Hoje Macau China / ÁsiaCovid-19 | Oslo rejeita acusação de Pequim que liga salmão norueguês ao novo surto [dropcap]O[/dropcap] governo de Oslo rejeitou a acusação chinesa de que o salmão norueguês estaria na origem do novo surto de covid-19, identificado nos últimos dias e associado a um mercado da capital da República Popular da China. “O assunto está em fase de resolução”, disse o ministro das Pescas da Noruega, Odd Emil Ingebrigtsen, citado pela agência TDN Finans. “Nós estamos a trabalhar nos últimos pormenores e posso confirmar que o assunto parece resolvido”, acrescentou. O ministro explicou que representantes da Noruega e da República Popular da China se reuniram hoje e concluíram que o salmão norueguês não está na origem do surto viral detetado na semana passada no mercado grossista de Xinfadi em Pequim. Pelo menos 137 pessoas foram contaminadas na semana passada na capital da República Popular da China após um surto que obrigou ao confinamento de alguns quarteirões e à anulação de milhares de ligações aéreas. Os meios de comunicação social oficiais de Pequim indicaram que o vírus tinha sido detetado no mercado de Xinfadu, nas bancas que vendiam salmão importado. Na sequência das notícias, as cadeias de supermercados Wumart e Carrefour suprimiram a venda do salmão da Noruega, tal como confirmou o Centro de Produtos do Mar da Noruega, organismo oficial de promoção de vendas de peixe. A agência France-Presse contactou hoje a embaixada de Pequim em Oslo, mas não obteve qualquer resposta até ao momento. A República Popular da China é apontada como um mercado “promissor” para o sector tendo absorvido no ano passado 25 toneladas de salmão norueguês.
Nuno Miguel Guedes Divina Comédia h | Artes, Letras e IdeiasA Inquisição que veio do frio [dropcap]A[/dropcap]pesar de tudo, uma pessoa vem para esta vida com algumas esperanças. Uma delas, pelo menos no meu caso, era não ter de assistir ao que se está a passar na Noruega desde há algum tempo. Discute-se, coisa extraordinária e assustadora, o que é ou não permitido escrever num livro. Sim, a coisa chegou a esse ponto. No caso norueguês, pilar do socialismo-porque-temos-petróleo, agrava-se: nada de escrever na primeira pessoa do singular. A literatura não deve – não deve, reparai ! – dizer “eu” porque toda a cultura política e social se inclina para a diluição do indivíduo face ao colectivo. Ora isto, politicamente, já teve e tem exemplos. Quem quiser que os adopte. Mas não deixa de ser assustador que haja ainda quem pense que a arte deva ser sujeita a uma ortodoxia, seja ela qual for. Pior ainda quando essa ideia nasce numa democracia liberal. Estamos longe dos artistas de regime. E mesmo esses… Lembro a conhecida anedota, contada pelos russos, sobre a morte de Maiakosvki, poeta futurista maior e entusiasta da revolução bolchevique. Até que um dia deixou de o ser. A história diz que se suicidou; o povo, arguto e impiedoso, conta que as suas últimas palavras foram “Não disparem, camaradas”. Na Noruega a chamada “literatura da realidade” ou no original virkelighetslitteratur (rótulo vago, como todos) está sob ataque há pelo menos quatro anos. Este fenómeno voltou a ganhar força muito à conta do sucesso dos livros autobiográficos de Karl Ove Knausgard, seis volumes sob o título A Minha Luta (todos publicados em português pela editora Relógio de Água). É uma luta antiga e futura: gente que se revê nas personagens de romances e que fica indignada. Que o autor não tem direito, porque ninguém perguntou nada, porque a fotografia não fica bonita. Percebe-se, porque nenhum escritor escreve a partir do nada. Que haja um debate em que uma das partes diga que isso não é eticamente correcto (o que implica naturalmente outra coisa muito sintomática destes dias: toda a arte tem de reflectir uma ética) , isso,volto a dizer, é que é preocupante. Há gente, neste debate, que reclama um código ético para a literatura, uma espécie de livro de estilo de comportamento que não se pode transgredir. Uma vez que o faça, o autor é maldito. E pior: deixa de ser literatura. Sim, eu sei: nobody expects the norwegian Inquisition. Nem vou falar do desconhecimento da história da literatura: haverá gente melhor para isso e eu não passo de um leitor inquieto. Mas escuso de invocar todos os escritores que se basearam em pessoas reais para criarem ficção. Que haja quem se reveja e se aborreça é coisa normal e já tratada (é rever o As Faces de Harry, de Woody Allen). Azarinho. Há e haverá sempre um autor, vivo, pulsante, individuo que olha, regista e cria. E o que cria é parte dele, e o que faz é parte legítima da sua auctoritas – autor, autoridade. Negar oficialmente e de forma proibitiva essa possibilidade é negar toda a criação. Por mim, se a coisa continua assim, estou pronto para a resistência e pegar em armas. Ou então talvez não: estou tão cansado destes dias em que a arte e a vida têm de ser um panfleto que há dias em que me apetece contradizer Maiakovski e implorar: disparem, camaradas!
Jorge Rodrigues Simão Perspectivas VozesRumo ao Estado de Direito Socialista “Since China’s reform and opening began in 1978, the country has come a long way on the path of Socialism with Chinese Characteristics, under the leadership of the Communist Party of China. Over 30 years of reform efforts and sustained spectacular economic growth have turned China into the world’s second largest economy, and wrought many profound changes in the Chinese society.” “The Road to the Rule of Law in Modern China” – Quanxi Gao, Wei Zhang, Feilong Tian [dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]uanto mais importante se torna a China, mais difícil se converte o entendimento da sua realidade. O mundo ocidental na diversidade dos países que o compõem tem a sua visão peculiar, própria e especial da China, devido ao crescente aumento de empresários, estudantes e turistas que viajam para o país, que acrescido do conhecimento de especialistas na matéria cria maior confusão na aprendizagem da realidade chinesa. A Noruega pode parecer uma inesperada fonte de conhecimento sobre a China pelos estudos que tem produzido, mas tal visão expressaria um mito sobre a Noruega, de ser um lugar remoto e voltado para dentro, quando na realidade se trata de um país geograficamente grande, mas demograficamente pequeno e altamente próspero, fortemente dependente das exportações de petróleo para o resto do mundo, e que tem uma grande participação na estabilidade global. É um aliado americano forte na OTAN e mantém um sofisticado mecanismo de defesa. Tem uma cultura cosmopolita e integra refugiados de todo o mundo como seus cidadãos. A Noruega tem um forte interesse em tendências em todo o mundo, inclusive na China, e o seu Comité do Prémio Nobel da Paz, que não faz parte do governo, concedeu dois prémios Nobel da Paz a pessoas nascidas na China. Assim, não é de estranhar que a política externa da Noruega e o estabelecimento da segurança mantenha um olhar atento sobre os assuntos globais. Para um país pequeno, a política de segurança é menor sobre o equipamento, e maior sobre a compreensão das línguas, culturas e história de outros países, a fim de aprender o que estimula as suas políticas e como podem ser acomodadas ou resistir. A China, conjuntamente com o mundo árabe, foi frequentemente como o clássico “outro” para um Ocidente sempre em mudança, que esforça por definir e redefinir-se a si mesmo. Vindo do ambicioso mas inseguro poder comercial e militar de Veneza do século XIII, Marco Polo retratou a China como infinitamente rica e poderosa. O pensador do Iluminismo François-Marie Arouet Voltaire, enquanto argumentava contra o obscurantismo religioso, defendia que a China era o lar da racionalidade secular. A China para Adam Smith, durante a primeira revolução industrial, foi um exemplo de advertência de estagnação económica e Friedrich Hegel, escreveu na era napoleónica, a inverdade de que a China exemplificava um país sem heróis, revolução ou progresso, relegado para um estatuto fora da história. Ao longo dos anos, o Ocidente foi vendo a China como pobre ou rica, supersticiosa ou racional, bárbara ou civilizada, passiva ou guerreira. O Ocidente, com efeito, definiu a sua própria identidade, criando uma imagem da China como o seu oposto imaginário. Actualmente, encontramo-nos em um período, que não é o primeiro, do suposto declínio ocidental. O Ocidente sente-se desunido, indeciso, ineficiente e fraco. As representações de uma China em ascensão como unida, decisiva, eficiente e forte dão significado concreto a essas características, sendo quase negativo que a China esteja realmente a estender-se e em ascensão. O seu produto interno bruto (PIB) aumentou dois dígitos durante três décadas, e o seu orçamento militar cresceu consequentemente, afirmando os seus interesses nacionais principais com vigor crescente. A questão fundamental é de saber, se a ascensão da China é realmente equivalente ao declínio do Ocidente, ou se trata do seu acompanhamento natural ou é mesmo a sua causa. Quando vemos a China como uma ameaça, estamos a vê-la como realmente é? A chamada ameaça da China é uma mudança de forma, para usar uma frase de Karl Marx, um espectro que assombra o mundo pós-Guerra Fria da dominação americana, sendo difícil identificar o que os teóricos da ameaça chinesa realmente temem. Pode-se resumir o discurso, indicando três tipos de preocupações, que actuam por vezes em conjunto. O primeiro tipo é económico, pois a China tornar-se-á a maior economia do mundo, indo absorver toda a tecnologia ocidental e inundar o Ocidente com os seus produtos; a sua moeda será a reserva do mundo; estabelecerá padrões para produtos de tecnologia e de consumo e forçará o mundo a adoptar a maneira chinesa de fazer negócios. O segundo tipo é militar, pois o crescimento económico da China fará que tenha cada vez mais poder militar para continuar as suas existentes reivindicações territoriais e expandir a sua influência regional, além de estender os seus interesses estratégicos no exterior, como trabalhadores, campos petrolíferos, investimentos, entre outros, e irá sentir-se contrafeita de projectar o poder militar para proteger esses interesses. É de prever que irá dominar primeiro a sua região e depois quiçá o mundo. O terceiro tipo é normativo, pois o sucesso do modelo chinês porá fim ao domínio do “soft power” da democracia e dos direitos humanos. A China reescreverá as normas internacionais existentes sobre o livre comércio, direitos humanos, intervenção humanitária, assistência ao desenvolvimento e usará a sua influência financeira para influir não só a mídia nacional, mas também estrangeira, o pensamento académico e a cultura pública. Existem duas formas de avaliar tais receios, sendo o primeiro, através da possibilidade de projectar as tendências existentes no futuro, o que poderíamos chamar de previsão na trajectória. Este tipo de previsão é correcto na maior parte das vezes, porque a maioria das tendências geralmente continuam a desenvolver-se na mesma direcção. Mas tal previsão tem eventualmente a garantia de errar, porque cedo ou tarde a história nos surpreende. A segunda abordagem é a de pensar sobre todas as formas improváveis em que as situações poderiam sair da trajectória, e tentar identificar os cenários mais inverosímeis. Este tipo de previsão é errado na maioria das vezes, mas cedo ou tarde tem uma boa percentagem de ser correcto, porque, a longo prazo, a única situação certa é a ocorrência de algo inesperado. Se pensarmos sobre a improvável ameaça da China, devemos, em primeiro lugar, incorporar os factos e tendências de que o regime chinês está sob controlo estável, apesar de muitos e diversos desafios às suas regras. Excluindo a possibilidade de desordem política, a economia continuará a crescer, ainda que tenha começado a desacelerar, como aconteceu com todas as economias de rápido crescimento, e é de esperar que a taxa de crescimento continue a abrandar. O governo chinês enfrentará uma agenda complexa de segurança interna e externa, em um futuro distante, e deve gerir os desafios internos decorrentes de mudanças sociais rápidas, cepticismo ideológico e insatisfação entre grupos étnicos e religiosos, lutando com as queixas da população rural, cujas terras estão a ser confiscadas ou poluídas, e com os residentes dos centros urbanos que se opõem à actividade de fábricas poluentes e produtos de consumo inseguros. É de esperar que Taiwan continue a resistir à integração na República Popular da China. Os principais vizinhos da China, como o Japão, Índia e Rússia, e os seus fortes vizinhos, como a Coreia do Sul, Vietname e Indonésia, continuarão a resistir à influência chinesa. Os Estados Unidos não sairão da Ásia. A prosperidade da China continuará a depender da sua interdependência com a economia global, como fonte de matérias-primas e energia, e como um mercado para as suas indústrias. A China continuará a apostar fortemente na paz e nas estabilidades regionais e globais, para que a sua economia não seja perturbada, sendo improvável que, no futuro previsível, procure ou seja capaz de expulsar os Estados Unidos da Ásia ou de destruir o sistema global. Isso não significa que a ascensão da China não apresente nenhum desafio ao “status quo”. É possível a existência de um atrito contínuo entre a China e muitos dos seus vizinhos, dado tentar melhorar a sua posição em litígios territoriais. A China continuará a desafiar o argumento dos Estados Unidos, de que pode conduzir legalmente exercícios navais e operações de inteligência até doze milhas náuticas ao largo da costa chinesa, e continuará a pressionar Taiwan para a reunificação, ao abrigo do princípio da existência de uma só China, que o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, parece querer contrariar. Assim, é de esperar atrito entre a China de um lado e os Estados Unidos, e os seus aliados regionais do outro. Tais fricções carregam o risco da escalada, sendo improvável de conduzir a conflitos armados. É um exagero confundir esse risco de conflito local, com o risco de a China tomar conta do mundo. E quanto à mudança fora da trajectória? Quanto maior for o período de tempo, mais provável é a ocorrência de algo dramaticamente diferente, basta pensar na queda da União Soviética ou da Primavera Árabe. Naturalmente, esse tipo inesperado de mudança é intrinsecamente imprevisível, mas devemos ser capazes de identificar alguns tipos de mudanças históricas radicais, com menor improbabilidade, que outras de acontecer. Por exemplo, observando a situação interna da China, podemos identificar vulnerabilidades essenciais no modelo económico, sendo a primeira a que inclui o pesado tributo que a degradação ambiental produz no solo, água, ar e saúde pública, tornando o actual modelo de crescimento insustentável, se não for invertida a actual tendência rapidamente. A segunda vulnerabilidade económica é a estrutura demográfica de uma população em envelhecimento, e a terceira é o estímulo do crescimento rápido pelo pesado, e muitas vezes improdutivo, investimento estatal em infra-estrutura e imobiliário, através de empréstimos de bancos estatais. Tendo em consideração esses factores, é possível descartar um ressurgimento do crescimento de dois dígitos e a regra na possibilidade, embora não inevitável, de um declínio dramático do crescimento ou da possibilidade da ocorrência de uma crise económica. O sistema político chinês não é tão vulnerável como se possa pensar, não sofrendo do complexo da falsa estabilidade a longo prazo, como acontece, nas mal realizadas democracias, como por exemplo, as do Japão, França e Estados Unidos, entre muitos outros países. Os líderes chineses afirmam oficialmente que se deve reformar e melhorar o seu sistema político, criando democracia de estilo socialista e construindo o Estado de direito socialista, ou seja, o sistema político chinês permanece em construção, e mesmo que a população dê ao regime altas notas de desempenho, vê o sistema actual como uma estação no caminho da evolução política, em direcção a uma futura forma de governo desconhecido, e a ser criado. A mudança política deve ser pacífica e gradual. O ambiente internacional da China é potencialmente turbulento. A China faz fronteira com um dos países mais instáveis do mundo, a Coreia do Norte, governada por uma ditadura pessoal anacrónica, dividida em conflitos entre facções, e armada com armas nucleares, que governa uma população carecida. Se esse regime cair ou desencadear uma guerra, a China pagará um grande preço. Outros regimes instáveis que fazem fronteira com a China, incluem a Birmânia, Paquistão, Afeganistão, Tajiquistão, Quirguistão e Cazaquistão. Os conflitos étnicos ou a ascensão de movimentos extremistas poderiam produzir fluxos de refugiados ou paraísos terroristas nesses lugares que ameaçariam a segurança da China. A desordem na África ou no Médio Oriente, podem no futuro ameaçar os suprimentos de petróleo, cobre e outras matérias-primas necessárias à China. A polarização das relações com a Europa e Estados Unidos, poderá ameaçar os seus mercados de exportação e a sua estabilidade financeira. Em contrapartida, é difícil pensar em mudanças plausíveis, fora da trajectória existente, no ambiente de política externa da China que melhorariam a sua segurança. É improvável, por exemplo, que qualquer um dos maiores países vizinhos decida aliar-se à China porque a desconfiança é alta em toda a região. A alteração da trajectória existente, que é susceptível de ocorrer cedo ou tarde, tende a diminuir ao invés de aumentar a ameaça da China. Todavia, alguns mitos sobre a China são verdadeiros. A China está localizada em uma parte diferente do mundo, em relação ao Ocidente e tem as suas prioridades, necessidades de segurança e visão do futuro, e nem sempre vê o mundo, da mesma maneira que vêem os ocidentais. Está cada vez mais estreitamente ligada ao Ocidente e não se está a afastar, pelo que é urgente que entendamos essa verdade.