António Cabrita Diários de Próspero h | Artes, Letras e IdeiasArquitectura e poética [dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m Maputo existe um hotel, o Taj Mahal, onde os mictórios do bar se localizam exactamente por trás do balcão da recepção. E a porta de tal fétido lugar tem de há muito os gonzos enferrujados pelo que a primeira visão que algum hóspede pode ter, quando faz o registo de entrada ou pede a chave do quarto, será a de uma morcela que urina. Será igualmente um modo insólito para se entrar no teor desta crónica que pretende dar conta de uma feliz exposição de arquitectura que inaugurou em Maputo, mas através do bizarro exemplo talvez se entenda a oportunidade de uma verdadeira lição de arquitectura numa terra que foi perdendo qualquer noção do que seja um plano urbanístico, a ordenação do território, o respeito pelos planos directores das cidades ou a adequação arquitectónica. A exposição é de José Forjaz, o arquitecto decano no país, que aos 84 anos, decidiu mostrar 40 projectos não edificados, no Instituto Camões. Numa nova deriva prévia, vou contar o que me aconteceu na ida à casa de uma amiga. Ela não estava e fiquei na sala à espera dela, a espreitar a estante. E então aí vi um livro que se chamava “How to think like Leonardo da Vinci”. Fiquei estarrecido. Eis que nos impingem métodos para chegar instantaneamente às vistas largas do Leonardo sem termos de passar pelo esforço de subir à montanha, aplainando de imediato o terreno. O que acontece é que o vale altíssimo a que ele chegou e a percepção que aí ganhou era indissociável do processo da subida, das dificuldades e dos conseguimentos na escalada e nenhum livro de 300 páginas, que se lêem em oito horas, supre os quarenta anos da subida, as vicissitudes, os méritos e os sentimentos frustres que tanto acompanharam o Leonardo no seu percurso. E só aí, na sua provação, pôde converter o estudo das topologias do terreno que tanto o cansaram em vantagens e conhecimento. Ora a lição que se tira destes projectos no papel de José Forjaz, considerado internacionalmente como um grandes arquitectos de África, é o seu flagrante aspecto totalizador. A relação com a arquitectura é aqui pensada de um modo total – fazendo convergir no esquisso todos os aspectos da relação do homem com o ambiente e a paisagem, o corpo, o espaço físico, material, a memória tangível ou intangível dos lugares, o solo, a meteorologia, a antropologia, a economia, a energia, a estética, a funcionalidade, a geomancia, etc., etc. Ou seja, só a idade faz o arquitecto – não há recurso à mentira. Vamos agora ao aspecto poético. Não se confunda poético com estético, que pode ser a sua declinação em estereotipo, em cânone. O que em rigor é bom como aquisição vernacular imediata mas é sempre mau quando uma conquista expressiva se torna hábito. O poético não é um mero jogo das formas, é uma relação mais profunda e exige, entre outras, duas características basilares. Uma delas, assenta naquilo que a arquitectura partilha com as outras artes, o ritmo. O ritmo está para a arquitectura como as estrofes, as rimas e as aliterações estão para o poema. Mas também acontece que de uma forma plástica a arquitectura nos traduza, por vezes, acordes musicais. Um poeta espanhol, o José Bergamin chamava à tourada a “música calada”. Não está mal visto, mas podemos deslocar esta definição, se calhar até com mais propriedade, para certas obras de arquitectura. Outro atributo da poética é especificamente arquitectónica e define-se pela empatia revelada entre o projecto e o lugar, numa espécie de co-nascimento retroactivo. Bom, o sentido de uma paisagem, o que estrutura o seu campo visual, não resulta de uma análise intelectual dos elementos que a compõem mas de uma apreensão sintética das relações que os unem. É como se a paisagem ajudasse o seu espaço construído a encontrar a sua verdade perceptiva. O José Forjaz que num seu texto fala sobre as relações entre a arquitectura e a medicina não poderia deixar de ser sensível a este aspecto. A poética, nestes projectos, encontra-se no encontro entre a experiência sensível de estar diante da paisagem e de se tornar evidente que o espaço construído fala com ela, ou melhor que ele diz o que a paisagem queria dizer de si mesma. Este sentido inscrito no sensível é mais do que uma troca, ao mesmo tempo material e cultural, que se estabelece entre o homem e o seu meio, é entender o mundo como uma ressonância em que todos os elementos interagem para dar mais do que a soma do todo. Isto até pode acontecer de maneiras muitos diferentes. Pode dar-se por “substracção”, como na Casa de Chá, um projecto para o Japão, que ilustra a crónica, em que a transparência se funde no espaço em vez de lhe impor intrusamente um volume, ou noutro exemplo, este construído, no caso do Memorial de Mbuzini, erguido no lugar onde se deu o acidente de avião que vitimou Samora Machel, em que um dos elementos estruturantes para a idealização do memorial foi o vento, tão presente na colina. O que deve ter sido compreendido por muito poucos. Mas é por isso que uns são dotados de poética e outros não. O mais vulgar exemplo desta espécie de simbiose ou de sentimento-paisagem é a célebre Casa na Cascata do Lloyd Wright. Aquela casa enriquece a paisagem, era como se a cascata tivesse corpo mas lhe faltasse algo, houve a partir dela um co-nascimento, algo mais do que uma simples correcção sintáctica. A cascata e a vivenda mobilizam um traço de união entre o espaço e o espírito. È o mesmo que eu encontro por exemplo no projecto do Museu de Arte Tomihiro, no Japão, um museu destinado a duas artes quase intangíveis, a aguarela e a poesia (cf. em Caliban.pt) Aqui só lamento que a tecnologia não permitisse ainda ao José Forjaz ter posto o museu a levitar sobre a encosta, sendo aliás ao que o projecto propende.
Leocardo VozesGernika [dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]assavam alguns minutos das dez da manhã do último dia 1 de Agosto quando saí da minha casa na Rua Urritibide, em Bilbau, e minutos depois estava na estação de Casco Viejo, onde menos de meia hora de metro me levaram à estação do ajuntamento de Gernika-Lumo. A cidade de Gernika, completamente destruída em Abril de 1937 pelos bombardeamentos da Luftwaffe nazi, tem hoje 16 mil habitantes, e um outro tanto de histórias para contar. Situada na região de Basturialdea, no vale do rio Oka, a cidade ficou imortalizada naquele que é provavelmente o quadro mais famoso de Pablo Picasso, “Guernica” – o seu nome em castelhano. Cheguei pouco antes da hora de almoço, e depois de me deliciar com algumas guloseimas na conceituada pastelaria Bidaguren, fui visitar um pouco da cidade, sentir-lhe o pulso, e depois de queimar as calorias do “brunch”, arranjei lugar para os deliciosos pimentos verdes de Gernika – os melhores do mundo, sem exagero. Era então altura de realizar um sonho de infância: ir ver a “Gernikako arbola” – o carvalho centenário de Gernika, símbolo vivo da identidade basca. A primeira “arbola” (“árvore”, em basco), conhecida entre os locais como “o pai”, foi plantada no século XIV, e ali ficou durante 450 anos, até dar lugar à “velha árvore”, cujo tronco se encontra rodeado de um pequeno gazebo perto da actual. A terceira, e provavelmente a mais famosa, foi plantada em 1860, sobrevivendo ao bombardeamento de Gernika e às tentativas das tropas falangistas de a destruir durante a Guerra Civil espanhola. Contudo não resistiu a um fungo, que acabaria por a matar já em 2004, mas o ajuntamento preservou algumas pernadas, entre elas a actual “arbola”, plantada em 2015. Quando cheguei às “juntas generales”, onde se encontra o carvalho de Gernika, deparei com o tal gazebo onde se encontra o tronco já ressequido e praticamente oco, e resolvi confirmar junto de um funcionário que se encontrava à porta do museu se era aquela a segunda encarnação da árvore. Não sei se me fiz entender, mas o simpático senhor colocou-me a mão no ombro, levou-me por uma pequena sala dedicada à heráldica basca, e deixou-me à porta do jardim onde se encontrava a “arbola”, dizendo em voz baixa, quase sussurrando: “esta é a nossa árvore, a original, e a alma do nosso povo”. Agradeci-lhe, e lá me deixou ali, completamente só, perante a famosa “arbola”, junto da qual e ainda hoje os mandatários do povo basco prestam juramento quando tomam posse de cargos públicos. Não me comovo com facilidade, e nem senti nada que se parecesse com um nó na garganta, mas antes uma espécie de apertão no peito: perante mim estava a árvore que um dia Adolf Hitler quis para si, crendo que possuía poderes mágicos. Foi um momento especial, e ainda mais sabendo que aguardei tantos anos até estar perante aquele pedaço do meu imaginário. Não sou muito dado a nacionalismos de nenhum tipo, mas simpatizo com a causa basca, pois é um pretensão que além de justificada pela História, é também inclusiva – na eventualidade de um dia ser criado o estado independente do Euskal Herria (País Basco espanhol e francês e Navarra), pode ser basco quem quiser, quem se sentir basco. Para quem ainda não o fez, recomendo a todos que incluam na lista de destinos a visitar enquanto ainda por cá andam a cidade de Gernika, e a sua “arbola”, o orgulho de um povo que resistiu às mais violentas intempéries da História. Denok Gernikako dira – somos todos cidadãos de Gernika.
Hoje Macau China / ÁsiaPresidente filipino insta polícia a retomar a “guerra contra a droga” [dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, instou a polícia a servir novamente na “guerra contra a droga”, um mês depois de ter suspendido a campanha após a confirmação de corrupção no seio das forças de segurança. O Presidente filipino afirmou que deu ordens ao chefe da Polícia Nacional, Ronald dela Rosa, para “recrutar homens jovens e patriotas da Polícia Nacional como membros das forças de trabalho” nas operações anti-droga, em declarações reproduzidas ontem pela estação local ABS-CBN. “Tenho que fazê-lo porque me faltam homens”, disse Duterte, que não apontou uma data concreta ou mais detalhes sobre o reinício da campanha. O Presidente especificou, no entanto, que os polícias que integrem as futuras operações não devem estar envolvidos em corrupção. Duterte suspendeu a sua campanha anti-droga no final de Janeiro depois de reconhecer que, no âmbito desta, alguns agentes tinham levado a cabo práticas abusivas, como o sequestro e homicídio de um empresário no quartel-general da Polícia Nacional na cidade Quezón. Duterte prometeu então centrar-se em levar a cabo uma “limpeza” na Polícia Nacional e, uma vez finalizada, retomar as operações que desde o passado mês de Junho até Janeiro custaram a vida a mais de 7.000 alegados narcotraficantes e toxicodependentes. Às armas Vários políticos apoiantes de Duterte e o próprio chefe da Polícia Nacional, Ronald dela Rosa, instaram nos últimos dias o Presidente a retomar o quanto antes a campanha. Dela Rosa disse na segunda-feira que se isso não acontecer vão “perder-se os avanços conseguidos nos primeiros sete meses”. Por outro lado, as Forças Armadas das Filipinas assinaram na terça-feira um acordo com a agência anti-droga (PDEA) que serviu para envolver os militares do país na campanha contra o narcotráfico de Duterte. Duterte, que chegou ao poder em Junho de 2016, prometeu ‘limpar’ as Filipinas de narcotraficantes e toxicodependentes, por considerar que a droga está a destruir as novas gerações do país. Vários países e organizações internacionais criticaram a sua política de linha dura, denunciando que viola os direitos humanos.
Hoje Macau China / ÁsiaHerdeiro do reino da Samsung indiciado por corrupção O herdeiro do império da Samsung e quatro outros executivos do maior fabricante de ‘smartphones’ do mundo, foram indiciados ontem nomeadamente por corrupção no âmbito do vasto escândalo que afecta a Coreia do Sul há meses, informou o Ministério Público. [dropcap style=’circle’]”O[/dropcap]s procuradores especiais indiciaram hoje, (ontem), o vice-presidente da Samsung Electronics Lee Jae-Yong (…) por corrupção, desfalque, ocultação de activos no estrangeiro e perjúrio”, afirmou Lee Kyu-Chul, porta-voz da equipa que investiga o escândalo de corrupção e tráfico de influências que levou à destituição, ainda não definitiva, da Presidente, Park Geun-Hye. Maior fabricante mundial de ‘smartphones’, que representa um quinto da economia sul-coreana, a Samsung vê-se novamente envolvida num escândalo, quando ainda está a tentar recuperar do problema do Galaxy Note 7, cujas baterias explodiam. Vice-presidente da Samsung Electronics e filho do presidente do grupo, Lee Jae-Yong, 48 anos, é suspeito de ter pago cerca de 40 milhões de dólares em subornos à confidente de Park Geun-Hye, Choi Soon-Sil, conhecida como “Rasputina sul-coreana”, em troca de favores políticos. Lee, que se tornou no patrão de facto da Samsung, depois do pai ter sofrido um ataque de coração em 2014, em prisão preventiva desde dia 17, negou todas as acusações contra si. Os seus colegas enfrentam acusações idênticas à excepção da de perjúrio. Amiga do alheio O escândalo em causa centra-se em Choi Soon-Sil, amiga de 40 anos da Presidente, suspeita de ter usado pessoas para obrigar os grandes grupos industriais do país a “dar” quase 70 milhões de dólares a duvidosas fundações por si controladas. O Ministério Público considerou Park como cúmplice no caso, ao ter permitido que Choi interviesse em assuntos de Estado – apesar de não deter qualquer cargo público. Choi terá extorquido, com a sua conivência, os principais conglomerados do país para fazer entrar 77.400 milhões de won (cerca de 61 milhões de euros) em duas fundações que controlava, em troca de favores. O parlamento, controlado pela oposição, aprovou a destituição da Presidente a 9 de Dezembro por causa daquele que é um dos maiores escândalos políticos da história recente da Coreia do Sul, uma decisão que terá de ser ratificada pelo Tribunal Constitucional para ser definitiva. A justiça tem até Junho para decidir se Park tem de abdicar permanentemente ou pode voltar a assumir o cargo. Os poderes presidenciais de Park estão suspensos, com o primeiro-ministro a liderar o Governo. Caso a destituição de Park avance, a Coreia do Sul tem que realizar eleições presidenciais nos 60 dias seguintes. Mesmo no caso de o Constitucional rejeitar o “impeachment” parlamentar, a Coreia do Sul vai realizar eleições presidenciais no próximo dia 16 de Dezembro, já que o mandato de cinco anos de Park Geun-hye está prestes a expirar.
Sofia Margarida Mota Ócios & NegóciosSofi Handmade – Artesanato | Fong Mei I, proprietária Sofi Handmade é a marca criada por Fong Mei I. A jovem de Macau vê na concepção de acessórios uma paixão e já tenciona passar o conhecimento a outros. Para já, tem as peças disponíveis nas várias feiras de artesanato do território, e em lojas em Macau e na Taipa [dropcap]F[/dropcap]ong Mei I tem 26 anos e é a responsável pela pequena empresa de artesanato Sofi Handmade. O negócio é a tempo parcial para a recém licenciada em língua e literatura chinesa, mas é fruto de um gosto pessoal pelo trabalho feito com as mãos. Foi mesmo a paixão pelo artesanato que levou Fong Mei I a deixar o emprego a tempo inteiro de modo a ter mais espaço para esta actividade alternativa. “Há uns anos tinha um emprego mas queria dedicar-me mais ao artesanato. Agora estou a trabalhar a tempo parcial e tenho mais flexibilidade de horários”, refere ao HM. O tempo é fundamental, não só para a produção dos objectos, mas também para a sua comercialização. “Agora, tenho mais disponibilidade para participar em actividades que envolvam o artesanato e a participação em feiras relacionadas”, menciona a jovem local. O interesse pelo artesanato e pela criação de objectos únicos data de 2012, altura em que começou a “aprender sozinha algumas técnicas através da visualização de vídeos na Internet”. O resultado foi a produção de acessórios, essencialmente brincos, colares e pulseiras recorrendo à utilização de metal, missangas e cristais. A actividade da Sofi Handmade começou timidamente e como resposta a um convite de amigos. “No início de 2015 comecei a criar objectos mas, naquela altura ainda não tinha a minha própria marca. Foi através do convite de uns amigos que queriam participar numa feira local de artesanato promovida pelo Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM)”, recorda. A responsável pela Sofi Handmade fez algumas peças que acabaram por ser vendidas e decidiu criar a sua própria marca. Satisfeita com o desenvolvimento da actividade e com a aceitação do público, a artesã classifica as suas peças como “bonitas”. Os clientes são essencialmente jovens do sexo feminino. “A maioria dos meus clientes são meninas que gostam de se vestir bem”, afirma. No entanto, o mercado tende a alargar. Com a crescente participação em feiras locais, a artesã tem constatado que, cada vez mais, os interessados nas suas peças vão desde crianças a adultos “com mais de 50 anos”. Fong Mei I revela ainda que o negócio está a crescer e os seus produtos já têm espaço fora das tendas. “Já tenho peças em duas lojas onde apresento as minhas criações em regime de consignação, a Binshu Studio em Macau e a Youth Works, na Taipa”, diz. Para o desenvolvimento do projecto, a proprietária considera fundamental os apoios que o Governo de Macau tem vindo a conceder ao sector do artesanato. “A feira promovida pelo Instituto Cultural, no Tap Seac, é muito importante”, afirma. “É ali que mais vendo e onde ganho grande parte das minhas receitas”. A razão, afirma, prende-se com o facto de ser um local em que passa muita gente de diferentes origens. “O certame integra artesões de regiões diferentes. Além de Macau existem feirantes de Hong Kong, Malásia, Cantão e da Coreia do Sul. É a maior actividade de criatividade cultural”, explica. O negócio vai de vento em popa e Fong Mei I vê o futuro com bons olhos. Além da produção, a jovem local quer agora lançar-se no ensino das suas artes. “Vou continuar a participar nas actividades e quero realizar workshops para ensinar este ofício.”
Jorge Rodrigues Simão PerspectivasO longínquo futuro sustentável “Most people in the world today have an immediate and intuitive sense of the urgent need to build a sustainable future. The stories that carry the message may be about pollution alerts or the bans on driving and closed beaches that result from them, or about hunger and famine, growing health problems such as asthma and allergies, unsafe drinking water, ’greenhouses gases’ and the threat of global warming and rising ocean levels, the destruction of the world’s forests and the expansion of its deserts, the disappearance of species, the large-scale death of fish and birds caused by oil spills and pollution, or about forest fires, floods, dust storms, droughts and other so-called ’natural’ disasters.” “United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization – Educating for a Sustainable Future” – UNESCO (1997) [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] fotografia tirada pelo astronauta William Anders durante a missão Apollo 8 à Lua, em 24 de Dezembro de 1968, permite-nos ter a certeza de que os recursos da Terra são limitados, carecendo de resposta o estudo, acerca de qual será o seu significado para a humanidade, durante o século que vivemos, e se poderemos prever quais serão os acontecimentos históricos existentes, que sofrerão um processo de alargamento ou reversão, e se iremos desfrutar de um estado permanente de capitalismo liberal, irradiando o pico da nossa civilização nos séculos vindouros, bem como o tipo de mundo que os nossos descendentes vão herdar. É difícil acreditar conscientemente na mudança da nossa natureza de forma a adequá-la à individualidade de cada um, podendo existir um erro de pensamento, pois talvez pudéssemo-nos tornar criaturas dóceis, modestas, com pequenos egos e desejos, cultivando humildemente pequenas áreas de terreno e facilmente dissuadidos de procriar um grande número de crianças. O escritor alemão Kurt Vonnegut, sugeriu no seu romance “Galapagos”, publicado em 1985, que podíamos evoluir para mamíferos aquáticos peludos com cabeças aerodinâmicas, cérebros menores e mais simples e uma propensão para peixes. É de duvidar que tal aconteça nessa linha de sugestão, pois o nosso esforço para a reprodução em quantidades cada vez maiores mais em uns locais que em outros, sustenta o nosso sucesso como espécie e historicamente permitiu-nos reconstruir as nossas comunidades rapidamente após um surto de fome ou praga. Além disso, a ambição pessoal é parte da nossa natureza e sempre existirão pessoas que vão querer dominar outras, sendo de suspeitar que uma proporção significativa da população vai continuar a ser atraída por essas pessoas de destorcida personalidade, quer sexualmente, como socialmente, forçando a uma maior competição dentro da comunidade, e mesmo que houvesse algum acordo político internacional que moderasse o nosso comportamento, logo seria minado ou derrubado. É um facto sem margem para dúvidas, que os seres humanos não gostam de ser humilhados por sistemas, regras e limitações. Adoramos escutar os que se libertam da restrição e da opressão. A nossa paixão pela liberdade é intrínseca ao espírito humano, pois somos como a República de Veneza; condenados porque não podemos suportar o pensamento de ser algo diferente do que somos. O petróleo de entre todos os recursos é o que está configurado para reduzir a sua oferta e existência. O petróleo como bem escasso e não renovável é talvez o mais importante que conforma a mente das pessoas, pois sustenta as nossas vidas, desde a alimentação e transportes à lei e ordem, defesa e recreação, sendo certo que terminará em algum momento do actual século ou milénio. É apenas uma questão de tempo. As reservas actuais e comprovadas representam cerca de cinquenta vezes o consumo mundial anual, mas esse índice está sujeito a flutuações consideráveis que podem ser alargadas, à medida que forem encontrados mais campos petrolíferos. As reservas comprovadas totais foram significativamente maiores em 2012 do que em 2000 e alternativamente, poderão diminuir à medida que o aumento da população e da industrialização consumissem essas reservas mais rapidamente. As reservas de petróleo existentes e a descobrir podem prolongar a sua existência por mais cinquenta ou setenta anos, mas mais importante, é que os fornecimentos de petróleo deixarão de atender à procura mundial em algum momento, e muito provavelmente na vida dos nossos filhos. O mesmo acontecerá com gás natural, do qual depende a produção de fertilizantes. As jazidas de gás natural existentes representam cerca de sessenta vezes o consumo mundial anual, que aumenta anualmente em 2 a 3 por cento. O gás de xisto alargou muito essas reservas e provavelmente as estenderá ainda mais, mas essa energia extra começou a ser vendida a baixo custo. Poder-se-ia acreditar que os governos procurassem racionalizar esta herança inesperada, de forma a durar o tempo suficiente, para que seja possível encontrar e produzir fontes alternativas e viáveis de energia aos combustíveis fósseis. A Fábula de Esopo: A cigarra e a formiga, em que esta trabalha duramente todo o verão preparando-se para o início do inverno, enquanto a cigarra apenas canta ao sol e não tem nada para viver quando a estação muda, mostra o que acontece com aqueles que não conseguem proteger-se contra futuras faltas, pelo que os preguiçosos sempre colherão o que merecem. Apenas os ditadores planeiam para um milhar de anos e nessa perspectiva, abre-se diante de nós uma série de possibilidades, sendo que numa extremidade do espectro está o futuro sustentável e dentro deste cenário, descobrimos como produzir toda a nossa energia e fertilizantes a partir de fontes sustentáveis, para que a sociedade possa continuar a existir, como sempre aconteceu, e no outro extremo do espectro está a “crise universal”, ou seja, uma calamidade de proporções maiores que a da “Peste Negra”, pandemia, que durante o século XIV matou cerca de setenta e cinco milhões de pessoas, e que será o resultado de uma falha mundial, em substituir os combustíveis fósseis antes de começarem a esgotar-se. O problema é de que ambas as extremidades do espectro envolvem a sociedade tornando-se mais hierárquica e menos liberal. Se começarmos por considerar o tipo de resultado mais suave que é o futuro sustentável, que não sendo ficção, permite imaginar uma realidade futura em que cada quinta com geradores hidroeléctricos nos seus riachos nas encostas, painéis solares nos seus campos e turbinas eólicas que elevam nas colinas, as casas e edifícios industriais em todas as cidades brilhando com células fotovoltaicas nas suas paredes e telhados, e as casas rurais com uma caldeira de biomassa. Moinhos de vento enormes no mar aproveitam o poder da brisa do mar, e a cada onda, enormes pistões alojados em túneis nos penhascos conduzem a energia para a rede de distribuição aérea convencional a nível nacional. As aeronaves voam com biocombustíveis, o que acontece já com a United Airlines, cujo modelo Boeing 737 está a voar na rota Los Angeles – São Francisco, desde 2015, com 30 por cento de biocombustíveis derivado de fezes e gorduras animais. Os tractores e as máquinas agrícolas usam biodiesel à base de soja, como acontece por exemplo, no Brasil. As carrinhas eléctricas levam grãos e animais para os mercados urbanos, de onde são transportados por comboios eléctricos para os seus locais de abate e processamento. Mas mesmo neste estado harmonioso, haverá uma concorrência muito maior por recursos, em particular, haverá uma luta inflexível sobre o solo. Imaginemos o Reino Unido como um exemplo, e supormos que investimos significativamente em energia solar, eólica e hídrica nas próximas décadas, para que em 2050 possamos produzir toda a nossa electricidade a partir dessas fontes. Trata-se de uma enorme suposição; no entanto, por razões de argumentação, suponhamos que seja possível. Na verdade, vamos ainda mais longe e imaginemos que pelo tempo que o petróleo leva a atingir um ponto de crise, não apenas satisfazemos todas as nossas necessidades de electricidade, mas também, geramos tanta electricidade a partir de fontes renováveis que podemos reduzir o consumo de petróleo, gás e carvão pela metade, que ainda deixaria o problema de substituir a restante metade da energia derivada dos combustíveis fósseis. Todas as formas de biocombustível actualmente em experiência, incluindo a colza, várias nozes, algas, milho e beterraba precisam de terras. O cálculo para satisfazer apenas metade da procura de transporte rodoviário do Reino Unido em termos de diesel e gasolina, mostra que seria necessário o uso exclusivo de 11,3 milhões de hectares, ou seja, quase 87 por cento da área total do país, representando muito mais que todas as terras agrícolas disponíveis, não incluindo as necessidades de transporte não rodoviário, a produção industrial e de plásticos, máquinas agrícolas e combustível para aviação e também, não tendo em conta o aumento da procura à medida que a população cresce. Ainda que se possa defender a construção de várias dezenas de centrais nucleares, mesmo que fosse politicamente e ambientalmente aceitável, seria apenas uma solução temporária. As reservas mundiais de urânio são cem vezes menores que o consumo mundial anual, e à medida que o carvão, gás e o petróleo diminuem, a probabilidade é da sua procura aumentar drasticamente, mas que não ultrapassará o petróleo por muitas décadas. Assim, a longo prazo, o futuro sustentável não só requer níveis astronomicamente elevados de investimento em electricidade a partir de fontes renováveis, mas também uma quantidade incrivelmente grande de terras agrícolas a serem dedicadas à produção de biodiesel, bioetanol ou algum outro combustível novo, criando uma tensão entre a produção de alimentos e combustíveis, que já é politicamente explosiva em alguns países duramente pressionados. O crescimento da população e a consequente necessidade de construir cada vez mais habitações, contribuem para essa competição por terra. As cidades, vilas, aldeias e infra-estrutura urbana representam 10,6 por cento da superfície do Reino Unido. Os bosques, orlas costeiras, dunas e estuários, lagos de água doce, rios, montanhas, e charnecas representam mais 15,9 por cento da superfície do país. Os restantes 73,5 por cento são terras agrícolas, existindo por consequência muito espaço para a construção de novas habitações. No entanto, actualmente, todas as terras agrícolas produzem apenas cerca de 59 por cento das necessidades alimentares totais dos ingleses, ou seja são apenas 72 por cento auto-suficientes, para os alimentos que são vendidos no seu mercado interno. Isso significa que até mesmo as colheitas que tiveram em abundância, como o trigo, cevada, aveia, sementes de linho e colza, não são produzidas em quantidades que permitam reduzir a produção. Tiveram um excedente de trigo em 2008, colhendo 10 por cento a mais do que necessitavam. O inverso aconteceu em 2012, pois tiveram uma colheita pobre, tendo importado mais do que exportaram. O Reino Unido não é auto-suficiente em carne e construir em terras agrícolas, pode fornecer telhados para as pessoas, mas não vai ajudá-las a alimentarem-se a longo prazo. Os que discordam sempre poderiam argumentar que construir habitações ajudaria a alimentá-los, criando rendimento que permitiria comprar excedentes de outros países. Tal ideia só pode ser uma estratégia de curto prazo, pois sempre que uma parcela de terra é usada para habitação, deixa de ser produtiva para alimentos ou combustível. Se supusermos que se tinha de entregar uma pequena porção da terra agrícola para ser desenvolvida como habitação todos os anos, em um montante equivalente ao aumento da população actual, e considerando que a terreno cultivado valia cerca de vinte mil libras por hectare, e que a terreno para construção valia um milhão de libras ou mais por hectare, dependendo do local, o balanço patrimonial é assim melhorado em novecentas e oitenta mil libras por hectare de terra de cultivo, e este dinheiro extra nutre a economia, apoiando empregos e aumentando lucros. Agora, suponhamos que os ingleses continuam com tal prática até ao final do século. A taxa actual de crescimento da população é de 0,76 por cento por ano e quase duplicará em 2100, atingindo cerca de cento e quatro milhões de pessoas e prover habitações, postos de trabalho e infra-estrutura para mais cinquenta milhões de pessoas exigiria que cerca de 6,8 por cento do país fosse desenvolvido, dependendo do uso que puderem dar aos locais previamente desenvolvidos, o que representa 9 por cento das terras agrícolas produtivas no Reino Unido, sugerindo que a produção doméstica total seria 9 por cento menos do que os níveis actuais, a menos que os terrenos restantes fossem cultivados de forma mais intensiva. Mas esses terrenos de cultivo teriam que alimentar um número significativamente maior de bocas e ao invés de satisfazer 72 por cento das necessidades alimentares domésticas, as terras agrícolas reduzidas só poderiam alimentar 33 por cento. Os ingleses seriam dependentes de alimentos de origem estrangeira. E aí reside o problema, pois dois terços das nações do mundo têm populações a crescer mais rapidamente que o Reino Unido, pois a média mundial actual é de 1,2 por cento anual. Todos estes países estão ocupados a transformar terras agrícolas em habitações para venda, afastando gradualmente a sua capacidade de produzir alimentos suficientes para as próprias populações, muito menos criando excedente necessário para a exportação. O volume total de culturas de base oferecidas para venda nos mercados internacionais atingirá um máximo em algum momento e, em seguida, começará a diminuir rapidamente. Os preços irão subir em todo o mundo e, inevitavelmente, menos pessoas serão capazes de os comprar. As organizações de ajuda internacional e instituições de caridade serão pressionadas a não gastar o seu dinheiro alimentando vítimas da fome no exterior, mas a aliviar a pobreza nos seus países. Além disso, o modelo actual não leva em consideração as enormes quantidades de terra necessárias para a criação de electricidade e produção de biocombustíveis, e sem grandes extensões de terra consagradas a essas formas de energia, não haverá cultivo, e nenhum progresso em direcção a um futuro sustentável. A situação imaginada para o Reino Unido poderá bem acontecer em apenas oitenta e três anos.
João Paulo Cotrim PolíticaSubidas Horta Seca, 22 Fevereiro [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]inda Helder, claro, que há muito para digerir no seu mais recente, Camões e outros contemporâneos (Presença). Ninguém como ele, justamente, fez de Camões meu contemporâneo. Puxou dos altares mais ou menos laicos, sacudiu-lhe o pó por desfastio, e, na vez de lhe puxar lustro, leu-o sem o retirar do seu tempo. Percebeu, então, que o poeta havia sido pioneiro do entendimento do corpo como instrumento de conhecimento da natureza das coisas, e com isso se arrogava o direito à felicidade na terra, para já, sem se desfazer da possibilidade de a repetir nos céus. Além dessa humanidade toda feita de malandragem, muito mais descobriu embarcando com ele, por exemplo que «O seu poema havia sido afinal uma viagem através de dúvidas em relação ao passado, de desespero em relação ao presente e de incerteza em relação ao futuro. Nós somos esse futuro.» Vai ao osso, este «Luso, filho de Baco», na interpretação sempre deleitosa, mas também na conclusão desgostosa. «Fazendo jus aos avisos de Sá de Miranda e de Camões, as riquezas das colónias foram servindo, ao longo dos séculos, para sustentar a oligarquia portuguesa, e por isso pouco serviram para o desenvolvimento económico e social da nação portuguesa.» Horta Seca, 22 Fevereiro Auto-retratos, de Paulo José Miranda, foi incluído na pequena lista dos candidatos ao grande prémio das Correntes d’Escritas, que distingue o melhor livro de poesia dos últimos dois anos. Os prémios literários tornaram-se, por isso, tema da minha agenda. E temo que assim continue, em chegando ao festival. Não acredito na fórmula, que pouco diz da real qualidade, que depende de tantas variáveis quanto combinações no euromilhões, que gera mais intrigas que telenovela mexicana, que excita bastidores e desperta os podres poderes. Está por fazer estudo aprofundado que, excluído o não despiciendo cifrão, me diga em que serviu ao labor literário do autor laureado. Reforço de auto-estima? Meia hora de visibilidade? Por dever de função, pode ganhar-se mais quatro ou cinco leitores. Talvez. Na arquitectura das convenções percebe-se que pode vir a ser ora porta, ora varanda, aqui parede falsa e ali escada. Fica por saber que construir: albergue espanhol ou casa de repouso? Coube em sorte Armando Silva Carvalho, parecendo confirmar por aqui a tendência de premiar mais a obra completa, que o volume solto. Antes assim. Podia ser pior, muito pior. Correntes d’Escritas, Póvoa do Varzim, 23 Fevereiro Sísifo fecha a trilogia e empresta-lhe o nome. Depois da paixão, em Gnaisse, e da perda, em Por Mão Própria, somos chamados à iniciação com Petrarca a marcar as respirações e tendo Camus por companheiro. Nada mais, nada menos. Luís Carmelo atinge aqui um cume. Logo no horizonte se apresentará montanha maior, mas este desafio foi domado. Para além do caleidoscópio da narrativa – um achado, este modo de organizar o que se vai contando desfazendo as coincidências, iluminando perspectivas ao infinito – as personagens possuem cativante densidade e as rochas em que sustentamos os passos da subida são de prosa poética brilhando com grande intensidade. Esta semana, que acompanhei as suas ansiedades em variados momentos, percebi o que sabia. A vista que conta alcança mais escalando o monte Carmelo, e basta relembrar o seu Genealogias da Cultura, para tornar cristalino o que digo. O Pedro Teixeira Neves, ao passar-lhe a palavra, aqui na mesa, disse que ainda não tinha a atenção que merecia. Alguma ganhou ao responder ao mote «se as torturarmos as palavras acabarão por confessar» com uma metáfora que sobrevoou o Cine-Garrett cheio: um dos mais belos objectos inventados pelo homem é o boomerang, que constrói espaço com velocidade e movimentos sobre si a partir de uma dinâmica entre dois pontos. Para o mano Luís, que explicou com a sua característica dança de braços (ver foto), os textos que foram desenhando nos ares a tradição de que somos feitos, resultam da dinâmica entre a revelação e a confissão. Tocar o alto e experimentar o íntimo, que mais interessa? Atlântico, 24 Fevereiro Para a Isabel, poema breve por acabar. «Palma sobre palma/estendi-te a mão/para que não estivéssemos sós/ao descobrir na sabedoria/do crepúsculo uma quinta/estação pós-primavera//a das reparações» Correntes d’Escritas, Póvoa do Varzim, 24 Fevereiro Com tanta palavra atirada ao ar, o chão dos festivais literários muda com os dias consoante o lento desfiar dos oradores. Pode ser tapete, conforto baço que abafa o som dos passos, onde só o pó contém memória de vida. Pode ser feito de berlindes, obrigando-nos a esforços compassados para não cair em tentação. Algumas palavras, de tão leves, desfazem-se no ar com o som das palmas. Outras são vistas sobrevoando cabeças em busca de memórias que as conservem. Também as há pesadas, das que, ao cair e se não nos desviarmos, nos pisam com estrondo os calos, nos marcam com nódoas e arranhões. Vai sendo raro, que a cultura do presente pede ar condicionado, maneiras de salão, o refresco mentolado do chiste. Brita ou areia, acontece por vezes. De entre todos, abomino o chão movediço, pegajoso da babugem do diz que disse, da quotidiana telenovela que mastiga cada vocábulo em asco morno. De súbito, o relâmpago. Alguém diz que a literatura se faz, não para reproduzir o mundo, mas para o acrescentar. Em luta. «Literatura – a poesia – é uma arte que se move por uma rebelião contra as palavras, num perpétuo braço de ferro contra elas. As palavras, amiúde, não seduzem o poeta: atacam-no, ludibriam-no. E ao escritor cabe esta incomodidade, esta raiva, por ter de escrever com as palavras, gastas, dos outros, não para dizer o mundo – para isso basta-nos uma mão cheia de enredos de dicionário –, mas para o construir pedra a pedra». Rita Taborda Duarte deu-me chão. E se ando precisado dele…
Julie Oyang PolíticaA mulher chinesa e o seu corpo [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] semana passada a Victoria’s Secret inaugurou uma loja de primeira linha em Xangai, o que nos leva a concluir que as chinesas dos nossos dias estão interessadas em comprar soutiens ocidentais e excitadas com a ideia. As modelos da marca, as Victoria’s angels, gritaram nihao no anúncio de apresentação, o que do ponto de vista da cadeia americana, ajudava a criar empatia com as novas consumidoras do gigantesco mercado chinês. Esta ocasião acordou em mim a vontade de investigar a história do corpo feminino na China. A partir do início do séc. XX, jovens estudantes que regressavam do ocidente e do Japão começaram a trazer para casa um conceito novo; o corpo como objecto artístico. Desde essa altura a arte corporal/nudez conheceu cerca de 100 anos de altos e baixos. Em 1917, a primeira mulher modelo começou a trabalhar numa classe de artes em Xangai. Cerca de dez anos mais tarde, em 1926, um grande senhor da guerra, o General Sun Chuanfang tornou-se governador de Xangai. O General Sun deu início a uma campanha contra o uso de modelos nus nas Escolas de Arte. Classificou o professor Liu Haisu de “traidor da arte” e os nus nas salas de aula foram proibidos. Um dos conselheiros de Sun explicou-lhe que no Ocidente era comum existirem modelos nas escolas de arte e que talvez fosse melhor não dar grande importância ao assunto, ou acabaria por dar mais um motivo aos ocidentais para se rirem do atraso da China. Sun recuou e apenas multou Liu por “prejudicar mulheres e homens chineses”. E assim começou a interminável luta entre a intervenção estatal e a liberdade de expressão do “corpo”. Depois da fundação da República Popular da China em 1949, o uso de modelos humanos nas aulas de arte era rigorosamente controlado pelo Governo Central. Foi só em 1965 que o Presidente Mao assinou uma autorização oficial que permitiu a presença de modelos nas academias de arte, afirmando que “o uso de modelos nus é cientifico”. Esta tomada de posição de Mao foi altamente influenciada pela sua mulher Jiang Qing, cujo papel como “mentora das artes” tem sido por sistema tristemente menosprezado. No entanto, a assinatura oficial do Presidente não trouxe mudanças significativas à mentalidade feudal que dominava a China há milhares de anos. Os anos 80 deram as boas vindas ao verdadeiro renascimento do Nu Feminino na China. A política de reformas e de abertura criou um ambiente social mais descontraído; a China e os chineses passaram por mudanças tão rápidas quanto inconcebíveis. Surpreendentemente, a sociedade chinesa demonstrou estar pronta para dar o salto para o futuro e para acabar para sempre com certas restrições, como as que envolviam o corpo feminino e a nudez como sujeito de interesse cultural e artístico e passível de ser comercializado. E, desde então, o corpo da mulher chinesa passou a ser o campo de batalha entre os valores ancestrais, que frequentemente se materializam a partir da voz do regime, e o capitalismo. Ambos vão lutando entre si e tomando o poder alternadamente. A mulher chinesa moderna é governada por dois papás que, por razões não inteiramente altruístas, consideram a filha uma coisinha preciosa, mas que estão dispostos a sacrificá-la em qualquer altura, sempre em nome do amor. Destaque A mulher chinesa moderna é governada por dois papás que, por razões não inteiramente altruístas, consideram a filha uma coisinha preciosa, mas que estão dispostos a sacrificá-la em qualquer altura, sempre em nome do amor
Hoje Macau EventosCasa Garden acolhe exposição de João Palla [vc_row][vc_column][vc_column_text] Casa Garden [dropcap style=’circle’]”T[/dropcap]racing Liners” foca os traços enquanto parte do espaço circundante e como objecto plástico. É assim um resumo possível para a exposição do arquitecto João Palla, inaugurada na próxima sexta-feira, às 18h30, na Casa Garden. “Neste trabalho os traços são entendidos enquanto novas espacialidades onde se pretende atribuir um valor ao acto do delinear e um sublimar enquanto objecto plástico”, lê-se na nota de imprensa. Para João Palla, “o desenho de uma passadeira é executado por linhas que são projectadas no pavimento, um pré-traçado para o posterior preenchimento com aplicação de tinta”. Estes traçados que apareceram nos Estados Unidos há cem anos mantêm os mesmos métodos de execução até aos dias de hoje e sofrerem raras alterações. Esta invariabilidade de uma técnica, descrita como “quase artesanal”, conflui “num diálogo entre o desenho, a memória e a sua materialidade.” Por outro lado, “a não uniformidade de regras entre regiões do planeta resulta em situações sui generis muito diferentes”. São os traços feios pelos seus desenhadores que João Palla vai apresentar de forma multidisciplinar, numa “relação entre pré-traçado e pintura final”.[/vc_column_text][vc_cta h2=”João Palla” h2_font_container=”font_size:33px|color:%23ffffff” h2_google_fonts=”font_family:Oswald%3A300%2Cregular%2C700|font_style:300%20light%20regular%3A300%3Anormal” shape=”square” style=”flat” color=”peacoc” use_custom_fonts_h2=”true”]JOÃO PALLA licenciou-se pela Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, tendo passado pelo Instituto Universitário de Arquitectura de Veneza. Colaborou com o arquitecto Manuel Vicente em Macau e Lisboa entre 1990 e 1997. Como bolseiro da Fundação Oriente completou uma tese de investigação intitulada ‘Arquitectura de Bambu em Macau’. Em 2000, é um dos membros fundadores da Associação dos Arquitectos Sem Fronteiras Portugal. Completou o Mestrado em Design e Cultura Visual no IADE e o Doutoramento em Ciências da Arte na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Ensina no IADE desde 1999 e dedica-se à prática profissional enquanto arquitecto, fazendo incursões pelo campo das artes plásticas expondo ocasionalmente.[/vc_cta][/vc_column][/vc_row]
Sofia Margarida Mota Eventos MancheteMúsica | Êxitos intemporais em estreia local São três os protagonistas do espectáculo “Three Phantoms” que está, já a partir de sexta-feira, no Parisien Theater. A ideia é interpretar alguns dos mais famosos temas do teatro musical de Nova Iorque e Londres [dropcap style=’circle’]É[/dropcap] a estreia asiática da produção “Three Phantoms”, um teatro musical que traz ao palco do Parisien Theater canções dos mais conhecidos musicais interpretados na Brodway e na West End. São muitas as participações na produção, mas o coração do espectáculo centra-se nos “Three Phantoms” que integram o inglês Earl Carpenter, o irlandês David Shannon e, da Escócia, Kieran Brown. Os protagonistas têm em comum a participação no conhecido Fantasma da Ópera de Andrew Lloyd Wabber e apostam, agora, numa produção própria em parceria com a Ginger Boys. A primeira vez na Ásia reúne muitas expectativas. “Estamos muito entusiasmados com esta estreia no continente asiático. Não é só um teatro musical e temos algumas surpresas para o público”, disseram ontem num encontro com a comunicação social. Sem adiantarem o teor da surpresa, sublinharam que “o público pode esperar um repertório com temas dos mais relevantes espectáculos da Broadway de Nova Iorque e da West End londrina, em que os destaques vão para canções do Fantasma da Ópera, Cats, Saturday Nignt Fever e Les Mirerables.” Da mostra apresentada ontem aos jornalistas, a promessa será cumprida entre oscilações entre momentos de calma e de frenesim. Formato a nu A compilação de peças conhecidas num só espectáculo podia ser arriscada, mas acabou por se tornar “uma ideia muito boa e tornar a apresentação mais relaxada”. Comparando, por exemplo, com o Fantasma da Ópera, a preferência dos protagonistas vai, sem dúvida para este. “Aqui temos oportunidade de cantar diferentes géneros musicais e, artisticamente, andamos entre extremos, o que torna o próprio teatro mais interessante. Não usamos máscaras ou maquilhagem e é tudo centrado na componente musical”, explicaram. Se, por um lado, o formato actual é mais aliciante, por outro é um desafio para os intérpretes, por ser “mais íntimo e assustador, mostramo-nos mais do que se estivermos a interpretar uma personagem”, explica o trio. O espectáculo conta ainda com uma componente coreográfica que, de acordo com “os fantasmas”, confere uma dinâmica diferente e mais apelativa. “Transforma o espectáculo numa viagem maravilhosa em que não há apenas pessoas paradas a cantar canções.” Da chegada a Macau mencionam o contraste e a diferença que encontraram num território tão pequeno. “Macau tem tanta variedade de estilos, temos este local [Parisien], e temos a influência portuguesa e toda uma outra Macau na península”, remataram.
Hoje Macau China / ÁsiaTaiwan assinala 70.º aniversário de massacre Taiwan assinalou ontem o 70.º aniversário da sangrenta repressão de protestos contra o governo, numa altura de renovada tensão entre Pequim e Taipé. [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s protestos, que começaram a 28 de Fevereiro de 1947, foram dirigidos contra a administração corrupta do Partido Nacionalista da China, de Chiang Kai-shek. Tropas governamentais abriram fogo sobre manifestantes que protestavam pacificamente contra a morte de civis em confrontos com a polícia na sequência do espancamento de uma vendedora de cigarros. Entre 18.000 e 28.000 pessoas terão morrido no incidente, ocorrido entre a derrota dos japoneses que ocuparam Taiwan até 1945 e a retirada para a ilha das forças nacionalistas, de Chiang kai-shek, que na altura controlavam ainda a China. A China considera a revolta popular parte da luta global que levou à vitória comunista em 1949, enquanto muitos taiwaneses a vê como uma reacção contra as tentativas da China para governar a ilha sem o consentimento da sua população nativa. Suprimidos sob o governo nacionalista, a revolta tornou-se um ponto aglutinador para os taiwaneses que dizem que a ilha e a China são nações separadas. Achas para a fogueira As comemorações deste ano são particularmente especiais, porque o governo está a preparar uma lei que poderá rebaptizar um monumento histórico no centro da capital, Taipé, dedicado a Chiang kai-shek e remover a sua estátua do local. A administração independentista de Taiwan, liderada pela Presidente Tsai Ing-wen, também está a revelar todos os documentos governamentais secretos sobre o incidente. O Kuomintang, que Chiang dirigia quando foi derrubado pelo Partido Comunista Chinês (PCC) de Mao Tse Tung que, nesse ano, fundou a República Popular da China levando Chiang Kai-shek a refugiar-se em Taiwan, que liderou sob lei marcial até à sua morte em 1975. O então governo nacionalista pediu desculpa às vítimas do massacre em 1995, mas movimenta-se para excisar a memória de Chiang que se manteve intacta sob a administração do anterior Presidente nacionalista Ma Ying-jeou, que deixou a liderança de Taiwan no ano passado.
Hoje Macau China / ÁsiaEncerrado sistema que fez sair sete mil milhões de euros para fora do país [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] China anunciou ontem ter encerrado um sistema que transferiu ilegalmente 6,8 mil milhões de euros para fora do país, numa altura em que Pequim tenta travar a fuga de capitais. Em comunicado, a Administração Estatal de Divisas da China anunciou ter investigado seis empresas com sede em Shenzhen, no sul do país. Outras firmas terão usado documentos falsos ou falsificado compras ao exterior como forma de transferir dinheiro para fora do país, revelou o regulador. Entre os métodos utilizados consta ainda a transferência de grandes montantes através de várias pequenas transferências, visando despistar as autoridades. O regulador chinês disse que este ano vai “fortalecer a supervisão do mercado de troca de divisas e atacar seriamente as violações das regras do câmbio, como forma de proteger a balança de pagamentos da China com o exterior”. “Ao mesmo tempo, vamos aumentar a transparência das políticas e promover a abertura dos mercados financeiros ao exterior”, acrescentou. Ser racional No ano passado, o aumento do investimento chinês além-fronteiras, procurando melhores retornos, levou Pequim a criticar o que designa de investimento “irracional” e a adoptar uma série de restrições à transferência de dinheiro para o exterior, face à fuga de capitais, abrandamento do crescimento económico e queda do valor do yuan. Em Portugal, o país asiático tornou-se, nos últimos anos, um dos principais investidores, comprando participações nas áreas da energia, seguros, saúde e banca. Em Janeiro passado, no entanto, o Banco de Portugal escolheu o fundo norte-americano Lone Star para negociar a compra do Novo Banco, em detrimento do fundo chinês China Minsheng Financial Holding. Apesar de ter a melhor proposta financeira, o Minsheng não apresentou provas de que conseguiria pagar o montante oferecido, devido às restrições nas transferências de divisas para fora da China. As reservas cambiais do país asiático, as maiores do mundo, caíram consecutivamente nos últimos sete meses, à medida que o banco central chinês gastou entre 40.000 e 60.000 milhões de dólares para aumentar o valor da moeda chinesa, o yuan. Em janeiro, as reservas chinesas caíram para o valor mais baixo em seis anos, ao atingir 2,99 biliões de dólares (2,82 biliões de euros), uma queda de 992 mil milhões de dólares (937 mil milhões de euros), comparativamente ao valor máximo de 3,99 biliões de dólares, atingido em unho de 2014.
Hoje Macau China / ÁsiaÁsia tem de gastar 26 biliões de dólares em infra-estruturas até 2030 [dropcap style=’circle’]A[/dropcap]s nações asiáticas têm de gastar 26 biliões de dólares em infra-estruturas até 2030 para combater a pobreza, os efeitos das alterações climáticas e impulsionar o crescimento económico, aponta um relatório do Banco Asiático de Desenvolvimento (BAD) ontem divulgado. No seu relatório apresentado ontem em Hong Kong, o BAD, instituição com sede em Manila, afirma que os governos de alguns dos países mais pobres do mundo que devem investir em quase todas as áreas, desde transportes, a telecomunicações, passando pelo saneamento e fornecimento de electricidade e de água. Os especialistas do BAD instam os legisladores da Ásia a duplicar a actual despesa em infra-estruturas, que se situa aproximadamente em 881.000 milhões de dólares por ano. “A procura de infra-estruturas ao longo da Ásia e no Pacífico excede em muito a actual oferta”, afirmou o presidente do BAD, Takehiko Nakao, em comunicado. Em falta A Ásia é uma das regiões economicamente mais dinâmicas do planeta, mas também é ‘casa’ de 400 milhões de pessoas que vivem sem electricidade, de 300 milhões que carecem de água potável e de 1.500 milhões que não têm acesso a saneamento básico, segundo os dados do BAD. Além disso, muitos países precisam de portos, caminhos-de-ferro e estradas adequadas que permitir ligar os seus territórios de forma eficiente, observa o BAD no relatório. Em concreto, o banco estima que, até 2030, nos países asiáticos em desenvolvimento falta investir 14,7 biliões de dólares em electricidade, 8,4 biliões em transportes, 2,3 biliões em telecomunicações e 0,8 biliões em instalações sanitárias. Os 1,7 biliões por ano que o BAD aconselha que sejam investidos até 2030 no seu mais recente relatório representam mais do dobro do que o calculado no anterior relatório do tipo que elaborou, em 2009, para o período 2010-2020, altura em que instava a investimentos na ordem dos 750.000 milhões de dólares por ano. Os especialistas da instituição atribuem essa diferença, por um lado, ao aumento do número de países incluídos no relatório – dado que o de 2009 referia 32 e o deste ano abarca todos os 45 países em desenvolvimento da Ásia e Pacífico e, por outro, ao aumento dos preços que se verificou desde então.
Hoje Macau SociedadeJustiça | TSI mantém arguidos ligados ao caso Ho Chio Meng em preventiva Foram detidos preventivamente porque se temia que combinassem o depoimento com Ho Chio Meng. Os dois empresários do caso do ex-procurador vão continuar na prisão, com a justiça a usar o mesmo argumento. A defesa não concorda e lembra que o julgamento já está a decorrer [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Tribunal de Segunda Instância (TSI) negou o pedido de libertação dos dois empresários envolvidos no processo conexo ao do ex-procurador, Ho Chio Meng. A notícia foi avançada à Rádio Macau pelo advogado Pedro Leal. Mak Im Tai e Wong Kuok Wuai estão em prisão preventiva há um ano. São os únicos dos nove arguidos deste caso que se encontram presos: quatro estão a monte e três aguardam pelo fim do julgamento em liberdade. No recurso contra a prisão preventiva, Pedro Leal alegou violação do princípio da igualdade e defendeu que deixou de haver motivos para a medida de coacção continuar a ser aplicada. Os dois empresários ficaram em prisão preventiva por, alegadamente, terem tentado combinar o depoimento com Ho Chio Meng, durante a fase de inquérito. Ora, o ex-procurador encontra-se também ele detido preventivamente. Com o processo já em julgamento, o TSI entende que a prisão continua a justificar-se, ainda com o argumento da manutenção da prova. Pedro Leal discorda, dizendo que se trata de “uma falsa questão, porque a prova está a ser feita em audiência de julgamento”. “[Os dois arguidos] estão a produzir a prova de acordo com as questões que lhes estão a ser colocadas. Cada um está a ouvir o que o outro diz. Se a ideia fosse impedir que um repetisse o que o outro disse, não estariam a prestar declarações em frente um do outro”, observa. “Além do mais, eu defendo os dois – se for essa a questão, posso conciliar a prova dos dois. Mas não há que conciliar: os factos estão ali; eles têm de responder ao que é perguntado pelo tribunal. A prova está lá toda. Se não está, não deviam ter sido acusados”, acrescentou à emissora. Voto vencido A decisão do TSI não foi unânime, sendo o voto de vencido do juiz Dias Azedo. A declaração foi, no entanto, escrita à mão. Pedro Leal aguarda pela informatização da sentença para perceber o conteúdo. O advogado deverá avançar com novo pedido de libertação quando começarem a ser ouvidas as testemunhas. “Sempre que entender que a prisão preventiva não se justifica, vou requerer. A partir do momento em que tenham prestado declarações em relação à matéria que consta da acusação, já não há que ter receio – a não ser que se entenda que, por estarem em liberdade, poderão pressionar as testemunhas. É uma situação de que nunca ouvi falar. Mas tudo é possível”, diz Pedro Leal. O tribunal está ainda a ouvir os arguidos sobre os milhares de factos que constam da acusação. Mulher de Ho Chio Meng apresenta novo atestado A mulher do antigo procurador apresentou novo atestado médico para justificar a ausência em tribunal. Apesar de se encontrar em Macau, Chao Sio Fu está a ser julgada à revelia desde que o julgamento do processo conexo ao de Ho Chio Meng começou, a 17 de Fevereiro, uma vez que nunca apareceu na sala de audiências. De acordo com a Rádio Macau, que está a acompanhar o julgamento no Tribunal Judicial de Base, a arguida tem vindo a justificar as faltas com a necessidade de dar assistência a um dos filhos, que está a receber tratamento hospitalar. Havia a expectativa de que comparecesse ontem, mas de acordo com advogada da arguida, foi marcada mais uma consulta. Chao Sio Fu está acusada de dois crimes de prestação de falsas declarações e um crime de riqueza injustificada. O TJB continuou a ouvir o ex-chefe de Gabinete de Ho Chio Meng. António Lai foi confrontado com uma série de contratos referentes à compra e manutenção de telecopiadoras no Ministério Público. Em alguns casos, não houve confirmação superior a autorizar a aquisição, o que não impediu que os serviços fossem contratados. António Lai mostrou-se surpreendido, admitiu que a situação era “estranha” e disse não conseguir explicar o que aconteceu, diz a emissora.
Hoje Macau SociedadeJogo | Galáctica subida de lucros [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] Galaxy Entertainment anunciou ontem lucros de 6,3 mil milhões de dólares de Hong Kong em 2016, mais 51 por cento face a 2015. As receitas de jogo do grupo cifraram-se em 52,8 mil milhões de dólares de Hong Kong, mais quatro por cento em termos anuais homólogos, segundo o comunicado da empresa. O EBITDA ajustado – lucros antes de impostos, amortizações e depreciações – aumentou 18 por cento para 10,3 mil milhões de dólares de Hong Kong. “A médio e longo prazo temos uma perspectiva positiva sobre Macau e estamos confiantes de que Macau irá transformar-se num centro mundial de turismo e lazer, como previsto pelo Governo, e estamos satisfeitos por sermos capazes de o apoiar a sua visão de liderança”, afirmou o presidente do Galaxy Entertainment, Lui Che Woo. No último trimestre de 2016, as receitas de jogo do grupo aumentaram sete por cento em termos anuais para 13,3 mil milhões de dólares de Hong Kong, com as receitas do segmento de massas a aumentarem 15 por cento para 5,6 mil milhões de dólares de Hong Kong, e as receitas VIP a apresentarem um aumento de três por cento para 7,2 mil milhões de dólares de Hong Kong. A operadora prevê iniciar a construção da terceira e quarta fase da expansão do Galaxy Macau no final do primeiro trimestre ou início do segundo, com foco nas actividades extrajogo, e dirigidas principalmente para o sector MICE (reuniões, convenções e exposições), entretenimento e espaços para as famílias. No comunicado, a empresa remete para mais tarde detalhes sobre o resort integrado a construir em 2,7 quilómetros quadrados na Ilha da Montanha, um projecto que não contempla a componente de jogo. Além disso, refere que está considerar oportunidades nos mercados estrangeiros, incluindo o Japão. O grupo opera seis dos 38 casinos de Macau.
Hoje Macau SociedadeExportações | Comércio externo caiu em Janeiro [dropcap style=’circle’]O[/dropcap] comércio externo de mercadorias de Macau em Janeiro atingiu 7,53 mil milhões de patacas, registando uma queda de 2,6 por cento em termos anuais homólogos, indicam dados oficiais ontem divulgados. Segundo a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), Macau exportou bens avaliados em 971 milhões de patacas – menos 0,4 por cento face a Janeiro de 2016 – e importou mercadorias no valor de 6,56 mil milhões de patacas, menos 2,9 por cento face ao período homólogo do ano passado. Consequentemente, o défice da balança comercial de Janeiro alcançou 5,59 mil milhões de patacas, indicou a DSEC. Em termos de destino, verificou-se em Janeiro uma descida de 19,8 por cento nas exportações para a China, num total de 111 milhões de patacas, e uma ligeira subida para Hong Kong (1,4 por cento), para um total de 643 milhões de patacas. Em contrapartida, os bens vendidos para a União Europeia (22 milhões de patacas) e Estados Unidos (21 milhões de patacas) registaram aumentos de 21,6 por cento e 110,2 por cento, respectivamente. Já do lado das importações, registou-se uma descida de 13 por cento nas compras à China (2,33 mil milhões de patacas) e uma subida de 6,4 por cento nas aquisições à União Europeia (1,68 mil milhões de patacas).
Hoje Macau Manchete SociedadePIB | Fitch prevê crescimento de 2,5 por cento do PIB de Macau O Produto Interno Bruto a subir, o jogo em recuperação. Em 2017, o Cotai vai ter casinos novos, o que contribui para um cenário positivo. A Fitch acredita que, depois da pequena tempestade, regressou a bonança [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] agência de notação financeira Fitch prevê que o Produto Interno Bruto (PIB) de Macau cresça 2,5 por cento em termos reais este ano, apoiado pelo crescimento das receitas do jogo, depois da contracção de 2,1 por cento em 2016. “A economia de Macau está a começar a recuperar, com o PIB a expandir-se em 4,4 por cento em termos reais no terceiro trimestre de 2016 e sete por cento no quatro trimestre do ano passado. A grande contracção no primeiro semestre de 2016 deixou o crescimento real do PIB negativo em termos anuais, fixando-se em -2,1 por cento, mas a Fitch espera um crescimento de 2,5 por cento em 2017, apoiado pelas melhorias das receitas com a abertura de novos casinos”, refere o relatório divulgado esta semana. “Os dados sugerem que os segmentos dos clientes VIP e do mercado de massas registaram um crescimento positivo no quarto trimestre de 2016, aumentando a probabilidade de recuperação este ano”, acrescenta. No projecto de orçamento para 2017, o Executivo de Macau prevê que as receitas globais da Administração ascendam a 102,944 mil milhões de patacas, menos 0,29 por cento do que o previsto para 2016. Dentro dessas receitas globais esperadas em 2017, 80 mil milhões de patacas (mais de 9,2 mil milhões de euros) correspondem a impostos directos, o que traduz um aumento de 0,77 por cento em relação ao estimado para este ano. Para 2017, a Fitch prevê um excedente orçamental de cinco por cento do PIB, reflectindo as suas expectativas de um crescimento de aproximadamente seis por cento das receitas do sector do jogo. Nota igual A agência de notação mantém a sua avaliação de AA- à economia de Macau, com uma perspectiva estável, sustentando a sua avaliação no “quadro de políticas credíveis do território pelas finanças públicas e externas excepcionalmente fortes, que continuam a fortalecer-se apesar dos três anos consecutivos de contracção económica”. Por outro lado, refere que “a classificação é limitada dada a elevada volatilidade do PIB, elevada concentração no sector do jogo e turismo pelo interior da China”, assim como a susceptibilidade de Macau “às mudanças no ambiente político mais amplo da China”.
Hoje Macau SociedadeCrime | Rapaz acusado de coacção sexual a colega de 11 anos [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] Polícia Judiciária deteve um jovem de 17 anos, aluno de uma escola local, por alegada coacção sexual de uma menina de 11 anos, que frequenta o mesmo estabelecimento de ensino. A Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) já teve conhecimento do caso e assegura que vai dar o acompanhamento necessário aos alunos envolvidos. De acordo com Leong Vai Kei, chefe do Departamento de Ensino, a história ontem tornada pública não é um acontecimento isolado. “De vez em quando temos casos destes”, concede. “Mas o mais importante são os trabalhos de prevenção.” A responsável explicou que o apoio da DSEJ junto das escolas não se limita ao aconselhamento, garantindo que é feito um vasto trabalho de sensibilização para que os estudantes saibam viver em sociedade. “A maioria dos problemas tem que ver com a autodisciplina”, acrescentou Leong Vai Kei. “Queremos que saibam o que é correcto e o que não é, o que devem fazer, quais os comportamentos que devem ter perante os outros.” Em relação ao caso mais recente, a responsável contou que, mal os serviços souberam do que aconteceu, comunicaram com a escola. Os conselheiros da DSEJ iam entrar em contacto com a vítima e com a mãe, bem como com o rapaz de 17 anos. “A rapariga é muito corajosa. Quando foi atacada, gritou e o rapaz afastou-se. Falou com a mãe que, por sua vez, foi à polícia”, disse. “Se fosse tímida e não tivesse dito nada, este rapaz poderia ter feito mais. Estamos muito orgulhosos dela”, afirmou Leong Vai Kei. “Vamos também trabalhar com os alunos da mesma turma para que saibam que esta atitude não foi correcta.” Já em relação ao modo como jovens em idade escolar utilizam a Internet, e a possibilidade de partilha de dados pessoais a desconhecidos através de redes sociais e de programas de chat, a chefe de Departamento de Ensino frisou que o trabalho de sensibilização não deve ser feito apenas pelas escolas e pelo Governo. “A educação tem de ser dada também em casa, não é apenas na escola”, vincou.
João Luz SociedadeApoios | Comissão define estratégia contra a demência e cria Dia do Idoso Foi apresentada a estratégia dos serviços sociais de Macau para acudir às necessidades da população idosa. Em reunião presidida por Alexis Tam, foi definida a celebração do Dia do Idoso, assim como se adiantaram medidas no combate à demência [dropcap style=’circle’]O[/dropcap]s serviços sociais dedicaram ontem o dia às questões que afligem a terceira idade. As forma de lidar e detectar a demência, mais vagas em lares e a celebração do Dia do Idoso foram os principais destaques da primeira reunião do ano da Comissão para os Assuntos do Cidadão Sénior. Nos trabalhos presididos pelo secretário para os Assuntos Sociais e da Cultura foram elogiados os contributos dos cidadãos idosos para o que é, hoje em dia, a RAEM. Alexis Tam referiu que, pela via da colaboração, entre os vários departamentos competentes irá acelerar o processo de promoção e concretização do Plano Decenal (2016-2025) que pretende prestar apoio aos idosos. Para tal, será dada atenção especial aos funcionários dos serviços para lidarem adequadamente com cidadão mais velhos, em particular com aqueles que sofram de demência. Durante a apresentação, o chefe do Departamento de Solidariedade Social, Choi Sio Un, reforçou que “a sociedade deve divulgar mensagens de respeito e amor pelos idosos”. É nesse sentido que será criada uma nova celebração no território, o Dia do Idoso, que deverá ser comemorado “no nono dia do calendário chinês”, anunciou Choi Sio Un. A data foi escolhida por coincidir com o feriado em que é prestado o culto aos antepassados, o Chong Yeong, “uma data fácil de memorizar pelos chineses e em que as famílias terão disponibilidade” para passar algum tempo de qualidade com os parentes mais velhos. Na mesma linha, o chefe do Departamento de Solidariedade Social (DSS) insistiu que serão “promovidas actividades recreativas para divulgar na sociedade uma mensagem de respeito pela terceira idade”. Combater a demência A perda de memória e identidade é uma das mais tristes consequências do envelhecimento e um dos focos do plano decenal da RAEM. Logo, a demência é um dos problemas a atacar no futuro pelos serviços sociais. Foi anunciada a criação de dois centros de cuidado diurno e tratamento da doença degenerativa, assim como a fundação do Centro de Avaliação e Tratamento da Demência. Outra das novidades é a base de dados que revela a taxa de incidência da doença no território. Nesta matéria, Choi Sio Un informou que em Macau existem cerca de quatro mil idosos com demência, dos quais 1500 foram identificados através do rastreio. Estes testes procuram avaliar a capacidade de memória dos pacientes. Neste sentido, o chefe do DSS adiantou que não basta os casos das pessoas que, por sua iniciativa, se deslocam aos serviços para fazer o rastreio. “Vamos promover a comunicação com a comunidade de forma a envolver as famílias e capacitá-las para reconhecerem os sinais de demência”, esclareceu. O combate à doença também se vai fazer no plano jurídico, nomeadamente, com a criação do Regime Jurídico de Garantia de Direitos e Interesses dos Idosos. Além disso, durante a primeira reunião da Comissão para os Assuntos do Cidadão Sénior foi discutida a situação das infra-estruturas de apoio à população mais envelhecida de Macau. Neste capítulo, está prevista a criação de 700 a 800 novas vagas em lares de idosos, aumentando o número de camas nestas instituições para mais de duas mil. Entre o aumento de apoios prestados, está prevista o alargamento de 200 vagas para os serviços de cuidados diurnos e, igualmente, mais duas centenas para os serviços domiciliários.
Isabel Castro Manchete PolíticaAutonomização do crime de branqueamento de capitais é consensual O assunto levantou dúvidas, mas já estão resolvidas. A comissão da Assembleia Legislativa que está a estudar as alterações aos crimes de branqueamento de capitais e terrorismo concorda com o Governo. Em breve, a lavagem de dinheiro vai poder ser dissociada do crime que a precede [dropcap style=’circle’]A[/dropcap] 3.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa conta entrar em Abril na recta final da análise às alterações aos crimes de branqueamento de capitais e terrorismo. O diploma foi aprovado na generalidade em Novembro do ano passado, sendo que a principal parte do trabalho na especialidade está feita. Agora, as assessorias da AL e do Governo têm um mês para elaborarem um texto que vai servir de referência aos deputados na última fase da análise. Ontem, Governo e deputados resolveram a questão que mais dúvidas suscitou à comissão. “Chegámos a um consenso que vai no sentido de autonomizar os crimes de branqueamento de capitais e crimes precedentes”, explicou Cheang Chi Keong, o presidente da comissão. A legislação em vigor foi aprovada em 2006. “Na altura, os crimes precedentes não foram autonomizados. Mas, ao longo da execução da lei, verificou-se que a punição dos crimes precedentes dificulta o trabalho dos procedimentos judiciais”, contextualizou o deputado. Cheang Chi Keong acrescentou que há vários países e territórios que optaram por esta separação entre lavagem de dinheiro e crimes precedentes. “Vai encurtar o tempo na conclusão do processo”, apontou. O presidente da comissão disse ainda que há processos em tribunal que não tiveram sucesso, porque “o dinheiro não tinha sido obtido cá, mas fora do território”. É por isso que se propõe a autonomização dos dois crimes, “para acabar com uma lacuna”. As explicações do secretário A reunião desta terça-feira contou com a presença de Lionel Leong, secretário para a Economia e Finanças, que falou com os deputados sobre a intenção destas mudanças na legislação. De acordo com Cheang Chi Keong, o governante sublinhou a importância da manutenção de um ambiente económico saudável. Além disso, as alterações vão ao encontro das normas fixadas pelas organizações internacionais. “Nestes dez anos, a economia de Macau cresceu muito rapidamente, mas isso trouxe alguns riscos relativamente a aspectos como o branqueamento de capitais e o terrorismo”, continuou o deputado. “O Governo entende que há toda a necessidade de introduzir alterações a estas duas leis, para minimizar os riscos daí decorrentes.” O Executivo pretende ainda assegurar que Macau não entra nas listas negras da comunidade internacional por falta de legislação.
João Luz PolíticaCAEAL | Deputados com dúvidas e sugestões para as eleições No encontro entre a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa e os deputados houve mais questões e dúvidas do que, propriamente, sugestões. Entre a nova lei eleitoral e as questões levantadas serão encontradas as instruções para a campanha do próximo Verão [dropcap style=’circle’]D[/dropcap]urante uma hora, uma selecção de deputados da Assembleia Legislativa (AL) interrogaram a Comissão de Assuntos Eleitorais (CAEAL), de forma a contribuírem para a definição das instruções para as próximas eleições ao órgão legislativo. As maiores dúvidas dos tribunos prenderam-se com a forma como se podem proteger de calúnias ou de falsas notícias na comunicação social durante a campanha, assim como os sítios onde realizar eventos de propaganda política sem violar as regras estabelecidas na lei eleitoral. Depois do discurso do presidente da CAEAL a agradecer a presença dos deputados, a sessão arrancou com as dúvidas de Mak Soi Kun. O tribuno colocou em causa a regra das duas semanas para avisar a comissão da participação de candidatos em actividades que possam ser consideradas de campanha. Mak Soi Kun considera esta imposição injusta para as candidaturas e um entrave no “normal funcionamento das associações”. O deputado interrogou ainda os membros da CAEAL acerca da operacionalidade da lei eleitoral, achando-a pouco exequível. Pereira Coutinho elencou o seu exemplo pessoal quando, em plena campanha eleitoral, explodiu na comunicação social a alegação que teria assediado sexualmente uma mulher. “Estas falsas informações deviam ser proibidas, digo-o por experiência própria, ferem a reputação do candidato, mesmo que a justiça demonstre a sua inocência”, referiu. O deputado acrescentou ainda que a mera acusação mancha a reputação, algo que pode ser fatal numa campanha eleitoral. Leong Veng Chai e Ella Lei também se manifestaram contra as acções que comprometem a imagem dos candidatos. A representante dos Operários alertou ainda a CAEAL que “apresentar queixa às autoridades pode não resolver a situação”. Cartazes e rua Melinda Chan levantou questões em relação ao dia de reflexão, argumentando que em Hong Kong até se pode fazer campanha no próprio dia em que os eleitores vão às urnas. A deputada pediu esclarecimentos sobre as medidas que a CAEAL pretende tomar quanto a actos de campanha na Internet quando executados por pessoas fora da RAEM. Outra questão levantada por Melinda Chan prendeu-se com a licitude, ou não, do transporte que as associações facultam aos eleitores no dia do sufrágio. Quanto à participação em associações, Si Ka Lon alertou para o facto de que é frequente os candidatos serem presidentes honorários de várias associações envolvidas na campanha. A dúvida do deputado prende-se com a possibilidade da candidatura ser penalizada pela actividade de uma campanha na qual não esteve envolvida. “Macau tem milhares de associações, onde os candidatos têm graus honoríficos, não me parece que se a associação fizer uma actividade de campanha isso constitua conflito de interesses”, acrescentou. Si Ka Lon ainda interrogou se estas acções têm de ser comunicadas à comissão. Então e quando os cartazes são colocados por cidadãos sem ligação à candidatura? Esta foi uma interrogação transversal ao encontro dos deputados com a CAEAL. Song Pek Kei afirmou que nestas situações “é injusto que os candidatos sejam punidos”. Outra das preocupações dos deputados prendeu-se com a falta de clareza das regras quanto à necessidade de comunicar à comissão os locais de campanha. Neste capítulo, Pereira Coutinho exemplificou que se fizer campanha não pode precisar com exactidão onde vai passar. “Parece que os senhores não confiam nos candidatos porque, em princípio, todos vão participar imparcialmente e com justiça nas eleições”, comentou. No fundo, os deputados levantaram mais questões do que, propriamente, sugestões. O presidente da CAEAL, Tong Hio Fong, ainda interrompeu a sessão para esclarecer que esta era destinada apenas a recolher opiniões. Porém, um rol de perguntas é a consequência quando os jogadores têm dúvidas em relação às regras de um jogo no qual estão prestes a entrar.
Andreia Sofia Silva Manchete Reportagem SociedadeLai Chi Vun | As histórias de uma indústria que morreu Na pequena povoação de Lai Chi Vun, em Coloane, vivem-se dias de incerteza. Os rumores são muitos e a única certeza é a de que os estaleiros não podem ser deitados abaixo de um momento para o outro. Com a primeira fase da demolição prestes a arrancar, os moradores questionam a ausência de concurso público para esse processo e garantem que, sem os estaleiros, Lai Chi Vun perde a sua alma [dropcap style=’circle’]P[/dropcap]ara chegarmos ao lugar onde ainda cheira a mar é preciso descer umas escadas e andar no meio de casas construídas com folhas de zinco, onde os mais velhos descansam. Em Lai Chi Vun a história teima em manter-se viva através de velhas estruturas onde, outrora, foram construídas centenas de barcos por ano. Numa altura em que a primeira fase das demolições dos estaleiros de construção naval se prepara para arrancar, o HM foi conhecer as histórias de quem não quer apagar o passado. Há, pelo contrário, uma vontade de reconstruir um novo presente e futuro, com outras soluções. Para Lei Kam Seng, não resta hoje mais nada para fazer a não ser garantir a segurança dos estaleiros. Vai a casa num instante para mostrar, orgulhoso, a licença, encadernada a vermelho, que obteve para trabalhar na área. Era um adolescente quando começou uma vida de trabalho árduo. “Tenho 67 anos, mas ainda tenho o meu certificado. Já não se fazem licenças destas”, conta ao HM, enquanto mostra a sua juventude a preto e branco. O estaleiro onde trabalhou tantos anos é um dos que será demolido pelo Governo, situado logo no inicio da rua. “Há mais de 20 anos que não construo barcos, trabalhei durante 40 nesta indústria. Quando era jovem eram tempos muito bons, agora é mais duro. Estava a trabalhar, toda a minha família estava ligada a este negócio. Éramos quatro filhos e, graças à indústria da construção de barcos, conseguimos aguentar-nos.” Numa altura em que o jogo não dominava a economia, construir barcos era uma opção para muitas famílias. “Na altura esta era a indústria com melhor desenvolvimento. Quando era aprendiz, quando os barcos chegavam tínhamos de os pintar e reconstruir e pô-los de regresso ao mar. E podíamos fazer também barcos muito grandes. Só havia um casino nessa altura”, recorda Lei Kam Seng. Na pequena povoação, a agitação do dia-a-dia era muita. “A povoação foi criada para a construção dos barcos de pesca e para trazer os barcos do mar para terra [para reparações]. Cortavam-se grandes pedaços de madeira que depois eram trazidos para aqui. No tempo em que fui patrão havia muita gente a trabalhar aqui, e havia sempre alguém a fazer comida para nós”, contou Lei Kam Seng. João Pedro Ho, que mora uns metros mais à frente com a sua mulher, nunca construiu barcos mas, durante anos, esteve numa fábrica de materiais e produtos para este tipo de embarcações. Com oito ou nove anos lembra-se de ir com o pai para a vizinha aldeia de Ka-Ho, onde se faziam trabalhos de carpintaria. Desse tempo, só restam memórias. “Fazia tudo o que era necessário para os barcos. Agora estou reformado. Quando deixou de haver trabalho, reformámo-nos. Antes vivia em Macau. Comecei com 14 anos, até que tudo isto acabou”, disse. Durante a entrevista com o HM bebemos um chá verde enquanto olhamos para a frágil estrutura que permanece bem ao lado da sua casa. A mulher mostra-nos as cordas que eles próprios colocaram para segurar algumas estacas de madeira. “Há cerca de três ou quatro anos fiz queixa sobre a falta de segurança da estrutura, mas como ninguém se preocupou, decidimos colocar estas cordas como suporte.” Apesar da insegurança, João Pedro Ho não quer deixar o cantinho de uma vida. A mulher acrescenta de imediato que uma operação recente à perna, feita em Hong Kong, não o vai permitir mudar-se para outro lugar. “Disseram-nos para sair daqui, porque é perigoso [a demolição], mas se eu me mudar onde vou viver? Na rua? Não vou sair e vou ficar aqui a olhar para o que vão fazer. Vou prestar atenção.” Demolição por convite As notícias sobre o futuro da povoação e dos estaleiros chegam a Coloane a conta-gotas. Os jornais e as televisões ajudam a transmitir informações, mas muitos moradores assumem não fazer a mínima ideia do que se está a passar e do que está para vir. “A povoação foi criada para a construção dos barcos de pesca e para trazer os barcos do mar para terra [para reparações]. Cortavam-se grandes pedaços de madeira que depois eram trazidos para aqui.” LEI KAM SENG, ANTIGO CONSTRUTOR DE BARCOS Um dia, João Pedro Ho viu responsáveis de vários departamentos do Governo, como da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) e da Direcção dos Serviços para os Assuntos Marítimos e da Água (DSAMA), a inspeccionarem o estaleiro ao lado da sua casa. Como tinha dúvidas, resolveu intervir. “A maior parte das pessoas que vieram aqui não nos disse nada. Vinham aqui olhar para os estaleiros, então fui eu lá falar com eles. Não estão a ser transparentes. Naquele dia calhou eu estar aqui na rua e fui directamente falar com eles. Se não estivesse aqui a prestar atenção ninguém sabia o que se estava a passar”, explicou. Foi aí que João Pedro Ho soube que as demolições serão feitas através de um convite a uma empresa e não por concurso público. “Eles estavam a ver como iriam demolir a estrutura, e aí eu perguntei: ‘Vai haver concurso público?’ Disseram-me que não, que iria ser por convite directo, porque são necessários pelo menos três meses para preparar um concurso público, e os trabalhos têm de ser feitos antes que chegue a época dos tufões. Disseram-me que o processo seria assim para garantir a nossa segurança.” O HM tentou confirmar esta informação junto da DSAMA, bem como o nome da empresa que irá fazer a demolição, mas o organismo apenas referiu que todas as informações disponíveis constam nos comunicados de imprensa já divulgados, que não fazem nenhuma referência às informações pedidas. João Pedro Ho tirou fotografias aos rostos, guardou recortes de jornais. As dúvidas são partilhadas pela esposa e pela vizinha, que entretanto se junta à conversa. “É evidente que alguém vai fazer dinheiro com estas demolições. Se não fosse para fazer dinheiro, porque o fariam? Não há sequer concurso público para isto. Vai ser um construtor privado”, aponta. Também o antigo construtor de barcos Lei Kam Seng tem as suas queixas, que não são apenas dirigidas ao Governo. “Há muitas pessoas na associação [Associação dos Construtores de Barcos de Macau-Coloane-Taipa], mas esta deveria ser mais activa.” “A associação nunca falou connosco. Nunca foi feita uma consulta pública, nunca falaram com quem mora aqui. Não sabemos absolutamente nada. Vivemos aqui e continuamos a não saber nada”, acrescenta Lei Kam Seng. Nos diversos comunicados emitidos, a DSAMA afirma que muitos dos estaleiros não foram mantidos pelos próprios construtores dos barcos, declaração rejeitada por Lei Kam Seng. “Isso não é verdade. Deveriam deixar as pessoas investir e dar diferentes utilizações aos espaços. Se o Governo permitisse às pessoas investirem, então as pessoas iriam fazê-lo.” Este antigo construtor afirma que muitos dos que têm falado à comunicação social sobre este assunto já não fazem parte das primeiras gerações de construtores navais e que, por isso, não percebem a essência de Lai Chi Vun. “Só há uma ou outra pessoa que originalmente fez parte desta indústria, mas todos os outros são só empresários que não compreendem este lugar.” A China ganhou barcos Para João Pedro Ho, não foi só o jogo que arrastou consigo todas as outras indústrias. Os estaleiros localizados em Zhuhai, China, começaram a fabricar mais barato e com menos burocracias. “É uma pena que tudo isto tenha acabado. A partir de uma certa altura a China continuou com a sua indústria de construção de barcos. Não havia trabalho aqui, então muitos foram para a China para continuarem a sua carreira. Além de ser mais barato construir lá, o Governo de Macau manteve uma série de procedimentos que dificultavam a vinda dos barcos para aqui. Deixaram de aparecer, então não havia mais nada para fazer.” “Queria trazer os estudantes aqui para tirarem fotos e preservarem esta memória. Porque depois já não haverá nada, serão apenas terrenos.” KOU, PROFESSOR DE HISTÓRIA João Pedro Ho sabe que, actualmente, há pelo menos um estaleiro em Zhuhai onde ainda se constroem juncos de madeira. “Continuam a construir barcos em Zhuhai e há uma lista de espera. O Governo de Macau não ajuda nesse aspecto e também começou a aparecer muita sujidade no rio, muita areia. Antes o Governo não deu apoio, e antes de tantas mudanças ao nível dos solos, com as obras, era fácil mover os barcos aqui nesta zona.” O HM chegou a contactar uma das fábricas de construção de barcos na cidade chinesa, mas a promessa de retorno do contacto, com mais detalhes sobre a construção naval do lado de lá da fronteira, não chegou a concretizar-se. Por estes dias muitos têm aproveitado para visitar o local para verem de perto algo que, em breve, já não deverá existir. Foi o caso de um professor de História, de apelido Kou, que levou a sua turma a conhecer o lugar onde um dia se construíram barcos de madeira. “Este é um sítio com história e os estaleiros vão ser demolidos, então decidi vir aqui com os meus alunos”, contou ao HM, enquanto segurava um mapa que ele próprio fez da zona. “Queria trazer os estudantes aqui para tirarem fotos e preservarem esta memória. Porque depois já não haverá nada, serão apenas terrenos.” Kou é mais uma voz que está contra a decisão da Administração. “Gostava que os estaleiros fossem preservados para as próximas gerações. O Governo desenvolveu Macau e a Taipa, então poderia garantir a preservação de Coloane para as próximas gerações, mantendo um espaço verde.” João Pedro Ho não tem dúvidas. “Estas coisas devem ser mostradas às pessoas”. “A indústria de construção naval em Macau tem uma longa história, e se tudo for demolido vão destruir tudo e já não haverá mais nada”, frisa. O HM quis confirmar com a DSAMA a data certa para o arranque das primeiras demolições mas, até ao fecho desta edição, não foi obtida uma resposta. O porta-voz dos moradores de Lai Chi Vun, David Marques, acredita que os trabalhos poderão começar entre hoje ou amanhã, mas ontem à noite nenhum sinal de demolição pairava sobre a povoação. Lai Chi Vun | A história e as razões do fim da indústria Muito antes de haver jogo e ópio, houve juncos de madeira e um intenso comércio de pescas interno e além-mar. Houve cordoarias que chegaram até à Almeida Ribeiro. Hoje só resta o estaleiro de Lai Chi Vun para contar um pedaço da história da indústria naval em Macau, mas tudo começou há vários séculos. Para o investigador Luís Sá Cunha, a construção naval e as pescas constituíram um ponto fulcral da sociedade e da economia do território. “O jogo não faz parte do genoma de Macau, só a partir de certa altura. Em 2005 li uma notícia no jornal de que o último barco a ser construído nos estaleiros tinha sido lançado ao mar. Isso foi há pouco tempo! No final dos anos 90 estava tudo a funcionar”, contou ao HM. Para o investigador, o aparecimento dos casinos está longe de ser a única razão a apontar para o fim da indústria. “Não se conseguiram adaptar às inovações tecnológicas, e aí a culpa foi dos estaleiros. Porque toda a tradição chinesa vive de memória e de tradição de pai para filho, ou de mestre para discípulo. Todas as técnicas e sabedoria eram baseadas na madeira.” “Não estão a ser transparentes. Naquele dia calhou eu estar aqui na rua e fui directamente falar com eles. Se não estivesse aqui a prestar atenção ninguém sabia o que se estava a passar.” JOÃO PEDRO HO, MORADOR Luís Sá Cunha explica também que “a construção naval não tinha planos, era feita com uma grande improvisação”. “Poucos estaleiros conseguiram fazer a implementação dos motores nos barcos. Faziam tudo aqui e os motores eram montados em Hong Kong. Muitos estaleiros na Taipa e Coloane começaram a viver das reparações.” Depois de um período áureo da indústria, a partir dos finais da década de 90 tudo começa a acabar. Nessa altura havia 19 estaleiros em Macau que faziam 94 barcos por ano, sendo que nas ilhas existiam 16 estaleiros [os que ainda persistem], que faziam 150 barcos por ano. “Um número notável”, considera Luís Sá Cunha. Além do “conservadorismo” das técnicas, na zona de Lai Chi Vun começou a existir uma grande distância entre a terra e a água, o que dificultou o transporte e recolha de barcos. Mas o fim do comércio ultramarino também trouxe a crise a Lai Chi Vun. “A partir de certa altura, depois da II Guerra, houve a cessação da emigração chinesa, e já não havia exportações para os chineses ultramarinos. Houve a concorrência do comércio de Cantão. O comércio de Hong Kong, a seguir à II Guerra Mundial, teve uma emergência enorme, e começaram também eles a fabricar barcos, mais modernos.” Houve depois uma mudança da indústria para Zhuhai. “Os preços começaram a aumentar nesta zona e por isso é que foram todos para lá.” Uma construção “misteriosa” Os primeiros estaleiros começaram por aparecer na península e não nas ilhas, e já no século XVIII os mapas faziam essa referência. Os chamados “mandarins”, olheiros da China, chegaram a decretar que não se podia fazer barcos para estrangeiros. Ainda assim, “havia estaleiros que os mandarins não viam”. Por essa razão, Luís Sá Cunha defende que a “construção naval em Macau é um bocado misteriosa”. “Não houve durante a história muitos registos escritos sobre isso, mas também havia uma certa clandestinidade dos estaleiros. Estes sempre tiveram um estatuto e uma consciência de grande autonomia.” Isso acontecia pelo facto de os construtores navais dominarem uma técnica que, à época, era bastante desenvolvida. “Eram importantes, mas muitos dos serviços eram clandestinos.” A partir da década 60 do século XIX os estaleiros começam a desaparecer da península e a ir para as ilhas, devido aos planos de urbanização do governador Ferreira do Amaral. “Criou-se uma zona de epidemias, porque as aldeias não tinham qualquer higiene, as casas eram improvisadas, e as pessoas viviam em barcos que estavam sempre encostados uns aos outros. Albergava também ilegais e piratas, porque a polícia não ia lá. [Até que] entraram em vigor as novas políticas de urbanização de Macau, a partir dos anos 60 do século XIX até ao final do século.” Permaneceram as estâncias de madeira e alguns estaleiros na península, e quando Ferreira do Amaral mandou construir uma fortaleza e levar a polícia para Coloane, “os estaleiros começam a ser desviados” para as ilhas. Anos 30, época dourada Luís Sá Cunha não consegue apontar uma data concreta sobre o arranque da indústria de Lai Chi Vun, que já tinha alguns habitantes e piratas. Na década de 30 do século XX, começa a “época áurea” da indústria. “Dá-se um grande surto da construção naval em Taipa e Coloane, e um desenvolvimento da principal indústria extractiva de Macau, que era a pesca.” As emigrações dos chineses para países como a Austrália ou Estados Unidos dinamizaram o comércio e as exportações. “O peixe fresco não era o produto mais procurado, mas sim o peixe seco e as conservas.” Em 1937, “dá-se algo ainda mais importante, que dá mais força a Taipa e Coloane: passam a fazer-se ligações diárias de barcos a motor a óleo, e instala-se o telefone”. É então que, segundo o investigador, as ilhas se tornam ponto atractivo de turismo para as famílias de Macau. Nos anos 60, a península voltou a ter estaleiros junto à zona do Patane, “com melhores condições”, tendo chegado a existir um total de 40, fora dez cordoarias que se espalhavam pelas ruas. Preservar é preciso Para Luís Sá Cunha, a preservação dos estaleiros é importante para lembrar que, um dia, Macau teve uma vida socioeconómica intimamente ligada ao mar, que se traduz até pela toponímia das ruas. O investigador defende que poderia “haver um estaleiro a construir miniaturas que as pessoas poderiam comprar”. “E porque não estar lá a construir um barco, um junco pequeno, para andar nas águas com os turistas? Havia a necessidade de juntar isto tudo, a toponímia, fazer um percurso marítimo, um itinerário, com todos estes elementos e explicações”, conclui.
João Luz China / Ásia ManchetePerspectiva | Reunião entre Donald Trump e Xi Jinping à vista Os avanços e recuos nas relações entre Estados Unidos e China vão conhecer um novo episódio: o encontro, frente-a-frente, entre os dois líderes. Desde as primárias republicanas, Trump tem abalado a estabilidade diplomática entre as duas potências. Os líderes devem encontrar-se em Julho, à margem da cimeira do G20 de Hamburgo [dropcap style≠’circle’]V[/dropcap]isualize este número: 1,12 biliões de dólares. Damos uma ajuda, são 12 zeros. Esta é a soma no pano de fundo das relações sino-americanas. Trata-se da dúvida soberana norte-americana que Pequim detém, isto depois de vender grande parte desses títulos de dívida para fortalecer o yuan em tempo de desaceleração do crescimento económico. Os dados são da Secretaria do Tesouro, demonstrando que a China já não é a maior detentora de dívida americana, tendo sido ultrapassada pelo Japão. Esta pedra no sapato de Washington é um dos factores que deve ser tido em conta com a chegada de Donald Trump à Casa Branca. O homem que quer renegociar tudo, para que a América volte a ser grande, não tem parado de falar na China desde as primárias republicanas, quase sempre de forma pouco diplomática e descuidada. Pois bem, avista-se um encontro com Xi Jinping à margem da próxima cimeira do G20, a realizar-se em Hamburgo no próximo mês de Julho, de acordo com fontes citadas pelo South China Morning Post. Ao longo dos anos, Pequim tem financiado Washington com somas exorbitantes de dinheiro, naquilo que poderá ser o maior elefante na sala do mundo da economia política mundial. Usando outra analogia elefantina, quando Donald Trump entra na loja de porcelana da geopolítica, começa a partir a loiça toda. Nomeadamente, pondo em causa a política “uma só China”, no que diz respeito a Taiwan, mas também acusando Pequim de manipulação de moeda. Aliás, há dias, o magnata nova-iorquino rotulou os chineses de “campeões mundiais de manipulação cambial”, em declarações prestadas à Reuters. Esta alegação surge depois da Administração norte-americana ter tentando apaziguar as relações entre as duas maiores potenciais económicas mundiais. Em mais uma demonstração de incoerência, é de salientar que, escassas horas antes, o novo Secretário do Tesouro, Steven Mnuchin, afirmara que a Casa Branca não tinha planos para rotular a China como um país que manipula moeda. Frente-a-frente Também na questão de Taiwan, Trump voltou atrás na aproximação à histórica pedra no sapato da diplomacia chinesa. Depois de colocar em causa a política “uma só China” múltiplas vezes, numa chamada com Xi Jinping, o Presidente norte-americano inverteu marcha e garantiu continuar a política seguida por Washington na questão formosina. Na sequência da chamada, o Presidente chinês terá dito que “os dois países estão totalmente aptos a tornarem-se bons parceiros”, de acordo com a agência Xinhua. A maior constância de Donald Trump tem sido a inconstância. Nesse aspecto, torna-se urgente uma reunião entre os dois líderes, sem tweets incendiários pelo meio. “Pequim tem mantido contactos com a equipa de Trump sobre a possibilidade de uma reunião bilateral e Washington tem expressado opiniões semelhantes”, revela fonte citada pelo South China Morning Post. No entanto, a incerteza é um dos traços da administração Trump, que tem revelado grande cepticismo, mesmo algum desdém, em relação a reuniões multinacionais. O isolacionismo tem sido uma imagem de marca da permanente campanha da nova Administração, profundamente marcada pela presença próxima de Steve Bannon. O vice-presidente do Instituto de Relações Internacionais Chinesas, Yuan Peng, afirmou ao South China Morning Post que um encontro entre os líderes é essencial para mudar o tom e o rumo da relação entre Pequim e Washington. O analista disse mesmo “tratar-se de uma urgência para que os países possam trabalhar no futuro próximo”. Do outro lado do espectro, James Woolsey, antigo director da CIA e ex-conselheiro de Trump em matérias de segurança nacional, aponta o mesmo caminho, dando a ideia de que quanto mais cedo a reunião acontecer, melhor. “A chave é não deixar a retórica azedar as relações entre os dois países, para se começar a trabalhar de imediato”, comentou ao matutino de Hong Kong. É de salientar que Woolsey se demitiu por discordar das declarações do Presidente acerca dos serviços secretos norte-americanos. Visita a Washington Trump tem reiterado a ideia de que nos negócios é importante a relação pessoal, o confronto cara a cara. Tal como no reino animal, quando dois machos alfa se encontram o embate pode resultar em cooperação ou sangue. Nesse sentido, Gal Luft, director do americano Instituto de Análise à Segurança Global, uma organização norte-americana, afirma que é fundamental os líderes “estabelecerem ligações pessoais, conhecerem-se”. O analista acrescenta que a “química pessoal que emergirá, ou não, poderá ditar a relação entre os dois países”. A coincidir com o 45.º aniversário da histórica visita de Richard Nixon à China, que marcou a normalização das relações diplomáticas entre os dois países, Pequim enviou o seu diplomata n.º 1, Yang Jiechi, a Washington. O conselheiro de Estado chinês estará hoje em reuniões com as contrapartes norte-americanas, diz um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros à Xinhua. De acordo com uma fonte ligada ao Partido Comunista Chinês (PCC), citada pela agência oficial, o assunto no topo da agenda será a discussão da altura para a primeira reunião entre os dois presidentes. Outro dos pontos na ordem de trabalhos será a situação na Coreia do Norte. Neste aspecto, as dúvidas também se mantêm, uma vez que o Presidente norte-americano repetiu, várias vezes, que usaria a questão de Taiwan para renegociar a posição chinesa em relação a Pyongyang. No caso de Donald Trump seguir a via do isolacionismo e não comparecer em Hamburgo, uma hipótese bem possível para o encontro com Xi Jinping é a próxima reunião da APEC, a cimeira de Cooperação Económica da Ásia-Pacífico, a realizar-se no Vietname. Também é possível que a visita de Yang Jiechi resulte num encontro fora de reuniões multinacionais. Aperto de mão Para Xi Jinping, uma reunião com Donald Trump em Julho reveste-se de um significado especial, uma vez que o líder chinês tem razões para sentir alguma ansiedade em estabilizar as relações entre as duas potências antes da reunião do congresso do PCC, em Outono. A normalização das relações com Washington é um trunfo que o actual líder chinês, por certo, gostaria de levar para o encontro em Pequim que definirá a liderança chinesa. Entretanto, já se especula sobre o que dirá nas entrelinhas o primeiro aperto de mão entre Trump e Xi Jinping. Depois do excesso de análise do cumprimento do magnata nova-iorquino ao primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, e ao primeiro-ministro canadiano, Justin Trudeau, já muito se especula sobre as conclusões a tirar na forma como Xi Jinping saudará Trump. Apesar dos apertos de mão vigorosos do Presidente norte-americano, no plano geopolítico vingam as questões económicas, militares e diplomáticas. Neste capítulo, Pequim tem tido a tarefa ingrata de tentar chegar à comunicação com uma Administração que responde de forma inconsistente e errática em matérias demasiado sensíveis. Para o vice-presidente do Instituto de Relações Internacionais Chinesas, Yuan Peng, a pior incerteza é não saber com quem contactar em Washington e como, atendendo a que Donald Trump tem demonstrado pouco interesse em usar os típicos canais diplomáticos. “E se acontece algo, uma urgência, quem contactamos?”, interroga-se Yuan Peng. A questão ganha outra dimensão com o uso descuidado de Donald Trump das redes sociais, onde não se coíbe de improvisar sobre matérias sensíveis sem qualquer apoio de consultores, nomeadamente, enquanto assiste a programas da Fox News. Até a reunião se realizar, tudo pode acontecer, com o mundo em suspenso, aguardando as cenas dos próximos capítulos.
Sofia Margarida Mota Manchete PolíticaJason Chao | Activista promete fiscalizar processo eleitoral O vice-presidente da Associação Novo Macau, Jason Chao, agora demissionário, tem na manga um novo projecto. A implementação de um sistema de monitorização que garanta a transparência das eleições é a nova meta. Entra em acção a partir de Abril [dropcap style≠’circle’]J[/dropcap]ason Chao está de saída da Associação Novo Macau (ANM), não por divergências com o organismo, mas porque pretende implementar um projecto de monitorização eleitoral. A informação foi dada ontem, num encontro com a comunicação social, em que o vice-presidente demissionário da ANM fez saber que se trata de “um novo projecto independente e será lançado em Abril”. A ideia resulta de uma reflexão acerca da sociedade civil do território. “O que observei da experiência do meu trabalho anterior é que a sociedade civil de Macau não tem uma boa infra-estrutura, ao contrário de Hong Kong que, ao nível civil, é uma sociedade muito enérgica”, afirmou. Para já, Jason Chao avança sozinho na fiscalização das eleições e não adianta nomes com quem pretenda fazer parcerias. “Espero formar uma equipa, mas para já avanço apenas comigo. Não estou a trabalhar com ninguém ainda, mas espero ter pessoas a colaborar neste projecto”, referiu. Na calha está a “fiscalização” de todo o processo eleitoral que inclui várias acções. Referindo-se à participação nas actividades ligadas às campanhas, o objectivo é “ter pessoas que participem e que a elas tenham acesso”. O intuito é tornar pública toda a informação recolhida e, em caso de recusa na obtenção, o facto também será comunicado. Por outro lado, este tipo de plataforma não existe no território e não é função que se possa pedir a ninguém “porque o empenho e intervenção na sociedade civil tem de ser feito de forma voluntária.” Jason Chao lembra as legislativas de 2013, em que participou, para dizer que “presenciou situações de abuso de poder e de censura para com a Novo Macau”. O activista local sentiu que não tinha qualquer tipo de apoio e pretende, com o novo projecto, ter uma palavra a dizer de forma independente. Os pormenores, no entanto, são ainda desconhecidos, sendo que “toda a informação será divulgada no momento certo”. Jason Chao explicou ainda que não será uma plataforma semelhante à da vizinha Hong Kong, a Thunderbolt, promovida por um dos cofundadores do movimento de desobediência civil “Occupy Central”, Benny Tai Yiu-ting. Para Jason Chao, o importante é monitorizar as eleições e não fazer “engenharia da eleição”. Adeus definitivo O ainda dirigente associativo não pensa voltar a fazer parte de uma associação de cariz político. “É improvável que regresse”, afirmou. As razões, apontou, são de foro pessoal e têm que ver com a sua personalidade e condição de saúde recentemente diagnosticada. “Há sete meses fui a um psiquiatra em Hong Kong e fui diagnosticado com síndroma de Asperger, uma subcategoria do espectro do autismo”, disse. Jason Chao admite que a síndrome interfere no contacto com outras pessoas e, “no processo de eleições em Macau, as interacções pessoais com os residentes são muito importantes”. O activista não se sente apto a integrar este tipo de actividades, pelo que prefere trabalhar de forma independente e longe dos holofotes da política. “Gosto de trabalhar para a excelência e para a implementação de novas ideias, por isso, desta vez, dado que a Novo Macau tem tido cada vez mais interessados em se associar, parece-me uma boa altura para escolher um papel que melhor se encaixe em mim”. O rei que vá à luta A Associação Novo Macau (ANM) vai continuar com o trabalho que tem vindo a desenvolver e mantém os objectivos, sendo que, com a saída de Jason Chao, vão registar-se mudanças no que respeita à aproximação dos problemas diários da população. “Claro que temos uma agenda partilhada com as ideias do Jason Chao, mas com algumas pequenas alterações”, afirmou o vice-presidente Scott Chiang. Para ilustrar o caminho que a entidade pretende seguir, Scott Chiang refere as áreas de interesse do membro demissionário e a sua aplicação aos “novos” objectivos. “Jason Chao tem uma forte ligação aos direitos humanos e à liberdade individual, que são temas sem popularidade em Macau. Haverá algumas alterações a este nível. Não vamos deixar estes assuntos, mas pretendemos chegar a um maior número de pessoas e partilhar dos mesmos interesses”. A ideia é continuar a lutar por uma sistema democrático mas de forma a intervir na vida da população. “Temos lutado pela democracia, mas a maioria dos residentes tem outro tipo de problemas que lhes afectam o quotidiano. O que temos de fazer é juntar os vários pontos: temos um mau sistema que leva a más políticas que, por sua vez, levam aos problemas de tráfego”, exemplificou. Scott Chiang não adianta nomes para concorrer às próximas eleições dando a entender que o papel poderá caber ao presidente Sulu Sou. “O rei tem de montar o seu cavalo e ir para a batalha”, disse.