Alexandr Svetlicinii, professor de Direito da Universidade de Macau: “Empresas estatais não são apenas actores económicos”

O autor do livro “Chinese State Owned Enterprises and EU Merger Control”, recentemente apresentado na Fundação Rui Cunha, faz uma análise da última legislação aprovada no seio da União Europeia que regula o investimento das empresas estatais estrangeiras, incluindo da China. Alexandr Svetlicinii acredita que estas leis podem trazer mais obstáculos e diz que Portugal tem um quadro regulatório mais brando do que alguns Estados membros

 

Quando começou a investigação que serviu de base a este livro?

Há vários anos que investigo este tema mas nos últimos anos tive um projecto de investigação com o Instituto de Estudos Europeus de Macau, que me ajudou a transformá-lo num livro. Apesar de este abordar o tratamento das empresas estatais chinesas também levanta questões importantes sobre as empresas estatais europeias dentro da UE. Quando houver uma recuperação da crise económica, causada pela covid-19, talvez vejamos um maior envolvimento dos Estados na economia com investimentos e empresas estatais. Veremos talvez mais políticas industriais do que antes. Todas estas questões ligadas à propriedade estatal são relevantes para a UE e não apenas por causa da China. Deve haver regras mais claras de como lidam [as empresas estatais chinesas] com as empresas estatais europeias.

Aborda no livro a ideia de “três grandes montanhas” aplicada aos investimentos estatais chineses.

Esta expressão simboliza alguns obstáculos que têm de ser ultrapassados. Faço esta comparação para identificar três quadros regulatórios que servem de base aos investimentos estrangeiros na União Europeia (UE), mais especificamente aos investimentos feitos por empresas estatais chinesas. A primeira montanha diz respeito ao “controlo da fusão”, que já existe há algum tempo e que consiste na regulação das empresas em termos de competição. A Comissão Europeia e os Estados-membros, dependendo do volume de aquisições, exigem compromissos ou condições e podem, muitas vezes, proibi-las. O que acontece é que as aquisições por parte das empresas chinesas levaram a uma série de questões, porque algumas delas, muito básicas mas ao mesmo tempo importantes, não foram devidamente respondidas.

Tais como?

Falo do conceito de “unidade económica singular” para empresas que estão separadas em termos legais mas são controladas pela mesma entidade. Em termos de competição são vistas como uma mesma unidade económica singular. Esta questão, relativamente às empresas estatais chinesas, não foi devidamente respondida. Houve muitos debates sobre até que ponto este “controlo da fusão” é suficiente para proteger os mercados europeus tendo em contas as preocupações ao nível da influência na competição das empresas. Também falo das mudanças das regras desse “controlo da fusão”, no sentido de que outras áreas, e não apenas a competição, devem ser incluídas. A Comissão Europeia não se mostrou disposta a mudar as regras do “controlo da fusão” porque são aplicadas de forma igual às empresas europeias. Então focaram-se em outras regulações.

Pode dar exemplos?

A análise do investimento directo estrangeiro baseado na segurança. Este regulamento foi adoptado em 2019 e começou a ser implementado em Outubro de 2020 e não introduz regras novas, mas exige aos Estados-membros que cooperem nesta análise aos investimentos estrangeiros. Muitos Estados-membros estão a adoptar novas regras e têm de partilhar informações sobre estes investimentos estrangeiros, incluindo com a Comissão Europeia. Esta é a “segunda montanha”, o segundo quadro regulatório. O terceiro está, para já, no formato de proposta.

E a “terceira montanha”?

É um relatório publicado pela Comissão Europeia em Junho do ano passado onde se propõe que se adoptem um conjunto de padrões de análise para as empresas estrangeiras e quaisquer empresas que façam negócios na UE com subsídios estrangeiros estatais. Actualmente, há um controlo estatal desses subsídios que são garantidos pelos Estados-membros, e há regras restritas sobre a atribuição de subsídios pelos Estados-membros da UE. Mas não há um quadro regulatório para os subsídios que são concedidos por empresas estrangeiras. A Comissão Europeia quer colmatar esta lacuna e no final deste ano deve apresentar uma proposta legislativa nesse sentido. Estes três quadros regulatórios serão aplicados aos investimentos estrangeiros e também aos investimentos chineses feitos por empresas estatais, tendo em conta a segurança de sectores considerados estratégicos por alguns estados membros da UE. As empresas estatais são, por norma, grandes beneficiárias dos subsídios estatais, por isso é que [este quadro regulatório] é também aplicável.

A relação entre as empresas chinesas e europeias, e a forma como estão presentes nos mercados, tem sido justa até agora?

O que posso dizer é que os dois sistemas regulatórios, na UE e na China, têm diferenças, e por causa disso as empresas que operam dentro e fora claro que podem parecer e tornar-se diferentes. Não chamaria uma relação injusta, mas distinta. A questão para a UE é como colocar no mesmo nível as suas próprias empresas e as estrangeiras. Por exemplo, os mercados europeus estão a tentar reduzir as diferenças com os quadros regulatórios que mencionei há pouco. E há depois o acordo de investimentos entre a China e a UE, onde se tentam impor condições de competitividade à China e isso é suposto ajudar as empresas europeias no acesso aos mercados e às operações no país. [É uma tentativa] de colocar entidades distintas, de ambientes diferentes, mais ou menos ao mesmo nível.

Relativamente ao acordo de investimentos, que análise faz? Quem beneficia mais com ele, a China ou a UE?

Um dos objectivos da UE foi garantir o acesso das empresas europeias ao mercado chinês e também colmatar estas lacunas na China para que as empresas europeias possam operar no país. Este acordo coloca alguns compromissos do lado da China e alguns deles estão directamente relacionados com estes objectivos. Se acompanharmos o desenvolvimento da China em matéria de investimento estrangeiro, nos últimos anos ela própria foi-se abrindo a novos mercados e sectores. O país reformou a sua legislação e tornou-a mais fácil para empresas estrangeiras. O que este acordo faz é instituir uma obrigação. Por exemplo, uma das preocupações da UE é que as empresas estatais tenham um tratamento preferencial, o que faz com que seja mais difícil aos investidores estrangeiros competir com elas no mercado chinês. E uma das obrigações é que ambas as partes devem garantir que as empresas estatais tomem as decisões com base em questões comerciais, ou seja, como uma empresa e não como um órgão estatal.

O livro refere a ideia de as empresas estatais chinesas serem vistas como “o pilar do socialismo com características chinesas”. A UE está a prestar mais atenção a esse lado político do investimento?

Há que compreender o tipo de efeito. Por exemplo, o facto de as empresas estatais poderem ser guiadas não só por razões comerciais mas também por algumas políticas e económicas, por a China querer desenvolver determinados sectores. Às vezes as empresas estatais podem tomar decisões que poderiam não se basear apenas na obtenção de lucros mas na implementação dessas políticas. Mas este facto não é único para a China, podemos nomear muitos países onde as empresas estatais têm essa função pública, e mesmo na UE isso acontece. As empresas estatais não são apenas actores económicos, também têm funções sociais e políticas. Talvez haja uma diferença em termos de intensidade, relativamente ao facto de as empresas europeias não serem tão importantes para o Estado como são na China.

Pergunto se essas empresas têm também uma agenda política.

Não parece que na UE haja uma clara compreensão ou articulação do tipo de agenda política das empresas estatais. Na adopção das regulações sobre o investimento estrangeiro, baseado em questões como a segurança e a ordem pública, um dos critérios incluído foi o domínio estatal sobre o investimento estrangeiro. A regulação europeia sugere que a propriedade estrangeira possa ser analisada caso represente uma ameaça em matéria de segurança nacional. Alguns Estados-membros também incluíram este critério nas leis nacionais. A própria UE não tem competência em matéria de segurança, então cada estado-membro vai decidir por si se considera ou não uma ameaça. Até agora não existe consenso por parte dos Estados-membros sobre eventuais ameaças à segurança ou ordem pública causadas pelos investimentos das empresas estatais. Mas há países com indústrias mais desenvolvidas, como é o caso da França ou da Alemanha, que parecem ser mais cautelosos relativamente ao investimento estrangeiro estatal, enquanto que outros países, com indústrias menos desenvolvidas, acolhem melhor esse investimento. Não o consideram uma ameaça e têm-no em conta consoante o sector de investimento.

Estas regulações podem trazer grandes mudanças a nível prático?

Todo este desenvolvimento legislativo pode criar um obstáculo adicional para os investimentos de empresas estatais estrangeiras. Contudo, o acordo de investimentos entre a China e a UE vai ser um exercício importante de construção da confiança entre ambas as partes. E se for implementado de forma satisfatória ambas as partes vão ganhar com ele e os futuros investimentos possam ser vistos de uma outra forma. Agora há uma atitude cautelosa por parte da UE, sobretudo numa altura de recessão económica. Devido à nova legislação e recessão económica talvez possamos esperar mais obstáculos a este tipo de investimentos em sectores estratégicos.

Este é o período da presidência portuguesa da UE. Espera algumas alterações em matéria política e legislativa na relação com a China?

Não vejo que neste período a relação entre a China e a UE sofra mudanças significativas. São poucos meses de presidência e provavelmente o acordo de investimento não será ratificado nos próximos seis meses, vai levar mais tempo. Mas quando falamos da relação bilateral entre a China e Portugal talvez seja mais aberta, por uma questão estratégica, comparada com outros Estados-membros. Um sinal que vemos é que Portugal já tem regras de análise de investimento directo estrangeiro desde 2004, mas estas não requerem uma pré-aprovação ou notificação dos investimentos estrangeiros. Apenas permitem que o Governo intervenha e reveja projectos individuais que possam gerar maior preocupação em matéria de segurança nacional. É um regime algo aberto. Alguns Estados-membros adoptaram regras mais estreitas, mas Portugal não o fez.

17 Mar 2021

ANIMA | Fundação Macau dá cinco milhões, mas apenas para salários 

A Fundação Macau já informou a ANIMA de que irá conceder um apoio de cinco milhões de patacas, mas apenas para os salários dos funcionários, deixando de parte as despesas com os animais. Albano Martins promete contactar de novo Wu Zhiliang e diz que a decisão dá pouco espaço de manobra à associação

 

A Sociedade Protectora dos Animais de Macau – ANIMA vai receber um novo apoio financeiro da Fundação Macau (FM) mas este não é suficiente para cobrir todas as despesas. Segundo contou Albano Martins, presidente honorário da ANIMA, ao HM, a FM promete atribuir cinco milhões de patacas mas este dinheiro apenas pode ser utilizado com os salários dos funcionários. A ANIMA pediu cerca de seis milhões de patacas mas esperava uma maior flexibilização no uso do dinheiro.

“Quando fizemos o pedido propusemos que fosse dividido entre salários e as despesas com os animais. A FM fixou só para salários, o que nos cria um enorme problema. O nosso orçamento fica rígido e a decisão da FM é tecnicamente difícil de aceitar.”

Nesse sentido, Albano Martins promete contactar hoje o presidente da FM, Wu Zhiliang, para que a situação possa ser contornada. “O dinheiro é suficiente para os salários, mas o nosso orçamento para este ano é de quase 10 milhões de patacas. Teremos de explicar que a decisão não é a mais saudável do ponto de vista de quem trabalha com um orçamento. Teremos sempre de devolver à FM o dinheiro que não usarmos”, acrescentou.

Relativamente aos apoios financeiros dos casinos, a ANIMA vê-se obrigada a fazer novos contactos. “Estamos de tal modo apertados que não temos outra solução se não contactá-los novamente. Mas vamos levar com os pés, porque eles deram o apoio no final do ano passado, não vão dar dinheiro agora no primeiro semestre.”

Visita ao Canídromo

A ANIMA mantém o plano de fazer uma actividade de recolha de fundos para fazer face às despesas, mas a mesma será adiada para 21 de Julho deste ano, quando se celebra a data da intervenção do Governo no processo de encerramento do Canídromo. Este mês, dia 26, irá decorrer uma actividade de convívio para lembrar os dois anos do encerramento completo do antigo espaço de corridas de galgos. Já foram enviadas cartas a várias entidades públicas a pedir autorização para esta actividade.

“A ANIMA gostaria, com a imprensa e diversos convidados locais, incluindo adoptantes de galgos e os seus animais, e o próprio IAM [Instituto para os Assuntos Municipais], de fazer uma visita na manhã desse dia a todas as instalações dos canis do Canídromo e registar esse grande acontecimento colectivo de todos através de fotos e vídeos”, lê-se na carta enviada à Direcção dos Serviços de Finanças, que tem responsabilidade de gestão do espaço.

Na mesma carta, a ANIMA recorda que o processo de retirada dos animais “poderia ser feito com mais tempo”. “Vestimos a camisola das preocupações do Governo e dessa forma em apenas seis meses após o início da operação de embarque (26/09/2018) realizámos todos os galgos fora do Canídromo”, lê-se ainda.

16 Mar 2021

Fronteiras | Não residentes podem ir ao Interior da China e regressar

Passa a ser possível para os não residentes estrangeiros que estão em Macau pedir visto para irem ao Interior da China, podendo regressar ao território e ficar isentos de quarentena. Na conferência de imprensa de saúde, Tai Wa Hou mostrou-se insatisfeito com a adesão à vacinação, apelando à população para participar de forma “mais activa”

 

A partir de hoje, os não residentes estrangeiros em Macau passam a poder ir à China Continental e regressar, mas apenas se tiverem visto emitido pelo Comissariado do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) da República Popular da China na RAEM. A medida foi anunciada ontem na habitual conferência de imprensa sobre a covid-19, tendo sido publicada em despacho do Chefe do Executivo. O despacho refere também que estas pessoas não podem ter estado em locais fora do Interior da China ou da RAEM nos 21 dias anteriores à entrada em Macau.

“Este despacho é aplicável para os estrangeiros que se encontram actualmente em Macau e pretendem através de visto visitar o Interior da China e depois regressar para Macau”, anunciou Leong Iek Hou. A coordenadora do núcleo de prevenção de doenças infecciosas e vigilância da doença esclareceu que não se aplica a trabalhadores não residentes (TNR) no exterior que pretendem deslocar-se ao Interior da China e a partir daí regressar a Macau.

Sobre a possibilidade de os TNR que perderam trabalho saírem e poderem ser contratados no regresso, o representante do Corpo de Polícia de Segurança Pública indicou que há outros factores em consideração. “Se os portadores de ‘bluecard’ satisfazem as exigências definidas pelo Comissariado do MNE na RAEM, então vão conseguir obter tal visto e deslocar-se para o Interior da China e dentro da validade do visto regressar a Macau. Assim não são sujeitos a qualquer quarentena. (…) Mas se a pessoa pode ser recontratada, tem de satisfazer outras exigências”.

O Comissariado do MNE da República Popular da China em Macau comunicou ontem ajustamentos à política de vistos. Os residentes estrangeiros de Macau, permanentes e não permanentes, passam a poder candidatar-se a todas as categorias de visto para a China Continental. Além disso, podem também candidatar-se a vistos todos os estrangeiros em Macau que inocularam a vacina chinesa contra a covid-19, com certificados válidos de vacinação dos Serviços de Saúde de Macau.

Meta distante

O coordenador do plano de vacinação contra a covid-19, Tai Wa Hou, indicou que há mais de 65 mil inscrições para a administração de vacina, sendo que 29.833 já tomaram a vacina. Quase dez mil das inscrições são de trabalhadores não residentes. “De acordo com este número, são um pouco mais de mil pessoas por dia que se inscrevem. Para mim, acho que não é um número muito satisfatório, claro que desejo que possa haver mais pessoas a inscrever-se para administrar a vacina e precisamos dessa participação mais activa por parte da população de Macau”, comentou Tai Wa Hou.

Questionado sobre um eventual passaporte de vacinas, o responsável indicou que após as duas doses de vacina, em Macau será emitido um cartão comprovativo dessa administração em chinês, inglês e português. No entanto, apontou que a sua utilidade para os residentes que visitarem outros locais depende das políticas implementadas nesses países ou regiões. Por outro lado, Tai Wa Hou disse que “não há qualquer mudança” em relação à aquisição de vacinas da AstraZeneca.

16 Mar 2021

Mak Soi Kun preocupado com localização de habitação pública na avenida Wai Long

A habitação pública na avenida de Wai Long foi discutida na Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Finanças Públicas, com Mak Soi Kun a referir que quem chega a Macau de avião pode ficar com má imagem da cidade ao ver roupa estendida. Por outro lado, a execução orçamental do PIDDA mereceu elogios por parte da Comissão

 

Mak Soi Kun apontou ontem desvantagens ao uso do terreno na avenida Wai Long para habitação pública, argumentando que a possibilidade de os moradores estenderem roupa na varanda pode prejudicar a imagem de Macau, além de apontar a necessidade de recursos financeiros para isolamento de ruído. O presidente da Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Finanças Públicas disse ontem no final de uma reunião com o Governo que se o terreno fosse destinado a habitações de luxo estes problemas não se colocavam.

De acordo com o deputado, se o terreno fosse destinado a habitações de luxo não se colocaria a questão da poluição sonora, porque “pessoas com dinheiro, não teriam esse problema se morassem naquele espaço da avenida Wai Long porque têm capacidade financeira para instalar vidros isoladores de ruído”. Em causa está a proximidade com o aeroporto, que envolve factores como ruído e poluição. Mak Soi Kun indicou que quando o terreno é destinado a habitações públicas “as pessoas não têm tantos recursos financeiros”, sendo assim necessário fazer avaliação do impacto ambiental.

O deputado e empresário da construção civil revelou ainda preocupação com as aparências. “Quando é transformado em [habitações] públicas os moradores podem estender roupa para secar na varanda e isso pode afectar toda a nossa imagem, por estar perto do aeroporto”, comentou. E acrescentou que a utilização das fracções públicas sem afectar a imagem transmitida ao exterior “poderá implicar outros recursos financeiros aquando da sua concepção”.

No seguimento dos pontos negativos apresentados e frisando que há mais terrenos do que na altura em que a construção das frações em Wai Long foi pensada, Mak Soi Kun considera que se pode abandonar o projecto de habitação pública naquele local. “Temos mais terrenos na zona de novos aterros da zona A, são projectos que estão ainda em curso e poderão resolver a questão do problema de habitação mais rapidamente. Assim, se virmos que há problemas quanto à avaliação do impacto ambiental, poderemos considerar a possibilidade, ou não, de abandonar o projecto na avenida Wai Long para habitação pública”, apontou. O deputado frisou que antes da decisão são necessários resultados da avaliação ambiental e que cabe à população decidir o destino do projecto.

Aumento de eficiência

A Comissão de Acompanhamento para os Assuntos de Finanças Públicas reuniu ontem para discutir o relatório de execução orçamental do Plano de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração (PIDDA), relativo ao último trimestre de 2020. Até ao quarto trimestre do ano passado o orçamento aprovado foi de 11,5 mil milhões de patacas e a taxa de execução fixou-se em 95,8 por cento. “A eficiência tem sido crescente ao longo do último ano e mesmo com a pandemia, vemos que essa situação melhorou”, elogiou o presidente da Comissão.

Dos números apresentados, o Instituto de Habitação teve a taxa de execução orçamental mais alta, de 99,8 por cento, seguindo-se as Obras Públicas e Transportes (98,8 por cento) e os Serviços de Saúde (98,7 por cento). Os deputados questionaram se a saída do centro de saúde em Seac Pai Van dos projectos do PIDDA iria afectar a qualidade de vida dos moradores, e segundo Mak Soi Kun, o Governo esclareceu que a obra não foi cancelada, mas a calendarização foi ajustada.

16 Mar 2021

Estudo de Políticas | Novo director vai ponderar sistema de crédito social

Cheong Chok Man tomou ontem posse como director dos Serviços de Estudo de Políticas e Desenvolvimento Regional, substituindo Mi Jian que abandonou o cargo, depois de uma investigação do CCAC, apesar de afastadas as acusações. O novo homem do leme promete “não ficar só no gabinete” e estudar a possibilidade de implementar o crédito social em Macau

 

Depois de uma liderança que terminou com controvérsia, Cheong Chok Man chega a director dos Serviços de Estudo de Políticas e Desenvolvimento Regional, substituindo Mi Jian no cargo, vindo da assessoria do gabinete do Chefe do Executivo.

No final da cerimónia de tomada de posse no cargo de liderança do think tank do Governo, Cheong Chok Man negou tecer comentários sobre o antigo director e sublinhou que o Comissariado contra a Corrupção afastou todas as acusações que recaíam sobre Mi Jian. “Todos os trabalhos foram feitos de acordo com a lei e é assim que vamos continuar a trabalhar, como qualquer funcionário público”, comentou Cheong Chok Man.

Recorde-se que Mi Jian foi investigado por alegadas irregularidades na contratação de pessoal, favorecimento de familiares e antigos estudantes seus e suspeitas de uso indevido de fundos, mas acabou ilibado.

Outro assunto quente que transita da liderança anterior é a possibilidade de implementar em Macau um sistema de crédito social como existe no Interior da China. “É muito importante uma pessoa ser sincera e ter crédito. Vamos estudar se Macau já tem todas as condições e, de acordo com a realidade local, estudar a possibilidade de implementar uma coisa semelhante”, afirmou ontem o novo director dos Serviços de Estudo de Políticas e Desenvolvimento Regional.

O antigo director apontou numa primeira instância para a hipótese de o sistema ser trazido para a RAEM e mais tarde afirmou que havia em Macau capacidade para implementar um sistema de crédito social próprio.

Resumindo em poucas palavras o complexo sistema que pode limitar a capacidade para comprar viagens, ou arrendar casa, o sistema de crédito chinês assenta na avaliação de indivíduos, que são pontuados e divididos entre bons e maus cidadãos. Aos bons são dados privilégios, enquanto os maus sofrem consequências.

Todos para a montanha

Quanto a prioridades, Cheong Chok Man pretende que “a implementação do princípio ‘Um País, Dois Sistemas’ com características de Macau” seja estável e duradoura. Além disso, frisou a importância de ouvir a população. “Vamos ouvir as pessoas”, comentou, acrescentando que as funções que passa a exercer não implicam “ficar só no gabinete”.

De resto, Cheong Chok Man referiu que as duas prioridades principais serão “coordenar o segundo plano quinquenal da RAEM, aproveitando as oportunidades trazidas pelo 14º plano quinquenal do país e, dessa forma, participar na Grande Baía”.

“Neste âmbito, o desenvolvimento e cooperação na área de Hengqin é essencial, representa muitas novas oportunidades para a Macau a nível de emprego e integração no desenvolvimento do país”, apontou, depois de tomar posse oficialmente.

16 Mar 2021

Apoios | Governo cria programa de cupões de consumo só para pagamento electrónico

Além da necessidade de instalar plataformas de pagamento electrónico no telemóvel, é preciso gastar 14.400 patacas entre Maio e Dezembro para obter 4.800 patacas em cupões de consumo. O novo programa de consumo beneficia mais quem fizer despesas maiores

 

O Governo apresentou ontem um programa de cupões de consumo para residentes, trabalhadores não-residentes e estudantes do Interior em Macau, que vai estar disponível a partir de Maio nas plataformas de pagamento móvel. O anúncio foi uma das novidades do “Plano de Garantia do Emprego, Estabilização da Economia e Asseguramento da Qualidade de Vida da População”, que terá um custo de 5 mil milhões de patacas.

De acordo com os moldes apresentados, o programa de “promoção do consumo local” vai permitir a quem utilize métodos de pagamento electrónicos, como o MPay e SimplePay, receber 5 cupões de 10 patacas, quando fizerem um consumo de 50 patacas. Quando consumirem 100 patacas e pagarem com a aplicação de telemóvel, os utilizadores recebem 10 cupões de 10 patacas, num total de 100 patacas.

Atingidos os vales únicos de 50 e 100 patacas, o programa adopta um modelo para beneficiar as pessoas que gastam mais. Assim, por cada 30 patacas em consumo, o utilizador recebe um cupão de 10 patacas. Se, por exemplo, o utilizador pagar uma refeição de 90 patacas com o telemóvel, vai receber três vales de 10 patacas, num total de 30 patacas. É possível acumular cupões de 10 patacas até um máximo de 200 patacas por dia e um limite de 600 patacas por mês. Feitas as contas, entre Maio e Dezembro, os consumidores vão poder acumular um máximo de 4.800 patacas em vales, caso gastem 14.400 patacas.

Na apresentação, o secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong, reconheceu que o programa foi criado para incentivar a economia e compensar quem gasta mais, porque a crise já passou e se está na fase de revitalização.

“No ano passado, foi o Governo que estimulou o mercado. Mas, este ano, perante a revitalização económica precisamos de confiança. A resposta à crise não passa pelo que o Governo pode fazer, mas antes pelo que todos os cidadãos podem fazer para incentivar o consumo”, afirmou Lei Wai Nong. “Este plano é para incentivar a circulação interna do dinheiro e estimular a economia de Macau. Para as pessoas com mais dinheiro é um incentivo para o consumo. Para as pessoas em dificuldades económicas é um plano de benefícios”, acrescentou.

Sistema implementado

Durante a apresentação dos novos apoios, Lei Wai Nong foi questionado sobre os diferentes aspectos da implementação do programa como o recurso a plataformas de pagamento electrónico. Quem não utilizar estas plataformas fica automaticamente excluído do programa.

Em relação às questões, Lei explicou que já são muito populares. “Em Macau temos oito aplicações de pagamento móvel. O ano passado foi um ano de oportunidades e as transacções com as plataformas forma de 6,32 mil milhões de patacas, o que significa um crescimento de 5 vezes face a 2019. Em relação a 2018 o crescimento foi de 71 vezes”, argumentou. “Há uma generalização do pagamento móvel. Há 660 mil inscritos em plataformas de pagamentos móveis”, sublinhou.

No entanto, ficaram sem resposta uma série de perguntas sobre a implementação do programa, como a possibilidade de fazer registos em mais do que uma das oito aplicações e poder ultrapassar os limites. O Executivo não respondeu como será feito o controlo.

Cartão de idosos e hotéis

Ainda no que diz respeito ao incentivo ao consumo, o Governo vai permitir que residentes com 65 ou mais anos usufruam de descontos até 5 mil patacas, entre Maio e Dezembro, se o pagamento for feito com o cartão de consumo. Por exemplo, quando os idosos gastarem 30 patacas e pagarem com o cartão têm desconto de 10 patacas.

O desconto será de 20 patacas, se a conta for de 60 patacas. Os benefícios para os idosos vão ter um custo de 567 milhões de patacas aos cofres da RAEM e são os únicos que podem ser utilizados com pagamentos através do cartão de consumo.

As medidas de incentivo ao consumo disponibilizam ainda 120 milhões de patacas a todos os residentes para excursões, refeições, no que é encarado como uma continuação do programa Macau, Ready Go. A principal diferença é que nesta fase todos os residentes vão receber 200 patacas para gastar em hotéis locais.

Além das medidas para o “consumo local”, o Governo apresentou inovações no programa de requalificação para trabalhadores em lay-off. Quem não estiver a trabalhar a tempo inteiro pode inscrever-se em cursos de formação e receber 5 mil patacas quando concluir os mesmos. Deixa de haver limite de inscrições, uma vez que até agora os programas só poderiam ser frequentados por recomendação dos patrões.

Um embrulho diferente

O “Plano de Garantia do Emprego, Estabilização da Economia e Asseguramento da Qualidade de Vida da População” incluiu vários apoios que já tinham sido anunciados, como a comparticipação pecuniária no valor de 10 mil patacas e 6 mil patacas para residentes permanentes e não-permanentes, respectivamente.

Ontem foi revelado que, à imagem do que aconteceu no ano passado, a distribuição do “cheque” vai ser antecipada para Abril, altura em que começara a ser distribuído pelos residentes mais velhos.

Por outro lado, o Governo recordou que vai haver devolução do imposto profissional relativo a 2019, que pode chegar a 70 por cento, num valor máximo de 20 mil patacas. Esta vertente faz parte de um pacto de redução de impostos e de isenções fiscais, que vai resultar na perda de receita para os cofres da RAEM de 1.056 milhões de patacas.

Agnes Lam: Programa ajuda mais ricos

Agnes Lam criticou o programa de cupões por considerar que vai contribuir para ajudar quem tem maior poder de compra, quando devia servir desfavorecidos e desempregados. Por outro lado, a deputada indicou que o recurso a pagamentos móveis exclui grande parte da população, como crianças que não têm contas bancárias, e que o esquema com cupões de 10 patacas dificulta o consumo, o que vai fazer com que apenas seja utilizado em supermercados. Nas redes sociais, a deputada apelou ainda ao Executivo para que aposte na terceira ronda do programa de consumo, uma opção que encara como mais viável.

Pereira Coutinho recebeu queixas

José Pereira Coutinho afirmou ontem ter recebido várias queixas de pessoas idosas devido ao programa de cupões. “Hoje recebemos muitas queixas de cidadãos com mais idade, que nos indicaram que o Governo apresentou um programa de assistência com medidas demasiado complicadas. Porque é que o Governo não teve em conta a perspectiva destas pessoas antes de estabelecer as medidas de assistência”, questionou. “Conseguiram complicar uma coisa simples. É demasiado complicado”, acrescentou.

16 Mar 2021

Desemprego | Reunião na DSAL acaba em manifestação e corte de estrada

Uma reunião com a DSAL para acompanhar os pedidos de apoio de 517 residentes desempregados acabou numa demonstração de descontentamento, que levou ao corte da Avenida Dr. Francisco Vieira Machado. Pereira Coutinho aponta o dedo ao secretário para a Economia e Finanças por permitir o trabalho de TNR e diz que é “normal” os ânimos exaltarem-se quando é difícil sustentar a família

 

Ainda a reunião não tinha começado e já o ambiente à porta das instalações da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) parecia agitado. Cá fora, conversas cruzadas entre vários grupos de trabalhadores da construção civil desempregados, gesticulando e levantando a voz, quer em conversa, quer em depoimentos a jornalistas. Lá dentro, o deputado José Pereira Coutinho, acompanhado por representantes de 517 trabalhadores desempregados da construção civil reuniam com os dirigentes da DSAL para entregar uma carta a explanar as preocupações e os anseios dos visados.

Meia hora depois do início do encontro, pelas 11h, um grupo de residentes desempregados que acompanharam a iniciativa, decidiu impedir a polícia de colocar uma fita sinalizadora que serviria para restringir a entrada nas instalações da DSAL. Em vez disso, e depois de rasgada a fita, o grupo invadiu o edifício e subiu escada acima em direcção à sala onde decorria o encontro. Muitas outras dezenas de pessoas fizeram o mesmo e, durante largos minutos, a espera passou para o primeiro andar da DSAL, junto à porta da sala de reuniões.

Por fim, a reunião terminou e a situação aparentava ser mais calma. Aos jornalistas, Pereira Coutinho revelou que, apesar de o balanço ter sido “positivo”, há situações “escandalosas”, como os casos de falsas contratações de residentes para pedir quotas de trabalhadores não residentes (TNR) e deficiências fundamentais na política de importação de TNR. A responsabilidade, na óptica de Coutinho, é do secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong.

“O que estas pessoas querem é emprego. Há muitas falsas contratações, há TNR que se deslocam de um lado para o outro dos estaleiros. Há inclusivamente situações escandalosas sobre o facto de a Universidade de Macau, em vez de formar trabalhadores locais, estar a formar trabalhadores não locais. Ficamos, de facto, estupefactos ao saber que existem situações tão escandalosas e, por isso, apresentámos hoje [sexta-feira] uma carta. O balanço é sempre positivo porque fomos recebidos. Agora, a responsabilidade é do secretário para a Economia e Finanças que autoriza os TNR a [trabalhar], quando nós temos tantos desempregados em Macau”, sublinhou.

Na carta dirigida a Wong Chi Hong, director da DSAL, Pereira Coutinho aponta ainda que para além da contratação de “empregados fantasma”, o que permite às empresas pedir quotas de TNR à DSAL, existem outros problemas, como incutir a “demissão voluntária”, a discriminação de trabalhadores mais velhos e a violação do princípio de contratação de não residentes apenas como “complemento dos recursos humanos locais”.

Defendendo que o Governo deve dar “prioridade os residentes desempregados”, foram ainda pedidas melhorias dos modelos de licenças de obras, nomeadamente que, à entrada dos estaleiros, seja divulgado o número de trabalhadores locais e não residentes.

Segundo a carta dirigira à DSAL, presumindo-se que a família de cada uma das 517 pessoas tem quatro membros, “são mais de 2.000 residentes de Macau que estão a sofrer dificuldades financeiras devido à onda de desemprego”. “O Governo (…) não pode ignorar a grave situação de declínio súbito da qualidade de vida deste grupo de residentes”, pode ler-se.

Via de desentendimento

Terminada a reunião, a tensão escalou. Uma larga fatia do grupo de desempregados que acompanhou a iniciativa dirigiu-se para o centro da Avenida Dr. Francisco Vieira Machado, em frente das instalações da DSAL, gritando, a tempos, palavras de ordem, e desafiando as autoridades policiais.

A circulação de trânsito ficou cortada nos dois sentidos, motivando longas filas e obrigando veículos a inverter o sentido da marcha para sair do local. Durante cerca de mais de 20 minutos, a demonstração de descontentamento improvisada foi contida com alguns cordões policiais em várias frentes, mas não o suficiente para desmobilizar os desempregados.

“É normal os ânimos terem-se exaltado, porque eles não têm receitas e quando uma pessoa não tem dinheiro para sustentar a família, isso é um problema. Por exemplo, há aqui um rapaz com 40 e tal anos que está desempregado e que tem família. Porque é que ele está desempregado? Ele não é aleijado, tem mãos, tem pés”, vincou Pereira Coutinho.

A situação só foi resolvida, não sem resistência, com a chegada de mais agentes do Corpo da Polícia de Segurança Pública que, com a ajuda de cordas separadoras conseguiu circunscrever os manifestantes às bermas da avenida e reabrir a circulação de trânsito.

Director da DSAL: “Residentes não aceitam”

Wong Chi Hong, director da DSAL, declarou que o Governo sempre acompanhou os casos de desemprego de residentes, mas que nem todos aceitam as propostas. “Às vezes encaminhamos [os residentes] para empregos, mas eles não aceitam.” Quanto à situação no sector da construção civil, Wong Chi Hong disse que os trabalhos de escavações e fundações exigem menos trabalhadores, e que os residentes devem ter sempre prioridade. “A construção civil funciona por fases e o Governo nunca aprovou pedidos de TNR para a vaga de pedreiro”, frisou.  O director da DSAL disse que, até finais de Janeiro, havia em Macau 175.778 TNR, uma diminuição de 17.720 face a igual período do ano passado. “Fizemos o encaminhamento para vagas de emprego. Tivemos 465 inscrições e fizemos o acompanhamento de vagas de emprego para 310 pessoas. 260 delas realizaram entrevistas e mais de 100 foram empregadas com sucesso”, disse.

15 Mar 2021

EDP | Rocha Vieira de fora do Conselho Geral de Supervisão

O ex-Governador de Macau, Vasco Rocha Vieira, está fora da lista proposta pelos accionistas para o Conselho Geral e de Supervisão da EDP. Após dois mandatos, e de ter sido sugerido como independente pela Three Gorges, o General deixa a empresa

 

O antigo Governador de Macau, Vasco Rocha Vieira, vai deixar de fazer parte do Conselho Geral e de Supervisão da empresa Energias de Portugal (EDP). A decisão ainda não foi oficializada, mas o General não faz parte dos nomes para o triénio de 2021 a 2023 propostos pelos accionistas China Three Gorges e Oppidum Capital SL.

Segundo o documento enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), o número de membros do órgão de supervisão da eléctrica portuguesa é reduzido de 21 para 16 membros. Vasco Rocha Vieira é excluído, assim como Maria Celeste Cardona, Ilídio Pinho e Jorge Braga de Macedo. A decisão vai ser votada pelos accionista da EDP a 14 de Abril, de acordo com a informação enviada à CMVM.

Vasco Rocha Vieira era um dos membros mais activos da comissão, com uma taxa de presença em reuniões sempre acima de 90 por cento, ao longo do ano passado. Em 19 reuniões plenárias da empresa, em 2020, apenas faltou a uma. No que diz respeito às comissões de que fazia parte dentro do órgão de supervisão, a Comissão de Vencimentos e a Comissão de Acompanhamento do Negócio nos Estados Unidos da América, num total de 14 reuniões, Rocha Vieira participou em todas.

Sugerido pela Three Gorges

Apesar de não ter ligações conhecidas ao mundo empresarial, o ex-Governador e ex-secretário Adjunto para as Obras Públicas e Comunicações do Governo de Macau, foi nomeado para o cargo de supervisor independente por sugestão da empresa estatal chinesa Three Gorges.

Em 2012, a proposta de Rocha Vieira, ligado ao Partido Social Democrata (PSD), gerou polémica partidária, com o Partido Socialista (PS) a acusar a escolha de ser puramente política. No entanto, Rocha Vieira sempre manteve que foi indicado por sugestão da empresa estatal chinesa Three Gorges.

Apesar de perder um emprego, Rocha Vieira não deverá sofrer impacto financeiro, porque tem uma reforma vitalícia de 13.607 euros, equivalente a 130 mil patacas, a mais alta paga pela Caixa Geral de Aposentações de Portugal. Parte deste pagamento está suspensa, devido ao montante que recebia na EDP até Dezembro do ano passado. No entanto, com a saída da eléctrica, a CGA deverá voltar a assumir a totalidade da pensão.

15 Mar 2021

AMCM | Activos do sector bancário crescem 10,2% apesar da pandemia

O presidente da AMCM, Benjamin Chan considera que os resultados alcançados em plena pandemia reflectem uma “forte resiliência e solidez” do sector financeiro de Macau. Para 2021 a expectativa é de que a economia de Macau possa registar um crescimento de “dois dígitos”

 

Os números falam por si. Apesar das dificuldades geradas pela pandemia de covid-19 em 2020, Benjamin Chan, presidente da Autoridade Monetária de Macau (AMCM) considera que o sistema financeiro de Macau foi capaz de se manter estável e até, de crescer.

“Embora a economia de Macau tenha sido severamente afectada pela epidemia no ano passado, com o esforço conjunto de todos, o sistema financeiro de Macau manteve-se estável e as suas actividades têm sido capazes de crescer, de forma constante, neste ambiente desfavorável”, apontou o responsável o discurso que proferiu durante o almoço de Ano Novo Lunar da Associação de Bancos de Macau.

Reflexo disso mesmo, está o facto de, até finais de 2020, o montante total dos activos do sector bancário ter aumentado 10,2 por cento relativamente ao ano anterior, atingindo 2,20 mil milhões. Além disso, revelou Chan, os resultados operacionais do ano aumentaram “ligeiramente, para um novo máximo” de 17.1 mil milhões, enquanto que o rácio de crédito vencido se fixou num “nível baixo”, de 0,4 por cento.

O presidente da AMCM destaca ainda o facto de a população empregada no sector financeiro ter registado um aumento, apesar do crescimento da taxa de desemprego em Macau. “Todos estes dados objectivos reflectem a forte resiliência e a solidez das bases do sector financeiro de Macau”, disse.

Por ocasião do evento, Benjamin Chan recordou ainda que, o sector bancário auxiliou o governo na implementação das duas rondas do cartão de consumo e introduziu uma série de créditos relacionados com o combate à pandemia que proporcionaram “suportes de serviços financeiros adequados e oportunos às PMEs e ao público em geral”.

Nunca pior

Para o futuro, apoiado no surgimento das vacinas contra a covid-19 e nas previsões de recuperação de 5,5 por cento da economia mundial, partilhadas pelo Fundo Monetário Mundial, Benjamin Chan estima que a economia de Macau possa atingir um crescimento de “dois dígitos”.

Para revitalizar a economia em 2021, a AMCM promete unir esforços com o sector financeiro em áreas como os sistemas de infraestrutura e os sistemas jurídicos e formação de talentos, de forma a “cooperar com as linhas de acção governativa do Governo da RAEM em relação ao fortalecimento do sector financeiro moderno”.

Por seu turno, durante o almoço de Primavera, o presidente da Associação de Bancos de Macau, Li Guang afirmou que “não há fim para o desenvolvimento, nem fim para a luta” e que 2020 ficou marcado pelo apoio prestado durante à pandemia, que “tem garantido a estabilidade de milhares de PMEs e dezenas de milhares de famílias em Macau.

O responsável deu nota ainda para o facto ter sido dada continuidade à construção da plataforma de serviços financeiros entre a China e os países de língua portuguesa e que, no futuro, juntamente com esta, a aposta no desenvolvimento da Grande Baía contribuirá para a diversificação económica de Macau.

15 Mar 2021

TDM | AIPIM preocupada com livre exercício do jornalismo

A Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau mostrou-se preocupada com o livre exercício do jornalismo na TDM, devido às novas orientações editoriais que proíbem jornalistas de português e inglês de divulgarem opiniões contrárias às da China. O Sindicato dos Jornalistas de Portugal também manifestou “enorme preocupação” e “solidariedade”

 

A Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau (AIPIM) “manifesta enorme preocupação pela gravidade das implicações de alguns aspectos referidos (…) no que diz respeito ao livre exercício do jornalismo e às condições dos jornalistas para exercerem a sua actividade com profissionalismo e dignidade”, apontou a associação em comunicado, reagindo à notícia das novas orientações editoriais da Teledifusão de Macau (TDM).

Entre os vários pontos transmitidos às redacções portuguesa e inglesa na reunião da passada quarta-feira onde foram comunicadas as novas directivas, a AIPIM demonstrou muita preocupação com “uma indicação de impossibilidade do pessoal da TDM de ‘divulgar informação ou opiniões contrárias às políticas do Governo Central da RPC’” e ainda o apoio às medidas adoptadas por Macau.

“O ponto em questão é particularmente preocupante na medida em que colide com o pluralismo informativo e a busca do contraditório – princípios basilares da actividade profissional dos jornalistas”, para além de gerar “um clima de incerteza e receio, o qual tem um impacto muito negativo no trabalho do jornalista”.

Demonstrando respeito pela autonomia da linha editorial dos órgãos de comunicação social, a AIPIM considera também que o ponto em questão pode entrar em colisão com parte do Manual Editorial da TDM: “A ‘regra das duas fontes’ deve ser aplicada rigorosamente pelos [nossos] jornalistas quando transmitem uma notícia ou informação importante”, citou a associação.

Um jornalista da TDM, que pediu para não ser identificado, disse na quinta-feira à Lusa que pelo menos um editor já colocou o lugar à disposição. O não cumprimento das novas directrizes dá despedimento por justa causa, adiantou. “Confirmando-se uma abordagem deste género, julgamos ser algo de injustificável e inaceitável”, denunciou na mesma nota a AIPIM.

Na reunião com a direcção de informação, foi dito aos cerca de 40 jornalistas de língua portuguesa e inglesa directrizes como: A TDM divulga e promove o patriotismo, o respeito e o amor à pátria e a Macau; A TDM é um órgão de divulgação da informação do Governo Central da República Popular da China e de Macau; O pessoal da TDM não divulga informação ou opiniões contrárias às políticas do Governo Central da China e apoia as medidas adoptadas por Macau.

A AIPIM pediu esclarecimentos à TDM “por forma a garantir o pleno exercício da profissão” e demonstrou ainda toda “a solidariedade com os (…) colegas profissionais dos serviços em português e inglês da TDM, que merecem respeito, consideração e apoio”.

Mensagem de Lisboa

A emissora pública de televisão e rádio de Macau assumiu em comunicado que vai manter a actual política editorial alinhada com o “princípio do patriotismo e do amor por Macau”.

“A Teledifusão de Macau (TDM) não irá alterar a sua política actual em matéria de cobertura noticiosa”, indicou a emissora, num comunicado em chinês, sem nunca se referir à reunião de quarta-feira onde foi lida uma directiva que proibia os jornalistas de português e inglês de divulgarem informações e opiniões contrárias às políticas da China, confirmada à Lusa por vários jornalistas da empresa e veiculada pelos ‘media’ locais.

“Enquanto organismo público de radiodifusão, a TDM continuará a cumprir a sua responsabilidade social nos meios de comunicação social e a aderir ao princípio do patriotismo e do amor por Macau”, lê-se na mesma nota.

O Sindicato dos Jornalistas (SJ) de Portugal manifestou também “enorme preocupação” e “solidariedade” com os jornalistas em língua portuguesa e inglesa da Teledifusão de Macau (TDM.

Na nota enviada à Lusa, o Sindicato dos Jornalistas de Portugal alertou “para as implicações de tais orientações para o livre exercício do jornalismo em Macau, onde trabalha um número significativo de profissionais portugueses”. De acordo com a nota, a presidente da Direcção do SJ, Sofia Branco, “já falou ao telefone com o presidente da AIPIM”, José Carlos Matias, “tendo este assegurado que existem canais de diálogo internos para tentar resolver a situação reportada”.

O SJ expressou igualmente “a sua solidariedade com os profissionais dos serviços em português e inglês da TDM”, através da AIPIM. O HM contactou João Francisco Pinto, director de informação e programas dos canais portugueses da TDM, e Gilberto Lopes, director-adjunto de informação e programação portuguesa da TDM – Rádio Macau, que não comentaram a situação.

TDM | “Acredito que não vai haver mudanças”, Coutinho

O deputado e conselheiro das comunidades portuguesas na Ásia, José Pereira Coutinho, considera que “não vai haver grandes mudanças” na TDM depois do aviso que terá sido feito aos jornalistas e produtores dos canais portugueses e ingleses da emissora. Contudo, o deputado mostra-se também preocupado. “Não sei quem é que disse aquilo, não consigo perceber de onde veio [a informação], mas a situação é preocupante. No entanto, acredito que não vai haver mudanças. Como conselheiro das comunidades portuguesas, acredito nas autoridades locais, acredito na Lei Básica e no princípio “um país, dois sistemas” e as coisas estão a funcionar. Veja-se que eu, como deputado, nunca sofri qualquer pressão para falar ou para fazer tudo o que é necessário, porque estamos a trabalhar para o bem da população de Macau”, explicou o deputado à margem de uma reunião na DSAL.

15 Mar 2021

Hong Kong | Pequim promete medidas contra a “interferência do Ocidente” na reforma eleitoral

Os dirigentes chineses disseram este fim de semana que não existe “espaço para recuar” em relação às medidas anunciadas para a reforma do sistema eleitoral de Hong Kong. Isto apesar das críticas e ameaças de sanções de países ocidentais. Para eles, as sanções são medalhas e prometem responder à letra

 

Altos funcionários chineses declararam “a sua determinação inabalável de reparar as brechas na cidade chinesa que foram exploradas pelas forças anti-China, e lutar resolutamente com contra-medidas, se esses países ocidentais continuarem a intrometer-se nos assuntos internos da China”. Na questão de Hong Kong, “o governo chinês não tem espaço para recuar, já que os problemas de Hong Kong não são uma questão de democracia, mas sim de subversão e tomada do poder”, disse Zhang Xiaoming, vice-director do Gabinete dos Assuntos de Hong Kong e Macau.

” Nos últimos anos, forças anti-China exploraram brechas e falhas no actual sistema eleitoral de Hong Kong para colocar em risco a soberania da China, a segurança nacional e os interesses do desenvolvimento, prejudicando gravemente a ordem constitucional e a governação efectiva. Portanto, o governo central deve tomar as medidas necessárias para melhorar o sistema. Tal não apenas cabe à Assembleia Nacional Popular (APN), como é a sua responsabilidade”, referiu Zhang Yong, vice-chefe da Comissão para Assuntos Legislativos do Comité Permanente da APN, em conferência de imprensa na sexta-feira.

Pelosi e as mãos negras

A China chega mesmo a nomear alguns políticos ocidentais que acusa de serem “mão negras” por detrás “da turbulência social” que agitou a cidade. Países como os Estados Unidos, Austrália e Reino Unido, que têm criticado a China na questão de Hong Kong, apoiam abertamente algumas figuras políticas anti-China na instigação de um movimento antigovernamental e anti-China em Hong Kong, e fazem parte das “mãos negras” por trás da turbulência social que arrastou a cidade da prosperidade e estabilidade à beira do colapso.

“Algumas forças estrangeiras participaram da turbulência social e do tumulto que durou meses em Hong Kong em 2019, incluindo a política democrata Nancy Pelosi, que elogiou abertamente os distúrbios como uma “visão linda”, e o líder da maioria no Senado Mitch McConnell e o senador republicano Marco Rubio, que deu apoio aos desordeiros anti-China. Quando a violência no Capitólio estourou em Washington, esses políticos classificaram-na como ‘terrorismo’, o que mostrou a típica duplicidade dos seus padrões, e eu não entendo como têm moral para apontar o dedo aos assuntos de Hong Kong”, Zhang Xiaoming disse. O MNE britânico Dominic Raab e a australiana Marise Payne foram também criticados.

Também Rita Fan Hsu Lai-tai, ex-presidente do Conselho Legislativo de Hong Kong (LegCo), afirmou que “os países ocidentais, liderados pelos EUA, muitas vezes falam sobre a situação de Hong Kong fora do contexto”. “Por exemplo, quando a Lei de Segurança Nacional entrou em vigor no ano passado, alguns políticos britânicos disseram que violava a Declaração Conjunta. No entanto, está claramente afirmado na Declaração Conjunta que a defesa nacional e a diplomacia são direito e responsabilidade da China”, disse Fan, sublinhando que a defesa nacional inclui questões de segurança nacional. Para Rita Fan, “os países ocidentais e as forças independentistas de Taiwan são os beneficiários de minar a estabilidade de Hong Kong”.

As sanções aplicadas a alguns funcionários chineses pelos EUA parecem ser medalhas, nas palavras de Zhang Xiaoming. “Estamos profundamente orgulhosos de termos sido sancionados pelos EUA”, disse Zhang Xiaoming, ao mesmo tempo que prometia contra-sanções. O governo chinês está a preparar legislação para responder a estas sanções. Por exemplo, ” se Washington tomar mais medidas, a China pode exigir uma redução do Consulado Geral dos EUA em Hong Kong impondo restrições às suas actividades.”

Rita Fan vai mais longe e pergunta: “Para alguns grupos políticos de Hong Kong que não entendem isto e clamam por uma democracia definida pelo Ocidente, quero que se sentem e pensem, vale a pena sacrificarem-se pela hegemonia ocidental?”.

Londres condena “clara violação” da Declaração Conjunta

O Reino Unido disse que a decisão da China de impor “mudanças radicais” para restringir a participação no sistema eleitoral de Hong Kong é uma nova “clara violação” da Declaração Conjunta Sino-Britânica. O ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, Dominic Raab, lamentou a decisão da China de impor “mudanças radicais” que reduzem o papel dos cidadãos na escolha dos seus líderes territoriais, em vez de dar a uma comissão pró-Pequim o poder de nomear mais legisladores.

Segundo o ministro britânico, a decisão da China é parte “de um padrão concebido para assediar e suprimir todas as vozes críticas das políticas da China”. Raab acrescentou que a posição chinesa “marca uma terceira violação, em menos de nove meses, da Declaração Conjunta juridicamente vinculativa”.

“A decisão de Pequim de impor mudanças radicais para restringir a participação no sistema eleitoral de Hong Kong é uma clara violação da Declaração Conjunta Sino-Britânica, juridicamente vinculativa”, disse o ministro.

“O Reino Unido continuará a defender a população de Hong Kong. A China deve agir de acordo com as suas obrigações legais e respeitar os direitos e liberdades fundamentais em Hong Kong”, acrescentou o ministro dos Negócios Estrangeiros britânico. Contudo, durante a época colonial, Londres nada fez para dar voz ao povo de Hong Kong, no sentido de escolherem os seus governantes.

15 Mar 2021

Reunião na DSAL acaba em manifestação e corte de via pública

Uma reunião com a DSAL para acompanhar os pedidos de apoio a 517 trabalhadores da construção civil que estão desempregados, acabou numa demonstração de descontentamento, que levou ao corte da Avenida Dr. Francisco Vieira Machado. O deputado José Pereira Coutinho aponta o dedo ao secretário para a Economia e Finanças por permitir o trabalho de TNR quando há desemprego entre residentes e diz que é “normal” os ânimos exaltarem-se quando é difícil sustentar a família. Saiba mais na próxima edição do Hoje Macau.

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13 Mar 2021

APN | Os nove artigos que alteram o sistema eleitoral de Hong Kong

Motins, interferência estrangeira e os pedidos de “independência” dos últimos anos levaram Pequim a alterar o sistema eleitoral de Hong Kong. Uma comissão de revisão de candidaturas vai apreciar cada um dos candidatos às eleições e decidir se apresentam as qualidades necessárias para concorrerem, quer para o Chefe do Executivo quer para o LegCo. O sufrágio universal não foi sequer referido

 

A Assembleia Popular Nacional (APN) adoptou ontem, quinta-feira, uma decisão sobre o “melhoramento do sistema eleitoral da Região Administrativa Especial de Hong Kong (RAEHK)”, informou a Xinhua. A decisão, aprovada por uma maioria esmagadora de votos na quarta sessão da 13ª APN, contém nove artigos:

– Melhorar o sistema eleitoral da RAEHK implica implementar plena e fielmente o princípio “um país, dois sistemas”, segundo o qual o povo de Hong Kong administra Hong Kong com um alto grau de autonomia, manter a ordem constitucional conforme estabelecido pela Constituição e a Lei Básica, garantir a administração de Hong Kong por pessoas de Hong Kong com patriotas nos seus órgãos principais de governo, melhorar efectivamente a eficácia da governação e salvaguardar o direito de voto e o direito de se candidatar a residentes permanentes da RAEHK.

– A RAEHK deve estabelecer uma Comissão Eleitoral que seja amplamente representativa, adequada às realidades e representativa dos interesses gerais de sua sociedade. A Comissão Eleitoral será responsável pela eleição do Chefe do Executivo designado e parte dos membros do LegCo. A Comissão Eleitoral também será responsável pela nomeação de candidatos para o Chefe do Executivo e membros do LegCo, bem como por outros assuntos. A Comissão Eleitoral será composta por 1500 membros, dos seguintes cinco sectores: industrial, comercial e financeiro; profissionais; populares; trabalhadores, religiosos e outros; membros do LegCo e representantes de organizações distritais; deputados de Hong Kong na APN, membros de Hong Kong do Comité Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês e representantes de membros de Hong Kong de organizações nacionais relacionadas.

– O Chefe do Executivo será eleito pela Comissão Eleitoral e nomeado pelo Governo Popular Central. Os candidatos ao cargo de Chefe do Executivo serão nomeados conjuntamente por pelo menos 188 membros da Comissão Eleitoral, entre os quais o número de membros de cada sector não deve ser inferior a 15. A Comissão Eleitoral elegerá o Chefe do Executivo designado em votação secreta, na base de uma pessoa, um voto. A eleição do Chefe do Executivo designado exige a maioria simples dos votos de todos os membros da Comissão Eleitoral.

– O LegCo será composto por 90 membros em cada mandato. Os membros do LegCo incluirão os membros nomeados pelo Comité de Eleição, os designados pelas constituintes funcionais e os eleitos directamente por zonas geográficas.

– As candidaturas serão apreciadas por uma comissão de revisão da qualificação do candidato. A comissão será responsável por rever e confirmar as qualificações dos candidatos a membros da Comissão Eleitoral, do Chefe do Executivo e dos membros do LegCo. A RAEHK deve melhorar o sistema e os mecanismos relacionados com a revisão de qualificação, para garantir que as qualificações dos candidatos estão em conformidade com a Lei Básica, a Lei de Segurança Nacional, a interpretação do Comité Permanente da APN do Artigo 104 da Lei Básica , a decisão do Comité Permanente da APN sobre a qualificação dos membros do LegCo e as disposições das leis locais relevantes.

– O Comité Permanente da APN está autorizado a, de acordo com a decisão sobre a melhoria do sistema eleitoral da RAEHK, alterar o Anexo I da Lei Básica.

Segundo a agência Xinhua, “a decisão é mais um grande passo dado pelo Estado para melhorar os sistemas jurídicos e políticos da RAEHK, desde que a Lei de Segurança Nacional foi adoptada”. Ao deliberar um rascunho da decisão, a sessão da APN foi de opinião que “o retorno de Hong Kong à pátria colocou a região sob o sistema de governação geral do país, e que a Constituição e a Lei Básica formam conjuntamente a base constitucional da RAEHK”.

O sistema eleitoral da RAEHK, que inclui os métodos de selecção do Chefe do Executivo e de constituição do Conselho Legislativo (LegCo), é “uma parte importante da estrutura política da RAEHK”, de acordo com a APN.

Assim, “o sistema eleitoral deve estar em conformidade com o princípio ‘um país, dois sistemas’, atender às realidades da RAEHK e servir para garantir que Hong Kong seja administrado por pessoas que amam o país e Hong Kong”.

Por isso, entende a APN que o sistema eleitoral deve ser “favorável à salvaguarda da soberania nacional da China, segurança e interesses de desenvolvimento e ajudar a manter a prosperidade e estabilidade de longo prazo de Hong Kong”.

12 Mar 2021

Turismo | Docente alerta para falta de protecção de direitos fundamentais dos TNR

Carlos Noronha, docente da Universidade de Macau, defendeu numa palestra online destinada a alunos do Instituto de Formação Turística que, à luz do Código de Ética da Organização Mundial de Turismo, os direitos dos trabalhadores não residentes não estão devidamente protegidos e dá como exemplo o caso do pedido de manifestação sobre Myanmar

 

Os trabalhadores não residentes (TNR) não estão a ver os seus direitos fundamentais plenamente reconhecidos em Macau à luz do Código de Ética adoptado pela Organização Mundial do Turismo (OIT) das Nações Unidas. A ideia foi defendida por Carlos Noronha, docente da Universidade de Macau (UM) e um dos fundadores do Instituto para a Responsabilidade Social das Organizações na Grande China em Macau.

Carlos Noronha foi convidado a comentar o assunto numa palestra online destinada a alunos do Instituto de Formação Turística (IFT), à qual o HM teve acesso, tendo referido um dos artigos do Código de Ética, relativo aos direitos dos trabalhadores do turismo.

“Aqui falamos de direitos fundamentais e, em Macau, temos, na maioria, trabalhadores do exterior. Os trabalhadores locais, às vezes, formam associações laborais e têm alguma voz na sociedade. Mas e os TNR? Parece que não estão protegidos.”

Carlos Noronha deu o exemplo da posição assumida pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) relativamente ao direito de reunião e manifestação por parte dos TNR. Recorde-se que, a propósito de um pedido de reunião contra o golpe de estado no Myanmar, o CPSP defendeu que os TNR não têm direito a manifestar-se por não serem residentes.

“Esta é uma acção que mostra um direito fundamental de patriotismo, mas o Governo diz que não têm o direito de reunião ou de manifestação. Então o que fazem? Apenas podem trabalhar, nada mais. Não têm direitos básicos para participar na sociedade e mesmo demonstrar sentimentos em relação a assuntos políticos ou sociais”, disse no mesmo vídeo.

Ao HM, Carlos Noronha reiterou esta posição. “Segundo o Código de Ética os trabalhadores do turismo devem ter direitos fundamentais. Imagine-se um estudante do exterior, com visto, será que está proibido de aderir a determinado protesto? O mesmo se aplica aos TNR.”

O Código de Ética, de aplicação voluntária, deve ser reforçado e implementado pela Direcção dos Serviços de Turismo, CPSP, serviços de emigração e pelo próprio sector, defendeu o docente. “Quando se está num negócio de turismo é preciso ter em atenção questões como a sustentabilidade e as condições de trabalho que são dadas aos funcionários. Pensar no respeito pela cultura e nos benefícios mútuos, não é apenas deixar que as pessoas venham, ganhem o seu salário e vão embora.”

Garantir o equilíbrio

Jenny Guan, docente do IFT, pretende promover junto dos alunos um maior conhecimento do Código de Ética da OMT, que tem um carácter voluntário e que, como tal, não tem uma lei de base que obrigue à sua implementação.

Ao HM, diz acreditar que “a indústria e algumas entidades [em Macau] estão a tentar ter um desempenho de acordo com os padrões internacionais.”

No que diz respeito aos TNR, Jenny Guan defende que é preciso olhar com objectividade para aquilo que empresas e concessionárias fizeram durante a pandemia. “As empresas fizeram o seu melhor para manter os trabalhadores locais quando, durante um período de tempo, não houve receitas. Temos de pensar que precisam de garantir um equilíbrio entre a responsabilidade social e as responsabilidades perante os accionistas”, disse ao HM.

“Acredito que o objectivo nunca foi o despedimento desses trabalhadores e que providenciaram indemnizações ou outros apoios financeiros”, rematou.

Tendo em conta o Código de Ética, Jenny Guan alerta também para a necessidade de “educar turistas, estudantes e residentes para terem um melhor comportamento, para que possamos melhorar a imagem internacional de Macau como uma cidade de turismo”.

12 Mar 2021

Governo apoia aperfeiçoamento do sistema eleitoral de Hong Kong

O Governo de Macau expressou ontem, em comunicado, que “defende e apoia firmemente” a decisão do Governo Central saída ontem da APN, sobre o aperfeiçoamento do sistema eleitoral da Região Administrativa Especial de Hong Kong (RAEHK).

“O regime eleitoral é parte integrante e importante do sistema político. E o aperfeiçoamento dos sistemas eleitorais das Regiões Administrativas Especiais (RAE) é efectuado com base na Constituição da República Popular da China, sendo muito significativo para o Governo Central exercer de forma eficaz o poder pleno da governação”, pode ler-se no comunicado divulgado ontem pelo Gabinete de Comunicação Social.

Na mesma nota, é sublinhado ainda que a APN, como órgão máximo do poder estatal decidiu aperfeiçoar o sistema eleitoral de Hong Kong “de acordo com a lei e a situação real” do território e com o objectivo de “defender a soberania, segurança e interesses de desenvolvimento do país”, insistindo “convictamente” no aperfeiçoamento do princípio “um país, dois sistemas”, uma acção “indispensável para garantir a sua concretização estável e duradoura”.

Reagindo à decisão, o Executivo de Macau afirma ainda que o conceito se reveste de “grande significado” e tem um enorme impacto para a manutenção a longo prazo “da prosperidade e estabilidade de Hong Kong, bem como do bem-estar de toda a sua população”.

Manter a estabilidade

No mesmo comunicado, o Governo da RAEM frisa também que, desde a transição, tem concretizado “plena e correctamente” os princípios de “um país, dois sistemas” e “Macau governado pelas suas gentes” com alto grau de autonomia, sem descurar o princípio fundamental de “Macau governado por patriotas”.

“Vem-se defendendo, de forma resoluta, a ordem constitucional da RAEM, em conformidade com o estabelecido pela Constituição e pela Lei Básica, abrindo-se caminho a uma implementação bem-sucedida do princípio ‘um país, dois sistemas’ com características próprias de Macau”.

Para o futuro fica a garantia de “unir os diversos sectores da sociedade” e manter a estabilidade de Macau a longo prazo, “escrevendo um novo capítulo na implementação com sucesso” desse conceito.

“A RAEM irá unir os diversos sectores da sociedade, continuar a promover a boa tradição do amor à pátria e a Macau, defender firmemente a soberania nacional, bem como a segurança do país e seus interesses de desenvolvimento, e manter a prosperidade e estabilidade de Macau a longo prazo”, consta do comunicado.

12 Mar 2021

CPSP recusou nove pedidos de manifestação desde 2018

Desde 2018, o Corpo de Polícia de Segurança Pública recebeu 356 notificações de manifestações e recusou nove. No mesmo período, houve 23 promotores que desistiram dos pedidos de reunião e manifestação

 

Desde 2018, altura em que passou a ser a entidade receptora pelas notificações dos manifestantes, o Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) proibiu nove manifestações. Segundos os dados disponibilizados pela corporação ao HM, 2020, foi o ano em que houve mais proibições, num contexto que fica marcado pelo surgimento da pandemia da covid-19.

Entre 2018 e 23 de Fevereiro de 2021, o CPSP recebeu 305 pedidos de reuniões e manifestações formais, ou seja, aqueles em que houve um pedido por escrito e que não se esgotou nas comunicações verbais.

No primeiro ano como entidade responsável por receber as notificações, mudança à lei que entrou em vigor a 13 de Setembro, o número de pedidos foi de 51. Nesse ano foram realizadas 45 reuniões e manifestações e o CPSP não permitiu duas manifestações. No mesmo período, de acordo com a lei, foram ainda canceladas duas manifestações pelos promotores e houve outras duas reuniões ou manifestações impedidas, porque se considerou que o aviso prévio não preenchia os requisitos legais.

No ano seguinte, em 2019, os pedidos de manifestação recebidos foram 164, dos quais dois foram recusados. Entre a iniciativa recusada, constou uma manifestação marcada para o Leal Senado, com várias detenções, em que os promotores pretendiam mostrar solidariedade contra a violência da polícia em Hong Kong. A manifestação tinha sido proibida com o aval do Tribunal de Última Instância (TUI), numa decisão que dividiu os juízes entre Sam Hou Fai e Song Man Lei, contra a manifestação, e Viriato Lima, que votou vencido a favor de autorizar a iniciativa.
Entre as 164 notificações de manifestação houve igualmente 15 pedidos retirados a pedido dos próprios promotores.

78 avisos este ano

Foi em 2020, em contexto da pandemia, que as proibições mais do que duplicaram face a 2019. Nesse ano, o CPSP recebeu 78 avisos prévios, entre os quais cinco que foram recusados pela Polícia.

Um dos pedidos de reunião e manifestação mais mediático, entre as recusas, prendeu-se com a vigília sobre Tiananmen, que depois de vários anos a ser organizada foi proibida pela primeira vez no ano passado. As autoridades justificaram a proibição com as medidas contra a pandemia da covid-19, numa decisão que mereceu igualmente o apoio do Tribunal de Última Instância, com votos a favor de Sam Hou Fai, Song Man Lei e José Dias Azedo.

Entre os pedidos, houve ainda quatro promotores, que por iniciativa própria, abdicaram das iniciativas.
Finalmente, este ano houve um aviso prévio de 12 casos, dos quais dois foram canceladas pelo promotor. Os dados não incluem ainda a iniciativa promovida pela associação Poder do Povo e o vice-presidente Wu Shaohong, mais recente, que pretendia fazer uma reunião de solidariedade para com as vítimas de violência no Myanmar. O pedido acabou por ser retirado por Wu, que revelou não ser capaz de corresponder às exigências do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) de garantir que não havia pessoas com febre alta ou doenças do tracto respiratório a participar no evento.

12 Mar 2021

Cloee Chao, representante dos Trabalhadores do Jogo | A mãe de todas as lutas

Criou uma associação laboral porque não tinha para onde se virar, afectada pelo fumo passivo nas salas de jogo. Cloee Chao subiu a pulso na indústria dos casinos, criou duas filhas que a acompanham em lutas laborais enquanto trabalhava por turnos e prepara-se para voltar a candidatar-se a deputada. Ainda não decidiu se corre com Ng Kuok Cheong, mas garante que vai continuar a cooperar com o deputado pró-democracia, com quem partilha lutas e princípios

 

Como chegou à indústria do jogo? Era algo que ambicionava? O que a atraiu?

A minha entrada na indústria do jogo foi há mais de 20 anos. Na altura, tinha acabado o ensino secundário complementar e estava com dificuldades para encontrar emprego. Consegui trabalho como secretária num escritório, através de recomendação de familiares. Nesse tempo, Macau era uma cidade pequena, a população era pouco mais de 300 mil habitantes e as oportunidades de emprego não eram muitas, excepto nos serviços do Governo e casinos. A admissão na indústria do jogo não era como nos dias de hoje, era difícil encontrar um formulário de proposta de emprego, mas arranjei um através da irmã de um amigo que era croupier no casino Lisboa. Isto foi antes da liberalização do jogo, quando só havia o Casino Lisboa. Preenchi e entreguei o formulário e ligaram-me da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM) a perguntar se tinha interesse em ir a uma entrevista. Nunca tinha entrado num casino. No início, o meu trabalho era tratar das bebidas, atrás do croupier, além de recolher fichas de jogo, entre outras coisas. Tudo era uma novidade para mim, mas a STDM era uma empresa grande e dava formação aos trabalhadores. Depois de três meses de formação, e de um exame rigoroso, podia ser promovida a croupier.

Trabalhou num casino ao mesmo tempo que criou duas filhas, enquanto mãe solteira. Que protecções laborais faltam às famílias monoparentais?

Sou mãe solteira, responsável por todas as despesas da casa. Como este trabalho implica turnos, não pude cuidar das minhas filhas e tive de contratar uma empregada doméstica, o que aumentou as despesas. Se perguntar a assistentes sociais, vão-lhe revelar que as crianças com maiores problemas são oriundas de famílias em que os pais trabalham na indústria do jogo. Hoje em dia, faço todos os possíveis para que as minhas filhas me acompanhem, até em manifestações estão perto de mim. Por exemplo, nas últimas eleições a minha filha mais velha, que estuda na universidade, foi quem fez o design da nossa campanha. Mas, de facto, não há qualquer apoio a famílias monoparentais. Quando me divorciei, senti-me desamparada, não me facilitaram turnos que me permitissem cuidar da minha família. Lembro-me da felicidade que senti na altura da liberalização, porque se começou a falar de creches, disponíveis 24 horas por dia, para filhos de funcionários. Mas é complicado, mesmo para um casal, se trabalharem por turnos que não coincidem. A relação torna-se distante e, assim, é natural que a taxa de divórcio seja mais alta entre trabalhadores do jogo.

Que razões a levaram a criar a Associação Novo Macau pelos Direitos dos Trabalhadores de Jogo?

Foi devido à gravidade de uma doença que contraí por causa do fumo passivo. Tive um problema nas amígdalas, que me forçou a ir ao hospital todos os meses para receber tratamento. O médico disse-me que se continuasse a trabalhar naquele ambiente poderia morrer. Alguns colegas tiveram cancro e problemas respiratórios. Estes casos eram frequentes antes da aprovação da lei que proibiu o fumo do tabaco nos casinos. Nesta altura, tinha salário de supervisora, superior a 20 mil patacas por mês, e não podia abdicar desse dinheiro. Procurei a ajuda de outras associações, que não defendiam a abolição total do fumo. Depois de nos termos manifestado, decidimos começar a associação. Ao princípio não foi fácil, os colegas tinham receio de chatear o chefe ou arranjar problemas se estivessem comigo. Mas, lentamente, começámos a ser aceites.

Numa altura em que parte da população está em situação de subemprego, a DSAL recebe poucas queixas e dá conta de poucos conflitos laborais. Como analisa esta realidade?

A DSAL recebe menos queixas que nós. Nós ouvimos trabalhadores com problemas tão diversos como licenças sem vencimento, pressões para assinar demissões ou cartas de aviso. Durante este período de pandemia, percebo as empresas do jogo, face à quebra de lucros. Muitos anfitriões de salas VIP continuam sob licença sem vencimento, há pessoas com um terço do rendimento, quem tenha perdido bónus e a receber menos de 10 mil patacas. Na minha óptica, os trabalhadores mais afectados são da área da restauração, que tem muitos não residentes e locais em part-time, contratados através de agências de emprego, e estes não se queixam à DSAL.

Que confiança tem na Concertação Social. É um organismo eficaz? O que falta?

Todos os membros do Conselho Permanente de Concertação Social (CPCS) são nomeados, o Governo só ouve a voz de um lado. Se perguntar aos residentes, não acredito que muitos saibam o que é. Por exemplo, queremos dar as nossas opiniões sobre a lei sindical, queremos participar activamente, e não temos meios. Se compararmos com a Assembleia Legislativa, que só tem alguns deputados que representam a população, o CPCS tem zero.

Quais são as suas expectativas quanto à Lei Sindical?

Temos receio que a lei sindical não seja o que nós queremos, mas o que o Governo quer. Temos contacto com associações sindicais do exterior, ainda esta semana reunimos online. No passado, visitámos outras regiões como Estados Unidos, Espanha, onde existem leis sindicais. O mais importante é garantir convenções colectivas de trabalho e direito à greve. Estou preocupada com a possibilidade de estes direitos serem restringidos. Receio também que os sindicatos sejam organizados pelos próprios empregadores, com inscrição obrigatória no momento da admissão na empresa.

Está a ponderar a possibilidade de concorrer às eleições na lista de Ng Kuok Cheong. Não teme dividir o eleitorado de trabalhadores do jogo, que não se alinham com a política mais pró-democracia?

Todos sabem que os deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San apoiam as associações de operários e que partilhamos escritório, estiveram presente na fundação da nossa organização. Estou sempre presente nas actividades que promovem e também os convidamos para acções organizadas por trabalhadores do jogo. Creio que quem conhece a nossa associação, sabe que somos apoiantes dos deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San. É possível que haja quem tenha conceitos políticos diferentes dos deputados, mas não me parece que isso tenha grande impacto, uma vez que eles apoiam os trabalhadores há dezenas de anos. Mesmo que possam não concordar com alguns aspectos políticos, conhecem os seus desempenhos em questões laborais. Pelo contrário, acho que os apoiantes do campo democrático não nos aceitam porque nossa associação celebra o dia nacional e o aniversário da associação. Não somos do campo democrático, nem pró-Governo, somos uma associação de operários. Em Macau só existem estes dois campos. Independentemente de me candidatar, ou não, com Ng Kuok Cheong, vamos continuar a cooperar.

Concorda com as ideias e as lutas que Au Kam San e Ng Kuok Cheong têm protagonizado em Macau, como a vigília do 4 de Junho? Não acha que pode ser um risco político?

Ao longo dos anos, organizaram as suas actividades e que nunca foram suspensas, incluindo as actividades não puderam ser públicas devido à pandemia, acho que o maior risco político é desistirem de as organizar. Claro que me reconheço nestas lutas, se não concordasse não estaria com os deputados. Como as pessoas sabem, o campo democrático em Macau é moderado, mas pode ter sofrido com a atmosfera que se vive em regiões vizinhas. Mas creio que a população os apoia há muitos anos.

Numa eventual candidatura à AL, quais são as propostas e políticas que gostaria de ver implementadas em Macau?

Como eu sou trabalhadora do jogo, o foco principal é a esperança de participar no processo da renovação da concessão das licenças de jogo, fazer sugestões legislativas e lutar pelos direitos dos trabalhadores. Na altura da liberalização do jogo, as empresas candidatas às concessões prometeram muito, como creches 24 horas, dormitórios para funcionários, mas só vi estas promessas cumpridas no estrangeiro. Se calhar, porque faltam terrenos em Macau, mas ao longo dos anos não me parece que as empresas se tenham esforçado muito. De qualquer das formas, a cultura não-jogo é fraca em Macau. Por exemplo, The House of Dancing Water era muito conhecido, mas fechou devido ao impacto da pandemia. Desta vez, espero que as promessas feitas pelas concessionárias fiquem estabelecidas a escrito, de forma clara. Outro exemplo é o sector das exposições e eventos, que, de facto, estão bem desenvolvidas no Venetian. Mas é raro recrutarem residentes.

Como avalia o trabalho do Governo de Ho Iat Seng até agora e que medidas gostaria de ver implementadas?

Acho que o Governo tem feito um trabalho muito bom, incluindo com medidas que tiveram como prioridade o bem-estar da população, algumas corajosas, como fechar os casinos durante um período devido à pandemia. De 0 a 100, dou uma pontuação de 85 pontos. Demonstram maior capacidade de trabalho do que os governos anteriores. Por exemplo, as medidas de prevenção da pandemia não foram aplicadas às empresas de jogo apenas tendo em conta interesses negociais. Creio que o Governo impediu que muitos trabalhadores não fossem despedidos.

12 Mar 2021

Eleições | Imprensa deve ocultar artigos sobre eleições durante período de reflexão

No período antes das eleições, no dia da reflexão e durante as eleições, os órgãos de comunicação social vão ter de remover dos portais os artigos sobre as eleições e os respectivos candidatos que possam influenciar os eleitores. A obrigação legal foi declarada ontem pelo presidente da Comissão de Assuntos para as Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL), o juiz Tong Hio Fong, e abrangem artigos de actos eleitorais de outros anos.

“Aqueles conteúdos que têm uma natureza de propaganda e que levam a esse efeito que pode influenciar a intenção de voto… Essas informações e reportagens pelo menos terão de ser ocultadas ou retiradas nos prazos estipulados pela lei”, afirmou Tong Hio Fong, no final de uma sessão de esclarecimento entre a CAEAL e os órgãos de comunicação social. “A liberdade de imprensa está consagrada na Lei Básica e na Lei Eleitoral, mas temos que chamar a atenção ao seguinte […] se as informações, directa ou indirectamente, por exemplo, estão a apelar ou a chamar um cidadão para votar, isto já ultrapassa a permissão da lei”, frisou.

Apesar desta informação, Tong Hio Fong diz que a CAEAL vai ter em conta considerações técnicas, na altura de exigir aos órgãos de comunicação social para “ocultarem” os conteúdos. “Se a instituição ou órgão de comunicação social tiver sob seu controlo e puder manipular a plataforma em que a divulgação foi feita, como não pode haver divulgações, pelo menos tem a responsabilidade de ocultar essas informações. Claro que não podemos descartar a hipótese de haver razões técnicas que tornem isso impossível”, sublinhou.

Sem período eleitoral

Tong recusou ainda traçar um período temporal, considerando que a obrigação abrange qualquer publicação que se considere que pode influenciar as intenções de voto. Por outro lado, declarou que a obrigação não se limita aos órgãos de comunicação social, mas que pode implicar outras plataformas online, como as páginas de Facebook das associações.

Por estes motivos, a CAEAL diz ter uma linha aberta para os órgãos de comunicação social, ao mesmo tempo que prometeu não reencaminhar qualquer caso directamente para o Ministério Público, sem primeiro ouvir os médias e dar uma hipótese para que os conteúdos sejam retirados.

Nas eleições de 2017, o jornal Plataforma viu um dos seus artigos removidos, devido a uma entrevista com um candidato. Sobre este assunto, Tong Hio Fong declarou anteriormente que o caso foi reencaminhado para o Ministério Público e que depois disso não receberam mais informações.

11 Mar 2021

Raquel Banha: “As pessoas não têm de ignorar a deficiência”

Raquel Banha tem 24 anos e considera-se uma “Artivista”. Mulher de vários talentos, domina a arte da escrita no seu blog Chairleader e é mestre em Marketing Digital. Nasceu com uma doença neuromuscular rara e usa o blog para quebrar tabus e falar sobre a deficiência

Foto – Inês Oliveira

 

Li no teu blog, a certa altura, que “há 20 anos que namoras a tua varanda solarenga, local da casa onde te sentes mais viva e livre, e onde aprendes a viver através dos outros, das pessoas, dos animais, das plantas”. O que seria necessário para poderes sair da varanda e viver essa vida que tanto observas?

Há muitos factores, na verdade. Moro num prédio com 24 degraus, que não tem rampa, não tem elevador, não tem nada. E durante 18 anos, o meu pai, todos os dias, me transportava às cavalitas. Além de eu estar, obviamente, dependente dele, 56 anos já começam a pesar no corpo de um adulto. Então apareceu a Ana.

A Ana é a tua assistente pessoal.

Sim, comecei a ter assistência pessoal desde Outubro de 2019 e já desde essa altura que houve a necessidade de arranjar maneira de sair de casa, de forma, mais ou menos, autónoma. E em Maio de 2020, instalámos uma cadeira elevatória. Ainda não é ideal, por várias razões: esta cadeira de rodas (eléctrica) não vai a casa por exemplo.

Quanto é que pesa?

200 quilos.

Há ajudas do Estado para tudo isso?

Há algumas…esta cadeira foi o Estado que me deu, mas demorou três anos a chegar. É uma eternidade (sorri). Como estávamos numa situação complicada e urgente, pois o meu pai já estava mesmo muito mal das costas, tivemos de arranjar rapidamente a cadeira elevatória, e então fomos nós, do nosso bolso, que a pagamos. Agora estamos à espera da junta de freguesia. Disseram que como os degraus para entrar no prédio ainda estão na rua, poderiam fazer a obra sem cobrar nada. Portanto, para sair de casa, esta era a minha primeira barreira, a barreira arquitectónica, que é a mais óbvia. Depois há uma outra barreira, a barreira emocional. Eu agora, felizmente, com a Ana, supostamente já poderei fazer aquilo que quero. Mas estamos a falar de 23 anos. Foram 23 anos sem a oportunidade de fazer aquilo que eu queria, à minha maneira, no meu horário… E a nossa mente acaba por se moldar a essa realidade. E agora, tenho a oportunidade de sair, mas não sei o que é que vou fazer, não sei o que é que posso fazer, nem tão pouco tive oportunidade para construir um circulo social de amigos consistente para dizer “agora vou tomar um café com…” Não criei isso ao longo do meu desenvolvimento. E claro, tenho a consciência de que a minha personalidade também não ajuda. Às vezes acabo por ficar em casa, pois vou lá fora fazer o quê? Não sei. Há muita coisa que não conheço, não sei por onde começar… e isto depois é uma bola de neve. Costumo dizer que a independência é um músculo. E, no meu caso, foram 23 anos que estive sem utilizar esse músculo. É um processo lento e demorado.

E há o problema com que se deparam todas as pessoas que têm de se deslocar em cadeira de rodas eléctrica, que é a impossibilidade de entrar na maioria dos locais públicos, porque não têm acesso.

Pois, não entro.

Portanto aquela coisa de telefonar a alguém a dizer “vamos jantar não sei onde e depois vamos a uma discoteca” ou uma combinação de última hora, é uma coisa que não existe para ti. Tens de ter tudo programado, saber onde é que podes entrar e onde é que não podes entrar.

Lá está. É aí que entra o lado emocional. O trabalho de sair e planear tudo, com a grande possibilidade de chegar aos sítios e as coisas não correrem bem. Isso desmotiva-me imenso. Por isso é que digo que o lado emocional comanda tudo.

Compreendo.

Há aqui um degrau sim, mas o lado emocional é aquele que dita que vamos ter de arranjar uma solução, uma alternativa. E de facto a nossa vida tem de ser programada com muito tempo de antecedência. Tenho de telefonar primeiro, para saber se o sítio é acessível, depois as pessoas dizem-me que “ah, é acessível, sim”, chegas lá e não é acessível. Porquê? Porque as pessoas também não têm formação técnica para saber avaliar se aquele espaço é totalmente acessível ou não. Mesmo com a Ana ao meu lado é muito cansativo para mim…

Há um termo, que começa a ser usado quando se fala de discriminação e preconceito social contra pessoas com capacidades reduzidas – que é o “capacitismo”. Queres falar um pouco sobre isto? E já agora, gostava imenso que desenvolvesses a tua ideia de que (para ti) está ligado a uma “premissa de que assim que uma pessoa nasce e/ou fica com uma incapacidade é automaticamente um ser especial.”

Acho que é uma tendência natural da sociedade. Quando vês alguém diferente, começa a surgir uma variedade de suposições à volta dessa pessoa e nós baralhamos muito os termos “diferente” com “especial”. E não tem nada a ver uma coisa com a outra. Diferente é diferente… Ser especial é quando alguém faz alguma coisa que realça e tem valor. Estando agora mais dentro da comunidade de pessoas com deficiência, é algo que eu noto muito. Todos nós, a certa altura da nossa vida, somos chamados de “especiais e únicos”. Depois, quando chegamos ao mundo real e temos este contacto com pares da nossa comunidade, percebemos que afinal há mais pessoas como nós, percebemos que afinal não somos assim tão especiais, nem únicos. E isso tem várias consequências a nível psicológico e emocional. Por exemplo, pessoalmente, acho que isto mexeu muito, e mexe, com a minha autoconfiança. Quando faço alguma coisa e as pessoas me elogiam, fico sempre na dúvida se é puro mérito meu, ou se está ligado com esta conotação “especial da deficiência”. Ou seja, o facto de eu me ter apercebido desde cedo que não era assim tão especial, não era assim tão única, criou uma necessidade dentro de mim de criar essa “parte especial de mim” de que tanto falavam. E então há aqui uma espécie de exigência comigo mesma, “tenho de fazer alguma coisa para ultrapassar a minha deficiência”. Mas eu pergunto: será que isso é mesmo necessário? Será que isto é algo meu, ou é uma necessidade que desenvolvi por causa de tudo isto à minha volta? Não sei.

Também dizes que sentes com frequência as pessoas estarem contigo e isso fazê-las sentirem-se bem porque estão perante alguém que está pior do que elas. Perverso, não?

É perverso mas toda a gente pensa assim, eu inclusive. Aliás, ainda não consegui formular uma opinião sobre o voluntariado internacional, por exemplo. Agora está muito na moda, um jovem ir a África ou à Ásia fazer voluntariado durante umas semanas ou meses. Mas na maioria dos testemunhos que tenho lido, as pessoas vão com o objectivo principal de verem que há pessoas em situações piores do que elas. Vão lá, são iluminados pela desgraça dos outros e voltam seres superiores, com um currículo todo pimpão. E isso faz-me comichão. Mas lá está, não quero ser demasiado fundamentalista, porque ainda estou a tentar perceber este fenómeno e essa necessidade das pessoas se compararem a outras, para pensar “ah, afinal eu tenho que dar mais valor à minha vida”. Mas, até agora, com a informação que tenho, isso incomoda-me.

Naturalmente.

Incomoda-me, irrita-me. Nós não devemos comparar a nossa realidade com a dos outros.

Sim, a dor dos outros não pode ser um bálsamo para nós…

Não é? Irrita-me muito.

É a isso que tu chamas “objectificação da deficiência como meio de inspiração”?

Sim, mistura-se um bocado com o ponto anterior. “Eu gosto e sinto-me bem em ver alguém em “piores” condições que eu. Faz-me sentir melhor”… E há aquela cena do “ah eu vejo alguém com deficiência a fazer determinada coisa, se ela consegue, eu também consigo”.

Mas também há pessoas que fingem ignorar. 

Conheço várias pessoas, das quais tive necessidade de me afastar um pouco, porque elas vinham sempre com esse discurso do “ah, eu quando olho para ti, não vejo a deficiência”… as pessoas claramente deparam-se com uma pessoa diferente, com alguma coisa que não conhecem ou entendem, e a maneira delas lidarem com isso, ou tentarem disfarçar esse sentimento de estranheza, é dizerem “ah, eu olho para ti e não vejo a deficiência”. As pessoas não têm de ignorar a deficiência. É como eu estar a olhar agora para ti e ignorar que tens uma coisa nos ouvidos (os auscultadores do gravador). É ridículo. Não é real…. não faz sentido.

Como o que te aconteceu na escola, numa aula de ciências.

Exactamente isso… acho que foi numa aula de ciências, sim, em que o laboratório era no primeiro andar. A escola não tinha elevador, rampa, nada. E marcaram a aula lá para cima e eu fiquei muito chateada porque, quando eu vou para uma escola, a primeira coisa que se faz é falar com o conselho, com a direcção, para mostrar que eu tenho uma deficiência e que não é para esquecê-la, é precisamente para tê-la em conta. E marcaram aulas para o primeiro andar. Eu falei com uma professora e ela, com um ar muito despreocupado, diz-me para eu não ficar chateada porque isso queria dizer que olhavam para mim e não viam a minha cadeira de rodas. E isso não é um argumento válido. É só parvo.

Fazes parte da direcção do Centro de Vida Independente cujo objectivo é a defesa e a divulgação da filosofia da vida independente em Portugal. Queres falar-nos sobre o vosso trabalho?

A filosofia da vida independente vem revolucionar a maneira como se lida com a deficiência, pois há vários modelos da deficiência e o mais comum é o modelo médico. Que pressupõe que estas pessoas “têm de ser curadas”, e até haver uma cura, não há nada a fazer. As pessoas são postas num hospital ou num lar, à espera que aconteça algo, que não vai acontecer. Pronto. E a esperança destas pessoas está apenas ligada à ciência e aos laboratórios. Quando, na realidade, os processos de descoberta e de evolução científica demoram, às vezes, mais do que uma geração. Ou várias gerações. E não podemos deixar morrer gerações, à espera de algo que pode ou não acontecer. Então, houve a necessidade de se criar o modelo social, que diz que somos todos diversos funcionalmente e que as sociedades é que não estão adaptadas para toda a gente. Nascemos ou adquirimos esta ou aquela doença, e vamos provavelmente, morrer assim. Mas queremos viver a melhor vida possível com a nossa realidade, no presente. Sabemos perfeitamente que vamos sempre precisar de uma segunda pessoa para concretizar aquilo que queremos. Isto da vida independente não é nada mais, nada menos, do que fazermos aquilo que nós quisermos, tendo controlo total da nossa vida, das nossas opções. Com a ajuda de uma segunda pessoa.

No teu caso a Ana, a tua perna metade, como lhe chamas?

A minha perna metade (sorri) é como ter uma muleta, estás a ver? A muleta está lá disponível para eu poder fazer aquilo que eu quiser. A vida independente já é uma realidade nalguns países na Europa. Nomeadamente na Suécia, onde estão super avançados, e onde ter um assistente pessoal é super banal. Em Portugal, até há muito pouco tempo, nunca se tinha falado na hipótese de sermos nós a controlar a nossa vida. Há uma frase emblemática neste movimento que é “Nada sobre nós, sem nós”. É muito isso: é trazermo-nos como parte activa deste processo todo. Uma coisa que é muito comum ainda nas associações e instituições de pessoas com deficiência, é que a maioria delas são geridas por familiares, por cuidadores e por pessoas que não têm deficiência. E temos de alterar isso, porque são essas pessoas que estão a decidir e a lutar por coisas que nós podemos lutar. Temos uma voz e queremos muito ser activos e fazer acontecer, e não ir por aquele lado da solidariedade, de pedinchar, entendes?

Entendo, claro. É um direito que nos assiste enquanto seres humanos.

Tem a ver com direitos humanos, é isso mesmo. Os direitos humanos não são solidariedade. Está na constituição, está na lei. E nós trabalhamos para garantir que estes direitos humanos são cumpridos. Acho que é essa a nossa principal função, para que mais pessoas tenham estes direitos. Porque, por exemplo, em Lisboa, neste momento, somos apenas, salvo erro, menos de 50 pessoas a usufruir de assistência pessoal, paga pelo Estado. E isso é muito pouco.

Um tema que é particularmente sensível e que continua um tabu para as pessoas em geral é o amor, a paixão, a sexualidade. Muitas pessoas com diversidade funcional encontram-se dependentes da ajuda de outras para exercer a sua sexualidade. Em Espanha sei que há assistentes sexuais, mas não sei se esse serviço existe em Portugal, creio que ainda não.

Oficialmente não.

Queres falar um pouco sobre isso?

Olha, ainda no outro dia falei disso, ou ouvi falar disso, que tem a ver com o papel do assistente sexual. Qual é o papel do assistente sexual? Isso também é um tabu. As pessoas pensam que um assistente sexual é quase como um prostituto ou uma prostituta e não tem nada a ver uma coisa com a outra. Portanto, na sua génese não há sexo entre a pessoa com deficiência e o assistente. O objectivo do assistente é…por exemplo, uma pessoa com muito pouca mobilidade e que tenha muita dificuldade em ter prazer sexual com ela própria – masturbação, o ou a assistente sexual ajuda nesse processo, mas é a mão da pessoa com deficiência que faz essa exploração, com a força da mão do/da assistente. Não é uma mão qualquer em cima do teu corpo, é a tua própria mão, onde tu quiseres, como tu quiseres, mas com o auxílio de uma segunda pessoa. Depois ainda há outro tipo de assistência, necessária numa relação sexual, onde já estão envolvidas duas ou mais pessoas. Imagina que uma dessas pessoas tem dificuldade em fazer o movimento necessário para a relação acontecer – o assistente sexual poderá auxiliar nisso. Poderá estar na relação, mas nunca activamente. Portanto, está lá, mas apenas para auxiliar na realização da mesma. Outra situação, por exemplo, é uma relação sexual entre duas pessoas com deficiência.

Sim, sim. Eu conheço um casal assim. Têm dois assistentes, um para cada um deles.

Lá está. Têm? A sério?

Sim, vêm de Espanha, precisamente.

Fantástico. Que bom para eles. E depois há aqui uma outra situação, que ainda não está muito bem delimitada. Por exemplo, a Ana não é assistente sexual, é pessoal, mas até que ponto eu não poderia pedir à Ana que me ajudasse a pôr uma lingerie mais sensual? Ou, imaginando que eu não preciso de ajuda para o acto em si, mas preciso ajuda para me limpar. É um assistente pessoal ou é um assistente sexual? Ainda há coisas não estão muito bem definidas. Porque no fundo as tarefas que eu mencionei já não fazem parte do acto em si, são coisas extras ou posteriores.

Mas é importante que se criem condições em Portugal para formar esses assistentes. A sexualidade é um direito.

Aos 17 anos fui a uma conferência sobre sexualidade na deficiência e foram mencionados vários exemplos de progenitores que masturbavam os filhos. Isto é uma coisa completamente impensável! Por vários motivos lógicos, emocionais, de privacidade e dignidade humana. E isto acontece em Portugal, mais no interior, onde os pais acabam por dar este prazer sexual aos filhos… É algo sobre o qual o Estado devia ser responsabilizado. A sexualidade é um direito humano, logo o Estado tem de dar resposta a este tipo de casos. Obviamente no que toca a encontrar um parceiro sexual, estamos, teoricamente, muito teoricamente, em pé de igualdade. Visto que todos nós passamos por isso.

Quando falamos em sexualidade, falamos também da relação com o nosso corpo e é uma coisa por que toda a gente passa. Toda a gente tem de encarar isto como uma realidade. Faz parte da nossa vida, de todos nós.

Mas eu estou confiante que mais dia menos dia também haverá assistentes sexuais em Portugal.

Para terminar esta conversa, gostava que desenvolvesses a ideia que deixaste expressa no teu blogue e que diz: “Quero viver num mundo onde todos os Dom Quixotes têm lugar seguro para viver as suas aventuras de cavalaria e enfrentar todos os seus monstros e gigantes.”

Dou muito valor à saúde mental, para mim é das coisas mais importantes na vida. Porque…ok, eu tenho uma deficiência, é o que é, não há volta a dar, nem há muito mais para explorar, digamos assim. Mas existem todos os desafios que passam por “viver com a deficiência” e “viver num mundo que ainda não está preparado para viver com a deficiência”. E além disso, como é que eu hei de explicar… venho de uma família toda ela bastante emocional, digamos assim…e também há historial de doenças psicológicas na minha família – eu própria tenho depressão crónica há cerca de 15 anos – tenho ansiedade, sou obsessiva e compulsiva, mas para mim tudo isto é muito natural. Sou uma pessoa que fala abertamente sobre tudo. Essa frase que eu escrevi vem da minha necessidade de querer falar sobre isto tudo, sem ter vergonha, sem ter medo. E por um lado também gostava de ser compreendida, sabes? Porque, na verdade, quantos de nós não enfrentamos demónios e monstros? Todos nós temos desafios ao longo da nossa vida e é super natural a nossa mente levar-nos a sítios estranhos. E eu sinto muito essa necessidade de falar com as pessoas e tocar em assuntos mais “chatos”. E as pessoas não gostam de falar de problemas, nem sempre gostam de pôr a cabeça a funcionar e eu não sou assim. Eu gosto de falar sobre as coisas, gosto de tocar nas feridas e tenho um humor, muito negro e sarcástico, “eu vou falar sobre aquilo que tu não queres falar”. Gostava de sentir mais abertura por parte das pessoas para poder falar e dialogar sobre isso, sobre monstros e gigantes. Eu acho que é muito por aí. Pelo menos eu espero contribuir com aquilo que eu faço na vida e com o meu blog.

11 Mar 2021

Extorsões online | Desmanteladas redes de conversa nua e enjo kosai

Numa operação conjunta com as autoridades de Hong Kong e do Interior da China denominada “Biombo do Céu”, a PJ desmantelou três redes criminosas com ligações a casos de extorsão através de conversa nua online e de enjo kosai. A maioria das vítimas é de Macau e Hong Kong. Os casos de enjo kosai envolveram 2,8 milhões de dólares de Hong Kong. Foram detidas 11 pessoas

 

A Polícia Judiciária (PJ) anunciou ontem o desmantelamento de três redes criminosas, dedicadas à extorsão online através de conversa nua e à prática de enjo kosai, uma prática oriunda do Japão, comumente associada à prestação de serviços de “companhia com benefícios” em troca de dinheiro, por parte de estudantes do ensino secundário. No total, a operação resultou na detenção de 11 pessoas, nenhuma delas em Macau.

Sublinhando que, desde o início da pandemia, o número de vítimas relacionadas com estes casos tem vindo a registar uma subida exponencial em Macau e Hong Kong, o porta-voz da PJ revelou que, na origem da descoberta, esteve a criação de uma equipa de investigação dedicada, que conta com a ajuda das autoridades do território vizinho.

Após uma investigação mais aprofundada, o grupo de trabalho concluiu que a origem, tanto dos meios usados para comunicar, como das contas bancárias para as quais eram enviados os montantes das extorsões eram provenientes da China e de Hong Kong. A partir daí, foi solicitada a cooperação das autoridades do Interior e, sob a orientação do Ministério de Segurança de Estado da China e iniciada a chamada operação “Biombo do Céu”.

O primeiro caso foi descoberto em Novembro de 2020 na província de Henan, onde um homem de 35 anos foi detido por suspeita de ter extorquido 17 pessoas através de conversa nua online. Segundo a PJ, as vítimas são oriundas de Macau, Hong Kong e do Interior da China, tendo sido registados prejuízos de entre os 1.000 e os 100.000 renminbis.

A segunda rede foi desmantelada em Jiangxi no mês seguinte. Desta feita foram detidas cinco pessoas de nacionalidade chinesa, também elas suspeitas de extorsão, com recurso a conversa nua online. Entre as vítimas, revelou a polícia, estará pelo menos um residente de Macau lesado em mais de 6.000 renminbis. Até Julho, a rede obteve lucros de 100.000 renminbis.

Por fim, a terceira rede criminosa foi desmontada em Hong Kong e envolveu 11 casos relacionados com a prática de enjo kosai. Segundo a PJ, foram detidas cinco pessoas suspeitas de terem ligações com a prática deste tipo de crimes de “companhia com benefícios” perpretados por menores. No total, os 11 casos de enjo kosai registados no território vizinho envolveram movimentações de 2,8 milhões de dólares de Hong Kong.

Tendência crescente

O modo de operar não é não novo. Durante a conferência de imprensa, o porta-voz da PJ recordou que, na maioria das vezes, as vítimas destes casos são homens seduzidos por filmes eróticos gratuitos, levados a descarregar aplicações como o WhatsApp ou o WeChat para interagir com alguém do outro lado. No caso da conversa nua a vítima acaba normalmente por ser chantageada com a divulgação de vídeos ou dados pessoais pelos seus contactos. Já para o enjo kosai, é feito um convite para participar, explicou a PJ.

Recorde-se que no relatório sobre a criminalidade referente a 2020 divulgado pelo gabinete do secretário para a Segurança, Wong Sio Chak, os casos de extorsão a pretexto de conversa nua mostraram um tendência crescente. Desta feita, dos 94 casos de extorsão registados em 2020, mais 25 do que em 2019, 68 tiveram na “conversa nua” a base para a prática do crime. Em 2019 houve apenas seis casos desta natureza.

11 Mar 2021

Construção civil | FAOM reúne com Governo. Apenas 79 desempregados contratados 

Os deputados ligados à Federação das Associações dos Operários de Macau reuniram ontem com a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais a propósito dos trabalhadores da construção civil sem emprego. Governo diz que, dos 465 trabalhadores, apenas 79 foram contratados

 

O desemprego que persiste no sector da construção civil levou os deputados Ella Lei, Leong Sun Iok, Lam Lon Wai e Lei Chan U, da Federação das Associações dos Operários de Macau (FAOM), a reunir com a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL), a fim de analisar a situação de 465 residentes desempregados.

A DSAL apontou, em comunicado, que tem vindo a acompanhar estes casos e que, desse grupo, apenas 79 foram contratados, enquanto que 194 aceitaram realizar entrevistas de emprego. Do total de 465 desempregados, 400 pediram emprego nas áreas de auxiliar da construção civil, pintor, electricista, carpinteiro de cofragem e técnico de gesso cartonado, entre outras, representando cerca de 85 por cento do total.

A DSAL adiantou também que 115 candidatos não foram contratados por não terem sido aprovados no teste de técnicas ou por terem desistido. Além disso, 116 não realizaram as entrevistas de emprego por se terem recusado a fazê-lo, por falta de comparência, impossibilidade de contacto ou por não terem sido escolhidos pelo empregador.

A DSAL afirma contactar os residentes desempregados tendo em vista o calendário das obras. Até Setembro compareceram em entrevistas de emprego um total de 298 pessoas, tendo sido contratadas 159, o que constitui uma taxa de sucesso de 53 por cento. Esta semana foram marcadas entrevistas para 81 candidatos, envolvendo sete profissões e 53 vagas de emprego.

Restos para TNR

A deputada Ella Lei declarou, à margem a reunião, que a FAOM tem recebido várias queixas dos trabalhadores. Estes dizem ter sido despedidos com a justificação de que as obras terminaram, no entanto, “os trabalhadores descobriram que continuam a existir trabalhos para os trabalhadores não residentes (TNR)”.

Ella Lei exigiu, na reunião com a DSAL, a prioridade ao emprego para residentes, sobretudo na construção civil, sector com maior índice de desemprego. A deputada pediu também um melhor mecanismo de coordenação para a substituição dos TNR, bem como a implementação de normas que obriguem à prioridade da contratação de locais por parte das obras públicas. Foi também pedido um maior combate aos trabalhadores ilegais.

A representante da FAOM chamou ainda a atenção para a existência de trabalhadores em regime freelancer. “Isso faz com que os TNR trabalhem em mais do que um estaleiro e quando uma obra acaba continuam a trabalhar noutros sítios. Mas os locais não têm esta oportunidade”, disse.

Leong Sun Iok alertou também para a necessidade de organizar mais cursos de formação, uma vez que este ano “há muita procura na área da construção modular”. “As vagas são limitadas e espero que o Governo possa fazer um planeamento antecipado”, acrescentou.

11 Mar 2021

Covid-19 | Ho Iat Seng diz que “bom trabalho de Macau” merece vinda de turistas

Ho Iat Seng afirmou que o esforço e o desempenho de Macau no combate à pandemia é um factor de tranquilidade para a vinda de mais turistas chineses para o território. Membros da delegação da RAEM na Assembleia Popular Nacional pediram o retorno dos pedidos online de vistos individuais

 

O Chefe do Executivo disse, em entrevista a uma agência estatal chinesa, que o “bom trabalho na prevenção da pandemia” no território justifica a vinda de turistas da China a Macau.

“Porque fizemos um bom trabalho de prevenção da pandemia, os amigos da China continental podem vir a Macau [para fazer turismo]”, afirmou Ho Iat Seng, numa entrevista em vídeo publicada ontem na China News Service, a segunda maior agência de notícias estatal da China.

Ho Iat Seng reforçou que, tal como Macau, o sucesso na prevenção da pandemia por parte da China continental permite que os residentes do território possam deslocar-se ao país.

Após o reinício, em 23 de Setembro, da emissão dos vistos individuais e de grupo da China continental para o território, suspensos desde o início da pandemia de covid-19, o número de visitantes tem subido gradualmente, ainda que de forma lenta e muito abaixo de uma média de cerca de três milhões de visitantes registada por mês em 2019.

Excursões em vista

Um dia antes das declarações de Ho Iat Seng, no âmbito da Assembleia Popular Nacional, 12 delegados de Macau, propuseram e apelaram, segundo o jornal Ou Mun, para o reforço de medidas que permitam que mais turistas chineses possam visitar Macau. Segundo os deputados, Macau alcançou resultados notáveis na prevenção e controlo da epidemia e, por isso, uma boa base para expandir ainda mais o número de turistas.

Por essa razão, os responsáveis pedem o restabelecimento, o mais rápido possível, das “disposições convenientes para que os residentes do interior da China se possam candidatar ‘online’ aos vistos de Visita Individual de Macau e para a aplicação de autosserviço e emissão imediata de vistos no local junto das autoridades de imigração”, segundo o jornal em língua chinesa.

Pedem ainda a abertura de excursões de grupo entre o interior da China e Macau e que as autoridades chinesas apoiem na divulgação de Macau como destino de viagem mais seguro para os turistas do continente.

11 Mar 2021

Empregadas Domésticas | Agnes Lam quer correcção de “erros” legislativos

Após a alteração da lei de contratação de não residentes, Agnes Lam diz que os salários das empregadas domésticas subiram para 8 mil patacas e que as famílias perderam capacidade para as contratar

 

A deputada Agnes Lam quer debater na Assembleia Legislativa as novas alterações à “Lei da Contratação de Trabalhadores Não Residentes”, para permitir que TNR desempregados em Macau possam ser contratados.

A proposta é apresentada depois de em Junho do ano passado os deputados terem votado por unanimidade, entre os 30 dos 33 que exerceram este direito, proibir a contratação de trabalhadores não residentes que ficassem sem contrato na RAEM.

Nos moldes das alterações à lei a contratação só pode ser feita se os trabalhadores que a lei especifica serem “não especializados” deixarem Macau. No entanto, com as restrições impostas pela pandemia e o encerramento das fronteiras a estrangeiros, passou a ser impossível recorrer a mão-de-obra oriunda as Filipinas e Indonésia, por exemplo.

Face às alterações, Agnes Lam mostra-se preocupada com o aumento dos salários das empregadas domésticas, que nas condições actuais praticamente só podem ser contratadas no Interior. Segundo a legisladora o vencimento mensal passou para 8 mil patacas, quando anteriormente a DSAL aprovava salários de 3.500 patacas, acrescido de subsídio de alojamento.

“Mesmo com as autoridades a aumentar as quotas para a importação de não residentes na área das empregadas domésticas, entre Janeiro e Novembro do ano passado apenas foram contratadas 50 pessoas”, afirma Agnes Lam, com base nas estatísticas oficiais. “Existe o entendimento de que o salário mensal das ajudantes domésticas quase duplicou e é actualmente de, pelo menos, 8 mil patacas. Também não há actualmente empregadas domésticas a procurar trabalho nas agências de emprego. Ao mesmo tempo, as famílias de Macau não têm rendimentos para pagar estas empregadas domésticas”, é acrescentado.

Neste novo panorama, o número de empregadas domésticas teve uma quebra de 1.240 pessoas, de 30.923 para 29.683 no ano passado. Um valor que contrasta com o aumento anual de 1.600, entre 2017 e 2019.

A deputada sublinha ainda que como os casais de Macau têm uma vida profissional activa, as empregadas domésticas são fundamentais e é preciso debater para ser atingido um consenso capaz de ultrapassar a situação. Agnes Lam diz que há pelo menos 1.000 famílias afectadas pelas restrições.

Quanto à votação do Verão passado, Lam justifica que as medidas foram aplicadas para combater a imigração ilegal e que na altura os deputados acreditavam estar no “último quilómetro” da pandemia. “Contudo, mais de meio anos depois, a situação de pandemia no mundo continua, o que faz com que seja muito difícil permitir a entrada de estrangeiros”, lamenta.

11 Mar 2021

Fukushima | As dúvidas e os problemas 10 anos depois do acidente nuclear

Faz hoje 10 anos que o Japão enfrentou um grave acidente nuclear na cidade de Fukushima depois de um terramoto seguido de tsunami. O país encerrou entretanto muitas centrais nucleares mas depara-se com um dilema, dadas as responsabilidades que tem perante o Acordo de Paris. Há problemas que persistem enquanto a população continua a recusar a energia nuclear. Patrícia Neves, que esteve em Fukushima nessa altura e que escreveu um livro sobre o tema, recorda a experiência

 

Há 10 anos o Japão voltou a enfrentar o fantasma do nuclear depois dos acontecimentos da II Guerra Mundial, com os bombardeamentos em Hiroshima e Nagasaki. A 11 de Março de 2011, depois de um terramoto e de um tsunami, o país não estava preparado para um terceiro embate: um acidente na central nuclear de Dai-ichi, em Fukushima.
Patrícia Neves, à data jornalista da agência Lusa, foi destacada para fazer a cobertura dos desastres naturais e acabou por viver de perto o incidente nuclear. Dessa experiência resultou o livro “Império Nuclear – A era pós-Fukushima”, publicado em 2014, e um documentário.

Patrícia Neves só conseguiu voar para o Japão no dia 12. Quando chegou ao aeroporto de Tóquio, os sinais de caos foram imediatos. “Havia muitas filas de trânsito, continuavam a fazer-se sentir réplicas do terramoto a toda a hora”, recordou ao HM.

O objectivo era chegar a uma das zonas do país mais afectadas pelo terramoto, Tohoku, no nordeste do Japão. Patricia Neves viajou com uma equipa de jornalistas portugueses por questões de segurança. “Havia muitas pessoas desaparecidas na região e era muito difícil lá chegar. Numa situação normal essa viagem demoraria entre três a quatro horas, mas demorou cerca de 12.”

As estradas estavam cortadas, faltava o combustível em todo o lado. Foi nesse momento que começam as explosões na central nuclear de Fukushima. “Numa das explosões eu estava a atravessar a província de Fukushima. Quando chegamos à região [Tohoku] deparamo-nos com a devastação que o tsunami causou, uma coisa indescritível, um cenário de guerra. Depois havia a questão do acidente nuclear e das informações contraditórias que nos chegaram de várias fontes, das autoridades e dos media estrangeiros.”

O medo das radiações fez com que muitos repórteres tenham deixado o país nessa altura, mas Patrícia Neves decidiu ficar mais uns dias. “Impressionou-me o impacto do tsunami na vida das pessoas, mas também o acidente nuclear, algo que nunca tinha vivido e que foi muito forte a nível profissional e pessoal.”

A ex-jornalista destaca a “resiliência” com que os japoneses voltaram a lidar com um incidente nuclear. “A forma como o povo japonês reagia ao desastre também me sensibilizou, porque tem esta forma muito particular de reagir de forma muito ordeira a catástrofes.”

O incidente nuclear obrigou à deslocação de milhares de pessoas para outras zonas do Japão, tendo muitas famílias sofrido situações de discriminação. “Houve casos de bullying nas escolas, recusas de médicos em recebê-los. A população temia que a radiação fosse contagiosa, o que revelava que havia muito pouca informação sobre o nuclear. Fukushima abriu os olhos da população para o perigo do nuclear”, descreveu Patrícia Neves.

O medo que persiste

Aquele que foi o maior acidente nuclear da história desde Chernobyl, na Ucrânia, causou mais de 20 mil mortes e desaparecimentos. Ouvidos pela Reuters, os moradores da cidade de Iwaki, a 30 quilómetros do epicentro do tsunami, recordam, dez anos depois, os momentos em que a mãe natureza lhes pregou uma partida.

“Depois do terramoto e do tsunami houve muitos projectos de construção e eu fiquei ocupado com trabalho. Mas recentemente as coisas abrandaram um pouco. A minha vida está mais parecida com aquilo que era antes do desastre”, confessou Natsuki Suzuki, trabalhador da construção civil.

Persiste ainda um enorme medo em relação às radiações. Hiroharu Haga, vendedor de peixe de 49 anos de idade, disse que continua “preocupado com o que vai acontecer à indústria do peixe nos próximos dez anos”. “Há algum debate sobre o lançamento da água radioactiva tratada da central nuclear para o mar. Estou preocupado com o que vai acontecer depois disso. Há incertezas sobre o futuro.”

As preocupações não são em vão. Segundo o jornal Nikkei Asia, 140 toneladas de água são contaminadas diariamente, em média, e que é usada para remover substâncias radioactivas que permanecem na zona. Esta água é depois armazenada em tanques e já existem mais de mil, cheios a 90 por cento. A capacidade máxima de armazenamento destes tanques deverá ser atingida no Outono de 2022, altura em que a água terá de ser lançada ao mar.

Por entre os receios, há quem nunca tenha recuperado do choque, como é o caso de Yuko Yoshida, de 75 anos. “Não recuperamos de todo. Há ainda terras vazias, e não há nada que os turistas possam ver na prefeitura de Fukushima, apenas algumas pessoas regressaram”, contou.

Para Katsumi Teshima, empregada no sector de retalho, com 53 anos, é importante mostrar optimismo. “Na altura muitas pessoas estavam deprimidas e tinham caras tristes, mas penso que é importante mostrar que os nossos sorrisos estão a voltar e que isso não acontece apenas por causa dos Jogos Olímpicos. É importante mostrar às pessoas que os nossos sorrisos estão a voltar ao que eram antes.”

300 milhões para Tohoku

Mesmo com um terramoto e um tsunami, o acidente nuclear aconteceu exclusivamente por razões humanas, como disse à Reuters Kiyoshi Kurosawa, responsável pela investigação que concluiu que o incidente foi “totalmente feito pelo homem”. “Fukushima ficou marcado na história da energia nuclear”, acrescentou.

Para reerguer Tohoku dos destroços, o Governo japonês gastou 300 mil milhões de dólares americanos (32.1 triliões de yen), mas há áreas em Fukushima que permanecem por recuperar, sem esquecer que hoje a população está mais desperta para os perigos da produção deste tipo de energia.

Um inquérito divulgado pelo canal de televisão NHK revela que 85 por cento da população está preocupada com a energia nuclear. Outro inquérito, publicado pelo jornal February Asahi, conclui que 53 por cento dos inquiridos opõem-se à re-activação dos reactores, comparando com os 32 por cento que estão a favor.

“Passaram dez anos e algumas pessoas esqueceram. O zelo desapareceu. As reactivações não estão a acontecer, então as pessoas pensam que, se esperarem, a energia nuclear vai desaparecer”, declarou Yu Uchiyama, professor de ciência política da Universidade de Tóquio.

Patrícia Neves destaca o facto de hoje a energia nuclear representar apenas seis por cento do total de produção de energia do país, quando antes de 11 de Março de 2011 esse peso era de 30 por cento. As autoridades japonesas enfrentam, no entanto, um dilema, pois ao ratificar o Acordo de Paris, devem ter fontes renováveis e sustentáveis de energia. Mas o nuclear, uma energia limpa e barata, acarreta riscos.

“O que os especialistas dizem é que para [o país] cumprir com as suas obrigações há que voltar a apostar no nuclear e a colocar em funcionamento os reactores. A população continua a opor-se e o Japão está perante este dilema. Existe o problema da radiação e do armazenamento do lixo radioactivo. A situação da central de Fukushima está longe de estar resolvida e há ainda muito a fazer”, apontou.

Zero nuclear em 2069

Actualmente só nove dos 33 reactores nucleares obtiveram licença para voltar a operar de acordo com as regras de segurança pós-incidente, mas apenas quatro estão de facto a funcionar, e nenhum deles em Fukushima.  Dados do primeiro semestre de 2020 revelam que a energia nuclear representa apenas seis por cento do total das fontes de energia. Um conselheiro do Governo para as políticas energéticas, Takeo Kikkawa, lembrou à Reuters que o objectivo é que existam apenas 18 reactores em 2050 e zero em 2069, conforme foi anunciado pelas autoridades japonesas em Outubro do ano passado. “O Japão é um país pobre em recursos e não podemos abandonar de repente a opção do nuclear. Mas, na realidade, o futuro da energia nuclear é sombrio.”

Numa reportagem intitulada “10 anos de Fukushima: problemas tóxicos, poucas soluções”, o jornal Nikkei Asia relata como continuam a ser gastos milhões em matérias de segurança e de descontaminação de solos, e de como persistem as preocupações de moradores e dos que trabalham a terra.

Shinjiro Koizumi, ministro do Ambiente, declarou que vai levar tempo até que o país fique totalmente livre da energia nuclear. Isto porque o actual primeiro-ministro japonês, Yoshihide Suga, “deixou claro que as energias renováveis devem ser uma fonte primária de energia e que deve ser maximizada a sua implementação”. Depois, “deve reduzir-se a dependência da central nuclear o máximo possível”, frisou o ministro.

11 Mar 2021