O vento nas ameixieiras de Wang Shishen

Shitao (1642-1707), o pintor peripatético, vagueando pela região de Jiangnan, «a Sul do grande rio Changjiang» figurou um poeta erguendo-se num barco, olhando impressionado para uma enorme massa rochosa e escreveu os versos:

Enquanto o vento vai soprando

na Ravina Ocidental

quem permitiu que o poema

se completasse sozinho?

Tanta pena da ameixieira,

a solitária do frio,

que não tem companhia.

Daqui apenas se avistam

os poucos ramos que sobraram,

Flores caídas enchem já o chão

e a Primavera ainda não terminou.

Um coração amargurado,

apertado como uma semente,

consegue persistir

em tais pensamentos constantes (…)

A pintura numa folha de álbum (Reminiscências de Qinhuai, tinta e cor sobre papel, 25,5 x 20,2 cm, no Museu de Arte de Cleveland) é exemplar do seu processo como pintor literato individualista para quem o crescente simbolismo da pintura como que pedia o contraste dinâmico com a palavra poética. Essa figura do indivíduo solitário no meio da paisagem está presente em muitas das suas pinturas e até foi assim que ele fez o seu Auto-retrato supevisionando a plantação de pinheiros.

Um outro pintor, seu contemporâneo e da mesma região de Jiangnan, habitante da cidade de Yangzhou, também figurou esse sujeito sensível que da natureza recebe sinais de lentas ou delicadas mutações. Wang Shishen (1686-1759) faria uma rara pintura de um homem caminhando ao frio com um jarro de barro, que se presume cheio de neve para ser derretida e feita água, quem sabe se para o chá, aproximando-se da vedação de uma habitação coberta com um telhado de palha, a que chamou Pedindo água de neve (rolo vertical, tinta sobre papel, 91 x 26,8 cm, no Museu de Arte da Universidade de Princeton).

Wang Shishen, o pintor de Anhui que escolheu o nome artístico de Chaolin, «aninhado na floresta», ficaria conhecido pelas suas pinturas de ameixieiras. Um álbum de oito pinturas de Paisagens e flores no Metmuseum (tinta e cor sobre papel, 20,3 x 25,1 cm) será um modelo a mostrar a potenciais compradores a sua habilidade de pintor profissional na rica região comercial ao longo do Grande Canal. Mas noutras pinturas, como Flores de ameixieira, no Museu de Arte de Cleveland (rolo vertical, tinta sobre papel, 144,4 x 75,7 cm) descreve uma situação típica das actividades dos literatos: «

Em busca de flores de ameixieira com amigos,

Aproveitamos a frescura de um dia claro,

Sinto leves os meus sapatos pretos e as meias de algodão,

Que belos os bosques diante da porta deste antigo templo,

Caminho para a frente e para trás,

como se habitasse numa pintura.

Noutro poema diz:

O distinto badalar de um sino

rompe o silêncio nas montanhas,

Mil anos depois todos os heróis

das Seis dinastias estão esquecidos,

Sob uma janela budista

apreciamos os dias ociosos,

Ramos e flores de ameixieira

guardam para si todo o vento Leste.

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