Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeCentro UNESCO | Um edifício “interessante” com pouca utilização Criado em 1998, ainda durante a Administração portuguesa, o Centro da UNESCO de Macau pretendia ser um espaço de promoção do património e da cultura. Hoje, sob gestão da Fundação Macau, acolhe apenas exposições esporádicas. As informações online e a promoção são escassas. Muitos gostariam de ver um melhor aproveitamento do espaço [dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] no meio de uma avenida barulhenta e caótica que está edificado o Centro da UNESCO em Macau. Criado em 1998, ainda durante o Governo de Vasco Rocha Vieira, o centro passa hoje despercebido aos olhares de muitos, sendo escassas as informações sobre as actividades que desenvolve. Três nomes ligados ao meio cultural consideram que está a fazer-se pouco por este espaço. Segundo o website da Fundação Macau (FM), entidade que actualmente gere o Centro da UNESCO, realizaram-se no ano passado várias exposições de arte. A última, com o nome “Dez Anos de Artes Visuais”, data de Junho e foi organizada pela Associação de Artes Visuais de Macau. Em Março do mesmo ano, decorreu a exposição “Uma Centena de Pinturas de Choi Weng Chi sobre o tema da águia”, promovida pela Associação de Pintura e Caligrafia de Terceira Idade de Macau”. Em Outubro, o mesmo espaço foi ainda palco de duas sessões de demonstração realizadas pelo Ballet Nacional da China para estudantes de duas escolas. O historiador Fernando Sales Lopes, que já vivia em Macau à época da inauguração do edifício, afirma ao HM que o espaço nunca foi muito divulgado junto do público. “Foi um projecto implementado nos últimos anos da Administração portuguesa, mas nunca teve grande utilidade. Houve algumas exposições, mas nunca houve grande actividade. Depois da transferência, aquilo tem estado um pouco parado e até pensei que estivesse fechado”, diz. Para o historiador, “Macau tem tão pouco espaço que todos os outros espaços fazem falta”. “Realmente, há muitos anos que não conheço qualquer actividade daquele espaço. O centro poderia ser útil para qualquer outra coisa. Qualquer espaço que não esteja a ser utilizado aqui em Macau é uma pena, porque não temos locais suficientes”, aponta. O arquitecto Francisco Vizeu Pinheiro, por sua vez, defende que “houve uma mudança de gestão e realmente poderiam fazer mais”, por existirem “poucos espaços para o público”. Para Vizeu Pinheiro, o facto de o local ter UNESCO no nome pressupõe a realização de actividades relacionadas com o património, algo que não tem vindo a acontecer. “Nesse aspecto, deveria ter mais coisas relacionadas com a UNESCO. Deveria ter uma biblioteca com materiais dessa entidade, como esteve a funcionar há mais de 15 anos.” “As pessoas passam por ali e pensam que está abandonado, e talvez nem seja o melhor local para uma entidade como esta, porque há poucas escolas e mais hotéis e escritórios”, frisou o arquitecto. De acordo com o website do centro, a galeria de exposições só foi inaugurada em 2012, sendo que, a partir de 1998, o objectivo do espaço seria “promover actividades com vista a concretizar os fins fixados no Acto Constitutivo da UNESCO e da FM”. Exposições para que te quero Uma visita ao website do Centro da UNESCO, que data dos anos 90, pode verificar-se que um dos objectivos é, exactamente, a preservação e promoção do património. O espaço no NAPE tem como função “promover debates, colóquios, seminários, conferências sobre temas da UNESCO ou afins”, bem como a responsabilidade de “colaborar ou cooperar com as instituições locais, regionais e internacionais, especialmente na área da juventude, nas acções e realizações que têm ligação com os objectivos da UNESCO”. Cabe ao local gerido pela FM o fomento do “estudo e conservação dos valores e tradições locais, do folclore, lendas e costumes”, bem como “promover o ensino para a preservação do património cultural e natural, bem como campanhas para a protecção e restauro da herança cultural dos antepassados”. Deve ainda “distribuir as publicações e a documentação da UNESCO, a título gratuito ou venal, em conformidade com o acordo estabelecido entre a Fundação e os competentes serviços da organização”. Mas o Centro da UNESCO em Macau deve também ter um papel ambiental, ao nível do apoio a “estudos sobre a biosfera, poluição e conservação da natureza”. Segundo a resposta da Fundação Macau ao HM, o trabalho tem incidido sobretudo ao nível do acolhimento de exposições. “Todos os anos a FM, através da sua subunidade de apoio técnico Centro UNESCO de Macau, organiza e co-organiza diversas exposições, apresentações artísticas e concursos.” A FM refere ainda que “o edifício tem uma sala de exposições e uma sala multifuncional, as quais são aproveitadas tanto pela própria FM, como pelas associações autorizadas para apresentar diversos tipos de trabalhos artísticos e efectuar intercâmbios, criando também condições para os cidadãos ficarem a conhecer e participar em acções artísticas e culturais”. Confirmando que não existe, para já, nenhum projecto especial em termos de actividades ou de renovação do próprio edifício, a FM afirma ainda que “tem vindo a conceder subsídios às associações e organizações civis, tais como a Macau Documentation and Information Society”. Tal apoio financeiro serviu para “promover a inscrição dos elementos culturais e históricos únicos de Macau no Registo da Memória do Mundo para a Ásia-Pacífico”. Como bastidores Na opinião de André Ritchie, arquitecto, o espaço é pouco conhecido e divulgado, lamentando o facto, até porque o projecto arquitectónico em questão é “interessante”. “Concordo que não está a ser bem aproveitado neste momento. Mas acho que, para mim, é um edifício muito interessante do ponto de vista arquitectónico. Antes da transição houve ali alguns eventos, era um espaço agradável e uma peça de arquitectura interessante.” O antigo coordenador do Gabinete de Infra-estruturas de Transportes (GIT) lamenta ainda que o Centro da UNESCO em Macau não esteja a receber a devida manutenção. “Custa-me ver o edifício a não ser tratado como deve ser. Mas este comentário é aplicável a muitas peças de arquitectura que existem em Macau, com valor, que ao nível da manutenção não são cuidadas como deveriam”, defende. “Não falo apenas na manutenção física, pois ao fim de alguns anos os edifícios aparentam algum desgaste, falo também do respeito pelos espaços. Quando passo pelo Centro da UNESCO vejo ali os contentores do lixo mesmo à entrada principal. Isso é uma certa falta de consideração.” O arquitecto dá outro exemplo de “um edifício que é tratado com os pés”: o Centro de Ciência de Macau. “Tudo parece que é tratado como se estivéssemos nas traseiras dos edifícios”, observa. Apesar de estarmos perante um espaço que visa promover e debater cultura, o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, não quis falar sobre a utilização do Centro da UNESCO de Macau pelo facto de ser gerido pela FM, que está sob alçada do Chefe do Executivo. O HM tentou ainda chegar à fala com Jorge Rangel que, em 1998, era secretário-adjunto para a Administração, Educação e Juventude, cargo que ocupou entre 1991 e 1999, mas até ao fecho desta edição não foi possível estabelecer contacto.
Andreia Sofia Silva PolíticaHigiene | Exigidas sanções para donos de terrenos desocupados [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Ho Ion Sang considera que o Governo deve proceder a uma alteração da estrutura orgânica dos Serviços de Saúde (SS), para que possam ser aplicadas sanções a quem possui terrenos e não leve a cabo a limpeza dos espaços. “Os serviços administrativos têm a responsabilidade de tratar das questões de salubridade ambiental; e em relação à salubridade ambiental dos terrenos de propriedade privada, segundo o decreto-lei 81/99/M, são atribuições dos SS a defesa da saúde e a prevenção da doença, com o dever de desenvolver os respectivos trabalhos”, assinala o deputado. “Vai o Governo aperfeiçoar o decreto-lei, aditando normas sancionatórias, em prol do impulsionamento dos proprietários dos terrenos para que cumpram as devidas responsabilidades?”, questionou o deputado ligado à União Geral das Associações dos Moradores de Macau (UGAMM, ou Kaifong). Citando um estudo levado a cabo pelos Kaifong, sobre os terrenos desocupados, Ho Ion Sang referiu que “a situação de higiene” desses espaços “encontra-se em situação grave”. Tal “demonstra que o Governo não conseguiu desempenhar os devidos efeitos da fiscalização, mesmo quando tem essa competência”. Ho Ion Sang lembrou que uma das conclusões do estudo aponta para a existência de 293 terrenos, ou seja, 75,1 por cento, que estão “desocupados com problemas de higiene ambiental, devido a resíduos sólidos, ervas daninhas, estacionamento de viaturas e lixo”. Além disso, o deputado pretende saber quais são as medidas para potenciar o desenvolvimento dos terrenos junto dos concessionários. “Que medidas dispõe o Governo para fazer com que o proprietário acelere o aproveitamento dos terrenos? Relativamente a alguns terrenos de propriedade privada com maior dimensão, que reúnem condições para serem desenvolvidos e não têm planos de desenvolvimento, o Governo deve negociar com os respectivos proprietários e liderar os trabalhos, dando prioridade ao desenvolvimento daqueles terrenos em projectos de instalações sociais. Vai fazê-lo?”, questionou.
Andreia Sofia Silva PolíticaAL | Chui Sai Peng disponível para continuar como deputado O deputado Chui Sai Peng afirma querer continuar na Assembleia Legislativa, caso o sector empresarial pelo qual é eleito assim o entenda. O também engenheiro civil espera que Macau se possa transformar numa plataforma de startups [dropcap style=’circle’]P[/dropcap]or vontade de José Chui Sai Peng, deputado eleito pela via indirecta, pouco ou nada vai mudar nas próximas eleições legislativas. À margem da segunda edição do Fórum de Inovação Colaborativa dos Dois Lados do Estreito, Hong Kong e Macau, o também engenheiro civil afirmou ter toda a disponibilidade para continuar no hemiciclo. “Sou eleito pelo sector empresarial e, se este achar que ainda sou útil na Assembleia Legislativa (AL), então estarei ao seu serviço”, apontou o deputado que, antes da actual legislatura, foi deputado nomeado pelo Chefe do Executivo. Convidado a fazer um balanço sobre o trabalho do hemiciclo, Chui Sai Peng afirmou que a Assembleia está “sempre a tentar servir os cidadãos”. “Temos muitas questões em discussão, esperamos que possamos reagir a tempo e aprovar as leis que sejam úteis”. “Toda a Assembleia está a trabalhar arduamente para criar uma atmosfera na qual Macau possa ser um bom lugar, governado com base na lei e em prol dos cidadãos”, disse ainda. Uma hub que diversifica Para Chui Sai Peng, o território poderia transformar-se numa hub de empresas ligadas ao ramo da tecnologia, conhecidas como startups, as quais estabeleceriam laços de cooperação com países e regiões vizinhas, sem esquecer Portugal. O deputado deu mesmo o exemplo da Fábrica das Startups, estabelecida em Lisboa. “O Governo já tem alguns planos para as startups, mas é preciso mais financiamento. Mais do que conceder um espaço [aos empresários] é importante providenciar conselhos e sugestões na área do marketing e gestão, por exemplo, criar uma rede de negócios. Investidores e pessoas inovadoras podem juntar-se e criar algo em conjunto.” Para o deputado, a realização do fórum visa que jovens empresários e investidores possam criar algo em conjunto, em prol de uma economia diversificada. “Temos de encorajar mais acções de intercâmbio e eventos, e também investigação a nível internacional, para que Macau possa ter uma maior diversificação para além do jogo, com a introdução deste novo elemento que é a ciência e a tecnologia.” “Temos 12 projectos de Hong Kong, Taiwan, Macau e China, que estão em competição. Os vencedores, e até mesmo os perdedores, têm a oportunidade de mostrar o seu trabalho a empresas e a entidades que dão apoio financeiro. Os mais jovens podem obter mais fundos, porque é impossível pedir ao Governo que apoie tudo, porque não é algo comercial”, acrescentou Chui Sai Peng. O deputado participou ontem no fórum sobre tecnologia e inovação enquanto presidente da direcção da Associação Promotora das Ciências e Tecnologias de Macau, que coordenou o evento em conjunto com o Governo e a Associação de Ciências e Tecnologia da China. Na cerimónia de abertura, realizada no Centro de Ciência de Macau, participaram diversas figuras do meio político local, tal como o secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, e Ho Iat Seng, presidente da AL. Deputados como Chan Iek Lap, Dominic Sio e Lam Heong Sang, vice-presidente do hemiciclo, estiveram também presentes. Lionel Leong defende aposta na inovação No discurso de abertura do Fórum de Inovação Colaborativa, o secretário para a Economia e Finanças falou da necessidade de apostar na inovação. “O Governo da RAEM defende vigorosamente que é necessário persistir na inovação e ter na mira uma inovação perfeita, para que ela assuma um papel preponderante no processo de desenvolvimento económico e social.” Além disso, Lionel Leong referiu que o Governo “atribui também grande importância à promoção da educação científica abrangente, insistindo na formação de recursos humanos como pilar da inovação”.
Andreia Sofia Silva Ócios & Negócios Pessoas“O Santos, loja portuguesa” | Dos enlatados ao galo de Barcelos Um dos mais famosos restaurantes portugueses na vila da Taipa emprestou o nome, e apenas isso, ao espaço “O Santos, loja portuguesa”. O projecto de Joana Fonseca e da Vino Veritas quis concentrar num só local tudo o que Portugal tem para oferecer de bom [dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]um cantinho da vila da Taipa, todas as regiões de Portugal estão concentradas numa só. O projecto “O Santos, loja portuguesa” permite-nos ir de Norte a Sul e descobrir as iguarias, os vinhos e as lembranças vindos do outro lado do mundo. Joana Fonseca é uma das proprietárias, ao lado da empresa de importação Vino Veritas, e conta que o uso do nome do restaurante “O Santos” se deveu à longa amizade que mantém com Santos Pinto, o proprietário da tasca alentejana. “O restaurante e a loja são negócios diferentes e independentes. A loja adoptou o nome “O Santos” porque já é um nome estabelecido na vila da Taipa, então decidimos procurar o Santos e ver se nos emprestava o nome. Temos uma relação especial com ele e, estando aqui na vila da Taipa, achámos que seria o nome mais correcto”, explicou Joana Fonseca ao HM. A loja, aberta recentemente ao público, pretende ter uma mostra diversificada do que é genuinamente português. “Temos souvenirs, como o galo de Barcelos, as imagens da Nossa Senhora de Fátima. Temos também um andar só dedicado a vinhos, onde as pessoas podem ter um atendimento personalizado.” A ideia inicial para o arranque do projecto foi o facto de os produtos portugueses existirem em toda a parte, mas estarem dispersos em lojas e restaurantes. “Muitas vezes, as pessoas procuram produtos portugueses na vila da Taipa e o que acaba por acontecer é que está tudo muito espalhado. As pessoas não têm noção da gama de variedade de produtos que existem. Achámos então que seria boa ideia concentrar tudo no mesmo sítio e seria uma boa maneira de promover produtos portugueses em Macau.” Olaria e bordados Joana Fonseca frisa que há mais ideias para dinamizar a oferta de produtos. “Ainda estamos à procura de fornecedores e de produtos diferentes que ainda não existam em Macau. No futuro, vamos ter um terceiro andar que será dedicado apenas a artesanato e produtos portugueses ao nível dos bordados, cerâmicas, olaria. Coisas que sejam artesanato português e que representem as diferentes regiões em Portugal”, adianta. “Neste momento estamos ainda a fazer um estudo de mercado e a tentar perceber o que as pessoas procuram em Macau. Temos outras ideias nas quais estamos a trabalhar, para trazer, por exemplo, biscoitos tradicionais e mel. Há uma gama de produtos que queremos ter aqui”, explicou uma das mentoras do projecto. O sucesso das conservas Além dos habituais vinhos e queijos, as conservas de peixe têm feito sucesso no mercado chinês, sendo bastante procuradas por turistas. Na loja “O Santos” essa procura também se faz notar. “Uma das coisas que vendemos melhor são as conservas portuguesas”, refere Joana Fonseca. Ainda assim, “temos vendido um pouco de tudo”, adianta a empresária. “Quem tem mais interesse nos produtos são pessoas de Hong Kong e Macau, mas também temos pessoas da China e do Japão à procura de vinhos. O turista vai directamente ao galo de Barcelos ou às conservas e é mais nisso que temos apostado e também vendido.” Com presença apenas na vila da Taipa, o objectivo é que, no futuro, a península também possa ter a sua loja de produtos portugueses. “Neste momento vamos ver como corre a experiência na vila da Taipa, e qual a receptividade das pessoas em Macau e dos turistas. Mais tarde a extensão a Macau poderá ser uma possibilidade”, afirma Joana Fonseca, que garante que não é objectivo vender produtos da gastronomia macaense, apesar da ligação que existe a Portugal. “O objectivo da loja é mesmo concentrar-se em Portugal e nos produtos que o país tem para oferecer, além de o promover através dos seus produtos. Não há tanto a ideia de estabelecer uma ligação com os produtos macaenses”, remata.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaErro médico | Juristas apontam falhas na mediação e seguros O Centro de Mediação de Litígios Médicos entrou ontem em vigor. Um jurista aponta que a legislação está do lado das seguradoras, em vez de proteger os prestadores de cuidados de saúde, indo contra o princípio da mediação. Há também quem critique os baixos valores do seguro obrigatório [dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]oi ontem publicado em Boletim Oficial (BO) o despacho que determina a criação do Centro de Mediação de Litígios Médicos, no âmbito do Regime do Erro Médico, implementado no ano passado. Contudo, um jurista ouvido pelo HM considera que a forma como esta entidade foi legislada não protege os prestadores de cuidados de saúde, sejam médicos, hospitais ou clínicas, indo contra o próprio espírito da mediação presente no direito. Para o jurista, que não quis ser identificado, o Centro de Mediação de Litígios deveria estar abrangido no mesmo regulamento administrativo sobre o seguro de responsabilidade civil obrigatório. Desta forma, o diploma que institui o centro de mediação determina que “o prestador de cuidados de saúde que adere ao procedimento de mediação deve notificar o acto à sua seguradora, cuja participação no mesmo, conjuntamente com o segurado, é obrigatória”. Para a mesma fonte, se a seguradora é obrigada a participar no processo de mediação, “é desvirtuado o conceito de liberdade de ambas as partes e, na prática, quem está na mediação é a seguradora e não o médico. A companhia de seguros vai sempre tentar garantir uma indemnização mais baixa”, explicou. O mesmo jurista afirma ainda que há um elevado número de responsabilidades dos prestadores de cuidados de saúde que ficam de fora do regime do seguro. “É um regime tão restritivo que a maior parte dos danos ficam de fora”, defendeu. O HM sabe também que a forma como foi feita a legislação se deveu a pressões colocadas pelas companhias de seguro junto da Autoridade Monetária e Cambial de Macau (AMCM). Até ao fecho desta edição, não foi possível obter uma reacção junto da AMCM. Baixos valores Outro jurista, que também não quis ser identificado, considera que a forma como a mediação destes casos foi legislada não vai contra os direitos dos prestadores de cuidados de saúde, defendendo, no entanto, que os valores do seguro são demasiado baixos. Diz o regulamento administrativo que um médico de medicina tradicional chinesa, um farmacêutico ou um técnico de farmácia devem ter um seguro de 500 mil patacas, enquanto médicos e médicos dentistas devem ter um no valor de um milhão de patacas. Um médico que realize cirurgias deve estar abrangido por um seguro de, no mínimo, dois milhões. Já o seguro de pessoas colectivas, como clínicas ou hospitais, poderá atingir as 20 milhões de patacas. “Os montantes mínimos obrigatórios são muito baixos”, defendeu este jurista ao HM. “Caso ocorra o dano de morte ou invalidez permanente parece-me um valor muito baixo, tendo em atenção o rendimento médio potencial dos utentes e a esperança de vida útil. São valores baixos para o potencial dano que o médico pode causar.” “Se for um idoso em fim de vida, dois milhões de patacas chega. Mas imagine um juiz aposentado que tenha 70 anos e que ainda tem uma esperança média de vida considerável, ou mesmo uma pessoa em início de carreira. Parece-me muito pouco. Mas, comparando com o que temos agora, é um princípio”, acrescentou ainda o mesmo jurista. Ontem foi também publicada em BO a criação da Comissão de Perícia do Erro Médico, que determina que um pedido de perícia vai custar quatro mil patacas.
Andreia Sofia Silva PolíticaObras do edifício do Fórum Macau arrancam este ano [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) admitiu nove das 12 propostas que recebeu para a “empreitada de concepção e construção do Complexo de Serviços para a Cooperação Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, mais conhecido como edifício do Fórum Macau. O projecto será edificado na zona do Lago Nam Van e a construção “poderá ter início no segundo semestre do corrente ano”. Prevê-se que a obra demore cerca de um ano e meio a ser realizada, segundo as previsões da DSSOPT. De fora ficaram três propostas, que não foram aceites porque “não cumpriam as disposições definidas no programa do concurso e nos esclarecimentos prestados por escrito aos concorrentes”, aponta um comunicado. O edifício irá albergar o Centro de Exposição dos Produtos dos Países de Língua Portuguesa, o Centro de Serviço das Empresas da China e dos Países de Língua Portuguesa, o Centro de Informações, o Pavilhão de Exposições sobre as Relações Económicas e Comerciais entre a China e os Países de Língua Portuguesa e as Respectivas Culturas, o Centro de Formação entre a China e os Países de Língua Portuguesa, bem como o Pavilhão de Exposição sobre o Desenvolvimento Urbanístico de Macau. O concurso público para a entrega de propostas esteve envolto em polémica, uma vez que vários arquitectos relataram ao HM que a tradução para português das cláusulas técnicas chegou com um mês de atraso. Além disso, houve diversas alterações ao projecto a meio do processo. Olhando para a lista de concorrentes disponibilizadas pela DSSOPT, conclui-se que nenhuma empresa portuguesa participou no concurso público, que previa candidaturas em regime de consórcio.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeConstrução civil | Maioria dos cursos de formação são em chinês Não há cursos de formação suficientes em português ou inglês para arquitectos, engenheiros ou urbanistas, apesar de ser obrigatória a sua frequência para a renovação das licenças profissionais. Arquitectos falam de uma situação “lamentável”, que pode afastar muitos do mercado de trabalho [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] novo regime de acreditação de arquitectos, engenheiros e urbanistas, implementado em 2015, passou a obrigar estes profissionais a frequentarem cursos de formação por forma a conseguirem renovar as suas licenças. Cabe à própria Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), ou a associações do sector, como a Associação dos Arquitectos de Macau (AAM), a realização de acções de formação, mas estas têm sido escassas e insuficientes para atingir o número de créditos exigido. A situação é preocupante ao nível das acções de formação em português ou inglês. As novas regras constantes no “regime de qualificações nos domínios da construção urbana e do urbanismo” está a deixar os não falantes de chinês de mãos atadas, por não conseguirem cumprir algo que é obrigatório e que os pode afastar da assinatura de projectos. Maria José de Freitas, arquitecta, considera a situação “lamentável”. “Infelizmente é o que está a acontecer. Para quem já está inscrito na DSSOPT só em 2018 é que vai ter a necessidade de apresentar essa formação contínua. Pode ser que até lá existam outros cursos que providenciem o número de pontos necessários”, disse ao HM. A arquitecta considera que a própria AAM “tem de estar ciente de que as pessoas, para terem a carteira profissional e exercerem, têm de renovar a licença na DSSOPT, e para isso têm de ter um certo número de pontos. Tem de haver uma entidade que proporcione estes cursos.” A situação tanto afecta os profissionais com anos de carreira em Macau como os que acabaram de chegar ao território, já que todos têm de renovar a sua licença profissional de dois em dois anos. É necessário chegar às 50 horas de formação, metade na área de trabalho, outra metade em áreas relacionadas com a profissão. DSSOPT em chinês Rui Leão, arquitecto e presidente da Docomomo Macau, defende que “estão a criar-se condições bastante desagradáveis para uma coisa que sabemos ser uma situação de Macau, ou seja, a existência de profissionais que usam línguas diferentes e o facto de termos duas línguas oficiais. Está a criar-se um desequilíbrio numa coisa que é obrigatória”. Para o responsável, o ónus da culpa não recai apenas na AAM. “É um problema com que todos os profissionais de língua não chinesa se debatem, porque não há acções de formação suficientes para completar os créditos exigidos. É muito complicado para as associações conseguirem assegurar tradução simultânea.” Do lado da DSSOPT, a maioria das acções tem sido realizada em cantonês. “Não tenho sequer conhecimento de que haja cursos em português”, explicou Rui Leão. “Penso que são em chinês e é uma coisa que estranho, porque se os cursos são obrigatórios, deveriam ser assegurados para todos os profissionais. Acho que há vários ateliers de arquitectura e engenheiros que têm de fazer a formação em português ou inglês e que têm uma dificuldade especial em conseguir cumprir [os requisitos]”, adiantou o arquitecto. A Docomomo Macau, enquanto entidade internacional que debate a arquitectura e a preservação de edifícios, com presença em vários países e regiões, fez o ano passado formações viradas para a renovação da licença profissional. Rui Leão assegura que é quase impossível ter acesso a tradução. “Tentei de várias maneiras ter apoio e não consegui. Não há essa preparação.” AAM quer fazer mais Até ao fecho desta reportagem não foi possível chegar à fala com o presidente da AAM, mas Nuno Soares, arquitecto e membro da direcção da associação, assegura que a AAM tem de realizar, por ano, oito acções de formação, e que o objectivo é fazer mais do que isso. “Nem todos os cursos são em português ou inglês, e a regra é que a maior parte deles sejam em inglês, para permitir que todos os membros possam assistir. Há algumas formações em chinês, mas serão a excepção. Sempre que pudermos, faremos em português”, frisou Nuno Soares. As queixas já chegaram à associação mais representativa do sector. “Todos nós queremos fazer mais formações, a AAM já tinha essa preocupação. Vários membros têm manifestado o facto de não terem muitas horas de formação, e por isso estamos a tentar fazer mais do que aquelas com as quais nos comprometemos. Estamos a tentar aproximarmo-nos de um curso por mês. O programa está activo e estamos a tentar intensificá-lo”, apontou. Segundo a página oficial da AAM, o ano passado foram realizadas sete acções de formação. Muitas delas foram realizadas em inglês ou com recurso a legendas. “Tem sido difícil” Dominic Choi preside à associação Arquitectos sem Fronteiras, é falante nativo de chinês e reconhece a falta de formações para todos. “Sei que há falta de cursos em inglês ou português. É algo novo em Macau e obter 50 horas em dois anos tem sido difícil para muitos profissionais. As pessoas estão a tentar obter créditos. Há quem só consiga obter 20 horas, mesmo falantes de chinês.” Para o dirigente da Arquitectos sem Fronteiras, “há um elevado risco” de muitos profissionais não verem a sua licença profissional renovada. “É um problema crucial. Neste momento alguns colegas, sejam arquitectos ou engenheiros, sentem que o tempo está a esgotar-se e que os cursos não são suficientes para preencher todos os requisitos. Não houve uma grande consideração pela realidade e pode haver muita gente desqualificada.” Dominic Choi fala ainda das consequências do lado de quem investe. “Se estou a construir um edifício agora, com contrato assinado [e depois não tenho a licença renovada], do ponto de vista dos investidores será difícil encontrar um arquitecto.” Para além disso, “não houve planeamento, porque quando estabeleceram esta regra deveriam ter pensado nas condições do mercado para realizar as acções de formação”, remata Dominic Choi. Que soluções? Rui Leão considera fundamental a criação de um website com todas as informações dos cursos a realizar. “A informação está dispersa. Seria uma plataforma à qual todos tivessem acesso. As associações esforçam-se por realizar este tipo de iniciativas mas metade dos associados acaba por não saber o que acontece.” Para Maria José de Freitas, é ainda necessário clarificar de que forma é que outras acções de formação contam para a obtenção de créditos. “Pessoas que fazem outros cursos, em universidades por exemplo, não sei como vêem o reconhecimento das suas formações. É algo que ainda não está devidamente explicado. Se não há cursos suficientes em língua inglesa ou portuguesa, então que alternativas há? Tudo isso tem de ser ponderado.” A arquitecta que não acredita que esta situação vise prejudicar os não falantes de chinês. “Não me parece que haja qualquer intuito de prejudicar os arquitectos de língua portuguesa. Será antes uma questão que ainda não foi devidamente ponderada sobre as suas implicações.” Aprovações demoradas Não só o número de cursos não é suficiente, como o Conselho de Arquitectura, Engenharia e Urbanismo leva tempo a aprovar as acções de formação a pedido das associações. A entidade “demora algum tempo a aprovar as acções de formação, e tem sido prática a realização de acções cujos créditos ainda não estão aprovados. Só quando se recebe a aprovação dos créditos é que os certificados são emitidos aos participantes”, disse Rui Leão. Dominic Choi alerta ainda para o facto de os “critérios quanto à aceitação dos cursos não serem claros”. “Tínhamos sempre de submeter os pedidos e não havia uma explicação clara se iriam ou não aprovar essas acções. Iríamos demorar muito tempo a preparar um ou outro curso e depois poderia não ser aprovado, e conheço casos de cursos que não obtiveram aprovação antes.” É por esse motivo que a Arquitectos sem Fronteiras só foca as suas atenções em projectos humanitários, neste momento.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaErro médico | Decisões da mediação sem hipótese de recurso As decisões adoptadas pelo Centro de Mediação dos Litígios Médicos não terão direito a recurso, pois o pedido do processo tem carácter voluntário. Os limites mínimos do seguro para hospitais, clínicas e médicos variam entre 500 mil a 20 milhões de patacas [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Conselho Executivo apresentou ontem os diplomas relativos à constituição do Centro de Mediação de Litígios Médicos e da Comissão de Perícia do Erro Médico. Foi ainda apresentado o regulamento administrativo que institui a obrigatoriedade dos prestadores de cuidados de saúde de serem portadores de um seguro. Os articulados estão relacionados com o Regime do Erro Médico, implementado o ano passado. Conforme explicou Leong Heng Teng, porta-voz do Conselho Executivo, não haverá direito a recurso das decisões do centro de mediação. “Não há lugar a recurso porque tem carácter voluntário. A mediação pode ter resultados positivos para ambas as partes ou não.” Em relação aos relatórios da comissão de perícia, “os utentes têm o direito de questionar a comissão”, caso não concordem com os resultados. Efectuada a perícia, o documento será fornecido a utentes, Serviços de Saúde (SS) e prestadores de cuidados de saúde, ou seja, médicos, clínicas ou hospitais. O relatório terá de estar pronto no prazo de 90 dias, podendo ser alargado o seu prazo, conforme a gravidade do caso. Ainda assim, Leong Heng Teng deixou claro que a decisão “não se deve prolongar por um tempo indefinido”. A realização da perícia técnica irá obrigar ao pagamento de taxas por parte dos “prestadores de cuidados de saúde, utentes e, em determinadas situações, os familiares dos utentes”. O valor será fixado por despacho do Chefe do Executivo. A comissão de perícia será constituída por sete membros, cinco deles ligados ao sector da saúde e dois da área do direito, sendo que devem ter “um mínimo de dez anos de experiência”. O seu mandato será de dois anos, sendo que o regulamento administrativo não explicita quantas vezes é que os mesmos membros podem ver a sua nomeação renovada. Tanto o centro de mediação, como a comissão de perícia entram em funcionamento no próximo dia 26. Caberá ao Chefe do Executivo decidir, por despacho, quem são os nomes escolhidos para o centro de mediação. Seguro a quanto obrigas A obrigatoriedade de adopção de um seguro por parte de médicos, clínicas e hospitais preocupou o sector desde o início da discussão sobre o Regime do Erro Médico. O Governo fixou os limites mínimos do seguro entre 500 mil e 20 milhões de patacas, ficando prometido o apoio da Autoridade Monetária e Cambial de Macau (AMCM) caso o médico ou entidade veja recusado, por três vezes, o pedido por parte da seguradora. “A AMCM criou um mecanismo para apoiar o prestador de cuidados de saúde na comunicação com a seguradora, para que acabem por conseguir o seguro. Vamos tentar saber quais as razões para a recusa por parte de três seguradoras. Pode dever-se à natureza da área médica, por ser muito complexa. É com esse mecanismo que vamos obrigar as seguradoras a aceitar a venda do seguro”, explicou uma representante do organismo. A título de exemplo, a medicina tradicional chinesa ou farmácia são áreas que ficam abaixo das 500 mil patacas de seguro, sendo que a medicina ocidental obriga a patamares mais elevados, com seguros entre um e dois milhões de patacas. Clínicas privadas e hospitais, como o Kiang Wu, por exemplo, terão de adquirir seguros na ordem dos 20 milhões de patacas. O seguro irá abranger situações como “indemnizações por danos para a saúde física ou psíquica dos utentes, causados por acto médico, com violação dos diplomas legais”, as indemnizações “por danos decorrentes do auxílio médico urgente prestado”, ou ainda o pagamento das custas judiciais e honorários dos advogados. São excluídos os actos de erro médico praticados com dolo, pois entram no âmbito da prática criminal.
Andreia Sofia Silva Perfil PessoasLídia Adelina Lourenço, artista de doçaria | Prémios de açúcar [dropcap style≠’circle’]L[/dropcap]ídia Adelina Lourenço nunca tinha feito um bolo daqueles que parecem verdadeiras obras de arte e que nem apetece comer, para não estragar. Contudo, foi lendo, experimentando, até se transformar na primeira artista de pastelaria em Macau a fazer bolos a três dimensões. Foi a descoberta de um talento que estava escondido. Tudo começou em 2009, quando um problema pessoal a levou a experimentar um novo mundo. “Sentia-me triste, não tinha confiança”, contou Lídia Adelina Lourenço, que à época trabalhava na Teledifusão de Macau. “Senti que, quando saía do trabalho, tinha de fazer outras coisas. Então comecei a fazer bolos com base em vídeos no YouTube e aí sentia-me contente. Era difícil sentir-me contente naquela altura. Comecei a levar bolos todos os dias para o trabalho, até que a minha chefe me sugeriu que abrisse uma página no Facebook para tentar vendê-los. Achei que não conseguia fazê-lo, porque nunca tinha estudado nesta área. Mas a verdade é que comecei a vender desde a primeira publicação que fiz, já há sete anos”, contou ao HM. Começou por vender bolos comuns, até que surgiram as primeiras encomendas para bolos diferentes de todos os outros. A artista aprendeu tudo aquilo que sabe sozinha. “Mandei vir livros do Reino Unido e comecei a ler sozinha como podia fazer bolos a três dimensões. Naquela altura mais ninguém fazia isso em Macau. Comecei a ter mais confiança em mim”, recorda. Anos depois, Lídia Adelina Lourenço obteve o terceiro lugar a nível mundial na modalidade de arte em pastelaria, e conta com seis prémios, incluindo quatro medalhas de ouro em competições. Este ano, vai participar numa competição em Nova Iorque, em Maio, e noutra na cidade italiana de Milão, em Outubro. Para esta artista, alinhar em concursos representa muito mais do que trazer troféus para casa. “Gosto de participar em competições porque assim posso adquirir mais experiências e conhecer mais pessoas, não é apenas para ganhar. É algo positivo. O facto de perdermos neste tipo de campeonatos não quer dizer que seja um mau trabalho, pois todos os trabalhos são bons”, explicou. A arte de Lídia Adelina Lourenço já chegou à televisão, tendo protagonizado um programa de culinária de alguns episódios na TDM. O programa deverá regressar este ano ao pequeno ecrã, contou a artista. Ensinar os outros Lídia Adelina Lourenço também faz parte do Conselho das Comunidades Portuguesas, na qualidade de suplente, mas são os bolos que são o seu ganha-pão, apesar das horas de trabalho que representam. “Muitas vezes penso que deveria mudar de profissão e poderia ganhar mais, mas gosto de fazer isto”. A artista recorda o momento, numa competição em Birmingham, no Reino Unido, em que despendeu 15 horas por dia a fazer duas esculturas, no período de duas semanas. O esforço, porém, compensou: ficou em terceiro lugar ao nível mundial, numa competição que recebe artistas de todo o mundo. Lídia Adelina Lourenço abriu, em Maio de 2015, a sua loja, intitulada “Linalenço Dessert”, onde também promove workshops com outros artistas de renome mundial. Nestas sessões os interessados podem, por exemplo, aprender a fazer bolos iguais às famosas malas Birkin, da Hermés. “Antes paguei as minhas deslocações para aprender esta arte em países como a Inglaterra e os Estados Unidos, então tive a ideia de começar a convidar estes artistas para que, assim, as pessoas possam aprender alguma coisa sem saírem de Macau. Todos os dias tenho encomendas e dou aulas.” Apesar de reconhecer que ganha pouco tendo em conta as horas que gasta com cada obra de arte, Lídia Adelina Lourenço não se vê a mudar de profissão. “Adoro fazer isto porque cada bolo, para mim, é especial. Gosto de fazer bolos em forma de escultura, embora demore muito tempo.” “Já fiz mais de mil desenhos para bolos, gosto que cada pessoa tenha o seu próprio desenho, um bolo diferente. Não sei muito bem o que me inspira. Só sei que todos os dias faço algo diferente, depende do que o cliente gosta ou deseja”, disse ainda. Atenta às últimas tendências em termos de alimentação, Lídia Adelina Lourenço admite criar receitas para quem é alérgico a ovos ou farinha. O açúcar, corantes e cremes especiais é que não podem faltar.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaBiblioteca Central | Orçamento final será conhecido em 2019 O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura confirmou na Assembleia Legislativa que o orçamento de 900 milhões de patacas poderá não chegar para erguer a Biblioteca Central no edifício do antigo tribunal, mas os valores exactos só serão conhecidos em 2019. A localização é para manter, apesar de algumas críticas dos deputados [dropcap style≠’circle’]“S[/dropcap]e o edifício do antigo tribunal fosse utilizado para albergar serviços públicos, seria um desperdício.” As palavras são do secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam, e servem para confirmar que a futura Biblioteca Central vai ser mesmo construída no centro da península, apesar de alguns deputados terem ontem defendido a sua edificação na zona dos novos aterros. Quanto ao orçamento, Alexis Tam deixou claro que 900 milhões de patacas, o valor já anunciado, não deverão ser suficientes para erguer o projecto. Contudo, o orçamento exacto só será conhecido daqui a dois anos, quando for aberto o concurso público para as obras. O processo para o projecto de arquitectura só terá início em 2018, sendo que a inauguração da biblioteca ficou prometida para 2022. “Penso que não vai ser suficiente o orçamento de 900 milhões de patacas, não é um número preciso”, apontou o secretário. “A Biblioteca Central de Hong Kong custou 700 milhões de dólares de Hong Kong, mas trata-se de um número de há dez anos. No futuro, vai haver um concurso público e só aí é que vão existir números precisos.” Afirmando tratar-se de uma “estimativa por baixo”, o secretário acabou por afirmar que o orçamento poderá ser inferior ou superior às 900 milhões de patacas. “Quando há muito dinheiro fazem-se as pessoas passar por tolos”, disse o deputado Ng Kuok Cheong. “Se não fosse uma cidade com tanto dinheiro, jamais um governante diria isso. Tal só acontece porque há eleições num circuito restrito”, criticou o deputado. “Se conseguir atrair os nossos jovens, criar hábitos de leitura e fazer algo pela população, 900 milhões de patacas não é nada”, defendeu, por sua vez, Mak Soi Kun. No debate, proposto pela deputada Song Pek Kei, Alexis Tam levou maquetas do projecto e distribuiu dados de outras bibliotecas centrais construídas em várias cidades do mundo. O secretário prometeu manter as fachadas dos dois edifícios onde ficará albergada a biblioteca. “Não vamos desmantelar nada. Trata-se de um edifício histórico, solene, e é o local ideal para a revitalização. Há muitos exemplos de transformação de edifícios históricos para actividades culturais ou actividades comerciais”, frisou Alexis Tam. Vários deputados questionaram a localização da futura Biblioteca Central por se tratar de uma zona com muito fluxo de pessoas e tráfego, mas o secretário confirmou que há “1600 lugares de estacionamento nos auto-silos perto, incluindo 30 itinerários de autocarros, o que facilita o acesso das pessoas”. Mais bibliotecas de bairro Alexis Tam repetiu ao longo da tarde que a Biblioteca Central irá servir não apenas estudantes e idosos, mas também académicos, além de constituir uma plataforma para publicações históricas. A construção de mais bibliotecas comunitárias está nos planos do Executivo. “Já ponderámos outros locais, perto do Centro de Ciência e nos novos aterros. Se, no futuro, houver espaço podemos construir aí mais bibliotecas comunitárias. Também na zona de Seac Pai Van pensámos criar uma biblioteca comunitária. Estas bibliotecas comunitárias desempenham o papel de uma sala de leitura mas, comparando com a Biblioteca Central, as funções são diferentes”, apontou. “Há universidades que têm bibliotecas ainda maiores do que esta, que não é assim tão grande quanto isso”, acrescentou ainda Alexis Tam. Chui Sai Peng ausente O deputado Tsui Wai Kwan lembrou a polémica ocorrida em 2008, quando o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) foi obrigado a intervir perante o facto de o gabinete do engenheiro civil e deputado José Chui Sai Peng ter feito a consultadoria para o projecto, sendo que a vencedora do concurso acabaria por ser uma arquitecta da sua empresa, de nome Vong Man Ceng. “Houve um problema com o concurso público e isso levou a um desperdício de tempo”, afirmou. Numa sessão plenária em que Chui Sai Peng não esteve presente, o secretário optou por não comentar o caso. “Não queria aqui abordar o que se passou. Só posso dizer que todos os projectos demoram tempo e esta obra será concluída no próximo mandato. Mas, se não iniciarmos agora o trabalho, o próximo Governo demorará mais tempo a realizá-lo.” Alexis Tam referiu ainda que o projecto “não entrará em conflito com as habitações públicas”, pois também “faz parte da vida quotidiana da população”. “Não é lógico que sejam construídas habitações públicas neste edifício. Se construirmos a futura biblioteca nos novos aterros, a obra poderá levar dez a 20 anos, e penso que este local é o mais adequado”, reiterou Alexis Tam. Angela Leong defende preservação do Hotel Lisboa A deputada Angela Leong defendeu no debate de ontem a necessidade de preservar o Hotel Lisboa. “Temos edifícios que podem transformar-se e ter outra finalidade, mantendo o seu valor histórico, como é o caso do Hotel Lisboa. Houve casos em que a Fundação Macau adquiriu esse tipo de edifícios, que devem ser preservados, pois só assim será conhecida a nossa história. Está a olhar para mim, mas sim, vou preservar a Pousada de São Tiago. Não vou entregar ao Governo para fazer pressão.” Esta terça-feira a deputada confirmou que a pousada vai fechar temporariamente devido às obras do metro ligeiro, mas afastou a possibilidade de alterações profundas ao edifício.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaCasinos | Governo admite continuação das salas de fumo e reforça medidas A ideia de acabar totalmente com o consumo de tabaco em espaços fechados não é para já. Em resposta aos estudos feitos pelo sector do jogo, os Serviços de Saúde moderam o discurso da tolerância zero. Continua a ser uma meta a longo prazo e há mais exigências às operadoras. Alexis Tam diz que não há cedência a pressões [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s Serviços de Saúde (SS) anunciaram ontem medidas que vão de encontro às sugestões dos casinos para as salas de fumo, aumentando, porém, os padrões de exigência. “Os critérios agora estabelecidos têm validade no mundo inteiro, são de nível elevado. Espero que as salas de fumo salvaguardem a saúde dos funcionários dos casinos.” As palavras são de Cheang Seng Ip, subdirector dos SS, que demonstra concordância com as conclusões dos estudos apresentados pelo sector do jogo. Para os serviços liderados por Lei Chin Ion, as propostas das operadoras têm de ser consideradas com seriedade, não significando, no entanto, que todas as sugestões foram aceites. O subdirector dos Serviços de Saúde refere que são uma referência, mas que “os serviços propõem um critério mais elevado na salvaguarda da saúde dos trabalhadores dos casinos”. O fim do tabaco em espaços fechados continua a ser o grande objectivo dos Serviços de Saúde. “A instalação de salas de fumo é um passo avançado na progressão para a proibição total mas, da nossa parte, gostaríamos que fosse mais rápido, ainda há muitas considerações a serem tomadas”, revela Tang Chi Ho, chefe do Gabinete para a Prevenção e Controlo do Tabagismo. Exigências aumentam À margem do debate sobre a Biblioteca Central, Alexis Tam reiterou a ideia de que as salas de fumo serão o caminho a seguir. Apesar de afirmar que ainda não tinha recebido o documento dos SS, o governante tomou conhecimento do mesmo achando que “a proposta é viável”. O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura comentou ainda que, “se as salas de fumo forem bem instaladas e não afectarem os outros, então não há problema”. Agora a bola está do lado das operadoras, que terão de se pronunciar acerca das exigências técnicas do Governo. Alexis Tam afasta a ideia de cedência aos casinos, uma vez que, aquando da “aprovação da lei na generalidade na AL, foram auscultadas opiniões da população e dos trabalhadores”. O Executivo “tem de balançar os interesses de todos, isso é a democracia, mas é difícil obter consenso de cem por cento das partes”, acrescentou. De acordo com as sugestões dos Serviços de Saúde, os casinos têm de cumprir as normas do Regulamento de Segurança contra Incêndios e Regulamento Geral de Construção Urbana. Além disso, as salas de fumos precisam de estar separadas fisicamente das restantes instalações dos casinos. As exigências dos serviços impõem também que os revestimentos dos tectos, paredes e pavimentos devem impedir o vazamento de fumos. Além disso, as portas das salas de fumo devem ser deslizantes e com fecho automático. Nestas zonas não se poderá jogar, nem podem ser afixados anúncios que incentivem o consumo do tabaco. Aguarda-se resposta das operadoras.
Andreia Sofia Silva PolíticaAssembleia | Vong Hin Fai não comenta continuidade [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] deputado Vong Hin Fai não quis revelar se pretende manter ou deixar o cargo na Assembleia Legislativa (AL), preferindo continuar a cumprir as actuais responsabilidades enquanto deputado nomeado pelo Chefe do Executivo. À margem do almoço de Primavera da AL, Vong Hin Fai, que recentemente ajudou a fundar a Associação dos Agentes Jurídicos de Macau, confirmou que a entidade não visa entrar em conflito com a já existente Associação dos Advogados de Macau (AAM). “A AAM é uma associação colectiva de direito público que, legalmente, tem as suas funções, para testar a qualidade dos advogados e a inscrição dos advogados. A nossa associação é uma entidade privada e temos objectivos diferentes, não há conflito. A nossa associação tem todo o gosto de fazer colaborações com outras instituições, não apenas instituições do ensino superior na área do direito, como associações da área jurídica, tal como a AAM.” Para este ano é objectivo da nova associação a organização de palestras na área do direito. “Vamos fazer a nossa colaboração com associações locais e entidades fora de Macau, do interior da China, Hong Kong ou Taiwan. A nossa associação vai fazer visitas este ano nesse sentido. Como queremos chegar à unificação dos associados, vamos organizar este ano algumas conferências sobre direito de Macau.”
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaAL | Ho Iat Seng disponível para continuar no hemiciclo O presidente da Assembleia Legislativa garante ter disponibilidade para continuar a ser deputado. Ho Iat Seng fala ainda na ocorrência de “alguns conflitos mais radicalizados” na sociedade [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]o Iat Seng é presidente da Assembleia Legislativa (AL) desde 2013 e tudo indica que continuará a fazer parte do hemiciclo, seja como presidente ou apenas na condição de deputado. Em ano de eleições legislativas, assume estar disponível para continuar, caso seja nomeado pelos seus pares e eleito pela via indirecta. “Só posso dizer que estou disponível para continuar. Se for nomeado pelo sector industrial tenho interesse em continuar [mais um mandato]”, disse ontem aos jornalistas, à margem do almoço de Ano Novo Chinês do órgão legislativo. No seu discurso, Ho Iat Seng falou dos últimos protestos ocorridos no território, de uma “modificação do clima social em Macau e do surgimento de novos diferendos”. Para o presidente da AL, factores como “os problemas oriundos do legado da história”, “a escolaridade da população” e o “rápido crescimento económico” nos últimos anos levaram ao surgimento de “alguns conflitos mais radicalizados”. Ho Iat Seng acredita, por isso, que esses indicadores “tornaram mais complexas as formas de expressão de que se revestem as situações, as opiniões e as preocupações da população”. “Face à diversidade das exigências sociais, à complexidade dos interesses envolvidos e à disputa contínua entre diferentes posturas da opinião pública, têm vindo a aumentar as querelas na sociedade, o que complica ainda mais o trabalho legislativo.” É uma situação que, para o presidente do hemiciclo, “torna mais pesada a pressão sobre a AL”. Para Ho Iat Seng, “existe ainda espaço para a melhoria do trabalho” do órgão legislativo. “A AL tem estado sempre atenta à diversidade das exigências da sociedade nas suas considerações, procurando estabelecer o equilíbrio dos vários interesses, no quadro da legalidade.” Nesse sentido, “cabe-nos [à AL] a responsabilidade indeclinável de preservar a estabilidade e a prosperidade deste território, e de modelar activamente um ambiente de maior justiça e equidade”. Tempo contado Com um total de 14 propostas de lei a serem ainda alvo de apreciação na especialidade, as três comissões permanentes da AL não têm qualquer possibilidade de recepção de mais diplomas da parte do Executivo. Até ao dia 15 de Agosto, todos os diplomas terão de ser votados, a tempo da realização das eleições, que ainda não têm data marcada. “Temos de ver que não podem chegar mais iniciativas legislativas da parte do Governo para que tenhamos tempo para concluir todas as propostas que nós temos [em mãos]. Temos de assegurar o trabalho das duas partes”, apontou. Apesar da corrida contra o tempo, Ho Iat Seng assegura que o diálogo com o Executivo tem sido garantido. “Se as propostas não forem aprovadas a tempo, têm de esperar pela próxima legislatura e esse não é o nosso desejo. Sabemos que há muitas outras propostas que estão a aguardar para serem apresentadas à AL. Neste momento, já apresentamos as nossas sugestões ao Governo e estamos a aguardar pela resposta.” Ainda assim, o presidente do hemiciclo garante que há espaço para a continuação do trabalho de fiscalização por parte dos deputados, com a marcação de plenários para a resposta a interpelações orais por parte do Governo. “Recebemos muitas interpelações orais para a próxima sessão e isso não vai ser afectado pelo trabalho de apreciação das leis. Há tempo para trabalhar enquanto se espera pelas propostas do Governo”, conclui. Lei do fumo pronta até Agosto Um dia depois das seis operadoras de jogo terem publicado mais um relatório sobre o consumo de tabaco nos casinos, Ho Iat Seng afirmou que a proposta de lei que revê o diploma de 2012, e que visa a total eliminação do fumo, terá de estar concluída até 15 de Agosto. “O nosso objectivo é fazer com que essa intenção legislativa possa chegar ao plenário ainda antes do fim da sessão legislativa. Temos de ter um prazo limite e espero que, até finais de Maio, todo o processo fique concluído, se não vai ser retirado.”
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadePousada de São Tiago fechada até obras do metro terminarem Angela Leong, directora executiva da Sociedade de Jogos de Macau, que gere a Pousada de São Tiago, confirmou o encerramento do estabelecimento hoteleiro. As portas estão fechadas até ao fim das obras do metro ligeiro no local [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Pousada de São Tiago em Macau, inaugurada em 1982 e instalada numa fortaleza do século XVII, vai encerrar temporariamente devido às obras do metro que decorrem na zona, afirmou ontem a directora executiva da Sociedade de Jogos de Macau (SJM), à margem do almoço de Primavera da Assembleia Legislativa. Segundo Angela Leong, também deputada, o intenso barulho das obras na zona da Barra – local onde está a ser erguido um centro modal para o futuro metro ligeiro – está a afastar os hóspedes e vai obrigar a fechar as portas já no próximo mês de Março. “Quando começaram as obras, não havia nem um hóspede e, mesmo quando há, é só ao sábado, a partir de segunda-feira não há hóspedes. Os turistas vêm para Macau, para um lugar tão bom como São Tiago, [mas] após uma noite temos de os ajudar a sair porque as obras começam às 7h. Há turistas que fazem festas de casamento mas, depois, temos de os transferir para outros locais”, explicou Angela Leong. “Actualmente não é possível continuar com o hotel porque não há hóspedes. Por isso vamos suspender até que as obras das ruas acabem”, afirmou. A directora executiva da SJM garantiu que os 20 a 30 trabalhadores não serão despedidos, mas sim transferidos para outros hotéis da operadora na cidade, mantendo os salários e regalias. “Os trabalhadores serão colocados noutros hotéis. Não vão existir despedimentos, mas os trabalhadores têm de aceitar ir trabalhar para outro local. Se não concordarem com a transferência, então teremos de cessar o contrato com os trabalhadores”, explicou. Projecto parado Angela Leong garantiu que não é objectivo da SJM fechar a pousada para sempre. “Vamos manter o hotel de São Tiago porque é um monumento, as pessoas gostam de coisas antigas. Lá dentro é muito bonito e não vamos fazer renovações”, rematou. Em 2014, Angela Leong falou da possibilidade de alargar o actual espaço destinado à pousada, mas não houve qualquer avanço. “Era para ter um projecto, estávamos a trabalhar para isso. Mas, de momento, não tenho mais informações”, disse ontem a deputada. A Fortaleza da Barra, construída pelos portugueses para defender Macau, foi erguida em 1629 e, após cair em ruínas, foi recuperada de modo a acolher a pousada, onde está integrada uma capela do século XVIII. O metro ligeiro de Macau já está em construção, mas não há ainda um calendário para o fim das obras na península, enquanto na Taipa se espera que esteja terminado em 2019.
Andreia Sofia Silva SociedadeHabitação Pública | Página no Facebook revela falhas em Seac Pai Van A Associação de Mútuo Auxílio dos Moradores de Seac Pai Van, em Coloane, decidiu revelar no Facebook todas as falhas de construção existentes no empreendimento de habitação pública. São lá que estão expostas todas as queixas de quem lá vive, com críticas à fiscalização da obra Com Vítor Ng [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]anos com ferrugem, azulejos partidos, postes caídos. As imagens partilhadas na recente página da rede social Facebook, da responsabilidade da Associação de Mútuo Auxílio dos Moradores de Seac Pai Van, expõe as falhas de um complexo de habitação pública que tem gerado queixas desde que começou a receber moradores, há cerca de quatro anos. Wong Lai I, responsável pela associação, ligada à União Geral das Associações de Moradores de Macau (UGAMM, ou Kaifong), falou ao HM sobre os problemas que persistem no local. “Hoje em dia, o Facebook é muito utilizado e pode ajudar-nos a divulgar as situações que enfrentamos aqui. Além disso, também serve para promover as nossas actividades. Desta forma, cada vez mais pessoas, quer sejam moradores neste bairro ou noutros, podem participar nas actividades”, defendeu. Segundo Wong Lai I, muitos dos problemas só são resolvidos após a apresentação de queixas. “Uma vez recebemos queixas sobre a queda de tijolos nos edifícios. Um mês depois o Governo mandou cá profissionais para fazerem testes. O Executivo só trata deste tipo de problemas se nos queixarmos”, lamenta. Outro ponto em falta na zona é o número de instalações desportivas. “Já tentámos expressar as nossas ideias junto do Governo mas, até agora, não se fez qualquer avanço.” Pouca fiscalização Além da queda dos tijolos das paredes, a responsável pela associação afirmou que há sempre azulejos e outro tipo de revestimentos partidos nos passeios. Wong Lai I pede que seja feita uma recuperação total, com bons materiais, para que se possa resolver os problemas de uma só vez. Para Wong Lai I, todos os inconvenientes da zona se devem à falta de fiscalização no período de construção do empreendimento. Apesar da existência de problemas, Wong Lai I admite que as condições na zona melhoraram. “Quando vim morar para aqui não havia luz, todas as ruas eram escuras. Havia apenas duas famílias a morar no mesmo prédio. Não tínhamos nada nesta zona e demorávamos sempre uma hora para sair do trabalho e chegar a casa.” Cedo a necessidade de fundar uma associação para defender os interesses dos moradores se tornou imperativa. “Em 2014 começámos a organizar uma associação com os moradores dos outros edifícios. Esperávamos que as nossas condições melhorassem e a associação seria um bom meio para expressar as nossas opiniões”, disse Wong Lai I. “Somos muito activos, e quase todos os dias recebemos opiniões dos moradores. Isso ajuda-nos a emitir as nossas queixas junto do Governo”, rematou.
Andreia Sofia Silva EventosDesporto | Projecto Mana Vida associa exercício a solidariedade social Cíntia e Guilherme Leite Martins há muito que faziam desporto para se manterem em forma, mas decidiram começar um projecto diferente. Parte dos ganhos obtidos com as aulas de fitness será destinada a instituições de solidariedade, sendo que os participantes também podem fazer os seus contributos a troco de aulas. O lançamento oficial é este domingo [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] mais recente projecto de Cíntia e Guilherme Leite Martins visa a prática do exercício físico a pensar nas necessidades das organizações sem fins lucrativos. Com o Mana Vida, há corridas e caminhadas em grupo, ou aulas de fitness, em que parte dos fundos obtidos em cada sessão será destinada a instituições de solidariedade social. Os participantes também podem contribuir com alguma valência, a troco de aulas. As sessões têm decorrido nos trilhos de Coloane, no empreendimento One Oasis ou ainda no Parque Central da Taipa. “O lema condutor do Mana Vida é o de encorajar as pessoas a terem uma vida mais saudável e a promoverem um sentimento de solidariedade. As pessoas, ao participarem nas nossas actividades e ao contribuírem para a causa do projecto, estão igualmente a construir uma comunidade mais forte e benevolente”, explicaram os responsáveis do projecto ao HM. A primeira acção do Mana Vida será a oferta de ténis a crianças residentes da Associação do Berço da Boa Esperança, uma associação sem fins lucrativos que tem à sua responsabilidade dois lares residenciais para menores. “Traçámos como primeiro objectivo a compra de ténis de desporto para jovens e crianças constituintes de uma organização local, com os recursos obtidos através das actividades fornecidas pelo movimento. Deste modo, o Mana Vida funciona como se fosse uma plataforma que procura fazer a ligação entre aquele que pretende fazer exercício físico e simultaneamente ajudar outras pessoas.” O lançamento oficial do Mana Vida acontece este domingo, na Pousada de Coloane. O evento começa às 9h e prossegue até às 14h, com a realização de diversas actividades desportivas. Segue-se um pequeno-almoço, sem esquecer algumas “conversas descontraídas” sobre a temática da vida saudável. Treinar em grupo Cíntia e Guilherme Leite Martins pretendem atrair pessoas para treinar em conjunto. “Sabemos que não é fácil uma pessoa levantar-se e ir correr ou andar sozinha, portanto, criámos grupos e pontos de encontro para que a pessoa se sinta motivada e encontre alguém para fazer o mesmo. A parte engraçada disto é que nós procuramos sempre maneiras de incentivar um participante a formar um grupo que seja conveniente para ele e para os amigos. Existindo essa adesão, adicionamos a actividade no nosso calendário.” Uma das opções de treino disponíveis é “You&Me”, cujas aulas têm como princípio “desenvolver a proficiência, social e emocional, a confiança e auto-estima, entre pais e filhos”. Há ainda as opções de Body Sweat e Kickn TRX, que são “treinos funcionais realizados ao ar livre”. “São treinos que se baseiam em movimentos naturais do ser humano, como pular, correr, puxar, agachar, girar e empurrar. O praticante ganha força, equilíbrio, flexibilidade, condicionamento, resistência e agilidade”, explicam Guilherme e Cíntia. Já a modalidade “Stroller Mania” é uma forma de exercício que pode ser feita com adultos e os carrinhos de bebé. “É algo que já se faz pelo mundo e tem o objectivo de recuperar a actividade física das mães, sem terem que comprometer o seu tempo com os filhos. As mães são ainda apresentadas a uma comunidade com um estilo de vida semelhante.” Existe ainda a opção pelas modalidades gratuitas como corridas ou a chamada “power walk” [caminhada], em zonas como a marginal da Taipa e os diversos trilhos existentes. “Estas últimas actividades têm como objectivo incentivar o indivíduo a sair do sofá [ou da cama], conhecer lugares desconhecidos no território, aproveitar a natureza local e reforçar o espírito de comunidade.” À procura de apoios Com um plano semanal de aulas a decorrer, e com alguns participantes fixos, Cíntia e Guilherme Leite Martins confessam, no entanto, que tem sido difícil encontrar colaboradores. “O Mana Vida funciona maioritariamente à base da doação de tempo das pessoas e de pessoas que nos têm ajudado ao nível logístico. O processo de cativar colaborações tem-se revelado ligeiramente lento, pois leva tempo para alguém conseguir compreender como este mecanismo de solidariedade funciona.” Foi daí que surgiu a ideia de implementar a “troca de serviços”. “Alguém que queira colaborar connosco poderá trocar os seus serviços por uma das nossas aulas. Isto capacita a pessoa a dar-se conta de que o seu talento tem importância e que também está a contribuir para a vida dos outros.” Neste momento, o Mana Vida precisa de “treinadores qualificados, tradutores, agentes de social media, fotógrafos, produtores de som e imagem, patrocinadores e pessoas positivas interessadas em ajudar com novas ideias”. É certo que o Mana Vida visa estabelecer laços em Macau, mas a ideia é também ir mais além. “A longo prazo, estamos a traçar um plano para lançar este projecto para fora de Macau, pois consideramos que o modelo que estamos a criar é extensível a outros locais do mundo. O querer ajudar não pode ter limites, o importante é manter-se verdadeiro e focado ao propósito deste esforço”, rematam os criadores da iniciativa.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteDireito | Ex-juiz diz que lei de contratações públicas “é permissiva” João Valente Torrão lança esta quinta-feira um livro que põe o dedo na ferida quanto à desactualização do regime de bens e serviços em vigor. A obra, intitulada “Regime jurídico da contratação pública da RAEM”, expõe as falhas de um diploma “desactualizado” e “permissivo”. O antigo juiz e formador de magistrados defende mais do que duas formas de contratação, com implementação do sistema online [dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]á muito que a adjudicação de bens e serviços por parte da Administração é o calcanhar de Aquiles de um Executivo que afirma governar em prol da transparência. Numa altura em que o ex-procurador da RAEM responde em tribunal por ter autorizado demasiadas adjudicações directas de bens e serviços para o Ministério Público, sempre às mesmas empresas, alegadamente de familiares, e sem concurso público, é lançado um livro que espelha os problemas do actual regime. João Valente Torrão, antigo presidente do colectivo de tribunais em Macau nos anos 90, formador de vários magistrados do território, lança esta quinta-feira a obra “Regime jurídico da contratação pública da RAEM”, na Fundação Rui Cunha (FRC). O livro será apresentado por Vasco Fong, ex-comissário contra a corrupção, actual director do Gabinete de Protecção dos Dados Pessoais. Em entrevista ao HM, João Valente Torrão defende a revisão do regime das despesas com obras e aquisição de bens e serviços, em vigor desde 1984. “A lei de Macau é uma lei que, em Portugal, já foi alterada várias vezes. A aquisição de bens e serviços é um diploma de 1985, o de Obras Públicas é de 1999. Mesmo o de 1999 não é um diploma muito vanguardista, digamos assim”, começa por apontar. Quais são, então, as maiores falhas? “Em primeiro lugar, a lei actual não obedece às regras internacionais, como a consagração de princípios como a transparência, imparcialidade, publicidade. Como digo no livro, o tribunal pode superar, e a Administração tem superado, através do Código do Procedimento Administrativo [a falta de uma lei actualizada]. O Código do Procedimento Administrativo é uma lei válida, que para mim tem o mesmo valor da Lei Básica. É possível ultrapassar essas questões.” João Valente Torrão defende ainda a criação de um sistema electrónico para as adjudicações feitas no seio da Função Pública. “Há o aspecto do uso electrónico da contratação. Em Portugal, e para que se tenha noção da importância disto, registaram-se em 2013 175 mil procedimentos electrónicos. Em Macau, entre 2000 e 2013, a contratação pública subiu de dois mil milhões para onze mil milhões de patacas. Em termos monetários, é muito importante.” João Valente Torrão defende ainda a criação de mais formas de contratação. “Há um atraso nos procedimentos, há apenas o concurso público e o ajuste directo. Em Portugal, na União Europeia e em toda a parte já existem vários procedimentos para a contratação pública.” Para além disso, a obra lançada pela FRC defende que a nova lei terá de apontar “as garantias dos interessados” no processo de contratação. “O principio da audiência prévia, antes da adjudicação, não está na actual lei mas está no Código do Procedimento Administrativo. A indemnização seria uma das garantias necessárias. “No caso da contratação pública, tem alguma gravidade, porque apenas se pode recorrer para o tribunal depois de estar adjudicado o serviço ou adquirido o bem. Em Portugal temos um serviço de contencioso que permite ir a tribunal logo enquanto o processo decorre. Tem alguns riscos, mas em Portugal está claramente identificada a possibilidade de indemnização. No livro também defendo que é possível uma indemnização.” China à nossa frente O antigo juiz, já retirado dos tribunais, não encontra uma explicação para a ausência de uma lei, quando a China já tem legislação avançada. “Essa importância é dada através das organizações internacionais, como a Organização Mundial do Comércio. A China já tem uma legislação mais avançada sobre esta matéria face a Macau.” “Se a própria China já tem esta legislação, não vejo porque é que aqui há-de continuar assim. Não garantem os direitos dos adjudicatários, porque não se conhecem melhor certos aspectos, e adoptar a contratação por via electrónica. Tudo isso é bom para garantir a imparcialidade, para diminuir as possibilidades de corrupção”, defendeu. Em Macau, muitas das adjudicações de bens e serviços acabam por ser feitas sem a realização de um concurso público. Não é ilegal, alerta o autor do livro, mas não está certo. “A lei é muito permissiva. A lei diz que se o concurso público não tiver êxito, vai-se para o ajuste directo. O ajuste directo exige a consulta de três entidades, mas isso pode ser dispensado ‘em caso de’. É provável que às vezes haja um abuso do ajuste directo.” A ausência de análise Para João Valente Torrão, o facto de só agora o Governo estar a elaborar um novo regime de aquisição de bens e serviços pode advir do facto de haver pouco debate sobre o assunto. “Este diploma é de 1985, já poderia ter sido actualizado pelo menos em 2000, no início da RAEM. Como não se levantam muitas questões, talvez seja por isso que o Governo não está pressionado a fazer alterações.” No geral, aponta, há falta de estudos na área do Direito. “A questão também não é levantada em tribunal. Sobre esta matéria encontrei apenas meia dúzia de artigos. Aqui não se estuda muita coisa porque as pessoas não têm o espírito de litigância [de levar casos a tribunal]. Como não aparecem muitos casos, os advogados não estudam e os tribunais não decidem.” O facto do Governo ter começado a reagir tarde a diversos relatórios do Comissariado da Auditoria e Comissariado contra a Corrupção não é, para o antigo juiz, uma forma de descredibilização destas entidades. “ O Governo tem as suas prioridades. O facto de responder tardiamente não significa menos respeito por essas entidades. Até vejo os órgãos do Governo dizerem que aceitam as conclusões. Talvez seja uma forma de actuação do Governo.” Caso Ho Chio Meng “denegriu a justiça” Convidado a comentar a detenção do ex-procurador do Ministério Público, João Valente Torrão assume que nem era preciso ir tão longe para denegrir a justiça. “Nem era preciso ser um antigo procurador, bastava ser um juiz ou alguém de categoria inferior. Basta isso para denegrir um pouco a justiça. Sei que ele está acusado de uma série de crimes, 1500, o que me impressiona um pouco, mas não sei quem fez a acusação. Claro que é uma mancha na justiça. Tudo depende do que se provar em tribunal.” Questionado sobre o facto de continuar a ser prática do MP a adjudicação directa de serviços, prática de que está acusado Ho Chio Meng, João Valente Torrão avisa que “não vê qualquer ilegalidade”, mas que, em “nome da transparência, para que não haja suspeitas de corrupção, talvez fosse bom não abusar muito dessa forma”. “Magistrados não escrevem em português” João Valente Torrão alerta para o facto de muitos dos magistrados em funções não utilizarem muita a língua portuguesa nos processos. “Todos esses magistrados [formados na década de 90] falavam e escreviam português. Mas agora o que se diz, e sei por experiência própria, é que nem se dão ao trabalho de escrever em português, e há apenas um mero despacho em chinês.” Sobre a falta de magistrados, João Valente Torrão não dá muitas sugestões. “Não tenho processos neste momento e os advogados estarão em melhores condições para avaliar a situação. Posso dizer que fui formador, juntamente com alguns colegas, e todos nós nessa altura demos o nosso melhor para formar magistrados e a ideia geral é que, todos aqueles que formámos, eram magistrados muito bons. Temos de saber se é possível formar cá magistrados. Sei que há um curso a decorrer agora, mas não tenho mais informações.” Sobre os actuais atrasos na Justiça, o antigo juiz prefere recordar o seu tempo. “Não sei detalhes, sei que o número de processos terá aumentado muito. Quando cá estive éramos quatro juízes portugueses e fazíamos todos os serviços atempadamente. Mas, não tenhamos ilusões, eram menos processos, e talvez menos complexos.” “Em Macau não interpretam a lei” O antigo presidente do colectivo de tribunais de Macau prefere não dramatizar em relação ao gradual desaparecimento do Direito de Macau. “O Direito é o mesmo em todo o lado. Há a tendência para os princípios serem gerais. O que noto em Macau é que, muitas vezes, não interpretam a lei, mas isso não é por ser português ou chinês, é porque não sabem as bases da interpretação. Uma lei interpreta-se pelo seu espírito e a sua história.” “Talvez o problema não esteja no Direito, porque o Direito é igual em toda a parte. Na China, em 1999, o sistema chinês tinha mais tendência para se aproximar do ocidental do que do inglês. Quando me dizem que isto pode acabar, penso que não acaba”, adiantou. Sobre a má qualidade dos cursos de Direito no território, João Valente Torrão prefere lembrar que “talvez os estudantes não aprendam bem os princípios do Direito, que são iguais em toda a parte”. Código do Procedimento Tributário “desactualizado” Especialista em legislação na área dos impostos, João Valente Torrão lança mais um alerta face à desactualização do Código do Procedimento Tributário. “Há uns anos que está para ser reformulado e ainda não foi, e esse é um dos casos em que há uma profunda desactualização. Não apenas ao nível dos impostos, porque a Lei Básica diz que se trata de um regime altamente favorável. É o procedimento. Dou um exemplo: caso se queira impugnar uma decisão da pessoa que liquida os impostos, a lei não é clara. Ainda temos as leis de há muitos anos, a execução fiscal data de 1951. Uma modernização não fazia mal, e que indicasse claramente os direitos dos contribuintes e dos adjudicatários.”
Andreia Sofia Silva PolíticaCódigo Penal | AL analisa dois novos crimes relativos a menores O Governo vai ter de mexer nalgumas penas previstas para os crimes sexuais que pretende aditar ao Código Penal. É que há molduras que não batem certo com a legislação já em vigor. Ontem, a Assembleia esteve a analisar dois novos delitos, ambos sobre menores [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s deputados da 3.a Comissão da Assembleia Legislativa (AL) estão “preocupados” com o desfasamento que existe entre as penas previstas, neste momento, pelo Código Penal para crimes de natureza sexual e aquelas que constam da proposta de lei que vem aditar novos delitos à codificação. O assunto vai ser o tema dominante de uma reunião agendada para a próxima quinta-feira, de acordo com as explicações deixadas por Cheang Chi Keong, presidente da comissão. “No artigo 166.o [abuso sexual de crianças] do Código Penal, a pena máxima prevista é menos grave do que no crime de pornografia de menor [sugerida na proposta de lei]”, exemplificou Cheang Chi Keong. “Vamos trocar ideias de modo a saber se as molduras penais vão ser definidas de uma forma equilibrada, para que haja compatibilidade entre os crimes.” Ontem, o grupo de deputados esteve a analisar dois novos crimes que dizem ambos respeito a menores: o recurso à prostituição de menor e o crime de pornografia de menor. O Código Penal prevê já a criminalização destes dois actos, mas apenas em situações em que a vítima tem menos de 14 anos. Com o articulado, o Governo pretende estender a protecção até aos 18 anos. “Uma pessoa que recorra ao serviço sexual prestado por um menor entre 14 e 18 anos vai ter de assumir responsabilidade criminal”, salientou Cheang Chi Keong. “Não está em causa uma ameaça, mas sim uma transacção sexual. Neste momento, os clientes não precisam de assumir qualquer responsabilidade criminal.” O crime tem natureza pública, não sendo preciso queixa da vítima para que o Ministério Público possa intervir. Na reunião de ontem, discutiu-se sobretudo a intenção legislativa. “O objectivo é reforçar a tutela penal para com os menores”, vincou o deputado. “A prostituição infantil existe, de facto. De acordo com os estudos e as recomendações internacionais, a melhor forma para combater este fenómeno e o consumo deste tipo de serviços é a criminalização deste acto”, assinalou ainda. Tal como Governo, a AL espera que a introdução deste novo crime “seja uma forma de eliminar a tendência da sua procura, contribuindo ao mesmo tempo para salvaguardar a saúde e o desenvolvimento das crianças”. Que os há, há O novo crime de pornografia de menor diz igualmente respeito a vítimas entre os 14 e os 18 anos. “Os menores que forem aliciados ou utilizados em espectáculos pornográficos ou em produtos pornográficos vão ter protecção reforçada”, explicou Cheang Chi Keong. “A pessoa que os alicia vai ser criminalizada. A moldura penal vai de um a cinco anos de prisão. A natureza do crime é igualmente pública.” O deputado destacou ainda um aspecto “muito importante” do artigo em questão: “Este crime está já incluído na lei da criminalidade organizada. É uma forma de reflectir a determinação do Governo na criminalização desses actos e na protecção dos menores.” Questionado sobre a existência de casos acerca das situações previstas nestes novos crimes, o deputado afirmou que o Governo não forneceu dados concretos, dando a entender, porém, que não há dúvidas sobre a existência deste tipo de delitos. “Na sociedade, temos acesso a este tipo de notícias, mas aqui não falámos de casos concretos”, resumiu.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaMetro Ligeiro | Gestão poderá incluir empresas estrangeiras A posse é nossa mas os gestores poderão ser locais e estrangeiros. É que o Governo quer delegar a gestão do metro ligeiro: por um lado, cria-se uma sociedade de Direito privado com capitais de Macau; por outro, abre-se a possibilidade de empresas de fora participarem no projecto [dropcap style≠’circle’]T[/dropcap]eve ontem início o processo de consulta pública para a criação da lei do sistema de transporte do metro ligeiro, a qual deverá durar 60 dias. Ng Keng Chung, coordenador adjunto do Gabinete para as Infra-estruturas de Transportes (GIT), referiu que é intenção do Executivo entregar a gestão do metro ligeiro a uma sociedade de Direito privado composta por capitais públicos de Macau, com a possibilidade de empresas estrangeiras poderem participar no estabelecimento da sociedade. “Esperamos encontrar empresas que tenham experiência de trabalhar com o metro ligeiro, mesmo fora de Macau, para aderirem a esse trabalho.” Apesar disso, o Executivo falou na importância de ter gestores de Macau. “Ainda estamos a fazer um estudo quanto à estratégia de funcionamento da sociedade. Pensamos como podemos dar mais oportunidades a pessoas de Macau para participarem neste meio de transporte. Queremos atrair os locais [para cargos de gestão]. Esta entidade tem de ter uma percentagem de locais para que possam aprender algo novo”. O coordenador-adjunto do GIT confirmou que concessionar a gestão do metro ligeiro a privados está fora de questão. “Pensámos nessa possibilidade [de fazer uma concessão a empresas], mas temos de pensar numa estratégia de como podemos fornecer um melhor serviço aos cidadãos. Se for através de uma concessão teremos de pensar na capacidade financeira e de gestão dessa empresa. Neste momento, achamos que criar uma sociedade com capitais de Macau é mais adequado”, explicou. Caberá a esta sociedade fazer a gestão e manutenção do metro ligeiro, sob fiscalização do Governo. O documento de consulta fala na fiscalização feita por um “organismo público”, mas Ng Keng Chung não conseguiu adiantar mais informações. Em Novembro de 2016, durante a análise na especialidade do orçamento de 2017, o Governo confirmou junto dos deputados que iria atribuir 1,4 mil milhões de patacas para a Macau Metro Ligeiro SA, “uma empresa sem accionistas e inteiramente participada pelo Governo”, a ser criada este ano. Taipa em 2019 O coordenador-adjunto do GIT confirmou ainda a inauguração do segmento da Taipa para 2019, afastando a possibilidade da lei de gestão do metro não estar pronta a tempo do funcionamento deste meio de transporte. “Vamos iniciar as obras dentro das estações e instalação de alguns equipamentos, bem como a construção da passagem superior. O tempo não é muito mas vamos tentar acelerar o processo e iremos em breve divulgar mais informação”, apontou Ng Keng Chung. Antes de entrar em funcionamento, o metro ligeiro será posto a circular sem passageiros. Fica ainda decidido que irá funcionar com operação automática, sem condutor, “por forma a garantir a prestação de um serviço público de transporte colectivo de passageiros de forma segura, rápida, fiável e pontual”, descreve o documento de consulta. Lei a metro A futura lei do sistema de transporte do metro ligeiro vai ainda prever a criação de um seguro obrigatório de responsabilidade civil, o qual deverá ser de 200 milhões de patacas, como limite mínimo, “tendo como base da estimativa a lotação dos futuros comboios do metro ligeiro”, lê-se no documento de consulta. O seguro será criado através de regulamento administrativo. São ainda previstas sanções administrativas para quem incorrer em actos que possam prejudicar a operadora e o funcionamento do metro ligeiro, as quais variam entre as 400 e as 5000 patacas. Como os crimes previstos no Código Penal na área dos transportes não se podem aplicar ao metro ligeiro, por se tratar de um sistema diferente, a lei vai determinar as molduras penais caso se verifiquem ocorrências criminais. Uma condução perigosa poderá originar um a oito anos de prisão, enquanto que a captura de um comboio por quem não tiver essa competência ou responsabilidade ganha uma moldura penal de cinco a 15 anos de prisão. Há ainda molduras penais de três a dez anos para quem atentar contra a segurança das operações ou causar desastres, sendo que o perigo causado por negligência incorre numa pena de prisão de um a oito anos. No que diz respeito à investigação técnica de acidentes, todos os relatórios de investigação, incluindo as conclusões e recomendações, “devem ser divulgados à população”.
Andreia Sofia Silva SociedadeProposto aumento de multas e taxas para resíduos de obras [dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]riar taxas para o depósito de resíduos de construção, aumentar as multas e obrigar os empreiteiros a criar um plano de recolha antes do arranque da obra. Eis as conclusões da consulta pública para a elaboração do “Regime da Gestão de Resíduos de Materiais de Construção de Macau” As conclusões da consulta pública sobre a futura criação do “Regime da Gestão de Resíduos de Materiais de Construção de Macau” visam maiores responsabilidades para os empreiteiros nesta matéria. O relatório, ontem divulgado pela Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA), sugere que “o depósito de resíduos de materiais de construção [resultantes de estaleiros, domésticos, dos estabelecimentos comerciais, dos escritórios] no Aterro deixe de ser gratuito e que se passe a cobrar taxas para o efeito”. Quanto aos valores a cobrar neste caso, é proposta a criação de duas categorias, pois a taxa para os resíduos já separados a partir da fonte “deverá ser mais baixa”. Assim sendo, deve-se cobrar uma taxa “não inferior a 130 patacas” por cada tonelada de materiais já misturados com outros resíduos, os quais são “resultantes da demolição e construção e de materiais não inertes resultantes da demolição e construção”. No caso de materiais já seleccionados, o valor baixa bastante, para menos de 30 patacas por tonelada. O relatório da consulta pública revela ainda uma sugestão relativa ao aumento das multas “pelo abandono e depósito inapropriados de resíduos de materiais de construção civil”. Um plano à maneira O processo de consulta pública ficou concluído em Dezembro de 2015, sendo que a DSPA demorou mais de um ano para elaborar este relatório. O documento traz ainda uma novidade, a de encarregar os empreiteiros da gestão dos resíduos resultantes das suas obras. “Propõe-se a elaboração, pelos empreiteiros, de um plano de resíduos de materiais de construção adequado antes de se iniciarem obras em grande escala”, aponta o comunicado da DSPA. Para além disso, “estes devem também tomar as respectivas medidas para reduzir o volume de resíduos de materiais de construção, de diferentes categorias, produzidos na construção civil”. Quanto à elaboração do regime, a DSPA não apresenta nenhuma data concreta. O organismo promete “proceder ao respectivo processo legislativo com base nas respectivas opiniões e sugestões, tendo em consideração a realidade de Macau”. Fica ainda prometido que a DSPA “aperfeiçoará o respectivo regime de fiscalização, no sentido de se construir uma sociedade economizadora de recursos”.
Andreia Sofia Silva PolíticaLicenças especiais | Ng Kuok Cheong quer revisão da lei este semestre O deputado Ng Kuok Cheong exige que o Governo avance para a revisão do diploma que regula a emissão de licenças especiais de condução já este semestre, referindo que houve um desperdício de recursos em fiscalizações infrutíferas [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] atribuição de licenças especiais e os alegados abusos cometidos por condutores oriundos do continente continua a gerar controvérsia junto do poder político. O deputado Ng Kuok Cheong não ficou satisfeito com as respostas dadas pelo Governo na última sessão plenária e entregou mais uma interpelação oral ao Governo, onde pede que a lei de atribuição de licenças especiais para condutores seja revista já no primeiro semestre deste ano. “O Governo deve concretizar a revisão da lei, que está em estudo há vários anos, e tentar que a alteração do regime de licença especial esteja concluída no primeiro semestre deste ano. Vai fazê-lo?”, questiona. Ng Kuok Cheong fala ainda de gastos supérfluos efectuados por parte das autoridades policiais em fiscalizações que não tiveram quaisquer resultados. “As referidas mais de 40 mil acções de fiscalização [número apresentado pelo Executivo na última sessão plenária, relativo às acções realizadas desde 2009] não passam de um mero desperdício de recursos policiais. Os governantes também confessaram que existem lacunas na lei, mas não se comprometeram a melhorar os métodos de fiscalização, e nem sequer existe uma calendarização para a revisão do diploma.” O deputado apontou ainda que “os dirigentes do Governo destacaram agentes policiais para a realização de mais de dez mil acções de fiscalização simples e ineficazes aos veículos com licença especial, com vista a demonstrar a não existência de ilegalidades. Não será isto um desperdício excessivo de recursos policiais?”. Mudanças na inspecção Para o membro da Assembleia Legislativa (AL), eleito pela via directa, há que mudar também a forma como este tipo de fiscalizações são realizadas por parte das autoridades. “O Governo deve divulgar, a breve prazo, o processo de aperfeiçoamento da inspecção dos veículos com licença especial. E durante a inspecção, para além da verificação dos registos de entrada e saída dos veículos, devem também ser registados os dados pessoais básicos dos passageiros e as informações constantes dos documentos de viagem com os quais entraram em Macau, com vista a verificar se os veículos cumprem o princípio da ligação ponto a ponto com a China e a facilitar o respectivo acompanhamento e tratamento”, sugeriu. Para Ng Kuok Cheong, há falhas que devem ser corrigidas. “Durante a fiscalização não se registam ilegalidades porque a polícia limita-se a verificar o registo de entrada e saída dos veículos, sem verificar se os passageiros atravessaram a fronteira.” “Algumas operadoras de Jogo passaram a recorrer às empresas que contratam motoristas da China continental com licença especial destinada à condução dos autocarros de turismo para assegurarem os serviços de shuttle bus, o que não passa, de forma evidente, de um meio para os motoristas da China poderem desempenhar essas funções em Macau sem precisar de requerer o estatuto de trabalhadores não residentes (TNR)”, rematou. Ainda não foi marcada uma data para que esta interpelação obtenha resposta do Governo na Assembleia Legislativa.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaProtesto | Motoristas acampam no Leal Senado A Associação de Motoristas Locais iniciou no sábado um protesto no Leal Senado contra o aumento das taxas de veículos e os alegados abusos cometidos pelos portadores de licenças especiais. Alguns manifestantes estão em greve de fome Com Vítor Ng [dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uando o HM falou ontem com Wong Tim Iao, este não comia há mais de 24 horas. A opção deste membro da Associação dos Motoristas Locais foi de iniciar uma greve de fome num protesto que se tem feito notar no Largo do Senado. Nem todos os seus companheiros optaram por esta via, mas manifestam-se pelos mesmos motivos: o aumento súbito das taxas de veículos e o facto de muitos portadores de licenças especiais conduzirem em Macau, sem serem portadores do blue card. Na sua óptica, roubam-lhes os empregos. O protesto deverá acabar hoje. Wong Tim Iao referiu ao HM que o Governo decidiu aumentar as taxas dos veículos sem ter, sequer, apresentado uma proposta na Assembleia Legislativa para discussão. No caso dos veículos pesados, as taxas para a remoção chegam às seis mil patacas, mas este condutor diz que nunca há lugares de estacionamento suficientes. “Se recebermos uma multa todos os dias, o valor vai ser igual ao nosso salário”, disse. Thomas Chen, outro condutor presente, também referiu que bastam duas multas num mês para que se atinja um ordenado mensal, algo que não compensa pegar no volante. Wong Tim Iao queixa-se ainda de que o Governo não aborda da forma correcta a questão dos veículos com duas matrículas, vindos do lado de lá das Portas do Cerco. “Esses veículos com duas matrículas passam a fronteira e circulam pelos hotéis. Estão a ameaçar a nossa sobrevivência”, apontou. “Tentamos manifestar-nos antes mas não encontrámos outra maneira para expressarmos as nossas queixas. Agora só podemos mesmo fazer greve de fome”, disse. Parcas respostas A Associação dos Motoristas Locais já se havia manifestado pelos mesmos motivos no passado dia 22 de Janeiro. Mas Wong Tim Iao revelou que a resposta apresentada pelo Governo não os convenceu. “O Governo não reagiu de forma nenhuma, pelo contrário, ainda disse que iria aumentar mais as taxas. Acho que este Governo não ouve as vozes dos cidadãos”, frisou. Os protestos prometem, assim, continuar. “Para que o Governo nos possa dar mais atenção, já estamos a planear a próxima etapa, e talvez façamos uma actividade mais radical. Mas teremos que discutir primeiro com os nossos colegas”, afirmou. O grupo está ligado à Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), do deputado José Pereira Coutinho, que até ao fecho desta edição não esteve contactável. Ontem à tarde o deputado Au Kam San, da Associação Iniciativa para o Desenvolvimento Comunitário, explicou os incidentes ocorridos com a polícia na noite de sábado, que quis dispersar os manifestantes. Mas não prestou mais declarações aos jornalistas. Segundo o comunicado divulgado pela associação de motoristas, as autoridades interromperam o protesto por volta da meia-noite, numa altura em que todos os manifestantes estavam em silêncio. “Nessa altura havia alguns estrangeiros a beber connosco mas a polícia mandou-nos sair. O comportamento da polícia constitui uma violação aos direitos dos cidadãos. Estávamos a comportar-nos normalmente e já não a agir como manifestantes”, lê-se. Graças à ajuda de Au Kam San, o problema acabaria por ficar resolvido e todos puderam continuar no Leal Senado.
Andreia Sofia Silva Entrevista EventosManuel Afonso Costa: “Uma parte da minha alma é oriental” “Memórias da Casa da China e de Outras Visitas” é o mais recente livro de poesia de Manuel Afonso Costa, lançado ontem pela editora portuguesa Assírio e Alvim. A obra não representa apenas um regresso do poeta às publicações, ao fim de dez anos. É também uma forma de assumir que o Oriente, a China, lhe entrou em casa, que é como quem diz, pela alma adentro [dropcap]Q[/dropcap]uando é que começou a pensar este livro, a escrevê-lo? Esse livro surge numa linha de continuidade, de uma poética que lhe é anterior. Não há um momento inaugural em que tenha decidido escrever poemas que obedecem a um determinado critério ou objectivo. Não há um thelos, no sentido de finalidade, de algo que esteja definido à priori. Isso acontece, talvez, no romance, em que a pessoa se senta para contar uma história. Para começar algo do zero. Sim. Com a poesia, a pessoa desde que começa a escrever, a determinada altura da vida, não deixa de o fazer e acaba por ir reunindo poemas suficientes para publicar. Não tem de existir uma ruptura, um ponto final e depois o começar de outra coisa. Dentro dessa linha de continuidade, tem de haver o aparecimento progressivo de alguma coisa diferente e nova. Mas deixe-me referir que vai haver um encontro de literatura e filosofia, em Macau e em Lisboa, promovido pelo Instituto Internacional de Macau, onde vão falar da minha poesia, com o tema “O aparecer da China na poesia de Manuel Afonso Costa”. Portanto há uma realidade que aparece, que é a China, sendo que não poderia aparecer apenas a partir dos livros. Aparece também a partir da sua vivência com a sociedade. Exacto. Já conhecia a China, teoricamente, já tinha visto gravuras, já tinha lido livros. Já tinha tido acesso à poesia chinesa, há muitos anos, mas nada tem que ver com o choque com a realidade. Este livro fala das memórias da casa na China. Claro que não é a casa onde eu vivi, é uma casa simbólica, é o lugar China, no sentido lato, onde vivi e tive o meu espaço próprio. A descrição do seu livro fala precisamente da casa enquanto símbolo. Metaforicamente falando, que tipo de casa é esta? É uma casa que alberga a sociedade chinesa? Em concreto, não. Diria que a minha poesia é muito fenomenológica, está sempre muito ligada às vivências. Foi muito importante vir para o Oriente e entrar em contacto com uma realidade. Esta desafia-nos. Existe a intencionalidade da nossa consciência, mas existe também a intencionalidade quase provocatória da realidade sobre nós. A realidade estimula-nos a reagir. Viver aqui, numa sociedade com um grafismo e arquitectura diferentes… Mas não me refiro só a Macau, embora seja o elemento predominante, porque foi o sítio onde passei os meus últimos anos de Oriente. Fui muitas vezes a Hong Kong nos anos 90 e vivi quase um ano em Zhuhai. Então é todo o conjunto que me estimula. Quando me refiro à casa, é uma casa simbólica. Não é essa casa, com a sua arquitectura própria. Ela é concreta porque está plantada num lugar diferente, um lugar cuja entourage [o que está à volta] é diferente. Refiro-me a uma parte do mundo onde vivi grande parte da minha vida, e a nossa vida é toda feita de casa em casa. De vivência em vivência. Vamos deixando nessas casas um bocado de nós enquanto lá vivemos. Ficam ligadas a elas todas as memórias. É em casa que escrevemos (eu pelo menos), amamos, cozinhamos, dormimos. A casa desempenha um papel extraordinariamente rico nas nossas memórias. A casa é opaca, está de alguma maneira fechada, uns afectos abrem-se, outros nem tanto. Ao mesmo tempo, a realidade exterior entra pelas paredes da casa. Se não, viveria aqui como se estivesse a viver em Lisboa ou em Paris. Estamos permanentemente em contacto com uma língua diferente e um grafismo diferente. Uma das coisas que mais me impressionou foi andar meio perdido por certas zonas de Macau, onde são ostensivos e quase histéricos os painéis publicitários mostrados ao exterior. Isso dá uma certa geometria estética, colorida, de luz e caracteres, algo extraordinariamente intenso. É essa realidade que entra em contacto com a casa, que entra dentro de nós. E quando escrevemos ou pintamos, enquanto artistas, damos conta dessa transmigração das realidades. Disse que este livro é o resultado do que tem vindo a publicar até aqui. A última obra intitula-se “Caligrafia Imperial e Dias Duvidosos”. Passou de uma referência à caligrafia, um elemento muito característico da cultura chinesa, para essa vivência da China. De que forma é que estas obras se interligam? Têm um ponto em comum. O livro “Caligrafia Imperial e Dias Duvidosos” tem cerca de 17 poemas que publiquei numa revista de cultura, sendo uma réplica literária minha do quadro dos tributários que está no museu em Taipé, uma obra de um imperador chinês do século XVIII. É uma obra chinesa, megalómana, e sensibilizou-me muito, tal como a Cidade Proibida e as Muralhas da China. Depois dou-lhe o nome de caligrafia [ao livro] porque um dos elementos do quadro dos tributários é a caligrafia: há uma gravura e há um texto. Com isso o imperador captou toda a realidade, que não conseguiu captar com os sentidos. Foi uma das primeiras formas de ligação à cultura e sociedade chinesa, e à grandeza da poesia e cultura chinesas. Há uma continuidade porque os primeiros poemas deste livro [Memórias da Casa da China e de Outras Visitas] também foram publicados na revista de cultura, na minha segunda passagem pela China. Estes novos poemas não abordam o quadro dos tributários, mas fazem referência a alguns poetas chineses e à literatura chinesa. O modo de dizer da poesia chinesa é sempre mais sentencioso do que o nosso e esse é um aspecto que me sempre atraiu. É uma poesia despojada, onde as coisas aparecem como se fossem sentenças, mas depois não são para ler à letra. Contém outra realidade e sou sensível a essa ironia muito bem disfarçada e austera da poesia chinesa. Chamei-lhe casa pela simples razão de que agora tenho o direito de me referir a uma casa na China. Ao fim de tantos anos… Já tenho uma parte da minha alma que é oriental. Eu já tenho uma casa na China. Acharia pretensioso se dissesse isso em 1994, tendo acabado de chegar a Macau. Passou muito tempo, com tantas experiências, e tendo uma parte da minha vida que ver com esta realidade, posso dizer que tenho uma morada no Oriente. O livro “Caligrafia Imperial e Dias Duvidosos” foi publicado em 2007, há exactamente dez anos. Porquê esse interregno? Muitas pessoas me perguntam isso. Creio até que este livro é melhor do que o anterior, e acredito que o próximo venha a ser melhor que este. Houve uma continuidade de escrita, fui apurando, em termos de savoir-faire, que é muito importante. Há uma maneira de fazer, com prática, experiência e continuidade. Não vou ser hipócrita: nunca deixei de ler e escrever. A escrita e a poesia são as maiores paixões da minha vida. Acontece que não paro muito em lado nenhum. Estive em Macau de 1993 a 2000, depois fui-me embora, estive em França, nos Estados Unidos, e desde 2011 vivo em Macau. Perco os contactos, as rotinas. Depois tive duas filhas, fiz o doutoramento, algo megalómano, e não tendo nunca deixado de escrever, fui pondo um pouco de lado as questões mais burocráticas. Isso porque é mais fácil escrever do que publicar. Os livros deveriam aparecer publicados por milagre. Gosto infinitamente mais de escrever e ainda mais de ler. É também crítico literário. É algo que falta em Macau? Sim, mas não é só em Macau. Temos de ser justos. Em Portugal a crise nesse domínio é avassaladora. E a poesia está, em larga medida, a desaparecer das livrarias por esse mundo fora. Em França escreve-se e publica-se muito pouca poesia. Como explica isso? Há uma tendência clara de uma crise das humanidades, está tudo interligado. O fim do latim e do grego para mim é catastrófico, e basta ler o George Stein [crítico literário] para se perceber porque é que é catastrófico. Há um desinvestimento nas áreas literárias, e os jornais são um espelho da sociedade. Fala-se da crise, dos números, das taxas. Houve um tempo em que todos os jornais, na sua maioria, tinham suplementos literários. Eu, que era uma pessoa com poucas posses, comprava sempre esses suplementos, que eram autênticos dossiers que tinha em casa. Os críticos eram verdadeiros profissionais, criticavam o que gostavam e o que não gostavam.
Andreia Sofia Silva PolíticaAngela Leong pede fiscalização de subsídios a escolas privadas [dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] deputada Angela Leong interpelou o Governo sobre o processo de atribuição de apoios financeiros por parte do Fundo de Desenvolvimento Educativo a escolas privadas, alegando que a fiscalização não está a ocorrer como o esperado. Por isso, a também administradora da Sociedade de Jogos de Macau (SJM) quer que o Executivo crie um órgão só para fiscalizar eventuais abusos. “As autoridades devem estudar a criação de um serviço especializado destinado à fiscalização eficaz das finanças das escolas particulares. Vão fazê-lo?”, questionou, exigindo que sejam também verificados os salários que são pagos aos professores. “As autoridades devem, via análises efectuadas em conformidade com este princípio, verificar se as remunerações do pessoal docente das escolas particulares atingem a devida percentagem, com vista a assegurar que as escolas apliquem os recursos públicos no desenvolvimento educativo.” Angela Leong lembrou alguns casos de ilegalidades cometidas, que foram denunciadas pelo Comissariado da Auditoria. “Em 2015, descobriu-se que uma escola tinha recebido cerca de seis milhões de patacas de subsídios para o ensino especial, mas só uma pequena parte tinha sido utilizada com os alunos do ensino inclusivo. Isto resultou em criticas do público contra a fiscalização indevida, que impede os alunos de obter os devidos apoios.” Nesse mesmo ano, “o CA descobriu a falta de cuidado da Direcção dos Serviços de Educação e Juventude quanto à fiscalização dos pedidos de subsídios das escolas privadas, situação que resultou em abusos do erário público por parte de algumas escolas, e que só desfavorece o desenvolvimento educativo”, acrescentou a deputada. Angela Leong lembrou que Macau foi o primeiro território chinês a implementar a escolaridade gratuita, tendo sido criado o FDE para garantir “a optimização das condições de ensino das escolas privadas”. Para a deputada, é fundamental uma racionalização do sistema de ensino, de modo a garantir a formação de talentos. A interpelação oral apresentada pela deputada ainda não tem data marcada para receber uma resposta do Executivo no hemiciclo.