China-UE | Alcançado acordo que visa acesso mais igualitário de empresas europeias ao mercado chinês 

Depois de sete anos de negociações, está assinado o acordo entre a China e a União Europeia em matéria de investimentos bilaterais que visa um maior e mais igualitário acesso de empresas europeias ao mercado chinês. Xi Jinping já disse que este entendimento vai permitir a criação de uma “economia mundial aberta”

 

Os europeus querem ter um maior e mais igualitário acesso ao mercado chinês e conseguiram finalmente dar um primeiro passo para que isso se torne uma realidade. Depois de sete anos de negociações, está assinado o acordo entre a China e a União Europeia (UE) relativamente aos investimentos directos bilaterais. O acordo prévio, assinado nos últimos dias do ano de 2020, passará ainda pelo crivo do Conselho e do Parlamento Europeu.

Em comunicado, a Comissão Europeia declarou, a 30 de Dezembro, que, nos últimos 20 anos, as empresas da UE investiram na China qualquer coisa como mais de 140 mil milhões de euros, enquanto que a China investiu na EU cerca de 120 mil milhões.

Para a Comissão, “o investimento directo estrangeiro da União Europeia na China mantém-se relativamente modesto no que diz respeito à dimensão e potencial da economia chinesa”.

Pretende-se, com este documento, que “os investidores da UE consigam ter um melhor acesso a uma economia em rápido crescimento, com 1,4 mil milhões de consumidores”, e que estes “possam competir a um melhor nível no mercado chinês”. Tal “é importante para a competitividade global e para o crescimento futuro da indústria da UE”, lê-se no comunicado.

Do lado da UE, é ainda referido que este é “o Acordo mais ambicioso que a China alguma vez assinou com um terceiro país” em matéria de investimentos directos. Pequim “compromete-se agora a abrir-se à UE numa série de sectores-chave” e a assegurar “um tratamento justo” às empresas europeias, de modo a que estas possam competir em condições de igualdade, referiu a Comissão.

“Pela primeira vez, a China também concordou com disposições ambiciosas sobre desenvolvimento sustentável, incluindo compromissos sobre trabalho forçado e a ratificação das convenções fundamentais relevantes da Organização Internacional do Trabalho”, indicou o executivo comunitário em comunicado.

Para Xi Jinping, Presidente chinês, este “acordo de princípio” dará “um importante contributo” para a construção de uma “economia mundial aberta”.

Segundo a agência noticiosa oficial chinesa Xinhua, o Presidente chinês declarou que este acordo também vai servir para impulsionar o caminho da recuperação após a actual pandemia da doença covid-19 e reforçar a confiança internacional na globalização económica e no comércio livre.

Numa declaração divulgada em Bruxelas, Von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, considerou este acordo “um marco importante” nas relações da UE com a China, apontando que o mesmo “proporcionará aos investidores europeus um acesso sem precedentes ao mercado chinês”, ao mesmo tempo que “compromete a China com princípios ambiciosos a nível de sustentabilidade, transparência e não-discriminação”.

Por seu lado, o vice-presidente executivo da Comissão, Valdis Dombrovskis, que tem a seu cargo a pasta do Comércio, sublinhou que “este acordo dará às empresas europeias um enorme impulso num dos maiores mercados do mundo e de mais rápido crescimento, ajudando-as a operar e a competir na China”.

“Garantimos compromissos vinculativos em matéria de ambiente, alterações climáticas e combate ao trabalho forçado. Envolver-nos-emos de perto com a China para assegurar que todos os compromissos sejam plenamente cumpridos”, garantiu.

O que vai mudar?

São várias as áreas onde a China se compromete a fazer mudanças em prol de uma maior liberalização, nomeadamente ao nível da saúde. Em plena pandemia da covid-19, o Acordo assinado com a UE vai permitir maiores ligações aos hospitais privados no país. “A China vai oferecer uma maior abertura de mercado a joint-ventures para hospitais privados em cidades chinesas incluindo Pequim, Xangai, Tianjian, Guangzhou e Shenzhen”.

Ao nível da indústria, a China “fez compromissos com muito poucas exclusões (em particular, em sectores com um significativo excesso de capacidade)”. “Em termos do nível de ambição, tal vai coincidir com uma abertura por parte da UE. Praticamente metade do investimento directo estrangeiro da UE é feito na área da indústria (por exemplo, nas áreas dos transportes e equipamentos de telecomunicações, químicos e equipamentos de saúde). A China não fez este tipo de compromissos no que diz respeito ao acesso ao mercado com outros parceiros”, aponta a Comissão Europeia.

Na área da indústria automóvel, a China “concordou em remover os requisitos para joint-ventures”, além de se comprometer “a dar acesso ao mercado dos veículos ecológicos”. Ao nível do sector financeiro, “a China já iniciou o processo de liberalização gradual do sector dos serviços financeiros”, prevendo-se uma eliminação dos requisitos para joint-ventures para a área da banca, comércio de seguros e acções, bem como gestão de activos.

Além disso, “em adição às regras contra a transferência forçada de tecnologias, o Acordo será também o primeiro a endereçar obrigações para as empresas estatais, regras de transparência para subsídios e compromissos relacionados com o desenvolvimento sustentável”, lê-se.

A nível laboral, “os gestores e especialistas das empresas da UE vão ter a permissão para trabalhar em subsidiárias chinesas durante três anos sem restrições como quotas ou testes do mercado laboral”. Além disso, “os representantes dos investidores da UE terão a permissão para visitar [o país] livremente antes de fazer um investimento”.

As opiniões

Em editorial publicado aquando da assinatura do Acordo, o jornal Global Times, ligado ao Partido Comunista Chinês (PCC), considerou este memorando como um “presente de ano novo para o mundo”. “Este é um grande evento entre a China e a UE. São também notícias estimulantes para um mundo que está ainda atormentado com uma pandemia prejudicial. Esta é uma grande decisão orientada para o futuro”, pode ler-se.

O mesmo editorial destaca o facto de este acordo ter sido discutido nos últimos sete anos, tendo decorrido 30 sessões de negociações. “É concebível que existam muitas dificuldades. No entanto, os dois lados finalmente concluíram as negociações. Tal comprova um facto: enquanto os dois lados forem sinceros no desejo de reforçar a cooperação recíproca, podem ultrapassar quaisquer diferenças.”

“Alguns ocidentais gostam de discutir quais os lados que fazem mais concessões num acordo, e quais foram os objectivos atingidos. De facto, enquanto um acordo for atingido através de uma negociação igualitária, não pode haver uma vitória unilateral. A cooperação com ganhos mútuos é a base lógica na era da globalização. O acordo de investimento entre a China e a UE não vai desvirtuar-se desta lógica”, acrescenta o mesmo editorial.

Um certo timing

Ainda em Setembro do ano passado, no âmbito das negociações, a presidente da Comissão Europeia havia destacado a desigualdade existente ao nível do investimento. “Temos o nosso mercado europeu aberto, mas as nossas empresas não beneficiam de simetria e enfrentam demasiadas restrições e dificuldades”, disse, citada pelo jornal Público.

Já Angela Merkel, chanceler alemã, falou de uma “alteração do comportamento da China” e de um “novo impulso político” para a conclusão deste processo. “Os chineses são muito bons negociadores, e penso que com vontade política de ambos os lados será possível cumprir os prazos”, respondeu, questionada sobre a intenção de fechar o acordo até ao fim do ano.

Num artigo de opinião publicado no jornal português Público, a 30 de Dezembro, Nuno Severiano Teixeira, investigador da Universidade Nova de Lisboa, destacou o facto de este Acordo ser assinado após a vitória de Joe Biden nas presidenciais norte-americanas.

“E, finalmente, a eleição de Biden despertou em Pequim o sentido da urgência. De tal modo urgente que dias antes do Natal, numa reunião de embaixadores dos Estados-membros, em Bruxelas, foi aprovado à pressa um documento provisório que, numa correria, deveria ser objecto de uma reunião dos responsáveis europeus, ainda antes do fim do ano.”

Nuno Severiano Teixeira apresenta, ao mesmo jornal, uma visão crítica deste Acordo. Para o investigador, este “é importante, mas não a qualquer preço”. “E, de um ponto de vista económico, poder-se-ia perguntar se um tal acordo vale a pena nestes termos. Se não se deveria ir mais longe nas negociações. Mas essa não é a questão principal. A questão principal é: até que ponto as vantagens comerciais de curto prazo não vão traduzir-se em perdas políticas e estratégicas de longo prazo?”, questionou.

A “conclusão em princípio” das negociações sobre este novo acordo de investimento UE-China ocorreu durante uma videoconferência, na qual a UE esteve representada pelos presidentes da Comissão, Ursula von der Leyen, e do Conselho Europeu, Charles Michel, tendo ainda participado a chanceler alemã, Angela Merkel, e o Presidente francês, Emmanuel Macron, enquanto a China se fez representar pelo seu chefe de Estado, Xi Jinping.

A UE reiterou ainda o convite dirigido ao Presidente chinês, Xi Jinping, para uma cimeira UE-China ao mais alto nível, com a participação dos chefes de Estado e de Governo dos 27, que chegou a estar prevista para este ano mas foi adiada devido à covid-19, devendo então decorrer em Bruxelas em 2021, em data ainda a definir.

4 Jan 2021

Xi Jinping diz que acordo com UE vai ajudar a criar uma “economia mundial aberta”

O Presidente chinês, Xi Jinping, afirmou ontem que o “acordo de princípio” sobre Investimentos alcançado esta quarta-feira com a União Europeia (UE) dará um “importante contributo” para a construção de uma “economia mundial aberta”.

Ao fim de quase sete anos de negociações, o bloco comunitário e Pequim chegaram hoje a um “acordo de princípio” sobre Investimentos durante uma videoconferência entre os líderes da UE e Xi Jinping.

Segundo a agência noticiosa oficial chinesa Xinhua, o Presidente chinês declarou durante a videoconferência que este acordo também vai servir para impulsionar o caminho da recuperação após a actual pandemia da doença covid-19 e reforçar a confiança internacional na globalização económica e no comércio livre.

A UE e a China estavam a negociar este acordo desde 2014, mas, nas últimas semanas, as conversações avançaram de forma substancial face a um compromisso das partes de concluir um documento antes do final do ano.

De acordo com Bruxelas, o acordo político hoje alcançado “irá criar um melhor equilíbrio nas relações comerciais UE-China”, uma vez que “a UE tem sido tradicionalmente muito mais aberta do que a China ao investimento estrangeiro”.

Pequim “compromete-se agora a abrir-se à UE numa série de sectores-chave” e a assegurar “um tratamento justo” às empresas europeias, de modo a que estas possam competir em condições de igualdade, referiu a Comissão Europeia.

“Pela primeira vez, a China também concordou com disposições ambiciosas sobre desenvolvimento sustentável, incluindo compromissos sobre trabalho forçado e a ratificação das convenções fundamentais relevantes da Organização Internacional do Trabalho”, indicou o executivo comunitário em comunicado.

O texto do acordo deverá ainda ser finalizado pelas partes e aprovado pelo Conselho (Estados-membros) e pelo Parlamento Europeu, o que só sucederá numa fase posterior, em 2021.

A “conclusão em princípio” das negociações sobre este novo acordo de investimento UE-China ocorreu durante uma videoconferência, na qual a UE esteve representada pelos presidentes da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e do Conselho Europeu, Charles Michel, tendo ainda participado a chanceler alemã, Angela Merkel (cujo país ocupa até ao final de dezembro a presidência semestral rotativa do Conselho da UE, que será assumida por Portugal no início do ano) e o Presidente francês, Emmanuel Macron.

31 Dez 2020

UE e China alcançam “acordo de princípio” sobre investimentos

A União Europeia e a China chegaram esta quarta-feira a um “acordo de princípio” sobre Investimentos, ao fim de sete anos de negociações, durante uma videoconferência entre líderes da UE e o Presidente chinês, Xi Jinping, anunciou a Comissão Europeia.

De acordo com Bruxelas, este acordo político “irá criar um melhor equilíbrio nas relações comerciais UE-China”, uma vez que “a UE tem sido tradicionalmente muito mais aberta do que a China ao investimento estrangeiro”.

Pequim “compromete-se agora a abrir-se à UE numa série de sectores-chave” e a assegurar “um tratamento justo” às empresas europeias, de modo a que estas possam competir em condições de igualdade, referiu a Comissão.

“Pela primeira vez, a China também concordou com disposições ambiciosas sobre desenvolvimento sustentável, incluindo compromissos sobre trabalho forçado e a ratificação das convenções fundamentais relevantes da Organização Internacional do Trabalho”, indica o executivo comunitário em comunicado.

Os baixos padrões laborais chineses, e em particular a questão do trabalho forçado, constituíam, para vários Estados-membros da UE, o principal obstáculo à conclusão de um acordo com Pequim.

O texto do acordo deverá ainda ser finalizado pelas partes e aprovado pelo Conselho (Estados-membros) e pelo Parlamento Europeu, o que só sucederá numa fase posterior.

A “conclusão em princípio” das negociações sobre este novo acordo de investimento UE-China ocorreu durante uma videoconferência celebrada hoje, na qual a UE esteve representada pelos presidentes da Comissão, Ursula von der Leyen, e do Conselho Europeu, Charles Michel, tendo ainda participado a chanceler alemã, Angela Merkel, e o Presidente francês, Emmanuel Macron, enquanto a China se fez representar pelo seu chefe de Estado, Xi Jinping.

Numa declaração divulgada em Bruxelas, Von der Leyen considerou este acordo “um marco importante” nas relações da UE com a China, apontando que o mesmo “proporcionará aos investidores europeus um acesso sem precedentes ao mercado chinês”, ao mesmo tempo que “compromete a China com princípios ambiciosos a nível de sustentabilidade, transparência e não-discriminação”.

Por seu lado, o vice-presidente executivo da Comissão Valdis Dombrovskis, que tem a seu cargo a pasta do Comércio, sublinhou que “este acordo dará às empresas europeias um enorme impulso num dos maiores mercados do mundo e de mais rápido crescimento, ajudando-as a operar e a competir na China”.

“Garantimos compromissos vinculativos em matéria de ambiente, alterações climáticas e combate ao trabalho forçado. Envolver-nos-emos de perto com a China para assegurar que todos os compromissos sejam plenamente cumpridos”, garantiu.

De acordo com um comunicado conjunto da Comissão e do Conselho, durante a videoconferência de hoje os líderes abordaram também outros dossiês, designadamente o combate às alterações climáticas, a pandemia da covid-19, Hong Kong e direitos humanos, com os dirigentes europeus a congratularem-se com “importantes progressos numa série de questões-chave”, mas “contínuas expectativas e preocupações noutras áreas”, sem especificar.

A União Europeia reiterou ainda o convite dirigido ao Presidente chinês, Xi Jinping, para uma cimeira UE-China ao mais alto nível, com a participação dos chefes de Estado e de Governo dos 27, que chegou a estar prevista para este ano mas foi adiada devido à covid-19, devendo então decorrer em Bruxelas em 2021, em data ainda a definir.

31 Dez 2020

A nova era por haver

Ao longo destes 21 anos de RAEM, as instruções de Pequim têm sido cruciais para garantir algum desenvolvimento nesta região “governada pelas suas gentes”. Aliás, algo que percebemos é que sem elas a comunidade portuguesa aqui residente teria muito mais dificuldade em encontrar um espaço de subsistência. Lembramo-nos, por exemplo, do ano de 2003, no qual o Governo Central determinou que Macau seria uma ponte para os Países Lusófonos o que, em grande parte, justifica a nossa presença e utilidade enquanto peças desse processo que, infelizmente, ainda não conheceu a desenvoltura desejada, na medida em que tem encontrado escolhos locais que vão do desinteresse à oposição.

O estabelecimento do Fórum Macau tem conhecido altos e baixos. Estes últimos devem-se, sobretudo, à sobranceria de alguns decisores locais e a escolhas menos felizes para a liderança deste processo. Os altos acontecem quando Pequim resolve “puxar algumas orelhas”, como aconteceu por ocasião da visita do primeiro-ministro Li Keqiang, em 2016, 13 anos depois do estabelecimento do Fórum, cujo discurso estabeleceu 19 (!) pontos que faltavam realizar para que Macau atingisse, minimamente, aquele desiderato.

A verdade é que temos de analisar com especial cuidado e atenção as “quatro expectativas” que o Presidente Xi Jinping aqui deixou, quando do seu discurso em Dezembro de 2019, e que, oportunamente, o actual Chefe do Executivo Ho Iat Seng relembrou na sua intervenção de ontem. Contudo, não basta analisar e relembrar: antes de mais, é preciso executar.

Em primeiro lugar, o Presidente sublinhou a necessidade de “melhorar a qualidade da governação”, nomeadamente através da modernização dos processos burocráticos, aproveitando o desenvolvimento das novas tecnologias.

Contudo, Xi chamou especialmente a atenção para que o “estado de direito” seja rigorosamente respeitado como “princípio básico da governação” e que, nesse contexto, os melhoramentos se realizem. Isto é, no nosso entender, que não dêem somente privilégios aos privilegiados e que estes encontrem na lei as fronteiras para a sua acção, descartando a possibilidade de inusitadas benesses só para alguns, em geral os mesmos. É que, como dizia o jovem Carson Fong, na nossa edição de ontem, a maior parte da população tem consciência do que realmente se passa nos bastidores.

Em segundo lugar, Xi Jinping referiu a diversificação económica sustentada, sobretudo, nas relações com o exterior, devendo Macau aproveitar as possibilidades criadas pela iniciativa nacional “Uma Faixa, Uma Rota” para potenciar os negócios locais, quer com os Países Lusófonos quer no contexto da Grande Baía. Ao disponibilizar uma enorme fatia de terra na Ilha da Montanha (Henqin), Pequim pouco mais pode fazer para proporcionar aos investidores e empreendedores de Macau possibilidades competitivas, assim aqui exista suficiente visão e capacidade de aproveitar oportunidades de negócio que ultrapassem o âmbito do Jogo e da especulação imobiliária, as duas áreas que têm satisfeito enormemente as ambições financeiras dos privilegiados locais.

Em terceiro lugar, e talvez o mais importante, o Presidente recomendou que se coloque em primeiro lugar a população e a melhoria da sua qualidade de vida. Para Xi, “tem de estar muito claro que o objectivo do desenvolvimento é melhorar a vida das pessoas. Assim, a RAEM precisa de adoptar arranjos institucionais mais justos, mais equilibrados e que beneficiem todos, para que os frutos do desenvolvimento possam ser partilhados por toda a comunidade.” Nós não diríamos melhor, mas, durante anos, insistimos neste discurso. Macau, inexplicavelmente devido ao seu extraordinário PIB per capita, apresenta deficiências nas áreas da saúde, educação, trânsito, habitação, meio ambiente, etc. O dinheiro, por muito tempo, não tem sido alocado à melhoria dos sistemas públicos, nomeadamente na área da saúde, mas deslocado para o privado, servindo os interesses de alguns, ao invés de servir o interesse geral. A demora na construção do Hospital da Taipa é o sintoma mais grave deste problema.

Em quarto lugar, Xi Jinping falou da preservação da harmonia social, entendendo que tal objectivo só pode ser conseguido se o Governo escutar a população através de consultas sobre os problemas prementes, que devem ser resolvidos de forma coordenada e não unicamente por decretos desligados da realidade e das aspirações das pessoas. O Presidente não esqueceu o facto de que na RAEM habitam várias comunidades, sublinhando que “sendo um lugar onde as culturas chinesa e ocidental se encontram, Macau está bem posicionado para promover trocas entre pessoas e aprendizagem mútua entre culturas”.

Oiçam o Presidente Xi, é o nosso voto para a governação de Macau. É que se, segundo ele, “nenhuma força externa tem o direito de nos ditar seja o que for”, também os desejos egoístas de alguns, que unicamente pensam em si e nos seus, não devem ter o direito de condicionar o desenvolvimento de Macau e a melhoria da qualidade de vida da generalidade da população.

Aos 21 anos, a RAEM atinge uma outra maioridade. Tal acontece num momento de crise provocado pela pandemia, mas as crises são também momentos de reflexão e de afastamento de percursos menos próprios. Esperamos que o governo de Ho Iat Seng, como foi ontem prometido no discurso, siga as vias traçadas por Xi Jinping e inaugure agora uma nova era de desenvolvimento conjunto que contemple todos e transforme Macau numa região onde seja permitido que o potencial financeiro e humano disponíveis atinja níveis nunca vistos nesta cidade multicultural que muitos exemplos, de desenvolvimento, cultura e tolerância, tem para dar ao país e ao mundo.

21 Dez 2020

EUA/Eleições | Xi Jinping deu os parabéns pela vitória ao democrata Joe Biden

[dropcap]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, deu ontem os parabéns pela vitória ao Presidente eleito dos EUA, Joe Biden, expressando esperança num espírito de cooperação entre os dois países, para que todos fiquem a ganhar.

A China foi uma das últimas potências a dar os parabéns a Biden, que venceu este mês o republicano Donald Trump nas eleições presidenciais norte-americanas. O Ministério dos Negócios Estrangeiros só o fez no dia 13 deste mês, quase uma semana semana depois de Biden ser anunciado como vencedor, no dia 7.

Os analistas dizem que Pequim pode ter querido evitar tensões nas relações com o Presidente cessante, que ainda não reconheceu publicamente a derrota, alegando a existência de “fraude eleitoral” e pedindo a recontagem de votos.

Na mensagem de parabéns, Xi disse a Joe Biden que relações “saudáveis e estáveis” são a “expectativa comum da comunidade internacional”, de acordo com um comunicado divulgado.

“Esperamos que os dois lados mantenham o espírito de não-conflito e não-confronto, respeito mútuo e cooperação em que todos ganham, focando-se na cooperação, controlando as diferenças e promovendo o desenvolvimento saudável e estável das relações entre a China e os EUA”, pode ler-se no comunicado.

As relações entre China e EUA deterioram-se rapidamente desde que Donald Trump assumiu a presidência.

Os dois países enfrentam uma guerra comercial e tecnológica e disputas em torno da soberania do mar do Sul da China, a questão de Taiwan ou o estatuto de Hong Kong.

Trump classificou a China como uma ameaça à segurança dos EUA e impôs restrições sob as exportações de tecnologia para o país asiático.

Nos últimos meses, a insistência de Trump em apelidar a covid-19 de “vírus chinês” contribuiu para antagonizar as percepções sobre o líder norte-americano no país.

Analistas políticos esperam, no entanto, poucas mudanças na relação bilateral, devido à frustração generalizada nos EUA em questões comerciais e de direitos humanos e a acusações de espionagem e usurpação de tecnologia pela China.

A posse de Biden como 46.º Presidente dos Estados Unidos está marcada para 20 de Janeiro de 2021.

26 Nov 2020

Um novo conceito de cidadania

“The cure for much of what ails our society is active citizen participation. Those who don’t care, those who do nothing, bear enormous responsibility for the suffering in the world.”
Laurence Overmire
The One Idea That Saves The World: A Message of Hope in a Time of Crisis

 

[dropcap]O[/dropcap] fantástico plano chinês para aumentar o investimento e os resultados no sector da Inteligência Artificial (IA) beneficia, na realidade, de um trabalho bastante tradicional, “online”. Para que os algoritmos e máquinas “raciocinem” e processem informação, é necessário que os dados cheguem rapidamente, que sejam muitos e catalogados da forma mais detalhada e precisa possível. Todas as imagens, vídeos e áudio devem ser “etiquetados”, ou seja, associados a um elemento, características e outros dados.

As etiquetas são, por outras palavras, dados inseridos por seres humanos que permitem processar, de uma forma cada vez mais rápida, outros dados. Este é o mundo dos chamados “taggers”. Na China encontraram um nome ad hoc o que pode não ser um bom presságio, conhecidos por “os novos trabalhadores da Foxconn”.

São jovens que encontraram trabalho no degrau mais baixo da pala do boné da “nova era” chinesa, marcada pela presença generalizada da IA. Henan e Guizhou são duas regiões que decidiram centrar tudo no desenvolvimento de novas tecnologias, e em tempos recentes têm sido descritas por muitos jornalistas chineses interessados em estudar este novo fenómeno. Todos os locais visitados parecem semelhantes com pequenos escritórios, em alguns casos caves com poucas pessoas no interior que aceitam a tarefa de alimentar a IA. Trabalhadores que ao longo de um dia vêem milhares de imagens, etiquetando tudo. Olham para uma fotografia num ecrã e afixam etiquetas manualmente, vêem um vídeo e pregam etiquetas, ouvem um áudio e colocam etiquetas.

As etiquetas servem para qualquer coisa, desde o rosto de uma pessoa, estrada, longa fila de carros, panoramas e lugares até animais. Tudo passa através das etiquetas dos etiquetadores. Só graças a eles é que o mundo da Internet das coisas se poderá realizar num futuro próximo. Só desta forma os carros sem condutores poderão viajar, se conseguirão controlar à distância todos os aparelhos em casa ou usar a sua face para pagar, reservar ou comprar. Só então é que as câmaras inteligentes poderão fazer o seu trabalho. É “um processo de aprendizagem cognitiva que exige que os seres humanos rotulem os alimentos” e “por mais extravagante e por mais poderosa que seja a empresa, não se pode viver sem grandes quantidades de dados supervisionados e processados. E como sempre acontece num sistema capitalista, há os que vão utilizar (pessoas, empresas e Estados) os serviços feitos por outras pessoas para os tornar cada vez melhor.

Na China um “datatagger” pode também processar quarenta fotos por dia, ganhando dez yuans por hora, cerca de um euro, ou seja um salário mensal total de trezentos euros. Tal como nos primeiros tempos das fábricas de iPhone da Foxconn, que simbolizavam o papel da China no extremo inferior da cadeia de valor da produção global, a revolução da IA criou uma nova vaga de empregos de mão-de-obra intensiva. Acontece que por detrás da indústria mais avançada do país estão os novos fatos azuis do mundo hitech. O centro da marcação de dados, como a maioria das actividades da “Big Data” é Guizhou, uma das regiões mais pobres que se tornou um centro tecnológico global.

O mundo dos identificadores de dados é também constituído por centenas de estudantes de escolas profissionais que lotam as novas fábricas após as aulas e se sentam em frente a ficheiros informáticos para etiquetar fotografias e analisar a linguagem humana. Mas mesmo este negócio capaz de atrair muitos recém-formados, não exigindo especialização, está a mudar-se para outras áreas do país, como Shandong, Henan, Hebei e Shanxi, onde os custos de mão-de-obra são mais baixos. No entanto, as actividades que têm lugar nesta periferia do mundo tecnológico da China são cruciais para que a IA artificial cumpra as suas promessas.

A importância destes trabalhadores é reconhecida pelas próprias empresas tal como a Basic Finder que está entre as empresas de etiquetagem que prosperam no mercado da “Big Data”, e tem clientes que vão desde universidades americanas como Berkeley, aos projectos de veículos não tripulados do Vale do Silício até aos líderes chineses de IA SenseTime e iFlytek. As encomendas do estrangeiro representam cerca de 30 por cento do negócio total. A China lançou o “Next Generation Artificial Intelligence Development Plan (Plano de Desenvolvimento de Inteligência Artificial da Próxima Geração) ” desde 2017. O plano prevê três fases, a serem concluídas em 2030. O objectivo é ambicioso pois até 2030 as teorias, tecnologias e aplicações de IA da China viajarão pelo mundo, fazendo do país o centro líder mundial de inovação neste campo. Encontram-se actualmente na fase que terminará em 2020.

O plano foi criado pelo governo chinês e prevê a promoção do desenvolvimento de uma nova geração de indústria de IA. O projecto planeia concentrar-se em alguns aspectos, em particular, nos “Veículos Ligados Inteligentes” ou mesmo carros auto-conduzidos (carros sem condutor), um dos objectivos mais defendidos tanto pelos Estados Unidos como pela China (e no qual a corrida para o 5G terá uma forte influência). Depois há todo o sector da robótica, reconhecimento facial e assistentes de voz pessoais. Quase todos os peritos e analistas concordam em enfatizar a incrível força chinesa, derivada de um dado objectivo que é a quantidade e a velocidade do processamento de dados.

O “Financial Times” de 1 de Maio de 2018, num artigo intitulado “China and US compete to dominate Big Data”, resumiu a vantagem competitiva da China no caso de uma empresa sediada em Shenzhen, Malong Technologies, que treinou os seus algoritmos de reconhecimento de imagem em massa de dados chineses, analisando centenas de milhares de fotos de desfiles de moda para identificar tendências na indústria do vestuário, e está a experimentar esta tecnologia com empresas de comércio electrónico nos Estados Unidos.

O mercado chinês é grande e a sua segmentação torna-se fundamental para as empresas de moda ansiosas por se estabelecerem num mercado tão vasto e lucrativo, mas pouco conhecido (e isto também foi demonstrado por incidentes ao longo do caminho, como o da Dolce e Gabbana, cujo vídeo publicitário lançado na China em 2018 irritou o público, criando um caso diplomático, um boicote contra a empresa, e finalmente forçando os dois designers a uma retumbante sessão de desculpas, com um vídeo que deu a volta ao mundo).

A diferença chave é de que há mais pessoas, dados e empresas e tendo acesso a estes dados na China, pode-se exportar toda essa tecnologia para o mundo. Muitos dados e uma disposição para os conceder, num país onde as pessoas encomendam, compra, pagam e jogam online, deixando enormes impressões de dados que depois permitem aos internautas visar com precisão anúncios e promoções. Em 1769 Wolfgang von Kempelen, barão e engenheiro, para satisfazer o deleite de Maria Teresa da Áustria e da sua corte, construiu o chamado “mecânico turco”, também chamado “jogador automático de xadrez”. Era um objecto apresentado como uma máquina, capaz de raciocinar e escolher as melhores jogadas durante um jogo de xadrez.

O “turco” parecia um homem de origem do Médio Oriente, incluindo um turbante, e era acompanhado por uma espécie de “torre” como um computador pessoal, cheio de cabos e fios. Este objecto foi apresentado como sendo movido e animado por uma forma de IA, capaz de derrotar praticamente qualquer pessoa no xadrez. Entre os famosos perdedores estava até Napoleão. Com a morte do barão “inventor”, a estrutura foi comprada pelo austríaco Johann Nepomuk Maelzel, que continuou a trazer o “ mecânico turco” e a espantar os círculos aristocráticos da época. Não que as dúvidas e rumores não se tivessem insinuado sobre o verdadeiro poder “artificial” do “mecânico turco”, mas para o bem ou para o mal o truque funcionou até 1826, quando um certo Edgar Allan Poe se interessou pelo caso e ficou tão apaixonado que publicou no final das suas investigações e análises um longo artigo no qual revelou o engano escondido no seio do chamado “mecânico turco”.

Através de um raciocínio dedutivo, que Poe utilizaria mais tarde em alguns dos seus romances mais famosos, o famoso escritor demonstrou que dentro da estrutura, na realidade, havia um homem em carne e osso. O “mecânico turco” tinha sido uma atracção durante muito tempo, captando muita atenção porque se apresentava como uma forma misteriosa de IA derivada de uma máquina. Na realidade era um engano, mas a imaginação desencadeada por essa história encontrou a sua transfiguração no nosso tempo, operada não menos do que pela Amazon. Assim, Jeff Bezos em 2005 criou o Amazon Mechanical Turk, um serviço de micro-empregos digital. É um nome que envolve toda uma série de referências cruzadas e refere-se ao “mecânico turco” e ao seu embuste, quase como que para admitir que nem mesmo o que chamamos de IA é realmente artificial.

Na realidade não é, como vimos no caso dos “etiquetadores”. De acordo com muitos testemunhos, é antes o conjunto de actividades destinadas a facilitar ou ensinar as máquinas a melhorar todos os dias. É outra forma de IA só aparentemente independente do trabalho de homens reais, de facto, as pessoas que alimentam todo o mecanismo não estão fechadas numa espécie de armadura, mas sim em cubículos, nos quartos das suas casas ou os afortunados em espaços modernos de co-trabalho. Naturalmente, estes são trabalhos alienantes e mal remunerados. A mecânica turca da Amazon está encarregada de reconhecer imagens, transcrever áudios, melhorar a pronúncia e a dicção das máquinas. Actualmente, no mundo, há pelo menos quinhentos mil trabalhadores empregados neste tipo de serviços.

Mas não é tudo tal como testemunharam “mecânicos turcos” ao serviço da Amazon, há muito mais, porque estes novos trabalhadores cognitivos também respondem a inquéritos intermináveis sobre o consumo de bebidas energéticas, questionários sobre como passar o seu tempo livre, se preferem um acampamento na Austrália ou se acham que é melhor o quarto de cama e pequeno-almoço na cidade vizinha, se acham que um determinado produto é suficientemente publicitado. Os dados são a nova grande riqueza, o produto real, o valor a extrair, o novo ouro a conquistar. Os grupos de investigação científica são outra face desta história.

Para obterem dados rapidamente, confiam na Amazon e contribuem assim para um novo tipo de exploração.
Os “mecânicos turcos” são na sua maioria índios e americanos e o “pagamento” não é para todos em dinheiro pois alguns são pagos em vales, na Amazon. Provavelmente também alguns emigrantes chineses para os Estados Unidos têm feito parte deste sistema. Aparentemente, de facto, os chineses empregados no Vale do Silício estão a regressar à China para aproveitar ao máximo o potencial do mundo digital desejado por Pequim. Se o WeChat, de facto, é um catalisador dos trabalhadores digitais reconhecidos no mundo, o SenseTime é o porta-estandarte do recente impulso chinês à IA e uma das razões pelas quais tantos emigrantes chineses especializados em IA regressaram a casa.

O aplicativo é de facto considerado o mais futurista no que diz respeito ao reconhecimento facial, mas tem de lidar com o controlo rigoroso que o Estado quer ter sobre esses dados como é natural. A condição dos trabalhadores digitais chineses não pode ser compreendida se não considerarmos as características do contexto que caracterizam o sistema económico nacional com as aberturas da era pós-maoísta (finais dos anos de 1970) que acabaram por criar mecanismos neoliberais, mas “controlados” pelo Estado. As empresas que produzem aplicações, de facto, devem equipar-se para que os conteúdos que “passam” através da sua plataforma reflictam a vontade do governo. A classe dos trabalhadores digitais encontra-se, portanto, sobrecarregada pela dinâmica do mercado ultraliberal onde o Estado tem forçosamente de orientar estes processos o que significa altas taxas de trabalho. Aos olhos ocidentais pode parecer uma contradição, mas não aos olhos dos chineses, habituados ao “socialismo de mercado”; um aspecto importante a ter em mente também para o Ocidente, que está cada vez mais empenhado em relacionar-se com empresas chinesas com uma ligação muito forte com o governo.

Em 2015, em Dongguan, a cidade emblemática da “fábrica do mundo” da China, onde foi produzida a maioria dos bens que conhecemos como “fabricados na China”, nasceu a primeira fábrica sem humanos, como parte de um projecto maior definido pelas autoridades chinesas como “Substituição de Humanos por Robôs”. Os efeitos desta corrida à automatização, sancionada pelo projecto pretendido pelo presidente Xi Jinping “Made in China 2025” (ou seja, a tentativa da China de inovar dez sectores industriais estratégicos para se tornar líder mundial em sectores tecnológicos chave), parecem estar a dar os primeiros frutos. De acordo com dados emergentes de um relatório da China Development Research Foundation, a automação substituiu até 40 por cento dos postos de trabalho em algumas empresas chinesas nos últimos três anos, destacando os efeitos do impulso do governo cebtral para se tornar uma superpotência mundial em IA.

Em alguns dos principais centros de produção de exportação chineses, 30 a 40 por cento da mão-de-obra foi reduzida em resultado da automatização. O “sonho chinês” do Presidente Xi Jinping de uma China com cada vez mais automatização, utilização de “Big Data” e IA fornece outros exemplos dignos de genialidade.

Em Maio de 2018, o primeiro “banco robô” abriu em Xangai, sem empregados humanos e tal como noticiado pela imprensa internacional, Xiao Long, ou “Pequeno Dragão”, não é o empregado típico, é um robô, o protagonista do primeiro balcão bancário totalmente automatizado e sem recursos humanos e fala com os clientes, aceita cartões bancários, cheques e pode responder a perguntas básicas.

Após uma breve conversa inicial com Xiao Long, os clientes passam por pontos electrónicos onde os seus rostos e cartões de identificação são digitalizados. O exemplo perfeito da IA, reconhecimento facial como elemento suficiente para entrar no banco e permitir que o robô tenha toda a informação necessária. É ainda de considerar mais uma das aplicações de maior sucesso na China, listada na bolsa de valores e pronta para aterrar em todo o Sudeste Asiático, o Ping An Good Doctor, a aplicação que liga os utilizadores a uma rede de 40000 médicos em todo o país através de uma aplicação móvel e utiliza um assistente de IA para tratar de questões gerais dos pacientes.

O modelo de negócios da empresa atraiu investimentos de fundos soberanos de vários países como o Canadá, Singapura, Estados Unidos e Japão. O que emerge deste cenário é que as novas tendências no mundo do trabalho na fase mais avançada do capitalismo devem agora ser procuradas na China. Será dentro do poder chinês que o mundo do trabalho, tanto o tradicional que terá de lidar com o avanço da automação, como o ultra-precioso da economia gigante encontrará novas ferramentas e novos conflitos para enfrentar. E o trabalho não será o único instrumento de afirmação social, porque graças à tecnologia pode-se reivindicar o direito de decidir, quem pode e quem não pode trabalhar. A IA, super-apps e cidades inteligentes, o resultado do trabalho de milhões de pessoas, está a delinear um novo conceito de cidadania.

25 Nov 2020

Xi Jinping rejeita que a China queira desassociar-se economicamente dos EUA

[dropcap]O[/dropcap] Presidente da China, Xi Jinping, rejeitou hoje sugestões de que o seu país procurará desassociar-se economicamente dos Estados Unidos e outros parceiros comerciais, numa altura de crescentes tensões em torno do comércio e tecnologia.

Numa intervenção ‘online’ durante uma reunião com executivos da região Ásia Pacífico, Xi prometeu continuar a abrir o mercado chinês, mas não anunciou nenhuma iniciativa para responder às reclamações de que o Partido Comunista subsidia indevidamente as empresas chinesas, enquanto as protege da competição externa.

Xi rejeitou as sugestões de que Pequim poderia responder às sanções dos EUA contra as suas empresas de tecnologia libertando-se da ligação a parceiros globais, visando a auto-suficiência.

O Partido Comunista promoveu os seus próprios padrões tecnológicos, ao bloquear o acesso de firmas estrangeiras à rede doméstica. Isto gerou temores de que os mercados mundiais se possam dividir em segmentos menores, com padrões industriais incompatíveis, prejudicando a produtividade.

“Nós nunca iremos recuar na História e tentar separar-nos ou formar um ‘pequeno círculo’ para manter os outros de fora”, disse Xi.

O evento de hoje ocorreu na véspera da reunião entre os líderes da Organização de Cooperação Económica Ásia-Pacífico (APEC) organizada pela Malásia.

Os comentários de Xi seguiram-se à assinatura, no domingo, do maior acordo de livre comércio do mundo, a Parceria Económica Compreensiva Regional, que inclui a China e 14 países asiáticos.

O acordo atrai outros países em desenvolvimento porque reduz as barreiras ao comércio de produtos agrícolas, bens manufaturados e componentes.

O documento é, no entanto, pouco abrangente para serviços e acesso de empresas estrangeiros nas economias de cada país, um objetivo dos Estados Unidos e outras nações desenvolvidas.

A administração de Donald Trump cortou o acesso do grupo chinês de tecnologia Huawei à maioria dos componentes e tecnologia dos Estados Unidos, por motivos de segurança.

A Casa Branca está ainda a pressionar o proprietário chinês do serviço de vídeo TikTok a vender a sua operação nos Estados Unidos.

Xi prometeu reduzir taxas alfandegárias, mas não deu detalhes.

“Vamos reduzir ainda mais as taxas alfandegárias e custos burocráticos, cultivar uma série de zonas de inovação e promoção do comércio de importação, e expandir as importações de produtos e serviços de alta qualidade de vários países”, prometeu.

As repetidas promessas da China de estabelecer zonas de comércio livre e aliviar as restrições às importações geraram reclamações por parte dos Estados Unidos, Europa, Japão e outros parceiros comerciais, de que Pequim está a usar essas medidas isoladas para evitar cumprir com as promessas feitas quando aderiu à Organização Mundial do Comércio, em 2001, de permitir às empresas estrangeiras competirem livremente na sua economia, nos setores bancário, financeiro e outros serviços.

19 Nov 2020

BRICS | Xi Jinping defende Acordo de Paris e promete ajuda na recuperação económica

[dropcap]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, defendeu o Acordo de Paris sobre o clima e prometeu que o seu país se integrará mais activamente na recuperação da crise económica provocada pela pandemia de covid-19.

Durante uma reunião por videoconferência dos líderes dos países BRICS (sigla em inglês para o grupo de países que inclui Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), Xi Jinping disse acreditar que é necessário “cumprir o Acordo de Paris com base no princípio da responsabilidade comum”, duas semanas depois de os EUA se terem retirado oficialmente desse tratado.

“Anunciei recentemente na ONU a decisão da China de aumentar as suas contribuições voluntárias nacionais para que as nossas emissões de CO2 diminuam até 2030 e sejamos um país neutro em carbono até 2060”, disse o líder chinês.

“Temos de alcançar a harmonia entre o homem e a natureza. O aquecimento global não parou porque há uma pandemia”, explicou o Presidente chinês.

Xi Jinping deixou ainda a promessa de que o seu país se aplicará no mercado global, “para impulsionar a recuperação económica”, perante os efeitos da pandemia de covid-19.

“A economia global está a passar pela sua pior recessão desde a Grande Depressão, na década de 1930, e a abertura e a inovação são necessárias para alimentar a recuperação global. A China estará mais activamente integrada no mercado global, para criar mais oportunidades e contribuir para a recuperação”, disse o Presidente chinês, durante a cimeira dos BRICS.

Estabilidade e segurança

Xi também prometeu “aprofundar a solidariedade e a cooperação” para “enfrentar os desafios da pandemia”, e observou que várias empresas chinesas estão a participar na terceira fase dos testes clínicos das suas vacinas, na Rússia e no Brasil, acrescentando que espera também cooperar a esse nível com a África do Sul e com a Índia.

“Temos de olhar para o futuro juntos”, concluiu o Presidente chinês, apontando para a necessidade de abordagens multilaterais para os grandes problemas mundiais.

A 12.ª cimeira dos BRICS, que tem por tema a “estabilidade global, segurança comum e crescimento inovador”, esteve marcada para Julho, em São Petersburgo, na Rússia, mas foi adiada para agora, devido à pandemia, estando a realizar-se em formato de videoconferência.

A cimeira é liderada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, contando ainda com a presença, para além de Xi Jinping, do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, do Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, e do Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro.

17 Nov 2020

ASEAN | Países da Ásia-Pacífico assinam um dos maiores acordos comerciais de sempre

No domingo foi assinado um dos maiores acordos de comércio de sempre abrangendo uma área com 2,2 mil milhões de habitantes e quase 30 por cento do comércio mundial. O acordo junta a China e 14 países da região, incluindo Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia e estabelece regras para transaccionar bens e serviços, investimento externo e regulação de mercados de comércio electrónico e propriedade intelectual

 

[dropcap]P[/dropcap]arceria Económica Abrangente Regional (RCEP, na sigla em inglês). Este é o nome do histórico acordo comercial assinado no domingo, enquanto o resto do mundo, em particular o ocidente, está mergulhado em assuntos internos, debates infinitos entre ciência e direitos fundamentais no combate à pandemia e o ressurgimento de movimentos políticos radicais.

O maior acordo comercial do mundo em termos de Produto Interno Bruto (PIB) junta os países da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), agregando 2,2 mil milhões de pessoas oriundos de países que representam 28 por cento de todo o comércio global.

O RCEP, que abre caminho para a criação de uma zona livre de comércio, abrange dez economias do sudeste asiático (Indonésia, Tailândia, Singapura, Malásia, Filipinas, Vietname, Birmânia, Camboja, Laos e Brunei), China, Japão, Coreia do Sul, Nova Zelândia e Austrália.

Após cerca de oito anos de negociações, o acordo foi assinado no domingo, durante a cimeira anual da ASEAN. Numa cerimónia por vídeo conferência, que acabou por não incluir a Índia na lista de signatários, depois da saída do Governo de Narenda Modi, os líderes dos países signatários acolheram o acordo como uma nova esperança de recuperação das economias fortemente afectadas pela pandemia.

No final das negociações, o primeiro-ministro do Vietname, Ngueyen Xuan Phuc, era um homem satisfeito. “Estou muito feliz por poder anunciar que, depois de oito anos de trabalho intenso, conseguimos concluir as negociações do RCEP, que está pronto para ser assinado. Este é o maior acordo de comércio livre do mundo e é uma mensagem forte na afirmação da ASEAN como líder no apoio aos sistemas de mercado multilateral.

Cria uma nova estrutura de comércio na região, permite a facilitação comercial, revitaliza as cadeias de abastecimento destabilizadas pela covid-19 e é instrumental na recuperação pós-pandemia”, apontou o líder do país anfitrião da cimeira, citado pela agência Associated Press.

Outros tratados

Numa declaração conjunta, os líderes dos países-membros afirmaram que o RCEP seria um ponto crucial nas estratégias nacionais para recuperar economicamente, depois da paralisia global ditada pela pandemia da covid-19. “O acordo demonstra o nosso forte compromisso em implementar políticas de recuperação económica, com o apoio ao desenvolvimento, criação de emprego, ao fortalecimento das cadeias de abastecimento regionais, assim como o nosso empenho em garantir um acordo de comércio e investimento baseado em regras claras, aberto e inclusivo”, aponta a declaração.

Feitas as contas, os PIBs dos países signatários juntos representam 30 por cento do PIB global, valor que poderia ser ainda mais substancial caso a Índia tivesse permanecido nas negociações, alargando a aplicação do tratado a mais 1,4 mil milhões de pessoas. Porém, o Governo de Narendra Modi levantou dúvidas quanto aos riscos que o acordo poderia representar para a indústria e o sector agrícola da Índia.

Ainda assim, a declaração conjunta dos signatários deixou uma porta aberta para a Índia se juntar ao RCEP no futuro, sublinhando que seria “bem-vinda”.

Apesar de não conferir o mesmo nível de integração verificado na União Europeia, ou mesmo no Acordo entre Estados-Unidos, México e Canadá, o RCEP dá passos importantes na remoção de barreiras comerciais, assim como na expansão da influência de Pequim na economia mundial.

O acordo irá baixar as tarifas de importações entre os países-membros, que já por si eram reduzidas, ao longo do tempo, mas, acima de tudo, tem implicações de grande carácter simbólico, depois da saída dos Estados Unidos da Parceria Transpacífica, uma das primeiras medidas da Administração Trump. O novo tratado materializa a afirmação regional de que o compromisso nos esforços multilaterais é para manter, com vista a estabelecer o mercado livre como a fórmula para a prosperidade.

Em contrapartida, ao contrário de outros tratados, como o estabelecido com a UE, o RCEP não define padrões unificados de direitos laborais e de metas ambientais, nem obriga os signatários a abrir os seus mercados em áreas económicas vulneráveis internamente.

Na sombra das eleições

O momento da assinatura do RCEP é algo que também merece atenção, pouco depois da vitória de Joe Biden nas eleições presidenciais, de quem se espera uma mudança de 180 graus na gestão da política externa dos Estados Unidos, depois de Trump ter relegado a posição geoestratégia de Washington para segundo plano.

Durante a campanha eleitoral, e tendo em conta o discurso de Biden muito virado para a reconstrução e “salvação” interna dos Estados Unidos, fortemente assolados pela pandemia, foram muitos os analistas a mostrar cepticismo perante a possibilidade de o democrata querer restituir o tratado transpacífico, ou mesmo revogar sanções aplicadas à China. Uma das críticas mais comuns aos acordos de comércio livre é que resultam em desemprego em países mais desenvolvidos, à medida que os centros de produção são deslocados.

Depois de recuperar os votos do Michigan e da Pensilvânia, é improvável que Biden deite a perder a fé depositada pelos eleitores nestas zonas altamente industrializadas regressando à Parceria Transpacífica. No entanto, a crescente influência de Pequim pode levar os Estados Unidos a firmar acordos “avulsos” com países do sudeste asiático.

Vantagem de Xi

“É a vitória do multilateralismo e do mercado livre”, foi assim que o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, descreveu o RCEP. “O proteccionismo e o unilateralismo estão em crescimento, provocando sérios impactos na economia mundial, desafiando os regimes de comércio multilateral e expondo fraquezas económicas”, disse, citado pela agência Xinhua.

O governante teceu rasgados elogios à capacidade da ASEAN para ocupar o centro decisório económico, com base em regras e princípio, como a não interferência em assuntos internos, a construção de consensos ou respeitando os níveis de conforto de cada país-membro. Li Keqiang destacou o papel da ASEAN para os avanços na região em termos políticos e de cooperação em segurança, economia e desenvolvimento social.

“Este acordo também demonstra que perante desafios, os países devem escolher a via da solidariedade e cooperação, em vez da confrontação e conflito. Devem encarar-se uns aos outros com um espírito de parceria e não recorrendo a políticas económicas egoístas, que apenas favorecem um lado”, acrescentou Li.

Também o vice-ministro do Comércio, Wang Shouwen, adiantou que “o acordo é um novo marco na integração económica do Ásia oriental”, em declarações citadas pela Xinhua. O representante considera que o tratado irá injectar confiança nos mercados da região, melhorar a capacidade dos países-membros para combater com a pandemia e promover a prosperidade.

Por outro lado, o primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, afirmou que o acordo “irá abrir novas portas aos investidores, empresas e agricultores”.

Este acordo cimenta a posição da China enquanto parceiro económico dos países do sudeste asiático, a Coreia do Sul e Japão, colocando Pequim ao leme do comércio regional.

Outra consequência mencionada pelo Governo chinês é que o RCEP marca a primeira vez que a China e o Japão chegam a um acordo bilateral de redução de tarifas, “alcançado um progresso histórico”.

16 Nov 2020

China | Plano quinquenal focado na auto-suficiência e políticas ambientais

Terminou ontem a quinta sessão plenária do Comité Central do Partido Comunista da China que discutiu o plano estratégico do país para os próximos cinco anos (2021-2025). O futuro deve trazer afastamento dos objectivos económicos aferidos pelo crescimento do PIB, corte drástico nas emissões de carbono, auto-suficiência na produção tecnológica, segurança alimentar e aposta no consumo interno

 

[dropcap]N[/dropcap]o clássico “Five Years”, David Bowie canta “the news guy wept and told us the earth was really dying”, traduzido à bruta “o pivot do noticiário disse-nos que a Terra estava a morrer”, restando cinco anos. Ora bem, o facto é que a actualidade mostra um mundo em profunda convulsão, sem estratégia conjunta para problemas globais, com uma pandemia a varrer vidas e recursos. No meio deste cenário, terminou ontem a quinta sessão plenária Comité Central do Partido Comunista da China, com o plano quinquenal em cima da mesa, destinado a traçar o futuro para os anos entre 2021 e 2025.

Apesar de as decisões da cúpula do partido apenas se tornarem públicas, oficialmente, quando a minuta do plano político para os próximos cinco anos for submetida à Assembleia Popular Nacional, que reúne no próximo ano, a estratégia pode ser aferida pelas publicações nos jornais oficiais.

A meta derradeira é a chamada “modernização socialista”, que implicará o rumo das políticas seguidas a nível nacional, provincial, assim como nas empresas controladas pelo Estado.

A agência Xinhua escrevia ontem que “a China é um país que cumpre a sua palavra, assim que ficar estabelecido o plano para os próximos cinco anos, tanto o Governo Central como os governos locais fazem tudo para assegurar a sua implementação”.

Um artigo extenso do jornal oficial Global Times aponta para o afastamento da medida que afere o sucesso económico com base no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Pela primeira vez, desde 2002, Pequim reviu em baixa este ano a previsão de crescimento, que era de 6,5 por cento. Para já, o Global Times cita economistas chineses que perspectivam a perda de importância das metas de crescimento sustentadas no PIB, “mantendo em níveis mais baixos, à volta de 5 por cento, ou mesmo deixando de apontar uma meta específica”.

No mercado financeiro, são esperadas medidas para libertar e baixar taxas de juro de forma a combater a desigualdade no acesso ao crédito, alargando as vantagens alcançadas apenas por grandes empresas estatais que conseguem crédito em bancos públicos, enquanto o sector privado enfrenta grandes dificuldades para conseguir empréstimos em condições vantajosas.

Mudança de ciclo

O jornal indica que o Governo Central pode afastar-se do modelo de crescimento puramente quantitativo, para se focar na optimização estrutural da economia, baseada na inovação e no investimento, “face aos anos difíceis que se avizinham”. Um dos economistas citados, Wang Yiwei, da Renmin University of China, refere “está a ocorrer uma mudança na filosofia dos decisores políticos, porque o crescimento rápido já não é representativo da força da economia chinesa”.

O conceito de “circulação mútua” é outro dos pontos-chave, que Xi Jinping já mencionou em Maio. A estratégia assenta no aprofundamento da “circulação doméstica”, ou seja, na produção, distribuição e consumo suportado por inovação tecnológica doméstica. Este ciclo interno terá o impulso adicional da exportação.

Estes são alguns dos mecanismos de defesa do Governo Central para responder às dificuldades dos próximos 10 a 15 anos, face à possibilidade de intensificar as tensões entra China e Estados Unidos, riscos do ressurgimento da pandemia e uma crise financeira global.

Como se viu no discurso de Xi Jinping em Shenzhen, um dos motores da economia é a aposta na inovação tecnológica, missão que se tornou ainda mais urgente desde as medidas restritivas à tecnologia chinesa, com imposições dos Estados Unidos a cortar a oferta de componentes essenciais as empresas como a Huawei.

Como tal, é expectável que surja a aposta na produção de semicondutores, no desenvolvimento da tecnologia de telecomunicações 5G, computação em nuvem, veículos autónomos, robótica fabril e inteligência artificial.

Varas de porcos

Uma das aparentes e mais ousadas propostas que podem sair do plano quinquenal é a entrada na classe média de mil milhões de chineses, algo que a Xinhua descreve como fruto “da magia dos planos quinquenais da China, sustentados na continuidade”.

A agência oficial aponta a redução da pobreza como um exemplo de política de longo prazo, implementada desde os anos 1980. “No final de 2019, o número de chineses a viver abaixo do limiar da pobreza desceu para 5,51 milhões, quando em 2012 eram 98,99 milhões. A China está a caminho de erradicar a pobreza extrema até ao fim de 2020, tornando-se no primeiro país do mundo a acabar com a pobreza extrema”, escreveu ontem a Xinhua.

Um dos pontos essenciais será garantir segurança alimentar, principalmente depois de o país ter atravessado problemas devido à escassez de carne de porco, resultante do surto de peste e das disrupções provocadas pela guerra comercial. Assim sendo, Pequim vai tentar assegurar a reconstrução da reserva de cereais, promover a produção doméstica de produtos agrícolas, diversificar o leque de abastecedores internacionais e repor os stocks de carne de porco.

Outra meta ousada do Governo Central é corrigir os desequilíbrios em termos de oportunidade entre populações rurais e urbanas, nomeadamente através da abertura para fixação de residência de cidadãos oriundos de povoações rurais em cidades. A ideia é responder à escassez de mão-de-obra em centenas de cidades chinesas, em vários níveis de desenvolvimento industrial, ao mesmo tempo que se aumenta o consumo.

Por outro lado, serão apresentadas reformas na gestão de terrenos para permitir aos agricultores conseguirem aceder a maiores parcelas de terra, abrindo o mercado imobiliário de propriedades rústicas.

Verdes anos

O Presidente Xi Jinping traçou 2060 como a meta para a China atingir níveis zero de emissões de carbono, algo que deverá sair reforçado no plano quinquenal. O Global Times refere que os objectivos de emissões de carbono devem ser reforçados, com políticas de combate às alterações climáticas, citando fontes do Ministério da Ecologia e Ambiente.

Quanto aos que apontam que a verdadeira aposta da China é o crescimento económico, o Global Times argumenta, categorizando o cepticismo como críticas ocidentais, que a China conseguiu cumprir oito dos nove objectivos ambientais definidos no plano quinquenal anterior. “O objectivo que falta conquistar, assegurar boa qualidade de ar em 337 cidades, durante mais de 84,5 por cento dos dias de 2020, será conseguido como foi planeado”, escrever o jornal oficial.

O artigo publicado ontem no jornal do partido não desperdiça a oportunidade para picar o adversário. “Enquanto a Administração Trump vira as costas às questões ambientais e climáticas, a China atinge grandes progressos e desenvolvimentos na gestão ambiental, sendo expectável que as medidas vigorosas prossigam no 14.º plano quinquenal para atingir a meta da neutralidade de carbono e assumir as responsabilidades de um país central na resposta global à crise climática”.

O vice-ministro da Ecologia e Ambiente, Zhao Yingmin, recordou o trabalho feito nesta matéria, cerca de uma semana antes das reuniões do Politburo. O governante apontou que as emissões de gases com efeito de estufa per capita caíram 18,2 por cento desde 2015, salientando que entre 2016 e 2020 a China alcançou os maiores progressos em termos ambientais.

29 Out 2020

China | Plano quinquenal focado na auto-suficiência e políticas ambientais

Terminou ontem a quinta sessão plenária do Comité Central do Partido Comunista da China que discutiu o plano estratégico do país para os próximos cinco anos (2021-2025). O futuro deve trazer afastamento dos objectivos económicos aferidos pelo crescimento do PIB, corte drástico nas emissões de carbono, auto-suficiência na produção tecnológica, segurança alimentar e aposta no consumo interno

 

[dropcap]N[/dropcap]o clássico “Five Years”, David Bowie canta “the news guy wept and told us the earth was really dying”, traduzido à bruta “o pivot do noticiário disse-nos que a Terra estava a morrer”, restando cinco anos. Ora bem, o facto é que a actualidade mostra um mundo em profunda convulsão, sem estratégia conjunta para problemas globais, com uma pandemia a varrer vidas e recursos. No meio deste cenário, terminou ontem a quinta sessão plenária Comité Central do Partido Comunista da China, com o plano quinquenal em cima da mesa, destinado a traçar o futuro para os anos entre 2021 e 2025.

Apesar de as decisões da cúpula do partido apenas se tornarem públicas, oficialmente, quando a minuta do plano político para os próximos cinco anos for submetida à Assembleia Popular Nacional, que reúne no próximo ano, a estratégia pode ser aferida pelas publicações nos jornais oficiais.

A meta derradeira é a chamada “modernização socialista”, que implicará o rumo das políticas seguidas a nível nacional, provincial, assim como nas empresas controladas pelo Estado.

A agência Xinhua escrevia ontem que “a China é um país que cumpre a sua palavra, assim que ficar estabelecido o plano para os próximos cinco anos, tanto o Governo Central como os governos locais fazem tudo para assegurar a sua implementação”.

Um artigo extenso do jornal oficial Global Times aponta para o afastamento da medida que afere o sucesso económico com base no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Pela primeira vez, desde 2002, Pequim reviu em baixa este ano a previsão de crescimento, que era de 6,5 por cento. Para já, o Global Times cita economistas chineses que perspectivam a perda de importância das metas de crescimento sustentadas no PIB, “mantendo em níveis mais baixos, à volta de 5 por cento, ou mesmo deixando de apontar uma meta específica”.

No mercado financeiro, são esperadas medidas para libertar e baixar taxas de juro de forma a combater a desigualdade no acesso ao crédito, alargando as vantagens alcançadas apenas por grandes empresas estatais que conseguem crédito em bancos públicos, enquanto o sector privado enfrenta grandes dificuldades para conseguir empréstimos em condições vantajosas.

Mudança de ciclo

O jornal indica que o Governo Central pode afastar-se do modelo de crescimento puramente quantitativo, para se focar na optimização estrutural da economia, baseada na inovação e no investimento, “face aos anos difíceis que se avizinham”. Um dos economistas citados, Wang Yiwei, da Renmin University of China, refere “está a ocorrer uma mudança na filosofia dos decisores políticos, porque o crescimento rápido já não é representativo da força da economia chinesa”.

O conceito de “circulação mútua” é outro dos pontos-chave, que Xi Jinping já mencionou em Maio. A estratégia assenta no aprofundamento da “circulação doméstica”, ou seja, na produção, distribuição e consumo suportado por inovação tecnológica doméstica. Este ciclo interno terá o impulso adicional da exportação.

Estes são alguns dos mecanismos de defesa do Governo Central para responder às dificuldades dos próximos 10 a 15 anos, face à possibilidade de intensificar as tensões entra China e Estados Unidos, riscos do ressurgimento da pandemia e uma crise financeira global.

Como se viu no discurso de Xi Jinping em Shenzhen, um dos motores da economia é a aposta na inovação tecnológica, missão que se tornou ainda mais urgente desde as medidas restritivas à tecnologia chinesa, com imposições dos Estados Unidos a cortar a oferta de componentes essenciais as empresas como a Huawei.

Como tal, é expectável que surja a aposta na produção de semicondutores, no desenvolvimento da tecnologia de telecomunicações 5G, computação em nuvem, veículos autónomos, robótica fabril e inteligência artificial.

Varas de porcos

Uma das aparentes e mais ousadas propostas que podem sair do plano quinquenal é a entrada na classe média de mil milhões de chineses, algo que a Xinhua descreve como fruto “da magia dos planos quinquenais da China, sustentados na continuidade”.

A agência oficial aponta a redução da pobreza como um exemplo de política de longo prazo, implementada desde os anos 1980. “No final de 2019, o número de chineses a viver abaixo do limiar da pobreza desceu para 5,51 milhões, quando em 2012 eram 98,99 milhões. A China está a caminho de erradicar a pobreza extrema até ao fim de 2020, tornando-se no primeiro país do mundo a acabar com a pobreza extrema”, escreveu ontem a Xinhua.

Um dos pontos essenciais será garantir segurança alimentar, principalmente depois de o país ter atravessado problemas devido à escassez de carne de porco, resultante do surto de peste e das disrupções provocadas pela guerra comercial. Assim sendo, Pequim vai tentar assegurar a reconstrução da reserva de cereais, promover a produção doméstica de produtos agrícolas, diversificar o leque de abastecedores internacionais e repor os stocks de carne de porco.

Outra meta ousada do Governo Central é corrigir os desequilíbrios em termos de oportunidade entre populações rurais e urbanas, nomeadamente através da abertura para fixação de residência de cidadãos oriundos de povoações rurais em cidades. A ideia é responder à escassez de mão-de-obra em centenas de cidades chinesas, em vários níveis de desenvolvimento industrial, ao mesmo tempo que se aumenta o consumo.

Por outro lado, serão apresentadas reformas na gestão de terrenos para permitir aos agricultores conseguirem aceder a maiores parcelas de terra, abrindo o mercado imobiliário de propriedades rústicas.

Verdes anos

O Presidente Xi Jinping traçou 2060 como a meta para a China atingir níveis zero de emissões de carbono, algo que deverá sair reforçado no plano quinquenal. O Global Times refere que os objectivos de emissões de carbono devem ser reforçados, com políticas de combate às alterações climáticas, citando fontes do Ministério da Ecologia e Ambiente.

Quanto aos que apontam que a verdadeira aposta da China é o crescimento económico, o Global Times argumenta, categorizando o cepticismo como críticas ocidentais, que a China conseguiu cumprir oito dos nove objectivos ambientais definidos no plano quinquenal anterior. “O objectivo que falta conquistar, assegurar boa qualidade de ar em 337 cidades, durante mais de 84,5 por cento dos dias de 2020, será conseguido como foi planeado”, escrever o jornal oficial.

O artigo publicado ontem no jornal do partido não desperdiça a oportunidade para picar o adversário. “Enquanto a Administração Trump vira as costas às questões ambientais e climáticas, a China atinge grandes progressos e desenvolvimentos na gestão ambiental, sendo expectável que as medidas vigorosas prossigam no 14.º plano quinquenal para atingir a meta da neutralidade de carbono e assumir as responsabilidades de um país central na resposta global à crise climática”.

O vice-ministro da Ecologia e Ambiente, Zhao Yingmin, recordou o trabalho feito nesta matéria, cerca de uma semana antes das reuniões do Politburo. O governante apontou que as emissões de gases com efeito de estufa per capita caíram 18,2 por cento desde 2015, salientando que entre 2016 e 2020 a China alcançou os maiores progressos em termos ambientais.

29 Out 2020

Xi Jinping diz que país “não vacilará” perante pressão dos EUA

[dropcap]O[/dropcap] Presidente da China declarou hoje que “chantagens, bloqueios e pressão máxima não levam a lugar nenhum” e que o país jamais “cederá, nem será subjugado”, num aviso velado aos Estados Unidos.

“A China nunca permitirá que nenhuma força viole ou separe o território sagrado”, afirmou Xi Jinping, num discurso proferido no Grande Palácio do Povo, em Pequim, para marcar o 70.º aniversário da chegada à Coreia do Norte dos voluntários chineses que lutaram na Guerra da Coreia (1950-53), para “resistir à agressão norte-americana”.

Sem mencionar o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, Xi denunciou o “unilateralismo, protecionismo e egoísmo extremos”, bem como “atos arrogantes, hegemónicos e hostis, que não levam a lugar nenhum”. “É preciso falar com os invasores na língua que eles conhecem”, afirmou, numa referência à guerra travada há 70 anos.

“Uma guerra deve ser travada para deter a invasão e a violência. Deve ser enfrentada com violência. É necessário vencer para conquistar paz e respeito”, salientou.

Num forte tom nacionalista, Xi Jinping apelou para um “avanço mais rápido” na modernização das forças armadas da China, e à “união na formidável força que une todos os chineses” para que “lidem com os problemas com a cabeça erguida”.

“A China nunca vacilará perante ameaças ou será subjugada. Nós, os chineses, somos firmes e confiantes e olhamos para o futuro com a expectativa do rejuvenescimento desta nação”, garantiu.

As declarações surgem um dia depois do anúncio de uma possível venda de armas dos Estados Unidos a Taiwan, ilha que funciona como uma entidade política soberana, mas que Pequim considera uma província rebelde e sobre a qual afirmou já que não renunciará ao uso da força para conseguir “a reunificação” de Taiwan com o resto da República Popular da China.

O Departamento de Estado norte-americano anunciou a intenção de vender três lotes de armas à ilha, incluindo mísseis SLAM-ER e unidades HIMARS, um sistema de lançamento múltiplo de mísseis.

O negócio está avaliado em 1,8 mil milhões de dólares. China e Taiwan dividiram-se em 1949, quando os nacionalistas se refugiaram na ilha, após perderem a guerra civil para os comunistas, que governam a República Popular da China desde então.

O Presidente chinês lembrou que há 70 anos as tropas chinesas e os norte-coreanos derrotaram os rivais e “destruíram o mito da invencibilidade do Exército dos Estados Unidos”.

“Nós destruímos o plano dos agressores. Após a vitória, os chineses finalmente puderam remover o rótulo de serem ‘os doentes do Leste Asiático'”, apontou.

“Mostrámos ao mundo a coragem das nossas forças armadas para lutar e vencer”, acrescentou, indicando ainda que cerca de 197 mil chineses morreram no campo de batalha. O líder chinês assegurou que a participação da China na Guerra da Coreia mostrou o compromisso com a salvaguarda da paz mundial e apelou aos chineses para “promoverem o espírito dessa guerra”.

Ao mesmo tempo, defendeu que Pequim “não procura a expansão” e “está preparada para trabalhar com o mundo”. “O desenvolvimento pacífico e a cooperação mutuamente benéfica continuam a ser o caminho certo”, reiterou.

A relação entre a China e os Estados Unidos deteriorou-se rapidamente nos últimos dois anos, com várias disputas simultâneas entre as duas maiores economias do mundo. Em Pequim e em Washington, referências a uma nova Guerra Fria são agora comuns.

À guerra comercial e tecnológica ou à luta diplomática e ideológica juntaram-se renovadas tensões em torno de Taiwan ou da soberania do mar do Sul da China.

23 Out 2020

Grande Baía | Xi coloca Shenzhen no centro do projecto de integração

O papel de Shenzhen no projecto da Grande Baía vai ser reforçado. Este foi um dos destaques do discurso do Presidente chinês na cerimónia do 40.º aniversário do estabelecimento da zona económica especial, onde Xi Jinping apelou à criação de incentivos para cativar jovens de Macau e Hong Kong a optarem por Shenzhen para estudar e trabalhar

 

[dropcap]“E[/dropcap]stamos à beira de mudanças sem precedentes neste século e devemos seguir o caminho da autossuficiência, isso significa que devemos tornar-nos independentes na busca pela inovação”, referiu Xi Jinping, citado pela CCTV. O Presidente chinês discursou ontem em Shenzhen, na cerimónia que marcou o 40.º aniversário da zona económica especial, um modelo que o líder referiu como forma de aprofundar a abertura da economia chinesa.

A cidade que serve de hub tecnológico está no centro do projecto da Grande Baía, algo que foi destacado no discurso do Presidente chinês como um factor de união com Macau e Hong Kong. “Devemos continuar a encorajar e a guiar os nossos compatriotas de Hong Kong, Macau e Taiwan, assim como os chineses emigrados, para o importante papel do seu investimento e empreendedorismo como contributos para a abertura, nos dois sentidos, das zonas económicas especiais”, indicou o líder chinês.

Xi Jinping referiu que o Partido Comunista Chinês vai emitir mais de 60 mudanças de política ou novas directrizes para a Shenzhen. Apesar de não dar pormenores, revelou que o objectivo é dar “mais autonomia em áreas importantes”.

Com tal, prometeu relaxar regulamentos para impulsionar novas indústrias e apelou aos empresários e trabalhadores de Shenzhen para que contribuam para o “grande rejuvenescimento da nação chinesa” e a “optimização e actualização da produção”, numa referência às ambições do país em tornar-se um competidor global em sectores de alto valor agregado, incluindo nas telecomunicações, biotecnologia, carros eléctricos ou energia renovável.

Amor profundo

A busca do “aprofundamento da integração” entre os jovens de Macau, Hong Kong e da província de Guangdong é uma prioridade social, entre os meus planos económicos, “para aumentar o sentido de pertença à pátria-mãe”.

Assim sendo, a China deve “utilizar completamente a importante plataforma Guangdong-Hong Kong-Macau para cooperar e atrair mais jovens de Hong Kong e Macau para estudar, trabalhar e viver na pátria-mãe”, indicou Xi Jinping.

Além de destacar o autêntico milagre que transformou Shenzhen, uma vila de pescadores, num hub tecnológico, o Presidente chinês comprometeu-se com a necessidade de estabelecer um sistema de governação que recompense o talento, despromova os medíocres e expulse os incapazes. “Precisamos estabelecer um ecossistema político com determinação para lutar contra a corrupção e derrubar o formalismo e a burocracia institucional. A corrupção será combatida infalivelmente e a burocracia rejeitada. Vamos estabelecer um ecossistema político saudável e correcto”, perspectivou o líder.

“Estou aqui em Guangdong para mostrar à China e ao mundo que o Parido Comunista da China vai continuar firmemente a liderar o povo chinês pelo caminho da reforma e da abertura”, apontou.

14 Out 2020

Shenzhen | Xi Jinping promete apoio ao desenvolvimento de hub tecnológica na China

[dropcap]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, prometeu hoje apoiar o desenvolvimento do maior ‘hub’ de tecnologia da China, numa altura em que os Estados Unidos tentam conter as ambições de Pequim nas indústrias de alto valor agregado.

Xi realizou um discurso por altura do 40º aniversário desde que Shenzhen se abriu à economia de mercado, parte da política de reforma e abertura impulsionada pelo antigo líder chinês Deng Xiaoping.

O chefe de Estado da China prometeu relaxar os regulamentos para impulsionar novas indústrias e apelou aos empresários e trabalhadores de Shenzhen para que contribuam para o “grande rejuvenescimento da nação chinesa” e a “otimização e atualização da produção”, numa referência às ambições do país em tornar-se um competidor global em setores de alto valor agregado, incluindo nas telecomunicações, biotecnologia, carros elétricos ou energia renovável.

“Estamos perante mudanças sem precedentes no espaço de um século e devemos seguir rumo à autossuficiência. Isto significa que devemos tornar-nos independentes no nosso impulso de inovação”, apontou Xi Jinping, citado pela emissora estatal CCTV.

Situada na fronteira com Hong Kong, Shenzhen tornou-se um centro global para o fabrico de componentes eletrónicos e sede das principais firmas tecnológicas do país, incluindo o grupo de telecomunicações Huawei, a fabricante automóvel BYD ou o gigante da Internet Tencent.

Estas empresas enfrentam, no entanto, crescente pressão por parte dos Estados Unidos, que temem perder o domínio industrial em alta tecnologia.

Segundo Xi Jinping, o Partido Comunista Chinês vai emitir mais de 60 mudanças de política ou novas diretrizes. Sem avançar mais detalhes, o líder chinês afirmou que Shenzhen teria “mais autonomia em áreas importantes”.

As duas maiores economias do mundo enfrentam já uma prolongada guerra comercial, que inclui a imposição de taxas alfandegárias sobre centenas de milhares de milhões de dólares das exportações de ambos.

Mas a pressão do Governo norte-americano para que as empresas boicotem entidades chinesas específicas converteu-se num esforço concertado para forçar fornecedores e países terceiros a aderirem a um bloqueio à tecnologia chinesa.

Washington bloqueou o acesso da Huawei a componentes e tecnologia norte-americanos, o que ameaça paralisar as vendas de telemóveis e equipamentos da empresa.

Nos últimos dois anos, a administração de Donald Trump colocou outras 70 empresas chinesas na Lista de Entidades do Departamento de Comércio, limitando o seu acesso a tecnologia norte-americana.

Trump emitiu ainda uma ordem, em agosto passado, que declarou o WeChat, uma aplicação de mensagens instantâneas operada pela Tencent, como ameaça à segurança nacional.

Estas medidas aceleraram a urgência da China em desenvolver tecnologia autónoma, incluindo na produção de ‘chips’ para processadores e outros componentes, no qual Shenzhen desempenha um papel fundamental.

Shenzhen é também uma cidade central no projeto de integração regional apadrinhado por Xi Jinping, a Área da Grande Baía – uma metrópole mundial, que inclui também Macau e Hong Kong e mais oito cidades de Guangdong, através da criação de um mercado único e da crescente conectividade entre as vias rodoviárias, ferroviárias e marítimas.

14 Out 2020

Shenzhen | Ho Iat Seng reúne com Xi Jinping esta semana

[dropcap]X[/dropcap]i Jinping vai marcar presença esta semana na cerimónia do 40.º aniversário da zona económica especial de Shenzhen, de acordo com o South China Morning Post. A agenda das celebrações está centrada nas actividades de quinta-feira, mas o Presidente da República Popular da China pode chegar a Shenzhen já amanhã.

O jornal de Hong Kong dá conta de que Xi tem reunião marcada com Ho Iat Seng e com Carrie Lam, separadamente. A última vez que o Presidente chinês se encontrou com o Chefe do Executivo de Macau foi para lhe dar posse a celebrar a implementação da RAEM, em Dezembro do ano passado.

“A última ordem que tivemos foi para ter tudo pronto na segunda-feira”, referiu uma fonte do South China Morning Post, que adiantou ser expectável que Xi reitere o compromisso com a política de abertura e que indique o sector tecnológico como decisivo no rumo económico da China.

A reunião com Carrie Lam será outro dos pontos altos da semana, no rescaldo da implementação da Lei de Segurança Nacional em Hong Kong, e enquanto estão detidos em Shenzhen 12 residentes da região vizinha, incluindo um cidadão português.

A zona económica especial de Shenzhen “nasceu” a 26 de Agosto de 1980, parte do esforço de Deng Xiaoping de abertura do país ao mundo, apenas dois anos depois do final da Revolução Cultural. A última visita de Xi à cidade aconteceu em Outubro de 2018, quando sublinhou o compromisso com o processo de reforma e continuação da abertura económica, bem como o estabelecimento de uma “cidade socialista exemplar”.

11 Out 2020

ONU | Xi Jinping recusa politização da pandemia

[dropcap]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, considerou esta terça-feira, na ONU, que se deve recusar a politização da pandemia de covid-19 e garantiu que a China “nunca entrará nem numa guerra fria nem numa guerra quente”.

Xi Jinping falava, num discurso pré-gravado, no debate geral da 75.ª sessão da Assembleia Geral da ONU, que decorre na sede da organização, em Nova Iorque, sem uma referência explícita aos Estados Unidos, cujo Presidente, Donald Trump, exigiu às Nações Unidas, no mesmo fórum, que peçam responsabilidades à China pela actuação de Pequim na fase inicial da expansão da pandemia do novo coronavírus.

“A China é o maior país em vias de desenvolvimento que sempre seguiu um caminho pacífico e de cooperação. Nunca pretendemos lutar pela hegemonia nem pela expansão e nunca procuraremos as supostas tentativas de influência”, afirmou o chefe de Estado chinês.

“Não temos a intenção de entrar numa guerra fria ou numa guerra quente com nenhum país. Pelo contrário, persistimos em ultrapassar as diferenças através do diálogo e solucionar as disputas através de negociações”, acrescentou.

Sem nunca se referir aos Estados Unidos ou ao nome do Presidente norte-americano, Xi Jinping mostrou-se contra o protecionismo e unilateralismo e foi ao encontro das palavras do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, ao defender o multilateralismo e a concertação de posições para ultrapassar as divergências.

“A politização da pandemia deve ser recusada e temos o imperativo de criar uma visão aberta e inclusiva, contra o protecionismo e contra o unilateralismo”, observou, salientando que se deve também “repudiar as disputas ideológicas, ultrapassar as armadilhas do choque das civilizações e respeitar mutuamente o caminho de cada país”.

Garantindo que Pequim está a colaborar com várias instituições científicas para se encontrar uma vacina eficaz para combater a covid-19, Xi Jinping lembrou que a própria China já está na fase final de ensaios clínicos para assegurar esse objetivo.

“Assim que estiverem disponíveis, iremos oferecê-las como bens públicos globais, priorizando os países em vias de desenvolvimento”, afirmou, referindo que Pequim irá também “cumprir o compromisso” de, nos próximos dois anos, oferecer 2.000 milhões de dólares para programas destinados à agricultura, alívio da pobreza, educação, mulheres, crianças e alterações climáticas.

Para o Presidente chinês, a prioridade passa por apoiar os países em desenvolvimento, sobretudo os africanos, e promover o alívio da dívida.

“A covid-19 não será a última crise da humanidade e devemos estar preparados para combatermos juntos os eventuais desafios globais. A pandemia lembra-nos que vivemos numa aldeia global interconectada e interdependente. (…) e mostra-nos que a globalização económica é uma realidade objetiva e uma corrente histórica. Não se pode meter a cabeça na areia, como a avestruz”, sublinhou.

Para Xi Jinping, a covid-19 demonstra que a humanidade “necessita de uma revolução” para propiciar formas ecológicas de promover o desenvolvimento e a construção da civilização ecológica, dando o exemplo chinês, cujas medidas ambientais vão permitir atingir as metas mínimas de dióxido de carbono antes de 2030 e materializar a neutralidade do carbono antes de 2060.

Já a nível internacional, o Presidente chinês anunciou que a China vai oferecer 50 milhões de dólares ao Plano Mundial de Resposta Humanitária ao covid-19 das Nações Unidas, e idêntico montante, a terceira contribuição, ao Fundo Fiduciário de Cooperação Sul/Sul entre a China e a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).

Anunciou também a expansão, a partir de 2025, e por mais cinco anos, do programa ligado ao Fundo para a Paz e Desenvolvimento China/ONU e que Pequim vai instalar um Centro Global de Conhecimento e Inovação Geoespacial das Nações Unidas e um Centro Internacional de Investigação de Macrodados também na sede da organização.

A semana de alto nível na Assembleia Geral da ONU começou esta terça-feira, num formato sem precedentes nos 75 anos da organização, em que os discursos de chefes de Estado e de Governo será feita por vídeos previamente gravados, devido à pandemia.

23 Set 2020

Presidente chinês apela à cooperação e ao fim da “mentalidade de Guerra Fria”

[dropcap]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, pediu esta segunda-feira, perante as Nações Unidas, para que os países abandonem a “mentalidade de Guerra Fria” e apostem na cooperação, na era pós-covid-19.

“A mentalidade da Guerra Fria, as linhas ideológicas ou os jogos onde ninguém ganha não são solução para os problemas de um país e muito menos uma resposta aos desafios conjuntos da humanidade”, sublinhou Xi, na sua intervenção por vídeo, na cimeira do 75º aniversário da ONU.

Em pleno conflito com os Estados Unidos, o dirigente chinês defendeu que é preciso “substituir o conflito pelo diálogo” e procurar interesses comuns entre as nações, destacando que todos os países devem actuar com respeito mútuo e sob o princípio da igualdade.

“Nenhum país tem o direito de dominar os negócios globais, controlar o destino dos outros ou ficar com todas as vantagens do desenvolvimento. Muito menos se deve permitir fazer o que bem entende e ser uma potência hegemónica, o bandido ou o dono do mundo”, disse o Presidente chinês, numa uma mensagem destinada aos Estados Unidos.

Xi insistiu que “o unilateralismo é um beco sem saída” e defendeu que as vozes do mundo em desenvolvimento devem estar mais representadas na ONU, já que refletem os interesses da maioria dos estados.

O Presidente chinês destacou ainda as conquistas das Nações Unidas, desde a sua fundação em 1945, mas avisou que o mundo agora enfrenta vários desafios que representam um grande teste, incluindo o “ataque repentino da covid-19”, referindo-se à pandemia.

“O mundo enfrenta agora um novo ponto de partida histórico”, disse Xi, que pediu renovação, no momento que sucede à pandemia, bem como o compromisso com o multilateralismo e o trabalho a benefício de todos.

Além de falar na cimeira que marca o 75º aniversário, o Presidente chinês volta a intervir terça-feira com um discurso mais abrangente, no dia de abertura da Assembleia Geral da ONU.

21 Set 2020

Covid-19 | Xi Jinping diz que China passou “teste histórico” ao superar a doença

[dropcap]O[/dropcap] Presidente chinês defendeu hoje que a China passou o “teste histórico” do novo coronavírus, após ter erradicado a doença do seu território, numa altura em que já matou cerca de 900 mil pessoas em todo o mundo.

A propaganda oficial do regime celebra há vários meses a gestão do Partido Comunista Chinês (PCC) do surto, inicialmente detetado no país, em dezembro passado.

A China registou, oficialmente, 4.634 mortes desde o início da epidemia, e há 23 dias consecutivos que não soma casos de contágio local.

O Presidente chinês, Xi Jinping, distinguiu hoje quatro “Heróis do Povo” que estiveram na luta contra a doença, perante centenas de convidados, no Grande Palácio do Povo, junto à Praça Tiananmen, em Pequim.

“Travámos uma grande batalha contra a epidemia, que acabou por ser dura para todos. Passámos por um teste histórico e extremamente difícil”, disse Xi Jinping. “Estamos agora na vanguarda mundial em termos da recuperação económica e na luta contra a covid-19”, apontou.

A China “ajudou a salvar um grande número de vidas em todo o mundo com ações concretas”, disse Xi, apontando para a exportação de 209.000 ventiladores, 1,4 mil milhões de fatos de protecção e 151 mil milhões de máscaras. A China também enviou equipas de médicos para ajudar alguns países.

A China é acusada pelos Estados Unidos de negligência na gestão da fase inicial do vírus e de ter ocultado a gravidade da doença, inicialmente detetada na cidade chinesa de Wuhan, no centro do país.

Uma posição que foi criticada por Xi Jinping: “qualquer ato egoísta, qualquer rejeição da responsabilidade para acusar os outros e qualquer distorção dos fatos” podem “causar danos” à sua própria população e ao resto do mundo, advertiu.

A cerimónia de hoje começou com um minuto de silêncio em homenagem aos mortos. Se o novo coronavírus foi detectado pela primeira vez na China, Pequim ressaltou que a sua origem não foi comprovada cientificamente.

Nenhuma menção foi feita durante a cerimónia ao médico Li Wenliang, de Wuhan, que alertou os colegas sobre o surgir de uma misteriosa doença respiratória, mas foi repreendido pela polícia, que o acusou de espalhar “boatos”. A sua morte, em fevereiro passado, gerou forte indignação contra o Governo.

8 Set 2020

Xi Jinping aposta no consumo interno face a “mudanças turbulentas” no ambiente externo

[dropcap]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, alertou que a China vai enfrentar um período de “mudanças turbulentas”, marcado por “maiores riscos externos”, pelo que vai apostar no fomento do consumo interno para sustentar o seu crescimento económico.

Xi, que participou na segunda-feira à noite num simpósio sobre o plano económico quinquenal a ser lançado pelo Partido Comunista Chinês (PCC) no próximo ano, disse que “a China deve estar preparada para o desafio”, face aos “ventos cada vez mais contrários no ambiente externo”, segundo a agência noticiosa oficial Xinhua.

O Presidente chinês frisou que “é preciso estabelecer um novo padrão de desenvolvimento”, que tenha o mercado interno “como base” e que permita que os mercados interno e externo se “reforcem”. “O mercado interno vai dominar o ciclo económico nacional no futuro”, disse, citado pela Xinhua.

Xi Jinping afirmou crer que a pandemia da covid-19 está a acelerar as mudanças “inéditas num século” e que a China deve “aproveitar as oportunidades” que surgirem.

A China vai assim tentar crescer através da inovação científica e tecnológica “independente” e investir no “desenvolvimento de tecnologias essenciais o mais rápido possível”.

Sobre a diplomacia, o chefe de Estado chinês indicou que a China “fará com que o seu estatuto continue a elevar-se na economia mundial”.

O país asiático enfrenta uma prolongada guerra comercial e tecnológica com os Estados Unidos, à medida que a administração de Donald Trump procura reduzir a interdependência entre as duas maiores economias do mundo e conter a ascensão do país asiático.

A União Europeia afirmou também recentemente que a China não fez os avanços esperados desde a última cimeira, em 2019, para reduzir as barreiras no acesso ao seu mercado, o que afecta a Europa, o maior investidor estrangeiro e parceiro comercial do país asiático.

A pandemia de covid-19 já provocou pelo menos 809 mil mortos e infectou mais de 23,4 milhões de pessoas em 196 países e territórios, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.

26 Ago 2020

China | Campanha contra desperdício alimentar chega às redes sociais

Vídeos de pessoas a ingerir enormes quantidades de comida são o alvo mais recente da campanha chinesa de luta contra o desperdício alimentar. A política lançada por Xi Jinping deu azo a especulação quanto à capacidade para alimentar os 1,4 biliões de cidadãos, numa altura em que o país enfrenta desafios em múltiplas frentes como inundações, pandemia, pragas e tensões comerciais

 

[dropcap]O[/dropcap] que tem de apelativo ver alguém comer grandes quantidades de comida? A resposta pode cobrir um amplo leque de motivações psicológicas, mas não chega para explicar a popularidade imensa de alguns vloggers que ganham a vida a enfardar descomunais pratadas de comida.

Nascida há 35 anos em Fukuoka, Yuka Kinoshita é uma das youtubers mais populares do género, com quase 5,5 milhões de subscritores e mais de 2 biliões de visualizações. Apesar da figura elegante, os vídeos da japonesa documentam refeições que dão para alimentar uma família numerosa com muita fome, por vezes chegando às 23 mil calorias ingeridas. Por exemplo, no início do ano, mais de 1,5 milhões de pessoas viram Yuka mandar abaixo 200 peças de sushi, e quase 2 milhões assistiram à hercúlea tarefa de comer quatro quilos de salmão e um quilo de sopa miso.

Este fenómeno, que ganhou imensa popularidade nos últimos 10 anos, em particular na Ásia, dá pelo nome de mukbang, expressão nascida do coreano da conjugação das duas palavras “comer” e “transmitir”.

Além das críticas que apontam estes programas como a derradeira glorificação da bulimia, o mukbang ganhou recentemente um poderoso inimigo: o Governo chinês.

Tudo começou quando o Presidente chinês, Xi Jinping, declarou guerra ao desperdício alimentar. Estava dado o mote para o lançamento da campanha “prato limpo”, com o Presidente a detalhar que a pandemia de covid-19 “fez soar o alarme” para o desperdício de alimentos, acrescentando que a China deve manter atenta em relação a uma potencial crise de segurança alimentar.

Dieta na net

Das palavras à acção, vários meios de comunicação oficiais materializaram a condenação social dos autores deste tipo de conteúdo audiovisual. A CCTV transmitiu várias reportagens críticas sobre o mukbang e os seus protagonistas, e as próprias redes sociais chinesas entraram no jogo adicionando avisos para os internautas que procuram termos como “programa de comida” ou “comer em directo”.

A adaptação não se fez esperar, com vloggers e produtores de conteúdos a emitir avisos no Douyin, a versão chinesa do TikTok, para “aproveitar a comida”, “comer de forma apropriada” ou “estima a comida, recusa o desperdício, come com responsabilidade e leva uma vida saudável”.

As mensagens parecem anunciar o fim do festim deste tipo de canais na China, ou pelo menos nas redes sociais chinesas, uma vez que não surgem em aplicações fora do Continente, como a TikTok.

Em declarações à BBC, a analista de media chineses Kerry Allen explica que “há algum tempo que as redes sociais chinesas mostram nervosismo face à possibilidade de terem conteúdos que possam ser considerados como maus ou imorais pelo Estado”.

Porém, a analista refere que os receios não são unilaterais, e que também o Governo encara com algum cuidado as novas liberdades que advêm da hipótese de transmitir vídeo em directo, algo que as novas aplicações tornaram extremamente popular. Assim sendo, foi com naturalidade que surgiram regras rígidas de transmissão e publicação de vídeos, em particular vídeos na via pública, ou que aparentem ter conteúdo “sedutor”.

Aliás, foi a partir da fixação de parâmetros rígidos quanto ao conteúdo que começaram a surgir vídeos de pessoas a cantar ou a comer.

Resposta popular

Seguindo a máxima de quanto mais alto maior a queda, após a condenação pública os próprios espectadores começaram a reagir negativamente aos conteúdos, em particular às estrelas chinesas conhecidas como “reis do estômago grande”, que levam o conceito de refeição para o campo da proeza circense. Estes vídeos começaram a ser censurados com edições que impossibilitam o espectador de ver o que se passa.

A BBC relata que muitos destes vídeos foram a retirados pelos próprios autores, depois do ataque de internautas que aproveitaram a oportunidade para divulgar a identidade dos vloggers e envergonhá-los como desperdiçadores.

Porém, a condenação dos excessos não se fica pela internet. O The New York Times (NYT) relata outros exemplos de medidas que procuram combater o desperdício alimentar, como uma escola que fez depender a inscrição dos alunos com base no nível de comida desperdiçada na cantina, ou um restaurante colocou uma balança à entrada para tentar impedir algo contraproducente ao negócio: que o cliente não peça demasiada comida.

A disciplina gastronómica faz parte da imagem que o Partido Comunista da China tem cultivado do seu líder, Xi Jinping, um homem que luta oficialmente contra o excesso e a gula. “Cultivem hábitos de consumo frugais e promovam um ambiente social em que o desperdício é uma prática vergonhosa e a frugalidade é aplaudida”, referiu o Presidente chinês num artigo publicado no Diário do Povo.

Política e ecos

O artigo salienta que, “além da ser uma necessidade básica da população, a cultura gastronómica sempre foi muito importante para os chineses”. “Porém, à luz do forte desenvolvimento da indústria alimentar de hoje, o desperdício alimentar tornou-se proeminente”.

O jornal oficial descreve ainda que durante 2018, em média por cada refeição 93 gramas de alimento foram parar ao caixote do lixo, o que representou uma taxa de desperdício de 11,7 por cento. De acordo com um estudo da Academia Chinesa de Ciências e do Fundo Mundial da Vida Selvagem, citado pelo Diário do Povo, entre 2013 e 2015, os consumidores chineses desperdiçaram cerca de 18 milhões de toneladas de comida, o suficiente para alimentar, durante um ano, entre 30 a 50 milhões de pessoas.

É aqui que a política de Xi Jinping enfrenta um obstáculo cultural que ocupa o centro da mesa de qualquer jantar na China. A própria tradição dita que se peça comida em excesso e que o desperdício seja interpretado como demonstração de generosidade em relação a familiares, clientes, parceiros de negócios e convidados especiais.

A mensagem de combate ao desperdício tem sido transmitida de forma mais alargada, apontando no sentido da procura da autossuficiência alimentar principalmente face às disrupções comerciais resultantes do caos geopolítico e das tensões diplomáticas com os Estados Unidos, além das dificuldades trazidas pelas cheias e a pandemia, que podem mexer nas reservas de alimentos.

Tempos complicados

No mês de Julho, o preço dos alimentos na China subiu 13 por cento, em comparação com o período homólogo do ano passado, de acordo com as estatísticas oficiais. O preço da carne de porco, produto essencial, aumentou cerca de 85 por cento no mesmo período em análise, em parte devido ao efeito devastador que as cheias estão a ter nas rotas de abastecimento.

Segundo um relatório divulgado no Diário da Juventude Chinesa (China Youth Daily em inglês), agricultores da província central de Henan, região estratégica no que diz respeito à produção de cereais, admitiram armazenarem grande parte das colheitas deste ano na esperança que os preços aumentem.

É neste contexto que o curioso fenómeno de internet mukbang tem recuado, quase em vergonha, na China. A imagem de uma jovem a sorver quatro quilos de noodles é completamente oposta a esta citação sobre a campanha “prato limpo”, publicada no Diário do Povo: “No prato do jantar, todos os grãos são o resultado do trabalho árduo de alguém”.

Daí que se tenha tornado normal nos últimos dias expressões de arrependimentos dos “reis do estômago grande” chineses. O NYT cita uma autora chinesa que mudou o seu nome de “Big Stomach Mini”, ou mini estômago grande, para o mais austero cognome “Dimple Mini”, ou covinhas mini, numa retração.

A popular vlogger, que chegou a publicar um vídeo em que comeu um carneiro assado inteiro, postou um vídeo a apelar aos fãs que saboreassem todas as dentadas e que levassem para casa as sobras. O vídeo atraiu mensagens positivas de mais de 11 milhões de fãs. A vlogger acrescentou que “não há problema nenhum em apreciar delícias culinárias” e apelou aos fãs para não desperdiçarem ou incorrerem em comportamentos extravagantes.

25 Ago 2020

Professor chinês crítico do Presidente Xi Jinping detido em Pequim

[dropcap]A[/dropcap]s autoridades chinesas prenderam um activista e professor de Direito chinês que fez duras críticas ao Presidente da China, Xi Jinping, na sequência da pandemia de covid-19, segundo vários familiares. Xu Zhangrun foi preso em casa, nos arredores de Pequim, por mais de 20 agentes de segurança, segundo familiares e amigos citados pela imprensa internacional.

A mulher do professor foi contactada pelas autoridades, que justificaram a prisão do marido pelo fato de ele ter usado os serviços de uma prostituta durante uma viagem a Chengdu, no sudoeste da China, segundo a agência France-Presse.

Após o surto do novo coronavírus ter alastrado pelo país, Xu escreveu um ensaio, intitulado “Alerta Viral: Quando a Fúria Ultrapassa o Medo”, no qual argumentava que a obsessão do regime com a estabilidade e a centralização do poder em torno de Xi Jinping estavam a paralisar e incapacitar a burocracia do país, impedindo uma resposta rápida e eficaz ao vírus.

“Nada – nem a liberdade, dignidade ou felicidade do povo chinês – é mais importante do que manter a estabilidade”, acusou.

No mesmo ensaio, Xu disse que, devido à ausência de liberdade de expressão e de um sistema burocrático moderno, o líder chinês “não tem restrições” e a Comissão de Segurança Nacional, que foi estabelecida por Xi, “domina com punho de ferro cada camada da burocracia”, que responde ao seu superior “até atingir, no topo, A Única Pessoa Responsável”.

“No entanto, esse indivíduo é apenas um homem de carne e osso que não pode estar presente em todos os aspetos da governação”, resumiu, no ensaio, publicado ‘online’, em 04 de fevereiro. Xu apelou então à demissão de Xi Jinping.

Antigo professor de Direito na Universidade Qinghua, uma das mais prestigiadas do país, Xu foi afastado após criticar abertamente o Presidente chinês, Xi Jinping.

O activista, que esteve preso entre 2014 e 2017, viveu nos últimos meses em sítios diferentes, para evitar ser detido, depois de ter organizado uma reunião entre apoiantes de reformas democráticas, em Xiamen, na costa leste do país, em final de dezembro.

7 Jul 2020

Derrotar o Inimigo Comum da Humanidade com Solidariedade e Cooperação

Por Shen Beili, Comissária do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China na RAEM

 

[dropcap]E[/dropcap]m 7 de Junho, o Departamento de Comunicação do Conselho de Estado da China emitiu um livro branco intitulado “Combate ao COVID-19: China em Ação”. Consistindo em quatro partes, a saber, “Luta da China contra a epidemia: um teste de fogo”, “Prevenção, controle e tratamento bem coordenados”, “Reunindo uma força poderosa para combater o vírus” e “Construindo uma comunidade global de saúde para todos”, o livro branco apresenta uma visão panorâmica sobre a luta chinesa contra o novo coronavírus. Demonstra também a filosofia de governação centrada no povo do Partido Comunista da China e do governo chinês, e as notáveis realizações da China na modernização da sua governança.

Após o surto da epidemia, o presidente Xi Jinping assumiu o comando geral desta batalha popular. Tendo sempre em mente a segurança do povo, tomou decisões cruciais em cada momento crítico, apontando o caminho para vencer o vírus e reforçando a confiança e força do povo. Sob a liderança do PCCh, a China fez funcionar um sistema rigoroso de prevenção e controle em que participa toda a sociedade, e não poupou esforços para tratar pacientes e salvar vidas. Divulgou, de forma atempada, aberta e transparente, as informações relativas à epidemia conforme exigido por lei, e mobilizou rápida e efetivamente recursos de toda a nação para combater a epidemia e proteger, a todo custo, a segurança e saúde do povo.

Com árduos esforços e enorme sacrifício, a China conseguiu mudar a situação da epidemia. Em pouco mais de um mês, a propagação crescente do novo coronavírus foi contida; em cerca de dois meses, o aumento diário de casos domésticos havia caído para um dígito;e em aproximadamente três meses, foi alcançada a vitória decisiva na batalha defensiva de Hubei e Wuhan. Com essas realizações estratégicas, a China protegeu a vida, segurança e saúde do seu povo, e contribuiu significativamente para salvaguardar a saúde pública regional e global. Este livro branco de 37 mil palavras, bem estruturado e informativo, fala em voz alta a resposta da China nesta grande prova global de combate ao COVID-19.

O livro branco compartilha experiências preciosas da China nas ações coordenadas de prevenção, controle e tratamento, as quais podem ser referência para a comunidade internacional. Face à mais sereva emergência de saúde pública internacional desde a Segunda Guerra Mundial, a China defende que todos os países cuidem dos interesses da humanidade e do bem-estar das gerações futuras, somem esforços e troquem apoios no sentido de construir uma comunidade global de saúde para todos, em conformidade com o conceito da comunidade de futuro compartilhado para a humanidade. A China apela à comunidade internacional que se reúna, abandone o preconceito e a arrogância, rejeite ideias e condutas egoístas e se oponha à estigmatização e politização do vírus, para que o espírito de solidariedade, cooperação, responsabilidade e dedicação leve todos nós à vitória na luta contra esta pandemia.

Desde o início do surto, a China vem realizando ativamente intercâmbios e cooperações internacionais. Vem fortalecendo a comunicação de alto nível, compartilhando informações e promovendo pesquisas científicas junto com organizações internacionais e outros países. Além disso, vem fazendo todo o possível para prestar assistência, contribuindo com a sua inteligência e força para a luta global contra o coronavírus.

A ação da China nesta luta não apenas revela fatos, verdade e sinceridade, como também fornece inspiração ao mundo sobre como lidar com os crescentes desafios globais que estão intimamente relacionados.
Primeiro, devemos colocar sempre em primeiro lugar a vida e os interesses do povo. Nos momentos críticos em que a vida, segurança e saúde da população são severamente ameaçadas, todos os países devem agir com o senso de responsabilidade e identificar rapidamente o problema. Devem levar em consideração fatores de todas as vertentes, e tomar decisões oportunas e resolutas. Devem empregar medidas extraordinárias para lidar com emergências extraordinárias e envidar todos os esforços para proteger as pessoas.

Segundo, devemos persistir na construção da comunidade de futuro compartilhado da humanidade. A custo de vida, esta pandemia adverte-nos que os países devem superar as diferenças geográfica, racial, histórica, cultural e até de sistemas sociais. É urgente trabalhar de mãos dadas para construir a comunidade do futuro compartilhado da humanidade e cuidar deste único planeta onde podemos sobreviver. Para isso, uma das tarefas mais importantes é acelerar a construção de uma comunidade global de saúde para todos.

Terceiro, devemos salvaguardar o multilateralismo com maior firmeza. O COVID-19 comprova que nenhum país, por mais forte que seja, pode permanecer imune a desafios globais. Perante um desastre, quem cruza os braços e fica ocioso acabará vendo o tiro sair pela culatra, e quem aponta os dedos para outros acabará danificando a sua própria reputação. A supremacia e o fugir de responsabilidades, em vez de servir para resolver seus próprios problemas, prejudicarão os direitos e interesses justos de outros países. Apenas o multilateralismo pode fornecer à comunidade internacional uma força coesa para agir, e somente a união nos levará a superar as situações difíceis.

Quarto, devemos coordenar a contenção da epidemia e o desenvolvimento económico e social. Esta pandemia impõe dificuldades sem precedentes ao desenvolvimento dos países e torna inevitável uma grave recessão económica. É imperativo que a comunidade internacional trabalhe em conjunto para estabilizar e reabilitar a economia mundial. O desacoplamento, a “construção de muros” e a desglobalização, que são contra a tendência geral do desenvolvimento, podem dividir o mundo, como também não serão benéficos para qualquer país. A comunidade internacional deve prosseguir com a globalização, salvaguardar o sistema multilateral de comércio baseado na Organização Mundial do Comércio, cortar tarifas, remover barreiras, e facilitar o fluxo comercial.

O COVID-19 continua a espalhar-se pelo mundo. O que fazemos hoje determina como sairemos no futuro. A comunidade internacional deve reforçar a solidariedade e empenhar-se em cooperação. A China acredita firmemente que com isso conseguiremos derrotar a epidemia, e o mundo emergirá deste momento sombrio da história humana para abraçar um futuro ainda mais brilhante.

10 Jun 2020

NATO rejeita ver China como inimigo mas quer aliança reforçada perante ascensão de Pequim

[dropcap]O[/dropcap] secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, rejeitou ver a China como inimigo, mas pediu um reforço da Aliança Atlântica perante “a ascensão de Pequim”, que está a mudar o “equilíbrio global do poder”.

“Não, a NATO não vê a China como o novo inimigo ou adversário, mas vemos que a ascensão da China está a alterar fundamentalmente o equilíbrio global do poder”, declarou o líder da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO, sigla inglesa), falando numa conferência ‘online’ sobre o futuro e a sua visão para a aliança em 2030.

Falando a partir de Bruxelas no evento digital organizado pelo Atlantic Council e pelo German Marshall Fund, Jens Stoltenberg vincou que os 30 aliados da NATO devem “permanecer fortes militarmente, mas mais unidos politicamente e ter uma abordagem global mais ampla”.

Desde logo porque “está a aquecer a corrida à supremacia económica e tecnológica”, ao mesmo tempo que se “multiplicam as ameaças às sociedades abertas e às liberdades individuais”, destacou o responsável norueguês, numa alusão à aposta feita pela China para se tornar na maior potência mundial em termos económicos e militares.

“A China está a aproximar-se de nós a partir do Ártico ou do ciberespaço”, acrescentou, considerando que isso coloca pressão sobre “os valores e modos de vida” da aliança e que, por essa razão, a NATO deve ter uma “presença global”.

Falando sobre a sua visão para a organização nos próximos 10 anos, Jens Stoltenberg sustentou que a NATO tem trabalhar “ainda mais estreitamente com os países que partilham da mesma visão”, como “a Austrália, Japão, Nova Zelândia e Coreia do Sul”.

Tal cooperação permitira “estabelecer normas e padrões, no espaço e no ciberespaço, sobre as novas tecnologias e o controlo global do armamento e, em última análise, [serviria] para defender um mundo construído sobre liberdade e democracia, e não sobre intimidação e coerção”, adiantou.

Na ocasião, Jens Stoltenberg foi ainda questionado sobre uma eventual retirada, por parte dos Estados Unidos, de parte do contingente destacado na Alemanha.

Escusando-se a comentar as notícias avançadas pela imprensa, o responsável notou antes que, “nos últimos anos, houve um aumento” da presença militar norte-americana em “vários locais” da Europa e “não apenas na Alemanha”.

O Presidente norte-americano, Donald Trump, tem vindo a repreender sistematicamente os aliados da NATO na Europa e no Canadá por aquilo que considera serem despesas insuficientes em matéria de defesa, o que levou a tensões dentro da organização.

Nos últimos anos, Donald Trump também retirou os Estados Unidos do acordo climático de Paris e do acordo nuclear iraniano e, mais recentemente, ameaçou cortar o financiamento à Organização Mundial de Saúde, acusando-a de ser controlada pela China e de ter enganado o mundo sobre a pandemia de covid-19.

9 Jun 2020

Codvid-19 | Washington e Pequim trocam acusações sobre origem do surto

A troca de hostilidades entre as duas maiores potências económicas passou para o campo da saúde pública e das teorias de conspiração. Um oficial do Governo chinês acusou os Estados Unidos pelo foco de infecções em Wuhan, depois da presença de militares norte-americanos na cidade onde participaram num evento desportivo. Entretanto, Donald Trump voltou a referir-se ao novo coronavírus como o “vírus chinês”

 

[dropcap]E[/dropcap]m tempo de tréguas na guerra comercial, cavam-se trincheiras no twitter e apontam-se culpas quanto à origem do novo coronavírus, com altos responsáveis políticos chineses e norte-americanos a disseminar teorias de conspiração.

A escalada de retórica rebentou na conta de Twitter do Presidente norte-americano, que escreveu que “os Estados Unidos iriam apoiar empresas, como companhias aéreas que foram particularmente afectadas pelo vírus chinês”.

Sem surpresas, a resposta de Pequim não se fez esperar. A China disse ontem estar “fortemente indignada” depois de Donald Trump referir-se ao Covid-19 como “vírus chinês”, acusando o Presidente norte-americano de criar um “estigma” contra o país. “Estamos fortemente indignados e opomo-nos firmemente a essa expressão”, disse Geng Shuang, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, em conferência de imprensa.

“A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a comunidade internacional opõem-se claramente a vincular um vírus a determinado país ou região visando evitar estigmas”, defendeu.

O contra-ataque também chegou à conta de Twitter do Global Times, jornal oficial do Governo Central. “Que Presidente! Ao rotular a Covid-19 como o ‘vírus chinês’, Trump tenta esconder o fracasso das medidas de prevenção e controlo impostos pela sua administração contra o surto. Então, passa a culpa para a China, tentando provar que não é responsável pela actual situação que os Estados Unidos vivem”, lê-se na conta do jornal que reflecte a posição de Pequim.

Porém, esta não é a primeira vez que de Washington chegam expressões deste género. Membros do Governo norte-americano usaram anteriormente expressões semelhantes, apesar de esta ser a primeira vez que Trump o faz publicamente.

Mas este foi apenas um dos mais recentes “tiros” disparados numa batalha de comunicação que politiza o surto.

Quem diz o quê

Pouco depois das notícias que deram conta do surto em Wuhan, começaram a circular online teorias sinistras sobre a origem do vírus, que foram sendo rebatidas por cientistas. Algumas destas ganharam tracção entre pessoas de poder, muitas com conhecidas posições políticas críticas em relação a Pequim, como Stephen Bannon, um dos homens responsáveis pela campanha que elegeu Donald Trump para a Casa Branca.

Há quase um mês o senador republicano do Arkansas, Tom Cotton, disse aos microfones da Fox News que o vírus teria sido criado num laboratório bioquímico de alta segurança em Wuhan para ser usado como arma química.

“Não temos provas de que o vírus tenha começado lá, mas tendo em conta a duplicidade e desonestidade da China desde o início do surto temos de, pelo menos, levantar a questão e ver para onde apontam as provas. Até agora, a China não tem facultado factos sobre esta questão”, declarou Cotton.

Mais tarde, o senador teve voltar atrás na tese de que o novo coronavírus era, na realidade, uma arma biológica, mas já era tarde demais. O rumor ganhou ressonância na câmara de eco dos média conservadores, com discursos que fizeram lembrar a propaganda anti-soviética da altura da Guerra Fria.

Acção vs Reacção

A resposta de Pequim não se faz esperar. O contra-ataque surgiu com a tese de que o novo coronavírus havia sido introduzido na cidade de Wuhan, em Outubro passado, pela comitiva das forças armadas norte-americanas aquando da participação numa espécie de olimpíadas militares.

Mais uma vez, apesar da falta de provas que sustentem a tese, esta mereceu a bênção do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, nomeadamente com um porta-voz a acusar Washington de não ser transparente sobre o conhecimento que tem em relação à doença.

As insinuações ganharam corpo numa série de tweets de Zhao Lijian, porta-voz do ministério, publicados na passada quinta-feira, que desviaram agressivamente qualquer tentativa de argumentar má gestão de Pequim durante as primeiras semanas do surto

O chefe da diplomacia norte-americana, Mike Pompeo, acusou ontem a China de “semear informações falsas e rumores absurdos” sobre a origem do novo coronavírus.

No momento em que as autoridades dos EUA estão preocupadas com a propagação rápida do vírus e que as cidades norte-americanas abrandam, preparando-se para a eventualidade de uma quarentena geral, Mike Pompeo falou telefonicamente com o mais alto funcionário do Partido Comunista Chinês, acusando as autoridades da China de desinformação.

“O secretário de Estado enfatizou que o momento foi mal escolhido para semear desinformação e rumores absurdos e que está na altura de os países se unirem para combater uma ameaça comum”, disse o Departamento de Estado norte-americano, num comunicado que comentava a conversa telefónica entre os dois políticos.

Diplomacia e poesia

Washington já tinha convocado o embaixador chinês em Washington para lhe transmitir o desconforto com as insinuações, mas as autoridades dos EUA estão agora também preocupadas com a velocidade de propagação do vírus no seu país.

Em declarações à CCTV, Yang Jiechi, diplomata chinês, diz ter avisado pelo telefone Mike Pompeo que qualquer tentativa para manchar os esforços da China na contenção da pandemia “não iria ser bem-sucedida”. Na chamada, que aconteceu na segunda-feira, Yang manifestou a oposição e condenação pelos esforços movidos por políticos norte-americanos para denegrir a China e alertou que ameaças aos interesses chineses vão ser alvo de retaliação.

A posição de Pequim teve eco em várias embaixadas chinesas, como no Cazaquistão ou Nigéria, que se juntaram ao coro de críticas a Washington.

O diplomata chinês sediado no Cazaquistão usou o Facebook para dar a sua perspectiva contra Washington. “A falta de máscaras, luvas, testes e equipamentos, além do crash da bolsa também foram provocados pela China? Chegou a altura de admitir aquilo que têm escondido dos eleitores e da comunidade internacional, porque há muitas perguntas por responder”, escreveu o diplomata chinês em russo.

No meio desta troca de galhardetes, houve um dano colateral que extrapolou a relação entre países. Na passada segunda-feira, o peruano Nobel da literatura, Mario Vargas Llosa, foi alvo de críticas de Pequim que o acusou o de “irresponsabilidade e opiniões preconceituosas”, depois de o escritor ter assinado um artigo no jornal espanhol El Pais e no peruano La Republica.

A tese do laureado pela Academia Alfred Nobel teoriza sobre a ligação entre o regime político chinês e a resposta ao surto, especulando se a resposta seria diferente caso a China fosse uma democracia.

“Parece que ninguém está a sublinhar que tudo o que se está a passar poderia ser evitado se a China fosse um país livre e democrático, em vez de uma ditadura”, comentou o peruano, citado pelo portal Hong Kong Free Press.

As palavras de Llosa foram recebidas com indignação em Pequim, que se expressou através de um comunicado da embaixada no Peru. “Respeitamos a liberdade de expressão, mas não aceitamos qualquer tipo de difamações e estigmatizações arbitrárias”, lê-se no comunicado.

Além disso, a representação diplomática realça que Llosa, “enquanto figura pública, não deveria espalhar opiniões irresponsáveis e preconceituosas sem qualquer propósito”.

18 Mar 2020