem da quebra do volume de negócios e a promoção do plano de apoios actualmente em vigor. Relativamente à importação de motoristas profissionais, situação que tem sido alvo de polémica junto de certos sectores da população, o secretário recordou que a questão não é consensual, para dizer que “o Governo segue uma visão científica” e leva a cabo uma “contínua auscultação dos sectores comercial e laboral, por forma a encontrar uma resolução” para a questão. A decisão, garantiu, só será tomada depois do “devido estudo e análise”. Lionel Leong deixou a promessa de ouvir a sociedade de modo a repensar a necessidade de importação de condutores do exterior. O secretário falou também dos planos para o Canídromo. “Com o fim do contracto, a Companhia de Corridas e Galgos de Macau (Yat Yuen) deve encontrar novas instalações para levar a cabo as suas operações e, para isso, apresentar o respectivo pedido aos serviços competentes e respeitar o plano urbanístico, sem pôr em causa a tranquilidade da população, assim como o respeito pelos padrões internacionais nas corridas de galgos”, afirmou.
Hoje Macau China / ÁsiaChina | Economia abrandará em 2017 As previsões da Academia Chinesa de Ciências Sociais apontam para o ritmo mais lento de crescimento da economia chinesa desde 1990 e para a contínua desvalorização do yuan, face ao dólar [dropcap]O[/dropcap] ritmo de crescimento da economia chinesa vai abrandar para 6,5%, em 2017, e a moeda do país vai continuar a desvaloriza-se, face ao dólar norte-americano, previu na segunda-feira o principal instituto de pesquisa do país. A previsão surge depois de anunciados, no início deste mês, vários indicadores positivos para a segunda maior economia mundial. Contudo, a economia “continua a sofrer uma cada vez maior pressão negativa”, armou a Academia Chinesa de Ciências Sociais (ACCS), citada pelo site oficial . O instituto de pesquisa prevê ainda que o yuan, que atingiu este mês o valor mais baixo dos últimos oito anos – irá desvalorizar entre 3% e 5%, face ao dólar. Em ritmo brando A ACCS anunciou estas previsões durante uma conferência de imprensa, realizada anualmente, três dias após os líderes chineses se reunirem para debater assuntos chave da economia. Durante o encontro, que contou com a participação do Presidente chinês, Xi Jinping, os líderes prometeram resolver problemas urgentes da economia, sobretudo nos grupos estatais vistos como improdutivos, e no sector imobiliário, afectado por uma enorme ‘bolha’ especulativa. No último ano, o ACCS previu que a economia iria crescer 6,7%, em 2016. Por enquanto, a previsão tem se confirmado, com o ritmo de crescimento económico a fixar-se em 6,7%, o mais baixo desde o pico da crise financeira, ao longo de três trimestres consecutivos. Para o próximo ano, o ACCS prevê um ritmo mais lento da meta de crescimento definida por Pequim para o período entre 2015 e 2020 – entre 6,5 e 7%. Seria também o ritmo mais lento desde 1990, quando a economia do país cresceu 3,9%. Vários factores permitiram à China atingir a meta proposta pelo Governo, incluindo um aumento do consumo interno, a recuperação no investimento em imobiliário e fortes gastos em infra-estruturas. As importações e exportações devem cair 9,5 e 7,2 por cento, respectivamente, durante este ano, face a 2015. As importações em Novembro superaram as expectativas, pondo fim a taxas homólogas negativas. EM MUDANÇA Pequim está a encetar uma transição no modelo de crescimento do país, visando maior ênfase no consumo doméstico, em detrimento das exportações e investimento, que asseguraram três décadas de trepidante, mas insustentável”, crescimento económico. O processo tem sido, no entanto, difícil. O aumento do consumo in- terno deve abrandar de 10 para 9,5%, em 2017, refere o ACCS. O país enfrenta ainda vários desafios, como e cesso de capacidade de produção em empresas estatais obsoletas e fuga de capital. A eleição do norte-americano Donald Trump, que acusa a China de manipular a sua moeda e prometeu aumentar os impostos sobre os produtos chineses, acarreta também instabilidade, tendo em conta que os Estados Unidos são o maior parceiro comercial do país asiático.
Tânia dos Santos Sexanálise VozesSexus Festivus [dropcap]P[/dropcap]ara os que estão cansados do tradicional Natal e que gostavam de ter uma alternativa, aqui está uma proposta: o Festivus do Sexo. A inspiração vem directamente da celebração inventada pela família de um dos escritores da série Seinfeld, que acabou por incluí-la num episódio e torná-la muito popular. No enredo conta-se a história de como o pai do George inventou uma nova celebração para Dezembro, de forma a substituir o Natal. O dia não é o mesmo, mas o de 23 de Dezembro, e para quem nunca acompanhou a série e não sabe o que raio é o Festivus, uma explicação detalhada é requerida. O Natal, apesar da original condição re- ligiosa, tem sobrevivido com uma crescente dependência consumista. As crianças que- rem ver um Pai Natal generoso e as pessoas querer agradar a tudo e a todos com prendas, prendas e mais prendas. O Festivus resultou de muita frustração natalícia, o que levou a uma família a criar seu próprio feriado com tradições muito peculiares associadas. Não há árvore de Natal, mas sim um poste de alumínio completamente nu, desprovido de qualquer decoração. Antes de começar o jantar, que não tem um menu específico, cada pessoa tem direito a verbalizar as suas queixas e frustrações em relação aos presentes nesta celebração. Se um filho não dá atenção suficiente aos pais, os pais que lhe digam na cara! Se a sogra é um pesadelo, a nora que se queixe! No fundo esta é uma tentativa de socializar e tornar tradição a má disposição que também é tão típica natalícia, apesar da expectativa ser sempre a contrária. Ainda há mais uma tradição, as proezas de forças, onde o anfitrião desfia um convidado para uma luta de corpo a corpo, até que um seja declarado o vencedor. Para os casais solitários a passar um Natal a dois (que acontece a muitos quando estão fora dos seus países de origem) e não há fa- mília alargada por perto, a proposta é de um Sexus Festivus. Esta será uma festa crítica ao consumismo natalício mas altamente sexual. O poste de alumínio tradicional, podia-se converter num strip pole. Este seria o símbolo do Sexus Festivus e o incentivo para o pessoal tirar a roupa, de forma sensual, acompanhada da sua música favorita. Homens e mulheres por igual. O objectivo é despirem-se por completo. Claro que o tradicional ‘momento de queixas’ não se encaixa no espírito deste meu evento criado. A minha proposta seria mais sensual e simpática. Em vez de queixas, devem elogiar o seu parceiro por todas os momentos sexuais proporcionados no último ano, detalhadamente. Para mostrar que se preocupam e que estão de facto agradecidos por terem um parceiro tão sexualmente gratificante (não há nada como reforçar o bom comportamento). As proezas de forças é que não se alteraria muito do formato original, não seria uma luta de corpo a corpo, mas sexo de corpo a corpo, do mais desenfreado e inspirado. Ganha quem mais conseguir proporcionar orgasmos, se quiserem manter o factor competitivo na equação. O jantar para o Sexus Festivus caria à descrição das mentes sexualmente inspiradas. Poderiam querer alimentos de especiarias afrodisíacas, ou mesmo formas fálicas e vulvares criadas pelas frutas e legumes de eleição. A imaginação poderia ainda sugerir fazerem um daqueles jantares de ‘sushi body’ onde o corpo nu seria utilizado como a plataforma onde a comida é apresentada, neste caso, sushi. Mas poderia ser de outra coisa qualquer! Esta seria a altura ideal para todos os aficionados por sito lia (sexo+comida), ou simplesmente curiosos, misturarem o sexo com os prazeres do estômago num jantar muito especial. O jantar Sexus Festivus! Acho que todos concordamos que o Natal até pode ser divertido, mas não há nada como criar a nossa festa cheia de tradição sexual. Um exclusivo para os que podem, porque muitos que até querem terão que se contentar com o bacalhau, as couves, as rabanadas, as prendas pouco inspiradas e as intrigas familiares. Desejo-vos a todos um feliz e tranquilo Natal, e os que se atreverem, um muito orgásmico Sexus Festivus.
Hoje Macau Manchete PolíticaÀ beira da maioridade: Trânsferência de Administração foi há 17 anos Faz hoje 17 anos que Rocha Vieira entregou a administração de Macau a Pequim. Fê-lo abraçado a uma bandeira portuguesa, numa transição emocionada. O HM ouviu vários testemunhos que nos fizeram o balanço da vida da RAEM [dropcap]O[/dropcap] início eram as descobertas. O espírito aventureiro dos navegadores portugueses chegou aos Mares do Sul da China, e aqui ficaram a administrar o território durante mais de quatro séculos. Até 1999, quando se deu a transferência de administração para a República Popular da China, nascendo a Região Administrativa Especial de Macau. Em dia de aniversário, ouvimos as opiniões de quem aqui vive, para um balanço destes 17 anos. O designer Manuel Correia da Silva considera que podemos olhar para a idade da RAEM como olhamos para o crescimento de uma pessoa. Houve uma infância e, hoje em dia, estamos à beira da maioridade mas ainda a atravessar uma fase tardia da adolescência. “Espero que a maturidade chegue a todas as figuras de poder desta cidade, não só ao Governo local, mas também à sociedade civil”, comenta. “Espero que a maturidade chegue a todas as figuras de poder desta cidade, não só ao Governo, mas também à sociedade civil.” MANUEL CORREIA DA SILVA, DESIGNER A ideia de chegar à idade adulta é intimamente ligada a um sentido de autonomia, “já podemos sair sozinhos”, como comenta Correia da Silva. A ideia é uma maior capacidade de auto- gestão que permita a internacionalização, o envolvimento com a região. O designer não se refere apenas a factores comerciais. Nesse aspecto houve, realmente, maior abertura ao exterior, mas a um novo olhar político, uma nova forma de pensar o território. Nesse sentido, considera que a RAEM devia “olhar para as lusofonias como um bom canal de internacionalização”, na forma como a marca Macau se pode instituir lá fora. Para tal, será necessário projectar uma imagem mais graúda, “e isso tem que ver com responsabilidade”. Hoje em dia, Macau é uma cidade mais cosmopolita, que oferece maior liberdade de movi- mentos aos cidadãos, mais ligada ao que se passa em seu redor. “Nós já estávamos envolvidos neste Delta, uma zona do mundo especialmente activa nestes últimos 10 anos”, algo que melhorou com “as políticas de abertura da China para o resto do mundo”. Factos políticos com impacto, e que forçaram a competitividade e inovação. BOOM VERTIGINOSO Portugal entregou Macau à China com os cofres em situação modesta. “Quando passou a administração tínhamos apenas um fundo de 10 biliões de patacas, o que não dava para alimentar sequer um ano de Orçamento”, lembra o economista Albano Martins. Neste momento, o Governo tem os cofres cheios. Facto que é incontornável neste balanço de aniversário, assim como os números do desemprego. Aquando da transferência, Macau tinha uma taxa de mais de sete por cento, hoje em dia está abaixo dos dois por cento, um número que representa pleno emprego. Au Kam San, deputado à Assembleia Legislativa, aponta a óbvia “liberalização do jogo de grau limitado e a política de visto individual oferecida pelo Governo Central”, como “factores decisivos para o desenvolvimento a grande velocidade”. Estes foram os pilares que enriqueceram a administração da RAEM, e que possibilitaram o investimento numa série de infra- -estruturas que enriqueceram o nível de vida dos habitantes de Macau. “As comunidades portuguesa e macaense continuam dinâmicas, são partes fortes do sistema, e merecem o reconhecimento devido pelos Governos Central e local.” CARLOS MARREIROS, ARQUITECTO Albano Martins acrescenta que “os grandes desenvolvimentos se deram durante a administração de Edmund Ho que foi, de facto, a grande dinamizadora”. O economista considera que durante esse período houve coragem para tomar decisões mas, infelizmente, o segundo mandato ficou manchado pelo escândalo Ao Man Long. “Nesta última administração pouca coisa se fez, tirando uma ligeira acção neste último mandato, embora sempre com um atraso que não era expectável dadas as capacidades financeiras que a administração de Macau hoje tem”, comenta o economista, que vive há quase 40 anos no território. O arquitecto Carlos Marreiros reforça este ponto, acrescentando que “a administração não soube acompanhar a dinâmica do investimento, a uma escala gigantesca, à qual não estávamos acostumados”. Também no panorama regional, a inacção governativa levou à perda de competitividade. A inércia administrativa é algo palpável, a que a população reage. “A população tem um relacionamento muito crispado com a administração. O que a administração faz é sempre mau, o que não é verdade, também há coisas muito positivas”, acrescenta. Nesse aspecto, salienta a classificação pela UNESCO do centro histórico de Macau como património mundial e o investimento recente na educação. “O acesso ao ensino melhorou bastante, é gratuito e estendido a todas as idades com um apoio pecuniário para quem queira continuar a estudar.” Apesar destas melhorias, a apatia generalizada do poder local é sentida pelo povo, levando a “um processo de pré-divórcio, como uma comunicação impossível, alicerçada no conflito que não resulta em consenso, mas numa sociedade fracturante”. “Isso não é bom numa terra pequena, é mau para a criação de soluções e para o diálogo”, acrescenta o arquitecto nascido em Macau. Para a deputada Melinda Chan, “uma das vantagens que vieram com a transição foi a melhoria na segurança”. Chan elenca ainda nos aspectos positivos o reconhecimento da RAEM ao nível internacional, “que se sentiu com a entrada de grandes empresas e investimento, e com o aumento de turistas”. NEM TUDO SÃO ROSAS A prosperidade trouxe por arrasto alguns problemas, particularmente no que diz respeito à poluição, ao crescimento desordenado, ao trânsito e à habitação. Este último capítulo é destacado por Lam U Tou que considera que, anterior- mente, “a população mais pobre conseguia com algumas poupanças ter as suas próprias casas”, algo que o boom no mercado do imobiliário veio dificultar. Para o membro do Conselho Consultivo dos Serviços Comunitários da Zona Central, esta é a maior falha do Executivo e o factor de maior desagrado da população. Já o deputado Au Kam San vê na corrupção o pior efeito secundário do boom económico, com consequências muito nefastas para a sociedade. “Durante a administração portuguesa havia problemas de corrupção, mas eram de menor dimensão. Hoje, o problema cresceu à medida que o Governo ficou mais rico, como exemplificou o caso Ao Man Long”. O pró-democrata acha que a promiscuidade entre o ciais da administração e grupos empresariais atinge maiores proporções. Uma das razões apontadas por Au Kam San prende-se com o défice de democracia, com os quadros governativos a ocupar muito tempo o poder. Este é um problema que “sacrifica o interesse dos pequenos cidadãos”, acrescenta. “Durante a administração portuguesa havia problemas de corrupção, mas eram de menor dimensão. Hoje, o problema cresceu à medida que o Governo ficou mais rico, como exemplificou o caso Ao Man Long.” AU KAM SAN, DEPUTADO No rol de aspectos negativos, Albano Martins destaca a ausência de “um sistema de reformas digno desse nome, adequado aos rendimentos do Governo”, não esquecendo as problemáticas questões do trânsito, cultura e a poluição. Para o economista, é como se a administração da RAEM não soubesse lidar com o crescimento exponencial. “A solução encontrada parece ser parar esse crescimento.” Carlos Marreiros olha para este quadro socioeconómico com alguma preocupação, num panorama em que “as pequenas e médias empresas têm dificuldade em se imporem”. Para tal, tem contribuído um desenvolvimento mal distribuído, “nem sempre para benefício do povo”. Mas o arquitecto também vê o copo meio cheio, e faz “um balanço globalmente positivo”. “As comunidades portuguesa e macaense continuam dinâmicas, são partes fortes do sistema, e merecem o reconhecimento devido pelos Governos Central e local. Nestes 17 anos não deixámos de participar, fomos fazedores do passado de Macau, um passado com mais de quatro séculos, estamos a fazer o presente e a projectar o futuro de todos nós”, comenta o arquitecto. Neste aspecto, o sabor diferente que a portugalidade oferece à região torna Macau num local diferente do resto da China, sendo que “uma das principais razões é a existência desta universalidade que é a cultura portuguesa, miscigenada localmente a vários níveis, e que cria originalidade na ponta desta enorme China”. Foi há 17 anos que o Governador Vasco Rocha Vieira levou a bandeira ao peito e partiu para Portugal Não obstante os 17 anos da transferência de administração de Macau para a China, a alma lusitana ainda se faz sentir na universalidade de que Carlos Marreiros fala. Um bom exemplo desse aspecto fluido culturalmente é a própria vida de Manuel Correia da Silva. Há três anos, o designer viu-se na iminência de ter de mudar de cidade, empurra- do pelo desconforto que sentia, pela deterioração da qualidade de vida e a subida vertiginosa da in ação. As circunstâncias empurraram-no para lá das Portas do Cerco e a procurar outra vida em Zhuhai. “Para mim isto também já é Macau, apesar de existir aqui uma fronteira administrativa que é preciso ultrapassar. Macau vem comigo para este lado da fronteira e o mesmo acontece no sentido inverso. É uma fronteira um bocado orgânica, ela vai e volta comigo”, explica. Uma fluidez que parece ser a metáfora perfeita para simbolizar Macau.
Paulo José Miranda PolíticaA vida fechada a tijolos [dropcap]I[/dropcap]maginai uma casa ou um edifício sem portas, sem janelas, apenas com espaço interior fecha- do em si mesmo, como se alguém tivesse posto tijolos a fechar as janelas e as portas, para que ninguém mais possa entrar! Como aqueles edifícios que encontramos nas partes antigas da cidade, que já foram espaços com alegria e hoje são vazios, como unhas ocas. Uma casa totalmente fechada no seu interior, como um humano sem portas e sem janelas para outro. E agora imaginai que isso é um livro de poesia: A Habitação de Jonas, de Inês Fonseca Santos; que o edifício é uma baleia e que no espaço, lá dentro, há um homem. Jonas habita a baleia, a solidão, o isolamento eterno a que está votado; foi condenado a ser só como todos nós. “Jonas caminhava por procurar outro. / Talvez ele existisse: / o homem dos sinos. / Talvez ele fosse um homem infinito.” (p.13) Neste início de poema, o VI da parte “Primeiro Dia Primeira Noite” dá-nos a confirmação de que habitação se fala aqui neste livro. Uma habitação fechada para a rua e onde se caminha por procurar outro. Procurar outro não é um m. Jonas não caminha “para” outro ou para procurar outro, Jonas caminha “por” procurar outro, Jonas caminha como quem vai ser só para sempre. Jonas é um infinito de só, uma casa completamente fechada, sem portas, sem janelas, uma casa para nada. No poema II (p. 9) lê-se: “Apenas uma sílaba com som: dor. // Jonas soube: não existia / na cidade outro homem.” Esta condição de Jonas, esta imagem do humano enquanto Jonas, que está só, completamente só na cidade, caminhando por procurar outro é uma imagética profunda do que é o ser humano, uma parábola à dimensão do paradoxo da existência. Devemos repeti-la, porque a cada esquina nos é repetida. Devemos repetir, porque a cada página nos é repetida, a cada verso. E não há parábola sem a febre da imagem e um horizonte de sentido, ainda que longínquo, ou que possa parecer longínquo. Leia-se o segundo poema do livro (p. 8): “Jonas chegou a casa: no lugar da porta, a boca do peixe. Empurrou um dente, entrou. Sentou-se na enorme afta daquela língua desconhecida que habitava. Olhou em volta: um lugar em ruínas, não uma casa em ruínas; uma boca tentando ser uma cidade inabitada. Na primeira cidade com hálito, os sinos soavam de quarto em quarto de hora.” E é aqui que estamos, no livro como na vida: num lugar em ruínas, não numa casa, mas num lugar. “Jonas levantou-se. / Queria arrumar o coração no lugar / certo, descer por ele até mais do que uma sílaba: / até uma palavra.” (p. 10) Em todas as páginas, em todos os versos ao longo deste precioso livro escutamos as nossas próprias vidas, mais próximas do que se fosse dela mesma, a nossa, que a poeta escrevesse, tão mais próximo como só a imaginação que transfigura o sentimento o pode fazer. A demanda de Jonas é a nossa demanda. E o outro é o próprio, que busca outro como a si mesmo. Uma palavra basta, uma palavra. Mas onde escutar essa palavra? Onde há essa palavra, que se houver nos basta? O que seguir, que caminho seguir para encontrá-la? Não será essa palavra uma boca, um beijo, um coração puro a palpitar nas mãos de todos os nossos sonhos, eternamente sonhos? Os dias, aquilo que deram a Ruy Belo, ao invés da vida – Eu vinha para a vida e dão-me dias (Ruy Belo in Homem de Palavra[s]) – é o que nos dão a todos, o que dão a Jonas, nesta boca, nesta cidade, neste livro. Quem ao andar na rua não sente agora as paredes altas do céu da boca da baleia, o tecto opaco da vida, o badalo do sino antes da descida vertiginosa para o estômago do animal? A cada esquina que viramos ouvimos os sinos, a anunciação de nenhuma palavra, a lembrança do silêncio que nos veste como uma farda. “Era uma voz / de abismo, de fundo de copo, / E repetiu: dor.” (p. 11) Lisboa, a baleia por onde ando, por onde a poeta escreve, a cidade onde não há outro homem. Em nenhuma cidade há outro homem, mas esta é a minha baleia. Esta é a minha baleia, grita por um livro inteiro a poeta Inês Fonseca Santos. Lisboa, a minha baleia; eu, Jonas, a caminhar por procurar outro. “As paredes, ao se afastarem os móveis, / erguem-se, despidas, coradas até à raiz dos rodapés, / como paredes sem móveis: demasiado brancas (…)” (p. 5) A loucura não é a vertigem do álcool, o voo das drogas, a euforia dos corpos, um armazém chinês com tudo o que não nos faz falta. A loucura é a casa vazia, sem janelas, sem porta, as paredes brancas de nada, os móveis velhos e gastos, afastados dos rodapés, mostrando os anos que passaram, os anos que passaram para nada, pois nada se viu, nada vimos, nada aprendemos, nada cresceu dentro de nós, como cresce no interior de uma grávida. Só engravidando não somos sós. Só engravidando não somos um vazio puro, uma ruína. E depois? E depois da gravidez? De novo um ruína de nós mesmos, uma ruína da infância. Uma ruína do que poderia ter sido, sem que na realidade alguma vez pudesse ter sido, pudesse ser. “VIII Jonas só compreendeu a palavra ‘ferida’ ao alcançar o topo da língua. Assistiu, do monte, à invasão da cidade: coágulos de sangue cobrindo a grande boca. Jonas sufocou. Pôs sobre os olhos as mãos. E desejou nos ouvidos o toque dos sinos.” (p. 15) Desejamos. Desejar é uma pele, uma segunda farda, a farda dos dias de festa, a farda com que vamos aos dias de gala, para além da farda do silêncio do dia a dia. Esta é a nossa vida, grita Jonas, pôr as mãos sobre os olhos e desejar o toque dos sinos. Que sabemos de nós? Como caminhar por procurar outro e não sabermos quem somos? Como não desejar a música dos sinos, as palavras silenciosas da música, que nos tocam, literalmente nos tocam, que nos fazem vibrar como o tempo vibra numa ruína. “Paredes, estais hoje mais velhas do que nós”, escreve num verso, a poeta. Nós estamos mais velhos do que nós, escrevo eu. As ruínas, as paredes, o tempo a descascar a vida, a descascar a vida e a deixar marcas nos dedos sujos, desta nossa consciência a assistir a tudo. “A nossa vida, disse ela, / aqui de cima.” (p. 22) A nossa vida, diz a consciência, aqui de cima. E o que a consciência se dá mal com os dias! E o que a consciência se dá mal com as ruínas! E o que a consciência se dá mal com a sua própria ruína! Jonas, sou eu agora que te peço, eu o teu leitor, eu aquele que te traz aqui à beira de seres outro, à beira da estrada de seres outro, não me mostres mais o que é a vida, não me escrevas mais estes versos: “eram pedaços de intestino, / onde também dói / quando tudo o que resta / é uma porta fechada // sobre a memória, / sobre ela / sobre mim.” (p. 28) A vida fechada como uma casa onde puseram tijolos no lugar de portas, onde puseram tijolos no lugar de janelas, onde puseram tempo no lugar de braços, onde puseram dor no lugar de um horizonte. Este é um livro de descida ao mais íntimo dos me- dos, à mais íntima das solidões, como só quem escreve sentimentos sobre a lâmina da imaginação o sabe. Se esta minha leitura vos parece um enorme “só”, é porque este livro é isso mesmo. Imaginai Jonas no interior da baleia! Imaginai-vos, cada um de vós, no interior da existência! O livro, que é um objecto de arte, traz ainda um conjunto de ilustrações de Ana Ventura, cuja beleza não mitiga o terror da escrita. Termino com um poema da poeta Inês Fonseca Santos, último da segunda parte do livro “Segundo Dia Segunda Noite”: “XI As minhas dúvidas, como poderei saber se são as mesmas, se são as minhas? Perguntou-lhe ele, erguendo-se uma última vez. Sentada diante dele, ela agarrou a certeza como ele agarrou as pedras: na boca e nos ouvidos, o toque dos sinos e só então a voz. Eu sei, como tu sabes, quem é esse que habita as paredes da casa. Eu sei, como tu sabes, que única mão é essa que folheia os livros, que apanha as pedras. E eu sei, como tu sabes, que ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos assim tão pequenas. Mas eu olho, como tu olhas, essa mão minúscula cosendo um corredor de almofadas, aguardando que sobre elas durma. E eu sei, como tu sabes, que essa mão translúcida comanda os versos, abusando de pensamentos e palavras, actos e omissões. Sabes? Antes de mim, antes de ti, já existia este jardim.” (p. 30)
Isabel Castro EventosJosé Drummond na lista final do Sovereign Asian Art Prize É a terceira vez que José Drummond, artista plástico português radicado em Macau, é nomeado para o prémio mais importante da região vizinha na área das artes. O reconhecimento lá fora não acompanha o que se passa em casa [dropcap]T[/dropcap]rata-se de uma nomeação directa, conquistada pela presença este ano no Sovereign Asian Art Prize. José Drummond foi finalista na edição de 2016, tendo o seu trabalho sido mostrado na Christie’s, garantindo um lugar na competição do próximo ano. Regressa ao mais importante prémio das artes em Hong Kong com três trabalhos, todos eles feitos com caixas de luz. É a terceira vez que o artista português, a viver em Macau há mais de 20 anos, entra na lista daqueles que a organização entende serem os melhores da Ásia. “É sempre bom. Não acho que os prémios sejam completamente reveladores do trabalho que as pessoas fazem no trajecto da sua carreira, mas são veículos de reconhecimento que acabam por ser importantes, especialmente nos dias de hoje”, comenta José Drummond ao HM. “Nesse sentido, é óptimo.” Organizado anualmente, o Sovereign Asian Art Prize convida artistas contemporâneos, que estejam a meio da carreira, para submeterem três trabalhos online. As obras são depois avaliadas por um júri da região constituído por especialistas em arte, que escolhem os 30 melhores trabalhos. É esta selecção que vai estar ex- posta num local público em Hong Kong, sendo que se segue depois uma nova apreciação. O artista vencedor recebe 30 mil dólares norte-americanos. À excepção da obra vencedora, os restantes trabalhos são leiloados durante a gala de atribuição dos prémios. Além da obra seleccionada pelo júri, é ainda distinguido o trabalho que mais votos recebeu do público que foi ver a exposição. “É um dos prémios mais importantes da região Ásia-Pacífico”, contextualiza José Drummond. “Já começo a ser um repetente, é a terceira vez que estou nesta fase. Penso que será a primeira vez que acontece a um artista de Macau.” O artista português foi o único do território presente na fase final da iniciativa. DA NOITE E DO DIA Na edição de 2017, Drummond concorre com um media que tem uma presença importante na sua obra: as caixas de luz. “Tem que ver com o meu interesse em espelhar todos estes conceitos à volta da luz e da sombra. Depois, embora sejam fotografias tiradas no momento, há sempre nos meus trabalhos uma condição teatral, cenográfica, quase encenada. É por isso que tenho optado, para estas séries, pelas caixas de luz.” As três obras a concurso resultam de fotografias tiradas à noite, um momento em que a cidade se transfigura. Na sequência de um trabalho que tem vindo a fazer, as imagens obedecem a uma narrativa poética, que “tem que ver com o estado de desassossego, com a insónia”. No primeiro trabalho, “Think of the saddest thing in your life”, vê-se uma fotografia tirada num lago. “É só água. Digo, a determinada altura no texto, como a água pode ser tão opaca quanto a vida. Temos esta ideia de que a água é transparente, mas não é”, observa. “Mais uma vez, tem que ver com a teoria da luz, com as cores. Nesse trabalho usei luz que transformasse a cor normal do lago. Ficou azul porque forcei a que casse assim.” “All those moments at night when you’re not with me”, a segunda fotografia, “é mais próxima de um instantâneo” e está relacionada com uma investigação que o artista plástico tem estado a fazer, associada à ideia da “ausência do outro, que nos leva a deambular pelas ruas”. Trata-se de uma série em que José Drummond procurou captar situações que entende serem interessantes na cidade. A imagem em questão mostra o recanto de uma pessoa que “colecciona coisas inúteis que recolhe do lixo”. “Colecciona garrafas de plástico e pendura-as à entrada de casa. Tem as portas de casa abertas e consegue-se ver tudo o que se passa lá dentro.” Há uma certa organização no espaço fotografado, explica: “Tem uma cadeira pendurada, há uma lógica muito pessoal que nos faz confusão. Esta pessoa em especial tem sido objecto da minha investigação há algum tempo, com fotografias em diferentes momentos do dia e com objectos diferentes”. “Não acho que os prémios sejam completamente reveladores (…), mas são veículos de reconhecimento que acabam por ser importantes.” JOSÉ DRUMMOND, ARTISTA PLÁSTICO A fotografia enviada para Hong Kong tem “um ar quase de ficção científica”. “Não tenho qualquer intervenção na imagem, a não ser clicar”, refere. No entanto, o lado cénico mantém-se. “Tudo aquilo é encenado, mas por outra pessoa.” A fotografia insere-se numa série em que Drummond vai à procura de pessoas que estão, de certa forma, fora do que é convencional, “personagens que são deixadas para trás” na sociedade. O último trabalho, “When my hands make your heads spin”, tem a morte como subtexto. “É uma reflexão. São dois ravers no final de uma festa. O final da festa significa também quase o final do corpo. A paz é quase morte, naquele sentido. Depois de toda a excitação e do excesso que possa ter havido, há depois este momento, completamente oposto”, mostra. “Esta dualidade entre vida e morte é um lado que tenho andado a explorar. É muito difícil falar sobre a morte e registá-la. Nunca conseguimos fazer uma boa representação da morte porque não sentimos a nossa; só a sentimos através da morte dos outros.” LÁ FORA Nos últimos anos, José Drummond tem sido mais valorizado fora de Macau do que em casa. “De algum modo, parece que o meu trabalho vai sendo mais reconhecido fora de Macau do que aqui”, diz. Além do lugar conquistado entre os finalistas da edição de 2016 do Sovereign Asian Art Prize, o artista teve o seu trabalho exposto na Berlin Transart Trienalle, em Agosto passado. Durante este ano, participou em festivais de vídeo de Portugal, Espanha e Áustria. Juntamente com a artista Peng Yun, teve uma obra no Rosalux Project Space em Berlim. Por cá, fez um trabalho especificamente para a última edição do Festival Literário Rota das Letras. José Drummond teve ainda um ano muito activo enquanto curador. Foi responsável por mais uma edição do VAFA e do festival de vídeo experimental EXIM, além do papel desempenhado na selecção de obras para a exposição que assinala o nono aniversário da Art For All, cuja inauguração está marcada para esta semana. O ano do artista plástico termina com uma projecção de um trabalho na Cinemateca Paixão, no próximo dia 28, que serve de introdução à obra que, em Janeiro de 2017, vai apresentar.
Hoje Macau China / ÁsiaBarcos e aviões dos EUA espiam em águas chinesas [dropcap]A[/dropcap] China usou ontem o caso do drone norte-americano capturado no Mar do Sul da China para denunciar que barcos e aviões dos Estados Unidos entram regularmente nas suas águas em operações de vigilância. “Navios e aviões dos EUA realizam operações de reconhecimento e vigilância” em “águas costeiras da China”, a informou ontem uma porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Hua Chunying. Pequim pediu a Washington para que “pare com essas operações”, a formando que a China “continuará atenta”, disse Hua, em conferência de imprensa. Segundo a China, aquelas operações realizam-se desde há “muito tempo” e “co- locam em perigo” a segurança da navegação na zona. Aporta-voz rejeitou confirmar, contudo, se o drone aquático norte-americano capturado pela marinha chinesa, no Mar do Sul da China, estava a realizar operações de espionagem. O Pentágono afirmou que o drone servia para pesquisas científicas e foi capturado pela Marinha chinesa em águas internacionais. A porta-voz do MNE rejeitou confirmar a versão norte-americana, dizendo que os detalhes concretos pertencem ao Ministério da Defesa chinês. Na rede social Twitter, o Presidente eleito dos EUA, Donald Trump, acusou a China de ter roubado o drone e afirmou que Pequim podia car com ele. “Não gostamos da palavra ‘roubar’ porque não foi isso que se passou”, reagiu Hua Chunying. O jornal Global Times considerou ontem que estes comentários revelam que falta a Trump “bom senso para liderar uma superpotência”. Segundo Washington, o incidente ocorreu a cerca de 50 milhas náuticas a noroeste da base naval norte-americana na Baía de Subic, nas Filipinas, numa zona reclamada por Pequim e vários países vizinhos.
Hoje Macau China / ÁsiaChina no meio das nuvens Escolas e fábricas fechadas, voos cancelados. Mais de duas dezenas de cidades chinesas estão cobertas de fumo com os índices de poluição a registarem valores muito acima dos recomendados pela Organização Mundial de Saúde [dropcap]P[/dropcap]elo menos 23 cidades do Norte da China estão sob alerta vermelho, devido à poluição, que obrigou ao encerramento de escolas e fábricas e cancelamento de voos, enquanto um manto de fumo cobre a região. Em Pequim, a qualidade do ar na tarde de ontem era melhor do que o previsto, com a concentração de partículas PM2.5 – as mais nas e susceptíveis de se infiltrarem nos pulmões – a atingir os 250 microgramas por metro cúbico. Trata-se de um nível nove vezes mais alto ao máximo recomendado pela Organização Mundial de Saúde, mas ainda assim é menos de metade do máximo registado na cidade em 2015, quando superou os 600. O alerta vermelho, o nível máximo de um sistema de quatro cores, foi emitido na sexta-feira e dura até quarta- -feira, esperando-se que a poluição se agrave ao longo dos próximos dias. A maioria das emissões poluentes vem da queima do carvão, que sobe no Inverno, com o aumento da procura por aquecimento, gerando nuvens de poluição. Em Shijiazhuang, capital de Hebei, a província que con na com Pequim, a concentração de partículas PM2.5 atingiu ontem à tarde 701 microgramas por metro cúbico. Na cidade portuária de Tianjin, a 150 quilómetros da capital, mais de 180 voos foram cancelados, desde que o alerta foi emitido, segundo a televisão estatal CCTV. As auto-estradas na cidade foram também encerradas. DESCONTENTAMENTO GERAL Vários hospitais em Tianjin registaram um aumento do nú- mero de pacientes com doenças respiratórias como a asma, de acordo o jornal oficial Diário do Povo. É a primeira vez este ano que Pequim emite o alerta vermelho. A maioria das emissões poluentes vem da queima do carvão, que sobe no Inverno, com o aumento da procura por aquecimento, gerando nuvens de poluição. Nos últimos anos, a poluição tornou-se uma das principais fontes de descontentamento popular na China, a par da corrupção e das crescentes desigualdades sociais.
Hoje Macau SociedadeCanídromo de Macau autorizado a funcionar até julho de 2018 O Canídromo de Macau, considerado uma das mais cruéis pistas de corrida de galgos do mundo por organizações internacionais, foi autorizado a funcionar até meados de Julho de 2018. Já se esperava pela renovação da concessão, mas Albano Martins lamenta que assim seja A última renovação [dropcap]D[/dropcap]everá ser a última renovação da concessão dada à Yat Yuen, empresa do universo da Sociedade de Jogos de Macau que explora o Canídromo de Macau. Uma ordem executiva, publicada ontem em Boletim Oficial, delega poderes no secretário para a Economia e Finanças “na escritura pública de prorrogação do prazo até 20 de Julho de 2018 e alteração do contrato de concessão celebrado entre a RAEM e a Companhia de Corridas de Galgos Macau (Yat Yuen), S.A., para a exploração, em regime de exclusivo, das corridas de galgos”. A ordem executiva vem formalizar o anúncio do Governo que, em Julho, informou que a Yat Yuen teria de decidir entre terminar a exploração da actividade ou relocalizá-la no prazo de dois anos. O Executivo indicou na altura que, a optar pelo encerramento, a empresa terá de pagar todas as indemnizações aos trabalhadores e assegurar o destino final dos galgos que tem em seu poder. Caso escolha a relocalização, “terá de melhorar as condições de criação e tratamento dos galgos”, “em conformidade com os padrões internacionais”, e adequar-se aos “planos urbanísticos”. A operar há mais de 50 anos, o Canídromo de Macau viu a licença renovada por dez anos em 2005, pelo que se gerou a expectativa de que pudesse encerrar no final de 2015. No entanto, o contrato de concessão de exploração da Companhia de Corridas de Galgos de Macau (Yat Yuen) – do universo da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM), fundada pelo magnata de jogo Stanley Ho – foi renovado por mais um ano, até 31 de Dezembro de 2016, com o argumento de que não seria justo encerrar o espaço “de um dia para o outro”. Em paralelo, foi encomendado um estudo ao Instituto de Estudo sobre a Indústria do Jogo da Universidade de Macau, que concluiu que “existem diferentes opiniões da sociedade sobre a renovação ou não do contrato de exploração de corridas de galgos”. “Até 2018, a concessão tem de ser renovada, se entretanto os animais não estiveram já todos mortos” ALBANO MARTINS, PRESIDENTE DA ANIMA Em Julho, a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos de Macau indicou ter optado pelo prazo de dois anos para um desfecho em relação ao Canídromo depois de considerar “o contributo” das corridas de galgos “para o posicionamento” da cidade como “centro mundial de turismo e lazer” e para a diversificação do sector do jogo, assim como as “expectativas da sociedade” e as conclusões do referido estudo. CORRIDAS SEM INTERESSE As receitas do Canídromo, localizado numa zona de elevada densidade populacional, têm vindo a cair há vários anos. Em 2015, cifraram-se em 125 milhões de patacas – menos 13,7 por cento do que em 2014, e menos 63 por cento do que em 2010 – representando 0,05 por cento do total arrecadado por todo o sector do jogo de Macau. O Canídromo tem motivado protestos internacionais, que pedem o seu encerramento, na sequência de uma campanha impulsionada pela Anima – Sociedade Protectora dos Animais de Macau, com organizações de defesa dos direitos dos animais a considerá-lo o “pior do mundo” ao denunciar que nenhum cão sai vivo daquele espaço. Segundo cálculos da Anima,“as mortes rondarão este ano ‘apenas’ os 50 animais, o que constitui uma grande vitória face às ‘normais’ 30 mortes por mês, características de um passado não muito distante, que deve ter dizimado entre 16 mil a 19 mil animais ao longo dessa longa tradição cultural”, escreveu o presidente da associação, Albano Martins, num artigo de opinião publicado na sexta-feira no Jornal Tribuna de Macau. Para tal, terá contribuído o bloqueio da importação de galgos da Austrália e da Irlanda, o que, escreve Albano Martins, fez com que o Canídromo tivesse de reduzir o número de corridas. Em declarações ao HM em reacção à esperada renovação do contrato, o presidente da Anima não deixa de mostrar preocupação com os animais que, até 2018, vão continuar a estar no Canídromo. “Até 2018, a concessão tem de ser renovada, se entretanto os animais não estiveram já todos mortos”, diz, relativizando o argumento dado pelo Governo em relação ao tempo dado à empresa para arranjar uma solução para o negócio. O responsável pela Sociedade Protectora dos Animais de Macau lamenta ainda que “o Governo não tenha em consideração que, se se quer uma cidade moderna, isso não se faz com o sofrimento de animais que não têm culpa alguma”. “Este tipo de jogo já não é interessante para ninguém”, remata. * com LUSA
Isabel Castro Manchete SociedadeOs 1001 contratos de Ho Chio Meng Em mais uma sessão do julgamento do antigo procurador da RAEM, o arguido continuou a alegar a inocência dos crimes que lhe são imputados. O tribunal tentou obter respostas gerais sobre os contratos em que terá havido crime, mas Ho Chio Meng foi aos pormenores Não, tudo tintim por tintim [dropcap]D[/dropcap]a acusação fazem parte mais de mil contratos celebrados pelo Ministério Público (MP) durante os anos em que Ho Chio Meng esteve à frente da estrutura. Ontem, de acordo com o relato feito pela Rádio Macau, foram analisados mais de 300. Dizem todos respeito ao funcionamento do MP e a lista é vasta: da compra de fotocopiadoras a aluguer de bonsais, passando pela limpeza de tapetes, manutenção de extintores e fornecimento de água e luz. Segundo a emissora, o antigo procurador fez questão de responder por cada um dos contratos em que a acusação encontra indícios de crime. O colectivo de juízes do Tribunal de Última Instância, onde Ho Chio Meng está a ser julgado, ainda perguntou ao arguido se negava, de forma geral, os crimes de burla e associação criminosa associados a estes contratos, mas o ex-procura- dor fez questão de refutar os factos um a um. A acusação entende que os 1300 contratos em questão terão dado, a Ho Chio Meng, 50 milhões de patacas, um valor acumulado ao m de dez anos. O arguido recuperou um argumento que tinha usado já na sessão anterior: é absurdo pensar que um procurador iria criar uma associação criminosa para obter vantagens tão reduzidas. Nalguns destes contratos, os benefícios detectados pela acusação não chegam a 500 patacas. O ex-procurador garantiu que não recebeu um avo e reiterou a inocência. Ho Chio Meng assegurou que não violou qualquer princípio, não indicou fornecedores, não participou de forma alguma nos alegados falsos concursos e não retirou qualquer vantagem. OLHEM OS LAPSOS De acordo com a acusação, as empresas que beneficiaram deste esquema – dez no total – eram controladas por um irmão e um cunhado de Ho Chio Meng através de dois testas de ferro, todos eles arguidos no processo. Segundo a rádio, Ho Chio Meng disse que não assinou a maioria dos contratos, nem teve conhecimento dos factos. Os valores dos contratos em análise são muito variados. Entre 2011 e 2014, o MP gastou 300 mil patacas com fotocopiadoras. Estes contratos terão resultado numa contrapartida de 36 mil patacas atribuídas a Ho Chio Meng e a mais sete pessoas ao longo de três anos. Já com os aparelhos de ar condicionado, a alegada associação criminosa terá obtido três milhões de patacas em vantagens. Ho Chio Meng diz que é absurdo pensar que um procurador iria criar uma associação criminosa para obter vantagens tão reduzidas A acusação explica que estas contrapartidas eram conseguidas através de um esquema de subempreitadas: as empresas contratadas pelo MP subcontratavam outras empresas mais baratas para executar o serviço. Durante a sessão de ontem, Ho Chio Meng aproveitou para corrigir alguns pontos da acusação, como cálculos de percentagens e nomes trocados. O tribunal admitiu haver lapsos. O julgamento é retomado depois das férias judiciais, a 4 de Janeiro do próximo ano. Ho Chio Meng vai acusado de mais de 1500 crimes.
Hoje Macau Breves SociedadeRestauração com dias pouco dourados [dropcap]A[/dropcap]penas 26 por cento dos proprietários de restaurantes entrevistados pelos Serviços de Estatística e Censos obtiveram melhores resultados em Outubro deste ano do que no mês anterior. Outubro é o mês de feriados por causa da implantação da República Popular da China e, logo, de mais turistas em Macau, mas o reflexo do aumento de visitantes não se fez sentir em todo o sector. A fatia com melhores resultados registou um aumento de cinco pontos percentuais em relação a Setembro. A maioria – 49 por cento – dedica-se à gastronomia chinesa. Já 51 por cento dos proprietários viram o volume de negócios diminuir em Outubro, com menos 12 pontos percentuais do que no mês anterior. Os restaurantes ocidentais foram aqueles que mais sofreram, com uma queda de 26 pontos. Quanto ao comércio a retalho, só 35 por cento dos inquiridos é que disseram ter feito mais vendas, com 58 por cento dos entrevistados a falarem de uma diminuição, em média, de um ponto percentual no volume de negócios.
Hoje Macau China / ÁsiaFilme chinês mais caro de sempre arrecada milhões na estreia [dropcap]O[/dropcap] filme mais caro da história do cinema chinês, “The Great Wall”, protagonizado pelo norte-americano Matt Damon, arrecadou 465 milhões de yuan (cerca de 64 milhões de euros), no primeiro fim de semana em que foi projectado. Segundo os cálculos elaborados em tempo real pelo portal China Box Office, o filme registou o quarto melhor início deste ano no mercado chinês de cinema, o segundo maior do mundo. A obra, dirigida pelo chinês Zhang Yimou, custou mais de 140 milhões de euros, e relata as aventuras de um mercenário inglês, interpretado por Damon. A história remete para uma China imaginária, onde a Grande Muralha, o monumento mais conhecido do país, foi edificada para deter a invasão por monstros que comem carne humana. “The Great Wall” é a primeira co-produção entre a China e os Estados Unidos da produtora de Hollywood Legendary, adquirida no início deste ano por Wang Jianlin, o homem mais rico da China e presidente do grupo Wanda Group, que tem a maior rede de distribuição cinematográfica do mundo. Um outro filme da mesma produtora, estreado este ano, o “Warcraft”, arrecadou quase 92 milhões de euros no seu primeiro fim de semana nos cinemas chineses, e alcançou receitas finais de 201 milhões de euros. A obra com melhores resultados na estreia, este ano, na China, o “The Mermaid”, alcançou uma receita de bilheteira final de 466 milhões de euros, o melhor resultado de sempre no país. TRAILER https://www.youtube.com/watch?v=_38pS49tQW0 • SITE OFICIAL
Hoje Macau SociedadeHabitação | Número de casas vendidas dispara [dropcap]A[/dropcap]s transacções de imóveis destinados a habitação em Macau subiram 122 por cento no mês passado, em comparação com o período homólogo de 2015, acompanhadas por uma subida de 21 por cento do preço do metro quadrado. Estatísticas disponibilizadas no portal dos Serviços de Finanças revelam que em Novembro deste ano foram transaccionadas 1144 fracções, muito acima das 515 vendidas no mesmo mês do ano passado. Foi na Taipa que se verificou o maior aumento de venda de fracções para habitação, com 239 transaccionadas este ano face às 79 em 2015, uma subida de 202 por cento. Na península de Macau, foram vendidas 818 habitações, mais 114 por cento na comparação anual. O aumento das transacções foi acompanhado por uma subida dos preços de 21 por cento, em termos gerais, para 90.428 patacas por metro quadrado. Na Taipa, a subida foi mais acentuada, 32 por cento, de 76.189 patacas por metro quadrado para 100.571 patacas. A menor subida em termos percentuais, 14,9 por cento, verificou-se na zona com os preços mais altos, Coloane, onde o metro quadrado atingiu em Novembro 125.237 patacas, mais que as 108.999 patacas desse mês em 2015. Desde a liberalização de facto do jogo em Macau, em 2004, com a abertura do primeiro casino fora do universo do magnata Stanley Ho, o sector imobiliário tem estado sempre em alta. No entanto, os preços começaram a cair no início de 2015, registando desde então flutuações. O preço médio do metro quadrado das casas em Macau caiu 13 por cento no cômputo do ano passado face a 2014.