Japão adverte contra proteccionismo dias antes da reunião do G20

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] ministro das Finanças do Japão, Taro Aso, manifestou ontem preocupação com o proteccionismo económico e afirmou que a economia global deve manter-se aberta, dias antes da reunião de ministros das Finanças do G20 desta semana.

Taro Aso disse que a economia de um país não pode manter-se sozinha, e sublinhou que “não há dúvida de que foram feitos esforços para alcançar uma sociedade aberta”, segundo declarações citadas pela agência Kyodo.

“É inevitável que tudo se torne mais global”, disse o ministro após uma reunião do governo japonês.

Espera-se que a próxima reunião dos ministros das Finanças e governadores de bancos centrais do G20, que vai decorrer na cidade alemã de Baden-Baden a 17 e 18 de Março, dê atenção especial às medidas proteccionistas do Presidente norte-americano, Donald Trump.

Durante o encontro, Aso vai reunir com o secretário do Tesouro norte-americano, Steven Mnuchin, que por sua vez poderá criticar a desvalorização do iene, que favorece os exportadores japoneses.

Donald Trump já acusou o Japão de desvalorizar a sua moeda para tornar as suas exportações mais competitivas.

Os ministros das Finanças na União Europeia (UE) acordaram recentemente uma posição comum nesta reunião, e reafirmaram o seu compromisso com a abertura dos mercados.

Aso disse ontem também que a reunião vai focar-se nos impostos internacionais e a desregulação financeira.

“Vamos explicar [a situação] da economia japonesa, mas também necessitamos de [outros] pontos de vista”, afirmou.

15 Mar 2017

José Maçãs de Carvalho, fotógrafo: “Interessa-me a aparência das coisas no plano visual”

Com “Arquivo e Democracia” transportou para Lisboa a realidade das empregadas filipinas de Hong Kong que usufruem das ruas da cidade para aproveitarem os domingos de descanso. A exposição está no Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia. As histórias de vida são duras mas, ainda assim, José Maçãs de Carvalho, fotógrafo e subdirector do Colégio das Artes da Universidade de Coimbra, assume não retratar episódios do ponto de vista sociológico, mas sim meramente visual. O ex-residente de Macau prepara novos projectos para o território

[dropcap]C[/dropcap]omo surgiu a possibilidade de fotografar as empregadas filipinas de Hong Kong?
A ideia de fazer um ensaio visual sobre a questão já existe desde o tempo em que vivi em Macau [entre 1994 a 1998]. Desde 1999 tenho regressado a Macau anualmente e desde 2009 que comecei a filmar com mais regularidade.

Porquê o nome “Arquivo e Democracia”?
Desde 2011 que investigo a matéria do arquivo. Já fiz sete exposições cujos títulos têm a palavra. Aliás, a minha tese de doutoramento (2014) é sobre Arquivo e Memória. Aqui, em Hong Kong, o ‘Arquivo’ vem pelo excesso, excesso de pessoas na rua ao domingo, excesso no gesto, enfim, acumulação também. ‘Democracia’ porque a forma como ocupam as ruas configura uma espécie de democracia plena, total.

O que mais o fascinou durante a realização deste projecto a Oriente?
Filmei entre 2009 e 2012. Sempre achei este acontecimento muito curioso, estranho, e por ser contingente. Se não se for ao domingo a Hong Kong nunca se vê este fenómeno. Em Macau, as empregadas domésticas residem nos seus próprios apartamentos, o que faz com que não estejam nas ruas nos seus dias de folga como em Hong Kong, onde vivem em regime interno na casa dos patrões.

Pensou em abordar também a realidade das empregadas em Macau?
Não me interessa aquele acontecimento como facto social, não adopto um ponto de vista sociológico. Interessa-me a aparência das coisas no plano visual, portanto não são as empregadas filipinas que me interessam, mas a forma como aquelas mulheres ocupam a zona mais rica de Hong Kong e como interagem com a arquitectura.

As empregadas filipinas e indonésias em Hong Kong têm estado no epicentro de uma discussão sobre os direitos humanos e laborais. Como é que a fotografia pode contribuir para esse debate e reflexão?
A arte pode sempre contribuir para o debate se tiver uma ligação ao real. Macau surge também retratada no projecto “Arquivo e Melancolia”, recentemente em exposição no Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado (MNAC). Porquê ir buscar uma imagem tirada dos anos 90, numa altura em que o território era tão diferente? Que história faltava contar? O filme que mostrei no MNAC foi filmado em 2011 e retomava uma fotografia que fiz numa loja de parafusos, no Porto Interior, quando vivia em Macau, no fim dos anos 90. Mais uma vez, esse filme não é sobre Macau, é sobre uma acumulação excessiva e periclitante de milhares de parafusos e porcas; um epítome da precariedade do arquivo e da memória.

Tem algum novo projecto pensado sobre Macau e sobre a Ásia?
Há vários projectos em progresso: uma exposição que desenvolverei com a Margarida Saraiva, ainda sem data, e ainda um projecto de fotografia que iniciei em 1999 e que retrata o quotidiano de ex-alunos meus de Macau.

Macau teve uma comunidade portuguesa pujante nos anos 80 e 90, período em que viveu no território. Que memórias guarda, que análise faz à produção de arte em Macau na altura?
As melhores memórias. Macau é a minha segunda terra. Até poderia morrer em Macau. Nesse tempo a produção artística era muito irregular: coisas fracas e coisas muito boas.

Anos depois da transição, Macau ainda constitui um fascínio para os artistas portugueses?
Diria que a Ásia, mais do que Macau.

É subdirector do Colégio das Artes da Universidade de Coimbra. Estão pensadas parcerias com o território?
Para já, não. Temos parcerias com o Museu Russo de S. Petersburgo e a Universidade da Sorbonne, em Paris. Temos ainda em estudo uma parceria com uma universidade inglesa.


Novo livro lançado a 18 de Março

As fotografias sobre as empregadas filipinas que ocupam as ruas de Hong Kong e o trabalho desenvolvido sobre esse tema são parte integrante do novo livro de José Maçãs de Carvalho, a ser lançado no próximo dia 18. A obra chama-se “Arquivo e Intervalo” e é o resultado da exposição no Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia (MAAT), tendo o apoio da editora Stolen Books e do Colégio das Artes da Universidade de Coimbra. A obra reúne quatro textos “que se aproximam de quatro filmes em torno da matéria do arquivo e que, de algum modo, também epitomam questões fulcrais da prática fotográfica e videográfica”, escreve o autor. Desde 2010 que José Maçãs de Carvalho tem trabalhado “em exclusivo problemáticas relativas ao arquivo e à sua expressividade”. Os textos do novo livro “problematizam a substância do arquivo naquilo que ele tem de excesso, precariedade e esquecimento, mas também aquilo que o marca como lugar e temporalidade”, acrescenta. Os textos de “Arquivo e Intervalo” têm organização de José Maçãs de Carvalho e são da autoria de José Bragança de Miranda, Pedro Pousada, Adelaide Ginga e Ana Rito. A apresentação será feita no próximo dia 18, no MAAT, em Lisboa, pelo escritor Gonçalo M. Tavares e por José Bragança de Miranda, investigador e ensaísta.

15 Mar 2017

Rota das Letras | Deusa d’África fala de Moçambique, da guerra e da paz

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] escritora e activista cultural moçambicana Deusa d’África, que está em Macau a participar no festival literário Rota das Letras, sonha com “um país que seja homem”. A “guerra” só deve ser feita por causas justas, como a literatura.

Aos 28 anos, Deusa d’África é autora de “Ao Encontro da Vida ou da Morte” (poesia), “A Voz das Minhas Entranhas” (poesia) e “Equidade no Reino Celestial” (romance).

Nasceu Dércia Sara Feliciano, no sul de Moçambique, na província de Gaza. Anos mais tarde, trocou o nome de baptismo por o de uma das personagens que criou em “Equidade no Reino Celestial”.

“A minha mãe decidiu que eu devia ser Dércia Sara Feliciano. (…) E o nome que eu escolhi para mim é Deusa d’África. E ela aceita este nome, tanto que quando me acorda (…) ela diz: ‘Deusa, hora de ir ao trabalho’. E no meu local de trabalho dizem que não gostam do nome Dércia, porque Dércia é difícil. Então Deusa é mais simpático”, explicou durante uma palestra no Rota das Letras.

Deusa d’África é mestre em Contabilidade e Auditoria, lecciona na Universidade Pedagógica e na Universidade Politécnica, e é gestora financeira do projecto Global Fund – Malária em Moçambique.

É a partir de Xai-Xai, capital de Gaza, a cerca de 200 quilómetros de Maputo, que reflecte sobre o país que “cresceu economicamente”, mas que enfrenta “muitos desafios”.

“Há muitos elementos que envolvem o crescimento de um país, dos quais ainda necessitamos como um povo, para que o país possa se erguer e possa se tornar aquilo que nós sonhamos, que é um país que seja homem, um homem competitivo diante dos outros homens, que são os países”, disse Deusa d’África em entrevista à Lusa.

A autora refere-se, em concreto, à necessidade de criar “um ambiente de paz e de tranquilidade” para que o povo moçambicano possa “crescer, viver e sonhar”, num ambiente de paz que não fique “à mercê da vontade dos homens”.

A paz em Moçambique tem estado sob permanente ameaça nos últimos anos, devido a clivagens entre a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, e a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo).

Entre 2013 e finais de 2016, o país foi assolado por acções de violência opondo as Forças de Defesa e Segurança (FDS) e o braço armado da Renamo, no âmbito da contestação do processo eleitoral de 2014 pelo principal partido da oposição.

A mais recente trégua entre as duas partes foi anunciada no passado dia 3, com a duração de 60 dias. “Felizmente temos esta informação, esta trégua (…) vai-se prolongando uma semana, duas, um mês. São notícias boas, mas não é o que nós sonhamos como moçambicanos”, disse.

Sem paz, “não podemos estudar, as crianças não podem crescer, não podem tornar-se os homens do futuro, os presidentes de amanhã, os ministros de amanhã diante desta situação”, acrescentou, reflectindo a propósito do conflito que considera “um problema de vaidade humana”.

Das festas aos funerais

Deusa d’África desenha as suas próprias roupas e sonha com um desfile de moda, entre tantos projectos que lhe faltam fazer.

Além da escrita – que lhe permite ser homem, mulher, criança e às vezes até seres inanimados –, Deusa d’África acumula o papel de activista cultural, nomeadamente através da associação Xitende, fundada em 1996 e da qual é coordenadora-geral.

A autora diz-se activista “pela sociedade inteira”, que luta pela “justiça social” e em prol da produção literária num país onde, diz, “se lê menos” e faltam políticas de promoção da leitura.

“Sou um contraste. Tudo muito estranho, mas vem do berço. (…) A minha família sempre foi ligada às artes, especificamente literatura, música, e eu não podia ser diferente dos meus”, afirmou.

“Com cinco anos de idade, na primeira classe, eu já dizia poesia. Em todos os casamentos no bairro, todas as festas de aniversário, tinha de estar lá a dizer um poema. Hoje em dia sou convidada até em cerimónias fúnebres. Dizem que quando eu digo um poema até se esquecem que estão num ambiente triste, viajam no além”, contou.

Deusa d’África não vê limites quando toca à dinamização cultural. Por exemplo, entre outras “actividades absurdas”, organizou uma marcha pelo livro por ocasião de uma celebração do Dia Mundial do Livro, a 23 de Abril.

Para a autora, o livro e a poesia “são uma forma de resistência, uma forma de combate, uma forma de fazer a guerra”.

Uma guerra contra? “Uma guerra é uma guerra. O importante é que a guerra tenha causas”. “O problema dos homens é que eles fazem guerras sem nenhum motivo. E o que nós temos que aprender, diz até Adolfo Hitler no livro ‘A Minha Luta’, é aprender a fazer uma guerra tendo uma causa justa”, disse. “E neste caso específico, a causa é a literatura, a promoção da nossa literatura, ao promover a literatura estamos a promover a própria existência da humanidade. Uma causa mais do que suficiente para que a gente lute por ela”, acrescentou.

15 Mar 2017

Sei de rios

São Luiz, Lisboa, 12 Março

[dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]ue sei eu? Talvez por isso afirme que o fado atingiu agora extrema maturidade, sabor e saber entre figo e pão saído do forno, entre o vigor da técnica e o perfume do espírito. Fica-me isso em fundo de boca neste concerto, singelamente chamado de Camané e a Orquestra Metropolitana de Lisboa, ainda que devesse incluir algures no título o director musical, Filipe Raposo. Lá está, que sei eu: quem decidiu o alinhamento, a escolha e o encadear dos temas, o avanço e recuo de cada instrumento, os silêncios? Saio esmagado no fim da semana, percebendo que desde a segunda-feira anterior tudo viria a estar contaminado por isto. Começa com o costumeiro atraso na percepção de que Camané está prestes a explodir e convém estar por perto. Salvam-me os bastidores (obrigado, Elsa. Obrigado, Aida). Os versos cantados em lâmina a sublinhar esses momentos revividos. O delírio de melodias despenteadas para lá da bainha descosida do pano negro. Bato com a mão na cabeça para interromper as correspondências entre o que agora oiço e o que vivi ao longo da semana, do ano, que digo?, dos anos. Camané, devias ser estudado pela física quântica, essas tuas maneiras de misturar num instante tempos e espaços. Esqueçamo-nos de mim, assunto implosivo do diário. Quem como ele arrisca experimentar sem perder o pé, voar de contrabaixo sem perder os arreveses da tradição. O verso de David Mourão-Ferreira seria o mesmo sem a energia de José Mário Branco? A paisagem de Jobim e Oliveira escavaria tão funda a sua inutilidade sem Raposo e a tua voz? Outros modos são possíveis, mas estes combinam lua e noite de forma única. Na variedade das canções, que vão do tango ao quase pop, na complexidade dos arranjos, no modo de jogar com os ritmos e as sensibilidades, com os instrumentos puxando o cantar para danças nada óbvias, com invariável certeza de que as palavras são o chão da boca Choro, quieto como convém. Na boca de cena do fado há um negro muito nosso, que precisamos escavar para libertar as selvas de cor que por ali se escondem. Sim, pode haver luxúrias de luz e aventura nas noites domésticas que guardamos nos bolsos. Reparo, não sem tristeza, que colecciono respostas íntimas a inquéritos de imprensa. Relembro esta, pela mão da Manuela Paraíso. «Qual é a característica dos portugueses que mais o irrita? O coitadismo. Somos o povo que mais se lamenta, mas também o que mais embirra com quem faz e que ignora o que fez. Enfim, o espírito de rés-do-chão». Camané, tu resgataste o fado do coitadismo.

Mymosa, Lisboa, 6 Março

Nunca pensei. Devia tatuar mais esta no corpo, tão desafinado que vai com o que pensa. Estou com o Ferreira Fernandes a partir História, que vai sendo maneira nossa de abrir conversa, e logo José transfigura para me contar das ocultas razões que levaram o rio Kwanza a inventar país. Tanto angolano na minha vida e nenhum me havia falado com tal rasgo destas histórias trágicas de amor: um rio daquele tamanho parte para Norte ao encontro do oceano; desenha no encontro uma baía capaz de se erguer capital de reino Ndongo; e daí, por portas travessas, resolvido conflito com o outro reino não menos mítico do Kongo, faz nascer país assente na língua portuguesa que, sofrendo barragens e transvases, não deixa de ser nascente e foz. Kwanda sendo rio, na vez de moeda, faz toda a diferença. E ponto. Um ponto é tudo, assim titulou ele a melhor crónica da imprensa portuguesa, citando poeta que se fez moçambicano, filho do que desenhou mitos à beira Tejo.

Foi o Bruno Vieira Amaral que me perguntou, há uns anos e para a Ler: «Falta alguma coisa no seu BI? Sim, uma identidade». Eis-nos fadistas. O Bruno de Almeida filmou o namoro das esquinas com o mar da Palha, cenário de Sei de um Rio, fecho inolvidável do que ainda não vi: «Rio onde a própria mentira/Tem o sabor da verdade/Sei de um rio».

Mymosa, Lisboa, 11 Março

Almoço longo com o Carlos Querido, em rotineiro e soalheiro costume de camponeses, ele da zona oeste, faroeste, eu da Penha, a mais alta e infértil colina de Lisboa. Ambos mondadores do silêncio, lavramos à mesa uma alegria pesada. «Se canto, não me dói tanto/O coração magoado/Mas há em tudo o que canto/Este silêncio pesado», risca a Manuela de Freitas. À laia de conclusão, passou outra resposta a interrogatório, desta para papel de jornal do Fernando Alvim. «Só escrevi um fado, que João Lucas compôs, mas quando ouvi pela primeira vez o António Zambujo a cantar pedaço da minha delirante infância pensei por momentos que a vida podia fazer sentido, breve é claro. Breve o sentido e a vida, que a poesia só ensina a cair. Fado do Homem Crescido, escrito para o filme de animação homónimo que o Pedro Brito realizou, diz com imagens e sons e palavras que a amizade é impossível, pelo que estamos condenados à solidão. Ora nada mais vale senão a amizade.»

Santa Bárbara, Lisboa, 13 Março, madrugada

A noite faz-se ainda mais noite com Lua cheia desta maneira. Faz-se bruta e provoca-me do outro lado do vidro, eterna companheira, lanterna de todos os versos. «É triste sorte/Que nos faz pensar na morte/E em tudo o que em nós morreu», diz João Ferreira-Rosa. Mas teria forma a vida sem o côncavo do que nos vai morrendo? Última resposta ainda ao Alvim. «Vi a chegada à Lua em directo e logo ali descobri uma vocação, que era magro e não me dava mal com as matemáticas. Um certo professor, contudo, deu-me a conhecer um tal de Fernando Pessoa, jaz morto mas não arrefece. Até já tinha lido poesia, mas nunca tinha lido poesia. Não mais me livrei dela, apesar de ainda ter continuado a achar durante anos que podia ser astronauta. Têm sido os versos a levar-me à lua e a prender-me à terra. A enterrar-me.»

15 Mar 2017

O silêncio dos inocentes – o lado negro e insidioso da violência escolar

[vc_row][vc_column][vc_column_text][dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ra uma vez uma escola, uma pequena escola de bairro, sem problemas sociais conhecidos.

Apesar de ser uma terra de abundância de meios e nada lhe faltar, esta escola tem meninos e meninas que, tal e qual os de outras escolas com menos meios, agridem física e verbalmente outros meninos e meninas, desrespeitam professores e funcionários da escola.

Todos eles necessitam urgentemente de ajuda… vítimas e agressores… pessoal docente e não docente…

Qual tem sido o papel do Sr. Reitor[1] e da Vice-reitora? Quais os procedimentos instituídos e que medidas têm tomado para assegurar a manutenção/restauração da disciplina? Recebeu e falou com algum agressor? Acareou alguma vez agressor e vítima? Congregou os respectivos pais e encarregados de educação? Quantos processos disciplinares por violência escolar levantou? Quantos Conselhos de Turma? Algum registo escrito?

Ou, pelo contrário, sistematicamente têm sacudido a incómoda “água do seu capote do poder” com a mofenta estola de arminho? Ou tudo não passa de alucinações dos “caladinhos” nas conversas de café na “Fusta”?

E o Serviço de Psicologia? Que relatórios tem feito? Que abordagem tem tido nos casos de violência escolar? Que seguimento tem proporcionado e que medidas tem proposto à direcção da escola, quer para às vítimas quer para os agressores, quer para os docentes e não docentes?

Toda a violência é geradora de sobressalto, mesmo a que é praticada em jeito de Talião. Mas a violência física é apenas parte do drama que um número indeterminado de crianças vive, tantas vezes silenciosamente, e que as afasta da escola e de tudo o que de bom esta deveria representar: há a violência verbal, a marginalização por este ou aquele motivo, que passa despercebida, pois enquanto os professores tomam o merecido café na sala do corpo docente ninguém está vigilante nos claustros e o sistema de videovigilância tem outros destinatários e propósitos que não a segurança dos alunos.

Para quando uma dinamização profissional dos recreios? Por que não se aposta nos jogos tradicionais que transmitem regras de forma didáctica? Para quando a introdução destes temas com a devida pedagogia em acções destinadas aos alunos e ao corpo docente e não docente?

Sim, há alunos que sofrem, há alunos que são marginalizados, há alunos que fogem (para a biblioteca ou para qualquer sitio onde haja um adulto) para não serem humilhados e que, por isto, não gostam desta escola.

Mais grave, estes actos e factos foram banalizados e como todos os processos de “banalização do mal” gera uma resignação por parte da comunidade escolar que vai exigir medidas extraordinárias para reverter a violência exercida sobre os “patinhos feios” desta escola.

O ambiente escolar é uma preocupação de todos, dos docentes, mas também dos pais, nomeadamente este fenómeno da violência escolar mais isolada ou, no anglicismo “Bullying[2], que é mais grave, pelo carácter reiterado.

Também não é de estranhar uma identificação com a vítima, com o seu sofrimento, tantas vezes silente e pelo carácter insidioso da agressão, algumas vezes grupal.

Mas esta identificação não se pode ficar pela compaixão, pela mera comiseração, ou com uma lágrima de circunstância, ou compunção encenada por dever de ofício.

Nem se deve deixar a vítima cristalizar em processo de vitimização.

A direcção da escola tem um dever de guarda e protecção das crianças que, por seu lado, estão em processo de socialização e de aprendizagem das regras elementares de vida em sociedade. Estes fenómenos de violência têm de ter uma atenção e resposta pronta por parte dos responsáveis da escola, seja ela dos Lusitanos, dos Francos ou dos Chins.

Estes fenómenos não se auto resolvem e a escola tem de ter mecanismos de prevenção, de mediação e de repressão da indisciplina e da violência escolar (que estão bem plasmados no regulamento interno).

Até porque a violência não tem como destinatário exclusivo típico uma criança designada a “gorda”, o “trinca-espinhas”, o “caixa de óculos”, a “coxa” ou simplesmente o que não ostenta, desde o 1º ciclo, o iPhone topo de gama, e como tal é ridicularizado na sua particularidade, diferença ou falta de denominador comum que lhe dá salvo conduto de acesso ao grupo.

A “lei da selva”, onde o mais forte imperava, não convém a uma Escola Humanista do século XXI. A escola não pode ser uma incubadora que potencia a violência grupal ou individual contra os mais fracos.

Violência que já galgou os muros e inunda o relacionamento privado em que o fenómeno passa desapercebido aos pais que convivem despreocupadamente, enquanto este fenómeno escolar se reproduz…

A escola tem de ser garante da formação e da transmissão dos valores correctos.

Cumpre a cada um dos pais, cujos filhos frequentam essa escola da paróquia, indagar o que lá se passa, para além das portas, janelas e postigos, cuja obra, equívoco crasso do Sr. Reitor[3], manifestamente não é idónea a resolver este gravíssimo problema, mas apenas para permitir que o mesmo seja escamoteado!

Quantas vítimas, em silêncio, tiveram de mudar de escola e até de continente para fugir à crueldade da violência escolar numa instituição que não protege os mais fracos e com manifesto insucesso no que tange a aprendizagem dos valores essenciais que devem ser ministrados na disciplina de formação cívica?

Quantos professores e funcionários auxiliares são diariamente humilhados e ofendidos, por angélicos meninos e meninas de tenra idade, sem que lhes seja restaurada a dignidade e autoridade devida?!

Quantos professores e funcionários se encontram desmoralizados e sem esperança por esta desdita de terem de trabalhar diariamente, entregues a si próprios, sem reforço com a inacção duma direcção procrastinadora que os devia apoiar?

Será aceitável deixar os agressores reincidentes sem castigo e as vítimas sem reparação ?

Será aceitável que os adultos docentes adoptem como resposta defensiva: “não quero saber de queixinhas!!”

Todos os indícios e todas as barreiras físicas criadas só servem para escamotear toda esta gravíssima situação, sendo de concluir que há falta de cumprimento do dever de zelo da direcção desta escola, no que respeita à sua função de garante da disciplina, da segurança e da saúde física e moral dos alunos cuja guarda, durante o tempo lectivo, lhes foi confiada pelos respectivos pais e encarregados de educação.

Dever de zelo que também se lhes impõe para respeitar e fazerem respeitar os direitos e deveres dos alunos, legalmente consagrados[4], e replicados no regulamento interno aprovado (?) pela entidade competente (?).

Longe vão os tempos dos “putos” cantados pela voz timbrada de Carlos do Carmo: estes nossos putos já não jogam com bola de pano, não sabem o que é o arco que rola e as caricas, berlindes, abafadores e piões só os conhecem de ouvir falar, como peças de museu de brincadeiras d´antanho. Muitos já nem quando a tarde cai lhes passa a revolta, nem tão pouco já se sentam ao colo do pai… nem a ternura lhes volta…

Talvez esteja na altura de lhes proibir o uso, dentro da escola, de smartphones e máquinas de jogos electrónicos, objectos do tipo estupidificante que servem para discriminar e os alienam das brincadeiras e dos jogos que lhes são próprios da idade. A escola já disponibiliza telefone fixo para as comunicações com os pais, que é o que importa assegurar bidireccionalmente.

Este fenómeno da violência escolar exige medidas proactivas de vigilância, prevenção e mediação[5] para gestão e resolução de conflitos, de modo a construir uma escola segura e sã, onde as crianças cresçam sem medo, de forma empática, sabendo distinguir, uns e outros, quais os comportamentos que são aceitáveis e inaceitáveis. Este últimos devem ser reprovados, denunciados e os danos, quando ocorram, devidamente reparados.

Urge declarar TOLERÂNCIA ZERO À VIOLÊNCIA ESCOLAR, seja ela de que tipo for.

Nos diversos ciclos devem ser promovidos grupos ad hoc com pessoal docente, não docente e chamar os pais a participar neste projecto.

Sempre que necessário promover reuniões com os alunos e encarregados de educação (dos alunos envolvidos) para debater os factos ocorridos, e colher quer a censura quer as medidas de restauração do bem jurídico violado, e assegurando que todos os alunos tomaram conhecimento.

Se isto for feito, recorrendo desde logo ao bom senso e às regras duma sã vida em sociedade, terá como efeito necessário uma aprendizagem efectiva dos valores essenciais que devem ser objecto da formação cívica. A criança deve ser confrontada com os factos, com os seus actos, procurar saber por que o fez, e convidá-la a verbalizar e tomar consciência da gravidade e reprovação social dos mesmos, para que se arrependa e sinceramente procure ressarcir a vítima sujeitando-se a uma pena, por exemplo, que o grupo ou a turma considere adequada.

Estas práticas, muitas vezes desenvolvidas em círculo (onde todos têm oportunidade de se confrontar cara a cara), permitem que os alunos partilhem as suas emoções e desenvolvam um sentimento de pertença e de comunidade, no respeito pelas suas diferenças, individualidade e até, quando é o caso, pelas deficiências ou limitações do seu colega, estimulando a entreajuda, e até a salutar defesa do terceiro, mais fraco, normalmente a vítima deste jogo de poder.

Da escola esperamos que forme cidadãos conscientes e honrados, não cobardes que se comprazem com o sofrimento infligido ao seu colega mais fraco, ou que assistam passivamente a estes actos inaceitáveis.

Os pais, cujo tempo útil, durante a semana, é diminuto, comparativamente ao tempo lectivo, têm o direito de ser informados do comportamento e evolução do processo de socialização dos seus educandos e até, de preferência, em participar activamente neste processo. Têm o direito e o dever de saber se o seu educando foi vítima ou agressor para o apoiar ou repreender, como educador e ultimo garante da sua formação cívica e moral.

Por uma escola segura, sadia e civicamente evoluída:

Basta do fazdecontaquesenaoescrevermosefingirmosquenadasepassounada-sepassou!!

Porque se nada mudar, se nada se fizer, um dia destes, como noutros dias, em muitos sítios do mundo, pode haver um menino, dos 6 aos 18 anos, que se desespera e que, no seu desespero sem esperança, pode fazer algo definitivo para se livrar duma violência escolar sem controlo, conscientemente negligenciada, pelas múltiplas denúncias de que tem tido conhecimento!

Foi na esperança de poder evitar uma fatalidade destas, bem como para ajudar a parar o sofrimento silencioso das vítimas, que foram escritas estas linhas, para que algo mude… decisivamente!

Manuel Gouveia, Pai

[/vc_column_text][vc_message style=”square” message_box_color=”white”][1] Cf, historicamente o artigo 16.º do Decreto n.º36:508, de 17/09/1947, já mais coevamente o Decreto-Lei n.º24/97/M, de 16/6 os passou a designar Director e subdirector,

Artigo 3.º
(Órgão de direcção)

  1. O órgão de direcção do Liceu é constituído por um director e quatro subdirectores.
  1. O director e os subdirectores são equiparados, para efeitos de vencimento, respectivamente, a chefe de divisão e a chefe de sector.

[2] “uma forma particular de violência associada sempre a uma relação de poder entre alguém que se apresenta como superior e um seu igual que se considera inferior e incapaz de responder à agressão” – enquanto outros autores amplificam o significado do conceito, integrando nesta categoria diferentes formas de indisciplina escolar.

[3] Não fora a exiguidade circundante e a próxima obra do Sr Reitor seria a construção dum fosso, com crocodilos de estimação famintos, para melhor impedir o acesso dos pais ao recinto escolar.

[4] Lei n.º 51/2012, de 5 de setembro (República Portuguesa) Aprova o Estatuto do Aluno e Ética Escolar, que estabelece os direitos e os deveres do aluno dos ensinos básico e secundário e o compromisso dos pais ou encarregados de educação e dos restantes membros da comunidade educativa na sua educação e formação (cujas normas, designadamente direitos e deveres dos alunos se devem repercutir nos regulamentos internos e de disciplina das Escolas dos Lusos):

Artigo 7.º
Direitos do aluno

São direitos do Aluno, nomeadamente:

  1. a) Ser tratado com respeito e correção por qualquer membro da comunidade educativa, não podendo, em caso algum, ser discriminado em razão da origem étnica, saúde, sexo, orientação sexual, idade, identidade de género, condição económica, cultural ou social ou convicções políticas, ideológicas, filosóficas ou religiosas;

  1. f) Ver salvaguardada a sua segurança na escola e respeitada a sua integridade física e moral;

 Artigo 10.º
Deveres do aluno

São deveres do Aluno, nomeadamente:

  1. d) Tratar com respeito e correção qualquer membro da comunidade educativa, não podendo, em caso algum, discriminar alguém em razão da origem étnica, saúde, sexo, orientação sexual, idade, identidade de género, condição económica, cultural ou social, ou convicções políticas, ideológicas, filosóficas ou religiosas:

  1. f) Respeitar a autoridade e as instruções dos professores e do pessoal não docente;
  2. g) Contribuir para a harmonia da convivência escolar e para a plena integração na escola de todos os alunos;

  1. i) Respeitar a integridade física e psicológica de todos os membros da comunidade educativa, não praticando quaisquer atos, designadamente violentos, independentemente do local ou dos meios utilizados, que atentem contra a integridade física, moral ou patrimonial dos professores, pessoal não docente e alunos;
  1. j) Prestar auxílio e assistência aos restantes membros da comunidade educativa, de acordo com as circunstâncias de perigo para a integridade física e psicológica dos mesmos;
  1. x) Reparar os danos por si causados a qualquer membro da comunidade educativa ou em equipamentos ou instalações da escola ou outras onde decorram quaisquer atividades decorrentes da vida escolar e, não sendo possível ou suficiente a reparação, indemnizar os lesados relativamente aos prejuízos causados;

[5] A mediação escolar possibilita uma gestão positiva de conflitos e tem sido objecto de trabalhos, designadamente de licenciatura e mestrado. Tem sido implementada em diversos países. Um programa de Mediação Escolar global pretende:

  1. Um programa de Mediação entre colegas, que trata de conflitos entre estudantes (dimensão horizontal), entre estudantes e adultos (dimensão vertical), e entre adultos (dimensão horizontal).
  2. Os pais compreendem o programa, usando as habilidades em casa, dando apoio constante aos filhos.
  3. A direcção da escola, os professores, o pessoal auxiliar e administrativo fazem parte activa do programa, usando os princípios da Mediação, implementando o programa e dirigindo os conflitos para a Mediação.
  4. Tem de existir formação para todos os intervenientes na escola.
  5. O mediadores devem ser os próprios estudantes (no caso de conflitos entre eles);
  6. Ensina-se na aula, a todos os estudantes, a resolverem conflitos através da comunicação eficaz e no desenvolvimento de habilidades pessoais (Mediação entre-Pares).
  7. Essas aulas devem ser ministradas por professores com capacitação prévia fornecida por Formadores em Mediação.
  8. No caso de conflitos de dimensão vertical, o mediador deverá ser externo à instituição.
  9. Os adultos procuram resolver os seus conflitos através da Mediação (conflitos entre professores, entre professores e pais, etc.)

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15 Mar 2017

Bar Celona, Tapas and Rice | Da Catalunha a Macau

O Bar Celona, Tapas and Rice traz a Macau os sabores catalães. Dos petiscos característicos ao arroz único da região, o espaço aberto desde 2015 tem contado com casa cheia e orgulha-se da sua exclusividade

 

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hama-se Bar Celona, Tapas and Rice e é o espaço pensado para trazer os sabores da Catalunha ao Oriente. A ideia partiu do proprietário, António Guijarro, natural de Barcelona. António esteve sempre ligado à hotelaria e a vinda para Macau teve na origem um convite enquanto consultor de restauração. “Após uma passagem pela Austrália vim ao território fazer consultadoria no âmbito da abertura de um hotel. Já na altura a ideia era a mistura de conceitos que fundissem cozinhas.”

Perante a diversidade do território, António Guijarro pensou em fazer algo mais. “Queria fazer alguma coisa que pudesse contribuir para o movimento e política da diversidade de oferta turística em Macau”, diz ao HM.

Se, por um lado, já era um território dotado de uma grande variedade de restaurantes de diferentes géneros e todos “muito bonitos”, Barcelona ainda não tinha um lugar na península. “Os espaços que encontrei iam da cozinha portuguesa à local e passavam por muitos tipos de cozinha do ocidente. No entanto, Barcelona tem características gastronómicas únicas e queria fazer a minha contribuição particular”.

Com o caminho percorrido desde a abertura do Bar Celona, em 2015, António Guijarro “esqueceu” os obstáculos que entretanto teve de ultrapassar e preserva as alegrias que, afirma, têm sido muitas, especialmente no que diz respeito à receptividade por parte da população local.

“Os locais têm sido incríveis desde a nossa abertura. O espaço é muito bonito e temos contado com casa cheia permanentemente”, afirma satisfeito. Os clientes podem ser famílias ou grupos de amigos com idades entre os 20 e os 50 anos, que querem comer bem e passar um bom bocado. “Cerca de 60 por cento dos nossos clientes são locais”, diz.

As aplicações de turismo ajudaram no sucesso do lugar e é através delas que chegam muitos visitantes dos mais diversos lugares. “Temos turistas da Coreia, Japão e Singapura que procuram um restaurante de primeira qualidade.”

Para o proprietário, a grande adesão deve-se também ao crescente número de turistas que tenta fugir aos casinos. “É um espaço que faz parte do desenvolvimento de Macau. A localização, na zona da Areia Preta, também confere uma maior proximidade à verdadeira Macau, o que agrada a muitos visitantes.”

Arroz catalão

Apesar de as tapas serem a especialidade, António Guijarro explica que o sucesso do Bar Celona se deve a muito mais do que isso. Deve-se ao todo. “Penso que as pessoas que nos visitam não o fazem apenas pelas tapas, mas principalmente por apreciarem todo um produto que nos propomos oferecer e que faz parte da cultura do próprio espaço.”

Do todo fazem parte os alimentos que, na sua maioria, são importados “e de grande qualidade”. A razão, aponta, “é não ser possível encontrar, deste lado do mundo, produtos semelhantes. Não têm a mesma intensidade e prezamos manter os sabores originais”. A ideia é manter uma cozinha típica, clássica e autêntica.

Mas o Bar Celona – Tapas and Rice não oferece só os petiscos, e a opção pelos pratos de arroz nada tem que ver com a presença oriental, muito pelo contrário. O arroz, aqui, é específico da Catalunha e, segundo o proprietário, dotado de um sabor único. “A Catalunha produz e tem uma forma de cozinhar o arroz também única. O cereal, cultivado entre o mar e as montanhas, não se encontra em mais parte nenhuma do mundo”, explica. “Temos uma grande variedade de arroz que misturamos com outros produtos. Por exemplo, temos como especialidade o arroz de lagosta, que é um prato que aqui não existe”.

Para o futuro, António Guijarro vê a expansão. A ideia é exportar a marca para as maiores cidades asiáticas. “Já estamos a pensar em Hong Kong, Singapura, Taipé e Zhuhai”, remata.

15 Mar 2017

Pyongyang ameaça responder a Seul e Washington com ataque “ultra preciso”

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] Coreia do Norte voltou ontem a denunciar os exercícios militares da Coreia do Sul e Estados Unidos, que são um ensaio de um ataque preventivo a Pyongyang, e ameaçou lançar “ataques ultra precisos” perante violações da sua “soberania”.

Se Seul e Washington atentarem contra a soberania, “os ataques ultra precisos” das tropas norte-coreanas “vão realizar-se sem piedade em terra, ar e mar”, alertou num comunicado publicado pela agência estatal de notícias norte-coreana KCNA.

A nota avisa Seul e Washington, que actualmente levam a cabo as suas manobras anuais Foal Eagle e Key Resolve, de que os “porta-aviões de propulsão nuclear e o resto de activos estratégicos dos imperialistas sul-coreanos estão ao alcance dos ataques ultra precisos do Exército Popular da Coreia”.

Em manobras

O texto do regime de Pyongyang surge um dia depois de os aliados iniciarem os seus exercícios de combate simulado Key Resolve, que vão durar até dia 24, e que começaram a executar também, no passado dia 1, o Foal Eagle, manobras que serão concluídas no final de Abril.

O destacamento de activos militares este ano para os exercícios é o maior até à data, já que Washington incluiu os seus caças F-35B e o porta-aviões nuclear Carl Vinson, depois de o regime norte-coreano ter realizado em 2016 um número recorde de testes nucleares e de mísseis.

Pyongyang, que denuncia periodicamente a natureza não defensiva destas manobras, já lançou no passado dia 6 de Março, em jeito de resposta ao início do Foal Eagle, quatro mísseis balísticos de médio alcance que caíram em águas japonesas.

Ao clima de especial tensão que se vive na península coreana junta-se a instalação, desde a semana passada, em solo sul-coreano do estado antimísseis THAAD.

Este sistema norte-americano para travar projécteis norte-coreanos que ameacem cair na Coreia do Sul gerou críticas do regime de Kim Jong-un e da China, que considera que interfere nos seus sistemas de defesa.

15 Mar 2017

Henrique Raposo, escritor e cronista: “Hoje, dou por mim a elogiar os sindicatos”

Henrique Raposo, cronista no semanário Expresso e autor do polémico “Alentejo Prometido”, que será apresentado hoje no festival Rotas das Letras, está em Macau. Estivemos à conversa sobre o Alentejo, os desafios da Europa, as crises de valores e os paradoxos ideológicos que grassam o Mundo, ao som de guitarras portuguesas
FOTO: Eduardo Martins | Rota das Letras

[dropcap]A[/dropcap]presenta hoje, no festival Rotas das Letras, o livro “Alentejo Prometido”, que originou indignação em Portugal. Como explica esta reacção?
Acho que as pessoas que ficaram indignadas não leram o livro. A meu ver, o livro é uma carta de amor ao Alentejo e, como todas cartas de amor, tem momentos de dureza e de ternura. A indignação foi provocada por um clip de uma entrevista ao Pedro Boucherie Mendes que circulou na Internet. Na altura escrevi que admito que me expliquei mal, sou escritor, não sou orador. Mas nada justifica aquilo que se passou. O que se passou é que a esquerda portuguesa vai sempre ter uma má relação comigo porque nasci no povo da esquerda e não sou da esquerda. Nesse sentido, vamos ter sempre uma relação difícil e aquilo foi um pretexto para me baterem.

Portanto, considera a indignação mais política do que regionalista.
Começou com uma reacção epidérmica de alentejanos na Internet, sobretudo miúdos que não têm referências do passado. Aliás, sobre o presente gostava que alguém encontrasse páginas mais luminosas e esperançosas que as minhas. Talvez se eu tivesse dito que o livro está mais próximo do romance, de um trajecto pessoal, do que do ensaio a polémica fosse menor. Depois, como muitos romances, parte do pessoal e abre para o geral, o livro é sobre um desterrado que tenta encontrar a sua identidade, é a minha “estrada de Damasco”. Não tenho problemas de estar na minoria, no campo mediático é evidente que quem é liberal, ou conservador, está em minoria. A esquerda domina o espaço o público, até acho normal. A indignação, a partir de certo momento, foi instrumentalizada pelo PCP, principalmente através das câmaras municipais. Depois há uma certa direita marialva que também não gostou do livro. Não acho que o livro seja político mas, como tenho uma forte carga política devido ao meu papel como cronista, as pessoas não conseguiram ver aquilo como um romance, e quiseram ver, à força, um estudo.

Como vê a ascensão do eurocepticismo na Europa?
Não estou apocalíptico. Estou pessimista, aliás, sou pessimista por natureza. Não se constrói algo como a União Europeia sem crises. O coração da Europa é a França e a Alemanha, tudo se joga aí. Acho que vamos ter boas notícias este ano porque a Le Pen, mesmo ganhando a primeira volta, perde a segunda. Hoje em dias as sondagens valem o que valem, ainda assim todas indicam que a Frente Nacional perde na segunda volta. Quem vota Fillon, quem vota centro-direita, um conservador clássico, não vai votar Le Pen. Mas, atenção, se nada mudar na maneira como os franceses encaram os muçulmanos, nada vai mudar. Melhores notícias ainda estão a vir da Alemanha, onde a CDU continua forte, a Alternative für Deutschland não está a conseguir comer muito eleitorado ao centro-direita. Mas mais interessante é a recuperação do SPD de Schultz, isso é uma boa notícia. É fundamental que o centro seja forte, para aguentar aquilo que parece uma tenaz extremista dos dois lados.

Num plano mais alargado no tempo, não considera que as instituições europeias podem estar em perigo?
A longo prazo ainda sou mais optimista, porque a minha geração, a geração Erasmus, sente a Europa. Eu sinto-me europeu aqui, sinto-me europeu nos Estados Unidos. Sempre fui muito pró-americano e quando fui passar uma temporada nos Estados Unidos julgava que me ia sentir em casa. Todos os meus heróis políticos estão na direita americana, o Lincoln, os pais fundadores. Mas não, eu sou europeu. Posso ter afinidades ideológicas com eles, posso respeitar a república americana, que é o maior projecto político desde o Império Romano, é absolutamente maravilhoso, mas não sou americano, sou europeu.

Mas não acha que sem uma reformulação institucional as tensões dentro da União Europeia podem aumentar?
O que pode haver é um choque na Europa entre o leste e o ocidente. Acho que é muito possível haver uma coisa feia. Não é impossível uma guerra, não é impossível nos Balcãs, nem na zona da Hungria, por exemplo. Vejo mais a possibilidade de conflito entre eles, e depois vejo uma separação cultural, entre o leste e o ocidente europeu. Na questão como abordam os negros, os muçulmanos, por exemplo. Critico muito a esquerda europeia porque recusa, numa perspectiva muito politicamente correcta, integrar o muçulmano no nosso modo de vida, porque ele tem a cultura dele e tem de viver à parte. Abomino esta espécie de Apartheid ao contrário, julgo que isso tem custado caríssimo. Também tenho de criticar a direita da Europa de Leste que é aberta e orgulhosamente racista. Têm orgulho em ter sociedades exclusivamente brancas. São sociedades que vão ser nacionalistas, vai receber muito mal qualquer tipo de pessoa estranha, não querem ser uma sociedade cosmopolita, não confundir com multiculturalista. Por este prisma, não vão conviver bem com a União Europeia, nem com a globalização, como se está a ver agora.

Não teme o nacionalismo no ocidente europeu?
No leste as atitudes são muito nacionalistas. Enquanto os portugueses, espanhóis, franceses, ingleses, tivemos mundo, tivemos império, que não foram nada simpáticos para o resto do mundo. Neste aspecto, detesto o luso-tropicalismo que diz que fomos uns porreiraços para os outros, não fomos. Fomos tão racistas e imperialistas como os outros. Mas isso teve um efeito benévolo hoje em dia, porque temos uma maior facilidade em contactar o outro. Somos cosmopolitas porque fomos imperiais. Nós, em Lisboa, não vamos ter uma direita nacionalista/racista, porque já temos duas gerações a conviver diariamente com negros, muçulmanos, indianos. Da minha geração de intelectuais à direita há uma barragem permanente contra Trump e Brexit, contra Le Pens.

“Fomos tão racistas e imperialistas como os outros. Mas isso teve um efeito benévolo hoje em dia, porque temos uma maior facilidade em contactar o outro.”

Ficou surpreendido com a eleição de Donald Trump?
Trump é a ponta de um iceberg que já tem décadas. Existe um problema enorme na política americana ao nível do financiamento. Transforma a democracia numa oligarquia porque, no fundo, quem decide o voto é o “um por cento” que financia as duas máquinas partidárias. Se acho que em Portugal há demasiados lobbies debaixo da mesa, que deviam ser assumidos e institucionalizados de qualquer maneira para que as coisas não fossem tão obscuras, na América eu acho que se passa ao contrário. Chegou-se a um ponto de centralidade do lobbying que está a desvirtuar tudo. Aliás, há reportagens arrepiantes em que se mostra o dia-a-dia de um congressista, que é estar ao telefone a pedir financiamento para campanha. Não é estar a falar com as pessoas para tentar resolver os problemas delas. Não é estar em diálogo com os outros senadores, ou congressistas, para ter os tais acordos “bipartisan”, que resolvem os problemas. Isto desvirtua tudo.

O investimento em lobby na Europa também tem aumentado nos últimos 15, 20 anos. Acha que há um deficit de democracia também na Europa?
Isso eu não acho, porque a União Europeia é feita por democracias, votamos em democracias nacionais, e temos votado sistematicamente em quem é pró-europeu. Nesse sentido, não acredito no deficit democrático na Europa. Não sou nacionalista, abomino a Le Pen, mas se fizer um texto onde defendo o patriotismo clássico sou apelidado, imediatamente, de fascista, reaccionário, por aí fora. Se critico um muçulmano que bateu na filha ou que matou a filha, e se critico a maneira como nós, europeus, descrevemos essa barbárie dizendo que é um crime de honra, sou apelidado de islamofóbico. Não aceito isso. Há também falta de comunidade, quer à esquerda, quer à direita. O discurso clássico da esquerda tem a sido “a globalização desregulou a economia, acabou com fábricas e sindicatos”. Enquanto critica a desregulação da economia, elogia a desregulação da família, os novos valores, a família tradicional, o casamento que é desnecessário, um discurso libertário nos valores familiares. A direita fez o contrário, critica a desregulação da família, mas depois elogia a desregulação da economia. Mas estamos todos a falar das mesmas coisas, sentimos todos falta de comunidade. A direita sente falta da família, do bairro; a esquerda sente falta dos sindicatos.

Cresceu numa comunidade de cariz socialista.
Cresci num ambiente sindical e, se quiser, isto é um elogio indirecto ao PCP, porque foi o ambiente em que cresci, e eles fazem muito bem uma coisa: bairro! Através dos sindicatos, das associações. Ainda hoje, e regressando ao “Alentejo Prometido”, queria voltar a um bairro imaginário que tive quando era puto, ali na zona de Loures. Já não é o meu bairro, já não me sinto em casa. Hoje, dou por mim a elogiar os sindicatos, apesar de achar que o sindicalismo em Portugal está muito atrasado, continua em guerras dos século XIX. Precisamos de dar empregos industriais às pessoas. Nós, Ocidente, precisamos de perceber que não podemos ser só uma sociedade de consumidores, temos de voltar a fazer coisas, a ter aquele sentido de comunidade que a fábrica dá. Por outro lado, precisamos de voltar a ter respeito pela família, seja de que família for. Casamento gay, para mim, era já amanhã, apesar de isso criar problemas com amigos cristãos que não gostam dessa ideia. Temos de voltar a criar família, laços de comunidade.

Como é possível ser católico, sentir a mensagem de Jesus, numa direita que se afasta da defesa do Estado Social?
Existe uma tensão na direita entre a defesa da família, temos de saber conciliar o que é crescimento económico com a família. Vejo a direita só a falar de mercado e a esquerda a falar de Estado, e no meio onde está a comunidade? Onde é que as famílias moram, onde é que as crianças brincam? Na esquerda há uma tensão entre, por um lado, a defesa dos direitos dos gays, das mulheres e depois a incapacidade de criticar o Islão que é a comunidade mais homofóbica e mais machista. Essa tensão está a custar caríssimo à esquerda, é por isso que o Labor em Inglaterra está como está. À direita a tensão é na defesa da globalização, que eu acho que é positiva, não sei como se pode falar da globalização sem se falar da diminuição drástica da pobreza no mundo inteiro. Sobretudo, aqui nesta zona. Centenas de milhões de chineses saíram da mais abjecta pobreza e são hoje em dia classe média.

Como vê a posição da China neste contexto capitalista global?
É a minha primeira vez na Ásia, no velho e grande Oriente, estou a absorver tudo. Lembro-me de um historiador económico, David Landes, que há uns anos escreveu um livro onde dizia que o capitalismo era a cara chapada dos chineses. Vendo o que se está aqui a passar, o capitalismo muitas vezes desregulado, que existe na China sob a égide de um partido comunista, é uma realidade muito interessante. O que me está a fazer alguma espécie é ver miúdos chineses muito parecidos com os ocidentais. Vejo casais de namorados na rua e são como europeus, ou americanos, têm roupas iguais, os cantores pop que ouvem parecem muito semelhantes. Até agora, a coisa mais fascinante que tenho estado a observar são as modelos chinesas, o ideal de beleza chinês parece ser da chinesa ocidentalizada, na própria face. Apesar de todo o poder asiático, o ocidente continuava a decidir o belo, o que não deixa de ser, para um ocidental empedernido como eu, uma coisa maravilhosa. Quero fazer uma reportagem muito sensitiva sobre o que tenho vivido aqui e depois quero pensar um ensaio sobre isto.

14 Mar 2017

ADN | Macau sem data para avançar com base de dados

A base de dados de ADN que Macau pretende criar permanece sem data para avançar devido à “complexidade” do processo de produção legislativa. Há cinco anos que os trabalhos estão em curso

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] notícia é avançada pela Agência Lusa, que cita a Polícia Judiciária (PJ): a base de dados de ADN está a ser pensada há cinco anos, mas os trabalhos legislativos são complexos, pelo que não existe ainda uma data para que possa ser criada.

A intenção foi anunciada no Verão de 2012 pelo então director da PJ e hoje secretário para a Segurança, Wong Sio Chak. A promessa ficou plasmada nas Linhas de Acção Governativa para o ano seguinte, em que se destacava que a PJ lançara, meses antes, um “estudo legislativo para criar, extrair e gerenciar o recurso ao banco de dados de ADN”.

Contudo, em face da “complexidade” de alguns procedimentos – como a produção de uma proposta de lei – não existe actualmente uma data prevista para o lançamento da prometida base de dados ADN, como reconhecem as próprias autoridades.

“Os procedimentos relativos à produção legislativa nesta área são morosos, pelo que o trabalho de legislação sobre a base de dados de ADN está ainda em curso”, disse a PJ, em resposta escrita à Lusa, indicando que uma proposta “já foi apresentada ao órgão superior para ser enviada à Assembleia Legislativa”, após as “devidas alterações” de acordo com pareceres dos serviços da área da justiça e do Gabinete para a Protecção de Dados Pessoais.

No entanto, “dada a complexidade dos procedimentos subsequentes”, a PJ diz que “não é possível” responder quando é que o diploma sobre a base de dados de ADN poderá vir a ser entregue à Assembleia Legislativa.

“Estando ainda o trabalho em curso, a PJ continua a acompanhar e cooperar nos respectivos trabalhos, fazendo a preparação para a criação da base de dados ADN para que – quando a lei entrar em vigor – a base de dados seja estabelecida dentro do mais curto prazo”, refere a PJ.

Tecnologias que faltam

A PJ espera que a base de dados de ADN possa contribuir para melhorar “a eficiência do trabalho de execução da lei” e “aprofundar o conceito promovido pelo Governo” relativo ao “reforço da polícia com tecnologias científicas modernas”.

Como se refere nas Linhas de Acção Governativa para 2013, “a aplicação da análise de ADN na investigação criminal e na prática da ciência forense tem-se tornado cada vez mais comum”.

Em Portugal, por exemplo, a base de dados de perfis de ADN foi criada há sete anos, período durante o qual recebeu 8139 amostras, das quais 5820 de condenados (71 por cento), um número considerado ainda reduzido, em comparação com outras jurisdições e com o número de condenações registadas por ano.

Essa base de dados permite fazer o cruzamento de amostras recolhidas no local do crime, ou mesmo de vítimas, com os perfis já identificados e registados, e recolher amostras de ADN em pessoas ou cadáveres e compará-las com as de parentes ou com aqueles existentes na base de dados, com vista à sua identificação.

14 Mar 2017

Deputados à APN pedem alterações no acesso ao ensino superior da China

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap]s oito deputados de Macau à Assembleia Popular Nacional (APN) defenderam mudanças de acesso de alunos locais ao ensino superior chinês. A ideia é alterar o sistema de atribuição de quotas, para evitar que estudantes do Continente percam vagas na universidade.

Segundo o Jornal do Cidadão, Lei Pui Lam, Chui Sai Peng, Lao Ngai Leong, Lionel Leong [secretário para a Economia e Finanças], Leong Iok Wa, Lok Po, Io Hong Meng e Ho Sut Heng sugeriram que se altere o sistema de atribuição de quotas para o ingresso no ensino superior do Continente. A ideia é que haja uma divisão entre as quotas atribuídas aos estudantes das duas regiões administrativas especiais e as que são concedidas aos alunos nascidos na China. Segundo o jornal de língua chinesa, a proposta visa assegurar os direitos dos alunos da China.

Actualmente, um aluno de Macau ou de Hong Kong pode ser aceite numa universidade chinesa com base numa entrevista com comissões dos estabelecimentos de ensino, não estando obrigado a fazer o exame nacional de acesso ao ensino superior, o ‘gao kao’.

As quotas de acesso aumentaram até 40 por cento para alunos com nota excelente, devido à promoção junto das escolas de Macau. Os deputados consideraram que os alunos reagiram de forma activa ao processo. No final, cerca de 78 por cento dos alunos conseguiram entrar nas instituições de ensino superior chinesas.

O problema prende-se com o facto de, devido às restrições, as quotas de acesso não poderem exceder os números atribuídos pelo país. Isso significa que, por cada aluno de Macau e de Hong Kong que é aceite por entrevista e que depois acaba por não se candidatar, há menos uma vaga disponível para um aluno do Continente.

Para os oito deputados à APN, a alteração do actual sistema de atribuição de quotas também é mais uma forma de garantir a fórmula “Um país, dois sistemas”. Foi também sugerido que se reveja toda a política e o sistema de acesso ao ensino superior na China, cujo trabalho deve começar já este ano, com vista a melhorar os trabalhos para o próximo ano. Os deputados acreditam que se possa considerar uma maior flexibilidade dessa política e dar mais opções para os cursos disponíveis.

14 Mar 2017

Proposta de lei dos consumidores pode chegar à Assembleia ainda este ano

Com Vítor Ng

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] proposta de lei de protecção dos consumidores pode dar entrada na Assembleia Legislativa até ao final do ano. A ideia foi deixada por Wong Hon Neng, presidente da comissão executiva do Conselho de Consumidores (CC).

De acordo com o responsável, a elaboração do articulado para a lei de defesa dos consumidores já está, efectivamente, em fase avançada. “Foi criado um grupo de trabalho que, depois de ter divulgado o relatório da consulta à população sobre o regime da protecção dos direitos e interesses dos consumidores, iniciou, de imediato, o planeamento da proposta de lei”, afirma Wong Hon Neng.

No entanto, dada a quantidade e complexidade dos artigos, diz, o CC está ainda a proceder a melhoramentos do diploma, sendo que, “até ao final deste ano, a proposta pode entrar oficialmente no processo de legislação”. O objectivo, sublinhou, é “reforçar a garantia dos direitos e interesses dos consumidores, e a fiscalização de transacções online”.

Para protecção dos consumidores, Wong Hon Neng recorda que, aquando do tratamento de queixas que contemplam empresas locais, o conselho entra directamente em contacto com as entidades acusadas. Quando se tratam de queixas apontadas a empresas do exterior, o organismo dá a conhecer a situação à protecção de consumidores estrangeira, sendo que já existe um contrato de cooperação com Macau.

Na agenda do conselho está ainda a melhoria dos processos de certificação de lojas virtuais. “O CC vai continuar atento aos critérios de certificação, sendo que será cada vez mais difícil obter a autorização necessária”, apontou Wong Hon Neng. No entanto, as empresas sem as condições exigidas têm ainda a possibilidade de melhorar os serviços sob instruções do próprio CC.

Atrasos sucessivos

No final do ano passado, o deputado Si Ka Lon alertou a Administração para a necessidade de ser mais pró-activa na divulgação junto dos comerciantes das vantagens de adesão ao programa das lojas certificadas. Numa interpelação escrita ao Executivo, o tribuno mostrava-se preocupado também com o facto de não haver uma data para a submissão da proposta de lei dos direitos do consumidor.

A consulta pública sobre a revisão do regime da defesa dos direitos e interesses do consumidor foi concluída em 2014. No ano seguinte, os Serviços de Economia diziam que a proposta iria estar pronta ainda nesse ano, e que o processo legislativo deveria ter início em Novembro.

 

14 Mar 2017

Legislativas | Candidatos com menos dinheiro. Eleições são dia 17 de Setembro

Já se sabe o dia em que os eleitores de Macau vão eleger os deputados para a próxima legislatura. Chui Sai On também fixou o limite de despesas por candidatura. É bastante inferior ao das últimas eleições. A medida é bem recebida, mas não basta

Com Vítor Ng

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] um mês e um dia depois do fim da legislatura, a um mês menos um dia do início da próxima. A 17 de Setembro, os eleitores do território vão às urnas escolher os 14 deputados eleitos por sufrágio directo. No mesmo dia, no sufrágio de base corporativa, são eleitos os 12 deputados da via indirecta. O grupo ficará depois completo com os nomeados de Chui Sai On.

A data foi publicada ontem por ordem executiva do Chefe do Executivo. Também em Boletim Oficial foi divulgado o despacho do líder do Governo que determina o limite das despesas que cada candidatura pode gastar nas eleições: mais de três milhões e meio de patacas (3.549.622).

O número representa uma queda significativa em relação às últimas eleições, em 2013, altura em que cada lista estava autorizada a despender mais de 5,6 milhões.

Para José Pereira Coutinho, trata-se de um sinal positivo, por corresponder à ideia de que candidatos com menos posses terão oportunidades semelhantes às dos mais afortunados. No entanto, o deputado e candidato às eleições destaca que, além da teoria, é preciso garantir que, na prática, estes limites são cumpridos.

Positivo e tanto faz

“A utilização desse dinheiro para publicidade de cada uma das listas deve ser justa, ou seja, não deve ser pelo facto de haver maior capacidade financeira que certos candidatos devem ter maior exposição pública”, sublinha. “É importante também que as listas cumpram rigorosamente o limite das despesas.”

Pereira Coutinho alerta ainda para pormenores de execução dos limites agora conhecidos. “Na prática, em muitas listas ligadas a certos grupos empresariais, é difícil fiscalizar o cumprimento das regras, na medida em que, por interpostas pessoas, pode estar a ser despendido dinheiro do bolso dos candidatos, que não vai directamente das listas.” Por isso, o deputado recomenda “muita pedagogia” para que estas normas sejam observadas.

Au Kam San é da mesma opinião de Pereira Coutinho: o montante que tinha sido autorizado para as eleições de 2013 era claramente excessivo, “apesar de, na altura, já ter havido uma diminuição”. Fazendo uma alusão à relação dos valores permitidos com as contas públicas, o pró-democrata saúda esta revisão em baixa.

“O Chefe do Executivo diminuiu o valor limite e isso é razoável”, afirma Au Kam San, acrescentando que são números que, em termos concretos, não afectam a sua candidatura. “Não vamos gastar esses valores.”

Já Ella Lei não tem opinião sobre a matéria, não proferindo qualquer juízo de valor acerca desta diminuição. A deputada eleita por via indirecta, ligada aos Operários, limita-se a dizer que “é normal que o Chefe do Executivo defina um limite de despesas”, rematando com a ideia de que os candidatos “têm de respeitar essas regras”.

14 Mar 2017

Ho Chio Meng | Oriana Pun assegura defesa do ex-procurador

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] antigo líder do Ministério Público (MP) já tem nova defesa. Depois de ter ficado sem advogado, uma vez que Leong Veng Pun pediu o abandono do patrocínio, Ho Chio Meng passa agora a ser defendido por Oriana Pun, noticiou ontem a Rádio Macau.

Advogada desde 2005, Oriana Pun domina a língua portuguesa e faz parte da Direcção da Associação dos Advogados. O prazo para o ex-procurador constituir nova defesa terminava hoje e Ho Chio Meng evitou, assim, ser defendido por um advogado oficioso.

Leong Veng Pun deixou de defender Ho Chio Meng na passada quarta-feira, alegando falta de condições. A juíza titular do processo decidiu notificar o defensor para esclarecer ao tribunal o motivo do abandono, tendo-lhe lembrado que deve cumprir os deveres estipulados no Código Deontológico dos Advogados, de modo a que o arguido pudesse obter atempadamente a assistência de outro causídico. No mesmo dia, foram suspensas as sessões de julgamento que estavam já agendadas.

Em comunicado, o Tribunal de Última Instância dizia então que, mal estivesse marcada nova data para a realização da audiência, seriam divulgadas ao público as informações sobre o processo. Até à hora de fecho desta edição, ainda não tinham sido anunciados detalhes sobre quando voltará Ho Chio Meng a tribunal.

O julgamento do ex-procurador da RAEM começou a 9 de Dezembro do ano passado. Vai acusado de mais de 1500 crimes. No Tribunal Judicial de Base, arrancou em meados de Fevereiro o processo que tem como arguidos ex-funcionários do MP, familiares de Ho Chio Meng e empresários que alegadamente cometeram os crimes em co-autoria com o antigo procurador.

14 Mar 2017

Pouca liberdade académica, investigações e prestígio: a análise ao trabalho do reitor da UM, Wei Zhao

Em nove anos à frente da Universidade de Macau, Wei Zhao lidou com a mudança da instituição para o campus da Ilha da Montanha e enfrentou investigações de auditoria. Há quem entenda que trouxe prestígio à instituição. Outros dizem que não respeitou a liberdade académica

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]ntrou em 2008 e deixará o lugar dez anos depois, em Novembro do próximo ano. Está quase concluída a história de Wei Zhao como reitor da Universidade de Macau (UM), após ter decidido não se recandidatar a um terceiro mandato. O Governo reagiu ontem à sua saída da universidade pública através de um comunicado oficial.

“O secretário para os Assuntos Sociais e Cultura [Alexis Tam] respeita a autonomia de que beneficia a UM, assim como a decisão tomada pelo próprio reitor”, lê-se no documento. Além disso, o secretário “reconhece os trabalhos realizados pelo professor Wei Zhao enquanto reitor da UM”.

A UM emitiu ontem um comunicado onde explica que o novo reitor será escolhido com base num processo de recrutamento internacional, levado a cabo por uma comissão que ainda não tem data para ser criada.

“A universidade fez grandes progressos nos últimos anos em termos de desempenho e ao nível da obtenção de reputação internacional, investigação e publicações, e na promoção dos talentos”, considerou Peter Lam, presidente do organismo.

O HM falou com personalidades que não têm uma relação directa com a UM para analisar o mandato de Wei Zhao. Segundo o politólogo Larry So, foi um homem que, acima de tudo, contribuiu para um maior prestígio da universidade.

“A coisa mais importante é que a UM mudou-se para a Ilha da Montanha e tem hoje um campus muito maior do que o anterior. Durante o seu mandato, houve uma maior promoção da UM junto da China em termos de reputação e rankings. Colocou um grande ênfase na construção da reputação da universidade”, apontou.

Pouca liberdade académica

Ainda assim, as críticas chegam quanto à promoção de uma maior liberdade académica. Poderia ter feito mais, mas não fez. “Por norma, a liberdade académica é aceitável [em Macau]. Tanto na UM, como no Instituto Politécnico de Macau a Administração respeita-a, mas diria que há umas certas limitações, uma espécie de autocensura. O próprio reitor nunca fez uma promoção no sentido de existir uma forte liberdade académica ou de expressão. Ele teve bastantes oportunidades para fazer uma melhoria nesse sentido”, acrescentou Larry So.

Jason Chao, activista, é ainda mais claro. “Não posso dizer que tenha sido um grande apoiante da liberdade académica. Não acredito que haja uma garantia da liberdade académica dentro do actual sistema. Independentemente da pessoa que for escolhida para ser o novo reitor, não me parece que as coisas vão mudar.”

Para Éric Sautedé, actualmente a trabalhar em Hong Kong, Wei Zhao não respeitou a liberdade académica, tendo-a ignorado. “O grande erro foi o despedimento de Bill Chou em 2014, por razões possivelmente ‘fabricadas’ e muito dúbias. A liberdade de expressão não foi respeitada e continua a ser esquecida como, por exemplo, para organizar um simples evento para celebrar o 4 de Junho [dia do protesto em Tiananmen]”, apontou.

Polémicas e silêncios

Wei Zhao tem sido um reitor parco em palavras, em que as raras entrevistas são concedidas aos meios de comunicação de língua chinesa. Ainda assim, não teve um mandato fácil.

Um dos casos mais polémicos aconteceu em 2011, quando se soube que o recém-nomeado director da faculdade de Direito, John Mo [entretanto substituído por Gabriel Tong], não era especialista em Direito de Macau. O facto gerou várias críticas por parte da comunidade jurídica, mas o próprio John Mo acabaria por desvalorizar o episódio.

Já em Fevereiro de 2015, o Comissariado de Auditoria (CA) resolveu investigar o “regime de atribuição de alojamento aos trabalhadores da UM”, tema que foi alvo de reportagens devido à existência de alegadas irregularidades e desigualdades na distribuição de apartamentos a docentes no novo campus. Contudo, nada foi apontado à instituição. Foi também analisada a “Instalação da Fundação para o Desenvolvimento da Universidade de Macau”.

O CA analisou ainda a criação do Instituto de Investigação Científica e Tecnológica da Universidade de Macau em Zhuhai, cuja criação “comportou graves riscos” para a Administração. Vários juristas chegaram a apontar ao HM que tal acto constituía uma violação da Lei Básica, mas o Governo optou por não fazer uma investigação por considerar que esta interpretação não constou do relatório do CA.

“Não temos muitas informações sobre essa questão. Se me pergunta se, de certa forma, afectou a continuidade do mandato ou a sua reputação, teríamos de ter mais informações para fazer comentários. Comentar algo de forma especulativa não seria justo nem para ele, nem para a própria universidade”, comenta agora Larry So.

Para Éric Sautedé, Wei Zhao “implementou um sistema bastante opaco de gestão, em que o instituto de investigação em Zhuhai é apenas a ponta do icebergue”.

14 Mar 2017

Polytec | Projecto na Areia Preta está pronto até Julho

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] presidente do Grupo Polytec, Or Wai Sheun, acredita que o projecto previsto para o lote T na zona da Areia Preta pode ser concluído antes do término do prazo da concessão do terreno, apontado para Julho. De acordo com declarações dadas ao canal chinês da Rádio Macau, o projecto pode ser concluído em Maio e obter a licença de utilização em Julho.

O responsável pelo grupo imobiliário acredita que o destino do empreendimento do lote T não será o mesmo do Pearl Horizon. Sobre este caso, o responsável põe em causa o tratamento dado ao processo pelo Governo e a forma como o Executivo procedeu à recuperação do terreno. Para Or Wai Sheun, o Grupo Polytec não teve responsabilidades no incumprimento de prazos e defende que é necessário ter em conta os interesses dos proprietários.

O grupo imobiliário perdeu, no mês de Dezembro, a segunda acção em tribunal sobre a questão. A empresa avançou com uma providência cautelar para suspender a reversão do terreno para o Governo até que o tribunal decretasse a última decisão sobre o processo. A providência foi apresentada em Novembro, tendo sido rejeitada pelo Tribunal de Última Instância.

Entretanto, há cerca de três mil proprietários de fracções do Pearl Horizon que não chegaram a receber as chaves do alvo do investimento. Após várias manifestações, no início de Fevereiro, os lesados pediram explicações a Lau Si Io por considerarem que o ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas deveria explicar em público a intenção legislativa do articulado que permitiu ao Governo travar a obra do empreendimento.

14 Mar 2017

Jornal inglês Guardian publica texto sobre “lado negro” da economia de Macau

Gente sem outra opção que não viver em Zhuhai, pessoas que vivem em casas modestas mas que trabalham em hotéis de luxo. A inflação, as ruas pobres, o contraste com a riqueza. O Guardian decidiu olhar para a Macau além casinos
Versão online do artigo do The Guardian

[dropcap style≠’circle’]C[/dropcap]hama-se Auyeung Lai-sung e serve de pivô a um longo texto através do qual o Guardian tenta mostrar que existe outra realidade em Macau além do luxo. É com a história desta mulher que o artigo começa: Auyeung Lai-sung veio clandestina para Macau, numa tentativa de escapar à extrema pobreza na China rural. Entrou ilegal no território mas, em vez de um futuro brilhante, “nunca conseguiu passar da cozinha de um dos mais lucrativos casinos do mundo”.

A entrevistada acorda de madrugada para fazer ‘dim sum’ para um restaurante de cinco estrelas, enquanto à noite janta noodles instantâneas para poupar dinheiro, para dar apoio à família. “Vejo as pessoas no restaurante e interrogo-me como é que conseguiram ganhar tanto”, comentou. “Eu queixo-me, mas é inútil. Nada vai mudar.”

O Guardian enquadra depois Macau: é o terceiro sítio mais rico do mundo. Está à frente de Singapura, Noruega ou Suíça, e atrás apenas do Luxemburgo e do Qatar. Seguem-se os números do jogo, a noção de que houve uma quebra “ligeira” em 2015, e a ideia de que o sector está em recuperação. O dinheiro dos casinos constitui 70 por cento das receitas do Governo e “os cofres públicos beneficiaram do crescimento económico da China, com mais milionários a querem viajar para o único local do país onde as apostas nas salas de jogo são legais”.

O texto inclui uma alusão ao facto de ter sido a cidade onde viveu Kim Jong-nam, o meio-irmão do líder norte-coreano Kim Jong-un, assassinado no aeroporto de Kuala Lumpur no mês passado. “É também um destino de eleição para funcionários corruptos do Governo chinês”, apesar de esta tendência ter sido alterada com a campanha de luta contra a corrupção no Continente.

“Mas ao lado dos muito ricos de Macau, estão os muito pobres”, escreve o diário. As estatísticas oficiais dizem que 2,3 por cento da população vive em situação de pobreza, mas “essa percentagem é baseada nos rendimentos, não tendo em conta a espiral do custo de vida que acompanhou o boom da indústria dos casinos”.

Ouvidos de mercador

A Caritas estima que 10 por cento da população vive na pobreza, com sete por cento a lutar para garantir necessidades básicas, como a alimentação. A este propósito, o Guardian cita o político e “líder de uma força pró-democrática” Pereira Coutinho: “O Governo não pode fazer nada para ajudar os pobres porque a corrupção é desenfreada. Só os ricos é que são ouvidos pelo Executivo, enquanto os pobres são ignorados e sofrem”.

No artigo faz-se ainda referência à distribuição anual de nove mil patacas, com a entrevistada central do texto, Auyeung Lai-sung, a lamentar a falta de apoios sociais em continuidade. “É notório o contraste entre o apartamento onde vive e os halls dos opulentos casinos”, lê-se.

O autor do texto passou pelo Cotai mas também visitou o Iao Hon, bairro onde “um terço da população trabalha em casinos”. O local “não tem o glamour dos casinos ou o charme colonial por norma associados à cidade”. O secretário-geral da Caritas, Paul Pun, é citado para explicar que o fosso entre ricos e os pobres é grande, “o Governo tem consciência do problema, mas precisa de ter coragem para o enfrentar e para lidar com os investidores do sector imobiliário”.

Entrevistado é também um homem que, durante 40 anos, trabalhou na construção civil. Não teve possibilidade de comprar uma casa e, há quatro anos, mudou-se para Zhuhai. Para o homem, que tem agora 83 anos, foi a única forma de evitar ficar sem um tecto. “Sinto-me só aqui, todos os meus amigos estão em Macau e não tenho com quem conversar. Trabalhei muito toda a minha vida. Nunca imaginei que Macau pudesse mudar tanto.”

O artigo do Guardian contava ontem com quase uma centena de comentários, de leitores que lamentam os estragos provocados pelo desenvolvimento do jogo, mas também de quem considera que o texto reúne apenas lugares-comuns.

14 Mar 2017

Sanaz Fotouhi, co-produtora de “Love marriage in kabul”: “A política não vai criar a paz”

Co-produziu um filme que aborda a questão dos casamentos arranjados no Afeganistão, mas também escreve. “Love Marriage in Kabul” foi o passaporte para Sanaz Fotouhi vir a Macau participar no festival Rota das Letras. Com o HM conversou sobre o Afeganistão do pós-guerra e de como os padrões ocidentais de liberdade trazem pressão às mulheres do Médio Oriente

[dropcap]Q[/dropcap]Qual a história que está por detrás do documentário “Love Marriage Kabul”? Como é que chegou a esse projecto?
Na realidade, é uma história longa. Quando decidimos [Sanaz trabalhou com Amin Palangi e Pat Fiske] fazer o filme não era para ser este em particular. Em 2006, decidimos fazer um filme sobre o Afeganistão, então viajámos para lá e procurámos por temas interessantes. Deparámo-nos com um assunto terrível, as mulheres que se imolam, como tentativa de suicídio. Mas a curta-metragem, intitulada “Hidden Generation [Geração Escondida]”, continha um assunto tão horrível que as pessoas não se identificaram e, surpreendentemente, o filme não correu assim tão bem, porque não houve essa identificação. Decidimos fazer algo mais positivo. Demorámos alguns anos a pesquisar sobre este assunto, queríamos encontrar uma história feliz. Só depois de ter acesso a esta organização [Mahboba’s Promise] é que descobrimos a história perfeita para fazer o filme.

É difícil encontrar histórias felizes junto das mulheres do Médio Oriente?
Penso que não é difícil, há muitas histórias. É difícil, isso sim, ter acesso às histórias. Sabemos que elas existem, mas o que é mais difícil é estabelecer esse contacto para que as pessoas contem as suas histórias.

As pessoas têm medo de contar ou consideram que muitos dos casos que ocorrem são normais?
É uma questão cultural. O Médio Oriente tem sociedades muito segregadas, a diferença entre o que é público e privado é muito clara. Assuntos como o casamento, ter filhos, suicídio, são coisas muito pessoais, sobre as quais as pessoas não querem falar, sobretudo com alguém estrangeiro. Por isso é que ajudou bastante o facto de ser mulher para fazer este filme. O meu parceiro é o director do filme, mas é um homem [Amin Palangi] e não conseguiu ir a sítios onde eu conseguia ir. Então o meu papel para obter as histórias das mulheres foi muito importante.

Este filme teve uma grande projecção internacional. Isso é fundamental para mostrar ao mundo o que está a acontecer com as mulheres no Médio Oriente?
Sim. Quisemos sobretudo mostrar às pessoas que a vida continua, que as pessoas conseguem viver para além da guerra [do Afeganistão], algo que tem vindo a acontecer de forma contínua nos últimos anos. Com o “Hidden Generation” quisemos mostrar a ocorrência de um problema, era urgente e importante, mas como era muito errado, não havia uma conexão com as pessoas. Mas “Love Marriage in Kabul” tem uma história que todos gostam, todos se apaixonam por ela. Por isso é que as pessoas se identificam mais com este filme.

Nasceu no Irão. Por que decidiu fazer um filme no Afeganistão?
Em parte foi coincidência. O meu pai trabalhou no Afeganistão, em Cabul, então ficámos fascinados com o país. E depois é muito mais fácil fazer filmes no Afeganistão do que no Irão (risos).

Devido à censura?
Sim e também porque precisamos de muitas coisas, permissões, pedidos. No Afeganistão podemos ir simplesmente aos sítios.

Há ainda uma repressão em relação à mulher iraniana?
Para quem vive fora do Irão, ter acesso à realidade do país pode ser surpreendente, porque as mulheres na verdade têm bastante poder e têm vindo a ganhá-lo nos últimos anos. Olhando para os números de acesso às universidades, há mais mulheres do que homens, as mulheres são poderosas nos negócios, são educadas, têm uma voz. A situação é boa se compararmos com outros países vizinhos.

Como a Arábia Saudita, por exemplo.
Sim. Não posso comparar com o Afeganistão, porque o país ainda está a recuperar da guerra. É preciso tempo para recuperar. Mas, comparando com a Arábia Saudita, sem dúvida que a vida é melhor. Há grandes diferenças.

E no Afeganistão? A sociedade está a recuperar no sentido certo?
As coisas têm vindo a melhorar. Quando visitámos o país em 2006, e quando voltámos em 2009, e depois em 2013, fomos observando muitas mudanças. Logo a seguir à saída dos Talibã o país não tinha quaisquer infra-estruturas. Não havia telefones, bancos, tudo foi destruído. Gradualmente fomos vendo uma melhoria na sociedade. Mas, ao mesmo tempo, penso que a situação das mulheres ficou diferente. No filme “Hidden Generation” investigámos as razões pelas quais as mulheres se tentavam imolar. E surpreendentemente as mulheres começaram a fazer essas tentativas depois da saída dos Talibã. Pensávamos que as coisas seriam piores durante o Governo Talibã, mas descobrimos que, com a sua saída, novas coisas começaram a aparecer no país. As mulheres ficaram expostas a novas ideias, mas houve muita pressão.

Não sabiam como lidar com essas ideias.
Não sabiam. Quando os Talibã saíram, a televisão voltou ao Afeganistão. Então as mulheres começaram a assistir a filmes Bollywood e a ver coisas diferentes, mulheres a exporem-se. Muitas pessoas decidiram ir para países como o Paquistão ou o Irão porque a guerra acabou, mas depararam-se com situações de pobreza, também com muita pressão. Depois da guerra começou a surgir também a influência de muitas organizações não-governamentais (ONG) que chegaram ao Afeganistão e começaram a dizer que era preciso dar liberdade às mulheres. Mas a liberdade foi imposta segundo padrões ocidentais. O que percebemos é que podemos ensinar isso às mulheres, mas os homens não estão preparados para ter isso na sociedade. As mulheres podem começar a protestar, mas os homens vão dizer “cala-te e senta-te”. É uma situação extremamente complexa. Não podemos culpar os homens directamente, porque para eles é uma forma de protecção, não sabem lidar com isso.

Como se pode criar então uma liberdade com padrões adaptados ao Médio Oriente, aos seus usos e costumes?
A liberdade é uma coisa relativa. Há diferentes padrões de liberdade. É muito difícil abordar isto porque a liberdade dos países ocidentais é muito diferente da liberdade do Médio Oriente. Há uma enorme diferença cultural. Não acho que a comunidade internacional seja responsabilizada por trazer essa liberdade. Temos é de criar compreensão para que as pessoas possam avançar para isso sem qualquer tipo de críticas. Essa é a solução.

É necessário então uma maior promoção dos ideais e mais acções de educação.
Mais do que as ONG, penso que as histórias são importantes, a arte é importante. Acho que a política não vai criar a paz, é apenas sobre benefícios materiais. Exposições, fotografias, filmes, são uma boa forma de criar essa conexão.

A sua família estava no Irão em 1979. Como viveram a revolução?
A minha história é diferente, porque eu não cresci no Irão. Vivi no Japão, na América, em Hong Kong. O meu pai era bancário e não me considero a típica mulher iraniana. Mas sim, a minha família estava no país nessa altura, viram tudo de fora, não eram propriamente apoiantes do que estavam a acontecer, não se envolveram nessa questão. O meu pai sempre trabalhou em vários países.

Sente-se afortunada pelo facto de não ter vivido no Irão? Isso deu-lhe maior liberdade para fazer coisas?
Essa é uma pergunta interessante, nunca pensei sobre isso. A minha história é única. Sinto que faço mais coisas, e não apenas em relação às mulheres no Irão. Mas isso não tem que ver com o facto de ser iraniana, mas sim com o meu estilo de vida, com o facto de viajar tanto.

Que projectos pretende desenvolver a seguir?
Estou a trabalhar num livro sobre este filme, estou à procura de uma editora. É sobre os bastidores do filme, mas também sobre a minha perspectiva enquanto mulher no Afeganistão. Também sou directora-geral da Asia-Pacific Writers and Translators (Escritores e Tradutores da Ásia-Pacífico).

14 Mar 2017

Xi Jinping quer exército a modernizar-se tecnologicamente

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Presidente chinês, Xi Jinping, instou as Forças Armadas do país a aproveitar o desenvolvimento tecnológico da China para modernizar o seu equipamento e integrar-se mais com o sector civil.

Segundo avançou ontem a imprensa oficial, o líder chinês fez estas declarações no domingo, ao reunir-se com delegados do exército na Assembleia Nacional Popular, o órgão máximo legislativo da China.

O exército deve aproveitar os êxitos alcançados pela China na ciência e tecnologia para actualizar as suas armas e equipamento e os militares devem melhorar a sua formação e treino para incluir estas matérias e serem mais profissionais, afirmou.

Xi Jinping disse ainda que as tecnologias militares e civis estão cada vez mais conectadas.

O Presidente chinês pediu aos militares que façam pleno uso das tecnologias civis, visando a modernização do exército, e que facilitem a transferência das inovações de origem militar para as empresas para que possam ter uma utilidade mais prática.

Nesse sentido, o chefe de Estado chinês apelou à eliminação de barreiras institucionais e dos grupos de interesse que travam essa integração entre a sociedade e o exército.

Processo em curso

As Forças Armadas chinesas atravessam um processo de reforma, que arrancou há dois anos, e que visa modernizar a organização e reduzir o número de efectivos em 300.000, para dois milhões, até ao final deste ano.

Parte dessa remodelação inclui uma maior integração entre os sectores civil e militar, para a qual foi criada uma comissão específica em Janeiro, presidida por Xi.

A China vai aumentar em 7% os gastos com a Defesa este ano, para 151.000 milhões de dólares, o ritmo mais lento desde 1991, revelou o Governo na semana passada.

O primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, disse que as defesas aérea e marítima serão reforçadas, assim como os controlos fronteiriços, visando salvaguardar o interesse e segurança nacionais.

Segundo avança ontem o jornal de Hong Kong South China Morning Post, o exército chinês planeia quintuplicar o seu corpo de marinheiros, de 20.000 para 100.000 efectivos, para proteger os crescentes interesses do país além-fronteiras.

14 Mar 2017

Apoiantes da ex-Presidente sul coreana em confrontos com a polícia

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m grupo de apoiantes de Park Geun-hye envolveu-se ontem em confrontos com a polícia e jornalistas que se encontravam frente à casa da ex-presidente da Coreia do Sul destituída na sexta-feira.

Uma dezena de apoiantes de Park, que inicialmente se encontravam concentrados junto ao edifício da presidência sul-coreana, no sul de Seul, organizaram uma vigília frente à residência da ex-Presidente, agitando bandeiras e insultando os jornalistas presentes no local.

Os manifestantes tentaram impedir os fotógrafos e os repórteres das televisões de captarem imagens do interior da casa de Park Geun-hye, situada no bairro de Gangnam, em Seul.

O comportamento dos apoiantes da ex-Presidente obrigou a polícia a intervir.

Por volta das 15:30 o número de jornalistas e de apoiantes de Park aumentou o que levou as autoridades a instalar barreiras para separar os dois grupos.

Os apoiantes da ex-Presidente envolveram-se em violentos confrontos com a polícia no sábado e na sexta-feira, depois do Tribunal Constitucional ter anunciado a ratificação da destituição de Park, aprovada pelo Parlamento no passado mês de Dezembro, por ligações à rede “Rasputina”.

Teoria da conspiração

Nos confrontos dos últimos dias, três apoiantes de Park morreram e várias pessoas ficaram feridas.

Segundo a agência Yonhap, muitos dos seguidores de Park declaram-se “nostálgicos” da ditadura de Park Chung-hee, pai da chefe de Estado destituída, e que governou o país entre 1961 e 1979.

Para os apoiantes da família Park, o processo de destituição foi uma conspiração dos partidos de esquerda e dos meios de comunicação social.

Na sexta-feira, o Tribunal Constitucional considerou que a ex-Presidente infringiu a lei ao permitir que a amiga Choi Soon-sil, conhecida como “Rasputina”, se tivesse imiscuído em assuntos de Estado, sem ocupar qualquer cargo público e envolvendo-se em processos de extorsão de fundos a grandes empresas sul-coreanas.

Após a decisão do Tribunal Constitucional, Park perdeu a imunidade e o Parlamento é obrigado a marcar eleições presidenciais nos próximos 60 dias.

Segundo a Yonhap, que consultou especialistas, é provável que as eleições se realizem no próximo dia 9 de Maio.

14 Mar 2017

Análise da 7ª jornada | Benfica soma e segue

João Maria Pegado

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] desta maneira que o líder do campeonato continua o caminho para a revalidação do titulo. Mais um triunfo, desta vez: CPK 0 Vs Benfica De Macau 4.

O jogo até começou de maneira positiva para o CPK, a ocupar o meio campo ofensivo ia criando boas situações para finalização e ia deixando a equipa encarnada intranquila na defesa. Nesta altura Batista diz presente e manteve o núlo.

A equipa de Inacio Hui apresentou num 4-3-3 com um triângulo invertido no meio campo com Bruno Figueiredo mais perto de Pedro Clementes para contrariar e emparelhar com o triângulo ofensivo do Benfica. Surpresa para a ausência de Vinicius Akia, jogador que tinha estado muito bem na partida frente ao Monte Carlo, e no seu lugar entrou Ho Ka Seng. Com esta entrada do adversário forte, o treinador Henrique Nunes, que apresentou o onze habitual somente com uma mudança Amancio Goitia no lugar de Chan Man, começou a corrigir certos aspectos que estavam a contribuir para o ascendente do CPK. A linha defensiva juntou mais ao meio campo e equipa encarnada começou a  recuperar a bola mais à frente no seu meio campo, não permitindo que Patriota aproveitasse o espaço que até ali existia entre a defesa e meio campo encarnado. Com esta nova forma de estar, o Benfica começou a sair em transições rápidas para o ataque apanhando o CPK em contra pé e ia começando a equilibrar as oportunidades de golo . Destaque nessa altura para uma fabulosa defesa de Domingos a remate de Leonel Fernandes.

Dava para sentir que seria uma questão de minutos até surgir o primeiro golo dos encarnados, visto o CPK ter começado a esticar demasiado a sua equipa e haver diversos espaços entre os seus sectores. E assim foi. Aos 30 minutos golo de Carlos Leonel a aproveitar uma assistência de cabeça de Nicholas Torrão que sozinho, erro de Ronald que foi ao lado contrário da sua defesa, nas costas dos centrais tocou para dentro onde estava o número 45 do Benfica a finalizar.

No artigo anterior foi dito que a linha defensiva do CPK tinha que roçar a perfeição para a equipa sonhar com um resultado positivo e que qualquer erro seria fatal e assim foi. Minutos seguintes. Falta numa zona perigosa e Edgar Teixeira a bater o livre por cima da barreira e Domingos mal é mal batido. Estava feito o 2-0 e foi-se para intervalo.

Mais do mesmo

Na segunda parte as equipas voltaram sem alterações e notou-se que a equipa liderada por Diego Patriota estava já derrotada psicologicamente e só chegava a baliza do Benfica com remates de longe. Os encarnados com um treinador muito energético a partir do banco não deixava os seus jogadores baixar a guarda e aos 60 minutos a defesa do CPK não tira a bola de dentro de área e um excelente pormenor de Loenel Fernandes a passar a bola por cima do central adversário e retribui a oferta do primeiro golo para Nicholas Torrão que assim fez o 3-0.

Jogo resolvido e destaque para último golo aos 90 minutos pelo jovem Ethan Lay, que marcou o seu primeiro tento pelos encarnados.

Ficou claro que este Benfica é superior a qualquer equipa e que será muito difícil alguém tirar pontos a esta equipa que para mais começou apresentar em campo os seu reforços que fazem dela um plantel mais completo.

Quanto ao CPK o mesmo problema que foi identificado em jogos anteriores. A falta de Ronieli (Cheng Fung) e ausência de um jogador para o substituir faz com que todo o trabalho da equipa seja inglório, mais a ausência de uma liderança a nível de treinador que também se faz notar.

Restantes jogos

Quinta feira um jogo interessante de assitir. Cheng Fung 1 Vs 1 KA I , os pupilos de João Rosa conseguiram o empate através de Ronieli após sofrerem o primeiro golo do KA I convertido de livre por William Carlos Gomes. Surpresa talvez pelos números que foram, para a derrota do Sporting 1 Vs 5 Kei Lun. Os leões jogaram com menos um, após uma expulsão infantil, e da parte do Kei Lun destaque para Cesar De Souza com dois golos.

Na sexta-feira, vitória importantíssima na luta pela permanência do Development 1 Vs 0 Lai Chi. No fecho da jornada sete o Monte Carlo 5 Vs 1 Policia . Os canarinhos ainda passaram pelo susto de estar a perder mas depois veio a melhor capacidade do conjunto orientado por Claudio Roberto que com o seu ataque destroçou a Policia com destaque para os dois golos de Neto.

Edgar Teixeira # 14 Homem da jornada

Tudo que faz parece fácil. A maneira com que toca na bola faz com que os relvados de Macau pareçam dos melhores do mundo. A sua inteligência táctica permite que faça mais de uma posição. Desta vez acabou a ala. Para já vai conquistando um lugar para melhor do campeonato.

14 Mar 2017

O problema dos clones

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]m destes dias jantei com uma amiga, a Inês, e, a páginas tantas, ela confessa-me a sua relutância em ser teletransportada. “O teletransporte, a existir”, assegura-me, “não funcionaria como vemos nos filmes de ficção científica”. “E isso quer dizer o quê?” Pergunto. “Nos filmes de ficção científica”, prossegue, “o teletransporte é equivalente a mover água de um sítio para outro, ou seja, a matéria que estava de um lado é transferida para outro lado através de um meio adequado para o efeito.” De facto, pensei, é também assim que eu concebo o teletransporte, enquanto possibilidade de um futuro por acontecer. “O teletransporte assemelha-se muito mais a uma cópia, na verdade. O sujeito está do lado de cá, passa por uma espécie de scanner que o lê e, do lado de lá, é reconstruído. Mas não é a mesma matéria que passa de um lado para o outro, é como se o resultado do transporte fosse, na verdade, uma versão dois de ti próprio, um clone.”

Um clone. Se nos focarmos no processo leitura e recriação, tal como a Inês mo descreveu e que corresponde, de resto, ao modo como a física quântica o teoriza, é difícil não pensarmos nas implicações que uma tecnologia deste tipo teria ao nível daquilo que postulamos ser a identidade. Mesmo que não seja possível termos – como de resto não o parece ser, pois a leitura quântica é de carácter destrutivo –, num determinado instante, dois sujeitos exactamente iguais coexistindo – mesmo que por fracções de segundo –, ficam algumas dúvidas inquietantes.

Cada teletransporte corresponderia, na verdade, a uma espécie de suicídio. O sujeito – ao contrário do que acontece, por exemplo, num elevador, no qual a pessoa que entra e que sai é a mesma – entraria num compartimento e, no processo, seria destruído para poder ser reconstruído noutro local. De certo modo, isto reconfortava a Inês. Era garantia de não poderem existir, em simultâneo, duas criaturas absolutamente idênticas. Mas a questão da recriação criava outros problemas, nomeadamente a questão das versões.

A Inês não estava de todo confortável com o facto de cada transporte ser uma espécie de progressão aritmética de versões de si própria. Afinal, e mesmo sem a possibilidade de existir outro eu para além de mim, pela natureza específica do processo, o sujeito tinha forçosamente notícia de a sua existência corresponder, na verdade, a uma recriação de um original que já não era ele. Para mim, no entanto, este pensamento não era inquietante. Para existir um clone, insistia, tem de existir um original. Se o original é destruído no processo de cópia, a questão não se põe.

Da nossa discordância acerca da natureza filosófica do teletransporte passámos para outro tipo de considerações. “Imagina”, sugeri-lhe, “que o processo de leitura não era destrutivo. Imagina que te conduziam para dentro de uma sala, completamente às escuras, e que te clonavam. Imagina que o processo era instantâneo e que, quando acendiam as luzes, estavam dezenas de sujeitos exactamente iguais a ti, da roupa às memórias, do corpo à capacidade de se auto-nomearem. Haveria alguma forma de podermos distinguir, com certeza, o original dos clones? Mais importante ainda, haveria alguma forma de o original saber que o era?”. Ficámos o resto da noite nisto. Talvez a quantidade de passos dados dentro da sala pudesse ajudar o sujeito a determinar em que posição estava quando se deu a clonagem. Se, de algum modo e sem se mexer, estivesse numa posição inteiramente diferente da distância que imaginava ter percorrido, saberia com certeza que não era o original. Mas era fácil ultrapassar isso. Se o sujeito fosse de cadeira de rodas, teria uma notícia muito mais difusa da distância percorrida. Ou se a sala fosse antecedida por um corredor extenso que dificultasse a leitura da distância às cegas. O facto, indesmentível, é que todos os sujeitos pensariam ser o original e que todos eles nutririam, mesmo não o verbalizando, a mesma dúvida: e se eu for meramente uma cópia?

Não conseguimos resolver o paradoxo. Nem sei se tem resolução. Mas temos de jantar juntos mais vezes.

14 Mar 2017

A vertigem de nunca estar a ser 

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]m Ver no Escuro, terceiro livro de poesia de Cláudia R. Sampaio, editado em 2016 pela Tinta da China, o título dá-nos de imediato uma pista. Ver no escuro pode querer dizer várias coisas, entre elas a situação literal de alguém que, em casa ou na rua, se esforça por ver o que está diante de si, envolto no escuro. Por outro lado, ver no escuro, e como título de um livro de poesia, pode muito bem querer dizer-nos, indicar-nos que estamos prestes a entrar num espaço, o do livro, onde alguém escreve como se o mundo estivesse fechado num breu e a linguagem o iluminasse.

Por outro lado, e de um modo mais literal, ver no escuro também é o modo como a autora termina o livro: “fazendo-me ver no escuro” Mas eis a última estrofe do livro: “Agora mato-me escrevendo / e aqui ressuscito em rua beijando pés / Eu sou esta verdade / Sou a desorientada concentração / das noites desertas / E ascendo-me, grata, / com a poesia dançando entre a / vida e a morte, magnífica / tapando-me a boca toda, / fazendo-me ver no escuro” (p. 78) Parece claro, este ver no escuro, para a poeta, é o próprio acto da poesia, o acto de escrever poesia. E, contrariamente à poesia de Catarina Santiago Costa e ao seu Tártaro – lido aqui semanas atrás –, Cláudia R. Sampaio não se vira do avesso, nem convoca uma linguagem à revelia da linguagem dos dias, à revelia da linguagem que levamos à rua. Em Ver no Escuro deparamo-nos com a mesma linguagem que levamos à rua a passear, a mesma linguagem com que agradecemos a quem nos acende o cigarro, mas com uma eficácia poética conseguida através de um desequilíbrio sintáctico. Aqui, é o verso que repõe a dimensão metafísica da linguagem e não a palavra. “Tragam-me um homem que me levante com / os olhos / que em mim deposite o fim da tragédia / com a graça de um balão acabado de encher / tragam-me um homem que venha em baldes / solto e líquido para se misturar em mim / (…)” (p. 39) São inúmeros os versos ao longo do livro, onde a distorção da linguagem ilumina partes escuras da existência. Deixemos aqui apenas mais um exemplo, que se prende com o próprio sentido de ver no escuro, que a poeta quer que se veja, independentemente de nos deixar a liberdade de vermos outros, que nos parecem até mais pertinentes: “Passei todo aquele poema a viver.” (p. 63)

Mas Ver no Escuro é também, ou principalmente, um livro sobre o medo do esquecimento. Quando alguém morre, o seu esquecimento dói muito a quem o amou um dia, e continua a amar. Os primeiros tempos de luto, vive-se no paradoxo de lembrar e da dor da lembrança, que nos faz querer esquecer, e este querer esquecer quantas vezes não faz nascer uma culpa inconfessável? Como se não fôssemos dignos, não estivéssemos à altura do amor que nos foi dado. Ou, na tese mais forte e, paradoxalmente, mais calmante para a existência, como se nada pudesse ser feito contra o esquecimento de quem um dia nos amou tanto. “E no fim são todos cinza” (p. 7), canta a poeta no final do primeiro poema. Mas o esquecimento do outro, para nós e para aqueles que compõe o mundo, não é o único esquecimento que dói, a única ausência que faz vibrar a existência, contorcendo-a de uma dor que parece não existir de facto, uma dor que não é uma pedra sobre um rim, uma pedra sobre um braço, uma pedra sobre a fronte. O esquecimento é uma pedra sobre a existência. Uma pedra a dizer para onde vamos, para onde todos caminhamos. Todos os dias se morre: “Os  dias começam com a despedida / de qualquer coisa / nem a água dura para sempre / nem a cova impiedosa deste colchão” (p.40) Todos os dias o mundo caminha para o seu desaparecimento. Tudo está a desaparecer diante dos nossos olhos. Escreve a poeta, este poema à página36:

Morro todos os dias

especialmente depois do lanche

quando pego no regador fininho

onde despejo o dilúvio dos olhos

e vou regando as plantas

à espera de descendência.

A dor que mais parece macerar a existência, neste livro, é o esquecimento de si mesmo. Tudo caminha, não apenas para deixar de ser, mas para o esquecimento de ter sido, que é não o não-ser, mas o buraco negro do ser. Quem consegue deixar um pai morto transformar-se num buraco negro de ser? Uma mãe, uma avó, um irmã ou uma irmã? Quem, como Orfeu, em podendo, em tendo forças, não vai ao mais fundo dos infernos resgatar o esquecimento desses que o amaram? Resgatar do esquecimento quem o amou é resgatar o próprio amor. Aqui, neste livro, a tentativa de resgate é a do próprio. Orfeu desce ao Hades, não para resgatar a sua amada, mas a si mesmo. Somos nós, cada um de nós, que está morto para si mesmo. Cada um de nós, vivos, ou assim o julgamos, arrasta-se pelo Hades em busca de si mesmo – já tínhamos visto aqui, semanas atrás, algo semelhante no Tártaro, de Catarina Santiago Costa. Escreve Cláudia R. Sampaio: “Estou viva. / E penso que para além de mim / não há quem o saiba.” (p. 62) Estes versos, que ecoam Álvaro de Campos, sublinham a dor de esquecimento que nos assalta e que pode ter estas formulações: se ninguém me sabe viva, estarei eu viva? Se ninguém me lembra, lembrar-me-ei eu de mim mesma? “Existo até à memoria / como um peixe às voltas” (p. 65)

Ver no Escuro é também, ou principalmente, um livro sobre o medo do esquecimento

A memória é tudo. Aqui, Deus é a memória de todos. Só Deus se lembra de tudo e de todos. Só Deus transporta em Si o que alguém foi; não apenas o que é, mas o que foi. E é aqui, neste lugar místico, que o sentido da poesia em Cláudia R. Sampaio aparece. O poema é uma imitação falhada de Deus. Imitação, porque toca os interstícios da existência e faz dela memória; falhada, porque nenhum poema nos leva a nós, a um eu que preste, é sempre uma ficção de eu, uma possibilidade de eu. “E dentro desta anáfora descobri que um  / momento nunca é igual a outro. Como um poema. / Como eu, que nunca sou igual / a mim própria. Às vezes sou eu sem ser.” (p. 63)  Ou ainda, como ela mesma canta acerca do amor: “E agora sou uma esponja e encolho / porque ainda estamos a reduzir-nos / em violentíssimo eco / Adeus, eus, eus” (p. 33) E o que diz acerca do amor pode ser dito acerca de cada um de nós e da poesia, como ela mesma escreve neste verso, à página 58: “não adianta escrever se não somos”. Esta redução do humano à impossibilidade de permanência, ver o humano pelo que não pode, atravessa todo o livro. “E dentro desta anáfora descobri que um  / momento nunca é igual a outro. Como um poema. / Como eu, que nunca sou igual / a mim própria. Às vezes sou eu sem ser.” (p. 63) O humano é o que não é, a não ser em relâmpagos. Pior: o humano é o que já foi, e não há memória que nos salve. “Sou instante.” Mas não se segura o instante. Ninguém é o que é. O humano é aquele que vai sendo. A poeta, nos seus poemas, vive esta vertigem de nunca estar a ser, de sempre ter sido, e de estar arrastar a morte pelos dias até ao desaparecimento completo, até ao buraco negro do esquecimento. “E tudo é outro nome que não este.” (44), termina assim um dos poemas mais longos deste livro. O esquecimento é, podemo-lo dizer agora, apenas o outro lado de não se estar a ser, mas de sempre termos sido. É a parte angustiante do ter sido, o futuro do ter sido. Mas um futuro que não trará uma memória, não trará um passado. O nosso fim, o fim daquele que é ter sido, é um infinito buraco negro. Esta é a vertigem que percorre este livro de Cláudia R. Sampaio, propositadamente ad nauseam. Terminemos com um poema da autora (pp. 70-1):

Sou instante.

É assim que escrevo, com a alma enfiada nos dedos

ou os dedos enfiados nos olhos

miraculosamente sentada, respirando,

sendo a faca cortada ao meio

sendo a coluna um pouco torta perto de

uma janela quase sempre aberta

como se daí viesse tudo.

Talvez a cabeça enfiada neste corpo seja

um grito que vem de outra boca,

ou de asfaltos, ou de peixes voadores.

Talvez este desencontro inscrito em mapas venha

de pássaros desajustados bicando planetas.

Eu devia ser a água vertida em bebedouros imundos,

tornando-os úteis

devia ser a noite de sexo incendiada, em que o fôlego

fosse altar

devia ser do espaço onde me coubesse eu-só

devia ser trocada por três côdeas

ou por um livro do Cesariny

ou por um pranto

Qualquer coisa que me levasse daqui.

Porque eu descalço-me antes de caminhar sobre mares.

Com estes dois pezinhos aprendizes, assim me

vou até ao fundo

e no meio das convulsões e dos impulsos que

me calçam, deverei existir

Que a minha verdade me seja entregue por quem

me entrar no infinito:

ninguém

Não duvido de que ficarei sozinha

e há tanta beleza nisto que tremo toda

enfiando um dedo na eternidade

Podemos ser abandonados por todos

mas seremos imortais por conta própria.

14 Mar 2017

Difamação

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o dia 7 deste mês a “apple.nextmedia” publicou um artigo sobre o processo de difamação instaurado por Leung Chun-ying, Chefe do Executivo de Hong Kong, contra Kenneth Leung K C., membro do Conselho Legislativo da cidade. A propósito o “China Morning Post” escreveu,

“A ordem judicial apresentada na segunda-feira pelos advogados de Leung Chun-ying acusa Kenneth Leung de difamação alegando que o Chefe do Executivo “ainda estava a ser investigado pela Comissão Independente Contra a Corrupção e também pelas autoridades tributárias de Hong Kong e de outros países, a propósito de uma receita de 4 milhões de libras da UGL”.

A ordem judicial também especificava que Kenneth Leung tinha proferido declarações difamatórias quando afirmou que “as autoridades centrais irão ficar numa posição muito embaraçosa, na eventualidade de este vir a ocupar o cargo de Vice-Presidente da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês.”

Para além do pedido de uma indemnização monetária, Leung Chun-ying solicitou ao Tribunal uma “Ordem de Injunção” a fim de travar os procedimentos difamatórios.

A ordem judicial é uma intimação emitida pelo queixoso contra o réu e que dá inicio à acção judicial. Neste documento é habitual ser apresentada uma descrição dos factos e ser mencionado o valor da indemnização exigida pelo queixoso.

Em Hong Kong, a difamação tanto pode dar origem a um processo cível como a um processo criminal. No entanto, é muito raro um caso desta natureza dar origem a um processo criminal, a menos que sejam postas em causa a paz e a ordem públicas. O queixoso costuma desencadear um processo cível para proteger a sua reputação. Em Macau é diferente, a difamação dá origem a um processo semi-criminal e, assim que a vítima dá o seu consentimento, o Governo formula a acusação.

O artigo adiantava que uns dias antes do envio da acção judicial Kenneth tinha recebido uma carta-aviso.

Numa acção por difamação, o queixoso costuma enviar uma carta elaborada pelo advogado, onde explica que as declarações do acusado prejudicaram a sua reputação. O destinatário da carta é intimado a apresentar prova que sustente as afirmações proferidas ou então a retratar-se e a apresentar um pedido de desculpas. Nestas situações, o pedido de desculpas e um desmentido público é a melhor forma de resolver o problema. No caso de Leung Chun-ying, é muito pouco provável que se chegue a um acordo antes da acção judicial.

De qualquer modo, Leng Chun-ying não vai para já apresentar a ordem judicial a Tribunal para dar início à acção legal. Cabe agora a vez a Kenneth Leung de apresentar a Defesa aos magistrados. A “Defesa” consiste num documento apresentado pelo acusado ao Tribunal a expor as suas razões. Terá de apresentar provas da seriedade e da legalidade das suas afirmações.

Em Hong Kong, os casos de difamação sobem ao Tribunal de Primeira Instância (em Macau, ao Tribunal da Relação). Estes julgamentos têm a presença de um júri. A presença do advogado também é requerida. É preciso ter em conta que os seus honorários são muitíssimo elevados. Se não se estabelecer um acordo antes da audiência, podem alcançar os dez milhões. Donde se concluí que a difamação é um jogo para milionários.

De acordo com a Lei de Bases, o dever do legislador é monitorizar o desempenho do Governo e por isso é natural que os seus membros sejam alvo de críticas. No entanto, não é permitido proferir afirmações falsas. É preciso não esquecer que os membros do Governo também são residentes de uma Região Administrativa Especial e que a Lei protege os seus direitos. Combater a difamação é uma das armas que podem usar para defender a sua reputação.   

Mas se Leung Chun-ying usar o seu direito legal para processar Kenneth, o preço político pode ser muito elevado. Não é de admirar que existam comentários sobre “a quebra de relações entre o poder executivo e o poder legislativo”. Como é a primeira vez que em Hong Kong um Chefe do Executivo processa um deputado, os comentários “surpresa” irão surgir um após outro.

Ninguém gosta destes constantes burburinhos que destabilizam Hong Kong. Embora a ordem judicial já esteja preparada para ser apresentada em tribunal, ainda estamos a tempo de resolver a situação pacificamente. Fazemos votos para que os litigantes cheguem a um acordo o mais breve possível. Será o melhor para Hong Kong e para as partes envolvidas.

Professor Associado do Instituto Politécnico de Macau
Consultor Jurídico da Associação para a Promoção do Jazz em Macau
14 Mar 2017

Partido Comunista Chinês endurece retórica contra Islão

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Partido Comunista Chinês (PCC) tem endurecido a retórica contra o Islão, com altos quadros da organização a advertir para a infiltração do extremismo religioso no país e a necessidade de proteger a identidade chinesa.

Shaerheti Ahan, alto quadro do PCC em Xinjiang, advertiu os líderes políticos que estão reunidos em Pequim, para a sessão anual da Assembleia Nacional Popular, para os perigos da China ser destabilizada pela “situação internacional anti-terror”.

No ano passado, o Presidente chinês, Xi Jinping, ordenou o partido para guiar as minorias étnicas e religiosas do país no sentido de as adaptar melhor à sociedade socialista.

Entretanto, líderes regionais em Xinjiang, onde vivem os uigures, minoria étnica chinesa de religião muçulmana, elevaram as medidas de segurança e patrulhas policiais devido a um aumento da violência que as autoridades associam ao separatismo islâmico.

Apesar de alguns académicos questionarem se as redes do extremismo islâmico estão a penetrar no país, os líderes chineses têm alertado para a necessidade de combater os perigos do fundamentalismo, em linha com o discurso internacional.

Funcionários da região autónoma de Ningxia, no norte do país, onde vive outra minoria muçulmana, os Hui, mas que, ao contrário de Xinjiang, não regista violência associada à religião, advertiram também na semana passada para os perigos do extremismo islâmico.

Extremas comparações

O secretário do PCC em Ningxia Li Jianguo referiu-se mesmo às políticas do Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

“O que a [organização extremista] Estado Islâmico e extremistas instigam é a jihad, terror e violência”, disse Li.

“Essa é a razão pela qual vemos Trump a proibir a entrada de muçulmanos. Não interessa se as políticas anti-muçulmanos é do interesse dos Estados Unidos ou promove a sua estabilidade. É sobre prevenir o extremismo religioso de penetrar em toda a cultura americana”, acrescentou.

Wu Shimin, antigo funcionário para assuntos étnicos em Ningxia, disse que o trabalho ideológico deve ser reforçado na região para promover a identidade chinesa entre a população Hui, os descendentes de comerciantes muçulmanos que percorriam a Rota da Seda vários séculos antes.

“As raízes dos Hui estão na China”, disse Wu.

“Para discutir consciência religiosa, devemos primeiro discutir a consciência chinesa. Para falar dos sentimentos das minorias, temos primeiro de falar dos sentimentos do povo chinês”, afirmou.

Da retórica

Discursos e Mohammed al-Sudairi, estudante de doutoramento na Universidade de Hong Kong e especialista do Islão na China, afirmou que os comentários dos responsáveis de Ningxia reflectem a crescente retórica anti-islão entre a liderança chinesa.

“Existe uma tendência crescente para ver o Islão como um problema na sociedade chinesa”, disse al-Sudairi, citado pela agência de not Associated Press.

“Xi Jinping tem estado ansioso com o que considerou uma perda de controlo do partido sobre a esfera religiosa quando chegou ao poder, e precisava de uma intervenção”, indicou.

Em Xinjiang, onde nos últimos anos centenas de pessoas morreram em ataques violentos, a crescente retórica do governo coincidiu com novas medidas de segurança, que activistas consideram ter exacerbado um ciclo de repressão, radicalização e violência.

O Governo, entretanto, diz que a região enfrenta uma grave ameaça de separatistas uigures ligados a organizações extremistas como a al-Qaida e o EI, apesar de apresentar poucas provas nesse sentido.

Na sexta-feira passada, Xi reuniu com funcionários de Xinjiang, segundo a imprensa estatal, e ordenou que estes protejam a estabilidade da região, propondo metaforicamente que ergam uma “grande muralha de ferro”.

É uma referência com implicações históricas: o antigo líder chinês Deng Xiaoping elogiou as forças armadas do país como uma “grande muralha de ferro e aço”, em Junho de 1989, dias após a sangrenta repressão militar do movimento pró-democracia da praça Tiananmen.

14 Mar 2017