CTM | Renovação automática do contrato poderá vir a acontecer

O contrato de concessão do Serviço Público de Telecomunicações entre o Governo e a CTM continua a dar que falar. Raimundo do Rosário esclarece que existem vários tipos de activos em causa, sem descartar a possibilidade de renovação automática do contrato até ao final do ano

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]uma nova reunião com a Comissão de Acompanhamento para os Assuntos da Administração Pública, o Governo reforçou a fragilidade de uma possível não renovação do contrato de concessão do serviço público de telecomunicações com a Companhia de Telecomunicações de Macau (CTM).
O contrato, assinado em 2009, será alvo de uma revisão intercalar até ao final deste ano. Aqui poderá decidir-se se o contrato é renovado automaticamente ou não.
“[No contrato] está previsto que a meio, ou seja, este ano de 2016, possa ser feita uma revisão. Mas a revisão só terá lugar se houver uma infracção grave de alguma lei, ou se houver imperiosas razões de interesse público”, esclareceu Raimundo do Rosário, Secretário para os Transportes e Obras Públicas, no final da reunião de ontem, frisando que, se nenhum dos casos se detectar, o contrato será renovado automaticamente até ao final do presente ano.
Questionado sobre a decisão do Governo, Raimundo do Rosário apenas referiu que não houve, por parte da CTM, qualquer incumprimento da lei e que o interesse público terá de estar sempre relacionado com “imperiosas razões”. “Renovação? É possível que vá acontecer”, acrescentou ainda o Secretário.
No entanto, avançou, o próximo passo é um encontro entre o Governo e a operadora de telecomunicações.

Activamente ligados

Como defendido pela Comissão na primeira reunião, a questão dos activos continua por resolver. A Comissão acredita que este é “um contrato injusto” para com as outras operadores a actuar no mercado. “Este é um contrato injusto, tem cláusulas injustas (…) alguns membros [da comissão] indicaram nunca ter visto um contrato assim”, explicou Chan Meng Kam, presidente da Comissão.
Raimundo do Rosário quis esclarecer que em causa estão três tipos de activos: os de concessão, os comuns e os de investimento feitos pela própria CTM. “Parte dos activos são da RAEM e parte são da concessionária”, apontou o Secretário.
Os activos de concessão serão inspeccionados pelo Governo e um representante da CTM, com vista a verificar o bom estado de funcionamento. Os activos comuns “são os activos afectos à prestação de serviços concorrenciais e à prestação dos serviços públicos de telecomunicações em regime de exclusivo”, como se pode ler no contrato. Caso as partes acordem nos termos que determinado activo comum deve ser atribuído a uma delas, a parte que àquele renuncia será compensada pelos seus direitos sobre esse activo. Compensação esta que será calculada pelo valor que for mais elevado de entre o valor líquido ou o custo de substituição no momento de atribuição.
Por fim, os activos de investimento referem-se aos investimentos realizados pela CTM nos serviços locais e internacionais de circuitos alugados, bem como nos serviços de trânsito. Estes serão considerados da única e exclusiva propriedade da CTM e não integram os activos da concessão.

Soluções à vista

Questionado sobre a vontade da Comissão, Chan Meng Kam não confirma que o grupo de trabalho considera a não renovação o passo a seguir. “Não queremos que seja injusto (…) já viram os preços em Macau (…) a concessão não pode pertencer a uma só (…)”, argumentou, indicando ainda que para a Comissão existem fortes razões de interesse público neste caso.
Chan Meng Kam acrescentou ainda que durante o encontro a Comissão teve como principais alertas e conselhos ao Governo a promoção da concorrência do mercado justa, pedindo mais esforços ao Executivo para rever a cláusulas deste “contrato injusto” e que o mesmo entre em conversações com a CTM. Pontos que o Governo garantiu fazer.

29 Jun 2016

Ensino infantil | População insatisfeita com trabalho do Governo

Enfrentando a crescente taxa de natalidade, o trabalho do IAS na pasta do serviço infantil não tem sido suficiente. Num debate, a população mostrou acreditar que a Administração pode fazer muito mais

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]conteceu ontem, organizado pela Aliança de Povo de Instituição de Macau, o 18º “Citizen Talk”, subordinado ao um dos temas mais polémicos e quentes da actualidade: o ensino infantil. Este assunto tornou-se uma da maiores preocupações dos pais de Macau. Na discussão estavam presentes as deputadas Wong Kit Cheng e Song Pek Kei, representantes do Instituto da Acção social (IAS) e membros de várias associações do foro social, para discutirem os trabalhos feitos e os que ainda faltam fazer.
Segundo os últimos dados de Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), em 2013, nasceram 6571 crianças, aumentando para 7360 em 2014, e para 7055, no ano passado. Neste momento existem 8600 vagas nas creches de Macau. O Relatório das Linhas de Acção Governativa, de 2016, comprometia-se a aumentar este número para 10 mil este ano, algo que o Governo acredita conseguir.

Mais professores

Com o considerável aumento do número de creches nos últimos anos, foi questionado se o número dos professores consegue cumprir as necessidades do território. Em resposta, a chefe da Divisão de Serviços para Crianças e Jovens, Lao Kit Im, referiu que o instituto tem vindo a investir cada vez mais na formação dos professores. “A partir do ano passado, em cooperação com a faculdade de Educação da Universidade de Macau, lançamos o curso de formação destinado aos funcionários de creches que não têm diploma de pedagogia, mas que têm paixão em contribuir para o serviço de creche”, disse, acrescentando que o “curso vai ser aberto ao público pela segunda vez consecutiva, já no próximo ano lectivo”.
Lao Kit Im afirmou ainda que o subsídio para os creches tem vindo a aumentar muito. “Antigamente, o subsídio para a remuneração dos professores de creches correspondia a um terço da remuneração cada um, mas no ano passado já se iniciou a atribuição do subsídio total a um professor por duas turmas, e, por uma turma, um subsídio para um professor assistente e uma governante de creche”, esclareceu, frisando que o IAS também “oferece subsídios ao pessoal da limpeza, administradores e funcionários.” É ainda atribuído um subsidio regular às creches para formação de docentes.

Supervisão da qualidade

Ieong Kuong Kao, representante da Aliança de Povo de Instituição de Macau, questionou se o organismo realizou algumas medidas de supervisão para os mais de cem milhões de subsídios atribuídos anualmente. Lao Kit Im garantiu que o organismo está sempre a fazer uma supervisão regular. “Fazemos visitas imprevistas às creches para supervisionar a situação da gestão e para verificar se o saneamento e o sistema de prevenção de incêndios estão a ser mantidos como antes. Também temos reuniões com os responsáveis das creches regularmente para que estes façam relatórios do seu trabalho”, explicou.
A representante explicou ainda que a qualidade do ensino nas creches não é muito satisfatória e existe uma diferença na qualidade entre as creches. “Alguém me contou que há creches que só deixam as crianças dormir e brincar, mas também existem creches que oferecem um ensino muito bom”, garantiu. Na sua opinião, a creche é um lugar para as crianças se adaptarem à vida em grupo, aprender a cuidar de si mesmos, mas não um lugar “para pegar numa caneta e aprender a escrever”. O organismo leva mais em conta a promoção da vida social e em grupo, e a sua formação a nível de convívio. “Já pedíamos a educadores de Hong Kong para planear mais de 500 actividades de promoção social, visando a promoção das competências pessoais das crianças”, explicou.

Facilidade de transporte

Questionada por uma cidadã se vão existir serviços de transporte para as creches, sobretudo as que estão a ser construídas nas ilhas, a responsável do IAS disse que, como o alvo dos novos serviços serão as crianças com idades compreendidas entre os três meses e os três anos, não será seguro providenciar o transporte, dado existirem dificuldades em assegurar a segurança dos carros.

Conforme as regiões

Um residente presente no colóquio sugeriu que o IAS possa pensar na distribuição de vagas por zona consoante o número de crianças existente, por forma a evitar que estas sejam colocadas em creches mais afastadas da sua zona de residência. O IAS disse, contudo, que será difícil pôr essa ideia em prática. “A nossa pesquisa mostrou que os pais escolhem muitas vezes as creches que estão localizadas nas zonas onde trabalham ou que ficam perto nas casas dos avós. Não vamos conseguir dar prioridade às zonas onde as crianças vivem, mas tudo irá depender de um consenso entre os pais.” A mesma responsável referiu ainda que é importante que os pais compreendam que as crianças vão aprender socialmente as várias competências, não sendo necessária pressa para encontrar uma creche. Isto porque muitos pais já procuram creches assim que os filhos nascem.

Plano provisório

A deputada Song Pek Kei defendeu que o IAS está a trabalhar apenas para resolver os problemas com o ensino infantil a curto prazo, falando da necessidade de fazer um plano global para a construção de creches, sobretudo nas novas habitações públicas. A responsável do IAS referiu que “neste momento a criação de uma creche demora mais de um ano. O que estamos a fazer neste momento é reservar um espaço para uma creche assim que fique disponível, e contactamos de imediato as entidades responsáveis. Quando tomamos conhecimento de que vai ser construída uma nova habitação pública, começamos a comunicar com esses departamentos”.

Vozes da sociedade

Chan Peng Peng, conselheira do Conselho Consultivo de Serviços Comunitários das Ilhas e mãe, partilhou com os cidadãos a situação de falta de cresces. “Nas ilhas, o serviço de creches é muito insuficiente”, refere, existindo apenas 11. “O ideal para os pais é que os seus filhos ingressem nas instituições públicas, mas dada a dificuldade acabam por procurar os serviços no privado” afirma Chan, salientando que de acordo com as suas pesquisas o valor das creches privadas é superior ao das propinas universitárias. Quanto à falta de espaço para a construção de mais estabelecimentos, a conselheira sugere o início da colaboração com os casinos de modo a solicitar que as operadoras também abram creches e assim assumam uma maior responsabilidade social.

IAS considera valor das propinas razoável

A acusação surgiu através de uma intervenção do deputado Chan Meng Kam. Na visão do legislador, as propinas de algumas das creches financiadas pela Administração são elevadas. Feitas as contas, o Executivo subsidiou, neste ano lectivo, 33 creches, sendo que apenas cinco delas oferecem um serviço gratuito, e pedindo apenas cem patacas mensais para as refeições às famílias carenciadas.
As restantes 28 instituições de ensino, subsidiadas pelo IAS, exigem um pagamento entre as 1100 patacas e as 1700, dependendo do número de horas passadas na creche. Na contas do deputado, estão ainda incluída as 17 escolas privadas, sendo que uma delas é operada por uma organização sem fins lucrativos e oferece, também ela, um serviço gratuito. As restantes aplicam propinas que ultrapassam as 3700 patacas para aulas diárias e 2900 para aulas até ao meio-dia. Valores que para o deputado são elevados, até porque parte das escolas recebem subsídios.
Em resposta, Vong Yim Mui, presidente do IAS, indicou não considerar que o valor praticado pelas creches subsidiadas seja elevado, referindo, no entanto, que a propina média deste ano aumentou 11% quando comparada com o ano de 2013, ou seja, um aumento de 4% anual. Aumento razoável para Macau, acredita o IAS, quando comparado com o a índex dos preços do consumidor.
No caso das outras escolas, o IAS respondeu que nada pode fazer por se tratarem de escolas de foro privado. “O IAS normalmente não intervém no preço das propinas das escolas privadas. O valor é decidido pelas suas próprias direcções, com base no custo da operações, na situação do mercado. Mas podemos garantir que vamos acompanhar e investigar em caso de queixas”, explicou o Administração.

Melhorias à vista

Vong Yim Mui recordou que o Governo já introduziu muitos recursos para a criação de novas creches e medidas para melhorar os serviços dos recursos humanos e serviços oferecidos pelas próprias instituições. Até agora, apontou, mais de metade dos pais de crianças entre os 0 e os 3 anos de idade estão à procura do serviço de creche, sendo que o Governo conta poder satisfazer o grupo. Números mais recentes mostram que 90% das crianças com dois anos estão matriculadas nas creches do território.
Além disso, sublinhou o IAS, na resposta, será estudada a introdução de um mecanismo especial para ajudar as famílias mais carenciadas e com poucos rendimentos. Tal como acontece agora, que existem escolas que estão a oferecer um serviço temporários a essas famílias.
O instituto garantiu ainda ao deputado que tem feito um trabalho de fiscalização dos valores praticados pelas creches. A Administração rematou afirmando que há sempre maior procura do que oferta dos serviços de creche.
Na primeira quinzena do presente mês, o Governo avançou que até ao próximo ano cinco novas creches vão abrir portas, uma na Ilha na Montanha e as restantes em Macau. Ao todo, mais de 1400 crianças poderão usufruir do serviço. A creche na Ilha da Montanha ficará à responsabilidade da Obras da Mães. Depois de aberto, este espaço será uma das maiores creches de Macau, com capacidade até 200 crianças.

Com Angela Ka

29 Jun 2016

Ocean Garden | Parque infantil em péssimas condições põe segurança em risco

Equipamentos em mau estado, tudo cheio de lixo e muitas vezes utilizado como casa de banho para cães. É assim o estado em que se encontra o parque de lazer dos Ocean Garden. O IACM nega responsabilidades e atira o assunto para a administração do condomínio. Mães unidas querem um espaço onde os filhos possam brincar

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] o parque da polémica. Apesar de Macau disponibilizar “parques de lazer com excelentes equipamentos” este é o seu calcanhar de Aquiles. Fica no complexo Ocean Garden, na Taipa, ao lado do Sakura Court, perto da Rotunda dos Jogos da Ásia Oriental.
No site do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) é identificado ainda como zona de lazer da Avenida do Oceano, sendo um espaço sob a responsabilidade do instituto. Mas parece que a realidade não é tão clara, é que chamado à atenção pelo estado de degradação do espaço, o Governo nega responsabilidades.
A ideia de denunciar o caso ao IACM partiu de Andreia Martins, mãe de uma criança de dois anos. “Eu sei que as crianças correm e brincam e estão sujeitas a isto [magoarem-se], mas duas crianças magoaram-se neste parque, uma partiu a cabeça e outra um dente”, começa por contar ao HM.
Depois de comentar o estado do parque, seja pela degradação visível e aspecto de abandono, como pelo lixo que salta à vista de quem por ali passa, Andreia decidiu escreveu uma carta expositiva ao IACM, colectando ao mesmo tempo várias assinaturas.
Na carta, enviada a 6 de Maio do presente ano, Andreia Martins, e as assinantes, indicavam que “as condições actuais destas instalações […] devem ser requalificadas em prol da segurança e bem-estar dos seus utilizadores”.
O documento dedica vários parágrafos ao assunto e menciona ainda dois outros parques que são da responsabilidade de administração de condomínios do complexo.
“Em relação à sua carta, em que refere os estragos em instalações recreativas da zona de lazer e o mau estado higiénico dos Jardins do Oceano, proponho a V.Exa. que, por esta zona não se encontrar sob a gestão do IACM, procure contactar directamente o promotor do respectivo empreendimento ou a empresa de administração de condomínio para lhe referir essas situações”, assina Cecilia So Mui, chefe dos Serviços de Zonas Verdes e Jardins do IACM.
É, apontam as assinantes, uma não resposta, porque o IACM não menciona o parque em causa, que é da sua responsabilidade. “Ignora ou parece querer ignorar”, defende Andreia Martins.
“Parece que se esqueceram que aquele parque é deles [IACM]. Acho que o Governo não está a ser competente, e mal viram que o parque era do Ocean Garden não quiseram saber. Isto é uma tremenda falta de profissionalismo”, aponta Joana Couto, mãe de uma criança com menos de um ano.
“É preciso perceber que isto não é nada inventado por nós. O parque é da responsabilidade do IACM e isso está no próprio site do instituto. Esta resposta parece só referir-se aos outros parques (…) parece-me que não quiseram responder. Deviam ter explicado o que se passa. Até podiam dizer que estão a fazer um estudo, como fazem tantos, também podiam dizer que estavam a estudar uma solução. Mas nem isso. Não tiveram a simpatia de nos dizer. Portanto isto é claramente ignorar e varrer para baixo do tapete”, argumenta ainda Diana Massada, uma das assinantes.

Pontos negros

Os problemas são vários e as mães tornam isso claro. “Em primeiro lugar, existe um problema de segurança. O escorrega é perigoso, pois a sua estrutura é antiga e instável. Em segundo, é um escorrega que não pode ser utilizado por crianças de todas as idades. É uma estrutura demasiado alta, sem escadas, que obriga as crianças a trepar as barras de ferro para poderem utilizar o escorrega”, começa por apontar o documento a que o HM teve acesso.
A questão da segurança é ainda apontada pelas assinantes pois, apontam, as instalações destinada para exercício físico para adultos são partilhadas no mesmo espaço do parque, sem qualquer separação física. “Esta situação causa incómodo tanto aos utentes destas instalações, como às crianças e quem as supervisiona, pois as crianças acabam por circular naquela zona, como se instalações infantis se tratassem. Já houve casos de crianças que se magoaram, atingidas por alguém que praticava exercício físico, causando um transtorno geral”, apontam ainda.

Ao lado do perigo

Outra falha apontada por Joana Couto é a falta de protecção entre o parque e a marginal. “Aquela zona de relvado está aberta para a marginal, de forma directa. Portanto crianças a brincar, meninos que jogam à bola naquela zona, é super perigoso. Perigosíssimo. Facilmente olhamos para o lado e a criança já está na estrada”, contou, indicando que já lhe aconteceu. “Não sei de acidentes que tenham acontecido, mas eu já vi, por mais do que uma vez, bolas a irem parar à estrada e os miúdos a irem a correr na tentativa de apanhar a bola. Se não fossemos atrás deles podia ter acontecido o pior”, apontou.

Saúde em causa

Mas não é apenas o estado de degradação que preocupa as mães, a higiene está também em causa. “Jovens residentes ou estudantes da Escola Secundária Pui Vai têm o hábito de frequentar o espaço, sujando as instalações e largando lixo no chão, incluindo beatas de cigarro, infringindo uma série de regras e leis da RAEM”, defende Andreia Martins.
Também para Diana Massada a situação de falta de limpeza é insustentável, colocando em causa a saúde das crianças e acompanhantes.
Pior que isso é o descuido dos utilizadores que passeiam animais de estimação e deixam que os mesmos “façam as suas necessidades” no parque de lazer para os residentes. Sem fiscalização não há como impedir que isto aconteça e ninguém “quer os filhos a brincar num espaço sujo, que é utilizado para parque de cães”, acrescenta ainda Andreia Martins.
Seguindo as instruções, uma proprietária de um apartamento no complexo e também assinante da carta entrou em contacto com a empresa responsável pelo condomínio. “Foi feita uma abordagem oral, mais um alerta desta situação, mas a administração ignorou por completo”, esclarece Andreia Martins.
A luta não termina. As assinantes vão continuar chamar o Governo às suas responsabilidades. “Se o IACM diz que não tem responsabilidade sobre este parque, se alguma criança se magoar a sério quem é que se responsabiliza?”, atira ainda para o ar Diana Massada.
O grupo vai agora responder ao IACM partilhando o link do Web site do instituto que indica que aquele parque é da sua responsabilidade. Andreia Martins diz ainda que vão averiguar de quem é a responsabilidade criminal em caso de acidente com os equipamentos dos parques que pertencem à administração do condomínio. Vão ainda enviar uma carta através do advogado à administração do condomínio e um documento expositivo ao gabinete da Sónia Chan, Secretária para Administração e Justiça, tutela a que pertence o IACM. Tudo “em prol da segurança das crianças”.
Ao HM, até ao fecho desta edição, o IACM não apresentou qualquer esclarecimento. Andreia Martins explica ainda que num território “com tantos bons parques” não faz sentido este ficar esquecido. Entre este compasso de espera, aguarda-se que as crianças possam voltar a brincar.

28 Jun 2016

TDM | Associações de deputados patrocinam programas

A Fundação Chan Meng Kam e a Associação de Conterrâneos de Jiangmen, dos deputados Mak Soi Kun e Zheng Anting, patrocinam programas transmitidos no canal chinês da TDM. Coutinho fala de “conluio” com “grandes associações”

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]urgem no pequeno ecrã sorridentes e a cumprimentar idosos. É assim o programa patrocinado pela Associação dos Conterrâneos de Jiangmen no canal chinês da TDM, o qual mostra os rostos dos deputados Mak Soi Kun e Zheng Anting. Transmitido no período da tarde, esse programa é patrocinado pela associação à qual pertencem os deputados e visa sobretudo a região de onde são oriundos os membros do hemiciclo.
Não são apenas os conterrâneos de Jiangmen a ter um programa patrocinado na TDM. A Fundação Chan Meng Kam, criada em 2013 pelo deputado, também paga a transmissão de um programa que é emitido no período da manhã.
Manuel Pires, presidente do conselho de administração da TDM, confirma a transmissão de vários programas patrocinados por associações, cujo patrocínio surge devidamente identificado no fim. Em declarações ao HM, Manuel Pires deixa bem claro: “nós não passamos publicidade a deputados”. O homem forte da TDM referiu que o facto destes pertencerem a associações e serem membros da Assembleia Legislativa (AL) é apenas algo que é comum acontecer em Macau.
Sem termos acesso a valores, tentámos contactar os deputados em causa. Chan Meng Kam esteve incontactável e o seu número dois, Si Ka Lon, referiu nada saber sobre o programa. Não conseguimos falar com Mak Soi Kun mas conseguimos falar com o seu número dois, Zheng Anting. Num primeiro contacto referiu que a sua associação não patrocinava qualquer programa, mas depois explicou que o patrocínio vem de dez pessoas, e não apenas de deputados.
“As outras pessoas que pagam também ocupam lugares importantes em Macau. É um programa que também é difundido em Jiangmen, para contar às pessoas como os conterrâneos trabalham de forma árdua em Macau. Se o programa viola a lei eleitoral, então quer dizer que não podemos dizer que somos deputados quando sairmos à rua. Se contarmos aos outros o que fazemos também estamos a violar a lei eleitoral?”, questionou Zheng Anting.

“Cúmulo dos cúmulos”

O deputado José Pereira Coutinho garante que a Associação dos Trabalhadores da Função Pública (ATFPM) não patrocina nenhum programa, falando da existência de “conluio entre o Governo e as associações poderosas que existem em Macau”.
“Isto é o cúmulo dos cúmulos, porque as associações que estão a pagar estes programas são as que tiveram mais votos nas últimas eleições. Esta é uma forma de antecipação, porque na verdade a campanha eleitoral já começou, já foram escolhidos os mandatários para a recolha de votos”, acusou Coutinho.
O deputado lança ainda farpas à TDM. “A TDM patrocina estas associações ao permitir a transmissão dos programas. Este patrocínio é escandaloso por parte da TDM”, apontou Coutinho, que diz que a revisão da lei eleitoral para a AL “é tardia e não vai ser eficaz”.
Contactado pelo HM, o analista político Larry So não vê, para já, incompatibilidades, mas prevê eventuais problemas no futuro. “Pelo que sei o Chan Meng Kam não faz isso a título pessoal, faz isso em nome da sua fundação. Penso que a Sociedade de Jogos de Macau (SJM) também faz um patrocínio no programa da manhã. Estamos numa sociedade comercial e isso é possível. Claro que estamos a aproximar-nos do período eleitoral e aí podem surgir problemas. Mas neste momento ainda não estamos no período de campanha eleitoral e não me parece que haja algum tipo de controvérsia”. Apesar disso, Larry So reconhece que “este é um tipo de promoção, em que (os deputados) podem ser mais bem conhecidos junto da sociedade, através dos meios de comunicação social”.

28 Jun 2016

Protesto | Residente acusa Venetian de capturas ilegais

Vão para uma sala e ficam sem documentos durante umas horas. A Venetian está a ser acusada por um residente de fazer capturas ilegais de pessoas dentro do casino, com a ajuda dos seguranças

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m residente, de nome Lei, manifestou-se ontem junto à fronteira com Zhuhai acusando a Venetian de ter autorizado a sua captura e encerramento numa sala com mais pessoas, algo que, segundo disse, ocorrerá com frequência dentro do empreendimento. Segundo relatou este individuo, os seguranças levam-nos para salas, apoderam-se dos documentos de identificação e os homens só podem sair várias horas depois, sem uma explicação.
Lei, que empenhava um cartaz que revelava a sua idade (48 anos) e o apoio que recebe de grupos como “Poder do Povo” e “Aliança da Juventude” contou o que aconteceu consigo em Maio. “Estava à espera de um amigo meu ao lado de um bar, no Venetian, quando de repente surgem três seguranças nepaleses que me obrigaram a ir para uma sala de segurança”, referiu Lei.
Quando chegou à sala, Lei terá encontrado outros chineses, sendo que alguns lhe disseram que estavam ali há cerca de 20 horas. O senhor Lei terá sido forçado a ficar na sala durante duas horas, tendo ficado sem documentos de identificação. Sem explicações por parte dos seguranças, Lei diz ter ficado ferido nos braços e nas costas.
Lei afirma que demorou algum tempo a denunciar o caso porque estava à procura de testemunhas, tendo referido que não tem qualquer ligação com a Venetian, tendo apenas sido jogador no casino da empresa. Lei referiu ainda saber apenas que os outros detidos são do interior da China, acusando a Venetian de permitir esta “ilegalidade” todos os dias, exigindo explicações à operadora.

Sem medo

“Um chefe do departamento de segurança, estrangeiro mas que fala chinês, já disse que a Venetian não tem medo de processos judiciais, por ter uma forte equipa de advogados.” Durante o protesto, Lei questionou o facto dos Estados Unidos serem um país onde existe preocupação com os direitos humanos. “Porque é que esta empresa americana faz ilegalidades na China, porquê?”, questionou.
Depois do protesto, Lei promete ir ao consulado-geral dos Estados Unidos em Hong Kong denunciar o caso, bem como fazer uma queixa junto das autoridades policiais de Macau.

28 Jun 2016

Portas do Cerco | Renovação do terminal custa seis milhões. Deputados criticam

O Governo vai gastar mais de seis milhões de patacas na renovação do terminal de autocarros e passageiros das Portas do Cerco. Ng Kuok Cheong, Si Ka Lon e Kwan Tsui Hang consideram que essa renovação continua sem resolver os problemas existentes

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] empresa local Companhia de Engenharia Young’s vai ficar responsável por mais uma obra de renovação do terminal de autocarros e passageiros das Portas do Cerco. Segundo um despacho publicado ontem em Boletim Oficial (BO), a empresa irá receber pouco mais de 6,5 milhões de patacas para realizar a “empreitada de melhoramento das zonas de espera de passageiros e de circulação rodoviária do centro rodoviário subterrâneo das Portas do Cerco”. A obra deverá ficar concluída em 2018, segundo os prazos de pagamento fixados no despacho publicado e assinado pelo Chefe do Executivo.
Há muito que os problemas de circulação, ventilação e infra-estruturas na zona da fronteira são abordados pelos deputados da Assembleia Legislativa (AL). Confrontados pelo HM, três deputados aplaudem esta iniciativa mas continuam a achar que a obra não vai resolver o problema.
“O Governo já fala da renovação da zona das Portas do Cerco há muitos anos. Agora vai gastar seis milhões de patacas, mas no passado há foram gastos mais milhões, mas tudo serviu apenas para tratar alguns sintomas e não para resolver a origem do problema. Investir seis milhões vai trazer certamente mudanças positivas, mas não vai servir para tratar o problema de origem”, referiu Si Ka Lon, número dois de Chan Meng Kam no hemiciclo.
“Sem ter um plano geral para a zona, tudo o que o Governo fizer não irá solucionar os problemas. Sei que o Governo já investiu muito num plano geral para a zona das Portas do Cerco, mas ainda nada disse sobre o assunto. Deveria ser mais transparente”, apontou o deputado.

Mais ligações

A deputada Kwan Tsui Hang espera que o Governo “possa acelerar o planeamento e a investigação” sobre a renovação da zona. Já o deputado Ng Kuok Cheong considera que o Governo “já deu a ideia de que não pretende realizar uma grande mudança” no local.
“Talvez tenha adoptado as sugestões dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), e fazer mudanças maiores ao nível dos transportes. A área precisa de grandes alterações e não apenas ao nível dos transportes mas também no que diz respeito à ligação com o Metro Ligeiro e as habitações que existem à volta. O que me parece é que o Governo não revela muita preocupação sobre esse assunto”, apontou Ng Kuok Cheong. Si Ka Lon espera que o plano de renovação melhor o sistema de circulação do ar, por forma a proporcionar um ambiente mais confortável aos passageiros.

Com Angela Ka

28 Jun 2016

Natália Gromicho: “Sempre me revoltei por não ter apoio no meu país”

Natália Gromicho está na RAEM para apresentar a sua primeira exposição na terra que há muito sonhava conhecer. A artista que expõe em Nova Iorque e é representada na Baker Street londrina pintou à vista de quem quisesse as 11 obras que abrem portas ao público na Casa Garden, já no próximo dia 30 de Junho

A Natália já conta com cerca de 20 anos de carreira. Como é que tudo começou?
Tenho mais do que 20 anos de carreira. Sempre me interessei por desenhar. Apesar de ter estado sempre na área das ciências, já no liceu fazia recortes das ilustrações dos manuais de português que eram, na sua maioria de grandes artistas. Quando ingressei no 10º ano resolvi abraçar as artes e optei por um curso profissional na área. Acabaram-se as negativas à excepção de geometria descritiva. Acabei por finalizar o 12º ano à noite.

Acabou por ingressar nas Faculdade de Belas Artes em Lisboa…
Desisti das belas artes. Sou autodidacta e serei sempre autodidacta, à semelhança da Graça Morais que cá esteve em exposição recentemente. Aquilo na faculdade era um horror! Por um lado estava num “convento” e o edifício, naquela altura, não tinha condições nenhumas de trabalho. Fui para lá autoproposta. Era aluna de 20 a desenho quando acabei o liceu, e cheguei ali e desisti quase de imediato. Aquilo não era para mim. Queria uma coisa diferente e não me sentia entendida. Queria outro tipo de trabalho e fiz-me à vida. Eu aprendo com os erros.

Também passou pela cerâmica…
Essa é a minha paixão maior. A minha formação na escola foi de cerâmica artística. Tirei o curso profissional nessa área e convivi com os melhores professores. Depois chego às belas artes e tenho um professor que nos aconselha a desenhar com um régua. Desisti logo! Também frequentei um curso no ARCO de carácter intensivo e foi aí que consegui aprofundar o nu artístico. E estando agora na China, aproveito para ir em busca das cerâmicas de cá e aprender mais.

Como arrancou então a sua carreira?
Depois de desistir das belas artes criei uma exposição auto-sustentável. Andei com esse projecto a correr Portugal. Não havia dinheiro e criámos um pacote, eu e o Gonçalo Madeira, o meu agente. A exposição era entregue a um determinado sítio e esse sítio entregaria a outro, e assim sucessivamente. andei com uma exposição itinerante por Portugal inteiro. Não havia dinheiro e fizemos um pacote em que eu entregava a exposição num sitio, esse sitio entregaria a outro, e assim se correu o país inteiro.

Foi o trabalho que marcou o seu arranque…
Sim porque Portugal tinha que saber quem era a Natália Gromicho. Já ouviu falar dela? Não. Então vai ouvir que os trabalhos vão estar perto de si. Foi essa a intenção. Foi uma exposição muito bem recebida e coincidentemente os trabalhos seguiram para a Austrália onde foram ainda melhor recebidos e vendidos. Estiveram no Adelaide Festival.

Depois do sucesso na Austrália como foi o regresso a Portugal?
A exposição correu bem e quando voltámos resolvi ter o meu atelier em Lisboa. Sempre me revoltei por não haver apoios ou reconhecimento no meu país. Depois de lá fora ter corrido tudo tão bem resolvi ser e afirmar-me como portuguesa. Quando chegámos a Portugal fomos procurar um local para recomeçar num momento de afirmação. Curiosamente o departamento de cultura de Câmara de Lisboa não nos deu qualquer incentivo e foi a área do património que nos propôs um espaço que possivelmente nos interessaria. Era uma antiga galeria municipal da câmara, abandonada, no edifício do espaço Chiado. Foi quando começaram a aparecer os primeiros convites para expor. Na mesma altura fui convidada para expor em grande formato no Open Day, uma iniciativa da LX Factory. Aconteceu tudo ao mesmo tempo e a câmara ajudou nesse sentido. Aqui se vê o espelho da cultura que devia ter sido o principal apoiante e não foi mais uma vez.

Apesar de estar sediada em Portugal a sua obra é conhecida, vendida e divulgada no exterior. Como é que se sente com este reconhecimento que não é na sua terra?
Portugal é futebol. Ramon Casalé, crítico de arte espanhol, foi quem me fez a primeira crítica arrebatadora. Em Portugal, tenho o atelier aberto ao público e as pessoas nem sequer lá entram. Isso acaba por me dar mais força. Quero fazer coisas mais estranhas numa linguagem ainda mais provocante. natalia_gromicho_5_sofiamota

A sua linguagem tem mudado. Como a poderia definir?
Tenho que me conseguir expressar de uma outra maneira que não seja por palavras. As coisas têm que ser ditas de outra maneira. A minha linguagem é para inovar e chocar. Ninguém consegue fazer uma pincelada igual à minha. Marco pela imperfeição. O homem não é perfeito e a imperfeição é arte. Se fizesse uma coisa perfeitinha era uma máquina, coisa que não sou.

É sabida a sua paixão pelo Oriente. Porquê este encanto?
A disciplina e o rigor. Acho que aqui as coisas são coerentes.

Influenciou também o desenvolvimento do seu trabalho?
Dei comigo a conhecer Singapura, uma cidade emergente, em pleno crescimento. Comecei logo a transmitir isso com o meu trabalho, com coisas mais geométricas. Não me comparem nunca com a deusa Vieira da Silva. A obra está feita, as manchas surgem, eu não tenho a culpa, não sei o que é, a minha obra está feita. Desenhei muito e fartei-me. Acho que desenhar toda a gente pode fazer. A minha passagem pelo Oriente fez com que o abstracto aparecesse de uma forma mais intensa. Passei a dar menos importância à linha, passei do figurativo para o abstracto. Também me inspirei na arquitectura e considero que aqui no Oriente se fazem coisas fantásticas. Por exemplo em Macau, construíram de uma cidade velha, uma coisa cheia de cor.

Como está a correr esta estadia por Macau?
Macau sempre foi um sonho meu. Já na Expo 98 em Lisboa visitava frequentemente o pavilhão dedicado a Macau. O contraste, aqui, encanta-me e é diferente de qualquer outra coisa que conheça. Saímos das Ruínas de S. Paulo, por exemplo, e logo a seguir se encontramos um edifício como o Grand Lisboa. Macau é uma surpresa.

Vai também inaugurar, pela primeira vez uma exposição no Museu Oriente em Portugal. É o esperado reconhecimento nacional?
Nunca foi minha intenção estar a expor numa coisa tão sagrada como é um museu. Mas sim, o reconhecimento pela Fundação Oriente em Portugal é de facto o culminar de muito tempo de trabalho. E exposição será composta por 71 obras em que muitos trabalhos são de grande formato e resultam de seis anos de trabalho que abrangem também as viagens pelo Oriente.

Pintou aqui na Casa Garden os trabalhos que vai expôr…
Acho que é bom ter companhia. Quando trabalho, mesmo acompanhada estou sozinha, mas é um desafio. Pode correr bem ou mal, se correr mal faz igualmente parte. É também uma maneira das pessoas verem como trabalho e de verem o processo de um artista expressionista.

O que espera levar de Macau, que queria tanto conhecer?
Tenho muitas ideias para levar comigo e poder mostrar o que é Macau. As que vão ser aqui expostas já estavam de alguma forma em mente, mas os trabalhos inspirados em Macau vão nascer após esta passagem.

28 Jun 2016

UM | Yao Jingming novo director do departamento de português

Yao Jingming vai substituir Fernanda Gil Costa na direcção do departamento de português da Universidade de Macau. Toma posse em Setembro e não comenta as causas da mudança. Alunos justificam mudança para “ensino mais oriental”

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] direcção do Departamento de Português da Universidade de Macau (UM) terá, já no próximo Setembro, uma nova cara: Yao Jingming. “Sim, posso confirmar isso. Mas só tomo posse a 1 de Setembro”, confirmou o actual coordenador de mestrados de Tradução.
Sem prestar qualquer esclarecimento adicional, Yao Jingming irá substituir a actual directora, Fernanda Gil Costa, que até ao fecho desta edição não foi possível contactar.
Numa tentativa de justificar a mudança o HM falou com alguns alunos do departamento de português que não estranham a mudança, até porque os alunos preferem um “ensino mais oriental”.
Um aluno finalista, que preferiu manter o anonimato, explicou que o “ensino ocidental do departamento da UM promove um estudo autónomo, aplicando uma disciplina muito livre”. Sendo que “os estudantes locais, em geral, não são muito trabalhadores” e se não forem “obrigados a estudar nunca serão bons profissionais”.
As diferenças, conta, entre alunos oriundos do interior da China e os locais são evidentes. “Os alunos que vêm do interior da China, habituados ao ensino oriental, são muito diferentes de nós e normalmente aprendem melhor do que os locais”, explicou, indicando que o ensino ocidental não impõe ao aluno a responsabilidade de ser bom aluno. “Mas claro que também há bons alunos locais”, explica, frisando que a Universidade de Línguas Estrangeiras de Pequim é muito “mais exigente” que a UM, mesmo na área de Língua Portuguesa.
“Se comparamos a UM, de um modo geral, às universidades da China, percebemos que o ensino é pior. Se quisermos trabalhar na área de português, depois de nos graduarmos, precisamos de saber muito, é muito importante aprender bem os conhecimentos básicos, gramática, o léxico, tudo. E nisso Pequim é melhor por ter o ensino ocidental”, acrescenta.

Missão cumprida

Para um actual aluno Fernanda Gil Costa cumpriu as suas funções de forma muito correcta. “A mudança de cargo já anda a correr os corredores da UM. Embora não tenha sido aluno da professora Fernanda Costa, acho que sempre assumiu as suas responsabilidades de forma muito correcta, gentil e soube unir as pessoas”, aponta. No entanto “o programa do departamento de português e o seu método pedagógico tende a ser mais académico”, algo que para o aluno não está direccionado para os alunos chineses e locais, e se estivesse, frisa, talvez os resultados do ensino fossem um pouco melhores.
Felipe, actual estudante do departamento, acredita que “um director chinês vai certamente trazer mudanças positivas para o departamento”. “Ele deve conhecer melhor o que os alunos querem e trabalhar num modelo pedagógico mais apropriado”, explicou, ao HM.
“Na verdade, não quero comparar o modelo ocidental e oriental de aprendizagem de línguas, pois ambos devem possuir as suas próprias vantagens e desvantagens. O que é mais importante é saber o que os alunos querem e ajustar o programa. Estive alguns meses em Portugal a fazer intercâmbio e lá há muitos bons professores portugueses e gostei muito das aulas. Se calhar os professores aqui devem prestar mais atenção ao ensino. As teorias de ensino de português aqui desenvolvidas não são muito adequadas aos alunos de Macau e devem ser ajustadas conforme o resultado de práticas. Em suma, acho que o departamento vai ser melhor”, remata.

Maior comunicação

O aluno finalista não esconde que existem problemas no programa de português. “Uma das características do nosso departamento é que não existe comunicação entre os professores, levando a que existam repetições nos conteúdos do ensino de cada professor. Acho que o método chinês para a fase inicial de aprendizagem é claramente mais útil porque exige que os alunos aprendam muito bem a base da língua”, argumenta.
O aluno chega mesmo a dizer que, de forma geral, o departamento de português não consegue adaptar-se aos alunos. “Os professores da UM, são maioritariamente professores estrangeiros, tratam-nos como alunos que falam uma língua materna estrangeira, levando a que os alunos não se consigam adaptar às diferenças do ensino ocidental e oriental. Acho que os professores do departamento não possuem muita experiência de ensinar português aos estudantes estrangeiros”, argumenta.
Uma combinação entre os dois tipos de ensino é a solução apresentada pelo ex aluno. “Acho que tanto o ensino ocidental como o oriental têm as suas vantagens. É melhor combinar os pontos positivos de cada um para alcançar um resultado melhor. Na primeira etapa, é melhor utilizar a maneira oriental para obrigar os estudantes a aprender, mas nas etapas seguintes o ensino ocidental orienta os estudantes a abordar a língua e a aprofundar o interesse deles à língua, até que os alunos possam realmente amar a língua . Nós temos recursos para fazer isso, porque temos professores chineses e portugueses”, frisou.
Para o aluno a escolha de Yao Jingming foi bastante acertada, apesar de nunca ter sido seu professor. “Para mim, não me importo se é um professor chinês ou uma professora estrangeira que vai assumir o cargo do director do departamento. O mais importante é o director perceber bem a necessidade dos alunos, e ter experiência suficiente para ensinar os alunos de língua materna chinesa. Nunca fui ensinado pelo professor Yao, mas acho que o departamento deve fazer uma reforma, acho que o professor Yao conhece melhor os estudantes chineses e talvez venha trazer um impacto positivo”, remata.

Com Angela Ka

27 Jun 2016

Lei Heong Iok, presidente IPM: “Cada vez mais escolas pedem docentes de português”

O ensino bilíngue é uma das “meninas dos olhos” de Lei Heong Iok. O presidente do Politécnico de Macau acredita na RAEM enquanto plataforma de trocas comerciais e culturais e lidera uma instituição que acompanha os tempos e as mudanças

Para o Instituto Politécnico (IPM) quais as mais-valias da Lei do Ensino Superior?
Para o IPM o aspecto mais importante é, com certeza, o poder vir a abrir os graus de mestrado e doutoramento. Esta abertura é de grande importância para o ensino superior até porque até agora, não podíamos abrir estes graus e com a futura lei do ensino superior o IPM poderá ter este poder académico.

Mas já têm parcerias com o grau de mestrado…
Sim. Os nossos colegas dos politécnicos portugueses já oferecem essa possibilidade. Desta forma estabelecemos parcerias nomeadamente com Instituto Politécnico de Leiria e temos cursos de mestrado abertos, sendo que o diploma é dado pela instituição portuguesa, mesmo que a formação também seja dada em Macau.

Com esta abertura, que áreas de mestrado ou doutoramento poderão abrir?
Até hoje os nossos licenciados pedem estes cursos porque não podendo continuar os estudos no IPM têm que procurar outras instituições, tanto em Macau e mesmo no estrangeiro. Por exemplo o curso tradução e interpretação português | mandarim, será uma prioridade. O governo já definiu e iniciou a pratica da construção de uma plataforma de comércio entre a China e os Países de Expressão portuguesa e por isso precisa de técnicos bilingues qualificados. Como nós não temos podido abrir mestrados e doutoramento podemos pensar que há aqui uma contradição. Os alunos já pedem a abertura nas áreas de cultura e língua portuguesa com prosseguimento de estudos em mestrado e até de doutoramento.

É essa então a primeira aposta, a abertura de graus superiores no ensino bilingue?
Sim. Não só é esse o nosso desejo como já iniciámos os preparativos para que isso aconteça.

Falando em bilinguismo, O IPM tem esta licenciatura em tradução. Faz sentido ter uma licenciatura deste género sem antes ter formação específica na língua em si? Sendo a especialização em tradução talvez uma área para os tais mestrados?
Isso faz sentido se pensarmos na qualidade. Essa pode ser uma solução que poderemos adoptar para quando se chegar à altura de fazer traduções e interpretações já exista o domínio das duas línguas. Realmente é necessário muito tempo para que se consiga fazer tradução . Mas temos que procurar uma solução equilibrada conforme as necessidades por parte dos alunos e mesmo dos pais que podem querer ou não investir tanto tempo ou dinheiro. Estamos a falar que havendo primeiro língua e depois mestrado, de um período de seis anos de estudos. Naturalmente que ficaria garantida uma melhor qualidade mas implica mais investimentos.

Não será a qualidade a prioridade?
Quatro anos em muitas áreas de estudo, não são efectivamente suficientes. Daí e mais uma vez, a necessidade de abertura de mestrados e doutoramentos. O IPM também está a pensar seriamente nessa lógica para os cursos que possam ser seguidos de graus superiores. Já sabíamos disso também há muito e por isso tratámos de antemão de estabelecer parcerias com politécnicos e universidades portuguesas e já conseguimos com Leiria ou Lisboa . Sabemos que temos ali fontes onde beber esse conhecimento. Para o grau de doutoramento já estabelecemos uma parceria com a Universidade de Lisboa. Gostaria de referir outro aspecto : hoje em dia, com o uso da tecnologia em particular na área da tradução, na chamada “machine translation”, temos estado especialmente atentos. Neste momento temos com Leiria e Coimbra , em andamento um projecto para a criação de um laboratório de tradução automática assistida por computador. Já falámos com o presidente do IPL e com alguns professores de Coimbra. Neste momento esta uma delegação do IPM em Coimbra , com especialistas na área de informática para darmos andamento ao projecto. Lei_Heong_Iok_6_sofiamota

Estão a criar um sistema informático capaz de fazer traduções com qualidade?
Exactamente! Hoje em dia está na moda e já há programas com alguma qualidade neste tipo de tradução nomeadamente do inglês para o chinês ou vice versa.

Dadas as especificidades do chinês, acha que é possível conseguir qualidade?
É muito difícil mas acho que é possível e que vale a pena tentar.

E o futuro dos tradutores que estão a formar ?
Acho que o Homem é sempre necessário para controlar a máquina.

Há alunos provindos da China continental que se licenciam em Macau, nomeadamente na área da tradução e interpretação, e depois não são absorvidos pelo mercado local por dificuldades relativas à residência. Qual a sua opinião?
Isso é uma área que não me compete, mas eu sou da opinião de que estando nós a formar tradutores de qualidade se devem abrir as portas de ambos os lados: quer a chineses do continente quer a portugueses que aprenderam o mandarim. Macau como plataforma deve não só atrair estas pessoas como ainda criar condições para que elas trabalhem cá de modo a aproveitar da melhor maneira esses recursos. Penso que é muito importante criar boas condições para a construção desta plataforma. O Governo, defendo eu, deve aproveitar. Pelo que sei, há vários serviços do Governo onde fazem falta bons tradutores e intérpretes. Por que não aproveitar melhor os alunos que passam por Macau? Acho que se devem criar condições para facilitar os pedidos de residência para esses profissionais.

O IPM está também a abrir novos cursos e a integrar estudantes de mais países…

Sim, abrimos um novo curso de língua chinesa para pessoas dos países de expressão portuguesa. Este é o primeiro ano deste curso de licenciatura em língua e cultura chinesa.

Qual a especificidade deste curso?
A abertura deste curso é especialmente preparada para pessoas que falem português e que queiram aprender mais chinês, não só a nível de língua como da cultura chinesa. Estamos a abrir este curso enquanto licenciatura e quem sabe, no futuro, ter outros graus. Já estabelecemos algumas parcerias e com a coordenação de vários politécnicos, para que tenhamos mais estudantes portugueses acabados de sair do secundário e que vêm directamente para o IPM, fazendo cá a licenciatura. E não serão só de Portugal. Teremos alunos de Cabo verde, Angola e mesmo do Brasil. No primeiro ano já vamos começar com quatro estudantes brasileiros e virá também uma turma de Cabo Verde que frequentará cursos nas áreas de jogos. De Portugal ainda não tenho o número de alunos, mas saberemos que irá aumentar. Já temos mais edifícios na Taipa cedidos pelo Governo que também ajudarão a albergar estes novos alunos e a partir do próximo ano lectivo já poderemos receber mais estudantes.

Como é que estes cursos vão ser financiados?
Com certeza que haverá estudantes com dificuldades financeiras pelo que tentaremos facilitar dentro do possível esses alunos com bolsas de estudo, ou mesmos estadia nas residências. Poderemos ainda ponderar a atribuição de outros subsídios como à alimentação. Lei_Heong_Iok_4_sofiamota

Na área do português, o IPM tem ainda o curso de Administração Pública que tem vindo a ter cada vez menos alunos. Porquê?
Macau foi entregue à China já há quase 18 anos e por isso o número de portugueses na administração pública tem também vindo a diminuir. As pessoas que falam português começam a não ver utilidade em tirar este curso. Por outro lado, há cada vez menos pessoas que falam português interessadas em ingressar na função pública. No entanto, se construirmos uma plataforma também aberta a mais países de expressão portuguesa, acreditamos que este curso poderá renascer e voltar a crescer. Actualmente também não o podemos abrir a estudantes da China ou outros estrangeiros, mas tendo outros cursos abertos a estudantes de língua portuguesa, esses alunos posteriormente poderão sentir interesse e querer integrar este, de Administração Pública. Acho que no futuro não voltaremos a sentir a falta de alunos. Por outro lado, também criámos a formação em relações económicas e comerciais e assim conseguir ter mais alunos e dar mais aulas aos nossos professores.

Enquanto plataforma, como tem dito, em que mais se tem destacado o IPM?
O IPM muda com o tempo e com as circunstâncias. Depois de ler uma recente entrevista do presidente Marcelo Rebelo de Sousa e sendo que Portugal pretende também ser um ponto estratégico da “Rota da Seda”, o IPM pode contribuir mais e melhor. Assim, por exemplo, e na sempre referida falta de técnicos bilingues, nomeadamente em áreas como a lei, finanças ou tecnologia, porque não pensar no futuro no domínio da área ferroviária, por exemplo. Estamos também a criar condições para abrir formação da docência do português.

Por quê a docência do português?
Cada vez mais escolas primária e secundárias pedem docentes de português, mesmo na China continental. Mas há que garantir a qualidade e o IPM com as parcerias que tem, pode assumir isso mesmo.

Relativamente aos estágios e à remuneração ou não dos mesmos. O que acha?
É difícil responder a isso devido à lei do trabalho em vigor. Podemos é utilizar a chamada “ajuda aos estudantes”, com alguns subsídios de incentivo Penso que o Governo também nesse sentido deveria abrir mais possibilidades.

Falamos actualmente das duplas licenciaturas que poderão vir a ser administradas. Considera uma medida positiva para o ensino superior?
Num futuro próximo o IPM não vai aderir às duplas licenciaturas. Pensamos mais na qualidade.

“A criação de um exame conjunto entre várias instituições é feito no sentido de facilitar aos alunos”

Acha que vão interferir nessa qualidade?
Há pessoas que são capazes de fazer duas coisas ao mesmo tempo. Há outras que não o podem fazer, nem querem. Mas quem faz duas coisas ao mesmo tempo, na minha opinião, tem sempre mais dificuldade e a qualidade do resultado será aquém do esperado.

Os novos exames unificados aos quais o IPM aderiu, constituem uma medida facilitadora para quem?
Penso que a criação de um exame conjunto entre várias instituições é feito no sentido de facilitar aos alunos. Com resultados já obtidos nas diversas áreas, os alunos podem concorrer em simultâneo a várias instituições.

Mas se correr mal não tem mais hipótese de repetir…
Tem razão nesse sentido, mas não há rosas sem espinhos. Nós vemos mais vantagem do que desvantagens. Acho que facilita muito. Na época de exames, coitados dos estudantes que se queiram candidatar a por exemplo dez instituições, têm que fazer dez exames, um para cada uma. É um período terrível para os estudantes. Agora fazendo este exame que depende das instituições que aderem, só têm que fazer um para essas mesmas instituições.

Qual a sua opinião quando ao financiamento por parte do Governo do ensino superior privado?
Não me quero pronunciar quanto a essa política do Governo.

A UM encerrou algumas turmas de português. Qual a sua opinião? cancelamento de turmas de português pela UM?
Eu só li o que foi publicado na imprensa portuguesa. De qualquer forma acho que quer o governo ou o IPM investem muito mais na área do português. O gabinete do ensino superior e Alexis Tam o nosso secretário, também dão muita importância ao ensino da língua e cultura portuguesa e apoia-nos muito nesse sentido.

O que tem a dizer acerca da recente descida de dez lugares da UM no ranking asiático?
Não meto o nariz na área dos outros. Interessa-me mais a minha instituição.

Avaliação do ensino superior…
Acho que os novos sistemas de avaliação são importantes. O IPM por exemplo contrata delegações de avaliação portuguesas para avaliação do nosso curso na língua. Ainda não saiu o resultado mas a delegação já enviou uma nota com uma avaliação positiva o que é muito bom ara nós e nos dá também um grande estímulo. Para outros cursos também convidamos agências especialistas em cada uma das áreas. No inglês convidamos Nova Zelândia e na informática convidámos agências de Inglaterra. É importante aceder à qualidade segundo os critérios internacionais. Se Macau quer ser internacionalmente reconhecido tem que ter instituições cuja qualidade esteja de acordo com os critérios internacionais, e para isso não pode recorre a avaliação local.

27 Jun 2016

Brexit | Futuro ainda é incerto para estudantes de Macau

O Reino Unido decidiu a saída da União Europeia e para já é incerto o futuro dos estudantes de Macau com nacionalidade portuguesa. Só sabem que temem dificuldades de permanência no país. Jason Chao aconselha-os a “apressarem-se”

[dropcap style≠’circle’]B[/dropcap]árbara vive no Reino Unido há 12 anos, é macaense e ainda não sabe o que o futuro lhe reserva após os resultados do Brexit, referendo que decretou a saída do país da União Europeia. Como portadora de passaporte português Bárbara tem acesso a regalias sociais e a propinas mais baixas, mas o futuro avizinha-se hoje mais difícil.
“Estou um pouco assustada,não sei o que vai acontecer, porque, apesar de viver lá há 12 anos, vai ser mais difícil com o Brexit provar que sou residente e que vivo sozinha. Vai ser mais difícil conseguir trabalhar e viver lá e ter um suporte financeiro”, contou a estudante ao HM.
“Pago as mesmas propinas do que um estudante do Reino Unido, mas neste momento não tenho a certeza do que vai acontecer, porque cobram propinas mais altas aos estudantes internacionais. Com o Brexit vamos ser considerados estudantes internacionais e isso pode afectar a nossa ida, porque não teremos as mesmas capacidades financeiras para estudar lá”, acrescentou Bárbara.
Jason Chao, dirigente da Associação Novo Macau (ANM) que assistiu ao referendo em Londres, pede aos estudantes que estão a pensar seguir os seus cursos universitários no Reino Unido para se “apressarem” antes que mudem as regras do jogo.
“Os estudantes de Macau e os seus pais escolhem as universidades do Reino Unido pela sua reputação, a posição no ranking e para poderem melhorar o inglês. Encorajo os residentes de Macau com passaporte português a se apressarem para apanhar o último comboio se querem as actuais facilidades de acesso às instituições de ensino superior do Reino Unido. Mas tudo vai depender das negociações. Se o direito de liberdade de movimentos se mantiver, creio que virtualmente não haverá qualquer impacto”, defendeu ao HM.
“O pior cenário que pode acontecer é que todos os europeus a residir, trabalhar e estudar no Reino Unido terão de pedir vistos de permanência, os quais serão aprovados caso a caso. David Cameron demitiu-se do cargo de primeiro-ministro e isso deixa as coisas pouco claras quanto às futuras negociações”, referiu ainda Jason Chao.
Os eleitores britânicos decidiram que o Reino Unido vai sair da União Europeia, depois de o ‘Brexit’ ter conquistado 51,9% dos votos no referendo de quinta-feira.

Governo activa resposta a possíveis consequências

O Governo de Macau afirmou que a saída do Reino Unido da União Europeia terá um impacto “relativamente limitado” no território, mas criou “uma plataforma de resposta” às consequências que podem advir no plano económico e financeiro. Apesar das “implicações” do resultado do referendo nas tendências económicas internacionais e nos mercados financeiros “serem muito profundas”, prevê-se que o impacto em Macau “deva ser relativamente limitado”, refere um comunicado do gabinete do Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong.
Por um lado, a percentagem dos activos denominados em libras esterlinas, detidas pela reserva cambial de Macau, é muito reduzida e, por outro, o volume de comércio com o Reino Unido também é pequeno e Macau não dispõe de mercado de capitais de acções. Em paralelo, o Executivo reitera que dispõe de “capacidade suficiente para fazer face às flutuações eventuais do mercado financeiro”.O Secretário da tutela deslocou-se à Autoridade Monetária de Macau (AMCM) para um reunião de trabalho, organismo que “já definiu uma plataforma de resposta às consequências” que possam advir do resultado do referendo e desencadeou os respectivos “mecanismos de supervisão e de resposta ao incidente”.
No comunicado, a tutela explica ainda que os fundos da reserva cambial são denominados principalmente em activos em dólares norte-americanos e em dólares de Hong Kong, com os em libras a representarem apenas 0,35%. Em paralelo, a reserva financeira de Macau não dispõe de activos em libras esterlinas. Já no sistema bancário local, no capítulo dos activos estrangeiros, a proporção de crédito sobre a Grã-Bretanha cifra-se em apenas 2,1%, correspondendo a cerca de 17,8 mil milhões de patacas.
“Apesar de se constatar um aumento dos investimentos realizados pelos residentes de Macau, nos títulos emitidos pelas entidades britânicas, que ascenderam, no ano passado, a 11,7 mil milhões de patacas, o peso de tais investimentos representou menos de 3% em títulos emitidos no exterior”, detalha. LUSA

China exige rápido acordo

A China apelou sexta-feira à União Europeia (UE) para que chegue “rapidamente” a acordo com o Reino Unido, após a vitória da “saída” no referendo, e reiterou o seu respeito pela decisão do povo britânico. “Esperamos que as duas partes iniciem conversações e cheguem rapidamente a um acordo”, sobre a forma como se conduzirá a saída britânica, disse a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Hua Chunying.
Hua disse, na conferência de imprensa de rotina que mantém com os jornalistas estrangeiros, que a China “respeita” o resultado do referendo e a decisão do primeiro-ministro britânico, David Cameron, que já anunciou a intensão de se demitir. A porta-voz esclareceu, no entanto, que a China manterá os acordos de cooperação financeira com o Reino Unido.
Um dos mais importantes diz respeito à escolha da “city” para lançar emissões de títulos denominados na moeda chinesa, o yuan. Hua indicou ainda que a UE e os seus membros vão necessitar de “algum tempo” para estabelecer os termos da saída. A porta-voz acrescentou que Pequim manterá a sua cooperação com o Reino Unido e a UE, insistindo que “uma Europa forte e estável favorece os interesses da China”.

27 Jun 2016

Metro Ligeiro | Deputados dizem que prémio pode ser exemplo no futuro

Um prémio aos bem comportados. É a ideia lançada, na passada semana, por Raimundo do Rosário, a atribuir à empresa que cumprir os prazos definidos na obra do metro ligeiro. Em reacções, vários deputados idealizam a medida para todas as obras públicas, mas é preciso ter atenção

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão 8%, do valor total da obra, que serão atribuídos à empresa que cumprir os calendários de trabalho na construção do segmento da Taipa do metro ligeiro. Prémio decidido pelo gabinete do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário, e tornado público na semana passada.
As reacções já chegaram e para vários deputados esta é uma boa ideia, que poderá funcionar não só na obra do metro ligeiro mas em todas as obras públicas. Em declarações ao Jornal de Cidadão, o deputado Au Kam San aplaudiu a ideia do Governo, afirmando que é uma iniciativa indicada para o território. A deputada Kwan Tsui Hang junta-se ao pró democrata e acredita que a medida pode vir solucionar o problema de atrasos nas obras públicas.
No entanto, a deputada Ella Lei apesar de não discordar com a ideia, acha que os atrasos são um problema dos construtores e que os mesmos devem assumir as responsabilidades quando não cumprem o calendário de trabalho.
Já José Pereira Coutinho, deputado, não concorda com a ideia, nem com a atribuição das funções do Gabinete para as Infra-estruturas de Transportes (GIT) a uma empresa privada. Para o também presidente da Associação dos Trabalhadores para a Função Pública de Macau (ATFPM) esta substituição de funções vem tirar clareza às funções. “Transferir para uma empresa privada, vai fazer com que os donos da empresa não sejam obrigados a participar na Assembleia Legislativa para responder a interpelações”, explica. Maiores dificuldades na fiscalização das obras e das operações são também consequências futuras apontadas pelo deputado.

Prémio gordo

O valor (8%) é para o deputado pró-democrata Au Kam San um “montante chorudo”, mas, aponta, feitas as contas talvez o Governo consiga poupar mais assim do que se com as derrapagens nos orçamentos devido aos atrasos. Se assim for, o deputado apoia a aplicação de um prémio em todas as obras públicas, fazendo com que para além de cumprirem o calendário, o Governo poupa erário público.
“Percebo que seja difícil introduzir nova idéias em Macau, principalmente por causa das burocracias, mas pelo menos o Secretário está a tentar isso, quebrando a tradição de Macau, portanto, só posso apoiar esta medida”, explicou o deputado à publicação chinesa.
A questão da poupança é também referida por Kwan Tsui Hang que diz-se acreditar que o Governo poderá deixar de gastar “grandes montantes dos cofres públicos” com esta medida. “Com os atrasos que têm existido os montantes gastos têm sido muito altos. O tempo perdido não é calculável por dinheiro, e portanto este novo sistema pode vir resolver este problema dos atrasos constantes. O Governo pode perceber qual o efeito desta medida e a médio e longo prazo implementá-la em outras obras”, explicou a deputada.
Mencionando outro ponto, a deputada considera que o Governo deve recrutar profissionais do estrangeiro, especializados em matérias ligadas à construção do metro ligeiro. Isto porque, segundo a Kwan Tsui Hang, os funcionários do GIT não têm experiência profissional suficiente para tratar da obra.

Bom e vilão

Au Kam San acha ainda que embora exista um prémio o Governo não se pode esquecer das punições, apesar do Executivo já ter admitido que não existe uma cultura de punição. “Podemos ter os dois sistemas a funcionar ao mesmo tempo, um de punição e um de prémio. É preciso punir quem não cumpre, e premiar quem cumpre, sempre tendo como base a lei”, apontou.
Apesar de Ella Lei não se mostrar contra, para a deputada cumprir calendários é uma responsabilidade e isso tem de ser cumprido. Antigamente, relembrou a deputada, em caso de atrasos os empreiteiros tinha de entregar um relatório a dar explicações. Algo que não acontece agora. É preciso exigir isso, apontou a deputada, e pedir profissionalismo às empresas.

27 Jun 2016

Plano Quinquenal | Governo acusado de fugir à questão democrática

Os deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San apresentaram as suas ideias no âmbito do Plano de Desenvolvimento Quinquenal, o qual, acusam, foge à questão da implementação do sufrágio universal para a eleição do Chefe do Executivo. A proposta contém novas ideias para a avaliação do Governo

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o dia em que Chui Sai On, Chefe do Executivo, ouviu a população sobre o Plano de Desenvolvimento Quinquenal, os deputados Au Kam San e Ng Kuok Cheong decidiram apresentar as suas ideias sobre o mesmo Plano, através da Iniciativa de Desenvolvimento Comunitário de Macau (IDCM), associação que lideram.
Os dois membros do hemiciclo acusam o Governo de fugir à questão da democracia e do sufrágio universal no Plano de Desenvolvimento Quinquenal. Para Au Kam San e Ng Kuok Cheong, é fundamental apostar na construção de um “regime político saudável” que possa atrair a participação de todos os cidadãos.
Os deputados defenderam que a eleição por sufrágio indirecto para a AL tem sido sempre controlada por uma minoria, sem nenhuma competitividade ou transparência, exigindo mais assentos por sufrágio directo. Para Au Kam San e Ng Kuok Cheong, só assim haverá uma verdadeira representatividade da população nos diversos órgãos consultivos e no hemiciclo.

Novas avaliações

O IDCM defende uma avaliação ao desempenho governativo através de várias vertentes. Uma delas prende-se com a avaliação feita pelos cidadãos através de inquéritos, os quais seriam feitos por universidades. Os funcionários públicos iriam realizar avaliações anónimas dos seus directores, enquanto que os secretários das cinco tutelas iriam avaliar os directores. A proposta sugere uma publicação anual de todas estas avaliações, com a devida definição das punições.

Longe de Pequim

A proposta apresentada pela IDCM está dividida em nove partes, as quais serão o resultado dos vários seminários organizados e opiniões recolhidas junto da população. Questões como os transportes públicos ou o sector do Jogo também foram abordadas, bem como a necessidade de uma maior avaliação do desempenho do Governo, a construção de mais habitação pública e um melhor sistema de segurança social.
“O Plano de Desenvolvimento Quinquenal foi elaborado e promovido pelo Gabinete de Estudo das Políticas, o qual não possuir o direito de planeamento. Este é apenas um material de propaganda do Governo e só junta os trabalhos que já estão a ser feitos. Isto é para mostrarmos que aprendemos a fazer as coisas como Pequim faz, mas as diferenças entre os dois planos quinquenais são óbvias”, disse o deputado Ng Kuok Cheong.
“O Plano Quinquenal da China apresenta responsabilidades políticas, e ao fim de cinco anos analisam-se as falhas e o que correu bem. Mas em Macau quando se concluir o Plano de Desenvolvimento Quinquenal já terá havido uma mudança de Governo. O novo Governo vai dizer que foi o anterior que falhou e isso tem a ver com a ausência de responsabilização”, defendeu ainda o deputado.

As outras ideias

Croupiers, aterros e transportes

“A Zona A dos novos aterros é o único terreno onde o Governo tem total autonomia para o seu planeamento”, referiu Au Kam San. A proposta sugere que no primeiro e segundo ano de implementação do Plano Quinquenal o Governo conclua o planeamento da Zona A, sendo que no terceiro ano deverá estar concluída a concepção das cerca de 28 mil habitações públicas que lá serão construídas, para que estejam prontas até ao final do Plano.
Os deputados defendem ainda uma maior proporção da habitação económica em relação à habitação social, sem esquecer a “classe da sanduíche”, ou seja, os residentes que não estão aptos a uma candidatura à habitação económica nem conseguem comprar casa.

Tudo na mesma
Sobre os dois sectores económicos mais importantes de Macau, a proposta defende que sejam criados mais elementos turísticos. Os deputados referiram que deve ser mantida a lei que proíbe os trabalhadores não residentes de serem croupiers nos casinos. Au Kam San e Ng Kuok Cheong garantem que a maneira mais eficaz de garantir o emprego aos locais é aumentar os custos de recrutamento dos não residentes. “Sem garantias, por mais promessas que o Governo faça, vamos ter sempre truques que enganam os trabalhadores”, referiram.
Sobre os transportes públicos, os deputados defendem a instalação de corredores exclusivos para autocarros nas principais vias, à semelhança do que tem sido feito na zona da Barra.
Os deputados voltaram a pedir uma transferência dos ganhos do jogo da Fundação Macau para o Fundo de Segurança Social, bem como a construção de mais lares e centros para idosos, mais cursos de formação e mais serviços médicos.

Participação de 500 residentes

A sessão de consulta pública destinada ao público, no âmbito do Plano de Desenvolvimento Quinquenal, decorreu na sexta-feira e contou com a presença de 500 residentes. Segundo um comunicado oficial, foram apresentadas sugestões nas áreas do urbanismo, saúde e educação, com destaque para a “atenção ao desenvolvimento e preservação de recursos dos solos de Coloane”, bem como a “definição das políticas de protecção ambiental mais transparentes”. Foi ainda pedido a “intensificação de ordenamento do porto interior e o melhoramento do aspecto da Rua de Bocage nas proximidades da Praça de Ponte e Horta”. Houve ainda “quem sugerisse o lançamento de políticas favoráveis à família, a atenção às camadas que não têm possibilidade de adquirir habitação no mercado privado, mas que, ao mesmo tempo, não preenchem os requisitos de habitação pública”. Os participantes defenderam ainda a “apresentação da calendarização relacionada com a construção de habitação pública e renovação urbana, bem como o delineamento de um bom plano de habitação pública na zona A”.

Candidatura à AL em silêncio

Au Kam San e Ng Kuok Cheong não quiseram prestar declarações sobre as eleições legislativas do próximo ano, não tendo referido se vão ou não candidatar-se a assentos na AL.

Angela Ka
27 Jun 2016

Especial 24 de Junho | A mãe de todas as batalhas

Decidiu-se nesse dia a sorte deste território. Para o bem e para o mal. Os holandeses perderam. E lá se foram as socas, o calvinismo e as tulipas. Ficou o vinho, o bacalhau, os jesuítas e o macaense. Foi um milagre

[dropcap]P[/dropcap]ara falar do dia 24 de Junho de 1622, ninguém melhor que C. Boxer com esta excelente síntese: “A ideia dum ataque holandês contra Macau datava já de muito antes de 1622. Pondo de parte as visitas hostis feitas por naus ou galeões holandeses em 1601, 1603 e 1607, que não eram, afinal, destinadas para ocupar a colónia à mão armada, a malograda tentativa de 1622 tinha a sua origem no estabelecimento dos holandeses no Japão, doze anos antes.”

A Companhia Holandesa das Índias Orientais, a VOC (Verenigde Oost-Indische Compagnie) foi criada em 1602, dois anos depois de formada a Companhia Inglesa das Índias Orientais e tinha sede em Amesterdão, onde em 1609 foi criado o Banco de Amesterdão para apoiar o comércio colonial. A Companhia cria o conceito actual de acções quando em 1610 divide o seu capital em quotas iguais e transferíveis em Bolsa. O objectivo era excluir os competidores europeus daquela rota comercial e o alvo eram então os portugueses, que se encontravam sob domínio espanhol e eram detentores dos melhores portos estrategicamente colocados na Rota Marítima da Seda. Entre 1609 e 1621, houve um período de tréguas entre holandeses e a Espanha, embora mal guardadas no Oriente, pois nunca os holandeses abandonaram a ideia de conquistar Macau. Quando os doze anos de tréguas expiraram em 1621, o então Governador-Geral holandês em Batávia, o celebrado Jan Pieterszoon Coen, resolveu fazer uma grande expedição, destinada a pôr termo à questão, pela tomada da Cidade de Santo Nome de Deus na China.

A Macau chegava a seda crua comprada na feira de Cantão e tão necessária aos holandeses para conseguir no Japão substituir os mercadores portugueses. Por isso era local apetecível e preferencial para dominar o Mar da China, pois Malaca, praça que controlava a passagem dos barcos do Índico para o Pacífico, estava bem fortificada com a Famosa. As praças portuguesas estavam todas em sobressalto com a possível chegada das armadas, ou inglesas ou holandesas.

Invasão Holandesa, petisco na mesa

Sabiam os holandeses que se conseguissem conquistar Macau, acabavam com a presença portuguesa no Extremo Oriente, ficando ainda numa posição privilegiada para interceptar os juncos chineses que navegavam para Manila, nas Filipinas. Através de uma carta conseguida durante a tomada de um barco português, sabia-se a cidade mal guarnecida tanto de homens, como deficitária em fortificações. A maioria dos homens de Macau encontrava-se na feira de Cantão e restavam na cidade apenas cinquenta mosqueteiros e uns cem moradores capazes de pegar em armas.

A esquadra holandesa foi organizada em Batávia para atacar Macau, sendo constituída por oito navios e mil tripulantes e capitaneada pelo Almirante Reijersen. Após partir desse porto a 10 de Abril de 1622, a ela se reuniram os barcos a viajar pelas águas do Mar da China e quando chegou à vista de Macau em 21 de Junho de 1622 a armada holandesa, composta por treze navios, encontrou as quatro naus vindas de Manila, onde participavam no bloqueio. Os dois barcos ingleses não chegaram a intervir na conquista de Macau, devido à carta de Coen a avisar que os ingleses apenas poderiam dar apoio no mar, mas nunca desembarcar em Macau e em tempo algum lhes fosse permitida a participação na construção da fortaleza que, após a conquista, os holandeses deveriam aí erguer. Como traziam já à partida a vitória assegurada, recusaram aos ingleses a participação no assalto à cidade, tendo estes se retirado antes do início dos combates.

O reconhecimento da península de Macau foi feito por três espiões e no dia seguinte, a 23 de Junho por Reijersen, que desde o barco analisou a cidade e vizinhança. Resolveu desembarcar no dia 24 na praia de Cacilhas, o ponto mais favorável. Ainda nessa tarde, três dos navios holandeses travaram um renhido duelo de artilharia com o baluarte de São Francisco. Dos barcos gritavam dizendo aos do baluarte que no outro dia seriam senhores de Macao. Retirando-se ao pôr-do-sol, houve nessa noite grandes festas nos barcos holandeses, o que levou o Capitão-mor Lopo Sarmento de Carvalho, a quem estava entregue o governo militar da cidade, mandar aos dos nossos baluartes responder com idênticos festejos de vitória.

A batalha decisiva

Ao romper do dia de São João Baptista, de 24 de Junho de 1622, duas horas depois do nascer do sol, saíram das naus da armada holandesa trinta e duas lanchas, transportando a força de desembarque até à praia de Cacilhas. Entretanto, duas naus holandesas começaram um intenso bombardeamento ao baluarte de São Francisco, ao que a guarnição do forte respondeu.

Espreitando por detrás de um pequeno banco de areia, preparado para a defesa da praiazinha de Cacilhas, estava António Rodriguez com 60 portugueses e 90 filhos da terra. Desembarcaram sem dificuldade os oitocentos homens das forças holandesas, sendo duzentos japoneses, índios e malaios holandeses e, formando os seus esquadrões em terra, marcharam para o entrincheiramento dos portugueses, havendo grandes cargas de mosqueteria de parte a parte.

O Almirante Reijersen, ainda mal tinha pisado terra, foi ferido por uma bala de mosquete na barriga, tendo de ser levado logo para o barco. Sem outras baixas de ambos os lados, foi conquistada a enseada, após os homens de António Rodriguez recuarem e logo em formação os holandeses continuaram o seu avanço, sob o comando do veterano capitão Hans Ruffijn. Na praia deixaram duas companhias para cobrir a retirada, e seguiram pela campina que torneava a Colina de Nossa Senhora da Guia.

Foi então que da fortaleza de S. Paulo, ainda por acabar, os padres jesuítas atiraram três bombardas, tendo uma bala acertado no barril de pólvora de um dos barcos, que se encontrava no meio do esquadrão. Tiro fatal, para o sucesso do dia, foi calculado pelo grande matemático padre italiano Jerónimo Rho S.J., chegado a Macau nesse mesmo ano. Com o inesperado estrondo nas bandas da sua esquadra, os holandeses pararam e perdida a confiança ao olhar para um bambual pensaram estar perante uma cilada. Então decidiram pelo lado do Oriente ocupar a Colina da Guia, que dominava sobre a cidade e praia de Cacilhas. Mas aí, na ermida encontrava-se Rodrigo Ferreira com oito portugueses e até vinte topazes e cativos, que lhes foram dando cargas e os fizeram parar. Apercebendo-se das intenções, João Soares Vivas com 50 mosqueteiros e Lopo Sarmento de Carvalho, que vinha carregando desde a parte da cidade, aí chegaram para ajudar.

Com o cume do monte ocupado pelos portugueses, o esquadrão inimigo de oitocentos mosqueteiros então capitaneados por Ruffijn, ficou em posição desprotegida e quando este capitão caiu em combate, os holandeses desordenados puseram-se em fuga, tratando só de salvar as vidas. Com o ânimo empolgado, o povo aproveitando a debandada perseguiu-os com tanto ímpeto que os fazerem embarcar a nado, mesmo às companhias que na praia ficaram. Deixaram mortos no campo, na praia e afogados no mar até 700 homens e por despojo oito bandeiras, um canhão, cinco tambores, muitas armas, e alguns prisioneiros, de que até ao seguinte dia só viverão sete.

Logo após a vitória, no próprio local da batalha, os vencedores deram a liberdade aos seus cafres, em prémio da sua lealdade e coragem. Os moradores acorreram à Sé, onde se celebraram solenes ofícios em acção de graças pela vitória que acabavam de obter. Aí, nessa altura, o Senado e o povo prometeram idêntica comemoração todos os anos na véspera de São João, voto que foi escrupulosamente cumprido até agora e assim, o dia de S. João Baptista é festejado em Macau na Calçada da Igreja de S. Lázaro.

24 Jun 2016

Especial 24 de Junho | Carlos Marreiros: “Nunca existiu união na comunidade macaense”

O Dia da Cidade poderá um dia ser feriado, mas agora não é uma questão fundamental. Carlos Marreiros faz a radiografia à sua própria comunidade e defende que os jovens macaenses têm melhor formação, mas devem ser mais activos. Para o arquitecto, a saída dos macaenses da Função Pública está longe de ser uma tragédia

A questão da casa-museu macaense é um projecto que está parado. É um projecto ao qual se pretende regressar?
Temos uma proposta muito detalhada. Há um conjunto do espólio e o museu que serão instalados em duas casas no bairro de São Lázaro, projectadas em 1903 e que estão parcialmente em ruínas. Existe um estudo de viabilidade e uma estimativa de custos, de construção, decoração, criação do museu e aquisição de espólio.

Porque é que ainda não se avançou?
Esse projecto foi apresentado às entidades competentes há uns anos e em condições muito favoráveis para o Governo. A Santa Casa da Misericórdia (SCM) deseja utilizar uma proposta deste espaço para a cedência do museu para 25 anos. Houve expressa vontade de alguns governantes que consideraram muito positiva esta iniciativa que até teria uma parte educativa muito importante. Mas vai o diabo entender, passaram estes anos todos, e nada. A SCM nem sequer teve uma resposta formal sobre isto. Parece que a prática corrente é que as pessoas pura e simplesmente ficam sem resposta.

Vão continuar a insistir?
Eu não vou porque não tenho argumentos para insistir. A SCM, que eu saiba, está um bocado desmoralizada, porque os anos passam, o edifício vai-se deteriorando, as pessoas morrem e depois o projecto já não é válido e precisa de ser remodelado, e isso custa dinheiro.

Considera que este é um exemplo da falta de preservação da cultura macaense que existe por parte das autoridades?
Considero, porque tirando o museu de Macau, na Fortaleza do Monte, é algo que existe sempre no discurso político, mas depois na prática não se verifica. Macau precisa de diversificar. O Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura acabou de inaugurar aquele espaço junto aos lagos Nam Van. Vai fazer também um projecto junto às Casas-Museu da Taipa, mas mais virado para a cultura portuguesa. Eu aplaudo essas iniciativas, mas são iniciativas do foro cultural recreativo e do consumismo. Há falta de museus em Macau e temos de criar bons museus na zona.

Pode dar exemplos?
Temos de pensar naquilo em que somos bons. Compreendemos que temos uma história rica, e não é por acaso que figuras como Camilo Pessanha ou Sun Yat-Sen escolheram Macau. Sun Yat-Sen, que tanto agrada aos chineses por ser o pai da modernidade chinesa, e aos europeus, que o aceitam como um grande reformador e estadista. É uma figura de primeiro plano e internacional com ligação a Macau, e teve ligações provadas com macaenses como Hermenegildo Fernandes. Teve fortes relações com o Camilo Pessanha também. O Governo ou quem de direito não faz estas investigações , não sabe explorar o potencial que é fazer um grande museu sobre o Sun Yat-Sen e a sua ligação com Pessanha, com Vicente Jorge e Francisco Hermenegildo Fernandes. Se este museu, centrado em Sun Yat-sen e nestas personalidades, for bem feito, tem potencial de atractivo internacional, muito mais do que as coisas que aqui têm sido feitas. Se em várias coisas somos os melhores do mundo, porquê contentarmo-nos em sermos o melhor do mundo na jogatana e nos casinos? Eu não me contento. Devíamos pensar num branding em termos de figuras como Sun-Yat Sen e Camilo Pessanha, porque a indústria do souvenir é paupérrima. Agora fala-se muito na questão dos estaleiros de Lai Chi Vun. Fico muito feliz porque a população e o Governo estão a tomar atenção sobre aquele sítio.

Mas não será porque os estaleiros estão prestes a cair e é uma situação urgente? Caso contrário talvez nada fosse feito.
Em Macau é perigoso ser-se avançado. Nunca somos compreendidos, e isto não é um pretensiosismo meu. No estrangeiro quem tem ideias avançadas é reconhecido e apoiado, em Macau é maltratado. É melhor ser mais vulgar. As pessoas estão preocupadas, e é certo que aquilo está prestes a cair. Sabemos que a associação dos moradores está insatisfeita e querem manifestar-se. O Governo deveria criar um grupo privado, com locais, para fazer um levantamento aprofundado e pensar num museu para lá.

Mas o Governo afirma que já foram feitos estudos.
Não está feito nenhum estudo. Sou membro do Compasso Volante, um concurso internacional de estudantes de arquitectura de todo o mundo, organizado pelo Instituto Politécnico de Milão. Em Macau eu e o José Sales Marques somos membros do júri. Em Macau foi escolhida, por duas vezes, a povoação de Lai Chi Vun, houve prémios, fizemos duas exposições. Fizemos estudos, propusemos ao Governo, não há resposta. Há uma parte para viabilizar a construção, para construir e ganhar dinheiro.

Com habitação?
Construção de residências de luxo, com apenas três andares, integradas na colina. Fazer uma pequena marina e um museu, incluindo uma super cobertura integrada com a actual estrutura dos estaleiros. A iniciativa privada fazia as suas contas, o Governo adquiria isto e geria-o.

O Governo não faz, mas também não deixa fazer?
O actual Chefe do Executivo pode agradecer a sua fortuna porque tem cinco super secretários que dão o corpo ao manifesto e abrem o peito para receber as balas. Edmund Ho não teve o luxo de ter Secretários dessa qualidade. Não percebo porque é que o Governo continua a andar ao passo de uma tartaruga cega, surda e com as quatro patas coxas. Aliás, ultimamente com algumas iniciativas até deram tiros no próprio pé.

Voltando à preservação da cultura macaense. As autoridades estão a falhar, ou a própria comunidade também está?
Ambas. Cabe ao Governo a liderança, mas cabe à sociedade privada a iniciativa. Que eu saiba nenhuma das instituições macaenses propôs um museu. Mais uma vez a SCM foi pioneira em fazer um núcleo museológico na actual sede, pois é a maior representante da comunidade macaense, com 450 anos de existência. As outras associações contribuem, mas quem tem autoridade para falar em nome de todos os macaenses é a SCM.

Hoje celebra-se o Dia da Cidade. É uma data esquecida? Deveria ser feriado novamente, ou deveríamos recordar o dia de outra forma?
Feriado acho que não, porque é um dia que diz apenas respeito à comunidade macaense. Caso contrário teríamos de ter um dia da comunidade de Fujian ou de Cantão. Hoje temos um arraial que em boa hora começou a ser organizado pela Associação dos Macaenses (ADM) e Casa de Portugal em Macau (CPM). Quem me dera poder contribuir mais com o Albergue SCM para o festival popular. marreiros.1.sofiamota

Porque é que não o faz?
Não tenho meios. Mas não é contribuir com sardinhas, mas com um estudo aprofundado e edição de livros sobre este dia. Não tenho qualquer complexo em dizer que este não tem de ser um dia oficial, porque há o dia oficial da existência da RAEM. Macau, Cidade nome de Deus, é passado. Agora a comunidade pode continuar com isso e um dia, se se justificar, também possa ser um feriado. Para já acho que não tem importância.

O Governo iria acolher bem essa ideia, de ser feriado um dia?
No futuro, porque não? É uma parte da comunidade, mas o Governo teria de pensar nas outras comunidades que também têm relevância em Macau, como os filipinos, que festejam o seu dia nacional, ou os birmaneses. Não têm feriado, mas eles festejam. A ADM e a CPM são os vértices desta actividade e devem continuar por muito tempo, até porque o Governo apoia.

Os macaenses têm de se unir para voltar a ter poder na cultura, na política, o poder de decidir em Macau?
Sei que sou irritante porque ponho o dedo na ferida. Os macaenses têm de ser mais activos e os portugueses também, porque é o segundo sistema. Em 450 anos nunca existiu união na comunidade macaense, porque é que ia existir agora? A comunidade já provou em momentos importantes do passado, quando a sua soberania estava em causa, que a sua união é importante. Quem é que veio a favor da casa-museu macaense? Os jornais e houve três pessoas que falaram: o provedor da SCM, eu e o Pedro Barreiros. Quem mais veio da comunidade macaense e portuguesa? Ninguém. Falar tem consequências, a verdade dói. Pessoas como nós, estas três pessoas que disse, sofremos represálias. Na prática depois há auto-censura por parte de serviços.

Pode dar exemplos?
Não vou dar exemplos, mas quem está calado está melhor. Macau é uma feira de vaidades e as carpideiras e os talibãs funcionam.

Falando na presença na Função Pública e na AL, é mais importante essa união?
Não temos a força motriz da sociedade para eleger por sufrágio directo. Mas essa é uma realidade que vem desde o 25 de Abril. Quanto à Função Pública, os jovens macaenses estão hoje mais bem preparados. Mas têm de sair, intervir. O macaense naturalmente vai a pouco e pouco sair da Função Pública e isso é um fenómeno natural, e quem não encara isso de frente está a errar.marreiros.3.sofiamota

Não deve ser visto como uma tragédia.
Antes pelo contrário. Para o macaense poder criticar e ser independente tem que ter poder de compra e para isso tem de ser patrão dele próprio e não pode ter o Governo como patrão. O problema da comunidade macaense no passado era esse.

Coloane | “Planos do passado estão ultrapassados”

Carlos Marreiros diz não compreender como é que, 16 anos depois da criação da RAEM, Coloane continua sem um plano urbanístico. Marreiros defende a manutenção do pulmão verde mas com uma construção organizada, focada para os idosos, crianças e turismo de saúde.
“O plano feito por Manuel Vicente está ultrapassado. Os planos do passado estão ultrapassados. Têm, no máximo, cinco anos de validade no mundo, em Macau têm no máximo dois. É preciso fazer um Plano Director porque é inacreditável que 17 anos depois não haja um plano para Macau e as Ilhas. Fazer o plano de urbanização das ilhas, que significa construir, mas não alto, denso, mau e feio. As Ilhas devem continuar a ser os pulmões verdes da RAEM. Deve-se construir com rigor, uma construção de baixa densidade e focada nos equipamentos sociais”, disse o arquitecto, que pede uma aposta ecológica no fornecimento de água para esta zona e construção de jardins nos terraços. Quanto aos prédios altos, devem ir para os novos aterros, aponta.

24 Jun 2016

Especial 24 de Junho | Função Pública, um destino em crise para os macaenses

A função pública foi, desde há muito, um destino quase invariável para a população macaense. Mas com as mudanças registadas nos últimos tempos quisemos saber se a “tradição” se mantém. Uns dizem que sim, outros que não. As dificuldades causadas pela falta de “chinês” são o principal motivo, mas também a cultura de gestão e a atracção dos hotéis

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]rabalhar na função pública foi sempre um destino seguro, e comum, para as gentes da terra. A “malga de ferro”, assim chamarão alguns, ao invocarem o seu legado chinês para descreverem uma situação profissional estável e duradoura. Todavia, com as mudanças registadas nos últimos tempos, o HM quis saber se a tradição ainda se mantém. As opiniões dividem-se mas sente-se uma certa tendência para que a tradição deixe de ser o que era.
“Antes era diferente”, começa por dizer Guiomar Pedruco, empresária.
“O português ainda era muito usado na função pública, mas hoje não”, explica, aclarando que o seu ‘antes’ designa cerca de 20 anos atrás.
A língua é mesmo um dilema para a população macaense que não domina o idioma chinês escrito, levando mesmo Guiomar a falar em discriminação.
“Muitos não querem estar lá porque é tudo à base do chinês e eu sei que se sentem discriminados. O português é só para inglês ver”.
Antonieta Lam, funcionária pública, compreende a situação mas diz que “depende do serviço”, aventando que “onde usem menos português é natural que sintam mais dificuldades em trabalhar”.
Para além disso, Antonieta não acredita que tenha existido alteração na tradição pensando que os macaenses continuam a querer aderir à função pública.
“Não mudou nada”, garante, adiantando, todavia, que “reparo que hoje em dia os macaenses não falam tanto português como antigamente. Os pais quiseram que estudassem inglês ou chinês. Os que estão na função pública falam pouco português.”
Para além da língua, Guiomar descobre outra questão: feitio.
“Os macaenses barafustam muito e os chineses não gostam de nós por causa disso”.
Antonieta sabe do assunto mas acha que a cultura mudou.
“Eram refilões, sim, mas hoje em dia já não. A transição já foi há muito tempo e os macaenses adaptaram-se à forma chinesa de trabalhar”, garante.

A atracção hoteleira

Quem parece estar a desviar os macaenses da função pública são os hotéis.
“Hoje, os macaenses preferem hotéis e empresas privadas. Vão estudar para fora, só falam inglês e é para aí que vão”, diz Filomena, ex-funcionária pública e hoje a trabalhar para uma pequena empresa local.
A opinião é corroborada por Filipe Senna Fernandes, empresário.
“Muita gente tem optado pela hotelaria. Estudam na Austrália, na Suíça, voltam e trabalham para os hotéis.”
Também ele trabalhou para função pública mas apenas “quatro anos e meio”, diz-nos.
“Optei pelo turismo por achar ser o único departamento ligado aos mercados internacionais. O pensamento é diferente e a comunicação é essencialmente feita em inglês. Agora, talvez falem menos mas não tanto como outros departamentos”, explica Filipe que adianta ainda considerar que “os macaenses já não são assim tão tradicionais. São mais internacionais”, remata.

Cultura nova, vida nova

A mudança de cultura de gestão na função pública, todavia, parece exercer um peso determinante nos macaenses na altura da escolha.
“Conheço muitos que ainda lá estão só para garantirem a reforma”, diz Filomena adiantando mesmo que “com os portugueses as coisas eram mais simples. Faz o teu trabalho, acaba e vai-te embora”, explica exemplificando:
“Agora tem de se recuperar horas mesmo que se vá ao médico. Nem se pode ir tomar um café em paz. Antes as pessoas exageravam, iam e ficavam meia hora na conversa, mas agora também é demais. Controlam tudo”, desabafa Filomena mas não concluindo sem nos revelar que “eu e muitos outros não conseguimos trabalhar com chefes chineses. Eles não gostam de nós macaenses e são vingativos”.

Nota: Tentámos falar com vários macaenses que trabalham na função pública mas foi muito difícil recolher testemunhos. As respostas foram, normalmente, “de trabalho não falo”, ou “nesse tipo de assunto não toco” condimentadas com uma momentânea “falta de tempo para comentar”.
24 Jun 2016

Especial 24 de Junho | Jorge Fão: “As pessoas perderam o espírito de luta”

Diz-se 99% chinês, sem ligações a um feriado que já foi o da cidade. Jorge Fão recorda uma comunidade de garra, mas actualmente apagada. O português perdeu importância e o chinês é essencial a qualquer macaense que queira vingar

Assinalava-se hoje o Dia de Macau, 24 de Junho, perdido com a transição da soberania para a China. Acha que deveria ter sido um feriado a manter-se?
Como macaense naturalmente que gostaria que fosse, ou seja, devia ter sido continuado. Não devia ter acabado. Mas aquilo que eu gostaria, nem sempre acontece. Mas, sou sincero, compreendo porque é que [retiraram o feriado], é que o Dia de Macau, o 24 de Junho, não é só por que é o dia da cidade, tem uma ligação com a igreja. Tem uma conotação religiosa. Feriados religiosos foram retirados alguns, e temos outros, por exemplo o Dia do Buda. Este dia não existia no passado, mas os chineses acharam que seria mais justo termos este dia e retirar outros, por exemplo o Dia de Macau. Talvez tenha sido este motivo, esta conotação religiosa, que fez com que este feriado fosse retirado.

Focando-nos na comunidade. Como é que um macaense olha de fora para a sua comunidade? Como vê os seus problemas, como é visto pelas outras comunidades?
Problemas, sou sincero, acho que não temos. Não vejo problemas na comunidade macaense. O que posso dizer é que a comunidade macaense do passado pode ter sentido algumas dificuldades e a do futuro talvez também sinta. Ou seja, dou um exemplo, a comunidade macaense do passado para se singrar na vida não tinha que estudar muito, mas uma coisa tinha que saber obrigatoriamente: a língua. Veja o meu caso, a minha cara é totalmente chinês, o meu sangue é 99% chinês, sangue português só tenho 1 ou 2 %. Apesar de só ter um passaporte, o português. No meu tempo, a nossa comunidade educava-nos pelo português. Quando os meus pais casaram – e eles eram filhos de chineses – educaram os filhos com costumes ocidentais. Também os meus tios faziam isso com os meus primos. Naquele tempo quem não falasse português, praticamente não tinha hipótese de estar empregado, ou conseguir o que se chamava de bom emprego, que fosse bem pago. Muitas vezes nem o era, até porque estou a falar dos anos 50, 60. Portanto, no passado tínhamos que estudar o português, obrigatoriamente, isto se queríamos ter uma posição social. Agora, o presente e o futuro mudou, é o contrario. Agora, para se ser um bom macaense não basta saber a língua portuguesa, como é obrigatório conhecer a língua escrita, lida, chinesa. Coisa que eu não sei. Percebe-se a desvantagem da comunidade do meu tempo.

Tempos antes da transição perceberam que os tempos iam mudar, nomeadamente na questão da língua?
Na função pública tudo era em português mas, de facto, quando se falou do handover [transição da soberania] começou a iniciar-se, digamos, a “macaização dos quadros”, ou seja, a meter os locais para os quadros. Porque até aí ninguém falava nisto. jorge.fao.2-sofiamota

E a comunidade macaense futura. Tem em mãos uma mudança na língua prioritária?
Agora os nossos filhos, e na geração seguinte, é obrigatório que saibam a língua chinesa. Mas isto é também uma tendência do mundo, não é só a nossa comunidade, os portugueses também. Vejo que em Portugal se estuda cada vez mais chinês, assim como em outros países, Estados Unidos da América, por exemplo. Lá está, a China, neste momento, já é uma das potencias económicas mundiais. Países que são ricos e que podem a distribuir dinheiro o mundo percebe que tem que aprender a sua língua.

Há algum facto diferencial nesta comunidade? Algo que vos torne uma comunidade especial, diferente de todas as outras?
Não, nada. Não acho que tenhamos algo de diferente. Por exemplo, a questão do patuá: no meu tempo era proibido falar patuá. Era visto como inferior, uma língua que não era o português. Lembro-me perfeitamente de em minha casa não se poder falar chinês. O meu pai chamava-me logo à atenção. Os meus pais não falavam patuá, tinha umas tias que falavam, mas só entre elas, para a rua nem sequer falavam. É que patuá era uma mestiçagem, nem sequer é fácil de entender. O patuá que se fala hoje é um patuá trabalhado. Houve uma evolução. Naqueles nossos tempos era só falado com pessoas de idade. Eu não falo, por exemplo, não me lembro. A verdade é que se nos dedicamos à aprender e a falar patuá, vamos começar a falar mal português, por causa dos verbos, pois não existem tempos verbais. A língua importante era o português e era preciso saber falar bem, o patuá não era bom português.

Mas actualmente é algo que vos diferencia.
Sim, mas agora as coisas mudaram. O mundo mudou, a mentalidade das pessoas mudou. Agora é aceitável falar patuá com qualquer pessoa, ninguém te vai chatear com isso. Antigamente nem pensar. A mentalidade colonialista era assim.

Mas destacou-se na comunidade macaense da altura…
Sim, sou muito rebelde, sempre foi assim. (risos) A partir dos 30 comecei a lutar por tudo e por nada. Ao 20 e poucos anos fiz o meu primeiro recurso a uma decisão dos meus chefes, até ao Conselho Ultramarino, na altura não existia Tribunal de Última Instância. O último recurso era em Portugal e era este, o Conselho Ultramarino. O bicho da rebeldia já veio de muito cedo. Quando acho que é injusto, tenho de lutar para ser justo.

Mas a comunidade na altura não era assim…

Pois não. (risos) Eram todos muito politicamente correctos, até o meu pai, os meus tios, todos. Fui várias vezes chamado a atenção, por causa das manifestações de rua, e outras coisas. Por quê? Medo. A comunidade tinha medo, as pessoas tinham medo de tudo. Agora há menos. Hoje é tudo só politicamente correcto para tirar partido de alguma situação. Basta ver, no passado conseguíamos guerrilhar contra o regime, hoje em dia, a minha comunidade não dá para lutar. Para quê? Temos um continente aqui em cima, um bilhão e tal, com aquela mentalidade… jorge.fao.4-sofiamota

Que vos trata bem?
Sim, nós [macaenses] somos bem tratados [pela China]. Nós não fomos mal tratados. Não vejo fortes razões para criticar, lutar contra o que quer que seja.

Mas nem tudo está bem…
Certo, mas o pensamento mudou e tornou-se mais individual. No passado quando falávamos em comunidade estávamos a falar da função pública, 90% da comunidade estava lá. Agora? Não. Os meus filhos não estão, por exemplo, os meus sobrinhos, quer dizer, ninguém quer estar na função pública. Portanto já não se fala da comunidade. Quando se fala em problemas na administração e na função pública já não se refere à comunidade, porque a comunidade macaense já lá não está. As pessoas perderam o espírito de luta.

Mas lutou-se, no seu tempo.
Imagina que não tinha lutado? Macau é a única província ultramarina que tem direito a uma pensão paga pelo Governo português. Mais nenhuma tem. Porque nós lutámos. Angola, Moçambique, Timor onde estive, nenhum deles tem. Falei com locais e eles disseram ‘quando os portugueses saíram daqui levaram tudo’. Nós não. Nós lutámos. Como estava a par da situação política do país, percebi que se a nossa comunidade macaense não fizesse nada, hoje se calhar nem sequer estávamos aqui a conversa. Talvez estivéssemos em Portugal, a mendigar.

Vai festejar o feriado, mesmo que não o seja. Ou lembra-se de o festejar?
Não, nem sequer me lembro de o festejar. Já confessei, não sou nada ligado à religião, e como é o dia do padroeiro, S. João Baptista, eu nunca estive ligado a isso. Embora, tenha sido baptizado e a primeira comunhão, também estudava no Colégio Dom Bosco. Mas, não, não vou festejar. Honestamente, este dia não me traz grande significado.

24 Jun 2016

Metro | Sistema vai ser estendido até Coloane. Orçamento divulgado

Já há decisão: o metro ligeiro vai até Coloane. Raimundo do Rosário apresentou decisões, valores e novas soluções. Ho Ion San aplaude a coragem do Governo

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] da boca de Raimundo do Rosário, Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que sai a confirmação: o sistema do metro ligeiro vai ser estendido até Coloane.
“A nossa primeira prioridade é acabar a linha da Taipa e a seguir ligá-la à Barra e depois haverá uma linha que sairá do ISTMO Taipa – Coloane, para Coloane, para Seac Pai Van. Essa linha terá uma extensão aproximada de dois quilómetros com duas estações. Terá uma primeira estação no novo hospital [Complexo de Cuidados de Saúde das Ilhas] e uma segunda estação na habitação pública de Seac Pai Van”, esclareceu o Secretário, à Rádio Macau.
Também este ano será decidido sobre a linha de Macau, conforme explicou Raimundo do Rosário. “Como sabem a linha de Macau tem sido objecto de alguma ‘contestação’, mas nós tomaremos uma decisão sobre a linha de Macau este ano”, garantiu.
O segmento da Taipa, do metro ligeiro, terá um custo 11 mil milhões de patacas, conforme indicou Raimundo do Rosário, acrescentando que estará concluído em 2019. “O que eu queria deixar claro é o seguinte: todos os custos estão aqui metidos. Assumo isso. Os custos futuros, esta é uma estimativa. Sei que não estamos habituados a fazer isto, mas passaremos a fazê-lo, que é dizer quando as coisas acabam e quanto é que as coisas custam. Agora, tem de ser bem explicado, pelo seguinte, dou um exemplo, o parque material de oficinas não serve só a linha da Taipa, servirá Coloane e depois, em parte, Macau. Entretanto, todo o custo deste parque material de oficinas foi imputado nestes 11 mil milhões da Taipa, embora não sirva só à Taipa. Portanto não são só os nove quilómetros e as 11 estações”, explicou.
Há ainda números para a construção do Parque de Materiais e Oficina do metro ligeiro. Vai ter um custo de mil milhões de patacas, e o seu concurso público abre já a 1 de Julho.

Tudo muito bem

Em reacções às declarações de Raimundo do Rosário, Ho Ion San, deputado, afirmou que este foi um “acto de coragem”. “Tanto os deputados como a população solicitaram várias vezes ao Governo uma calendarização sobre o projecto do metro ligeiro. O Governo agora tem essa coragem, é corajoso em aceitar esse desafio e assumir esta responsabilidade. Para além de tentar cumprir o prazo e a sua responsabilidade, também tentou pensar em novas soluções”, disse, referindo-se à criação de um prémio de 8% do valor da obra à empresa, se esta cumprir os prazos estipulados.
Raimundo do Rosário avançou ainda que a exploração do metro ligeiro vai ser entregue a uma empresa de capitais públicos, levando à extinção do Gabinete de Infra-Estruturas e Transportes, em 2017.

24 Jun 2016

Portugal 3 – Hungria 3 | O jogo que não quisemos vencer

As decisões de Fernando Santos impediram Portugal de vencer, quando estava por cima. Mas o sonho continua

Cristiano Ronaldo faz o 3-3 para Portugal | FOTO: EPA/CJ GUNTHER
Cristiano Ronaldo faz o 3-3 para Portugal | FOTO: EPA / CJ GUNTHER
[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Hungria-Portugal foi o jogo mais espectacular do Euro 2016 até ao momento e terminou com uma igualdade a três golos e o consequente apuramento português (e dos húngaros, em primeiro, a que se juntaram os islandeses, em segundos) para os oitavos-de-final da competição.

Na partida que, por enquanto, rendeu mais golos na prova, Portugal esteve sempre em desvantagem. Primeiro, num remate à entrada da área portuguesa, Gera inaugurou o marcador (19’) para os húngaros, mas Nani, bem junto ao intervalo, repôs a igualdade.

No início do segundo tempo, a Hungria recolocou-se em vantagem, aproveitando um livre que sofreu um desvio na barreira nacional, mas Cristiano Ronaldo surgiu no jogo ao marcar um golaço, de calcanhar (50’), que recolocava o marcador numa igualdade – o internacional português passou a ser o primeiro futebolista a marcar em quatro fases finais consecutivas de Europeus.

Só que aquele resultado durou cinco minutos, já que em mais um remate que sofreu um desvio, Dzsudzsák voltaria a colocar a Hungria na frente do marcador.

Novamente desqualificado, face à conjugação de resultados, Portugal foi capaz de repor a igualdade (62’), num cabeceamento de Cristiano Ronaldo, que assim “bisou” na partida e recolocou a selecção no lote das qualificadas para a fase seguinte do Euro 2016, apesar de ter terminado a fase de grupos com três empates.

Islândia em primeiro

Entretanto, a Islândia venceu a Aústria por 2-1 na última jornada do Grupo F e assegurou assim o 1º lugar com cinco pontos. Esta vitória dos nórdicos permitiu a Portugal ser terceiro e assim evitar o lote dos ‘tubarões’ do Euro 2016. Com vontade de ser primeira no grupo, a Islândia começou a todo o gás. E logo aos dois minutos atirou uma bola ao ferro por Gudmundsson num pontapé do meio da rua. Com tanto domínio inicial, foi sem surpresa que a equipa nórdica chegou ao golo por intermédio de Bodvarsson. Depois de um lançamento longo, a bola sobrou para o 15 que não falhou na hora h.

Com vontade de inverter o rumo dos acontecimentos e com esperança ainda na qualificação para a próxima fase do Euro, a Áustria tentou responder ao golo. Arnautovic em excelente posição cabeceou por cima. Aos 36 minutos, a Áustria teve uma soberana ocasião para marcar. Skulason travou Alaba na área, e o árbitro não teve dúvidas para assinalar o castigo máximo. Na transformação Dragovic atirou ao poste.

No segundo tempo, à passagem dos 60 minutos, o pendor ofensivo austríaco deu os seus frutos. Schöpf tirou um adversário da frente e rematou para o fundo da baliza. A Áustria foi à procura da vantagem e quase o conseguiu, mas permitiu a intervenção do guardião nórdico. Quando nada o fazia prever, a Islândia marcou ao cair do pano. Arnor Ingvi Traustason fez o tento da vitória e permitiu à sua seleção acabar em primeiro lugar do grupo.

Com este triunfo, Portugal qualificou-se em terceiro lugar. Já a Islândia ao ficar em primeiro lugar do grupo vai medir forças com o segundo classificado do Grupo E.

Ronaldo fica a um golo de Platini

Cristiano Ronaldo isolou-se ontem no segundo lugar dos melhores marcadores da história do Europeu de futebol, a um tento de Michel Platini, ao ‘bisar’ face à Hungria, em encontro da terceira jornada do Grupo F, em Lyon. O ‘capitão’ da seleção lusa, que é agora o melhor marcador luso em Europeus, Mundiais e, naturalmente, no somatório das duas competições, passou a contar oito golos em campeonatos da Europa, com os tentos aos 50 e 62 minutos. Ronaldo, que havia marcado dois golos no Euro2004, um no Euro2008 e três no Euro2012, superou os sete tentos do inglês Alan Shearer e ficou a um dos nove do francês Michel Platini, todos marcados na edição de 1984. O ‘7’ luso, que também reforçou o estatuto de melhor marcador do Europeu, juntando qualificação e fase final (28 golos), tornou-se também o primeiro jogador da história a marcar em quatro Europeus, sendo que, juntando os Mundiais, também é o único com golos em sete fases finais.

Na história dos Europeus, Ronaldo, que ontem se isolou com o jogador com mais encontros disputados (17, contra 16 de Edwin van der Sar e Lilian Thuram), estreou-se a marcar no primeiro jogo do Euro2004, quando fez o tento de honra da seleção portuguesa frente à Grécia (2-1), no Estádio do Dragão.

Reacções

Fernando Santos | “Fundamental foi passar. Queríamos tê-lo feito como primeiros do grupo, mas foi impossível, depois das incidências nos dois primeiros jogos, em que Portugal foi melhor e não conseguiu vencer, e deste, apanhados três vezes a perder, num jogo contranatura, com Portugal a jogar razoavelmente bem. O adversário três vezes criou perigo e fez golo. A equipa teve uma grande atitude, capacidade de resposta e conseguiu igualar três vezes e tentou o quarto golo, também. No período final, o adversário não quis jogar, tentou que Portugal se adiantasse para atacar. Não adiantava insistir quando estávamos apurados, a três minutos do fim, e correr o risco de sofrer um golo. Nos últimos minutos, a equipa soube pensar no que tinha que fazer. Fizemos tudo para ganhar, queria ganhar, mas é normal que nos últimos seis ou sete minutos os jogadores saberem que o importante é estarmos cá. A Croácia é uma excelente equipa. Viemos para o Euro com uma ambição. Quem vem para o Europeu tem que jogar com todos. Vai ser um grande jogo.”

Danilo Pereira | “[O seleccionador] pediu-me para entrar e segurar o meio-campo. Estamos todos felizes pelo apuramento, não da forma como queríamos, mas é sempre um apuramento. No final, vimos que Hungria não estava a atacar, e também decidimos não fazer. O resultado convinha e não podíamos sofrer golos. Preparados para tudo e as críticas fazem parte do dia a dia.

João Mário | “A Hungria, por estar já apurada, apareceu a encarar o jogo de forma muito aberta e competitiva, mas estávamos preparados e não foi surpresa nenhuma. [Croácia, próximo adversário] É uma selecção muito forte, com excelentes jogadores e muito bem organizada. Há que encarar esse jogo cara-a-cara, com muita tranquilidade. Agora, no ‘mata-mata’, o objetivo é passar. Há que encará-lo com optimismo e corrigir os aspectos menos positivos”.

Nani | “Cumprimos o objectivo, pelo menos um deles, que era passar. Não conseguimos da maneira como queríamos, que era ganhar os jogos, mas o mais importante foi passar. Agora é a fase a eliminar.

Hoje fomos infelizes em dois lances, em que a bola ressaltou nos nossos jogadores. Soubemos responder, mostrámos excelente atitude, bom futebol e que somos uma equipa forte. E marcámos três golos, embora não tenhamos conseguido vencer. Os portugueses podem estar orgulhosos e continuar a acreditar. A Croácia jogou muito bem contra a Espanha. Mas com equipas fortes costumamos responder muito bem. Temos que ser muito competentes, mas temos ainda muito para demonstrar”.

Renato Sanches | “O que interessa é que estamos apurados. Foi um bom jogo, apesar do desfecho. Não está a faltar nada à Selecção. Estamos a jogar bem, apenas falhámos alguns golos. Há que continuar a trabalhar, que as coisas vão aparecer. Contra a Croácia, será um jogo difícil, mas estamos preparados”.

23 Jun 2016

Filhos Maiores | Comerciantes e SCM já não suportam o protesto no Leal Senado

Há quatro meses que a Associação dos Pais dos Filhos Maiores não arreda pé do Largo do Senado. Comerciantes queixam-se do barulho ensurdecedor dos altifalantes e já fizeram queixas à PSP. António José de Freitas, provedor da Santa Casa da Misericórdia, pede intervenção do IACM

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s vozes de protesto da Associação dos Pais dos Filhos Maiores, ouvidas há 114 dias, estão a esgotar a paciência dos comerciantes que todos os dias fazem o seu negócio junto ao Largo do Senado, incluindo a própria Santa Casa da Misericórdia.
Há quatro meses que estes idosos se sentam em pequenos bancos de plástico junto a uma tenda, debaixo de um sol escaldante, à espera que o Governo reaja aquilo que pedem há anos: que os seus filhos possam regressar do continente e viver em Macau. Os altifalantes não se calam, ao ponto dos comerciantes não conseguirem ouvir os seus próprios clientes.
Shan, uma idosa que vende fruta numa pequena banca, diz já não aguentar mais o protesto. “Perguntem ao Governo porque é que deixam as pessoas estar aqui e a falar alto diariamente. Eles dizem que é legal”, aponta ao HM.
“Isto afecta muito o nosso negócio. Já fui pedir para se calarem, mas eles não quiseram saber e mandaram-me embora. E a polícia também foi lá e eles mandaram-nos embora. Todos os comerciantes aqui já ligaram para a polícia por causa desta situação, mas eles continuam ali. Estão aqui há muitos meses e acho que isto não é adequado ficarem aqui tanto tempo, porque há muitos turistas que passam aqui. Também há turistas estrangeiros que foram pedir para se calarem mas não conseguiram”, contou Shan, que não acredita na causa que deu origem ao protesto. filhos maiores6_HM
“É impossível! Os filhos deles já são muito velhos, têm a sua família, todos estão casados”, disse a comerciante. Mais à frente, uma vendedora de roupas de verão, que não quer ser identificada, também se mostra descontente com a presença dos protestantes. “Quero que saiam rapidamente dali. Não sei porque é que o Governo dá autorização para as pessoas estarem ali tanto tempo. Durante o dia, nas casas, ninguém consegue descansar.”

IACM deve agir

A Santa Casa da Misericórdia (SCM) é talvez a entidade mais prejudicada com este protesto, já que a tenda está localizada mesmo em frente do edifício. O seu provedor, António José de Freitas, pede uma intervenção mais directa do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM).
“Esta situação não agrada à SCM nem ao comércio circundante. Aliás já tive a oportunidade de falar com os comerciantes e todos manifestaram o seu desagrado. Como nesta zona os prédios são todos antigos, incluído o da SCM, não há sistemas anti-som e o barulho é muito incomodativo, com os altifalantes”, contou o provedor.
“Independentemente da decisão do tribunal, sobre a qual não tenho condições para comentar, penso que o IACM, que tem a competência para gerir os espaços públicos, deve tomar uma decisão no sentido de impedir que sejam feitas actividades naquela zona relativamente a todos os organismos e associações. Ninguém deveria fazer lá alguma coisa, a não ser o IACM, sobre as celebrações principais. Se o IACM pudesse fazer isso toda a população iria aplaudir, incluindo as associações que têm lá feito actividades, porque a situação não é igual para todos. O largo do Senado é o único espaço pedonal onde todos os turistas vão”, referiu António José de Freitas.
O HM tentou contactar José Tavares, actual presidente do IACM, mas o mesmo referiu que não dá entrevistas por telefone. Até ao fecho da edição, não foi possível agendar um encontro presencial com Tavares.

Pacífica, mas ruidosa

António José de Freitas garante que o Governo pouco pode fazer neste caso, depois do Tribunal de Última Instância (TUI) ter autorizado a utilização do espaço público. “Todos os dias vão lá polícias, desde o primeiro dia. É um desperdício de recursos. Todos os dias ficam lá dois ou três polícias até fecharem a tenda. É verdade que tem sido uma manifestação pacífica em termos de ordem, mas não é pacífica em termos de ruído. Toda a gente fica boquiaberta. É enfadonho ouvir sempre as mesmas gravações e ver sempre o mesmo cenário, isto estraga a imagem de Macau”, frisou o provedor da SCM.

Protesto interminável

Presidente diz que associação não arreda pé do Senado

“Não vamos reagir às criticas e vamos continuar aqui até que o problema fique resolvido, até que o Governo nos dê uma resposta concreta.” É desta forma que Lei Yok Lan, presidente e fundadora da Associação dos Pais dos Filhos Maiores reage às críticas que são apontadas pelos comerciantes.
“O Governo ainda não nos deu nenhuma resposta e não teve nenhuma reacção ao nosso protesto. Ninguém do Governo veio aqui. No ano passado já falamos com alguns dirigentes e disseram-nos que este assunto depende da decisão do Governo Central e que o nosso pedido já foi feito a Pequim. Todos nós que estamos aqui sentados acreditamos que aquilo que o Governo disse é verdade, mas ainda não tivemos resposta. Disseram-nos que podíamos ir aos serviços de emigração, mas fomos informados que o assunto está terminado e resolvido”, contou Lei Yok Lan ao HM.
O acórdão do TUI autorizava a permanência da tenda até ao passado dia 20 de Março, no período compreendido entre as 7h00 e as 22h00. Da parte do gabinete da Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, chegou uma resposta escrita que pouco adianta ao que já foi dito aos protestantes.
“O Governo da RAEM tem sempre prestado atenção aos apelos das organizações de reunião familiar de Macau e tem mantido uma boa comunicação com as mesmas. Considerando que, de acordo com o artigo 22.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, compete ao Governo Popular Central a autorização da fixação dos residentes do Continente Chinês na RAEM, o Governo já transmitiu o respectivo apelo às entidades competentes do Governo Central.”
Em Março a associação ocupava um espaço bem maior do que o círculo que hoje ocupa, até que a PSP lhe confinou apenas 38 metros quadrados. Os idosos recorreram junto do tribunal, mas o TUI deu razão às autoridades.
“A polícia pode interromper manifestações quando as mesmas se afastem da sua finalidade pela prática de actos contrários à lei que perturbem grave e efectivamente a segurança pública ou o livre exercício dos direitos das pessoas. Cabe também à PSP (…) zelar pelo bom ordenamento do trânsito de pessoas nas vias públicas (…) Assim sendo, com base neste conjunto de normas, afigura-se-nos poder extrair um princípio segundo o qual a Polícia tem poderes para fixar uma área para reunião ou manifestação, dentro do local mais vasto pretendido pelos respectivos promotores”, decidiu o tribunal.
A associação conta com o apoio do deputado Chan Meng Kam, cujo rosto está estampado na tenda que serve de abrigo ao protesto. O membro da Assembleia Legislativa já fez um apelo a Pequim para que faça regressar os filhos destes idosos que emigraram para Macau nos anos 80 e conseguiram obter residência permanente. Estes têm lutado até aos dias de hoje para que se possam juntar à família que um dia deixaram para trás.
O HM tentou ainda obter esclarecimentos junto da PSP, mas até ao fecho desta edição não foi possível.

Com Angela Ka
23 Jun 2016

Macau Investimento | Deputados questionam injecção de fundos

Foram ontem alterados os estatutos da Macau Investimento e Desenvolvimento SA para oficializar o aumento do capital social para 3 mil milhões de patacas. Coutinho e Au Kam San exigem explicações e mais transparência

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão poucas as informações existentes sobre uma empresa pública que tem como papel principal gerir os negócios de Macau na Ilha da Montanha, mas foi ontem publicado um despacho em Boletim Oficial (BO) que incorpora a nova injecção de capital nos estatutos da Macau Investimento e Desenvolvimento SA. Em Janeiro já tinha sido oficializado o aumento de capital das iniciais 400 milhões para quase 3 mil milhões de patacas, um aumento de 86%.
Contactado pelo HM, o deputado José Pereira Coutinho alertou para o facto do Governo fazer injecções de capital em empresas das quais pouco se sabe. “Recentemente o Governo tem estado a tomar decisões extremamente importantes para o futuro desenvolvimento a longo prazo da RAEM sem que tenha tido o cuidado de dar a conhecer à Assembleia Legislativa (AL) e aos cidadãos na generalidade a tomada destas decisões.”
O deputado considera que a decisão deveria ter sido discutida junto da Comissão de Acompanhamento das Finanças Públicas da AL. “Para além desse aumento de capital da empresa, há o facto de ter assinado um protocolo com o interior da China para fazer aplicações financeiras cujo conteúdo do protocolo não foi divulgado. O Governo tem que tomar cuidado com estas decisões com uma natureza pouco transparente. Este deve dar conhecimento a essa comissão porque queremos saber como é que o Governo gere os fundos públicos”, reiterou ao HM.

O mistério

O deputado Au Kam San garantiu que não tem muitas informações sobre a empresa. “Não sei em que projectos esta empresa investiu, mas se o Governo introduz mais dinheiro dos cofres públicos na empresa é essencial uma maior transparência. Sou deputado e deveria ter acesso a mais informações do que os residentes, mas se eu não sei o que a empresa está a fazer, então os residentes não sabem de nada”, defendeu.
“O Governo deve justificar a razão desse aumento de capital, será que esse investimento vai trazer alguma vantagem para os residentes? O Executivo deve explicar este aumento junto da AL ou através de algum tipo de publicação”, frisou.
Em Janeiro o HM tentou obter mais esclarecimentos sobre este aumento de capital, mas nunca obteve uma resposta. A Macau Investimento e Desenvolvimento SA foi criada em 2011 tendo como accionistas a RAEM, com 94%, o Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização (3%) e o Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (3%). A sociedade comercial, que é uma sociedade anónima, tem como linhas de orientação “promover o desenvolvimento sustentável e os negócios no exterior de Macau”, realizando “projectos de investimento” e foi criada propositadamente para ficar responsável pela exploração e gestão da área da Ilha da Montanha e dos projectos a desenvolver conjuntamente entre a RAEM e a região vizinha.

23 Jun 2016

Tiananmen | Escolas evitam falar sobre massacre. Alunos aprendem por si

O negro dia 4 de Junho de 1989 continua a ser assunto incómodo. As escolas evitam falar e os livros nem sequer mencionam a data. No entanto, há professores que fazem questão de transmitir aos seus alunos tudo sobre o massacre. Tornar matéria obrigatória é questão difícil de responder

[dropcap style≠’circle’]“N[/dropcap]ão, os meus professores nunca me falaram sobre o 4 de Junho, nem os manuais escolares mencionavam o que aconteceu. Soube pelo youtube e pelas redes sociais”, começa por contar, ao HM, Lin Ka, estudante a residir em Macau.
Nasceu em Xangai, mas logo cedo veio para Macau, lamenta que nas escolas de Macau pouco ou nada se fale do massacre estudantil na Praça de Tiananmen. “Um ou outro professor disse qualquer coisa, mas foi muito pouco. Se queria saber tinha de pesquisar na internet”, argumenta.
Na escola de Sio Fong, um jovem licenciado, os manuais adoptados eram de Hong Kong e mencionavam o acontecimento. “Mas era muito pouco, era uma coisa de nada”, apressa-se em esclarecer. No entanto foi um padre que trouxe a Sio Fong alguns conhecimentos. “Tínhamos um professor padre, que era muito novo, nascido e criado em Hong Kong, e foi ele que nos explicou tudo o que tinha acontecido. Depois disso cada um de nós podia ir estudar e pesquisar”, conta.

Ser autodidacta

Ser-se autodidacta para saber o que aconteceu é também ideia defendida por Teresa Vong, docente na Universidade de Macau. A professora recorda que dantes mais alunos conheciam a história, mas que agora nota que eles não sabem. “Para saber é preciso ir pesquisar e isso acontece mais a pessoas que não são chinesas”, explica ao HM.
Na realidade são as próprias escolas que escolhem dar, ou não, esta parte da história da China. “Segundo os regulamentos de Macau em relação à educação, as escolas privadas e públicas possuem autonomia no seu ensino. O Governo não define os manuais das escolas, e as escolas podem optar por manuais publicados por qualquer regiões conforme as suas características e necessidades”, explica-nos a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ).
O Executivo indica que de acordo com o plano de “Exigências das competências académicas básicas da educação regular do regime escolar local”, actualmente a ser executado no ensino infantil e primários, e a começar a ser executado no ensino secundário a partir de 2017, “a perturbação politica que ocorreu em 1989 pertence a categoria de história das Exigências”.
No ensino primário é exigido aos alunos, explica a DSEJ, saberem “as consequências das figuras importantes e dos assuntos históricos em tempos diferentes da China” e terem “consciência do desenvolvimento, mudanças e desafios enfrentados pela nação”.
Durante o ensino secundário, os alunos devem saber “exploração e prática da politica democrática na China”, e todos os momentos pelos quais a China passou depois de 1949. É exigido aos alunos que tenham a “consciência da construção da política democrática do país” e compreendam os “meios para participar nos assuntos administrativos”.
Das dez escolas de Macau contactadas pelo HM, apenas três quiseram comentar o assunto. A Escola da Associação para Filhos e Irmãos dos Agricultores admite que os manuais adoptados são do interior da China e não é mencionado o massacre. Contudo um professor faz questão de explicar aos alunos o que foi, quando e porquê. “O nosso professor de história ensina aos alunos o que foi o dia 4 de Junho”, explica a direcção da escola.
A Escola Nossa Senhora de Fátima, o Colégio Yuet Wah, o Colégio de Santa Rosa de Lima – Secção Chinesa e o Colégio do Sagrado Coração de Jesus assumiram o assunto como inconveniente e portanto não se mostraram disponíveis para responder.

Caminho árduo

Questionada sobre tornar esta matéria obrigatória no ensino em Macau, Teresa Vong diz “ser muito difícil”, apontando várias razões. “Nem Hong Kong tem esta matéria como obrigatória, muito menos a China”, frisa. Ser um acontecimento “recente na história da China” é também ponto referido pela docente.
“Os alunos não percebem nada sobre o 4 de Junho. Mas é difícil dizer se este assunto deveria ser obrigatório. Por acaso falei sobre isso com um professor de história e no seu ponto de vista, é preciso definir o [massacre] como acontecimento histórico. A China nunca o confirmou. Foi a explicação que o professor me deu”, remata, sublinhando a necessidade de investigação.
Enquanto aqui se tenta apagar a história, ou pelo menos, não falar dela f, do outro lado do mundo, na Universidade de Harvard decorre um curso totalmente dedicado ao Massacre de Tiananmen. As inscrições estão abertas.

Com Angela Ka
23 Jun 2016

Exame Unificado | Alunos nervosos e preocupados com o futuro, dizem docentes

A ideia era tirar a pressão aos alunos, mas parece que não está a resultar. O Governo tornou público os exemplos do Exame Unificado e as aulas de apoio já começaram. Alunos estão nervosos e há docentes a defender que este não é o melhor método

[dropcap style=’circle’]“[/dropcap]A Europa continua a estar ‘lá fora’, o que preserva o nosso ‘dentro’”. Na sua opinião, o que é que esta afirmação revela relativamente à cultura portuguesa? Esta é uma das perguntas exemplo do Exame Unificado (Línguas e Matemática), correspondente à disciplina de Português.
Estão publicados os modelos de exames de Chinês, Português, Inglês e Matemática do Exame Unificado, e parece que a ideia que levou o Governo a criar este tipo de exame – diminuir a pressão aos alunos – não está a resultar.
“Os alunos estão mais preocupados. Ficam mais pressionados, com medo de reprovarem”, começa por explicar Stephen Wong, Director do Centro de Educação Unnamed. Isto acontece porque antes deste método de avaliação ser implementado os alunos que terminassem o secundário tinham quatro oportunidades para fazer os exames, algo que deixa de acontecer agora porque só podem fazer o Exame Unificado uma vez. “Se os alunos reprovassem havia mais três exames que poderiam fazer, agora só têm um. Isto quer dizer que se o aluno chumbar não terá nenhuma outra oportunidade de estudar em Macau”, explica. Não terá, pelo menos nas quatro universidades abrangidas pelo este Exame Unificado, sendo elas a Universidade de Macau (UM), o Instituto Politécnico de Macau (IPM), Instituto de Formação Turística (IFT) e Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (MUST).
Também Lawrence Wong, reitor da Waseda Professional Education, aponta a mesma reacção. “A maioria dos alunos estão mais stressados com este exame, mais do que antes. No passado os alunos poderiam fazer os exames de forma separada e caso reprovassem no primeiro exames ainda tinham mais três universidades para tentar. Agora? Com este exame se chumbarem não podem entrar em nenhuma das faculdades”, argumentou. ensino escolas alunos
Tomás Keong, aluno, explicou, ao HM, que mesmo existindo outras universidades em Macau estas “quatro são as melhores” e por isso é natural que os alunos queiram entrar numa destas. “Se chumbar não vai conseguir, claro que há muito mais pressão”, apontou. Confrontado com a argumentação do Governo, Tomás Keong diz “não fazer sentido”.
Mais do que a questão da pressão está em causa a não abrangência a todos os alunos de Macau. “Em princípio não estou de acordo com este exame unificado, é que, por exemplo, o Governo disse que este exame servia para tirar pressão, mas quer dizer, só tira a pressão dos alunos que queiram ir para estas quatro universidades, os outros não contam”, acusa Teresa Vong, docente na UM.

Pobre promoção

O exame entrará em vigor já no ano lectivo de 2017/2018, mas os trabalhos já começaram em 2012. Alegou na altura o Governo, através da Direcção para Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), que o Exame Unificado pretendia “aliviar a pressão dos estudantes, resultante dos exames de admissão, realizados em diferentes instituições do ensino superior”. O Governo queria também “responder às exigências, existentes ao longo do tempo, do sector educativo, dos estudantes e dos seus pais”. Por isso, em 2012, foi criado, pelas quatro universidades em causa, um grupo de coordenação. A este grupo de trabalho competia a organização deste Exame Unificado, com a cooperação do Gabinete de Apoio ao Ensino Superior (GAES).
Depois de várias reuniões “para obter consenso” das actividades a desenvolver na promoção do exame parece que os resultados ficaram aquém do previsto. “Não acho que o Governo tenha feito uma boa preparação e isso nota-se na reacção dos alunos, que estão cheios de dúvidas quanto a este exame”, explica Stephen Wong.
Também para Ma Xiaofong, estudante finalista do ensino secundário, os trabalho de divulgação não foram os melhores. “As indicações [para o exame] não são suficientes, só existe um modelo de exemplo”, continuou.
Ma Xiaofong ainda não sabe se vai fazer o exame ou não, diz que ainda tem tempo para pensar, mas não discordava do regime anterior, achava-o “até melhor” do que a aplicação do exame unificado. “Para mim estava tudo bem como estava, não precisávamos desta mudança. Há menos espaço para os alunos, mas também tem um lado positivo”, explicou.

Obrigatoriedade de parte

Apesar do exame incluir quatro disciplinas os alunos não são obrigados a fazer todas. Os estudantes, de acordo com as exigências de cada universidade e da sua área especializada, podem escolher candidatar-se apenas a algumas disciplinas que têm interesse para o próprio candidato. “Assim, não é obrigatório que se candidatem a todas as quatro disciplinas. As restantes provas das outras disciplinas, podem ser organizadas, livremente, pelas instituições do ensino superior”, esclarece o Governo. Claro é que num curso de Língua e Literatura Chinesa a prova a realizar é de Chinês, assim como é exigida a prova de Matemática para um curso na área de Ciências e Engenharia. [quote_box_right]“Os alunos estão mais preocupados. Ficam mais pressionados, com medo de reprovarem”
Stephen Wong, Director do Centro de Educação Unnamed[/quote_box_right]
Relativamente à obrigatoriedade do exame, o Governo esclarece que este não é obrigatório para o término do ensino secundário. “Não é obrigatório que os estudantes do ensino secundário façam o Exame. Aliás, o resultado dos estudantes neste Exame não está nada relacionado com a conclusão do ensino secundário e, também, não prejudica, a sua participação nos exames de admissão realizados por outras instituições, que estão fora do âmbito do Exame Unificado de acesso, nem o prosseguimento dos seus estudos no exterior”, esclarece o Governo em nota à imprensa.
A DSEJ explica ainda que “se os estudantes pretenderem candidatar-se às quatro instituições, podem, também, solicitar o acesso sob a recomendação da escola secundária, sem necessidade de realizar o exame. Podem, ainda, aproveitar a classificação obtida nos exames internacionais para pedir dispensa parcial ou total das provas das disciplinas no âmbito do exame unificado”.

Ser em todo

A questão da internacionalização é uma falha apontada por Teresa Vong. Para a professora, na hipótese de existir este exame então deve ter em conta os alunos que querem estudar fora. Algo que não acontece neste momento. “Os alunos que querem ir estudar na China ou em Taiwan têm que fazer outro exame. Não tenho isto bem confirmado, mas por aquilo que sei o resultado deste exame unificado de Macau não é reconhecido por Taiwan ou China. Portanto os exames dos que queiram estudar fora têm de ser outros. Isto não faz sentido, se o Governo quer unificar então tem de ser tudo”, explicou a docente. “Este é uma tentativa para resolver uma questão local, não tem abrangência internacional”, rematou.
Ideia refutada por Lawrence Wong que acredita que este é um método que vem organizar e obrigar os alunos a tomarem decisões mais cedo. “Acho que este exame unificado poderá servir para que as escolas secundárias possam definir padrões muito claros. Por exemplo, se os estudantes querem entrar em universidades de Taiwan, fazem os exames de Taiwan, se querem ficar cá, fazem este. Isto vem criar um mapa muito claro das tendências dos alunos, quantos vão para aqui ou para outra opção. Por último, os estudantes podem agora melhor preparar-se para os exames que querem”, explica.

Apoio pronto

Por hábito, a esmagadora maioria dos centros de estudo em Macau têm um curso especifico para os exames de ingresso ao ensino superior. É o caso do Centro de Educação Unnamed que sempre teve o curso de preparação para a Universidade de Macau. “Antes oferecíamos o curso para os exames de acesso à UM, mas quando tornámos público o nosso novo curso para o exame unificado recebemos muitas mensagens dos alunos a perguntar o que era, como é que seria o conteúdo do exame, entre outras coisas. Sinal de que a promoção do Governo falhou ou não foi suficiente”, explica o director. Também Lawrence Wong conta ao HM, que já está a decorrer o curso de preparação para este exame, mesmo só estando agendado para Abril do próximo ano. [quote_box_left]“Se o aluno chumbar não terá nenhuma outra oportunidade de estudar em Macau”[/quote_box_left]
Em análise aos exemplos fornecidos pela DSEJ, Stephen Wong faz notar alguma diferenças, como é o caso das exigência de Matemática. “Depois de compararmos este modelo de exame ao anterior exame de acesso da UM percebemos algumas diferenças, por exemplo as perguntas de Inglês são mais fáceis, é pelo menos, menos exigente, mas o de Matemática é mais difícil. Acho que este vai ser um desafio para os alunos”, explicou.
Lawrence Wong classifica os exames de muito semelhantes. “Tendo como base os exames da UM, que é para onde a esmagadora maioria dos estudantes quer ir, este exame é muito idêntico”. Para o reitor estes novos exames foram elaborados com base nos da UM e por isso esta pode ser uma vantagem para os estudantes. No entanto, Stephen Wong é claro. “É preciso uma maior promoção e preparação dos alunos”, para que os mesmos fiquem mais calmos e confiantes no exame que os espera.
“Sugiro que o Governo avance com formações e mais instruções para nós, docentes, para podermos ajudar os estudantes que se sentem perdidos”, remata.

(com Angela Ká)

22 Jun 2016

Previdência | Deputados aprovam regime com três votos contra

Três votos contra de José Pereira Coutinho, Leong Veng Chai e Kou Hoi In não foram suficientes para chumbar a proposta do regime de previdência central não obrigatório. Debaixo de críticas, Alexis Tam promete melhorar lei quando for analisada na especialidade

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s comentários do hemiciclo davam a entender que o regime de previdência central obrigatório iria ser chumbado, mas a verdade é que o diploma acabou aprovado na generalidade com apenas três votos contra. Kou Hoi In, deputado nomeado, manteve a sua palavra até ao fim e votou contra um diploma que prevê contribuições de 10% para a segurança social por parte de patrões e empregados, mas que não obriga as empresas a fazê-lo.
José Pereira Coutinho e Leong Veng Chai, o seu número dois, ainda referiram que podiam votar a favor com mais explicações por parte do Governo, mas o voto final foi vermelho. “O Governo continua a não ter coragem para assumir o princípio da responsabilidade social, para que todos os trabalhadores possam ter dignas condições de vida. Em Macau é tudo à vontade do freguês. Não havendo uma calendarização para o regime obrigatório não votámos a favor, porque os trabalhadores não podem ficar à espera”, disse Coutinho na sua declaração de voto. 22616P4T1-A
Quem votou a favor garantiu que o diploma terá de ser alvo de muitas mudanças. “Este regime já devia ter sido instituído, mas esta proposta é melhor do que nada, embora esteja aquém das expectativas”, disse Song Pek Kei. Angela Leong, que também é administradora da Sociedade de Jogos de Macau (SJM), foi clara. “Este diploma contem aspectos polémicos mas temos que dar o primeiro passo, senão as garantias de aposentação dos trabalhadores ficaram sem uma data, por isso votei a favor. O Governo precisa de negociar com as grandes empresas.”
Chui Sai Cheong, deputado indirecto e irmão de Chui Sai On, alertou para a necessidade de incluir as “empresas privadas que têm o seu próprio regime de pensões”. “Esta lei tem problemas de operacionalidade em relação às empresas que já dispõem de fundos de pensões, há matérias que precisam de ser melhoradas especialmente porque há situações injustas para essas empresas e estas não podem tornar-se vítimas desta lei.”

Empresas a fechar?

O deputado Fong Chi Keong alertou para o risco de Pequenas e Médias Empresas (PME) poderem fechar por não conseguirem suportar os custos com a segurança social. “Em Macau existem mais de 14 mil PME, e a maior parte destas empresas vão fechar por causa do regime de contribuições obrigatório e não obrigatório”, alertou.
Já Kou Hoi In garantiu que o patronato não fica protegido com este regime. “Os empregadores não estão salvaguardados, não fazem parte da população? Quando entra em falência ou quando se reformar, como vai ficar protegido? O patrão contribui mas depois o dinheiro fica todo para o trabalhador. Esta política deve ser para toda a população. Porque é que os empresários têm de assumir esta responsabilidade, em vez do Governo? O empregador pode contribuir para o primeiro nível, mas não para o segundo. Não pode usufruir da protecção deste regime. Tem de contribuir mas depois não pode beneficiar, será isto justo? Neste momento o empregador tem de assumir alguns encargos com regalias”, defendeu o deputado nomeado. 22616P4T1-C
Alexis Tam, Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, decretou que o Executivo já injectou elevadas somas nos actuais regimes de pensões. “A contribuição do Governo representa 85%. Em relação ao segundo nível, já injectamos 49 mil patacas para cada conta individual de previdência (para residentes permanentes). Temos investido bastante na saúde e áreas sociais. Este regime visa sensibilizar os patrões para que possam disponibilizar garantias após a aposentação.”

Captar empresas

O Governo deixou ainda a promessa de rever a lei daqui a três anos para que se implemente o regime de contribuições obrigatório, para além de começar a falar com as grandes empresas do ramo do Jogo, finanças e concessionárias, que já têm os seus regimes privados de pensões.
“O Governo já tem um plano e vamos dialogar com as concessionárias de jogo e as empresas de grande dimensão para aderirem a este regime. Estamos confiantes de que nos próximos três anos seremos capazes de convencer as concessionárias, empresas do sector financeiro e associações que recebem subsídios, pois estas também têm a obrigação de aderir a este regime não obrigatório. Vamos criar condições para que estas associações e empresas possam aderir”, prometeu Alexis Tam.
Após a votação, os três deputados da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), Kwan Tsui Hang, Ella Lei e Lam Heong Sang, pediram, em comunicado, um calendário para a implementação de contribuições obrigatórias.

22 Jun 2016

Grafiti | Macau ainda tem muito caminho para andar

Reabilitar edifícios devolutos com cores e imagens. Dar voz aos artistas que usam o grafiti para transformar Macau numa região mais actual, mais interventiva e mais bonita. Deixar que a arte urbana invada a RAEM e assim acompanhar tendências internacionais na diversificação cultural. Estas são as premissas que poderiam fazer da Macau uma casa para o grafiti, uma solução para as paredes abandonadas e um chamariz para o turismo

[dropcap style=’circle’]E[/dropcap] se Macau fosse uma galeria a céu aberto à semelhança de projectos que já se fazem um pouco por todo o mundo? O grafiti tem sido o rei na lavagem de cara de muitos espaços públicos e privados um pouco por todo o lado. A arte urbana passou de marginal a acarinhada não só pelos seus criadores como por um público que cada vez mais a aprecia. Viajar para ir a estes novos “museus” já consta dos planos de muitos e alguns já fazem parte dos roteiros mais apreciados.
Em Macau o aproveitamento de espaços antigos devolutos para a criação, nomeadamente para obras em grafiti, também é assunto que não passa despercebido. São interessados os criadores locais, a população e mesmo os deputados.
Ainda esta semana o tema foi mote de interpelação por parte da Angela Leong. A deputada interpela o governo precisamente acerca da criação de uma zona para grafiti nos bairros antigos enquanto atracção turística e cultural. grafitty gantz5
No que respeita ao património público o Instituto Para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) disse ao HM que terá tido um espaço dedicado a este género de arte na Rua dos Mercadores, num espaço alugado. No entanto e após a devolução ao respectivo proprietário o espaço estaria destinado a outros fins de foro privado e como tal não poderia interferir. É hoje um parque de estacionamento. Salientou ainda que sem autorização ninguém pode interferir no espaço público sob risco de ser acusado de vandalismo. O crime que representa a possível utilização de espaço para o grafiti é corroborado pela Polícia de Segurança Pública que confirma ao HM que o acto é classificado de Dano Qualificado, incorrendo a pena de multa ou prisão.
Quanto ao aproveitamento artístico de espaços, o IACM afirma que não será da sua tutela, remetendo a responsabilidade para o Instituto Cultural (IC). O IC adianta que está empenhado na promoção das diferentes formas artísticas na RAEM salientando a recente criação de uma zona especial de exposições no lago Nam Van para a qual convidou a equipa de artistas locais GANTZ5 Crew para realizar um trabalho entre Maio e Junho integrado na iniciativa “Anim’Arte NAM VAN”. Não adianta, no entanto, qualquer outra informação sobre a reutilização de mais espaços para promoção do grafiti.

Colectivo local

A GANTZ5 Crew é o colectivo de artistas locais que se dedica ao grafiti na RAEM. Pat Lam que assina como PIBZ é um dos membros da Crew e começou a pintar paredes em 1999. Para o artista, é “como dar um presente à cidade”. O colectivo já tem trabalhos espalhados por Macau e para Pat, actualmente é mais fácil pintar grafiti, lembrando as detenções e os problemas com as autoridades por que já passou. Para o artista o grafiti traria a Macau uma atenção especial. Salienta ainda a sua importância no alerta para os edifícios mais antigos e em mau estado enquanto pensa na “reabilitação” artística, mesmo que temporária dos mesmos. Pat afirma ainda a falta de espaços para pintar e relembra o projecto que animou a Rua dos Mercadores e a sua importância, lamentando o fim do mesmo, sem continuidade ou alternativa. A utilização das zonas mais antigas de Macau é ainda considerada uma mais valia tanto cultural como promotora de mais visitantes à região. Fica a questão dee porque é que a RAEM não promove o grafiti enquanto cartão de visita turístico ao mesmo tempo que dá “outro ar” à “baixa” da cidade.

Por esse mundo fora

O grafiti tem vindo a sair dos subúrbios urbanos onde nasceu enquanto arte marginal, de intervenção e reflexão social, e tem vindo a ocupar o coração das grandes cidades. O fenómeno é visível um pouco por todo o mundo e os seus protagonistas cada vez mais destacados internacionalmente. Há cidades pelo mundo fora que são já são denominadas “amigas do grafiti”. Lisboa por exemplo, é uma delas tendo registado nos últimos anos um elevado aumento de turistas para visitar as suas paredes pintadas. Na Europa é já tida como a capital do grafiti.
Também a Ásia tem vários exemplos entre os quais se destaca Kaosiung em Taiwan onde o governo tem vindo a expandir cada vez mais os espaços para que os artistas possam pintar legalmente. O governo local deu andamento à legalização do que chama de arte pública e com um espaço mais alargado de tela urbana, promove não só os artistas locais como cativa talentos de fora. Kaosiung é agora também um destino para uma vaga de visitantes que à semelhança de Lisboa procuram mais oferta no designado turismo cultural.
A movimentada Shibuya em Tóquio ou o não menos conhecido Soho de Hong Kong não são excepção e já contam com espaços assinados por artistas internacionalmente reconhecidos como Space Invader, Titi Freak, ou do português Vhils.
Alexandre Farto, também conhecido por Vhils foi um dos nomes do ano passado referido pela revista Forbes enquanto talento português e o já consagrado e ainda anónimo Banksy que chama tantos a conhecer as paredes que vai pintando, esteve nos nomeados às 100 pessoas mais influentes do mundo da Time em 2010.

22 Jun 2016