Bai Ming | Artista chinês pela primeira vez em Portugal

A iniciativa é do Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia de Lisboa e leva, pela primeira vez, as obras do artista Bai Ming à capital portuguesa. “Branco e Azul” é a exposição que mostra, entre outros trabalhos, as cerâmicas do criador

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] exposição “Branco e Azul | Bai Ming – Lisboa” já está aberta ao público no Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia (MAAT) e é constituída por mais de 200 peças de cerâmica, desenho e pintura. As obras, em exibição até 4 de Setembro, “traçam uma rota de encontro e de fascínio entre o Oriente e o Ocidente”, lê-se na apresentação oficial do evento.

Bai Ming é considerado um dos artistas que mais tem contribuído para a renovação e revitalização da criação artística chinesa no campo da cerâmica, garantindo que “toda a inovação dá continuidade à tradição, numa fusão entre o óleo e a tinta-da-china, a abstracção e a decoração, a cerâmica e a escultura, entre a tradição e as novas linguagens”.

Como o próprio refere, “viaja livremente entre vários suportes”, com “uma enorme curiosidade quanto a expressões novas e únicas”. O autor é ainda “apaixonado por experimentar diferentes materiais, sentir diferentes expressões em vários tipos de barro, de papel, de tinta”. As suas esculturas, instalações e cerâmicas assentam numa estética de serenidade. No entanto, de acordo com o artista, não será correcto confundir serenidade e quietude.

A obra de Bai Ming está em exposição na Sala dos Geradores, no edifício da Central – que se transforma em espaço expositivo também pela primeira vez – e no recém-inaugurado Jardim do Campus Fundação EDP.

A iniciativa está integrada no programa “Cooperação Sino-Portuguesa e Resultados do Intercâmbio Cultural ao Abrigo da Iniciativa ‘Uma Faixa, uma Rota’”.

Curadores rendidos

A curadoria está a cargo de Fan Di’an, presidente da Academia Central das Belas-Artes da China, Rosa Goy e Margarida Almeida Chantre, do MAAT.

De acordo com a informação divulgada pelo Portal Martim Moniz, Rosa Goy, curadora da exposição, destaca que “o branco e o azul chegam à Central Tejo através do olhar de Bai Ming”. “O artista traz pela primeira vez, a Portugal, a sua percepção e (re)interpretação da natureza e das formas com as suas cerâmicas e pinturas.” O criador é “detentor de uma técnica tradicional e ancestral, trazendo a Lisboa mais de 200 peças que reflectem não só a sua visão renovada das formas e dos elementos decorativos, mas também a sua observação das mutações e variações na natureza”.

Margarida Almeida Chantre salienta o nome desta mostra, referindo que “a evocação da relação entre China e Portugal se faz descobrir nos trabalhos de Bai Ming através da forte presença visual da cor azul”. A tonalidade reflecte o mar, o que “liga à rota de seda e que flui para os elementos da natureza que encontramos nas mais de 200 peças apresentadas em exposição”.

Para a curadora, “o artista desconstrói formas e temas gravando nas peças o que vê, o que sente, o que experiencia e o que o rodeia”.

Já Pedro Gadanho, director do MAAT, reforça a importância da exposição: “Num dos mais simbólicos espaços institucionais da Central Tejo, mas também no contexto do recém-inaugurado jardim de um campus em estado de aceleração renovada, acolhemos o importante trabalho de um artista que actualiza e expande a tradição da porcelana, como uma das mais fortes expressões artísticas de um país de cultura milenar”.

Arte | Bienal abre portas a jovens criadores lusófonos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] VIII Bienal de Jovens Criadores da Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP) arrancou ontem em Cerveira, em Portugal, com cerca de 250 participantes e a presença de representantes dos vários países membros.

Integrada na XIX Bienal Internacional de Arte de Cerveira, que decorre até 16 Setembro, a “Vila das Artes” acolhe, durante esta semana, a VIII Bienal de Jovens Criadores da CPLP, conta com 180 jovens artistas, em início de carreira, entre os 250 participantes.

Na cerimónia de inauguração eram esperados os ministros dos nove países da CPLP, numa sessão presidida pelo ministro português da Educação, Tiago Brandão Rodrigues.

Com organização do Instituto Português do Desporto e da Juventude, Conselho Nacional de Juventude, em parceria com a Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira e a Fundação Bienal de Arte de Cerveira, a iniciativa tem por objectivo “promover o intercâmbio entre os jovens da CPLP, bem como o debate de temas com base nas perspectivas culturais de cada um e nas diversas formas de expressão”.

O presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira e da Fundação Bienal de Arte de Cerveira, Fernando Nogueira, sublinhou, em conferência de imprensa, quando da apresentação da iniciativa, em Abril, que era “um sonho concretizado” poder “alargar a bienal mais antiga do país e da Península Ibérica aos países da CPLP”.

Assim, jovens de Portugal juntam-se a colegas de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor Leste no que será, segundo a organização, um encontro entre os jovens artistas dos nove países membros “com base nas suas perspectivas culturais reproduzidas em variadas formas de expressão”.

25 Jul 2017

O erro ontológico de Machado de Assis na análise de O Primo Basílio

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] que vou dizer agora, em verdade não foi dito em O Primo Basílio, mas só o amor poderia estancar de vez essa multiplicação contínua do desejo. Aliás, amar a Deus é o amor por excelência, é isso que Leopoldina muito bem vê, já que não acredita no amor entre um homem e uma mulher. No mesmo sentido que em Santo Agostinho: só se pode amar aquilo que não muda. Tudo aquilo que muda, pela sua própria condição de mutabilidade não é solo seguro para fincarmos o amor ou um projecto de amor. O amor é, em si mesmo, a possibilidade da permanência, da imutabilidade. A imutabilidade é o horizonte de sentido do amor. Por isso, Santo Agostinho dizia que só se pode amar a Deus.

Há ainda uma característica fundamental no estrutura do desejo, tal como ele é apresentado em O Primo Basílio, que não só passou completamente ao lado do espírito do senhor Machado de Assis, como ainda fez questão de afirmá-lo: “Luísa resolve fugir com o primo; prepara um saco de viagem, mete dentro alguns objectos, entre eles um retrato do marido. Ignoro inteiramente a razão fisiológica ou psicológica desta precaução de ternura conjugal: deve haver alguma; em todo caso, não é aparente.” Ora, trata-se de um dos vários toques de génio de Eça, onde não só nos mostra mais acerca da operacionalidade do desejo, mas também de como a sua multiplicação está intimamente ligada ao nada. Porque o desejo tem muitas dificuldades de deixar aquilo que experimentou e que gostou. Luísa pode não querer Jorge, querer Basílio, mas o desejo dela tem muita dificuldade em deixar Jorge, em deixar de ter Jorge. O desejo quer tudo. Uma vez despertado, consciente do seu objecto, o desejo não quer deixar nada para trás, não quer abdicar do que já teve. O desejo transforma tudo em possibilidade de se vir a ter. Nada mais difícil para o desejo do que fechar possibilidades. Para o desejo de Luísa, o retrato de Jorge significava o não fechamento da possibilidade de Jorge ser seu objecto. Não se pode querer entender o desejo com moral. O desejo é do foro do natural, e se quisermos compreendê-lo temos de esquecer os deuses modernos, as convenções sociais. Páginas atrás, que remetem para a manhã desse mesmo dia que produz indignação no senhor Machado, há uma outra passagem muito mais esclarecedora em relação a este ponto. Quando decide fugir, nessa manhã, Luísa pensa em Jorge e, depois de lembrar os cuidados extremos que ele teve quando ela esteve doente de cama, com pneumonia, pensa ainda: “E agora, quando ele soubesse, quando ele voltasse! Quando ao entrar ali na alcova – visse as duas almofadas, ainda! Ela iria longe, com outro, por caminhos estranhos, ouvindo outra língua. Que horror! E ele ali estaria, naquela casa só, chorando, abraçado a Sebastião. Quantas memórias dela para o torturar! Os seus vestidos, as suas chinelinhas, os seus pentes, toda a casa! Que vida triste, a dele! Dormiria ali só! Já não teria ninguém para o acordar de manhã com um beijinho, passar-lhe o braço pelo pescoço, dizer-lhe: “É tarde, Jorge!” Tudo acabará para ambos. Nunca mais! – Rompeu a chorar, de bruços sobre a cama…” Ela não chora pela antecipação da dor dele. É o seu desejo que chora, por ter de deixar algo que lhe pertence. O seu desejo também quer aquilo que já teve, os cuidados de Jorge, o seu amor, mesmo o amor dela por ele, embora não abdique do amor de Basílio. É esta a miséria. O poder sobre nós começa a perder-se em nós pela fome do nosso desejo. O desejo impele-nos a querer tudo o que queremos. E este querer tudo não se dá com a vida. O desejo é  selectivo, mas não o suficiente. Luísa quer o amor aventuroso de Basílio e quer o amor cuidadoso de Jorge, mas certamente não quer o amor de Julião, por exemplo. Mas este querer tudo-selectivo do desejo implica ter de escolher, ter de perder alguma coisa do que se quer. E isso dói-nos muito no desejo. Quem aqui é que já não experienciou isto em si mesmo? Quem ao deixar para trás uma relação, muitas vezes complicada, não mantém consigo, no seu computador, as fotografias de um outro tempo, a imagem daquele ou daquela que já deixámos, do tempo em que o desejo era efectivo? É o querer tudo do desejo a fazer-se sentir em nós. E este querer tudo do desejo, a sua impossibilidade ou dificuldade de deixar o que já foi seu, está intimamente ligado à experiência do nada pelo humano. É neste querer tudo do desejo, a um mesmo tempo – e não uma coisa a seguir à outra e outra, como é normalmente compreendido como sendo característica dele –, que o nada se tornar uma experiência e uma verbalização humana. O querer tudo do desejo, a um mesmo tempo, traz o nada à boca. Veja-se a cena:

– Al pallido chiarore

Dei ostri d’oro…

Luísa, através das últimas vibrações dos seus nervos, ia entrando na realidade; os seus joelhos tremiam. E então, ouvindo aquela melodia, uma recordação foi-se formando no seu espírito, ainda estremunhado: era uma noite, havia anos, em São Carlos, num camarote com Jorge; uma luz eléctrica dava ao jardim, no palco, um tom lívido de luar legendário; e numa atitude extática e suspirante o tenor invocava as estrelas; Jorge tinha-se voltado, dissera-lhe: “Que lindo!” E o seu olhar devorava-a. Era no segundo mês do seu casamento. Ela estava com um vestido azul-escuro. E à volta, na carruagem, Jorge, passando-lhe a mão pela cinta, repetia:

– Al pallido chiarore

Dei astri d’oro…

E apertava-a contra si…

Ficara imóvel à beira do divã, quase a escorregar, os braços frouxos, o olhar fixo, a face envelhecida, o cabelo desmanchado. Basílio então veio sentar-se devagarinho junto dela. Em que estava a pensar?

– Nada.

É o desejo a exigir o que lhe pertence, a exigir o que é dele. O desejo – com a ajuda da memória – expondo à consciência de Luísa que não quer perder o que é dele, que não pode perder Jorge. Jorge e Basílio fazem sentido, a um mesmo tempo, para o desejo de Luísa. É neste preciso momento, ao escutar a terceira ária do Fausto, que Luísa passa a ser refém da multiplicação do desejo. Pois até aqui o desejo ainda não se multiplicara, esta singular experiência não se fazia realmente sentir, ela e o desejo só tinha olhos para Basílio, mas a partir de agora ela entende que Basílio não chega. O desejo quer Basílio, mas nem por isso quer perder Jorge. O desejo quer tudo o que tem. E o desejo de Luísa já teve Basílio. Teve Basílio e teve Jorge. É extraordinária a frase que Eça põe na boca de Luísa para responder à pergunta de Basílio, acerca do que ela está a pensar: “Nada.” Precisamente. Ela não está a pensar em nada, ela está em nada, centrada no nada, na consciência do finito nada humano. Nesse momento ela é nada, é um imenso nada que se verbaliza a si próprio, um imenso nada a dizer o seu nome. Quando em situações semelhantes nós respondemos às nossas parceiras ou parceiros, nada, para além disso querer dizer que não queremos contar, é também um reflexo daquilo que verdadeiramente se está a passar em nossa alma: nada, isto é, o nada a aumentar através da multiplicação do desejo. Nesse momento ficamos melancólicos, porque estamos reféns de nós mesmo, reféns do imenso nada que nos habita e que subiu até à boca, verbalizado. A melancolia advém da suspeita – para não dizer mais – de que nada nos chegue. Se aprendêssemos a escutar o desejo nas suas múltiplas apresentações, talvez não fossemos mais felizes, mas seríamos seguramente mais capazes de entender o que nos acontece e o que poderíamos esperar que venha a acontecer. Não podemos evitar o desejo, mas podemos aprender a interpretá-lo e agir em concordância a essa mesma interpretação.

È fundamental que se entenda a diferença desta passagem do livro de uma outra, que apresentaremos em seguida, passada no dia seguinte nos aposentos de Luísa:

Todavia a lembrança de Jorge não a deixava; tivera-a sempre no espírito, desde a véspera; não a assustava, nem a torturava; estava ali, imóvel mas presente, sem lhe fazer medo, nem lhe trazer remorso; era como se ele tivesse morrido, ou estivesse tão longe que não pudesse voltar, ou a tivesse abandonado! Ela mesma se espantava de se sentir tão tranquila. E todavia impacientava-a ter constantemente aquela ideia no espírito, impassível, com uma obstinação espectral; punha-se instintivamente a acumular as justificações: não fora culpa sua. Não abrira os braços a Basílio voluntariamente!…

Aqui, o desejo não se faz sentir, o desejo não age. Luísa está antes tomada pela necessidade de justificativa para o seu acto de impiedade social. Há aqui uma tentativa de reduzir o nada da noite anterior, há um esforço para racionalizar o que se está a passar com ela, o que lhe aconteceu, que foi à sua revelia, ou, como ela mesma diz, não caiu nos braços do primo voluntariamente. Ela tenta encontrar no desejo um destino, tenta inverter o nada da noite anterior.

25 Jul 2017

Timor-Leste – Eleições | Diferença entre os dois maiores partidos será mínima

 

O partido de Xanana (CNRT) e o de Mari Alkatiri venceram as eleições. A diferença entre os dois será mínima. Resta saber como serão feitos os arranjos para governar o país.

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] diferença de votos entre os dois maiores partidos timorenses nas eleições legislativas de sábado vai ser mínima e o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) ainda pode vencer a Fretilin, que continua à frente na contagem.

Na sede do CNRT, em Díli, os números do partido apontam a uma vitória em Díli – o último município onde ainda não terminou a contagem – que poderá permitir reverter a liderança que a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) manteve durante toda a contagem.

A diferença de votos entre os dois partidos vai ser mínima – podendo não chegar a 3.000 votos – o que pode implicar que tenham o mesmo número de lugares no Parlamento Nacional, que elege um total de 65 deputados.

Quando estavam contabilizados 97,27% dos votos, a Fretilin lidera a contagem com 155.438 votos (29,72%), à frente do CNRT que tem 149.871 votos ou 28,55%, o que representa uma diferença de apenas 5.567 votos.

Em Díli, o único município onde ainda decorre contagem (estão contabilizados 72,29% dos votos) o CNRT tem 28.239 votos (38,62%) contra os 21.529 da Fretilin (29,44%).

Francisco Kalbuadi, secretário-geral do CNRT, indicou à Lusa números que apontam para uma ligeira vitória do seu partido, afirmando porém que vão “esperar pela contagem” que esperam estar concluída até ao final da noite.

Questionado sobre se o CNRT, caso vença, negociará ou não com a Fretilin para a formação de Governo, Kalbuadi remeteu uma decisão para mais tarde, depois de uma reunião do partido.

“Depois dos resultados, amanhã, há uma reunião da comissão política e vamos ouvir a orientação do presidente do partido, Xanana Gusmão e talvez uma conferência para decidir qual ai ser a nossa posição”, disse.

“Neste momento não posso dizer nada. A decisão é coletivamente do partido”, afirmou.

 

Primeiro-ministro | “Veredicto sábio”

O primeiro-ministro timorense, Rui Maria de Araújo, considerou ontem que os resultados preliminares das eleições legislativas, que colocam a Fretilin e o CNRT como os dois partidos mais votados, são um “veredicto sábado e eloquente” dos eleitores. “Os resultados preliminares demonstram um veredicto sábio e eloquente do Povo de Timor-Leste: querem que Mari Alkatiri e a Fretilin liderem o processo de mudança rumo a um desenvolvimento mais sustentável nos próximos 5 anos, mas sem relegar para segundo plano o líder histórico Xanana Gusmão”, disse à Lusa em Díli.

“E contam sempre com a participação do outro líder histórico Taur Matan Ruak, dos mais jovens do PD e de outras franjas significativas da sociedade”, sublinhou. Rui Araújo destacou ainda a “maturidade cívica e política” que o povo de Timor-Leste mostrou “durante as campanhas eleitorais e, ao acorrer em massa às urnas, provando que está ciente da importância do seu papel na participação do desenvolvimento do país”.

 

Mari Alkatiri promete diálogo com Xanana

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] secretário-geral da Fretilin agradeceu ontem a “grande responsabilidade” que o eleitorado timorense depositou no seu partido, provavelmente o mais votado nas legislativas de sábado, comprometendo-se a dialogar com Xanana Gusmão e com quem queira apoiar o desenvolvimento do país.

“Tudo faremos para abraçar todos mas vamos continuar a trabalhar com Xanana Gusmão, essa figura incontornável desse país, no sentido de responder a esta mensagem clara do nosso povo”, afirmou Mari Alkatiri, num discurso na sede da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) em Díli.

Na primeira declaração de um líder partidário depois das eleições de sábado – e quando a Fretilin lidera a contagem dos votos – Alkatiri disse que houve “uma luta renhida entre os dois grandes partidos” mas recordou que a Fretilin e o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) de Xanana Gusmão “são partidos aliados”.

Agora, contados os votos, “o povo transmitiu uma mensagem clara, de que quer que se continue a consolidar a paz e a estabilidade e que se continue com o programa de desenvolvimento para tirar o povo dessa situação de pobreza”.

Questionado pela Lusa se a abertura ao diálogo se limita a Xanana Gusmão ou se aceita falar com os restantes partidos, incluindo o PLP do ex-Presidente Taur Matan Ruak, o secretário-geral da Fretilin disse que todos são bem vindos.

De braços abertos

“Agora a campanha acabou. Não existem adversários, existem só compatriotas que quiserem trabalhar juntos”, disse. “Estar de braços abertos para incluir todos no processo de governação e de construção do país não significa que todos devem entrar para o governo. Por mim o Governo mais eficaz é sempre um governo pequeno”, disse.

Questionado sobre se vai ou não ser primeiro ministro, Alkatiri disse que já solicitou ao secretário-geral adjunto do partido, José Reis, a marcação de uma reunião do Comité Central da Fretilin (CCF) a quem caberá tomar a decisão, dando-lhe a liberdade de escolher se aceita ou não liderar o executivo.

Mais do que uma declaração de vitória o discurso de Mari Alkatiri, em tétum e português, foi um convite “de braços abertos” às restantes forças políticas que, disse, queiram juntar-se ao projeto de desenvolvimento do país.

Rodeado por centenas de dirigentes e apoiantes do partido, que depois o saudaram num misto de celebração e emoção – muitos choraram num momento que para a Fretilin marcar o regresso ao controlo do Governo, 10 anos depois – Alkatiri agradeceu a “maturidade” do povo timorense.

“Estas responsabilidade que o povo agora nos entrega será tratada com o maior sentido de responsabilidade. Por isso obrigado a todos”, disse, explicando que em breve conversará com Xanana Gusmão com quem espera, no momento oportuno, fazer uma conferência de imprensa conjunta.

Alkatiri disse que o voto do eleitorado na Fretilin é um sinal do que o partido fez na campanha mas é também uma declaração de apoio “aos que trabalharam muito para garantir a estabilidade e a paz em Timor-Leste” e para “permitir o desenvolvimento do país”.

“Tentámos convencer o povo e o povo ouviu-nos. O povo não deu a maioria absoluta a ninguém e temos que respeitar a vontade do povo”, disse.

“Deu maioria simples à Fretilin, reconhecendo a capacidade, os valores e os princípios da Fretilin”, disse ainda.

Diáspora | Fretilin vence, PLP em 2.º à frente do CNRT

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Fretilin obteve a maioria dos votos dos eleitores timorenses na diáspora, com 345 dos 1.086 votos expressos (31,77%), à frente do PLP e do CNRT, segundo dados finais provisórios dos centros de votação fora de Timor-Leste.

Os dados, compilados ontem pela Lusa com base em informação do Secretariado Técnico de Assistência Eleitoral (STAE), mostram que o quarto partido mais votado foi o PD e o quinto o Khunto.

Nas eleições legislativas de sábado foi possível votar em centros de votação instalados em três cidades australianas – Darwin, Melbourne e Sydey -, na Coreia do Sul, Portugal e Reino Unido.

No total votaram 1.086 eleitores de um universo de recenseados de 2.124, com a abstenção a ser de 49%

Os dados totais da votação nesses centros mostram que a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) obteve 345 votos (31,77%), o Partido Libertação Popular (PLP) obteve 255 votos ou 23,48%, e o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) obteve 218 votos ou 20,07%.

O Partido Democrático (PD) obteve 42 votos ou 3,87% e o Kmanek Haburas Unidade Timor Oan (Khunto).

A cidade australiana de Melbourne foi o local onde a participação foi mais elevada (74,20%) e Londres a cidade onde foi mais baixa (42,31%).

24 Jul 2017

Entrevista | Angela Leong, deputada e candidata às legislativas

 

É deputada à Assembleia Legislativa há 12 anos e uma das empresárias de maior sucesso do território. Mas Angela Leong não esquece as origens, que a ajudam a perceber as dificuldades de quem menos tem. A preparar-se para uma nova corrida eleitoral, afasta ter uma lista oriunda do jogo. A candidatura é feita de pessoas dos mais variados sectores que têm ideias e objectivos em comum

 

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] deputada à Assembleia Legislativa (AL) há 12 anos. O que a leva a recandidatar-se?

O Dr. Stanley Ho tem-me dito que todos temos de ter presente a fonte que nos enriquece. Por isso, quando alcancei algum sucesso no sector comercial, candidatei-me à AL, em 2005, com o intuito de dar o meu melhor e contribuir para a sociedade. Cresci na classe baixa. Compreendo bem as solicitações dos residentes que são da classe baixa, percebo as dificuldades que essas pessoas enfrentam. Por isso, no futuro, vou fazer o meu melhor, dar atenção à situação dos residentes e representar as suas vozes, trazendo os assuntos deles à AL, para pedir ao Governo melhorias na vida dos cidadãos. Nem me apercebi de que tinham passado 12 anos da minha primeira eleição. Sinto-me muito contente porque os meus trabalhos conquistaram o reconhecimento e apoios de uma parte dos residentes. Eu própria ganhei várias coisas com o facto de ser deputada à AL. É toda esta dinâmica que faz com que me recandidate, sendo também uma missão que vem dos 12 anos na AL.

 

Quais são os seus principais objectivos para as eleições deste ano?

Só tenho um único objectivo: executar as ideias da nossa comissão de candidatura da maneira mais ampla possível, para resolver os problemas dos cidadãos e contribuir para a sociedade.

 

Este ano há também outras candidaturas ligadas ao sector de jogo. Espera uma maior competição?

A nossa lista chama-se Nova União para o Desenvolvimento de Macau, cujo significado é unir profissionais de vários sectores que têm ideias idênticas. Esperamos juntar a nossa inteligência e experiência para avançarmos com medidas e políticas em prol do desenvolvimento diversificado de Macau. A nossa equipa conta com representantes de vários sectores: do jogo, de instituições ligadas aos serviços sociais, jovens, médicos e também macaenses. Não é só do sector do jogo. Além disso, ao longo de todos estes anos, a nossa equipa só se tem candidatado pela via directa, porque o objectivo é lutar pelos benefícios dos residentes, em vez de estar limitada a um determinado sector e expressar a voz de apenas uma parte da sociedade. Só deste modo é que o desenvolvimento económico geral se vai fazer com equilíbrio e harmonia. Por isso, mesmo que haja outras comissões de candidatura ligadas ao jogo, para nós é igual.

 

Há 25 comissões de candidatura para as eleições de Setembro. Vai ser mais difícil assegurar a reeleição?

É do conhecimento geral que as eleições para a AL são muito competitivas. Mas é óbvio que estou contente por haver cada vez mais grupos a candidatarem-se às eleições legislativas, sobretudo os jovens, porque isso demonstra que há cada vez mais jovens que dão atenção à política e ao desenvolvimento de Macau. Isso é bom e pode levar o Governo a ouvir vozes diferentes da sociedade.

 

William Kuan candidata-se ao seu lado. É um empresário do sector imobiliário, além de estar ligado à responsabilidade social do sector do jogo. São assuntos que deverão ser abordados na AL?

O jogo responsável, área em que William Kuan trabalha, é o que defendo desde o início, numa altura em o Governo ainda não tinha começado a prestar atenção ao jogo responsável. Como o Dr. Stanley Ho tem insistido no princípio de “ser importante contribuir para a sociedade onde tiramos os seus recursos”, tenho desejado que se fomente o jogo responsável. Numa sociedade como Macau, em que a indústria dos casinos é uma indústria pilar, este tipo de trabalho tem como objectivo reduzir os impactos negativos do jogo. Neste contexto, William Kuan tem as mesmas ideias da nossa equipa de candidatura. Além disso, é representante de vários grupos, incluindo de jovens, ligados à religião e a uma associação de serviços sociais sem fins lucrativos. Como referi, a nossa equipa tem insistido em candidatar-se pelo sufrágio directo. Em vez de representarmos só um determinado grupo ou profissão, queremos aproveitar a experiência em cada área profissional para ajudarmos e representarmos as vozes dos residentes oriundos de classes sociais e sectores diferentes, e também transmitir ao Governo medidas e sugestões construtivas, que sejam exequíveis.

 

A sua comissão de candidatura defende que o ensino superior deve ser gratuito para os residentes de Macau. Como é que olha para a qualidade do ensino superior do território? O que deve ser feito para que seja promovida?

Se se quiser alcançar as metas de diversificação adequada da economia e do desenvolvimento sustentável, é necessário haver uma reserva de talentos suficiente e diferenciada. Por isso, esperamos que o Governo acrescente mais quatro anos na sua política de educação gratuita, de modo a contemplar o ensino universitário, e alargue o âmbito dos beneficiários de bolsas de mérito especial e da cobertura de cursos. O objectivo é recompensar os alunos universitários de qualidade para que consigam elevar a sua capacidade académica e ter boas notas, aumentando a cobertura do ensino superior em Macau. Em relação à qualidade do ensino superior, sugerimos – e está também previsto no nosso programa político –, que se façam actualizações adequada às estruturas dos cursos de todas as instituições de ensino superior para que reúnam os requisitos internacionais em termos académicos, fazendo com que os cursos possam responder às necessidades de desenvolvimento diversificado de Macau e estejam ao nível internacional. Além de poder elevar a qualidade dos residentes, isso poderá aumentar a competitividade de Macau.

 

Tem havido algumas críticas sobre propaganda eleitoral dirigida aos trabalhadores dos casinos. Que comentário faz a estas afirmações?

A nova lei eleitoral da Assembleia Legislativa entrou em vigor no início do ano. Foi aditada uma disposição em que se prevê que os responsáveis das sociedades concessionárias da exploração de jogos de fortuna ou azar e das sociedades promotoras de jogos, bem como os seus trabalhadores, quando no exercício de funções no interior dos casinos, têm os deveres de imparcialidade e neutralidade. Eu, enquanto deputada à AL, sendo também uma empresária do sector do jogo, tenho apoiado estas disposições e tenho cumprido as políticas do Governo. Por isso, desde a entrada em vigor da nova lei eleitoral, a nossa comissão de candidatura e as minhas empresas têm executado rigorosamente as leis em vigor. No entanto, geralmente é normal encontrarem-se dificuldades em termos da execução após a entrada em vigor de novas leis. Assim sendo, sugiro à CAEAL que esclareça o mais cedo possível a parte que foi revista na lei eleitoral e unifique os padrões de execução em todos os casinos, para assegurar a justiça e imparcialidade nas eleições. Por exemplo, será que os bancos, as companhias de electricidade, o aeroporto, a companhia de fornecimento de água e as companhias de telecomunicações, assim como as outras concessionárias de serviços públicos, precisam de cumprir a referida disposição, o que está previsto na lei eleitoral?

 

O Governo está a trabalhar na revisão dos contratos do jogo e coloca-se a possibilidade de aumentar o número de concessões de três para seis. É uma boa solução para o sector?

Temos de ver quais serão as políticas a adoptar pelo Governo nesse sentido e qual o desenvolvimento da sociedade. O Executivo ainda está a estudar esta questão e devemos esperar pelo planeamento. Só depois da divulgação dos planos é que poderemos dar uma resposta. Como uma das operadoras, claro que esperamos poder continuar a ter esta oportunidade de manter o negócio (a Sociedade de Jogos de Macau assinou o contrato de subconcessão com a MGM em 2005). Como directora-executiva de uma operadora, prefiro não comentar mais nada, uma vez que o Governo ainda não anunciou um plano neste sentido. Mas, tendo em conta que todas as empresas têm as suas licenças e investiram muito dinheiro, que levou ao desenvolvimento da economia de Macau e do turismo, esperamos que todos tenham a oportunidade de continuar as operações. O mais importante é a divulgação dessa política, mas antes penso que o Executivo deveria colocar este assunto sob consulta pública.

 

Existem empreendimentos do sector do jogo que ainda não foram inaugurados. O sector vai ter de enfrentar a escassez de recursos humanos? O Governo precisa de definir uma política de trabalhadores não residentes mais flexível?

Em relação ao mecanismo de apreciação para a importação de trabalhadores não residentes, tenho pedido ao Governo que insista no princípio de que este tipo de mão-de-obra serve apenas para preencher a falta de recursos humanos locais no mercado. Por isso, acredito que se o Governo continuar a adoptar este princípio na importação de trabalhadores não residentes, é capaz de assegurar os benefícios de emprego dos trabalhadores locais e garantir um equilíbrio em relação à necessidade de recursos humanos entre os sectores. Nos últimos anos, a economia de Macau avançou, as indústrias passaram a ser gradualmente mais diversificadas, pelo que a necessidade de recursos humanos está a aumentar. Mas a dependência excessiva do mecanismo de importação de trabalhadores não residentes não será uma solução que funcione a longo prazo. Considero que se deve começar por formar talentos locais, analisar profundamente a estrutura demográfica de Macau e a distribuição da população activa em cada profissão, bem como a necessidade de trabalhadores em cada área, com base numa investigação científica, e definir um planeamento de recursos humanos a médio e longo prazo, em conjugação com a realidade do desenvolvimento de indústrias, actualizando as directrizes e políticas para o desenvolvimento geral dos trabalhadores em Macau.

 

Em que ponto está o projecto para o parque temático da Hello Kitty, que quer construir no Cotai?

Têm existido muitos problemas com a política que o Governo quer implementar. Sendo nós uma das concessionárias do terreno, gostaríamos de desenvolver mais parques temáticos, mas ainda não estamos autorizados a continuar o desenvolvimento do terreno, uma vez que o Governo decidiu suspender a política. Como concessionária gostaria de começar este projecto, para que haja uma maior diversificação no sector do turismo, mas não podemos avançar. O problema não é nosso e espero que nos ajude a descobrir o que se passa. Tudo depende do Governo, porque alterou o plano.

 

Não deu apoio directo para nenhuma das soluções apresentadas recentemente em relação à Lei de Terras? Porquê? Concorda com alguma das ideias que foram propostas ao Chefe do Executivo pelos seus colegas da AL?

Como o disse anteriormente, eu basicamente apoio e conjugo as leis e as políticas que entraram em vigor. Em relação à Lei de Terras, apoio muito a legislação, porque Macau é uma terra pequena com muita população, e a construção urbana e o desenvolvimento são restringidos pelos recursos de solos que temos. Como desenvolver, atribuir e utilizar os terrenos de modo eficaz tem sido um assunto a que a sociedade está atenta, sendo também um ponto essencial para o desenvolvimento de Macau. Entretanto, após ter entrado em vigor a Lei de Terras, surgiram problemas com a aplicação, devido às suas imperfeições – o caso do Pearl Horizon é um exemplo típico. Os proprietários do Pearl Horizon não cometeram qualquer erro, foram confrontados com um prejuízo grande por causa da alteração à lei e à política de terras. Sem dúvida que tal situação contraria a intenção legislativa da Lei de Terras. Sugiro que o Governo estude o mais rápido possível como aperfeiçoar a lei, para garantir os benefícios legítimos dos cidadãos, evitando o sofrimento dos cidadãos devido à implementação de políticas.

24 Jul 2017

Lei de branqueamento de capitais com revisões regulares

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] legislação referente ao branqueamento de capitais vai ser revista periodicamente. A garantia foi dada pelo próprio secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, em declarações à comunicação social no passado sábado.

Lionel Leong não adianta a periodicidade mas afirma claramente o objectivo da medida: “continuar a corresponder às necessidades exigidas pelo Grupo Ásia/Pacífico contra o branqueamento de Capitais (APG, na sigla inglesa) e aperfeiçoar conforme as novas conjunturas trazidas pelo desenvolvimento da indústria”, lê-se no comunicado enviado à comunicação social. Em causa está o sector do jogo.

O secretário adiantou ainda que, apesar da avaliação positiva dada a Macau no encontro do APG realizado na semana passada, em Colombo, o Executivo considera que há espaço para vários melhoramentos.

No que respeita às necessidades apontadas pela organização no sentido de aumentar a eficácia na acusação e julgamento de crimes contra o branqueamento de capitais, a recente revisão da legislação já indica um passo no sentido de melhorar o desempenho do território nesta matéria.

Nota positiva

Na semana passada, Macau recebeu uma nota positiva no encontro da APG em Colombo e foi classificado com “Eficácia Substancial” no domínio da supervisão. De acordo com o Gabinete de Informação Financeira (GIF), esta atribuição “não é muito frequente entre as jurisdições avaliadas a nível mundial”.

O relatório referente ao território que obteve aprovação do APG, aponta que “os requisitos de licenciamento no sector do jogo para as concessionárias, subconcessionárias e promotores de jogo é robusto”.

Além disso, o mesmo documento refere que Macau tem vindo a aplicar medidas respeitantes ao “licenciamento e avaliação de idoneidade” que incluem “os promotores de jogo e os seus colaboradores”.

O relatório dá ainda uma nota positiva ao trabalho da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), por esta possuir “uma equipa de auditoria experiente e adequadamente qualificada” para a supervisão das medidas adoptadas.

“A qualidade dos relatórios de auditoria analisados durante o processo de avaliação foi considerada bastante satisfatória”, assinalava, na semana passada, o comunicado do GIF.

DSAL continua a inspeccionar

Também no sábado, Lionel Leong fez referência aos acidentes de trabalho que têm ocorrido no território. O secretário destacou o trabalho recente da Direcção Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) em que foi feita a fiscalização a mais de 550 estaleiros. O resultado foi a suspensão de obras em 31, a ordem de multa a mais de 100 e 150 recomendações de melhoramento. De acordo com Lionel Leong, a DSAL vai continuar com as acções de fiscalização de modo a levar as entidades envolvidas ao cumprimento das regras de segurança no trabalho.

Polícia sem recursos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Divisão de Investigação de Crimes Relacionados com o Jogo queixa-se que não tem recursos para trabalhar eficazmente. A informação é dada pelo deputado Ng Kuok Cheong que afirma ter recebido uma carta de um grupo de agentes da autoridade a revelar a falta de recursos humanos no terreno. Consequentemente, e de acordo com a missiva, Ng Kuok Cheong apela ao Governo para tomar medidas. Em causa, está o devido tratamento dos crimes relacionados com o jogo.

“Os trabalhos na Divisão de Investigação de Crimes Relacionados com o Jogo são constantes, quer seja dia ou de noite, porque os casos são muitos e não conseguimos tratar de tudo”, diz a carta, segundo o deputado. O incumprimento do tratamento dos casos deve-se ao número insuficiente de polícias que, de acordo com Ng Kuok Cheong, têm diariamente de lidar com mais de uma dezena de casos. “Em muitos casos, mesmo saindo de madrugada, o trabalho é reiniciado às nove da manhã do dia seguinte”.

Para os agentes queixosos, a falta de profissionais pode também colocar em causa a integridade física de quem está de serviço. “Num caso de sequestro há, muitas vezes, apenas dois a três polícias a trabalhar e, caso os suspeitos ofereçam resistência, estes agentes podem estar em perigo”, adiantam os queixosos.

Os remetentes da carta enviada a Ng Kuok Cheong referem ainda que este tipo de tratamento é desumano. A razão, apontam, tem que ver com o facto de terem um horário excessivo de trabalho, e, salientam, “há mesmo casos de perda de consciência”.

Ng Kuok Cheong quer saber junto do executivo a veracidade das declarações que recebeu, sendo que apela à tomada de medidas nesta matéria. O deputado considera que a indústria do jogo é um pilar importante para a economia de Macau e, como tal, cabe ao Governo mobilizar recursos para a segurança de quem nela trabalha.

24 Jul 2017

Lei do metro | Divulgados resultados sobre consulta pública

Os futuros utentes do metro que participaram na consulta pública sobre a lei a aplicar pronunciaram-se, sobretudo, sobre os deveres dos passageiros. E fizeram-no para dizer que estão contra as multas para quem não ceder os lugares prioritários. O Governo cede e deixa cair as penalizações

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Governo recuou na intenção de aplicar multas a quem não ceder os lugares prioritários no futuro metro ligeiro. É que os cidadãos não concordam com a medida, indica um relatório divulgado no final da semana passada.

“Considerando que esse acto não constitui impactos à segurança da operação, este Gabinete vai propor, na futura legislação, que não seja necessário introduzir as penalidades sobre a situação de ocupação irrazoável dos lugares sentados prioritários”, pode ler-se no relatório final da consulta pública à lei do sistema de transporte do metro ligeiro, elaborado pelo Gabinete para as Infra-estruturas de Transportes.

De acordo com o documento, “a maior parte dos cidadãos não concorda com a aplicação de sanção quando não sejam cedidos os lugares prioritários”. “Houve opiniões que consideraram que é difícil definir o critério de ocupação dos lugares sentados prioritários, como por exemplo, é difícil identificar as pessoas que não têm características físicas mas necessitam realmente de utilizar os lugares, isso vai causar outros problemas sociais, pelo que a cultura de ceder os lugares sentados prioritários deve começar pela educação cívica”, pode ler-se no capítulo dedicado aos deveres dos passageiros, aquele que mais recebeu opiniões em toda a consulta.

No documento de consulta são sugeridas multas entre 400 e cinco mil patacas para quem violar os deveres dos passageiros, “consoante a gravidade do acto praticado e dos danos dele resultantes, da culpa do infractor e da respectiva capacidade económica”.

A ocupação de lugares reservados encontra-se nesta lista, bem como outras ofensas como abrir as portas do comboio sem permissão, não ter bilhete, fazer peditórios ou manifestações sem autorização da operadora, fumar ou transportar animais (à excepção de cães-guia).

Este é um ponto quase excepcional de discordância, com a maioria das 379 opiniões recolhidas a manifestar acordo com o que foi proposto sobre o metro ligeiro.

Selfies e dinheiro público

Os participantes na consulta questionaram o motivo por que o Governo optou por constituir uma empresa de direito privado com capitais exclusivamente públicos, em vez de subcontratar ou conceder a empresas privadas experientes, ao que o Executivo respondeu que o regime de concessão de serviço público é “mais adequado para a actual realidade de Macau”.

Algumas opiniões consideraram o valor do seguro obrigatório de responsabilidade civil baixo, fixado num limite mínimo de 200 milhões de patacas por ano para indemnização por eventuais acidentes do metro.

Entre opiniões individuais destacadas no relatório consta uma para que seja criada uma carruagem exclusiva para, por exemplo, mulheres ou alunos, e outra para que sejam limitadas as ‘selfies’ dentro das carruagens.

A consulta sobre a lei do sistema de transporte de metro ligeiro decorreu entre 13 de Fevereiro e 13 de Abril, recolheu 379 opiniões, e incidiu sobre seis aspectos: operação, segurança, deveres, títulos de transporte, regime tarifário e regime de responsabilidade e investigação técnica de acidentes.

O metro tem tido sucessivos atrasos e derrapagens. O projecto está dividido entre a linha da Taipa e a da península de Macau. A primeira deverá estar concluída em 2019, mas a segunda ainda não tem data.

Metro | Kwan Tsui Hang pede esclarecimentos

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] deputada Kwan Tsui Hang quer saber o trajecto de metro na península de Macau. O pedido é feito ao Executivo que, até à data, ainda não adiantou mais informações acerca desta matéria. Em interpelação escrita, a depurada solicita o ponto da situação relativo às obras do metro ligeiro e pede ainda um novo planeamento para a política geral de transportes e de trânsito terrestre do território. A razão, aponta, é a interferência do atraso no metro na boa execução das políticas actuais.

A deputada recorda que a política geral de trânsito e transportes terrestres de Macau prevê um sistema de trânsito verde, com base no princípio de “primazia aos transportes públicos”, no metro ligeiro, e em outros meios de transportes públicos adoptados no território. Na pática, Kwan Tsui Hang não vê resultados.

“O funcionamento do metro ligeiro esteve previsto para 2015”, afirma para salientar os atrasos da obra. No entanto, apesar de o segmento da Taipa poder começar a funcionar em 2019, não está ainda nenhuma proposta feita sobre o itinerário e o custo para a secção de Macau.

Na mesma interpelação, Kwan Tsui Hang acrescenta: “a política geral de trânsito e de transportes terrestres de Macau para o período de 2010 até 2020 prevê metas na melhoria do transito local”, obejctivo que, diz, não será atingido, precisamente “porque o metro ligeiro está muito atrasado”. Dada a situação, a deputada solicita ao Governo um novo plano para o trânsito local tendo em conta a não existência de metro.

Por outro lado, Kwan Tsui Hang salienta as mudanças que vão ocorrer em sequência da ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, sendo que, aponta, é necessária uma restruturação da rede de transportes públicos de forma a dar resposta às novas necessidades do território.

24 Jul 2017

Entrevista | Anabela Leal de Barros, investigadora

 

No modo como se fala estão muitas vidas, muitas centenas de anos, muitos barcos que chegam e partem. Anabela Leal de Barros, docente e investigadora, vai atrás da história das palavras, mas também das histórias das pessoas. De casa em casa, de escola em escola, fixou contos e lendas de Timor-Leste. Hoje, é lançado em Macau “Rumando de Lés a Leste – Contos e Lendas de Oecusse”, um livro cheio de gente

 

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omo é que surgiu o interesse por Timor-Leste?

Para além do facto de todos os portugueses nascerem com o gene “amigo de Timor-Leste” e terem andado anos a sonhar com a sua libertação?… Quando lá cheguei pela primeira vez, em 2002, e vi tudo o que havia a fazer para a implementação real do português como uma das duas línguas oficiais, e vi aquelas montanhas relvadas a cair a pique sobre aquele mar turquesa bordado de búzios, e vi aqueles sorrisos sempre a radiar, seja por rios secos ou caminhos pedregosos, percebi que ou ia de vez ou ia muitas vezes.

Antes deste livro há um trabalho no país. Que percurso foi este que levou à decisão de recolher contos e lendas de Oecusse?

Começou por ser a lecionação, enquanto docente da Universidade do Minho, de disciplinas de Linguística na Universidade de Timor Lorosa’e (UNTL), em 2002 e 2003, no curso de Português (uma das licenciaturas que a Fundação das Universidades Portuguesas então oferecia em Timor), e mais tarde no Mestrado em Formação de Professores, ramo de especialização em Língua Portuguesa, com orientação de mestrandos e participação em júris de provas, que a Universidade do Minho leccionou no INFORDEPE (Instituto Nacional de Formação de Docentes e Profissionais da Educação) e na UNTL (2012 a 2015). Nesses 14 anos percebi que os professores timorenses que frequentavam esses cursos guardavam pelo menos dois tesouros em situação precária e a merecer estudo: o português de Timor, com traços locais, asiáticos e antigos, e a literatura timorense de tradição oral. Eram maioritariamente os mais velhos, que frequentaram a escola em língua portuguesa, antigos guerrilheiros e membros da Resistência que antes a tinham usado como código, dificilmente decifrável pelos indonésios, e por fim tinham passado a ensiná-la, ainda sem habilitações superiores, quase generalizadamente. Comecei a sensibilizá-los e prepará-los para a recolha desse material, publiquei os “Contos e Lendas de Timor-Leste” (2014), deixei metade dos textos de 2002 para outro livro e, com o lançamento de uma edição revista e ampliada daquele, a 27 de Novembro de 2015, no âmbito das Comemorações dos 500 anos da Chegada dos Portugueses a Timor-Leste, no enclave de Oecusse, inaugurei uma nova fase: instalado o “vício” da recolha e salvaguarda dos contos e lendas, passei a dedicar-lhe períodos exclusivos ‘in loco’, de casa em casa e de escola em escola. Daí o novo livro, e mais dois, um deles em co-autoria com um antigo orientando de mestrado.

Oecusse é o único município isolado do resto do país. Até que ponto esta localização geográfica específica se repercute nos contos e também na oralidade?

Em todos os municípios de Timor-Leste abundam ainda os contos e lendas por recolher e registar, e quando contados em português, a partir de uma das dezenas de línguas maternas timorenses, trazem traços antigos e locais ainda não devidamente recolhidos e descritos. Contudo, Oecusse é aquele onde essa aventura impõe mais desafios; para se imaginar o quanto esteve isolado no passado basta sabermos que no século XXI o enclave ainda fica fechado por terra das cinco da tarde às nove da manhã; por mar, o barco leva meio dia a chegar de Díli e não é diário; pelo ar, o avião também folga um dia, quando não mais, ao sabor do tempo atmosférico. ‘Isolado’ no meio da ‘ilha’ (do latim ‘insula’), ‘ilhado’ no meio da Indonésia, Oecusse e os seus mais velhos são os depositários de um português que fascina escutar e investigar, à medida que se escavam os contos. O indonésio envolvente, o baiqueno materno, o tétum veicular e oficial, o inglês, outras línguas importadas dos municípios timorenses de leste, entrelaçam-se e confluem de algum modo nesse português que muitos guardam e nos entregam com um sorriso a seguir a um “Tardi!”, “Noiti!”, às vezes “Boa tarde”, “Boa Noite”, mas sobretudo “Bom dia/Dia!” apenas na voz dos mais puristas. Com os progressos cada vez mais evidentes do inglês, e em inglês, começamos a ouvir “Morning, sir!”… Quanto à repercussão nos contos, para além dos “bordados” que exibem nessas línguas, pois as palavras vão afluindo (quem conta em baiqueno prefere por vezes nomear certas realidades em tétum, ou até em indonésio, língua de desambiguação mesmo entre timorenses) e enquanto linguista é minha obrigação mantê-las no texto (com anotações em rodapé), também os contos são por vezes de fonte ou influência indonésia, tal como outros viajaram há muito de Portugal e acabaram adaptados e adoptados como locais; ou então migraram de outros municípios. Contos leva-os o vento, seguem os contadores para onde quer que vão e, a certo momento, passam a ser cidadãos do mundo. Daí que faça sentido começarmos por conhecê-los no seu lugar de nascimento, e depois, se possível, irmos seguindo as suas passadas, pois mal começam a andar, ensaiam caminhos e voos mais altos e cada vez mais longos.

A recolha das histórias que compõem este livro foi feita casa a casa. Como é que foi o trabalho de campo?

Foi no campo. Atravessei leitos de rio onde quase só corriam pedras e poeiras, subi montes, desci vales (tomo este isocolo à poesia barroca), bem devagarinho (que não haveria sinalização que valesse a tanto abismo, derrocada, área esburacada, charco, porco, galináceo e caprino a fazer-se à estrada). Foi à queima-roupa. Sem marcações, iam-me levando de casa em casa; cada contador acompanhava-me ou indicava-me a casa ou a escola de outro — de moto, de microlete, em longas caminhadas a pé; por vezes começava por fotografar as flores de um jardim e acabava a registar um conto e a provar fritos de coco. Os contadores, desprevenidos, muniam-se logo de um sorriso e de uma cadeira, mal me viam à distância, entregavam-me o seu tempo sem nunca regatear, íamos buscando palavras nos dicionários de todos os que arriscavam estar presentes (em baiqueno, em tétum, em indonésio, em português), e ora a ferros, ora com ventosas, ora de parto fácil e natural, lá vinha o conto, com o café de Timor bem docinho. No fim, valia sempre a pena; o conto aflorava limpo, provando, afinal, que o português não é assim tão difícil, e a satisfação geral quado lhes lia o resultado “final” é a minha melhor memória.

Procura-se com esta obra não só fixar a tradição oral de Oecusse, mas também o “português timorense” que, no enclave, tem características especiais. Que características são estas e como foi o processo de escrita dos contos e lendas recolhidos?

As eventuais características exclusivas do português deste distrito só serão discerníveis quando todos os traços específicos do português timorense estiverem descritos; sem ambicionar já a fazer essa destrinça, sem efectuar essa joeira, posso contar que, enquanto investigadora e docente de História da Língua Portuguesa, há mais de 20 anos, vibrei ao ouvir falantes de Oecusse lamentarem hospitaleiramente não terem mais a oferecer-me para além de ‘água cozida’ (hoje, em português europeu, sempre ‘água fervida’): o adjectivo/particípio passado presente nos dicionários antigos (logo desde o vocabulário manuscrito de português-chinês de Ricci e Ruggieri, do século XVI, e também nos manuscritos lexicográficos em chinês-português dos sécs. XVII e XVIII). Ou ainda ver e fotografar em Padiae uma ‘sintina < sentina’ (‘sanitários públicos, casa-de-banho’), ler nas ementas ‘assadura’ (‘carne grelhada’), ouvir dizer ‘chumaço’ (‘almofada, cheia’), ‘lapiseira’ (‘caneta, esferográfica’), ‘baliza’ (‘fronteira’). Em termos morfossintácticos, diz-se em Timor sempre ‘ribeira’ (não ‘ribeiro’), ‘pequeninho’ (não ‘pequenino’), ‘gémeos de três’ (decalque do tétum para o cultismo ‘trigémeos’, desconhecido), ‘pente de bananas’ (mais específico, pois ‘cacho’ é todo o “braço coberto de pentes” dado por uma bananeira), ‘tempo da chuva’ (não ‘das chuvas’); ‘tempo da colheita’ (não ‘das colheitas’). No âmbito dos intercâmbios linguísticos, achei no baiqueno (ainda sem norma ortográfica) ‘teto/tetu’ (indicando também o ‘telhado’ e o ‘forro’ das cabanas com uma parte ao ar livre onde se sentam os vigilantes dos pássaros no meio das várzeas), ‘parinseza/parincesa’ (‘princesa’), ‘cantareiros’ (‘canteiros’, os vários patamares ou pedaços de terra alagada que compõem uma várzea ou arrozal, com pequenas “paredes” para conter a água). Neste momento, os professores timorenses mais conhecedores do português manifestam certas perplexidades a esse nível. Por exemplo, por que está a televisão a preferir somente a palavra ‘arroz’, quando todos sabem que em Timor se distingue o ‘néli’ ou ‘néle’ (‘grão cru, planta, semente, grão por descascar’) e o ‘arroz’ (‘grão pilado, descascado ou já cozinhado’). A verdade é que é preciso urgentemente legitimar essas distinções locais, que Sebastião Rudolfo Dalgado já tinha registado, sem esquecer que os termos asiáticos viajaram e foram partilhados; esse veio da Índia, permite uma distinção lexical e semântica de crivo mais fino, justificável numa área geográfica em que o arroz é a base da subsistência, e muitas vezes prato único, ainda hoje. Enfim, os traços são muitos, todos os dias me aparece e fascina algo novo que conheço dos dicionários e manuscritos antigos — mas que aí me aparece ainda falado. Depois, surgem-me os termos locais e de línguas vizinhas que chegaram ao português europeu no período dos Descobrimentos: sobretudo palavras do malaio-indonésio, como ‘areca’, ‘arequeira’, ‘gamute’, ‘gamuteira’, ‘tuaca’, ‘tuaqueira’, ‘gondão’, ‘gondoeiro’, ‘gundieiro’, ‘casuarina’, ‘bétel’, ‘canária’, ‘parão’, ‘tuaca’, ‘lorico/louro’ (antes ‘loro’, o ‘papagaio’), ‘suco’, ‘cacatua’ (em português europeu, hoje, só ‘catatua’, mas sendo aquela a forma etimológica), ‘barlaque’, ‘catupa’. Algumas chegaram-nos já através do tétum. Outras são mesmo do tétum, como ‘tais’ (os lindíssimos panos tradicionais de algodão colorido tecidos pelas timorenses). Vou anotando essas formas nos livros de contos e investigo-as depois em artigos científicos, mas seria aborrecido impor o meu entusiasmo nas já longas listas que agora me ocorrem, embora assim ‘de cor’ (e é mesmo ‘de coração’), e mereceria então ‘que me enfiassem uma peúga pelas goelas abaixo’, como diz o Woody Allen para explicar que “o mal é o bem em excesso”.

As histórias que os mais velhos sabem têm uma importância especial em Timor-Leste, certo?

Timor-Leste é tão rico de histórias como pobre de livros. Os livros permanecem ainda nas memórias dos falantes, mas todos os dias vão falecendo e falhando com elas e eles. Com os contos, falece o português. Não só o de outrora, que me interessa tanto, mas também o do futuro, que nos deveria interessar a todos, porém, não somente para enfeitar discursos políticos e camuflar interesses económicos. O meu oásis são as escolas. Os professores sabem o que os contos valem e já sabem a importância de os fixar e guardar em português. Trabalham comigo, num intervalo das aulas, no seu pouco tempo livre, juntos, um falando baiqueno, e depois tétum, e entretanto indonésio, e algum inglês (entre os mais novos), e por fim português. Os timorenses são multilingues. Daí, também, o valor de, no meio de tantas línguas, ainda guardarem espaço de cor, de coração, para a portuguesa. E para as histórias que ela mesma conta. Por exemplo, em Oecusse existe uma Lagoa a que chamam, mesmo em baiqueno, ‘Lagoa Sina’, mesmo ao lado do lugar onde aportaram pela primeira vez os portugueses em 1515: a praia de Lifau. ‘Lagoa Sina’ inclui, não o substantivo ‘China’, como parece a um leigo do século XXI, mas o adjectivo ‘chino, -a’, a forma antiga exclusiva para se dizer em português ‘chinês, -a’, como ainda hoje em castelhano (‘yo soy chino/ella es china’). Essa palavrinha conta uma história: os comerciantes chineses foram-se instalando muito cedo nesse sítio, onde hoje já se desmoronaram as construções que os abrigaram, mas a língua, essa, não esquece a história e continua a dar-lhe abrigo.

 Quais são os próximos projectos?

Para além de meia dúzia de livros já prontos sobre outros assuntos, que vão sofrendo há anos (fechados no computador) a prioridade que dou aos de Timor (mas também aos manuscritos e impressos antigos de Macau e da China, em vias de publicação), da literatura timorense de tradição oral sairão em breve mais dois livros de contos, e outro de Oecusse que recolhi em Junho-Julho deste ano, enquanto aguardava que chegasse de Macau (em quatro dias), mas sobretudo de Díli (em mais 15 dias), o livro “Rumando de Lés a Leste. Contos e Lendas de Oecusse”, para o lançamento. Outros projectos incluem contributos para a definição de normas ortográficas e a construção de dicionários para certas línguas locais, ou o estudo do intercâmbio e das interferências dessas línguas maternas no ensino-aprendizagem do português, para o que a colaboração dos estudantes, docentes e orientandos de mestrado e doutoramento timorenses serão cada vez mais indispensáveis.

24 Jul 2017

Internet | China aumenta censura e quer impedir uso de VPN

As redes sociais desempenham hoje um papel fundamental na modernização e reforma na China. Mas o governo insiste em manter um controlo apertado da internet. Nos últimos meses a censura tem apertado, o que pode colocar em risco o próprio desenvolvimento do país. O próximo passo é proibir o VPN.

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]o longo deste ano, a censura da internet têm aumentado na China. Se, por um lado, o país assume que quer dar saltos gigantescos em termos de modernização digital; por outro, parece temer as consequências políticas da evolução tecnológica.

É sabido que muitos portais estrangeiros estão proibidos na China. Facebook, Youtube, Google, etc., ficam do outro lado da chamada “Great Firewall of China”. Por isso, muitos internautas chineses e estrangeiros residentes têm usado a chamada VPN (Virtual Proxy Network), um mecanismo que permite aceder à Internet através de um servidor localizado além-fronteiras. O VPN permite aceder a esses portais proibidos, o que se tem revelado muito útil, sobretudo para as empresas estrangeiras com filiais no País do Meio. O sistema cria ligações criptografadas entre computadores e pode ser usado para abrir portais bloqueados pela censura chinesa.

Mas agora a China quer impedir o uso de VPN. Numa carta enviada a clientes corporativos, citada pela agência Associated Press, o maior fornecedor de acesso à Internet do país diz que o uso de VPN será apenas permitido para ligar à sede da empresa no estrangeiro.

Medo atrás de medo

A carta enviada pela China Telecom Ltd. diz que os utilizadores de VPN vão ser impedidos de aceder a portais fora da China. Portais como o Facebook, Youtube e Google ou ferramentas como o Dropbox e o WeTransfer estão bloqueados na China. As versões electrónicas de órgãos de comunicação como o The New York Times ou o Economist também estão censurados.

A carta repete um anúncio feito em Janeiro de que apenas VPN autorizadas pelas autoridades chinesas serão permitidas. A mensagem suscitou receios de possível fuga de segredos comerciais ou informação, entre empresas que questionam a fiabilidade dos serviços encriptados chineses e a possibilidade de as autoridades acederem às suas mensagens. Os reguladores anunciaram em Janeiro uma campanha para erradicar o uso de VPN usadas para contornar a censura do regime.

A medida reflete a visão do Presidente chinês, Xi Jinping, de “soberania do espaço cibernético” ou o direito de Pequim em limitar a actividade dos seus cidadãos ‘online’. O controlo sobre a informação é especialmente sensível este ano, já que no outono vai decorrer o congresso do Partido Comunista Chinês (PCC), o mais importante acontecimento da agenda política chinesa, que se realiza de cinco em cinco anos.

Esta semana, o regulador municipal de Pequim para a Internet anunciou que pediu aos operadores de portais, incluindo o Baidu e a Tencent, para que removem material que “distorça a história da China e do Partido” e “promovam valores anormais”.

Pequim tem repetidamente pressionado empresas estrangeiras para que disponibilizem tecnologia, conhecimento encriptado e outros segredos comerciais, em troca de acesso ao seu mercado. As empresas a operar na China apontam o controlo da Internet como um dos maiores obstáculos às suas operações no país.

Empreendedor sofre

Mas não são apenas os estrangeiros que sofrem com o recrudescimento da censura. Os próprios negócios dos cidadãos chineses estão a ser gravemente afectados, sobretudo os novos negócios, as startups, que dequem o presidente Xi tanto fala. A verdade é que este recente movimento do governo para suprimir conteúdos na internet tem preocupado uma diversa comunidade de cineastas, blogueiros, membros dos media e educadores, que temem que os seus portais possam ser fechados por causa do controlo mais rígido do governo.

Em Junho, os reguladores fecharam portais de celebridades, restringiram quais tipos de vídeos as pessoas podem publicar e suspenderam os serviços online de streaming -– tudo isso sob alegações de conteúdo impróprio.

Uma associação do sector fez circular uma nova regulamentação de efeito imediato determinando que pelo menos dois “auditores” terão que analisar todo conteúdo audiovisual publicado online para garantir que esses conteúdos sejam fiéis aos “principais valores socialistas”. Tópicos considerados inapropriados incluem vício em drogas e homossexualidade, disse a Associação de Serviços de Transmissão Online da China, afiliada ao governo e que representa mais de 600 membros.

“De acordo com estas regras de censura, nada vai passar, o que vai exaurir a criação audiovisual artística”, escreveu Li Yinhe, uma académica que estuda sexualidade na Academia Chinesa de Ciências Sociais, mantida pelo governo. Sob as novas regras do governo, obras como a ópera “Cármen”, de Georges Bizet, e “Otelo”, de Shakespeare, tecnicamente teriam que ser banidas por mostrarem prostituição e exibirem cenas explícitas de afecto, disse.

As regras, que afectam gigantes das redes sociais como Weibo, bem como pequenas plataformas que têm florescido no movimentado espaço criativo online da China, representam as mais recentes medidas para endurecer a fiscalização na internet, antes do Congresso do Partido Comunista no segundo semestre, quando o presidente Xi Jinping deve consolidar seu poder.

“Costumávamos descrever a constante regulação conta-gotas como a fervura de um sapo em água morna. Agora está a escaldar com água a ferver”, disse à Reuters Wang Xiaoxiao, um agente de talentos que representa diversos actores que conquistaram fama na internet.

A internet é o melhor instrumento de domínio inventado pelo Homem

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]o contrário do que muitos ocidentais pensam, a internet na China não é, aparentemente, muito diferente de qualquer outro país. Vamos ali encontrar gente mal disposta, revoltada, crítica, pouco disposta a mostrar-se compassiva ou harmoniosa. Isto é o que revela um estudo, feito pela Universidade de Harvard, divulgado pelo jornal inglês The Guardian. A ideia de que a internet chinesa é constituída por um conjunto de gente tímida e sem face visível é, segundo o estudo, ridícula.

A investigação também revelou que a maior parte dos conteúdos censurados, além do habitual Falun Gong, pornografia e democracia, prendem-se com publicações que incitem ao activismo, mesmo que este seja a favor do governo. Gente na rua, manifestações, concentrações espontâneas, não. O governo não permite esse tipo de publicação, ainda que defenda os seus pontos de vista.

Por outro lado, a internet é extremamente útil ao Governo Central porque, por não possuir os feedbacks proporcionados por uma situação de liberdade democrática, é através da rede que vai tomando o pulso ao país, nomeadamente nas regiões mais longínquas. A internet tornou-se assim numa espécie de sistema de aviso prévio que permite ao governo agir antes que uma situação desagradável ocorra. Por exemplo, se surgem publicações sobre a corrupção num município, o governo central pode agir antes que o desagrado se torne demasiado público e provoque agitação social.

Além disso, fala-se do “exército de 50 cêntimos”, um grupo de dois milhões de pessoas, cuja ocupação é colocar publicações na internet, a 50 cêntimos cada uma. E, se no princípio estes actores da net respondiam ao críticos do governo, hoje mudaram de táctica: criam outros assuntos que desviam a atenção dos internautas para outras áreas. Isto para além de continuamente louvarem o Partido Comunista e o modo como conduz a China.

Economia digital cresce quase 20%

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] economia digital da China cresceu 18,9%, em 2016, para 22,6 biliões de yuans, ultrapassando o ritmo de crescimento do conjunto da economia, indica um estudo do Ministério da Indústria e Tecnologia da Informação chinês. A economia digital compôs 30,3% do Produto Interno Bruto (PIB) chinês, no ano passado, de acordo com o mesmo estudo, apontando que se for considerado o impacto indireto, o contributo ascende a 69,9%. Este sector inclui modelos de negócio como o comércio electrónico, computação em nuvem ou pagamentos via carteiras digitais, que têm na China uma difusão ímpar a nível mundial. O crescimento da economia digital, em 2016, supera o ritmo de crescimento da economia chinesa, de 6,9%. O estudo estima que o sector alcance os 32 biliões de yuans, em 2020, e que em 2030 componha metade do PIB do país.

21 Jul 2017

Primeiro olhar de Pessanha sobre Macau

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o riquexó, puxado por um cule que agarrava os varais para levantar a cadeira pelo eixo das rodas, Camilo Pessanha prepara-se agora para partir da Rua do Visconde de Paço d’ Arcos, assim chamada desde 15 de Novembro de 1882, quando até então era designada apenas por Rua Marginal do Porto Interior. A vontade era de continuar para Sul, pois os aterros, desde as Portas do Cerco até ao Largo do Pagode da Barra, foram feitos entre 1867 e 1869, quando a uma parte dessa marginal rua foi dado o nome de Avenida António Sérgio.

Um dos lados da via tinha uma berma num dos ramos do Rio Oeste e na outra edifícios de dois andares, cujo rés-do-chão se encontrava recuado. Eram, normalmente lojas ou armazéns, quase todos relacionados com os negócios marítimos, ficando o andar superior destinado a residência. Em túnel, esse passeio permite aos transeuntes resguardarem-se da chuva e aos comerciantes exporem fora das lojas os produtos. Tal arquitectura, dos finais do século XIX, é conhecida por Kei Lau, sendo especial da área de Lingnan, que compreende as províncias de Fujian, Guangdong, Guangxi e Hainão, no Sudeste da China.

A Pessanha não faltaria a vontade de seguir pela tão apelativa estrada marginal, onde desembarcara vindo de Hong Kong, encontrando-se próximo o cais do barco de Cantão, seguido por um outro, onde se descarregavam as mercadorias provenientes da província de Guangdong. Terá imaginado essa idílica viagem, quando está ainda na Rua do Visconde de Paço d’ Arcos, que em 1882 tinha 26 prédios, começava na Rua do Guimarães e acabava na Rua do Miguel Ayres. Já o Cadastro de 1906 refere esta rua, conhecida em chinês por Pa-su-ta-ni-ku-kae, na freguesia de Santo António, com 34 prédios, a começar e acabar na Rua do Guimarães, onde ficavam os cais dos vapores Mao-cheong, do Ying-king, do Fat-on, do Ung-cheong, do Tai-on e do Hong-sam. Mental viagem a circundar pela marginal até à Praia Grande, só em 1910 poderá realizar.

Plano para mais tarde

O percurso que Pessanha estava prestes a começar a fazer, já a 1 de Novembro de 1890 estava descrito no jornal O Macaense:

“Quem desembarca do vapor de Hong Kong, no porto interior, e quer vir à Praia Grande, tem de atravessar um dédalo de ruas estreitas e imundas, orladas por casas de paredes escuras e tristes. Há principalmente uma travessa muito estreita, junto à Rua de Felicidade por onde têm de passar todos os que quiserem transitar em jenrickshas. É tão estreita que um homem de braços abertos não pode passar por ela. É ela a Travessa do Tintureiro (Tai Pang Hong), ou Travessa do Falcão, com menos de cem metros que, começando no Largo do Senado, termina na Rua dos Mercadores.

Houve em tempos um projecto bastante grande de fazer uma larga avenida, que partindo do Largo de Caldeira no porto interior, viesse acabar na Praia Grande, passando pela frente do edifício do Leal Senado. Para esse fim seria preciso expropriar um bom número de casas chinesas, e uma parte da casa que é actualmente o Hotel Hing-kee, e calculava-se que seriam necessários $30 000. Não pedimos agora tão grandiosa obra. Por enquanto talvez bastaria modificar a Rua de Felicidade, alterando-a gradualmente desde o seu começo na Rua Marginal (Rua do Visconde de Paço d’ Arcos), para torná-la transitável para jinrickshas, que agora não podem subir a ladeira que a vem ligar com a Rua dos Cules. Os prédios da Rua de Felicidade pertencem a uma sociedade de negociantes abastados, que são bastante condescendentes. Não será difícil persuadi-los a converter, as que hoje servem de lupanares, em lojas mais asseadas e com frontarias mais alegres, com o que eles virão finalmente a lucrar. Essa transformação não poderá deixar de ser lentamente feita, mas se o governo melhorar aquela rua de modo que a torne mais frequentada, os proprietários por seu próprio interesse irão transformando os prédios, enxotando dai os lupanares.”

O capitalista chinês Vong Loc formara uma Companhia, a 绍昌堂 (Shao Chang Tang), que adquiriu a Fábrica de Processamento de Chá Pereira, com a frente para a Rua da Alfândega e traseiras situadas junto à água, e comprou as antigas casas em redor do Beco de Matapau e por aterro, no início dos anos 60 do século XIX foi construída a Rua Nova da Felicidade Abundante, em chinês Fok Long San Kai.

Nessa nova zona do Porto Interior, que compreendia a Rua da Felicidade, Beco, Travessa e Pátio da Felicidade, Pátio do Aterro, Rua da Caldeira, Travesso do Bazar Novo, Rua do Bocage, Travessa das Virtudes, Travessa do Auto Novo, foram construídas mais ou menos 160 lojas. Em 1864, a Companhia desfez-se devido aos sócios estarem desanimados, pois as lojas continuavam vazias e Vong Loc comprou-as todas, mudando o nome à Companhia para 集成堂 (Ji Cheng Tang), tornando-se então o maior proprietário de Macau.

Trinta anos depois, à estreita Rua da Felicidade, de casas com portas de espaldar e tijolos cinzentos, virá Camilo Pessanha com ela iluminada pelos candeeiros vermelhos a indicar os coulaus (restaurantes) para apreciar a música das pei pa tchai, mulheres assim chamadas por tocarem pei pa (pipa), um instrumento musical de quatro cordas e cantarem pela noite dentro. Vestindo um qipao (túnica), eram preparadas para agradar aos comensais.

Segundo o que o Engenheiro Director das Obras Públicas Augusto Abreu Nunes descreve a 11 de Fevereiro de 1903:

“As ruas mais importantes que cortam o Bazar e estabelecem a ligação entre ele, a rua Marginal e o centro da cidade, na direcção Leste/Oeste são: a Rua da Felicidade e a Rua das Estalagens, duas ruas estreitas, tortuosas, tendo em alguns pontos a máxima largura de 6,5 metros! Estas ruas são ligadas transversalmente por outras, em piores condições ainda: a Rua dos Mercadores, a do Mastro, a do Aterro Novo, etc., chegando nestas travessas a haver largura de 3 metros e não sendo a maior nunca superior a 7 metros. Resulta deste estado do Bazar, uma aglomeração enorme de casas de negócio, e portanto de gente e carros pelas ruas, que se atropelam constantemente, dificultando o trânsito e o comércio. A estes inconvenientes acresce, como consequência, que as condições higiénicas daquele recanto são deploráveis, isto é: uma falta de ar e luz em todas as habitações, becos e ruas, e um fétido insuportável por toda a parte”.

Para chegar ao Largo do Senado

A Rua do Visconde Passos d’ Arcos tinha à sua frente a oblíqua Rua do Corte Real (Co-ti-li-ha-kai), que termina junto à Rua Nova do Comércio no cruzamento com a Rua do Guimarães. Fosse essa a opção, logo na Rua do Guimarães começa a Rua do Matapau, que permite atingir a Rua dos Mercadores e daí seguir depois pela Travessa dos Tintureiros até à Praça do Senado, cruzamento com a Rua da Cadeia. Se escolhesse prosseguir um pouco para Sul, pela Rua do Visconde Passos d’ Arcos, até onde acaba a Rua do Guimarães, poderia entrando pela Rua da Caldeira, pequeno porto (caldeira) aterrado em 1875, prosseguir pela Rua da Felicidade e cortando para a esquerda, a Rua do Aterro Novo, onde virando para a direita, encontra a Rua do Matapau (a dos marceneiros), para chegar à Rua dos Mercadores.

Fora de hipótese era escolher ir para Norte, pois o percurso era bem mais longo e ficava fora de mão. Mas se tal ocorresse, encontrava a Rua da Madeira, que depois de cruzar com a Rua do Guimarães e com a Rua Nova de El-Rei (actual 5 de Outubro), um pouco mais adiante apareceria as travessas da Cordoaria e do Pagode, seguindo até à Rua do Mastro. Também para aí chegar havia, antes do Largo de Matapau, a Rua do Pagode, que seguia paralela à Rua da Madeira. Já da Rua do Mastro para chegar à Rua dos Mercadores havia para quem circulava pela Rua do Pagode, desviando um pouco para a direita, a Travessa das Portas, sendo no entanto muito estreita e por isso, só a pé tinha passagem. Duas outras estreitíssimas travessas faziam a ligação da Rua do Mastro para a Rua dos Mercadores, a dos Becos e a Travessa dos Mercadores.

Outro percurso era continuar ainda mais para Norte pela Rua do Guimarães, seguir até ao Largo do Matapau (Largo do Pagode do Bazar onde se encontra o Templo de Hóng Kông e começa a Rua Nova de El-Rei, actual Cinco de Outubro) e daí, pela relativamente larga para a época Rua das Estalagens, seguir até à dos Mercadores. A ligar a Rua dos Mercadores com o Largo do Senado, existia a Rua da Palha, que dá ao Largo de S. Domingos, onde se situa o Quartel com o mesmo nome, instalado no antigo Convento. Contíguo a esse largo está o Largo do Senado.

De referir, como o Padre Manuel Teixeira nota, que o Bairro de S. Domingos iria em breve ser totalmente remodelado pelo Director das Obras Públicas eng. Abreu Nunes. Na altura, ainda se estava à espera do projecto para o Mercado de S. Domingos, devorado por um incêndio a 15 de Novembro de 1893 e para o qual só em 19 de Julho de 1904 foi aberto concurso para a obra de construção. A venda dos produtos era desde então feita na Travessa do Soriano, que estava transformada num lugar imundo, um depósito de detritos orgânicos, um verdadeiro foco de infecção.

Do Senado para a Praia Grande

A viagem, feita em corrida num passo miúdo e cadenciado, avança por entre outros carros, sendo usada a voz como buzina. Camilo Pessanha, ao cruzar pelo triangulado e aprazível Largo do Senado, já não verá o “grandioso, soberbo e extraordinário urinol dos cupidos, que com tanta arte e perfeição aí existira. Era uma obra pitoresca, admiravelmente arquitectada”, que daí tinha sido acabada de retirar, como refere um jornal de 31 de Março de 1894.

Já toda a zona ocupada pelos edifícios da Santa Casa da Misericórdia (Igreja Visitação de Nossa Senhora, Cartório e Casa dos Expostos, que em 1883 estavam em risco de ruína) no Largo do Senado, em 1888 tinha sido remodelada. Foram abertas ruas, construído um novo Cartório e renovadas as casas de habitação com rés-do-chão e primeiro andar aí existentes, onde em 1893 e durante cerca de um ano no n.º 14 do Largo do Senado teve Sun Yat-sen o seu consultório.

Do Largo do Senado havia duas vias para chegar ao Hotel Hing Kee, na Praia Grande. Entrepunha-se no caminho um pequeno outeiro a partir da Travessa dos Anjos e subindo passava pelo Largo da Sé até ao início da Rua Central, de onde mais íngreme nascia um cortinado de colinas trepando para Sul, atingindo o ponto mais alto na Colina da Penha. Pertencia essa cadeia montanhosa ao corpo do Dragão da cidade.

Para atingir o Largo da Sé, vindo da Rua de S. Domingos, as travessas do Bispo e de S. Domingos e desde o Largo do Senado, através da Rua do Roquete até à Rua da Sé. Do Largo da Sé onde o Paço Episcopal e a Catedral se encontram, descendo pela Calçada de S. João entra-se na Rua da Praia Grande, onde virando para a direita, um pouco adiante estava o hotel. A Calçada de S. João era usada para enviar o peixe aos vendedores que esperavam e ansiavam por um novo Mercado de S. Domingos. A meio da Calçada S. João, à direita de quem desce e na continuação da Rua Formosa, existe o Pátio das Flores, talvez então com ligação à Travessa Nova (situada na Rua da Sé), que servia as traseiras das casas da Praia Grande.

Mas mais rápido para chegar ao hotel era pela Rua do Gonçalo subindo o outeiro até ao começo da Rua Central e nesse cruzamento, onde também vinha acabar a Rua da Sé, descer pela Calçada do Governador para a Rua da Praia Grande.

A opção foi pela Rua do Gonçalo e o riquexó, puxado pelo cule descalço, trepou aquele lanço em declive até ao começo da Rua Central, junção com a Calçada do Governador. Nesse cruzamento, uma patrulha da polícia controla os cules que puxam os jinrickshas pois, não lhes sendo permitido conduzir esses carros com passageiros na subida e descida da Rua Central, os transgressores eram multados. Assim se evitavam os repetidos e contínuos desastres que até 1893 iam ocorrendo em calçadas mais ou menos íngremes. O jornal Echo Macaense, de 29 Agosto de 1893 escrevia:

“Como se sabe, a ordem, que insensatamente havia sido dada para se vedar o trânsito pela Rua Central a indivíduos que fossem de carro puxado por um só chinês, foi afinal, em consequência sem dúvida dos repetidos clamores da imprensa local, modificada no sentido de não se permitir que subam ou desçam aquela rua, senão aos carros que conduzam mais de um adulto, sendo tirado por um cule. Sem embargo, porém, dessa modificação, bastante razoável, continuam a fazer-se ouvir queixas contra a patrulha da Rua Central, sendo raras as reuniões onde se não comente este ou aquele incidente, ocorrido na mencionada rua”.

Na descida da Calçada do Governador, Pessanha encontra de frente o Fortim de D. Pedro. O riquexó, travado pelo cule ao chegar à Praia Grande, desvia para a esquerda e quando atinge o hotel já a luz do dia esmorece. Partira de Hong Kong no vapor Heungshan às duas da tarde e anoitecia quando desce do riquexó completamente extenuado. Tem, no entanto, antes de antes de avançar para a porta do hotel, a tentação de admirar a belíssima baía com a sua graciosa curva de 1300 metros de extensão. Espreitando, não se via passagem para lá do Baluarte do Bom Parto.

21 Jul 2017

Xi Jinping pede progresso militar

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] presidente chinês Xi Jinping pediu que as principais instituições de pesquisa e educação militar do país cultivem mais talentos para as forças armadas e que construam mais instituições de investigação e educação militar, de modo a atingir um nível internacional. Xi, também secretário-geral do Comitê Central do Partido Comunista da China (PCC) e presidente da Comissão Militar Central (CMC), fez o comentário na quarta-feira, num discurso dirigido aos chefes das forças armadas.

Após entregar as bandeiras aos chefes numa cerimónia para marcar a reestruturação das instituições, Xi classificou a reforma como uma decisão vital feita pelo comité central do PCC e pela CMC para “realizar o Sonho Chinês e construir um exército mais forte”.

“Para construir uma instituição de investigação militar de primeira classe com liderança global, a Academia de Ciência Militar do Exército de Libertação Popular (ELP), como a força de liderança na pesquisa científica militar, deve satisfazer a nova procura de pesquisas militares e combinar melhor as teorias e tecnologias militares”, continuou.

Xi enfatizou ainda que a Universidade de Defesa Nacional do ELP é uma base significativa para cultivar talentos e também oficiais, devendo impulsionar a inovação na educação, pesquisa e gestão para se tornar uma universidade abrangente superior sob comando unificado.

Quanto à Universidade Nacional de Tecnologia da Defesa, deve seguir as tendências mundiais de desenvolvimento da ciência militar e trabalhar mais para proporcionar avanços tecnológicos-chave, para criar uma instituição de nível internacional, explicou Xi.

“É necessário talento, teoria, ciência e tecnologia militar de primeira classe para tornar o ELP num exército líder mundial”, disse Xi. “A ciência e tecnologia são as capacidades essenciais da luta na guerra moderna”, notou.

Xi enfatizou ainda que as instituições militares têm que assumir a responsabilidade e os os comandantes devem obedecer a uma direção política correcta para salvaguardar a autoridade e a liderança centralizada e unificada do Comité Central do PCC, agir de acordo com o CCPCC e manter a liderança absoluta do PCC sobre o exército.

A China tem actualmente 43 instituições educacionais militares, incluindo duas – a Universidade de Defesa Nacional do ELP e a Universidade Nacional de Tecnologia da Defesa – diretamente subordinadas à CMC, 35 especializadas nos serviços armados específicos, e seis das forças policiais armadas.

Nova Zelândia | Assinado acordo de exportação de cebolas

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] China finalmente assinou um acordo de exportação de cebola com a Nova Zelândia depois de 10 anos de negociações, revelou nesta quarta-feira um comunicado oficial. Um acordo sanitário foi assinado no início deste ano, abrindo caminho para a exportação de cebola chinesa ao mercado da Nova Zelândia, segundo a Administração Geral da Supervisão de Qualidade, Inspeção e Quarentena da China (AGSQIQ). O governo da Nova Zelândia tem um sistema de quarentena de plantas muito rigoroso para proteger seu próprio ecossistema, segundo o comunicado. A AGSQIQ ajudou os exportadores domésticos de cebola a melhorarem o nível de administração nos últimos anos. O AGSQIQ prometeu lançar medidas de quarentena rigorosas para garantir a qualidade das cebolas exportadas. A China é um dos principais produtores de cebola do mundo, com uma produção anual de cebola de 20 milhões de toneladas. As exportações respondem por meramente 3,5% de sua produção total.

 

1,2 milhão de toneladas de água dessalinizada por dia

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] produção diária dos 131 projetos de dessalinização da água do mar da China atingiu mais de 1,18 milhão de toneladas até o final de 2016, informou um relatório oficial divulgado nesta quarta-feira. O relatório em relação à utilização da água do mar em 2016 emitido pela Administração Estatal dos Assuntos Marítimos indicou que o maior projeto de dessalinização da China poderia produzir 200 mil toneladas de água por dia. O custo da água do mar dessalinizada por tonelada varia de cinco a oito yuans (US$ 0,74 a 1,19), segundo o relatório. Das águas do mar dessalinizadas da China, 66,61% foram usadas por propósitos industriais e o restante para o uso residencial. A China vai acelerar a legislação sobre a utilização da água do mar, ampliará o seu uso e lidará com as preocupações públicas com a água do mar dessalinizada potável, disse Qu Tanzhou, chefe do departamento de ciência e tecnologia subordinado à administração.

Matou os pais e mais 17 pessoas

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m homem foi julgado na quarta-feira por matar 19 pessoas incluindo seus pais. Segundo o tribunal, quando um pedido de dinheiro foi rejeitado por seu pai, Yang Qingpei regressou em 28 de setembro de 2016 à aldeia de Yema, na Província de Yunnan, e matou seus pais. Para encobrir o crime, Yang matou 17 vizinhos, incluindo três crianças. Depois fugiu para a capital da província, Kunming, e voltou ao trabalho, segundo um comunicado divulgado pelo departamento de segurança pública de Yunnan. Yang assumiu a autoria dos crimes, expressou remorso e pediu desculpa aos parentes das vítimas. Cerca de 200 pessoas estavam presentes no tribunal, incluindo parentes, legisladores, imprensa e membros do público. O tribunal adiou a condenação para outro dia.

Alibaba lança assistente de voz de baixo custo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]grupo chinês Alibaba lançou na quarta-feira um assistente de voz de preço reduzido, semelhante ao “Echo” da Amazon.com, na sua primeira incursão em dispositivos domésticos inteligentes. O “Tmall Genie”, mesmo nome da plataforma de comércio eletrônico Tmall da empresa, custa 499 yuans, preço muito mais baixo do que o de produtos similares da Amazon e do Google, que custam entre 120 e 180 dólares. Estes dispositivos são activados por comandos de voz para executar tarefas como verificar agenda, buscar previsão do tempo, mudar música ou controlar aparelhos domésticos inteligentes, usando conectividade de Internet e inteligência artificial. O Tmall Genie está atualmente programado para usar o mandarim como idioma e só estará disponível na China. O aparelho é activado quando um usuário reconhecido diz “Tmall Genie” em chinês.

Presença de Cristiano Ronaldo esgota clássico

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] presença de Cristiano Ronaldo no jogo entre o Shanghai SIPG e Guangzhou Evergrande, no sábado, esgotou os bilhetes, o que ilustra a popularidade do internacional português na China, noticiou ontem a imprensa chinesa.

Segundo o acordo feito entre Ronaldo e a Superliga de futebol chinesa, o português vai surgir em campo 15 minutos antes do início da partida, em Xangai, para cumprimentar os jogadores de ambas as equipas.

O Guangzhou Evergrande é o actual primeiro classificado na prova máxima do campeonato de futebol chinês, enquanto o Shanghai SIPG, conjunto treinado pelo português André Villas-Boas, segue em segundo lugar, a um ponto de distância.

Mas é a presença de Cristiano Ronaldo que está a atrair os adeptos chineses da modalidade, sublinhou a imprensa local. “C Luo” [Cristiano Ronaldo, em chinês] é o português mais conhecido na China, onde o futebol tem tido renovado interesse, com as grandes empresas do país a investir na modalidade, animados pela ambição do Governo em colocar a seleção do país entre as melhores do mundo.

Em Dezembro passado, o empresário do avançado, o português Jorge Mendes, disse que Ronaldo rejeitou um salário anual de cem milhões de euros proposto por um clube chinês, que ofereceu ainda 300 milhões ao Real Madrid pelo passe do jogador. Nenhum conjunto chinês confirmou a proposta.

21 Jul 2017

Poluição | Estudo levanta dúvidas sobre qualidade do ar em escolas privadas

Um estudo feito por uma aluna de mestrado da Universidade de São José demonstra a relação entre a qualidade do ar exterior e o que se respira dentro de salas de aula de três escolas privadas. Algumas medições apresentaram valores de concentrações de micropartículas três vezes superiores às recomendações da Organização Mundial de Saúde

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]urante 15 dias Ida Leong, aluna de mestrado do Instituto de Estudos Ambientais da Universidade de São José, mediu a concentração de partículas em suspensão em 12 salas de aula e sete zonas exteriores de três escolas privadas de Macau. Sem referir quais os estabelecimentos em causa, a investigadora quis aferir da influência da qualidade do ar do exterior no ar respirado pelos alunos e docentes durante o período das aulas.

Os resultados do estudo são, no mínimo, alarmantes. Como é sabido, entre os meses de Outubro e Março a qualidade do ar de Macau degrada-se consideravelmente. Durante esse período, a concentração de partículas em suspensão (PM10 e PM2,5) dentro das salas de aula foi, em média, duas a três vezes superior aos valores máximos recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Estas condições verificaram-se “principalmente quando a humidade e a precipitação foram menores e quando se verificaram ventos dos quadrantes norte e oeste”, explica Ida Leong.

A investigadora da Universidade de São José concluiu que “a qualidade do ar nas escolas de Macau é fortemente afectada pela poluição atmosférica, mas que as escolas podem tomar medidas preventivas de forma a minimizar os riscos para as crianças”.

Este tema tem sido uma das preocupações centrais da UNICEF no âmbito da saúde ambiental. No final do ano passado a organização fez um estudo sobre o impacto da poluição atmosférica nas crianças com conclusões preocupantes. A exposição a ar de má qualidade durante a infância pode ter consequências crónicas, principalmente ao nível do desenvolvimento do sistema respiratório que pode ficar afectado para o resto da vida.

No relatório da UNICEF, “Clean the air for children”, são elencados estudos que mostram que crescer num ambiente poluído pode reduzir a capacidade pulmonar em 20 por cento. O equivalente aos efeitos de crescer numa casa em que o fumo em segunda mão é uma constante. A ciência também demonstra que os adultos que cresceram em ambientes de constante poluição atmosférica tendem a desenvolver problemas respiratórios ao longo da vida.

Jovens pulmões

O relatório da UNICEF destaca também a susceptibilidade maior das crianças que crescem em ambientes com poluição atmosférica em serem contagiadas por vírus, bactérias e infecções várias. Além disso, estar sujeito a estas condições aumenta os riscos de infecções respiratórias e reduz a capacidade das crianças para as combater, uma vez que os seus sistemas imunológicos, ainda em desenvolvimento, também sofrem com a poluição.

Outro facto alarmante prende-se com a respiração das crianças, duplamente mais rápida que a dos adultos, absorver mais ar por unidade corporal. Também as suas vias respiratórias são mais pequenas, levando a que infecções originem com maior frequência bloqueios.

A poluição dentro de portas é mais comum em zonas rurais e empobrecidas, conclui o relatório da UNICEF, desafiando a realidade do que se passa em Macau. Isso deve-se à maior frequência de uso de combustíveis de biomassa para cozinhar ou aquecimento, algo que é raro nas cidades.

A escola é um dos ambientes interiores mais importantes para a saúde das crianças, uma vez que é aí que passam grande parte do dia. A situação em Macau é particularmente “grave porque a maioria das escolas está localizada perto de ruas com intenso tráfego, colocando as crianças em idade escolar em perigo de exposição a elevados níveis de poluição atmosférica”, explica Ida Leong.

A académica teve em consideração vários factores na investigação que fez, além das medições nas escolas. Teve em conta factores como as potenciais fontes de micropartículas, as condições meteorológicas e as variações de concentração de micropartículas registadas ao longo do ano pela Direcção dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos de Macau (SMG).

Resposta institucional

Os resultados verificados por Ida Leong variam dependendo da localização das escolas e do tipo de ventilação usado nas salas de aula. “Concluímos que as crianças que estudam nas escolas que analisámos, e que não têm procedimentos para evitar a entrada do ar exterior nas salas de aula, estão em elevado risco potencial”, explica a investigadora. A perigosidade verifica-se principalmente entre Outubro e Março, ou seja, parte significativa do ano lectivo.

A resposta por parte da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) foca-se na implementação do Guia de Funcionamento das Escolas, onde se estabelece que “o planeamento da construção escolar deve, pelo menos, estar de acordo com os princípios de segurança, prática, protecção do ambiente, arborização, protecção contra a poluição e o ruído”.

Estas directrizes aplicam-se igualmente a estabelecimentos de ensino privado. Fonte dos Serviços de Educação confirmou ao HM que são realizadas inspecções para aferir que as indicações são seguidas pelas escolas. É de salientar que este guia de funcionamento é um corpo de regras dinâmico, que vai sendo alterado consoante surgem novos problemas que necessitem de resolução.

Outro dos argumentos da DSEJ não responde à questão da poluição dentro das salas de aula. São as recomendações para o ajuste de actividades ao ar livre/desportivas conforme a qualidade do ar. Nesse guia é sugerido que “as escolas devem acompanhar as previsões do índice de qualidade do ar emitidas pela SMG”.

Em resposta escrita enviada ao HM, a DSEJ afirma que “quando o índice de qualidade do ar atinge um nível muito insalubre, perigoso ou até muito perigoso, as escolas podem, de acordo com a situação real, reduzir ou cancelar adequadamente as actividades ao ar livre/desportivas”. Afirma ainda que nestas condições “o pessoal de promoção da saúde deve acompanhar, de perto, o estado de saúde dos docentes e dos alunos”.

O mesmo guia refere que a ventilação natural deve ser o meio prioritário para garantir as condições sanitárias e ajustar o ambiente interno, e que “quando a ventilação natural é insuficiente ou impossível, os equipamentos de ventilação artificial para renovação contínua de ar são necessários”.

Uma das soluções para prevenir a insalubridade do ar respirado pelos alunos durante as aulas é muito simples: fechar as janelas. Apesar de esta ser uma solução lógica, não é certo que seja tida em consideração. Quando questionado se estes guias eram de facto implementados na escolas de Macau, a DSEJ remeteu de novo para o guia. O mesmo documento que privilegia a abertura de janelas como forma natural de ventilação, em lado algum referindo que devem ser fechadas em dias de maior poluição.

Além, disso, outra das deficiências apontadas pelo estudo de Ida Leong é a susceptibilidade da qualidade do ar directamente ligada com os materiais de isolamento usados nas construções das escolas.

Construção e bom senso

No que diz respeito ao isolamento, o Guia de Funcionamento das Escolas estabelece que devem ser “instaladas barreiras, filtros, ou outras medidas eficazes para reduzir a poluição causada pela emissão dos gases dos automóveis”. Ainda assim, os resultados do estudo da investigadora registam elevadas concentrações de poluição atmosférica entre-portas.

O estudo realizou-se em duas escolas de Macau e numa situada na Taipa. Importa referir que a OMS tem como limites recomendados de concentração de partículas PM 2.5 25 microgramas por metro cúbico e para as partículas PM10 o valor fixa-se nas 50 microgramas. A primeira escola analisada está rodeada por duas ruas movimentadas, com três lados do edifício voltados para prédios altos. Dentro das salas de aula monitorizadas teve dez dias de concentração de partículas PM 2.5, as mais nocivas, acima dos limites recomendados, registando no pior dia, em média, 46.05 microgramas por metro cúbico. Quase o dobro do limite recomendado. No que toca às partículas PM10, os resultados foram piores, com apenas um dia de níveis abaixo do limite recomendado pela OMS. O pior dia registou, em média, 165,97 microgramas por metro cúbico, mais de três vezes acima do limite.

A escola analisada na Taipa situa-se numa área relativamente arejada, com uma parte do edifício voltada para prédios altos e outra parte virada para uma área arborizada. Ainda assim, os resultados foram muito semelhantes, com as concentrações de partículas consistentemente acima dos valores mínimos. No que toca à partículas PM10, registaram-se três dias com valores que triplicaram, em média, os limites estabelecidos pela OMS.

A escola número três foi a que registou piores resultados. O edifício em questão situa-se em Macau, junto a uma estrada com muito trânsito e com um arranha-céus do outro lado da rua. Os outros lados da escola estão voltados para umas obras e uma zona arborizada. Este estabelecimento escolar teve valores, em média, sempre superiores nos 15 dias de medição das partículas PM2.5, sendo que em dois dias foram registadas concentrações quatro vezes superiores aos limites. No que toca às PM10, os valores foram quase sempre acima do dobro do limite, sendo que em dois dias andou perto do quíntuplo dos limites recomendados.

É de salientar que estes limites recomendados pela OMS são normalmente ultrapassados em todo o mundo, como a própria investigadora que realizou o estudo admite.

A Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA) tem um guia com instruções para a qualidade do ar no interior dos estabelecimentos públicos. O guia estabelece “a entrada de ar fresco para diluir o teor dos poluentes no ar do espaço interior”. Faz ainda a ressalva de que “este método requer que a qualidade do ar fresco do exterior seja melhor do que a do ar no espaço interior”.

Como solução derradeira, a DSPA recomenda a instalação de elementos de purificação do ar.

Apesar dos resultados serem alarmantes, tendo em conta os limites recomendados pela OMS, Ida Leong entende que a investigação que levou a cabo deixa uma mensagem e uma solução clara: “As escolas podem agir no sentido de melhorarem a qualidade do ar nas salas de aula usando bons materiais de isolamento e fechando as janelas quando a poluição for maior”.

20 Jul 2017

AL | Comissão não recua e mantém intenção de proibição de cartazes

Vong Hin Fai reconhece que a proposta está a causar polémica, mas a maioria dos membros da comissão a que preside concorda com ela, e a maioria é que manda. O plenário agora que decida se quer o fim de cartazes nas bancadas dos deputados. As mensagens políticas na roupa não são proibidas

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]ão deverão ficar em tronco nu os deputados que decidam, imagine-se, estampar t-shirts com apelos ao sufrágio directo e universal e usá-las nos plenários. Se tiverem de mudar de roupa, será por decisão do presidente da Assembleia Legislativa (AL) e não ao abrigo do projecto de resolução que o hemiciclo deverá apreciar em breve.

A Comissão de Regimentos e Mandatos da AL assinou ontem os pedidos de admissão de dois projectos de resolução, que seguem agora para o presidente do hemiciclo, para decisão sobre a sua distribuição aos deputados e votação em plenário. Um destes projectos visa agilizar o processo de interpelação sobre a acção governativa; com o outro pretende-se fazer várias alterações ao Regimento.

Ontem, o presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Vong Hin Fai, pronunciou-se sobre “a questão que mais atenção tem suscitado” para reiterar que a interdição de cartazes com mensagens políticas nas sessões plenárias não visa restringir os direitos dos membros da AL.

Em sede de comissão, o assunto foi de novo abordado, tendo o grupo de deputados mantido a posição apresentada no início desta semana. “Optámos por manter esta redacção. Como se trata de uma alteração substancial e temos de respeitar o plenário, pretendemos ouvir a opinião dos deputados”, disse Vong Hin Fai. “A atitude da comissão é aberta às opiniões do plenário”, acrescentando que não afasta “a hipótese de serem propostas alterações por outros colegas” aquando da análise na generalidade do projecto de resolução.

Vincando que a Comissão de Regimento e Mandatos tem poder de iniciativa na proposta de alterações às regras internas da AL, Vong Hin Fai fez questão de esclarecer que “este trabalho não foi feito de um dia para o outro”. “Na segunda-feira passada, disse que em Março auscultámos todos os deputados”, recordou, para explicar em seguida que a polémica alteração não surgiu no seio da comissão que lidera.

“Houve colegas que fizeram esta proposta durante essa auscultação de opiniões. A comissão considerou esta sugestão. Não foi aceite por unanimidade, mas a maioria concordou”, afirmou o deputado nomeado pelo Chefe do Executivo.

Copas fechadas

Aquando da reunião do início desta semana, Vong Hin Fai recusou-se a revelar quantos deputados da Comissão de Regimento e Mandatos é que se opõem a esta interdição. Limitou-se a dizer que “foi mais do que um”. Ontem, perante a insistência dos jornalistas, manteve a posição adoptada na segunda-feira. “Alguns deputados não concordaram com esta alteração. Esses colegas podem comunicar com os media, não me convém dizer os nomes”, declarou. “Mais de metade concordou. Menos de metade não concordou.”

Vong Hin Fai – que invoca a solenidade dos plenários para justificar a intenção da proibição de cartazes – recusou-se, de igual modo, a dar conta da argumentação de quem pensa de forma diferente dentro da comissão. “[Esses deputados] não concordaram com esta alteração. Não concordaram com o conteúdo desta norma. Quem não concordou, não concordou”, disse.

O presidente da comissão revelou, contudo, que no grupo de deputados houve quem tivesse mostrado preocupação em relação a materiais de suporte – que, pela lógica do actual projecto, estarão interditados. O que fazer se um deputado quiser ilustrar determinada situação com um mapa? “Na minha opinião, podem ser aceites elementos de suporte. Mas vamos deixar essa discussão para o plenário.”

Salientando várias vezes que “os deputados têm liberdade de expressão em relação à sua posição política” e que “a comissão respeita esse direito”, Vong Hin Fai insistiu na tecla da necessidade de manter a solenidade dos plenários. Inquirido sobre exemplos que tenham sido usados pelos proponentes da proibição como fundamentação para esta mudança, o presidente da comissão não respondeu.

Se a maioria dos deputados concordar com a proposta de interdição, cartazes, placas, faixas, letreiros e estandartes, com mensagens de natureza política ou qualquer outra, ficarão de fora da sala de reuniões plenárias, independentemente do seu conteúdo ser ou não simpático para com o Governo.

Quanto à possibilidade de essas mensagens serem estampadas na roupa, o projecto de resolução nada diz. “Se os colegas trouxerem uma t-shirt, vamos deixar o futuro presidente da AL actuar e decidir nos termos do Regimento. Não está abrangido o vestuário dos deputados”, garante Vong Hin Fai.

20 Jul 2017

Entrevista | Cláudia Varejão, realizadora

O filme “Ama-San”, da realizadora portuguesa Cláudia Varejão, integra o ciclo que está a decorrer na Cinemateca Paixão, dedicado ao cinema documental. O interesse pelo Oriente vem de longe. A produção dedicada às “amas”, mulheres mergulhadoras japonesas, já foi galardoada em vários festivais e é um momento de encontro entre a cineasta e este lado do mundo

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]omo é que apareceu a ideia de fazer “Ama-San”?
Tive conhecimento destas comunidades de mulheres mergulhadoras em 2012, ao ler um livro de poesia de uma amiga, onde encontrei uma referência aos seus corpos que partiam à procura de pérolas, nas zonas costeiras do Japão. Na altura, não sabendo se era uma imagem ficcionada pela autora, comecei a pesquisar. Impressionou-me muito o que fui encontrando, desde a existência desta prática, que tem cerca de dois mil anos de existência, à bravura destas mulheres que arriscavam as vidas num trabalho tão duro. Estamos a falar de um contexto patriarcal, absolutamente dominado pelo poder dos homens e onde estas mulheres, muitas vezes, são o elemento estrutural na economia da família. Preocupou-me também que estivesse diante de uma tradição em vias de extinção. Ao longo do processo, tive a sorte de me fazer acompanhar de pessoas que acreditaram na minha vontade e capacidade de fazer este filme. Recebi uma bolsa da Fundação Oriente de Lisboa para fazer uma primeira viagem ao Japão, onde fiz um levantamento fotográfico de algumas vilas piscatórias onde as “amas” mergulham. Foi nesse período que conheci Wagu, a vila onde mais tarde viria a filmar. Na segunda viagem, em 2014, trabalhei exclusivamente no filme. Contei com a produção da Terratreme Filmes em Portugal, a Pillow Films no Japão e o apoio financeiro do Instituto do Cinema. Para finalizar o filme, contámos com a co-produção com a suíça Mira Film e apoio financeiro da televisão suíça. O Oriente em geral e o Japão em concreto sempre fizeram parte dos meus interesses culturais e até de vivência quotidiana. Não é inocente portanto o meu interesse pelas “amas”.

Além da experiência cinematográfica, foi uma experiência pessoal? 
Sim. Procuro um cinema com fortes laços na realidade, na vida que se move diante dos meus olhos. Geralmente, quando filmo, crio fortes laços de afecto com as pessoas. Desde as pessoas que estão diante da câmara, passando por todas as que estão em redor e as que me acompanham depois, na fase mais isolada de pós-produção. Neste filme criei um laço que me é muito querido com uma das “amas”, a que corresponde à geração do meio, a Mayumi. Foi ela que me ajudou a concretizar muitas das cenas que desejei filmar. Houve um entendimento muito bonito, muito maternal da parte dela para comigo, que se transformou dentro de mim num agradecimento profundo. Ainda hoje, à distância, trocamos mensagens por telefone. Não são escritas por causa da língua, trocamos fotografias semanalmente uma com a outra. Para o público, o que fica, são os filmes. Para nós, que os fazemos, o que nos fica são as memórias, mas sobretudo as relações que criamos para o resto da vida.

Existiram algumas dificuldades específicas na produção deste filme?
Não tenho propriamente um método para encontrar o meu cinema. Há muitas ferramentas de trabalho que ainda estou a descobrir e a explorar. Em nada muda a minha aproximação à realidade ou à ficção. Eventualmente, apenas a constituição da equipa com quem trabalho. Mas o meu olhar e a forma como o dirijo a quem está diante de mim são sempre os mesmos. Nesse sentido, é possível que se confundam os géneros nos meus filmes. Em verdade, parece-me que a catalogação do género é um conceito criado para o mercado de distribuição e de exibição em festivais e salas. Nós, realizadores, somos mais livres internamente se pensarmos menos isso. Não preparei absolutamente nada com as “amas”, em termos de cenas e narrativas, antes de filmar. O que foi acontecendo foi sendo filmado com a cadência da realidade, do quotidiano, da relação que íamos estabelecendo entre nós e moldado pelo meu olhar com a câmara. Muito pontualmente, repetiu-se alguma cena. Mas pouco. Depois, houve a incompreensão da língua, para ambos os lados. Filmar num contexto em que não se domina o nosso mais seguro cartão-de-visita, a palavra, exige a criação e recriação dos modelos em que estamos habituados a trabalhar e a comunicar. No caso deste filme, o facto de não dominar o japonês, acabou por resultar a favor do próprio filme: deu-lhe uma determinada intimidade. Falava sempre através da minha assistente de realização, a Aya Koretzky, que ia traduzindo aquilo que eu precisava. Por isso mesmo, quando filmava, as “amas” ignoravam a minha presença pois sabiam que não iriam falar directamente comigo. E talvez isso resulte no tal olhar íntimo que se atribui ao filme, na naturalidade dos gestos.

É um filme que tem sido destacado um pouco por todo o lado. Mais um trunfo para o cinema português?
O filme tem tido um percurso muito fluido no circuito de festivais, com alguns prémios que nos têm deixado a todos felizes. A força que atravessa a vida destas mulheres tem dado que falar. Motiva as pessoas a irem ver o filme e cria um discurso após as sessões. Quer dizer que qualquer coisa no mundo está a mudar. As consciências estão a criar raízes mais profundas, o olhar está mais livre, menos submisso às ideias que carregamos de um passado profundamente desequilibrado para as questões de género. Os estereótipos estão, lentamente, a cair. A curiosidade do público tem enchido as projecções nos festivais e a estreia comercial em Portugal foi um sucesso de bilheteira, tendo em conta o tipo de filme: é de baixo orçamento e é documental. Por todo esse retorno e reconhecimento pelo trabalho da equipa, mas sobretudo pelas “amas”, eu fico feliz. Gostava que a vida das “amas” ecoasse nas nossas próprias vidas, que nos fizesse sentir mais do que pensar. Estas mulheres viraram do avesso a própria sociedade japonesa. São um caso raro, não só no Japão mas em todo o mundo, em que as mulheres conseguiram anular uma série de estereótipos associados à feminilidade. As “amas” conquistaram a sua liberdade através do amor e força, pelo mar, pelas suas famílias, pela vida. São a poesia, mas é ainda mais, tudo verdade.

O que falta à indústria portuguesa para que se possa desenvolver e internacionalizar?
Portugal não tem uma indústria de cinema. Portugal é dos países europeus com maior dificuldade em produzir os seus próprios filmes. A única fonte de financiamento dentro do nosso país é o Estado português que, através da lei do cinema, cobra uma taxa às operadoras que depois reverte para os cofres do Instituto do Cinema e Audiovisual. Esta é a única verba disponível localmente. E, como é fácil de imaginar, o dinheiro não chega para alimentar nem um terço do potencial que temos no nosso país. Grande parte dos filmes produzidos actualmente recorre a co-produções internacionais, um pouco por todo o mundo. Vivemos com muita dificuldade. Há uma linha imensa de profissionais no cinema, desde produtores, realizadores, técnicos, distribuidores, festivais de cinema, que vivem permanentemente a fazer omeletas sem ovos. O trabalho é extremamente subvalorizado e precário. Somos um grupo de loucos alimentados quase só pela nossa fé e prazer. Para as novas gerações o estrangulamento é uma barreira bruta para darem início aos seus filmes. Ao cinema, e a toda a cultura que se produz em Portugal, falta investimento, estratégia, visão, e responsabilidade do Governo. Vivemos subfinanciados há muitos anos. É assustador que não se aprenda com os erros cometidos no passado. Os cortes no sector são permanentes. Cultura é produção de saber e, por sua vez, crescimento de uma sociedade. É a nossa mais preciosa herança. Sem memória não somos nada. Não posso naturalmente exigir o mesmo financiamento para a cultura e para a saúde. São necessidades de uma ordem muito distinta. As doenças culturais não são visíveis da mesma forma que o nosso corpo se expressa. São doenças que, por exemplo, se reconhecem na forma como as cidades crescem. Estão à nossa volta se as quisermos ver. E enquanto não existir esta consciência generalizada, continuaremos a viver, no sector da cultura, desamparados e a levar as nossas próprias energias ao limite. Para rematar este discurso triste, ainda que necessário, devo dizer que o cinema português está em grande forma. Aliás, sempre esteve. Temos autores com uma obra extraordinária, que são reconhecidos dentro e fora do nosso país e cujo os prémios que permanentemente lhes são atribuídos enchem de orgulho o público em geral. É, para mim, quase comovente que se consiga caminhar tanto e tão longe quando o corpo está permanentemente a ser impedido. Maior sinal de que o cinema que produzimos é dos mais ricos do mundo parece-me impossível. E a ideia de que o público português não vê o seu própria cinema é um boato mal contado. Por exemplo, os números de espectadores que o “Ama-San” tem feito em sala revelam um público muito curioso e participativo. Maior sinal de vitalidade é impossível. Só falta mesmo que olhar dos nossos políticos se encontre com a realidade. Entretanto, nós continuamos, individualmente mas unidos, a cuidar do cinema.

O que é que a impressionou deste lado do mundo? 
O Oriente é, de facto, um mundo específico dentro do nosso mundo. Muito se aprende na diferença. Mas o ser humano é sempre o mesmo. É aí que reside o meu fascínio e o meu olhar: na total diversidade humana que converge num só.

20 Jul 2017

WhatsApp regista interrupções

 

A aplicação de mensagens instantâneas tem registado, desde terça-feira, interrupções no serviço na China, suscitando receios de que possa ser parcialmente bloqueado no país, à semelhança de várias outras ferramentas ‘online’ estrangeiras.

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]urante grande parte de terça-feira, o WhatsApp esteve inacessível na China, a menos que os utilizadores recorressem a uma VPN (Virtual Proxy Network), mecanismo que permite aceder à Internet através de um servidor localizado fora do país. Muitos dos utilizadores na China daquele serviço de mensagens instantâneas, que é detido pelo Facebook, são estrangeiros a residir no país, que têm assim uma alternativa ao WeChat, o serviço chinês mais utilizado no país, mas que está sujeito ao controlo e censura impostos pelas autoridades locais.

As interrupções no serviço do WhatsApp surgem num período politicamente sensível para a China. No outono, vai decorrer o congresso do Partido Comunista Chinês (PCC), o mais importante acontecimento da agenda política chinesa, que se realiza de cinco em cinco anos. Na semana passada, o activista chinês e prémio Nobel da Paz de 2010 Liu Xiaobo morreu enquanto cumpria uma pena de prisão de 11 anos por subversão contra o poder do Estado.

Um estudo divulgado esta semana pela Universidade de Toronto mostra como a censura chinesa conseguiu bloquear, em tempo real, imagens de homenagens a Liu, em conversas privadas no ‘Wechat’, ilustrando a sofisticação do sistema de reconhecimento de imagens do aparelho de censura do regime. Na noite de terça-feira, já era possível enviar mensagens através do ‘WhatsApp’ na China, mas não partilhar imagens.

Um pesquisador chinês, conhecido pelo pseudónimo Charlie Smith, considerou que as autoridades optaram por bloquear todas as mensagens não escritas, precisamente porque não conseguiam fazer uma censura selectiva, como no ‘WeChat’, que pertence ao gigante chinês da internet Tencent. Como o conteúdo do WhatsApp é encriptado, “eles optaram por fazer uma censura bruta de todas as mensagens não escritas”, afirmou Smith, citado pela agência Associated Press (AP).

“Não seria de surpreender que tudo no WhatsApp fosse bloqueado, forçando os utilizadores na China a usar serviços não encriptados, censurados e monitorados, como o WeChat”, acrescentou.

Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês disse na terça-feira não ter qualquer informação sobre o que se passou com o WhatsApp.

Com 1,2 mil milhões de utilizadores, o WhatsApp é um dos serviços de mensagens instantâneas mais usado no mundo. É detido pelo Facebook, que está bloqueado na China desde 2009. A plataforma digital de distribuição de vídeos Youtube, a rede de mensagens instantâneas Twitter ou o motor de busca Google também estão bloqueados na China, com Pequim a argumentar que redes sociais a operar fora do seu controlo constituem uma ameaça para a segurança nacional.

As autoridades têm também prestado crescente atenção a aplicações que utilizam mensagens encriptadas. Depois de Pequim ter lançado uma campanha contra ativistas e advogados dos Direitos Humanos no país, em 2015, o Diário do Povo, jornal oficial do PCC, apontou a aplicação ‘Telegram’ como a plataforma onde os advogados coordenavam as suas atividades. Em tribunal, os advogados foram também forçados a confessar como usavam aplicações de mensagem encriptadas para comunicar livremente com colaboradores estrangeiros. O Telegram foi, entretanto, bloqueado no país, e muitos dissidentes chineses optam agora por utilizar o WhatsApp.

20 Jul 2017

Activismo político | Constrangimentos e silêncio na RAEM desde 2014

É hoje mais difícil ser activista político em Macau do que era há quatro anos, quando o novo Executivo de Chui Sai On assumiu funções. Há menos associações no activo e nem os protestos do 1.º de Maio tiveram a expressão de outros tempos. Académicos e activistas falam de uma sensação de medo, da existência de avisos directos e do esforço para controlar um contágio vindo de Hong Kong

 

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m 2014 Macau teve o maior protesto de que há memória. Milhares de pessoas invadiram as ruas e o jardim perto da Assembleia Legislativa (AL) para lutar contra a proposta de lei do regime de garantias. Nesse mesmo ano, três associações do campo pró-democrata juntaram-se para organizar um referendo civil sobre a eleição do Chefe do Executivo.

Quatro anos depois, o activismo político, que nunca teve em Macau a mesma dimensão que tem em Hong Kong, registou uma quebra. Há muito que não se conhece qualquer iniciativa da associação Tri-Decade Action Union e é sabido que quase todos os membros da Juventude Dinâmica de Macau pertencem também à Associação Novo Macau (ANM), cuja liderança só ficará definida depois das eleições, quando Scott Chiang decidir, ou não, permanecer como presidente.

Bill Chou, antigo docente da Universidade de Macau (UM), envolvido num polémico caso de suspensão, chegou a ser activista ao lado da ANM. Hoje garante que é mais difícil defender causas políticas na RAEM.

“O activismo político em Macau não está tão activo como estava há quatro anos. As autoridades estão mais preparadas para recorrer ao litígio para capturar os activistas”, disse ao HM. “Alguns activistas podem ter medo, enquanto outros podem ser apenas mais tácticos”, acrescentou.

Questionado sobre as actividades das poucas associações de cariz político, Bill Chou afirma que a “Tri-Decade Action Union já não é considerada pelos seus apoiantes para ter um papel efectivo na mobilização ao voto”. Quanto à Juventude Dinâmica, “foi absorvida pela ANM”, defende. 

Eric Sautedé, académico na área da ciência política e ex-docente da Universidade de São José, considera que “os movimentos sociais e políticos independentes, oriundos das associações tradicionais, de alguma forma enfraqueceram ou falharam no recrutamento de sangue novo nos últimos dois anos”.

As mudanças que a ANM sofreu desde as eleições de 2013 – a separação face aos deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San e a liderança indefinida são alguns exemplos – explicam, para Eric Sautedé, as alterações nos restantes grupos. “As tensões com a ANM podem explicar, parcialmente, o estado das coisas, porque todos estes movimentos estão interligados.”

“Houve uma verdadeira renovação e as eleições legislativas de 2013 foram traumatizantes para a ANM, tendo gerado uma crise de orientação e de sucessão. A Tri-Decade Action Union sempre foi um truque e uma ferramenta útil para dividir o campo pró-democrata. A maioria dos membros da Juventude Dinâmica de Macau pertence à ANM”, adiantou Sautedé.

Além disso, o académico defende que “as associações mais tradicionais ou patrióticas, sobretudo as que têm camadas jovens, têm sido muito activas no recrutamento, e os subsídios que têm recebido do Governo ajudou-as a desenvolver esse trabalho de inscrição”.

Sou Ka Hou e pouco mais

Bill Chou dá outra razão para a diminuição das acções do campo pró-democrata: a maior atenção que o Governo tem dado às questões sociais depois da polémica com o regime de garantias.

Igual ideia tem Eric Sautedé. “Com a mudança de Governo em 2014, o crescimento do descontentamento da população, que culminou com o protesto de Maio de 2014, gerou alguma atenção e houve alguma estabilidade, sobretudo desde que tem sido dada maior atenção às questões sociais.” 

Ainda assim, o ex-docente da USJ não tem dúvidas: “Há cada vez menos espaço para movimentos autónomos e independentes em Macau”.

“Infelizmente, sem surpresa, Macau está a seguir uma tendência restritiva que se tem verificado na China nos últimos cinco anos. Há esperança em figuras como Sou Ka Hou (candidato às eleições ao lado de Paul Chan Wai Chi), mas há muita responsabilidade a recair nos ombros de poucas individualidades”, disse ainda.

A influência de Hong Kong

Numa altura em que quatro deputados do campo pró-democrata de Hong Kong acabam de ser suspensos do Conselho Legislativo (LegCo) por não terem respeitado o juramento no arranque da legislatura, o hemiciclo local discute a possibilidade de proibir os deputados de levarem cartazes para os plenários.

Há, de facto, uma ligação entre o que está a acontecer na região vizinha e o apaziguamento do activismo político em Macau? Bill Chou não soma directamente os dois factores.

“Há uma ligação muito limitada. Os movimentos políticos estão, na sua maioria, dependentes das iniciativas das pessoas. As pessoas de Macau têm medo de agir”, considerou o docente.

Eric Sautedé lembra o caso denunciado pelo professor Hao Zhidong, da UM, para afirmar que, além de Hong Kong, a situação de Taiwan representa um exemplo de influência ou tentativa de castração do contágio dos movimentos pró-democracia.

Ainda assim, o docente chama a atenção para o marasmo da sociedade civil.

“As bases destes movimentos são apenas uma parte da equação: onde estão os jornalistas, os professores universitários e os advogados a apoiar estes movimentos? Para onde foram? Dentro das fileiras dos profissionais dos sectores liberais, mesmo os ‘suspeitos habituais’, os mesmos de há 15 anos, têm-se tornado menos desafiantes e argumentativos.”

“Acredito que os activistas têm medo e têm sofrido pressões. Macau é uma comunidade pequena e todos se conhecem, e a confrontação, que era vista como algo ‘impróprio’, é agora vista como pressão política. As pessoas têm vindo a receber avisos directos com potenciais consequências”, conclui Eric Sautedé.

Do lado dos activistas, Jason Chao, ex-presidente da ANM, considera que as duas regiões “têm um destino semelhante”. “Além da diferença em termos de maturidade da sociedade civil, as populações dos dois territórios vivem com o mesmo sistema e ambiente político”, acrescentou.

Lei Kuok Keong, presidente da Juventude Dinâmica de Macau, considera que Macau pode retirar “mensagens importantes” dos movimentos ocorridos ali ao lado.

Já Isaac Tong, fundador da Tri-Decade Action Union, acredita que a relação é quase nula ou “fraca”. “A maior parte das pessoas de Macau não gosta dos activistas de Hong Kong e dos seus movimentos.”

Juventude Dinâmica | “Há um retrocesso no ambiente político”

Chegou a ser liderada pela jovem Winkie Kuan, mas esta decidiu sair da presidência da Juventude Dinâmica de Macau para dar mais atenção à família. Esse papel cabe a Lei Kuok Keong, também ligado à ANM.

Esta associação que, em 2014, participou na realização do referendo civil, mantém um papel activo nas redes sociais, mas o seu líder não ousa afirmar que há “um retrocesso no ambiente político de Macau”. “Não vemos futuro quanto à possibilidade de implementar um sistema mais democrático, com a eleição por sufrágio universal do Chefe do Executivo e dos deputados.”

Há pressões, constrangimentos, receios do que poderá advir de uma acção de rua. “Qualquer tipo de actividade é hoje mais difícil de se realizar, devido ao ambiente político que se vive. Há ainda a falta de atenção e consciência por parte dos jovens”, apontou Lei Kuok Keong.

A ausência da Juventude Dinâmica dos protestos do 1.º de Maio deveu-se não apenas à tentativa de não politizar a iniciativa, mas também pela falta de apoios. “A maioria dos nossos membros não estava em Macau e tivemos muitas dificuldades de mobilizar e organizar pessoas”, explicou.

Todos os activistas de Macau “sofrem diferentes pressões” neste momento. “Há uns que têm medo e noutros casos a própria família tem medo. Macau é muito pequeno e quem participa em acções políticas sofre consequências”, acrescentou.

O presidente da Juventude Dinâmica chama ainda a atenção para o facto de poucas associações do campo pró-democrata terem, de facto, capacidade para eleger deputados. “Muitos deputados mais velhos vão sair este ano, mas isso não significa que os mais jovens consigam ser eleitos, apenas quem pertence a um pequeno circulo”, remata.

 

Jason Chao | “Eleger um deputado será decisivo para a ANM”

Foi presidente da ANM e chegou a atirar aviões de papel dentro da Assembleia Legislativa como forma de protesto. Hoje, Jason Chao coordena o website “Project Just Macau” e não tem dúvidas de que tudo está mais difícil.

Jason Chao

“Na última década as pessoas começaram a falar. Mas é do conhecimento geral que as pessoas de Macau, no geral, são apáticas em relação à política”, começa por dizer. Jason Chao diz preocupar-se com uma “ausência de valores” face ao bom desempenho da economia. Nada mais parece interessar.

“A luta por uma democracia genuína está cada vez mais difícil, tanto em Hong Kong, como em Macau. No passado olhávamos para Hong Kong como um modelo de progresso do desenvolvimento político. O que está a acontecer é que Hong Kong está a seguir os passos de Macau no que diz respeito ao autoritarismo. À medida que a China vai diminuindo as liberdades em Hong Kong, vejo menos possibilidades de existir liberdade em Macau num curto espaço de tempo”, explicou.

Quatro anos depois há um maior “constrangimento do espaço individual e da liberdade política em Macau”. As diversas detenções de activistas e uma “baixa tolerância do Governo em relação ao discurso dissidente” contribuíram para que haja “um ambiente mais severo ao nível do desenvolvimento da sociedade civil”.

Jason Chao nota diferenças até na cobertura que os media locais têm dado às actividades do campo pró-democrata. “A cobertura dos media das actividades de associações como a ANM tem diminuído desde 2014.”

O ex-presidente da ANM considera que a Tri-Decade Union tinha apenas como objectivo eleger um deputado e terá perdido o rumo. Quanto ao futuro da ANM, as eleições legislativas de Setembro serão decisivas.

“Apesar de Ng Kuok Cheong afirmar que continua a ser membro da ANM, ele transferiu todas as suas responsabilidades políticas para a nova associação. Obter pelo menos um assento na AL será decisivo para a sobrevivência da ANM”, defendeu.

 

Tri-Decade Action Union “não está activa, mas ainda existe”

Isaac Tong ajudou a fundar a associação Tri-Decade Action Union, que “não está no activo, mas ainda existe”. Desde 2014 que não realiza qualquer actividade, uma vez que muitos dos seus membros saíram. Questionado sobre o actual panorama do activismo político, Isaac Tong considera-o “fragmentado e individualizado”.

Isaac Tong, da Tri-Decade Action Union

“Ainda temos liberdade de expressão, de apresentar petições, uma oportunidade para chamarmos a atenção. Mas a maioria dos activistas não consegue obter financiamento suficiente. É fácil ser-se activista mas é difícil movermo-nos e sermos bem-sucedidos.”

O fundador da associação acredita que os activistas “não têm medo e são corajosos”, mas são poucos. Isaac explica que muitos dos membros desta associação “estão focados nas suas carreiras”. “Ainda nos preocupamos com questões públicas e ainda temos como ideal transformar Macau num lugar melhor. Mas neste momento não temos tempo para organizar actividades.”

A realidade é dura e ser activista em Macau do campo pró-democrata não é fácil. “Para mantermos a nossa família temos de trabalhar. Se és um funcionário público, é melhor cortar a relação com uma associação política, a não ser que seja do campo pró-China. Se começares um negócio, tens de lidar com o Governo. Mesmo numa PME o teu patrão não vai gostar se tiveres uma actividade política. A realidade é cruel e se é difícil manter um equilíbrio entre a vida pessoal e o trabalho, é ainda mais difícil obter um equilíbrio disso tudo com a política, no campo pró-democrata”, considera Isaac Tong.

19 Jul 2017

Casinos | Ng Kuok Cheong defende fim das subconcessões

São três mas, em termos práticos, são seis. Ng Kuok Cheong defende que o Governo não deve, no futuro, autorizar a existência de subconcessões na principal indústria do território. O deputado quer que o Executivo comece já a explicar o que tem em mente. Não está sozinho no pedido que faz

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m planeamento rigoroso e atempado. É esta a exigência de Ng Kuok Cheong em relação aos concursos que aí vêm para o sector do jogo. As actuais concessões terminam em 2020 e em 2022. O deputado entende que se trata de uma excelente oportunidade para corrigir o que está mal e deixa algumas ideias numa interpelação escrita enviada ao Executivo.

Um dos aspectos que, para o pró-democrata, merece reflexão é o número de concessões. À semelhança do que tem vindo a ser defendido por vários especialistas na matéria, também Ng pensa que é necessário acabar com situações híbridas. Na missiva enviada ao Governo, o deputado recorda que o número de licenças de jogo é de apenas três, mas a figura das subconcessões deu origem a que outras tantas operadoras tivessem entrado no mercado.

Atendendo ao actual contexto, Ng Kuok Cheong defende o fim das subconcessões e pergunta se o Executivo equaciona alterar a legislação.

O pró-democrata gostaria também que a população pudesse ter um papel mais activo na definição do futuro do jogo. Assim sendo, sugere a participação dos residentes através de uma consulta pública sobre as contrapartidas que devem ser exigidas às futuras operadoras, para que o Governo possa reflectir e incluir ideias nos cadernos de encargos das concessionárias.

Para Ng, deve aproveitar-se todo este processo para garantir que vai ser dado um novo impulso à diversificação do tecido económico de Macau. É ainda defensor de que os residentes devem ser os primeiros nas listas de contratações, e mostra preocupações em relação à protecção ambiental e à responsabilidade social.

Os locais primeiro

Também a Associação de Estudos Sintético Social de Macau (AESSM) tem estado a pensar no futuro do motor económico do território. Os membros deste movimento consideram que os futuros concursos para a concessão de licenças de jogo são um momento que deve ser aproveitado para resolver problemas existentes no sector, sendo que é igualmente uma oportunidade para “não deixar, de novo, os cidadãos desiludidos”.

Kot Man Kam, presidente da AESSM, refere num texto publicado no Jornal do Cidadão que, aquando do processo de liberalização da indústria do jogo, em 2002, os residentes ficaram sem perceber por que razão foram atribuídas três concessões e se abriu a porta a outras três subconcessões.

Tendo em conta o que acontece na prática neste momento, Kot Man Lam é do entendimento de que devem ser criadas pelo menos seis concessões, mantendo-se assim o número de operadoras. O presidente da associação afasta uma diminuição do número de actores no sector, alertando para consequências ao nível económico e do mercado laboral, que poderiam ter repercussões em termos de estabilidade social.

A AESSM não repudia a possibilidade de se ir além das seis operadoras, mas aconselha prudência neste aspecto, propondo que se tome como referência as soluções adoptadas noutras jurisdições. O Governo deve analisar as propostas que receber a pensar no desenvolvimento de Macau a longo prazo, aconselha, e deve também ponderar a possibilidade de dar primazia às empresas locais.

Dar e receber

No processo de revisão das concessões do jogo, as operadoras do sector devem ter um papel mais activo na satisfação das necessidades decorrentes do desenvolvimento de Macau, observa também a associação de Kot Man Lam.

A AESSM propõe ainda que os casinos tenham funções sociais de maior relevo em relação ao seu universo de funcionários. Devem ser as empresas a garantir habitações, devem criar sistemas de formação e de ascensão profissional para os residentes, disponibilizar serviços de creches para os filhos dos trabalhadores e centros de serviços para idosos. O objectivo é ajudar a resolver as dificuldades com que se deparam os funcionários.

Kot Man Lam manifesta ainda algumas preocupações em relação à segurança, sugerindo ao Governo um reforço do sistema de vigilância nos casinos para que se evitem crimes e irregularidades. O Executivo deve reforçar a execução da legislação aplicável aos promotores do jogo, para evitar infracções nos casinos.

19 Jul 2017

Centro histórico não cumpre regras sobre instalação de aparelhos de ar condicionado

Estão regulamentados. Os aparelhos de ar condicionado, no centro histórico, não devem ser visíveis nas fachadas que dão acesso à via pública. A medida é para ser aplicada na zona sujeita ao Plano da Almeida Ribeiro, mas a realidade é outra

 

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]em todos os edifícios estão a cumprir o Plano da Almeida Ribeiro no que diz respeito à instalação de aparelhos de ar condicionado. As directivas, há muito implementadas, determinam que estes não devem ser visíveis nas fachadas, mas a prática tem sido bem diferente.

Numa das plantas existentes no website da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSOOPT), referentes a uma construção na zona do centro histórico, lê-se: “Deverá prever soluções para a instalação de aparelhos de ar condicionado, de forma a evitar a projecção directa na via pública de água resultante do seu funcionamento”.

O documento aponta ainda que os aparelhos “deverão, casos estejam instalados nas fachadas de edifício, ser cobertos com elementos decorativos”.

Ao cimo da página, o carimbo vermelho é claro: “Este terreno insere-se na zona sujeita ao Plano da Almeida Ribeiro”.

Para a arquitecta Maria José de Freitas, a instalação de aparelhos de ar condicionado nas fachadas de edifícios nesta zona não deveria sequer ser autorizada. Falar de elementos decorativos é o mesmo que dizer que “não há critério”, aponta ainda a arquitecta, que tem trabalho feito na área do património.

Na visão de Maria José de Freitas, bastava a DSSOPT dizer que “não se admite aparelhos de ar condicionado na fachada e mais nada”, sendo que o que existe actualmente é apenas uma forma de “tapar o sol com a peneira”.

Desculpas não valem

Para o arquitecto Mário Duque, estando em causa edifícios históricos, “estes equipamentos têm de estar dentro do regulamento que define a sua instalação e, de acordo com o Plano da Almeida Ribeiro, não se podem exibir ares condicionados nas fachadas a não ser que estas tenham dispositivos próprios para os acomodar”, sublinha.

O facto de se tratarem de edifícios antigos – que compõem, na sua maioria, a zona histórica – não pode ser usado como desculpa para que não sejam implementadas as medidas devidas.

Mário Duque aponta que não faz sentido a DSSOPT afirmar que esta é uma regra a ser implementada em construções novas, tratando-se de uma zona histórica. “Dizer que o Plano da Almeida Ribeiro só se aplica nos edifícios novos não serve ao lugar”, sublinha o arquitecto, a quem foi transmitida esta informação.

Dificuldades antigas

Quando se trata de velhos edifícios, as soluções têm de ser ponderadas e criativas. “No entanto, é necessário arranjar um espaço que não seja tão visível e que tenha condições para proteger estas unidades”, diz Maria José de Freitas, sendo que, a utilização dos terraços para este fim é uma solução a ter em conta.

“É necessário criar uma regra que defina onde devem ser colocados os ares condicionados”, refere Mário Duque. “A questão pode ser estética, mas é essencialmente construtiva, até porque não se estragam fachadas que duram várias décadas com aparelhos que só duram cinco anos.” O arquitecto sublinha ainda que os principais agentes de degradação das fachadas dos edifícios são as estruturas ilegais e estes equipamentos.

Para Maria José de Freitas, a ocultação destes aparelhos “pode dar mais ou menos trabalho, mas é sempre possível”, diz. “Se isso não acontece, penso que é uma falta de cuidado”, remata.

Solução pouco à vista

A fiscalização do cumprimento legal destas regras está a cargo do departamento de urbanização da DSSOPT. Para Mário Duque, o que está em causa é a incompetência dos próprios serviços. Também Maria José de Freitas aponta o dedo à fiscalização, sendo que considera que é a entidade que “deve ter um papel mais activo”.

A arquitecta coloca ainda a possibilidade desta fiscalização ser uma competência do Instituto Cultural e avança com uma sugestão: “A solução passaria pela criação de um grupo interdepartamental que tivesse a preocupação de cuidar da boa aparência e das boas condições de imagem e de habitabilidade daquilo que Macau quer mostrar”, frisa.

Dadas as características muitas vezes particulares de cada edifício, Maria José de Freitas considera também que cada caso deveria ser estudado individualmente. “As regras deveriam ser implementadas nos edifícios existentes no centro histórico e nos edifícios que incluem a zona classificada, onde se pretende que existam características visuais e de imagem que transmitam uma impressão de qualidade e que não venham disfarçadas com decorações”, diz a arquitecta.

Contactada com a questão, a DSOOPT não deu qualquer indicação no que respeita ao cumprimento das regras relativas à instalação de equipamentos de ar condicionado na zona do Plano da Almeida Ribeiro e do Centro Histórico.

19 Jul 2017

Chan Kai Chon, director do Museu de Arte de Macau: “O MAM deve ser para todos”

Chan Kai Chong tem um objectivo: quem entrar no museu que dirige deve conseguir encontrar aquilo que procura. Por isso, quer uma instituição diversificada, capaz de comunicar com as várias comunidades que vivem na cidade. Para o novo responsável pelo MAM, o espaço museológico não tem razões para temer a concorrência regional. Basta que continue a afirmar-se como o local onde cabem diferentes culturas

[dropcap]A[/dropcap]Assumiu o cargo de director do Museu de Arte de Macau (MAM) há dois meses. Como é que está a ser este desafio?
Em primeiro lugar, devo dizer que, apesar de ter feito investigação sobre história de Macau, e estudos de história de arte chinesa e acerca do intercâmbio artístico entre Oriente e Ocidente, gerir um museu é algo completamente diferente. Tenho de conhecer o funcionamento normal de cada parte administrativa e as que lidam com os assuntos ligados à museologia. Por isso, para mim, é um desafio. Simultaneamente, fiquei muito contente por ter uma oportunidade para aprender. Creio que toda a gente precisa de aprender ao longo da vida.

Vem da área da educação artística, que foi uma das apostas visíveis do MAM. É uma das áreas que quer desenvolver no museu? Para que o MAM tenha público, é preciso fazer formação de públicos. Quais são os seus planos nessa matéria?
O museu tem organizado muitos cursos, destinados a adultos, adolescentes e crianças. Por exemplo, no piso 0 temos acções de formação destinadas aos miúdos. É uma forma de educar e de aumentar o conhecimento artístico das crianças. É também um modo de os miúdos conhecerem o conceito de museu. Neste momento, também temos alguns trabalhos destinados aos Amigos do MAM, pelo que organizamos visitas guiadas, acções de formação e visitas fora do território. Além disso, o museu tem colaborado com a Direcção dos Serviços de Educação e Juventude. Em conjunto, são organizadas visitas para que todos os alunos do sexto ano venham ao museu. Através das visitas guiadas, explica-se como se deve visitar um museu e como é que se apreciam obras de arte num espaço destes. É uma parte da disciplina de Artes Visuais na escola. Os museus têm mais recursos artísticos para responderem a estas necessidades. Estive a falar com os nossos colegas sobre a possibilidade de, no futuro, se prepararem mais materiais didácticos e de apoio destinados a cada grupo etário, para que os miúdos percebam melhor, através de alguns textos e jogos, e se possam aproximar mais das obras de arte.

Em termos gerais, como é que olha para o desenvolvimento do MAM? Que caminho é que este museu deve seguir?
Acredito que o museu deve ser para toda a gente. Na semana passada inaugurámos uma exposição: quase todos os artistas são jovens. Mas, no quarto andar, temos um grande mestre de pintura chinesa. E temos também uma exposição sobre as mulheres, constituída a partir do nosso espólio. Como temos quatro pisos, gostava que as pessoas, quando entrassem aqui, pudessem encontrar o que querem ver, o que querem aprender. É esse o meu objectivo. Por outro lado, vamos aumentar os recursos humanos para que possam ser melhoradas as visitas guiadas. A ideia é fazer com que os visitantes tenham uma maior facilidade em saber o que ver e qual é o conceito original, para saber como ver as obras.

FOTO: Sofia Margarida Mota

Macau é um território pequeno e muito associado ao jogo – não à arte. Que imagem é que o MAM pode ajudar a projectar? É possível que o MAM possa fazer parte da imagem de Macau?
O MAM tem 18 anos. Este museu tem representado um papel importante na divulgação da cultura chinesa no território. Macau não é só uma cidade de casinos, tem uma história diferente e muito rica. Um museu serve, em primeiro lugar, como um sítio onde os visitantes podem ter uma sensibilização estética. Em segundo lugar, uma visita a um museu pode servir para aumentar os conhecimentos através dos quadros. Acredito que, aquando da criação dos quadros pelos artistas, existem intenções, ideias e sentimentos – isto é conhecimento. Se quisermos atingir estes dois objectivos, as nossas exposições e actividades têm de ser muito diversificadas. Macau tem as comunidades chinesa, portuguesa e de língua materna inglesa. Por isso, precisamos de diversificar os temas dos nossos trabalhos.

Nos últimos meses, temos ouvido falar muito da integração regional, com a Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau a ser estudada. Na perspectiva da futura grande área metropolitana, em termos artísticos vamos ter muita concorrência das cidades em redor. Como é que o MAM pode ser diferente? Que lugar é que pode ocupar neste contexto?
Antes de mais, gostava de dizer o seguinte: a comunidade chinesa de Macau é constituída por muitas pessoas com diferentes proveniências. Cada uma tem o seu background cultural, assim como eu tenho origem na Província de Guangdong. Quando se fala na Grande Baía, este conceito engloba as diferentes cidades da zona do Delta do Rio das Pérolas. A maioria tem a mesma raiz cultural. Qual é o papel que precisamos de ter neste contexto? O MAM tem uma história de 18 anos e a experiência de mostrar os diferentes grandes mestres ocidentais e orientais neste território. Em comparação com museus de cidades vizinhas, temos o nosso espaço para continuarmos a ter o privilégio de representar um papel que, em primeiro lugar, deve mostrar a cultura chinesa de Macau – através das relíquias e pinturas chinesas –, para transmitirmos a herança da cultura chinesa. Temos colaborado com o Museu de Orsay e o Victoria & Albert de Inglaterra, temos esta ligação. Acho que podemos continuar a ter um papel relevante na divulgação das culturas chinesa e ocidental. Também estou convencido de que, para o ano, o nosso papel na divulgação da arte e da cultura portuguesa vai ser maior do que no passado recente.

Há alguma novidade que possa adiantar em relação a essa presença portuguesa no MAM?
Neste momento, estamos em preparativos. Desde que assumi o cargo de director, fui a Itália, para ver a Bienal de Veneza, e depois fui a Portugal. Lá estive em alguns museus e nalgumas galerias, bem como em estúdios de artistas de Lisboa. Já temos algumas ideias para avançar com projectos. Neste momento estamos a trabalhar para isso.

Como é que olha para o desenvolvimento da arte em Macau? A cidade é pequena, não existe uma Faculdade de Belas-Artes.
O Instituto Politécnico de Macau tem, há já muito tempo, uma Escola Superior de Artes. Também tomei conhecimento de outra universidade que também tem o curso de Artes. Por isso, penso que, neste momento, Macau tem cada vez um espaço maior para a formação profissional e académica nesta área. Para mim, é um pouco difícil descrever o cenário das artes em Macau. Há muitas formas de arte. Quando falamos de artes plásticas, vemos que a arte contemporânea é mais viva do que a de outros grupos de artistas. Os artistas na vertente contemporânea são mais visíveis.

Isso significa que há um maior dinamismo nos artistas mais jovens?
Macau é diferente da China e do estrangeiro. Nem todos os artistas são profissionais. Mas alguns jovens em Macau, neste momento, já começaram a ter a sua imagem como artistas profissionais. Isto é uma mudança muito significativa ao longo da história da arte de Macau. Estudo a história do território há 20 anos e nota-se que isto está a acontecer. É um bom sinal na evolução da arte de Macau. Mas é difícil fazer uma avaliação global – há quem trabalhe em pintura chinesa, outros trabalham em arte contemporânea. Quando me refiro à arte contemporânea, falo apenas da arte ocidental. Na pintura chinesa, embora haja pessoas que estão a alterar o seu gosto estético e a criar novos estilos, geralmente os artistas gostam mais das técnicas tradicionais.

FOTO: Sofia Margarida Mota

Qual é o seu maior desejo para o MAM?
O meu maior desejo é que os nossos trabalhos – quer na parte administrativa, quer na componente académica – possam aumentar e chegar a um nível razoável em termos de museologia. Depois, queremos publicar mais materiais em termos de investigações e aumentar a velocidade da publicação dos catálogos de exposições. No futuro, gostava que o MAM fosse parte da vida dos nossos cidadãos.


Nas mãos do historiador

Natural de Zhongshan, província de Guangdong, Chan Kai Chon fez o ensino secundário em Macau, na escola Hou Kong. A arte não foi a primeira opção académica do director do MAM: quando chegou a altura de frequentar a universidade, foi para Jinan, onde estudou Economia. Com a licenciatura concluída, Portugal apareceu no seu percurso, com dois anos passados em Coimbra, onde frequentou o curso de Língua e Cultura Portuguesa. De regresso a Macau, começou a trabalhar na Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ). Mas, uma vez mais, surgiu a necessidade de estudar: em Nanjing fez o mestrado de Pintura Chinesa. Seguiu-se Pequim e a Academia Central de Belas-Artes, para estudar História de Arte. Trabalhou na DSEJ durante 20 anos, “sempre em áreas relacionadas com a educação artística”, nota. Chan Kai Chong tem várias obras publicadas no domínio da história de arte em Macau, na China Continental, em Hong Kong e em Singapura. Além disso, dedica-se ao desenho e à pintura.


Chagall para o ano

O Museu de Arte de Macau recebe, no próximo ano, uma exposição de obras do pintor Marc Chagall, adiantou ao HM o director da instituição. Para já, ainda não há detalhes sobre o que será mostrado no território da autoria do multifacetado artista, fortemente influenciado pelo fauvismo e pelo surrealismo. “Os nossos colegas do Instituto Cultural foram a Paris em Maio”, explicou Chan Kai Chon. “Estamos a trabalhar neste projecto.” Dos planos para 2018 do MAM faz ainda parte uma exposição de pinturas a óleo de artistas russos. Além disso, a colaboração que tem vindo a ser desenvolvida com o Museu do Palácio de Pequim deve conhecer novos desenvolvimentos, com mais um projecto.

18 Jul 2017

Plenários | Comissão de Regimento e Mandatos quer fim dos cartazes

É bem provável que, a partir de Outubro, seja impossível aos futuros deputados levarem cartazes para as bancadas durante as intervenções nos plenários. A Assembleia Legislativa está a preparar alterações às regras internas. Esta mudança está longe de ser consensual

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi a única alteração proposta que não foi aprovada por unanimidade, na votação interna da Comissão de Regimento e Mandatos. O grupo de deputados, liderado por Vong Hin Fai, está a terminar uma série de modificações ao funcionamento da Assembleia Legislativa, mudanças que terão de ser ainda apreciadas em plenário. Uma das novidades – a mais problemática – tem que ver com a exibição de cartazes, durante as sessões plenárias, nas bancadas reservadas aos deputados.

“O objectivo é assegurar a solenidade das reuniões e o prestígio do plenário”, vincou Vong Hi Fai. “Nos lugares dos deputados não se poderão utilizar cartazes e esse tipo de objectos de apoio. Não serão permitidos acessórios para transmitir mensagens políticas”, afirmou.

Esta sugestão da Comissão de Regimento e Mandatos “contou com a concordância da maioria dos membros da comissão”. O presidente admitiu que não houve unanimidade, mas recusou-se a dizer quantos foram os deputados que discordaram da ideia. “Não posso dizer. Foi mais do que um. Mas mais de metade concordou, só por isso é que se avançou com esta solução.”

O recurso a cartazes tem sido uma opção dos deputados da chamada ala pró-democrata, Au Kam San e Ng Kuok Cheong, mas não só. Entre outros, e apesar de o fazer com menos frequência, também José Pereira Coutinho usa este tipo de objectos na AL. Da Comissão de Regimento e Mandatos faz parte Au Kam San, pelo que não será arriscado dizer que se trata de uma voz contra esta proibição. Resta agora adivinhar que será o “mais do que um” a que Vong Hin Fai se referia: o grupo é também constituído por Kou Hoi In, Chui Sai Cheong, Leonel Alves, Au Kam San, Angela Leong e Gabriel Tong.

Ontem, em conferência de imprensa e perante a insistência dos jornalistas, Vong Hi Fai assegurou que esta nova limitação, se for aprovada, “não impede o uso da palavra”. “Respeitamos a liberdade individual dos deputados”, disse o deputado nomeado por Chui Sai On. O também advogado acrescentou, em resposta a uma questão colocada, que não será proibida a colocação de mensagens na roupa dos deputados que optem por esta via para se expressarem de forma diferente.

Votos com tempo

Em termos gerais, as alterações que se pretende fazer ao Regimento da AL e às resoluções conexas têm como grade objectivo “assegurar a participação dos deputados na fiscalização da acção governativa e elevar a eficiência” da Assembleia. No início deste ano, precisou Vong Hin Fai, foi enviada uma carta a todos os membros do órgão legislativo em que foram solicitadas opiniões sobre o funcionamento da estrutura. O documento que amanhã deverá estar pronto para ser levado a plenário resulta deste trabalho interno de auscultação.

Uma das novidades tem que ver com a emissão de votos, que podem ser de congratulação, pesar, saudação, louvor ou censura. Além de uma alteração à redacção, passará a haver uma antecedência mínima de 24 horas para a apresentação do texto relativo à proposta de emissão de votos.

“Neste momento, não existe uma antecedência mínima. Isto serve para assegurar que o texto da proposta é traduzido e distribuído aos deputados. Em termos procedimentais, há necessidade de fazer esta alteração”, defendeu Vong Hi Fai. Recorde-se que, em Janeiro deste ano, um voto de pesar pela morte do antigo Presidente da República Portuguesa Mário Soares, apresentado por Pereira Coutinho, teve um desfecho inesperado, ao receber vários votos contra, apesar de ter sido aprovado. Alguns deputados justificaram o sentido de voto com o desconhecimento do teor da proposta do colega.

Também as reuniões urgentes do plenário vão ter novas regras para serem convocadas: as actuais 48 horas vão ser reduzidas para 24. A norma para o conhecimento prévio dos textos vai ser adaptada para este tipo de reuniões: o prazo é actualmente de cinco dias, mas passa a não se observado nestes casos.

Deverão ser aprovadas novidades para o processo de urgência. “A nossa sugestão é que, tendo em conta a solenidade do processo legislativo, deve depender de mais de metade do número total de deputados”, disse Vong Hin Fai.

Tempo e aos grupos

De resto, os proponentes de projectos de lei poderão fazer marcha-atrás e desistir dos seus diplomas até ao início da fase de discussão na especialidade em plenário. “A norma não era clara”, esclareceu o presidente da Comissão de Regimento e Mandatos.

Nestas mexidas às regras internas da AL, aproveita-se ainda para acabar com a “certa discrepância” entre as versões chinesa e portuguesa do artigo que dispõe sobre a admissibilidade de um projecto de lei.

Para as propostas de debate levadas por deputados ao plenário, está neste momento fixado um período de 30 minutos, que vai ser eliminado. “Os deputados podem manifestar-se se concordam ou não com o debate. Por não haver esta restrição de tempo, eliminamos o período reservado às declarações de voto.”

Existe ainda a intenção de optimizar o processo de interpelação oral. “As interpelações semelhantes devem ser agrupadas para efeitos de procedimento”, defendeu Vong Hin Fai. As regras em vigor ditam que se deve seguir a ordem de apresentação dos requerimentos. “Quando disserem respeito à mesma área de governação, para tornar o trabalho mais eficaz, sugerimos que se agrupem essas interpelações, mesmo que sejam de assuntos diferentes, mas desde que digam respeito à mesma tutela”, explicou.

A Comissão de Regimento e Mandatos pretende fazer aprovar estas alterações ainda durante a corrente legislatura, ou seja, antes de 15 de Agosto. As novas regras só serão, contudo, aplicadas depois das eleições de Setembro.

 

“É mau para o segundo sistema”

José Pereira Coutinho arrasa por completo a intenção ontem manifestada por Vong Hin Fai, na qualidade de presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, em relação à proibição de cartazes e de outros objectos pelos deputados nas suas bancadas, durante os plenários. “É muito mau”, reagiu Coutinho ao HM. “É muito mau para Macau, é muito mau para o segundo sistema. É o resultado do consumar de actos conduzidos por um pequeno grupinho muito influente dentro da Assembleia Legislativa, que está a limitar a liberdade de expressão, o que é muito grave por parte dos deputados”, atira o tribuno. Pereira Coutinho teme as consequências deste tipo de interdições. “A acontecer assim, estamos a caminhar para um sistema em que dificilmente os cidadãos de Macau poderão, de facto, confiar nos deputados”, alerta. “Espero que seja um erro de interpretação ou um acaso que possa ser resolvido da melhor forma, porque é muito grave proibir que os deputados, dentro da sua própria bancada, se possam exprimir por qualquer forma que seja”, rematou.

18 Jul 2017

Animais | Galgos do Canídromo podem ser adoptados fora de Macau

A Anima lançou campanha mundial para salvamento dos galgos do Canídromo e pede para ficar um ano na infra-estrutura para poder transferir os animais. A associação só aceita enviar os galgos para países onde estes estejam protegidos legalmente

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Canídromo de Macau está quase a fechar as portas. Para antecipar o encerramento, há muito aguardado pela Anima, a associação pediu ao Governo para ocupar o espaço durante um ano a fim de poder enviar os galgos para adopção. Albano Martins explica que esta questão ganhou contornos internacionais, uma vez que se juntaram ao apelo associações de Itália e Estados Unidos, França, etc.

“Temos de ser práticos, não temos mais espaço para animais. Se não temos, como podemos salvá-los?”, interroga-se o presidente da Anima, que vai mais longe e confessa que sozinhos não conseguem. Albano Martins realçou que não se pode deixar morrer os galgos, não só por uma questão moral mas também para se projectar uma boa imagem de Macau. “Não podemos receber mais animais, mas também não podemos fechar o nosso coração”, explica.

Para tal, a Anima precisa encontrar quem adopte os 650 cães do Canídromo de Macau. Antes do início da campanha “Rescue the Greyhounds”, já haviam sido encontrados 250 candidatos para receber galgos.

Quanto ao destino dos cães, Albano Martins adianta que associações francesas prestam-se a receber uma centena, de Itália recebeu 60 possíveis donos, assim como do Reino Unido. Aliás, o país para onde os galgos serão enviados têm de preencher uma condição essencial: ter leis de protecção animal. Ou seja, não serão remetidos cães para a China, Vietname, Paquistão ou Indonésia.

Anima em números

Um dos empecilhos para o salvamento dos galgos é a questão da propriedade dos animais. Angela Leong, directora-executiva da empresa que detém os direitos de exploração do Canídromo, justificou a não entrega dos galgos à Anima com o facto de muitos animais serem propriedade de privados. Albano Martins discorda desta posição, lembrando que o Canídromo é dono de 120 cães e que estes podiam ser entregues imediatamente. Por outro lado, na eventualidade dos donos não quererem os galgos, o Canídromo fica com eles.

O assunto foi debatido quando da apresentação do relatório anual de 2016 da associação. Desde a fundação da Anima, em final de 2003, até ao fim do ano passado, foram resgatados 3424 animais. No final de 2016, o número de cães supervisionados pela Anima era 961, dos quais 392 se encontravam em abrigo. Os gatos totalizaram 2092, sendo que 192 se encontram em instalações da associação. Até agora, este ano foram resgatados 476 animais.

No ano passado foram adoptados 216 animais, mais 32 do que em 2015. No entanto, também o número de resgatados subiu em 2016, de 397 para 476, facto que contribuiu para a sobrelotação dos abrigos da Anima.

Noutra acepção, a Anima fechou o ano de 2016 com um prejuízo de 1,13 milhão de patacas, uma dívida “que torna mais complicado o ano de 2017”, mas Albano Martins está esperançado na capacidade da associação para angariar fundos. O presidente da associação sublinha neste ponto que até agora a Anima pagou todas as dívidas que contraiu.

18 Jul 2017

Uber | Empresa de transporte termina operações temporariamente

A Uber anunciou ontem a sua saída do mercado para pensar “num novo modelo de negócio”. Andrew Scott lembra que a Uber não teve a melhor estratégia quando chegou a Macau. Tong Ka Io exige ao Governo uma modernização do sistema, que permita novos meios de transporte

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]empre foi ilegal, já esteve para sair do mercado uma vez, mas não saiu. Agora é a sério, mas não para sempre. Este tem sido o percurso da Uber desde que começou a operar em Macau, sempre de forma irregular.

Ontem, a empresa de transporte que funciona através de uma aplicação de telemóvel anunciou a saída temporária do mercado para pensar em novas maneiras de operar.

“Ao fazermos uma pausa, esperamos poder abrir portas a um diálogo construtivo com todos os accionistas em Macau e termos a capacidade de criar um ambiente de negócio que traga benefícios para todos”, aponta um comunicado da empresa.

“Estamos a explorar novas formas de servir a cidade novamente, e temos tido alguns contactos com parceiros de negócios, incluindo operadores de transportes e hotéis”, escreve ainda a Uber.

Para a empresa, “a decisão de parar não foi fácil, e foi feita tendo em conta os melhores interesses para Macau”. O HM tentou saber junto da empresa quantas multas foram aplicadas aos condutores da Uber neste período de operações, mas a empresa recusou prestar mais informações além das que foram divulgadas no comunicado.

Macau não é um mercado significativo para a empresa norte-americana, mas o território engrossa a lista de países onde os serviços da Uber se depararam com problemas de regulamentação, como a Coreia do Sul e o Japão. Também em Hong Kong os motoristas continuam a enfrentar uma batalha legal. Em Taiwan, a Uber suspendeu os serviços durante dois meses, mas retomou a actividade em Abril, depois de negociações com as autoridades.

Um início complicado

Andrew Scott, presidente da Associação de Passageiros de Táxi de Macau, lembra que a estratégia inicial da Uber de entrada no mercado local não foi a mais correcta. “É triste esta notícia e reconheço o facto de a Uber saber que tem espaço de melhoria em termos de regularização das suas operações em Macau”, apontou ao HM.

Contudo, Andrew Scott lamenta que a empresa “tenha chegado a Macau com a mesma postura e confrontação com que chegam a todos os mercados”.

“Macau nunca reagiu bem a empresas vindas do estrangeiro que pretendem dizer o que deve ser feito. É uma vergonha porque o conceito de ter acesso a um meio de transporte através de uma aplicação de telemóvel é uma tendência de futuro, e não tenho dúvidas de que veremos isso em Macau, de uma forma ou de outra”, acrescentou.

Modernização precisa-se

Quando a Uber anunciou, no ano passado, que ia sair do mercado, a associação Iniciativa de Desenvolvimento Comunitário organizou um protesto de apoio que juntou cerca de 300 pessoas nas ruas.

Hoje, Tong Ka Io, o seu presidente, diz que mantém a sua posição e pede que as operações da Uber sejam integradas na nova lei dos táxis, que o Executivo continua a preparar.

“O Governo deveria rever a lei para introduzir novos meios de transportes em Macau. A preocupação não reside apenas numa só empresa, mas pedimos novos meios de transporte. Lamentamos a decisão da saída da Uber do mercado. São necessárias novas regulações que facilitem a entrada de novos serviços de transporte no mercado”, defende.

“Gostaríamos de ver implementados novos tipos de meios de transporte público, para que Macau tenha uma melhoria no sistema de transportes. O serviço de táxis continua a não ser satisfatório e há muitos problemas”, referiu o responsável.

Tong Ka Io considera que o sistema de transportes em Macau continua o mesmo de há décadas, sem que o Executivo mostre sinais de uma mudança profunda.

“A sociedade mudou, mas o nosso Governo continua a ter o mesmo sistema de há décadas, e continua a querer manter as mesmas formas de funcionamento do sistema. Se a empresa quiser implementar um novo modelo, decerto não se incluirá no sistema tradicional que actualmente existe e na lei em vigor”, concluiu.


DSAT diz que é necessário operar de acordo com a lei

Lam Hin Sang, director dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, disse ontem à margem da conferência de actualização das tarifas dos táxis que todos os serviços de transporte semelhantes à Uber têm de respeitar a lei em vigor. “Este serviço online tem de ser regularizado. Por exemplo, o serviço de rádio táxis funciona através de uma aplicação de telemóvel. Desde que satisfaça os regulamentos em vigor, achamos bem [que existam]. Todos os serviços que não se encontrem numa situação regularizada iremos seguir a lei”, apontou.

18 Jul 2017

Análise | Aumento das tarifas dos táxis gera discórdia em vários sectores

A anunciada actualização dos preços das viagens de táxis promete agitar a sociedade. A DSAT tentou chegar a um equilíbrio que fosse razoável tanto para a classe profissional, como para os utentes. Perspectivam-se manifestações no horizonte numa decisão que não agrada nem a taxistas, nem a cidadãos

[dropcap style≠’circle’]“P[/dropcap]ara a actualização das tarifas consideramos o índice de preços no consumidor, a inflação e os preços da gasolina para veículos ligeiros, tentámos equilibrar para todos”, explica Lam Hin San, director da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT). O dirigente do Executivo para os assuntos do trânsito apresentou os novos preços que entram em vigor à meia-noite do próximo domingo, dia 23.

Segundo as estimativas apresentadas pelo homem forte da DSAT, o aumento das tarifas será de cerca de 10 patacas por percurso, “um valor razoável”, de acordo com Lam Hin San.

A solução encontrada pelos serviços promete gerar controvérsia tanto entre utentes como taxistas. “Eles precisam de ter um rendimento razoável e a população quer ter um bom serviço”, explica o director da DSAT. Lam Hin San acrescenta ainda que “é difícil satisfazer todas as pessoas” e que os valores resultam de um ponto de equilíbrio.

No entanto, esta solução parece não agradar a gregos, nem a troianos. A Associação Poder do Povo planeia já uma manifestação para a próxima semana para protestar a actualização das tarifas. Cheong Weng Fat, vice-presidente da associação considera que “as tarifas só deveriam ser aumentadas após a melhoria dos serviços”. O dirigente associativo explicou ao HM que em Shenzhen e Zhuhai as tarifas dos táxis não são actualizadas há uma década, período durante o qual Macau já teve três aumentos. Fenómeno que não se verifica em Hong Kong, o preço da bandeirada subiu recentemente.

Andrew Scott, presidente da Associação de Passageiros de Táxi acha que este aumento é “mais do mesmo”. O dirigente associativo entende que as “as tarifas deviam ser aumentadas substancialmente, mas apenas com a melhoria dos serviços prestados”

Após meses de negociações, a proposta final foi discutida no Conselho Consultivo do Trânsito e as associações que representam os taxistas lá tiveram de aceitar o que o Governo ofereceu.

Do outro lado do campo, Tony Kuok, presidente da Associação de Mútuo Auxílio dos Condutores de Táxi, é da opinião de que a proposta final “é um bocado diferente daquela que os taxistas esperavam”. O representante dos taxistas enalteceu a rapidez com que o Governo resolveu esta matéria, demorando apenas cinco meses. Em situações passadas, a proposta final chega numa altura em que a inflação já anulou os efeitos de um aumento de tarifa. Nesse sentido, Tony Kuok mostrou-se compreensivo, comentando que o Executivo não pode acatar todas as propostas da classe. Nesse sentido, o dirigente acha que os taxistas tiveram de aceitar este aumento, porque se não o fizessem “a negociação poderia demorar mais um ano”, ou seja, foi um mal menor.

Causa e efeito

Até se chegar ao valor de 17 patacas para os primeiros 1600 metros, foram rejeitadas propostas de dois sectores. Uma que pretendia 20 patacas na mesma distância e outra que pedia o mesmo valor para os primeiros 1500 metros de corrida. O equivalente respectivo de 17,65 e 25,49 por cento de aumento. Com a actualização feita, o crescimento da tarifa é de 11,76 por cento.

Outro distinção é ao nível da forma como o taxímetro aumenta. As associações do sector pediam um acrescento de duas patacas a cada 220 metros, em contraposição aos anteriores 260 metros. A DSAT ficou-se pela metade, ou seja, o salto de duas patacas verificar-se-á a cada 240 metros.

Quanto a taxas adicionais, a tomada de táxis no Terminal Marítimo de Passageiros da Taipa e no campus da Universidade de Macau vão custar mais cinco patacas. Nesse sentido, foram rejeitadas as propostas das associações do sector que propunham taxas adicionais durante o Ano Novo Chinês e nos feriados obrigatórios. Outras reivindicações que ficaram pelo caminho foram a taxa adicional de bagagem de três patacas no percurso da Taipa para Coloane, a taxa de cinco patacas de Macau para Coloane e de início de viagem no aeroporto.

Lam Hin San reconhece que existe na sociedade um desagrado grande com os serviços prestados pelos taxistas, nomeadamente no que toca às tarifas abusivas, à recusa de passageiros e às viagens com voltas intermináveis. O director da DSAT não tem dúvidas de que um factor a ser revisto é o valor da multa de 1000 patacas, por não ter efeito dissuasor.

No plano regulamentar, o director da DSAT acredita que o regulamento de táxis será aprovado na próxima legislatura da Assembleia Legislativa.

18 Jul 2017

Liu Xiaobo | Corpo cremado e cinzas atiradas ao mar

Os admiradores de Liu Xiaobo não terão um local onde lhe prestar homenagem. As suas cinzas foram atiradas ao mar. A família agradeceu ao Governo pela sua “humanidade”. Ai Weiwei considerou a cerimónia “repugnante” e “uma violação do respeito devido aos mortos”.

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] corpo Liu Xiaobo foi cremado numa “cerimónia simples”, em que compareceram família e amigos, e as cinzas atiradas ao mar neste sábado, horas depois da cremação. Foi o seu irmão mais velho, Liu Xiaoguang, que fez este anúncio durante uma conferência de imprensa organizada pelas autoridades, que controlaram de perto o funeral.

Liu Xiaobo foi cremado “conforme a vontade dos membros de sua família”, anunciaram as autoridades. O governo chinês divulgou fotos mostrando a viúva, a poetisa Liu Xia, ao lado de seu irmão e do irmão de Liu Xiaobo, rodeados de amigos, diante de corpo do dissidente cercado de flores brancas.

A dispersão das cinzas do Nobel da Paz implica que ele não terá sepultura onde parentes, amigos e admiradores possam prestar homenagem. “As autoridades temem que se alguém tão emblemático como Liu Xiaobo tiver um túmulo, transformar-se-á em local de peregrinação para os seus simpatizantes”, declarou à AFP Ye Du, dissidente ligado à família.

O artista e dissidente chinês Ai Weiwei, que vive em Berlim, tuitou uma foto do funeral, definindo a cerimónia como “repugnante” e “uma violação do respeito devido aos mortos”.

Mas Liu Xiaoguang defendeu esta opção, defendeu o sistema socialista e agradeceu às autoridades pela sua humanidade e colaboração. “Tudo reflecte a vantagem do sistema socialista” e que “os principais especialistas do país e do exterior se reuniram para o tratamento de Liu Xiaobo”, disse Liu. “Em nome dos outros membros da família Liu Xia e Liu Xiaobo, gostaria de agradecer cada vez mais o cuidado humanista do Partido e do governo”, concluiu Liu Xiaoguang.

Não é possível verificar a sinceridade destas palavras, pois as autoridades têm exercido desde o início do drama um severo controlo das informações vinculadas a Liu e pessoas próximas. A imprensa não pôde fazer perguntas ao irmão do dissidente ao final da declaração.

O professor Markus M. Buachler, da Universidade alemã de Heidelberg, e o professor Joseph M. Herman do US MD Anderson Cancer Center, foram convidados para assistir ao tratamento. Liu Yunpeng, médico assistente de Liu Xiaobo, disse que o hospital fez todo o possível para tratar o paciente, incluindo 25 consultas conjuntas do hospital, cinco consultas conjuntas envolvendo especialistas chineses e uma que envolveu especialistas internacionais.

Liu Xiaobo morreu aos 61 anos, depois de ter passado mais de oito na prisão, condenado por subversão pelo seu trabalho como ativista pelos direitos humanos e por reformas na República Popular da China. Foi o primeiro Prémio Nobel a morrer privado de liberdade desde o pacifista alemão Carl von Ossietzky, que morreu em 1938 num hospital quando estava detido pelos nazis.

Após a sua morte, os olhares voltam-se para a sua esposa, Liu Xia, em prisão domiciliar desde 2010. A ex-poetisa e fotógrafa foi autorizada a visitar seu marido no hospital antes de seu falecimento, mas seus contactos com o mundo exterior são muito restritos. “Até onde sei, Liu Xia é livre”, afirmou Zhang Qingyang, dirigente da municipalidade de Shenyang, sem dar mais detalhes. Essa declaração foi questionada por pessoas próximas, que continuam sem ter contacto com Liu Xia.

Em Hong Kong, milhares de pessoas fizeram uma manifestação com velas na mão para prestar homenagem a Liu.

Desde a chegada ao poder do presidente Xi Jinping, no final de 2012, a repressão política na China aumentou. Além de reprimir defensores dos direitos Humanos, o governo também perseguiu seus advogados, prendendo dezenas de juristas e militantes.

 

Pequim considera entrega do Nobel a Liu uma blasfémia

Um jornal do Partido Comunista Chinês (PCC) disse que Liu Xiaobo era um peão do Ocidente, cujo legado desaparecerá em breve. Em editorial, o Global Times, jornal em inglês do grupo do Diário do Povo, o órgão central do PCC, afirmou que Liu teve uma “vida trágica”, porque tentou confrontar a sociedade chinesa com apoio de fora. O Global Times considerou que os últimos dias de Liu foram “politizados por forças estrangeiras”, que usaram a doença de Liu para “promoverem a sua imagem e demonizarem a China”.

A questão dos direitos humanos é uma fonte de persistente tensão entre o Governo chinês e os país europeus e Estados Unidos, que tendem a enfatizar a importância das liberdades políticas individuais. Para as autoridades chinesas, “o direito ao desenvolvimento é o mais importante dos direitos humanos” e o “papel dirigente” do Partido Comunista, no poder desde 1949, é “um principio cardial”.

“Na história da China, nenhum dos heróis foi delegado pelo Ocidente. A posição e valor de alguém na História será decidida pelos seus esforços e persistência para o desenvolvimento do país”, concluiu o jornal.

Por seu lado, o porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, Geng Shuang afirmou que a atribuição do Nobel da Paz em 2010 a Liu Xiaobo, foi uma blasfémia. “Atribuir a distinção a tal pessoa contraria o propósito deste prémio. O Nobel da Paz foi blasfemado”, acusou em conferência de imprensa.

Vários países criticaram Pequim pela morte do dissidente, depois de se terem oferecido para dar tratamento médico a Liu. Geng revelou que Pequim protestou junto dos Estados Unidos e do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU, pelos “comentários irresponsáveis” sobre a morte do dissidente.

Por isso, a China disse também que enviou protestos diplomáticos a vários países, entre os quais os Estados Unidos, por “comentários irresponsáveis” sobre o caso de Liu Xiaobo. “Apresentámos protestos a alguns países para mostrar o nosso descontentamento”, afirmou Geng Shuang.

Geng detalhou que entre os destinatários dos protestos constam os EUA e o alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad al Hussein. França e Alemanha também figuram da lista.

O porta-voz chinês condenou os países que criticaram a forma como a China lidou com Liu, considerando que as críticas “têm fins ulteriores” e “não têm base nenhuma”, constituído uma “interferência” nos assuntos internos do país.

Entretanto, Taiwan também não ficou sem uma resposta directa. Um porta-voz de Pequim disse que “os ataques arbitrários repetidos do Partido Progressista Democrático (PPD) de Taiwan e de sua líder contra a parte continental são comportamentos perigosos”, refere a Xinhua.

“As autoridades de Taiwan e o PPD fizeram comentários imprudentes sobre o sistema político da parte continental depois da morte de Liu Xiaobo causada por um cancro”, disse Ma Xiaoguang, porta-voz do Departamento dos Assuntos de Taiwan do Conselho de Estado.

Ma referiu ainda que Liu foi condenado por violar a lei chinesa. Após o diagnóstico de cancro no fígado, os departamentos e instituições médicas da China fizeram todos os esforços para tratar Liu humanamente conforme a lei, insistiu.

Ma disse que o PPD e a sua líder deixaram cair o véu de “manter a actual situação”, atacaram repetidamente a parte continental e agravaram os conflitos através do Estreito, tentando recuar nas relações, provocando para tensão e turbulência.

“Este tipo de comportamento é muito perigoso”, explicou Ma. “Manipulação política, mudança do enfoque e enganar as pessoas não terão sucesso”, concluiu Ma.

17 Jul 2017

Tabaco | Alterações à lei aprovadas na especialidade. Salas de fumo continuam

O diploma inicial previa o fim do fumo nos casinos, mas a oposição das operadoras obrigou o Governo a recuar. Alguns deputados torceram o nariz às salas de fumo nos casinos, que vão ter de obedecer a novas regras, mas de nada lhes adiantou. A nova lei entra em vigor no início do próximo ano

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Assembleia Legislativa (AL) aprovou as alterações à lei de prevenção e controlo do tabagismo, com o Governo a recuar na intenção inicial da proibição total do fumo nos casinos. As modificações ao diploma, debatido agora na especialidade, foram todas aprovadas.

A lei prevê a proibição de fumar em todos os recintos fechados à excepção dos casinos, onde serão criadas salas para fumadores. “A sala é uma boa medida e os requisitos que vamos exigir [para a sua construção] são muito rigorosos. Vamos exigir ventilação permanente e uma maior área entre salas de fumadores e zona de jogo”, disse o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, sublinhando que o Governo está a cumprir o estabelecido na convenção-quadro para o controlo do tabaco da Organização Mundial de Saúde (OMS).

A cada três anos, o Governo vai avaliar e efectuar um relatório sobre os trabalhos de controlo do tabagismo, indicou. “Só há duas excepções para as salas de fumadores: aeroportos e casinos. Em todos os outros locais é proibido”, garantiu.

O secretário explicou aos deputados que as seis operadoras de jogo concordaram com “a necessidade de criar salas para fumadores com requisitos muito rigorosos”.

A lei vai entrar em vigor em Janeiro do próximo ano, mas 29 dos 44 casinos existentes já pediram as normas para a construção das salas de fumadores. “Os casinos podem criar as salas antes da data [de entrada em vigor da lei] e as seis operadoras concordaram com esta proposta de lei”, afirmou o secretário.

A deputada Ella Lei – que, durante o processo de análise na especialidade, se mostrou descontente com as cedências do Executivo ao sector do jogo – afirmou que “não apoia, nem concorda com a decisão do Governo”.

“Os casinos são os únicos recintos fechados que permitem fumadores, em violação da convenção-quadro da OMS e em prejuízo dos trabalhadores. Só a proibição total do fumo em recintos fechados protege a saúde das pessoas. As salas de fumo são tóxicas. A obrigação do empregador e do Governo é proteger a saúde dos funcionários”, disse.

O deputado Chan Iek Lap defendeu uma compensação pecuniária para os trabalhadores dos casinos obrigados a conviver com o fumo.

A proposta inicial de revisão da lei do tabaco apresentada pelo Governo proibia totalmente o fumo em casinos, universidades e paragens de autocarros, e impedia a exibição de maços para venda.

O regime de prevenção e controlo do tabagismo foi aprovado pela AL em 2011, passando a ser proibido fumar na maior parte dos recintos fechados.

Prédios antigos em debate

Os deputados aprovaram ainda a realização de um debate sobre a degradação dos prédios com mais de 30 anos e a necessidade de legislação sobre vistorias regulares, apresentado pelo parlamentar eleito por via directa Mak Soi Kun. O debate vai realizar-se ainda de 15 de Agosto, data em que termina a legislatura.

A AL rejeitou um recurso interposto pelo deputado José Pereira Coutinho relativo à proteção da reserva natural de Coloane, por considerar ser necessária a autorização prévia de Chui Sai On. O presidente da AL, Ho Iat Seng, afirmou tratar-se de um projecto de lei que vai afectar a política de terras do Governo, sendo por isso necessária a autorização prévia do Chefe do Executivo.

Os deputados rejeitaram ainda um outro projecto de Pereira Coutinho para promoção, sensibilização e divulgação dos tratados de Direitos Humanos e Convenções da Organização Internacional do Trabalho.

17 Jul 2017