Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteCovid-19 | Medidas de apoio económico consideradas insuficientes e sem novidade Assim que foram registados os primeiros casos do surto de covid-19 que afecta Macau, o secretário para a Economia e Finanças anunciou medidas de apoio económico para residentes e empresas. No entanto, economistas, deputados e dirigentes associativos entendem que os estímulos são insuficientes numa economia estrangulada O Governo anunciou no domingo medidas de apoio a pequenas e médias empresas (PME) e residentes assim que as autoridades começaram a registar os primeiros casos de covid-19 do surto que fez parar Macau. Lei Wai Nong, secretário para a Economia e Finanças, anunciou sete medidas, no valor total de dez mil milhões de patacas, que passam sobretudo pelo adiamento da devolução dos empréstimos pedidos ao Governo e de impostos cobrados, sem esquecer outros benefícios fiscais. No entanto, tendo em conta que a economia está em recessão há muitos meses, analistas consideram que o pacote de medidas não basta. “O Chefe do Executivo disse que quando a maioria da população estivesse vacinada Macau voltaria à normalidade. Temos de o fazer”, adiantou o deputado José Pereira Coutinho ao HM. “Estas medidas são insuficientes porque se mantém a devolução dos empréstimos, além de outros benefícios fiscais não chegam. É preciso clarificar a situação das PME na área da restauração, para que tenham alguma actividade. Não se resolvem dificuldades destas empresas impedindo as pessoas de fazer as refeições dentro dos estabelecimentos. Estas restrições são extremamente prejudiciais para as PME”, declarou. Recorde-se que os restaurantes e outros estabelecimentos de comida estão a ser incentivados a funcionar apenas em regime de take-away, embora tal não seja para já obrigatório. No entanto, Alvis Lo, director dos Serviços de Saúde (SSM), assegurou no domingo que tal poderá ser obrigatório caso a situação pandémica assim o justifique. Coutinho defende ainda que a bitola deve estar também do lado da banca, que deve ter “uma responsabilidade social” face a pagamentos de empréstimos. “O Governo tem de estabelecer moratórias, o que poderia ajudar famílias com dificuldades financeiras, monoparentais, ou que têm a seu cargo idosos.” O deputado não tem dúvida de que este novo surto, e a forma como as autoridades estão a lidar com ele, constitui “um grande rombo na economia, com um grave impacto psicológico nas pessoas”. Quem também considera as medidas insuficientes é o economista José Sales Marques, embora “sejam sempre um paliativo”. “Há algum tempo que vivemos em recessão, as perspectivas começavam a tornar-se optimistas e de repente surge algo como aquilo que estamos a passar. As medidas não são suficientes e o sentido delas é apenas minorar os problemas, dar alguma folga às PME, nomeadamente no que diz respeito à bonificação de juros e devolução de alguns impostos cobrados. Os montantes não são significativos e dão apenas um certo conforto paliativo”, acrescentou. Sales Marques considera fundamental dar ânimo aos números económicos, para que se verifique um crescimento sustentável. “Espero que esta crise não se prolongue e se limite aos casos que já existem, e que não sejam impostas novas limitações. A economia vive da procura externa e do jogo, das actividades ligadas à exportação de bens e serviços. Esta tem de começar a funcionar de novo, porque continuaremos a viver com dificuldades.” Resposta rápida Ouvido pelo jornal Ou Mun, o deputado Ho Ion Sang, ligado aos Kaifong e presidente do Centro de Sabedoria Colectiva, defendeu que as medidas visam resolver, de forma urgente, os problemas que os diversos sectores da economia e os residentes sentem. Ho Ion Sang recordou que a situação pandémica nas regiões vizinhas tem causado impactos negativos no turismo e outras indústrias associadas a este sector. Chui Sai Cheong, deputado e presidente da Associação Comercial de Macau, disse concordar com o pacote de apoios lançado pelo secretário Lei Wai Nong, sendo esta decisão “necessária e oportuna” e algo que permite aos mercados ganharem alguma confiança. No entanto, tendo em conta o actual estado da economia, Chui Sai Cheong entende ser necessário que as autoridades avaliem a eficácia das medidas, uma vez que a estabilidade das PME é essencial para uma economia onde a confiança predomine. Un Sio Leng, presidente da Associação Geral das Mulheres, defendeu que as medidas mostram, acima de tudo, uma resposta rápida e urgente por parte do Governo perante as dificuldades da população. A dirigente sublinhou que as PME dão emprego aos residentes que são muito importantes para o desenvolvimento económico do território, pelo que as medidas anunciadas, logo no início do surto, são um incentivo. Un Sio Leng espera ainda que o Governo pondere a criação de um subsídio de apoio às despesas familiares, alunos, idosos e famílias com maiores dificuldades, além de medidas de apoio complementares para desempregados e pessoas em licença sem vencimento. Por sua vez, Chan Ka Leong, presidente da União Geral das Associações dos Moradores de Macau (Kaifong), disse ao jornal Cheng Pou que as medidas são oportunas e que podem dar resposta às necessidades da população. Uma vez que o surto levou a uma nova suspensão de muitas actividades, como o programa de excursões locais para residentes, Chan Ka Leong destaca o enorme impacto para as PME e empregados que dependiam desse plano de fomento turístico. Olhando para o pacote das medidas anunciadas no domingo, Chan Ka Leong entende que o subsídio para a compra de combustível atribuído aos taxistas pode ajudar muito o sector. Jorge Valente, empresário, entende que reduzir taxas e impostos é sempre uma boa medida. No entanto, uma vez que os impostos sempre foram baixos em Macau, onde as concessionárias de jogo dão o grande contributo em matéria fiscal, trata-se de uma medida “que não ajuda muito”, pois estão envolvidos pequenos montantes. “O principal problema que enfrentamos é a falta de actividades económica, de pessoas e turistas que possam consumir. Relativamente à medida de apoio aos taxistas, só funciona se os táxis tiverem muitos clientes. Se o veículo estiver quase sempre parado, e se, ainda por cima, houver muitos carros eléctricos ou híbridos, creio que é uma medida que não ajuda quase nada”, apontou ao HM. Como medida “bastante boa” Jorge Valente destaca o facto de as PME só pagarem, até 31 de Dezembro de 2023, os juros dos empréstimos concedidos pelo Governo e não os montantes. “[A eficácia] destes empréstimos depende muito se a empresa sobrevive para ter melhores dias de negócio. Se a empresa entrar em insolvência antes do fim da pandemia, [os custos e perdas] vão ser muito maiores”, frisou. Reserva q.b. O economista José Félix Pontes entende que as medidas em questão “trazem algum alívio, embora temporário” às PME, residentes e algumas profissões liberais, tendo como ponto de referência “as medidas tomadas nos dois anos anteriores” e, portanto, sem novidade. “Quanto ao montante dos fundos públicos envolvidos (dez mil milhões de patacas), provenientes, mais uma vez da Reserva Financeira, a sua adequação dependerá da alteração da denominada ‘política de tolerância zero’. Esta, a manter-se, fará com que Macau continue com poucos visitantes, níveis baixos de taxa de ocupação hoteleira, quebra nas receitas do jogo ou aumentos sem significado.” Félix Pontes traça ainda o cenário do crescente desemprego, com mais empresas, de pequena ou grande dimensão, a encerrarem portas, o que resultará “num Produto Interno Bruto anémico”. Na óptica do economista, a Reserva Financeira da RAEM deve ser destinada “a projectos relevantes na área económica e social” e não como uma espécie de “amortecedor ou ‘tapa buracos’ da economia local”. Como tal, a alternativa passa por elevar a taxa de vacinação contra a covid-19 com três doses. Félix Pontes entende que deveria mesmo obrigar-se toda a população a vacinar-se contra a doença. Só assim “não seriam necessários os confinamentos, ainda que localizados, e a realização de testes em massa sempre que haja um certo número de casos”, concluiu.
Andreia Sofia Silva PolíticaIdosos | Instalados equipamentos de segurança em oito mil casas O Instituto de Acção Social (IAS) instalou equipamentos de segurança em oito mil casas de idosos até Abril deste ano, no âmbito do “programa de avaliação de segurança domiciliária e de financiamento para a aquisição de equipamentos para idosos”. A informação consta na resposta a uma interpelação da deputada Song Pek Kei. Este programa, aponta Hon Wai, presidente do IAS, tem como objectivo “implementar, a título experimental, o novo modelo de serviços para pessoas séniores nos apartamentos para idosos, introduzindo serviços e equipamentos inteligentes”. Relativamente aos “cuidados transfronteiriços para idosos”, o Governo assegura que “aqueles que residem de forma permanente no interior da China e reúnam os requisitos legais podem continuar a receber a pensão e subsídio para idosos, bem como a pensão e o subsídio de invalidez, sem esquecer a comparticipação pecuniária e o apoio económico, entre outros benefícios sociais de Macau”. No que diz respeito aos prestadores de serviços, as autoridades de Guangdong “já definiram as políticas para que estes tenham acesso aos mesmos benefícios que as instituições do interior da China gozam em matéria de acesso ao mercado, disponibilidade de espaços, redução e isenção de impostos, entre outras medidas”. No entanto, até à data, “o IAS não recebeu nenhum pedido de informação sobre o assunto”. Sobre o projecto do “Novo Bairro de Macau”, a nascer na Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin, o IAS confirma a criação de centros de serviços para idosos que irão assumir “um papel pioneiro”, além de permitirem “explorar e acumular a experiência obtida na criação de equipamentos de serviços de apoio a idosos no interior da China”.
Andreia Sofia Silva Eventos24 de Junho | CCCM celebra data histórica com conferência Foi há 400 anos que Macau venceu os holandeses na célebre batalha ocorrida a 24 de Junho de 1622, e que manteve o território sob administração portuguesa. Em Lisboa, o Centro Científico e Cultural de Macau recebe, na sexta-feira, uma palestra em jeito de celebração O Centro Cultural e Científico de Macau (CCCM) promove, esta sexta-feira, uma conferência de celebração do aniversário da vitória de Macau sobre os holandeses. “24 de Junho de 1622: História e Memória” é o nome da iniciativa que decorre em Lisboa e que conta com a presença de dois oradores. Um deles é Rui Loureiro, investigador do Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes, também associado ao Centro de História Além-Mar da Universidade Nova de Lisboa. Mariana Pereira, doutoranda do Cambridge Heritage Research Centre, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido), e também investigadora associada do Instituto Internacional de Macau (IIM), será outra das convidadas. Segundo um comunicado, o CCCM pretende, com este evento, “assinalar a passagem dos 400 anos da celebrada data do 24 de Junho”, uma data “com indiscutível relevância histórica e patrimonial para Macau”. As visões de uma data Mariana Pereira irá falar dos “Retratos do 24 de Junho Macaense em Portugal: uma visão patrimonial”. Recorde-se que a investigadora lançou o projecto de um website dedicado a este acontecimento histórico, apoiado pelo IIM. Mariana Pereira, macaense e arqueóloga, está actualmente a fazer um doutoramento na área do património cultural. Ao HM, aquando do lançamento do site, no ano passado, disse esperar que, no futuro, este se torne “numa plataforma onde se possa colocar informação disponível sobre o 24 de Junho, que se desdobra em muito mais do que aquilo que as pessoas veem e as celebrações que decorrem”. Por sua vez, Rui Loureiro vai falar do tema “Macau e a ameaça holandesa: génese do ataque de 1622”. O evento encerra-se com um debate onde se prevê “a participação de intervenientes da comunidade macaense e outros, sobretudo orientado para os aspectos patrimoniais”, que terá a moderação de Mariana Pereira. Aquando do lançamento do website, a investigadora declarou ao HM que estão em causa “vários tipos de 24 de Junho”, tendo em conta que é o “único evento macaense” que não se celebra em mais nenhum outro lugar, estando ainda “associado à história de Macau como cidade”. “O que está a acontecer é que o 24 de Junho está muito associado a uma festa portuguesa que parece ser mais recente do que a celebração da batalha. O arraial [ocorrido em Macau] está a ter uma maior visibilidade e gostaríamos de trazer algum equilíbrio, com outras componentes, porque tudo forma o 24 de Junho em Macau”, acrescentou.
Andreia Sofia Silva EventosCovid-19 | Eventos culturais e passeios turísticos cancelados. Museus fechados A descoberta de 12 casos de covid-19 na comunidade levou ao encerramento de museus e ao cancelamento de espectáculos e actividades, nomeadamente os passeios turísticos destinados a residentes. Com o estado de prevenção em vigor, não há data para que espaços culturais e eventos regressem ao calendário normal Com o Governo a sugerir aos residentes para não saírem de casa, devido ao surto comunitário de covid-19 detectado no sábado à noite, o encerramento de espaços e cancelamento de eventos culturais voltou a repetir-se, como em situações semelhantes no ano passado. Em termos de museus, fecharam ontem portas o Museu Marítimo, com a reabertura “a ser notificada oportunamente”, bem como o Museu dos Bombeiros ou o Museu do Grande Prémio, sem esquecer o Edifício Ritz. Neste contexto, a Direcção dos Serviços de Turismo (DST) promete contactar todas as pessoas que já tinham adquirido bilhete para o Museu do Grande Prémio para proceder ao respectivo reembolso, uma vez que também não foi adiantada, para já, uma data de reabertura. Outro dos espaços que encerrou portas de imediato foi o Museu das Forças de Segurança de Macau. Além disso, o Instituto Cultural (IC) avançou para o encerramento de outros espaços culturais, como as bibliotecas públicas, espectáculos de artes performativas ou espaços ligados ao sector das indústrias criativas. Quem requisitou livros nas bibliotecas públicas não tem de respeitar, para já, o prazo de entrega das obras, não havendo, segundo o IC, “necessidade de o público se apressar para devolver os materiais da biblioteca”. Em situação de prevenção pandémica, “o horário de reabertura de vários espaços culturais será anunciado separadamente”. Sem visitas para ninguém Desde ontem que estão também suspensas as excursões locais inseridas no programa “Passeios, gastronomia e estadia para residentes de Macau”. Quem quiser esclarecer mais informações sobre os percursos já adquiridos, pode ligar para as linhas telefónicas 8396 3052 ou 2838 9153, diariamente entre as 09h e as 19h. Na linha de encerramentos e cancelamentos, o Instituto de Promoção do Comércio e Investimento de Macau (IPIM) decretou também o fecho de portas do Centro de Exposição dos Produtos Alimentares dos Países de Língua Portuguesa, “até novo aviso a emitir oportunamente”. Outro evento cancelado pela DST é a conferência de imprensa sobre a 10ª Exposição Internacional de Turismo (Indústria) de Macau, que estava agendada para amanhã. Também foi cancelada a sessão de esclarecimento para o sector da restauração sobre os critérios de avaliação para o período de supervisão do “Programa de Avaliação de Serviços Turísticos de Qualidade”, prevista para hoje. Em comunicado, a DST pede “a compreensão” dos agentes e operadores turísticos.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaEconomia | Governo lança sete medidas de apoio no valor de 10 mil milhões O secretário para a Economia e Finanças anunciou ontem um pacote de sete medidas de apoio a residentes e empresas no valor de dez mil milhões de patacas. Os serviços públicos vão ficar encerrados até amanhã, mas os casinos continuam a operar Depois de ser confirmado um surto comunitário no território, o Governo anunciou sete novas medidas de apoio económico a residentes e empresas. As medidas representam um gasto público de dez mil milhões de patacas, que terá ainda de passar pelo crivo da Assembleia Legislativa. Assim sendo, será devolvido o imposto domiciliário para os sectores industriais e comerciais, decretada a isenção do imposto de turismo, além de serem concedidos apoios a taxistas para fazer face ao aumento do preço dos combustíveis. O pacote de medidas inclui também ajudas a profissionais liberais e lojas, sendo também estendido o prazo para que as pequenas e médias empresas (PME) devolvam o montante dos empréstimos concedidos pelo Governo. Até ao dia 31 de Dezembro de 2023 pagam apenas os juros. “Sabemos que está quase a vencer o prazo de devolução e daremos mais um ano para que as empresas devolvam o empréstimo”, declarou o secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong. O governante admitiu ainda atribuir mais apoios a “empresas de grande envergadura” pois estas “começaram a fechar”, prometendo “outra ponderação”. O secretário terá como referências os planos de apoio criados nos últimos dois anos. “Estas medidas visam reduzir a sobrecarga sentida pelas empresas e dar um apoio nesta fase difícil da pandemia, para que possam superar as dificuldades. Daí os benefícios atribuídos aos profissionais liberais e lojas. Serão ainda adoptadas medidas de impulso ao consumo, como sorteios, a anunciar mais tarde.” Casinos não fecham O secretário garantiu também que, para já, os casinos não fecham portas, tendo em conta que são implementadas medidas de controlo da saúde, como a medição da temperatura, entre outras. Em relação à votação da proposta de lei do jogo na Assembleia Legislativa, o governante afirmou que deverá decorrer conforme o calendário previsto. Na segunda conferência de imprensa de ontem foi confirmado que Macau não tem falta de fornecimento de produtos. Chegou ontem ao território o segundo lote de produtos alimentares frescos e vivos, e hoje chegam mais 300 toneladas de vegetais, 150 toneladas de frutas, 700 mil ovos e 380 porcos vivos. O Lam, vice-presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), garantiu que não haverá falta de comida para quem está isolado em casa. “Será atribuído um kit de comida com legumes e carne de porco, com uma quantidade suficiente de alimentos para três dias. Temos carne congelada e legumes com maior duração, como batatas.” O lixo será recolhido também por equipas do IAM durante a noite. As autoridades indicaram ainda que não é recomendável comer dentro de restaurantes, mas, para já, não é proibido fazê-lo. “Afastamos a possibilidade (de comer dentro dos restaurantes) antes de terminarmos a ronda de testes, porque se as pessoas tirarem a máscara e tomarem as refeições, isso constitui um risco. Em Macau, durante a pandemia, muitas medidas foram adoptadas com a colaboração dos cidadãos. Começamos com um apelo, mas se a situação não for controlada poderemos, pela via legal, obrigar as pessoas a não comer nos restaurantes”, disse Alvis Lo, director dos Serviços de Saúde de Macau (SSM). Foi ainda decretado que os serviços públicos permanecem de portas encerradas até amanhã, “à excepção dos serviços indispensáveis e urgentes”. Os funcionários públicos devem “observar o cumprimento do dever, evitando saídas e ficando em casa”.
Andreia Sofia Silva SociedadeCalçada do Gaio | UNESCO recebe nova carta sobre altura do edifício O Grupo para a Salvaguarda do Farol da Guia enviou ontem uma nova carta à UNESCO a apelar a um maior acompanhamento do projecto do prédio embargado na Calçada do Gaio, em prol da preservação do corredor visual do Farol da Guia. Recorde-se que há cerca de uma semana o mesmo grupo fez um apelo público para que este prédio tenha uma altura máxima de 52.2 metros, por oposição aos actuais 82,32 metros. O Conselho do Património Cultural defende a conclusão das obras do edifício com esta altura, embora a solução esteja ainda dependente da posição de outros departamentos públicos. Na carta, o Grupo apela a “uma tomada de posição firme” por parte da UNESCO “em prol do estabelecimento dos limites de altura nos edifícios à volta do Farol da Guia”. “Os Governos de Macau e da China devem ter o compromisso de reduzir a altura do edifício embargado para 52.5 metros. A UNESCO deveria monitorizar de perto o projecto revisto sobre o edifício na Calçada do Gaio para garantir que a altura máxima de 52.5 metros será respeitada”, lê-se na carta. A missiva pede ainda que a UNESCO exija ao Governo de Macau a realização de um estudo urbanístico e de conservação “para toda a extensão da Avenida do Dr. Rodrigo Rodrigues sem mais atrasos”. A missiva acusa ainda a UNESCO de fazer “um lento e ineficaz acompanhamento” do caso, o que “já trouxe sérios danos à integridade visual e aos principais pontos visuais do Farol da Guia”. “Um novo, enorme e alto edifício na Avenida Dr. Rodrigo Rodrigues bloqueou de forma efectiva a conexão visual entre o Farol da Guia e o Arco Oriental, outro marco de Macau. A UNESCO deveria verificar quaisquer impactos no património causados por este projecto e deveria propor medidas preventivas a fim de reduzir os danos na integridade visual do Farol da Guia”, acrescenta-se ainda.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeQuarentenas | Governo aconselha a alterar data da viagem de regresso Para quem tenha dificuldade em marcar um quarto de hotel para a realização da quarentena obrigatória em Macau, as autoridades aconselham a, simplesmente, alterar a data da viagem. O Centro de Coordenação de Contingência diz não ter ainda condições para reduzir preço dos testes feitos nos hotéis Para quem deseja regressar a Macau e estiver com dificuldades em marcar o quarto de hotel para cumprir a quarentena obrigatória, agora de dez dias mais sete de auto-monitoramento, as autoridades apresentam a solução: mudar a data da viagem. Esta foi a resposta dada ontem pela representante da Direcção dos Serviços de Turismo do Centro de Coordenação e de Contingência do novo tipo de coronavírus. “A maior parte das pessoas regressam a Macau entre os meses de Junho e Julho, e se não conseguirem marcar quartos de hotel aconselhamos a que alterem a data de regresso. Temos agora o hotel Sheraton e quem vier de Hong Kong pode fazer esta escolha.” A mesma responsável confirmou que “a situação da marcação dos quartos está estável”, estando a ser acompanhada a situação de estudantes de Macau que pretendem passar as férias de Verão no território ou de outras pessoas que viajem do estrangeiro. “Se for necessário iremos ajustar as medidas e apresentar mais quartos de hotel.” Ficou a promessa da assinatura dos contratos com unidades hoteleiras “com a maior brevidade possível para dar resposta aos cidadãos”, caso sejam necessários mais quartos para os meses de Julho, Agosto e Setembro. Apesar de o Governo ter decretado a redução dos dias de quarentena, mantêm-se os preços dos testes. “Já temos um plano de desconto de 50 por cento do preço dos testes para estudantes, mas tendo em conta os recursos limitados não temos ainda margem para a redução dos preços dos testes feitos nos hotéis”, disse Leong Iek Hou, coordenadora do Centro de Coordenação. Redução em estudo Desde o início da pandemia, e até Maio deste ano, a maior parte das infecções foram detectadas até ao sétimo dia de quarentena. Ainda assim, o Governo continua a estudar a adopção do modelo “7+7”, ou seja, sete dias de quarentena e sete de auto-monitoramento de saúde. “Há cidadãos que gostariam de ver reduzido o número de dias, mas há outros que consideram que mais dias de quarentena é uma medida cautelosa. Veremos agora a situação, se aumenta ou não o risco para a sociedade, e depois pensaremos na medida ‘7+7’”, explicou Leong Iek Hou. Sobre o período de auto-monitoramento e a obrigatoriedade de realização de testes durante sete dias, é necessário “para quem tenha um período de incubação mais longo”. “Com cinco testes conseguimos perceber se a pessoa está ou não infectada. Quisemos encontrar um equilíbrio tendo em conta a redução dos dias de quarentena”, adiantou Leong Iek Hou. Quanto à varíola dos macacos, as autoridades locais estão a analisar a possibilidade de introduzir no território a vacina. “Temos mantido uma estreita comunicação com os fabricantes para tentar introduzir em Macau a vacina contra a varíola dos macacos”, foi referido na conferência de imprensa.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteChina | “Iniciativa de Segurança Global” quer mostrar país como “potência benigna” Os académicos Carlos Gaspar e Francisco José Leandro defendem que a “Iniciativa de Segurança Global”, anunciada por Xi Jinping em Abril no Fórum Boao, é uma componente de defesa da Rota da Seda, que tem como objectivo mostrar ao mundo a posição “benigna” em diplomacia e segurança. Para Carlos Gaspar, o projecto “Uma Faixa, Uma Rota” constitui “uma viragem” nas posições da China, de uma estratégia defensiva para ofensiva Foi em Abril deste ano que Xi Jinping anunciou, no Fórum Boao, a chamada “Iniciativa de Segurança Global”. Para os analistas de ciência política Carlos Gaspar, da Universidade Autónoma de Lisboa, e Francisco José Leandro, da Universidade Cidade de Macau, este é mais um dos muitos tentáculos que compõe a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, com uma clara aposta em matéria de defesa. Os dois académicos participaram na terça-feira numa aula aberta online, promovida pela Universidade Autónoma, com o tema “Nova Rota da Seda e Iniciativa Global de Segurança chinesas”, protagonizada por Francisco José Leandro. O académico referiu que, com a Iniciativa Global de Segurança, a China quer transmitir a ideia de uma “potência global benigna”, que aposta na resolução de conflitos “de um modo pacífico”. Acima de tudo, está em causa a “existência hegemónica de um único actor e a partilha do palco [diplomático] global”, frisou o académico. Francisco José Leandro destacou a existência de seis pontos estratégicos na medida avançada por Xi Jinping, que se prendem com o Mar do Sul da China, a Euroásia ou as relações entre a Índia e Rússia. “Creio que esta Iniciativa, que faz parte da Rota da Seda, foi desenhada para promover parcerias, fugindo da ideia de alianças, algo pouco flexível, que mobilizem diversos tipos de actores e que tem por objectivo promover os interesses chineses”, destacou. O autor alerta para a presença dos acessos às zonas do Índico, Pacífico, Ilhas Salomão, Timor-Leste e Papua Nova-Guiné, “que surgem no contexto de uma segunda área de defesa, que os chineses consideram ser a zona próxima [do país] em termos de interesse estratégico”. Na óptica de Francisco José Leandro, a Iniciativa de Segurança Global “tem como finalidade o acesso, com consentimento, a certas zonas tendo em conta os interesses fundamentais da China”. Estão em causa “aspectos específicos, sobretudo para as regiões africanas, da Euroásia, América Central e do Sul, e também nas regiões polares, no Ártico e Antártico”. O autor destaca também o facto de a Iniciativa estar ligada à dimensão global da Rota da Seda e de o centro das relações internacionais se ter mudado para a zona do Índo-Pacífico. “Esta Iniciativa visa procurar uma solução que contribua para um certo equilíbrio das relações internacionais, mas temos de saber ainda como essa contribuição vai evoluir”, disse. Apesar de a política ter como base o “princípio da defesa indivisível”, uma ideia “que não é nova”, é a primeira vez que é apresentada ao mundo com características chinesas. “Como devemos entender isso? Significa que não está próximo de nenhum dos modelos que conhecemos, mas também não sabemos qual é o modelo. Um dos aspectos interessantes desta Iniciativa é o conceito vago, que se espera ir construindo no contexto dos interesses e da visão chinesa.” Há defesa Para Carlos Gaspar, a “Iniciativa de Segurança Global” é o reflexo da Rota da Seda em matéria de defesa, uma vez que o mundo tem conhecido, nos últimos anos, as perspectivas económica e cultural da política. O académico considera que a política faz “parte integrante da Rota da Seda, com uma dimensão geo-económica ou tecnológica, e é a primeira que tem a ver com a dimensão de segurança e estratégico-militar”. Além disso apontou que a Rota da Seda “é o projecto fundador que marca a viragem de uma posição defensiva para uma fase ofensiva na estratégia internacional da China”. Para Carlos Gaspar, “a partir do momento em que a China quer demonstrar que é uma potência global, demonstra-o com iniciativas concretas”. O país é hoje “a única potência internacional que o é em todas as dimensões relevantes que servem para avaliar o poder internacional de um Estado. É isso que separa a China e os Estados Unidos do conjunto das outras grandes potências”, frisou o analista. Segundo Carlos Gaspar, “não há nenhum Estado que tenha beneficiado tanto como a China das regras da ordem liberal internacional”, e também não há outro país “que seja capaz de ser um rival sistemático da ordem liberal, e de a pôr em causa à escala regional e global”. Acima de tudo, destacou Francisco José Leandro, a Rota da Seda é uma política com vários domínios, sendo que em matéria diplomática impõe-se a criação de “alternativas e pontos de acesso” da China a outras regiões, com a criação de “corredores e rotas marítimas” que servem para “colocar o país no centro do mundo”. Sector mais desenvolvido Na sua apresentação, Francisco José Leandro destacou o enorme aumento, em termos de investimento, em termos numéricos e de qualidade, que o sector da defesa chinês tem revelado nos últimos anos. “A partir de 2014, o volume das exportações ultrapassou o volume das importações em termos de armamento. A China é hoje um dos grandes produtores no sector da defesa, pois produz para si própria e para outros Estados. Mais interessante é o facto de o país produzir mais e muito melhor. Os sectores que estão em expansão são os da tecnologia, como os sistemas de defesa aérea ou os navios, enquanto que, por exemplo, a produção de blindados está em queda. Esta é uma razão de peso para considerarmos que a China é um actor global do ponto de vista da segurança.” Actualmente, a China “não é só o maior exército do mundo como, de entre os países asiáticos, com a excepção do Japão e da Coreia do Sul, é aquele que mais exporta tecnologia para os países vizinhos”, destacou Francisco José Leandro. Sem esquecer a aposta que o país tem feito na área do nuclear e espacial, o académico reforçou a ideia de que “as forças armadas chinesas têm feito um percurso muito interessante”. “O Presidente Xi Jinping viu 2035 e 2049 como duas grandes metas no processo de modernização das forças armadas e da capacidade de actuação conjunta. Há uma reorganização em curso da transformação das forças armadas no sentido da sua actuação mais conjunta e mais moderna. Por isso, assistimos a um maior número de participação em exercícios internacionais.” Além disso, “o próprio orçamento da defesa tem vindo de forma consistente a subir”. “É impressionante o investimento que tem sido feito nesta área, e a China está entre os países que mais investem no sector da defesa”, concluiu. Acima de tudo, são vários os factores que fazem hoje da China um actor global em matéria de segurança e defesa. Francisco José Leandro destacou a “capacidade cibernética [do país] e a presença global de empresas militares de segurança”.
Andreia Sofia Silva EventosCinemateca Paixão | Fantasia preenche a tela este Verão A Cinemateca Paixão apresenta um cartaz de filmes recheados de fantasia até Julho. O ciclo “Um Verão de Coisas Estranhas” apresenta películas como “A Lua de Júpiter”, de Kornél Mundruczó, ou “Antes Que Tudo Desapareça”, do japonês Kiyoshi Kurosawa. Destaque ainda para o ciclo “Selecções de Junho e Julho”, com a exibição de três filmes recentes O mundo da fantasia, em que seres estranhos descem à terra e outras coisas fora da realidade comum acontecem, preenche o novo cartaz da Cinemateca Paixão, disponível até Julho. O ciclo “Um Verão de Coisas Estranhas”, traz a possibilidade de os amantes de cinema “fugirem para um mundo de fantasia através de fantásticos filmes que nos levam a mundos e eventos estranhos e a seres totalmente loucos”. Trata-se de uma viagem “alucinante e fantástica pelo trabalho de alguns dos cineastas mais criativos da nossa geração”. Um dos filmes em exibição, dia 1 de Julho, é “A Lua de Júpiter” [Jupiter’s Moon], de Kornél Mundruczó, uma produção húngara e alemã de 2017 que conta a história de Aryan, um jovem imigrante que, depois de ser baleado ao cruzar a fronteira da Hungria de forma ilegal, percebe que adquiriu o poder sobrenatural de levitar. Colocado num campo de refugiados, Aryan cruza-se com o Dr. Stern, um médico que pretende explorar ao máximo esta nova capacidade de Aryan. “Antes Que Tudo Desapareça” [Before we vanish], o filme que o japonês Kiyoshi Kurosawa realizou em 2017, é outra das apostas da Cinemateca Paixão. Esta é a história da viagem que três alienígenas realizam ao planeta Terra para analisarem o terreno e prepararem uma invasão em massa. Os três seres do outro mundo tomam posse de seres humanos e roubam-lhes sentimentos e ideias como o senso de bondade, maldade, propriedade e família, deixando um rasto de destruição psicológica e espiritual. “Antes Que Tudo Desapareça” será exibido já no dia 30 deste mês e também no dia 9 de Julho. “Fronteira” [Border], de Ali Abbasi, é uma produção sueca e dinamarquesa de 2018 que conta a história de Tina, personagem interpretada pela actriz Eva Melander, que é uma guarda na fronteira com a capacidade para cheirar as emoções humanas e, desta forma, apanhar contrabandistas. Um dia, Tina depara-se com um homem misterioso que apresenta um cheiro que a confunde, levando-a a confrontar-se com pensamentos e emoções sobre ela própria e a humanidade. Este filme poderá ser visto no próximo dia 26 e também a 5 de Julho. Do rol de produções asiáticas presentes neste ciclo de cinema, destaque ainda para “O Lamento” [The Wailing], do sul-coreano Hong-jin Na. Neste filme de 2016, conta-se a história de uma aldeia pacata que, subitamente, começa a registar uma série de assassinatos após a chegada de um homem misterioso. Pode ser visto nos dias 2 e 10 de Julho. Destaque também para as produções “O Fantasma da Sicília” [Sicilian Ghost Story], de Fabio Grassadonia e Antonio Piazza, exibido nos dias 25 de Junho e 6 de Julho, e ainda “Robot&Frank”, de Jake Schreier, que será exibido nos dias 24 e 28 deste mês. As selecções Além do ciclo de cinema dedicado ao mundo da fantasia e do sobrenatural, a Cinemateca Paixão apresenta ainda outras três películas inseridas nas “Selecções de Junho e Julho”. Um dos filmes escolhidos é “Just Remembering”, do japonês Daigo Matsui, uma produção do ano passado que conquistou um prémio especial no Festival Internacional de Cinema de Tóquio. As exibições estão agendadas, em Junho, para os dias 19, 21, 23, 26 e 29, enquanto que em Julho a película pode ser vista nos dias 1, 3 e 8. De Espanha chega também uma película recente, com a assinatura de Fernando León de Aranoa, intitulada “The Good Boss” [O Bom Patrão], uma comédia protagonizada pelo conhecido actor Javier Bardem. Esta é uma história de um patrão, Básculas Blanco, dono de uma fábrica, que passa a vida a intrometer-se na vida de todos os funcionários. A comédia espanhola será exibida nos dias 18, 22, 23, 25, 28 e 30 de Junho, bem como nos dias 3 e 6 de Julho. “A Hero” [Um Herói], uma produção iraniana de Asghar Farhadi, também lançada no ano passado, revela o percurso de Rahim, que, saído da cadeia em liberdade condicional por um curto período, tenta fazer com que o seu credor retire a queixa que o levou à prisão, propondo-lhe pagar a dívida. No entanto, as coisas não correm conforme o plano de Rahim. Este filme poderá ser visto, este mês, nos dias 24, 26 e 29 de Junho, enquanto que em Julho as projecções estão agendadas para os dias 2, 5 e 7 de Julho.
Andreia Sofia Silva Grande Plano ManchetePandemia | Portugueses lamentam burocracia, viagens caras e restrições desumanas Muitos portugueses a residir em Macau estão a preparar a primeira viagem a Portugal desde que começou a pandemia, à boleia da lenta redução das restrições. As opções de viagem são poucas e as que existem são muito mais caras do que o habitual. A burocracia dificulta ainda mais a vida de muitas famílias, algumas a viajar com crianças A chegada do Verão motivou muitas famílias portuguesas a residir em Macau a marcarem as primeiras viagens a Portugal desde que a pandemia começou. Num misto de receio e saudade dos familiares com quem não estão há mais de dois anos, devido às restrições fronteiriças ainda em vigor, não faltam peripécias para fazer uma viagem que antes da pandemia era longa, mas bem mais simples. A começar pelos preços das viagens. Existem poucas opções de voos durante a semana e têm de ser marcadas através de uma agência de viagens para que nada falhe entre escalas, nomeadamente a imensa papelada que é preciso apresentar. Se antes da pandemia, uma viagem normal a Portugal podia variar entre sete e dez mil patacas, hoje os preços quase duplicaram. Vanessa Amaro, professora universitária, viaja no Verão com o marido e três filhos pequenos porque um deles precisa de se submeter a uma cirurgia que não pode ser feita no território. Ao HM, desabafa sobre uma situação que lhe traz expectativa, mas também muito receio. De frisar que, aquando da realização desta entrevista, ainda a quarentena obrigatória para entrar em Macau era de 14 e não dez dias mais sete de autogestão, como já foi anunciado. “Sair daqui, neste momento, é extremamente complicado porque as opções são poucas, pois só há duas viagens por semana, na quarta-feira e no sábado. Estamos habituados a comprar viagens online e não me recordo a última vez que fui a uma agência, mas agora é o único caminho possível.” Vanessa Amaro relata a saga de ter visto o preço de um voo aumentar imenso num só dia. “Perdemos horas e horas à espera de novas opções na agência. Fui ver um voo numa quarta-feira, com o valor de 17 mil patacas, que já é caríssimo. No mesmo dia, à noite, escolhi um voo, e o preço tinha passado para 20 mil patacas. Os valores oscilam muito. Conheço pessoas que pagaram viagens a 15 mil patacas, e outras que pagaram 28 mil patacas, depois de mim. Os bilhetes têm imensas observações que temos de cumprir para sair daqui, como documentos, declarações e testes obrigatórios, o que leva uma pessoa a desesperar.” Actualmente, uma das opções é viajar por Hong Kong e regressar por Singapura, evitando, assim, a realização de uma dupla quarentena, em Hong Kong e Macau. Mas tal implica comprar viagens por companhias diferentes, excluindo a hipótese de pagar preço mais económico de ida e volta. “Ir por Hong Kong é sempre um risco porque só há um autocarro por dia para nos levar ao aeroporto. Chegamos lá, precisamos de uma declaração de saúde, e no aeroporto esperamos muitas horas porque os voos saem tarde. Se o voo é cancelado, não podemos sair do aeroporto”, afirmou Vanessa Amaro. A professora universitária confessa “sentir muito medo” de voltar a Macau e testar um fraco positivo, tendo em conta a possibilidade de isolamento longe da família. “Nem tenho medo de apanhar covid-19, mas sim de chegar com um fraco positivo e ficar separada dos meus filhos, em isolamento, sem necessidade nenhuma. Acho que a situação é desumana.” Além da “burocracia e do dinheiro que se gasta”, Vanessa Amaro destaca o facto de os testes de despistagem à covid-19 realizados no hotel durante a quarentena, no valor aproximado de duas mil patacas, terem de ser pagos com antecedência. “É tanta coisa que eu, para já, só me foquei no que tenho de fazer para sair daqui. Fazer um teste, ir buscar o certificado, e seja o que deus quiser. Fiz a reserva no Hotel Tesouro a contar que o Governo abra novas opções. Somos dois adultos com três crianças, e nesse hotel teremos de ficar separados. Todos estamos vacinados e vamos ter de passar os dias da quarentena sem nos vermos, como se fossemos criminosos”, frisou. Os que não conseguem pagar Ana Lara Clemente, professora, nem estava a pensar fazer uma viagem tão atribulada, tendo em conta que o marido e os dois filhos mais velhos já estão em Portugal. Mas a família ainda não conhece o seu filho mais novo, com apenas dois anos. “Não era para ir porque estou restringida aos dias de férias que tenho, e com a quarentena e o período de auto-gestão fazia com que fosse impossível ir a Portugal. Eles foram mais cedo, contando eu e os outros dois filhos não fossemos. Mas, entretanto, as regras mudaram e os sete dias já não são de autogestão de saúde, o que nos permite fazer a vida normal. Surgiu assim a ideia de ir a Portugal. Foi uma grande alegria para todos nós”, contou. No entanto, a saga da viagem complica-se com o regresso, uma vez que o menino de dois anos não pode ser vacinado devido à idade, o que obriga a estar 14 dias num quarto de hotel, quando a família cumpre apenas dez. “O meu marido fica com ele, porque eu não tenho tantos dias de férias. Eu e os meus outros filhos vamos tentar sair ao fim de dez dias de quarentena. É um pouco complicado, mas vamos ver o que é possível.” Para ir a Portugal, Ana Lara Clemente pagou 25 mil patacas, sendo que a sua família é composta por cinco pessoas. Muitos na sua situação simplesmente não têm como pagar uma viagem tão cara. “Tenho colegas que me dizem que não podem ir, por terem uma família grande. Acrescentam-se as despesas da quarentena, dos testes e o que se gasta em Portugal. Não é um encargo que todas as famílias consigam suportar.” Apesar de todas as regras, Ana Lara Clemente mostra uma atitude compreensiva e assume adorar viver em Macau. “Estou cá há três anos, apaixonei-me pelas pessoas, pelos cheiros. Não me importo, porque gosto muito de viver em Macau e não equaciono sair de cá tão cedo. Mas também gosto do meu país e da minha família. Ao fim de três anos não conhecerem o meu filho, é algo que começa a pesar um pouco”, confessou. Falta de informações Uma outra professora, que não quis ser identificada, viaja sozinha e não vê a hora de sair do território por umas semanas para ver a família. A ideia de viajar surgiu quando as autoridades decidiram baixar a quarentena de 21 para 14 dias, factor decisivo apesar de já ter cumprido 21 dias de quarentena no passado. “A viagem mais barata que consegui foi 16 mil patacas. Como tenho a condicionante de dar aulas e ter de estar em Macau numa data específica, não tenho qualquer flexibilidade de datas, e isso reduziu ainda mais as minhas possibilidades. Tendo em conta que temos as despesas da quarentena e dos testes, os custos logísticos de ir a Portugal custam uma pequena fortuna.” A partir do momento em que se coloca um pé no avião, o dia de chegada a Portugal é sempre incerto. “Uma abertura de ida e volta com Hong Kong é urgente e necessária, pois não vemos a nossa família há mais de dois anos e andamos a juntar dinheiro para fazer esta viagem. As coisas estão de tal maneira que temos de marcar as viagens através de uma agência para termos algumas garantias, sem as ter, mas é a única forma. Houve pessoas que marcaram sem agência e tiveram problemas no regresso, com a perda de voos devido a atrasos e mudanças de última hora.” A professora não tem dúvidas: mais de dois anos com condicionantes para viajar para fora de Macau, mesmo com todas as vacinas contra a covid-19, “é desumano”. “Uma sociedade que assume a família como um valor, colocar entraves à reunião familiar é desumano, quer sejamos estrangeiros ou não, pois damos o nosso contributo individual e social para este território”, desabafou. Com quarentena marcada no Hotel Tesouro, a professora lamenta, por um lado, o elevado preço dos testes, além de não ter ainda a informação de quanto vai pagar por uma noite na unidade hoteleira, questionando a legalidade de fazer este tipo de marcação sem saber valores previamente. As dificuldades de viajar e os muitos dias de quarentena têm originado uma vaga de saídas de pessoas da comunidade portuguesa, muitas delas que residiam em Macau há muitos anos. O cansaço parece acumular-se. Ainda assim, o cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, Paulo Cunha Alves, desvalorizou esta situação, nas celebrações do último 10 de Junho. “Durante estes séculos da nossa presença em Macau houve sempre momentos em que a comunidade saiu mais e outros em que saiu menos. Apenas encaro isso como uma questão temporal, que é fruto da conjuntura da pandemia e que tem obrigado as pessoas a tomar decisões sérias e que devem ser (…) assumidas por si.” Uma posição muito criticada pela professora que preferiu não revelar a identidade, que assume que “Portugal não nos tem ligado nenhuma”. “Quanto muito, dão-nos os parabéns pelo esforço que estamos a fazer. Mas isso não nos serve de nada. Precisamos de esforços é para ter normalidade, porque esta situação é prejudicial para todos”, rematou.
Andreia Sofia Silva EventosCinema | Jay Sun dirige primeiro festival dedicado à comunidade LGBT O Macao International Queer Film Festival está agendado para Outubro. É a primeira edição de um festival de cinema inteiramente dedicado à comunidade LGBT. Jay Sun, já com uma larga experiência na indústria, quer tirar um assunto tabu do armário e debatê-lo na sociedade através dos filmes Macau acolhe, em Outubro, o primeiro festival de cinema inteiramente dedicado à comunidade gay do território. O Macao International Queer Film Festival não tem ainda o cartaz fechado mas terá quatro secções de películas locais e internacionais com temas que giram em torno do mundo LGBT. “Have a Good Night”, filme chinês de 2020 realizado por Hongyu Jiang, será uma das fitas exibidas. Jay Sun, que trabalha há alguns anos na indústria do cinema, sobretudo na organização de eventos, é o director do Macao International Queer Film Festival e pretende, sobretudo, trazer para discussão temas que têm estado escondidos ao longo dos anos. “Há muito tempo que planeava fazer este evento, mas ainda não tinha surgido o momento certo. Hong Kong e Taiwan têm os seus festivais ligados às comunidades LGBT e Queer, e mesmo na China existe um festival de cinema deste género. Então pensei porque é que Macau não teria também um evento destes, que é a forma de expressão mais básica da nossa comunidade, relativamente à diversidade de género”, referiu ao HM. Jay Sun não promete um cartaz extenso, mas garante que haverá uma grande diversidade de filmes de qualidade. “Teremos uma mostra de filmes asiáticos e clássicos também, para mostrar películas que todos gostam. Não está ainda confirmado, mas gostaria de incluir uma secção de curtas-metragens produzidas por locais, embora tenha percebido que não há assim muitos filmes feitos em Macau sobre este tema”, frisou. A organização do festival há muito que estava na cabeça de Jay Sun, que só agora encontrou o momento certo para avançar. “Hoje em dia não há nada de estranho em falar sobre a nossa sexualidade, mas parece-me que no caso da comunidade LGBT de Macau não é um assunto abordado, não está no dicionário. Falamos sobre isso nos bastidores, parece que estamos nos anos 80, mas estamos em 2022. É altura de avançar com mudanças e, através dos filmes, promover a consciência das pessoas, levando-as a pensar que este não é um assunto sobre o qual tenhamos de ter vergonha de falar”, adiantou. Mais LGBT no cinema Sem calendário, programação ou local de exibição ainda definidos, o Macao International Queer Film Festival tem vindo a ser divulgado nas redes sociais e, para já, as reacções têm surpreendido Jay Sun. “Quando comecei a divulgar o festival vi que o número de ‘gostos’ e de partilhas estavam acima das minhas expectativas. Pensei que havia alguma esperança nesta cidade. As histórias, em geral, dizem muito sobre nós próprios e os outros, e nos últimos anos tenho visto filmes que nos contam histórias tocantes.” Jay Sun acredita que, a nível mundial, a comunidade LGBT está cada vez mais presente no mundo do cinema, dando exemplos de filmes vencedores de óscares, como é o caso de “Call Me By Your Name” ou “Brockeback Mountain”. “Temos de trazer este tema para junto das pessoas e não mantê-lo debaixo da mesa. Podemos discutir estes assuntos e, através dos filmes, as pessoas podem começar a discutir estes temas tabu. Espero que as pessoas não fiquem com vergonha de vir ao nosso festival”, rematou.
Andreia Sofia Silva EventosLiteratura infantil | André Carrilho lança “Senhor Mar” Chama-se “Senhor Mar” e é a segunda obra de literatura infantil do ilustrador e cartoonista André Carrilho que acaba de ser lançada. O livro baseia-se novamente numa história pessoal vivida com os filhos e foca-se na ideia de compreensão do mundo que nos rodeia, sobretudo em relação às questões ambientais Depois de “A menina com os olhos ocupados”, André Carrilho, cartoonista e ilustrador português, acaba de lançar um segundo livro infantil com ilustrações, intitulado “Senhor Mar”. Ao HM, o autor, que viveu alguns anos em Macau, conta detalhes de uma história que, mais uma vez, tem como ponto de partida vivências pessoais com os filhos. “Um dia estava na praia com eles a explicar-lhes porque não podiam ir para o mar porque as ondas são perigosas, e porque o mar tem de ser respeitado. A minha filha virou-se e disse ‘Tenha cuidado senhor mar’. Achei que era um bom título e que tinha a ver com o olhar dela face aquela imensidão desconhecida. Havia ali um processo de conhecimento, de tentar compreender, e quis passar isso para o livro”, frisou. Acima de tudo, “Senhor Mar” é “a história lúdica de um dia passado na praia e sobre a menina que vai aprendendo e reflectindo acerca do mar”. Depois do sucesso de “A menina com os olhos ocupados”, tendo em conta os milhares de exemplares vendidos, os prémios ganhos e as traduções já existentes para língua estrangeira, André Carrilho pretende continuar a embrenhar-se no mundo do livro infantil e da ilustração. “É a oportunidade que tenho de fazer um livro de artista, em que consiga ser mais autor. Pego [desta vez] na mesma personagem que tinha pegado no primeiro livro, mas o pressuposto é um bocado diferente. Enquanto que no primeiro livro pegava na maneira como nos alheamos através da tecnologia que existe à nossa volta, com este a ideia foi de, não tendo esse alheamento, ver como tentamos compreender o mundo, sobretudo no que diz respeito às questões ecológicas e ao mar.” Contar histórias André Carrilho confessa que, desde que foi pai, as possibilidades para a escrita de novas histórias não mais pararam de surgir. “Já tenho várias histórias [na gaveta]. Quando me tornei pai fiquei de imediato com várias histórias [com base no] que ia observando. Talvez por ser cartoonista tenho sempre muito inspiração em relação ao que vou vendo e aos problemas que vou encontrando. Normalmente as questões que encontro ao lidar com as crianças, sobretudo com as minhas, espoletam-me sempre soluções ao nível do desenho. Acontece o mesmo com as questões sociais, políticas e económicas. As questões parentais levo sempre para livros infantis.” Em relação a “Senhor Mar”, lançado na semana passada, as expectativas são de que a história possa chegar a um maior número de pessoas possível. “O primeiro livro correu muito bem. Veremos o que vai acontecer com este. Quando faço as obras não penso nelas para venderem muito. Tenho confiança de que as pessoas achem os livros interessantes tal como eu acho. Desde que consiga chegar a um número considerável de casas e pessoas, e que estas leiam os livros e os partilhem com os filhos, já fico contente”, rematou.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeEdifício Ka On Kok | Moradores desalojados devido a desmoronamento Um deslizamento de terras provocado por uma obra, na quinta-feira, levou à destruição parcial de apartamentos do edifício Ka On Kok, junto ao Centro Hospitalar Conde de São Januário. Não houve mortos nem feridos, mas há vários desalojados. Moradores de prédios adjacentes temem pela segurança Vincent Cheang não ganhou para o susto. Poucos minutos depois de o filho ter saído do quarto para ir ter consigo a uma outra divisão da casa, um deslizamento de terras destruiu o quarto por completo. Tal como ele, outras famílias do edifício Ka On Kok, na Estrada de São Francisco, perto do Centro Hospitalar Conde de São Januário, ficaram com as casas parcialmente destruídas. Segundo o Governo, uma obra privada terá causado o deslizamento de terras ocorrido junto ao tardoz do prédio. O local do acidente fica ao lado do troço da antiga muralha da cidade, que também ficou parcialmente destruída. Os apartamentos sofrem agora com diversas infiltrações. A Direcção dos Serviços de Solos e Construção Urbana (DSSCU) efectuou, na quinta e sexta-feira, inspecções no local, incluindo ao estaleiro da obra, tendo concluído que a estrutura do prédio “não apresenta perigo iminente de desmoronamento”. No entanto, tendo em conta a ocorrência de chuvas intensas nos próximos dias, tanto a DSSCU como a Direcção dos Serviços de Obras Públicas (DSOP) iniciaram “obras urgentes de protecção” e de limpeza do local com a remoção dos pedregulhos. Em relação à obra em curso, actualmente suspensa, as autoridades apontam que “o projecto de arquitectura foi aprovado dentro da validade da planta de condições urbanísticas e presentemente é ainda válida a licença de obra deste empreendimento”. Vincent Cheang está neste momento a residir num hotel. Até sábado não havia água e luz nas casas. “Pelo menos agora já posso ir lá lavar a minha roupa. O Governo já nos contactou para discutirmos o que vai acontecer no futuro. Sei que neste momento é difícil remover todas as pedras do local. Espero que possam resolver a situação rapidamente”, contou ao HM. A culpa é do centro? Ontem, os moradores de edifícios adjacentes ao local do acidente realizaram uma conferência de imprensa onde revelaram temer pela sua segurança. É o caso de um morador do rés-do-chão do edifício Kam Lai Kuok, de apelido Ng. “Caso chova muito vou ter infiltrações de água no prédio e em minha casa, pois moro num rés-do-chão. Isto aconteceu também em Outubro quando houve o tufão. Queixei-me aos bombeiros, à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes e ao Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-estruturas. Vieram cá pessoas para fiscalizar, disseram que não havia riscos imediatos, mas depois não houve mais avanços”, adiantou. Ng vai precisar de renovar a casa por completo, uma vez que o soalho é de madeira e apodreceu com a água. Muitos moradores descrevem que as infiltrações nunca ocorreram antes do arranque das obras de construção do edifício de doenças infecto-contagiosas junto ao hospital público, mesmo com os tufões Hato e Mangkhut. “As infiltrações já nos perturbam há cerca de meio ano e não temos meios para nos queixarmos. Com os danos causados no edifício Ka On Kok, estamos preocupados e queremos que haja medidas preventivas. Chegámos a recrutar um técnico para analisar a origem das infiltrações, que não nos deu certezas, mas que falou da possibilidade de virem da zona montanhosa ao lado. Não podemos fazer nada, porque se a obra é do Governo este é que tem de verificar”, explicou Ng. Os deputados Song Pek Kei, Nick Lei e José Pereira Coutinho estiveram ontem presentes na conferência de moradores. Ao HM, Coutinho disse já ter recebido pedidos de ajuda de residentes de dois blocos habitacionais adjacentes às obras do centro de doenças infecto-contagiosas. “Esta questão é bastante urgente e exige cuidados redobrados por parte das autoridades para evitar que as situações se repitam, nomeadamente a fixação de materiais que impeçam o deslizamento de terras e a queda de grandes pedras.” Coutinho descreve que, neste momento, há sete pedregulhos caídos junto ao edifício Ka On Kok. “Se as águas fizerem deslizar essas pedras, então vamos ter acidentes graves porque a maior parte das fracções voltadas para o local da construção são quartos de crianças. Vejo esta situação com alguma apreensão. Estamos a analisar a que nível iremos interceder”, concluiu. Segundo a imprensa chinesa, a presidente do Instituto Cultural, Leong Wai Man, prometeu recuperar da parte danificada da antiga muralha, de cerca de 18 metros. Para já, assegurou, a prioridade é garantir a segurança dos moradores.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeCovid-19 | Período de quarentena baixa de 14 para dez dias A partir da meia noite desta quarta-feira o período de quarentena passa de 14 para dez dias, incluindo sete dias de auto-monitorização de saúde. Tal implica ter o código de saúde verde e a realização de testes de despistagem à covid-19 O Governo anunciou este sábado que os dias de quarentena obrigatória para quem entra em Macau vindo de Hong Kong, Taiwan e países estrangeiros vão passar dos actuais 14 para dez dias, incluindo o cumprimento de um período de auto-monitorização de saúde, o que significa que a pessoa fica com o código verde, podendo, portanto, entrar em todos os locais do território, mas terá de realizar testes de ácido nucleico no 11.º, 12.º, 14.º, 16.º e 17.º dias após a entrada. Segundo uma nota de imprensa divulgada pelo Centro de Coordenação e de Contingência do novo coronavírus, esta medida foi adoptada “tendo em conta o curto período de incubação da infecção da estirpe variante Ómicron”, uma vez que “as pessoas infectadas podem ser detectadas através de um teste de ácido nucleico no prazo de sete dias após o contacto com este vírus”. As autoridades dizem ter tomado esta decisão “após [ser realizada] a análise à experiência recente do interior da China e os dados da RAEM”. O modelo “10+7”, assim descrito pelas autoridades, só pode ser aplicado a pessoas totalmente vacinadas contra a covid-19 e que tenham todos os testes negativos aquando da entrada no território. O período de auto-monitorização de saúde inicia-se no primeiro dia após a realização da quarentena, sendo que “o dia da entrada em Macau, e até às 6h do dia seguinte, é considerado como dia zero”. Caso não sejam realizados os testes neste período de sete dias, o código de saúde passa então de verde a amarelo. Quem não realizar o teste obrigatório dentro das 24 horas após a data agendada, passa a ter um código vermelho. Além disso, “as pessoas provenientes de Hong Kong, região de Taiwan ou de países estrangeiros não estão autorizadas a deslocar-se ao Interior da China através da RAEM até que o teste de ácido nucleico no 14.º dia, após a entrada, tenha um resultado negativo”, aponta ainda a mesma nota. Sete dias em análise Esta medida foi anunciada dois dias depois da conferência de imprensa semanal do Centro de Coordenação e de Contingência do novo coronavírus, onde as autoridades admitiram estar ainda a estudar a possibilidade de reduzir os dias de quarentena. “Vamos primeiro reduzir de 14 para dez dias a título experimental e veremos se há a possibilidade de reduzir para sete dias. Estamos a analisar a situação no Interior da China, pois a medida de quarentena de sete dias difere de cidade para cidade”, disse Leong Iek Hou. Nesse dia, foi também anunciada a entrada a todos os trabalhadores não residentes (TNR) estrangeiros, sendo que a partir de hoje podem entrar os TNR com blue card válido, oriundos do Interior da China. Trabalhadores estrangeiros especializados devem candidatar-se ao processo de entrada a partir de 24 de Junho. Recorde-se que na última semana, o Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, avançou com a possibilidade de reduzir a quarentena de 14 dias no período do Verão, sem adiantar uma data concreta. “Há quatro cidades piloto do Interior da China que, durante cerca de um mês, experimentaram implementar um período de quarentena de 10 dias mais sete [de auto-gestão]. Estamos a continuar o nosso trabalho, pois esta parece ser a tendência. Depois de avaliarmos as nossas medidas (…) iremos tentar que sejam 10 dias mais sete. Esperamos atingir essa meta durante o Verão”, adiantou Ho Iat Seng à TDM-Rádio Macau. Para Xangai e Mongólia Desde a 1h de hoje que é obrigatório o cumprimento da quarentena de 14 dias para quem tenha estado em diversos locais das cidades de Erenhot e Chifeng, na Região Autónoma da Mongólia Interior. A medida aplica-se também a quem tenha viajado de vários locais da cidade de Xangai, nomeadamente de diversos complexos residenciais. Quem tenha estado no distrito Fengxian, em Xangai, deverá “estar atento ao seu estado de saúde e ser sujeito a testes de ácido nucleico por iniciativa própria”, no primeiro, quarto e sétimo dia, sendo que o código de saúde ficará verde neste período.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeCovid-19 | Governo abre portas a TNR de todas as nacionalidades A partir de segunda-feira, os trabalhadores não-residentes com blue card válido estão autorizados a entrar para Macau, enquanto que quem tem autorizações de trabalho pode candidatar-se ao processo de entrada a partir de 24 de Junho O Governo decidiu levantar algumas restrições de entrada no território, permitindo a vinda de trabalhadores não-residentes de todas as nacionalidades. Foram ontem anunciadas regras para três grupos de trabalhadores, sendo que já a partir da meia-noite de segunda-feira será permitida a entrada de trabalhadores não-residentes (TNR) com um blue card válido, sem necessidade de requerimento prévio emitido pelos Serviços de Saúde (SSM). Em relação aos TNR especializados com autorização de trabalho emitida pela Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) e Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), bem como quem tenha autorização especial de permanência, podem candidatar-se ao processo de entrada a partir de 24 de Junho. As regras completas serão publicadas no dia 17 de Junho pelas autoridades. Cabe às entidades empregadoras de TNR especializados fazer o pedido de requerimento aos SSM, enquanto os próprios trabalhadores devem tratar do processo para os familiares. As autoridades sublinharam que é obrigatória a vacinação contra a covid-19 para quem entra em Macau, sendo que os empregadores devem assumir o pagamento da quarentena caso os TNR não tenham condições económicas para o fazer. Na conferência de imprensa de ontem do Centro de Coordenação e de Contingência, foi ainda referido que os cidadãos do Nepal, Sri Lanka, Bangladesh, Nigéria e Paquistão devem requerer um visto junto da embaixada ou consulado da China antes de entrarem em Macau pela primeira vez. Recorde-se que desde 27 de Maio é possível a entrada de portugueses não-residentes e que, até à data, foram recebidos 54 pedidos, estando todos em processo de análise. Em relação à vinda de trabalhadores domésticos, o Governo recebeu 100 pedidos e aceitou 55. Apenas cinco requerimentos foram cancelados a pedido do empregador. Redução em análise Em relação à redução do período de quarentena, Leong Iek Hou deu eco às palavras de Ho Iat Seng, mas não adiantou datas concretas. “Vamos primeiro reduzir de 14 para dez dias a título experimental e veremos se há a possibilidade de reduzir para sete dias. Estamos a analisar a situação no Interior da China, pois a medida de quarentena de sete dias difere de cidade para cidade. Há pessoas que precisam de ficar em casa e outras que saem no período de auto-gestão de saúde”, adiantou Leong Iek Hou, médica e coordenadora do centro. As autoridades anunciaram também o encerramento, a partir de segunda-feira, do centro de vacinação de Mong-Há.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteCensos 2021 | Mais residentes têm curso superior, mas mercado não absorve graduados Numa década, o número de residentes com curso superior mais que duplicou. A maior parte opta por licenciaturas em ciências empresariais, línguas e turismo. Entre 2011 e 2021, quase metade dos diplomas foram obtidos nas universidades locais. Analistas ouvidos pelo HM assumem que o mercado laboral não consegue absorver todos os licenciados Em dez anos, a fatia da população com curso superior quase duplicou, segundo os resultados dos Censos 2021, que traçam o retrato de um período marcado não apenas pelo investimento público no ensino superior, aponta o relatório. “A tendência para a formação contínua foi impulsionada pelo aumento da procura de quadros qualificados, que se deve ao desenvolvimento económico”, lê-se. Da população com mais de 15 anos, num total de 583.089 pessoas, 175.956, ou seja, 30,2 por cento, tinha curso superior, quando esse valor era em 2011 de apenas 18,1 por cento, o que constitui um aumento de 99,9 por cento. Relativamente aos locais, deu-se um aumento de 97,9 por cento do número de residentes com formação superior, sendo que as maiores proporções se registam nas pessoas com idades compreendidas entre 25 e 29 anos e dos 30 aos 34 anos, com percentagens de 72,2 e 61 por cento. A grande escolha dos residentes recai na licenciatura, que representa 69,8 por cento, enquanto que apenas 14,7 dos residentes tem mestrado e 1,6 por cento doutoramento. Relativamente às áreas de ensino, os cursos de “ciências empresariais e administração” são os mais procurados, com uma fatia de 30,5 por cento, enquanto os cursos de “humanidades e línguas” representam nove por cento. Seguem-se os cursos de “turismo, hotelaria e serviços de catering”, com 8,4 por cento. Apesar de muitos locais optarem por estudar no estrangeiro, a verdade é que a procura por cursos em Macau aumentou, com 44,2 por cento dos diplomas a serem obtidos no território. Segue-se o Interior da China com 29,5 por cento, Taiwan com 10,5 por cento e Hong Kong com 2,8 por cento. Portugal representa apenas 1,3 por cento dos destinos para frequentar o ensino superior. Ainda no sector educativo, os Censos mostram que “com a elevação do nível de escolaridade da população, 29 por cento dos trabalhadores detinham cargos de ‘directores e dirigentes administrativos’, ‘especialistas das profissões intelectuais e científicas’ e ‘técnicos e profissionais de nível intermédio’”, um aumento de 6,2 por cento face a 2011. Estes trabalhadores mais qualificados eram, no total, 10.5432, sendo que 73,8 por cento tinha estudado no ensino superior. E encontrar emprego? Para Agnes Lam, académica e ex-deputada, estes dados são “um bom sinal” e reflectem “o investimento que tem sido feito pelo Governo no que diz respeito à escolaridade gratuita e concessão de bolsas”. No entanto, acredita que, com o actual cenário de crise económica, “o mercado não consegue absorver todas as pessoas”. “Deveria haver um mecanismo para ajudar licenciados a iniciarem os seus próprios negócios em determinadas áreas, e não apenas a abrirem cafés. Há pequenos negócios que podem ser criados, mas serão precisos mais dez anos para vermos algum desenvolvimento [a este nível]. Deveríamos apostar também na educação profissional. Não podemos ter os mesmos empregos que tínhamos nos anos 90 e as pessoas também têm de encarar essa realidade”, admitiu. Rui Martins, vice-reitor da Universidade de Macau (UM), interpreta os dados demográficos do ensino como o reflexo do investimento público e privado no ensino superior. “A nível de licenciatura creio que grande parte dos alunos são de Macau, mas ao nível de mestrado e doutoramento este panorama inverte-se um bocado”, disse. Antes da pandemia, 30 por cento dos graduados da UM encontravam emprego assim que terminavam o curso, mas o cenário mudou um pouco. “Estamos numa situação de crise devido à pandemia e isso afecta grandemente a economia dos casinos. Estes têm, à sua volta, uma série de empresas e indústrias que permitem a criação de muitos empregos. Até 2019/2020, costumava dizer que bastava a um aluno de Macau entrar na UM para ter emprego. Mas a economia está a abrandar e os licenciados começam a ter mais dificuldades em encontrar emprego.” No entanto, Rui Martins acredita que, levantadas as restrições pandémicas e com mais visitantes, a situação laboral “entrará no ritmo normal que tínhamos”. Por sua vez, Carlos Noronha, docente da UM, destaca o “grande encorajamento para que os residentes trabalhem em Hengqin”, embora haja ainda poucas vagas no contexto dos projectos de cooperação existentes. “Temos de esperar mais um tempo porque a economia está a ser muito afectada pelas restrições. Como se pode atrair os jovens a trabalhar em Hengqin? Por exemplo, na Grande Baía, existe um sistema jurídico diferente e estas coisas têm de ser resolvidas.” Carlos Noronha entende, contudo, que existe “receio de ir trabalhar para outros locais”, pois em Macau “os jovens são muito protegidos e talvez queiram manter-se por perto ou mesmo “procurar emprego em Hong Kong”. “Não há emprego se a porta para a internacionalização continuar fechada. [Seria importante] enviar estudantes universitários para o estrangeiro para absorverem mais conhecimentos e deixá-los regressar a Macau ou para Hengqin para transferir ferramentas e capacidades. Macau vai conhecer um retrocesso se continuar desta forma”, rematou o docente da UM. Tudo para Coloane Coloane registou, em dez anos, um aumento de moradores de 753,7 por cento, e uma subida vertiginosa de 900 por cento no número de habitações. Por sua vez, a Ilha Verde teve um aumento de 143,9 por cento, devido à construção “de edifícios novos e empreendimentos habitacionais públicos de grande envergadura”. Entre 2011 e 2021 registou-se uma quebra de 6,8 por cento no número de pessoas a viver na península, enquanto que a proporção a residir na Taipa aumentou 16,4 por cento. Os mais velhos residem sobretudo em zonas como a Praia Grande e Penha, numa proporção de 18,4 por cento, e avenida Conselheiro Ferreira de Almeida, com 17,1 por cento. Em termos de dimensão do território, Macau tinha em 2021 mais 3,14 quilómetros quadrados, sendo que na baixa da Taipa residem 75.689 pessoas, 11,1 por cento da população total. Na zona da Areia Preta reside 10,4 por cento. TNR no activo Entre 2011 e 2021, deu-se um aumento de 8,8 por cento das pessoas em idade de trabalhar “em consequência dos incrementos de imigrantes e de trabalhadores não-residentes”. A população activa feminina cresceu 14,6 por cento, sendo superior à masculina em 3,3 por cento. Em termos gerais, Macau a população activa no ano passado era de 377.071 pessoas. A população empregada global era, em Agosto de 2021, composta por 364.043 pessoas, mais 7,8 por cento em relação há dez anos atrás. Sectores como o do jogo, inserido nas “actividades culturais e recreativas, lotarias e outros serviços”, comércio por grosso e retalho, hotelaria e restauração tinham 48 por cento da população empregada global, uma quebra de 4,1 por cento em relação a 2011. A área do “trabalho doméstico” tinha, em 2021, mais cinco por cento de pessoas empregadas, num total de 30.242 pessoas, em relação a 2011. No ano passado havia também mais pessoas empregadas nos sectores da educação (5,4 por cento), saúde e acção social (4,3 por cento) e actividades financeiras (3,9 por cento). Salários em alta A mediana do rendimento dos trabalhadores de Macau subiu 5.600 patacas em dez anos, situando-se, em Agosto do ano passado, em 15.600 patacas. Os funcionários públicos apresentam a mediana de rendimento mensal mais elevada, com 40.000 patacas, seguindo-se os sectores da “educação”, com uma mediana de 27.000 patacas, e “produção e distribuição de electricidade, gás e água”, com 25.500 patacas. Idosos em casa A população idosa mais que duplicou, com um aumento de 107,2 por cento em relação a 2011. Os idosos representavam no ano passado 12,1 por cento da população, mais 4,9 por cento face a 2011, sendo que mais de metade dos dependentes, 63,7 por cento, vivem em casas de família, enquanto que 34,5 por cento estão em lares. Ainda assim, 95,5 por cento dos idosos com 60 ou mais anos afirma ter capacidade para levar uma vida autónoma. A solidão na terceira idade é cada vez mais comum, uma vez que, em dez anos, houve um aumento de 80,3 por cento de idosos a morar sozinhos. Francisco Manhão, presidente da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau (APOMAC), considera que, em termos gerais, os mais velhos têm uma boa vida em Macau, sendo importante o regresso da injecção das sete mil patacas anuais nas contas individuais de previdência. Isto porque o Governo “deveria partilhar mais a sua riqueza com os residentes, em particular com os da terceira idade”. Além disso, Francisco Manhão defende a criação “de uma cidade satélite” para albergar os idosos. Rendas mais caras Olhando para o contexto da habitação privada arrendada, os Censos mostram que em Agosto do ano passado as zonas do Pac On e Taipa Grande são as que têm a renda média mensal mais elevada, no valor de 16.300 patacas. Pelo contrário, viver nas zonas do Patane e São Paulo era mais barato, com uma renda média mensal de 5.500 patacas. A renda média mensal das casas paga por agregado familiar atingiu, em 2021, o valor de 8.700 patacas. Português menos falado Em matéria de domínio de línguas, os Censos revelam que, em dez anos, houve uma ligeira descida de 0,1 por cento das pessoas que falam fluentemente português, representando apenas uma fatia de 2,3 por cento. Entre 2011 e 2021, Macau passou a ter mais pessoas a dominar o inglês, um aumento de 1,3 por cento, representando uma proporção de 3,6 por cento. Tal deve-se “ao crescimento da população imigrante oriunda de outros países ou territórios”. Em termos de domínio geral de línguas, 86,2 por cento da população usava o cantonense como meio de comunicação, enquanto que 45 por cento falava mandarim, menos 3,8 por cento e mais 3,6 por cento, respectivamente.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteAlexandre Pais, director do Museu Nacional do Azulejo: “Portugueses não tinham o segredo da porcelana” Estudioso da influência da porcelana chinesa na cerâmica portuguesa, Alexandre Pais é um dos contribuídores do livro “Rotas da Cerâmica”, que conta a história do comércio da porcelana e da sua produção em Jingdezhen, na China. O livro editado pelo Instituto Confúcio da Universidade de Aveiro também aborda o período de grande exportação para a Europa, sobretudo para Portugal, a partir dos séculos XVI e XVII Como surgiu a possibilidade de participar nesta obra? Já tinha tido contactos com o professor Carlos Morais e fizemos uma série de projectos. O meu texto é sobre a integração da faiança portuguesa de inspiração oriental e é um resumo da minha tese de doutoramento. O livro, em si, é importante porque nos apresenta o ponto de vista do Oriente em relação à porcelana. Normalmente, tudo o que existe é sempre do ponto de vista do Ocidente. Pelo que li, há muita bibliografia oriental à qual os ocidentais não têm acesso, incluindo sobre escavações arqueológicas. Como chega porcelana chinesa a Portugal ao ponto de inspirar a nossa cerâmica? Ela entra nos finais do século XV e início do século XVI, após a descoberta do caminho marítimo para a Índia. Portanto, com Vasco da Gama chega logo uma série de porcelanas. Ela depois começa a ser comercializada em grande quantidade, e Portugal é o primeiro país europeu a comercializar grandes quantidades de porcelana, mas também outro tipo de materiais e objectos. A porcelana entra de facto no gosto de toda a sociedade, com objectos para todas as bolsas, menos para as classes mais desfavorecidas. Até à burguesia, digamos assim? Do que chamamos burguesia, que na altura não existia, mas mercadores, classes um pouco mais abastadas que não pertenciam à nobreza. A porcelana é disseminada por todo o mercado europeu, e depois, quando perdemos a independência e ficamos sob alçada da coroa espanhola, outros países começam a cobiçar as rotas portuguesas do Oriente, nomeadamente os holandeses. [Chega mesmo a haver] a apreensão de diversas caravelas que transportavam porcelanas, que depois são vendidas no mercado de Amesterdão, e a partir daí a Holanda começa a querer o caminho e perdemos essa rota comercial pela associação com Espanha. Não quer dizer que deixe de entrar porcelana em Portugal, mas entra pouca, e não temos já essa importância. Não temos provas, mas parece-nos que as olarias portuguesas começam a produzir um tipo de decoração que, não sendo porcelana, invoca o Oriente. Existe um produto genuíno que é mais raro e caro, mas os portugueses começam a consumir esta faiança que tem qualquer coisa de exótico. E é por aí que vai sendo feita esta produção. É curioso porque surge um pouco também como contraponto às produções espanholas, que são diferentes. Depois também terá algumas componentes exóticas. A sensação que tenho é que a nossa faiança surge como contraponto ao que é produzido na península e como resposta à perda da rota e da quantidade de porcelana que vinha para a Europa. O domínio espanhol levaria a porcelana chinesa também para Espanha. Não estudei muito esse ponto, mas é óbvio, porque os espanhóis, ao ficarem com o reino português, ficaram com todas as rotas comerciais. Depois havia a rota de Manila para compensar a questão das rotas holandesas, e a porcelana e os espanhóis também faziam encomendas específicas à China, como os portugueses anteriormente também faziam. Mas Espanha acaba por beneficiar do facto de nos ter sob sua alçada. Depois de 1640 como ficou o comércio da porcelana? Reforçou-se, houve uma expansão no mercado? Não inicialmente, porque os primeiros 20 anos não foram fáceis. Falamos de 1640, mas o processo da restauração da independência foi longo. Isso nota-se pela própria produção de faiança: numa fase inicial, ainda tenta acompanhar a questão do exotismo, mas começamos a notar uma certa decadência. À medida que vai havendo dinheiro e reforço das rotas comerciais portuguesas, e como depois começa a ser possível encomendar directamente na China, a produção passa a ser completamente diferente da que era no século XVI. Aí era o azul e branco, mas a partir desta altura, em finais do século XVII, começamos a ter as chamadas famílias, verde, rosa. Começamos a ver, como há uma alteração do gosto e da própria utilização, pois a sociedade torna-se mais complexa, uma mesa portuguesa começa a ter mais produtos, surgem mais exigências em termos de higiene, por exemplo. Aí começam a ser encomendadas à China uma série de formas diferentes e objectos com outras características, surgem as peças brasonadas. Com o século XVIII dá-se uma grande expansão da loiça brasonada para o mercado interno, e aí a faiança deixa de ter qualquer importância. Além do brasão, que elementos destaca nessas peças? Algumas obras são encomendas específicas com elementos relacionados com os locais a que se destinam, como é o caso das casas religiosas. As grandes alterações prendem-se com a morfologia, a quantidade de peças que são encomendas com novas utilidades. São produzidas terrinas com a forma de animais, vegetais e frutas, o que tem a ver com a cenografia barroca das mesas temáticas. Eram, portanto, feitas encomendas específicas aos fabricantes chineses. Sim, mas isso já no século XVI. Havia motivos que eram levados para o centro produtor e que às vezes não eram bem interpretados. Mostrava-se um motivo e ele era invertido, por exemplo. Há erros porque o oleiro chinês não sabia interpretar bem as instruções, frases ou palavras invertidas, por exemplo. O livro fala dos centros de produção na China, nomeadamente em Jingdezhen. Era uma importante actividade económica na altura? Sim. Jingdezhen é uma região quase totalmente dedicada à olaria. Havia mais centros produtores na China, mas esta região era o ponto principal. Produziam também para outros centros na Ásia, mas era em Jingdezhen que estavam os centros de produção imperiais. Havia loiça para a corte, para o imperador e para exportação. Este centro ainda hoje está activo e replica muitas produções antigas. O que revela o comércio de porcelana sobre as ligações entre Portugal e a China? O Oriente sempre foi um foco de interesse para o Ocidente. Os portugueses são um povo muito curioso em relação a outras culturas e povos. Nota-se essa predisposição até na nossa expansão. O Oriente era uma civilização muito requintada e avançada e suscitava curiosidade. Ter objectos de uma cultura que não é próxima, com uma noção de exotismo, é sempre um factor apetecível, e dá uma dimensão mais sofisticada a quem a possui. Despertou-me curiosidade, na caracterização da cidade de Lisboa no século XVII e dos tipos de população, com pessoas oriundas da Índia, do Japão, da China. A convivência era relativamente estável entre essas populações e a população portuguesa. Nós mostrávamos as nossas faianças no Oriente? Os missionários levavam algumas peças? Suponho que seria algo residual. Tentei perceber se na China e Japão haveria faiança portuguesa, e tenho informação escrita de que haveria alguns exemplares em Hiroshima, mas não tenho mais dados. Portugal importava mais porcelana chinesa do que outros países europeus? Não sei se isso está estudado. Inicialmente, no século XVI, até à perda da rota comercial, tínhamos mais comércio com o exterior. Éramos os maiores importadores de produtos chineses, nomeadamente de porcelana. Nos séculos XVII e XVIII já existiam as companhias orientais holandesas e inglesas. Tendo em conta a quantidade de serviços de porcelana brasonados que há em Portugal dessa época, mostra que tínhamos um papel muito destacado na importação. Ainda se encontram influências dessa ligação na cerâmica de hoje em dia, por exemplo? Não. Essa influência dura todo o século XVII, e um dos últimos anos começa a ser já muito residual. A partir do momento em que retomam as rotas comerciais com a China, no final desse século, a faiança volta a ser um produto para classes menos endinheiradas, sem necessidade de grande decoração. Nessa altura as olarias portuguesas começam a trabalhar mais no azulejo. A cerâmica passou para segundo plano. Há visões do Oriente no azulejo português, por exemplo? Sim, visões da China e do Japão feitas com base em gravuras europeias. Muitas retratam um quotidiano que é imaginado, sempre com a ideia do exótico. Não é o retrato real de uma sociedade, mas a fantasia sobre o que é a vida do outro. Falamos de uma sociedade que, para nós, era pagã, adorava vários deuses, tinha hábitos estranhos. Mas ainda no século XVII, encontramos alguma influência exótica no azulejo português, embora não seja determinante. No caso da faiança, essa influência está muito presente inicialmente, mas progressivamente o que interessa é uma recriação de elementos que vão sendo aplicados na faiança. Depois adicionam-se elementos ocidentais, criando-se um produto híbrido. Nós não tínhamos o segredo da porcelana. Porquê? Não se percebia que material era, e pensava-se que a matéria de porcelana era um tipo de búzio específico. A produção de porcelana nunca foi privilegiada porque tínhamos imenso comércio com a China e, provavelmente, terão pensado que não valeria a pena produzir em Portugal. Demora algum tempo até a Vista Alegre começar a produzir porcelana, já no século XIX, ainda que o segredo do material tivesse sido descoberto antes. A história do comércio Editado pelo Instituto Confúcio da Universidade de Aveiro, “Rotas da Cerâmica” conta com a participação de diversos autores, com a edição por Carlos Morais e Ying Han. Além da colaboração de Alexandre Pais, o livro tem ainda a colaboração de Guo Mo, da Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau, que aborda “os motivos chineses na faiança portuguesa: três exemplos de ‘venerar sem subserviência’”. Destaque ainda para o capítulo dedicado à “expansão e influência da cultura da cerâmica chinesa no sudeste asiático”, da autoria de Han Yeliang e Zhi Rui, da Universidade de Línguas Estrangeiras de Dalian, na China.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeCensos revelam crescimento mais lento da população A população de Macau tem vindo a crescer de forma mais lenta em comparação a 2011. Esta é uma das conclusões dos resultados globais dos Censos 2021 ontem divulgados, que mostram que a taxa de crescimento médio anual foi de 2,1 por cento, inferior à taxa de 2,4 por cento, registada entre os anos de 2001 e 2011. Por sua vez, a população total em 2021 era de 682.070 pessoas, mais 23,5 por cento em relação a 2011. Excluindo estudantes do exterior e trabalhadores não residentes, Macau tinha apenas, em 2021, 568.662 pessoas, mais 17,2 por cento, em relação a 2011. O envelhecimento contínuo da população é outra das conclusões dos Censos. A população idosa, composta por pessoas com mais de 65 anos, era constituída por 82.812 pessoas, um aumento de 107,2 por cento em relação a 2011. Os idosos representam hoje 12,1 por cento da população, mais 4,9 por cento face a 2011. Por sua vez, o índice de envelhecimento cresceu 23,0 pontos percentuais para 83,7 por cento. Mais mulheres e solteiros O relatório de 2021 conclui também que Macau tem hoje mais mulheres do que homens, e também mais solteiros. A população feminina era de 361.785 pessoas e a masculina de 320.285 pessoas, representando 53 e 47 por cento da população total, respectivamente. Em relação à população com idade igual ou superior a 16 anos, 27,4 por cento era solteira, o que representa um aumento de 2,8 por cento em relação a 2011. Os casados eram, em 2021, 64,1 por cento, menos 3,3 por cento por comparação a 2001. Os dados mostram ainda que os jovens casam cada vez mais tarde, por volta dos 30 anos, quando em 2001 se casavam por volta dos 28 anos. Outra das conclusões, passa por uma maior escolaridade da população, uma vez que, no ano passado, 30,2 por cento da população com mais de 15 anos tinha frequentado um curso do ensino superior, num total de 175.956 pessoas. Trata-se de um crescimento de quase 100 por cento em relação a 2011. Olhando para a génese das famílias, houve um aumento de 18,7 por cento no número de agregados familiares face à última edição dos Censos, no entanto, hoje a sociedade tem mais famílias compostas por duas pessoas. Este tipo de agregado familiar é actualmente “predominante”, representando 25,6 por cento, um aumento de 2,3 por cento em relação há dez anos. Os Censos revelam, portanto, “uma redução contínua da dimensão dos agregados familiares”. Em dez anos, deu-se ainda um aumento da oferta de habitação pública. Só em habitações económicas moram hoje mais 61,3 por cento das famílias.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteQuarentena | Redução não é suficiente para fomentar turismo, dizem analistas Ho Iat Seng admitiu reduzir o período de quarentena para dez ou sete dias. Analistas ouvidos pelo HM consideram que a medida não é suficiente para impulsionar a economia e o turismo. Óscar Madureira acredita que reduzir quarentenas vai, sobretudo, trazer benefícios para os residentes O Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, admitiu na segunda-feira a possibilidade de reduzir no Verão o período de quarentena obrigatória à chegada ao território de 14 para dez ou sete dias, embora não tenha avançado com datas para a entrada em vigor da medida. “Há quatro cidades piloto do Interior da China que, durante cerca de um mês, experimentaram implementar um período de quarentena de 10 dias mais sete [de auto-gestão]. Continuamos o nosso trabalho, pois esta parece ser a tendência. Depois de avaliarmos as nossas medidas (…) iremos tentar que sejam 10 dias mais sete. Esperamos atingir essa meta durante o Verão”, disse Ho Iat Seng, segundo a TDM-Rádio Macau. Analistas ouvidos pelo HM afirmam, contudo, que a medida está longe de poder causar um boom turístico em Macau. Primeiro, porque o sector do jogo já está a sofrer com outras políticas, e depois porque, com a permanência de restrições, a atracção para jogar no território ou para o visitar vai continuar a ser menor. O advogado Óscar Madureira, especialista na área do jogo, não tem dúvidas de que “a medida é boa, essencialmente, para os residentes”, que desejam sair de Macau para visitar o seu país e as famílias. “Não acredito que seja fácil, enquanto durarem as restrições, começar a receber turistas de fora. Continua a ser exagerado alguém fazer quarentena de sete dias para jogar num casino. Apesar de ser uma redução significativa, continuo a achar que o impacto será pouco relevante”, adiantou ao HM. Ainda assim, o responsável defende que a medida acaba por ser positiva. “Tudo o que ajude a facilitar a vinda de turistas para Macau é bom e aumenta o número de potenciais clientes, mas depende de qual vai ser o resultado deste aligeirar de medidas.” “Macau e a China eram, até há bem pouco tempo, os únicos territórios do mundo que não permitiam a entrada de estrangeiros, e é bom saber que eles estão a inverter a política, a considerar outras possibilidades. Sem dúvida que é bom, embora seja uma medida que peque por tardia”, frisou. Para o economista Albano Martins, o impacto também será reduzido. “A medida é um passo em frente em relação à situação absurda que se vive hoje, não apenas em Macau como em toda a China. Trata-se de uma opção claramente política e, portanto, em Macau tem de se respeitar. Mas continua a ser uma medida obsoleta, porque fora da China as pessoas já se habituaram a conviver com a covid-19 e ao fim de uma semana de auto-isolamento em casa estão preparadas para regressar ao trabalho.” Relativamente ao jogo, Albano Martins aponta que este já está a definhar há muito, e não apenas com as restrições pandémicas. “O jogo está a ser praticamente liquidado, e é também uma decisão claramente política. A China considera que viola a sua cartilha e o cerco aperta-se cada vez mais. Apesar do estatuto autónomo de Macau, o certo é que, de há dois anos para cá, a China começou a apertar essa actividade económica. Os resultados das operadoras mostram que o sector do jogo está muito mau. Está melhor do que antes [em relação ao período da pandemia], mas a medida não vai resolver nada.” O economista estima que a China vai ter de pôr um ponto final às políticas altamente restritivas de controlo da pandemia. “É uma mudança que a China vai ter de fazer, mais dias menos dia, porque não vale a pena o país continuar fechado. Esta pandemia vai ser endémica e vamos ter de nos habituar a viver com ela.” Menos dias, mais quartos Luís Herédia, presidente da Associação dos Hotéis de Macau, também frisou que estamos perante uma decisão positiva, mas que não chega para impulsionar a economia. “Esta possibilidade é, com certeza, baseada em estatísticas que podem demonstrar que continua a haver alguma segurança, mas também no sentido de apontar o caminho para a abertura. Evidentemente, é uma acção positiva e não só serve a todos os que vivem cá, mas também aos que nos visitam. [Se estas medidas se concretizarem] o impacto é menor. Mas, ainda estamos longe de atingir o que desejamos, que é uma abertura maior.” Ainda assim, o presidente da Associação dos Hotéis de Macau dá conta que o território tem de se preparar para a ocorrência de um novo surto, à medida que vai abrindo portas. “Já há, passo a passo, alguma intenção de um dia virmos a abrir totalmente. São necessários cuidados, incluindo o plano de vacinação”, lembrou. Para o responsável, reduzir a quarentena vai permitir, acima de tudo, “um maior fluxo de residentes e não-residentes”, pois “os que nos são próximos podem entrar e sair”. “Todos desejamos [a abertura]. Não tem sido fácil, pois não têm entrado turistas suficientes. Mesmo assim, o sector hoteleiro e as operadoras têm tentado fazer o seu melhor para minimizar o impacto das perdas”, acrescentou. Em relação ao número de quartos de hotel, a redução de quarentena também poderá proporcionar vagas para todos os que desejem vir para Macau. “É uma medida importante, porque não havendo muitos quartos disponíveis, pois nem todos os hotéis têm características para possibilitar a logística desejada, acabará por haver mais disponibilidade, dado que o tempo de estadia será reduzido.” O afluente de Hong Kong Outro dos cenários que poderá mudar com a redução dos dias de quarentena será as ligações com Hong Kong, que tem uma grande importância para Macau não apenas no turismo, mas também nas áreas da saúde, imobiliário ou empresarial. “A redução dos dias de quarentena pode ser convidativa para que os próprios técnicos possam vir cá resolver questões pendentes. Mesmo ao nível da saúde, temos alguma dependência de Hong Kong. O mesmo se passa com questões técnicas ao nível da reparação de tecnologia. Por isso, pode vir a ajudar, mas não será um fluxo muito grande que se vá sentir na economia”, lembrou Luís Herédia. As palavras de Ho Iat Seng são um sinal de esperança para muitos, mas, acima de tudo, não vão ainda originar “uma massa de pessoas a querer vir para Macau”, tendo em conta que, além dos 10 ou sete dias de quarentena, terá de ser cumprido um período de auto-gestão de saúde de sete dias. Só depois será possível entrar em locais como restaurantes, lojas e hotéis, com o código de saúde verde. Acima de tudo, “é uma medida que convida empresas a enviar pessoas para tratar de assuntos importantes, que podem agora ser resolvidos”, rematou o Luís Herédia. Covid-19 | Sector do turismo aguarda resultados positivos As declarações de Ho Iat Seng foram recebidas com algum agrado por parte de representantes do sector hoteleiro e do turismo. Tai Cheng, vice-presidente da Associação de Hoteleiros de Macau, apontou ao jornal Ou Mun que a redução do período de quarentena constitui um forte estímulo para o sector, uma vez que se pode recuperar o número de visitantes estrangeiros, melhorando a baixa moral que o mercado vive. Por sua vez, Andy Wong, presidente da Associação da Indústria Turística de Macau, frisou que as declarações do Chefe do Executivo são uma mensagem positiva e sinal de que o Governo está a reagir à nova fase da covid-19. Andy Wong acredita que a mensagem traz confiança às pequenas e médias empresas, tendo em conta que a economia necessita de recuperar para níveis pré-pandemia. Apesar de a Direcção dos Serviços de Turismo ter afastado a possibilidade de abrir as fronteiras com Hong Kong em Agosto, Andy Wong defende que a decisão deverá ser tomada mediante uma junção de opiniões das autoridades do Interior da China, Macau e Hong Kong para a abertura gradual das fronteiras. Isto porque os visitantes de Hong Kong representam uma fatia importante dos negócios das PME locais, frisou. A deputada Wong Kit Cheng lembrou que o Governo fez esforços para atingir a taxa de vacinação de 90 por cento, além de ter criado um plano de resposta de emergência caso ocorra um surto em Macau. Ainda assim, Wong Kit Cheng não considera que a medida anunciada por Ho Iat Seng vá atrair mais visitantes a curto prazo, apesar de ser uma medida favorável. Com Pedro Arede e Nunu Wu
Andreia Sofia Silva EventosJoalharia | Peças de Cristina Vinhas expostas a partir de hoje na Casa de Vidro Cristina Vinhas está de volta às exposições individuais nove anos depois. “Mudanças” é hoje inaugurada na Casa de Vidro do Tap Seac, no âmbito das celebrações do 10 de Junho, e apresenta peças diferentes que pretendem chamar a atenção para a importância de preservar o meio ambiente. Para ver até ao dia 25 deste mês “Mudança” é o nome da nova exposição individual de Cristina Vinhas que, nove anos depois da última mostra com o seu nome, apresenta novas peças de joalharia onde a necessidade de preservação do meio ambiente constitui a mensagem principal. Tratam-se de “peças novas feitas totalmente para esta exposição”, onde se misturam materiais como o vidro, o estanho ou o latão, entre outros. “Esta exposição divide-se em duas partes, uma delas em que retrato o subsolo e outra o mar, a parte subaquática. Há algum tempo que trabalho nesta exposição pois tem peças especiais. Penso que é uma mostra diferente e original”, afirmou Cristina Vinhas ao HM. Para a artista, que dá aulas de joalharia na Escola de Artes e Ofícios da Casa de Portugal em Macau (CPM), o tema “mudança” surge devido à importância “de um ajuste na forma de estar, de nos relacionarmos com os outros, com a terra e com o mar”. “Tem de haver mais respeito pelo meio ambiente. A exposição é uma chamada de atenção. Além da parte da beleza [das peças], o que está subentendido é o alerta para a importância da protecção do ambiente”, acrescentou a artista. A última edição do programa oficial de celebração do 10 de Junho – Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas contou com uma exposição de peças de filigrana, mas Cristina Vinhas quis trazer algo de diferente este ano. “Seria mais adequado [apresentar a filigrana], porque tem mais a ver com a nossa alma portuguesa, é mais conotado com a nossa joalharia. Mas não iríamos repetir. Tenho alguma dificuldade em repetir as peças e colecções, mas não descarto essa hipótese. Esta mostra é também um reflexo das vivências que tenho em Portugal e na Europa.” Menos alunos Cristina Vinhas não tem dúvidas: jamais conseguiria fazer as peças que compõem a mostra “Mudança” se não estivesse a viver em Macau. “As peças que encontrei há alguns anos em Cantão dificilmente conseguiria encontrar numa outra zona do mundo. Tenho a minha oficina em Portugal mas seria difícil fazer uma exposição de vidro lá. Também consegui fazer a minha exposição por estar a leccionar na CPM. Aqui faço coisas que não conseguiria fazer noutro lugar, pois estou a trabalhar com outros materiais.” Em Portugal, aponta a responsável, “acabamos por encontrar materiais mais tradicionais, e estas peças fogem um pouco ao que é habitual na joalharia”. “Na área do vidro também apresento uma abordagem diferente. Faço a combinação do vidro com estanho e latão, que não é comum ver e penso que o resultado é bastante interessante”, frisou. “Mudança” foi ainda possível devido ao facto de Cristina Vinhas ter menos alunos no atelier de joalharia na CPM, devido ao facto de muitos portugueses estarem a deixar o território. “A afluência às aulas é bastante inferior face aos anos anteriores. Temos de abrir para a comunidade chinesa, pois nós, portugueses, somos poucos aqui e é difícil sobreviver se contarmos apenas com a nossa comunidade. Além disso, não podemos contar com o apoio da comunidade portuguesa. Em relação aos ateliers, temos de conquistar novos mercados e alunos”, sugeriu.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteTrabalho | Relatório revela dificuldades de contratação no Interior da China e Hong Kong A consultora Manpower Group concluiu que é cada vez mais difícil contratar trabalhadores em todo o mundo. A empresa de assessoria de recursos humanos indicou num relatório global que o Interior da China, Hong Kong e Taiwan enfrentam as situações mais críticas. Dois empresários locais traçaram o retrato da situação de Macau, destacando os entraves impostos pelas restrições pandémicas e a revolução no sector do jogo O mercado laboral está a mudar em todo o mundo e, apesar de haver maior vontade de contratar em muitos países, não há quadros qualificados para preencher vagas. A conclusão é do mais recente relatório do Manpower Group, uma empresa internacional de assessoria em recursos humanos, que estudou a intenção de reforço de recursos humanos para o terceiro trimestre deste ano. Dois anos depois do início da pandemia, vive-se actualmente um maior optimismo sobre a possibilidade de novas contratações em alguns países, “a níveis que não eram vistos desde o início da pandemia”. Mas a verdade é que o cenário em alguns países e regiões da Ásia, não é assim tão positivo. “Os empregadores reportam dificuldades no preenchimento de novas vagas, com os maiores impactos a serem sentidos em Taiwan, Portugal, Singapura, China, Hong Kong e Índia”, pode ler-se no documento. Em relação aos sectores mais afectados, a Manpower Group destaca “educação, saúde, trabalho de acção social, função pública e imobiliário”. O relatório conclui que as perspectivas de contratação para os meses de Julho a Setembro são mais fracas em Taiwan, com apenas mais três por cento, ou Japão, com mais quatro por cento. A nível mundial faltam talentos, “com 75 por cento dos empregadores a reportar dificuldades no preenchimento de vagas”, número que representa mais de o dobro face a 2010, que era de 31 por cento. Na zona da Ásia-Pacífico, Hong Kong apresenta o aumento das intenções de contratação na ordem dos 11 por cento, uma melhoria de oito por cento face ao segundo trimestre deste ano, e de dez por cento face a igual período do ano passado. Relativamente à China, o intuito de recrutar diminuiu em oito sectores, com apenas a banca e finanças a registarem subidas de quatro por cento em termos trimestrais. Macau não surge no relatório, mas dada a proximidade com China e Hong Kong, o HM convidou dois empresários para comentar o actual cenário económico e laboral. Para António Trindade, CEO da CESL-Ásia, Macau tem “condições muito particulares” relacionadas com o sector do jogo, além de o factor pandemia, “que tem sido extremamente importante”. “Nota-se que, como não há uma perspectiva do que se vai passar em relação às concessões de jogo, e sabendo-se que vai acontecer uma grande mudança, a economia está praticamente parada. Não só as concessionárias deixaram de fazer investimentos como estão a despedir pessoas ligadas às actividades de jogo e às restantes operações.” A RAEM vive, portanto, “uma situação de completa paralisia”, defende António Trindade, que não assume uma postura optimista. “O que se percebe e vê é que, por exemplo, os grandes empregadores estão a despedir muitas pessoas. Os despedimentos em massa vão continuar nas próximas semanas, porque não vejo uma mudança de perspectiva. Não se sabe muito bem como vai ser a economia no ano que vem. Esperamos a renovação das concessões por mais seis meses e um concurso público, mas não sabemos a implicação da nova lei do jogo em relação ao concurso. Vai haver uma redução do mercado de trabalho.” As restrições de entrada no território e a obrigatoriedade de cumprir quarentena afastaram muitos quadros estrangeiros de Macau, e para o CEO da CESL-Ásia o cenário não deverá mudar tão cedo. “A economia está a reduzir, muita gente vai deixar Macau e não prevejo que voltem tão cedo. Se voltarem, não serão as mesmas pessoas. A economia vai voltar a crescer, mas não sabemos quando”, acrescentou António Trindade. Em relação à China, “existem outros factores, como a guerra na Ucrânia e o impacto prolongado e combinado de situações que não se notam muito ainda, embora exista alguma percepção”. “Mesmo nas economias do resto do mundo só iremos sentir o impacto de uma maneira generalizada nos próximos dois ou quatro meses, dependendo [da evolução] do conflito”, adiantou o empresário português. Lei fora da realidade O empresário macaense Jorge Valente entende que, “provavelmente devido aos confinamentos, na China, Hong Kong e Macau muitos expatriados ou talentos optam por ir para outros locais com menos restrições”, defendeu ao HM. “Repare que, quem tem talento é cobiçado em todo o mundo e pode escolher o emprego que quer, no local que gostar mais. Hong Kong tem a agravante da instabilidade política, e os talentos fogem para Singapura, isto para quem quer sair da China”, exemplificou. No caso de Macau, a legislação laboral “está totalmente desvinculada das necessidades reais”, acusou Jorge Valente. “Os deputados e as associações de trabalhadores não sabem o que estão a fazer e defendem as causas erradas, não apresentado soluções reais.” O empresário aponta que a situação dura há muitos anos e que passa pela defesa de “mão-de-obra não habilitada” ou “dificultar a importação de mão-de-obra”. “[Deputados e dirigentes associativos] estão ainda muito virados para pensar nos trabalhadores da construção civil, sendo esta uma das causas para a dificuldade de diversificação [económica], pois estas medidas entram em conflito. O Governo não está a conseguir impulsionar a economia e diversificá-la”, frisou o responsável. Jorge Valente vai mais longe e refere que as autoridades “estão apenas preocupadas com medidas de combate à covid-19, deixando as pessoas passarem fome ou ficarem no desemprego”. Apesar de ser permitida, desde 27 de Maio, a entrada de não residentes oriundos de Portugal, por exemplo, Jorge Valente acredita que faltam condições para que estas pessoas possam cumprir a quarentena obrigatória. “Os únicos hotéis com saída são os da quarentena, estão cheios e não são suficientes.” Poucas habilidades Tal como António Trindade, também o empresário macaense pensa que não deverá haver nenhuma melhoria na área do emprego até que fique resolvida a renovação das concessões de jogo e dos casinos-satélite. De frisar que, numa primeira fase, o Governo avançou para o fim destes espaços de jogo fora dos grandes empreendimentos geridos pelas seis concessionárias, mas, entretanto, recuou na medida face às várias críticas que a medida mereceu. Além disso, Jorge Valente acredita que a qualidade da mão-de-obra disponível em Macau “não é suficiente e não corresponde às necessidades do mercado”. Os exemplos trazidos para o debate são o desenvolvimento de Macau como plataforma comercial entre a China e os países de língua portuguesa sem trabalhadores bilingues suficientes. “A Direcção dos Serviços de Economia e antigos secretários para os Assuntos Sociais e Cultura deveriam ter apostado, desde 1999, na educação em língua portuguesa, mas apenas a partir [do mandato] de Alexis Tam se começou a falar nisto, e só no fim se começou a fazer qualquer coisa”, descreveu. Jorge Valente não tem dúvidas: “mesmo os [trabalhadores não residentes] do interior da China já não querem vir para Macau para serem trabalhadores de segunda [blue cards]”. “Se a economia começar a melhorar, a escassez vai ser ainda mais notória”, rematou. Olhemos para números mais concretos descritos no último relatório do Manpower Group: uma em cada cinco empresas de todo o mundo têm dificuldades em encontrar pessoas qualificadas na área da tecnologia. Mais de 40 mil empregadores responderam ao inquérito, sendo que em 28 de 40 países e regiões foram reportadas para o terceiro trimestre de 2022 perspectivas consideráveis de recrutamento face ao trimestre anterior. Segundo o documento, “os empregadores de todo o mundo esperam ainda contratar mais trabalhadores no terceiro trimestre de 2022, reportando um ajustamento sazonal”. Surge, aqui, o crescimento de 33 por cento nas intenções de recrutamento em termos globais, com 47 por cento a planear contratar e 34 por cento a programar manter estável a força laboral. Apenas 15 por cento dos patrões acreditam que o número de trabalhadores irá diminuir.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteAmbiente | Consumo de recursos aumentou em 2021, enquanto a qualidade do ar melhorou O relatório sobre o estado do ambiente de Macau em 2021, divulgado pela Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental, dá conta do aumento do consumo de água, electricidade e resíduos sólidos. Por sua vez, a qualidade do ar melhorou, apesar da tendência crescente da concentração de ozono na atmosfera Mesmo com a economia a meio gás e a recuperação lenta do número de turistas para valores pré-pandemia, Macau continua a registar gastos elevados de recursos, embora a qualidade do ar tenha melhorado no ano passado. Estas são algumas das principais conclusões do relatório do estado do ambiente em 2021 da responsabilidade da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA). Conforme aponta o documento, “a quantidade de resíduos sólidos urbanos descartados, o consumo de electricidade e o volume de água facturada aumentaram em diferentes graus”. Na prática, o volume de água facturada passou de 85.515 milhares de metros cúbicos em 2020 para 86.308, um aumento de 0,9 por cento. Quanto ao consumo de electricidade, foi registado um aumento de cinco por cento, com 5.415 milhões de KWH consumidos em 2020 face aos 5.688 KWH do ano passado. Ainda no capítulo do consumo de energia, os sectores que ocupam maior proporção são o comércio, consumo doméstico, a indústria e os organismos públicos. Sobre o consumo de água, os gastos domésticos registaram uma quebra de 6,8 por cento face a 2020, embora continue a representar “a maior fatia no consumo de água”. O relatório indica que “em comparação com 2020 o volume de água gasta nas várias zonas da cidade subiu em 2021, com excepção da península de Macau”. Os maiores aumentos verificaram-se no campus da Universidade de Macau, com 17,6 por cento, e aterros do Cotai, na ordem dos dez por cento. Mesmo com as alterações trazidas com a pandemia, o consumo de água no território revela “uma tendência crescente” olhando para os valores dos últimos dez anos. No que diz respeito à quantidade de resíduos sólidos descartados no ano passado o total atingiu 453.152 toneladas, o que representou um aumento de 3,6 por cento face ao ano passado quando foram descartadas 437.592 toneladas de resíduos. O relatório da DSPA aponta que, apesar “da inconstância da situação epidémica em 2021 ter tido impacto na recuperação da economia de Macau, o número de turistas e o Produto Interno Bruto subiram significativamente em relação a 2020”. Mesmo “com a recuperação gradual da economia”, a população manteve-se semelhante à de 2020, tendo diminuído “ligeiramente” a densidade populacional face a 2020. O relatório faz a referência ao II Plano Quinquenal de Desenvolvimento Socioeconómico da RAEM, em vigor até 2025, que recomenda “que todos os sectores da sociedade integrem melhor os conceitos ‘verde’ e ‘baixo carbono’ no processo de recuperação e desenvolvimento económico”. Raimundo do Rosário, secretário para os Transportes e Obras Públicas, faz um alerta no relatório da DSPA, apelando à sociedade civil que se empenhe na missão de proteger o ambiente. “A par da acção governativa, é também imperativa a colaboração e o apoio dos diversos sectores sociais. Pequenas acções podem induzir grandes mudanças. Adoptar, o mais possível, boas práticas ambientais no dia-a-dia, como poupar água, electricidade, deslocar-se através de meios ecológicos e evitar o desperdício de recursos. Tudo conta. Tudo pode fazer a diferença”. As acções “prioritárias” para o Executivo e sociedade são a redução de emissões, o controlo do aumento da temperatura e “garantir um futuro mais sustentável para as gerações vindouras”. Cuidado com o ozono Relativamente à qualidade do ar no território, o relatório da DSPA sustenta que “melhorou em comparação com o período antes da pandemia”, sendo que em 93 por cento dos dias de 2021 a qualidade do ar foi classificada de “bom” e “moderado”, uma “percentagem semelhante à registada em 2020. Os dados, recolhidos pelos Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG), foram analisados com base nas novas Orientações para a Qualidade do Ar (Air Quality Guidelines) da Organização Mundial de Saúde (OMS), que entraram em vigor a 1 de Janeiro de 2021 e que levou à redefinição, em Macau, do índice de qualidade do ar. Os dados revelam ainda que no ano passado entre 10 a 24 dias registaram ar insalubre, de acordo com os registos recolhidos em todas as estações de monitorização da qualidade do ar no território, o que implica cuidados redobrados para quem tem doenças crónicas ou pratique actividades físicas ao ar-livre. O documento refere que “os principais poluentes registados foram partículas inaláveis em suspensão (PM10) e partículas finas em suspensão (PM2.5)”, que ainda assim tiveram emissões inferiores “em diferentes graus, tendo-se verificado a maior descida na estação da berma da estrada, em Ka-Hó”. De modo geral, “as concentrações médias anuais de PM2.5 registadas em todas as estações de monitorização foram inferiores aos novos valores padrão”. Também em relação às partículas PM10, as concentrações médias anuais ficaram abaixo dos “novos valores padrão”. Relativamente aos limites padrão de ozono (O3), foram excedidos nas estações ambientais de Taipa e Coloane, mas no caso das estações ambientais de alta densidade de Macau e em Ka-Hó as concentrações de O3 baixaram, sendo que a concentração média anual de O3 na estação ambiental de Coloane “foi semelhante à de 2020”. Em 2021, o mês com melhor qualidade do ar em Macau foi Agosto, enquanto que pior mês e, termos de qualidade do ar foi Janeiro. Apesar dos resultados positivos em matéria de qualidade do ar, a DSPA deixa o alerta face à “tendência ascendente, nos últimos dez anos” das concentrações de O3, situação “a que deve ser prestada mais atenção”. Em matéria de partículas PM2.5 ou PM10 verificou-se, nos últimos dez anos, “uma tendência de descida”. Em termos gerais, “nos últimos anos a qualidade do ar da região do Delta do Rio das Pérolas continuou a melhorar, mas o problema do O3 ainda se mantém notório”. A DSPA afirma mesmo que “nos últimos anos a poluição por ozono tem vindo a agravar-se e está a afectar consideravelmente a qualidade do ar na Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau”. Além disso, “as tendências de variação dos poluentes atmosféricos de Macau têm sido, de modo geral, idênticas à tendência global verificada na rede de monitorização da qualidade do ar da região”, nomeadamente na província de Guangdong e em Hong Kong. Relativamente ao dióxido de carbono (CO2), “continuou a dominar as emissões de gases com efeitos de estufa de Macau”, correspondendo “a mais de 90 por cento do total de emissões”. Ainda assim, a pandemia provocou “uma queda considerável” nas emissões de dióxido de carbono, verificando-se “uma tendência global de descida na última década”. Por sua vez, o óxido nitroso e o metano representaram menos de dez por cento das emissões. As obras poluem A DSPA dá ainda conta que no ano passado as principais fontes de emissões de partículas em suspensão no ar, como é o caso da PM10, PM2.5 ou PTS foram os sectores da construção civil e transportes terrestres, representando, respectivamente, 40 e 25 por cento. O relatório explica que “os transportes terrestres, a incineração de resíduos e o sector da construção civil tornaram-se a principal origem de óxido de azoto (NO2), representando, cada um, mais de 20 por cento”. Além disso, as principais emissões de CO (monóxido de carbono), amónia (NH3) e COVNM (compostos orgânicos voláteis não mecânicos) foram, respectivamente, “os transportes terrestres, o tratamento de águas residuais e os solventes orgânicos”. Quanto às emissões de óxidos de enxofre, os grandes responsáveis pela emissão foram a incineração de resíduos, o sector do comércio e dos serviços e o consumo doméstico. Por fim, “a incineração de resíduos e os transportes terrestres” também dominaram as emissões de chumbo. Em termos gerais, as emissões de poluentes para a atmosfera registaram uma quebra entre 2020 e 2021, “à excepção do aumento das emissões de chumbo, de compostos orgânicos voláteis não mecânicos e de monóxido de carbono”. O relatório conclui também que “as emissões provenientes dos transportes marítimos e da produção local de energia eléctrica baixaram visivelmente”, enquanto que as emissões com origem nos sectores dos transportes aéreos, construção e sector industrial aumentaram.
Andreia Sofia Silva EventosAlbergue SCM | “Raízes”, de Giulio Acconci, inaugurada na quarta-feira O Albergue SCM acolhe a partir de quarta-feira “Raízes”, uma mostra individual de Giulio Acconci que regressa às exposições ao fim de um longo período a desenvolver outros projectos. A mostra reúne pinturas e esculturas que reflectem o percurso pessoal e as influências familiares do artista Afastado de exposições em nome individual há algum tempo, a arte de Giulio Acconci pode voltar a ser vista em Macau numa nova exposição que abre portas a partir da próxima quarta-feira, 8, às 18h30. “Raízes – Exposição de Arte Individual de Giulio Acconci” é uma mostra, que reúne pintura e escultura, que integra o cartaz das comemorações do 10 de Junho – Dia de Camões, Portugal e das Comunidades Portuguesas, que traz vários eventos culturais à cidade. A colecção de obras conta a história de um homem que nasceu em Macau e que sempre contactou com diversas comunidades que fazem parte do território, mas que recebeu ao longo da vida influências do Myanmar da parte da mãe e italianas da parte do pai. O arquitecto Carlos Marreiros, presidente do Albergue SCM, desafiou Giulio Acconci a olhar para si próprio e a revelar-se através da arte. “O conceito principal desta exposição tem a ver com as minhas raízes que são muito diversas. O meu pai nasceu em Itália e a minha mãe pertence a um grupo étnico do Myanmar. Mas o facto de ter nascido em Macau e de ter amigos chineses, por exemplo, também contribui para essa diversidade. Em criança sempre falei inglês e cantonês, e também estudei português. Sempre tive a capacidade de aprender e absorver mais sobre outras culturas e idiomas”, contou ao HM. Giulio Acconci confessou ter-se embrenhado de forma emotiva no processo de criação e preparação da mostra. Os trabalhos são um reflexo disso mesmo. “Comecei por fazer alguns trabalhos com tinta da china, mas senti que, apostar no abstracto seria o mais indicado para expressar todos os sentimentos e contar uma história”, disse. “Raízes” é, portanto, uma mescla de materiais e técnicas artísticas. “Embrenhei-me no abstracto e misturei muitas técnicas, além de ter usado também muitos materiais. Recorri também à escultura, pois o meu pai era escultor e então, de certa forma, entrei nesse passado. Passei meses a reflectir sobre a forma como iria expressar as minhas raízes e, eventualmente, quando surgiu a hora de criar, simplesmente misturei estilos e técnicas”, frisou. O homem e o todo “Raízes” é o somatório de quadros de Giulio Acconci que remete para as memórias de infância na casa da família. Mas, para o artista, a obra mais significativa é aquela que dá o nome à exposição, por representar o homem com tudo aquilo que foi e é. “Há uma pintura figurativa intitulada ‘Raízes’ que, para mim, é muito expressiva, pois representa uma pessoa que está conectada com tudo. É a ideia de alguém que não se consegue desligar das memórias, da comida e das línguas”, descreveu o artista. Não é a primeira vez que Giulio Acconci olha para si mesmo e explora o seu passado, mas é a primeira vez que o faz do ponto de vista da interconexão. “Explorei as minhas raízes e antecedentes nas primeiras exposições, sobretudo a influência que o meu pai teve sobre mim. Mas desta vez faço um cruzamento de todas as minhas raízes familiares, sobre a minha mãe, e, por exemplo, sobre o que as mulheres usam na região do Myanmar de onde ela é.” No tempo em que não expôs a título individual Giulio Acconci tem ensinado outros, feito trabalhos por comissão ou desenvolvido workshops. Sobre esta exposição, espera que, pelo menos, o público possa percepcionar mais coisas sobre si. “Os meus amigos e pessoas que conheço parecem-me muito entusiasmadas com esta exposição. Vou ver como reagem ao meu trabalho, esperando que retirem algo das peças que vão ver, ou que, neste processo, conheçam um pouco mais sobre mim”, concluiu.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteAna Cristina Alves, autora e académica: “Este livro é um diálogo intercultural” Acaba de ser lançado, com a chancela da editora Labirinto, o novo livro de poesia de Ana Cristina Alves, especialista em filosofia chinesa, docente e responsável pela área educativa do Centro Científico e Cultural de Macau. “Visitações” reúne poemas que estabelecem um diálogo permanente entre as espiritualidades ocidental e oriental, partindo da base do “I Ching – O Livro das Mutações” Como surgiu a possibilidade de editar esta obra? Foi uma experiência poética. A última vez que estive em Macau foi em 2015, mas andei muito pelo Oriente e pelo sul da China. Entre 2011 e 2015, estive muito voltada para temas religiosos, fiz investigação na Academia Sínica, recolhi dados sobre templos, que são cerca de dez mil. A pesquisa para o trabalho científico não foi publicada, ficou na gaveta. Nos dez anos que estive em Macau visitei sempre os templos. Sempre gostei muito da espiritualidade chinesa, porque é aberta a receber influências de várias religiões e nenhumas se zangam umas com as outras. Sobre esse projecto que ficou na gaveta… Sim, ficou ali. Entretanto, chegou a pandemia, que nos remeteu a todos para casa. Sempre encarei a arte como terapia, sou capaz de estar o dia todo a ouvir música, por exemplo. Como nesses dois anos de pandemia estive bastante tensa, e como gosto muito de escrever e de poesia, foi uma maneira de me agarrar à vida pelo lado positivo, pois fomos bombardeados com notícias negativas todos os dias. Recordei-me então das experiências que vivi nas visitas ao Oriente e começaram a surgir espontaneamente poemas que estão divididos em vários capítulos. Como dividiu tematicamente o conteúdo? Os capítulos são sobre divindades chinesas, seres sagrados do Oriente e do Ocidente, porque eu sou portuguesa e o meu olhar ocidental está lá inevitavelmente. Escrevi também poemas sobre festividades e seres sagrados ligados a divindades. Outros escritos resultaram de visitas a templos. Tudo do ponto de vista poético, não científico, através de um diálogo intercultural. A última parte do livro é sobre poesia de adivinhação, numa tentativa para chegar a um amor diferente, objectivo, mas também compreender o mistério que não se deixa compreender por palavras. Quanto mais nós tentamos entrar em certas esferas e explicar tudo de forma racional, pior é. Peguei no clássico I Ching – O Livro das Mutações. Já a Fernanda Dias [poetisa] tinha feito uma experiência deste tipo, em Macau, porque a obra tem 64 hexagramas. Ela fez um poema para cada um deles, em “O Fio de Seda”, publicado em 2012. Utilizei a filosofia da complementaridade e fiz poemas sobre 32 hexagramas, porque acredito sempre nos opostos que não são oposição, mas que são complementares. Qual o objectivo desse exercício? Foi uma tentativa de entrar neste mistério que não entendemos, mas que sentimos através da nossa intuição, de que há qualquer coisa da qual é difícil falar do ponto de vista racional. São 32 poemas dedicados à adivinhação. Mas foi muito compensador. De cada vez que escrevia um poema, por muito más que fossem as notícias sobre a pandemia, nunca me deixavam muito maldisposta. A arte compensava e era como se estivesse a fazer terapia. Esta obra, “Visitações”, surge num momento muito particular da nossa história colectiva e individual, em que nos confrontamos com a pandemia. Alguns poemas mostram esse lado. Em que sentido? Por exemplo, há uma divindade muito malandra (Na Tcha), um menino que provoca muitos desacatos e que acaba por magoar um dos filhos do Rei Dragão, que nunca lhe perdoa. Esta divindade está mesmo ao lado das Ruínas de São Paulo [Templo de Na Tcha] e tem um dom especial: combater epidemias. É óptimo para estes tempos. Como descreve este livro? É um diálogo intercultural, que aponta para uma espiritualidade, mas que não a define, não diz “é assim”, ou de outra forma. Não há dogmas, mas leituras de possíveis caminhos espirituais, uma espiritualidade muito aberta, com a mistura de divindades. Um dos capítulos é sobre seres divinos, sagrados e monstros, no Ocidente e no Oriente, sempre numa tentativa de diálogo. Na primeira parte do livro temos poemas dedicados à minha sensibilidade reservada, enquanto que a maior parte dos poemas têm como fio temático a espiritualidade chinesa e o diálogo com a espiritualidade ocidental. O que significa esta sensibilidade reservada? São poemas mais seculares, mais do dia-a-dia, que surgem em confronto com situações. Tenho lido muito e gosto muito de Fernando Pessoa, dos clássicos, mas também de Luís de Camões e Sophia de Mello Breyner. Mas o meu despertar poético é sempre sobre situações da vida e por qualquer coisa que se está a passar no aqui e agora. A guerra na Ucrânia preocupa-me muito, por exemplo. Não é tanto a sensibilidade de receber influência dos outros poetas, mas quando me surge este chamamento poético, este diálogo, é sempre sobre algo que está a acontecer na minha vida. Que poema destaca nesta obra? “Macau Tricolor” é um poema de que gosto muito. Dentro das experiências poéticas uma das que gosto de fazer é misturar línguas dentro do próprio poema, é um traço da minha poesia. Este poema é sobre Macau e surge na sequência do 24 de Junho, antigo Dia de S. João, quando ocorreu a batalha contra os holandeses, em 1622. Começa por ser escrito em português, depois passa para patuá, graças ao pouco que aprendi com o Adé, e depois termina em chinês. Celebro os portugueses, os macaenses com a sua especificidade e os chineses que estão em Macau, a quem pertence não só a terra como a administração. Escreveu outros poemas sobre a China? Há muitos poemas sobre a China e as festividades tradicionais chinesas, sobre a festividade dos barcos dragão e o ano novo chinês. Mas esta China é aquela que eu deixei em 2015 e não a de hoje. No livro “Migrando pelos Dias” falo mais da China dos dias de hoje. Este livro aborda a China espiritual e tradicional, assim como o contacto com o Ocidente também cultural e espiritual. Tenho um poema sobre o São Martinho, o Natal e a Páscoa. Saí de Macau há sete anos, e o que me lembro da China e de Macau está mais na cultura do que na vivência diária. Porquê o nome “Visitações”? A capa, que está muito bem conseguida, tem duas portas fechadas. Então é como bater à porta de algo, de um mundo misterioso, e a visitação é a tentativa de entrar nesse mundo, mas a porta mantém-se fechada. Está semi-aberta com a nossa sensibilidade, mas pouco compreendemos sobre esse mundo com seres sagrados e divindades. “Visitações” é então essa ideia de visitar um mundo transcendente. Acredito que com a poesia se consegue lá chegar. Tem uma larga experiência como investigadora, sobretudo na área da filosofia oriental. Escrever estes poemas trouxe-lhe outra perspectiva da China? Desta vez usei o clássico “I Ching – O Livro das Mutações”, que o padre Joaquim Guerra chamava “A Bíblia Chinesa”. Dá uma outra visão menos pragmática e utilitária da cultura chinesa. Leva-nos à cultura tradicional que valorizava a sensibilidade poética. Não nos podemos esquecer que os governantes, para passarem os exames imperiais, tinham de fazer poesia e saber interpretá-la, para chegarem a oficiais e mandarins. Este contacto com os clássicos é a entrada no mundo da história, que hoje muitas vezes é esquecido na China contemporânea porque valores económicos, e outros, se levantam.