Kung Fu | Clube em Portugal celebra 22 anos com lançamento de livro

O Clube de Kung Fu Hong Long – Escola de Artes Marciais Chinesas, situado em Oeiras, ensina há 22 anos uma arte que prepara corpo e mente para a competição e para a vida. Mário Lameiras, que treinou cinco anos com um mestre de Macau, é hoje carinhosamente apelidado de “Lam Sifu” e ensina miúdos e graúdos. No clube praticam-se também as danças do leão e dragão

 

Mário Lameiras, “Lam Sifu” para os alunos (Sifu em chinês significa mestre, professor ou pessoa qualificada), está há muitos anos ligado não só às artes marciais chinesas como também à sua cultura. Depois de ter treinado cinco anos com o mestre Yin Chang Li em Macau, Mário Lameiras criou o Clube de Kung Fu Hong Long – Escola de Artes Marciais Chinesas, que há 22 anos existe em Portugal, mais concretamente em Oeiras.

É aí que os alunos treinam o estilo tradicional de Kung Fu de Shaolin do Sul, região chinesa célebre pelos milenares treinos desta arte marcial. O treino pode começar a partir dos sete anos, sendo de “alto rendimento e com exercícios físicos e mentalmente exigentes”.

São ensinadas as técnicas “TaoLu”, que transmitem o espírito marcial ao aluno, ou ainda as técnicas de combate, que incluem defesa pessoal. Os alunos são ainda ensinados a praticar a “Jiao Xu”, ou “Sombra”, uma técnica de combate com adversários imaginários, ou ainda o manuseamento de armas tradicionais chinesas, como é o caso da vara, espada, Kwan Dao e Pu Dao. Não faltam ainda treinos de Chi Kung e Qi Gong, nomeadamente ao nível dos exercícios respiratórios, “com o objectivo de promover a saúde”, lê-se na página oficial do clube.

Em entrevista ao HM, o português Mário Lameiras não esconde o orgulho que sente pelo percurso do clube que ajudou a criar. Sifu Lam foi também o coordenador de material para um álbum fotográfico que recorda os melhores momentos dos 20 anos de existência do clube, que só agora é materializado em livro, após a adiamentos motivados por questões logísticas.

“O clube produziu vários campões nacionais e atletas que representaram o país em competições internacionais. Temos uma vertente cultural com a divulgação das danças do leão e do dragão e já fizemos diversas apresentações em eventos, nomeadamente com a dança do leão que é a nossa especialidade”, contou.

Mário Lameiras confessou ainda que a escola conta actualmente com 80 atletas e formandos, estando “numa fase de expansão”.

O estilo dos “5 Animais”

Mário Lameiras treinou artes marciais na China, mas a sua formação académica de base é na área do Direito. Contudo, o amor pela arte marcial levou-o a outros golpes, nomeadamente com diversas formações em medicina tradicional chinesa. Foi ainda, até 2022, presidente do conselho disciplinar da Federação Portuguesa de Artes Marciais Chinesas, bem como vice-presidente da Federação Portuguesa de Artes Marciais Chinesas entre os anos de 2006 a 2009, de 2012 a 2016 e depois até 2020.

Mário Lameiras recorda os treinos com o mestre Yin Chang Li. “Ele veio para Lisboa de Macau nos anos 70. Emigrou muito cedo de Cantão para Macau. Em 1976, ainda eu era muito jovem, pois estava no liceu, comecei a treinar com ele. Na altura o grupo que o mestre Yin tinha era apenas com jovens chineses. Ele acabou por voltar para Macau nos anos 80.”

“Lam Sifu” treinou ainda segundo o estilo do “Punho dos 5 Animais”, que se inspira “na biomecânica do Leopardo, Tigre, Garça, Serpente e Dragão”, e que em chinês tem como nome “Ng Yin Kuen / Wu Xing Quan”. Datam do século VIII as primeiras práticas deste estilo muito particular de treino.

Trata-se de um estilo ” praticamente desaparecido”, que esteve na base dos treinos feitos nos templos de Shaolin, conhecidos pela dureza e exigência física imputados aos alunos.

“Discute-se muito se terá existido, de facto, este estilo, mas existem provas, nomeadamente escritos de ocidentais que dão conta da sua existência. Conta a lenda que o ‘estilo dos 5 Animais’ era a base de preparação do treino do templo, mas que depois haveria vários estilos de especialização consoante o mestre que ensinava e o aluno que aprendia.”

Mais do que treinar, Mário Lameiras aprendeu com o mestre “uma maneira de estar na vida”. “Era um ensino muito tradicional. Hoje em dia os instrutores de Kung Fu usam estilos mais modernos, ligados ao desporto, mas o ensino dele tinha uma vertente mais filosófica, com ideias muito importantes. O ponto principal é mesmo o aspecto humano e filosófico que esta arte envolve”, frisou.

Altamente defensível

Praticar Kung Fu não diz apenas respeita ao corpo, mas à mente. “Os valores do Kung Fu estão muito ligados a questões como auto-confiança, preparação física, defesa pessoal, um pouco os chavões associados à prática das artes marciais. Mas transmite também uma maneira racional e objectiva de ver a vida, afasta os medos e receios que as pessoas têm e todos esses bloqueios psicológicos.”

“Lam Sifu” dá mesmo o exemplo de alunos que, sendo vítimas de bullying na escola, deixam de o ser. “Não porque comecem a bater em toda a gente, mas porque ganham uma atitude diferente em relação aos outros, deixando de ser vítimas. Essa parte filosófica, aliada aos treinos físicos, é muito importante. Também temos pessoas que apenas nos procuram pela parte física ou para ganhar medalhas, mas o Kung Fu tem mais para oferecer do que o lado desportivo.”

Manuel Garcia, praticante de Kung Fu nesta escola há dois anos, descreve numa nota enviada ao HM a presença dos ensinamentos do mestre Yin Chang Li.

“Já há muitos anos que regressou a Macau, numa época em que as comunicações não eram tão fáceis, perdendo-se a ligação à raiz. No entanto, o clube, composto maioritariamente por portugueses, desenvolve um trabalho contínuo por manter viva esta herança cultural.”

Manuel Garcia destaca também o facto de o Kung Fu, apesar de “estar muitas vezes associado a desportos de combate ou a filmes de acção”, ser um símbolo de “uma cultura imaterial, de transmissão oral, muito importante de preservar”. “Esta associação procura fomentar os valores do Kung Fu tradicional em pleno, transcendendo a vertente marcial”, frisou.

Também “Lam Sifu” defende que deveria haver uma maior preservação desta arte marcial e das histórias que traz consigo, destacando que, na China, é cada vez maior a aceitação social.

“Em 2008 estive um mês na China e verifiquei que há cada vez mais uma aceitação dos valores tradicionais. As artes marciais chinesas são um legado cultural da humanidade que deveria ser preservado pela mais valia que trazem ao ser humano. Felizmente que a China tem aceite com mais facilidade o retorno deste tipo de cultura.”

No Clube de Kung Fu Hong Long há ainda outros treinadores, todos discípulos de Mário Lameiras: Luís Moreira, actual presidente, começou a praticar artes marciais chinesas em 2007, possuindo a graduação de nível seis, ou seja, como aluno avançado, do estilo de Shaolin do sul. É também treinador de Wushu, outra modalidade chinesa de artes marciais.

João Barroso começou os treinos em 2009, também ensina Wushu e é campeão nacional de Wushu Kung Fu, em “Formas de Armas”, distinção obtida em 2012.

O tradicional é bom

No website oficial da escola lê-se uma descrição do projecto em plena consonância com as práticas e ideias mais tradicionais do Kung Fu. “Não aceitamos a figura de Bodhidarma ou Tamo como patrono do Kung Fu. Aliás, até é duvidoso que tal personagem alguma vez tenha praticado artes marciais. E não usamos o nome de Shaolin em vão. A formação dos nossos praticantes inclui a abordagem da verdadeira evolução do Kung Fu, com a ajuda da metodologia científica da disciplina de História.”

O Clube Hong Long disponibiliza “um treino duro que requer muita força de vontade”. “Não se fazem passagens administrativas nem exames pagos. A escola recusa qualquer escala de graduações que não seja o método tradicional das escolas chinesas. Não há cintos às cores, a não ser as faixas com a cor da escola. Os novos alunos entram para o primeiro nível e têm de mostrar empenho e progresso para ascenderem aos níveis imediatos”, é referido. A cerimónia de celebração do aniversário do clube decorreu este domingo em Oeiras.

9 Jul 2024

Daniel Cheng, autor de “How I built an Integrated Resort”: A ausência de um “plano abrangente” para a diversificação

O analista de jogo e antigo executivo do sector dos casinos Daniel Cheng lançou, em Maio, o livro “How I Built an Integrated Resort” [Como Construí um Resort Integrado], um manual de boas práticas para operadores, investidores e académicos. O autor lamenta que o ónus da diversificação económica de Macau esteja nas concessionárias e aponta a falta um “plano abrangente” do Governo para atingir esse objectivo

 

Porque decidiu lançar um livro sobre este tema? Um resort integrado é a resposta para o desenvolvimento futuro na área do turismo e lazer para muitas regiões?

O conceito de resorts integrados ajudou a tornar o jogo em algo mais aceitável em muitas jurisdições, particularmente na Ásia. Especialmente em países e regiões que anteriormente evitavam a legalização dos casinos devido a preocupações sociais e de segurança, e que ultrapassavam os potenciais benefícios económicos. No entanto, muitos dos novos resorts funcionam apenas no nome, não cumprindo os verdadeiros princípios do conceito.

Qual é, então, o resort integrado ideal em termos de confiança dos consumidores e de segmento de mercado?

Há muitos preceitos fundamentais, mas o mais importante é uma visão partilhada que alinhe os objectivos macro do Governo e os objectivos comerciais dos operadores.

Como encara actualmente o mercado de resorts integrados em Macau após as novas licenças de jogo? Quais são as hipóteses de expansão e modernização em relação ao que já existia?

O novo regime de jogo de Macau procura realinhar o desfasamento entre a indústria e a visão do Governo, segundo a qual a “Macau 1.0” era meramente uma legitimação da antiga estrutura de jogo existente antes da liberalização do sector. Embora o valor económico do mercado sofra um golpe, principalmente devido à erradicação do sector dos jogos de fortuna e azar e de todos os seus elementos mais obscuros, o novo regime proporcionará uma estabilidade de longo prazo, mesmo que o sector volte a atingir os níveis de glória que rondavam os 50 mil milhões de dólares no passado.

Acredita na diversificação do segmento não-jogo em Macau?

Acredito, se for orientada pelo mercado. Actualmente, as seis concessionárias estão a investir em activos não relacionados com o jogo de acordo com as directivas da nova lei e não necessariamente com o objectivo principal de gerar receitas não relacionadas com o jogo. Esta situação poderá conduzir a atracções que não correspondem à procura do mercado, levando a que haja um exagero em torno da ideia de Macau ser um grande destino para o segmento não relacionado com o jogo [nas áreas do lazer e entretenimento].

Que diferenças pode apontar entre o modelo de resort integrado de Singapura, como o Marina Bay Sands, e as restantes jurisdições de jogo, tanto na Ásia como nos Estados Unidos?

Se colocarmos Singapura e Macau lado a lado, e aplicarmos a lente de um consumidor, a distinção é clara, na medida em que as duas jurisdições possuem sistemas de “hardware” [infra-estruturas e empreendimentos] e “software” [modelos de negócio, sistemas] muito diferentes. No caso de Singapura, trata-se de um importante centro financeiro internacional e uma porta de entrada com uma população muito maior, e altamente qualificada. Enquanto a economia de Macau continua a depender quase exclusivamente dos casinos, Singapura tem uma economia que assenta numa vasta gama de sectores de actividade. O modelo de resort integrado não existe de forma isolada, mas insere-se neste tecido económico e social mais vasto. Assim, se fosse possível reproduzir o modelo do Marina Bay Sands para o Cotai, este não conseguiria atrair tantos visitantes devido às características subjacentes diferentes, além de que iria continuar a servir principalmente os visitantes do Interior da China. O modelo de resort integrado é uma variante do modelo existente em Las Vegas, onde há uma integração do entretenimento nas instalações do casino a fim de atrair segmentos mais vastos de clientes. O que o Governo de Singapura fez foi elevar o segmento não relacionado com o jogo ao mesmo nível do casino, introduzindo salvaguardas sociais. Embora os operadores de Macau e das Filipinas tenham posteriormente adoptado a designação de “resort integrado”, a verdade é que, nestes casos, são empreendimentos categoricamente diferentes, uma vez que são semelhantes aos resorts existentes em Las Vegas, onde o casino tem maior visibilidade e é o centro das atenções.

Como vê a evolução do comportamento de consumo dos turistas chineses nos próximos anos, à medida que os mercados de jogo asiáticos se desenvolvem?

Dada a enorme dimensão da China, é provável que o seu desenvolvimento económico continue a crescer a partir das áreas metropolitanas durante as próximas décadas. Este crescimento continuará a alimentar a economia de Macau num futuro previsível, dada a sua proximidade com a China, mesmo que a “Macau 2.0” não atinja a visão do Governo de transformar o território num centro mundial de turismo. À medida que os consumidores chineses se vão tornando mais sofisticados, os clientes dos segmentos “premium” e mais experientes passarão a deslocar-se a resorts integrados mais ao estilo de Singapura. Porém, o mercado [de jogo] irá continuar a ser suficientemente grande para sustentar resorts centrados em casinos, como é o caso das Filipinas.

Acredita na diversificação económica de Macau como um todo, com a redução do peso do jogo?

Concordo com a visão, mas tenho uma dupla posição em relação ao seu sucesso.

Porquê?

Há um claro desejo de Pequim manifestado na nova lei e licenças de jogo atribuídas. No entanto, o Governo de Macau não pegou nessa visão e não a articulou num plano abrangente, transferindo para as concessionárias o ónus de apresentação de ideias para atracções não relacionadas com o jogo. Este facto sugere que a missão de criar a “Macau 2.0” não é da responsabilidade de uma única entidade. Para agravar esta falta de responsabilidade exclusiva de uma só entidade, o sistema de “harware” turístico do pequeno enclave é limitado, além de que não há muito que se possa fazer em termos do desenvolvimento de novas atracções turísticas para aumentar o seu lado atractivo.

Qual é o mercado de jogo asiático mais prometedor actualmente, além de Macau? Quer esteja em desenvolvimento, como a Tailândia, quer já esteja a funcionar em pleno.

O Japão e a Tailândia têm ambos um potencial fantástico. No entanto, o seu sucesso depende, em grande medida, do quadro regulamentar e da execução. Já assistimos a alguns erros do Japão e espero que as autoridades tailandesas tenham observado atentamente o desenvolvimento da região nos últimos 20 anos. Se adoptarem as melhores práticas e evitarem os erros do passado, poderão maximizar o seu potencial.

8 Jul 2024

António Lucena de Faria, CEO da Fábrica de Startups | A inovação com o “Pier 25”

A Fábrica de Startups, entidade portuguesa ligada à área do empreendedorismo, acaba de se aliar à Melco para criar um programa destinado a jovens locais que queiram seguir a via empresarial. O CEO da Fábrica de Startups, António Lucena de Faria, revela que a iniciativa “Pier25” está também ligada à renovação das Pontes-Cais 23 e 25, no Porto Interior

 

Como surgiu a oportunidade de a Fábrica de Startups se aliar à operadora de jogo Melco na criação deste programa de empreendedorismo?

Tudo surgiu com base numa relação construída ao longo dos últimos anos com o ecossistema empreendedor da RAEM. Temos vindo a desenvolver programas de intercâmbio com empreendedores locais e a organizar programas de aceleração que fomentam a inovação e o crescimento das startups na região. Quando a Melco nos lançou o desafio de revitalizar as Pontes-cais nº23 e 25, no Porto Interior, reconhecemos de imediato o potencial desta iniciativa. O desafio visava enriquecer e diversificar o turismo comunitário, marítimo e sustentável em Macau. Foi com grande entusiasmo que concebemos um programa diferenciador que não só transformará estes edifícios em pólos de inovação tecnológica que também fortalecerá um dos sectores mais vitais para a região, o turismo. Esta parceria é, assim, um reflexo do compromisso da Melco e da Fábrica de Startups em revitalizar as zonas históricas de Macau e diversificar a oferta turística. A nossa experiência, acumulada ao longo de mais de 12 anos a dinamizar ecossistemas inovadores com um foco especial no turismo, posiciona-nos como o parceiro ideal para esta missão. Juntos, pretendemos impulsionar a economia local e transformar as startups em verdadeiros agentes de inovação.

O que o “Pier 25” traz de inovador ao nível do desenvolvimento de startups e empreendedorismo jovem?

O “Pier 25” distingue-se pelo seu carácter inovador no desenvolvimento de startups e empreendedorismo, oferecendo muito mais do que um simples programa de aceleração. Baseia-se no conceito de inovação aberta, que analisa os desafios específicos do sector e procura soluções concretas para os mesmos, com o apoio de grandes empresas, como é o caso da Melco Resorts & Entertainment. Inicialmente, organizámos um ciclo de “think tanks” internacionais para promover a reflexão e análise das questões fundamentais do sector. Reunimos especialistas de várias partes do mundo, incluindo Portugal, Brasil, Cabo Verde, Angola, Macau e diversas cidades da Grande Baía, com o objectivo de mapear conjuntamente os principais desafios.

Quais?

Refiro-me, por exemplo, à gestão do impacto ambiental decorrente do turismo massificado, a sobrecarga de infra-estruturas, a protecção e valorização do património cultural ou a gestão da capacidade para evitar a superlotação de atrações turísticas, entre outros. Com esta base, avançámos para a fase de candidaturas de startups capazes de endereçar estes desafios. Os projectos com maior potencial serão convidados a participar numa série de bootcamps (campos de treino), onde terão a oportunidade de validar os seus modelos de negócio e adaptar as suas soluções à realidade local. Desta forma, o “Pier 25” cumpre a nossa missão de ajudar pessoas a serem empreendedores de sucesso, reduzindo o risco associado ao lançamento de novos produtos ou serviços. As candidaturas terminam já no dia 14 de Junho.

Como encara o actual panorama empresarial de Macau à luz dos projectos de integração regional com Hengqin e a Grande Baía?

O panorama empresarial da RAEM está a ser significativamente moldado pelos projectos de integração regional com Hengqin e a Grande Baía. Esta integração oferece uma oportunidade única para Macau diversificar a sua economia, tradicionalmente dominada pelo sector do jogo, e abrir novos horizontes de desenvolvimento empresarial. Com a ligação a Hengqin, Macau beneficia de um acesso directo a uma zona que está a tornar-se um centro de inovação e desenvolvimento tecnológico, além de proporcionar acesso a recursos financeiros e humanos de excelência. Esta proximidade facilita a colaboração entre empresas, universidades e centros de pesquisa, potenciando a transferência de conhecimento.

A Fábrica de Startups, sediada em Portugal, proporciona também uma ponte para a lusofonia neste contexto empresarial?

A equipa da Fábrica de Startups tem tido o privilégio de poder integrar diversas delegações de países oficial de língua portuguesa e assistir de perto, ano após ano, ao crescimento e fortalecimento desta ligação. Este é um momento crucial para as empresas locais aproveitarem estas oportunidades e se prepararem para um futuro de crescimento económico. Além disso, Macau representa uma plataforma estratégica para empresas dos Países de Língua Portuguesa (PLP) que procuram expandir-se para os mercados asiáticos. A posição geográfica privilegiada de Macau, proporciona uma ponte eficaz para a entrada e crescimento nos mercados asiáticos.

Na sua óptica, o que impede Macau de ter mais jovens empreendedores?

Macau tem enorme potencial para se tornar um centro de empreendedorismo, e estamos a ver progressos significativos na criação de um ambiente mais favorável para jovens empreendedores. Temos assistido a um interesse crescente entre os jovens em explorar caminhos inovadores e criativos. Programas nas universidades estão a surgir para promover esta mentalidade empreendedora, inspirando os jovens a pensar além das carreiras tradicionais, bem como as infra-estruturas de apoio ao empreendedorismo com novos espaços de incubação e aceleração a ser criados e a ligar Macau a Hengqin. Destacaria ainda a conectividade internacional, que está a evoluir de forma notável. As parcerias e colaborações com ecossistemas empreendedores na Grande Baía estão a tornar-se mais frequentes. O programa Pier 25 é um excelente exemplo desta evolução positiva. Estamos a trazer para Macau uma oportunidade única de acesso a novos mercados e de promoção da inovação. Este programa facilita a troca de conhecimentos entre startups locais e internacionais, reforçando a posição de Macau como um polo de inovação e empreendedorismo.

 

“Pitch” com melhores projectos em Setembro

Hoje termina o processo de candidaturas ao “Pier 25” e as próximas fases são o anúncio, em Setembro, dos projectos vencedores que, e depois a procura de investidores no momento do “pitch”, ou seja, a apresentação de uma ideia com o intuito de a vender. Segundo um comunicado divulgado pela Melco, o programa irá disponibilizar prémios para os projectos de startups vencedores no total de 300 mil patacas, bem como a possibilidade de desenvolver um projecto-piloto com a operadora de jogo.

Entre os dias 10 de Julho e 1 de Agosto decorrem as sessões do “Pier 25” com dez startups seleccionadas, com sessões remotas semanais, criadas para “capacitar os empreendedores na área do ‘go to market’ [adaptação às características do mercado], desenvolvimento de projectos-piloto e modelos de negócio, além de oferecer mentoria especializada e oportunidades de criar uma rede de contactos”. No final desta fase de “bootcamp”, ou trabalho de campo, serão escolhidas as cinco melhores startups que terão, assim, acesso ao chamado “Pitch Day”, quando o projecto será apresentado com o intuito de atrair potenciais investidores.

Os organizadores pretendem atrair startups tecnológicas de turismo do Brasil, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Portugal, Macau, Hong Kong e Shenzhen com foco em sustentabilidade, impacto social e mobilidade. “Valorizam-se projectos que incorporem tecnologias como Inteligência Artificial, Realidade Aumentada, Internet das Coisas, Blockchain”, destaca o mesmo comunicado.

14 Jun 2024

Corrupção | Registado grande número de casos ligados a empresas de segurança

O relatório de 2023 do Comissariado contra a Corrupção, divulgado ontem, dá conta da predominância de casos de corrupção envolvendo empresas que prestam serviços de segurança. Um dos casos diz respeito a burlas e falsificação de documentos que levaram os Serviços de Saúde e Polícia de Segurança Pública a prejuízos de cerca de três milhões de patacas

 

O Comissariado contra a Corrupção (CCAC) divulgou ontem o relatório anual de trabalho relativo ao ano de 2023 que destaca o grande número de casos a envolver empresas prestadoras de serviços de segurança no território.

No documento, entregue ontem ao Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, lê-se que “vários casos que envolveram diversas sociedades prestadoras de serviços de segurança, ocupando estes uma percentagem relativamente alta”.

Há vários casos que envolvem mesmo a prática de crime, nomeadamente “burla, falsificação de documentos para obtenção fraudulenta de quotas para trabalhadores não residentes (TNR) ou corrupção na gestão interna no sector privado”.

O CCAC dá ainda conta que “foram detectados problemas relacionados com os concursos para prestação de serviços”.

A entidade liderada por Chan Tsz King considera que o período da pandemia, quando as fronteiras estiveram praticamente fechadas, potenciou o aumento das irregularidades associadas a este sector.

“Devido a uma procura de mão-de-obra relativamente grande nos sectores da segurança e da limpeza e, durante o período da epidemia, também por causa ainda das dificuldades de passagem de fronteiras, surgiram situações 20 irregulares na gestão desta área”.

Um dos exemplos referidos no relatório diz respeito a “mais de uma dezena de queixas” recebidas pelo CCAC relativas ao período compreendido entre Outubro de 2021 e Novembro de 2022.

As denúncias, anónimas, dizem respeito a “um gerente de segurança e alguns chefes de uma empresa responsável pela prestação de serviços de segurança nos postos fronteiriços de Macau”.

Assim, na prestação de serviços de segurança ao Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), aos Serviços de Alfândega e aos Serviços de Saúde (SS), estas pessoas “deram instruções aos trabalhadores, seus subordinados, para se deslocarem a diferentes serviços públicos, no mesmo horário de trabalho, para efectuarem marcação de presenças, criando assim a ilusão de ter um número suficiente de trabalhadores de segurança destacados nesses serviços, com o objectivo de defraudar os serviços públicos referidos”.

Num primeiro caso mencionado pelo CCAC, as autoridades perceberam que “um chefe principal da empresa de segurança agiu em conluio com vários chefes, ordenando aos trabalhadores de segurança seus subordinados que estavam de serviço num posto fronteiriço, para se deslocarem a dois ou três serviços públicos, no mesmo horário de trabalho ou nas horas seguintes, para efectuarem o registo de entrada e saída”.

Na realidade, descreve o relatório “cada um desses trabalhadores de segurança apenas prestou serviço num único serviço público dentro de um horário de trabalho, sem prestar qualquer trabalho extraordinário”.

Foram ainda feitos “registos de assiduidade falsos nas folhas de ponto do CPSP e dos SS em nome de trabalhadores que se encontravam de férias, já desvinculados do serviço, ou a prestar serviço noutros postos fronteiriços”. Desta forma, criou-se “a ilusão da existência de um número suficiente de trabalhadores de segurança destacados nos serviços e da conformidade com o exigido nos contratos celebrados com os serviços em causa”. No total, o CPSP e os SS registaram, com esta actuação, “prejuízos superiores a 3,09 milhões de patacas”.

O segundo acaso apontado pelo CCAC diz respeito à prestação de serviços aos SS por parte da mesma empresa, que usou o mesmo esquema para prestar dados falsos no âmbito do contrato de prestação de serviços assinado.

Assim, 23 chefes da empresa e pessoal de gestão defraudaram os SS em 2,3 milhões de patacas, sendo estas pessoas suspeitas “da prática dos crimes de burla e de falsificação de documento previstos no Código Penal, bem como do crime de falsificação informática previsto na Lei de combate à criminalidade informática”. Os casos já foram encaminhados para o Ministério Público para prosseguimento da investigação.

Picar mal o ponto

No relatório destaca-se também a investigação, por parte do CCAC, “de vários casos em que trabalhadores da Função Pública picaram o ponto de forma fraudulenta na comparência ao serviço”.

Para o CCAC, é sinal que “ainda existem pessoas que correm riscos na esperança de não serem apanhadas, em desrespeito pelos princípios da integridade, da autodisciplina, e da observância dos regulamentos disciplinares e da lei”.

Desta forma, é apontada “a necessidade de reforço no âmbito da sensibilização, no sentido de elevar a ética e a conduta dos trabalhadores da função pública no cumprimento da lei”.

Um dos casos diz respeito aos Serviços de Alfândega e ocorreu em Agosto de 2022, quando um chefe do posto alfandegário “utilizou o pessoal da secretaria para o ajudar a ‘picar o ponto’ nos períodos de entrada no serviço através da utilização de um cartão de ponto duplicado”.

Após investigação do CCAC, apurou-se que dois chefes dos postos alfandegários e cinco verificadores da secretaria “tinham na sua posse cartões de identificação duplicados”, tendo concordado todos em falsificar os registos de assiduidade de colegas. Assim, foram conseguidas remunerações suplementares ao salário base no valor superior a 130 mil patacas.

Menos casos com subsídios

Destaque também para o facto de em 2023 “o número de diversos tipos de casos de burla para obtenção de subsídios do Governo ter sido o mais baixo dos últimos anos”.

O CCAC recorda que, nos anos anteriores, “registou-se um elevado número de casos de burla praticados por diversos tipos de associações ou instituições contra o Governo”, o que levou a entidade liderada por Chan Tsz King a definir o combate a este tipo de corrupção “como uma das prioridades do Governo”.

Graças a trabalhos intensivos de fiscalização e promoção, “a tendência de ocorrência deste tipo de casos foi temporariamente reprimida em 2023, tendo os respectivos trabalhos de combate alcançado resultados de forma faseada”.

São também apontados os casos “ocorridos em escolas, instituições educativas ou centros de formação envolvendo questões relativas à admissão de estudantes, à aquisição de bens e serviços, ao pagamento de subornos e à gestão”.

O CCAC diz tudo ter feito para investigar estes processos da melhor forma a fim de ” evitar a formação de um ciclo vicioso”. Registaram-se ainda “alguns casos pontuais nos serviços públicos”, mas sem que haja “características evidentes que possam levar à conclusão de se tratar de uma tendência”.

Menos denúncias anónimas

Em termos gerais, o CCAC destaca que, em 2023, face ao período anterior à pandemia, “o número de denúncias e queixas relacionadas com o combate à corrupção apresentou ainda um registo relativamente baixo”.

No ano passado, esta entidade recebeu 701 queixas ou denúncias, sendo que a grande maioria, 676, foram feitas pelos cidadãos. Apenas dez processos foram encaminhados pelos serviços públicos.

Foram instruídos, no ano passado, 249 processos, enquanto 387 “foram remetidos ao Centro de Gestão de Queixas por não satisfazerem os requisitos necessários para a instrução de processos”. Deste grupo, 214 dos processos foram arquivados, enquanto 173 foram encaminhados para outros serviços para acompanhamento e tratamento do processo.

Destaque para o facto de cada vez mais queixas serem apresentadas por autores que se identificam. “De acordo com os dados dos últimos anos, o público tem optado mais por apresentar as denúncias com identificação, havendo também uma diminuição em termos anuais no número de queixas ou denúncias anónimas”.

No ano passado, do total de queixas ou denúncias, 411 foram identificadas, mesmo aquelas em que foi solicitado o anonimato do autor, sendo que 265 foram feitas de forma anónima. Juntando os casos transitados de 2022, foram concluídos, no ano passado, 238 processos de investigação.

13 Jun 2024

Grande Baía | Estudo diz que Macau protege privacidade e dados pessoais

Um estudo académico concluiu que Macau presta mais atenção à privacidade e protecção de dados pessoais na digitalização de serviços públicos em comparação com as práticas em Guangdong. Porém, o mesmo estudo defende a integração com a área da Grande Baía, através de uma plataforma única digital

 

O Governo de Macau tem apostado na digitalização dos serviços públicos nos últimos anos, nomeadamente através da criação da plataforma “Conta Única”. Contudo, até que ponto esta expansão de serviços se compara com as funcionalidades existentes na província de Guangdong? Um estudo elaborado por dois académicos da Universidade Politécnica de Macau (UPM) conclui que na RAEM se dá mais atenção às questões legais na hora de digitalizar serviços, existindo uma maior preocupação com a garantia de protecção de dados pessoais.

O trabalho intitula-se “Digitalização dos serviços públicos na área da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau com base na comparação entre a província de Guangdong e a Região Administrativa Especial de Macau” e é da autoria de Yin Yifen e Zhang Wenshuo, dois académicos da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UPM, e ainda Zhang Zekai, da empresa Guangdong Huaqian Shantou, que opera na área da contabilidade e gestão.

Afirmam os autores que “o Governo da província de Guangdong adopta um modelo de Governo digital intensivo, integrado e normalizado que é ‘orientado para o utilizador'”, enquanto no caso de Macau o serviço de “E-government” também é “orientado para o utilizador”. Contudo, trata-se de um serviço que “presta mais atenção à privacidade pessoal dos residentes e fornece serviços através da cooperação entre departamentos”. O estudo define a digitalização de funções administrativas como sendo “um serviço atencioso e de alta frequência”.

Os autores destacam que “Macau dá mais atenção ao papel das leis e regulamentos” além de “prestar mais atenção à protecção da privacidade pessoal”. Como exemplos são citados o regulamento administrativo de 2018 relativo aos serviços electrónicos, que contém definições sobre o formato dos dados utilizados. A equipa de investigadores enumera também uma directiva de 2018, assinada pelo Chefe do Executivo, que contém “especificações técnicas e regulamentos sobre os níveis de segurança do sistema de contas de utilizador”. É também referido o exemplo da lei de 2022 relativa à “Exibição por meios electrónicos dos documentos necessários à condução de veículos”.

No caso da aplicação para telemóvel da “Conta Única”, os autores destacam que “para a abertura de contas à distância é utilizado o reconhecimento facial como ferramenta de identificação”, sendo que os dados capturados “apenas são enviados para o Gabinete de Certificação de Identidade, de forma encriptada e unidirecional, para comparação”. “Após a confirmação, apenas o resultado é devolvido e não será restaurado numa fotografia”, sendo que “nem o Serviço de Administração Pública nem outros serviços guardam os dados”. O estudo explica também que, no caso de Macau, “os cidadãos têm o direito de optar por utilizar ou não os serviços electrónicos”.

Expandir e proteger

A investigação académica debruça-se também sob o contexto da integração regional ligado ao projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau e defende, por isso, uma maior conexão com os serviços digitais das diferentes cidades que fazem parte do projecto.

Assim, é sugerido o estabelecimento de “uma plataforma digital transfronteiriça unificada”, existindo, para este projecto, “pontos comuns e diferenças na implementação digital dos serviços públicos entre Guangdong e Macau”.

Defende-se que a plataforma “deve ser altamente segura e fiável”, bem como “suportar várias línguas, moedas e outras características para satisfazer diversas necessidades dos residentes e empresas transfronteiriças”. Refere-se que “os sistemas de serviços e recursos de dados dos Governos de Hong Kong e Macau permitem a interoperabilidade e a colaboração dos serviços públicos transfronteiriços”.

Deve também apostar-se na “introdução de meios técnicos avançados”, nomeadamente a inteligência artificial ou armazenamento de dados em nuvem, formatos que devem ser “plenamente utilizados para melhorar a eficiência dos serviços públicos”, ao nível da previsão “das necessidades dos cidadãos e optimização da atribuição de recursos e serviços, sem esquecer “a segurança e confiança do intercâmbio de dados transfronteiriços”.

É também proposta a “informatização das agências governamentais” na zona da Grande Baía, a fim de se fazerem “esforços conjuntos para digitalizar os serviços governamentais e melhorar o nível de digitalização dos serviços governamentais, incluindo o fortalecimento da integração dos sistemas governamentais internos”.

Apesar das sugestões, é lançado o alerta sobre a necessidade de protecção dos utilizadores na rede. Deve-se, neste contexto, “reforçar a circulação transfronteiriça de dados e a proteção da privacidade”, sendo necessário “reforçar o mecanismo de cooperação para a circulação de dados transfronteiriços, a fim de garantir a segurança dos dados e a proteção da privacidade”.

Que efeitos?

Relativamente à aposta na digitalização de serviços feita pela província de Guangdong, é referido o lançamento da “Rede de Serviços do Governo Provincial de Guangdong”, bem como a “Plataforma de Grandes Dados do Governo Provincial de Guangdong” e ainda a aplicação para telemóvel com os “Serviços do Governo Provincial de Guangdong”, sem esquecer os formatos de armazenamento de dados em nuvem e análise de grandes dados.

No caso de Macau, as necessidades dos utilizadores são analisadas “através da disponibilização do Portal do Governo de Macau, da Plataforma de Integração do Sistema de Informação do Governo de Macau e da Conta Única”, entre outras plataformas que visam “optimizar os processos de serviço e melhora o nível de serviços personalizados”.

O estudo traça os efeitos conseguidos através destas plataformas digitais, nomeadamente uma “melhor conveniência e eficiência dos serviços públicos”, pois “pessoas e empresas podem tratar de vários assuntos de forma conveniente e rápida através da rede de serviços públicos e das aplicações móveis, poupando tempo e custos”.

Foi ainda reforçada a “interacção entre a Administração pública e os cidadãos”, além de se melhorar “a transparência e qualidade dos serviços públicos”, pois “a aplicação de plataformas de megadados governamentais permite que o Governo analise melhor os dados de serviço, ajuste as estratégias de serviço em tempo útil e melhore a qualidade e a satisfação do serviço”.

Para os autores do estudo, a aposta na digitalização promove ainda “a partilha de informações e a colaboração na Administração pública”, com uma maior troca “de informações e colaboração entre vários departamentos governamentais”. Agilização que permite “melhorar a eficácia geral dos serviços governamentais”.

11 Jun 2024

Jogo | Tailândia acelera leis, mas Macau lidera nas receitas brutas, diz analista

A Tailândia está a preparar leis para regular o jogo. O analista de jogo Daniel Cheng defendeu ao HM que o país poderá liderar em termos de EBITDA [lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações], mas Macau continuará a ganhar nas receitas brutas. O analista abordou este tema na conferência G2E Asia, que termina hoje no Venetian

 

Macau é a Las Vegas da Ásia, mas cada vez mais há países no continente à espreita para desenvolver projectos de jogo e apostarem no mercado dos casinos, trazendo maior competitividade e desafios ao mercado de jogo local.

Da Tailândia têm chegado notícias quanto à aproximação da legislação sobre o jogo, que deverá ser implementada no primeiro trimestre do próximo ano. Qual poderá ser o impacto para Macau do espoletar deste mercado? Para Daniel Cheng, analista de jogo e antigo executivo do sector, Macau vai continuar a liderar nas receitas brutas, mas as operadoras de jogo na Tailândia poderão estar à frente no mercado em termos de EBITDA, ou seja, lucros obtidos antes do pagamento de juros, impostos, depreciações e amortizações.

“A forma e a dimensão do mercado tailandês, e a sua competitividade relativa na região, dependem de factores como a estrutura legislativa, o enquadramento e modelo do sector ou ainda o plano de execução das licenças. Se estes três factores forem optimizados, a Tailândia pode tornar-se o novo líder do mercado regional em termos de EBITDA, embora Macau continue a liderar no capítulo das receitas brutas. A dimensão do mercado poderá ser superior a 10 mil milhões de dólares com oito sociedades de investimento”, declarou ao HM.

O antigo executivo em empresas de jogo entende que “o mercado tailandês de exploração de infra-estruturas de jogo tem todos os fundamentos para criar uma verdadeira indústria” e que “na pior das hipóteses, caso um, dois ou três factores não forem bem aplicados, o mercado tailandês poderá aproximar-se do modelo filipino e talvez ultrapassar os cinco mil milhões de dólares, se forem emitidas oito licenças”.

Para Daniel Cheng, “embora a Tailândia possa retirar alguma quota de mercado aos operadores regionais, a nova oferta também aumentará a procura do mercado e contribuirá para uma maior dimensão do mercado regional”. Desta forma, “Macau será a região mais isolada em comparação com os outros países, uma vez que o Governo chinês pode facilmente ajustar a torneira da oferta de turistas de Guangdong e de outras províncias para Macau”.

Daniel Cheng abordou este tópico no painel sobre mercados emergentes de jogo na convenção G2E Asia, uma das maiores do sector na Ásia, que termina hoje no Venetian e que teve início na terça-feira.

Turbulência política

As autoridades tailandesas estão a trabalhar a todo o gás para que o país venha a ter um sector do jogo que complementará a já bem-sucedida indústria turística tailandesa. O relatório de mais de 200 páginas foi aprovado “quase por unanimidade” em Março pelo parlamento local, e foi enviado para o Conselho de Ministros e depois submetido ao Ministério das Finanças para revisão do conteúdo e formalização de algumas recomendações contidas no relatório da comissão parlamentar.

Daniel Cheng destaca que “a revisão está prevista para este mês”, sendo que “o primeiro-ministro [Srettha Thavisin] está a dar um forte impulso no sentido de se acelerar o processo”. “Com o amplo apoio da Câmara [parlamento], e uma vez redigida e revista a legislação, espera-se que a nova lei seja aprovada já no primeiro trimestre de 2025”, destacou o antigo executivo em empresas de jogo.

A Inside Asian Gaming (IAG) citou a posição apresentada por Daniel Cheng no painel da G2E Asia, onde este afirmou que “o actual Governo – com o qual não concordo muito – gostaria de ver os frutos desta legislação e a abertura dos primeiros resorts de jogo tailandeses enquanto ainda está em funções”.

A IAG citou também o analista sénior da Seaport Research Partners, Vitaly Umansky, participante do mesmo painel da G2E Asia, que alertou para o facto de as autoridades tailandesas olharem para o desenvolvimento da indústria do jogo em Macau e Singapura, tentando replicar um dos dois modelos.

“Penso que a dificuldade de abordar a legalização e o desenvolvimento desta forma reside no facto de tanto Macau como Singapura serem construções geográficas e políticas únicas que são muito difíceis de reproduzir na maioria dos outros países da Ásia e do resto do mundo”, declarou Umansky.

O analista alertou ainda para os desafios que as autoridades tailandesas podem esperar para implementar em pleno uma indústria deste tipo, nomeadamente em termos de questões políticas.

“Para ter os meios necessários para criar uma indústria de grande escala, ou seja, com capacidade para atrair investimentos estrangeiros com uma escala suficientemente grande, que acabem por construir propriedades com investimentos multimilionários e ter um bom ambiente de regulação, o maior problema vai ser mesmo a parte regulatória.”

Para Vitaly Umansky há “risco político, porque pedir a uma empresa pública, um operador e promotor internacional de jogo que invista quatro ou cinco mil milhões de dólares americanos num país que está politicamente em risco de ter mudanças de Governo ou agitação política, é um pedido muito grande”.

Jogo até 5%

Na mesma sessão na G2E Asia, Vitaly Umansky frisou que esta inconstância política pode afastar potenciais investidores do futuro mercado de jogo tailandês. “Qual é a situação de risco político num país como a Tailândia, onde a canábis é legalizada num ano e criminalizada no ano seguinte? O Governo muda, as coisas mudam. Este não é um ambiente político estável em que um operador esteja disposto a investir milhares de milhões de dólares.”

O analista de jogo deu o exemplo do Sands Macao, inaugurado em 2004 com um investimento de 265 milhões de dólares americanos e que abriu caminho para o desenvolvimento da Cotai Strip.

“Se o Governo mudasse de opinião e dissesse: ‘Olha, nós compreendemos que isto é difícil’, então poderiam começar por construir uma Sands Macao para ver como corre e utilizar esses fluxos de caixa para reinvestir, e só depois construir um mercado adequado ao longo do tempo. Mas ordenar desenvolvimentos de vários milhares de milhões de dólares sem um quadro regulamentar que sabemos que pode funcionar, penso que será quase uma impossibilidade”, rematou Umansky.

Citado pelo jornal Bangkok Post, Chai Wacharonke, porta-voz do Governo tailandês, declarou que a futura indústria do jogo no país poderá crescer até aos 2,2 biliões de dólares até 2028, descrevendo que a Tailândia terá de “acelerar os planos para obter a sua quota parte de receitas globais” tendo em conta a expansão do mercado de jogo a nível regional e global.

O porta-voz do Executivo citou o relatório elaborado pelo parlamento local que determina que o projecto de resorts deverá gerar o mínimo de 12 mil milhões de Baht em impostos no primeiro ano de execução. O estudo determina ainda que os casinos não devem ocupar mais do que cinco por cento nos resorts integrados, a fim de garantir um equilíbrio entre os segmentos jogo e não-jogo, composto pelas áreas de entretenimento e lazer.

Espera-se que o tecido de resorts na Tailândia se desenvolva em Banguecoque, com dois empreendimentos, um no chamado “Corredor Económico Oriental (EEC)” e mais dois em Chiang Mai e Phuket, zonas bastante turísticas.

Ainda segundo o Bangkok Post, o estudo foca-se em três aspectos, nomeadamente “as implicações para as políticas económicas, sociais, educativas e culturais da existência de um recinto deste tipo na Tailândia; a estrutura empresarial e a cobrança de receitas e a legalidade e os critérios para as leis relativas ao entretenimento e ao jogo”.

6 Jun 2024

“PÁTRIA” | Diogo Vilhena faz documentário sobre viagem aérea entre Portugal e Macau

O realizador Diogo Vilhena está em Macau a filmar um documentário que celebra os 100 anos do Raid Aéreo Portugal-Macau, a viagem que Brito Pais e Sarmento de Beires fizeram no avião “PÁTRIA” entre Vila Nova de Milfontes e Macau. A ideia da produção é reunir memórias e juntar pedaços de uma história pautada por heroísmo

 

Chama-se “Milfontes-Macau: Um retrato de 100 anos de histórias inspiradas por uma viagem” e é o projecto de documentário que o realizador Diogo Vilhena tem desenvolvido nos últimos meses para celebrar a viagem centenária do “PÁTRIA”, nome dado ao avião que percorreu mais de 16 mil quilómetros entre Portugal e Macau, num tempo em que eram escassos os conhecimentos técnicos para uma viagem daquela natureza.

Se à época a história da aviação portuguesa já tinha dois heróis (Gago Coutinho e Sacadura Cabral), Brito Pais e Sarmento de Beires quiseram também percorrer os céus levando o nome de Portugal para bem longe. A eles juntou-se Manuel Gouveia.

Porém, a longa jornada aérea acabou por ficar esquecida na historiografia portuguesa pelo facto de Sarmento de Beires ter sido opositor ao regime do Estado Novo. Mas este ano, em jeito de celebração dos 100 anos da viagem, são várias as iniciativas que tentam resgatar da sombra das memórias o feito.

Uma das iniciativas é, assim, de Diogo Vilhena, realizador que cresceu em Vila Nova de Milfontes a ouvir a história destes “heróis”. “Esta história é contada em família e em contexto da memória local, quase como se eles fossem uma espécie de super-heróis que conseguiram fazer a viagem”, conta ao HM.

Aos 16 anos, Diogo Vilhena percebeu que não era mito, e que os portugueses tinham mesmo voado para terras longínquas. “Comecei a perceber que sempre foi algo apagado pelo Estado Novo e depois, sucessivamente, a nível institucional e corporativo. Na verdade, se a viagem tivesse sido um desastre, havia a informação de que tinha sido de Vila Nova de Milfontes a Macau, mas como foi um sucesso, passou a ser designada como tendo sido feita de Lisboa a Macau, e assim fez escola. Houve uma espécie de vergonha do sucesso da viagem, assumiu-se que já havia dois heróis, o Gago Coutinho e Sacadura Cabral, e não valia a pena ter mais heróis.”

A viagem é importante não apenas do ponto de vista dos feitos para a aviação, mas também por questões políticas. Em 1924 Portugal vivia sucessivas crises políticas com a I República, instaurada em 1910, mas este raid conseguiu receber o apoio do público. Mesmo sem apoio do Estado, os três aviadores viajaram até ao Oriente com o apoio popular. Foram concedidos donativos recolhidos em campanhas e eventos públicos, nomeadamente um “rally” que fechou Lisboa só para este fim. Alguns actores famosos participaram para que a venda de bilhetes fosse mais bem-sucedida.

A revista “Seara Nova” também deu apoio à viagem, comprando uma edição do livro de poesia de Sarmento de Beires, intitulado “Sinfonia do Vento”. Com estes fundos foi possível adquirir o avião Breguet XVI B2, chamado “PÁTRIA”.

O início da viagem deu-se a 7 de Abril de 1924 e foram vários os desafios, tendo obrigado Brito Pais e Sarmento de Beires a escalas em países como Espanha, Tunísia, Líbia, Egito, Síria, Iraque, Irão, Índia, Birmânia, Tailândia, Vietname e China. Na Índia enfrentam uma tempestade, aterram no deserto e foram forçados a adquirir um segundo avião, o “PÁTRIA II”.

Uma espécie de milagre

Diogo Vilhena, que tem realizado nos últimos meses diversas entrevistas para o documentário, diz continuar intrigado sobre o facto de “ter sido possível a estes homens, que viajavam numa casca de noz com asas, realizar este feito, numa altura em que não havia equipamentos, protecção, comunicações”.

Os aviadores só tinham autorização para voar entre Vila Nova de Milfontes e Málaga, em Espanha, sendo que, a partir daí, estavam por sua conta. “Para mim, esta é uma das aventuras mais épicas da história de Portugal, porque quiseram fazer a viagem e concretizaram-na mesmo. Acreditaram numa espécie de irmandade que ali foi criada, com uma estrutura militar, pois tratava-se de forma hierárquica, com o ‘Sim, meu capitão'”.

Até nas celebrações eles estiveram sempre unidos, destaca o realizador. “Brito Pais era um sujeito mais bem visto pelo regime, mas nunca permitiu que fosse homenageado sozinho. Sempre disse que, para o ser, tinham de ser os três homenageados. Infelizmente, o Brito Pais morreu dez anos depois da guerra [II Guerra Mundial].”

Colar memórias

Assumindo ser difícil contar uma história com 100 anos, em que os seus protagonistas há muito faleceram, ou até familiares mais directos, Diogo Vilhena tem-se concentrado em estabelecer ligações e contar uma história de forma una, que ensine algo a cada pessoa que participa.

“O documentário está a ser montado pela relação da memória. A ideia é revisitar a memória que existe nos espaços e pessoas, mas não de forma directa, muitas das vezes. Há pessoas entrevistadas que foram generais e pilotos de F-16, mas que fizeram a escola primária em Macau e tiveram sempre esta imagem um pouco turva sobre a viagem. Não percebiam bem a história, porque era contada de diversas formas. São memórias que distam 17 mil quilómetros umas das outras.”

Assim, explica Diogo Vilhena, “a ideia é viajar para que, no final, o filme fique montado de forma que todas as memórias sejam importantes para a narrativa”. “Como esta história não faz parte da história oficial do país, passa a ser um informativo de fragmentos, em que cada pessoa ensina qualquer coisa a outra”, frisou.

Em Macau, o realizador pretende entrevistar o jornalista e autor João Guedes, por este “conhecer o território”, onde reside há dezenas de anos. Nos planos está também uma conversa com Santos Pinto, proprietário do Restaurante O Santos na Taipa que foi para Macau pela Marinha portuguesa, e que por lá ficou.

“A ideia é mostrar o que é ir de Portugal quase aos trambolhões e ficar em Macau para sempre, estabelecendo um paralelismo com o que aconteceu há 100 anos.”

Embaixadores da nação

Diogo Vilhena destaca também o facto de Sarmento de Beires, Brito Pais e Manuel Gouveia terem funcionado um pouco como embaixadores da cultura portuguesa, “por levarem sempre a bandeira de Portugal”. “A ideia era que transportavam Portugal, porque tinham viajado com o apoio da pátria, das pessoas, ricas ou pobres, e não do Estado.”

O autor do documentário confessa que “é sempre um processo complicado trabalhar com memórias”. “Há pequenos detalhes que muitas pessoas conhecem, e é nisso que me estou a concentrar. Entrevistámos o sobrinho-neto do mecânico [Manuel Gouveia], que é engenheiro da Airbus, e, de repente, transportei-o para a sua infância, em que fala das memórias da avó, que era irmã deste mecânico. Aí consigo ter, na primeira pessoa, a memória de gente que inspirou uma geração.”

As pessoas entrevistadas “ainda hoje ficam loucas a pensar como eles [Brito Pais e Sarmento Beires] conseguiram fazer determinadas coisas, como andar em altitude na Birmânia. O ar era rarefeito e podiam desmaiar”.

“Tinham muito desconhecimento técnico, fizeram alguns erros sem noção, mas o que é certo é que chegaram lá. Houve um tufão que os impediu de aterrar em Macau, tendo aterrado em Hong Kong, perto de um cemitério”, aponta Diogo Vilhena. A chegada a Macau aconteceu a 23 de Junho de 1924.

O regresso foi feito por terra e mar, com trechos da viagem de comboio ou a bordo de navios e ferries, com passagens entre o Japão, Canadá, Nova Iorque, Londres e Lisboa. Chegados à capital portuguesa, perguntaram ao comandante do navio que os transportara de Londres se havia conhecimento da travessia aérea que tinham feito. O comandante disse saber de algo, por andar a navegar, mas que em Portugal ninguém sabia de nada. “Aí Brito Pais disse: ‘Ainda bem. Chegamos da mesma forma que partimos. Indigentes’.”, recorda Diogo Vilhena.

O realizador diz-se surpreendido também com o “conhecimento que determinadas pessoas têm sobre alguns pontos da viagem, sabendo muito sobre cartografia, a forma como funcionava o avião, como conseguiram apoios”. “Não há ninguém que tenha o domínio completo da história no seu todo. Não há uma visão global, e espero que com este projecto construir essa ideia global”, rematou.

A estreia do documentário deverá acontecer dia 21 de Setembro deste ano, precisamente o dia em que Manuel Gouveia, Sarmento de Beires e Brito Pais chegaram a Lisboa. O regresso a Vila Nova de Milfontes foi seis dias depois.

4 Jun 2024

EPM | Governo português “acompanha” situação de professores dispensados

A petição lançada pela comunidade escolar contra a saída de Alexandra Domingues da Escola Portuguesa de Macau, docente e representante dos professores junto da direcção da escola, contava ontem com perto de 900 assinaturas

 

O Governo português pediu esclarecimentos ao director da Escola Portuguesa de Macau (EPM), depois de vários professores da instituição terem sido dispensados esta semana, disse fonte oficial à Lusa na sexta-feira. “O Ministério da Educação, Ciência e Inovação está a acompanhar a situação, tendo solicitado esclarecimentos ao director da Escola Portuguesa de Macau”, afirmou à Lusa o gabinete do ministro Fernando Alexandre.

No início da semana, a direcção da EPM comunicou a pelo menos seis professores que não ia renovar o vínculo laboral com a instituição, alegando motivos de gestão. No departamento de Português, três professores viram esse elo terminado. São todos detentores de bilhete de residente permanente e encontram-se no território ao abrigo de uma licença especial de Portugal para Macau.

A leccionar no território há 33 anos e ligada praticamente desde o início à EPM, Alexandra Domingues, também representante dos professores junto do Conselho de Administração, disse à Lusa estar “em choque”: “Nada me levou a crer da parte da direcção da escola que no nosso departamento houvesse necessidade de alguém sair”.

Por sua vez, a presidente do conselho regional da Ásia e da Oceânia das Comunidades Portuguesas considerou “desumana a atitude” da direcção de comunicar o fim do elo profissional “apenas a 27 de Maio”, ou seja, a poucos meses do início do novo ano lectivo.

“Os conselheiros estão ao lado dos professores despedidos e tudo farão ao seu alcance para repor a justiça e continuar o seu trabalho na Escola Portuguesa de Macau em prol do desenvolvimento educativo” de Macau, escreveu Rita Santos, em comunicado divulgado nas redes sociais.

Uma queixa relacionada com o caso levou, entretanto, as autoridades da Educação de Macau à escola.

Petição na linha

Desde que o caso veio a público foi lançada uma petição “pela continuidade da professora Alexandra Domingues na EPM”, que contava ontem à hora de fecho desta edição com 876 assinaturas.

“Consideramos que a docente, que há vários anos lecciona em Macau, exemplifica uma notável qualidade profissional e pessoal, dedicando-se de corpo e alma ao ensino e aos seus alunos”, lê-se no texto, dirigido ao presidente da Fundação Escola Portuguesa de Macau, Jorge Neto Valente, e ao director da EPM, Acácio de Brito.

Um outro professor da instituição, que pediu para não ser identificado, admitiu à Lusa haver “uma incompreensão muito grande” com o corte do vínculo laboral: “Pede-se que o corpo discente aumente, portanto, o corpo docente devia acompanhar”, defendeu.

“Não conseguimos entender que alguns dos professores que venham a ser dispensados sejam professores de língua portuguesa e sobretudo aqueles que já estão mais bem preparados e que conhecem perfeitamente as necessidades, sobretudo dos alunos falantes de chinês”, refere.

Também este ponto é abordado por Rita Santos, ao indicar que “a maioria dos alunos” da EPM “não tem o português como língua materna, devendo “professores experientes como estes (…) ser mantidos”.

Na quarta-feira, o director da EPM, no cargo desde Dezembro de 2023, recusou estar em curso qualquer “processo de reestruturação”. Num ‘email’ enviado à Lusa, referiu que todos os anos “ocorrem situações de saídas e entradas de novos docentes”.

“Reforço que as licenças especiais são suscitadas pela direcção da escola e pedidas em plataforma do ME [Ministério da Educação]. Processo normal, que em casos, por vontade do docente, não pretende a renovação da licença especial, em outros, por razões gestionárias, a escola decide não suscitar essa renovação”, escreveu.

DSEDJ lembra Escola Portuguesa que tem de seguir as leis laborais

A Direcção dos Serviços de Educação e de Desenvolvimento da Juventude (DSEDJ) esteve na Escola Portuguesa de Macau (EPM) para recordar à instituição que está obrigada a respeitar as leis laborais. A explicação sobre a deslocação de sexta-feira à EPM foi feita ontem, através de um comunicado, depois de o Governo ter sido questionado por vários órgãos e comunicação social sobre o assunto.

“Em relação às alterações do corpo docente na Escola Portuguesa de Macau, a Direcção dos Serviços de Educação e de Desenvolvimento da Juventude recebeu várias perguntas dos órgãos de comunicação social e tem estado em contacto de forma contínua com a escola”, foi reconhecido. “Através destes contactos, a DSEDJ ficou a saber que a Escola Portuguesa de Macau comunica com o Ministério de Educação de Portugal sobre a constituição do pessoal docente e sobre os procedimentos para a escolha dos professores. Foi pedido à escola que realize estes procedimentos cumprindo rigorosamente a Lei das Relações de Trabalho e os contratos assinados”, foi revelado.

No novo processo de contratações, a EPM está a trocar professores residentes por professores que vão receber o título de trabalhadores não-residentes, o que contraria a política laboral local.

Em cima do acontecimento

No comunicado, a DSEDJ afirma também que vai acompanhar a situação e garantiu que o novo pessoal docente só será autorizado, no caso de haver efectivamente necessidade. “A DSEDJ continuará a prestar atenção ao desenvolvimento curricular da escola e à afectação dos professores”, foi apontado, para depois ser indicado que só haverá autorização para contratar novos professores face à “prova das habilitações académicas”, assim como à “efectiva necessidade das contratações face ao número de aulas”.

Por outro lado, a DSEDJ considera que as mudanças no corpo docente são normais devido “a reformas e transferências” dos professores. O Governo indicou também que é normal que as escolas ajustem o corpo docente de acordo com as suas necessidades, mas sublinha que todas as escolas privadas têm de seguir as leis e as orientações da DSEDJ.

Neto Valente responde a petição e revela que DSEDJ não confiava na direcção anterior

“Não vale a pena, não é com abaixo-assinados, com petições e com barulho que se vai resolver o problema da escola”. Foi desta forma que Jorge Neto Valente, presidente da Fundação Escola Portuguesa de Macau, reagiu, em declarações à TDM, sobre a situação da Escola Portuguesa de Macau.

Após ter estalado a polémica com vários despedimentos, Neto Valente comentou publicamente o assunto, para garantir que não haverá alterações às decisões que afirmou terem sido tomadas pelo directo da escola, Acácio de Brito.

“Se um director de escola não pode seleccionar os professores que vêm para a escola, o que é que ele faz? Ele não tem de dar aulas, não está cá para dar aulas”, disse Neto Valente. “No caso actual, o director Acácio de Brito além da carreira docente que teve, e brilhante, é inspector de ensino. E, portanto, chegou à escola e começou a detectar um sem número de situações que importa corrigir. Isto não é para se fazer com alarme e circunstância pública, é para se fazer com toda a serenidade”, acrescentou.

Recusadas perseguições

O presidente da Fundação Escola Portuguesa de Macau recusou ainda que haja movimentações do director do estabelecimento de ensino no sentido de perseguir eventuais opiniões divergentes. Esta é uma questão sensível na vaga de dispensas, dado que uma das pessoas que vai ser afastada era a representante dos professores juntos da direcção da escola.

“Não estamos ali a perseguir ninguém e estamos a corrigir situações. Havia e há ainda muitas situações a corrigir e continuará a ser prosseguido esse procedimento, com serenidade”, indicou o presidente da associação.

Neto Valente acusou ainda a anterior direcção da Escola Portuguesa de Macau, liderada por Manuel Machado, de não ter a confiança da Direcção dos Serviços de Educação e de Desenvolvimento da Juventude. “Anteriormente, eu diria, que a Direcção dos Serviços teria perdido a confiança na escola, na direcção da escola, pela maneira como as coisas estavam a acontecer”, acusou. “Eu diria que estamos a reconstruir, e já se reconstruiu, um clima de abertura, transparência e de confiança, derivado das boas relações e bons contactos que existem [com DSEDJ]”, complementou.

2 Jun 2024

EPM | Dispensa de professores causa agitação, mas director defende opções

A semana começou da pior maneira para cinco docentes da Escola Portuguesa de Macau, que foram dispensados contra a sua vontade. A maioria deverá evitar o desemprego, dado que tem colocação em Portugal. Uma das dispensadas era representante dos professores junto da direcção

 

Uma onda de dispensas está a abalar a comunidade relacionada com a Escola Portuguesa de Macau (EPM) e pelo menos cinco professores deixam a instituição no final do ano lectivo contra a sua vontade.

As alterações à composição do corpo docente começaram a ser comunicadas na passada segunda-feira, através de uma ronda de encontros entre o director e os vários docentes. Os encontros serviram para comunicar aos professores se ficavam mais um ano na EPM ou se teriam de deixar a instituição no final do ano.

Ao HM, o director da EPM, Acácio de Brito afirmou que vão sair 11 professores, e que as saídas implicam situações profissionais diferentes, mas reconheceu que em cinco casos as dispensas resultam de exclusiva opção da direcção.

Os cinco afectados estão em Macau ao regime do abrigo de licença especial, o que significa que pertencem aos quadros do Ministério da Educação em Portugal, e que deverão ter colocação profissional no próximo ano.

“Temos nove docentes que têm licença especial [e que vão deixar a EPM]. Entre os nove, cinco vão sair por opção da escola, também há uma saída por motivos de aposentação e três que saem por vontade própria”, revelou Acácio de Brito. “Há também duas pessoas contratadas localmente que disseram que se iam embora”, acrescentou.

Acácio de Brito lamentou a decisão de dispensar docentes contra a sua vontade, mas justifica a opção com o desempenho das funções. “Eu penso que sim [que houve pessoas desagradas com a decisão], é a minha convicção. Não tenho a menor dúvida que há pessoas que vão sair contra a sua vontade”, reconheceu. “Quero dizer sobres estes processos de dispensa que preferia não ter de os fazer, pessoalmente, mas faço-os e profissionalmente já o fiz em várias situações. Mas não me dá agradabilidade nenhuma”, completou.

Substituições tratadas

O processo de dispensa de professores causou mal-estar na comunidade escolar, e nos últimos dias o HM recebeu vários relatos sobre a situação, de membros da comunidade, e essencialmente encarregados de educação que pediram para não serem identificados.

Uma das preocupações insistentemente partilhada prendeu-se com o facto de a contratação de novos professores poder ser um problema, com consequências para a qualidade do ensino.

“Como encarregado de educação, estou extremamente preocupado, porque não sabemos o que se está a passar e receamos que estejam a afastar as pessoas por razões que não conhecemos”, partilhou um encarregado de educação sobre as suas preocupações. “São professores que ao longo dos anos deram provas de competência, e se preocupavam com os alunos. Por isso, a sua saída é incompreensível”, acrescentou.

Outro encarregado de educação indicou que vai ser complicado a escola ficar a ganhar com a substituição: “Tememos que vão contratar outros docentes que sejam menos competentes, que não tenham conhecimento da realidade de Macau e que tenham menos experiência”, indicou. “Somos contra a saída porque conhecemos muito bem o corpo docente e vemos que estão a sair professores competentes”, destacou.

Face a estas dúvidas, a direcção da EPM garante que as contratações de 10 profissionais estão fechadas, e que não houve qualquer tipo de problema burocrático.

“As nove pessoas [em licença especial] vão ser substituídas por 10 professores com qualificações e entre esses professores alguns têm experiência internacional e, naturalmente, são professores seniores”, respondeu Acácio de Brito. “Os 10 docentes estão garantidos. Têm autorização para vir para Macau, mas ainda não têm autorização do Governo Português. Mas, têm autorização dos organismos competentes da RAEM”, frisou.

A direcção da EPM afasta ainda a existência de barreiras burocráticas nas contratações: “Não tive nenhuma dificuldade. Mas, fiz as coisas de forma atempada. Comecei a ouvir os professores [da EPM sobre os seus planos para o futuro] a 21 de Fevereiro, e naturalmente que fui ponderando, verificando, fui alterando as constatações que iam tendo, fui analisando…”, destacou.

Com as alterações, o director da EPM também admite a possibilidade de partirem pessoas que têm Bilhete de Identidade de Residente, substituídas por outras com o título de trabalhador não-residente. “Entre as pessoas que vão sair, se calhar algumas têm BIR, mas isso também não é relevante”, considerou.

Saída de peso

Outra situação que causou mal-estar na comunidade escolar foi uma das docentes dispensada ser a representante dos professores junto da administração da escola. Com a sua saída, houve encarregados de educação que se mostraram alarmados face à possibilidade de a direcção não aceitar críticas internas.

Todavia, Acácio de Brito afasta o cenário: “Só quem não me conhece [pode achar que a saída é motivada por críticas]. O que eu costumo dizer às pessoas é: se eu quisesse pessoas que só concordam comigo, o que fazia era ir todos os dias de manhã falar para a frente do espelho”, defendeu-se. “Se as pessoas falam comigo para repetir aquilo que eu acho, então prefiro que não me digam nada, porque não me estão a acrescentar nada”, sublinhou. “Até posso dizer, aprecio mais alguém que me diz as coisas na cara, do que aquela que me dá palmadinhas nas costas e depois é incorrecta […] e também já foi tempo em que confiava em pessoas que concordam sempre comigo”, acrescentou.

Ainda sobre as alterações, o director da Escola Portuguesa afirma que tem como objectivo fazer da instituição e melhor escola portuguesa fora de Portugal e garante a qualidade dos contratados. “Os critérios utilizados têm a ver com o conhecimento, ponderação e a experiência. Acho que como inspector [de educação nas funções de director da escola], tenho autoridade e competência da lei para tomar esta decisão”, realçou. “Posso enganar-me, mas dificilmente me enganarei porque tenho confiança nas escolhas que fiz e na qualidade das pessoas contratadas”, frisou. “Quero que esta seja a melhor escola portuguesa no estrangeiro e das melhores escolas portuguesas”, realçou.

Reestruturação à vista

Sobre as alterações no corpo de docentes, o director recusou haver uma reestruturação do corpo docente. “Não está em curso nenhum processo de reestruturação na Escola Portuguesa de Macau”, assegurou Acácio de Brito. Mas, admitiu que num futuro próximo poderá haver mudanças “em termos da organização de departamentos, e eliminação de alguns cargos” por considerar que “não têm acrescento para a própria instituição”.

Todavia, as alterações terão de ser “objecto de aprovação em sede da Fundação Portuguesa de Macau”. Acácio de Brito garantiu também que a haver uma reestruturação esta acontecerá “apenas e só em sentido funcional”.

Fundação sem respostas

O HM tentou obter esclarecimentos sobre a vaga de dispensas junto do presidente da Fundação Escola Portuguesa de Macau, Jorge Neto Valente, mas as tentativas de contacto ficaram sem resposta.

Por sua vez, o vice-presidente da Fundação Escola Portuguesa de Macau, Miguel de Senna Fernandes, afirmou estar fora do território e ter sido surpreendido com as mexidas internas: “Também recebi esta notícia um bocado de chofre e não consigo dizer absolutamente nada. Sei que houve uma remexida do corpo docente, mas não sei os termos em que foi feita”, afirmou, ontem, ao HM. “Tenho de voltar a Macau e depois tentar procurar saber o que se passa”, acrescentou.

Ainda assim, o vice-presidente da fundação indicou que é natural que o director tenha as suas razões para promover mexidas: “Ouvi falar sobre o assunto, porque estamos a falar de pessoas que estão em Macau há muitos anos e de repente são dispensadas. Mas também é uma questão de gestão, o senhor director terá as suas razões, mas eu ainda não sei essas razões e fui colhido de surpresa”, reconheceu.

Associação sem queixas

Ao HM, o presidente da Associação de Pais da Escola Portuguesa de Macau, Filipe Figueiredo Regêncio, reconheceu estar ao corrente do sucedido, mas indicou que, até ontem de manhã, na condição de representante dos pais não tinha recebido qualquer queixa.

“Tenho ouvido falar do assunto devido a telefonemas de alguns pais, que falaram comigo. Mas, através da associação de pais ainda ninguém me disse nada”, afirmou Filipe Figueiredo Regêncio, questionado sobre a existência de queixas junto da associação de pais. “Os contactos que tenho recebido mostram alguma preocupação, mas que me parece ser uma preocupação que resulta mais em termos de ambiente [criado pelas movimentações] do que em virtude das pessoas que vão ser dispensadas”, frisou. “É a minha impressão”, acrescentou.

O representante dos encarregados de educação reconheceu também a legitimidade da direcção da EPM para tomar as medidas vistas como adequadas para salvaguardar os interesses dos alunos, embora tenha admitido que no caso de uma dispensa tem algumas reservas.

30 Mai 2024

Óbito | “Armandinho”, o músico que deixa saudades ao jazz local

Armando Araújo, o brasileiro que escolheu Macau e a Ásia para viver e deambular pelos palcos, começou por tocar baixo, mas depressa passou para a bateria. A sua figura era uma referência para a cena do jazz local e muitos da nova geração aprenderam com ele. Armandinho morreu na madrugada de segunda-feira, depois de anos com problemas de saúde

 

Era tão importante para os palcos locais e para a cena do jazz que lhe fizeram um concerto de homenagem em 2020. Armando Araújo, mais conhecido por “Armandinho”, morreu na madrugada de segunda-feira, com 74 anos, depois de vários anos a lidar com diversos problemas de saúde que o afastaram dos palcos. Ainda assim, de vez em quando, voltava a sentar-se atrás da bateria, apesar da visível fragilidade.

O músico brasileiro veio viver para Macau nos anos 70 e percorreu vários palcos, incluindo no Japão. Foi uma das grandes presenças do Clube de Jazz de Macau que existiu na década de 90 na Rua das Alabardas, além de fazer parte dos “The Bridge”, outra banda icónica do território que actua há várias décadas.

Deixa saudades a organizadores de eventos e músicos com que partilhou palcos. Quem o conheceu fala do lado genial para a música que lhe permitia tocar quase tudo, e da magia com que tocava cada nota.

Rui Simões, organizador de muitos eventos de jazz e ligado à plataforma NOYB (None Of Your Business), diz ao HM que a partida de “Armandinho” constitui “uma enorme perda para Macau”.

“Todas as reacções que tenho recebido são de enorme tristeza e de grande respeito por um músico que era uma referência para todos os outros. Como pessoa, tinha uma simpatia e um sorriso constante”, disse.

Rui Simões esteve por detrás do concerto de homenagem ao músico e destaca “a oportunidade de recordar em palco a forma como dominava a bateria, sempre em grande cumplicidade com os restantes músicos em palco e com o público, a quem gostava de explicar tudo o que se estava a passar, sempre com uma atitude muito pedagógica”. “Armandinho” explicava “os diferentes ritmos e estilos musicais de forma muito divertida e sempre com boa disposição”, lembra.

Também José Sales Marques realça o carisma de Armando Araújo ainda dos tempos do Clube de Jazz de Macau, que dirigiu, e que nos anos 90 era juntava grande parte da comunidade portuguesa, mas não só.

“Foi com imensa tristeza que soube da morte de Armando Araújo. Um músico excepcional, um jazzista de excelência, cujo contributo para a afirmação do jazz em Macau jamais será esquecido”.

Sales Marques salienta “a forma singular de dar vida à música, acariciando a bateria com uma mestria contida e brincando com os ritmos mais complexos da forma mais simples possível. Quem teve o privilégio de o ver tocar sabe de que estou a falar. Em nome do Jazz Club de Macau e em meu próprio apresento condolências à sua família e amigos mais próximos. A sua memória estará para sempre presente entre nós, com uma batida muito especial, enquanto ele descansa em paz.”

Tocar com as estrelas

Zé Eduardo, outro músico e educar incontornável na cena do jazz de Macau, retorna ao final dos anos 70 quando conheceu o baterista em Macau. “Toquei muitas vezes com o Armando, que conheci em 1979 quando fui, com o Rão Kyao ao segundo Festival de Jazz de Macau. Toquei posteriormente com ele sempre que era convidado pelos ‘The Bridge’ e no contexto de algumas visitas que fui fazendo a Macau. Era uma personagem importante da ‘cena’ musical em Macau e que deixa marca”, apontou.

Quem também se recorda desse concerto longínquo, e de outros, é José Chan, companheiro na banda “The Bridge”, com a qual sempre tocou, primeiro de forma irregular, e depois permanente, a partir dos finais dos anos 90 e inícios dos anos 2000.

“Ele era como um membro da família, pois já nos conhecíamos desde que cheguei a Macau, em 1988. Foi um dos primeiros músicos do Clube de Jazz de Macau e quando eles fizeram os primeiros festivais já participava, nomeadamente com Rão Kyao. Depois tocou no Japão com Lisa Ono.” Aliás, a cantora e compositora de raízes japonesas nascida no Brasil também partilhou palco com Armando Araújo. “Se ele não tivesse um certo nível [como músico], jamais o convidariam para tocar no Japão, sobretudo em clubes de renome”, frisa outro membro dos “The Bridge”, Humphrey Cheong, saxofonista.

O Japão foi, aliás, o que trouxe Armando Araújo para a Ásia, onde acabou por ficar toda a vida. “O ponto de partida foi o Japão, mas ele vinha muitas vezes a Macau porque era o sítio mais perto onde se falava português. Mais tarde casou com uma senhora macaense e ficou por cá. Ele contou-me que foi convidado por músicos brasileiros para vir para a Ásia. Naquela altura ganhava-se bem como músico, no Japão e havia um grande intercâmbio cultural com o Brasil”, explicou José Chan.

Um génio

A doença começou a fazer parte do dia-a-dia de “Armandinho”, obrigando-o a deixar de tocar regularmente com os “The Bridge” a partir de 2017. “Depois só tocava connosco quando se sentia bem e podia, nomeadamente no LMA (Live Music Association)”, disse José Chan, recordando que estas experiências permitiam o contacto com as gerações mais novas. “Ele podia tocar qualquer coisa. Era baterista, mas inicialmente até começou por ser baixista. Também cantava e tocava guitarra. Era um bom músico e vai-nos fazer muita falta, mas a vida é mesmo assim”, frisou José Chan.

Humphrey Cheong não tem dúvidas em denominá-lo como “uma espécie de génio”, pois “podia tocar qualquer coisa”.

“Há cerca de dez anos, quando o ‘Armandinho’ ainda estava em melhor forma, aconteceu um episódio interessante. Um músico profissional que veio a Macau sem a sua banda habitual viu-se ‘forçado’ a tocar com músicos locais. Depois do concerto perguntou o que Armando fazia profissionalmente, e disse que estava interessado em tocar com ele de forma regular, levando-o em digressão. Ele estava nesse patamar de profissionalismo.”

A união é outro dos pontos que o saxofonista dos “The Bridge” destaca da passagem de “Armandinho” pela banda. “Quando tocávamos juntos, independentemente do que tinha acontecido no passado, ele comunicava com todos e juntava-nos mesmo que estivéssemos a tocar as nossas partes a solo. Conseguia captar o melhor de nós quando tocávamos juntos, com o seu estilo forte, muito próprio.”

Mars Lei, músico e presidente da Associação de Promoção do Jazz de Macau, destaca que as gerações mais novas “podem não ter muitas memórias dele, por ser mesmo de outra geração mais antiga”.

“Mas no meu caso, que vivi a cena musical de Macau nos anos 90, recordo-me bem de vê-lo tocar. Foi uma grande influência para mim, na ligação com o jazz. Mesmo depois da transição, íamo-nos cruzando em vários locais e concertos, mas nunca tivemos a oportunidade de tocar juntos. Ele era uma espécie de referência para todos nós.”

Terminadas todas as notas, fica a lembrança. “Claro que é uma pena a partida dele, mas poderemos sempre lembrá-lo. Mesmo que os ‘The Bridge’ deixem de tocar com ele, a verdade é que esta ligação ficou para sempre”, rematou Humphrey Cheong.

28 Mai 2024

Arte pública | Estudo aponta desenvolvimento “tardio” e falta de “políticas claras”

Um estudo académico publicado na revista E3S Web of Conferences conclui que a arte pública em Macau está numa fase inicial de desenvolvimento, carecendo de público e de uma “política clara” de fomento. Destaca-se ainda o facto de o processo de decisões estar centralizado no Executivo, o que dificulta a conexão com o público

 

Macau tem ainda um longo caminho a percorrer no que diz respeito ao desenvolvimento da arte pública urbana, pois não só são poucos os projectos erguidos na malha urbana como apresentam pouca ligação com quem cá vive e com turistas.

Esta é a conclusão do estudo “Research on Public Art Planning in Macao from the Perspective of Urban Cultural Communication” [Investigação sobre o Planeamento da Arte Pública em Macau na Perspectiva da Comunicação Cultural Urbana], publicado em Abril na publicação académica “ERS Web of Conferences”. Os autores do estudo são Zhu Hui, do Departamento de Arquitectura da Universidade de Soochow, em Suzhou, China; António Cadeias, do Departamento de Química da Universidade de Évora; e Marcello Pelillo, da área de ciências computacionais da Ca’ Foscari – Universidade de Veneza.

O estudo nasceu de uma apresentação feita na “International Conference on Urban Construction and Transportation” em Janeiro deste ano, na cidade de Harbin, China.

O trabalho realizado pela equipa de académicos destaca que “Macau ainda se encontra numa fase relativamente inicial do desenvolvimento da arte pública”, devendo este “ser combinado com as próprias características” do território e com “o modo de desenvolvimento das regiões” vizinhas.

Para os três académicos, a arte pública em Macau apresenta como problemas a existência de “menos obras de artistas locais, o insuficiente sentido de participação pública” ou ainda “a falta de planeamento global [da parte do Governo]”, sem esquecer “apoio jurídico e político” para o desenvolvimento de actividades culturais deste tipo.

Além disso, a arte pública sofre de “insuficiente manutenção e gestão numa fase posterior”, além de que é necessário apresentar determinadas características, como “singularidade, funcionalidade, historicidade e interactividade”, sem esquecer a publicidade dos projectos, para que haja uma difusão “da cultura urbana e se estabeleça a imagem da cidade”.

Relativamente à participação do público, os autores destacam que “o Governo é o principal responsável pelo planeamento, construção e gestão da arte pública em Macau, e que o público apenas pode visitá-la, sem ter um poder de decisão efectivo”. Desta forma, “sem a participação do público, a arte pública carece também da sua natureza básica de ‘publicidade'”, além de que a sua localização “também afecta o sentido da participação do público”.

Tendo em conta a pequena dimensão do território nas zonas mais antigas, nomeadamente na península, os autores do estudo referem que “muitas obras de arte pública são colocadas em faixas à beira da estrada, e que o público apenas as pode apreciar de pé ou junto à estrada”.

No que diz respeito à ausência de planeamento do Executivo, o estudo destaca que “a distribuição da arte pública na cidade é desigual e o seu desenvolvimento é lento”, sendo que “a distribuição da arte pública nas novas zonas urbanas, como a Taipa e o Cotai, é menor, o que contrasta claramente com a Península de Macau”.

Um início tardio

Os académicos dividem a evolução da arte pública urbana de Macau em três fases, com a transferência de administração portuguesa de Macau para a China a representar o ponto intermédio. Em termos gerais, a expressão da arte pública urbana no território “começou tarde”, sendo que “a verdadeira arte pública apareceu [graças] aos monumentos de amizade sino-portuguesa construídos pelo Governo português de Macau após a década de 1990”. Antes dessa década, “as principais obras de arte pública urbana eram sobretudo esculturas religiosas e decorações arquitectónicas de importância histórica na cidade”, é referido.

A ligação da arte pública com a religião, bastante visível na Macau do período pré-transição, é semelhante “ao desenvolvimento da arte pública no [período] da Idade Média, no Ocidente”. Trata-se de “um rico património histórico e cultural que simbolizam o espírito de Macau”, situando-se “nas atracções históricas mais importantes de Macau”, pelo que “a maioria não pode ser deslocada”.

O estudo refere vários monumentos públicos que fazem referência às relações bilaterais históricas entre chineses e portugueses, num total de dez trabalhos, como é o caso das Portas do Entendimento, junto à Torre de Macau e da autoria do escultor Charters de Almeida, ou ainda o Arco do Oriente, na zona do NAPE.

“Este tipo de obras de arte pública é instalado, sobretudo, em praças e nós de tráfego importantes”, cuja instalação é “relativamente bem feita, mas há problemas, como o volume demasiado grande das obras, o facto de serem abstractas”, ou seja, “difíceis de compreender”, além de ser “controverso o seu significado”.

Se a religião e a diplomacia pautaram a arte pública feita antes da transição, após a liberalização do jogo surgiram novos projectos em zonas como o Cotai, com estilos diversos e que “realçam o luxo destes grandes empreendimentos [de jogo] e que atraem turistas”. Porém, nestas obras, “a história e cultura locais de Macau raramente são mostradas”.

A importância dos festivais

O estudo em questão destaca também o facto de a arte pública que se vê em Macau nos dias de hoje estar dependente de festivais que, na sua maioria, são organizados pelo Governo, nomeadamente o Instituto Cultural ou a Direcção dos Serviços de Turismo.

“Uma grande parte da arte pública de Macau está relacionada com eventos festivos importantes”, sendo a sua expressão “inovadora e tradicional em simultâneo”.

“Sempre que há uma variedade de festivais tradicionais chineses e ocidentais, o mais atractivo é a grande instalação de iluminações artísticas em frente à sede do Governo” [junto ao lago Nam Van], assim como “luzes decorativas em estradas importantes e nós paisagísticos da cidade”, bem como a realização de actividades e espectáculos. O estudo destaca ainda a organização anual de eventos como o Festival da Luz, mais recente, ou o Festival Fringe, que acontece há vários anos, que vieram “injectar uma nova vitalidade na cultura urbana”.

Embelezar e educar

Entre os problemas enunciados no estudo, os autores defendem que, mais do que embelezar a cidade, “a arte pública de Macau deve ligar os comunicadores a vários públicos no processo de comunicação cultural urbana”, sempre numa ligação próxima à cidade, reparando “o contexto urbano e reforçando o seu posicionamento”. Além disso, a arte pública urbana possui também a função de “reforço das funções educativas, sociais e práticas”, contribuindo para “melhorar a impressão negativa que a arte pública causa a Macau”.

Os académicos recordam que o pequeno enclave foi o primeiro local, em território chinês, onde a cultura ocidental entrou, fazendo com que Macau tenha hoje “um encanto cultural único e uma coexistência harmoniosa das culturas chinesa e ocidental”.

Desta forma, “o desenvolvimento da arte pública urbana não é apenas um meio de divulgar a longa história e cultura de Macau, mas também uma forma eficaz de Macau se transformar num centro mundial de turismo e lazer” e “uma base de intercâmbio e cooperação com a cultura chinesa”. Estas ideias vão de encontro à “corrente principal, de coexistência multicultural”, patentes no projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, ressalva o estudo.

28 Mai 2024

ARTM | Defendidas alternativas a prisão para consumidores de drogas

O presidente da Associação de Reabilitação dos Toxicodependentes de Macau reiterou que pesadas penas de prisão não são respostas eficazes na luta contra a droga. Por sua vez, a directora executiva da Agência das Nações Unidas para os Assuntos de Droga e de Crime defendeu uma postura “equilibrada” para lidar com a toxicodependência

Com agência Lusa 

 

O presidente da Associação de Reabilitação dos Toxicodependentes de Macau (ARTM) defendeu na sexta-feira que devia existir uma “maior vontade” de quem julga casos relacionados com droga em Macau de encontrar alternativas à prisão. Deveria haver “maior vontade de quem sentencia, de dar oportunidade às pessoas para entrarem para o tratamento, sem ter que enviar para a prisão”, disse Augusto Nogueira, rejeitando, no entanto, necessidade de mexidas legislativas.

O consumo de droga em Macau é criminalizado e punido com pena de prisão até um ano ou até 240 dias de multa, mas desde 2009, a legislação prevê, em alguns casos, a suspensão da pena a quem se sujeite voluntariamente a tratamento ou internamento.

“Qualquer lei que coloca as pessoas que consomem drogas na prisão é uma lei dura, porque não há necessidade, pode haver sempre outras alternativas para as pessoas que consomem drogas”, constatou. Questionado sobre a possível descriminalização do consumo, à semelhança do que acontece em Portugal desde 2001, Augusto Nogueira disse não “haver uma necessidade actualmente em Macau”, visto serem contextos diferentes.

“Portugal fê-lo porque estava numa situação diferente nessa altura. No final dos anos 1980 e nos anos 1990 era uma situação pandémica, em que quase todas as famílias tinham pessoas a consumir drogas. Era uma situação muito complicada, o número de pessoas que consomem drogas é completamente diferente do número em Macau”, considerou.

Em 2023, no território de cerca de 680 mil habitantes, foram contabilizados 119 consumidores, mais 34 do que no ano anterior e menos 112 do que em 2021, de acordo com o Sistema de Registo Central dos Toxicodependentes de Macau. Importa realçar que este registo apenas contabiliza as pessoas que estão em tratamento ou a contas com a justiça por terem sido apanhadas pelas autoridades a consumir estupefacientes.

No entanto, apesar de indicar uma “situação bastante estável” no consumo local, Nogueira admite haver “casos escondidos” e considera imperativo persistir nos trabalhos de prevenção e de proximidade para incentivar ao tratamento: “Quando existe uma lei que criminaliza as pessoas, obviamente tem que haver, as pessoas consomem drogas às escondidas”, realçou.

O responsável da ARTM falava aos jornalistas à margem de um encontro com a directora executiva da Agência das Nações Unidas para os Assuntos de Droga e de Crime (UNODC), Ghada Waly.

De frisar que, recentemente, foi publicado na revista académica Asian Journal of Addictions (AJA) o estudo de uma técnica superior da Polícia Judiciária de Macau, Connie Lok Cheng, que defende precisamente o contrário, ou seja, o aumento das penas para os crimes de relacionados com drogas, além da reabilitação obrigatória. O trabalho intitula-se “Research on Optimization of Adolescent Drug Abuse Prevention Policies in Macao” [Investigação sobre a Optimização das Políticas de Prevenção da Toxicodependência na Adolescência em Macau], que cita os exemplos mais duros, em matéria de legislação anti-droga, do mundo, nomeadamente a aplicação da pena de morte na China ou Singapura.

“Na perspectiva da prevenção da toxicodependência entre adolescentes, é necessário reforçar as penas para o tráfico, transporte e fabrico de drogas, de forma a reduzir a oferta de drogas no mercado e, assim, diminuir o risco de os adolescentes entrarem em contacto com as drogas”, lê-se.

A autora escreveu ainda que “em comparação com as regiões vizinhas, as penas para os crimes de droga são mais leves”, sendo referido os casos do Interior da China, Taiwan ou Singapura onde “a pena máxima para o tráfico de droga é a pena de morte”. Pelo contrário, destaca a autora, “em Macau há apenas uma pena de prisão de duração determinada”.

Connie Lok Cheng defendeu também que uma reabilitação opcional contribui para reduzir “a severidade e a gravidade das penas”, dando como exemplo o de Hong Kong e China, onde se aplica “um modelo obrigatório de reabilitação de toxicodependentes para aumentar a severidade das penas”.

Assim, a técnica da PJ sugere, no referido estudo, “um modelo de reabilitação faseada se a reabilitação voluntária não mostrar eficácia dentro de um determinado período, e depois fazer a transição para a reabilitação obrigatória para reforçar os efeitos do tratamento e da dissuasão”.

Equilíbrio precisa-se

Em Macau apenas por umas horas para conhecer o trabalho da organização não-governamental, Ghada Waly indicou, em conferência de imprensa, a importância de uma visão equilibrada por parte dos governos no controlo da droga.

“A minha mensagem para os governos é que tenham sempre uma abordagem equilibrada, em que observem as convenções, onde haja espaço para o tratamento, para tratar a dependência da droga como um desafio da saúde pública, mas também olharem para como o sistema judicial pode ser mais eficiente”, disse.

Waly notou que o facto de as autoridades financiarem uma organização como a ARTM, “a trabalhar simultaneamente na prevenção, tratamento, reabilitação e formação profissional, ” é um “passo positivo”.

Natural do Egipto, Ghada Waly é a primeira mulher a liderar este organismo da ONU e conta com 28 anos de experiência na área do alívio da pobreza e protecção social. Antes de ocupar o cargo na ONU Ghada Waly foi Ministra da Solidariedade Social do Egipto.

A Agência das Nações Unidas para os Assuntos de Droga e de Crime (UNODC) foi criada em 1997, mas desde 1946 que a ONU tem em funcionamento a Comissão de Estupefacientes, um dos principais organismos desta entidade para lidar, a nível global, com os fenómenos de consumo e tráfico de droga.

Em Março deste ano decorreu a 67ª sessão desta comissão, tendo sido abordado, segundo o website oficial da ONU, um “cenário cada vez mais complexo” que passa pela existência de “redes de tráfico de droga, uma oferta recorde de drogas ilícitas e opções limitadas de tratamento para os consumidores de droga”, descreveu a UNODC.

Nesta ocasião, Ghada Waly destacou o facto de os “desafios relacionados com as drogas estarem a evoluir rapidamente”, devido à rápida entrada e dissimulação das drogas sintéticas no mercado. “As redes de tráfico têm evoluído no que diz respeito aos modelos de negócio, além de que os mercados ilícitos se sobrepõem aos conflitos e instabilidade”, declarou a directora-executiva da UNODC.

Ghada Waly apelou à Comissão de Estupefacientes que sejam encontradas “respostas equilibradas que protejam as nossas comunidades, promovam a saúde pública e defendam os direitos humanos”, defendendo que “nenhuma medida de policiamento e aplicação da lei vai acabar com o mercado de drogas ilícitas enquanto houver uma enorme procura”.

Além disso, acrescentou que “nenhuma medida de prevenção, tratamento e redução de danos irá acabar com a dependência e distúrbios generalizados enquanto substâncias perigosas continuarem a inundar as comunidades”. Lembrando a crescente tendência do tráfico de droga transfronteiriço, Ghada Waly destacou que “nenhum país pode proteger as suas fronteiras e cidadãos sozinho”.

Destaque ainda para o facto de a ARTM ter sido uma das 130 signatárias de uma carta aberta a Ghada Waly aquando da realização da 66ª Comissão de Estupefacientes, no ano passado, enviada pela Federação Mundial contra as Drogas [World Federation Against Drugs].

Nesta carta aberta foi lançado um apelo “para a promoção de serviços de saúde que não sejam discriminatórios, baseados em provas, informações sobre o trauma” e que sejam também “sensíveis ao género, à cultura e idade” de consumidores. Foi salientada “a necessidade de continuar a promover a prevenção baseada em provas, o acesso a tratamento e recuperação”, bem como o incentivo “à monitorização e avaliação com dados separados por género”.

26 Mai 2024

BEYOND Expo | A cimeira de tecnologia que quer ser a Websummit da Ásia

Arrancou ontem mais uma edição da “BEYOND Expo”, a cimeira de tecnologia e empreendedorismo que se quer afirmar como uma Websummit deste lado do mundo, chamando a Macau startups e investidores nas áreas da tecnologia, inovação e meios digitais. Para Lu Gang, co-fundador do evento, juntamente com Jason Ho, filho do Chefe do Executivo, as expectativas são elevadas

 

A Websummit, um dos maiores eventos mundiais na área da tecnologia, startups, inovação e empreendedorismo, criada por Paddy Cosgrave, é conhecida em todo o mundo e até tem alguma presença do mercado asiático. Contudo, para Lu Gang não chega.

O co-fundador da “BEYOND Expo”, cimeira tecnológica e de empreendedorismo local que arrancou ontem no Venetian, e que termina no sábado, quer transformar o evento numa espécie de Websummit, mas virada para o mercado asiático. Tudo a partir de Macau, que convenientemente assume o papel de plataforma comercial e de serviços, e uma porta de entrada para o projecto da Grande Baía.

“Já estivemos na Websummit, e considero que é uma grande plataforma de tecnologia e eventos, como são outros eventos onde já estivemos, em Las Vegas e Helsínquia. A grande razão pela qual criámos a BEYOND é porque olhamos para estas grandes plataformas, como a Websummit, e vemos uma grande presença de startups de toda a Europa, mas não da Ásia”, confessou ao HM.

Para Lu Gang, “nos últimos dez anos temos visto cada vez mais inovação a surgir na Ásia. Mas, na verdade, vemos poucos eventos como a Websummit a acontecer deste lado do mundo”. “É difícil, mas estamos a tentar construir algo como a Websummit, que tem reunido muitas pessoas e empresas na Europa. Mas defendemos que é necessária uma plataforma que, todos os anos, agregue pessoas e companhias ligadas à inovação tecnológica da Ásia”, acrescentou.

Ao lado de Lu Gang está Jason Ho, filho do Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, que não se mostrou disponível para uma entrevista. Até sábado são esperados diversos painéis e eventos com dezenas de oradores, cerca de 800 expositores e muitos palcos onde se falará de liderança no feminino, alterações climáticas ou tecnologias da saúde. A BEYOND Expo tem três marcas associadas, nomeadamente a “BEYOND Healthcare”, virada para o debate em torno da inovação na saúde, a “BEYOND ClimateTech”, sobre a forma como as novas tecnologias podem ser utilizadas para dar respostas em matéria de alterações climáticas, e a “BEYOND Consumer Tech”, em prol de soluções sobre formas de consumo.

Organizado desde 2021, o evento passou por várias alterações devido à pandemia, sendo esta a segunda vez que se realiza de forma presencial e com a participação de muitas entidades e personalidades de cariz mundial.

“Procuramos, este ano, ter mais participantes internacionais, ao nível dos media, governos, startups, empresas. A BEYOND está a tornar-se verdadeiramente num dos grandes eventos internacionais que se realizam em Macau”, disse Lu Gang.

Inspiração para as PME

Mais do que ser um evento cada vez mais internacional, a BEYOND Expo quer tornar-se influente para os negócios locais, criando uma rede de contactos e de parcerias. “O nosso objectivo é fazer com que as pequenas e médias empresas (PME) locais se sintam inspiradas pelo nosso evento e se tornem cada vez mais empresas internacionais. Talvez nos próximos cinco anos vejamos mais PME internacionais ou startups a nascer localmente”, adiantou.

Lu Gang, que não é de Macau, diz que a organização escolheu o território para a realização da BEYOND Expo por ter “uma localização perfeita para grandes eventos”, graças aos sectores do turismo, hotelaria, entretenimento e restauração.

Apesar das vantagens geográficas, Macau ainda é um território desprovido de um sector tecnológico desenvolvido se compararmos com regiões como Xangai, Pequim ou Hong Kong.

“Se olharmos para o ecossistema tecnológico, comparando com outras grandes cidades da Ásia, penso que Macau não tem grandes vantagens. Os locais precisam ainda de fazer mais tentativas e de se esforçar mais para criar projectos na área tecnológica. A nossa visão, com a BEYOND Expo, é trazer para Macau as grandes empresas e empresários para que possam encorajar os jovens empresários locais a desenvolver projectos mais inovadores.”

Vozes femininas

Uma das novidades deste ano é o painel “SheTech Summit”, que decorre hoje e aborda temas como a liderança feminina nas empresas de tecnologia e de como as mulheres trazem vantagens ao mundo empresarial. Entre as oradoras destaque para Ming Gao, presidente da sucursal do ICBC (Industrial and Commercial Bank of China) em Macau, Dragana Kostic, vice-presidente da área de tecnologia da BMW para a região da Ásia Pacífico, ou Maggie Liu, vice-presidente da NVIDIA Global.

Lu Gang contou ao HM que o empreendedorismo feminino é uma das grandes áreas a desenvolver pela BEYOND Expo. “Queremos destacar as contribuições das mulheres nesta área, e temos uma grande diversidade na edição deste ano, desde líderes de grandes empresas, como a NVIDIA ou a BMW, a gestoras de startups.”

Depois de tantas idas e vindas devido à pandemia, a BEYOND Expo parece estar pronta a arrancar. Lu Gang mostra-se optimista em relação ao futuro do evento.

“Esperamos construir uma expo cada vez maior, e que seja, de facto, a versão asiática da Websummit ou de outros eventos do género na área da inovação tecnológica. Queremos construir uma plataforma na Ásia que seja também como uma festa, ou grande evento anual, para organizarmos aqui a grande festa da tecnologia da Ásia todos os anos, e ter convidados a falar das suas ideias e apresentar os seus mais recentes produtos deste lado do mundo.”

O co-fundador da BEYOND Expo fala ainda das conexões crescentes não só com a Europa como com a América do Sul e o Médio Oriente. “Todos [empresas e personalidades] podem vir à Ásia mostrar o seu potencial, e esperamos, de facto, criar mais parcerias e colaborações com países tanto do oriente como do ocidente. Queremos que a BEYOND se torne, de facto, cada vez mais influente e uma valiosa plataforma de tecnologia para todo o mundo.”

Apresentando a visão de alguém de fora, Lu Gang não deixou de comentar o posicionamento do jogo no evento e na economia, numa altura em que o Governo aposta cada vez mais em novos sectores de actividade para a diversificar a economia.

“No futuro continuaremos a ter jogo, mas podemos também ter tecnologia. Vemos também que há cada vez mais empresas chinesas a irem para mercados internacionais, então Macau poderia ser um lugar perfeito para essas empresas, sobretudo no acesso aos mercados internacionais e de língua portuguesa”, declarou Lu Gang.

“Embracing the Uncertainities” [Abraçar as Incertezas] é o mote da edição deste ano que tem também um painel dedicado ao investimento. Tem como nome “BEYOND Investment Summit” e conta com nomes como Harry Man, partner da “Maxi Partners”, na China, ou Jung-hee Ryu, CEO da FuturePlay.

Na “Asia-LATAM Tech Forum”, também uma novidade este ano na BEYOND Expo, o tema é “A New Era of Business and Cultural Cooperation” [Uma Nova Era de Cooperação Cultural e de Negócios], que acontece amanhã. É aqui que se verifica o lado internacional da BEYOND, com oradores da América Latina, como é o caso de Cassio Spina, presidente da “Anjos do Brasil” (Associação de Investidores-Anjo do Brasil) ou Ingrid Barth, presidente da “Abstartups”, a Associação de Startups do Brasil. Por sua vez, no “BEYOND Founder Forum” o tema é a inovação na ásia e o diálogo com jovens fundadores de empresas. Neste painel será orador Mario Yau Kwan Ho, presidente do conselho de administração do grupo NIP e presidente da “Macau Esports Federation”, bem como David Lee, CEO e co-fundador da Nex.

23 Mai 2024

Droga | Técnica da PJ defende penas mais pesadas e menciona pena de morte

Uma técnica superior da Polícia Judiciária defende num estudo que Macau deve aumentar as penas por consumo e tráfico de droga, destacando os exemplos do Interior da China, Taiwan e Singapura onde vigora a pena de morte. Para a autora, a actual legislação é “clemente” e deveria consagrar a reabilitação obrigatória

 

Consumir droga em Macau é um crime punido com uma pena de prisão que pode ir de três meses a um ano ou aplicação de multa no valor máximo equivalente a 240 dias. No caso do tráfico, a pena de prisão pode ir dos cinco aos 15 anos. Porém, Connie Lok Cheng, técnica superior da Polícia Judiciária (PJ), defende que a moldura penal deve ser agravada, considerando que Macau tem penas baixas quando comparado com a China ou Hong Kong.

A conclusão consta do estudo “Research on Optimization of Adolescent Drug Abuse Prevention Policies in Macao” [Investigação sobre a Optimização das Políticas de Prevenção da Toxicodependência na Adolescência em Macau], publicado recentemente no Asian Journal of Addictions (AJA).

“Na perspectiva da prevenção da toxicodependência entre adolescentes, é necessário reforçar as penas para o tráfico, transporte e fabrico de drogas, de forma a reduzir a oferta de drogas no mercado e, assim, diminuir o risco de os adolescentes entrarem em contacto com as drogas”, lê-se.

A autora vai mais longe e chega mesmo a comparar Macau com jurisdições onde se aplica a pena de morte para este tipo de crimes. “Em comparação com as regiões vizinhas, as penas para os crimes de droga são mais leves”, é referido, apresentando-se os exemplos do Interior da China, Taiwan ou Singapura onde “a pena máxima para o tráfico de droga é a pena de morte”. Pelo contrário, destaca a autora, “em Macau há apenas uma pena de prisão de duração determinada”.

Para Connie Lok Cheng, “Macau implementa a reabilitação voluntária de toxicodependentes, o que reduz a severidade e a gravidade das penas”. A autora fala dos casos de Hong Kong e da China, onde se aplica “um modelo obrigatório de reabilitação de toxicodependentes para aumentar a severidade das penas”.

A responsável acredita que “devido ao facto de os custos de cometer crimes serem mais baixos, Macau tornou-se num paraíso para os grupos internacionais de tráfico de droga”.

Desta forma, “a sociedade deve discutir de forma colectiva e chegar a um consenso, reavaliando a necessidade da reabilitação compulsória”.

A técnica da PJ sugere “um modelo de reabilitação faseada se a reabilitação voluntária não mostrar eficácia dentro de um determinado período, e depois fazer a transição para a reabilitação obrigatória para reforçar os efeitos do tratamento e da dissuasão”.

Realidade escondida

A moldura penal do consumo e tráfico de droga não é alterada desde 2009, embora as autoridades tenham vindo a acrescentar, em diplomas avulsos, novas drogas cujo consumo, tráfico e fabrico é criminalizado.

A autora, que analisou dados oficiais do Sistema de Registo Central de Toxicodependentes do Instituto de Acção Social (IAS), bem como da PJ, descreve um decréscimo no número de consumidores notificados entre 2018 e 2022, nomeadamente de 424 para 85, sendo que os adolescentes representaram, em 2018, 5,7 por cento, enquanto em 2022 essa fasquia passou a 4,7 por cento.

“De um modo geral, o número de toxicodependentes notificados e a percentagem de toxicodependentes notificados com menos de 21 anos de idade diminuíram nos últimos anos”, destaca Connie Lok Cheng, que alerta, contudo, para um cenário de consumo escondido.

“É importante não esquecer a questão da natureza clandestina dos crimes de droga, que levou à redução no total do número de casos e detenções. Apesar de o número de adolescentes toxicodependentes registar uma tendência decrescente, isso não significa que o problema do consumo de drogas na adolescência tenha melhorado.”

Quanto aos dados da PJ, “o número de pessoas enviadas ao Ministério Público por tráfico e consumo de droga também diminuiu nos últimos anos”, devido “à eficácia dos esforços antidroga”, mas também “ao facto de a pandemia ter impedido os departamentos antidroga conexos de aceder a novos casos entre 2020 e 2022”.

A autora destaca que hoje a droga vende-se de várias formas, com novos tipos de embalagens, num fluxo de negócio cada vez mais digital. “Os adolescentes consomem mais frequentemente novos tipos de drogas, como cocaína, marijuana, metanfetamina (ice) e a ketamina. Estes novos tipos de drogas, em comparação com as drogas tradicionais como a heroína, têm uma natureza mais ‘dissimulada’, podendo ser simplesmente snifadas ou engolidas directamente, em vez de serem injectadas com uma seringa.”

Quanto aos locais de consumo, continuam a ser sítios escondidos. Em 2022, 25 por cento dos adolescentes consumiam em casa de amigos, um ligeiro aumento face aos 24,3 por cento dos jovens que cometiam esses actos em 2018. Se em 2018 21,6 por cento consumia em casa, o valor baixou para zero em 2022, enquanto o consumo em discotecas ou bares de karaoke, que em 2018 representava 24,3 por cento, aumentou exponencialmente para 50 por cento em 2022, depois de baixar para zero no ano anterior, devido ao encerramento destes espaços por causa da pandemia. Nota-se ainda um grande aumento nos consumos em parques, na rua ou casas de banho públicas, pois a percentagem passou de 2,7 por cento em 2018 para 25 por cento em 2022. Os dados citados pela técnica da PJ são provenientes do Sistema de Registo Central de Toxicodependentes do IAS.

Alerta nas fronteiras

Segundo a visão de Connie Lok Cheng, o panorama tem tendência a piorar se pensarmos que Macau caminha a passos largos para a integração regional, graças aos projectos da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, Zona de Cooperação Aprofundada de Guangdong e Macau em Hengqin ou ainda devido ao aumento de fluxo na ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau.

“Em resposta ao aumento contínuo da população de jovens que atravessa as fronteiras, é possível que a tendência para a toxicodependência ou o comportamento criminoso entre os adolescentes se torne ‘transfronteiriço'”, é descrito, sendo classificado como “proeminente” o “problema dos adolescentes que atravessam as fronteiras para consumir drogas”.

Connie Lok Cheng volta a citar dados oficiais que mostram que “antes da pandemia a situação dos adolescentes que atravessavam as fronteiras para consumir drogas era comum”, pois, segundo as estatísticas de 2018 e 2019, “de entre os toxicodependentes notificados com menos de 21 anos de idade, 33,3 e 58,3 por cento, respectivamente, foram para a China e Hong Kong para consumir drogas”.

O estudo fala ainda na existência de cinco grandes desafios no combate ao consumo e tráfico de droga, nomeadamente “o enfraquecimento das funções familiares”, devido ao elevado número de trabalhos por turnos que os encarregados de educação têm na indústria do jogo e do turismo, “a distribuição de droga na Internet, a descentralização do quadro anti-droga” e ainda aquilo que a autora diz ser “a clemência das sanções penais para os crimes relacionados com a droga”. É também acrescentado o factor “dissimulação do consumo e do tráfico de droga”.

Serviços confusos

Quanto à “descentralização do quadro anti-droga”, Connie Lok Cheng refere-se ao modelo dentro da Administração para a fiscalização e o combate, dada a existência de um “mecanismo descentralizado na luta contra a droga que não favorece a eficácia da aplicação das políticas”, por ser do tipo “guarda-chuva, operado sob coordenação de vários departamentos governamentais”, nomeadamente a PJ, IAS e Direção dos Serviços de Assuntos Jurídicos.

“A polícia, enquanto órgão de aplicação da lei, trata os crimes de droga como infracções públicas. Quando a polícia toma conhecimento de crimes de droga, intervém proactivamente e dá seguimento às investigações. Como resultado, a propaganda de prevenção do crime de droga conduzida pela polícia tende a inclinar-se para a aplicação da lei e a responsabilidade criminal.

Por outro lado, para os assistentes sociais, o principal objectivo da sua acção é orientar os jovens no sentido de estabelecerem bons padrões de vida, procurarem ajuda atempadamente quando enfrentam problemas com drogas e aceitarem tratamento profissional. As diferentes orientações promocionais podem causar confusão aos jovens quando recebem mensagens de diferentes perspectivas”, ressalva. Isto porque “quando os jovens toxicodependentes tomam conhecimento das consequências legais dos crimes de droga, o receio de serem responsabilizados criminalmente pode diminuir a sua vontade de procurar ajuda de forma proactiva”.

A autora dá ainda o exemplo da existência de “diferentes serviços de luta contra a droga, que criaram várias linhas directas para os serviços”, o que também pode confundir o consumidor que procura ajuda, remata.

22 Mai 2024

Turismo | Viagens domésticas na China continuam a dominar face a 2019

Um relatório do Mastercard Economics Institute destaca que o turismo doméstico na China ultrapassou as viagens internacionais. Por outro lado, o Japão atingiu níveis históricos no turismo graças à desvalorização do iene, atraindo mais de três milhões de estrangeiros em Março. Aqui mais perto, Hong Kong conseguiu estadias mais prolongadas

 

Depois de muito tempo com quarentenas prolongadas e fecho de fronteiras que impossibilitaram viagens internacionais, os cidadãos chineses habituaram-se a ir para fora cá dentro, uma vez que os dados relativos às viagens domésticas continuam a superar os das viagens internacionais.

Segundo o mais recente relatório do Mastercard Economics Institute (MEI) sobre o sector global do turismo, divulgado na última quinta-feira, “a dinâmica de viagens da China continental mudou, com maior importância [do turismo] a nível interno, uma vez que há uma maior percentagem de passageiros da China que viaja no seu país”, lê-se.

O relatório, intitulado “Travel Trends 2024: Breaking Boundaries” [Tendências de Viagem 2024: Quebrando Barreiras], que analisa 74 mercados e 13 só na região da Ásia-Pacífico, refere que um maior número de viagens domésticas constituiu “um impulso para as empresas locais da China”.

No primeiro trimestre deste ano, as viagens domésticas estavam 15 por cento acima dos níveis registados em igual período de 2019, antes da pandemia, o que significa que o “tráfego doméstico de passageiros se normalizou totalmente”.

O relatório do MEI conclui que “o tráfego internacional deverá recuperar mais tarde”, tendo em conta os dados fornecidos pela Administração da Aviação Civil da China. O tráfego turístico internacional “ainda não recuperou e está actualmente 19,7 por cento abaixo dos níveis de 2019”, também no que diz respeito ao primeiro trimestre deste ano.

O MEI descreve que “a história do turismo doméstico [na China] é positiva, com a procura a exceder os níveis de 2019”. Este facto “pode atribuir-se parcialmente a uma mudança nas preferências por destinos domésticos à medida que o interesse no turismo local se expande”. Assim, “as quotas de tráfego de passageiros na China continental reformularam-se nos últimos anos, com ênfase no turismo interno”.

A maior recuperação de viagens domésticas no país em relação a voos internacionais fez com que “mercados historicamente dependentes dos viajantes da China continental tenham registado uma mudança de quota correspondente a favor dos viajantes dos Estados Unidos, Europa e resto da Ásia-Pacífico”, lê-se no relatório.

Estadias mais prolongadas

O relatório, que não menciona Macau, dá ainda conta do aumento do número de estadias em algumas regiões da Ásia-Pacífico (APAC), nomeadamente Hong Kong. Nesta zona do globo, os turistas “estão a prolongar as viagens em média de 1,2 dias até um total de 7,4 dias, motivados por destinados baratos, climas quentes e taxas de câmbio favoráveis”. O MEI aponta que em 2019 a média de estadias era de 6,1 dias por viagem.

No caso específico de Hong Kong, “os visitantes estrangeiros estão a permanecer [no território] uma média de 6,4 dias, um aumento, em média, de 1,1 dia em relação a 2019”. O relatório dá conta que, para este ano, é esperado um crescimento adicional em termos da média diária de estadias relacionado com as isenções de vistos na região da Ásia-Pacífico, “tal como um aumento da capacidade de voos internacionais que irão beneficiar destinos como Singapura, Malásia e Tailândia”.

“Entre os destinos da APAC com um maior aumento da duração de viagens entre 2019 e 2024 foi a Índia, com mais dois dias, o Vietname, com dois dias mais, e Indonésia, com uma média de 1,9 dias”. Além disso, as estadias no Japão aumentaram, em média, 1,4 dias, “em grande parte devido à fraca inflação dos preços de quartos de hotel durante este período, em comparação com outros mercados”.

Bendito iene

Relativamente ao Japão, o país está a posicionar-se como um dos maiores destinos turísticos da APAC e do mundo. O fluxo de turistas tem atingido nos últimos meses números recorde devido, em grande parte, à desvalorização do Iene.

O relatório descreve que “o Japão tem constituído uma das histórias mais interessantes no sector das viagens deste ano”, com “um fluxo recorde de passageiros impulsionados pelo iene historicamente fraco, o mais baixo registado desde Março de 1990″.

Prova do impacto positivo da desvalorização do iene no turismo é o facto de o país do “sol nascente” ter recebido em Março mais de três milhões de turistas estrangeiros (3 081 600), o número “mais elevado de sempre”, tendo em conta que “nem sequer chegámos ao pico da época de viagens”, destaca o relatório.

Pelo contrário, “as chegadas de visitantes da China ao Japão diminuíram cerca de 36,5 por cento em relação aos níveis registados em 2019”.

Em termos globais, este ano arrancou “com um forte crescimento no sector das viagens”, não apenas “em termos de despesas [dos turistas], mas também do número de pessoas que viajam”.

Registou-se, nos primeiros três meses do ano, “um máximo histórico de cerca de 15,9 milhões de americanos que viajaram internacionalmente”, além de que os grandes eventos “estão a impulsionar as tendências de viagem”, como concertos ou competições desportivas. Além do Japão, países como a Irlanda e Roménia “registaram o maior crescimento na percentagem de despesas de turistas em relação ao ano passado”.

Estadias mais prolongadas

Em todo o mundo verificou-se, nos últimos meses, que “os viajantes estão a prolongar as suas viagens em cerca de um dia, em média”, em relação “ao que era normal antes da covid-19”.

Neste caso, as regiões do Médio Oriente e África são as que “mais têm beneficiado com esta tendência, ambas com cerca de dois dias extra incluídos no destino”. Já os Estados Unidos “têm beneficiado menos desta nova tendência, registando um aumento menor na duração das viagens prolongadas”.

No que diz respeito ao panorama do consumo, é certo que “os preços [do turismo] continuam elevados, mas o sector das viagens está bem posicionado com um consumidor resiliente”.

“Na indústria de viagens e lazer, os preços ao consumidor, especialmente na indústria hoteleira, permanecem elevados em relação aos níveis anteriores à pandemia. Com preços elevados, verificámos que há um número crescente de consumidores a procurar viagens mais económicas.”

O MEI explica que os preços elevados se explicam por uma “combinação de capacidade limitada, escassez de oferta e custos laborais elevados”, com exemplos adicionais de “escassez de aviões, pilotos e o aumento generalizado do crescimento dos salários reais”.

Há ainda o factor “pressão da procura”, quando há mais turistas a viajar do que a oferta disponível. Assim, o MEI estima, para este ano, que se continue a registar inflação no turismo “induzida pela procura ao longo do ano, em parte devido à economia baseada em experiências e grande extensão das intenções de viagem”.

Na área da hotelaria, “os quartos vão continuar a estar totalmente reservados, o que constitui um alívio para hotéis e motéis que ficaram gravemente afectados pelos encerramentos prolongados nos anos de 2020 a 2022”. Em termos gerais, “os preços vão permanecer elevados no sector das viagens, lazer e hotelaria, mas não de forma preocupante”.

Munique no top

O turismo é, por sua vez, cada vez mais pautado por experiências. “Os viajantes a nível mundial continuam a dar prioridade às experiências. Gastaram mais em vida nocturna e menos em compras a retalho, sector que recuperou a um ritmo mais lento”, descreve-se no relatório.

A análise do MEI traça ainda o top 10 dos destinos mais populares para este Verão, com base nos dados de marcações de hotéis e viagens. Munique, na Alemanha, será o destino mais popular para este Verão, tendo em conta que o país vai receber o campeonato europeu de futebol, o EURO 2024. O jogo de abertura será nesta cidade. Segue-se Tóquio, no Japão, tendo em conta “o iene historicamente fraco e um ano inteiro sem restrições” no contexto da pandemia. Em terceiro lugar surge Tirana, capital da Albânia, “que fica a uma curta distância de carro de muitos hotéis costeiros e é muito mais económica em comparação com os principais centros turísticos de outros países europeus”.

No top 10 entram ainda Nice, Cancun, Bali, Banguecoque, a ilha de Corfu e Aruba, uma pequena ilha no mar das Caribe.

21 Mai 2024

TDM | O “problema” inicial e o sucesso das emissões, 40 anos depois

A TDM nasceu a 13 de Maio de 1984. A data, coincidente com a celebração das primeiras aparições de Fátima, foi escolhida pelo Governador Almeida e Costa. Os 40 anos da TDM foram celebrados na segunda-feira em Lisboa, com uma palestra onde participaram algumas personalidades políticas que recordaram como o projecto da TDM foi “um problema” que acabou por se revelar um sucesso

 

Há 40 anos, o panorama audiovisual local levou uma reviravolta com o nascimento da Teledifusão de Macau (TDM), a estação pública de televisão e de rádio que levou profissionais da RTP para o território para criar conteúdos informativos e de entretenimento sobre Macau, como até então não se tinha visto.

A data do nascimento da TDM, celebrada oficialmente na segunda-feira, dia 13 de Maio, foi escolhida pelo Governador Almeida e Costa que, em 1984, liderava a Administração portuguesa, e que coincidia com o dia da efeméride religiosa das primeiras aparições de Nossa Senhora de Fátima aos três pastorinhos.

A ideia era fazer um canal bilingue que fosse o espelho de duas línguas e culturas. A transferência de administração portuguesa de Macau para a China estava a chegar e a criação do canal transformou-se num dossier diplomático complexo e parte integrante das negociações.

A história da TDM foi recordada na segunda-feira em Lisboa no Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) num evento que reuniu os profissionais da RTP que ajudaram a fazer o canal e a sua informação, mas também personalidades políticas portuguesas que testemunharam e participaram na criação da TDM. Todos destacaram as dificuldades de um projecto complexto que tinha tudo para nascer torto, mas que acabou por vingar. Disso deu conta Nicolau Santos, actual presidente do conselho de administração da RTP.

“A TDM é um projecto notável que se afirmou em condições que não eram particularmente fáceis, com muitas pessoas que não falavam português. Esta é uma história de sucesso de que a RTP se orgulha particularmente. A TDM presta um serviço público moderno, eficaz e com forte impacto no território, sendo a defesa da língua portuguesa um dos objectivos estratégicos. Orgulhamo-nos muito do sucesso da TDM, que é a expressão do conhecimento e competências que a RTP possui na área do serviço público.”

António Vitorino, figura do Partido Socialista (PS) e secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares do Governo português entre 1983 e 1985, com a tutela do audiovisual, foi mais claro quanto às dificuldades do nascimento da TDM.

“A TDM era, na altura, um problema”, começou por dizer. “A TDM estava no coração de um dos temas mais delicados da Declaração Conjunta que era a questão dos direitos fundamentais como a liberdade de expressão e de imprensa, matéria a que a parte portuguesa era sensível. O mérito da intervenção sobre a TDM foi o meu colega de Governo, Carlos Monjardino, que persuadiu o Governador Pinto Machado a incluir a questão da TDM nas negociações sobre o contrato de jogo para garantir a sustentabilidade da televisão de Macau além da administração portuguesa do território”, recordou.

Línguas de fora

As primeiras emissões da TDM aconteciam apenas no horário das 18h às 23h e intercalavam entre chinês e português. Só mais tarde se criaram dois canais diferentes com conteúdos próprios, sendo que actualmente a TDM tem cinco canais, incluindo um com emissões em inglês.

Desde cedo que a TDM se tornou numa questão diplomática, onde o bilinguismo era fundamental, destacou também António Vitorino. Não era apenas importante ter emissões locais em português, mas também em chinês.

“O tema do bilinguismo era central nas negociações entre Portugal e a China. Este não era uma arma de arremesso, mas sim uma ferramenta forte utilizada pela parte chinesa para introduzir o chinês como língua corrente na Administração, que na sua maioria era composta por pessoas que tinham o português como língua de trabalho.”

Além disso, recorda António Vitorino, Portugal “queria garantir que o português, que seria língua oficial [da RAEM], teria garantias de estabilidade”, sendo “imprescindível a garantia da manutenção de um canal bilingue” nas negociações para a Declaração Conjunta, assinada em Pequim em 1987.

Segundo António Vitorino, a TDM com emissões bilingues constituía “um factor de confiança para a população de Macau e esse argumento foi muito bem aceite pela China”.

“Um canal marcante”

Maria de Belém Roseira, outra figura do PS, ex-candidata à presidência da República portuguesa e administradora da TDM entre 1986 e 1987, recorda que aceitou o cargo numa altura em que a empresa “atravessava problemas financeiros e de recursos humanos”.

A responsável, que também classificou o nascimento da TDM como um “dossier complicado”, frisou que “nunca aceitaria ser presidente” e que veio para Macau para fazer os estatutos da empresa. “Quis vir-me embora, mas Pinto Machado achou que deveria continuar e fui ficando”.

“Foi interessante perceber a importância estratégica da TDM e de como os chineses atribuíram à TDM uma atenção e sensibilidade que levaram a alguma alteração de comportamentos. Sentiu-se uma postura diferente até à assinatura da Declaração Conjunta e depois, porque as preocupações e princípios passaram a ser diferentes. A transição de Macau estava a prazo e era normal que os chineses tentassem ter uma presença mais marcante e de maior intervenção na gestão diária da empresa.”

Maria de Belém falou ainda da polémica surgida em 1987 quando, já com Carlos Melancia como Governador, se tentou privatizar parcialmente a TDM com a entrada de um novo accionista, a Emáudio, ligada a Robert Maxwell.

“Era apetecível do ponto de vista comercial um canal daquela natureza”, lembrou Maria de Belém. “Foi aí que surgiram as dificuldades com a Emáudio e Robert Maxwell e empresas que tiveram alguns problemas. Estavam a passar-se coisas que não me agradavam”, disse apenas, sem se prolongar em detalhes.

Para a responsável, que também foi ministra da Saúde, a TDM “era realmente um canal muito marcante para a comunidade portuguesa que estava em Macau”, sendo que a língua tem hoje “um papel estratégico fundamental”.

A prova de fogo

Jorge Silva, um dos principais profissionais da TDM até hoje, recordou as primeiras emissões e os desafios em termos técnicos. “Na altura, a população de Macau via a TVB de Hong Kong e outros canais. A TDM foi uma pedrada no charco porque, pela primeira vez, Macau via-se a si própria, exibindo-se temas e reportagens sobre o território. O interesse da população no canal foi-se renovando e aumentando ao longo dos anos.”

Assinada a Declaração Conjunta, começou-se a preparar a transição e a verdadeira prova de fogo da TDM em termos técnicos foi a transmissão em directo das cerimónias da transferência, a 20 de Dezembro de 1999.

“A transferência de Hong Kong foi dois anos antes [1997] e aprendemos muito com essas transmissões. Eram muitos os convidados presentes, foram muitas horas no ar, cinco ou seis, e esse foi, talvez, o desafio mais marcante da TDM, tal como a chegada dos Governadores ao território. Tal implicava muitas horas de transmissão, desde o jetfoil até à chegada ao Palácio.”

Se a TDM nasceu como projecto bilingue, será que se mantém na sua plenitude nos dias de hoje? Jorge Silva assegura que sim. “O espaço em língua portuguesa continua o mesmo. Com a separação dos canais continuamos a ter o mesmo espaço de emissão, formámos já jovens bilingues na redacção portuguesa, que dominam também o inglês e que são bastante úteis. A TDM está hoje muito virada para a troca de programas com o Interior da China e países de língua portuguesa.”

O pivot de informação referiu também que “há o acordo entre a China e Portugal para a manutenção dos dois canais na TDM e seria bom que isso continuasse”. “Penso que a China vai honrar os seus compromissos como tem honrado. Os critérios editoriais são definidos pela própria empresa. Gostaria que esse espaço de liberdade e ideias continuasse na TDM e que Macau mantivesse essa autonomia e identidade própria, com ligação a Portugal, mas mantendo essa diferença no espaço e país em que estamos inseridos, que é a China”, concluiu.

Carmen Amado Mendes, presidente do CCCM, destacou que “uma televisão de língua portuguesa em Macau tem, de facto, um papel essencial”. “Foi a televisão que foi dando a conhecer a realidade de Macau e todas as mudanças que foram ocorrendo ao longo de 40 anos. O crescimento da própria TDM é também inegável, tendo passado de um canal bilingue para ter cinco canais. Esperamos estar aqui daqui a 40 anos a falar sobre mais um aniversário e fazemos votos para que este crescimento se mantenha”, adiantou.

16 Mai 2024

Estudo conclui que nanoplásticos afectam células da pele de seres humanos e de peixes

A exposição a nanoplásticos afecta as células da pele de seres humanos e de peixes, concluiu um estudo realizado por investigadores do Centro de Ciência do Mar (CCMAR) e da Universidade do Algarve (UAlg), hoje divulgado.

Para chegar a esta conclusão, os investigadores “desenvolveram uma abordagem inovadora ‘in vitro’” para estudar os efeitos da absorção das minúsculas partículas de plástico nas principais células que compõem a derme, designadas por fibroblastos, explicou a academia em comunicado.

O estudo, publicado na revista Science of the Total Environment, pretendeu compreender “como é que os nanoplásticos interagem com a pele”, um dos primeiros pontos de contacto com as partículas que estão em crescente presença no ambiente.

De acordo com o investigador do CCMAR e da UAlg, Maoxiao Peng, citado na nota, “esta nova abordagem permite a utilização de linhas celulares da pele em ambiente laboratorial para recolher informação consistente e robusta sobre os efeitos dos nanoplásticos”.

Esta utilização, refere o investigador, torna-a “mais ética e mais rápida porque evita a utilização de animais para o mesmo efeito”.

A nova abordagem revelou que os nanoplásticos desencadeiam diferentes respostas fisiológicas nos vários tipos de células de fibroblastos, “acumulando-se de forma consistente em redor do núcleo e das membranas das células”.

Segundo a investigadora Rute Félix, também citada na nota, foi constatado que os efeitos negativos nas células da pele variam conforme as características dos nanoplásticos, tais como o seu tamanho e a concentração. “Estes resultados sugerem que os nanoplásticos podem comprometer a saúde da pele”, alerta.

Por seu turno, a investigadora Deborah Power realça que “este estudo abre caminho para uma melhor avaliação dos riscos e efeitos dos nanoplásticos a nível biológico e ecossistémico”.

Face às conclusões do estudo, Deborah Power alerta para a “necessidade urgente” de se reduzir a presença de plásticos no ambiente, “dado o seu potencial para afetar a saúde humana e o biossistema em geral”.

Os investigadores concluem que o estudo no contexto do Plastifish, um projecto com Macau e a China apoiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, representa “um importante avanço na compreensão dos impactos dos nanoplásticos na saúde da pele”.

15 Mai 2024

Tecnologia | Jovens e estudantes são os que mais usam IA em Macau

A Inteligência Artificial é cada vez mais usada por residentes que procuram benefícios ao nível do trabalho e ensino, sobretudo ChatGPT e Poe. Jovens e estudantes dominam a utilização destas novas tecnologias. As conclusões constam no relatório “Tendências do Uso da Internet em Macau” da Associação para a Investigação na Área da Internet de Macau

 

A Inteligência Artificial (IA) está a popularizar-se em todo o mundo e também em Macau, onde cada vez mais residentes recorrem a ferramentas como ChatGPT ou Poe, para produzir textos para diversos fins ou simplesmente para consultar informação.

A conclusão consta do relatório “Internet Usage Trends in Macao” [Tendências do Uso da Internet de Macau], relativo a este ano, que aponta que, dos 1.502 entrevistados, todos residentes, 64 por cento conhece a IA enquanto 27 por cento já usou estas plataformas, “sendo as taxas de conhecimento e de utilização mais elevadas do que em 2023”. No ano passado, 50 por cento dos inquiridos dizia conhecer a IA. O ChatGPT é usado por 78 por cento dos inquiridos, seguindo-se o Poe com 19 por cento.

O relatório indica ainda que “os grupos mais jovens e de estudantes apresentam taxas de utilização mais elevadas”. No que diz respeito aos objectivos com que usam estas plataformas, 22 por cento dos internautas espera que a IA “melhore a eficiência da aprendizagem ou o trabalho”, além de que 15 por cento recorre a estas ferramentas para “responder a questões da vida quotidiana”.

Dos inquiridos, 49 por cento diz-se muita disposta a usar a IA no futuro, sendo que “a vontade dos jovens e estudantes é maior”. Tal demonstra que “a vontade dos internautas de utilizar a IA generativa está a aumentar gradualmente”.

O relatório foi produzido pela Associação de Macau para a Investigação na Área da Internet [Macao Association for Internet Research – MAIR] juntamente com a consultora eRS e-Research, fundada por Angus Cheong, ex-académico da Universidade de Macau.

Os 1.502 entrevistados têm idades compreendidos entre 6 e 84 anos, ou seja, foram inquiridas crianças sem idade escolar para terem capacidades de literacia que as habilitem a usar as ferramentas em questão. O relatório conta com Angus Cheong como investigador principal, além de ter sido produzido por Athena Seng, Jing Li, Wandy Mak, Erica Kwok, Candy Fong, Karen U, Holly Ho. As entrevistas realizaram-se em Janeiro deste ano.

Os perigos associados

Apesar da crescente penetração da IA no território, os autores do estudo não deixam de apontar riscos que estão associados a estas plataformas. “É ainda necessário ter bastante cuidado na aplicação da IA em cenários específicos”, pois os resultados “podem ser afectados por questões como a parcialidade dos dados, preconceitos e incorrecta compreensão semântica”, o que pode levar a IA a “distorcer os factos”.

“As pessoas não devem aceitar cegamente a informação gerada pelo modelo, devendo aprender e a avaliar [os conteúdos] com exactidão e racionalidade”. Assim, sugere-se que no futuro “o Governo, o meio académico e empresas possam trabalhar em conjunto para reforçar opções de exploração e aplicação da IA”.

“Com um esforço conjunto, Macau pode melhor promover o desenvolvimento da IA, ajudando a inovação e o progresso em vários sectores e proporcionando aos residentes formas mais convenientes e eficientes de aprender, trabalhar e viver”. Tal pode trazer “mais possibilidades e mudanças para o futuro” do território.

Uso superior à média

Em termos gerais, Macau apresenta uma taxa de utilização de internet de 93 por cento, enquanto a taxa de Internet móvel é de 91 por cento. O relatório destaca o facto de “a taxa de adopção da Internet ser superior à média mundial”, que é de 66 por cento, estando “entre as melhores da Ásia”.

Para se perceber a evolução do uso da internet no território, importa referir que, em 2001, a taxa de utilização era de apenas 33 por cento, e que nos últimos cinco anos tem-se mantido sempre acima dos 90 por cento, entre 91 e 93 por cento.

De destacar o facto de o Índice de Clivagem Digital ter diminuído para quase zero, sinónimo de que “os residentes de todos os estratos sociais têm iguais oportunidades de acesso à Internet”, sobretudo os telemóveis.

Os residentes recorrem à internet sobretudo para fins de lazer e entretenimento, sendo que uma “elevada percentagem de agregados familiares possui computadores”. Destaque para o maior uso do tablet em relação ao computador de secretária ou portátil entre os consumidores locais.

O acesso à internet é feito através do telemóvel, mas o estudo releva que “nos últimos anos um número crescente de internautas tem acedido à internet através da televisão”. À noite, a partir das 21h, é quando os internautas mais usam a internet, com a taxa de utilização a essa hora a “registar um crescimento significativo em comparação com dez anos atrás”.

WeChat e Taobao ganham

Em termos de actividades, a internet é usada, principalmente, para ler, ver e ouvir notícias, e aceder a redes sociais, com a plataforma WeChat a ser a mais usada por quase todos os grupos etários, seguindo-se o YouTube, Facebook e Whatsapp. O consumo de conteúdos audiovisuais surge logo de seguida em termos de popularidade, com o visionamento de filmes e séries em streaming, além de música.

O documento refere que “os menores, os jovens e os grupos de estudantes apresentam taxas mais elevadas de participação em várias actividades audiovisuais e de entretenimento” na área do streaming. Nos últimos anos os utilizadores que usam a internet para estarem informados manteve-se nos 80 por cento, enquanto 70 por cento dos inquiridos costuma escrever comentários nas redes sociais. Em termos de comunicação social digital, observa-se que “as pessoas de meia-idade e os jovens, além das pessoas com níveis educacionais mais elevados, são mais propensos a participar em várias actividades relacionadas com a informação online”.

Relativamente ao comércio online regista-se uma tendência de aumento, com 76 por cento dos entrevistados a afirmar que já fez compras desta forma, “sendo o Taobao a principal plataforma de compras online”. As compras são, sobretudo, de “produtos de cuidados da pele ou para necessidades diárias”. Um total de 83 por cento dos inquiridos fez pagamentos online.

Alerta segurança

Os investigadores colocaram ainda questões sobre a segurança online. Num território onde são frequentes os casos de burla online, o relatório mostra que, de facto, metade dos inquiridos diz ter tido problemas de privacidade ou segurança, “sendo o mais comum a fraude online, seguindo-se vírus em dispositivos, roubos de contas pessoais ou de palavras-passe”, ou mesmo “violação da privacidade”. Ainda assim, “cerca de 60 por cento dos internautas avaliam o estado actual da privacidade e segurança da Internet em Macau como seguro, proporção semelhante à registada no passado”.

Os autores do estudo consideram que é preciso promover mais a literacia digital e ter em conta a necessidade de preservação da segurança. “As pessoas de meia-idade e os jovens adultos, bem como as pessoas com um nível de educação mais elevado e com emprego têm a probabilidade relativamente mais elevada de se deparar com vários tipos de problemas de privacidade e segurança na internet. Este facto pode estar relacionado com a sua utilização mais frequente da internet e com um maior nível de sensibilização.”

Os autores acrescentam ainda que estes números “indicam que, embora o público tenha um certo nível de consciencialização e preocupação com a privacidade e a segurança na Internet, ainda há muitos desafios a enfrentar”.

Os riscos nos jovens

O relatório destaca também o facto de os utilizadores de internet serem cada vez mais jovens e do impacto negativo que isso pode causar a vários níveis, tornando-se fundamental aumentar a literacia digital dos mais novos.

“Actualmente, a utilização da internet por menores centra-se em actividades de lazer e entretenimento. No futuro, estes devem melhorar a literacia cibernética, aprender e dominar conhecimentos e competências e organizar razoavelmente o seu tempo de utilização da Internet para melhor a utilizarem na sua vida e na sua aprendizagem”.

Cabe ainda às escolas, famílias e sociedade “orientar os menores para o uso saudável da internet”, devendo as instituições de ensino “incorporar a literacia da internet no currículo para cultivar conhecimentos e competências dos alunos” nesta área, além de que os pais “devem reforçar a educação familiar dos menores para evitar a dependência excessiva da internet”.

O uso de internet por parte de menores de idade atingiu 91 por cento, sendo que estes optam, em 95 por cento dos casos, para ver filmes e vídeos, seguindo-se o consumo de música, em 85 por cento dos casos, ou para jogar (88 por cento). No que respeita às redes sociais, 52 por cento usa o TikTok. A literacia digital nos jovens entre os seis e 11 anos é menor, pelo que é necessário “melhorar a segurança na Internet e os aspectos de auto-proteção”, é indicado.

13 Mai 2024

AICEP | Fórum anual focado na Inteligência Artificial termina hoje

Chega hoje ao fim a 31ª edição do Fórum AICEP das Comunicações Lusófonas, focado na área da inteligência artificial, que trouxe a Macau representantes do sector das telecomunicações dos países de língua portuguesa. João Caboz Santana, presidente da AICEP – Associação Internacional das Comunicações de Expressão Portuguesa, destaca o desenvolvimento de Macau na área das telecomunicações

 

“Criar Valor com Inteligência Artificial” é o mote da 31ª edição do Fórum AICEP das Comunicações Lusófonas, o encontro anual que junta representantes do sector das telecomunicações dos países de língua portuguesa e que arrancou ontem em Macau e que chega hoje ao fim.

O evento, que trouxe a Macau a representante da autoridade reguladora das telecomunicações em Portugal, Sandra Maximiano, presidente do conselho de administração da ANACOM, conta ainda com representantes das autoridades locais na área das telecomunicações, nomeadamente Ebel Chan, vice-presidente comercial da CTM – Companhia de Telecomunicações de Macau, ou Derby Lau, directora dos Serviços de Correios e Telecomunicações.

Em entrevista ao HM, João Caboz Santana, presidente da AICEP, frisou a importância de discutir as questões da Inteligência Artificial (IA) em Macau. “A IA suscita ainda muitas questões, existindo poucas respostas. É importante discutir de forma ampla este tipo de soluções, e não vale a pena tentar parar o vento com a mão. A IA traz soluções incontornáveis para as economias e sociedades, e é oportuno discutir este assunto em Macau. Temos um painel específico no fórum para discutir como devemos encarar a regulação deste sector, como é o caso das questões de segurança, privacidade e transparência. Nesta área, os quadros regulatórios dos países são, na maior parte, omissos”, disse.

A iniciativa conjunta, que todos os anos se realiza num país ou região diferente do universo lusófono, pretende criar um espaço para discutir soluções com aplicação prática no mercado das telecomunicações.

“A AICEP quer dar um importante contributo nas cooperações na área do digital”, frisou João Caboz Santana, que entende que a IA é, actualmente, “um dos mais importantes factores disruptivos do momento”.

“Há quem diga que estamos a viver a quarta revolução industrial, e, de facto, no contexto dos importantes desafios que decorrem da transformação digital, a IA está a impactar fortemente todos os aspectos da nossa vida, rompendo, de forma generalizada, os nossos hábitos e formas de trabalhar, sendo importante estudar os seus progressos.”

Para o presidente da AICEP, a IA é, cada vez mais, “uma mais-valia para pessoas e organizações”. “Temos de avaliar como conseguimos tirar melhor partido dessas soluções tecnológicas que vão permitir que as organizações melhorem a sua qualidade, aumentem a sua eficiência e reduzam entraves competitivos”, indicou o responsável.

Grande “satisfação”

Criada na Guiné-Bissau em 1990, a AICEP é constituída por todos os operadores de correios, telecomunicações e órgãos reguladores desta área dos países de língua portuguesa, incluindo Macau.

“É grande motivo de satisfação continuarmos com esta ligação importante a Macau a fim de continuarmos com grandes actividades de cooperação em prol do desenvolvimento [do sector], pois, sendo nós uma associação focada no desenvolvimento das comunicações, devemos preservar um dos pilares estruturais da associação, que é a lusofonia.”

O fórum, que conta também com a presença de representantes da área das telecomunicações de Hong Kong e China, representa “dois dias de trabalho em prol do desenvolvimento do sector das comunicações que é, talvez, um dos mais importantes motores de desenvolvimento de qualquer economia”.

João Caboz Santana destaca a existência de “fortes laços de cooperação com os CTT e CTM em Macau, há vários anos”, entidades que categoriza como “importantes membros do nosso grupo associativo”.

“O facto de estarem inseridos numa economia tão diferente da europeia, como é a asiática, faz com que haja uma partilha de desenvolvimento e soluções do que melhor que se vai fazendo nas economias asiáticas, já tão avançadas.”

O responsável destaca a possibilidade de Macau, por estar integrada na economia chinesa, poder transmitir conhecimentos e experiências a outros países de língua portuguesa com menor grau de desenvolvimento na área das telecomunicações.

“O desenvolvimento das telecomunicações nos países de língua portuguesa não é, de todo, semelhante, e temos de apostar nas soluções dos países mais desenvolvidos. Os países menos desenvolvidos têm, de facto, vantagens e benefícios oriundos dos que já têm um maior grau de desenvolvimento, podendo aprender com o que estão a fazer, evitando erros, saltando etapas e acelerando processos”, referiu.

Neste sentido, “Macau, através dos seus membros [na AICEP], tem dado importantes contributos em prol da sustentabilidade e desenvolvimento de economias menos desenvolvidas no mundo português”.

Camisola amarela

Questionado sobre o grau de desenvolvimento do sector das telecomunicações de Macau face a Portugal e a outros países lusófonos, João Caboz Santana entende que o território está no pelotão da frente.

“Macau já tem muito bom estado de desenvolvimento do sector das telecomunicações, com soluções bastante inovadoras e um mercado muito maduro e desenvolvido. Certamente que é um mercado que está na linha da frente no que diz respeito à oferta de produtos e serviços, sabendo oferecer aos mercados e clientes produtos com grande qualidade, a preços acessíveis e tão bons e avançados como o que de melhor se vai fazendo no resto da Europa.”

Relativamente à progressiva integração do território na ilha de Hengqin e na Grande Baía, João Caboz Santa diz estar confiante e optimista, ainda que haja entraves a solucionar relacionados com diferenças de acesso a redes sociais e sistemas de pagamentos no mundo digital entre a RAEM e a China.

“A ligação de Macau e China ao mundo que fala português é muito forte e ambas as partes desejam que se fortaleça. Há organizações locais, como é o caso do Fórum Macau, que têm feito um trabalho extraordinário no sentido de fazer crescer as relações entre todos. O facto de Macau estar cada vez mais inserido na economia chinesa não tem prejudicado a sua ligação aos países de língua portuguesa, bem pelo contrário.”

O presidente da AICEP entende que “é do interesse da China e das regiões a existência de uma forte cooperação e intercâmbio em termos de trabalho, e isso reflecte-se também na área das telecomunicações”.

“Macau tem sabido manter o desenvolvimento das comunicações em ligação com as comunidades lusófonas, proporcionando soluções que vão de encontro às necessidades dos clientes”, rematou.

O segundo do dia do fórum, que arrancou hoje às 9h, conta com a presença de Raimundo do Rosário, secretário para os Transportes e Obras Públicas, que tem a tutela das telecomunicações no território. No mesmo painel falam ainda João Bento, CEO dos CTT em Portugal, bem como Derby Lau e Vandy Poon, administrador-delegado e CEO da CTM.

De Portugal chega Alberto Pimenta, dos CTT em Portugal, que vai falar sobre as últimas novidades na área do comércio electrónico, enquanto Shi Wei, da Baidu AI Cloud, falará da área da IA na China. A regulação sobre a tecnologia em foco na edição deste ano do fórum será abordada no painel das 14h15 com a presença de Derby Lau, dos CTT locais, João Bento e Augusto Mota de Carvalho, presidente do conselho de administração da Angola Cables.

Por sua vez, o “Impacto da IA no Mercado de Trabalho” será o tópico a debater a partir das 15h30, com a presença de Ivan Cheung, partner da consultora Delloite, na China ou José Arantes, director institucional e de arquivo da RTP – Rádio e Televisão de Portugal. Além do fórum de debate, realiza-se também a assembleia-geral da AICEP. O evento arrancou ontem no Hotel Sheraton.

10 Mai 2024

Zona A | Redução de espaços verdes no plano pormenor não preocupa

Anunciado em Março, o Plano de Gestão para a Zona Este prevê uma menor área verde face ao prometido em 2022. Arquitectos desvalorizam a alteração, afirmando que o planeamento de Macau tem de ser feito a uma escala metropolitana ou com foco na zona costeira. Ainda assim, existem críticas ao planeamento dos aterros

 

O futuro mora na zona norte e na conexão que terá à zona A dos novos aterros, criando um novo foco habitacional e societário, com promessas de mais infra-estruturas e acessos. Anunciado em Março, o Plano de Gestão para a Zona Este – Distrito 2, que comporta a zona A e ilha artificial que estabelece a conexão com a zona A, tem, afinal, menos 50 por cento de espaços verdes face ao que foi prometido pelo Governo na consulta pública de 2022.

Segundo o portal Macau News, a quebra em termos de espaços verdes ou vazios é hoje 47 por cento menor, passando de 711 mil metros quadrados para 373,719. A grande maioria do espaço contemplado no plano será usado para habitação, que irá albergar cerca de 96 mil moradores.

Ainda segundo a mesma fonte, “o plano não menciona se o Governo Central assinou ou não um projecto de recuperação de 0,36 quilómetros quadrados que foi proposto em 2022”. Caso este projecto vá avante, o novo terreno “deverá ser reservado para espaços verdes e será construído na área entre a costa noroeste da Zona A e a costa nordeste da península de Macau”.

Nos 373.719 metros quadrados previstos para a área verde do plano, inclui-se a construção de um corredor verde central que atravessa de norte a sul do aterro, prevendo-se ainda a implementação de “corredores de arborização que ligam as extremidades este e oeste da área de intervenção, delimitada por quatro zonas, e um corredor verde marginal a envolver a costa”.

A redução de espaços verdes não assusta os arquitectos André Ritchie e André Lui, que preferem olhar para alternativas que se vão criando em torno do rápido desenvolvimento do território.

“Relativamente ao ambiente verde da zona A, penso que não nos devemos concentrar apenas na taxa de ecologização, pois trata-se de uma zona com uma importante linha costeira. O planeamento deve centrar-se no aproveitamento da linha costeira como um novo espaço de lazer”, disse André Lui.

Já André Ritchie, arquitecto que esteve ligado ao projecto de construção do Metro Ligeiro, considera que está na altura de pensarmos no desenvolvimento urbanístico de Macau de uma forma global e integrada na Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau.

“Não podemos mais pensar o planeamento de Macau e o ordenamento territorial apenas à escala da RAEM. Temos de olhar para a escala da Grande Baía. Não é de todo inconcebível pensarmos que Macau pode ter uma densidade populacional maior e que, à nossa volta, temos espaços verdes disponíveis. No meu caso, moro na Taipa, e demoro menos tempo a ir a Hengqin do que ao posto fronteiriço da futura zona A. Demoro mais tempo a ir até este posto fronteiriço do que depois na ponte a caminho de Hong Kong. Aí faço caminhadas em Lantau, tenho esse contacto com a natureza”, exemplificou.

Em termos de integração e interligação territorial, o arquitecto destaca o alargamento das possibilidades de condução, com a política que permite a circulação em Guangdong, e o facto de “as fronteiras serem hoje mais permeáveis”, o que levou as vidas dos residentes a uma “escala metropolitana”.

André Ritchie dá também o exemplo de cidades europeias, nomeadamente Lisboa, onde cada vez mais a população vive nos subúrbios, deslocando-se de carro ou transportes e trabalhando no centro. “Temos espaços verdes aqui à volta, e bastante perto. Aí atenua-se um pouco [a falta de espaços verdes], pelo que não encaro esta questão como merecedora de grande preocupação”, apontou.

Necessidade de reformulação

André Ritchie adiantou que “a grande maioria das pessoas concorda com a criação de mais áreas verdes e esses espaços vazios, que são bem-vindos a Macau, dada a alta densidade habitacional que existe”, sobretudo na zona norte.

Contudo, o planeamento do território exige “equilíbrio entre interesses públicos e privados, políticos e económicos”, destacou. “Os planos têm de ser revistos periodicamente. Não sei se entre o período da consulta pública e dois anos depois, se o Governo não terá entendido o enquadramento geral da cidade, no contexto da Grande Baía, com fronteiras cada vez mais maleáveis.”

“Com essas mudanças, os planos são revistos e isso tem de ser encarado com alguma naturalidade. Mas poderá levantar-se a questão de eventuais espaços verdes que poderiam estar construídos e que agora não serão implementados”, disse.

Oportunidades perdidas

O arquitecto Mário Duarte Duque tem uma posição contrária, lamentando a redução dos espaços verdes e afirma que os novos aterros são “intervenções marcantes no desenvolvimento urbanístico da RAEM dada a sua dimensão” que, no entanto, “tiveram poucos avisos em consideração e que, até agora, não consolidaram conhecimento”.

Do ponto de vista da forma urbana, os novos aterros “também não nutrem grande entusiamo” por parte do arquitecto. Isto porque “pela primeira vez na RAEM prosseguiram-se com planos de pormenor onde apenas as infra-estruturas estiveram em comando, e não a forma urbana”, pelo que “a geografia e a arquitectura não tiveram intervenção de relevo”.

O arquitecto destaca ainda o facto de a elaboração dos planos de pormenor, ao abrigo do novo Plano Director da RAEM, pecarem por tardio em termos de ordenamento. “Promoveu-se a elaboração de planos pormenor para que a ocupação dos lotes não continuasse a ser feita por Plantas de Condições Urbanísticas (PCU) avulsas e discricionárias. O certo é que quando foi efectuada a consulta pública para o plano pormenor da zona A já tinha existido a necessidade de elaborar PCU e os edifícios estavam já em construção. Neste cenário, muito pouco há a recomendar que possa ser de oportuna utilidade.”

Questão de temperaturas

Mário Duarte Duque realça também as consequências climáticas do excesso de construção. “O facto de, na versão final do plano pormenor, se terem comprometido áreas verdes inicialmente previstas significa que, aí, o espaço urbano será mais quente do que o inicialmente estimado, se é que foi estimado. A temperatura atmosférica das cidades é consequência dos materiais da camada superficial.”

O arquitecto entende que o plano pormenor “prepara-se para se apropriar de corpos de água, sem tirar partido do modelo de aterros preconizado”, devido “à possibilidade de compensar a redução de espaço livre com acréscimo de área de aterro”.

Tendo em conta que os aterros em construção vieram dotar a RAEM “de um significativo perímetro de frente hídrica”, tal significa que existe uma “importante componente reguladora da temperatura atmosférica”.

Reduzir espaços verdes, ou livres, tem um impacto negativo na relação da cidade com a água envolvente e a radiação solar, denota ao HM Mário Duarte Duque. “A água precisa de muito mais radiação solar para elevar a sua temperatura, comparativamente com o solo e com os materiais de que as cidades são feitas. Ou seja, para a mesma radiação solar, a água aquece menos, e essa diferença não só é geradora de equilíbrio, como desenvolve ventos locais nas frentes hídricas, que penetram no espaço urbano mediante uma adequada forma urbana, e que são desejáveis. Prescindir desses corpos de água significa afastar a cidade ainda mais da sua frente hídrica, e anular características que são favoráveis”, rematou.

A zona destinada a habitação prevista no plano pormenor da zona tem uma área total de 433.649 metros quadrados, servindo para a construção de 49 lote de edifícios e 15.255 metros quadrados de área comercial distribuídos em três lotes.

8 Mai 2024

FRC | Sandro Mendonça fala hoje do impacto das ‘Big Tech’

Sandro Mendonça, recentemente nomeado Fellow Economist da Comissão Europeia, estará hoje na Fundação Rui Cunha para falar das cinco grandes empresas tecnológicas Apple, Microsoft, Google, Amazon e Facebook e da ligação ao mercado europeu. Ao HM, declara que Macau começa a ter bons exemplos na área da tecnologia

Marcas como Apple, Microsoft, Google, Amazon e Facebook fazem parte do dia-a-dia de cada um de nós. Nas regiões administrativas especiais é comum o uso de aparelhos criados por Steve Jobs, bem como a rede social de Mark Zuckenberg, enquanto na China aposta em alternativas, com a Baidu, Tencent, ByteDance ou Temu.

O posicionamento que as cinco empresas tecnológicas ocupam no mundo e, em particular, no mercado europeu será hoje tema de uma conferência promovida pela Fundação Rui Cunha (FRC) e que conta com a presença de Sandro Mendonça, professor associado do departamento de economia do ISCTE Business School – Escola de Negócios do Instituto Universitário de Lisboa, cronista da Macau Business. O académico foi recentemente nomeado Fellow Economist da Comissão Europeia, para liderar um projecto de análise ao papel e impacto das Big Tech na Europa até 2040.

Aliás, esse será o âmbito da conferência que irá apresentar na FRC, intitulada “The Future of Big Tech” [O Futuro das Grandes Tecnológicas].

Ao HM, Sandro Mendonça destaca que estas empresas dominam “de forma consistente” o sector tecnológico mundial desde 2010, tanto em “termos de capitalização bolsista, lucros ou alcance nos mercados internacionais”. As cinco grandes empresas “estão por todo o lado”, quer “nos sistemas operativos móveis e fixos, na busca na Internet, nas redes sociais, nas vendas por comércio electrónico ou no armazenamento de dados empresariais em nuvem”. Com menor presença na China, embora no país o Windows “esteja por todo o lado, assim como os Iphones”, estas tecnológicas “estão fortemente em Macau e Hong Kong”.

“Quando lançamos o escrutínio sobre estas gigantes megapolistas, alguns padrões vêm ao de cima. É notório que nenhuma delas é europeia, tendo, todas o seu quartel-general nos EUA.”

O académico destaca ainda “um facto central que pode ser chocante”, no sentido em que “o investimento destas tecnológicas em investigação e desenvolvimento, num só ano, é maior do que todo o esforço conjunto nesta área que os 27 países da União Europeia fazem num programa-quadro, ou seja, em sete anos”.

Sandro Mendonça coordenou um estudo sobre a presença destas cinco empresas no mercado europeu para o Directorado-Geral da Investigação e Inovação (DG Research) em Bruxelas, intitulado “O Futuro das Grandes Tecnológicas na Europa” [The Future of Big Tech”, já publicado.

“Fome de inovação”

Segundo um comunicado da FRC, a conferência de hoje alerta para o facto de estas “Big Tech” terem vindo “para ficar”, tratando-se de empresas que “não conseguem estar paradas, tendo fome de inovação”.

Citado pela mesma nota, Sandro Mendonça destaca que as “grandes empresas tecnológicas aproveitam as infra-estruturas em nuvem, os modelos de negócio das plataformas digitais e, cada vez mais, as tecnologias de Inteligência Artificial, para captar áreas de mercado em expansão e alcançar um desempenho superior”, embora continuem a estar mais ausentes do mercado europeu. Há ainda “outros gigantes internacionais a aproximarem-se, como a Alibaba ou a Tencent”.

Desta forma, Sandro Mendonça irá debruçar-se sobre o papel da Europa “numa economia totalmente orientada para o mercado” e ainda sobre “as soluções convencionais, como a regulamentação e a política de concorrência”, e se estes instrumentos serão “suficientes para lidar com as repercussões” oriundas do posicionamento destas empresas.

“Será altura de passarmos à fase neoliberal e de nos envolvermos num activismo industrial informacional do tipo disruptivo? Ou, pelo contrário, será que o incremento da descentralização empresarial resolverá quaisquer falhas temporárias de competitividade e governação europeias?”, questiona o responsável.

Questionado pelo HM sobre a ligação destas grandes empresas tecnológicas ao mercado chinês, o académico defende que o país saído do processo de reforma e abertura liderado por Deng Xiaoping “nunca se deixou enfeitiçar pelo mercado”.

“A China usou o mercado, mas não se deixou levar por ele. Parece-me que a China dos nossos dias tem uma base inovadora endógena, o que lhe dá centralidade e criatividade. Dá-lhe também maior autonomia e maior segurança, pois está menos sujeita a chantagens que outros lugares que são dependentes de outros para efeitos de tecnologia, segurança e sistemas financeiros”, declarou.

Bons exemplos de Macau

Numa altura em que o Governo local quer apostar no sector da tecnologia para diversificar a economia, o HM questionou Sandro Mendonça quanto às reais capacidades do território para o fazer.

O autor declarou que o “futuro está perto”, pelo facto de Macau estar incluído no “Silicon Valley chinês”, ou seja, a Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. Contudo, na hora de fomentar o desenvolvimento, Sandro Mendonça deixa um alerta: “Macau só serve aos residentes, à China e ao mundo se continuar a ser Macau”, preservando a sua identidade.

“Dou um exemplo real e prático, que já é um caso significativo que resulta da cooperação entre Zhuhai, Hengqin e Macau. Hengqin conseguiu atrair uma jovem engenheira de Pequim, Lyu Jinyan, para um projecto radicalmente importante para a China, o desenvolvimento de biomateriais para a área médica.”

Neste contexto, foi lançado, no final do ano passado, “um produto complementar a esta agenda de longo prazo”, intitulado “Machloom 麥士能”, virado “para o bem-estar e reparação da fadiga cerebral”, que já marca alguma presença em farmácias locais e que “ostenta o símbolo das Ruínas de São Paulo no símbolo comercial” do produto.

Outro exemplo de sucesso destacado por Sandro Mendonça diz respeito às empresas “e-Research Solutions” e da “uMax Data Technology”, consultoras e tecnológicas fundadas por Angus Cheong, formado na Universidade de Macau.

Angus Cheong lançou um instrumento multi-modal movido a inteligência artificial chamado DiVoMiner”. Sandro Mendonça lamenta a pouca visibilidade que este projecto tem a nível local. “Tudo isto é mais conhecido lá fora do que em Macau. Lá fora [Angus Cheong] é conhecido, escutam a sua opinião. Não sei porque estas empresas, de raiz local, não são mais conhecidas.”

Papel dos portugueses

“Vejo aqui o papel histórico de Macau, uma área híbrida em que novas propostas de negócio ganham uma camada cultural que lhes agrega valor e potencial para escalar internacionalmente”, referiu o académico, que aponta “o grande trabalho de contexto” que se encontra em curso, também feito “por portugueses que acreditam nas virtudes das boas relações Oriente-Ocidente”.

Sandro Mendonça destaca os casos de Rui Pedro Cunha, presidente da Câmara de Comércio Macau-Europa, Bernardo Mendia, na qualidade de secretário-geral da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Chinesa, e ainda Rodrigo Brum, que deixou o Fórum Macau há uns anos para fundar a Câmara de Comércio e Indústria dos Países de Língua Portuguesa na Grande Baía de Guangdong, Hong Kong e Macau (China). “Estamos com boas dinâmicas em curso. Espero que prossigam, pois não é cedo”, remata.

A palestra de hoje começa às 18h30 e integra-se no ciclo “Roda de Ideias” promovido pela FRC. Sandro Mendonça está de regresso a Macau depois de, em Abril, ter falado, também na FRC, sobre “A Mudança nas Comunicações: Do 5G à IA através das Plataformas Digitais”.

2 Mai 2024

Turismo | Após quase um século da inauguração, o Hotel Central vai reabrir ao público

O Hotel Central vai abrir portas, ainda de forma experimental, a partir desta quarta-feira. A inauguração oficial está marcada para 22 de Julho, data da primeira inauguração há 96 anos. Recordamos histórias de um lugar de luxos e prazeres, que ficou marcado por festas inebriantes, lutas de tríades, espionagem e boatos de canibalismo

 

Manuel Rodrigues teria cerca de dez anos quando o seu pai, segurança pessoal de Pedro José Lobo, o levou ao Hotel Central. O jovem macaense, que em 1969 haveria de partir do território para continuar os estudos superiores em Toronto, no Canadá, tinha curiosidade em ver como se jogava “Fan Tan”, o tradicional jogo chinês. “Fui lá uma ou duas vezes com o meu pai. Nunca aprendi a jogar, mas tinha interesse em ver como se jogava”, recorda ao HM.

Lugar de negócios, prazeres e divertimentos, o Grand Central Hotel, conhecido entre os portugueses como o Hotel Central, foi inaugurado a 22 de Julho de 1928 com o nome de Hotel Presidente, passando a designar-se Grand Central Hotel a 31 de Outubro de 1930. Aquele que foi o primeiro arranha-céus de Macau, com 11 andares, ganhou fama, tendo sido retratado nas histórias de James Bond, da autoria de Ian Fleming. Essa notoriedade foi conquistada “tanto por boas como pelas piores razões”, lê-se na biografia de Roque Choi, da autoria de Cecília Jorge e Rogério Beltrão Coelho.

Muitas décadas depois, e após um grande interregno ao abandono e de portas fechadas, o Hotel Central ganha um novo capítulo da sua história, abrindo ainda de forma experimental a partir desta quarta-feira, Dia do Trabalhador, sendo inaugurado oficialmente a 22 de Julho, data da sua primeira inauguração há 96 anos. Na semana passada, decorreu uma “soft opening” para alguns convidados.

O edifício, propriedade do grupo Lek Hang, foi totalmente revitalizado, prometendo agora ser um espaço que contribui para dar uma nova vida aos bairros mais antigos de Macau.

Na mesma biografia de Roque Choi, lê-se que o Hotel Central foi lugar de inovações, pois, segundo Luís Andrade de Sá, foi lá que se instalou “o primeiro sistema de elevadores eléctricos que, num minuto, subiam da entrada ao ‘roof garden’ de onde se desfrutava de uma magnífica vista”.

Tendo como gerente Francisco Assis Fong, no Hotel Central existiam “divertimentos europeus e chineses”, incluindo um salão-de-beleza, dois restaurantes e um salão de dança, chamado “Clube Hou Hing”, no sexto andar. Este espaço de dança, ou cabaret, “era o maior salão de dança da cidade, com jazz privativo, divertimentos e bilhar”.

A partir de Abril de 1937, por decisão do Governador Tamagnini Barbosa, o Hotel Central passa a ter jogo graças à concessão à sociedade Tai Hing, que arrendou a unidade hoteleira para este fim. Meses depois, abria no sexto andar o novo “Cabaret Grand Central”, ganhando o edifício mais três pisos. Foi nesta sala de jogos que Manuel Rodrigues entrou ainda jovem.

Um ar “orientalizado”

Entre a inauguração do hotel e a chegada à cena da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM), em 1963, e já com uma nova concessão de jogo, Macau era um território parado, muito marcado pelas agruras da II Guerra Mundial nos anos de 1939 a 1945. Pelo Hotel Central passava toda a movida e negociatas próprias da época. O turismo, ao contrário de hoje, era bastante incipiente.

Manuel Rodrigues, conhecido como “Manecas”, recorda que o turismo só ganhou fulgor com a chegada do Governador Jaime Silvério Marques ao poder, em 1959. Até lá “o turismo limitava-se à atracção do Grande Prémio de Macau”, com as apostas em corridas de galgos a atrair mais pessoas a partir dos anos 60.

“Macau era um território muito apagado e com poucas oportunidades, mas, olhando para trás, isso tinha a ver com as políticas do Governo de Macau. Em termos económicos, era uma política extremamente restritiva”, recorda o macaense formado em Economia.

Nos anos 50 e 60 o Hotel Central era “um dos centros sociais de Macau”, “um local de encontro de empresários chineses, na sua maioria”, além de que, durante a guerra, era também um ponto de encontro para japoneses, sem esquecer “alguns empresários médios, macaenses”.

“Os metropolitanos [portugueses] não frequentavam muito o Hotel Central, porque eram na sua maioria militares e funcionários públicos. Frequentavam outros locais, como o Hotel Bela Vista. Depois ao lado, mais abaixo do Hotel Central, havia o Hotel Kuoc Chai, chamado de ‘Estrela de 5 Pontas’. Lá havia bastante animação entre chineses e macaenses”, destaca.

Ao HM, João Guedes, jornalista e autor de diversos livros sobre a história de Macau, confirma de facto o pouco gosto que os portugueses tinham por este hotel, por ter um ar “demasiado orientalizado para a comunidade portuguesa daquele tempo”.

“O jornal ‘O Petardo’, que se publicava em Hong Kong, diz dele o seguinte: ‘Não é simplesmente um restaurante chinês, um coulau, mas sim uma hospedaria chinesa ricamente mobilada, uma casa de pernoitar onde toda a gente, qualquer que seja a sua condição, pode ser recebida sem se inquirir da sua procedência, dos seus costumes, do seu modo de vida!”

O jornal descrevia ainda o Hotel Central como “uma verdadeira casa de prazer, onde se banqueteiam todas as noites, quer nas suas amplas salas, quer no âmbito dos seus quartos de cama, os ‘bons vivants’, quantas vezes piratas”.

Com a chegada do jogo, João Guedes fala num fomento da vida nocturna em conjugação com “as meretrizes [que trabalhavam] na Rua da Felicidade”, ali tão perto.

“A frequência do hotel era, pelos vistos, composta maioritariamente por polícias que iam lá, de certo modo, fiscalizar o sítio, aproveitando para se divertir, sem esquecer os ladrões e os piratas. Ajustes de contas surgiam entre as seitas que se digladiavam aos tiros e à bomba”, disse João Guedes.

Canibalismo: verdade ou ficção?

Durante a II Grande Guerra Mundial e a Guerra do Pacífico, a rotina do Hotel Central pautava-se também pela “presença reforçada de militares japoneses que passavam férias e fins-de-semana em Macau hospedados nesse hotel”, bem como alguns militares portugueses, polícias e espiões.

“Foi esta atmosfera que jornalistas e escritores captaram em relatos e novelas livrescas, pela Europa e pelas Américas. Tudo isso foi desaparecendo em movimento acelerado até as suas salas de dança, corredores, quartos e restaurantes se pacificarem definitivamente com a chegada da STDM.”

Perduraram no tempo as histórias de canibalismo praticado no restaurante do Hotel Central no período da II Grande Guerra Mundial, quando Macau aumentou bastante a sua população com refugiados vindos da China e Hong Kong e a fome grassava por toda a parte.

No livro “Macau 1937-1945: Os Anos da Guerra”, do jornalista João Botas, reproduz-se um testemunho da autoria do Monsenhor Manuel Teixeira sobre esta questão.

“Como não havia o que comer, alguns hotéis (por exemplo, o Hotel Central), compravam crianças, cozinhavam-nas e davam-nas a comer aos clientes. Tinha um grande amigo, e meu paroquiano, o dr. Juiz Evaristo Mascarenhas, que me confessou ter ido a um desses restaurantes e lhe terem proposto uma refeição de carne humana, “muito saborosa”, segundo o próprio juiz. A fome é má conselheira…”

Monsenhor Manuel Teixeira descreveu que este assunto pouco foi falado de forma oficial. “Eram rumores que circulavam por toda a parte, mas não se podiam publicar nos jornais. Mas toda a gente sabia”, lê-se ainda.

Manuel Rodrigues diz, porém, que estas histórias associadas ao Hotel Central não passam de boatos sem fundamento. “Ouvi histórias de canibalismo no Hotel Central que nunca foram confirmadas, porque, pelo que os meus pais contavam, tratava-se de histórias fictícias. Se houve canibalismo não aconteceu no Hotel Central. Poderia ter acontecido noutros lugares, mas não em hotéis em Macau. O meu pai, que conhecia extremamente bem os meandros de Macau, pois era segurança de Pedro José Lobo, nunca confirmou que houvesse esse tipo de actividades nos hotéis em Macau.”

A partir da década de 60, com a nova concessão de jogo e a construção do Hotel Lisboa, sem esquecer o Hotel Estoril, na praça do Tap Seac, o Hotel Central passou a empreendimento destinado a “hospedarias económicas, para pessoas com mochila às costas, até encerrar sem brilho”, conclui João Guedes.

Hotel Central | Renovação custou 2,2 mil milhões

Renovar o velhinho Hotel Central demorou três anos e custou ao grupo Lek Han 2,2 mil milhões de patacas. Sio Chong Meng, proprietário da unidade hoteleira, disse à TDM – Rádio Macau que as expectativas iniciais passavam por ter o hotel a funcionar de forma experimental em Março, mas tal não foi possível devido aos atrasos na emissão das licenças necessárias.

O responsável referiu que revitalizar o hotel foi o maior desafio da sua carreira de 30 anos pelo facto de o edifício sofrer de problemas estruturais, correndo mesmo risco de desabamento. Contudo, foram aplicadas sugestões de peritos e realizados vários testes que tornaram a construção possível.

Sio Chong Meng referiu que a decoração do hotel é inspirada na sua história, sobretudo no período dos anos 20, 30 e 40, tendo um restaurante, um centro comercial com três andares e ainda sete lojas no rés-do-chão. O 11º andar será um telhado com uma vista panorâmica sobre a cidade.

O responsável, que comprou o empreendimento em 2016, disse estar confiante no futuro do projecto e do investimento feito. O Hotel Central reabre com o slogan “Que o Hotel Central seja brilhante e viva por mais cem anos”.

29 Abr 2024

Eleições | Advogado indica que Rita Santos e ATFPM poderão ter violado lei

Rita Santos e dirigentes da ATFPM foram alvo de uma queixa remetida pelo deputado Paulo Pisco, do Partido Socialista, à Comissão Nacional de Eleições. A queixa está a ser analisada pelo Ministério Público. O advogado Paulo Saragoça da Matta considera que pode estar em causa uma violação da lei eleitoral portuguesa. Paulo Pisco diz que provas apresentadas não foram negadas

 

Na sequência das últimas eleições legislativas ocorridas em Março deste ano, Rita Santos e a Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM) foram acusados de suspeitas de terem protagonizado actos alegadamente violadores da lei portuguesa. Face a esse cenário, o deputado do Partido Socialistas (PS) eleito pelo Círculo da Europa apresentou uma queixa à Comissão Nacional de Eleições (CNE), que, por sua vez, a encaminhou para o Ministério Público (MP), a fim de se apurar a eventual prática de crime.

Esta queixa incide sobre duas situações: o facto de Rita Santos ter sido vista à porta do edifício dos correios, em Macau, a tentar recolher os boletins de voto a eleitores, além da suspeita de que membros da ATFPM ligaram a eleitores chineses afirmando que estes “podiam trazer as cartas com os boletins de voto à sede da ATFPM, que eles tratavam de tudo”.

Ao HM, Paulo Pisco diz que está na hora de alterar um cenário de alegada fraude que há anos se repete nas eleições. “Tem de haver correcção em todos os actos eleitorais e transparência. Os partidos têm de estar em pé de igualdade. Não pode haver uns que utilizam truques e outros que fazem as coisas como deve ser.”

Paulo Pisco aponta que há registo de “provas e evidências” e que a CNE fez a devida confirmação. “Apresentámos as provas de que as coisas se passaram efectivamente assim e a CNE confrontou as pessoas visadas na queixa. As provas não foram negadas. Parte-se do princípio de que elas foram reconhecidas e, portanto, há todas as razões para que esta queixa tenha sido reencaminhada para o MP.”

Do MP não há, até à data, novidades sobre o processo, muito menos uma acusação formal. “Confirma-se a recepção da queixa mencionada. A mesma encontra-se em análise”, foi referido ao HM em resposta escrita.

O que está em causa

O HM quis perceber que crimes podem estar em causa numa eventual acusação a Rita Santos e aos responsáveis da ATFPM envolvidos. O advogado Paulo Saragoça da Matta destaca que, antes de analisar os crimes que poderão ser imputados, é fundamental avaliar as verdadeiras intenções de Rita Santos e do pessoal da ATFPM.

“Se olharmos para a lei eleitoral da Assembleia da República, diria que o único crime que se pode enquadrar nesta situação é o artigo 152 [Coação e artifício fraudulento sobre o eleitor ou o candidato].”

Este artigo prevê uma pena de prisão de seis meses a dois anos para quem “usar da violência ou ameaça sobre qualquer eleitor” ou “usar de enganos, artifícios fraudulentos, falsas notícias ou de qualquer outro meio ilícito para o constranger ou induzir a votar em determinada lista ou a abster-se de votar”.

Assim, para o advogado, “a situação tem de ser muito bem investigada”. “Não sabendo qual o objectivo da senhora, que não conheço, não há indícios da prática de crime. A ser [crime], seria esse, mas com a evidência dos objectivos”, acrescentou.

Quanto à possibilidade de se aplicar o Código Penal nesta questão, o advogado fala na possível aplicação do artigo 341, relativo à fraude e corrupção de eleitor. Este artigo pune a pessoa que, com recurso a “artifício fraudulento”, leve eleitores ao voto, os impeça de votar ou ainda os leve “a votar em certo sentido”. É ainda criminalizada a compra ou venda de votos. Nestes cenários, os culpados incorrem em penas de prisão até um ano ou pagamento de multa até 120 dias.

Contudo, na visão do advogado, volta a ser imperativo definir, na investigação, as verdadeiras intenções de Rita Santos e dos restantes membros da ATFPM.

“A senhora poderá sempre alegar que o que iria fazer era mesmo ajudar as pessoas, remetendo os votos ao seu destino nos termos legais. [Pode estar em causa] o erro quanto ao procedimento que, se não for censurável, exclui o dolo e, assim, a tipicidade. Sendo um erro censurável, aí sim, permitirá dar o tipo [de crime] por preenchido”, declarou.

Apesar das hipóteses teóricas, Paulo Saragoça da Matta diz ser pouco provável que se aplique este artigo do Código Penal ao caso “pela simples razão de que são crimes que exigem comportamentos de alguma violência ou intencionalidade específica que a matéria de facto relatada não preenche”.

O advogado fala mesmo na possibilidade de o caso vir a ser arquivado. “Uma das questões que se pode colocar é o arquivamento por não estar previsto no Código Penal que, além dos seus artigos, também os crimes eleitorais estão previstos em legislação avulsa.”

O HM contactou outros advogados sobre esta matéria, que recusaram comentar casos concretos.

Uma questão de credibilidade

Paulo Pisco entende que este tipo de situações suspeitas leva ao “descrédito do acto eleitoral e do método de eleição”.

“Não pode haver uma violação das regras eleitorais, que são explícitas e não admitem este tipo de situações. Por uma questão de transparência e respeito pelos actos democráticos e sistema de voto, apresentámos a queixa. Espero que possa haver, finalmente, uma modificação dos comportamentos, porque o sistema de voto não pode estar permanentemente sob descrédito.”

O deputado do PS considera mesmo que, sendo Rita Santos conselheira do CCP, esta entidade “deve prestar contas em relação a este tipo de situações que lançam descrédito no sistema de votação”.

Já Paulo Saragoça da Matta entende que ficam afectadas “a seriedade, transparência e honestidade com que os actos eleitorais são vistos”. É algo que “indirectamente afecta a qualidade da democracia”, mas não as autoridades, pois o advogado destaca o facto de “protestos e queixas feitas por partidos em momentos eleitorais são relativamente habituais”. “É algo que faz parte do jogo político de qualquer democracia”, frisou.

Considerando que a queixa na CNE e o processo no MP “afectam a credibilidade da pessoa denunciada”, “todas as entidades envolvidas, e preocupadas com as eleições e a nossa diáspora, vão sempre ter a má imagem que fica da mera existência da suspeita”.

Contudo, Paulo Saragoça da Matta recorda o outro lado da moeda no que diz respeito à apresentação de queixas desta natureza. “Quando se impute a alguém a prática de um crime, sabendo que realmente ali não há crime nenhum, estamos a incorrer na prática de um crime de denuncia caluniosa. A legislação prevê isso para desmotivar que as pessoas, até no âmbito da luta política, apresentem denuncias criminais, sabendo que não é verdadeiramente crime, de alguma forma.”

O HM questionou Rita Santos sobre o decorrer da análise da queixa no MP português, bem como José Pereira Coutinho, mas até ao fecho desta edição não obteve respostas. Também o actual presidente do conselho permanente do CCP, Flávio Martins, não respondeu às questões colocadas por email.

29 Abr 2024

Fórum Macau | As “moderadas” ambições e o lado técnico do plano de acção

Terminada a sexta Conferência Ministerial do Fórum Macau, a académica Cátia Miriam Costa destaca as “questões técnicas” saídas do novo plano de acção e a “novidade considerável” que é a inclusão da Zona de Cooperação Aprofundada. Francisco José Leandro, da Universidade de Macau, entende que o plano é “moderadamente ambicioso”

 

Aquele que foi considerado um dos eventos políticos e diplomáticos mais importantes do ano no território, a Conferência Ministerial do Fórum Macau terminou na terça-feira com a apresentação de um novo plano de acção a implementar até 2027, sem esquecer os encontros com empresários dos países de língua portuguesa que trouxeram projectos e expectativas de maior cooperação.

Dois académicos analisaram o plano de acção saído da sexta conferência, a convite do HM, e entendem que traz algumas novidades, reforçando o papel de Macau como plataforma de comércio e serviços entre a China e os países de língua portuguesa.

Cátia Miriam Costa, académica ligada ao ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa e aos assuntos relacionados com a China e Macau, considera que, no novo plano de acção do Fórum Macau, a China “elenca uma série de questões técnicas, como por exemplo, as questões fitossanitárias ou o estabelecimento de seguros de crédito, que são uma novidade”. Na óptica da académica, são temas mais específicos que “constituem de facto obstáculos à circulação de bens e serviços”. Verifica-se, portanto, “a entrada em domínios técnicos específicos no que respeita ao alargamento das relações comerciais e o reforço da ideia de cooperação e outras áreas económicas e sociais como a saúde, a agricultura, ensino e cultura”.

Dividido em seis áreas, o plano de acção começa por abordar o tópico “Cooperação no comércio e investimento”, onde se incluem as linhas mais técnicas abordadas pela académica.

A China diz-se “disposta a apoiar e facilitar a participação de empresas dos países de língua portuguesa” em feiras de negócios, nomeadamente a Exposição Internacional de Importação da China, Feira de Importação e Exportação da China, Feira Internacional de Comércio em Serviços da China e Exposição Económica e Comercial China–Países de Língua Portuguesa (Macau), “entre outras importantes convenções e exposições”.

Pretende-se também, da parte de Pequim, “prestar seguros de créditos à exportação” para empresas chinesas e lusófonas com foco em “sectores prioritários como infra-estruturas, energias e construção naval”.

A China quer também “prestar apoio financeiro ao comércio, ajudando as empresas chinesas para expandir as importações provenientes dos países de língua portuguesa”. Além disso, o Governo Central pretende “prestar medidas de facilitação em matéria de inspecção sanitária e fitossanitária dos produtos alimentares e agrícolas importados” do mundo lusófono, além de cumprir o objectivo de criar guias de comércio e de investimento entre a China e os países de língua portuguesa.

Uma “ligação directa”

Cátia Miriam Costa entende que a sexta Conferência Ministerial veio materializar ainda mais a visão da China sobre Macau, considerando-o “um território essencial para a cooperação com os países de língua portuguesa”. “Agora materializa essa plataforma com uma proposta de ligação directa à China continental”, frisou.

Uma das novidades do plano de acção apontadas por Cátia Miriam Costa prende-se com a “indicação da Zona de Cooperação Aprofundada em Hengqin como espaço para desenvolvimento dos projectos que unam a China e os países de língua portuguesa”. Trata-se de um ponto que “reflecte a questão financeira, mas também científica e tecnológica”, sendo “indicador da vontade de dinamizar esta zona de cooperação e alargar o diálogo entre a China e os países de língua portuguesa a Guangdong”. É sinal de que as autoridades de Pequim pretendem uma cooperação que vá “além de Macau e que se projecte para a China continental”.

A cooperação na Zona de Cooperação Aprofundada de Guangdong e Macau em Hengqin surge no sexto ponto do plano de acção, intitulado “Cooperação na Plataforma Macau”. Nele lê-se que a China pretende, nesta região, apoiar a construção de uma “plataforma de serviços financeiros” e o desenvolvimento do “mercado internacional de obrigações em renminbi e patacas”.

Pretende-se ainda, neste domínio, dar apoio nas áreas da cooperação científica e tecnológica, promovendo projectos que se desenvolvam tanto na China, como Macau e o universo lusófono, e que tenham “condições para ser implementados de forma prioritária na Zona de Cooperação Aprofundada”.

A ideia é também, via Hengqin, apoiar Macau “na construção de um mecanismo de cooperação no sector audiovisual” através do “diálogo de políticas” e no fomento de projectos em “co-produção, intercâmbio de programas, cooperação técnica e formação de quadros”.

Comércio e saúde

Para Francisco José Leandro, académico da Universidade de Macau, o plano de acção sintetiza-se no apoio aos sectores da agricultura e educação, investimento nas áreas dos serviços médicos e turismo, sem esquecer a aposta na cooperação e serviços financeiros “em torno da utilização do renminbi e no desenvolvimento do eixo Cantão-Hengqin-Macau”. Contudo, o académico ressalva a importância de aguardar pela “versão final [do plano de acção] para melhor análise e estudo”.

“Há um esforço da parte chinesa no apoio às suas exportações através do crédito, seguros e facilitação da inspecção sanitária”, acrescentou Francisco Leandro. O académico destaca também “o interesse em reforçar o apoio à formação de quadros nos países de língua portuguesa, designadamente nas áreas médicas e da saúde, de turismo, da linguística e do audiovisual”.

Em termos gerais, considera que “o plano estratégico de cooperação agora aprovado é moderadamente ambicioso e aposta na continuidade do desenvolvimento das relações entre a China e os países de língua portuguesa”.

Relativamente à área da saúde, o plano de acção contempla todo um capítulo destinado à “cooperação médica e sanitária”, com a China a admitir a vontade de aprofundar as parcerias “entre hospitais associados da China e dos países de língua portuguesa”, com a prestação de “consultas gratuitas ou realizando outros projectos médicos de curto prazo”.

Relativamente à medicina tradicional chinesa, a China pretende aumentar a formação de quadros qualificados nos países lusófonos através do estabelecimento de centros de medicina tradicional chinesa. Além disso, Pequim quer “enviar aos países de língua portuguesa da Ásia e de África equipas médicas integradas no total por 300 pessoas”.

O plano de acção inclui ainda a área da economia azul, domínio onde “os ministros concordaram em promover o estabelecimento de parcerias relacionadas com a economia azul entre a China e os países de língua portuguesa, por forma a estudar e elaborar planos sectoriais, bem como desenvolver projectos de cooperação sustentável” nesta área.

Destaque ainda para as promessas de cooperação na área das pequenas e médias empresas (PME), pretendendo-se, através do Fórum, “organizar actividades de intercâmbio” entre empresas chinesas e lusófonas. Além disso, os ministros “acordaram em aproveitar a plataforma de Macau para desenvolver a cooperação em matéria de incubação, parceria e promoção de startups”.

Ainda na área do desporto, pretende-se o “reforço do intercâmbio e cooperação ao nível de diversas modalidades desportivas entre países participantes”, além de se “promover a formação de treinadores e outros técnicos”.

Seis em vinte

A China estabeleceu a RAEM como plataforma para o reforço da cooperação económica e comercial com os países de língua portuguesa em 2003 e, nesse mesmo ano, criou o Fórum de Macau. O organismo integra, além de Macau e China, nove países de língua portuguesa: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. A Guiné Equatorial foi o mais recente a aderir, à luz da adesão do país à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Cada país nomeia um delegado permanente em Macau, à excepção do Brasil que ainda não nomeou nenhum representante desde que o Fórum foi criado, mas que nesta sexta Conferência Ministerial expressou vontade de o fazer.

Tal foi revelado por Francisco Tadeu Barbosa de Alencar, secretário executivo do Ministério do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte brasileiro. Citado pela Lusa, este referiu não existir ainda qualquer decisão sobre um delegado permanente do Brasil no Fórum de Macau, mas indicou ser “um instrumento a considerar para fortalecer a relação” com o organismo.

Cinco conferências ministeriais foram realizadas em Macau em 2003, 2006, 2010, 2013 e 2016, durante as quais foram aprovados Planos de Acção para a Cooperação Económica e Comercial. Inicialmente prevista para 2019, a sexta conferência ministerial foi adiada para Junho de 2020, mas com a pandemia da covid-19 acabou por não se realizar. Em 2022, houve apenas um curto evento online que culminou com a assinatura de uma declaração ministerial.

26 Abr 2024