Hospitais pelas costuras

[dropcap]N[/dropcap]as redes sociais corre um vídeo que se tornou rapidamente viral. Num encontro de técnicos e responsáveis pela Saúde, uma enfermeira com mais de vinte anos de carreira, levantou-se e usou da palavra. Foi o fim do mundo. A senhora trabalha há quatro anos nas urgências de uma unidade hospitalar e disse aquilo que o povo tem ouvido pela calada. A enfermeira falou alto, bem alto e desancou em todos os que têm tido responsabilidade pelo sector da saúde pública. Ouvimos pormenores de comover um elefante: que as macas enchem os corredores; doentes que morrem sem qualquer assistência nesses corredores porque as enfermeiras nem conseguem chegar às macas com o material adequado para salvar uma vida; que há cantos de salas que são para aqueles que os profissionais de saúde entendem não haver nada a fazer, ou seja, morrerem virados para as paredes do canto; que o pessoal médico e de enfermagem bem como os auxiliares estão exaustos, não têm um salário decente e ainda por cima agora proibiram-lhe quaisquer dias de férias até ao fim do ano. A enfermeira corajosa sintonizou que a situação acontece há anos e que por não aguentar mais psicológica e fisicamente já pediu para mudar de local de trabalho.

Passam décadas, a aflição continua, as horas, dias ou meses para uma consulta, a incapacidade de encontrar soluções estruturais, não apenas a prazo, são algumas das razões do caos na Saúde. O problema não é dos últimos governos. Tudo tem a ver em grande parte com o intuito de alguns “tubarões” desejarem que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) – que em boa hora o saudoso António Arnaut fundou – possa chegar ao fim para que os hospitais privados e os seguros de saúde tomem o seu reinado. Todos aqueles que nunca concordaram com a existência do SNS, hoje, hipocritamente, dizem defendê-lo mas boicotam-no sistematicamente e, tantas vezes, das maneiras mais vis preocupando-se apenas em informarem os hospitais públicos que os materiais necessários estão esgotados…

Lamento que a generalidade das reais denúncias sobre o que se passa no SNS venha de organizações partidárias quando lhes convém, e com a lenga-lenga do costume: falta pessoal especializado, faltam camas, faltam meios. Pois faltam. E faltam faculdades de medicina, médicos novos que em princípio são chumbados para não irem ocupar o lugar dos “cotas”. E quais outras razões de tanta carência? A Ordem dos Médicos, comandada por um imitador de sindicalista, nem pode ouvir falar em médicos vindos do exterior ou em construir-se um hospital novo que não seja em Lisboa. Outra razão prende-se, sem dúvida, com os salários miseráveis que são pagos aos profissionais de saúde. E há discriminação entre as classes. Imaginem, por exemplo, que no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, os médicos podem estacionar os seus carros gratuitamente, mas se for um enfermeiro, uma terapeuta doutorada ou outro técnico terão de pagar todas aquelas horas de trabalho. Horas? Ui, nem falemos de horários. É uma tristeza. Especialmente sobre os enfermeiros que chegam a trabalhar o dia todo e no dia de folga, muitas vezes, são chamados para as 24 horas de um banco de urgência. Centenas de enfermeiros já debandaram para Inglaterra e para outros países onde são tratados como gente: bom salário, horas extraordinárias bem pagas, cedência de residência, alimentação gratuita nos hospitais, subsídio para transporte e férias pagas sem qualquer desconto. Com estas condições de trabalho, quem é que não quer deixar os hospitais portugueses? Os médicos pretendem deixar o SNS para ingressar nos privados, mas há dias o governo proibiu a saída do SNS a qualquer profissional.

A tradição da falta de coragem política em dar saúde ao povo mantém-se. Temos uma ministra e uma directora-geral na tutela da Saúde que já levaram portugueses ao desespero por não as poder diariamente ouvir a palrarem, em todos os canais de televisão, apenas sobre o número de mortos e de infectados pela covid-19. Mas nunca se pronunciaram sobre os milhares que morrem diariamente com ataques cardíacos, diabetes, AVC’s, infecções renais ou pulmonares, muito menos referiram-se ao cancro que afecta milhares de doentes, alguns que já nem são atendidos. Muito menos falam de se construir novos hospitais, de aumentarem os salários dos profissionais de saúde e de oficializarem as suas carreiras para que os mesmos não deixem o país. E a situação está cada vez mais grave, ao ponto do Presidente da República decidir a continuação do estado de emergência. Ainda na semana que findou chegou-se ao ponto de os hospitais Santa Maria e Pulido Valente terem suspendido as cirurgias que não sejam urgentes durante três semanas, dependendo da evolução da situação pandémica. Mas as queixas sobre hospitais sobrelotados chegam de todo o país. A ruptura é uma realidade e em certas unidades hospitalares as camas já são no interior das ambulâncias estacionadas à porta das urgências porque os hospitais estão a rebentar pelas costuras…

*Texto escrito com a antiga grafia

22 Nov 2020

LAG 2019 | APOMAC pede redução do tempo de espera no hospital público

[dropcap]O[/dropcap] secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, esteve ontem reunido com os dirigentes da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau (APOMAC) onde ouviu sugestões para as Linhas de Acção Governativa (LAG) do próximo ano, que serão apresentadas na Assembleia Legislativa (AL) no próximo dia 15.

De acordo com um comunicado divulgado pela APOMAC, foi pedida uma redução do tempo de espera para consultas e tratamentos no Centro Hospitalar Conde de São Januário. “Os dirigentes da APOMAC, bem como os seus associados, apresentaram diversas propostas no sentido de melhorar a prestação de cuidados de saúde dos idosos, tendo manifestado a necessidade de reduzir o tempo de espera para um diagnóstico ou uma simples operação cirúrgica (por exemplo, às cataratas), que por vezes demoram meses, senão anos, no hospital público.”

Além disso, foi pedido que Alexis Tam “inclua nas suas políticas o rastreio gratuita do cancro da mama, cujo índice de pacientes tem aumentado anualmente”. De acordo com um estudo recentemente publicado, o rastreio é gratuito mas as filas de espera são muitas e há falta de conhecimento dos benefícios.
Além disso, Francisco Manhão, presidente, e Jorge Fão, presidente da mesa da assembleia-geral, pediram também apoios para os idosos, sobretudo no que diz respeito ao aumento das pensões e do número de camas em lares.

Como resposta, o secretário Alexis Tam referiu que “apostou fortemente na aquisição e melhoria de todos os equipamentos hospitalares”, estando “convicto de que muito em breve o hospital público será considerado um dos mais avançados em termos tecnológicos nesta região”.
Quanto à contratação de pessoal, o secretário afirmou que “tem encontrado algumas dificuldades”, mas que “não irá exigir da política de contratação de mais profissionais”, adianta o mesmo comunicado.

7 Nov 2018

Gasteroenterites somam e seguem

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] pico de casos que se tem registado nos últimos dias de gasteroenterite não tem ainda uma causa clara. No entanto, os Serviços de Saúde de Macau (SSM) adiantaram ao HM que de uma análise inicial, “os principais motivos da gasteroenterite podem estar relacionados com a ingestão de comida estragada, ou exposta a temperaturas anormais, ou ao facto de não haver cuidados higiénicos, como lavar as mãos, após o manuseamento de lixo”.

No que respeita às causas exactas, os resultados poderão ser conhecidos mais tarde. Neste momento a situação ainda está sujeita às pesquisas e análises que serão efectuadas pelo Centro de Segurança Alimentar do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, dizem os SSM.

Para evitar o alastrar da situação, e na sequência dos danos causados pelo tufão Hato, os serviços continuam a manter o apelo a cuidados máximos, e pedem “para que os fornecedores de alimentos, que não possam garantir a segurança alimentar, suspendam o fornecimento dos alimentos facilmente deterioráveis”.

Foram registados um total de 220 casos de gastroenterite na segunda-feira em dois hospitais de Macau e os Serviços de Saúde admitem que o número pode continuar a subir, informaram ontem os SSM em comunicado, excluindo, no entanto, um surto colectivo.

O maior número de casos foi registado no hospital privado Kiang Wu, num total de 178, “todos eles sem relação e considerados esporádicos”, lê-se.

“Todos os pacientes foram considerados casos normais e não houve nenhum caso considerado grave”, refere o comunicado.

31 Ago 2017

Justiça | São Januário no banco dos réus

Relato de um parto acidentado

Os pais de uma criança nascida no São Januário moveram um processo por negligência médica contra a unidade hospitalar e a equipa que acompanhou o parto. Em causa estão alegadas más práticas médicas momentos antes do nascimento que originaram a paragem cardíaca do recém-nascido, que terão resultado em paralisia cerebral

[dropcap]E[/dropcap]ncontra-se em julgamento no Tribunal Administrativo um caso por erro e negligência médica num parto que resultou em paralisia cerebral profunda do bebé. O processo foi instaurado pela família em 2013 contra o Centro Hospitalar Conde de São Januário, o médico, Huang Yaobin, e a enfermeira, Vong Iok Lin. Os pais do menino, que hoje tem seis anos, reclamam uma indemnização superior a quatro milhões de patacas.

Tudo começou na madrugada do dia 1 de Novembro de 2010, por volta das cinco da manhã, quando rebentaram as águas à futura mãe. O casal apressou-se a seguir, esperançoso, para o hospital. A partir daí, tudo correu mal no nascimento do primeiro lho do casal. A grávida foi medicada com Citocitol, um fármaco que induz as contracções que preparam o feto para o parto natural. Neste momento, adianta salientar que a futura mãe teve uma gestação sem incidentes e entrou na unidade hospitalar com um bebé saudável. Mesmo depois de um dia inteiro com indução, não havia sinais de progresso no trabalho de parto, sem dilatação do colo do útero.

No dia 2 de Novembro continuou a ser dada medicação à parturiente, ainda sem resultados. Este tipo de fármaco provoca contracções que podem causar stress ao bebé. Como tal, entre as 12h e as 14h começam a registar-se alterações nos batimentos cardíacos do feto, alegadamente sem que a equipa médica tomasse conta da situação. A enfermeira que acompanhou a grávida administrou-lhe oxigénio. Esta situação, de acordo com Malcolm Griffiths, especialista inglês em obstetrícia que testemunhou ontem em tribunal, “indicia que alguém cou preocupado, apesar da medida não ter qualquer mérito médico”.

PARAGEM CARDÍACA

Algo não estava a correr bem. De acordo com a testemunha ouvida ontem no Tribunal Administrativo, à preocupação da enfermeira devia ter sido correspondida com uma reavaliação médica. Em vez disso, continuou-se com a medicação, até que tudo descambou. Às 15h34 deu-se a primeira bradicardia no feto, o que significa uma diminuição do ritmo cardíaco que, num bebé, reduz a circulação sanguínea. Malcolm Griffiths esclareceu que mais de 10 minutos desta situação são o suficiente para provocar danos irreversíveis no cérebro, por falta de irrigação de sangue. Os normais batimentos cardíacos de um feto estão entre os 110 e os 160 por minuto, sendo que abaixo dos 100 já há um esforço considerável para um bebé. Neste caso, os batimentos chegaram aos 60 por minuto.

Esta questão, de acordo com a testemunha, deveria ter alertado a enfermeira para a gravidade da situação. Nesta altura, foi reduzida a medicação de indução, mas a resposta deveria ter sido mais robusta, ou seja, parar totalmente a medicação, chamar o médico e começar a preparação para a cesariana. Porém, o bebé recuperou o ritmo cardíaco, “milagrosamente”, segundo a análise de Malcolm Griffiths.

Malcolm Griffiths esclareceu que mais de 10 minutos desta situação são o suficiente para provocar danos irreversíveis no cérebro

Segundo a testemunha ouvida pelo colectivo de juízes, se nesta altura tivesse sido chamado um médico, talvez hoje a criança não sofresse da paralisia profunda que a deixou completamente incapaci- tada para a vida.

Porém, isso não aconteceu. Às 15h59, o ritmo cardíaco do feto voltou a descer para níveis graves de bradicardia, onde se manteve até ao parto, às 16h16. Em resultado desta ocorrência, o bebé nasceu sem pulso, tendo sido reanimado sete minutos depois. Ou seja, es- teve 24 minutos sem oxigénio no
cérebro, algo que, alegadamente, resultou na paralisia cerebral pro- funda do recém-nascido.

CONTESTAÇÃO VIRAL

A contra-argumentação do São Januário, além de ter recorrido ao lugar-comum de que a paralisia cerebral pode ter várias causas, sustentou-se num vírus que a mãe terá contraído. Para ser mais concreto, o citomegalovírus. A hipótese foi afastada pelo especialista em obstetrícia e ginecologia chamado pelos autores do processo. Numa observação às análises realizadas à mãe, Malcolm Griffiths garantiu que esta estava imune ao vírus, provavelmente contraído durante a adolescência, afastando o argumento dos réus. Para o obstetra inglês, não se encontra aí a razão da paralisia cerebral profunda. De resto, os réus argúem que o parto correu com toda a normalidade, que foram seguidos à risca os procedimentos do hospital, não havendo nada a apontar à equipa médica envolvida no parto.

Porém, o resultado foi uma criança totalmente dependente que não se senta, não come sozinha, não anda, que usará fraldas a vida inteira e que apenas consegue comunicar com os olhos para dizer sim, ou não. Um menino sem qualquer tipo de autonomia.

De acordo com o que o HM apurou, o médico, Huang Yaobin, tem outro processo no mesmo tribunal também devido a um incidente que resultou em paralisia cerebral, felizmente, não tão profunda como este caso. É de salientar que depois deste segundo incidente, o clínico saiu do Conde de São Januário, estando agora a trabalhar no Kiang Wu.

O julgamento prossegue no Tribunal Administrativo.

4 Mar 2017

Não residentes | Ginecologia e obstetrícia com preços mais elevados no hospital público

Kuok Cheong U, director do Centro Hospitalar Conde de São Januário

[dropcap style≠’circle’]K[/dropcap]uok Cheong U, director do Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ), revelou que houve um aumento de 10 a 12 por cento face a 2015 no número de mulheres não residentes que deram entrada no hospital público para darem à luz os seus filhos.

Segundo o Jornal do Cidadão, Kuok Cheong U referiu que o hospital público está a estudar a possibilidade de cobrar preços mais elevados nos serviços de ginecologia e obstetrícia às mulheres não residentes, por forma a tornar a cobrança mais razoável.

Kuok Cheong U explicou que iriam ser tidos em conta factores como a inflação, os custos com as cirurgias e internamentos, e ainda as taxas cobradas nas regiões vizinhas. O responsável disse, contudo, que os valores cobrados às mulheres residentes não vão sofrer mudanças.

Actualmente, os titulares de bluecard pagam a totalidade das taxas moderadoras no hospital público, sem direito a qualquer desconto, ao contrário do que acontece com quem tem a residência permanente e não permanente. Ainda assim, houve queixas de que as taxas moderadoras não são actualizadas desde 1986, sendo que as despesas médicas têm vindo a aumentar nos últimos anos. O director do São Januário referiu, contudo, que se tratou de um aumento razoável, e que tanto os recursos humanos como as infra-estruturas hospitalares ainda não sofrem muita pressão. Até finais de 2016, trabalhavam em Macau cerca de 105 mil trabalhadores não residentes.

3 Jan 2017

Órgãos | Novo hospital poderá ter centro de transplantes

Os Serviços de Saúde garantem que poderão criar um centro de transplantes de órgãos no novo Complexo de Cuidados de Saúde das Ilhas, estando ainda a ser estudada a legislação sobre morte cerebral e doação de órgãos. O anúncio é feito depois de os SS terem dito que não têm sequer condições para tal

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]inda não está preparada para o processo clínico, mas a RAEM poderá mesmo ter num futuro próximo um centro de transplantes no novo hospital público. A garantia foi dada ao HM pelos Serviços de Saúde (SS).

“No futuro Complexo de Cuidados de Saúde das Ilhas está prevista a existência de um centro de transplante de órgãos que se responsabilizará pela coordenação da actividade a respeito de transplantação de órgãos. Se forem definidos os critérios, legislação e diplomas legais, a RAEM será capaz de desenvolver uma parte de transplantação e a mensagem sobre a dádiva de órgãos terá de ser veiculada junto do público”, apontou o organismo em resposta escrita. A mesma garantia já tinha sido dada ao deputado Si Ka Lon, que havia entregue uma interpelação escrita ao Governo.

A criação dessa legislação está a ser estudada pela Comissão de Ética para as Ciências da Vida, cujos novos membros foram nomeados em Outubro do ano passado. As discussões sobre as futuras regras em casos de morte cerebral ou a colheita, dádiva e transplante de órgãos continuam, não tendo sido adiantada uma data para que o processo legislativo sobre o assunto esteja concluído.

Segundo os SS, o assunto continua por concluir por se tratar de uma matéria sensível. “A definição de morte cerebral é um tema rigoroso e altamente científico, que implica vários factores, tais como, ciência e tecnologia, ética, cultura ou religião, sendo controversa a definição de morte. Pelo exposto, em Macau, ainda não existem critérios e regras relativos à morte cerebral, ou seja, na prática, ainda não é permitida a colheita de órgãos em cadáveres. Por outro lado, quando há uma doação, a colheita e transplante de órgãos, necessita da avaliação de diversos factores, nomeadamente, o uso de doação, a existência ou não de destinatário adequado e as condições para a realização da transplantação”, explicou o organismo.

[quote_box_right]“Se forem definidos os critérios, legislação e diplomas legais, a RAEM será capaz de desenvolver uma parte de transplantação” – Serviços de Saúde[/quote_box_right]

Recorde-se que, há cerca de um mês, o HM noticiou que, em cinco anos, 23 pessoas foram enviadas para o exterior para serem sujeitos a um transplante de órgãos, tendo sido referidas as mesmas dificuldades de ordem ética para chegar a uma conclusão.

O processo de transplante deve respeitar duas fases. Uma diz respeito à colheita dos órgãos ainda em vida, a qual deve ser feita mediante um documento de consentimento assinado pelo doador ou autorizado por um juiz. Quanto à colheita de órgãos em mortos, só poderá ser feita quando declarada morte cerebral do paciente.

Mais de 600 doaram medula óssea

O transplante de medula óssea é um procedimento clínico que também tem de ser feito no exterior. No âmbito do “Memorando sobre o Registo de Doadores de Medula Óssea em Macau”, assinado em 2012 com a Autoridade Hospitalar de Hong Kong, um total de 667 pessoas, de entre 703 cidadãos inscritos no Centro de Transfusões de Sangue de Macau, foram doadores de medula óssea e de células estaminais. Os dados são referentes até Dezembro do ano passado.

8 Jul 2015

Ó tu que fumas

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap] coisa é assim: vens a Macau e tens tudo o que não há lá na terra. Para começar, hotéis com alcatifas fofas às flores e tectos a imitar a Europa e os dias sempre azuis. Depois, tens mesas de jogo que nunca mais acabam, ainda por cima agora mais aliviadas de gente. É com facilidade que podes torrar as poupanças de uma vida, as poupanças da família e ainda os trocos contados dos vizinhos, que pacoviamente acreditaram no teu faro apurado para o jogo.

Se te sobrarem umas patacas e se o álcool etílico que te venderam numa embalagem com nome estrangeiro o permitirem, ainda podes terminar a noite bem acompanhado por uma jovem que vende o corpo a preço fixo. Não interessa se a miúda se quer vender ou se foi vendida, porque o problema não é teu e tu ages de acordo com a lei, embora a desconheças. Macau é jogo, luxo, a limusina que te foi buscar para fingires que és rico, o copo cheio, a garrafa vazia, as fichas perdidas, o sexo, o prazer todo num pacote turístico do melhor que há, e que se lixe o património, talvez amanhã passes por lá se não estiver muito calor.

O pior vem depois do prazer: corpos desnudados e contas feitas e tu nem sequer podes acender um cigarro. Aquele cigarro do depois. Quem nunca fumou não te entende e nesta terra de prazeres ilimitados parece que ninguém te percebe. O hotel não tem varanda, para evitar desgraças, e lá vestes tu as calças de há bocado, não te dás ao trabalho de apertar bem a camisa e sais em chinelos, não há uma sala de fumadores em lado algum e vais para a rua, com o que te resta de cabelo desalinhado do sexo todo. Macau é uma terra que quase não existe, onde tudo se compra, tudo se vende, acabaste de dizer adeus à miúda com quem não vais dormir, a polícia estava ali ao lado, mas está tudo bem. Macau é uma terra de vícios, onde tudo é permitido – menos fumar um cigarro.

Macau nunca foi outra coisa que não uma terra estranha, mas há alturas em que é mais. Contra a opinião das operadoras do jogo – que registaram no mês passado os piores resultados desde 2010 –, o Governo insiste e leva por diante uma fundamentalista proposta de revisão da lei do tabaco. Não interessa se as salas dos casinos são destinadas exclusivamente a quem fuma, sem mesas de jogo nem trabalhadores. A liberdade, mesmo pequena e confinada a um espaço fechado com uns cinzeiros sujos no meio, não interessa. Nada interessa nada. É assim e pronto. É assim porque alguém se lembrou que o tabaco faz muito mal.

Pena que ninguém se tenha lembrado de que há muitas outras coisas que também fazem mal, do género o que se come por aí, as condições em que a comida é confeccionada, o que vem dentro de uma garrafa de whisky, o que sai dos tubos de escape das carcaças podres que circulam na cidade. O que interessa é a guerra ao tabaco e pronto, não interessa quando nem onde. Ninguém se lembrou, por exemplo, que sujeitar um doente à privação de nicotina não é do mais aconselhável que há. Antigamente, no tempo em que a liberdade era outra coisa, fumava-se numa zona ao ar livre no hospital. Quem partia uma perna e fumava era poupado ao esforço de trepar paredes por causa daquela vontade de acender um cigarrinho. Não tenho conhecimento de que alguém tenha morrido de cancro por causa do fumo que o doente do lado expirou no terraço do primeiro andar.

Agora a coisa é diferente: não se fuma no perímetro do hospital, nem se fuma nas ruas em redor. Macau é uma cidade saudável e não cede a pressões internas ou externas, cumpre à risca as directrizes da Organização Mundial de Saúde, que ninguém tenha dúvidas de que assim é, mais limpinho do que isto não há. Eles andam por aí a salvar vidas e a gente é que não os compreende, acha-os intolerantes, tem outras prioridades. Eu tenho: preferia que os Serviços de Saúde poupassem nos incansáveis fiscais antitabaco e investissem, só para dar um exemplo, no tratamento dos doentes com hepatite C que não podem ser medicados com os métodos convencionais. Estão à espera há meses, a ver se fintam a morte. Macau tão à frente e Macau tão atrás.

Não tenho nada contra os Serviços de Saúde. Conheço gente que trabalha sob a alçada destes serviços que é muito boa gente; da gente com quem não troquei mais de uma dúzia de frases não posso falar. Não tenho nada contra, apesar de já ter tido más experiências pessoais, algo em que serei acompanhada por sensivelmente 75 por cento das pessoas que me lêem. Não tenho nada contra, apesar de os Serviços de Saúde mentirem aos jornalistas, mentindo à população. Mas eu não tenho nada contra. Eu só não gosto de fundamentalismos.

[quote_box_right]Preferia que os Serviços de Saúde poupassem nos incansáveis fiscais antitabaco e investissem, só para dar um exemplo, no tratamento dos doentes com hepatite C que não podem ser medicados com os métodos convencionais. Estão à espera há meses, a ver se fintam a morte. Macau tão à frente e Macau tão atrás[/quote_box_right]

[dropcap style=’circle’]2.[/dropcap] Esta semana fiquei a saber que há gente maltratada no Consulado Geral de Portugal e não me espanta: todos nós já nos sentimos ligeiramente enxovalhados em serviços com atendimento ao público. E quem atende ao público já se sentiu insultado por aqueles que tem de receber. Faz parte. Não é sequer uma característica das cidades multiculturais – quando vivia em Portugal detestava ir às Finanças porque saía de lá com um atestado de estupidez fiscal afixado na testa.

Mas o conselheiro das Comunidades Portuguesas José Pereira Coutinho tem uma visão diferente do assunto e toca a denunciá-la em praça pública. Faz ele muito bem, que está aqui para defender os pobres e os aflitos. A denúncia foi feita não nos elitistas e politizados jornais locais, mas sim na livre e nada politizada imprensa de Portugal. Escolheu um jornal que eu desconhecia (e de cujo nome não recordo neste momento), o que foi pena, porque nas páginas do Expresso, do Público ou do Diário de Notícias teria outra (merecida) projecção. Não obstante, graças à generosidade da imprensa local, chegaram-nos os ecos da actividade crítica de Pereira Coutinho ao consulado, profissão que agora desempenha em simultâneo com mais algumas.

Nestes oito anos em que ocupa o cargo de conselheiro das Comunidades Portuguesas, desconheço que Pereira Coutinho tenha apresentado um conjunto de propostas para a melhoria do funcionamento da representação diplomática portuguesa. Também desconheço que se tenha empenhado activa e publicamente na defesa dos portugueses – expatriados – com dificuldades na obtenção e na renovação da autorização de residência. São portugueses que supostamente representa e que simpatizam – muitos deles talvez conjuguem agora no passado este tão nobre sentimento – com a veia ocidental sindicalista do também deputado.

Podia dar mais exemplos de todos os lusitanos problemas com os quais o conselheiro não se preocupou durante estes anos, mas não me apetece. O monólogo segue dentro de momentos num lusitano jornal, que os jogos políticos deste género não se fazem de olhos nos olhos.

3 Jul 2015

Kuok Cheong U, director do Centro Hospitalar Conde de São Januário

Kuok Cheong U, o novo director do hospital público, mostra-se confiante na melhoria dos serviços médicos. Mais trabalho de equipa, uma academia de formação médica, escoamento de pacientes mais eficaz e serviços com horários prolongados são alguns dos pontos que defende. Para ele, a RAEM tem de contar com os seus recursos e não esperar por “milagres”, vindos de Pequim ou de Portugal

[dropcap]O[/dropcap] cirurgião Rui Furtado afirmou que no atendimento no serviço de urgências só existem médicos não diferenciados, ou seja, sem especialidade, algo que, na sua opinião, põe em causa o diagnóstico. Isto é verdade?
Temos médicos especialistas em serviço nas urgências, sempre tivemos. Comecei a trabalhar neste hospital em 1992, comecei como médico especialista em Macau em 1986 e antes disso trabalhava no Kiang Wu, portanto conheço os dois sistemas hospitalares muito bem. No início, o médico especialista de serviço, incluindo todas as especialidades e não só o serviço de urgência, trabalhava segundo o sistema de médico por chamada, ou seja, podia não estar no hospital mas se fosse necessário era contactado e tinha que se apresentar no serviço. Com isto, o que acontecia é que os médicos de clínica geral estavam no serviço, nessa altura, falo dos anos 90. Mas depois disso percebeu-se a tendência mundial de melhorar o sistema de saúde incluindo o serviço de urgência e começámos a estabelecer médicos especialistas neste serviço. Temos seis médicos especialistas no serviço de urgência que cumprem o seu serviço em turnos de 24 horas, durante todo o ano. Temos um plano de escalas, um relatório do trabalho dos médicos… Portanto, temos sim médicos especialistas competentes no nosso serviço de urgência.

Foi ainda dito que o serviço de urgência tem vindo a aumentar o número de camas…
É preciso esclarecer que o aumento de camas não é do serviço de urgência mas sim das salas de observação em que os doentes estão, como o nome indica, em observação até ser determinado o seu problema. É aí que se percebe o que é que o doente precisa, se é necessário um tratamento urgente ou se passa para a especialidade. Neste período de tempo precisamos de camas para ter os doentes. Nas salas de observação, no início, nos anos 90, tínhamos cerca de dez camas, mas depois com o desenvolvimento económico de Macau e o aumento da densidade populacional, precisávamos de melhorar a nossa capacidade de recepção de doentes. Portanto fomos aumentando consoante a necessidade, passo a passo, de dez camas, para 20, 30 até às cem.

Mas este aumento entope o serviço, porque a especialidade não tem a mesma capacidade para receber.
Concordo com o que o dr. Furtado disse: o número de camas é excessivo. Temos que considerar como contornar a situação não só para expandir mas como controlar, e como, claro, usar os recursos da melhor forma. Isto é o que eu vou fazer e estou confiante que o consigo fazer. É um facto a incapacidade que temos de momento em fazer circular os pacientes. Este é o problema. O que estou a tentar é resolvê-lo, como tentar diminuir o tempo em que os pacientes estão na sala de observação. Isto é algo que temos que fazer, melhorar a comunicação entre as especialidades e a emergência. Temos que nos reconectar. Quero resolver esta questão nos próximos três meses.

Portanto o problema do número de camas insuficiente, em todas as especialidades, mantém-se?
Sim, mantém-se. Estamos a tentar resolvê-lo de várias formas. Uma delas é tentar organizar e equilibrar as salas de observação. Estamos também a tentar aproveitar alguns espaços desaproveitados do hospital mas, claro, é preciso ter em conta os recursos humanos existentes. Portanto, temos muito trabalho pela frente.

Assumiu o cargo há pouco tempo. Quais as medidas prioritárias a tomar?
Neste momento ainda estamos na fase de planeamento. Disse-lhe que estou confiante, porque há de facto uma excelente comunicação entre mim, como director do hospital, o director dos Serviços de Saúde e o Gabinete do Secretário. Neste momento todos sabemos que a economia de Macau não está numa fase muito estável e, por isso, temos que considerar [a execução do plano] de forma mais cuidadosa. Temos vários planos, mas um plano é um plano. Sabemos também que as pessoas estão muito atentas a este assunto e queremos ir ao encontro das preocupações da população.

kuok cheong u

Mas, no imediato, o que pretende fazer?
Por exemplo, anunciámos que vamos alargar o horário do alguns departamentos. Porquê? Porque queremos ganhar tempo perante o cenário da lista de espera para a especialidade. Esta lista é um pouco longa e achamos que conseguimos resolver isso tendo um horário mais alargado. Este é o ponto um. Sempre tendo em conta que aumentar o horário não pode implicar aumentar a carga de trabalho dos recursos humanos, não só médicos, mas também dos enfermeiros e auxiliares. Temos que ter muito cuidado. Por isso é que vamos tentar em quatro departamentos primeiro, como um teste.

Quais os departamentos?
Cardiologia, Ortopedia, Fisioterapia e Radiologia. A lista de espera de Ortopedia é muito grande, é de mais de cem dias. Claro que comparado com outras cidades, como Hong Kong, não é assim tão longa, mas em Macau é de facto grande. Vamos tentar aproveitar e organizar o horário, administrando-o da melhor forma possível. Na minha opinião temos espaço para crescer, para melhorar. Nas áreas de Cardiologia e Radiologia estou bastante familiarizado e sei que conseguimos diminuir o tempo de espera. Estes quatro departamentos são os meus alvos de teste para me responder às perguntas: como conseguimos diminuir e se efectivamente conseguimos da forma adequada e sem aumentar a pressão nos recursos humanos. Pretende-se criar turnos rotativos, o que significa que vamos manter o pessoal, toda a equipa, médicos e enfermeiros, 24 horas por semana. Assim consigo não aumentar a pressão nos recursos e ao mesmo tempo melhorar a performance dos profissionais.

E o segundo ponto?
Queremos também tomar esta medida, não só pelas listas de espera, mas também pelo novo Hospital das Ilhas. Não sou engenheiro, não estou dentro da construção, mas o meu trabalho é preparar uma equipa profissional para trabalhar lá.

Como é que o vai fazer?
Se não tivermos tempo, se não tivermos espaço não consigo preparar uma equipa local. Não podemos esperar ajuda de Pequim ou de Portugal porque eles têm os seus trabalhos, os seus problemas. Temos que nos preparar a nós mesmos. Portanto, se conseguir prolongar a hora de trabalho em todos os departamentos significa que terei mais um período de tempo para os novos trabalhadores, usando as mesmas instalações para fazerem o seu trabalho. Se eles conseguirem fazer um turno, terei uma segunda equipa preparada. E quando o hospital estiver pronto terei uma equipa para enviar para lá.

Quando é que acha que o novo hospital estará pronto?
Não sou eu que lhe posso dar essa resposta porque não sou engenheiro. Mas o meu trabalho é preparar os profissionais e isso já está a ser feito. Mas claro, antes de me empenhar a 100% nisto, tenho que fazer alguns testes. Tenho que perceber qual a resposta da população. Por exemplo, um paciente tem uma dor, ele irá preferir ir ao hospital depois das 18 horas ou espera até ao dia seguinte? Tenho que perceber o comportamento da sociedade, tenho ainda que ouvir os médicos, colaboradores, enfermeiros, auxiliares e as suas opiniões. Eles também têm famílias. É um trabalho de equipa, temos que trabalhar como tal e assumir que aqui se trabalha assim.

Discute-se a acreditação dos médicos. O director sempre defendeu a avaliação dos mesmos. Quem faz esta avaliação? O próprio hospital?
Até agora, desde que vim para este hospital, passei por um período bem difícil de treino – faz parte -, de estágios e exames. Compreendo a lei e a regulação de forma clara e concordo com ela. Todos os médicos neste hospital, incluindo eu próprio, estamos conforme a lei. A avaliação é feita por especialistas de fora e locais que trabalham em equipa.

[quote_box_left]”Estamos a tentar incluir médicos com excelentes qualidades, independente da sua nacionalidade, da sua língua. Estamos a tentar tornar o sistema internacional. Desde que assumi funções, todas as comunicações, reuniões e decisões são feitas em inglês e é assim que deve continuar”[/quote_box_left]

E sobre a acreditação do hospital atribuída por uma empresa australiana. Foi comprada conforme acusam?
Tenho uma resposta da empresa, sobre um artigo que saiu no vosso jornal sobre este assunto que diz, passo a citar, “a organização pode comprar o serviço de acreditação, mas nunca o resultado final”, palavras de Christine Dennis, CEO da Australian Council on Healthcare Standards (ACHS), a empresa responsável pela acreditação. Acho que isto é uma afirmação muito importante. Por exemplo, podemos comprar um Ferrari mas nunca compraremos um campeonato. Certo?

As alterações propostas pela empresa serviram apenas para conseguir a acreditação ou ainda estão a ser respeitadas? O hospital foi acusado de as ter esquecido logo depois de conseguir a acreditação. É verdade?
Não creio. Aqui trabalha-se em equipa e num sentido geral trata-se de uma atmosfera muito boa, embora haja casos em que algumas boas pessoas não são assim tão bons colegas de equipa. Alguns deles, quer [o hospital] tenha ou não acreditação podem não dar o seu melhor e nós temos que estar de olho neles, para garantir o trabalho certo. Por isso é que existe um director, para garantir que as coisas funcionam e são cumpridas. Se não estiverem a funcionar correctamente é necessário marcar uma reunião para resolver o problema. Esse encontro vai-nos dizer se estamos a dar um bom apoio e se estamos a seguir os conselhos da [empresa de] acreditação. Porém sei que alguns departamentos não têm recursos humanos suficientes, nem espaço suficiente para trabalhar. Mas estamos a tentar fazer uma reforma nesse sentido…é para isso que aqui estou.

A quantidade de dinheiro público, em fundos do Governo, que é entregue ao hospital privado Kiang Wu, é bastante volumosa. Esse dinheiro não deveria ser empregue nas instalações públicas? Aqui neste hospital?
Essa é uma questão que deve ser feita ao director dos Serviços de Saúde. A minha opinião é que existe um orçamento limitado. Por exemplo, no caso do hospital, este edifício não pode aumentar, por ser localizado numa zona em que é preciso manter o tamanho actual. O facto de não poder crescer vai implicar a compra de serviços ao exterior. Sabemos que Macau é uma terra pequena e que a densidade populacional está a crescer cada vez mais, tornando-se uma das maiores do mundo. Este é um serviço de saúde, estabelecido nos anos 80, e é preciso perceber como é que pode ir ao encontro deste aumento da população. Uma das soluções é abrir outro hospital, já o estamos a fazer. Mas antes disso é preciso alargar o horário do funcionamento dos serviços. Segundo ponto, comprar serviços. A questão que deve ser considerada é quanto é preciso pagar por isso.

Entrando em algumas especialidades, como a Obstetrícia e Ginecologia. Não foi feito a mais de 500 mulheres o primeiro ultra-som fetal. Como é que se justifica esta ausência de comunicação entre médico e paciente?
Há diferentes níveis deste ultra-som fetal, nós fazemo-lo em três níveis: nos primeiros três meses, nos três meses do meio e nos últimos três meses. Não fazer o primeiro não traz qualquer problema. Normalmente não é necessário. À excepção de alguns casos em que algo possa correr mal, um sangramento, por exemplo. Segundo sei, não há obrigatoriedade no exame nos primeiros três meses. Podemos pensar assim: os seres humanos nem sempre tiveram ao seu dispor máquinas de ultra-som e continuámos a crescer na mesma. O ultra-som é algo que os médicos podem usar como um acrescento, não precisamos do ultra-som para manter a gravidez estável. Se a grávida se sentir bem e estiver tudo bem, o primeiro exame pode não ser feito, não há necessidade. Já no segundo período da gravidez podemos utilizar este exame para perceber o estado do feto, se é normal ou se poderá ter um problema grave no futuro. Na fase final nem sempre é preciso. A segunda fase é a mais importante, porque, no caso de ser preciso fazer uma intervenção, é mais fácil nesta altura do que mais tarde. Futuramente, com o desenvolvimento da medicina, talvez nem seja necessário o ultra-som.

Estavam de saída alguns médicos desta especialidade. Já foram substituídos?
Sim, neste momento temos 16 obstetras e ginecologistas a trabalhar neste hospital. Nos últimos dois anos saíram seis e foram recrutados cinco.

Falando de uma maternidade mais humanizada… Está disponível neste hospital a epidoral para as mulheres em trabalho de parto? Passa por elas a decisão de receber a anestesia ou não?
Sim, claro que temos, mas a opção de administrar passa pelo ginecologista ou obstetra em questão. Claro que a opinião da mãe e da família é tida em conta, mas trata-se de uma decisão médica.

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Os cursos pré-natais, disponíveis neste hospital, são dirigidos apenas em cantonês. Num sistema de saúde que se quer internacional, como é que isto acontece?
Desconhecia e garanto que vou resolver a questão. Daqui a três meses volte a perguntar-me isso. (risos)

Ainda no idioma, porque é que o hospital não está no seu todo equipado pelo menos com as duas línguas? Há corredores e especialidades só na língua chinesa.
Quero estabelecer uma melhor comunicação com as pessoas e isso já está a acontecer, como por exemplo, na entrada do hospital coloquei informações de uma exposição em três línguas: Chinês, Português e Inglês. Essa é uma aposta minha. Não sei falar em Português, mas quero muito alcançar este objectivo de pelo menos duas línguas.

Pretende colocar profissionais portugueses e chineses a liderar equipas? Faz questão que haja essa permanência das duas línguas?
Estamos a tentar incluir médicos com excelentes qualidades, independente da sua nacionalidade, da sua língua. Estamos a tentar tornar o sistema internacional. Desde que assumi funções, todas as comunicações, reuniões e decisões são feitas em inglês e é assim que deve continuar.

Chegou um caso ao HM de uma paciente que não conseguiu fazer o tratamento na especialidade de Nefrologia e teve que ir para o privado fazer. Há falta de equipamento?
De facto, temos máquinas, mas é certo que não são suficientes, por isso é que temos que comprar o serviço ao hospital Kiang Wu, embora seja bastante caro. Queremos expandir os nossos serviços de hemodiálise para que os pacientes possam de forma autónoma fazer o seu tratamento. Isto não é algo novo em Macau, é uma tendência mundial. A necessidade de passar quatro ou cinco horas de dois em dois dias num hospital para tratamento é algo que temos que combater, proporcionando ao paciente outras formas de fazer a hemodiálise. Estamos a tentar perceber se há uma área em que isto possa ser feito.

Num sistema de saúde perfeito, o público não terá que comprar ao privado. Concorda?
Não ignoro os serviços privados, eles fazem parte de Macau, são um recurso da população. Serviços e médicos, privados ou não, pertencem a Macau. Por isso, acho que devemos trabalhar em equipa.

Concorda com a vontade de ser criada uma Faculdade de Medicina?
Não. Acho que há um mal entendido entre academia, escola e universidade. Alexis Tam disse que vamos ter uma academia médica em Macau e isso eu apoio e dedicar-me-ei a 100% nesse projecto. Macau é um terra pequena e talvez faça sentido no futuro ter uma Faculdade de Medicina, mas não agora. Não temos recursos, não temos as condições para levar este projecto para a frente. A não ser que cresçamos a nível de volume e que, efectivamente, haja essa necessidade.

Mas concorda com a academia médica?
Sim, acho que é preciso uma academia que dê formação contínua aos profissionais já existentes. Precisamos de um organismo de acreditação profissional e essa academia vai convidar especialistas de fora, seja dos EUA ou de outro lado. Vamos tentar convidá-los para gerir esta academia e os programas de formação deverão ser acreditados a nível internacional. Estamos sempre a querer que em Macau o sistema de saúde seja acreditado internacionalmente, por isso, julgo que este é o caminho a seguir. Por exemplo, a lei de Macau não é a lei de Hong Kong mas de qualquer forma, e mesmo que eu não queira lá trabalhar, quero que o meu estatuto profissional seja reconhecido em Hong Kong.

Quando é que esta academia estará pronta?
Este é um grande trabalho, um grande projecto, que não espero que aconteça em três meses, mas sim, em dois, três ou quatro anos.

Concorda com a Lei do Erro Médico?
No meu ponto de vista, não é uma prioridade. Nem todos os países têm esta lei, por exemplo, Hong Kong não tem, porque está contemplado no Código Civil. Não deve ser uma prioridade, mas temos espaço para a discutir, temos espaços para a perceber. Está aberto para discussão mas não é prioritário.

Em caso de saída de Lei Chin Ion, poderá aceitar assumir o cargo como director dos SS?
Ainda é cedo para falar sobre isso, ainda agora me sentei nesta cadeira e tenho muito trabalho pela frente. Como disse há muita coisa para fazer, quero muito fazer o meu trabalho bem e sei que o vou fazer.

“Os próximos cinco anos serão a era mais brilhante da saúde”, defendeu Alexis Tam. Quer comentar?
É preciso uma correcção na interpretação dessa expressão. Antes de aceitar este cargo, trabalhei no gabinete portanto percebo perfeitamente o que o Secretário quer dizer com essa expressão. O que é o brilhante? O brilhante refere-se à construção. Há muitos planos de construção, tanto eu como o Secretário sabíamos isso, portanto, serão anos brilhantes no que respeita à construção. Agora posso dizer-lhe que faremos o nosso melhor para acompanhar esta tendência de evolução, esta construção. Não somos engenheiros, mas como é que vamos equilibrar o crescimento com a construção? Com os nossos planos para melhorar os serviços, não só no hospital mas também nos Serviços de Saúde. Estou confiante nesta era brilhante que agora começa.

29 Jun 2015

S. Januário | Rui Furtado e António Martins terão saído por burla de administrador

Limpezas no hospital?

12615P9T1[dropcap style=’circle’]R[/dropcap]ui Furtado e António Martins não viram o seu contrato renovado com os Serviços de Saúde (SS) devido ao envolvimento no caso do administrador do Hospital São Januário. Pelo menos é o que diz um comunicado dos Serviços de Saúde (SS), que refere que “posteriormente, os contratos [dos] dois cirurgiões não foram renovados”.

Recorde-se que Rui Sá, ex-administrador do Centro Hospitalar Conde de São Januário, foi condenado por crime de falsificação de documentos e burla. Tal como escreveu o HM, o responsável teria pedido a dois médicos cirurgiões que passassem receitas em nome dos pacientes, para depois recolher os medicamentos – para doenças crónicas – e apropriar-se deles. Os dois médicos não foram acusados, tendo servido apenas de testemunhas no caso. Contudo, agora é público que estes são Rui Furtado e António Martins, ambos ex-funcionários do São Januário.

Ora, os SS apresentam um comunicado assegurando não ser tolerantes face a infracções e anunciando melhorias na fiscalização do hospital. Mas, no mesmo comunicado, referem que a saída destes dois médicos se deveu ao envolvimento no caso e que Rui Sá foi despedido com justa causa.

“O réu obteve dezenas de prescrições de medicamentos através de dois ex-cirurgiões da nacionalidade portuguesa, apropriando-se, por vezes, com grandes doses de medicamentos para tratamento de insónia, Alzheimer e doenças do foro mental. (…) Posteriormente, os contratos destes dois cirurgiões não foram renovados”, pode ler-se.

Os Serviços de Saúde reafirmam que não são indulgentes com as infracções e têm exigido de forma rigorosa aos trabalhadores, que devem ser regulares na permanência no seu posto de trabalho, realizando de forma periódica palestras que visam a reforçar o cumprimento rigoroso da lei e da integridade por parte dos trabalhadores. Os Serviços de Saúde têm também realizado a revisão e aperfeiçoado permanentemente o mecanismo interno de fiscalização. O lançamento do rigoroso do regime de sistema electrónico na vertente de entrada, saída e de ausência permite a eliminação de actos ilícitos.

Análises e bloqueios

[quote_box_right]“O réu obteve dezenas de prescrições de medicamentos através de dois ex-cirurgiões da nacionalidade portuguesa, apropriando-se, por vezes, com grandes doses de medicamentos para tratamento de insónia, Alzheimer e doenças do foro mental. (…) Posteriormente, os contratos destes dois cirurgiões não foram renovados” – Comunicado dos SS[/quote_box_right]

O HM tentou contactar Rui Furtado, mas não foi possível até ao fecho desta edição. Não foi possível também contactar António Martins.

No comunicado à imprensa, o SS esclarecem que têm realizado a revisão e aperfeiçoado permanentemente o mecanismo interno de fiscalização e que, depois do caso do ex-administrador, as autoridades de saúde “efectuaram uma análise auto-crítica sobre regulamentos vigentes no que ao levantamento de medicamentos [diz respeito], de modo a bloquear eventuais lacunas”. Confirmando que denunciaram a situação “após a detecção das respectivas situações, tendo colaborado no julgamento na qualidade de assistente do processo”, os SS solicitam também que todos “os médicos dependentes dos Serviços e Unidades devem observar de forma rigorosa as respectivas regras, quando prescrevem medicamentos aos doentes”.

As autoridades esclarecem ainda que a administração se tem esforçado para reforçar o cumprimento rigoroso da lei e da integridade por parte dos seus trabalhadores, realizando a revisão e aperfeiçoamento permanentemente o mecanismo interno de fiscalização. “O lançamento do rigoroso do regime de sistema electrónico na vertente de entrada, saída e de ausência permite a eliminação de actos ilícitos”, concluem os SS.

12 Jun 2015