José Simões Morais h | Artes, Letras e IdeiasNingbo e a cidade de Liampó [dropcap style=’circle’]N[/dropcap]a província de Zhejiang encontramos a cidade de Ningbo, situada no Delta do Rio Yangtzé. Com uma estratégica posição na costa marítima a meio da China, usufrui de três portos, o Beilun banhado por um canal de águas profundas, o Zhenhai e o antigo porto de Ningbo, equipado para petroleiros e outros navios de grande porte. Se a razão da visita é ser Ningbo a última cidade do Grande Canal e encontrar-se na lista das cidades chinesas ligadas à antiga Rota Marítima da Seda, confesso trazer a curiosidade desperta pela Peregrinação de Fernão Mendes Pinto e Tratado das Coisas da China do Frei Gaspar da Cruz, cujas informações recolhidas em meados do século XVI, me colocavam a imaginação às voltas ao pretender entender como seria Liampó, “estabelecimento mercantil nas ilhas de Shuang-hsü”, como o classifica Rui Loureiro numa das notas redigidas no Tratado das Coisas da China. Por isso, aqui não vamos escrever sobre a actual Ningbo e seus arredores, nem da cidade esplendorosa desde a dinastia Tang até à Song do Norte, que com o nome de Mingzhou foi um dos principais portos da costa chinesa, o que continuou na dinastia mongol dos Yuan. Com a abertura dos caminhos terrestres, a cidade começou a perder importância e caída no esquecimento, quando em meados da dinastia Ming, o , dominicano Frei Gaspar refere, os portugueses “a invernar nas ilhas de Liampó e estarem nelas tanto de assento e com tanta isenção que lhes não faltava mais que ter forca e pelourinho”. Tal estabelecimento inicial dos mercadores portugueses em Liampó terá ocorrido em 1540 e segundo Rui Loureiro, Liampó tanto designava nas nossas fontes quinhentistas a cidade de Ningpo e área circundante, como o estabelecimento português que floresceu entre 1540 e 1549 em Shuang-hsü, uma das ilhas do arquipélago de Chu-san, no litoral fronteiro a Ningpo. Complementa Victor F. S. Sit, ” Em Shuangyu, os portugueses envolveram-se com piratas chineses e japoneses (wokou) em negócios ilícitos de elevados lucros, dando, assim, origem a uma colónia portuguesa, a segunda maior da Ásia, de importância apenas inferior à de Malaca. Lá viviam 10 mil comerciantes, entre os quais 1200 portugueses. Havia mil casas, uma municipalidade, uma assembleia, um tribunal, várias igrejas e um hospital. Esta povoação mais parecia um estado dentro da China”. A muy nobre e sempre leal cidade de Liampó Ainda antes do estabelecimento em Macau dos portugueses, segundo Montalto de Jesus refere, “da leitura de outro relato contemporâneo, a famosa Peregrinação de Mendes Pinto, ressalta que Liampó foi sempre considerada como a mais bonita, a mais rica e a melhor abastecida colónia que os portugueses tiveram na Ásia – um município oficializado como cidade portuguesa e intitulado, nos testamentos e escrituras, Esta muy nobre e sempre leal cidade de Liampó, pelo Rey nosso Senhor, como se se situasse em Portugal. A colónia atingiu o auge da sua prosperidade depois da descoberta do Japão (ocorrida entre 1542 e 1543). O comércio, calculado em mais de três milhões de cruzados de ouro, rendia três ou quatro vezes o capital investido. A comunidade era de mil e duzentos portugueses e mil e oitocentos orientais, que por ali prosperavam sem ser molestados pelos piratas. Ao Sul, no entanto, os portugueses eram muitas vezes vitimados e o comércio entre Malaca e Liampó disso se ressentia fortemente. Certa vez calhou a António de Faria, que arruinado resolveu vingar-se. Com o apoio dos seus companheiros equipou uma expedição contra o seu saqueador, o famoso corsário Coja Acém, terror da costa chinesa. A partir do Sião, Faria esmagou muitos piratas poderosos – e uma das vitórias impressionou tanto os chineses que estes lhe enviaram uma deputação, oferecendo-lhe um tributo de vinte mil taéis e solicitando a sua protecção como rei dos mares. Ele de boa vontade aceitou e emitiu salvos-condutos, pondo como condição que os portugueses fossem tratados de forma fraternal pelos chineses sempre que se encontrassem.” (…) “a expedição teve a seguir a fatalidade de naufragar numa ilha deserta – e a perseguição teria terminado aí não fosse o apresamento de um barco que casualmente lá aportou para se restabelecer de água. Então, com a frota de um pirata chinês, Faria terá eventualmente conseguido alcançar, derrotar e matar Coja Acém e a sua horda, não dando quartel nem aos feridos e doentes encontrados em terra. A frota vitoriosa, carregada de ricos espólios, perdeu-se parcialmente num tufão”. Tal terá ocorrido por volta de 1541 e é preciso lembrar que por essa altura, e desde 1521, após a primeira das duas batalhas navais ocorridas entre navios mercantes portugueses e a armada chinesa, as autoridades chinesas decretaram a expulsão dos portugueses e por isso, eram estes ali considerados piratas. Os piratas japoneses Tributários da China no século V a.n.E., durante a dinastia Zhou do Leste, os japoneses ao longo dos tempos até à dinastia Ming continuaram a receber do erudito país constantes influências, tanto culturais como religiosas, de onde lhes veio na dinastia Tang, o Budismo, o modelo com que estruturaram a sua hierarquia Imperial, a arquitectura das casas e muitas outras influências. Já na dinastia Yuan, por os japoneses não quererem em 1266 ser tributários da dinastia mongol, em 1274 e 1281 foram invadidos pelas tropas de Kublai Khan. Nessas duas vezes, na primeira invasão os 30 mil mongóis e coreanos foram repelidos por uma tempestade e na última, com 140 mil soldados, “ao fim de dois meses de luta, nova tempestade – Kamikaze, vento divino – dispersa a frota invasora. Novamente Kubilay se prepara para tomar as ilhas, organizando um quartel-general para o ataque em 1293. A sua morte em 1294 susta esta tentativa. O regente dos Hojo, mantém, no entanto, o alerta militar até 1314”, segundo Gonçalo Mesquitela. Estas tentativas mongóis de invasão levaram os japoneses à construção de embarcações, ficando assim guarnecida a capacidade marítima do Japão. Anteriormente e desde longo tempo, “o comércio exterior japonês estivera entregue a navegadores coreanos e chineses. A ameaça mongol, como dissemos, desenvolveu a classe marítima nipónica. Nas décadas que se lhe seguiram, instituíram-se numerosas comunidades japonesas na costa, (…), aventurando-se depois no mar da China”, como refere Mesquitela. E com ele continuando, “Nos princípios do século XIV, os japoneses começaram as actividades de pirataria e saque das costas, tendo daí advindo para estes barcos japoneses o nome de Wako, oriundo da bandeira invocadora do deus da Guerra que ostentavam. Este carácter de pirata resultava também da clandestinidade a que as autoridades da Coreia e da China obrigavam o comércio marítimo, considerado indesejável, pelo que o pretendiam suprimir ou, pelo menos, restringir fortemente”. Logo desde o início da dinastia Ming, em 1373 o Imperador Hong Wu (1368-1398) “mandava ao Japão dois monges como seus enviados, pedindo que cessassem as actividades Wako contra a navegação e as costas chinesas”, Mesquitela e continuando com a sua ideia, em 1401 o Japão tornou-se de novo tributário da China, prometendo acabar com os wako a troco de uma viagem de dez em dez anos. Nesse decénio houve seis. “Com um acordo comercial mais liberal, recomeçou o comércio em 1432, sob a mesma base de uma embaixada decenal, mas com mais navios”. Por essas ligações de barco receberam então os japoneses a influência chinesa nas artes e na técnica. Navegação marítima interdita Após a chegada da última das sete viagens do Almirante Zheng He, em 1433 o Imperador Ming, Xuande (Zhu Zhanji, 1425-35), “desencorajara abertamente quaisquer ligações marítimas de chineses com o estrangeiro, instituindo penas severas para os infractores, que, no entanto, nunca deixaram de se multiplicar”, segundo Rui Manuel Loureiro. E continuando com Frei Gaspar: “E ainda ao longo da costa, nem de uma parte para outra na mesma China, lhe é lícito ir sem certidão dos loutiás da terra donde partem, na qual se relata para onde vai e o negócio a que vai, e os sinais de sua pessoa e a idade que tem. Se não leva esta certidão é degradado para as partes fronteiras”. (Existiam os passaportes internos para os chineses viajarem dentro na China). “O mercador que leva fazenda leva certidão da fazenda que transporta e como pagou direitos dela. Em cada alfândega que há em cada província paga uns direitos, e não os pagando, perde a fazenda e degradam-no para as partes fronteiras. Sem embargo das sobreditas leis, não deixam alguns chineses de navegar para fora da China a tratar; mas estes não tornam mais à China. Destes vivem alguns em Malaca, outros no Sião, outros em Patane e assim por diversas partes do Sul estão espalhados alguns destes que saem sem licença. Pelo que destes que já vivem fora da China, alguns tornam em seus navios a navegar para a China debaixo do amparo dos portugueses. E quando hão-de despachar os direitos de seus navios, tomam um português seu amigo a quem dão algum interesse, para que em seu nome lhes despache os direitos. Alguns chineses, desejando ganhar o remédio para sua vida, saem mui escondidos nestes navios destes chineses a contratar fora e tornam mui escondidos que o não saibam nem seus parentes, porque se não divulgue e não incorram na pena que os tais têm. Pôs-se esta lei porque achou el-rei da China que a muita comunicação das gentes de fora lhe podia ser causa dalguns alevantamentos, e porque muitos chineses, com achaque de navegarem para fora, se faziam ladrões e salteavam as terras de longo do mar”, segundo escreveu o Frei Gaspar da Cruz. Foi após os problemas ocorridos entre 1521 e 1522 e sobretudo pelos desmandos de Simão de Andrade, que levaram à expulsão dos navegantes portugueses da costa chinesa, que estes chineses a viver fora da China os encaminharam “a que fossem a Liampó fazer fazenda, porque não há naquelas partes cidades nem vilas cercadas, senão muitas e grandes aldeias ao longo da costa, de gente pobre, a qual folgava muito com os portugueses, porque lhes vendiam seus mantimentos, com que faziam seu proveito. Nestas aldeias eram estes mercadores chineses que com os portugueses navegavam aparentados e por serem conhecidos recebiam ali por sua causa melhor os portugueses, e por eles negociaram com os mercadores da terra trouxessem suas fazendas a vender aos portugueses. E como estes chineses que andavam entre os portugueses eram os que terçavam (interceder a favor) entre os portugueses e os mercadores da terra nas compras e vendas, tinham deste negócio mui grande proveito. Os loutiás pequenos de longo do mar recebiam também mui grandes proveitos deste trato, porque recebiam grossas peitas de uns e doutros, pelos deixarem contratar e lhes deixarem trazer e levar as fazendas. Pelo que esteve este trato entre eles muito tempo encoberto d’el-rei e dos loutiás grandes da província. Depois de se haverem feito por algum tempo assim encobertamente as fazendas em Liampó, foram-se pouco a pouco estendendo os portugueses e começaram a ir fazer fazenda ao Chincheo e às ilhas de Cantão. E também já outros loutiás, pelas peitas, os iam consentindo por todas as partes, pelo que chegaram alguns portugueses com a contratação até além de Nanquim, que é já muito longe de Cantão, sem nunca el-rei ser sabedor deste trato. Sucederam as contratações de maneira que começaram os portugueses a invernar nas ilhas de Liampó”, Tratado das Coisas da China de Frei Gaspar da Cruz. Em 1542/3 chegaram os portugueses ao Japão e “Liampó tornou-se numa importante base comercial para os Portugueses nas viagens para o Japão, que aí desafiavam todas as ordens proibitivas em vigor para o comércio externo. Um incipiente comércio popular, no dizer dos governantes, e o comércio clandestino, agravaria ainda mais o problema da pirataria japonesa”, segundo referem Jin Guo Ping e Wu Zhiliang.
Joana Freitas China / Ásia MancheteJapão | Ataque com faca a centro de deficientes deixa duas dezenas de mortos Satoshi Uematsu decidiu tirar a vida a 19 pessoas e esfaquear mais de duas dezenas. O jovem tinha defendido anteriormente que o Japão deveria permitir a eutanásia e que o seu desejo era que os deficientes desaparecessem deste mundo. As doenças mentais são “altamente estigmatizadas” no país [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]caso está a chocar o Japão e não é para menos. Um ataque levado a cabo por um jovem de 26 anos foi considerado como o mais letal desde a II Guerra Mundial: pelo menos 19 pessoas morreram e 20, entre 45, ficaram gravemente feridas. As vítimas não só eram deficientes mentais que habitavam num centro de apoio, como viviam num centro onde o perpetrador tinha trabalhado. Satoshi Uematsu entrou armado com uma faca no Centro Tsukui Yamayuri En, eram 2h30 da manhã no país nipónico. O jovem de 26 anos tinha trabalhado precisamente no Centro, localizado na cidade de Sagamihara, um subúrbio de Tóquio, e com capacidade para 150 utentes. Uematsu entregou-se à polícia depois do ataque e declarou-se culpado. Mas também explicou o que o fez tirar a vida a 19 pessoas e ferir mais de 40. “As vidas das pessoas com múltiplas deficiências são extremamente difíceis e, por isso, o meu objectivo é conseguir um mundo em que essas pessoas possam receber eutanásia, com o consentimento do seu tutor”, escreveu o homem numa carta entregue a um deputado em Fevereiro. No documento, Satoshi Uematsu manifestava ainda a intenção de “matar 470 deficientes pelo bem do Japão”, segundo as autoridades locais. A carta levou a que as autoridades alertassem para o risco de um incidente destes ter lugar. O homem foi, então, submetido a testes médicos e internado num hospital psiquiátrico, por ser considerado perigoso. A 2 de Março teve alta, após 12 dias de internamento, porque os psiquiatras concluíram que tinha melhorado e que já não representava perigo. As autoridades não tinham voltado a receber queixas relacionadas com o seu comportamento. Antes disso, Satoshi Uematsu tinha trabalhado no Centro Tsukui Yamayuri En, de onde se despediu em Fevereiro do ano passado, três anos depois de ter sido contratado. Premeditado? O jovem, que não tinha antecedentes criminais ou de qualquer tipo de delinquência, entregou-se à polícia depois do crime, confessando que seria melhor que “os deficientes desaparecessem deste mundo”. Ao todo, as autoridades japonesas confirmaram a morte de 19 pessoas e falam em 45 vítimas de ferimentos – metade delas com lesões graves. As vítimas mortais tinham entre “os 18 e os 70 anos”. Dez eram homens, nove mulheres. Uematsu, carregava consigo uma saca com facas e outros objectos afiados, alguns com marcas de sangue. A polícia, até ao fecho desta edição, ainda procurava uma justificação formal para o ataque, mas o desejo manifestado pelo jovem – de que o Governo japonês deveria permitir a eutanásia para os deficientes – é, quase de certeza, o motivo que levou ao ataque. O jovem forçou a entrada no espaço através de uma janela, que partiu com um martelo. O porta-voz do Governo japonês, Yoshihide Suga, considerou o “incidente extremamente trágico e chocante”, depois de ter descartado ligações ao terrorismo islâmico. O primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, lamentou a morte dos deficientes e afirmou que tem de “se procurar a real causa deste crime”, comprometendo-se a que “o Governo vai esforçar-se por isso”. Não é ainda claro se Uematsu agiu pela ideia de misericórdia ou por preconceito. Se, por um lado, o jovem defendia a eutanásia dos deficientes “se autorizada”, por outro, declarações de que queria que os deficientes desaparecessem deste mundo e mensagens na sua conta do Twitter dão a ideia de um ataque premeditado. “Não sei se é certo, mas devo actuar. Fui aconselhado a reformar-me voluntariamente, mas poderei vir a ser preso, de qualquer forma”, escreveu em dois posts nas redes sociais, em Fevereiro deste ano. Na terça-feira, uma nova nota chegou à sua conta do Twitter: “pela paz no mundo, meu lindo Japão” fazia acompanhar-se de uma “selfie escura”, como assegura a imprensa japonesa. Quando o sol não nasce para todos – Pessoas com doenças mentais são “altamente estigmatizadas” no país Apesar de não se saber se o caso de ontem está ligado ao preconceito, relatórios sobre a saúde no país do sol nascente mostram que a doença mental ainda é altamente estigmatizada no Japão. Um documento de 2013 a que o HM teve acesso, intitulado “Review of Mental Health in Japan”, indica isso mesmo. “Apesar do conhecimento sobre as doenças mentais, estudos mostram que, no geral da população japonesa, apenas algumas pessoas aceitam que estes doentes possam recuperar. Uma personalidade fraca é muitas vezes tida como a base para as doenças mentais e, mais do que isso, a maioria das pessoas mantêm uma distância grande dos indivíduos com doenças mentais”, pode ler-se. Além da socialização – e convém referir que doenças como a depressão são consideradas maleitas mentais -, mais de 60% dos japoneses diz que nunca empregaria uma pessoa com este tipo de problema. Quase 80% dos profissionais considera que as pessoas com doenças mentais não têm capacidades para viver sozinhas e o estigma, refere o jornal Japan Times num artigo sobre o caso, é ainda maior porque também a população opta pelo internamento destes doentes “demasiado cedo”. “O estigma face às doenças mentais é enorme no Japão, não é o pior do mundo mas é muito elevado. No Japão, as pessoas que são doentes mentais são-no, aos olhos da população, não por factores biológicos, mas porque as pessoas é que não querem mudar, são más e têm uma personalidade fraca.” Tabus e demónios É um tabu discutir a doença, afirma o relatório, até porque o japonês é visto como um cidadão que tem de contribuir para a sociedade e que tem, por isso, um certo valor. Kazuhiro Soda, um realizador de renome na área do documentário no Japão, pegou precisamente nestas questões. O próprio realizador “mudou a sua forma de pensar sobre a doença”, explica o Japan Times. “Mudou a minha imagem. Pensamos neles como pessoas demoníacas, assustadoras. Mas, durante um período de tempo, fui um deles e não era um monstro”, disse, admitindo que tinha sofrido de depressão. Um estudo do Ministério da Saúde japonês indica que, pelo menos, 24% da população sofre de doenças mentais. Ainda assim, a vergonha persiste e, consequentemente, a taxa de suicídio entre estas pessoas é “extremamente alta”. O pior, mas não o único Assassinatos em massa são algo raro no Japão, relembra a imprensa nipónica. Contudo, e apesar de considerado um dos países mais seguros do mundo, o país do sol nascente já foi testemunha de alguns ataques mortais com recurso a armas brancas. Em 2001, oito crianças morreram e 19 ficaram feridas, quando um homem entrou à força na sua escola. Em 2008, sete pessoas são mortas por um homem que não só lançou um camião contra elas, na rua, como as esfaqueou a seguir. Num autocarro, em 2010, um homem desempregado decidiu vingar-se, esfaqueando dez pessoas.
Hoje Macau China / ÁsiaJapão | Caminho aberto para a reforma da Constituição [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] vitória conquistada pelo partido do primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, e os seus parceiros nas eleições da Câmara Alta, realizadas no domingo, abre caminho à sua intenção de reformar a Constituição. Segundo os resultados, o Partido Liberal Democrata (PLD, no poder) conseguiu ampliar a confortável maioria de que dispunha no Senado, a par com os parceiros de coligação governamental, o partido budista Novo Komeito, com o qual também domina a Câmara Baixa da Dieta (o parlamento do Japão). Nas eleições parciais de domingo estavam em jogo metade dos 242 assentos da Câmara Alta, tendo o PLD aumentado a sua representação até 121 deputados, enquanto o Komeito alargou a sua até aos 25, informou a cadeia televisiva pública NHK. Ambos os partidos acumulam assim 146 assentos (contra os 135 que detinham anteriormente), aos quais se somam mais de uma dezena de deputados da Iniciativas de Osaka e de outros partidos e candidatos independentes favoráveis à reforma da Constituição que o partido de Shinzo Abe quer impulsionar. Esta clara vitória concede maior margem a Abe para continuar a sua estratégia de reforma económica, conhecida como “Abenomics”, e para prosseguir com a controversa alteração do artigo pacifista da Constituição que prevê um aumento das competências no domínio da Defesa. Carta branca “O meu Governo recebeu o mandato para continuar em frente com a ‘Abenomics’”, afirmou o primeiro-ministro, em entrevista à NHK, após serem conhecidos os primeiros resultados, sem deixar de fazer referência à reforma constitucional almejada. Este “não foi um dos temas de debate” nas eleições, disse Abe, indicando, porém, que a comissão parlamentar responsável pelo assunto vai discutir, a partir do Outono, “os detalhes e os artigos concretos que se podem alterar” na Constituição. “A reforma da Constituição é a maior aspiração do partido [PLD] desde a sua fundação”, frisou o primeiro-ministro conservador, em declarações reproduzidas pelo jornal Nikkei. O Executivo de Abe já conseguiu aprovar, em 2014, uma reinterpretação do artigo 9.º da Constituição, que impedia o país de usar a força para resolver conflitos internacionais, e em Setembro último levou adiante um pacote legislativo com medidas para exercer o chamado direito à “autodefesa colectiva”. Trata-se da mais importante e polémica reforma militar no país asiático desde o final da II Guerra Mundial, que foi aprovada sob forte protesto da oposição e de parte da sociedade civil, por se considerar que vulnera o espírito pacifista da Magna Carta. Agora, Shinzo Abe pode aproveitar o facto de os partidários da reforma dominarem dois terços das duas câmaras do parlamento para ir mais além e introduzir outras emendas, já que tem vindo a defender que a Constituição japonesa se encontra desfasada, dado o actual panorama regional, em que a China tem conquistado cada vez mais peso militar e em que a Coreia do Norte prossegue com o seu programa nuclear e de mísseis. A legislação japonesa estipula ser necessário o apoio de dois terços dos deputados das duas câmaras e uma maioria simples em referendo para alterar a Constituição, o que fez com que o texto nunca tenha sido mudado desde que entrou em vigor, em 1947.
Hoje Macau China / ÁsiaBrexit | Japão estuda ajudas até 88.000 milhões de euros [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] governo japonês estuda um pacote de ajudas que poderá alcançar até 10 biliões de ienes (88.000 milhões de euros) para mitigar os efeitos do “Brexit” sobre as empresas e a economia nipónica. A medida foi debatida ontem no seio de uma reunião do Conselho de Política Económica e Fiscal em que participou o primeiro-ministro, Shinzo Abe, o ministro das Finanças, Taro Aso, e o governador do Banco do Japão (BoJ), Haruhiko Kuroda. Segundo adiantou a agência Kyodo, esse pacote seria dotado com um montante de entre 5 e 10 biliões de ienes (entre 44.000 milhões e 88.000 milhões de euros), a ser aprovado após as eleições do Senado, no próximo dia 10 de Julho. Contudo, alguns analistas financeiros ou membros do partido no poder (Liberal Democrata, PLD) insistiram que a verba deve ser muito maior para não comprometer o ritmo de recuperação da terceira economia mundial. Juros baixos O pacote de estímulo contempla mecanismos para mitigar os efeitos da valorização do iene – consequência mais imediata do “Brexit” – e o possível agravamento do ambiente empresarial para as companhias japonesas com operações no Reino Unido. O pacote contempla, de momento, planos de financiamento com taxas de juro muito baixas para as pequenas e médias empresas através da estatal Corporação Financeira do Japão. “Devemos tomar todas as medidas possíveis para prevenir todo o impacto negativo na economia nipónica, especialmente no que se refere às pequenas e médias empresas”, insistiu ontem o primeiro-ministro, após o encontro. Também está a ser estudada a possibilidade de o Banco de Cooperação Internacional do Japão expandir as suas linhas de crédito em divisas estrangeiras para grandes empresas que operem fora do arquipélago. Ao mesmo tempo, segundo as informações aventadas, aprovar-se-ão subsídios para empresas que não levem a cabo despedimentos, estando também em análise a eventual distribuição de vales de desconto para que os turistas que visitam o Japão não sofram com a grave valorização da moeda japonesa. Com mais de 1.300 empresas em solo britânico (40% das quais manufactureiras), o Japão é o segundo maior investidor estrangeiro no Reino Unido, a seguir aos Estados Unidos.
Hoje Macau China / ÁsiaContestado protesto do Japão a aproximação de vaso de guerra [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Ministério da Defesa da China contestou o protesto formal do Japão devido à recente incursão de uma fragata militar chinesa perto das águas das disputadas ilhas Diaoyu conforme informava ontem o jornal oficial China Daily. “As Diaoyu e as suas ilhas adjacentes são parte do território chinês e a navegação de navios de guerra na sua jurisdição é razoável e legítima”, assinalou a instituição militar em resposta aos protestos oficiais de Tóquio. A fragata ficou a cerca de 38 quilómetros das ilhas Diaoyu na madrugada de quinta-feira, mantendo-se nessas águas durante aproximadamente uma hora antes de regressar à costa chinesa. Imediatamente depois de o navio ter sido avistado pelo contratorpedeiro japonês Setogiri, o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros nipónico, Alitaka Saiki, convocou o embaixador chinês em Tóquio, para lhe transmitir um protesto oficial. Navios da guarda costeira chinesa navegaram nos últimos anos com frequência pela zona, mas esta foi a primeira vez que uma incursão envolveu um barco militar. O Ministério da Defesa japonês também informou que foi detectada a presença de três navios militares russos numa área contígua às Diaoyu precisamente no momento em que o barco chinês navegava na zona. Histórias e discórdias A disputa territorial entre a China e o Japão em torno das Diaoyu tem décadas, mas agravou-se em Setembro de 2012, depois de Tóquio ter anunciado a compra de três dos cinco ilhotes do pequeno arquipélago, de apenas sete quilómetros quadrados, administrado, de facto, pelo Governo japonês. O arquipélago desabitado, mas potencialmente rico em recursos minerais, fica no Mar da China Oriental, a cerca de 120 milhas náuticas de Taiwan, que também reclama a sua soberania, e a 200 milhas náuticas de Okinawa, no extremo sul do Japão.
Hoje Macau China / ÁsiaJapão protesta aproximação de navio de guerra chinês às Senkaku [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Governo japonês apresentou ontem um protesto formal junto do Executivo de Pequim após a aproximação de uma fragata da marinha chinesa às disputadas ilhas Senkaku, a primeira incursão do tipo. O vice-ministro dos Negócios Estrangeiros nipónico, Akitaka Saiki, convocou o embaixador chinês em Tóquio, Cheng Yonghua, ao qual apresentou o protesto e transmitiu a sua preocupação relativamente à aproximação do navio de águas territoriais que o Japão considera suas, informou a diplomacia japonesa. O diplomata Cheng Yonghua defendeu, por seu lado, que a navegação do barco é totalmente justificável dado que Pequim sustenta que as ilhas Senkaku – chamadas de Diaoyu pela China e administradas de facto por Tóquio – são parte do seu território, explicaram fontes próximas do assunto à agência Kyodo. O contratorpedeiro japonês Setogiri confirmou que na madrugada de ontem uma fragata da marinha chinesa penetrou em águas contíguas aos ilhotes e permaneceu na zona durante quase três horas sem chegar a entrar em águas que o Japão considera suas. Navios da guarda costeira chinesa navegaram no passado com frequência pela zona, mas esta é a primeira vez que uma incursão envolve um barco militar. O Ministério da Defesa japonês também informou ontem que foi detectada a presença de três navios militares russos numa área contígua às Senkaku precisamente no momento em que o barco chinês navegava na zona. A disputa territorial entre a China e o Japão em torno das Senkaku/Diaoyu tem décadas, mas agravou-se em Setembro de 2012, depois de Tóquio ter anunciado a compra de três dos cinco ilhotes do pequeno arquipélago, de apenas sete quilómetros quadrados, administrado, de facto, pelo Governo japonês. O arquipélago desabitado, mas potencialmente rico em recursos minerais, fica no Mar da China Oriental, a cerca de 120 milhas náuticas de Taiwan, que também reclama a sua soberania, e a 200 milhas náuticas de Okinawa, no extremo sul do Japão.
Hoje Macau China / ÁsiaJapão | China expressa preocupações sobre derramamento nuclear [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] China está muito preocupada com as consequências do acidente nuclear ocorrido em 2011 em Fukushima e pediu que o governo japonês tome medidas de acompanhamento oportunas, disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Hua Chunying. A China espera que o Japão tome medidas efectivas para proporcionar informações oportunas, completas e precisas à comunidade internacional e proteja o ambiente oceânico, disse Hua em conferência de imprensa. A operadora da central, a Tokyo Electric Power Co., admitiu pela primeira vez na última segunda-feira que a sua insistência em descrever a tragédia como “dano de um reactor nuclear” nos últimos cinco anos havia “escondido a verdade”. O radioquímico marinho Ken Buesseler do Instituto Oceanográfico Woods Hole dos Estados Unidos disse que as consequências do acidente nuclear de Fukushima foram sem precedentes pois mais de 80% das substâncias radioactivas derramadas escoaram para o mar. A porta-voz chinesa disse que seu país espera que o Japão mantenha um alto sentido de responsabilidade para seu próprio povo, os povos dos países vizinhos e a comunidade internacional, acrescentando que a China deseja se comunicar com as partes envolvidas, incluindo a República da Coreia. A China também pediu que a Agência Internacional da Energia Atómica (AIEA) reforce o monitoramento e a avaliação da água radioactiva, disse Hua. Após um terramoto seguido de tsunami em 2011, o Ministério das Relações Exteriores chinês advertiu sua população que seja prudente sobre viagens às áreas do desastre, segundo a porta-voz, dizendo que a advertência continua vigente.
Hoje Macau China / ÁsiaJapão | Rapaz sai do hospital após ser abandonado numa floresta [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] rapaz de sete anos que sobreviveu durante quase uma semana após ser abandonado pelos pais numa floresta teve ontem alta do hospital, acabando com um drama que cativou o Japão e acendeu o debate sobre disciplina infantil. A polícia disse que os pais não vão ter nenhuma consequência por terem abandonado Yamato Tanooka como castigo por atirar pedras, apesar da revolta pública generalizada. Yamato estava muito alegre quando saiu do hospital municipal de Hakadate no norte da ilha de Hokkaido. Com um boné preto de basebol, parou a sorrir e acenou à multidão de jornalistas e curiosos. Segurava uma bola de basebol feita em papel que tinha mensagens de apoio escritas. Quando lhe perguntaram o que queria fazer, disse: “Basebol!”. Sobre se queria voltar à escola, respondeu com entusiasmo: “Quero ir!”. Depois de alguns minutos, que incluíram aplausos, o seu pai levou-o para uma carrinha e foram embora. Processo disciplinar O rapaz sobreviveu durante seis noites sozinho depois dos pais o terem deixado na estrada de uma montanha, no dia 28 de Maio, perto de bosques onde existem ursos. Muitos japoneses ficaram indignados com o casal, que disse ter forçado o filho a sair do carro para lhe dar uma lição depois de ele ter atirado pedras a carros e a pessoas. O pai disse que voltou atrás cinco minutos depois para o ir buscar mas não o encontrou. O caso acendeu o debate no Japão sobre disciplina parental. Algumas pessoas pediram compreensão para os pais, mas a maioria condenou a atitude excessiva. “Não vamos considerar isto um caso criminal”, disse à AFP um porta-voz da polícia de Hakkaido, acrescentando que o caso seria apenas encaminhado para a segurança social. Toru Numata, um advogado que lida com casos violência doméstica e abuso, disse à AFP: “Considerando os factores por detrás do caso, as hipóteses de tornar o caso processável são muito pequenas”. Numata disse que o foco seria provavelmente a saúde mental do rapaz e o possível trauma do episódio. Depois de Yamato ter deixado o hospital, as redes sociais celebraram a sua recuperação, e uma pessoa escreveu no Twitter: “Que bom que ele foi salvo… Dêem-lhe muitos beijos”. Mas alguns mostraram-se incomodados com a grande cobertura dos media. “Os media precisam de andar atrás dele?”, escreveu um utilizador. “Era melhor deixarem-no em paz”. A equipa de salvamento e os soldados passaram dias a vasculhar as florestas da montanha depois de Yamato ter desaparecido. A criança foi finalmente descoberta na passada sexta-feira, abrigada numa cabana de um campo de treino militar a cinco quilómetros do sítio onde foi abandonada. Yamato estava desidratado e foi levado para o hospital. A polícia interrogou-o durante uma hora no hospital, na segunda-feira, acompanhado pela mãe e pelos médicos, informou o jornal Tokyo Shimbun. O diário citou o que o rapaz disse à polícia: “Eu andei sozinho e não encontrei ninguém”, acrescentando que às vezes parava para descansar e chegou à cabana quando estava escuro. Yamato manteve-se quente ali, durante as noites frias, ao dormir entre dois colchões. Bebeu água de uma torneira, mas não tinha nada sólido para comer. O pai, Takayuki Tanooka, de 44 anos, disse na segunda-feira que pediu desculpa ao filho e que o rapaz o perdoou. “Eu disse-lhe: ‘O pai fez-te passar por um período difícil. Desculpa’”, disse Takayuki à rádio TBS. “E depois, o meu filho disse: ‘Tu és um bom pai. Eu desculpo-te’”, acrescentou Tanooka.
Hoje Macau China / ÁsiaPequim pressiona Tóquio contra ideias de militarismo Aproveitando a vista de Obama a Hiroxima, a China aproveitou para dizer ao Japão para não pensar em militarismos de novo pois só trazem sofrimento. A visita do Presidente americano, entretanto, está a ser utilizada para retomar as ideias de desnuclearização global A China instou o Japão a não tomar o caminho do militarismo de novo, disse o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros esta quarta-feira durante o seu comentário à visita que o presidente Barack Obama fará a Hiroxima. “Esperamos que, ao convidar outros líderes a visitarem Hiroxima, o Japão mostre ao mundo que nunca mais vai seguir pelo caminho do militarismo, facto este que infligiu forte sofrimento ao seu próprio povo, aos povos dos países vizinhos e ao resto do mundo” disse o porta-voz Lu Kang em conferência de imprensa. “As duas bombas atómicas que os Estados Unidos lançaram sobre Hiroxima e Nagasaki antes do final da segunda Grande Guerra Mundial esmagaram as ilusões militaristas dos japoneses de uma vez por todas, causando enormes perdas humanas”, disse Lu. Os civis japoneses que sofreram com as bombas nucleares merecem toda a nossa simpatia, disse ainda. “Uma importante lição que a segunda Grande Guerra nos deu é que devemos usar a história como um espelho, prevenir que a tragédia da guerra aconteça novamente e fortalecer a ordem internacional do pós-guerra,” acrescentou Lu. Reavivar a desnuclearização A viagem a Hiroxima do presidente Barack Obama, é uma oportunidade para reavivar o debate sobre o desarmamento nuclear no mundo, disseram nesta quarta-feira as autoridades da cidade. Obama poderá perceber pessoalmente o impacto que o bombardeamento nuclear de 1945 teve sobre a cidade, explicaram aquelas fontes oficiais. A 27 de Maio, Obama ficará na História como o primeiro Presidente americano em exercício a visitar Hiroxima, anunciou na terça-feira a Casa Branca, salientando, todavia, que o objectivo não é apresentar desculpas por uma decisão tomada por Harry Truman há 71 anos. Obama, que viajará ao Japão para uma cimeira do G7, visitará o local onde ocorreu o primeiro bombardeamento nuclear da história acompanhado do primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe. “Espero que aqui, em Hiroxima, Obama proponha medidas concretas na direcção de um mundo sem armas nucleares”, declarou a presidente da câmara de Hiroxima, Kazumi Matsui. Aproximadamente 140.000 pessoas morreram devido à bomba nuclear lançada no dia 6 de Agosto de 1945 pelos Estados Unidos às 8h15 locais. Dezenas de milhares morreram pela explosão da bola de fogo e outras devido aos ferimentos e doenças provocados pelas radiações nas semanas, meses e anos posteriores.
Joana Freitas Manchete SociedadeII Guerra | Macau comemora 70 anos. Investigadores divididos com feriado Macau comemorou ontem os 70 anos do final da Segunda Guerra com uma mensagem dirigida aos idosos e aos jovens. Wong Sio Chak assegura que é importante que se perceba a história para valorizar Macau como é, mas especialistas dividem-se sobre a implementação deste dia como feriado [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s 70 anos do fim da II Guerra Mundial foram ontem assinalados na China (ver página 12) e Macau não escapou às celebrações. Por cá, há muito que se faz anunciar a data que, em 2014, se tornou feriado para comemorar o Dia Nacional da Vitória da China na Guerra de Resistência contra a Agressão Japonesa, sendo que numa das praças principais da cidade, o Leal Senado, enormes cartazes celebram “a vitória do povo chinês na guerra contra a Japão” e a “vitória mundial contra o fascismo”. Para Wong Sio Chak, Secretário para a Segurança, o dia foi também marcado em Macau para “endereçar aos soldados e ao povo da Pátria o maior reconhecimento pela excelência dos históricos contributos e heróicos sacrifícios que protagonizaram”, bem como para relembrar os compatriotas “inocentes que pereceram” e apresentar aos mais velhos cidadãos de Macau agradecimentos pela prestação do apoio e da ajuda aos soldados na Guerra contra o Japão. Provas irrefutáveis No discurso da cerimónia, Wong Sio Chak disse que, apesar de terem passado 70 anos, as provas dos actos violentos dos agressores são irrefutáveis e incontestáveis e relembrou que, por cá, a constituição de grupos de apoio ao continente foi algo bastante comum. “Durante a Guerra, para ajudar aos compatriotas da China continental submetidos aos sofrimentos extremos, os cidadãos de Macau participaram activamente no ensejo de salvação da Pátria, estabelecendo [por vontade própria] associações aglutinadoras do amor à Pátria e desencadeando acções de grande envergadura para a sua salvação. Todo o povo, independentemente do seu extracto social, dedicou-se e contribuiu generosamente para o financiamento da guerra e muitos jovens, que ao tempo viviam uma vida caracterizada por uma estabilidade raramente encontradas nessa época, regressaram à China continental e correram para a linha da frente para servir e participar naquela contenda bélica, acontecendo que muitos deles resultaram gloriosamente feridos ou morreram heroicamente.” Wong Sio Chak disse ainda esperar, através das comemorações, que os jovens possam retirar lições. “Temos de aproveitar este dia comemorativo para veicular, ano após ano, aos nossos descendentes, as humilhações e sofrimentos a que foram submetidos os antepassados há 70 anos, sendo que não nos move o ódio, mas sim a missão de lhes lembrar as lições que podemos retirar desta guerra, para que aprendam com a história e jamais permitam que tal volte a acontecer”, frisou o Secretário, explicando que a ideia não é “hipervalorizar a história mas sim para que os jovens sintam o ambiente de estabilidade, paz e desenvolvimento em que vivemos”. Estranho, mas entranhado Apesar de Macau ter sido neutro, recebeu meio milhão de refugiados e atravessou um período de grande dificuldade em que muitos passaram fome. No entanto, foi também um território povoado por “milícias pró-japonesas”, responsáveis pelos conflitos e maus-tratos que o exército nipónico não podia realizar, como explica à agência Lusa o jornalista e investigador João Guedes. A contradição de sentimentos em relação à proclamação deste feriado, tanto na China, como em Hong Kong e Macau, é salientada por quatro especialistas ouvidos pela Lusa. Se por um lado, explicam, persiste uma memória dolorosa acerca da presença japonesa em todo o território chinês, por outro, esta conflitua com a atracção dos chineses pelo Japão contemporâneo, cultura, produtos e gastronomia. “Ninguém do Governo disse que [a criação deste feriado] está relacionada com as tensões actuais. Dizem que tem que ver com a importância de lembrar a história. Claro que fazer este tipo de declaração é já uma indicação de que está, sim, relacionado com tensões actuais”, comenta Barry Sautman, académico da Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong, que investiga questões relacionadas com o nacionalismo chinês. “Quando se tem uma grande parada militar e centenas de milhares de espectadores a assistir é uma grande oportunidade de passar uma mensagem política”, comenta. You Ji, académico da Universidade de Macau especializado em política externa chinesa, é um entusiasta do feriado: “Ele existe para se lembrar que se mataram pessoas a sangue frio. Acho que é uma boa lição sobre o certo e o errado. Mesmo que as pessoas não leiam livros, nem participem nas actividades, acabam por pensar nestas coisas”. O investigador acredita que, tal como defende o Governo chinês, o Japão não efectuou um “sincero e adequado” pedido de desculpas pelas “atrocidades” da guerra, e que é por isso que a China “não consegue virar a página”, ao contrário da Europa.[quote_box_right]“Temos de aproveitar este dia comemorativo para veicular, ano após ano, aos nossos descendentes, as humilhações e sofrimentos a que foram submetidos os antepassados há 70 anos”, Wong Sio Chak, Secretário para a Segurança[/quote_box_right] A parafernália comemorativa – cujos cartazes foram fotografados e reproduzidos nas redes sociais – gerou, em Macau, alguma estranheza, em parte devido à linguagem utilizada. You Ji admite o seu “potencial” de desconforto, mas considera, no entanto, que é “difícil condenar que se use este tipo de linguagem porque nos corações [dos chineses] há feridas que ainda não foram curadas”. Bill Chou, politólogo do Instituto de Educação de Hong Kong e antigo docente da Universidade de Macau – de onde saiu depois de acusar a instituição de perseguição política – lembra que “estas comemorações não são um plano do Governo de Macau, que está apenas a organizar um programa de uma autoridade superior”. O investigador alerta para o facto de a história ser pouco debatida em Macau, algo que não é tão gritante no território vizinho: “A maioria das pessoas de Macau nasceu na China, é de uma geração que não foi educada com factos históricos, mas apenas com propaganda”. “Ao nível civil [em Macau], acho que as pessoas não estão realmente comprometidas com isto, o que se verifica pela forte presença nos restaurantes japoneses e pelo interesse pela cultura japonesa”, comenta Bill Chou. You Jia discorda: “Temos de distinguir os dois fenómenos. As pessoas de Macau, e até da China, não detestam os japoneses, basta olhar para os números do turismo. Distinguem a história do presente”. O Japão ocupou uma parte da China, desde 1931 até ao fim da guerra. Razões históricas e disputas territoriais têm intensificado o nacionalismo nos últimos anos. Pequim e Tóquio disputam, por exemplo, a soberania das ilhas Diaoyu ou Senkaku, no Mar da China Oriental. O evento de ontem contou com a presença de cerca de 440 personalidades, entre as quais o sub-director do Gabinete de Ligação do Governo Central da RPC na RAEM, Yao Jin, sub-comissário do Ministério dos Negócios Estrangeiros na RAEM e Cai Siping, director do departamento político de Guarnição em Macau do Exército de Libertação do Povo Chinês, Zhang Jian.
Hoje Macau China / ÁsiaJapão pede investigação de espionagem [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, pediu ontem ao Presidente norte-americano, Barack Obama, para investigar a suposta espionagem por parte da Agência de Segurança Nacional (NSA, em inglês) ao Governo de Tóquio e a várias entidades e empresas nipónicas. Abe transmitiu o pedido a Obama durante uma conversa ao telefone mantida ontem, informou o ministro porta-voz do Executivo japonês, Yoshihide Suga, em conferência de imprensa. O primeiro-ministro também solicitou ao Presidente dos Estados Unidos que tome “acções apropriadas” sobre a suposta espionagem, enquanto Obama manifestou as suas desculpas relativamente ao caso, disse Suga. “Se for verdade, a nossa relação de confiança pode sair danificada”, disse o ministro porta-voz em declarações reproduzidas pela agência Kyodo. No final de julho, o portal WikiLeaks publicou uma série de documentos em que assegura que a NSA espiou o Governo e várias empresas do país asiático. Além de relatórios, o portal fundado por Julian Assange compilou uma lista de 35 alvos japoneses de “alta prioridade” para interceptar telefonicamente, da qual figuram o Governo, o Banco do Japão, vários ministérios e grandes grupos como a Mitsubishi. Segundo o Wikileaks, as escutas remontam até 2006, altura em que o actual primeiro-ministro, Shinzo Abe, governava pela primeira vez. As informações obtidas “demonstram um conhecimento pormenorizado de decisões internas do Japão sobre questões como as importações de produtos agrícolas e os diferendos comerciais, as posições japonesas no ciclo de negociações multilaterais de Doha da Organização Mundial de Comércio, sobre energia nuclear e emissões de gases com efeito de estufa”, de acordo com o Wikileaks.
Andreia Sofia Silva Perfil PessoasYujin Katsube, jornalista: “Interessa-me o futuro desenvolvimento de Macau” [dropcap style=’circle’]E[/dropcap]m 1997 ficou para a história a visita oficial da Princesa Diana a Angola, para conhecer de perto o drama das minas de guerra e as vítimas feitas ao longo destes anos. Na sua casa, em Quioto, a visita também ficaria para sempre na mente de Yujin Katsube. Este jornalista japonês, residente em Macau, já então queria escrever histórias e ajudar as pessoas, mas a visita da “Princesa do Povo” acabaria por ser determinante na sua escolha do percurso. Actualmente residente em Macau, Yujin Katsube é editor do órgão de informação “The Macau Shimbun”, virado para o público japonês que quer conhecer mais sobre Macau. Actualmnte sente-se a concretizar o sonho de uma vida, mas não esquece o momento em que, no final da década de 90, se decidiu pelo estudo da língua portuguesa. Hoje, com um sorriso tímido, lá vai dizendo algumas palavras da língua de Camões, depois de ter esquecido muitas outras. “Os japoneses sentem-se muito próximos à língua portuguesa, porque mantemos uma longa amizade desde os tempos dos Descobrimentos. Quando andava na escola secundária na minha cidade, Quioto, já sonhava em ser jornalista. Para aumentar os meus conhecimentos decidi aprender uma língua e cultura estrangeira. Quioto é a antiga capital do Japão e mantém um estilo de vida mais tradicional e conservador, então senti que seria muito difícil concretizar os sonhos lá. Decidi ir viver para Tóquio e tirar o meu curso superior”, conta ao HM. A decisão de aprender português teve muito a ver com o seu pai, professor e auto-didacta da cultura pop dos Estados Unidos. “Perguntei-lhe que línguas é que deveria aprender, e ele recomendou-me as românicas. Disse-me que o inglês era muito popular e que não era nada de especial, e eu estava muito interessado na história portuguesa, especialmente a época dos Descobrimentos e o futebol, então pensei que se aprendesse português teria mais oportunidades de me tornar jornalista.” Estudou na Universidade Sofia, fundada pelos jesuítas, onde aprendeu o idioma com professores de Portugal e do Brasil. Assim que acabou o curso começou a trabalhar na área editorial, a editar uma revista e a coordenar um conjunto de guias de viagem, que incluíam viagens a Macau e a Hong Kong. A paixão por Macau foi imediata. Visitou o território em 2006 e não mais o largou. Hoje é casado com uma residente local e tem um filho, que já domina o cantonês. “Tornei-me um grande fã de Macau e quis conhecer mais sobre a cidade. Em 2007, a empresa onde trabalhava planeou o lançamento de uma nova revista em Macau, Hong Kong e China. Procuravam alguém que coordenasse o projecto, tive muita sorte.” No “The Macau Shimbun”, Yujin Katsube garante que não escreve apenas sobre o sector do jogo, “mas também do turismo e da cultura de Macau, para que o público japonês tenha mais interesse. Através do meu trabalho penso que posso construir uma ponte entre Macau e o Japão.” “Enquanto jornalista interessa-me o futuro desenvolvimento de Macau e quero ver com os meus próprios olhos o desenvolvimento dos actuais projectos que estão a ser feitos no Cotai. Também me interessa o que a China espera de Macau enquanto plataforma entre a China e os países de língua portuguesa. É um papel único que Macau pode fazer”, conta ao HM. O filho de Yujin acabou de entrar na escola e Macau é o lugar onde se sente em casa. Os pais preferem a pequenez do território ao frenesim constante de Hong Kong, mas já tomaram a decisão de ir ficando, consoante a vontade do filho. “Espero que o meu filho possa ter amigos e oportunidades para ficar mais ligado à cultura portuguesa. Estou à procura de uma equipa de futebol onde ele possa jogar. Os jogadores portugueses sempre atraíram a atenção dos japoneses e se o meu filho jogar à bola com eles, vou ficar muito feliz”, remata.