Português detido em Tóquio com 69 cápsulas de droga que tinha ingerido

[dropcap]U[/dropcap]m português foi detido na segunda-feira no Aeroporto de Haneda, em Tóquio, Japão, por tentar contrabandear estimulantes que tinha ingerido, noticiou hoje a agência de notícias nipónica Kyodo, que cita uma fonte policial.

A polícia divulgou que foram recuperados 673 gramas de estimulantes do corpo do português.
A droga encontrada possui um valor de mercado estimado em 40 milhões de ienes, segundo as autoridades, e estava contida em 69 cápsulas.

O homem de 42 anos viajava de Frankfurt para Tóquio e remeteu-se ao silêncio, segundo a polícia.
As forças de segurança explicaram que foi obtido um mandado para recuperar as cápsulas depois de o português ter-se recusado a ser alvo de uma inspecção alfandegária em Haneda.

Este acabou por ser submetido a uma TAC (Tomografia Axial Computadorizada) num hospital, que detectou os invólucros, e as cápsulas foram recuperadas nos dias seguintes.

3 Jul 2019

Cimeira do G20 termina com apoio ao comércio livre e crescimento económico

[dropcap]O[/dropcap]s países do G20 concluíram no sábado a cimeira daquele grupo com uma declaração de apoio “aos fundamentos do livre comércio” e ao “crescimento económico”, com as tensões globais como pano de fundo, segundo o Japão, que recebeu a reunião.

Os líderes do G20 “concordaram na sua determinação em favorecer o crescimento económico” e mostraram “ansiedade e descontentamento no contexto da globalização” e pelo “sistema comercial global”, afirmou o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, numa conferência de imprensa no final da reunião de dois dias. O grupo “foi capaz de reafirmar os fundamentos do livre comércio”, segundo Abe, que sublinhou em particular o apoio do G20 a “alcançar mercados abertos, livres e não discriminatórios” e “um terreno de jogo justo”.

“É difícil encontrar uma solução para tantos desafios globais de uma só vez, mas conseguimos mostrar uma vontade comum em muitas áreas”, afirmou o primeiro-ministro nipónico.

Os mandatários também reconheceram os “claros riscos da desaceleração da economia global”, segundo Abe, adiantando que os países do G20 “estiveram de acordo na sua determinação em favorecer o crescimento económico” e “reformar a Organização Mundial do Comércio (OMC)”.

O comunicado final acordado pelos líderes do G20 sublinha “a intensificação das tensões geopolíticas e comerciais”, mas no texto não se inclui qualquer menção ao auge do proteccionismo, no actual contexto de conflitos comerciais entre os Estados unidos e a China e outros países.

“O crescimento global parece estar a estabilizar-se, e em geral espera-se um crescimento moderado mais à frente este ano e em 2020”, sublinha a declaração conjunta do G20, que também se compromete a “enfrentar os riscos” derivados das tensões anteriormente mencionadas e a “empreender mais acções” se for necessário.

Entretanto, 19 dos 20 membros do G20 – sem os Estados Unidos – reafirmaram em Osaka o compromisso da “implementação completa” do acordo assinado em 2015 em Paris sobre a luta contra o aquecimento global. Os signatários concordam na “irreversibilidade” deste acordo, numa declaração final redigida em termos similares aos publicados no final do G20 no ano passado mas obtido com dificuldade devido à oposição de Washington.

1 Jul 2019

Japão e EUA discutem desequilíbrios comerciais entre os dois países

[dropcap]O[/dropcap] secretário do Tesouro norte-americano, Steven Mnuchin, e o ministro das Finanças do Japão, Taro Aso, discutiram hoje como lidar com o desequilíbrio no comércio entre os dois países.

“Discutimos a cooperação entre os Estados Unidos e o Japão em diferentes questões económicas e de segurança”, disse o secretário do Tesouro dos EUA através de sua conta no Twitter.

Ambos os representantes discutiram essas questões à margem da reunião dos ministros das Finanças e governadores dos bancos centrais do G20 que decorre neste fim de semana em Fukuoka, no sudoeste do Japão.

Os dois países aliados, estão actualmente a negociar um tratado comercial bilateral. No final do mês de maio, o Presidente norte-americano, Donald Trump, voltou a criticar o “tremendo desequilíbrio” no comércio entre o Japão e os Estados Unidos, uma alusão ao excedente japonês, uma das razões que motiva Washington a negociar um novo acordo com Tóquio.

“Temos que alcançar o Japão, eles têm feito muito mais negócios connosco, mas gostaríamos de fazer um pouco mais de negócios” com eles, insistiu. Nestas negociações, os Estados Unidos procuram garantir um maior acesso ao mercado japonês em produtos como carne bovina e suína e trigo.

O Japão importa grande parte destes produtos da Austrália e da Nova Zelândia, graças ao acordo comercial transpacífico, conhecido como TPP, do qual a administração Trump decidiu retirar os Estados Unidos.

Tóquio, por sua vez, pede tarifas mais baixas para produtos industriais japoneses, incluindo veículos, uma das principais exportações para os EUA. Na reunião de hoje, o ministro das Finanças do Japão informou o representante norte-americano que posição japonesa é de que o acordo de comércio não deve incluir qualquer disposição sobre a sua política monetária.

Donald Trump, tem acusado repetidamente o Japão de desvalorizar o iene para impulsionar as suas exportações de automóveis para os Estados Unidos e ameaçou impor limitações ao sector industrial japonês.

A moeda japonesa permaneceu fraca em relação ao dólar, ao euro e a outras moedas nos últimos anos, como resultado de várias medidas de flexibilização monetária aplicadas pelo Banco do Japão, uma estratégia projectada para tirar o país asiático do seu longo ciclo de deflação.

Essa desvalorização do iene favoreceu as exportações japonesas, tornando as empresas nipónicas mais competitivas no exterior.

Durante a reunião dos ministros do G20, que será concluída neste domingo, espera-se analisar os efeitos sobre a economia global do surgimento de políticas proteccionistas, os crescentes desequilíbrios entre os fluxos comerciais e os impactos da tecnológica.

9 Jun 2019

Japão | Oposição quer legalizar casamento entre pessoas do mesmo sexo

[dropcap]O[/dropcap]s principais partidos da oposição no Japão apresentaram um projecto de lei para legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, semanas depois de Taiwan se tornar o primeiro território na Ásia a legalizar o casamento ‘gay’.

O projecto, submetido na segunda-feira, provavelmente não vai longe na Dieta japonesa, o parlamento que é composto pela Câmara dos Representantes e pela Câmara dos Conselheiros, onde o Partido Liberal Democrata, no poder, apenas avançou em matéria de direitos civis de pessoas LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgéneros), noticia o jornal The Japan Times.

O projecto de lei apresentado por partidos como o Partido Democrático Constitucional do Japão e o Partido Comunista Japonês propõe que o casamento seja estabelecido com base na igualdade do casamento.

A linguagem neutra seria adoptada com os termos “parte do casamento” para substituir “marido” e “mulher”, enquanto “pai e mãe” seria alterada pela designação “pais”.

Um dos problemas reside no artigo 24 da Constituição, no qual se declara: “O casamento deve ser baseado apenas no consentimento mútuo de ambos os sexos e deve ser mantido através da cooperação mútua com base na igualdade de direitos entre marido e mulher”.

Enquanto alguns defendem que este artigo é focado nos registos familiares e não afecta o casamento entre pessoas do mesmo sexo, os opositores sustentam que é necessária uma mudança constitucional para permitir essas uniões.

5 Jun 2019

Presidente dos EUA inicia sábado visita ao Japão com Coreia do Norte na agenda

[dropcap]O[/dropcap] Presidente norte-americano, Donald Trump, inicia sábado uma visita ao Japão, com uma agenda focada no reforço das relações bilaterais e no impasse das negociações com a Coreia do Norte.

Trump será o primeiro governante estrangeiro a ser recebido pelo novo imperador do Japão, Naruhito, que subiu ao trono no dia 1 de Maio na sequência da abdicação do seu pai, o agora imperador emérito Akihito.

A visita do chefe de Estado norte-americano prolonga-se até 28 de Maio e inclui reuniões oficiais e momentos de lazer com o primeiro-ministro nipónico, Shinzo Abe, que esteve em Washington em Abril.

Na segunda-feira, os dois líderes irão debater os desafios colocados pela Coreia do Norte à comunidade internacional, num momento em que as negociações com os Estados Unidos se encontram estagnadas, indicaram fontes do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Japão.

De acordo com as mesmas fontes, Trump e Abe “irão coordenar estreitamente as suas políticas” sobre esta questão, sensível após o fracasso da última cimeira entre o Presidente dos Estados Unidos e o líder norte-coreano, Kim Jung-un, no final de Fevereiro em Hanói.

Trump chega ao Japão quando Tóquio e Washington discutem um novo acordo comercial, embora não se espere grande progresso nesse sentido, segundo fontes norte-americanas.

O Presidente dos EUA, que volta ao Japão no final de junho para participar na cimeira do G20, chega no sábado à tarde, mas não estão previstos contactos oficiais com Abe antes de domingo.

24 Mai 2019

Imperador Akihito abdica e deseja “paz e felicidade” para o Japão e o mundo

[dropcap]O[/dropcap] imperador Akihito anunciou hoje a sua abdicação, agradeceu ao povo japonês e desejou que a era do seu filho, que na quarta-feira lhe sucede, traga “paz e felicidade” ao Japão e ao mundo.

Akihito encerrou hoje as cerimónias de abdicação, após 30 anos de reinado no trono de Crisântemo, que será ocupado agora pelo seu filho mais velho, o príncipe herdeiro Naruhito.

Esta foi a primeira abdicação do trono de Crisântemo no Japão em mais de dois séculos. O imperador Akihito disse hoje que se sente “com sorte” por ter cumprido as suas funções “com um profundo sentimento de confiança e respeito para o povo”, nas suas últimas palavras pronunciadas durante a cerimónia de abdicação.

“Hoje concluo os meus deveres como imperador”, declarou o imperador do Japão no início de seu breve discurso durante a cerimónia, realizada no Palácio Imperial, em Tóquio, diante de 294 participantes, incluindo representantes da família real e dos três ramos do Governo japonês.

Depois de agradecer as palavras do primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, que o precedeu na cerimónia, também agradeceu ao povo japonês “por apoiá-lo e aceitá-lo em seu papel de símbolo do Estado”.

Akihito, de 85 anos, dirigiu-se ao público na cerimónia de abdicação, que durou pouco mais de dez minutos e foi realizada no Salão Pino, a maior sala do Palácio Imperial de Tóquio.

Antes dos discursos, os camareiros imperiais apresentaram dois dos três tesouros sagrados que Akihito guardou durante as suas três décadas no trono e que simbolizam o poder do cargo, além dos selos imperiais usados para assinar os documentos oficiais.

O acto terminou com Akihito a abandonar o salão, acompanhado pelos camareiros que carregavam os baús com os tesouros sagrados, seguido pela imperatriz Michiko e os demais membros adultos da família imperial.

De acordo com o protocolo imperial japonês, o imperador Akihito continuará no cargo até à meia-noite de hoje e a proclamação de seu filho mais velho e príncipe herdeiro Naruhito terá lugar na quarta-feira.

Akihito anunciou em Agosto de 2016 que a sua idade e problemas de saúde o impediam de cumprir plenamente os seus deveres como imperador. Após esse anúncio na televisão, aconteceram uma série de decisões políticas para a sua abdicação, possibilidade que não estava contemplada no quadro legal então em vigor, até que uma lei específica foi aprovada nesse sentido.

O primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, anunciou hoje formalmente a abdicação do imperador Akihito e sublinhou a era de paz que o país tem experimentado nestas três décadas.
Shinzo Abe falou em nome do povo japonês no ato de abdicação de Akihito.

“O imperador, de acordo com a lei imperial especial, abdica hoje”, disse Abe na cerimónia. Na sua mensagem, o primeiro-ministro sublinhou ainda que Akihito “sempre quis a paz da nação e a felicidade do povo japonês”.

O chefe do Governo japonês lembrou o papel desempenhado pelo imperador Akihito e pela imperatriz Michiko para consolar os japoneses pelos desastres naturais que o país sofreu nos últimos trinta anos.

O príncipe herdeiro Naruhito subirá ao trono de crisântemo na quarta-feira e, numa cerimónia separada, herdará o privilégio imperial da espada e da joia, bem como os selos imperiais como prova da sua sucessão como o 126.º imperador do Japão.

30 Abr 2019

Imperador japonês Akihito abdica do trono para o filho mais velho Naruhito

[dropcap]A[/dropcap]o fim de 30 anos, o reinado do imperador japonês Akihito termina esta semana, quando abdicar em favor do filho mais velho, Naruhito, que se tornará o soberano da mais antiga monarquia reinante do mundo.

No dia 1 de Maio, às 00:00 locais, o Japão entra no ano 1 da nova era imperial “Reiwa” (“Bela harmonia”), após três décadas sob o império de “Heisei” (Conclusão da paz”).

Pela primeira vez em dois séculos, um imperador abdica do trono em vida, em virtude de uma lei de excepção escrita especificamente para Akihito, que em 2016 tinha expressado o seu desejo de se poder afastar de funções, por “não poder exercer de corpo e alma” as tarefas de imperador, com problemas de saúde.

Com 85 anos, Akihito deixa o trono ao seu filho mais velho, o príncipe herdeiro Naruhito, de 59 anos, historiador de formação e propenso a ignorar a tradição imperial rígida e os protocolos severos do Japão.

Naruhito promete ajudar o Japão a avançar para a modernização da mais antiga monarquia reinante do mundo, tornando-se o imperador número 126 a subir ao Trono do Crisântemo.

A biografia de Naruhito não é a mais ortodoxa para o padrão dos príncipes herdeiros do Japão, tendo sido criado pela mãe, Michiko, e não pelo pessoal do Palácio Imperial, e tendo estudado no estrangeiro, em vez de ficar pelos estabelecimentos de ensino japoneses, como era tradição.

Tal como o pai, Naruhito casou com uma plebeia, a princesa Masako, a quem tem protegido de críticas e ataques públicos, sobretudo na fase em que esta atravessou uma fase de doença prolongada de foro psicológico.

A figura do imperador do Japão foi forjada ao longo dos séculos, a partir da origem divina que simbolicamente se lhe associa, mas a história recente tem reafirmado a sua personagem como um símbolo de unidade do Estado, embora com funções políticas quase nulas.

Nem sequer naquilo que está associado ao regime imperial que protagoniza: quando o governo do Japão recentemente escolheu o novo nome para a época que terá início em 1 de Maio, “Reiwa” (“bela harmonia”), o imperador não foi tido nem achado.

Após a derrota do Japão na II Guerra Mundial, o novo papel do imperador ficou muito limitado, praticamente com valor simbólico. É o imperador que nomeia o primeiro-ministro, mas estritamente de acordo com a decisão do Parlamento.

“Segundo a Constituição, o imperador japonês é um símbolo, mas penso que este imperador já transformou o símbolo num ser humano”, defende Makoto Inoue, jornalista que há 15 anos cobre a agenda imperial para o jornal Nikkei.

O imperador que agora abdica, Akihito, teve uma educação bem mais tradicional que a do filho, conduzida por tutores imperiais, mas passou por experiências traumáticas, como quando teve de fugir da II Guerra Mundial, em criança, através das montanhas de Nikko.

Desde que foi nomeado imperador, após a morte do pai, em 1989, Akihito recusou sempre ser tratado como um “ser divino” e procurou humanizar o cargo que ocupou, lutando sempre pela imagem do Japão como um país pacífico, tendo mostrado remorso pelos ataques do exército imperial japonês, durante a II Guerra Mundial.

Tal como o filho que agora o sucede no cargo, Akihito também casou com uma plebeia, a imperatriz Michiko, que conheceu a praticar ténis, um dos seus desportos favoritos.

Ao filho, Naruhito, incutiu o gosto pelas viagens, convenceu-o a estudar em Oxford, em Inglaterra, e sempre acarinhou o perfil mais heterodoxo do herdeiro que agora assume o lugar de imperador.

Os analistas dizem que o novo imperador manterá a proximidade com as pessoas que o pai já tinha trazido para o trono e espera-se que ele preserve o espírito pacifista e de defesa da Constituição japonesa.

Quem lida com Naruhito de perto descreve-o como “sincero e atencioso” com quem o rodeia e muito interessado nas causas sociais e ambientais.

Mas os japoneses estão já preocupados com a sucessão da família imperial, já que Naruhito e Masako têm apenas uma filha, Aiko, de 17 anos, que pela sua condição feminina não poderá aceder ao trono, deixando o lugar para o próximo na linha de sucessão, Akishino, irmão mais novo de Naruhito, e o seu filho, Hisaito, de 12 anos, único neto de Akihito.

29 Abr 2019

Tóquio | Facas na secretária de neto do imperador japonês

As duas facas de cozinha estavam na secretária do príncipe Hisahito, de 12 anos, alegadamente deixadas por um individuo suspeito que foi visto a entrar na escola. A cerimónia de abdicação do imperador Akihito terá lugar esta terça-feira

 

[dropcap]D[/dropcap]uas facas de cozinha foram encontradas na secretária da escola do príncipe Hisahito, neto do imperador Akihito do Japão, tendo a presença de um homem suspeito sido detectada por câmaras de segurança, informaram sábado meios de comunicação social locais.

As autoridades aumentaram recentemente a vigilância em relação à família imperial japonesa, a poucos dias da abdicação do imperador Akihito, no trono há cerca de 30 anos.

Responsáveis da escola encontraram, na sexta-feira, as facas na secretária usada diariamente pelo príncipe de 12 anos, segundo revelou a rede pública de radiodifusão NHK e outros órgãos de comunicação social, citando investigadores, sob condição de anonimato.

O príncipe Hisahito, que começou a frequentar esta escola este mês, não estava na turma quando as facas foram lá deixadas lá.

Não foram reportados feridos, danos materiais ou ameaças, segundo a polícia, que, de acordo com os media, procura um homem de meia idade, vestido como trabalhador da construção civil, que entrou no perímetro da escola, usando um capacete, e foi registado por câmaras de segurança. Nem o porta-voz da polícia nem a escola comentaram esta informação.

Pouco significativo

Ameaças contra a família imperial são relativamente raras no Japão. Em 1975, Akihito foi quase atingido por um ‘cocktail Molotov’ em Okinawa, um importante campo de batalha da Segunda Guerra Mundial, onde havia um forte sentimento de hostilidade à família imperial.

O Japão está a preparar-se para a abdicação, na terça-feira, do imperador Akihito, o que acontece na família pela primeira vez em 200 anos.

O seu filho mais velho, o príncipe herdeiro Naruhito, de 59 anos, sucederá a Akihito no dia seguinte, marcando a transição para a era ‘Reiwa’ (“Bela Harmonia”).

O jovem príncipe Hisahito é filho do príncipe Akishino, o segundo filho do casal imperial e um dos quatro possíveis herdeiros do Trono do Crisântemo.

A mais velha família imperial ainda governante enfrenta o perigo de extinção, porque não reconhece às mulheres o direito de aceder ao trono, quando existem apenas quatro herdeiros masculinos.

Além dos príncipes Naruhito (59 anos) e de Akishino (53), são possíveis herdeiros o jovem príncipe Hisahito e o irmão do imperador Akihito, o príncipe Hitachi, actualmente com 83 anos.

29 Abr 2019

Igreja do Japão prepara-se para investigar alegados abusos sexuais

[dropcap]A[/dropcap] igreja católica no Japão está preparar uma investigação sobre alegados abusos sexuais contra menores cometidos por padres, incluindo acusações de há 20 anos, foi ontem anunciado.

A Conferência dos Bispos Católicos no Japão disse que criou um grupo em cada diocese para receber denuncias relacionadas com abusos sexuais, mas não adiantou mais detalhes sobre a investigação.

A conferência, sediada em Tóquio, informou que pesquisas anteriores encontraram dois casos notificados em 2002 e cinco em 2012, que não foram verificados.

Esses casos serão investigados, incluindo se os supostos abusadores foram punidos, que punição receberam e qual a resposta que os bispos deram às vítimas, disse conferência.

A decisão surge depois da cimeira sobre abusos realizada em Fevereiro por decisão do papa Francisco em resposta aos escândalos que envolvem o clero.

O papa Francisco deve visitar o Japão em Novembro, na primeira visita papal ao país desde João Paulo II em 1981.

A Conferência de Bispos Católicos do Japão disse ainda que numa pesquisa sobre assédio sexual em 2004 encontrou 17 casos de “contactos físicos coercivos” sendo algumas das vítimas crianças.

Um japonês de 62 anos denunciou recentemente que foi abusado sexualmente por um padre há décadas, quando frequentava uma escola católica no oeste de Tóquio tendo ainda a conferência conhecimento de outras denúncias de abusos em diferentes escolas católicas, mas a extensão do problema permanece desconhecida. A comunidade católica do Japão é de cerca de 440.000 pessoas.

12 Abr 2019

“Reiwa” é o nome da nova era que vai marcar reinado do imperador Naruhito

[dropcap]O[/dropcap] Governo japonês anunciou hoje que o nome da nova era que marcará o reinado do imperador Naruhito será “Reiwa”, uma combinação de dois caracteres inspirados pela poesia waka nipónica.

O termo é inspirado nos principais cânticos da colecção “Manyoshu” de waka, antiga poesia japonesa, compilada por volta do século VIII, e foi escolhido entre cinco possibilidades, anunciou em conferência de imprensa o porta-voz do Governo nipónico, Yoshihide Suga.

O nome “Reiwa” surge da combinação de dois caracteres que podem ser traduzidos como “agradável” ou “ordem” e “harmonia” ou “paz”, explicou Suga, que expressou o desejo de que o nome seja bem recebido pelo público e “profundamente enraizado” nas suas vidas.

A nova era vai começar a 1 de Maio, quando o príncipe herdeiro Naruhito, de 59 anos, assumir o papel de imperador após o pai Akihito abdicar a 30 de Abril, a primeira vez que tal sucede no Japão em mais de 200 anos.

O reinado de 85 anos do imperador Akihito durou três décadas, desde Janeiro de 1989, na chamada era “Heisei”, um termo formado por dois caracteres que juntos poderiam ser traduzidos como “alcançar a paz”.

Os nomes das épocas nipónicas anteriores eram “Meiji” (governo esclarecido) de 1867, quando o imperador Mutsuhito ocupava o trono; “Taisho” (grande legitimidade), de 1912, que correspondeu à era do imperador Yoshihito; e “Showa” (paz e harmonia) de 1926, durante a era do imperador Hirohito.

A escolha do novo nome, tal como o próprio anúncio, é um evento histórico para os japoneses, e resultou de uma reflexão de vários meses feita por uma comissão que integrou especialistas e líderes políticos.

“É um belo nome”, disse à emissora pública NHK o Prémio Nobel de Medicina, Shinya Yamanaka, que estava entre os nove membros da comissão.

O anúncio do nome da nova era foi transmitido em directo na televisão e foram instalados vários espaços públicos para que fosse possível à população assistir à transmissão por todo o país.

1 Abr 2019

O espelho dos outros

Acontece com frequência: a nossa imagem aos olhos dos outros pode influenciar mais o nosso comportamento do que a imagem que temos de nós próprios. Ou a imagem que temos da imagem que os outros têm de nós, para ser mais preciso. Vem isto a propósito do que se vende – ou não – nas chamadas lojas de conveniência japonesas, agora que se avizinham os grandiosos Jogos Olímpicos do Verão de 2020 e massivas quantidades de visitantes estrangeiros são esperadas no sempre distante país do sol nascente.

 As lojas de conveniência têm uma popularidade no Japão incomparável com o que passa em qualquer país europeu, ou mesmo asiático, onde geralmente também se encontra com facilidade este tipo de estabelecimento. O caso japonês não deixa de ser extremo, em todo o caso: na generalidade das zonas urbanas é possível encontrar uma destas lojas quase em cada quarteirão. Há excepções de vários tipos: havendo quarteirões onde não há lojas, também há outros onde coexistem várias, em geral pertencentes a diferentes cadeias, nacionais ou internacionais.

Independentemente da cadeia, as lojas tendem a ser bastante semelhantes: estão convenientemente abertas 24 horas por dia, 7 dias por semana, e vendem, como o nome sugere, o que pode fazer falta em qualquer momento, com uma variedade surpreendente: refeições prontas, frutas e legumes frescos, lacticínios, produtos de charcutaria, vinhos, uma vasta parafernália de outras bebidas, doces, pão, bolachas, gelados, detergentes vários, utensílios de limpeza, produtos de higiene pessoal, cosméticos, papel higiénico, guarda-chuvas, tabaco, ou mesmo algum vestuário de emergência, incluindo as camisas brancas com que grande parte dos homens japoneses se veste para ir trabalhar.

Um pouco mais surpreendente, pelo menos para os nativos de países com tecnologias digitais de utilização quotidiana aparentemente mais avançadas, como é o caso de Portugal, são alguns dos serviços prestados nestas lojas e que nós já transferimos quase completamente para os cabos das redes de informação: compra de bilhetes para espectáculos, pagamentos de impostos ou outras contribuições para instituições públicas também são maioritariamente feitos nestes estabelecimentos, igualmente equipados com anacrónicas máquinas de fotocópias, que no Japão continuam a consumir despropositadas quantidades de papel.

O assunto desta crónica é outro, no entanto. É que entre os produtos de extrema conveniência comercializados nestes estabelecimentos estão os jornais, revistas e colecções de manga tão populares na cultura japonesa. E entre estas revistas (de animação ou não) estão as publicações para adultos – na esmagadora maioria dos casos orientadas para o público masculino – cujas capas normalmente ostentam magníficas representações de voluptuosos seios femininos e cujos interiores estão invariavelmente repletos de pornografia explícita.

Não sendo estes conteúdos particularmente diferentes daquilo que se pode encontrar na literatura recreativa para adultos em qualquer outra parte do mundo, o que surpreende é a exposição: estas publicações partilham espaços relativamente exíguos com outros géneros, incluindo a literatura infantil, normalmente a escassos centímetros de distância. Não consta que desta ultra-exposição pornográfica tenha vindo grande mal ao mundo – ou pelo menos ao Japão. Na realidade, poucos ou nenhuns problemas são conhecidos em relação ao assunto – nem sobre a manifesta e permanente objectificação dos corpos femininos para entretenimento masculino, nem sobre o fácil acesso que as crianças japonesas podem ter às publicações (mesmo que por lei não as possam comprar).

Em todo o caso, as coisas vão mudar num futuro próximo: até ao início dos Jogos Olímpicos, dentro de pouco mais de um ano, as lojas de conveniência são obrigadas a deixar de comercializar este tipo de literatura, que passará a ser disponibilizada em outros circuitos. A razão é simples: aos olhos dos visitantes estrangeiros que hão-de vir, esta exposição da pornografia é inaceitável. Ou pelo menos parece ser essa a imagem que as autoridades japonesas têm da imagem que os estrangeiros podem vir a ter do Japão. Seja como for, as revistazinhas com generosas mamas nas capas terão que passar a ser vendidas em circuitos especializados. Tanta exposição pública não é conveniente.

22 Mar 2019

Branquear com sangue

[dropcap]O[/dropcap] castelo está cercado, aproxima-se o fim. O general Kurogane sobe aos cómodos reais para confrontar a Dama Kaede, astuciosa intriguista, cujas conjuras e ciladas, acrescidas de um sortilégio sexual, conduziram o clã Ichimonji à catástrofe iminente.

A câmara fixa-se nela e Kaede, niponicamente hierática, como deve ser a alteza sobretudo em face do veredicto, vai fitando um ponto infinito enquanto revela que o seu triunfo é inexorável assim alcançando a vingança por que tanto porfiara. Está iminente a aniquilação dos Ichimonji que décadas atrás haviam massacrado a sua família.

Kurogane desembainha a catana e ante o clamor de pânico das cortesãs, na parede para onde agora olhamos estampa-se um formidável jorro sangue. O realizador Akira Kurosawa oferece-nos alguns segundos de fascínio e silêncio para contemplarmos aquele esplendor vermelho.

De seguida o General Kurogane repta quem o quiser ouvir: “Preparem-se para morrer.” E parte para a batalha.

Ao longo de “Ran” o General Kurogane assassinara e cometera crimes irremissíveis porque a todos os valores sobrelevou o princípio da lealdade. Em nome dela permitiu-se executar as iniquidades que lhe foram encomendadas pelo seu Senhor; para não a desfalcar recalcou apreensões e dúvidas, comprometendo-se com franqueza em actos que sabia serem indecentes.

Mesmo que imperturbável e deixando connosco o encargo de ajuizar o que nos dava a ver, a câmara de Kusosawa, porque nada omitindo, foi-nos revelando a personagem do General Kurogane como sórdida e degradada. Um esbirro sempre teria o indulto da inconsciência e da subordinação, mas o braço direito do Senhor não tem como atenuar a sua parte de responsabilidade individual.

É inesperado, logo um golpe de génio, daqueles que desequilibram o escrúpulo do espectador, que no final de “Ran” Kurosawa conceda a Kurogane uma dádiva inestimável – a redenção. É, aliás, uma dupla e apoteótica oferta: primeiro a de acertar contas com a perfídia ao cortar o mal pela raiz acutilando a Dama Kaede, no que acrescenta mais uma grave culpa ao seu rol; mas a seguir a de resgatar a honra com uma morte em combate.

Aliás retrocedendo àquela cena capital nela descobrimos, porque só ali nos é dado saber, que afinal a odiosa Dama Kaede também agiu com abandono e sem cupidez, por motivos superiores ao seu interesse pessoal, consciente desde o início das suas maquinações de que, na melhor das hipóteses, trespassá-la-ia a lâmina de uma catana. Também ela agiu por fidelidade, neste caso à memória dos seus antepassados, desafrontando o ultraje com um castigo ainda maior do que o sofrido. Maior porque mais subtil do que a mera extinção olho por olho, dente por dente, da casa Ichimonji. A queda que ela provocou é antecedida por um apogeu de poder e força, angariados por uma sucessão de infâmias políticas, conjuras familiares e massacres militares. Não só ela fez com que os Ichimonji caíssem de mais alto como trabalhou para que merecessem a ruína.

Ou seja também com a Dama Kaede Kurosawa foi misericordioso. A economia narrativa de “Ran” ficaria estropiada se ela fosse retirada de cena de maneira inconclusiva, rendendo o seu desenlace à imaginação e à especulação dos espectadores, talvez a pior desgraça a que se pode condenar uma personagem. Esse martírio ficou reservado para o velho rei Hidetora cuja ponderação, equidade e candura no início do filme, ao dividir com isenção o reino pelos seus três filhos, desencadeou todos os tormentos e tribulações que fomos presenciando. Hidetora, o justo, acaba cego e só a tactear o vazio à borda de um precipício.

As culturas mais díspares e historicamente incomunicáveis, todas reconhecem o sacrifício da vida pela sorte das armas como um honroso resgate dos males antes praticados. “Ran” é assim um filme absolutamente japonês e absolutamente shakespeariano. A tragédia é inseparável do sangue – nos tempos de hoje talvez o elemento que mais repugna ao sentimentalismo e ao moralismo vigentes – e tem aqui como detonador a lealdade, pois é por via dela que se corre para a perdição.

Do elenco de virtudes cardinais a lealdade será a que mais a que mais sobressalta a ética com os seus dilemas, a que mais corrompe as outras virtudes e a que mais dano causa a quem a professa. Incubado nas decisões erradas que incauta e aleatoriamente por ela vamos tomando o vírus do fatalismo nela latente pode alastrar a peste da tragédia, esse ectoplasma que se apropria sem remédio de uma vida.

Pior do que a lealdade só a deslealdade.

8 Mar 2019

Tóquio | Tribunal concede liberdade sob fiança a ex-presidente da Nissan

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] tribunal distrital de Tóquio aceitou ontem o pedido de liberdade sob fiança do ex-presidente da Nissan Carlos Ghosn, noticiaram vários órgãos de comunicação social japoneses.

Detido há três meses na capital nipónica, Carlos Ghosn poderá sair em liberdade caso o Ministério Público japonês não apresente novo recurso.

O montante da fiança foi fixado em mil milhões de ienes (cerca de oito milhões de euros).

A aceitação do terceiro pedido de fiança de Ghosn surgiu um dia depois de um dos advogados ter afirmado estar confiante de que o antigo responsável da construtora automóvel Nissan ia conseguir ficar em liberdade.

O advogado recém-contratado, Junichiro Hironaka, é conhecido por ter conseguido que vários clientes tenham sido absolvidos no Japão, onde a taxa de condenações é de 99%.

Na segunda-feira, Hironaka afirmou ter proposto novas formas de monitorizar Ghosn após a libertação sob fiança, como vídeovigilância. Hironaka questionou também o fundamento da detenção de Ghosn, num caso que considerou “muito peculiar”, sugerindo que podia ter sido resolvido como um assunto interno da empresa.

No Japão, os suspeitos ficam em detenção provisória durante meses, frequentemente até ao início dos julgamentos. Os procuradores defendem que os suspeitos podem alterar provas e não devem ser libertados.

Os dois pedidos de fiança, apresentados pelos advogados de Ghosn, foram negados.

O empresário franco-brasileiro de origem libanesa Carlos Ghosn, de 64 anos, foi detido em Novembro em Tóquio por suspeitas de fraude fiscal e de quebra de confiança.

 

6 Mar 2019

Taipé | Taiwan defende diálogo com o Japão

[dropcap]A[/dropcap] Presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, defendeu a abertura de um diálogo com o Japão, apesar da inexistência de laços diplomáticos, face à crescente actividade militar da China.

Pela primeira vez, a governante expressou a “intenção de conduzir um diálogo directo com o Governo japonês sobre questões de segurança cibernética e segurança regional”, noticiou ontem o jornal local Taipei Times.

Tsai Ing-wen falava em entrevista ao diário japonês Sankei News, tendo reforçado depois os planos na sua conta oficial do twitter.

“Estou determinada a trabalhar com parceiros como o Japão na defesa dos valores partilhados. Enfrentamos uma avalanche de desinformação e notícias falsas com o objectivo de minar a democracia”, disse Tsai.

A Presidente avisou ainda o resto do mundo que nenhum país está isento de tais ataques.

“Hoje Taiwan está no centro das atenções. Amanhã será outro país”, disse, numa alusão à China, que já acusou, noutras ocasiões, de intimidação militar.

Tsai também procurou convencer a comunidade internacional a apoiar Taiwan face à pressão chinesa, apelando aos valores comuns da democracia e da liberdade.

“Taiwan é a prova de que o desenvolvimento democrático e económico andam de mãos dadas. A nossa ‘ilha da resistência’ é uma força para o bem do mundo e não há dúvida de que Taiwan pode ajudar a promover e salvaguardar a liberdade e a democracia”, defendeu.

4 Mar 2019

Mulheres de Conforto

[dropcap]F[/dropcap]aleceu Kim Bok-dong, uma das muitas mulheres de conforto do Exército Imperial Japonês, das poucas que viveu até aos 90 anos. Estima-se, com maior ou menor conservadorismo, que estas mulheres tenham existido às dezenas ou centenas de milhar naquilo a que chamavam ‘estações de conforto’ do exército japonês. Escusado será dizer que a expressão ‘mulheres de conforto’ é um infeliz eufemismo do tempo da II Guerra Mundial para nomear as mulheres que eram repetidamente violadas, violentadas e escravizadas.

As estações de conforto foram estabelecidas por todo o império com o propósito, dizem os historiadores, de confortar os soldados japoneses. Mas este é um conceito altamente contestado. A parte mais afectada afirma que os soldados japoneses raptaram raparigas e mulheres das colónias imperiais para fazer um trabalho que muitas prostitutas japonesas já se tinham voluntariado fazer, mas que, com o crescimento das tropas, sofriam de uma clara falta de pessoal, recorrendo, por isso, à escravatura sexual.

Os japoneses, por sua vez, discordam. Desde 1991 que as sobreviventes mulheres de conforto vieram a público com estes relatos de horror e desumanização para se confrontarem com muita resistência por parte do Japão em assumir a responsabilidade pelo que aconteceu – de para sempre afectar as vidas destas meninas e mulheres que julgavam ir trabalhar para fábricas de uniformes para ajudar nos esforços de guerra.

Não irei estender-me demasiado acerca do desenvolvimento deste conflito, parece-me, contudo, que o ponto mais importante desta tensão é que estas estações de conforto não são assumidas como uma política regulamentada pelo exército japonês – que tinham como intuito evitar o descontrolo total das tropas. Há quem afirme que depois do massacre de Nanjing às mãos dos japoneses, que levou à morte e violação em massa, que as estações de conforto seriam uma forma de controlar (1) a raiva militar, (2) a tensão sexual e (3) evitar espalhar doenças venéreas ao circunscrever o sexo violento a estes espaços onde – os homens punham-se em fila para repetidamente violar uma mulher.

Este esforço desmedido de desresponsabilizar os horrores de guerra japoneses faz-me lembrar algo: uma ideia verdadeiramente contemporânea que parece perseguir-nos cada vez que falamos de violência sexual.

As vozes que contestam um movimento de reparação pública a estas mulheres, tendem a proferir o que eu já estou bem farta de ouvir: que as vítimas não são vítimas. Tudo serve para justificar esta posição, ora porque as mulheres demoraram demasiado tempo para virem a público (demoraram 45 anos para verbalizar os horrores da guerra), ora porque as mulheres conforto, como prostitutas que eram, (supostamente) faziam dinheiro com isso. Parece-me que este cliché argumentativo está no meio de uma séria tensão diplomática que não só revela perspectivas ingénuas das formas da violência sexual em contexto de guerra, mas também revela os valores definidores de uma identidade colectiva e nacional. Um país como o Japão percebe o papel que teve no conflito armado, mas ainda existem realidades (verdades?) que ainda não foram integradas.
Kim Bok-dong morreu sem ouvir o que queria ouvir. Houve várias tentativas de reparações entre o Japão e a Coreia, mas Bok-dong não acreditou serem verdadeiramente honestas. Ela dedicou a vida a contar a sua história e a denunciar a violência sexual em contexto de guerra por este mundo fora – e certamente que, com alegria, percebeu que muitas e muitos ainda estão dispostos a lutar pela sua causa.

20 Fev 2019

Casais homossexuais processam Governo do Japão no Dia dos Namorados

[dropcap]T[/dropcap]reze casais homossexuais recorreram hoje aos tribunais japoneses, no Dia dos Namorados, para processarem judicialmente o Governo do Japão, contestando a constitucionalidade da rejeição no país do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Seis casais, segurando cartazes nos quais se podia ler “Casamento para todo o Japão”, entraram num tribunal de Tóquio para processar o Governo japonês, uma iniciativa que também se verificou nas cidades de Osaka, Nagoya e Sapporo.

Um dos queixosos, Kenji Aiba, ao lado do parceiro, Ken Kozumi, disse aos jornalistas que “lutaria esta guerra em conjunto com as minorias sexuais em todo o Japão”.

No processo, argumenta-se que a lei viola o direito constitucional à igualdade, num país em que se observa uma crescente aceitação pública da diversidade sexual e do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Os casais afirmaram querer que o Governo siga o exemplo de muitas outras nações de forma a garantir a liberdade conjugal.

Dez municípios japoneses chegaram a promulgar ‘decretos de parceria’ para casais do mesmo sexo para facilitar, por exemplo, o arrendamento conjunto de apartamentos, mas estes não são juridicamente vinculativos.

Os advogados dos queixosos adiantaram que os casos podem levar até cinco anos, ou mais, para serem decididos.

14 Fev 2019

Tóquio | Carlos Gohsn diz que Nissan está a “destruir a sua reputação”

O ex-presidente do grupo Nissan encontra-se aprisionado num centro de detenção em Tóquio. Está acusado de ter “conspirado para minimizar os seus ganhos cinco vezes entre Junho de 2011 e Junho de 2015”

[dropcap]C[/dropcap]arlos Ghosn, antigo presidente do grupo Nissan suspeito de falsificação de informação financeira e detido em Novembro em Tóquio, disse ontem que a Nissan está a “destruir a sua reputação”.

“O objectivo era claro e houve resistência desde o início”, disse Carlos Ghosn durante uma palestra num centro de detenção em Kosuge, em Tóquio, onde está detido desde 19 de Novembro.

Em entrevista à agência de notícias francesa France Presse e Les Echos no centro de detenção de Tóquio, Carlos Ghosn disse que está a ser “punido antes de ser condenado”.

Carlos Ghosn, que está detido há dois meses, disse sentir-se injustiçado.

“Não tenho telefone, nem computador, mas como posso defender-me? “, questionou durante sua primeira entrevista aos meios de comunicação não-japoneses desde sua prisão.

“Estou focado. Quero lutar para restaurar a minha reputação e defender-me de acusações falsas”, disse.

O ‘chairman’ (presidente do conselho de administração) e presidente executivo do grupo Nissan e da aliança Renault-Nissan-Mitsubishi, o empresário franco-brasileiro de origem libanesa Carlos Ghosn, de 64 anos, foi detido em Novembro em Tóquio por suspeitas de fraude fiscal.

Ghosn é acusado de ter “conspirado para minimizar os seus ganhos cinco vezes entre Junho de 2011 e Junho de 2015”, declarando uma soma total de 4,9 mil milhões de ienes (cerca de 37 milhões de euros) em vez de quase 10 biliões de ienes.

O grupo Nissan poderá igualmente estar sujeito a processos judiciais.

 

Culpas repartidas

O Ministério Público acredita, de acordo com a imprensa, que, se houver culpa, a responsabilidade também recai sobre a empresa, pois a mesma entregou às autoridades documentos financeiros imprecisos nos quais Ghosn escondeu uma parte significativa dos seus rendimentos.

Estas suspeitas que recaem sobre Ghosn colocam uma série de questões sobre o futuro da aliança Renault-Nissan-Mitsubishi (actual líder de vendas a nível mundial), processo que o próprio empresário franco-brasileiro liderou.

Além de presidente do grupo Nissan Motor, Goshn é também o homem forte das duas empresas que compõem a aliança com a Nissan, a Renault e a Mitsubishi Motors, e é considerado o homem de negócios estrangeiro mais influente no Japão.

Ghosn chegou à Nissan em 1999 como presidente executivo para liderar a recuperação do fabricante, com sede em Yokohama, depois de ter oficializado uma aliança com a francesa Renault.

1 Fev 2019

Japão | Shinzo Abe em Moscovo para discutir ilhas disputadas com Rússia

[dropcap]O[/dropcap] primeiro-ministro do Japão viajou ontem para Moscovo, em visita oficial, para tentar resolver o impasse sobre as ilhas Curilas, no Pacífico, disputadas entre os dois países há mais de sete décadas.

“As negociações com a Rússia estão pendentes há 70 anos e não serão fáceis”, disse Shinzo Abe aos jornalistas antes de embarcar no avião que o levará a Moscovo, onde se encontrará com o Presidente russo, Vladimir Putin, na terça-feira.

Moscovo e Tóquio estão há mais de sete décadas sem assinar o tratado de paz depois do conflito armado devido ao contencioso territorial sobre quatro ilhas, retiradas ao Japão pela então União Soviética.
“Quero falar honestamente com Putin para poder avançar o máximo possível na negociação do tratado de paz”, sublinhou o primeiro-ministro nipónico.

As negociações não se adivinham nada fáceis. Na semana passada, O ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergey Lavrov, insistiu que o Japão deve reconhecer que as disputadas ilhas Curilas, no Pacífico, são parte do território russo como ponto de partida para as negociações.

A declaração do ministro russo, depois de conversações com o seu homólogo japonês, Taro Kono, reflectem os esforços de Moscovo para moderar as expectativas japonesas de um acordo iminente.

22 Jan 2019

Brexit | Japão pede à UE e a Londres menor impacto possível na economia global

[dropcap]O[/dropcap] Governo japonês pediu ao Reino Unido e à União Europeia (UE) que tentem minimizar o possível impacto do ‘Brexit’ na economia global, horas depois do parlamento britânico ter chumbado o acordo negociado entre as duas partes.

Em conferência de imprensa, o porta-voz do governo nipónico reiterou a preocupação com que Tóquio “observa de perto” a chamada “crise do ‘Brexit’” [saída do Reino Unido da UE], agravada pela decisão tomada ontem pelo parlamento britânico.

O Japão “pediu repetidamente a ambas as partes para incluir os princípios de previsibilidade e estabilidade jurídica no processo de saída, com o objectivo de minimizar o impacto negativo sobre as empresas japonesas, sediadas no país, e sobre a economia global”, disse Yoshihide Suga.

O primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, transmitiu este pedido à homóloga britânica, Theresa May, numa cimeira bilateral realizada na semana passada durante uma visita ao Reino Unido.

O governo japonês “vai continuar a seguir os passos dados por ambas as partes e a oferecer assistência às empresas japonesas sediadas no Reino Unido”, sublinhou Suga.

Com mais de mil empresas, que empregam cerca de 150 mil pessoas, o Japão é o segundo maior investidor estrangeiro no Reino Unido depois dos Estados Unidos, pelo que Tóquio exigiu de Londres garantias de que estas empresas não serão prejudicadas durante o período de transição.

Ontem o Parlamento britânico rejeitou o acordo de saída do Reino Unido da UE negociado pelo Governo de Theresa May com Bruxelas, por 432 votos contra e apenas 202 a favor.

A dois meses e meio da data prevista para a saída britânica da UE, os deputados da Câmara dos Comuns rejeitaram o acordo de saída, apesar do último apelo feito pela primeira-ministra, imediatamente antes da votação, contra “a incerteza” que a rejeição do texto provocaria.

16 Jan 2019

Canadá interpela Japão sobre a “importância da conservação das baleias”

[dropcap]O[/dropcap] primeiro-ministro canadiano interpelou ontem o seu homólogo japonês, Shinzo Abe, sobre “a importante questão da conservação das baleias”, após Tóquio formalizar a retirada da Comissão Baleeira Internacional para retomar a pesca comercial em Julho.

O arquipélago asiático junta-se assim à Islândia e à Noruega, únicos países que praticam a caça de baleia para fins comerciais, e abriu caminho a duras críticas da comunidade internacional e das organizações defensoras dos direitos dos animais.

Segundo um comunicado ontem divulgado, durante uma conversa telefónica na segunda-feira à noite entre os dois dirigentes, Justin Trudeau “prometeu trabalhar com parceiros internacionais para proteger as espécies de baleias”.

O Japão anunciou a 26 de Dezembro passado a sua saída da Comissão Baleeira Internacional (IWC, na sigla em inglês), desafiando abertamente os defensores dos cetáceos, 30 anos após o fim oficial de caça às baleias, cuja população continua a diminuir.

Outra das questões discutidas entre ambos foi o comércio internacional, saudando a entrada em vigor, a 30 de Dezembro, do Acordo de Livre Comércio Transfronteiriço (IPPP, na sigla em inglês).

Trudeau e Abe também debateram a próxima cimeira do G20, que será realizada em Junho em Osaka, no Japão, com o primeiro-ministro canadiano a prometer que o Canadá “apoiará activamente o Japão para ajudá-lo a ter sucesso”.

Por fim, falaram sobre a “detenção de dois cidadãos canadianos na China, reiterando ambos a importância [da luta] pela Justiça e pelo Estado de Direito”, adianta o comunicado.

As autoridades chinesas mantêm há um mês detidos o ex-diplomata canadiano Michael Kovrig, contratado pelo ‘think tank’ Internacional Crisis Group e o construtor canadiano Michael Spavor, que mantém frequentes contratos com a Coreia do Norte, indiciados por ameaças à segurança do Estado.

Muitos observadores acreditam que as detenções são uma retaliação pela prisão, em Vancouver, do diretor financeiro da empresa Huawei, gigante de telecomunicações da China.

9 Jan 2019

Milionário japonês bate recorde de partilhas na rede social Twitter em três dias

[dropcap]U[/dropcap]ma publicação no Twitter do milionário japonês Yusaku Maezawa, na qual prometia dinheiro aos seus seguidores, tornou-se na mais difundida na história daquela rede social, depois de ultrapassar, em três dias, as 5,6 milhões de partilhas.

O empresário japonês, fundador e director-executivo da ZozoTown, uma plataforma de vendas online de artigos de moda, a maior do Japão, superou o recorde anterior obtido pelo norte-americano Carter Wilkerson, que atingiu as 3,5 milhões de partilhas em Abril de 2017.

“Darei um milhão de ienes a 100 pessoas em dinheiro”, escreveu Maezawa na sua publicação, pedindo-lhes que seguissem a sua conta e partilhassem a mensagem entre 5 e 7 de Janeiro. O milionário passou do meio milhão para 6,1 milhões de seguidores, algo que provocou críticas de vários utilizadores da rede social que o acusam de comprar seguidores.

No entanto, na sua mensagem, Maezawa disse que ofereceu o dinheiro como um gesto de “gratidão” aos consumidores pelos bons resultados de vendas obtidos pela ZozoTown em 2018. O milionário seleccionou os 100 vencedores hoje, como explicou em várias publicações na sua conta.

Em Setembro do ano passado, o director-executivo japonês atraiu a atenção mundial após ser escolhido pela empresa aeroespacial SpaceX, fundada pelo também milionário Elon Musk, para se tornar no primeiro turista espacial em 2023.

Segundo a revista Forbes, Maezawa é o 18.º homem mais rico do Japão, com uma fortuna avaliada em 2.700 milhões de dólares.

8 Jan 2019

Cinema | Início de 2019 celebrado com tributo à actriz japonesa Kirin Kiki

Kirin Kiki, a actriz japonesa que morreu no passado mês de Setembro, aos 75 anos, vítima de cancro, é homenageada pela Cinemateca Paixão no ciclo de cinema que vai abrir 2019. Já a partir de dia 1 vão ser exibidos quatro filmes em que Kiki é protagonista e entre eles está o vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes deste ano, “Larápios”

 

[dropcap]O[/dropcap] ano de 2019 abre na cinemateca paixão com um programa especial de dicado à actriz japonesa Kirin Kiki, falecida no passado mês de Setembro e uma das protagonistas do grande vencedor de Cannes deste ano “Larápios”

A homenagem tem início logo no dia 1, pelas 19h30 com a exibição de “An”, um filme de 2015 realizado por Naomi Kawase.

Uma presença assídua em Cannes, Naomi Kawase abriu o evento “Un Certain Regard” em 2015 com este drama gastronómico que conta a história de Sentaro. O protagonista vive uma vida tranquila cozinhando dorayaki – um pastel com recheio doce de pasta de feijão vermelho – de qualidade medíocre numa pequena pastelaria suburbana. Um dia, uma simpática idosa chamada Tokue (Kirin Kiki) começa a trabalhar na loja de Sentaro. Consigo, Tokue traz uma receita caseira do mesmo pastel. A dupla improvável acaba por estabelecer uma parceria de sucesso e por dar um novo sentido à vida de cada um. De acordo com a apresentação da Cinemateca Paixão “An” “é um gentil drama humanista, apresentando poeticamente as visões de Naomi sobre a vida e o mundo”.

A An segue-se, no dia 4 pelas 19h30, um dos filmes de referência de Hirokazu Kore-eda, “Depois de tempestade”. Nomeado para o Prémio “Un Certain Regard” no Festival de Cannes 2016, para o Melhor Cinematógrafo no Prémios de Cinema Asiático 2017 e para Melhor Filme no Festival Internacional de Cinema de Chicago 2016, a película traz a Macau mais um drama familiar.

Ryota, um escritor de renome e falido que se sustenta a ele e ao filho com um trabalho paralelo enquanto detective privado, após a morte do pai, consegue reconciliar-se com a sua mãe e com a ex-mulher. No apartamento onde vivia em criança, redescobre o passado da família e procura as suas origens. Kirin Kiki, é a matriarca Yoshiko, uma mulher idosa conhecida pelas tiradas sarcásticas e pelo olhar crítico ao mundo.

 

Ladrões premiados

O dia seguinte é o momento para ver o filme galardoado em Cannes este ano com a Palma de ouro e a última obra do realizador Hirokazu Kore-eda “Larápios”. Mais um drama familiar de Kore-eda que conta a história de uma família que sobrevive à conta de pequenos roubos. No entanto, após uma das suas sessões de furto, Osamu e o filho encontram uma menina, abandonada ao frio. De início relutante em dar abrigo à rapariga, a esposa de Osamu e matriarca da família concorda em tomar conta dela. Apesar de pobres, mal conseguindo o sustento com os furtos que fazem, parecem viver felizes e com a nova presença em casa começam a ser desvendados os elos que podem unir as pessoas, sendo ou não de sangue. De acordo com o realizador quando recebeu o prémio em Cannes, “existem formas variadas de formação familiar que não passam por laços de sangue, mas que envolvem algum ideal de honra”, disse Kore-eda. “Existe intolerância demais neste mundo. Eu quis filmar a caridade”, apontou.

A fechar a homenagem à actriz japonesa, fica a exibição de “Crónica da minha mãe” de Masto Harada.

Em 1975, o escritor Inoue Yasushi compilou três contos autobiográficos num único romance que segue a sua relação, por vezes tensa, com a mãe que sofre de demência, durante os últimos anos da sua vida. O filme é uma adaptação do romance que traz temas como o abandono, o ressentimento e o declínio, e em que Kirin Kiki interpreta a idosa que se debate com a lenta perda das memórias que amava.

28 Dez 2018

As memórias de um homem “com uma lucidez extraordinária”

[dropcap]O[/dropcap] livro de Morishima Morito foi publicado pela primeira em 1950 e, até ao ano passado, não havia qualquer tradução para outra língua estrangeira. Coube à japonesa Yuko Kase realizar a tradução da obra. Paulo Ramos, editor do livro, afirma que o embaixador “revela uma lucidez extraordinária e mostra-se contrário à política seguida pelo Governo militar do seu país”.

Com António de Oliveira Salazar discutiu inúmeros assuntos durante o seu mandato como embaixador. “Durante estas reuniões foram debatidas duas questões principais: a ocupação de Timor-Leste pelos Japoneses e a situação em Macau”, disse Paulo Ramos ao HM.

Em 1946 Morito acaba “desiludido com a maneira como o Governo geria a diplomacia e o Ministério dos Negócios Estrangeiros” e acaba por abandonar a carreira diplomática. Enveredou pela política nipónica, tendo sido deputado pelo Partido Socialista japonês. Morishima Morito faleceu em 1975.

“Pearl Harbor – Lisboa – Tóquio: memórias de um diplomata” teve uma primeira edição sem fins comerciais, sendo que a segunda edição está disponível em livrarias, mas num circulo restrito. A chegada da obra às livrarias de Macau ainda carece de confirmação.

“Este é daqueles livros de que me orgulho mesmo muito de ter editado: pelo conteúdo, pelas revelações e, acima de tudo, pela perspectiva de um grande diplomata sempre consciente de que o seu país caminhava para o abismo”, concluiu Paulo Ramos.

27 Dez 2018

A morte do cônsul e a quase ocupação de Macau pelos japoneses na II Grande Guerra

Em 1945 o cônsul japonês Yasumitsu Fukui, destacado para Macau, foi assassinado por um gangue chinês. A morte esteve ligada a uma tentativa de ocupação de Macau pelos japoneses, que iria servir para a defesa de um possível ataque dos americanos via Hong Kong. Este e outros relatos constam nas memórias do embaixador japonês em Lisboa durante a II Guerra, Morishima Morito, recentemente traduzido para português, e que poderá chegar às livrarias

[dropcap]N[/dropcap]o tempo em que Macau sofria as consequências da chegada de milhares de refugiados de Hong Kong e da China, devido à ocupação japonesa nos dois territórios, ocorreu um assassinato que poderia ter causado um incidente diplomático entre o Japão e Portugal e que esteve ligado a uma vontade dos japoneses de ocuparem Macau.
A história é revelada no livro de memórias do embaixador japonês em Lisboa durante a II Guerra Mundial, Morishima Morito, de nome “Pearl Harbor – Lisboa – Tóquio: Memórias de um diplomata”, e que foi traduzido para português em finais do ano passado. Pedro Ramos, responsável pela publicação e editor da Ad Litteram, garantiu ao HM que já está em conversações com Macau para que a obra possa estar disponível no território.
No livro, ao qual o HM teve acesso, lê-se que “em 1945, no início do inverno, o cônsul Yasumitsu Fukui, acreditado em Macau (…) foi assassinado a tiro por um gangue chinês”, começa por contar Morishima Morito, que enviou posteriormente um telegrama ao Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) do Japão.
Neste telegrama pedia-se a “emissão formal de um pedido de desculpas por parte do Governo português a propósito deste incidente”, além de uma mobilização “de todos os meios possíveis de busca e detenção dos autores e das pessoas responsáveis pelo ataque e puni-los quando forem presos”. Nesse documento pedia-se também a Lisboa o pagamento de uma indemnização, um valor que seria abatido na dívida cobrada pelo Governo de António de Oliveira Salazar aos japoneses por terem ocupado Timor-Leste.
A ideia para esse acordo partiria do próprio Morishima Morito. “Cheguei à conclusão de que, neste caso, não se deveria exigir uma indemnização ao governo português, porque haveria fortes probabilidades de tal exigência o levar a apresentar pedidos de indemnização pelos actos de violência cometidos pelas tropas nipónicas em Timor.”
Nessa fase, o embaixador chegou a dialogar com Teixeira de Sampaio, secretário-geral do MNE em Portugal, para se dar início às conversações. Quando a II Guerra Mundial chegou ao fim, “o Governo português estava inclinado a propor uma indemnização fosse abatida nas indemnizações de vidas pelo Japão a propósito dos actos que os seus militares tinham cometido em Timor”.

Os motivos políticos

No meio deste processo, chegou-se à conclusão que a morte do cônsul japonês tinha ocorrido por questões políticas, uma vez que este não tinha inimigos no território, recordou Morito nas suas memórias.
“Fukui tinha o hábito de participar todos os dias numa sessão matinal de ginástica organizada pela comunidade nipónica. Nesse dia, ao regressar da sessão, foi assassinado por chineses que o atacaram e balearam.”
Na altura o Governo de Macau chegou a elaborar um relatório sobre este assassinato, que acabou por ser classificado como “um crime comum”, uma vez que ocorreu “durante um trajecto da sua vida particular [de Fukui]”.
“Num caso destes a responsabilidade das autoridades só pode ser invocada por negligência, por exemplo, se o cônsul tivesse sido ameaçado e prevenido as autoridades, pedindo-lhes expressamente protecção, e estas tivessem decidido não tomar quaisquer medidas de vigilância. Porém, não foi este o caso.”
Morito escreve que o cônsul era uma “pessoa cordial e leal que se dava muito bem não só com os colegas e residentes japoneses mas também com a população chinesa em geral”, pelo que “não era possível que alguém tivesse qualquer tipo de rancor contra ele”. Neste sentido, o embaixador defendeu que existiram “motivos políticos bastante fortes” para a morte.
Esses motivos são relevados no mesmo capítulo, sobre uma “conspiração” que estaria a ser preparada pelos japoneses para uma ocupação sobre Macau.
Depois deste incidente, Teixeira de Sampaio avisou os japoneses de que estariam a ocorrer situações que violavam a soberania do Estado português. No telegrama, lia-se que “em Macau, as forças japonesas não avisaram o Governador do território e destacaram o coronel Sawa (chefe dos serviços secretos do exército) que está a formar pessoal”.
Lia-se também que “é do conhecimento público que o coronel Sawa tem andado a prender e a executar chineses sem ter poderes para tal”. “No entanto, tendo em conta a situação actual das relações bilaterais entre as duas nações, o Governo de Macau está a dar um consentimento tácito a estes incidentes frequentes.”
Perante isto, Morito percebeu “pela primeira vez que estava desvendado o mistério do assassinato do cônsul Fukui”, uma vez que depois da sua morte ocorreram “disparos contra as instalações do Consulado-geral do Japão, trocas de tiros entre japoneses e chineses e outros confrontos”.

A tentativa de ocupação

As memórias de Morishima Morito revelam que chegou a existir “um plano do exército japonês para ocupar Macau”, o que levou Teixeira de Sampaio a enviar um telegrama onde solicitava “muito discretamente a atenção das autoridades nipónicas”.
O referido telegrama dava conta de que, em Macau, os japoneses não teriam avisado o Governo do destacamento do coronel Sawa, à data chefe dos serviços secretos do exército japonês, e que estaria a formar pessoal. “É do conhecimento público que o coronel Sawa tem andado a prender e a executar chineses sem ter poderes para tal”, o que, na visão de Teixeira de Sampaio, se tratava “obviamente de uma violação da soberania do Estado português”.
“Tendo em conta a situação actual das relações bilaterais entre as duas nações, o Governo de Macau está a dar um consentimento tácito a estes incidentes frequentes”, escreveu o secretário-geral do MNE. Para Morito, “estava desvendado o mistério do assassinato do cônsul Fukui”, uma vez que, depois da sua morte, ocorreram mais incidentes tal como “disparos contra as instalações do Consulado-geral do Japão, trocas de tiros entre japoneses e chineses e outros confrontos”.
Começa-se então, a pensar na ocupação do pequeno território a sul da China. “Começava a ser discutida com mais insistência a possibilidade do envio de um destacamento militar para Macau, cujo objectivo seria a protecção dos cidadãos japoneses residentes, pois não se podia contar apenas com o Governo de Macau para manter a segurança pública na eventualidade de uma ofensiva militar norte-americana em Hong Kong.”
De seguida, impôs-se um bloqueio a Macau, uma acção que “provocou um grande sofrimento a cerca de 300 mil chineses, cuja vida quotidiana se tornou bastante difícil devido ao aumento dos preços, sobretudo dos produtos alimentares, e à escassez de alimentos no mercado”.
Na visão de Morishima Morito, “poder-se-ia concluir, perante as circunstâncias, que a crise diplomática entre o Japão e Portugal não era tanto a questão de Timor, mas centrava-se nos problemas em torno de Macau”.
O embaixador sugeriu depois o encerramento “imediato da agência do coronel Sawa” e o “levantamento imediato do bloqueio a Macau”. Só depois dessa decisão é que as autoridades japonesas nomearam Masaki Yodogawa como novo cônsul, uma vez que este “dominava bem a língua portuguesa e acompanhara o observador português a Timor pouco tempo antes”. No final da II Guerra, Sawa seria acusado de crimes de guerra e executado pelos chineses.

27 Dez 2018