Renovação | Construtoras vão poder apoderar-se de casas de particulares

Caso não concordem com a renovação do prédio onde vivem, os pequenos proprietários podem ser obrigados a abdicarem das suas casas. A medida, proposta pelo Governo, levantou ontem várias questões por parte dos deputados. Quanto à responsabilidade do pagamento dos trabalhos em casas particulares, o Executivo ainda não tomou uma decisão

 

[dropcap]É[/dropcap] o último recurso, mas o Executivo propõe que a lei de renovação urbana permita que construtoras, ou outras alianças de proprietários, desapropriem particulares das suas fracções para se por em prática a renovação. Este é um mecanismo que vai poder ser aplicado nos casos em que a construtora ou a aliança de proprietários estejam no controlo de 90 por cento dos direitos de propriedade de um prédio, 80 por cento ou até, em situações de risco, 60 por cento.

Segundo o Governo, as expropriações têm de ser feitas através de uma “uma indemnização adequada e atempada”, mas nem por isso a medida deixou de ser questionada pelo deputado Ng Kuok Cheong, durante a sessão de ontem de troca de opiniões sobre a futura lei entre membros do Governo e alguns deputados.

Na sua intervenção, Ng apelou ao Executivo para agir com prudência e recordou a Lei de Reordenamento dos Bairros Antigos que foi deixada cair em 2013, por ser considerado que não oferecia protecção suficiente a pequenos proprietários de fracções.

“Espero que seja possível criar um regime para que os empreiteiros adquiram uma percentagem das fracções que lhes permita avançar com a renovação urbana. Mas há que proteger os direitos dos proprietários”, frisou o pró-democrata. “Para aplicar a desapropriação há que definir um regime adequado, além de uma compensação pecuniária justa. O Governo não deve seguir a Lei de Reordenamento dos Bairros Antigos”, acrescentou.

No caso de prédios com mais de 30 anos e menos de 40, o executante da renovação, que pode incluir construtoras, aliança de proprietários, ou mesmo a empresa estatal Macau Renovação Urbana, precisa de ter 90 por cento do prédio, ou o apoio de proprietários que constituam essa percentagem, para poder forçar as obras. No caso dos prédios com mais de 40 anos a percentagem baixa para 80 por cento e, quando se considera que o prédio pode ruir ou que é um perigo para a segurança pública, a percentagem é de 60 por cento.

Face a esta questão, Liu Dexue, director da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça (DSAJ), garantiu que a lei vai propor “mecanismos justos e parciais” e que vão ser implementados procedimentos para “proteger os interesses dos privados”. A expropriação pode ser igualmente aplicada nos casos em que os proprietários sejam considerados “incapazes”, desconhecidos ou ausentes.

Contudo, as percentagens em causa também levantaram dúvidas, com deputados como Ella Lei, Leong Sun Iok ou Sulu Sou a questionarem os critérios e a apontarem que os pequenos proprietários podem ser prejudicados.

E quem paga?

Segundo o texto de consulta sobre a futura proposta de lei, os proprietários podem voltar para a fracção que possuíam depois de renovada. Se tal não for possível, podem receber uma outra fracção. Em vez da troca, poderá ocorrer antes o pagamento de uma compensação em dinheiro.

Estas medidas podem ser ainda complementados com o pagamento de um subsídio especial, que poderá ser utilizado para pagar os encargos com as mudanças dos moradores ou rendas de arrendamento de uma fracção, enquanto se aguarda pela conclusão dos trabalhos de renovação na casa original.

Contudo, o Executivo não foi capaz de explicar quem vai ser responsável pelos pagamentos, se serão feitos pelo próprio Governo ou pelos “sujeitos de renovação urbana”, que incluem os proprietários ou as construtoras por detrás dos projectos da renovação urbana. As explicações do Governo também não indicaram os responsáveis pelo pagamento das obras.

Ontem, foi o deputado Au Kam San quem se debruçou sobre este assunto: “E os custos da renovação urbana? Antes foi dito que as despesas seriam suportadas pelos próprios proprietários.

Mas afinal quem vai suportar os custos? E quando houver troca de fracções, quem vai compensar pela troca? E se não forem os proprietários, quem vai pagar?”, questionou.

A pergunta ficou sem resposta, para já, com Liu Dexue a responder que vai “depender das regras que forem estabelecidas” durante a consulta pública.

Governo desconhece número de afectados

Segundo as estimativas do Governo há 3.697 prédios que podem ser incluídos no âmbito da renovação urbana, uma vez que têm idade superior a 30 anos. Contudo, o Executivo desconhece o número de pessoas que vivem nestas fracções e que podem ser afectadas pelos trabalhos. Este facto foi reconhecido ontem por Liu Dexue, director da DSAJ, à saída da sessão de esclarecimentos em declarações aos jornalistas. Contudo, o director garantiu aos deputados que se as fracções estiverem arrendadas, os inquilinos vão ver os seus direitos protegidos.

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