Latrina mental

[dropcap]A[/dropcap] diferença entre uma ideia e bosta pode parecer ténue aos afortunados de fraco olfacto. Quando a diferença é difícil de identificar podemos estar na presença de uma ideia de estrume, adubo natural que fertiliza o campo dos conceitos escatológicos. Macau é terreno fértil onde abunda este tipo de composto mental. As coisas que se ouvem e lêem nesta pastagem, não raras vezes, são uma espécie de clister intelectual, as primeiras gotas de um dilúvio castanho.

Há coisa de dias, não importa onde, nem por quem, li algo que, à primeira vista, me fez rir às gargalhadas e depois me encheu de desgosto.

Não querendo antecipar o suspense quanto às fedorentas pérolas, deixem-me que vos guie pela mirabolante tese que pretende resolver o elevado preço da carne de porco em Macau, ao mesmo tempo que elimina o valor das terras numa cidade faminta de espaço, com uma das maiores densidades populacionais do planeta.

Junta-se uma pitada dos chavões locais, como diversificação económica (faltou a Grande Baía) e está feito.
A teoria é adorável, pura, inocente, faz florir um canteiro. Imagine que o Governo decide dedicar a zona X dos Novos Aterros à pecuária, mais propriamente à criação de porcos. Sim, provavelmente a mais cara pocilga do mundo. Cometendo o risco de bater o recorde mundial da sensualidade impressa, vou citar a empreitada de construção directamente do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-Estruturas, seguido de um breve trecho de prosa dessa bíblia da suinicultura que é a publicação “Vida Rural”. Porque não andamos aqui a brincar.

“A Zona X do Novos Aterros Urbanos ficará localizada” entre coisas, “com uma área de cerca de 320 000 m2”, e destina-se principalmente à zona de instalações públicas e de habitação”. Coisinha para custar mais de 816 milhões de patacas. Imaginem quantos quilos de febras se compram com este balúrdio.

Antes de passar ao Evangelho de São Bácoro, deixem-me informar que sou do Alentejo, a Meca do Porco Preto. Um dos segredos desse mítico e mundialmente apreciado suíno é a sua dieta forte em bolota. Será que alguém vai propor o cultivo de sobreiro, aka chaparro, na zona Y? Nasceria um novo princípio: “Dois Aterros, Um Chavascal”. Fica a sugestão.

Outra questão por responder é como aplacar dois dos mais poderosos lobbies e negócios, não só da região, mas do mundo inteiro, construção e imobiliário, a favor de algo que se pode importar. Não podemos adquirir espaço, terras, ao exterior, uma ideia que escapou aos inúmeros facínoras expansionistas que escreveram a sangue as mais tristes páginas da história mundial. Imagine-se o expansionismo guiada pela fome de costeleta.

E como o prometido é devido, aqui vai a citação do “Vida Rural”: “As porcas, de forma natural, desmamam os leitões e são depois colocadas com os varrascos durante 30 dias. Para os leitões nascerem entre Março e Abril terão de ser colocadas à cobrição entre Novembro e Dezembro”. Ouro vertido em prosa, em doses equivalentes de despropósito e lirismo.

Quase 3000 caracteres vertidos e só ainda vou num tópico. Acho que me entusiasmei. Permita-me a rápida guinada para uma verborreia que a falta de senso levou ao corte editorial. Acredite, caro leitor, a quantidade e qualidade do excremento que ouvimos e lemos é de tal ordem que seria possível erguer um Taj Mahal fecal todas as semanas. Mas esta catedral merdosa merece um lugar de pódio.

Imagine que a pandemia da covid-19 crescia para níveis de filme apocalíptico protagonizado pelo Bruce Willis. Este é o ponto de partida para o impressionismo de Belle Époque deste Claude Merdet, para a fragância do nosso Cócó Chanel. Se Macau vivesse um cenário de grande extinção em massa devido ao coronavírus, com ruas como valas comuns, ou pior, com uma situação económica de incalculável prejuízo para as PME, um dirigente associativo achou no absurdo a solução. Quiçá, um ávido leitor de Albert Camus, pronto para achar significado de vida no despropósito. Este senhor acha boa ideia o Governo substituir os trabalhadores das PMEs por heróis anónimos vestidos com fatos NBQ, aqueles que vimos em desastre nucleares como em Fukushima, vestimenta híbrida entre alienígena e fato espacial. Imaginemos como seria o dia-a-dia de uma loja ou pequeno restaurante, com empregados em fatos hazmat ao estilo “Breaking Bad”, mas com outro tipo de culinária. Onde é que estes estabelecimentos iriam arranjar clientes, e mesmo se existissem, até que ponto do desejo de comprar é superior ao amor à vida? Não lembro de ver roulottes de bifanas, ou lojas de sopa de fitas em Chernobyl. Às tantas, a série documental ocultou esses bravos guerreiros atómicos.

Defecados estes dois montes de fumegantes ideias, acabei também por largar uma flatulência cerebral. Semanalmente, despejar nesta nauseabunda página os grandes êxitos das ideias de merda que, imunes à vergonha, conhecem a luz do dia e transformam o espaço público numa latrina de festival de Verão. Mas talvez isso seja demasiado cruel com o estimado leitor, para a minha sanidade mental e saúde pública da população.

4 Mai 2020

Cartão de Consumo | Subida de preços leva a pedidos de boicote a supermercados

O cartão de consumo levou à corrida ao comércio e ao aumento dos preços. Depois de queixas de consumidores, a Direcção dos Serviços de Economia exigiu a redução dos preços a algumas lojas. Na internet partilham-se listas de estabelecimentos a evitar. Entretanto, sem direito a cartão de consumo, os trabalhadores não residentes são forçados a cortar nas despesas

 

[dropcap]“C[/dropcap]oncordo que devemos boicotar estes supermercados. Para ser honesta, depois de ler notícias sobre a subida de preços, decidi não fazer lá as minhas compras”, desabafa uma agente de seguros de 50 anos de apelido Un. A residente, que falou com o HM carregada com um saco de compras, referiu-se às cadeias Royal e San Miu, dois dos alvos preferenciais da ira dos consumidores, em especial de internautas, na sequência da inflação desde a entrada em funcionamento dos cartões de consumo.

Apesar do aumento do preço dos produtos, a residente não deixa de elogiar a medida do Governo pela “conveniência” que traz. “A pandemia causou grande impacto para as finanças das famílias e do comércio. Estimular o consumo ajuda os dois lados”, comentou à saída de uma loja Sunsco.

Desde a entrada em funcionamento do cartão de consumo, que teve início na passada sexta-feira, o Conselho de Consumidores recebeu centenas de queixas de residentes revoltados com a “oportuna” subida de preços.

Da queixa às autoridades, até à justiça consumista foi um passo curto, dado online. Em diversos grupos de Facebook e no WeChat, as caixas de comentários deram voz à frustração dos consumidores e surgiram sugestões de boicote aos estabelecimentos comerciais que procuraram lucrar com a vaga consumista.

Na sequência do desagrado social, a rede Royal apresentou a sua versão dos factos, o que provocou ainda mais reacções negativas. Num grupo de Facebook, uma residente não poupou palavras ao condenar a empresa. “A explicação da Royal não bate com os factos. A população de Macau vê com os olhos e lembra-se com o coração. Toda a gente sabe o que se passa. Foram estúpidos, sabiam que íamos inspeccionar rigorosamente e ainda ousaram aumentar os preços. É preciso ser parvo para acreditar na desculpa do ajuste de preços.”

Outro internauta atacou a honestidade dos supermercados. “Comerciantes sem escrúpulos. A explicação não fez sentido nenhum, nem terá utilidade, o Governo deve puni-los para evitar que outras lojas façam o mesmo”, sugeriu o residente.

Houve também quem adaptasse o lema da Royal (o supermercado das pessoas de Macau), para “o supermercado que engana as pessoas de Macau”. O internauta acrescentou que “devido à sua desonestidade, toda a população de Macau deve boicotar o Royal”.

Executivo à espreita

Além de fotos e vídeos dos mesmos produtos com preços diferentes, circula na internet uma lista negra com lojas dos grupos Alpha Group e Weng Fong Group, nomeadamente os supermercados Royal, Supreme, Grand Mart, Royal Home e Farmácia Loi Loi.

Apesar do tom agressivo nas redes sociais, o Governo encara o assunto com sobriedade e cautela. Em comunicado, a Direcção dos Serviços de Economia (DSE), frisou que “o Governo da RAEM está muito atento às flutuações dos preços dos produtos no mercado, salientando que o lançamento do cartão de consumo electrónico tem por objectivo inicial a promoção da economia, garantia do emprego e manutenção da vida da população”.

Além disso, a DSE deixa o aviso de que o comércio “tem de assumir as suas responsabilidades sociais e não deve aproveitar a oportunidade para aumentar injustamente os preços”, lembrando que cabe ao sector criar um “bom ambiente de consumo” e “empenhar-se na manutenção da estabilidade dos preços.”

A senhora Ieong, uma reformada de 74 anos, referiu à saída de um Royal que notou uma ligeira subida dos preços. “Vim comprar uma caixa de biscoitos, antes custava 66 patacas e agora é 69 patacas. Isto não é correcto, portanto, devemos boicotar estas lojas”, comentou ao HM. A residente realça que o cartão de consumo é uma grande ajuda, sobretudo desde as limitações para entrar em Zhuhai. “Os idosos, como eu, iam muito a Gongbei comprar carne e legumes, que são lá muito mais baratos. Como não podemos ir agora, o cartão é um apoio importante”, comentou.

Face à avalanche de críticas, o Conselho de Consumidores tem-se multiplicado em apelos ao uso da linha aberta para denúncia (8988 9315, com o serviço de gravação telefónica 24 horas por dia e 6298 0886 no WhatsApp. “Se descobrirem qualquer irregularidade sobre os preços praticados no mercado, os consumidores podem ligar à linha aberta, com a apresentação de fotografias, imagens ou textos, que devem ser completos e precisos para que o acompanhamento seja mais eficaz”, detalharam as autoridades em comunicado.

Aliás, um dirigente do CC, citado pelo canal chinês da TDM – Rádio Macau especificou que capturas de imagens de fontes desconhecidas, e entregues por fontes anónimas”, dificulta o trabalho das autoridades.

Sem rede

Um dos sectores da população mais desfavorecida, os trabalhadores não residentes (TNR), não só ficaram fora das medidas de apoio lançadas pelo Governo, como o cartão de consumo, como ainda têm de suportar a inflação decorrente da corrida consumista.

Erik Lestari, que dirigiu uma organização de representação de trabalhadores migrantes, mas que continua a ser activista da causa, é hoje em dia um dos rostos das redes informais de entreajuda de TNR que sofrem as amarguras económicas agravadas com o lançamento dos cartões de consumo. A empregada doméstica indonésia aponta, com algum humor, que a inflação coincide felizmente com o período do Ramadão, altura em que a maioria dos muçulmanos praticam o jejum ritual. “Este mês é bom, porque estamos a jejuar. Portanto, precisamos de menos comida e bebida”, comenta.

A activista testemunhou a forma como as filas nos supermercados engrossaram a partir de 1 de Maio. “Os trabalhadores migrantes, portadores de blue card e visitantes, estão a enfrentar dificuldades. Muitos de nós não temos trabalho devido à pandemia e agora o que temos a fazer é poupar e partilhar com quem precisa”, apontou ao HM Erik Lestari. Se antes conseguia alimentar-se com uma despesa mensal de 1000 patacas, a empregada doméstica estima que esse orçamento já não seja suportável, em especial devido aos aumentos de produtos como ovos, laticínios e arroz. “Espero que o Governo consiga controlar os preços, não os deixe subir tanto, para que não nos tenhamos de esforçar tanto para fazermos compras.” É o apelo público de Erik Lestari.

Vinda de outras paragens, Filipinas, Jassy Santos deixou ao HM um pedido mais directo ao Executivo de Ho Iat Seng. “Espero que o Governo de Macau nos dê importância”, referiu a representante da Progressive Labor Union of Domestic Workers (Macau). Jassy Santos explica que com a inflação trazida pelo cartão de consumo, não teve outra hipótese a não ser aumentar o orçamento dedicado aos bens essenciais e minimizar as restantes despesas.

Um dos rostos mais conhecidos do activismo pelos direitos dos TNR em Macau, Benedicta Palcon, que lidera a Greens Philippines Migrant Workers Union, destacou o facto de que, independentemente do estatuto junto dos Serviços de Identificação, todos sofrem com os efeitos da pandemia do novo tipo de coronavírus e com a subida dos preços. “Não podemos fazer nada porque o cartão é para os residentes locais. Mas mesmo sem BIR também somos afectados pela pandemia da covid-19. Alguns de nós perderam o emprego, ou ficaram em licença sem vencimento”, comentou ao HM.

Benedicta Palcon, que dedica parte da vida a dar visibilidade a uma das classes sociais mais desfavorecidas do tecido demográfico local, gostava que o Governo não pensasse só nos residentes, mas também nos outros trabalhadores que contribuem para a sociedade de Macau. Além da desigualdade de tratamento no acesso a apoios, a activista só sente igualdade nas amarguras. “O aumento dos preços vai-nos afectar muito porque também compramos o que precisamos para as nossas necessidades diárias nos supermercados.”

Entre Maio, Junho e Julho cada residente de Macau tem direito a três mil patacas para gastar no comércio local. Ainda este ano, a partir de Agosto cada residente vai beneficiar ainda de mais cinco mil patacas.

Real desculpa

Face às críticas e ameaças de boicote, uma representante do grupo de supermercados Royal ligou no passado sábado para o jornal Ou Mun para explicar a mudança de preços e as fotos que circulam nas redes sociais com fotografias de etiquetas de preços diferentes para o mesmo produto. A representante referiu que o supermercado faz mensalmente duas campanhas promocionais, no início do mês e no dia 16. Como tal, no dia antes de 1 de Maio, devido à nova campanha de descontos, alguns preços baixaram, enquanto os que tinham sido abrangidos pelas promoções na campanha anterior voltaram ao seu preço inicial, ou seja, ficaram mais caros. A representante adiantou ainda compreender como essa situação levou à confusão dos consumidores, mas não explicou porque só foram divulgadas imagens de produtos que ficaram mais caros.

4 Mai 2020

China Plaza | Falha de energia afectou serviços públicos

[dropcap]V[/dropcap]ários serviços públicos situados no China Plaza foram ontem suspensos temporariamente devido a uma falha de energia. De acordo com a Companhia de Electricidade de Macau (CEM), “pelas 11h04, uma falha no posto de transformação de média tensão do Edf. China Plaza causou um disparo, resultando na falha de energia na zona centro”.

A CEM enviou para o local o piquete de emergência para restabelecer a energia, que viria a ser reposta para a maioria dos clientes às 11h38 e totalmente recuperada às 13h12.

Quanto aos utentes dos Serviços de Identificação com atendimento marcado para o período em que faltou a electricidade, a entidade pública assegurou que podem voltar hoje, a qualquer hora, ou marcar hora de atendimento por telefone, adiantou o canal chinês da TDM – Rádio Macau.

Devido ao corte de energia, as pessoas que esperavam para serem atendidas foram evacuadas do edifício, com 893 clientes dos serviços públicos a serem afectados e, segundo a TDM – Rádio Macau, três pessoas a ficarem presas num elevador. Não se registaram feridos e a CEM garantiu que a causa do incidente está a ser investigada.

29 Abr 2020

Turismo | Serviços dão formação na Índia sobre atracções de Macau

A pensar no levantamento das restrições de viagem, a Direcção dos Serviços de Turismo está a formar parceiros na Índia para dar a conhecer e divulgar os produtos de Macau

 

[dropcap]O[/dropcap] departamento da Direcção dos Serviços de Turismo (DST) na Índia está a formar parceiros de viagens sobre as atracções turísticas do território, através de plataformas online. Em resposta ao HM, o organismo explicou que o surto da covid-19 é um contratempo para a indústria das viagens, mas que acredita que “os destinos que se mantêm visíveis e relevantes nestes tempos de incerteza vão ser os primeiros a recuperar e a atrair turistas indianos”.

Foram desenvolvidos programas de aprendizagem electrónica, troca de mensagens e formações online para dar informações no âmbito do comércio das viagens sobre as várias facetas de Macau. O objectivo é ajudar a que os agentes de viagens compreendam melhor o destino e promovam a RAEM junto dos viajantes já a pensar no fim das restrições de mobilidade. O departamento na Índia já fez formações com agências como a Thomas Cook, Make My Trip e outras de menor dimensão. Mais de 1400 profissionais de viagens foram formados na Índia durante o período de isolamento.

Mercado apetecível

No entender da DST, a Índia está entre os mercados de visitantes internacionais de Macau com “maior potencial” para a cidade expandir a diversidade dos mercados de origem dos visitantes internacionais e o período de estadia dos visitantes em Macau. No ano passado, vieram ao território mais de 127 mil visitantes indianos, com 75 por cento a passarem a noite na cidade.

Em 2019, foi feito um estudo sobre o mercado de visitantes indiano, nomeadamente sobre o seu comportamento em Macau. Os resultados revelaram que 85 por cento das pessoas visitaram Macau pela primeira vez, e mais de metade ficou durante três dias e duas noites. Além disso, 71 por cento dos inquiridos expressou interesse em regressar, enquanto 96 por cento declarou que vai recomendar o destino a outras pessoas.

29 Abr 2020

Cabecilha de gangue de assaltantes nos anos 90 transferido para Macau

Passado mais de um quarto de século, o cabecilha responsável por quatro assaltos à mão armada, entre 1991 e 1994, regressou a Macau depois de cumprir pena no Interior. O homem, detido em Coloane, aguarda julgamento pelo roubo de um táxi e auxílio e acolhimento de imigrantes ilegais

 

[dropcap]O[/dropcap] cabecilha de um grupo criminoso que espalhou o terror em Macau entre 1991 e 1994, numa vaga de assaltos à mão armada, foi ontem transferido para a RAEM depois de cumprir pena no Interior da China.

O indivíduo, residente de Macau, com 55 anos, de apelido Mak, era o responsável pela compra de armas, por escolher os locais e planear os assaltos.

No currículo local, Mak tem quatro crimes, que se conheça. O primeiro ocorreu em 29 de Janeiro de 1991, quando liderou uma equipa de cinco homens no assalto a um banco na Taipa, que rendeu ao gangue 170 mil patacas.

Passado pouco mais de três meses, a 5 de Maio de 1991, de novo cinco homens assaltaram uma sala de jogo no antigo Casino Lisboa, levando fichas e dinheiro num montante total de 5,46 milhões de patacas. O grupo tomou-lhe o gosto e a 26 de Novembro, pouco mais de meio ano depois, voltou a assaltar a mesma sala de jogo, desta feita levando 3,4 milhões de patacas em fichas e numerário.

Depois deste último golpe, as autoridades não têm registo de mais crimes violentos praticados por Mak, nem o HM conseguiu apurar junto da Polícia Judiciária (PJ), se o residente terá saído do território. Porém, em Maio de 1994 voltaria ao radar das autoridades policiais depois de liderar um grupo de dez homens no assalto a um casino na Taipa.

Assalto nas ilhas

No dia 11 de Maio de 1994, o alvo de Mak foi o casino do Hyatt Regency Macau, que actualmente tem no nome Regency Art Hotel Macau. Segundo uma notícia da RTP da época, às 3h23 da manhã, seis homens mascarados e armados com metralhadoras AK-47 e pistolas roubaram cerca de 30 milhões de patacas. Ontem, a PJ corrigiu a quantia para 34 milhões de patacas.

No decurso do assalto, foram disparados oito tiros para o ar e, sob coacção das armas, os funcionários do casino foram obrigados a abrir os cofres. Não se registaram feridos, mas dois jogadores desmaiaram com a comoção.

Durante a fuga, os assaltantes deixaram cair no chão quase um milhão de patacas, e escaparam para Coloane num táxi roubado. Mais tarde, o dono do táxi foi encontrado amarrado numa mata. Os assaltantes, que há altura se presumia terem fugido para o Interior da China, abandonaram o carro, onde deixaram armas e um engenho explosivo que não foi detonado.

Mak viria a ser detido na China onde foi condenado a pena de morte pelos crimes de assalto à mão armada e posse ilegal de armas, pena que viria a ser posteriormente atenuada. O residente cumpriu a sanção até ontem no Interior, antes de ser transferido de volta para Macau para ser julgado pelos crimes do roubo do táxi, auxílio à imigração clandestina e acolhimento de imigrantes ilegais, seus cúmplices nos assaltos.

Os crimes não prescreveram, apesar de terem ocorrido há mais de 25 anos, porque os prazos para tal não correm durante o período em que o arguido cumpre pena noutra jurisdição.

Mak arrisca-se a ser condenado pela justiça de Macau a uma pena entre 3 a 15 anos se for provado que no roubo do táxi foram usadas armas de fogo, entre dois e oito anos por auxílio à imigração ilegal e até dois anos de cadeia se for condenado pelo crime de acolhimento.

O arguido encontra-se detido no estabelecimento prisional de Coloane a aguardar julgamento. O jornal Exmoo avança que três outros indivíduos envolvidos na vaga de crimes foram transferidos para Macau para serem julgados pela justiça da RAEM.

28 Abr 2020

Liberdade

[dropcap]L[/dropcap]iberdade, a derradeira fronteira das almas irrequietas, dos poetas, dos líricos que perdem as estribeiras nas extremidades da vida. Liberdade, quimera que nunca se consegue conquistar totalmente, amante exigente, jamais saciada, triunfo que precisa de defesa permanente, impossível de vencer, romance para sempre inacabado. Ânsia, fome, desejo de um dia poder voar.

Liberdade, eterno campo de batalha entre a autonomia e a servidão, punhal pronto para ser enterrado no flanco da injustiça e da iniquidade, pureza que atrai conluios nos espaços onde a subjugação cresce e a ganância conspira.

Tão natural como o fluir de um rio sem barragens até à foz da felicidade, Tejo imenso que “corre, bem ou mal, sem edição original”. Parte integrante e essencial de tudo o que tem pulso. Fatal, inescapável, que vem sempre à tona, com a candura e a inocência de uma criança que agarra o diabo pelos colarinhos, sem se aperceber da besta que domina.

Liberdade, irmã gémea da Responsabilidade, chave e fechadura, sal e pimenta que condimenta a existência. Agir livremente implica ser responsável pelos acções tomadas em Liberdade, legitima a escolha feita. Não é um preço que se paga, nem uma obrigação que castra os seres livres, mas uma qualidade do raciocínio, um privilégio daqueles que vivem a sério. Este determinismo primordial separa os homens dos bichos, confere humanidade por mais violenta que seja a nossa natureza.

Não sou nenhum santo, longe disso. Assumo os meus namoriscos ardentes com a libertinagem, sem vergonha nem culpa de pecador arrependido. Tento guardá-la para mim, acomodá-la num cofre debochado, longe dos olhares alheios, não por receio de julgamentos moralistas, porque não reconheço autoridade a puritanos com segredos ocultos em infectos armários, mas por puro recato e privacidade.

Gosto do sangue rápido, dos largos prazeres que só a Liberdade é capaz de albergar. Seria uma flor descolorida e murcha se plantada num canteiro absolutista, com os meus espinhos a cobiçarem a carne tenra dos tiranos, a morte desses faustosos césares inchados de usurpação. Botânica homicida a florir em chaga nos tecidos adiposos dos tiranetes. Putas que os pariram até à última geração.

Nas minhas veias corre revolução, dinamite e estricnina. Nunca durmo, nunca descanso enquanto na penumbra crescer esse bolor do fascismo. As paredes da casa da Liberdade já estiveram mais brancas, mas também já foram tão negras que se confundiam com a morte.

Se das minhas forças depender, não há justificação possível que me impeça de lutar pela Liberdade dos meus irmãos e irmãs. Jamais passará. É inconcebível o regresso da opressão, do cárcere, da barbárie da tortura e do homicídio de Estado para punir o delito de pensamento. Jamais um livro numa estante determinará a morte de alguém, jamais se perseguirá com a força do Estado quem pensa diferente, quem discorda, quem ama diferente, quem nasceu com outra tonalidade de pé. Jamais o povo será votado à indigência, escravo da esmola, “desbravando os caminhos do pão”.

Enquanto tiver forças, não posso deixar um irmão perecer às mãos do prepotente carrasco, não posso permitir a relativização bacoca do palhaço que escarnece do que é mais sagrado em nós.

Essa doença não pode voltar, terá de prevalecer a inoculação contra o fascismo, mesmo que disfarçado com um social por trás e um fingindo punho erguido. Um pássaro que ganhou a Liberdade, em momento algum desejará uma gaiola diferente, pois o céu é a sua morada natural.

E quando os meus olhos se fecharem, sei que terei o diabo na mão e um sorriso nos lábios gretados, como qualquer bom filho de Grândola, terra que me honra todos os dias.
25 de Abril Sempre. Fascismo nunca mais!

27 Abr 2020

Quase dois terços dos pedidos de apoios a PME foram aprovados

[dropcap]E[/dropcap]ntre 1 de Fevereiro e 24 de Abril, foram entregues 9.716 pedidos aos apoios destinados a pequenas e médias empresas (PME), dos quais 6.160 foram aprovados, de acordo com dados divulgados ontem pela Direcção dos Serviços de Economia (DSE). As aprovações representam quase dois terços dos pedidos efectuados, ou quase 63 por cento.

O mesmo comunicado realça o relaxamento provisório dos requisitos de candidatura, que passaram a incluir PME “que exerçam actividade há pelo menos um ano” na lista de empresas que podem tentar os apoios. Anteriormente, era pedido pelo menos dois anos de actividade.

O prazo para tratar das formalidades e receber as ajudas financeiras estende-se até 10 de Setembro.
O montante máximo da verba de apoio está fixado em 600 mil patacas, sem juros, que poderá ser restituído num prazo máximo de oito anos. Recorde-se que esta forma de apoiar o tecido empresarial foi implementada pela primeira vez para aliviar o impacto da SARS, em Maio de 2003.

Quanto ao plano de bonificação de juros de créditos bancários, segundo a DSE, até 24 de Abril foram recebidos 2.506 pedidos, dos quais 1.790 foram aprovados.

Importa recordar que “uma vez autorizado pelo banco o crédito no montante máximo de 2 milhões de patacas”, as PME podem obter “bonificação de juros até 4 por cento, com o prazo máximo de bonificação de 3 anos. O prazo de implementação deste apoio termina a 17 de Setembro.

Auxílios vários

Outra das estratégias para minorar o impacto da crise no tecido empresarial local é medida de ajustamento de reembolso, destinado às PME que tenham pedido anteriormente empréstimo no âmbito dos diversos planos de apoio, como por exemplo, o plano de apoio a jovens empreendedores e o plano de apoio especial às PME afectadas pelo tufão Hato.

Segundo a DSE, entre 1 de Fevereiro e 24 de Abril, foram recebidos um total de 1.956 pedidos de “ajustamento de reembolso”, dos quais 1.898 foram aprovados.

Há cerca de três semanas, o Governo anunciou que iria apoiar financeiramente empresas a fundo perdido entre 15 mil e 200 mil patacas.

27 Abr 2020

Reacção à reacção

[dropcap]E[/dropcap]sta coluna é hoje a celebração da liberdade de pensamento e da convivência com o contraditório, algo só possível quando o espírito democrático prevalece. O tópico é a controvérsia facebookiana, que extravasou para a política portuguesa, sobre a celebração do 25 de Abril na Assembleia da República (AR). A própria polémica justifica a necessidade permanente de assinalar o dia. Não vou comentar as teorias dos poleiros, não só eles já existiam antes (e em abundância e magnitude típicas do corporativismo familiar fascista), como não foram consequência da revolução. Sem correlação, quanto mais casualidade.

A oposição às celebrações não tem justificações de saúde pública. Além da sessão se circunscrever ao hemiciclo, respeitando as directrizes da DGS, sem manifestações públicas de massas, nunca antes estas vozes se levantaram para criticar o mau exemplo que a AR tem dado ao manter o funcionamento. Só agora é uma selectiva questão de saúde pública, que procura uma excepção ao que tem acontecido, perante o silêncio de todos. A polémica tresanda a político e não é coincidência que venha de quem desdenha do 25 de Abril, nem é mero acaso que quem apoia a abertura de excepção não esconda o saudosismo à ditadura.

Abel Matos Santos demitiu-se da direcção do CDS depois de virem a lume declarações suas de amor a Salazar e à PIDE. O problema é que o seu pensamento era conhecido dentro do partido, como foi admitido, e ainda assim não só permaneceu no CDS como integrou a direcção. Sobre o Chega, não preciso mencionar os neonazis que recheiam os quadros sociais do projecto de André Ventura. Este é o tipo de pessoas que elenca razões de saúde pública para cancelar as celebrações de um dia que desprezam. Topam-se à distância.

23 Abr 2020

Detidas 12 pessoas por fraude com vales de saúde

[dropcap]A[/dropcap]s autoridades policiais desmantelaram uma rede complexa que se dedicava à fraude com vales de saúde, que rendeu 9 milhões de patacas, desde Maio do ano passado. No total, foram detidas 12 pessoas, num esquema que envolveu o uso de documentos de identificação de mais de 11 mil residentes.

O caso tem como epicentro uma clínica médica na Areia Preta e duas lojas situadas no bairro do Iao Hon, uma de produtos de medicina tradicional chinesa e outra de mariscos secos.

As autoridades começaram por suspeitar da clínica devido ao grande volume de vales de saúde usados no ano passado, em particular um dia em que deram entrada no sistema 27 vales numa hora. A investigação levou às lojas no Iao Hon e à suspeita de que mais de 11 mil pessoas cederam os seus BIR para a aquisição de vales. Para já, de acordo com o canal chinês da TDM – Rádio Macau, as autoridades não descartam a hipótese de investigar quem cedeu a identificação com dolo criminal.

A loja de produtos secos e o estabelecimento de produtos de medicina tradicional chinesa recolhiam a identificação de residentes, incluindo cliente que muitas vezes usam este método para pagar compras, e de seguida adquiriam vales de saúde que eram usados na clínica da Areia Preta.

De acordo com as autoridades, é presumido que o médico depois de receber o vale de saúde reembolsava os lojistas com 70 por cento do valor e que, no total, terá assim apurado 1,8 milhões de patacas.

22 Abr 2020

Marido tentou disfarçar homicídio da mulher com assalto

Mudanças do cenário do crime apontam para a possibilidade de o suspeito confesso do homicídio que ocorreu no passado domingo ter tentado suscitar a hipótese de a esposa ter sido atacada na sequência de um assalto. O homem vai ser acusado de homicídio da mulher

 

[dropcap]A[/dropcap]ntes de regressar ao trabalho, Lee, residente de Macau, teve o sangue frio para limpar o cenário sangrento resultante do homicídio da sua esposa antes de se apresentar no local de trabalho, onde desempenha funções de vigilante. O crime ocorreu no passado domingo, no 8º andar do Bloco 11 do Edifício Kwong Wa, situado na esquina da Avenida de Venceslau de Morais com a Avenida do Nordeste.

A Polícia Judiciária (PJ) apresentou ontem, em conferência de imprensa, alguns detalhes do macabro crime e não afasta a possibilidade de Lee ter tentado disfarçar o homicídio com um assalto. Para tal, contribuem os factos de o vigilante, de 67 anos, ter retirado da carteira da esposa 2 mil patacas, que escondeu num canto do roupeiro “para fazer parecer que a morte resultara de um assalto”, apontou a PJ ao HM.

Além disso, o homem limpou manchas de sangue, mudou a roupa da esposa e descartou-se do vestuário ensanguentado. Depois da sessão de limpezas, saiu para o trabalho e só regressou a casa no dia seguinte às 6h da manhã.

Caderneta e jogo

Quando voltou ao apartamento na zona norte da península, Lee acabou por ligar para os bombeiros que acorreram ao local acompanhados pela polícia. O corpo da mulher foi descoberto na cozinha, com a cabeça coberta com um pano. Questionado pelas autoridades no local, o suspeito confessou ter assassinado a mulher depois do jantar devido a problemas financeiros.

Segundo informação facultada pela PJ, Lee terá pedido dinheiro e a caderneta bancária à mulher. A vítima recusou a solicitação do marido e atacou-o com “pauzinhos”, acto que provocou a ira de Lee que a agrediu na cabeça, repetidamente, com um banco.

A investigação forense aponta para numerosas feridas na cabeça da vítima, causadas por um objecto contundente, e para hematomas nos pulsos, que apontam para um cenário de luta.

Em declarações às autoridades, o homem admitiu gostar de jogar nos casinos, apesar de não ser claro que esse tenha sido o motivo do crime. Lee será acusado de homicídio, crime com moldura penal entre 10 e 20 anos de prisão.

22 Abr 2020

Ambiente | 2019 foi o ano de maior calor desde que existem registos

O ano passado registou a temperatura média mais elevada, 23,6ºC, desde que Macau começou a recolher estes dados. Comparada com 2018, a temperatura média de 2019 subiu 0,8ºC. A insalubridade do ar também afectou no ano passado o território em mais dias do que em 2018, com mais 41 dias irrespiráveis

 

[dropcap]M[/dropcap]acau está cada vez mais quente. O ano passado registou a mais elevada temperatura média, 23,6ºC, desde que se iniciou a anotação destes dados, em 1952, o que representou uma subida de 0,8ºC face a 2018. A conclusão abre o relatório das Estatísticas do Ambiente, divulgado ontem pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC).

Os meses de Julho e Agosto foram os mais quentes, com temperatura máxima de 35,7ºC, um pico que foi ligeiramente inferior (0,1ºC) ao registado no ano passado. No outro lado do espectro, Janeiro teve a temperatura mínima mais baixa, com 8,4ºC, ainda assim 3,8ºC mais quente do que em 2018.

Outro recorde desde o início dos registos verificou-se na quantidade de dias frios, que no ano passado foram apenas 12. As Estatísticas do Ambiente consideram dias frios aqueles em que se registem temperaturas mínimas diárias inferior ou igual a 12ºC.

A chuva e sol, dois parâmetros aparentemente antagónicos, também aumentaram no ano passado, em comparação com 2018. “Quanto à insolação, observou-se um total de 1.791,6 horas, mais 47,2 horas, em termos anuais”, uma subida de quase dois dias inteiros de sol, com Novembro a bater o recorde anual.

Quanto à precipitação, 2019 teve mais 14 dias de chuva em relação ao ano anterior. A precipitação total atingiu 2.248mm, um aumento de 452,4mm em relação a 2018, ou seja, choveu 25 por cento mais de um ano para o outro.

O ar que respiramos

As Estatísticas do Ambiente destacam ainda a ocorrência de cinco tempestades tropicais em 2019 com destaque para a que obrigou as autoridades a içar do sinal nº8: o ciclone tropical Wipha, que passou pelo território no dia 31 de Julho. A rajada máxima da tempestade atingiu os 100,1 quilómetros por hora e a velocidade média do vento, durante 10 minutos, alcançou 67,3 quilómetros por hora.

Mais de quatro dezenas de dias com ar insalubre, quase um mês e meio, em 2019 é outro dos números que salta à vista nas Estatísticas do Ambiente,

As estações de monitorização com os piores resultados verificaram-se nas estações da estrada de Ká-Hó e na estação ambiental da Taipa, ambas 41 dias insalubres, respectivamente mais 29 e 12 dias do que em 2018.

Por outro lado, “quanto aos dias com ar bom, o número mais elevado de dias verificou-se na estação de alta densidade habitacional da Taipa, alcançando 249 dias”, lê-se no documento. Importa referir que o ozono foi o principal poluente atmosférico em Macau durante 2019.

O ano passado foi também marcado pelo maior consumo de água, com um total de 92.815.000 m3, mais 2,1 por cento em termos anuais. Os organismos públicos foram os responsáveis pelo maior aumento do consumo de água (2,8 por cento), seguido pelo consumo doméstico (2,3 por cento) e consumo do comércio e indústria (1,8 por cento)

Outro dado preocupante em termos de ambiente e saúde pública é o aumento da densidade populacional, que passou das 20.000 pessoas por km2 em 2018, para 20.400 por km2 no ano passado.

21 Abr 2020

Governo vai distribuir máscaras infantis nas admissões das creches

Com o regresso às aulas ao virar da esquina, a DSEJ anunciou que vai distribuir máscaras infantis para crianças do registo central com vista ao início das entrevistas de admissão para as creches, que arrancam em Maio. Ontem, foram também anunciadas mais duas baixas hospitalares

 

[dropcap]D[/dropcap]epois da inscrição é só levantar. A simplicidade foi a toada da apresentação do plano de máscaras para crianças do registo central, apresentado ontem por Wong Ka Ki, representante da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ), durante a conferência de imprensa diária dedicada ao acompanhamento da pandemia do novo tipo de coronavírus. “Cada criança pode ter seis máscaras”, especificou o responsável ao enquadrar a medida que pretende tornar mais seguras as entrevistas para admissão em creches, que têm data marcada para 2 de Maio.

O prazo de inscrição para ter direito às máscaras infantis é curto. Começa hoje às 10h e termina amanhã, quarta-feira, às 23h59. Os interessados têm de visitar a página de internet da DSEJ e inserir o bilhete de identidade da criança, o código de verificação do registo central, número de telemóvel e escolher uma data, hora e local para o levantamento das máscaras. No final do processo, será enviada uma SMS, no prazo de 24 horas, para o número de telemóvel indicado, que servirá para levantar as máscaras.

Munidos com o BIR das crianças e código de levantamento, os encarregados de educação têm cinco locais para levantar as máscaras, entre os dias 25 e 29 de Abril. A saber, os locais são o escritório da deputada Wong Kit Cheng, a Creche da Associação das Mulheres de Macau, a Escola da Associação Geral das Mulheres de Macau, o Centro de Apoio Familiar da Associação das Mulheres de Macau e o Centro de Apoio à Família “Alegria em Abundância”, da mesma associação.

Venham mais duas

Ontem assinalaram-se 12 dias consecutivos sem novos diagnósticos de infecção do novo tipo de coronavírus em Macau. Lo Iek Long, médico-adjunto da direcção do Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ), deu conta ontem de duas altas hospitalares referentes a domingo. Os pacientes foram ontem enviados para o Centro Clínico de Saúde Pública de Coloane para o período de isolamento da praxe de 14 dias. De momento, permanecem internados 23 doentes, todos com sintomas ligeiros e sem dificuldades respiratórias, enquanto que todos os indivíduos considerados de contacto próximo concluíram o período de isolamento.

Um dos doentes com alta é uma jovem residente de 19 anos, que estuda no Reino Unido. No passado dia 15 de Março, chegou do Reino Unido a Hong Kong via Singapura e entrou em Macau no dia seguinte num veículo fretado.
A jovem teria pela frente um período obrigatório de observação domiciliária, mas como deu positivo no teste de ácido nucleico foi internada na enfermaria de isolamento no dia 18 de Março. Após 34 dias de internamento e dois testes de ácido nucleico negativos, a estudante foi transferida para Coloane.

O outro paciente que teve alta hospitalar é um jovem residente de 21 anos, que estuda em Londres. A 22 de Março, o estudante partiu de Londres com destino a Hong Kong. No dia seguinte, chegou a Macau num autocarro dourado e à chegada ao posto fronteiriço de Macau da Ponte HKZM queixou-se de febre e dores de cabeça. Após o teste positivo, o jovem esteve internado durante 29 dias, até ter alta. Ontem foi encaminhado para o Centro Clínico de Saúde Pública de Coloane.

21 Abr 2020

A segunda vaga

[dropcap]M[/dropcap]odelos, referências e padrões são trunfos da neurociência e psicologia comportamental que são jogados com displicência nos dias que correm. A repetição de algo que conhecemos, o paradigma habitual, representam conforto e segurança face ao imprevisto de novos contextos. Mesmo que o comportamento seja destrutivo, se fizer parte de um padrão a que estamos habituados é racionalizado como seguro.

Por vezes, uma abrupta alteração de circunstâncias transforma o normal comportamento padronizado num perigo, principalmente quando a vida se transforma numa excepção.

Neste momento, seja por medo ou cansaço, o mundo inteiro anseia pelo regresso à normalidade. Todos desejam voltar a sair sem receios, viver como antes, sem restrições, saltitar de nenúfar em nenúfar com a leveza de um anjo. Negócios querem voltar aos lucros, as famílias aspiram à reunião, os rios querem vazar na foz.
Queremos o retorno da inocência do contacto próximo. Mas será que a retoma dos dias previsíveis se pode fazer nos mesmos moldes? Ou teremos de inventar uma nova normalidade?

Em Macau, o novo normal implica máscara, desinfectante e disciplina de não ceder à sedução inebriante do lucro. Recordo que em Macau, até agora, ninguém morreu deste bicho, apesar de ser uma das regiões com maior densidade populacional a braços com um vírus altamente contagioso e que se camufla assintomaticamente. Ainda assim, a grande indústria do território permanece seca, sem matéria-prima (jogadores ou turistas, como lhe quiserem chamar). De resto, os locais continuam a encher restaurantes, mercados, trilhos na natureza e a cara destapada passou a ser uma vergonha social e um avistamento aberrante.

Dou este contexto para alertar o resto do mundo que anseia o retorno aos dias que já lá vão, quando ainda lidam com surtos comunitários. Compreendo que seja mais fácil depender informativamente de memes, ancorados em bodes expiatórios e relativização, mas a microbiologia não atende a caprichos pessoais, inclinação política e não existe vacina contra a realidade e a estupidez. Parece cada vez mais evidente cientificamente, que a infecção pode voltar a quem já recuperou da covid-19. Pela vossa e nossa saúde, tenham isso em consideração.

Uma segunda vaga nunca é boa notícia. Como a segunda onda de tsunami, ou a cauda de um tufão. A primeira vaga rebenta tudo enquanto a segunda transforma destroços em aladas armas mortíferas. A segunda vaga de covid-19 pode ser o coup de grâce, o golpe final, em sistemas de saúde altamente debilitados. Sem vacina ou cura à vista, o retorno da curva à sinuosidade que se queria achatada pode ser trágica.

Na perspectiva mais míope e economicista, uma segunda vaga significa paralisação ainda mais prolongada, se não tivermos apenas como intenção a breve satisfação de um orgasmo de pico bolsista.

Hokkaido, no Japão, e Daegu na Coreia do Sul também se fartaram da disciplina e decidiram reabrir as portas de casa à normalidade. Por arrasto veio a segunda vaga. Claro que o Ocidente ainda pensa que a Ásia é outro planeta, algures entre Marte e Júpiter, e vai, outra vez, ignorar os avisos da experiência.

As duas cidades responderam de forma diferente à segunda onda. Daegu apercebeu-se do erro e iniciou testes em larga escala, isolou pessoas que contactaram infectados e voltou à quarentena. Hokkaido fez exactamente o contrário, o que resultou numa vertiginosa subida de infecções, que implica a paralisação total da ilha.

Compreendo o desejo fantasioso de quem quer tratar a realidade como um pesadelo do qual se pode acordar. Mas, a menos que se queira voltar à estaca zero, é fundamental controlar os surtos comunitários antes de ambicionar qualquer regresso à normalidade como a conhecíamos. Ou querem voltar à animalesca equação entre o valor da vida e o valor do dólar?

Se tiveres sequer uma centelha de dúvida sobre o que é mais valioso, faz um favor à decência e nunca mais voltes a pôr os pés numa igreja, a intitulares-te como pró-vida, ser humano ou pessoa de bem.
A pandemia colocou-nos num barco muito precário. Infelizmente, muitos, os do costume, vão passar por enormes problemas económicos e sociais, o pão vai faltar. Mas é aqui que se torna fundamental ter um Estado, um Governo.

Lamento libertários, o lucro jamais terá esta incumbência de tábua de salvação, a indústria nunca terá a vida como prioridade e não são raros os casos em que a morte é a base do rendimento, a perfídia a estrela do norte que guia o cifrão.

Se me permitem o descaramento, peço um momento de reflexão. Querem mesmo voltar à estaca zero e deitar por terra todos os esforços e sacrifícios que fizeram? Quanto custará ao mundo a vossa petulante teimosia?

20 Abr 2020

Medo do escuro

[dropcap]D[/dropcap]epois de alguns minutos, quando a vista se adapta à escuridão, começam a emergir formas e contornos cada vez mais nítidos. No entanto, por vezes no breu abrigam-se segredos alérgicos a olhos de terceiros, mas que são demasiado evidentes para não se enxergarem à vista desarmada. A situação das empresas de capitais públicos de Macau é uma vergonha para todas as estruturas de poder.

Por muito que se escondam milhares de milhões de patacas na Ilha da Montanha, que se repitam mantras de Grandes Baías e cooperação regional, a absoluta recusa em apresentar, até aos deputados, as contas destas empresas levanta suspeitas gravíssimas que precisam ser resolvidas. Comem-se bolos inteiros em três fatias, compra-se o silêncio da populaça com algumas migalhas, e a banda segue tocando alegremente a música da razoabilidade financeira, enquanto se reza que Pequim não adapte a visão ao escuro.

É também incrível a passividade dos deputados, que parecem tímidos demais para exercer na única tarefa que lhes compete (fiscalizar o Governo), já que abdicaram de legislar. No escuro, sucessivos Governos esticam até ao limite da interpretação mais extensiva uma lei para justificar que as empresas de capitais públicos não devem prestar contas a ninguém.

A palavra dos dirigentes basta. Isto é o primado do poder absoluto sobre a lei, a permissividade a atracar nas docas da pilhagem, o descaramento usado como argumento jurídico. E nada se passa. Pelos vistos, a coisa pública não é do domínio público, pertence à jurisdição do mistério e do oculto.

17 Abr 2020

Governo suspende futuras injecções em empresas de capitais públicos

[dropcap]C[/dropcap]om a excepção de despesas já orçamentadas, o Governo vai suspender injecções de dinheiro nas empresas de capitais públicos, revelou o deputado Mak Soi Kun depois da reunião da Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Finanças Públicas, a que preside.

“Os investimentos que já foram efectuados vão continuar a ser desenvolvidos, mas a partir deste ano o Executivo vai suspender injecções de capitais”, porque entendeu que deve “haver um reajustamento das políticas de investimento público devido à situação de crise económica”, explicou o deputado.

Hoje em dia, a RAEM tem 22 empresas de capitais públicos constituídas, com capitais sociais que rondam os 13 mil milhões de patacas. Ontem a discussão entre deputados e Governo teve como protagonista a estrela da companhia, a Macau Investimento e Desenvolvimento S.A. (MID), uma empresa pública constituída em 2011. A empresa de capitais públicos é responsável por uma série de investimentos em Hengqin, como o Parque Científico e Industrial de Medicina Tradicional Chinesa e a Incubadora de Empresas Científicas e Tecnológicas, e até agora recebeu 9,2 mil milhões de patacas do erário público.

Mak Soi Kun revelou ainda que o Gabinete para o Planeamento da Supervisão dos Activos Públicos, liderado por Sónia Chan, deveria emitir directrizes para que as empresas com mais de 50 por cento de capitais públicos revelem as suas contas. O processo não avançou porque, entretanto, todos os esforços se centraram no combate ao novo tipo de coronavírus.

A questão adensa-se uma vez que a partir da empresa mãe foram constituídas três filiais, e destas surgiram 17 subfiliais. Apesar de os deputados que acompanham as finanças públicas terem pedido informação financeira completa tanto sobre a empresa-mãe, como pelas filiais, estas não foram concedidas.

Importa explicar que a razão de ser desta complicada árvore genealógica empresarial, como Mak Soi Kun lhe chamou, foi facilitar os diferentes projectos a serem desenvolvidos num lote de terreno na Ilha da Montanha. Cada filial terá por sua conta uma parcela de terreno.

Porém, face ao volume do investimento público, os deputados quiseram aferir da eficiência financeira e social das empresas. “Não vimos critérios quantificáveis sobre a eficiência social conseguida por essas empresas”, disse o presidente da comissão.

Fundos perdidos

Desde a sua criação, a Macau Investimento e Desenvolvimento S.A. nunca teve lucro, encerrando o ano passado com um prejuízo de perto de 41,3 milhões de patacas. Entre 2011 e 2016, os prejuízos somados rondaram os 25 milhões de patacas. Todos estes valores não foram detalhados e constam apenas de um balanço integrado.

Nos anos de 2017 e 2018, os dados revelados pela comissão mostram lucros de 266 e 119 milhões de patacas, com a ressalva de que estes números foram apurados a partir da valorização do terreno. Não foram referidos que critérios foram utilizados ou quem procedeu a esta avaliação.

Até agora, o Governo tem-se escudado no Código Comercial para não revelar as contas destas empresas, argumento que não colhe junto dos legisladores. “Consultámos a opinião da nossa assessoria jurídica que nos disse que não há nenhuma norma jurídica que obste ao Governo a prestação de informações dessas empresas de capitais públicos. A nosso ver, a Assembleia Legislativa é parte integrante do sistema político da RAEM, temos nas nossas competências a fiscalização”, afirmou Mak Soi Kun.

16 Abr 2020

Ho Iat Seng destaca “Um País” e agradece empenho de residentes durante pandemia

Durante o discurso do Dia da Educação da Segurança Nacional, Ho Iat Seng referiu que a defesa da segurança do Estado é um “dever sagrado” de Macau. Além disso, o Chefe do Executivo agradeceu o empenho dos residentes e da China no apoio ao combate ao novo tipo de coronavírus, não deixando de advertir que a crise ainda não acabou

 

[dropcap]“A[/dropcap] defesa da segurança nacional é um dever sagrado e uma responsabilidade devida por parte da RAEM e de todos os residentes de Macau.” Esta foi uma das frases marcantes do discurso de Ho Iat Seng, proferidas ontem no âmbito do Dia da Educação da Segurança Nacional. O Chefe do Executivo alertou que, apesar de a China se encontrar num “período ideal de desenvolvimento”, enfrenta ameaças e riscos imprevisíveis e que o bem-estar da população e o desenvolvimento sustentável de Macau “só serão garantidos quando a segurança do Estado for sustentada de forma abrangente e mais cuidadosa”.

Em vésperas da apresentação das primeiras Linhas de Acção Governativa, Ho Iat Seng sublinhou a importância da pátria para o desenvolvimento de Macau e do princípio “Um País, Dois Sistemas”. Nesse aspecto, realçou que é preciso ter “sempre presente que “Um País” é a pré-condição e a base dos “Dois Sistemas”.

Reflectindo a actual crise global causada pela covid-19 na segurança do Estado, Ho Iat Seng afirmou que a China incorporou a “biossegurança no sistema de segurança nacional” e acelerou a construção do sistema de contingência. “Perante o surgimento de novo tipo de coronavírus, para além de continuarmos a prevenir e combater as epidemias, devemos também ver as ameaças à segurança do campo biológico”, argumentou o Chefe do Executivo.

Ainda não acabou

Outro dos pontos fundamentais do discurso de Ho Iat Seng centrou-se no combate à pandemia, em particular reconhecendo o empenho da China e dos residentes de Macau. “Como chinês e residente de Macau, agradeço sinceramente ao País pelas suas decisões difíceis e contributos positivos para a saúde humana e o bem-estar de todo o nosso povo, incluindo os residentes de Macau”. O agradecimento foi alargado “aos residentes de Macau pela sua cooperação e tolerância” e pela “excelência do seu civismo”.

Não obstante o tom congratulatório, o Chefe do Executivo fez questão de sublinhar que “a crise ainda não terminou” e que “o teste continua”, sem esquecer o empenho e “trabalho árduo”, “até à exaustão”, dos profissionais de saúde e agentes da linha da frente das forças e serviços de segurança, apesar da “grande pressão física e mental”.

Entre as tarefas de combate à pandemia, Ho Iat Seng enumerou também o contributo do pessoal que garantiu o cumprimento da “quarentena, transporte, tratamento médico, salvamento, enfermagem, investigação das movimentações dos pacientes confirmados e localização das pessoas com contactos próximos, controlo da migração e manutenção da ordem pública”.

Quanto ao País, Ho Iat Seng reconheceu que, embora também gravemente afectado pela epidemia, garantiu o abastecimento efectivo das necessidades quotidianas de Macau.

16 Abr 2020

5G | Teoria que liga tecnologia à pandemia cresce online

À margem do que a ciência decifra quanto à origem e características do novo coronavírus, no mundo virtual as conspirações à volta da tecnologia 5G proliferam quase ao ritmo da pandemia. Desde servir como arma das “elites” para exterminar grande parte da população, ou meio de fragilizar o sistema imunitário, as conspirações convencem cada vez mais pessoas, enquanto as redes sociais tentam parar a disseminação de conteúdos falsos

 

[dropcap]A[/dropcap] desinformação sobre a covid-19 está a ser quase tão difícil de conter como a própria pandemia. Uma das teorias de conspiração mais partilhadas, e que também tem sofrido inúmeras mutações, aponta a tecnologia 5G como a fonte, ou meio de propagação, da pandemia que percorre o mundo inteiro.

Sem qualquer base científica, ou sequer correlação, as primeiras afirmações que ligaram a tecnologia de rede wireless de nova geração e o novo tipo de coronavírus começaram a circular nas margens da internet entre os adeptos mais aguerridos do New Age e os seguidores do QAnon (uma rede de conspirações ligada à extrema-direita que protege Donald Trump e, entre muitas outras teorias, liga políticos da ala democrata a redes de tráfico sexual de crianças). A infância da teoria começou com a vaga asserção de que as elites globais, normalmente associadas a milionários judeus, estariam a usar o 5G para espalhar o novo coronavírus.

A disseminação seria o segundo passo, com a partilha de vídeos e o empurrão de algoritmos que ampliam teorias que nasceram nos cantos mais recônditos da Internet até aos média tradicionais.

Pelo caminho, a “viralidade” contou com o empurrão de celebridades como os actores Woddy Harrelson e John Cusack e a cantora M.I.A., que partilharam as tais teorias entre os milhões que os seguem nas redes sociais.
Depois das teorias que ligam a radiação provocada pelo 5G às doenças oncológicas, o surgimento do novo coronavírus uniu os dois bichos-papões. Uma das teses alega que as redes 5G provocam, do nada, infecção ou os sintomas da infecção. Uma teoria mais moderada refere que a tecnologia emite radiações que enfraquecem o sistema imunológico, tornando as pessoas mais susceptíveis à infecção.

Inúmeras investigações, que passaram o crivo do método científico, demonstraram que as ondas de radiofrequência emitidas por telemóveis não têm energia suficiente para danificar o ADN de uma pessoa ou provocar aquecimento de tecidos. Aliás, os níveis de energia emitidos por telemóveis são menores que os emitidos por fornos micro-ondas e televisões.

Outro factor descurado pelos teóricos de conspirações é a menor capacidade dos sinais de 5G, em comparação com o 4G, para penetrar objectos.

Tempestade perfeita

Esta não é a primeira vez que a Internet é inundada com teorias sem base científica sobre a covid-19. Das teses que argumentam que o novo tipo de coronavírus é uma arma biológica criada em laboratório, passando pela alegação de que é um esquema do antigo CEO da Microsoft, Bill Gates, para despovoar o planeta, a covid-19 tem sido usada para criar múltiplos bodes expiatórios que afastam a atenção do público para a forma como os governos lidam com a pandemia.

Ainda no reino das teses, uma das mais bizarras indica que o novo coronavírus teve origem num culto composto por celebridades que usou um lote estragado de sangue de criança para tratamentos de rejuvenescimento.
Não é a primeira vez que a actualização de infra-estruturas wireless inspiram ligações a problemas de saúde, o mesmo aconteceu quando começaram a ser montadas as primeiras antenas de 4G.

Ainda antes do início da pandemia, já a tecnologia 5G era apontada, sem suporte científico, como causa de uma série de maleitas, mas o surgimento da covid-19 deu uma nova vida às conspirações e mesmo a actos de vandalismo, com particular incidência no Reino Unido.

De acordo com a BBC, antenas de redes móveis 5G têm sido incendiadas no Reino Unido, depois da ignição inicial da partilha de teorias de conspiração na Internet que ligam as infra-estruturas à propagação da pandemia. No início do mês, pelo menos três antenas arderam completamente, sendo necessária intervenção dos bombeiros e da polícia.

Em declarações ao portal noticioso The Verge, um porta-voz da Vodafone UK confirmou que num espaço de 24 horas quatro antenas haviam sido incendiadas, o que levou à abertura de investigações policiais. Pelo menos uma antena, que não serve a rede 5G foi igualmente danificada em Birmingham.

“Os nossos engenheiros estão a apurar as causas do fogo numa das nossas torres em Birmingham. A confirmar-se o fogo-posto, que parece plausível, vamos colaborar com a polícia de West Midlands para encontrar o responsável pelo crime”, referiu ao portal de notícias um porta-voz da EE, outra operadora de redes móveis.

“Esta infra-estrutura servia milhares de pessoas na área de Birmingham, providenciando conexão 2G, 3G e 4G, ao longo de muitos anos. Vamos tentar restaurar o serviço o mais rapidamente possível, mas os estragos causados pelo fogo são significativos”, completou.

Liberdade vs Verdade

A Comissão Internacional de Protecção contra Radiação Não Ionizante, instituição de peritos científicos que analisam a forma como a exposição a campos electromagnéticos usados em telemóveis, e outros objectos, afecta a saúde, afastou qualquer tipo de ligação entre o 5G e o coronavírus.

“A teoria que afirma que o 5G tem impacto no sistema imunitário e que, por isso, faz as pessoas adoecerem, não tem qualquer base”, afirmou Eric van Rongen, presidente da instituição, à CNN. O cientista que refere que se existisse impacto deste tipo de radiação em doenças infeciosas “já teria sido detectado há décadas”.
Enquanto não existe uma vacina para a covid-19, a cura da disseminação de informação falsa também é difícil de remediar.

Ainda assim, plataformas de Internet e redes sociais começaram a dar os primeiros passos para limitar a propagação de desinformação sobre o novo tipo de coronavírus, apesar de tardiamente.
Na semana passada, o YouTube baniu vídeos que ligam as redes 5G à covid-19, depois de inicialmente terem lavado as mãos da responsabilidade com a justificação de que o conteúdo não violava as políticas de publicação. Alguns destes vídeos tinham acumuladas centenas de milhares de visualizações.

Também o Twitter reagiu, prometendo melhorar o algoritmo para identificar e banir a distribuição de informação falsa. “Vamos continuar a agir contra contas que violem as nossas regras, incluindo publicações de conteúdo que contenha alegações que carecem de verificação científica e que incitem a desarmonia social, pânico generalizado, ou caos de larga escala”, referiu um porta-voz da empresa à CNN.

Actualmente, uma busca no Facebook que contenha as entradas 5G e coronavírus apresenta, na maioria, fontes e informação credíveis, apesar de ainda se poder encontrar algumas teorias de conspiração. A empresa de Mark Zuckerberg prometeu agir agressivamente para combater a disseminação de informações falsas, em particular as que possam inspirar actos de vandalismo, como os de incendiar antenas.

15 Abr 2020

É como não ver

[dropcap]S[/dropcap]em surpresas, o estudo encomendado à associação liderada por Kevin Ho, sobrinho de Edmund Ho, revelou que cerca de 97 por cento da população não sabe o que é uma lei sindical. Não fico chocado perante a total ignorância, numa terra onde se acha que ter opinião política é querer atrair chatices. Não pode existir sociedade civil quando as pessoas abdicam dos seus direitos por desconhecimento. Em Macau não existe a cultura da protecção do trabalhador, mesmo quando muitos foram empurrados para cortes salariais significativos, quando a única alternativa era o desemprego numa altura de crise. Isto não é uma decisão, é coacção. Não é harmonia, é opressão.

Mas proponho ao leitor que faça uma sondagem a jovens na casa dos 20 ou 30 e poucos que tenham crescido em Macau, e pergunte se sabem quem é Ho Chio Meng. O desconhecimento é deprimente. É por isso que se pode encomendar um estudo sobre a pertinência dos sindicatos a uma associação dirigida por um empresário familiarmente ligado ao poder político, e que já havia sublinhado não ver necessidade para uma lei sindical, sem quem ninguém diga nada.

Ah, não esquecer que temos de papar calados com a tanga cíclica do socialismo, e virar os olhos quando se equipara protecção da parte mais fraca da relação laboral a desarmonia e se celebra a desregulação como liberdade empresarial. Meus amigos, isto é capitalismo selvagem, não há propaganda semântica sobre características que apague o evidente amor de Macau aos princípios do inimigo ideológico. Que reine a desregulação e o mais forte faça farinha dos ossos do oprimido que joga Switch à espera de mais um cheque do Governo. Cegueira autoinduzida.

14 Abr 2020

Estudo Lei Sindical | Patrões acham que debate “prematuro é perturbador”

Está aí o relatório do estudo sobre a Lei Sindical, que aponta para o total desconhecimento, tanto de trabalhadores como do patronato, sobre o que implica a legislação. Os empregadores referem que os sindicatos podem ser desviados por pequenos grupos com pedidos irracionais. Pereira Coutinho considera o estudo uma perda de dinheiro e questiona a sua legitimidade

 

[dropcap]D[/dropcap]epois de servir como uma justificação dada pelo sector empresarial e o anterior Executivo para não se legislar, foi divulgado no domingo o relatório do “Estudo das condições sociais necessárias para se iniciar a discussão da Lei Sindical”, da autoria da Associação de Estudo de Economia Política de Macau, presidida por Kevin Ho.

Além da natural divisão entre as partes, destaque para a opinião do patronato que considera que “a parte laboral deve lutar pelos seus direitos”, mas adverte para o perigo de um sindicato, que pode “ser utilizado por uma pequena parte de pessoas para exigir pedidos irracionais ou até excessivos”. Aliás, o próprio debate, “num momento prematuro”, pode ser “perturbador”, aponta o relatório.

O líder da associação que elaborou o estudo, Kevin Ho, sobrinho do ex-Chefe do Executivo Edmund Ho, referiu em entrevista ao HM que não achava necessária uma lei sindical. “Se um trabalhador sofre porque é maltratado pelo seu empregador, pode arranjar outro emprego facilmente noutro lado”, disse, há quase dois anos, o empresário e presidente da Associação Industrial e Comercial de Macau.

O deputado José Pereira Coutinho coloca em causa o estudo e a entidade que o elaborou, por falta de credibilidade. “Este estudo é um desperdício de dinheiro público. É muito pobre e um estudante universitário faria muito melhor. Dá a entender que querem fazer uma omelete só com um ovo”, comenta.

Uma das expressões que atravessa o relatório é a harmonia social e o recurso à negociação na resolução de conflitos laborais. Nesse aspecto, o deputado destaca que, face à violação de direitos pela entidade patronal, “nenhum trabalhador em Macau se atreve a fazer queixa do empregador, só o faz quando foi despedido ou quando está prestes a ser”.

Desconhecer é viver

A maioria dos inquiridos revelaram que esta não era a altura para discutir o assunto. Opinião que esbarra na percentagem de entrevistados de rua que confessaram ter “desconhecimento total” ou “pouco conhecimento” da Lei Sindical, 97,21 por cento. Os empregadores com confissão semelhante ainda são mais – 98,68 por cento.

O estudo, baseado em entrevistas feitas entre 1 de Dezembro de 2018 e 5 de Janeiro de 2019, aponta que entre as opiniões de especialistas se destaca que como “ainda não surgiu crise na sociedade” o Governo ainda não avançou com o projecto “e não há problema em adiar”. E que “em termos de urgência, acredita-se que a legislação da Lei Sindical ainda não consta na agenda do Governo”.

Outro factor que contextualiza o tema é a promessa do Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, de que, “no enquadramento da Lei Básica, essa legislação sindical pode ser implementada porque, de todas as cidades da China, só em Macau a lei sindical ainda não entrou em vigor”. Neste aspecto, Pereira Coutinho recorda que não existe um calendário para tal proposta de lei, que tanto pode ser no primeiro, como no segundo mandato do Chefe do Executivo. “Uma coisa posso garantir, na primeira oportunidade, vou apresentar novamente a lei sindical”, promete o deputado.

14 Abr 2020

Droga | Covid-19 “obriga” casal a traficar através de plataforma online

[dropcap]C[/dropcap]om as restrições fronteiriças impostas pelas autoridades para travar a propagação da pandemia, um casal de residentes que traficava metanfetaminas para Macau passou a usar uma plataforma de compras online para trazer a droga para o território.

Segundo a Polícia Judiciária (PJ), um residente, com 34 anos, e uma residente, de 33 anos, foram detidos por suspeita de receber droga escondida em embalagens de café. A mercadoria entraria no território com a “ajuda” de uma empresa de logística que serve plataformas online, como o Taobao. De acordo com os registos fronteiriços, o casal passou a fronteira para o Interior várias vezes, viagens que a PJ suspeita terem servido para trazer droga para o território, mas as restrições fronteiriças resultantes da pandemia da covid-19 obrigaram os traficantes a mudar de estratégia.

A mulher, de apelido Lam, que segundo as autoridades trabalha em vendas, dedica-se ao tráfico de droga há, pelo menos, três anos. O homem, com quem Lam tem um relacionamento amoroso, e que afirma ser taxista, é suspeito de ter levado Lam ao Interior para adquirir metanfetaminas, antes das restrições fronteiriças.

Um dos pacotes de café descobertos pela PJ continha 12,5 gramas de droga, com valor de mercado de 41 mil patacas. Foi também encontrada parafernália de consumo

Na sequência da investigação, as autoridades terão descoberto que o indivíduo, de apelido Lin, terá contactado um traficante através uma aplicação móvel. Os estupefacientes, que custaram cerca de 4000 RMB, foram pagos também online.

O casal foi detido em casa do homem, na Avenida de Almeida Ribeiro, onde foram encontrados outros pacotes de café idênticos ao que continha droga. Os residentes foram conduzidos ao Ministério Público por suspeitas de tráfico de droga.

9 Abr 2020

Religião | Prevenção da pandemia divide moderados e fundamentalistas

Enquanto no Vaticano o Papa Francisco celebra os ritos pascais sozinho, muitos líderes religiosos, das mais diversas crenças, contrariam as medidas que procuram parar a propagação do novo coronavírus. Em Itália, o país com mais vítimas mortais da covid-19, o líder da extrema-direita defendeu a abertura de igrejas para a celebração da Páscoa. Um pouco por todo o mundo, fundamentalistas desafiam autoridades de saúde e cientistas

 

[dropcap]A[/dropcap]s clivagens entre ciência e fé são tão velhas quanto a necessidade de encontrar respostas transcendentais para as dúvidas encontradas no mundo natural, e voltaram a tornar-se evidentes no contexto da pandemia da covid-19.

No passado domingo, em plena época pascal, o líder do partido de extrema-direita Lega, Matteo Salvini, defendeu a abertura das igrejas para a realização dos ritos de Páscoa. O dirigente do partido que nasceu de uma força política que operava uma milícia responsável por violência contra imigrantes, mostra-se desafiante relativamente às medidas de contenção da pandemia, apesar de a Itália ser o país com mais mortos, pela covid-19.

Para travar o novo coronavírus, Matteo Salvini argumentou que “a ciência por si só não chega”, e que é fundamental a contribuição do “bom Deus”.

As declarações foram rebatidas pela própria Conferência Episcopal. “O momento é de responsabilidade e vamos ver quem é capaz de demonstrá-lo”, afirmou o cardeal Gualtiero Basetti, presidente da Conferência Episcopal italiana, em entrevista ao Corriere della Sera, em resposta a uma pergunta sobre que opinião tem daqueles que pressionam para que as igrejas voltem a abrir na Páscoa.

As afirmações de Salvini fazem eco da posição dos sectores mais conservadores, que criticaram a suspensão das missas para limitar a propagação do vírus no país. “É a primeira vez que se celebra a semana santa desta maneira, sem o contributo dos fiéis, mas isso não implica renunciar a viver estes dias plenamente”, frisou o cardeal Gualtiero Basetti. “A impossibilidade de assistir às missas da Páscoa este ano é um acto de generosidade. É nosso dever respeitar aqueles que, numa emergência, estão na linha da frente com grande risco para a sua segurança”, acrescentou.

Também o arcebispo de Bolonha (norte), o cardeal Matteo Maria Zuppi, defendeu o encerramento das igrejas durante a pandemia, afirmando, em entrevista ao La Repubblica, que as regras têm de ser cumpridas. “Eu também gostava de poder celebrar a semana santa e a Páscoa com a comunidade. Mas arriscar é perigoso, as regras devem ser respeitadas e a Igreja tem o dever de o fazer”, disse.

A posição de Salvini é replicada um pouco por todo o mundo, inclusive por líderes religiosos de crenças que o político despreza, e volta a trazer para a ordem-do-dia o conflito ideológico entre ciência e aquilo a que os quadrantes mais ortodoxos denominam de liberdade religiosa.

Américas evangélicas

Em Belém, considerado pelos crentes como o local onde Jesus Cristo nasceu, as portas da Igreja da Natividade estão encerradas. Da mesma forma, a Mesquita de Omar Bem Khatab fechou.

Nos Estados Unidos a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, mais conhecida por mórmon, encerrou muitos templos e limitou, ou suspendeu temporariamente, aglomerações de crentes um pouco por todo o mundo.

Atitude seguida pela Igreja Presbiteriana, que desaconselhou círculos de oração e assegurou aos crentes que podiam limitar a participação em actos religiosos nas igrejas sem medo de julgamento.

Porém, fora das religiões com liderança centralizada e no reino das variadíssimas denominações evangélicas independentes, não existem limites. Muitos líderes religiosos ignoram as quarentenas e tornam a desobediência às autoridades numa cruzada pela liberdade religiosa. Landon Spradlin, um pastor evangélico, é o retrato perfeito que ilustra a fragmentação ideológica e a extrema politização da actualidade com um desfecho trágico.

Antes de ser contaminado pelo novo coronavírus, Spradlin referiu-se à pandemia, numa publicação de Facebook, como uma histeria vendida pela comunicação social e fez as habituais e perigosas comparações com a gripe. Teorias poucos dias repetidas pelo Presidente Donald Trump. Aliás, o pastor plagiou o magnata e disse que os média trataram muito melhor Obama do que Trump, e que a covid-19 fazia parte de uma conspiração para desacreditar Trump. Sem se preocupar com medidas de contenção, e acreditando no poder da fé no combate ao vírus, Spradlin foi para Nova Orleães em missão para salvar almas do deboche e vício durante o Mardi Gras. Um mês depois, morria infectado pela covid-19, engordando a contabilidade de casos de doentes que testam negativo, mas que estão infectados.

O cocktail de fé e conservadorismo político levou ao revigoramento das posições anticientíficas, algo que não é novo, mas que ganha contornos particularmente perigosos hoje em dia.

Depois de ser detido por organizar serviços religiosos apesar das restrições impostas pelas autoridades da Florida, um pastor evangélico protestou argumentando ser “vítima da tirania governamental”. O Governador, republicano, Ron DeSantis ouviu a declaração do pastor e voltou atrás, designando os serviços religiosos como “actividades essenciais”. O passo seguinte foi retirar às cidades e condados o direito de banir as actividades religiosas.

Na direcção oposta, os líderes da publicação Christianity Today e da Associação Nacional Evangélica assinaram uma declaração conjunta a referir que não ir à igreja nesta altura é um “sacrifício de amor”, não é desprezo pela necessidade da oração. “Não vamos transmitir paz através de abraços, mas por telefone. Serão estes meios inferiores? Sim. Serão aceites pelo Senhor? Acreditamos que sim”, refere a declaração, citada pelo The Guardian.

Diabo do secularismo

Em Israel, apesar das medidas impostas, os judeus ultra-ortodoxos resistem às directrizes do Governo para conter o surto da covid-19, com um efeito devastador no número de infectados.

Aliás, o surto está a espalhar-se nas comunidades mais conservadoras entre quatro a oito vezes mais rapidamente do que na sociedade geral.

Uma dessas comunidades situa-se em Bnei Brak, nos subúrbios de Telavive, onde 95 por cento dos residentes são ultra-ortodoxos. Apenas naquela localidade, o Governo avançou que quase 40 por cento dos residentes possam estar infectados, num universo de 200 mil pessoas.

As autoridades de saúde atribuem a proliferação em larga escala de infecções entre este tipo de comunidades religiosas à densidade populacional, famílias numerosas, um sentimento profundo de desconfiança da autoridade estatal, à ignorância dos riscos de saúde disseminado por líderes religiosos.

Além disso, partilham forte aversão à tecnologia e aos média seculares, algo que acreditam ser exigido pelas leis religiosas. O The Times of Israel avança que quatro residentes de Bnei Brak recorreram ao Supremo Tribunal de Justiça com uma acção que pretende terminar o bloqueio argumentando que a medida viola os seus direitos fundamentais e encoraja a discriminação contra a comunidade ultra-ortodoxa.

“Desde o estabelecimento do Estado de Israel, nunca houve uma decisão com um impacto tão grave nos direitos humanos”, escreveram os peticionários.

O encerramento de cidades foi coadjuvado pelo músculo das forças policiais israelitas e pela divisão de pára-quedistas das Forças de Defesa de Israel, com a construção de checkpoints a limitar o movimento dos residentes para fora das comunidades.

A estas medidas localizadas juntam-se as ordens de isolamento a nível nacional, que remetem para quarentena em casa todos os israelitas, à excepção das saídas para acorrer a necessidades essenciais.

Fé em julgamento

Na Coreia do Sul, o Governo municipal de Seul pediu ao Ministério Público a acusação de Lee-Man-hee, auto-proclamado messias e fundador da Igreja de Shincheonji, o culto que registou um foco de contaminações. O alegado emissário de Deus vai-se sentar no banco dos réus juntamente com mais 11 arguidos acusados de esconder nomes de membros que sabiam estar infectados das autoridades que tentavam controlar a propagação do surto.

Segundo o Governo sul-coreano, os membros da seita cristã infectaram-se uns aos outros em Fevereiro na cidade de Daegu, no sul do país, o epicentro da pandemia na Coreia do Sul, antes de se espalhar.

Depois das consequências desastrosas deste caso, no passado domingo, as autoridades municipais de Seul voltaram a recorrer à justiça numa acção contra uma igreja evangélica que violou as ordens emanadas da administração da cidade que proíbe reuniões em massa para prevenir a propagação do novo coronavírus.

8 Abr 2020

Óbvio desfecho

[dropcap]P[/dropcap]ermitam-me molhar o dedo grande do pé noutra água de comentário que não seja a pandemia. Ontem foi noticiado que o inquérito instaurado a Wang Sai Man foi arquivado. O desfecho expectável para o deputado “eleito” indirectamente e que já ocupa funções no hemiciclo anuindo docilmente a todas as posições do Executivo, depois de ter infringido a lei eleitoral em directo na televisão. A lei é clara neste aspecto.

Quem falar do seu programa político nas imediações do local de voto, no dia do “sufrágio”, está a fazer a campanha eleitoral. A situação é toda ela caricata. Enquanto candidato único na “eleição”, não havia necessidade de fazer campanha. O arquivamento do inquérito é justificado pela ausência de dolo do, à altura, candidato único, critério que não está na lei. Mas a malta dá um jeitinho com imaginação e lá safa a coisa.

O MP podia ter ido mais longe e dizer que Wang Sai Man não poderia ter intenção de fazer campanha eleitoral à boca das urnas por não ter nada a ganhar com isso. Mais pareceu desconhecimento da lei, o que para quem se candidata a deputado não é um bom cartão de visita. A chatice é que desconhecimento da lei não significa isenção de responsabilidade. A politização da justiça nestes casos é gritante, tão óbvia que dói.

Não dava jeito repetir uma eleição fantoche. Da mesma forma que o juramento à porta fechada feito pelo presidente da Assembleia Legislativa infringiu a lei que exigia que este fosse feito publicamente. Arranjou-se um funcionário, que por acaso era fotógrafo, e está feito. Tudo isto é desnecessário. Mas o poder político em Macau não consegue parar de mostrar o mais completo desrespeito pela lei. Pena que a justiça o permita.

3 Abr 2020

Economia | China prepara estímulo, enquanto zona Euro tem recessão no horizonte

Além da crise de saúde pública, a pandemia do novo coronavírus lançou a economia global num novo precipício. Enquanto a China se prepara para apresentar um plano de estímulos económicos, um pouco à semelhança dos Estados Unidos, a Europa actua de forma descoordenada com cada país a procurar mitigar a crise à sua maneira. O FMI já prevê um cenário de recessão semelhante à crise de 2009

 

[dropcap]A[/dropcap]s repercussões da pandemia que varre o mundo inteiro vão muito além da trágica situação de saúde pública. Além de deixar a descoberto muitos dos pontos fracos de instituições e governos, terá consequências económicas que já se começam a vislumbrar.

O Governo Central da República Popular da China comprometeu-se com medidas que deixam antever que Pequim se prepara para lançar um pacote de estímulos económicos de larga escala, para contrariar o impacto económico da pandemia.

Assim sendo, Pequim deverá aumentar o défice orçamental e colocar à venda dívida soberana, o que permite aos governos locais vender obrigações de financiamento de infra-estruturas. De acordo com a Xinhua, na semana passada o Politburo do Partido Comunista Chinês reuniu e aprovou as medidas com o objectivo de estabilizar a economia.

A agência oficial chinesa não deu mais detalhes quanto a possíveis estímulos fiscais. Importa recordar que a China ainda não divulgou o orçamento para 2020 devido à crise pandémica que forçou ao adiamento das anuais reuniões políticas e parlamentares de Pequim e que o défice orçamental não excede os 3 por cento há mais de uma década.

A capacidade produtiva da China tem sido fortemente afectada neste trimestre pelo encerramento de fábricas e paralisia de transportes. Além disso, com o mercado global também a sofrer com a pandemia, a procura externa de produtos chineses caiu igualmente.

De acordo com a Xinhua, o relatório da reunião do Politburo acrescentou que “o desenvolvimento económico, especialmente o retorno das cadeias de abastecimento, enfrentam novos desafios à medida que os casos de infecções importadas aumentam”. Com a economia global paralisada, Pequim vira-se para dentro. “São precisas fortes medidas macro-económicas para reduzir o impacto e expandir a procura doméstica”, projecta o relatório.

Outro ponto fundamental foi a manutenção dos objectivos de crescimento económico, que já eram algo contidos, para a “construção de uma sociedade moderadamente próspera” em 2020.

Num comunicado diferente, também divulgado na sexta-feira passada, o Banco Popular da China apelou a uma melhor coordenação das políticas macro-económicas, ao mesmo tempo que sublinhou que irá garantir a liquidez necessária para ajudar a economia real e evitar riscos de inflação.

Mundo parado

A consultora Oxford Economics divulgou ontem um relatório onde estima que a economia da zona Euro vai enfrentar uma recessão de 2,2 por cento enquanto a economia mundial vai estagnar este ano devido à pandemia da covid-19.

“A pandemia do novo coronavírus vai infligir uma profunda recessão na economia mundial, e em muitas das principais economias, durante a primeira metade deste ano”, lê-se numa nota enviada aos investidores, e que a agência Lusa cita, na qual se prevê que a zona euro caia 2,2 por cento, os Estados Unidos 0,2 por cento e a China cresça apenas 1 por cento.

No relatório, que já vai na segunda actualização devido à progressão da pandemia, os analistas desta consultora britânica escrevem que “para o conjunto do ano o crescimento global deve descer para zero” e acrescentam que “no primeiro trimestre, a economia mundial deve contrair-se a um ritmo mais rápido do que durante a crise financeira de 2009, caindo cerca de 2 por cento e sendo provável uma nova queda de 0,4 por cento no segundo trimestre”.

A estagnação prevista para o total do ano na economia mundial “marca o segundo valor mais baixo dos últimos 50 anos, só superado pela severidade da crise financeira de 2009”, apontam os analistas, que lembram que a previsão anterior à pandemia, para o crescimento mundial, era de 2,5 por cento.

Apesar do panorama sombrio para a primeira metade do ano, esta consultora estima que a recuperação económica seja “muito forte, segundo a experiência histórica”, antevendo que uma forte recuperação da actividade económica no final do ano. “A perspectiva de evolução a curto prazo é extremamente desafiante, mas a actividade vai recuperar depois das medidas de distanciamento social” e beneficiando também com a combinação dos estímulos monetários e orçamentais e da despesa discricionária”, lê-se no documento, que antecipa um crescimento de 5,3 por cento da economia mundial no último trimestre deste ano e uma média de 4,4 por cento em 2021.

As previsões, alertam, são particularmente incertas neste período, mas os analistas apontam ainda que num cenário de agravamento da pandemia, imposição de mais restrições sociais e mais stress nos mercados financeiros, a economia mundial poderia ter um crescimento negativo de 1,3 por cento, com a zona Euro a cair 3,2 por cento, os EUA 2,6 por cento e até a China poderia ver o PIB retrair 0,9 por cento.

Recordar 2009

A directora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, afirmou que “já está claro” que a economia mundial entrou “numa recessão, igual ou pior que a de 2009” devido à pandemia de covid-19. “Já está claro que estamos numa recessão igual ou pior que a de 2009”, afirmou Georgieva, numa conferência de imprensa por vídeo na sede da instituição financeira internacional, para avaliar o impacto económico da expansão global do coronavírus.

A líder do FMI disse esperar uma recuperação em 2021 desde que os governos adoptem medidas adequadas e “coordenadas”.

Mais de 80 países solicitaram já assistência financeira à instituição, segundo Georgieva. “Exortamos os países a intensificarem agressivamente as medidas de confinamento”, afirmou. “Podemos reduzir a duração desta crise”, acrescentou.

Georgieva também se congratulou com a aprovação de um pacote de apoio à economia norte-americana num montante de cerca de 2 milhões de milhões de dólares, sublinhando a necessidade de atenuar o impacto da pandemia na maior economia do mundo, obrigada a suspender a sua actividade como aconteceu em muitos outros países. “É importante para o povo norte-americano. É também importante para o resto do mundo, dada a importância dos Estados Unidos”, considerou.

A título de exemplo

A economista chefe da OCDE, Laurence Boone, considerou ontem “pertinente” a emissão de dívida comum na zona Euro alertando que falta coordenação entre os planos dos vários estados membros que estão a agir de forma unilateral. Em entrevista à publicação francesa Les Echos, Boone explica que “é pertinente a ideia sobre instrumentos comuns capazes de financiar – de forma solidária – os gastos de saúde ou relacionados com a gestão por causa do coronavírus”.

Trata-se de um mecanismo “importante porque na União Europeia fazem-se poucas transferências numa altura em que o vírus afecta todos sendo que os países não têm todos os mesmos meios de enfrentar” o problema, assinalou a responsável da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico).

Para Laurence Boone, os países da União Europeia podem vir a utilizar o mecanismo sobretudo porque o Banco Central Europeu (BCE) já “cumpriu a sua parte” oferecendo condições de financiamento o que, afirmou, “tranquilizou” os mercados permitindo absorver as novas emissões de dívida que se prevêem.

A economista francesa sublinha que a disparidade entre os planos apresentados pelos vários países europeus faz com que seja complicado fazer uma avaliação. “Outro exemplo da falta de coordenação na Europa relaciona-se com as ideias sobre as paralisações laborais (a tempo parcial), mas ninguém o está a fazer da mesma forma fazendo com que as empresas estejam a tomar medidas diferentes nos vários países”, acrescentou.

Em termos gerais, Boone insiste que a “evidente falta de coordenação na gestão da crise” tem de ser corrigida.

31 Mar 2020

Reflexão perdida

[dropcap]O[/dropcap] mundo é um bêbedo agarrado a um poste de electricidade a tentar perceber porque razão a gravidade o odeia tanto. Não acredito que algum dia a clarividência ganhe terreno à boçalidade, a ponderação à estupidez. Mas creio que nunca estivemos tão perto de um acontecimento catalisador de reflexão global, que impulsione ponderação, que leve a um balanço, a avaliação da forma como organizamos as sociedades.

A mais básica reflexão é tentar entender quanto vale uma vida. Meter um preço neste item que jamais deveria estar à venda deveria ser abjecto por si só, mas pertinente face ao que se passa.

De que vale uma economia se ela não só não funcionar para as pessoas, quão assassino é um sistema que prefere a morte à destabilização dos mercados?

Não estou a inferir que a covid-19 começou esta mórbida dialéctica. Já não existem muitos segredos quanto à economia de guerra de lucros perpétuos através do conflito, à discrepância de poder entre o consumo dos países ricos e a produção dos países pobres que cria novas formas de escravidão, ao luxo que se sustenta na miséria, à economia que defende crimes bancários com o sangue dos pobres. Tudo isto é bem real e aceite com complacência de todos.

Mas esta crise é diferente, a microbiologia não discrimina entre pobres e ricos e isso une-nos no sofrimento ao mesmo tempo que nos separa para reduzir a propagação.

Esta pode também ser uma boa oportunidade para pensarmos enquanto espécie, e anteciparmos o que aí vem em termos de crises climáticas. Uma boa oportunidade que não tenho qualquer dúvida será desperdiçada.

Outra área que merece reflexão é a verdadeira força e integridade das uniões e projectos que integram nações ou territórios. Começo pelo local.

O novo coronavírus deixou à mostra as fraquezas que já se adivinhavam no projecto da Grande Baía. Sempre que se faz um estudo sobre mobilidade de jovens entre Guangdong, Macau e Hong Kong, os resultados são invariavelmente negativos para o projecto de integração, principalmente nas regiões administrativas especiais. Fracturas que antes ficavam na esfera individual tornaram-se visíveis agora, com os respectivos governos a impor restrições uns aos outros sem aviso prévio, ou com poucas horas de antecedência.

Mesmo que a política obrigue aos paninhos quentes posteriores, estas respostas unilaterais não são bons pronúncios de entendimento, além de que as pessoas conseguem ver a milhas a mitigação política que clama que tudo está bem e em harmonia, enquanto multidões correm para as Portas do Cerco, ou enquanto polícias de duas províncias do Interior trocam murros e pontapés devido à discriminação a que os habitantes de Hubei são sujeitos.

Na Europa a desunião é ainda mais gritante, com a total ausência de voz de comando centralizado e as velhas retóricas de povos inferiores versus povos superiores em crescendo, numa altura em que solidariedade é sinónimo de sobrevivência. Além disso, um dos pilares constitutivos da União Europeia (livre circulação de pessoas e bens) implica fronteiras abertas, ou seja, gasolina e vento no fogo descontrolado da propagação do novo coronavírus.

Infelizmente, isto dá força aos isolacionistas que temem tudo o que lhes é externo. Calcifica os vários tipos de nacionalismos, numa altura em que o amparo mútuo é essencial.

Tantas oportunidades de reflexão que serão desperdiçadas, ou que vão ficar contidas em círculos académicos e conversas de iluminados.

Sei que vou meter este texto na página e lembrar-me de mais gritantes exemplos de necessidade de ponderação e balanço sobre quem somos. Mas aqui vai mais um motivo para reflectirmos, antes que a frustração se instale.

Até que ponto vivemos afastados do essencial e damos primazia ao supérfluo. Para já, não experimentamos escassez de bens a um nível global, além dos golpes desferidos aos sistemas de saúde de todo o mundo.

Mas, quando começarmos a sentir a falta de água, um cenário que vai muito para lá do provável, veremos o quão afastados vivemos do essencial.

Quando faltar arroz não vamos matar a fome com telemóveis, não vamos guardar legumes na cloud, nem vamos saciar a sede com apps. Na vertiginosa velocidade tecnológica, que marca o avançar da história pela capacidade de processamento, parece que deixámos de processar o essencial.

30 Mar 2020