Piscinas | Nadadores-salvadores regressam hoje ao trabalho

 

Depois de um impasse laboral que levou 24 nadadores-salvadores a recusarem trabalhar, que causou o encerramento de duas piscinas públicas, a situação volta à normalidade. Os nadadores regressam hoje às piscinas depois de terem reunido com o Instituto do Desporto e a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais

 

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]consenso foi alcançado. Hoje, os 24 nadadores-salvadores que se recusaram trabalhar e que levaram ao encerramento das piscinas de piscinas de Cheoc Van e do Parque Dr. Sun Yat Sen, retomam as suas funções. A informação foi revelada ontem pela vice-presidente do Instituto do Desporto (ID) Christine Lam, após a reunião com a Direcção de Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), o representante da empresa “Surf Hong” e os queixosos. “Estes 24 nadadores-salvadores recomeçam hoje os seus trabalhos nas piscinas, de acordo com a organização dos trabalhos da empresa”, disse a vice-presidente de forma a eliminar qualquer dúvida.
Relativamente à definição do horário de trabalho, a responsável adiantou apenas que “os encontros com a empresa vão continuar, de modo a definir o horário e o calendário deste profissionais”.
Foi, no entanto, revelado que o encerramento das piscinas se deveu ao incumprimento contratual por parte da “Surf Hong” , o que irá resultar na aplicação de sanções à empresa.
“Como não conseguiram prestar os serviços adequados neste contrato vamos agora analisar a situação e ver o que vamos fazer a seguir. Mas temos também de exigir a qualidade dos serviços e vamos considerar a punição depois de conhecermos os pareceres dos nossos assessores jurídicos”, avançou Lam.
Para já, o mais importante é reunir consensos e retomar “o normal funcionamento das piscinas”, de acordo com a responsável do ID.

Nas mãos da DSAL

No que respeita ao incumprimento da legislação que regula as relações laborais entre a “Surf Hong e os nadadores salvadores”, o caso está agora entregue à DSAL que vai reunir “os documentos necessários e analisar os processos dos trabalhadores”, revelou Cheok Sok Kuan, representante destes serviços após o encontro de ontem.
Entretanto, e segundo o representante da “Surf Hong”, Victor Wong, a companhia vai “regularizar as situações em falta”. Wong não admitiu, porém, as falhas contratuais mencionadas pelos nadadores-salvadores. O empresário alertou antes para a escassez de recursos humanos e acrescentou que vai tentar contratar mais pessoas. “É um trabalho muitas vezes sazonal e não é fácil encontrar pessoas para preencher os lugares”, disse.
Os contratos dos 24 trabalhadores queixosos vão manter-se sem que sofram qualquer represália” afirmou Wong.

Situações resolvidas

No que respeita a salários em atraso, os nadadores-salvadores têm a situação resolvida. “Foram pagos, no dia 22 de Agosto, os ordenados referentes a Junho, Julho e Agosto”, esclareceu um dos representantes dos trabalhadores.
Um dos agravos dos funcionários foi a alegada retenção da carteira profissional por parte de entidade patronal, que os inibia de procurar novo emprego. A questão está resolvida, ao que parece, e os nadadores-salvadores já têm os seus cartões. Segundo o representante, “a empresa vai ficar com uma cópia e os nadadores-salvadores com o original, como deveria ter sido sempre feito”.
Dos 24 trabalhadores em questão, 23 são não residentes.
De acordo com o representante dos queixosos, existem mais profissionais a lamentar a situação laboral que atravessam. No entanto, estes 24 foram os que “tiveram a coragem de denunciar o que está a acontecer”.
Os nadadores-salvadores estiveram acompanhados pelo deputado Sulu Sou, que tem apoiado as reivindicações dos mesmos.

24 Ago 2018

Entrevista | Académico Sonny Lo diz que Governo resolve crises com lei

 

[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]uma entrevista transmitida ontem na Rádio Macau, Sonny Lo, analista político e professor universitário, argumentou que o Governo de Macau resolve crises sociais recorrendo apenas à implementação de leis.

“É interessante porque o Governo parece olhar para as medidas legislativas, como a Lei de Bases da Protecção Civil, como uma prioridade. Parece que o Governo tem uma tendência para usar meios legislativos para lidar com potenciais crises, como um tufão”, disse Sonny Lo, numa entrevista concedida no âmbito do primeiro aniversário do tufão Hato.

Para Sonny Lo, “as medidas legislativas são importantes, mas idealmente o Governo devia focar-se em todas as medidas concretas, como aprofundar o leito do mar, garantir que todos os veículos são estacionados em parques de estacionamento elevados em vez de parques subterrâneos, e garantir que é instalada uma barreira de forma a evitar novas inundações”, referiu.

Estas medidas são “mais importantes do que mudanças ao nível das leis para lidar com as chamadas ‘falsas informações’ em situação de crise”, disse Sonny Lo, referindo-se à medida, já anunciada pelo Executivo, de criar o chamado “crime de falso alarme social”.

No que diz respeito à Lei de Bases da Protecção Civil, que o Governo também quer implementar, Sonny Lo lembrou que é necessário algum grau de flexibilidade. O académico acrescentou ainda que as autoridades lidaram com o Hato de forma menos transparente do que o Governo chinês há dez anos, aquando da ocorrência do sismo em Sichuan.

24 Ago 2018

Legislação | Deputados receiam que lei do alojamento temporário fique na gaveta

 

Ho Ion Sang elogia a proposta do regime jurídico de habitação para alojamento temporário e de habitação para troca no âmbito da renovação urbana, mas teme que sem calendário o diploma volte a ficar na gaveta. Ng Kuok Cheong desconfia que esta proposta serve apenas para resolver os problemas do Pearl Horizon

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]deputado Ho Ion Sang espera que os trabalhos relativos à renovação urbana não afectem o ritmo da construção de habitação pública. Em declarações ao Jornal do Cidadão, Ho admite que ao regime jurídico de habitação para alojamento temporário e de habitação para troca no âmbito da renovação urbana, que está em consulta pública até 20 de Setembro, pode impulsionar, de facto, a renovação urbana no território. No entanto, deixa um alerta: “o Governo não pode adiar a construção de habitação pública por causa dos trabalhos na área da renovação urbana”, lê-se.
Ho recorda que a legislação que visa a reorganização dos bairros antigos demorou mais de dez anos a ser produzida e que actualmente existem mais de quatro mil edifícios construídos há mais de três décadas.
Neste contexto, o deputado enfatiza a urgência de se avançar com todos os procedimentos que possam impulsionar a renovação destas construções, para se encontrarem soluções para outros problemas relativos à segurança das pessoas nas suas residência.
Relativamente ao documento em consulta pública, o tribuno acredita que estão abrangidas as áreas essenciais, bem como os requisitos para que se avance o mais cedo possível com os trabalhos. Mas, continua a faltar um calendário nomeadamente sobre a redação do relatório final após o processo de consulta pública e a entrada do diploma na Assembleia Legislativa. Ho teme que estes passos demorem muito tempo, atrasando todo o processo de renovação que é necessário.

Mais casas

Não desfazendo a importância da proposta de lei, Ho Ion Sang alerta para a necessidade de habitação económica e social e defende que, apesar do avanço na área da renovação urbana, o Governo deve apostar simultaneamente a construção de habitação pública. Neste sentido, o deputado espera que o Executivo avance com a abertura de candidaturas para habitação pública no próximo ano e proceda às devidas revisões legais.
Por sua vez, o deputado Ng Kuok Cheong julga que o regime jurídico de habitação para alojamento temporário e de habitação para troca no âmbito da renovação urbana é limitado. A razão, aponta à mesma fonte, é visar apenas a resolução dos casos dos compradores de fracções do Pearl Horizon. O pró-democrata considera que a renovação urbana em si vai continuar “a ser constantemente adiada”, disse ao Jornal do Cidadão.
Ng Kuok Cheong sublinhou ainda que é importante produzir legislação e avançar com obras de renovação urbana até porque podem ser soluções para “melhorar a qualidade de vida da população”.
A proposta de lei que se encontra em consulta pública desde terça-feira prevê indemnizações para moradores de prédios antigos que habitem em casas temporárias do Governo e que não consigam regressar às antigas fracções. Com esta legislação, os lesados do Pearl Horizon podem também comprar casas de alojamento temporário, sem receberem compensação.

24 Ago 2018

Auditoria | SAFP contribuíram para atraso do Governo Electrónico

 

Formulários que nunca foram digitalizados, medidas que não passaram de projectos piloto sem serem regulamentadas por lei, sistemas que levaram anos a criar. O último relatório do Comissariado de Auditoria revela que os SAFP apresentaram “deficiências” na implementação de planos, além de demorarem a modernizar os serviços

 

 

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s Serviços de Administração e Função Pública (SAFP) falharam na implementação do Governo Electrónico quer a nível interno dos serviços, quer a nível externo na ligação aos utentes dos organismos públicos. E terão falhado por falta de acção e de leis de suporte, aponta o mais recente relatório de investigação do Comissariado de Auditoria (CA).
O trabalho do CA incide, sobretudo, na modernização dos serviços a nível interno, ao nível dos sistemas de gestão de pessoal, e do sistema “ePass”, criado em 2009 para que os cidadãos possam criar uma conta individual e aceder aos serviços públicos online.
Ambos os serviços demoraram anos a ser criados e ainda não estão implementados na totalidade. Faltaram datas concretas para a conclusão de planos e muitos serviços públicos não foram sequer contactados sobre o período experimental de implementação de medidas.
O relatório frisa que, entre 2011 e 2016, foram elaborados quatro planos para implementar o Governo Electrónico, sendo que, até 31 de Dezembro de 2016, “dos 61 trabalhos que podiam ser objecto de avaliação em relação à sua execução, apenas 39 tinham sido concluídos, representando 63,93 por cento do total de trabalhos previstos”. Para o CA, tais números reflectem “uma baixa taxa de execução”. Em relação aos restantes 22 projectos, 16 deles “tinham sido propostos há mais de dez anos e ainda não tinham sido concluídos”.
Uma das razões apontadas pelo relatório passa pelo facto dos SAFP sempre terem admitido que não eram responsáveis pela implementação do Governo Electrónico, algo que as leis em vigor desmentem.
“Os SAFP afirmaram que, até à sua reestruturação, em 2011, não lhe cabia coordenar os trabalhos de implementação do Governo electrónico, tendo admitido, porém, que tinha havido deficiências na implementação de projectos planeados. Por exemplo, alguns deles que não tinham prazos para conclusão e outros que, apesar de o terem, não foram cumpridos.”
Contudo, o CA constatou que, de acordo com a Lei Orgânica dos SAFP, datada de 1994, ou seja, “antes da reestruturação de 2011, verificou-se que já era da competência dos SAFP a modernização da Administração pública”.
Em 2001, quando Florinda Chan ainda era secretária para a Administração e Justiça, foi criado um grupo de trabalho inter-serviços para a implementação do Governo Electrónico, cuja coordenação ficaria a cargo do director dos SAFP. Desta forma, o CA conclui que “quer antes, quer depois da sua reestruturação, os SAFP foram sempre a entidade com competência para desenvolver e implementar o Governo Electrónico”.

Eternamente piloto

Apesar de confirmada a responsabilidade para modernizar e informatizar os serviços públicos, tanto internos como externos, a verdade é que os SAFP terão optado por trabalhar nos últimos anos com projectos piloto, sem força efectiva.
“Constatou-se que, por não ter havido um estudo aprofundado, e uma vez que, aquando da implementação do projecto-piloto, não foram recebidas as opiniões dos serviços públicos que fizeram parte do mesmo, tal fez com que os projectos de implementação do Governo electrónico acabassem por ser meros estudos ou simples documentos orientadores sem qualquer eficácia.”
O CA conclui também que “foi decidido que os projectos avançariam sob a forma de projectos piloto, uma situação que se mantém há vários anos”. “Deste modo, a morosidade na implementação do Governo Electrónico não é de surpreender”, acrescenta o relatório.
A nível interno, os SAFP tiveram em mãos o projecto, nos últimos anos, de modernizar o sistema de gestão de pessoal, incluindo a digitalização de requerimentos ligados à área dos recursos humanos. Mas também aqui pouco, ou nada, foi feito.
“Em relação à informatização dos procedimentos internos de gestão de pessoal, anunciada em 2006, existem 18 impressos constantes no Regime Jurídico da Função Pública e todos eles necessitavam de ser informatizados. Contudo, até final de 2016, o modelo ‘participação de faltas e férias’ era o único impresso que podia ser preenchido electronicamente”, revela o relatório.
Na verdade, “a informatização destes documentos levada a cabo pelos SAFP tem sido extremamente ineficaz e ineficiente, pois, em dez anos, apenas um formulário foi informatizado”, acrescenta o CA.
No que diz respeito ao uso do sistema de gestão de pessoal, cujos módulos foram criados em 2001, “até 31 de Dezembro de 2016, apenas 22 dos 97 serviços públicos estavam a usá-lo, o que corresponde a 22,68 por cento.” Para o CA, “está claro que esse objectivo não foi alcançado”.
Além disso, os SAFP terão também cometido erros ao nível da gestão de dados pessoais. No que diz respeito aos sistemas relacionados com os pedidos de férias, inscrição em acções de formação ou recolha de dados dos recursos humanos houve “deficiências”, além de terem sido desenvolvidos de forma “grosseira e imprudente”.
“Houve questões relacionadas com a segurança dos dados dos recursos humanos e a sua transmissão em rede, fazendo com que o ‘sistema de pedidos de férias’ só tenha entrado em funcionamento em 2010, depois de terem sido desenvolvidas as tecnologias necessárias.” Quanto aos restantes sistemas, “demoraram cerca de 13 anos a serem desenvolvidos e só entraram em desenvolvimento em 2015”.

e-Pass sem lei

Outro ponto abordado pelo CA é a ligação dos serviços públicos com a população, nomeadamente com a criação do sistema e-Pass, em 2009. Contudo, “devido à forma descuidada como esta plataforma foi planeada relativamente aos seus destinatários, actualmente o e-Pass destina-se apenas a residentes que tenham completado 18 anos, deixando de fora os não residentes e as pessoas colectivas”, tal como associações ou empresas.
Além disso, o e-Pass carece de uma base jurídica, apesar de ter sido anunciado nas Linhas de Acção Governativa nos últimos anos. O sistema foi revisto em 2012 e prometeu-se a lei para este ano, “sem se especificar uma data concreta”, além disso, o mecanismo de identificação unificado nunca foi concretizado.
“Não foi elaborado qualquer diploma legal que enquadrasse e regulasse tal plataforma, pondo-se o problema da produção dos efeitos jurídicos dos actos aí praticados, bem como o problema da verificação da identidade dos utilizadores.”
Esta foi, segundo o CA, a razão pela qual existem tão poucos serviços públicos a recorrer ao e-Pass. Até 31 de Dezembro de 2016, apenas sete serviços públicos disponibilizavam serviços nesta plataforma, “a maioria deles relacionados com serviços de consulta”, sendo que “o número de contas individuais criadas era reduzida”.
Os SAFP adiantaram ao CA que, entre 2010 e 2012 “não chegou a ser definido nenhum plano para a implementação do Governo Electrónico”, isto apesar de, todos os anos, o relatório das LAG terem incluído “planos de trabalho nesse domínio”.
Em dois anos, os SAFP limitaram-se a melhorar o que já tinha sido feito e a promover as “Bases de Desenvolvimento dos Serviços de Governo Electrónico” e as plataformas electrónicas “e-Pass” e “eDocX”. Só depois de 2011, quando foi alvo de uma reorganização, é que os SAFP passaram a dedicar-se ao “aperfeiçoamento de infra-estruturas”.
É de frisar que, durante o processo de investigação, o CA esperou seis meses por informações e dados sobre a realização de três planos. Após várias solicitações, em Maio de 2017, o organismo de fiscalização obteve, finalmente, aquilo que havia pedido.

 

SAFP respondem e prometem novidades para 2019

Na resposta dos SAFP às conclusões do relatório do CA, são referidas algumas medidas ou alterações que deverão ser implementadas no próximo ano, tal como a nova versão da “plataforma de gestão e serviços para os trabalhadores da Função Pública”, ou sistema de gestão pessoal, algo que está em articulação com a revisão do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública que tem sido levada a cabo.
Relativamente ao sistema e-Pass, também deverá estar concluída em 2019 a regulamentação do modelo de assinatura electrónico por níveis e a “informatização dos respectivos procedimentos”, existindo também o objectivo de criar “regulamentos consoante as necessidades comuns dos procedimentos administrativos”.
É garantido que, em 2019, os SAFP irão “aperfeiçoar os diversos trabalhos de planeamento geral, bem como fazer a avaliação da execução do mesmo”. Deverá também ser elaborado “o próximo plano de desenvolvimento do Governo Electrónico, tendo em conta as questões levantadas e as insuficiências contidas no relatório”.
Os SAFP dizem aceitar as conclusões do CA “com humildade” e afirmam ter percebido que existem, de facto, “algumas insuficiências, nomeadamente na definição de projectos de implementação em termos de planeamento geral, coordenação e execução”.
Terá sido reforçada “a realização de estudos preliminares antes da criação dos projectos”, além de que foram feitas “análises aprofundadas sobre os procedimentos administrativos”. Tudo para que os SAFP possam “acumular experiência de modo a preparar os próximos planos gerais”.

 Wong Kit Cheng pede melhorias

Por mera coincidência, a deputada Wong Kit Cheng entregou ontem uma interpelação escrita ao Governo onde pede melhorias no sistema de Governo Electrónico, lembrando que Eddie Kou, actual director dos SAFP, revelou recentemente que a taxa de execução era superior a 80 por cento.
“Recentemente foi inaugurado o centro de actividades em Seac Pai Van e os cidadãos perceberam que, para entrar na zona de diversão para crianças, têm de trazer uma cópia do BIR para se inscreverem. As pessoas questionam porque é que não podem simplesmente utilizar o BIR num sistema electrónico inteligente”, exemplificou a deputada. Wong Kit Cheng frisou que este não é caso único e que é necessário um sistema uniformizado para os serviços públicos.

 

Um plano que existe desde 1990

No relatório ontem divulgado pelo CA é contada toda a história da implementação do Governo Electrónico, que dura desde o tempo da Administração portuguesa. Tudo começou em 1990, quando os SAFP “tinham como atribuições a promoção das políticas de modernização da Administração pública”. Essa modernização “inclui o que hoje em dia se designa por ‘informatização’”. Em 2000 foram iniciados, pelos SAFP, estudos preliminares sobre o assunto e foi estabelecido um grupo interserviços em 2001, cuja coordenação esteve a cargo do director dos SAFP. Em 2011 a Lei Orgânica dos SAFP foi alterada, o que deu a este serviço mais competência para coordenar o Governo Electrónico. Contudo, “após um processo de desenvolvimento de mais de duas décadas, os resultados da implementação não são satisfatórios, estando muito longe de corresponder às expectativas da sociedade”. Além disso, os SAFP “não tinham consciência do quão abrangente é a implementação de um Governo Electrónico”.

24 Ago 2018

De que tem medo Raymond Tam?

 

[dropcap style=’circle’]P[/dropcap]ublicamos hoje uma edição especial para recordar a passagem do tufão Hato por Macau, um ciclone tropical que mudou a vida a muita gente e que fez soar o alarme das autoridades quanto à necessidade de mudar os mecanismos de resposta.
Para esta edição decidimos escrever sobre as memórias dos dias seguintes à tempestade que matou dez pessoas e que deixou tantas outras sem casa e sem negócio. Decidimos pedir reacções sobre o que foi feito durante este ano e se realmente mudou alguma coisa. Foi neste contexto que decidimos pedir uma entrevista a Raymond Tam, director dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG), escolhido depois da polémica com o processo disciplinar instaurado a Fong Soi Kun.
Serve esta crónica para lhe explicar, caro leitor, porque é que não temos Raymond Tam em discurso directo a descrever o que tem feito nos SMG, em acumulação de funções com o cargo de director na Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental. O primeiro pedido de entrevista foi feito aos SMG no passado dia 7. Como resposta, uma assessora pediu-me, como é habitual, as perguntas que iria fazer. Nós, jornalistas, não temos por hábito proceder desta forma, mas em Macau é quase obrigatório cumprir este pedido se queremos ter notícias ou declarações. Quase tudo tem de estar previamente preparado e estudado, como se o erro fosse um crime. Estas foram as perguntas que enderecei a Raymond Tam:

– Como foi o processo de adaptação ao trabalho nos SMG? Quais os principais desafios que enfrentou?

– Sentiu que a equipa estava desmoralizada ou afectada pelo processo de mudanças após a saída de Fong Soi Kun e da ocorrência dos episódios no tufão Hato?

– Quais as principais mudanças que ocorreram no trabalho no dia-a-dia, a nível técnico, em prol da melhoria do processo de levantamento dos sinais de tempestade?

– As autoridades anunciaram que, entre 2022 e 2028, será criada uma plataforma de comando para operações de segurança e resposta a emergências na cidade. Que papel terão os SMG nesta nova entidade?

– Considera que, um ano depois da ocorrência do tufão Hato, a população confia mais no trabalho dos SMG?

– Macau está hoje mais preparada para receber um tufão semelhante ao Hato ou considera que há ainda muito a fazer a nível da resposta a catástrofes, sobretudo dentro dos SMG?

– São necessários mais recursos humanos nos SMG? Deparam-se com alguma dificuldade a este nível, um ano depois da tempestade?

– Como tem conjugado o trabalho de director dos SMG em acumulação com o cargo de director da DSPA?

– Quando foi nomeado para este cargo falou-se da sua alegada falta de experiência na área da meteorologia. Que comentário faz, meses depois de ter sido nomeado director dos SMG?

Passados uns dias, recebo uma resposta dos SMG, onde me foi dito que o pedido de entrevista teria de ser feito novamente ao Gabinete de Comunicação Social (GCS), o que fiz. Do GCS disseram-me que não coordenam pedidos de entrevista feitos a directores de serviços, pois trabalham de perto com o gabinete do Chefe do Executivo, pelo que teria de fazer novamente o pedido aos SMG. Voltei a reencaminhar o email.
Sem reacção por parte dos SMG, foi-me garantido que iria receber “um esboço” com respostas às minhas perguntas (tradução: um comunicado) em chinês, mas que não sabia quando teria a versão em português. Pedi para me enviarem logo a versão em chinês pois faria todo o sentido publicar as respostas hoje e não daqui a uma semana, mesmo implicando trabalho extra. A esta hora, caro leitor, continuo à espera da resposta de Raymond Tam.
Deixo aqui bem claro que, em seis anos de profissão em Macau, nunca um pedido de entrevista feito por mim a membros do Governo foi tratado pelo GCS, mas sim pelos assessores de imprensa dos respectivos serviços.
Perante esta situação, ocorre-me perguntar: de que tem medo, senhor Raymond Tam? Que perguntas desta lista o incomodam mais? Porque não negou simplesmente a entrevista, em vez de adiar eternamente este assunto, para que não pudesse conversar consigo?
Não é a primeira vez que Raymond Tam escapa aos jornalistas. Recordo-me de uma outra tentativa de entrevista que este jornal lhe fez, ainda era apenas director da DSPA. Respondeu por escrito: menos mal. Outros pedidos de entrevista foram pura e simplesmente rejeitados.
Não tenha medo: não queremos ataques, queremos explicações. Não nós, mas a população para quem escrevemos. São as pessoas que precisam de saber o que se passa desde que esta tempestade matou dez residentes. As cheias continuam a acontecer no Porto Interior, a poluição aumenta no território a olhos vistos, o lixo continua a não ser reciclado. A população precisa de respostas.

 

23 Ago 2018

Automobilismo | Vários pilotos de Macau interessados na Taça da Grande Baía

A “Taça da Grande Baía” é a única novidade no programa da 65ª edição do Grande Prémio de Macau. O promotor do conceito esteve em Macau recentemente, onde apresentou o carro que dá corpo à competição monomarca, o Lotus Exige GT, e revelou mais pormenores sobre a competição

“Ser o promotor do troféu monomarca Lotus no 65º Grande Prémio de Macau é uma honra”, admitiu ao HM Eric Wong, o fundador da Richburg Motors, a empresa responsável pela organização da “Taça da Grande Baía”. “Este é um momento significante para a Lotus, como primeiro promotor a apoiar um evento da Grande Baía. Além disso, será no primeiro ano depois da Lotus UK (Group Lotus plc) ter sido comprada pela Geely (Zhejiang Geely Holding Group). Isto é relevante.” Para Eric Wong, também ele um entusiasta dos desportos motorizados e piloto amador, esta nova competição distingue-se por “proporcionar uma plataforma para pilotos que queriam juntar-se a uma competição de desportos motorizados de topo, de nível amador e com carros de Grande Turismo (GT)”.
Antes da grande corrida no Circuito da Guia, os pilotos que apostarem em competir na Taça vão ter a possibilidade de experimentar os carros ingleses no Circuito Internacional de Zhuhai, onde será realizada uma prova no terceiro fim-de-semana de Setembro.

Para clientela diferente

Nos últimos quatro anos a dita “slot comercial” do Grande Prémio foi ocupada pela “Corrida da Taça Chinesa”, prova de carros de Turismo, patrocinada pelo construtor automóvel chinês BAIC e que o ano passado foi ganha pelo macaense Hélder Assunção. A “Taça da Grande Baia” apresenta-se como um conceito diferente.
Eric Wong acredita que o seu novo produto tem para oferecer algo mais interessante aos pilotos, uma vez que sublinha as capacidades e talento de cada um, até porque a preparação da viatura é igual para todos os concorrentes.
“Ao contrário das corridas de carros de Turismo, os carros GT são muito mais relevantes no que respeita ao nível de habilidade (dos pilotos) e no equilíbrio de performance da dinâmica aerodinâmica, equilíbrio do chassis, potência e peso. O nosso troféu com o Exige GT tem todos os elementos necessários para os pilotos que procuram competir em condições de igualdade e custos razoáveis”, explicou Eric Wong que em 2015 foi o impulsionador da “Suncity Lotus Celebrity Cup” do Grande Prémio, uma corrida primordialmente pensada para atrair celebridades do showbiz de Hong Kong.
Esta também não é uma competição para iniciantes, apesar de representante da marca Lotus para Macau estar ciente que vai ter vários pilotos com pouca ou nenhuma experiência em carros de GT. Por isso mesmo, o empresário da região vizinha está a oferecer “cursos de pilotagem para quem queira iniciar-se nas corridas de GT, com pilotos profissionais de topo, que têm experiência de pódios no Grande Prémio de Macau.”
Outro dos motivos para cativar potenciais pilotos, está no moderno carro inglês, equipado com um motor V6 com compressor, “que está disponível para venda por um preço bastante razoável, 998.000 dólares de Hong Kong.”

Interesse em alta por cá

A trabalhar em contra-relógio para ter todos os carros prontos para Setembro, Eric Wong está confiante que vai ter casa cheia para o evento do mês de Novembro entre nós. “O recrutamento de pilotos já começou em Hong Kong, na China Continental e em Macau. Nós esperamos 25 carros no evento”, afirma o promotor.
Diversos pilotos da RAEM já mostraram interesse em junta-se à “Taça da Grande Baía”, mas Eric Wong prefere não revelar números, nem nomes, apenas atesta que “há interesse” e que “estamos em negociações com vários pilotos”.
Para aqueles que não estejam dispostos a comprar um destes vinte e cinco Lotus Exige GT, a organização tem uma outra opção: alugar um volante nas corridas de Zhuhai e Macau pelo valor de 460.000 dólares de Hong Kong, um preço que inclui todo o apoio técnico, inscrição, transporte, gasolina e pneus.
As inscrições encerram no dia 7 de Setembro e, no caso dos representantes do território, apenas pilotos que participaram nos dois Festivais de Corridas de Macau ou em corridas de carros de Turismo estão elegíveis.

 

 

23 Ago 2018

Facebook | Banidas contas ligadas à Rússia e Irão por manipulação

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]rede social Facebook identificou e baniu 652 páginas, grupos e contas ligadas à Rússia e ao Irão por manipulação coordenada que incluía a partilha de material político. A remoção das páginas, grupos e contas resultaram de quatro investigações – três envolvendo o Irão e uma envolvendo a Rússia -, indicou a empresa norte-americana na terça-feira, através do seu fundador e CEO, Mark Zuckerberg. As campanhas de manipulação tinham como alvo os Estados Unidos, o Reino Unido, países da América Latina e do Médio Oriente. A rede social revelou ainda ter informado os Governos dos Estados Unidos e do Reino Unido. O Facebook intensificou significativamente a fiscalização da sua plataforma desde o ano passado, quando foi tornado público que agentes russos realizaram com sucesso operações de manipulação política naquela rede social, com o objectivo de influenciar a eleição presidencial norte-americana de 2016.

23 Ago 2018

Pelo menos dez ministros australianos demitiram-se

[dropcap style=’circle’]P[/dropcap]elo menos dez ministros australianos demitiram-se, avançou ontem a Agência France Presse (AFP), um novo golpe para o primeiro-ministro Malcom Turnbull, que venceu na segunda-feira uma votação interna do Partido Liberal pela liderança do Governo. Malcolm Turnbull obteve 48 votos, contra 35 do ministro do Interior, Peter Dutton, que, entretanto, renunciou ao cargo, embora se mantenha como deputado.
A divergência surgiu na segunda-feira, quando o primeiro-ministro anunciou que ia renunciar à tentativa de promulgar a legislação de redução de emissões de gases com efeito de estufa, reconhecendo que o fazia por falta de apoio no parlamento.
Para Nick Economou, analista político da Universidade Monash, em Melbourne, os deputados do Partido Liberal estão a abandonar o primeiro-ministro com receio que Turnbull conduza o partido a uma derrota esmagadora nas eleições legislativas de Maio de 2019.
Entretanto, outros nove ministros apresentaram a demissão. De acordo com a AFP, Malcom Turnbull ainda só aceitou o pedido de dois: a de Peter Dutton e a da ministra do Desenvolvimento Internacional, Concetta Fierravanti-Wells.
Ainda assim, o primeiro-ministro afirmou ontem que outros ministros “garantiram inequivocamente lealdade e apoio”.

Réplicas políticas

Malcolm Turnbull assumiu a chefia do Governo, em Setembro de 2015, ao afastar o antecessor Tony Abbott, membro do mesmo partido.
Foi durante o Executivo de Abbott que a Austrália se comprometeu a reduzir as emissões em 26 por cento em relação ao nível de 2015 e até 2030 para lutar contra o aquecimento climático. Um objectivo considerado, na altura, insuficiente pelos opositores. Este objectivo foi oficializado em Dezembro de 2015 no âmbito do Acordo de Paris.
A Austrália atravessa um período de grande instabilidade política desde que o primeiro-ministro John Howard perdeu o poder em 2007, após mais de 11 anos no cargo. No próximo mês, Turnbull fará mais de três anos como primeiro-ministro, tornando-se o líder com maior longevidade no cargo desde John Howard.

23 Ago 2018

EUA | Ex-advogado de Trump declara-se culpado e implica-o

O ex-advogado pessoal de Donald Trump, que na terça-feira se declarou culpado em oito acusações, admitiu ter pago a duas mulheres “a pedido do candidato” e “com a intenção de influenciar as eleições” presidenciais de 2016

[dropcap style=’circle’]M[/dropcap]ichael Cohen, advogado e empresário, deu-se como culpado em cinco acusações de fraude fiscal, uma de fraude bancária e duas por violação das leis de financiamento das campanhas eleitorais, numa audiência no tribunal federal de Manhattan, Nova Iorque.
Inquirido pelo juiz William Paule, Cohen precisou ter pago as quantias de 130.000 e 150.000 dólares a duas mulheres que afirmavam ter tido uma relação com Donald Trump em troca do respectivo silêncio, “a pedido do candidato” e “com a intenção de influenciar as eleições” presidenciais, de que Trump sairia vencedor. Michael Cohen não forneceu os nomes das mulheres, mas os montantes correspondem aos pagamentos já conhecidos feitos a Stormy Daniels, actriz de filmes pornográficos que afirma ter tido uma breve ligação com Trump em 2006, e a Karen McDougal, uma ex-modelo da revista Playboy que afirma também ter tido uma ligação com o multimilionário em 2006-2007.
Estas declarações, que implicam que o Presidente norte-americano poderá ter cometido um crime, foram de imediato classificadas pelos comentadores como muito graves para Donald Trump, ainda mais por procederem de Cohen, a quem chamavam o ‘pitbull’ ou ‘cão de fila’ do chefe de Estado, e que foi agora “açaimado” ao aceitar cooperar com a Justiça.

Soldado fiel

Cohen trabalhou durante mais de dez anos para o magnata nova-iorquino do imobiliário e houve uma época em que dizia que “levaria um tiro” por ele.
A quase totalidade das acusações de que é alvo é passível de uma pena máxima de cinco anos de prisão, excepto a acusação de declaração fraudulenta a um banco, pela qual arrisca 30 anos de cadeia.
Esta inesperada reviravolta deu-se no dia em que outro colaborador próximo do Presidente, o seu antigo director de campanha Paul Manafort, foi considerado culpado de oito crimes por um júri, após um julgamento por fraude bancária e fiscal.
À condenação de Manafort, o Presidente reagiu dizendo ser “uma vergonha”, mas sobre a declaração de culpa de Cohen e a cooperação deste com as autoridades judiciais não emitiu publicamente qualquer comentário.
Manafort foi condenado na terça-feira na Virgínia por crimes de que foi acusado pelo procurador especial Robert Mueller, encarregado da investigação sobre se houve ingerência da Rússia nas presidenciais de 2016 e potencial obstrução da justiça, um processo a que o Presidente chama “caça às bruxas”.
Trump disse à imprensa, à chegada a Charleston, na Virgínia ocidental, que a condenação de Manafort “não tem nada a ver com o conluio russo” e sobre os crimes do seu ex-director de campanha, foi perentório: “Isso não me envolve”.

 

23 Ago 2018

O Complexo de Marco Polo

[dropcap style=’circle’]C[/dropcap]omprei hoje na rua As Viagens de Marco Polo, que não relia há uma década. O que me recordou um conceito que criei para um artigo científico: o complexo de Marco Polo.
O Marco Polo, um aventureiro e navegador de Veneza, fez a mais espantosa viagem europeia do século XIII e viajou para o Oriente, tendo estado na China 20 anos. Foi tal a sua integração que foi embaixador do Imperador da china, gozando de prestígio e poder.
Regressado a Itália, com 41 anos, foi feito prisioneiro dos Genoveses, numa batalha. E na prisão encontrou o cronista Rustichello da Pisa, a quem relatou as suas viagens e os reinos do Oriente.
Só que o relato do veneziano era cru e de antemão jornalístico e destituído dos seres fabulosos, lendas e maravilhamentos que recheavam as crónicas da época. E Rustichello, para tornar o relato credível, acrescentou gordura “mitológica” ao que Marco Polo contara, fantasias comuns ao imaginário da época e que compusessem um certo “efeito de real”.
A esta necessidade de irreais para tornar um discurso verosímil é que eu chamei o Complexo de Marco Polo.
Sem adivinhar que no século XXI este modo patológico de ler a realidade se tornaria uma constante da paisagem política.
As fake news, na sua inversão da realidade, representam esta patologia investida de modo imperial.
O que evidentemente só acontece em períodos de mutação civilizacional, quando os valores antigos se diluem e os novos ainda não se firmaram.
Estado límbico em que assomam os oportunistas destituídos da qualidade maior dos verdadeiros líderes: a grandeza humana.
O poder tem muitos inquilinos, já a grandeza é habitada por poucos.
Grandeza: tinha-a o presidente Mujica do Uruguai, que podia ter comido, como os outros, no poleiro do poder e renunciou, optando por uma pobreza essencial, franciscana. Paradoxalmente pode assim ser generoso para com o seu povo, servindo-o e deixando-o melhor do que estava antes.
Também paradoxalmente, no cárcere, se apossou Mandela da sua nobreza. Em vez de alimentar o ressentimento e o ódio, Mandela adquiriu na relação com o seu carcereiro bóer as propriedades do perdão que o tornaram grande, porque aprendeu a pensar contra si mesmo e os primeiros impulsos.
No fim da vida apareceu uma biografia que lhe debotava a imagem; referia-se a um comportamento repreensível com as primeiras mulheres que amou, mas Mandela não usou do seu poder para abafar a revelação – que com certeza o incomodava – e com esse gesto quis demonstrar que mesmo os líderes são humanos e falíveis mas que o que importa é aquilo em que nos tornamos. Grandeza.
Grandeza teve Kofi Annan quando percebeu que a comunidade à qual tinha de dedicar a sua vida não era a ganense mas outra mais alargada, a da humanidade, e se tornou um líder da paz e um reconciliador que só falhou – como na Síria – quando não lhe deram os meios para isso. De resto, mesmo quando desautorizado, como na invasão do Iraque, era ele quem tinha razão.
E entre outras coisas deixou como legado o princípio da “responsabilidade de proteger”, o qual redefiniu durante algum tempo os rumos da diplomacia e da intervenção humanitária. Segundo esta ideia a opressão de um povo pelo seu governo é também uma ameaça à estabilidade dos outros países. Ideia de uma co-responsabilidade que, por egoísmo e cinismo da onda neo-liberal, infelizmente tem conhecido retrocessos.
Grandeza tinha Edward Said que mesmo confessando «ainda não fui capaz de compreender o que significa amar um país», dedicou décadas à causa palestiniana, embora sem ter abdicado um grama de espírito crítico.
Falta grandeza aos líderes políticos da actualidade – impreparados, falhos de energia, privilegiam os golpes de bastidores. A um bom adversário que os ajude a superarem-se e melhorar preferem não tê-lo; e confundem “maquilhagem” com comunicação.
Quando é assim é precisamente pela comunicação que tudo começa a patear. Como em Trump que já não comunica, agride e grunhe, à medida que lhe vão caindo as máscaras.
Que uma potencia mundial tenha como líder um homem que é um hipopótamo numa loja de loiças, de um capricho que só se conhece dos mais loucos dos Césares, seria da ordem do mistério não fora isso provar simplesmente que os povos não tiram lições da História, ou que pelo menos a experiencia humana só é reconhecida como tal se for incarnada – chegando através do exemplo alheio não é encarada devidamente dado que cada povo se julga portador de um destino de excepção.
Infere-se aqui outra norma atordoadora: cada país dispensa as lições da História e tem de passar pela provação do erro e de errar cega e voluntariamente, para se convencer a si mesmo de ter uma identidade que vale a pena, sacrificando tudo e todos. Cada povo cresce assim mais pelo bordo e a soma dos seus desastres do que como efeito de boas políticas de desenvolvimento. Há uma degradante atracção pela entropia na prática política quando se considera que uma má escolha é uma boa escolha apenas por ter sido uma escolha nossa.
Talvez porque o poder, violência física mesclada na violência simbólica, não sabe “unificar” senão enveredando pelo padrão da desordem. O dividir para reinar. Como é um padrão parece ser uma ortopedia racional: não é, é apenas o efeito do complexo de Marco Polo, que irrealiza de tal forma a realidade que até simula a verdade com uma mentira de grande aparato técnico.
Simultaneamente à perda de grandeza no universo da ética política, a este mergulho na insignificância que tudo relativiza no quotidiano, constatamos que o mal na sua suprema manifestação tradicional – o demoníaco – desapareceu. Ou é reificado, transformado em espectáculo, como na recente série televisiva Lucifer. Manifestação da loucura normal.
Entretanto, como dizia Popper é mais fácil falsear que verificar uma hipótese, para que não se quebrem as rotinas, o que Marco Polo aprendeu à sua custa quando viu na sua sombra um desvio de direcção.

 

23 Ago 2018

Índia | Incêndio em prédio provoca quatro mortos e 22 feridos

[dropcap style=’circle’]U[/dropcap]m incêndio deflagrou ontem no 12.º andar de um prédio residencial em Bombaim, capital financeira e de entretenimento da Índia, matando quatro pessoas e ferindo outras 22, incluindo dois bombeiros, segundo as autoridades locais. Dezenas de pessoas foram resgatadas do prédio de 17 andares Crystal Tower, segundo um oficial do corpo de bombeiros.

A causa do incêndio nesta área comercial de Parel, em Bombaim, em está sob investigação.

As chamas e o fumo espalharam-se rapidamente, deixando presos alguns moradores numa escadaria, disse aos jornalistas o chefe dos serviços de bombeiros, P.S. Rahangdale. Rahangdale disse que pediu à polícia que o prédio fosse encerrado e o seu dono detido, porque os equipamentos de combate a incêndios, incluindo aspersores e acoplamentos de mangueiras, funcionavam com problemas.

Avinash Supe, responsável pelo Hospital KME, disse que 24 pessoas foram levadas para o hospital, quatro das quais já sem vida. Outras 20 pessoas estavam a ser tratadas por inalação de fumo e queimaduras, mas em condição estável, disse Avinash Supe.

Dois bombeiros também ficaram feridos enquanto combatiam o incêndio, disse um oficial da corporação.

Os incêndios são comuns na Índia, onde leis de construção e segurança são muitas vezes desrespeitadas por construtores e moradores. Em Dezembro, um incêndio de madrugada num restaurante em Bombaim matou 15 pessoas.

23 Ago 2018

Termina em lágrimas reencontro de familiares de ambas as Coreias

 

[dropcap style=’circle’]M[/dropcap]ais de duzentos coreanos do norte e do sul despediram-se ontem em lágrimas no final da reunião entre famílias de ambos os países que se separaram após a guerra civil da península. O grupo de 89 sul-coreanos que cruzou a fronteira na segunda-feira para se encontrar com 185 familiares residentes no norte regressou ontem ao seu país de origem, após uma despedia emotiva entre familiares que nalguns casos não se viam há mais de sete décadas.
Um dos participantes, Lee Su-nam, de 77 anos, disse sentir “algo indescritível” ao rever o seu irmão e sobrinho, que moram no norte e a quem não via há 65 anos, mas também expressou a sua frustração por ter de se separar deles novamente. “Podemos ver-nos novamente?” Parece impossível, a menos que fôssemos mais jovens “, disse Lee, em declarações à agência sul-coreana Yonhap.
A maioria das centenas de sul-coreanos que participam das reuniões desta semana são septuagenários e octogenários – a mais velha é uma mulher de 101 anos chamada Baik Sung-gyu – segundo o Ministério da Unificação em Seul.

Danos familiares

Dezenas de idosos sul-coreanos atravessaram a fronteira com a Coreia do Norte para encontrar-se com familiares dos quais estão separados desde a Guerra da Coreia (1950-53).
Os 89 participantes encontraram-se com familiares da Coreia do Norte na estância de esqui do monte Kumgang, sob a supervisão de agentes norte-coreanos. Estas reuniões prolongaram-se por seis sessões durante três dias, num total de 12 horas.
A iniciativa integra uma nova série de encontros de famílias separadas pela guerra e decorre no quadro da reaproximação entre Seul e Pyongyang, iniciada no princípio do ano. A Guerra da Coreia separou milhões de pessoas e selou a divisão hermética da península. As reuniões caracterizam-se pelas fortes emoções, uma vez que a maioria dos participantes tem idades avançadas e anseiam por rever os seus familiares uma vez mais antes de morrer.

23 Ago 2018

Japão | Fins científicos justificam a captura 177 baleias

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]Japão capturou 177 baleias durante sua temporada de pesca de cetáceos que tem lugar na costa norte do arquipélago no Verão, uma acção que os nipónicos explicam ter uma finalidade científica, informou ontem a Agência Nacional de Pesca. O Japão sustenta que o objectivo da captura das baleias passa por contribuir para a gestão e conservação dos recursos marítimos, analisando o conteúdo dos seus estômagos, cujos resultados são depois enviados à Comissão Internacional da Baleia. A actividade baleeira japonesa tem sido alvo de críticas por parte da comunidade internacional e organizações de animais, que a classificam de pesca comercial encapotada, uma vez que a carne dos espécimes estudados é posteriormente vendida. O país nipónico afirma que a análise também é usada com o objectivo de calcular uma quota adequada para a captura de baleias, de acordo com o comunicado divulgado pela entidade pesqueira japonesa.

23 Ago 2018

Crime | Ataque com faca deixa seis mortos e doze feridos

 

[dropcap style=’circle’]S[/dropcap]eis pessoas morreram e outras doze ficaram feridas num ataque com uma faca no sul da China, alegadamente perpetuado por um homem de 54 anos, informou ontem a imprensa local. Identificado pela polícia como Huang, o suspeito terá morto a namorada e três familiares desta, incluindo a mãe, após discutirem, em Liuzhou, na região autónoma Zhuang de Guangxi, sudoeste do país. O homem conduziu a seguir até ao centro da cidade, onde alegadamente esfaqueou 14 pessoas, entre as quais se registaram duas vítimas mortais, segundo um comunicado da polícia, citado pela imprensa local. O comunicado afirma que Huang foi detido na cena do crime e admitiu ter morto a namorada e a mãe desta. A China tem registado vários incidentes do género, normalmente ligados a pessoas com problemas psicológicos ou com ressentimentos com vizinhos ou a sociedade no geral. Em Abril passado, um homem armado com uma faca matou sete estudantes e feriu outros 19 quando os jovens regressavam a casa, no norte da China. Em Fevereiro, um homem matou uma mulher e feriu 12 pessoas num centro comercial em Pequim, também num ataque com faca.

23 Ago 2018

Pequim optimista quanto a negociações com Washington

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]China afirmou ontem que tem esperança de “obter bons resultados” nas conversações sobre a disputa comercial com os Estados Unidos, numa altura em que o Presidente norte-americano, Donald Trump, disse não esperar grande coisa desse diálogo.
O vice-ministro do Comércio chinês, Wang Shouwen, deve reunir-se nos próximos dias em Washington com o subsecretário do Tesouro norte-americano que tem o pelouro dos assuntos internacionais, David Malpass.
Mas, numa entrevista divulgada ontem pela agência Reuters, citada pela AFP, Trump referiu não esperar grande coisa das conversações, precisando que não tem agenda para a resolução do conflito sobre as tarifas e apontando para um “horizonte a longo prazo”. “Na China continuamos com esperança de obter bons resultados” nas negociações, afirmou ontem Lu Kan, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
“A China não gosta de se exprimir antes do início das negociações. Esperamos que as duas partes possam sentar-se calmamente, com pragmatismo e trabalhar bastante para alcançar bons resultados com base na igualdade e na confiança”, insistiu Lu, em conferência de imprensa.
O secretário do Comércio norte-americano, Wilbur Ross, teve conversações em Junho, em Pequim, com o vice-primeiro-ministro chinês Liu He, mas sem conseguir reduzir a tensão.
Após a imposição no início de Julho de taxas às importações de produtos chineses representando 34 mil milhões de dólares, Washington prepara-se para taxar a partir de 23 de Agosto uma série de outros produtos, no valor de 16 mil milhões de dólares. A administração Trump acusa a China de práticas “desleais” e de “roubo de propriedade intelectual”, exortando o gigante asiático e reduzir drasticamente o excedente comercial com os Estados Unidos.
Em resposta, Pequim adoptou em Julho taxas no valor de 34 mil milhões de dólares para produtos norte-americanos importados, nomeadamente porco e soja, e prometeu tarifas suplementares de 16 mil milhões. “Creio que certamente a China manipula a sua divisa” para resistir às tarifas, disse Trump à Reuters, repetindo uma acusação que já tinha feito várias vezes.
O banco central chinês refutou ontem qualquer manipulação, reafirmando que não transforma a taxa (do yuan) em “arma” comercial.

23 Ago 2018

Saúde Pública | China combate surto de peste suína africana

 

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]China está a combater um surto da peste suína africana, detectado em três áreas do país, susceptível de afectar a produção de carne de porco no maior produtor do mundo, de acordo com o ministério da Agricultura chinês.
Milhares de porcos morreram ou foram abatidos, num esforço para travar a doença, que é altamente contagiosa, e só afecta porcos e javalis. O surto surge numa altura em que a China tenta deslocar a criação de porcos das fazendas para operações em larga escala, onde o desperdício e a propagação de doenças são mais fáceis de controlar.
A China produz anualmente 600 milhões de porcos e a carne de porco é parte essencial da cozinha chinesa, compondo 60 por cento do total do consumo de proteína animal no país. A flutuação do preço daquela carne é sensível e o Governo guarda uma grande quantidade congelada, para pôr no mercado quando os preços sobem.
Na cidade de Lianyungang, leste do país, 15.000 porcos foram abatidos, depois de um surto ter sido detectado, na semana passada, segundo o ministério da Agricultura. As autoridades detectaram 615 porcos infectados, entre os quais 88 morreram. Estão a ser tomadas medidas para desinfectar áreas contaminadas e impedir que a doença se espalhe.
No início deste mês, em Shenyang, no nordeste do país, foi reportado o primeiro surto da doença, com 47 porcos infectados, e que acabaram por morrer. Outros 30 porcos foram encontrados mortos devido ao vírus, em Zhengzhou, no centro do país, para onde foram transportados desde Jiamusi, no extremo norte da China.

23 Ago 2018

PCC | Nomeado novo responsável pela propaganda internacional

Pequim nomeou ontem um membro de confiança do Partido Comunista Chinês para dirigir as operações de propaganda internacional, numa altura em que a China se tenta promover como uma grande potência responsável

 

[dropcap style=’circle’]X[/dropcap]u Lin, antigo responsável pelo regulador chinês para a Internet, estará encarregue de promover a imagem da China no exterior, numa altura em que o país é alvo de críticas por práticas comerciais injustas, violações dos direitos humanos e militarização do Mar do Sul da China, que reclama quase na totalidade.
A escolha de Xu para director do Gabinete de Informação do Conselho de Estado surge numa altura em que o país reclama a posição de grande potência, capaz de preencher o vazio na governação das questões globais, alegadamente deixado pelos Estados Unidos com a ascensão ao poder de Donald Trump. Desde que Trump foi eleito, em 2017, Washington rasgou compromissos internacionais sobre o clima, comércio livre, migração ou nuclear, permitindo a Pequim reclamar a liderança nestas áreas.
A “solução chinesa” materializa-se na “Nova Rota da Seda”, um gigantesco plano de infra-estruturas lançado pelo Presidente do país, Xi Jinping, e avaliado em 778 mil milhões de euros, visando reactivar as antigas vias comerciais entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e sudeste Asiático.

Outro lado da medalha

Críticos lembram, no entanto, que a China continua a ser a mais proteccionista entre as principais economias e o maior emissor de gases com efeito de estufa. Pequim, que há muito se queixa que a imprensa ocidental domina o discurso global e alimenta preconceitos contra o país, investiu nos últimos anos milhares de milhões de euros para convencer o mundo de que a China é um sucesso político e cultural.
Xu, de 55 anos, estava encarregue pela Administração do Ciberespaço da China, organismo que controla o conteúdo disponível para os mais de 700 milhões de internautas chineses e exerce vigilância sobre as empresas do sector da Internet.

23 Ago 2018

Hato | Um ano depois

 

[dropcap style=’circle’]U[/dropcap]m ano depois da passagem do tufão Hato por Macau, uma das zonas que mais sofreu com a catástrofe vive quase como se nada tivesse acontecido. Entre a Rua dos Mercadores e a 5 de Outubro, os biscoitos estão feitos e prontos a comer, o Mahjong joga-se por entre ruelas, as loiças estão inteiras nas prateleiras. As mezinhas para a medicina chinesa não precisam ser espalhadas pelos passeio e o lixo que enchia as ruas está agora arrumadinho pelas cuidadoras do costume. Na sombra, e à vista desarmada, está a certeza de que numa situação semelhante o cenário dantesco vivido há um ano regressa.

23 Ago 2018

Associações lembram que inundações no Porto Interior continuam

 

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Associação Aliança do Povo de Instituição de Macau organizou ontem um seminário onde se debateram medidas que o Governo implementou no último ano após a passagem do tufão Hato pelo território. Nick Lei, presidente da associação, disse que o Governo tem vindo a empenhar-se na melhoria do sistema de transmissão de informações por parte dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG), bem como na área da protecção civil. No entanto, no que diz respeito às infra-estruturas básicas, Nick Lei revelou que os residentes do Porto Interior continuam preocupados com as inundações, pois não têm notado alterações e temem enfrentar os mesmos problemas do passado.

O dirigente pede também o reforço da sensibilização dos cidadãos. “Essa sensibilização não passa pela construção de estruturas ou pela implementação de leis, e por isso há condições para que seja algo prioritário”, frisou, defendendo o reforço de seminários nas escolas.

Nelson Kot, presidente da Associação de Estudos Sintético Social de Macau, revelou dúvidas quanto a alguns trabalhos do Governo. “A comunicação social noticiou recentemente que alguns comerciantes do Porto Interior continuam a sofrer inundações. Alguns alegam que a água entra pelo sistema de drenagem. O Governo tem planos para resolver isso?”, questionou.

Nelson Kot sugeriu, durante a palestra, que deveriam ser construídas infra-estruturas mais elevadas na rua Norte do Patane com função de comportas para a prevenção de inundações.

Chan Ka Leong, vice-presidente do Centro da Política da Sabedoria Colectiva, ligado à União Geral das Associações de Moradores de Macau, lembrou que o Executivo avançou com algumas medidas ao nível da protecção civil e planos a curto, médio e longo prazo, mas muitos deles só podem ser concretizados em 2019. A associação falou com moradores do Porto Interior, que referiram esperar que o Governo erradique por completo o problema das inundações. Chan Ka Leong também defende a construção de viadutos ou infra-estruturas elevadas para resolver o problema, em cooperação com o interior da China.

 

23 Ago 2018

Voluntariado | Quando os residentes saíram à rua para limpar Macau

Ana Cristina Vilas comprou vários metros de tecidos numa loja que ficou inundada com o tufão Hato. Leonor Machado juntou-se a um grupo organizado pela Associação dos Macaenses para limpar o lixo que restou na zona do Cinema Alegria. Robbie Kwok lidera uma associação social que ajudou idosos sem água e luz. Um ano depois, estes voluntários dizem que ainda há muito para fazer

[dropcap style=’circle’]I[/dropcap]mediatamente após tempestade, a bonança teimou em surgir, com Macau mergulhada num caos e destruição como nunca se tinha visto no território. Do Porto Interior a Coloane, a água tudo levou e tudo destruiu, desde os pertences das famílias aos pequenos negócios que teimam em existir nos bairros antigos, mesmo com a pressão das rendas.

O tufão Hato será sempre recordado como a tempestade que gerou um tsunami de solidariedade, com todas as comunidades a arregaçarem as mangas para ajudar a limpar as ruas ou a visitar casas de famílias mais necessitadas. Um apoio que chegou além do que foi dado pelos militares do Exército Popular de Libertação da China.

Ana Cristina Vilas, funcionária pública, também limpou as ruas, mas ajudou de maneira diferente, comprando vários metros de tecido a uma loja do Porto Interior que ficou com toda a mercadoria encharcada.

“Sabia que aquela zona estava inundada e fui à procura da loja de tecidos, porque como estou à frente do projecto ‘Dress a Girl around the world’ costumo ir lá muitas vezes. Fui e deparei-me com aquele caos, eles tinham um monte de tecidos encharcados à porta e estavam a vendê-los a um preço muito baixo e a pedirem-nos, por favor, para comprarmos.”

Junto à Rua dos Mercadores, zona de comércio tradicional por excelência, e nas ruas adjacentes, os comerciantes afectados pelas cheias foram colocando mercadorias nos passeios enquanto limpavam o interior das lojas. Várias peças de roupa foram estendidas e colocada à venda a um preço baixo, para mitigar um pouco os prejuízos provocados pelo tufão.

Ana Cristina Vilas, que já havia gasto milhares de patacas na loja de tecidos, ajudou ainda outra loja de artigos de costura, comprando materiais. Um ano depois, esses estabelecimentos continuam abertos ao público, mas a residente não esquece o caos dos primeiros dias.

“No dia a seguir ao tufão [24 de Agosto] não fui trabalhar porque estou num serviço público e não tínhamos água, não tínhamos casas-de-banho, nem ar condicionado. Resolvi não ir trabalhar e fui para Coloane ajudar famílias que estavam a precisar, sobretudo pessoas mais velhas. De manhã estive em Coloane e depois voltei ao Porto Interior.”

Quando, dias depois, as ruas continuavam sujas, com lama e um cheiro fétido a lixo e humidade, percebeu-se que era necessário mover multidões através das redes sociais. Leonor Machado, também funcionária pública, juntou-se a um grupo organizado pela Associação dos Macaenses.

“Estive na zona do Cinema Alegria, havia áreas que estavam intransitáveis. Depois as coisas maiores foram aos poucos sendo tiradas, fomos limpando o resto, havia coisas podres, móveis estragados. Íamos pondo tudo, aos poucos, num camião. Fiz isto entre as 20h e as 23h, mas houve pessoas que ficaram toda a noite. Isto também se passou em várias zonas da cidade, como a Barra, por exemplo.”

Leonor Machado, que nasceu em Macau, assegura que nunca tinha visto o território destruído desta forma. “Passei lá nos dias a seguir ao Hato e havia lixo acumulado com dois a três metros de altura. Mas as pessoas juntaram-se e gostei imenso de ver. Houve uma entreajuda muito grande”, recorda.

Ajuda aos mais velhos

Robby Kwok, presidente da associação Hope International Volunteer, não andou com os seus voluntários a limpar ruas, mas ajudou vários idosos que moram em bairros antigos a ter acesso a comida, medicamentos e água potável. Ao HM, Robby não esquece esses dias em que nada parecia funcionar.

“O Hato mostrou que as coisas não estavam, de todo, organizadas, e conseguíamos perceber que havia falta de experiência por parte das autoridades para lidar com o assunto. A electricidade falhou durante vários dias, o que é ridículo para uma cidade que se diz internacional. Também falhou a água e isso também foi inaceitável.”

No rescaldo do desastre natural, o Governo decidiu ajudar financeiramente os comerciantes afectados e implementou também uma lei que concede benefícios fiscais a quem ficou com a viatura ou motociclo destruídos.

No que diz respeito às famílias, o Instituto de Acção Social (IAS) deu formação a assistentes sociais para os habilitar a lidar de perto com eventuais traumas sentidos pelas famílias.

Paul Pun, secretário-geral da Cáritas, assegurou ao HM que, no espaço de um ano, só houve dois casos de pessoas que não conseguiram obter ajuda do Governo, muitos deles por mera falta de informação.

“Há cerca de um mês tivemos um caso de uma família que ficou prejudicada pelo tufão Hato, pois não conseguiam arranjar sozinhos as zonas danificadas da casa para a nova época de tufões. Este foi o único caso recente que tivemos. Mas quanto àqueles que continuam à espera de apoio do Governo, não temos dados. Se as famílias forem qualificadas para receber ajuda, são sempre apoiadas pelo Governo”, assegura.

Paul Pun recordou também outro caso em que um idoso ainda não tinha arranjado a casa devido a dificuldades financeiras, e que não recebeu ajuda porque o filho se enganou a preencher os requerimentos, tendo ficado no grupo de pessoas não elegíveis para os subsídios.

Muito a fazer

Todos os que andaram nas ruas de luvas e sacos do lixo na mão consideram que há ainda muito a fazer no que diz respeita às respostas das autoridades para catástrofes desta dimensão. “Parece-me que as coisas já voltaram mais ao sítio e o Governo tem estado a ajudar com subsídios. Mas não acho que isso seja uma solução efectiva e directa para alguns dos problemas”, frisou Leonor Machado.

Isto porque “há vários problemas a ter em conta se surgir outra catástrofe. Uma grande parte é o Governo que tem de fazer, mas tudo depende também de como estão os territórios à volta de Macau, porque um dos maiores problemas foi a falta de água, que vem de fora”, acrescentou.

Na visão de Ana Cristina Vilas, haverá ainda muitas famílias necessitadas no território que sofrem efeitos do Hato. “Há muita gente a precisar de ajuda. As pessoas mais pobres e carenciadas, se calhar, nunca mais se recompuseram”, disse, lembrando que Coloane foi uma das zonas mais afectadas há um ano atrás.

“A ajuda demorou a chegar a Coloane, sobretudo para os idosos que não estavam preparados para lidar com isso. Havia muito lixo dentro de casa, ficaram sem muitas das recordações de família, por exemplo. Houve casas que tiveram de ser completamente limpas, incluindo móveis.”

Para esta funcionária pública, há muito mais a fazer por parte das autoridades além da questão do levantamento dos sinais de alerta de tempestade.

“Na parte baixa da cidade sabemos que as coisas continuam a não estar resolvidas. Ainda há pouco tempo tivemos um tufão de baixa intensidade e houve cheias. Acho que não houve grandes mudanças. Preocuparam-se mais com o levantamento dos sinais de tempestade e com os parques de estacionamento, por causa dos carros, mas há outros aspectos que precisavam de ser tidos em conta, tal como as cheias nas zonas do Porto Interior.”

Robby Kwok lembra que a organização das ruas, sobretudo no que diz respeito às obras viárias, continua a não existir.

“Este ano as autoridades têm dito que estão preparadas para tempestades tão fortes como o Hato, mas na verdade não sabemos se é mesmo assim. Vamos ver o que acontece, e não nos podemos esquecer que as construções na via pública não são organizadas, estão sempre a ser concluídas e a serem feitas de novo. Se um tufão Hato acontecesse novamente, o que é que eles iriam fazer? Há muitos inconvenientes nesse aspecto.”

Para o presidente da Hope International Volunteer, “o mais importante é a alteração dos sistemas de abastecimento de electricidade e água. Ainda assim, “os cidadãos também estão mais atentos ao levantamento dos sinais, preocupam-se mais e vão logo para casa”, rematou.

 

23 Ago 2018

Hato | Auto-silo do edifício Fai Tat abre no sábado

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap] Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) anunciou ontem a abertura ao público do parque de estacionamento do edifício Fai Tat, um dos auto-silos que ficou afectado com a passagem do tufão Hato. No total estarão disponíveis 487 lugares de estacionamento. Como resposta às catástrofes, a DSAT afirma que exigiu às empresas de gestão “que aumentem a altura das comportas contra inundações dos auto-silos localizados nas zonas baixas”. Passa também a ser exigido o fecho dos parques uma hora depois de ser içado o sinal 8 de tempestade ou o “storm surge” de grau 3. Todos os veículos danificados nos parques de estacionamento foram removidos no passado dia 4 de Outubro.

23 Ago 2018

Hato, um ano depois| Um duro golpe para o pequeno comércio

 

Foi desmedida a luta travada pelo pequeno comércio após o duro golpe infligido pelo tufão Hato. As portas que hoje continuam abertas mostram a resiliência de quem, mesmo a braços com irremediáveis perdas, não cedeu ao desalento

 

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s estragos foram demasiados. Tantos que casal Lai tem dificuldades em precisar com minúcia. Só com os danos numa das frágeis divindades o Louceiro Fu perdeu 100 mil patacas. “Estamos a recuperar passo a passo. No armazém, por exemplo, temos mercadorias danificadas, mas também não temos recursos humanos para dar resposta”, explicou a proprietária do número 33 da Rua dos Mercadores.
O sentimento de impotência irrompeu com a água que invadiu um de dois andares do amplo espaço. Os dias seguintes foram de árduo trabalho para resgatar o que podia (e não podia) ser ainda aproveitado. Salvar o negócio a todo o custo foi a única opção para muitos, como Lai, que assistiram impotentes à força da natureza que colocou em perigo o único sustento.
Mais do que o facto de os apoios serem insuficientes para cobrir os avultados prejuízos, preocupa-lhe o futuro. “O trabalho do Governo é lento. Não vejo que nada tinha sido feito para travar as inundações”, observa Lai.
A sensação é partilha por Lao, proprietário de um alfarrabista: “Não sei o que é que o Governo fez para prevenir as cheias. Não acompanho as notícias, mas não se nota nada”. Embora tenha visto a água de cheias entrar pelo espaço dentro por 14 ocasiões – nem sempre durante tempestades tropicais – quando olhou para o impacto do tufão Hato ficou petrificado. “Fiquei de pé, parado a olhar, espantado e sem saber o que fazer. Tinha perdido tudo”, conta. Lao ainda demorou quatro horas até abrir a porta, que ficara, aliás, bloqueada com os livros a boiar em amontoados à entrada. “Também ninguém me podia ajudar, toda a gente estava ocupada com problemas idênticos”.
Os danos, esses, ninguém os compensa. A seguradora não vai chegar-se à frente por considerar os bens, sobretudo livros e revistas usados, como “lixo”. “Vou demorar imenso tempo a recuperar”, diz, sentado num espartano banco em frente a uma ventoinha, enquanto mostra as imagens da destruição guardadas no telemóvel.
O alfarrabista esteve fechado durante meio ano. Afinal, nada havia para vender dentro daquelas paredes com a tinta descascada. Na viragem de ano, Lao decidiu reabrir, colocando inicialmente à venda as poucas coisas que lhe ofereceram depois da catástrofe. Desde então foi alargando a oferta, dispersa por estantes desorganizadas, adquirida aos poucos. “Coloquei tudo em lugares mais elevados”, diz, lamentando que na realidade nada mais possa fazer.

Das lágrimas à loucura

Os tecidos que Cheang vende desde que sucedeu ao pai no negócio, aberto há mais de duas décadas, também fora todos à vida. Na mesa há fitas métricas, desnecessárias para se perceber a altura a que a água chegou. “Foi um pesadelo”, descreve. “Este ramo já é difícil em circunstâncias normais e normalmente importamos as mercadorias em grande volume para depois vender pouco a pouco e o Hato levou tudo”, conta, estimando as perdas na ordem das centenas de milhares de patacas. Um prejuízo abatido em 50 mil patacas pelo abono concedido às pequenas e médias empresas pelo Governo.
Já Andy Wan, proprietário de uma loja de música, aderiu à linha de crédito, sem juros, criada para as pequenas e médias empresas afectadas pelo tufão Hato. O montante máximo (600 mil patacas) está longe de cobrir o prejuízo calculados em dois milhões, dado que a maioria dos produtos, como sistemas de som, é cara. “O que se passou foi muito grave”, diz Andy, que foi obrigado a encerrar o estabelecimento durante um período de tempo. “Fartei-me de chorar, até fiquei um pouco louco, mas agora estou melhor”, comenta, sem esconder o descontentamento em relação ao Governo. “É lamentável. Não estou nada satisfeito com o que têm feito”.
Lao, dona de uma mercearia ali perto, não só diz não ver “nada em concreto” como duvida que a planeada barreira no Porto Interior surta efeitos. A única coisa positiva que assinala foi o empréstimo sem juros que pediu para fazer face a quase um milhão de patacas em prejuízos.
Au, à frente da loja de tintas do pai, também saudou os apoios, embora insuficientes para cobrir o rombo de 600 a 700 mil patacas. A probabilidade de cheias voltarem a afectar o negócio que têm na 5 de Outubro preocupa-o. Demonstrando estar completamente a par dos planos que o Governo traçou para tentar minimizar o impacto das inundações, Au mostrou-se desiludido: “Receio que não sejam eficazes. Acho que não vão resolver o problema”.

23 Ago 2018

Hato | Deputados consideram que Macau não está preparado para outra catástrofe

Um ano depois da passagem do Hato, Macau continua sem estruturas essenciais para enfrentar uma calamidade idêntica, consideram vários deputados. A zona do Porto Interior continua a inundar quando as chuvas se intensificam, não há abrigos para acolher residentes, nem um fundo para apoiar a população em caso de catástrofe. Estas foram algumas das falhas apontadas por legisladores

 

[dropcap style=’circle’]F[/dropcap]az hoje um ano que o tufão Hato deixou um rasto de destruição no território e deixou também a descoberto a absoluta impotência da RAEM para lidar com uma catástrofe natural.Um ano depois, e decorridas muitas promessas do Executivo, e até garantias de que o território está preparado para enfrentar calamidades, vários deputados afirmam veementemente que Macau continua sem mecanismos de resposta eficazes.
Para Agnes Lam, as melhorias dos serviços meteorológicos e de comunicação com a população são um passo na direcção certa. Mas falta o essencial.
A deputada aponta a ausência de informação prestada à população sobre o fazer e para onde se dirigir numa circunstância semelhante. “Em caso de falha de electricidade e de internet, as pessoas não sabem o que fazer e deveriam já estar informadas acerca dos sítios onde se dirigirem em busca de protecção”, referiu ao HM.
A opinião é partilhada por Ella Lei, que considera que a informação relativa à evacuação em caso de catástrofe ainda não é suficiente. “Tem de ser feito trabalho educativo para informar as pessoas de como se abrigarem em caso de tufão e onde se dirigirem”, apontou ao HM a legisladora com ligações à FAOM.
Para Ella Lei, é fundamental garantir que não voltam a morrer pessoas. Recorde-se que a passagem do Hato fez dez vítimas mortais.

Mais abrigos

Ainda para proteger a população, Lam apela à construção de mais abrigos. “Sei que o Governo está a tratar desta matéria, mas o processo está a ser demasiado lento para uma situação que é urgente,” apontou. A deputada eleita pela primeira vez para o hemiciclo no passado entende “é preciso construir abrigos perto das zonas que normalmente são mais afectadas de modo a garantir a segurança das pessoa, não só durante a passagem de tufões mas para as acolher nos dias seguintes”, acrescentou.
Por outro lado, o Governo, um ano depois já deveria ter criado um mecanismo para gerir equipas de voluntários que, “felizmente”, se oferecem para ajudar em situações de catástrofe. “Com o Hato, a população uniu-se e veio para a rua fazer o que podia, mas não existia um mecanismo central capaz de gerir melhor as operações e voluntariado. Cabe ao Governo, depois de ter passado por esta experiência, criar um centro de gestão de voluntários que trabalhe directamente com as instituições de apoio social”, disse.
Esta seria também uma forma de implicar o Executivo no trabalho comunitário o que, considera Lam, é uma função fundamental na reacção a um cenário devastador.

Fundo pouco comum

O deputado Pereira Coutinho lamenta que após a passagem do Hato, e com a necessidade de ajudar a parte da população, ainda não tenha sido criado um fundo de apoio em situações de calamidade.
Em causa está o que considera uma situação de discriminação que aconteceu com a distribuição de ajudas financeiras a quem ficou lesado patrimonialmente com o tufão.
Para Pereira Coutinho o facto de apenas os proprietários de veículos danificados que compraram uma viatura nova terem sido ajudados com a devolução do imposto de selo não foi justa.
O deputado também considerou injusto que o apoio apenas tenha sido concedido a comerciantes que tinham estabelecimentos em rés-do-chão atingidos pelas cheias na zona do Porto Interior, sendo que os que residiam nas mesmas circunstâncias e “até perderem as suas casas ficaram excluídos”, disse.

Parques mortíferos

O deputado lamenta ainda a situação dos parques de estacionamento subterrâneos, que tem que ser resolvida “rapidamente”, especialmente nas áreas baixas da cidade. “Sei que antes do estabelecimento da RAEM não era autorizada a construção deste tipo de estruturas nas zonas baixas o que faz todo o sentido. São construções consideradas de alto risco por estarem sujeitas a inundações com muita facilidade”, referiu.
A mesma visão é partilhada por Agnes Lam, que aponta uma solução para os lesados. “Em vez de proibirem as pessoas de entrarem nestes parques em caso de tufão o Governo deveria já ter garantido a criação de um seguro de protecção para estes veículos”, sublinhou. Na sequência do tufão Hato morreram quatro pessoas por afogamento nestas estruturas.

Porto sem solução

As inundações na zona do Porto Interior são uma constante. Um problema recorrente que se agigantou com a passagem do Hato, deixando aquela zona da cidade intransitável. O rio vem para a rua e trouxe os esgotos consigo.
Para solucionar o problema, o Governo divulgou vários projectos que incluem a construção de comportas, um muro capaz de travar a subida da água do delta e melhores sistemas de drenagem. Mas, até agora o Porto Interior continua a ser o foco de inundações que serão agravadas no caso de uma nova tempestade.
Pereira Coutinho é peremptório quanto à escassez de medidas efectivas para prevenir a subida das águas, mesmo depois do caos ocorrido há um ano. “Colocar altifalantes, mais câmaras de vigilância e melhorar o sistema de comunicações interno e externo através do aumento do número de linhas telefónicas para as chamadas de socorros, não chega, é preciso evitar as inundações”. “Aliás, basta que venha uma chuva mais forte que o fenómeno das cheias, especialmente no Porto Interior, repete-se”, acrescentou.
Segundo o deputado, esta situação reflecte a inoperância do Governo
Para Pereira Coutinho as inundações são o problema mais grave do território, até porque “já existe há anos e não está a ser solucionado”.
A manutenção da situação do Porto Interior é, para Sulu Sou, o exemplo máximo da ausência de estruturas básicas para fazer face a calamidades.
Um ano decorrido, “as inundações mantêm-se e quando há a maré sobe acompanhada por chuvas aquela zona fica inundada e quem lá vive e trabalha é lesado. O que significa que perante um tufão continuará a sofrer da mesma forma como sofreu com a passagem do Hato”, apontou o deputado.

Dinheiro não chega

Para o deputado Sulu Sou, a redenção através dos apoios dados em dinheiro não são solução para o problema que se pode repetir. “Temos que fazer mais para que não sejam necessários cheques para resolver os estragos”, disse.
Apesar de elogiar as melhorias feitas nos sistemas de alerta e de comunicação, “as pessoas continuam a correr perigo”, afirmou, referindo-se à ausência de infra-estruturas básicas que protejam os residentes.
Também a deputada Ella Lei lamenta que, mesmo depois da constatação da necessidade de instalações básicas, um ano depois, Macau continue com o mesmo problema. “Estou preocupada porque não se sabe quando é que vem mais um tufão devastador”, refere ao HM. “A população acreditou que, depois do que aconteceu, o Governo iria tomar medidas e criar mais estruturas mas, até agora, não sabemos de nada, além das melhorias nos sistemas de comunicação”, revelou.

Wong Sio Chak diz que território está preparado

O secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, foi ontem ao programa matinal do canal chinês da Rádio Macau afirmar que, um ano depois do tufão Hato, Macau está mais bem apetrechado para responder a uma catástrofe semelhante. “A nossa capacidade – de todos os serviços competentes – é melhor do que no ano passado. O tufão Bebinca não teve muita chuva e o vento não foi forte, foi uma ajuda para experimentar a nossa capacidade”, acrescentou o secretário, em declarações reproduzidas pela Rádio Macau. Este ano abriram um total de 16 centros de emergência, estando prevista a construção de um novo edifício para o Centro de Protecção Civil e de Operações de Contingência na península. Wong Sio Chak referiu ainda no programa que há um plano a dez anos de resposta a este tipo de catástrofes

23 Ago 2018

Tufão Hato | Um ano depois

 

Faz hoje um ano que o tufão Hato atingiu Macau com uma força sem par em mais de meio século. Dez vidas perderam-se no caos de uma cidade paralisada com graves inundações e generalizados cortes de electricidade e de água, com o rasto de destruição a deixar a descoberto as fragilidades da capacidade de resposta a catástrofes e um sentimento de impotência. Para memória futura, fica o filme dos acontecimentos

 

[dropcap style=’circle’]D[/dropcap]ia 23 de Agosto de 2017. Quando amanheceu Macau estaria longe de imaginar que estaria diante um longo e trágico dia. Os acontecimentos desenrolaram-se rapidamente muito cedo: num intervalo de apenas duas horas e meia, o sinal 8, hasteado às 09h, passou a 9 e, logo depois, a 10, alcançando o máximo da escala, um cenário nunca visto desde que o York assolou o território em 1999 mesmo às portas da transferência do exercício de soberania.
Ao habitual encerramento das pontes ao trânsito e ao cancelamento de ligações marítimas e aéreas juntou-se o fecho temporário de fronteiras que deixou a cidade isolada. Imagens a mostrar a dimensão dos estragos, um pouco por todo o lado, multiplicavam-se nas redes sociais, que acabaram por transformar-se numa ferramenta importante ao serviço da informação. Isto porque parte da população esteve sem acesso ou com acesso intermitente aos canais de rádio e televisão da TDM, a principal aliada da Protecção Civil, através da qual comunica com a população, enviando alertas sobre a intensidade do tufão, circulação de transportes, dados sobre feridos e mortos, zonas perigosas, além de informações sobre o encerramento dos serviços públicos e escolas.
O grande embate chegou com as notícias das primeiras mortes. Embora acostumada a uma média de cinco a seis tempestades tropicais por ano, Macau não ficava de luto desde 1983, ano em que o Ellen fez mais de uma dezena de vítimas mortais, grande parte em naufrágios de juncos no Porto Interior. O balanço oficial viria a fechar com dez mortos, quatro dos quais encontrados em parques de estacionamento, tornando o Hato no tufão que o maior número de vidas ceifou no século XXI.
A pujança do Hato ficou patente em centenas de incidentes. Quedas de objectos suspensos, como reclames, toldos ou placas metálicas, bem como nas centenas de janelas arrancadas, ou nas milhares de árvores devastadas passaram a fazer parte da paisagem. Ocorrências que resultaram em mais de 240 feridos, a esmagadora maioria ligeiros. O Hato foi mesmo o mais forte tufão em 53 anos, apenas batido pelo Ruby (1964), cujos ventos atingiram 211 quilómetros por hora. Ainda assim, um recorde que foi ultrapassado no ano passado na estação da Taipa Grande, onde a rajada máxima atingiu 217,4 quilómetros por hora, de acordo com um relatório publicado pelos SMG.

Sem luz e sem água

Pela hora de almoço deu-se um apagão generalizado. O fornecimento de energia foi sendo reposto gradualmente, com a prioridade a ser dada às habitações. Dias depois ainda havia zonas às escuras, como o Fai Chi Chei, devido aos danos causados pelas inundações nos postos de transformação. Os cortes de electricidade e as inundações também obrigaram ao fecho de casinos, um feito raro na capital mundial do jogo, afeita a funcionar 24 horas por dia.
Seguiu-se o corte no abastecimento de água na sequência da inundação da Estação de Tratamento de Água da Ilha Verde, que deixou metade da população sem acesso a água canalizada. Com as torneiras a seco dias a fio, os residentes acorreram em massa às bocas-de-incêndio, uma das poucas formas de suprirem necessidades urgentes, atendendo a que a água engarrafada desapareceu das prateleiras, na sequência de uma corrida aos supermercados e estabelecimentos comerciais. As filas mudaram-se depois para os pontos temporários de abastecimento estabelecidos pelo Governo, complementados pela distribuição itinerante de água, assegurada por camiões-tanque.
Já nas ruas a água abundava. Afinal, quase um terço de Macau (29 por cento) ficou inundada, evidenciando o fracasso de medidas de protecção e obras contra as cheias, empreendidas três anos antes. O Porto Interior, apesar de familiarizado com inundações, foi particularmente fustigado, estimando-se que o nível da água tenha alcançado os 5,5 metros.
Todos os sinais de tempestade tropical foram baixados sensivelmente 12 horas depois, mas muito estava por fazer depois daquela quarta-feira negra, com os destroços, envoltos em lama, a tomarem conta da cidade.
Dois dias depois saem à rua militares da Guarnição em Macau do Exército de Libertação do Povo Chinês (ELP), num acto inédito desde a transição. Mil soldados participaram nos trabalhos de resposta à catástrofe, regressando ao quartel ao fim de três dias, a 28. Na véspera, porém, ainda a cidade não estava recuperada do Hato, chega um novo tufão: o Pakhar. Apesar de ter sido mais brando, trouxe intensas chuvas que encharcaram o que custara enxugar, dificultando as tarefas de limpeza. Com a aproximação iminente da nova tempestade foi reforçada a urgência de escoar, particularmente por razões de saúde pública, as toneladas de lixo amontoado. Na corrida contra o tempo foram fundamentais os milhares de voluntários que montaram uma gigantesca operação de limpeza nas zonas mais fustigadas pela intempérie, num movimento sem precedentes.

O pós-tufão

A calamidade, que as autoridades designam como “incidente”, levou o Chefe do Executivo a pedir desculpas à população. “Embora tenhamos feito previsões e tomado medidas preventivas face a este desastre não podemos deixar de reconhecer que o que foi feito não foi suficiente. Aqui, em nome do Governo da RAEM, peço imensas desculpas à população”, declarou Fernando Chui Sai On.
Apesar de o Governo admitir falhas, há deputados que entendem que ficaram por apurar responsabilidades políticas, dado que o director dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos (SMG) foi o único a cair. Fong Soi Kun, que dirigia os SMG desde 1999, apresentou a demissão um dia depois da passagem do Hato. No entanto, a sua actuação viria a ser alvo de um inquérito, com o Chefe do Executivo a decidir aplicar-lhe o castigo máximo a que estava sujeito – a demissão – a qual se traduz na suspensão da reforma durante quatro anos, dado que já estava aposentado quando o processo disciplinar foi instaurado. Fong Soi Kun decidiu contestar na justiça o processo disciplinar que lhe foi movido. Em Junho, o Tribunal de Segunda Instância aceitou a providência cautelar apresentada pela defesa de Fong Soi Kun, o que lhe permite continuar a receber a pensão mensal de aproximadamente 80 mil patacas até que haja uma decisão final.

23 Ago 2018