Alexandre Farto aka Vhils, artista: “Gosto de trabalhar com as forças do caos”

“Destroços” é a primeira exposição individual em Macau do artista português Alexandre Farto, conhecido como Vhils. A inauguração tem lugar no próximo dia 31 nas Oficinas Navais N.º1. Ao HM, Alexandre Farto falou do seu percurso entre artista marginal e referência internacional, e do que o move no seu trabalho

[dropcap]A[/dropcap] intervenção urbana passou de arte marginal a arte com reconhecimento internacional. Concorda? Na sua opinião, como é que foi feito este trajecto, e o que motivou o crescente interesse e reconhecimento?
Em certa medida, sim. Parte daquilo que começou como um movimento marginal, ilegal, evoluiu nos últimos anos para uma nova forma de arte pública, com reconhecimento institucional. Mas este é um fenómeno complexo e é preciso não desligar a coisa inteiramente do meio onde surgiu. Se, por um lado, temos esse crescente reconhecimento, ainda há muita gente a criar ilegalmente no espaço urbano, e essa vitalidade, que não podemos desligar da sua natureza marginal, é importante. Como qualquer outro fenómeno que nasceu das subculturas, seja em que área for, esta forma de arte surgiu das margens e, depois, a sua crescente popularidade fê-la ser absorvida pelo mainstream. O sistema sabe bem absorver aquilo que acha aproveitável, mesmo quando tem origem em movimentos anti-sistémicos. Este trajecto tem muito que ver com, por um lado, o amadurecimento desta geração dos últimos 20 ou 30 anos que cresceu com esta forma de arte, que gosta e segue o trabalho destes artistas e que, agora, começa a ter a oportunidade de os apoiar. Por outro lado, tem havido um reconhecimento institucional, sobretudo da parte das autarquias e governos locais que começam a vê-la como parte de uma solução, e não apenas como parte de um problema ligado à cidade e o modo como se vive a cidade. Há depois também todo um trabalho por parte de investigadores, curadores, galeristas e outros agentes ligados à dimensão institucional das artes que tem contribuído positivamente para este reconhecimento e valorização.

No seu caso, como é que o Vhils saiu da marginalidade? Como foi a evolução estética e técnica no seu trabalho?
Bom, o Vhils tem origem precisamente nesses tempos de marginalidade. Surgiu nesse meio, como produto desse mesmo meio. Primeiro no graffiti ilegal, uma prática que me permitiu expressar a rebeldia própria da adolescência e a liberdade de explorar a cidade e ocupar o meu lugar no espaço público, de mostrar que não era invisível como tantos outros. Teve muito que ver com a minha própria emancipação. No entanto, o graffiti funciona dentro de uma lógica de circulo fechado, sendo feito apenas para quem está dentro da comunidade. Apesar de não ter deixado de pintar, cheguei a uma certa altura em que comecei a reflectir sobre o que estava a fazer, o que queria fazer, e a consciencializar-me sobre o potencial de usar o mesmo espaço para comunicar com um público muito mais vasto. Comecei a explorar outras técnicas e a trabalhar com a cidade de outra forma. À medida que fui crescendo, comecei a desenvolver esta reflexão sobre a natureza da cidade contemporânea, o modo como vivemos neste espaço, o sistema que a sustém. A certa altura, entendi que as paredes que eu andava a pintar já tinham as suas histórias contidas nas suas camadas. Em Lisboa isto era visível, havia restos de murais da revolução que nos falavam dessa utopia, depois cartazes publicitários que nos falavam do boom do desenvolvimento e da integração no sistema capitalista, por cima disso veio o graffiti e depois as paredes foram sendo pintadas de novo pelas autarquias até levarem com mais graffiti, mais cartazes, e por aí adiante. O que entendi foi que as paredes vão ganhando camadas que captam todos esses registos, e que hoje em dia estas mudanças são tão velozes que parece difícil conseguirmos absorver tudo. Foi com base nessas observações que procurei começar a trabalhar com estas camadas que já lá estavam, em vez de estar a adicionar mais. Ao mesmo tempo fui-me juntando com outras pessoas com as quais partilhava o interesse de expor trabalho noutros ambientes, e começámos a organizar as nossas próprias exposições. A mais importante foi a Visual Street Performance (VSP) que teve uma edição anual entre 2005 e 2010. Comecei também a tentar mostrar trabalho em galerias. Da junção desses dois contextos conheci a galerista Vera Cortês que se interessou pelo meu trabalho e decidiu apoiar-me. Em 2006 tive a primeira exposição na sua galeria em Lisboa. Foi nessa altura que comecei a trabalhar com aglomerados de cartazes que retirava da rua e a explorar um processo de subtracção dos materiais. A ideia é anular parte destas camadas e expor a entranha, tornar visível aquilo que é invisível, expor a sua história através de processos destrutivos. Pouco depois comecei a fazer o mesmo com as paredes, e o trabalho que faço hoje partiu daí. Em 2007, mudei-me para Londres para estudar na universidade, o que acabou por ser uma fase muito importante para a internacionalização do meu trabalho. Em Londres fui convidado a trabalhar com a Lazarides Gallery e, depois disso, os convites foram-se sucedendo para desenvolver projectos em vários pontos do mundo. No entanto, não deixei de fazer coisas em Portugal, e depois de alguns anos senti que já não fazia sentido ver o país como periférico e podia perfeitamente trabalhar a partir de Lisboa para o mundo. Em 2012 voltei a Portugal, onde abri o meu estúdio. Entretanto tive um convite para fazer uma residência artística em Hong Kong e mudei-me para aqui em 2015. De forma a poder aproveitar o potencial da região abri um segundo estúdio e, desde então, tenho trabalhado entre Lisboa e Hong Kong.

FOTO: Paulo Spranger/Global Imagens

Em que é que o Vhils intervém e o que comunica com o público?
A ideia é criar um diálogo com alguns elementos da realidade material, mas também imaterial, da cidade, desenvolvendo uma reflexão sobre a natureza das sociedades urbanas contemporâneas através da fricção e justaposição. Gosto de trabalhar com as forças do caos presentes na cidade, de as incorporar na obra, de revelar a essência das coisas que, simbolicamente, se encontra soterrada nas camadas que as compõem. Daí o recurso a processo destrutivos que, por um lado, têm origem na noção de vandalismo estético presente no graffiti, e, por outro, também espelham os ciclos de destruição e criação através dos quais a cidade opera o seu crescimento. O meu trabalho deve muito ao espaço urbano, bebe muito daquilo que ele oferece e produz, procurando desenvolver uma reflexão sobre a sua natureza e as suas características, assim como a relação que tem com aqueles que nele habitam. Depois estabelece uma ligação com aquilo que lhe dá forma no presente, questionando o modelo de desenvolvimento globalizante e o modo como este afecta a identidade de indivíduos, comunidades e culturas a um nível local. Tenta, acima de tudo, tornar visível o invisível, seja ao nível de materiais ou ao nível de pessoas e comunidades. Faz uma leitura de contrastes entre estes temas, assim como o impacto das mudanças em curso, sobre a destruição que cria e a criação que destrói. Para mim a arte só faz sentido quando faz uso da capacidade de sensibilizar e ajudar a promover a discussão. Mas eu prefiro ver o meu trabalho mais como uma reflexão crítica sobre vários tópicos que considero importantes do que propriamente uma forma de acção política.

Que aspectos da actualidade merecem um alerta maior?
Acho que há vários aspectos que estão relacionados. Têm origem na mesma questão, num processo desencadeado por este modelo de desenvolvimento que seguimos de forma irreflectida. Um modelo que tem trazido coisas positivas e negativas mas que, em última instância, é absolutamente insustentável a longo prazo. Preocupa-me sobretudo a assimetria entre mundos (entre aqueles que têm cada vez mais e aqueles que têm cada vez menos), assim como a erosão das identidades locais através da imposição de padrões uniformizantes. Creio que a arte serve para levantar questões, para ajudar a reflectir, para ajudar a chamar a atenção para situações importantes e inquietantes. Não tenho a presunção de achar que tenho todas as respostas ou soluções para estas questões. Acho que é importante reflectirmos em conjunto, trabalharmos em conjunto. A questão é haver vontade para tal.

Num futuro, o que prevê que possam vir a ser os motes para o seu trabalho? Quais os “perigos” que devem ser reflectidos?
É difícil projectar no futuro, mas creio que, entre outros, a cidade, o modo como opera, a crescente uniformização que o presente modelo de desenvolvimento global impõe, a erosão das especificidades culturais e identitárias locais, a crescente tensão entre o espaço urbano e o espaço rural, são temas que irei continuar a explorar nos próximos tempos.

Porquê Vhils? Há alguma história por detrás do nome?
O nome Vhils vem da altura em que pintava graffiti ilegal. É um nome que segue a mesma lógica de um pseudónimo, mas escolhido para ser escrito, difundido e desenvolvido esteticamente. Não tem significado nenhum, a sua escolha deve-se apenas à sequência de letras que me agradava, e permitia escrevê-lo e pintá-lo de forma rápida e segura. Quando comecei a apresentar trabalho em exposições já era conhecido como Vhils e decidi manter o seu uso junto com o meu nome verdadeiro. 

Disse em entrevista que antes de ser convidado pela Fundação de Arte de Hong Kong já era sua intenção passar uns tempos no Oriente. Porquê? O que via deste lado do mundo para querer vir até cá?
Em 2012, fiz uma residência artística em Xangai e gostei muito da China. No ano seguinte vim a Hong Kong pela primeira vez trabalhar numa peça e numa exposição e também me senti bem aqui. Como disse, a natureza do meu trabalho é a realidade urbana. A escala da transformação, desenvolvimento e mudança que aqui está a acontecer não tem paralelo no presente, mesmo se a observarmos à volta do mundo. Por este motivo, é terreno fértil para me inspirar e reflectir.

Depois do mural de Camilo Pessanha para o Consulado, tem agora a primeira exposição individual em Macau. Tem um significado especial?
Sim, certamente. Macau é um entreposto de culturas, um território rico em encontros e desencontros com tudo o que isso trouxe de positivo e negativo ao longo dos séculos. É exactamente o tipo de sítio que eu gosto de explorar e trabalhar, com uma enorme riqueza de camadas que foi acumulando ao longo do tempo, e encontra-se também num processo de grande transformação e desenvolvimento. Tudo isto me fascina por vários e diferentes motivos. Obviamente que tem o acréscimo da ligação portuguesa que, caindo num lugar-comum, é aquele misto de familiaridade e exotismo que toca a quem vem do outro lado do mundo.

Projectos na calha?
Há muitos em curso. Entre aqueles que posso divulgar encontra-se outra exposição individual no CAFA Art Museum, em Pequim, que abre no final do mês de Junho.

22 Mai 2017

Urbanismo | Arquivo de Macau mostra crescimento da cidade

[dropcap style≠’circle’]A[/dropcap] partir do dia 9 de Junho, quem for ao Arquivo de Macau poderá ficar a saber mais sobre a evolução do território, com a exposição “Macau Ilustrado – Exposição de Plantas Urbano-Arquitectónicas”.

A mostra é constituída por uma selecção de cerca de 60 plantas urbanas e desenhos arquitectónicos conservados no Arquivo de Macau que, organizados tematicamente, permitem aos visitantes compreender a evolução do padrão urbano da cidade, através das mudanças concretas desenvolvidas dos finais do século XIX até meados do século XX.

Em nota à imprensa, explica-se ainda que a exposição revela as características de design dos edifícios de Macau, em que se nota a linguagem de variados estilos adoptada por diferentes desenhadores, que “exploraram possibilidades da fusão entre elementos ocidentais e orientais, enquanto captaram as tendências internacionais”.

Durante o período da exposição serão realizadas diversas palestras abertas ao público. A primeira está agendada para o dia 17 de Junho e é da responsabilidade do arquitecto Lui Chak Keong, que vai fazer uma retrospectiva sobre o desenvolvimento urbano e arquitectónico de Macau. A palestra será conduzida em cantonense. Desconhece-se se há tradução.

19 Mai 2017

João Mascarenhas, músico: “Não acredito numa jam session séria”

Um acaso levou-o ao evento Jazz Sunday Sessions que acontece no espaço Live Music Association todos os domingos. A partir daí, o músico brasileiro, que vive entre Macau e Hong Kong, começou a pensar em novos projectos para o território. João Mascarenhas acredita que o público local precisa de educação para ouvir outros sons que não os da música clássica, para compreender o sabor do improviso

Foi o João que descobriu as Sunday Jazz Sessions no Live Music Association (LMA). Como surgiu o interesse pelo evento?

Foi uma coincidência. Tive um trabalho aqui, de último minuto, em que umas pessoas de Hong Kong me pediram para arranjar músicos em Macau. Comecei a contactar músicos que conhecia, e aí comentaram comigo que havia essas sessões no LMA. Já tinha planos para começar a passar mais tempo em Macau, e foi uma coincidência muito boa.

Está a pensar desenvolver alguns projectos em Macau. Que tipo de projectos são esses?

Estou querendo começar a ensinar. Quero começar alguma coisa no LMA. Há músicos bons em Macau, mas estão estagnados. Queremos mudar a educação musical aqui. Tenho vindo a ser contactado por dirigentes associativos e quero trazer músicos de Hong Kong também. Basicamente quero trabalhar com a educação, porque é algo fundamental para criarmos uma plateia. Se tivermos os estudantes daqui, que começam a chamar os amigos, cria-se um fomento da cena da música jazz. Estou a pensar também criar uma associação aqui em Macau, para também fomentar esse lado educacional.

Como foi a sua vinda para a Ásia e a entrada na cena musical de Hong Kong, onde existe mais diversidade?

Hong Kong tem de facto mais lugares para se trabalhar. Estive em Macau em 2005. Antes estive nos Estados Unidos a fazer um mestrado em Composição, mas estava um pouco aborrecido e não aguentava mais ficar lá. Apareceu então um trabalho no Vietname, onde gravei dois discos, e depois arranjei emprego em Macau. Aqui tocava com uma banda num hotel e conheci a minha esposa. Isso me fez ficar aqui por aqui. Decidi também voltar para a universidade e ganhei uma bolsa da Universidade de Hong Kong para trabalhar em composição. Comecei a fazer trabalhos como compositor, produtor e também como educador, porque fiz bastantes workshops.

Entre a primeira experiência em Macau como músico e esta fase agora, que análise faz da evolução da cena musical aqui?

Macau tem uma coisa que lembra muito a minha cidade natal, Belém [no Brasil]. Não se tem referências do que acontece no resto do planeta se não se for lá fora ver o que está acontecendo. Costumava fazer comentários sobre um slogan que havia em 2005, que dizia “No mundo de diferenças, a diferença é Macau”. Tem uma conotação negativa. Naquela altura havia as escolas do Conservatório, que vão estar sempre ligadas à cena da universidade. Então se não tiver musica clássica, não é uma coisa séria, não é uma coisa para ser ouvida. Cria-se uma barreira entre o que é música popular e o que é música clássica. Naquela época só havia dois bares com música ao vivo. Com esse boom dos casinos, passaram a existir os lugares, os bares que deveriam ter música. Mas Macau ainda não tem uma produção de músicos não clássicos, com nível profissional suficiente para gerir entretenimento de alta qualidade. Os músicos de conservatório mais puritanos e conservadores chamam música popular ao jazz, mas o jazz não é isso. O jazz teve um grande boom no início do século XX, quando apareceu em Nova Orleães o crioulo tocando. Depois houve o boom das bandas brancas, com Glenn Miller, o swing, a década de 30. Depois chegou Bebop. Era uma outra maneira de pensar completamente diferente. O artista de jazz é um performer e, ao mesmo tempo, um compositor. Ele improvisa. Em Macau ainda não tem essa coisa, não produz ainda músicos que tenham esse nível para serem entertainers de música popular, e está começando no jazz. O caminho para mudar isso é a educação musical, e gostaria muito que, pelo menos, os clássicos pensassem na flexibilidade. A coisa do jazz exige uma pequena prescrição, depois há uma improvisação e interacção. O jazz é, na verdade, uma música interactiva. O meu coração está na hora do improviso.

Também é preciso educar o público?

Exacto. Em Hong Kong faço workshops sobre apreciação de jazz para pessoas que não são músicos, de uma maneira informal. E quero começar a fazer isso aqui também.

Macau é muito feita de comunidades. É possível treinar os diferentes ouvidos que existem aqui?

É possível. Tudo depende da maneira como se entrega esse tipo de música e de informação, como se apresenta uma música para as pessoas. Tem de haver entretenimento também. A música clássica está morrendo e em decadência, e o que mantém a música clássica ao vivo é a parte da música de filme. Há uma orquestra em Hong Kong que vai executar as músicas do filme do Harry Potter, por exemplo. A música clássica está querendo pegar nessa coisa do visual, para conseguir alguma sobrevivência.

É um tipo de música para se ouvir sentado.

É um pouco isso. Acho que o jazz está entre isso e a música popular, direccionada para um total entretenimento. Não acredito numa jam session séria, num ambiente de teatro. O jazz é improvisação, depois interacção. Há também uma coisa que o artista de jazz tem, que é a individualidade. O músico tem um jeito de tocar.

Gosta mais de ser educador ou músico?

Ser músico envolve a composição, que é uma coisa solitária. Passo horas e horas no meu computador. Adoro compor e produzir, adoro ensinar, performances também é uma coisa forte. Não consigo separar essas coisas.

A música clássica está em declínio. E o jazz?

Hoje em dia, a indústria está cheia de géneros de música. As fronteiras estão misturadas. A música clássica, de concerto, ainda tem o suporte das instituições académicas e do Governo. Isso acontece aqui em Macau também e em Hong Kong. O jazz é visto como uma música de bar, de cabaret, inferior, mas na verdade é bem mais difícil do que música clássica. Tenho alunos de Macau para quem é difícil pensar fora da caixa, porque sempre lhes deram uma partitura para seguir.

19 Mai 2017

FAM | Teatro da Cidade de Reiquejavique apresenta obra de Tchekhov

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] uma abordagem “moderna e surpreendente”, diz o Instituto Cultural (IC) acerca do modo como o Teatro da Cidade de Reiquejavique, da Islândia, apresenta “A Gaivota” de Tchekhov. O espectáculo encerra a edição do XVIII Festival de Artes de Macau e, de acordo com a organização, ainda existem alguns bilhetes disponíveis.

Em comunicado, o IC recorda que o clássico “A Gaivota” já foi levado ao palco um sem-número de vezes. A encenação da produção apresentada em Macau é da autoria da encenadora lituana Yana Ross. Galardoada com o prémio para a Melhor Encenação no Festival Internacional Kontakt de Torun 2016, na Polónia, Yana Ross é conhecida pelo seu estilo único nos círculos de teatro dos países nórdicos.

A adaptação de “A Gaivota” desloca o enredo da tradicional propriedade rústica russa, tal como descrito por Tchekhov, para uma luxuosa casa de Verão islandesa, “explorando a natureza humana a partir de uma perspectiva única”. O espectáculo sobe ao palco do Grande Auditório do Centro Cultural de Macau nos dias 27 e 28.

Também ainda há lugares vagos para “Double Bill”, por Hiroaki Umeda, agendado para os dias 26 e 27. “O renomado coreógrafo apresenta não só a sua peça a solo ‘Holistic Strata’, como também um novo trabalho desenvolvido em conjunto com bailarinos locais, usando o corpo humano para quebrar as limitações existentes.”

Fim-de-semana cheio

Já hoje e amanhã, é apresentado “O Inferior”, que explora as fronteiras entre o mundo real e virtual, e ainda a peça em patuá “Sórti na Téra di Tufám” (ver texto nas páginas 2 e 3). Entre hoje e domingo, “Miss Revolutionary Idol Berserker” traz, escreve o IC, “uma onda de juventude e leva o público a um frenético mundo japonês”.

Neste fim-de-semana, há ainda espaço para ópera cantonense, com Chu Chan Wa e “um grupo de excelentes actores locais”, que apresentam o clássico “The Butterfly Lovers”.

No dia 23, a Companhia da Ópera Nacional de Pequim leva ao palco uma adaptação concisa do clássico de ópera de Pequim “Senhora Anguo”, enquanto a Orquestra de Macau apresenta o concerto “Ressonância Através do Espaço-Tempo”.

De 26 e 28 deste mês, há teatro para crianças: “À Mão” é criado com bonecos de barro.

19 Mai 2017

Erik Kuok, director do festival Bok: “O teatro não é só um espaço de apresentações”

A quinta edição do Festival Bok está a ser preparada e, de 28 de Junho a 9 de Julho, o edifício do antigo tribunal vai ser ocupado por teatro e artes performativas. Ao HM, o director executivo do evento avançou alguns detalhes da programação e explicou por que é esta iniciativa diferente de tudo o que se faz em Macau

 

O Bok nasceu em 2013. Como é que apareceu a ideia de criar um festival de teatro?

Na altura, a companhia Horizonte queria alargar as funções do teatro. Estavam num espaço, num edifício industrial, e pensavam no que podiam fazer com ele, além dos ensaios e das apresentações. Começaram a pensar em formas de fazer com que o teatro não fosse só para eles e se dirigisse aos outros. Foi assim que deram início a este projecto. Ainda não se chamava Bok, mas o conceito já era o indicado pela palavra que, em cantonês, que dizer ‘luta’. A ideia era uma espécie de ‘fightclub’ dentro do teatro. Bok também tem que ver com jogo, quando se joga usa-se a mesma expressão. Por seu lado, quando se fala de jogo, fala-se de correr riscos e, nesse sentido, o Bok também é um termo apropriado. A Horizonte resolveu então pegar neste conceito. Convidaram companhias de teatro locais, mas também de Hong Kong e do Continente, e durante quatro semanas fizeram a primeira edição do festival. Cada semana era dedicada a uma companhia. A intenção era fazer com que cada espectáculo pudesse ser apresentado o maior número de vezes possível, porque normalmente as companhias acabam por, depois de produzir uma peça, apenas a mostrar em uma ou duas ocasiões. Na terceira edição fui convidado a juntar-me à equipa. Propus à organização que o festival fosse feito em mais do que um teatro porque, com o aumento das rendas, os espaços dos teatros vão desaparecendo. As companhias não conseguem suportar os custos. Pensei então pegar no próprio conceito de Bok que, em chinês, também é associado a ligação, com a mesma pronúncia. Foi quando se pensou em fazer o festival em vários espaços. Havia, naquela altura, quatro teatros na Avenida Venceslau de Morais. Mudámos o conceito e fizemos o festival não em quatro semanas, mas em quatro espaços durante uma semana, sendo que, na mesma rua, o público tinha sempre quatro opções de espectáculos. No ano passado, expandimos esta ideia e não a resumimos a uma avenida. Saímos para a rua, e associámo-nos a vários espaços e organizações.

O festival criou entretanto várias valências, uma delas o Bok Club. O que é?

O Bok Club apareceu da minha experiência noutros países. Em Portugal, reparei que as pessoas, depois de assistirem a um espectáculo, ficavam a conversar até bastante tarde. Mesmo quando o teatro estava prestes a fechar, as pessoas continuavam a conversar e a beber. Achei que era uma coisa boa. O teatro não é só um espaço de apresentações. É também um espaço para as pessoas partilharem ideias, para conversarem. Não tínhamos este tipo de atmosfera em Macau e achei que seria importante promover uma coisa do género. Por exemplo, aqui as pessoas vão a um espectáculo no Centro Cultural e, quando acaba, saem e vão às suas vidas. O Bok Club está aberto para que, depois das apresentações, artistas e público se encontrem de uma forma informal. Nos últimos dois anos, depois dos espectáculos, criámos um bar onde as pessoas podiam estar. É também uma ocasião social em o público se conhece. Este ano vamos implementar o Bok Club de uma forma diferente. Este ano estaremos apenas em dois lugares: vamos trabalhar com um bar na zona da Praia Grande em que vamos preparar pequenas coisas todas as noites durante o festival, de modo a que o público se possa encontrar ali. Ao mesmo tempo, estamos a pensar em ter algumas pop up performances. Estas apresentações serão sempre uma surpresa porque o público nunca sabe o que vai acontecer. Tem de ir para se surpreender e para ver.

Este ano voltam a estar em espaços fechados. Saíram da cidade e foram para o teatro. Porquê a mudança de estratégia?

O tema deste ano do festival tem que ver com a dinâmica do público. A questão que se coloca é o que fazer com o público que vai aos espectáculos. Neste sentido, as pessoas podem não ser meros espectadores e podem tornar-se parte das próprias peças. Se por um lado, nesta edição, temos uma concepção mais formal de teatro – os espectáculos voltam a ser feitos neste tipo de espaços, ao contrário do ano passado em que andámos em espaços alternativos –, por outro, podemos jogar com isso e dinamizar o interior do próprio teatro e usar o público para isso.

Há alguma apresentação que destaque desde já?

Vamos ter um espectáculo que vem da Coreia que se chama “Bodies in the Dark”. No entanto, ninguém saberá do conteúdo até ir vê-lo. O mesmo se passa com o local onde vai acontecer. Quem comprar o bilhete para este espectáculo será contactado pelos artistas e eles darão indicações. O espectáculo acontece e, ainda assim, o público continuará sem saber onde está, nem com quem está. Em termos de programação, tentamos trazer teatro diferente e alternativo. Queremos encontrar coisas que o público de Macau, de outra forma, não teria oportunidade de experienciar.

É o segundo ano que o festival avança sem apoios do Governo. Como é que conseguem fazer esta gestão, tratando-se de um festival internacional?

Trabalhamos com muitos parceiros, tanto locais, como de fora. Por outro lado, temos tido a colaboração de voluntários. No ano passado tivemos 15 e, este ano, resolvemos fazer uma chamada aberta. Recebemos 50 inscrições e neste momento estamos a dar formação. Penso que estas acções são muito importantes para os próprios voluntários. Não é só uma força de trabalho, é a participação numa actividade que lhes pode mudar a vida. Foi o que se passou comigo. Comecei como voluntário e agora trabalho enquanto profissional. É uma oportunidade de descobrirem uma actividade que gostam e de conviverem com pessoas que, no futuro, podem ser úteis caso optem por uma carreira na produção. Outra característica que se destaca com o nosso programa de voluntariado é que são elementos que contribuem activamente para o festival, podem dar opiniões e trocar impressões.

Também promovem o desenvolvimento do teatro local, nomeadamente com a rubrica “Give it a shot” onde incentivam à prática do teatro experimental. Que mais-valias traz esta secção aos artistas de Macau?

É uma secção que trata do próprio processo de trabalho. Apareceu porque percebemos que, em Macau, as companhias estão sempre a produzir. A razão é terem de criar novos conteúdos calendarizados para que possam continuar a receber os fundos que as apoiam. Sentimos que não há tempo de fazer a parte da pesquisa e do desenvolvimento de um trabalho em profundidade. O que fazemos é convidar artistas locais, com um ano de antecedência, dizemos que vão trabalhar juntos e que têm de fazer um trabalho que não necessita de ser finalizado. Nós tratamos de dar o devido acompanhamento com dramaturgos, com espaço e algum dinheiro para apoiar o projecto, bem como recursos humanos. Por outro lado, fornecemos também uma rede de contactos que vai ter acesso a estes trabalhos e a estes artistas. Depois de apresentarem a ideia, durante o festival vão desenvolvê-la, vão pesquisar e ter tempo para investigar, aprender e evoluir. Também fazemos intercâmbio internacional mas não da forma usual. Em vez de convidarmos artistas internacionais sem saber o que os locais precisam, primeiro sondamos as necessidades que mais se fazem sentir e depois vamos ao encontro dos profissionais mais adequados.  

Estamos a falar de um festival de teatro que implica a utilização, muitas vezes, de uma linguagem verbal. A língua é um obstáculo neste género de eventos? 

A linguagem não é problema. Da minha experiência, trata-se somente do que se sente com o trabalho que se vê. Quando vamos ao teatro, as palavras não são a única forma de transmitir uma mensagem. Há dois anos, por exemplo, tivemos uma peça coreana que não estava legendada e que foi inteiramente falada em coreano. O que fizemos foi dar ao público alguma informação básica acerca da peça, de forma a dar contexto. O resultado foi uma grande satisfação por parte do público. Apesar de não entender cada uma das palavras, através da forma como foi encenada a audiência percebeu os conteúdos. Um bom espectáculo consegue fazer isto.

Qual é o balanço que faz, nesta quinta edição?

Posso dizer que ainda estamos numa escala pequena no que respeita a público. Dentro do nosso e daquele a que queremos chegar, digamos que nos dirigimos a dois extremos. Um deles constituído por pessoas que são amantes do teatro e que vão ver peças frequentemente, e outro que nunca frequenta o teatro. Para chegar a este segundo alvo, tentamos ter actividades que não têm nada que ver com teatro e com elas levamos as pessoas a ter uma experiência diferente em que, de alguma forma, entram em contacto com esta arte. Por exemplo, este ano vamos ter uma corrida com sessões de leitura. Os interessados juntam-se a um atleta que contratámos e vão com ele, a correr, conhecer a cidade. O percurso tem várias paragens e em cada uma delas é dada a conhecer a sua história. No final, juntam-se, descansam e partilham uma sessão de leitura em que o tema está relacionado com a cidade e o silêncio. Claro que estamos abertos a todo o tipo de público, mas estes dois lados, que de alguma forma são opostos, são os nossos maiores alvos. Talvez um dia possamos fazer mais mas, este ano, já temos muitos eventos livres de forma a chamar a participação das pessoas.

18 Mai 2017

FAM | Peça de teatro “O Inferior” apresentada este fim-de-semana

[dropcap style≠’circle’]Q[/dropcap]ual a relação entre o ser humano e a Internet? Até que ponto é que o mundo virtual influencia a nossa vida diária? A Associação de Arte Teatral Dirks pegou nestas questões para criar a peça “O Inferior”, que sobe este fim-de-semana ao palco do Centro Cultural de Macau (CCM) no âmbito do Festival de Artes de Macau.

A peça foi escrita pela dramaturga Jennifer Haley e é a primeira vez que é representada na Ásia. A Associação de Arte Teatral Dirks criou algo de raiz, misturando projecções de vídeo e representação multimédia.

No espectáculo é retratado uma espécie de jogo, intitulado “O Refúgio”, uma realidade virtual que vai ganhando cada vez mais utilizadores. Subitamente, um detective vindo do mundo real começa a investigar crimes que acontecem em “O Refúgio”, iniciando-se então um período de dúvidas que envolve a vida real e a imaginação.

Para Wu May Bo, directora do espectáculo, “este guião é-nos familiar”. “Hoje em dia usamos o Facebook frequentemente e, ao fim de dez minutos, já estamos de volta à vida real. As pessoas já misturam todos esses elementos na sua cabeça. É isso que queremos mostrar ao público, em termos estéticos”, disse em conferência de imprensa.

Por norma, a Associação de Arte Teatral Dirks faz adaptações de textos ou romances, mas desta vez tudo foi feito de raiz, pensado e preparado durante um período de sete meses.

“Recorremos a designers gráficos e visuais para mostrar essa diferença entre a realidade e o mundo virtual”, adiantou Ip Kam Man, também director do espectáculo. Em palco foi utilizada “mobília simples e luzes para expressar um espaço mais real”, explicou ainda.

Wu May Bo disse que a ideia, desde o início, foi mostrar em palco um equilíbrio entre o real e o virtual, daí a cooperação com designers.

“Como o guião descreve dois espaços distintos, o espaço da realidade e outro mais escondido, então pensámos em como poderíamos criar uma flutuação de espaços. Pensámos em como poderíamos criar a história na mente do público, em vez de contar essa história”, referiu.

Um debate actual

Os directores do espectáculo consideram que Jennifer Haley é uma autora “inteligente” pela forma como conseguiu impor um debate sobre algo tão actual. “Precisamos desta virtualidade para sobreviver ou precisamos de algo em que possamos tocar?”, questionou Ip Ka Man.

Wu May Bo garantiu que esta perspectiva está presente em todas as personagens, sob diferentes perspectivas. “Jennifer Harney é de Los Angeles e o seu trabalho está muito relacionado com o desenvolvimento de tecnologia, ou realidade virtual, e ainda a ligação que isso tem com valores morais nos dias de hoje”, concluiu.

17 Mai 2017

Festivais | TIMC representa Macau em eventos em Portugal

A experiência de organização do This is My City vai ser abordada em dois eventos diferentes que acontecem nas próximas semanas em Portugal. Manuel Correia da Silva, principal responsável pela organização do festival de Macau, vai falar sobre o que se faz no território e não só. A ideia é construir redes entre cidades e pessoas

[dropcap style≠’circle’]É[/dropcap] o maior seminário internacional para profissionais das artes de rua e realiza-se anualmente numa cidade europeia diferente. Este ano, o FRESH STREET#2 faz-se em Portugal, fora dos principais centros urbanos: em Santa Maria da Feira, cidade onde, desde 2001, é organizado um festival de rua.

Ao contrário do que é hábito, o certame tem este ano um painel com uma forte componente lusófona. Ao lado de Cabo Verde e do Brasil vai estar Macau, através do festival This is My City (TIMC) e do seu principal organizador, o designer Manuel Correia da Silva.

“A moderadora é Cristina Farinha, que está ligada às cidades criativas da União Europeia. Foi ela que desenhou este painel e lançou a ideia da importância de saber o que é que se anda a passar na China, através de Macau, e em Macau”, conta Correia da Silva ao HM. Além da experiência pessoal e no TIMC, as conversas que tem mantido com a organização dizem-lhe que vai com uma missão que não se resume aos dez anos de festival na RAEM.

“Vou também divulgar o que se passa para lá de Macau. Quando hoje se fala em Macau é importante, para quem não conhece, falar da região do Delta, o que se passa em Shenzhen, em Hong Kong e também em Zhuhai”, cidade pequena para a dimensão das urbes chinesas mas que tem o festival de Beishan, com duas edições anuais, uma dedicada à música do mundo e outra ao jazz.

Para Correia da Silva, importa passar a mensagem do que aqui se faz, mas a participação neste tipo de iniciativas, destinadas sobretudo a profissionais, permite perceber como é que os festivais acontecem lá fora. “É bom estudarmos estes modelos noutras cidades para que o TIMC também aprenda relativamente à organização e à produção destes eventos”, sublinha.

Diversidade maior

O certame de Santa Maria da Feira tem ainda a vantagem de decorrer numa cidade que não está no centro, mas sim na periferia. “Pode fazer sentido, através deste festival, ligar Macau a Santa Maria da Feira, mais do que falarmos das grandes cidades, onde tudo já está muito ocupado e falado”, observa o responsável pelo TIMC.

“Se calhar, podem aparecer uns casamentos inesperados porque somos todos mais periféricos. Macau é periférico em relação à China, no Delta não é a cidade com mais pessoas e com uma economia mais sólida, por ser monocromática”, acrescenta.

A periferia não significa que se esteja em desvantagem, antes pelo contrário, e Manuel Correia de Silva entende que é preciso começar a trabalhar o conceito “centro da periferia”. Macau tem a mais-valia de não ter uma cultura massificada e as cidades mais pequenas propiciam a diversidade. “As pessoas estão fartas dos centros, porque o Primavera Sound é igual em Lisboa, no Porto ou em Barcelona, como são iguais todos os franchisings que acontecem em todas as grandes cidades, como se vê com o Sónar”, exemplifica. “Nas periferias, apesar de serem mais pequenas, aparecem coisas diferentes. Por isso, olhar para a periferia é hoje importante.”

Em simultâneo com a discussão e com os diferentes painéis do FRESH STREET#2, Santa Maria da Feira organiza o seu festival de rua. “Os diferentes países europeus participam com performances, teatro e circo, e por isso o festival acontece a estes dois níveis”, diz.

Lusofonia do futuro

Apesar de ser na capital portuguesa, também o MIL – Lisbon International Music Network é um evento independente. Realiza-se nos dias 1 e 2 de Junho e é o segundo destino de Manuel Correia da Silva. Trata-se de um novo festival que inclui uma vertente exclusivamente destinada a profissionais. Tem por missão a valorização e a divulgação da música popular moderna de origem lusófona, tendo em vista a sua internacionalização.

“Há um conjunto de palestras e de conferências que vão acontecer com pessoas da indústria da música: programadores, produtores, pessoas que fazem agenciamento, editoras”, contextualiza o organizador do TIMC. “Fui convidado para um painel que tem como tema a lusofonia em 2030.” Para Macau, onde a lusofonia é hoje um tema tão presente, “será interessante perceber para onde é que ela caminha, que tipo de rede é esta e no que se vai transformar”.

No ano em que o This is My City, uma iniciativa da associação +853, assinala uma década de existência, Manuel Correia da Silva salienta o facto de as duas organizações portuguesas virem ao encontro de Macau. “Querem o mesmo de nós aqui em Macau, aqui na China, e querem-nos como intermediários desta ligação”, afirma. “Isso é importante, é interessante, e acho que é algo a que o TIMC também tem de se dedicar a partir de agora. Está na altura de Macau e do TIMC também se exportarem. Temos uma história, já temos qualquer coisa para mostrar lá fora.”

17 Mai 2017

Cartoon | Joan Cornellà tem exposição patente em Hong Kong até domingo

O humor violento do catalão Joan Cornellà tem angariado fãs um pouco por todo o mundo. Quem quiser ver os seus trabalhos ao vivo tem até domingo, dia 21, oportunidade para o fazer. A exposição estará em exibição na Gallery 27 em Quarry Bay, em Hong Kong

[dropcap style≠’circle’]“A[/dropcap] Hong Kong Themed Solo Exhibition” é o nome da exposição que traz um dos cartoonistas do momento à região vizinha. Depois da estreia bem-sucedida do ano passado, Cornellà passou o mês de Janeiro em Hong Kong a absorver o que se passa na cidade. De acordo com a organização do evento, o catalão tem investigado a metrópole vizinha, “a festejar muito e a trabalhar pouco”, numa tentativa de absorver e digerir a essência. O resultado são os 38 novos trabalhos que se encontram patentes na Gallery 27, na Quarry Bay, até domingo.   

Como é costume nos seus trabalhos, esta exposição vive da tensão entre a ingenuidade dos sorrisos dos personagens retratados e o grotesco, violento, resultado de situações sociais que levam a amputações e mortes violentíssimas. Não existem assuntos tabus nas tiras do cartoonista que frequentemente se foca no suicídio, no aborto, no homicídio por razões banais.

No evento de Facebook criado pela galeria que acolhe a exposição, pode-se ler que “a natureza satírica dos trabalhos de Cornellà levanta o tapete que cobre a cidade, permitindo que se olhe para a porcaria que se esconde por baixo”. A luz que ilumina esse lado negro de Hong Kong é o sentido de humor desconcertante da obra do cartoonista.

Sorriso amarelo

Joan Cornellà tornou-se um fenómeno viral nas redes sociais, tendo mais de 4,5 milhões de seguidores no Facebook. Apesar de ser considerado por alguns como um artista perturbante, e por vezes ofensivo, o catalão usa uma linguagem simplista e infantil, apesar de abertamente sinistra, focada nas falhas da natureza humana.

Nesta exposição, o sarcasmo da obra do espanhol incide sobre vários aspectos da vida em Hong Kong. Com particular destaque para um cartoon de um homem a tirar uma selfie dentro de uma jaula onde vive. O cartoonista retrata as pobres condições de habitabilidade e os minúsculos apartamentos onde os hongkongers vivem, acompanhado pela crítica à cultura da obsessão da partilha instantânea e de auto-retratos nas redes sociais.

Outra das obras em destaque na exposição é a tira que retrata uma rapariga triste por ter o cabo desconectado do gira-discos. Um homem vem ao seu auxílio, sorridente, e coloca os dedos na tomada da electricidade usando o seu corpo como extensão para dar energia à aparelhagem. A música começa a soar, para alegria da rapariga que dança feliz, enquanto o homem é electrocutado, com sangue a jorrar dos olhos, nariz e ouvidos. Numa expressão que parece ultrapassar todos os limites do altruísmo, o homem continua a sorrir, apesar de trespassado de voltagem eléctrica.

Esta é uma das assinaturas dos cartoons de Cornellà, os sorrisos doentios das personagens, enquanto cometem atrocidades diluídas no estilo minimalista e inocente dos desenhos.

Apesar de ser considerado por muitos sectores como um artista da Internet, de profundo mau gosto, Joan Cornellà tem publicado as suas tiras em publicações como El Periódico, o diário catalão Ara e o New York Times.

Numa entrevista ao South China Morning Post, o cartoonista explicava a relação entre comédia negra e a tragédia. “Temos de começar com a ideia de que quando rimos, rimos de algo ou alguém. Com empatia, ou não, há sempre um grau de crueldade”, dizia Cornellà.

16 Mai 2017

Dança e música clássica no Le French May

[dropcap style≠’circle’]H[/dropcap]ong Kong continua com uma profusão de eventos culturais para todos os gostos. No próximo dia 2 de Junho pode ser visto o espectáculo de teatro-dança “Simon Says”, que terá exibições também nos dois dias seguintes.

O evento parte do jogo infantil com o mesmo nome, em que os participantes têm de obedecer às ordens de quem interpreta o papel de “Simon”. Os jogadores são eliminados sempre que desobedecerem aos comandos, ou não corresponderem à vontade de quem dá as directrizes. O jogo vive da tensão entre obediência e rebelião às ordens dadas, com a fronteira entre o verdadeiro e o falso a confundirem-se em palco.

O espectáculo é uma co-produção da Unlock Dancing Plaza & Le Phare, e do Centre Chorégraphique National du Havre-Normandie, onde quatro bailarinos dão movimento a vários estados da natureza humana. Subserviência e rebeldia, autenticidade e extravagância, e a tensão entre o absurdo e a determinação inabalável. “Simon Says” transmite a explosão resultante destas contradições.

Os quatro bailarinos do grupo viajaram para Le Havre, em França, onde trabalharam com a coreógrafa Emmanuelle Vo-Dinh. Após um processo de um ano e meio, a coreografia foi sendo apurada até chegar aos palcos de Hong Kong, nos próximos dias 2, 3 e 4 de Junho, no Studio Theatre do Centro Cultural de Hong Kong.

Cordas vivas

Outro dos destaques do cartaz do Le French May para o início do próximo mês é o concerto “New Rising Star Quartet in Beethoven and Mozart”, no dia 3 de Junho, interpretado pelo grupo Quartet Van Kuijk.

O grupo que faz a sua estreia na edição deste ano do Le French May em Hong Kong foi formado em 2012 e em 2015 venceu a competição Wigmore Hall String Quartet Competition, em Londres. O Quartet Van Kuijk é considerado um dos mais promissores “ensembles”, deslumbrando os espectadores com concertos cheios de vida. Têm recebido rasgados elogios da crítica, um pouco por todo o mundo. O grupo francês sobe ao palco da Hong Kong City Hall para um concerto único, no dia 3 de Junho, às 18h, para um espectáculo a não perder.

16 Mai 2017

USJ | Bambu nas margens de Sai Van

[dropcap style≠’circle’]E[/dropcap]lapse é a estrutura de bambu que vai estar exposta no Lago Sai Van de 22 a 27 deste mês. A iniciativa materializa em escala real um projecto dos alunos do terceiro ano do curso de arquitectura da Universidade de S. José (USJ). Ao longo do ano lectivo, os estudantes desenvolvem uma ideia para a construção de um pavilhão em bambu e, no final, um júri constituído por professores da instituição e convidados de Hong Kong elege o melhor trabalho que se materializa nas margens do lago Sai Van.

O pavilhão Elapse partiu de uma ideia de movimento inspirada no filme “American Beauty”. “Este pavilhão nasceu de uma relação poética que o grupo de alunos arranjou e que tem como mote uma imagem do filme “American Beauty” em que há uma cena de um saco a voar dirigido pelo vento”, explica ao HM João Ó, o professor responsável pela edição de 2017 da iniciativa. “Os alunos pegaram na imagem e a própria modelação deste pavilhão sugere esse movimento que é fluido no ar, mas que se encontra geometricamente ligado. Há uma sensação de animação por imagem”. O resultado é que cada momento do movimento está, de alguma forma, expresso na construção.

De modo a criar um momento único que marque a inauguração da instalação, a iniciativa conta com a vida dada por uma projecção de vídeo mapping e pela interatividade de uma performance de dança.

“O video mapping e a dança são os elementos que lhe vão dar movimento”, diz João Ó. A ideia tem como objectivo, não só dar dinâmica ao objecto que por si é estático, mas também “atrair o público e fazer um pouco a interacção no que respeita ao design de eventos”, conta o professor. De acordo com João Ó, não basta colocar uma escultura num espaço, é também necessário uma visão mais alargada dos media contemporâneos e do que se pode fazer para intensificar o próprio evento.

O vídeo está a cargo do Neba studio e a Soda-City Experimental Workshop Arts Association vão executar a performance. Desta forma, o público pode também assistir a dois modos diferentes de criar interactividade com um objecto estático, sendo que uma tem por base a luz e a outra, a expressão corporal. “É uma forma de dar vida, animar e criar um momento singular”, aponta o responsável. Por outro lado, “ao aplicar técnicas avançadas de design digital aos materiais de construção vernaculares, o pavilhão pretende ressoar com a cultura de construção histórica de Macau e a sua paisagem urbana contemporânea.”

Do estudo ao real

A iniciativa já se realiza há seis anos e faz parte de um módulo do terceiro ano da disciplina de arquitectura da universidade de S. José. O objectivo do módulo em que é ministrada é a produção final de um pavilhão feito com o material vernacular que é o bambu.

A importância do bambu é clara para João Ó. “O bambu é um material autêntico da região do sul da Ásia que se utiliza principalmente na industria da construção”, diz. Com a sua utilização académica, o também arquitecto João Ó considera que é também uma forma de prolongar e propagar este método tradicional que tende cada vez mais a ficar extinto, nomeadamente em Macau e Hong Kong onde era muito utilizado tanto na construção dos andaimes da construção civil como dos pavilhões temporários das óperas chinesas. “Do que tenho visto, a utilização do bambu nesta iniciativa foi a forma que a USJ encontrou para prolongar este conhecimento associado ao bambu e continuar a sua divulgação junto da população e para os alunos”, refere.

No que respeita ao empenho dos alunos, a motivação é clara até porque “permite que tenham um lado mais prático do curso que estão a finalizar.” Para João Ó, este é o momento em os projectos saem do papel. “O que acontece na disciplina de arquitectura é que temos muitas vezes a maqueta e o desenho técnico, mas, neste caso, temos a construção e uma ideia formulada pelos próprios alunos à escala de um para um, ou seja, um modelo real”, explica. A concretização de uma ideia é, considera, além de útil, muito motivadora para os alunos porque há uma exposição do trabalho dos estudantes junto da comunidade local.

O segundo lugar do concurso efectuado no mesmo módulo  vai estar exposto na galeria da Creative Macau. A mostra integra a exposição geral “On the Waterfront”. A ideia, à semelhança das edições anteriores, é mostrar o trabalho feito pelos alunos do terceiro ano. O nome nasce da relação que Macau tem com a água.

15 Mai 2017

Festival Eurovisão da Canção | Salvador Sobral faz história

O português Salvador Sobral conseguiu a primeira vitória portuguesa no Festival Eurovisão da Canção com recordes de pontuação. O cantor interpretou “Amar pelos dois” e conquistou a Europa com uma postura real e música sentida

[dropcap style≠’circle’]“E[/dropcap]u quero que o Salvador Sobral ganhe o festival da Eurovisão. Ele é bom demais”, foram as palavras de Caetano Veloso num vídeo que publicou no Twitter enquanto via, no passado sábado, o Festival Eurovisão da Canção. Salvador Sobral ganhou, e conseguiu a primeira vitória de Portugal no festival europeu. Mais tarde, dizia, que estas palavras foram mais importantes do que galardão.

Salvador Sobral cantou em português, “Amar pelos dois”, com letra e música de Luísa Sobral, sua irmã, e obteve 758 pontos na votação combinada dos júris nacionais e do público, na final do festival disputada por 26 países em Kiev, na Ucrânia.

Após a vitória, Sobral sublinhou que a “música não é fogo-de-artifício, é sentimento” e que “vivemos num mundo de música descartável”, apelando para uma mudança. “Vivemos num mundo de música descartável, de música ‘fast-food’ sem qualquer conteúdo. Isto pode ser uma vitória da música, das pessoas que fazem música que de facto significa alguma coisa. A música não é fogo-de-artifício, é sentimento. Vamos tentar mudar isto. É altura de trazer a música de volta, que é o que verdadeiramente interessa”, disse nas primeiras declarações após a vitória.

Mais tarde, em declarações à RTP, Salvador Sobral sublinhou tratar-se de “uma boa vitória também para a música no geral”, apesar de saber “que estas coisas são muito efémeras, estes concursos, amanhã já ninguém se lembra”.

“O importante é continuar a fazer música, mas sinto que é um bom passo que as pessoas tenham gostado desta música, que tem tanto conteúdo, emocional, lírico, melódico, acho que isto pode ajudar de alguma maneira, se calhar até nos anos próximos a Europa a trazer músicas com um bocadinho mais de significado a todos os níveis”, afirmou o cantor.

Questionado pelo apresentador José Carlos Malato sobre se esta vitória significa a entrada do cantor na história, Sobral disse não querer pensar nisso, recordando a digressão que tem agendada para os próximos meses, com concertos a partir do próximo sábado em Marco de Canavezes, seguindo-se o Cartaxo (26 de Maio) e Ovar (27 de Maio), antes de prosseguir a 10 de Junho em Ílhavo com datas que continuam até Agosto.

Politicamente incorrecto

Salvador Sobral, face a uma pergunta sobre o apelo que fez de apoio aos refugiados na conferência de imprensa que se seguiu à primeira meia-final, disse não pretender acrescentar nada ao que já havia afirmado, mas realçou que transmitiu uma mensagem sobre os refugiados por acreditar ser o maior problema com que a Europa se confronta actualmente, sem querer ser político.

“Recebemos um e-mail da organização a dizer que não podia continuar a usar aquela camisola [que dizia ‘SOS Refugiados’]”, explicou, por não serem permitidas mensagens políticas ou comerciais: “Pensei que era estranho. E se vestir uma camisola da Adidas, é uma mensagem comercial? Era apenas humanitária. Já disse tudo o que tinha a dizer, não penso que deva apertar o mesmo botão outra vez”.

Sobral, que disse nunca ter escrito uma canção com o propósito de passar na rádio, frisou que a sua vida não vai mudar em nada e que vai prosseguir com a digressão prevista para este Verão.

“Nunca quis saber dos votos, só quis cantar uma canção bonita como ela é”, declarou.

Durante a conferência de imprensa, o supervisor executivo da União Europeia de Radiodifusão, Jon Ola Sand, enalteceu o trabalho da organização local em Kiev e disse que a preparação para 2018, em Portugal, começa “já na segunda-feira”.

O inquieto

Salvador Sobral publicou “Excuse me”, o seu disco de estreia, há um ano, cruzando referências de uma vida, que provam o seu modo inquieto de viver a música, do jazz de Chet Baker aos clássicos brasileiros de Dorival Caymmi.

Tinha 26 anos, era um desconhecido, não mais do que o irmão de Luísa Sobral, e um rosto perdido na memória de edições de concursos de talentos vocais, há muito desaparecidas.

O cantor nasceu em Lisboa, em 1989, ouvia música desde criança e, numa entrevista recente ao El País, recordou as viagens em família, as canções partilhadas com os pais, dos Beatles, dos Genesis, de Simon & Garfunkel e John Lennon, sobretudo clássicos dos anos dos anos 1960/70, e as harmonias feitas com a irmã.

Dedicou-se a um curso de Psicologia e a um Erasmus em Maiorca. Para ganhar dinheiro, começou a cantar em bares. E foi aí que tudo mudou.

Descobriu Chet Baker, através de um guitarrista argentino com quem cantava: “Deslumbrou-me. Parecia uma angústia misturada com esperança, com melancolia, tudo numa só pessoa. Identifiquei-me totalmente com ele e com o seu estilo”, disse na entrevista ao jornal espanhol El País, publicada no passado dia 16 Abril.

O curso de Psicologia deu lugar ao de Música, e Maiorca a Barcelona, onde, em 2014, começou a actuar com a banda Noko Woi, com quem participou no festival Sonar. Um ano mais tarde seria uma voz na programação dos festivais Mexefest e, no seguinte, entraria no Cool Jazz.

Entre a vitória em Lisboa e a vitória em Kiev, a actuação de Salvador Sobral teve impacto nos meios internacionais de comunicação. Surgiu na TVE a cantar com o concorrente espanhol, foi entrevistado pelo El País, chegou às páginas do El Mundo, do Daily Express, do The Sun. A agência France Presse definiu-o como “o ‘crooner’ português de coração demasiado grande”.

“Sou um inquieto musical, preciso de ter muitos projectos em simultâneo. Estou a preparar um disco de boleros em jazz. É uma dor de cabeça ter tantas facetas. Acabarei por ter tantos heterónimos como Fernando Pessoa”, garantiu ao El País.

REVEJA A PARTICIPAÇÃO DE SALVADOR SOBRAL NO FESTIVAL EUROVISÃO DA CANÇÃO
15 Mai 2017

Teté Alhinho, cantora: “Nós nascemos com a música”

A cantora de Cabo Verde Teté Alhinho sobe hoje ao palco do Teatro D. Pedro V para dar a conhecer o seu último disco, “Mornas ao Piano”. Pela primeira vez no território, a convite da Associação de Divulgação da Cultura Cabo-verdiana, fala ao HM da sua relação com a música e com a terra que lhe deu o ritmo e o sentir

[dropcap]O[/dropcap] seu site de apresentação começa com “Nasci ao som das ilhas e delas herdei o ritmo e o sentir”. O que é nascer ao som das ilhas, como são o seu ritmo e o seu sentir?
O ritmo das ilhas não é o mesmo do continente. Temos mar por todos os lados. Os sons são muito diferentes, até porque só esta presença de mar também o é. O vento também vem com diferentes sons. Vem, ora de um lado, ora do outro. Claro que é uma forma também metafórica para situar o lugar onde nasci e, talvez, porque é que sou como sou. Os ilhéus também têm um ritmo especial de vida, e dão uma forma diferente de ser a Cabo Verde, que tem uma forma de sentir muito peculiar. De sentir a música, por exemplo, porque é um país muito musical.

Que particularidade é essa?
Porque somo ilhéus, temos sempre uma necessidade de partida, de procurar o mar. Temos esse instinto, o de ir e depois voltar. É o mar que nos leva e é o mar que nos traz. Também somos, penso, mais abertos e receptivos a muita coisa. O mar também nos traz muita gente de diferentes latitudes. Sou da Ilha de S. Vicente, cujo Porto Grande trouxe sempre muitas pessoas de várias nacionalidades. Uns ficam, outros não, e isso cria uma certa abertura de mente que acho que o cabo-verdiano tem. Não é uma mentalidade local, fechada, é aberta ao novo, mas também muito ciente do que é seu. Por outro lado, e falando da musicalidade local, nós nascemos com a música. É a mãe que canta, é a empregada que canta, é a dança que aparece desde o colo da mãe. Eu cresci assim: com uma mãe que gostava de cantar. O meu pai também gostava muito de música e tínhamos uma aparelhagem em casa. No Mindelo sempre houve a presença constante da música. Não tinha por onde fugir. Tivemos também um piano em casa e era a nossa diversão lá em casa.

Ao falar de Cabo Verde é quase impossível não nos remetermos para a morna. Vamos ter um concerto de mornas ao piano. O que é para si a morna de Cabo Verde?
É a expressão geral e comum de todo o cabo-verdiano. O barlavento tem os seus ritmos e o sotavento tem outros. A morna fez-se sempre mais em S. Vicente e Boa Vista. A morna, penso, foi a forma que encontrámos para traduzir a nossa nostalgia provocada pela distância. O cabo-verdiano sempre emigrou e com isso nasce a saudade: com as partidas, as tristezas, as perdas e o amor, claro. Já dizia o Baltazar Lopes que acelerando a morna chegava-se à coladeira. A coladeira acabou por ser um ritmo que veio tirar um pouco da melancolia associada à morna. É um ritmo que começa já a tratar de outras coisas, como o quotidiano, a crítica social e um pouco de sátira. Costumo dizer que a morna é um sentir comum cabo-verdiano.

Como é que aparece o piano associado à morna?
Normalmente a morna é associada à guitarra porque se trata de um instrumento barato. Mas a morna também se tocava ao piano em Cabo Verde. Se recuarmos no tempo, encontramos grupos que usavam o piano. Em S. Vicente, em particular na Rua de Lisboa, havia o Café Royal que tinha um piano. Todos os que tocavam piano paravam ali e era um instrumento que se ouvia sempre, até porque Mindelo era muito pequenino. Este disco acabou por ser uma coisa natural. O piano para mim sempre existiu na música de Cabo Verde. Não com a mesma expressão da viola, a que chamamos violão, mas sempre existiu. Daí este projecto “Mornas ao Piano”.

A sua carreira também passou por um projecto dedicado a crianças com o disco “O Menino das Ilhas”. Como é que apareceu esta vertente?
Eu adormecia os meus filhos a cantar. Ao cantar ia compondo alguns temas para crianças e ia guardando essas canções. Quando regresso a Cabo Verde em 1991, não havia nada para crianças. Temos um cancioneiro que é herdado e não é, realmente, nacional. Há algumas canções, mas dirigidas mais para a dança infantil. Pensei que fazia falta um trabalho para os mais novos e eu tinha três filhos pequenos. Foi assim que um dia me levantei e disse: vou gravar um disco para crianças. A partir desse dia, o disco nasceu. É um trabalho de que gosto muito também porque está muito ligado aos meus filhos.

Também trabalhou com a sua filha Sara.
Neste disco a Sara trabalhou comigo em três temas. Depois continuámos a colaborar. Sempre a vi como uma miúda muito entoada desde pequena e sempre tentei estimulá-la para a música. Fizemos um disco depois que se chama “Gerações” por ter esse sonho, o da filha que seguisse a música e que pudesse fazer aquilo que eu não tinha conseguido. Nascemos em épocas diferentes. Ela podia ter feito, por exemplo, uma carreira para crianças. Mas acabou por ir estudar para as Canárias e escolheu outras prioridades.

Que música é que ouve e a inspira?
Ouço música quando tenho tempo. Gosto de ouvir de tudo um pouco. Gosto muito de ouvir Bana e da Cesária. Gosto dos artistas mais modernos, mais jovens. Gosto da música instrumental cabo-verdiana. Quando tenho tempo levanto-me e ponho música, alguma que também possa dançar um bocadinho. Gosto especialmente da Cátia Guerreiro e do Jorge Palma. Ofereceram-me uns CDs do Sérgio Godinho que oiço para o descobrir. O Sérgio tem de ser descoberto. Depois também gosto muito da Ella Fitzgerald. Gosto de música.

O que é cantar para si?
Tem sido diferentes coisas em diferentes momentos. Em pequenina comecei a dançar. Depois o cantar começou a estar associado à minha casa, aos meus irmãos, ao piano que tínhamos, à alegria. Aliás, cantar é sempre uma alegria e canto mais quando me sinto bem. Depois foi o despertar, a partir dos oito anos. Foi um descobrir-me para a música, para o facto de conseguir e saber cantar. Era sempre uma coisa muito boa. Com o 25 de Abril, o cantar foi uma forma de eu também participar no movimento pró-independência. Tinha cerca de 17 anos nessa altura e era o cantar de músicas de protesto e luta. Foi a minha contribuição para o processo de independência e de reivindicação dos direitos do nosso país. Depois fui para Cuba e cantar era já um processo e manifestação cultural daquilo que era Cabo Verde. Passei pelo México e vou para Portugal já com três filhos. Cantar foi então para mim um escape muito grande. Tive três filhos em três anos e meio, o que fez com que tivesse vivido muitos anos seguidos entre casa, fraldas e comida. Sou também licenciada em Educação Física e ia trabalhar, aliás precisava de o fazer. Mas começava a precisar de mim porque, no meio disto tudo, eu tinha desaparecido. Essa necessidade de mim acordou-me. Tinha de fazer alguma coisa e decidi gravar um disco. Vesti-me, nunca me vou esquecer, com uma saia azul, uma blusa branca e uns sapatos azuis da tia Alice, meti-me a caminho e fui aos Olivais ver o Péricles Duarte. Ele aceitou, foi ver as músicas que tinha, falou com o Paulino Vieira, começámos a ensaiar e foi assim que nasceu o “Mares do Sul”, nos estúdios da Valentim de Carvalho. É um disco pelo qual eu tenho um grande apreço porque representa um marco. Foi tornar a ganhar um pouco o meu espaço que estava todo tomado pela família, que era a minha prioridade. Nunca deixei de fazer música a partir desse momento. Agora, a música é essencialmente comunicação. É o resultado de tudo o que vivi. É o poder expressar o que sinto. É a consolidação de todo este crescer. É o partilhar as minhas composições, o meu sentir e aquilo que a própria música representa. A música consegue o que nada mais consegue, consegue ser universal. Acho que cria uma confluência de sentimentos e uma união. Muita gente diz-me que não entende as palavras, mas que sente o que ouve. Acho que a música é capaz de ir muito longe. A música limpa. Acredito que a arte em geral – e a música em particular – é a grande esperança da Humanidade. Por outro lado, é um retorno de tudo o que tenho feito na vida. Não digo que seja tardia, mas é antes o resultado das minhas escolhas e é também o que me resta para preencher o que ainda tenho para viver. Também me provoca encontros com outras pessoas e com outros lugares. A música permite-me ter boas memórias.

12 Mai 2017

Filme “The Great Wall” é pouco interessante, diz realizador

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] realizador chinês Zhang Yimou disse que o fracasso da maior produção cinematográfica conjunta entre a China e os Estados Unidos, o “The Great Wall”, terá ficado a dever-se ao pouco interesse da história retratada.

“Os atores são todos muito bons. [O protagonista] Matt Damon e todos os outros foram esplêndidos”, afirmou Zhang à agência The Associated Press.

“Provavelmente, a história é um pouco fraca, ou o momento não foi o melhor, ou então fomos nós que não fizemos um bom trabalho. Pode ser por muitas razões”, acrescentou.

O “The Great Wall” remete para uma China imaginária, onde a Grande Muralha, o monumento mais conhecido do país, foi edificada para deter a invasão por monstros que comem carne humana.

O guião demorou sete anos para Hollywood concluir.

Zhang acrescentou elementos da cultura chinesa e o seu estilo visual, patente no drama de Kung fu, “House of Flying Daggers”, ou na cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos Pequim 2008.

Os produtores esperavam que o filme, com um orçamento de 150 milhões de dólares, pudesse inverter a tendência das produções conjuntas entre a China e os EUA falharem em ambos os mercados.

O “The Great Wall” arrecadou apenas 45 milhões de dólares em receitas de bilheteira, desde que estreou em fevereiro passado, mas ganhou 332 milhões globalmente.

Na China, onde foi exibido em dezembro, alcançou 171 milhões de dólares, tornando-se o oitavo filme com maiores receitas no país, em 2016.

O filme foi produzido pela Legendary East, subsidiária chinesa da produtora de Hollywood Legendary Entertainment, adquirida no ano passado por Wang Jianlin, o homem mais rico da China e presidente do grupo Wanda Group, que tem a maior rede de distribuição cinematográfica do mundo.

Zhang considerou que o “The Great Wall” é um marco na colaboração entre produtores chineses e de Hollywood.

“Como os chineses dizem, ‘tudo é difícil no início’. Penso que foi importante começar. Espero que haja mais cooperações do género, que as pessoas não parem só porque o resultado não foi bom”, afirmou Zhang.

Questionado se participaria de outra produção conjunta entre a China e Hollywood, Zhang respondeu: não tenho que ser eu a fazer. Espero que mais pessoas colaborem nisto”.

11 Mai 2017

Distância Zero com três workshops a cargo de Larry Ng

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]ão 12 horas de trabalho em cada um dos três dias em que decorre o workshop “A exploração dos segredos da vida através de uma rotunda poética”. A proposta é da Cooperativa Distância Zero, que traz ao território Larry Ng, de Hong Kong, para dar um conjunto de três workshops ligados à arte da representação entre os dias 15 e 17.

A promessa é uma viagem formativa que passa pela combinação de técnicas de ópera, de máscara e do teatro físico de Jacques Lecoq e Etienne Decroux. A ideia é a exploração da manipulação básica de bonecos e máscaras, e dos seus princípios estéticos. Em simultâneo, “queremos explorar a expressão física do actor e as suas possibilidades dentro do teatro físico”, explica Larry Ng ao HM. O conceito da oficina desdobra-se assim na interacção entre três aspectos: a representação, o rosto e o corpo.

O tema, “A exploração dos segredos da vida através de uma rotunda poética”, pretende metaforizar todo o processo de aprendizagem. Durante os três dias, a iniciativa vai dar o palco a “um espaço nublado e mágico em que há lugar para o humano e para o não-humano, e em que um expressa o outro”.

A vacilação entre a mentira da representação e a realidade da vida representa também um aspecto a ser explorado. “O uso da máscara está directamente associado à mentira ou à farsa, em suma, à própria encenação teatral enquanto representação da vida através de algo que não o é”, diz Larry Ng. O objectivo é possibilitar a criação de um espaço poético em que as pessoas possam andar entre o visível e o invisível, entre o interno e o externo. “É uma rotunda poética”, afirma, em que os participantes vão abordar as expressões da complexidade da natureza humana.

Máscaras vivas

Por outro lado, a técnica da máscara aborda uma estrutura viva. “As máscaras são vivas, ganham vida com a manipulação dos actores”, refere o formador. São objectos que pedem o domínio do movimento para que possam assumir expressões que levem o público a dar-lhes uma personalidade, um estado de espírito. “O movimento dá-lhes vida”, sublinha.

Desta forma, o workshop terá como base o desenvolvimento de técnicas de movimento, através de exercícios ligados ao teatro físico trazidos das escolas que fazem parte da formação de Larry Ng: a de Jacques Lecoq e  a de Etienne Decroux, em que máscara e mímica se aliam. Pela formação que vai abordar as leis básicas do movimento e a relação entre estrutura e movimento, é intenção do formador colocar os participantes num processo exploratório não só das possibilidades do próprio corpo, como da sua associação estética e representativa aquando do uso da máscara e mesmo da sua aplicação à ópera, por exemplo.

Os conteúdos principais da oficina estão divididos em vários módulos entre eles: os princípios básicos do exercício, do corpo e do espaço; o movimento com textura e forma; o movimento do corpo com diferentes materiais e estruturas; os princípios e técnicas da utilização de marionetas; os princípios e técnicas da utilização de máscaras básicas e técnicas estéticas como a imagem, a imaginação e a poesia.

Larry Ng tem a carreira marcada por formação e participações entre a Europa e Hong Kong, sendo doutorando do Departamento de Sociologia da Universidade Chinesa de Hong Kong.

A iniciativa é dirigida a todos os interessados por representação e pelas suas técnicas.

11 Mai 2017

Performance | Teatro Areia Preta apresenta “Moon Light” no Iao Hon

O movimento e a música vão inundar, este fim-de-semana, o espaço público na Praça Iao Hon com um espectáculo de autoria do Teatro Areia Preta. A peça tem como pano de fundo o drama vivido pelos refugiados sírios e as guerras que empurram as pessoas para a estrada

[dropcap style≠’circle’]S[/dropcap]exta-feira, sábado e domingo, pelas 18h30, a Praça Iao Hon será palco de uma performance intitulada “Moon’s Light”, que traz para a rua o movimento e a acrobacia do Teatro Areia Preta. A companhia tem como público habitual as crianças, mas este fim-de-semana apresenta uma performance inspirada nas migrações.

“É uma peça de teatro físico com muito conteúdo de acrobacia aérea”, desvenda António Martinez, director artístico da companhia e um dos performers que vai pisar o palco. Sendo mais específico, acrescenta que é “um espectáculo com muito impacto em termos visual, colorido, com muitos elementos de acrobacia, música e sem texto”. Não é de estranhar, uma vez que esta é a linha de trabalho normalmente trilhada pela companhia. A estética que lhes é mais familiar.

Com a música e o movimento como panorama, a peça conta histórias de viagens constantes das nossas vidas, assim como as consequências e sentimentos que essas deambulações trazem às pessoas. “Moon’s Light” pretende reflectir o drama provocado pelo conflito sírio, as condições desumanas que os refugiados enfrentam. Através dos meios que caracterizam as actuações do Teatro Areia Preta – andas, acrobacias e multimédia – a peça apresenta ao público a fatalidade e as consequências da guerra, oferece catarse para os horrores dos conflitos e perspectiva um cenário de esperança.

Este é um contexto importante para António Martinez. “O teatro não pode deixar de ser uma plataforma para empurrar o público a pensar na situação que estamos a viver”, explica. Para o director do Teatro Areia Preta, o activismo e a lucidez perante a actualidade é algo que naturalmente impregna a inspiração artística e a impele a transmitir uma mensagem ao público. “Mesmo que não estejamos directamente envolvidos, a crise dos refugiados é um problema global que afecta todos, e temos de nos posicionar. É por isso que é importante o teatro agitar a consciência crítica das pessoas”, revela António.

Ao luar

A performance “Moon’s Light” não se baseia unicamente na situação da Síria. O director da companhia explica que também os fluxos migratórios “dos países da América do Sul para o Norte, de África para a Europa. No fundo, as viagens de quem foge do conflito e da miséria em busca de um recomeço, de uma vida nova, “é o nexo de união da peça toda”, revela António Martinez.

Outro dos elementos em destaque na apresentação será o próprio meio, a rua, assim como o público, bem diferente do convencional espectador de teatro.

“Não é a mesma coisa apresentar uma peça no Centro Cultural, ou na praça Iao Hon”, explica o director da companhia. Esta não é a primeira vez que o Teatro Areia Preta toma as ruas como palco, aliás, há quatro anos apresentaram um espectáculo no mesmo local deste fim-de-semana.

“Conhecemos os nossos públicos, temos alguns anos de experiência. O público da Praça Iao Hon é muito especial, são as pessoas que moram naquele bairro e que não frequentam salas de teatro”, conta António Martinez. O director e performer salienta que os espectadores da zona norte de Macau são, em regra, generosos, com grande entrega.

Este tipo de espectáculo cria um tipo de feedback diferente entre quem o vê e quem o executa. “No palco de rua há um diálogo muito especial, porque o público tem uma frescura quase infantil, está a ver algo que não esperava, que agradece muito qualquer gesto”, explica.

Normalmente, as peças do Teatro Areia Preta têm como as crianças como principais espectadores. Desta feita, o espectáculo, que decorre no âmbito do Festival de Artes de Macau, promete entreter e despertar consciências.

11 Mai 2017

Bienal de Veneza | José Pedro Croft apresenta seis esculturas

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] projecto de Portugal para a Bienal de Arte de Veneza 2017, com seis esculturas criadas pelo artista José Pedro Croft, teve ontem a pré-inauguração naquela que é uma das maiores montras internacionais de arte contemporânea.

A representação oficial portuguesa é feita através do projecto “Medida Incerta”, instalado na Villa Hériot, na Ilha de Giudecca, que abriu ao público especializado esta quarta-feira e ao público em geral no sábado, dia em que a organização anuncia os prémios da Bienal de Arte de Veneza.

Nesta 57.ª Exposição Internacional de Arte – Bienal de Veneza, o projecto de Croft, com curadoria do historiador de arte João Pinharanda, consiste em seis esculturas de grandes dimensões, em vidro, espelho e ferro, que evocam a obra do arquitecto Álvaro Siza Vieira em Veneza.

José Pedro Croft disse à agência Lusa que todo o processo de trabalho e preparação deste projecto foi documentado e será também objecto da exposição apresentada no interior da Villa Hériot, com maquetas, projecção de vídeos e fotografias.

A obra de José Pedro Croft está representada em diversas colecções públicas e privadas, nomeadamente no Banco Central Europeu, em Frankfurt (Alemanha), no Museu Rainha Sofia, em Madrid (Espanha), no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (Brasil) e na Colecção Albertina, em Viena (Áustria).

Em Portugal, está presente nas colecções da Caixa Geral de Depósitos, da Fundação Calouste Gulbenkian e do Museu Berardo, em Lisboa, na colecção António Cachola, no Museu de Arte Contemporânea de Elvas, e na Fundação de Serralves, no Porto, entre outras.

Ontem na Villa Hériot, Ilha de Giudecca, em Veneza, o ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, e o secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado, estiveram presentes na pré-abertura do Pavilhão de Portugal na 57.ª Exposição Internacional de Arte.

10 Mai 2017

IIM | Inscrições abertas para concurso de fotografia local

O Instituto Internacional de Macau já abriu as inscrições para mais uma edição do concurso de fotografia dedicado ao território, “A Macau que eu mais amo”. Este ano há novidades: a organização quer imagens capazes de registar uma cidade além dos edifícios

[dropcap style≠’circle’]U[/dropcap]ma Macau além do cimento e dos monumentos. Um território além do visível à primeira vista e mesmo do palpável é o desafio que o Instituto Internacional de Macau (IIM) faz na edição deste ano do concurso de fotografia. “Ao contrário das edições anteriores desta iniciativa, este ano, o IIM pretende aproximar os concorrentes dos valores culturais e tradicionais do território”, explicou António Monteiro ao HM.

A ideia é alargar os motivos de interesse dos participantes e convidar à exploração de características do território capazes de ir além do interesse comum pelos edifícios ligados ao património local. “Queremos aproximar os jovens e, de forma geral, os residentes, a participar num concurso em que registem imagens que não se resumam ao património físico e em que espelhem também os valores tradicionais da comunidade local”, refere o responsável. O objectivo é preservar a dinâmica social e cultural do território de modo a que sejam registadas características “que possam estar em risco de desaparecer ou de serem esquecidas”.

Como exemplo, António Monteiro sugere que seja dada mais atenção a situações que envolvam pessoas, gastronomia, lojas ou letreiros que caracterizem Macau, “visto serem também elementos inerentes à cultura local”, diz. “É preciso ver mais do que as Ruínas de S. Paulo e o Farol da Guia. As pessoas geralmente tendem muito a fotografar o património físico, mas não focam aspectos que tenham que ver com festividades, por exemplo, com as culturas tradicionais, e é isso que estamos a querer fazer nesta edição”, esclarece.

O próprio nome, sublinha António Monteiro, remete para este objectivo, ou seja, para a procura de situações que envolvam também a emoção. “A Macau que eu mais amo” pretende que “as pessoas se dirijam a assuntos que as façam sentir mais o lugar onde vivem, sendo que é uma forma de colocar a população a olhar para a Macau invisível”.

Imagens de todos

O concurso é dirigido a dois tipos de participantes, tendo uma componente geral e uma outra orientada para os mais jovens. “O evento foi sempre mais aberto para a vertente jovem, não só crianças, mas principalmente estudantes universitários”, refere o responsável. O foco nos estudantes tem também como objectivo chegar a pessoas que tenham na sua formação a componente de imagem e da fotografia, de modo “a usarem esse conhecimento e poderem com ele, fazer os seus registos de Macau”.

Os prémios dividem-se entre montantes em dinheiro e certificados de participação. Para as três melhores imagens há prémios de cinco mil, três mil e duas mil patacas. Há também uma menção honrosa que é composta por um certificado e a oferta do montante de 500 patacas, “o que é uma novidade”. Há ainda o prémio especial para o melhor trabalho apresentado pelo sócio da Associação de Fotografia Digital de Macau, que co-organiza a iniciativa com o Instituto Internacional, com o valor de mil patacas. As candidaturas estão abertas a todos os residentes até 31 de Agosto.

António Monteiro não deixa de referir o crescente número de participações, principalmente da faixa mais jovem da população. A razão, aponta, é o investimento na divulgação tendo em conta este tipo de público. “Temos tentado fazer uma maior promoção junto das escolas, tanto do ensino secundário, como nas universidades”, explica. “Além disso, tentamos promover a iniciativa de modo a abranger um público mais geral e temos investido, por exemplo, na divulgação via Facebook, onde conseguimos chegar a mais pessoas”, remata.

10 Mai 2017

Mostra de cinema lusófono estreia-se no fim-de-semana

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] Lusophone Film Fest, uma mostra de cinema lusófono que teve a primeira edição em 2014 no Quénia, estreia-se em Macau no próximo fim-de-semana, com cinco filmes e o desejo de manter presença permanente na cidade.

A mostra acontece nos dias 13 e 14, com curtas e longas-metragens, de Cabo Verde, Macau, Moçambique, Portugal e Timor-Leste.

O moçambicano Inusso Jamal, co-fundador e coorganizador do evento, disse à Agência Lusa que a ideia nasceu quando ele e o amigo português Pedro Matos viviam em Nairobi, no Quénia, onde trabalhavam em ajuda humanitária.

Inicialmente pensaram em exibir os filmes no jardim de uma das suas casas, mas recearam que acabasse por só chegar a “expatriados, pessoal privilegiado”, e acabaram por fazer uma parceria com o Instituto Goethe, que cedeu a sala.

“Aí demos início à primeira mostra de cinema lusófono”, contou. Na altura, o objectivo de “cativar a audiência queniana” foi bem-sucedido. “Era essa a ideia, queríamos que um queniano soubesse o que se faz em Maputo, em Luanda, queríamos criar essa ponte”, explicou.

Depois de Nairobi seguiu-se Zanzibar (Tanzânia), Banguecoque (Tailândia), Sydney (Austrália) e Phnom Penh (Camboja). Agora é a vez de a mostra chegar a Macau. “Estando aqui na Ásia, era uma das prioridades, pela língua, pela cultura. Por isso apostámos em Macau”, disse.

A mostra quer continuar a expandir-se e chegar também aos “países de origem”, ou seja, aos países lusófonos, com o desejo de uma passagem por Lisboa em Julho.

Inusso Jamal frisou que a ideia é estabelecer em cada um dos locais uma mostra permanente, regular, onde filmes de toda a geografia lusófona sejam exibidos. Numa próxima sessão em Macau, a organização gostaria de mostrar produções – curtas e longas-metragens, documentários e animação – de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe.

O cartaz

No sábado, a Casa Garden da Fundação Oriente vai exibir o filme “Feral”, de Daniel Sousa (Cabo Verde), “Macau sâm Assi”, de Sérgio Perez (Macau) e “A Ilha dos Espíritos”, de Licínio Azevedo (Moçambique).

No domingo será a vez de “Dodu, O Rapaz de Cartão”, de José Miguel Ribeiro (Portugal) e “A Guerra da Beatriz”, de Luigi Acquisto e Bety Reis (Timor-Leste).

“A ideia é fazer da mostra algo permanente, ter um Lusophone Film Fest Macau. Em Nairobi continua a decorrer, em Banguecoque continua a decorrer, em Sydney continua a decorrer. Cada mostra, dependendo dos acordos que temos com os parceiros, pode ser numa base mensal, ou trimestral – que é o que a gente vai ver se consegue fazer em Macau”, explicou.

10 Mai 2017

Rui Rasquinho, artista plástico: “Não quero limitar esta exposição a uma teoria”

“Tentative Notebook” é a exposição de Rui Rasquinho que será inaugurada no próximo sábado na Art for All Society (AFA). Trata-se de um conjunto de trabalhos realizados durante o último ano, em livros de esboços, e que explora o próprio processo de desenhar

De que trata “Tentative Notebook”?

Esta exposição é uma espécie de representação do processo de desenhar. Comecei por desenhar em cadernos de esboços, os chamados “sketchbook”, uma prática sem objectivo e de alguma forma obsessiva. Pensava mais no processo que envolvia o que estava a fazer e não pensava em objectivos. Esta é a origem da exposição. A ideia geral é esta: em vez de estar a fazer estudos para produzir uma obra final, uma conclusão, este trabalho fala do caminho, do processo que pode levar a um resultado. Aliás, não há sequer obra final, nem nunca haverá. Cheguei à conclusão de que seria mais interessante expor esta perspectiva. Comecei com desenhos nos livros de esboços e depois passei a utilizar os cadernos desdobráveis. Uma outra coisa interessante quando se desenha todos os dias compulsivamente é o facto de não existir um objectivo final. O que existe é provocar o destino. Uma das condições para o fazer, apesar de difícil concretização, é a não racionalização e deixar que as coisas aconteçam. Passado um tempo, o desenho começa a ter uma vida quase própria. A mão, de uma forma quase inconsciente, começa a ir para sítios a que não estou a prestar atenção. Esse acidente e esse acto de provocar a prática dá resultados. Depois de meses de desenho compulsivo, de repente pego numa folha de papel e as coisas saem de uma forma inacreditável. O hábito faz o monge. Surpreendo-me. Mas não é uma coisa pensada. É o saber e descobrir onde é que esta obsessão vai e fazer as coisas de uma forma intuitiva. Limpar as coisas e, depois, a prática transforma-se em destreza. É daquelas coisas que se deixar de fazer também desaparece. A exposição vai integrar vários livros de esboços, os desdobráveis e desenhos em vários tipos de folhas. No entanto, em vez de ter as coisas geometricamente ordenadas nas paredes para facilitar a leitura do público, trata-se mais de uma representação do estúdio onde tudo acontece. Não se trata de uma representação literal, não estou  colocar o meu estúdio ali, é uma alegoriazinha, uma encenação da coisa. Vai também incluir vários objectos.

Trata-se de uma instalação?

Sim, mas queria evitar essa palavra. No entanto, e infelizmente, a nomenclatura é essa. Mas não se trata de uma instalação, é uma exposição de desenhos. A instalação acaba por acontecer por acaso. A ideia-chave é que esta exposição seja uma encenação não literal do processo de estúdio e de ensaio. A prática inicial para este trabalho começou no ano passado, numa altura em que comecei a desenhar compulsivamente. Outro aspecto importante é a existência de uma certa compulsão na prática do desenho, um resultado que deriva um pouco da escrita automática e tem um ponto de catarse que também não queria que fosse muito empolgado. A exposição também integra um vídeo. É só uma peça, mas tem duas imagens que têm que ver com o próprio tema, a paisagem. São imagens abstractas que evocam paisagens. Por outro lado, neste trabalho há sempre uma hesitação entre a figuração e o abstracto. É uma acção propositada porque o abstracto em si é ininteligível e o que interessa no processo é perceber o que lhe está nos interstícios. É como se imaginássemos uma ideia em que se quer atingir a abstracção em que se sabe que isso também é impossível. Por isso, continuamos a fazer tentativas. O vídeo incorpora também essa ideia em imagens. No que respeita a suportes, utilizo o papel e o vídeo. Carvão, tinta e grafite são os materiais. Existe ainda outra palavra de que não gosto, que é a interacção, mas que também existe na “Tentative Notebook”. As pessoas vão ter, de alguma forma, de explorar e navegar naquele espaço.

Estamos a falar de um trabalho acerca da paisagem.

O tema em si é muito abstracto e está ligado à ideia de paisagem. Apesar de usar alguns materiais chineses, não é uma “cena” chinesa de maneira alguma. Este tema da paisagem, obviamente, não se refere só à paisagem física, é uma temática que tenho vindo a desenvolver. Na última exposição o tema era idêntico e dirigido as paisagens físicas e não físicas. Desenvolver um trabalho acerca deste tema foi uma grande surpresa, mesmo para mim. Quanto estudava na universidade a paisagem era considerada a coisa mais afastada, menos interessante. Na altura tínhamos coisas que achávamos muito mais interessantes como a arte conceptual, por exemplo. A paisagem aparecia muito como uma coisa do séc. XVIII e os pintores de séc. XX que a faziam eram considerados os pintores de domingo. Mas é um tema muito interessante e que abrange muitos aspectos. Há também várias tradições. Há uma tradição mais ocidental que é a realista, ou pelo menos que tenta imitar a natureza, e há a oriental que é mais interior em que é pintado um estado de espírito, mais do que propriamente a paisagem em si. Pintam a paisagem com o filtro do espírito.

Como é que apareceu o interesse pela temática?

Nunca pensei nisso. Foi acontecendo de forma gradual, talvez, e pode ter tido que ver com a busca da abstracção. Não é busca da abstracção, mas sim do resultado que a busca da abstracção pode trazer. Explicar este tipo de coisas, penso, é desnecessário. Não gosto de as explicar. Há dois tipos de linguagem. O meu trabalho é num deles e depois não faz sentido explicar numa outra. Há uma certa qualidade misteriosa que as coisas têm de conter, sobretudo nestas práticas, e que não podem ser completamente explicadas. O que falo e que tem que ver com os meus desenhos em geral é a busca e o importante é o espaço de leitura das pessoas. As pessoas vêm o que querem consoante as suas referências e essa liberdade para mim é fundamental. Tem de existir um espaço de interpretação e de mistério. É esse espaço  de incompreensão que, às vezes, partilho e que, às vezes, não quero dissecar. Não quero limitar esta exposição a uma teoria. Tenho desenvolvido este tema nas minhas duas últimas exposições. É um trabalho entre o figurativo e o abstracto. É uma espécie de investigação que vai acontecendo. Já utilizei vídeo, fotografia e desenho. São investigações à volta da paisagem e acho que vou continuar por aqui. É um tema que precisa de, pelo menos, mais uma investida, porque não está ainda totalmente resolvido. Precisa de ser apurado.

Tem um trajecto marcado entre a produção de trabalhos diferentes que vão desde projectos pessoais a ilustrações. Onde se sente melhor?

É como se fosse bipolar. São duas coisas diferentes. Obviamente que não são estanques. Numa delas tenho um pré-texto que é um texto que serve de base ao meu trabalho e que considero ser também interessante. Nos meus projectos pessoais não tenho nada. Sou eu que invento tudo. São também duas linguagens diferentes. Numa delas tenho de ter em atenção o outro porque são ilustrações editoriais. Nos meus projectos tenho liberdade total. Gosto e  preciso de ambas as áreas.

9 Mai 2017

USJ | Carlos Morais José fala sobre Camilo Pessanha

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]a Universidade de São José, fala-se hoje ao final da tarde sobre Camilo Pessanha. A sessão é da responsabilidade do jornalista e editor Carlos Morais José, e é aberta a todos os que queiram conhecer melhor a obra do poeta português, natural de Coimbra, que morreu em Macau em 1926.

“A curta obra de Pessanha rescende, na esteira de Antero, a uma intensa reflexão filosófica, na qual se imiscui a sabedoria oriental, não como elemento exótico mas desempenhando, a par com o ópio, o papel de entorpecente, de leve bálsamo, ainda assim capaz de mitigar uma dor incurável”, escreve-se na apresentação da sessão, intitulada “Camilo Pessanha: Um resto de batel”.

É ao início da carreira poética de Pessanha, ao “Soneto de Gelo”, que se vai buscar o mote para a aula aberta de hoje. “Um resto de batel (…) para não afundar na treva imensa” espelha a dor metafísica de Camilo Pessanha, observa Carlos Morais José, “ao dar por si num universo sem Deus e entregue a uma vida não glorificada por um Destino”.

Carlos Morais José vive em Macau desde 1990. É director do jornal Hoje Macau e fundou duas editoras: a COD e a Livros do Meio, que publica obras sobre a China. É ainda autor de vários livros, de crónicas a poesia, passando também pela ficção. No ano passado, publicou o seu primeiro romance, “O Arquivo das Confissões – Bernardo Vasques e a Inveja”.

A sessão “Camilo Pessanha: Um resto de batel” começa às 19h, na Biblioteca 2 da Universidade de São José.

8 Mai 2017

Música | Conferência em Lisboa sobre instrumentos chineses

A capital portuguesa recebe, a partir de hoje, especialistas em etnomusicologia para dois dias de sessões sobre instrumentos e música chinesa. Pretende-se sensibilizar a academia do país para a importância das sonoridades que nasceram a Oriente

[dropcap style≠’circle’]P[/dropcap]elo segundo ano consecutivo, por iniciativa do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM), Lisboa é palco de uma conferência sobre música chinesa e instrumentos chineses. A série de palestras começa hoje e conta com a participação de etnomusicólogos e investigadores de renome internacional. Entre os convidados está o presidente do Instituto Cultural de Macau, Leung Hio Ming, antigo director do conservatório local e músico de formação.

Na edição deste ano, há dois instrumentos homenageados: o ‘sheng’ e o ‘guqin’. “São dois ícones da música clássica chinesa, da música imperial, duas espécies que sobrevivem há mais de três mil anos na sua forma original”, contextualiza ao HM Enio de Souza, responsável pelo serviço educativo do Museu do CCCM. “O gujin, de cordas dedilhadas, é Património da Humanidade desde 2010.”

A história destes dois instrumentos chineses é um dos temas da conferência, que abrange outras questões, da notação musical da China antiga ao xamanismo e ao taoísmo. Vai ainda falar-se da produção discográfica durante o período da Revolução Cultural e do património cultural intangível na República Popular da China.

Macau também é motivo de reflexão, com intervenções sobre as infra-estruturas culturais do território nas décadas de 1980 e 1990, e o ensino e a performance da música chinesa em Macau.

Aberta a todos os interessados, a iniciativa tem como principal alvo a academia portuguesa. Procura-se, sobretudo, criar um debate em torno da importância da música chinesa. “Um dos grandes objectivos é sensibilizar a academia portuguesa para a importância de ter como disciplina a música e a organologia chinesa, e também a música asiática”, explica Enio de Souza.

Do outro mundo

Residente em Macau entre 1983 e 1999, Enio de Souza tem entre as suas principais metas, no trabalho no Museu do CCCM, a sensibilização para a música e os instrumentos chineses.

Em 2003, o responsável criou um ateliê de instrumentos musicais chineses para escolas e público em geral. Na altura, contava com “algum domínio” na matéria que adquiriu durante os anos passados em Macau e com um acervo museológico de 42 espécies de instrumentos musicais chineses. Rapidamente se apercebeu do quão invulgar era a iniciativa, num país em que a música chinesa era uma realidade desconhecida.

“Comecei a aperceber-me de que não havia estudos sistemáticos sobre organologia chinesa em Portugal. Não há nenhuma cadeira nas universidades que têm departamentos de música ou de etnomusicologia relacionada com música e instrumentos chineses”, observa. Quando começou a investigar o tema, chegou à conclusão de que em Portugal não havia, de facto, “nenhum musicólogo ou etnomusicólogo que alguma vez se tivesse debruçado sobre música e instrumentos musicais chineses”.

Foi precisamente para colmatar esta falha que Enio de Souza decidiu avançar com estas conferências de Lisboa, a par do restante trabalho que vai desenvolvendo no CCCM. Hoje em dia, começa a haver algum interesse no âmbito da musicologia histórica e da etnomusicologia viradas para Oriente. “Já há alunos de doutoramento a trabalharem, já há teses de mestrado sobre a Orquestra Chinesa de Macau, outros estudantes universitários que também se começam a debruçar sobre esta matéria”, aponta.

Preparar público

Depois do “grande sucesso” das palestras do ano passado, a iniciativa deste ano serve ainda para preparar terreno para o que aí vem: em Maio do próximo ano, o Centro Científico e Cultural de Macau recebe a edição 21 da Conferência da European Foundation for Chinese Music Research (CHIME). “Para uma conferência desse nível, com mais de uma centena de participantes internacionais, tem de haver um público minimamente preparado. Vêm musicólogos e etnomusicólogos do mundo inteiro”, avança o responsável.

Enquanto o encontro da CHIME não se realiza, debate-se por estes dias em Lisboa a importância e a razão social dos instrumentos musicais chineses, porque é que fizeram determinado tipo de composições, a quem eram destinadas e como surgiram.

A conferência de Lisboa é uma organização conjunta do CCCM, do Instituto de Etnomusicologia – Música e Dança da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, e do Instituto Confúcio/Universidade de Lisboa, com o apoio científico garantido pela CHIME. A iniciativa conta ainda com o apoio do Museu Nacional da Música e do Instituto de Medicina Tradicional, sendo que tem como patrocinador principal a Fundação Jorge Álvares.

8 Mai 2017

FAM | Hu(r)mano acontece hoje e amanhã no Teatro D. Pedro V

Estreia hoje em Macau o espectáculo português Hu(r)mano, coreografado por Marco da Silva Ferreira. No Teatro D. Pedro V, o público poderá assistir a diversas expressões da dança urbana de uma forma teatral, onde as ferramentas de cada bailarino foram usadas como complemento de um todo

 

[dropcap style≠’circle’]N[/dropcap]o tecido urbano somos um todo e temos a nossa individualidade, com as nossas expressões, os nossos ritmos. Em Hu(r)mano, a peça que estreia hoje no Teatro D. Pedro V, no âmbito do Festival de Artes de Macau (FAM), Marco da Silva Ferreira quis fazer a sua própria interpretação da dança urbana, pegando nas capacidades e potencialidades de cada um dos bailarinos com quem trabalhou. Há o real e o imaginário, que parte do todo e que se cria a partir de cada um dos bailarinos que pisam o palco.

“É uma peça de dança a partir de um universo urbano, ao nível do corpo, do ritmo ou da energia, e também da sonoridade”, disse ontem o coreógrafo, em conferência de imprensa.

Marco da Silva Ferreira quis ir além do óbvio, trabalhando ritmos e linguagens já conhecidos. “Existe um novo trabalho sobre as linguagens urbanas do ponto de vista coreográfico, sobre o seu ritmo, o seu tempo, o seu desenvolvimento. Em vez de me concentrar tanto na mensagem ou nos símbolos que as danças urbanas tinham em si, peguei nelas e trabalhei-as num contexto teatral. A peça é tão simples quanto isso. É o corpo no espaço e no tempo, com estas premissas”, explicou.

Novas roupagens

Hu(r)mano chega pela primeira vez a Macau, depois de passagens por salas de espectáculo icónicas em Portugal, como é o caso do Teatro Municipal do Porto ou o Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa.

O coreógrafo assume ter ido buscar inspiração aos movimentos de dança urbana tanto de Portugal, como de outros países, mas não esqueceu as outras formações dos seus bailarinos (Anaísa Lopes, Duarte Valadares e Vítor Fontes). Jogou com elas e com as diversas ferramentas de que dispunha para fazer este projecto.

“Pegamos em coisas que aconteciam em Portugal, os bailarinos são portugueses nesta cultura de que estou a falar. São bailarinos que têm um cruzamento com danças contemporâneas, através da improvisação, da dança clássica ou de outras técnicas que se constroem em contexto académico. Estes bailarinos são particulares por isto: não são apenas bailarinos de dança urbana.”

Esta junção aconteceu porque Marco da Silva Ferreira não quis fazer do Hu(r)mano uma espécie de documentário em palco. “Não me interessava fazer uma peça documental, sobre o que está a acontecer no contexto urbano. Foi a construção de uma ficção minha, existe um filme do Marco nisto.”

“Peguei em coisas que eles [bailarinos] já têm no corpo e que não consigo tirar. Eles não vão responder com o corpo às propostas que eu lhes dou. Essa reacção do corpo intuitiva era boa para mim”, acrescentou o coreógrafo, referindo-se aos três bailarinos que se encontram em palco.

Vítor Fontes falou da sua experiência de trabalhar com o mentor de Hu(r)mano. “Tem sido um processo gratificante, o de acompanhar todo o processo de crescimento da peça e estar envolvido nesta nova criação. [Tem sido importante] perceber os pontos de ligação, contribuir também para o desenvolvimento da Insucesso. Tem sido uma montanha russa de emoções”, apontou.

A importância das parcerias

Em Portugal, Marco da Silva Ferreira trabalhou com várias entidades durante o processo de criação do Hu(r)mano. Uma delas foi o Espaço do Tempo, entidade dirigida pelo coreógrafo português Rui Horta, em Montemor-o-Novo, e que promove residências artísticas.

Marco da Silva Ferreira recorda que o Espaço do Tempo “foi a casa” que os acolheu já na fase final de concepção e produção, incluindo uma antestreia do espectáculo.

“A partir daí conseguimos entrar numa plataforma internacional e isso fez com que a peça se disseminasse um pouco. O Espaço do Tempo foi um espaço de concretização do trabalho e de pontos de fuga para a Europa. Existiam parceiros do Espaço do Tempo que passaram a conhecer-nos”, disse o coreógrafo.

Esta residência artística “fez um trabalho de comunicar o que estava a acontecer de Portugal para fora”. “Se calhar a peça não tinha tido o 2014 que teve, só teria o 2015, com o trabalho no Teatro Municipal do Porto. Foi importante porque nos permitiu fechar o trabalho, filmá-lo e enviá-lo para determinados sítios”, concluiu Marco da Silva Ferreira.

Hu(r)mano acontece hoje e amanhã no Teatro D. Pedro V às 20h, tendo a duração de 50 minutos.

5 Mai 2017

Felipe Fontenelle apresenta novo álbum em Portugal

[dropcap style≠’circle’]O[/dropcap] músico brasileiro Felipe Fontenelle, radicado em Macau, acaba de lançar um novo trabalho discográfico. Intitulado “M de Memória”, o disco tem como single de lançamento “Deus Também Sorri”, sendo, no seu todo, “um trabalho recheado de surpresas [onde] não faltam detalhes com ecos do seu percurso de vida entre o Brasil, Portugal e Macau”.

A música “Deus Também Sorri” será apresentada na próxima quarta-feira em Lisboa, estando já agendados espectáculos noutras cidades do país. O single de estreia do novo trabalho conta com letra de António Ladeira, tendo sido produzido no Rio de Janeiro, Brasil.

“Gravado com a velha guarda do Samba e da Bossa Nova, traz-nos um ‘cheiro’ moderno de outros tempos. Essa foi também a inspiração para o videoclip de apresentação de ‘Deus Também Sorri’, realizado por Pedro Varela (Os Filhos do Rock e A Canção de Lisboa)”, aponta um comunicado enviado pelo músico e compositor.

O novo trabalho de Felipe Fontenelle, que em Macau tem estado ligado a projectos da Casa de Portugal em Macau, constitui “uma viagem ao passado entre memórias de infância”, onde existem “os vinis dos seus pais no apartamento da Paulista, em São Paulo, e os textos de autores que marcam a literatura portuguesa”.

“M de Memória” tem o poeta Fernando Pessoa, “que dá corpo a cinco músicas originais”, tendo ainda participações de nomes como Cristina Branco, Joana Espadinha e António Ladeira (letrista de Stacey Kent). O disco conta com a colaboração de diversos músicos que já tocaram com Chico Buarque ou Cesária Évora.

É, portanto, “um disco melodioso e cheio de emoções que nos surpreende com conversas de família e, até, algum dialecto macaense”. Após um percurso musical em Portugal e no Brasil, Felipe Fontenelle gravou, em Macau, em 2015 e 2016, os discos “Tributo a Macau”, “Pessoa” e “Rua 25 de Abril”, este último com a banda Sunny Side Up.

5 Mai 2017

Café na Taipa acolhe “Zoom Pop Up Bazar” esta sexta-feira

É já esta sexta-feira que o Lax Café, na Taipa, acolhe um bazar com fotografia, comida e produtos artesanais. Andreea Apostol fala de um projecto que está a começar do zero e que pretende mostrar o que existe de diferente no território

[dropcap style≠’circle’]F[/dropcap]ugir do habitual e do previsível e fazer diferente. Foi com esta ideia em mente que Andreea Apostol decidiu organizar o Zoom Pop-Up Bazar, que decorre esta sexta-feira no Lax Café, na Taipa.

Com entrada gratuita, o público poderá ter acesso a produtos diferentes, que passam pela fotografia, artesanato ou mesmo pelas sobremesas que não vão ao forno ou ao fogão, segundo o movimento gastronómico Raw.

“O Zoom Bazaar foi uma ideia que eu e a minha amiga Roxana tivemos a partir do projecto intitulado “Script of Memories” [serviço de fotografias]. Decidimos fazer um bazar porque achamos que Macau precisa deste tipo de eventos, algo diferente daquilo que habitualmente encontramos”, contou Andreea Apostol ao HM.

Andreea Apostol sempre trabalhou na área da culinária, mas desta vez quis ir um pouco mais além. “Será um pequeno bazar onde as pessoas poderão desfrutar de um bom momento com comida e bebida, experimentar sobremesas especiais (raw e vegan) e olhar para a exposição do projecto Script of Memories. Há ainda a possibilidade de comprar alguns produtos artesanais, bem como lindas jóias.”

A mentora da iniciativa garante que sempre quis garantir a originalidade por detrás de cada projecto. “Queremos promover os pequenos negócios. Todos os participantes foram cuidadosamente escolhidos tendo em conta o conceito do bazar. A ideia era que trouxessem produtos criativos e inovadores”, explicou.

Doce sem pecado

“Rawlicious” é um dos projectos participantes no Zoom Pop-Up Bazaar e surgiu recentemente na vida de Andreea Apostol. “As sobremesas sempre fizeram parte da minha vida, pois sou pasteleira desde 2013. Sempre comi bolos, mas nos últimos meses tenho estado mais atenta ao que como e à forma como alimento o meu corpo.”

Foi então que Andreea Apostol descobriu o lado de bom de poder fazer tartes e bolos sem recorrer ao forno e a ingredientes como farinhas ou açucares. “Fazer sobremesas cruas deu-me a possibilidade de desfrutar das sobremesas sem comprometer a minha saúde. Comecei a criar cada vez mais receitas e descobri que criar sobremesas cruas é fácil e decidi concentrar-me neste projecto.”

Vão também estar presentes negócios como o Yayo Craft Collection, com produtos feitos à mão, ou ainda a Luv & Bart jewelries, que se dedica a fazer jóias “de boa qualidade” a preços mais baixos. O público poderá ainda ver os produtos vintage da Mementos of Macau.

“Com este evento queremos promover a criatividade, a iniciativa e coisas genuínas. Os participantes do bazar são verdadeiramente criativos e têm algo de novo, que não encontramos em Macau”, concluiu Andreea Apostol.

4 Mai 2017