IPM | Lançado primeiro concurso internacional de tradução

 

O primeiro concurso mundial de tradução de português-chinês vai acontecer pela mão do Instituto Politécnico de Macau. A ideia é motivar alunos de todo o mundo para a aprendizagem do par linguístico e chamar a atenção para a importância de Macau como plataforma bilingue

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Instituto Politécnico de Macau (IPM) vai promover o primeiro concurso mundial de tradução português-chinês. A iniciativa, que conta com o apoio do Gabinete para o Ensino Superior de Macau (GAES), pretende usar o território enquanto plataforma para preconizar uma das características de Macau – a coexistência e entendimento entre duas línguas.

“O tema da tradução é uma constante desde a chegada dos portugueses ao território e actualmente assume especial importância não só no que respeita à Administração e à área jurídica, como também para um melhor entendimento do quotidiano da cidade”, explicou ontem Lei Heong Iok, presidente do IPM, na conferência de imprensa de apresentação do concurso.

Já para Sou Chio Fai, coordenador do GAES, a iniciativa tem como principal função a atracção de estudantes interessados no par linguístico em causa e chamar a atenção para o território. O dirigente alerta ainda para a constante necessidade de tradutores, sendo que “é preciso formar mais quadros bilingues não só na área da tradução, mas com experiência em algum tipo e especialização. Por exemplo, pessoas com experiência na área empresarial, financeira, em engenharia ou em arquitectura”, referiu ao HM, à margem da conferência.

São todos bem-vindos

O concurso é dirigido às instituições de todo o mundo que façam parte da Associação de Megadados Linguísticos (LBDA, na sigla inglesa), às instituições de ensino superior de Macau e de Portugal, e àquelas que integrem cursos de tradução ou de áreas afins.

A distinção dos vencedores tem uma recompensa que se espera apetecível. O primeiro prémio leva para casa 100 mil patacas, o segundo 80 mil e o terceiro 50 mil. Foi ainda criado um prémio especial para as equipas das instituições de Macau em que o primeiro classificado tem direito a 50 mil patacas e o segundo a metade do valor.

Para participar, os alunos interessados deverão constituir uma equipa que poderá ter dois ou três estudantes e devem ter um orientador da sua escola. O professor que irá orientar os trabalhos premiados tem também direito a um prémio.

As inscrições podem ser feitas até 31 de Janeiro no site do IPM, sendo que vão ser dados três meses para a concretização dos trabalhos de tradução. Os vencedores são conhecidos no próximo mês de Agosto.

29 Nov 2016

Festival | This is My City 2016 arranca na sexta-feira com Balla e Rui Reininho

Música, ideias, imagens. O This is My City chegou bem de saúde à edição número 10, mas quem o organiza pensa em mudanças para o futuro. Até lá, vive-se Macau

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]asceu de forma espontânea, entre duas lojas, no coração da cidade chinesa, para além da muralha. Manuel Correia da Silva e Clara Brito, ambos designers, tinham um espaço no Beco da Melancia; o fotógrafo António Falcão era o proprietário da livraria Bloom, no Largo do Pagode do Bazar. A Macau dos festivais era sobretudo institucional, com os cartazes do costume. Fazia falta outro tipo de cultura – a dos livros, a de uma certa música, a das ideias, a dos conceitos.

A vontade de um punhado de gente resultou num acontecimento que, logo nos primeiros anos, contou com a adesão de muito público. O interesse de quem se juntava aos finais de tarde e noites no bazar levou a uma maior organização: o This is My City (TIMC) foi crescendo, chamando gente de fora, e assim passaram dez anos, ocupando diferentes espaços, sempre na cidade.

A edição que assinala a década prolonga-se ao longo de duas semanas e arranca com música, que chega de Portugal. É talvez o ponto mais forte do programa, aquele que mais público será capaz de captar: a organização traz à cidade o projecto Balla, “num formato inédito”, com um convidado especial: Rui Reininho, a voz dos GNR. “Tem algumas figuras que fazem também parte desta cidade”, destaca Manuel Correia da Silva, responsável pelo evento.

A abrir o concerto da próxima sexta-feira, dia 2 de Dezembro, vai estar o trio de Macau “Turtle Giant”, constituído por Beto, Frederico Ritchie e António Conceição. O palco escolhido para o início desta edição é um regresso ao início de tudo: o TIMC volta ao Largo do Pagode do Bazar.

“O This is My City tem sempre tentado ocupar o espaço da cidade: o que acontece não é dentro de paredes. Mesmo aqueles que não pensam em participar passam por nós, e podem usufruir e experienciar daquilo que oferecemos”, aponta Correia da Silva. O concerto no bazar começa às 18h30.

Ainda na sexta-feira, mas já no Kampek, outro tipo de música: DJ Balla e Rui Reininho, promete a organização, vão proporcionar aos que se juntarem à festa “uma noite para não esquecer”. O japonês DJ Shintaro também vai actuar.

Imagens e ideias

A 6 de Dezembro, o TIMC aproveita a passagem por Macau do projecto “No Trilho dos Naturalistas”, um documentário constituído por quatro episódios coordenador por António Gouveia. Na Casa Garden vai ser mostrada uma parte deste projecto: “Angola 58’” é realizado por André Godinho. O projecto conta com a participação de Alexandra Cook, uma professora de Filosofia da Universidade de Hong Kong com um forte interesse em estudos ambientais.

Três dias depois, a 9 de Dezembro, o regresso do PechaKucha: um formato de intervenção pública que junta a projecção de imagens às ideias deixadas por vários oradores, num tempo fixo que permite um maior dinamismo. O TIMC trouxe este tipo de palestras a Macau pela primeira vez em 2010. O Albergue SCM recebe de novo a edição de 2016, a partir das 18 horas.

À mesma hora, no mesmo espaço, são projectadas várias curtas-metragens do realizador Maxim Bessmertny.

À semelhança do que já tinha acontecido no ano passado, também em 2016 o This is My City organiza um Instameet. O tema é a cidade – o evento do TIMC vai ter uma página própria. O encontro acontece no dia 10, entre as 12h e as 18h, no Macau Design Center.

Pensar ao lado

De regresso à Casa Garden, no dia 13 de Dezembro, para uma exposição e uma palestra sobre um projecto de pesquisa acerca de uma cidade que nos é próxima: Shenzhen. “Unidentified Acts of Design”, de Luisa Mengoni e Ole Bouman, explora a ideia do design que surge fora das quatro paredes de um estúdio.

Os autores vão estar presentes para uma discussão sobre “actos de design fora do formato”. Manuel Correia da Silva desdobra o conceito: nesta sessão, vai debater-se “aquilo que se tem passado em Shenzhen com o impacto da tecnologia”. “O tecido industrial de Shenzhen absorveu muito do topo da tecnologia. Há franjas que se estão a construir em torno dessa tecnologia, com criativos de todo o mundo que vão para lá para criarem os seus produtos e as suas start-ups, com todo o impacto que tem tido naquela cidade”, refere.

Esta palestra vai ao encontro de um dos objectivos do TIMC – pensar Macau no contexto dos vizinhos. “Acho que é importante. Macau tem de ser uma cidade mais para fora. Temos de começar no Delta e achamos que Shenzhen deverá ser o primeiro passo, a conhecer e a ligar, para que possamos estar mais actualizados, regionalizados e internacionalizados”, defende Correia da Silva.

O fim de um ciclo

Dez anos depois dos encontros espontâneos no bazar, Manuel Correia da Silva faz um balanço “muito positivo” do evento. “São dez anos na cidade pós-99, que tem 17. Fazemos parte desta nova cidade. Não somos muito mais novos do que ela”, nota.

“Fomos capazes de fazer algo que, de espontâneo, se tornou parte de um espaço que fomos capazes de ocupar, com um festival que tem um formato diferente, que se propôs apresentar um conteúdo diferente”, continua o designer e responsável por um evento que nunca quis ser mainstream.

“Não queríamos esse papel, já está ocupado e não é o nosso. Mas em Macau, não se sendo mainstream, às vezes é muito difícil sobreviver. Fomos capazes de o fazer, estamos cá, fazemos um óptimo saldo, mas sentimos que se fecha um ciclo”, continua o presidente da +853, a associação que organiza o festival.

Numa década, assinala Correia da Silva, “a cidade mudou muito e, por isso, não faz sentido manter o festival como ele é hoje em dia”. O público não sentirá a necessidade de reflexão que os organizadores entendem ser necessária. “Não sabendo exactamente o que vai acontecer no futuro, há algo que é certo: as coisas não vão continuar a ser como foram, achamos que temos de revitalizar-nos, adaptar-nos e, por isso, estamos a trabalhar com essa ideia, pelo que queremos que esta edição sirva para marcar esse ponto”.

28 Nov 2016

Njo Kong Kie, director musical: “Estamos a sair das fronteiras da arte”

 

“Um Piquenique no Cemitério” é o nome da peça que vai estar no Centro Cultural de Macau a 2 e 3 de Dezembro. O espectáculo conta com a direcção musical de Njo Kong Kie que, apesar de radicado em Toronto, aproveita as vindas a Macau para trabalhar em projectos locais. O compositor falou ao HM do espectáculo, dos desafios que enfrentou e do mundo da arte alternativa local

 

O que é que vamos ver neste “Um Piquenique no Cemitério”?

A peça é, na sua essência, um concerto. Por isso vamos ouvir música. Numa outra camada do espectáculo temos diferentes elementos que incluem vídeos e interpretação dramática e, por último, é uma peça em que tivemos o cuidado de incluir o público.

Contracenam com a audiência?

Quando começámos esta peça, há três anos no LMA, enquanto parte do Festival de Artes de Macau, tivemos o cuidado de desenhar um espaço em que o público e os artistas partilhassem a mesma área, o que possibilita a interacção e a integração de novos elementos. Agora, estamos a transferir a ideia para o pequeno auditório do Centro Cultural de Macau (CCM) em que a sala, dadas as suas características, implica uma certa separação dos espectadores mas, ainda assim, queremos manter o espírito de partilha do espectáculo entre as duas partes. Há vários aspectos que estamos a tentar contornar com novas escolhas cénicas em que as interacções com a audiência serão mantidas, e vamos tentar fazer com que o público sinta que estamos a dialogar e que está no mesmo espaço. Mas, acima de tudo, esperamos que as pessoas tenham oportunidade de assistir a um bom espectáculo e de ouvir boa música.

Que música é que foi, especificamente, concebida para o espectáculo?

Vamos ter um conjunto de composições que integram a música clássica e contemporânea com um toque experimental, misturadas com alguns sons mais comerciais e populares. Gosto de pensar que, algures neste espaço musical, estamos perto da música clássica, mas não demasiado perto. Tem raízes clássicas, o que faz parte da minha formação, mas algumas pessoas poderão pensar que é música minimalista e não estarão erradas. Temos também tido feedback de que o som se assemelha a música para cinema, o que quer que isso seja. Acho que, possivelmente, é porque o som desta peça, de alguma forma, evoca algumas imagens e, por isso, o mais próximo dos adjectivos que as pessoas encontram para a descrever é a de ‘música para cinema’. Certamente que tem muito ritmo e ao mesmo tempo é muito lírica. É um instrumental para piano, violino e violoncelo, que são o coração da orquestra, mas também temos guitarra clássica e eléctrica, por exemplo.

Qual foi o maior desafio na concepção desta peça?

Penso que o maior desafio foi enquadrar as interpretações dramáticas num espectáculo musical. Muitos dos temas saíram de um álbum que criei há uns anos e escrevi as peças enquanto estava em digressão. Estivemos na estrada durante dois anos e a fazer sempre o mesmo repertório. Depois de alguns meses, comecei a tentar encontrar formas de manter a orquestra motivada, de modo a combater a rotina, e comecei a escrever pequenas peças para que nos divertíssemos. Incorporei essas peças nos ensaios para manter as pessoas entusiasmadas e isso foi um sucesso. Após um tempo, tinha acumulado uma dúzia de pequenas peças musicais em que cada uma tinha a sua própria personalidade. A parte musical acabou por ser relativamente simples na medida em que estava praticamente composta. Mas os músicos não estavam muito habituados a tocar música mais minimalista. É um género em que é difícil manter a concentração e alguns dos músicos acharam, por exemplo, difícil a precisão rítmica que tinha de ser mantida quase como se se tratasse de uma máquina para que a peça se mantivesse una. Isto foi um desafio nos ensaios: manter a peça coesa. No entanto, sem dúvida que o maior dos desafios foi manter esta coesão em formato teatral. Incorporar todos os elementos, os músicos com os actores com quem estou a trabalhar e toda a encenação. É como conceber toda uma história nova porque apenas a música seria uma abordagem muito abstracta.

Um piquenique no cemitério não é uma imagem ou tema comum…

Quando temos um título, especialmente um título como este, as pessoas esperam encontrar algum tipo de respostas no espectáculo. Quando estamos a apresentar a peça num espaço alternativo, é mais fácil as pessoas sentirem a peça e enquanto a sentem não fazem perguntas que poderiam, eventualmente, fazer. Apesar de a peça ser, muitas vezes, pouco clara, essa característica também permite às pessoas terem a liberdade de sentir. “Um Piquenique no Cemitério”, apesar de ser acerca da morte é, acima de tudo, acerca da vida e de como é que pode ser abordada num cenário como o sugerido pelo nome. A peça acaba por ser irónica e questiona um pouco o que é que fazemos durante a viagem que nos leva da vida à morte.

A peça tem andado em digressão há três anos.

Sim, temos estado em vários sítios e estivemos em Portugal também, por exemplo. Penso que a recepção em Portugal foi muito especial por termos estado em diferentes tipos de espaços – desde espaços convencionais, como a Fundação Oriente e o Centro Cultural de Famalicão, a um restaurante em Vila Real. Estivamos também no Maus Hábitos, no Porto. Cada um destes espaços era muito diferente e tinha características próprias, e com audiências também características. No restaurante, por exemplo, o público que tínhamos era de pessoas que iam lá regularmente. Era um público muito pequeno e em que estávamos todos muito próximos e correu muito bem. Por outro lado, quando estivemos no Maus Hábitos, o ambiente era muito idêntico ao do LMA, muito independente e correu tudo muito bem, acabámos por integrar objectos que apareciam no espaço na própria encenação, o que também resulta. Esta é uma peça muito dinâmica. Gostamos de transferir a energia que sentimos no espaço para o espectáculo e queremos estar relaxados. Afinal, estamos a falar de um piquenique num espaço inusitado: o cemitério, por não se saber o que se passa além da morte, é sempre um lugar do desconhecido. É uma espécie de humor negro.

Uma peça para todos e em todo o lado?

Sim, até porque não tem um idioma. É universal. É uma coisa que tem, acima de tudo, que ver com tempo. Há um sentimento de nostalgia na peça. Usamos em alguns pontos legendas idênticas às que se usam no cinema mudo com pequenos trechos de texto, em inglês e chinês que, basicamente, servem para guiar o pensamento consoante o que se vai ouvindo.

Tem sido um grande caminho até ao CCM…

Agora sentimos que já podemos ir a esta sala sem correr o risco de sermos mal entendidos. Já é uma peça conhecida e temos alguma experiência em preparar o público antes da sua entrada, para que não entendam mal o nosso trabalho.

O que têm planeado para o futuro?

Vamos continuar com “Um Piquenique no Cemitério”. Já temos um espectáculo agendado para o Japão na continuação das nossas apresentações internacionais.

Estamos na presença de um espectáculo alternativo e experimental. Da sua experiência, como é que Macau olha para este tipo de criações?

Quando comecei a colaborar mais regularmente com artistas locais, em 2008, fiquei logo surpreendido com a quantidade de pessoas ligadas a trabalhos experimentais. Parece existir um grande fosso entre os clássicos tradicionais, que já não fazemos muito, e aquilo que muitos artistas contemporâneos estão a fazer e que são as suas próprias criações. Por exemplo, em Macau não há muita gente a fazer Shakespeare ou, tirando um ou dois que tenha visto, peças do Tchekhov. As pessoas estão a apostar em trabalhos contemporâneos e o público está na mesma linha. Temos ainda, no mundo da dança, coisas muito interessantes a ser feitas. A Comuna de Pedra, por exemplo: desloca-se aos bairros antigos de Macau para apresentar coreografias contemporâneas. O público olha para eles com um ar intrigado, mas eles fazem-no e é uma forma de mostrar o desejo de que a arte chegue a todos. O público, mesmo sem saber muito do assunto, acaba por se aproximar, ver e falar disso. Podem não entender mas acabam por gostar. Da mesma forma, fizemos uma apresentação desta peça em Taiwan num mercado, o que é também um cenário inesperado. Quando estávamos a actuar, as pessoas deixavam o que estavam a fazer e vinham ver-nos. Ter este tipo de proximidade com o público é muito especial. Aquilo que fazemos com a arte, às vezes, é tão limitado demograficamente que sabe muito bem podermos expandir-nos e chegar a mais pessoas. Por exemplo, quando pensamos no CCM não estamos a pensar que estas pessoas – dos mercados e da rua – venham ver o nosso trabalho e, com apresentações alternativas, estamos a sair das fronteiras da arte.

25 Nov 2016

Palestra | João Ó fala sobre renovação de edifícios na USJ

Os edifícios de acesso público devem reflectir as necessidades da comunidade. A ideia é defendida amanhã, pelo arquitecto João Ó, numa palestra que tem como ponto de partida a renovação do edifício Ritz, ao Largo do Senado

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á coincidências felizes e esta, diz João Ó, foi uma delas. O arquitecto foi convidado, no ano passado, para dar aulas na Universidade de São José (USJ), no módulo de Design de Interiores. As aulas práticas de Ó na instituição de ensino superior coincidiram com um convite da Direcção dos Serviços de Turismo, que desafiou três universidades do território para um concurso de ideias sobre a renovação do interior do edifício Ritz, localizado no Largo do Senado.

A USJ lançou um concurso interno junto dos estudantes. Durante um semestre, discutiram-se conceitos e trabalharam-se ideias. Os resultados deste projecto são conhecidos amanhã, durante uma sessão em que vão ser atribuídos prémios às três melhores ideias, mas em que também se vai falar da reconversão de edifícios e dos desafios que a sociedade de hoje coloca a esta tarefa. O pretexto é o Ritz.

Ritz com pouca vida

“O edifício foi renovado pela equipa de Manuel Vicente, Carlota Bruni e Rui Leão. Foi finalizado em 2004, com um programa muito específico: áreas de exposições no rés-do-chão e o resto dos pisos – são cinco, incluindo o rés-do-chão – seriam arrendados a associações de Macau”, contextualiza João Ó.

“Não sei qual foi a dinâmica que houve estes anos todos, mas a verdade é que o edifício está meio fechado.” O único piso aberto ao público é o rés-do-chão, que “tem algumas exposições, mas que está um pouco abandonado”.

Aquando da intervenção, “manteve-se a fachada e criaram-se mais pisos do que era possível”, aponta o arquitecto. “Foram acrescentados dois pisos aos três da fachada, o que implica que os pés direitos diminuíram muito e tornam o espaço, a meu ver, bastante claustrofóbico. É um dos problemas que encontro no edifício.”

Na palestra, o arquitecto vai falar sobre a forma como estas estruturas poderão ser renovadas – não só as classificadas, mas também outras que foram originalmente projectadas com finalidades diferentes. O objectivo é discutir “como é que podem ter uma nova vida com um novo programa e que tipo de programas é que a sociedade de hoje em dia precisa, porque não tem as mesmas necessidades de há dez anos”. A velocidade com que se alteram os interiores das casas de acesso público é ainda mais visível em Macau.

História da Casa Amarela

“Todos os anos há uma necessidade nova, as lojas abrem e fecham de um dia para o outro, e esta necessidade de mudança, muito intensa, reflecte-se na utilização de estruturas antigas”, assinala João Ó.

Na sessão da Universidade de São José, o arquitecto vai dar dois exemplos bem diferentes sobre a reconversão de edifícios, uma questão que pode ser “bastante complicada” se não for feita uma boa gestão e se, no caso dos proprietários privados, os lucros rápidos e avultados forem o único aspecto a ser tido em consideração.

João Ó participou na renovação da Casa Amarela, no sopé das Ruínas de São Paulo. O cliente era a Direcção dos Serviços de Turismo e o objectivo da renovação compreendia finalidades distintas. “A semicave era um espaço para o Instituto Cultural, os restantes três pisos variavam entre recepção e informação do público, havia uma casa de chá, depois foi também o Lusitanus, o restaurante português. Era uma variedade de programa que, infelizmente, pelos vistos não resultou”, recorda.

Detida por um privado, a Casa Amarela estava a ser arrendada pelo Governo. Mas o proprietário decidiu mudar de inquilino, arrendou o espaço a uma loja de roupa, que acabou por desistir do negócio. “O cliente – neste caso os empresários – também tem a necessidade de saber qual é a melhor forma de explorar um espaço destes, sendo que estamos no coração da cidade”, aponta Ó.

O arquitecto defende que, quando se mexe no interior de um edifício, é preciso pensar no que é que a cidade precisa, “em termos comerciais, lúdicos e turísticos”. O lucro tem sido o grande objectivo, mas “tem que haver um balanço qualquer”.

O segundo exemplo escolhido por João Ó contrasta com a história da Casa Amarela: trata-se do Macau Design Centre, que está instalado na zona da Areia Preta. O arquitecto conhece bem este edifício fabril utilizado pela Associação de Designers de Macau, uma vez que a empresa que detém – a Impromptu Projects – está lá instalada.

“Estando aqui e vivenciando o espaço, percebe-se que a estrutura funciona muito bem e a criação de sinergias entre estúdios com diferentes objectivos é bastante feliz”, anota. O espaço é um “um projecto a longo prazo”, tem por enquanto fins criativos, os fins lucrativos poderão surgir mais tarde. “Para as pequenas e médias empresas resulta bastante bem.”

Destes dois exemplos, João Ó conclui que os empresários não devem pensar apenas “em lucros imediatos de grande valor, mas sim numa perspectiva muito mais localizada – e não globalizada – para explorar um espaço que poderá ter um rendimento a longo prazo, e poderá ser vantajoso para a comunidade local”.

As ideias de João Ó e os projectos dos alunos da USJ começam a ser apresentados às 18h30, amanhã, no “Speakers’ Hall” da universidade. A iniciativa é aberta a todos os que se interessem pelo tema.

24 Nov 2016

Programa “Vinhos na Rádio” organiza curso

241116p9t2
João Paulo Martins é crítico e jornalista vinícola

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] uma iniciativa que partiu de solicitações de ouvintes da Rádio Macau, que desafiaram a produção do programa “Vinhos na Rádio” para uma partilha de conhecimentos que fosse além da antena. O curso de vinhos vai já na terceira edição, conta com a parceria da Fundação Oriente e é da responsabilidade do crítico João Paulo Martins, jornalista que trabalha na imprensa vinícola desde 1989. Arrancou ontem ao final da tarde, na Casa Garden, e termina hoje, com a participação de 15 pessoas.

“Tenho vindo a Macau com alguma regularidade, gosto de cá vir. As pessoas daqui têm interesse em relação a vinhos, têm acesso a bons vinhos portugueses – porque se vendem cá todos –, e a vinhos de outras partes do mundo, até mais do que temos em Portugal”, assinala João Paulo Martins. “São pessoas com algum conhecimento e interesse, com algum poder de compra, são interessadas e isso é o melhor que podemos ter quando estamos a dar um workshop de vinhos”, explica acerca dos seus formandos.

Num curso deste género, começa-se pelo princípio de tudo: a uva. “Como é que ela cresce e se desenvolve, até chegar à altura da vindima, como é que se faz o vinho”, indica o jornalista. “É importante perceber quais são as etapas determinantes de todo o processo evolutivo do ciclo da uva até chegar à vindima.”

Depois, João Paulo Martins deixa algumas noções sobre como é que se faz o vinho e “como é que, com as mesmas uvas, se fazem vinhos com diferentes perfis, para percebermos como é que cada produtor organiza o seu vinho no sentido de corresponder aquilo de que gosta”.

Numa outra fase, “perante um vinho no copo”, o responsável pelo curso fala sobre “o que tem de se aprender a ler: os aromas, a prova de boca, as texturas, a acidez, o prolongamento do vinho no final, tentar perceber se é um vinho novo ou velho, conforme o tipo de aromas que tem, conforme a cor, se mostra um potencial bom para guardar em casa”.

A preocupação de João Paulo Martins, vinca, “é que o consumidor tente tirar o máximo partido do vinho que tem à frente para provar”. Quanto mais souber do assunto, “mais prazer pode ter em beber” o que tem no copo, refere o autor da obra “Histórias com vinho & outros condimentos”, livro recentemente lançado.

Assunto de mulheres

Há algumas décadas, a vinha e o vinho era assuntos tipicamente masculinos. Hoje, arrisca o jornalista, “50 por cento dos enólogos portugueses são mulheres, o que é uma situação de facto nova em relação ao que existia há 30 anos”.

Não há estatísticas oficiais, mas são cada vez mais as mulheres a trabalhar nesta área. No entanto, já se fizeram as contas aos consumidores e chegou-se à conclusão de que são as mulheres que fazem as compras em casa, diz o jornalista: “São as mulheres que compram o açúcar e o arroz, e que compram também o vinho”.

O facto de serem as mulheres a escolher fez com tenha passado a haver “um interesse crescente pelo vinho que, felizmente, deixou de ser um assunto masculino”. Esta vontade de saber mais reflecte-se nas acções de formação sobre a matéria e Macau não é excepção – a presença feminina tem aumentado a cada edição do curso organizado pelo “Vinhos na Rádio”.

A designer Sofia Bobone é uma das participantes na iniciativa. Depois de dois pequenos cursos dados por Luís Herédia, em que ficou “com algumas noções que não tinha”, decidiu juntar-se ao grupo que se reúne por estes dias na Casa Garden. “Bebo socialmente e encaro estas formações como algo com um aspecto mais mais lúdico. É sempre bom saber mais, para poder apreciar os vinhos”, diz.

O conhecimento ajuda no momento da escolha. “Pode ser tudo mais fácil na compra, na escolha de vinhos nos restaurantes, até aprender a combinar quais são aqueles que ficam melhor com certos tipos de comida. Isso faz bastante diferença”, refere Sofia Bobone.

Para a designer, os vinhos deixaram de ser um tema masculino, apesar de continuar a haver mais críticos nesta área. “Há muitas mulheres que têm interesse, gostam e são apreciadoras. Na altura dos nossos pais, as mulheres bebiam muito menos, hoje em dia já não há essa diferença.”

24 Nov 2016

Curtas | Sound & Image Challenge com a maior adesão de sempre

O Sound & Image Challenge volta a marcar o final do ano, desta feita com um número recorde de participações. A organização destaca não só a quantidade de filmes recebidos, como a qualidade que coloca a iniciativa local na corrida dos melhores festivais independentes do mundo

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] festival Sound & Image Challenge 2016 já tem cartaz e vai mostrar curtas-metragens entre 6 a 11 de Dezembro. A edição deste ano integra temas do quotidiano actual e, além das películas em competição, conta com filmes da China Continental, Taiwan, Macau, Singapura, Filipinas, Tailândia e Portugal, numa secção extra.

No total são 64 curtas a ser exibidas no Teatro Dom Pedro V e 50 filmes que vão ocupar a tela da Cinemateca Paixão.

Lúcia Lemos, responsável pela Creative Macau – a entidade organizadora do evento – mostra-se excepcionalmente satisfeita com a quantidade e a qualidade das curtas-metragens que foram recebidas pela entidade, tanto na secção extra, como para as secções “Shorts” e “Volume”.

“Além das 1650 inscrições que deram entrada no Centro das Indústrias Criativas, a iniciativa conta ainda com 41 filmes, além dos candidatos”, sublinha. “Embora as curtas-metragens nas duas categorias de competição não devam exceder 15 ou 30 minutos, recebemos um número recorde de trabalhos vindos de todo o mundo”, diz Lúcia Lemos, na nota de apresentação do festival.

A responsável frisa ainda a qualidade que marca a edição deste ano. “Gostaríamos de realçar a tremenda qualidade dos filmes que recebemos e de destacar o tratamento de temas globais actuais, como é o caso dos campos de refugiados em várias regiões do mundo”, menciona Lúcia Lemos na mesma nota.

Fará também parte do programa uma masterclass e a participação de profissionais do cinema. A master estará a cargo de Cheng Liang, que apresentará a sua curta-metragem “City of Black and White”, um filme composto por três histórias mudas.

Filmes do mundo

Os filmes selecionados para as competições “Shorts” e “Volume” vieram dos Estados Unidos, Europa, Médio Oriente, América do Sul, Sudeste Asiático, China e Macau o que, segundo Lúcia Lemos, “mostra que um número crescente de realizadores tem interesse por um festival de cariz independente e sem ser convencional”.

Para a responsável, a adesão poderá ter que ver com as particularidades do território anfitrião: “Um festival possivelmente inspirado pelos sedutores 450 anos de história que Macau possui enquanto ponto de encontro entre o Oriente e o Ocidente”.

Lúcia Lemos não deixa de mencionar o papel do cinema enquanto forma de comunicação. “O cinema é o tipo de entretenimento mais democrático, porque nos permite a ligação a outras culturas sem as invadirmos e tem o poder de mudar vidas alterando a percepção do mundo real”.

O Festival Internacional Sound & Image Challenge tem como objectivo, nas palavras de organização, “tornar-se uma referência no âmbito de festivais deste género”.

 

 

 

Programa

 

6 de Dezembro

Cerimónia de Abertura no Teatro D. Pedro V – 19h

7 de Dezembro

Projecção de filmes extra com conversa depois da exibição – 14h às 22h

Masterclass do realizador Cheng Liang – 19h

8 de Dezembro

Projecção dos filmes nomeados para a secção “Shorts” – 9h30 às 22h

9 de Dezembro:

Projecção dos filmes nomeados para a secção “Volume” com conversa depois da exibição – 14h às 15h

Projecção de filmes extra com entrevistas após a exibição – 15h30 às 17h

Cerimónia de gala de entrega de prémios – 19h às 21h30

Cinemateca Paixão

10 de Dezembro

Projecção de filmes nomeados das secções “Shorts” e “Volume” – 14h às 22h

11 de Dezembro

Projecção de filmes extra – 14h às 15h30

Projecção de filmes nomeados da secção “Shorts” – 15h30 às 22h

23 Nov 2016

Mais de 60 artistas participam na “6075 Macau Hotel Art Fair”

Começa esta quinta-feira a segunda edição do evento “6075 Macau Hotel Art Fair”, que vai mostrar obras de arte de mais de 60 artistas pelas paredes dos quartos do Hotel Regency. Pela primeira vez, a Fundação Stanley Ho participa ao patrocinar um prémio

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] habitual verem-se obras de arte em galerias ou em espaços maiores de exposição, como feiras, mas desta vez os amantes da pintura poderão vivenciar a arte de outra forma. A partir desta quinta-feira e até domingo, o Hotel Regency, na Taipa, acolhe a segunda edição da “6075 Macau Hotel Art Fair”, onde quadros de cerca de 60 artistas, vindos de várias regiões da Ásia, estarão expostos nas paredes dos quartos e nos corredores.

Após a primeira edição, organizada em Janeiro deste ano, os promotores decidiram apostar nas obras de arte de artistas nascidos após 1975 – daí os números “6075”. De Macau participam 11 entidades, sejam galerias de arte ou artistas em nome individual, incluindo a AFA – Art for All Society.

De Hong Kong chegam trabalhos de quatro galerias, enquanto a China domina em termos de participações, com 15 entidades. Além de Taiwan, que também esteve representada na primeira edição, a Macau Hotel Art Fair contará com a presença dos trabalhos da Myanmar Ink Art Gallery, constituindo uma estreia no território.

A segunda edição fica também marcada pelo lançamento de uma nova área artística, intitulada “Special Discovery”, e que se dedica a abordar apenas uma forma de arte. Esta conta este ano com a participação da Academia de Arte da China.

Outra das novidades prende-se com a participação da Fundação Stanley Ho, que patrocina o prémio “Dr. Stanley Ho Foundation Art”. Este visa “seleccionar potenciais artistas com performances excepcionais por forma a apoiar o seu futuro desenvolvimento e encorajar novas criações”. O Governo faz-se representar através do apoio concedido pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) na divulgação de jovens artistas de Macau.

Terra dinâmica

“Os artistas vão trazer vitalidade a cada quarto de hotel ao apresentar os seus projectos a solo. Ao exibir trabalhos de artistas emergentes e ao colaborar com galerias, tal como curadores e críticos, a segunda edição da 6075 Macau Art Fair irá estabelecer-se como uma plataforma de trocas culturais e de ligação com agentes e artistas de grande potencial”, apontam os organizadores.

O facto de o evento se realizar num hotel constitui “uma forma inovadora de mostrar a arte ao público, para que a audiência possa observar a arte de diferentes ângulos e perspectivas e estimular mais as emoções e a imaginação”.

A organização deste evento está a cargo da leiloeira Poly Auction e da entidade SOCIL cultural, criada este ano para “expandir o desenvolvimento das indústrias da arte e cultura”, que pertence a Sabrina Ho, filha de Stanley Ho. O objectivo da exposição no Hotel Regency é proporcionar “uma plataforma para as trocas culturais e a conexão de coleccionadores de arte com obras de grande potencial”, além de tentar “promover o turismo local” e mostrar Macau como uma “capital artística jovem e dinâmica”.

Quanto à primeira edição, os organizadores falam de “sucesso” em termos de vendas, tendo sido vendidas cerca de 500 obras, sendo que atraiu “um notável número de visitantes, incluindo coleccionadores e entusiastas da arte”.

22 Nov 2016

Mercado de Natal no Albergue mostra trabalho de 16 artesãos locais

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] já no próximo dia 3 de Dezembro que o Albergue acolhe a primeira edição do Mercado de Natal, uma ideia que partiu de Cátia Silva, gestora da empresa de eventos Bad Bad Maria. São 16 os artesãos locais que vão mostrar os seus produtos, seja comida, artigos de decoração, roupas ou acessórios.

“Este evento nasce precisamente da paixão que tenho por artesanato. Juntando três factores, a época do ano, um sítio lindíssimo como é o Albergue e esta vontade de fazer coisas novas, pensei em promover um evento que pudesse proporcionar um dia diferente”, contou ao HM Cátia Silva, que tem a responsabilidade da organização de toda a iniciativa, que tem o patrocínio do Albergue SCM.

“O projecto serve para apoiar os artesãos locais que fazem coisas à mão, quer seja roupa, comida, acessórios, decoração. Tentámos apoiá-los e promover um evento ligado à época natalícia, e aí surge esta sinergia. Espero que haja mais edições. O projecto foi apresentado há algum tempo e tem sido uma loucura (em termos de organização). Mas é efectivamente uma coisa que gosto de fazer”, disse ainda.

A primeira edição não pretende, para já, apoiar projectos de cariz social, mas poderá fazê-lo um dia, confirmou a mentora do Mercado de Natal. “Enquanto projecto inicial não pensámos em acções de caridade, mas temos um participante, o Le Petit Chef, e os lucros dos produtos que venderem vão para uma obra de caridade. O projecto inicial foi feito só para apoiar os artesãos locais e promover um evento de Natal. Mas nas próximas edições podemos pensar nisso.”

Para Cátia Silva, são necessárias mais iniciativas deste género para promover o trabalho artesanal que é feito por muitas mãos, sem grande conhecimento do público. “É necessário este tipo de eventos para envolver a comunidade. Todas as pessoas que fazem estes trabalhos, a maior parte, não têm negócios, uma loja. É uma oportunidade única de mostrarem o trabalho que fazem ao longo do ano.” O Mercado de Natal tem entrada gratuita e as portas estão abertas entre as 11h e as 19h.

22 Nov 2016

Vídeo | Festival experimental com edição dedicada a Portugal

O EXiM 2016 olha para Portugal. O evento selecciona, em cada edição, um país ou região para poder mostrar o que de melhor na área do vídeo por lá se faz. Este ano traz de Portugal o vídeo experimental, com destaque para o trabalho feito no feminino

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] “um festival diferente”, classifica José Drummond, um dos curadores, a par com Bianca Lei, de mais uma edição do festival dedicado ao vídeo experimental, o EXiM 2016.  “É um festival diferente no sentido em que não tem candidaturas e os filmes projectados são uma escolha. É ainda um evento que tem como alvo o que se faz a nível experimental, como indica o próprio nome”, explica ao HM.

Tem a direcção de Bianca Lei, que nesta edição divide com José Drummond a curadoria. “As projecções de Macau ficaram a cargo da Bianca Lei e eu com as de Portugal.”

Na origem da iniciativa está a ideia de que cada ano seja dedicado a um país que irá dividir a participação com Macau. Esta edição é dedicada a Portugal.

O critério de escolha das apresentações que vão acontecer no Armazém do Boi é essencialmente a diversidade. “Em vez de fazer três screenings semelhantes, a nossa aposta de imediato foi em ter uma sessão mais variada e ter uma maior diversidade de práticas, que pudesse, de alguma forma, fazer um bocadinho o panorama do que se tem feito nos últimos cinco ou dez anos com artistas realmente diferentes ou a trabalharem o vídeo de uma forma diferente”, explica José Drummond. A título de exemplo, o curador refere os trabalhos de Rui Calçada Bastos, José Carlos Teixeira, Bruno Campo e Carla Carreira e António Júlio Duarte.

O evento é marcado, após a sessão de abertura de sexta-feira que junta artistas locais e portugueses, por uma aposta no trabalho feito no feminino, com as projecções de Tatiana Macedo e de Mariana Viegas. A razão é, segundo o curador, a necessidade de dar mais espaço a que os trabalhos feitos por mulheres sejam apresentados. “Tenho insistido muito em que, de algum modo, a presença feminina se destaque, de modo a poder dar contextos associados a esse mundo que é particular”, explica.

José Drummond considera que “as mulheres têm de ter mais espaço”. “Ainda não é suficiente porque, além do modo e sensibilidade de abordagem das mulheres ser especial, essas coisas têm de começar a ter a mesma presença e balanço também no vídeo para podermos ser mais justos”, diz.

Ao falar das escolhas que fez, em particular para a edição de 2016 do EXiM, o curador explica “Mariana Viegas está a viver na Dinamarca e Tatiana Macedo tem estado numa residência em Berlim. Enquanto ponto de ligação é o facto de serem ambas artistas portuguesas que não estão no seu país”.

Além da mulher

As duas artistas partilham ainda o facto de terem trabalhado anteriormente em fotografia. Mas, no que respeita ao vídeo, apresentam abordagens nada semelhantes, apesar de nenhuma das duas se centrar na questão do género ou de assuntos relacionadas.

“São trabalhos diferentes e o que acho curioso é que, no trabalho delas, não há uma tentação do feminino no sentido em que as artistas não demonstram preocupações mais directamente ligadas ao mundo das mulheres: a maternidade, por exemplo. No caso destas autoras isso não acontece, sendo que a sensibilidade feminina está lá.” Para Drummond, “quando se vê um trabalho feito por uma mulher, percebe-se isso mesmo”.

Mariana Viegas, segundo Drummond, já na sua obra fotográfica mostra uma paixão muito intensa de contraste entre ruínas e seres vivos. “O trabalho dela estabelece essa relação entre um espaço em geral de ruínas e a continuação de uma outra qualquer existência. Sem que se note que seja forçado, há um olhar sobre a morte, sobre uma ideia qualquer de um apocalipse que, mesmo assim, deixará que continue a existência.” No entanto, “esta é uma leitura pessoal e feita no vazio”, salvaguarda o curador.

O trabalho da Tatiana Macedo aparece como um trabalho “muito interessante” que pega no título de uma canção do Leonard Cohen – “Seems So Long Ago, Nancy”. É um vídeo de 45 minutos, é uma visão, sobre um museu em especial, o Tate Gallery, e é feito a partir do olhar dos seguranças e funcionários do espaço.

“O protagonista não é o público ou as obras, mas sim as pessoas que trabalham no museu, aquelas pessoas que estão ali chateadas num canto, sentadas numa cadeira. É um trabalho com uma poética muito interessante na forma como aborda temas como o tédio e o vazio, é uma visão depurada do que é um museu a partir da perspectiva dessas pessoas.”

A experiência

As projecções encerram no serão de domingo com o trabalho de José Maçãs de Carvalho, que também faz a transição da fotografia para o vídeo, embora o trabalho que tem vido a desenvolver seja essencialmente marcado pelo carácter experimental. “Na fotografia de José Maçãs de Carvalho existe  sempre um lado conceptual muito forte, enquanto no vídeo há uma tentativa de experimentar caminhos que o vídeo proporciona.”

O autor tem várias pequenas peças em que apresenta coisas diferentes de como trabalhar este meio e, “ao longo da sua carreira, foi apontando caminhos diversos de como o fazer”.

Programa

EXiM 2016 Portugal and Macao Experimental Video Festival
Local: Armazém do Boi | 25, 26 e 27 de Novembro

Sexta-feira

19h – Artistas: Natercia Chang Sio Weng, Joein Leong, Ella Lei, Yves Etienne Sonolet, Ray Chu, Carla Cabanas, Nuno Cera

Sábado

16h  – Trabalhos de Tatiana Macedo e Mariana Viegas
19h – Trabalhos de Ray Sun Ruey Horng, Lei Cheok Mei, Ieong Kun Ieng , Suki Chan , Ivy Choeng , Fish Leong Ka Ian, Sam Kin Hang, Jack Yau, William Kwok, Napx, Leong Hou Un, Paula Lo, Natercia Chang Sio Weng e Ray Chu

Domingo

16h – Trabalhos de Nuno Cera, Bruno Ramos, José Carlos Teixeira, António Júlio Duarte, Carla Cabanas & Rui Calçada Bastos
19h – Trabalhos de José Maçãs de Carvalho

21 Nov 2016

DocLisboa | O Chá Gordo de Catarina Cortesão Terra e Tomé Quadros

Fazem documentários sobre Macau porque é neste exercício onde a realidade toca a ficção que vão, também eles, pensando na cidade onde vivem. Catarina Cortesão e Tomé Quadros encontraram no chá gordo a formação de uma comunidade de fusão, o tempo do território. Para que a memória, que ainda existe, se viva já.

[dropcap]“C[/dropcap]há Gordo de Memórias” é apresentado hoje ao final da tarde no âmbito da extensão a Macau do DocLisboa, uma iniciativa organizada pelo Instituto Português do Oriente. Não é o vosso trabalho mais recente.
Catarina Cortesão (C.C.) – Não, não é. Este documentário foi feito no âmbito do Macau DocPower, com o apoio do Centro Cultural, em 2013/2014. Pelo facto de haver tempos muito curtos para a apresentação da ideia, filmagem e edição, dentro dessas limitações e do apoio que nos deram, iniciámos o projecto sobre o chá gordo. Começámos a fazer a nossa pesquisa, começámos a falar com vários intervenientes da comunidade macaense para nos informarmos sobre quem eram os grandes cozinheiros. Munimo-nos do nosso conselheiro, Fernando Sales Lopes, que estuda a gastronomia macaense há vários anos – tem uma tese de mestrado, é um investigador ligado a essa área, na vertente da gastronomia macaense como sinal identitário da própria comunidade. Tivemos várias conversas com ele, foi-nos apontando caminhos, também construímos os nossos. Fomos vendo quem eram os cozinheiros mais emblemáticos – Aida de Jesus, Graça Pacheco Jorge, Rita Cabral, Carlos Cabral, Cíntia Conceição Serro. Destas conversas que fomos tendo, mais questões foram surgindo em relação à gastronomia macaense e o projecto cresceu. E cresceu numa determinada direcção.

E que direcção foi essa?
C.C. – Não queríamos fazer uma mera peça jornalística, esclarecedora do que é o chá gordo dentro da gastronomia macaense – pelo contrário, queríamos fazer uma narrativa fílmica a partir da mesa do chá gordo, onde estão os principais pratos da gastronomia macaense. Olhamos para a mesa do chá gordo, que é extensa, e nela vemos definidos não só o percurso e o que é a comunidade macaense, mas também o percurso dos portugueses até chegarem a Macau. Verifica-se o uso de ingredientes de Malaca, de Goa, de Angola, de Moçambique, e modos de confecção que, por sua vez, reflectem a aliança entre a cultura portuguesa gastronómica com a cultura chinesa, que também é bastante marítima. Daqui nasceu a primeira gastronomia de fusão, que é a gastronomia macaense.

Dizia que, quando se olha para a mesa do chá gordo, vê-se a comunidade.
C.C. – Vê-se a comunidade e a história de Macau dos últimos 300 ou 400 anos. Isso é muito notório logo na primeira percepção e mais ainda quando se tenta saber de onde vêm os pratos e se fala com as cozinheiras, quando elas apresentam os livros de receitas. São autênticos tesouros, na medida em que vão circulando entre as melhores cozinheiras ou são cedidos às pessoas da família com mais apetência para continuar esse espólio e dar bom nome à família através dessa mesa. Quando as pessoas achavam que não havia alguém que pudesse continuar com esse testemunho de uma forma destacada na comunidade macaense, levavam os livros de cozinha para a cova. Ou seja, não transmitiam as receitas, não as partilhavam. Há receitas da Graça Pacheco Jorge, do livro que era da tia, em que está escrito em baixo ‘não partilhar esta receita com qualquer pessoa’.

Como é que se faz uma abordagem mais cinematográfica a um tema que facilmente pode cair, em termos de tratamento, num documentário do género jornalístico?
Tomé Quadros (T.Q.) – Procuramos, de alguma forma, seguir a máxima de John Grierson, quando diz que o documentário deve ser abordado de uma forma criativa – isto dito no final da década de 20 do século passado. Significa que pretendemos fugir do documentário como uma peça jornalística e encará-la como narrativa fílmica tout-court. Procuramos com isso introduzir mecanismos da ficção no documentário, procuramos dirigir os nossos entrevistados, na medida do possível, como se de actores se tratassem, procuramos ter um cuidado estético bastante grande – e não só, em termos de continuidade, de racord também –, para que tudo faça sentido. Desta forma, introduzimos um narrador presente – a Nair Cardoso, uma jovem macaense – que, no fundo, conduz o espectador pelas diferentes estórias que fecham este todo que é a narrativa fílmica acerca do chá gordo. Temos um fio condutor, uma história, que coincide com a realidade: a Nair regressa a Macau passados alguns anos de ter ido para Portugal e vem à procura de um livro de receitas que era do avô macaense. O livro tinha sido escrito pela avó chinesa, que tinha aprendido para que toda esta gastronomia macaense existisse em casa. Há um dia em que encontra este livro no sótão da casa e guarda-o. Vai procurar, através do livro, as raízes da identidade, memória e cultura macaenses. Claro que houve uma transformação muito grande da simbiose homem-cidade, mas essa memória, a cultura e a identidade perduram.

É um documentário para memória futura?
T.Q. – No fundo, o que procurámos com o documentário é que sirva como um espelho, que a própria comunidade se veja ao espelho. Por exemplo, na questão das receitas, é muito complicado ter acesso e foi um dos maiores obstáculos, mais do que até ganhar confiança da parte dos intervenientes. Assistimos a um momento talvez único: a Cíntia Conceição Serro cedeu aos arquivos do Instituto Cultural todo o espólio que tinha herdado em termos de receitas e manuscritos escritos. Temos isso no documentário. É interessante ver que também há uma tomada de consciência por parte dos intervenientes, de que afinal esta memória deve ser mantida.

Não são realizadores profissionais, na medida em que têm outras ocupações. Há vários anos que fazem documentários sobre a cultura de Macau. Como é que conseguem ir trabalhando nesta área, que exige todo um processo de pesquisa? Sentem muitas dificuldades?
C.C. – Temos bastantes dificuldades pelo facto de sermos uma equipa muito pequena. Eu e o Tomé fazemos 80 por cento do trabalho. Depois contamos com o Daniel Saraiva para o som e agora temos uma nova pessoa que nos está a ajudar, o João Cordeiro. Temos ajuda nas filmagens e coloração. Nestes processos temos arranjado sempre alguém que nos ajuda por ser especialista na matéria. É muito difícil porque temos vidas profissionais exigentes e as nossas famílias. Isso faz com que exista alguma pressão, e de alguma forma, o tempo nos escape. O tempo que é dado aos projectos no Centro Cultural é muito pequeno, em seis meses temos de fazer tudo, o que cria muita pressão, mas são opções que fazemos. Temos de gerir muito bem o tempo. Somos bastante curiosos e gostamos de ter a percepção daquilo que acontece. Em Macau ainda não existe essa memória construída em termos de narrativas fílmicas. Sobre o chá gordo não há nada, apenas alguns episódios em que as pessoas descrevem o que poderá ser, mas algo muito insípido. O grande desafio é que adoramos filmar e editar, e apreciamos o produto final. Depois de estar feito, passamos para outro, porque queremos fazer cada vez mais. Já estou a pensar no projecto seguinte.

T.Q. – O cinema foi o lugar que nos deu a conhecer um ao outro e foi onde a memória futura teve lugar. A Catarina tinha alguma formação e trabalho feito em fotografia, com uma grande base no teatro, e com grande desejo de desenvolver algo na área do cinema. Partilhávamos o mesmo olhar e as mesmas preocupações, e procurávamos fazer cinema em conjunto. Eu trazia a formação da Escola das Artes do Porto, em som e imagem. Se calhar trazia um olhar mais formatado e menos livre, e a simbiose com um olhar mais livre e outro mais técnico resultou. O documentário surgiu como o modelo de pensar o cinema mais apropriado porque nós, além da questão do cinema, tínhamos a vontade muito própria de falar de Macau, que nos apaixona. Sentimos que havia um vazio por preencher. Havia que começar a trabalhar sobre a memória, cultura e identidade de Macau, e encontrámos o formato certo.

Já estão a pensar no próximo documentário?
T.Q. – Temos o “Time of Bamboo”, que está quase terminado, foi o projecto deste ano, que vem na sequência da memória de Macau. Há um paralelismo com o chá gordo em termos do conhecimento que passa de geração em geração. Não há um livro do saber do bambu, como as estruturas são calculadas. Tentamos fazer uma ponte entre o legado e aquilo que pode vir a ser o futuro do bambu.

C.C. – Em relação a projectos de futuro, ando interessada sobre a questão linguística. Ando a reflectir porque é que é difícil ao estrangeiro falar chinês e as crianças não têm acesso à aprendizagem da língua. Não são apenas os portugueses, mas os estrangeiros em geral. Porque é que isso não acontece nas escolas? Qual é a questão, o problema? Tem que ver com uma questão de vivência? Acho que seria um tema interessante para fazer um documentário. Apetece-me fazer um documentário sobre crianças e jovens dentro dessa questão linguística, das diferenças das línguas, o ‘lost in translation’. Comecei a escrever um guião, embora seja para uma curta-metragem, que reflecte essa faixa etária. Mas é uma história que tem algumas aventuras, à volta dos portugueses, chineses e macaenses. É sempre esse o meu ponto de reflexão.

18 Nov 2016

Arnaldo Gonçalves organiza ciclo de palestras sobre religião

 

“Há um regresso do sagrado à preocupação das pessoas”

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] “Sagrado e o Profano – Diálogos no Delta do Rio” é o lema do ciclo de palestras que tem início no próximo dia 25, pelas 18h30, na Livraria Portuguesa. Uma iniciativa do Fórum Luso Asiático que pretende discutir a religião e o seu papel na sociedade contemporânea. Arnaldo Gonçalves fala ao HM da motivação que deu origem à iniciativa

 

De onde partiu a ideia para o tema do ciclo “O Sagrado e o Profano – Diálogos no Delta do Rio”?

A ideia de fazer um ciclo de palestras acerca da religião veio de um sentimento que se foi acumulando ao longo do tempo. Achei interessante pegar numa temática que ainda não foi tratada em Macau mas, sobretudo, porque se sente que há uma grande inquietação. Enquanto cientista social, sinto que há um regresso do sagrado à preocupação das pessoas. Durante muito tempo, desde Weber no século XIX, que se começou a acreditar que as pessoas não precisavam da religião para nada e que a religião era uma coisa já acabada, de séculos anteriores, e que só através da ciência e do uso da razão é que as pessoas podiam descobrir a felicidade. Esta ideia, de alguma forma, revelou um mito com pés de barro, porque as pessoas procuram sempre algo.

Que encontram na religião?

Nesse aspecto assistimos, um pouco por todo o mundo, ao regresso das preocupações de foro religioso – num sentido diferente em relação a outros períodos, porque não é tanto um retorno às chamadas religiões institucionais que têm igreja, um corpo hierarquizado, um clero ou um dogma, mas sim um regresso a múltiplas formas de espiritualidade. Achei que era interessante trazer este tema que, no fundo, se trata do confronto entre o sagrado e o profano, isto é, o confronto entre o apelo à religião e um mundo material que é o que nos rodeia. É no cruzamento de ambos que foi associada uma outra ideia que, pessoalmente, sempre achei curiosa no budismo, e que é a questão do “rio”. O budismo é uma religião que acredita na reencarnação e que nós vamos num rio a atravessar de uma margem à outra. As próprias escolas do budismo são definidas de acordo com esta analogia da jangada pequena e da grande jangada. Aqui temos o Rio das Pérolas e, por outro lado, a metáfora ao rio também representa um caminho. Um rio é uma coisa que não pára, é uma fluência que não é estática porque nunca voltamos a repetir a mesma secção do trajecto e experimentamos sempre partes novas. Vamos também abordar as grandes religiões monoteístas que são as que se impõem à nossa cultura, mas também outras não monoteístas e que estão muito enraizadas, especialmente aqui na Ásia, sem esquecer outras formas de espiritualidade que, se tivermos tempo e houver público, iremos tratar.

Falou de um regresso às preocupações religiosas e ao sagrado. O que é que está a acontecer socialmente para que se esteja a assistir a essa transformação?

Penso que é uma resposta, de certa forma, a uma instabilidade que se sente no mundo. O mundo nunca esteve tão instável como agora. Neste momento somos confrontados com surpresas praticamente todas as semanas acerca de coisas que acontecem e põem em causa o que podemos chamar de uma certa normalidade. Isto traduz-se na tal intranquilidade vivida pelas pessoas. As pessoas não se sentem seguras, estão preocupadas com os problemas que possam ter. Por exemplo, quando viajam estão mais preocupadas com isso, no contacto com outras comunidades que desconhecem também não se sentem seguras e essa intranquilidade não é resolvida pelos governos, não é resolvida pelos sistemas políticos. E é uma coisa que fica no coração das pessoas.

É aí que a religião tem um papel?

Sim, acho que esse apelo à religião representa a procura de uma iluminação e de uma paz interior. É algo que as pessoas pouco a pouco têm descoberto enquanto forma de usufruírem daquilo que têm, de se conhecerem a si próprias e de terem uma relação de abertura em relação ao outro que desconhecem e de que desconfiam, porque é diferente, porque ora diferente ou porque pensa diferente. Acho que esse apelo é consistente.

O ciclo de palestras vai abrir com a temática do Islão. Alguma razão em particular?

Não foi intencional, mas é a religião da maioria da população asiática. Por outro lado, há uma grande curiosidade pessoal em relação ao Islão que também passa pela formação em estudos internacionais e pelos actuais estudos que estou a desenvolver há três anos que abordam os estudos religiosos. O Islão é a religião mais praticada na Ásia, tem um bilião de seguidores nesta região do mundo. Acabou por se juntar o útil ao agradável e começar por tentar perceber o que é o Islão, como é que é uma doutrina que dá resposta à intranquilidade das pessoas, como é que o apelo ao divino pode preencher uma parte desta inquietude.

A seguir ao Islão o que é que vem?

A segunda palestra vai debruçar-se no judaísmo. Vai ser dada por um professor da Universidade de Macau, judeu praticante e um fervoroso conhecedor do Antigo Testamento. Prevemos ter o evento no início de Janeiro, mas depende da disponibilidade do espaço. Depois seguem-se o cristianismo, o budismo e por aí fora.

Como é que se vai organizar cada palestra?

Queremos que seja uma conversa em que o convidado faz a exposição acerca da forma como vê a religião e em que há espaço para que o público coloque as suas questões, de modo a suscitar um debate.

Qual é a sua relação com a religião?

Não tenho qualquer religião. Mas por exemplo o professor James D. Frankel, que vai abrir este ciclo de palestras, é uma pessoa muito interessante. Tem formação em Estudos Comparados na religião e é um convertido ao Islão. Pessoalmente acho curiosíssimo que um americano, formatado pela cultura em causa, branco, caucasiano, tenha sentido este apelo. O que é que o Islão lhe terá trazido para que se tivesse convertido? Comecei a viajar muito cedo por uma série de países islâmicos e, da experiência que tenho, a imagem que nos dão do Islão, nebulosa e bélica, não corresponde à realidade que vi nestes países. É uma religião doce. Nunca senti a pressão de que tanto se fala.

Como vê a religião em Macau?

Em Macau, a religião cristã tem um peso muito forte e somos levados a pensar que é a única que existe, até porque é o fio ideológico da comunidade macaense. Mas também temos o budismo que é a doutrina praticada pela maioria. O Islão aqui é praticado por uma pequena comunidade que nem templos tem e é pouco visível, mas que integra pessoas de várias comunidades. Esta palestra só é possível com a ajuda da associação muçulmana local que me auxiliou na escolha do perito orador e nos contactos que fiz.

 

17 Nov 2016

MIFF – Seis dias para a sétima arte

Filmes em competição e fora dela, bailarinas que sonham maior, prémios e estatuetas, masterclasses e galas. Aqui fica uma ideia do que vai poder ver entre 8 e 13 de Dezembro

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão 11 os filmes que vão estar em competição na primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau (MIFF, na sigla inglesa). Divididas as projecções entre o Centro Cultural e a Torre de Macau, as películas vão disputar nove prémios, entre os quais o melhor filme, o melhor realizador, os melhores actor e/actriz e o melhor argumento.

O júri é presidido por Shekhar Kapur, cineasta indiano que conta com um vasto currículo, de onde se destaca “Elisabeth”, nomeado para sete Óscares e vencedor de dois, e galardoado com cinco BAFTA, entre os quais o prémio para melhor filme.

Da secção de competição fazem parte “150 miligrams” (França); “Free Fire” (Reino Unido); Gurgaon (Índia); “Hide and Seek” (China); “Queen of Spades” (Rússia); “Survival Family” (Japão); “The Winter” (Argentina) e “Trespass Against Us” (Reino Unido). Os filmes juntam-se a “Elon não acredita na morte”, do brasileiro Ricardo Alves Jr, em estreia internacional e que tem como protagonistas Rômulo Braga e Clara Choveaux, e a “São Jorge”, do realizador Marco Martins, que valeu a Nuno Lopes o Prémio Especial de Melhor Actor atribuído pelo júri da secção “Orizzonti” do Festival Internacional de Cinema de Veneza, em Setembro. É a primeira vez que “São Jorge”, que conta a história de um pugilista desempregado que se vê obrigado a trabalhar em cobranças de dívidas para sobreviver, pode ser visto na Ásia.

De destaque nesta secção é ainda a realização da local Tracy Choi, “Sisterhood”, que tem agora a sua estreia marcada.

Estreia a dançar

“Polina”, filme francês realizado por Valérie Müller e Angelin Preljocaj, marca a abertura do Festival Internacional de Cinema de Macau. O filme conta a história de uma jovem russa que sonha desde a infância com uma oportunidade no Bolshoi. Cansada da disciplina a que está submetida, a bailarina vai para França onde abandona o ballet clássico para se aventurar no mundo da dança contemporânea. “Polina” conta com as interpretações de Juliette Binoche e Anastasia Shevtsova.

O MIFF é composto por mais quatro secções de competição: “Gala”, “Dragões Escondidos”, “Crossfire” e “Cinefantasy”.

Momento de oportunidade

Ainda no programa está o “Crouching Tigers Project Lab” que integra, entre 9 e 11 de Dezembro, palestras, oficinas e painéis destinados ao debate entre profissionais do sector. É aqui que poderão ser criadas alianças para avançar com projectos cinematográficos. As ideias em cima da mesa são 12 e estão divididas em três categorias: género, autor e parceiros associados. Os vencedores serão distinguidos com prémios monetários: um no valor de 20 mil dólares — atribuído pela Fox International Productions — e outro de 10 mil, concedido pela Ivanhoe Pictures e Huace Media.

Entre os candidatos estão dois projectos portugueses, “Peregrinação”, de João Botelho, e “San Ma Lo 270”, de João Pedro Rodrigues e Rui Guerra da Mata.

Para os jovens talentos, essencialmente os locais, o MIFFA tem, desde segunda-feira, as inscrições abertas para um concurso de curtas-metragens. Os candidatos interessados têm até 30 de Novembro para enviar os seus projectos.

A conversar é que se aprende

Não há festival de cinema sem masterclasses e Macau não é excepção. Apesar da tímida estreia com duas sessões agendadas, consta do programa a master com Gianni Nunnari, e outra com Tom McCarthy e Bobby Cannavale. Ambas agendadas para 10 de Dezembro, sabe-se já que o tema abordado por McCarthy será o uso de histórias pessoas na arte de contar, enquanto Cannavale irá abordar a relação entre realizadores e actores.

O MIFF é organizado pela Direcção dos Serviços de Turismo de Macau e pela Associação de Cultura e Produções de Filmes e Televisão de Macau (MFTPA). Conta com um orçamento de 55 milhões de patacas, dos quais 20 milhões são garantidos pelo Governo.

16 Nov 2016

Helena de Senna Fernandes: “A minha responsabilidade é dar continuidade aos trabalhos”

Helena de Senna Fernandes assumiu a representação da primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau. Uma posição repentina que vem na sequência da demissão de Marco Mueller da direcção do evento. A também directora dos Serviços de Turismo fala da sua “inesperada” função e do acontecimento pelo qual dá a cara

[dropcap]H[/dropcap]erdou a representação repentina da primeira edição do Festival de Cinema Internacional de Macau. Como é estar neste papel?
É verdade. Foi uma situação inesperada mas, depois de termos recebido a notícia da demissão de Marco Mueller na noite de sexta-feira, impunha-se a manutenção da estabilidade da organização. A demissão do director não é positiva, nesta altura do campeonato, sobretudo numa altura em que estamos na fase final de preparação do evento. Depois de falarmos com os consultores internacionais do festival, era necessário transmitir confiança aos nossos parceiros e ao nosso público. Era necessário alguém que substituísse Mueller na direcção e não seria justo convidar outro director para continuar o trabalho que outra pessoa já tinha feito. Não seria agora que iríamos mudar alguns dos conceitos que foram deixadas por Marco Mueller. Neste sentido, a melhor solução foi a presidência da comissão organizadora assumir a representação do evento. Não tenho experiência na área do cinema, mas considero que a minha responsabilidade é dar estabilidade e continuidade aos trabalhos que ainda têm de ser realizados de modo a garantir o sucesso do projecto.

Quais são, agora enquanto representante, as expectativas para o MIFF?
Para já, o mais importante é dar continuidade ao evento, principalmente no que respeita à promoção dos jovens de Macau que têm o sonho de fazer os seus próprios filmes. A intenção é avançar com a ideia de tornar a iniciativa numa plataforma em que os cineastas locais consigam ter uma oportunidade para darem a conhecer ao exterior os seus trabalhos. Penso que esta é uma forma privilegiada de dar a conhecer as indústrias criativas de Macau. Também tencionamos, através do festival, dar uma oportunidade para que seja criado um público local, ou seja, para que os residentes possam ter acesso a mais géneros de cinema. A ideia é que o público conheça, não só o cinema comercial, mas que também tenha acesso e comece a apreciar filmes mais artísticos. Esta é uma altura em que as pessoas de Macau podem abrir mais os olhos para que, eventualmente, esteja aberta a possibilidade de criar uma indústria nesta área. Queremos também criar os consumidores destes produtos que são os filmes. Tem de existir gente que assista e compre, nós temos de criar esta componente referente às audiências de Macau.

Falou de indústria do cinema mas Macau não tem essa dinâmica. Em que é que o MIFF vai ajudar, concretamente?
Acho que essa ajuda não se vai verificar já. Esta é a primeira edição e não se pode esperar esse tipo de retorno imediatamente. Quando olhamos para este festival, temos de estar conscientes de que não estamos só a projectar filmes ou a dar prémios. Estamos também a criar espaço para que a indústria internacional venha a Macau e possa conhecer o território. Existe também uma componente formativa e que é concretizada pela realização, por exemplo, de masterclasses. Para que haja uma indústria a funcionar tem de existir conhecimento e faz parte do evento promover isso também. Os jovens locais não devem ter apenas o sonho em ser realizadores, têm de ter conhecimento. Por outro lado, esta é uma indústria que deve desenvolvida passo a passo e não de um dia para o outro. Como estamos a iniciar este caminho, temos ainda de ter em conta que é importante trabalharmos muito com a China e mesmo com Hong Kong. A China, por exemplo, representa uma grande parcela de público de cinema e como tal, ao pensar na criação da indústria em Macau, temos de ter em atenção as perspectivas de entrada no mercado chinês e as colaborações que possamos vir a ter com cineastas da China Continental. É lá que está o grande público que irá consumir os produtos do cinema de Macau.

É a directora do Turismo de Macau. Qual é o impacto do MIFF no sector?
Claro que é importante utilizar este evento enquanto plataforma para promover Macau. Uma das questões é a promoção do território internacionalmente de modo a que seja mais conhecido e que mais pessoas queiram vir de visita. Por outro lado, e de muita importância, é a promoção da terra enquanto espaço de produção de cinema, ou seja, que Macau se torne capaz de chamar os cineastas internacionais para que cá venham fazer, por exemplo, a rodagem das películas. É fundamental esta aposta no sentido de que realizadores internacionais escolham a região para os seus cenários e, desta forma, projectar Macau para audiências internacionais.

O embaixador do MIFF é Jang Keun Suk, um actor coreano essencialmente conhecido pelo seu trabalho em novelas. Qual foi o critério para esta escolha?
Também estamos a falar de turismo e, desse ponto de vista, a Coreia é o nosso mercado mais importante.

É uma estratégia de marketing turística?
Sim. É uma estratégia para atrair os olhos dos coreanos para Macau. Na óptica do turismo, e agora falo enquanto directora do organismo, é importante ter um forte representante coreano porque é que aí que está o nosso grande alvo internacional. Neste momento, é um mercado que está a crescer na ordem dos dez por cento e, como tal, não foi ao acaso que escolhemos Jang Keun Suk como embaixador.

Cannes ou Locarno são conhecidas precisamente devido aos festivais de cinema que acolhem. Poderiam ser desconhecidos, mas estão nas bocas do mundo e são destinos por muito apetecidos por serem uma referência da sétima arte. Acha que Macau pode vir a fazer parte dos destinos culturais associados ao cinema e com o contributo do MIFF?
Locarno, Cannes e mesmo Hong Kong já são festivais com uma forte afirmação no mercado e já existem há muitos anos. Sim, acho que podemos pensar nisso como um objectivo a atingir no futuro. Não vamos pensar nisso como um objectivo que se atinge dentro de pouco tempo, mas podemos começar agora a criar um nicho próprio. Espero que com o tempo e com a continuação do trabalho possamos conseguir um lugar de relevo.

Disse na conferência de imprensa de apresentação que o MIFF ainda iria ter algumas surpresas…
Não posso ainda dizer quais serão porque a comissão ainda está em fase de contactos e negociações. Mas estamos a falar de convidados especiais que, esperamos, vão fazer do festival um evento mais completo.

Gosta de cinema?
Infelizmente não tenho possibilidade nem tempo para ir ao cinema. Vejo essencialmente através da internet, mas a altura em que dedico mais tempo a ver filmes é, realmente, dentro dos aviões. E sim, gosto de filmes e de diferentes géneros de cinema.

Quais são os filmes da sua vida?
O primeiro filme que me lembro de ver é o “Música no Coração” e este é realmente um filme de que gosto. É um filme que tenho sempre presente.

Como é que vê este festival no futuro?
Penso que vai ser estabelecido como um dos festivais de referência a nível mundial. Espero que seja, num primeiro passo, um festival obrigatório, primeiro dentro da Ásia, e com o tempo vá ganhando terreno ao nível internacional.

16 Nov 2016

Semana da Bélgica traz artistas do país até Hong Kong

[dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]ários artistas belgas têm obra exposta na região vizinha durante esta semana. Alguns são consagrados; outros são menos conhecidos. Há espaço ainda para o debate sobre as colecções e o investimento em obras de arte.

São vários artistas que expõem pela primeira vez em Hong Kong, em dois espaços diferentes – o KEE Club e o ArtOne. As exposições têm a curadoria de Emilie Rolin Jacquemyns, uma cidadã belga residente na região vizinha.

Sendo um dos países com mais coleccionadores de arte per capita, a Bélgica tem vindo a desenvolver-se como um centro importante para a divulgação do trabalho de artistas contemporâneos. A organização das exposições em Hong Kong destaca que as obras levadas até à antiga colónia britânica mostram não só artistas consagrados, mas também novos talentos da Bélgica, que espelham um país “rico em cultura e expressão artística”.

Dos 13 nomes com trabalhos representados no KEE Club encontram-se Harold Ancart, Ann Veronica Janssens e Sophie Whettnall. Ancart foi recentemente distinguido pelo Financial Times como um dos artistas mais importantes do ano. Nascido em Bruxelas, vive e trabalha em Nova Iorque. A Hong Kong leva um único trabalho, sem nome. “Utilizando o espaço e a repetição nas suas instalações de arquitectura e nas obras em papel, o trabalho de Harold Ancart é frequentes vezes minimalista, com recurso a motivos como papagaios, a selva e palmeiras”, descreve a organização.

Ann Veronica Janssens “utiliza a distribuição da luz, da cor e superfícies reflectoras para revelar a instabilidade da percepção do tempo e do espaço através de instalações, projecções e esculturas”. Nascida no Reino Unido, a artista vive em Bruxelas. Em Hong Kong, apresenta o trabalho “Espelho Mágico”.

Sophie Whettnall, que vive e trabalha em Bruxelas, foca-se na luz mas também na sua ausência, bem como na paisagem – um tema recorrente nas suas obras, marcadas por “elementos naturais que reflectem conceitos e percepções contraditórias”. Quem passar pelo KEE Club pode ver “Border Lines #26”, numa mostra que foi inaugurada ontem e que termina na próxima sexta-feira.

Imagens e ideias

No ArtOne, a exposição é da responsabilidade do fotografo Yves Ullens de Schooten, com o trabalho “O Teatro das Luzes”. Trata-se de fotografia abstracta “para expressar a emoção e a energia da luz e da cor”. A exposição – “Materiais e Contraste” – pode ser visitada até sábado.

Sobre as exposições que agora organiza, a curadora Emilie Rolin Jacquemyns explica que quis levar até Hong Kong um conjunto variado de artistas para que o público pudesse ficar com uma ideia do que é a Bélgica. “De cada vez que olho para o trabalho deles, está ali uma parte da nossa cultura, da nossa história e do nosso modo de vida. A luz está no centro de todos estes trabalhos, até mesmo quando é subtil e minimalista. Para mim, existe uma sensação de calma que une todas estas peças, uma noção de brilho e uma expressão de cor que fazem com que a Bélgica fique mais perto de mim, aqui em Hong Kong.”

Além das exposições, amanhã, no KEE Clube, há um debate sobre colecções e investimento em arte, a cargo do consultor de arte Jehan Chu, a partir das 19h.

15 Nov 2016

MIFF | Evento sem Marco Mueller avança com transtornos, mas confiante

 

 

A primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau é marcada pela saída repentina de Marco Mueller da direcção. Mais do que para a apresentação do cartaz, a conferência de imprensa realizada ontem foi marcada pela ausência do italiano de renome que prometia levar o território ao mundo

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] conferência de imprensa destinada à apresentação do programa da primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau (MIFF, na sigla inglesa) ficou essencialmente marcada pela ausência de Marco Mueller. O italiano que, até ao passado domingo, era o director do evento e que apresentou demissão é agora substituído pela directora dos Serviços do Turismo e representante da Comissão Organizadora, Maria Helena de Senna Fernandes.

A iniciativa, que vai ter lugar entre os dias 8 e 13 de Dezembro, irá, à partida, decorrer sem grandes alterações, afirma Senna Fernandes, não deixando de sublinhar que o MIFF vai sofrer contratempos. “Não posso dizer que não há transtornos com a saída de Marco Mueller, mas estamos confiantes, porque um festival não é feito por uma só pessoa mas da junção do trabalho de várias partes.”

Tudo na mesma

Até ontem, o programa previsto para a primeira edição do MIFF não tinha sofrido qualquer alteração apesar da saída do director. “A maioria dos filmes foi escolhida por Marco Mueller, mas também há convidados especiais que a Comissão Organizadora contactou por achar que podiam ter um ângulo diferente, de modo a construir um programa mais completo”, explica Senna Fernandes.

A actual responsável pelo evento justifica que, das reuniões a que assistiu em que pudessem ter existido divergências quanto à inclusão de obras, nunca os diferendos deixaram de ser resolvidos, sendo que, na sua perspectiva, não foi por discordâncias de programação que Marco Mueller terá pedido a demissão.

Encontrar um substituto para o demissionário director está, nesta altura, fora de questão. Para Helena de Senna Fernandes, “não seria justo colocar outra pessoa para de repente assumir esta tarefa, sem mais nem menos, e que já tem a assinatura de outra pessoa”. No entanto, e tendo em conta edições futuras, a Comissão Organizadora admite que já está à procura de quem assuma o cargo – ainda assim, é uma tarefa que, de momento, exige calma. “Há pessoas em todo o mundo que têm este tipo de experiência e há pessoas qualificadas para assumir este tipo de tarefas. Não é altura para precipitar a situação, mas sim para acalmar os ânimos”, diz Helena de Senna Fernandes.

Tudo indica que a programação prevista para a primeira edição do MIFF não vai sofrer alterações e, até ontem, nenhum dos convidados declinou os convites. “Quando publicámos a notícia da demissão de Marco Muller, fizemos saber a informação a todos os contactos associados ao festival, e até à data, ainda não recebemos nenhuma recusa por parte dos nomes até agora confirmados”, explica a directora dos Serviços de Turismo. “Os filmes que estão divulgados também já assinaram acordo com evento pelo que, caso não queiram prosseguir com a sua participação, terão as consequências previstas”.

 

 

 

Estreias mundiais e asiáticas em destaque

O cartaz da primeira edição do Festival Internacional de Cinema de Macau é composto por 49 filmes. A informação foi adiantada ontem na conferência de imprensa promovida pela comissão organizadora do evento.

Do programa relativo à competição internacional, a mais prestigiada do evento, constam 11 películas, todos eles estreias, mundiais ou asiáticas. As origens são diversas e os filmes vêm de França, Inglaterra, Índia ou Japão.

Ainda em competição oficial está a estreia no grande ecrã de “Sisterhood”, da realizadora local Tracy Choi, ou “São Jorge”, do português Marco Martins, metragem que valeu a Nuno Lopes o prémio de melhor actor da secção “Horizontes” do Festival de Veneza. Os 11 filmes em competição concorrem a nove prémios dos quais se destacam os de melhor filme, melhor realizador ou melhores actores de ambos os géneros.

Do júri fazem parte cinco elementos presididos pelo produtor e realizador indiano Skekhar Kapur, que já viu as suas obras nomeadas para os Óscares e Baftas.

O festival inclui ainda várias rubricas e em competição há uma secção especialmente dedicada à Ásia, a “Hidden Dragons”.

A comissão organizadora sublinhou a importância das “masterclasses” – duas – que vão ser levadas a cabo por Gianni Ninnari, Tom McCarthy e Bobby Cannavale.

Do programa consta ainda uma secção de competição de curtas-metragens de modo a incentivar a produção e divulgação local. As inscrições abriram ontem e fecham a 30 de Novembro.

O MIFF abre o ecrã com “Polina”, a 8 de Dezembro, uma produção francesa que conta a história que junta a sétima arte e a dança contemporânea na personagem que dá nome à película. A realização está a cabo de Angelin Preljocaj e Valérie Muller, e o elenco conta com Anastasia Shevtsova e Juliette Binoche.

Os bilhetes estão à venda a partir da próxima segunda-feira e os preços são de 50 patacas para as sessões normais e de 80 para as sessões em 3D.

Mueller em tribunal?

A Associação de Cultura e Produção de Filmes e Televisão de Macau, co-organizadora do MIFF, fez saber ontem, em nota de imprensa, que “irá exigir a Marco Mueller todas as responsabilidades decorrentes do incumprimento contratual, por todos os meios ao seu alcance, incluindo a via judicial”. Helena de Senna Fernandes admite a possibilidade de abertura de um processo contra o director demissionário, dadas as circunstâncias da sua saída. Para a associação, o que está em causa é o incumprimento do compromisso assinado pelo director italiano. “Marco Mueller faltou ao compromisso assinado como director do Festival conforme acordo assinado com a Associação de Cultura e Produção de Filmes e Televisão de Macau [sic]”, lê-se na mesma nota.

É a segunda vez que se anuncia uma primeira edição de um festival internacional de cinema de Macau organizado por esta associação. No ano passado, o evento também terá estado para acontecer, sem ter sido realizado. Helena de Senna Fernandes, confrontada com a situação, não adiantou as razões que levaram a iniciativa a ficar pelo caminho e os representantes da associação não se pronunciaram em conferência de imprensa, nem avançaram com mais informações acerca de um eventual processo contra Marco Mueller.

 

15 Nov 2016

Despedida | Morreu o músico Leonard Cohen

É um ano negro para quem gosta de música – de música a sério. Leonard Cohen morreu na passada sexta-feira, aos 82 anos. Tinha músicas e poemas para acabar, mas dizia-se preparado para ir embora

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á menos de um mês contava que só pensava na família, nos amigos e no trabalho que tinha em mãos. “Tive uma família para alimentar. Nunca vendi o suficiente para ser capaz de deixar de pensar em dinheiro. Tive dois filhos e a mãe deles para apoiar durante toda a vida. Tornou-se um hábito”, explicava à New Yorker, numa longa entrevista publicada a 17 de Outubro.

“Depois há a questão do tempo, que é poderoso, com o seu incentivo para acabar. Estou longe de conseguir acabar. Acabei algumas coisas. Não sei quantas mais conseguirei acabar, porque neste momento sinto uma grande fadiga… Há alturas em que tenho de me deitar”, desabafava. “Já não consigo tocar.”

Leonard Cohen morreu aos 82 anos e a notícia chegou pelo Facebook. Na página oficial de Cohen alguém anunciou, “com profundo pesar, que morreu o legendário poeta, escritor de canções e artista”, para depois acrescentar que “perdemos um dos visionários mais prolíficos da música”. Não foram dados detalhes sobre o que aconteceu – apenas que estava planeada uma cerimónia em Los Angeles, onde o músico viveu durante muitos anos.

No artigo de Outubro, a New Yorker contava que Cohen tinha poemas para terminar, letras de músicas que ainda não tinha acabado, outras que não tinha gravado e outras prontas mas ainda por lançar. Estava a pensar, na altura, fazer um pequeno livro de poemas. “A grande mudança é a proximidade com a morte”, dizia. “Eu sou o tipo de pessoa arrumada. Gosto de acabar as coisas que comecei. Se não puder, tudo bem. Mas a minha natureza é essa.”

Leonard Cohen sabia que não seria capaz de acabar as canções que tinha a meio. “Acho que não vou conseguir. Talvez, quem sabe? Mas não me atrevo a ficar preso a uma estratégia espiritual. Jamais o faria. Tenho algum trabalho para fazer. Estou pronto para morrer. Espero que não seja muito desconfortável. Chegou a minha hora.”

Uns dias depois, foi lançado o 14o. e último álbum do cantor, “You Want it Darker”. Na música que abre o disco – a música que dá o nome ao disco – ouve-se “I’m ready my Lord”. Cohen estava pronto.

Da simplicidade

O que é que tinha Cohen de especial? “Para mim tudo. As palavras que tocam no mais íntimo de nós, na esperança, no amor, na sua constante beleza. A voz que nos envolve como nenhum outro, que ecoa dentro do nosso corpo. A música que se eleva em arranjos de uma simplicidade espiritual tão difícil de conseguir.” José Drummond, artista plástico, recebeu a notícia do desaparecimento de Leonard Cohen com profunda tristeza. “É uma estupidez por certo mas, tal como com David Bowie, sinto-me órfão”, diz. “São aqueles que estiveram sempre ao meu lado. Em quem sempre me refugiei em momentos de dor ou de alegria. É tão difícil escolher uma música apenas”, admite.

Cohen foi transversal – atravessou gerações, países, chegou à fama sem nunca ter sido o artista que mais discos vendeu. Educou os sentimentos de muitos, com letras em que se fundiram imagens religiosas, temas de redenção e desejo sexual. E o amor, pois, o amor. “Cohen foi sempre o meu preferido para sonhar, para namorar, para acordar, para adormecer”, diz Drummond, sobre este homem “enigmático, uma estrela que se ocultava, que deixava a música falar por ele, que embora nascido judeu se dedicou ao budismo zen e que, nos seus poemas, incorporava todo um sentido cristão”, resume. “Podemos falar tanto sobre ele e o que quer que digamos é sempre bom.”

Natural do Quebeque, Leonard Cohen já era um poeta e um novelista conceituado quando, em 1966, se mudou para Nova Iorque. Tinha 31 anos quando entrou no mundo da música. Não foi preciso muito tempo para que a crítica começasse a comparar o seu trabalho ao de Bob Dylan, pela força lírica das canções que escrevia.

Apesar de ter influenciado muitos músicos e de ter sido distinguido das mais diversas formas – celebrado pelo mundo do espectáculo, mas também pelas autoridades oficiais do Canadá, por exemplo – Cohen raras vezes atingiu os tops com o folk-rock (rótulo talvez curto) que foi gravando. Escreveu, no entanto, músicas que foram revisitadas por centenas de artistas. “Hallelujah”, lançada em 1984, é talvez o melhor exemplo do modo como o escritor de canções marcou gerações de cantores.

Do sagrado ao profano

Muitas das canções que Leonard Cohen escreveu tornaram-se famosas pela voz de outros músicos – no início dos anos 1960, Judy Collins ajudou à projecção do compositor ao gravar alguns dos seus primeiros temas.

Os admiradores de Cohen comparam os seus trabalhos a uma espécie de profecia espiritual. Escreveu sobre religião, mas também sobre amor e sexo, política, arrependimento e acerca daquilo que um dia disse ser a procura por “uma espécie de equilíbrio no caos da existência”.

As letras das suas músicas eram muito pessoais – e às vezes assemelhavam-se a preces, como “Bird on the Wire”, de 1969. Entre os temas mais conhecidos estão “Suzanne”, “So Long, Marianne”, “Famous Blue Raincoat” e “The Future”.

“So Long, Marianne” nasce do relacionamento com Marianne Ihlen, uma mulher que foi namorada – e musa – de Cohen nos anos 1960, depois de se terem conhecido na Grécia.

No artigo da New Yorker, depois de ter ficado a saber que Marianne teria poucos dias de vida, conta-se que Leonard Cohen lhe escreveu um email: “Bem Marianne, chegou a altura em que somos mesmo velhos e em que os nossos corpos já não aguentam, e eu acho que te vou seguir muito em breve”. Dois dias depois, o cantor ficou a saber que ela morreu depois de ter lido o email que lhe enviou. So Long, Marianne.

Dos livros aos discos

A voz anasalada e grave – muito grave – de Cohen nem sempre foi bem recebida pela crítica e por outros músicos, como o britânico Paul Weller, que chegou a considerar que se estava perante um estilo melancólico “de cortar os pulsos”. Mas a verdade é que o trabalho de Leonard Cohen também é marcado pela ironia e por um sentido de humor muito próprio.

Nascido em 1934, filho de judeus, o poeta, novelista e escritor de canções cresceu em Montreal, num bairro onde se falava inglês. Na adolescência, leu Federico García Lorca, aprendeu a tocar guitarra e formou uma banda de country que se chamava “Buckskin Boys”. Frequentou a McGill University, em Montreal, tendo publicado o seu primeiro livro de poesia pouco depois de se ter formado.

A viver com apoios do Governo do Canadá e com dinheiro que herdou da família, Cohen publicou, na década de 1960, as colecções de poesia “The Spice-Box of Earth” e “Flowers for Hitler”, e os romances “The Favourite Game” e “Beautiful Losers”. Mas, desiludido com o modo de vida que tinha, decidiu começar a escrever canções e acabou por fazer uma audição em 1967 com John Hammond. O produtor conseguiu um contrato com a Columbia Records, a discográfica com que Cohen viria a ter uma relação de cinco décadas.

Deu centenas e centenas de concertos, mas também passou por períodos de isolamento, de meditação, longe dos públicos. Durante os anos 1990, esteve num mosteiro budista zen nas Montanhas de São Gabriel, perto de Los Angeles. Entre 2008 e 2013, voltou a palco com muita regularidade, depois de ter sido incapaz de recuperar grande parte dos nove milhões de dólares que dizia terem-lhe sido tirados por Kelley Lynch, antiga manager e companheira.

Apesar da relação por Marianne – e das outras mulheres que fizeram parte da sua vida – Leonard Cohen não casou. Deixou dois filhos, milhares de fãs e uma obra para durar até ao fim do amor.

 LER AINDA: A alquimia de transformar a escuridão 

14 Nov 2016

A alquimia de transformar a escuridão

O último álbum de Leonard Cohen
O último álbum de Leonard Cohen

[dropcap]U[/dropcap]m mês depois de completar 82 anos, Leonard Cohen ofereceu ao mundo o seu, agora confirmado, último álbum. “You Want it Darker” não é só mais uma viagem do compositor, poeta e cantor canadiano, à melancolia da existência. Agora, visto à luz da sua recente despedida, é o adeus sóbrio e sublime de um dos grandes nomes da canção dos últimos 50 anos.

Leonard Cohen abre o disco com o tema que lhe dá nome e faz antever a morte, em que o “I´m ready my lord” não é só mais um verso, mas sim a assinatura da canção. A playlist que se segue, faixa a faixa, não é menos consciente.

“Treaty” é uma verdadeira metáfora de amor e angústia perante a vida. Um tema de cansaço que, agora, se pode associar ao seu debilitado estado de saúde e à impotência perante o inevitável. O tão almejado “tratado” regressa na última faixa de “You Want it Darker”, agora num frenesim de cordas que marcam o abrir de portas do fim do disco e de 50 anos embalados pelos temas de Leonard Cohen.

A voz grave, que mais parece vinda das entranhas da melancolia, continua pelo álbum fora. Limpa, como a verdade que Cohen aponta tema a tema, e cortante em cada palavra que entoa.

“I´m travelling light, it´s au revoir” é só um verso que abre mais uma canção, já com “You Want it Darker” a meio. Uma canção entre bandolins e coros, que o cantor tanto honrou ao longo da carreira, num convite a uma dança harmoniosa com a despedida de um amor, de uma vida.

Não é possível escolher o melhor tema dos nove que compõem o último disco de Cohen. Mas é imperativo um tirar de chapéu, grato e humilde, como também ele ensinou a fazer nos concertos que deu nos últimos anos de vida. “You Want it Darker” é mais um reflexo daquele que conseguiu dotar a escuridão da existência de uma beleza doce, capaz de fazer os outros entenderem melhor o que levam no coração. “You Want it Darker” é um álbum, como todos os outros de Leonard Cohen, de amor, esperança, desilusão e, agora, de um verdadeiro adeus.

 LER AINDA: Morreu o músico Leonard Cohen 

14 Nov 2016

Palestra | Turismo deve dar a conhecer a história do território

 

O património de Macau classificado pela UNESCO deve ser dado a conhecer para além da fotografia turística, considera a arquitecta Maria José de Freitas, que dá uma palestra amanhã sobre os desafios de uma das principais indústrias do território. A intenção é perceber como ligar as informações dada pelos guias à história local

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] história de Macau, o património e a sua herança cultural representam, actualmente, um desafio para os guias turísticos da região. A ideia é defendida pela arquitecta Maria José de Freitas ao HM, que considera que há que investir activamente na formação dos profissionais do sector. “O desafio para os guias turísticos diz respeito à informação a ser passada às pessoas e aos visitantes capaz de conter mais dados acerca da história do património local por onde passam”, ilustra.

De modo a explicar a actual situação, Maria José de Freitas sublinha que “os principais desafios que neste momento se apresentam nesta comunicação entre património e agentes turísticos estão associados ao próprio contexto do território”. Para a arquitecta, circunstâncias como o desenvolvimento do sector do jogo e a abertura de toda uma série de novos casinos, e a consequente entrada de mais pessoas no território provenientes, na maioria, da China Continental, criam a possibilidade de dar a conhecer “um pouco mais acerca de Macau”.

No entanto, o facto de os casinos proporcionarem passeios pela cidade não significa que promovam o conhecimento pelos locais por onde passam. “As pessoas são levadas a passear, mas não são informadas”, aponta Maria José de Freitas. “Andam pelas ruas, tiram umas fotografias, passam pelas Ruínas de São Paulo ou pelo Senado e pouco mais acontece, quanto muito ainda comem uns pastéis de nata, o que é muito curto e muito pouco.”

No entendimento da arquitecta, urge a criação de circuitos de passeio curtos e com menos gente, mas munidos de guias devidamente informados para que possam elucidar sobre o que foi a história de Macau e sobre os espaços que se estão a percorrer.

No programa das visitas deveria constar por exemplo a deslocação, acompanhada da devida informação, ao museu que se situa nas Ruínas, que faz alusão aos jesuítas e ao papel da própria Igreja, além de ter sido o Colégio de São Paulo que representa a primeira universidade ocidental na Ásia. A ideia é que estas são informações “que podem abrir os horizontes a quem nos visita e até proporcionar uma outra imagem de Macau”.

Da foto ao conhecimento

O desafio é avançar de uma situação de registo fotográfico “como se o património não passasse de um cenário de fundo para um registo informado e mais participado”, explica a arquitecta. Maria José de Freitas dá como exemplo a possibilidade de os visitantes, num trajecto de um dia, poderem conhecer os locais principais da cidade, sendo que seria positivo, para quem queira mais detalhe, um outro tipo de resposta. “É nesta parte que residem as dificuldades e que deve ser alvo de intervenção mais cuidada, tendo em vista o património de Macau que é reconhecido pela UNESCO.”

A ideia encaixa no que as políticas para a diversificação do turismo têm vindo a proclamar e que tem de ser efectivamente posto em prática. Para o efeito, há que ter guias com formação universitária e na posse de informação fundamentada e detalhada. “Macau tem de escolher entre um turismo em que tem 40 ou 50 pessoas enfiadas num autocarro e que param em determinados lugares para a tal fotografia, ou assume que tem um património para mostrar e uma cidade que, nas suas ruas, arquitectura e planeamento manifestam uma história que precisa de ser contada, sendo que é necessário que haja alguém capaz de o fazer.” Neste sentido, a arquitecta considera ainda que cabe ao Governo e mesmo aos casinos a promoção da vertente cultural do património de Macau.

Um património único

“Macau tem um património único, nomeadamente no que respeita à mistura cultural. E é nesta miscigenação, que não é inteiramente ocidental ou oriental, que está a originalidade do território”, afirma. Outra característica do património local reside no facto de “não ser demasiado erudito”, no sentido em que muitas das construções não foram feitas por arquitectos ou engenheiros, mas sim por militares, por exemplo, que por cá viveram e deixaram o seu legado cultural inscrito no actual património. “Os nossos edifícios mostram uma história escrita na pedra e que é de cinco séculos, e que continua a ser construída”, remata Maria José de Freitas.

Se por um lado as entidades competentes não têm tido o papel que lhes cumpre na associação da informação turística à história local, a palestra que irá proferir a convite da Associação de Estudos da Herança e Património de Macau revela, surpreendentemente, a vontade de assumir este tipo de desafios por parte de entidades privadas e formadas por “gente interessada e com formação”.

“O encontro com este núcleo aconteceu, inesperadamente, em Portugal, numa conferência internacional acerca de património em que faziam uma apresentação sobre Macau e as suas particularidades”, recorda. No entanto, “esta é uma situação, a da relação entre o património e a informação turística, que passa muito ao lado das entidades oficiais, quer ligadas a Portugal, que ao Instituto Cultural, e são estas pessoas, ao nível individual, que mostram ter uma actividade cuidadosa, informada e rigorosa acerca de um assunto que é, de facto, de relevo”, defende.

A palestra “De cenários amorfos a espaços culturais com significado – Desafios para o turismo na cidade de Macau” tem lugar amanhã, pelas 14h, na sede da Associação de Estudos da Herança e Património de Macau, situada na Rua dos Artilheiros.

11 Nov 2016

Fortes Pakeong Sequeira: “O trabalho criativo é um acto de partilha”

 

Aos 13 anos foi para Hong Kong para ser gangster. A vida mudou-lhe o rumo e Fortes Pakeong Sequeira é um dos artistas locais de renome. Multifacetado, inaugura no próximo fim-de-semana a exposição “Return to Nature” e organiza a segunda edição do festival alternativo “Blademark”

 

“Return to nature” apresenta uma nova abordagem sua. O que é que o público pode esperar desta exposição?

Não espero que as pessoas venham ver esta exposição para dizerem que gostam muito deste meu novo estilo. Espero, acima de tudo, conseguir partilhar aquilo que realmente tenho sentido e que me acompanhou na concepção dos trabalhos que vão estar expostos.

Está a falar de alguma altura ou circunstância em particular?

Sim. O último ano tem sido um momento muito especial e preenchido por muitas questões. Na essência, andava duvidoso acerca do que realmente queria enquanto artista. Ao mesmo tempo que me ia questionando, ia trabalhando e, no resultado, gostava que as pessoas, ao observarem, pudessem também, perante elas, perguntarem-se o que é que realmente as faz viver e para o que é que vivem.

 Ao longo do processo, encontrou algumas respostas?

Acho que, com o processo criativo destas obras, encontrei algumas respostas ao que me incomodava. Este ano foi um ano de transição para mim, em que me senti perdido. Na base da “aflição” estava a decisão que tinha tomado de me tornar independente dentro do que fazia. Isso assustou-me e, de repente, senti-me perdido. De repente questionei-me se era realmente um artista e o que é que conseguia fazer. Mas dei por mim a conseguir fazer as coisas e, mais que tudo, senti que tinha quem apoiasse o meu trabalho. Por outro lado, foi bom fazer alguma coisa que nunca tinha feito antes e, ao mesmo tempo, senti que estava a aprender muito. Acabou por ser muito gratificante até porque não faço as coisas só para mim, mas sim para partilhar com os outros. O trabalho criativo é um acto de partilha. Quando resolvemos ser independentes e os outros não nos dão o valor que possamos ter, é muito triste. As pessoas pensam que és um vagabundo. Com este trajecto aprendi também a ver quem é que estava comigo. Foi bom não estar sozinho e sentir o apoio de vários lados. Esta exposição é o produto de tudo isso e desse caminho num processo em que resolvi mudar tudo na minha vida. Mais que assustador, foi um processo engraçado, mas conturbado.

O festival que se realiza no próximo fim-de-semana vai já na segunda edição. Como apareceu e porquê a repetição?

No ano passado, o festival foi criado pela banda de que faço parte e que tem o mesmo nome – Blademark. Fazíamos dez anos de existência e resolvemos comemorar com uma festa que se transformou num festival. A adesão foi surpreendentemente boa e só nos demos conta quando nos apercebemos do número de pessoas que tinham participado e dos comentários que faziam. O resultado foi surpresa e satisfação por um festival dedicado à componente mais alternativa, do rock, e mesmo do metal ter tanta adesão em Macau. Penso que é fundamental o convívio entre diferentes tipos de culturas urbanas e com o evento, associadas à música, juntaram-se pessoas que trabalhavam em várias áreas, ligadas essencialmente, às industrias criativas. Esta sinergia acabou por fazer com que o evento se tornasse maior e mais dinâmico.

Agora, mais independente e enquanto artista, como é sobreviver em Macau nesta área?

Não é nada fácil. O facto de se pintar ou desenhar não garante que os trabalhos sejam vendidos. No processo temos de comprar os materiais que utilizamos e acabamos por estar a gastar sem nunca ter garantias. No entanto, este ano e com tanta mudança, decidi apostar noutras áreas ligadas à criação artística e a marcas associadas. Por exemplo, comecei a dedicar-me mais à ilustração e à concepção de objectos com os desenhos que vou fazendo. Para mim é também um novo desafio um novo interesse. Estou também a apostar em roupa, por exemplo. Paralelemente, criei uma marca pessoal à qual se associam outros projectos, como por exemplo a Blademark, que também é uma marca, ou a Denim Works em que participo com outro sócio. Vamos formando uma rede em que juntamos objectos e criatividade, e a coisa funciona.

A sua história e sucesso não são comuns….

Talvez não. Lembro-me que sempre pintei desde pequeno, era uma coisa natural. Recordo-me de uma amiga da minha mãe referir que “tinha jeito para aquilo”. Por volta dos oito anos ganhei um prémio internacional e a minha professora da altura recomendou que eu seguisse alguma coisa ligada à carreira artística. No entanto, aos 13 anos desisti de estudar e optei por uma carreira de gangster em Hong Kong.

Mas o que é que aconteceu?

Na realidade desisti de tudo e escolhi não ser uma pessoa, naquele momento. Vivi cinco anos em Hong Kong. Acabei por ficar detido no posto da polícia durante um mês, estava quase com 18 anos. A minha mãe foi-me buscar e fui a vários julgamentos. Acabei por ser solto, regressei a Macau e voltei para a escola.

Aos 18 anos?

Sim. Todos os meus colegas de turma eram mais novos do que eu cinco anos. Não foi fácil adaptar-me, mas não tinha outra hipótese e estava ciente de que não podia dedicar-me mais à preguiça. Já tinha perdido demasiado tempo. Acho que tive mais uma oportunidade para viver. Acabei por tirar Design Gráfico no Instituto Politécnico de Macau, área em que trabalhei vários anos e com a qual viajei pelo mundo. Depois as coisas foram acontecendo. Acabei por ser convidado a expor e em 2009 a participar a “Art Beijing”. Foi um momento muito importante porque foi a primeira vez que saí de Macau para mostrar o meu trabalho enquanto artista. Como pintava ao vivo durante o evento, as pessoas interessaram-se por mim e pelo que estava a fazer. A partir daí comecei a andar entre Macau e China Continental, e quando dei por mim estava a passar por Tóquio, Nova Iorque ou Portugal para mostrar a minha técnica. Fui vendendo alguns dos meus trabalhos de modo a sobreviver.

Que conselho deixaria aos jovens artistas de Macau?

Que acreditem. Se gostam do que fazem, se isso for onde se encontram realmente, têm de confiar e trabalhar. No fim, o que é bom na vida é o que se ama, porque o dinheiro, na realidade, não consegue comprar o que nos preenche.

Que expectativas tem para esta segunda edição do Blademark?

A única coisa que espero é que as pessoas gostem de lá estar. O festival vai ter sete bandas a dar concertos e muitas actividades e mostras de trabalhos criativos associados à marca e não só. São todos bem-vindos.

 

Blademark para todos os gostos

Realiza-se no próximo fim-de-semana a segunda edição do Blademark. O festival que vai ocupar o Albergue promete dar oportunidade ao contexto alternativo de se mostrar, tanto na música, como pelos objectos espalhados e à venda pelas tendas que o integram. O objectivo é criar um espaço dinâmico em que caibam todos, afirmou a organização ao HM. Das 15h às 20h, o pátio do Albergue vai acolher em palco os Lansin, Kylamary, Ferdinand Choi, Experience, Catalyser, Zenith e, claro, a banda que lhe dá nome e corpo, os Blademark. A assinalar o evento, e além das bancas de vestuário, artesanato, produtos de design ou comes e bebes, esta segunda edição conta com a projecção do filme “A primeira década dos Blademark”. A entrada é livre.

10 Nov 2016

Han Lili | Literatura local é de qualidade mas precisa de divulgação

 

 

A literatura de Macau está bem e recomenda-se. A ideia é passada pela académica Han Lili que esteve no Fórum do Livro de Macau em Lisboa para apresentar e discutir a produção e necessidades da actividade literária local

 

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] necessário divulgar a literatura que se produz em Macau. A sugestão é deixada pela académica e poetisa Han Lili, após ter participado no primeiro Fórum do Livro de Macau em Lisboa. A também professora do Instituto Politécnico de Macau foi, a convite da Associação Amigos do Livro, dar a conhecer um pouco da produção literária que se faz na região, de modo a suscitar a discussão acerca da temática.

Um dos problemas que a produção literária local atravessa é a falta de divulgação e o Fórum proporcionou um momento para que tal fosse feito. Com um balanço “muito positivo” do evento, Han Lili não deixa de sublinhar o facto de mesmo as pessoas que são de Macau e que estavam presentes em Lisboa desconhecerem algumas das traduções que já existem de obras escritas em chinês na região. A situação demonstra que “a produção literária que por cá se faz não é suficientemente divulgada, e o Fórum proporcionou um momento de debate acerca das dificuldades e caminhos a seguir de modo a motivar a literatura local”, refere Han Lili no balanço que faz da sua participação na iniciativa.

Divulgação é prioridade

“Os escritores locais enfrentam muitos desafios, porque o mercado não tem muita procura”, afirma a académica, pelo que considera “imperativo que sejam divulgados na China Continental e com iniciativas como o Fórum do Livro de Macau”, para que as traduções possam ser incentivadas e as obras possam rumar a outros continentes. “Há falta de informação em Macau acerca do que cá se produz literariamente, e é preciso divulgar e materializar esta ponte entre as duas culturas”, ilustra ao HM.

No cerne das questões debatidas em Lisboa esteve a necessidade de apoio social e institucional para divulgar a literatura de Macau. “Para dar a conhecer livros é necessário que as pessoas saibam que existem e que os leiam, é preciso público.”

Neste sentido, é urgente que se passe à sensibilização social de modo a fomentar o hábito de ler obras escritas por locais. Han Lili considera ainda que “se houver este mercado e esta procura, será uma forma de incentivar os próprios tradutores a realizar um trabalho mais exaustivo e elaborado, de modo a ter o sucesso necessário na sua função”.

No entanto, a dificuldade em traduzir este tipo de obras, e especialmente a poesia, é vivida na primeira pessoa pela académica. Paralelas à necessidade de tradução para uma maior divulgação estão as dificuldades associadas ao processo de passar conceitos, nem sempre concretos, para um outro sistema linguístico.

No sentido de promover o bilinguismo e a sua materialização no que respeita à tradução literária, Han Lili considera que as directivas de Pequim no sentido de desenvolver a língua portuguesa são fundamentais e “já se notam”. “A estratégia do Governo Central e respectiva implementação das Linhas de Acção Governativa já se reflectem, por exemplo, nos cursos de Tradução que são motivo de cada vez mais candidaturas”, explica, sem deixar de salientar que é preciso mais. Para traduzir uma obra literária não basta ser tradutor, há que ter sensibilidade e dominar por completo as culturas em que as línguas com que se trabalha se inserem.

“No mercado é muito difícil encontrar tradutores de qualidade, sobretudo de obras literárias, área em que não chega ter o curso e é preciso ter a sensibilidade necessária para, por exemplo, poder traduzir poesia.”

A ilustrar a situação, Han Lili dá o seu próprio exemplo enquanto poetisa. “Não traduzo os meus poemas, ou os escrevo em português ou em chinês, porque há elementos que não podem ser traduzidos”, explica.

No entanto, na opinião da académica, os escritores locais estão cada vez mais incentivados e precisam de mais iniciativas por parte das próprias instituições.

A académica, que foi falar de literatura chinesa de Macau à capital portuguesa, considera que o tema engloba não só a literatura produzida por autores locais, mas também a que foi escrita por outros desde que seja sobre o território, ou feita por quem por cá tenha passado. “Para poder alargar a dimensão que abrange a literatura de Macau, recorri à definição proposta por José Seabra Pereira, em que literatura de Macau não significa que seja escrita por pessoas de Macau, mas sim aquela que é sobre a terra, porque Macau não é um conceito geográfico”, explica Han Lili ao demonstrar que o tema é alargado.

Na calha para o futuro

Macau já tem uma produção literária “sólida”, afirma ao HM, que se reflecte tanto no que respeita à escrita em português como em chinês, e mesmo em obras traduzidas, algumas pelos próprios autores. Han Lili destaca Yao Jingming, que escreve em chinês, português ou mesmo inglês. No entanto, “apesar de Yao Jingming fazer as suas traduções, tem muitas obras que ainda não têm versão em português”. Para a professora, o académico é um exemplo do que de sólido e de qualidade se faz em Macau ao nível da escrita”. “Além de ter uma sensibilidade poética, [Yao Jingming] consegue escrever em línguas diferentes, sem que interfiram uma com a outra”, explica.

Outra referência proposta para futura tradução é a poetisa Susana Yun ou Tai Ki, que “é uma excelente romancista”. Ao recorrer a pequenas histórias, Tai Ki consegue tecer um argumento complexo e muito estruturado, o que lhe valeu o prémio de literatura, durante três anos, atribuído pela Fundação Macau: “Isto demonstra que a qualidade começa a ser reconhecida”.

 

9 Nov 2016

Exposição de Tim Burton chega a Hong Kong

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] o mundo fantástico de uns dos realizadores mas aclamados da actualidade. Depois de passar por várias capitais mundiais, é a vez de Tim Burton trazer, a Hong Kong, a sua magia.

A exposição, que se traduz num espaço labiríntico, alberga nove galerias temáticas e explora transversalmente o trabalho do realizador num caminho que vai da infância ao agora aclamado Tim Burton.

Em Hong Kong, apresenta cerca de 500 obras que incluem esboços e projectos completos, pinturas, storyboards e fotografias em grande formato de trabalhos tão conhecidos como “Eduardo Mãos de Tesoura”, “O Estranho Mundo de Jack”, “Batman”, “Marte Ataca!” ou “Ed Wood”, não descurando o que ficou de trabalhos nunca materializados em obra editada.

A retrospectiva de trabalhos de Tim Burton foi concebida pelo MoMA, em 2009, e depois viajou para as cidades de Melbourne, Toronto, Los Angeles, Paris e Seul. O “Mundo de Tim Burton” foi crescendo e a ele foram acrescentados mais 150 itens para mostrar. A exposição conta com a curadoria independente de Jenny He, em colaboração com a Tim Burton Productions, e está patente na ArtisTree até 23 de Janeiro do próximo ano com bilhetes que vão dos 180 aos 220 HKD.

O autor

Timothy Walter Burton nasceu em 25 de Agosto de 1958, em Burbank, no sul da Califórnia, nos Estados Unidos. Enquanto adolescente, dedicava-se ao desenho e à produção de curtas-metragens, como forma de se alhear do tédio. Em 1976, entrou no California Institute of The Arts e, alguns anos depois, em 1979, entrou para a The Walt Disney Company, onde foi estagiário de animação.

A carreira na sétima arte de Burton começou em 1985 na Warner Bros, com “As Grande Aventuras de Pe-wee”, “Beetlejuice” (1988) e “Batman” (1989), e a sua reputação enquanto autor de um estilo visual único foi conseguida com o sucesso de “Eduardo Mãos de Tesoura” (1990) e “The Nightmare Before Christmas” (1993). Ao longo da sua produção cinematográfica, Burton explorou os mais variados géneros, entre eles, a biografia em “Ed Wood” (1994), a ficção-científica em “Marte Ataca!” (1996), o terror com “A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça” (1999), a fantasia de “Big Fish” (2003), stop-motion com “A Noiva Cadáver” (2005), a literatura infantil em “Charlie e a Fantástica Fábrica de Chocolate (2005)” e o musical em “Sweeney Todd” (2007).

 

8 Nov 2016

Moda | Macaense Nuno Lopes de Oliveira quer estabelecer marca em Macau

 

A colecção final de curso do macaense Nuno Lopes de Oliveira mereceu destaque na Vogue britânica e na Elle italiana. Findo o curso e com a marca estabelecida na capital inglesa, Nuno Lopes de Oliveira quer trazer a marca para a sua terra natal através do estabelecimento de uma loja online

 

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a cabeça de Nuno Lopes de Oliveira o mundo pode ser dourado e brilhante, mas ao mesmo tempo leve e descontraído. As roupas têm tons fortes, mas também podem ser associadas ao chamado estilo street wear. O macaense, que recentemente terminou o curso de Design de Moda na Universidade Middlesex de Londres, conseguiu que algumas peças da sua colecção final de curso aparecessem nas revistas Vogue britânica e Elle italiana, que ditam tendências e criam estilistas.

Com a marca estabelecida em Londres, Nuno Lopes de Oliveira quer agora estabelecer-se na terra que o viu nascer e de onde saiu há dez anos para fazer a sua formação como estilista. Ao HM, o designer confessou que o estabelecimento da sua marca em Macau far-se-á através da criação de uma loja online, devido aos elevados preços das rendas.

“Vou manter o meu negócio em Londres enquanto tento trazer a minha marca para Macau. Será difícil, mas vai valer a pena”, confessou. “Vim a Macau participar num evento de moda da Feira Internacional de Macau (MIF), mas o meu objectivo é fazer uma pesquisa no mercado local e da Ásia, e tentar expandir a minha marca. Continuo a ter o meu negócio em Londres, mas estou neste momento à procura de fábricas na China com as quais possa trabalhar para implementar a minha marca”, explicou.

Londres, há muito uma das principais praças mundiais da moda, é um local mais fácil para Nuno Lopes de Oliveira começar uma carreira, mas a aposta na sua terra natal é para manter. “A atmosfera em Londres, na indústria da moda, é mais vibrante e há mais oportunidades. É mais fácil chegar aos estilistas e que eles cheguem até mim, mas em Macau isso não acontece. É esse o contraste que existe. Mas não quero estabelecer-me em Hong Kong só e deixar Macau para trás, porque sou de Macau. Tenho o meu negócio em Londres que serve de apoio e penso que as coisas podem funcionar em Macau”, apontou.

Tecidos com glamour

Enquanto não expande o seu trabalho, Nuno Lopes de Oliveira garante que as peças de roupa que faz não são muito comerciais e são apenas feitas por encomenda. O designer macaense tem ainda contactos com várias celebridades, sendo que a socialite Paris Hilton usou uma das suas criações quando actuou em Macau como DJ.

O designer acredita que as suas peças apareceram em duas grandes revistas de moda porque soube fazer diferente. “O dourado faz-me lembrar Macau e a sua arquitectura. O dourado faz-me lembrar a minha casa, então é como mostrar que tenho saudades de casa. O meu design tem tudo que ver com o meu estilo. Reflecte o lado glamoroso de Macau. O meu estilo é também uma mistura de alta costura com roupa de rua, e as colecções captam isso, algo diferente, porque eu não sigo tendências. A parte boa de ser designer é que podes criar algo diferente.”

Referindo que em Macau “há muitos estilistas talentosos”, Nuno Lopes de Oliveira defende que é bom que existam apoios governamentais, para uma maior diversidade de projectos económicos.

“O Governo tem vários apoios financeiros para os novos negócios, mas o que falta em Macau são oportunidades. No fim de contas, o foco acaba sempre por ir parar aos casinos, mas Macau pode ter uma maior diversidade. Tanto o Governo como as pessoas de Macau devem estar mais envolvidas em actividades culturais e isso iria levar Macau a tornar-se uma cidade mais diversificada.”

A preparar uma nova colecção, Nuno Lopes de Oliveira gostaria de levar as suas peças à próxima Semana da Moda em Londres. A participação na Semana da Moda de Shenzen, no próximo ano, já está garantida.

 

8 Nov 2016

Clockenflap | Festival de Hong Kong com olhos postos no futuro

A edição de 2016 do Clockenflap acontece no último fim-de-semana deste mês, com uma agenda cheia e diversificada. Música, dança, teatro e cinema são garantidos. Há andróides como convidados especiais, num dos festivais mais aguardados da Ásia

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hega a Hong Kong quando os dias começam a ficar mais frescos e é um dos momentos mais esperados do ano por aqueles que gostam de música, de músicos ao vivo, de performances e festivais. O Clockenflap tem vindo a crescer de ano para ano e 2016 não é excepção: entre 25 e 27 deste mês há muita música, artes e algumas surpresas a pensar no futuro.

O festival distribui-se por vários palcos ao longo do recinto construído no Central Harbourfront de Kowloon – é por aí que vão passar mais de 50 artistas.

À semelhança dos anos anteriores, os palcos principais são o Harbourflap, o FWD e o KEF, onde vão estar alguns dos nomes mais sonantes do cartaz e que prometem abordar as tendências musicais actuais de modo ecléctico. Ali há espaço para os artistas que recentemente vieram a público e para os que já têm assinatura marcada com anos de carreira e sucesso.

Desfile de lendas

Junta-se à festa das artes e na secção das “lendas” o grupo pioneiro de hip hop americano The Sugarhill Gang, que tiveram o single “Rapper’s Delight” a estrear o pódio da Bilboard. Noutro género, e vindo da música tradicional jamaicana, marcam presença os The Jolly Boys. Do rock, estão os Yo La Tengo que vão, com certeza surpreender os mais novos e trazer memórias a outras gerações que dedicavam os ouvidos à música independente. George Clinton & Parliament Funkadelic, como o nome indica, trazem o ritmo a palco e ao público, no funk que lhes é conhecido.

Ainda pelos palcos de “ouro” vão passar os Chemical Brothers, referência de mais de duas décadas de música, e os nórdicos e etéreos Sigur Rós trazem a sua linguagem própria vinda dos glaciares da Islândia. Do Reino Unido vem a rapper M.I.A. e os London Grammar que prometem, com este concerto, um espectáculo exclusivo na Ásia. Os Foals são também um dos nomes aguardados e que já constam como favoritos do evento. Taiwan também tem lugar marcado no palco das estrelas com a presença de Cheer Chen.

Os artistas do continente que acolhe o Clockenflap não foram esquecidos. Em estreia vão estar, de Taiwan, “No Party For Cao Dong” que, na cena rock alternativa, são considerados pela organização como um dos nomes mais procurados após a fusão pós-rock com o indie e os sons mais pesados do “metal”.

Ellen Loo, a formação alternativa Huh!? e ainda, com a nota no blues, os Juicyning, são alguma da “parta da casa” que vai marcar a presença de Hong Kong. A Coreia do Sul faz-se representar pelo quarteto indie Quartet Hyukoh e o Japão traz Sekai No Owari.

Já conhecido pela sua tendência burlesca e inesperada, o Club Minky é um dos espaços mais desejados para uma pausa bem-disposta, e muitas vezes, surpreendente. Ali cabem o teatro, o cabaret, a comédia ou as acrobacias. Este ano, a cabeça de cartaz são os vencedores do prémio “Melhor Circo e Teatro Físico” no Fringe de Adelaide, os All Genius All Idiot. Vindos de Estocolmo, utilizam a linguagem circense para abordar a condição e o comportamento humano.

Enquanto os palcos maiores se enchem, os menores não ficam atrás. Na agenda está ainda a malaiana Yuna, o pós dubstep de SBTRKT, os Blood Orange ou os inovadores Pumarosa com um espectáculo que não exclui a dança.

A eles juntam-se nos palcos onde o electrónico é maior, o Electriq e o Robot, nomes como o DJ Rødhåd, o DJ e produtor Danny Daze (EUA), Nick Höppner ou Terry Francis (Reino Unido). Também na agenda está Jimmy Edgar e Shy FX.

O Clockenflap volta a apostar nos momentos mais individualistas e a discoteca silenciosa regressa ao evento num espaço onde a música é vivida “a solo” e de auscultadores. Paralelamente, o Cinema Silenzio está de portas abertas e ecrã ligado. Nesta edição o programa é vasto, mas o projector está de olhos postos em “Lo and Behold” do já lendário Werner Herzog.

O futuro também está ali. Sophia é o robô mais recente e avançado da Hanson Robotics e personaliza os últimos desenvolvimentos na área da inteligência artificial. Capaz de aprender através da experiência e da interacção, este é o momento para poder conviver com “um ser do outro mundo”.

Paralelamente, e ainda na área da robótica, ocorre a performance que utiliza uma “máquina cega” que vai conhecendo os traços dos rostos que se disponham a passar por uma experiência diferente.

A realidade virtual também vai estar em Kowloon com a possibilidade de viver uma experiência a 3D como se estivesse a ver através dos olhos de um animal.

A segunda fase de venda de bilhetes termina esta semana, no dia 10. Os preços vão dos 850 aos 1620 dólares de Hong Kong (para o bilhete de três dias), sendo grátis para as crianças com menos de 12 anos.

7 Nov 2016

Livro | 15 anos depois, imprensa de Macau está bem e recomenda-se

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] coordenador do livro que aborda os jornais portugueses de Macau, entre 1999 e 2014, afirmou que a imprensa local tem “qualidade” e que permanece relevante, contrariando as previsões que se fizeram do seu fim. “A imprensa diária de Macau é uma imprensa que tem qualidade” e que se mostra “dinâmica”, apesar de “todas as dificuldades e insuficiências que tem”, disse à agência Lusa o coordenador do livro “15 Anos Depois: A Imprensa Portuguesa de Macau (1999-2014)”, João Figueira.

No entanto, aquando da transferência da soberania para a China, em 1999, perspectivava-se que a imprensa portuguesa em Macau poderia estar em vias de acabar, muito por culpa da ideia de que “o estatuto de região especial” e a manutenção do português como “língua oficial não passavam de meras fachadas”, explanou João Figueira, que falava à margem da apresentação da obra, na Casa da Escrita, em Coimbra.

“A realidade depois veio contrariar isso. Nunca a imprensa foi tão apoiada do ponto de vista oficial como é hoje e é apoiada não no sentido de controlar, mas por se entender que tem de haver uma imprensa diversificada que fale e que se expresse nas línguas oficiais”, sublinhou o também docente de Jornalismo da Universidade de Coimbra.

Além disso, “uma boa parte dos jornalistas não debandaram” quando Macau se tornou uma das regiões administrativas especiais da China, tendo feito “tudo para que a profecia não se cumprisse”. Numa região onde a população falante da Língua Portuguesa é minoritária, os jornais são também “um elemento de inserção” para uma comunidade que, na sua “esmagadora maioria”, pertence “a um padrão sócio cultural especial”, sendo altos quadros da administração, advogados, arquitectos, engenheiros ou analistas financeiros, entre outros.

A imprensa portuguesa acaba também por ser importante para toda a sociedade macaense, abordando muitas vezes assuntos que os jornais chineses “não abordam por sua iniciativa e que acabam por apenas tocar nessas matérias citando aquilo que saiu nos jornais portugueses”. “Apesar de tudo, temos uma tradição de liberdade de expressão e de capacidade de questionamento dos poderes que, culturalmente, na China não existe”, notou João Figueira.

Obstáculos e interrogações

Porém, há vários problemas que são também reflectidos no livro, nomeadamente a dificuldade no acesso às fontes e o facto de a maioria dos jornalistas não falar chinês e ter de fazer um trabalho “que muitas vezes tem que fazer quase em segunda mão, mediado por um intérprete”. A grande preocupação para o futuro está centrada nas próximas eleições que “vão decorrer daqui a quatro anos” e que levarão à mudança de líder, visto que o actual, Fernando Chui Sai On, está no seu segundo mandato.

“As interrogações têm que ver com isso: sobre se se vai manter o mesmo posicionamento de abertura e de apoio às minorias que coexistem neste território e que Pequim insiste que têm de existir”, observou.

Para o responsável da editora Livros do Oriente, Rogério Beltrão Coelho, a imprensa portuguesa, que vivia “basicamente apoiada ou sustentada por gabinetes de advogados” antes de 1999 viu as suas redacções “aumentarem em número e em qualidade”.

A imprensa portuguesa “afirmou-se por emitir opinião e por ser muito interventiva”, notou o editor que também passou por vários órgãos de comunicação de Macau, considerando que a importância que a China “dá à comunidade portuguesa e ao ensino do português” também foram importantes para a sobrevivência dos jornais.

“A força de intervenção da imprensa portuguesa é muito superior à sua tiragem”, frisou Rogério Beltrão Coelho. A obra, lançada pela Fundação Rui Cunha e Livros do Oriente, é da autoria de José Carlos Matias, Diana do Mar, Sónia Nunes, Marco Carvalho e Frederico Rato, contando com prefácio de Adelino Gomes.

7 Nov 2016