Covid-19 | Medidas de apoio económico consideradas insuficientes e sem novidade

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Assim que foram registados os primeiros casos do surto de covid-19 que afecta Macau, o secretário para a Economia e Finanças anunciou medidas de apoio económico para residentes e empresas. No entanto, economistas, deputados e dirigentes associativos entendem que os estímulos são insuficientes numa economia estrangulada

 

O Governo anunciou no domingo medidas de apoio a pequenas e médias empresas (PME) e residentes assim que as autoridades começaram a registar os primeiros casos de covid-19 do surto que fez parar Macau. Lei Wai Nong, secretário para a Economia e Finanças, anunciou sete medidas, no valor total de dez mil milhões de patacas, que passam sobretudo pelo adiamento da devolução dos empréstimos pedidos ao Governo e de impostos cobrados, sem esquecer outros benefícios fiscais.

No entanto, tendo em conta que a economia está em recessão há muitos meses, analistas consideram que o pacote de medidas não basta. “O Chefe do Executivo disse que quando a maioria da população estivesse vacinada Macau voltaria à normalidade. Temos de o fazer”, adiantou o deputado José Pereira Coutinho ao HM.

“Estas medidas são insuficientes porque se mantém a devolução dos empréstimos, além de outros benefícios fiscais não chegam. É preciso clarificar a situação das PME na área da restauração, para que tenham alguma actividade. Não se resolvem dificuldades destas empresas impedindo as pessoas de fazer as refeições dentro dos estabelecimentos. Estas restrições são extremamente prejudiciais para as PME”, declarou.

Recorde-se que os restaurantes e outros estabelecimentos de comida estão a ser incentivados a funcionar apenas em regime de take-away, embora tal não seja para já obrigatório. No entanto, Alvis Lo, director dos Serviços de Saúde (SSM), assegurou no domingo que tal poderá ser obrigatório caso a situação pandémica assim o justifique.
Coutinho defende ainda que a bitola deve estar também do lado da banca, que deve ter “uma responsabilidade social” face a pagamentos de empréstimos. “O Governo tem de estabelecer moratórias, o que poderia ajudar famílias com dificuldades financeiras, monoparentais, ou que têm a seu cargo idosos.”

O deputado não tem dúvida de que este novo surto, e a forma como as autoridades estão a lidar com ele, constitui “um grande rombo na economia, com um grave impacto psicológico nas pessoas”.

Quem também considera as medidas insuficientes é o economista José Sales Marques, embora “sejam sempre um paliativo”. “Há algum tempo que vivemos em recessão, as perspectivas começavam a tornar-se optimistas e de repente surge algo como aquilo que estamos a passar. As medidas não são suficientes e o sentido delas é apenas minorar os problemas, dar alguma folga às PME, nomeadamente no que diz respeito à bonificação de juros e devolução de alguns impostos cobrados. Os montantes não são significativos e dão apenas um certo conforto paliativo”, acrescentou.

Sales Marques considera fundamental dar ânimo aos números económicos, para que se verifique um crescimento sustentável. “Espero que esta crise não se prolongue e se limite aos casos que já existem, e que não sejam impostas novas limitações. A economia vive da procura externa e do jogo, das actividades ligadas à exportação de bens e serviços. Esta tem de começar a funcionar de novo, porque continuaremos a viver com dificuldades.”

Resposta rápida

Ouvido pelo jornal Ou Mun, o deputado Ho Ion Sang, ligado aos Kaifong e presidente do Centro de Sabedoria Colectiva, defendeu que as medidas visam resolver, de forma urgente, os problemas que os diversos sectores da economia e os residentes sentem.

Ho Ion Sang recordou que a situação pandémica nas regiões vizinhas tem causado impactos negativos no turismo e outras indústrias associadas a este sector.

Chui Sai Cheong, deputado e presidente da Associação Comercial de Macau, disse concordar com o pacote de apoios lançado pelo secretário Lei Wai Nong, sendo esta decisão “necessária e oportuna” e algo que permite aos mercados ganharem alguma confiança. No entanto, tendo em conta o actual estado da economia, Chui Sai Cheong entende ser necessário que as autoridades avaliem a eficácia das medidas, uma vez que a estabilidade das PME é essencial para uma economia onde a confiança predomine.

Un Sio Leng, presidente da Associação Geral das Mulheres, defendeu que as medidas mostram, acima de tudo, uma resposta rápida e urgente por parte do Governo perante as dificuldades da população. A dirigente sublinhou que as PME dão emprego aos residentes que são muito importantes para o desenvolvimento económico do território, pelo que as medidas anunciadas, logo no início do surto, são um incentivo. Un Sio Leng espera ainda que o Governo pondere a criação de um subsídio de apoio às despesas familiares, alunos, idosos e famílias com maiores dificuldades, além de medidas de apoio complementares para desempregados e pessoas em licença sem vencimento.

Por sua vez, Chan Ka Leong, presidente da União Geral das Associações dos Moradores de Macau (Kaifong), disse ao jornal Cheng Pou que as medidas são oportunas e que podem dar resposta às necessidades da população.

Uma vez que o surto levou a uma nova suspensão de muitas actividades, como o programa de excursões locais para residentes, Chan Ka Leong destaca o enorme impacto para as PME e empregados que dependiam desse plano de fomento turístico. Olhando para o pacote das medidas anunciadas no domingo, Chan Ka Leong entende que o subsídio para a compra de combustível atribuído aos taxistas pode ajudar muito o sector.

Jorge Valente, empresário, entende que reduzir taxas e impostos é sempre uma boa medida. No entanto, uma vez que os impostos sempre foram baixos em Macau, onde as concessionárias de jogo dão o grande contributo em matéria fiscal, trata-se de uma medida “que não ajuda muito”, pois estão envolvidos pequenos montantes.

“O principal problema que enfrentamos é a falta de actividades económica, de pessoas e turistas que possam consumir. Relativamente à medida de apoio aos taxistas, só funciona se os táxis tiverem muitos clientes. Se o veículo estiver quase sempre parado, e se, ainda por cima, houver muitos carros eléctricos ou híbridos, creio que é uma medida que não ajuda quase nada”, apontou ao HM.

Como medida “bastante boa” Jorge Valente destaca o facto de as PME só pagarem, até 31 de Dezembro de 2023, os juros dos empréstimos concedidos pelo Governo e não os montantes. “[A eficácia] destes empréstimos depende muito se a empresa sobrevive para ter melhores dias de negócio. Se a empresa entrar em insolvência antes do fim da pandemia, [os custos e perdas] vão ser muito maiores”, frisou.

Reserva q.b.

O economista José Félix Pontes entende que as medidas em questão “trazem algum alívio, embora temporário” às PME, residentes e algumas profissões liberais, tendo como ponto de referência “as medidas tomadas nos dois anos anteriores” e, portanto, sem novidade.

“Quanto ao montante dos fundos públicos envolvidos (dez mil milhões de patacas), provenientes, mais uma vez da Reserva Financeira, a sua adequação dependerá da alteração da denominada ‘política de tolerância zero’. Esta, a manter-se, fará com que Macau continue com poucos visitantes, níveis baixos de taxa de ocupação hoteleira, quebra nas receitas do jogo ou aumentos sem significado.”

Félix Pontes traça ainda o cenário do crescente desemprego, com mais empresas, de pequena ou grande dimensão, a encerrarem portas, o que resultará “num Produto Interno Bruto anémico”.

Na óptica do economista, a Reserva Financeira da RAEM deve ser destinada “a projectos relevantes na área económica e social” e não como uma espécie de “amortecedor ou ‘tapa buracos’ da economia local”. Como tal, a alternativa passa por elevar a taxa de vacinação contra a covid-19 com três doses. Félix Pontes entende que deveria mesmo obrigar-se toda a população a vacinar-se contra a doença.

Só assim “não seriam necessários os confinamentos, ainda que localizados, e a realização de testes em massa sempre que haja um certo número de casos”, concluiu.

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