Hong Kong | Activistas locais discordam de estudo da UM

 

Scott Chiang e José Pereira Coutinho, ligados a alguns protestos desde 2014, discordam das conclusões do estudo levado a cabo por Albert Wong. Há alguma troca de informações com Hong Kong, mas os protestos em Macau acontecem por vontade própria, assumem

[dropcap style≠’circle’]“T[/dropcap]emos as nossas interacções, mas não são tão dominantes como as pessoas possam pensar.” A frase pertence ao presidente da Associação Novo Macau (ANM), Scott Chiang, e serve para refutar as conclusões do estudo do académico Albert Wong, da Universidade de Macau (UM). O trabalho, tornado público esta semana, conclui que os protestos que o território tem vindo a enfrentar são directamente influenciados pelo que se passa na região vizinha.

“Achamos que não somos influenciados por nada mais do que o trabalho das nossas iniciativas. O que aconteceu em Taiwan ou Hong Kong pode servir de inspiração, mas apenas de como podemos implementar iniciativas. Não é uma motivação mais directa para levarmos acções a cabo. Não é algo que simplesmente possamos aprender de outro lado, temos de acreditar.”

Para o presidente da ANM, a situação é bem diferente em relação ao território vizinho. “Hong Kong, neste momento, está muito polarizada, o que não acontece em Macau. Há algumas trocas de informações, de como podemos fazer coisas, mas não seguimos sempre essas ideias.”

Scott Chiang observa, no entanto, que novos líderes surgiram nos últimos anos, bem como mais pessoas a virem protestar para a rua. “Há a ideia de que em Macau as pessoas são mais relutantes em tomar iniciativas para mudar o rumo dos acontecimentos, mas isso tem mudado nos últimos anos.”

Então e Seul?

Para José Pereira Coutinho, deputado e presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública (ATFPM), o estudo de Albert Wong não faz qualquer sentido. “Em termos gerais, discordo totalmente que as manifestações em Macau tenham que ver com as manifestações de Hong Kong. São territórios com diferentes dimensões e a base estruturante da sociedade é diferente.”

Coutinho dá mesmo o exemplo da Coreia do Sul, onde milhares saíram à rua a pedir a saída de Park Geun Hye, Presidente do país entretanto destituída.

“Há manifestações em todo o mundo. O que está a acontecer em Macau é uma forma espontânea das pessoas manifestarem o seu desagrado contra algumas políticas do Governo. As pessoas devem ser mais participativas e interventivas. Só assim é que a sociedade pode desenvolver-se, e criar mais e melhores oportunidades para os jovens.”

O mega protesto de 2014, contra o regime de garantias, é referido no estudo, bem como os protestos organizados pelos trabalhadores do jogo. Mas para Coutinho foi apenas um pontapé de saída.

“Em 2014 aconteceu o que nunca tinha sucedido: pela primeira vez, mais de 20 mil pessoas foram contestar algo simples, de que ninguém pode ter imunidade geral. Foi isso que trouxe as pessoas cá para fora. Para a ocorrência da mega manifestação, não há apenas uma explicação, mas sim várias. Continuo a acreditar que as manifestações são espontâneas e a sociedade está a evoluir. Poder-se-á, isso sim, discutir a lentidão da participação das pessoas face a Hong Kong”, referiu Coutinho.

O estudo, intitulado “The Summer 2014 protests in Macau: their context and continuities”, afirma que “foram os jornais e revistas de Hong Kong, disponíveis nos quiosques e lojas de conveniência de Macau, que disponibilizaram uma fonte imparcial de comentário aos cidadãos de Macau”. Esses protestos “não surgiram do nada”, afirma Albert Wong, num território que “nasceu da corrupção”. Para firmar esta conclusão, o académico referiu os casos do ex-governador Carlos Melancia e do ex-secretário para as Obras Públicas e Transportes, Ao Man Long.

12 Jan 2017

Turismo | Inquérito mostra que residentes querem uma cidade mais real

Não querem pastiche, mas sim autenticidade. Só assim é que Macau poderá atrair visitantes com outros interesses que não as mesas dos casinos. O Governo foi ouvir a opinião dos residentes e cerca de 1200 quiseram dizer o que pensam: basta aproveitar o que existe para que a cidade seja um destino bem mais interessante

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]iversificação dos produtos turísticos de Macau, flexibilidade e desenvolvimento de áreas urbanas, exploração de potenciais mercados de origem e de visitantes de qualidade. São estas as principais preocupações das pessoas e entidades que participaram no processo de consulta pública sobre o plano geral do desenvolvimento da indústria do turismo.

A compilação das ideias manifestadas foi tornada pública ontem. Em nota à imprensa, a Direcção dos Serviços de Turismo (DST) explica que, entre 23 de Maio e 22 de Julho do ano passado, recebeu quase 1200 opiniões. A maioria foi recolhida em sessões de intercâmbio (28,7 por cento). Depois, o correio electrónico serviu para transmitir 17,6 por cento das sugestões, com 12,2 por cento a serem enviadas por carta. “As três categorias alvo de maior atenção foram recursos e produtos turísticos, desenvolvimento urbano, bem como mercados de origem dos visitantes e mercados-alvos”, sintetiza a DST.

A análise das opiniões recolhidas serviu já para fazer ajustamentos ao plano geral, garante a direcção de serviços liderada por Maria Helena de Senna Fernandes. “Foram propostos projectos relevantes”, escreve-se ainda, entre eles o reforço do planeamento e promoção de rotas turísticas temáticas, a promoção de viagens individuais em iates, o desenvolvimento de passeios de barco com a função de recreio e meio de transporte marítimo.

À DST chegaram também sugestões para novas zonas turísticas, campanhas promocionais e estratégias direccionadas a camadas altas de visitantes. Há ainda quem entenda que se devem “destacar as conotações culturais” do território e a “diversidade da oferta de produtos turísticos para transformar Macau num destino turístico de permanência de vários dias”.

Razões para todo o ano

Vamos às sugestões concretas: a maioria está em língua chinesa, mas há algumas ideias deixadas em inglês. É o caso da MGM, operadora de jogo, que entende existir muito espaço para expandir os eventos organizados no território. A empresa dá o exemplo do Grande Prémio de Macau, que já faz parte do calendário dos amantes da especialidade, para defender a necessidade de outras iniciativas anuais que garantam a existência de ofertas permanentes para os turistas. A MGM deixa um exemplo: um festival de gastronomia internacional que dure o ano inteiro, com actividades diferentes a acontecer a cada três meses.

Entre as opiniões manifestadas por residentes para a diversificação de produtos turísticos, nota ainda para a ideia de que os rituais das igrejas de Macau deveriam poder ser assistidos por turistas, “que teriam de respeitar o espaço”. Foi expressa ainda a noção de que “não existem infra-estruturas verdadeiramente direccionadas para o turismo, como a Disneylândia, ou actividades que façam com que os visitantes permaneçam mais tempo (os desportos aquáticos seriam uma opção)”.

O arquitecto Francisco Vizeu Pinheiro, que também fez chegar o que pensa à DST, salientou que “existem muitos locais por aproveitar, como a antiga Fábrica de Panchões Iec Long, que poderiam ser utilizados para fins turísticos”. Ainda no capítulo dos recursos e produtos turísticos, o especialista defende que alguns edifícios do Governo de valor histórico e patrimonial poderiam ser abertos ao público.

Vizeu Pinheiro propõe igualmente uma rota junto à água para que se possa andar a pé entre o Terminal Marítimo do Porto Exterior, a Doca dos Pescadores, o Centro de Ciência, a estátua de Kun Iam e os lagos Nam Van. “Estas áreas estão emparedadas e isoladas”, aponta.

Já a MGM tem uma opinião curiosa acerca do que deve ser a skyline de Macau. A empresa recorda que os grandes destinos turísticos têm “skylines icónicas”, o que é importante para o turismo ligado ao mar. Macau tem condições para impressionar quem chega por via marítima, mas a operadora considera que “colocar os edifícios do Governo na zona B dos novos aterros, conforme está planeado, faz com que não se aproveite totalmente o potencial existente” para que o território tenha “uma skyline reconhecida internacionalmente”.

Museus e lanternas

Numa opinião emitida em conjunto com Penny Yim Kin Wan, Francisco Vizeu Pinheiro defende que “os museus de Macau são pequenos, com narrativas curtas e limitadas, correspondendo à tendência de há três décadas”.

Para os especialistas, Macau deve disponibilizar produtos patrimoniais autênticos, baseados nas tradições históricas, e não experiências falsas. Recordando o passado marítimo partilhado por Portugal e pela China, é deixada uma ideia para um novo espaço: um museu marítimo onde possam ser colocados “galeões portugueses do século XVI, fragatas e juncos chineses do século XIX, bem como lorchas, que resultaram da tecnologia combinada de portugueses e chineses”. As embarcações em exposição teriam a escala real.

Também os responsáveis pela Lord Stow’s Bakery disseram de sua justiça acerca dos museus: é preciso que sejam desenvolvidos com fáceis acessos. A empresa, localizada em Coloane, mostra ainda preocupação com o aproveitamento turístico da ilha: “As aldeias atraem sempre turistas, mas é preciso ajudar a desenvolver a rua principal de Coloane, abandonada há décadas”. Propõe-se iluminar – também com recurso a lanternas – a Rua dos Navegantes. “Recuperem o molho de soja tradicional e embalem-no de forma apelativa.”

Já a Câmara de Comércio Americana em Macau olha de forma geral para os diferentes recursos para vincar que “o todo é maior do que a soma das partes”, acrescentando que deve existir a preocupação de conjugar os interesses das grandes operadoras do jogo e das empresas locais ligadas ao turismo, “para que todos os intervenientes participem no desenvolvimento sustentado e saudável da indústria”.

Dormir na TV

A DSRT quis ainda auscultar a sensibilidade local em relação aos tipos de alojamento destinados aos visitantes. Davis Fong, da Universidade de Macau, especialista em jogo, admite a  discussão em torno da acomodação a preços mais acessíveis – e isto apesar de haver uma ligação entre os números de quartos e de turistas. Para o investigador, deve ser sobretudo tida em conta a competitividade regional.

Penny Yim Kin Wan e Francisco Vizeu Pinheiro fazem uma proposta mais concreta: “A sede da TDM é demasiado pequena para a utilização local e futura, além de que o satélite constitui uma ameaça para a saúde dos vizinhos. O edifício deveria ser convertido numa boutique-hotel, atraindo jovens visitantes para a Avenida do Coronel Mesquita.

A elaboração do plano geral para o desenvolvimento da indústria do turismo arrancou no início de 2015. Concluída que está a consulta pública, a terceira fase envolve a revisão e conclusão do projecto final, que deverá ficar pronto em meados deste ano.

11 Jan 2017

Estudo | Índice de empreendedorismo aumentou

Um estudo realizado pela Universidade de Macau revela que o índice de empreendedorismo aumentou no último trimestre. Os que investem pela oportunidade estão em maior número

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] empreendedorismo em Macau parece estar bem e recomenda-se. É o que conclui um trabalho levado a cabo pela Plataforma dos Serviços das Pequenas e Médias Empresas (PME), eRS e-Research Lab. e a Faculdade de Gestão de Empresas da Universidade de Macau (UM), com base em 201 opiniões de empreendedores de empresas recém-criadas.

O relatório mostra que todos os itens referentes ao último trimestre de 2016 estão numa melhor posição, sendo que o índice de ambiente empreendedor atingiu os 49,9 por cento, o valor mais alto em comparação com os dois trimestres anteriores. Quanto ao índice de pensamento empreendedor, é de 41,4 por cento, número que pela primeira vez foi além dos 40 por cento. Quanto à satisfação dos trabalhos feitos pelo Governo, também aumentou 5,6 por cento. Enquanto isso, mais de 80 por cento dos empreendedores afirma ter empregados locais a tempo inteiro.

O mesmo documento mostra que 65,2 por cento dos empreendedores são “orientados pelas oportunidades”, um número 1,9 por cento superior aos que apenas investiram por necessidade. Já 41 por cento afirmam ter recuperado o seu investimento inicial, um valor que aumentou em relação aos restantes meses do ano.

Em relação à influência do mercado, 54,7 por cento dos inquiridos consideram que há muitos concorrentes comerciais e apenas quatro por cento consideram que não há concorrentes. Apenas 20,4 por cento referiram que os seus serviços ou produtos apareceram no mercado há menos de um ano.

Pouca inovação

Apesar dos resultados satisfatórios, apenas cinco por cento dos empreendedores acham que todos os seus potenciais clientes consideram os seus produtos ou serviços inovadores. Em relação à penetração no mercado local, 81,3 por cento entendem que as suas empresas, recém-criadas, ainda não causaram impacto, ou causaram pouco.

Ma Chi Seng, fundador da Plataforma dos Serviços das Pequenas e Médias Empresas (PME) e deputado nomeado, disse, citado pela imprensa chinesa, estar satisfeito com o facto de o número de empregadores locais ter aumentado em comparação com os dois relatórios anteriores.

 

11 Jan 2017

Economia | Expectativa dos consumidores em baixa, diz estudo da MUST

A fé económica dos consumidores de Macau continua em baixa, de acordo com o inquérito à confiança realizado pela Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. No entanto, alguns números desafiam a mais elementar lógica da ciência, alerta Albano Martins

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s consumidores de Macau continuam insatisfeitos quanto à evolução dos principais indicadores económicos que afectaram o seu quotidiano no último trimestre do ano passado. Essa é a principal conclusão do relatório que analisa os índices de confiança, publicado pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentado da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. Se olharmos para os itens analisados, percebemos que, no campo do emprego, houve um declínio significativo, mantendo-se, no entanto, a níveis acima da do nível de satisfação.

Com uma pontuação entre zero e 200, o índice fixou-se no último trimestre de 2016 nos 100.28, sendo o mais elevado entre os assuntos analisados. Ainda assim, este número representou um decréscimo de 2.2 pontos, em relação ao terceiro trimestre. Os autores do estudo justificam este número com a tendência dos consumidores de Macau para serem pessimistas acerca do mercado de trabalho. Uma justificação que não convence o economista Albano Martins, uma vez que “a economia evoluiu positivamente, os números do desemprego mantém-se estáveis, nos 1,9 por cento, dentro do pleno emprego, não se entendendo esta incongruência”.

No que diz respeito à confiança quanto aos preços, o índice foi de 72.74 pontos, o que representou uma descida de 1.65 pontos, ou 2,2 por cento em relação ao terceiro semestre de 2016. Estes números são justificados com a preocupação da inflação no futuro. Mais um dado que, para Albano Martins, não tem qualquer reflexo na realidade. “Explicam com a subida do índice dos preços, claro, mas isso sobe sempre, a variável a medir aqui seria a inflação, e essa tem vindo a descer”, indica o economista. Tirando em casos esporádicos de deflação, é normal que os preços mantenham uma trajectória ascendente. De facto, a inflação em Novembro último situava-se nos 2,56 por cento, um valor muito baixo, tendo em conta uma perspectiva evolutiva. Em Novembro de 2015, a inflação era de 4,71 por cento e, para se ter um contexto mais alargado, o ano de 2014 terminou com a inflação nos 6,05 por cento.

Outro indicador que desceu significativamente foi o dos padrões de vida, situando-se nos 97.24 pontos, o que representa uma quebra de 1.35 pontos em relação ao trimestre anterior. O estudo justifica esta descida com a inflação, uma razão que não tem reflexo com a realidade, como vimos já.

Estudo duvidoso

Os números mais baixos foram no sector da confiança no mercado imobiliário, com uma confiança de 54.89 pontos, ou seja, bastante insatisfatório. Aqui, a descida foi de 4.39 pontos, ou 7,4 por cento em relação ao trimestre anterior. Este é um item onde Albano Martins vê alguma lógica, “embora a expectativa ainda possa ser de redução dos preços”. Porém, os indicadores apurados vão de encontro à recuperação do sector do jogo, aliado à falta de terrenos, o que pode resultar numa nova subida do mercado imobiliário.

De resto, o que se retira de mais substancial do inquérito é a sua falta de validade. “Uma coisa é o consumidor ter uma percepção errada, outra é os autores do estudo, no final, justificarem os resultados de uma forma incongruente com o que, de facto, se passa na economia”, explica Albano Martins.

Para o economista, não basta dizer que os inquéritos foram feitos aleatoriamente, há outros requisitos científicos a cumprir. “Estes índices deviam vir com a informação detalhada da forma como são feitos, como é composta a amostra, coisa que aparece em qualquer país civilizado, assim como as margens de erro deste tipo de extrapolação.”

Sobre o índice global, depois de feitas as somas, repara-se que a mesma foi conseguida através de simples médias aritméticas dos vários componentes analisados. “Como se a economia local fosse algo que nada tivesse que ver com o emprego, ou o consumo”, explica o economista. Para Albano Martins, este tipo de estudos não tem qualquer validade económica. “Estamos a somar galinhas com patos e a dividir por dois, somamos o que não é somável”, remata o economista.

10 Jan 2017

IAS | Lei da violência doméstica revista semestralmente

O Instituto de Acção Social admite mexer em breve na lei da violência doméstica, que entrou em vigor em Outubro último. Um caso de um agressor que reincidiu veio gerar um novo debate, desta feita sobre lacunas no diploma

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo pondera rever a lei da violência doméstica com uma frequência semestral. A ideia foi lançada pela presidente do Instituto de Acção Social (IAS) ao Jornal do Cidadão. Celeste Vong referiu, no entanto, que “ainda é demasiado cedo para admitir a existência de lacunas legais no diploma”.

Era suposto o diploma ser revisto de três em três anos. A presidente do IAS referiu que a primeira alteração pode vir a ser realizada em Fevereiro ou Março. Em análise estarão os possíveis problemas que tenham decorrido na aplicação da legislação.

A necessidade de uma revisão prematura partiu de um caso registado no passado mês de Dezembro, em que as autoridades policiais detiveram o primeiro homem suspeito de um crime de violência doméstica. O arguido foi condenado, tendo ficado proibido de manter contacto com a vítima. No entanto, o agressor acabou por voltar a agredir a vítima. O episódio veio levantar a questão da existência de lacunas no diploma.

Celeste Vong considerou que ainda será cedo para confirmar a existência de fragilidades e apontou que o caso em questão será devidamente acompanhado. “É necessário mais tempo para avaliar a situação”, disse, sendo que “a lei oferece às vítimas plena protecção e prevê medidas de restrição de contacto por parte do agressor com carácter obrigatório, ao mesmo tempo que incentiva o recurso à denúncia e pedido de ajuda voluntário por parte das vítimas”.

Um problema geral

Para Melody Lu, representante da Coligação Anti-Violência Doméstica, o caso registado pode não ser uma consequência de uma lacuna legal. “Penso que não é um problema da lei em si, mas uma situação que requer uma revisão constante das acções que são tomadas”, disse ao HM. A activista, que lutou pela passagem da violência doméstica a crime público, refere como exemplo Taiwan, onde a lei já tem cerca de 20 anos e está em revisão praticamente todos os anos porque é descoberta alguma falha ou situação que necessita de mais atenção.

“No entanto, a questão é sempre complexa”, ressalvou, e em Macau ainda mais, visto os processos relativos ao delito envolverem vários departamentos diferentes.

Melody Lu recorda que, aquando da fase final do processo legislativo, a coligação que representa mostrou-se apreensiva quanto à protecção das vítimas: “Em particular nos casos em que já foi feita queixa à polícia, muitas vezes não existe uma acção imediata das autoridades, pelo que o crime acaba por se repetir”.

Para a representante da coligação, uma das questões que se levantam é o facto de o agressor poder mesmo continuar a conviver com a vítima. “Seria suposto que a polícia se encarregasse da protecção de potenciais vítimas que já tenham sofrido agressões, mas isso ainda não está claro no diploma”, disse, salientando que “está escrito na lei, mas ainda não é possível perceber bem como é que a polícia colabora com o IAS”.

Ao HM, Juliana Devoy, directora do Centro do Bom Pastor, afirmou desconhecer a intenção do Governo, pelo que não quis fazer qualquer comentário.

10 Jan 2017

Jogo | Manifestação exigiu aumentos e lei sindical

Depois das taxas, os croupiers. Ontem a Associação Nova dos Direitos e Interesses dos Trabalhadores do Jogo, dirigida por Cloee Chao, foi até à sede do Governo pedir aumentos salariais e a implementação da lei sindical

 

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]nquanto o Governo estuda, o povo reclama. Enquanto o Governo promete avançar com um concurso público para estudar a implementação da lei sindical, mais uma associação ligada ao sector do Jogo volta a pedir a legislação de um artigo da Lei Básica. Cloee Chao voltou à rua com a sua Associação Nova dos Direitos e Interesses dos Trabalhadores do Jogo e com 300 croupiers. Exigem aumentos salariais na ordem dos cinco por cento às operadoras e pedem uma lei sindical, para que “nunca mais seja preciso ir à rua apresentar a mesma reinvindicação”.

No protesto estava Lo, de 50 anos, que disse ao HM que não vê o seu salário aumentado há dois anos, algo que não acompanha a inflação.

A carta entregue na sede do Governo, dirigida ao Chefe do Executivo, refere que em 2016 apenas a Sands China ajustou os salários dos seus trabalhadores, sendo que as restantes operadoras não fazem aumentos desde 2015, tendo “prejudicado de forma disfarçada” os direitos sociais dos empregados.

“No início de 2016 as empresas de Jogo publicaram os juros líquidos de 12,5 mil milhões de patacas após o pagamento de impostos. Apesar do sector ter sofrido um ajustamento profundo, os dados mostram que todas as empresas ainda obtiveram enormes lucros.”

Cloee Chao alertou para o facto dos salários pagos na indústria não serem tão bons como a maioria das pessoas pensam, tendo em conta ordenados pagos a pessoal administrativo, técnicos, empregadas de limpeza, pessoal de segurança e condutores. Estes estarão a ser substituídos por não residentes, que ganham salários mais baixos.

“Há mais de dez anos um croupier recebia 14 mil patacas, mas hoje em dia recebe 18 mil, o que está de acordo com a média salarial revelada pelas estatísticas oficiais (15 mil patacas). Onde está então o emprego com alto salário? Podem imaginar os salários que são pagos noutras posições”, lê-se na carta.

A ausência de uma lei sindical faz com que, no caso dos trabalhadores exigirem aumentos, “só podem ficar à espera que os capitalistas se tornem benevolentes, ou optam por sair à rua”, sem outras saídas.

Cloee Chao confirmou que deseja recolher assinaturas do sector, caso os aumentos não se realizem após o Ano Novo Chinês. As reivindicações também deverão chegar às mãos dos deputados do hemiciclo.

10 Jan 2017

Ho Chio Meng | 9,3 milhões de patacas foram parar a sala VIP

Em mais uma sessão do julgamento do antigo procurador da RAEM, Ho Chio Meng confirmou que transferiu 9,3 milhões de patacas para o irmão, que acabaram por ir parar a uma sala VIP

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]firma não ter estado ligado ao negócio, mas a confirmação foi ontem feita no Tribunal de Última Instância (TUI). Segundo a Rádio Macau, Ho Chio Meng, ex-procurador da RAEM, afirmou ter transferido 9,3 milhões de patacas para o irmão, de nome Ho Chiu Shun, através da compra de participações na Sociedade de Promoção de Jogos Seng Ou Limitada. A transferência foi feita no início de 2015 mas, segundo o arguido, a ideia era que o dinheiro fosse investido na compra de um apartamento na zona da Praia Grande, que estava em nome do irmão desde 2006. O dinheiro terá sido investido ainda em imóveis, um parque de estacionamento e depositado em várias contas poupança em Macau e na China.

De acordo com a emissora, que está a acompanhar o julgamento, Ho Chio Meng alegou não saber que aquele dinheiro seria, meses mais tarde, investido numa sala VIP. Com base na versão do Ministério Público (MP), o arguido cometeu este crime quando já tinha conhecimento da investigação levada a cabo pelo Comissariado contra a Corrupção (CCAC).

Ho Chio Meng recordou perante o juiz uma conversa com o irmão, em que este lhe terá dito que o sector VIP dos casinos representava um negócio “com futuro”, mas disse que a decisão de investir o dinheiro no sector junket partiu exclusivamente de Ho Chiu Shun.

O ex-procurador não conseguiu mostrar provas da compra do apartamento, por, segundo a sua versão, não ter tido tempo de assinar as escrituras, por já estar sob investigação.

Dinheiro lavado?

Na tese do MP, o investimento numa sala VIP faz parte de um esquema de branqueamento de capitais. Ho Chio Meng não conseguiu explicar as transferências de dinheiro feitas entre o seu irmão e os sócios de dez empresas que, durante dez anos, ficaram com os contratos atribuídos pelo MP.

A acusação diz que coube ao antigo procurador a atribuição de instruções a dois sócios destas empresas, também arguidos, para abrirem contas, receberem e movimentarem dinheiro vindo de subornos pagos. Essa ideia parte de conversas telefónicas alegadamente mantidas entre Ho Chio Meng, o irmão, um cunhado e mais dois sócios de duas empresas. Ho recusou e disse ter feito “um jogo” quando leu a sua própria acusação: “adivinhar” qual era a sua voz no meio dos telefonemas.

O ex-procurador reiterou a inocência, alegando que a tese do MP é apenas uma “dedução”. “Para a acusação, é impossível [descrever] factos objectivos. Não há factos que possam apresentar. Apenas dizem: ‘O fulano pediu, o fulano deu instruções’. Isto é uma presunção”, declarou. E insistiu: “Têm de dizer quais os factos, a data, a hora [a que foram cometidos], como dei instruções e qual foi o resultado”.

Na mesma sessão de julgamento, o antigo procurador admitiu ainda ter omitido bens da sua declaração de rendimentos, alegando desconhecimento da lei. Deixou ainda uma frase: “Não fiz de propósito”.

Ho Chio Meng ilibou a sua mulher, Chao Sio Fai, de ter culpas no cartório. “Fui eu quem fez as declarações. A minha mulher não teve conhecimento, nem se meteu no assunto. A responsabilidade cabe a mim.” Chao Sio Fai é também arguida, acusada de prestar falsas declarações, algo que causa “tristeza” ao antigo procurador.

As declarações de rendimentos dizem respeito ao período entre 2010 e 2015. Contas na China e em Macau, 300 mil patacas num cofre de uma das casas do casal, um apartamento e um parque de estacionamento na Areia Preta serão os bens que faltam nessas declarações. Ho Chio Meng disse que comprou esta fracção para o pai.

10 Jan 2017

Mário Soares (1924-2017) | O democrata insaciável

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Tinha 92 anos e estava internado há já algumas semanas. Mário Soares morreu em Lisboa no passado sábado. Homem polémico, amado por uns, contestado por outros, foi uma figura incontornável do passado-presente português. A ele se deve a consolidação da democracia no país

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi a figura central da democracia portuguesa. Começou a vida política ainda estudante, no combate ao Estado Novo, fundou o Partido Socialista (PS) e desempenhou os mais altos cargos políticos na República Portuguesa. Nascido em Lisboa, a 7 de Dezembro de 1924, filho de João Lopes Soares, que foi ministro na I República, e de Elisa Nobre Baptista, Mário Alberto Nobre Lopes Soares teve um percurso político intenso, com influência em alguns dos mais importantes acontecimentos do século XX em Portugal.

Preso político e exilado pela ditadura de Oliveira Salazar e Marcelo Caetano, foi um dos fundadores do PS, em 1973, e depois do 25 de Abril de 1974 foi ministro dos Negócios Estrangeiros dos primeiros governos provisórios, primeiro-ministro dos I, II e IX governos constitucionais, entre 1976 e 1978 e entre 1983 e 1985, e Presidente da República por dois mandatos, de 1986 a 1996.

Os primeiros passos de Mário Soares na política foram dados aos 19 anos, em plena ditadura e no final da II Grande Guerra Mundial, quando aderiu, na clandestinidade, ao Partido Comunista Português (PCP) em 1943, tendo nessa década feito parte de organizações de resistência ao regime como o MUD (Movimento de Unidade Democrática) Juvenil e o MUNAF (Movimento de Unidade Nacional Antifascista).

Antes, ainda adolescente, conheceu por via do seu pai o líder histórico do PCP, Álvaro Cunhal, então jovem dirigente comunista, que foi regente de estudos do Colégio Moderno e que lhe deu lições particulares (tal como Agostinho da Silva), incentivando-o, depois, a seguir na universidade os estudos de Filosofia.

Dois anos depois, em Agosto de 1946, foi pela primeira vez preso pela polícia política do Estado Novo, a PIDE. Cinquenta anos mais tarde, numa entrevista, confessou que a prisão foi a sua “segunda universidade”.

Terminada a II Guerra Mundial e no início da Guerra Fria (Estados Unidos/União Soviética), foi secretário da Comissão Central da candidatura do General Norton de Matos à Presidência da República, em 1949, tendo participado desde essa altura em todos os actos eleitorais permitidos pelo regime do Estado Novo.

Licenciado em Ciências Históricas-Filosóficas (1951) e em Direito (1957), pela Universidade de Lisboa, Mário Soares desligou-se, entretanto, do PCP, partido do qual seria formalmente expulso em 1950.

“Ainda hoje não lhe posso dizer se fui eu que saí ou se foi o partido que me expulsou”, disse na entrevista à jornalista Maria João Avillez, que deu origem ao livro “Soares – Ditadura e Revolução”.

Os dias da prisão

Em 1953, numa fase em que era acusado de ser “oportunista” pelo PCP, aderiu à Resistência Republicana e Socialista, que pretendia construir uma alternativa de esquerda não comunista. A luta contra a ditadura foi um dos legados que recebeu do pai, que disse ser a “sua grande referência moral”. A actividade política levou a que fosse perseguido pela PIDE e preso 12 vezes num período de três anos.

Na prisão, casou-se com Maria de Jesus Barroso, jovem actriz do Teatro Nacional, a 22 de Fevereiro de 1949, com quem teria dois filhos, Isabel e João. Como advogado, defendeu presos políticos e representou a família de Humberto Delgado nas investigações que provaram a responsabilidade da PIDE no assassínio do “general sem medo”.

Em 1961, subscreveu o Programa para a Democratização da República, acto que o levaria novamente à prisão por seis meses. Três anos depois, com Francisco Ramos e Costa e Manuel Tito de Morais, fundou a Acção Socialista Portuguesa, organização que levaria mais tarde à formação do PS, e (já com Marcelo Caetano como presidente do Conselho) esteve em 1969 na primeira linha da constituição da CEUD (Comissão Eleitoral de Unidade Democrática).

Em 1968, foi por oito meses deportado em São Tomé e Príncipe e, dois anos depois, foi forçado a exilar-se em França, onde deu aulas em Vincennes, em Paris, na Sorbonne, e na Faculdade de Letras da Alta Bretanha.

Durante o seu período no exílio, Mário Soares foi o principal dinamizador da fundação do PS, a 19 de Abril de 1973, em Bad Munstereifel, na República Federal Alemã, sendo eleito secretário-geral de imediato, cargo que desempenharia durante 13 anos, até 1986.

Quando o PS foi fundado, preparava-se já em Portugal o movimento dos capitães que levaria à queda da ditadura. Logo que soube do golpe de Estado, Mário Soares decidiu regressar imediatamente a Portugal, apanhou o comboio em Paris e chegou a Lisboa dois dias após o 25 de Abril. Na estação de Santa Apolónia, foi recebido em euforia por uma multidão, a quem falou da varanda da estação.

De África à Europa

No nascimento do novo regime político, com o general António de Spínola a Presidente da República, foi ministro dos Negócios Estrangeiros dos três primeiros governos provisórios e ministro sem pasta do IV, nestes dois últimos já com o general Costa Gomes nas funções de chefe de Estado. Neste período, esteve directamente envolvido no início da descolonização da Guiné, Cabo Verde, Angola, São Tomé e Príncipe e Moçambique – processo que, pela sua controvérsia, marcou a sua carreira política.

Depois de o PS ter vencido com cerca de 38 por cento dos votos as primeiras eleições livres da democracia, para a Assembleia Constituinte, em Abril de 1975, Mário Soares entrou em frontal rota de colisão com o bloco comunista e com o então primeiro-ministro Vasco Gonçalves, demitiu-se do IV Governo Provisório e foi o principal protagonista civil do movimento contra a ameaça de “um novo totalitarismo”, desta vez de inspiração soviética.

Tendo como aliados internacionais Helmut Schmidt (chanceler da República Federal Alemã), Olof Palme (primeiro-ministro sueco), François Mitterrand (que viria a ser Presidente de França), e próximo do então norte-americano em Lisboa, Frank Carlucci, o líder do PS bateu-se por uma via europeia para Portugal e lutou politicamente contra o Processo Revolucionário em Curso (PREC), que seria derrotado militarmente com o golpe de 25 de Novembro de 1975, chefiado pelo general Ramalho Eanes.

O PS voltou a vencer o segundo acto eleitoral da democracia, as primeiras eleições legislativas, em Abril de 1976, e Mário Soares foi nomeado primeiro-ministro do I Governo Constitucional.

Enquanto chefe de Governo, primeiro com um executivo do PS sem maioria no Parlamento, depois em coligação com o CDS, teve de gerir o regresso de milhares de retornados das ex-colónias e uma situação de quase ruptura financeira do país, aplicando um programa negociado com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas foi também neste período, em 1977, que Mário Soares iniciou formalmente o processo de adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (CEE).

De 1979 a 1983, na oposição, acordou com a Aliança Democrática (PSD/CDS/PPM) a primeira revisão da Constituição, que consagrou o carácter civilista do regime.

Em 1983, Soares foi novamente primeiro-ministro, desta vez em coligação com o PSD liderado por Mota Pinto. O IX Governo Constitucional, conhecido como o Governo do “Bloco Central”, de 1983 a 1985, foi confrontado com a necessidade de um segundo pedido de resgate ao FMI e concluiu o processo de adesão de Portugal à CEE a 12 de julho de 1985.

Apesar da recomposição das finanças públicas e de se ter alcançado o objectivo da integração europeia, o PS sofreu a maior derrota da sua história nas eleições legislativas de 1985, com 21 por cento dos votos.

Os anos da presidência

Mesmo com um ambiente político desfavorável – as sondagens davam-lhe oito por cento das intenções de voto –, Mário Soares decidiu no final de 1985 lançar-se na corrida presidencial.

Na primeira volta, atingiu os 25 por cento, batendo os outros candidatos apoiados por eleitorado de esquerda, Maria de Lurdes Pintassilgo e Salgado Zenha, que até 1980 tinha sido o seu “número dois” na direção do PS. Na segunda volta, derrotou o candidato apoiado pelo PSD e CDS, Freitas do Amaral, por 120 mil votos de diferença.

Em Belém, exerceu um primeiro mandato em que apostou na proximidade com as pessoas, através da realização de “presidências abertas”, em que se fixava vários dias fora da capital, tal como os antigos monarcas portugueses fizeram até ao final do Antigo Regime. No plano externo, realizou dezenas de viagens por todo o mundo, visando projetar a imagem de Portugal como uma democracia moderna.

Neste seu primeiro mandato, PS, PRD (Partido Renovador Democrático) e PCP uniram-se numa moção de censura que derrubou o Governo minoritário liderado por Cavaco Silva, mas Soares recusou a formação de um novo executivo com base naqueles partidos de esquerda e convocou eleições antecipadas em 1987, nas quais o PSD teve a sua primeira de duas maiorias absolutas.

Mário Soares foi reeleito sem dificuldade Presidente da República em 1991, com 70,4 por cento dos votos e com o apoio do PSD. No entanto, o seu segundo mandato seria marcado por um clima de crispação com o Governo de Cavaco Silva.

Nos meios do PSD, foi apontado como uma das “forças de bloqueio” da governação de Cavaco Silva, enquanto Soares reclamou “o direito à indignação” mesmo perante um Governo de maioria absoluta.

Em 1995, depois de dez anos de “jejum” de poder socialista, Mário Soares deu posse a António Guterres como primeiro-ministro e, alguns meses depois, no início de 1996, passou o testemunho da Presidência da República a um outro socialista, Jorge Sampaio.

Político até ao fim

Fora de Belém, Mário Soares voltou a percorrer o mundo, participando em conferências e palestras. Escreveu artigos em jornais e revistas e nunca se coibiu de comentar a actualidade nacional e internacional.

Em 1999, por convite do então secretário-geral do PS, António Guterres, regressou à política activa, aceitando o desafio de liderar a lista dos socialistas para o Parlamento Europeu, acto eleitoral que venceu com cerca de 44 por cento dos votos.

“Agora, basta! Não haverá mais política, nem exercício de cargos políticos”, disse a 7 de dezembro de 2004, durante um jantar comemorativo dos seus 80 anos.

Mas em 2005, agora por proposta do líder do PS, José Sócrates, Mário Soares decidiu travar mais um combate político e lançou-se numa terceira candidatura à Presidência da República.

Porém, Manuel Alegre também resolveu entrar na corrida presidencial de 2006 como independente, disputando-lhe o espaço socialista, e Cavaco Silva venceu o acto eleitoral logo à primeira volta. Soares acabaria em terceiro lugar, inclusivamente atrás de Alegre, com pouco mais de 14 por cento dos votos.

Ao longo da última década, Soares posicionou-se claramente na esquerda política, aproximando-se de personalidades do Bloco de Esquerda e do espaço comunista. No plano internacional, Soares apoiou a acção do antigo chefe de Estado brasileiro, Lula da Silva, e fez questão de mostrar a sua amizade com o falecido e controverso presidente venezuelano, Hugo Chavez.

Em contraponto, o fundador do PS fez discursos extremamente violentos contra o ex-Presidente norte-americano George W. Bush, contra a chanceler germânica, Angela Merkel, e contra o rumo recente da União Europeia, que considerou subordinada ao neoliberalismo e à “ditadura dos mercados”.

Já o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, mereceu-lhe sempre os mais rasgados elogios, considerando-o “o maior estadista e político que existe no mundo”. Barack Obama e o papa Francisco foram as duas últimas figuras mundiais encaradas como referências pelo fundador do PS.

Ao contrário do que acontecera com anteriores líderes do PS como Vítor Constâncio, Jorge Sampaio ou António Guterres, Soares teve poucos momentos de choque com a liderança socialista de José Sócrates (2004/2011), a quem frequentemente elogiou a sua coragem e determinação política.

Após a queda política de Sócrates, Soares manteve-se equidistante na disputa pela liderança do PS travada entre António José Seguro e Francisco Assis, em Julho de 2011, elogiando ambos, mas no Verão de 2013 incompatibilizou-se com o então secretário-geral do PS, Seguro, quando este se envolveu em negociações (falhadas) com o PSD, sob observação do ex-Presidente da República Cavaco Silva.

Nas eleições “primárias” socialistas de Setembro de 2015, Mário Soares esteve ao lado do actual líder, António Costa, contra António José Seguro, tendo depois apoiado o antigo reitor da Universidade de Lisboa Sampaio da Nóvoa nas presidenciais de janeiro de 2016, que Marcelo Rebelo de Sousa venceu logo à primeira volta.

Durante o período de resgate financeiro de Portugal, entre 2011 e 2014, Mário Soares colocou-se frontalmente contra o executivo PSD/CDS-PP liderado por Pedro Passos Coelho, tendo promovido conferências na Aula Magna da Reitoria da Universidade de Lisboa que juntaram representantes de todas as forças de esquerda “em defesa da Constituição” e em rejeição contra a linha da “troika” (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional).

Em 2012, através de um manifesto, o antigo Presidente da República pediu a demissão do executivo liderado por Passos, alegando que Portugal estava a “arruinar-se” e a “ser destruído”, e defendeu a formação de um Governo de personalidades (ou técnico) sem recurso a eleições antecipadas, tal como tinha acontecido em Itália.

No mesmo ano foi promotor de um novo manifesto, desta vez de solidariedade com o povo da Grécia, juntamente com 33 personalidades ligadas à esquerda portuguesa, entre eles o ex-líder da CGTP Carvalho da Silva, de quem se aproximou politicamente, chegando mesmo a sugerir que seria um bom candidato presidencial.

Nos últimos anos, a corrente neoliberal tornou-se a inimiga número um do combate político de Mário Soares. Nesta fase, numa das suas aparições públicas, Mário Soares deixou mesmo um aviso em tom dramático sobre os perigos do poder dos mercados financeiros.

Após a morte da sua mulher, Maria de Jesus Barroso, em Julho de 2015, começaram a ser raras as aparições públicas de Mário Soares. Em 2016, já com a sua saúde debilitada, Mário Soares foi alvo de várias homenagens institucionais, a primeira quando recebeu em Abril do presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, numa cerimónia reservada, o diploma de deputado honorário no âmbito dos 40 anos da posse da Assembleia Constituinte.

No mesmo mês, por ocasião das comemorações do 25 de Abril de 1974, o fundador do PS recebeu do presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, também numa cerimónia reservada, a chave da cidade – a mais alta distinção atribuída pelo município a personalidades com relevância nacional e internacional.

A 23 de Julho, foi a vez do primeiro-ministro, António Costa, numa cerimónia pública que se realizou nos jardins de São Bento, prestar homenagem ao I Governo Constitucional, liderado por Mário Soares, por ocasião dos 40 anos da posse deste executivo minoritário do PS.

Mário Soares esteve presente pela última vez numa sessão pública a 28 de Setembro, quando o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, homenageou a antiga presidente da Cruz Vermelha Portuguesa Maria de Jesus Barroso.[/vc_column_text][vc_text_separator title=”” css=”.vc_custom_1483988720204{margin-bottom: 12px !important;}”][vc_message message_box_style=”solid” style=”square” icon_fontawesome=”fa fa-comments”]

REACÇÕES

Chui Sai On, O Chefe do Executivo sublinhou o importante papel tido por Mário Soares “no diálogo entre a China e Portugal no que diz respeito a assuntos relacionados com Macau” para frisar que a ausência de Mário Sares será “sentida”. Chui Sai On não deixou de referir, em mensagem enviada à comunicação social, o carácter de liderança de excelência e as “estreitas relações com o território” tidas pelo político português.

Miguel de Senna Fernandes, presidente da Associação dos Macaense e da APIM, fala de um político que deixa “alguma saudade”, pois sempre que vinha ao território “provocava banhos de multidão”.  “A imagem que havia em Macau era de uma pessoa que sabia ouvir. Recordo-me que quando chegou a Macau, nas suas visitas, já como Presidente da República, era uma pessoa muito querida, estava muito habituado aos banhos de multidão, que ele próprio provocava”, disse o advogado. O macaense recorda como o político causava “constante preocupação ao pessoal da segurança” porque, ao contrário de “outras personalidades que se afastavam da multidão por razões de segurança”, Soares “fazia questão de quebrar [o aparato de segurança], juntava-se às pessoas, fazia questão disso”. “Vamos sentir muita falta dele”, diz Senna Fernandes, lembrando como a estreia do seu grupo de teatro em patuá, os “Doçi Papiaçám” foi dedicada a Soares, no ano de 1993.

Vasco Rocha Vieira, general e último governador de Macau, fala de Mário Soares como tendo sido “um grande político, um grande homem e um grande português”, que viu “o tempo à frente do seu tempo”. “Devemos muito ao doutor Mário Soares: o Portugal da liberdade, da democracia, da abertura ao exterior, de uma nova visão do mundo e da sua capacidade de ser maior do que o seu espaço nacional. Portugal e os portugueses devem-lhe isso e devem recordá-lo como um grande político, um grande homem e um grande português”, afirmou Rocha Vieira. Para Rocha Vieira, Soares foi “um homem que viu o tempo à frente do seu tempo”. “Esteve nas grandes decisões estratégicas de Portugal moderno, na segunda metade do século XX, e, principalmente, depois da implementação da democracia em Portugal. Apontou rumos, apontou estratégias e teve a percepção de que Portugal, na escala nacional, precisava de se expandir para outros mercados, para outros espaços, nomeadamente União Europeia, na altura CEE, e a CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa)”, vincou o último governador. Além disso, o general sublinhou “a noção muito clara” que Mário Soares tinha de que Portugal, para lá destes espaços, “precisava também de alianças para garantir” a segurança e a defesa do país, razão pela qual o antigo Presidente da República foi “um grande defensor da presença activa de Portugal na Nato”.

Anabela Ritchie, última presidente da Assembleia Legislativa antes da transferência de soberania, recorda Mário Soares como um presidente muito interessado “na preservação da identidade” local e preocupado com a prevalência de direitos fundamentais. “Tinha muito em mente a preservação da identidade e singularidade de Macau, a manutenção de Macau depois da transição para a República Popular da China”, recordou Anabela Ritchie à Lusa, apontando que o segundo mandato de Soares como Presidente, até 1996, coincidiu com um “período muito importante” para o território, quando se negociava a “entrega” de Macau. Apesar da distância, Ritchie garante que Soares “sempre se interessou, sempre quis ouvir” e mostrava “grande solidariedade e carinho” por Macau. “Interessava-se mesmo e usava amiúde a expressão ‘Macau é um desígnio nacional’, no sentido em que é um projecto que deve envolver toda a gente. Creio que sensibilizava as pessoas para as tarefas que estavam a ser realizadas em Macau no período de transição”, lembra.

Tiago Pereira, secretário coordenador da secção do Partido Socialista (PS) em Macau, recorda ainda a forma como Mário Soares lidou com o processo de transferência do território. “Macau esteve sempre presente nas sua preocupações, e ele de facto estava preocupado, no sentido em que queria entregar a administração de Macau da melhor forma possível à China. Consegue dotar Macau de infra-estruturas próprias importantes. A secção do PS em Macau obviamente admira muito o doutor Mário Soares, mas não só: a comunidade portuguesa em geral também o sente e é uma pessoa respeitada localmente pela comunidade chinesa também”, rematou.

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9 Jan 2017

Mário Soares (1924-2017) | A legalização de 50 mil pessoas em Macau

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m aparente acto espontâneo de Mário Soares, dado às fugas ao protocolo, durante uma visita a Macau, teve um resultado inesperado: ao consolar uma criança, deu um empurrão à legalização de 50 mil pessoas. O jornalista João Guedes, já então repórter da TDM (Teledifusão de Macau), recorda-se de quando, em 1989, Soares visitou Macau e foi abordado por um grupo de trabalhadores ilegais chineses, que pediam a regularização da sua situação – um problema que se arrastava há anos “mas ninguém tinha coragem” de resolver.

O Jornal Tribuna de Macau descreveu como Mário Soares foi confrontado com uma “pequena manifestação” que incluía “quatro crianças empunhando um cartaz com inscrições chinesas” que pediam “a intervenção do Presidente para a obtenção dos documentos de identificação de Macau para as suas mães”.

As crianças “abriram um pano onde se lia a frase ‘Por favor dá o bilhete de identidade à minha mãe’”, escreve o jornal, explicando que as mães estavam ilegalmente em Macau, casadas com maridos em situação legal e com filhos já nascidos no território, “devidamente documentados”.

“Ao notar a presença de cidadãos de etnia chinesa que insistentemente o pretendiam interpelar junto ao Palácio da Praia Grande, Mário Soares cruzou a avenida para apurar o que se estava a passar. Quando (…) se aproximou do local, um cidadão de etnia chinesa (…) prostrou-se no chão aos pés de Soares pedindo a sua intervenção para resolver a situação da sua mulher”, escrevia o Tribuna na edição de 3 de Março de 1989.

Soares, “visivelmente chocado com a situação e com o choro das crianças, (…) prometeu resolver a situação”. Tendo em conta que a mulher corria risco de ser repatriada para a China, o Presidente declarou que “as crianças não podem ser separadas da mãe”. “Vamos tratar disso”, afirmou.

A “Operação Dragão”

Segundo João Guedes, este episódio desencadeou uma operação de legalização, cerca de um ano mais tarde, preparada “entre os maiores segredos”, tentando evitar que multidões acorressem a Macau para conseguir um documento de identificação. Esta é uma ligação comum na memória de quem vivia na cidade na altura.

“O governador [Carlos Melancia] ficou à rasca, toda a gente ficou à rasca e é quando o governador não tem alternativa se não virar-se para o comandante das forças de segurança e dizer ‘Legalize-me toda a gente que está em Macau’. E pronto, legaliza 50 mil pessoas”, conta à Lusa.

O jornalista refere-se à “Operação Dragão”, em Março de 1990, que começou com um anúncio das autoridades de que seriam legalizados os pais indocumentados de cerca de 4200 crianças. A notícia gerou tal afluência que acabou por resultar na legalização de “um número mais avultado do que se imaginaria”, escreve o Tribuna.

Durante anos, recorda João Guedes, surgiam rumores, periodicamente, de que Macau ia legalizar a população em situação irregular, cerca de 15 por cento à época. “Eram nuvens de chineses a tentar chegar a Macau das formas mais imaginosas. Havia rumores, o pessoal vinha por vários meios, a nado ou em sampanas, havia até passadores chamados ‘cabeças de cobra’”, explica. Apesar de os rumores nunca se concretizarem, os ilegais – empregadas domésticas, trabalhadores da construção – iam-se acumulando.

“Era uma questão que se pressentia como necessária, mas ninguém tinha coragem para pôr isso em andamento. Até essa coisa do Soares”, explica o jornalista, lembrando que já decorriam preparativos para a transferência de administração de Macau de Portugal para a China e era necessário saber exactamente quantas pessoas havia na cidade.

Surge, então, este anúncio, indicando os locais onde as pessoas se deviam reunir para iniciar os procedimentos. “Um dos pontos era o Canídromo”, onde se deu “uma grande bronca”, devido à concentração de uma “multidão enormíssima” junto aos portões da pista de corridas de cães, recorda Guedes.

O jornalista encontrava-se no alto do forte de Mong-Ha com um operador de câmara. “Tinha uma vista perfeita para o Canídromo e assisti àquilo, estivemos a transmitir em directo”, conta.

O gesto humanitário

O Tribuna de Macau descreve como “milhares de imigrantes” vieram “a salto para Macau”, atraídos por “boatos” de “uma possível amnistia que lhes possibilitasse manterem-se no território”.

“A multidão não arredou pé, exigindo que o Governo lhes desse garantias quanto à legalização. (…) Ao princípio da noite o caso encontrava-se num beco sem saída, com alguns manifestantes a avançarem com a ideia de greve de fome”, descreve o jornal.

O Governo chegou a anunciar a suspensão das legalizações e mandou ‘limpar’ a cidade, mas voltaram a criar-se grupos: “Cerca das duas horas da manhã a situação foi-se deteriorando com a chegada de mais centenas e centenas de ilegais (…) A situação manteve-se tensa durante largas horas, com a multidão aos gritos a exigir ser também registada, uma multidão que ia engrossando à medida que o tempo passava”.

Com dificuldade em controlar a multidão, as autoridades “decidiram fazer a listagem” dos ilegais, sendo conduzidos para o Campo da Polícia, nas Portas do Cerco, e o Estádio do Canídromo. Neste último “estabeleceu-se o pânico”, com disparos para o ar pela polícia e pessoas “no chão espezinhadas”, “chegando a haver rumores, não confirmados, que uma criança teria sido morta”.

Nesta operação foram registados mais de 50 mil ilegais, escreveu a Lusa na altura.

Miguel Senna Fernandes diz “não ter dúvidas” de que esta operação foi uma consequência da reacção de Soares aos manifestantes em 1989. “Naturalmente é um gesto humanitário de Mário Soares para uma política consentânea à realidade de Macau e das suas gentes. Seja como for, a visita de Soares em 1989 teve um efeito praticamente directo quanto à Operação Dragão, não aconteceu antes porque, enfim, tinha de se ver a logística e oportunidade”, disse à Lusa.

9 Jan 2017

Mário Soares (1924-2017) | Faxes, mentiras e vícios

Nem tudo correu bem ao estadista convicto que faleceu este sábado. Sobretudo em Macau. Apesar dos banhos de multidão que recebeu, Mário Soares teve de enfrentar alguns episódios que lhe podiam ter manchado a carreira. Mas não mancharam

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] primeiro dá-se com a Emaudio, empresa ligada ao então Presidente da República e financiada com dinheiros que sobraram da campanha eleitoral. Carlos Melancia, ex-governador de Macau, era sócio. A Emaudio queria uma posição na Teledifusão de Macau (TDM) para chegar mais facilmente ao mercado de Hong Kong. Maria de Belém Roseira era então vogal da TDM e denunciou supostas irregularidades cometidas pelo presidente e vogal da TDM, já que estaria a ser preparado um processo de transformação da empresa pública numa sociedade anónima, por forma a facilitar a entrada da Emaudio.

Nuno Delerue, à data secretário com a tutela da comunicação social, exonerou o presidente da TDM, mas acabou exonerado por Mário Soares. Soares escreveria a Pinto Machado, então governador, a exigir um “conhecimento prévio” por parte da Presidência da República de todas as questões que se passassem em Macau ao nível da comunicação social. Tal acto levou Pinto Machado a demitir-se.

Num artigo publicado na revista local Face, António Duarte, ex-assessor de Melancia, explica que havia, já em 1987, a ideia de semi-privatizar a TDM. “Quando o Expresso publicou que Melancia tinha sido sócio da Emaudio e pretenderia que a empresa de Rui Mateus, associada a Robert Maxwell, conquistasse o negócio da TDM, o governador ficou surpreendido. E os seus colaboradores mais próximos também. Ninguém sabia que Carlos Melancia tinha sido sócio da Emaudio. (…) Mas o pequeno escândalo estava lançado. Melancia desencadeou, então, uma ofensiva (nem sempre bem percebida) para explicar porque razão tinha suspenso um concurso de pré-qualificação de candidatos à TDM e iniciado contactos com a Emaudio-Maxwell. ‘É com a Emaudio – dizia-me Melancia – porque ela traz agarrado a Maxwell, que é quem me interessa para a TDM’”, escreveu António Duarte. O caso viria a ser arquivado em tribunal em 1992.

O fax alemão

O semanário O Independente, que abordou o caso Emaudio, recordado no livro “O Independente – a máquina de triturar políticos”, também lançou mais uma bomba para a carreira de Soares: a história do fax, ligado à construção do Aeroporto Internacional de Macau. A Weidleplan, consultora alemã, queria participar no projecto e terá feito um donativo político de 50 mil contos à Emaudio. O problema foi o facto da Weidleplan não ter sido a escolhida. Como o dinheiro não foi devolvido, a empresa decidiu enviar o fax, visando Carlos Melancia, a pedir a devolução do dinheiro. O documento acabaria por ir parar às páginas d’O Independente.

O caso dá-se em plena campanha eleitoral para as presidenciais, e segundo Carlos Morais José e António Duarte, havia a tentativa de manchar a campanha de Mário Soares com os ecos de Macau. “Aquando da telenovela do caso TDM, que, por ironia, viria a ser arquivado em tribunal, em finais de 1992, o jornalista do Expresso, Joaquim Vieira, contou-me, em Lisboa, que tinha a sua caixa de correio inundada de documentos e fotocópias que saíam do palácio e da própria TDM. E já havia quem enviasse faxes”, relatou o ex-assessor de Melancia.

Carlos Morais José, director do Hoje Macau, à época correspondente em Macau d’O Independente, acompanhou o caso de perto e recordou-o na revista Face. “A verdade é que estávamos em ano de eleições presidenciais. (…) tornava-se óbvio que o ataque a Melancia tinha como alvo Soares.”

E dá exemplos. “Tudo ficou ainda mais claro, numa daquelas ingenuidades jornalísticas que contam com a ingenuidade do leitor. Capa: “Caça ao tesouro”. Assunto: a obra de arte no cofre de Melancia, que os investigadores do Ministério Público tinham encontrado, eventualmente, o facto de ter sido assim feito um hipotético pagamento. Disparate: na mesma página, o resultado de uma sondagem que dava a Mário Soares uma margem mais que favorável nas eleições presidenciais. Era tudo tão claro como a água”, escreveu.

O Ministério Público nunca chegou à Presidência da República, e Soares até conseguiu ser reeleito. Melancia acabaria por ser absolvido em tribunal, em 1993, das suspeitas de corrupção passiva. Mas um olhar para as primeiras páginas d’O Independente na altura permite ver uma óbvia associação de Mário Soares a todos estes processos. Ele saberia de tudo e quase todos os intervenientes seriam próximos do Presidente. Contudo, a justiça nada conseguiu provar.

A ligação mais recente de Soares com Macau diz respeito a Ng Lap Seng. A revista Visão publicou, há mais de um ano, um artigo a ligar o milionário chinês, actualmente em prisão domiciliária nos EUA por suspeitas de corrupção, à Fundação Mário Soares. Todos, incluindo Carlos Monjardino, ligado à Fundação, afirmam não conhecer Ng Lap Seng, mas o seu nome está lá. E a biografia de Joaquim Vieira sobre Soares afirma que todos os que deram donativos fazem parte da fundação. Um mistério ao qual Soares nunca respondeu.

9 Jan 2017

Justiça | Ho Chio Meng faz reparos à acusação

De cápsulas de café a esquentadores, passando por viagens de avião com pessoas que, alegadamente, não deviam ter viajado à boleia do Ministério Público. O julgamento do antigo procurador continua e Ho Chio Meng reitera que é inocente

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] ex-procurador da RAEM não se conforma com a acusação de que usou dinheiro do Ministério Público para pagar bilhetes de avião e quartos de hotel a pessoas estranhas ao serviço. Ho Chio Meng garante que “não há crime” algum e reiterou que a “acusação está mal feita”. De acordo com a Rádio Macau, que tem estado a acompanhar o julgamento, Ho Chio Meng deixou, na passada sexta-feira, um desabafo: “Não posso ter mais azar do que estar aqui sentado. Mas azar do que este não pode haver”.

Acusado de mais de 1500 crimes, a maioria relacionados com a aquisição de bens e serviços de pequeno valor, Ho Chio Meng referia-se à acusação de que, em sete anos, gastou milhões de patacas em viagens e hotéis com pessoas que não faziam parte do MP e que a acusação identifica como “amigas” do arguido. O ex-procurador voltou a contestar a escolha das palavras: “Esse termo [‘amiga’] não é correcto. Se [o convidado] não for homem, só pode ser mulher. Se a acusação fala nas mulheres, é necessário que diga que há homens também”.

Na versão de Ho Chio Meng, os beneficiários das despesas de representação “estavam a prestar serviços para o MP”, apesar de não fazerem parte do organismo. Seriam pessoas próximas do Gabinete de Ligação ou que viram os gastos autorizados por “um dirigente” que o ex-procurador disse não pretender identificar. A informação estará num documento. “Se tivessem visto este documento, não teriam esta conclusão. Não pensaram bem as coisas”, afirmou, dirigindo-se aos magistrados do MP.

Entre estas pessoas que não faziam parte do serviço e viajaram com o Gabinete do Procurador, está Wang Xiandi, também arguida no processo. Apesar das tentativas do tribunal, Ho Chio Meng não quis entrar em pormenores sobre as ligações de Wang ao MP.

“Sou inocente. Choro pela inocência”, reforçou o ex-Procurador, referindo-se ainda às acusações relacionadas com as despesas de representação. “Sinto-me mal a ler isto. Não corresponde à verdade e afecta a minha família. Da maneira como está escrito, afecta a minha família”, disse.

Rir do que é “muito ridículo”

Na mais recente sessão do julgamento, que está a decorrer no Tribunal de Última Instância, Ho Chio Meng reforçou o tom das críticas à acusação de que é alvo, relata ainda a Rádio Macau. O ex-procurador revelou indignação sobre o alegado esquema de corrupção associado à aquisição de bens e serviços durante o tempo em que esteve à frente do Ministério Público, e disse que havia factos da pronúncia que lhe davam vontade de rir.

“Vi o contrato e até me ri. Não por estar contente, mas por ser muito ridículo”, afirmou Ho Chio Meng, referindo-se ao momento em que, já na prisão, viu por que estava acusado de burla pela compra de serviços de microfilmagem. A acusação alega que houve crime porque as empresas contratadas “não prestaram serviços profissionais, apenas mandaram os seus trabalhadores desempenhar o trabalho”.

Na versão do MP, o serviço devia ter sido prestado por um “técnico de microfilmagem” e por um “operador de computador”. Já Ho Chio Meng alega que esta é uma área onde não há especialistas. “Até eu posso fazer este trabalho”, disse.

O ex-procurador preparava-se também para contestar a acusação na parte em que cita a quantidade de microfilmes comprada, mas a referência serviu apenas para o juiz Sam Hou Fai, que preside ao julgamento, concluir que, afinal, o arguido tem tempo para “ver a acusação tintim por tintim”.

A sessão começou com Ho Chio Meng a afirmar que as condições na prisão são “muito difíceis” para preparar a defesa. “É uma pessoa sozinha, um papel e uma caneta” contra os mais de 1500 crimes que constam da acusação.

O antigo procurador voltou a apontar para a “falta de provas” e disse que a acusação é “subjectiva” e parcial por ignorar alguns factos.

Ainda sobre os contratos de obras e serviços relacionados com a residência oficial, Ho Chio Meng repetiu que se limitou a seguir o modelo do Governo para escolher sempre a mesma empresa. “Em relação às residências oficiais, há prestações de serviços praticamente fixas”, reforçou.

A existência de um piano na moradia oficial do então procurador causou perplexidade ao tribunal. Sam Hou Fai, que também tem direito a residência oficial, quis saber quanto custou o piano e quem o comprou. “A sede do Governo perguntou-me o que queria para lá”, respondeu Ho Chio Meng. E acrescentou: “Não se esqueça que entrei primeiro. Vivi lá primeiro”.

Água quente e café

Na sessão falou-se ainda da instalação de um esquentador na residência (Ho Chio Meng é acusado de ter recebido 700 patacas de comissão pelo serviço) e da compra de cápsulas Nespresso para o MP. O tribunal quis saber por que o café não era comprado directamente ao fornecedor, mas através de uma empresa.

Ho Chio Meng alegou questões práticas e disse que este foi um assunto a que não prestou atenção por entender que “é pouco relevante”, apesar da burocracia envolvida. O tribunal insistiu na pergunta e Ho Chio Meng acabou por se mostrar indignado. “Toda a gente toma café. Mas quem foi preso preventivamente e está aqui sentado, acusado de burla ou de participação económica, sou eu”, rematou.

9 Jan 2017

Taxas de veículos | Vozes e cartazes invadiram as ruas contra aumento

Os números não são consensuais, mas seriam entre 1600, segundo a polícia e 5000, segundo a organização, os manifestantes que ontem se fizeram ouvir contra o aumento de taxas anunciado pelos Serviços de Tráfego. A liderar a manifestação esteve o deputado José Pereira Coutinho que considera a medida uma punição social

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] moldura humana era de perder de vista na chegada da manifestação de ontem à Sede do Governo. Um aglomerado de cartazes com palavras de ordem contra o recente aumento de taxas sobre os veículos impunha-se no ar e para que não existissem mal entendidos, as frases estavam em chinês, português e inglês. Era uma manifestação para ser bem percebida por todos: Executivo e população. A acompanhar os dizeres soavam as vozes que gritavam “retirada” e seguiam o nitidamente satisfeito organizador, José Pereira Coutinho.

Segundo o deputado, eram cerca de cinco mil os manifestantes. “Uma adesão muito boa  e que nos deixa muito satisfeitos”, disse à comunicação social após a entrega da petição. No entanto, Pereira Coutinho não deixou de sublinhar que “seriam  muito mais se muitos não tivessem de estar de serviço”.

Para o dirigente da Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), uma das entidades promotoras do protesto, o facto de chamar multas, e não taxas, à recente medida do Governo, é simples de explicar. “Esta forma de aumentar drasticamente os valores do que chamam de taxas é uma penalização e, como tal, não está correcto penalizar a população. Por isso são multas”, disse. Para o deputado trata-se de uma penalização que “vai directamente aos bolsos dos cidadãos” e como tal, deve ser previamente analisada junto da população.

A ATFPM findou a manifestação com a entrega da petição no Governo. Trata-se de “uma missiva a pedir a retirada do despacho que aumentou substancialmente as multas”.

As razões apontadas pelo líder da ATFPM são sumariadas em três pontos: “a falta de consulta pública, as multas exorbitantes que vão para o bolso de empresas privadas e, por último, alguém tem de assumir responsabilidades por todo esta imbróglio”. Para Pereira Coutinho os residentes não devem, no primeiro dia de Janeiro “sofrer consequências tão drásticas”.

O deputado frisou ainda que considera outras formas de intervenção contra a medida tomada no ano novo. “Não estão fora de questão outras formas de acção mais drásticas como expressão de vontade dos cidadãos”. Coutinho avisou já que, no caso de não existir cooperação por parte do Governo, está a organizar uma marcha lenta de automóveis e motociclos.

No entanto, não deixa de apresentar soluções para que estas situações não se repitam no futuro, ou seja,  “quando existir o problema, é necessário consultar a sociedade e as associações que a representam, e, só depois, tomar as decisões”.

Da revolta

Na multidão que se fazia ouvir estava Lou. Com cerca de 50 anos, considera que esta é “uma questão muito ligada à vida quotidiana dos residentes “ e, como tal, sentiu-se no dever de participar no protesto. “O meu marido foi multado quatro vezes no mês passado por estacionamento ilegal apesar de ter colocado a mota em locais que não influenciavam o trânsito”. O motivo, apontou Lou ao HM, foi o facto de não existirem lugares suficientes nos parques de estacionamento, não dando outra alternativa ao marido que não fosse optar por um lugar onde conseguisse e que em nada afectasse o transito. “As multas já são dadas com um carácter intensivo, e como se não bastasse, aumentaram”, reclamou.

Os Serviços de Tráfego (DSAT) não fizeram o anúncio do aumento com a devida antecedências, considerou o jovem manifestante de 20 anos , George Tong. Revoltado, afirma que os salários, pelo contrário, não tiveram aumentos pelo que questiona a possibilidade de viver o dia a dia desta forma.

“Se o Governo conseguir melhorar os transportes públicos estou disposto a deixar de conduzir, disse ao HM. Para o jovem, a solução passaria tão somente por uma boa rede pública de transportes.

De entre as vozes do protesto estava também Sam, de 30 anos. Participava na manifestação por considerar que, “além do grande aumento das multas, também o preço dos veículos foi fortemente inflacionado com a medida”

Para a manifestante é essencial marcar presença e dizer que não àquilo que considera um abuso na medida em que “todos os residentes acabam por ser afectados”.

O Chefe do Executivo prometeu “servir o povo” e não é isso que se está a passar, considerou Mok, um residente com cerca de 50 anos visivelmente zangado com aquilo que considera “uma injustiça”.

Em português falou ao HM, L. que considera que arranjar um lugar num parque “é muito difícil e o aumento das multas é exagerado”. Para o residente, “se o Governo que fazer um aumento tem, em primeiro lugar de arranjar alternativas”.

A manifestação de ontem foi mais um protesto contra a medida anunciada pela DSAT no início do ano e que dita aumentos das taxas para veículos que variam entre os 50 por cento e os 1233 por cento, sendo que a taxa de remoção de veículos registou uma subida de valor entre os 400 por cento e 1233 por cento.

Segundo os dados da Polícia de Segurança Pública, participaram na manifestação cerca de 1600 pessoas.

PSP desocupou 91 lugares estacionamento em seis dias

Um comunicado oficial revela que a Polícia de Segurança Pública (PSP) desocupou 91 lugares de estacionamento em parques públicos entre os dias 1 e 6 de Janeiro, os quais estavam ocupados ilegalmente por veículos há algum tempo. Citado por outro comunicado, o secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, garantiu que os trabalhos da PSP no cumprimento das novas taxas de veículos tem sido efectuado “de uma forma mais complacente”. Wong Sio Chak respondeu ainda que “o cumprimento da lei é uma responsabilidade da polícia, apesar de algumas acções serem tomadas de uma forma mais complacente, tal como os primeiros cinco dias após a entrada em vigor da nova tabela de taxas”. O secretário adiantou ainda que as novas medidas reforçaram “o cumprimento da lei para os veículos abandonados sob estacionamento ilegal”.

9 Jan 2017

Turismo | Alojamento em residências familiares continua sem consenso

 

O alojamento em residências de família continua a não ser uma ideia bem recebida pela população local. O estudo mais recente indica que está a cair o interesse pelo assunto. Aqueles que concordam com a ideia não a querem ver colocada em prática no local onde moram
[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s dados divulgados ontem pela Direcção dos Serviços de Turismo (DST) mostram, mais uma vez, que as opiniões não são consensuais e que os residentes têm menos interesse na possibilidade de haver alojamento em residências familiares.

O inquérito mais recente sobre a matéria, realizado entre 28 de Julho e 29 de Agosto do ano passado, revelou que 55 por cento dos residentes já ouviram falar no tema, enquanto em 2014, altura em que foi feito o primeiro estudo do género, eram 58 por cento. Paralelamente, o número de inquiridos que mostraram não ter opinião sobre este tipo de alojamento subiu de 42 para 84 por cento.

No que respeita ao uso de terrenos, e tendo em conta os itens que avaliaram a “modificação de terrenos e edifícios de finalidade habitacional” e a “utilização de terrenos e edifícios de fins não-hoteleiros” para o uso de alojamento familiar por visitantes, os resultados mantiveram-se semelhantes. “Menos de metade dos residentes – 42 por cento em 2016 e 48 por cento em 2014 – considera que alojamento em residências de família pode ser criado em terrenos ou edifícios para fins habitacionais, revelando hesitação dos residentes em relação à modificação do uso dos terrenos”, lê-se na nota enviada à comunicação social.

Dados sem conclusão

Quanto à implementação da medida na freguesia de residência, no ano passado, apenas os residentes da Taipa e da freguesia da Sé concordaram com a ideia, mas os apoiantes não ultrapassam os 60 por cento. Em 2014, os entrevistados da freguesia da Sé e de Coloane tinham optado, em primeiro lugar, pela implementação de alojamento em residências de família na sua área envolvente.

Em suma, os resultados de ambos os estudos mostraram a tendência dos residentes de escolher o desenvolvimento do plano em zonas fora da freguesia onde vivem. As razões, indicam os resultados, demonstram preocupação com o impacto na segurança pública, na higiene e no trânsito.

O Governo considera, assim, que os dados continuam a não ser conclusivos.

A pesquisa de opinião realizou-se através de inquéritos de rua e on-line. Os inquéritos de rua abrangeram várias zonas da cidade, tendo como alvo indivíduos com idade igual ou superior a 18 anos a residir em Macau nos últimos 12 meses. No total foram recolhidos 2146 inquéritos, entre os quais 2102 inquéritos de rua e 44 inquéritos on-line. A DST afirma ainda que “continuará a prestar atenção ao desenvolvimento deste assunto, consoante a evolução da sociedade”.

6 Jan 2017

Associação entrega petição ao Chefe do Executivo a pedir redução das taxas de veículos

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Associação dos Profissionais de Motociclos de Macau entregou ontem uma petição a Chui Sai On pedindo a retirada ou reelaboração da actualização das taxas feita pela Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT).

Lei Chong Sam, o presidente da associação, descreve, na carta entregue na Sede do Governo, o aumento das taxas como “uma medida louca” que apenas vai trazer mais insatisfação e queixas por parte da população.

“Não foi feita qualquer consulta pública, apesar de ser um assunto relacionado com a vida de todos”, afirmou. Por outro lado, o anúncio das medidas foi “repentino e provocou uma forte reacção”.

O dirigente associativo queixou-se ainda que “os métodos de cobrança são irreais e o que os valores das taxas são injustos”. Para Lei Chong Sam, as únicas entidades que saem beneficiadas com a medida são as empresas que detêm parques de estacionamento e não os cofres públicos. “A parte mais afectada é a população trabalhadora que tem de recorrer aos veículos próprios para se deslocar para os empregos e escolas por não ter uma rede de transportes públicos eficaz, capaz de satisfazer as necessidades”, frisou.

Por outro lado, considera ainda que a medida é demasiado ampla, visto abranger todas as taxas relacionadas com a compra, a avaliação, a utilização quotidiana dos veículos pelos cidadãos, os meios de transporte em geral, a aprendizagem e o pagamento das licenças.

A associação referiu ainda que compreende que exista um ajustamento das tabelas vigentes dado que há muito não sofriam alterações, mas não compreende este “aumento quase louco” em que o Executivo usa a burocracia como “um inimigo contra a população”.

Recorde-se que o assunto, que causou muita polémica, está na origem de uma manifestação agendada para o próximo domingo, que conta com o apoio dos deputados Pereira Coutinho e Leong Veng Chai. Está marcada para hoje uma conferência de imprensa em que vai ser divulgado o traçado do protesto.

 

6 Jan 2017

Conselho de Consumidores | Queixas diminuíram em 2016

As queixas recebidas pelo Conselho de Consumidores diminuíram no ano passado. As telecomunicações continuam a liderar as reclamações. A compra de casas na China Continental está a revelar-se problemática

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] volume de queixas dirigido ao Conselho de Consumidores (CC) desceu 12 por cento no ano passado, comparativamente ao ano anterior. Em 2016, foram 6420 os casos que chegaram ao organismo: 1673 queixas, 4711 pedidos de informação e 36 sugestões.

Os residentes mostraram que, durante o ano passado, a área de maior descontentamento foi a relacionada com “Equipamento de Telecomunicações” seguida de perto pela dos “Imóveis”, com 198 e 184, respectivamente. Ainda no topo do desagrado ficaram os serviços de telecomunicações (144), os transportes públicos (99) e o sector das comidas e bebidas (92). No total, estes foram os tópicos que reuniram cerca de 43 por cento das queixas, correspondentes a 717 dos casos registados.

No entanto, segundo a nota divulgada pelo CC, as queixas relativas ao “Equipamento de Telecomunicações”, área no topo do ranking, diminuíram cerca de 35 por cento.

O problema da casa

O CC refere ainda que as queixas em relação às restantes áreas, no seu todo, também foram menos, com excepção do item correspondente aos “Imóveis”, que assinalou cerca de 100 conflitos na primeira metade do ano. Na origem destes casos está, diz o organismo, a aquisição de habitação na China Continental por residentes. O Conselho faz ainda saber que, com o conhecimento da situação, “lançou, por iniciativa, um mecanismo de comunicação com as associações comerciais ou cívicas das citadas áreas, realizando reuniões e encontros com as mesmas no sentido de se debater sobre o motivo dos conflitos de consumo”.

As queixas denunciadas por turistas somaram 683 casos que correspondem a dez por cento do total recebido pelo CC. O descontentamento dos visitantes incidiu na qualidade e no preço dos relógios, jóias e equipamentos de telecomunicações.

O organismo diz também que, em breve, irá mais detalhes sobre os casos recebidos em 2016.

6 Jan 2017

Ponte do Delta | Zhuhai anuncia planta do posto fronteiriço

As autoridades de Zhuhai já divulgaram os planos para a fronteira que vai existir na ligação entre Hong Kong, a cidade chinesa e Macau. A prioridade no acesso vai ser dada aos transportes públicos

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]cupa uma área total de 107,33 hectares e vai ser instalado na ilha artificial construída para o efeito. As autoridades da cidade chinesa vizinha deram a conhecer os detalhes do posto fronteiriço de Zhuhai na Ponte do Delta.

De acordo com a imprensa chinesa, que teve acesso aos pormenores da planta, a zona oriental da fronteira tem ligação ao segmento principal da ponte. A parte ocidental da estrutura está virada para o município chinês, enquanto o lado sul fará a ligação ao posto fronteiriço de Macau.

O terreno onde vai ficar instalada a fronteira tem espaço para outras infra-estruturas: as autoridades explicam que existem áreas para serviços industriais, instalações públicas e ainda uma zona reservada para o desenvolvimento.

A planta revela também as localizações concretas das zonas funcionais do posto fronteiriço de Zhuhai, como o controlo da documentação, a zona integrada do serviço e o centro de transportes rodoviários.

A planta permite ficar ainda a perceber-se como é que vai ser feito o controlo dos transportes no posto fronteiriço: a ideia é controlar e orientar a entrada de viaturas privadas na ilha artificial, sendo que vai ser dada prioridade aos veículos públicos.

A planta também reserva uma abertura na rede rodoviária subterrânea da cidade para que possa ser feita uma ligação ao centro de transportes rodoviários do posto fronteiriço. A zona sul permitirá chegar ao posto fronteiriço de Macau.

A ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau deverá estar concluída no final deste ano. A secção da cidade vizinha já está concluída: ficou pronta com o túnel de Gongbei, um projecto que demorou quatro anos a ser executado. A passagem tem mais de 2700 metros de comprimento e atravessa o posto fronteiriço.

5 Jan 2017

Ho Chio Meng dá o exemplo de adjudicações feitas pelo Governo

O antigo líder do Ministério Público voltou ontem ao Tribunal Judicial de Base. O arguido defende-se da adjudicação de obras à mesma empresa com o exemplo do Governo

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]o Chio Meng afirmou ontem no Tribunal de Última Instância (TUI) que usou os mesmos argumentos do Executivo para justificar a entrega de obras sempre à mesma empresa, por ajuste directo. De acordo com a Rádio Macau, que acompanhou a sessão, o antigo procurador exemplificou com a vasta série de contratos que, desde 2000, foram entregues ao deputado Fong Chi Keong.

A emissora nota que é, provavelmente, o caso que mais salta à vista de entrega de contratos públicos, sempre à mesma empresa, com dispensa de concurso e a um ritmo anual. Ho Chio Meng não indicou nomes mas fez referência às “obras na sede do Governo” que, desde a transição, têm sido entregues a uma empresa do deputado Fong Chi Keong, que presta também o mesmo tipo de serviços à Assembleia Legislativa.

O reparo foi feito pelo arguido enquanto estava a ser ouvido sobre as obras de remodelação da residência oficial que ocupou enquanto procurador, quando informou que ia dar a “resposta que o Governo deu a uma interpelação de um deputado” sobre as obras no palácio da Praia Grande. Ou seja, os contratos foram entregues sempre à mesma empresa por uma questão de “segurança”, “confidencialidade” e “boa qualidade do serviço prestado”, facto que descreveu como “natural e lógico”.

Ho Chio Meng negou, no entanto, ter indicado qualquer empresa a troco de contrapartidas. De acordo com a acusação, as companhias que, durante dez anos, ficaram com todos os contratos do Ministério Público eram controladas por familiares do ex-procurador, através de testas de ferro.

Defesa em bloco

Ainda segundo a rádio, forçado pelo tribunal a ser mais rápido na defesa, Ho Chio Meng deixou de analisar os contratos um a um, repetindo sempre as mesmas respostas. Está agora a responder por tipos de serviços comprados, que a acusação dividiu em 24 séries.

As respostas mantêm-se, com o ex-procurador a negar a prática de crimes e a criticar a forma como a acusação está construída. Disse, por exemplo, que, para o MP, “basta haver uma subempreitada para haver crime de burla”. Já nos casos em que o serviço foi de facto prestado pela empresa que ficou com o contrato, Ho surge acusado de participação económica em negócio.

Quase um mês depois do início do julgamento, ainda não foi possível perceber quais os factos em concreto que ligam o ex-procurador às empresas citadas na acusação, assinala a emissora.

A audiência terminou duas horas mais cedo, com o presidente do TUI, Sam Hou Fai, a concordar que o arguido precisava de tempo para preparar a defesa. O juiz deu ordens a Ho Chio Meng para “apontar” e ler, na prisão, os milhares de factos da pronúncia que pretende analisar na próxima sexta-feira – dos mais de 1500 crimes que constam da acusação, 1300 dizem respeito só a contratos.

Antes de o tribunal passar para a inquirição de testemunhas, Ho Chio Meng tem ainda de se pronunciar sobre 56 crimes de lavagem de dinheiro.

5 Jan 2017

Emprego | Já há um esboço para salário mínimo universal

O secretário para a Economia e Finanças disse que, em 2018, o salário mínimo vai ser para todos. Pelo andar da carruagem, a ideia deverá ser concretizada a tempo. Os Assuntos Laborais já têm um esboço do projecto

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] notícia foi avançada ao jornal Ou Mun pela Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL): já está concluída a elaboração do enquadramento da proposta do salário mínimo universal. Lionel Leong, o secretário para a Economia e Finanças, tinha prometido a implementação plena desta medida laboral no espaço de três anos após a entrada em vigor do salário mínimo para os trabalhadores da limpeza e da segurança dos prédios, o que aconteceu em Janeiro do ano passado.

A DSAL explica que, agora, o próximo passo vai ser a apresentação do esboço feito ao Conselho Permanente de Concertação Social e a recolha de opiniões escritas. Além disso, o Governo vai lançar uma consulta pública sobre a matéria. É bem provável que esta seja a fase mais complicada do processo, pois o sector patronal deverá colocar alguns entraves à proposta.

Em relação ao salário mínimo para os trabalhadores da limpeza e a segurança dos prédios, os Assuntos Laborais indicam que, até Novembro passado, foram iniciados oito processos de investigação que envolveram dez empregadores. As queixas principais estão relacionadas com salários e feriados obrigatórios. Dois destes processos estão ainda em fase de investigação, sendo que os restantes já foram concluídos.

Ora, precisamente sobre o modo como tem estado a ser aplicado o salário mínimo, diz a Federação das Associações dos Operários de Macau que, neste ano de vigência, não recebeu qualquer queixa por parte de trabalhadores. A organização considera que a DSAL deve avançar com um mecanismo para que seja possível fazer actualizações do valor da remuneração obrigatória.

A Associação de Administração de Propriedades de Macau também dá sinais de que não estão a ser detectados quaisquer problemas. O sector garante que não se opõe ao salário mínimo universal.

4 Jan 2017

CEPA | Exportações de Macau para a China caíram

A diminuição não é preocupante, mas indica que não há um dinamismo local em torno do acordo de cooperação com a China. Para valores mais elevados talvez seja necessário contar com o que vem de fora

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s exportações de mercadorias com isenção de taxas aduaneiras de Macau para o interior da China atingiram 97,18 milhões de patacas no ano passado, traduzindo uma ligeira diminuição, indicam dados oficiais. No cômputo de 2015, o valor das exportações de mercadorias com isenção de direitos aduaneiros de Macau para a China atingiu 101,4 milhões de patacas.

De acordo com dados publicados no portal do CEPA – Acordo de Estreitamento das Relações Económicas e Comerciais entre o Interior da China e Macau –, sob alçada da Direcção dos Serviços de Economia, Dezembro foi o melhor mês, com o registo de 12,3 milhões de patacas, enquanto Agosto o pior, com 4,7 milhões de patacas.

No mês passado, aquando de uma visita a Lisboa, o secretário para a Economia e Finanças de Macau, Lionel Leong, e três secretários de Estado do Governo português analisaram a possibilidade de entrada de produtos alimentares portugueses na China precisamente através do CEPA.

O governo de Macau manifestou, por essa ocasião, o “desejo” de que “Portugal possa também ponderar a entrada, de modo semelhante ao CEPA, no mercado português, dos produtos da China interior, processados parcialmente em Macau”.

O CEPA tem como objectivo “promover a prosperidade e o desenvolvimento comum do Interior da China e da Região Administrativa Especial e reforçar a cooperação mútua económica e comercial”, estabelecendo “um relacionamento semelhante a parceiros de comércio livre, num país com duas regiões aduaneiras autónomas”.

Desde a entrada em vigor do acordo, em Janeiro de 2004, têm vindo a ser assinados vários suplementos, com vista ao alargamento das áreas, produtos e serviços. Até Dezembro último, o valor acumulado das exportações de mercadorias com isenção de direitos aduaneiros atingiu 764,44 milhões de patacas.

No plano do comércio de serviços, no mesmo período, foram emitidos 612 certificados de prestador de serviços de Macau, quase metade dos quais relativos a serviços de transporte (agenciamento de carga/ logística/ conservação/ armazenamento).

4 Jan 2017

Jogo | Analistas prevêem subida das receitas em Janeiro

O ano novo lunar vem aí e, por isso, os casinos vão estar cheios. Os especialistas acreditam que Janeiro vai ser o melhor mês para o jogo desde que começou a recuperação do sector

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] tendência inverteu-se em Agosto de 2016, com as receitas a recuperarem das perdas dos anos anteriores, e este mês os casinos de Macau deverão regressar a números francamente encorajadores. A expectativa é da Union Gaming Securities Asia, citada pelo site GGRAsia.

“Janeiro deve ser um mês com um crescimento grande”, apontou o analista Grant Govertsen. Para esta expectativa contribui o facto de o ano novo lunar se assinalar ainda durante o mês que agora começou. Os feriados são por norma aproveitados por muitos residentes da China Continental para virem a Macau jogar.

“Apesar de o calendário de Janeiro não ser favorável, com menos uma sexta-feira e menos um sábado [do que Janeiro de 2016], estamos à espera que a taxa de crescimento seja a mais elevada desde que começou a recuperação”, acrescenta Govertsen.

Também o Deutsche Bank Securities acredita num mês positivo para os casinos, com um crescimento das receitas brutas na ordem dos 12 por cento em termos anuais. “Como de costume, tendo em conta a volatilidade em torno do ano novo chinês, acreditamos que o melhor será analisar Janeiro e Fevereiro em termos agregados”, escreveram analistas da empresa numa nota divulgada esta semana.

Menos, mas melhor

Os casinos de Macau fecharam 2016 com receitas de 223,21 mil milhões de patacas, uma queda de 3,3 por cento face ao cômputo de 2015. Trata-se do terceiro ano consecutivo de quebra depois de uma diminuição de 34,3 por cento em 2015 e de 2,6 por cento em 2014.

Apesar da contracção em 2016, os últimos meses do ano mostraram sinais de recuperação, com Dezembro a marcar o quinto mês consecutivo de subida das receitas em termos anuais homólogos, segundo os dados publicados pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ).

No último mês do ano, as receitas dos casinos atingiram 19,815 mil milhões de patacas, ou seja, subiram oito por cento, depois de 14,4 por cento em Novembro. Em Agosto, terminaram 26 meses consecutivos de quedas anuais homólogas do sector.

Arrastada pelo desempenho do seu principal motor, a economia de Macau entrou em queda no terceiro trimestre de 2014, ano em que, pela primeira vez desde a transferência, o Produto Interno Bruto (PIB) diminuiu (menos 1,2 por cento, de acordo com os dados oficiais revistos). Em 2015, o PIB caiu 21,5 por cento. No primeiro e segundo trimestres de 2016 contraiu-se 12,4 por cento e sete por cento, respectivamente, em termos anuais homólogos.

Ao fim de dois anos de contracção, a economia de Macau voltou a crescer, com o PIB a aumentar quatro por cento no terceiro trimestre terminado em Setembro.

3 Jan 2017

Não residentes | Ginecologia e obstetrícia com preços mais elevados no hospital público

Kuok Cheong U, director do Centro Hospitalar Conde de São Januário

[dropcap style≠’circle’]K[/dropcap]uok Cheong U, director do Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ), revelou que houve um aumento de 10 a 12 por cento face a 2015 no número de mulheres não residentes que deram entrada no hospital público para darem à luz os seus filhos.

Segundo o Jornal do Cidadão, Kuok Cheong U referiu que o hospital público está a estudar a possibilidade de cobrar preços mais elevados nos serviços de ginecologia e obstetrícia às mulheres não residentes, por forma a tornar a cobrança mais razoável.

Kuok Cheong U explicou que iriam ser tidos em conta factores como a inflação, os custos com as cirurgias e internamentos, e ainda as taxas cobradas nas regiões vizinhas. O responsável disse, contudo, que os valores cobrados às mulheres residentes não vão sofrer mudanças.

Actualmente, os titulares de bluecard pagam a totalidade das taxas moderadoras no hospital público, sem direito a qualquer desconto, ao contrário do que acontece com quem tem a residência permanente e não permanente. Ainda assim, houve queixas de que as taxas moderadoras não são actualizadas desde 1986, sendo que as despesas médicas têm vindo a aumentar nos últimos anos. O director do São Januário referiu, contudo, que se tratou de um aumento razoável, e que tanto os recursos humanos como as infra-estruturas hospitalares ainda não sofrem muita pressão. Até finais de 2016, trabalhavam em Macau cerca de 105 mil trabalhadores não residentes.

3 Jan 2017

Estudo | 24 por cento dos jovens trabalhadores são pobres

Um estudo realizado pela Comissão dos Assuntos da Juventude, da FAOM, conclui que pelo menos 24 por cento dos jovens que estão a trabalhar continuam a ser pobres, com um salário anual abaixo das 74.880 patacas. Há preocupações sobre a pobreza no pleno emprego

[dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]endo como base o salário mínimo em vigor de 6240 patacas, pago a empregadas de limpeza e trabalhadores da área da segurança, há ainda jovens trabalhadores que são considerados pobres. Um estudo elaborado pela Comissão dos Assuntos da Juventude da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), referido no Jornal do Cidadão, mostra que 23,9 por cento dos jovens com emprego têm um salário anual inferior a 74.880 patacas.

Além disso, 86 por cento dos jovens consideram que o baixo salário é o factor principal para a pressão sentida no trabalho, enquanto 75,4 por cento dos inquiridos já tiveram a experiência de mudar de emprego.

Pobreza na riqueza

Citado pelo Jornal do Cidadão, o académico Lian Si, docente da Universidade de Negócios e Economia Internacional de Pequim, alertou para a existência de situações de pobreza num contexto de pleno emprego. “Esta pobreza é mais especial e também mais severa, e o Governo deve prestar atenção”, apontou o académico na conferência de imprensa.

No que diz respeito à consciência profissional dos empregadores jovens, o estudo revelou que a remuneração e a perspectiva profissional são dois elementos que os jovens valorizam mais quando fazem a escolha de um emprego durante a sua carreira, ocupando 43,7 por cento e 27,2 por cento, respectivamente.

Cerca de 71,8 por cento dos inquiridos já pensaram em prosseguir os estudos académicos para aumentar a sua formação, enquanto 47,7 por cento se sentiram inferiorizados no trabalho devido ao seu baixo nível de educação.

Pelo contrário, 54,2 por cento dos inquiridos consideram que o facto de se possuir uma formação académica não traz grande influência para a remuneração, e 6,5 por cento considera que um canudo não tem qualquer influência. Apenas 35,4 por cento defendem que uma formação superior tem uma grande influência no ordenado mensal.

O estudo levado a cabo pela FAOM mostra que quanto mais elevada é a formação académica em Macau mais ganham os trabalhadores, o que significa que os jovens não têm a consciência da relação entre formação e salário.

O responsável pelo estudo considera ser necessário o estabelecimento de um mecanismo de formação contínua junto dos jovens, bem como a promoção dos estudos junto destes trabalhadores.

3 Jan 2017

Governo aumenta taxas sobre veículos acima dos 50 por cento

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]stão a gerar polémica as novas taxas referentes à circulação de veículos, inspecção, exames de condução, bem como ao depósito e remoção de viaturas, que entraram em vigor no passado domingo. Segundo um comunicado da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), os aumentos variam entre os 50 por cento e os 1233 por cento, sendo que “a taxa de remoção de veículos é aquela que tem um maior aumento”, situado entre os 400 por cento e 1233 por cento.

A DSAT explicou as razões para tão elevados aumentos. “Dado que as referidas taxas foram praticadas, sem alteração, há mais de dez anos, encontrando-se muito desfasadas do mercado, e a fim de corresponder ao objectivo de controlar o crescimento da frota de veículos, através do meio económico, e orientar o uso racional dos veículos, é relativamente grande a sua actualização”, argumentou.

As actualizações respeitantes à renovação de licença de veículos não visam apenas os condutores comuns, mas também aqueles que possuem um alvará de táxi, sem esquecer os casos de transferência de propriedade de licença. Por forma a “reprimir as especulações com as licenças”, transferir a propriedade da mesma passa das actuais duas mil patacas para 20 mil patacas.

Para depositar motos e veículos antigos, o proprietário terá de pagar 250 patacas no caso de se tratar de um velocípede e seis mil patacas para automóveis pesados e veículos especiais. A taxa de remoção de um ciclomotor sobe das 120 patacas para 750, enquanto para automóveis ligeiros sobe de 300 para 1500 patacas. A DSAT explica que o objectivo, nestes casos, é “dissuadir os condutores que tenham ocupado os lugares de estacionamento, quer em parques de estacionamento públicos, quer em parquímetros de vias”.

Haverá ainda mudanças na forma como são adquiridos os números de matrícula dos automóveis, “por forma a evitar que os cidadãos façam fila de espera toda a noite para a aquisição dos números de matrícula e reprimir as respectivas especulações”. Por isso, a DSAT aumentou o valor da taxa de alienação dos números de matrícula, além de adjudicar os números a quem oferecer preços mais elevados, em vez de ser feita a atribuição pela ordem de chegada.

Vozes do contra

Em declarações ao jornal Ou Mun, o deputado Ho Ion Sang começou por referir que o problema do trânsito existe há muito tempo em Macau, mas que o Governo não tem feito quaisquer trabalhos para controlar o tráfego. Para o deputado, o ajustamento das taxas deve corresponder à actual inflação, sendo que o seu aumento repentino poderá provocar ainda mais descontentamento junto dos cidadãos.

Para Ho Ion Sang, deve haver mais transparência em futuros aumentos. “Não se devem resolver os problemas do trânsito apenas através de meios económicos. As últimas medidas adoptadas pelo Governo estiveram todas relacionadas com pagamentos em dinheiro. Ainda assim, o serviço de transporte público não consegue satisfazer as necessidades da população em termos de deslocações. As obras nas vias públicas e o adiamento do traçado do metro ligeiro na península também constituem factores importantes para o agravamento do problema”, apontou.

Apesar de a DSAT querer, com estes aumentos, combater o estacionamento ilegal, a verdade é que, para Ho Ion Sang, esse problema deve-se à falta de parques de estacionamento. O deputado alertou para a ausência de medidas do Executivo nesse sentido.

Os novos aumentos também despertaram a atenção dos deputados José Pereira Coutinho e Leong Veng Chai, que convocaram, para hoje, uma conferência de imprensa intitulada “Acabem com as multas exageradas”. O encontro com os jornalistas decorre na Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau.

3 Jan 2017

Especial 2016 | Raimundo do Rosário é a personalidade do ano

Personalidade do ano – Raimundo do Rosário

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Secretário para os Transportes e Obras Públicas chegou, viu e…convenceu. E porquê? Porque – vejam lá bem! – é capaz de tomar decisões, algo que há muito não se via pelas bandas do seu pelouro. Ao segundo ano da sua presença no Governo, as coisas parece que querem andar, ainda que emperradas pelas areias do costume. Ele diz que não sabe, não diz que não pode e não teme atirar o prazo das obras para as calendas, quando esse é o seu triste destino. É o caso do metro ligeiro, entre outras. Raimundo do Rosário conhece bem os interesses locais, demasiado bem para ser optimista. Mas, nesta RAEM do quanto-menos-te-mexes-melhor, foi uma lufada de racionalidade, desassombro e eficácia, bem necessária depois da Era Glacial que se seguiu ao incidente Ao Man Long e ao empata-obras que o substituiu. Ninguém espera que faça milagres ou que os milagres se façam por si, mas deverá manter a mesma postura e demonstrar a mesma vontade em defender o interesse público se quiser terminar o ano em 2019 a sua passagem pelos mais altos cargos do Governo da RAEM com uma nota extremamente positiva. Depois da sua presença em Lisboa, na delegação de Macau, será o final dourado de uma distinta carreira como servidor da coisa pública.

Ralhete do ano – Li Keqiang

A presença do primeiro-ministro expôs as fraquezas do Governo local, que, além de ser manso e garantir a mansidão popular,pouco efectuou no sentido de implementar os desígnios de Pequim. De tal modo que Li Keqiang não se coibiu de, em “édito-rei”, exigir as medidas que há muito deveriam estar longe do papel e das intenções. Os governantes coraram e a oligarquia encolheu os ombros, pois pouco disto lhe interessa. Todos disseram que sim e as cabeças ficaram a abanar até o pó da carruagem de Li assentar no fim da estrada. Depois, a partilha do bolo continua. A ver vamos se o discurso criativo do primeiro-ministro cai em saco roto ou não.

Governante do ano – Lionel Leong

O Secretário para a Economia e Finanças é o homem das “missões impossíveis”: uma, diversificar a economia de Macau; duas, convencer os empresários locais a dotarem-se de uma postura contemporânea e menos ambiciosa. Outro deixaria correr o marfim, mas Lionel Leong tem-se distinguido pelo modo como está por dentro dos dossiês e parece por isso levar a sério as suas hercúleas tarefas. A cadeira no Olimpo ainda está à vista.

Revelação do ano – Wong Sio Chak

Raramente a polícia é trampolim para mais altos voos, mas o ano de 2016 revelou um Wong Sio Chak, ex-director da judiciária e agora Secretário para a Segurança, de peito firme e asas abertas, angariando apoios ao supremo cargo na RAEM. Nesse sentido, é uma revelação. A prosseguir nessa heróica senda, faz tremer os liberais pela sua postura, um tanto ou quanto militarizada, e a visão, que partilha sem pudor, de uma sociedade securitária, talvez demasiado regrada, uma espécie de Singapura retardada e fora do tempo. Treme a Macau do laissez-faire, laissez-passer, um dos traços identitários mais fortes desta terra. Temem os que preferem um mundo de “amplas liberdades democráticas”, tal qual Álvaro Cunhal nos ensinou.

Desilusões do ano

Festival de Cinema – Pariu um rato. Mais uma vez o que poderia ter sido e até parecia que ia ser, não chegou a ser nem metade. Filmes premiados com salas vazias, e, sobretudo, uma irrelevância final, muito fruto da exclusão de Marco Muller, que chegou a ser confrangedora. Macau demonstrou não ter capacidade para aquilo que anunciou. O Governo, depois da casa desfeita, ainda quis pôr um freio na bizarra situação. Conseguiu mas o cavalo não chegou a sair da estrebaria. Prometeu muito. Pariu um rato. Porque a rolha foi roída pelo rei da Rússia.

Hotel Estoril – Convidar e desconvidar Siza Vieira não lembra a ninguém. Ah..não..espera…aconteceu a Oese de Pecos, onde afinal nada parece haver de novo. A não ser os novos estudos, as novas consultas e os novos concursos.

Evento do ano – Fórum Macau

A presença de primeiros-ministros e outros figurões já seria suficiente para destacar este evento, cuja importância para a RAEM é, sobretudo, apreciada por quem o vê de fora. As medidas anunciadas por Li Keqiang foram muito bem recebidas por todos os países participantes, e, sobretudo, por quem ficou à porta a roer as unhas: São Tomé e Príncipe. De tal modo que, entretanto, a ilha já se divorciou da ilha e arranjou casório com o continente. O Fórum desempenha o seu papel…

Instituição do ano – Centro do Bom Pastor

A aprovação da lei da violência doméstica foi uma grande vitória para as organizações que por ela combateram e nenhuma esteve mais perto da linha da frente do que o Centro do Bom Pastor, dirigido pela irmã Juliana Devoy. Se esta lei foi aprovada e se hoje as pessoas gozam de protecção contra a violência como nos países civilizados, tal deve-se muito aos incessantes esforços desta instituição e da sua face mais conhecida.

Artista do ano – Ivo M. Ferreira

O filme “Cartas da Guerra”, baseado na obra epistolar de António Lobo Antunes, está a ter uma visibilidade única, se pensarmos que se trata de uma obra de um residente de Macau e que, além das críticas esfuziantes, foi pré-seleccionado para os Óscares. Ivo M. Ferreira mostra até que ponto é possível existirmos e que este céu cinzento da descrença local bem pode esperar. Ele vai ali, já volta.

Figura Internacional do ano – António Guterres

Avíssaras! O secretário-geral da ONU é português e os portugueses conhecem bem a sua capacidade para o diálogo e, de um modo geral, para a conversa, a conversinha e mesmo para a converseta. Este é, aliás, um traço comum ao puro lusitano. Pode ser que esta capacidade, aliada a um também lendário malabarismo numérico, façam de António Guterres o homem com o perfil certo para o cargo. O mundo parece pensar que sim.

Vergonha do ano – Ho Chio Meng

É muito aborrecido, para não dizer chato, saber que o antigo procurador da RAEM foi preso e acusado de 1500 e tal crimes. Não sei…é assim uma sensação desagradável pensar que o responsável máximo pela defesa dos interesses públicos andava a meter a mão em massa que não lhe pertencia nem era suposto pertencer. A sua detenção foi um golpe duro na credibilidade do sistema judiciário de Macau. E, se pensarmos que este senhor foi um dia putativo candidato ao cargo de Chefe do Executivo, colhendo apoios nas mais variadas paróquias, que isto nos sirva de lição para um futuro não muito longínquo.

Livro do ano – Delta literário de Macau

O livro do consagrado e respeitado professor Carlos Seabra Pereira, publicado pelo Instituto Politécnico de Macau, constitui um marco na crítica literária de Macau. Nele são referidos e apreciados os principais autores que escreveram ou escrevinharam por estas terras, num esforço que se reconhece praticamente exaustivo e titânico. Até hoje nada se tinha escrito assim.

Exposição do ano – Ad Lib

A craveira internacional de Konstantin Bessmertny é um dado de facto mas a sua arte, inquietação e reflexão não descansam à sombra dos louros justamente recolhidos. A exposição que apresentou no Museu de Arte de Macau é um exemplo maduro da sua capacidade artística e da imaginação critica a que nos habituou.

Filme do ano – Sisterhood

Ainda longe da exigência técnica e plástica de “Cartas da Guerra”, “Sisterhood” é um enunciado corajoso e desassombrado de Tracy Choi, luminosa crueza na sociedade morna, hipócrita e desenxabida de Macau. A realizadora mostra mão e um sentido próprio para o seu trabalho. espera-se mais.


Prémios especiais

O que mais me irá acontecer do ano – Helena de Senna Fernandes

E de repente cai-lhe no colo um festival internacional de cinema, cujo director desapareceu misteriosamente, embora para parte certa. A directora dos Serviços de Turismo teve de assumir a cabeça do animal. Salvou-a ver extensamente filmes “nos aviões” e a persistência com que repete o seu filme favorito: “Música no Coração”

O que vou fazer se me deixarem do ano – Alexis Tam

O Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura lançou uma mão-cheia de projectos mas, a cada um deles, praticamente sem excepções, foi contestado pelas auto-denominadas “forças vivas da população”. E Alexis Tam, sistematicamente, recuou e fez mais consultas, que é como quem diz, lavou daí as suas mãos. A sua pele deve estar seca.

O pêndulo de Foucault do ano – Ho Iat Seng

A eterna reserva moral da RAEM, enquanto presidente da Assembleia Legislativa, revelou-se um homem com uma desmedida tendência para a harmonia e o consenso. E também para a prudência quando tal é necessário. De tal modo que é capaz de embalar e fazer adormecer um frasco de anfetaminas.

O vira disco e toca o mesmo do ano – Ng Kuok Cheong

Os acontecimentos em Hong Kong retiram cada vez mais margem de manobra aos democratas locais. E Ng Kuok Cheong é um bom exemplo disso: este ano a sua criatividade levou-o a querer discutir o sufrágio universal na Assembleia Legislativa, como tem feito todos os anos. E, como em todos os anos, levou uma nega quase geral.

O grande salto em frente do ano – Casinos

Jogo a cair, receitas a baixar, e os casinos de Macau a investir como cães danados. No Cotai, se juntarmos os trapinhos recentes de todos eles, a coisa vai parar à módica quantia de 17 mil milhões de patacas. Isto quando as renovações das licenças estão em águas de bacalhau. É o que se chama uma aposta.

O Auslander Raus! Do ano – Ella Lei e companhia

Quando toda a gente sabe que Macau parava sem mão-de-obra estrangeira, a qual precisamos como de chao min para a boca, de gente qualificada e não só, a deputada Ella Lei e companhia continuam a defender que a causa das causas é expulsar os trabalhadores alienígenas. Isto numa cidade onde o desemprego não atinge os dois por cento. De facto o ridículo não mata e a perda de tempo também não.

O centro é onde eu quiser do ano – Song Pek Kei

O Governo quer uma biblioteca central no centro da cidade. Parece lógico. Pois. Mas nem para todos nasce esse sol. A deputada Song Pek Kei entende que a biblioteca central deve ser nos novos aterros. O problema é que deixa de ser central, capisce? Não? Pois…

O a gente manda e mainada do ano – Táxis

As multas não os demovem, os fiscais não lhes metem medo. Eles são os taxistas de Macau. Fazem o que querem e ao Governo mostram…pirilau. Por essas ruas acima, navegam como querem, cobram o que lhes apetece e nada de levantar a grimpa que ainda te partem o focinho. São a prova de que este é um Estado falhado.

30 Dez 2016