Filmes portugueses regressam à Cinemateca Paixão

Começa hoje mais um ciclo de cinema português na Cinemateca Paixão. A mostra que vai até sexta-feira traz ao ecrã películas que passaram pelo IndieLisboa e que têm sido aclamadas internacionalmente. “Amor, Amor” o filme que abre as hostes, tem no elenco a actriz portuguesa, que reside em Macau, Margarida Vila-Nova

 

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]elo terceiro ano consecutivo, a Portugal Film traz à Cinemateca Paixão uma selecção de filmes portugueses que marcaram o último ano no circuito internacional.

O programa abre hoje, às 20h, com a exibição do filme “Amor Amor”, de Jorge Cramez e que tem como uma das protagonistas Margarida Vila-Nova. “Amor Amor” é uma história que gira em torno das múltiplas relações entre um grupo de amigos e as promessas que se fazem na passagem de ano.

Em “Amor Amor”, as personagens Marta e Jorge namoram há sete anos, naquela que parece aos olhos de todos uma relação “perfeita”. De acordo com a sinopse da película, a relação é “demasiado perfeita, para desespero de todos: de Bruno, muito mais novo que Marta, mas loucamente apaixonado por ela; de Lígia, irmã de Bruno e melhor amiga de Marta, que adoraria ver o irmão feliz; de Carlos, amigo de Jorge, que mantendo um namoro superficial com Lígia, ama secretamente Marta; e de Jorge, ele próprio que, por medo que tal idílio seja a sua prisão, convencido de que o seu amor e o desejo de casamento da sua amada inibam a sua liberdade”. “‘Amor Amor’ é a história deste grupo de amigos que entre a madrugada de 31 de Dezembro e a madrugada de 1 de Janeiro, em Lisboa, vivem os ziguezagues do amor e em que há quem venha a descobrir-se a si próprio e há quem venha mesmo a descobrir o amor”. Há ainda os que vão descobrir o preço limite da liberdade num fim de ano que pode mudar tudo de uma forma completamente inesperada.O filme, que estreou no festival IndieLisboa 2017, participou em competições nacionais e internacionais e é a segunda longa metragem de Jorge Cramez.

Regresso ao passado

Amanhã, a mostra apresenta o documentário de Susana de Sousa Dias, “Luz Obscura”. O filme, que tem sido reconhecido internacionalmente, aponta a organização, é um documento fundamental para reflectir sobre os aspectos mais obscuros do Estado Novo. “Como dar corpo a quem desapareceu sem nunca ter tido existência histórica?” é a questão que se coloca neste documentário que procura revelar como um sistema autoritário opera na intimidade familiar, fazendo emergir, simultaneamente, zonas de recalcamento actuantes no presente.

A mostra termina na sexta-feira, dia 29, com uma sessão de curtas metragens composta por quatro películas. “Limoeiro”, uma animação de Joana Silva realizada em contexto escolar na Royal College of Art de Londres, é um filme que pretende reconstruir uma personagem fictícia, através da fisicalidade de um espaço em ruína.

Segue-se “O Homem de Trás-os-Montes”, de Miguel Moraes Cabral, uma ficção que parte do Guia de Portugal de Raul Proença, uma edição histórica, conhecida pela qualidade literária das descrições do país. Apaixonado por Trás-os-Montes e inspirado pelo guia, Miguel procura histórias para realizar este documentário. O imprevisto marca a produção, sendo que “um dia, a aparição de um homem montado num burro vai mudar o seu destino”, revela a organização.

“Flores”, de Jorge Jácome, um dos filmes portugueses que mais prémios arrecadou no último ano em festivais de cinema, é uma ficção que imagina um cenário de crise natural nos Açores provocada por uma incontrolável praga de hortênsias. Perante um cenário de crise natural, a população açoriana vê-se forçada a abandonar as ilhas. Entretanto, dois jovens soldados, “sequestrados pela beleza da paisagem, guiam-nos pelas narrativas dos que partiram e o inerente desejo de resistirem, ficando”, lê-se em comunicado. Com esta deambulação, “o filme assume uma reflexão nostálgica e política sobre território e identidade, bem como sobre o papel que assumimos nos lugares aos quais pertencemos”.

A sessão termina com “Os Humores Artificiais”, de Gabriel Abrantes, curta que estreou no festival de cinema de Berlim no ano passado, onde ganhou uma nomeação para os European Film Awards. O filme conta a história de uma menina indígena do Estado do Mato Grosso, Brasil, que se apaixona por um robô. “Os Humores Artificiais” foi rodado no Mato Grosso (Canarana e nas aldeias Yawalapiti e Kamayura dentro do Parque Indígena do Xingu) e em São Paulo e mistura uma “certa estética hollywoodiana com abordagens típicas do registo documental”.

27 Jun 2018

Fadista Teresinha Landeiro estreia-se em disco com “Namoro”

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] fadista Teresinha Landeiro, de 22 anos, que começou a cantar aos 12, por mero acaso e sem qualquer tradição fadista na família, edita na sexta-feira o seu primeiro álbum, “Namoro”, produzido pelo guitarrista Pedro de Castro.

Em entrevista à agência Lusa, a fadista afirmou que a sua opção, ainda tão jovem, pelo fado, se deveu ao facto de gostar de cantar em português e da temática dos poemas, maioritariamente interpretados no fado, aliando-se “à magia de ser cantado à noite”.

“Foi uma amiga da minha mãe que me despertou o interesse pelo fado e, aos 12 anos, como prenda de aniversário fui pela primeira vez a uma casa de fados, e a magia, pela sonoridade, foi imediata. E encantou-me de tal forma, que me despertou a vontade de querer ouvir e aprender mais”, disse a intérprete.

Teresinha Landeiro é autora da maioria dos onze poemas que gravou no CD, aos quais juntou um tema que lhe ofereceram, “Lisboa Marcha Assim”, de Fernando Jorge Alves e António José Alves, e quatro temas do repertório fadista.

Referindo-se aos temas que recria, Teresinha Landeiro disse que “é sempre um desafio cantar, até porque vai haver sempre termos de comparação, mas tem de se andar para a frente”, e daí ter gravado, entre outros, “Raminhos de Violeta”, de Carlos Alberto França, “que cantava desde pequenina”, e que foi gravado por Hermínia Silva e Rodrigo.

Outros temas recriados são “Gota Abandonada”, de Maria de Lourdes de Carvalho e Martinho d’Assunção, que foi gravado, entre outras fadistas, por Maria Valejo e Maria Dilar, e ainda “O Riso que Me Deste”, de autoria e criação de Teresa Tarouca, que Teresinha Landeiro gravou no denominado “Fado Penha de França”, de Pedro Castro, um fado que Pedro Moutinho também recriou no seu álbum “O Amor não Pode Esperar” (2013), e, por último, a marcha “Noite de Santo António”, de Norberto de Araújo e Raul Ferrão, gravada por Amália Rodrigues, que Landeiro apontou como “a melhor voz, de sempre, de Portugal”.

Para a fadista aos temas recriados procurou dar o seu “cunho pessoal” e a sua “graça”, e se é “um desafio enorme” recriar temas que outros artistas já gravaram, “tem um gostinho especial” interpretar as suas próprias letras.

Sobre a sua faceta de autora afirmou: “Eu sempre gostei muito de escrever quadras simples, com rimas básicas, e quando senti o primeiro desgosto de amor, tentei expressá-lo de alguma maneira, refugiei-me na escrita e, no final de contas, quando comecei a olhar para eles, pensei que os podia cantar”.

Segundo a fadista, como muitas pessoas até a aconselhavam a não cantar certos fados, alegando que não eram para a sua jovem idade, optou pelas suas letras.

“Se eu cantasse os meus próprios poemas, ninguém poderia dizer que os não compreendia, e foi uma forma de me defender”, argumentou.

O CD abre com “Sonhos Meus”, de sua autoria, que gravou na melodia do Fado Carlos da Maia de Sextilhas, e interpreta ainda com letras suas, “Amor aos Molhos”, com música de Pedro de Castro, “Teus Olhos nos Meus”, que gravou no fado Perseguição, de Carlos da Maia, “Dias Sempre Iguais”, que canta no Fado Bizarro, de Acácio Gomes da Silva, e “Santo António Traiçoeiro”, que gravou no denominado “Fado Fininho”, de Alfredo Mendes.

A fadista gravou também, no Fado S. Miguel, de Armandinho, “Naquele Dia”, em que juntou duas quadras de Fernando Pessoa, a uma estrofe sua.

Teresinha Landeiro considera que o “tempo foi essencial” para gravar este CD, “nomeadamente num género musical, em que é necessário um grande amadurecimento”, e daí ter esperado dez anos desde a sua estreia, para gravar o primeiro CD, acrescentando: “Ainda hoje ponho em dúvida se seria a melhor altura, se realmente estou preparada, debato-me sempre com questões e dúvidas, mas passei muitos anos a ouvir outros fadistas a cantar, e fui amadurecendo, foram dez anos de aprendizagem, ouvindo até outros estilos musicais para meu enriquecimento, e um dia poder vir a gravar um disco”.

“Não sei se estou totalmente preparada, mas olho para aquilo que fiz e acho que é um bom reflexo do meu trabalho e daquilo que eu gosto”, sentenciou.

Para o seu percurso qualificou como “muito importante a presença constante de Pedro de Castro”, guitarrista que a acompanha desde que começou a cantar e que admira como músico, guitarrista, fadista e como pessoa.

Além de Pedro de Castro, na guitarra portuguesa, a fadista é acompanhada por André Ramos, na viola, e Francisco Gaspar, na viola baixo.

26 Jun 2018

MGM | Exposição “Art is Play” é hoje inaugurada junto à Grande Praça

Cinco artistas, uma delas de Macau, vão mostrar as suas obras na exposição “Art is Play”, que está disponível ao público até ao dia 9 de Setembro. Cristina Kuok, directora do departamento de artes e desenvolvimento cultural do MGM, fala de uma iniciativa que visa levar o público a uma nova experiência em termos de entretenimento

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a memória de Cindy Ng sobre a sua terra natal o elemento água tem particular importância. A que cai do céu, a que sai da terra, a que permanece. Em “Mindscape”, Cindy Ng retrata a água com panos de tule a cair do tecto, que nos ajudam a compor o nosso próprio imaginário. Cindy Ng, nascida em Macau, vive em Pequim onde assume ter encontrado um lugar para o fluir da criatividade. Ela é uma das cinco artistas que integra a exposição colectiva “Art is Play”, que é hoje inaugurada junto à Grande Praça do MGM e que estará aberta ao público até ao dia 9 de Setembro.

Se em “Mindscape” temos acesso às memórias da artista sobre Macau, logo de seguida entramos no universo da japonesa Ayumi Adachi, em “Setsuna 0.013 seconds”, que nos remete não só para os últimos instantes da vida do ser humano, em que tudo o que está para trás é recordado, mas também os últimos instantes de tempo de qualquer momento importante das nossas vidas.

Ayumi Adachi vive em Hong Kong e levou a obra “Setsuna 0.013 seconds” a outros espaços expositivos, como é o caso de Xangai. Aos jornalistas, durante a visita guiada, a artista revelou que esta obra tem uma grande componente de meditação. 

“Compreendo que talvez não faça sentido para muitos, porque falo do momento da morte que as pessoas ainda não vivenciaram”, assumiu. Ao mesmo tempo, a música ajuda a compor a experiência de quem entra na sala azul, enquanto que os espelhos funcionam como um reflexo.

“Art is Play” é, como o nome indica, uma exposição que pretende ir além de uma simples mostra de arte. É um lugar onde o público pode ter as suas próprias experiências, sendo convidado a utilizar o telemóvel ou a câmara fotográfica para registar os momentos de interacção com as obras que vê.

O ano passado o MGM realizou uma exposição com uma forte componente tecnológica, mas desta vez o rumo foi diferente.

“Aqui tudo é muito colorido, e esse foi um dos pontos mais importantes que tivemos em consideração quando começamos a fazer o trabalho de curadoria com os nossos consultores e parceiros. Desta vez não é tanto essa experiência interactiva do ponto de vista tecnológico, mas é uma interacção diferente.”

“Queremos que as pessoas percam tempo a tirar fotografias e a serem criativas com as câmaras fotográficas e telemóveis”, frisou Cristina Kuok. “Temos um projecto mais meditativo com a obra de Cindy Ng e depois passamos para uma sala muito colorida com balões e depois temos os padrões e os espelhos. Não tivemos um objectivo específico, porque fizemos aqui muitas combinações e tivemos em conta as diferentes experiências que poderíamos providenciar nas salas. Desta vez é mais sobre o Instagram, selfies com a família ou os amigos, é esse lado divertido.”

Questionada sobre a relação crescente entre a arte e as redes sociais nos dias de hoje, Cristina Kuok garantiu que a ideia é que se possa estabelecer um novo paradigma de entretenimento.

“Hoje em dia as redes sociais são muito importantes, tal como o lado de manter as memórias. Se olharmos para a Grande Praça, é um lugar onde as pessoas podem aproveitar o seu tempo e relaxar. O entretenimento pode assumir várias formas”, adiantou a responsável do MGM.

Entre balões e espelhos

Depois de passarmos por duas salas que nos levam a um estado mais meditativo, chegamos ao trabalho de tomtom, uma artista inglesa que cresceu em Hong Kong e que assina o projecto “Orangelicious”. Com balões de vários tamanhos, a ideia é que os visitantes possam tirar fotografias com o laranja como cor de fundo.

“É como estar no país das maravilhas, num momento feliz. Este é o paraíso da selfie, que retrata também a época do verão, quando tínhamos alegria durante as nossas férias”, disse tomtom.

Depois de “Walala x Play”, de Camille Walala, que nos remete para o movimento Pop Art, cheio de espelhos e formas diferentes, chegamos à instalação de Janice Wong, uma artista da doçaria oriunda de Singapura, que possui uma loja com o seu nome no empreendimento da MGM no Cotai.

No corredor escuro podem observar-se 20 mil flores feitas com chocolate e açúcar à mão, até que se chega à instalação principal, feita de pequenas flores, onde se pode ler “Bring Art to Life” (Trazer a arte à vida). Em “Sugar Glow Garden” foram gastas 700 horas de trabalho. No ar cheira a chocolate, e a própria Janice Wong revelou como é importante para ela despertar os cinco sentidos.

Janice Wong. HM

“Só trabalho com materiais comestíveis, e utilizei muito as cores azul e lilás, porque queria trazer serenidade ao espaço. Para mim é assim que a arte deve ser, divertida e com ligação aos cinco sentidos”, rematou Janice Wong.

A entrada nesta exposição é de 120 patacas, sendo que crianças até aos três anos de idade não pagam bilhete.

26 Jun 2018

Mostra com seis exposições junta obras de 27 artistas lusófonos e da China

[dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]ários espaços em Macau acolhem, a partir do próximo dia 9, a mostra “Alter Ego” composta por seis exposições e uma intervenção de arte urbana por 27 artistas de países lusófonos e da China.

O fio que liga as seis exposições é uma “reflexão sobre o ser humano”, daí o conceito que dá nome à mostra, ‘alter ego’, “o segundo eu”, explicou a francesa Pauline Foessel, curadora da mostra com o artista português Alexandre Farto (Vhils), em declarações à agência Lusa.

Apesar de serem seis exposições diferentes, com artistas diferentes, “idealmente o público deve visitar todas”. Entre os trabalhos expostos há “pintura, instalação, serigrafia, escultura”, estando algumas peças “ainda em produção, porque estão a ser feitas no local, são ‘site specific’”, referiu Alexandre Farto.

“Há muita diversidade de meios e isso também vem do facto de se juntarem aqui 27 artistas, cada um com o seu percurso, o seu trabalho”, disse. Apesar disso, acrescentou Pauline Foessel, “há diálogo e interligação entre o trabalho dos artistas”.

A ‘rota’ das exposições começa com “O Eu”, que estará patente no Museu de Arte de Macau, “que é basicamente ‘eu tenho que me conhecer para começar a conhecer o outro’”, descreveu Pauline Foessel. Aqui estarão expostas obras do são-tomense Herberto Smith, da dupla de portugueses João Ó & Rita Machado, do chinês Li Hongbo, do moçambicano Mauro Pinto, de Vhils e do artista de Hong Kong Wing Shya.

De “O Eu”, segue-se para “O Outro”, partindo da premissa de que “para existir preciso do outro”. Esta exposição, que reúne trabalhos do guineense Abdel Queta Tavares, da macaense Ann Hoi, do cabo-verdiano Fidel Évora, dos portugueses Estúdio Pedrita e Ricardo Gritto, dos timorenses Tony Amaral e Xisto Soares, do chinês Zhang Dali e do artista de Hong Kong Yiu Chi Leung, estará patente no Edifício do Antigo Tribunal.

Na terceira exposição, “Da Linguagem à Viagem” passa-se “à interacção – entre mim e alguém preciso de linguagem –, com uma dupla de artistas [o brasileiro Marcelo Cidade e o angolano Yonamine] a reflectir sobre esse conceito”.

Na quarta exposição, que estará patente na Galeria de Exposições Temporárias do IACM, dá-se o “Choque Cultural”, que “pode acontecer nas trocas e nas viagens, por diferenças culturais”. Aqui será possível apreciar-se obras do moçambicano Gonçalo Mabunda, dos angolanos Kiluanji Kia Henda e Nástio e do português Miguel Januário.

“Depois disso passamos à ‘Globalização’ [patente nas Casas de Taipa], o conceito mais abrangente que surgiu de todas as interacções entre os diferentes países”, contou Pauline Foessel. Aqui estarão expostos trabalhos do brasileiro Guilherme Gafi e da portuguesa Wasted Rita.

A sexta e última exposição, patente nas Oficinais Navais n.º1 – Centro de Arte Contemporânea, foi baptizada com o nome da mostra “Alter Ego” e é uma exposição individual do luso-angolano Francisco Vidal.

Além das seis exposições dentro de portas, “Alter Ego” conta também com uma intervenção de arte urbana, “transportando os temas explorados no espaço museológico para a esfera pública”, da autoria do português Add Fuel.

Os curadores, segundo Alexandre Farto, tentaram “reunir um conjunto de trabalhos fortes e que se interligassem uns com outros, porque também é uma oportunidade única de mostrar o trabalho destes artistas em Macau, que é uma porta de entrada para a China e para a Ásia em geral”. As seis exposições ficam patentes até 9 de Setembro.

26 Jun 2018

Canções Populares Húngaras e Russas, de Lopes-Graça, pela primeira vez em CD 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]s Canções Populares Húngaras e Russas, de Fernando Lopes-Graça, pelo pianista Nuno Vieira de Almeida, são editadas em disco, pela primeira vez, num alinhamento que inclui outras estreias do compositor.

As Dez Canções Populares Húngaras foram escutadas, em estreia absoluta, em março último, em Serpa, no Baixo Alentejo, pelo pianista Nuno Vieira de Almeida e a meio-soprano Cátia Moreso, que também as gravou, no âmbito do Festival Terras Sem Sombra.

As Nove Canções Populares Russas, “totalmente desconhecidas, e que nem foram datadas por Romeu Pinto Correia”, especialista na obra de Lopes-Graça, foram gravadas pela soprano Susana Gaspar e pelo tenor Fernando Guimarães, um dos mais internacionais cantores portugueses atuais, que foi “L’Orfeo”, de Monteverdi, na Ópera de Lausanne, em 2016, ano em que foi nomeado para um Grammy, também como protagonista de “Il ritorno d’Ulisse in Patria”, com a Orquestra Boston Baroque.

Outra “estreia” do CD de Fernando Lopes-Graça são Quatro Cantos de Natal, de Gil Vivente, “descobertos por Conceição Correia, coordenadora da Casa Verdades Faria-Museu da Música Portuguesa”, no Monte Estoril, instituição à qual Lopes-Graça entregou o seu espólio.

O CD “Songs and Folk Songs”, de Fernando Lopes-Graça (1906-1994), editado internacionalmente pela Naxos, além das dez canções magiares, das nove russas e dos Cantos de Natal de Gil Vicente, inclui Quatro Cantos de Natal, de tradição popular portuguesa, dois “romances”, de Armindo Rodrigues, três poemas de Adolfo Casais Monteiro e “As três canções de Olívia”, de Adriano Jardim.

Nuno Vieira de Almeida, em declarações à agência Lusa, afirmou que optou por “misturar” canções populares e canções originais, “para melhor se compreender o estilo do compositor”.

A canções originais são “Música”, “Poemas das Mãos Tombadas” e “Marcha Triunfal”, a partir de poemas de Casais Monteiro, “Romance das Três Meninas no Laranjal” e “Romance dos sete Cavaleiros”, de Rodrigues, “As três canções de Olívia” (“Desalento”, “O Bordado” e “Distância”), e os Cantos de Gil Vicente, que “são das primeiras” que Lopes-Graça compôs e, desde então, “não terão voltado a ser interpretadas”.

O pianista, que conviveu com o compositor, afirmou que “há muitíssimo material [inédito] de Lopes-Graça”, e que há projetos com a Fundação D. Luís I, de Cascais, que coordena a programação do Bairro dos Museus da autarquia, para “continuar o trabalho”, pois “há muitas obras do compositor, nomeadamente para canto e piano, que é a parte maioritária da sua criação, que continua por estrear”.

A Fundação prevê continuar a promover a gravação de obras de Lopes-Graça, disse.

Referindo-se às Dez Canções Populares Húngaras, o pianista defendeu que a importância da sua gravação se junta à sua estreia em sala. A estreia aconteceu no passado dia 02 de março, no Centro Musiberia, em Serpa, no Baixo Alentejo, que esgotou.

“É muito importante fazer as estreias de obras importantes do nosso património [musical] e que são desconhecidas”, disse Vieira de Almeida à Lusa, recordando que foi preciso esperar cerca de 65 anos para ouvir as Dez Canções Populares Húngaras, o que “é uma vergonha para o país”.

Lopes-Graça deu por terminado em 1954 a harmonização das Dez Canções Populares Húngaras.

“Se foi bom ter estreado é também muito bom ter gravado”, enfatizou o pianista, referindo que “tal implica custos maiores, pelo que há muito mérito da Fundação D. Luís I, e uma gravação é algo que fica”. A gravação de todas as canções foi realizada no Grande Auditório da Culturgest, em Lisboa, em julho do ano passado.

Referindo-se a projetos futuros, Nuno Vieira de Almeida disse que, de Fernando Lopes-Graça, há um ciclo de Canções Gregas, outro de canções da ex-Checoslováquia, “e muitas outras coisas, como canções francesas, inglesas, e nada disso está gravado”. “A maior parte está inédita”, assim como “muita produção que não é de canções populares”.

Para o músico, “o passo seguinte [às estreias e gravação das peças de Lopes-Graça] é a edição das partituras”.

Referindo-se à Canções Populares Húngaras, Vieira de Almeida salientou o respeito de Lopes-Graça pela linha melódica húngara, “que adaptou com harmonias que ele entendeu que faziam parte daquela linha melódica”.

Lopes-Graça teve “a genialidade de saber adaptar a sua linguagem [musical] ao tipo de linha melódica que tinha para harmonizar e para tratar”.

“É admirável a capacidade de Lopes-Graça se imiscuir na linha melódica das canções e se ouvirmos, neste disco, as canções populares húngaras são totalmente diferentes das canções populares russas”.

“O que o solista canta é a linha popular, a grande maioria do trabalho composicional está na parte instrumental”, explicou.

Sobre esta gravação, Nuno Vieira de Almeida sublinhou a consultoria do “cantor favorito de Lopes-Graça”, o tenor Fernando Serafim, que “conhece as partituras”. E como Lopes-Graça “sistematicamente modificava o que compunha, ao gravarmos devemos manter vivo tão próximo quanto possível, o espírito do compositor, e não o contrariar”.

Nuno Vieira de Almeida estudou com José Manuel Beirão e, como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, com Leonid Brumberg, em Viena, e com Geoffrey Parsons, em Londres. Em Portugal, estreou obras de Schönberg, Webern, Wolf, Britten, entre outros compositores, além de ter promovido a primeira audição de obras de compositores portugueses como Carlos Caires, Constança Capdville, João Madureira e Paulo Brandão.

Cátia Moreso estudou no Conservatório nacional de Lisboa e na Guidhall Scholl of Music and Drama (GSMD), em Londres, e venceu vários concursos, nomeadamente o Aria Friends Bursay do Wexford Opera Festival.

Susana Gaspar estudou na Escola de Música do Conservatório Nacional de Lisboa, e GSMD, e no National Opera Studio, de Londres, como bolseira da Royal Opera House.

Fernando Guimarães foi o vencedor do Prémio Jovens Músicos, em 2007, o mesmo ano em que que venceu o Concurso Internacional de Canto “L’Orfeo”, e protagonizou pela primeira vez esta ópera de Monteverdi, em Mântua, Itália, no 400.º aniversário da estreia da obra.

Antonio Florio, Ottavio Dantone, Martin Gester, Alessandro de Marchi, Enrico Onofri, Skip Sempé, Florian Helgath e Leonardo García Alarcón, maestro associado da Orquestra Gulbenkian, a partir da próxima temporada, são alguns dos regentes com quem Guimarães tem trabalho na última década.

Estreou-se nos palcos norte-americanos, como protagonista de “Il ritorno d’Ulisse in Patria”, sob a direção do maestro Martin Pearlman.

25 Jun 2018

António Conceição Júnior, autor e artista | O choro do ferro

“Rumo ao apogeu militar dos Descobrimentos” é o tema da palestra de António Conceição Júnior que tem lugar no próximo dia 12 de Julho, pelas 18h30, na Fundação Rui Cunha. O interesse do autor e artista local pela armaria é algo que se tem vindo a aprofundar. As razões contemplam, não só o seu testemunho histórico, mas também o valor estético e o carácter existencial. Paralelamente, Conceição Júnior têm-se dedicado à concepção de espadas
FOTO: Gonçalo Lobo Pinheiro

[dropcap]C[/dropcap]omo é que surgiu o seu interesse pela armaria? Foi um interesse estético aliado à cultura?
Decisivamente, sim. A história da humanidade carrega uma grande componente bélica, tão importante que Sun Tzu e Maquiavel dedicaram-lhe as obras, com o mesmo título, “A Arte da Guerra”. A guerra é uma parte importante de todos os períodos da história da humanidade. A armaria é, como já referia Sun Tzu, um dos “principais artigos utilizados pelo exército”, usado tanto para fins ofensivos como defensivos nesta “questão de vital importância para o Estado”. As guerras são travadas por homens, usando armamento, que muitas vezes é o único testemunho material do engenho tecnológico das culturas ou civilizações. Numa perspectiva histórica, e perante estas expressões culturais, conferimos beleza a estes instrumentos de guerra proveniente da decoração que os imbuía de poder e status simbólico. Podem e devem ser vistos como uma parte da busca humana pela perfeição. A armaria que me interessa, enquanto objecto estético e histórico, é hoje anacrónica, tendo sido no seu tempo necessário para moldar e defender culturas, civilizações. Estes objectos, portadores de grande criatividade e engenho, reflectem o desenvolvimento tecnológico das culturas que os criaram e estão imbuídos de beleza.

Tem um interesse particular por espadas. Como apareceu este gosto?
As espadas surgiram pelo interesse histórico e cultural destas peças. Comecei a intervir em fóruns, sobretudo para contextualizar historicamente a armaria e reflectir sobre o processo alquímico do aço, especialmente o praticado por alfagemes contemporâneos, cuja forma de expressão artística deveria ser reconhecida – exemplo da joalharia. Este interesse continuou, com a visita, ainda nos anos de 1990, à maior colecção de armaria portuguesa propriedade do professor Rainer Daehnhardt e que o próprio me mostrou. Em 1993, tive oportunidade de organizar, na Galeria do então Leal Senado, uma exposição de Armaria Portuguesa, contando com a colaboração do Museu Militar de Lisboa. Em 2005 e 2006, já no Museu de Arte de Macau, concebi e organizei duas grandes exposições: “Senhores do Fogo”, a primeira exposição, a nível mundial, de obras de alfagemes contemporâneos, e “História do Aço na Ásia Oriental”, também a primeira a nível mundial a reunir peças de diferentes épocas provenientes da China, Coreia, Japão, Filipinas e Sudeste Asiático Continental.

«Precisei de saber o que era uma lâmina forjada depois de várias dobras até uma sanmai (três camadas), que é uma lâmina de aço com um alto teor de carbono, “adornada” nas duas faces com outro aço mais macio, que age como um pára-choques. Isto conferia uma enorme beleza às lâminas. Assisti, durante a noite, ao nascimento do aço – faz-se sempre no escuro para se poder ver a verdadeira transparência que a incandescência confere ao ferro. Depois de estar em brasa – Yang – e ser mergulhado na água do seu oposto – Yin -, pude vislumbrar a transcendência alquímica da lâmina.»

Como é que começou a conceber espadas?
Nos fóruns que frequentava, passei a ter algum reconhecimento, tendo começado a surgir inúmeros pedidos de coleccionadores. Para desenhar é preciso conhecer o objecto que se representa. Deste modo, precisei de saber como as espadas eram feitas. Visitei, então, dois alfagemes americanos e pude presenciar o modo como as espadas mais complexas são feitas. Precisei de saber o que era uma lâmina forjada depois de várias dobras até uma sanmai (três camadas), que é uma lâmina de aço com um alto teor de carbono, “adornada” nas duas faces com outro aço mais macio, que age como um pára-choques. Isto conferia uma enorme beleza às lâminas. Assisti, durante a noite, ao nascimento do aço – faz-se sempre no escuro para se poder ver a verdadeira transparência que a incandescência confere ao ferro. Depois de estar em brasa – Yang – e ser mergulhado na água do seu oposto – Yin -, pude vislumbrar a transcendência alquímica da lâmina. O nascimento do aço de uma espada é um processo muito especial, em que se ouve o próprio choro do ferro a transformar-se em martensite e pearlite. É um verdadeiro parto. Percebi, nesse momento, porque é que os fabricantes de espadas japoneses são simultaneamente sacerdotes xintoístas e porque cada peça (koshirae) de uma katana tem um nome, tal como na China a designação de cada membro de uma família indica o grau de parentesco e a sua proveniência paterna ou materna. Em África, algumas tribos mantinham os seus alfagemes fora da tribo e inteiros, isto é, não circuncidados, para que pudessem operar deveras a transformação do ferro em aço. Então, já mais municiado, concebi e desenhei espadas conforme a orientação e gosto dos clientes. Muitas eram ao estilo japonês, contudo não me esquivava de lhes conferir nomes de outras culturas, como Atziluth.

Há, além do simbolismo, toda uma esfera desconhecida destes objectos.
As pessoas geralmente têm medo de espadas. Preconceitos da ignorância ou o síndrome da espada de Dâmocles. A espada de Dâmocles, por exemplo, é representada dependurada por um fio sobre a nossa cabeça. O síndrome que lhe está associado é o receio de alguém que, por exemplo, tendo-se curado de um processo oncológico, possa ter uma recaída. Mas há mais símbolos e espadas famosas. A Excalibur é o exemplo-mito-lenda da espada que só poderá ser retirada da rocha por alguém devidamente qualificado para o fazer. A espada Flamejante é simbolicamente manejada por um arcanjo para combater o mal. No caso japonês existe a Katsujin-ken, a espada que dá vida, isto é, o mito da espada protectora. Os koan (paradoxos) Zen são interessantíssimos. Se, por outro lado, lhe relembrar que a bainha de uma espada se diz saya em japonês, então voltamos ao masculino e ao feminino e, assim, à inteireza da espada quando embainhada. Devo dizer que a concepção de uma espada, actualmente, implica um conhecimento profundo e intuitivo dos diversos intervenientes, tais como o autor da lâmina, o polidor, se lâmina de estilo japonês, o fabricante da bainha, do punho, da guarda, do pomo, etc, etc. É, muitas vezes, uma cadeia de produção artesanal de altíssima qualidade.

25 Jun 2018

Cemitério militar português em França entre candidatos a Património Mundial da UNESCO

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] cemitério militar português de Richebourg, integrado na candidatura franco-belga dos memoriais da Frente Ocidental da I Guerra Mundial, pode vir a ser classificado como património mundial da UNESCO, na reunião que se inicia hoje, no Bahrein.

O Comité da UNESCO reúne-se até 4 de julho, em Manama, no Bahrein, para escolher os novos locais que vão passar a fazer parte da lista de Património Mundial, após análise das 30 candidaturas existentes, segundo o ‘site’ da organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).

O cemitério militar português de Richebourg, onde estão enterrados cerca de 1800 soldados portugueses da Grande Guerra de 1914-1918, poderá ser classificado como Património Mundial, quando se assinala o centenário da Batalha de La Lys – a pior derrota militar portuguesa -, ao estar integrado na candidatura conjunta “Lugares funerários e memoriais da I Guerra Mundial na Frente Ocidental”, apresentada pela Bélgica e pela França.

Vestígios portugueses podem também ser contemplados pela candidatura dos sítios cristãos clandestinos da região de Nagasaki, no Japão, onde comunidades missionárias ibéricas tiveram um papel determinante, nos séculos XVI e XVII.

A maioria das candidaturas (22) diz respeito a sítios culturais, como a paisagem arqueológica de Danevirke e a Catedral de Naumburgo, na Alemanha, o oásis de Al-Ahsa, na Arábia Saudita, as Colónias de Beneficência, da Bélgica e da Holanda, os monumentos da antiga Quanzhou—Zayton, na China, os lugares inuit de caça marítima, da Dinamarca, e o porto tradicional de Khor Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.

A Medina de Azahara, em España, o conjunto urbano histórico de Nimes, em França, o conjunto arquitetónico vitoriano e “art déco” de Mumbai, na Índia, a cidade velha de Jacarta, na Indonésia, com as quatro ilhas vizinhas – Onrust, Kelor, Cipir e Bidadari -, o sítio arqueológico de Fars, no Irão, assim como o conjunto industrial de Ivrea e as colinas de Conegliano e Valdobbiadene, em Itália, estão igualmente entre as candidaturas a analisar.

O sítio de Thimlich Ohinga, no Quénia, a antiga cidade de Qalhât, em Omã, os mosteiros budistas da Coreia do Sul, as minas de Rosia Montana, na Roménia, e o sítio megalítico de Göbekli Tepe, na Turquia, juntam-se à lista.

Esta contempla ainda paisagens naturais da China (Fanjingshan), Rússia (Vale do Bikin), França (Puys e Limagne), Irão (Arasbaran) e África do Sul (Montes de Barberton Makhonjwa), e três áreas de “caráter misto”: o lugar de Pimachiowin Aki (A terra que dá vida), no Canadá, o Parque Nacional de Chiribiquete, na Colômbia, e o vale de Tehuacán-Cuicatlán, no México.

A reunião do comité da UNESCO, composto por representantes de 21 países membros da organização, será dedicada também a examinar o estado de conservação de locais classificados e de outros que, tendo sido classificados, foram entretanto considerados “em perigo”.

Um dos ameaçados, que pode perder a classificação, é o centro histórico de Shakhrisyabz, no Uzbequistão.

Inscrito em 2000, entrou na lista de património em perigo em 2016, devido a projetos de desenvolvimento urbano em grande escala, que alteraram o ordenamento original, o ambiente dos monumentos e os seus estratos arqueológicos, como sublinhou a diretora do Centro de Património Mundial e Património da Humanidade da UNESCO, Mechtild Rössler, na apresentação da agenda da reunião.

A barreira de corais do Belize, a segunda maior do mundo, depois da Austrália, por seu lado, deverá sair da lista do património mundial em perigo, na qual figura desde 2009, graças às medidas entretanto tomadas, incluindo a mais recente, de final de 2017: o abandono da exploração petrolífera no mar.

No Quénia, o lago Turkana poderá, por outro lado, estar “ameaçado”, após a construção de uma represa na Etiópia, que teve “um sério impacto” na região, diz a UNESCO.

“Gibe III”, a maior barragem hidroelétrica em África, inaugurada pela Etiópia no final de 2016, foi construída a várias centenas de quilómetros ao norte do Omo, afluente etíope do Lago Turkana, fazendo baixar o nível das suas águas e interrompendo as inundações sazonais essenciais ao ciclo reprodutivo dos peixes.

Durante a reunião do Bahrein também deverá ser feito um apelo para o reforço do Fundo do Património, que atualmente está nos níveis de 1991, segundo Mechtild Rössler, que considerou a “situação muito séria”.

24 Jun 2018

Macau acolhe a partir de Julho mostra sobre as Chapas Sínicas

A colecção de “Registos Oficiais de Macau Durante a Dinastia Qing (1693-1886)”, recentemente inscrita na UNESCO, começa a estar exposta ao público a partir do dia 7 de Julho, primeiro no Museu das Ofertas sobre a Transferência de Soberania de Macau, e depois no Arquivo de Macau

 

[dropcap style≠‘circle’]E[/dropcap]stá prestes a ser inaugurada a exposição intitulada “Chapas Sínicas – Histórias de Macau na Torre do Tombo”, que se insere na primeira edição do Festival de Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa, organizado pelo Instituto Cultural.

Esta iniciativa é apresentada pelo Arquivo de Macau em parceria com o Arquivo Nacional da Torre do Tombo, estando previstas duas fases para a sua apresentação ao público.

A primeira fase decorre a partir de 7 de Julho no Museu das Ofertas do Período da Transição, e termina a 7 de Agosto. Segue-se depois a segunda fase de exposição entre os dias 21 de Agosto e 7 de Dezembro deste ano, desta vez no Arquivo de Macau.

Foi o ano passado, a 30 de Outubro, que a colecção dos “Registos Oficiais de Macau Durante a Dinastia Qing (1693-1886)”, candidatura conjunta do Arquivo de Macau e do Arquivo Nacional da Torre do Tombo de Portugal, foi inscrita pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) no Registo da Memória do Mundo.

De acordo com um comunicado, estes registos “reflectem as condições da sociedade, a vida das pessoas, o desenvolvimento urbano e do comércio” de Macau durante o período em que a Dinastia Qing reinou na China. “Além disso, representam o papel de Macau para o mundo”, acrescenta o IC. A exposição apresentará uma selecção de mais de cem documentos para partilhar histórias que, embora tenham ocorrido em Macau, são de relevância histórica para a China, Portugal e até para a história mundial.

Além das exposições, o IC organizou ainda uma palestra gratuita a 8 de Julho, que conta com a participação de Zhang Wenqin, professor de História de Relações Sino-Estrangeiras na Universidade Sun Yat-sen; Jin Guoping, investigador do Instituto de Estudo de Macau da Universidade de Jinan e Silvestre de Almeida Lacerda, director-geral da Direcção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas de Portugal. Este debate terá como foco “a importância documental das ‘Chapas Sínicas’ bem como a preservação e digitalização dos registos. A palestra terá tradução para português.

 

A importância histórica

Na altura da inscrição das Chapas Sínicas na UNESCO, a historiadora Tereza Sena falou à Lusa da sua importância, por constituírem “um conjunto documental extremamente importante para a história de Macau, mas não só, também como testemunho do que foi realmente a vivência de Macau durante um período bastante lato da sua história”. As Chapas Sínicas incluem um total de 3600 documentos, incluindo mais de 1.500 ofícios redigidos em chinês, cinco livros de cópias traduzidos para português das cartas trocadas entre a autoridade municipal portuguesa (Leal Senado) e o império chinês, e quatro volumes de documentos diversos.

Esta documentação, referente ao período entre 1693 e 1886, encontra-se na Torre do Tombo, em Lisboa, e a sua inscrição na UNESCO é fruto de uma candidatura conjunta de Macau e Portugal.

Durante este período, que é anterior “à afirmação colonial, que só se fará no século XIX”, chineses e portugueses coabitavam na cidade, e imperava uma jurisdição mista.

“O que penso que pode ser importante, não só do ponto de vista histórico, mas para a humanidade em si, é como durante três séculos duas comunidades dominantes coabitam num espaço, regulam-se pelas suas próprias leis e têm uma coexistência pacífica”, apesar de momentos de tensão, explicou a historiadora, referindo-se a um período mais alargado do que o dos documentos agora classificados.

As ‘chapas’ — assim chamadas devido ao carimbo que lhes era colocado — são “um conjunto de documentos em chinês que corresponde à correspondência oficial trocada entre os mandarins, os oficiais chineses da zona circunvizinha, de que Macau dependia administrativamente, e o seu interlocutor, a única autoridade que os oficiais chineses reconheciam: o procurador do Senado”.

Este procurador “dialogava com as autoridades chinesas” que se “dirigiam a ele como o representante, a cabeça dos portugueses”, contando com o apoio de um corpo de tradutores, segundo Tereza Sena.

A historiadora sublinhou que, da leitura destes documentos, emergem detalhes sobre a “permanência consentida” dos portugueses em Macau e muita informação sobre a cidade. “Podemos ver o aprovisionamento diário, que se fazia através do procurador, a subsistência da cidade, preços. Tem que ver não só com o aspecto político, mas com a vida da cidade”, disse.

No entanto, acima de tudo, “dão-se ordens”: “Havia uma série de regras básicas. Não se podem construir casas novas, não se podem fazer obras sem autorização, etc. Porquê? A lógica chinesa é que havia um interposto mercantil, todos beneficiam do negócio, os estrangeiros podem lá viver, dentro de uma série de regras”.

Tereza Sena explicou que só no século XVIII é que Portugal começa a preocupar-se com a tradução das ‘chapas’, quando é imposto em Macau o Código de Qianlong, a partir de 1749, “um momento muito complicado nas relações luso-chinesas, porque há uma afirmação que tem que ver com a própria estruturação interna do império chinês, de que a jurisdição terá que ser regulamentada de acordo com as leis do império”.

Ao mesmo tempo, emergem na região presenças ocidentais “concorrentes comercialmente em Macau” e “começa a haver uma preocupação muitíssimo grande em encontrar um documento legitimador da posse de Macau”.

As ‘chapas’ são então traduzidas e, apesar de se ter “perdido o rasto” da sua saída de Macau, “a certa altura [século XIX] elas aparecem em Portugal”.

22 Jun 2018

Livro | Lançada em Lisboa versão portuguesa de “Música Católica em Macau no Século XX”

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi publicada recentemente em Lisboa a versão portuguesa de “Música Católica em Macau no Século XX”, uma obra que aborda “um fenómeno raro em território chinês”. O livro, da autoria de Dai Ding Cheng, docente do Instituto Politécnico de Macau, resulta de uma cooperação entre o Instituto Cultural (IC) e o Instituto Confúcio da Universidade de Aveiro.

A obra, um projecto no âmbito das bolsas de investigação académica, foi lançada em chinês em 2013, mas ganhou, dois anos depois, uma versão revista e outra em inglês. A versão agora lançada em português “apresenta a académicos de língua portuguesa o contexto tradicional e histórico da fase inicial da música católica em Macau”, bem como “diversos aspectos da expansão da música católica em Macau no séc. XX, um fenómeno raro em território chinês”, sublinha o IC, num comunicado divulgado ontem.

Após o lançamento em Portugal, “Música Católica em Macau no Século XX: Os Compositores e as Suas Obras Vocais num Contexto Histórico Único” foi alvo da “atenção e elogios” por parte de diversas entidades, entre as quais a Rádio e Televisão Portuguesa (RTP), a Associação Amigos da Nova Rota da Seda, a Liga dos Chineses em Portugal e a China Examiner, observa o IC.

A cerimónia de lançamento do livro, publicado pela Edições Colibri, teve lugar a 30 de Maio no Centro Científico e Cultural de Macau em Lisboa.

21 Jun 2018

Fundação Rui Cunha | Novo ciclo de cinema arranca na próxima quarta-feira

A Fundação Rui Cunha volta a acolher o quinto ciclo de cinema, desta vez dedicado ao cibercrime. Películas como “Snowden” ou “The Girl with the Dragon Tattoo” vão passar na Casa Garden a partir da próxima semana. O filme de Oliver Stone sobre o ex-analista da CIA abre a iniciativa

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]lhar com outros olhos para um dos crimes que mais tem crescido nos últimos anos é um dos objectivos da Fundação Rui Cunha (FRC) com a criação do quinto ciclo de cinema, que este ano se dedica ao crime informático. O primeiro filme a ser exibido é “Snowden”, de Oliver Stone, e conta a história de Edward Snowden, ex-administrador de sistemas da CIA que tornou públicos os detalhes de programas de videovigilância norte-americanos e a sua dimensão global. A Casa Garden, sede da Fundação Oriente no território, volta a ser receber este ciclo de cinema.

“Entendemos que é uma forma de falar de Direito nesta altura do ano, em que está imenso calor e ninguém tem paciência para assistir a conferências. É uma outra forma de falar de problemas jurídicos”, explicou Filipa Guadalupe, que adiantou as razões para a escolha do cibercrime enquanto tema.

“É um tema internacional e transversal, mas que tem muito a ver com Macau, até porque está na forja o projecto da lei da cibersegurança e fala-se imenso na questão da protecção de dados. Está tudo relacionado, de alguma maneira, porque o cibercrime é a consequência da violação dos dados pessoais.”

A coordenadora do Centro de Reflexão, Estudo e Difusão do Direito de Macau, entidade ligada à FRC, frisou que, nos últimos anos, este tem sido um dos crimes mais comuns e em franca expansão, incluindo no território.

“Infelizmente, tem sido o crime económico que mais tem crescido, muito por força de mais pessoas a nível mundial terem acesso à internet. Por isso é uma forma fácil de praticar crimes. Alguns estão tipificados na lei, como pedofilia ou violação de identidade, mas há outros que não estão assim tão tipificados, ou protegidos em termos jurídicos e para que é preciso chamar a atenção.”

Do clássico ao actual

Por se tratar de um crime relativamente recente, que cresceu ao mesmo ritmo da internet, não há muitos filmes que abordem esta temática. Ainda assim, a FRC decidiu incluir no programa a película “Italian Job”, de 1969. “Tem o Michael Kane e é um filme de culto, um dos primeiros que abordou esta temática.”

“Este ano não temos nenhum filme chinês mas temos um que foi filmado em Hong Kong, que é o ‘Black Heat’. Temos um filme de culto, intitulado ‘The Girl with the Golden Tattoo’, que é sueco, e vamos projectar a versão original nessa língua. Depois temos dois filmes incontornáveis sobre este tema, que é o ‘Snowden’, do Oliver Stone, e o ‘Firewall’”, explicou Filipa Guadalupe.

O quinto ciclo de cinema da FRC traz a novidade de, este ano, apresentar dois filmes com legendas em cantonês, na perspectiva de atrair alguns espectadores chineses. Prevê-se a ocorrência de debates, incluindo sobre as questões práticas da implementação da nova lei da cibersegurança em Macau, mas tudo vai depender daquilo que os convidados quiserem abordar, assegurou Filipa Guadalupe.

“Não nos limitamos a projectar o filme, convidamos sempre uma pessoa, seja jurista ou um fã de cinema, para fazer a apresentação do filme. No final pode existir um pequeno debate sobre o tema que o filme reproduziu”, concluiu.

21 Jun 2018

Luís Represas edita novo álbum com participação de Carlos do Carmo e Mia Rose

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] novo disco de originais do cantor e compositor Luís Represas, “Boa Hora”, que inclui a participação de Carlos do Carmo, Jorge Palma, Paulo Gonzo, Mia Rose e Stewart Sukuma, é editado na sexta-feira, foi hoje anunciado.

“Boa Hora”, composto por 14 temas, sucede a “Cores”, editado em 2014. De acordo com o agenciamento do artista, num comunicado hoje divulgado, os temas que compõem o novo álbum de Luís Represas “são o resultado natural de um processo de renovação que ganhou contornos de inevitabilidade”.

“Em 2018, Luís Represas abre asas para a descoberta de novos tons musicais explorados e descobertos ao lado de amigos da nova música nacional, e claro, de nomes que o acompanham desde sempre”, lê-se no comunicado.

Para ‘single’ de apresentação foi escolhido “Na Curva do Horizonte”, tema que “ganha ainda mais sentido com o brilho da voz de uma nova amiga: a muito especial Mia Rose”.

Em “Boa Hora”, Luís Represas juntou-se também “a amigos de longa data, como o brasileiro Ivan Lins, com quem cocompõe ‘Asas de Anjo’, ou Jorge Palma e Paulo Gonzo, com quem cria uma luminosa sequela de ‘125 Azul’ [tema dos Trovante, banda da qual foi vocalista e fundados], em ‘Cinema Estrada’”.

Em “No colo do vento”, Luís Represas juntou-se ao fadista Carlos do Carmo e, em “Se achas que sim”, ao músico moçambicano Stewart Sukuma.

No álbum, o cantor contou ainda com o vocalista dos Diabo na Cruz, Jorge Cruz, com quem escreveu e compôs o tema “Boa Hora”.

A produção do disco ficou a cargo de Fred Pinto Ferreira, com exceção de dois temas, produzidos por Francisco Faria e Manuel Faria.

20 Jun 2018

UCP | Filme “A última vez que vi Macau” exibido no Porto

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Escola das Artes da Universidade Católica do Porto recebe, de 18 a 23 de Junho, uma semana de actividades gratuitas dedicadas ao cinema, com um programa de formação e várias projecções de filmes, conferências e exposições. No último dia, os realizadores João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata apresentam “A Última Vez que Vi Macau”, juntando-se após a sessão a Haden Guest, para discutir a obra, numa projecção marcada para o auditório da Escola das Artes.

A “Summer School on Cinematic Art” começou na segunda-feira e decorre até sábado com um programa aberto ao público, decorrendo ainda em vários espaços da cidade do Porto, do auditório da escola ao Cinema Passos Manuel, à Biblioteca Municipal Almeida Garrett ou a Serralves, com um conjunto de projecções de filmes, debates e exposições.

A reitora da Universidade Católica Portuguesa, Isabel Capeloa Gil, abre o programa com uma aula sobre “cinema e o inconsciente tecnológico”, num dia que terá ainda uma projecção de “El Dorado XXI”, filme documental de Salomé Lamas, na Escola das Artes.

A realizadora portuguesa inaugura ainda a exposição “Auto-retrato”, projecto final da residência artística que levou a cabo na Católica do Porto e ancorada numa experiência de filmagem na Transnístria, território que contém uma república autoproclamada, não reconhecida pelas Nações Unidas, em conflito com a Moldávia desde a dissolução da União Soviética.

Amanhã, o cineasta tailandês Apichatpong Weerasethakul apresenta, na Biblioteca Almeida Garrett, o filme “Tio Boonmee Que se Lembra das Suas Vidas Anteriores” (2010), com que venceu a Palma de Ouro do Festival de Cannes.

Weerasethakul inaugura, na sexta-feira, a exposição “The Serenity of Madness”, uma mostra de curtas-metragens experimentais e instalações vídeo, bem como fotografias, ‘sketches’ e materiais de arquivo, que podem ser vistos no Núcleo de Arte da Oliva, em São João da Madeira.

O realizador, que considera “muito belo” o cinema de Manoel de Oliveira e de Pedro Costa, esteve em Portugal em 2016, para as estreias nacionais de “Cemitério do Esplendor”, o filme, e do espectáculo que o prolonga em palco, “Feever Room”, apresentado no âmbito do festival Temps d’Images, tendo ainda concebido a exposição “Liquid Skin”, para a casa das caldeiras da antiga Central Tejo, do Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia.

20 Jun 2018

Artes | Festival de artes da China e PLP começa a 30 de Junho

A edição inaugural do Festival de Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa vai decorrer entre 30 de Junho e 13 de Julho. O evento vai contar com um ciclo de cinema dedicado aos realizadores locais de ascendência portuguesa

[dropcap style≠’circle’]”E[/dropcap]ncontro em Macau” é o nome da primeira edição do Festival de Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa. A iniciativa, com um orçamento de 28 milhões de patacas, está dividida em cinco secções que incluem exposições, cinemas, serões interculturais, artes performativas e um Fórum cultural. Na área dedicada ao cinema estão incluídos três filmes realizados por cineastas locais: “Imagens, Macau”, “Filmes em Chinês” e “Filmes em Português”.

O filme “350 metros”, de Fernando Eloy, é uma das películas que será exibida durante o festival. Produzido em 2008, o filme retrata o que se passa durante um dia na Rua 5 de Outubro em Macau. “Foi filmado em 24 horas non stop” explicou Fernando Eloy ao HM.

De acordo com o realizador, a ideia de registar o dia daquela rua surgiu por ser um lugar em que a vida se mantem em suspenso, imune ao reboliço do tecido urbano que a circunda. “Apercebi-me de como o tempo parecia não passar ali apesar de toda a convolução em que a cidade já vivia. Nem 7/11 tinha. Era um exemplo de uma forma de vida de Macau onde se sente a ideia de bairro de forma acintosa”, apontou. O título do filme, “350 metros”, é referente ao cumprimento da rua, e foi também o primeiro filme de Eloy.

De autoria de Ivo Ferreira, será exibido “O Estrangeiro”, uma película que retrata a história de um Portugal que já não existe em Macau. “Ina” é o filme de António Caetano de Faria que aborda a questão das drogas.

História no ecrã

Além da secção de cinema dedicada a Macau o festival vai ter também como destaque a exibição da primeira longa-metragem de Manoel de Oliveira, “Aniki-Bóbó”, e o documentário “Douro, Faina Fluvial” de autoria do lendário cineasta portuense.

Do lado do cinema chinês, o destaque vai para o filme mais recente do realizador Xin Yukun, “Wrath of Silence”, com exibição marcada para o primeiro dia do evento.

Além disso, serão apresentados três filmes contemporâneos da China, nove filmes rodados na África do Sul e em países de língua portuguesa, nomeadamente Portugal, Brasil, Cabo Verde e Guiné Bissau, e ainda nove filmes em chinês e português, filmados em Macau.

No total vão ser apresentados 24 filmes em 23 sessões na Cinemateca Paixão.

O serão de espectáculos é a rubrica que apresenta as artes performativas produzidas pela China e pelos países de língua portuguesa. Além da performance vinda de Guansu, o serão vai ainda contar com música e dança tradicional de países como a Guiné-Bissau, Moçambique e Timor-Leste, e performances de artistas do Brasil e de São Tomé e Príncipe.

O serão tem lugar no dia 6 de Julho, no Centro Cultural de Macau.

Os bilhetes para o Festival de Cinema já estão à venda na Cinemateca Paixão com o valor de 60 patacas. Os ingressos para o Serão de Espectáculo está disponível na bilheteira online de Macau e custam 50 patacas.

 

20 Jun 2018

Portugal | Chá envelhecido em pipas de vinho do Porto voa para Macau

[dropcap style=’circle’] O [/dropcap] amor uniu uma ex-jornalista e um produtor de vinhos no Norte de Portugal e o resultado foi a criação do primeiro chá afinado em barricas de Vinho do Porto cuja produção já voa para Macau.
Os primeiros 40 quilos de chá Oolong, uma categoria entre chá preto e chá verde, que estagiaram durante seis meses em pipas de vinho do Porto com várias décadas, estão a ser exportados a partir de uma herdade em Fornelo, no concelho de Vila do Conde. Pequenas caixas de madeira onde cabem 75 gramas daquele produto biológico oriundo da Ásia, começaram recentemente a ser exportadas do Norte de Portugal para várias lojas biológicas e ‘gourmet’ de todo o país e também para Macau.
Cada caixa de madeira com aquele chá especial, baptizado de Pipa Chá, custa 19 euros, conta à agência Lusa a ex-jornalista alemã Nina Gruntkowski, 42 anos, que chegou a Portugal há uma dúzia de anos trazida “por amor” e hoje criou a empresa Chá Camélia em Fornelo, com cerca de dois hectares de extensão, onde se está a produzir para além de chás especiais, o primeiro chá verde em Portugal.
O Pipa Chá deve ser preparado com água a 90 graus centígrados, deve-se deixar repousar no bule “durante três minutos” e a planta aguenta três infusões sem perder qualidade, descreve a responsável pela criação do chá com travo a vinho do Porto.
“O meu marido [Dirk Niepoort] tem uma empresa de vinho do Porto e usamos as pipas pequenas do vinho da Niepoort para estagiar o chá Oolong e afinar mais o gosto do chá”, conta Nina, assinalando que conseguiram realizar o “casamento perfeito entre dois sabores, o do chá e o vinho”.
Actualmente, o chá Oolong, que é afinado nas pipas de Vinho do Porto, é importado de plantações biológicas da China e Taiwan, principalmente de uma plantação biológica da família Morimoto, situada na ilha mais a sul do Japão, perto da cidade de Miyazaki.

19 Jun 2018

Efeméride | “Barcos Dragão” reforçam integração de portugueses em Macau

[dropcap style=’circle’] A [/dropcap] s equipas do Instituto Português do Oriente e do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais são constituídas por atletas amadores portugueses. À agência Lusa, os remadores dos barcos dragão garantem que a prova os ajuda a estarem mais inseridos na cultura local.
Uma equipa feminina do Instituto Português do Oriente (IPOR) estreou-se ontem nas corridas “Barcos Dragão”, em Macau, como forma de reforçar a integração na comunidade daquele território administrado pelos chineses, explicou à Lusa uma das participantes.
“Eu acho que uma equipa totalmente portuguesa de uma instituição portuguesa poder participar num campeonato destes, que é uma coisa local da China, de Macau, traz uma grande energia e uma grande mensagem para os chineses em geral e para Macau. Quer dizer que nos integramos, fazemos parte da comunidade”, disse a vogal da direcção do IPOR Patrícia Ribeiro.
Para Patrícia Ribeiro, viver este tipo de provas fortalece os laços entre a comunidade portuguesa e a chinesa. “Participar nestas competições serve exactamente para demonstrar que também fazemos parte deles. Somos bem recebidos aqui em Macau”, considerou a funcionária do instituto, que tem como uma das principais missões difundir a língua e a cultura portuguesas no Oriente.
A exemplo dos últimos anos, o IPOR voltou a abrir as portas para que a comunidade possa acompanhar os jogos da selecção portuguesa no Mundial2018 de futebol.
Apesar da dificuldade do fuso horário, a grande maioria das colegas da embarcação assistiu ao embate contra a Espanha, em que Cristiano Ronaldo marcou os três golos do empate de Portugal com a Espanha (3-3). “A nossa inspiração […], a nossa musa inspiradora é o Cristiano Ronaldo, porque ele tem uma força e uma energia que nos transmitiu agora nesta prova”, confessou, sorridente, Patrícia Ribeiro.
O IPOR foi a única equipa portuguesa a participar neste evento, mas dentro de algumas equipas de Macau há também portugueses que se juntam à população local. Foi o caso de Rodrigo de Matos, residente em Macau há oito anos – este ano teve “um clique” e decidiu participar naquela que considera ser “uma grande festa”. “Este ano comecei a trabalhei no Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais de Macau (IACM) e soube que eles tinham uma equipa de ‘Barcos Dragão’ e a precisar de novos atletas para fazer uma reciclagem, de maneira que vim experimentar e gostei”, contou Rodrigo de Matos, antes do início da sua prova. “Isto é um evento com uma certa tradição. Será para este território comparável às corridas de remo, em Inglaterra, nos célebres duelos entre Oxford e Cambridge. A diferença é que estas são umas regatas internacionais”, explicou o funcionário do IACM.

Todos juntos
Ontem foi o último dia em que se realizaram as regatas locais de pequenas e grandes embarcações para entidades públicas de Macau, universitárias e dos trabalhadores da função pública, num total de 140 equipas.
Já as grandes provas internacionais tiveram lugar ontem, com a participação de equipas estrangeiras a competirem na Regata Internacional de Barcos Dragão de Macau para Grandes Embarcações, na categoria Open e na categoria feminina.
“O número de equipas que participam são cerca de 160”, disse à Lusa a secretária-geral da comissão organizadora dos “Barcos Dragão”.
Inicialmente, estas provas eram planeadas de forma voluntária por organizações não-governamentais, mas desde 1979 esta actividade passou a ser promovida de forma anual, incluindo uma regata internacional de barcos dragão, em que equipas de diferentes países têm sido convidadas a participar.
Desde o estabelecimento da RAEM que a Regata Internacional de Barcos Dragão de Macau é organizada em conjunto pelo Instituto do Desporto e pela Associação de Barcos Dragão de Macau, China.
A festividade tem origem numa lenda sobre um alto e leal funcionário do reino de Chu, de nome Qu Yuan, que se terá lançado ao rio pondo termo à sua vida, após ter visto o rei recusar as suas propostas por causa de intrigas. Caindo em desgraça perante o soberano, Qu Yuan partiu para o exílio, altura em que compôs vários poemas a expressar a sua revolta por não poder continuar a servir o seu país, e mais tarde decidiu suicidar-se.
Dada a estima que nutriam pelo patriótico e justo “poeta”, os habitantes locais remaram nos seus barcos de madeira para a zona, fazendo com que os barcos dragão simbolizem a busca pelo salvamento de Qu Yuan.

19 Jun 2018

Livro | Ivo Carneiro de Sousa lança “História de Timor-Leste” na próxima segunda-feira

[dropcap style=’circle’] I [/dropcap] vo Carneiro de Sousa lança na próxima segunda-feira “History of East-Timor”, esperando contribuir para que a história e a antropologia de Timor-Leste não caiam no esquecimento e despertar o interesse de jovens investigadores.

Seis de mais de 30 artigos que escreveu sobre Timor-Leste desde 1983 foram o ponto de partida para o livro que o investigador Ivo Carneiro de Sousa espera que ajude a compreender, de uma perspectiva antropológica, a história do pequeno país asiático. O lançamento tem lugar na próxima segunda-feira, pelas 18h30, no Clube Militar.

Embora, ao longo dos anos, tenha recebido pedidos, incluindo de um ministro da Educação timorense, para compilar alguns dos artigos que foi escrevendo sobre a terra à qual tem relações familiares, a “oportunidade” para finalmente o fazer – como descreve – só surgiu em Fevereiro do ano passado, quando foi submetido a uma operação e, ainda no hospital, começou a dar forma a “History of East-Timor” (“História de Timor-Leste”).

“A ideia foi compilar, reorganizar, reescrever os textos que permitissem compreender, de uma perspectiva antropológica a história de Timor-Leste”, explica o autor que tentou “perceber as estruturas sociais, culturais, a dispersão etnográfica e como tudo isso é tão importante hoje em dia na construção de um país independente”.

A obra não ficou, porém, reduzida a uma colectânea, dado que Ivo Carneiro de Sousa acabou por introduzir conteúdos novos, sobre os quais nunca havia escrito, e mergulhar em nova pesquisa, adicionando fontes novas. O autor destaca nomeadamente as leituras sobre as campanhas arqueológicas feitas pelos australianos em Timor: “Eu não fazia ideia que tinham recuado a presença humana de Timor de 30 mil para 42 mil anos, o que é uma descoberta científica muito importante, porque significa que são essas populações que depois vão ser os aborígenes da Austrália”.

Na feitura do livro, uma das “grandes preocupações” foi sobretudo “perceber aquilo que se designa como a história pré-colonial anterior à extensão da administração portuguesa em Timor. Isto é, as estruturas sociais e políticas”, salienta Ivo Carneiro de Sousa, apontando que o objectivo foi “trabalhar a memória e perceber como é que ela se actualiza hoje em dia”. Assim, o livro, com o subtítulo “entre mitos, reinos da memória, Macau e os desafios da antropologia cultural”, tem um corte não tanto cronológico, mas antes mais temático.

As relações com Macau

Macau também “entra” na História de Timor-Leste. “Quis mostrar a ligação muito estreita que existia, que não era apenas a económica, mas também os aspectos relacionados com o próprio conhecimento cultural e etnográfico que se faz a partir de Macau”, sublinha.

É que “além do comércio de sândalo desconhece-se significativamente que parte importante da escravatura que vinha para Macau era timorense, sobretudo feminina”, observa. “Macau era um mercado importante de venda regional de escravatura”, realça Ivo Carneiro de Sousa, contextualizando: “Filipe II proibiu a escravatura nas Filipinas e não era possível escravizar as populações locais, pelo que o que acabou por acontecer é que Macau se torna numa plataforma de venda de escravos para as Filipinas e para outros locais”.

Depois, no século XVIII, embora “seja proibida a escravatura nas colónias portuguesas de África, “continua a fazer-se em Timor e através de Macau”, salienta o investigador, dando conta da presença no território de descendentes de chineses casados com antigas escravas timorenses. Em paralelo, há “uma comunidade chinesa-timorense, fruto da emigração de chineses de Macau para Timor que também continua a existir”.

Ivo Carneiro de Sousa também procurou perceber quem em Macau estudou e se interessou por Timor-Leste, recuperando designadamente Wenceslau de Moraes (1854-1929), Bento da França (1859-1906) ou Jaime do Inso (1880-1967) que passaram por Macau e por Timor. Este último reveste-se de particular importância na perspectiva do investigador. “Ele esteve na chamada guerra de Manufahi, que é a guerra colonial de Timor e escreveu ‘Timor-1912’ que é um livro importante, mas muito menos conhecido que as célebres ‘Visões da China’ que escreveu em Macau”.

Com “History of East-Timor”, Ivo Carneiro de Sousa espera contribuir para que a história e a antropologia de Timor-Leste não caia no esquecimento e despertar ao mesmo tempo o interesse de jovens investigadores. “É para que possam existir alunos de mestrado e doutoramento que se interessem por investigar Timor que não é propriamente fácil”, afirmou, referindo-se ao facto de “existir muito pouca informação documental, porque parte dos arquivos desapareceram durante a ocupação indonésia e a invasão japonesa”.

O livro tem a chancela da Este-Oeste Instituto de Estudos Avançados, criada em 2012. A apresentação da obra, na próxima segunda-feira, vai ser feita em português, inglês e chinês.

15 Jun 2018

Hotel | Morpheus inaugurado hoje

O hotel Morpheus, do grupo hoteleiro e operador de jogo Melco International, desenhado pela arquitecta Zaha Hadid, é hoje inaugurado em Macau. O hotel, quase sem colunas e suportado por um exoesqueleto que envolve o edifício, custou perto de mil milhões de euros e está situado na ‘strip’ de casinos do Cotai, entre as ilhas da Taipa e de Coloane.
“Zaha Hadid e eu iniciámos conversações sobre o Morpheus em 2009 e partilhámos a mesma visão: criar uma nova maneira de expressar a vida contemporânea”, disse o director executivo da Melco, Lawrence Ho, filho do magnata do jogo de Macau Stanley Ho, quando foi anunciada, em Maio, a data da abertura do Morpheus. O hotel desenhado pela britânica de origem iraquiana, que morreu a 31 de março de 2016, vai ter mais de 770 quatros, incluído suites e vilas, avançou o grupo.
Alain Ducasse, ‘chef’ de renome internacional, com mais de 20 restaurantes espalhados pelo mundo, dos quais três receberam três estrelas Michelin, no Mónaco, Paris e Londres, vai abrir dois restaurantes no Morpheus, um dos quais o seu primeiro restaurante asiático, o Voyages.
As vigas de metal e cimento curvilíneas, assinatura de Hadid, conhecida como a ‘Rainha das Curvas’, cobrem a estrutura de vidro, criando um efeito de rede. No centro do paralelepípedo há três buracos, aquilo a que os arquitectos chamam a zona “free form”, que não obedece a nenhuma forma geométrica. “Inspirado em objectos de jade, a sua forma complexa desafia a física de uma forma sem precedentes”, de acordo com um comunicado do grupo.
A inauguração do Morpheus marca também a abertura da terceira fase do conjunto denominado City of Dreams, que pretende promover o turismo, encorajar a diversificação económica na Ásia e apoiar os objectivos de desenvolvimento a longo prazo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), indicou a mesma nota. A Melco Internacional está presente na China, Filipinas, Rússia, Macau e garantiu a primeira e única concessão para um casino em Chipre.

15 Jun 2018

Pintura | Austin Sou estreia-se a solo na Galeria da Fundação Rui Cunha

[dropcap style=’circle’] F [/dropcap] luid Gestures (“Gestos fluidos”, numa tradução livre) marca a estreia a solo do jovem artista Austin Sou. A exposição individual de pintura, inaugurada na quarta-feira, encontra-se patente na Galeria da Fundação Rui Cunha até ao próximo dia 23.
Nascido e criado em Macau, Austin Sou é um jovem artista que aspira a deixar a sua marca no mundo da arte. Com o seu trabalho abstracto, que vai buscar inspiração à dança e ao ioga, Austin Sou procura estabelecer uma conexão entre a natureza e a liberdade.
A vontade de ser artista surgiu quando percebeu que ao estar em contacto – tanto consigo próprio como com aqueles que o rodeiam –, permitia-lhe superar as barreiras da timidez e outras reservas sociais, realça a Fundação Rui Cunha num comunicado enviado às redacções.
A exposição individual de pintura, que pode ser vista como “uma janela para o trabalho de uma nova geração de artistas locais”, reúne um total de 11 obras. A curadoria ficou a cargo do professor e também artista Cai Guo Jie.
“A obra e o processo criativo de Austin [Sou] foca-se muito na arte perdida de conceber os seus próprios pigmentos”, afirmou Cai Guo Jie, para quem o que torna o trabalho de Austin Sou “tão único” é o facto de “ele gostar de accionar as características materiais dos pigmentos e de dominar a abertura da cor e emoção”.
“Os diferentes pigmentos são inseridos num recipiente, criando bolsas de cor”, fazendo com que “ele não esteja apenas a conceber um único trabalho, mas a dar um novo sentido de cor. O resultado é uma sensação de completude, uma conexão com a natureza e o círculo da vida”, acrescentou o curador.

15 Jun 2018

Mundial da Rússia tem início hoje, mas para os coleccionadores de cromos o ambiente já está no ar há algumas semanas

Tradição de verão. Com as grandes competições de selecções chega também a febre da colecção dos cromos. Macau não escapa ao fenómeno e são vários os pais e jovens que se dedicam à compra e troca de autocolantes

 

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Campeonato Mundial de Futebol começa esta noite, às 23h, com a partida entre a anfitriã Rússia diante da Arábia Saudita. Contudo para os amantes dos cromos locais o torneio já começou há algumas semanas e até já há quem tenha conseguido reunir todos os 682 autocolantes.

Esta é uma febre mundial que não passa ao lado de Macau e, muitas vezes, os filhos são o pretexto para que os pais recordem os seus tempos de infância e voltem a coleccionar os autocolantes mágicos.

“Já não fazia a colecção desde 1990 ou 1994, já não me recordo bem. Ainda era numa altura em que os cromos não tinham cola, éramos nós que tínhamos de arranjar. Agora voltei a fazer devido ao meu filho, considerei que era uma boa altura para ele fazer”, afirmou Rui Barbosa, empresário e comentador, ao HM. “Ele tem cinco anos e é a primeira experiência. Talvez seja um pouco novo, mas não faz mal porque eu também tenho prazer em fazer a colecção”, confessa.

Uma experiência semelhante é partilhada por Diana Massada, presidente da Casa do Futebol Clube do Porto em Macau.

“É a primeira vez que estou a fazer colecções do Mundial. Mas quando era jovem fiz várias colecções, com diferentes tópicos e sempre gostei. Desta vez estou a fazer com o meu filho de quatro anos e meio. Ele ainda é novo, acha piada a abrir as carteiras com os cromos, faz as equipas, reconhece os repetidos, mas a colagem deixa para mim”, conta a presidente da Casa do FC Porto.

À caixa é melhor

Com a caderneta a ser constituída por 682 autocolantes e as carteiras a trazerem cinco cromos, cada, fazer a colecção toda exige pelo menos a compra de 137 carteiras, isto no caso de não haver qualquer repetido. É por isso que as pessoas envolvidas na colecção acabam por comprar mais de duas caixas. O preço pelas 50 carteiras das caixas varia entre as 360 e as 450 patacas, dependendo do local de venda.

“Em Macau são raras as pessoas que não compram pelo menos uma caixa de carteiras logo no início. Acho que pelo menos entre os mais velhos não se limitam a comprar 10 ou 20 carteiras. Isso só acontece mais à frente, quando também já estão na fase de trocas”, explica José Reis, director comercial.

Contudo, nas primeiras semanas em que surgem à venda as cadernetas, nem sempre é fácil encontrá-las, porque esgotam depressa. Com o passar do tempo, como as pessoas começam a trocar mais do que comprar, a procura torna-se mais fácil.

“Temos notado um grande entusiasmo, aliás os cromos mal chegam e esgotam-se. Creio que já tivemos de fazer encomendas de novos cromos pelo menos três vezes”, apontou Cláudia Falcão, vice-administradora da Livraria Portuguesa, ao HM.

Também Pedro Lopes, trabalhador na área da informática e marketing, menciona casos de ruptura de stock de cadernetas e casos em que as pessoas precisam de fazer encomendas: “Eu comecei com a compra de duas caixas de cadernetas e tive facilidade na compra dos cromos. Mas sei que tem havido ruptura do stock rapidamente”, afirmou.

Os casos de lojas e bancas de vendas de jornais que precisam de pedir mais cromos ao distribuidor em Hong Kong repetem-se um pouco por toda a cidade. Mesmo assim, o HM não conseguiu encontrar casos de especulação com os autocolantes mágicos.

Internet facilita trocas

Além da compra, uma das partes que mais entusiasma os coleccionadores é a troca. No entanto, há diferenças significativas em comparação com o que acontecia na infância de muitos dos coleccionadores. Uma das principais é a existência da internet e a possibilidade que oferece para as trocas com pessoas desconhecidas. Desta forma, surgem grupos online, principalmente entre a comunidade chinesa, para a troca dos autocolantes em que as pessoas indicam os cromos que têm repetidos e os que procuram. Depois de encontrado o cromo desejado, as pessoas combinam encontrar-se um pouco por toda a cidade.

“Tenho trocado cromos com amigos, amigos dos meus filhos e mesmo em grupos do facebook, utilizados por ambas comunidades, portuguesa e chinesa. Os chineses também gostam muito de coleccionar, até fiquei surpreendido com o número de pessoas que está a fazer a colecção”, admitiu Pedro Lopes, ao HM.

Por sua vez, Tin U, proprietário de uma loja de camisolas de futebol, não faz troca de cromos. Mas optou por criar uma plataforma nas redes sociais para os clientes. “Nós oferecemos um espaço porque os nossos clientes gostam de fazer a colecção. Mas também há vários grupos online. Eu pessoalmente não participo, só mesmo por sentir que há clientes que se interessam muito pelos cromos”.

Contudo a troca tradicional cara-a-cara entre amigos e conhecidos não é substituída. Diana Massada revela que na festa de aniversário de um dos amigos do filho, que foram os pais que terminaram a fazer as trocas.

“Este fim-de-semana a troca aconteceu no aniversário de uma das crianças, de amigos comuns. Foi uma situação diferente, enquanto as crianças brincavam no aniversário, estavam os pais com as carteiras e com os cromos a fazer as trocas”, contou em tom animado.

Aplicação móvel

Outra das grandes diferenças é a existência de aplicações móveis, em que os coleccionadores inserem o número dos cromo que possuem e o número dos repetidos. Depois a aplicação faz as contas e indica aos coleccionadores os que estão em falta. Além disso, permite que se liguem a outros coleccionadores com a aplicação e possam saber quais os amigos que têm os cromos que lhes interessam trocar.

“Comecei a utilizar a aplicação este ano quase desde o início. Em comparação com a colecção do Campeonato Europeu de 2016 poupou-me muito tempo. Metemos o número de cromos, os repetidos e não se perde tempo”, começou por explicar Pedro Lopes. “Antes disso tinha de fazer um tabela, fazer as contas por mim e isso demorava muito mais tempo”, disse.

Também Rui Barbosa admite que a aplicação tem muitas vantagens e uma delas é gastar menos tempo nas contas. Mesmo assim, os cromos fazem com que frequentemente acabe por dormir mais tarde, uma vez que é depois do dia que tem tempo para se focar na colecção.

“Há noites que em vez de dormir às 23h ou 23h30, me deito mais tarde, mais próximo da meia-noite, meia-noite e meia, porque fico a trocar mensagens para a troca”, afirmou. “A aplicação facilita-nos a vida, mas também é diferente do que acontecia na infância, quando olhava para os cromos todos com muita atenção e conhecia-os melhor. Assim, também devido à aplicação, tenho os cromos todos virados para baixo, sei quem são os jogadores, mas só olho mais para os números. Perde-se um pouco a magia. Só quando for colar os cromos é que vou ter mesmo aquela atenção, mas nessa altura já só vou ter um cromo de cada”, explicou.

Entre as pessoas ouvidas pelo HM, ainda ninguém tinha concluído a colecção. No entanto, Pedro Lopes revelou que quatro amigos já tinham conseguido todos os cromos. O coleccionador, que está a cerca de 5 cromos de finalizar toda a caderneta, considerou que a tarefa tem sido mais fácil do que em 2016, quando fez a colecção do Europeu, que Portugal ganhou.

14 Jun 2018

Exposição | “Vertical reclamation of individual spaces” é inaugurada amanhã

Depois de uma passagem por Macau em Dezembro, Ana Aragão regressa para a apresentação da exposição “Vertical reclamation of individual spaces”, a partir de amanhã, na Casa Garden. Fazem parte desta mostra desenhos inéditos que a artista produziu inspirada nas particularidades estéticas do território

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap]na Aragão esteve pela primeira vez em Macau no passado mês de Dezembro. Em entrevista ao HM, deixou a promessa de voltar com obras inspiradas no território. E é com esses e outros trabalhos que é inaugurada amanhã “Vertical reclamation of individual spaces”.

A mostra conta com a curadoria de João Ó, sendo que “esta ideia surgiu imediatamente após a exposição da Ana Aragão no Taipa Village  no ano passado”, começa por dizer o curador ao HM.

Nos seis meses que separam estas duas exposições a artista foi, com o que levou de Macau, produzir uma nova série de obras que agora apresenta. “É uma exposição compreensiva do seu trabalho”, refere João Ó. Para o efeito, “Vertical reclamation of individual spaces” está divida em quatro partes distintas.

O primeiro momento expositivo está ainda a ser criado e faz parte de uma residência artística que a também arquitecta está a fazer no território. “Vai ser um mapa chamado “Mapa psicogeográfico” e que reflecte o itinerário imaginário dela em Macau”, apontou João Ó.

A artista está, durante este processo, a experienciar a cidade e, ao mesmo tempo, a cartografar os objectos que considera mais interessantes dentro do que vai vendo. “Estamos a falar de um itinerário ultra-subjectivo e não de um mapa turístico de Macau”, esclareceu o curador.

A segunda fase da exposição é o momento que lhe dá o nome “Vertical reclamation of individual spaces”. Aqui é apresentado ao público um conjunto de desenhos inéditos feitos em Portugal e inspirados em Macau. Estes desenhos são, ao mesmo tempo, fictícios e baseados na realidade, isto porque a artista foi buscar objectos e contextos presentes na arquitectura da cidade.

Estas particularidades, revelou João Ó, têm a ver com a construção informal da cidade onde se integra a presença das gaiolas, “as formações inesperadas que vemos nos arranha-céus ou na habitação social”, apontou.

São estes os elementos que serviram de inspiração à artista e a partir dos quais Ana Aragão desenvolveu edifícios “sempre verticais, mas gerados por informalidades, constituindo objectos completamente orgânicos”, sublinhou.

Construção única

A originalidade das construções locais que é retratada neste segundo momento expositivo destaca-se na medida em que trata um tipo de arquitectura que não se vê na Europa. “Na Europa é tudo muito mais regulamentado e as pessoas respeitam a arquitectura”, disse.

No entanto, e por cá, o “desrespeito” não deixa de ter o seu interesse e transmite, paradoxalmente, “a forma autoral que as pessoas têm na manutenção da estética de um edifício”. João Ó explicou que, por um lado, as pessoas não respeitam a arquitectura original mas, por outro lado, estão a conquistar o espaço individual. “A Ana enveredou pelo lado asiático para explorar este universo da conquista”, referiu.

Ao terceiro momento da exposição, o curador chama de retrospectiva em que foram seleccionados vários trabalhos da artista feitos no âmbito do design gráfico mas recorrendo a uma diversidade de suportes. “Estamos habituados a ver designers gráficos a aplicar o seu génio em papel e sempre de uma forma bidimensional, neste caso, sem deixar de ser bidimensional, os suportes utilizados são diferentes são utilizados, por exemplo tapetes, cerâmica, rótulos de vinho ou posters”, explicou João Ó.

O curador destaca ainda o sentido crítico que Ana Aragão imprime em qualquer trabalho que faça. “Ela não faz uma ilustração só porque é bonito. Há uma intervenção e uma intenção muito forte quando ela ilustra o mundo imaginário dela sobre um caso em particular”, disse.

Há ainda outro objecto que retrata esta parte da exposição, que não vai estar patente, mas vai ser representado numa fotografia e que o curador faz questão de referir pela sua importância. “É uma instalação de vidro feita em várias camadas em que a indústria de caixilharia convidou a Ana para ilustrar os desenhos em vários panos de vidro fazendo uma tridimensionalidade quase como um cenário”, explicou. A peça não vai estar presente mas “através da fotografia também de grande dimensão é possível transmitir o que é esperado desta obra”, apontou.

Este terceiro momento é ainda composto pela apresentação de várias serigrafias acerca dos trabalhos que integram a exposição e que vão estar à venda.

Arquitectura de papel

Por último, numa quarta parte da mostra, é projectado um vídeo que contem excertos de entrevistas dadas por Ana Aragão. “É uma forma de apresentar o que ela faz e a sua educação”, disse o curador. Neste momento final estão incluídos mais dois vídeos com entrevistas a dois arquitectos, ex-professores da artista que falam sobre “Vertical reclamation of individual spaces” na sua perspectiva académica. Os arquitectos abordam a questão da arquitectura de papel produzida para cidades visionárias. “O conceito refere-se às cidades que, apesar de não poderem ser efectivamente construídas, reflectem um avanço no imaginário e uma possibilidade de que num futuro, seja distópico ou utópico, sejam possíveis de acontecer”, explicou.

Para João Ó, a vertente mais intelectual e académica de interpretar o trabalho actual de Ana Aragão situa-se precisamente neste último momento até porque “nem toda a arquitectura tem de ser construída”. “Há duas vertentes a considerar: uma que diz que para se ser arquitecto os conhecimentos têm de ser aplicados em construções e outra que diz que não é bem assim, e que é preciso desenhar e conceber mundos porque a submissão ao exequível seria demasiado limitada”, rematou.

13 Jun 2018

InspirARTE | Espectáculos extra de “O Caminho Para Casa”

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m resposta à grande procura de bilhetes, o Centro Cultural de Macau (CCM) vai apresentar três espectáculos adicionais de “O Caminho Para Casa”. Vinda da Dinamarca, esta produção para crianças sobe ao palco do CCM em finais de Julho e os bilhetes para os espectáculos extra já estão disponíveis.

“O Caminho Para Casa” é uma “aventura visual sem palavras encenada através de marionetas e música e que explora a imaginação sem limites de uma criança”, refere o comunicado oficial.

Inspirada no conto ilustrado de Oliver Jeffers, a peça “reconta a história de um rapaz que um dia voa tão alto e tão longe, que o seu avião a hélice acaba por poisar na lua já avariado”, lê-se no mesmo comunicado. É aí que conhece um marciano que se encontra na mesma situação. “O Caminho Para Casa” é uma encenação da companhia dinamarquesa Theatre Refleksion que está de regresso ao território após uma passagem pelo CCM em 2014 com a produção “Música Celeste”. Esta peça é uma produção incluída no programa InspirARTE no Verão.

12 Jun 2018

Exposição “Stillness in motion” é inaugurada no próximo dia 28 na Creative Macau

“Stillness in motion” é a exposição de fotografia de Agostinho Guilherme Fernandes que vai ser inaugurada no próximo dia 28 na galeria da Creative Macau. Com este trabalho o autor, mais conhecido por Nico Fernandes, quer ultrapassar a linguagem estática da captura fotográfica tradicional e transmitir movimento e tridimensionalidade a cada obra

 

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] ideia para ““Stillness in motion” partiu da observação do Tai Chi, uma prática que mais parece uma coreografia e em que o movimento é o caminho para a quietude. “Quando observamos o Tai Chi percebemos que é através daqueles movimentos lentos, associados ao Kung Fu, que os praticantes procuram um equilíbrio, um estado de calma”, começou por dizer Nico Fernandes ao HM.

O resultado são 28 imagens de coreografias de vários tipos de danças em que a questão do movimento dos bailarinos está sempre presente. As longas exposições utilizadas pelo fotógrafo, muitas vezes associadas ao movimento da própria câmara são algumas das técnicas que escolheu para mostrar o que via.

No entanto, o resultado fica longe daquilo que que chama de “fotografia tradicional”, em que a imagem é estática, nítida e objectiva. “Penso que a fotografia em Macau ainda é muito vista sob uma perspectiva tradicional em que a introdução de técnicas que vão além da imagem estática do momento não são apreciadas”, conta o fotógrafo. Ciente da crítica, Nico Fernandes insiste na sua concepção de imagens. Para o fotógrafo amador é com elas que consegue contar as suas histórias, não a história que aparece manifesta mas aquela que tem dentro de si e que pode ser interpretada e mesmo recriada por quem as vê. “As minhas imagens são muitas vezes pensadas num universo mais surrealista em que mostro o que se passa dentro de mim e ao mesmo tempo deixo liberdade ao público para dar a sua história a cada fotografia”, explica.

Espera frutífera

O fotógrafo começou a interessar-se pela imagem “há muito”, mas a fotografia era um hobby “demasiado caro”. “Era preciso ter as máquinas, rolos e pagar a revelação”, diz. Foi esperando por tempos melhores, e com o aparecimento da fotografia digital que viu a possibilidade de começar a dedicar-se a esta arte muito mais próxima.

Há cerca de dez anos comprou a sua primeira câmara e começou a interagir em fóruns da especialidade para aprender. O segredo, para se conseguir chegar ao que se pretende, considera, é a humildade. “Colocava lá as minhas imagem e recebia as críticas. Tinha mesmo quem dissesse que as fotografias não prestavam”, aponta, mas o que interessa “é colocar o ego de lado, perceber porque é que não são boas e aprender a fazer melhor”.

Os anos passaram e sempre fiel à intenção e dar às suas fotografias um lado mais onírico, Nico Fernandes desenvolveu as técnicas que precisava para isso. Ao seu lado teve um professor, Yung Siu Sun, que favorável à exploração das possibilidades de uma imagem nunca desencorajou Nico Fernandes a desistir de quebrar as regras clássicas da fotografia. “Acabei por conhecer o fotógrafo Yung Siu Sun que sempre me apoio naquilo que queria fazer”, refere.

Não sendo visto como o “fiel fotógrafo” em Macau, os trabalhos que tem feito já lhe valeram o reconhecimento internacional, nomeadamente da Royal Academy de Londres, sendo que “nunca se faz uma imagem para se entrar numa competição”. disse. “A imagem é sempre um processo pessoal, feito para o próprio, depois, se gostarmos e acharmos que vale a pena, podemos concorrer com ela”, remata.

12 Jun 2018

Joana Vasconcelos inaugura no dia 29 exposição no Guggenheim de Bilbao

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma máscara criada com espelhos sobrepostos, que representa uma metáfora das várias facetas humanas, vai ser ‘estrela’ da exposição “I’m your mirror”, que a artista Joana Vasconcelos inaugura a 29 de Junho, no Museu Guggenheim Bilbao, em Espanha.

A criadora, conhecida por produzir obras de grandes dimensões usando objectos do quotidiano, criou um vídeo sobre a montagem desta peça que está a ser exibido na rede social facebook, antecipando um pouco do que vai mostrar em Bilbao.

“Esta é a peça principal da exposição, entre algumas novas que vou mostrar, e está associada ao luxo e ao consumismo”, diz a artista no vídeo, acrescentando que a obra tem um duplo sentido: que ao tirar a máscara pretende mostrar uma parte muito importante do seu corpo de trabalho.

A exposição de Joana Vasconcelos no Museu Guggenheim Bilbao vai incluir 14 peças novas, entre as quais um anel solitário, com três toneladas, feito com jantes de carros e copos de cristal.

Mas a máscara veneziana, que dá título à exposição, “vai permitir, ao longo dos anos, criar novos ambientes e perspetivas, quando for exposta noutros lugares”.

“Mostra a dimensão doméstica, portuguesa e internacional da minha obra”, explica a artista, no vídeo, apresentando fases da montagem, que envolve espelhos sobrepostos, como escamas.

Alavanca para o futuro

“I’m your mirror” pretende funcionar “como um ‘pivot’ para o futuro, mas que também resume o passado” do trabalho da artista, que se destacou, em 2012, por se tornar na primeira mulher e criadora mais jovem a expor algumas das suas obras no Palácio de Versalhes, em Paris.

Em Fevereiro último, numa apresentação da exposição aos jornalistas, avançou que a mostra reunirá 35 obras, 14 das quais novas, incluindo aquela máscara veneziana, feita com 231 molduras de duplo espelho e que tem um peso aproximado de 2,5 toneladas.

A máscara e o anel solitário são duas das obras que ficarão expostas no exterior do museu, tal como o “Pop Galo”, um gigantesco Galo de Barcelos em azulejo e luzes LED, que iniciou no final de 2016 em Lisboa uma itinerância por várias cidades do mundo, entre as quais Pequim.

No átrio do Guggenheim Bilbao, o espaço central do museu, ficará uma obra feita de propósito para o local, da série “Valquírias”, com 30 metros de altura, 36 de largura e 45 de profundidade, que entra pelos cantos e ângulos que Frank Gehry (arquiteto que projetou o museu) desenhou para o Guggenheim.

Ao Guggenheim, Joana Vasconcelos irá também levar algumas das suas peças mais icónicas como “A Noiva”, um candelabro feito com tampões, ou “Marilyn”, um par de sapatos de salto alto feito com panelas, e outras peças das séries “Urinóis”, “Pinturas em crochet” e “Bordalos”.

A obra mais antiga que estará em exposição data de 1997, ano em que o Museu Guggenheim Bilbao abriu ao público.

Homenagem a uma canção

O título da exposição “é também uma homenagem a Nico [voz da canção ‘I’ll be your mirror’ dos Velvet Underground]”. No título da canção, o verbo é usado no futuro (“serei o teu espelho”), mas, no da exposição, está no presente (“sou o teu espelho”), porque a mostra “espelha o presente, não o futuro” e o trabalho da artista “é um reflexo do mundo que a rodeia”, explicou, na altura, a organização.

Esta exposição insere-se na “linha de pensamento curatória do Museu Guggenheim Bilbao, iniciada há quatro anos, de grandes exposições de mulheres artistas”, referiu Petra Joos, uma das comissárias da mostra, quando foi apresentada, em Lisboa.

“I’m your mirror” é a primeira exposição individual de um artista português no Museu Guggenheim Bilbao.

A artista tem uma equipa de cerca de 60 pessoas a trabalhar na produção da mostra, que está preparada para uma itinerância, estando Petra Joos a trabalhar com Serralves e Roterdão para o acolhimento da mostra.

A artista, de 46 anos, representou oficialmente Portugal na Bienal de Arte de Veneza em 2013, num projeto comissariado por Miguel Amado, que levou um cacilheiro transformado em obra de arte ao recinto principal da mostra internacional contemporânea.

O cacilheiro “Trafaria Praia”, que chegou a circular no Tejo para visitas turísticas, é propriedade da Douro Azul e encontra-se à venda desde o final do ano passado.

12 Jun 2018

Anthony Bourdain | Há seis anos, o chef norte-americano provou minchi

Foi com o programa “Sem reservas”, da CNN, que o chef, escritor e apresentador de televisão norte-americano Anthony Bourdain esteve em Macau, em 2011. Comeu caril de quiabos com camarão na cantina da APOMAC e jantou minchi na casa de Cecília Jorge, além de ter experimentado as iguarias chinesas em tascas de rua no Patane. Bourdain cometeu suicídio aos 61 anos em França esta sexta-feira

 

[dropcap style≠’circle’]D[/dropcap]espretensioso, um conversador nato, um amante de boa e variada comida mas, sobretudo, de conversas sobre a cultura e os hábitos das pessoas. Assim era Anthony Bourdain, chef de cozinha, e escritor e apresentador de programas de gastronomia. O apresentador da CNN cometeu suicídio esta sexta-feira em França depois de ter atravessado um longo período de depressão e consumo de drogas duras.

Em 2011 Bourdain esteve em Macau a gravar um dos episódios do programa da CNN intitulado “Sem Reservas”, que contou com a presença de vários membros da comunidade macaense, tal como Cecília Jorge, que preparou um minchi na sua casa. Anthony Bourdain encontrou-se ainda com o falecido padre Lancelote Rodrigues no Clube Militar, que posteriormente o levou a almoçar na cantina da Associação dos Aposentados, Reformados e Pensionistas de Macau (APOMAC).

Francisco Manhão, presidente da APOMAC, recordou ao HM o momento em que o apresentador experimentou o prato macaense caril de quiabos com camarão, por sugestão do padre Lancelote Rodrigues, que adorava essa comida.

“Sei que adorou a nossa comida e falamos um bocado sobre a comida macaense e portuguesa também, sobre o que costumamos preparar na cantina da APOMAC”, contou Manhão, que ficou “surpreendido” com a visita de uma personalidade mundial. “Tanto Cecília Jorge como o padre Lancelote Rodrigues acharam que era um bom lugar para ele ficar a conhecer a gastronomia macaense.”

O presidente da APOMAC recorda “uma pessoa alegre e divertida”. Também Jorge Fão, outro dirigente da APOMAC, se lembra dessa visita inesperada, apesar de não ter estado presente nesse almoço.

“Tudo aconteceu no dia de aniversário de um colega meu. Quando ele estava a almoçar apareceu o Anthony Bourdain acompanhado pelo padre Lancelote Rodrigues. Foi o padre que o levou à APOMAC.”

Apesar do privilégio de contar com a presença do apresentador, os dirigentes da APOMAC nunca quiseram usar isso para promoverem o espaço de refeições, que, apesar de receber gente de fora, tem como principal objectivo servir almoços aos associados já idosos.

“A APOMAC nunca quis fazer publicidade, não gostamos muito de nos aproveitar disso. A APOMAC é sempre uma cantina que serve os idosos e os associados, é essa a nossa intenção original. Mas não podemos objectar a entrada de pessoas muito célebres. Isto é bom para a comida macaense, porque acontece a publicidade através de pessoas célebres, porque está em causa o nosso património.”

“Era frontal, inteligente”

Cecília Jorge, macaense e autora de inúmeros livros sobre a gastronomia já distinguida pela UNESCO, lembra que o seu encontro com o famoso apresentador foi fruto de um acaso, pois Bourdain nunca foi muito conhecido nesta zona do mundo.

“Foi uma situação um bocado maluca. Eu e o meu filho João trabalhávamos no jornal Macau Daily Times, e nós não tínhamos quase tempo livre para acompanhar pessoas. Não sabíamos quem ele era, porque em Macau não tínhamos acesso ao programa. O que aconteceu é que o editor da CNN em Hong Kong me pediu ajuda para ser consultora no programa, para que desse esse contexto sobre a gastronomia macaense.”

Cecília Jorge e o filho, João Jorge Magalhães, artista e designer, acabaram por ser guias gastronómicos de Bourdain, mostrando-lhe o que de melhor tem a comida macaense e chinesa. Além da cantina da APOMAC, o apresentador passou pelo restaurante Fernando, em Coloane, e por várias tascas de rua na zona da Ribeira do Patane.

“O João, como conhece esse sítios todos acabou por ir. No fim insistiram numa coisa que eu tinha dito desde o inicio que não participava, que cozinhasse na minha casa e servir uma refeição. Eu tinha dito desde o inicio que a minha cozinha era uma vergonha porque em Macau é tipicamente chinesa e não dava para fazer muita coisa, é pequena.”

A verdade é que Cecília Jorge acabou por confeccionar uma das centenas de opções que existem do minchi. E destaca as diversas dificuldades que a equipa de filmagens teve de enfrentar para conseguir fazer o programa em Macau.

“Eles insistiram comigo porque tinham tudo programado e a dada altura as pessoas começaram a desistir. Ele [o editor da CNN em Hong Kong] pediu-me então para lhe ir safando o programa, para não ser um flop. Acabamos por ajudar a fazer um programa que foi sendo adaptado constantemente. Só quem sabe a falta de condições daquela equipa para filmar… julgo que passaram dias sem conseguir comer sequer. E penso que mesmo assim fizeram um programa interessante.”

A autora do livro “Os Sabores das Nossas Memórias – A Comida e a Etnicidade Macaense”, entre outros, assume ter aceite o desafio apenas porque gostou do formato do programa de Bourdain, que era conhecido por experimentar todo o tipo de comida, desde a mais gourmet aos pratos de rua, servidos em tascas.

“O formato do programa agradou-me desde o inicio e percebi que seria uma boa maneira de abordar a gastronomia macaense e Macau, no fundo. Aceitei por causa disso, sem saber quem ele era e qual seria a dimensão e o impacto.”

Além disso, Bourdain “era frontal, inteligente, culto, vivido. Não era vedeta”, acrescenta a autora. “A abordagem que ele fez da comida foi interessante. Foram-se conseguindo mais pessoas para dar o cunho local sobre a maneira de se viver em Macau. Tive dois a três dias com ele e era uma pessoa extremamente interessante como ser humano.”

Mesmo quando almoçou na APOMAC, o apresentador da CNN destacou-se pela conversa e pela abertura em conhecer um novo tipo de gastronomia.

“Ele não experimentou muita coisa. Ele gostava de conhecer pessoas e a cultura, através da gastronomia ele queria saber como é que os povos vivem. Serviu mais em termos de conversa sobre questões culturais ligadas à comida do que propriamente para provar este ou aquele prato.”

11 Jun 2018