Lei Sindical de Pereira Coutinho de novo chumbada. Deputados pedem acção do Governo

O projecto de Lei do Direito Fundamental de Associação Sindical voltou a ser chumbado na Assembleia Legislativa. Deputados votaram contra mas pediram ao Governo para apresentar o diploma. Lam Heong Sang lembrou que o hemiciclo “tem a sua quota-parte de responsabilidade” por a lei não existir. Pereira Coutinho diz que vai voltar a apresentá-la

[dropcap style=’circle’]J[/dropcap]osé Pereira Coutinho viu ontem pela sexta vez o seu projecto de Lei do Direito Fundamental de Associação Sindical ser chumbado pelos colegas da Assembleia Legislativa (AL). No total, apenas oito deputados votaram a favor da criação da Lei Sindical, tendo os restantes 14 – incluindo sete abstenções – invocado a não auscultação do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS), a não inclusão de prévias opiniões dos deputados ou a repetição de conteúdos para a não aprovação da lei.

Recorde-se que o deputado tinha, em troca da sua anuência a um projecto de lei do arrendamento, o apoio de outros deputados da AL. Mas nem isso adiantou. Chan Meng Kam e Song Pek Kei, dois dos que iriam, conforme foi noticiado, apoiar a iniciativa, acabaram por se abster. Já Si Ka Lon, da lista destes dois deputados, votou a favor, a par de Ng Kuok Cheong, Kwan Tsui Hang, Lam Heong Sang, Leong Veng Chai, Ella Lei e Au Kam San.

À margem do debate, Pereira Coutinho voltou a acusar o Governo e deputados de estarem ao lado das grandes empresas e prometeu apresentar os mesmos projectos de lei para o ano (ver caixa). “O Governo está aliado com as empresas e até hoje não submeteu a Lei Sindical. Esta AL é composta por diferentes interesses que saem por detrás de cada um dos deputados. Como os projectos tecnicamente têm óptima qualidade, e não tendo como pegar, utilizam-se argumentos falaciosos, tais como opiniões que não foram contidas no diploma. Respondo que havendo uma aprovação na generalidade, os deputados e associações vão ser ouvidos nas comissões”, disse aos jornalistas.

A hora errada

Muitos deputados disseram mesmo que esta não é a melhor altura para aprovar a lei que iria regular e proteger os trabalhadores em caso de greve, devido à quebra das receitas do Jogo. “Há que ter uma lei sindical para proteger o exercício dos direitos. Será que neste momento a conjuntura sócio-económica é a melhor fase para legislar sobre a matéria?”, questionaram os deputados Chan Meng Kam e Song Pek Kei.

Apesar de votarem contra, lamentou-se o facto do diploma não ter sido aprovado e voltou-se a exigir ao Governo a apresentação de uma Lei Sindical. O vice-presidente da AL, Lam Heong Sang, disse mesmo que o hemiciclo também tem responsabilidades nesta matéria.

“Este projecto de lei não foi aprovado, o que lamentamos. É uma lei que se aplica em quase todos os países e territórios. Sem a lei, é reduzida a capacidade das associações na defesa dos direitos dos seus trabalhadores. A AL, como órgão legislativo, tem a sua quota parte de responsabilidade e deve-se esclarecer quais as razões para o projecto de lei ainda não ter sido aprovado. Há toda a necessidade de ter uma lei sindical”, disse, na declaração de voto subscrita com Kwan Tsui Hang e Ella Lei.

[quote_box_left]“O Governo está aliado com as empresas e até hoje não submeteu a Lei Sindical. Esta AL é composta por diferentes interesses que saem por detrás de cada um dos deputados” – Pereira Coutinho, deputado[/quote_box_left]

O número dois de Pereira Coutinho, Leong Veng Chai, lembrou que, caso já existisse uma lei sindical, situações como a dos trabalhadores do Parisian, que só receberam a indemnização depois do protesto junto do Gabinete de Ligação do Governo Central, nunca teriam acontecido.

“Os trabalhadores de um grande estaleiro queixaram-se à DSAL e não conseguiram vencer, e tiveram de ir ao Gabinete de Ligação para receberem todas as indemnizações. Uma lei de associação sindical é muito importante e o Governo da RAEM deve trabalhar para que haja uma lei dessas”, concluiu.

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O meu amigo Leong Veng Chai

A sessão plenária de ontem na AL foi sobretudo dedicada à discussão e votação na generalidade dos seis projectos de lei de Pereira Coutinho, que pretendiam legislar questões como a discriminação em favor da raça ou sexo, confidencialidade, tutela de personalidade do trabalhador, a promoção dos tratados ratificados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) ou a área ecológica protegida de Coloane. Talvez com uma sensação de déja-vu, foram poucos os deputados que pediram a palavra, tendo o número dois de Pereira Coutinho, Leong Veng Chai, sido dos poucos que falou em prol dos diplomas do parceiro político. Coutinho foi acusado de não ouvir o CPCS, a Associação dos Advogados de Macau, de legislar temas já constantes noutras leis e de não incluir as anteriores opiniões dos deputados. A todos, Pereira Coutinho responde que se tratam de “argumentos falaciosos”, já que os seus projectos de lei “são tecnicamente bons”.

16 Jun 2015

Hong Kong | Detidos nove pessoas suspeitas de planear detonar bomba

saikung-bomb-police[dropcap style =’circle’]A[/dropcap] polícia de Hong Kong deteve ontem nove pessoas que, alegadamente, planeavam detonar uma bomba junto ao parlamento, dias antes da votação da polémica reforma do sistema eleitoral.

As forças de segurança realizaram as detenções depois de encontrarem, ontem de manhã, um explosivo numa zona de antigos estúdios noticiosos e de entretenimento, já abandonados, em Sai Kung, onde agentes especializados fizeram explodir o artefacto de forma controlada, informa o South China Morning Post.

Segundo o diário, que cita fontes policiais anónimas, foram detidos cinco homens e quatro mulheres, com idades entre os 21 e os 34 anos, todos de Hong Kong.

O tipo de bomba encontrado consistia num explosivo de “forte potência” que já foi utilizado em diferentes atentados, como o de Julho de 2005 em Londres, em que morreram 52 pessoas e mais de 700 ficaram feridas.

As detenções aconteceram a poucos dias da votação, pelo conselho legislativo, da proposta de reforma eleitoral apresentada por Pequim, que define as regras para a primeira eleição via “sufrágio universal” na região.

A proposta – que obriga a que os candidatos a chefe do Governo sejam seleccionados por uma comissão vista como próxima de Pequim – gerou meses de protestos nas ruas, com os manifestantes a pedirem uma “real democracia”.

Para esta semana voltam a estar convocados protestos de ampla magnitude.

16 Jun 2015

Alimentos | IACM ponder aumento de postos de venda

O mercado da Taipa poderá ficar maior, mas se esta é ainda uma hipótese em estudo, o IACM anuncia para já que vão aumentar as bancas de venda de alimentos em Macau e que estas podem vir a ser colocadas mais perto dos mercados municipais

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) adiantou que o Governo está a planear “aumentar o número de pontos de venda a retalho [de alimentos] para elevar o nível de concorrência”. Em paralelo a este plano, o IACM informa ainda que em cima da mesa está também a possibilidade de cancelamento da norma que impede a emissão de licenças para a venda de pescado e carnes dentro do raio de acção dos mercados municipais. mercado alimentos

Num comunicado enviado à imprensa, o IACM explica ainda que os vogais do Grupo de Estudo de Construção Urbana do Conselho Consultivo do IACM, juntamente com o Grupo de Estudo da Sanidade Alimentar, concordam que para cancelar a norma relativa à exploração de outros pontos de venda de produtos alimentares frescos no raio de acção dos mercados é necessário “garantir a higiene ambiental e a segurança alimentar, bem como estudar e analisar os problemas inerentes ao funcionamento, gestão e factores de preços dos produtos alimentares à venda nos mercados”.

Taipa maior

Durante a reunião, o Presidente do Conselho de Administração, Alex Vong, referiu que o IACM “vai desenvolver um projecto de expansão do mercado da Taipa e aumentar o número de bancas para satisfazer a procura de produtos alimentares frescos por parte dos cidadãos”, sendo que esta hipótese ainda está em estudo.

Assim, o mercado da Taipa irá incluir, além do átrio intermédio do rés-do-chão, uma zona verde no terraço. As decisões são resultado de um encontro em Maio passado.

Recorde-se que, na semana passada, o Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, esteve reunido com 20 associações do sector industrial e comercial, que pedem à Administração medidas para aumento de turistas que possam consumir no território. O sector de retalho, na sua generalidade, queixa-se que tem vindo a sofrer consequências devido à quedas das receitas do Jogo. As associações querem que o Governo crie planos promocionais trans-sectoriais ou realize actividades festivas e feiras, para atrair a visita a Macau dos turistas permitindo o reforço da dinâmica da economia.

16 Jun 2015

Tabaco | Zheng Anting pede se para recuar na proibição total

Ella Lei quer a proibição total de fumo nos casinos já, mas Zheng Anting pediu ontem ao Executivo que volte atrás, numa manifestação clara de divergências na AL sobre o assunto

[dropcap style=’circle’]S[/dropcap]emanas depois de ter sido o rosto de dois encontros entre associações do sector do Jogo e o Governo, o deputado Zheng Anting voltou a pedir ao Secretário Alexis Tam, da tutela dos Assuntos Sociais e Cultura, para rever a decisão de proibir o fumo nos casinos. Já Ella Lei manifesta-se sobre o mesmo tema, mas pedindo a implementação da proibição o mais breve possível.
“Solicito aqui ao Governo que reveja a política de proibição do tabagismo e a sua calendarização, para não dificultar ainda mais a exploração das operadoras de Jogo”, disse o deputado directo na sua interpelação oral, apresentada no debate de ontem no período antes da ordem do dia.

Smoke
Smoke

O fim do fumo nos casinos também mereceu a atenção da deputada indirecta Ella Lei, representante da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), e desde o início uma forte defensora do fim do fumo nos espaços de jogo.
“Apesar do Governo da RAEM ter mencionado várias vezes a revisão da respectiva lei e a concretização da proibição total do tabaco em recintos fechados, se a revisão da lei não avançar e se esta não for aprovada pela Assembleia Legislativa (AL), a concretização da proibição total vai ser adiada indefinidamente. Exorto mais uma vez a Administração a honrar a sua promessa de revisão do Regime de Prevenção e Controlo do Tabagismo, concretizando a proibição total nos casinos”, apontou na sua interpelação oral.

Contraditório

Pelo contrário, o deputado Zheng Anting continuou a argumentar os seus pontos contra a medida anunciada por Alexis Tam, lembrando a possibilidade de desemprego e diminuição dos negócios locais.
“Saliento novamente que, em termos teóricos, concordo que o ideal seria criar um ambiente sem fumo, mas tenho de admitir que, em termos objectivos, se se proibir totalmente o fumo nos casinos, isso irá afectar gravemente as receitas de jogo, nomeadamente os negócios das salas VIP. A proibição total constitui um grande perigo para as actividades negociais”, referiu.
O deputado acrescentou ainda que segundo as previsões dos sectores profissionais, se for agora implementada a proibição total do fumo nos casinos, especialmente nas salas VIP, vai “haver novamente perdas de três mil milhões de patacas”. Segundo o deputado, os croupiers vão também “ver-se obrigados a tirar licença sem vencimento, vão ver as suas garantias reduzidas, ou até mesmo ter de passar pelo risco de perder o emprego”.
O encontro entre o Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, e a Associação de Mediadores de Jogo e Entretenimento de Macau, com o apoio de Zheng Anting, decorreu no início do mês, tendo Alexis Tam também reunido com estes responsáveis.

16 Jun 2015

Mudança de paradigma

[dropcap type=”2″]É[/dropcap]vulgo dizer-se que uma imagem vale por mil palavras, mas é vulgar porque assim é como julgo ser o caso desta. Por isso mesmo, hoje poupo palavras e coloco o foco neste instantâneo captado no passado domingo de manhã a caminho de Zhuhai. Mas como qualquer pessoa que não passe a vida enclausurado no ar condicionado dos gabinetes ou dos automóveis vegetando em realidades alternativas, podia ter sido em outro dia qualquer…

Para quem há pouco tempo cá está ela pouco dirá, mas para quem cá nasceu ou pelo menos aqui vive há meia dúzia de anos, sabe perfeitamente que uma foto destas há não muito tempo atrás teria de ser captada no sentido Zhuhai – Macau.

Mas o paradigma mudou: a realidade de hoje é que, apesar dos sustos constantes com a segurança alimentar e produtos de consumo na China, muitos cidadãos de Macau não vêem outra alternativa senão atravessarem diariamente a fronteira com os cestos vazios. São cada vez mais e cada vez mais apressados, mesmo quando a Pataca já não vale mais do que o Reiminbi como em dias que já lá vão. A propósito, lembro-me de Shakespeare quando um dia escreveu que “Algo está podre no reino da Dinamarca” ou então estou completamente enganado, esta imagem é uma ficção e a realidade é que vivemos numa cidade virada para os seus habitantes e com eles preocupada. Se assim for, lamento a interpretação deturpada.

Música da Semana

Naturalmente,  “Os Vampiros” de Zeca Afonso. Tenha uma boa semana caro leitor.

(…) “São os mordomos do universo todo
Senhores à força mandadores sem lei
Enchem as tulhas bebem vinho novo
Dançam a ronda no pinhal do rei

Eles comem tudo eles comem tudo
Eles comem tudo e não deixam nada” (…)

16 Jun 2015

Amores mais baixos se levantam

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]entrevista que Konstantin Bessmertny deu ontem a este jornal coloca o dedo numa ferida muito importante deste Macau do crescimento desenfreado: o Governo deixa as concessionárias do Jogo fazerem tudo o que lhes apetece e assim inundar a RAEM de cópias baratas do que têm em Las Vegas, sem lhes exigir nada, sem controlar nada, sem dizer uma palavra sobre o que por aqui é erguido.

E assim temos um Venetian (já decadente), igual ao americano, bem diferente do que a Sands fez em Singapura, ou seja, uma reprodução ao invés de um edifício singular que já se tornou num marco turístico da Ásia. E assim casinos Wynn iguaizinhos aos que existem no Nevada. E assim vamos ter uma ridícula Torre Eiffel, também copiada da que existe em Las Vegas. O mau gosto e a avareza (compreensível) dos casineiros inundou esta cidade perante a indiferença governamental.

É difícil compreender a apatia do Governo perante a destruição estética da cidade. Não lhe terão amor? Ou nem sequer o assunto lhes passou pela cabeça? É certo que, numa primeira fase, os novos casinos deram muito dinheiro. Mas será que o dinheiro e só o dinheiro é a coisa mais importante do mundo? <

Não será que para a qualidade de vida e do turismo de Macau, bem como para o seu renome internacional, não seria importante construir uma cidade esteticamente original, irrepreensível, e não a cópia de um sítio decadente e ultrapassado como Las Vegas?

Macau, enquanto Monte Carlo do Oriente, era uma cidade charmosa, com qualidade de vida, excessiva e libertária. Esta Las Vegas da Ásia é kitsch, é foleira, não tem glamour nem mistério. Não é nada. Porque deixou de ser original. E isto perante a passividade governamental, entretido que estava a contar as patacas e a fazer maus investimentos.

Espera-se que o actual Governo siga por outros caminhos, que se interesse mais pela cidade em si, que mostre realmente amor por ela, até porque “amar Macau” é também “amar a Pátria”. O problema é que, bem sabemos, pelo menos no Conselho Executivo, amores mais baixos se levantam…

16 Jun 2015

Forças de Segurança | Comissão de Disciplina quer mais competências

Mais poder para tomar decisões. É o que pede a Comissão de Fiscalização e Disciplina das Forças de Segurança, que no ano passado recebeu mais de 40 queixas contra agentes da autoridade

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]Comissão de Fiscalização e Disciplina das Forças de Segurança (CFD) quer ter mais competências e poder de decisão. Isso mesmo defende Leonel Alves, presidente da Comissão, no relatório anual da entidade, disponível no website da CFD.

A Comissão indica que fez um estudo em 2014 sobre “as perspectivas de evolução das competências” e lança um apelo ao Secretário para a Segurança, Wong Sio Chak. “[Que a CFD possa] propor ou sugerir o arquivamento do processo quando não forem obtidos indícios suficientes dos factos que lhes deram origem, a correcção do funcionamento ou ajustamento estrutural que entender mais adequados à melhoria da qualidade ou eficiência do serviço e ao cumprimento da lei, a sugestão de reconhecimento de actos meritórios quer colectivos quer individuais”, pode ler-se num texto assinado por Leonel Alves.

Segundo o também advogado,  estes pedidos podem ser autorizados assim que o Secretário para a Segurança divulgue um despacho, assinado por si, sublinhando as competências para averiguação que decorrem do despacho que constituiu a CFD.

“É este o desafio que lançamos à tutela. Não obstante partilharmos a ideia de que o exclusivo da acção disciplinar deve centrar-se na hierarquia, muito particularmente quando estão em causa serviços de segurança e forças policiais, pensamos que existe margem de evolução no exercício das competências deste órgão de controlo externo”, assina Leonel Alves, presidente da CFD.

Para já, esta entidade tem como competências emitir parecer sobre decisões dos serviços e corporações da área da segurança respeitantes a queixas dos cidadãos e remeter esses pareceres ao Secretário para a Segurança, além de elaborar um relatório anual relativo à sua actividade.

Apesar de não considerar que o papel da Comissão está minorado, Leonel Alves escreve que é possível fazer mais. “Será que olhando ao papel que a CFD representa (…) vislumbramos formas de evolução? Será que é possível, sem ferir a harmonia do sistema, incrementar os poderes de intervenção da CFD? Pensamos que sim e talvez esteja em nós, CFD, pelo menos em parte, a chave para a remoção dos constrangimentos. A CFD pode, no âmbito do mandato que a constitui, ou quando muito recebendo um reforço de reconhecimento por parte da tutela, designadamente, por despacho interno, proceder às averiguações sumárias que entender, por si ou por técnico para o efeito nomeado pelo Presidente.”

PSP na mira

No ano passado, a CFD recebeu 44 queixas, sendo a Polícia de Segurança Pública (PSP) a entidade que motivou mais indignações. Esta corporação foi alvo de 73% das queixas apresentadas, com a PSP a ser acusada de “procedimentos inadequados”, “má atitude dos agentes”, “abuso de poder” e “actuação indevida”. Em 2014, de acordo com o relatório analisado pelo HM, também a Polícia Judiciária (PJ) mereceu queixas dos cidadãos – nove ou 19% -, sendo que a Escola Superior das Forças de Segurança motivou duas reclamações e o Estabelecimento Prisional de Macau e os Serviços de Alfândega foram visados cada um numa queixa. “Houve casos que envolveram mais de uma entidade”, explica ainda a CFD.

A maioria das queixas – 37 – foi apresentada directamente por cidadãos à CFD, enquanto três dessas vieram de entidades externas (dois casos encaminhados pelo Comissariado Contra a Corrupção e um caso informado pelo EPM). Há ainda, de acordo com o documento, quatro casos investigados por iniciativa da CFD.

Mais amor por favor

De acordo com os dados disponíveis no relatório, as queixas subiram de 34 em 2010 para 46 em 2013, tendo descido para 44 o ano passado. A Comissão ainda não conseguiu tratar de seis, por estarem ainda “em processamento em virtude da sua complexidade”, pelo que a CFD diz precisar de dados mais detalhados. Ainda assim, a Comissão de Fiscalização traça um balanço positivo pela “estabilização do número de queixas apresentadas” que, face ao desenvolvimento da sociedade, “é de salientar como positivo”.

Segundo o documento, a Comissão levou ainda a cabo duas reuniões com queixosos, como diligências necessárias para resolver as questões. A emissão de pareceres e a promoção de melhorias junto das autoridades são outras dessas diligências.

“Na sequência da análise de casos concretos, decorrentes de queixas de cidadãos, a Comissão recomendou que a abordagem ao cidadão deve ser sempre caracterizada por correcção e urbanidade, devendo o agente policial abster-se de quaisquer considerações ou comentários que possam induzir humilhação ou desconsideração quanto à origem e condição social, bem como quanto ao nível de instrução do interlocutor”, pode ler-se no documento.

Na sequência da análise de casos concretos sobre as queixas contra os agentes de trânsito, a CFD recomendou à PSP que os agentes “não incutam nos cidadãos a ideia de tratamento desigual ou selectivo, de uns relativamente a outros infractores, em igual ou semelhante situação de infracção”.

O facto de agentes policiais – “para obter reforço da sua posição, não só em assuntos comuns do seu quotidiano, mas também em situações de conflito de natureza pessoal”- terem usado a sua autoridade também foi alvo de recomendações, a par de outras situações, como o atendimento a um cidadão portador de anomalia psíquica.

“[Revelou] falta de preparação adequada dos agentes ou a falta das instruções necessárias para lidar com esta particularidade, pondo consequentemente em risco os direitos do interessado (…).”

16 Jun 2015

Konstantin Bessemertny: “O dinheiro não nos faz ter mais consciência cultural”

Um dos maiores artistas de Macau e da Ásia tem optado por trabalhar na sombra, aparecendo pontualmente com alguns trabalhos. Konstantin Bessemertny defende que para Macau é suficiente uma exposição a cada cinco anos, condenando os governantes que não consomem cultura. Para o artista, a política do território, no que diz respeito à arte, arquitectura e espaços públicos, deveria ser decidida por um órgão totalmente independente

[dropcap style=’circle’]F[/dropcap]ez a última exposição individual em Macau em 2012. Porquê este tempo todo sem uma mostra individual em Macau?
O mundo artístico está a mudar quanto à democratização da criatividade. E não só em Macau, em todo o mundo. Agora qualquer pessoa é artista, e o problema dos artistas contemporâneos é mostrarem-se e produzirem demasiado. Há tanta arte disponível nos dias de hoje! Então a maneira mais lógica é tornarmo-nos como monges que ficam no seu mosteiro, e é isso que estou a fazer. Apareço raramente, em ocasiões específicas. Mudei o meu pensamento em relação a alguns eventos, como feiras de arte, porque penso que são apenas plataformas, como os media, o Instagram. São plataformas para uma arte algo imatura, na sua forma de expressão.

Mas não tem nenhum projecto para expor em Macau?
Não disse isso. Primeiro, temos de nos limitar a nós próprios, para um certo número de exposições, por um certo período de tempo. Penso que Macau é um bom sítio para uma exposição a cada cinco anos. Consegue imaginar uma exposição todos os anos? Tenho vindo a trabalhar em alguns quadros, sim, mas comecei a gastar mais tempo em cada trabalho, em vez de produzir sob pressão. Estou a tentar adaptar-me à nova realidade.

De que forma?
Estou a tentar focar-me, também devido a essa questão da excessiva produção artística. Há tanta arte destruída. Numa bienal, 95% da arte que lá está exposta vai para contentores. Tudo o que vai para o lixo não é arte, então estou a tentar focar-me em sítios que possam ter algo interessante, ou em coisas que as pessoas me pedem. É difícil, porque temos de convencer pessoas, instituições, mudar as mentalidades de certos meios, quando as pessoas pensam actualmente nas tendências a curto prazo. A arte acaba por ir para o caminho da “cultura da celebridade”.

[quote_box_left]“Mudei o meu pensamento em relação a alguns eventos, como as feiras de arte, porque penso que são apenas plataformas, como os media, o Instagram. São plataformas para uma arte algo imatura, na sua forma de expressão”[/quote_box_left]

Em que os artistas são como estrelas pop.
Sim. Claro que isso começou nos anos 60, com o Andy Wharol e o movimento pop-art. Mas acho que isso não é arte, é design. Então essa arte pode ir para museus, mas quem disse que ia lá ficar para sempre? Mas respondendo à sua questão, tenho vindo a trabalhar em coisas específicas. Continuo a trabalhar em Macau, com algumas pessoas, em galerias. As galerias de arte estão a morrer, porque já chegaram a um ponto de exaustão.

Em todo o mundo.
Não estou apenas a falar da pequenina Macau. Aqui tudo acontece em pequena escala, mas as questões (do mundo artístico) são iguais às dos restantes países do mundo. Os problemas são os mesmos, a questão é que em Macau as coisas são mais visíveis e podemos tirar conclusões mais rápidas. Mas de cada vez que há algum tipo de iniciativa em Macau, eu tento contribuir. Tive agora dois trabalhos meus no Armazém do Boi, depois dei um trabalho a uma galeria junto às Ruínas de São Paulo, o que já é bastante (risos). Mas se me pedirem “por favor, faça uma grande exposição”. Direi que não.

Mas vive em Macau há 23 anos, como olha para a arte que tem vindo a ser produzida neste pequeno território?
Não há arte. A arte é a procura, e qual é a procura aqui? Pela Hello Kitty? Há mau gosto. Para compreender o que é a arte, temos de ser educados, ter a nossa própria motivação, sermos curiosos. Infelizmente o público aqui não é assim. Para qualquer coisa que se produza em Macau não há procura, mas não é uma questão de preço. Porque é que as pessoas de Macau não compram as obras de arte locais? Porque preferem ter posters na parede, coisas criativas que compram em Bali. Tem tudo a ver com questões de gosto, educacionais, de cultura. É como aquela máxima de “nós somos o que comemos”, e somos também os livros que temos na estante e os quadros que temos na parede. É um pouco perturbador.

[quote_box_right]“A arte é a procura, e qual é a procura aqui? Pela Hello Kitty? Há mau gosto. Para compreender o que é a arte, temos de ser educados, ter a nossa própria motivação, sermos curiosos. Infelizmente o público aqui não é assim”[/quote_box_right]

Em relação aos museus, galerias ou entidades públicas. Pensa que o Governo poderia investir na criação de mais espaços como estes?
Esse é um conceito socialista. Ajudar os artistas? O problema é que, se as pessoas não tiverem experiência no meio, não souberem a melhor forma de se tornarem artistas, isso é um erro. Temos esse problema com as políticas públicas. A arte transforma-se numa coisa preguiçosa, que não é desafiante. Quando ajudamos os artistas não criamos qualidade. Recentemente falei com várias pessoas do meio cultural de Macau e disse que a melhor forma é abrir concursos ou comissões para espaços públicos, em que uma vez por ano qualquer artista poderia concorrer para um apoio. Temos muitas construções aqui, mas podemos ver o quão tudo é horrível. E não estou apenas a falar da arte, mas a arquitectura também é muito má.

Está a referir-se ao Cotai?
A todo o lado. E porquê? Porque não queremos saber. Chega aqui alguém e deixamo-lo construir um projecto, e não dizemos “não faça esta imitação da escultura” ou “não revista isto de plástico”. O conceito é muito pobre. Recentemente estive em Singapura no Marina Bay Sands. O casino pode não estar a ter muitos lucros, mas é um edifício bonito. Ao menos podem orgulhar-se daquele esforço. Se há 15 anos me dissessem que iríamos ter uma Torre Eifeel em Macau…é horrível. Não é apenas o facto de não envolver os artistas locais, mas tudo deveria ser feito por concurso e aprovado pelas instituições e pessoas de Macau. Porque é que Macau deixa que essas coisas feias sejam aqui construídas?

Pensa então que deveria haver um novo modelo para o Cotai? Um espaço que poderia servir para promover os artistas locais?
A questão dos artistas locais é similar a um jardim de infância, “acabei o meu curso, dêem-me um espaço para poder mostrar o meu trabalho”. O que poderíamos fazer agora? Criar um órgão independente, composto por artistas ou arquitectos, que não esteja envolvido com o sector do imobiliário, do Jogo ou da construção. Esse órgão deveria decidir o que é bom ou mau para Macau. Tudo deveria ser aprovado por este órgão. Em Guangzhou, o Governo deu responsabilidades a um grupo deste género para fazer uma cidade bonita. Estas pessoas não têm interesses no dinheiro, porque são professores, artistas… simplesmente ditam o que é bom ou mau para a cidade. Então vemos que a arquitectura e os espaços são bonitos, existe bom gosto. O problema aqui é que os lucros não trazem o bom gosto, o dinheiro não nos faz ter mais consciência cultural.

Em Macau parece que o Governo tem de estar em todo o lado, concedendo subsídios. Pensa então que deveria ser criado um novo modelo de apoio?
Quando cheguei a Macau, fiquei impressionado. Porque antes era melhor do que agora. Macau era melhor do que Hong Kong. E porquê? Porque no Governo, todos os secretários adjuntos, tinham interesse por arte. Construíam casas em Portugal, gostavam do design chinês, da mobília, visitavam galerias e estúdios de arte. Estes governantes ajudavam mais o mercado da arte do que qualquer outra pessoa. As pessoas que temos actualmente no Governo podem apoiar a cultura e a arte, mas individualmente não vão a concertos, nunca foram a uma galeria, e falo de Hong Kong também. Este é um problema. As pessoas que querem ajudar os artistas são apenas funcionários públicos ignorantes que tentam ser uma espécie de pais destes alunos de arte que acabam os seus cursos, para que sejam felizes.

[quote_box_left]“Se há 15 anos me dissessem que iríamos ter uma Torre Eifeel em Macau…é horrível. Não é apenas o facto de não envolver os artistas locais, mas tudo deveria ser feito por concurso e aprovado pelas instituições e pessoas de Macau”[/quote_box_left]

Mas acredita que o Governo de Macau, em concreto, está a seguir esse caminho?
Não estou a criticar apenas aqui, porque na verdade o nosso Instituto Cultural (IC) ou o museu funcionam muito melhor do que poderíamos pensar. Claro que ainda há melhorias a fazer. Mas as pessoas deveriam ser nomeadas não porque falam cantonense, se são locais ou não, mas sim por mérito e conhecimento. Para cada projecto deveria haver uma selecção, e se for o melhor, mesmo que não fale cantonense, não deve constituir um problema. Macau poderia ser um modelo para a multi-culturalidade. Tudo deveria ser feito por pessoas com coragem e conhecimento para melhorar as coisas.

Ajudou a criar a AFA – Art for All Society. Como olha para a entidade nos dias de hoje? Que desafios encontram?
A AFA foi uma solução encontrada para se fazer e promover a arte. Mas diminuí a minha participação há cerca de dois ou três anos. Vamos mantendo o contacto, mas percebi que ficar lá mais tempo não iria ser benéfico para mim, porque sou uma pessoa ocupada, viajo muito. E não quero fazer esse tipo de trabalho de pedir patrocínios. A minha ideia inicial era de que a AFA não era apenas para os artistas locais, mas seria uma plataforma para as pessoas produzirem e consumirem arte, e seria a primeira do género em Macau. Mas há leis e regras que temos de seguir, então tornou-se uma entidade muito virada para Macau. Percebi que o que fazemos é algo anti-marca, porque um artista faz um trabalho, o Governo apoia-o, muito bem. Mas dou-lhes apoio sempre que é necessário.

Qual o caminho que Macau está a tomar, com os casinos e as réplicas?
Penso que já não é apenas o Jogo que domina, mas podemos atrair as famílias, com as crianças, e temos de pensar como dar-lhes o divertimento e fazer com que isso seja lucrativo, com eventos ou apostar na área da restauração. Penso que nesse sentido Macau está a ir no caminho certo. Há algumas questões, como o facto do Governo querer acabar com o fumo nos casinos. Não sou fumador, mas um turista vem a Macau para jogar, fumar e comer. Concordo em não fumar em restaurantes, ao pé de crianças…mas nos casinos? Estas pessoas jogam, bebem e fumam. Eles vêm cá para se divertir, então onde está o divertimento?

[quote_box_right]“O que poderíamos fazer agora? Criar um órgão independente, composto por artistas ou arquitectos, que não esteja envolvido com o sector do imobiliário, do Jogo ou da construção. Esse órgão deveria decidir o que é bom ou mau para Macau”[/quote_box_right]

O Governo já mostrou a vontade de criar mais museus. Qual deveria ser o modelo a implementar?
Macau já foi o primeiro território na Ásia a ter uma bienal, no tempo dos portugueses, e ninguém fala disso. Macau poderia transformar-se num centro de arte na Ásia e dizer que desde os anos 90 (que promove esse tipo de eventos). Hong Kong era um deserto cultural, Pequim e Xangai não tinham arte, de todo. E Macau já tinha uma bienal de arte. Então deveríamos promover isso sem fazer esse corte entre a Administração portuguesa e o Governo chinês. Macau sempre foi Macau e deve ter orgulho desses pequenos detalhes, para além das diferenças. Nessa altura Macau não tinha nada, tirando um ou outro problema com um Governador, mas era um lugar engraçado e interessante.

Para si, ainda é assim?
Vejo este lugar como uma continuação da cultura da Europa, e que ainda mistura outras formas, como essas coisas americanas que agora existem. Penso que é uma boa plataforma para a arte e cultura, e Macau poderia ser de novo um centro de arte. Temos dois modelos: a feira de Singapura, apoiada pelo Governo, ou a Art Basel em Hong Kong, totalmente privada. Poderíamos fazer uma mistura, com um pouco de apoio do Executivo. Os casinos também poderiam participar, mas a questão é que eles só promovem os artistas de topo, as grandes marcas. Macau deveria ditar um pouco as regras, criando esse órgão, com 30% de artistas locais, e mais um grupo de artistas convidados, para decidir quais seriam os projectos certos.

15 Jun 2015

Rendas | Coutinho retira projecto e une-se a Chan Meng Kam

Do dia para a noite, Pereira Coutinho decidiu retirar o seu projecto de lei sobre o arrendamento e unir-se a Chan Meng Kam. A notícia chegou com surpresa, mas tem um propósito: reunir o maior número de deputados para que seja aprovado algum diploma que controle as rendas. Coutinho aceita mas quis, em retorno, apoio na aprovação da Lei Sindical

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] deputado José Pereira Coutinho surpreendeu tudo e todos quando anunciou a retirada do seu projecto de lei sobre o arrendamento – apresentado na semana passada à Assembleia Legislativa (AL) e pronto para ir a votos na segunda-feira – para se unir ao deputado Chan Meng Kam.

“Sim, é verdade. Decidi unir-me ao grupo de deputado que também vai apresentar um projecto similar e com objectivos idênticos ao meu projecto”, começou por confirmar José Pereira Coutinho ao HM, enumerando pontos em comum entre os dois diplomas. “Os aspectos de controlo das rendas e referências no sentido de combater as pensões ilegais [são semelhantes]”, diz.

Assumindo que está a aliar-se a forças diferentes dentro da AL, o deputado – viu o seu colega do hemiciclo rejeitar alguns dos seus projectos – admite que esta aliança poderá ser benéfica para todos.

“Atendendo que o objectivo é aprovar a lei em causa, acho que seria importante eu subscrever este novo projecto e retirar o meu com o objectivo de que os residentes de Macau passem a ter uma Lei de Arrendamento num futuro próximo”, argumenta, esclarecendo que Chan Meng Kam conseguirá reunir mais votos a favor dos outros deputados.

A carta de pedido de retirada do projecto de lei foi enviada ontem a Ho Iat Seng, presidente da AL. “Acabei de assinar o projecto de lei [da equipa de trabalho de Chan Meng Kam] e acabei de enviar uma carta ao presidente da AL para solicitar a retirada do meu projecto”, confirmou ao HM, no final da conferência de imprensa organizada na Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM) sobre a Lei Sindical.

Unir forças

[quote_box_right]“Atendendo que o objectivo é aprovar a lei em causa, acho que seria importante eu subscrever este novo projecto e retirar o meu com o objectivo de que os residentes de Macau passem a ter uma Lei de Arrendamento num futuro próximo” – Pereira Coutinho, deputado[/quote_box_right]

Pereira Coutinho não nega que a união traz algum interesse, já que assegura que recebeu uma garantia por parte de Chan Meng Kam de apoio ao projecto da Lei Sindical. “Foi uma das contrapartidas que lhe fiz e espero que [Chan Meng Kam] cumpra a promessa”, afirma.

Questionado sobre o número de vezes que Chan Meng Kam votou contra os projectos de lei encabeçados por Pereira Coutinho, o presidente da ATFPM justifica que “às vezes é necessário dar passos para a frente ou para trás, faz parte da vida, [que] é feita de muitas surpresas”.

“Vejo [esta união] de forma positiva, desde que [Chan Meng Kam] apoie o projecto da Lei Sindical tudo bem para mim, são mais apoiantes e aumentam as possibilidades da lei vir a ser aprovada. Apesar de ainda existirem algumas dificuldades”, argumenta.

Equipa de votos

A união a Chan Meng Kam vem ainda trazer mais votos. Pelo menos é nisso que acredita Pereira Coutinho. “Porque ao ser do Chan Meng Kam os outros dois [Song Pek Kei e Si Ka Lon] também vão apoiar, em princípio, sendo da mesma equipa, daí mais votos”, explica.

Recorde-se que um projecto de lei sobre esta matéria há muito tem sido anunciado pela deputada Song Pek Kei, que encabeçou um grupo de trabalho dedicado a este projecto. Também Gabriel Tong esteve envolvido, ajudando na parte jurídica. Questionada pelo HM, a deputada confirmou que irá assinar o projecto de lei em causa por fazer parte da equipa de Chan Meng Kam. “Se o deputado José Pereira Coutinho já falou com o deputado Chan Meng Kam faremos uma equipa. O que de nós os três [Chan Mang Kam, Si Ka Lon e Song Pek Kei] assinar o projecto está a representar toda a equipa. O que queremos é impulsionar a lei”, disse ao HM.

Sobre o projecto elaborado pela deputada, Song Pek Kei afirmou “que não está decidido quem poderá assinar esse projecto”, não dando qualquer informação extra sobre se o documento será ainda submetido à AL.

Num email enviado ao HM, Chan Meng Kam esclarece que avançou com o projecto com o objectivo de “desenvolver de forma saudável o mercado de arrendamento”. Sobre o convite ao deputado Pereira Coutinho, Chan esclarece que faz parte de uma tentativa de “angariar mais apoio” a um só projecto de lei.

12 Jun 2015

A menina que tinha um olho na nuca

[dropcap style=’circle’]E[/dropcap]ra eu um teenager quando um dia, na zona de fumadores do Liceu, encontro um chonto di gente à volta de uma revista, discutindo um assunto com grande entusiasmo.

Tratava-se de uma revista de fofoquices de Hong Kong (*), daquelas que folheamos quando estamos no cabeleireiro. Trazia um artigo impressionante: uma menina que tinha um olho na nuca. Perfeito, simétrico, bem no meio do cabelo. As fotos eram convincentes. E assustadoras.

A malta comentava com grande excitação esse incrível fenómeno. E enquanto uns apontavam as vantagens que essa rapariga teria nos exames escritos por poder copiar o colega de trás, outros contavam histórias de freak shows que tiveram a oportunidade de assistir na Tailândia, cujos pormenores não vou aqui descrever por não ser adequado, e ainda outras histórias incríveis que conheciam, contadas por um amigo. E esse amigo, claro, é sempre um indivíduo que ninguém conhece e ninguém sabe ao certo quem é.

Os meus conhecimentos limitados do corpo humano aliados ao bom senso foram suficientes para me levarem a concluir, prontamente, que aquele artigo não devia ser levado a sério. Um olho na nuca? Naquela revista? I mean, come on…

No entanto, fui imediatamente confrontado pelos presentes que me exigiram, sem demora, argumentos concretos que sustentassem a minha posição. Ora, tinha mais que fazer. Afastei-me e fui à minha vida.

Fast forward para a actual era das redes sociais e o cenário repete-se.

Li algures que, no futuro, havemos de registar os tempos actuais como “antes do Facebook” e “depois do Facebook”. Não sei se será necessariamente assim. Contudo, não deixa de ser um facto que o Facebook, em conjunto com as outras redes sociais, alterou profundamente a forma como vivemos as nossas vidas.

E, sobretudo, a forma como a informação – seja ela útil ou inútil, mas sobretudo a inútil – é partilhada e divulgada.

O Facebook regista actualmente mais de 1.44 mil milhões de utilizadores. O news feed do Facebook é um espaço em constante actualização, a todo o segundo, com todo o tipo de informação, desde a estrondosa notícia do Jorge Jesus no Sporting aos inconsequentes selfies do não-sei-quem na praia com os seus cãezinhos.

Deixemos de lado os selfies do não-sei-quem. Não me incomodam nada e confesso até que me relaxam ao fim do dia quando estou cansado e desligo o cérebro.

O que me preocupa mesmo é as notícias bombásticas que são imediatamente partilhadas e espalhadas pelo mundo fora, pois frequentemente carecem de rigor informativo e, como tal, têm um poder deformativo enorme. Os comentários que conseguem gerar nas redes sociais e os impactos que têm na formação da opinião pública é um fenómeno que não pode ser ignorado.

Por alguma razão as agências noticiosas, também elas presentes nas redes sociais, e logo a seguir os cibernautas, têm a ânsia de divulgar as notícias sem antes verificar a sua veracidade, a credibilidade da fonte, apurar os factos ou simplesmente parar para reflectir um pouco sobre o assunto.

Dessa atitude resultam notícias que são verdadeiramente hilariantes.

O jornal satírico World News Daily Report, por exemplo, publicou um artigo sobre uma suposta entrevista que Ringo Starr deu a um jornal afirmando que o verdadeiro Paul McCartney morreu em 1966. O actual Paul McCartney é um sósia chamado Billy Shears, o qual entretanto se veio a revelar um excelente músico. Apanhei essa notícia no The Mirror, jornal que, achava eu, devia ser mais maduro e ajuizado.

Por sua vez, a cadeia americana KTVU, subsidiária da Fox News, anunciou em primeira mão os nomes dos quatro pilotos do malogrado voo da Asiana Airlines que se despenhou na aterragem em São Francisco: Sum Ting Wong, Wi Tu Lo, Ho Lee Fuk, Bang Ding Ow. Explicação para quem não entendeu a absurdidade da coisa: “Something’s wrong! We’re too low! Holy f***! Bang, ding, ow!”

Anda tudo louco?

Naturalmente, esses são casos extremos em que só se deixa levar pela notícia quem, de facto, é muito obtuso e não tem cura. Por isso, deixemos estar.

Analisemos agora outro tipo de notícia, menos surreal e com potencial para produzir efeitos mais abrasivos. Um exemplo que apanhei agora mesmo em circulação no news feed, vindo da Rede de Informação Universal (RIUS): “Brasil vendeu o jogo para a Alemanha num esquema de corrupção que envolveu milhões”.

Essa captou a minha atenção pois veio na altura certa, coerente com o recente escândalo de corrupção da FIFA. Não sei o que é a RIUS, mas não interessa: tal como aquele nosso amigo que ninguém sabe ao certo quem é e que conta histórias mirabolantes, é irrelevante.

E como nas redes sociais tudo funciona à velocidade da luz, em menos de 24 horas essa notícia já gerou 930 chilreanços no Tweeter, 247 mil likes e shares no Facebook e outros tantos milhares de comentários pelo ciberespaço fora.

Nessas ondas de comentários tudo é válido e, por alguma razão, a discussão tende a escorregar para o campo da irrazoabilidade, onde falsas verdades são ditas com convicção e disparates que, sinceramente, não lembram nem sequer ao palhaço, são abundantes.

Agora vejam: se com a notícia inicial alguém se sentiu lesado e pretende, através de um segundo post, colocar algum rigor à coisa e repôr a verdade, desejo-lhe então muita sorte pois terá pela sua frente uma tarefa árdua e ingrata.

Porque entretanto já ninguém quer saber do conteúdo desse segundo post uma vez que, na sequência do primeiro post em que a notícia foi lançada bombasticamente, milhões de cibernautas já partilharam, comentaram, formaram uma opinião e tomaram uma posição sobre o assunto em discussão. E tudo com base em disparates e falsas verdades que por vezes são até maleficamente e habilmente semeadas no momento certo.

[quote_box_right]Voltando então à história da menina que tinha um olho na nuca: mal sabia eu na altura que, afinal, tinha acabado de viver um cenário que se havia de repetir, persistentemente, ao longo de uma fase particular da minha vida profissional.[/quote_box_right]

E agora o busílis da questão: é apenas assim no ciberespaço? Não. Na realidade, trata-se de um comportamento que não se limita apenas às redes sociais, não fossem os cibernautas (também) pessoas reais de carne e osso.

No nosso pequeno e queridíssimo Macau, assiste-se a essa atitude em todo o lado, nomeadamente no programa da manhã da rádio chinesa, no fórum semanal no Jardim da Areia Preta, nos debates e sessões de consulta pública, ou mesmo naquele órgão oficial onde representantes do Governo são convocados para prestar esclarecimentos a um grupo de distintas personalidades, entre elas um ilustre que interpreta a violência doméstica como modo de aproximação conjugal.

É assim que se forma a opinião pública.

E, posto isso, estamos a chegar ao fim do artigo. É momento de revelar ao caríssimo leitor a verdadeira raison d’être do tema de hoje o qual, mesmo não sendo uma especialidade minha, nem nada que se pareça, insisti em desenvolver: o que acabou de ler foi um desabafo.

Sim. Porque no passado, em diversas ocasiões, o autor desta coluna foi incumbido da tarefa de, em conjunto com a sua equipa de trabalho, dar a cara para o dito segundo post – o tal que todos ignoram pois a discussão na sequência do primeiro post ganhou ímpeto e tomou já um rumo próprio.

Não é nada fácil desviar um rio com uma corrente forte. E cito aqui as sábias palavras de Joseph Goebbels, ministro da propaganda de Hitler: “uma mentira repetida 1000 vezes torna-se verdade”.

Voltando então à história da menina que tinha um olho na nuca: mal sabia eu na altura que, afinal, tinha acabado de viver um cenário que se havia de repetir, persistentemente, ao longo de uma fase particular da minha vida profissional.

O final foi o mesmo: a dada altura afastei-me e fui à minha vida.

Sorrindo Sempre

Quem teve a pachorra de ler o Sorrindo Sempre anterior (edição de 29 de Maio) lembra-se com certeza da bengalada que dei a um funcionário do Fundo de Pensões (FP) a quem atribuí o título de ignóbil e pedi para deixar de pensar com o traseiro.

Para a minha agradável surpresa, no dia em que a coluna foi publicada recebi uma chamada da Presidente do FP, que foi muito simpática comigo e me pediu desculpa pelo sucedido. Explicou-me também por que motivo o FP dá especial atenção ao endereço e ao nome do contribuinte, merecendo por isso um esclarecimento:

1. O FP mantém uma base de dados dos contribuintes e o endereço é uma referência importante na eventualidade de futuras notificações.

2. Rigor no registo do nome do contribuinte é fundamental para evitar que o cheque com o dinheiro do Fundo de Previdência seja emitido com gralhas.

As explicações da senhora Presidente pareceram-me legítimas, ainda que não justifiquem o que para mim continua a ser uma falta do seu funcionário: o facto de ter sido incapaz de levantar aquelas (falsas) questões na minha presença.

No entanto, seria muito mesquinho da minha parte insistir no assunto. E, no fim, até pedi desculpa à Presidente do FP, pois a senhora tem coisas muito mais importantes com que se preocupar no exercício das suas funções do que aturar as tretas que o André Ritchie escreve na sua coluna. Senti-me bastante mal pelo tempo que desperdiçou ao telefone comigo. Muito ng hou yi si.

O Sorrindo Sempre é o meu espaço de desabafo para denunciar com cinismo e alguma maldade as absurdidades do meu dia-a-dia. Não quero, no entanto, transmitir a ideia de que sou uma prima donna que barafusta por tudo e por nada.

Assim sendo, o Sorrindo Sempre desta semana termina então com este esclarecimento e sem uma história bombástica. Hoje mou ah. Paciência. A vida é assim.

Sorrindo Sempre.

(*) Vulgarmente conhecidas por “pat gwa chap chi”.

12 Jun 2015

A espera em Cantão de Tomé Pires

[dropcap style=’circle’]N[/dropcap]uma viagem normal, em condições favoráveis, desde Cochim até à costa chinesa demorava-se quatro meses, mas esta, que trazia o Embaixador Tomé Pires, levava já mais de dezassete meses quando, em 15 de Agosto de 1517, a frota comandada por Fernão Peres de Andrade chegou a Tamão (Lin Tin). Aí, os primeiros contactos com os chineses foram através do Pio de Nantó, tendo os portugueses que ficar mais de um mês em Tamão à espera pela permissão para seguir até Cantão. Segundo Gonçalo Mesquitela, os portugueses chamavam a esta ilha de Tamão, Beniaga, que significa mercadoria, e a causa por “esta ilha ser assim chamada é porque todos os estrangeiros que vão à Província de Cantão, é a marítima mais ocidental que o Reino da China tem, a ela por ordenanças da terra hão-de ir por estar por espaço de três léguas da terra firme e ali provém os navegantes do que vão buscar” como refere João de Barros. Beatriz Basto da Silva explica que o termo de Ilha de Veniaga só foi usado pela primeira vez em 1525, referindo-a como a ilha de encontro comercial de mercadores portugueses e chineses e é uma expressão propositadamente vaga, tal como “a designação de ‘ilha do encontro’, já que podia não ser a mesma em cada ano, como convinha ao comércio clandestino que então se praticava na China meridional”, sendo Tamão, (Tunmen em mandarim), nesse ano de 1517 a Ilha da Veniaga. E continuando com Mesquitela: “A três léguas da ilha da Veniaga está outra em que vive o almirante ou capitão-mor do Mar, na vila de Nantó (Nantou encontra-se na área de Nanshan, em Shenzhen). Logo que chegam estrangeiros a Veniaga faz saber aos regedores de Cantão quais são e que mercadorias trazem e quais querem comprar”…”Informado disto por Duarte Coelho, mandou Fernão Peres recado ao capitão da armada chinesa, fazendo-lhe saber quem era e que vinha com uma embaixada d’el-rei D. Manuel de Portugal, seu Senhor, a el-rei e que por vir em paz e não em guerra, não respondera nas palavras de Barros. Ao que o capitão (chinês) respondeu manifestando-lhe muito boas vindas e que pelo navio de Duarte Coelho, chegado dois dias antes, soubera, que a sua armada tinha partido de Malaca; e que pelos chineses que ali iam tinha também notícias da verdade e cavalheria dos Portugueses. Que folgava com a paz e que guardasse os costumes da terra, que ele primeiro ia mandar recado aos regedores de Cantão, e o que respondessem, isso fariam.” Mas os dias iam passando e a resposta não aparecia e então “Fernão Peres insistiu por mensageiro junto do Almirante do Mar, o Pio, tendo como resposta, dada nos mais amáveis termos, que os regedores de Cantão ainda não tinham comunicado a sua decisão.” E continuando com João de Barros: “Sobre este negócio houve tantos recados de parte a parte que enfadado Fernão Peres desta dilação, mandou tirar do porto da ilha alguns navios para se pôr em caminho e com os pilotos chineses que trouxera de Malaca, meteu-se em Cantão.”

“Enquanto Fernão Peres subia o Rio das Pérolas até à cidade de Cantão, parte da armada permanecia próximo da foz, sob o comando de Simão de Alcáçova; João de Barros relata-nos que este grupo de navios foi atacado por piratas, mas não se refere a baixas avultadas; ter-se-á tratado de uma simples escaramuça…” refere João Oliveira e Costa.

A instrução protocolar

Em finais de Setembro de 1517, os barcos que transportavam a Embaixada Portuguesa ao Imperador do Celeste Império entraram em Cantão. “Desfraldando bandeiras e salvando com toda a artilharia, os navios portugueses lançaram ferro em frente do cais principal da cidade” A. Cortesão.

Como os três governadores de Cantão, o Tutam, o Concam e o Chumpim, se encontravam ausentes da cidade foi com o Puchanchi, o haidao interino Gu Yingxiang, que os portugueses primeiro trataram. Gu Yingxiang não os recebera, sendo toda a comunicação feita por intermédio do intérprete chinês”, como está referido no Revisitar os Primórdios de Macau para uma nova abordagem da História de Jin Guo Ping e Wu Zhiliang. Aí se diz que, devido ao haidao Wang Hong se encontrar fora numa missão oficial a Pequim, Gu Yingxiang nessa altura substituía-o na repartição do Haidao (Circuito da Defesa Marítima).

“Logo o Puchanci, a mais alta autoridade que no momento se encontrava em Cantão, mostrou o seu desagrado contra o que dizia ser uma violação dos direitos da terra por parte dos portugueses, que demais tinham chegado sem consentimento oficial. Respondeu Andrade que o salvar da artilharia e desfraldar de bandeiras era devido à sua ignorância, apenas significando uma marca de respeito, e, quanto a vir sem licença, explicou que o Pio acabara por lha dar e fornecer pilotos” Armando Cortesão.

Resolvido este pequeno problema, muitos outros foram ocorrendo. Para João de Barros: “A ida dos três governadores fora da cidade, segundo depois pareceu, foi mais artifício para Fernão Peres ver a majestade e pompa de suas pessoas quando entrassem nela, que alguma outra necessidade; e ainda para ver os graus da precedência de cada um e a diferença que a cidade fazia no seu recebimento, vieram um e um, tomando dia próprio para isso.”

“Foi então arranjada uma entrevista com os portugueses. Andrade, que até aí tinha proibido o desembarque de qualquer português ou a entrada de chineses nos navios, enviou a terra o feitor (Giovanni da Empoli), . O feitor disse aos Governadores como o Rei D. Manuel de Portugal, desejando relações de amizade com tão grande Príncipe como era o Rei da China, enviara aqueles navios, sob o comando do seu Capitão Fernão Peres de Andrade, conduzindo um Embaixador e presentes para serem entregues aos Governadores de Cantão, que os enviariam à corte” A. Cortesão e com ele continuando, “No fim de Outubro de 1517, foi Tomé Pires desembarcado por Andrade, . O presente para o Imperador, que só na sua presença deveria ser aberto, foi fechado na mesma casa e a chave entregue a Pires” Armando Cortesão. O encontro entre os governantes da cidade e o Embaixador Tomé Pires decorreu na Mesquita Huaisheng, que continua hoje a existir na Rua Guangta, no centro de Cantão.

Ainda antes disso, o haidao interino Gu Yingxiang “imediatamente mandou comunicar tudo e Ning Cheng, eunuco dos Três Salões e Guo Xun, o marquês Wuding, à altura no cargo de Zongbing acorreram ao aviso. O cabecilha (Tomé Pires) saiu de longe para os receber mas não lhes fez genuflexões. O Censor Metropolitano e Grande Coordenador Chen Jin (o Tutão) chegou mais tarde sozinho e mandou dar vinte bastonadas no intérprete, dizendo ao Superintendente do Comércio Marítimo: . No primeiro dia, começaram a fazer genuflexão com a perna esquerda, no segundo dia conseguiram fazê-la com a perna direita, e só no terceiro dia aprenderam a bater a cabeça no chão” Revisitar os Primórdios de Macau.

Fernão Peres deixa Pires em Cantão

[quote_box_right]O encontro entre os governantes da cidade e o Embaixador Tomé Pires decorreu na Mesquita Huaisheng, que continua hoje a existir na Rua Guangta, no centro de Cantão[/quote_box_right]

“Embora a comitiva ficasse alojada num edifício próprio, especialmente destinado às missões estrangeiras, as despesas da estada corriam por conta dos portugueses, como expressamente exigira Fernão Peres” assim diz João de Barros na Ásia, segundo Rui Manuel Loureiro e com ele continuando: “Durante longos meses, os portugueses estiveram ancorados diante da grande metrópole da província de Guangdong, efectuando proveitosos negócios e colhendo amplas notícias sobre a realidade sínica, por ocasião de sucessivas visitas à cidade e de múltiplos contactos com a população local e com os mandarins cantonenses. Entretanto, um navio capitaneado por Jorge Mascarenhas explorou demoradamente o litoral chinês até às imediações de Amoy”. E Beatriz Basto da Silva complementa “entre saguates (presentes destinados a predispor bem um interlocutor, costume muito comum então no Oriente, especificamente na China), deixou sementes de bom entendimento”.

Por outro lado, segundo João Oliveira e Costa: “o êxito desta armada deveu-se em grande parte ao tacto do capitão-mor (Fernão Peres de Andrade), que procurou respeitar todas as práticas locais. Num país com um poder fortemente centralizado, como era a China dos Ming, que contrastava com a situação política do resto do continente asiático, os Portugueses não podiam ofender as autoridades de uma cidade, pois se tal acontecesse não seriam bem aceites em todos os outro portos do Celeste Império. Não era possível repetir aqui o que acontecera na Índia e na África Oriental…”

Rui Loureiro refere que: “De acordo com documentos coevos, o jurubaça principal da embaixada portuguesa, um chinês que dava pelo nome de Huo-che Ya-san (Huozhe Yasan), estabelecera excelentes relações com as autoridades provinciais, logo após o desembarque no porto de Cantão. Por sua própria iniciativa, e graças a uma generosa distribuição de dádivas, conseguira obter autorização imperial para Tomé Pires visitar Pequim como enviado do rei de Malaca.”

“Depois de declinar convites para ir a terra, Andrade despediu-se dos Governadores, por lhe ter chegado notícia de que os navios que deixara em Tamão tinham sido atacados pelos piratas, e também porque uma parte da sua gente dos navios de Cantão estava adoecendo com febres e disenteria, doença que já vitimara nove homens, entre os quais Impole (o feitor da armada). Desta vez, os chineses prestaram todo o auxílio na reparação dos navios.” E seguindo ainda com A. Cortesão: “Após algum tempo em Tamão, recebeu Andrade notícia (aliás, falsa) de que os Governadores de Cantão já tinham ordem da corte para enviar a Embaixada. Mandou então lançar pregões para se qualquer chinês tivesse recebido agravo de algum português ou algo lhe fosse devido, se lhe queixasse a fim de receber reparação ou pagamento, o que causou excelente efeito. E, assim, partiu em Setembro de 1518, depois de se ter demorado quase catorze meses na China, chegando a Malaca , conforme comenta Barros”, que adita ter Fernão Peres nesta estadia aprendido dos chineses algumas técnicas de construção naval, que introduziu nos navios portugueses e passaram a ser, nestes, de uso corrente.

A longa espera em Cantão

5 HM Mesquita em Canta¦âo

Com Tomé Pires, segundo João de Barros, ficaram em Cantão sete portugueses mas, Cristóvão Vieira informa que foram Duarte Fernandes, Francisco de Budoia, Cristóvão de Almeida, Pedro de Faria e Jorge Álvares, todos portugueses, <eu, Cristóvão Vieira, pérsio de Ormuz, doze moços servidores e cinco jurabaças> (intérpretes). Eram, pois, cinco portugueses, um persa lusitanisado e dezassete outros.

Duarte Coelho foi enviado pelo capitão-mor D. Jorge de Mascarenhas para Malaca com a informação de o Embaixador Tomé Pires ter sido bem recebido em Cantão mas, quando aí chegou em Março de 1518, Duarte Coelho logo mandou avisar Fernão Peres de Andrade que a praça estava a ser atacada pelo Rei de Bintão. Já com a informação que chegara instruções do Imperador da China para lhes enviar o Embaixador português, os navios sob o comando de Fernão Peres largaram de Tamau em finais de Setembro de 1518, chegando no mês seguinte a Malaca. Ainda antes de partir, Fernão Peres de Andrade disse aos Governadores de Cantão que, no ano seguinte, outro Capitão português iria com uma armada buscar o Embaixador.
No entanto, Tomé “Pires e o seu séquito ainda tiveram de esperar mais de quinze meses em Cantão antes de partirem para Pequim. Só depois de três recados transmitidos à corte e de terem vindo de lá outros três recados para os Governadores, pedindo mais pormenores sobre os portugueses, etc., chegou enfim ordem para a Embaixada seguir” A. Cortesão. Já Beatriz Basto da Silva diz que: “Tomé Pires aguardou viagem em Lantao” onde os visitantes ficaram em “prisão preventiva”, enquanto não chegava autorização imperial a Cantão.

Assim, por questões de ordem diplomática, a embaixada teve que esperar até 1520 para que fosse permitido a Tomé Pires ir até Pequim entregar os presentes e a carta que trazia do Rei de Portugal D. Manuel ao Imperador da China, nessa altura Zheng De (1505-21) da dinastia Ming, cujo nome de Templo é Wu Zong.

12 Jun 2015

S. Januário | Rui Furtado e António Martins terão saído por burla de administrador

Limpezas no hospital?

12615P9T1[dropcap style=’circle’]R[/dropcap]ui Furtado e António Martins não viram o seu contrato renovado com os Serviços de Saúde (SS) devido ao envolvimento no caso do administrador do Hospital São Januário. Pelo menos é o que diz um comunicado dos Serviços de Saúde (SS), que refere que “posteriormente, os contratos [dos] dois cirurgiões não foram renovados”.

Recorde-se que Rui Sá, ex-administrador do Centro Hospitalar Conde de São Januário, foi condenado por crime de falsificação de documentos e burla. Tal como escreveu o HM, o responsável teria pedido a dois médicos cirurgiões que passassem receitas em nome dos pacientes, para depois recolher os medicamentos – para doenças crónicas – e apropriar-se deles. Os dois médicos não foram acusados, tendo servido apenas de testemunhas no caso. Contudo, agora é público que estes são Rui Furtado e António Martins, ambos ex-funcionários do São Januário.

Ora, os SS apresentam um comunicado assegurando não ser tolerantes face a infracções e anunciando melhorias na fiscalização do hospital. Mas, no mesmo comunicado, referem que a saída destes dois médicos se deveu ao envolvimento no caso e que Rui Sá foi despedido com justa causa.

“O réu obteve dezenas de prescrições de medicamentos através de dois ex-cirurgiões da nacionalidade portuguesa, apropriando-se, por vezes, com grandes doses de medicamentos para tratamento de insónia, Alzheimer e doenças do foro mental. (…) Posteriormente, os contratos destes dois cirurgiões não foram renovados”, pode ler-se.

Os Serviços de Saúde reafirmam que não são indulgentes com as infracções e têm exigido de forma rigorosa aos trabalhadores, que devem ser regulares na permanência no seu posto de trabalho, realizando de forma periódica palestras que visam a reforçar o cumprimento rigoroso da lei e da integridade por parte dos trabalhadores. Os Serviços de Saúde têm também realizado a revisão e aperfeiçoado permanentemente o mecanismo interno de fiscalização. O lançamento do rigoroso do regime de sistema electrónico na vertente de entrada, saída e de ausência permite a eliminação de actos ilícitos.

Análises e bloqueios

[quote_box_right]“O réu obteve dezenas de prescrições de medicamentos através de dois ex-cirurgiões da nacionalidade portuguesa, apropriando-se, por vezes, com grandes doses de medicamentos para tratamento de insónia, Alzheimer e doenças do foro mental. (…) Posteriormente, os contratos destes dois cirurgiões não foram renovados” – Comunicado dos SS[/quote_box_right]

O HM tentou contactar Rui Furtado, mas não foi possível até ao fecho desta edição. Não foi possível também contactar António Martins.

No comunicado à imprensa, o SS esclarecem que têm realizado a revisão e aperfeiçoado permanentemente o mecanismo interno de fiscalização e que, depois do caso do ex-administrador, as autoridades de saúde “efectuaram uma análise auto-crítica sobre regulamentos vigentes no que ao levantamento de medicamentos [diz respeito], de modo a bloquear eventuais lacunas”. Confirmando que denunciaram a situação “após a detecção das respectivas situações, tendo colaborado no julgamento na qualidade de assistente do processo”, os SS solicitam também que todos “os médicos dependentes dos Serviços e Unidades devem observar de forma rigorosa as respectivas regras, quando prescrevem medicamentos aos doentes”.

As autoridades esclarecem ainda que a administração se tem esforçado para reforçar o cumprimento rigoroso da lei e da integridade por parte dos seus trabalhadores, realizando a revisão e aperfeiçoamento permanentemente o mecanismo interno de fiscalização. “O lançamento do rigoroso do regime de sistema electrónico na vertente de entrada, saída e de ausência permite a eliminação de actos ilícitos”, concluem os SS.

12 Jun 2015

Wynn Cotai | Au Kam San apoia petição da IUOE. Maioria não

O deputado da bancada democrata mostra-se aberto a apoiar a IUOE no aprofundamento do caso do terreno da Wynn no Cotai, até porque já falou sobre o tema com o Governo. Mas mais ninguém, nem o colega de bancada Ng Kuok Cheong, alinha com Au Kam San

[dropcap style=’circle’]S[/dropcap]ó o deputado Au Kam San parece querer apoiar a União Internacional de Engenheiros Operacionais do Nevada (IUOE, na sigla inglesa) na investigação e pedido de reembolso de 50 milhões de dólares americanos à Wynn.

O democrata considera que é preciso que a AL enfrente o Governo com esta questão, porque nunca há respostas concretas, diz, da parte das Obras Públicas. Au Kam San disse apoiar “com certeza” a petição da IUOE. Isto, porque conforme relembra ao HM, “já elaborou uma interpelação escrita relativamente ao caso” e “a resposta do Governo mostrou que não havia nenhum registo” do terreno.

“O Governo rejeita sempre [falar sobre o tema], parece que não existe este caso e que apenas a Wynn Macau travou promessas com uma outra parte, que não se sabe quem é. No entanto, no processo de concessão do terreno, uma empresa não iria ser tão estúpida ao ponto de oferecer um grande montante de dinheiro sem indicação de algum governante”, atira Au Kam San ao HM.

Recorde-se que a IUOE enviou uma petição aos deputados esta semana, pedindo que actuem para que a Wynn receba uma indemnização no valor de 50 milhões de dólares americanos. O valor corresponde ao alegado montante que a operadora teve de pagar a uma empresa de Pequim para conseguir ficar com o terreno que tem actualmente no Cotai. Num email enviado ao HM, a IUOE explicava que o objectivo da carta era pedir aos deputados que ajudem a descobrir “se os oficiais do Governo agiram dentro da sua autoridade legal, ao prometerem os direitos de concessão do terreno no Cotai ao grupo de Ho Ho (empresário da Tien Chao), sem documentarem o caso”.

Para Au Kam San é preciso esclarecer “qual foi o governante que indicou à empresa [de Pequim] que se comprometesse com a outra companhia” e, por isso, o deputado quer que a entrega da petição da IUOE possibilite a realização de uma audição sobre o conteúdo do caso no hemiciclo. Audição que, diz, “incluiria o pessoal do Governo [responsável pelo caso]”.

O deputado aponta mesmo que esta situação pode não ser a única e, que pelo interesse público, a AL deveria averiguar e pedir mais esclarecimentos sobre a situação. “Macau, sendo uma região de Direito, como é que pode acontecer haver entidades que fazem [as coisas por] dinheiro desta forma? Pelo grande interesse público, a AL deve [pedir] a solução deste caso”, frisou.

O único

[quote_box_right]“O Governo rejeita sempre [falar sobre o tema], parece que não existe este caso e que apenas a Wynn Macau travou promessas com uma outra parte, que não se sabe quem é. No entanto, no processo de concessão do terreno, uma empresa não iria ser tão estúpida ao ponto de oferecer um grande montante de dinheiro sem indicação de algum governante” – Au Kam San, deputado[/quote_box_right]

Mas Au Kam San não recolhe apoio dos colegas do hemiciclo. O teor complexo é uma das justificações mais dadas quando os deputados são questionados sobre o assunto, bem como a impotência da AL.

Para José Pereira Coutinho, o tema não pode ser discutido pelos deputados da Assembleia Legislativa. “Não posso subscrever esta petição, porque não estou por dentro do assunto. Não sei qual a situação, qual o imbróglio e não posso, realmente, fazer um juízo coerente e sério sobre a situação”, começou por dizer Pereira Coutinho ao HM.

Da mesma forma que Pereira Coutinho, também Ng Kuok Cheong não quer apoiar o pedido da IUOE. Para o colega de bancada de Au Kam San, só o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) poderá pronunciar-se sobre o caso.

“O conteúdo é complicado, não sei bem o que [a IUOE] dos Estados Unidos está a fazer. A Assembleia Legislativa (AL) deve entregar o caso ao CCAC depois de receber o pedido de intervenção e vamos testar a reacção do CCAC”, disse ao HM.

Recorde-se que o organismo liderado por André Cheong já está a investigar o caso, segundo confirmou anteriormente.

Kwan Tsui Hang critica que a forma como foi entregue a petição nem sequer foi oficial, uma vez que os deputados terão recebido a carta por email, pelo que “nem sequer se sabe que é verdade”. O facto de não ser uma entidade de Macau a fazer o pedido, “ou um residente”, também tira a confiança da deputada. “Pode não ser verdade. A [IUOE] não foi directamente à AL e isto são negócios entre eles. A AL nem sequer pode fazer a investigação, só o CCAC.”

Pereira Coutinho também concorda. “Compete às autoridades da RAEM, nomeadamente ao CCAC, ao Comissariado de Auditoria, à Direcção dos Serviços de Finanças, para saber se de facto no âmbito das suas competências, houve alguma coisa que não esta correcta, que é preciso investigar. Na qualidade de deputado não tenho dados para isso.”

Outros deputados ouvidos pelo HM, como foi o caso de Chan Meng Kam e Song Pek Kei, ainda nem sequer viram a petição. E a maioria, como concorda Pereira Coutinho, não deverão alinhar com Au Kam San. “Acho que, se Pereira Coutinho não pega, mais ninguém pega.”

12 Jun 2015

Retalho | Exigidas medidas para aumento dos turistas

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap]s mudanças no sector do retalho como consequência da diminuição das receitas do Jogo motivaram um encontro entre o Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, e representantes de 20 associações do sector industrial e comercial. No encontro, as associações fizeram “propostas como adopção de medidas que visam atrair a vinda de mais visitantes para Macau, a fim de aliviar os efeitos negativos provocados pela queda das despesas médias dos turistas”. Isto porque “caso haja uma descida drástica deles, maiores dificuldades poderão ser trazidas para a economia de Macau”, refere um comunicado oficial.

Essas medidas visam a criação de planos promocionais trans-sectoriais ou a “realização de actividades festivas e feiras, para atrair a visita a Macau dos turistas e para reforçar a dinâmica da economia”. Foi ainda proposta maior publicidade a “diversos pontos de consumo em Macau, por forma a encaminhar os turistas para as zonas comunitárias, apoiando a sobrevivência das Pequenas e Médias Empresas (PME) lá instaladas”. As associações pedem que seja aumentada a responsabilidade social das operadoras de Jogo, através do aumento de aquisição de bens e serviços locais, bem como que seja feito um reforço do incentivo ao consumo local por parte dos residentes.

Efeito dominó

Lionel Leong admitiu que devido ao ajustamento profundo das receitas oriundas do sector de Jogo, verificou-se, no primeiro trimestre, um decréscimo no comércio a retalho, quer em termos do valor das transacções, quer em termos do volume de venda. Para o Secretário, isto demonstrou que a “situação desfavorável de operação do sector nos últimos tempos começou a ter repercussões nos outros sectores”.

O mesmo comunicado aponta que se registaram “mudanças nos negócios dos estabelecimentos do comércio a retalho, tendo a descida das receitas do Jogo afectado a procura de consumo, por parte dos turistas e dos residentes de Macau, no que diz respeito aos produtos de elevada qualidade, originando um decréscimo não só no valor dos seus negócios, como também no volume da sua venda”.

Para além disso, o consumo dos residentes locais também foi afectado dadas as alterações do ambiente económico, passando uma parte dos trabalhadores do sector de Jogo a adoptar uma postura prudente nas suas despesas. “Determinadas actividades sectoriais viram as suas receitas a contrair-se, no entanto, não se conseguiram ser beneficiadas, ao mesmo tempo, de uma redução nos seus custos operacionais, dificultando assim a sua sobrevivência”.

12 Jun 2015

Macau e Portugal aprofundam cooperação na formação de quadros

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap] Secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, recebeu ontem o Secretário de Estado da Justiça português, António Costa Moura, para debater uma cooperação mais profunda na formação de quadros. No final do encontro, o Secretário explicou que Sónia Chan se mostrou muito interessada nas reformas que estão em curso em Portugal.

“Assumi com a Secretária da Justiça o compromisso de enviar toda a documentação relevante produzida em Portugal sobre esta matéria e a Secretária mostrou muito interesse também no aprofundamento das relações a nível da formação”, disse à Rádio Macau. “Principalmente em matérias que dizem respeito ao registos e notariado com os códigos fundamentais sobre matriz portuguesa.” António Costa Moura mostrou ainda muito orgulho e confiança quanto ao futuro.

“Tivemos abertura para que continue a ser assim e concordámos com estas autoridades que, de facto, a área da formação é estratégica neste domínio. Dentro do quadro de competências de cada umas da entidades, que respeitamos e prezamos muito, levarei para Portugal a mensagem do empenhamento das autoridades locais”, declarou. Sobre a vinda de magistrados de Portugal para Macau, o Secretário de Estado da Justiça sublinhou que o país está também com falta de pessoas nesta área, mas vai continuar a respeitar a política de facilitação de contactos.

12 Jun 2015

Viriato Soromenho Marques: “A nossa política doméstica é hoje política europeia”

Viriato Soromenho Marques, professor de Filosofia da Universidade de Lisboa, tem um extenso currículo, não apenas académico. Esteve em Macau para promover o seu novo livro intitulado “Portugal e a Queda da Europa”, no qual defende a abolição do Tratado Orçamental da UE e que o federalismo europeu não seja apenas penitência mas também salvação.

[dropcap style=’circle’]A[/dropcap] pontou diversos erros na construção da União Europeia, fazendo um diagnóstico não muito favorável. Por outro lado, apontou um outro caminho que seria mais federalismo. Isso faz-me lembrar o que Nietzsche diz de Kant: a raposa que destrói a sua jaula para a seguir construir outra e se meter nela…
(Risos) Refere-se à passagem da Crítica da Razão Pura para a Crítica da Razão Prática, não é?

Sim. Da crítica “radical” da possibilidade de conhecer à emergência do “radical”, “terrorista” imperativo categórico (risos).
De facto, penso que há uma consistência na minha afirmação, isto é, a construção europeia foi efectuada através de uma metodologia que, desde o início e para os observadores mais atentos, estava “impregnada” de deficiências de design, ou seja, de construção. Temos vários marcos das críticas que foram feitas. As críticas foram feitas em diferentes períodos: um deles que foi na década de 70, porque a ideia de uma união monetária – que é hoje a zona Euro – já vem bastante de trás. Praticamente, desde que a comunidade europeia se constituiu, em 1958, com um dos Tratados de Roma, que temos várias tentativas de a construir. A primeira – e a mais consistente – é de 1970 e tem o nome do Primeiro-Ministro do Luxemburgo [Pierre Werner], que ficou encarregue de fazer o esboço e é o Plano Werner, que consiste em fazer uma união monetária de 70 a 80, ou seja, em dez anos. Este é muito parecido com aquele que está actualmente em vigor. Tendo sido objecto de críticas válidas, se o plano actual é muito semelhante, as críticas são igualmente válidas. As deficiências que hoje vemos claramente são fruto do choque daquela estrutura com a realidade. A primeira crítica é a seguinte: uma união monetária só pode sobreviver se tiver uma grande solidariedade política e por isso é que as uniões monetárias – que a História verifica e que sobreviveram – são as que tinham o suporte de uma união política, geralmente de recorte federal ou aparentado…

Pode dar um exemplo, para entendermos melhor o que é realmente para si essa necessidade…, digamos, federal.
O exemplo mais puro é o do Federalismo Americano. Temos a Constituição Federal de 1787, aprovada e em vigor em 88, mas não temos o dólar nem nenhum banco central. No entanto, tinham já uma Constituição comum dizia as competências do Governo comum. Só timidamente, à medida que a realidade ia evoluindo, é que eles começaram a introduzir o dólar – em 1792 – e houve várias tentativas falhadas de fazer um banco central.

[quote_box_left]“Uma união monetária só pode sobreviver se tiver uma grande solidariedade política e por isso é que as uniões monetárias – que a História verifica e que sobreviveram – são as que tinham o suporte de uma união política, geralmente de recorte federal ou aparentado…”[/quote_box_left]

Está então a dizer que existem erros estruturais, conjunturais e também eventos dramáticos…
Um outro caso, a que eu chamo de império federal, foi o II Reich, de Bismarck. A Alemanha tinha 30 e tal unidades políticas e a Prússia liderava a unificação depois da vitória sob a França. Só em 1876 é que foi possível unificar todos os bancos centrais que existiam nos estados alemães e que na altura se chamava Reich Bank. Em 1871 fizeram a Constituição. Digo que [isto] era Imperialismo Federal na medida em que os estados continuavam a estar representados parlamentarmente; a única questão é que o imperador era sempre da Prússia. O Império Austro-Húngaro – que também tem traços democráticos – tinha uma união monetária que passava pelo crivo do Parlamento. Como era um império constituído por dois reinos, de dez em dez anos havia uma sessão especial do Parlamento que se debruçava sobre a renovação da união monetária… Nós nunca tivemos nada disto na zona Euro.

Sem união política, considera então impossível a união monetária?
Que funcione, sim. A união política permite criar uma esfera de Governo comum e a Comissão Europeia não é um governo comum, até porque precisam de ter um orçamento comum que permita fazer investimentos, políticas contra-cíclicas quando os Estados estão com dificuldades. Num governo federal, quando há uma expansão económica, o governo tende a contrair.

Quando fala de federalismo, está a falar de política, mas a verdade é que o Tratado Orçamental, que impõe a intromissão na definição dos orçamentos nacionais, não é só um instrumento económico mas, sobretudo, de economia política. No fundo, já existe federalismo através deste tratado…
Existe uma caricatura, na medida em que só existe o federalismo como penitência e não como salvação. Uma questão central tem que ver com o orçamento comum e a capacidade de políticas de coordenação económicas, que são duas coisas que efectivamente ainda não existem na Europa. O orçamento comunitário da UE corresponde a 1% do PIB e, quando o [Jean-Claude] Juncker e o [Durão] Barroso se sentavam com os chefes de Estados dos Governo, tínhamos 1% do PIB europeu sentado à mesa de 45% do PIB europeu, que é sensivelmente aquilo que os orçamentos dos governos representam. Temos uma desproporção absolutamente brutal. Para podermos falar de federalismo económico de um governo que tivesse capacidade de fazer as tais medidas, precisaríamos de ter um orçamento europeu, no mínimo, de 4% a 5%. Isto para um federalismo “low-cost”…

[quote_box_right]“Vale a pena ler o documento das propostas apresentadas por Juncker, depois destes quatro meses de negociação com Tsipras. É como se nada tivesse acontecido, as mesmas coisas. É o IVA a aumentar, exclusões de sectores de pessoas com problemas…”[/quote_box_right]

Isso significaria mais impostos para os povos europeus?
Neste momento temos 1% e não dá. Como é que vamos arranjar os tais 5%? Através da superação de uma outra desvantagem que a actual situação traz: não só não temos política de coordenação económica, como temos uma competição fiscal – no sentido português da palavra – terrível. Isto provoca situações como as empresas do nosso PSI 20 pagarem impostos na Holanda. A vantagem da coordenação económica é que obriga a algum federalismo fiscal. Isto significa simplesmente que o orçamento comum é baseado nos impostos e toda a gente percebe. Se perguntar como é que funciona o orçamento europeu, só um técnico é que sabe responder. Mas esta baseia-se no princípio de garantir que algumas economias são contribuintes líquidas e outras beneficiárias: é de paternalismo fiscal. A ideia é manter sempre sete ou oito países à frente.

É essa Europa que quer federalizar ainda mais, dando mais poder a estes países? Se já temos um federalismo na prática…
O que temos é uma “consolidação de Estado”, ou seja, uma forma de hegemonia misturada com uma partilha de soberania monetária e cambial, mas que é um federalismo só com desvantagens e sem a solidariedade e o desenvolvimento. É um sistema monstruoso e que, na minha perspectiva, não vai sobreviver muitos anos. O BCE é que tem salvo a Europa de uma desagregação que teria acontecido em 2010 ou 2011. A grande reforma que precisamos não são na Grécia ou Portugal, mas sim da zona Euro e a prova disso é o BCE. O próprio resgate da Grécia e Portugal era proibido pelo artigo 125 [Tratado de Lisboa] e é muito interessante, porque o mecanismo que foi encontrado é o da ambiguidade e falta de coragem de se dirigir ao cidadão. O artigo 125 é uma espécie de cadáver que está no Tratado… E o artigo 123, que proíbe o financiamento monetário. Ou seja, enquanto os bancos centrais de outros países compram as suas obrigações do tesouro no mercado primário e consegue fazer um financiamento político, o BCE compra a dívida que está sobretudo na posse dos bancos, no mercado secundário.

Então, pelos vistos, interpretando esse artigo do Tratado de Lisboa, conclui-se que os políticos europeus estão nas mãos desses bancos, fazem-lhes as vontades. Vamos federalizar mais para lhes dar ainda mais poder, para expandir e dar uma dimensão final às doutrinas neo-liberais?
Não. A proposta que defendo é a explicitação do federalismo e isso implica ser capaz de voltar ao princípio, à ideia de um tratado constitucional, definindo claramente as competências da esfera europeia, fazer uma reforma fiscal que permita habilitar esse governo a ser eleito pelos cidadãos com os recursos orçamentais necessários e impedir esta situação em que temos o Conselho Europeu a controlar o processo. A Comissão Europeia está neste momento na posição de “serva” do Conselho Europeu e não tem tido capacidade de iniciativa. Os tratados recomendam que todo o processo legislativo começa na Comissão e agora é ao contrário: todo ele começa nas reuniões do Conselho Europeu, por sua vez dominado pela Alemanha, às vezes com o apoio da França. Temos que fazer esse caminho – claro que a política é a procura da liberdade possível – mas também procurar evitar a “física política” – que é quando se faz a única coisa que se pode fazer. Estamos a ver que a política na Europa está a estreitar-se tanto que qualquer dia já só temos física, sendo só administrada a desordem.

[quote_box_left]“O que temos é uma ‘consolidação de Estado’, ou seja, uma forma de hegemonia misturada com uma partilha de soberania monetária e cambial, mas que é um federalismo só com desvantagens e sem a solidariedade e o desenvolvimento. É um sistema monstruoso e que, na minha perspectiva, não vai sobreviver muitos anos”.[/quote_box_left]

Neste enquadramento, também deu a ideia de que prefere uma solução que passe pelos partidos políticos tradicionais do que pela emergência de novas forças políticas ou novos conceitos, que acontecem em países como a Grécia, a Espanha ou a França. Em que sentido prefere os tradicionais?
O que prefiro é que exista uma consciência colectiva dos europeus no sentido de não voltarem as costas à Europa, porque é a casa que nós temos e, se ela se fragmentar, as ruínas caem-nos em cima. Julgo que tudo é possível porque entramos numa zona – com a Grécia – em que as regras já não se aplicam e é uma situação nova, porque é a primeira vez que um país da OCDE não cumpre os planos do pagamento do FMI e é, de facto, grave. É, sobretudo, feito num contexto em que não sabemos se vai haver acordo, pelo que se não houver, a Grécia terá que criar uma nova moeda. No entanto, isto vai ser uma confusão muito dolorosa para a Grécia e para o resto da Europa, porque não é só a questão dos credores oficiais, mas também da inserção deste país no mercado europeu, na medida em que os importadores e exportadores vão, certamente, ficar numa situação em que deixarão de estar interessados em vender produtos à Grécia, país com nova moeda e que vai ter que renegociar tudo com toda a gente.

Mas a dívida infinita também não é uma opção viável…
Não. Temos que ser rigorosos. Vale a pena ler o documento das propostas apresentadas por Juncker, depois destes quatro meses de negociação com Tsipras. É como se nada tivesse acontecido, as mesmas coisas. É o IVA a aumentar, exclusões de sectores de pessoas com problemas…

Não existe um regime de federalismo político assumido: com eleições, governo, presidente da Europa, nada… Mas há uma dúzia de bancários e políticos de determinados países que jogam no mercado financeiro e impõem aos países determinadas medidas.
Não lhe parece que podíamos aproveitar a Grécia para, pacífica e politicamente, começarmos a mudar as coisas? Era interessante. Essa racionalidade fazia sentido e julgo que os países que deviam ter logo aproveitado com a questão grega eram Portugal, Espanha e a Itália. O que eu acho inadmissível – e que os eleitores vão ter que punir estes governos nas próximas eleições – é que os governos de Portugal e Espanha não tivessem aproveitado, até porque sabemos que os ministros das finanças português e espanhol foram mais papistas que o Papa no Eurogrupo e isto significa que tanto em Portugal como em Espanha o que tivemos foram dirigentes partidários e não nacionais. Pensaram no seguinte: se conseguirmos ganhos por causa da Grécia, significa que toda a oposição que temos à nossa esquerda, vai ganhar as eleições porque vão perguntar porque não fizemos o que a Grécia fez. – É preciso que corra mal na Grécia para que nos corra bem a nós – é precisamente o discurso de Passos Coelho.

[quote_box_right]“Os ministros das finanças português e espanhol foram mais papistas que o Papa no Eurogrupo e isto significa que tanto em Portugal como em Espanha o que tivemos foram dirigentes partidários e não nacionais”[/quote_box_right]

Mas estes partidos do arco da governação são aqueles que defende…
Não exactamente. A reforma do sistema partidário pode assumir várias dimensões. Falamos dos casos grego e espanhol, onde está a ver-se uma reforma ao lado dos partidos tradicionais. Todavia, julgo que também é possível vislumbrar uma reforma da parte dos partidos tradicionais. Podemos conceber um processo misto, com o aparecimento de partidos convencionais que sejam capaz de dar a volta e ajustar contas com o seu passado, renovando-se, com novos partidos. No caso português, temos no espaço da direita uma certa renovação, com uma coligação que vai aguentar até ao fim e que vai partir outra vez para as eleições. A direita foi capaz de fazer uma coisa que a esquerda tem muita dificuldade em fazer, que foi unir-se, sempre com a perspectiva da manutenção do poder. Em relação à esquerda, vejo dois partidos mais pequenos – o PCP, que é um partido clássico que mantém basicamente as mesmas posições e o BE, que está numa posição de grande incerteza em relação ao futuro –, o aparecimento de uma força que vai disputar votos à esquerda, à direita e ao centro – que é Marinho Pinto – e a questão do PS, que é um grande enigma. Aparentemente, teria condições para se renovar e até produziu, com a equipa de Seguro, as primárias – que era um desígnio já muito antigo –, mas está a ser perturbado por uma grande dificuldade em não apenas calibrar o seu discurso programático mas também da narrativa do seu passado. A situação de ter um ex-primeiro-ministro preso não facilita a situação. Um dos grandes problemas do PS vai ser conseguir a demarcação muito clara relativamente à figura do anterior primeiro-ministro, mas também do método de fazer política que foi predominante durante esse período.

As Legislativas 2015 estão à porta e há a possibilidade do Governo mudar. Em que medida é que uma possível alteração de partido poderia influenciar a forma como Portugal se posiciona na Europa?
Julgo que a verdadeira escolha está, essencialmente, na compreensão de que a nossa política doméstica é hoje política europeia, tal como para Espanha, Grécia ou Itália. Qualquer possibilidade de contrariarmos a austeridade, que tem feito cair o investimento público a níveis tão baixos que só têm paralelismos históricos se recuarmos décadas, de ter capacidade para lutar contra a fragmentação financeira da UE, que faz com as nossas empresas tenham condições competitivas piores do que empresas da Europa Central… Tudo isto só será possível mudando as regras do jogo europeu. A melhor política que um novo governo pode fazer, pelo bem do nosso país, será a de dialogar extensivamente com forças de outros países. Temos algum tempo, mas não temos todo o tempo do mundo, partindo do princípio que a situação da Grécia não vai escalar muito mais. Aquilo que temos mesmo discutir é a questão do tratado orçamental e a minha posição é radical: este devia ser abolido, porque é um instrumento que não serve à UE. Se tivermos que encontrar uma posição intermédia, teremos que rever aquelas metas absolutamente irrealistas do défice e da dívida pública que nos condenariam a uma austeridade por, pelo menos, mais 20 anos.

[quote_box_left]“Um dos grandes problemas [do PS] vai ser conseguir a demarcação muito clara relativamente à figura do anterior primeiro-ministro, mas também do método de fazer política que foi predominante durante esse período.”.[/quote_box_left]

Disse que Portugal não tem uma lógica de projecto colectivo. Em que medida seria possível contornar esta sua ideia?
Maurice Duverger dizia uma coisa muito interessante quando aderimos à UE: ao entrarem na comunidade europeia, vocês, portugueses, parecem estar a reformar-se da História. Isto significa que Portugal não amadureceu suficientemente o seu desígnio estratégico, depois de termos rompido com uma tradição secular. A maioria dos portugueses e políticos não se apercebeu da mudança sísmica da revolução de 74: é que, nesta altura, não nos limitámos a substituir uma ditadura por um regime de democracia representativa. Já a tínhamos tido na Primeira República e na Monarquia. Em 74 interrompemos um ciclo em que a nossa identidade estratégica dependia de um apoio externo, que era o imperial. Em 74 estava em causa precisamente esta questão: onde é que vamos buscar este apoio externo? O país continuou a precisar disso… Adriano Moreira diz isso e eu apoio. Julgo que a Europa foi isso mesmo, mas não fomos capazes de perceber que a Europa era um espaço de luta e não de repouso. Devíamos ter negociado os termos de amarração na Europa.

Uma espécie de projecto nacional, como houve com os Descobrimentos… Resumimo-nos agora à selecção nacional de futebol e, esporadicamente, tivemos Timor, que foi um caso de sucesso.
Exacto. O falhanço nacional principal foi o Tratado de Maastricht. Em 1986 a negociação e as condições de entrada foram bem conseguidas. O que a democracia conseguiu não é nada que o Estado Novo não tivesse já pensado, até porque o primeiro pedido de adesão à comunidade europeia foi feito em 66, e não foi com Marcelo Caetano mas sim com Salazar, que pediu a adesão discretamente. Foi De Gaulle que se opôs porque tinha acabado de criar a sua política agrícola comum. Olhou para Portugal e pensou que era um país pequeno mas demasiado parecido com França: tinha muito agricultores. A vocação europeia não é nenhuma descoberta democrática, mas sim lógica.

Haveria outras alternativas?
De entre várias outras, há um projecto mais audaz, que seria o de uma união lusófona, que faria de Portugal um país descentrado da Europa, com uma base europeia, mas fundamentalmente centrado em África, que era o projecto de Norton de Matos. Nova Lisboa era o embrião de uma capital em África, o que seria uma experiência absolutamente extraordinária. O que falhou? O que falha actualmente: não se pode fazer isto nem um regime federalista sem democracia plena. Julgo que a actual crise que estamos a viver é também um momento para um despertar da nossa consciência nacional, de não estamos condenados à fatalidade, de pensar o país como um processo de venda a saldo do capital construído, dos bens imóveis, até que não exista mais nada. Este governo tem vendido tudo aquilo que constituía um suporte da nossa capacidade de autonomia em caso de sermos obrigados a seguir o nosso destino. No fundo, o nosso país está a ficar um país de assalariados.

[quote_box_right]“Temos que estreitar a cooperação com os PALOP, mas Portugal não pode pertencer a uma lusofonia mais forte se não tiver alguma coisa para oferecer. Devemos manter o projecto europeu, porque o que nos valoriza junto dos moçambicanos, brasileiros e angolanos é a nossa pertença à Europa.”[/quote_box_right]

O investimento chinês tem estado particularmente presente na área de investimento português. Como vê a influência da China em Portugal e que futuro augura?
A China é claramente uma potência que tem uma visão estratégica mundial, já não é só asiática, e também não tem estados de espíritos: partidos republicanos e democráticos, políticas conjunturais, nem presidentes burros ou inteligentes… Tem um projecto estratégico de décadas. Outro aspecto: a China não faz caridade e está a investir em Portugal porque neste momento é um bom negócio com empresas bastante válidas e estruturas lucrativas. Parece-me também que na perspectiva de projecção de poder no mundo, a China prefere a aliança e a parceria ao confronto e à dominação. Estando nós numa situação tão incerta e insegura em que a nossa permanência na zona Euro pode estar em perigo, é conveniente termos outras amarrações geopolíticas e geoestratégicas do ponto de vista económico com outras zonas do mundo. Temos que estreitar a cooperação com os PALOP, mas Portugal não pode pertencer a uma lusofonia mais forte se não tiver alguma coisa para oferecer. Devemos manter o projecto europeu, porque o que nos valoriza junto dos moçambicanos, brasileiros e angolanos é a nossa pertença à Europa.

Como aos olhos da China…
Faz todo o sentido fazermos parcerias com a China em vários sectores e talvez se tenha exagerado um pouco na percentagem de capital de cada sector que foi negociado e a culpa foi do nosso Governo. A Índia é também muito importante, mas os EUA também não devem ser esquecidos, tal como outros países. Diria que, à semelhança do que a região de Macau representa, também no que diz respeito ao investimento chinês em Portugal, o governo que vem a seguir deverá manter uma boa cooperação com a China.

com Leonor Sá Machado
leonor.machado@hojemacau.com.mo

12 Jun 2015

Lei dos Animais | Só cães e felinos são de consumo proibido

És um cão ou um rato?

[dropcap style=’circle’]E[/dropcap]m Macau, todos os animais, excluindo cães e gatos, podem ser consumidos. A ideia foi transmitida pela deputada Kwan Tsui Hang ontem, quando sublinhou a diferenciação do Governo entre animais para consumo e cães e gatos. Ontem, durante a reunião da 1.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL) com membros do Governo, a presidente anunciou que a principal preocupação da proposta de Lei dos Animais é a questão da dor infligida nos animais.

Seja em situações de abate permitido ou actos de violência e maus tratos para com os animais, o Governo pretende que a dor infligida seja a menor possível. No que diz respeito ao abate, Kwan apontou oito diferentes casos que o documento legislativo prevê, incluindo consumo, surtos de doenças contagiosas ou epidemias, controlo do número de animais – no caso do número de animais abandonados no canil municipal exceder o permitido –, alívio de dor ou sofrimento do animal ou segurança pública.

Abate sem dor

[quote_box_left]“Os maus tratos contra animais são diferentes dos maus tratos aos seres humanos, que podem ser morais e físicos. Mas nos animais é difícil compreender a sensação do animal em relação a determinado acto” – Kwan Tsui Hang, deputada[/quote_box_left]

Outra das situações foca a desratização, prática muito comum em Macau, mas que não tem, de acordo com o Governo citado por Kwan Tsui Hang, ser um acto doloroso para o animal: o Executivo prefere o abate por meio de “utilização de meios humanos que não inflijam dor aos animais”, explicou.

Por exemplo, a presidente da Comissão alertou para o emprego de produtos com veneno, como são os raticidas, ao invés de se optar pelas ratoeiras. “Temos que fazer os possíveis para evitar dores desnecessárias [para matar ratos]”, concluiu a deputada. É que, de acordo com o Executivo, “os ratos também são animais” e devem ser abatidos de formas menos violentas.

A reunião de ontem focou-se na discussão de uma nova versão da proposta, recentemente entregue pelo Governo a estes deputados. Assim, foi debatida a noção de “maus tratos”, que Kwan entende não ser tão fácil de definir como no caso dos seres humanos. “Os maus tratos contra animais são diferentes dos maus tratos aos seres humanos, que podem ser morais e físicos. Mas nos animais é difícil compreender a sensação do animal em relação a determinado acto”, acrescentou a deputada.


IACM junta-se a IH para promover protecção
O presidente do Conselho de Administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), Alex Vong, referiu que vai juntar-se com o Instituto de Habitação (IH) para promover a protecção de animais. O evento vai acontecer este sábado no Edifício do Lago – habitação pública. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, Vong foi questionado sobre a questão de terem sido descobertos animais mortos no edifício e afirmou que não tinha jurisdição, pelo que “só pode haver conclusão final quando acabar a investigação da Polícia de Segurança Pública”. Polícia que já disse não ter provas que possam levar a investigação adiante para já e que anda “de porta em porta” a tentar perceber o que se passou. O presidente do IACM disse ainda que vai abrir estas actividades de promoção a outras habitações públicas.
12 Jun 2015

Governo | Salário mínimo universal até fim de 2018

Salário mínimo para todos será mesmo em 2018 “ou até mais cedo”. Entretanto, porteiros e funcionários da limpeza vão passar a receber ordenados de 30 patacas à hora em 2016, sendo que o Governo se mostra aberto a rever este valor

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap]O salário mínimo para porteiros e funcionários da limpeza entra em vigor já em Janeiro de 2016, sendo que o Executivo prometeu que até finais de 2018 o salário mínimo para todas as classes de trabalhadores deverá estar implementado.

Os deputados da 3.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa (AL) reuniram-se ontem com o Secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong, por forma a analisar na especialidade a proposta de lei referente à implementação do salário mínimo. O diploma passa agora a chamar-se Salário Mínimo para Trabalhadores de Limpeza na Administração Predial.

Segundo Cheang Chi Keong, deputado que preside à Comissão, vai mesmo ser implementado o salário para todos daqui a três anos.

“O salário universal poderá ser implementado até finais de 2018 ou antes, se tudo correr bem. O Governo já deu um grande passo e o valor do salário mínimo vai ser actualizado”, explicou o deputado.

[quote_box_right]“O salário universal poderá ser implementado até finais de 2018 ou antes, se tudo correr bem. O Governo já deu um grande passo e o valor do salário mínimo vai ser actualizado” – Cheang Chi Keong, presidente da 3.ª Comissão Permanente da AL[/quote_box_right]

As 30 patacas por hora será o valor a ter em conta na implementação dessa medida, ainda que o Governo esteja aberto a rever os montantes daqui a três anos. “No futuro, aquando da aplicação do salário mínimo universal, vão ser aplicados estes valores, mas tudo dependerá da situação na altura”, disse Cheang Chi Keong.

Para já, os trabalhadores da limpeza e segurança passam, a partir de Janeiro de 2016, a receber 30 patacas por hora, 240 patacas por dia, 6240 patacas mensais. Cerca de 6200 trabalhadores ficarão abrangidos, contudo, “13 mil trabalhadores de outras profissões vão continuar a receber menos de 30 patacas por hora”.

Riscos de part-time

O Governo está também a trabalhar na criação de um regime de trabalho a tempo parcial. “Ainda tem de ser criado um regime de tempo parcial, é algo que está ausente deste regime e tem que ser feito por lei. A Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) já tinha ponderado isto e o Governo já está a preparar isso. Alguns empregadores poderão usar o regime de part-time, e isso apresenta riscos”, referiu Cheang Chi Keong. O parecer jurídico que conclui a análise na especialidade deverá estar concluído na próxima semana.

12 Jun 2015

Eddie Murphy, mestre de capoeira: “Macau foi amor à primeira vista”

[dropcap class=”type1″]S[/dropcap]e lhe falarmos de Edilson Almeida consegue reconhecer? É difícil, até porque até ele tem algumas dificuldades em se reconhecer pelo nome próprio. Pois bem, Edilson Almeida é, nada mais nada menos, do que o Mestre Eddie Murphy, cara muito conhecida de toda a comunidade de Macau.

“É um orgulho, uma alegria quando passo na rua e as pessoas levantam a mão, dizem ‘olá mestre Eddie’, é muito bom”, começa por nos contar o único mestre de capoeira de Macau, Hong Kong e China.

Mesmo lesionado não negou, como estávamos à espera, dar uma entrevista ao HM. De sorriso rasgado, conta-nos um pouco do que é. “Sou um optimista, adoro o que faço, amo minha família, adoro Macau.”

Foi há sete anos que chegou ao território, não à China. Isto, porque vivia em Shenzen há cinco anos. “Acredita que nunca tinha vindo a Macau? Não acredito nisto, mas é verdade, em cinco anos aqui ao lado nunca vim a Macau. Estava cego”, relembra.

A convite para colaborar com uma academia que na altura existia em Macau, o mestre Eddie abraçou o desafio e mal colocou os pés neste território não teve dúvidas: “foi amor à primeira vista”.

“Mal cheguei fiquei apaixonado. Só o facto de ver coisas em Português, os nomes das ruas, os autocarros… não queria acreditar, senti-me em casa”, conta. A verdade é que num abrir e fechar de olhos, o mestre e a sua família criaram raízes neste lado do mundo.

Primeiro passos

[quote_box_right]Foi há sete anos que chegou ao território, não à China. Isto, porque vivia em Shenzen há cinco anos. “Acredita que nunca tinha vindo a Macau? Não acredito nisto, mas é verdade, em cinco anos aqui ao lado nunca vim a Macau. Estava cego”, relembra.[/quote_box_right]

Pouco tempo depois de residir em Macau, a academia em que Eddie trabalhava fechou e o mestre de capoeira temeu o pior. “Tinha um mês para sair de Macau porque tinha ficado sem trabalho, pensei no que iria fazer para arranjar uma solução”, relembra, frisando que foi a ajuda das pessoas que fez com que, sete anos depois, Eddie Murphy seja responsável por uma academia de capoeira, uma empresa de entretenimento, uma escola de dança e de grande parte dos eventos de carnaval e latinos que acontecem no território. “Também é da nossa responsabilidade a organização do carnaval em Hong Kong”, acrescenta.

Na altura, relembra, muita pessoas foram ao encontro do mestre de capoeira e apresentaram sugestões e “muita ajuda” para que o Eddie conseguisse avançar com a sua vida aqui. Por Macau ser um espaço pequeno, com traços de pequena vila, tem este lado positivo.

“Em Macau é possível conhecer toda a gente. Todos sabem quem é quem e se é bom ou mau”, explica, sublinhando que cada um “escolhe com quem quer andar”.

“À minha volta gosto de ter pessoas boas, pessoas que gostam de fazer o bem, pessoas positivas e que se esforçam por estar de sorriso mesmo nos dias maus. Tu tens duas formas de viver a vida, ou de sorriso ou de cara fechada, tu é que escolhes o que queres ser”, partilha.

União é a máxima

facebookNão associar o mestre ao seu trabalho na capoeira é quase impossível. Foi Eddie Murphy que trouxe para China esta espécie de dança que culturas mas, principalmente, que “faz bem à alma”. Das suas aulas fazem parte alunos de todas as nacionalidades e giro é ver as diferenças de comportamentos, reflexos dos diferentes lugares de onde chegam.

“Os chineses são mais tímidos, porque são assim por natureza, o português é mais aberto. Com as crianças chinesas é preciso ir mais devagar, mas depois de se sentirem à vontade funcionam como família”, conta.

E é esta união a base da capoeira e de todos os ensinamentos que o mestre pretende passar a todos aqueles que passam pela sua vida. “Muitas vezes acontece que quem começa a frequentar as aulas tem problemas, tem uma fase menos boa na vida, muitas vezes ligadas com a família. Os meus alunos chineses têm muitas vezes esse problema, uma educação mais rígida, com mais respeito porque é um respeito imposto e não pode ser assim. É importante – e esta é uma das linhas da capoeira – que se perceba que o respeito é merecido e não imposto”, partilha.

Eddie Murphy acredita que Macau está melhor do que há sete anos e é a Taipa a zona que mais lhe enche o coração. “Sou muito ligado aos valores familiares, à minha família de sangue ou à da capoeira, porque é isso que somos, uma família, e a Taipa permite no tempo livre ires passear com a tua família, ir a um parque com as crianças, dar um passeio. Adoro a Taipa”.

É a indústria do Jogo que mais preocupa Eddie Murphy. “É preciso ter algum controlo nos casinos e na construção dos casinos, é preciso dar atenção aos que cá moram e não querem saber dos casinos, olhar para os filhos dos trabalhadores [desses espaços] que muitas vezes estão sem os pais durante a noite”, argumenta.

Um amor para sempre

Não há hesitação nenhuma quando perguntamos ao mestre o que pretende fazer no futuro. “Quero ficar em Macau, já não saio daqui”, diz-nos de sorriso rasgado. “Tenho recebido muito amor aqui, dos meus alunos, dos pais dos meus alunos, de todos aqueles que até não se identificam com o movimento da capoeira mas vão aos encontros e estão connosco”, conta.

Planos para o futuro não faltam. Eddie Murphy, marcado pelo seu espírito de trabalho, levanta um pouco o véu e conta-nos que talvez para o próximo ano Macau receba, pela primeira vez, o Campeonato Mundial de Capoeira, que poderá receber pelo menos cem países.

12 Jun 2015

Angola e China “podem ir mais longe” na cooperação

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, manifestou-se esta terça-feira empenhado em “estreitar as relações com a China”, afirmando que os dois países “têm imensas potencialidades para valorizar” e “podem ir mais longe” na cooperação bilateral.

“A história tem demonstrado que é na base da confiança e do respeito mútuos que se forjam relações sólidas e duradouras, como a parceria estratégica com a China”, disse José Eduardo dos Santos no início das conversações com o homólogo chinês, Xi Jinping.

“Os laços de amizade e de solidariedade entre os nossos povos e países são muito fortes e queremos continuar a estreitá-los”, acrescentou.

As conversações decorreram no Grande Palácio do Povo, no centro de Pequim, depois de uma cerimónia de boas vindas com guarda de honra, salvas de canhão e o hino nacional dos dois países tocado por uma banda militar.

Dezenas de crianças agitando bandeiras de Angola e da China saudaram os dois presidentes.

Na avenida que passa no topo norte da praça Tiananmen, frente à imponente tribuna de cor de púrpura que dá o nome do local – Porta da Paz Celestial (Tiananmen) -, os candeeiros estavam ornamentadas com as bandeiras dos dois países.

“A China foi o país que mais depressa compreendeu a situação difícil de Angola no final da guerra, em 2002, e qual a ajuda que poderia dar à reconstrução nacional”, realçou o Presidente angolano.

Numa entrevista feita ainda com os jornalistas presentes na sala, salientou também que “em poucos anos, Angola conseguiu grandes progressos” e que “a China é hoje o maior importador de petróleo angolano”.

O velho amigo

José Eduardo dos Santos iniciou na segunda-feira uma visita de seis dias à China, acompanhado por nove ministros.

É a sua quarta visita àquele país em 27 anos, o que faz do Presidente angolano “um velho amigo da China”, como lhe chamou o homólogo chinês.

“Esta visita injectará novo ímpeto na parceria estratégica entre China e Angola”, disse o presidente chinês, que é também secretário-geral o Partido Comunista Chinês (PCC), o cargo político mais importante do país.

Xi Jinping definiu “o aprofundamento das relações com Angola” como “uma política consistente da China”, afirmando que esse relacionamento “é um modelo da cooperação mutuamente vantajosa” que o seu país mantém com África.

“África é um amigo seguro da China e a China fará o seu melhor para que África alcance a paz e o desenvolvimento económico”, declarou.

Orgulho e estratégia

[quote_box_right]”A China foi o país que mais depressa compreendeu a situação difícil de Angola no final da guerra, em 2002, e qual a ajuda que poderia dar à reconstrução nacional” -José Eduardo dos Santos, Presidente angolano[/quote_box_right]

Evocando o 40.º aniversário da independência de Angola, que se assinala em Novembro próximo, o Presidente chinês disse que o MPLA, o partido no poder, e o povo angolano “devem estar orgulhosos” pelas “extraordinárias mudanças” entretanto ocorridas no país.

O programa de José Eduardo dos Santos na China inclui ainda uma deslocação a Tianjin, o maior porto do norte do país, a cerca de 150 quilómetros da capital, e um fórum económico com quase 200 participantes.

Xi Jinping visitou Angola em 2011, quando era vice-presidente da China, e foi também nesse ano que os dois países assinaram um “acordo de parceria estratégica global”.

Devido à acentuada diminuição do preço do petróleo no mercado mundial, no primeiro trimestre deste ano, o valor das exportações angolanas para a China caíram cerca de 50% em relação a igual período de 2014.

A China anunciou que ajudará financeiramente Angola a “superar as dificuldades” criadas por aquele fenómeno, mas não especificou o montante da ajuda.

Segundo fontes chinesas, o volume dos empréstimos e das linhas de crédito concedidos pela China a Angola desde 2004 rondará os 15.000 milhões de dólares.

11 Jun 2015

Visita | Secretário de Estado da Justiça reúne hoje com Sónia Chan

Podem vir aí mais oportunidades de alargar a cooperação judiciária e judicial entre Macau e Portugal. Sem discutir pormenores, António Costa Moura frisou a possibilidade de as duas regiões poderem colaborar no que à adopção de crianças diz respeito. Ideias que ainda não passam disso, mas que estarão hoje em debate

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Secretário de Estado da Justiça, António Costa Moura, vai debater hoje com Sónia Chan diversas ideias no âmbito da cooperação judicial e judiciária, onde se encaixam algumas que já estão em andamento, mas também novas, como é o caso da cooperação no âmbito da adopção.

Realçando o facto de não se querer adiantar às entidades de Macau, Costa Moura disse ao HM que poderá haver a possibilidade de cooperar para que seja possível agilizar o processo de adopção de crianças dos dois locais. “A ideia é eventualmente [discutir] a área da adopção, através da qual podemos enriquecer o relacionamento bilateral. Temos uma lei da adopção que é aberta ao mundo e é uma ideia, mas não é algo que queria lançar sem falar com as entidades [de Macau]”, frisou em declarações ao HM, à margem da recepção oferecida pelo Consulado de Portugal à comunidade portuguesa, que ontem teve lugar.

Costa Moura realça que “não há qualquer acordo firmado” ainda sobre este assunto, sendo que no encontro com Sónia Chan se vai fazer um balanço sobre os acordos que estão, esses sim, já em vigor.

O Secretário de Estado fez questão de deixar firme “a ideia de que o Governo de Portugal quer seguir o trabalho na área dos serviços prisionais, formação de magistrados, segurança pública e no cumprimento escrupuloso dos dois acordos de cooperação”, que versam sobre a transferência de pessoas condenadas e na cooperação em matéria jurídica e judiciária.

Questionado pelo HM sobre se há algo mais que pode ser aprofundado nesses acordos, Costa Moura foi peremptório: há sempre.

[pull_quote_left]O Governo de Portugal quer seguir o trabalho na área dos serviços prisionais, formação de magistrados, segurança pública e no cumprimento escrupuloso dos dois acordos de cooperação[/pull_quote_left]

“A cooperação tem de ser um exercício de dois movimentos, não pode ser imposta por um ou outro lado. Tem de ser querida e tem de resultar em vantagens para ambas as partes. Temos algumas áreas, nomeadamente a prisional – como formação e técnicas de reinserção social – em que estamos já a fazer coisas em conjunto. Mas não há nada que impeça que este quadro de cooperação possa ser alargado a outras áreas do sistema prisional. Mas ainda é prematuro, antes de falar com entidades, isto são [apenas] ideias que temos”, ressalva.

Costa Moura encontra-se também hoje com a Associação dos Advogados de Macau (AAM) e assegura ao HM “estar aberto para discutir” o que os advogados quiserem. O Secretário, que representou Portugal no Dia 10 de Junho, afirma que haverá “uma franca troca de ideias”.

Sereno elogiado, Sónia elogia

António Costa Moura fez ainda questão de agradecer ao cônsul Vítor Sereno pela competência na representação de Portugal em Macau. Sem esquecer “as autoridades locais e a comunidade”, o “profundo agradecimento” mais destacado foi para o cônsul “pelo profissionalismo, competência e dedicação” na sua carreira e na causa pública que é servir os interesses do Estado português no exterior. “Confirmei ao longo desta tarde [ontem] o cumprimento disso mesmo”, disse.

Entre mais de 200 pessoas que ontem encheram a residência consular, discursou ainda Sónia Chan, Chefe do Executivo interina – já que Chui Sai On está fora de Macau. Chan referiu, novamente, a utilização de Macau como plataforma entre a China e os PLP, elogiando os “resultados positivos” das diversas entidades criadas para esse efeito.

Caso disso é o Fórum Macau, que “contribuiu para elevar a influência internacional de Macau e promoveu uma diversificação adequada das indústrias de Macau”, como disse no seu discurso.

[pull_quote_right]A cooperação tem de ser um exercício de dois movimentos, não pode ser imposta por um ou outro lado. Tem de ser querida e tem de resultar em vantagens para ambas as partes[/pull_quote_right]

A também Secretária para a Administração e Justiça assegurou que o Governo da RAEM vai continuar empenhado na promoção do “desenvolvimento dos empreendimentos dos PLP em Macau e no interior da China”, bem como vai “incrementar, em conjunto com o [continente], a cooperação com os PLP, a União Europeia e os países latinos”.

Promessas ainda de que o Executivo vai continuar a respeitar a “multiculturalidade, a promover a economia e a melhorar a qualidade de vida, criando melhores condições de vida e de trabalho para toda a população, incluindo os portugueses residentes em Macau”.

Vítor Sereno, que se fazia acompanhar no palco pelos Conselheiros das Comunidades Portuguesas José Pereira Coutinho e Fernando Gomes – que faltaram às comemorações da manhã por “motivos de trabalho”, segundo a Rádio Macau – prometeu melhorar o trabalho no Consulado.

 


 

Alexis Tam e a importância da comunidade lusa
“Uma coisa é certa. Todos nós pensamos [no Governo] que os portugueses são elementos essenciais para Macau”, afirmou Alexis Tam, em declarações à Rádio Macau, ontem, durante a recepção à comunidade na Residência Consular. Destacando ainda o contributo da comunidade portuguesa para a história e para o património do território, o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura garantiu que o Governo tem criado “as condições” para a comunidade portuguesa se “sentir bem” no território e que a ideia é promover o uso do Português no território. “Estou com esperança que mais tarde a língua portuguesa ainda vai ser muito falada em Macau. É este o meu trabalho e eu faço o melhor possível para chegar a este objectivo”, disse à rádio.

Banda da PSP toca o hino
A banda do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) voltou a tocar o hino português durante o hastear da bandeira de Portugal, nas cerimónias oficiais do dia 10 de Junho. “Pela primeira vez, em 15 anos, tivemos a banda ao vivo. Estou muito grato ao senhor Secretário para a Segurança e ao senhor comandante do CPSP por este gesto de cortesia, de boa vontade, que evidencia claramente o nível de excelência que a RAEM tem com Portugal. Estou muito satisfeito com isso”, afirmou o cônsul-geral de Portugal, Vítor Sereno, aos microfones da Rádio Macau. O Grupo de Escuteiros Lusófonos também marcou presença, bem como seis escolas chinesas e portuguesas.

11 Jun 2015

Português | Mais de metade dos discursos de Chui Sai On sem tradução integral

Desde que assumiu funções como Chefe do Executivo que Chui Sai On nunca fez um discurso em Língua Portuguesa e mais de metade do que disse em público só mereceu uma tradução “do conteúdo essencial”. Agnes Lam mostra-se “surpreendida” com esse facto, enquanto que Amélia António defende uma tradução completa das palavras do governante

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] Gabinete do Chefe do Executivo confirmou ao HM que, em mais de cinco anos à frente dos destinos da RAEM, Chui Sai On fez um total de 202 discursos em público, tendo 192 sido proferidos em Chinês. Mais de metade, 116, não mereceram contudo a tradução integral para o Português, a segunda língua oficial do território. Apenas 76 discursos foram traduzidos para Português na sua totalidade.

Por discursos oficiais contam-se não apenas as vezes em que Chui Sai On discursou perante uma audiência específica, mas também as ocasiões públicas em que respondeu a perguntas da imprensa chinesa em eventos públicos. O facto de 116 discursos não terem sido traduzidos na sua totalidade para a língua de Camões significa que as informações passaram por uma selecção prévia antes de serem divulgadas junto da comunicação social.

Segundo a nota oficial enviada ao HM, “o Gabinete de Comunicação Social (GCS) traduziu o conteúdo essencial dos mesmos, publicando-os sob forma de comunicados de imprensa”.

No que diz respeito ao Inglês, “do total de 202 discursos, ao considerar as exigências ditadas pela ocasião, o Chefe do Executivo proferiu dez discursos directamente em língua inglesa (não incluídas as traduções feitas da língua chinesa)”.

A resposta enviada ao HM surge no seguimento do artigo “Isto aqui não é Hong Kong”, que analisava o uso do Português por parte do Governo, com base num artigo publicado no South China Morning Post. Este jornal denunciava uma descriminação face ao Inglês na região vizinha, mas analistas locais consideram que o Português não sofre este tipo de problemas em Macau, sendo que representantes de altos cargos do Governo o usam em situações públicas.

Apesar da inexistência de traduções integrais de algumas palavras de Chui Sai On em público, o Governo considera que “sempre respeitou o uso da Língua Portuguesa na RAEM, atribuindo-lhe alto valor”.

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[quote_box_right]“Isto surpreende-me bastante, porque nunca pensei que não fosse providenciada a tradução integral. Penso que o Chefe do Executivo tem de ser mais consciente em relação a este aspecto” – Agnes Lam, docente da UM[/quote_box_right]

Confrontada com os números, Agnes Lam, docente da Universidade de Macau (UM) na área da Comunicação Social, e ex-candidata às eleições legislativas, mostrou-se surpreendida com a situação.

“Isto surpreende-me bastante, porque nunca pensei que não fosse providenciada a tradução integral. Penso que o Chefe do Executivo tem de ser mais consciente em relação a este aspecto, porque o fornecimento de informações à comunidade deve ser uma prioridade. Há recursos para isso e deveria ser feito, não é justo que não seja providenciada a versão integral.”

A docente lembra, contudo, que a existência de constrangimentos ao nível dos recursos humanos pode ditar que muitas palavras cheguem mais tarde à comunidade portuguesa.

“Claro que a melhor solução seria providenciar toda a informação em Chinês e Português ao mesmo tempo, uma vez que são ambas as línguas oficiais e é esse o protocolo. Compreendo que podem haver constrangimentos ao nível da tradução, mas mesmo que não haja uma tradução integral no momento, os meios de comunicação social portugueses deveriam ter acesso à versão completa mais tarde”, disse Agnes Lam.

Amélia António, presidente da Casa de Portugal em Macau (CPM), refere que a língua mais importante “é, obviamente, o Chinês, dado que a população em geral é o público a que se destinam [os discursos]” e defende que é compreensível que o líder do Executivo fale em Chinês. Contudo, aponta que “fazer a tradução integral em Português seria simpático e era um contributo e uma afirmação do estatuto de língua que o Português tem”.

Uma das representantes da comunidade portuguesa em Macau salienta, no entanto, que não se podem estabelecer comparações com o anterior Chefe do Executivo, Edmund Ho, que dominava o Português. “Estamos perante pessoas com personalidades e maneiras de estar diferentes. Não se pode avaliar o interesse pela comunidade dessa forma. Edmund Ho é uma pessoa com um grande à vontade e com um temperamento muito amigável e expansivo e sempre teve um modo de lidar com a comunidade muito franca e aberta. O actual Chefe do Executivo é uma pessoa mais reservada e com uma forma de estar mais formal”, concluiu Amélia António.

11 Jun 2015

Luta regressa à Arena

[dropcap style=’circle’]O[/dropcap] espectáculo do boxe está de volta à Arena do Venetian, com o chinês “Ik” Yang Lian Hui a tentar pela primeira vez vencer um título mundial. Natural de Dalian, na China continental, Ik combate contra César “El Distinto” Cuenca, da Argentina, pelo cinto da International Boxing Federation (IBF) na categoria de juniores/peso médio.

Yang soma 19 combates e é treinado por Freddie Roach, treinador de Manny Pacquiao e Zou Shiming, e estreou-se no boxe em 2007, tendo vencido sete dos seus últimos oito combates por KO. Cuenca, que soma 46 vitórias, e estreou-se no boxe em 2002, sendo esta a primeira vez que luta fora da Argentina.

ENTC

“Yang construiu uma sólida base de fãs na China graças ao seu entusiasmante estilo de lutar”, explica a organização em comunicado. “Cuenca está a três lutas de igualar a marca mítica de Rocky Marciano e conseguiu inúmeros títulos nos seus 13 anos de carreira.”

O evento “Victory at The Venetian” acontece a 18 de Julho, pelas 17h30, e traz ao território atletas que já pisaram o ringue do Cotai anteriormente. É o caso de Nonito “Filipino Flash” Donaire, da Filipinas. Vencedor de cinco categorias a nível mundial, Donaire foi ainda considerado lutador do ano em 2012. Em Macau, luta contra Anthony Settoul, de França.

Na lista dos lutadores incluem-se ainda o norte-americano Mickey “The Spirit” Bey Jr., campeão mundial de pesos leves da IBF, que defende o título contra Denis “Genghis Khan” Shafikov, da Rússia. Rex “The Wonder Kid” Tso, de Hong Kong, e o “Macau Kid” Kuok Kun Ng combatem também, bem como José Ramirez, ainda que os oponentes destes três atletas não tenham sido anunciados.

Os bilhetes para o evento, organizado em parceria com a Top Rank, promotora mundial de boxe, custam entre as 180 e as 1680 patacas.

11 Jun 2015

Da Primavera e do Outono

[dropcap]E[/dropcap]m 1046 a.C., há cerca de 3.500 anos, em plena Idade do Bronze, os Shang travavam a mais crucial batalha contra os Zhou, onde é hoje a província de Henan, na bacia do Rio Amarelo, berço da civilização chinesa.

A batalha de Muye opôs o exército dos Shang, de 700.000 homens, contra os Zhou, possuidores de uma força de 4.000 carros de guerra e 48.000 homens, ditando a queda dos primeiros.

Esta batalha iria dar origem à mais longa dinastia da China, a dos Zhou, nada mais que 790 anos (1046 – 256 a.C.), dividindo-se em complicados sub-períodos, nem por isso menos interessantes.

É no período chamado “Primavera e Outono” (770 a.C. – 476 a.C.) que se afirmam, na falta de outro termo, as quatro escolas filosóficas chinesas: o Taoísmo, o Confucionismo, o Mozismo e o Legalismo.

Conta a lenda que Lao Tzu, antes de transpor as portas de Luoyang para desaparecer no horizonte Ocidental, deixou escrito o Tao te Qing, os fundamentos do Taoísmo, que contém este belo trecho, entre tantos outros:

[pull_quote_center]Havia algo de indeterminado antes do nascimento do Universo.
Essa qualquer coisa vagueia sem cessar.

Como não lhe conheço o nome, chamo-lhe Tao (Caminho, Via)
Com um nome deve ser a Mãe de todas as coisas
Sem nome, é o Antepassado dos deuses.[/pull_quote_center]

Do legado Taoísta, à benevolência do Confucionismo, segue-se a entrada do Budismo na China dos Han (206 a.C. – 220 d.C.) pela Rota da Seda, estabelecendo-se uma como que trindade de crenças, onde ao conceito cósmico, dinâmico e abstracto do Taoísmo se conjugam os princípios éticos do Confucionismo e a oportunidade da extensão temporal por via da crença Budista na roda das encarnações.

No Império do Meio o tempo passa a ter uma outra dimensão.

O tempo do tempo

Das altas montanhas debruadas de nuvens, às magnificentes capitais e à grandeza dos seus inventos, dir-se-ia que toda a longa história da China parece ter sido tecida – pura ilusão – para desembocar num conceito que lhe era exógeno, o da República.

[quote_box_right]Este breve olhar sobre a história milenar de um país que, nas últimas décadas, assistiu a uma transformação quase ímpar no desenrolar da história do mundo, fez-me lembrar um outro, no Extremo Ocidental da Europa, que, também há poucas décadas, teve o ensejo de se poder metamorfosear em um país democrático, moderno e desenvolvido, mas, dessa Primavera, resta-lhe apenas, apesar do céu azul, um ar Outonal. [/quote_box_right]

A República mais não significou que a primeira tentativa de resgate de um sistema decadente e corrupto cujo final, protagonizado pela Regente Ci Xi, mostrou a distância e o alheamento com que o Império era (des)governado.

Após o período revolucionário liderado por Mao Zedong, a China percorre em 30 anos, como país mais populoso do mundo, um caminho em direcção ao que Deng Xiao Ping apontou: “Socialismo não tem de significar pobreza”. E nos subsequentes planos quinquenais e no estabelecimento do princípio Um País Dois Sistemas conduzem com firmeza o país a uma Economia Socialista de Mercado, um dos conceitos-chave que iriam, num curtíssimo período, criar uma classe média de 400 milhões, uma classe milionária assinalável, e colocar a economia chinesa no topo da escala mundial. Apesar dos quase 100 milhões que vivem ainda abaixo da linha de pobreza, das migrações e da sustentabilidade ambiental constituírem um desafio para o governo central, a República Popular da China é hoje uma presença mundialmente poderosa.

Este breve olhar sobre a história milenar de um país que, nas últimas décadas, assistiu a uma transformação quase ímpar no desenrolar da história do mundo, fez-me lembrar um outro, no Extremo Ocidental da Europa, que, também há poucas décadas, teve o ensejo de se poder metamorfosear em um país democrático, moderno e desenvolvido, mas, dessa Primavera, resta-lhe apenas, apesar do céu azul, um ar Outonal.

11 Jun 2015