Entrevista | Li Keqiang, primeiro-ministro chinês

Ao colocar um ponto final nas sessões magnas, o primeiro-ministro chinês deu uma conferência de imprensa onde referiu que os investimentos provenientes de Macau são bem-vindos. Li Keqiang negou que o Governo Central tenha dado, ou dará, ordens a empresas chinesas do sector tecnológico para espiar países terceiros e afirmou que é impossível separar as duas maiores economias mundiais

[dropcap]A[/dropcap] Lei do Investimento Estrangeiro causou alguma confusão às populações de Macau, Hong Kong e Taiwan. Quando endereçou as medidas de abertura da economia não mencionou os três territórios. Isso quer dizer que se esperam ajustes às políticas do Governo Central quanto aos investimentos provenientes dos três territórios?

Macau e Hong Kong são duas regiões administrativas especiais da República Popular da China, enquanto os dois lados do Estreito de Taiwan pertencem a “Uma só China”. Desde sempre que atribuímos grande importância aos investimentos provenientes das três regiões. Por exemplo, os investimentos de Hong Kong e Macau representam 70 por cento dos investimentos estrangeiros no Interior da China. Como tal, vamos aprofundar vantagens para Macau e Hong Kong e garantir que mantém alfândegas distintas e portos livres. Queremos também criar condições mais favoráveis para que os empresários de Taiwan invistam no Interior. Além disso, o panorama institucional e a práticas que têm estado em vigor há bastante tempo vão-se manter inalteradas. Esperamos que estes esforços sejam eficazes para atrair mais investimento de Macau, Hong Kong e Taiwan. O Conselho de Estado irá formular regulamentos e legislação, nesse processo vamos ouvir com atenção as visões dos compatriotas chineses de Macau, Hong Kong e Taiwan para que os seus direitos e interesses sejam protegidos. Os investimentos destas três regiões são muito bem-vindos.

 Como é que o Governo Central irá promover o desenvolvimento dos dois lados do Estreito de Taiwan de forma a melhorar a qualidade de vida das populações?

No início deste ano, Xi Jinping proferiu um importante discurso nas comemorações do 40.º aniversário proclamação da Mensagem aos Compatriotas de Taiwan. Nessa circunstância, articulou os princípios e políticas relativas à questão de Taiwan. Vamos continuar a prosseguir o princípio “Uma só China”, promover o Consenso de 1992, ao mesmo tempo que nos opomos aos movimentos independentistas de Taiwan. Continuaremos a promover a melhoria das relações pacíficas e a reunificação com a pátria. As populações dos dois lados do Estreito de Taiwan são unidas por um elo de amizade. Queremos introduzir políticas dirigidas aos compatriotas de Taiwan, de forma a assegurar que têm o mesmo tratamento que os cidadãos do Interior quando para lá forem estudar, trabalhar, viver e fazer negócio. Já introduzimos 31 medidas para promover trocas culturais e económicas entre os dois lados, políticas que são para ser implementadas completamente. Precisamos trabalhar, de mãos dadas, para tornar o sonho da renovação nacional uma realidade.

Depois do falhanço da Cimeira de Hanói e face à possibilidade da Coreia do Norte retomar os testes mísseis, como vê o papel da China para fomentar um diálogo construtivo entre Pyongyang e Washington?

O problema da Península Coreana é antigo e complicado, não se resolve de um dia para o outro. A seguir à Cimeira de Hanói, ambas as partes expressaram prontidão para se manterem em contacto e isso é melhor que nada. Acredito que é importante que todos sejamos pacientes, que se aproveitem oportunidades e factores importantes quando surgem e que se promova o diálogo entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte para alcançarmos o resultado que todos queremos. A China está comprometida com a desnuclearização da Coreia do Norte e esperamos que se chegue a uma solução de paz e estabilidade. Esta tem sido a nossa posição. Uma solução pacífica para os problemas da península é do interesse tanto do Norte como do Sul, mas também é importante a nível regional e mesmo global.

Que ponto de situação faz das relações entre Estados Unidos e China e como encara o futuro?

A relação entre a China e os Estados Unidos têm progredido muito nas últimas quatro décadas. É verdade que esta relação tem passado por altos e baixos, ainda assim acho que os interesses comuns em muito suplantam as diferenças. A estabilidade da relação com os Estados Unidos é algo do interesse mútuo e que beneficia o mundo inteiro. Como tal, espero que o relacionamento continue numa tendência positiva. Apesar da estabilidade geral, temos enfrentado algumas dificuldades de tempos a tempos.

Em relação à guerra comercial, que tipo de acordo a China aceitará? As empresas chinesas do sector da tecnologia são forçadas pelo Governo Central a espiar?

Nas últimas semanas e meses, temos lidado com divergências em termos comerciais e mantido conversações constantes. No ano passado, durante a Cimeira do G20, os dois presidentes chegaram a consensos importantes. Esperamos que a comunicação que temos mantido chegue a bons resultados, estamos a trabalhar para atingir uma situação em que ambas as partes saiam satisfeitas. Acho que é esse o resultado que todo o mundo quer ver. China e Estados Unidos são as duas maiores economias do mundo, cada vez mais interligadas ao longo dos anos em que cooperamos. Não é realista, nem possível, separar as duas economias. Acredito que temos de seguir os princípios da cooperação, em vez do confronto, aprofundar o respeito e benefício mútuo, igualdade para continuarmos a crescer e beneficiar as populações dos dois países. Quanto às divergências, acho que temos sabedoria e capacidade para as ultrapassar e regressar à tendência de aprofundamento das relações. Perguntou-me se o Governo Central pede às empresas chinesas para espiar outros países. Quero que fique bem explícito que isso não é consistente com a lei chinesa, não é assim que a China se comporta. A China não fez, nem vai fazer isso no futuro.

Apesar do progresso conseguido no que respeita à qualidade de vida da população ainda existem queixas. Além do alívio da pobreza, que progressos o povo chinês pode esperar no futuro?

Todos os assuntos relacionados com a vida das pessoas são de extrema importância e o Governo ainda tem muito trabalho pela frente. Com o desenvolvimento económico esperamos melhorar a qualidade de vida dos cidadãos. Temos de nos focar nos aspectos-chave e nas maiores dificuldades que a população enfrenta. O envelhecimento e os cuidados infantis são alguns dos pontos de maior preocupação dos cidadãos. Portanto, o Governo tem de prestar muita atenção a estes aspectos sociais. A população com 60 anos, ou mais, chegou aos 250 milhões, os que têm 65 ou mais são 170 milhões. Por outro lado, o número de crianças abaixo dos seis anos ultrapassou os 100 milhões. Os serviços que se dedicam a estes segmentos da população ainda são deficitários, uma situação que afecta a larga maioria das famílias chinesas. A insuficiência de serviços de cuidado infantil é particularmente grave depois da implementação da política dos dois filhos. No que diz respeito à população idosa, em média, existem apenas três camas para cada centena de cidadãos de terceira idade. Há estudos que indicam que nas grandes cidades os idosos têm de esperar até aos 90 anos para conseguirem uma cama num lar. O aumento deste tipo de infra-estruturas está atrasado em relação às necessidades crescentes.

Que acções concretas o Governo Central irá implementar para dar resposta a esta crise?

Durante as minhas visitas de inspecção, testemunhei exemplos de boas experiências, principalmente no que diz respeito a serviços fornecidos pela própria comunidade. Se é possível que este tipo de serviços seja disponibilizado a preços acessíveis, com qualidade e segurança, isso será benéfico para todos. O Governo tem de desenvolver mecanismos inovadores para corresponder às necessidades destas pessoas. Além disso, é preciso dar apoio legal. Por exemplo, podemos oferecer habitação pública de forma a aliviar os custos dos privados que prestem cuidados de alimentação, mobilidade assistida, serviços de dia, reabilitação e universidades séniores. O Governo Central também pode atribuir isenções fiscais para estes serviços no que toca às despesas com água, electricidade e gás natural. O trabalho principal das autoridades locais é garantir justiça no acesso a este mercado, assim como melhorar a fiscalização para que estes serviços sejam prestados com qualidade. Quem não respeitar a lei será expulso do mercado, uma garantia que pode deixar descansadas as famílias e os cidadãos séniores. Quando os nossos cidadãos idosos tiverem uma vida decente na reforma e quando as nossas crianças tiverem acesso serviços infantis, as famílias podem levar uma vida muito mais feliz, libertando os jovens e a população de meia idade para perseguirem o caminho do empreendedorismo.

19 Mar 2019

Entrevista | Académico Sonny Lo diz que Governo resolve crises com lei

 

[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]uma entrevista transmitida ontem na Rádio Macau, Sonny Lo, analista político e professor universitário, argumentou que o Governo de Macau resolve crises sociais recorrendo apenas à implementação de leis.

“É interessante porque o Governo parece olhar para as medidas legislativas, como a Lei de Bases da Protecção Civil, como uma prioridade. Parece que o Governo tem uma tendência para usar meios legislativos para lidar com potenciais crises, como um tufão”, disse Sonny Lo, numa entrevista concedida no âmbito do primeiro aniversário do tufão Hato.

Para Sonny Lo, “as medidas legislativas são importantes, mas idealmente o Governo devia focar-se em todas as medidas concretas, como aprofundar o leito do mar, garantir que todos os veículos são estacionados em parques de estacionamento elevados em vez de parques subterrâneos, e garantir que é instalada uma barreira de forma a evitar novas inundações”, referiu.

Estas medidas são “mais importantes do que mudanças ao nível das leis para lidar com as chamadas ‘falsas informações’ em situação de crise”, disse Sonny Lo, referindo-se à medida, já anunciada pelo Executivo, de criar o chamado “crime de falso alarme social”.

No que diz respeito à Lei de Bases da Protecção Civil, que o Governo também quer implementar, Sonny Lo lembrou que é necessário algum grau de flexibilidade. O académico acrescentou ainda que as autoridades lidaram com o Hato de forma menos transparente do que o Governo chinês há dez anos, aquando da ocorrência do sismo em Sichuan.

24 Ago 2018

Rui Tavares, historiador e político, sobre Macau: “Até 2049, Portugal tem responsabilidades”

Historiador, político, ex-deputado europeu, Rui Tavares teme que as alterações à Constituição chinesa possam “vir a fazer escola” no mundo. Sobre Macau, o convidado do festival Rota das Letras lamenta que não haja um maior acompanhamento da parte da Assembleia da República e que Portugal ainda tem “obrigações morais e políticas importantes, enquanto garantia da autonomia de Macau dentro do Direito Internacional”

[dropcap]H[/dropcap]Há muitas vozes que dizem que a alteração à constituição chinesa é um retrocesso relativamente à revisão da constituição feita por Deng Xiaoping na década de 80. Concorda?
Concordo que há um retrocesso, que aliás é global. Estamos a assistir a um endurecimento dos regimes no mundo, e aqueles, como na União Europeia (UE), que não o estão a fazer, têm dentro de si regimes que têm estado a endurecer, como os EUA, Turquia, Rússia, Brasil. Há uma série de fenómenos muito preocupantes. E a China foi, de certa forma, mexer num processo que tem sido vantajoso para a China, e isso pode ser problemático para o país. O processo que, apesar de não ter correspondido a uma abertura generalizada, permitiu uma rotação de quadros políticos no topo da hierarquia chinesa, foi muito benéfico para a China nas últimas décadas. Substitui-lo por um processo em que o mesmo líder político pode ficar [no poder] indefinidamente não só pode ser problemático como coloca a seguinte questão: qual é o problema para que esta decisão propõe ser a solução? Ou seja, qual era exactamente o problema que a China tinha que necessitava de ser resolvido através de uma emenda constitucional como esta? Não se vê nenhum.

É uma questão de ideologia?
É uma questão de concentração de poder. Os Executivos têm uma propensão para concentrar poder que, normalmente, só é contida pelas constituições ou pela força da sociedade civil. Em casos que estudei, como o da Hungria, faltaram esses dois elementos, pois o poder podia mudar a Constituição e a sociedade civil não foi suficientemente forte para o conter. Depois do poder ter a concentração de autoridade que pretende, em geral, não a larga. Na Hungria não largaram.

No último congresso do Partido Comunista Chinês (PCC) foi afirmado que estamos numa nova era para o socialismo com características chinesas. Que socialismo é este? O que vem aí em termos de ideologia política?
Parece-me claro que há a assunção oficial de uma doutrina, segundo a qual a grande diferença que interessa não é entre autocracias e democracias, é entre a boa e má governança, e que é muito conveniente para as autoridades chinesas. Esta destina-se a minimizar a importância da existência de liberdades cívico-políticas e da capacidade de escolha, e a maximizar aquilo a que os cientistas políticos chamam de “output legitimacy”. Ou seja, o regime é legítimo quando produz, de acordo com esta doutrina, que me parece errada, consequências desejáveis para a população. Se a economia está a crescer, se há emprego, estabilidade e segurança nas ruas, o regime é legítimo. Eu não vou negar que todas estas coisas são importantes, mas os regimes não podem utilizar essa legitimidade dos resultados como forma para ter uma legitimidade dos resultados, como se fosse desculpa para desconsiderar a legitimidade dos processos, nomeadamente os processos democráticos. O que é preocupante não é só para a China, mas também para o resto do mundo.

Que exemplos pode referir?
O regime da RPC, ao contrário da Rússia, é um regime desejável do ponto de vista em que há muitos outros países que desejam ser como a China, ter o seu tipo de performance. Ao passo que, quando se olha para a Rússia, tem uma posição mais retórica, com traços de uma paranóia geopolítica, o que faz com que gere as suas próprias resistências. O modelo chinês é mais exportável. Esta ideia de dizer que esta distinção entre autocracia e democracia não importa, porque o que importa é se produz boa ou má governança, é uma ideia perigosa porque é sedutora para muitos governos, incluindo no Ocidente. Não é um discurso assim tão diferente do que têm alguns burocratas da UE, que dizem que a UE não tem de ser mais democrática, porque o que é preciso é crescer mais e produzir mais emprego. Ninguém nega isso, mas é evidente que a falta de democracia na UE nos levou a onde estamos hoje. No mundo em que olhamos para os grandes blocos, e grande parte deles são liderados por regimes que estão em vias de se tornar mais autoritários, se a UE, se quer legitimar mais junto dos seus cidadãos e manter a sua credibilidade para o resto do mundo, tem de se democratizar. O que mais me preocupa é que parece que essa doutrina [da China] vai fazer escola.

Uma notícia apontava mesmo para o facto de muitos países africanos estarem a ponderar alterar as suas constituições para reforçar o poder presidencial e até Donald Trump fez elogios a Xi Jinping. Vêm aí tempos perigosos e de alguma inquietação?
Vêm. Temos uma situação muito ambivalente: existem ferramentas, acesso à informação, tecnologia e níveis educacionais altos que nos permitiriam gerir os nossos Estado-nações e organizações de forma mais democrática, dando mais respostas aos anseios das populações, mas não há como negar que este combate vai ser difícil nos próximos anos. Numas partes do mundo será mais arriscado do que noutras. O que é importante é que a sociedade civil à escala global seja capaz de criar redes de solidariedade que transcendam as fronteiras do Estado-Nação. Preocupar-se mais com o que está a acontecer na China e também em Macau e Hong Kong. Estarmos mais preparados para ajudar os nossos co-cidadãos de outras partes do mundo, porque os próximos anos vão ser difíceis e precisamos de deter a regressão no Estado de Direito e na democracia noutras partes do mundo, porque regressa sempre às zonas do mundo onde estamos. A sociedade civil portuguesa pode achar que não tem importância o que se está a passar do outro lado do mundo, mas tem, e isso acaba por reverter para Portugal. No caso específico de Macau, Portugal tem obrigações morais e políticas importantes enquanto garante da autonomia de Macau dentro do Direito Internacional.

Em relação a esse ponto, Hong Kong tem um movimento independentista que não se verifica em Macau. O Reino Unido tem opinado muito sobre a questão de Hong Kong, mas Portugal tem evitado fazer comentários. À luz dessas obrigações de que fala, considera que o país deveria ter uma posição mais forte relativamente a Macau?
Portugal deve ter uma posição mais atenta e mais activa. O Ministério dos Negócios Estrangeiros ou o Governo podem agir de forma mais discreta, e às vezes nem sempre pública. Mas acho que o devem fazer. A Assembleia da República (AR) tem a obrigação de agir de uma forma mais política e mais pública. É pena que não haja um acompanhamento regular da situação de Macau, com uma comissão parlamentar que reúna regularmente, que produza relatórios anuais. É uma pena também que os parlamentares portugueses no Parlamento Europeu não façam em relação a Macau aquilo que eu e a Ana Gomes fizemos em relação a Timor, de servirem de quase embaixadores de Macau junto do Parlamento Europeu. De facto, a comunidade política portuguesa não tem estado tão atenta quanto as obrigações morais e cívicas de Portugal em relação a Macau justificariam. São obrigações que estão plasmadas em instrumentos bilaterais de Direito Internacional, como é o caso da Declaração Conjunta. No caso específico de Macau, não estamos a falar de ingerência, de interferência nos assuntos internos da China, desde que nos mantenhamos nos limites que Portugal sempre soube respeitar.

Só se olha para a questão económica e esquecem-se as questões sobre os direitos, liberdades e garantias, e o sistema político?
Acho natural que o Governo português tenha uma visão marcada por um certo pragmatismo em relação ao que são os interesses económicos do investimento directo chinês em Portugal e do papel que empresas portuguesas possam ter no mercado chinês. Mas é importante que a AR não se sinta limitada por esse papel. O Parlamento deve ter capacidade de ter uma posição política, de acompanhar e recolher factos acerca da situação dos direitos, liberdades e garantias em Macau, onde vive uma comunidade portuguesa muito grande e diversa. Se há coisa que retiro das minhas conversas com portugueses em Macau é que estes têm vontade que esta informação passe para Portugal, de que estão atentos, preocupados também, e que gostariam que houvesse de Portugal uma atenção em relação à questão de Macau nos próximos tempos, para que o desenvolvimento harmónico desta sociedade, da sua autonomia e das suas liberdades, seja garantido. Até 2049, Portugal tem as suas responsabilidades e deve cumpri-las. Mas isso não passa pela política do megafone, passa por fazer perguntas. De cada vez que haja uma questão que possa pôr em causa a garantia dos direitos e liberdades, deve perguntar-se o que se passou. Passa também por ouvir mais a sociedade civil de Macau, com mais fóruns em que esse esforço seja feito. Esse papel deve ser feito pela nossa diplomacia, de uma forma mais discreta, mas também pela nossa AR.

O Gabinete de Ligação teme que haja influências do movimento independentista de Hong Kong em Macau. Acredita que essa influência possa, de facto, acontecer?
O movimento independentista de Hong Kong acaba, muitas vezes, por ser usado como uma forma de condicionar o movimento democrático. Não me queria pronunciar sobre as veleidades independentistas, porque está para lá de um limite que é preciso respeitar em relação à soberania e integridade territorial da China. Hong Kong e Macau pertencem à China. Acho natural que os movimentos, pela representação política, pelo pluralismo, se reforcem mutuamente de um sítio para o outro, na medida em que isso for a demonstração de um anseio político que cabe dentro da Lei Básica e dentro dos pressupostos da Declaração Conjunta. Ninguém deve declarar-se preocupado ou ameaçado pelo facto de as sociedades quererem viver de acordo com os compromissos que os Estados tiveram perante elas. E que acreditam que, até 2049, serão cumpridos.

continue a ler a entrevista a Rui Tavares
20 Mar 2018

Adriano Jordão, fundador do FIMM: “É preciso saber levar a chama na vida”

 

O Festival Internacional de Música de Macau tem hoje ao piano, no palco do D. Pedro V, “Reencontros”, com o seu criador. Um festival que nasceu de muita vontade e que por “força do destino” trouxe Audrey Hepburn a Macau, logo na primeira edição. Adriano Jordão recorda como tudo aconteceu

 

Está aqui no trigésimo aniversário do Festival que criou…

Além de o FIMM ter sido uma ideia minha, também toquei no primeiro concerto da primeira edição. Há 30 anos estava a abrir o FIMM e estar aqui agora é uma tremenda emoção.

Como é que tudo começou?

Em primeiro lugar, sempre gostei de fazer muita coisa. Sou formado em Direito, por exemplo, mas sempre me interessei por tudo um pouco e foi aí que apareceu a música. Por outro lado, vir a Macau era um sonho que tinha desde pequeno. Começou com a oferta de umas cabaias muito bonitas que o meu avô materno tinha trazido para Portugal. Depois fui convidado a tocar em Hong Kong e foi nessa viagem que conheci a terra. Desde os primeiros contactos que tive com Macau que sonhava com um lugar mais cosmopolita e moderno, capaz de aliar as suas idiossincrasias históricas e as suas aptidões económicas à civilização cultural, com a componente ocidental que tanto o diferencia. Já na altura e com as características de Macau pensei que existiam duas soluções: que isto pudesse ser Las Vegas ou Mónaco, e eu preferia o Mónaco, claro.

Foi por isso que pensou num Festival Internacional de Música?

Pensei logo que um acontecimento musical de primeiro plano a nível mundial atrairia a Macau a inteligência cultural e embelezaria a sua imagem internacional. Tinha tido uma excelente experiência no Festival Internacional dos Açores e resolvi propor ao então recém-nomeado Governador Pinto Machado a realização deste evento, desafio que aceitou de imediato. Foi um ano de trabalho muito árduo e, quando tudo parecia estar resolvido, alguma coisa emperrava o sistema e recomeçava-se do zero.

Pensou em desistir?

Pensei mesmo que o projecto morria quando o seu primeiro defensor cessou funções. Mas chegou o Eng. Carlos Melancia que acabou por ser um elemento crucial. No entanto, é de notar, as reacções negativas vinham sempre da parte portuguesa e nunca da parte chinesa. Os entraves foram muitos e numa reunião com o Turismo, Costa Nunes sugeriu que o melhor seria ter uma grande estrela de cinema em Macau. Pedi-lhe nomes e ele avançou com o de Andrey Hepburn.

E conseguiu trazer a estrela?

Sim. Com aquelas coincidências estrelares que iluminam as nossas vidas, lembrei-me de ter visto na residência do embaixador da Holanda em Lisboa uma fotografia de Audrey Hepburn. Aproveitando o fuso horário comecei a fazer contactos e liguei para Lisboa. Para minha grande decepção soube que o embaixador tinha abandonado a carreira. No entanto, e face à minha insistência e ao meu desapontamento, a funcionária deu-me um número de Nova Iorque onde o poderia encontrar. Ganhava mais cinco horas de fuso horário. Ao falar com ele, e numa feliz coincidência, a actriz era sua familiar e tinha raízes holandesas.

 Portanto, conseguiu.

Disse-me que Audrey Hepburn falaria comigo mas que me aconselhava a que, além da música, imaginasse uma fórmula que a atraísse, visto estar numa fase em que andava mais preocupada com situações sociais. Lembrei-me da UNICEF. Menti com quantos dentes tinha na boca mas utilizei, na altura, o drama dos refugiados do Vietname e disse à actriz que gostaríamos de a ter em Macau para angariar fundos. Quando lhe perguntei pelo cachê, ela disse que não queria nada porque estaria numa acção de solidariedade. Depois falei com UNICEF que aceitou a minha sugestão. Em consequência disso, a UNICEF acabou por nomear Audrey Hepburn “Embaixadora da Boa Vontade” e deu-lhe uma razão para viver por grandes causas os últimos anos da sua vida. Foi este o primeiro FIMM e foi um sucesso.

Que critérios tinha para as escolhas do festival?

Os que sempre tive: intransigência absoluta ao nível da qualidade, equilíbrio nas presenças chinesa e portuguesa, e a internacionalização do evento.

Quantos anos durou a sua presença no FIMM?

Foram cinco anos e depois segui outros rumos.

Como é que encara as diferenças que nota em Macau, três décadas depois?

Sinto que há aqui um certo mal-estar quanto a esse assunto. Há uma certa inquietação nas pessoas ou dúvida acerca do caminho. Mas o que penso é que a vida não anda para trás, mas sim para a frente. Por vezes este andar é com coisas que não entendemos no momento e que só entenderemos depois. Vou dar-lhe um exemplo: eu, pessoalmente não gosto de ler o jornal num iPad, mas não é um erro existir essa plataforma. Gosto também muito mais de fazer compras na loja da esquina, porque era assim na minha infância, mas não sou contra os actuais centros comerciais, apesar de preferir a intimidade de um mundo que já não existe hoje.

E as mudanças na música?

Também têm sido muitas e o grande problema, hoje, é que as pessoas estão a perder as referências. O nível dos concertos, por exemplo, é muito mais baixo actualmente. Isso acontece porque as pessoas que vão ver o espectáculo estão à espera de ouvir a reprodução do CD que têm em casa e que põe no carro.

Um concerto tem de ser muito mais…

Um concerto é uma criação daquele momento. Se um concerto for feito para ser a reprodução do CD é uma porcaria. E o que temos hoje é a inversão das coisas. Mas não sei se, infelizmente, não estaremos no caminho do fim dos concertos. Para conseguirem vingar, as pessoas começam a fazer concessões até não se sabe onde e a achar que afinal não é assim tão mau. Só esse pensamento já é péssimo. Depois, quanto maior a concessão, menor a qualidade. O problema de hoje, no geral, é que todos optam pelo que é mais fácil.

Porque é que isso está a acontecer?

Esse é o lado perverso contra o qual me revolto e que tem que ver com a tecnologia. Não tenho nada contra e até sou a favor, a minha repulsa é pelo modo como é usada. Somos nós que a temos que dominar e não o contrário. Esse é o grande ponto. E este monstro do computador pensante, que já criámos, vai ser desastroso. Os nossos neurónios, com as ajudas virtuais, começaram a ser muito menos utilizados. Basta recorrermos ao exemplo dos números de telefone. Antigamente todos sabíamos os números de todos e agora ninguém sabe o de ninguém, porque nos apoiamos na lista do telemóvel. O pensamento começou a deixar de ser tão utilizado a partir de Gutenberg. Foi a primeira revolução tecnológica. Não foi o Gutenberg que foi mau; mau foi termos deixado de usar o cérebro. O problema é que depois a preguiça começa a tomar conta de nós. E a memória treina-se e as pessoas já não o estão a fazer. Até na música. A música tem de ser tocada sem partituras. É preciso saber levar a chama na vida. As pessoas têm de saber aquilo por que lutam e ir à procura disso mesmo. Claro que é mais fácil estar no sofá em casa e acender uma chama artificial. Mas o levar a chama na música é fundamental e integra as suas referências.

Quais são essas referências?

Em primeiro lugar, é perceber que na música não há verdade. Por exemplo, das coisas que mais gosto e detesto na vida é integrar um júri internacional. Gosto, porque é muito bom ver e ouvir a música que os jovens andam a tocar, mas detesto porque tenho a certeza absoluta que vou ser sempre injusto. Por exemplo, o mesmo concorrente visto por júris diferentes tem classificações também diferentes. O problema não está no jovem, está no júri, e essa sensação de que a justiça não existe não me é nada agradável.

 Anulavam-se os concursos?

Não, mas sou adepto de que não haveria hierarquização de lugares nos concorrentes vencedores. Elegiam-se três primeiros lugares. Os concursos são importantes porque trazem metas e são motor de trabalho mas deveriam ser feitos de outra forma. Mas, lá está, na música não há verdade.

O que é que podemos esperar do concerto de hoje, deste “Reencontros”?

É isso mesmo. É o meu reencontro com o FIMM. Fui convidado agora pela direcção chinesa do festival, e venho aqui. Continuo a gostar muito de Macau e a ter respeito por esta terra. É por isso que não estou cá com aquela postura saudosista daquele Macauzinho bonito do passado e que está na história. Agora, este mundo é diferente. É nele que estou e é na RAEM que também me reencontro. Temos é de estar abertos para o futuro.

 

20 Out 2016

Rogério Beltrão Coelho: “Macau é uma aldeia com grandes condições financeiras”

Rogério Beltrão Coelho é o jornalista responsável pela agora revitalizada Associação Amigos do Livro. Fortemente ligado a Macau, pretende dar um novo alento à actividade editorial para que o registo literário não se perca e a cultura permaneça


Jornalista, já passou pela imprensa da RAEM. Da sua experiência, houve mudanças significativas nos jornais antes e depois da transferência?

Houve muitas. A história da imprensa de Macau é muito curiosa. O primeiro jornal do território é a Abelha da China, que é criado com fins eminentemente políticos. Nos anos 80 há a Gazeta Macaense, que é um jornal dedicado aos escândalos. Em 82 aparecem o Jornal de Macau e o Tribuna de Macau, que na altura ainda era semanário. Estas publicações já eram feitas por profissionais vindos de Portugal e que respeitavam os princípios que formam a nossa actividade de jornalistas, nomeadamente éticos e de rigor. É aqui que começa de facto a aparecer a imprensa com alguma qualidade e alguma responsabilidade. A partir de meados dos anos 90, e essencialmente após a transferência, os jornais ganham outra força e outra forma e começam a vir mais jovens profissionais

É essa gente que dá novo alento à imprensa?
É gente jovem que, de uma forma geral, tem talento e qualidade e que imprime à imprensa uma outra dinâmica e uma outra qualidade. O que não quer dizer que, dadas as especificidades aqui da terra, os jornais sejam politicamente puros.

Há limites no exercício da profissão de jornalista?
Tive esse experiência também entre 2009 e 2011 no Macau Daily Times. Não que tivesse tido alguma dificuldade de funcionamento, mas acho que há limitações de várias ordens no exercício da profissão em Macau.

Fala da liberdade de expressão?
Não se pode dizer que há um exercício dessa liberdade. É um facto que ela existe, mas o seu exercício, fruto das especificidades de Macau, nem sempre é pleno. Não quer dizer que em situações pontuais a imprensa não vá aos limites positivos no seu papel de denúncia ou afirmação. Existem também as limitações inerentes a uma imprensa provinciana. Macau é uma aldeia com grandes condições financeiras, com um grande desenvolvimento, que pode ser discutível, mas que é de facto um grande desenvolvimento económico. A imprensa em Macau é de província, o que não quer dizer que seja má. Mas há que ter noção dessa dimensão e do que se pode fazer dentro dessas balizas. Não temos, por exemplo, condições para desenvolver uma imprensa de investigação. beltão_coelho_3_sofiamota

Está ligado essencialmente à actividade editorial. Como surgiu?
Tirando os primeiros dois anos em que estive cá a criar o Gabinete de Comunicação Social, toda a minha actividade jornalística foi desenvolvida na área editorial. Já em Portugal estava ligado à edição de livros e depois em 86 em Macau estive no Instituto Cultural, em que realizámos uma série de iniciativas entre as quais edições inéditas. Em 90 criámos a Livros do Oriente que funcionou muito bem até à transferência.

O que aconteceu?
Ao contrário do que as pessoas possam pensar nunca houve um apoio directo à actividade editorial. Na maior parte dos casos, a edição era a fundo perdido e o que a sustentava eram os projectos que tínhamos, como a Revista Macau. Tínhamos sobretudo a produção de livros para entidades terceiras como o Governo ou fundações, etc. Eram encomendas que nos permitiam depois alimentar a actividade editorial altamente deficitária. Hoje temos cerca de 90 títulos editados e tivemos dois ou três casos que não deram prejuízo.

Não há leitores em Macau?
Já houve mais. Hoje quando se faz um lançamento aparecem 20 ou 30 pessoas no máximo. O tema “Macau” é um tema que interessa pouco. Portugal está muito desligado da RAEM em termos de conhecimento ou interesse. Houve uma luta constante para ultrapassar essa situação criando um mailing próprio, por exemplo das pessoas que estivessem em Macau ou outros interessados que, no meu entender, atingiria umas dezenas de milhares de pessoas. No entanto isso nunca foi possível.

E porquê?
A actividade editorial em Macau padece de uma estrutura que nunca teve. Era e é possível encontrar apoios a nível individual. Posso criar um projecto mas sem uma estrutura que apoie toda a actividade e que vá ao encontro das necessidades de marketing e de divulgação, nunca chego a lado nenhum porque não tenho interlocutor e não há interesse ao nível oficial para o fazer.

Macau não tem interesse?
Não tem uma política do livro. A meu entender, a entidade que poderia regular, dinamizar e criar condições de apoio é o Instituto Cultural, que não o faz. Limita-se a ser editor, o que é profundamente errado.

Seria então essa a função do IC, de coordenação?
Não diria coordenar, mas sim de criar condições.

Que tipo de condições são necessárias?
Criar um fundo editorial. Uma verba que todos os anos os editores que concorressem com as suas propostas submetidas teriam apoio, como se faz com outras actividades culturais. Há ainda necessidade de uma coisa importantíssima: um fundo de tradução. Estando em Macau e sendo a ponte entre as comunidades e culturas portuguesa e chinesa, temos o dever e devíamos ter a missão de ser os transmissores dessa cultura. É intenção da Associação Amigos do Livro a promoção da actividade editorial de livros chineses em Macau. É preciso criar tradutores e um fundo de tradução para que esse obstáculo seja transposto. Ninguém vai editar um livro tendo que suportar os custos de tradução.

De que mais precisa o mercado editorial?
Não há um prémio literário ou de poesia em Macau. Não há incentivo à criação. Não há uma bolsa literária que responda à vontade de alguém querer escrever um livro e possa dedicar o tempo necessário à escrita com um suporte financeiro que o sustente. Não há sequer a preocupação das pessoas se sentarem à mesa e colocarem estes problemas e tentarem encontrar soluções.

Mas tem havido esforços no sentido de solicitar a atenção da Administração…
Estes problemas têm sido colocados à Administração ao longo dos anos e continuam a sê-lo. Caem em saco roto. Os casinos daqui a cem anos já não existem. Os edifícios deterioram-se. Mas daqui a cem anos, as obras que forem publicadas ainda estão consultáveis. As pessoas ainda poderão ler, seja em que forma for, impresso ou digitalmente. Essa informação perdurará.

Mas não há comércio do livro? Não há forma de entrar no mercado da China?
Foram traduzidas em Macau para Chinês algumas obras de alguns portugueses. Posso estar a ser injusto, mas penso que isso aconteceu numa perspectiva de mostrar serviço. Quando se traduz para a China uma edição de 500 exemplares que objectivos é que se pretende atingir? Numa das viagens que fiz à China encontrei o tradutor do Jorge Amado que me dizia que já na altura as traduções deste autor atingiam tiragens de cerca de 360 mil unidades. Agora com uma tiragem de cinco mil exemplares para o mercado chinês podemos dizer que poderá chegar aos meios académicos mas não entra na China. E mesmo esses não sei se são distribuídos. Por outro lado, não podemos fazer livros cá e mandá-los para a China. Temos que entrar em acordo e fazer parcerias com editoras chinesas que se mostrem interessadas e que assumam essa co-edição, o que não é fácil. Tem que se partir de um fenómeno que desperte a atenção, que foi o que aconteceu com o Jorge Amado e “Gabriela”.

Qual é o problema com a distribuição?
Aqui os livros morrem no lançamento. Há um grande folclore com isso e depois ficam nos armazéns. É apenas anunciada a cerimónia e não o livro. Não há uma crítica literária em Macau. Falta toda uma estrutura e uma vivência. Vai-se à livraria e o livro nem está lá. É o pior que pode acontecer a um livro. Um pessoa que tenha interesse numa obra vai uma e duas vezes à sua procura, não encontrando, esquece. Penso que é importante numa terra como Macau ter uma componente de conhecimento e de cultura que prevalece além de tudo e que, quanto mais enriquecida for, mais valor tem o território. Tenho 26 anos de actividade editorial aqui e não consigo falar com ninguém que supostamente terá a tutela desta área.

Por que razão?
Não sei. Acho que há coisas que funcionam hoje muito melhor do que na Administração portuguesa. Exemplo disso são os serviços públicos. Mas a nível de poder e decisão não há acesso a quem de direito. Se se conseguisse ir directamente a quem decide era mais fácil. Acho que isso é a grande falha da Administração no contacto com os agentes culturais.

Mesmo numa altura em que se fala tanto de indústrias criativas?
Acho que nem se sabe o que é isso das indústrias criativas, mesmo quem se agarra a isso como uma tábua de salvação económica. Neste momento as indústrias criativas são a moda e o design, mas a actividade editorial também o é: fomenta o design, a escrita, a tradução, a ilustração, etc. Não há um fórum onde isto possa ser discutido num território que tem tanto dinheiro e que pode pôr as coisas a funcionar, assim como fez com os serviços públicos.

A Associação Amigos do Livro está de volta com novas actividades.
A Associação, que foi criada há uns anos, devido a determinas circunstâncias esteve parada. Retomou a actividade o ano passado e estamos com uma série de projectos que precisam de apoios. Nalguns deles não há necessidade de dinheiro mas sim de disponibilização de espaços. E até pode haver parcerias em que nós damos a nossa parte e que sendo retribuída podemos seguir actividade. A primeira actividade, e que teve o apoio incondicional da Fundação Rui Cunha – o que nos permitiu seguir em frente, foram as conversas sobre o livro. É um espaço que nos permite discutir assuntos ligados ao livro, dar a conhecer aquilo que é a actividade literária em Macau e nos países à volta. Permite-nos conhecer o mundo em que estamos de forma a podermos partir depois para outras iniciativas. beltão_coelho_3_sofiamota

Quais são as iniciativas previstas?
Sessões de poesia, alguns programas para a televisão, com intervenções curtas na área literária, etc. Está ainda em marcha uma grande acção em Outubro: o Fórum do Livro de Macau em Lisboa. Neste momento metade do programa está garantido com apoios e parcerias com instituições em Portugal mas ainda faltam muitas respostas ligadas a Macau. Integra uma grande feira do Livro, conferências e terá lugar em vários sítios. Já temos o Centro Científico e Cultural de Macau, o Museu do Oriente, o Clube Militar Naval e a Casa de Macau de Lisboa e esperamos contar com a sala de visita em Lisboa que é a Delegação Económica e Comercial de Macau. Estamos à espera de uma resposta. Pensamos que será positiva mas a senhora da missão da Delegação não decide nada sem perguntar a Macau e é mesmo capaz de dizer que não.

De que vai constar este Fórum?
Vamos falar das várias vertentes do livro de Macau em Português e em Chinês. Dar a conhecer os autores vivos e outros que precisam de ser lembrados, como é o caso do Silva Mendes ou do Camilo Pessanha ou de Ondina Braga, que escreveu muito sobre Macau.

Quanto seria preciso vender em Macau para rentabilizar um edição?
Vender 500 exemplares de uma edição já é rentável. E há cada vez menos interesse. O livro de Macau não se vende na livraria e é preciso também um trabalho online. Julgo que uma acção pontual como esta do Fórum vai despertar interesse naquele momento, naquela semana. Hoje em Macau há um fenómeno muito curioso. A comunidade está muito dispersa. Este jovens que cá estão vêm com a mentalidade de emigrante, o que não acontecia no passado, e por isso cada um vive na sua tribo. Se um faz uma coisa os outros também fazem, mas se for alguma coisa que seja de interesse geral para além da tribo já não se importam. Têm os seus interesses culturais e económicos muito específicos e estão muito distanciados de Macau. Vivem na sua bolha, vão às compras, têm uma empregada para cada criança e consomem luxo. Vive-se hoje uma grande arrogância.

E a cultura?
É uma pequena minoria.

Não podia ser a cultura um chamariz para o turismo?
Poderia, mas o nosso turista é minoritariamente ligado à cultura. Têm que se criar motivos de interesse e programas para apoiar esse turismo. Macau não tem espaço, mas na Europa não há cidade que não tenha, por exemplo, esplanadas. Aqui distribuem-se panfletos com os telefones das “meninas” e em Praga distribuem-se a publicitar os concertos todos os dias em vários sítios diferentes e as pessoas vão porque se habituaram àquilo. É preciso que as pessoas que decidem tenham preocupações culturais e tenho dúvidas que as tenham. A partir daí tudo poderia funcionar.

4 Jul 2016

Lei Heong Iok, presidente IPM: “Cada vez mais escolas pedem docentes de português”

O ensino bilíngue é uma das “meninas dos olhos” de Lei Heong Iok. O presidente do Politécnico de Macau acredita na RAEM enquanto plataforma de trocas comerciais e culturais e lidera uma instituição que acompanha os tempos e as mudanças

Para o Instituto Politécnico (IPM) quais as mais-valias da Lei do Ensino Superior?
Para o IPM o aspecto mais importante é, com certeza, o poder vir a abrir os graus de mestrado e doutoramento. Esta abertura é de grande importância para o ensino superior até porque até agora, não podíamos abrir estes graus e com a futura lei do ensino superior o IPM poderá ter este poder académico.

Mas já têm parcerias com o grau de mestrado…
Sim. Os nossos colegas dos politécnicos portugueses já oferecem essa possibilidade. Desta forma estabelecemos parcerias nomeadamente com Instituto Politécnico de Leiria e temos cursos de mestrado abertos, sendo que o diploma é dado pela instituição portuguesa, mesmo que a formação também seja dada em Macau.

Com esta abertura, que áreas de mestrado ou doutoramento poderão abrir?
Até hoje os nossos licenciados pedem estes cursos porque não podendo continuar os estudos no IPM têm que procurar outras instituições, tanto em Macau e mesmo no estrangeiro. Por exemplo o curso tradução e interpretação português | mandarim, será uma prioridade. O governo já definiu e iniciou a pratica da construção de uma plataforma de comércio entre a China e os Países de Expressão portuguesa e por isso precisa de técnicos bilingues qualificados. Como nós não temos podido abrir mestrados e doutoramento podemos pensar que há aqui uma contradição. Os alunos já pedem a abertura nas áreas de cultura e língua portuguesa com prosseguimento de estudos em mestrado e até de doutoramento.

É essa então a primeira aposta, a abertura de graus superiores no ensino bilingue?
Sim. Não só é esse o nosso desejo como já iniciámos os preparativos para que isso aconteça.

Falando em bilinguismo, O IPM tem esta licenciatura em tradução. Faz sentido ter uma licenciatura deste género sem antes ter formação específica na língua em si? Sendo a especialização em tradução talvez uma área para os tais mestrados?
Isso faz sentido se pensarmos na qualidade. Essa pode ser uma solução que poderemos adoptar para quando se chegar à altura de fazer traduções e interpretações já exista o domínio das duas línguas. Realmente é necessário muito tempo para que se consiga fazer tradução . Mas temos que procurar uma solução equilibrada conforme as necessidades por parte dos alunos e mesmo dos pais que podem querer ou não investir tanto tempo ou dinheiro. Estamos a falar que havendo primeiro língua e depois mestrado, de um período de seis anos de estudos. Naturalmente que ficaria garantida uma melhor qualidade mas implica mais investimentos.

Não será a qualidade a prioridade?
Quatro anos em muitas áreas de estudo, não são efectivamente suficientes. Daí e mais uma vez, a necessidade de abertura de mestrados e doutoramentos. O IPM também está a pensar seriamente nessa lógica para os cursos que possam ser seguidos de graus superiores. Já sabíamos disso também há muito e por isso tratámos de antemão de estabelecer parcerias com politécnicos e universidades portuguesas e já conseguimos com Leiria ou Lisboa . Sabemos que temos ali fontes onde beber esse conhecimento. Para o grau de doutoramento já estabelecemos uma parceria com a Universidade de Lisboa. Gostaria de referir outro aspecto : hoje em dia, com o uso da tecnologia em particular na área da tradução, na chamada “machine translation”, temos estado especialmente atentos. Neste momento temos com Leiria e Coimbra , em andamento um projecto para a criação de um laboratório de tradução automática assistida por computador. Já falámos com o presidente do IPL e com alguns professores de Coimbra. Neste momento esta uma delegação do IPM em Coimbra , com especialistas na área de informática para darmos andamento ao projecto. Lei_Heong_Iok_6_sofiamota

Estão a criar um sistema informático capaz de fazer traduções com qualidade?
Exactamente! Hoje em dia está na moda e já há programas com alguma qualidade neste tipo de tradução nomeadamente do inglês para o chinês ou vice versa.

Dadas as especificidades do chinês, acha que é possível conseguir qualidade?
É muito difícil mas acho que é possível e que vale a pena tentar.

E o futuro dos tradutores que estão a formar ?
Acho que o Homem é sempre necessário para controlar a máquina.

Há alunos provindos da China continental que se licenciam em Macau, nomeadamente na área da tradução e interpretação, e depois não são absorvidos pelo mercado local por dificuldades relativas à residência. Qual a sua opinião?
Isso é uma área que não me compete, mas eu sou da opinião de que estando nós a formar tradutores de qualidade se devem abrir as portas de ambos os lados: quer a chineses do continente quer a portugueses que aprenderam o mandarim. Macau como plataforma deve não só atrair estas pessoas como ainda criar condições para que elas trabalhem cá de modo a aproveitar da melhor maneira esses recursos. Penso que é muito importante criar boas condições para a construção desta plataforma. O Governo, defendo eu, deve aproveitar. Pelo que sei, há vários serviços do Governo onde fazem falta bons tradutores e intérpretes. Por que não aproveitar melhor os alunos que passam por Macau? Acho que se devem criar condições para facilitar os pedidos de residência para esses profissionais.

O IPM está também a abrir novos cursos e a integrar estudantes de mais países…

Sim, abrimos um novo curso de língua chinesa para pessoas dos países de expressão portuguesa. Este é o primeiro ano deste curso de licenciatura em língua e cultura chinesa.

Qual a especificidade deste curso?
A abertura deste curso é especialmente preparada para pessoas que falem português e que queiram aprender mais chinês, não só a nível de língua como da cultura chinesa. Estamos a abrir este curso enquanto licenciatura e quem sabe, no futuro, ter outros graus. Já estabelecemos algumas parcerias e com a coordenação de vários politécnicos, para que tenhamos mais estudantes portugueses acabados de sair do secundário e que vêm directamente para o IPM, fazendo cá a licenciatura. E não serão só de Portugal. Teremos alunos de Cabo verde, Angola e mesmo do Brasil. No primeiro ano já vamos começar com quatro estudantes brasileiros e virá também uma turma de Cabo Verde que frequentará cursos nas áreas de jogos. De Portugal ainda não tenho o número de alunos, mas saberemos que irá aumentar. Já temos mais edifícios na Taipa cedidos pelo Governo que também ajudarão a albergar estes novos alunos e a partir do próximo ano lectivo já poderemos receber mais estudantes.

Como é que estes cursos vão ser financiados?
Com certeza que haverá estudantes com dificuldades financeiras pelo que tentaremos facilitar dentro do possível esses alunos com bolsas de estudo, ou mesmos estadia nas residências. Poderemos ainda ponderar a atribuição de outros subsídios como à alimentação. Lei_Heong_Iok_4_sofiamota

Na área do português, o IPM tem ainda o curso de Administração Pública que tem vindo a ter cada vez menos alunos. Porquê?
Macau foi entregue à China já há quase 18 anos e por isso o número de portugueses na administração pública tem também vindo a diminuir. As pessoas que falam português começam a não ver utilidade em tirar este curso. Por outro lado, há cada vez menos pessoas que falam português interessadas em ingressar na função pública. No entanto, se construirmos uma plataforma também aberta a mais países de expressão portuguesa, acreditamos que este curso poderá renascer e voltar a crescer. Actualmente também não o podemos abrir a estudantes da China ou outros estrangeiros, mas tendo outros cursos abertos a estudantes de língua portuguesa, esses alunos posteriormente poderão sentir interesse e querer integrar este, de Administração Pública. Acho que no futuro não voltaremos a sentir a falta de alunos. Por outro lado, também criámos a formação em relações económicas e comerciais e assim conseguir ter mais alunos e dar mais aulas aos nossos professores.

Enquanto plataforma, como tem dito, em que mais se tem destacado o IPM?
O IPM muda com o tempo e com as circunstâncias. Depois de ler uma recente entrevista do presidente Marcelo Rebelo de Sousa e sendo que Portugal pretende também ser um ponto estratégico da “Rota da Seda”, o IPM pode contribuir mais e melhor. Assim, por exemplo, e na sempre referida falta de técnicos bilingues, nomeadamente em áreas como a lei, finanças ou tecnologia, porque não pensar no futuro no domínio da área ferroviária, por exemplo. Estamos também a criar condições para abrir formação da docência do português.

Por quê a docência do português?
Cada vez mais escolas primária e secundárias pedem docentes de português, mesmo na China continental. Mas há que garantir a qualidade e o IPM com as parcerias que tem, pode assumir isso mesmo.

Relativamente aos estágios e à remuneração ou não dos mesmos. O que acha?
É difícil responder a isso devido à lei do trabalho em vigor. Podemos é utilizar a chamada “ajuda aos estudantes”, com alguns subsídios de incentivo Penso que o Governo também nesse sentido deveria abrir mais possibilidades.

Falamos actualmente das duplas licenciaturas que poderão vir a ser administradas. Considera uma medida positiva para o ensino superior?
Num futuro próximo o IPM não vai aderir às duplas licenciaturas. Pensamos mais na qualidade.

“A criação de um exame conjunto entre várias instituições é feito no sentido de facilitar aos alunos”

Acha que vão interferir nessa qualidade?
Há pessoas que são capazes de fazer duas coisas ao mesmo tempo. Há outras que não o podem fazer, nem querem. Mas quem faz duas coisas ao mesmo tempo, na minha opinião, tem sempre mais dificuldade e a qualidade do resultado será aquém do esperado.

Os novos exames unificados aos quais o IPM aderiu, constituem uma medida facilitadora para quem?
Penso que a criação de um exame conjunto entre várias instituições é feito no sentido de facilitar aos alunos. Com resultados já obtidos nas diversas áreas, os alunos podem concorrer em simultâneo a várias instituições.

Mas se correr mal não tem mais hipótese de repetir…
Tem razão nesse sentido, mas não há rosas sem espinhos. Nós vemos mais vantagem do que desvantagens. Acho que facilita muito. Na época de exames, coitados dos estudantes que se queiram candidatar a por exemplo dez instituições, têm que fazer dez exames, um para cada uma. É um período terrível para os estudantes. Agora fazendo este exame que depende das instituições que aderem, só têm que fazer um para essas mesmas instituições.

Qual a sua opinião quando ao financiamento por parte do Governo do ensino superior privado?
Não me quero pronunciar quanto a essa política do Governo.

A UM encerrou algumas turmas de português. Qual a sua opinião? cancelamento de turmas de português pela UM?
Eu só li o que foi publicado na imprensa portuguesa. De qualquer forma acho que quer o governo ou o IPM investem muito mais na área do português. O gabinete do ensino superior e Alexis Tam o nosso secretário, também dão muita importância ao ensino da língua e cultura portuguesa e apoia-nos muito nesse sentido.

O que tem a dizer acerca da recente descida de dez lugares da UM no ranking asiático?
Não meto o nariz na área dos outros. Interessa-me mais a minha instituição.

Avaliação do ensino superior…
Acho que os novos sistemas de avaliação são importantes. O IPM por exemplo contrata delegações de avaliação portuguesas para avaliação do nosso curso na língua. Ainda não saiu o resultado mas a delegação já enviou uma nota com uma avaliação positiva o que é muito bom ara nós e nos dá também um grande estímulo. Para outros cursos também convidamos agências especialistas em cada uma das áreas. No inglês convidamos Nova Zelândia e na informática convidámos agências de Inglaterra. É importante aceder à qualidade segundo os critérios internacionais. Se Macau quer ser internacionalmente reconhecido tem que ter instituições cuja qualidade esteja de acordo com os critérios internacionais, e para isso não pode recorre a avaliação local.

27 Jun 2016

António Katchi: “Executivo tem tratado a lei cada vez pior”

Um Governo que não cumpre a lei e a utiliza em seu bel-prazer, um território que está a perder as suas liberdades e um Direito local cada vez pior. São algumas das opiniões de António Katchi, jurista e docente do Instituto Politécnico de Macau, que afirma não ter medo de dizer o que pensa

Em 2011 afirmou que Macau caminhava para um sistema anti-democrático. Já atingimos esse ponto?
De facto, sempre houve a expectativa que Macau pudesse ser um regime democrático ou, pelo menos, caminhasse para esse lugar. A verdade é que Macau tem apenas um pequeno elemento democrático que é a eleição por sufrágio directo de uma parte dos deputados. Claro, havia a expectativa que essa parte fosse aumentando até que se chegasse à eleição integral da Assembleia Legislativa (AL), por sufrágio directo, e também à eleição do próprio Chefe do Executivo através do mesmo sistema. Ora passaram quase 17 anos sobre a transferência da soberania e não houve nenhum passo nesse sentido. Pelo contrário, houve até um passo atrás com a extinção dos municípios.

Que eram eleitos de forma parcial…
Sim, havia um órgão que era parcialmente eleito por sufrágio directo e os municípios, os dois, o Leal Senado e o das Ilhas, foram extintos e substituídos pelos Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), cujo Conselho de Administração é inteiramente nomeado pelo Governo. Portanto, não houve a evolução que se espera, mesmo que fosse gradual, para um regime mais democrático.

Mas Macau poderia algum dia sê-lo?
Não. Não se pode ter essa ilusão, de que em Macau poderia haver um regime plenamente democrático, porque Macau é uma região em que o regime é totalitário. Mesmo que por hipótese a AL e o Chefe do Executivo fossem eleitos por sufrágio universal directo, o facto é que eles estariam sempre subordinados a autoridades políticas nacionais destituídas de democraticidade.

Mas há outros sinais…
No capítulo dos direitos, liberdades e garantias têm surgido, por vezes, ameaças. Houve uma deterioração daquilo que normalmente se diz o primado da lei, portanto, no comportamento da Administração Pública. Isto é, após a transferência da soberania o Executivo tem tratado a lei cada vez pior. Porque muitas vezes as autoridades administrativas invocam a lei não como um fundamento que, de acordo com a interpretação possa justificar a acção, mas apenas como um pretexto que manifestamente não oferece qualquer justificação para a acção concreta.

Por exemplo?
Um dos exemplos mais conhecidos é quando se invoca a Lei da Segurança Interna para impedir a entrada em Macau de pessoas que não põe minimamente a segurança interna do território. Pessoas que não estão ligadas a organizações terroristas, nem a qualquer outro tipo de organização criminosa, nem em relação às quais existem menor fundamento para que as mesmas queiram vir aqui causa distúrbio, ou exercer qualquer actividade ilícita. Quando se proíbe a entrada de um jornalista, um advogado, de um professor universitário, de um deputado, de um sindicalista ou até de uma pessoas que só vem apanhar o avião para qualquer outro lado, como já aconteceu, tudo isto significa que o Governo invoca esta lei, sem especificar o artigo. Mas mesmo que especificasse não existiria a menor relação naquilo que está previsto e aquilo que é o motivo real do qual eles estão a proibir a entradas das pessoas.

A proibição do chamado “referendo”, em 2014, avançado pela Associação Novo Macau é outro exemplo de como o Governo usou a lei de forma errada e para seu interesse?
Sim. O Governo invocou uma série de argumentou que nada tinham a ver com a situação. Primeiro, aquilo não era um referendo, se não o era e era apenas uma sondagem como é que se pode dizer que aquilo era ilegal pelo facto da constituição chinesa e a Lei Básica não preverem a figura de referendo? Logo aqui já está errado. Depois o Gabinete para a Protecção de Dados Pessoais veio a invocar uma parte do segundo acórdão do Tribunal de Última Instância (TUI), repare, uma parte apenas, a que lhe interessava. Com esta parte pegaram ainda na Lei de Protecção de Dados Pessoais e fizeram uma mixórdia para dizer que os movimentos que organizavam o chamado referendo, estavam a violar a lei.

O Governo usa a lei de forma ilegal, para atingir os seus próprios interesses?
Exactamente, neste caso, para interesses do regime chinês. O Governo está agir contra a lei. Neste caso, foi deste o Chefe do Executivo e da Secretária para a Administração e Justiça, que estavam envolvidos neste processo, até à antiga coordenadora do Gabinete para os Dados Pessoais, Sónia Chan, actual Secretária, todos eles, juntamente com a polícia, foram coniventes com esta violação da lei. Violação de direitos fundamentais com a invocação de uma disposição legal, mas que estava a ser manipulada. Assim como estava a ser manipulado o acórdão do TUI.

E no futuro?
A maior ameaça que as pessoas poderão vir a sofrer na sua liberdade de expressão ainda está para vir. Essa ameaça está contida no documento que o Governo divulgou recentemente sobre a Lei Eleitoral. É uma autêntica lei mordaça.

Quais os riscos se esta proposta for aprovada?
Se isto vier a ser uma lei obviamente que virá violar de uma forma bruta a liberdade de expressão, em geral, e nomeadamente a liberdade de propaganda política que é uma decorrência da liberdade de expressão. De acordo com a proposta, o que está previsto é que a partir do momento que o Chefe do Executivo fixa a data das eleições e até duas semanas antes do acto eleitoral, ou seja, até ao início do período oficial de campanha eleitoral, ninguém poderá falar publicamente sobre as eleições. Nem as pessoas que se vão apresentar como candidatos se podem assumir como tal, nem as pessoas que pretendem apoiar essa candidatura poderão falar em abono dessa mesma candidatura ou criticar outras, nem nós. Nem jornalistas, nem os residentes, nem os membros das associações, nem simpatizantes. Ficaremos amordaçados e não poderemos dizer nada. Isto é como uma suspensão da liberdade de expressão.

Mas mesmo no período eleitoral há entraves…
Sim. Os candidatos só poderão realizar as actividades que tiverem sido previamente indicadas à Comissão Eleitoral. O documento prevê que antes do início da campanha eleitoral os candidatos forneçam à Comissão em causa, uma informação completa sobre todas as actividade de campanha que pretendam realizar e que lhes entreguem todos os materiais de campanha. Isto é claro de um controlo total. E as pessoas só poderão falar em abono ou em critica de algum candidato se se tiverem registado como apoiante. Quem não o fizer não poderá sequer dar a sua opinião. Isto não é suspender a liberdade de expressão?

Sempre se mostrou uma pessoa que aponta do dedo ao que considera errado. Outros docentes universitários sofreram represálias por expressão livremente as suas opiniões. Não tem que o mesmo lhe aconteça?
Não tenho medo, mas tenho noção que podem existir consequências. Achei chocante os casos de Eric Sautedé e Bill Chou. Foram demonstrativos da tal degradação do ambiente de liberdade que se vive em Macau. Felizmente isso não aconteceu em todas as instituições, não sei de nenhum caso no Instituto Politécnico de Macau (IPM) em que alguém tenha sido perseguido por exprimir as suas opiniões. Espero que assim continue. O que aconteceu na Universidade de Macau (UM) e na Universidade de São José (USJ) foi bastante grave, eu diria até que seria razão suficiente para o Governo demitir o reitor da UM, se outras razões não houvesse, como por exemplo a repressão que foram vítimas alguns estudantes, em 2014, na cerimónia de graduação, que estavam a manifestar o seu apoio ao professor Bill Chou. Portanto, medo não direi que tenha, mas consciência que as pessoas correm alguns riscos, sim, correm. Se algum dia aparecer num canal de televisão chinês a confessar algum crime, com certeza não estarei a falar de minha livre e espontânea vontade.

Rematando: coloca de parte a possibilidade de Macau atingir o sufrágio universal?
Acho que pode depender da correlação de forças que se estabeleça em Macau, Hong Kong e na China. Claro que podemos dizer que o regime chinês é muito mais poderoso do que a população de Macau. Isto é, mesmo que Macau lute muito é claro que sabemos que se o regime chinês quiser recusar o sufrágio universal, terá possibilidade de o fazer. Mas é preciso avaliar os custos dessa decisão, porque isso poderá fazer com que a nossa sociedade se torne altamente instável. O regime chinês terá de avaliar os prós e contras, e pensar que apesar de detestar a democracia, e a temer, poderá chegar a um ponto em que considere que é melhor ter uma sociedade tranquilizada com um regime político que não lhe agrade, a uma sociedade constantemente agitada, e com prejuízo para a economia local. É possível que venha a existir o sufrágio universal, mas tudo isto depende da luta popular. Sem a mobilização da população em favor de um regime democrático, o regime chinês não o irá fazer.

Depois da adesão histórica na manifestação de 2014 contra o Regime de Garantias, acha que estamos a perder o ritmo?
Isto tem altos e baixos. As pessoas, em geral, mesmo aquelas que gostam de estar em manifestações também não têm disponibilidade para estar de forma constante. Acho que as pessoas do sector público temem participar, principalmente as que estão com vínculos precários. Mas mesmo as que estão no quadro têm medo, nomeadamente por temerem consequência a nível de classificação de serviço.

E esta luta dos jovens pró-democratas, Jason Chao, Scott Chiang?
Tenho muita consideração por eles, acho-os bastante dedicados à causa pública, bastante corajosos. Nós bem sabemos que há muitas pessoas com esta idade que preferem estar, com todo o direito, tranquilos na sua vida. Estes novos jovens sacrificam o seu tempo e até a sua liberdade, como foi o caso de Jason Chao, para lutar pelas suas ideias e mudanças que acham que são boas para a sociedade. Posso não concordar com tudo mas acho que, de forma geral, lutam por boas causas, questões de maior liberdade, ambiente, maior participação das pessoas nos assuntos públicos, entre outras.

Quando o ex-procurador é acusado de corrupção e detido, o que é que isto releva de Macau?
Sou muito céptico em relação à campanha “Anti-corrupção” da China. Esta campanha não é contra a corrupção, isto é uma purga dentro do partido comunista. Não estou a dizer que as pessoas que tenham sido apanhadas, não sejam realmente desonestas, e não tenham feito aquilo de que são acusadas. Primeiro, não temos a certeza se estas pessoas fizeram aquilo a que são acusadas; depois, não sabemos quantas pessoas que fizeram coisas destas, ou pior, e que não são apanhadas, nem sequer incomodadas. Por outro lado, nós não podemos esquecer o procedimento que tem sido seguido na China continental. É que não é o Ministério Público (MP) que aparece com uma acusação, começa sempre por um acto da Comissão de Disciplina e Controlo dentro do Partido Comunista, ou seja, podemos crer que o Comité Permanente do Partido Chinês, ou seja, aquele conjunto de sete pessoas que dominam superiormente o partido, dá indicações para investigar ou acusar, eventualmente sem investigação, determinadas pessoas. Só depois é que passa para o MP e depois essas pessoas são levadas para tribunal, e já se sabe que não há garantia de independência dos tribunais na China.

E em Macau?
Em princípio não será assim, mas não sabemos. Como é que eu posso saber se o Comissariado Contra a Corrupção não se transformou num braço da cúpula do partido chinês, nesta campanha anti-corrupção? Não estou a dizer que sim, mas também não ficava admirado que assim fosse.

Passando para o Direito de Macau. Está a ganhar, ou ganhou, uma identidade própria?
Acho que o Direito de Macau se não piorou muito foi graças a certas correcções feitas na AL. Isto porque muitas vezes há anteprojectos de propostas de lei horríveis, por exemplo a da Lei Eleitoral, mas depois, com as consultas públicas, melhoram, mas pouco, e quando chegam à AL ainda estão muito maus. Depois, devido à intervenção de alguns deputados, principalmente os eleitos por sufrágio directo, e dos seus assessores, são melhorados.

Mas ainda assim aquém?
Sim, mesmo assim aquém.

Por que é que este trabalho dos assessores da AL não é feito pelos assessores do Governo?
Na AL os deputados, em princípio, deixam falar os assessores jurídicos, porque os deputados não são superiores hierárquicos dos assessores. Portanto, cada deputado não é chefe dos assessores e por isso não têm autoridade para proibir que os mesmos se manifestem, e parto do princípio que até têm interesse em ouvi-los para eles próprios ficarem informados e terem argumentos para discutir com o Governo. Isto é diferente com o que acontece na Administração. Às vezes há pessoas que podem pensar que os assessores jurídicos do Governo são menos bons, ou que não cumprem o seu papel, mas isso não é verdade. Eles muitas vezes tentam fazer o melhor trabalho mas são impedidos. E muitas vezes o que escrevem é posto na gaveta.

Antipatia pelo Governo chinês não implica antipatia contra a China

Passando à região vizinha, concorda com a separação de alguns jovens democratas da vigília para recordar Tiannamen?
De todo, não concordo absolutamente. Isso implica uma ruptura pela luta da democracia em Hong Kong, como além significa uma quebra na solidariedade nacional que seria bom que existisse, pela luta da democracia na China. Seria muito importante que existisse uma unidade entre os activistas que lutam pela democracia, pela liberdade, pelos direitos humanos e pelos direitos laborais na China. Por outro lado, evidentemente que a luta pela chamada independência de Hong Kong é algo que é virtualmente impossível, além de que, no meu ponto de vista, isto é ilegítimo. Hong Kong não é uma nação: é uma parte da China, que foi roubada pelo imperialismo britânico através das guerras do ópio. Portanto, que Hong Kong é território historicamente chinês não suscita qualquer dúvida. Não há fundamento para a exigência da sua independência. Esta divisão do movimento democrático de Hong Kong vem enfraquecer o próprio movimento e vem dar argumentos ao regime chinês para lançar a ideia de separatismo, alegando que as pessoas de Hong Kong não são patriotas, sobretudo os democratas. Mais ainda, esta separação está a dar força à ideia da China que dar a liberdade aos democratas para apresentar candidatos ao Chefe de Executivo, iria colocar em risco a soberania chinesa sobre Hong Kong.

Mas há uma atitude de ódio ao regime chinês?
Pois, a cúpula dirigente do Partido Comunista tem responsabilidades na crescente antipatia da população de Hong Kong relativamente ao regime chinês. É óbvio que, de um ponto de vista racional, a antipatia ao Governo chinês não deveria implicar antipatia contra a China. Eu, por exemplo, antipatizo com o regime, mas adoro a China como nação, ao mesmo tempo que odeio o regime. Infelizmente algumas pessoas criam esta aversão à China, não são raros os exemplos de pessoas que se recusam a falar mandarim, alguns nem sequer querem aprender. Há um culto de ódio. É irracional detestar a China porque se detesta o regime. Porque é que isto acontece? Não é só desinformação em Hong Kong, é também a atitude arrogante, prepotente, sobranceira, odiosa do Governo chinês, que não consegue gerar a simpatia a alguém, nem nos dirigentes norte-coreanos.

É uma atitude além fronteiras…
Sim, não é só com o seu povo, mas também com os países vizinhos. Uma atitude que cada vez mais a deixa isolada, e os países vizinhos, mesmo com regimes semelhantes ao chinês, acabem por cair nos braços do imperialismo americano. É o caso do Vietname, que se tem vindo a aproximar dos Estados Unidos da América que, por exemplo, vai agora comprar armas aos americanos. Porque é que isto acontece? Só por causa dos EUA que querem aumentar a sua presença? Sim, talvez. Mas a outra parte é por culpa da China que se afasta em vez de se aproximar. Em vez de suscitar confiança, tenta mostrar a sua força, ao mesmo tempo que de forma hipócrita diz que ninguém tem nada a temer.

Há uma tendência, a nível mundial, para este tipo de regime actualmente? Como por exemplo, a eleição de Rodrigo Duterte, actual presidente das Filipinas.
É um facto que quer a recente eleição do Duterte e a possível eleição do Donald Trump (nos EUA), significam vitórias de extrema-direita, como poderá acontecer em França, como esteve prestes a acontecer na Áustria. Claro que isto não é assim em todos os países, mas é um facto que ultimamente tem acontecido. Isto resulta do descontentamento da população em relação a outros candidatos que não fizeram nada, ou quase nada, para melhorar as condições de vida das pessoas. Nas Filipinas o Governo anterior nada fez para resolver problemas estruturais do país. Com a pobreza existe esta possibilidade.

10 Jun 2016

Samuel K.C. Tong sobre turismo: “Preocupação é com o rendimento, não com número de turistas”

O Plano Geral do Desenvolvimento da Indústria do Turismo não deveria estar separado do relatório de revisão intercalar do sector de Jogo. É a opinião de Samuel Tong, que defende a promoção da participação dos residentes nos produtos turísticos, mas também o dar a conhecer aos turistas os costumes e cultura de Macau, antes destes chegarem ao território

Qual é o objectivo da Associação de Estudo de Economia Política de Macau, o que promovem?
A Associação tem como objectivo promover o estudo de políticas públicas, que são muitos diferentes dos estudos académicos. Os estudos académicos focam-se mais na inovação e não se interessam pela operabilidade em si. Fazemos estudos de políticas públicas, usando as condições existentes para encontrar uma melhor forma de as aplicar e dar sugestões ao Governo. Os nossos membros são professores de diversas instituições do ensino superior, especialistas em Direito, Lei Básica, Turismo, Economia, Transporte, entre outros.

O Plano Geral do Desenvolvimento da Indústria do Turismo de Macau, que acabou de ser publicado, estima que até 2025 o número de visitantes pode atingir entre os 33 a 40 milhões.  Como avalia estas estimativas?

Essas estimativas são apenas de consulta, não são um resultado final. Os crescimentos referem vários dados, tais como o crescimento dos anos passados e da Organização Mundial de Turismo (UNWTO). Penso que é importante que a promoção do crescimento económico de Macau dependa mesmo do sector de turismo, portanto os visitantes são muito importantes, sejam muitos ou não. Pelo ângulo do desenvolvimento económico, o que temos com que nos preocupar mais é o rendimento total do turismo, mas não com o número de turistas. E este rendimento deve incluir elementos de Jogo e de extra-Jogo. Quero salientar que o Plano Geral do Desenvolvimento da Indústria do Turismo deve ter em consideração também o do sector de Jogo, que faz parte do turismo e cujos serviços visam também turistas. Portanto não podemos separar o plano do turismo e o Jogo, se quisermos desenvolver um “turismo integrado”. 

Portanto considera que o actual documento de consulta separa-se do Jogo?

Sim. Se calhar por causa da forma de administração, a pasta do Secretário para a Economia e Finanças fez um relatório  de revisão intercalar do sector de Jogo e agora a Direcção dos Serviços do Turismo (DST) publicou este plano geral. Mas avaliando os dois documentos, ambos visam os turistas – só que actualmente a vinda de turistas é motivada pelo jogo. Então porque é que separam um do outro? O Jogo entra no quadro do plano do Turismo, o que é mais adequado para a necessidade do desenvolvimento de Macau.

E o Plano Quinquenal do Desenvolvimento está coerente com o Plano Geral do Turismo e o relatório de Jogo?
O Plano Quinquenal deveria abranger o plano do turismo e o relatório de Jogo e depois cada plano ter mais pormenores sobre os seus sectores.

Existe a preocupação na sociedade sobre a capacidade de suporte da cidade face ao número de visitantes, algo que se considera ter ficado de fora do Plano Geral. Concorda?
Quanto à capacidade de suporte, penso que é um assunto mais académico do que um assunto da política pública. Isso porque olhando para outras cidades que são destinos de turismo, a questão da capacidade de suporte não é muito discutida. A ideia é mais falada quanto a museus ou parques temáticos, para controlar o número de visitantes e melhorar a experiência dos turistas. Para uma cidade aberta como destino turístico, é difícil aplicar um limite da capacidade de suporte, por exemplo, o número actual já chega a um limite, mas continua a haver turistas a apanhar voos para Macau e não podemos fechar as fronteiras para não entrarem. Além disso, o actual problema da capacidade de suporte é apenas encontrado em alguns sítios de Macau: as Portas do Cerco e a Avenida Almeida Ribeiro, por exemplo. Mas muitos outros sítios não são visitados por turistas. Pela minha experiência de trabalho no Aeroporto, a capacidade de suporte é mais falada ao nível das infra-estruturas.

Mesmo assim, considera importante encontrar um equilíbrio entre os turistas e os residentes?
É preciso fazer por isso, obviamente. No Plano Geral do Turismo há também conteúdo para se encontrar esse equilíbrio, por exemplo, observando o desenvolvimento do turismo através de experiências para não só os turistas mas também para os residentes. Penso que é importante permitir aos residentes saberem qual é a importância do turismo de Macau para a vida e a sociedade geral.

No plano geral, a DST apresenta várias medidas de curto-prazo, incluindo “Transformar Macau como um destino turístico de permanência de vários dias” e “Promover o reconhecimento da indústria do turismo pelos residentes e a gerir a sua participação”. Estas medidas podem mesmo ser realizadas a curto-prazo?
Não sei se se consegue, mas há muito a fazer. Porque a importância de uma viagem é toda a experiência no destino do turismo e isso é influenciado pela interacção entre residentes e turistas. Portanto se os residentes apoiam e conhecem as actividades turísticas, aceitam-nas e consideram os turistas mais amigáveis. Por outro lado, é importante ensinar os visitantes sobre quais são os costumes e hábitos de Macau. Como em Singapura, antes de chegar, os turistas sabem quais são as regras locais. Portanto a promoção é mútua, por exemplo, temos que ensinar os visitantes a não fumar no interior, quando fazemos promoção do turismo de Macau noutros países. No que toca a destino turístico de permanência de vários dias, penso que é apenas uma das medidas para aumentar o consumo do turismo mais diversificado, não só compras mas também estadias e refeições.

O Plano Geral do Turismo propõe a promoção da conexão directa com o Aeroporto Internacional de Hong Kong como vantagem de atrair mais visitantes de média e longa distância a Macau. Como avalia esta estratégia?
Quando queremos desenvolver a clientela internacional, a acessibilidade é muito importante. Sabemos as pessoas chegam a Macau por vias terrestres, marítimas e aéreas. De forma geral, a maioria de visitantes de curta distância chega por via terrestre, mas penso que podemos cooperar mais com as cidades da Delta do Rio das Pérolas para atrair mais visitantes. Podemos também promover a ligação de ferry para os turistas que vêm em grandes iates para Hong Kong virem depois a Macau.  Mas o que deve ser mais facilitado deve ser a via aérea. Actualmente, as linhas aéreas do Aeroporto Internacional de Macau são muito limitadas. As companhias têm “dores de cabeça” a pensar como trazer mais turistas da Europa e América, de média e longa distância. Penso ser viável a realização da conexão directa quando a Ponte Hong Kong-Macau-Zhuhai entrar em funcionamento, porque são apenas 30 minutos de carro entre as duas regiões. No entanto, os arranjos transfronteiriços devem ser analisados mais cedo, não apenas pensados quando a ponte estiver pronto.

Explorar produtos turísticos marítimos, criar parques temáticos e desenvolver  mais modalidades de entretenimento familiar são alguns dos trabalhos com que o Governo quer avançar. 
Sendo Macau um mercado capitalista, o que o Governo pode oferecer são bens públicos, infra-estruturas, melhoria das leis e regulamentos e mais desenvolvimento. No final, quem desenvolve e opera os projectos são as empresas e os investidores. As medidas que apontou têm uma boa direcção para o turismo integrado. Mas primeiro é preciso verificar a competitividade no desenvolver de projectos em Macau comparativamente a outros sítios do mundo. Quais são as vantagens e existem investidores que tenham vontade de operar os projectos? O que o Governo precisa de pensar é como levar os investidores a fazer isso.

Mas actualmente quem tem mais recursos turísticos para promover são as operadoras de Jogo…
 Na realidade, as operadoras de Jogo promovem elementos extra-jogo com o objectivo final de ganhar lucros pelo jogo. É preciso ter investidores de operadoras extra-jogo para promover esses elementos, para corresponder à ideia da diversificação da economia. E não podem ser sempre as operadoras de Jogo a promover os elementos extra-Jogo, porque o efeito é sempre limitado. Claro que no mercado local não existem estes investidores, mas quando conseguirmos melhorar a cooperação do mercado com o exterior e facilitar o movimento de visitantes, é possível atrair mais investidores estrangeiros a desenvolver elementos extra-jogo em Macau.

27 Mai 2016

Agnes Lam: “Há muito receio dos acontecimentos de Hong Kong”

A activista e professora Agnes Lam confessa-se aliviada com a queda das receitas do Jogo. Para ela, a reforma política não vai acontecer devido ao receio de um Occupy Leal Senado

Comecemos por falar das Linhas de Acção Governativa. Já dois Secretários e o Chefe do Executivo apresentaram os seus planos de governação para o próximo ano. Que balanço faz?
Penso que se limitaram a dar continuação ao trabalho das últimas LAG. Parece-me que estão retidos em alguns problemas que não sabem como resolver. Há novos desafios, como as mudanças na economia. Este ano dedicaram-se a fazer com que as pessoas se sintam bem e descansadas, assegurando-as de que nada lhes vai faltar. Para isso inventaram já uma série de novos termos para apelidar a situação, como “período de ajustamento”. Isto parece uma coisa inovadora e positiva, mas a noção é de que vai continuar a descer. É óbvio que o Governo ainda não arranjou uma forma de colmatar a queda do Jogo. Há anos que dependemos desta indústria e nunca se fez nada para descobrir outras fontes de rendimento. Não é possível fazer nascer uma nova indústria do zero, portanto a ideia é acalmar as pessoas.

Mas trata-se só de uma continuação do ano anterior?
Mais ou menos. Houve uma coisa que me chamou a atenção: Chui Sai On enfatiza planos a longo prazo e penso que faz isso para dar a entender que é um bom planeador. Está basicamente a apresentar planos de dez e cinco anos, uma estratégia que nunca aconteceu em Macau. Nem com Edmund Ho, nem com a Administração portuguesa.

Será à imagem de como se governa na China?
Não sei se a ideia vem mesmo de Chui Sai On, mas julgo que também tem que ver com a necessidade que o CE tem de ter a certeza de tudo, fazendo uma série de estudos e consultas. Por outro lado, Macau também está a entrar numa fase em que começa a ter que pensar nas suas políticas de governação em relação à China. Antes, o Governo Central mencionava Hong Kong e Macau em duas ou três fases durante o anúncio do plano quinquenal da China. Agora, Macau está a ser incluído nesta apresentação. E isto é uma coisa à qual aqui não se está a prestar atenção.

E devia-se?
Sem dúvida. Se formos incluídos nos programas de desenvolvimento nacionais, temos que saber como é que a China nos perspectiva. E isso parte de todos nós, a forma como queremos que a China nos veja. Como é que a nossa voz vai ser ouvida pelo Governo Central e como é que optamos por definir Macau?

Como é que isso poderia ser feito?
Temos uma sociedade predominantemente chinesa, mas é ideologicamente diferente da China, mais adaptável. A nossa natureza terá que se integrada no plano quinquenal porque, mesmo que não queiramos, isso vai acontecer. É irrealista pensar o contrário.

As pessoas devem ficar preocupadas com essa inclusão?
Não diria preocupante. A inclusão é boa porque sabemos que não estamos sozinhos, que o mercado está sempre presente e que temos um alicerce. Até porque não temos a capacidade para sermos independentes. Estamos com e na China e a ideia é: “como é que podemos desenvolver-nos e contribuir para o crescimento do país, mantendo a nossa identidade?”

O que é preciso fazer?
Temos que seguir a tendência, criando um mecanismo para que o Governo realmente ouça a população e as nossas opiniões possam realmente chegar ao Governo Central. Precisamos de melhores formas de comunicação, além dos já existentes grupos de trabalho e de ligação. Há reuniões frequentes, mas têm que ver com negócios, acordos de cooperação, comércio… Não passa disso. O plano quinquenal é já a forma de governar na China, é normal. Mas todos os anos, a Conferência Consultiva Política do Povo China, juntamente com os representantes de Macau no Partido Comunista têm uma série de trabalhos para desenvolver a cada 12 meses, do plano a cinco anos. A estrutura aqui é clara.

E em Macau?
Não é. Falta um mecanismo que divida o anúncio das políticas e depois as desenvolva.

Faz sentido ter um plano quinquenal em Macau?
Para mim, qualquer planeamento faz sentido, até porque define metas e ajuda a completar objectivos. O problema é que os planos a cinco anos de Macau e da China são ligeiramente diferentes. No continente acontece numa vertente de crescimento económico, continua a forte componente comunista. Aqui não. Não estou contra um plano quinquenal, mas temos que perceber como o aplicar.

Como é que pode ajudar Macau?

Veja-se o objectivo de criar um Centro Mundial de Lazer e Turismo. A ideia, no plano, deve ser então atingir uma série de objectivos concretos como a redução de carros até um certo número… No entanto, o que se está a fazer é criar slogans de incentivo, mas nada de específico. Neste momento, estamos a ir no sentido oposto à criação deste Centro.

O que quer isso dizer?
Se se quer mesmo um Centro de Lazer, é preciso fazer com que a cidade seja um local bom para viver e visitar. Até mesmo na baixa. É preciso que as pessoas se sintam confortáveis, mesmo com a cidade cheia de turistas e isso acontece por todo o mundo. Adoro andar, por exemplo, mas há muita gente na rua e tento ir de autocarro, mas estão todos cheios. Acabo por pegar no carro para me deslocar, mas também me tira tempo, porque estou imenso tempo presa no trânsito. É disto que falo, da dificuldade em nos mexermos.

Mas o Governo defende que está já a diversificar a economia…
Ainda não chegámos aí. Constroem-se casinos e hotéis de luxo que ficam cheios e onde as pessoas dormem, mas depois saem dali e têm o quê? O Governo está preocupado com a queda das receitas, mas esta diminuição é completamente irrisória. É perfeitamente possível diminuir 10% das receitas e continuar a ganhar.

Acredita que a qualidade de vida vai piorar?
Sinto-me aliviada com a queda das receitas, porque as pessoas precisam que alguma coisa negativa aconteça e lhes abra os olhos. Assim vão perceber que o Governo não pode continuar a gastar as receitas em recursos valiosos, como são os terrenos. Tudo é despendido nos casinos e esta queda é uma alerta de que o Jogo não vai crescer para sempre. Aqui critica-se pouco porque as pessoas precisam do dinheiro que vem do Executivo.

As pessoas deviam questionar mais?
Sim. Não é bom que as pessoas pensem assim, principalmente quando pensamos na origem do dinheiro que financia os casinos: muito vem de oficiais chineses e é claro que um dia estas regalias vão ter fim. Se o dinheiro viesse de pessoas normais, o esquema de entretenimento era diferente, um sistema mais ligeiro, com bares, pequenos espaços de Jogo, mas nada desta envergadura. Até porque nunca investimos efectivamente na melhoria da qualidade de vida.

Em que aspectos?
Saúde, para começar. Outra das coisas é o trânsito… Preocuparam-se tanto em gastar dinheiro com semáforos e agora há demasiados.

Como ex-candidata a deputada da AL, concorda com a ideia defendida por alguns deputados, de que deviam existir mais assentos directos?
Sem dúvida. Essa devia ser a tendência seguida. E para tornar o sistema legislativa mais saudável, 50% dos assentos deviam ser de voto directo para fazer com que a voz popular chegasse mais facilmente. Antes era contra a ideia de deputados nomeados pelo Governo, mas fui mudando a minha opinião porque compreendo que estes podem ser úteis. No entanto, o sistema de nomeações deveria servir para proteger os interesses dos portugueses e do Governo, mas não se vê isso. É preciso nomear macaenses, portugueses, minorias… Neste momento só há profissionais de construção, do sector privado comercial. O Executivo tem que pensar se querem lá pessoas que fazer realmente alguma coisa: nomeiam-se pessoas que nos façam fazer boa figura, não má.

Sónia Chan já anunciou que não vai fazer seguir para a frente com a reforma política. Concorda?
Não, de forma alguma. Penso que deviam estar já a preparar-se para fazer isto e não percebo como não se está a fazer. Acho que há muito receio dos acontecimentos de Hong Kong. O Occupy Central fez com que as pessoas tivessem medo de ir com a ideia para a frente, pensando que as pessoas que as pessoas de Macau também se podem rebelar. O Governo não sabe lidar com isto.

Terá a decisão de Sónia Chan tido origem em ordens do Governo Central?
Acredito que sim. Esta questão já ficou determinada pela China, como tendo que ser primeiramente aprovada na sede. Nada será aprovado aqui sem ter sido primeiro na China.

Acha que em Macau há capacidade para isso?
Não. Simplesmente não a temos, até porque ninguém que aconteça nada semelhante.

Ainda três Secretários têm as suas LAG para anunciar. O que espera ouvir?
Penso que os sectores da Cultura e da Educação até estão no bom caminho, que se conseguiu resolver as questões do património cultural e do tipo de educação. Há é uma questão que gostava de ver melhorada: não se está a prestar a atenção devido aos problemas das crianças. Temos vários casos de abandono escolar e não se percebe porquê… Se se trata de falta de inteligência, problemas familiares ou até psicológicos. Conheço jovens que acabaram por ser diagnosticados com dislexia e outros problemas, mas era visto pelos professores como sendo mal-comportados e desatentos. Não há um sistema de monitorização destes problemas. Para Raimundo do Rosário, espero que se mantenha na linha de transformar os terrenos revertidos em habitação pública.

Na passada sexta-feira, vários deputados lamentaram que a implementação do salário mínimo estava a sobrecarregar os proprietários. Alguns querem mesmo que o Governo ajude a suportar os custos. Como vê esta situação?
O Executivo subsidia quem ganha menos de 4000 patacas. Quem ganhava menos que isso está agora a ganhar umas 6000 patacas. Mesmo que se dupliquem os salários, os proprietários não precisam de pagar o dobro, tem é que haver uma gestão dos dinheiros já entregues. Temos que simplesmente passar por esta fase para as pessoas entenderem que merecem ter um salário mínimo. Trata-se de ser humano.

30 Nov 2015

Roy Eric Xavier, académico macaense

O académico macaense da Universidade de Berkeley, Califórnia, está até ao dia 13 na Universidade de Macau a dar palestras sobre o lado económico da cultura de Macau, ao abrigo de um projecto Fullbright. Roy Eric Xavier acusa associações como a APIM ou o Conselho das Comunidades Macaenses de não terem uma maior aproximação aos jovens e empresas e defende a criação de uma base de dados sobre os profissionais expatriados que querem regressar

Como se sente ao ser convidado pela Universidade de Macau? Que projectos vai desenvolver?
Sinto-me honrado por ser o primeiro académico Fulbright a ser convidado pela Universidade de Macau (UM). Esta é uma oportunidade única para a China, Macau e os Estados Unidos de criarem mais intercâmbios internacionais, não apenas na área da educação, mas também em termos de negócios e comércio. O convite tem especial significado devido à minha herança macaense. Esta será a minha terceira visita em três anos, e desta vez o meu papel vai ajudar a universidade a compreender a história da comunidade macaense fora de Macau, e talvez para utilizar os laços culturais para fomentar o desenvolvimento local.

Tem vindo a estudar a cultura de Macau, com especial foco nas tradições macaenses. Porquê o maior foco do estudo no lado económico dessa cultura?
As ligações entre a cultura macaense e a economia já são conhecidas. Muitas famílias estão profundamente envolvidas em actividades culturais e económicas em simultâneo. 61115P2T1O turismo cultural actual é outro exemplo. A cultura de Macau no século XXI, especialmente para as novas gerações de macaenses, dentro ou fora de Macau, é algo atractivo que deveria ser tido em conta do ponto de vista económico. A razão é porque muitas pessoas vêem a rica história de Macau como sendo uma amostra evidente das relações entre o Ocidente e Oriente, e que deveria continuar nos dias de hoje. Fazer negócios em Macau traz muitas vantagens que Las Vegas não tem, incluindo uma ligação directa com a China.

Num artigo de investigação, intitulado “A cultura de Macau como um activo económico” diz que “o conceito de cultura como um activo, nas suas formas tangível e intangível, foi adoptado pelos governos de Macau e da China. Mas as tentativas para desenvolver ambas as formas desde a transferência de soberania têm sido incompletas”. Porquê?
O meu foco é mais nas formas intangíveis da cultura de Macau: a sua história e os efeitos que renovação dos laços tradicionais fora de Macau pode ter actualmente. Ambos os Governos têm feito bons progressos na preservação dos edifícios e outros espaços físicos, nas formas tangíveis de cultura. Mas gostaria de ver algo mais a ser feito para a compreensão da história de Macau, incluindo os contributos no estrangeiro, como é o caso dos macaenses que emigraram para Hong Kong e Xangai no século XIX, e para os Estados Unidos, Canadá, Austrália, Brasil e Portugal no século XX. A inclusão dos macaenses estrangeiros na história de Macau vai ajudar a renovar velhos laços e, o mais importante, a atrair mais jovens macaenses a regressar a Macau e a mostrarem as suas experiências e talentos. A minha investigação revela que a segunda e terceira geração de macaenses estão interessadas em Macau, e muitos são profissionais que trabalham para empresas nas áreas da tecnologia, medicina, comunicação, educação, finanças ou biotecnologia.

O que é que o Governo de Macau deveria fazer para promover mais os aspectos da cultura que menciona no artigo?
O Governo de Macau, através da universidade, já está a ter em conta parte das minhas propostas para começar a estudar a diversidade cultural de Macau e as suas origens, e os laços com a diáspora. O próximo passo importante será começar a organizar e recolher de forma sistemática a informação destas comunidades, incluindo uma base de dados dos novos profissionais que têm interesse em partilhar os seus conhecimentos com Macau. Um arquivo dessa natureza poderá estar ligado a outros da China e em todo o mundo através da internet, sendo que já tive uma discussão com investigadores chineses, em 2013, sobre uma possível colaboração. Esse processo poderia iniciar parcerias específicas entre Macau e os países onde esses profissionais vivem. Muitos estão dispostos a receber os profissionais de Macau que estão interessados. Isto nunca foi feito com os países de língua inglesa, incluindo os Estados Unidos, Canadá e a Austrália. Isso poderia ser uma boa oportunidade de começar colaborações tendo em conta as necessidades de Macau de expandir a sua economia para além do Jogo.

Diz também no seu artigo que as associações locais, como a Associação Promotora da Instrução dos Macaenses (APIM) e o Conselho das Comunidades Macaenses (CCM), “têm tido um sucesso limitado na promoção do turismo de Macau”. Estas entidades têm de alterar a sua forma de actuação?
Ambas as associações têm tido um sucesso limitado em atrair gerações mais jovens e profissionais para Macau porque a organização dos seus membros está virada para os macaenses reformados que já não têm contacto com grandes empresas. [quote_box_right]“Gostaria de ver algo mais a ser feito para a compreensão da história de Macau, incluindo os contributos no estrangeiro, como é o caso dos macaenses que emigraram para Hong Kong e Xangai no século XIX, e para os Estados Unidos, Canadá, Austrália, Brasil e Portugal no século XX”[/quote_box_right]Essas associações também têm juntado pequenos grupos de jovens macaenses a cada três anos para encontros de jovens, para aumentar a sua consciência (face à cultura). Mas sempre achei que deve ser feita uma aproximação mais ampla e mais profissional, algo que propus aos membros das direcções da APIM e CCM em 2014. Ambas as associações rejeitaram esse envolvimento.

Escreve que “a ligação entre a cultura e o desenvolvimento económico tem sido ténue, e, em alguns casos, não existe”. Acredita que o Governo de Macau ou as associações locais vão mudar a sua estratégia em relação a esse aspecto? Acredita na diversificação da economia, para além da indústria do Jogo?
Acredito que a situação vai mudar num futuro próximo, com mais informação. A diversificação da economia de Macau vai seguir a diversidade cultural. À medida que os sectores económicos se tornem mais activos em termos de trocas internacionais, mais conexões vão ser feitas. Por exemplo, o jogo em Macau já entrou numa fase virada para o entretenimento e vendas a retalho. Os media constituem uma grande parte desse entretenimento, e através disso surgem as comunicações, a tecnologia, e outras indústrias dessa área, como o desenvolvimento de social media, vídeo ou até vendas on-line. Claramente acredito que a economia de Macau pode ser diversificada.

Os casinos deveriam promover mais a cultura local?
Penso que os casinos de Macau têm um interesse directo na promoção da cultura local, porque têm vindo a criar mais atracções para as famílias e jovens profissionais que não são apenas croupiers. Os casinos têm uma maior vantagem face aos seus concorrentes de Las Vegas. Os casinos podem patrocinar “percursos turísticos culturais” e disponibilizar gastronomia exótica, algo que Las Vegas não pode oferecer. Macau, como não está no meio de um deserto como Las Vegas, que não tem mais nada para oferecer, tem uma localização exótica, cultura e uma história rica.

Apresenta algumas críticas no âmbito da lei de salvaguarda do património. Acredita que protege plenamente o património? Como podemos estabelecer uma relação entre o património e economia?
Não critiquei a lei do património. Simplesmente constatei que a preservação da história de Macau ainda não foi totalmente definida desde que a lei foi implementada em 2014. Mas ainda há tempo. Alguns esforços têm sido feitos, incluindo um acordo entre Portugal e Macau para preservar 3600 documentos da colecção “Sínicas” da UNESCO. Mas é preciso fazer mais. Proponho que a preservação cultural deveria incluir uma história mais completa de Macau, incluindo a história dos macaenses que emigraram para outros países. Materiais históricos, informação e dados deveriam ser recolhidos junto da população também. Nesse processo, as ligações culturais, e mais recentemente as económicas, vão resultar em centenas de contactos feitos.

Há o risco da cultura macaense desaparecer com o desenvolvimento económico?
Não acredito que a cultura de Macau vá desaparecer com o desenvolvimento económico, mas o contrário. Penso que vai continuar a prosperar porque um entendimento da cultura de Macau será parte do desenvolvimento económico, se a cultura for vista como um activo e se isso for usado de forma efectiva.

Regresso dois anos depois

Há dois anos que Roy Eric Xavier não visitava o território de onde a mãe é natural, e desta vez será docente convidado no Moon Chun Memorial College da Universidade de Macau, no âmbito de um projecto Fullbright, sendo o primeiro a ser convidado para Macau em 69 anos de história do projecto académico. Ontem falou das comunidades portuguesa e macaense, e na próxima terça-feira irá abordar o tema “As origens da cultura de Macau e a diversidade económica”. Na quinta-feira, 12 de Novembro, Roy Eric Xavier vai falar das “Relações tradicionais entre os locais e os macaenses expatriados”.

6 Nov 2015