Incêndios | Já há cinco vítimas mortais dos fogos que fustigam o país Portugal a arder

Mais parece um disco de terror riscado que a cada chegada do Verão teima em tocar. Chamas consomem Portugal repetidamente e reduzem recursos a cinza, desalojam gente e forçam os soldados da paz a dias e noites frente a frente com o inferno

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]no após ano, o Verão português inflama. As televisões abrem o telejornais com o que vai restando de Portugal a arder. É a voracidade das chamas a ganhar terreno, a destruir florestas, casas e tudo o que lhes passa pela frente. Quem de fora vê, observa rostos incrédulos e em choque dos que vivem o drama e a força inesgotável dos bombeiros, os soldados da paz que, sem mãos a medir, tentam fazer o que podem para que os estragos não sejam ainda maiores. Este ano o cenário mantém-se. Portugal está a arder e as labaredas não poupam terreno.
Ontem eram 34 os concelhos em “risco máximo” de incêndio em Portugal continental. A informação foi dada pela agência Lusa, tendo em conta a informação do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). O Instituto colocou também em risco ‘Muito Elevado’ e ‘Elevado’ de incêndio vários concelhos de todos os 18 distritos de Portugal continental.
O número de operacionais no terreno a tentar combater os nove maiores focos de incêndio do continente era de 960 e as chamas lavravam nos distritos de Aveiro, Braga, Guarda, Porto e Viana do Castelo, de acordo com a informação disponibilizada pela Autoridade de Protecção Civil.

De lés a lés

De norte a sul, Portugal arde. Em Aveiro estavam em curso três incêndios, sendo que o maior estava localizado no concelho de Arouca, onde 206 bombeiros combatiam as chamas, apoiados por 48 meios terrestres. Ainda em Aveiro, as chamas atingiam o concelho de Santa Maria da Feira, localidade de Canedo, com 56 operacionais no terreno apoiados por 14 viaturas e também na localidade de Real, com 52 operacionais e 16 meios terrestres.
Em Viana do Castelo há igualmente três incêndios de dimensão considerada significativa. O maior é no concelho de Vila Nova de Cerveira, localidade de Covas, onde 183 operacionais e 61 meios terrestres combatem o fogo que começou na tarde de domingo e tinha, no fecho desta edição, duas frentes activas.
Em Travanca, no concelho de Arcos de Valdevez, estavam 167 operacionais e 55 viaturas. A Protecção Civil destaca ainda o fogo com duas frentes activas em Igreja Vilar Murteda, combatido por 93 operacionais e 27 veículos.
O incêndio mais recente teve início na terça-feira, poucos minutos antes da meia-noite, no distrito da Guarda, na localidade de Pena Lobo. O fogo com duas frentes é combatido por 75 operacionais e 19 meios terrestres.
Em Braga, as chamas lavram, desde o início da noite de terça-feira, em Encourados onde estão 70 operacionais, e no distrito do Porto são 58 os operacionais que combatem as chamas em Milhundos, no concelho de Penafiel.
Para já, há registos de duas vítimas mortais no território de Portugal continental e que ocorreu na segunda-feira em Valongo. Uma das vítimas era um homem de 57 anos e a sua morte deveu-se a uma paragem cardio-respiratória na sequência das chamas que ameaçavam casas e fábricas perto do prédio onde vivia. A outra é um homem entre os 40 e 50 anos, vigilante do Parque Dormes, Santarém, que ardeu e cujo fogo destruiu ainda duas viaturas dos Sapadores.

Jardim queimado

Este ano nem o chamado jardim de Portugal escapou. À parte do continente, a ilha da Madeira está a ser assolada pelas chamas e, ontem, até ao fecho desta edição já tinha feito três vítimas mortais. As mortes tiveram lugar na terça-feira, segundo fonte do Governo Regional da Madeira, e ocorreram na zona da Pena, na freguesia de Santa Luzia, sendo moradores de duas das residências atingidas pelo fogo.
Os incêndios que deflagraram pelas 15h30 de segunda-feira no Funchal provocaram ainda dois feridos graves, cerca de mil desalojados, entre residentes e turistas, muitas casas e um hotel, o Choupana Hills, foram consumidos pelas chamas, tendo o fogo descido à cidade do Funchal na noite de terça-feira. O centro histórico de S. Pedro é descrito na imprensa nacional como um cenário dantesco.
As autoridades tiveram ainda de evacuar dois hospitais, estando cerca de 600 pessoas num Regimento de Guarnição, 300 no estádio dos Barreiros e 50 no centro cívico de São Martinho.
Cerca de 135 efectivos, 115 oriundos de Lisboa e outros 20 dos Açores, foram enviados para a Madeira para reforçar as equipas no combate aos incêndios.

Do outro lado

O Partido Ecologista “Os Verdes” exigiu ontem que seja decretada a situação de calamidade na sequência dos incêndios que lavram no Funchal, considerando que podem ser accionados junto da União Europeia pedidos de apoio.
Em comunicado, o colectivo regional da Madeira diz que “a situação dramática decorrente da propagação” do incêndio no Funchal, “atingindo o seu núcleo histórico, destruindo centenas de habitações e pondo em perigo milhares de pessoas e património inestimável”, tornou-se “um verdadeiro drama sem par na história dos incêndios nos últimos cem anos em Portugal”, em declarações citadas pela Lusa.
Segundo “Os Verdes”, além dos impactos sociais e económicos destes incêndios e da dimensão humana dramática que revestem, “estes têm ainda impactos ambientais profundos com uma perda de património natural, de biodiversidade e de património paisagístico que levarão muitos anos a recuperar”.

Mão humana

As causas para o que está a acontecer e que se repete ano após ano são variadas. Desde as altas temperaturas, ao descuido humano até mesmo à intenção de atear as chamas por diversos motivos são sempre pontos em cima da mesa.
No entanto, e para o Comandante Operacional de Agrupamento Distrital do Norte, Paulo Esteves, 35% dos incêndios florestais que fustigam o Alto Minho deflagraram à noite e “têm mão humana”.
“É fácil de ver que há mão humana quando se reportam incêndios nocturnos na ordem dos 30% a 35%. Termos seis focos no espaço de um quarto de hora, em quatro freguesias seguidas do concelho de Ponte de Lima, é um facto”, referiu aquele responsável.
Paulo Esteves, que falava em conferência de imprensa no Centro Distrital de Operações de Socorro (CDOS) de Viana do Castelo, adiantou que “o número de ignições” registadas nos últimos dias do Alto Minho “é que está na génese de tudo”.

Portugueses testemunham a dor de ver a terra a arder

Denisa Alencastre vive em Macau e é natural da Madeira. Estar a ver as chamas na terra que a viu nascer é fonte de preocupação e tristeza. Em jeito de alívio, refere ao HM “felizmente com a família está tudo bem”. A informação que tem acerca do que se está a passar vem do feedback por parte da família.
“Sei de pessoas que tiveram de abandonar as suas casas porque o fogo estava demasiado perto” e que só no despertar de ontem é que saberiam se ainda tinham casa para viver, conta.
Para esta madeirense, a situação que se está a viver “não é de agora” e “sempre foi um problema”. Denisa relembras os incidentes dramáticos de 2010 com o temporal e incêndios e agora a “história repete-se”. Na sua opinião, o mais grave que se regista no momento prende-se com o facto das chamas estarem “mesmo no centro do Funchal”.
“É uma verdadeira dor de alma”, desabafa a madeirense enquanto ilustra que “parte do colégio perto de S. Pedro ardeu e a escola secundária na Pena também”, instituições que frequentava. São as memórias que ardem.
Já Alice Dias assiste ao comer da sua bonita Serra do Gerês repetidamente. Natural de Arcos de Valdevez, a jovem que está em Inglaterra conta ao HM a “muita raiva e tristeza” que sente.
“Tristeza pelos danos causados, por saber que chegarei lá em breve e em vez de ver o verde lindo do meu Minho vou encontrar tudo negro, coberto de cinza”, explica a uma semana antes de voltar à terra mãe para umas pequenas férias. Por outro lado, Alice Dias não concebe brandamente o facto de ter noção que a “população idosa é posta em risco e tem de ser repetidamente deslocada por motivos de segurança”. A raiva que sente é por “saber que muitos dos incêndios começam por mão criminosa ou descuido”.
O contacto com quem está em casa é permanente e “quem lá está diz que é o inferno”. Os locais que tão bem conhece, como a Serra do Soajo e muitas áreas do parque natural da Peneda Gerês, “estão reduzidos a nada, ardeu tudo”.
O cenário é repetido e Alice já “perdeu a conta às vezes” que viu a sua terra arder. Para a jovem minhota, o maior dos problemas reside na ausência de prevenção. Neste sentido, ilustra com a necessidade “de mais limpeza florestal”. Por outro lado, e volta a referir, está “a mão criminosa”, sendo Alice a favor de penas pesadas para quem incorre neste tipo de crimes. É a destruição de hectares de terreno, da sua fauna e flora e do pouco património das aldeias que ainda vivem isoladas, remata com tristeza e desânimo. S.M./A.S.S.

Governo reage

Perante a situação, o Primeiro-Ministro português António Costa fez uma interrupção nas suas férias e recusou a existência de qualquer problema na eficácia da resposta aos incêndios, sublinhando que “o dispositivo tem estado a responder às ocorrências de acordo com aquilo que é o padrão normal”.
As declarações foram dadas num encontro com os jornalistas acompanhado pelo comandante operacional nacional da Proteção Civil, a Ministra e o Secretário de Estado da Administração Interna e citado na Lusa.
No entanto, Costa não deixou de sublinhar que perante “picos extraordinários”, como os que aconteceram no domingo e segunda-feira, existiram “dificuldades na resposta”, referindo-se o Primeiro-Ministro ao alerta emitido para ajuda internacional. Mas
António Costa recordando a “grande reforma no sector da protecção civil” realizada há dez anos, classificou como “essencial” a reforma da floresta. “É altura de, dez anos volvidos, não perder mais tempo para fazermos aquilo que é essencial fazer, a reestruturação da floresta de forma a termos uma floresta mais resistente, mais sustentável”, defendeu, considerando que esta é uma prioridade política a que terá de ser dada execução “tão rapidamente quanto possível”.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e o Primeiro-Ministro acordaram em conjunto deslocar-se à Madeira.

Soldados com pouca paz

“Não há dois fogos iguais”, diz o bombeiro Rui ao HM. “Há pequenos focos de incêndio onde tudo se consegue fazer e há outros com várias frentes e que são autênticos infernos”.
Chega ao ponto de haver corporações inteiras a fugir e a abandonar o material e as mangueiras, homens adultos a chorar de pânico. É a descrição do homem que vê os Verões ocupados com este cenário e que lá está para apaziguar agruras alheias.
Em jeito ilustrativo, refere que já esteve num incêndio em que os soldados da paz estiveram lá 38 horas seguidas em trabalho, “sem qualquer descanso ou paragem”.
As dificuldades são muitas e ninguém quer saber dos bombeiros voluntários no Inverno, afirma Rui, que faz da vida uma divisão entre o dia a dia normal e o combate das chamas. O bombeiro diz ao HM que “são necessários mais carros, mais fardas, mais homens e mulheres”. São estas pessoas que saem de um trabalho remunerado e da segurança e conforto familiar para ajudar outros, que por vezes até “os tratam mal quando lá chegam”.
Rui é da zona centro, mas corre o país onde for preciso. Relativamente aos apoios aos bombeiros voluntários, refere que “até há câmaras que dão apoio ao voluntariado, mas não é o caso desta”.
Para Rui é frustrante ter que passar por estes episódios ano após ano sem que nada mude. “Todos os anos se fala sobre as obrigações dos proprietários e os erros continuam a ser os mesmo”, afirma. Isto, aliado a “um péssimo ordenamento territorial, queimadas fora de prazo e sem controlo e a terras completamente ao abandono e sem acesso”, que acabam com o ramalhete por detrás da tragédia anual.
Para o bombeiro o cenário é claro: “há muitos interesses dos produtores de papel, dos que gerem meios aéreos e até de alguns dirigentes dentro dos bombeiros” para que tal continue a acontecer.

11 Ago 2016

Portugal tem bicampeão Europeu de canoagem

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]Fernando Pimenta sagrou-se no domingo bicampeão da Europa de canoagem, juntando o título de K1 5000 ao de 1000, conquistado no dia anterior. Um título inédito a dois meses dos Jogos Olímpicos.
O canoísta luso, que liderou do primeiro ao último metro, concluiu a prova em 3.29,040 minutos, batendo o dinamarquês René Poulsen (3.32,296), segundo classificado, e o húngaro Balint Kopasz (3.32.656), terceiro.
Pimenta admitiu um “sabor agridoce” por ter falhado o pódio em K4 1000.
“É muita ‘fruta’, mas sinto um sabor agridoce. Mesmo sendo talvez o atleta mais medalhado dos homens nestes Europeus, queria mais no K4. Ficámos a 100 milésimos do bronze. Sem dúvida que me sinto satisfeito pelo que fiz, mas os meus parceiros mereciam sair daqui com uma medalha. Vamos trabalhar para isso. O nosso momento está para chegar”, garantiu à agência Lusa.
Pimenta referia-se a Emanuel Silva, João Ribeiro e David Fernandes, com quem ficou a 108 milésimos do bronze em K1 1000.
“O nosso momento está para chegar. Vamos trabalhar para isso, mais unidos do que nunca, focamos no grande objectivo e meta, os Jogos Olímpicos”, vincou.
O canoísta português garante que sairia “sempre motivado” destes Europeus, considerando que não há limites para a fasquia de objectivos que delineia com o seu treinador Hélio Lucas.
“Não desmotivo fácil. Temos sempre um olhar novo, objectivo e meta. Sem dúvida que sair daqui com duas medalhas é muito gratificante, um clique muito bom. E agora é trabalhar, dar tudo por tudo. Continuar focado, concentrado ainda mais do que nunca”, concluiu.

28 Jun 2016

Euro 1016 | Portugal avança para os quartos

Faz lembrar a Itália. Especialmente a de 82 quando passou à segunda fase apenas com empates mas acabaria campeã do mundo após um jogo épico em que bateu o melhor Brasil dos últimos 40 anos nas meias finais. Cínica e calculista, estará a equipa portuguesa a seguir o mesmo caminho?

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m golo de Ricardo Quaresma, perto do final do prolongamento, garantiu ontem de madrugada a Portugal um lugar nos quartos de final do Euro2016 de futebol, no triunfo por 1-0 sobre a Croácia, num jogo em que teve ‘estrelinha’. Depois do ‘nulo’ registado no tempo regulamentar, Quaresma decidiu o duelo dos ‘oitavos’ na recarga a uma defesa incompleta de Subasic, aos 117 minutos, naquela que foi a única situação de verdadeiro perigo que a selecção nacional criou em toda a partida.
Instantes antes, a Croácia tinha acertado no poste da baliza de Rui Patrício e estava em ‘cima’ de Portugal, que nessa altura já tinha assumido o desejo de chegar às grandes penalidades, quando o seleccionador Fernando Santos juntou Danilo Pereira e William Carvalho no meio, aos 108 minutos.
Em Lens, as duas equipas não conseguiram fugir ao medo da eliminação e acabaram por realizar uma partida sem grandes situações de perigo. Rui Patrício e Subasic foram praticamente espectadores com lugar privilegiado no relvado.
O guarda-redes português não fez qualquer defesa em toda a partida, enquanto o croata, na única vez que interveio, parou com dificuldade um remate de Ronaldo, acabando a bola por sobrar para Quaresma, no lance que decidiu o jogo.
Antes, mesmo sem acertar no alvo, a Croácia acabou por ser a equipa que mais perto esteve de marcar e em quase todas as situações pelo defesa Vida, que já nos segundos finais esteve perto de levar a decisão para os penáltis.
Portugal foi praticamente inofensivo no ataque (Cristiano Ronaldo esteve demasiado preso aos centrais), mas melhorou e muito no funcionamento do seu meio campo, primeiro com a entrada de Adrien para o ‘onze’, mas sobretudo quando Renato Sanches foi lançado no arranque da segunda parte, para o lugar de André Gomes, que mais uma vez foi a unidade em mais baixo rendimento na equipa lusa.

Do banco saiu uma estrela

Renato Sanches, considerado pela UEFA o melhor em campo, ‘obrigou’ Fernando Santos a desistir do disfuncional 4-4-2 e mudar para um 4-3-3, dando outra consistência e alegria ao jogo de Portugal. O médio que vai transitar do Benfica para o Bayern foi também determinante no golo, na forma rápida que transportou a bola mais de 30 metros até à área da Croácia e, certamente por isso, acabou sendo considerado o “homem do jogo”.
Mesmo sem ‘poder de fogo’, algo que terá que solucionar com alguma urgência, a selecção nacional acabou por fazer, principalmente durante a segunda parte, o seu melhor jogo no Euro2016 e, mesmo com alguma ‘estrelinha’, carimbou um lugar nos ‘quartos’, em que vai encontrar a Polónia, em Marselha.
Com apenas dois dias de descanso, Fernando Santos foi obrigado a refrescar a equipa, fazendo não só entrar Adrien, mas também Cédric, para o lugar de lateral direito, José Fonte, para o centro da defesa (grande jogo do central do Southampton), e Raphael Guerreiro, ao lado esquerdo da defesa, como previsto. De fora, ficaram Vieirinha, Ricardo Carvalho, Eliseu e João Moutinho.

Jogo autista

Desde de muito cedo se percebeu que Croácia e Portugal entraram em campo sem autorização para arriscar, com a bola a passar demasiado tempo a meio campo, numas fases mais nos pé dos croatas, noutras nos portugueses.
Aos 25 minutos, Pepe atirou por cima em boa posição e, aos 30, Perisic atirou às malhas laterais da baliza de Patrício, nos dois únicos lances de registo na primeira parte., em que André Gomes acabou por ser o mais ‘desastrado’ em campo.
O médio do Valência, que não parece bem fisicamente, ainda teve alguns minutos para convencer Fernando Santos no arranque da segunda parte, mas o seleccionador nacional perdeu a paciência logo à primeira bola perdida e foi ‘obrigado’ a colocar Renato Sanches.
A partir dai, Portugal passou a actuar com João Mário e Nani bem abertos nas alas, e Ronaldo no meio, enquanto Sanches e Adrien fecharam o meio, à frente de William.

Penálti não assinalado

Portugal melhorou, trocou bem melhor a bola, mas, dentro do futebol temeroso das equipas, foi a Croácia que podia ter marcado, primeiro por Brozovic e depois por Vida. Ambos falharam a baliza em boa posição.
Depois de Nani ter sofrido uma grande penalidade clara (mesmo em frente do árbitro de baliza), e com o passar dos minutos, Portugal e Croácia fecharam ainda mais as suas linhas, praticamente abdicando de colocar mais unidades na frente.
Durante o tempo regulamentar, destaque ainda para a entrada de Quaresma, aos 87 minutos, para o lugar de João Mário.
No arranque do prolongamento, Kalinic ainda assustou Rui Patrício, mas o jogo foi-se mantendo na mesma toada, sem grandes aventuras por parte das duas equipas.
Com a entrada de Danilo e a saída de Adrien, aos 108 minutos, Portugal deu mostras de querer levar a decisão para os penáltis e a Croácia cresceu um pouco na partida. Vida, com a baliza aberta, atirou por cima, e Perisic acertou no ‘ferro’.
Praticamente na jogada seguinte, com os croatas subidos no terreno, Renato Sanches conduziu a bola mais de 30 metros, deixou em Nani, que com um centro rasteiro assistiu Cristiano Ronaldo na área. O ‘capitão’ da selecção nacional obrigou Subasic a grande defesa, mas, na recarga, Quaresma só teve que encostar a confirmou o triunfo.

27 Jun 2016

Pequim sabe que Portugal aguarda mais investimento chinês

O IPIM levou a Lisboa e ao Porto 30 empresários do “Grupo 9+2” (nove regiões chinesas, Macau e Hong Kong) e o resultado provável será mais investimento chinês em Portugal, país que o embaixador chinês, Cai Run, considera uma “terra de maravilhas, dotada de excelente localização geográfica”

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo português “está a aguardar” a participação de empresas chinesas em diversos sectores, segundo um comunicado do Instituto da Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM) ontem divulgado.
O instituto levou na semana passada a Lisboa e ao Porto 30 empresários do designado “Grupo 9+2”, que engloba nove regiões chinesas, Macau e Hong Kong, que formam a Região do Pan-Delta do Rio das Pérolas, para impulsionar “o intercâmbio e a cooperação”.
Na passagem por Lisboa, os empresários encontraram-se com o embaixador da China, Cai Run, que, segundo o mesmo comunicado, “sublinhou que o Governo português está a aguardar a participação das empresas chinesas nos sectores de energia, serviços financeiros, seguros, medicina, preservação da saúde, negócios marítimos, agrícola, infra-estruturas e cooperação na capacidade de produção”.
O embaixador incentivou, ainda, os empresários chineses a participarem no seminário de promoção do investimento em Portugal que terá lugar em Novembro e afirmou que considera Portugal uma “terra de maravilhas, dotada de excelente localização geográfica”.
Os empresários do “Grupo 9+2” estiveram num seminário com representantes de 30 empresas portuguesas e visitaram “empresas avançadas”, da área dos transportes e “negócios marinhos”, lê-se no mesmo texto.
Nesse seminário, o presidente do IPIM, Jackson Chang, “observou que Portugal e Macau têm profundas raízes históricas, sendo cada vez mais frequente a cooperação”, e revelou que em 2015 o comércio bilateral superou os 35 milhões de dólares norte-americanos, um aumento de 11,8%.

Oportunidades no Delta

Sempre segundo o mesmo comunicado, Jackson Chang lembrou que Pequim deu a Macau a missão de ser a ponte entre a China e os países de língua portuguesa, no âmbito da cooperação económica, e garantiu que a região está “a implementar com dinamismo” os designados “três centros” (de serviços comerciais para as pequenas e médias empresas chinesas e lusófonas; de distribuição de produtos alimentares da lusofonia; e para convenções e exposições das partes envolvidas).
“Existem boas razões para crer que foram já criadas condições para as empresas de Portugal, Macau e da Região do Pan-Delta do Rio das Pérolas colaborarem estreitamente, com vista a explorar oportunidades de negócio”, lê-se no texto.
Noutro encontro, Jackson Chang convidou a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) a incentivar a organização de delegações de empresários portugueses para participarem na edição deste ano da Feira Internacional de Macau (MIF, na sigla em inglês) e no conferência ministerial do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa, conhecido como “Fórum Macau”, que se realiza este ano, em Macau.
A China estabeleceu a Região Administrativa Especial de Macau como a sua plataforma para o reforço da cooperação económica e comercial com os países de língua portuguesa em 2003, ano em que foi criado o Fórum Macau, que tem um Secretariado Permanente e reúne ao nível ministerial de três em três anos.

27 Jun 2016

Portugal 3 – Hungria 3 | O jogo que não quisemos vencer

As decisões de Fernando Santos impediram Portugal de vencer, quando estava por cima. Mas o sonho continua

Cristiano Ronaldo faz o 3-3 para Portugal | FOTO: EPA/CJ GUNTHER
Cristiano Ronaldo faz o 3-3 para Portugal | FOTO: EPA / CJ GUNTHER
[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Hungria-Portugal foi o jogo mais espectacular do Euro 2016 até ao momento e terminou com uma igualdade a três golos e o consequente apuramento português (e dos húngaros, em primeiro, a que se juntaram os islandeses, em segundos) para os oitavos-de-final da competição.

Na partida que, por enquanto, rendeu mais golos na prova, Portugal esteve sempre em desvantagem. Primeiro, num remate à entrada da área portuguesa, Gera inaugurou o marcador (19’) para os húngaros, mas Nani, bem junto ao intervalo, repôs a igualdade.

No início do segundo tempo, a Hungria recolocou-se em vantagem, aproveitando um livre que sofreu um desvio na barreira nacional, mas Cristiano Ronaldo surgiu no jogo ao marcar um golaço, de calcanhar (50’), que recolocava o marcador numa igualdade – o internacional português passou a ser o primeiro futebolista a marcar em quatro fases finais consecutivas de Europeus.

Só que aquele resultado durou cinco minutos, já que em mais um remate que sofreu um desvio, Dzsudzsák voltaria a colocar a Hungria na frente do marcador.

Novamente desqualificado, face à conjugação de resultados, Portugal foi capaz de repor a igualdade (62’), num cabeceamento de Cristiano Ronaldo, que assim “bisou” na partida e recolocou a selecção no lote das qualificadas para a fase seguinte do Euro 2016, apesar de ter terminado a fase de grupos com três empates.

Islândia em primeiro

Entretanto, a Islândia venceu a Aústria por 2-1 na última jornada do Grupo F e assegurou assim o 1º lugar com cinco pontos. Esta vitória dos nórdicos permitiu a Portugal ser terceiro e assim evitar o lote dos ‘tubarões’ do Euro 2016. Com vontade de ser primeira no grupo, a Islândia começou a todo o gás. E logo aos dois minutos atirou uma bola ao ferro por Gudmundsson num pontapé do meio da rua. Com tanto domínio inicial, foi sem surpresa que a equipa nórdica chegou ao golo por intermédio de Bodvarsson. Depois de um lançamento longo, a bola sobrou para o 15 que não falhou na hora h.

Com vontade de inverter o rumo dos acontecimentos e com esperança ainda na qualificação para a próxima fase do Euro, a Áustria tentou responder ao golo. Arnautovic em excelente posição cabeceou por cima. Aos 36 minutos, a Áustria teve uma soberana ocasião para marcar. Skulason travou Alaba na área, e o árbitro não teve dúvidas para assinalar o castigo máximo. Na transformação Dragovic atirou ao poste.

No segundo tempo, à passagem dos 60 minutos, o pendor ofensivo austríaco deu os seus frutos. Schöpf tirou um adversário da frente e rematou para o fundo da baliza. A Áustria foi à procura da vantagem e quase o conseguiu, mas permitiu a intervenção do guardião nórdico. Quando nada o fazia prever, a Islândia marcou ao cair do pano. Arnor Ingvi Traustason fez o tento da vitória e permitiu à sua seleção acabar em primeiro lugar do grupo.

Com este triunfo, Portugal qualificou-se em terceiro lugar. Já a Islândia ao ficar em primeiro lugar do grupo vai medir forças com o segundo classificado do Grupo E.

Ronaldo fica a um golo de Platini

Cristiano Ronaldo isolou-se ontem no segundo lugar dos melhores marcadores da história do Europeu de futebol, a um tento de Michel Platini, ao ‘bisar’ face à Hungria, em encontro da terceira jornada do Grupo F, em Lyon. O ‘capitão’ da seleção lusa, que é agora o melhor marcador luso em Europeus, Mundiais e, naturalmente, no somatório das duas competições, passou a contar oito golos em campeonatos da Europa, com os tentos aos 50 e 62 minutos. Ronaldo, que havia marcado dois golos no Euro2004, um no Euro2008 e três no Euro2012, superou os sete tentos do inglês Alan Shearer e ficou a um dos nove do francês Michel Platini, todos marcados na edição de 1984. O ‘7’ luso, que também reforçou o estatuto de melhor marcador do Europeu, juntando qualificação e fase final (28 golos), tornou-se também o primeiro jogador da história a marcar em quatro Europeus, sendo que, juntando os Mundiais, também é o único com golos em sete fases finais.

Na história dos Europeus, Ronaldo, que ontem se isolou com o jogador com mais encontros disputados (17, contra 16 de Edwin van der Sar e Lilian Thuram), estreou-se a marcar no primeiro jogo do Euro2004, quando fez o tento de honra da seleção portuguesa frente à Grécia (2-1), no Estádio do Dragão.

Reacções

Fernando Santos | “Fundamental foi passar. Queríamos tê-lo feito como primeiros do grupo, mas foi impossível, depois das incidências nos dois primeiros jogos, em que Portugal foi melhor e não conseguiu vencer, e deste, apanhados três vezes a perder, num jogo contranatura, com Portugal a jogar razoavelmente bem. O adversário três vezes criou perigo e fez golo. A equipa teve uma grande atitude, capacidade de resposta e conseguiu igualar três vezes e tentou o quarto golo, também. No período final, o adversário não quis jogar, tentou que Portugal se adiantasse para atacar. Não adiantava insistir quando estávamos apurados, a três minutos do fim, e correr o risco de sofrer um golo. Nos últimos minutos, a equipa soube pensar no que tinha que fazer. Fizemos tudo para ganhar, queria ganhar, mas é normal que nos últimos seis ou sete minutos os jogadores saberem que o importante é estarmos cá. A Croácia é uma excelente equipa. Viemos para o Euro com uma ambição. Quem vem para o Europeu tem que jogar com todos. Vai ser um grande jogo.”

Danilo Pereira | “[O seleccionador] pediu-me para entrar e segurar o meio-campo. Estamos todos felizes pelo apuramento, não da forma como queríamos, mas é sempre um apuramento. No final, vimos que Hungria não estava a atacar, e também decidimos não fazer. O resultado convinha e não podíamos sofrer golos. Preparados para tudo e as críticas fazem parte do dia a dia.

João Mário | “A Hungria, por estar já apurada, apareceu a encarar o jogo de forma muito aberta e competitiva, mas estávamos preparados e não foi surpresa nenhuma. [Croácia, próximo adversário] É uma selecção muito forte, com excelentes jogadores e muito bem organizada. Há que encarar esse jogo cara-a-cara, com muita tranquilidade. Agora, no ‘mata-mata’, o objetivo é passar. Há que encará-lo com optimismo e corrigir os aspectos menos positivos”.

Nani | “Cumprimos o objectivo, pelo menos um deles, que era passar. Não conseguimos da maneira como queríamos, que era ganhar os jogos, mas o mais importante foi passar. Agora é a fase a eliminar.

Hoje fomos infelizes em dois lances, em que a bola ressaltou nos nossos jogadores. Soubemos responder, mostrámos excelente atitude, bom futebol e que somos uma equipa forte. E marcámos três golos, embora não tenhamos conseguido vencer. Os portugueses podem estar orgulhosos e continuar a acreditar. A Croácia jogou muito bem contra a Espanha. Mas com equipas fortes costumamos responder muito bem. Temos que ser muito competentes, mas temos ainda muito para demonstrar”.

Renato Sanches | “O que interessa é que estamos apurados. Foi um bom jogo, apesar do desfecho. Não está a faltar nada à Selecção. Estamos a jogar bem, apenas falhámos alguns golos. Há que continuar a trabalhar, que as coisas vão aparecer. Contra a Croácia, será um jogo difícil, mas estamos preparados”.

23 Jun 2016

Portugal existe desde o século V

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] remoto nome poético das Curvas (Cale) do Rio ligadas ao porto, de onde provém o Condado Portucalense, criado sem independência em 1097, coloca-nos em questão o existir já no século V, na margem esquerda do Rio Douro, uma vila cujos romanos davam o nome de Cale, sendo esta conhecida desde então pelo nome de Portugal. No actual concelho de Gaia, confrontando com Mafamude e Coimbrões, tem a povoação de Portugal a sua História associada à representação da formação de um território, feito por conquistas, povoamento e conversões. De povoação, a território elasticamente expandido desde o Rio Douro até Coimbra, qual respiração tinha Portugal no Mosteiro de Crestuma o seu centro de poder de condado no início do século X, então integrado no reino de Leão (910-1037). A Galiza estava dividida em diversos condados, sendo um deles o Condado de Portucale, o único situado para Sul do Rio Douro. Pouco mais de um século faltava para como país aparecer Portugal.

Aprendemos na escola que a palavra Portugal vem da junção de Porto Cale, de onde foi formado o Condado Portucalense. Para a palavra , todos sabemos significar local de costa onde as embarcações se abrigam e dá passagem para terra; já para , o dicionário refere vir do latim canale, que significa rego de água. No entanto, no tempo de Jesus, Estrabão, que percorreu a Península Ibérica nos primeiros anos da era de Cristo, mencionava Cale, assim chamada pela sinuosidade de curva, porque as curvas dos rios costumavam assim chamar-se na linguagem dos lugares.

Também por essa altura, segundo Plínio, no século I os túrdulos encontravam-se na cale do Rio Douro e fala deles como estando ainda espalhados por todo o litoral Atlântico, do Douro ao Anas (Guadiana), sendo da sua autoria a estruturação viária pelo litoral, que atravessa o território de Norte a Sul e perdura há dois mil anos. Estrebão refere-se a eles como os túrdulos antigos (turduli veteres), com escrita própria e leis registadas em verso, eram descendentes dos tartéssios.

Império Romano na Península

“Em tempos remotíssimos, o rio Douro, pela sua margem esquerda, limitava a antiga Lusitânia; e nas eminências presentemente denominadas Serra do Pilar e Castelo, existiram castros em épocas passadas. Com efeito, no antigo monte da Meijoeira – a actual Serra do Pilar – foram achadas moedas gregas do século III a.n.E. e comprovam, que, em tão importante cerro, existiu um castro helénico. Mais a poente, no sítio denominado Castelo, também existiu um Castro, onde, mais tarde, os romanos levantaram uma fortaleza e, consequentemente, fundaram uma povoação a que deram o nome de CALE. Esta povoação foi-se tornando muito florescente, não só por estar próxima à foz dum rio importante, como também pela pequena enseada, que lhe servia de porto.

Calçada romana

Quando estes povos construíram a estrada de Lisboa para o norte, com terminus em Braga, o porto de CALE, ficou a constituir o ponto obrigatório da passagem dos viandantes que, do sul, pretendessem seguir para as terras Minho-Galaicas; e aos que, destas, desejavam ir para as terras situadas entre os rios Douro e Tejo.

Naqueles tempos, na margem direita, e fronteira a Cale não havia nenhuma povoação, consoante se prova com o Itinerário de Antonino (livro elaborado no século II)”. Estava a Península Ibérica dividida em três províncias separadas: Lusitânia (a Oeste), Baética (a Sul), Tarracones (no Leste e Norte). O actual território de Portugal correspondia a uma boa parte da província romana de Lusitânia, nos territórios entre Douro e Minho e governada desde Eremita Augusta, agora Mérida em Espanha, e alguns dos territórios da Boetica habitados pelos celtibérios. Os Romanos dominaram a Península Ibérica até ao século V da era cristã, altura da sua decadência, coincidente com a chegada dos Bárbaros a invadir as terras Ocidentais.

No século V, o Bispo Idácio de Aquae Flaviae (Chaves) na sua Crónica falava do porto de Calem e dizia que Braga era a cidade mais ao Sul do reino da Galécia, que terminava no Douro. Reino criado no século III, era dividido pelo Rio Minho, tendo a Norte os lucenses e a Sul, os bracarenses. Os restantes dois reinos da Península Ibérica eram a Bética, a Leste do Guadiana (Anas) e a Lusitânia, do Douro ao Guadiana.

Da Resenha Histórica de CALE Vila de Portugal e Castelo de Gaia, na separata de Comunidades Portuguesas de 1970, onde não aparece o autor, diz-se, “O mesmo Idacio (c.395-468), quanto à povoação de CALE, mencionou-a, como o Castro chamado Portucale. Pela primeira vez, entre os mais antigos documentos, aparece o nome de Portucale, dado por este cronista, à povoação de Cale.

Idacio, que viu Cale, antepôs-lhe, ao designá-la, o substantivo porto, alatinando para portu, bem certamente pelo facto de, naquele tempo, o porto de Cale ser muitíssimo conhecido.

Na margem direita e fronteira a Portugal, continuava a ausência de qualquer burgo ou povoação, porquanto, se existisse, não deixaria de ser referida por este cronista, consoante o fez sobre Castrum Novum, que verificou existir no cerro de Penaventosa, do Porto.

Visigodos e o Reino das Astúrias

Os visigodos, vindos das margens do Danúbio e do Mar Negro, atravessaram a Europa e chegaram à Península Ibérica em 412. Como tropas federadas ao serviço de Roma vieram para expulsar os alanos, suevos e vândalos, que tinham acabado de ocupar a Península Ibérica. Após dominar toda a Espanha, este povo germânico pela força das armas em 476 tomou Roma, acabando com o Império Romano do Ocidente, tendo promulgado a “Lex Romana Visigo-thorum” em 506. “Em Lugo, no ano de 568, realizou-se um concílio, que determinou quais as igrejas que ficavam a pertencerem à Sé de Coimbra: «a Sé Conimbricense tenha a mesma Coimbra, Eminio, Selio, Roma, Antuana e Portugal – o Castelo antigo dos romanos>, segundo Pinho Leal. Por este documento, comprova-se que a povoação de CALE, ou Portugal, estava sujeita, eclesiasticamente, à Sé de Coimbra, a qual, jamais, superintendeu em igrejas além da margem esquerda do Douro”, Resenha Histórica de CALE.

Entre 568 e 586, o rei visigodo Leovigildo expulsou os funcionários imperiais e procurou unificar a Península. Foi o fim do Império Romano na Península Ibérica.

Mas no início do século VII, o reino Visigodo (410-711) entrou em crise, com rebeliões a Norte, nas Astúrias e com os bascos, encontrando-se o Sul sob domínio bizantino.

Batalha de Guadalete (31 de Julho de 711)

Em 711, acabou a guerra civil no reino visigodo, já que, com a chegada à Ibéria do exército muçulmano comandado por Tariq ibn Ziyad, numa só batalha deu-se a decapitação do reino visigodo. Pelágio, um príncipe godo, refugiou-se nas montanhas das Astúrias, e resistindo daí com um grupo de cristãos lutou entre 718 a 725 contra os maometanos. Refere Bernardo Vasconcelos e Sousa: “Tradicionalmente, a vitória dos cristãos sobre os muçulmanos na Batalha de Covadonga, no ano de 722, foi considerada como o início da chamada Reconquista, isto é, do processo militar pelo qual os cristãos recuperaram os territórios ocupados pelos seguidores do Islão. Mas mais do que um decisivo confronto bélico já no contexto de uma reconquista, Covadonga foi um recontro entre tropas muçulmanas que haviam penetrado na região montanhosa da Cantábria e uma força constituída por naturais daquela zona que reagiram para defenderem a sua autonomia, sob o comando de Pelágio, um membro da nobreza goda. A apropriação ideológica desta vitória, feita bastante mais tarde pelos clérigos asturianos, acabaria por conferir à batalha a importância de um facto transcendente, associado ao que se considerava ser a missão da monarquia asturiana, de libertação e de salvação de uma Hispânia que tombara perante os inimigos da fé cristã”. E nos três séculos seguintes a progressão dos Cristãos concentrados nas Astúrias reduziu o território dos Mouros, com isto surgiu os reinos de Oviedo, Leão, Galiza e Castela que ocuparam os territórios da antiga Lusitânia.

Portugal no Reino das Astúrias

O porto de Calem no século V foi referido pelo Bispo Idácio de Aquae Flaviae (Chaves), que diz ser Braga a cidade mais a Sul do reino da Galécia, que terminava no Douro. Rio, obstáculo de difícil atravessar, era por isso de fronteira. A localização desse porto gera assim controvérsia, pois sem haver ainda na margem direita, o que viria a ser a cidade do Porto, pugna a margem esquerda do Rio Douro e próximo da foz, o lado de Gaia, o povoado mais antigo dessas cales, Portugal.

Em 711 o último rei visigodo, Rodrigo (Roderico 710-711), tentou repelir a invasão muçulmana mas foi derrotado. Avançaram estes para Córdoba e Toledo, a capital visigoda, cercaram Mérida, que caiu em Junho de 713 e na Primavera seguinte, um exército muçulmano comandado por Musa ibn Nusair marchou para Saragoça, León e Astorga e dois anos depois caía Évora, Santarém e Coimbra. Em 716, após cinco anos, os muçulmanos tinham conquistado e ocupado toda a Península Ibérica, ficando sob domínio cristão apenas as Astúrias no Nordeste, na região montanhosa da Cantábria.

O Reino de Astúrias (718-910) teve como primeiro chefe Pelágio (718-737), um nobre visigodo que em 725 e após a batalha de Covadonga, fundou esse pequeno reino. O terceiro rei das Astúrias, Afonso I (739-759), o Católico, reconquistou terras até ao Douro. Sucedeu-lhe Fruela I (757-768) que valorizou as terras galegas, mas a região para Sul do Rio Minho até ao Douro ficou esquecida e entregue a si própria. De salientar como refere Matoso, “que a expansão asturiana para a Galiza não foi, de modo algum, um movimento pacífico e que os chefes galegos que dominavam a região aceitaram com dificuldade a nova ordem política”.

“No século oitavo vieram os árabes dominar uma grande parte da península ibérica; e, da sua permanência nas terras da antiga CALE ou Portugal, há a citar-se os nomes de Mafamude (freguesia), Almeára e Aldariça, povoações das freguesias de Canidelo e Santa Marinha e perto do oceano Atlântico, estabeleceram uma almenára – hoje lugar de Almeára – onde, de noite, acendiam fogueiras para guia das embarcações”, segundo José Matoso.

Quanto à povoação Portugal, os maometanos também não substituíram a sua antiga designação, apesar de nela residirem as autoridades que superintendiam no governo das terras sob a sua jurisdição. A vila de Portugal estava separada a Poente da vila de Mafamude e daí pelo monte abaixo, desde o termo Norte de Coimbrões (de fundação anterior à romana) até Gaia. Quanto ao nome de Mafamude é de origem árabe e supõe-se advir dos finais do século VIII, quando Afonso II realizou “uma expedição que chegou até Lisboa em 798 e acolheu no seu reino o caudilho Mahamud, natural de Mérida, que se tinha revoltado contra o emir. Há quem pense que ele se fixou em Mafamude,” da História de Portugal coordenada por José Matoso.

É com o Rei Afonso II (793-842), o Casto, que começou verdadeiramente a luta com o Islão, ocorrendo o assalto a Lisboa com a ajuda dos francos. O reino das Astúrias, com o seu centro político mais importante em Oviedo, valoriza as terras entre Douro e Minho, iniciando os asturianos “a actividade repovoadora na bacia do Douro, então uma espécie de no que respeitava ao controlo por parte de cristãos ou de muçulmanos”, segundo Bernardo Vasconcelos e Sousa. Mas com o Rei Ramiro (842-850) de novo, as terras entre Douro e Minho são esquecidas, ficando entregues aos chefes locais.

Ordonho I (850-866) fez a Galiza prosperar, havendo pela primeira vez uma efectiva incursão ao que virá a ser território português, “durante o qual se repovoou a cidade de Tui, antiga sede episcopal, com jurisdição até ao rio Lima. Aqui, os representantes régios tinham não só de tentar impor a sua autoridade, mas também de reprimir novos ataques normandos, a que acresciam agora, no litoral, os roubos e destruição de piratas sarracenos, mencionados pela primeira vez por esta época”, José Matoso.

Segundo Vasconcelos e Sousa, “No reinado de Afonso III (866-910, o Magno), os cristãos chegaram à linha do Rio Douro, sendo um dos mais importantes marcos desse avanço a tomada e o povoamento de Portucale, em 868, por Vímara Peres. Com centro em Portucale, junto à foz do Rio Douro, viria a constituir-se, a partir de finais do século IX, uma entidade político-administrativa cuja área se estendeu de sul do Rio Minho até à chamada Terra de Santa Maria, já a Sul do Douro”.

10 Jun 2016

Empresas chinesas querem porto português para canalizar mercadorias para a Europa

O embaixador da China em Portugal disse na quarta-feira que o Governo chinês está a estimular as empresas de transporte marítimo chinesas a encontrarem um porto em Portugal para canalizarem mercadorias para o mercado da União Europeia (UE). “Portugal é porta de entrada para a Europa e oceano Atlântico. A cooperação pode ser reforçada na área das infraestruturas. Nesta estratégia há vários projetos importantes”, disse Cai Run, numa referência à iniciativa estratégica “Uma Faixa, uma Rota” lançada por Pequim em 2013 e dirigida à Europa.
“Estamos a estimular as empresas de transporte marítimo a encontrarem um porto em Portugal, como um foco para a distribuição de mercadorias para o mercado da UE. Muitas empresas portuguesas também estão a procurar novos canais para a exportação dos seus produtos para a China”, assinalou Cai Run.
Durante o debate, o embaixador chinês destacou as “profundas relações pragmáticas em todos os âmbitos” entre os dois países, quando se celebra “o início da segunda década do estabelecimento da parceria estratégica global sino-portuguesa”.

7 mil milhões e a subir

Cai Run recordou que o comércio entre os dois países “cresceu 8,58% em 2015 face ao ano anterior” e revelou que Portugal já recebeu “mais de sete mil milhões de euros de investimento chinês, o quinto maior destino de investimento chinês na Europa”, para além de o investimento português na China também registar um “desenvolvimento estável”.
O diplomata sublinhou que a iniciativa estratégica “Uma Faixa, uma Rota” vai ser reforçada, com mais de 70 países interessados em participar no projeto.
“Portugal é um dos 57 membros fundadores do Banco asiático de investimento em infraestruturas, o objetivo é interligar o plano de investimento da União Europeia à iniciativa ‘Uma Faixa, uma Rota’”, disse.
A “cooperação trilateral” entre a China, Portugal e países lusófonos foi também salientada pelo representante de Pequim, nomeadamente a importância da 5ª conferência ministerial do Fórum Macau, que se realiza este ano na Região Administrativa Especial chinesa e que vai juntar a China e os países de língua portuguesa em contactos oficiais e empresariais.
O embaixador também vaticinou um reforço da cooperação empresarial bilateral na área ciência e inovação, e prognosticou a “tecnologia científica” como “ponto de crescimento” na futura cooperação bilateral.
“As empresas [estatais chinesas] ‘Three Gorges’ e ‘State Grid’ já estabeleceram um centro de investigação conjunta com os parceiros EDP e REN”, recordou a propósito.

O que a China quer

No início da intervenção, e numa referência ao “desenvolvimento da China”, Cai Run tinha enunciado alguns dos objectivos da liderança de Pequim: Garantir até 2010 uma sociedade “confortável” para os 1,3 mil milhões de chineses, e “aprofundar as reformas nas áreas política, social, cultural, e na construção do próprio Partido Comunista Chinês, incluindo intensificar a reforma estrutural no lado da oferta, assegurando um crescimento económico médio-alto”.
De acordo com o embaixador, em 2015 a economia chinesa teve um crescimento de 6,9% e pela primeira vez o sector dos serviços representou metade do PIB, atingindo 50,5%.
Informou ainda que o consumo contribuiu 66,4% para o crescimento económico na China, “tornando-se pela primeira vez o maior dos três motores de crescimento, à frente do investimento e exportação”, num país que “deu um contributo de 25%” para a economia global. Cai Run admitiu que o seu país ainda tem um “logo caminho” pela frente: “A nossa meta é que até 2020 o PIB e o rendimento ‘per capita’ dupliquem em relação ao 2010”.

22 Abr 2016

Miguel Poiares Maduro: “Europa pode ter resposta mais forte contra terrorismo”

Em Macau para falar da União Europeia e dos Direitos Fundamentais, Miguel Poiares Maduro defende que a Europa e o mundo cometeram falhas no processo de acolhimento de refugiados. Quanto ao terrorismo, o ex-Ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional em Portugal acredita que o fecho das fronteiras não é uma solução viável

[dropcap style=’circle’]D[/dropcap]eixou a política para regressar à carreira académica. Como Ministro, o que ficou por fazer?
Fica sempre algo para fazer, mas acho que fizemos muito nas minhas áreas. Fizemos uma reforma profunda na comunicação social, mas gostava de ter feito mais com a agência Lusa. Não pudemos avançar tanto e não podemos concluir o contrato de concessão que era suposto só ser concluído no final deste ano. Tive pena de não ter tido tempo para concluir o que me parecia importante para uma reforma da Lusa. No domínio dos fundos europeus deixamos totalmente preparado o Portugal 2020. Tenho pena de não ver a aplicação em concreto desse novo quadro e de não garantir que todas as reformas que empreendemos e que estão no papel sejam realmente implementadas. Gostava de ter tido a oportunidade de ter uma maior margem financeira e que a capacidade orçamental do Estado permitisse fazer outras coisas. Os constrangimentos financeiros são muito grandes, há certo tipo de coisas que gostaríamos de fazer e que não pudemos. Direi que tive uma ou duas frustrações de coisas que tive muito próximo de conseguir fazer e não consegui.

Quais são?
Uma delas foi o regime de registo e transparência do lobbying. Parecia-me importante esse registo de interesses para Portugal. Tive também uma segunda frustração que é o regime do Televisão Digital Terrestre (TDT), que infelizmente a forma como foi criada em Portugal faz com que seja difícil formar. Tenho muito cepticismo face à realização de uma reforma que permita tornar viável a TDT com uma oferta alargada de canais como eu achava que devia acontecer. Mas devido às circunstâncias, de existir um operador com direitos contratuais e de existir um sistema jurídico também controverso, relativamente aos direitos dos operadores, vai ser muito difícil formar a TDT como ela deveria ser formada. Temos uma expressão que é “o que nasce torto tarde ou nunca se endireita”. E o regime da TDT nasceu muito torto. Mas ao atribuir direitos a certos operadores, torna muito difícil reformar, porque, para a TDT ser viável, implicava um alargamento muito grande da oferta. Quando íamos testar se era possível uma reforma séria da TDT, a PT (Portugal Telecom, o operador) mudou a sua estrutura accionista.

Falando da Agência Lusa. É importante reformar e reforçar as delegações no estrangeiro, até para a própria expansão do Português?
Há três aspectos fundamentais para o futuro da Lusa. Um tem a ver com a sua internacionalização. Aí não é simplesmente uma questão de promoção das delegações no estrangeiro, é de reorganizar o posicionamento da Lusa nesse contexto. Talvez assumir algumas prioridades em vez de outras do passado. Fazer mais parcerias estratégicas. Mas era muito importante reforçar o papel da Lusa ao nível da digitalização, com a oferta de conteúdos digitais e também como escola de Jornalismo. Claro que esta visão estratégica tem uma dificuldade: há um problema que é aquilo que pode ser importante para o futuro da Lusa está, em alguns pontos, em conflito com os interesses de alguns dos accionistas privados da [agência]. Seria importante reformar a própria estrutura accionista da agência e ter o Estado português em maioria para permitir esse desenvolvimento. Numa altura em que os meios de comunicação social dependem tanto de uma agência de notícias, esta torna-se, de facto, num bem público. E é fundamental garantir os interesses estratégicos da Lusa. Era muito importante para mim a participação do Estado, para permitir um modelo de maior independência e desgovernamentalização.

Em relação à RTP, a RTP Internacional é hoje um canal que satisfaz as necessidades da comunidade migrante em todo o mundo?
O papel de um Ministro nesta área, e foi isso que procurei fazer, é criar uma estrutura institucional na RTP que possa promover uma maior independência e o foco naquilo que devem ser as prioridades do serviço público. A minha expectativa é que possamos melhorar a qualidade da RTP e a sua cultura de funcionamento e institucional, com mais independência e conteúdos diferenciadores. E isso também tem de acontecer no serviço internacional. Deve ser uma prioridade e, no novo contrato de serviço público que celebramos com a RTP, definimos que no seu serviço internacional deve servir a comunidade portuguesa mas também promover a cultura e economia portuguesas. Estou convencido que progressivamente isso vai acontecer.

Vem a Macau falar da União Europeia , dos Direitos Fundamentais e da sua “relação complicada”. Nos últimos anos tem-se tornado uma relação assim?
A principal tensão do papel dos Direitos Fundamentais no quadro da UE é que, inicialmente, os Direitos Fundamentais surgiram na UE como forma de garantir que a própria UE não os violaria. Mas à medida que houve um alargamento, quer da área de intervenção da UE, quer na própria composição, com mais Estados Membros, surgiu a necessidade de garantir que o poder que a UE exerce seja compatível com esses Direitos Fundamentais. Daí a criação da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, que hoje em dia é vinculativa. Depois surgiu a questão de que a UE deve ter o papel de protecção dos direitos ao nível dos Estados Membros. Não podemos ter um espaço europeu social, económica e politicamente integrado sem que haja alguma coesão e um nível de protecção dos Direitos Fundamentais nos diferentes Estados. Isso já existe no processo de adesão à UE. Mas uma vez aderindo os mecanismos de protecção dos Direitos Fundamentais são frágeis. Esse é o novo grande debate e a UE tem dois grandes desafios.

Miguel Poiares Maduro_GLP_12Quais são?
À medida que os seus poderes se alargam, na política de emigração, em poderes em matéria criminal e de combate ao terrorismo, surgem questões sobre se a UE garante ou não esses direitos. Por outro lado, à medida que a diversidade dos Estados Membros aumenta, surgem questões como a que surgiu recentemente com a Polónia e com matérias que dizem respeito à liberdade de expressão e pluralismo dos média. Surgem questões relativas à necessidade da UE ter um papel na garantia de salvaguarda dos Direitos Fundamentais dos diferentes Estados Membros. Se não tivermos pluralismo de informação em todos os Estados Membros, não poderemos ter eleições para o Parlamento Europeu que sejam genuinamente democráticas. Por isso é fundamental que a UE tenha um papel mais forte na garantia dos Direitos Fundamentais. Mas ao assumir esse papel, também significa que a União assume mais poder de intrusão na soberania desses Estados, gerando tensão entre a necessidade de integrar a Europa, em termos económicos e políticos, e salvaguardar a soberania e espaço de autonomia.

Portugal tem hoje pluralismo de informação, dado o encerramento de vários jornais?

Não acho que estejamos numa situação em que possamos dizer que não temos pluralismos de informação. Temos hoje um serviço público com maiores garantias de independência e isso é muito importante. Sem dúvida que a crise que os média atravessam hoje apresenta problemas não apenas em Portugal mas na Europa. A crise financeira apresenta um duplo risco para a comunicação social e o pluralismo: a diminuição do número de títulos e o risco de que possa existir algum controlo desses meios de comunicação social por razões que não têm a ver apenas com a sustentabilidade do órgão de comunicação social mas por interesses de outro tipo. É por haver esse risco de outros interesses no controlo económico dos meios de comunicação social que promovemos um novo regime de transparência e conflitos de interesse relativos aos meios de propriedade.

Enquanto Ministro coordenou o processo de acolhimento de refugiados em Portugal. A Europa cometeu aqui muitas falhas?
Cometeram-se e continuam a cometer-se falhas importantes no âmbito da UE. A resposta da UE à crise dos refugiados é insatisfatória. Mas demonstra também a dificuldade de funcionamento das próprias democracias hoje. O discurso populista transformou aquilo que era uma atitude humanitária na Europa, no início, para uma atitude de receio e mesmo rejeição. Isso deve-nos suscitar uma grande preocupação quanto ao funcionamento das nossas democracias hoje em dia. A democracia, para funcionar, precisa de uma dimensão de paixão e de racionalização. E estamos a perder os instrumentos de racionalização. Esse falhanço das democracias nacionais que depois leva ao fracasso da resposta europeia à crise de refugiados. Mas a obrigação de acolher refugiados é a nível internacional, não só na Europa, e a Europa até tem feito mais do que muitos outros países. É importante olhar para os dois lados da resposta europeia: é insatisfatória mas é uma resposta que é mais positiva que outros membros da comunidade internacional.

Está a referir-se aos Estados Unidos…
Sim, aos Estados Unidos e outros membros.

A China, por exemplo, poderia ter sido mais activa neste processo?
A China também poderia ter. Hoje em dia, com a capacidade económica e com a posição política que tem, poderia ter tido um papel relevante.

O terrorismo tem sido outra das grandes questões na Europa. A resposta, no combate ao Estado Islâmico, tem sido eficaz?
Ao contrário do que aquilo que alguns populistas defendem, que é o restabelecimento das fronteiras e colocar em causa o Acordo de Schengen, é o contrário. O terrorismo é, na maior parte dos casos, um terrorismo dos próprios Estados, como se viu em França ou Bélgica. O que a Europa pode é oferecer uma capacidade de resposta mais adequada ao fenómeno do terrorismo e este é um terrorismo diferente do que vimos num passado recente, por exemplo da Al-Qaeda. A Europa pode ter uma capacidade de resposta mais forte e o fundamental é reforçar laços e Schengen é o instrumento mais poderoso para promover a troca de informações. A resposta adequada ao terrorismo deve ser o reforço das políticas de integração europeia, um reforço de Schengen. As fronteiras não são eficazes.

Aqui mantemos o Direito de Macau. Acredita na sua manutenção além de 2049?

A sua identidade fundamental tem que ser mantida porque é esse o factor distintivo de Macau. Assimilar Macau, incluindo a sua cultura jurídica, na China seria errado, porque então que valor diferenciador é que Macau teria para a China? Não creio que isso seja sequer uma vontade das autoridades da China. Mas o facto de manter a entidade do ordenamento jurídico da [RAEM] não significa que ele não possa obter e ser influenciado por outros regimes jurídicos. Com o envolvimento de tantas empresas internacionais aqui, americanas, pouco a pouco alguns elementos da cultura da Common Law possam ter alguma influência, ou até da própria China. Num contexto de globalização todos os sistemas jurídicos são miscigenados.

Portugal poderia fornecer mais instrumentos para a manutenção desse Direito?
Portugal deve fazer o máximo possível e ter a maior disponibilidade para a cooperação. Deve utilizar também a sua presença na UE, porque a sua presença na UE também é um instrumento para manter a identidade do ordenamento jurídico de Macau. É importante que o território tire cada vez mais partido desse posicionamento estratégico que penso que pode ser um pólo de comunicação e encontro de diferentes culturas, sociais, económicas e políticas.

8 Abr 2016

Cristina Branco, fadista : “O Fado só pode ser cantado na Língua Portuguesa”

Esteve em Macau para um concerto onde mostrou o Fado bem português, ao lado de Mário Laginha. Convidada do Rota das Letras, Cristina Branco fala do percurso marcante da literatura na sua vida, de ser mulher e do sentimento único de ser fadista

De estudante de Comunicação Social à música e, mais concretamente, ao Fado. Como é que este caminho aconteceu?

Foi tudo muito rápido. De facto, era estudante de Comunicação Social e em determinado momento comecei a interessar-me pelo Fado. Pela música já era muito interessada, já ouvia imenso Zeca Afonso, Chico Buarque, os brasileiros… muito jazz, muito blues. Gostava muito de cantar, mas para mim, claro. Estava tudo lá, apesar de nunca ter imaginado ser cantora na minha vida. A determinada altura surge um convite para ir ouvir uma noite de fados, fui porque na altura estava a descobrir, não o Fado, mas a voz da Amália Rodrigues, porque o meu avô me tinha dado um disco [dela] pelo qual me apaixonei. E fui pela curiosidade de ouvir o som das guitarras ao vivo. Alguém perguntou se podia cantar. Eu cantei e fiquei completamente rendida àquela magia. De facto, sempre que o fado acontece e há aquela empatia com o público, há qualquer coisa ali. Ainda no outro dia, alguém em França me disse isso: há um misticismo que se passa naquela relação dos instrumentos com a voz, da voz com o público, há uma empatia muito grande. Há coisas que não se explicam e foi assim que comecei. Na verdade, todo o meu trabalho de fim de curso foi sempre à volta da música, com o ritmo, com a interpretação…

Está aqui no âmbito do Rota das Letras, mas também na sua carreira a literatura está muito presente.
Sempre gostei muito de literatura, gosto muito de literatura portuguesa, gosto muito escrever e acima de tudo gosto da Língua Portuguesa. Tenho a certeza de que de cada vez que se pega num poema em Língua Portuguesa, um poema de um autor que seja menos conhecido, só pelo facto de ser cantado passa para um público muito mais vasto. Pessoas que se calhar não conhecem determinado autor passam a conhecer, pelo simples facto de alguém o cantar. Porque a música é mais imediata, porque há pessoas que não lêem mas ouvem música. Há uma série de condicionantes para que isso aconteça, portanto a literatura entra por aí e por um gosto especial. Na minha casa sempre houve muitos livros, portanto também faz parte da minha educação.

cristina branco Criou personagens para o álbum “Alegria”. Como é que surgiu esta ideia, normalmente também tão associada à literatura?
A intenção não era que fosse um disco exclusivamente virado para a literatura mas no fundo são todos um bocadinho, porque vou sempre pedir [letras] a autores. Os meus discos têm uma vertente muito literária porque eu peço-as a muitos escritores portugueses. No caso do “Alegria” foi talvez mais específico, porque é uma leitura feita por mim antes dos autores. Construi as personagens, fui eu que lhes fiz o BI, disse o que é que elas faziam, como é que se chamavam, de onde vinham e para onde iam, quais eram os sonhos e as angústias e depois dei cada uma aos seus autores e pedi-lhes que escrevessem um poema à volta daquela pessoa. No fundo era criar quase um livro sonoro.

A sua carreira é recheada de colaborações. Como é que funciona este processo?
É por empatia acho. E isso acontece quando se gosta muito de determinado autor. As coisas têm que acontecer de forma espontânea e, no caso do Mário [Laginha], uma vez que vamos estar com ele, também foi assim. Trabalhamos na mesma companhia, com a mesma gente, e as coisas acabaram por acontecer naturalmente. A primeira vez que o Mário colaborou comigo foi com “Margarida” que o Camané também gravou e cantou. Na verdade o tema foi feito para o Camané, mas fui eu a primeira pessoa que o gravou. Perguntei se o Mário gostava de fazer uma música para mim e ele disse ‘olha porque é que não tentas o ‘Margarida’?’ Por acaso, não tenho certeza se foi assim que começou, mas depois fomos fazendo mais coisas. O Mário entra nos meus discos com várias composições. Acontece sempre por acaso, não é uma coisa premeditada. Não acredito na premeditação.


O Fado só pode ser cantado na Língua Portuguesa?
O Fado só pode ser cantado na Língua Portuguesa porque é Português.
Só se canta em Português porque é uma língua que surge naquele país e é a música certa para se cantar naquela língua. Ao cantarmos noutra língua estaremos a descaracterizar aquilo que é o Fado e, se é suposto termos algo que é nosso, o Fado será certamente uma dessas coisas. Não é que não haja uma tentativa de apropriação, antes pelo contrário, até acho que é um privilégio ver que pessoas de outras culturas cantam o Fado. Mas tenho a certeza que essas pessoas vão cantar o Fado na Língua Portuguesa e não nas suas. Porque isso não seria Fado. Não que também não cante noutras línguas, ou o faça com a guitarra portuguesa, mas interpretar uma música noutra língua com guitarra portuguesa é uma música noutra língua interpretada com guitarra portuguesa. Fado, Fado é em Português.
A Cristina tem uma carreira internacional. Como é que acha que os ouvintes que não entendem a Língua Portuguesa percepcionam o fado?

As pessoas não percebem Português e acontecem várias coisas nesse processo. Existem pessoas que desconhecem a Língua Portuguesa e de repente se apaixonam e querem saber mais só porque ouviram Fado, outras já conhecem a língua e descobrem o Fado pelo gosto que têm pela língua. Existem várias formas de chegar a uma convergência, que é o Fado.

Cantar no Oriente é muito diferente do Ocidente?

Cantar não, porque estamos a fazer o que sabemos fazer. Mas é diferente. Aqui há uma delicadeza qualquer que não se explica, é tudo muito diferente. Repare neste facto: temos que enviar rigorosamente o nosso repertório para que seja traduzido ao mínimo detalhe, o que impossibilita que possamos fazer alterações ao programa. Isso condiciona tudo, muda tudo. E depois a forma como as pessoas ouvem e o respeito imenso por aquilo que estamos a fazer. Ao deixar cair a última nota, às vezes não sabem muito bem como é que é, onde reagir, como é que fazemos. Batemos palmas agora, ou batemos palmas depois? Nota-se uma certa tensão que é positiva. Acho que há um carinho especial neste género de público quando ouve a nossa música.

Vem aí um novo álbum, “Menina”. Qual a expectativa?

Acho que é grande. Acho que o último disco é sempre o mais maduro, pelo menos do meu ponto de vista. Não consigo fazer um disco sem que tenha algo para dizer. Nunca aparece um disco que seja só uma imposição editorial. É mesmo porque tem que ser e, normalmente, são discos que marcam períodos importantes da minha vida. A minha história. O “Menina” é um disco que fala de mulheres. O disco fala de uma mulher que ao chegar a determinada idade, e de ter passado por vários estágios na sua vida, consegue concluir que está de bem com o que aconteceu. “Menina” é também “meninas”, “menina” é várias mulheres também em Português, é a “menina” solteira, é a “menina” prostituta. Na verdade, chamamos a tudo “menina”.

Este disco pode ser um auto-retrato, portanto.

Acho que é uma homenagem à condição feminina, sendo eu profundamente feminista.

Feminista, mulher, mãe, cantora. Como é a gestão desta vida de mulher?

É muita coisa. O meu marido costuma dizer que eu consigo abrir e fechar janelas com muita facilidade. A verdade é que quando entro em casa, entro em modo mãe, só e exclusivamente mãe. Não só por mim, mas também por imposição dos meus filhos. Não há cantora, não há artista. Tenho que ser exclusivamente aquilo que eles querem e gosto de o ser. Não gosto de misturar as tintas, mas na verdade, umas coisas entram nas outras necessariamente. A minha atitude enquanto cantora muda a partir do momento em que sou mãe. As coisas acabam por se misturar, é inevitável.

Neste estar em Macau, sente alguma identificação?
Há sempre qualquer coisa, porque a partir do momento em que vamos andando pela rua e há palavras que surgem em Português, há qualquer coisa que desperta de repente e pensamos: como é que é possível? A dada altura da história de um país, termos entrado em meia dúzia de cascas de noz e chegado a sítios tão longe… isso impressiona nesse sentido. Depois acho que somos sobejamente diferentes para percebermos que estamos a fazer com que haja uma afirmação da Língua Portuguesa e da cultura portuguesa num território que já se afastou de nós. E afastou-se tanto que a língua já só reside apenas em monumentos. O que acho que talvez seja menos correcto é que a língua não seja mais falada, não se ouça mais pela rua, ou que não existam mais referências à Língua Portuguesa. Passou também a ser um monumento.

15 Mar 2016

Virgem Suta – “Ela Queria”

“Ela Queria”

Ela sonhava com um herói
Ele playboy
Tinha alta pinta de jingão
Ela queria ser feliz
Ele um petiz
Queria apenas diversão
Ela sonhava com o amor
Ele estupor
Achava isso uma aflição
Mas algo havia entre os dois
Havia pois
E era para lá do bom

E o final foi bestial
Tudo ligou
O Dom Juan lá com o charme
Romeu virou

Ela adorava o céu azul
Ele ser cool
E lançar charme para o ar
Ela era tão bom coração
Ele um pimpão
Para com outras se embeiçar
O que pra ela era bem bom
Pra ele não
Tanto mais tinha em que pensar
Mas algo havia entre os dois
Havia pois
E era coisa pra durar

E o final foi bestial
Tudo ligou
O Dom Juan lá com o charme
Romeu virou

O tempo venceu o herói
Tudo lhe doi
E mesmo assim bem ela o quer
Agora é ele que lhe diz
Sou tão feliz
Por ter-te aqui supermulher
Ela sorri por tê-lo ali
Cutchi, cutchi
Tão manso, agora mimo quer
E nem aquele olhar mongol
De quem vê mal
Esconde o brilho a irromper

E o final foi bestial
Tudo ligou
O Dom Juan lá com o charme
Romeu virou

Virgem Suta

JORGE BENVINDA / NUNO FIGUEIREDO

24 Fev 2016

Cavalheiro – “Este Dia”

“Este Dia”

Nunca pensei estar aqui
Nunca esperei por este dia
Andei em frente e recuei
Caí numa vala vazia
E tudo foi acontecendo
Enquanto eu fazia outros planos
Agora o que tenho eu
De pouco em já tantos anos?

O tempo corre contra mim
Tira-me tempo para mudar
Eu tive tantas mais certezas
De como isto ia acabar
E tudo foi acontecendo
Enquanto eu fazia outros planos
Agora o que tenho eu
De pouco em já tantos anos?

Cavalheiro

JOÃO FILIPE / RICADRO CIBRÃO / JOÃO COUTADA

20 Fev 2016

Justiça | Portugal está a exigir que magistrados portugueses em Macau regressem ao país

O objectivo será preencher os quadros do MP em Portugal. O Conselho Superior português não está a autorizar a renovação das licenças dos magistrados portugueses em Macau e está a fazer com que os profissionais não tenham outra escolha senão o regresso a casa

vítor coelho
Vítor Coelho, magistrado português a viver há 16 anos em Macau
[dropcap style=’circle’]V[/dropcap]ítor Coelho é magistrado do Ministério Público (MP) e trabalha em Macau há 16 anos. Ainda este mês tem de deixar o território, por vontade do Conselho Superior do Ministério Público português, que está a repescar os magistrados que há anos trabalham na RAEM. E não é o único.

A cooperação entre Macau e Portugal ao nível do Direito é um tema constante entre os dois governos e a falta de magistrados na RAEM é uma das queixas mais ouvidas pelos profissionais da área. Mas a questão parece agora adensar-se. É que a licença especial – autorização que a maioria das pessoas ligadas a Portugal que trabalha nos vários organismos da Função Pública de Macau possui – está a ser negada e, por consequência, a fazer com que os contratos que cheguem ao fim não possam ser renovados. Mesmo que tanto o magistrado, neste caso, como a RAEM assim o pretendam.

“Não se percebe muito bem porque é que vou embora querendo ficar e quando, da parte de Macau, fui até convidado a ficar”, começa por explicar ao HM Vítor Coelho, um dos magistrados nesta situação, enquanto mostra uma carta onde é convidado pelo procurador do MP a ficar e a tratar da renovação da licença portuguesa. “O que se passa é que não há possibilidade nenhuma [de renovar] e já me foi negada a licença especial uma vez. Este ano já não tive essa licença.”

A licença especial permite aos trabalhadores com vinculo a Portugal exercerem em Macau com as mesmas regalias de lá e foi terminada. Passou a não ser a única via utilizada pelos magistrados para cá ficarem mas, como ela, também as outras formas deixaram de funcionar.

“Este ano estive com uma licença chamada de ‘longa-duração’ com base numa nova lei. Havia a licença sem vencimento, mas também acabou no ano passado”, descreve o magistrado, explicando que, já no último ano – em que conseguiu a renovação do contrato com a RAEM por mais 365 dias -, as condições da licença eram diferentes. “Não me deixavam descontar para aposentação, por exemplo.”

Também os magistrados que optaram por cá ficar sem essa licença especial não foram promovidos e não tiveram qualquer progresso na carreira.

Um 2016 negro

Ao que o HM apurou, Vítor Coelho não é o único nesta situação. Actualmente, estarão dois magistrados com licenças sem vencimento e um ainda com a licença especial, renovada antes da decisão de Portugal. E até estes deverão seguir o mesmo caminho de regresso.

Nas justificações do Conselho Superior – escritas em acórdãos a que o HM pediu acesso -, já disseram que seria a última vez que renovavam também esta licença especial. Até porque, assumem, para o ano será pior, porque haverá falta de profissionais.

“As justificações nos acórdãos são de renovação de quadros e da necessidade do preenchimento dos quadros por causa de aposentação. É normal que seja para preencher os quadros lá, mas se é assim, então é para não vir mais ninguém para cá?”, questiona o magistrado.

E se recusar regressar? “Não tenho essa hipótese”, explica Vítor Coelho ao HM. “O Conselho Superior é o nosso órgão de gestão e disciplina. Suponhamos que aceitava: aqui estaria tudo bem, eles até queriam que ficasse, mas não poderia ficar sem a licença desse órgão de gestão. Seria, na prática, uma espécie de abandono do lugar. Sou magistrado do MP em Portugal, sou procurador-geral adjunto e, não tendo licença para estar aqui, em Portugal era como se abandonasse o lugar, saía demitido, perdia a minha carreira. Para isso já basta este ano, que já estive a penar um bocado com isso.”

E o futuro?

O problema da não renovação das licenças está a acontecer apenas com magistrados do MP. Vítor Coelho explica que nunca presenciou situações semelhantes noutro órgão até porque, diz, sendo a China a pedir quadros de Portugal, isso deveria ser motivo de orgulho.

“Os acórdãos dizem que, a partir de 2016, há-de ser muito difícil renovar ou conceder licenças para Macau, o que para mim é uma coisa incompreensível. Tanto quanto sei, essa licença especial concedida pelos órgãos em Portugal nunca foi negada. Acontece que a mim e também a colegas magistrados, de há quatro anos para cá, o Conselho Superior do MP começou a pôr muitas reservas e muitos entraves à renovação desta licença especial, que por norma era renovada – através de um pedido ao Conselho – de dois em dois anos.”

O problema é pura e somente com o MP de Portugal e a situação não existe da parte da RAEM, sendo que Vítor Coelho só aceitou falar com o HM precisamente para terminar com os “rumores” de que o problema seria made in Macau.
“A coisa é clara: o senhor procurador pretendia renovar. Fui eu que não pude, porque não tenho condições, caso contrário ficaria. Se tivesse licença ficaria. Não foi Macau, Macau queria que eu ficasse.”

Apesar da dificuldade na renovação ter sido “previsível” para Vítor Coelho, o magistrado não sabe ainda para onde vai trabalhar quando aterrar em Portugal.

Para o profissional, os entraves podem estar a acontecer porque o Conselho Superior gostaria de ter alguma palavra a dizer sobre os magistrados que cá chegam, uma vez que quem os nomeia é a China.

“É normal que a China queira que estes magistrados fiquem devido à experiência e até pela estabilidade. (…) Isto é de uma inconsistência atroz. Há sempre uma grande cooperação e o país tem compromissos importantes com a China em relação ao preenchimento dos quadros dos magistrados aqui. Não entendo, mas respeito, tenho de respeitar e, por isso, vou obviamente regressar.”

A grande questão que se coloca agora é se Portugal vai continuar a colaborar no envio de magistrados portugueses para Macau – algo que o HM está a tentar perceber junto do Conselho Superior do MP português, do Ministério dos Negócios Estrangeiros e do Ministério da Justiça que, até ao fecho da edição, não nos enviaram resposta. Também quisemos saber junto do Gabinete da Secretária para a Administração e Justiça e da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Justiça da RAEM se existe conhecimento do caso, mas não foi possível.

PERFIL

Vítor Coelho não nega que Macau foi a sua casa durante 16 anos. Uma casa da qual “gostou muito” e onde se integrou “muito bem”. Adepto do desporto, o magistrado confessa ao HM que pertencia ao Clube de Ciclismo Recreativo da RAEM, onde tinha um cargo superior, e também ao Clube de Atletismo Fung Loi, tendo até participado na meia maratona de Macau deste ano. À parte destes ciclos, e das “jogatanas” de ténis, Vítor Coelho fala em amigos de várias nacionalidades que vai deixar para trás. “Temos sempre os nossos altos e baixos, mas Macau dá-nos muito e começamos a reflectir nisso. É uma sociedade muito próspera, nunca me faltou nada.” Ficaria, se pudesse, até porque está “muito ligado a Macau”. “Macau deu-me muito e fico satisfeito e conto cá voltar, de vez em quando, até porque tenho interesses emocionais.”

10 Dez 2015

Eduardo Cabrita e Jorge Oliveira no Governo de António Costa

António Costa decidiu chamar para a sua equipa duas personalidades que, cada um à sua maneira, deixaram a uma marca em Macau. Quem não se lembra das passagens de Jorge Oliveira e Eduardo Cabrita pela Cidade do Nome de Deus?

[dropcap style=’circle’]E[/dropcap]stiveram em Macau no tempo da Administração portuguesa e alguns anos depois dela. Lideraram gabinetes na área jurídica e os processos de concessão de jogo e conhecem como poucos a realidade jurídica e económica do território. Eduardo Cabrita, antigo director do Gabinete de Tradução Jurídica, ex-assessor e docente da Universidade de Macau (UM), vai ser o próximo Ministro-Adjunto do Governo português. Jorge Oliveira, que liderou os destinos do Gabinete para os Assuntos de Direito Internacional (GADI), será o Secretário de Estado para a Internacionalização.
Ao HM, Jorge Oliveira recusou fazer qualquer comentário à sua nomeação, por não se encontrar em Portugal e por ainda não ter tido qualquer encontro oficial sobre o cargo que irá desempenhar. De resto, poucos aceitaram comentar a nomeação de dois nomes que muito contribuíram para as leis e economia da RAEM.
O economista Albano Martins garantiu que Jorge Oliveira é um dos nomes mais importantes para assumir o cargo político. “Ele esteve na realidade de Macau durante muito tempo e acompanhou as preocupações dos empresários locais e portugueses relativamente à incapacidade dos governos anteriores de internacionalizarem a economia de forma mais rápida e mais sustentada. Provavelmente deve ter absorvido a ideia de que essa é uma área importante, permitir a diversificação da economia portuguesa e também a internacionalização da economia. É uma das pessoas indicadas para assumir a pasta”, defendeu ao HM.
Já Jorge Godinho, académico da UM na área do Jogo, disse ao HM que a nomeação de Jorge Oliveira “é uma surpresa”, tendo referido apenas que deseja “as maiores felicidades para o desempenho do cargo”.
“Tem havido alguns casos de pessoas que estiveram em Macau e que depois assumiram funções governativas. O doutor Eduardo Cabrita já saiu de Macau há muitos anos e depois fez toda a sua carreira política no PS, é frequente vê-lo no parlamento. Acho que é a progressão normal de quem faz política em Portugal”, disse ainda ao HM sobre o futuro Ministro-Adjunto.
Jorge Oliveira foi um nome próximo de Edmund Ho no que ao sector do Jogo diz respeito, tendo liderado, para além do extinto GADI, a chamada comissão especializada sobre o sector dos jogos de fortuna ou azar, ou Comissão do Jogo.
Em 2010, já sob liderança de Chui Sai On, Oliveira acabaria por pedir a demissão à Secretária para a Administração e Justiça Florinda Chan, tendo-se dedicado a actividades no sector privado, como disse aos jornalistas na altura.
Eduardo Cabrita, licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, deu aulas de Economia Política na UM, bem como no Centro de Formação de Magistrados de Macau. Entre 1988 e 1989, foi assessor do Secretário Adjunto para a Justiça, tendo sido, no período entre 1996 e 1999, Alto-Comissário da Comissão de Apoio à Reestruturação do Equipamento e da Administração do Território.
Num artigo publicado num seminário em 1996, sobre a questão da tradução jurídica em Macau, Eduardo Cabrita defendeu que “é da capacidade dos juristas locais para contribuir para que, pela afirmação da diferença, Macau seja um pólo alternativo e não um subúrbio de Hong Kong ou de Zhuhai, que se joga parte significativa da concretização do modelo autonómico desenhado na Declaração Conjunta”.

Rivalidade entre iguais

Quando cheguei a Macau em 1990, Eduardo Cabrita e Jorge Oliveira eram as duas estrelas ascendentes do Governo local. Cada um tinha a seu cargo gabinetes cujos papéis eram, na altura, fundamentais para o prosseguimento das políticas definidas pelas volutas da transição.
Naturalmente, como é apanágio em terra pequena, logo se falou de uma eventual rivalidade entre ambos. Afinal, se vinham do PS, se tinham a mesma idade e eram considerados políticos de grande futuro, porque razão pouco se viam juntos? Por outro lado, o trabalho dos dois gabinetes intersectava-se numerosas vezes, o que fez igualmente despontar o mito da rivalidade.
Nunca a realidade o confirmou. Se existiu ou não uma real rivalidade entre os dois, só os mais próximos poderão esclarecer. Mas este era um dos fait-divers que animava então a intrigalhada local.
No entanto, não é crível que esse hipotético mal-estar entre ambos encontre agora terreno para florescer em terreno vigiado por António Costa que, ao que se sabe, tem por ambos a maior consideração. Algo que, diga-se, é plenamente justificado.

Carlos Morais José

29 Nov 2015

Prana – “Raiva”

“Raiva”

Raiva é amor mal canalizado
É uma prenda enfim
Que ofereço só a mim
E aceito com agrado

Raiva é saudade de tudo o que nunca foi teu
É um tesouro achado
Que estimo e que guardo
Como se fosse meu

E não tens de a esconder
Quando ela vem
Porque a raiva só é má
Quando a alma é má também
Porque a raiva só é má
Quando a alma é má também

E a raiva não dá murros
Não dá turras nem pontapés
Quem a tem sempre a experimenta
Dos 8 aos 80 e de lés a lés

Porque a raiva não é feia
Não é crime nem é pecado
É uma fogueira ao frio
Uma santa com feitio um bocadinho ao lado

E não tens de a temer
Quando nada corre bem
Porque a raiva só é má
Quando a alma é má também
Porque a raiva só é má
Quando a alma é má também

Deixa toda a tua raiva em mim!
Deixa toda a tua raiva em mim!
Deixa toda a tua raiva em mim!
Deixa toda a tua raiva em mim!

E se caso com a alma
Não distingo o mal do bem
Guarda longe essa raiva
Antes que mates alguém
Guarda longe essa raiva
Antes que mates alguém

Prana

MIGUEL LESTRE / JOÃO FERREIRA / DIOGO LEITE

26 Nov 2015

Portugal | Marco histórico na vida política com a queda do Governo

Fez-se história em Portugal. Uma união da esquerda fez cair uma coligação de direita, eleita nas últimas legislativas. A batata quente está agora nas mãos de Cavaco Silva. Para Socialistas e Democratas locais este é um momento único da história política de país

[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]ão foi uma surpresa. Há semanas que o Partido Socialista (PS), o Partido Comunista (PCP), o Bloco de Esquerda (BE) e os Verdes participavam em reuniões conjuntas para avançar com um acordo de coligação informal. Na terça-feira foi o dia. Assinados três acordos, “muito idênticos” entre a esquerda portuguesa, a moção de rejeição ao programa de Governo da coligação Portugal à Frente (PAF) avançou e reuniu 123 votos a favor e 107 contra. O Governo de Portugal, reeleito a 4 de Outubro, caiu.
“Isto é um marco histórico. Em 40 anos é a primeira vez que tal acontece numa democracia. Um grupo, neste caso a coligação que ganha as eleições, é rejeitada pelo parlamento”, começa por defender, ao HM, Arnaldo Gonçalves, analista político, reforçando que em “democracia temos de nos habituar a estas coisas”.

Um desacordo acordado

Foram 11 os dias que a coligação dos democratas se aguentou no poder. Duas semanas que anteciparam, diz Arnaldo Gonçalves, uma “fase muito difícil para Portugal”. “Acredito que estão para vir momentos muito difíceis, acho que o acordo [da esquerda] está preso por arames, não nos dá qualquer segurança de estabilidade”, reforçou.
Em causa estão três acordos assinados com os partidos de esquerda transformados num documento de 138 páginas. “Estes acordos dizem respeito ao primeiro ano de legislatura, a partir daí será analisado caso a caso. Ou seja, para quem conhece o comportamento comunista em 40 anos de democracia, e sobretudo do seu braço operacional que é a intersindical, vai perceber que isto será uma completa confusão”, defende, prevendo que o país entre num estado de “greves todas as semanas”, “manifestações na rua” e “números da economia a descer a pique”.
Classificando-o com um programa “oportunista”, Arnaldo Gonçalves acredita ser um documento de “colagem de medidas que a esquerda copiou dos vários partidos para no fundo procurar fazer pontos na negociação”.
Para Miguel Bailote, líder do Partido Social Democrata (PSD) de Macau, estes novos programas em nada se parecem com o programa inicial do PS. “Penso que grande parte do eleitorado do PS não votou nesta solução de António Costa. O programa político socialista não tem nada que ver com a maioria de esquerda”, defendeu. “É muito difícil o PS manter um programa com as políticas que o BE e o PCP vão pedir, parece-me que será um Governo muito frágil, mas o tempo o dirá”, indicou.

Um acordo acordado

Do outro lado do círculo está Tiago Pereira, líder do PS de Macau, que reforça o “marco histórico na política portuguesa”. “Isto é um sinal de maturidade da democracia em Portugal”, reforça.
Um Governo do PS apoiado por partidos de esquerda, tal como classifica o líder socialista, vem romper a programa da direita que se baseava em “políticas de austeridade”.
“O PS, PCP e BE encontraram pontos comuns para construir um entendimento de salvaguarda do estado social, a rescisão da política de austeridade, o crescimento económico e o combate ao desemprego”, defendeu.
Questionado sobre a possível, ou não, instabilidade de um acordo a um ano, e não a quatro, Tiago Pereira assegura que é um procedimento “normal em democracia”.
“Percebo o receio que existe a uma eventual queda do Governo a meio da legislatura, mas esse perigo não é maior do que aquele que existiria num Governo de coligação, como aconteceu à PAF em 2013, que quase caiu. Portanto a discussão durante a legislatura deve acontecer e deve acontecer de forma clara e transparente para que todos possa acompanhar”, argumenta.

Juiz decide
Onde é que se vai buscar o dinheiro para diminuir a despesa pública e aumentar as receitas é a pergunta que salta cá para fora. “Não vejo nenhum milagre a acontecer. É importante perceber que se não cumprirmos as responsabilidades internacionais seremos penalizados”, argumenta Arnaldo Gonçalves.
Com a batata quentes nas mãos está agora o Presidente de República, Cavaco Silva, que tem à sua frente, segundo a Constituição Portuguesa, três caminhos possíveis: avançar com um Governo de Iniciativa Presidencial, manter um Governo de Gestão até novas eleições ou, simplesmente, não fazer nada, pois o seu mandato termina em dois meses e deixaria assim a decisão para o seu sucessor.
Note-se ainda que, segundo a Revisão de 1982 à Constituição, a Assembleia da República, órgão com mais poder, não pode ser dissolvida nos primeiros seis meses de nomeação, ou seja, até ao segundo trimestre de 2016.
“O Presidente da República não tem grande margem de manobra neste momento para constituir Governo de iniciativa presidencial nem prolongar o 20º Governo”, defendeu Arnaldo Gonçalves.
Ainda assim, para Miguel Bailote, em caso de futuras eleições, e segundo as sondagens, existe de forma clara a possibilidade da coligação PAF voltar a ganhar.
“Acredito nisso, as sondagens indicam [que se vai] nesse sentido”, sublinhou. “Terá de aceitar. Existem teorias sobre isto, várias. (…) Há sinais de que Cavaco Silva convide António Costa a formar Governo. Tudo indica que isso de facto irá acontecer. Não o fazer iria abrir uma crise política grave em Portugal e teria repercussões muito graves para o país, todos têm consciência disso”, remata.

VOX POP | O diz o povo

Joana Couto, realizadora
“Não percebo a reacção de pessoas que conheço que não votaram na direita e agora estão com conversas cheias de repugnância. Há sempre a queixa de que é tudo a mesma coisa. Não estou nada alarmada com esta coligação [informal], acho que é bom experimentar uma coisa diferente. Claro que sinto alguma preocupação, não sei se a esquerda se aguenta uma legislatura, mas espero que não haja muitas discordâncias, principalmente pelo partido comunista.”

Hugo Bandeira Maia, advogado
Só poderia aceitar um Governo de esquerda se todos tivessem de acordo, não assim, com a existência de acordo feitos à pressa [com cada partido] e muito mal desenhados. Não posso concordar com isso. Na minha visão, este grupo da esquerda não se aguenta uma legislatura, irá cair em pouco tempo.

Célia Boavida, consultora
“Sou politicamente de esquerda, portanto estou contente que eles se tenham unido. Nunca fui a favor de regimes de direita, portanto sim, estou contente. Agora é preciso esperar pelas declarações do Presidente da República e perceber o que será o futuro. Não faço ideia de qual a decisão que poderá tomar, é sempre muito complicado. Ainda por cima quando as sondagens [em caso de eleições] indicam que a coligação de direita venceria outra vez. Vai ser difícil governar e tomar decisões, isso vai.”

José Álvares, Advogado
“A antítese entre os programas dos diferentes partidos que fazem parte deste entendimento de esquerda é tal que será impossível uma solução de governabilidade no nosso país. Tenho, sinceramente, medo que se coloquem em causa todas aquelas medidas que tão arduamente atravessámos durante estes quatro anos que durou este Governo de PSD/CDS. Acho que o maior exemplo desta alternativa de esquerda é a Grécia. Se as pessoas não querem abrir os olhos com os exemplos que já existem, então aí, não há nada a fazer”.

Medidas para todos os géneros

PS com PCP
Descongelamento das pensões
Redução do IVA na restauração de 23% para 13%
Reposição dos feriados retirados
Reversão dos processos de concessão/privatização das empresas de transportes terrestres
Combate aos recibos verdes ilegais e ao abuso de estágios
Vinculação dos trabalhadores docentes e não docentes das escolas
Não admissão de qualquer novo processo de privatização

PS com Verdes
Revisão dos contratos de concessão
Manutenção no sector público dos serviços de água
Alargamento do sistema de estímulos fiscais às PME
Assegurar transportes públicos, nomeadamente no interior e zonas rurais do país
Criação de condições nas tarifas sociais que permitam o acesso de todos à água
Actualização anual das pensões de acordo com a lei de 2006, suspensa desde 2010
Aumentar a produção e produtividade das fileiras florestais

PS com BE
Actualização das pensões e fim ao corte nominal
Proibição das execuções fiscais
Fim das concessões e privatizações
Salário mínimo atinge os 600 euros [a quatro anos]
Regularização dos falsos recibos verdes
Reposição gradual dos salários da Função Pública [75% até ao terceiro trimestre de 2016]
Anulação das concessões e privatizações dos transportes colectivos de Lisboa e Porto

“Portugal é nova Grécia”, diz imprensa internacional

“Europa treme perante uma nova Grécia”, dita o jornal alemão Die Welt na sua edição de ontem, imediatamente após a queda da coligação PAF no parlamento português. O periódico da Alemanha fala de quedas abruptas do PSI 20 na Bolsa de Valores durante a sessão de segunda-feira, à qual se junta uma subida dos juros. Para os analistas do Citi, citados pelo mesmo jornal, o acontecimento da passada terça-feira era já esperado: “Alertámos, no Verão, que Portugal podia ser a próxima Grécia”.
O britânico The Guardian, por sua vez, fala de um acontecimento “sem precedentes” feita por uma “aliança impensável” há duas semanas. O periódico do Reino Unido faz a distinção entre os dois países. “Ao contrário da Grécia, onde lidera um partido de extrema esquerda, os Comunistas portugueses e o Bloco de Esquerda desempenham apenas um papel de apoiantes”, refere na edição de ontem.
Já as publicações Daily Telegraph e Daily Mail falam de uma aliança “histórica”, mas de sinais de fragilidade relativamente às negociações entre a União Europeia e o país. No entanto, nenhum média estrangeiro saiu com manchete dedicada ao destronamento do governo liderado por Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. Actualmente, só Portugal se junta à Grécia em termos políticos. Apenas estes dois países são agora liderados por forças afirmativamente de esquerda.

12 Nov 2015

A última traição do PS

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]povo português votou maioritariamente contra a coligação PSD-CDS, contra as mentiras sistemáticas e compulsivas, contra a austeridade e a falsa recuperação económica do país. É certo que não votou de forma ordeira, alinhada, porque a nossa esquerda é um saco de individualidades cujos egos, paradoxalmente, os impedem de se juntar sob a mesma bandeira. No entanto, se abstrairmos as concepções teóricas mais longínquas, existe um fundo comum entre o Bloco de Esquerda, a CDU, o Livre, o Agir e etc.

Esse fundo comum passa, por exemplo, pela salvação do que resta do Estado Social, pelo fim da sangria das privatizações incompreensíveis, pelo aumento do salário mínimo, a reposição das pensões, a fiscalização severa da actividade bancária, entre outras medidas. Esta esquerda não terá dúvidas quanto à necessidade, para salvar a economia das pessoas (não as finanças dos corruptos) de implementar uma série de medidas que, na sua “radicalidade”, não irão além de algum keynesianismo. O fantasma da colectivização, da saída inconsequente do Euro, o papão do “comunismo” já não colhem junto de mentalidade contemporâneas esclarecidas e servem apenas para assustar espectadores de algo similar à Fox News.

Hoje ser de esquerda significa muito, para além da solidariedade e da igualdade de oportunidades, ser por uma fiscalização democrática dos processos político-estatais, das compras e das vendas, dos negócios e das negociatas e, sobretudo, colocar um freio nos desmandos que a alta finança tem provocado nas economias, com o conluio dos boys dos partidos do arco da governação, para não ir mais alto.

Os resultados eleitorais são claros: o povo português votou contra aquilo que entende ser uma política de direita neo-liberal, subvencionada pelos poderes europeus para deixar Portugal à mercê dos investidores e das corporações estrangeiras, pela criação de um país de salários baixos e propriedade em queda. O povo português votou na esquerda e deu-lhe uma maioria.

Só que esse mesmo povo (ou grande parte dele) considera o PS um partido de esquerda, cuja acção não poderia nunca ir contra o Estado Social e que estaria obviamente de acordo com as medidas que acima expusemos como sendo consensuais ao resto da esquerda. Para o eleitorado, o PS não poderia nunca pactuar com esta política de austeridade mais merkeliana que a Merkel, com este desprezo absoluto pelas condições de vida dos cidadãos. Por isso, trinta e tal por cento ainda deram o seu voto a António Costa.

Qual não terá sido a desilusão geral quando o chefe do partido mais votado da esquerda, vem à ribalta no pós-eleitoral reconhecer uma derrota e, mais grave, mostrar-se disposto a permitir um governo de direita, ao invés de negociar um governo à esquerda, contrariando assim a vontade expressa do povo. Terá isto alguma coisa a ver com a passagem de António Costa pelo Bilderberg?

Esta “traição” à vontade popular atira de vez o PS para a insignificância política pois deixa bem claro a todos que, sob a liderança de António Costa, não é alternativa à direita, na medida em que não pretende deixar de comer da farta gamela do arco da governação. PSD-CDS e PS são actores de uma e mesma política: a dos tachos, a do segura-te ao poder a todo o custo, já lá voltamos mas tudo ficará na mesma — alheios que estão os valores, as ideias e as visões de uma sociedade mais justa.

Se Costa alinhar com a direita, ao invés de ser primeiro-ministro de um governo de esquerda, estará a trair os seus eleitores e não se auguram bons tempos para o PS. Os elementos mais direita rapidamente verão as vantagens de alinharem com o PSD-CDS, enquanto que os outros, as bases, preferirão votar no Bloco de Esquerda ou na CDU. Ou seja, está no horizonte a “pasokisação” do Partido Socialista, na medida em que condiciona a sua presença a ser cada vez mais irrelevante no espectro político nacional.

Afinal, é natural: os fenómenos europeus tendem a chegar tarde a Portugal. Mas, em geral, chegam. Esta poderá ter sido mesmo a última vez em que o PS teve oportunidade para trair.

7 Out 2015

Médica macaense inexplicavelmente recusada pelos Serviços de Saúde. Chumbo está em tribunal

Macaense, médica, licenciada com 19,6 valores pela Universidade de Coimbra. Desrespeitada e chumbada quando pretendeu entrar para o hospital público da RAEM. De boas intenções está Alexis Tam cheio mas, no inferno do São Januário, continua a pôr e a dispor o director dos Serviços de Saúde, que se recusa a comentar mais este caso, que vai chegar à barra do tribunal

 

São 13 anos de formação e experiência e uma média final – na especialidade de Medicina Interna – de 19,6 valores, numa escala de zero a 20. Foram estágios nos Cuidados Intensivos Polivalentes, Neurologia e Dermatologia. É uma médica, nascida e criada em Macau, com estudos em Portugal. Não chega. Não é suficiente para ser médica na RAEM, território que, segundo palavras do Governo, precisa de pelo menos 529 profissionais de Saúde até 2016. Alguns deles iriam, até, ser contratados em Portugal.

Foi em Junho do ano passado que Ana Silva (nome fictício) regressou a Macau, depois de ter conhecimento da intenção do Governo em contratar médicos. “Fui para Portugal porque em Macau não existe a possibilidade de tirar o curso de Medicina. Fiz todo o meu percurso, mas sempre consciente que um dia voltaria”, começou por contar ao HM.

Também a contratação de colegas do seu serviço para os Serviços de Saúde (SS), enquanto Ana estava a concluir a especialidade, acentuou a sua vontade de voltar.

Aqui estou eu

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A 1 de Julho, a médica escreveu uma carta dirigida ao director dos SS, Lei Chin Ion, demonstrando a vontade e disposição para trabalhar no hospital Conde de São Januário. Dois meses decorridos sem qualquer resposta por parte do director, Ana entrou em contacto com os SS, que lhe disseram que esta teria de fazer um exame de equiparação à sua especialidade médica. Para isso teria de submeter o pedido formal de novo ao director dos SS, coisa que fez de imediato.

É nesta altura que surge a primeira surpresa: Ana Silva recebe uma resposta do departamento dos recursos humanos dos SS a dizer que “não dispunham de qualquer posto de trabalho adequado e que não precisavam de profissionais especializados”.

“Achei tudo estranho. Então o Governo diz que precisa e que vai contratar e agora eu estava a ali a oferecer o meu trabalho, a achar que estava a fazer a coisa certa, e eles dizem-me que não”, argumentou.

Inconformada com a situação, Ana Silva voltou a insistir, tendo-lhe sido dito que iria ser reunido um grupo de júri adequado à sua área, para assim se fazer o exame.

A história começa a não bater certo desde o início. “Comecei a questionar-me porque é que o Governo quer contratar médicos portugueses e a mim, com BIR, [bilhete de identidade de residente] e natural de Macau – algo que eu achava que iria facilitar o processo – me obrigam a fazer um exame”, indagou.

É de notar que o Regime de Credenciação dos Profissionais de Saúde, que vem propor a realização de um exame de reconhecimento e equiparação, ainda está em discussão. Actualmente, o decreto-lei que está em vigor é o nº8/99/M de 15 de Março que, no ponto sete do artigo 64º diz: “o grau obtido nos internatos complementares realizados em Portugal considera-se equiparado ao obtido nos internatos complementares regulados no presente diploma”.

Uma leitura da Lei Básica permite-nos ainda saber que “o Governo da RAEM determina, por si próprio, o sistema relativo às profissões”, mas, apesar da soberania, a forma como a competência é regulada está definida na lei específica, neste caso no decreto supra mencionado.

Questionados sobre o assunto, os SS, assumindo o conhecimento do caso, não quiseram prestar qualquer esclarecimento.

Onze meses depois

“Não queria acreditar. O júri não estava preparado para o meu exame. Fizeram-me perguntas do género: como prova que o seu diploma é verdadeiro? Eu tinha os documentos que o provavam”

“Foi finalmente marcado o exame, depois de problemas com a tradução, porque obrigaram-me a entregar cinco exemplares do meu currículo – com mais de 50 páginas – em Inglês. Disseram-me que se eu quisesse, eles poderiam traduzir, mas que o exame ficaria suspenso até terem a tradução pronta. Preferi ser eu a traduzir para não demorar. Entreguei e o exame foi marcado para os dias 14 e 15 de Maio deste ano, portanto 11 meses depois de ter contactado o director dos SS pela primeira vez”, relembra Ana Silva.

Tal como prevê a lei, os examinandos podem requerer à entidade de avaliação que o exame seja feito numa das duas línguas oficiais da RAEM, língua Chinesa ou Língua Portuguesa. Chegado o dia do exame, Ana Silva entra na sala e, depois de feitas as apresentações, percebe que ninguém falava Português para além da intérprete escolhida pelos SS.

“A área de Medicina tem nomes muitos específicos é difícil fazer a tradução de certos termos. Quer dizer, se o Português é uma das línguas oficiais, como é que ninguém falava Português?”, questiona-se.

Depois de dois dias intensos de exames, teóricos e práticos, falados em Cantonês e Inglês, Ana Silva achou que tudo aquilo não passava “de uma espécie de praxe”. “Não queria acreditar. O júri não estava preparado para o meu exame. Fizeram-me perguntas do género ‘como prova que o seu diploma é verdadeiro?’ Eu tinha os documentos que o provavam. Também me perguntaram porque é que eu tinha voltado para Macau e porque é que fiz um estágio em Dermatologia por opção, pois em Macau é obrigatório. Percebi que não estavam a par da regras portuguesas. Um dos membros era de Hong Kong e estava a comparar sistemas de saúde completamente diferentes. O de Macau é parecido com o de Portugal, mas o de Hong Kong é baseado nas regras inglesas. São diferentes”, argumenta.

Divididos em duas partes – teórica e prática – os exames a que Ana Silva foi submetida foram “tudo menos normais”. “Uma má tradução, uma cara de gozo, tudo me pareceu estranho”, conta ao HM.

Ana não queria acreditar quando, depois de insistir com os serviços, teve acesso à sua nota: 9,5 para a prova prática e 9,3 para a prova teórica. “O meu curriculum vale 9,7 em Macau? Quando no meu exame em Portugal tive 19,6? (…) Nem eu faço isso aos meus alunos, mas fizeram-me isso, de colega para colega”, assinala.

Silêncio doente

Chumbada e indignada, a médica não desistiu e, como permite a lei, recorreu da decisão do júri, tendo oito dias para o fazer. Para submeter o recurso, Ana Silva teria de apresentar todo o seu processo, algo que não lhe foi facultado no período de tempo previsto, devido à “confusão de papéis e demora na tradução”.

“Para minha surpresa, a 1 de Julho, um ano depois de todo este processo exaustivo, vejo uma publicação em Boletim Oficial, assinada pelo Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, da minha classificação final. Estava oficialmente chumbada. Senti-me desolada. Além de todas as vicissitudes relativas ao exame em si, manifestamente injustas, ainda me cortam o direito de recorrer e reclamar”, relembra.

Feitas as contas, o processo traduzido para pedido de recurso chegou às mãos da médica a 23 de Junho, sendo que Alexis Tam assinou o acto final de homologação a 12 do mesmo mês. “É manifestamente ilegal porque só podia ser praticado após o decurso de oito dias dado pela lei”, alega a médica. “Eu própria desconhecia, a 12 de Junho, ainda quais as razões materiais da minha classificação final”, conta.

Ana Silva expõe, então, toda a situação a um advogado e é colocada uma acção judicial contra os SS e apresentada uma carta expositiva, dirigida a Alexis Tam, relatando todas as “ilegalidades que aconteceram”.

“A minha dignidade pessoal e profissional são muito mais importantes que qualquer avaliação truncada, sabe-se lá por que razões. Fui formada, académica e profissionalmente numa unidade reconhecida internacionalmente pelo seu mérito, (…) levarei este caso até às últimas consequências para exemplo de todos os jovens locais como eu, que saíram de Macau à procura de qualificações que aqui não existem e quando pretendem regressar não são aceites, sobretudo desta forma injusta”, termina.

O Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, em declarações ao HM, disse que não tinha “qualquer conhecimento da situação”, não lhe tendo chegado qualquer carta às mãos. Alexis Tam afirmou ainda que iria colocar-se a par de toda a situação. Mas da parte da assessoria do próprio Alexis Tam, o HM recebeu a informação de que o caso foi “reencaminhado para os SS”.

11 Ago 2015

Sérgio Godinho – “Espalhem a Notícia”

“Espalhem a Notícia”

Espalhem a notícia
do mistério da delícia
desse ventre
Espalhem a notícia do que é quente
e se parece
com o que é firme e com o que é vago
esse ventre que eu afago
que eu bebia de um só trago
se pudesse

Divulguem o encanto
o ventre de que canto
que hoje toco
a pele onde à tardinha desemboco
tão cansado
esse ventre vagabundo
que foi rente e foi fecundo
que eu bebia até ao fundo
saciado

Eu fui ao fim do mundo
eu vou ao fundo de mim
vou ao fundo do mar
vou ao fundo do mar
no corpo de uma mulher
vou ao fundo do mar
no corpo de uma mulher bonita

A terra tremeu ontem
não mais do que anteontem
pressenti-o
O ventre de que falo como um rio
transbordou
e o tremor que anunciava
era fogo e era lava
era a terra que abalava
no que sou

Depois de entre os escombros
ergueram-se dois ombros
num murmúrio
e o sol, como é costume, foi um augúrio
de bonança
sãos e salvos, felizmente
e como o riso vem ao ventre
assim veio de repente
uma criança

Eu fui ao fim do mundo
eu vou ao fundo de mim
vou ao fundo do mar
vou ao fundo do mar
no corpo de uma mulher
vou ao fundo do mar
no corpo de uma mulher bonita

Falei-vos desse ventre
quem quiser que acrescente
da sua lavra
que a bom entendedor meia palavra
basta, é só
adivinhar o que há mais
os segredos dos locais
que no fundo são iguais
em todos nós

Eu fui ao fim do mundo
eu vou ao fundo de mim
vou ao fundo do mar
vou ao fundo do mar
no corpo de uma mulher
vou ao fundo do mar
no corpo de uma mulher bonita

Sérgio Godinho

18 Jul 2015

Óbito | Maria Barroso faleceu ontem aos 90 anos. “Não era só a mulher de Mário Soares”

Depois de semanas em coma profundo, morreu a mulher do ex-presidente da República e primeiro-ministro português Mário Soares. Maria Barroso acompanhou o marido em várias viagens oficiais a Macau, sempre com uma personalidade própria. Fernando Sales Lopes, Arnaldo Gonçalves e o líder do PS em Macau lembram a mulher forte por detrás do presidente

[dropcap style=’circle’]F[/dropcap]oi mulher e primeira-dama, mas também mais do que isso. Ajudou a fundar o Partido Socialista (PS), dirigiu o Colégio Moderno durante a ditadura de Salazar, lidou com o exílio do marido, foi actriz. Todas as vidas couberam na vida de Maria Barroso, esposa do antigo presidente da República Portuguesa e primeiro-ministro Mário Soares.

Maria Barroso faleceu ontem aos 90 anos depois de ter estado em coma profundo durante várias semanas, após uma queda.

Em Macau, Maria Barroso esteve várias vezes, quer a acompanhar o marido quer como convidada do Festival Internacional de Música, onde falou publicamente sobre a importância de divulgação da Língua e cultura portuguesas. Mas nem por isso teve um papel secundário.

“Era uma pessoa discreta mas sempre presente, tinha uma personalidade tão forte que ela estava lá. Não veio só acompanhar o marido, ela também foi convidada muitas vezes para vir ao festival e depois fazia as suas visitas”, recorda ao HM o historiador Fernando Sales Lopes, que com ela travou conhecimento em Portugal.

Para Sales Lopes, Maria Barroso era uma pessoa culta e uma mulher que lutava na sua componente política e social contra a ditadura. “Mas a Maria Barroso é a mulher de Mário Soares mas não é a mulher do Mário Soares. Ela, por si, vale muito”, acrescenta. A personalidade vincada saltava à vista, tanto que um mestre chinês, aquando de uma das visitas de Soares a Macau, chegou a dizer-lhe, enquanto lhe lia a sina, que este só tinha chegado aos altos cargos políticos por ter uma forte mulher ao seu lado.

Carisma e cidadania

“A impressão pessoal que tinha dela é que era uma pessoa com uma presença pessoal muito forte, com um grande carisma, uma enorme capacidade do uso da palavra” – Arnaldo Gonçalves, académico

Arnaldo Gonçalves, académico, diz recordar-se mais de Maria Barroso na qualidade de estudante da Universidade Católica Portuguesa (UCP), onde foi aluno. Em Macau, das poucas visitas oficiais que acompanhou, recorda-se de uma mulher que “se apagava um bocado na presença (de Mário Soares)”. “Era a maneira de estar dela, porque o Dr. Mário Soares é aquela pessoa pró-activa que se conhece”, contou ao HM.

Maria Barroso passou a estar ligada à UCP depois do filho ter sobrevivido a um grave acidente em Angola. Foi então que se converteu ao catolicismo.

“A impressão pessoal que tinha dela é que era uma pessoa com uma presença pessoal muito forte, com um grande carisma, uma enorme capacidade do uso da palavra. Várias vezes a ouvi falar da importância de uma educação para a cidadania, que era uma coisa que ela dizia muito”, disse Arnaldo Gonçalves.

Para Fernando Sales Lopes, essa ligação à religião mostra bem como Maria Barroso nunca fugiu aos seus ideais. “A Maria Barroso foi uma pessoa íntegra, que defendeu sempre as suas ideias sem se curvar, uma lutadora em todos os aspectos. Toda a gente sabe que Mário Soares é ateu e quando o filho teve um acidente em Angola, ela converteu-se ao catolicismo. A partir daí passou a ser uma mulher crente, sem se afrontar com Mário Soares.”

À Rádio Macau, Jorge Neto Valente, presidente da Associação dos Advogados de Macau (AAM), recordou uma viagem oficial feita pelo casal a Macau, no final dos anos 70, inícios de 80. Neto Valente foi com Soares e a mulher até Cantão, de carro, em dia de tufão. “Mesmo assim houve aqui um encontro de pessoas que os estimavam”, lembra o advogado, recordando uma mulher “sempre muito coerente, sempre com muita dignidade”.

Tiago Bonucci Pereira, líder da secção do PS em Macau, frisou que “faleceu uma grande mulher que deixa um legado muito importante, com uma vida marcada pela democracia e causas sociais. Estará sempre ligada à luta contra o fascismo e a fundação do PS. É um exemplo de cidadania e humanismo”.

8 Jul 2015

A vergonha acabou

bancos[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]ão aceitar que a dívida soberana dos Estado é, antes de mais, uma dívida dos bancos privados, que esses mesmos estados tiveram de resgatar, é querer tapar o sol com a peneira. E, de facto, é isso mesmo que a propaganda oficial europeia anda a fazer há muito tempo, estribada na imprensa neo-liberal, ela própria nas mãos de interesses financeiros: tentar atribuir as culpas da crise às pessoas, ao facto de terem gasto acima das suas possibilidades, quando é o sistema financeiro o principal responsável pelo estado atroz do sítio.

As falácias são muitas. O desejo dos senhores do Eurogrupo e do FMI seria manter alguns povos europeus na situação de eternos devedores, ou seja, fazer de tal modo que as crianças nascidas em 2050 ainda estariam vinculadas a pagar esta dívida que é, nas condições exigidas pelas troikas, impagável. Quem pode aceitar este tipo de situação, para além dos nossos Passos Coelhos e Marias Luís? Quem pode vender o país aos pedaços, prescindir das pescas, da agricultura, da indústria e, sobretudo, de empresas públicas lucrativas? Ninguém com espinha vertebral e o mínimo de amor ao seu povo e aos seu país.

A questão hoje coloca-se, afinal, em saber quem manda na Europa: a economia ou a política? Manter a Grécia no Euro e na UE seria claramente uma decisão política, que faria com que os gregos não necessitassem de aproximações demasiado perigosas à Rússia de Putin ou mesmo à China. Levar a Grécia até à porta e aos repelões só pode ser uma decisão que não tem em conta os interesses geo-estratégicos, portanto derivada de quem unicamente equaciona o lucro como valor. O preço poderá ser no futuro muito mais alto.

Mas, quando olhamos para as notícias, é-nos realmente difícil vislumbrar políticos, homens de causas, de paixões, de ideais. Vemos uns serventes do sistema financeiro, encolhidos nos seus fatos, a seguir atentivamente as boutades da senhora Lagarde ou do senhor Schaulbe. Não surge ninguém com a autoridade e a força moral capazes de libertar a Europa do espartilho bancário, desta sangria de gente, desta desonra inaceitável.

Sem política, a Europa torna-se num mero mecanismo de favorecimentos financeiros, como o Tratado de Lisboa (artigo 123) plenamente demonstra. O que mais me admira é os seus mentores darem palmadas nas costas uns dos outros, como Sócrates e Barroso, sem nunca demonstrarem um pingo de vergonha. Esta, ao que parece, acabou.

29 Jun 2015

Os torna-viagens

[dropcap style =’circle’]O[/dropcap]Brasil tornou-se desde a sua origem o grande mito português de uma causa mais vasta que a própria noção territorial, um vasto significado de mitos de um Império renascido na mais plural vertente humana e de uma necessidade de aludir ao conceito da osmose daquilo que ficou conhecido por «Filosofia Portuguesa» e que teve os seus arautos, após, e sempre mais fundamentadamente, depois da sua existência. Estamos no Reino do Quinto Império, negado que nos foi o encontro com o Rei do Mundo, o tal Prestes João. Nunca, como aqui, depois de uma longa conversação com os homólogos espanhóis, nos pareceu tanto o fruto de uma habilidade e proveniências divinas. O mais vasto continente da América Latina era sem dúvida a nossa «Ilha dos Amores», o culto do Rei Midas e todas as coisas com que tecer o mito ardente de uma Terra Prometida. Multirracial, fraterno, rico, grande, estava concluída a saga dos navegadores, com êxito. África nunca produziria o mesmo encanto nem as praças fortes a Oriente. O Brasil era a nossa estrutura arquetípica, resultado de uma busca de espaço e de exotismo que na mente se buscava e seria necessário acontecer.

Com as guerras napoleónicas a fuga do Rei tornou-se um marco de preservação daquilo que devia ser mantido a todo o custo, ficando o território nacional para segundo plano nos momentos mais difíceis. Quanto a mim, esta atitude revela uma inquietante indulgência territorial para com os invasores, transmitindo-lhes a segurança de governar um Reino sem retaliações maiores. Portugal perde credibilidade e autonomia com esta fuga que até hoje não conseguiu recuperar. Um Rei que foge devia ser punido pela História, que foge porque o seu país é atacado, diga-se. Mas Portugal jamais reagiu a tal aviltamento, o facto de ser o Brasil o local da fuga iliba o monarca aos olhos do país. Com ele, foi um séquito, um mundo hierarquicamente constituído e não faltaram os fidalgos de província que, cansados de morgadio peninsular, quiseram novos escravos, mais genuínos e dóceis. Uma fidalguia desgastada e enraizada em modos feudais dá agora azo à sua megalomania, fundando um complexo conceito social, onde eles reinam de forma autónoma. E, assim, a noção de um Império é lá que se funda com o primeiro Imperador. Da ala liberal nascem paradoxalmente os grandes e primeiros bastardos da Nação. É preciso inovar na base de uma mensagem vinda de outros locais e esquecer, como em 1383-85, o Povo. A partir de um certo momento há que fazer como todos fazem se, se deseja a noção de “status”. O Povo é sempre essa massa anódina de mercenários e valentes que se levantam quando as causas e os discursos não resultam. Certos de que ele no seu labor de séculos há-de aguentar – por outro lado há quem não possa partir – o território tem de estar assegurado por aqueles a quem a vida dura não permite sonhos de grandeza. Há que guardar a reserva daquilo que o fez acontecer mantida a duras penas, dado que os Governos a partir daí foram formações de ajuda a outros Impérios, quiçá, não tão belos, mas mais poderosos. Aquilo que consideramos pequeno fica para o fim, e assim, sem atenção às gentes, Portugal se foi tornando paralisante, em cada etapa mais agonizante, dando para sempre a ideia de quem aqui fica não foi bem sucedido.

Mas toda esta noção implicou uma constante falta de rigor e a mais básica noção de Estado, eles são feitos para as pessoas e não o contrário. E assim nos fomos tornando aventureiros, numa aventura de sobreviventes que correm contra o seu próprio mito. Foi destas águas muito turvas que nasceu o fazer improvisado, o milagre da acção, a vida enquanto excepção e nunca como regra. Ficou-nos o sabor amargo dos que se vão quando mais precisamos deles, a desconfiança nos Governos, a deriva das ilusões. Desenvolvemos uma psicose colectiva que é a megalomania “ o melhor do mundo, o maior do mundo, o mais poderoso do mundo, o ardor infinito pelos nossos egos abandonados à loucura do transtorno… uma infinidade de sintomas digno de diagnósticos e de ajudas. Em vez de nos exaltarmos colectivamente na base da justiça ou da fraternidade, tornámo-nos sagazes nas artes do enredo, mesquinhos a ver o outro, medrosos a negociar, com artimanhas tais que cada um quer ser o poder de um centro que lhes falta. Há uma periferia amarga muito para lá da geográfica, e, como que aluados olhamos o mar de onde nos vem um horizonte sem lei para nos perdermos por aí fora. A terra fundada é um local onde se sofre. Mansamente, porque a escala contém as vontades e os ritos marciais que fariam bem para desanuviar os traumas. Não sendo possível anular a agressividade, comemo-la como um espectro abafante dando origem a uma má postura física e uma enevoada visão psíquica. O rebordo destas duas faz-se muitas vezes pela auto-imagem desgastada até às calendas de um inferno qualquer, e, como reféns, vivemos no torpor de todas as prisões.

Claro que continuamos a ir para o Brasil, é lá que ainda está a «Ilha dos Amores» ou ele vem até cá para nos mostrar o quanto estamos cansados. Os homens portugueses amam o exotismo erótico do povo que ajudaram, pensam, paternalmente a construir, dá-lhes a soberania dos machos Alfas, ao lado das suas mulheres, que eles por séculos abandonaram, e se tornaram dirigistas e muito responsáveis nas acções, a mulher portuguesa é quase um macho disfarçado . É valente, sim. Esteve quase sempre a sós ao comando da Nação. A protecção que lhes é devida, foi e continua a ser muito baixa. Eles que já são poucos e se vão, fundam novos sistemas “coloniais” abraçando as causas que lhes foram negadas enquanto machos dominantes. Neste vaivém, quem fica para trás, que sobreviva, porque também a própria estrutura e justiça da época não está para contemplar o feminino.

Levando os levantes de literaturas há muito gastas no Velho Continente, montam as suas bancas de uma inventividade que passou e de uma originalidade que foi palco vai para uns cem anos. Transportam assim os fantasmas de uma modernidade que nunca viveram e com ele encantam indígenas e anfíbias populações autóctones. Não seria possível brilhar tanto entre aqueles que sabem mais. Por isso, estendem lá as suas tendas de “artes mágicas” quase sempre falhas de talento, mas ousadas na acção, e sempre malsã, de antigos colonos.

Não falando na grave forma do ninho de víboras dos nazis e vândalos europeus que se escondem na selva Amazónica e de toda a espécie de condutas que o Velho Continente não quer, eles têm a largueza que se estreita cada vez mais a nossos olhos. A mentalidade de antigos negreiros não foi abolida e, por vezes, existe na memória colectiva, tensões. O Instituto Camões padece de soberania nacional tendo-se tornado um feudo da cultura brasileira, que fazem teses, milhões de teses acerca do Eça de Queiroz. Não passaram de um certo realismo de opereta, na vasta sanzala de uma cultura artificial. Salvam-se os poetas, dos melhores da Língua Portuguesa mas que, dados à economia verbal e à beleza pujante, nem sempre têm como mereceriam aqui lugar. O território é deles, cantam, dançam, levam a “boa-nova” como outrora nos seus casarios de fidalgos de província. Nunca deixaram de o ser perante uma elite embevecida com os antigos amos.

Os que ficaram, porém, muitos foram literalmente corridos- dos bons- não precisaram de fugir, e quando a Nação estava mais triste do que nunca, ainda lhe apararam as lágrimas deixaram testemunho das suas inolvidáveis obras, e com estranho amor ainda lhe sorriram. Não tiveram pedaço de terra que fosse sua, foram maltratados em todos os regimes e continuaram sonhando um país, afinal, que lhes deve tudo. O resto são mercadores, torna-viagem, esperteza saloia e incómodo ao próprio génio de ser. São esses que farão sempre falta a uma Nação assim, paralisada e imprópria, para o melhor das suas gentes.

Se morrer fosse tão fácil como deixar de existir, diria que o sol dos trópicos os há-de queimar para sempre no coração da Nação que, cansada de abutres, está agora a tentar sobreviver ao último estandarte da usura desenfreada, tal qual fizeram com o ouro que lhes veio do Brasil, numa ânsia de fazer brilhar o país de todas as ruínas.

25 Jun 2015

Macau e Portugal aprofundam cooperação na formação de quadros

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap] Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, recebeu ontem o Secretário de Estado da Justiça português, António Costa Moura, para debater uma cooperação mais profunda na formação de quadros. No final do encontro, o Secretário explicou que Sónia Chan se mostrou muito interessada nas reformas que estão em curso em Portugal.

“Assumi com a Secretária da Justiça o compromisso de enviar toda a documentação relevante produzida em Portugal sobre esta matéria e a Secretária mostrou muito interesse também no aprofundamento das relações a nível da formação”, disse à Rádio Macau. “Principalmente em matérias que dizem respeito ao registos e notariado com os códigos fundamentais sobre matriz portuguesa.” António Costa Moura mostrou ainda muito orgulho e confiança quanto ao futuro.

“Tivemos abertura para que continue a ser assim e concordámos com estas autoridades que, de facto, a área da formação é estratégica neste domínio. Dentro do quadro de competências de cada umas da entidades, que respeitamos e prezamos muito, levarei para Portugal a mensagem do empenhamento das autoridades locais”, declarou. Sobre a vinda de magistrados de Portugal para Macau, o Secretário de Estado da Justiça sublinhou que o país está também com falta de pessoas nesta área, mas vai continuar a respeitar a política de facilitação de contactos.

12 Jun 2015

Viriato Soromenho Marques: “A nossa política doméstica é hoje política europeia”

Viriato Soromenho Marques, professor de Filosofia da Universidade de Lisboa, tem um extenso currículo, não apenas académico. Esteve em Macau para promover o seu novo livro intitulado “Portugal e a Queda da Europa”, no qual defende a abolição do Tratado Orçamental da UE e que o federalismo europeu não seja apenas penitência mas também salvação.

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap] pontou diversos erros na construção da União Europeia, fazendo um diagnóstico não muito favorável. Por outro lado, apontou um outro caminho que seria mais federalismo. Isso faz-me lembrar o que Nietzsche diz de Kant: a raposa que destrói a sua jaula para a seguir construir outra e se meter nela…
(Risos) Refere-se à passagem da Crítica da Razão Pura para a Crítica da Razão Prática, não é?

Sim. Da crítica “radical” da possibilidade de conhecer à emergência do “radical”, “terrorista” imperativo categórico (risos).
De facto, penso que há uma consistência na minha afirmação, isto é, a construção europeia foi efectuada através de uma metodologia que, desde o início e para os observadores mais atentos, estava “impregnada” de deficiências de design, ou seja, de construção. Temos vários marcos das críticas que foram feitas. As críticas foram feitas em diferentes períodos: um deles que foi na década de 70, porque a ideia de uma união monetária – que é hoje a zona Euro – já vem bastante de trás. Praticamente, desde que a comunidade europeia se constituiu, em 1958, com um dos Tratados de Roma, que temos várias tentativas de a construir. A primeira – e a mais consistente – é de 1970 e tem o nome do Primeiro-Ministro do Luxemburgo [Pierre Werner], que ficou encarregue de fazer o esboço e é o Plano Werner, que consiste em fazer uma união monetária de 70 a 80, ou seja, em dez anos. Este é muito parecido com aquele que está actualmente em vigor. Tendo sido objecto de críticas válidas, se o plano actual é muito semelhante, as críticas são igualmente válidas. As deficiências que hoje vemos claramente são fruto do choque daquela estrutura com a realidade. A primeira crítica é a seguinte: uma união monetária só pode sobreviver se tiver uma grande solidariedade política e por isso é que as uniões monetárias – que a História verifica e que sobreviveram – são as que tinham o suporte de uma união política, geralmente de recorte federal ou aparentado…

Pode dar um exemplo, para entendermos melhor o que é realmente para si essa necessidade…, digamos, federal.
O exemplo mais puro é o do Federalismo Americano. Temos a Constituição Federal de 1787, aprovada e em vigor em 88, mas não temos o dólar nem nenhum banco central. No entanto, tinham já uma Constituição comum dizia as competências do Governo comum. Só timidamente, à medida que a realidade ia evoluindo, é que eles começaram a introduzir o dólar – em 1792 – e houve várias tentativas falhadas de fazer um banco central.

[quote_box_left]“Uma união monetária só pode sobreviver se tiver uma grande solidariedade política e por isso é que as uniões monetárias – que a História verifica e que sobreviveram – são as que tinham o suporte de uma união política, geralmente de recorte federal ou aparentado…”[/quote_box_left]

Está então a dizer que existem erros estruturais, conjunturais e também eventos dramáticos…
Um outro caso, a que eu chamo de império federal, foi o II Reich, de Bismarck. A Alemanha tinha 30 e tal unidades políticas e a Prússia liderava a unificação depois da vitória sob a França. Só em 1876 é que foi possível unificar todos os bancos centrais que existiam nos estados alemães e que na altura se chamava Reich Bank. Em 1871 fizeram a Constituição. Digo que [isto] era Imperialismo Federal na medida em que os estados continuavam a estar representados parlamentarmente; a única questão é que o imperador era sempre da Prússia. O Império Austro-Húngaro – que também tem traços democráticos – tinha uma união monetária que passava pelo crivo do Parlamento. Como era um império constituído por dois reinos, de dez em dez anos havia uma sessão especial do Parlamento que se debruçava sobre a renovação da união monetária… Nós nunca tivemos nada disto na zona Euro.

Sem união política, considera então impossível a união monetária?
Que funcione, sim. A união política permite criar uma esfera de Governo comum e a Comissão Europeia não é um governo comum, até porque precisam de ter um orçamento comum que permita fazer investimentos, políticas contra-cíclicas quando os Estados estão com dificuldades. Num governo federal, quando há uma expansão económica, o governo tende a contrair.

Quando fala de federalismo, está a falar de política, mas a verdade é que o Tratado Orçamental, que impõe a intromissão na definição dos orçamentos nacionais, não é só um instrumento económico mas, sobretudo, de economia política. No fundo, já existe federalismo através deste tratado…
Existe uma caricatura, na medida em que só existe o federalismo como penitência e não como salvação. Uma questão central tem que ver com o orçamento comum e a capacidade de políticas de coordenação económicas, que são duas coisas que efectivamente ainda não existem na Europa. O orçamento comunitário da UE corresponde a 1% do PIB e, quando o [Jean-Claude] Juncker e o [Durão] Barroso se sentavam com os chefes de Estados dos Governo, tínhamos 1% do PIB europeu sentado à mesa de 45% do PIB europeu, que é sensivelmente aquilo que os orçamentos dos governos representam. Temos uma desproporção absolutamente brutal. Para podermos falar de federalismo económico de um governo que tivesse capacidade de fazer as tais medidas, precisaríamos de ter um orçamento europeu, no mínimo, de 4% a 5%. Isto para um federalismo “low-cost”…

[quote_box_right]“Vale a pena ler o documento das propostas apresentadas por Juncker, depois destes quatro meses de negociação com Tsipras. É como se nada tivesse acontecido, as mesmas coisas. É o IVA a aumentar, exclusões de sectores de pessoas com problemas…”[/quote_box_right]

Isso significaria mais impostos para os povos europeus?
Neste momento temos 1% e não dá. Como é que vamos arranjar os tais 5%? Através da superação de uma outra desvantagem que a actual situação traz: não só não temos política de coordenação económica, como temos uma competição fiscal – no sentido português da palavra – terrível. Isto provoca situações como as empresas do nosso PSI 20 pagarem impostos na Holanda. A vantagem da coordenação económica é que obriga a algum federalismo fiscal. Isto significa simplesmente que o orçamento comum é baseado nos impostos e toda a gente percebe. Se perguntar como é que funciona o orçamento europeu, só um técnico é que sabe responder. Mas esta baseia-se no princípio de garantir que algumas economias são contribuintes líquidas e outras beneficiárias: é de paternalismo fiscal. A ideia é manter sempre sete ou oito países à frente.

É essa Europa que quer federalizar ainda mais, dando mais poder a estes países? Se já temos um federalismo na prática…
O que temos é uma “consolidação de Estado”, ou seja, uma forma de hegemonia misturada com uma partilha de soberania monetária e cambial, mas que é um federalismo só com desvantagens e sem a solidariedade e o desenvolvimento. É um sistema monstruoso e que, na minha perspectiva, não vai sobreviver muitos anos. O BCE é que tem salvo a Europa de uma desagregação que teria acontecido em 2010 ou 2011. A grande reforma que precisamos não são na Grécia ou Portugal, mas sim da zona Euro e a prova disso é o BCE. O próprio resgate da Grécia e Portugal era proibido pelo artigo 125 [Tratado de Lisboa] e é muito interessante, porque o mecanismo que foi encontrado é o da ambiguidade e falta de coragem de se dirigir ao cidadão. O artigo 125 é uma espécie de cadáver que está no Tratado… E o artigo 123, que proíbe o financiamento monetário. Ou seja, enquanto os bancos centrais de outros países compram as suas obrigações do tesouro no mercado primário e consegue fazer um financiamento político, o BCE compra a dívida que está sobretudo na posse dos bancos, no mercado secundário.

Então, pelos vistos, interpretando esse artigo do Tratado de Lisboa, conclui-se que os políticos europeus estão nas mãos desses bancos, fazem-lhes as vontades. Vamos federalizar mais para lhes dar ainda mais poder, para expandir e dar uma dimensão final às doutrinas neo-liberais?
Não. A proposta que defendo é a explicitação do federalismo e isso implica ser capaz de voltar ao princípio, à ideia de um tratado constitucional, definindo claramente as competências da esfera europeia, fazer uma reforma fiscal que permita habilitar esse governo a ser eleito pelos cidadãos com os recursos orçamentais necessários e impedir esta situação em que temos o Conselho Europeu a controlar o processo. A Comissão Europeia está neste momento na posição de “serva” do Conselho Europeu e não tem tido capacidade de iniciativa. Os tratados recomendam que todo o processo legislativo começa na Comissão e agora é ao contrário: todo ele começa nas reuniões do Conselho Europeu, por sua vez dominado pela Alemanha, às vezes com o apoio da França. Temos que fazer esse caminho – claro que a política é a procura da liberdade possível – mas também procurar evitar a “física política” – que é quando se faz a única coisa que se pode fazer. Estamos a ver que a política na Europa está a estreitar-se tanto que qualquer dia já só temos física, sendo só administrada a desordem.

[quote_box_left]“O que temos é uma ‘consolidação de Estado’, ou seja, uma forma de hegemonia misturada com uma partilha de soberania monetária e cambial, mas que é um federalismo só com desvantagens e sem a solidariedade e o desenvolvimento. É um sistema monstruoso e que, na minha perspectiva, não vai sobreviver muitos anos”.[/quote_box_left]

Neste enquadramento, também deu a ideia de que prefere uma solução que passe pelos partidos políticos tradicionais do que pela emergência de novas forças políticas ou novos conceitos, que acontecem em países como a Grécia, a Espanha ou a França. Em que sentido prefere os tradicionais?
O que prefiro é que exista uma consciência colectiva dos europeus no sentido de não voltarem as costas à Europa, porque é a casa que nós temos e, se ela se fragmentar, as ruínas caem-nos em cima. Julgo que tudo é possível porque entramos numa zona – com a Grécia – em que as regras já não se aplicam e é uma situação nova, porque é a primeira vez que um país da OCDE não cumpre os planos do pagamento do FMI e é, de facto, grave. É, sobretudo, feito num contexto em que não sabemos se vai haver acordo, pelo que se não houver, a Grécia terá que criar uma nova moeda. No entanto, isto vai ser uma confusão muito dolorosa para a Grécia e para o resto da Europa, porque não é só a questão dos credores oficiais, mas também da inserção deste país no mercado europeu, na medida em que os importadores e exportadores vão, certamente, ficar numa situação em que deixarão de estar interessados em vender produtos à Grécia, país com nova moeda e que vai ter que renegociar tudo com toda a gente.

Mas a dívida infinita também não é uma opção viável…
Não. Temos que ser rigorosos. Vale a pena ler o documento das propostas apresentadas por Juncker, depois destes quatro meses de negociação com Tsipras. É como se nada tivesse acontecido, as mesmas coisas. É o IVA a aumentar, exclusões de sectores de pessoas com problemas…

Não existe um regime de federalismo político assumido: com eleições, governo, presidente da Europa, nada… Mas há uma dúzia de bancários e políticos de determinados países que jogam no mercado financeiro e impõem aos países determinadas medidas.
Não lhe parece que podíamos aproveitar a Grécia para, pacífica e politicamente, começarmos a mudar as coisas? Era interessante. Essa racionalidade fazia sentido e julgo que os países que deviam ter logo aproveitado com a questão grega eram Portugal, Espanha e a Itália. O que eu acho inadmissível – e que os eleitores vão ter que punir estes governos nas próximas eleições – é que os governos de Portugal e Espanha não tivessem aproveitado, até porque sabemos que os ministros das finanças português e espanhol foram mais papistas que o Papa no Eurogrupo e isto significa que tanto em Portugal como em Espanha o que tivemos foram dirigentes partidários e não nacionais. Pensaram no seguinte: se conseguirmos ganhos por causa da Grécia, significa que toda a oposição que temos à nossa esquerda, vai ganhar as eleições porque vão perguntar porque não fizemos o que a Grécia fez. – É preciso que corra mal na Grécia para que nos corra bem a nós – é precisamente o discurso de Passos Coelho.

[quote_box_right]“Os ministros das finanças português e espanhol foram mais papistas que o Papa no Eurogrupo e isto significa que tanto em Portugal como em Espanha o que tivemos foram dirigentes partidários e não nacionais”[/quote_box_right]

Mas estes partidos do arco da governação são aqueles que defende…
Não exactamente. A reforma do sistema partidário pode assumir várias dimensões. Falamos dos casos grego e espanhol, onde está a ver-se uma reforma ao lado dos partidos tradicionais. Todavia, julgo que também é possível vislumbrar uma reforma da parte dos partidos tradicionais. Podemos conceber um processo misto, com o aparecimento de partidos convencionais que sejam capaz de dar a volta e ajustar contas com o seu passado, renovando-se, com novos partidos. No caso português, temos no espaço da direita uma certa renovação, com uma coligação que vai aguentar até ao fim e que vai partir outra vez para as eleições. A direita foi capaz de fazer uma coisa que a esquerda tem muita dificuldade em fazer, que foi unir-se, sempre com a perspectiva da manutenção do poder. Em relação à esquerda, vejo dois partidos mais pequenos – o PCP, que é um partido clássico que mantém basicamente as mesmas posições e o BE, que está numa posição de grande incerteza em relação ao futuro –, o aparecimento de uma força que vai disputar votos à esquerda, à direita e ao centro – que é Marinho Pinto – e a questão do PS, que é um grande enigma. Aparentemente, teria condições para se renovar e até produziu, com a equipa de Seguro, as primárias – que era um desígnio já muito antigo –, mas está a ser perturbado por uma grande dificuldade em não apenas calibrar o seu discurso programático mas também da narrativa do seu passado. A situação de ter um ex-primeiro-ministro preso não facilita a situação. Um dos grandes problemas do PS vai ser conseguir a demarcação muito clara relativamente à figura do anterior primeiro-ministro, mas também do método de fazer política que foi predominante durante esse período.

As Legislativas 2015 estão à porta e há a possibilidade do Governo mudar. Em que medida é que uma possível alteração de partido poderia influenciar a forma como Portugal se posiciona na Europa?
Julgo que a verdadeira escolha está, essencialmente, na compreensão de que a nossa política doméstica é hoje política europeia, tal como para Espanha, Grécia ou Itália. Qualquer possibilidade de contrariarmos a austeridade, que tem feito cair o investimento público a níveis tão baixos que só têm paralelismos históricos se recuarmos décadas, de ter capacidade para lutar contra a fragmentação financeira da UE, que faz com as nossas empresas tenham condições competitivas piores do que empresas da Europa Central… Tudo isto só será possível mudando as regras do jogo europeu. A melhor política que um novo governo pode fazer, pelo bem do nosso país, será a de dialogar extensivamente com forças de outros países. Temos algum tempo, mas não temos todo o tempo do mundo, partindo do princípio que a situação da Grécia não vai escalar muito mais. Aquilo que temos mesmo discutir é a questão do tratado orçamental e a minha posição é radical: este devia ser abolido, porque é um instrumento que não serve à UE. Se tivermos que encontrar uma posição intermédia, teremos que rever aquelas metas absolutamente irrealistas do défice e da dívida pública que nos condenariam a uma austeridade por, pelo menos, mais 20 anos.

[quote_box_left]“Um dos grandes problemas [do PS] vai ser conseguir a demarcação muito clara relativamente à figura do anterior primeiro-ministro, mas também do método de fazer política que foi predominante durante esse período.”.[/quote_box_left]

Disse que Portugal não tem uma lógica de projecto colectivo. Em que medida seria possível contornar esta sua ideia?
Maurice Duverger dizia uma coisa muito interessante quando aderimos à UE: ao entrarem na comunidade europeia, vocês, portugueses, parecem estar a reformar-se da História. Isto significa que Portugal não amadureceu suficientemente o seu desígnio estratégico, depois de termos rompido com uma tradição secular. A maioria dos portugueses e políticos não se apercebeu da mudança sísmica da revolução de 74: é que, nesta altura, não nos limitámos a substituir uma ditadura por um regime de democracia representativa. Já a tínhamos tido na Primeira República e na Monarquia. Em 74 interrompemos um ciclo em que a nossa identidade estratégica dependia de um apoio externo, que era o imperial. Em 74 estava em causa precisamente esta questão: onde é que vamos buscar este apoio externo? O país continuou a precisar disso… Adriano Moreira diz isso e eu apoio. Julgo que a Europa foi isso mesmo, mas não fomos capazes de perceber que a Europa era um espaço de luta e não de repouso. Devíamos ter negociado os termos de amarração na Europa.

Uma espécie de projecto nacional, como houve com os Descobrimentos… Resumimo-nos agora à selecção nacional de futebol e, esporadicamente, tivemos Timor, que foi um caso de sucesso.
Exacto. O falhanço nacional principal foi o Tratado de Maastricht. Em 1986 a negociação e as condições de entrada foram bem conseguidas. O que a democracia conseguiu não é nada que o Estado Novo não tivesse já pensado, até porque o primeiro pedido de adesão à comunidade europeia foi feito em 66, e não foi com Marcelo Caetano mas sim com Salazar, que pediu a adesão discretamente. Foi De Gaulle que se opôs porque tinha acabado de criar a sua política agrícola comum. Olhou para Portugal e pensou que era um país pequeno mas demasiado parecido com França: tinha muito agricultores. A vocação europeia não é nenhuma descoberta democrática, mas sim lógica.

Haveria outras alternativas?
De entre várias outras, há um projecto mais audaz, que seria o de uma união lusófona, que faria de Portugal um país descentrado da Europa, com uma base europeia, mas fundamentalmente centrado em África, que era o projecto de Norton de Matos. Nova Lisboa era o embrião de uma capital em África, o que seria uma experiência absolutamente extraordinária. O que falhou? O que falha actualmente: não se pode fazer isto nem um regime federalista sem democracia plena. Julgo que a actual crise que estamos a viver é também um momento para um despertar da nossa consciência nacional, de não estamos condenados à fatalidade, de pensar o país como um processo de venda a saldo do capital construído, dos bens imóveis, até que não exista mais nada. Este governo tem vendido tudo aquilo que constituía um suporte da nossa capacidade de autonomia em caso de sermos obrigados a seguir o nosso destino. No fundo, o nosso país está a ficar um país de assalariados.

[quote_box_right]“Temos que estreitar a cooperação com os PALOP, mas Portugal não pode pertencer a uma lusofonia mais forte se não tiver alguma coisa para oferecer. Devemos manter o projecto europeu, porque o que nos valoriza junto dos moçambicanos, brasileiros e angolanos é a nossa pertença à Europa.”[/quote_box_right]

O investimento chinês tem estado particularmente presente na área de investimento português. Como vê a influência da China em Portugal e que futuro augura?
A China é claramente uma potência que tem uma visão estratégica mundial, já não é só asiática, e também não tem estados de espíritos: partidos republicanos e democráticos, políticas conjunturais, nem presidentes burros ou inteligentes… Tem um projecto estratégico de décadas. Outro aspecto: a China não faz caridade e está a investir em Portugal porque neste momento é um bom negócio com empresas bastante válidas e estruturas lucrativas. Parece-me também que na perspectiva de projecção de poder no mundo, a China prefere a aliança e a parceria ao confronto e à dominação. Estando nós numa situação tão incerta e insegura em que a nossa permanência na zona Euro pode estar em perigo, é conveniente termos outras amarrações geopolíticas e geoestratégicas do ponto de vista económico com outras zonas do mundo. Temos que estreitar a cooperação com os PALOP, mas Portugal não pode pertencer a uma lusofonia mais forte se não tiver alguma coisa para oferecer. Devemos manter o projecto europeu, porque o que nos valoriza junto dos moçambicanos, brasileiros e angolanos é a nossa pertença à Europa.

Como aos olhos da China…
Faz todo o sentido fazermos parcerias com a China em vários sectores e talvez se tenha exagerado um pouco na percentagem de capital de cada sector que foi negociado e a culpa foi do nosso Governo. A Índia é também muito importante, mas os EUA também não devem ser esquecidos, tal como outros países. Diria que, à semelhança do que a região de Macau representa, também no que diz respeito ao investimento chinês em Portugal, o governo que vem a seguir deverá manter uma boa cooperação com a China.

com Leonor Sá Machado
leonor.machado@hojemacau.com.mo

12 Jun 2015

Visita | Secretário de Estado da Justiça reúne hoje com Sónia Chan

Podem vir aí mais oportunidades de alargar a cooperação judiciária e judicial entre Macau e Portugal. Sem discutir pormenores, António Costa Moura frisou a possibilidade de as duas regiões poderem colaborar no que à adopção de crianças diz respeito. Ideias que ainda não passam disso, mas que estarão hoje em debate

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Secretário de Estado da Justiça, António Costa Moura, vai debater hoje com Sónia Chan diversas ideias no âmbito da cooperação judicial e judiciária, onde se encaixam algumas que já estão em andamento, mas também novas, como é o caso da cooperação no âmbito da adopção.

Realçando o facto de não se querer adiantar às entidades de Macau, Costa Moura disse ao HM que poderá haver a possibilidade de cooperar para que seja possível agilizar o processo de adopção de crianças dos dois locais. “A ideia é eventualmente [discutir] a área da adopção, através da qual podemos enriquecer o relacionamento bilateral. Temos uma lei da adopção que é aberta ao mundo e é uma ideia, mas não é algo que queria lançar sem falar com as entidades [de Macau]”, frisou em declarações ao HM, à margem da recepção oferecida pelo Consulado de Portugal à comunidade portuguesa, que ontem teve lugar.

Costa Moura realça que “não há qualquer acordo firmado” ainda sobre este assunto, sendo que no encontro com Sónia Chan se vai fazer um balanço sobre os acordos que estão, esses sim, já em vigor.

O Secretário de Estado fez questão de deixar firme “a ideia de que o Governo de Portugal quer seguir o trabalho na área dos serviços prisionais, formação de magistrados, segurança pública e no cumprimento escrupuloso dos dois acordos de cooperação”, que versam sobre a transferência de pessoas condenadas e na cooperação em matéria jurídica e judiciária.

Questionado pelo HM sobre se há algo mais que pode ser aprofundado nesses acordos, Costa Moura foi peremptório: há sempre.

[pull_quote_left]O Governo de Portugal quer seguir o trabalho na área dos serviços prisionais, formação de magistrados, segurança pública e no cumprimento escrupuloso dos dois acordos de cooperação[/pull_quote_left]

“A cooperação tem de ser um exercício de dois movimentos, não pode ser imposta por um ou outro lado. Tem de ser querida e tem de resultar em vantagens para ambas as partes. Temos algumas áreas, nomeadamente a prisional – como formação e técnicas de reinserção social – em que estamos já a fazer coisas em conjunto. Mas não há nada que impeça que este quadro de cooperação possa ser alargado a outras áreas do sistema prisional. Mas ainda é prematuro, antes de falar com entidades, isto são [apenas] ideias que temos”, ressalva.

Costa Moura encontra-se também hoje com a Associação dos Advogados de Macau (AAM) e assegura ao HM “estar aberto para discutir” o que os advogados quiserem. O Secretário, que representou Portugal no Dia 10 de Junho, afirma que haverá “uma franca troca de ideias”.

Sereno elogiado, Sónia elogia

António Costa Moura fez ainda questão de agradecer ao cônsul Vítor Sereno pela competência na representação de Portugal em Macau. Sem esquecer “as autoridades locais e a comunidade”, o “profundo agradecimento” mais destacado foi para o cônsul “pelo profissionalismo, competência e dedicação” na sua carreira e na causa pública que é servir os interesses do Estado português no exterior. “Confirmei ao longo desta tarde [ontem] o cumprimento disso mesmo”, disse.

Entre mais de 200 pessoas que ontem encheram a residência consular, discursou ainda Sónia Chan, Chefe do Executivo interina – já que Chui Sai On está fora de Macau. Chan referiu, novamente, a utilização de Macau como plataforma entre a China e os PLP, elogiando os “resultados positivos” das diversas entidades criadas para esse efeito.

Caso disso é o Fórum Macau, que “contribuiu para elevar a influência internacional de Macau e promoveu uma diversificação adequada das indústrias de Macau”, como disse no seu discurso.

[pull_quote_right]A cooperação tem de ser um exercício de dois movimentos, não pode ser imposta por um ou outro lado. Tem de ser querida e tem de resultar em vantagens para ambas as partes[/pull_quote_right]

A também Secretária para a Administração e Justiça assegurou que o Governo da RAEM vai continuar empenhado na promoção do “desenvolvimento dos empreendimentos dos PLP em Macau e no interior da China”, bem como vai “incrementar, em conjunto com o [continente], a cooperação com os PLP, a União Europeia e os países latinos”.

Promessas ainda de que o Executivo vai continuar a respeitar a “multiculturalidade, a promover a economia e a melhorar a qualidade de vida, criando melhores condições de vida e de trabalho para toda a população, incluindo os portugueses residentes em Macau”.

Vítor Sereno, que se fazia acompanhar no palco pelos Conselheiros das Comunidades Portuguesas José Pereira Coutinho e Fernando Gomes – que faltaram às comemorações da manhã por “motivos de trabalho”, segundo a Rádio Macau – prometeu melhorar o trabalho no Consulado.

 


 

Alexis Tam e a importância da comunidade lusa
“Uma coisa é certa. Todos nós pensamos [no Governo] que os portugueses são elementos essenciais para Macau”, afirmou Alexis Tam, em declarações à Rádio Macau, ontem, durante a recepção à comunidade na Residência Consular. Destacando ainda o contributo da comunidade portuguesa para a história e para o património do território, o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura garantiu que o Governo tem criado “as condições” para a comunidade portuguesa se “sentir bem” no território e que a ideia é promover o uso do Português no território. “Estou com esperança que mais tarde a língua portuguesa ainda vai ser muito falada em Macau. É este o meu trabalho e eu faço o melhor possível para chegar a este objectivo”, disse à rádio.

Banda da PSP toca o hino
A banda do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) voltou a tocar o hino português durante o hastear da bandeira de Portugal, nas cerimónias oficiais do dia 10 de Junho. “Pela primeira vez, em 15 anos, tivemos a banda ao vivo. Estou muito grato ao senhor Secretário para a Segurança e ao senhor comandante do CPSP por este gesto de cortesia, de boa vontade, que evidencia claramente o nível de excelência que a RAEM tem com Portugal. Estou muito satisfeito com isso”, afirmou o cônsul-geral de Portugal, Vítor Sereno, aos microfones da Rádio Macau. O Grupo de Escuteiros Lusófonos também marcou presença, bem como seis escolas chinesas e portuguesas.

11 Jun 2015