Governo reitera que estaleiros de Lai Chi Vun vão abaixo

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s moradores estão contra a demolição de todos os estaleiros, alguns deputados também. Ainda assim, o Governo deixa claro, num comunicado oficial, que a demolição dos estaleiros da povoação de Lai Chi Vun, em Coloane, vai mesmo avançar. Quanto ao estudo feito em 2012, intitulado “Estudo do Planeamento da Povoação de Lai Chi Vun da Vila de Coloane”, será utilizado, embora não seja avançado qualquer calendário mais concreto.

“O estudo está concluído e futuramente servirá de referência interna aos serviços responsáveis pela execução dos respectivos trabalhos”, aponta apenas o Executivo.

Em Setembro do ano passado, o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, referiu apenas que “o futuro projecto de Lai Chi Vun deve ponderar essencialmente a elevação da qualidade da vida da população”.

Nesta fase, a demolição parece ser mesmo necessária. “De acordo com a avaliação mais recente, os estaleiros situados nos referidos 11 lotes ficaram gravemente deteriorados devido à falta de manutenção e correm riscos de queda da sua estrutura a qualquer momento.” Nos “últimos anos”, a DSAMA afirma ter recuperado os estaleiros e instalações localizados em três lotes.

Quanto à demolição dos 16 estaleiros, localizados em 11 lotes de terreno, a DSAMA garante que a culpa da destruição se deve, em parte, aos concessionários. “Os referidos ocupantes não assumiram a responsabilidade de manutenção de instalações e não utilizaram os respectivos lotes conforme as finalidades definidas na licença de ocupação a título precário. Como consequência, as respectivas licenças expiraram em 31 de Dezembro de 2015 e as suas renovações não foram autorizadas.” Ainda assim, “os pedidos de renovação das licenças de quatro lotes encontram-se em processamento”, confirma a DSAMA.

9 Fev 2017

Three Phantoms estreia dia 28 no Parisian

A classe mundial dos musicais promete encantar as noites de Macau. O Teatro do Parisian é a casa que recebe o espectáculo Three Phantoms, um musical que reúne alguns dos melhores momentos de “O Fantasma da Ópera”

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] próximo mês promete agitar a agenda dos fãs de musicais de Macau, assim como de todos os turistas que visitem o Cotai. De 28 de Fevereiro a 26 de Março, o Teatro do Parisian recebe o musical “Three Phantoms”, abrilhantado pelas estrelas que subiram ao palco para interpretar “O Fantasma da Ópera”.

O evento promete abalar as fundações do casino, reunindo uma compilação de músicas que fazem parte do afamado musical do reportório de Andrew Lloyd Webber. Já foi descrito como a melhor noite de gala de teatro musical alguma vez escrito, numa produção que promete deslumbrar os espectadores. Com milhares de performances enquanto fantasmas na famosa peça que encantou as “mecas” dos musicais West End e Broadway, vão subir ao palco três performers: Kieran Brown (Estados Unidos), David Shannon (Irlanda) and Earl Carpenter (Inglaterra).

Earl Carpenter tem uma longa e bem-sucedida carreira internacional, desempenhando papéis principais nalguns dos maiores sucessos musicais do último quarto de século. No seu currículo tem espectáculos de relevo como “Os Miseráveis”, “As Bruxas de Eastwick”, “Sunset Boulevard”, “Evita” e “A Bela e o Monstro”. Carpenter é também o dono e director criativo da Ginger Boy Productions, através do qual foi criado e dirigido este espectáculo que chega ao Teatro do Parisian.

No total, subirão ao palco dez cantores e bailarinos de renome mundial, naquele que tem sido um espectáculo com aclamação crítica, assim como um sucesso junto do público por onde a tournée tem passado. A sessão será acompanhada pela Concert Philharmonic Orchestra. Segundo a nota de imprensa sobre o evento, as performances, a encenação cuidada ao detalhe e o espectáculo de luzes evocaram o drama e a excitação que as músicas merecem.

Os bilhetes estarão à venda a partir de hoje em todas as bilheteiras do Cotai Ticketing, com um preço de 180 patacas.

9 Fev 2017

Comércio com países de língua portuguesa continua a cair

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s trocas comerciais entre a China e os países de língua portuguesa caíram pelo segundo ano consecutivo em 2016, totalizando 90,87 mil milhões de dólares, menos 7,72% do que em 2015, indicam dados oficiais.

Trata-se do segundo ano consecutivo de queda, depois de o comércio sino-lusófono ter caído 25,73% em 2015 naquela que foi a primeira diminuição desde 2009.

Dados dos Serviços de Alfândega da China publicados no portal do Fórum Macau indicam que, entre Janeiro e Dezembro do ano passado, a China comprou aos países de língua portuguesa bens avaliados em 61,28 mil milhões de dólares (– menos 1,64% – e vendeu produtos no valor de 29,59 mil milhões de dólares, menos 18,19% face a 2015.

O Brasil manteve-se como o principal parceiro económico da China, com o volume das trocas comerciais bilaterais a cifrar-se em 67,56 mil milhões de dólares em 2016, menos 5,91% relativamente a 2015.

As exportações da China para o Brasil atingiram 22,16 mil milhões de dólares, traduzindo uma quebra de 19,20%, enquanto as importações chinesas totalizaram 45,40 mil milhões de dólares, reflectindo um aumento de 2,31% relativamente a 2015.

Com Angola, o segundo parceiro chinês no universo da lusofonia, as trocas comerciais caíram 20,94%, para 15,57 mil milhões de dólares  entre Janeiro e Dezembro do ano passado.

Pequim vendeu a Luanda produtos avaliados em 1,76 mil milhões de dólares  – menos 52,69% face a 2015 – e comprou mercadorias avaliadas em 13,81 mil milhões de dólares, ou seja, menos 13,54%.

Vantagem de cá

Já com Portugal – terceiro parceiro da China no universo de países de língua portuguesa –, o comércio bilateral ascendeu a 5,61 mil milhões de dólares  – mais 28,54% –, numa balança comercial favorável a Pequim, que vendeu a Lisboa bens na ordem de 4,03 mil milhões de dólares  – mais 39,30% – e comprou produtos avaliados em 1,58 mil milhões de dólares (, mais 7,36%.

Só no mês de Dezembro, as trocas comerciais entre a China e os países de língua portuguesa ascenderam a 7,64 mil milhões de dólares, um decréscimo de 1,23% face ao mês anterior.

Os dados divulgados sempre incluíram São Tomé e Príncipe, apesar das relações diplomáticas que mantinha com Taiwan e de não participar no Fórum Macau.

A 20 de Dezembro, o Governo são-tomense anunciou o corte com Taiwan e, dias depois a China anunciou o estabelecimento de laços diplomáticos com São Tomé e Príncipe.

Na sequência disso, o Gabinete de Apoio ao Secretariado Permanente do Fórum Macau afirmou ter uma “atitude aberta” quanto à participação de São Tomé e Príncipe no Fórum Macau.

9 Fev 2017

Pequim estabelece rede única para monitorar níveis de poluição

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China estabeleceu uma rede única para monitorar a qualidade do ar no país, numa altura em que o Governo tenta controlar a difusão de informações sobre os níveis de poluição devido à insatisfação popular.

O anúncio surge depois de no mês passado os serviços meteorológicos nacionais da China terem ordenado os gabinetes de meteorologia regionais a parar de emitir alertas de poluição.

Até à data, os dados sobre a poluição têm sido sobretudo compilados a partir de estações locais, mas a nova rede nacional deve agora rastrear o nível de emissão de poluentes, utilizando uma combinação de amostragem manual, satélites de detecção e plataformas aéreas, segundo o jornal oficial Diário do Povo.

“Apesar dos dados colectados por estações terrestres poderem ser manualmente falsificados, os dados fornecidos por satélite em tempo real não podem ser alterados”, disse ao jornal He Kebin, da Universidade Tsinghua.

A iniciativa visa reduzir a emissão de poluentes e eliminar dados forjados, escreveu o Diário do Povo.

Em Outubro passado, funcionários do gabinete de Protecção Ambiental em Xi’an, na província de Shaanxi, foram detidos por manipular os dados de monitorização da qualidade do ar.

Toca a apagar

A criação de uma rede nacional coincide com os esforços do governo em eliminar denúncias sobre as vagas de poluição que frequentemente atingem as principais cidades do país.

De acordo com o jornal China Digital Times, as autoridades ordenaram todos os ‘sites’ chineses a “encontrar e apagar” uma história com dois anos publicada pelo portal de notícias com sede em Xangai The Paper, sobre os riscos da poluição para a saúde.

A peça cita um estudo da Universidade de Pequim que aponta que as partículas PM 2.5 – as mais finas e susceptíveis de se infiltrarem nos pulmões – causaram a morte de 257.000 pessoas em 31 cidades da China.Estas partículas causam bronquite crónica, cancro do pulmão e doenças cardíacas.

Pelos padrões da Organização Mundial de Saúde (OMS), a densidade das partículas PM2.5 não deve exceder os 25 microgramas por metro cúbico.

No mês passado, em Pequim, aquele índice chegou a exceder os 500, tornando a atmosfera “gravemente poluída” e as autoridades locais colocaram a cidade em alerta máximo.

No mesmo mês, um funcionário da Comissão Nacional da Saúde e Planeamento Familiar contrariou aquele estudo, afirmando que “é ainda muito cedo para tirar conclusões sobre a consequência da poluição para a saúde, particularmente a longo prazo”.

No mês passado, um homem de 29 anos, natural de Chengdu, no sudoeste da China, foi detido por cinco dias, por ter alegadamente espalhado rumores sobre os níveis de poluição.

A poluição é uma das principais fontes de insatisfação popular na China, a par da corrupção e das crescentes desigualdades sociais.

9 Fev 2017

Paisagem de mãos e rostos

Facebook, 23 Janeiro

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]e Freitas, mano maneiro que maneja o post como farpa, assinou: «anda tudo muito preocupado com o Trump e o caraças mas era importante lembrar outros flagelos, por exemplo, gajos que tratam os amigos por “Mano”.» Tem razão. Não sendo novo, as redes amplificaram muito este modo de dizer proximidade, intimidade, fraternidade. Mastigado em tique, ganha a vacuidade da pastilha elástica. Limpa o hálito, sugere um ar cool, pode até aliviar os nervos, mas acaba cuspida. Custa-me ver atirada assim palavra com espessura. Gosto muito de companheiro, o que partilha o pão. Estou longe de desdenhar camarada, o que partilha a camarata. Mano, contudo, desdenha a realidade prática e activa os cegos afectos, os da absoluta liberdade. Ainda que contenha mão e portanto gesto. Desenvolvendo a manobra, mano-a-mano propõe ainda a igualdade básica dos diferentes. Confesso, portanto: ainda que cada vez mais preocupado com Trump, ou talvez por isso, continuarei a manusear o flagelo. Desculpa lá, mano novo, em dias de peste, só a fraternidade de punhos no ar evitará mais cadáveres. Os de corpo e os de alma.

Horta Seca, 25 Janeiro

Vestia sempre de verde, em vários tons, mas apenas detectado por olhar atento. A suave discrição camuflava-o com cores pastel de uma aparente normalidade. E no entanto o seu verde-arco-íris era uma afirmação gritante. Mário Ruivo foi dos poucos portugueses que viveu voltado para o sítio certo: o oceano. Cruzou ciência e política, teoria e prática, com notável ponderação, sempre ao serviço da revolucionária ideia de desenvolvimento sustentável. Tudo isto muito antes do ambiente se ter tornado moda e, portanto, pronto-a-vestir. Demoraremos, como de costume, anos a perceber a dimensão exacta da sua herança, a originalidade da sua perspectiva, a inteireza do seu serviço público. Recordarei a generosidade de inúmeras partilhas, invariavelmente de sorriso nos lábios. Sem ele, o mar seria bem mais descolorido.

Paris, 26 Janeiro

Não percebi logo que a edição do Liberation que me recebia era aquela toda ela ilustrada, o que acontece assim há décadas por ocasião do Festival de Banda Desenhada de Angoulême, ideia que importámos para o Público, nos idos anos 1990, e, mais recentemente, para o Diário de Notícias. Cena doméstica japonesa com gato, desta matéria se faz a primeira, assinada por Minetarô Mochizuki. Folheio com fastio sem que a actualidade me apanhe até que. Eric Lambé, animador do grupo Mokka com Alain Corbel, ambos velhos parceiros, dá-se em entrevista por causa do recente «Paysage après la bataille» (Actes Sud BD/FRMK), que desenhou sob influência do argumento de Philippe de Pierpoint. Só em França um diário de referência oferece este destaque à bd e se permite tratar obras assim desta maneira. A protagonista, uma mulher em luto pela perda de um filho, surge muitas vezes de costas e sem rosto, o que suscita a curiosidade do jornalista. Eric explica então que «até ao fim do livro me perguntei quem ela era e qual poderia ser o seu rosto na “realidade”. Talvez seja isso um livro, procurar um rosto, procurar uma pessoa…» Confessa ter pensado redesenhar todos os rostos no final, mas percebeu que aquela figura depurada fazia parte da criação e que assim deixaria espaço à imaginação do leitor. Rostos que se procuram na planície da página, para que mais serve o gesto de criar? A mesma dupla assinou um brutal e doloroso «Alberto G.» (Seuil/FRMK), em torno do genial Giacometti, que também assombrou esta minha estada.

Fundação C. Gulbenkian, Paris, 26 Janeiro

«O máximo de presença com um mínimo de gritos», assim definia Ângelo de Sousa o seu programa, cuja obra se apresenta pela primeira vez em França nesta fulgurante «La couleur et le grain noir des choses», que faz também ela jus à premissa, «o máximo de efeito com um mínimo de meios». A mão estende-se aqui paisagem a perder de vista, seja em desenho ou fotografia, pintura ou filme. Corpo e objecto, coisa útil, portátil e sempre disponível, à mão de semear no olhar do artista. Omnipresente ou apenas adivinhada. Signo maior do gesto, o que traça a linha, o que dispara o obturador, o que recorta as pequenas esculturas. Nunca me senti tão atraído e empurrado de um lado para o outro. O ordinário e o efémero, o lixo e o prosaico, ratos mortos e ruínas convivem brutalmente com a abstracção e o sublime movimento da cor na pele da tela e a dança das formas do aço tintado ou das orelhas postas em irrequieto sossego. Nunca o belo foi tão feroz. Apetece gritar. «Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto».

Fundação C. Gulbenkian, Paris, 26 Janeiro

Soou incómodo ouvir, e agora, de algum modo, escrever, mas de que serve o pudor, quando estamos sós? Na biblioteca lusófona do bd de La Tour Maubourg, pela mão dita de Anne Lima, da Chandeigne, falou-se, pela primeira vez, não em França, mas em público, do modo como a abysmo se vem fazendo centro de uma intrincada rede de autores, que vai muito para além do tornar livro. Para o melhor e para o pior, têm explodido por aqui encontros de vários graus, leituras em voz alta, projectos partilhados, opiniões discordadas, antologias recolhidas e interpretadas, ensaios dirigidos, mergulhos em apneia nos manuscritos – mesmo no computador, é a mão quem mais ordena – de uns e de outros. Já tinha acontecido, apenas em perfume, em contos do Valério Romão, afinal o pretexto que nos trouxe a este «rencontre de la bibliothèque», mas este ano passará a um outro nível quando alguns autores se tornarem personagens. Que rostos virão a ter, na realidade?

9 Fev 2017

Ases e aselhas

[dropcap style≠’circle’]1)[/dropcap] Tem-se falado nos últimos dias em Macau da possibilidade do território poder vir a tornar-se alvo preferencial de agentes do terrorismo internacional, e tudo por causa “do Trump”. Em causa está a proibição de entrada nos Estados Unidos imposta pelo seu novo Presidente a sete países conotados com o terrorismo, que poderão assim escolher os interesses norte-americanos na RAEM para futuros ataques. Ora bem, como devem saber tenho um bocado de pudor em relacionar actos de terrorismo – um conceito muito abrangente – com as suas motivações, sejam elas de carácter religioso, nacionalista (IRA e ETA, para citar dois exemplos), ou outro qualquer, portanto para mim Macau corre o mesmo risco que outro lugar qualquer no mundo, com ou sem americanos à mistura. Contudo o tipo de atentados de que se fala, em larga escala, será algo de bastante improvável; é preciso não esquecer que o território está rodeado pelo espaço marítimo, terrestre e aéreo da R. P. China, onde mal passa uma mosca, quanto mais um eventual kamikaze. E mais uma coisa: se na fronteira são barrados professores baixinhos, carecas e velhinhos, e até as celebridades de países tidos como mais “exóticos” chegam a ficar retidas uma ou mais horas, estão com medo de quê, afinal. Surrealista mesmo é a análise que se faz da capacidade das forças de segurança de um enclave no sul da China com pouco mais de 20 km2 em responder a um eventual ataque concertado de grupos paramilitares com células um pouco por todo o mundo. Suponho que tivesse sido brincadeira, nada mais do que isso.

2) O que pode considerar quase um acto de “terrorismo” (eu disse que era “um conceito muito abrangente”, não foi?) é a alegada “sorte” de uma jogadora que passou por Macau durante o Ano Novo Lunar, e “sacou à casa” alguns milhões de patacas, ao ponto de influenciar as receitas daquela concessionária durante o respectivo período. Não sei até que ponto esta história é verdadeira, mas o casino chegou mesmo a alertar a concorrência para a “sorte” da senhora, que ficou assim referenciada como…bem, uma “sortuda”, enfim. No fundo aquela jogadora fez tudo mal; o ideal teria sido que perdesse tudo o que tinha até ao último centavo, fosse obrigada a prostituir-se para poder voltar a casa, e sem que antes não passasse mais umas quantas vezes pelo casino, iludida pela possibilidade de “recuperar o que perdeu”, e como muitos devem saber, às vezes nem isso lhes chega para aprender a lição. Pode-se dizer mesmo que esta turista não “sentiu Macau”. Not welcome anymore.

9 Fev 2017

Dois minutos e meio

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]ara antecipar quão próximo estará o mundo de um conflito nuclear de larga escala – de destruição total –, há 70 anos que uma associação norte-americana de cientistas avalia os perigos existentes, tendo em conta os avanços tecnológicos e a forma como os armamentos nucleares têm evoluído (e outras armas de destruição maciça e ameaças generalizadas à humanidade), e anuncia quantos minutos faltam para o fim disto tudo. Pois bem, o Doomsday Clock, o relógio do julgamento final, avançou 30 segundos este ano. Está agora a apenas dois minutos e meio para a meia-noite – para a hora da explosão.

O anúncio foi feito nos últimos dias de Janeiro, em Chicago. Segundo esta associação de cientistas atómicos (Science and Security Board Bulletin of the Atomic Scientists), estamos pois mais próximos do apocalipse. Uma das principais razões citadas para este avanço foi a eleição de Donald Trump e as declarações erráticas do então candidato presidencial – o anúncio foi feito poucos dias depois da tomada de posse do milionário de Nova Iorque e não terá tido grandemente em conta a actividade frenética do novo inquilino da Casa Branca. Aliás, pelo que temos visto nestes primeiros dias da Presidência Trump, o relógio deverá continuar a aproximar-se da meia-noite nos próximos 12 meses.

Este avanço fez o relógio do juízo final aproximar-se 30 segundos de um tempo onde só ainda esteve uma vez. Em 1953, na sequência dos testes efectuados com bombas de hidrogénio, primeiro nos Estados Unidos da América e depois na União Soviética, a associação determinou que faltavam então apenas dois minutos para a catástrofe global. O relógio tem oscilado entre os sete minutos para a meia-noite, quando a associação publicou o seu primeiro “bulletin”, em 1947, e os 17 minutos de 1991, quando a União Soviética chegou oficialmente ao fim e as duas principais potências atómicas começaram a reduzir os seus armamentos nucleares. A associação foi constituída em 1945 por alguns dos cientistas envolvidos no Manhattan Project, que criou as primeiras bombas atómicas, que não conseguiam manter-se à margem das consequências do seu trabalho.

Donald Trump não é o único responsável pelo avanço ruidoso do ponteiro dos segundos. Mas contribuiu para isso. Os cientistas, no artigo em que justificam a colocação do relógio nos dois minutos e meio para a meia-noite, explicam que o resultado da sua análise é multidisciplinar. A equipa que faz esta avaliação anual – que inclui cientistas de áreas tão variadas como a oceanografia, meteorologia, relações internacionais ou física, entre outras – olha para as tendências de longo prazo que afectam a humanidade, como o aquecimento global ou a proliferação de armas de destruição maciça ou as ameaças resultantes dos avanços tecnológicos emergentes, como as que terão interferido com a campanha eleitoral norte-americana e as notícias falsas que circulam nas redes sociais. Sem um acompanhamento próprio e políticas que procurem diminuir o impacto destas “campanhas”, será a própria democracia que sairá afectada. Com consequências imprevisíveis para o sistema global.

O mundo pós-II Guerra Mundial, construído em torno dos princípios da economia de mercado, dos direitos humanos e da democracia, está a ser questionado como nunca o foi nas últimas sete décadas. Um dos sinais mais recentes desse ataque foi o anúncio recente da União Africana de retirar os Estados-membros do tratado que instituiu o Tribunal Penal Internacional (a estrutura das Nações Unidas que lida com os crimes contra a humanidade e genocídio). Valores tidos como seguros, como marcas do progresso da humanidade, estão a ser postos em causa. E não apenas por Trump.

É evidente que os minutos deste relógio imaginário não são rigorosos. São meramente indicativos. Não há certezas no campo da futurologia, não fosse o futuro uma ciência incerta. Há, no entanto, tendências, índices, factos. Os minutos são pois uma imagem, uma declaração sobre o estado de saúde do mundo, um manifesto sobre a permanente tensão que caracteriza as relações internacionais. E devem ser lidos em perspectiva, comparados com os dados dos anos anteriores. Este ano estamos a viver uma situação que, no seu quadro geral, demonstra que o mundo está mais perigoso. Sinal que explica, por exemplo, porque é que tantos homens de negócios norte-americanos, empresários, muitos que fizeram fortuna com as tecnológicas em Silicon Valley, estão à procura de casas na Nova Zelândia para se mudarem para lá caso isto vá tudo pelos ares (a The New Yorker acaba de dedicar um longuíssimo artigo àquilo que os super-ricos estão a fazer para se preparar para o dia seguinte).

O mundo – as relações entre Estados, aquilo a que comummente se designa as Relações Internacionais – é como uma entidade orgânica que está em busca do equilíbrio. Não é estável, está em permanente agitação, ora para um lado ora para o outro, para manter o equilíbrio. Como o trapezista na corda, que a qualquer momento parece que vai cair, as relações internacionais estão em permanente tensão. Qualquer alteração das peças deste puzzle gigantesco tem pois influência nas outras todas, que têm de se adaptar, reposicionar, recolocar.

O que se vê é que o equilíbrio à escala global está muito instável, mais do que estava antes da eleição de Trump. Veja-se por exemplo a própria União Europeia que, tendo em conta a incerteza que vem do outro lado do Atlântico, juntou no passado fim-de-semana em Malta os chefes de Estado e de governo para discutir o futuro da própria União. O novo Presidente norte-americano, ao questionar tudo o que até agora era certeza, trouxe às relações globais uma dose excessiva de imprevisibilidade, que fez aumentar a tensão entre todos. Nos tempos que correm, o bater das asas de uma qualquer borboleta num qualquer ponto perdido do globo pode provocar uma reacção em cadeia de dimensões cataclísmicas. É essa a lógica que está por detrás do avanço do relógio para os dois minutos e meio antes da meia-noite.    

9 Fev 2017

Tailândia | Amnistia Internacional denuncia repressão contra dissidentes 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Amnistia Internacional (AI) denunciou ontem a repressão de que são alvo activistas, políticos e membros da sociedade civil na Tailândia por parte da junta, a qual acusa de utilizar os tribunais para perseguir a liberdade de expressão.

Segundo a organização, pelo menos 64 activistas pró-direitos humanos e pró-democracia são vítimas de uma campanha de “criminalização e castigo” que a junta, no poder desde o golpe de Estado de 2014, impulsiona contra os seus críticos.

Num novo relatório, a AI indica que advogados, jornalistas, estudantes e académicos, entre outros, são investigados e acusados ao abrigo de uma série de leis que as autoridades utilizam como “ferramentas de coacção” para silenciar os seus opositores.

Entre as leis a que recorrem figuram as relativas aos delitos de sedição, difamação, lesa-majestade ou a crimes informáticos, as quais prevêem pesadas penas de prisão, havendo casos julgados em tribunais militares.

A AI refere ainda ordens ditadas pela junta militar após o golpe, ainda vigentes, como a que proíbe concentrações de cariz político no espaço público de cinco ou mais pessoas.

“As autoridades criaram um clima de medo em que as pessoas não podem falar nem reunir-se pacificamente sem arriscar serem detidas ou acusadas”, afirmou a directora para o Sudeste da Ásia da AI, Champa Patel, num comunicado.

Muitos são acusados por terem feito o seu trabalho como jornalistas ou advogados ou por denunciar torturas ou casos de corrupção, expressar opiniões sobre assuntos do governo ou por exigir liberdade académica, refere a organização no relatório.

Segundo a AI, “os acusados não fizeram outra coisa que não exercer direitos humanos que a Tailândia está obrigada a respeitar ao abrigo da lei internacional. Ninguém recorreu ou instigou a violência”.

A organização sustenta que a campanha contra a dissidência levanta dúvidas relativamente às eleições que a junta militar prevê convocar em 2018, apelando às autoridades para retirar de imediato todas as acusações e processos-crime abertos.

“Desde a sua chegada ao poder, o governo militar da Tailândia desmantelou as protecções dos direitos humanos e asfixiou a liberdade de expressão no país”, afirmou Patel.

“Se não se reformarem ou revogarem rapidamente estas leis e ordens repressivas as restrições aos direitos humanos podem acabar por ficar enraizadas”, alertou.

Quem lesa a majestade?

Na segunda-feira, David Kaye, relator especial das Nações Unidas para a Liberdade de Expressão, também manifestou a sua preocupação relativamente à situação dos direitos humanos no país asiático, instando a Tailândia a parar de utilizar a lei contra a lesa-majestade como um instrumento de repressão política.

O apelo foi desencadeado pelo caso de Jatupat Boonpatararaksa, um activista pró-democracia que foi detido em Dezembro por ter partilhado no Facebook um perfil do novo rei da Tailândia, Maha Vajiralongkorn, escrito pela BBC em tailandês.

Milhares de tailandeses partilharam o mesmo perfil mas Jatupat Boonpatararaksa – crítico proeminente da junta militar conhecido pela alcunha de “Pai” – foi a única pessoa a ser acusada até ao momento, naquele que constitui o primeiro caso de lesa-majestade desde que Maha Vajiralongkorn Bodindradebayavarangkun assumiu o trono a 1 de Dezembro, poucas semanas depois da morte do seu pai, que reinou na Tailândia durante 70 anos.

Múltiplas audiências foram realizadas à porta fechada e o estudante enfrenta uma pena de até 15 anos de prisão no caso de ser condenado.

David Kaye afirmou estar preocupado com as audiências secretas, criticando de uma forma genérica a lei sobre a lesa-majestade, cujo uso disparou desde que a junta militar tomou o poder em 2014.

“As figuras públicas, incluindo as que exercem a mais elevada autoridade política, podem ser sujeitas à crítica, e o facto de algumas formas de expressão serem consideradas insultuosas para uma figura pública não é suficiente para justificar restrições ou sanções”, afirmou na terça-feira David Kaye, citado num comunicado.

Para o relator especial da ONU, tais leis “não têm lugar num país democrático”.

9 Fev 2017

Mário Mesquita Borges: “A última Administração portuguesa cometeu muitos erros”

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Mário Mesquita Borges, docente da Universidade Católica e natural de Macau, olha para os últimos anos do Executivo de Rocha Vieira como um período em que prevaleceu a ideia de abandono e em que foram cometidos “muitos erros”. É essa a génese para a falta de preservação da cultura portuguesa que hoje existe, defende. O seu livro, intitulado “Macau, as Últimas Memórias de Portugal”, é lançado hoje

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] seu livro contém a ideia base de que a defesa da língua e cultura portuguesas estão entregues à comunidade macaense, mas que tem sido feito pouco por isso. Como resolver esta questão?
Desde 1999 e previamente, nos últimos anos da Administração portuguesa, houve uma grande falta nesse sentido: garantir que existiam e ficavam cá os mecanismos e instituições para a promoção da língua portuguesa. Isso passa pela comunidade macaense porque é ela que, mais do que ninguém, compreende a confluência de culturas que sempre existiu. Ao nível oficial temos visto que, no que toca ao discurso político [sobre esse assunto), ele existe.

É algo presente em quase todos os discursos, aliás.
Sim, mas sabemos também que se fala muito no contexto da promoção da língua na relação económica com os países de língua portuguesa. Mas uma coisa é a vontade política e outra coisa é o fazer: ainda existe uma grande discrepância entre essas duas realidades. Portugal tem feito muito pouco para ajudar a promover a língua no território. Há o Instituto Português do Oriente, mas poderia ser feito mais. Sabemos das várias condicionantes que existem, mas o problema de base deve-se aos últimos anos da Administração portuguesa. A perspectiva sempre foi de abandono e não de permanência. Faria todo o sentido continuarmos aqui, de forma cooperante, para ajudarmos Portugal e também Macau.

Não houve uma visão de longo prazo.
Houve uma visão de curtíssimo prazo, e estou a ser simpático. A lógica era de debandada, não era de querer deixar uma marca que ficasse e continuasse para as gerações vindouras. E que evitasse, talvez, isto: há alguns anos a comunidade macaense encontrava muita identificação com aquilo que é português. Com a normal evolução populacional, as características portuguesas têm vindo a esbater-se, há uma tendência para a aproximação à cultura chinesa, mas isso é apenas normal.

As associações locais deveriam ter um papel mais importante? Faltam apoios financeiros e a existência de uma maior estrutura em termos de associativismo?
Era positivo se houvesse isso. Sei que são feitas algumas iniciativas por parte da Associação dos Macaenses e outras instituições. Mas deveria haver uma filosofia de conjunto mais firmada, sem tantas acções esporádicas. Esse tipo de acções poderiam ser feitas com apoios vindos de Portugal. Esse papel poderia ser desempenhado pelo Instituto Camões, por exemplo, ou pela Fundação Calouste Gulbenkian.

Há um problema de liderança das associações locais, não há novos rostos e parece não haver gente interessada em dirigir estas entidades. Este também pode ser um entrave a esse trabalho de preservação? Como explica esta falta de interesse, numa altura em que a comunidade portuguesa até regista um crescimento?
Isso é a volúpia da urbe e também falo disso no meu livro. Embora haja muita vontade, esse papel das gerações mais antigas é fundamental para a renovação. Contudo, e por muitas acções que sejam feitas, se não há uma vontade manifesta por parte das gerações mais novas, torna-se difícil impor. Tem de existir uma política de atracção e não de imposição. Só que voltamos ao que já disse: se não há um manifesto de interesse, se não há algo atractivo para as gerações mais novas, para encontrarem essa identificação com a cultura portuguesa… Li há uns dias que em 2016 se comemorou o centenário de Benjamim Videira Pires. Foi uma figura muito importante para a cultura do território. Ao nível de instituições locais, pelo que li, a data passou quase despercebida. Isso é um exemplo do que se passa.

Verifica-se também um quase desaparecimento da comunidade macaense da vida política, dos órgãos de decisão. Seria importante também para garantir esta preservação da cultura?
Esse é um problema de base. A identificação com a comunidade portuguesa já não é tão grande. Logo, aquela permanência da identidade macaense está quase em perigo de se desvanecer, infelizmente. A maioria das pessoas tem dificuldade em ver que os ganhos serão muito maiores se defendermos algo com características muito especiais de Macau, e esses ganhos seriam maiores para ganhar mais protagonismo, para se garantir que se conseguiriam depois cargos de maior decisão. O facto de termos consciência de que temos uma cultura enriquecida permite-nos ter uma mais-valia para alguém que tem só uma perspectiva. E Macau, como cidade intercultural, e mais cosmopolita, teria só a ganhar com isso.

No seu livro diz que o problema da falta de preservação da língua e cultura reside no facto de as “entidades governativas optarem por um encaminhamento duplo das políticas actuais”. Em que sentido?
Há um discurso oficial, mas depois não se faz o suficiente em relação ao que é dito, mas isso existe em qualquer parte do mundo. Infelizmente, Macau e a economia estão extremamente dependentes do jogo, e as autoridades teriam muito a ganhar se Macau fosse não só reconhecido pelos casinos. O facto de ser conhecido como um destino cultural, de turismo, e ser reconhecido por outras valências, seria muito positivo. Vemos o quão volátil isto pode ser, e isso percebe-se com a queda recente das receitas do jogo. Fala-se muito no aproveitamento do território para espaço de congressos e exposições, que também seria outro ponto essencial a desenvolver. Esta dependência dos casinos vai levar a uma cada vez maior descaracterização da cidade, devido à ocupação de espaços pela indústria.

Faz uma referência à construção da Biblioteca Central no edifício do antigo tribunal. Deixa no ar a ideia de que esse projecto poderá levar ao desaparecimento de mais um símbolo português.
Quando se deixou Macau, houve muitas questões que ficaram por resolver. Existem muitas questões na história de Macau que não foram bem explicadas. Isso porque sempre houve a perspectiva histórica portuguesa e a chinesa.

Não há uma única história de Macau.
Sim, e era importante fazer esse exercício, o de criar uma história de Macau que fosse feita por chineses e portugueses. Eventualmente iria permitir desvendar alguns mitos dessas questões que ficaram por esclarecer. Em relação ao edifício do antigo tribunal, é sempre um símbolo da presença portuguesa. Ao nível simbólico poderão existir algumas questões. Mas vamos aguardar com serenidade que o projecto avance.

A que se deve a existência dessas questões pouco esclarecidas? A interesses, desconhecimento do que viria após 1999?
Macau teve ao longo da sua história várias incidências que estão sempre envoltas em alguma falta de conhecimento. A maioria da população, incluindo as gerações mais novas, ou desconhece por completo ou não gosta de falar. Falo em particular do movimento “1,2,3”, muito importante para a história de Macau. Embora tenha havido um encontro de interesses entre aquilo que era a vontade chinesa e a portuguesa, também é importante lembrar que foi isso que nos permitiu ficar cá mais 40 anos. E a maioria das pessoas esquece-se disso ou não sabe. Sobre esse episódio são muito escassas as referências ao nível histórico. Mas a história foi mais sábia do que os políticos, e todos sabemos que Macau e a China tiveram a ganhar com a permanência dos portugueses durante mais este período, que permitiu uma transferência de poder pacífica. A maioria das pessoas tem uma grande dificuldade em ver a história e a sua continuidade, e da cultura, sem ter associada uma perspectiva política muito forte. Isso é o grande pecado da maioria das interpretações que são feitas.

E a política varia muito, consoante os partidos que estão no poder.
Isso acaba por prejudicar o que deveria ser contínuo, e o que vemos muitas vezes é que temos entendimentos da história que, depois, analisados à distância, temos a perfeita noção de que não correspondem à realidade, mas é isso que permanece e que é dado como verdade. Em Portugal, infelizmente, o que passa é que Macau foi um bom exemplo, em contraste com os manifestos erros que foram cometidos nas ex-colónias portuguesas. Mas a minha perspectiva não é essa: foram cometidos muitos erros durante a última Administração portuguesa e muito mais poderia ter sido feito. Ainda mais sabendo que Macau sempre foi uma terra com muitos recursos financeiros.

Macau teria a ganhar se tivesse tido uma Administração mais afastada das forças partidárias portuguesas?
Sim. Se houvesse um objectivo único, e uma definição clara e a longo prazo, mas esse continua a ser o problema de base muitas vezes. Já são raros os políticos com essa visão, há sempre visões a curto e médio prazo, e com interesses incluídos. Isso prejudica as coisas e a continuidade. Se isso existisse, independentemente de estar o partido A ou B no poder, tudo seria mantido.

O livro aborda também a questão da Escola Portuguesa de Macau (EPM), que vai ficar onde está. A EPM tem feito o seu trabalho na dinamização da língua e cultura, incluindo a sua transformação numa escola internacional?
A EPM tem um estatuto especial mas, por muito que a escola precise de sobreviver e captar mais alunos, essa necessidade de internacionalização poderá subjugar o outro papel mais importante que a EPM pode ter. Li que o número de alunos estrangeiros cresce cada vez mais, e agora ensinam o mandarim.

E há a ideia de ensinarem o cantonês.
Isso é fundamental, e essa foi uma questão que durante a Administração portuguesa não foi devidamente acautelada. Ter-se-ia ganho mais se houvesse uma política mais realista ao nível de educação em Macau antes da entrega do território, tanto na língua chinesa como na portuguesa.

Há uma referência no livro ao monumento Portas do Entendimento, que está ao abandono. É uma metáfora da representação da cultura portuguesa, que gradualmente vai desaparecendo?
É uma metáfora e um símbolo muito interessante relativamente à política de abandono que já referi. Seria mais importante, naquela altura, criar instrumentos e fazer com que as coisas acontecessem, num projecto a longo prazo, promovendo instituições e convidando instituições portuguesas a virem cá, para fazerem esse trabalho de continuidade, em vez de se deixar apenas uma matéria simbólica, porque estas valem o que valem. Embora seja importante o monumento em si, em termos simbólicos e estéticos nada me diz. Foi mais uma forma de abandonar as responsabilidades. A última Administração do território teve muito essa perspectiva. O intuito sempre foi fechar o ciclo e não promover uma continuidade.[/vc_column_text][vc_message message_box_style=”solid” style=”square” message_box_color=”chino” icon_fontawesome=”fa fa-book”]

“Macau, as Últimas Memórias de Portugal” é apresentado hoje às 18h30 no auditório do Consulado Geral de Portugal em Macau. O autor, Mário Mesquita Borges, está presente na iniciativa. A obra, que vai ser apresentada por Luís Sá Cunha, é editada pela COD.

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8 Fev 2017

AL | Debate sobre Biblioteca Central marcado para a semana

Não critica o orçamento, mas duvida da necessidade de uma obra de semelhante complexidade na zona nobre da cidade. A deputada Song Pek Kei conseguiu convencer os colegas de que é preciso discutir um dos projectos principais de Alexis Tam. A discussão já está agendada

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]e nada adiantou ao Governo dizer que a decisão já está tomada: Song Pek Kei, a número três da bancada de Chan Meng Kam, quer discutir o sentido de oportunidade da construção da Biblioteca Central no edifício onde funcionou o Tribunal Judicial de Base. A sessão na Assembleia Legislativa (AL) está agendada para o próximo dia 15.

A deputada entende que, a ser necessário, um projecto desta envergadura deve nascer nos novos aterros ou no Centro Cultural de Macau. O espaço do antigo tribunal não é, para Song Pek Kei, a localização mais viável.

“Segundo algumas propostas, o Governo poderia escolher um local perto da nova zona de aterros, do Centro Cultural e do Centro de Ciência para construir a biblioteca, pois poderá ser melhor do que a actual localização”, aponta no pedido de debate, submetido à AL em Novembro.

Song Pek Kei não se mostra frontalmente contra o projecto – um dos mais significativos do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura –, mas considera que é preciso discutir a ideia para que a construção da obra seja “mais científica, exequível e adequada às exigências dos residentes”.

Na proposta de debate, a deputada faz uma comparação com a estrutura similar de Hong Kong, edificada há seis anos. “O Governo referiu que a Biblioteca Central de Hong Kong, que entrou em funcionamento em 2010, tem uma área semelhante à da concebida para a Biblioteca Central de Macau. Na altura, o custo de construção atingiu os 700 milhões de dólares de Hong Kong. O custo previsto para a Biblioteca Central de Macau é de 900 milhões de patacas, tratando-se de um orçamento razoável”, aponta. Mas há uma grande diferença: “Os edifícios do antigo tribunal e da Polícia Judiciária implicam a protecção do património cultural; a fachada do antigo tribunal vai ser preservada, vão ser aditadas mais construções em cima e efectuadas escavações em baixo para a construção das caves, tratando-se de uma situação mais complexa do que construir um edifício em terreno plano, com provável desperdício de tempo e um custo elevado”.

Já há muitas

Song Pek Kei tem ainda reservas sobre a real necessidade de uma biblioteca deste género num local onde já há uma grande rede de estruturas destinadas aos livros e à leitura.

“Atendendo ao desenvolvimento das bibliotecas comunitárias nos últimos anos, o Governo deve, antes do planeamento da nova biblioteca central, avaliar a distribuição das bibliotecas comunitárias. Chegou a fazê-lo?”, pergunta.

De acordo com os números que a deputada recolheu, em Macau existem 305 bibliotecas: 86 salas de leitura e bibliotecas públicas, 103 bibliotecas escolares, 80 bibliotecas especializadas e 34 em instituições do ensino superior e escolas técnicas.

8 Fev 2017

Ella Lei pede dinamização dos estaleiros de Lai Chi Vun

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m interpelação escrita, Ella Lei fez eco das preocupações de moradores de Lai Chi Vun acerca da medida proposta pelo Governo para a demolição dos estaleiros navais que, salienta a deputada, são de relevo histórico.

No final de Janeiro, o Executivo anunciou a demolição, a curto prazo, das instalações de 11 lotes, de X-5 até X-15, onde estão situados os estaleiros degradados. Em questão, dizia-se, está a segurança pública e a prevenção de derrocadas antes da chegada da temporada dos tufões. Os cuidados atingem particular acuidade nos lotes X-12 e X-15, cujas demolições terão prioridade por estarem em pior estado. A medida levantou muitas questões e preocupações de locais.

Para Ella Lei, Lai Chi Vun “é um sítio arqueológico, uma vez que contém a vila antiga, assim como vestígios da tradicional indústria naval”. O local representa um marco importante para a vila piscatória, que importa preservar, assim como as embarcações de valor histórico. A deputada acrescentou ainda que “com o desenvolvimento económico de Macau, o número das vilas de pescadores está cada vez mais reduzido”. Um legado histórico que merece defesa do Governo.

Património naval ao abandono

Em Janeiro de 2013, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes fez uma investigação do planeamento de Lai Chi Vun, na vila de Coloane. Nesse levantamento, realçaram-se cinco objectivos: preservação de uma cultura naval única, dinamização do património industrial, melhoria da qualidade ambiental, melhoria do ambiente do passeio e a intensificação do turismo cultural. Neste capítulo, a deputada alerta que passaram muitos anos sem que as autoridades tenham avançado com o processo de salvaguarda da zona.

A representante da FAOM considera que, com o futuro dos estaleiros por um fio, os cidadãos locais vivem momentos de incerteza. “O mais importante é que as autoridades só disseram que os vão demolir, mas não disseram nada sobre os objectivos de salvaguarda e as directrizes de dinamização dos estaleiros”, comenta.

A deputada acrescenta que, como o Governo já elencou os lotes que precisam de obras de recuperação, estes não deviam ser considerados uma ameaça à segurança pública. Além destas preocupações, Ella Lei aproveitou a interpelação escrita para interrogar o Executivo acerca dos canais de comunicação que os cidadãos podem usam para participar no planeamento de Lai Chi Vun.

8 Fev 2017

Mak Soi Kun quer importação de domésticas do Interior da China

 

O deputado Mak Soi Kun interpelou por escrito o Governo para a necessidade de promover a contratação de empregadas domésticas do Interior da China, sem limitação de quotas.

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] representante da Associação dos Conterrâneos de Kong Mun de Macau considera que, “na visão dos cidadãos, esta política dá mais uma opção em termos de contratação de empregadas domésticas”. Na óptica do tribuno, a política de contratação facilita as famílias que trabalham por turnos, assim como as pessoas idosas que não têm capacidade para tomarem conta de si próprias e, mais importante, que apenas falam chinês.

A política de importação de trabalhadoras de origem chinesa já está em curso há algum tempo. Mak Soi Kun alerta que o Executivo não fez o suficiente para divulgar a medida, não tendo chegado a informação da política à população. “O Governo só colocou um slogan breve no site da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais”, explica o deputado. Esta foi a principal exigência da associação: uma maior promoção, e por meios diferentes, que faça chegar aos moradores de Macau o conhecimento da possibilidade de contratarem empregadas domésticas de língua chinesa. Além disso, é salientado na missiva a natural familiaridade dos trabalhadores oriundos do Interior da China com as tradições e cultura locais.

Os números

Já no ano passado, em resposta ao deputado Chan Meng Kam, o Gabinete de Recursos Humanos (GRH) confirmou os pedidos ao Continente para a importação deste tipo de mão-de-obra. À altura, o GRH entregava uma lista referente a Abril de 2014 onde se podia verificar que tinham sido aprovados 266 pedidos de importação de domésticas, 224 oriundas da província de Guangdong e as restantes da província de Fujian. Ao fim de um ano de contrato, 117 trabalhadoras viram os seus contratos renovados pelos patrões, uma percentagem um pouco desencorajadora.

De acordo com dados da GRH, em Dezembro de 2015 havia 114 empregadas domésticas do Interior da China a trabalhar em Macau. Este número subiu imenso, mais do que duplicou, relativamente a Dezembro de 2016, com as trabalhadoras oriundas da China Continental a ascenderem a 232. Neste domínio, as empregas oriundas das Filipinas continuam a ter a maior quota no sector, totalizando 12.761 em Dezembro último.

8 Fev 2017

Habitação pública | Ho Ion Sang teme processos judiciais

O deputado Ho Ion Sang teme que os concessionários dos terrenos que o Governo quer reverter iniciem processos judiciais contra a Administração, o que poderá atrasar o planeamento e a construção de mais habitações públicas

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo já prometeu a construção de mais casas públicas assim que conseguir recuperar os vários terrenos que continuam por aproveitar em todo o território, e cujo prazo de concessão já terá chegado ao fim. Contudo, esse processo preocupa o deputado Ho Ion Sang, que teme que os concessionários possam colocar o Governo em tribunal. O arranque de novos processos judiciais poderá, por isso, atrasar todo o planeamento de novas habitações públicas.

“As autoridades disseram que vão usar os terrenos vazios e destacaram que os terrenos só podem ser usados depois da sua reversão, mas existem preocupações na sociedade de que, se os concessionários dos terrenos iniciarem um processo em tribunal, as autoridades terão de esperar até saírem os resultados, e só depois podem ser iniciados os trabalhos de planeamento”, escreveu o deputado numa interpelação escrita entregue ao Executivo. “Isso vai adiar o planeamento inteiro em termos de desenvolvimento da habitação pública.”

Ho Ion Sang que, no hemiciclo, representa a União Geral das Associações de Moradores (UGAMM, ou Kaifong), deseja saber como estão os processos relativos aos diversos terrenos que a Administração pretende recuperar. “Como está o processo de reversão dos terrenos e quando vão começar os trabalhos de construção? Como há vários atrasos na construção de habitação pública, pretendo saber se as autoridades podem iniciar o planeamento assim que os terrenos forem revertidos”, disse.

Segundo Ho Ion Sang, “a sociedade está preocupada com o fornecimento de habitações públicas, o qual que não está a cumprir as necessidades da população.” “Como é que as autoridades vão avaliar estas necessidades para decidir o número de casas e o tipo de fracções a construir?”, questionou.

CEM em espera

O deputado falou do caso do terreno localizado na Avenida Venceslau de Morais, actualmente concessionado à Companhia de Electricidade de Macau (CEM). Está em curso a saída da central eléctrica, mas Ho Ion Sang questiona as razões da ausência de informações.

“Na resposta à minha interpelação, entregue há um ano, as autoridades disseram que o terreno da CEM está em processo jurídico de reversão, e assim que for terminada a demolição [da central eléctrica] e mudança as autoridades podem iniciar o planeamento. Já passou mais de um ano e o processo de desenvolvimento do terreno não é satisfatório”, vincou.

O representante dos Kaifong fala na existência de alguns entraves na utilização do terreno, apontando ainda outro exemplo: as parcelas na Avenida Wai Long, revertidas para o Governo no seguimento do caso Ao Man Long.

“Os terrenos são um factor importante para a disponibilização de habitações, mas isso depende do Executivo. O Governo já disse que vai utilizar os terrenos da Avenida Wai Long para construir habitação pública, bem como o terreno onde está a central eléctrica da CEM. Mas a utilização dos terrenos está a enfrentar vários problemas. Temos de saber se o local é apropriado para a construção de habitação pública.”

Ho Ion Sang lamenta que, nesta fase, “as autoridades só tenham concepções de base e não tenham ainda um planeamento concreto”.

8 Fev 2017

Governo admite acelerar substituição de aves vivas por aves refrigeradas

Acabar com a venda de aves vivas é uma prioridade, reiterou ontem a secretária para a Administração e Justiça, no rescaldo de mais um caso de gripe das aves. Mas a população não alinha na ideia do frango já embalado no frigorífico. Vai daí, é um objectivo sem datas

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ónia Chan, secretária que tutela o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), afirmou ontem que o Governo está “a ponderar acelerar os trabalhos para a substituição do abastecimento de aves de capoeira vivas por aves de capoeira refrigeradas”. Para já, mantém-se a comunicação com o sector, “a fim de prestar apoio, e recolher as suas opiniões e necessidades na reestruturação desta indústria”.

Em declarações proferidas à margem de uma reunião na Assembleia Legislativa, a governante recordou que, neste Inverno, foram detectados em Macau vários casos de vírus da gripe aviária. Os episódios levaram à intervenção do IACM, que pôs em curso uma série de medidas de prevenção e controlo da situação. Foram abatidos milhares de aves.

A secretária para a Administração e Justiça acrescentou que “Macau tem mantido a comunicação com o interior da China, no sentido de verificar a situação de inspecção e garantir a segurança do restabelecimento da importação de aves de capoeiras vivas”.

Quanto ao fim das galinhas e pombos vivos nos mercados, bem como a centralização do abate de aves, Sónia Chan reiterou que se trata de “uma prioridade na agenda do Governo”. A responsável recordou que já foi feita uma consulta pública sobre esta matéria, sendo “necessário ainda considerar as questões relativas aos hábitos gastronómicos dos cidadãos, bem como à reestruturação do sector de aves de capoeira vivas”. Em suma, “não há ainda uma calendarização” para a implementação da medida.

A Administração pretende transferir o mercado grossista de produtos refrigerados para a zona industrial transfronteiriça, uma ideia a concretizar no segundo semestre deste ano. Sónia Chan acrescentou que se está a proceder a todo o trabalho preparativo de deslocação das instalações em causa, destacando que o IACM já disponibilizou visitas aos profissionais do sector.

A maioria não quer

O caso mais recente de gripe das aves aconteceu na sexta-feira passada e implicou o abate de mais de 10 mil aves de capoeira, bem como a suspensão da venda durante três dias. Foi o quinto caso em menos de um ano e o segundo na época de ano novo lunar.

Em Dezembro, um lote contaminado oriundo da China gerou o primeiro caso de infecção humana, num dono de uma banca de venda de aves por grosso. O homem, entretanto, recuperou.

A consulta pública a que Sónia Chan se referia foi divulgada em Junho do ano passado e indicou que quatro em cada dez residentes de Macau se opõem à substituição de aves vivas por refrigeradas.

O inquérito, destinado a avaliar a reacção do público à medida que o Governo pretende aplicar para prevenir surtos de gripe aviária, concluiu que 42,2 por cento dos 1026 inquiridos manifestam-se contra ou absolutamente contra a medida, 24,2 por cento exprimiram concordância ou absoluta concordância e 33,3 por cento afirmaram serem indiferentes ao assunto.

A Organização Mundial de Saúde anunciou em Janeiro estar em alerta perante a propagação de surtos de gripe das aves, com casos reportados em cerca de 40 países desde Setembro passado.

Mais de 70 pessoas observadas

Os Serviços de Saúde estão a acompanhar 76 pessoas que “estiveram ocasionalmente em contacto com as aves abatidas” na passada sexta-feira, após ter sido detectado, pela segunda vez, o vírus H7N9 no mercado abastecedor Nam Yue. Até ao momento, “nenhuma pessoa apresentou sintomas”. Os serviços liderados por Lei Chin Ion sublinham que o Governo já implementou uma série de planos de contingência em resposta à gripe aviária, e possui uma reserva estratégica de medicamentos antivirais e de materiais de protecção pessoal. Além disso, existem equipamentos e instalações adequadas para fazer face a um eventual surto de H7N9.

8 Fev 2017

Zheng Anting interpela Governo sobre poluição atmosférica

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Zheng Anting está preocupado com a qualidade do ar que se respira em Macau. A preocupação do tribuno agravou-se devido aos dias contínuos de nevoeiro, “sobretudo de manhã”, mas que não são, necessariamente, sinónimo de poluição e que podem ser influenciados pela concentração de humidade. No entanto, de acordo com Zheng Anting, o índice de concentração de partículas de 2.5 situou-se num “nível horrível”, escreve numa interpelação ao Executivo.

A apreensão com a qualidade do ar atraiu a atenção da sociedade, de acordo com as declarações patentes na missiva. O deputado desconfia que as autoridades de Macau estejam a usar o fumo provocado pelos motociclos que circulam nas ruas da cidade como bode expiatório.

Para Zheng Anting, o smog deve-se, principalmente, à poluição importada do Interior da China. “A zona do Delta do Rio das Pérolas já tinha índices médios/altos de poluição atmosférica e smog”, explica, e “o vento traz esses poluentes para Macau”. O deputado tem ainda dúvidas quanto às capacidades das autoridades responsáveis para examinarem a qualidade do ar.

Na visão de Zheng Anting, “Macau, por ser uma cidade mundial de turismo e lazer, tem de resolver a poluição do ar, sob pena de poder prejudicar a indústria do turismo”. Além da indústria do turismo, o deputado elenca preocupação com a saúde dos cidadãos, em particular no que concerne ao aumento de casos de doenças respiratórias e cardiovasculares.

O deputado interpelou o Governo sobre a conclusão da proposta de regulamentos administrativos sobre o critério de emissão de gases dos veículos, e quando se irá entrar no processo de legislação. Aproveitou também para se manifestar contra um aumento excessivo das taxas aplicadas aos veículos. Defende que estas obrigações devem ser diminuídas, atendendo ao facto de se estar a aumentar a exigência em relação ao tipo de veículos nas estradas do território.

Por fim, o deputado quer saber como é que as autoridades pretender reforçar as informações divulgadas junto dos cidadãos sobre a poluição atmosférica, para que sejam tomadas medidas de prevenção a fim de reduzir o impacto para a saúde dos residentes.

8 Fev 2017

Teatro | CCM estreia este fim-de-semana a comédia “Idiot”

Com “Idiot”, a companhia teatral de Macau Canu Theatre traz-nos um espectáculo de comédia onde não há diálogo e em que as expressões corporais, à maneira da personagem Mr. Bean, fazem tudo o resto

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o Japão, uma mulher coloca um anúncio para recrutar um rapaz que lhe faça uns recados durante o dia e tudo o que ela pedir. Um jovem decide responder para ver o que acontece mas, se para uns essa decisão pode ser idiota, para outros pode ser apenas algo diferente. Quem são, afinal, os idiotas do nosso dia-a-dia? É este o mote para a história de “Idiot”, a mais recente produção da companhia teatral local Canu Theatre, que estreia na próxima sexta-feira no Centro Cultural de Macau (CCM), com mais um espectáculo agendado para sábado.

O público poderá ver um exemplo de teatro físico de comédia, sem diálogo entre os seus personagens. Joyce Chan, produtora do espectáculo, contou ao HM que tudo começou em França, onde estudou com Sami Abu Wardeh, actor que dará corpo à personagem principal. Lá teve o primeiro contacto com a forma de interpretação utilizada pelos palhaços e percebeu que tinha de fazer um espectáculo com estes elementos. Daí até à viagem ao Japão, onde viu um anúncio semelhante ao que deu mote à peça, foi um passo. “Os palhaços não fazem propriamente uma interpretação, mas fazem bastantes gestos e usam muito o corpo para transmitir mensagens. Mostram-se bastante ao público, é algo que vem de dentro, intimista. É diferente dos guiões que escrevemos para outro tipo de personagens”, explicou a autora de “Idiot”.

A opção por um espectáculo de comédia acabou por ser natural. “Durante o meu curso tivemos aulas sobre comédia e tragédia. Sempre que fazia trabalhos na área da comédia, e via as reacções do público a rir, sentia-me muito satisfeita, percebia que o público reagia de forma entusiástica ao que via. Pensei também que em Macau não há muitos espectáculos de comédia, então achei que seria uma boa oportunidade para trazer estes elementos para cá e fazer com o que o público local tenha acesso ao que aprendi em França.”

A inspiração de Mr. Bean

Sendo a primeira vez que pisa os palcos de Macau, Sami Abu Wardeh, londrino, revela-se expectante sobre um projecto que considera único. “Tem sido incrível trabalhar neste espaço e ter acesso a todas estas infra-estruturas. Temos muita liberdade para experimentar coisas diferentes”, disse. “Este tipo de interpretação, para mim, é mais honesto, temos mais liberdade, porque a maior parte das interpretações são isso mesmo, interpretações no sentido mais estático. Estou feliz por estar neste projecto. É algo alternativo sob várias formas, não vemos muitos projectos como este”, contou o actor ao HM.

Para Sami Abu Wardeh, a inspiração para compor o “idiota” veio de dois anos de trabalho com Joyce Chan, e também do famoso personagem da série televisiva Mr. Bean, interpretado por Rowan Atkinson. Joyce Chan admitiu que teve de fazer algumas adaptações ao público de Macau na hora de escrever a peça. “O início do projecto não foi fácil porque, no estrangeiro, a reacção à comédia é diferente, muitas vezes é difícil compreender o que é engraçado e o que não é, então fiz algumas adaptações para o público de Macau. Combinei vários elementos.” Fazer um espectáculo sem diálogo é, para Joyce Chan, uma forma mais libertadora de representar. “Uma performance sem linguagem oral é importante porque temos vários actores estrangeiros e usamos muitos gestos e expressões corporais. É uma forma bonita de contar uma história. Espero que as pessoas possam ter uma nova perspectiva, de que uma peça sem diálogo pode funcionar.”

Rir em Macau

Sendo a comédia um género pouco comum em Macau, Joyce Chan espera mudar mentalidades e aproximar o público a um tipo de espectáculo que é raro acontecer no território. “As pessoas gostam de comédia. Tudo depende do pensamento pessoal de cada produtor e a dimensão que pretende trazer para o público. Todos podem ter humor nos seus corações, todos podem sorrir. As pessoas de Macau vão gostar muito deste espectáculo”, apontou. Na calha está uma nova peça, também de comédia, mas mais virada para a crítica do panorama político local. Joyce Chan revelou estar confiante. “No curso abordámos também outro conceito de comédia com base na crítica política, onde exageramos expressões corporais. No futuro gostaria de fazer um espectáculo assim. O Governo de Macau dá-nos a liberdade para falarmos e esse espectáculo que quero fazer é uma forma leve de fazer comédia sobre questões políticas, por isso é que acredito ser possível levar esse projecto avante.”

8 Fev 2017

IIM lança livro sobre evolução económica da região do Delta do Rio das Pérolas

 

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]ublicado em inglês, sob a chancela editorial do Instituto Internacional de Macau (IIM), “Pearl River Delta – From the World Factory to Global Innovator”, é um livro que estuda o desenvolvimento económico de Cantão, Shenzhen, Foshan, Dongguan, Huizghou, Zhongshan, Jianmen, Zhuhai e Zhaoqing.

Este livro surge na sequência de outros oito volumes, um sobre cada grande cidade, escrito por Thomas Chan, especialista na zona em análise, consultor do Executivo de Hong Kong e do Governo chinês, e por Louise do Rosário, jornalista do Economist. Gonçalo César de Sá, do Macaulink, foi o coordenador da obra.

Mas porquê focar a atenção nesta zona? “Vivem nesta região cerca de 60 milhões de pessoas e achámos que pode ser mais utilizada pelos empresários de língua portuguesa. Existe tudo aqui no sul, este é o grande motor económico da China”, explica César de Sá. Dar a conhecer estas cidades pode despoletar oportunidades de investimento, de criação de parcerias entre empresários de países de língua portuguesa e os seus congéneres chineses do Delta do Rio das Pérolas. Outro dos objectivos passou por transmitir aos empresários portugueses o conceito de desenvolvimento económico local “e dizer: aprendam”, esclarece o coordenador do livro.

Uma ponte económica

Depois da publicação dos oito livros em língua portuguesa, para cada uma das cidades acima elencadas, faltava um que somasse tudo. O problema é que, com o rápido desenvolvimento da zona, as oito publicações em língua portuguesa estavam completamente ultrapassadas. Dessa forma, o IIM resolveu fazer um novo livro, desta vez em inglês, para alargar o público-alvo que estava limitado aos países de língua portuguesa.

A obra já inclui as novas directivas da China para o desenvolvimento da zona. Analisam-se os planos de “integração e criação de uma megalópolis que vai abarcar tudo, desde Guangdong, até Hong Kong e Macau tornando isto uma zona de grande desenvolvimento”, comenta o coordenador do livro.

Neste âmbito estão também grandes obras públicas, como a ponte Hong Kong – Macau – Zhuhai. Para Gonçalo César de Sá, esta obra é “apenas uma pequena peça do puzzle da grande integração económica. Outras peças serão, por exemplo, “a linha de caminho-de-ferro rápida que vai ligar Zhuhai a Cantão, que mais tarde ligará a Hengqin, finalmente entrando em Macau com o metro. Um exemplo de que os chineses planeiam a longo prazo e cumprem a curto prazo”, explica César de Sá.

8 Fev 2017

Juiz do Supremo da China diz que Trump é “inimigo do primado da lei”

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m juiz da máxima instância judicial chinesa acusou o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de ser um “agressor” e um “inimigo do primado da lei”, depois de este ter atacado o sistema judicial norte-americano.

Trump referiu-se a James Robart como “alegado juiz”, após este ter suspendido o seu decreto que proibia temporariamente a entrada de refugiados e cidadãos de sete países muçulmanos nos EUA.

He Fan, do Tribunal Supremo da China, associou as críticas de Trump ao homicídio de um juiz na China no mês passado.

“O Presidente a criticar juízes e o bandido que mata juízes são ambos inimigos do primado da lei”, afirmou He, na sua página oficial no WeChat.

“Num país que se diz ser o mais democrático e respeitador do primado da lei, o Presidente liderar os ataques a um juiz faz dele nada mais do que um agressor sem dignidade”, afirmou.

Desde que Trump tomou posse no mês passado, a imprensa estatal chinesa tem criticado a “crise sistémica” das democracias ocidentais, realçando a superioridade do sistema autoritário de Pequim.

Princípios do sistema

Na China, o “papel dirigente” do Partido Comunista (PCC), que governa o país desde 1949, é um “princípio cardial”, estando o sistema judicial subordinado ao poder político.

Em Janeiro passado, o presidente do Supremo Tribunal Popular da China, Zhou Qiang, disse que os tribunais do país devem resistir à “ideologia errada” do ocidente, como a democracia constitucional, separação de poderes e independência do sistema judiciário.

Após ascender ao poder, em 2013, o Presidente chinês, Xi Jinping, anunciou uma reforma no sistema legal, visando garantir o primado da lei.

No entanto, o regime promoveu também uma campanha repressiva contra activistas pró-democracia e advogados que trabalham em casos considerados sensíveis para o Governo.

Os tribunais chineses têm uma taxa de condenação de 99,92%.

8 Fev 2017

Actos de fé & Fumo negro

03/02/2017

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a primeira vez que aterrei em Maputo, em 1995, encontrei à entrada do Hospital Central um amputado, de ambos os pés, que vendia sapatos só de pé esquerdo. Impecavelmente engraxados. Cem meticais por sapato. E o par, perguntava o traunseunte curioso. Há-de chegar… – jurava com aquele brilho fanático nos olhos que encontramos nos aficionados da agricultura biológica – o mister passa cá pra semana… e lhe garanto o par.

O eventual comprador era convidado a um acto de fé. Ai de quem pusesse em dúvida a convicção de que o vendedor completaria a entrega da metade que faltava.

Tão insubornável fé só a reencontrei num vendedor de cautelas em Cacilhas, no outro lado do Tejo. Ia apanhar o cacilheiro e apanhei-o a limpar com papel de jornal as lentes de casco de garrafa dos seus óculos, de haste presa à armação por um arame, enquanto a sua boca de um verdete desdentado, proferia para um tipo de fato Boss, sapatos italianos e pingente de ouro na gravata: Eu há vinte anos que jogo no mesmo número!

Apanhei a frase no ar e desviei-me para um balcão, no fito de beber um café e de ruminar três minutos no absurdo de um maltrapilho tomar a miséria por oráculo.

Gente que acredita cegamente em «factos alternativos», tal como Kellyanne Conway, a assessora de Trump, que, para justificar um decreto idiota, inventou um alegado atentado que nunca se verificou, o massacre do Bowling Green.

Simultaneamente, e não é acaso se na moldura da comédia humana tais actos coincidem com a institucionalização dos «factos alternativos», foi destaque da semana a ímpia permissão que esteve quase a ser sancionada pelo parlamento romeno, o qual queria legitimar o desvio de fundos públicos, por abuso de poder, desde que não se ultrapassasse a irrisória quantia de duzentos mil euros. Esta piedosa imoralidade ganhou o seu primeiro argumento em plena Europa.

Porque foi com certeza uma primeira tentativa e este novo guião para uma futura regulação política dos bens e dos erários públicos irá repetir-se e vingará, dado que cai como ginjas no estado pantanoso em que se locomovem inúmeros Estados. Lembremos o caso do Brasil.

Há-de pois espantar-me o que li hoje nos jornais moçambicanos, sobre o ex-genro do ex-presidente Guebuza, o mesmo que assassinou a filha deste, há dois meses atrás? Relatava-se assim no novo «facto alternativo»: «Zofino Armando Muiane, segundo consta da acusação particular da família Guebuza, é um espião sul-africano que usava o nome de Washington Dube». Hesitamos, se rimos se choramos.

A seguir, na grande maioria dos estados africanos, virá impor-se a nova lei, imitada da desenvolvida Europa.

04/02/2017

É uma coisa maravilhosa a força com que as mulheres sobressaem no actual momento da literatura portuguesa. Tanto na poesia – e bastam-me cinco nomes: Raquel Nobre Guerra, Joana Emídio Marques, Rita Taborda Duarte, Inês Fonseca Santos e Maria João Cantinho – como na prosa, aonde, dentro do que pude ler (e mais não refiro por não terem chegado a Maputo), dois nomes se destacam com livros recentes que são a todos os títulos excepcionais: Ana Margarida Carvalho, com Não se pode morar nos olhos de um gato, e Alexandra Lucas Coelho, com Deus Dará. A literatura no feminino dá cartas, aparenta ser um feixe de enorme energia que veio para ficar, o que não significará apenas uma afirmação individual como um insofismável avanço na paridade social, cunhada nos patamares simbólicos,

E interrogo-me no mal-estar que estas mulheres emancipadas, inteligentes, maduras, poderão sentir perante a notícia de que a lei russa despenalizou a violência doméstica, mormente se o homem a não pratica mais do que uma vez por ano. É que tudo o que é mau, tende a repetir-se em todas as latitudes.

Uma vez por ano, argumenta-se, não faz um agressor, é um mero problema de comunicação no casal, que muito carinho posterior pode atenuar. Bom, há casos em que a violência no casal pode ser mútua. Mas são minoritários. O que interessa é o pano para mangas que o retrocesso desta lei dá ao álibi, esquecendo que as relações assimétricas são claramente maioritárias. E ficando o agressor sem cadastro isso não dará azo a novas investidas? Ao fim de quantas vezes se considerará ser a primeira vez?

O que me faz lembrar certas tradições rurais moçambicanas pelas quais se ensina a seviciar a mulher sem deixar marcas (consulte-se sobre estas e outras matérias o portal da Wlsa. Talvez por isso tenhamos assistido a esta aberração: a independência de Moçambique, durante 35 anos, não produziu uma única poeta à altura das duas que o colonialismo fez brotar: Noémia de Sousa e Glória de Sant’Anna.

07/02/2017

O que é um ateu? Agrada-me esta definição: alguém que é imune à idiolatria e que livre, até de si mesmo, não teme contradizer-se.

O que autorizará o caso de ateus-que-são-intermitentes, como eu, no sentido em que têm fé, na graça epicurista do vestido amarelo que esculpiu o corpo da macua que passou agora à minha frente na esplanada, espalhando no ar uma intensidade que contamina, por exemplo, como num género de inteligência-não-circunscrita – sem que para isso necessitem de acrescentar um nome à origem dessa energia transpessoal. O Budismo, neste sentido, alheia-se da necessidade de nomear Deus.

Vem isto a propósito de uma das palavras que mais tem inundado o imaginário popular dos últimos tempos e que está de facto a ter um peso terrorista: a apostasia e o seu praticante, o apóstata. Palavra que julgava banida. Considero insultuoso que metade da humanidade me considere um apóstata.

O ateísmo e o laicismo tem sido vilipendiados, nestes últimos anos, e considero que um dos combates do século passará por recuperar o direito e o bom nome de uma espiritualidade sem Deus.

8 Fev 2017

Devolvam a dignidade às filhas do galo 为鸡平反

[dropcap style≠’circle’]“[T[/dropcap]rump é] em primeiro lugar um homem adulto e, em segundo lugar, alguém que esteve envolvido na organização de concursos de beleza e que como tal conheceu ao longo de muitos anos algumas das mulheres mais belas do mundo. Custa-me muito a acreditar que ele fosse a correr para se encontrar num hotel com raparigas de moral duvidosa, embora as nossas sejam sem qualquer sombra de dúvidas as melhores de todo o mundo.” E desta forma promove Putin o turismo sexual na televisão russa.

Os cidadãos cibernautas de todo o mundo ficaram em choque com esta avaliação de cinco estrelas do Sr. Vladimir Bazófias. Apesar de tudo isto sinto-me tentada a disponibilizar aos meus leitores alguns factos alternativos (grin grin), lembrando as palavras eruditas de Lin Yutang: “Ninguém deverá menosprezar o importante papel desempenhado pelas prostitutas chinesas nas relações românticas, na literatura, na música e na política.”

Na antiga China, as damas da nobreza não precisavam de ser inteligentes nem talentosas para ser respeitadas. “Uma mulher é virtuosa desde que seja ignorante” é um provérbio que remonta à Dinastia Ming (1368-1644). Uma boa esposa chinesa é obediente ao marido, dedicada aos filhos, responsável pelas tarefas domésticas, virtuosa e ignorante em todas as outras matérias. Como se esperava que as esposas e concubinas seguissem os códigos sociais, os homens ricos e proeminentes procuravam legitimamente parceiras intelectuais fora de casa.

Agora aqui vai uma lista de prostitutas/poetisas famosas que deixaram uma marca na memória colectiva do povo chinês, e não só porque dançavam e cantavam para ganhar o pão nosso de cada dia. Algumas delas mudaram a história, para sempre.

Su Xiaoxiao 苏小小

Também conhecida como Su Xiaojun, foi uma cortesã chinesa que viveu em Qiantang City (Hangzhou dos nossos dias) durante a Dinastia Qi do Sul (479–502). Morreu com apenas 19 anos de idade. Foi cortesã e também poetisa. Havia quem pensasse que ela não queria ser esposa nem amante de ninguém. Assim, ao contrário das mulheres que ficavam enjauladas nos casamentos, optou por partilhar os seus encantos.

Li Shishi 李师师

Cortesã da cidade de Kaifeng, capital da Dinastia Song (960-1127), Li destacou-se pela sua incrível versatilidade. Era dotada para o canto, para a dança e para a poesia. O seu talento e beleza atraíram muitos escritores, poetas e oficiais abastados. O Imperador Song escapou-se do palácio numa noite de tempestade para ir ao seu encontro. Mais tarde veio a tornar-se viciado em laranjas descascadas pelas suas delicadas mãos. Os 108 heróis de a Margem Aquática não conseguiam conquistar uma posição na corte Song sem a interferência “entre lençóis” de Li.

Chen Yuanyuan 陈圆圆 

Chen Yuanyuan (16241681) foi uma prostituta muito conhecida que viveu durante os finais da Dinastia Ming e os inícios da Dinastia Qing. Foi concubina do General Wu Sangui. A captura de Chen por Li Zicheng, (o rebelde líder da revolta que depôs a Dinastia Ming), foi o motivo que levou Wu Sangui a abrir os portões da Grande Muralha para deixar entrar os Manchus.

Liu Rushi 柳如是

Liu Rushi (1618–1664) uma célebre cortesã que viveu nos finais da Dinastia Ming (1368–1644). Foi considerada por muitos estudiosos como a prostituta mais respeitável da antiga China, devido à sua lealdade à família real. Recusou submeter-se aos Manchu, os novos senhores.

Sai Jinhua 赛金花

Se ela não tivesse seduzido o Comandante Alemão do Exército das 8 Nações Aliadas durante a Revolta dos Boxer, não estou a ver como é que muitos dos artefactos chineses que estão actualmente nos Museus de Berlim, Londres, Paris e Moscovo lá tinham ido parar. Deveria ser nomeada para receber um prémio do Ministério da Cultura.

Sai Jinhua (1864 – 1936) foi uma célebre cortesã dos finais da Dinastia Qing. Tornou-se prostituta aos 20 anos. Casou-se com um oficial imperial de alta patente como sua concubina e viajou com o marido pela Rússia, Alemanha, Austrália e Holanda, como embaixatriz. Depois do Exército das 8 Nações ter invadido Pequim, teve uma relação com o Comandante Alemão.

Xiao Fengxian 小凤仙

Xiao Fengxian (1900-1954) prostituta afamada que conheceu os últimos anos da Dinastia Qing e os alvores da República da China. Foi a prostituta mais célebre do maior bairro de Pequim de “lanternas vermelhas”.  Tornou-se amante do General Cai E, o líder revolucionário que pôs fim às ambições imperiais de Yuan Shikai. Sem a influência da sua alcova o General Cai não teria arriscado a vida e voado para Yunnan para declarar a independência. Os sonhos imperiais de Yuan Shikai teriam vingado e estaríamos a ajoelhar perante o neto do Grande Yuan nos dias que correm. Esta mulher foi sem dúvida o arquitecto da reconstrução da República.

2017 é o Ano do Galo. Da Franga para alguns. “Franga” é calão para prostituta no chinês moderno. Nas ocasiões festivas, um frango bem cozinhado é um dos pontos altos de todos os banquetes familiares. Um chef chinês que se preze passa horas a suar na cozinha para fazer jus às receitas de que tanto se orgulha, subtis, mas cheias de sabor, e que demonstram em larga escala invenção e criatividade. Ao contrário das preparações rápidas, típicas das cadeias internacionais de fast food, a cozinha chinesa trata com o respeito que lhes é devido frangos e … as “frangas”.

8 Fev 2017

Taça de Carros de Turismo de Macau vai sofrer alterações

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]ntes das férias do Novo Ano Lunar, a Associação Geral Automóvel  Macau-China (AAMC) anunciou que a corrida da Taça de Carros de Turismo de Macau, que nas últimas duas décadas tem sido conhecida por “Taça CTM”, do 64º Grande Prémio de Macau, vai ser composta por dois tipos de viaturas ou duas classes: 1,600cc Turbo e 1,950cc ou superior. Noutras palavras, as duas classes que compunham o Campeonato de Carros de Turismo de Macau (MTCS na sigla inglesa) – a “AAMC Challenge” (1,600cc Turbo) e a “AAMC Macau Road Sport” (1,950cc ou superior) – e que tinham corridas separadas até aqui, vão fundir-se numa só corrida este ano. Divididos em duas classes, os dois tipos de viaturas que formam o MTCS correrão juntos, tanto nas corridas de apuramento, na China continental, como no Grande Prémio, em Novembro.

A Taça de Carros de Turismo de Macau, uma das mais importantes, se não mesmo a mais importante corrida do automobilismo local, será igualmente também disputada em moldes diferentes no 64º Grande Prémio de Macau. Ambas as classes vão estar separadas no treino-livre de quinta-feira de 30 minutos e no treino de qualificação de sexta-feira. Os dezoito melhores pilotos de cada classe na sessão de qualificação serão então apurados para a grande corrida a disputar no sábado, onde ambas as classes se juntam como nas provas de apuramento. Contudo, no final da corrida, haverá uma cerimónia de pódio, separada, uma para cada uma das classes. Os trinta e seis apurados para a corrida de sábado ficarão isentos do pagamento da taxa de inscrição.

Para todos

Como o HM já havia noticiado, a AAMC voltará a organizar dois fins-de-semana de corridas no Circuito Internacional de Zhuhai, que, como habitualmente, servirão de apuramento para os pilotos de carros de turismo locais para o grande evento do mês de Novembro. Contudo, este ano há uma novidade, pois também os pilotos estrangeiros terão de se qualificar pela mesma via. A comunicação da AAMC, escrita também em língua portuguesa, diz que, a partir de agora, os “…pilotos interessados em participar na corrida da Taça de Carros de Turismo de Macau (…) independentemente da sua nacionalidade, têm que participar nas provas de uma das classes do Festival de Corridas de Macau…”.

Após o somatório dos dois eventos, que totalizam quatro corridas, “os 25 pilotos melhores classificados serão seleccionados para participarem” e caso haja uma desistência de um piloto qualificado “esta vaga será substituída pelo piloto que tiver a melhor classificação seguinte”.

O primeiro Festival de Corridas de Macau está marcado para de 26 a 28 de Maio, enquanto o segundo encontro acontecerá de 23 a 25 de Junho. As inscrições abrem a 3 de Abril e encerram no dia 21.  É esperado para breve um novo anúncio da AAMC, agora com o regulamento técnico de ambas as classes, sendo que a palavra que corre nos bastidores do automobilismo local é que a classe 1,600cc Turbo vai sofrer alterações.

8 Fev 2017

O nascimento do Ou Mun ian

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]om o esboroamento do mundo antigo, alterou-se substancialmente o conceito de identidade, seja nas relações estabelecidas no corpus social, seja no interior daquilo a que ainda chamamos indivíduo. Se no passado as identidades estavam fortemente referenciadas e de algum modo amarradas a um núcleo duro, constituído por geografias limitadas, famílias, fratrias, religião e países, não padecendo por isso de grande possibilidade de oscilação, o mundo contemporâneo criou para a identidade um outro recorte do real. Ela é hoje uma função instável, com pouca substância, na medida em que constantemente se refaz na conjugação espaço-tempo, em cada lugar e a cada momento de tensão e de confronto. Não deixa por isso de ser um dos mais importantes conceitos, uma das mais eficazes ferramentas, na compreensão das motivações profundas de um grupo humano. Convém, no entanto, assimilar que não podemos hoje falar de identidade no mesmo quadro mental do passado. Estamos agora perante um conceito que de modo nenhum se refere a algo de fechado, ilhéu, defensivamente encerrado em concha autista. Pelo contrário, as identidades deverão ser concebidas como abertas, existentes porque comunicantes, em constante estado de desagregação e de reagregação, em interminável confronto com outras identidades, variáveis, mutantes, guerreiras; afinal ao ritmo da cultura no século XXI.

É também a esta luz que teremos de ler a identidade de Macau, até porque a sua sobrevivência enquanto tal prende-se fundamentalmente com a existência ou não de uma identidade – como temem os negativistas que apregoam a zhuhaificação. Advirto que não pretendo utilizar uma perspectiva académica, não situando por isso este texto no domínio da sociologia, da antropologia ou de qualquer outra ciência dita social ou humana. Para isso, precisaria de outros dados, de outro espaço, francamente de uma investigação que não se baseasse unicamente na observação quotidiana do que me rodeia – como aqui acontece, mas também no rigor dos números, em citações elefantinas e nas evidências das estatísticas.

E contudo… Identidade. Questão chave para Macau na medida em que estamos num espaço cercado, espécie de ilha cujos habitantes terão razões histórico-culturais para assumir uma identidade diversa do que os rodeia, dispositivo produtor de sentidos únicos e entrançados genealógicos. Questão uma e outra vez sublimada talvez exactamente por mexer em terrenos nem sempre pacíficos, admissíveis, raras vezes salubres. Repare-se que Macau é designado em mapas franceses e outros como a presque-île, o que não deixa de ser curioso.

Identidade. O tema recalcado, cujo debate foi sempre atirado para essas calendas que, admitamos, a acontecerem é só porque estamos na China onde o tempo tem uma dimensão mais que bíblica. E é pena. Limito-me, portanto, a constatar empiricamente uma mudança que considero interesante.

Passo a descrever o contexto. Quando aqui cheguei, no princípio dos anos 90, toda a pessoa de etnia chinesa nascida em Macau, quando interrogada sobre a sua origem, respondia ser “Tchong-ko ian” (uma pessoa da China). Quanto aos macaenses, chamavam-se “Tou-seng” (filhos da terra), entre outros nomes, de uso interno, que especificavam o grau rácico ou social. Já os portugueses da República, vulgo reinóis, eram conhecidos em cantonense por epítetos de vários géneros, que por pudor me escuso reproduzir. Certo é que a palavra Macau não aparecia, na língua chinesa (Ou Mun), para formar uma palavra que designasse as gentes de Macau. Ou seja, pessoas de Macau, claramente “Ou Mun ian”, não existiam.

Desde logo considerei este dado algo de muito singular e até parte da estranha identidade deste espaço. Então a larga maioria dos habitantes de uma cidade, de um quase Estado, não se reconhecem enquanto tal? Não se designam a si próprias enquanto tal? Que razões profundas criam uma situação dete tipo? Trata-se de um fenómeno efémero, passageiro, ou algo de verdadeiramente enraizado na matriz cultural desta gente? Invoquei as migrações recentes, mas isso não me satisfazia porque chineses que estavam em Macau há várias gerações tinham o “Tchong-ko ian” na ponta da língua. Nunca consegui responder de forma organizada a este tipo de perguntas. Por outro lado, a diferença em relação a Hong Kong se não era abissal rondava o profundo.

Claro que, na minha opinião, a situação não era favorável à manutenção futura da memória da cidade e um dos trabalhos a fazer seria precisamente estudar o assunto e mesmo intervir no sentido de fortalecer uma identidade que parecia extremamente pulverizada e repartida. Lembro-me de, por exercício lúdico, tentar encontrar um evento histórico que conseguisse unir todas as comunidades de Macau e não ter conseguido. O governo de então nunca se preocupou com o tema. Estava estabelecido, numa espécie de consenso silencioso, que uma das partes mais consistentes da identidade de Macau era não se interrogar sobre si própria. Como se, como pinta Goya, a razão engendrasse monstros. Ou talvez o verdadeiro receio fosse que eles saíssem debaixo do tapete.

A vida continuou. A RAEM surgiu. Macau passou a ser governado pelas suas gentes. O jogo foi liberalizado e nunca mais pararam de aumentar os seus lucros. A China tornou-se na maior fonte de turistas, sobretudo depois do aparecimento dos vistos individuais. A cidade, o quotidiano, as relações, mudaram. E as pessoas? E o seu interior? A visão que têm de si mesmas? Será que mudaram também?

É verdade. Tenho de confessar a minha inicial surpresa quando comecei cada vez mais a ouvir chineses de Macau a definirem-se como “Ou Mun ian”. E o mesmo se passa com jovens macaenses, cuja tendência parece ser abandonarem o “Tou seng”. Ou seja, a usarem a cidade de Macau, a RAEM, como referência identitária. Agora já não dizem com a mesma inevitável regularidade que são “Tchong-Ko ian”, mas sim pessoas de Macau. Que razões estarão por detrás desta mudança, que tem sido gradual embora inesperadamente acelerada? O que estará a levar as gentes de Macau a reconhecerem-se enquanto tal, quando dantes remetiam a sua identidade para a Grande China? As respostas não podem ser simples. Deixo apenas algumas pistas.

Em primeiro lugar, poderemos considerar a influência da propaganda governamental, assente no princípio “um país, dois sistemas” e no seu derivado “Macau governado pelas suas gentes”. Ora a verdade é que, sobretudo o segundo slogan, pode ter tido algum efeito, na medida em que atribui às pessoas de Macau um papel na condução da suas vidas, permitindo portanto uma identificação entre ser de Macau e específicos direitos sobre a sua própria existência. Não é realmente importante que as pessoas de Macau efectivamente tenham uma participação cívica mas a existência dessa possibilidade, que dantes não era sentida pela esmagadora maioria das pessoas de etnia chinesa, pode causar efeitos identitários.

O aumento da consciência cívica que o advento da transferência de soberania inevitavelmente trouxe a grande parte da população poderá desempenhar um papel (reconheço que menor) na mudança do dispositivo identitário.

Em segundo lugar, poderemos considerar o aumento exponencial de turistas do continente chinês e a constatação prática das, por vezes gigantescas, diferenças culturais que os separam da gente local, apesar de pertencerem ao mesmo país. Perante a quase imposição dos valores pan-chineses em Macau, do reforço paternalista e desnecessário do patriotismo e a própria invasão de sucessivas moles humanas, com quem os locais não se identificam nem tomam como modelo, é natural que se dê uma reacção local de reforço identitário.

De notar que as diferenças entre os chineses que nos visitam e os chineses de Macau são realmente profundas, nomeadamente ao nível dos hábitos alimentares, da língua, da religião, do modo de relacionamento em grupo, da maneira como entendem o mundo. É certo também que existe muito em comum. Nalguns casos, tanto como entre um português e um húngaro ou um esloveno, o que não é pouco. Tal facto só advoga a favor da diversidade natural de um país da dimensão da China, não deixando contudo de se manifestar no aparecimento de identidades locais e regionais, factores de enriquecimento cultural e de grande potencialidade futura.

Em terceiro lugar, teremos de contar com o factor geracional. Ou seja, não importa tanto estarmos agora perante uma terceira geração de pessoas já nascidas e criadas em Macau, mas sim o facto da RAEM enfrentar o mundo global e não ser já uma sociedade indefinida como a que existia no pré-handover. Pessoas cuja ligação ao continente chinês é valorizada e desvalorizada consoante o contexto. Pessoas que, independentemente do grau de educação, cresceram num espaço em plena mutação e indubitavelmente excitante, pleno de horizontes promissores, cada vez com mais nome internacional.

Nasceu, portanto, o Ou Mun ian. Bem vindo seja. Nas suas costas reside não apenas uma cidade, mas toda a História, toda a Cultura, todo o relato de um encontro que, também ele, não cessa de se desfazer e de se refazer, marcando o novo ritmo das múltiplas identidades que, num determinado espaço e momento, constituem a identidade de Macau.

8 Fev 2017

John Rocha é autor do projecto Eurasian Food Journey, sobre gastronomia macaense

Gosta de comer e adora cozinhar. No regresso aos sabores da infância, John Rocha, um euro-asiático de Hong Kong, decidiu que tinha chegado a hora de partilhar as receitas que vai cozinhando com quem as quiser experimentar. Há uma página no Facebook, um blogue e aulas de gastronomia macaense

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] filho de pai português e de mãe chinesa, nado e criado em Hong Kong. “Cresci numa família bilingue e fui influenciado tanto pela cultura ocidental, como pela cultura asiática”, conta John Rocha ao HM. Consultor de gestão de marcas, decidiu investir, há um par de meses, num projecto pessoal ligado à gastronomia macaense. Criou um blogue e uma página no Facebook, meios que servem para partilhar as receitas que vai experimentando. Pelo meio há também pratos portugueses.

John Rocha decidiu acabar com a ideia de que as receitas de família apenas a ela pertencem. Explica que tem centenas de pratos para experimentar e dar a conhecer ao mundo. Há um regresso aos sabores da infância, aos tempos em que era miúdo e comia os pratos confeccionados pela avó.

“Lembro-me de ser muito pequeno e de a minha família organizar festas – a primeira comunhão, a comunhão solene, baptismos, aniversários e, claro, ceias de Natal. Recordo-me de ver todos aqueles bolos e sobremesas, diferentes dos que eram servidos nas festas dos meus colegas de escola, a maioria deles chineses”, diz.

Das memórias da infância fazem também parte as idas semanais ao Club Lusitano, em Central, depois da missa de domingo. “Comia umas tostas de queijo, galinha e o famoso minchi”, elenca. Com a avó era frequentador habitual de uma loja em Kowloon onde a família encomendava bebincas e chilicotes.

“Foi assim que descobri a comida macaense. E, claro, a minha avó adorava cozinhar”, explica John Rocha. “Era demasiado novo para perceber de que tipo de gastronomia se tratava, só mais tarde é que percebi. A cozinha macaense tem muito que ver com a família, cada uma tem a sua versão de minchi.”

Panelas virtuais, panelas reais

O minchi serve de exemplo para o projecto que já está lançado e que quer expandir nos próximos tempos. “Espero que o meu blogue possa ajudar pessoas que têm algo em comum e que sirva como espaço de partilha, com diferentes receitas para o mesmo prato”, diz. “Neste momento, estou a cozinhar com base nas receitas da minha família e também a partir de receitas que fui encontrando. Gosto muito de fazer isto.”

A ideia da partilha surgiu da utilização das redes sociais. “Como muitas outras pessoas, usava o Instragram e publicava fotografias das minhas fotos. De repente, no ano passado, percebi que não era isso que me dava mais gozo.” Foi então que decidiu “dizer adeus ao mundo das selfies” e começar a publicar conteúdos que “pudessem ser interessantes e terem algum valor para os outros”. Em Dezembro, criou o blogue sobre a viagem gastronómica euro-asiática que quer dar a conhecer ao mundo.

John Rocha tem também algumas preocupações de natureza histórica. “Espero poder ajudar a documentar a gastronomia macaense, que faz parte da história. E, quem sabe, talvez esta iniciativa possa ajudar ao reencontro de amigos que perderam o contacto ou de familiares separados por milhares de quilómetros.” Resumindo, “o Eurasian Food Journey é sobretudo acerca de ligações, pessoas que criam laços através do prazer da cozinha e da partilha.”

Além das fotografias e receitas que John Rocha tem vindo a disponibilizar, a iniciativa deste residente de Hong Kong vai ter uma dimensão mais real: aulas de gastronomia macaense.

“Não estavam nos meus planos”, salienta, vincando que não faz disto profissão. “Como gosto muito de cozinhar, inscrevi-me num curso de cozinha italiana. Estava a falar com a chef acerca do meu contexto familiar e, um dia, ela convidou-me a fazer alguns pratos macaenses”, explica. A professora de cozinha italiana gostou e convidou-o para dar algumas aulas. “Como não faço isto com fins lucrativos, acordámos que parte daquilo que os alunos pagam vai para instituições de caridade aqui em Hong Kong.”

O curso arranca em Março. “As aulas vão ser dadas em cantonês porque espero poder contribuir para que a comunidade local fique a conhecer a gastronomia portuguesa e macaense.” Na lista de pratos de John Rocha não faltam a bebinca de leite e os chilicotes.

8 Fev 2017

ONU questiona investigação birmanesa sobre abusos contra minoria étnica

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] ONU questionou ontem a credibilidade da comissão governamental birmanesa que investigou a violência contra a minoria muçulmana rohingya, após denunciar que as acções das forças de segurança são passíveis de se considerar “limpeza étnica”.

Adama Dieng, enviado especial da ONU para a prevenção do genocídio, mostrou-se “chocado e alarmado” com o relatório, divulgado na semana passada, pelo Alto-Comissariado da ONU para os Direitos Humanos, que denuncia uma série de abusos perpetrados desde Outubro, altura em que o exército lançou uma grande ofensiva no estado de Rakhine (oeste) após ataques mortíferos de rebeldes contra postos fronteiriços.

Esses abusos incluem execuções sumárias, violações, desaparecimentos forçados, tortura e tratamento desumano ou detenção arbitrária, de acordo com o relatório que indica que centenas de membros da comunidade rohingya terão sido mortos.

A campanha militar levou aproximadamente 65.000 pessoas a fugir para o Bangladesh e 22.000 outras a deslocarem-se para o interior da Birmânia, segundo calculou o Alto-Comissariado da ONU para os Direitos Humanos.

A zona do norte de Rakhine mantém-se fechada ao acesso da ajuda humanitária, da qual dependem milhares de pessoas, e de observadores e jornalistas independentes.

Adama Dieng congratulou-se com o compromisso anunciado pelo governo birmanês de investigar os abusos denunciados no relatório, publicado depois de uma comissão liderada pelo vice-presidente Myint Swe não ter encontrado provas dos referidos abusos por parte das forças de segurança, mas contestou o resultado.

“A actual comissão não é uma opção credível para levar a cabo uma nova investigação”, disse Dieng, ao mostrar a sua preocupação relativamente às diferenças entre as conclusões do relatório do grupo governamental e as do organismo das Nações Unidas.

“Apelo para que qualquer investigação seja realizada por um grupo realmente independente e imparcial, que inclua observadores internacionais”, afirmou o enviado especial da ONU.

Em comunicado, o mesmo responsável insta o governo birmanês a demonstrar a sua sinceridade em resolver o conflito em Rakhine, onde a organização Human Rights Watch (HRW) também denunciou, na segunda-feira, novos casos de violência contra os rohingya.

Casa dos horrores

O grupo de defesa dos direitos humanos com sede em Nova Iorque documentou violações de mulheres, incluindo meninas de 13 anos, perpetradas por soldados e guardas fronteiriços que insultaram, agrediram e ameaçaram as vítimas por razões étnicas ou religiosas.

“Estes horríveis ataques a mulheres e meninas rohingya por parte das forças de segurança acrescentaram um novo e brutal capítulo ao longo e repulsivo historial de violência contra as mulheres por parte do exército birmanês”, disse a investigadora da HRW, Priyanka Motaparthy.

A activista culpou ainda o governo birmanês pelo seu fracasso na investigação das violações e de outros crimes contra os rohingya, apelando também à realização de uma investigação internacional e independente.

“O governo deveria parar de questionar estas denúncias de violações e em troca oferecer apoio às vítimas e acesso a cuidados médicos”, sustentou Motaparthy.

Mais de um milhão de rohingya vive em Rakhine e sofre discriminação na Birmânia, de maioria budista.

A maioria não tem cidadania e é considerada como imigrante ilegal do Bangladesh, ainda que alguns vivam no país há várias gerações.

Os rohingya são uma minoria muçulmana apátrida considerada uma das mais perseguidas do planeta pelas Nações Unidas.

8 Fev 2017