Comércio | UE alerta para impacto do sistema de crédito social

[dropcap]A[/dropcap] Câmara de Comércio da União Europeia na China apelou ontem às empresas europeias para que se preparem para o sistema de crédito social no país, alertando para interrupções “substanciais e amplas” dos seus negócios.

O mecanismo, que será lançado em 2020, implica uma “nova abordagem de conformidade regulamentar”, através do uso de análise de dados em grande escala (Big Data), visando a detecção imediata de não conformidade com as regras do mercado.

Cada empresa passa a estar sujeita a um sistema de “pontuação”, que afectará o regime fiscal, condições de crédito, acesso ao mercado ou participação em concursos públicos.

Os reguladores chineses, desde o fisco às alfândegas, estão a classificar cada vez mais empresas de acordo com aquele sistema, e a partilhar “listas negras” de firmas que violam regras.

Joerg Wuttke, o presidente da Câmara de Comércio, afirmou que “não é exagerado dizer que o Sistema de Crédito Social Corporativo vai ser o sistema mais abrangente criado por qualquer governo para impor um mercado autorregulado”.

“Também não é inconcebível que se trate de uma questão de vida ou morte para as empresas”, apontou.

Wuttke considerou como “profundamente preocupante” a “esmagadora ausência de preparação pela comunidade empresarial europeia”.

Documentos do governo revelam que uma variedade de reguladores chineses, desde da segurança no trabalho ao comércio electrónico ou cibersegurança, estão a compilar classificações de empresas segundo 300 regras específicas, informou a Câmara do Comércio, num relatório.

Prós e contras

Em muitos casos, as empresas estrangeiras podem até beneficiar do sistema, pois geralmente têm melhor conformidade em áreas como a protecção do ambiente, ressalvou a Câmara.

“Empresas europeias cujas operações são frequentemente suspensas, em dias altamente poluídos, a par de competidores que não cumprem com requisitos ambientais, deverão poder continuar a produção, enquanto os poluidores perderão pontos” exemplificou.

Em outros casos, uma empresa pode perder pontos devido às acções de um parceiro local. Um caso citado no relatório revela que uma empresa estrangeira foi informada de que a classificação do seu parceiro pelas autoridades alfandegárias afectaria a sua classificação.

O controverso mecanismo afectará também indivíduos, com os dados coletados a resultarem em recompensas ou punições, dependendo da pontuação, pelo que críticos consideram tratar-se de um sistema “orwelliano”.

O relatório considera que a discussão se tem focado nas implicações para os indivíduos, mas que houve “muito menos discussão” sobre o impacto para os negócios.

29 Ago 2019

Amazónia | Macron acusa Bolsonaro de mentir em matéria de compromissos ambientais

[dropcap]O[/dropcap] Presidente de França, Emmanuel Macron, acusou hoje o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, de mentir em matéria de compromissos ambientais e anunciou que, nestas condições, França vai votar contra o acordo de comércio livre UE-Mercosul.

“Tendo em conta a atitude do Brasil nas últimas semanas, o Presidente da República não pode se não constatar que o Presidente Bolsonaro lhe mentiu na Cimeira de Osaka”, afirmou a presidência francesa, referindo-se à Cimeira do G20 que se realizou no final de Junho.

“O Presidente Bolsonaro decidiu não respeitar os compromissos ambientais e não se empenhar em matéria de biodiversidade. Nestas condições, França opõe-se ao acordo com o Mercosul tal como está”, acrescentou.

Emmanuel Macron manifestou na quinta-feira preocupação com os fogos florestais que estão a devastar a Amazónia, a maior floresta tropical do planeta ,evocando uma “crise internacional” e pedindo aos países industrializados do G7 “para falarem desta emergência” na cimeira que os reúne este fim de semana em Biarritz (sudoeste de França).

Jair Bolsonaro, respondeu acusando o homólogo francês de ter “uma mentalidade colonialista descabida” ao “instrumentalizar” o assunto propondo que “assuntos amazónicos sejam discutidos no G7, sem a participação dos países da região”.

O acordo de livre comércio entre a União Europeia (UE) e o Mercado Comum do Sul (Mercosul), integrado pelo Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, foi fechado a 28 de Junho, depois de 20 anos de negociações.

O pacto abrange um universo de 740 milhões de consumidores, que representam um quarto da riqueza mundial.

A Irlanda ameaçou também hoje votar contra o acordo comercial se o Brasil não tomar medidas para proteger a floresta amazónica. “Não há qualquer forma de a Irlanda votar a favor do acordo de comércio livre entre a UE e o Mercosul se o Brasil não respeitar os seus compromissos ambientais”, afirmou o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar.

“Estou muito preocupado com os níveis recorde de destruição pelo fogo da floresta amazónica este ano”, acrescentou, numa nota à agência France-Presse.

Numa entrevista à agência EFE hoje divulgada, o embaixador da UE em Brasília, Ignácio Ybáñez, destacou o empenho do Brasil na aplicação do acordo, mas recordou a Bolsonaro a “aposta clara” do acordo no cumprimento do acordo de Paris sobre alterações climáticas.

Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) brasileiro, os incêndios no Brasil aumentaram 83% este ano, em comparação com o período homólogo de 2018, com 72.953 focos registados até 19 de Agosto, sendo a Amazónia a região mais afectada.

A Amazónia é a maior floresta tropical do mundo, cerca de 5,5 milhões de quilómetros quadrados, e possui a maior biodiversidade registada numa área do planeta. Segundo o INPE, a desflorestação da Amazónia aumentou 278% em Julho, em relação ao mesmo mês de 2018.

23 Ago 2019

Branqueamento de capitais | Crime organizado oriundo da China recorre a retalho de luxo na UE 

O mais recente relatório da Comissão Europeia sobre branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo revela que grupos de crime organizado da China recorrem ao retalho de luxo para lavar dinheiro. Actividades como jogo, investimento no imobiliário ou vistos gold são outras das vias mais comuns para lavar dinheiro. O relatório refere casos de norte coreanos que usam outros passaportes para fazer negócios fora do país

 

[dropcap]A[/dropcap] Comissão Europeia publicou um relatório sobre as formas mais comuns de lavagem de dinheiro ou de financiamento de actividades terroristas na União Europeia (UE), prejudicando, desta forma, o mercado interno do Espaço Schengen.

O relatório, com mais de 200 páginas e tornado público no passado dia 24, dá conta da presença de grupos de crime organizado oriundos da China que recorrem ao sector do retalho de luxo para lavar dinheiro. “Foi detectada a presença de grupos de crime organizado da China que exploram artigos de luxo (alta costura) e de marcas europeias de topo no mercado chinês. O dinheiro é fornecido de forma ilegal a nacionais da China que o usam para adquirir produtos de luxo. Esses produtos são, na sua maioria, vendidos online na China e os lucros são usados para pagar compensações na China”, lê-se.

Além disso, “as actividades ilegais dos grupos de crime organizado da China na Europa são a principal origem dos rendimentos ilegais para comprar esses produtos. Estas actividades ilegais incluem fraudes ao nível dos impostos e zonas aduaneiras no transporte de mercadorias chinesas, artigos de contrafacção, tráfico de drogas, exploração sexual e laboral”.

O relatório cita dados relativos aos anos de 2015 e 2016, que mostram que “os nacionais chineses a residir na UE eram usados para transportar dinheiro. Abriram contas bancárias, fizeram depósitos em numerário e transferiram capital para a China”. Foi também utilizado outro método, através dos turistas chineses, que “transferiram dinheiro aquando do seu regresso à China”.

Ciclos e mais ciclos

A regulação existente na UE obrigou estes grupos a mudarem de estratégia, aponta o relatório da Comissão Europeia. Como tal, passaram a utilizar “compradores para adquirir produtos de luxo”, que, depois de serem adquiridos na Europa, “eram levados para a China onde eram vendidos com uma margem de lucro e todos os ganhos eram transferidos internamente no país entre compradores e as estruturas criminosas”.

Este método “é uma forma dos criminosos conduzirem um ciclo completo de lavagem de dinheiro, ao ponto de poderem usar livremente os ganhos na China para pagar novas remessas de transporte de mercadorias, por exemplo”.  “Quando importadas da Europa, estas remessas podem ser subavaliadas e vendidas sem documentos. O dinheiro gerado vai de novo ser lavado e levado da Europa para a China, criando-se assim um ciclo de crime que contorna tanto os reforços feitos à legislação como as intervenções das autoridades ao nível dos impostos”, acrescenta o relatório.

Apesar da UE considerar o comércio de produtos de luxo e de pedras preciosas como tendo um risco “muito significativo” de branqueamento de capitais, a verdade é que as autoridades europeias acreditam que estas actividades pouco ou nada ajudam ao financiamento do terrorismo.

Os vistos gold

Actualmente, há 20 Estados-membros da UE com programas de atribuição de cidadania através do investimento no país, os chamados vistos gold. Contudo, a Bruxelas considera que estes programas acarretam elevados riscos ao nível de lavagem de dinheiro e corrupção. “Nos últimos anos, verificou-se uma crescente tendência de programas de atribuição de cidadania através do investimento. Estes esquemas aumentaram as preocupações sobre determinados riscos que estão inerentes, no que diz particular respeito à segurança, lavagem de dinheiro, fuga aos impostos e corrupção”, lê-se.

O relatório dá mesmo o exemplo de norte-coreanos que recorreram a outros passaportes para investirem fora do seu país. “Os nacionais da Coreia do Norte fizeram por obter passaportes alternativos, que usam para levar a cabo negócios fora do país – dois norte-coreanos foram identificados com passaportes das ilhas Kiribati e Seicheles para operar em Hong Kong e no Japão. Apesar de ambas as nações terem cancelado o programa de vistos, acredita-se que os seus passaportes foram emitidos depois da alegada data de cancelamento.”

No seio da UE, há o caso do Chipre, que, aos olhos das autoridades europeias, tornou-se “num refúgio financeiro para oligarcas russos e ucranianos e uma plataforma para operações de branqueamento de capitais”, uma vez que o país permite que se seja cidadão cipriota em menos de seis meses, mediante investimento de dois milhões de euros. Em dois anos, cerca de metade dos dois mil passaportes emitidos foi dentro deste esquema de vistos gold.

Apesar do relatório não mencionar directamente os cidadãos chineses que obtém cidadania portuguesa através dos visto gold, a verdade é que esta nacionalidade continua a liderar o número de processos no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Dados desde Outubro de 2012 até Junho deste ano mostram que foi emitido um total de 4.291 passaportes para cidadãos chineses, seguindo-se o Brasil com 764 passaportes.

Em ligação com a atribuição de vistos gold está o investimento na área do imobiliário, e que o relatório aponta como uma forma “muito significativa” de branqueamento de capitais ou mesmo de financiar actividades terroristas. Isto porque, apesar das regulações existentes, ainda há muitos pagamentos feitos a dinheiro.

“Apesar desta forma estar a diminuir, o dinheiro pode ainda ser usado em algumas transacções de imobiliário em alguns Estados-membros. Tal aumenta o risco de ocorrência de transacções anónimas. Os agentes do imobiliário estão normalmente envolvidos em relações de negócio com outros profissionais, dificultando a monitorização do negócio de forma efectiva.”

Desta forma, “as actividades do imobiliário podem constituir uma base para a circulação de dinheiro que chega de fora da UE por parte de clientes de alto risco, como pessoas que estão politicamente expostas”, acrescenta o relatório.

Os casinos

Apesar de existir legislação que regula o sector do jogo na UE há cerca de dez anos, as autoridades continuam a ter algumas preocupações, sobretudo no que diz respeito à falta de harmonização legislativa e na falta de regulamentação efectiva de apostas em tempo real.

O relatório considera que, apesar de o jogo nos casinos não constituir uma ferramenta para o financiamento do terrorismo, nem particularmente para actividades de lavagem de dinheiro, a verdade é que jogos como lotarias ou outro tipo de apostas constituem um risco.

“No caso de outras actividades de jogo, constituem risco de infiltração ou de domínio por parte de grupos de crime organizado”, lê-se. “Órgãos de aplicação de leis indicaram que os casinos estão particularmente expostos a ameaças de infiltração. Contudo, os casinos que são geridos por monopólios estatais ou empresas públicas parecem estar menos expostos a essa infiltração, devido às regulações impostas, ao nível da transparência e da propriedade”, aponta ainda o relatório.

31 Jul 2019

Aquela faixa

[dropcap]É[/dropcap] certo e sabido que os chineses estão por todo o lado, como os portugueses: viajamos para aquela ilha paradisíaca e eles estão por lá. Desta vez, os chineses decidiram estabelecer-se numa terra chamada Boi Morto, no norte de Portugal e, alegadamente, traficar haxixe.

A história foi ontem publicada nas páginas do Diário de Notícias e não deixa de soar alarmes sobre o lado negativo dos vistos gold. Já a ex-eurodeputada Ana Gomes, em entrevista ao HM, tinha alertado para o facto destes vistos poderem potenciar a entrada de tríades e esquemas de corrupção no espaço Schengen.

As próprias autoridades chinesas estão atentas e garantiram que não vão deixar passar em claro casos de corrupção no âmbito da política “Uma Faixa, Uma Rota”. Xi Jinping bem tenta combater a corrupção no seu país, um dos grandes problemas sociais e políticos dos últimos anos, mas o caminho não tem sido fácil.

Ainda a procissão vai no adro, que é como quem diz, ainda esta política está a começar a ser estabelecida, e já se teme a corrupção. Do lado da União Europeia, resta-nos esperar uma intervenção eficaz das autoridades, para que estes problemas não atinjam a Europa da pior maneira.

30 Jul 2019

Hong Kong | Parlamento Europeu aprova resolução sobre lei da extradição

Mais de uma dezena de eurodeputados, nenhum deles português, usou ontem da palavra para, no Parlamento Europeu, demonstrar o apoio aos manifestantes em Hong Kong e condenar as detenções. A China já reagiu e fala em hipocrisia da União Europeia, argumento também usado pelo eurodeputado Miguel Urban Crespo, do partido espanhol Podemos. A ex-eurodeputada Ana Gomes apelou à votação da resolução

 

[dropcap]O[/dropcap] Parlamento Europeu (PE) iniciou uma nova legislatura no passado dia 2 deste mês e iniciou a agenda com a votação de uma resolução contra a lei da extradição em Hong Kong e a detenção de manifestantes, sem esquecer o caso dos livreiros desaparecidos, ocorrido em 2015.

O debate sobre a resolução aconteceu na manhã de ontem, hora de Estrasburgo (cerca das 18h em Macau), e contou com a participação de 15 deputados, nenhum deles português.

A eurodeputada polaca Anna Fotyga foi uma das primeiras a intervir na sessão, presidida pela eurodeputada Dita Charanzová, vice-presidente do PE. “As pessoas de Hong Kong estão com medo e esse medo é facilmente detectável, uma vez que os protestos continuam. A razão do medo é a imposição de uma lei da extradição. Acredito que estes protestos irão continuar, a não ser que a solução se resolva politicamente, algo a que apelamos.”

Antony Hook, eurodeputado britânico, destacou a mobilização dos membros do PE. “Deveríamos ter orgulho no facto de esta resolução ter obtido o apoio dos cinco maiores grupos que compõem este parlamento. E isto é importante, porque os 28 Estados-membros são fortes quando estão juntos. Temos um inquebrável compromisso com a democracia e os direitos humanos, não apenas para nós próprios, mas para todas as pessoas no planeta. Cerca de dois milhões de pessoas protestaram nas ruas contra a lei da extradição imposta pelo Governo de Hong Kong que não é eleito pela sua população.”

Hook fez referência aos inúmeros relatórios internacionais sobre a situação dos direitos humanos na China. “Sabemos por vários relatórios o que acontece na China, tal como condenações injustas e prisões forçadas. A polícia usou força e violência que não eram necessárias e é claro que apoiamos os manifestantes de Hong Kong. Pedimos eleições livres e justas e queremos dizer que, nós, europeus, estamos com as pessoas de Hong Kong”, acrescentou.

Neena Gill, eurodeputada ligada ao Partido Trabalhista britânico, lembrou a importância deste assunto tendo em conta o papel que a China ocupa hoje como um dos principais actores na diplomacia mundial.

“A União Europeia (UE) deve dar um passo claro e apoiar a liberdade em Hong Kong. Isso é muito importante porque a China está a ter grande foco internacional neste momento, a sua economia está a abrandar e há que ter em conta o que se passa em Xinjiang. É muito importante frisar a questão dos direitos humanos.”

Para a eurodeputada, está em causa a manutenção do princípio “Um País, Dois Sistemas”. “Os protestos que temos visto nos últimos dias são um sinal claro de que a população de Hong Kong não vai deixar que os seus direitos sejam diminuídos. Se os protestos continuarem isto será uma grande vitória para a democracia. Contudo, se Pequim ganhar, será um fim prematuro da ‘Política um País, Dois Sistemas’”, frisou.

A crítica do Podemos

Apesar de apoiar a resolução, o eurodeputado espanhol Miguel Urban Crespo, do partido de extrema-esquerda Podemos, lançou críticas à própria UE. “Apoiamos o direito à manifestação em todo o mundo, pois trata-se de um direito fundamental e também o é em Hong Kong. Mas estamos a falar de violação de direitos humanos fora das fronteiras da Europa e isso é uma hipocrisia, uma vez que também ocorrem violações de direitos humanos dentro da Europa.”

Nesse sentido, Miguel Urban Crespo defendeu o diálogo “com todas as instituições e com Pequim para garantir os direitos da população em Hong Kong”, e também para “encontrar uma relação apropriada com a China”.

O mesmo argumento foi usado pelo país, uma vez que, de acordo com o South China Morning Post, o comissário do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês em Hong Kong se referiu aos parlamentares europeus como hipócritas. Em comunicado, é referido que a resolução ontem aprovada “ignora os factos e confunde o que é certo com o errado”.

Para Pequim, o documento do PE “está cheio de ignorância, orgulho e é duplamente hipócrita. Aponta o dedo e dá ordens ao nível das políticas adoptadas pela Região Administrativa Especial de Hong Kong e pelo Governo Central. A sua ignorância e atitude deixaram as pessoas sem palavras com espanto e horror”.

No pedido de resolução apresentado pelos eurodeputados, é referido o facto de a Chefe do Executivo de Hong Kong, Carrie Lam, não ter retirado por completo a proposta de lei da extradição, a qual “poderia facilitar a extradição de pessoas para a China por razões políticas e a sujeição a um sistema judicial com deficiências graves em matéria de direitos humanos”.

Nesse contexto, “o tribunal de Hong Kong não teria competência clara e explícita e a obrigação jurídica para examinar os diversos direitos humanos envolvidos em casos apreciados pelos tribunais na China continental ou noutros países”. Os eurodeputados alertam ainda para o facto de o “sistema judicial da China continental carecer de independência do Governo e do Partido Comunista Chinês e ser caracterizado por detenções arbitrárias, tortura e outros maus tratos, graves violações do direito a um julgamento justo, desaparecimentos forçados e vários sistemas de detenção em regime de incomunicabilidade sem julgamento”.

Os eurodeputados alertam ainda para o facto de a polícia de Hong Kong ter usado “actos de violência de um pequeno número de manifestantes como pretexto para a utilização desnecessária e excessiva de força contra os manifestantes”. O documento faz também referência ao caso dos quatro livreiros desaparecidos em Hong Kong no final de 2015.

18 Jul 2019

Comissão Mista | UE quer mais cooperação no combate ao tráfico humano

Realizou-se esta terça-feira a 17ª reunião da Comissão Mista União Europeia-Macau. Dos vários assuntos abordados em matéria de integração regional com a China e questões fiscais, ficou a garantia de que a União Europeia quer mais cooperação com a RAEM ao nível do tráfico humano

 

[dropcap]A[/dropcap] União Europeia (UE) mostra-se disposta a colaborar com Macau no combate ao tráfico humano. Esta foi uma das conclusões da mais recente reunião da Comissão Mista UE-Macau, e que aconteceu esta terça-feira.

De acordo com um comunicado oficial, “a UE e a RAEM esperam continuar a ter uma cooperação bilateral no combate ao tráfico de seres humanos”.

Além disso, aquela que foi a 17ª reunião da Comissão Mista UE-Macau desde 1999 serviu também para abordar o projecto político chinês da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. O mesmo comunicado aponta que “a UE manifestou o seu interesse na exploração, em conjunto com Macau, de canais de cooperação do desenvolvimento da Grande Baía”.

Do lado da RAEM foi explicado o posicionamento do território a este nível, nomeadamente através da apresentação do Plano Quinquenal de Desenvolvimento da RAEM (2016-2020), uma das bandeiras políticas do actual Chefe do Executivo, Chui Sai On. As autoridades de Macau também abordaram “os esforços do Governo para promover a diversificação da economia”, bem como “os últimos desenvolvimentos na cooperação com os países de língua portuguesa”.

Nesse sentido, “foram obtidos resultados relevantes da cooperação no âmbito de intercâmbio cultural, formação de educação internacional e de talentos, registo de medicamentos tradicionais chineses e comércio multilateral para a indústria da medicina tradicional chinesa”, aponta o mesmo comunicado.

A reunião foi presidida pelo secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, e pela Directora-Executiva Adjunta do Serviço Europeu de Acção Externa para a Ásia-Pacífico, Paola Pampaloni.

Diálogo sobre o fisco

As duas delegações discutiram também sobre políticas e assuntos de regulação. No que diz respeito às políticas fiscais, os representantes do Executivo referiram a “boa cooperação entre as duas partes nos anos passados para concretizar a boa governação fiscal e que se realizou uma reforma do sistema fiscal em Macau”.

Foram também abordados temas como o “combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, assuntos de protecção ambiental e promoção da cooperação multilaterais para apoiar a Organização Mundial do Comércio”.

No que diz respeito a questões económicas, a guerra comercial entre a China e os Estados Unidos foi também discutida. Os responsáveis da UE garantiram aos governantes de Macau que “a economia europeia ainda não se encontra afectada pelas condições externas desfavoráveis como a disputa comercial”, prevendo-se inclusivamente crescimento económico, “devido à forte procura interna, ao aumento gradual de postos de trabalho e ao custo de financiamento baixo”. A próxima reunião será realizada em Macau em 2020, já com um novo Executivo.

13 Jun 2019

Europa mais verde

[dropcap]A[/dropcap] agenda ecológica vai fazendo o seu lento mas aparentemente imparável caminho na discussão política: a cada vez mais visível emergência dos problemas ambientais e a eminência de uma catástrofe global sensibilizam um número evidentemente crescente de pessoas e mobilizam-nas para ações políticas diversas: com muito pouco tempo de diferença, tivemos adolescentes nas ruas de todo o mundo numa sem precedentes reivindicação do seu direito ao futuro e assistimos à duplicação da representatividade dos partidos ecologistas no Parlamento Europeu. Em vários países da Europa, os países ecologistas foram o segundo mais votado. Portugal também contribuiu para este crescimento com a estreia de um deputado eleito pelo PAN – contrariando, de resto, a generalidade das projeções publicadas na imprensa – mas foi da Alemanha (mais 8), França (mais 6) e Reino Unido (mais 5 deputados) que chegaram os maiores contributos.

Já em relação à participação eleitoral, foi modesto o contributo nacional e a abstenção manteve-se muito próxima dos níveis habituais neste tipo de sufrágio, ao contrário do que aconteceu na generalidade do território europeu – na realidade um sinal de que as questões transnacionais da governação da União Europeia se vão tornando mais interessantes e mobilizadoras para a população do continente. Talvez essa preocupação chegue também a Portugal, um destes dias.

Por enquanto pareceu percorrer grande parte do continente e contribuir – aparentemente de forma decisiva, como no caso da Holanda – para neutralizar a emergência da extrema-direita xenófoba em vários países.

O aumento da participação foi acompanhado por um manifesto aumento da diversidade. A tendência que se vem assinalando em quase todos os países para a perda de hegemonia dos alegados “blocos centrais” – essa mesa onde animadamente repastam as chamadas esquerda e direita “moderadas” – atingiu um patamar sem precedentes no Parlamento Europeu: pela primeira vez desde que se realiza este tipo de eleição, as duas grandes “famílias” políticas não têm, em conjunto, mais de 50% de deputados. “Geringonças” governativas cada vez mais complexas há hoje muitas, por esse mundo fora. Também no Parlamento Europeu novas e criativas aritméticas serão certamente convocadas para definir maiorias num contexto de relativa pulverização do eleitorado e diversificação programática dos seus excelsos representantes.

Nesta diversificação não coube o primeiro movimento que reivindica um original caráter europeu, liderado pelo conhecido ex-ministro das finanças da Grécia, no triste período histórico em que o país tentou enfrentar – sem sucesso – as regras da austeridade definidas pelas instituições europeias e pelo FMI. Apesar do mediatismo de algumas intervenções, nenhuma das candidaturas nacionais associadas a esse movimento transeuropeu – o Diem25 – conseguiu eleger representantes. Aliás, também a “esquerda da esquerda” sofreu significativa derrota e perda de representatividade à escala europeia, ainda que o número de representantes portugueses se tenha mantido, com uma significativa troca de posições entre os dois partidos (BE e CDU) aí representados. Pelo contrário, além dos ecologistas, também os liberais (onde se inclui o partido do Presidente francês, mas também uma forte representação – provavelmente temporária – do Reino Unido) conseguiram um crescimento significativo, juntando-se aos mais tradicionais grupos da social democracia, da democracia cristã e dos conservadores enquanto forças hegemónicas no Parlamento Europeu. Uma hegemonia mais partilhada e complexa, em todo o caso.

Ao contrário do que foi anunciando na imprensa da especialidade nas semanas anteriores à eleição, nem os movimentos mais assumidamente xenófobos (ou fascistas, numa designação também muito utilizada – até pelos próprios – e eventualmente mais precisa), nem os partidos mais abertamente anti-EU assumiram posições determinantes nos luxuosos hemiciclos de Bruxelas e Estrasburgo. Essa extrema direita liderada pelo movimentos anti-imigração da Itália, França e Alemanha não foi acompanhada por uma significativa emergência de movimentos semelhantes noutros sítios – na realidade, em países como a Holanda, até desapareceram do espectro. Tal como noutros momentos históricos, a emergência da extrema-direita só parece ser possível em momentos de crise económica profunda, o que não parece ser (já? ainda?) o caso. De maneira semelhante, também os movimentos claramente anti-EU acabaram por conseguir limitada representação parlamentar – e que se tornará ainda mais pequena se e quando se concretizar o Brexit e saírem do Parlamento os deputados eleitos pelo Reino Unido. Dessa saída resultarão uma nova reconfiguração de forças e novas geografias e aritméticas parlamentares. São tempos interessantes mas com respostas lentas às urgências fundamentais.

1 Jun 2019

Ana Gomes, ex-deputada do Parlamento Europeu, sobre vistos gold: “É uma prostituição da cidadania europeia”

Ana Gomes não se recandidatou às eleições europeias e vai reformar-se, mas não pretende abandonar o papel de investigadora na área do crime económico. A ex-eurodeputada defende que o programa dos vistos gold “é criminoso do ponto de vista da lei chinesa”, favorece a corrupção e a entrada de tríades na Europa. Ana Gomes fala de Vítor Sereno, ex-cônsul, como um dos grandes angariadores de vistos gold em Macau

[dropcap]M[/dropcap]arcelo Rebelo de Sousa esteve na China há pouco tempo. Foi algo crítica no seu Twitter face à postura do Presidente da República. Que balanço faz da visita?
Não conheço os balanços que se estão a fazer internamente, a nível diplomático e económico. Não tenho dúvida de que, ao nível dos media, as autoridades portuguesas procuraram mostrar que tudo é maravilhoso. Não gostei de ver o nosso Presidente da República ir na molhada dos 120 dignitários de países que participam na iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”. Acho que as relações Portugal-China são suficientemente importantes e distintas de outro tipo de relação, e mesmo que os chineses decidissem enquadrá-la na iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, Portugal não teria de ir na molhada.

Fala do Fórum que se realizou em Pequim sobre essa política.
Sim. Acho que há aqui uma questão de estatuto estratégico para Portugal, e não para a China, que nos deveria ter feito dizer que estaríamos disponíveis para ir este ano à China, mas não permitir um enquadramento de forma indistinta. Por muito que, quer o Presidente da República, quer o Governo, projectem uma imagem de grande triunfo, eu estou para ver qual foi o triunfo. Vi o Presidente da República falar das 48 universidades onde se aprende português. Já aprendiam, não? Não foi por causa desta visita.

É algo que tem vindo a acontecer aos longo dos anos.
E tem a ver obviamente com os desígnios estratégicos chineses, em relação aos quais não me cabe criticar. Acho muito bem, pois a China tem capacidade e interesse, vê as coisas de maneira global e a longo prazo. Tem os seus recursos para os monopolizar para aquilo que entende ser do seu interesse e naturalmente que isso passa pelo conhecimento das línguas, onde o português é relevante. Portugal não pode embarcar neste tipo de iniciativas, que são estratégicas para a China, só com uma perspectiva de interesse económico. A relação com a China é demasiado importante para ser entendida apenas de uma perspectiva económica e mercantilista, justificada a pretexto de um combate ao proteccionismo. A relação com a China tem de ser vista a várias dimensões.

FOTO: Lusa

Quais são elas?
Falo da dimensão da segurança humana em Portugal no que respeita aos direitos fundamentais dos cidadãos portugueses. Chegou-se ao ponto de se criar um sistema de crédito social, que serve para controlo das liberdades cívicas. Acho isto altamente preocupante, e não me venham dizer que ao falar de direitos humanos a Xi Jinping se cumpriu a nossa obrigação em matéria de direitos humanos. Não só vejo essas obrigações em relação aos cidadãos chineses que não dispõem de direitos básicos e fundamentais, a que a China está veiculada por fazer parte da ONU, mas também do ponto de vista dos cidadãos portugueses.

Como é que a segurança dos portugueses pode estar em risco?
Quando se contempla importar as redes 5G da Huawei, sabendo que na China não existe um regulamento geral de protecção de dados pessoais. Acho que é altamente hipócrita e perigoso passar-se por cima destes aspectos, já para não falar dos sectores da vida política e económica portuguesa que já estarão nas mãos dos chineses, não só pela via das compras que cá vieram fazer na altura da Troika, com grandes cumplicidades e grandes responsabilidades europeias, mas também nacionais, como pelo controlo que exercem através de tecnologias que tem os seus dados armazenados na China. Visitei a Huawei em 2015, perto de Pequim, e sei bem que qualquer dado que a Huawei obtenha em qualquer parte do mundo é, por imposição chinesa, armazenado na China.

Os políticos portugueses deixaram-se seduzir muito facilmente num período de crise económica, e agora é tarde?
Não sou ingénua e sei bem que o longo relacionamento com a China através de Macau sempre teve aspectos positivos a nível cultural, político e social, mas também tem aspectos bastante perniciosos, designadamente ao nível de uma lógica economicista que facilitou a corrupção, ao nível dos próprios partidos políticos. Se isso aconteceu no passado ainda mais acontece no presente, ainda por cima depois de Portugal passar este período de aflição tremenda com uma austeridade imposta, onde se privatizaram infra-estruturas críticas e centros estratégicos para Portugal e para a União Europeia (UE). Na altura incomodaram-me muito a atitude das autoridades nacionais e a negligência das autoridades europeias, designadamente as que integravam a Troika. Não viram as questões de segurança, de deixar uma empresa como a REN ser controlada pela State Grid. Na altura coloquei questões à Comissão Europeia, que me respondeu com respostas inenarráveis, de que era o mercado a funcionar. Hoje a sensibilidade na Comissão é outra, mas entretanto já muitas concessões foram feitas em Portugal na área da energia e dos portos, como é o caso do Porto de Sines, e também noutros países europeus. Não é por acaso que a Grécia e países do leste, como a Bulgária e Roménia, estão a ser alvo de um interesse alvo por parte da China.

O discurso político vigente não parece estar atento a esses perigos.
Até os negligencia totalmente. Reduziram a uma questão ao combate a um proteccionismo induzido pelo lado americano, quando obviamente isso é distorcer o que está em causa. É negligenciar a própria segurança nacional e europeia. Eu vejo grandes vantagens na forma como a China tirou da pobreza milhares de milhões de pessoas, mas no seu relacionamento com países africanos, há aspectos positivos e negativos. Portugal, sabendo o que sabe, e sendo membro da UE, não se pode dar ao luxo de ser ingénuo.

Houve uma nova resolução aprovada em Março no seio da UE relativa a crimes financeiros e casos de evasão fiscal. Vem resolver os problemas que se vinham verificando até então?
É a quarta directiva sobre branqueamento de capitais, na qual participei, mas já vem a caminho a quinta directiva. Conseguimos que os Estados-membros fiquem obrigados a criar registos centrais dos beneficiários únicos de todas as companhias, e portanto todas tem de registar e identificar quem é detentor de, pelo menos, 25 por cento das suas acções. Esta é a forma mais importante de combatermos a evasão fiscal e o branqueamento de capitais. Isto é importante para Portugal e também para a China, pois vamos cobrir grande parte dos esquemas de branqueamento de capital que se fazem através dos vistos gold, tendo em conta que os cidadãos chineses representam cerca de 80 por cento do número de pedidos. O próprio visto gold implica a compra de imobiliário com o valor mínimo de 350 mil euros, valor que é bastante mais elevado do que o montante que a China permite aos seus cidadãos exportarem anualmente. O esquema em si é criminoso do ponto de vista da própria lei chinesa. Certamente que o esquema se presta muito aos criminosos chineses e às tríades para se infiltrarem na UE, porque além dos adquirentes há os familiares. Este é um assunto que tem estado na mira das autoridades chinesas e eu própria contactei com elementos da polícia chinesa que me contactaram quando participei, há uns anos, num seminário sobre os vistos gold. Sei que estiveram algumas vezes em Portugal e que até houve um cidadão chinês que foi extraditado e que era portador de um visto gold. É um assunto de interesse mútuo, as autoridades portuguesas estão confrontadas com o recente relatório da UE sobre os riscos destes sistemas para a segurança do espaço Schengen, mas o actual Governo tem feito vista grossa e tem actuado de uma forma que considero altamente criticável.

Houve apenas um projecto proposto por um partido político português para por fim aos vistos gold, e que foi rejeitado pelos deputados.
Apoiei esse projecto e em breve farei uma reunião aqui com o representante da Comissão Europeia. Há cerca de 20 países europeus com esquemas de vistos gold. Que autoridades de vários países continuem a fazer vista grossa a este assunto não me vai impedir a mim e a mais gente de ajudar quem quer expor os casos. No caso de Portugal, o esquema é opaco, porque mesmo Chipre e Malta publicam as listas dos cidadãos que adquirem os vistos gold, mesmo na forma de passaportes. Tenho endereçado cartas a todos os governantes a pedir para consultar os nomes das pessoas e isso não me é facultado. A explicação que me dão é a protecção de dados, num país onde se publicam nomes e moradas por tudo e por nada. A única explicação que encontro é a consciência de que, se eu pudesse consultar essa lista, encontraria uma série de indivíduos que não seriam recomendáveis em nenhum país do mundo, a não ser atrás das barras de uma prisão.

Um ex-ministro foi inclusivamente arguido num processo relacionado com os vistos gold. Esse processo, só por si, tirou credibilidade a uma política já frágil?
Paulo Portas foi o pai dos vistos gold mas não inventou a roda, porque foi copiar outros esquemas de vistos gold que já existiam e havia obviamente intuitos de favorecer a corrupção. Não sou contra o facto de Portugal facilitar a vinda de cidadãos que tenham cá investimentos, mas não deve ser vendida a residência. Isso favorece a constituição de cartéis, de angariadores de vistos gold, que não só facilitam todo o tipo de criminalidade como eles próprios se sustentam com o financiamento. Da forma como este esquema foi operacionalizado há ligações de ex-ministros e de ex-chefes de gabinetes de ministros, não é só Miguel Macedo. Foi feita a colocação de antigos chefes de gabinete em posições chave do aparelho diplomático, na China, por exemplo, para a angariação de vistos gold, o que favorece a corrupção.

Pode dar nomes?
O antigo ministro Mário Lino é um dos que me dizem que tem uma empresa envolvida na operacionalização dos vistos gold. Além disso, vi várias vezes Vítor Sereno, na qualidade de cônsul em Macau e Hong Kong, a fazer auto-promoção do seu papel no esquema dos vistos gold.

Na China, Marcelo pediu mais investimento na economia real, e esse relatório da UE também fala do facto dos vistos gold não ajudarem a desenvolver a economia real.
Contam-se pelos dedos das mãos os vistos gold que foram concedidos em troca de investimento na economia e criação de emprego. A maior parte depende do imobiliário. Isso só por si demonstra que o esquema é perverso e não cumpriu os objectivos. Depois dizem que o Estado ganha imenso dinheiro com os emolumentos. É um esquema de prostituição da cidadania europeia. Não há controlo da origem das fortunas. E não sabemos hoje da missa a metade dos esquemas de corrupção e não sei se algum dia iremos a saber. O ganho económico não pode ser justificação.

Macau vai acabar com as sociedades offshore até 2021. Chegou a estar numa lista de paraísos fiscais da UE, depois saiu da lista. O facto de haver uma lei que põe fim às offshore faz com que haja mais transparência?
Não sei o que Macau está a prever nessa matéria. Sei que na UE há cada vez maior interesse em expor e conhecer estes esquemas. Já percebemos que não é pela lista de jurisdições que não cumprem as regras (que se resolve o problema), embora isso possa ser importante, mas é sim pela imposição de mecanismos de transparência. Nesse sentido a quarta directiva vai ter impacto além da UE e nas jurisdições que tem íntima ligação com países da UE, como é o caso de Macau. Na quinta directiva aperta-se o controlo.

Falou da questão dos partidos e da corrupção com ligações a Macau. Isso continua a acontecer mesmo depois da transição?
Pode acontecer por vias mais sofisticadas e através de escritórios de advogados. Estes são frequentemente intermediários desses esquemas e a criminalidade associada à fuga ao fisco e branqueamento está muito sofisticada, e isso faz-se através dos partidos políticos. Estamos atentos e penso que haverá mais investigação sobre isso. A Comissão Europeia passou recentemente uma directiva sobre as entidades obrigadas no quadro do branqueamento e incluem-se também agências imobiliárias ou escritórios de advogados, entre outros. Pessoalmente vou continuar a trabalhar nisso aqui.

Este ano comemoram-se os 20 anos da transferência de soberania de Macau para a China. A Lei Básica tem sido cumprida?
Acho que a Lei Básica tem muitos aspectos importantes e estruturantes para Macau, mas penso que ela poderia ter ido mais longe na altura.

Em que sentido?
Na área da defesa dos direitos dos cidadãos, acho que teria havido soluções mais próximas do modelo de Hong Kong que poderiam ser importantes. Mas em última análise a verdade é que tudo depende da China e da sua evolução. Apesar de Hong Kong ter uma Lei Básica mais rigorosa em termos de defesa dos direitos humanos, na prática a China não a tem respeitado e tem intimidado líderes de partidos políticos. Se faz isso em Hong Kong mais facilmente pode fazer em Macau, pela dimensão e pela facilitação da Lei Básica que deixámos. Não tenhamos ilusões, nunca seria Portugal ou a Grã-Bretanha a fazer valer os direitos, isso depende da capacidade dos cidadãos de Macau e Hong Kong. Há a harmonia e liberdade que é permitida por Pequim. Os chineses não respeitam quem não se faz respeitar. A Grã-Bretanha cometeu alguns erros, mas sabe fazer-se ouvir e respeitar. E Portugal não sabe. É por isso que acho que faço uma apreciação negativa da visita do Presidente da República.

Sobre a Lei Básica, o ex-jurista da Assembleia Legislativa Paulo Cardinal defendeu que Portugal deveria fazer relatórios sobre a sua aplicação em Macau, mas o ministro Augusto Santos Silva afastou essa hipótese.
Não estou surpreendida que a postura de Portugal seja de abdicação. Esse jurista tem certamente razão, mas isso seria se estivesse a lidar com autoridades que levassem a sério as suas responsabilidades históricas face aos cidadãos de Macau, o que não é o caso.

29 Mai 2019

UE destaca independência judicial e sugere sufrágio eleitoral para Macau

O relatório de 2018 da União Europeia sobre Macau é um misto de preocupações e palmadas nas costas. Por um lado, Bruxelas alerta para os reforços da segurança nacional e para a ausência de legitimidade política devido a déficits democráticos. Por outro, destaca a independência judicial e a liberdade de imprensa, com algumas reservas à mistura

 

[dropcap]O[/dropcap] relatório de 2018 da União Europeia (UE) sobre Macau mistura preces e críticas, mas a balança pende mais para o prato das preocupações. “Apesar de as liberdades civis serem protegidas em Macau pela Lei Básica, a oposição política é fraca e a sociedade civil não é muito participativa. A Lei Básica e o restante ordenamento jurídico não abrem oportunidade para o sufrágio universal. Ainda assim, a UE encoraja as autoridades de Macau a promover o envolvimento da população nas eleições do Chefe do Executivo e Assembleia Legislativa de forma a reforçar a legitimidade, apoio popular e fortalecimento do Executivo”.

A sugestão de Bruxelas acresce aos alertas devido ao incremento das políticas de segurança nacional, que conheceram novos capítulos no ano passado. As instituições europeias referem que estas iniciativas de reforço aproximaram mais Macau das visões chinesas. Neste aspecto, são salientadas a alteração legislativa que afasta juízes estrangeiros de processos relacionados com segurança nacional, a aprovação da lei do hino e os planos para rever a legislação de segurança nacional.

No plano da justiça, a UE destaca o processo que levou o deputado Sulu Sou e o activista Scott Chiang a serem julgados em tribunal. “Os crimes imputados pelo Ministério Público foram criticados devido à motivação política, mas a decisão do tribunal realça a independência da justiça”, lê-se no relatório.

Outra na ferradura

Ainda no capítulo das críticas, Bruxelas não esquece o caso de impedimento de participação de alguns escritores no festival literário Rota das Letras, em particular o facto da justificação ter recaído em motivos de segurança nacional. “A falta de transparência em casos destes sugere uma tendência preocupante na direção da censura política”, é referido no relatório.

A não renovação dos contratos de Paulo Cardinal e Paulo Taipa como assessores jurídicos da Assembleia Legislativa também é destacado por Bruxelas como um exemplo da prevalência dada a especialistas chineses.

Em termos legais, a UE menciona a ausência de leis que consagrem a liberdade sindical, a negociação colectiva, a ausência de salário mínimo e de mecanismos independentes de defesa dos direitos humanos, assim como de formas eficazes de combater o tráfico humano.

Mas nem só de reparos é feito o relatório. No que toca ao princípio “Um País, Dois Sistemas”, Bruxelas refere que a “continua a ser implementado, para o benefício da RAEM, da China e da inteira comunidade internacional”.

Outro dos aspectos positivos prende-se que a aceitação de duas recomendações feitas ao Executivo em Novembro em Genebra, referentes à protecção de trabalhadores migrantes e à discriminação contra a comunidade LGBT.

As instituições europeias realçam ainda que os meios de comunicação social do território “continuam a expressar um vasto leque de opiniões, apesar das preocupações com o aumento de auto-censura”, em particular dos órgãos chineses na cobertura de assuntos relativos a política chinesa. É também referida a dificuldade no acesso a fontes e na obtenção de informação completa fornecida pelas autoridades públicas.

Bruxelas menciona também que os residentes de Macau continuam a ter liberdade de reunião e manifestação numa variedade de assuntos, onde se incluem a vigília por ocasião do aniversário do massacre de Tiananmen, ou protestos pelo aumento de direitos laborais.

 

A resposta

Como vem sendo habitual, após a publicação do relatório da União Europeia o Executivo repudiou o documento de Bruxelas. “O Relatório da União Europeia ignora factos, tece comentários irresponsáveis e levianos sobre a RAEM. O Governo da RAEM manifesta a sua forte oposição e que não deve haver ingerência da União Europeia nos assuntos da Região Administrativa Especial de Macau e que se abstenha de falsas declarações e acções inadequadas sobre a política interna da República Popular da China”, lê-se no comunicado. É ainda mencionado a prosperidade e estabilidade de Macau e os “amplos direitos e liberdades plenamente garantidos na Constituição e na Lei Básica” de que goza população, “realidade testemunhada por todas as pessoas”.

10 Mai 2019

ONG de defesa dos direitos humanos querem que líderes da UE pressionem China

[dropcap]O[/dropcap]s líderes da União Europeia (UE) devem pressionar os seus homólogos chineses sobre a deterioração da situação dos direitos humanos naquele país na cimeira UE-China, marcada para terça-feira, em Bruxelas, alertaram hoje cinco ONG de direitos humanos.

Em comunicado, as cinco organizações não-governamentais consideram que os líderes europeus devem aproveitar a cimeira de 9 de Abril para amplificar as preocupações suscitadas durante o diálogo sobre direitos humanos entre a UE e a China, que decorreu nesta segunda e terça-feira e exortar as autoridades chinesas a fechar campos de “educação política” em Xinjiang e libertar dissidentes presos.

“A UE e os seus Estados-membros expressaram o seu firme empenho na defesa dos direitos humanos, e essa promessa está a ser testada entre a repressão implacável e deterioração rápida dos direitos humanos na China”, referiu Lotte Leicht, director do departamento de direitos humanos na UE na Human Rights Watch (HRW).

Lotte Leicht salientou que a cimeira representa “uma oportunidade importante para a UE enviar mensagens públicas fortes à liderança chinesa relativamente aos direitos humanos”.

Em 13 de Março, numa carta dirigida aos líderes da UE e ministros dos Negócios Estrangeiros dos 28 Estados-membros, aquelas ONG denunciaram severas violações dos direitos humanos na China, incluindo a detenção arbitrária em massa e a vigilância dos povos Turkic – um grupo etnolinguístico da Ásia -, “a intensificação da educação política no Tibete e a perseguição, desaparecimento forçado e prisão de activistas pacíficos, defensores dos direitos humanos e advogados de defesa”.

A carta foi assinada pela Amnistia Internacional (AI), Human Rights Watch, Campanha Internacional pelo Tibete, Federação Internacional dos Direitos Humanos e Serviço Internacional para os Direitos Humanos.

As cinco ONG também abordaram a crescente ameaça chinesa aos direitos humanos em todo o mundo através de esforços para prejudicar o direito internacional e enfraquecer instituições como o Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Na segunda e terça-feira, a UE acolheu a 37.ª edição do diálogo UE-China sobre direitos humanos.
“Apesar dos esforços de princípio do Serviço de Acção Externa da UE (SEAE), o diálogo continua a ser um instrumento diplomático fraco”, lamentaram as ONG, acrescentando que “as autoridades chinesas continuam sem conseguir demonstrar progressos concretos em questões de direitos humanos levantadas pela UE”.

As cinco ONG de defesa dos humanos instaram ainda os líderes da UE a pressionar a China a permitir a entrada de uma missão internacional independente de investigação em Xinjiang, a libertar prisioneiros políticos e a ratificar o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.

5 Abr 2019

China | Analistas defendem reforço da posição da UE no contexto da guerra comercial

Situada no meio da guerra comercial entre a China e os Estados Unidos, a União Europeia deve clarificar relações com a Ásia para desenvolver as suas empresas e travar eventuais pressões dos EUA ou de países do norte da Europa que tentem sabotar essas parcerias. O tema “A ascensão da RPC no tabuleiro internacional do pós-Guerra Fria” esteve ontem em debate na Universidade do Porto

 

[dropcap]N[/dropcap]o princípio era a União Soviética e os Estados Unidos, mas, com a queda da URSS, a China tem assumido cada vez mais um papel de relevo, tanto a nível económico como diplomático. No meio está a União Europeia (UE), que deve clarificar e reforçar o seu posicionamento no contexto da guerra comercial que se vive nos dias de hoje.

A Universidade do Porto (UP), em Portugal, acolheu ontem a palestra “A ascensão da República Popular da China (RPC) no tabuleiro internacional do pós-Guerra Fria”, que contou com a presença de Rui Lourido, presidente do Observatório da China (OC), Jorge Cerdeira, docente da Faculdade de Economia da UP, e António Lázaro, director do Instituto Confúcio da Universidade do Minho.

Em declarações ao HM, Rui Lourido defendeu que é altura da UE assumir a importância do seu posicionamento geoestratégico.

“A Europa tem de compreender que a China não é um inimigo, mas sim um concorrente com o qual deve fazer parcerias e estabelecer um relacionamento pacífico e de mútuo interesse”, começou por dizer.

Neste sentido, a Europa “deve abrir-se às negociações com a China de igual para igual, sem prescindir das suas alianças que podem ligar o continente à América, mas elas não são incompatíveis, bem pelo contrário, deverão ser complementares”.

Também Jorge Cerdeira defende que a UE é, nos dias de hoje, “um dos principais players internacionais, tal como a China ou os Estados Unidos”, “ocupando uma posição de destaque na produção, exportações, importações e investimento a nível internacional”.

Neste contexto, a UE deve compreender qual o seu papel no seio destas relações diplomáticas. “Naturalmente que nesta fase em que existem muitas incertezas sobre o futuro das relações económicas internacionais, a Europa deverá ter uma posição clara e unida sobre o assunto e ser capaz de assumir o seu papel de relevo no xadrez internacional.”

Para Jorge Cerdeira, essa necessidade não tem sido cumprida “muito devido aos constrangimentos internos que tem sofrido (que incluem a crise das dívidas soberanas, a questão dos refugiados, o processo do Brexit ou as diferentes posições dos países relativas à política da União)”, defendeu.

Pressões americanas

No passado dia 5 de Março o Conselho da UE aprovou as novas regulações que serão feitas aos investimentos estrangeiros provenientes de países terceiros em sectores estratégicos, como têm sido os investimentos chineses.

Para Rui Lourido, a UE deve analisar as propostas chinesas de acordo com os seus interesses, mas defende que neste processo de regulação há não só uma pressão dos países do norte da Europa, como é o caso da Alemanha ou França, mas também dos Estados Unidos, a quem não interessa “uma Europa unida”.

“Vejo estes regulamentos que têm vindo a ser levantados na sequência de pressões americanas e desta guerra comercial que é nefasta para o relacionamento e desenvolvimento das empresas europeias.”

Para Rui Lourido, “as empresas alemãs são concorrentes das empresas chinesas e não há mal nenhum nisso”, uma vez que “ambas as empresas devem fazer parcerias no sentido de aproveitarem o mercado chinês”.

O presidente do OC recorda os 17 acordos que recentemente Portugal assinou com a China no contexto da política “Uma Faixa, Uma Rota”, que incluem acções de investimento no Porto de Sines e mais ligações ferroviárias. “Quando Portugal faz isto cria inimizade ou concorrência com os portos do norte da Europa, que até hoje têm sido centrais para o comércio europeu. Estes países, ao verem que este comércio se pode deslocar para sul, algo que já acontece também com a Grécia, com os investimentos no porto de Piréu, pressionam Portugal para não entrar nestas parcerias que propiciam este desenvolvimento”, defendeu Rui Lourido.

O presidente do OC acha que, neste âmbito, “a perspectiva de Portugal tem de ser autónoma” e considera que “não se deve perder o foco face aos investimentos no sul da China e no espaço da Grande Baía e África, que serão centrais para a construção de um mundo pacífico, rentável e produtivo”.

Regular é preciso

Apesar de falar de pressões dos países do Norte da Europa e dos Estados Unidos, Rui Lourido acredita que a regulação do investimento directo estrangeiro na UE é necessária. “Este relacionamento deve ser escrupulosamente encaminhado e regulado nos interesses comuns de ambas as empresas”.

Jorge Cerdeira recorda que os investimentos chineses na Europa têm aumentado progressivamente desde que o país entrou na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001. “À Europa cabe, dentro da ideologia do nacionalismo pragmático que hoje se apregoa no que concerne à atracção e restrição do investimento directo estrangeiro, seleccionar os investimentos que entende serem favoráveis e rejeitar os que entende serem menos interessantes.”

Se Rui Lourido fala de pressões em prol da regulação, Jorge Cerdeira interpreta estas iniciativas como naturais. “Tal prática, comum noutros países (tal como, por exemplo, na China), deve ser encarada com naturalidade, ainda que, evidentemente, reste saber como é que esse processo de ‘filtragem’ (do investimento directo estrangeiro) vai ser efectivamente feito na prática”, disse ao HM.

“Fecharmo-nos ao relacionamento com a China não é bom, é o caminho inverso que a Europa e Portugal devem ter. A China é neste momento a segunda grande nação a registar as patentes de investigação, está quase colada aos Estados Unidos. Considero que esta aliança com empresas chinesas que detém esse know-how torna-se fundamental para a expansão das empresas portuguesas e a sua expansão nos mercados”, acrescentou Rui Lourido.

Guerra Fria 2.0

Apesar dos vários encontros, não há ainda uma resolução para o fim definitivo do conflito comercial que opõe a China aos Estados Unidos. Jorge Cerdeira não consegue prever se estamos perante uma nova Guerra Fria, ainda que com outros contornos, mas fala de um futuro “incerto”.

“O futuro da relação entre os EUA e a China, bem como a guerra comercial que tem existido, é incerto. Há dados e estudos que sugerem que a guerra comercial já custou aos EUA cerca de 8 mil milhões de dólares. Resta saber qual é a reação que as autoridades de política dos EUA e da China vão ter perante os resultados pouco favoráveis que advêm desta guerra.”

Incertezas à parte, o professor da UP acredita que “os últimos dois anos têm contribuído para uma maior afirmação das políticas proteccionistas face ao que verificou nos anos anteriores”.

Rui Lourido também não consegue prever uma nova Guerra Fria, mas fala de um mundo mais perigoso num futuro próximo caso estes conflitos continuem. “Essa guerra comercial que se tenta expandir a outros sectores com grande perigosidade torna o mundo mais instável. A China tem substituído o papel de equilíbrio que a América desempenhava nessas instituições e defende hoje o multilateralismo e a própria ONU.”

As relações de conflito neste contexto “devem ser mediadas pela ONU e não por reacções caso a caso”, sem esquecer o papel que entidades como a OMC ou o Mercosul devem ter, defendeu Lourido.

“A economia americana perdeu energia com a crise de 2008 e a forma mais inteligente de ultrapassar isso é com um relacionamento concorrencial, mas amigável. Há forças que não pensam assim e temos o presidente norte-americano (Donald Trump) a sair de tratados internacionais e a tentar desestruturar a Europa, porque à América não interessa uma Europa unida e forte.”

“Isso leva à criação de conflitos que os europeus devem ver de acordo com os seus interesses e estabelecer parcerias com a Ásia para que possam balancear a sua influência, com países como a China, Índia e Japão”, concluiu Rui Lourido.

3 Abr 2019

Portugal revê-se na abordagem europeia à relação com a China, diz MNE

[dropcap]P[/dropcap]ortugal revê-se na caracterização e nas orientações da Comissão Europeia em relação à China, mas não abdica de um relacionamento que serve os seus interesses estratégicos, enfatizou ontem o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva.

O ministro, que falava na comissão parlamentar de Assuntos Europeus, centrou a sua intervenção relativa ao Conselho Europeu da semana passada no relacionamento com a China, um dos temas discutidos pelos líderes europeus, nomeadamente no quadro da preparação da Cimeira União Europeia-China prevista para 9 de Abril.

Santos Silva evocou uma série “de factos”, da profunda relação comercial entre a UE e a China ao quadro estratégico dessa relação, que define nomeadamente o investimento chinês na Europa como “bem-vindo desde que sujeito às regras legais e padrões próprios da UE” e “estimula a cooperação com a iniciativa ‘Uma faixa, uma rota’, em relação à qual Portugal e a Itália “subscreveram memorandos de entendimento”.

“A posição de Portugal revê-se no essencial nestes factos e nesta orientação que vamos seguindo na UE”, afirmou, depois de evocar a caracterização feita a 11 de Março pela Comissão, que define a China “em quatro dimensões complementares: importante parceiro cooperativo da UE, parceiro negocial, concorrente económico da UE e um rival sistémico em matéria de modelos de governação”.

Mas, sublinhou Santos Silva, Portugal considera também que “a Europa não pode fechar-se sobre si própria”, antes “abrir-se ao mundo”, no quadro ONU.

“A nossa posição não é desalinhada, é talvez mais avançada, enquanto país que se orgulha de ter sido dos primeiros a chegar às costas da China e dos últimos a abandonar, entre aspas, a China”, frisou.

Neste sentido, Portugal procurará sempre concluir com a China “acordos mutuamente vantajosos”, de que “o memorando ‘rota da seda’ é um manifestação exemplar”, assegurou, precisando que ele vai ao encontro de sectores prioritários para Portugal como “a conectividade euro-asiática”, “a economia azul”, ligada ao mar, e o “investimento industrial” e “de raiz no quadro da mobilidade eléctrica”

“E não vemos porque não podemos usar nossa proximidade com China para esse efeito”, afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros, assegurando, noutro passo, que Portugal “está à vontade nos quatro cantos do mundo” e “não discrimina” parceiros comerciais.

27 Mar 2019

UE | França e Alemanha querem parceria mais equilibrada com China

No final do seu périplo europeu, Xi Jinping reuniu-se com Emmanuel Macron, Ângela Merkel e Jean-Claude Juncker, a convite do Presidente francês. Na calha, está a assinatura de um acordo global de grande dimensão sobre investimentos entre a União Europeia e a China

 

[dropcap]A[/dropcap] França, a Alemanha e a Comissão Europeia reivindicaram ontem uma parceria mais equilibrada entre a China e a Europa, baseada na “confiança” e “reciprocidade” e defenderam uma renovação do multilateralismo face a um afastamento dos Estados Unidos.

Os Presidentes da China e de França, Xi Jinping e Emmanuel Macron, anunciaram, no final de um encontro em que participaram também a chanceler alemã e o Presidente da Comissão Europeia, a intenção de aprovar um “acordo global sobre investimentos” entre a União Europeia e o gigante asiático.

“Os dois países [França e China] defendem a realização rápida de um acordo global ambicioso sobre os investimentos entre a União Europeia e a China, incluindo acesso e protecção dos investimentos num espírito de benefícios mútuos e recíprocos”, estipula o texto adoptado pelos Presidentes Emmanuel Macron e Xi Jinping.

A reunião entre Macron, Xi, Merkel e Juncker, a convite do Presidente francês, visava discutir questões ligadas ao comércio e ao clima numa altura que as relações entre Pequim e Washington se têm mostrado tensas.

O convite foi apresentado também como forma de aproveitar o momento em que Xi Jinping está a viajar pela Europa para apresentar e defender o projecto “nova rota da seda”.

Apresentado em 2017, o projecto “nova rota da seda” é tido como aquele que vai levar a China à liderança mundial e visa, em traços gerais, construir ligações terrestres entre a China e a Ásia Central e reforçar a ligação à África replicando uma rota por onde a China vendeu, durante séculos, seda a todo o mundo.

A nova rota da seda é “um projecto muito importante” e os europeus querem “desempenhar um papel nele”, defendeu Ângela Merkel no encontro, sublinhando, no entanto, que, para isso, deve haver reciprocidade.

“Temos tido alguma dificuldade em encontrar essa reciprocidade,” avisou a chanceler alemã.
Dúvidas que também foram referidas por Emmanuel Mácron ao Presidente chinês, a quem pediu que “respeite a unidade da União Europeia” face à adopção de medidas de investimento diferentes para os diversos países.

“Nós temos as nossas divergências (…) Nenhum de nós é ingénuo”, afirmou Macron, acrescentando, no entanto, que a Europa respeita a China e “espera, naturalmente, que os [seus] principais parceiros também respeitem a unidade da União Europeia”.

União de facto

Por seu lado, Xi Jinping assegurou que a Europa e a China “se movem juntas”, mesmo quando são “concorrentes”, já que as suas relações não são “de desconfiança”.

A China adoptou este mês uma lei do investimento estrangeiro que se destina a garantir igualdade de tratamento para empresas nacionais e estrangeiras, incluindo na adjudicação de contratos públicos, e evitar a transferência de tecnologia forçada. Mas os investidores estrangeiros estão excluídos de cerca de 50 sectores sensíveis.

Tanto a União Europeia como os Estados Unidos consideraram a posição insuficiente e vaga, tendo Bruxelas “aumentado o tom” a 12 de Março, quando avançou com uma série de propostas para “alcançar relações económicas mais equilibradas e mais baseadas na reciprocidade”.

O encontro surge pouco antes de uma cimeira entre a UE e a China, agendada para Abril em Bruxelas, e numa altura em que os europeus querem responder às preocupações sobre os investimentos de Pequim, especialmente no Oriente e no Sul.

As discussões também acontecem num momento em que a China está em plena negociação com os Estados Unidos para tentar resolver a disputa comercial entre os dois países.

Na reunião de ontem, a França e a China também assumiram uma posição conjunta sobre a necessidade de reformar a Organização Mundial do Comércio, defendendo, numa alusão aos Estados Unidos, que nenhum país “pode definir sozinho as regras do jogo”.

O encontro visou ainda discutir posições sobre o clima e a biodiversidade, tendo Xi Jinping e Emmanuel Macron prometido agir em conjunto “para um aumento global contra a erosão da biodiversidade”.

Os dois países também prometeram lutar “contra o crime ambiental, em especial, a caça ilegal e o tráfico de espécies de animais selvagens e flora ameaçadas de extinção”, bem como a poluição de plástico.

27 Mar 2019

UE |Empresas esperam que nova lei para o investimento seja respeitada

[dropcap]A[/dropcap]Câmara de Comércio da União Europeia na China disse sexta-feira esperar que a nova lei para o investimento estrangeiro, aprovada pelo legislativo chinês, seja respeitada a “todos os níveis” e em “todo o país”.

Num comunicado enviado à imprensa, o presidente da Câmara, Mats Harborn, disse que, “apesar de a lei não ter em conta todas as preocupações” da Câmara de Comércio, está “na hora de virar a página”.

Harborn reiterou que as “empresas estrangeiras querem igualdade” de tratamento e oportunidades, face aos competidores chineses, “mais do que qualquer coisa”.

No entanto, a Câmara considera “preocupante” que uma cláusula tenha sido mantida no texto final, e que “permite que questões políticas influenciem as relações entre o Estado e os investidores, reservando à China o poder de tomar medidas unilaterais contra parceiros comerciais e de investimento”.

“A sua formulação vaga aumenta ainda mais a incerteza jurídica para as empresas estrangeiras”, afirma.

“O pleno cumprimento desta lei exigirá uma monitorização exaustiva das autoridades administrativas em todos os níveis do governo e o total apoio do sistema jurídico, nos casos em que os direitos garantidos pela lei não sejam respeitados”, ressalva.

A nova regra jurídica, que entra em vigor em 1 de Janeiro de 2020, estabelece ainda uma “lista negativa”, o que significa que quaisquer sectores que não sejam declarados fechados ao capital estrangeiro estão automaticamente abertos ao investimento.

Voz de acção

O regime anterior exigia que Pequim designasse um sector como “aberto ao investimento” antes que uma empresa não-chinesa pudesse participar, uma cláusula há muito criticada pelos Estados Unidos e a União Europeia.

A Câmara “reconhece que a lei desempenha um papel importante na formalização da base legal para a mudança do antigo regime de investimento”, com um novo sistema de acesso ao mercado, baseado numa lista negativa.

Este sistema inspira confiança e “proporciona maior segurança às empresas europeias”.

A organização enaltece ainda que algumas das suas preocupações tenham sido levadas em conta na versão final.

A passagem das palavras aos actos agradou também ao grupo empresarial, já que o estabelecimento num texto legal de questões “mencionadas anteriormente em discursos formais” significa que “as possibilidades de mudanças se tornaram maiores”.

A lei foi aprovada sexta-feira, no último dia da sessão anual da Assembleia Nacional Popular, com o apoio de 99,5% dos cerca de 3.000 delegados.

18 Mar 2019

Brexit | Risco de saída sem acordo nunca foi tão elevado, alerta Barnier

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] negociador-chefe da União Europeia para o ‘Brexit’ defendeu ontem que a responsabilidade de solucionar o impasse no processo pertence unicamente ao Reino Unido, reconhecendo que o risco de uma saída desordenada nunca foi tão elevado.

“Estamos num momento muito preocupante, porque o risco de ‘não acordo’ nunca foi tão elevado. Recomendo não subestimar este risco, nem as suas consequências. Recomendo que todos os actores envolvidos se prepararem. […] Não desejámos este cenário, nunca trabalhámos para um cenário de ausência de acordo, mas estamos preparados para enfrentar esta situação”, declarou Michel Barnier.

Intervindo num debate sobre o processo do ‘Brexit’ no Parlamento Europeu (PE), em Estrasburgo (França), horas depois de o parlamento britânico ter voltado a rejeitar o Acordo de Saída do Reino Unido da União Europeia (UE), com 391 votos contra e 242 votos a favor, Michel Barnier considerou que o novo ‘chumbo’ “prolonga e agrava” a incerteza sobre a saída daquele país do bloco comunitário.

“O voto de ontem prolonga a agrava uma incerteza maior. É uma incerteza que toca particularmente o Reino Unido e a Irlanda, mas que afecta todos nós. A responsabilidade do ‘Brexit’ pertence unicamente ao Reino Unido e a responsabilidade para sair deste impasse pertence também ao Reino Unido”, afirmou.

 

Sem acordo

A primeira-ministra britânica não conseguiu fazer passar o Acordo de Saída, apesar dos três documentos adicionados na segunda-feira, que segundo o Governo britânico proporcionavam as garantias adicionais reclamadas pela Câmara dos Comuns relativamente à natureza temporária da solução de último recurso para a fronteira irlandesa inscrita naquele texto.

“Fomos ao limite do que podíamos fazer para ajudar o Governo a conseguir o apoio da Câmara dos Comuns. Sempre com três objectivos em mente: preservar a paz na ilha da Irlanda, preservar o Acordo de Sexta-feira Santa e a integridade do nosso mercado único”, sublinhou.

O negociador-chefe comunitário reiterou que o texto, negociado durante meses “com o Governo do Reino Unido e não contra ele”, é o “único disponível” se aquele país “ainda quiser deixar a UE e de forma ordenada”.

Vincando que “não haverá novas garantias ou interpretações suplementares” ao Acordo de Saída, e que UE não pode “ir mais longe”, o político francês garantiu que a UE vai continuar a respeitar as decisões do Reino Unido e a manter-se tranquila até ao fim da negociação com Londres.

14 Mar 2019

UE | Macau fora da nova “lista negra” de paraísos fiscais

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s ministros das Finanças da União Europeia, reunidos ontem em Bruxelas, adoptaram uma “lista negra” actualizada de jurisdições fiscais não cooperantes, composta por 15 países, permanecendo Cabo Verde na “lista cinzenta”, enquanto Macau já não é motivo de preocupação.

Na sequência de reformas e melhorias verificadas nos respectivos sistemas fiscais, 25 jurisdições que estavam no “radar” da União Europeia (UE) – na “lista negra” ou na “lista cinzenta”, uma segunda categoria de países com fragilidades que se comprometeram a combater – deixaram de ser motivo de preocupação para o Conselho Ecofin, entre os quais o território de Macau, que chegou a constar da primeira lista negra, de Dezembro de 2017, da qual transitou para a cinzenta no mês seguinte (Janeiro de 2018), onde permanecia até agora.

 

Entradas e saídas

A UE nota que “outras 34 jurisdições já deram muitos passos positivos para cumprir os requisitos, mas devem completar o seu trabalho até final de 2019, para evitarem constar da lista negra do próximo ano”, e entre estes territórios conta-se Cabo Verde, há já mais de um ano na “lista cinzenta”.

Relativamente à primeira lista de paraísos fiscais não cooperantes, publicada em Dezembro de 2017, mantêm-se na “lista negra” cinco territórios que não assumiram quaisquer compromissos no sentido de resolver as deficiências existentes nos seus sistemas fiscais e cumprir os critérios exigidos, designadamente Samoa Americana, Guão, Samoa, Trinidade e Tobago e Ilhas Virgens.

A estes cinco, juntam-se três que estavam originalmente na “lista negra”, haviam transitado para a “lista cinzenta” por terem assumido compromissos perante a UE, mas agora regressam por não os terem cumprido – Emirados Árabes Unidos, Barbados e Ilhas Marshall – e outros sete que estavam na “lista cinzenta” mas viram agravado o seu estatuto também por não terem honrado os seus compromissos: Aruba, Belize, Bermuda, Fiji, Omã, Vanuatu e Dominica.

Além desta “lista negra” de 15 territórios, a UE vai então continuar a monitorizar com particular atenção 34 países, que formam a chamada “lista cinzenta”, entre os quais Cabo Verde.

“A lista negra da UE de paraísos fiscais é um verdadeiro sucesso europeu. Teve um efeito retumbante sobre a transparência e a equidade fiscais a nível mundial. Graças ao processo de elaboração da lista, dezenas de países aboliram os regimes fiscais prejudiciais, tendo-se alinhado com as normas internacionais em matéria de transparência e equidade fiscal. Os países não conformes foram incluídos numa lista negra e terão de fazer face às consequências daí resultantes. Estamos a elevar a fasquia da boa governação fiscal a nível mundial e a reduzir as possibilidades de abuso fiscal”, comentou ontem o comissário europeu dos Assuntos Económicos, Pierre Moscovici.

13 Mar 2019

UE | Itália adere a ‘Uma Faixa, Uma Rota’ apesar das pressões externas

[dropcap]A[/dropcap]Itália deverá tornar-se, juntamente com Portugal, um dos poucos países da União Europeia (UE) a apoiar formalmente o projecto internacional de infra-estruturas lançado pela China ‘Uma Faixa, Uma Rota’, apesar da oposição de Washington e Bruxelas.

Citado pelo jornal Financial Times, o subsecretário do ministério italiano do Desenvolvimento Económico, Michele Geraci, revelou que Roma deve assinar um memorando de entendimento de apoio aquela iniciativa, que materializa a nova vocação internacionalista de Pequim.

A iniciativa visa conectar o sudeste Asiático, Ásia Central, África e Europa, e é visto como uma versão chinesa do ‘Plano Marshall’, lançado pelos EUA após a Segunda Guerra Mundial, e que permitiu a Washington criar a fundação de alianças que perduram até hoje.

O documento deverá ser assinado este mês, durante a visita a Itália do Presidente chinês, Xi Jinping.

“As negociações ainda não terminaram, mas é possível que sejam concluídas a tempo para a visita de Xi”, disse Geraci, citado pelo Financial Times.

“Queremos ter a certeza de que os produtos ‘Made in Italy’ podem ter mais sucesso em termos de volume de exportação para a China, que é o mercado que mais cresce no mundo”, explicou.

A iniciativa tem, no entanto, suscitado divergências com as potências ocidentais, que vêem uma nova ordem mundial ser moldada por um rival estratégico, com um sistema político e de valores profundamente diferentes.

Cepticismo americano

A Casa Branca disse já que a inclusão de Itália nos planos chineses não ajudará o país economicamente e pode prejudicar significativamente a sua imagem internacional.

“Nós vemos [Uma Faixa, Uma Rota’] como uma iniciativa ‘Made by China, for China’ [Feita pela China, para a China]”, reagiu o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, Garrett Marquis.

“Estamos cépticos de que o apoio do Governo italiano trará quaisquer benefícios económicos sustentáveis para o povo italiano e isso pode acabar por prejudicar a reputação global de Itália a longo prazo”, disse.

Bancos estatais e outras instituições da China estão a conceder enormes empréstimos para projectos lançados no âmbito daquele gigantesco plano de infraestruturas, que inclui a construção de portos, aeroportos, autoestradas ou linhas ferroviárias ao longo de vários continentes.

Mas os Estados Unidos apontam para um aumento problemático do endividamento, que em alguns casos coloca os países numa situação financeira insustentável, permitindo a Pequim avançar com os seus interesses geopolíticos.

No Sri Lanka, um porto de águas profundas construído por uma empresa estatal chinesa, numa localização estratégica no Índico, revelou-se um gasto incomportável para o país, que teve de entregar a concessão da infraestrutura e dos terrenos próximos à China, por um período de 99 anos.

“Todos os aliados e parceiros, incluindo a Itália, devem pressionar a China a alinhar os seus esforços globais de investimento com os padrões internacionais e as boas práticas”, apontou Garrett Marquis.

Xi no terreno

O Presidente chinês chega a Itália em 22 de Março, no dia seguinte a um encontro da União Europeia, em Bruxelas, que vai debater a criação de uma abordagem comum para os investimentos chineses no bloco europeu.

Alemanha e França têm pressionado por critérios de selecção mais rigorosos para os investimentos chineses no continente.

Em Dezembro passado, durante a visita de Xi Jinping a Lisboa, Portugal e China assinaram um memorando de entendimento para a cooperação bilateral no âmbito da ‘Uma Faixa, Uma Rota’ .

Lisboa quer incluir uma rota atlântica no projecto chinês, o que permitiria ao porto de Sines conectar as rotas do Extremo Oriente ao oceano Atlântico, beneficiando do alargamento do canal do Panamá.

7 Mar 2019

Transporte | Comissão Europeia e China iniciam cooperação

[dropcap]A[/dropcap]Comissão Europeia e a China estão a cooperar na criação de plataformas e corredores de transportes, no âmbito da iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”.

Maja Bakran Marcich, directora-geral adjunta da Comissão Europeia para a Mobilidade e os Transportes, disse que as autoridades europeias vão “trabalhar com a China para planear as plataformas e corredores”, tendo acrescentado ter-se chegado a um acordo para elaborar os termos de referência de um estudo com aquele objectivo.

Bakran Marcich adiantou no decurso da conferência que a ênfase da Comissão Europeia em actuais projectos de transportes está na “qualidade de ligação”, com intenção de “construir parcerias fortes”, tirando partido do “significativo quadro financeiro” disponível.

“Já dispomos de uma rede que cobre os Balcãs Ocidentais e se estende a países parceiros orientais. A cooperação deve respeitar a partilha de princípios de regras de mercado e normas internacionais e padrões estabelecidos”, referiu ainda a responsável europeia.

A China e a UE assinaram em Setembro de 2015 um memorando de entendimento sobre o estabelecimento de uma plataforma de relacionamento, com o objectivo de criar sinergias entre as políticas e projectos da UE e a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, particularmente através da cooperação em infra-estruturas, financiamento, interoperabilidade e logística.

Jiang Ruiping, vice-presidente da Universidade de Relações Externas da China, defendeu na mesma conferência que a cooperação China-UE “deve centrar-se na normalização, porque relacionamento diz respeito a infra-estruturas e questões técnicas.”

 

 

26 Fev 2019

Delegação do Parlamento Europeu impedida de entrar na Venezuela

[dropcap]U[/dropcap]ma delegação do Parlamento Europeu (PE), que tinha sido convidada pela Assembleia Nacional venezuelana (AN) a visitar a Venezuela, foi no domingo impedida de entrar no país e obrigada a apanhar um voo de regresso a Madrid.

A expulsão dos eurodeputados foi denunciada pelo deputado opositor Francisco Sucre, através da sua conta oficial no Twitter, onde afirma que a delegação já tinha chegado ao Aeroporto Internacional Simón Bolívar de Maiquetía (norte de Caracas), o principal do país.

“Queremos alertar a opinião pública nacional e internacional que o regime usurpador de Nicolás Maduro acaba de proibir a entrada na Venezuela de uma delegação de euro-deputados que vieram a convite da Assembleia Nacional da Venezuela e do seu presidente Juan Guaidó”, escreveu.

Numa outra mensagem, o deputado afirma que esta é uma “nova amostra de que Nicolás Maduro é um tirano que pretende isolar a Venezuela do concerto das nações livres e que gera sofrimento no seu povo, que padece de uma emergência humanitária complexa”.

“Denunciamos este novo atropelo contra a liberdade e a democracia. Proíbem a entrada aos euro-deputados e retêm os seus passaportes sem razão ou explicação alguma, o que é um abuso de força de um regime que recorre à força para aferrar-se ao poder”, sublinhou.

Francisco Sucre publicou ainda um vídeo, em que explica que os deputados mostraram às autoridades uma carta com o convite feito pela presidência da Comissão de Política Exterior do Parlamento, mas que obtiveram como resposta “isso não vale nada”.

Entretanto, também através do Twitter, o porta-voz do Partido Popular espanhol, Esteban González Pons, um dos deputados expulsos da Venezuela, explicou que “a única explicação” para o sucedido é que Maduro “não os quer” no país.

A delegação estava composta pelos euro-deputados Esteban González Pons, José Ignácio Salafranca Sánchéz-Neyra e Juan Salafranca. Dela fazia parte também o euro-deputado português Paulo Rangel, que perdeu o voo de ligação entre Madrid e Caracas.

18 Fev 2019

Brexit | Japão pede à UE e a Londres menor impacto possível na economia global

[dropcap]O[/dropcap] Governo japonês pediu ao Reino Unido e à União Europeia (UE) que tentem minimizar o possível impacto do ‘Brexit’ na economia global, horas depois do parlamento britânico ter chumbado o acordo negociado entre as duas partes.

Em conferência de imprensa, o porta-voz do governo nipónico reiterou a preocupação com que Tóquio “observa de perto” a chamada “crise do ‘Brexit’” [saída do Reino Unido da UE], agravada pela decisão tomada ontem pelo parlamento britânico.

O Japão “pediu repetidamente a ambas as partes para incluir os princípios de previsibilidade e estabilidade jurídica no processo de saída, com o objectivo de minimizar o impacto negativo sobre as empresas japonesas, sediadas no país, e sobre a economia global”, disse Yoshihide Suga.

O primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, transmitiu este pedido à homóloga britânica, Theresa May, numa cimeira bilateral realizada na semana passada durante uma visita ao Reino Unido.

O governo japonês “vai continuar a seguir os passos dados por ambas as partes e a oferecer assistência às empresas japonesas sediadas no Reino Unido”, sublinhou Suga.

Com mais de mil empresas, que empregam cerca de 150 mil pessoas, o Japão é o segundo maior investidor estrangeiro no Reino Unido depois dos Estados Unidos, pelo que Tóquio exigiu de Londres garantias de que estas empresas não serão prejudicadas durante o período de transição.

Ontem o Parlamento britânico rejeitou o acordo de saída do Reino Unido da UE negociado pelo Governo de Theresa May com Bruxelas, por 432 votos contra e apenas 202 a favor.

A dois meses e meio da data prevista para a saída britânica da UE, os deputados da Câmara dos Comuns rejeitaram o acordo de saída, apesar do último apelo feito pela primeira-ministra, imediatamente antes da votação, contra “a incerteza” que a rejeição do texto provocaria.

16 Jan 2019

Brexit: Acordo sujeito a “voto significativo” hoje dos deputados britânicos

[dropcap]O[/dropcap] parlamento britânico realiza hoje o chamado “voto significativo” ao acordo proposto pelo governo conservador da primeira-ministra, Theresa May, para a saída da União Europeia (UE) dentro de 73 dias, a 29 de Março.

Os deputados vão começar perto das 12h00 horas [hora local] o quinto e último dia de debate sobre o acordo para o ‘Brexit’, que começou na passada quarta-feira, e que vai encerrar pelas 19h00 horas com uma declaração da chefe do governo.

Depois desta intervenção, os parlamentares vão votar primeiro as alterações ao documento apresentadas pelos diferentes deputados e grupos políticos e só depois vão deliberar sobre o texto negociado com Bruxelas.

A hora da votação do acordo dependerá do número de emendas aceites pelo presidente da Câmara dos Comuns, John Bercow, que até segunda-feira tinha recebido pelo menos 12, podendo cada uma demorar cerca de 30 minutos a discutir e votar.

Na semana passada, Bercow causou controvérsia ao aceitar uma alteração a uma moção do governo que força à apresentação de um plano B no espaço de três sessões parlamentares.

Para passar, o acordo precisa teoricamente de 320 votos a favor para contrariar mais de 300 votos esperados dos partidos da oposição, em particular do Partido Trabalhista, dos Liberais Democratas e do Partido Nacionalista Escocês.

Porém, dezenas dos 317 deputados do partido Conservador e os 10 deputados do Partido Democrata Unionista ameaçaram reprovar o documento, muitos dos quais dispostos a aceitar uma saída sem acordo e desordenada.

Uma aprovação desencadearia a ratificação pelo Parlamento Europeu e a introdução no parlamento britânico da legislação para a respectiva implementação do acordo, que oferece uma saída ordenada da UE e um período de transição até ao final de 2020, durante o qual serão negociadas as futuras relações entre as duas partes.

Mas se, como é esperado, o documento for rejeitado, Theresa May tem de voltar ao Parlamento no máximo até segunda-feira 21 de Janeiro indicando os próximos passos a dar, sendo possível que a primeira-ministra responda ao resultado antes, seja ainda hoje à noite ou na quarta-feira.

Entre as diversas opções motivo de especulação estão um regresso de May a Bruxelas para pedir mais concessões de forma a propor de novo o acordo aos deputados e a realização de uma série de votos para testar qual a solução mais consensual.

Embora a saída sem acordo seja a opção por defeito, por a data estar escrita na lei, nos últimos dias a imprensa britânica deu conta da possibilidade de a data do ‘Brexit ser suprimida ou adiada ou de um grupo de parlamentares transversal aos diferentes partidos tentar ganhar o controlo do processo para determinar o seu curso.

15 Jan 2019

UE chega a acordo para se blindar a investimento directo estrangeiro, incluindo chinês

[dropcap]A[/dropcap] União Europeia (UE) ‘despertou’ finalmente para a necessidade de escrutinar o investimento de países terceiros em “sectores estratégicos” dos Estados-membros e procura agora ‘blindar-se’ a potenciais riscos para a segurança interna e ordem pública dentro do bloco comunitário.

O primeiro passo para salvaguardar os interesses europeus das potenciais ‘ameaças’ ocultas nos investimentos de países terceiros, nos quais a China se inclui, foi dado em 20 de Novembro, com o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão Europeia a chegarem a um acordo político sobre um quadro de análise do investimento directo estrangeiro na União Europeia (UE).

“Actualmente, menos de metade dos Estados-membros têm legislação em vigor que lhes permita examinar esses investimentos. Com base nas regras hoje acordadas, os Estados-membros manterão o poder de analisar e potencialmente bloquear investimento directo de países terceiros por motivos de segurança e de ordem pública”, esclarecia então a nota remetida pela presidência austríaca do Conselho da UE.

Sem nunca mencionar os ‘alvos específicos’ deste novo mecanismo regulatório, as instituições europeias esclareciam que as medidas visavam “os investidores estrangeiros” que poderiam procurar adquirir “activos estratégicos que lhes permitam controlar ou influenciar as empresas europeias cujas actividades são essenciais para a segurança e a ordem pública na UE e nos seus Estados-membros”.

A nova regulação, que terá de respeitar o princípio da não-discriminação e a protecção de informação confidencial, permitirá à Comissão Europeia emitir pareces consultivos quando considerar que um investimento, “planeado ou finalizado”, possa afectar a segurança ou a ordem pública em “um ou mais Estados-membros”.

Comunicação entre Estados

O texto preconiza ainda a criação de um mecanismo de cooperação entre os países e o executivo comunitário, que estabelece que Estados-membros e Comissão deverão informar-se mutuamente de qualquer escrutínio em vigor por parte das autoridades nacionais, e que prevê a disponibilização de informação, designadamente sobre o financiamento do investimento ou a estrutura accionista do investidor, caso seja solicitado.

O acordo político que, todavia, esclarece que a decisão final quanto a estes investimentos será sempre do Estado-membro em questão, tem ainda que ser aprovado por maioria qualificada pelos Estados-membros.

A proposta de criação de um quadro europeu de escrutínio do investimento directo estrangeiro, em paralelo com a finalização de uma análise pormenorizada dos fluxos de investimento directo estrangeiro que entram na UE, faz parte dos esforços desenvolvidos pelo executivo comunitário para defender as suas empresas, os seus trabalhadores e os seus cidadãos de potenciais ‘ameaças’ ocultas em investimentos externos.

“Precisamos de escrutínio sobre as aquisições por parte das empresas estrangeiras que visam os activos estratégicos da Europa”, defendeu em 12 de Novembro o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, que já se tinha mostrado ‘alerta’ para o potencial problema na resposta a uma carta da eurodeputada socialista Ana Gomes, que, juntamente com o alemão Elmar Brok, o questionou sobre os investimentos estrangeiros em sectores estratégicos da economia europeia, à luz da oferta pública de aquisição (OPA) lançada em Maio pela China Three Gorges sobre a EDP.

Na resposta, Jean-Claude Juncker comentou que, no quadro legal actual, pouco pode intervir, cabendo às autoridades reguladoras nacionais analisar os riscos da operação. É neste contexto que se insere o reforço do escrutínio daqueles investimentos, algo incentivado também pelo PE, que em Setembro manifestou preocupação com os investimentos chineses na UE.

Num relatório aprovado em 12 de Setembro sobre o estado das relações entre a UE e a China, os eurodeputados consideraram que os investimentos chineses fazem parte de uma estratégia global no sentido de empresas controladas ou financiadas por Pequim assumirem o controlo dos sectores bancário e energético e de outras cadeias de abastecimento.

Segundo o relatório aprovado em plenário, investigações recentes revelaram que, desde 2008, a China adquiriu activos na Europa no valor de 318 mil milhões de dólares, montante que não inclui várias fusões, investimentos e empresas comuns. Em 2017, 68 por cento dos investimentos chineses na Europa vieram de empresas públicas.

3 Dez 2018

Embaixadora da UE diz que China tem de abrir economia ao investimento estrangeiro

[dropcap]A[/dropcap] embaixadora da União Europeia para Hong Kong e Macau, Carmen Cano de Lasala, disse hoje que a China tem de “passar do discurso à acção” e “abrir as portas da sua economia ao investimento estrangeiro”.

“É preciso passar do discurso à acção” porque é possível ver “investimento chinês e de empresas chinesas na Europa, mas não o contrário”, afirmou durante a conferência “Relações UE-Ásia”, na Universidade de Macau, na qual se debateu o relacionamento entre a União Europeia e a China, bem como com as regiões administrativas especiais de Macau e Hong Kong.

A embaixadora explicou que a UE não concorda com a abordagem dos Estados Unidos, que desencadeou a actual disputa comercial com a China, mas criticou a falta de acção do regime de Pequim em matérias que passam pela abertura da economia a investimento estrangeiro e pelo combate à violação dos direitos de propriedade intelectual.

A espanhola assinalou que a União Europeia e a China estão a negociar compromissos de investimentos, mas que “todos os acordos comerciais devem reflectir princípios que vão desde os direitos laborais aos direitos humanos”.

Parcerias que, destacou, surgem em sintonia com “uma estratégia de sustentabilidade”, de acordo com uma filosofia multilateral, contrária ao “cenário de proteccionismo emergente no cenário mundial e de incumprimento de regras internacionais”, e na “partilha de princípios e valores”.

A diplomata defendeu ainda que a UE pode ter um importante papel na diversificação da economia de Macau, a capital do jogo mundial. “Macau é um grande exemplo de conectividade”, com o legado de “uma história europeia e uma economia dinâmica na Ásia, muito ligada ao jogo”, mas a UE pode “ajudar na sua diversificação”.

Carmen de Lasala sublinhou que as parcerias podem ser reforçadas em áreas como a educação, investigação e inovação, bem como no turismo.

20 Nov 2018

UE pede à China para se empenhar na reforma das leis de comércio mundial

[dropcap]A[/dropcap] comissária do Comércio da União Europeia, Cecilia Malmstrom, pediu sexta-feira que a China se envolva com a Europa na reforma da Organização Mundial do Comércio, perante o risco de os EUA imporem um sistema próprio de comércio.

“A China tem beneficiado muito com a Organização Mundial do Comércio (OMC), por isso pedimos que se empenhe em reformar e modernizar o sistema, para criar as condições para uma competição saudável”, disse sexta-feira Cecilia Malmstrom, durante um discurso em Paris, por ocasião de uma conferência sobre a reforma da OMC.

“Se assim não acontecer, serão os Estados Unidos a criar as suas próprias regras, fora do sistema”, disse Malmström, fazendo um apelo para que se reformem as regras do comércio internacional, perante o ministro francês das Finanças, Bruno Le Maire, e o director-geral da OMC, Roberto Azevedo.
“As regras precisam de ser atualizadas. Quando as desenhámos, em 1995, tínhamos outro sistema económico em mente”, disse Malmstrom.

Sem citar diretamente a China, a comissária europeia insistiu na necessidade de mudar as práticas de que Pequim é frequentemente acusada, particularmente pelos Estados Unidos e pela UE.
“Precisamos de lidar com as distorções (…) causadas por certas práticas, como subsídios à indústria, pelo papel do Estado nas empresas públicas e pela transferência forçada de tecnologia”, disse Malmstrom.

Depressa e bem

De sua parte, Le Maire lembrou que o próprio Presidente francês, Emmanuel Macron, pediu já a reforma da OMC, durante um discurso na OCDE, no final de maio.

Na sua intervenção, o ministro francês das Finanças defendeu uma reforma “rápida, concreta e ambiciosa” da OMC, alertando para o risco de uma “guerra fria comercial” entre a China e os Estados Unidos.

“Estamos hoje perante uma situação de guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, que é perigosa para a nossa economia, para o crescimento e para os nossos empregos”, disse Le Maire, que criticou as sanções comerciais recentemente impostas pela administração Trump.

“Esta guerra económica só terá perdedores, é injustificada, injustificável e simplesmente estúpida”, concluiu Le Maire.

Recentemente, o Presidente francês pediu à OCDE um “diagnóstico” de “disfunções do sistema atual” e um roteiro que poderia ser estabelecido na cimeira do G20 realizada no final do mês em Buenos Aires.

A China respondeu então positivamente a este apelo de Macron e de outros dirigentes mundiais e disse estar “pronta para trabalhar” com todos os membros da OMC para tornar as regras “mais abertas, mais inclusivas, mais transparentes e não discriminatórias”.

19 Nov 2018