Tabaco | Casinos apresentam novos estudos sobre qualidade do ar

As seis operadoras de jogo de Macau encomendaram dois estudos sobre a satisfação dos empregados com as salas de fumo, assim como a qualidade do ar dentro dos casinos. É que a competição assusta…

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stá tudo bem. Estas três palavras resumem os resultados dos estudos apresentados pelas concessionários de jogo, tanto quanto à satisfação dos funcionários com a implementação das salas de fumo, como na medição da qualidade do ar nas zonas livres de tabaco. Durante a apresentação foi repetida várias vezes a expressão “estudo independente”.

A Universidade de Macau estudou o grau de agrado dos funcionários dos casinos desde a lei do tabaco, implementada em 2014. O estudo, conduzido em Outubro do ano passado, consistiu de um questionário respondido por 14.301 trabalhadores em todos os casinos de Macau. Deste universo, 73 por cento trabalham directamente no jogo, 56 por cento deles mulheres, com médias de idade entre os 31 e 40 anos. O questionário revelou que 87 por cento dos trabalhadores reconhecem que a qualidade no ar no local de trabalho melhorou significativamente desde a implementação das salas de fumo.

Acerca da proibição de fumar, 40 por cento dos funcionários apoia a proposta defendida por Alexis Tam de tolerância zero para o tabaco nos casinos. O estudo revelou que entre quem trabalha na zona de jogo 45 por cento prefere banir totalmente o fumo no casino. “A maior dos funcionários é contra a política de tolerância zero, não podemos agradar a toda a gente, mas ao menos os resultados revelam que a maioria das pessoas apoia as salas de fumo”, comentou Ambrose So, director do Sociedade de Jogos de Macau. Ambrose So, em representação das seis concessionárias, adiantou ainda que o mais democrático será “respeitar a maioria, uma posição que deveria ser tomada pelo Executivo”.

Entre os trabalhadores que discordam do banimento total, 47 por cento considera que o fumo deve ser permitido apenas nas salas de fumo. Os restantes acham que as salas VIP deveriam ser zonas onde se pode fumar.

Poluição interior

O outro estudo, apresentado por Lee Shun Cheng da Universidade Politécnica de Hong Kong, refere-se à medição de partículas e compostos químicos nas zonas onde é proibido fumar. Foi realizado em duas fases: a dois e cinco metro de portas de salas de fumo. Foram medidos os níveis de monóxido e dióxido de carbono, a concentração de partículas de 10 e 2.5 micras, assim como benzopireno (composto que indica a presença de fumo de tabaco).

Neste capítulo, “os resultados dos casinos das seis concessionárias ficaram dentro dos níveis de padrão de qualidade de ar de interiores em Macau”, revelou o académico.

A equipa de Lee Shun Cheng propôs também medidas para melhorar a eficácia de extracção da zonas onde se pode fumar. Uma das medidas prende-se com a segurança de quem limpa as salas de fumo. A limpeza será feita durante os períodos do dia em que há menos apostadores, o que dará tempo para que o fumo seja extraído. Também será aumentada a pressão negativa dos extractores e montado um alarme que indica quando há pouca pressão na extracção, ou quando a porta estiver demasiado tempo aberta. Outra das medidas para melhorar a qualidade do ar no interior dos casinos passa pela instalação de um sistema de ventilação só para as salas de fumo.

Estas propostas para melhoria do ar que se respira nos casinos de Macau foram apresentadas ao Executivo no final do ano passado, tendo sido sugerido 12 a 18 meses para serem implementados. Por agora, as concessionárias aguardam a resposta governamental.

Ambrose So explica que, além de se tentar proteger a saúde dos trabalhadores dos casinos a ideia “será dar uma opção aos fumadores e não perturbar aqueles que não fumam”. O homem da SJM nem equaciona a possibilidade da proibição total, “o que teria um impacto negativo para a economia de Macau, especialmente numa altura de crise global e de aumento de competição na região”.

Governo | Prudência rumo à tolerância zero

Em resposta à conferência de imprensa das concessionárias dos casinos, onde foram apresentados estudos sobre a existência de salas de fumo, os Serviços de Saúde reafirmaram o objectivo de erradicar o tabaco de locais públicos. O Governo explica, em comunicado, que as políticas projectadas para controlo do tabagismo são para cumprir. A finalidade é tornar Macau numa cidade saudável, sem fumo, seguindo as recomendações da Organização Mundial de Saúde. Porém, o Executivo considera as propostas dos casinos para as salas de fumo “prudentes”, e um passo no controlo progressivo do tabagismo. A medida foi votada na Assembleia Legislativa, mas como foi chumbada, as medidas de controlo do tabagismo mantém-se em vigor. Ou seja, é totalmente proibido fumar nas áreas comuns de jogo. O comunicado dos Serviços de Saúde alerta que, no entanto, podem ser criadas salas de fumo e podem ser mantidas áreas para fumadores nas salas VIP.

14 Fev 2017

Ambiente | Macau em plena época de poluição atmosférica

Apesar dos ténues avanços para a melhoria da qualidade do ar em Macau, estes esbarram nos costumes e na falta de sensibilidade ambiental. Assim sendo, há alturas do ano em que o ar que respiramos é perigoso. Algumas zonas da cidade são irrespiráveis o ano inteiro

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão há bela sem senão. Transversalmente, quando o Homem migra dos campos para as cidades, e a sociedade se torna mais industrializada, mais próspera, o ambiente e as pessoas sofrem. Há seis décadas, a Europa via-se a braços com gravíssimos problemas de poluição atmosférica. A queima desenfreada de carvão, assim como a emissão de poluentes resultantes do boom industrial originaram chuvas ácidas. O mesmo se passou na América do Norte, na Rússia e, nas últimas décadas, na China. O processo de industrialização chinês provocou um êxodo massivo de pessoas dos campos para as cidades, aumentando a necessidade de urbanização sustentada na indústria do aço e do cimento.

Este é o contexto socioeconómico que degrada a qualidade do ar. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), todos os anos morrem três milhões de pessoas como consequência da poluição atmosférica, sendo que cerca de 92 por cento da população mundial respira ar poluído.

Apesar das metas ambiciosas de Pequim para reduzir a poluição atmosférica, a produção energética chinesa ainda assenta muito no carvão. Por cá, faz-se um esforço para tirar de circulação os motociclos com motores de dois tempos, responsáveis pela emissão de gases poluentes, com consequências directas para a saúde.

Os meses entre Outubro e Março são os mais perigosos. Durante a época seca, os ventos do norte chegam a Macau minados de poluentes, facto que, aliado à poluição gerada internamente, eleva a perigosidade para índices preocupantes. “Localmente devíamos fazer alguma coisa. Apesar de surgirem medidas que proíbem a circulação de determinados tipos de automóveis, ainda assim nota-se o fumo super poluente dos automóveis e camiões, que não têm qualquer tipo de filtragem”, explica Ágata Dias, investigadora do Instituto de Ciências e Ambiente da Universidade de São José.

Micro assassinos

O diabo está nos detalhes invisíveis, nos gases poluentes emitidos pelos escapes, nas emissões da central eléctrica, da refinadora de combustíveis e dos aterros incineradores. O resultado é a libertação de ozono, dióxido de enxofre, dióxido de azoto, monóxido de carbono mas, principalmente, de micropartículas. Neste caso, as mais prejudiciais são as 2.5 micras, demasiado pequenas para serem filtradas por máscaras comuns.

Segundo dados da Direcção dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos (DSMG), na última sexta-feira a concentração destas partículas foi quatro vezes superior ao limite recomendado pela OMS. Os níveis de ozono mantiveram-se em valores bons. Os índices de partículas de 10 micras atingiram níveis altos em Coloane, provavelmente, devido à actividade da cimenteira.

Apesar de serem invisíveis, os efeitos destas partículas são bem reais. “As de 10 micras penetram nos pulmões, mas as piores são as partículas de 2.5 micras que conseguem entrar na circulação sanguínea, alojando-se nos órgãos”, explica o pneumologista Alvis Lo. O médico acrescenta ainda que a exposição, de longo prazo, a estas partículas mais pequenas “provoca doenças crónicas pulmonares e cardiovasculares, assim como cancro do pulmão”. No entanto, Alvis Lo alerta também para o fumo do tabaco como um perigo mais agudo.

Na generalidade, os meses de mau ar situam-se entre Outubro e Março. Porém, há zonas da cidade que têm sempre elevados índices de poluição devido ao excesso de tráfego rodoviário. Neste sentido, importa recordar que em Macau, no ano passado, o número de veículos matriculados ultrapassou o quarto de milhão.

Para juntar insulto à injúria, existem zonas do território onde o planeamento urbanístico não permite a circulação de ar, mantendo gases e partículas acumuladas. “Por exemplo, o Parque Central da Taipa vai ficar completamente estrangulado do ponto de vista da circulação do ar”, comenta Ágata Dias. A investigadora aponta ainda a Avenida Almeida Ribeiro, “uma artéria onde havia circulação de ar até ao rio mas, com a construção da Ponte 16, o ar fica ali estagnado”, cheio de gases nocivos. Outra zona a evitar é a Rua do Campo, também com pobre arejamento. Nestas áreas, a qualidade do ar é sempre má, independentemente da altura do ano.

Pior a emenda

O problema dos escapes dos veículos parece ser incontornável. No entanto, a juntar aos veículos antigos, muito menos eficientes em termos energéticos, existe um problema cultural, na óptica de Ágata Dias. A própria população parece preferir automóveis de grande cilindrada, revelando não estar “sensibilizada para estes problemas ambientais”. A investigadora acrescenta ainda que devem existir “lobbies bem instalados em Macau que não querem que as coisas andem para a frente”.

A solução parece apontar na direcção dos veículos eléctricos, o que levanta outra questão preocupante. Onde se vai buscar essa energia? A resposta parece matar a pergunta à nascença, uma vez que Macau produz pouca energia, tendo de a importar do Interior da China. Ou seja, voltaríamos a ter o problema da necessidade de queimar carvão para alimentar os veículos eléctricos, e essa poluição regressaria ao território com os ventos que chegam do norte. Uma espécie de karma atmosférico. A solução parece estar numa acção conjunta com a China Continental na implementação de centrais de produção energética com fontes limpas, como a energia solar, ou eólica. Esta é a única forma de atingir sustentabilidade ecologicamente responsável.

Outro problema é a quantidade de energia que se desperdiça em Macau. A falta de sensibilidade ambiental vê-se nos edifícios que mantém as luzes acesas ligadas a noite inteira, sem um sistema racional de poupança. Os ares condicionados também são outro grande foco de consumo de electricidade, sendo normal permanecerem ligados independentemente da altura do ano. Mais electricidade gasta, mais combustíveis fósseis queimados para alimentar a profusão de luzes que iluminam Macau.

O reflexo na saúde

Quem chega a Macau, em especial durante o Inverno, pode experimentar uma sensação de ardor nos olhos e na garganta. A explicação para tal fenómeno é assustadora. Um turista que atravesse San Ma Lo e depois suba a Rua do Campo pode sentir esta irritação. Ora, isso resulta da presença de elevadas concentrações de dióxido de azoto e enxofre que, em conjugação com o ambiente húmido dos olhos e garganta produz… ácido nítrico e ácido sulfúrico.

O mesmo acontece com as primeiras chuvas. “Em contacto com estes óxidos produzem-se chuvas, que normalmente, são bastantes ácidas”, explica Ágata Dias. Os efeitos da chuva ácida também se fazem sentir no património, nomeadamente nas rochas carbonatadas, que reagem directamente a estes ácidos.

Mas o cenário de Macau, tirando os pontos críticos, não é assim tão mau entre Março e Outubro, com valores de concentração de poluentes, normalmente, bons. “As pessoas têm a ideia de que o ar está sempre mau porque há alturas húmidas e está um constante nevoeiro que, neste caso, não é smog”, relativiza Ágata Dias.

Esta é uma sensação relativamente comum entre a comunidade portuguesa, que acha que em Portugal tudo é um mar de rosas em termos atmosféricos, e que o ar é puro em todo o lado. Lisboa, por exemplo, tem valores de poluição semelhantes a Macau em alguns bairros. Quem viva na Avenida da Liberdade, na Avenida 5 de Outubro e na zona de Entre Campos também convive com uma elevada concentração de gases perigosos. Outra parte de Lisboa preocupante são os bairros nas imediações do aeroporto, uma vez que “os aviões são responsáveis por uma produção enormíssima de poluentes”, alerta a investigadora.

O cenário não é, contudo, catastrófico. Mas as soluções são complexas, difíceis de serem colocadas em prática, uma vez que requerem uma alteração de mentalidades, tanto por parte dos cidadãos, como dos governantes. Além disso, decisões isoladas estão votadas ao fracasso, é necessário compromisso regional e global, se queremos entregar um planeta respirável às próximas gerações.

13 Fev 2017

Protesto | Motoristas acampam no Leal Senado

A Associação de Motoristas Locais iniciou no sábado um protesto no Leal Senado contra o aumento das taxas de veículos e os alegados abusos cometidos pelos portadores de licenças especiais. Alguns manifestantes estão em greve de fome

Com Vítor Ng

[dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uando o HM falou ontem com Wong Tim Iao, este não comia há mais de 24 horas. A opção deste membro da Associação dos Motoristas Locais foi de iniciar uma greve de fome num protesto que se tem feito notar no Largo do Senado. Nem todos os seus companheiros optaram por esta via, mas manifestam-se pelos mesmos motivos: o aumento súbito das taxas de veículos e o facto de muitos portadores de licenças especiais conduzirem em Macau, sem serem portadores do blue card. Na sua óptica, roubam-lhes os empregos. O protesto deverá acabar hoje.

Wong Tim Iao referiu ao HM que o Governo decidiu aumentar as taxas dos veículos sem ter, sequer, apresentado uma proposta na Assembleia Legislativa para discussão. No caso dos veículos pesados, as taxas para a remoção chegam às seis mil patacas, mas este condutor diz que nunca há lugares de estacionamento suficientes.

“Se recebermos uma multa todos os dias, o valor vai ser igual ao nosso salário”, disse. Thomas Chen, outro condutor presente, também referiu que bastam duas multas num mês para que se atinja um ordenado mensal, algo que não compensa pegar no volante.

Wong Tim Iao queixa-se ainda de que o Governo não aborda da forma correcta a questão dos veículos com duas matrículas, vindos do lado de lá das Portas do Cerco. “Esses veículos com duas matrículas passam a fronteira e circulam pelos hotéis. Estão a ameaçar a nossa sobrevivência”, apontou.

“Tentamos manifestar-nos antes mas não encontrámos outra maneira para expressarmos as nossas queixas. Agora só podemos mesmo fazer greve de fome”, disse.

Parcas respostas

A Associação dos Motoristas Locais já se havia manifestado pelos mesmos motivos no passado dia 22 de Janeiro. Mas Wong Tim Iao revelou que a resposta apresentada pelo Governo não os convenceu. “O Governo não reagiu de forma nenhuma, pelo contrário, ainda disse que iria aumentar mais as taxas. Acho que este Governo não ouve as vozes dos cidadãos”, frisou.

Os protestos prometem, assim, continuar. “Para que o Governo nos possa dar mais atenção, já estamos a planear a próxima etapa, e talvez façamos uma actividade mais radical. Mas teremos que discutir primeiro com os nossos colegas”, afirmou.

O grupo está ligado à Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), do deputado José Pereira Coutinho, que até ao fecho desta edição não esteve contactável. Ontem à tarde o deputado Au Kam San, da Associação Iniciativa para o Desenvolvimento Comunitário, explicou os incidentes ocorridos com a polícia na noite de sábado, que quis dispersar os manifestantes. Mas não prestou mais declarações aos jornalistas.

Segundo o comunicado divulgado pela associação de motoristas, as autoridades interromperam o protesto por volta da meia-noite, numa altura em que todos os manifestantes estavam em silêncio.

“Nessa altura havia alguns estrangeiros a beber connosco mas a polícia mandou-nos sair. O comportamento da polícia constitui uma violação aos direitos dos cidadãos. Estávamos a comportar-nos normalmente e já não a agir como manifestantes”, lê-se. Graças à ajuda de Au Kam San, o problema acabaria por ficar resolvido e todos puderam continuar no Leal Senado.

13 Fev 2017

Ho Chio Meng | Dispensa de concursos continua a ser prática do MP

Uma assessora do Gabinete do Procurador foi ao tribunal onde está a ser julgado Ho Chio Meng explicar que o actual líder do Ministério Público não alterou as práticas em relação às obras e aquisições de serviços. Na era Ip Song Sang houve apenas um concurso público

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Ministério Público (MP) manteve a prática de Ho Chio Meng de atribuir contratos sem concurso público para gastos correntes do serviço. De acordo com o relato da Rádio Macau, que tem estado a acompanhar o julgamento de Ho Chio Meng, a afirmação foi feita no Tribunal de Última Instância por uma assessora do Gabinete do Procurador, que confirmou a tese da defesa sobre a legalidade de algumas adjudicações.

Desde 20 de Dezembro de 2014, altura em que Ip Son Sang substituiu no cargo Ho Chio Meng, o MP realizou apenas um concurso público. À excepção da empreitada para as futuras instalações do MP, todas as obras e aquisições de bens e serviços têm sido atribuídas por ajuste directo ou concurso por convite, de acordo com Man Hio U.

A emissora destaca que o sistema de contratação do MP é um ponto importante no processo contra Ho Chio Meng. O ex-procurador é acusado de ter manipulado milhares de contratos para desviar dinheiro e beneficiar um grupo de dez empresas, controladas por familiares e pessoas próximas.

Ouvida pela defesa, Man Hio U, que também assina como Pancho, confirmou que o MP continua a optar pela contratação com dispensa de concurso público, até mesmo quando os valores envolvidos ultrapassam os limites previstos por lei.

A testemunha defendeu-se com o regime de excepção e apresentou a mesma argumentação que Ho Chio Meng. Pancho deu um exemplo: os serviços de segurança e limpeza, que implicam gastos superiores a um milhão de patacas, continuam a ser atribuídos sem haver concurso público. Neste caso, Man Hio U alegou motivos de segurança para o não cumprimento da regra geral que prevê que, acima de 750 mil patacas, as adjudicações de bens e serviços sejam feitas através de concurso. A defesa tem apresentado a mesma teoria.

A acusação usa como argumento o facto de, durante o consulado de Ho Chio Meng, algumas contratações serem feitas de forma parcelar para contornar a obrigatoriedade de concurso público. A assessora de Ip Song San afirmou que, dentro do MP, é aceite que um recibo seja dividido por dois contratos.

Ainda assim, a testemunha detectou e alertou para várias irregularidades nos contratos atribuídos durante o mandato de Ho Chio Meng: diz que fez contrapropostas, que nunca foram acolhidas, e testemunhou “discussões” entre António Lai, chefe de Gabinete de Ho Chio Meng, e a adjunta, Elsa Cheang, que chegou a pedir escusa deste tipo de trabalho por discordar da forma de actuação do MP.

Uma das alegadas irregularidades tem que ver com a omissão de nomes e locais de destino nas facturas dadas para liquidação de gastos com viagens que, de acordo com a acusação, foram feitas em benefício próprio de Ho Chio Meng, de funcionários próximos e de familiares do ex-procurador.

Irmãos, trabalhos à parte

Também na última sessão, o TUI ouviu Lam I Na, ex-funcionária do Ministério Público e irmã de um dos co-arguidos no processo. A testemunha prescindiu do direito ao silêncio, facto que foi destacado pela acusação que, de resto, sugeriu várias vezes que o depoimento vinha preparado.

O testemunho de Lam I Na, entretanto despedida do MP, foi mais favorável à defesa: deu conta de reuniões de trabalho na chamada “sala de descanso para docentes”, onde foi encontrada uma cama de casal e uma sauna, e confirmou a existência de convidados na vivenda de hospedagem do MP em Coloane.

O irmão de Lam I Na consta do processo por ser funcionário das empresas que ficaram com os contratos atribuídos durante o mandato de Ho Chio Meng e funcionariam num piso arrendado pelo MP. Lam I Na disse que só teve conhecimento do trabalho do irmão quando o encontrou no escritório. Afirmou também que foi também só nesse momento que o irmão soube que era funcionária do MP.

De acordo com a acusação, Ho Chio Meng contratou pessoas próximas das empresas para facilitar a entrega de contratos.

13 Fev 2017

PSI | ATFPM aborda lei sindical e licença de maternidade

A ATFPM vai estar presente na reunião anual dos Serviços Públicos Internacionais, que este ano decorre na Coreia do Sul. A ausência de uma lei sindical em Macau, a implementação de 90 dias de licença de maternidade e o salário mínimo universal serão temas abordados por Pereira Coutinho e Rita Santos

 

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão três problemáticas do mercado laboral local que têm estado na ordem do dia e que vão transpor fronteiras. A Associação dos Trabalhadores da Função Pública (ATFPM) vai estar representada na Coreia do Sul para participar em mais um encontro anual da entidade Serviços Públicos Internacionais (PSI, na sigla inglesa), que congrega associações de 160 países, representantes de trabalhadores da Função Pública. Temas como a falta de uma lei sindical, os dias da licença de maternidade e o salário mínimo universal serão discutidos no encontro. Desde 1993 que a ATFPM é membro da PSI.

Ao HM, Rita Santos avançou que irá abordar a questão da licença de maternidade em Macau, pedindo a implementação de 90 dias. “A primeira vez que houve uma reunião em Macau, logo após o estabelecimento da RAEM, sugeri o aumento dos dias de licença de maternidade. Em muitos países, incluindo a China, são 90 dias”, vinca. “Lembro-me que sugeri 90 dias, houve muitas críticas, sobretudo do sector privado da área empresarial. Parece-me que agora há mais vozes a favor. As mulheres hoje em dia têm uma dupla responsabilidade porque, além de tomarem conta dos filhos, precisam de mais tempo de descanso.”

Já José Pereira Coutinho vai falar da ausência de uma lei sindical em Macau, apesar das diversas propostas de lei já apresentadas por deputados à Assembleia Legislativa, cujas votações resultaram em chumbos.

“Coutinho haverá de falar novamente da falta de uma lei sindical e de negociação colectiva, pela qual se luta desde 1987. Desde o início da ATFPM que apresentamos propostas ao Governo português”, lembra a presidente da assembleia geral da associação.

Para Rita Santos, a falta desta lei também se deve à falta de actuação da Administração portuguesa. “Foi culpa dos portugueses. Na altura parecia existir uma cedência em relação os empresários, e se tivesse sido aprovada a legislação hoje não teríamos esse problema. As leis e as convenções internacionais antes do Governo da RAEM foram transferidas para o período após 1999 sem problemas. Mas temos de olhar para a frente.”

Quanto ao salário mínimo universal, “o Chefe do Executivo disse que iria ser concretizado em 2019, mas até lá vamos mostrar as nossas vozes”.

Problemas consulares

Rita Santos falou ainda do I Encontro do Conselho Regional da Ásia e da Oceânia das Comunidades Portuguesas, que está marcado para finais de Março e onde irá participar o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luís Carneiro.

Na agenda estão assuntos relacionados com o funcionamento do Consulado-geral de Portugal em Macau. “Vamos transmitir os mesmos problemas em relação à falta de pessoal no consulado, é preciso actualizar os vencimentos, porque são baixos. Soube que vai haver um reforço do quadro, mas com um salário de oito mil patacas, o que é muito baixo. Vamos ver se Portugal dá mais atenção às actividades culturais e também ao papel de plataforma de Macau”, resumiu Rita Santos, que garantiu ainda que será debatida a possibilidade de implementação do voto electrónico. Isto numa altura em que a Assembleia da República em Portugal discute o assunto, após a entrega de uma petição.

O I Encontro do Conselho Regional da Ásia e da Oceânia das Comunidades Portuguesas abrange os territórios da China, Macau, Hong Kong, Austrália, Timor-Leste, Japão, Coreia e Tailândia.

 

 

Rita Santos não será candidata à AL

Em declarações à Rádio Macau, Rita Santos confirmou que não fará parte da equipa de José Pereira Coutinho nas eleições legislativas deste ano. “O número dois vai continuar a ser Leong Veng Chai, que está a fazer um bom trabalho. Temos tido bastante apoio dos cidadãos de Macau, assim como dos corpos gerentes. Convencemo-lo a continuar a prestar serviço à população de Macau, resolvendo os seus problemas diários”, apontou.

10 Fev 2017

Análise | Subsídios da Fundação Macau às universidades privadas

É um facto que salta à vista quando a Fundação Macau publica as listas de apoios concedidos: há uma universidade privada que recebe muito mais do que as outras. Sobre esta partilha de patacas, há pouco quem fale. Ng Kuok Cheong encontra um só critério para a bonança de alguns. Chama-se ‘guanxi’

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o ano passado, a Fundação Macau entregou ao organismo que gere a Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (UCTM) mais de 509,6 milhões de patacas. Este montante, resultante da soma dos apoios trimestrais concedidos pela entidade liderada por Wu Zhiliang, diz apenas respeito aos subsídios para financiar os planos anuais de actividades e obras que estão a ser levadas a cabo pela instituição. De fora ficaram as ajudas para bolsas de estudo e outros projectos.

A principal fatia do bolo dado à Fundação da UCTM foi tornada pública esta semana: no último trimestre do ano, seguiram para a instituição do Cotai mais de 446 milhões de patacas. A maior parte do dinheiro destinava-se a custear as obras do Complexo Pedagógico (Bloco O) da universidade. A Fundação da UCTM tem também sob a sua alçada o Hospital da Universidade e a Escola Internacional de Macau.

Este visível apoio financeiro à Universidade de Ciência e Tecnologia está longe de ser uma novidade. “Já não é a primeira vez. A UCTM recebe subsídios da Fundação Macau com uma regularidade impressionante”, constata o jurista Pedro Coimbra. Chegou-se a um ponto em que a situação é encarada com normalidade.

“Não percebo, sinceramente, porque é que essa verba aparece”, comenta ainda o jurista, em relação ao montante atribuído à universidade privada na recta final do ano. “Conheço muito pouco do trabalho da UCTM. Como tal, não percebo qual é a justificação para serem atribuídas verbas desse tipo.”

Pedro Coimbra não é o único a ter dificuldades em perceber o funcionamento e os resultados da instituição de ensino universitário. Apesar de ter como grandes objectivos “promover a troca cultural, o crescimento intelectual, o desenvolvimento económico e o progresso social”, a UCTM não se distingue por ter uma forte ligação à comunidade local. Há alguns anos, esteve na ribalta pelas piores razões: o curso de Direito que ali era ministrado apresentava um currículo muito pouco compatível com as necessidades dos alunos que pretendiam exercer no território.

Do público para o privado

Entre universidades e institutos públicos e privados, há nove estabelecimentos de ensino superior na cidade. A Fundação Macau contribui para o financiamento dos planos anuais de três universidades privadas: além da UCTM, também a Universidade de São José (USJ) e a Universidade da Cidade de Macau (UCM) recebem apoios.

As diferenças são, porém, expressivas. No ano passado, a USJ, através da Fundação Católica de Ensino Superior Universitário, recebeu 38 milhões de patacas. Quanto à UCM, com ligações ao deputado Chan Meng Kam, teve direito a 47 milhões. Em ambos os casos, ao longo dos anos, o Governo tem ajudado na criação de condições de funcionamento destas instituições, nomeadamente através do apoio para instalações.

Num território em que a grande maioria dos estabelecimentos de ensino não superior está nas mãos dos privados – a RAEM jamais poderia garantir educação aos residentes com as poucas escolas públicas existentes –, a lógica de apoio foi alargada também ao ensino superior, não obstante o facto de haver uma universidade pública de grandes dimensões. Há quem tenha dificuldade em compreender a razão destes apoios, sendo que a questão se torna ainda mais complexa quando em causa está a Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau, pelos valores significativos que arrecada.

A UCTM é constituída por seis faculdades (Tecnologias da Informação, Direito, Medicina Chinesa, Gestão Hoteleira e Turismo, Humanidades e Artes, e Ciências Médicas) e por quatro escolas (Gestão, Farmácia, Formação Contínua, Estudos de Pós-Graduação), tendo ainda um Departamento de Educação Geral.

Ao todo, a UCTM oferece 16 licenciaturas, 24 mestrados e 11 doutoramentos, num total de 51 cursos. À semelhança da Universidade de São José e da Universidade da Cidade de Macau, tem ainda programas de formação contínua. Já a USJ dispõe, ao todo, de 36 cursos e a UCM, a mais modesta em termos de diversidade académica, disponibiliza 24 programas.

A Universidade de São José tem cinco faculdades (Estudos Religiosos, Humanidades, Administração e Governação, Psicologia e Educação, Indústrias Criativas) e um instituto, dedicado à Ciência e Ambiente.

Quanto à Universidade da Cidade de Macau, está estruturada em seis faculdades, a saber: Gestão e Turismo, Gestão, Humanidades e Ciências Sociais, Educação, Direito, Estudos e Gestão Urbanística.

Quanto às propinas, a USJ é mais cara do que a UCTM – a Cidade de Macau não disponibiliza online os valores a pagar. Na universidade sob a alçada da Fundação Católica de Ensino Superior Universitário, o valor anual por aluno de licenciatura anda entre as 43 mil e as 53 mil patacas. Os não residentes podem ter de pagar 73 mil.

Na Universidade de Ciência e Tecnologia, a tabela tem variações conforme os cursos em causa. A maioria das licenciaturas custa 32.800 patacas por ano. O curso de Medicina Tradicional Chinesa está entre os mais caros: as propinas dos primeiros quatro anos são no valor de 37.200 patacas e o último ano implica desembolsar 32.800. Quanto aos estudantes que não têm BIR, os cursos mais baratos andam pelas 71 mil patacas e o mais caro ultrapassa as 88 mil.

Ainda no universo da UCTM, o dinheiro da Fundação Macau segue também para a Escola Internacional de Macau. No ano passado, o erário público serviu para ajudar à expansão do estabelecimento de ensino. Também aqui as propinas chegam a valores consideráveis: uma criança que ande no jardim de infância paga 70 mil patacas por ano; os pais dos alunos do ensino secundário gastam 105 mil.

Sem fundamento

Os deputados Au Kam San e Ng Kuok Cheong estão entre as vozes mais críticas em relação ao modo como a Fundação Macau distribui o dinheiro. Há anos que detectam problemas no que toca aos principais beneficiados: o Hospital Kiang Wu e a Universidade de Ciência e Tecnologia.

“Os recursos da Fundação Macau são demasiado grandes”, considera Ng Kuok Cheong. “Devia existir um mecanismo de transferência para outros organismos, nomeadamente para o Fundo de Segurança Social.” A fundação recebe um montante correspondente a 1,6 por cento das receitas brutas das concessionárias de jogo.

Sobre os apoios à UCTM tornados públicos esta semana, Ng Kuok Cheong não se alonga, mas é incisivo: “A Fundação Macau distribui dinheiro sem uma razão concreta.” O deputado pró-democrata diz não saber a razão de tanta generosidade para com a universidade do Cotai, mas deixa uma hipótese. “Talvez tenham boas relações, incluindo com o Chefe do Executivo.”

O jurista Pedro Coimbra também não encontra uma explicação. “Não vejo que haja uma justificação que possa ser aceitável para o grande público para ser atribuída uma verba dessas à universidade.” A sensação que fica é, assim, de estranheza. “Há outras instituições de ensino superior de Macau que me parecem mais conhecidas e às quais não são atribuídas verbas minimamente semelhantes a essas.”

 

 

 

 

Números

446 milhões

Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau

38 milhões

Universidade de São José

47 milhões

Universidade da Cidade de Macau

(Apoios da Fundação Macau em 2016)

10 Fev 2017

Código Penal | Alterações deixam de fora importunação sexual sobre a forma verbal

O novo crime de importunação sexual, que o Governo quer acrescentar ao Código Penal, diz respeito apenas ao contacto físico. Os deputados concordam com a intenção legislativa. Ninguém pediu mais ao Executivo

 

Só comete crime de importunação sexual aquele que mantiver contacto físico com a vítima, contra a sua vontade. O esclarecimento foi deixado por Cheng Chi Keong, presidente da 3.a Comissão Permanente da Assembleia Legislativa, no final de mais uma reunião em que esteve a ser analisada a proposta de lei que visa modificar e aditar crimes de natureza sexual ao Código Penal.

Ontem, na terceira reunião desta semana, esteve em debate um tipo de crime que suscitou algumas preocupações aquando do seu anúncio, por se temer más interpretações e problemas na aplicação: a importunação sexual. Os deputados concordam com a intenção do proponente mas, ainda assim, pretendem obter uma redacção mais clara do artigo em questão.

Trata-se de um “crime que não existe no nosso sistema jurídico”, começou por contextualizar Cheang Chi Keong. “A introdução tem como objectivo responder às expectativas e aspirações da sociedade. Vai colmatar uma lacuna.”

Na reunião, que contou com a presença da secretária Sónia Chan, os representantes do Governo “salientaram que o propósito é reforçar a tutela jurídica para com as vítimas desses actos e punir devidamente os respectivos agentes, salvaguardando a ordem social”.

A discussão teve sobretudo que ver com a delimitação do âmbito de aplicação do novo crime. O deputado lembrou que houve pessoas que ficaram na dúvida “se um palavrão” poderá ser considerado crime. Tal não vai acontecer, esclareceu, porque a importunação sexual prevista na proposta implica contacto físico. “É um dos elementos fundamentais do artigo”, notou.

Questionado sobre se houve deputados a defenderem a inclusão da forma verbal de importunação sexual na legislação, Cheang Chi Kong afirmou que não houve qualquer deputado a deixar uma sugestão nesse sentido. “O princípio é o contacto físico, é essa a intenção legislativa”.

Em Portugal, onde o Código Penal foi revisto há menos de dois anos também com vista à alteração de crimes de natureza sexual, a “formulação de propostas de teor sexual” passou a caber no crime de importunação sexual. Na altura, a modificação gerou bastante polémica. O delito pode valer uma pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias.

O lápis ou a caneta

Os deputados da 3.a Comissão Permanente vão ficar agora à espera que as assessorias da AL e do Governo reúnam para tratar de questões técnicas. “Esperamos que a norma seja redigida da forma mais clara possível”, indicou o presidente.

Um dos aspectos que merece uma revisão tem que ver com o tipo de contacto em causa. “Por exemplo, se um agente, pegando num objecto, num lápis ou numa caneta, tocar noutra pessoa, é considerado ou não crime de importunação sexual? Ou terá de ser mesmo um contacto físico? Creio que é intenção legislativa do Governo que o contacto físico abranja igualmente objectos”, declarou Cheang Chi Keong. “Esta questão também foi abordada na discussão sobre o crime de violação porque, no caso de haver coito oral ou anal, podem ser utilizados objectos ou outras partes do corpo.”

O deputado explicou ainda que “o Governo propõe que o crime seja semipúblico, ou seja, se a vítima não apresentar queixa, não vai haver lugar a processo judicial”. Mas existe a vontade de proteger os menores de 16 anos pelo que, nessas circunstâncias, o Ministério Público pode dar origem ao processo mesmo sem a apresentação de uma queixa.

A comissão tem novas reuniões agendadas para a próxima semana e espera que seja possível terminar a primeira fase da análise à proposta de lei, que tem que ver com o conteúdo dos artigos. Cheang Chi Keong acredita que, lá para o mês que vem, os aspectos técnicos estejam também resolvidos. “As questões colocadas ao Governo não são de princípio”, rematou.

10 Fev 2017

Escândalo | Abusos sexuais de menores na Igreja

Tem vindo a ser uma notícia recorrente, transversal a todos os continentes, escondida pelas mais altas esferas eclesiásticas. Esta semana foi revelado que na Austrália, nas últimas seis décadas, sete por cento dos padres católicos foram acusados de crimes sexuais contra menores. O Bispo de Macau diz que desconhece a situação

Mas Jesus lhes ordenou: Deixai vir a mim as crianças, não as impeçais, pois o Reino dos céus pertence aos que se tornam semelhantes a elas.

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s evangelizadoras palavras, que se encontram no Livro de Mateus, têm ganho um contorno sinistro nas últimas décadas. Durante séculos, a Igreja Católica gozou de um peso político e social desmesurado, reinando na Terra e nos Céus. Porém, com a laicização dos Estados a sedimentar-se um pouco por todo o mundo, alguns podres vieram à superfície, nomeadamente o abuso sexual de menores.

O mais recente e horripilante exemplo foi o da Austrália. No início desta semana, uma comissão governamental criada para o efeito tornou público que sete por cento dos padres que trabalharam no país, entre 1950 e 2010, foram acusados de crimes sexuais com crianças. Destes casos, muito poucos tiveram seguimento, revelando outra prática endémica em situações semelhantes que se passaram no mundo inteiro: o encobrimento. Não só as queixas dos menores foram relegadas para a gaveta da “má publicidade”, como os criminosos foram mudados de paróquia, sem qualquer punição, livres para continuar a espalhar terror.

Só agora estes casos chegam a tribunal, sendo que alguns demoraram muitas décadas até se aproximarem da justiça terrena. O reitor da Universidade de São José, Peter Stilwell, considera o processo escandaloso. “Aliás, só o indício é preocupante.” Acrescenta que é obrigatório que se “faça uma investigação sobre estes casos de abusos sexuais de menores, quer na Igreja, quer noutras instituições”.

No ano passado, o mais alto responsável da Igreja Católica em solo australiano, o cardeal George Pell, admitiu que “a Igreja cometeu enormes erros, fez escolhas catastróficas ao recusar acreditar nas crianças abusadas”. O clérigo ainda fez “mea culpa” por ter mudado padres acusados de pedofilia de paróquia em paróquia, confiando de mais na terapia para resolver o problema. No fundo, mantendo em segredo os abusos, numa autogestão imune a códigos penais.

As informações compiladas pela Comissão Real de Resposta aos Abusos Sexuais de Menores, organismo criado pelo Executivo australiano para investigar a dimensão da polémica, são das mais substanciais e detalhadas de entre os vários escândalos do género. A investigação revelou que, entre 1980 e 2015, 4444 pessoas apresentaram queixa de abusos a 93 autoridades católicas. Num detalhe que parece transversal a casos semelhantes, as piores e mais frequentes ofensas foram cometidas em escolas e lares para crianças vulneráveis. De um universo de 309 casos que a comissão referenciou à polícia, 27 já tiveram acusação, sendo que 75 ainda estão sob investigação.

Em comunicado emitido pelo Vaticano, o arcebispo de Sidney, Anthony Fisher, declarou-se “pessoalmente abalado e humilhado” pela descoberta. Fisher mostrou-se disponível para “assistir aqueles que foram prejudicados pela Igreja”, e empenhado em trabalhar para cimentar uma “cultura de maior transparência, responsabilização e segurança das crianças”.

Problema endémico

O caso australiano está longe de ser único, com os escândalos a espalharem-se, por exemplo, pelos Estados Unidos, Argentina, Irlanda, Inglaterra, Polónia.

Durante a década de 1990, a Bélgica foi abalada pela notícia de abusos sexuais de menores por padres católicos. Devido ao elevado número de casos reportados, à semelhança da Austrália, foi criada uma comissão especial para averiguar as alegações. A investigação revelou cerca de 500 queixas de crimes sexuais por alegadas vítimas, tendo sido citados 320 supostos abusadores. De entre os suspeitos, 102 eram membros da Igreja, oriundos de 29 congregações. Os factos que revoltaram a sociedade belga deixaram marcas profundas na forma como a população se relaciona com a fé, prosseguindo uma tendência de diminuição dos baptismos e de comparência em sacramentos. Além dos traumas causados, na sequência destes escândalos 13 alegadas vítimas cometeram suicídio.

Para o padre Peter Stilwell, este período conturbado que a fé vive não coloca em cheque o futuro da fé. “A Igreja está cá há 2000 anos, e acho que está aí para durar”, comenta. No que toca aos efeitos produzidos no número de fiéis, é um aspecto “secundário, os actos é que são a questão primária e uma chamada de atenção para a consciência da Igreja, aliás, ela é julgada pela sua própria mensagem”.

A resposta de Roma

Apesar de o Vaticano ter tido apenas condenação e promessas de firmeza a lidar com estas questões, muitas foram as vozes críticas em relação à posição assumida por Roma. Investigações internas, falta de denúncias às autoridades policiais e a descoberta de mais escândalos ao longo das décadas fizeram abalar as fundações da Igreja.

Na sequência dos escândalos de abusos sexuais nos Estados Unidos, David Clohessy, director de uma rede de sobreviventes de abusos, comentou o registo de Papa Bento XVI como “terrível”. É de referir que antes de ser ordenado máximo pontífice, o Cardeal Ratzinger chefiou a Congregação da Doutrina da Fé, entidade que tratou dos escândalos sexuais. “Ele leu milhares de páginas de relatos de casos de abusos, do mundo inteiro, e sabe muito mais ainda sobre encobrimentos. No entanto, pouco fez para proteger crianças”, dizia Clohessy ao Guardian, na altura. Na mesma linha, Jakob Purkarthofer, da plataforma austríaca de vítimas da violência sexual da Igreja, dizia que “Ratzinger fez parte do sistema co-responsável por estes crimes”.

O padre Peter Stilwell não concorda, considerando que a resposta do Vaticano, desde o início destes casos de escândalos sexuais, tem sido muito clara. “Desde o tempo do Cardeal Ratzinger na Congregação para a Doutrina da Fé, agiu-se com grande firmeza, até com uma certa incompreensão por parte das conferências episcopais e de alguns bispos, que esperavam encontrar alguma defesa da instituição”. O reitor da Universidade de São José considera que, quando se trata de encobrimento, esta é “uma questão de todas as instituições e a Igreja não escapa a isso, uma vez que se acha sempre que se consegue resolver os problemas sem dar muito nas vistas”.

Um novo dia

A consciência universal evolui ao passo da sociedade e é incontestável que, ao longo da história, a pedofilia foi vista com outro olhar, diferente dos dias de hoje. Mesmo dentro do século XX, o sexo com menores não era considerado um crime hediondo, como é actualmente. “A pedofilia ganhou em termos de consciência geral um relevo, que merece, que não teria há uns 30 anos. Antes achava-se que havia um deslize, um problema, mas que a pessoa resolvia, não se pensava na vítima”, comenta Peter Stilwell. Não havia uma percepção social das consequências para as vítimas, e para a forma como o abuso sexual danifica, para a vida, toda o desenvolvimento de uma criança.

Com a ordenação do Papa Francisco houve um virar de página, pelo menos no que toca a uma abordagem mais empática, na forma como o Vaticano passou a tratar estes casos. O actual Papa dirigiu-se às vítimas directamente, rezando por elas, pedindo-lhes desculpas. Peter Stilwell acha que o líder do Vaticano “dá voz a um trabalho que já vem sendo feito há algum tempo”.

O reitor adianta ainda que o que se passa na Austrália é um exemplo de progresso institucional de Roma a tratar destas questões. “Os bispos australianos são chamados a uma comissão real para fazerem depoimentos públicos. Há uma evolução da Igreja e o Papa deu a sua bênção. Nesse aspecto, a Igreja poderá servir de referência para outras instituições que também têm estes problemas”, comenta.

Desde a década de 1950 até 2012, o Vaticano já pagou em indemnizações mais de três mil milhões de dólares a vítimas de crimes sexuais cometidos por membros do clero. Todos os anos aparece um novo escândalo, numa instituição que muito lentamente pondera terminar com o celibato entre os sacerdotes. O caso australiano foi apenas mais um.

Instado a comentar este escândalo, Stephen Lee, Bispo de Macau, afirmou: “Não faço ideia que se passa na Austrália, porque estou em Macau, portanto, não acho que estou numa posição de prestar qualquer comentário”. E mais não disse.

9 Fev 2017

Taxas | Cancelada marcha lenta horas depois de ter sido anunciada

Afinal, no próximo sábado, já não vai haver veículos a desfilar pela cidade como acção contra o aumento das taxas em vigor desde o início de Janeiro. A marcha lenta de veículos foi cancelada horas depois de ter sido convocada. A razão? A polícia não autorizou o trajecto proposto

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ra mais uma forma de protestar contra a polémica actualização de taxas relativas a veículos, que já deu origem a uma manifestação. No entanto, a ideia foi adiada. “Tivemos uma reunião com as autoridades policiais e, devido ao facto de terem alterado profundamente o trajecto, desviando-o totalmente, de Macau para a ilha da Taipa, decidimos suspender a marcha lenta” de veículos prevista para sábado”, disse à agência Lusa o deputado Pereira Coutinho que, juntamente com o colega de bancada Leong Veng Chai, lidera um grupo de cidadãos promotores do protesto.

O itinerário da marcha submetido às autoridades para aprovação tinha início previsto na Torre de Macau às 15h, junto à Assembleia Legislativa, e passagem por várias artérias da cidade até à sede do Governo.

“Decidimos suspender porque não aceitamos o trajecto proposto”, sublinhou Pereira Coutinho, indicando que o grupo de cidadãos que lidera vai apresentar novo itinerário e nova data para a marcha lenta de carros e motos. “Temos de reunir. É uma pena porque quando os dirigentes chineses vêm a Macau (…) ou quando o Chefe do Executivo se desloca [na cidade], as pessoas aceitam de bom grado [os condicionamentos no trânsito]. Mas o caricato é que, quando são os cidadãos que querem manifestar-se, é o Governo que impede”, afirmou Pereira Coutinho.

Raimundo do Rosário na rua

Horas antes do cancelamento do protesto, em conferência de imprensa, Pereira Coutinho tinha explicado que a acção tinha dois objectivos. “O objectivo principal desta marcha lenta é o pedido de demissão do secretário [para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo do Rosário]. Foi uma desilusão e os cidadãos estão fartos. Além disso, queremos pedir ao Chefe do Executivo que retire o despacho.”

Para Coutinho, o Código do Procedimento Administrativo não foi cumprido, uma vez que os cidadãos não foram ouvidos sobre os aumentos que, na sua maioria, ultrapassam os 100 por cento. “Estamos num regime dito democrático, mas a atitude do Governo é autoritária, é ditatorial. O regime do ‘quero, posso e mando’ é do tempo de Marcelo Caetano”, apontou.

Na conferência de imprensa estiveram presentes representantes de outras associações que falaram do aumento brusco das taxas para remoção de um camião, caso esteja estacionado de forma ilegal, e que vão até às 12 mil patacas, quando o anterior valor era de 300 patacas. “Isso é mau para as empresas”, apontou o presidente da ATFPM.

“As pessoas estão insatisfeitas. E isto toca na pele das pessoas. Em Macau a vida está cara e os salários são baixos. As rendas vão continuar a subir. É o Governo que nos está a empurrar para a rua.”

Do encontro com Raimundo do Rosário, que serviu para analisar uma possível retirada dos aumentos, ficou uma má impressão. “[O secretário] deu-nos a perceber de que estava com pressa e que não estava, pela linguagem corporal, interessado na reunião em si”, aponta Pereira Coutinho. “Além dessa postura, não deu uma explicação minimamente razoável e satisfatória para explicar as razões para, de um dia para o outro e sem alertas, aumentar as taxas. Ficámos muito desiludidos com esta postura governativa. Vivemos num regime chamado democrático, temos um Código do Procedimento Administrativo que o Governo não cumpre, a nosso ver. Cabe ao Executivo ouvir e explicar.”

9 Fev 2017

Fundação Macau dá mais de 446 milhões à Universidade de Ciência e Tecnologia

Só nos últimos três meses do ano passado, a fundação liderada por Wu Ziliang entregou mais de 446 milhões de patacas à Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. De todas as instituições de ensino do território, é a que mais beneficia do erário público. Contra números, não há argumentos

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] uma longa lista de beneficiários, entre fundações e associações, que mereceram ajudas que ultrapassam, no total, os 727,5 milhões de patacas. Foi publicada ontem em Boletim Oficial a lista de apoios concedidos pela Fundação Macau no último trimestre de 2016 e há, desde logo, um nome que sobressai, pelos números que o acompanham: a Fundação Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (UCTM).

Somando os vários subsídios dados, entre Setembro e Dezembro do ano passado, a fundação da instituição de ensino superior localizada no Cotai recebeu mais de 446 milhões de patacas. O principal bolo, mais de 293 milhões, foi para custear as obras do Complexo Pedagógico (Bloco O) da universidade.

A entidade privada recebeu ainda a última prestação do apoio para a construção da quinta residência de estudantes e a aquisição de equipamentos, no valor de 20 milhões. Noutro cheque, seguiram mais de 71 milhões destinados à segunda fase das obras da construção de mais um edifício da Escola Internacional de Macau, sob a alçada da Fundação da UCTM.

Depois, foram dados 62,5 milhões a título de apoio financeiro para o plano anual de 2016/2017 da UCTM, do Hospital Universitário, da Escola Internacional de Macau e da Faculdade das Ciências de Saúde da UCTM. Este valor é referente à primeira prestação.

As escolas estão em destaque na lista ontem divulgada, mas não há instituição que chegue aos calcanhares da UCTM no que diz respeito a números. A Fundação da Universidade da Cidade de Macau, ao qual está ligada o deputado Chan Meng Kam, foi beneficiada com 45 milhões de patacas para ajudar “os estudos e publicação, actividades pedagógicas académicas, apoio aos equipamentos e subsídios aos estudantes”. Receberá outros fundos mais lá para a frente, uma vez que se trata da primeira prestação.

Bastante mais modesta é a ajuda à Fundação Católica de Ensino Superior Universitário: a primeira prestação para o actual ano lectivo da Universidade de São José vale 19 milhões.

No âmbito do ensino não superior, a Fundação Escola Portuguesa de Macau recebeu nove milhões de patacas para as despesas de funcionamento de todo o ano lectivo de 2016/2017. Para a Associação Promotora da Instrução dos Macaenses seguiram 1,65 milhões. É a primeira prestação de apoio ao plano anual da entidade presidida por Miguel de Senna Fernandes e também do Jardim de Infância D. José da Costa Nunes.

Às Missionárias de Nossa Senhora dos Anjos foram entregues 10,6 milhões, destinados à reconstrução do Edifício Verde e do Edifício de Paz da Escola Nossa Senhora de Fátima. Também as Franciscanas Missionárias de Maria estão a fazer obras: a Fundação Macau pagou 14,759 milhões para a remodelação e decoração do Prédio de Paz da Secção Chinesa do Colégio de Santa Rosa de Lima.

Comes e bebes

O Festival Gastronómico Internacional, evento que se realiza na rotunda junto à Torre de Macau, custou mais de sete milhões de patacas à fundação – isto só no último trimestre do ano. A Associação de Retalhistas e Serviços de Turismo de Macau recebeu 3,1 milhões de patacas; a União das Associações dos Proprietários de Estabelecimentos de Restauração e Bebidas de Macau encaixou 4,25 milhões. A união é presidida pelo deputado Chan Chak Mo, empresário com grande visibilidade no sector em causa.

Noutros domínios, a Aliança de Povo de Instituição de Macau, com ligações ao deputado Chan Meng Kam, teve direito a 10,5 milhões para custear as despesas com o plano de actividades de 2016. Esta última prestação contemplou 68 itens.

Já para a Associação dos Macaenses foi destinado um apoio de pouco mais de um milhão no terceiro trimestre de 2016, período em que a Santa Casa da Misericórdia recebeu 4,25 milhões, a serem aplicados no plano de actividades do Albergue.

9 Fev 2017

Mário Mesquita Borges: “A última Administração portuguesa cometeu muitos erros”

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Mário Mesquita Borges, docente da Universidade Católica e natural de Macau, olha para os últimos anos do Executivo de Rocha Vieira como um período em que prevaleceu a ideia de abandono e em que foram cometidos “muitos erros”. É essa a génese para a falta de preservação da cultura portuguesa que hoje existe, defende. O seu livro, intitulado “Macau, as Últimas Memórias de Portugal”, é lançado hoje

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] seu livro contém a ideia base de que a defesa da língua e cultura portuguesas estão entregues à comunidade macaense, mas que tem sido feito pouco por isso. Como resolver esta questão?
Desde 1999 e previamente, nos últimos anos da Administração portuguesa, houve uma grande falta nesse sentido: garantir que existiam e ficavam cá os mecanismos e instituições para a promoção da língua portuguesa. Isso passa pela comunidade macaense porque é ela que, mais do que ninguém, compreende a confluência de culturas que sempre existiu. Ao nível oficial temos visto que, no que toca ao discurso político [sobre esse assunto), ele existe.

É algo presente em quase todos os discursos, aliás.
Sim, mas sabemos também que se fala muito no contexto da promoção da língua na relação económica com os países de língua portuguesa. Mas uma coisa é a vontade política e outra coisa é o fazer: ainda existe uma grande discrepância entre essas duas realidades. Portugal tem feito muito pouco para ajudar a promover a língua no território. Há o Instituto Português do Oriente, mas poderia ser feito mais. Sabemos das várias condicionantes que existem, mas o problema de base deve-se aos últimos anos da Administração portuguesa. A perspectiva sempre foi de abandono e não de permanência. Faria todo o sentido continuarmos aqui, de forma cooperante, para ajudarmos Portugal e também Macau.

Não houve uma visão de longo prazo.
Houve uma visão de curtíssimo prazo, e estou a ser simpático. A lógica era de debandada, não era de querer deixar uma marca que ficasse e continuasse para as gerações vindouras. E que evitasse, talvez, isto: há alguns anos a comunidade macaense encontrava muita identificação com aquilo que é português. Com a normal evolução populacional, as características portuguesas têm vindo a esbater-se, há uma tendência para a aproximação à cultura chinesa, mas isso é apenas normal.

As associações locais deveriam ter um papel mais importante? Faltam apoios financeiros e a existência de uma maior estrutura em termos de associativismo?
Era positivo se houvesse isso. Sei que são feitas algumas iniciativas por parte da Associação dos Macaenses e outras instituições. Mas deveria haver uma filosofia de conjunto mais firmada, sem tantas acções esporádicas. Esse tipo de acções poderiam ser feitas com apoios vindos de Portugal. Esse papel poderia ser desempenhado pelo Instituto Camões, por exemplo, ou pela Fundação Calouste Gulbenkian.

Há um problema de liderança das associações locais, não há novos rostos e parece não haver gente interessada em dirigir estas entidades. Este também pode ser um entrave a esse trabalho de preservação? Como explica esta falta de interesse, numa altura em que a comunidade portuguesa até regista um crescimento?
Isso é a volúpia da urbe e também falo disso no meu livro. Embora haja muita vontade, esse papel das gerações mais antigas é fundamental para a renovação. Contudo, e por muitas acções que sejam feitas, se não há uma vontade manifesta por parte das gerações mais novas, torna-se difícil impor. Tem de existir uma política de atracção e não de imposição. Só que voltamos ao que já disse: se não há um manifesto de interesse, se não há algo atractivo para as gerações mais novas, para encontrarem essa identificação com a cultura portuguesa… Li há uns dias que em 2016 se comemorou o centenário de Benjamim Videira Pires. Foi uma figura muito importante para a cultura do território. Ao nível de instituições locais, pelo que li, a data passou quase despercebida. Isso é um exemplo do que se passa.

Verifica-se também um quase desaparecimento da comunidade macaense da vida política, dos órgãos de decisão. Seria importante também para garantir esta preservação da cultura?
Esse é um problema de base. A identificação com a comunidade portuguesa já não é tão grande. Logo, aquela permanência da identidade macaense está quase em perigo de se desvanecer, infelizmente. A maioria das pessoas tem dificuldade em ver que os ganhos serão muito maiores se defendermos algo com características muito especiais de Macau, e esses ganhos seriam maiores para ganhar mais protagonismo, para se garantir que se conseguiriam depois cargos de maior decisão. O facto de termos consciência de que temos uma cultura enriquecida permite-nos ter uma mais-valia para alguém que tem só uma perspectiva. E Macau, como cidade intercultural, e mais cosmopolita, teria só a ganhar com isso.

No seu livro diz que o problema da falta de preservação da língua e cultura reside no facto de as “entidades governativas optarem por um encaminhamento duplo das políticas actuais”. Em que sentido?
Há um discurso oficial, mas depois não se faz o suficiente em relação ao que é dito, mas isso existe em qualquer parte do mundo. Infelizmente, Macau e a economia estão extremamente dependentes do jogo, e as autoridades teriam muito a ganhar se Macau fosse não só reconhecido pelos casinos. O facto de ser conhecido como um destino cultural, de turismo, e ser reconhecido por outras valências, seria muito positivo. Vemos o quão volátil isto pode ser, e isso percebe-se com a queda recente das receitas do jogo. Fala-se muito no aproveitamento do território para espaço de congressos e exposições, que também seria outro ponto essencial a desenvolver. Esta dependência dos casinos vai levar a uma cada vez maior descaracterização da cidade, devido à ocupação de espaços pela indústria.

Faz uma referência à construção da Biblioteca Central no edifício do antigo tribunal. Deixa no ar a ideia de que esse projecto poderá levar ao desaparecimento de mais um símbolo português.
Quando se deixou Macau, houve muitas questões que ficaram por resolver. Existem muitas questões na história de Macau que não foram bem explicadas. Isso porque sempre houve a perspectiva histórica portuguesa e a chinesa.

Não há uma única história de Macau.
Sim, e era importante fazer esse exercício, o de criar uma história de Macau que fosse feita por chineses e portugueses. Eventualmente iria permitir desvendar alguns mitos dessas questões que ficaram por esclarecer. Em relação ao edifício do antigo tribunal, é sempre um símbolo da presença portuguesa. Ao nível simbólico poderão existir algumas questões. Mas vamos aguardar com serenidade que o projecto avance.

A que se deve a existência dessas questões pouco esclarecidas? A interesses, desconhecimento do que viria após 1999?
Macau teve ao longo da sua história várias incidências que estão sempre envoltas em alguma falta de conhecimento. A maioria da população, incluindo as gerações mais novas, ou desconhece por completo ou não gosta de falar. Falo em particular do movimento “1,2,3”, muito importante para a história de Macau. Embora tenha havido um encontro de interesses entre aquilo que era a vontade chinesa e a portuguesa, também é importante lembrar que foi isso que nos permitiu ficar cá mais 40 anos. E a maioria das pessoas esquece-se disso ou não sabe. Sobre esse episódio são muito escassas as referências ao nível histórico. Mas a história foi mais sábia do que os políticos, e todos sabemos que Macau e a China tiveram a ganhar com a permanência dos portugueses durante mais este período, que permitiu uma transferência de poder pacífica. A maioria das pessoas tem uma grande dificuldade em ver a história e a sua continuidade, e da cultura, sem ter associada uma perspectiva política muito forte. Isso é o grande pecado da maioria das interpretações que são feitas.

E a política varia muito, consoante os partidos que estão no poder.
Isso acaba por prejudicar o que deveria ser contínuo, e o que vemos muitas vezes é que temos entendimentos da história que, depois, analisados à distância, temos a perfeita noção de que não correspondem à realidade, mas é isso que permanece e que é dado como verdade. Em Portugal, infelizmente, o que passa é que Macau foi um bom exemplo, em contraste com os manifestos erros que foram cometidos nas ex-colónias portuguesas. Mas a minha perspectiva não é essa: foram cometidos muitos erros durante a última Administração portuguesa e muito mais poderia ter sido feito. Ainda mais sabendo que Macau sempre foi uma terra com muitos recursos financeiros.

Macau teria a ganhar se tivesse tido uma Administração mais afastada das forças partidárias portuguesas?
Sim. Se houvesse um objectivo único, e uma definição clara e a longo prazo, mas esse continua a ser o problema de base muitas vezes. Já são raros os políticos com essa visão, há sempre visões a curto e médio prazo, e com interesses incluídos. Isso prejudica as coisas e a continuidade. Se isso existisse, independentemente de estar o partido A ou B no poder, tudo seria mantido.

O livro aborda também a questão da Escola Portuguesa de Macau (EPM), que vai ficar onde está. A EPM tem feito o seu trabalho na dinamização da língua e cultura, incluindo a sua transformação numa escola internacional?
A EPM tem um estatuto especial mas, por muito que a escola precise de sobreviver e captar mais alunos, essa necessidade de internacionalização poderá subjugar o outro papel mais importante que a EPM pode ter. Li que o número de alunos estrangeiros cresce cada vez mais, e agora ensinam o mandarim.

E há a ideia de ensinarem o cantonês.
Isso é fundamental, e essa foi uma questão que durante a Administração portuguesa não foi devidamente acautelada. Ter-se-ia ganho mais se houvesse uma política mais realista ao nível de educação em Macau antes da entrega do território, tanto na língua chinesa como na portuguesa.

Há uma referência no livro ao monumento Portas do Entendimento, que está ao abandono. É uma metáfora da representação da cultura portuguesa, que gradualmente vai desaparecendo?
É uma metáfora e um símbolo muito interessante relativamente à política de abandono que já referi. Seria mais importante, naquela altura, criar instrumentos e fazer com que as coisas acontecessem, num projecto a longo prazo, promovendo instituições e convidando instituições portuguesas a virem cá, para fazerem esse trabalho de continuidade, em vez de se deixar apenas uma matéria simbólica, porque estas valem o que valem. Embora seja importante o monumento em si, em termos simbólicos e estéticos nada me diz. Foi mais uma forma de abandonar as responsabilidades. A última Administração do território teve muito essa perspectiva. O intuito sempre foi fechar o ciclo e não promover uma continuidade.[/vc_column_text][vc_message message_box_style=”solid” style=”square” message_box_color=”chino” icon_fontawesome=”fa fa-book”]

“Macau, as Últimas Memórias de Portugal” é apresentado hoje às 18h30 no auditório do Consulado Geral de Portugal em Macau. O autor, Mário Mesquita Borges, está presente na iniciativa. A obra, que vai ser apresentada por Luís Sá Cunha, é editada pela COD.

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8 Fev 2017

Teatro | CCM estreia este fim-de-semana a comédia “Idiot”

Com “Idiot”, a companhia teatral de Macau Canu Theatre traz-nos um espectáculo de comédia onde não há diálogo e em que as expressões corporais, à maneira da personagem Mr. Bean, fazem tudo o resto

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o Japão, uma mulher coloca um anúncio para recrutar um rapaz que lhe faça uns recados durante o dia e tudo o que ela pedir. Um jovem decide responder para ver o que acontece mas, se para uns essa decisão pode ser idiota, para outros pode ser apenas algo diferente. Quem são, afinal, os idiotas do nosso dia-a-dia? É este o mote para a história de “Idiot”, a mais recente produção da companhia teatral local Canu Theatre, que estreia na próxima sexta-feira no Centro Cultural de Macau (CCM), com mais um espectáculo agendado para sábado.

O público poderá ver um exemplo de teatro físico de comédia, sem diálogo entre os seus personagens. Joyce Chan, produtora do espectáculo, contou ao HM que tudo começou em França, onde estudou com Sami Abu Wardeh, actor que dará corpo à personagem principal. Lá teve o primeiro contacto com a forma de interpretação utilizada pelos palhaços e percebeu que tinha de fazer um espectáculo com estes elementos. Daí até à viagem ao Japão, onde viu um anúncio semelhante ao que deu mote à peça, foi um passo. “Os palhaços não fazem propriamente uma interpretação, mas fazem bastantes gestos e usam muito o corpo para transmitir mensagens. Mostram-se bastante ao público, é algo que vem de dentro, intimista. É diferente dos guiões que escrevemos para outro tipo de personagens”, explicou a autora de “Idiot”.

A opção por um espectáculo de comédia acabou por ser natural. “Durante o meu curso tivemos aulas sobre comédia e tragédia. Sempre que fazia trabalhos na área da comédia, e via as reacções do público a rir, sentia-me muito satisfeita, percebia que o público reagia de forma entusiástica ao que via. Pensei também que em Macau não há muitos espectáculos de comédia, então achei que seria uma boa oportunidade para trazer estes elementos para cá e fazer com o que o público local tenha acesso ao que aprendi em França.”

A inspiração de Mr. Bean

Sendo a primeira vez que pisa os palcos de Macau, Sami Abu Wardeh, londrino, revela-se expectante sobre um projecto que considera único. “Tem sido incrível trabalhar neste espaço e ter acesso a todas estas infra-estruturas. Temos muita liberdade para experimentar coisas diferentes”, disse. “Este tipo de interpretação, para mim, é mais honesto, temos mais liberdade, porque a maior parte das interpretações são isso mesmo, interpretações no sentido mais estático. Estou feliz por estar neste projecto. É algo alternativo sob várias formas, não vemos muitos projectos como este”, contou o actor ao HM.

Para Sami Abu Wardeh, a inspiração para compor o “idiota” veio de dois anos de trabalho com Joyce Chan, e também do famoso personagem da série televisiva Mr. Bean, interpretado por Rowan Atkinson. Joyce Chan admitiu que teve de fazer algumas adaptações ao público de Macau na hora de escrever a peça. “O início do projecto não foi fácil porque, no estrangeiro, a reacção à comédia é diferente, muitas vezes é difícil compreender o que é engraçado e o que não é, então fiz algumas adaptações para o público de Macau. Combinei vários elementos.” Fazer um espectáculo sem diálogo é, para Joyce Chan, uma forma mais libertadora de representar. “Uma performance sem linguagem oral é importante porque temos vários actores estrangeiros e usamos muitos gestos e expressões corporais. É uma forma bonita de contar uma história. Espero que as pessoas possam ter uma nova perspectiva, de que uma peça sem diálogo pode funcionar.”

Rir em Macau

Sendo a comédia um género pouco comum em Macau, Joyce Chan espera mudar mentalidades e aproximar o público a um tipo de espectáculo que é raro acontecer no território. “As pessoas gostam de comédia. Tudo depende do pensamento pessoal de cada produtor e a dimensão que pretende trazer para o público. Todos podem ter humor nos seus corações, todos podem sorrir. As pessoas de Macau vão gostar muito deste espectáculo”, apontou. Na calha está uma nova peça, também de comédia, mas mais virada para a crítica do panorama político local. Joyce Chan revelou estar confiante. “No curso abordámos também outro conceito de comédia com base na crítica política, onde exageramos expressões corporais. No futuro gostaria de fazer um espectáculo assim. O Governo de Macau dá-nos a liberdade para falarmos e esse espectáculo que quero fazer é uma forma leve de fazer comédia sobre questões políticas, por isso é que acredito ser possível levar esse projecto avante.”

8 Fev 2017

Índice Global da Paz mostra que mundo está cada vez menos pacífico

O planeta é um sítio cada vez menos pacífico. O Índice Global da Paz demonstra que não vamos pelo melhor caminho. O terrorismo e a instabilidade política são os grandes culpados da deterioração do panorama geral

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] mundo não vai bem. É esta a principal conclusão a retirar do Índice Global da Paz (IGP) de 2016, divulgado agora pelo Instituto para a Economia e Paz, um think-tank independente que analisa a situação mundial há uma década. “Os níveis globais de paz continuam a deteriorar-se, com um fosso cada vez maior entre os países mais e menos pacíficos”, escrevem os autores do relatório.

“Enquanto as nações mais pacíficas atingiram níveis históricos de paz, aquelas que não o eram tornaram-se ainda menos”, aponta o think-tank.

A internacionalização dos conflitos no Norte de África levou ao envolvimento de um número cada vez maior de países financiadores de operações da manutenção da paz. O IGP de 2016 conclui ainda que as operações levadas a cabo pelas Nações Unidas têm vindo a melhorar e, nos últimos três anos, os gastos militares desceram ao nível mundial.

No entanto, a situação no Norte de África “coloca em destaque a internacionalização dos conflitos modernos”, uma vez que “países a milhares de quilómetros de distância são afectados pelas vagas de refugiados que fogem da guerra”.

Em termos quantitativos, o estudo vinca que, em relação a 2015, o mundo tornou-se 0,53 por cento menos pacífico. Traduzindo a desigualdade entre países, 81 nações obtiveram melhores classificações nos critérios estudados, com 79 países a mostrarem piores notas nos indicadores em análise. “Como a dimensão da deterioração foi maior do que as melhorias, assistiu-se a uma diminuição da média destes países”, contextualiza o relatório.

A resistência europeia

O IPG é composto por 23 indicadores qualitativos e quantitativos, e as fontes utilizadas são “altamente respeitáveis”, garante a entidade responsável pela análise. Ao todo, foram avaliados 163 estados independentes e territórios, ou seja, 99,7 por cento da população mundial.

Dois dos principais indicadores pioraram, e muito, no ano passado: o impacto do terrorismo e a instabilidade política. As mortes causadas por actos extremistas aumentaram 80 por cento em relação a 2015 e apenas 69 países não foram palco de atentados terroristas. Houve 11 nações em que estas acções fizeram mais de 500 mortos – no ano anterior, tinham sido apenas seis as jurisdições a ultrapassar este número.

Quanto à instabilidade política, sentiu-se um pouco por todas as regiões. O IPG dá como exemplos os lusófonos Guiné-Bissau e Brasil, a Polónia, o Djibuti, o Burundi e o Cazaquistão.

A Islândia é, de novo, o país com a paz mais consolidada, seguindo-se a Dinamarca, a Áustria e a Nova Zelândia. Portugal encontra-se em quinto lugar, tendo subido nove posições desde 2015. No extremo da tabela, encontra-se, sem surpresa, a Síria. A lista das cinco nações onde os conflitos são mais difíceis completa-se com o Sudão do Sul, o Iraque, o Afeganistão e a Somália.

A Europa continua a ser a região mais pacífica do mundo, mas a média dos indicadores registou uma ligeira descida. Esta quebra é justificada com o impacto do terrorismo no continente – os ataques em Paris e em Bruxelas –, bem como a escalada da violência e a instabilidade política na Turquia, com relações difíceis com os seus vizinhos.

As melhorias mais significativas verificaram-se na América Central e nas Caraíbas. Tanto a América do Norte, como a América do Sul também apresentaram resultados mais positivos no ano passado. Por outro lado, o Norte de África é o ponto do planeta que mais preocupa. A África Subsariana também piorou em termos de paz.

Por aqui tudo na mesma

A China é apresentada no IGP no lugar 120 da tabela, apresentando um “estado de paz médio”. Fica muito aquém do Japão, que se encontra na nona posição, ou de Singapura, que surge no 20.o posto.

A Ásia-Pacífico obteve a terceira posição no ranking das regiões. “O nível de paz manteve-se, em termos gerais, o mesmo de 2015”, lê-se no relatório. Alguns países estão, no entanto, melhor: Indonésia, Timor-Leste, Myanmar e Tailândia.

“As tensões no Mar do Sul da China vão continuar a ter impacto nas relações externas das três nações envolvidas, a China, o Vietname e as Filipinas. No entanto, apesar de ser elevada a hipótese de escaramuças nas águas disputadas, continua a ser improvável um conflito militar de grande escala”, indica o IGP.

No plano negativo, o relatório destaca a situação política no Camboja, com o desentendimento entre os dois principais partidos, prevendo um ano complicado em Phnom Penh. O think-tank não tem dúvidas de que “vai continuar a subir o número de pessoas detidas sem qualquer justificação”.

As modestas melhorias assinaladas na Tailândia têm quer ver com os esforços feitos sobretudo com o Camboja, um rival de longa data. A paz doméstica permanece instável, uma vez que se trata de uma condição forçada pela junta militar no poder.

Nota ainda para o Myanmar, onde se alcançaram progressos significativos em termos de estabilidade política, “o que faz com que o risco de conflito esteja agora restringido a pequenas partes das zonas fronteiriças do país”. O relatório não faz referência à situação da minoria étnica muçulmana rohingya.

A Nova Zelândia, o Japão e a Austrália são os países com melhores indicadores de paz.

O exemplo Portugal

Dos sete países onde a paz está mais enraizada, seis são europeus. O IGP faz uma referência especial a Portugal que, no contexto europeu, foi a nação que mais evoluiu nesta matéria. Os autores do documento explicam que Lisboa obteve bons resultados no regresso gradual à normalidade política, depois do processo de ajustamento financeiro e económico do Fundo Monetário Internacional e da União Europeia.

“Não obstante as dificuldades encontradas pelo Governo de esquerda eleito em 2015, Portugal registou o segundo ano de melhorias em várias dimensões, especialmente em indicadores como a probabilidade de manifestações violentas, na instabilidade política e na escala do terror político”, aponta-se. A situação em Lisboa é, para o IGP, bastante melhor do que a verificada noutros países europeus que também foram alvo de resgates.

No grupo dos maus alunos sobressai a Turquia, país da Europa onde se registou o maior nível de deterioração em 2016.

Em França, o ano passado decorreu no rescaldo dos ataques terroristas de Novembro de 2015, encontrando-se agora na 46.a posição, um posto abaixo do ranking anterior. A Bélgica caiu três lugares (18.o), consequência da degradação dos indicadores que medem o impacto do terrorismo e o nível de percepção da criminalidade na sociedade.

As médias de dois dos maiores países europeus – França e Reino Unido – são ainda prejudicadas por obterem classificações muito baixas nos indicadores relativos à paz externa, “em linha com a estratégia militar adoptada nos últimos anos”.

O que está pior

A situação no Médio Oriente e no Norte de África já era má, mas no ano passado conseguiu ser ainda pior, com os conflitos na Síria e no Iémen a tornarem-se cada vez mais complicados.

Sobre o Iémen, o IGP explica que a guerra civil, que teve início em 2015, agravou-se de forma significativa, com um maior número de mortes, um enorme aumento de refugiados e pessoas deslocadas interinamente, e ataques terroristas de vários grupos extremistas. O quadro do país tem tido repercussões nos estados vizinhos.

Quanto à Síria, o documento faz referência à presença cada vez maior de poderes estrangeiros no conflito que fez milhares de mortos – entre 250 mil a 470 mil.

Apesar deste cenário complicado, há jurisdições da região que têm conseguido escapar à tendência negativa: o Sudão, o Irão e Omã conseguiram resultados melhores do que em 2015.

7 Fev 2017

Hipóteses | SCMP publica texto sobre possíveis ataques terroristas em Macau

 

O aviso é feito pelo South China Morning Post. O decreto de Donald Trump sobre pessoas oriundas de países islâmicos pode ter consequências para Macau. É que por cá há a combinação de interesses chineses, americanos e judeus. O jornal baseia-se nos receios de um consultor e num ataque de 2015

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] artigo tem como título “Porque é que a interdição de viagens de Trump coloca Macau e a Malásia na mira do Estado Islâmico” e assenta na teoria do regresso, ou seja, o jornal considera que militantes extremistas que estejam com as malas feitas para voltar a casa possam ser os autores de atentados mais perto do local de origem.

“A ordem executiva do Presidente dos Estados Unidos pode fazer com que os militantes islâmicos regressem aos seus países na Ásia, onde podem planear e tentar mais ataques”, escreve o South China Morning Post (SCMP), no seu suplemento sobre a Ásia.

A decisão de Donald Trump, muito contestada dentro e fora do país, visa cidadãos de sete países: Irão, Iraque, Síria, Iémen, Somália, Sudão e Líbia. “Existe a convicção generalizada de que a decisão de fechar as portas a estes cidadãos vai inflamar o sentimento antiamericano por todo o mundo”, aponta o diário de língua inglesa com maior expressão em Hong Kong.

A oposição ao político mais controverso a ocupar a Casa Branca alega que a interdição vai ter o efeito contrário e, em vez de tornar os norte-americanos mais seguros, “vai funcionar como um sargento de recruta para os grupos extremistas, como o Estado Islâmico e a al-Qaeda”.

Receios antigos

Apesar de o decreto de Trump não implicar cidadãos do Sudeste Asiático, o SCMP afirma que as autoridades regionais que pensam no contraterrorismo estão preocupadas com a possibilidade de o cerco feito ao Estado Islâmico resultar no alargamento da rede de terror a esta zona do mundo – bem como a outras –, com os militantes de grupos extremistas a regressarem a casa, à procura de um porto seguro.

No artigo citam-se declarações proferidas em Outubro do ano passado pelo representante do Gabinete das Nações Unidas para as Drogas e o Crime no Sudeste Asiático e Pacífico. Jeremy Douglas disse, então, em declarações ao This Week In Asia (um suplemento do SCMP), que a ameaça colocada por terroristas de regresso a casa era “real e iminente”. “A pressão militar crescente [no Estado Islâmico] na Síria e no Iraque deverá resultar num maior número de militantes a voltar, incluindo muitos que querem levar a cabo uma jihad violenta na região”, afirmou.

O gabinete liderado por Jeremy Doulgas estima que, na Síria e no Iraque, estejam a combater 516 indonésios, 100 filipinos, 100 malaios e dois cidadãos de Singapura. “Se apenas uma mão-cheia destes militantes regressar à terra natal, estes homens têm potencial para orquestrar ataques, tanto trabalhando em pequenas células, como agindo individualmente”, alerta o SCMP.

Sim, mas não

A este aviso seguiu-se outro, no mês passado: está a ser subestimada a hipótese de um ataque “espectacular” num alvo de relevo, o centro de jogo mais rico do mundo, Macau. O diário cita Steve Vickers, recordando que não foi a primeira vez que o consultor, a trabalhar a partir de Hong Kong, aventou a hipótese de haver terroristas a considerarem “um ataque espectacular a um alvo acessível como um centro comercial na Austrália ou um casino em Macau”.

Um relatório do mesmo consultor, publicado no ano passado, apontava que o sector do jogo de Macau “oferece um elo de interesses chineses, americanos e judeus que um grupo de terroristas pode considerar particularmente apelativo”. O jornal diz quem é quem: o magnata da Las Vegas Sands, Sheldon Adelson, e o dono da Wynn Resorts, Steve Wynn, são ambos judeus.

No relatório sobre os riscos de 2017, Steve Vickers reiterou as suas preocupações sobre Macau. “Um ameaça subestimada é o terrorismo. Macau representa uma aglomeração única de interesses chineses, americanos e judeus, com ligações às tríades, numa actividade que os islâmicos consideram pecaminosa. Pior, a cidade é vulnerável”, insistiu o consultor.

Fontes não identificadas do This Week in Asia disseram ao suplemento que, nos últimos meses, a segurança nas fronteiras de Macau foi reforçada em relação aos portadores de passaportes de países muçulmanos e aos visitantes que chegam das Filipinas.

Outra fonte indicou que o Aeroporto Internacional de Macau, que garante a ligação a vários pontos da região, é considerado “um elo fraco” no que toca à segurança do território.

É neste ponto que o jornal estabelece um paralelismo com um acontecimento em Singapura que data já de Agosto de 2015, e que considera tratar-se de “um aviso”. As autoridades da Indonésia detiveram seis homens suspeitos de estarem a preparar um ataque terrorista ao Marina Bay, onde está o resort integrado da Las Vegas Sands. Na altura, a polícia indicou que o grupo pretendia disparar rockets a partir de Batam, uma ilha indonésia do outro lado do Estreito de Singapura.

Os homens foram detidos depois de uma série de raides em vários locais, incluindo a um sítio onde foi encontrado o armamento. Faziam parte do grupo terrorista KGR@Katibah, que terá ajuda de um indonésio que foi para a Síria juntar-se ao Estado Islâmico. O suspeito terá estado envolvido no ataque que fez oito mortos no mês passado em Jacarta.

Regressando a Steve Vickers, para uma ressalva que o jornal só faz no final do texto: o consultor diz que as previsões de um ataque num alvo “espectacular” como Macau, na sequência do decreto de Donald Trump, podem ser “demasiado perigosas”.

O consultor, que trabalhou nos serviços secretos de Hong Kong, mantém as previsões que fez no mês passado, para dizer que “os terroristas atacam com frequência quando sentem que estão a ser ignorados”. Os acontecimentos recentes nos Estados Unidos “podem ser um impulso à máquina de relações públicas” dos terroristas.

7 Fev 2017

Lai Chi Vun | Moradores contra demolição de todos os estaleiros

O porta-voz dos moradores da vila de Lai Chi Vun, em Coloane, diz que a demolição dos dois estaleiros em pior estado começa já em Março, sendo que a população está contra a destruição das restantes 14 estruturas. David Marques quer realizar actividades que lembrem o valor histórico da vila

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]os 16 estaleiros de construção naval que a história se encarregou de deixar em Lai Chi Vun, Coloane, dois deles vão começar a ser destruídos já em Março. Quem mora nesta pequena povoação concorda com esta medida do Governo, por serem estaleiros que muito provavelmente iriam cair já este ano, durante a época dos tufões. Contudo, a maioria está contra a demolição dos restantes estaleiros, conforme disse ao HM David Marques, porta-voz dos moradores de Lai Chi Vun e ligado à Associação de Moradores de Coloane. A segunda fase da demolição deverá arrancar em Maio.

“Pelo que li, estão contra. Até agora, o único que quer ver tudo destruído é o Governo. Todos os moradores compreendem os perigos que existem e que os estaleiros que estão em pior estado devem ser retirados. Mas foi decidida a remoção de todos os estaleiros antes da existência de um plano em concreto, e esse é um ponto muito interessante.”

A pequena casa com quintal de David, construída pelos seus pais, fica mesmo ao lado de um dos estaleiros que será já destruído. “Havia um plano há alguns anos que nunca foi materializado. Mas agora estão a destruir sem informar se vão seguir o plano antigo ou se têm um novo plano. Ninguém nos disse nada”, acrescentou o porta-voz.

“Querem demolir os primeiros dois em Março e concordo com esta demolição. Vem aí mais uma época de tufões e estes dois estaleiros não iriam aguentar mais um ano. A nossa preocupação não é com estes dois estaleiros, mas com os restantes”, frisou David Marques.

O porta-voz referiu que ainda não foram discutidas possíveis compensações financeiras, uma vez que os estaleiros não são detidos por quem, em tempos, construiu barcos com as suas mãos. O ano passado foram pedidas novas licenças de utilização à Direcção dos Serviços para os Assuntos Marítimos e da Água (DSAMA), que foram recusadas. A DSAMA confirmou, num comunicado oficial, que existem quatro lotes onde “a situação é aceitável”, tendo os seus ocupantes “efectuado reparações de acordo com as exigências”, pelo que foram renovadas as suas licenças de utilização. Ainda assim, os estaleiros localizados nestes lotes também deverão ser demolidos.

Os 11 lotes onde estão localizados os 16 estaleiros são “terrenos do domínio público”, sendo a sua utilização “entregue a titulares da licença de ocupação a título precário”, explicou ainda a DSAMA.

Manter a história

A pequena povoação de Lai Chi Vun mantém-se semelhante ao que sempre foi e, segundo David Marques, a demolição dos estaleiros não irá desalojar moradores. Contudo, a preservação da história pode estar em risco.

“Até agora, não há ninguém que corra o risco de perder a sua casa, mas falei com um vizinho que defende que, se retiram todos os estaleiros, então também podem retirar a aldeia, porque deixa de existir uma razão para que a povoação continue a existir. Isto pensando a longo prazo.”

Com esta perspectiva em mente, David Marques está a planear a realização de algumas actividades culturais, incluindo um espectáculo, para que se possa compreender o valor cultural daquele lugar. “Vamos fazer umas actividades para mostrar o valor cultural da vila. Gostaria de fazer isso antes da demolição”, contou o porta-voz.

Num comunicado datado de Janeiro deste ano, a DSAMA explica que, entre 2013 e 2015, “oficiou pelo menos cinco vezes os ocupantes dos 11 lotes e exigiu aos mesmos que efectuassem a reparação de instalações o mais cedo possível”. Os ocupantes “não assumiram a responsabilidade de manutenção de instalações e não utilizaram os respectivos lotes conforme as finalidades definidas na licença de ocupação a título precário”, o que levou à não renovação das licenças.

Após uma avaliação feita em conjunto com a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes e o Corpo de Bombeiros, chegou-se à conclusão de que “os estaleiros situados nos referidos 11 lotes ficaram gravemente deteriorados devido à falta de manutenção e correm riscos de queda da sua estrutura a qualquer momento”.

Dessa forma, e para “garantir a segurança dos cidadãos e dos turistas”, “o Governo irá brevemente demolir as instalações dos referidos lotes”. “Tendo em conta que as instalações do lote X-12 e do lote X-15 se encontram na situação mais grave, estas instalações irão ser demolidas em primeiro lugar”, rematava o comunicado.

7 Fev 2017

Comportamento do Governo em relação às interpelações dos deputados é perigoso, dizem analistas

O modo como o Governo se comporta em relação à assunção de responsabilidades políticas é perigosa, avisam políticos e analistas. A população está cada vez mais atenta ao comportamento do Executivo e não gosta de réplicas vagas. Um dia destes, a casa ainda começa a vir abaixo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Chefe do Executivo tem de repensar o modo como lida com as questões que lhe são colocadas pelos deputados, sob pena de o Governo, no poder sem legitimidade conferida pelo voto popular directo, começar a sentir uma pressão cada vez maior. A ideia é deixada por Larry So, académico, comentador de assuntos políticos, na análise ao que aconteceu no passado dia 24 na Assembleia Legislativa.

Pereira Coutinho e Ng Kuok Cheong tinham apresentado duas interpelações orais, dirigidas ao Chefe do Executivo, sobre o episódio Sónia Chan. A actual secretária para a Administração e Justiça admitiu publicamente ter recomendado um familiar seu para trabalhar no Ministério Público (MP), uma sugestão que fez ao antigo procurador da RAEM, Ho Chio Meng. O caso aconteceu em 2008, quando era a responsável pelo Gabinete de Protecção dos Dados Pessoais, e só veio a público porque o ex-líder do MP, acusado de mais de 1500 crimes, falou dessa recomendação durante o julgamento que está a decorrer no Tribunal de Última Instância.

Os dois deputados acharam por bem pedir explicações a Chui Sai On. Por um lado, pretendiam perceber que mecanismos se pretende adoptar para evitar “cunhas” no seio da Função Pública; por outro, queriam ainda perceber se o Chefe do Executivo tem intenção de agir politicamente em relação ao caso. Pereira Coutinho foi ainda mais longe, falando em violações às regras da Função Pública e às normas do Código Penal.

Tanto Pereira Coutinho, como Ng Kuok Cheong não obtiveram resposta às perguntas que fizeram. E isto porque, apesar de as questões serem para Chui Sai On, foi Sónia Chan a ir à Assembleia Legislativa (AL) falar de Sónia Chan. Acresce que o caso da recomendação do familiar estava a ser alvo de uma investigação do Comissariado contra a Corrupção (CCAC), pelo que Sónia Chan se escudou na averiguação em curso para não falar dela própria.

Governante não fala assim

Para Larry So, a resposta dada pela secretária para a Administração e Justiça está longe de ser politicamente correcta, no sentido literal da expressão. “Não é apropriado. Pode ir à AL se o Chefe do Executivo lhe tiver pedido, mas só se tiver alguma informação para dar aos deputados”, admite o analista. “No entanto, ir lá para dizer que não pode falar sobre o assunto não é apropriado. Os deputados colocaram questões e a resposta foi ‘não vou falar sobre o assunto’”.

Para o académico, este tipo de comportamento é desadequado porque “estamos a falar da responsabilização dos membros do Governo”, pelo que Sónia Chan “deve explicações ao público”. O facto de ter chamado à colação a investigação do CCAC para não falar sobre a sensível matéria – depois de, numa primeira fase, ter assumido o que fez e ter ensaiado uma espécie de mea culpa – leva Larry So a considerar que está agora a tentar “pôr um travão” na polémica. “E deu a entender que a Assembleia Legislativa não tem nada que ver com o assunto”, aponta.

“Os membros do Governo devem assumir responsabilidades perante a população. Não me parece que Sónia Chan esteja a cumprir as suas funções de forma apropriada e correcta”, conclui.

Sobre a escusa de Sónia Chan ao tema central das interpelações, Pereira Coutinho sublinha que não é a primeira vez que o Governo “se aproveita” da abertura de investigações quando “não lhe é conveniente responder a questões sensíveis”. O deputado lamenta ainda que o Executivo não avance com um processo disciplinar sobre a questão em causa – entende que houve violação do dever de isenção –, independentemente de o caso estar a ser investigado pelo CCAC. “O exemplo tem de vir de cima, caso contrário, que legitimidade existe para assacar responsabilidades ao pessoal da linha da frente?”, lança. “Mas isto não é algo isolado, tem vindo a acontecer regular e sistematicamente desde o estabelecimento da RAEM.”

Onde fica a Lei Básica?

E a postura do Chefe do Executivo, o verdadeiro destinatário das cartas de Pereira Coutinho e de Ng Kuok Cheong? Que sistema é este que permite a delegação da responsabilidade da resposta às interpelações, independentemente do conteúdo das missivas, sabendo de antemão que o representante do Governo não irá responder ao que foi perguntado?

A Lei Básica, no seu Artigo 65.o, determina os termos em que o Governo responde à AL. Um desses termos diz respeito, precisamente, a um dos métodos de fiscalização da acção governativa, ao indicar que o Executivo tem de responder às interpelações dos deputados.

Pereira Coutinho recorda o que vem escrito no diploma fundamental da RAEM para afirmar que, “ao longo dos tempos, o Governo não tem cumprido com rigor a Lei Básica”.

“O objecto, o sujeito da interpelação, era a secretária para a Administração e Justiça. A interpelação era sobre a responsabilização política. Cabia ao Chefe do Executivo responder se iria assacar responsabilidades políticas pela conduta da secretária”, reitera. “O que Chui Sai On fez foi, pela lei do menor esforço, indicar o próprio sujeito da interpelação para ir à AL responder”, afirma.

Larry So faz uma análise pragmática do que aconteceu: “A questão foi colocada directamente ao Chefe do Executivo, mas como é ele que manda, pode sempre delegar a resposta na secretária”. O analista recorda que Chui Sai On “delega sempre” – nunca se deslocou à AL para um plenário dedicado a interpelações orais. Mas se, por exemplo, para uma interpelação sobre venda de aves vivas fará sentido a delegação da resposta no presidente do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, esta lógica de remissão não será aceitável no caso em concreto.

“Parece que o Chefe do Executivo está a tentar não assumir uma grande responsabilidade”, diz Larry So. “Estão a fazer perguntas sobre a secretária, pelo que vai ela enfrentar as questões. E ela decide que não responde às perguntas.” Para o académico, trata-se de “um tipo de jogo bastante infantil, como quando as crianças estão a brincar, ‘vais tu, eu não vou’”, ironiza. “O Chefe do Executivo devia dizer alguma coisa, nem que fosse uma frase simples”, recomenda.

Pereira Coutinho aponta ainda o dedo à postura da própria Assembleia. “O presidente da AL não teve a coragem de chamar a atenção do Governo que, de facto, para responder à pergunta dos deputados, deveria ser o Chefe do Executivo a comparecer”, constata.

Sem solução à vista

Pereira Coutinho e Larry So concordam que o episódio do dia 24 põe a nu as fragilidades do sistema. O deputado volta à carga com o facto de as comissões da AL se realizarem à porta fechada. “Se virmos como a Assembleia funciona, causa-me enorme espanto que os deputados possam conviver com o facto de os jornalistas não poderem entrar nas seis comissões para informarem o público daquilo que se passa nas reuniões”, diz Coutinho, que tem lutado sem sucesso contra “esta grave falta de transparência”.

Quanto à questão das interpelações sem resposta, por o emissário de Chui Sai On não ter possibilidade de esclarecer os deputados, a solução passa pela assunção da responsabilidade, sugere Larry So. “A população tem vindo a pedir responsabilização”, alerta o académico. “O Governo tem de olhar para as questões com isso em mente, porque a responsabilização dos governantes não faz parte do cenário.”

O analista acredita que se a atitude governativa se mantiver, “a frustração vai crescer, porque não são dadas respostas”. A médio prazo, “a pressão vai aumentar para que os governantes sejam eleitos por via directa”.

Pereira Coutinho não parece acreditar que o Governo avance na direcção da responsabilização e entende que é preciso ir à origem do processo que legitima o poder. “A solução passa por alargar a democraticidade do próprio processo eleitoral do Chefe do Executivo”, sustenta. “Quando o Chefe do Executivo compreende que a legitimidade para governar deriva do facto de ter o apoio de 400 pessoas que fazem parte do colégio eleitoral, é evidente que não tem de dar qualquer satisfação às outras pessoas, incluindo aos meios de comunicação social.”

António Katchi, jurista, também é do entendimento que “o busílis da problemática da responsabilização política dos governantes reside no próprio sistema político de Macau”. O especialista em Ciência Política e Direito Constitucional desdobra o sistema em três grandes componentes: “A forma de Governo oligárquica, o sistema de Governo ultrapresidencialista e o carácter falacioso da autonomia”.

A forma de Governo oligárquica significa que “nem a composição do Governo (Chefe do Executivo e Secretários), nem a composição maioritária da AL são determinadas, directa ou indirectamente, pelo voto popular”. Por seu turno, diz António Katchi, “um típico sistema de Governo presidencialista permitiria que os membros do Governo – ou, pelo menos, o Chefe do Executivo – fossem destituídos pela AL por razões jurídicas de particular gravidade, através de um processo de ‘impeachment’”.

Acontece que não é esse o sistema da região, dada a subordinação do Governo de Macau ao Governo Popular Central, “em termos que limitam – e falsificam – grandemente a autonomia de Macau e, instrumentalmente, reforçam a supremacia do Chefe do Executivo no quadro do sistema político local”, razão que leva o professor a falar em sistema “ultrapresidencialista”. Precisamente porque é Pequim que manda, mesmo que o Chefe do Executivo proponha a exoneração de um membro da sua equipa governativa, nada garante que tal se verifique. “Pode até suceder que o Chefe do Executivo queira deixar cair um secretário mal visto na AL ou na opinião pública mas, se o Governo Popular Central resolver segurá-lo, nada feito”.

Resumindo e concluindo, para António Katchi, “a solução estaria, ou começaria, na correcção destes três males”.

6 Fev 2017

Trânsito | Pereira Coutinho alerta para transtorno das obras

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m interpelação escrita ao Executivo, Pereira Coutinho pede transparência sobre as obras realizadas nas vias rodoviárias, o uso de betão na pavimentação das estradas e padrões claros nos trabalhos.

O deputado Pereira Coutinho interpelou o Executivo relativamente à enorme quantidade de obras nas vias rodoviários de Macau previstas para este ano. De acordo com dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, o Conselho Consultivo do Trânsito recebeu no ano transacto 485 pedidos para realização de obras nas vias, sendo que 77 já foram concluídas. Na interpelação escrita o deputado recorda que a área terrestre da cidade é de 30,4 km2, o que dá uma média de 16 obras por quilómetro quadrado.

O representante da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), reitera que tem recebido queixas de cidadãos cansados dos “engarrafamentos e as frequentes escavações nas vias”, que “estreitam tanto os passeios para os peões, como as faixas para os veículos”.

A situação adensa-se quando se trata de obras de grande envergadura que se prolongam por largos períodos de tempo. Neste capítulo, a interpelação destaca os trabalhos da “Rotunda Ouvidor Arriaga e da Rotunda do Estádio da Taipa, cuja conclusão exige mais de cem dias”. Pereira Coutinho tenta sensibilizar o Executivo para o transtorno provocado a quem têm de circular em vias entupidas de trânsito, em especial à hora de ponta.

Destaca ainda que a ATFPM recebeu indicações de cidadãos de que em obras recentes “não se vê ninguém a trabalhar nas partes vedadas, nem qualquer aviso, ou informação sobre as obras”. Neste sentido, o deputado pede explicações sobre a existência de medidas concretas que visem trazer transparência aos trabalhos realizados, nomeadamente o nome do construtor, o prazo de conclusão e o responsável pela mesma.

Pavimento e obras nocturnas

Pereira Coutinho aproveitou também para se referir ao material que pavimenta as vias de Macau, alertando para o rápido desgaste do alcatrão, que requer manutenção constante. Esta degradação é aumentada pela grande quantidade de veículos em circulação e as chuvas, causando “despesas do erário público” desnecessárias. O deputado dá como exemplo a seguir Avenida Almeida Ribeiro, onde se utilizou-se betão no pavimento, sem necessidade de grandes reparações nas últimas três décadas. Nesse sentido, Pereira Coutinho sugere ao Executivo que passe a usar este material, em alternativa ao alcatrão na repavimentação das vias. Uma das preocupações referidas pelo representante da ATFPM prende-se com a falta de critérios e padrões sobre a reparação e pavimentação das vias, assim como “a desactualização grave das respectivas normas”.

Na interpelação escrita o deputado sugere ainda que “as obras que provocam menos ruído podem ser efectuadas durante a noite, a fim de encurtar o prazo da sua conclusão”.

6 Fev 2017

Executivo vai conceder 3500 patacas para abate de motociclos poluidores

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hegou ao fim a discussão por parte do Conselho Executivo do “Plano de Apoio Financeiro ao Abate de Motociclos e Ciclomotores com Motor a Dois Tempos”. A estratégia delineada pelo Governo visa melhorar a qualidade do ar em Macau, reduzir a poluição atmosférica e implementar os planos de acção definidos pelo “Planeamento da Protecção Ambiental de Macau (2010-2020)”. Foram ouvidos para a elaboração do plano o Conselho Consultivo do Ambiente, o Conselho Consultivo do Trânsito, assim como organizações do sector comercial de veículos e transportes e organizações sociais e de protecção ambiental.

Em comunicado, o Conselho Executivo anunciou que o plano de apoio financeiro será lançado no enquadramento do Fundo para a Protecção Ambiental e a Conservação Energética (FPACE). A medida procura incentivar os proprietários a entregar os veículos para abate à Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental, tendo sido proposto o montante de 3500 patacas, por motociclo, para compensar o proprietário.

Quem estiver interessado terá de requer a concessão do apoio junto do presidente do conselho administrativo do FPACE. O Conselho Executivo fixou como requisitos essenciais que os beneficiários tenham pago o respectivo imposto de circulação, ou dele estejam isentos. De salientar ainda que não são abrangidos os veículos com uma nova matrícula emitida após o dia 1 de Setembro de 2014. O prazo para apresentar candidaturas ao apoio financeiro é fixado por despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas.

6 Fev 2017

Filipinas | Comunidade em Macau apoia acções de Rodrigo Duterte

Não são considerados humanos por serem autores de crimes e por terem a mente alterada devido ao consumo de estupefacientes. Este parece ser o pensamento de grande parte dos membros da comunidade filipina em Macau face à política antidrogas do seu Presidente, Rodrigo Duterte. Mesmo com assassinatos na família, os filipinos aceitam e compreendem que este é o caminho a seguir

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] comunidade filipina em Macau continua a acreditar piamente no candidato às presidenciais que ajudou a eleger em Abril do ano passado. Apesar de a Amnistia Internacional (AI) ter divulgado esta semana um relatório que dá conta da prática de “crimes contra a Humanidade” na implementação da política antidrogas, a crença de que Duterte vai acabar com a corrupção e o crime no país mantém-se inabalável.

O documento, intitulado “Se és pobre matam-te: execuções extrajudiciais nas Filipinas”, espelha uma política de combate à droga que se caracteriza por execuções à margem da justiça, com o conluio das autoridades e pagamentos feitos a agentes da autoridade por cada execução, que podem variar entre mil e pouco mais de duas mil patacas.

Os factos não chegam para mudar a postura de uma comunidade que acredita que Duterte vai limpar a sociedade de todos os seus males. Os filipinos que aqui vivem apoiam as mortes, compreendem-nas, mesmo que, em muitos casos, afectem as suas famílias. A garantia é deixada por dois representantes da Associação Santo Niño Cebu em Macau, “uma organização religiosa e cívica”, cujo “maior foco é unir a comunidade”, diz ao HM Jamilito Scotti.

É Scotti também que nos conta que “a maioria dos filipinos que vivem em Macau está do lado de Duterte”. Ele próprio “concorda com o que o Presidente está a fazer”.

A palavra de ordem é limpar para depois reconstruir. Há que compreender, mesmo que a morte doa. “Não conheço casos de filipinos em Macau que tenham perdido os seus familiares nas Filipinas neste contexto, mas acredito que haja pessoas que possam ter passado por essa situação”, admite Jamilito Scotti.

“A comunidade filipina em Macau está contente com o Presidente. Falamos sobre assunto entre nós e estamos contentes com esta Administração. Adoramos as nossas famílias e, mesmo que os nossos familiares sejam bons, há sempre alguém que não é. Temos de aceitar a realidade. Esse é o grande ponto, a grande ideia: temos de compreender e aceitar. Temos de estar unidos”, defende Jerry Cuijiano, também ligado à Associação Santo Niño Cebu.

Ele próprio teve um familiar assassinado em Dezembro do ano passado. “Tenho uma família grande e um dos meus familiares estava ligado a esse mundo [do tráfico de drogas]. Disseram-nos que foi morto numa situação de luta na rua. Quando ele morreu sentimos… não digo alegria, mas foi um agradecimento a Deus. Foi o primeiro da família que nunca nos ouviu, como é que poderíamos esperar que ele nos iria ouvir?”, relata Jerry Cuijiano.

A dor e o medo existem, mas são ultrapassados. “As pessoas compreendem. As vítimas destas famílias tinham uma mente fechada e pertenciam ao mundo das drogas. Não há espaço na nossa sociedade para criminosos, não podemos esperar garantir [o respeito pelos] direitos humanos para estas pessoas. Mas, na generalidade, a questão dos direitos humanos está a ser usada como desculpa para escapar”, inidca Cuijiano.

Nem o facto de estarmos perante uma das sociedades mais católicas do mundo afasta a ideia de que a morte é a única solução, sem lugar para o perdão. “Somos pessoas religiosas. Se me pergunta, eu escolho a vida. Matar as pessoas, os viciados em droga, não é a escolha mais acertada para resolver a situação, mas não podemos evitar os assassinatos. No entanto, a sua mente está diferente, têm uma mente distorcida por causa das drogas, estão afectados, e por isso criam situações de conflito”, frisa Jamiliano Scotti.

Menos que gente

Um dia depois de a Amnistia Internacional ter divulgado um relatório que fala na prática de crimes contra a Humanidade apoiados por Duterte, o secretário para a Justiça do país, Vitaliano II, deixou bem clara a ideia que o actual Governo filipino tem em relação a quem comete crimes no país.

Citado pelo Philippines Star, Vitaliano II disse que “os criminosos, os barões da droga, os traficantes, não pertencem à Humanidade. Não são humanos”. Uma ideia que é partilhada pela maioria que votou em Duterte, em busca da erradicação da corrupção e da pobreza.

Ana Fivilia, representante de outra associação ligada à comunidade filipina local, lembra que as mortes não foram a primeira opção do actual Presidente. “Duterte quis, numa primeira fase, limpar a confusão do consumo e tráfico de drogas, então decretou uma medida em que as autoridades batem à porta dos suspeitos de tráfico e consumidores, e tentam convencê-los a não continuar a fazer o mesmo. Têm uma lista nas mãos com todos os nomes”, explica.

“Penso que a maioria dos filipinos concorda com isso, porque os traficantes e consumidores foram avisados, mas não ouviram as opções que lhes foram dadas. É uma forma de resolver o problema e eliminar todos esses casos”, observa Ana Fivilia.

“Nesta situação precisamos de um Presidente assim, e é bom que se faça tudo para limpar, mudar, clarificar. Estou muito satisfeito com o que se está a passar nas Filipinas e quero dizer a todos que aqueles que morreram que escolheram morrer, porque optaram por ter aquele estilo de vida. Tenho noção do que são os direitos humanos, mas também temos de analisar os direitos das vítimas, dos criminosos. Temos de fazer um equilíbrio. A ideia de direitos humanos é boa e precisamos deles, se o país estiver numa boa fase. O país precisa de um homem como ele [Rodrigo Duterte], alguém para fazer o trabalho”, adiantou Jerry Cuijiano.

O responsável pela Associação Santo Niño Cebu admite que as Filipinas estão a ganhar má reputação a nível internacional, mas defende que estas acções têm de ser feitas. “Quando se assume uma acção como esta, de limpar os traficantes de droga, claro que dá uma má imagem. Mas temos de compreender que as pessoas que morreram eram criminosas, dependentes de drogas. Temos de fazer uma limpeza primeiro e depois impor os direitos humanos. Há criminosos que apenas cometem crimes porque precisam de ajudar a família, tudo bem. Mas e os criminosos que o fazem porque são loucos e só pensam em actos maus, como matar? Isso tem de ser removido.”

Reabilitar sim, mas pouco

O documento divulgado pela AI fala do envolvimento da polícia nas execuções, com muitos dos agentes a receberem dinheiro pelo que fazem. Mas há também uma ligação no próprio mundo da droga. “Quem mata essas pessoas são polícias que também estão ligados aos traficantes de droga”, admite Jerry Cuijiano.

“Há famílias assustadas com tudo o que está a acontecer. O Presidente Duterte tem a acção contra o tráfico e o que o Governo está a fazer é uma intenção de limpar todas as pessoas que estão envolvidas, incluindo os polícias. Há incidentes, assassinatos em que a polícia também está envolvida”, acrescenta Jamilito Scotti.

Questionados sobre a importância de apostar em centros de reabilitação para curar o vício da droga, tanto Scotti e Cuijiano optaram por não se alongar muito sobre o assunto.

“Há centros de reabilitação mas, quando as pessoas se tornam dependentes de drogas, só vêem o que querem. Perdem a noção de tudo. Tornam-se completamente limitadas”, diz Cuijiano. Já Jamilito Scotti considera que as condições actuais para receber toxicodependentes são más.

“Nas Filipinas há muitos toxicodependentes, mas não existem infra-estruturas suficientes para os receber. Por isso o Governo está a tentar ter centros em vários pontos do país, não apenas em Manila. Pelo que sei, há alguns países como o Japão ou a China que têm comunicado com as Filipinas para ajudar nesse sentido, para que haja mais centros de tratamento.”

Uma grande indiferença

Ângelo R. Lacuesta é um escritor filipino que já esteve em Macau para participar no festival literário Rota das Letras. Em declarações ao HM, por e-mail, o escritor fala do medo diário que se instalou no país, mas também na indiferença.

“Há uma série de coisas chocantes que estão a acontecer à nossa volta, mas duas delas sobressaem. Em primeiro lugar há uma série de assassinatos extrajudiciais a acontecer numa base diária. Em segundo lugar, há uma incrível apatia, indiferença e apoio que as pessoas têm vindo a demonstrar em relação a estes homicídios.”

Para Ângelo R. Lacuesta, é necessário olhar para a vida. “Antes de nos questionarmos quem está por detrás dessas mortes, ou que impacto terão na economia, um assassinato é um assassinato. Não tem nada que ver com política, ou personalidades – é uma questão de justiça”, remata.

O relatório da AI aborda 33 casos em que foram assassinadas 59 pessoas em diversas partes do país. A organização entrevistou 110 pessoas, incluindo testemunhas, familiares de vítimas e agentes das forças de segurança. Os pagamentos aos agentes serão uma prática comum. Um dos agentes confessou à AI que a polícia lhes paga entre oito mil e 15 mil pesos [qualquer coisa como 1300 a 2500 patacas] por execução, sendo que ainda recebem uma comissão das funerárias mais próximas.

A AI escreve que, “se não forem tomadas imediatamente medidas decisivas, a comunidade internacional deve recorrer ao Tribunal Penal Internacional para uma investigação preliminar a estes homicídios, incluindo a participação de altos funcionários do Governo”.

3 Fev 2017

Financiamento | Au Kam San pede fiscalização a associações

 

O deputado Au Kam San, em interpelação escrita, questiona o Governo sobre a forma como se autorizam e fiscalizam os financiamentos às associações. Para o deputado, algumas destas organizações são um “grande buraco negro”

[dropcap style≠’circle’]“P[/dropcap]orque é que o Governo autoriza este tipo de financiamento?”, interroga Au Kam San. O exemplo que serve de motor à interpelação escrita é um caso do ano passado, quando se descobriu que a Associação de Mútuo Auxílio dos Moradores de Mong Há desviou fundos para financiar o seu centro de convívio.

Para o deputado, em teoria, quando uma associação requer fundos do erário público deve especificar “o destino do financiamento”, os fins específicos para os quais são destinados. Ou seja, não podem ser utilizados para outras entidades. Em questão está a ligação entre a associação e o seu centro de convívio. O último está subordinado à Associação de Mútuo Auxílio dos Moradores de Mong Há, “mas ambas têm autonomia financeira”.

Para Au Kam San, a situação agrava-se uma vez que o dito cento de convívio já recebe fundos do Instituto de Acção Social (IAS). “Ao longo dos últimos 20 anos, o centro foi financiado em milhares de patacas para o pagamento da respectiva dívida”, escreve na interpelação. O tribuno acrescenta ainda que esta devia ser a única forma de financiamento do espaço, sendo que os valores transferidos para pagamentos de renda não ficaram inscritos nas receitas da associação. Ou seja, as centenas de milhares de patacas que serviriam para pagar as rendas “desapareceram completamente”.

Pedida responsabilidade

Au Kam San lembra que este tipo de problemas tem sido sempre alvo das críticas do Comissariado da Auditoria mas, apesar de tudo, são situações que continuam por resolver. O deputado alertou na interpelação que “quando o centro obteve o financiamento, o seu coordenador transferiu as verbas respectivas para a associação de que também é director-geral”. Esta manobra torna “a fiscalização impossível”, o que configura para Au Kam San “um autêntico abuso e uma ilegalidade”.

O deputado questiona-se como poderá o IAS ter permitido esta situação, sugerindo ser a própria associação a resolver os conflitos que tinha internamente. “Foram arbitrariamente utilizados recursos públicos, desapareceu mesmo ou foi desviado erário público, portanto, não restam dúvidas da natureza criminal da situação”, completa. Neste âmbito Au Kam San pergunta porque não foram feitas participações “aos serviços competentes da área da investigação criminal”.

3 Fev 2017

Turismo promete guerra contra excursões a preços baixos

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m resposta à interpelação escrita da deputada Kwan Tsui Hang que pedia fiscalização às agências de viagens e aos guias turísticos, o Executivo respondeu com medidas. De acordo com a Direcção dos Serviços de Turismo (DST), existe intenção de criar “normas destinadas à questão de excursões a preço nulo ou a preço baixo”. Como tal, foi proposta uma lei para proibir as agências de viagens de aceitar o acompanhamento de excursões turísticas à RAEM “sempre que o preço cobrado pelos serviços seja inferior ao respectivo custo e às sanções no caso do incumprimento”.

A DST tem realizado inspecções regulares a postos fronteiriços e pontos de interesse turístico, em especial durante os feriados e períodos festivos, quando se regista uma maioria afluência de turistas. Durante o ano passado foram “realizadas 1401 acções de inspecção”, assim como foram inspeccionados, aleatoriamente, 323 grupos turísticos oriundos do Interior da China.

No que toca a tratar disputas turísticas, a DST instaura procedimentos sancionatórios sempre que se verifiquem irregularidades por partes das agências, ou guias turísticos locais. Sempre que os incidentes tenham na sua origem operadores turísticos do Interior da China, a DST dá conhecimento dos casos à entidade homóloga da China, para que esta possa proceder como julgue conveniente. Neste sentido, no ano passado a DST recebeu 67 queixas, ou pedidos de assistência, por parte de turistas. Destas participações resultou um caso de infracção à legislação vigente, com devido procedimento sancionatório instaurado, sendo que em cinco outros casos envolvendo agências de turismo do Interior da China foi dado conhecimento às autoridades chinesas.

Guias protegidos

A resposta do Executivo, no que toca às excursões de baixo custo, alerta que “é difícil garantir a qualidade se o preço é demasiado baixo”. É compreensível que estes métodos sejam usados para angariar clientela mas, desta forma, os operadores turísticos procuram obter verbas de outras formas. Por exemplo, induzindo os turistas a fazerem compras, valores que se acrescentam ao preço das viagens. O Governo procura minorar o efeito destas técnicas comerciais através de campanhas de sensibilização dos turistas, distribuindo “panfletos informativos e curtas-metragens publicitárias para promover a racionalidade no processo de consumo”. Foi também disponibilizado no site da DST um link para recolha de queixas de turistas que se sintam lesados por estas práticas.

Outro dos pontos da resposta do Executivo prende-se com a protecção do guia turístico quando este trata da sua certificação. Antes de 1998, o cartão de guia era requerido pela agência turística, ficando esta com a faca e o queijo na mão porque o documento caducava com o fim do contracto. A alteração eliminou o regime de exclusividade à entidade patronal, aumentando a autonomia e flexibilidade dos guias turísticos.

3 Fev 2017

Estados Unidos | Presidente barra certos muçulmanos

Donald Trump começa a cumprir uma das mais polémicas promessas de campanha, numa hierarquia difícil de realizar: proibir a entrada de muçulmanos em território americano. O HM analisa as reacções que esta ordem executiva suscitou

[dropcap style≠’circle’]“D[/dropcap]ai-me os teus fatigados, os teus pobres, as tuas massas encurraladas ansiosas por respirar liberdade”, pode ler-se no pedestal da Estátua da Liberdade, em Nova Iorque. A citação, retirada do poema “The New Colossus” de Emma Lazarus, resume o espírito de ‘melting pot’ que caracteriza não só Nova Iorque, mas os inteiros Estados Unidos desde a sua génese. Pode dizer-se que, com a proposta do Presidente para banir muçulmanos de pisarem solo americano, parte desta mensagem perde-se.

Donald Trump já havia prometido barrar a entrada de quem professe o Islão “até percebermos o que se passa”, uma condição enigmática que vê agora concretização. A ordem executiva, assinada na semana passada, proíbe a entrada de mais de 218 milhões de pessoas, impedindo também a possibilidade de asilo a refugiados oriundos de determinados países predominantemente islâmicos. A acção temporária aplica-se durante 90 dias e proíbe a entrada de nacionais oriundos do Sudão, Irão, Iraque, Líbia, Somália e Iémen. Para acrescentar insulto à injúria, os refugiados provenientes destes países serão barrados por 120 dias.

A segurança nacional é apontada como a razão principal de tal acção, sendo de salientar que a larga maioria dos atentados terroristas em solo americano tem sido cometida por cidadãos americanos, em grande parte com ligações a milícias de extrema-direita. Brancos, cristãos e muito bem armados. Outra incongruência na medida da nova Administração é não abarcar a Arábia Saudita, o país de origem de Osama Bin Laden. Isto apesar de a maioria dos terroristas responsáveis pelo ataque de 11 de Setembro às torres do World Trade Center terem sido sauditas. Nem mesmo a exportação do wahabismo – uma vertente extremista sunita que tem inspirado terrorismo um pouco por todo o mundo – colocou a Arábia Saudita na lista negra. De fora da proibição também ficaram o Egipto, a Indonésia e os Emirados Árabes Unidos, tudo países onde Donald Trump tem negócios.

Consequências e reacções

A ideia inicial seria proibir a entrada de quem vem dos países visados para os Estados Unidos à procura de trabalho, para lá se fixar. Mas a verdade é que esta medida tem directo impacto em famílias de norte-americanos com raízes nestes países.

Um dos rostos dos visados é o de Abubaker Hassan, médico, que ficou separado da esposa e da filha recém-nascida em sequência do selectivo fechar de portas a muçulmanos. Há um par de meses, a sua mulher, Sara Hamad, levou a filha do casal a visitar familiares ao Qatar. Apesar de ambos terem visto para trabalhar e viver em Detroit, são de origem sudanesa, uma das nacionalidades afectadas pelo banimento. O rebento do casal, Alma, nascida em Detroit, tem cidadania norte-americana. Na passada segunda-feira, mãe e filha tentavam regressar a casa e foram impedidas de embarcar no aeroporto do Qatar, apesar da recém-nascida ter cidadania norte-americana, e a mãe ter visto de permanência. Mas como Hamad não é cidadã, ou residente permanente, ficaram em terra. Em desespero, a mãe disse à ProPublica que não pode “reunir a família”, nem o marido se pode juntar a elas.

Uma das reacções mais visíveis à proibição de entrada de muçulmanos em solo americano veio de Sally Yates, Procuradora-geral do Estado de Nova Iorque, que ordenou ao Departamento de Justiça que ignorasse o decreto presidencial. Em questão estava a constitucionalidade da medida, e a “garantia da justiça e a luta pelo que é certo”, disse Yates em entrevista à Reuters.

A oposição não caiu bem em Donald Trump, que a despediu quase imediatamente. Em comunicado, a Casa Branca justifica a demissão acusando a Procuradora-geral de “ter traído o Departamento de Justiça ao recusar aplicar uma ordem legal feita para proteger os cidadãos dos Estados Unidos”. A Administração Trump adiantou ainda que a “insubordinação [de Yates] demonstra pouco rigor a lidar com assuntos fronteiriços e falta de firmeza na resposta à imigração ilegal”.

Além dos protestos que se fizeram sentir em vários aeroportos norte-americanos, as reacções à proposta do Presidente chegaram de todos os quadrantes. Dez dias depois de passar o testemunho presidencial, Barack Obama reapareceu na cena política para repudiar o polémico decreto assinado por Trump. Em comunicado, o porta-voz de Obama declarou que o antigo ocupante da Casa Branca “discorda da discriminação com base em crença religiosa”. Acrescentou ainda que “espera ver os cidadãos a exercer o seu direito constitucional de protesto, uma vez que os valores americanos estão em causa”.

A voz do dinheiro

Dificilmente o Presidente escutará a opinião do seu antecessor. Porém, as vozes dos directores de grandes empresas não costumam passar ao lado do magnata nova-iorquino. Este pode ser o mais eficaz travão a abrandar o comboio anti-imigração da Administração Trump. Os homens máximos da Apple, Ford e Goldman Sachs emitiram comunicados categorizando o decreto que bane muçulmanos de entrar nos Estados como “antiamericano e mau para os negócios”.

Na mesma linha, a Google anunciou a entrega de donativos a organizações que apoiem imigrantes. Também a Starbucks se manifestou prometendo tudo fazer para ajudar empregados que sejam afectados pelo decreto, assim como contratar refugiados.

Ouvido pela Associated Press, o director executivo da Apple, Tim Cook, alertou para o facto de a empresa “não existir se não fosse a imigração”. Cook refere-se não só ao carácter multiétnico da multinacional, mas também ao facto de o fundador da Apple, Steve Jobs, ser filho de um refugiado sírio que conseguiu asilo nos Estados Unidos.

Ásia em protesto

Nos protestos que ocorreram no aeroporto de São Francisco, marcaram presença duas figuras de destaque de Silicon Valley: Sergey Brin, co-fundador da Google, e o presidente da Y Combinator, Sam Altman. Não só o mercado de mais de 1,5 mil milhões de muçulmanos é algo que as empresas das tecnologias não querem desperdiçar, como uma parte considerável da sua mão-de-obra é proveniente de países de maioria islâmica.

Também a área jurídica se fez ouvir no coro de protestos contra a acção executiva da Casa Branca, nomeadamente associações que representam advogados oriundos do sul da Ásia. As duas maiores associações que reúnem juristas da região declararam em comunicado que “as ordens, baseadas em preconceitos que preconizam que determinados grupos étnicos estão mais dispostos à violência, são incompatíveis com os valores americanos”. O comunicado acrescentou ainda que a medida não tornará as comunidades mais seguras, nem fortalecerá a nação.

No comunicado, o presidente dos Associação dos Advogados do Sul da Ásia, Vichal Kumar, acrescentou que “a criminalização e estigmatização de um grupo de pessoas devido às suas crenças, ou origem, viola o espírito de igualdade, justiça e princípio da presunção da inocência”.

Hong Kong assistiu ontem a protestos contra as medidas de Donald Trump. Foram poucos, cerca de 20, mas fizeram-se ouvir. Os manifestantes, ligados a vários grupos políticos como a Liga dos Sociais Democratas (LSD) e a International Migrant Alliance, seguiram em cortejo até ao consulado norte-americano no centro de Hong Kong. Empunhavam cartazes com mensagens que diziam “Fazer a América odiar novamente”, ou “Uma desgraça para a humanidade”. Em declarações à Rádio e Televisão Pública de Hong Kong, Avery Ng, dirigente da LSD, declarou que “desde que Donald Trump assumiu a presidência, conseguiu desafiar a Constituição norte-americana, desafiar os direitos humanos e os valores que todos nós, como cidadãos globais, defendemos”. Avery acrescentou ainda que, “se isto continuar, a divisão entre religiões, etnias e nacionalidades será cada vez maior”.

Esta parece ser a rota trilhada pela actual Casa Branca, que tem espalhado brasas um pouco por toda a comunidade internacional. Nem antigos aliados escaparam, como os países da Europa Central, Japão e México. Aguardam-se novos desenvolvimentos na frente chinesa.

2 Fev 2017

Jogo | Receitas subiram 3,1 por cento em Janeiro

A tendência da recta final de 2016 manteve-se no primeiro mês de 2017. Janeiro chegou ao fim com os casinos a darem sinais positivos sobre a recuperação do sector do jogo. Ambrose So acredita que o Galo vai despertar a indústria

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s casinos fecharam em Janeiro com receitas de 19,255 mil milhões de patacas, uma subida de 3,1 por cento face ao período homólogo de 2016, indicam dados oficiais ontem divulgados.

Este é o sexto mês consecutivo em que as receitas dos casinos registam uma subida, após 26 meses de quedas anuais homólogas da principal indústria do território, segundo as informações publicadas pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ).

Os casinos de Macau fecharam 2016 com receitas de 223,210 mil milhões de patacas, uma queda de 3,3 por cento face ao cômputo de 2015.

O ano passado foi o terceiro ano consecutivo de quebra depois de uma diminuição de 34,3 por cento em 2015 e de 2,6 por cento em 2014.

A importância do galo

Os resultados de Janeiro foram anunciados poucos dias depois de o presidente executivo da Sociedade de Jogos de Macau (SJM), Ambrose So, ter dito que espera que o Ano do Galo traga “crescimento renovado e prosperidade”.

No jantar anual de ano novo da SJM, Ambrose So lembrou como a indústria do jogo viu o início de 2016 acompanhar a “tendência descendente dos dois anos anteriores”, mas no final do ano verificou-se “a refrescante retoma de algum crescimento”, referindo-se à subida das receitas dos casinos.

“O mercado precisa de despertar e, para isso, o galo chega mesmo a tempo. Como toda a gente sabe o galo é o despertador do reino animal. Antecipamos que vai trazer crescimento renovado e prosperidade para Macau”, afirmou.

Em relação ao Grand Lisboa Palace, aquele que deverá ser o último projecto a inaugurar na vaga de novos casinos, em 2018, o responsável fez referência a “progressos positivos na construção”.

Os dados mais recentes da SJM indicam uma queda de 11,1 por cento nas suas receitas de jogo no terceiro trimestre de 2016, comparando com o mesmo período de 2015.

A SJM não esteve sozinha na diminuição do dinheiro arrecadado. A Wynn Macau anunciou há dias que os lucros da operadora caíram 26,6 por cento, para 46,6 milhões de dólares norte-americanos, no último trimestre de 2016, em comparação com o mesmo período de 2015.

Os dois projectos da Wynn em Macau – um no centro da cidade que opera desde 2006 e o novo Wynn Palace, que abriu a 22 de Agosto no Cotai – geraram receitas de 917,1 milhões de dólares nos três últimos meses do ano, mais 65 por cento em termos anuais. Este foi o primeiro trimestre completo a contar com os ganhos do novo projecto.

2 Fev 2017

Línguas | Tradutor de André Villas-Boas estudou um ano em Macau

Foi aluno do Politécnico de Leiria e esteve um ano em Macau. Luís Lino é o tradutor e intérprete da equipa de André Villas-Boas, o antigo treinador do FC Porto que agora comanda o Shanghai SIPG. Estudar mandarim abriu-lhe as portas para o mundo do futebol

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ó acreditou no dia em que chegou a Xangai. “É um sonho. Quando o André Villas-Boas me fez a proposta nem sequer queria acreditar.” Luís Lino acabou o curso há pouco mais de dois anos. O antigo aluno do Instituto Politécnico de Leiria viveu um ano no território, ao abrigo de um acordo com o Politécnico de Macau. Foi jogador do Sporting local e é um amante de futebol, pelo que entrar em campo para traduzir é a conjugação de duas paixões que, diz, jamais imaginaria que fosse possível.

A equipa de André Villas-Boas – antigo treinador do Porto, do Chelsea e do Tottenham, entre outros clubes – chegou a Xangai em Dezembro. A experiência, conta Luís Lino, está a ser francamente positiva. “Mas estive dois anos em Portugal [desde que acabou o curso] a falar mandarim muito raramente. Não tinha contacto diário com a língua. Quando cheguei, senti que estava bastante enferrujado, isto já para não dizer que nunca falei chinês no contexto do futebol”, explica. “Há muitos termos que me estavam a faltar. É um trabalho do dia-a-dia que não posso negligenciar. Estou a trabalhar constantemente.”

O tradutor tem como principais funções ajudar o treinador e os jogadores de língua portuguesa “na organização e em trabalho de back office”. Dá apoio em questões burocráticas, na preparação de documentos e em “tudo aquilo que os jogadores precisarem”. Em campo, ajuda na comunicação entre jogadores chineses e técnico principal da equipa.

“André Villas-Boas tem um adjunto, o Xie Hui, que é o David Beckham da China. Fala um inglês espectacular, já está no mundo do futebol há muitos anos, pelo que se apoia mais nele para dar instruções em campo. Mas estou lá, estou sempre atento e, quando é preciso complementar alguma coisa ou quando esse adjunto está ocupado a falar com outra pessoa, entro eu. Estou sempre pronto a ajudar”, descreve Luís Lino.

Fora das quatro linhas, o tradutor desempenha um papel importante nas conferências de imprensa. O Shanghai SIPG, equipa da Super Liga Chinesa, tem quatro jogadores de língua portuguesa: os brasileiros Elkeson, Hulk e Oscar, e Ricardo Carvalho, defesa central português com 89 internacionalizações ao serviço da selecção nacional.

Melhor aqui do que lá

Natural do Porto, Luís Lino viu na aprendizagem do mandarim um desafio. “A minha família também me dizia que seria a língua mais rentável na indústria da tradução, da interpretação. Foi sobretudo pelo desafio e pelo facto de ser muito exótico”, explica.

Escolhido o curso, a opção foi o Instituto Politécnico de Leiria, que oferece um programa de quatro anos, sendo que dois são passados fora, o que “faz uma diferença abismal”. No segundo ano do curso, Luís Lino foi estudar para a Universidade de Língua e Cultura de Pequim, e de lá veio para Macau, onde esteve entre 2012 e 2013. “Voltei para Portugal, fiz o primeiro semestre do quarto ano em Leiria e, depois, o estágio em Xangai.”

No final do curso, decidiu “pensar no que queria mesmo fazer”. Em casa, foi intérprete freelancer, “ia fazendo traduções, interpretações, incluindo para a Federação Portuguesa de Artes Marciais”, e trabalhou no Museu do Futebol Clube do Porto. “Estava a leccionar mandarim no Porto quando recebi esta proposta”, diz.

Em relação a Macau, onde esteve agora durante alguns dias de férias, diz olhar “com muito carinho, também por causa do Sporting”. O clube “ajudou a entrosar-me bem na cidade e conhecer muita gente de cá”, recorda Luís Lino, que veio viver para o território integrado numa turma de 16 estudantes.

Sobre o ano a estudar no Politécnico, numa cidade onde o mandarim não é a língua que se ouve na rua, Luís Lino entende que, “de acordo com o processo, tem de se passar por aqui”. “Mas, na altura, os nossos conhecimentos de mandarim ainda não eram consolidados o suficiente para conseguirmos entender o que se diz em cantonense, enquanto agora já é possível associar algumas expressões, depois de seis, sete anos de estudo”, refere.

De qualquer modo, “perder, não se perde”, ressalva. “Continua a ser melhor estar aqui do que em Portugal, onde não há referência diária absolutamente nenhuma. Depois, o nosso horário era muito intenso, com quatro a seis horas diárias só de chinês compreensivo, excluindo as aulas de leitura, de audição e de História da China.”

A oportunidade

O novo desafio obriga o jovem tradutor a regressar ao estudo. “Durante os treinos tenho sempre o meu caderno comigo. Sempre que ouço uma expressão que não conheço, aponto-a. Tenho várias ferramentas que me ajudam a memorizar e a estudar”, relata, enquanto pega no telemóvel e mostra as melhores aplicações para consolidar a língua chinesa. “O importante é compilar o maior número de léxico possível e ter a certeza de que nunca se pára”.

Apesar de ter vivido quatro meses em Xangai na recta final do curso, a experiência no Shanghai SIPG faz com que a capital económica da China seja olhada de outra forma. “Quando estou livre, há mais tempo para explorar. Somos um grupo, costumamos fazer muita coisa juntos, vamos passear e, geralmente, contam comigo para lhes dizer quais são os sítios a ir. Adoro Xangai, é mesmo o meu estilo. Não falta nada, tem muita coisa para ver, muitos lugares escondidos no meio da cidade.”

De malas feitas e prestes a embarcar de regresso à equipa de André Villas-Boas, o jovem tradutor confessa que, quando terminou o curso, pensou que iria trabalhar “para um escritório de advogados ou ser freelancer o resto dos meus dias”. “Mas a vida tem destas voltas. Trabalhei, empenhei-me, dediquei-me, mas também tive sorte. Agora é aproveitar a oportunidade”, remata.

2 Fev 2017