Casas e ocasos

Rebelva, Carcavelos, 18 Dezembro

[dropcap]O[/dropcap]s ateliers são-me assim como o reverso das telas, modo de espreitar as hesitações, de passear no grande jardim do caos, de tocar as bainhas da beleza. Sinto-me acolhido na confusão, a lareira acesa das ideias, queimando-se na absoluta liberdade, hesitantes ou disparatadas, roupas tocadas por restos das cores, por gestos involuntários, as ferramentas e as matérias postas no seu repouso prestes a. A pretexto do mais que improvável, logo desafiante, projecto da Catarina [Marques da Silva], a emergente galeria Cisterna, encontro-me no meio dos panos e formas da Ana [Jacinto Nunes]. Anuncia-se a chuva nas massas de cinza lá fora, erguendo pano de fundo apropriado para o que por aqui se passa ou guarda. Um rolo pode desdobrar-se em texturas e mistérios. Um recanto pode tornar-se janela para um jardim do Éden. Sobre a mesa podem baloiçar-se uns pássaros do paraíso ou alongar-se uma bailarina. A Ana pratica um desenho que mantém relação líquida com a palavra e o pensamento, desaguando nos mais díspares suportes. Anda em inquietação com os modos da mulher ser contra a gravidade, a paisagem e o tempo, de se fazer corpo no confronto com os bichos da arca atracada ao dilúvio. Admiro a estupefacção dos rostos, as figuras envolvendo o seu próprio movimento, os objectos de assentar. Aliás, vi por ali rostos a fazer de bancos, bailarinas suspensas na parede suportando peso. Trouxe nos olhos uma deusa de duas cabeças, desmultiplicada em olhos e bocas, sentada sobre rosto ecoando águas de cisterna de velha encruzilhada de civilizações, a interpelar-nos, a nós enrolados no tempo, com frescura de seda. «A deusa imaginária/ planeia crimes/ progride o caos.» Assentam bem, os versos finais de Progride o Caos, do Rui André Delídia. Entretanto, chove.

Horta Seca, Lisboa, 18 Dezembro

Escavamos na circunstância e, desfocados dos ritmos alheios, até em título excluindo natal («Às Voltas em Dezembro»), arranjámos maneira de plantar pretexto para mostrar a carne do ano, feita de livros e imagens. A generosidade do mano [José] Anjos suscitou um pouco mais, dispondo-se a tocar enquanto o António [de Castro Caeiro] ou o Pedro [Lamares], o Valério [Romão] ou a Raquel [Serejo Martins] foram dizendo. Surgiu do nada um calor que suspendeu a chuva e permite esperançar outros verões. Leio, do Delídia com delícia, de Em Pó como Antiquíssimas Memórias: «Infinito? Estrada de fogo nocturno?/ silencioso caminho/ por onde se parte para nunca chegar;/ máscara círculo etéreo/ de ódio contra a luz alastra a voz/ na névoa onde as formas se confundem/ contra aranhas e estrelas explodem as palavras.»

Lisboa, 19 Dezembro

Para o estado, o óbito é uma bala expansível, das que em requinte de crueldade se fragmentam e expandem por todo o corpo da vítima. Incontáveis gestos burocráticos minaram os últimos dias da contagem que me importa tão pouco. No seu afã prático, o meu pai resolveu partir de lugar próximo de tantas oficialidades. Não facilita voltar ali para sublinhar a morte com funcionalidades do obrigatório seguir em frente. Depois, no banco, era suposto herdar o seu nome, tal qual, quando há muito me escolheram outro apelido, com desagrado seu, estou certo. Tive que o dizer alto, sem querer: não quero esse nome.

Horta Seca, Lisboa, 20 Dezembro

Comecei por pensar em lâminas, vítima de dramatismo. Passei para golpes de papel, respondendo com optimismo. Nada disso. Alguns dias metamorfoseiam-se em corredores, longos corredores com paredes movediças e uma floresta de mãos. O terror tem raízes no quotidiano mais plano. De pouco serve voltar atrás, mas continuar implica arranhadelas, nódoas negras e, sobretudo, o asco. Não me posso queixar, pois ninguém me obrigou a vir passear para o pântano. Mas custa aguentar, sem qualquer ordem particular, o desdém e a indiferença, a má-fé e a ganância, a volúpia do ataque gratuito e a miséria fria dos pequenos poderes, enfim, o desprezo generalizado. «Corte/ feridas no olhar incurável/ doença aberta/ mapa volátil.» Delídia, de novo.

Horta Seca, Lisboa, 21 Dezembro

«em forma de árvore, a face oculta do mal/ agrava a chama dos jardins, escultura/ aérea. Faca volátil, colecção de mortes,/ ombros, braços contra paredes, raivas privilégios/ nas cabeças dos visionários, aventureiros/ como colares ou pássaros, tigres alfabéticos.» Trata-se de «Uma Ideia Mineral», isto é, um seu fragmento (terceiro). Nem para os editores as memórias se ficam pela espessura do papel. De uma penada perderam-se dois dos que importavam nisto de erguer livros que são vidas. Devo a ambos, além de preciosíssimos títulos para bibliotecas instáveis, conversa solta e o farol de uma ética. Coincidem no acaso desta croniqueta com a animália. Não foi apenas a Salamandra que o Bruno da Ponte (1932-2018) criou, mas nela nos encontrámos, tendo sido prévio leitor da Questões & Alternativas, e partilhando o interesse pela poesia experimental além de recorrente discussão sobre luta armada. Fez-se primeira ilha açoriana conhecida e ainda nos cruzámos na Abril em Maio, maneira de dar nós no tempo, aqui há tempos. Afastado que tenho andado dos sábados e da Anchieta, há muito que não me encontrava com o [Rui] Martiniano (1954-2018), mas a Hiena jamais deixará de me gargalhar ao peito. A boa editora faz-se cruzamento dos vários tempos que se souberam inventar uma literatura a partir dos restos arestas do humano. Um catálogo cometa, resultado de investigação de um particular e partilhado gosto febril. São peças simples e cuidadas, feitas para servir textos indispensáveis e nomes únicos, que brilharão no alfarrábio, como convém. Pássaros que continuam a voar na noite. Acendi, nestes dias, a Luz Negra, do seu lado B, a do poeta Rui André Delídia. Faça-se parágrafos de silêncio.

Horta Seca, Lisboa, 21 Dezembro

Voltámos a consumir a tarde por entre os acordes do [José] Anjos e as palavras de quem se chegou ao microfone. Desta ecoaram inéditos da Rita [Taborda Duarte] e do Ricardo Gil Soeiro, augurando horizontes. A inesperada figura da tarde acabou sendo o Tóssan, de que o Jorge [Silva], além de grande divulgador, se tornou voz. Suscitou mesmo a amorosa participação de vários putos sem medo. Tudo fragmentário, desorganizado, discreto. Aqui e ali surpreendente. Para o fim da tarde, rimando, deu-se a breve e inusitada apresentação de «Caridade Romana», a nova e inclassificável polifonia de José Emílio-Nelson. Pequeno somatório de impossíveis, cruzando momentos de fulgurância poética com confissões ejaculadas nas redes sociais, invocando a erudição das teologias heréticas para as queimar nas fogueiras dos misticismos desregrados e celebratórios do corpo, altar maior. Pensar com espinhos que esfolam, que pedem a paciência dos prazeres estendidos ao limite. Quem arriscará para além do paleio transgressivo? As capas (algures na página) são visões (dobradas) da carne do mergulhador de corpos, António [Gonçalves].

Cova Funda, Lisboa, 28 Dezembro

Fazendo da mesa tantas vezes bússola, saber que o Cova Funda vai fechar agrava a minha desorientação.
Foi ponto de partida e porto de abrigo, lugar de encontro, miradouro de horizontes, plantação de desafios e ideias, casa de família. Construído a partir da mesa. A Ana [Jacinto Nunes] faz das cadeiras um bicho. Soubera eu, e faria da mesa animal doméstico. A mesa é o melhor amigo do humano. Também serviam, no Cova, dos melhores cozidos da cidade, um peixe que o fogo celebrava como carícia, pezinhos de coentrada e outra comida de tacho que soerguia a cova a pontos altos. A companhia importava, mas até o farol precisa ser aceso.

9 Jan 2019

Fringe | Palestras sobre crítica de arte antecedem abertura oficial do festival

A edição do festival Fringe tem início oficial esta sexta feira, mas as actividades começam hoje com um ciclo de palestras dedicado à crítica de arte. O debate e a troca de ideias são a novidade deste ano do festival que tenciona promover formas alternativas de expressão artística no território

[dropcap]P[/dropcap]alestras e debates fazem parte, pela primeira vez, da edição do festival Fringe. Este ano o evento prevê três momentos, com temáticas diferentes, dedicados à troca de ideias, sendo que o primeiro, de um ciclo dedicado à crítica artística, tem inicio já hoje.

O objectivo, afirma a organização na apresentação do evento, é guiar os interessados “pelo mundo da arte e da escrita cultural através de dicas de escrita, palestras, entrevistas com artistas, desenvolvendo a tua capacidade de apreciação, competência analítica e observação atenta dos espectáculos”.

“Crítica de Arte 101” é o tema que vai preencher três palestras. A primeira tem lugar hoje pelas 20h na Macao Theatre Library e é dedicada à discussão da diversidade da crítica artística. A coordenar a conversa vai estar Mok Sio Chong, crítico de teatro local, dramaturgo e encenador. Mok Sio Chong é também editor-chefe da publicação trimestral Performance Arts Forum e de Reviews, sendo presidente do Macao Theatre Culture Institute.

Carol Law vai estar à frente da conversa agendada para amanhã, à mesma hora e no mesmo local, que se vai debruçar na preparação técnica para entrevistas a artistas. Carol Law, fez o mestrado em Jornalismo e Gestão Cultural pela Universidade Chinesa de Hong Kong e foi repórter de televisão responsável pela realização de entrevistas, redacção de notícias, edição de vídeo tendo trabalhado ainda na área de investigação. Actualmente, é escritora freelancer e trabalha com diferentes média, focando-se em temas como o desenvolvimento da indústria artística de Macau, estilo de vida ecológico e a história de Macau.

Sexta feira é dedicada ao debate sobre a questão “quão no limite é o festival Fringe?”. No Macau Theater Library vai estar Hui Koc Kun . Conhecido por “Big Bird”, Hui é dramaturgo, encenador e actor de teatro há mais de três décadas. Licenciado pela Faculdade de Letras da Universidade de Macau, foi também um dos primeiros licenciados do Programa de Administração de Arte do Centro de Artes de Hong Kong, e graduado pelo Programa de Pós-Graduação em Indústrias Culturais e Criativas da Academia de Artes e Design da Universidade de Tsinghua.

Hui tem na sua carreira a coordenação de eventos culturais e artísticos, incluindo o Festival de Música Pop de Macau, as Apresentações de Teatro Conjuntas de Macau, e o projecto Ano Novo Chinês em Lisboa. O dramaturgo foi um dos elementos envolvidos na criação do Festival Fringe e coordena o evento há mais de uma década. Actualmente, está envolvido na área da programação e os seus mais recentes projectos incluem o HUSH! Full Music e o Desfile por Macau, Cidade Latina.

Os interessados em participar têm que ter mais de 16 anos e para se inscreverem devem produzir um pequeno texto de 200 palavras a ser entregue no momento de chegada e onde descrevem os motivos da sua presença.

Fronteiras discutidas

As fronteiras entre a arte e o quotidiano são o tema que vai ocupar a palestra marcada para sábado, às 15h na galeria At Light. “A linha entre a arte e o quotidiano” é o tema de conversa que vai estar a cargo de Pak Sheung Chuen que vem de Hong Kong, Siraya Pai de Taiwan, e Cherrie Leong e Lei Sam I, de Macau. A conversa tem como objectivo possibilitar um espaço de debate acerca do papel da arte no dia a dia de cada um e debater a fronteira entre expressões artísticas e o quotidiano.

“Cada vez mais as actividades artísticas interagem com o nosso dia-a-dia e cada vez mais os espectáculos entram no nosso quotidiano. A arte está ultrapassar os limites e a entrar nas nossas rotinas diárias? Ou já estamos a envolver a arte na nossa vida diária e já não há mais fronteiras?”, questiona a organização na apresentação do evento. A participação é limitada a 30 pessoas com idades acima dos seis anos e as inscrições são feitas por ordem de chegada. A palestra vai ser conduzida em cantonês e mandarim.

No sábado, dia 26, é o momento de balanço com o encontro entre o público e críticos convidados para partilharem as suas opiniões sobre os espectáculos do Fringe.

9 Jan 2019

Metro Ligeiro | Linha da Taipa vai funcionar das seis à uma da manhã

[dropcap]O[/dropcap] Metro Ligeiro vai funcionar das 6h da manhã à 1h da manhã diariamente, revelou ontem o Gabinete para as Infra-estruturas de Transportes (GIT), de acordo com o canal chinês da Rádio Macau. Segundo a mesma fonte, a linha da Taipa do Metro Ligeiro entra em funcionamento na segunda metade deste ano.

Vão fazer parte desta linha 11 estações por onde vão circular cinco grupos de carruagens. Cada carruagem vai poder transportar cerca de 100 pessoas e a frequência de passagem do metro vai depender do número de passageiros.

O preço dos bilhetes continua a não ser dado a conhecer, sendo que, afirma o GIT, o valor a pagar depende da concessionária responsável pelo funcionamento da infra-estrutura, a MTR de Hong Kong.

9 Jan 2019

Obras Públicas | Pelo menos mais 36 milhões para reparar Portas do Entendimento

[dropcap]A[/dropcap]s obras de reparação das Portas do Entendimento vão custar entre 36 e 48 milhões de patacas. A empreitada, a arrancar até Junho, deve ser concluída dentro de sensivelmente um ano e meio, estimando-se que crie aproximadamente 40 postos de trabalho.

A informação foi divulgada ontem pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transporte (DSSOPT), na sequência do acto público de abertura de propostas. Foram apresentadas 20 candidaturas, cinco das quais admitidas condicionalmente.

As obras consistem em substituir os ganchos que seguram as paredes e reconstruir o pontão de ligação e em adicionar caldas de cimento em partes da plataforma, mantendo inalterado o aspecto exterior. Inaugurado em 1993, o monumento, o primeiro a ser construído para comemorar a amizade luso-chinesa, encontra-se vedado ao público por razões de segurança.

A última obra de reparação das Portas do Entendimento foi adjudicada, em Outubro de 2017, à CAA, Planeamento e Engenharia, Consultores, do engenheiro civil e deputado Chui Sai Peng, por 3,4 milhões de patacas.

9 Jan 2019

Registado primeiro caso de gripe mortal do ano

[dropcap]F[/dropcap]oi registado o primeiro caso mortal de gripe do ano. A vítima é um homem de 86 anos, que apresentava sintomas desde 26 de Dezembro e que foi inicialmente medicado na China, informaram ontem os Serviços de Saúde.

Dado que a sua situação não melhorou, o residente de Macau, que sofre de doenças crónicas, recorreu na sexta-feira ao Serviço de Urgência do Centro Hospitalar Conde de São Januário, acabando por ser hospitalizado devido a dificuldades de respiração. O idoso foi depois diagnosticado com pneumonia bacteriana e, no domingo, devido a uma insuficiência respiratória careceu de ventilação assistida para tratamento.

Já na manhã de segunda-feira, foi encaminhado para a Unidade de Cuidados Intensivos e a situação clínica agravou-se, sofrendo falência de múltiplos órgãos que levaram à sua morte no mesmo dia. O resultado do teste laboratorial das amostras respiratórias do paciente testou positivo para a gripe A (H1).

Desde Setembro, Macau registou 14 casos de gripe com pneumonia ou outras complicações. Actualmente, duas pessoas encontram-se ainda hospitalizadas: um homem de 86 anos e um menino de 4 anos. O estado clínico do idoso é considerado estável, enquanto o menino, que contraiu uma encefalite na sequência da gripe, encontra-se em estado grave.

9 Jan 2019

EPM | Cenário de integração na rede pública escolar foi afastado

A direcção da Escola Portuguesa de Macau esteve a trabalhar para aderir à rede escolar pública, de forma a procurar a encontrar soluções futuras para o financiamento da instituição. Porém, o número reduzido de alunos nos anos de ensino mais avançado inviabilizaram a hipótese

 

[dropcap]A[/dropcap] Escola Portuguesa de Macau (EPM) esteve a equacionar a entrada na rede pública escolar, mas decidiu abdicar da intenção devido à “instabilidade do número de alunos”. A revelação foi feita por Miguel de Senna Fernandes, membro do Conselho de Administração da Fundação Escola Portuguesa de Macau, ontem, ao HM.

Em causa está o facto dos subsídios atribuídos pelo Governo da RAEM no âmbito da adesão à rede pública escolar estarem dependentes do número de alunos por turma. No entanto, as turmas do ensino pós-primário têm um número instável e em alguns casos reduzido, o que colocaria em causa o financiamento da escola, perante a dimensão e gastos das actividades organizadas pela instituição.

“A adesão integral, ou seja de todas as turmas e anos de ensino, na rede pública era inviável, uma vez que a lei não contempla certas especificidades. No fundo, a entrada na rede escolar pública resume-se à atribuição de um subsídio para o funcionamento da escola. Mas este subsídio é concedido tendo em conta o número de alunos por turma”, começou por explicar Miguel de Senna Fernandes.

“A EPM tem até ao último ano do ensino primário um número constante e elevado de alunos. Só que depois desse ano, a situação já não acontece. Por exemplo, há turmas do 12.º ano que só têm sete alunos. Este número ia reflectir-se muito no subsídio recebido, o que faz com que a entrada seja impraticável face às muitas despesas. A estrutura da EPM não se compadece com este sistema”, acrescentou.

Candidatura seccionada

Quando a EPM esteve reunida com responsáveis da DSEJ, no Verão passado, houve a vontade de integrar a escola apenas até ao ensino primário. Porém, o Governo explicou que a alteração às regras de adesão mudaram há alguns anos, o que não permite que apenas uma secção de uma escola faça parte da rede. Isto quer dizer que para haver entrada na rede pública, todos os anos de ensino de uma escola têm de fazer parte da rede pública.

“Inicialmente pensou-se em pedir a entrada do ensino primário na rede pública escolar. Mas depois de ouvirmos as opiniões da DSEJ percebermos que esta opção não era viável. Há uns anos a lei foi alterada e deixou de ser possível fazer com que as escolas seja seccionadas. Agora, ou os estabelecimentos se integram totalmente, ou não podem entrar”, justificou Miguel de Senna Fernandes.

Por outro lado, o responsável diz que a EPM vai continuar a procurar fontes de financiamento, que para já está assegurada. “Não digo agora, mas daqui a uns anos acredito que a questão do financiamento vai voltar a colocar-se. Acredito que haverá uma saída para esta questão”, afirmou sobre o assunto.

Em 2016, durante uma visita a Macau, o ministro da Educação de Portugal, Tiago Brandão Rodrigues, revelou que o Governo da RAEM se tinha comprometido a financiar a instituição após 2017. Até essa altura, a Fundação Macau financiava a EPM com um montante que rondava os nove milhões de patacas.

No acto lectivo que se encontra a decorrer as propinas pagas pelos encarregados de educação para alunos com BIR variou entre as 8.170 e 13.310 patacas, devido ao subsídio atribuído pela DSEJ. No caso dos alunos não-residentes, o valor foi de 29.490 as 37.110 patacas.

9 Jan 2019

Desmantelada rede de levantamento ilegal de dinheiro

[dropcap]A[/dropcap] PJ, em cooperação, com as autoridades congéneres da China, desmantelou um grupo envolvido num caso de levantamento ilegal de dinheiro. Segundo o Ou Mun, foram detidas 21 pessoas da China, incluindo um líder do grupo, em vários apartamentos na Taipa.

Os suspeitos terão alegadamente utilizado máquinas POS (point-of-sale) alteradas para possibilitar o levantamento de quantias elevadas em Macau. No total, foram apreendidos 30 milhões de patacas em dinheiro vivo e depositados em contas VIP em casinos.

De acordo com informações da entidade bancária, citados pelo mesmo jornal, foram levantados 1,2 mil milhões, resultando num prejuízo de 2,4 milhões.

9 Jan 2019

Violação | Detido suspeito vindo do continente

[dropcap]U[/dropcap]m homem da China, de 33 anos, foi presente ao Ministério Público (MP) pela suspeita da prática do crime de violação. Segundo a edição de ontem do jornal Ou Mun, a Polícia Judiciária (PJ) foi informada do caso na quinta-feira pela Polícia de Segurança Pública (PSP).

A vítima, cuja nacionalidade não foi divulgada, veio a Macau com o homem, que conhecia há pouco mais de um mês, para jogar nos casinos. No regresso ao hotel, cujo quarto partilhavam, o homem imobilizou e violou a mulher.

A vítima pediu ajuda à PSP quando o homem estava a tomar banho. Após ter sido informada pela PSP, a PJ interveio, dirigindo-se ao hotel para deter então o alegado agressor.

9 Jan 2019

Associação quer fiscalização aos guias turísticos

[dropcap]O[/dropcap] presidente da Associação de Promoção de Guia Turismo de Macau, Ng Iong, revelou que o sector ligado aos guias turísticos registou uma queda de cerca de vinte por cento durante a época natalícia, sendo que atribui a situação ao aumento de guias ilegais no território proporcionado pela circulação na Ponte HKZM.

Perante este cenário o responsável afirmou ainda, em declarações ao Jornal Ou Mun, que está pessimista em relação ao desenvolvimento da actividade de guia turístico no ano de 2019 pelo que espera que o Governo venha a tomar medidas no aumento da fiscalização no sector.

De acordo com a mesma fonte, Ng Iong recordou que os profissionais do sector que operam de forma ilegal começaram a aparecer em Macau há cerca de dez anos, quando o centro histórico passou a ser considerado património. “Nessa altura começaram a aparecer guias turísticos de Hong Kong que traziam visitantes a Macau sem ser necessária a contratação de profissionais locais”, disse. Segundo Ng, as preocupações dos profissionais foram comunicadas ao Governo, sendo que nada foi feito.

Com a abertura da ponte HKZM, a associação nota que a situação está agora a agravar-se, chegando a Macau guias oriundos de várias cidades chinesas como Guangdong, Fujian e Guangxi, “afectando gravemente os direitos e interesses dos guias locais bem como o seu emprego”.

9 Jan 2019

Filho de Winnie Ho exige 2 mil milhões à STDM e Stanley Ho

Michael Hotung defende que a STDM e os tios e accionistas da empresa, Stanley Ho e Nanette Ho, têm de lhe pagar 2 mil milhões de dólares de Hong Kong, referentes à participação da mãe na empresa

[dropcap]M[/dropcap]ichael Hotung, filho da falecida Winnie Ho, está a processar a Sociedade de Turismo e Jogos de Macau (STDM) e os tios Stanley Ho e Nanette Ho, entre outros accionistas da empresa, e exige o pagamento de dividendos de 2 mil milhões de dólares de Hong Kong relativos à empresa. O processo deu entrada, ontem, nos tribunais da região vizinha, segundo a publicação Headline Daily, e promete reacender as lutas no seio da família Ho.

Através da batalha que vai agora começar nos tribunais da RAEHK, Michael, em conjunto com as empresas Moon Valley e Mutual Stand, está a reeditar o duelo jurídico entre Stanley e a irmã, que começou no anos de 2001, pelo controlo da STDM. Foi nesse ano que Winnie foi expulsa do Conselho de Administração da empresa que teve o monopólio do jogo de Macau, após 25 anos a servir a companhia.

Nesse diferendo jurídico, Winnie fez entrar nos tribunais um pedido a reclamar 3 mil milhões de dólares de Hong Kong em dividendos da STDM, que a irmã de Stanley Ho alegava que tinham ficado por pagar entre 2001 e 2005. Contudo, os tribunais acabaram por considerar que a irmã mais nova do magnata do jogo não tinha razão.

O caso acabou por ser altamente mediático com vários ataques pessoais. Por exemplo, durante os mais de 30 processos que Winnie colocou contra Stanley, a irmã chegou a recusar deslocar-se a Macau, por dizer que ela e os seus advogados tinham sofrido ameaças de morte de pessoas ligadas ao irmão.

Apesar de ter perdido a batalha, o que permitiu que a Sociedade de Jogos de Macau entrasse na bolsa de Hong Kong, no ano de 2008, Winnie Ho continuou a deter uma participação de 7,347 por cento da STDM. É também sobre estes valores que Michael Hotung pretende receber mais dividendos.

Filho renegado

Michael Hotung tem 59 anos e nasceu de uma relação entre Winnie Ho e Eric Hotung, multimilionário e filantropo falecido em 2017, que as famílias de ambos nunca aceitaram. Michael é ainda neto do empresário Robert Hotung, figura incontornável da história de Hong Kong, que está homenageado em Macau com uma biblioteca, na casa onde viveu durante a ocupação japonesa da região vizinha.

No entanto, a relação de Michael com o pai, Eric, esteve longe de ser pacífica e os dois tiveram vários diferendos nos tribunais. Em 2012, um tribunal americano condenou Eric a pagar 1,2 milhões de dólares americanos ao filho Michael, após o pai ter prestado à imprensa de Hong Kong declarações como “Ele não é meu filho!”, “a julgar pelo seus hábitos, não há hipótese nenhuma de ser da minha família” ou “este tipo de pessoas não pode ser membro da família Hotung”. O processo pode decorrer nos Estados Unidos, uma vez que Eric era proprietário de uma casa no país.

Também num outro caso em 2016, em que Eric Hotung exigia parte das acções de Winnie Ho na STDM, o pai Hotung acabou por reconhecer que tinha deserdado o filho devido ao processo de difamação. Em tribunal, Eric recusou mesmo usar o apelido Hotung para se referir ao filho e tratou-o por Mak.

9 Jan 2019

Património | Agnes Lam a favor da classificação de infra-estruturas modernas

[dropcap]A[/dropcap]gnes Lam endereçou uma carta ao Governo com opiniões sobre a classificação do segundo lote de bens imóveis desde a entrada em vigor da Lei da Salvaguarda do Património. A deputada entende que houve uma evolução face ao primeiro grupo, manifestando a sua concordância com a integração de mais infra-estruturas modernas.

Em declarações ao Jornal do Cidadão, Agnes Lam defendeu que o segundo conjunto mostra que o Governo está “mais atento” a aspectos como a cultura da população local e a mudança de vida das pessoas de classes sociais diferentes e às indústrias que marcaram o desenvolvimento da cidade moderna. Na perspectiva da deputada, a preservação pode ajudar os cidadãos no sentido de conhecerem a história da sua região e aumentar o sentimento de pertença em relação à comunidade.

Neste contexto, Agnes Lam espera que o Executivo mantenha o exemplo, investigando e protegendo imóveis modernos e os vestígios do passado industrial de Macau, recordando que actualmente diferentes grupos encontram-se a proceder aos trabalhos de estudo e preservação de edifícios modernos como sejam o Rainha D. Leonor, Armazém Tai Fung ou o prédio localizado no número 66 da Rua dos Ervanários.

A abertura do procedimento de classificação de um segundo grupo de imóveis teve lugar no final do ano passado. A lista contempla nove imóveis, entre os quais o Cemitério S. Miguel Arcanjo ou as Casas Moosa.
Ao abrigo da Lei da Salvaguarda do Património, a instrução do procedimento de classificação compete ao IC e compreende a abertura do procedimento, a audiência prévia do proprietário do imóvel (se for privado), a avaliação do Instituto Cultural e o parecer do Conselho do Património Cultural (que não é, porém, vinculativo), cabendo a decisão final ao Governo. A lei, em vigor desde 1 de Março de 2014, determina que esse procedimento deve ser concluído pelo IC no prazo de 12 meses, bem como que a proposta de classificação de um bem imóvel tem de ser objecto de consulta pública, a qual terminou no sábado. O IC tem agora até 180 dias para apresentar um relatório final relativamente às opiniões recolhidas.

9 Jan 2019

Habitação | Deputados querem preço de fracções para troca abaixo do mercado

Os deputados da 3ª Comissão Permanente consideram que os preços das fracções destinadas a troca devem ser abaixo dos praticados no mercado. O objectivo é incentivar a renovação urbana do território, disse Vong Hin Fai após a primeira reunião de discussão da proposta do regime de habitação para alojamento temporário e de habitação para troca

 

[dropcap]O[/dropcap]s deputados da 3ª Comissão Permanente consideram que o preço de venda da habitação para troca deve ser inferior ao preço de mercado. A ideia foi deixada ontem pelo presidente da comissão, Vong Hin Fai, após a primeira reunião de discussão na especialidade da proposta de lei acerca do regime jurídico de habitação para alojamento temporário e de habitação para troca no âmbito da renovação urbana. A razão, apontou Vong, vai no sentido de promover a própria renovação urbana. “Se quisermos incentivos para promover a renovação urbana e se o mercado estiver muito alto, como é que o Governo vai conseguir promover o seu avanço?”, questionou.

De acordo com o diploma em análise, o preço de habitação para troca deve seguir o estipulado no mercado para fracções do mesmo género. “Achamos que o preço deve ser abaixo do preço de mercado para que possa servir de incentivo à renovação e se o objectivo é promover a renovação urbana o Governo deve colocar à venda a habitação para troca a preços abaixo do mercado”, insistiu Vong Hin Fai.

Os marginalizados

Os deputados pedem também esclarecimentos ao Executivo relativamente à situação dos proprietários de espaços comerciais situados nos rés-do-chão dos edifícios e que podem ser alvo do processo de renovação urbana. Em causa está o facto destas pessoas não possuírem os requisitos necessários, de acordo com a proposta em análise, para se candidatarem à habitação temporária para arrendamento ou venda por troca na medida em que os estabelecimentos comerciais, que muitas vezes também lhe servem de residência, não têm oficialmente a finalidade residencial. “Os deputados estão preocupados que haja demolições que possam atingir uma loja sem finalidade habitacional mas onde o proprietário vive porque estes proprietários não podem candidatar-se ao arrendamento temporário nem à compra de habitação”, revelou o presidente da 3ª comissão.

De acordo com Vong Hin Fai o Governo deve ainda prestar esclarecimentos acerca das disposições especiais que a proposta abarca e que têm em conta os possíveis lesados pelo regime das expropriações ou por caducidade de concessão de terrenos.

A proposta prevê que estas pessoas se possam candidatar à habitação para troca e os deputados temem que, caso tenham recebido indeminizações por parte do Governo ou das promotoras de construção, venham a ser duplamente beneficiadas ao poderem integrar este regime.

Por outro lado, disse Vong, a proposta estabelece que o preço deve, nestes casos, seguir o valor do contrato de promessa de compra e venda, que pode, eventualmente ser inferior ao valor da casa para troca. “O preço do contrato pode ser abaixo do praticado no mercado pelo que os proprietários podem acabar por sair beneficiados”, apontou.

Neste sentido, os deputados da comissão querem mais esclarecimentos por parte do Executivo.

Conceitos dispersos

Também por definir, apontou Vong, está o próprio conceito de renovação urbana e da entidade que possa vir a ser responsável por ela. “O título da proposta faz referencia à renovação urbana, mas não conseguimos ainda encontrar uma definição jurídica para a expressão renovação urbana e queremos que o Governo esclareça isto”, referiu.

Por outro lado, o artigo 4º da proposta prevê que as construções [destinadas à habitação temporária e para troca] sejam feitas pela entidade responsável pela renovação urbana, mas de acordo com Vong Hin Fai não existe na proposta uma definição desta entidade. “Não sabemos qual é esta entidade – se é uma empresa ou serviço público”, disse.

9 Jan 2019

Malaca | As dificuldades de um bairro português que teima em existir

Construir a imagem de um cristo rei à entrada do bairro português em Malaca gerou um confronto com as autoridades malaias que por pouco não culminou na sua demolição. Há agora um plano para erguer uma imagem da virgem maria, mas Luísa Timóteo, da Associação Coração em Malaca, diz que isso não chega para manter a identidade portuguesa de uma pequena comunidade que vive pobre e com limitações. Pede-se uma escola e a visita de Marcelo Rebelo de Sousa

 

[dropcap]O[/dropcap] mar que outrora pôs o comer na mesa a várias famílias descendentes de portugueses já não é o mesmo. No seu lugar nasceu um imenso lodo que tirou o sustento aos vários pescadores que dali tiravam o seu ganha-pão diário. Em 2015, uma centena de pescadores que residem no bairro português de Malaca, na Malásia, protestaram erguendo caixões e enviaram um abaixo-assinado a Portugal a pedir embarcações e apoio técnico para voltarem a erguer a actividade.

Luísa Timóteo, presidente da organização não governamental (ONG) Associação Coração em Malaca, com presença em Portugal e Malaca, foi a portadora dessa missiva destinada às autoridades, mas nada aconteceu. Desde então, a situação mantém-se.

“Os pescadores estão uma desgraça, estão a pedir gente para lá, porque não têm embarcações para pescar e fazem-no manualmente”, contou Luísa Timóteo ao HM. “Entram pelo mar adentro até terem pé, e o mar está poluído, pelo que já não há peixe até onde eles podem chegar. [Em Portugal] temos o mar por nossa conta e temos tanta história, com capacidade para mandar embarcações para lá, e não fazemos nada.”

Ao largo do cais do Kampung Portugis – a designação do bairro português de Malaca, cidade conquistada por Afonso de Albuquerque em 1511 – quase não se vê vivalma, muito menos pescadores ou barcos em movimento.

Bunny Rodrigues é um dos pescadores que por ali vagueia na sua moto, e quando dá pela nossa presença faz uma paragem para conversar e fumar um cigarro. De chinelo no pé e ar descontraído, nem parece que vai começar a trabalhar daí a minutos: além de pescador, também faz umas horas extra num dos poucos restaurantes portugueses que existem no bairro. Orgulha-se do ordenado que tem: três mil ringitts, ou seja, cerca de 5.800 patacas, num país onde o salário médio mensal ronda os 800 dólares americanos.

HM

Casado com uma chinesa, Bunny Rodrigues aprendeu português com os pais e tem três filhos que, graças a si, falam todos a língua. Contudo, como nunca aprendeu português na escola, depressa o nosso diálogo passa a ser feito em inglês. Nunca comeu bacalhau mas sabe que é bastante salgado e de difícil preparação.

“Perguntei ao meu pai e ele disse-me que ainda temos familiares em Portugal, mas nunca os conheci”, contou Bunny Rodrigues, que nunca foi a Portugal e assume não ter dinheiro para fazer uma viagem a uma pátria que considera como sua.

Tal como Bunny Rodrigues, no Kampung Portugis encontram-se pessoas que mostram com orgulho o seu cartão de identificação com apelidos portugueses como De Mello, Silva, Rodrigues ou Albuquerque. Luísa Timóteo, cujo amor por Malaca a fez criar a ONG, fala de uma comunidade que se tem mantido ao longo de gerações praticamente sem apoios institucionais e com dificuldades económicas.

“Os jovens estão sem trabalho e não têm hipóteses de estudar, ficam com o curso elementar e às vezes nem isso. Esse é o grande problema, porque havia universidades [portuguesas] que abriam as portas para eles estudarem, mas têm de ter o ensino superior para depois se graduarem em Portugal”, defendeu Luísa.
Além disso, “a escolaridade nem sequer é obrigatória e há crianças que nem sequer vão à escola, e isso é muito triste, porque Portugal sabe disso e não age”.

A presidente da ONG e grande dinamizadora da manutenção da identidade dos portugueses de Malaca destaca também um centro da AMI, fundado em 2016 e que hoje dá apoio a cerca de mil moradores do bairro.

“Demos algumas cadeiras de rodas e bengalas, porque os mais velhos para andar até se agarram a cadeiras de plástico, e eu não posso ver isso”, contou Luísa Timóteo.

“Há pessoas que estão acamadas no chão. Criamos este centro da AMI para que haja uma reserva de material hospitalar que possa ser devolvido quando já não é utilizado. Não posso ver gente a ser tratada no chão, porque não têm cama ou porque correm o risco de cair da cama que têm em casa”, apontou.
À entrada do bairro notam-se algumas moradias e carros estacionados, mas, de acordo com a presidente da ONG, pertencem a “pessoas que estiveram a trabalhar fora, muitos deles na América, e que se vão destacando”.

“[As pessoas] estão ali estagnadas e a maioria da comunidade é muito pobre. Os jovens e crianças andam lá famintos, comem mal. Os velhos têm dificuldades de mobilidade.”

As autoridades malaias já começaram, entretanto, a desenvolver parcerias com este centro, onde são feitos workshops e rastreios contra o cancro da mama e a diabetes, uma das patologias mais comuns no país. “É uma achega muito grande, mas não chega”, lamenta Luísa Timóteo.

Falta quase tudo

As carências de que fala Luísa Timóteo notam-se nos primeiros olhares de quem chega ao bairro. Além do cais abandonado, encontram-se vestígios do velho Hotel Lisboa, que está vazio, e pouco movimento se nota por ali, à excepção de alguns moradores que deambulam de um lado para o outro, sem nada com que ocupar o tempo. Quem lá mora terá pedido à Associação Coração de Malaca para atrair um investidor português para o edifício do antigo hotel, mas Luísa Timóteo ainda nada conseguiu.

“O espaço foi alugado a uma pessoa que criou uns cursos universitários na área do turismo, mas há períodos em que fecha porque não há alunos.” Na cabeça da presidente da ONG germinam, contudo, outras ideias.
“Uma das nossas expectativas é que aquele edifício tão grande e tão bonito fosse aproveitado para todas as outras coisas que eles querem fazer, como a abertura de lojas, onde se poderiam ter produtos portugueses e onde pudesse também funcionar a escola portuguesa.”

Luísa Timóteo assegura que “os projectos estão sempre alinhavados mas não se concretizam, porque Portugal tem de se chegar à frente nas relações diplomáticas com a Malásia, porque eles [comunidade] também não podem fazer o que querem. Eles são um bairro, no fundo, uma aldeia, e como aldeia têm de obedecer às leis do país onde estão inseridos. A Malásia tem tido muita paciência em não ter já acabado com aquilo.”

Outro dos projectos que Luísa Timóteo gostaria de ver concretizado é a expansão do museu localizado no bairro português. “Queremos pedir apoios, pois achamos que não pode morrer de maneira nenhuma. Aquilo foi criado por eles, mas ninguém ali investiu nada, Malaca, Malásia ou Portugal. É necessário mais espaço, porque eles têm imensas coisas mas não está nada identificado.”

Esse trabalho será feito por um bolseiro abrangido por uma cooperação já estabelecida com o Instituto Camões (IC). “O museu tem de ser aumentado e requalificado, e pensa-se que isso possa ser feito fora da praça, mais próximo do edifício do Hotel Lisboa.”

Depois da presença de um jovem de Malaca em Lisboa, onde fez um projecto na Biblioteca Nacional, a Fundação Gulbenkian tomou conhecimento das necessidades da comunidade e decidiu oferecer uma biblioteca. Mas nem o seu transporte foi tarefa fácil. “Ninguém sabia como mandar aquilo, porque não se arranjava dinheiro, mas depois a fundação lá conseguiu enviar a biblioteca.”

“O IC está sensibilizado, a Fundação Oriente está sensibilizada. Eu não lhes digo que Portugal não está com eles, pois há muitas associações sensibilizadas, mas não chega”, salienta Luísa Timóteo.

A comunidade também deseja criar a sua própria corporação de bombeiros, mas, mais uma vez, faltam os meios humanos. “Temos de mandar alguém para lá para os ensinar, como aconteceu em Timor. Isto porque não é a Malásia que os vai ensinar a serem bombeiros. Nem era necessário muito dinheiro, porque eles querem é profissionais que os ensinem como se faz, para a comunidade se desenvolver.”

Pelo bairro não falta quem peça uma escola portuguesa. Luísa Timóteo diz que já entrou em conversações com o ministro português da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, mas que, até ao momento, apenas a questionaram quanto à existência de currículos portugueses.

Ainda na área da educação, a comunidade portuguesa de Malaca conta, desde Julho do ano passado, com um manual elaborado pelo académico Sílvio Moreira, actualmente a dar aulas na Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau. Este não é um mero livro de português como língua estrangeira, como o próprio contou ao HM. “Trata-se de um livro que pretende mostrar, em parte, a língua crioula de Malaca. Existe uma versão em crioulo, inglês e português europeu.”

O livro é ensinado aos mais novos de forma informal e em actividades promovidas pela Coração de Malaca e também nas aulas de Sara Santa Maria, “uma activista cultural que dá aulas a crianças de forma nada oficial”, apontou Sílvio Moreira.

Estátuas da discórdia

Desde o ano passado que o Kampung Portugis passou a ter uma imagem de marca: na pequena praça ergue-se uma enorme figura de um cristo rei que esteve envolvido em polémica. Bunny Rodrigues recorda-se bem: todos o construíram de forma voluntária e todos contribuíram com donativos, pois nada se fez às custas do Estado malaio. Nos dias de trabalho, várias famílias ofereceram comida caseira. Para este ano deverá ser erguida uma segunda estátua com a imagem da virgem maria, e até uma pequena fonte. Tudo para mostrar aquilo que são: católicos romanos.

“Se falar comigo sobre as figuras da igreja eu conheço-as a todas, porque é obrigatório saber tudo”, responde-nos em inglês. O que mais o deixa feliz é ver chegar portugueses de Portugal. “Não esperamos pessoas de outras religiões, mas sim que venham mais portugueses conhecer isto.”

Fora do bairro português, é fácil encontrar mais pessoas que descendem dos primeiros portugueses que por ali apareceram. Valérie Jéssica Pereira conduz um dos muitos tuk tuk barulhentos que povoam o centro de Malaca. Não vive no bairro português e os pais moram noutra povoação, também ela com portugueses de Malaca. Por ali existem várias povoações com descendentes de portugueses, apesar do Kampung Portugis continuar a ser o sítio mais tradicional, assegura Valérie.

“Nasci em Malaca, mas não falo o seu português, falo o meu português, da minha geração”, começa por explicar Valérie, que garante que a comunidade portuguesa ainda é aceite pelas autoridades.

“Penso que o nosso país é harmonioso, é uma só Malásia. Não há lutas, aceitamo-nos uns aos outros”, garante.

Apesar desta harmonia, a construção da estátua gerou um conflito com as autoridades, que queria demolir o projecto. Luísa Timóteo recorda que o problema só se resolveu porque um morador do bairro português era membro do parlamento local.

Apesar de Bunny Rodrigues estar confiante quanto à aprovação dos futuros projectos, que poderão ser erguidos ainda este ano, Luísa Timóteo teme que não seja bem assim.

“Eles podem fazê-lo à revelia, porque com uma licença não acredito que consigam. Trata-se de uma afirmação de pessoas que já têm dinheiro e outros horizontes, pois vivem no bairro mas já estiveram fora, a trabalhar noutros países. Aprenderam outras coisas. Isto porque a comunidade em si não arrisca nada, está quieta e serena nas suas casas.”

Valérie Jéssica Pereira defende que é possível que o projecto tenha seguimento. “Nos outros bairros portugueses não existem estes planos [de construir figuras religiosas]. Havia a ideia para a demolição da estátua, mas depois da mudança do Governo a estátua acabou por ficar, e agora há mais um projecto para construir outra. Todas as pessoas gostam de lá ir, especialmente os portugueses de Portugal, gostam de ver a estátua e visitar.”

“Penso que a estátua não afecta ninguém e é muito bonita. Quando chegamos ao bairro português pensamos na frase ‘Jesus dá-lhe as boas vindas’, então para mim é bonito. O anterior Governo queria demolir a estátua por razões políticas, mas para mim a estátua não é perigosa”, acrescentou.

UNESCO e Marcelo

Luísa Timóteo realça esta vontade da comunidade de querer manter uma entidade própria, mas recorda que seria muito mais importante dar seguimento ao projecto da UNESCO de fazer o levantamento do património português que resta em Malaca. Chegaram a realizar-se algumas reuniões sem que Portugal se tenha feito representar. O HM tentou chegar à fala com Joseph Santa Maria, um dos moradores do bairro que esteve ligado a este processo, mas até ao fecho desta reportagem não foi possível estabelecer contacto.

“Os colégios foram destruídos e agora estão em ruínas. Esse património que a UNESCO quer que seja levantado é aquilo para o qual eu gostaria que tivessem sensibilidade. Era muito mais importante reconstruir todas as igrejas”, apontou Luísa.

A responsável máxima pela Coração de Malaca sente-se quase sozinha nesta luta pela preservação da presença portuguesa neste pedaço da Malásia. Sempre defendeu a visita de governantes portugueses e pede que o actual Presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, faça uma visita a Malaca para perceber o espírito dos que lá vivem.

Luísa Timóteo não está optimista e teme que o tempo apague o que os descendentes de Afonso de Albuquerque foram deixando ao longo dos anos.

“Ainda se mantém a identidade, mas não sei se isso irá acontecer por muito mais tempo, porque eles já estão misturados com outras nacionalidades que existem ali ao lado, como filipinos ou chineses. Acho que quando morrer isto vai acabar, porque sou sempre eu que ando nesta liderança.”

Quem é do bairro “tem um amor a Portugal que é uma coisa louca”. “Querem construir estátuas, mas não é por aí. Têm é de ser educados e de se desenvolver noutras áreas, como o turismo, por exemplo.”

Mais uma vez, Portugal deveria desempenhar o seu papel. “Temos cá muita gente para os ajudar a formar. Eles querem renovar o folclore mas depois cantam sempre o ‘Malhão, Malhão’, não passam disso, quando temos tanto folclore e não mandamos para lá ninguém. Alguém de peso do Governo português deve ir lá e conversar com o Governo de Malaca, porque Malaca está disposta a negociar, e isso era muito bom para nós.

A nível de emprego não faltam lá oportunidades para os portugueses, e as portas não se abrem”, remata Luísa Timóteo.

9 Jan 2019

Birds Are Indie – “Close, but no cigar”

“Close, but no cigar”

Don’t you wanna think about it
One more time
Or do you wanna talk about it now?
Don’t you wanna think about it
One more time
Or do you want to dream about it now?

Do you want me to roll over
Close, but no cigar
Till this conversation is over
We’ll stay where you are
Then we’ll see if I still hang around

Birds Are Indie

JOANA CORKER, RICARDO JERÓNIMO e HENRIQUE TOSCANO

9 Jan 2019

AL | Juíza oriunda de Portugal inicia hoje funções como assessora

A partir de hoje, a Assembleia Legislativa (AL) conta com uma nova assessora. Uma contratação que vem aparentemente contradizer as afirmações de Ho Iat Seng que, aquando da não renovação dos contratos de Paulo Cardinal e Paulo Taipa, relativizou o impacto da sua saída, ao garantir que o quadro de juristas chegava e bastava

[dropcap]M[/dropcap]aria José da Costa Machado, juíza desembargadora em Portugal, inicia hoje funções como assessora da Assembleia Legislativa (AL). A contratação, por um período de dois anos, avançada ontem pela Rádio Macau, tem lugar poucos dias depois da saída de Paulo Cardinal e Paulo Taipa, a 31 de Dezembro.

O alargamento do quadro da assessoria jurídica vem contrariar as palavras do presidente da AL, Ho Iat Seng, que desvalorizou o impacto da saída dos dois experientes juristas, afirmando que o hemiciclo não só tinha “pessoal suficiente”, como de “qualidade”. No final do ano, a AL contava com 24 profissionais (dos quais nove assessores, seis técnicos agregados e nove técnicos superiores) e, em Setembro, Ho Iat Seng garantiu que a AL não tinha planos para contratar a breve trecho, apesar de ter ressalvado que essa possibilidade não estava posta de parte no futuro, se a mesa da AL assim o entendesse.

Rejeitadas razões de cariz político ou relacionadas com a nacionalidade e dado que a competência profissional de Paulo Cardinal e de Paulo Taipa nunca foi colocada em causa, nunca ficaram esclarecidas as dúvidas quanto aos fundamentos que estiveram efectivamente na base da decisão de dispensa dos dois juristas. Dúvidas que para os deputados Pereira Coutinho e Sulu Sou continuam a persistir.

Acentuar das dúvidas

“Então se a AL pretende substitui-los é porque eles não deviam ter sido dispensados”, observou o Pereira Coutinho, ao HM, insistindo na “má decisão” tomada pela AL de não renovar os contratos dos dois juristas, cuja “experiência e conhecimento não se compra com dinheiro e faz falta à AL”, onde há, a seu ver, “um grande défice de assessores jurídicos”. “Os juristas não têm mãos a medir face ao volume de trabalho”, apontou o deputado.

Sulu Sou partilha da mesma opinião: “Há muitas dúvidas relativamente à dispensa dos dois juristas” e “o argumento do presidente [de que o quadro de assessores jurídicos era suficiente] é muito estranho, porque eles têm trabalhado cada vez mais”. “Devia exigir mais e mais profissionais para garantir que a qualidade legislativa não vai ser reduzida”, sustentou o deputado, para quem a contratação da juíza a Portugal figura como uma “boa notícia”. “Espero que as novas pessoas possam trazer mais diversidade de opiniões. Ela pode não estar familiarizada com Macau – isso é verdade –, mas todas as pessoas novas precisam de um período de adaptação, pelo que esse não será um grande problema”, complementou.

Embora ressalvando não ter condições para “ajuizar” a nova contratação, por desconhecer o seu currículo e experiência profissional, realçando que o importante é que seja “competente” e “ética”, Pereira Coutinho fez referência ao factor do conhecimento da realidade local. “Não sei qual é o conhecimento que ela tem de Macau. Os advogados, por exemplo, têm uma formação adicional em Direito de Macau, e as funções na AL carecem de enorme experiência da realidade local”, sublinhou.

Nenhum dos dois deputados estava a par da contratação de uma nova assessora jurídica. Apesar de Pereira Coutinho reconhecer que “não é costume” os deputados serem informados a respeito, defende que tal faria sentido: “Por uma questão de respeito, devíamos ser informados do que está a acontecer”.

Longa carreira

Quem é a nova assessora? Maria José da Costa Machado começou a carreira na magistratura há mais de 30 anos, exercendo funções em vários tribunais de competência genérica, principalmente no Algarve, até ser promovida, em 2011, a juíza desembargadora, inicialmente em Coimbra e desde 2012 em Lisboa, para onde foi transferida a seu pedido. Pelo meio foi vogal do Conselho Superior de Magistratura (2004-2007).

Há sensivelmente um ano, Maria José da Costa Machado foi notícia em Portugal por ter pedido escusa como relatora num recurso interposto pelo ex-ministro português, José Sócrates, no âmbito da Operação Marquês. Segundo a imprensa, a juíza alegou que a percepção pública sobre a sua proximidade ao Partido Socialista (PS) poderia colocar em causa a imparcialidade de uma futura decisão.

Antes, a magistrada tinha ficado conhecida por ter sido a relatora do acórdão que absolveu a ex-ministra da Educação do Governo de José Sócrates. Uma decisão polémica, que remonta a Dezembro de 2015, que reverteu a pena de prisão de três anos e meio a que havia sido condenada pela alegada prática do crime de prevaricação.

Dois anos antes também esteve em foco pela sanção disciplinar que lhe foi aplicada por ter violado a norma que proíbe os magistrados judiciais da prática de actividades político-partidárias de carácter público. Em causa, acções de campanha eleitoral nas autárquicas de 2013 em que garantiu ter participado apenas na qualidade de mulher de Fernando Anastácio, então candidato à Câmara Municipal de Albufeira e actual deputado do PS. Foi-lhe aplicada a pena de advertência não registada, que constitui um mero reparo, figurando como a mais baixa prevista no estatuto disciplinar dos juízes.

8 Jan 2019

Jogo | Tribunal português anula despedimento colectivo decretado por empresa de Stanley Ho

[dropcap]O[/dropcap] Tribunal de Trabalho de Barcelos, em Portugal, anulou o despedimento colectivo de 21 funcionários do Casino da Póvoa de Varzim, gerido pela Varzim-Sol SA, cujo accionista maioritário é a Sociedade Estoril-Sol SGPS, cujo presidente do conselho de administração é o empresário Stanley Ho.

A sua filha, Pansy Ho, e Ambrose So, administrador da Sociedade de Jogos de Macau, são vogais do mesmo conselho de administração. A notícia da anulação do despedimento foi anunciada ontem pelo Sindicato dos Trabalhadores da Industria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Norte.

Segundo uma nota informativa do sindicato, o tribunal considerou “ilícito o processo de despedimento”, que aconteceu em Março de 2014, condenando a Varzim Sol, empresa que detêm a concessão de exploração do Casino da Póvoa, a “reintegrar todos os trabalhadores nos seus postos de trabalho”.

“O Tribunal considerou que não se mostraram objetivamente comprovados os motivos fundamentadores do despedimento coletivo e não haver nexo de casualidade entre o despedimento coletivo realizado e os fundamentos aduzidos para o mesmo”, pode ler-se no comunicado enviado pelo sindicato.

No mesmo texto foi explicado que com esta decisão da Justiça, a Varzim Sol terá reintegrar os trabalhados de acordo com a antiguidade e categoria que pertenciam, assim como pagar as retribuições que perderam, acrescidas dos respetivos subsídios de férias e Natal, diuturnidades e subsídio de alimentação, tudo acrescido de juros de mora”

O sindicato deu também conta de que, de acordo com a sentença, “a empresa terá de pagar os danos patrimoniais sofridos pelos trabalhadores, por se terem privado de auferir as gratificações que receberiam não fosse o despedimento, estabelecendo uma indemnização de 15 mil euros por cada um”.

Contactado pela agência Lusa, Francisco Figueiredo, responsável do Sindicato dos Trabalhadores da Industria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Norte, explicou que a sentença ainda é passível de recurso por parte da Varzim Sol, mas deixou um desejo.

“É natural que a empresa possa recorrer, mas a questão que se coloca é se o vai fazer mantendo os trabalhadores em casa, ou se vai recorrer aceitando a integração dos trabalhadores? Esperamos que, mesmo recorrendo, reintegre os trabalhadores”, disse o sindicalista.

Francisco Figueiredo considerou, ainda assim, que esta primeira sentença “é uma vitória para os trabalhadores e para o sindicato que lutaram todos estes anos”, apontando que “nem os peritos ouvidos em tribunal encontraram motivos para este despedimento”.

8 Jan 2019

Morreu o escritor britânico John Burningham

[dropcap]O[/dropcap] autor britânico John Burningham, que ficou conhecido por ter escrito e ilustrado dezenas de livros para crianças, morreu na sexta-feira aos 82 anos em consequência de uma pneumonia, foi ontem anunciado.

Formado em ilustração e design gráfico, John Burningham estreou-se na literatura para crianças em 1963 quando publicou um livro sobre Borka, um ganso que nasceu sem penas, com o qual recebeu o prémio Kate Greenaway Medal, o primeiro de várias distinções ao longo da vida.

Em 1970 voltaria a receber a mesma distinção com “Mr. Gumpy’s outing”, uma das obras mais conhecidas do autor, inédita no mercado português. O mais recente reconhecimento foi em 2018, com a atribuição de um prémio de carreira a John Burningham e à mulher e autora Helen Oxenbury.

Em Portugal estão publicados apenas alguns títulos do autor: “Aldo”, “A prenda de natal de Henrique Semprespera” e “Vai chegar um bebé”, o único que fez com Helen Oxenbury.

Citada pelo jornal The Guardian, Francesca Dow, da editora Penguin Random House, recordou John Burningham como um “verdadeiro pioneiro do livro ilustrado e um inesgotável e inventivo criador de histórias”. “Nunca falou com superioridade com as crianças, sempre as tratou com o maior respeito”.

8 Jan 2019

Qualidade do ar na China melhorou em 2018, dizem dados oficiais

[dropcap]A[/dropcap] qualidade do ar melhorou na China, em 2018, segundo um relatório divulgado hoje pelo ministério da Ecologia e Meio Ambiente, que compila os dados recolhidos em 338 cidades do país. Entre as áreas abrangidas pelo estudo, 79,3% dos dias registaram níveis “bons” de qualidade do ar, num acréscimo homólogo de 1,3% e que se enquadra na meta definida pelo Governo chinês.

Na área composta pelos municípios de Pequim e Tianjin e a província de Hebei, uma das mais poluídas do país, a percentagem de dias com boa qualidade de ar fixou-se em 50,5%, o que supõe um aumento de 1,2%, face ao ano anterior.

A densidade das partículas PM 2.5 – as mais finas e suscetíveis de se infiltrarem nos pulmões – caiu 11,8%, em termos homólogos, para uma média de 60 microgramas por metro cúbico. O nível máximo de concentração recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) é 25 microgramas por metro cúbico.

As cidades de Harbin e Changchun, capitais das províncias de Heilongjiang e Jilin, respectivamente, no nordeste do país, foram as que registaram maior melhoria da qualidade do ar, em 2018, segundo o relatório, que não avança com detalhes.

A China anunciou, no ano passado, um novo plano de acção para reduzir a poluição atmosférica, ao longo dos próximos três anos. O objectivo é reduzir as emissões de dióxido de enxofre e óxidos de nitrogénio em mais de 15%, em comparação com 2015, e que cerca de 300 das cidades abrangidas tenham 80% dos dias com bons níveis de qualidade do ar.

8 Jan 2019

Comboio usado pelo líder da Coreia do Norte chegou hoje a Pequim

[dropcap]U[/dropcap]m comboio de três carruagens e do modelo habitualmente usado pelo líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, chegou esta manhã a Pequim, após Pyongyang ter anunciado uma visita de quatro dias à China.

O comboio parou na Estação Norte de Pequim, cuja plataforma estava cheia de elementos da polícia e tropas paramilitares, descreve a agência Associated Press. Não foi confirmado, até agora, se Kim viajou naquele comboio, mas ambos os países confirmaram já a visita do líder norte-coreano à China, a quarta no espaço de um ano.

Kim deverá ser transportado para a Residência de Hóspedes Oficiais Diaoyutai, em Pequim, acompanhado de uma guarda de honra militar.

Na segunda-feira foi noticiado que um comboio especial norte-coreano entrou na China, aumentando as especulações sobre uma eventual visita a Pequim do dirigente norte-coreano, que foi mais tarde confirmada.

8 Jan 2019

Milionário japonês bate recorde de partilhas na rede social Twitter em três dias

[dropcap]U[/dropcap]ma publicação no Twitter do milionário japonês Yusaku Maezawa, na qual prometia dinheiro aos seus seguidores, tornou-se na mais difundida na história daquela rede social, depois de ultrapassar, em três dias, as 5,6 milhões de partilhas.

O empresário japonês, fundador e director-executivo da ZozoTown, uma plataforma de vendas online de artigos de moda, a maior do Japão, superou o recorde anterior obtido pelo norte-americano Carter Wilkerson, que atingiu as 3,5 milhões de partilhas em Abril de 2017.

“Darei um milhão de ienes a 100 pessoas em dinheiro”, escreveu Maezawa na sua publicação, pedindo-lhes que seguissem a sua conta e partilhassem a mensagem entre 5 e 7 de Janeiro. O milionário passou do meio milhão para 6,1 milhões de seguidores, algo que provocou críticas de vários utilizadores da rede social que o acusam de comprar seguidores.

No entanto, na sua mensagem, Maezawa disse que ofereceu o dinheiro como um gesto de “gratidão” aos consumidores pelos bons resultados de vendas obtidos pela ZozoTown em 2018. O milionário seleccionou os 100 vencedores hoje, como explicou em várias publicações na sua conta.

Em Setembro do ano passado, o director-executivo japonês atraiu a atenção mundial após ser escolhido pela empresa aeroespacial SpaceX, fundada pelo também milionário Elon Musk, para se tornar no primeiro turista espacial em 2023.

Segundo a revista Forbes, Maezawa é o 18.º homem mais rico do Japão, com uma fortuna avaliada em 2.700 milhões de dólares.

8 Jan 2019

Tribunal de Zhuhai condena activista pelos direitos humanos a dois anos de prisão

[dropcap]U[/dropcap]m tribunal chinês condenou o activista pelos direitos humanos Zhen Jianghua a dois anos de prisão por “incitar à subversão contra o poder do Estado”, informou ontem a organização não-governamental Amnistia Internacional (AI). O Tribunal Popular Intermédio da cidade de Zhuhai proferiu a sentença no final do mês passado.

Os julgamentos de activistas na China decorrem muitas vezes durante o período de Natal e Ano Novo, quando muitos diplomatas ocidentais e jornalistas se encontram de férias. Zhen, que tem uma década de experiência a trabalhar com comunidades marginalizadas do país asiático, é o fundador do portal “Human Rights Campaign in China”.

A AI informou ainda que o julgamento do activista de 33 anos decorreu à porta fechada, “o que gera sérias dúvidas sobre o seu direito a um julgamento justo”. Segundo a organização, Zhen foi condenado “apenas por exercer o seu direito à liberdade de expressão e associação”.

O activista lançou ainda uma campanha contra a censura na China e apoiou a educação e conscientização sobre o vírus da Sida. Zhen foi detido em 1 de Setembro de 2017 e posteriormente mantido num local secreto. Em 28 de Março foi formalmente acusado de “incitar a subversão contra o Estado”.

Aquele crime é frequentemente usado pela justiça chinesa contra dissidentes, activistas e advogados dos direitos humanos. Durante a actual liderança do actual Presidente chinês, Xi Jinping, as autoridades reforçaram o controlo de académicos, advogados e jornalistas, segundo organizações não-governamentais.

8 Jan 2019

Hong Kong escolhe defensor do diálogo China-Vaticano como bispo

[dropcap]O[/dropcap] líder da diocese católica de Hong Kong, o cardeal já reformado John Tong, será o administrador interino da Igreja no território, bloqueando desta forma a sucessão do bispo mais importante, crítico de Pequim. O anúncio foi feito ontem pela diocese, depois da morte do bispo Michael Yeung na semana passada.

A Santa Sé está disponível para uma reaproximação a Pequim, mas o bispo Joseph Ha é considerado demasiado directo para ser aceite como sucessor. O cardeal Tong, no entanto, tem defendido o diálogo entre a China e o Vaticano.

Alguns bispos de Hong Kong, como Ha, são forças morais politicamente activas, defendendo frequentemente a luta pró-democracia numa diocese com mais de 500.000 católicos. Tong, de 79 anos deixou o cargo de chefe da diocese em 2017.

8 Jan 2019

Cigarros da discórdia

[dropcap]P[/dropcap]or volta das 23.00h do passado dia 3, três homens do continente, apresentando sinais de alcoolismo, saíram do Diamond Hall do Galaxy Hotel, na Taipa, e vieram fumar junto à porta do edifício. Um polícia, dirigindo-se-lhes em Putonghua, pediu-lhe que apagassem os cigarros. No entanto os homens ignoraram o aviso e, também em Putonghua, partiram para os insultos. O agente insistiu no pedido, mas voltou a ser ignorado. De repente, um dos homens exaltou-se e atacou o polícia. A seguir, os outros dois juntaram-se ao ataque.

Com a situação fora de controle, foram requisitados reforços policiais. Como os homens não paravam de atacar o agente, este viu-se obrigado a puxar do bastão. Os atacantes tentaram agarrar o bastão e o equipamento de comunicação, que acabou por cair ao chão. Nessa altura o polícia sacou da arma e intimou-nos a parar. A desobediência continuou e o agente viu-se obrigado a disparar um tiro para o ar.

Depois dos disparos os homens pararam de atacar, mas continuaram a provocar verbalmente o polícia. Posteriormente os reforços chegaram e os desordeiros foram detidos e levados para a esquadra. O agente ficou ferido no abdómen e nas mãos. Foi levado de ambulância para o hospital, onde foi assistido. Teve alta às 3.00h da manhã do dia 4.

Os três homens, acusados de seis crimes, foram transferidos para a Procuradoria durante a tarde do dia 4, para serem inquiridos. Durante o interrogatório, os acusados identificaram-se como homens de negócios. Foram acusados de roubo, insulto, atentado à integridade física, etc. Negaram todas as acusações, alegando que o que se tinha passado não estava bem clarificado.

Não é a primeira vez que, em Macau, a polícia se vê obrigada a disparar para o ar. No entanto, parece ter sido a primeira vez em que foi necessário recorrer a esta medida, num caso em que, inicialmente, só estava em causa a proibição de fumar no local. Não será certamente um crime comparável a um assalto à mão armada.

O agente também está sob investigação devido aos disparos para o ar. Mas, tendo em conta o comportamento dos três homens, não parece que o agente venham a ter qualquer problema. E este comportamento terá ocorrido devido ao consumo de alcoól? A resposta será encontrada durante a investigação.

Mas vale a pena que Macau reflicta sobre este caso. A polícia disparou para o ar. Ninguém ficou ferido. Mas disparar para o ar também comporta riscos, porque uma bala em queda pode na mesma ser perigosa e atingir inocentes. E é evidente que, num caso destes, o polícia que dispara também não pode ser considerado culpado. O que é que se deve fazer numa situação similar? Será que se deve encontrar uma alternativa aos disparos para o ar? Além disso, se uma pessoa inocente ficar ferida, a quem compete a responsabilidade de garantir a indemnização? E a quanto deverá ascender essa indemnização? Que leis estão em vigor em Macau que regulem este tipo de compensações? Mas o que é mais importante é apurar a responsabilidade de quem obrigou a polícia a disparar. Nestes casos, qual é a responsabilidade legal dos desordeiros?

Saliente-se ainda que este incidente podia ter sido pior se, em vez de agentes da polícia, tivesse envolvido pessoal do Gabinete de Prevenção e Controlo do Tabagismo. Os polícias têm armas para garantir a sua segurança. Mas se alguém deste Gabinete tivesse sido atacado, como é que se teria podido proteger? Existe alguma resposta coordenada entre a polícia e os funcionários da Prevenção e Controlo do Tabagismo para lidar com situações deste tipo?

A causa de toda esta situação não deixa de ser trivial, mas as consequências acabaram por ser sérias. É preciso que os fumadores tomem consciência de que, em Macau, aos poucos, vão sendo tomadas medidas para proibir o fumo em quase todos os locais públicos. Isto não quer dizer que não se possa fumar, no entanto, só será possível em locais próprios. Se os fumadores respeitarem as normas, não se criarão conflitos constantes. É totalmente desnecessário.


Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau

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8 Jan 2019

Do Suor

[dropcap]S[/dropcap]eria sempre pouco o sabor a sal a deslizar pela pele que, uma e outra vez, se humedece de suor. E não tem a ver com um esforço qualquer mas simplesmente por ser, por estar sob o clima inóspito, sob o céu baixo e uma sufocante matéria estelar. Um vaivém descontínuo e um gotejar soberbo da testa que o lenço inutilmente limpa.

A experiência do suor exige um simulacro de língua fervente a descer pela pele. Indicia um corpo lacrimejado a preceito, a via crucis sem sangue, obsessiva, mas um corpo que incha, se expande, um corpo a rebentar.

A experiência do suor exige a paciência do doente e remete para a imobilidade hospitalar. É, curiosamente, imediata e progressiva como um som que não pára de crescer até nos rebentar os tímpanos. Uma música de pesadelo, música de fonte muda de onde silente escorre uma água espessa e quente.

O silêncio do suor obriga ao arquejo. Cola-se a roupa ao corpo como um destino se cola a uma existência em desgraça. O suor lembra o remorso, evoca o castigo infernal.

É, no entanto, bom ficar muito quieto enquanto as gotas nos emergem da fronte e lentamente escorrem rosto abaixo. É um desconforto que, aos poucos, se transmuta em aceitação de um estado praticamente excepcional. Existe um estranho peso, cálido e opressor, que nos afaga, que nos embala para um fora de nós, um inusitado espaço, terreno outro de inferno frígido, que pode até invocar o adorcismo e a alucinação.

*

A experiência do suor é também experiência limite do corpo, sobretudo quando ele deriva da não-acção, quando não existe uma razão real para suar, para a sua emergência. Quando não corremos, mal andamos e ainda assim a pele chora comovida por dar conta de si sob um opressivo calor sem sol.

O suor é uma chuva discreta, contranatura, olorosa, imbebível, que só o próprio corpo — ou outro corpo — admite reconhecer. O suor marca presença entre os amantes e é sublinhado pelo álcool e pelo medo. Surge da pele em toda a sua extensão e desliza grave por ela, acelerando o arrepio.

A presença do suor é sintoma de alteração, de metamorfose. Não serão as mesmas palavras, as mesmas intensidades, os mesmos desejos, as mesmas acções. Sob o seu reino, a mente ignora e experimenta, amiúde descobre novos prazeres.

Há algo de perda inconsequente na experiência do suor que é tão mais válida quanto menos for provocada e desejada. Seria sempre pouco o sabor a sal na pele, a indiciar uma e outra vez uma repetição, um arremedo infindo, a presença tépida e sublime de uma pequena morte.

8 Jan 2019