Patuá | Segunda edição de curso arranca amanhã no CCCM

Começa esta quinta-feira a segunda edição do curso de patuá promovido pelo Centro Científico e Cultural de Macau, e que conta com menos de uma dezena de alunos. Joaquim Ng Pereira, um dos formadores, acredita que a sobrevivência do dialecto se faz cada vez mais pela via da poesia e da literatura, ao invés do diálogo diário

 

Não são mais de dez os alunos que, este ano, participam na segunda edição do curso “Oficina de Patuá”, promovido pelo Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) e que começa esta quinta-feira, terminando a 4 de Novembro. Ainda assim, a data de arranque foi adiada devido à inicial falta de inscrições.

Ao HM, Joaquim Ng Pereira, um dos formadores, disse que os cinco ou seis alunos que, este ano, querem aprender um dialecto específico de Macau, que não terá mais do que algumas centenas de falantes em todo o mundo, são mais do que no ano passado.

“Em Portugal nunca houve este curso e vamos demorar algum tempo a conseguir angariar mais alunos. Temos esperança de que aos poucos isso venha a acontecer”, adiantou. O grande interesse dos que procuram aprender o dialecto é na vertente artística, com a poesia do macaense Adé [José dos Santos Ferreira].

“Isso é o que mais interessa às pessoas, que têm demonstrado muito interesse na parte de declamação de poesia. O diálogo no dia-a-dia [em patuá] já não existe, então é sempre na vertente artística que se desenvolve mais o interesse.”

Joaquim Ng Pereira acredita que a sobrevivência deste linguajar se faz precisamente pela parte artística, dando o exemplo de uma aluna que este ano vai repetir o curso porque gostou muito da parte da poesia.

De aluno a professor

Outra novidade do curso deste ano é a participação, como formador, de Raúl Gaião, linguista e aluno da primeira edição do curso. Formado em Filosofia, ciências literárias e estudos linguísticos, Raúl Gaião é autor do “Dicionário do Crioulo de Macau – Escrita de Adé em Patuá”, lançado em 2019, e da obra “Aspectos Lexicais na Obra de Autores Macaenses”, de 1999.

Raúl Gaião ficará encarregue de dar a parte linguista e gramatical do patuá, enquanto Joaquim Ng Pereira se dedica a ensinar as partes da declamação e fonética.

Entre quinta-feira e 29 de Junho será ensinado o enquadramento histórico, económico e social de Macau, bem como as origens do Patuá e o ensino e compreensão dos fonemas. De 4 de Julho a 27 de Julho, será realizada a introdução à fonética e dicção dos poemas e expressões do patuá, sendo ensinado ainda o módulo “Da palavra à frase – morfologia e sintaxe”.

De 5 a 28 de Setembro, serão ensinadas as “formas de falar” do patuá, sendo realizada a dicção de poemas de Adé e de outras expressões típicas do dialecto. Há ainda um período dedicado a aulas práticas e apresentações de trabalhos.

31 Mai 2023

Conferência sobre instrumentos da China até domingo em Lisboa e Mafra

Está a decorrer, desde terça-feira, em Lisboa e Mafra, a sexta edição da “Conferência Lisboa: Instrumentos Musicais e Música Chinesa” e a 24ª edição da conferência internacional da Fundação Europeia para a Investigação em Música Chinesa. Os dois eventos estão interligados, decorrendo nas duas cidades portugueses, e contam com o apoio e organização do Centro Científico e Cultural de Macau, que acolhe o evento até hoje, e o Palácio Nacional de Mafra, que o recebe até domingo. De frisar que a Fundação Jorge Álvares apoia também este evento de cariz anual. Do comité de organização do programa fazem parte nomes como o académico Enio de Souza, académico ligado ao Instituto de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa, Helen Rees, François Picard e Frank Kouwenhoven.

Do cartaz, fazem parte temáticas como a inserção da dança tradicional uigur em eventos sociais e espectáculos, a colecção de música chinesa e instrumentos da Fundação Jorge Álvares ou a análise, da parte de Enio de Souza, de como a música chinesa tem vindo a ganhar relevo em Portugal desde 1980. No primeiro dia da conferência houve ainda lugar para um concerto com o gamelão, instrumento tradicional da ilha de Java, na Indonésia.

O legado de Doming Lam

Hoje, serão abordadas temáticas como o papel dos instrumentos na música chinesa tradicional ou a “cantonização” do violino desde 1920, palestra protagonizada por May Bo Ching, da Universidade Cidade de Hong Kong.

Esta sexta-feira, já em Mafra, o evento tem como um dos pontos da agenda uma apresentação sobre as composições de Doming Lam, nascido a 5 de Agosto de 1926 e falecido a 11 de Janeiro deste ano, importante compositor, maestro e produtor musical macaense. Jen-Yen Chen, do Instituto de Musicologia da Universidade Nacional de Taiwan, vai falar das “composições católicas sagradas” de Lam no “contexto pós-colonial de Macau”, ou seja, de multiculturalidade.

Su Qian, da Universidade de Comunicações da China, de Pequim, propõe uma análise a ‘Nostalgia’, trabalho de Gao Weijie para a orquestra chinesa.

No último dia, destaque ainda para a apresentação de Edwin Porras, do Haverford College, nos EUA, sobre “as impressões digitais da música chinesa” em Cuba e a manutenção da presença dos instrumentos musicais chineses no país da América Latina. O cartaz é marcado por diversos concertos e visitas guiadas.

11 Mai 2023

CCCM | UM patrocina base de dados de documentos históricos

O Centro Científico e Cultural de Macau assinou, na quinta-feira, um acordo com a Universidade de Macau para o patrocínio de uma base de dados digital com documentação histórica digitalizada, existente em todo o mundo, sobre as relações entre portugueses e asiáticos, permitindo um acesso mais fácil a investigadores

 

Fazer investigação histórica implica trabalhar com documentos raros, facilmente danificáveis e, muitas vezes, de difícil acesso, espalhados em vários locais. A fim de reunir toda esta documentação online, o Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) tem vindo a expandir a base de dados intitulada “Portuguese Asian Digital Archives Network” (PADAN) [Rede Portuguesa de Arquivos Digitais Asiáticos] que, na quinta-feira, passou a contar com um novo patrocinador, a Universidade de Macau (UM).

A PADAN é, assim, uma plataforma digital para a agregação do material de investigação sobre a Ásia existente nas bibliotecas, arquivos e centros de documentação de Portugal e outros países. Com esta iniciativa, pretende-se que alguma da documentação à guarda da UM passe a pertencer a esta rede, conforme disse ao HM Rui Martins, vice-reitor da instituição.

“A UM tem muita informação e muitos documentos históricos adquiridos recentemente, nomeadamente o manuscrito, adquirido a privados, sobre a instalação da primeira embaixada portuguesa na China, e que data do reinado de D. João V. Só existem dois exemplares em todo o mundo e um deles está no Palácio Nacional de Queluz.”

Carmen Amado Mendes, presidente do CCCM, destacou no seu discurso que a PADAN irá “promover a investigação internacional sobre a história das relações entre portugueses e asiáticos e uma maior cooperação ao nível dos arquivos internacionais”.

“Os arquivos históricos e documentos escritos à mãos são algumas das mais preciosas e importantes fontes para a investigação histórica, mas o facto é que são materiais frágeis e únicos, o que significa que o acesso é difícil e restrito.

Recentes desenvolvimentos ao nível da tecnologia digital resultaram na possibilidade de haver um maior acesso a imagens e documentos históricos digitalizados, e este desenvolvimento traz um enorme potencial para fomentar e melhorar o estudo em torno de documentos raros sem risco de os danificar”, acrescentou.

Livros e mais livros

O acordo assinado na quinta-feira visa ainda a publicação de mais obras entre o CCCM e a UM, com o apoio financeiro desta universidade. “Temos uma colecção de oito livros publicados e há mais projectos a caminho”, contou Rui Martins. Uma das últimas edições foi sobre os 200 anos do jornal “Abelha da China”, sendo que a primeira edição aconteceu há dez anos com a publicação, na versão portuguesa, da tese de doutoramento de Carmen Amado Mendes, intitulada “Portugal e o estabelecimento da Questão de Macau, 1984-1999: Pragmatismo nas Negociações Internacionais”. Espera-se, assim, um aumento do número de livros editados neste contexto, em diversas áreas académicas.

24 Abr 2023

CCCM | Relação entre Portugal e Macau celebrada com exposição

O Centro Científico e Cultural de Macau organiza uma exposição que apresenta um vislumbre de cinco milénios de história e arte da China. A mostra tem como objectivo realçar a importância da RAEM nas relações entre Ásia e Europa

 

Uma garrafa de porcelana com cinco séculos e a última bandeira hasteada na transferência da administração de Macau são alguns dos objectos que contam a relação entre Portugal e a Macau no Centro Científico e Cultural de Macau, em Lisboa.

Estas são apenas duas das cerca de 4.000 peças patentes no espaço museológico do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) e que pretendem “dar uma ideia de 5.000 anos de história e arte chinesa, que vai desde o período neolítico até ao início do século XX”, como explicou o director do museu, Rui Dantas.

Neste espaço, adiantou à Lusa, os visitantes podem perceber “como Macau foi criado e as relações que se estabeleceram entre a Europa e a Ásia, a partir de Macau”. O acervo conta com exemplares das primeiras cerâmicas neolíticas, até terracotas funerárias, bronzes, cerâmica song, objectos para o fumo do ópio, pinturas, pratas e leques, entre outros.

Um dos objectos em destaque é uma garrafa decorada que foi encomendada, em 1522, por Jorge Álvares, um mercador abastado de Freixo Espada à Cinta que teve como sócio Fernão Mendes Pinto e foi um dos pioneiros portugueses no negócio da porcelana.

A obra assinala o início do comércio da porcelana, sendo uma das primeiras peças de encomenda no arranque de um vasto percurso de trocas comerciais, explicou o director do Museu de Macau.

Buda de Pun Yu Shu

Outra peça em destaque é um Buda assinado pelo artista cerâmico Pun Yu Shu, discípulo do célebre mestre da cerâmica de Shek Wan, e que foi encomendada pelo coleccionador Silva Mendes, o primeiro europeu a coleccionar peças de qualidade com as características da cerâmica de Shek Wan.

O espaço conta com um apontamento sobre a transferência (da administração do território de Portugal para a China), tendo exposta a última bandeira a ser arreada nas cerimónias oficiais da transferência da administração de Macau, em 1999.

Foi precisamente esse o ano em que o CCCM foi criado, com o objectivo de “promover o conhecimento das relações entre a Europa e a Ásia”, propósitos que se mantêm, com uma forte componente na formação, segundo a presidente do Centro, Cármen Mendes.

Nesta área, destacou o curso de Cultura e Língua Chinesa, recordando que o centro foi “a primeira instituição a leccionar este curso em Portugal”. Segundo Cármen Mendes, este é um centro “vivo”, com a passagem de muitos investigadores, doutorandos, bolseiros e pessoas interessadas nas relações entre Portugal e a Ásia, e outras que simplesmente não resistem a ofertas de formação como, por exemplo, sobre o patuá ou o guzheng (instrumento de música tradicional chinesa), administradas neste espaço.

“Temos cada vez mais visitantes, não só na nossa biblioteca – que é a melhor biblioteca com obras sobre a Ásia em Portugal, que reúne investigadores e outros interessados na Ásia -, o nosso museu e os cursos de formação que vamos leccionando para especialistas, académicos e também a sociedade civil e o público em geral”, indicou à Lusa.

Ao nível da investigação, sublinhou, “o centro tem tido um papel pioneiro na ligação de todos os académicos que trabalham sobre a Ásia em Portugal, alguns portugueses no estrangeiro e alguns estrangeiros com fortes ligações à academia portuguesa”.

Incentivo à investigação

Carmen Mendes destacou ainda as Conferências da Primavera, que reúne cerca de 180 oradores e a atribuição de bolsas de doutoramento anuais, financiadas pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), que tutela o Centro, a estudantes de doutoramento que fazem investigação sobre a Ásia.

O CCCM conta com 25 bolseiros de doutoramento, voluntários que neste espaço conseguem uma grande proximidade com a Ásia. “Temos aqui pessoas das mais diversas áreas disciplinares – da arte, religião, língua, cultura, também história e economia, mas há algo que as une: A paixão pela Ásia”, afirmou

Carmen Mendes mostra-se entusiasmada com a criação de uma incubadora científica e académica, que “vai permitir investigadores, empresários e até artistas terem esta ligação a Macau, através da Universidade de São José, a Universidade Católica de Macau”.

Em relação à biblioteca, a chefe da divisão de Informação e Documentação do CCCM, Helena Dias Coelho, apresenta-a como primeiramente “vocacionada para o estudo das relações entre Portugal e Macau” e, mais tarde, alargado a toda a Ásia.

“Somos, sobretudo, procurados por estudantes de estudos asiáticos, investigadores, muito por jovens estudantes de ensino superior, doutorandos e a nossa documentação responde a este tipo de procura”, disse à Lusa.

Nessa biblioteca, as obras mais procuradas são as gerais da história da Ásia, mas também os espólios, nomeadamente do monsenhor Manuel Teixeira, um historiador que viveu em Macau, onde publicou mais de uma centena de livros e centenas de artigos na imprensa.

Foi o próprio que doou o seu espólio ao CCCM, estando o mesmo devidamente tratado e consultável, repartido entre livros, fotografias, textos e pequenas notas. Nos arquivos da biblioteca está ainda uma colecção de microfilmes constituída por cerca de 7.000 microfilmes, com mais de 50.000 documentos essenciais para o estudo de Macau e das suas instituições, entre o início do século XVII e meados do século XX.

11 Abr 2023

Cooperação | USJ e CCCM criam “Macau Hub” até 2026

A Universidade de São José e o Centro Científico e Cultural de Macau vão criar nos próximos anos o “Macau Hub”. O projecto terá como objectivos principais a incubação de empresas, organização de conferências, workshops, a formação de um think tank ou iniciativas na área da cultura e arte

 

Na passada sexta-feira foi apresentado oficialmente o projecto “Macau Hub”, que a Universidade de São José (USJ) e o Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) irão desenvolver progressivamente até ao arranque oficial, em 2026. A ideia é organizar em conjunto actividades ligadas à área do ensino superior, mas que não conferem grau académico, como é o caso da incubação de empresas, realização de conferências nas mais diversas áreas, programas de estágios, de cursos de formação ao longo da vida ou mesmo a implementação de um think tank. Tudo em nome da parceria Portugal-China com Macau a ter o seu habitual papel de plataforma.

Além destas duas entidades, espera-se o contributo de associações ou institutos que queiram participar na iniciativa. Nesse sentido, os anos de 2024 e 2025 servirão para construir os conteúdos e iniciativas incluídas no “Macau Hub”.

A título de exemplo, Joaquim Ng Pereira, ligado à direcção da Fundação Casa de Macau, propôs na sessão de apresentação do projecto, no CCCM, a realização de um programa conjunto de estágios para que alunos da USJ possam estagiar temporariamente na sede da instituição em Lisboa.

Vitalino Canas, personalidade do Partido Socialista ligada a Macau que actualmente preside ao Fórum de Integração Brasil-Europa, disse estar interessado no diálogo para o intercâmbio de alunos brasileiros. Álvaro Barbosa, vice-reitor da USJ para a área da internacionalização, mostrou abertura a estas propostas.

Carmen Amado Mendes, presidente do CCCM, afirmou que o “Macau Hub” constitui “uma alavanca que permitirá elevar [a cooperação existente] a níveis que a nós, impulsionadores deste projecto, nos enchem de esperança”. Na prática, “estudantes, cientistas e empreendedores terão uma casa própria que assume como grande objectivo apoiá-los no desenvolvimento das suas vidas académicas e profissionais. Projectos, nas mais diversas áreas, contarão de forma sustentada com uma rede de profissionais, académicos e instituições que activamente os ajudarão a construir um futuro próspero, harmonioso e sustentável.”

A USJ e o CCCM trabalham em conjunto desde que assinaram um protocolo de cooperação, em 2021. “Embora conscientes dos enormes desafios que este projecto nos vai trazer, estamos particularmente satisfeitos com as novas dimensões de trabalho e o caminho que iremos percorrer juntos”, acrescentou Carmen Amado Mendes.

Espera-se agora que “a sociedade, nas várias partes do globo, se interesse e vá contribuindo com sugestões de forma a que nos permitam implementar e desenhar projectos de todos e para todos”. “Esta parceria com a USJ cria condições físicas para elevar a cooperação entre Portugal e a China para um novo patamar onde Macau desempenha um papel fundamental”, disse Carmen Amado Mendes.

A hora certa

Álvaro Barbosa destacou o desenvolvimento que a USJ tem feito nos últimos dez anos e mencionou quatro projectos em andamento na instituição de ensino superior, que podem representar o pontapé de saída para o “Macau Hub”.

Ao HM, referiu que este não é “um projecto de formação académica, mas tem uma dimensão extracurricular”. “Falamos de intervenções culturais, organização de workshops, conferências. Entendemos que a área da incubação empresarial é uma das áreas que as universidades devem ter de apoio aos alunos, sendo um instrumento muito útil na transição entre a academia e o mercado de trabalho. Essa área será central neste projecto.”

Neste sentido, o vice-reitor da USJ falou da incubadora que está a ser criada na universidade privada, intitulada “Macau Spin Incubator”, como uma das entidades que poderá assumir protagonismo neste novo “Hub”.

“Estamos a fundar uma incubadora de negócios e gostaríamos que este projecto fizesse a ligação com este espaço que vamos ter aqui. Pode ser uma grande oportunidade para as startups ou projectos de empresas de Lisboa que tenham interesse em se desenvolver na China ou no Sudeste Asiático que possam incubar-se neste espaço com ligação a Macau. A área do desenvolvimento dos negócios é talvez uma das áreas mais promissoras.”

Segue-se a ligação que o “Macau Hub” poderá ter ao mundo lusófono, pelo facto de a USJ “ter projectos concretos de intercâmbio e bolsas de estudo com alguns países lusófonos”.

“Com Portugal temos a evidente relação umbilical com a Universidade Católica Portuguesa. Temos uma relação muito forte com o Governo da Guiné-Bissau. Os representantes da Embaixada da Guiné-Bissau em Pequim estão a trabalhar de forma muito próxima connosco numa espécie de acordo para atribuir residência no país a cidadãos chineses e que, por via da residência, podem estudar em Macau na qualidade de alunos estrangeiros nos programas de língua e cultura portuguesa. Além de estudarem, estes alunos vão trabalhar de perto com os agentes da Guiné-Bissau na área da cultura e dos negócios. A ideia é formarmos uma geração de cidadãos chineses que sejam residentes do país africano e que façam esta ponte entre os dois países. É um projecto no qual estamos a trabalhar e pode ter ligação com Portugal”, disse na apresentação.

“Enorme ambição”

O vice-reitor da USJ referiu ainda as parcerias com o Brasil na área dos doutoramentos e pós-doutoramentos e o arranque da ligação a Angola, não só com o Governo, mas com a Universidade Católica de Angola. “A ideia é que o Governo de Angola ofereça bolsas para os alunos angolanos estudarem na nossa universidade. É uma parceria que está no início, mas que tem muito potencial. Estamos a trabalhar de forma muito próxima com Timor-Leste, com a Universidade Católica, a qual foi fundada muito recentemente, e damos apoio nisso.”

O vice-reitor falou também do laboratório de neuromarketing, criado pelo docente Alexandre Lobo, e que será exportado para a Universidade Católica do Porto. Além disso, a USJ, nos últimos três anos, “tem trabalhado de forma próxima com duas associações internacionais, a Federação Internacional das Universidades Católicas e a Associação Geral das Universidades Católicas na Ásia”.

“Estamos a montar uma dinâmica de centros de investigação em conjunto na área da Memória e Identidade”, acrescentou. Francisco Peixoto, chefe da delegação da USJ em Portugal, salientou que este é um “projecto de uma enorme ambição”. “Achamos que é a altura certa para o implementar pelo desenvolvimento da USJ, uma vez que estamos no processo de instalação de uma delegação da USJ em Portugal, com a qual estamos a contar com o apoio do CCCM”.

O “Macau Hub” será, assim, um “espaço físico, mas também intelectual e de discussão”, servindo para a “incubação de projectos e uma tentativa de conseguirmos que se torne num think tank para encontramos soluções na ligação entre Portugal, China e Macau”. Apostar-se-á ainda na “formação de executivos, realização de eventos culturais e sociais, na formação ao longo da vida e capacidade de conseguirmos criar uma academia de liderança internacional. Isto só faz sentido se for feito com parceiros”, rematou Francisco Peixoto.

CCCM | Governo português reforça missão do Centro

O Conselho de Ministros aprovou na quinta-feira um decreto-lei que reforça e promove a missão do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), foi divulgado em comunicado, na sexta-feira.

O diploma destaca o CCCM “como centro de referência, nacional e internacional, de investigação científica, de formação contínua e avançada, de publicação, de divulgação cultural e de informação especializada sobre as relações Europa-Ásia, designadamente como um polo dinamizador da parceria ‘China-Portugal Ciência e Tecnologia 2030’”.

A biblioteca do CCCM, de acordo com dados da instituição, é a mais completa e actualizada biblioteca sobre a China em todo o mundo lusófono, especializada na investigação e ensino, acerca da China/Macau, da Ásia Oriental e das relações entre a Europa e a Ásia.

A sua dimensão internacional e multidisciplinar, funciona em rede com outras bibliotecas e arquivos, nacionais e estrangeiros, de forma a melhor cumprir a sua missão de apoio à investigação e ensino, à informação e à divulgação de conhecimento.

O CCCM dispõe de cerca de 27.000 registos bibliográficos em catálogo, que incluem uma colecção de audiovisuais, designadamente o fundo de cerca de 40.000 ‘slides’ e 5.000 fotografias, entre outros suportes físicos, de que ressalta a colecção de cerca de sete mil microfilmes, com mais de 50.000 documentos. O centro é um instituto público integrado na administração indirecta do Estado e sob tutela do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

27 Mar 2023

CCCM inaugura hoje biblioteca e exposição de fotografia

É hoje inaugurada a nova biblioteca do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), em Lisboa, depois de um longo período de obras e reestruturação dos serviços. O evento de abertura contará com a presença de Elvira Fortunato, ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, além de incluir a inauguração da exposição de fotografia “À Procura de Macau”, da autoria de Jorge Veiga Alves, às 18h (hora de Lisboa).

O projecto de uma nova biblioteca foi, desde o início do mandato, um projecto primordial de Carmen Amado Mendes à frente da presidência do CCCM. Até à data, a biblioteca localizava-se num edifício externo ao Centro, sujeito ao pagamento de renda.

Numa entrevista ao HM, concedida em Fevereiro, a académica dava conta da vontade de mudar esta situação e reduzir despesas. “Temos ainda a questão das instalações provisórias, pois durante todos estes anos de vida do CCCM temos pago renda pelo espaço onde tínhamos a biblioteca e o arquivo, e isso não fazia qualquer sentido. Finalmente conseguimos concluir as obras no nosso edifício onde fica o museu, o que nos permitiu mudar a biblioteca, e deixar de pagar renda. Com isso promovemos o uso de salas de aula para as formações que disponibilizamos e gabinetes para investigadores. Estou contente por estarmos já numa fase final.”

Recordar Macau

Quanto à exposição de fotografia, trata-se de mais uma oportunidade para ver o trabalho de Jorge Veiga Alves, ex-residente em Macau e que há muito se dedica à fotografia nos tempos livres, nomeadamente sobre a Macau antiga, as suas gentes e culturas locais do período anterior à transição.

Apresentam-se, assim, 30 fotografias tiradas entre os anos de 1986 e 1994, no formato analógico, e que foram digitalizadas e incluídas no projecto pessoal do fotógrafo também intitulado “À Procura de Macau”. Esta mostra pode ser vista até final de Janeiro.

De frisar que desde Janeiro que as imagens e vídeos do espólio pessoal de Jorge Veiga Alves estão à guarda do CCCM e disponíveis para consulta na biblioteca digital da entidade.

O fotógrafo confessou ao HM, em Janeiro, que grande parte do seu espólio serve de exercício de memória de uma Macau que já não existe. “Tenho fotografias do que todos os portugueses fotografavam, como as danças do leão e do dragão. Às vezes andava na rua com a minha máquina fotográfica, nas horas vagas, e também fotografei outros temas e situações da realidade de Macau. Comecei a perceber que, independentemente da qualidade fotográfica, algumas imagens remetem para locais que já não existem ou que mudaram muito.”

19 Dez 2022

CCCM | Patuá e teatro em destaque no evento “Macau em Lisboa”

O Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) promove este domingo um evento especial intitulado “Macau em Lisboa”, onde o patuá e o teatro feito em patuá estarão em destaque. A ideia é promover “uma tarde macaense onde a graça, o chiste próprio do patuá, bem-humorado e satírico, a música e a declamação poética” serão os protagonistas.

Desta forma, pretende-se, com “Macau em Lisboa”, dar “a conhecer aspectos específicos da cultura macaense expressos através dos documentários “Natal e Ano Novo”, realizado pela Casa de Portugal em Macau e projectos dos Doci Papiaçam di Macau, nomeadamente a curta-metragem “Macau Sã Assi”, “Lorcha Di Amor”, peça de teatro e “Macau Champurrado”.

Entre as 14h30 e as 19h haverá a apresentação do espectáculo com músicas de Natal protagonizado por Carlos Piteira e Jaime Mota e ainda uma conversa com as académicas Maria Antónia Espadinha e Ana Cristina Alves. Haverá ainda récitas em patuá.

16 Dez 2022

CCCM | Bicentenário do jornal “Abelha da China” celebrado em Lisboa 

Os 200 anos da criação do primeiro jornal de língua portuguesa em Macau serão celebrados na próxima segunda-feira no Centro Científico e Cultural de Macau com uma conferência que contará com uma série de investigadores e historiadores ligados à RAEM, como é o caso de Tereza Sena, Jorge Arrimar ou Cátia Miriam Costa, entre outros. Será ainda lançado o livro “A Abelha da China nos seus 200 Anos: Casos, Personagens e Confrontos na Experiência Liberal de Macau”

 

O primeiro jornal em língua portuguesa de Macau foi criado há 200 anos e chamava-se “A Abelha da China”. Para celebrar a efeméride, que marca o início da presença da imprensa em português no território, algo que perdura até aos dias de hoje, o Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) acolhe, na próxima segunda-feira, uma palestra que conta com vários investigadores e historiadores ligados ao território que vão apresentar as diversas perspectivas históricas e políticas de um jornal ligado aos ideais liberais de 1820.

Ao HM, o académico Duarte Drumond Braga, um dos coordenadores do projecto, explicou a importância de celebrar esta data. “É o primeiro jornal de Macau e o primeiro de uma longa linhagem que continua até hoje. Ele está ligado ao movimento Liberal e a alguns partidários desse movimento em Macau, além de que era um jornal com uma orientação política bastante marcada nesse sentido. Penso que vale a pena ser celebrado.”

O painel de oradores conta com intervenções de Tereza Sena, historiadora e ex-residente de Macau, que apresenta o painel “Ascensão social e política de um natural de Macau durante o Liberalismo: António dos Remédios (ca.1770.-1841) – o primeiro passo”. Destaque ainda para a presença de Jorge Arrimar, poeta ligado a Macau que vai falar sobre a ligação do Ouvidor Arriaga, importante figura política do território à época e “um dos grandes inimigos” d’A Abelha da China, recordou Duarte Drumond Braga. “Ele era a figura mais poderosa de Macau nessa altura e partidário de um grupo rival às pessoas que estavam ligadas ao jornal.”

O programa inclui também a participação de Jin Guoping, do Instituto de Macauologia da Universidade de Jinan, em Cantão, e também ligado ao Centro de Estudos de Macau da Universidade de Macau, que abordará o tema “A Abelha da China estudada na Macauologia”.

Duarte Drumond Braga entende ser muito provável que o jornal fosse lido “por uma elite” da sociedade. A Abelha da China tinha artigos de opinião mas funcionava também como uma espécie de Boletim Oficial, que só seria criado muito depois. “Eram publicados resumos das sessões do Leal Senado, mas era um jornal que também tinha uma parte literária. Tinha uma posição política forte, porque o grupo liberal [ligado ao jornal] conseguiu chegar ao poder, embora sejam expulsos depois. O jornal também deu depois muitas informações sobre esse processo.”

O coordenador desta iniciativa entende que faltam ainda estudos académicos sobre o jornal. “Há um trabalho muito bom, feito pelo Daniel Pires, que é o ‘Dicionário Cronológico da Imprensa de Macau no Século XIX’, mas que não esgota estes materiais. Não só a Abelha da China como os jornais que começam a aparecer na altura estão ainda por estudar. Agnes Lam [docente na Universidade de Macau], por exemplo, deu um bom contributo, mas faltam ainda alguns estudos.”

Livro lançado

Acima de tudo o programa destaca a criação do primeiro jornal de língua não chinesa “no contexto da Revolução Liberal de 1820 e da primeira formulação do constitucionalismo português”, aponta o texto de apresentação do evento. Marcado, portanto, pelas doutrinas liberais da época, a Abelha da China “foi uma breve mas intensa publicação periódica (1822-23) que veio dar corpo à ideia de que não há verdadeira liberdade sem imprensa e sem a liberdade desta”.

“Plenamente alinhada com os debates do seu tempo, o seu projecto seria tomado por outros agentes políticos. Todavia, o seu legado de insubmissão acabaria por vingar”, aponta a mesma apresentação, que destaca ainda o facto de o periódico defender “uma ideia de autonomia sempre ligada à oligarquia local”.

“Nesse sentido, o jornal mostra também as alianças e os contactos múltiplos que o atravessam: com a China, onde sempre se enraizou, a Metrópole [Lisboa], o Brasil e Goa”.

“Por entre as suas páginas circulam figuras e influências de todas as proveniências, mostrando como Macau se integrava plenamente nos movimentos políticos e culturais do seu tempo, e onde a comunidade chinesa se encontrava ativa face a eles. E daí os casos, as figuras e os confrontos que gravitam em seu torno, e que os ensaios de historiadores e críticos da cultura e do jornalismo dissecam nesta obra”, lê-se ainda.

A sessão de segunda-feira, 12, conta ainda com a apresentação do livro “A Abelha da China nos seus 200 Anos: Casos, Personagens e Confrontos na Experiência Liberal de Macau”, que reúne artigos da autoria dos investigadores Cátia Miriam Costa, Jin Guoping, Jorge de Abreu Arrimar, Pablo Magalhães e Tereza Sena. A obra “tem por foco o primeiro jornal de Macau em língua portuguesa analisado a partir de diversas áreas das humanidades” e inaugura “a nova coleção de livros de História com chancela do CCCM, sendo feita em parceria com a Universidade de Macau”.

Acima de tudo, o livro pretende mostrar “um renovado interesse na história de Macau, na história do jornalismo na China e em língua portuguesa, e também na história sóciopolítica e cultural do território”.

9 Set 2022

CCCM | Mais de 160 instrumentos musicais chineses expostos em Mafra 

Um total de 167 instrumentos musicais chineses, incluindo os que representam algumas etnias chinesas, vão estar expostos a partir de hoje na nova galeria do Real Edifício de Mafra, em Portugal. Énio Souza, musicólogo e um dos poucos especialistas em instrumentos musicais chineses em Portugal, fala da maior exposição de sempre do género realizada no país

 

A Câmara Municipal de Mafra, o Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) e a Fundação Jorge Álvares inauguram hoje a “Exposição de Instrumentos Musicais Chineses” na nova galeria do Real Edifício de Mafra, por ocasião do terceiro aniversário da inscrição deste conjunto na Lista do Património Mundial da UNESCO.

O público poderá ver um total de 167 instrumentos musicais chineses, desde os mais clássicos aos mais representativos de algumas etnias que existem na China. A mostra, patente até ao dia 30 de Abril do próximo ano, nasce do acervo museológico do CCCM, em Lisboa, e contém peças originais utilizadas pela Orquestra Chinesa de Macau nas suas diversas actuações na Europa ao longo das décadas de 80 e 90 do século XX. Entre os instrumentos expostos incluem-se aerofones, cordofones friccionados, dedilhados e percutidos, bem como instrumentos de percussão em metal, em madeira e em pele.

Énio de Souza, um dos poucos especialistas em instrumentos musicais chineses em Portugal, ligado ao Instituto de Etnomusicologia – Centro de Estudos em Música e Dança da Universidade Nova de Lisboa, fala ao HM daquela que é, provavelmente, a maior exposição de sempre do género realizada no país.

“Acredito que seja a maior exposição de instrumentos musicais chineses alguma vez ocorrida em Portugal, com 167 instrumentos expostos. O acervo do CCCM tem, neste momento, uma das maiores colecções de instrumentos musicais chineses em Portugal, com um total de 215 tipos de instrumentos.”

Doação dos Países Baixos

Quando foi inaugurado, em 1999, o CCCM contava já com um acervo de 42 instrumentos musicais chineses. Mas em 2020 houve uma doação, da parte da European Foundation for Chinese Music Research, nos Países Baixos, de 187 instrumentos musicais chineses ao CCCM, bem como marionetas de sombra e de manipulação.

“A doação da Holanda resulta de uma colecção feita por etnomusicólogos na China. Grande parte dos instrumentos datam da segunda metade do século XX, alguns tipos são anteriores, do início do século”, contou Énio Souza. De frisar que o transporte e seguros dos instrumentos foram suportados pela Fundação Jorge Álvares.
Énio Souza começou a colaborar com o CCCM na divulgação dos instrumentos musicais chineses em 2002, ano em que foi criado um atelier para escolas e para o público em geral. Em 2019, reformou-se, mas a ligação a este mundo mantém-se.

Em Portugal, o musicólogo assegura que são raros os que se dedicam ao estudo deste tipo de instrumentos. “O estudo da música chinesa em termos académicos, quer no âmbito da musicologia, quer da etnomusicologia, é muito recente em Portugal. Não temos mais especialistas nessa área em Portugal, à excepção do esforço que tenho feito, desde 2012, para a divulgação dos instrumentos musicais chineses. Temos o Museu do Oriente com uma exposição sobre Ópera chinesa e há outras mostras que têm sido feitas, mas a nível académico o estudo é mesmo recente”, declarou.

7 Jul 2022

Literatura | “Olhar a China pelos livros” apresentado em Lisboa 

Jorge Tavares da Silva, académico e especialista em assuntos chineses, coordena a obra “Olhar a China pelos livros”, lançada recentemente no Centro Científico e Cultural de Macau. O livro contém textos de 18 autores que olham para a China a partir de livros escolhidos por si, disponibilizando ao leitor várias visões do país

 

“Olhar a China pelos livros” é o nome da mais recente obra coordenada por Jorge Tavares da Silva, professor universitário na área das relações internacionais e especialista em assuntos chineses que, desta vez, foi além do mundo académico para apresentar uma obra que traça a visão de 18 autores sobre a China.

Autores como Ana Cristina Alves, ex-docente na Universidade de Macau e coordenadora do serviço educativo do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), Francisco José Leandro, académico da Universidade Cidade de Macau, António Graça de Abreu, autor e tradutor, e Miguel de Senna Fernandes, presidente da Associação dos Macaenses, entre outros, foram convidados a olhar para a China com base numa obra por si escolhida.

O livro, lançado recentemente no CCCM, em Lisboa, apresenta, por isso, várias “formas de olhar para a China”, contou Jorge Tavares da Silva ao HM. “Tudo isto partiu da minha curiosidade, pois a China pode ser vista de muitas maneiras, e até algumas erradas.”

Livros como “Riding the Iron Rooster”, de Paul Theroux, sobre viagens de comboio na China, ou “Terra Bendita”, de Pearl S. Buck, dão o mote a muitos dos textos desta obra.

“Dei a liberdade total na escolha das obras. Alguns livros são chineses, não estão sequer traduzidos para inglês ou português. Desta forma, o livro tem essa vantagem de dar a conhecer obras desconhecidas no ocidente”, contou Jorge Tavares da Silva.

Das viagens à literatura

“Olhar a China pelos livros” traz diversos temas, e não falta sequer a gastronomia macaense. “Há obras que foram no sentido das viagens, enquanto que outros autores olharam para a China através da poesia clássica. Há quem tenha ido aos autores tradicionais, às grandes obras da filosofia chinesa.”

“Terra Bendita”, de Pearl S. Buck, foi a escolha de Jorge Tavares da Silva, apresentando uma visão do mundo rural chinês que já não existe. “ A Pearl S. Buck foi a autora que me levou para a China. Estava habituado a um mundo eurocêntrico, muito centrado no indivíduo, mas deparei-me com lógicas colectivas e formas de estar na sociedade completamente distintas. Foi esse contraste que me atraiu, o pensar que há um mundo além do europeu, com uma civilização que tem um mundo antagónico”, recordou o coordenador da obra.

Acima de tudo, Jorge Tavares da Silva espera atrair um público vasto, incluindo estudantes chineses de português, para que possam compreender mais sobre o seu próprio país. “Esta é uma obra para o público em geral, não é académica, e tem uma leitura muito descontraída. Esta obra vai ter algum impacto no sentido de leitura e interesse”, rematou.

3 Jul 2022

24 de Junho | Invasão dos holandeses em 1622 lembrada em Lisboa 

Mariana Pereira, antropóloga, e Rui Loureiro, historiador, foram os protagonistas de uma conferência, organizada pelo Centro Científico e Cultural de Macau, que lembrou os 400 anos do 24 de Junho de 1622, quando os holandeses tentaram invadir o território de Macau. A data continua viva na memória dos macaenses que lhe deram uma nova roupagem, assegura a antropóloga

 

“24 de Junho de 1622: História e Memória” é o nome da conferência que decorreu na última sexta-feira, em Lisboa, com o intuito de lembrar os 400 anos da invasão dos holandeses no território sob administração portuguesa. O evento, organizado pelo Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), contou com a presença do historiador Rui Loureiro e a antropóloga Mariana Pereira, que está a fazer um doutoramento sobre as percepções da comunidade macaense residente em Portugal face a esta data histórica. De frisar que, no período da Administração portuguesa, 24 de Junho era um dia feriado.

Mariana Pereira começou a desenvolver o trabalho de investigação em 2019, partindo não só de conversas com membros da comunidade. Uma coisa é certa: a data está longe de estar esquecida ou ignorada. “Nós é que decidimos o que queremos que o 24 de Junho seja”, apontou.

“É difícil dizer se há ou não uma ameaça à celebração [desta data], porque tem havido uma nova história sobre o 24 de Junho, com novos públicos e contextos. O 24 de Junho tem hoje um formato mais aberto e plural. A sociedade civil está a criar um novo rumo, com base em elementos da tradição histórica. A diáspora macaense também faz isso nos locais onde vive”, apontou.

Mariana Pereira acredita que esta data vai continuar a ser celebrada. “O cerne de estar ligado a um acontecimento histórico de Macau está lá e vai continuar nos próximos tempos”, disse.

Da guerrilha

Entre 1580 e 1640 Portugal ficou sob domínio dos espanhóis, herdando os conflitos que o país vizinho tinha com outros impérios europeus. Foi o caso dos holandeses, que tentaram estabelecer-se na Ásia e criar rotas de comércio tal como os portugueses já faziam a partir de Goa. Até finais do século XVI os portugueses detinham o exclusivo do comércio pela Rota do Cabo, sendo que “todos os europeus iam a Lisboa comprar produtos”, recordou Rui Loureiro.

Além de falar da figura do rei Filipe II de Espanha, cujo reinado foi marcado pela tentativa expansionista dos holandeses, o historiador abordou também a importância do livro “Itinerario”, de Jan Huygen van Linschoten’s, que mais não era “uma descrição muito bem informada de toda a Ásia e dos negócios dos portugueses, e que apresentou a Ásia aos holandeses”. Traduzido para várias línguas, este livro mais não era do que um verdadeiro “roteiro das principais rotas comerciais informações obtidas em Goa” pelo autor, provavelmente na qualidade de espião.

Desta forma, os holandeses conseguem estabelecer-se no que hoje é conhecido como a ilha de Java, conseguindo uma rota directa para o Oriente. A China, lugar de porcelanas e sedas exóticas, era o grande atractivo.

“A China era o melhor mercado para vender especiarias. A partir de 1631 os holandeses tentaram instalar-se em Macau, sem sucesso. Depois de 1622 nunca mais tentaram, e como alternativa conseguiram estabelecer-se na ilha de Taiwan, mas não durante muito tempo.”

Rui Loureiro relatou então o que se passou no dia 24 de Junho, com a chegada dos holandeses a Macau. “A armada holandesa, composta por 13 navios e 800 homens, tinha informação de que Macau estaria quase desprotegida. No entanto, tiveram de enfrentar uma resistência quase desorganizada, pois muitos portugueses tinham experiência de anos de navegação e, com poucas espingardas e canhões, obtiveram uma vitória fulgurante sobre as forças holandesas que iam preparadas para uma guerra convencional, mas depararam-se afinal com uma guerra de guerrilha.”

A vitória sobre os holandeses levou à construção de mais fortificações em Macau, após uma negociação com Cantão. Imperava a necessidade de segurança e protecção. “Macau, na década seguinte, passou a ter uma série de fortalezas em sítios estratégicos e nunca mais houve tentativas de conquista por parte de outra potência.”

Rui Loureiro destaca os trabalhos de investigação de Charles Boxer ou Wu Zhiliang, entre outros, sobre o 24 de Junho de 1622. Mas aponta que “não tem havido investigação mais recente” acerca deste episódio histórico.

27 Jun 2022

CCCM | Pintura de Marciano Baptista e Nuno Barreto em análise

De uma “Macau em vias de extinção” retratada nos quadros de Marciano António Baptista, datados dos finais do século XIX, passamos para as telas de Nuno Barreto que reflectem um estilo mais ocidental e um período de enorme mudança no território, quando a administração passou a ser chinesa. A investigadora Maria João Castro, da Universidade Nova de Lisboa, abordou o tema numa conferência do Centro Científico e Cultural de Macau

 

As pinturas de Macau da autoria de Marciano António Baptista e de Nuno Barreto apresentam duas visões completamente diferentes do território em períodos distintos, nos finais do século XIX e nos anos 90 do século XX. A investigadora Maria João Castro, da Universidade Nova de Lisboa, abordou o tema no último ciclo de conferências da Primavera do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) dedicado a Macau.

“As características mais marcantes destes dois artistas relacionam-se com a estética da sua obra e reflectem, de diferentes modos, duas visões da colónia do império português”, começa por dizer a académica ao HM. No caso de Marciano António Baptista, que viveu entre 1826 e 1896 e foi aluno do pintor inglês George Chinnery, acabou por desenvolver “técnicas e feições próprias”.

“Os seus esboços e aguarelas são especialmente precisos no que concerne ao detalhe e carregam a marca do seu mestre. A sua pincelada mostra-se de cunho claramente chinês, mas em combinação com técnicas ocidentais de perspectiva linear e coloração”, acrescenta Maria João Castro.

Com as pinturas de Marciano António Baptista olhamos “uma Macau em vias de extinção”, do tempo em que existiam “pagodes, fortalezas e juncos de diferentes tipos”, mas onde também se avistavam “navios a vapor, simbolizando o século XX que se aproximava”.

Nas telas observa-se “uma Macau idealizada, exótica, pitoresca, cujas telas condensam uma pincelada orientalizante de um território em extinção, devolvendo o olhar nostálgico de um território cuja vivência anunciava novos ventos”.

Outro imaginário

Relativamente à obra de Nuno Barreto, pintor nascido em 1941 e falecido em 2009, podemos observar uma “atmosfera e envolvência completamente distintas”. “O pintor viveu em Macau durante duas décadas, tendo pintado uma Macau já distante da idealização da província do extremo oriente do império português de Marciano [António Baptista], ou seja, a pintura macaense de Barreto reflecte o seu tempo: a passagem da administração do território para as autoridades chinesas e um traço de cunho nitidamente ocidental”, frisou.

Para a investigadora, “esta particularidade faz com as suas obras mais marcantes e emblemáticas retratem não só o fim do império português como uma visão pós-colonialista de vincado cunho global”.

“A Macau de Nuno Barreto é uma província moderna, uma cidade plena do século XX e que o artista pinta frequentemente de modo abstracto ou numa figuração muito própria que tem em atenção uma plasticidade profundamente ocidental. De certa forma, os seus quadros também reflectem o fim de um tempo, constituindo alegorias ao fim da administração portuguesa do território.”

Neste momento, está patente no Museu do Oriente, em Lisboa uma exposição dedicada às obras de Nuno Barreto, intitulada “Beber da Água do Lilau”. Maria João Castro denota que só agora é que a obra deste pintor “começa a ecoar pelos espaços culturais transnacionais”.

Além disso, “a obra de Marciano António Baptista só quase um século depois foi estudada e mostrada convenientemente”.

Maria João Castro considera que “as autoridades de Macau têm patrocinado a divulgação pontual da cultura sino-lusa no território, mostrando não a obra dos artistas desaparecidos como promovendo a viagem de artistas portugueses contemporâneos para expor no antigo território português, ou patrocinando pequenas residências”. “Isto parece-me importante e significativo”, notou.

Além destes dois pintores, Maria João Castro destaca o trabalho de Fausto Sampaio, que deixou “testemunhos de um olhar cruzado entre Oriente e Ocidente numa produção pictórica profundamente rica e diversa”.
Maria João Castro é doutorada em História da Arte Contemporânea e investigadora integrada do Centro de Humanidades da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

15 Mar 2022