Workshop leva crianças a encontrar estética de George Chinnery

O espaço zero do Museu de Arte de Macau vai acolher uma série de workshops para crianças dedicados à pintura e desenho, com particular incidência em correntes artísticas dos séculos XVIII e XIX. As inscrições para as oficinas, que decorrem entre a partir Abril, abriram ontem

 

Estão abertas entre hoje e o dia 15 de Março inscrições para a “Arte Sem Fronteiras – Oficina para Crianças”, que vão decorrer entre Abril e Junho no espaço zero do Museu de Arte de Macau (MAM). As oficinas serão divididas por faixas etárias, dos quatro anos aos 16, com um workshop pelo meio para pais e filhos.

A participação é exclusiva a membros dos Amigos do MAM, cuja inscrição é gratuita e dá direito a descontos na loja do museu e nos eventos organizados pelo MAM. Ainda assim, o preço para participar nas actividades da “Arte Sem Fronteiras – Oficina para Crianças” é de 240 patacas.

Uma das oficinas tem como objectivo explorar a técnica e estética de George Chinnery. “Na pegada de George Chinnery – Workshop Criativa de Arte Para Crianças” levará os participantes a “apreciar as obras de arte na exposição Foco, que oferece um relance de Macau e regiões vizinhas no século XIX, assim como da vida e práticas criativas de Chinnery com os seus amigos em Macau.” Com base na obra de Chinnery, os participantes serão desafiados a “aplicar a sua criatividade explorando vários meios, tais como o esboço e a aguarela”.

Este workshop terá três turmas para crianças com idades entre os cinco e os sete anos, um deles será ministrado em inglês, nos dias 13 de Abril e 1 de Junho, em três períodos que começam às 09h30 (para a turma em inglês), às 14h30 e 16h30. Cada classe tem uma duração de uma hora e meia.

Nos dias 14 de Abril e 2 de Junho será a vez de as oficinas serem ministradas a crianças entre os oito e 10 anos de idade, divididas em duas turmas com a actividade e iniciar-se às 11h30, também com um dos workshops a ser conduzido em inglês.

Todas estas oficinas de pintura têm um limite de participação de 20 vagas.

 

Arte em família

A actividade “Criar com Arte – Workshop para Pais e Filhos”, dedicada a crianças com idades compreendidas entre os quatro e seis anos, será conduzida apenas em cantonense. Estas oficinas estão marcadas para os dias 14 de Abril e 2 de Junho, entre as 09h30 e as 11h, e estão limitadas a 12 pares.

No âmbito deste workshop o MAM destaca a importância de dar espaço à imaginação dos mais novos. “Através da apreciação artística e sessões de criação dirigidas a diversos temas, as crianças e os pais podem aprender sobre as artes plásticas, experimentar com vários materiais e descobrir diferentes técnicas criativas. Liberte a criatividade das crianças em jogos em que se divertirão com os seus pais através da arte, aumentando a interacção e comunicação entre eles”, é indicado.

Finalmente, a actividade “Personagens Anime Divertidos – Workshop Criativa para Jovens”, para jovens entre 11 e 16 anos de idade, será realizada nos dias 14 de Abril e 19 de Maio no Quadrado de Arte no Museu das Ofertas sobre a Transferência de Soberania de Macau, entre 11h30 e as 13h30. A oficina será conduzida em cantonense e está limitada à participação de 12 jovens.

O MAM indica que este workshop “conduzirá os participantes na exploração do festim visual criado por artistas chineses e ocidentais nos séculos XVIII e XIX usando técnicas de desenho de personagens anime para compreender melhor as técnicas de pintura daquele tempo assim como o estilo de vida de Macau e regiões vizinhas”. Os jovens serão desafiados a criar “figuras usando técnicas de criação de divertidos personagens anime transferindo-os para cenas antigas e reinterpretando as obras expostas nas suas recriações”.

5 Mar 2024

FRC | Exposição de pintura de Ada Zhang abre hoje ao público

A galeria da Fundação Rui Cunha acolhe a partir da tarde de hoje a exposição individual de pintura de Ada Zhang intitulada “Facing the Sea”. As paisagens de Macau voltam a ser a musa da pintora, que ao longo de quase 40 obras reinventa ruas e lugares familiares do território

 

 

É inaugurada hoje, às 18h30, a Exposição Individual de Pintura “Facing the Sea”, de Ada Zhang, na galeria da Fundação Rui Cunha (FRC). A mostra “reúne um conjunto de 39 pinturas em aguarela, óleo e acrílico, com imagens que partem do seu talento em observar e captar a essência do que a envolve”, descreve a organização da exposição. A mostra estará patente ao público até dia 2 de Março e tem entrada livre.

As pinturas de paisagens e lugares de Macau voltam a ser o objecto de interesse da artista, que tem detalhado em tela múltiplas facetas da estética e atmosfera da cidade.

Esta é a segunda exposição de Ada Zhang na FRC, depois de “Home’s Where The Heart Is” ter passado pelas paredes da galeria em 2022. No ano que se inicia, a artista volta com novos trabalhos e redobrada energia, justificando o título da exposição com o entusiasmo de quem recebe a inspiração e as ideias que chegam como ondas e brisa do mar.

 

Casa e coração

Ada Zhang, natural da província de Sichuan, no Interior ocidental da China, mudou-se para Macau “há quase uma década, e, com a sua pincelada impressionista, descreve a paisagem urbana e os costumes do território através do seu estilo único e olhar de imigrante”.

Esta abordagem fresca a lugares que são mais do que familiares tem sido um dos trunfos da artista que tem exposto com regularidade em locais como o espaço a Associação de Reabilitação dos Toxicodependentes de Macau (ARTM) “Hold on to Hope Project”, na vila de Ká-Ho.

Ada Zhang é directora da Associação dos Artistas de Aguarela Contemporâneos de Macau, e membro da Associação de Artes de Macau, da Associação de Arte da Juventude de Macau, da Associação de Pintura de Macau, e da Associação Yü Ün dos Calígrafos e Pintores Chineses de Macau.

As suas obras ganharam o Prémio de Excelência do Concurso de Desenho Cheng Yang Bazhai em 2021 e foram seleccionadas para a Bienal de Aguarela da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau de 2021.

20 Fev 2024

AMAGAO | Pintura de Nissa Kauppila no Artyzen Grand Lapa

É inaugurada esta sexta-feira uma nova exposição de pintura no Artyzen Grand Lapa Macau, na galeria AMAGAO. Trata-se da exposição individual de pintura da artista americana Nissa Kauppila, que pode ser visitada até Março

 

A galeria AMAGAO apresenta esta semana, a partir de sexta-feira, 26, uma nova exposição de pintura, desta vez da artista americana, residente em Hong Kong, Nissa Kauppila.

A mostra, patente até ao dia 24 de Março na galeria AMAGAO, no lobby do empreendimento hoteleiro Artyzen Grand Lapa Macau, revela o trabalho da artista que nasceu na pequena cidade rural de Monkton, Vermont, nos EUA, e que se formou em Belas Artes na Escola de Design Rhode Island. Nissa Kauppila é ainda mestre na mesma área pela Universidade de Vermont.

Segundo um comunicado da galeria, a artista recorre à pintura para “expandir o seu senso de curiosidade”, além de “explorar o inquietante e o concreto”. Nissa Kauppila “descobriu que pintar a natureza do voo e da vida é um exercício gratificante de redescoberta”, recorrendo a técnicas e materiais usados na pintura tradicional chinesa.

Esta ligação ao lado oriental das artes despertou na artista americana “uma sensação de detalhe e fragilidade”, pelo que o seu trabalho explora também “o uso de linhas e cores como gavinhas de tensão, incorporando um sentimento de admiração pelo mundo natural”.

Segundo a AMAGAO, Kauppila “vai além da percepção e desintegra os seus temas de formas quase irreais em trabalhos executados em aguarela e tinta tradicional chinesa sobre papel de arroz tradicional”.

Viagens e inspiração

Esta exposição inclui pinturas inspiradas na primeira viagem de Kauppila a Portugal, tratando-se de “uma experiência festiva de cor, história, cor e vida selvagem”. Contudo, a artista também encontrou inspiração em lugares como Hong Kong, China Continental ou Sudeste Asiático.

“Cada pintura é intitulada usando coordenadas geográficas do próprio local em que a vida selvagem foi observada ou onde Kauppila estava a pintar na altura. Este esforço consciente em intitular cada obra desta forma permite que a pintura fale em termos de localização e observação”, pelo que “o espectador pode criar sua própria relação emocional com o tema sem influência ou sugestão inicial”, descreve o mesmo comunicado.

Nesta mostra, que tem apenas o nome da artista, todas as obras são originais sobre papel de arroz chinês, montadas no estilo tradicional chinês. O público interessado poderá encomendar impressões de edição limitada.

As pinturas de Kauppila já foram exibidas internacionalmente em Hong Kong, Nova Iorque, Atlanta, Londres, Singapura, Xangai, Guangzhou, Shenzhen, Hamburgo, Taipei e Seul. A artista tem ainda exposições e representações actuais em Vermont, Hong Kong e Singapura.

22 Jan 2024

Cheng Xiuji, um Pintor, um Imperador e o Livro das Odes

Tang Wenzong (809-840), o monarca que percebeu o grandeza do exemplo, mandou emitir um decreto apontando como Três maravilhas do grande império dos Tang, Sanjue webian, a poesia de Li Bai, a caligrafia de Zhang Xu e a arte da espada de Pei Min.

Como que confirmando essa intuição imperial sobre o valor da poesia, Wang Yinglin (1223-96), o filósofo e ensaísta os Song do Sul, guardou em Kunxue Jiwen a memória de uma relação entre o imperador Wenzong, um pintor e o grande texto clássico Shijing, que reúne poemas e canções de várias tradições, cuja compilação é tradicionalmente atribuída a Confúcio (551-479 a. C.) e é traduzido entre outros, como Livro dos Cantares ou Clássico da Poesia.

Aí se diz que, não estando satisfeito com a figuração «da vegetação, dos animais silvestres e dos retratos de antigas dignidades» de ilustrações anteriores, Wenzong pediu que fossem refeitas as pinturas relativas aos trezentos e cinco poemas. O pintor escolhido foi Cheng Xiuji (804-63) e, se o celebrado poeta dos Tang Du Mu (803-52) o menciona num Encómio como alguém que se distinguiu pelo modo admirável como refez as pinturas que ilustram o célebre texto e que lhe valeriam a promoção a Hanlin daizhao, «talento às ordens», parte do grupo criado pelos imperadores dos Tang como conselheiros eruditos, outras fontes referem-no primeiro como um alto funcionário militar, detentor de títulos de nobreza.

É o caso, raro para um pintor, de um Epitáfio que detalha o seu percurso na hierarquia oficial desde que passou o Exame sobre a compreensão dos clássicos, em 826. Uma terceira fonte, que se interessa mais pela sua qualidade como artista, lê-se no texto de biografias de mais de cem pintores, Tangchao minghualu, que o descreve como «aluno durante vinte anos» do preclaro pintor Zhou Fang (c.730-800). Zhu Jingxuan (activo entre 806-46), o seu autor, escreve: «Desde a era Zhenyuan (785-805) ele foi o único indivíduo na capital cujo avanço [na hierarquia] se deveu apenas à sua mestria como pintor e foi continuamente agraciado pelo favor imperial.»

O caso de Cheng Xiuji, com um imperador e o Shijing repetir-se-ia. Na dinastia Song do Sul, o imperador Gaozong (r.1127-62) ordenou que a sua própria caligrafia fosse utilizada para reescrever os poemas do Shijing e solicitou ao ilustre pintor Ma Hezhi (activo entre 1131-89) que fizesse as ilustrações, de que uma parte se pode ver no Museu do Palácio, em Pequim (rolo horizontal, tinta e cor sobre seda, 27 x 383,8 cm).

Qianlong (r.1736-95) também mandou que pintores da sua corte fizessem ilustrações para o texto, que ele próprio reescreveu. De modo característico, foi um projecto grandioso de trinta álbuns, um dos quais se pode ver no Museu do Palácio Nacional, em Taipé, que demoraram seis anos a ser terminados e brilhariam como uma das maravilhas do seu reinado.

6 Nov 2023

Exposição colectiva “MusicArt” abre hoje na Fundação Rui Cunha

A galeria da Fundação Rui Cunha acolhe a partir de hoje a Exposição Colectiva “MusicArt”, uma mostra que reúne trabalhos de 17 artistas locais e do Interior da China. Com curadoria de Giulio Acconci, o conjunto de obras estabelece uma ponte entre sons e imagem através de várias expressões artísticas

 

 

A Exposição Colectiva “MusicArt” vai estar em exibição na galeria da Fundação Rui Cunha (FRC) a partir de hoje, reunindo obras de 17 artistas de Macau e do Interior da China sob a batuta curadora do cantor, actor e artista local Giulio Acconci.

Com a inauguração marcada para as 18h30 de hoje, a mostra apresenta uma colecção variada de trabalhos e expressões artísticas abrangendo “diferentes meios e formatos, incluindo a pintura – óleo, acrílico, aguarela, digital e técnica mista, fotografia, gravura, colagem, metal, cerâmica, animação 3D, instalação e vídeo”, revela a organização.

A exposição está dividida em quatro partes: String Connections, Synesthesia, Imaging e Fusion. A segmentação conceptual da mostra tem como objectivo “transmitir as várias emoções da sociedade contemporânea e explorar as diversas possibilidades da arte interdisciplinar”, segundo a proposta do curador.

“MusicArt” é um “projecto de arte interdisciplinar experimental que conecta os mundos da cor e das notas musicais através de interpretação mútua, inspirando-se reciprocamente para alcançar um estado harmonioso”, revela o memorando da exposição.

Giulio Acconci acrescenta no documento que apresenta a exposição com o propósito de aliar as essências de formas de expressão diversas.

“É do conhecimento comum que tanto a Música quanto a Arte podem ser explicadas ou decompostas em teorias. Os fundamentos desses dois mundos, aparentemente diferentes, são surpreendentemente semelhantes: existem sete notas básicas na música (Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá e Si), assim como existem sete cores básicas no espectro cromático (Vermelho, Laranja, Amarelo, Verde, Azul, Anil e Violeta). Uma experiência interessante poderia ser substituir as notas e cores por números e ver o que acontece”, sugere o curador.

A exposição estará patente ao público até 22 de Julho.

 

Entre telas

Passando da teoria à prática, a FRC propõe alguns concertos, reunir as artes plásticas e a música no mesmo espaço. Assim sendo, o projecto irá contar com a colaboração da Associação Vocal de Macau e da Associação de Promoção do Jazz de Macau, que vão organizar dois concertos.

O primeiro espectáculo, marcado para 8 de Julho às 17h, intitula-se “Bel Canto Saturday”, e o segundo, agendado para 15 de Julho também às 17h, será o “Saturday Night Jazz”

O curador aponta a multiplicidade de meios artísticos como uma forma de integrar a complexidade da época.

“No confronto cada vez mais intenso de diferentes culturas e ideias, esta experiência artística interdisciplinar pode ajudar-nos a compreender melhor a época em que vivemos, e promover o vigoroso desenvolvimento da arte local em Macau”, refere Giulio Acconci.

27 Jun 2023

Wang Jianzhang e as «Coisas Dos Tang»

Feiyin Tongrong (1593-1661), o segundo abade do mosteiro Huangbo em Fuqing (Fujian), preocupado em preservar a sua interpretação e o modo de transmissão da suave alegria do budismo chan, escreveu num poema:

Tenho praticado o chan até ao ponto

Em que em mim mesmo o compreendo;

E agora entendido com clareza

A quem o devo passar?

Tudo o que vejo é este luar de Outono,

Enchendo todo o céu,

Uma roda única, refulgente,

Iluminando o riacho aqui à frente.

O seu discípulo Yinyuan Longqi, (1592-1673) por razões ainda hoje controversas mas que acabaram na fuga a um território em convulsão e ao encontro com monges que em Kyushu desejavam conhecer a exegese do mosteiro Huangbo, partiria em direcção a Nagasaki onde chegou em 1654, com trinta discípulos e uma bagagem cheia. Para além do budismo animado pelo dao, praticado por Feyin Tongrong, nela vinham objectos que depois encheriam o mosteiro Mampukuji em Uji, na prefeitura de Quioto, criando um simulacro do esplendor da dinastia Ming, ao tempo em que no continente se receava o crepúsculo do seu brilho, fulgor de séculos de cultura ininterrupta.

Entre essas peças das artes decorativas e do pincel, que os locais designavam karamono, «coisas da China» uma palavra escrita com os caracteres chineses tangwu, nesse caracter tang aludindo a uma outra cintilante dinastia com que no estrangeiro depois se identificariam os seus descendentes; tangrenjie, «pessoas da rua dos Tang», também vinham naturalmente rolos de pinturas. Algumas delas, obras de autores que não constariam das relações dos catálogos que registavam nomes e obras de pintores locais mas revelavam de maneira admirável essa percepção do homem criador, companheiro da natureza. Foi o caso de obras de um pintor de Quanzhou, em Fujian, que terão sido levadas pelos monges budistas que vinham dessa Província para o Japão.

Wang Jianzhang (activo c. 1621-50) refez a sua experiência do Mundo entre a memória e a inquietação, em pinturas que reivindicavam a grandeza das actividades vãs ligadas ao daoísmo, como em Regresso a casa vindo de apanhar cogumelos (rolo vertical, tinta e cor sobre papel, 85,4 x 51,2 cm, na Galeria de Arte de Nova Gales do Sul, em Sydney). Aí escreveu o poema:

Árvores na falésia enjaulam nuvens meio húmidas,

O portão de madeira junto de um rio foi aberto há pouco,

Diante do amanhecer, sozinho, busco um poema,

Enquanto recolho cogumelos, o sol põe-se e eu regresso.

Na pintura, Cores solitárias nas árvores do Outono (rolo vertical, tinta e cor sobre seda, 117,8 x 51,2 cm, no Museu de Arte de Cleveland) aludiu a um célebre diálogo sobre a felicidade dos peixes e os limites do conhecimento humano:

Gelo frio cai sobre as cercas,

Cores solitárias espalham os áceres

Recitando o capítulo das Águas de Outono1

Não consigo acalmar as emoções

no meu velho coração.

Zhuangzi,17

31 Mai 2023

Exposição de Denis Murrell a partir de hoje na Fundação Rui Cunha

A galeria da Fundação Rui Cunha (FRC) recebe a partir de hoje, às 18h30, a exposição “The Tai Heng Paintings”, do pintor australiano Denis Murrell, composta por 11 novas obras que vão estar patentes até 19 de Março.

O pintor radicado em Macau regressa à galeria da FRC com “11 pinturas abstractas de grande dimensão e porte”.
Segundo o próprio, “passaram-se dez anos desde que não pintava grandes telas, porque não tinha espaço para fazê-lo”.

A FRC escreve que o projecto foi “possível com o apoio da sua amiga e agente Suzanne Watkinson, que disponibilizou uma fracção do Edifício Tai Heng – na zona dos Lagos Sai Wan da península de Macau – para ser usado como estúdio, de onde o pintor avista uma grande parte da cidade e onde revelou ter-se inspirado para criar as suas obras mais recente”.

Os quadros que vão estar patentes a partir desta tarde resultam da “experiência contínua de quase 33 anos com técnicas de pintura abstracta, a partir de materiais e suportes diversos”.

Passar conhecimento

Além da criação artística, Denis Murrell tem dedicado o seu tempo a ensinar alunos locais as técnicas que aplica nas suas obras, nomeadamente através do uso da tinta acrílica, pigmentos naturais à base de água, tinta da China e papel absorvente sobre tela.

Denis Murrell nasceu nos arredores de Melbourne, Austrália, a 2 de Março de 1947. Durante 14 anos foi professor de Inglês na Papua Nova Guiné e depois na Austrália, antes de se mudar para Macau em Fevereiro de 1989. Por cá desenvolveu uma carreira artística reconhecida e premiada, que viria a culminar numa extensiva exposição sobre a sua obra, realizada em Novembro de 2012 no Museu de Arte de Macau, que reuniu muitos trabalhos que Denis Murrell doara ao longo dos anos àquela instituição.

Entretanto, em paralelo com a exposição “The Tai Heng Paintings”, o pintor irá realizar uma visita guiada e comentada, onde falará do seu trabalho e responderá às questões dos visitantes no próximo sábado, 17h na Galeria da FRC, antes do encerramento da mostra.

15 Mar 2022

Pintura | Antiga Leprosaria acolhe exposição de Bernardino de Senna Fernandes

Uma das casas da antiga Leprosaria de Ká-Hó recebe a partir de amanhã uma exposição de pintura da autoria de Bernardino de Senna Fernandes. Ao todo, a mostra inclui 26 obras sobre Macau e Lisboa, onde os traços não procuram alinhar-se com a realidade. Para o filho do autor, esta foi a forma de cumprir a vontade de Bernardino de Senna Fernandes de voltar a expor em Macau

 

A galeria de arte operada pela Associação de Reabilitação de Toxicodependentes de Macau (ARTM) numa das casas da antiga leprosaria da Vila de Nossa Senhora de Ká-Hó acolhe a partir de amanhã, uma exposição de pinturas da autoria de Bernardino de Senna Fernandes. A mostra reúne 26 pinturas a óleo e aguarela, que colocam Macau e Lisboa, no centro da tela.

Ao HM, Jorge de Senna Fernandes, filho do pintor conta que a ideia surgiu com o intuito de cumprir o desejo do pai de voltar a expor obras suas em Macau. Isto depois de ter realizado uma primeira exposição no território, ainda nos anos 90 do século passado.

“O meu pai organizou uma exposição em Macau em 1992 e, desde aí, que ficou a vontade de realizar uma segunda exposição aqui, só que não teve oportunidade de o fazer em vida. Depois de ter deixado um certo legado artístico, aproveitei a oportunidade que a ARTM me deu para cumprir esse desejo do meu pai”, apontou.

Para Bernardino de Senna Fernandes, explica o filho, pintar era um hobby que foi aprimorando ao longo do tempo ao seu ritmo e gosto, mas que, nem por isso, deixou de atrair a atenção de interessados e apreciadores da sua obra.

“Para o meu pai, pintar era um hobbie, já que ele não fazia disto vida. Era apenas para se distrair. Havia muita gente que gostava do que ele fazia e, quando iam lá a casa, comprava-lhe uma série de quadros e ele sempre foi fazendo as obras a seu gosto. O meu pai não era um pintor consagrado, mas ao longo da sua vida foi designer, trabalhou em vários sítios e participava em várias exposições e feiras internacionais como a FIL”, partilhou.

Macau no coração

Quanto às 26 obras expostas, estas retratam ângulos, locais e paisagens de Macau e Lisboa, duas cidades em que viveu o pintor. Depois de ter crescido em Macau até aos 18 anos, Bernardino de Senna Fernandes rumou a Portugal para continuar os estudos. De malas e bagagens, mudou-se para Coimbra, casou-se e assentou arraiais, regressando a Macau apenas 30 anos depois. Contudo, de todas as vezes que visitou o território, fez questão de recolher material, fazer esboços e fotografar algumas zonas da cidade para depois pintar Macau a partir de Lisboa.

“Estamos a falar de pinturas de locais específicos das duas cidades. Em Macau podemos ver várias zonas conhecidas e em Lisboa, bairros típicos, por exemplo. A zona de Alvalade, onde viveu, também aparece retratada. [Depois de partir do território], o meu pai veio a Macau três vezes, levou uma série de registos daqui. Às vezes levava o bloco para a rua e fazia os seus esquissos. Outras vezes utilizava fotografias, que é algo que se faz muito hoje em dia, pois já não há muitas pessoas a pintar na rua”, disse ao HM.

Sobre o estilo de Bernardino de Senna Fernandes, Jorge de Senna Fernandes destaca o “traço muito típico” do pintor que, apesar de não primar pelo realismo, permite a quem vê a obra identificar o local retratado.

“É uma série de obras que não são muito realistas, com um traço muito típico do meu pai, que permite identificar as zonas representadas. As obras não são tão realistas como uma fotografia, mas acho que as pessoas vão gostar, porque o que ele fez em vida, a meu ver, tinha qualidade e toda gente sempre gostou do que ele fazia”, sublinhou.

A partir de amanhã, a exposição de pintura de Bernardino de Senna Fernandes pode ser vista na galeria da ARTM em Ká-Hó (Hold On to Hope Project) até dia 11 de Janeiro.

3 Dez 2021

Quadro pintado por Churchill vendido por 7 milhões de libras

O quadro mais célebre pintado pelo antigo primeiro-ministro britânico Winston Churchill (1874-1965) foi vendido na segunda-feira, num leilão da Christie’s, em Londres, por sete milhões de libras.

“A torre da mesquita de Koutoubia”, quadro pintado em 1943 por ocasião de uma visita oficial de Churchill durante a Segunda Guerra Mundial, e que se encontrava na posse da família da atriz Angelina Jolie, foi à praça com estimativas entre 1,7 e 2,8 milhões de euros, mas acabou por ultrapassar esse valor. Com impostos, o quadro acabou por alcançar 8,285 milhões de libras, segundo a leiloeira internacional Christie’s.

O óleo sobre tela do líder britânico conservador tinha sido colocado à venda pela atriz americana Angelina Jolie, sendo considerado “a pintura mais importante de Sir Winston Churchill” por causa de seu “entrelaçamento na história do século XX”, segundo o historiador da arte britânica Barry Phipps no catálogo do leilão.

Churchill começou a pintar tarde, aos 40 anos, e gostava de fugir de Londres para a cidade de Marraquexe nos anos 1930, na época do protetorado francês, onde fez um total de seis viagens, em 23 anos.

“Aqui, nestes vastos palmeirais que emergem do deserto, o viajante pode ter a certeza do sol eterno” e “contemplar com satisfação incessante o panorama majestoso e coberto de neve das montanhas do Atlas”, escreveu Churchill em 1936.

O político gostava de se perder no labirinto de ruas da cidade velha, fazer um piquenique no vale de Ourika, nas alturas de Marraquexe, e armar o seu cavalete nas varandas do hotel La Mamounia, ou Villa Taylor – que se tornaria um marco do ´jet set` europeu na década de 1970.

Foi desta vila que pintou a mesquita Koutoubia, após a histórica conferência de Anfa, organizada em janeiro de 1943, em Casablanca, com o presidente dos Estados Unidos Franklin Roosevelt e o líder das Forças Francesas Livres, Charles de Gaulle, na presença do sultão Maomé V, para preparar a estratégia dos Aliados.

Churchill ofereceu o quadro a Roosevelt, na época, depois vendido por um dos filhos nos anos 1950, e mudou de mãos várias vezes, antes de, em 2011, ir parar à coleção do casal Angelina Jolie e Brad Pitt, muito antes da separação de ambos.

Durante as suas sucessivas renovações, o luxuoso hotel perdeu todos os vestígios desta passagem, ainda que uma ´suite´ e um bar ainda mantenham o nome do político britânico. Uma fotografia de imprensa da época mostra Roosevelt e Churchill juntos, a admirarem o pôr do sol sobre o panorama que inspiraria a pintura.

Esta paisagem simples e sem adornos representa o minarete, símbolo do poder da dinastia Almóada, do século XII, entrelaçado pelas muralhas da cidade antiga e encostado nas montanhas cobertas de neve.

4 Mar 2021

Pintura | Exposição individual de Sylviye Lei inaugurada em Pequim no sábado

Ainda sem entrar na pintura abstracta, as obras de Sylviye Lei revelam linhas invertidas e mais cores quentes e frias para expressar profundidade. No sábado é inaugurada a sua nova exposição a solo, em Pequim

 

[dropcap]S[/dropcap]ylviye Lei vai ter uma exibição a solo em Pequim. Intitulada “Modo Subjuntivo: Exposição Individual de Sylviye Lei”, a mostra é inaugurada às 16h de sábado, no zapbeijing. Depois de um período de transição, o artista de Macau desenvolveu a série “Dimensional”, que já não tem um elemento específico e cujo trabalho é mais difícil de reconhecer, apesar de não entrar no campo do abstracto. A sua pintura a óleo envolve mais linhas justapostas e invertidas, enquanto as bordas são definidas pelos contornos, descreve um comunicado da Art for All Society (AFA).

A luz mantém-se como o tema do artista, mas a arquitectura torna-se a estrutura do mundo dimensional, e “uma nova vida diária é a reversão, distorção, paralelo e intersecção do mundo dimensional”. “Lei ainda está atento aos detalhes da luz, que define o ritmo do mundo. Na série Dimensional, Lei aposta mais nas cores quentes e frias para expressar emoções e profundidade”, diz a nota.

O artista recorre a cores etéreas para produzir pinturas abstractas que pretendem abordar a natureza da realidade virtual no contexto social contemporâneo. “Através da repetição, o artista apresenta o que aparentemente é monótono como uma crítica à forma como as pessoas vivem na sociedade contemporânea”, é descrito. A exposição, sob a curadoria de Zha Ba, fica patente ao público até 22 de Dezembro.

Linha de continuidade

Lei nasceu em Macau em 1986, estudou na Academia de Belas Artes de Guangzhou e actualmente vive no território. Entre 2011 e 2014 o seu trabalho deu origem à série “Echo”, em que a luz e sombra da arquitectura eram representadas através da separação de preto e branco, com uma cor de destaque a acompanhar a trajectória da luz que percorria a pintura. “Com esta luz branca, pode-se deduzir a estrutura básica de um edifício. As bordas das faixas de luz são delicadas cores gradientes, que podem mostrar os traços de luz movendo-se gradualmente na superfície e em diferentes ângulos, com os quais também se pode deduzir a textura do edifício”, diz a nota.

Nos últimos anos, Sylviye Lei teve uma exposição a solo em Macau intitulada “Ver o invisível” e outra em Portugal sob o nome “Sequência dimensional”, além de várias mostras colectivas.

24 Nov 2020

Pintura | Exposição de He Duoling amanhã no Museu de Arte de Macau

É inaugurada amanhã, no Museu de Arte de Macau, a exposição de um dos pintores cimeiros da arte contemporânea chinesa, He Duoling. A mostra, intitulada “Renascer à Brisa da Primavera: Exposição de Arte de He Duoling” será recebida pela música da Orquestra de Macau

 

[dropcap]D[/dropcap]e Chengdu chega amanhã a Macau a pintura de um dos artistas contemporâneos chineses mais marcantes da actualidade, He Duoling, para uma exposição que será inaugurada no Museu de Arte de Macau, com a organização conjunta do Instituto Cultural (IC) e do He Duoling Art Museum.
A inauguração, marcada para as 18h30, será abrilhantada por uma performance ao vivo da Orquestra de Macau.

A mostra, intitulada “Renascer à Brisa da Primavera: Exposição de Arte de He Duoling”, é constituída por um conjunto de 48 peças, entre esboços e pinturas a óleo, pintadas em diversos períodos.

Além da ligação entre as cores e temas subtis das telas de He Duoling com a música, a cargo da Orquestra de Macau, quem marcar presença amanhã na inauguração vai receber um conjunto de “cartões requintados com poemas inspirados em pinturas, e ainda terão a oportunidade de receber cartazes autografados e comprar álbuns assinados das suas pinturas”.

Como destaques na mostra do pintor de Chengdu, o IC realça uma série de obras como “A Casa com Sobreloja”, “Zhai Yongming”, “Torre do Labirinto”, “Lebre”, “Floresta Russa”, “Casa sem Telhado”, entre outras.

Bilhete de identidade

A linguagem artística de He Duoling centrou-se em expressões de beleza, em mais de quatro décadas de criação, tanto através de uma perspectiva mais realista típica dos primeiros tempos de carreira, como pela atmosfera etérea de contornos esbatidos dos últimos anos de produção artística.

Formado no Instituto de Belas Artes de Sichuan, He Duoling é uma das figuras da pintura chinesa contemporânea em termos de projecção internacional, com uma presença em galerias de todo o mundo que lhe valeu a fama desde os anos 1980.

Conhecido pelos óleos de nus femininos e imagens de minorias em cenários campestres, em particular do sudoeste da China, o pintor faz parte de uma geração de virtuosos que catapultaram a pintura chinesa para o panorama internacional.

Além do traço muito próprio, He parece retirar algum prazer das provocações óbvias às correntes mais mainstream da arte contemporânea. Por exemplo, em 2007 estreou uma exposição intitulada “Youth 2007” que retratava corpos nus de costas viradas para o público, expondo o traseiro. As imagens afastaram-se da crueza da pornografia, ou do cartoon, e deixam a audiência na ambiguidade perante o que estão a ver.

Apesar de por vezes He Duong se aproximar de temas aparentemente grosseiros, a subtileza do seu traço não abre margem para ofensa e apenas transmite felicidade e liberdade. Esta linha ténue levou o pintor ao reconhecimento internacional, marcando presença em bienais e grandes exposições, como os famosos “Salons de Paris” no Museu do Louvre, às exposições de belas artes no Museu de Arte de Fukuoka, no Japão, e em galerias de renome no mundo inteiro.

A exposição pode ser visitada no Museu de Arte de Macau, na Avenida Xian Xing Hai, NAPE, diariamente entre as 10h e as 19h, com excepção à segunda-feira. A entrada é gratuita.

4 Nov 2020

Sobre a criação e as formas pictóricas. Tem a palavra K.S. Malévitch

(tradução de Emanuel Cameira / colagem de Paulo da Costa Domingos)

 

[dropcap]O[/dropcap] espaço é o receptáculo adimensional onde
a razão deposita a sua criação. Possa
também eu depositar a minha força criativa.

Toda a pintura do passado e presente antes do suprematismo (escultura, arte verbal, música) foi escravizada pela forma da natureza e aguarda a sua libertação para falar na sua própria língua e não depender da razão, do sentido, da lógica, da filosofia, da psicologia, das diferentes leis de causalidade e das mudanças técnicas da vida.

Foi então o momento da confusão babélica na arte.
Até à data, a arte da pintura, da escultura, a arte verbal foram um camelo albardado com um monte de odaliscas, de imperadores egípcios e persas, de Salomões, de Salomés, de príncipes, de princesas com os seus queridos lulus, de caçadas e de Vénus luxuriantes.

Até à data, não houve tentativas pictóricas enquanto tal, sem todos os tipos de atributos da vida real.
A pintura foi uma gravata na camisa engomada de um cavalheiro e o espartilho rosa comprimindo a barriga inchada de uma mulher gorda.

A pintura era o lado estético do objecto, mas nunca foi original, nunca teve um objectivo próprio. Os pintores foram magistrados, graduados da polícia que elaboravam diferentes actas sobre produtos deteriorados, roubos, assassinatos e vagabundos.

Os pintores foram também advogados, alegres contadores de anedotas, psicólogos, botânicos, zoólogos, arqueólogos, engenheiros, mas não havia pintores criativos.

O nosso movimento «itinerante» coloria vasos nas paliçadas da Pequena Rússia e tentava apresentar uma filosofia de banalidades.

Na mesma altura, a juventude entregou-se à pornografia e transformou a pintura numa miscelânea sensual, lasciva.

Não havia realismo pictural estabelecendo um objectivo próprio, não havia criação. Ainda não se pode considerar como criação uma composição com belas meretrizes nos quadros.

Também não se pode considerar a idealização das estátuas gregas dessa maneira, pois só havia aí o desejo de aperfeiçoar o seu Eu subjectivo.

Não se pode mais considerar desse modo as pinturas onde há excesso de formas reais: a pintura de ícones de Giotto, de Gauguin, etc…, não mais são que cópias da natureza.

Só há criação nas pinturas onde aparece a forma que nada toma do que foi criado na natureza, mas que resulta das massas pictóricas, sem repetir e modificar as formas primárias dos objectos da natureza.

O futurismo, ao proibir a pintura de pernas femininas, a cópia retratista, também afastava a perspectiva.
Mas ele introduziu essa proibição, não em nome de uma pintura livre dos mencionados princípios do Renascimento, dos Antigos, etc…, mas sob o efeito da mudança do lado técnico da existência.

A nova vida das máquinas e do ferro, o rugido dos automóveis, o brilho dos projectores, o ruído das hélices, despertaram a alma que roncava e se esvaía na cave dos erros listados. A dinâmica do movimento foi mote para destacar também a dinâmica da plástica pictórica.

Mas o esforço do futurismo para fornecer uma plástica pictórica pura não foi, per se, coroado de sucesso: não pôde afastar-se do lado figurativo, em geral, e apenas destruiu os objectos em nome da obtenção de dinâmica.

E essa última coisa foi obtida logo que metade da razão foi caçada, tal qual a velha trompa perante o hábito de ver os objectos por inteiro e de os comparar, incessantemente, com a natureza.

Mas o que distancia ainda mais o futurismo do seu desígnio em alcançar uma plástica pictórica pura é o facto de, no quadro, a construção de objectos que passam velozmente dar a impressão do estado de movimento da natureza.

Tratando-se de uma tarefa avançada, é indispensável operar com formas reais para obter essa impressão.
Seja como for, no cubo-futurismo estamos diante de um ataque à integridade dos objectos, da sua fractura, da sua partição, o que nos aproxima da aniquilação do figurativo na arte da criação.

Os cubo-futuristas reuniram todos os objectos na praça pública, quebraram-nos mas não os queimaram. Que pena!
Arrancaram a pintura às casas de moda, às retrosarias, às lojas de artesanato e perfumarias, e o nosso século de máquinas e de betão armado vestiu-a.

Os futuristas deixaram-se impressionar pela extraordinária força dos objectos que passavam a grande velocidade, pela sua sucessão rápida, e começaram a procurar maneiras de descrever a vida no seu estado contemporâneo.

Quanto à construção do quadro, surgiu da descoberta, na sua superfície, de pontos em que a posição de objectos reais, aquando da sua ruptura ou encontro, permitia alcançar a velocidade máxima. A descoberta desses pontos pode ser feita arbitrariamente, independentemente da lei natural da física e da perspectiva.

É por isso que vemos nas pinturas futuristas o aparecimento de fumo, de nuvens, do céu, de cavalos, de automóveis e de outros objectos em posições que não correspondem à natureza.

E o estado dos objectos tornou-se mais importante que a sua essência e os seus sentidos.
Vimos uma pintura fora do comum, uma nova ordem de objectos forçou a razão a vibrar, os críticos lançaram-se sobre a pintura como cães saltando de um portão.

Deviam ter vergonha!
Foi necessária uma enorme força de vontade para destruir todas as regras e arrancar a casca grossa da alma do academismo e cuspir na cara do bom senso.

Honra lhes seja feita!
Rejeitando a razão e propondo a intuição como subconsciente, os cubo-futuristas empregam ao mesmo tempo nos seus quadros, para seu próprio uso, formas criadas pela razão.

A intuição não podia exprimir todo o subconsciente no plano real das formas particulares.
Na arte dos futuristas, vemos todas as formas da vida real e, se elas são colocadas em lugares indevidos, tal não é feito inconscientemente, mas com uma justificação legítima e consciente, a de provocar a impressão do movimento caótico da vida contemporânea. A intuição só pôde encontrar novas belezas nos objectos já criados (cubismo).

A razão, a intenção, a consciência são superiores à intuição. A razão cria uma forma completamente nova a partir do nada ou aperfeiçoa a forma primária. Da carroça à locomotiva, ao automóvel, ao avião.
E, no entanto, atribuímos ao sentimento intuitivo uma superioridade, uma faculdade de prever e antecipar o tempo.

Esse sentimento extrai as coisas sempre novas de uma certa vacuidade inconsciente para as fazer entrar na vida real.
Na arte, não há evidências disso. A intuição procurou e encontrou o novo, o que é estético, apenas em objectos já criados.

O objectivo precede a criação racional e a autoconsciência é um meio. A criação intuitiva, por seu turno, é inconsciente e não possui objectivo nem resposta precisa.

As pinturas futuristas não justificam isso, o que é comprovado pela construção do quadro, pelo estabelecimento de uma ordem e pela questão da disposição dos objectos.
Se considerarmos um qualquer ponto do quadro, encontraremos nele um objecto que se afasta ou aproxima, ou um espaço colorido incluído.

Mas não encontraremos o essencial – a forma pictórica enquanto tal.
O elemento pictórico não é aqui outra coisa senão a veste do objecto em questão. E a quantidade pictórica foi dada, a necessidade de grandeza da forma, para a sua própria finalidade, e não o contrário.

Ao destacar nos quadros a dinâmica da plástica pictórica, como algo novo e sem destruir a figuração, a pintura futurista pode ser reduzida para a escala 1:20 sem perder a sua força de expressão.
Parece-me que o movimento deve ser puramente colorido, de modo a que o quadro não perca nenhuma das suas cores.

O movimento, a corrida do cavalo, da locomotiva, podem ser representados por um desenho num só tom de lápis, mas não é possível apresentar o movimento das massas vermelhas, verdes, azuis.
É por isso que é necessário recorrer directamente às massas pictóricas enquanto tais e buscar nelas as formas que lhes são próprias.

Vemos que o futurismo volta-se sobretudo para os objectos e opera com eles, o que é preciso recusar em nome da criação pictórica pura de novas formas criativas.

O dinamismo da pintura é tão-só uma revolta que transmuta as massas pictóricas do objecto para formas autárcicas que nada designam, isto é, para a hegemonia em relação às formas racionais; formas pictóricas que constituem o seu próprio fim para o Suprematismo, como novo realismo pictórico.

Resumo: o Futurismo, através do academismo das formas, aponta para o dinamismo da pintura.
O Cubismo, através da destruição do objecto, aponta para a pintura pura. E esses dois esforços, na sua essência, tendem para o suprematismo da pintura, para a vitória sobre as formas conformes ao propósito da razão criativa. Ao examinar-se a arte cubista, coloca-se a questão de saber por que energia dos objectos se tornou o sentimento intuitivo interessante e activo?

Veremos que a energia pictórica era secundária, não sendo a pintura o lado estético da construção que sai das relações mútuas das massas coloridas. Quanto ao objecto em si, quanto à sua essência e destino, quanto ao significado e à vontade de o representar de maneira mais completa (como o pensam muitos cubistas), tudo isso foi também uma preocupação inútil.

O sentimento intuitivo descobriu uma nova beleza nos objectos – a energia da dissonância que resulta do encontro de duas formas.
Os objectos contêm uma infinidade de momentos temporais, o seu aspecto é variado e, por conseguinte, a sua pintura também é variada. Todos esses aspectos temporais dos objectos e a sua anatomia (camada de madeira, etc…) tornaram-se mais importantes que a essência e foram tomados pela intuição como meio para construir a pintura; graças a isso, esses meios foram construídos de tal forma que a natureza inesperada do encontro de duas estruturas anatómicas resultaria numa dissonância de extrema força tensional, o que justifica o aparecimento de partes de objectos reais em locais que não correspondem à natureza.

Assim, em benefício das dissonâncias dos objectos, privamo-nos de ter uma representação da totalidade do objecto. Podemos dizer, com alívio, que deixámos de ser camelos de duas bossas, carregados com a confusão acima mencionada.

O objecto pintado de acordo com o princípio do cubismo pode ser considerado acabado quando a sua dissonância se esgota. Todas as partes repetidas podem ser omitidas pelo pintor. Mas se o pintor encontra pouca tensão na pintura, é livre de retirá-la de outro objecto.

No princípio do cubismo existe ainda uma tarefa preciosa, a de não restituir os objectos, mas de pintar o quadro.
Mas, no cubismo, ainda não se justifica a posição segundo a qual toda a forma real que não é criada pela força da necessidade da pintura é um acto de violência sobre esta última.

Se nos últimos milénios o pintor buscou o objecto, o seu significado essencial, se tentou justificar a sua aplicação, na nossa era cubista o pintor destruiu o objecto enquanto tal, com o seu significado, sua essência e sua finalidade.

Os objectos, as coisas do mundo real desapareceram como fumo para uma nova cultura da arte.
E os meus olhos podem ser vistos num museu de curiosidades, como atributos medievais, para passar em revista o mundo dos objectos.

O cubismo e o futurismo criaram o quadro a partir de detritos e fragmentos de objectos em prol das dissonâncias e do movimento.

A intuição foi esmagada pela energia dos objectos e não alcançou o objectivo autónomo da pintura.
Os quadros cubo-futuristas foram criados de acordo com vários princípios:
O princípio da escultura pictórica artificial (modelagem das formas).
O da escultura real (colagem), do relevo e do contra-relevo.
O da palavra.

No cubismo a pintura era expressa principalmente na superfície plana; antes dele a superfície plana era como um meio de iluminação!
No que diz respeito às superfícies pictóricas planas no cubismo, elas não constituíam um fim em si mesmo, mas serviam, pela sua forma pictórica, para a dissonância. E a sua própria forma era tal que podia proporcionar uma forte dissonância com as linhas rectas, curvas, etc… que se dirigiam para ela.

Cada superfície pictórica plana transformada num relevo pictórico proeminente é uma escultura artificial, e qualquer relevo saliente transformado numa superfície plana é pintura.
Assim, na arte pictórica, a intuição não criou formas que derivam da massa da matéria pictórica; de um bloco de mármore não se derivou a forma que é própria do cubo, do quadrado, da esfera, etc…

Encontramos a exaltação da intuição pelas combinações no quadro. Mas a intuição também foi exaltada pela pintura de um vaso sobre uma paliçada, por um girassol pintado… Os horrores representados nas pinturas do corpo humano e de outras formas provêm de a vontade criativa estar em desacordo com essas formas, encabeçando a luta do pintor para poder sair do objecto.

Até agora, a vontade criativa fez parte das formas reais da vida. E a fealdade é o combate da força criativa devido à tristeza do encarceramento. Em arte, chamarei a essa força criativa, a essa vontade, A.B., Abismo, como meio de proteger a autonomia de toda a arte, cujas formas serão uma nova revelação do realismo pictórico das massas, dos materiais, da pedra, do ferro e de outros.

Assim, por exemplo, ao bloco de mármore não é adequada a forma humana. Miguel Ângelo, ao esculpir David, violentou o mármore, mutilou um pedaço de pedra magnífica. Não havia mármore, havia David.

E ele estava profundamente enganado se dissesse que fez sair David do mármore. O mármore estragado foi contaminado desde início pelo pensamento de Miguel Ângelo sobre David, pensamento que ele inscreveu na pedra e que depois soltou como uma lasca de um corpo estranho. É preciso deduzir do mármore as formas que decorreriam do seu próprio corpo, e um cubo esculpido ou uma outra forma é mais precioso do que qualquer David.

O mesmo se passa na pintura, na literatura, na música.
A aspiração das forças artísticas em conduzir a arte na direcção da razão levou ao momento zero da criação. Mesmo entre os indivíduos mais expressivos, as formas reais têm a aparência da fealdade.
A fealdade foi empurrada entre os mais expressivos quase até ao ponto do seu quase desaparecimento, sem sair do âmbito do zero.

Mas eu transfigurei-me no zero das formas e fui além do 0-1. Considerando que o cubo-futurismo cumpriu as suas tarefas, passo para o suprematismo, para o novo realismo pictórico, para a criação não-figurativa.
A seu tempo, falarei do Suprematismo, da pintura, da escultura e da dinâmica das massas musicais.

Junho de 1915.
Moscovo.

tradução de:
“Du Cubisme au Suprématisme en Art, au Nouveau Réalisme de la Peinture en tant que Création Absolue”
K. S. Malévitch
De Cézanne au Suprématisme (premier tome des écrits), Éditions L’Âge d’Homme, Lausanne, 1974, pp. 37-43

27 Fev 2020

Pintura | Obras de Liu Mengkuan em exposição a partir de amanhã

[dropcap]A[/dropcap] inauguração da exposição “Banhando-se na Brisa Primaveril – Pinturas de Liu Mengkuan”, está agendada para amanhã, pelas 18:30, na Galeria de Exposições Especiais do Museu das Ofertas sobre a Transferência de Soberania de Macau. No total vão ser exibidas 90 pinturas que mostram “como Liu Mengkuan herdou e inovou as técnicas de pintura da Escola Lingnan”, aponta o Instituto Cultural numa nota de imprensa.

Liu Mengkuan é membro fundador da Associação de Arte de Hong Kong e presidente do Clube de Arte Mu Feng. Liu iniciou os estudos com Yang Shanshen, mestre da segunda geração da Escola Lingnan, em 1977, e decidiu ser pintor a tempo inteiro em 1983, tornando-se um membro da terceira geração da escola. Em 2003, fundou o Estúdio de Arte Mu Feng em Hong Kong e orientou cursos de pintura da Escola Lingnan no Museu de Arte de Hong Kong e no Centro de Artes de Hong Kong. Em 2012, fundou o Clube de Arte Mu Feng e dedicou-se à promoção da arte da Escola Lingnan.

Liu Mengkuan “é exímio a pintar flores, animais, pássaros, peixes, insectos, além de paisagens e criou um estilo fresco e puro nas suas pinturas”, aponta a mesma fonte acrescentando que “as suas obras herdaram a essência do espírito da Escola Lingnan de desenhar a partir da natureza, combinando-o com técnicas de pintura ocidentais”.

A exposição vai ser acompanhada por uma palestra, no sábado, em que Liu Mengkuan vai apresentar as pinturas dos mestres da Escola Lingnan, e compartilhar a sua experiência artística. A mostra estará patente ao público até 25 de Agosto.

25 Jul 2019

Exposição | Aguarelas no MAM a partir de sexta-feira

[dropcap]O[/dropcap]Museu de Arte de Macau (MAM) acolhe, a partir de sexta-feira, a exposição “Deambular e Sentir”, que reúne um conjunto de 32 aguarelas paisagísticas do pintor contemporâneo de Macau Lai Ieng. A mostra, de entrada livre, a inaugurar pelas 18h30, vai estar patente no MAM até ao próximo dia 16 de Junho.

Em comunicado, o Instituto Cultural (IC) afirma esperar que, “seguindo os percursos do desenho do artista e das suas observações e pincelas subtis, os visitantes possam descobrir a beleza dos recônditos cénicos de Macau e o encanto da vida local”. Com cores vivas e quentes, as pinturas de Lai Ieng retratam edifícios característicos nas ruas e travessas do Centro Histórico de Macau, como a Calçada do Lilau, a Rua dos Mercadores, a Rua dos Ervanários e a Calçada do Monte, “apresentando paisagens diárias negligenciadas, mas indispensáveis, ​​nas suas aguarelas”, destaca o IC na mesma nota de imprensa.

Desde que foi introduzida em Macau, a aguarela ocidental tem sido um meio de expressão preferido pelos artistas locais. Pintores de diferentes períodos deixaram excelentes obras que influenciaram as gerações posteriores, com Lai Ieng a surgir entre os contemporâneos mais influentes de Macau.

Nascido em Macau em 1949, Lai Ieng começou a estudar aguarela na década de 1970 sob a influência dos artistas de Macau Lok Cheong, Tam Chi Sang e Cheong Io Sang, tendo estudado pintura com o aguarelista Wang Zhaomin nos anos 1980. Em 2008, Lai Ieng foi agraciado pelo Governo com a Medalha de Mérito da Cultura.

20 Mar 2019

Pintura | Exposição de Chau Hon Va a partir de dia 19 no Centro UNESCO

[dropcap]”V[/dropcap]ida Própria a Passar nos Livros e na Pintura” é a exposição de Chau Hon Va, que tem inauguração marcada para o próximo dia 19 às 18h30 na sala da exposição do Centro UNESCO. A iniciativa faz parte do Projecto de Promoção de Artistas de Macau da Fundação Macau, e vai exibir 75 obras da mestre de pintura local. A par da mostra será lançada uma colectânea homónima com os trabalhos expostos.

A artista terá herdado o talento para a pintura da própria família, uma vez que é neta de Chau Jim, e filha de Chau Wan, dois pintores reconhecidos em Macau. De acordo com um comunicado, “as suas obras exibem quase sempre pássaros e flores, sobretudo crisântemos”. O seu trabalho tem ainda como características a utilização de cores escuras e a exploração de contrates e de transparências, acrescenta a organização.

Chau Hon Va vai ainda liderar um workshop no dia 23 às 15h, no local da exposição. Sob o tema “Andorinhas e Peixinhos” a iniciativa é dirigida a pais e crianças – entre os seis e os doze anos – e tem entrada gratuita.

Além, de pintora, Chau é actualmente presidente da direcção da Associação para Investigação e Inovação da Caligrafia e Pinturas Chinesas (Macau), membro da Associação dos Calígrafos e Pintores Chineses «Yü Ün» de Macau, vice-presidente da direcção da Associação de Pintura e Caligrafia de Terceira Idade de Macau e assessora da Associação de Arte e Cultura “Wa Ha” Macau.

12 Fev 2019

Pintura | “A state of bliss”, de Zhao Qian, é inaugurada hoje na Fundação Rui Cunha

É inaugurada hoje a exposição “A state of bliss” de Zhao Qian na Fundação Rui Cunha. A mostra traz à galeria da Praia Grande pinturas chinesas que pretendem transmitir paz e calma a quem as vê

 

[dropcap]A[/dropcap] exposição “A state of bliss” de Zhao Qian tem inauguração marcada para hoje pelas 18h30 a e traz à galeria da Fundação Rui Cunha um conjunto de 17 obras de pintura chinesa. Mas, adverte a curadora, Laurentina da Silva, não é a pintura tradicional a que o público está habituado que vai estar patente. “É diferente da pintura chinesa normal, diferente do que estamos habituados a ver”, conta, até porque “normalmente quando se fala de pintura chinesa pensa-se mais no jogo de sombras em que os pretos e cinzentos são cores muito comuns”, acrescenta.

Em “A state of bliss”, a artista Zhao Qian optou pelo uso de cores suaves com o objectivo de projectar nas suas obras “mais calma” e a “sensação de paz, do zen”, aponta Laurentina da Silva.

Para obter as tonalidades pretendidas e uma maior veracidade no seu trabalho a artista optou pelo uso de tinta japonesa. “As mais recentes produções de tinta na China não têm a mesma qualidade das mais antigas. Mas no Japão ainda se consegue encontrar tinta idêntica à que antigamente se fazia no continente porque eles fazem questão de manter a qualidade da tinta” aponta a curadora, “sendo mais original”, acrescenta.

Inspirações transcendentes

A inspiração para esta mostra veio de uma série de viagens que a artista realizou e a sua pintura é “o reflexo da imaginação misturado com as diversas experiências de vida”.

Depois de passar por Xinjiang, Tibete, Nepal e Tailândia e de ter estado em contacto com as diferentes manifestações religiosas destas regiões, Zhao decidiu passar para a tela o que delas tinha colhido, ou seja, o sentimento de tranquilidade que encontrou e que era comum às diferentes manifestações de fé. Por estes sítios foi absorvendo “o espírito que as religiões transmitem às pessoas mas, além do aspecto da fé, há mais: há um convite à calma e à paz”, refere a curadora. Por outro lado, a artista juntou ainda aspectos ligados ao seu dia-a-dia.

As 17 obras são o resultado desta mistura e concretizam “um conceito artístico além da natureza e tranquilidade, um estado entre o sonho e realidade, quer sejam cenários da vida diária ou de montanhas distantes, estas obras apresentam uma imagem de leveza, como um sonho”, aponta a apresentação do evento.

Em “A state of bliss” o público é convidado, na observação de cada uma das obras, a interpretar e a reflectir acerca de si e das suas aspirações. O objectivo é permitir ao observador que tenha ali também o seu momento de paz, em que possa interpretar as imagens que vê, avança Laurentina da Silva.

Zhao Qian, nasceu em 1983 na província de Anhui, na China. Concluiu o seu mestrado na Universidade de Xiamen em 2007, e foi oradora da universidade de Finanças e Economia de Anhui. É neste momento candidata ao doutoramento da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. Nos últimos anos, realizou várias exposições em Taiwan e na China Continental. A exposição pode ser vista até 21 de Janeiro.

8 Jan 2019

Casa Garden recebe a partir de quinta-feira exposição de aguarelas

Três visões artísticas diferentes juntas no mesmo espaço. “Estilos Distintos” é o nome da exposição que reúne trabalhos em aguarela de três artistas de Macau: Lai Ieng, Sio In Leong e Lei Vai Wa. A mostra abre ao público na Casa Garden, na quinta-feira às 18h30

[dropcap]A[/dropcap] aguarela volta a ganhar protagonismo na Casa Garden numa mostra, que congrega um trio de artistas de Macau, com o título “Estilos Distintos”. A exposição, apresentada na quinta-feira às 18h30, junta trabalhos de Lai Ieng, Sio In Leong e Lei Vai Wa.

O conjunto de quadros que forma esta exposição colectiva aborda diferentes temas, padrões e cores, daí o título. O ponto comum mais evidente é a excelência e mestria técnicos que transporta para as telas os talentos e visões dos três artistas.

Lai Ieng, um dos nomes da mostra que abre portas na quinta-feira na Casa Garden, estudou pintura de aguarela na Associação de Artistas de Macau desde 1970, com Lok Cheong, um pioneiro local deste tipo de pintura. Lai já exibiu as suas obras em Pequim, Portugal, Hong Kong, Taiwan e nos Estados Unidos e foi seleccionado por quatro vezes para a Mostra de Artistas de Hong Kong, Macau e Taiwan, integrada na Exposição de Belas Artes da China. Em 2008, apresentou-se a solo, em Macau, com a exposição “Aquarelas de Lai Ieng”. Em 2009, um trabalho seu foi seleccionado como uma das dez melhores obras da Exposição Anual de Artes Visuais de Macau.

Sio In Leong, outra visão desta exposição, é um dos nomes da aguarela local. Estudou pintura com Tam Chi Seng, um mestre pioneiro de Macau, e tornou-se membro da Associação de Artistas de Macau em 1978. Com uma técnica predominantemente realista, participou em todas as exposições dos membros da Sociedade de Artistas de Macau, da 1ª à 4ª Exposição de Arte Bienal de Macau, na Exposição Colectiva de Artistas de Macau, e na Bienal de Artes Visuais de Macau.

Em 1992 e 2010, respectivamente, expôs a solo com “Registo de Uma Vida”. Em 2014, fez nova exposição individual, “Sentir o Tibete – Aguarelas de Sio In Leong”. Em 1985, ganhou o Prémio de Excelência na Exposição de Jovens Artistas de Macau.

As influências

Outro dos nomes que expõe em “Estilos Distintos” é Lei Vai Wa, artista especializado em pintura a óleo e guache. Em meados de 2015, recebeu o título de “Artista com Virtude e Excelente Aptidão” que distingue aqueles que tiveram contribuições de vulto para a causa das artes. Como artista sénior, Lei é agora conselheiro de arte da Associação Internacional de Artistas da China, vice-presidente da Associação de Cultura e Arte de Macau, vice-director geral da Sociedade Internacional de Pintura a Óleo de Macau, chefe do comité de supervisão da Academia de Caligrafia de Macau e director da Associação dos Artistas de Belas-Artes de Macau.

Quando se fala de aguarelas no território o nome de George Chinnery (1774–1852) é uma inevitabilidade, o artista que pintou a velha Macau do século XIX com a leveza que a técnica proporciona. As telas onde o quotidiano ganhava vida, e onde as paisagens se imortalizaram, são pedaços de história que transportam para a realidade de uma Macau desaparecida. De certa forma, apesar das abordagens diferentes e contemporâneas, o trio de artistas que forma esta exposição dão um eco actual às aguarelas que pintaram a cidade no passado.

11 Dez 2018

Pintura | Joaquim Franco apresenta “The wave and other poems” em Hong Kong

Joaquim Franco dedica grande parte da mostra “The wave and other poems” a trabalhos que têm como foco o mar e a sua importância. A exposição está patente na Galeria Nido, em Hong Kong, até dia 23 de Setembro

[dropcap style=’circle’]T[/dropcap]he Wave and other poems” é nome da exposição do artista local Joaquim Franco que está patente na Galeria Nido em Hong Kong até ao próximo dia 23 de Setembro.
A mostra divide-se em dois momentos. Um primeiro constituído pela instalação “The Wave” seguido pela exibição quadros sob o tema “Other Poems”.

A primeira parte dos trabalhos apresentados por Joaquim Franco é uma instalação, “uma grande onda”, segundo a descrição do próprio. Mas não é uma onda qualquer, é uma instalação que tem uma mensagem de alerta para o problema do plástico e da crescente poluição que afecta, nomeadamente, os oceanos. “Esta instalação é uma onda de plástico que invade a galeria e que pretende representar metaforicamente a forma como o plástico está a invadir os oceanos”, apontou o artista ao HM.

Esta preocupação com o ambiente, em especial com a poluição das águas do mar, é um assunto que diz pessoalmente respeito ao artista e que tem origem na sua infância. “Sou da Ericeira, que fica mesmo virada para o mar, e por isso tenho esta ligação profunda ao oceano”, explicou.

Por outro lado, “é importante alertar as pessoas para o que se impõe que é um menor uso do plástico e a modificação do nosso comportamento em relação e este material para irmos acabando por o deixar de usar com esta intensidade”, sublinhou.

A ideia para a instalação partiu de um quadro produzido para uma exposição na Casa Garden, que se chamava “Oceano”, em que a presença do plástico apareceu pela primeira vez. “Mais tarde, entrei no atelier e encontrei uma série de sacos no chão. Foi quando me lembrei que este material tanto invade os oceanos como o estúdio onde trabalho, como os quadros que faço”, apontou.

Ainda dentro deste primeiro momento expositivo estão integradas duas pinturas: “O Oceano Atlântico” e o “Oceano Pacífico”, “numa onda que traz o plástico ao longo do espaço e passa por estes dois quadros”, referiu.

Homenagem a Cousteau

O segundo momento expositivo é referente “aos outros poemas” e é preenchido por vários quadros do artista. Também aqui se nota a presença do oceano, nomeadamente em três obras inspiradas em Jacques Cousteau. Um deles intitulado “O mundo do silêncio”, nome inspirado no livro homónimo do explorador francês. “Faço uma homenagem à sua vida porque foi alguém que se dedicou aos oceanos. Fez um estudo sobre a Antártida e conseguiu junto das Nações Unidas que aquela zona não fosse explorada”, revela o artista quanto às referências que recolheu para o trabalho. Um segundo quadro, “Calypso”, é o nome do barco do cientista.

A mostra patente na região vizinha tem ainda outra obra de inspiração oceânica, mas também ligada à infância do artista e que tem que ver com castelos de areia. “Aqui, a metáfora tem de ver com a ilusão que é associada a este tipo de construção”, referiu.
Para o artista, a presença de Cousteau nestas obras não foi um acaso. “Todos os sábados, quando era miúdo, havia na televisão um programa dele e o facto de o ver acabou por se tornar uma rotina tão importante para mim como a de ir à praia”, acrescentou.

As restantes obras são quadros que retratam “outros poemas como o amor ou as relações entre as pessoas.”

12 Set 2018

Exposição | Pintura chinesa e caligrafia patente na Fundação Oriente

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap] Associação de Pintura e Caligrafia Macau Oriente inaugura no próximo dia 22 “A segunda exposição de associados”. O evento terá lugar na galeria da Fundação Oriente às 18h30.
Esta é a segunda iniciativa do género desenvolvida pela associação e tem como objectivo a “promoção do intercâmbio entre a cultura chinesa e portuguesa”, revelou o responsável pela entidade, André António, ao HM.
Este ano o certame oferece algumas novidades e conta com um espaço dedicado a uma exposição internacional que exibe trabalhos de autores japoneses.
A exposição está dividida em três partes. Num primeiro momento “A segunda exposição de associados” apresenta um conjunto de trabalhos feito pelos membros da entidade que se expressam através de pinturas a óleo, aguarelas tradicionais chinesas e alguns trabalhos de caligrafia.
Num segundo momento, a mostra foca-se mais especificamente no trabalho do mestre local, Lam Iok Fai.
Por fim, vai estar patente uma exposição colectiva internacional em que a Associação de Pintura e Caligrafia Macau Oriente “convida amigos de vários países entre os quais Portugal”. Este ano, e para alargar o espectro do tipo de pinturas, foram também convidados artistas das Filipinas, Índia e Japão. No entanto, e dada a falta de tempo para concluir trabalhos, apenas os artistas japoneses vão marcar presença. “Os artistas da Índia e das Filipinas não tinham tempo para terminar as suas obras”, explicou André António. Nesta parte, a caligrafia fica de lado e vão ser expostas pinturas a óleo e aguarelas.

Dois em um

No total estão prontas a ser exibidas mais de 100 obras. Devido à falta de espaço, a exposição vai ser alterada cerca de duas semanas após a sua inauguração. “Estamos a pensar em mudar a exposição depois de decorridos 15 dias da sua abertura porque não conseguimos colocar todos os trabalhos de uma vez e assim as pessoas podem ver duas exposições numa só iniciativa”, explicou André António. “Primeiro colocamos uma parte das obras e depois mudamos para mostrar as que restarem. Num mês as pessoas podem ver duas exposições”.
A Associação de Pintura e Caligrafia Macau Oriente foi constituída há oito anos, mas só teve a sua primeira exposição no ano passado na galeria da Fundação Rui Cunha.
A ideia de constituir esta entidade partiu do próprio Mestre Lam Iok Fai que “é muito conhecido em Macau como artista” apontou André António. “Na década de 80 o Governo da altura chegou a comprar obras do artista que fazem actualmente parte do espólio do Museu de Macau”, acrescentou.
Da associação fazem parte elementos portugueses, macaenses e chineses num total de 30 membros. “Não precisamos de muitos mais também porque queremos ter artistas de qualidade”, disse.
Segundo o responsável, a arte tradicional chinesa, tanto na área da pintura como da caligrafia, é alvo de cada vez mais interesse e muito procurada por parte do público, especialmente do continente.
Os trabalhos dos artistas associados são particularmente procurados por apresentarem particularidades que dizem respeito ao próprio território. “Misturamos algumas técnicas e conceitos ocidentais nas obras que fazemos, o que lhes confere características especiais”, explicou. “É um trabalho ligeiramente diferente do tradicional, também por ser feito em Macau”, acrescentou André António numa referência à mistura cultural que caracteriza o território.

8 Ago 2018

Entrevista | Ricardo Moreira da Silva, artista plástico

[dropcap style=’circle’] R [/dropcap] icardo Moreira da Silva, Xisto Soares e Tony Amaral trazem a Macau obras incluídas na componente “O Outro” da Alter Ego, ao abrigo da Exposição Anual de Artes entre a China e os Países de Língua Portuguesa, patente no edifício da Antigo Tribunal até 9 de Setembro. Em discurso directo, Moreira da Silva revela um pouco da nova expressão artística que tem explorado e do estado da arte em Timor-Leste

Está em Macau com um trabalho que fez com os timorenses Xisto Soares e Tony Amaral. Como surgiu esta ligação?

Fui parar a Timor há quatro anos. Fui por uma questão de vistos e acabei por lá ficar a trabalhar numa agência de comunicação como director artístico. Entretanto, conheci artistas timorenses e vi-me a mãos com a situação que ali se vive. Há muita falta de referências artísticas. Talvez por isso, os artistas timorenses desenvolveram uma forma de arte muito própria, muito ligada ao animismo que também está muito próximo da arte conceptual contemporânea. Comecei a criar programas de educação cultural, com a  colaboração da Fundação Oriente e esta vinda aqui é integrada num programa de educação cultural que também trouxe estes dois artistas com quem já tenho trabalhado. Pretendo ainda desenvolver laços com Macau e espero criar uma possível ponte de ligação para ajudar os artistas timorenses a internacionalizarem-se.

 

E o que trazem a Macau?

Esta exposição foi um grande passo. Trouxemos três grandes peças monumentais, de 15 metros por cinco. A produção destas peças é um diálogo silencioso entre os três artistas e tem que ver com uma nova corrente que estou  desenvolver. Chama-se infra-arte e que na pintura está ligada à hiper-pintura. É uma pintura velada, de difícil acessibilidade se não se tiver tecnologia. É um conceito um pouco difícil de se ilustrar até por ser de vanguarda.

 

Mas pode explicar um pouco melhor?

A pintura ao longo da história tem vindo a trabalhar a questão da ilusão. Depois com a vinda da fotografia isso perdeu um bocado o sentido para a pintura tanto que houve quem afirmasse que a pintura estava morta. Entretanto, viu-se nas correntes do início do século XX, uma ligação da pintura à percepção e ao desenvolvimento intelectual dessa percepção. É uma espécie de linha de fenomenologia ligada à construção pictórica e a essas bases analógicas que são a pintura e a escultura. Hoje em dia, com o desenvolvimento tecnológico, houve outra vez uma usurpação desses espaços e esta é uma pintura que trabalha a dependência tecnológica. Trabalha noutros espectros visuais e essa acessibilidade a estes espectros depende sempre de outro tipo de tecnologias.

 

É necessário outro meio para aceder a essa pintura?

Sim, precisa sempre de um meio. Por exemplo, o raio-x ou o ultra violeta, etc, tudo isso, são espectros de percepção que geralmente não utilizamos no observador. Embora não seja comunicação, é um objecto de observação e vive por essa razão. Neste momento, trabalho no sentido de criar uma espécie de exercício que vive desta dependência.

 

A própria produção também implica esse meio?

Isto começou em 2013 e neste momento está a evoluir precisamente para isso, para uma manipulação já do meio tecnológico para conseguir tomar mais partido da criação. Mas a tecnologia não está acessível a toda a gente, não esta democratizada o que cria limitações mesmo nas produções de exposições. Muitas vezes a própria produção da exposição não consegue criar meios, foi o que aconteceu cá. Vínhamos com as peças de hiper-pintura e aqui não se conseguiram encontrar os meios para que o público pudesse entrar em contacto com a infra-imagem. De qualquer das maneiras, como objecto são bastante interessantes. São espiritualmente minimais. São peças monocromáticas, mas às vezes feitas com matérias muito simples e isso dá-lhes um charme muito próprio. Apesar de não estarem expostas, estas peças estão aqui em Macau e a sua venda vai reverter directamente para uma fundação que trabalha só nesta questão da internacionalização dos artistas e no desenvolvimento cultural em Timor. Naquele país, a arte é uma zona frágil da estrutura que está em desenvolvimento e que tem outras prioridades que não a cultura. Também estamos a fazer um grande levantamento biográfico e descobrimos que os grandes pilares da arte em Timor nos últimos 40 anos são mulheres. Isto até é uma contradição, porque neste momento não há quase artistas mulheres naquele país. Mas quem representa a história visual e cultural de Timor na cultura e na escultura, são realmente as mulheres. Neste sentido, também estamos com um programa que se chama o WAP, Woman Art Power, que tem só que ver com a calibração, com o trazer de volta um equilíbrio entre os dois géneros neste meio cultural tendo em conta a música, o teatro, a performance a escultura, pintora, etc.

 

Trouxeram peças que não foram expostas. Como foi criada a exposição que está no edifício do Antigo Tribunal?

Em termos de gestão de espaço houve algumas alterações. Quando chegámos, acabaram por nos ceder um espaço no Antigo Tribunal com características muito próprias. Era um espaço muito pequeno, com duas salas quase iguais, e uma acessibilidade muito pequenina através de uma porta que faz a ligação entre os dois espaços. Acabei por curar e ser também artista trazendo para ali a questão da Alegoria da Caverna.

 

Em que é que a alegoria se materializa aqui?

Estamos dentro de um córtex cerebral. A alegoria da caverna é a simulação do que é o espaço interno da consciência. É como se o crânio estivesse desabitado do cérebro, fosse um espaço arquitectónico que tem esta divisão entre os espaço dos dois lóbulos cerebrais. Dentro desta caverna, deste espaço, fizemos inscrições nas paredes, algumas com stencil. Fizemos pinturas, esculturas, inscrições. Trabalhar com estes dois artistas, neste espaço, acabou por representar um pouco o trazer-lhes à luz a situação que se passa em Timor. Lá, eles estão num ambiente confortável, mas com muita falta de referências e com um imaginário do que é que é o universo cá fora. Acaba por se transformar numa espécie de sombra e eles acabam por ter receio de entrar em contacto com ele. Esta vinda a Macau mostra-lhes também o oposto: não há monstros nenhuns. Isto é um universo de ligações e interligações, rizomático, que é acessível e eles são embaixadores culturais que trazem os seus hábitos e arte. Acabou por ser um  exercício muito válido e interessante. Esta mudança acabou por trazer à exposição uma influência já de Macau. A parte mais ritualística das velas, das latas com fogo e dos incensos acabou por ser transposto para dentro da instalação.

26 Jul 2018

Pintura | Austin Sou estreia-se a solo na Galeria da Fundação Rui Cunha

[dropcap style=’circle’] F [/dropcap] luid Gestures (“Gestos fluidos”, numa tradução livre) marca a estreia a solo do jovem artista Austin Sou. A exposição individual de pintura, inaugurada na quarta-feira, encontra-se patente na Galeria da Fundação Rui Cunha até ao próximo dia 23.
Nascido e criado em Macau, Austin Sou é um jovem artista que aspira a deixar a sua marca no mundo da arte. Com o seu trabalho abstracto, que vai buscar inspiração à dança e ao ioga, Austin Sou procura estabelecer uma conexão entre a natureza e a liberdade.
A vontade de ser artista surgiu quando percebeu que ao estar em contacto – tanto consigo próprio como com aqueles que o rodeiam –, permitia-lhe superar as barreiras da timidez e outras reservas sociais, realça a Fundação Rui Cunha num comunicado enviado às redacções.
A exposição individual de pintura, que pode ser vista como “uma janela para o trabalho de uma nova geração de artistas locais”, reúne um total de 11 obras. A curadoria ficou a cargo do professor e também artista Cai Guo Jie.
“A obra e o processo criativo de Austin [Sou] foca-se muito na arte perdida de conceber os seus próprios pigmentos”, afirmou Cai Guo Jie, para quem o que torna o trabalho de Austin Sou “tão único” é o facto de “ele gostar de accionar as características materiais dos pigmentos e de dominar a abertura da cor e emoção”.
“Os diferentes pigmentos são inseridos num recipiente, criando bolsas de cor”, fazendo com que “ele não esteja apenas a conceber um único trabalho, mas a dar um novo sentido de cor. O resultado é uma sensação de completude, uma conexão com a natureza e o círculo da vida”, acrescentou o curador.

15 Jun 2018

Júlio Pomar, o suave rebelde

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omo que por coincidência, mirei ontem à noite o relógio. Eram 01:57 e, sonolento, coloqueios auscultadores que estão bem perto, para ouvir as notícias da Antena 1. O noticiário abriu com uma triste notícia: Júlio Pomar tinha falecido aos 92 anos.

Olhei para o breu do tecto e ocorreu-me “A Cegueira dos Pintores” e de como me tinha comprazido a ler a escrita de um dos maiores pintores de sempre, de Portugal e, porque não, do mundo.

Se Pomar se tornou icónico pelo “Almoço do Trolha” e, consequentemente da sua inscrição no movimento Neorrealista português, será redutor tentar classificá-lo dentro de qualquer movimento. Júlio Pomar foi, igualmente, e como António Arnaut – desaparecido quase no mesmo dia – um cidadão de corpo inteiro, combatente pela liberdade, que foi preso por isso e por ser filiado no Partido Comunista Português, consequências da sua rebeldia perante preceitos e conceitos já fora de prazo.

Foi através da grande Amizade criada com outros grandes lutadores pela liberdade, Manuel de Brito e sua Mulher, Arlete Alves da Silva que, nos princípios dos anos 1980, me foi possível trazer a Macau, para a Galeria do Museu Luís de Camões, exposições da Galeria 111, entre as quais figuravam obras gráficas de Júlio Pomar. Foi no aprofundar dessa Amizade e de outras, como o grande Poeta Pedro Tamen e o Arq. José Sommer Ribeiro, respectivamente Administrador para as Belas-Artes e Director do Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian, todos amigos entre si, que foi possível realizar em 1985 o “Ciclo dos Últimos Cem Anos da Pintura Portuguesa” em Macau, na Galeria do Leal Senado, e na qual, também Júlio Pomar foi um dos cabeças de cartaz.

Na sua obra perpassam não apenas o Neorrealismo com obras de referência como o já referido “Almoço do Trolha” e “O Gadanheiro”, e posteriormente “Os Cegos de Madrid”, uma quase invocação a Goya, de 1957, e sucessivos ciclos como as sínteses nuas que encontram no “Banho Turco” e em “Maio de 68” referências que serão substituídas por outra linguagem radicalmente diferente com a sua série de tigres e macacos do início dos anos 80, que se desenvolve noutra série que aqui se representará com o retrato de Fernando Pessoa e outras personalidades, e touradas e corvos, numa incessante deambulação naquilo que ele próprio consideraria “a sua volubilidade”.

Para além da admiração pela sua espectacular versatilidade que aqui se testemunha de modo incompleto, Júlio Pomar foi sempre um daqueles rebeldes suaves incapazes de ser outra coisa que não a sua autenticidade. A atestá-lo fica esta pequena estória:

Pomar estava em Macau com sua Mulher Teresa e o casal Arlete Alves da Silva e Manuel de Brito e fomos os três casais ao Forum de Macau para ouvir um concerto onde pontificava um pianista da nossa praça. As cadeiras eram incómodas, eu fazia barulho com o celofane dos meus rebuçados e, pelo canto do olho, reparo num aceno do Pomar; propunha-me irmos fumar. Saímos os dois e fomos para o átrio fumar e conversar placidamente, enquanto ao longe rugia a orquestra. Conversámos e fumamos livremente, até que terminou o concerto e se nos juntaram as respectivas mulheres e os amigos. Dias depois, de um modo extremamente afável, no Arquivo Histórico do Tap Seac, Pomar descerrava um trabalho do jovem Ng Vai Meng, dando-lhe um afável abraço.

Para se ser verdadeiramente grande é preciso ser-se autêntico. Para se ser autêntico, é preciso por vezes ser-se rebelde, o que, no caso de Júlio Pomar, foi sempre um suave mas determinado rebelde, a recordar-me uma pintura anagramática: o SG Gentil, de um autor cujo nome teima em não me chegar à memória. Todos estamos mais pobres.

24 Mai 2018

Óbito | O artista plástico Júlio Pomar morreu aos 92 anos em Lisboa

O incontornável Júlio Pomar faleceu ontem aos 92 anos. O artista, por muitos classificado como indomável, deixa um vasto legado. Para Carlos Marreiros, além do génio artístico, a inteligência e a luta por ideais marcaram a sua vida e obra. Rui Rasquinho considera que Pomar é um exemplo de obstinação de um grande artista que viveu totalmente para o seu trabalho

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] artista Júlio Pomar faleceu na quarta-feira aos 92 anos. Tanto o homem como a obra deixam um legado de talento e luta pela liberdade.

Algumas das sua obras passaram por Macau pelo menos duas vezes. A última aconteceu em Setembro de 2015 numa mostra no Albergue SCM – “A jornada de um mestre – Júlio Pomar e amigos”.

“Era um artista muito coerente. Um artista indomável e de uma inteligência acutilante” começa por dizer o arquitecto Carlos Marreiros ao HM. Muitas vezes os artistas plásticos expressam-se bem nos seus trabalhos, mas verbalmente encontram algumas dificuldades. Não era o caso de Pomar. “O artista tinha um discurso poderoso, penetrante e sabia ser muito duro quanto o tinha que ser e ser muito sedutor e doce quando também o queria ser, sem nunca abdicar da sua posição”, refere o também responsável pelo Albergue.

Perseguido durante o Estado Novo, o artista fugiu para França. De acordo com Marreiros, esta necessidade de fuga acabou por ser uma mais valia: “Se calhar foi bom, porque desta forma Júlio Pomar pode abrir os seus horizontes de forma acelerada e qualitativa, mais do que se estivesse em Portugal”.

Uma das características da sua visão artística é a versatilidade. Homem que passou por várias fases ao longo da carreira, Pomar não deixou que nenhuma das suas facetas retirasse qualidade à globalidade da sua obra. Muito pelo contrário. Em cada mudança revelava a solidez. No entender de Carlos Marreiros, esta é uma afirmação não só de talento, mas também de inteligência. “Além do génio, o artista tem de ser culto, tem de ser inteligente e tem de ser muito trabalhador”. Júlio Pomar, aponta, reunia, pelo menos esta três, sem se ficar por aqui. Juntam-se às virtudes do pintor, o facto de Pomar utilizar a arte para indicar situações de injustiça social e de luta pela liberdade. “O facto de se conseguir reinventar a si próprio é uma das características mais notáveis e brilhantes do Júlio Pomar”, afirma.

Também para Rui Rasquinho, a morte de Pomar é a perda irreparável. Na visão do artista local o que mais se destacava em Júlio Pomar era o facto do artista viver intensamente a sua prática. “Ele só pensava em trabalhar e já há poucos assim”, refere.

Para o futuro, fica a obra que Carlos Marreiros considera que deve agora passar por um cuidadoso processo de catalogação, sendo que, afirma, seria de toda a pertinência criar um museu em sua homenagem. “Este espólio tem que ser organizado e classificado de forma a um dia integrar um museu digno da sua qualidade, ou que seja mesmo construído um museu dedicado a Júlio Pomar”.

Reacções oficiais

O Presidente da República Portuguesa lembrou Júlio Pomar como um “criativo irreverente” e considerou que a sua morte deixa a cultura portuguesa “muitíssimo mais pobre”, manifestando a certeza de que o Governo proporá “o luto nacional correspondente”.

O chefe de Estado descreveu Júlio Pomar como “um inovador e criativo irreverente, profundamente rebelde”, que “esteve sempre à frente do seu tempo” e “marcou boa parte do século XX, marcou a transição para o século XXI” em Portugal, “mantendo-se sempre jovem”.

“Nós devemos a Júlio Pomar a abertura de Portugal ao mundo e a entrada do mundo em Portugal, desde logo, durante a ditadura, não apenas como pintor, não apenas como desenhador, mas como grande personalidade da cultura”, afirmou.

Para ilustrar a irreverência de Júlio Pomar, Marcelo Rebelo de Sousa recordou “o seu retrato do Presidente Mário Soares que figura na galeria dos retratos no Museu da Presidência da República, e que na altura chocou tantos bem pensantes”, observando: “Porque ele era assim”.

O Presidente da República referiu ainda que o seu trabalho artístico “percorreu todas as fases, mais figurativo, menos figurativo, mais abstracto, menos abstracto” e definiu-o como “um desconstrutor” que olhava “para a outra realidade das coisas” e a retratava.

Por seu lado, o primeiro-ministro português, António Costa, afirmou que Portugal perdeu “um dos seus mais icónicos artistas”, numa primeira reacção à morte do artista plástico Júlio Pomar.

“Com a morte de Júlio Pomar, Portugal perde um dos seus mais icónicos artistas”, disse Costa, numa mensagem publicada na rede social Twitter.

“Ficará para sempre a sua obra, comprometida apenas com a cultura portuguesa e com a liberdade criativa”, acrescentou o chefe do Governo português.

Pintor e escultor, nascido em Lisboa em 1926, Júlio Pomar é considerado um dos criadores de referência da arte moderna e contemporânea portuguesa.

O artista deixa uma obra multifacetada que percorre mais de sete décadas, influenciada pela literatura, a resistência política, o erotismo e viagens a lugares como a Amazónia, no Brasil.

O homem

Nascido em Lisboa, em 1926, Júlio Pomar, que gostava mais de desenhar do que de jogar à bola quando era criança, vendeu o primeiro quadro a Almada Negreiros por seis escudos, numa época em que era impensável viver da pintura.

Tornou-se um dos artistas mais conceituados do século XX português, com uma obra marcada por várias estéticas, do neorrealismo ao expressionismo e abstracionismo, e uma profusão de temáticas abordadas e de suportes artísticos experimentados.

A obra foi dedicada, sobretudo, à pintura e ao desenho, mas realizou igualmente trabalhos de gravura, escultura e ‘assemblage’, ilustração, cerâmica e vidro, tapeçaria, cenografia para teatro e decoração mural em azulejo.

Desde muito jovem começou a escrever sobre arte, tem obra poética publicada, alguma musicada e interpretada por cantores como Carlos do Carmo e Cristina Branco.

Estudou na Escola de Artes Decorativas António Arroio e nas Escolas de Belas-Artes de Lisboa e Porto, tendo participado em 1942, em Lisboa, convidado por Almada Negreiros, na VII Exposição de Arte Moderna do Secretariado de Propaganda Nacional/Secretariado Nacional de Informação.

Fez parte da Comissão Central do Movimento de Unidade Democrática Juvenil (MUD), e participou activamente nas lutas estudantis, o que lhe custou a expulsão das Belas Artes do Porto.

Em 1947, realizou a primeira exposição individual, no Porto, onde apresentou desenhos, e colaborou com os jornais A Tarde, Seara Nova, Vértice, Mundo Literário e Horizonte, participando no movimento artístico “Os Convencidos da Morte”, assim denominado por oposição aos célebres “Os Vencidos da Vida”, grupo marcante na história da literatura portuguesa.

A oposição ao regime de Salazar leva-o a passar quatro meses na prisão, a apreensão de um dos seus quadros – “Resistência” – pela polícia política, e a ocultação dos frescos com mais de 100 metros quadrados, realizados para o Cinema Batalha, no Porto.

Mesmo assim, Júlio Pomar conseguiu desenhar e pintar na prisão – onde circulavam papel, lápis e caneta.

Num período inicial, neorrealista, foram marcantes algumas das suas obras, como “O Almoço do Trolha” ou a “Menina com um Gato Morto”.

Dos tempos que viveu em Paris, destaca-se a série de quadros a preto e branco para ilustrar a versão de “D. Quixote”, de Aquilino Ribeiro.

Em Portugal, a primeira retrospectiva da obra de Pomar foi organizada em 1978 pela Fundação Gulbenkian e exibida na sua sede em Lisboa, também no Museu Soares dos Reis, no Porto e, parcialmente, em Bruxelas.

Júlio Pomar também ilustrou várias obras, como “Guerra e Paz”, de Tolstoi, “O Romance de Camilo, de Aquilino Ribeiro, a obra “D. Quixote”, de Cervantes, “A Divina Comédia”, de Dante “Pantagruel”, de Rabelais, “Rose et Bleu”, de Jorge Luís Borges, e “Mensagem”, de Fernando Pessoa.

24 Mai 2018

Carlos Farinha, artista plástico e representante de Portugal na Art Beijing: “Olhar como se estivesse de lado”

Foi um dos dois artistas portugueses que estiveram presentes, no final de Abril, na Art Beijing. Carlos Farinha encerra nos seus quadros o mundo que vê e faz questão de misturar e as influências que vai recolhendo. Macau e o Oriente não são excepção

 

O que representa para si ter sido um dos dois artistas portugueses seleccionados para a Art Beijing?

Foi uma honra e uma enorme responsabilidade representar Portugal. Queria aproveitar a ocasião para agradecer à Galeria Arte Periférica e à Embaixada de Portugal por me ter proporcionado esta oportunidade. Estar nesta feira representa uma presença da arte portuguesa num mercado difícil mas de uma extraordinária dimensão e visibilidade. A título pessoal foi uma experiência curiosa e enriquecedora perceber a forma como o público chinês se relaciona com as minhas obras.

Quando vemos os seus trabalhos há uma espécie de tragicomédia presente. Concorda?

É curioso que me faça essa pergunta. Realmente tenho uma propensão para uma certa dramatização dos assuntos que pinto, [as pinturas] são muitas vezes criadas pela ironia, e uma certa abordagem despreocupada de um contador de histórias. As várias leituras que se pode fazer sobre as minhas pinturas são um sinal dos vários níveis de compreensão que pretendo criar, sem no entanto ser moralista ou generalista. Por exemplo, quando uso a caricatura, ela retira uma carga simbólica às histórias que conto levando-me para um campo onde posso desenvolver uma ironia que, se não fosse desse modo, poderia ganhar contornos melindrosos e ineficazes.

Qual o ponto de partida quando começa um trabalho?

Depende se é apenas um exercício ou o desenvolvimento de um conceito para uma exposição mas, muitas vezes, o dia-a-dia é o meu grande referente (político e social).

Quais são as suas referências?

São várias. Ultrapassam a própria pintura do Millet ou da Paula Rego, mas também passam pela actualidade e pelas redes sociais.

Passou por Macau. O que lhe ficou do território a nível pessoal? E a nível artístico?

Muito: Sentir um pouco de Portugal no Oriente e a sensação de que Macau tem uma identidade própria. Ficaram-me amigos, memórias e um desejo de conhecer melhor o Oriente. Conheci artistas, o trabalho da AFA e gosto particularmente do trabalho do Erick Fok.

Conseguimos identificar elementos de várias experiências culturais por onde vai passando. Como é que os interliga? Em que cultura se localiza para o fazer? Se é que isso acontece.

Bem, o meu processo criativo parte muito do facto de ter crescido fora de Portugal e de ter uma visão muito própria do meu presente. Olhar como se estivesse de lado para criar um espaço de crítica criativa.

Considera o seu trabalho como tendo, de alguma forma, uma componente interventiva?

Sim. Aliás, tive diversas experiências que me levaram a compreender melhor o mundo em que vivemos. Já tive vários quadros virais, partilhados centenas de vezes nas redes sociais. Sem essa necessidade de perceber o mundo em que vivemos, nunca seria um artista. Intervir é uma necessidade visceral no meu mundo.

Qual é a sua opinião da arte que se faz na China?

Bem, é uma potência em estado bruto, muito diversificada mas com características muito próprias. Daquilo que tive oportunidade de ver existe um encontro com a arte que é apresentada nos grandes centros culturais do mundo mas, ao mesmo tempo, procuram uma identidade própria.

Das suas obras, pode-nos contar a história de duas que tenham que ver com o Oriente?

“A tradutora” é um quadro que retrata as relações entre Portugal e a China através da representação simbólica de uma caravela portuguesa e de um junco chinês. A mulher que transporta os barcos serve para equilibrar e criar laços entre as duas culturas tão diferentes através do seu papaguear e do domínio das duas línguas. A tradutora é a garante da comunicação. “Lucky Man” é um quadro que retrata uma mesa de jogo num casino em Macau. Este quadro tem numa das figuras um boneco de boa sorte ao ombro, [porque] todos os jogadores procuram a sorte no jogo.

Neste momento, encontra-se a trabalhar em algum projecto?

Por acaso, estou a preparar uma cartografia plástica do mundo português, focada sobretudo no Oriente. É um projecto que ambiciono desde a minha primeira presença em Macau.

9 Mai 2018