Miguel Gomes, realizador: “O cinema não é um tribunal”

Molly e Edward têm casamento marcado, mas na hora de ir buscar a noiva ao comboio, Edward decide fugir, iniciando a “Grand Tour” pela Ásia. A película é um dos filmes de Miguel Gomes exibido no Festival de Cinema entre a China e os Países de Língua Portuguesa, que está a decorrer até 13 de Dezembro, dia em que é exibido “Grand Tour”

 

É um dos realizadores em foco neste festival de cinema que decorre em Macau. Como se sente pela oportunidade de mostrar o seu mais recente filme, “Grand Tour”, nesta região?

Poder mostrar o filme em qualquer sítio do mundo é sempre um objectivo para alguém que quer fazer filmes, pois estes só existem a partir do momento em que são vistos. O filme tem uma relação com a Ásia e a China. Foi comprado para Hong Kong, e não sei se será exibido comercialmente no território e quais são os planos dos distribuidores. Independentemente deste festival em Macau, o filme terá visibilidade nessa parte da China.

O filme é uma homenagem ao cinema antigo, pelo menos foi assim que o encarei.

Não. Acho que o cinema não precisa de ser homenageado, pelo facto de a história do cinema ser um património que homenageamos vendo-a. É muito importante que essa memória continue a fazer parte das nossas vidas e que os filmes possam ser exibidos. Em Lisboa temos a sorte de ter uma cinemateca muito competente e forte e que cumpre essa missão. O cinema de hoje está vivo, apesar de não ter um papel social tão forte como teve no século XX, e acho que não precisa de homenagens. O “Grand Tour” é um filme de hoje, mas digamos que tem a memória de outros filmes que foram feitos. Não pretendo homenagear o cinema, mas sim explorar o potencial que ele tem, fazendo duas coisas muito diferentes.

Quais são?

Uma delas terá a ver, de facto, com a história do cinema e do seu património histórico, que ligo ao trabalho em estúdio. Isso é uma coisa que o cinema fez muito, inventar mundos que não são o nosso mundo real. Por outro lado, quis captar a realidade, pois o cinema também tem esse potencial de colocar a câmara à frente de pessoas, filmar acontecimentos, lugares e poder registar isso.

Quando me refiro a essa homenagem ao cinema antigo refiro-me à presença de uma certa maneira de filmar que já esteve em voga. Queria misturar elementos cinematográficos antigos e contemporâneos?

Queria trabalhar com a Ásia fabricada, que nunca existiu, que o cinema criou.

Com a visão ocidental da Ásia.

A visão que os americanos e europeus criaram. Grande parte do cinema americano foi inventado por europeus, gente como [Josef von] Sternberg, que saiu da Alemanha e terá sido o expoente máximo de um autor de cinema que trabalhou com uma imagem da Ásia romantizada.

E filmou em Macau, inclusivamente. [O filme “Macao”, de 1952]

Exacto. Queria trabalhar com esse imaginário, tentando criar um diálogo em que pudéssemos sair para fora do estúdio e estar numa Ásia que correspondesse a um tempo colonial em muitos daqueles países, mas que depois, noutros momentos, pudéssemos estar num tempo presente. Esse tempo seria o futuro das personagens, já num outro tempo histórico pós-colonial.

“Grand Tour” era o nome dado ao percurso que então muitos ocidentais faziam para descobrir uma certa Ásia. Para fazer o filme presumo que tenha sido necessária alguma pesquisa histórica. Como foi esse processo?

Não lhe chamaria uma pesquisa muito profunda, porque não era esse o objectivo. [O “Grand Tour”] não é um filme de cariz sociológico, é uma fantasia de cinema. Está mais desse lado do que do lado sociopolítico, digamos assim. O ponto de partida foram duas páginas de um livro de viagens [o conto ‘Mabel’, de W. Somerset Maugham], que nos deram esse itinerário. A situação descrita [no conto] corresponde àquilo que vemos no filme, com um casal de noivos, com ele a viver na Birmânia e ela a regressar de Londres. Ele entra em pânico e foge no dia em que é suposto ir buscá-la ao cais de Rangum. O casal faz então esse itinerário, sendo que no livro ela consegue apanhar o noivo e casam-se, mas no filme é diferente.

Presumo que seja difícil comparar filmes. Mas entende que o “Grand Tour” marca uma viragem na sua carreira relativamente a produções anteriores?

Acho que não. É um filme pessoal, como todos aqueles que tive oportunidade de fazer. É pessoal no sentido em que não me foram impostas limitações ou qualquer caderno de encargos do produtor. Pude fazer exactamente o que queria. Vejo elementos comuns deste filme a outros que fiz. Acho que se insere numa continuidade do meu trabalho. Houve depois a questão da recepção do filme e do facto de ele ter ganho um prémio em Cannes [o de Melhor Realizador], o que obviamente me ajuda a continuar a trabalhar e ter uma receptividade mais favorável neste momento.

É um grande reconhecimento.

Antes de fazer este filme estava a tentar fazer outro no Brasil, uma adaptação do livro de Euclides da Cunha, “Os Sertões”, e é um projecto complicado, que envolve uma grande logística de produção. No período em que estava a tentar fazer o filme foi difícil [continuar] por várias razões, e uma delas chama-se Jair Bolsonaro [ex-Presidente do país]. Hoje estamos a retomar esse processo, de voltar ao filme. Houve uma altura de desânimo, em que pensei que tinha mesmo de abdicar do projecto, e hoje o processo de refinanciamento do filme está a avançar muito mais rapidamente. As perspectivas são mais animadoras.

Sente que o prémio ganho em Cannes é também do cinema português?

Espero que sim. Da minha parte, não tenho dúvidas de que aquilo que faço devo-o ao esforço de outros realizadores que filmaram antes de mim, e alguns deles continuam a fazê-lo. Eles tiveram de se confrontar com as características do nosso mercado e sociedade, conseguiram filmar num país onde não há indústria porque não há mercado para isso. Tiveram de lutar muito para poder filmar e fazer os filmes que fizeram. Reconheço uma experiência de identidade nesses filmes, revejo-me nisso, apesar dos filmes serem todos muito diferentes. Há, de facto, essa identidade na história do cinema português, talvez a partir dos anos 60, com o Cinema Novo, com produtores e realizadores que lutaram muito para poderem filmar. Fizeram filmes que, para mim, são muito importantes. Hoje em dia, com o sistema criado com a luta deles, é mais fácil para mim e para os meus colegas do que terá sido nos anos 60 e 70.

As condições políticas também eram outras, com menos investimento.

As condições políticas foram mudando ao longo do tempo, mas a vida deles também não foi fácil a seguir ao 25 de Abril de 1974. A forma como o cinema português se conseguiu impor e ganhar espaço para que existisse foi sendo travada em tempos históricos e interlocutores diferentes. E foi difícil.

Voltemos ao “Grand Tour”. Disse numa entrevista que a rodagem do filme foi “surrealista”. Que momentos que destaca dessa fase?

Quando disse isso referia-me a um momento específico da rodagem, na China, que foi muito surrealista. Esta ocorreu a milhares de quilómetros, estava em Lisboa porque não conseguia entrar no país por causa da covid-19. Depois de dois anos de espera para poder filmar, decidi que a única forma de fazer o filme seria ter uma equipa chinesa e eu estar em Lisboa e fazer a rodagem à distância. Estava num Airbnb no Areeiro, rodeado de monitores e a discutir aquilo que se deveria filmar com a equipa chinesa. Aí foi tudo muito surrealista, sim.

Alguma vez teve medo de não conseguir captar a essência do lugar, da cultura asiática, tendo em conta todas essas condicionantes?

Achava que a coisa não ia funcionar. Desconfio muito da técnica, sou bastante analógico, e achava que não ia funcionar. Para resultar tinha de ter a imagem em directo, dar um “acção” e um “corta” em tempo real, que pudesse ter a imagem geral, o que estava à volta no lugar além da imagem da câmara. Precisava de ter um sistema de comunicação que funcionasse com o director de fotografia e o responsável de câmara para lhe poder dar indicações na altura em que estávamos a filmar. Isso tudo foi possível, e fiquei espantado com isso. Por outro lado, a ideia de captar a essência do lugar, ou uma coisa mais profunda da cultura de um destes países, neste caso na China, parece-me um fardo demasiado pesado. Não era essa a minha intenção no filme, porque é algo impossível. Acredito que um filme é sempre o resultado de uma negociação entre alguém que olha e aquilo que existe para ser olhado. Há um lado subjectivo. Aquilo que nos interessa, que nos apela, que dialoga connosco e nos suscita o desejo de filmar pode existir na China, no Vietname, em África ou aqui na esplanada do café onde estamos. Parti para a Ásia como parti para a zona de Arganil para fazer um filme anterior, “Aquele Querido Mês de Agosto”.

Numa aldeia.

Sim, uma zona rural de Portugal, e não sei se olhava de maneira diferente numa situação ou outra. Há sempre qualquer coisa que acho bonito ou que me toca de maneiras diferentes. O que se passa em “Grand Tour” é uma série de desencontros, o do casal, mas parece-me que há também um desencontro entre aquelas personagens europeias na relação com o território. Parece que estão sempre desconectados do espaço onde habitam. Vivem um bocado numa bolha.

Mas o colonialismo também foi um pouco isso.

Sim. Concordo, acho que há pessoas que podem ver isso no filme, essa dissociação entre aquilo que as personagens estão a viver e aquilo que se passa em redor delas. Muitas vezes optámos por não traduzir o que se passava à frente deles para que o espectador ocidental possa estar tão intrigado e perdido como as próprias personagens. Também acho que, hoje em dia, há uma ideia, da qual discordo totalmente, que o cinema existe para corrigir a história e as injustiças todas do mundo. É também tarefa demasiado pesada para o cinema. Parece-me profundamente desajustado, porque o cinema não é um tribunal para julgar nem um espaço para punir espectadores e personagens, é outra coisa. Os filmes não têm de ser denúncias, prisioneiros de uma expectativa. Tentei fazer um filme onde a questão colonial pudesse ser tratada, mas sem ter de punir nem os espectadores, nem as personagens.

Qual era a sua relação com a Ásia ou a sua ideia de Orientalismo?

Quis trabalhar a ideia de que houve uma Ásia inventada e fabricada pelo olhar europeu, e tinha consciência que isso existiu e que tinha de trabalhar com isso no filme. O mundo da ficção, por outro lado, tem como uma das vertentes essa ideia de exotismo, independentemente da questão sociológica, de ter havido um olhar ocidental sobre o Oriente, quase como uma visão superficial desse mundo. Mas a ficção trabalha com estereótipos, e isso não é mau. É o cimento para depois fazer qualquer coisa com esses estereótipos.

Miguel Gomes na Cinemateca

Depois da primeira exibição ontem de “Aquele Querido Mês de Agosto”, a Cinemateca Paixão será o local para ver os filmes de Miguel Gomes seleccionados para a edição deste ano do Festival de Cinema entre a China e os Países de Língua Portuguesa. No próximo dia 8 é vez de “As Mil e Uma Noites – Volume 1, O Inquieto”, de 2015; seguindo-se “As Mil e Uma Noites – Volume 2: O Desolado” na terça-feira dia 10. Segue-se depois, na quarta-feira, 11 de Dezembro, o episódio da saga, com o nome ” As Mil e Uma Noites – Volume 3: O Encantado”. “Grand Tour” tem uma única exibição na sexta-feira, 13 de Dezembro.

29 Nov 2024

Oceanos | Pedida flexibilidade no financiamento

David Gonçalves, director do Instituto para as Ciências e Ambiente da Universidade de São José, defende uma canalização em Macau do investimento para a investigação científica sobre os oceanos e biologia marinha, a fim de flexibilizar projectos entre a China e países de língua portuguesa

 

O director do Instituto para as Ciências e Ambiente da Universidade de São José (USJ), David Gonçalves, considera que o investimento público em investigação académica na área da defesa dos oceanos deve estar centrada em Macau e não apenas em Pequim, a fim de melhor assegurar o funcionamento das equipas de investigação.

A ideia foi deixada ao HM no contexto da realização, na USJ, desde ontem, da quinta edição da SINOPORT Ocean Conference – Simpósio Anual para o Centro de Investigação Conjunta em Biologia Marinha [International Joint Research Center of Marine Biology], um encontro organizado pela Universidade do Algarve e a Shanghai Ocean University. O evento, que reúne académicos de Macau e de outras regiões, termina hoje.

“A questão que se coloca é se o Governo Central e local querem, de facto, atribuir o papel de plataforma na cooperação científica a Macau. Se sim, têm de surgir os mecanismos necessários, de natureza financeira, que neste momento não existem. O Governo de Macau deverá querer chamar a sim o papel de centralização nos mecanismos de financiamento. Penso que deveria haver um entendimento directo entre o Governo Central e Macau sobre o verdadeiro papel de plataforma e que mecanismos devem ser criados”, disse.

A ideia surge porque, neste simpósio, irá ser discutido o trabalho desenvolvido por dois laboratórios de investigação que são financiados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e que reúnem académicos da China, Europa e Portugal.

“Quando o financiamento é dado por parte da China, torna-se difícil que chegue a todos os parceiros [de um grupo de investigação], o que faz com que a cooperação não seja eficaz. Macau teria mais facilidades nesse campo, de poder canalizar financiamento para outros parceiros, e do ponto de vista prático seria mais fácil progredir se Macau fosse esse motor de arranque”, acrescentou. David Gonçalves espera ainda que esta questão seja discutida no simpósio.

“Actor natural”

O evento culminou, para já, na assinatura de um memorando de entendimento entre a USJ, Universidade do Porto e a Shanghai Ocean University. Hoje é a vez de Gui Menezes, da Okeanos e Universidade dos Açores, falar na sessão “Explorando o desconhecido: A evolução e o futuro da investigação marítima nos Açores”.

Joel Reis, da Universidade de Macau, apresenta o projecto ORVIS, que se trata de um “veículo robótico oceânico para a intervenção em águas pouco profundas”.

David Gonçalves referiu ao HM que a USJ foi convidada para acolher este simpósio, o que faz todo o sentido, pelo facto de Macau “ser um actor natural no entendimento entre a China e os países de língua portuguesa”. “A única coisa que falta é haver luz verde do Governo Central e do Governo local para pôr em prática esses mecanismos de cooperação”, salientou.

O financiamento já atribuído por Pequim levou à formação de dois laboratórios conjuntos virados para a investigação sobre os oceanos e vida marinha, que junta a USJ, a Shanghai Ocean University, a Universidade do Algarve, o Instituto de Oceanografia da China e o Instituto Português do Mar e Atmosfera, entre outras entidades.

No simpósio que hoje termina pretende-se “debater a cooperação que tem vindo a ser feita neste âmbito e perceber se as diferentes iniciativas se podem agregar para juntar esforços e aumentar a cooperação entre a China com os países de língua portuguesa na área dos oceanos, além de se perceber o papel que Macau pode desempenhar no futuro”, rematou David Gonçalves.

28 Nov 2024

Vera Paz e Ricardo Moura, directores “D’As Entranhas”, sobre “Home Sweet Home”: “Mais ácido que doce”

A peça “Home Sweet Home”, uma produção da companhia d’As Entranhas, é apresentada hoje e sábado no Centro Cultural de Macau. Em entrevista ao HM, os directores artísticos Vera Paz e Ricardo Moura falam de um projecto sobre a mulher, a solidão, o espaço interior de cada um e os confrontos emocionais com que nos deparamos

 

Como surge o projecto “Home Sweet Home”, que tem uma grande ligação à literatura portuguesa, com textos de Adília Lopes, Maria do Rosário Pedreira ou Dulce Maria Cardoso?

Vera Paz (VP): Este espectáculo surgiu na pandemia, era para ter sido feito antes, a ideia surgiu quando estávamos todos confinados. Por várias razões o “Home Sweet Home” não foi executado na altura. É sobre uma mulher confinada em casa, que é uma casa prisão, um espaço íntimo e privado. Há uma transmutação desse universo [literário]. A escolha da Adília [Lopes] partiu sempre da obra dela, e depois temos a Dulce Maria Cardoso, que escreve sobre o lugar da mulher, com sentimentos e perdas, que é o que me interessa. [A peça] fecha um de três solos, que começa com o espectáculo “Medeia” [apresentado em 2020], depois “A Boda” [apresentado em 2021] e agora temos, em “Home Sweet Home” a completa solidão. A dramaturgia foi feita cozinhando os textos com estas obras, sendo uma ficção biográfica do meu universo como mulher e uma reconstrução das memórias da mulher na peça.

Ricardo Moura (RM): No meu caso fui confrontado com o texto quase no final. No processo de construção do texto, nas últimas semanas, temos transformado algumas coisas e feito algumas mudanças. Adorei o texto e gosto do universo das mulheres. É sempre um desafio tentar entrar na vossa cabeça e pensar como se podem fazer as coisas. Idealizei logo uma série de imagens que, na minha cabeça, faziam sentido.

VP: A mulher de “Home Sweet Home” é uma construção de várias. Mas mais do que uma peça sobre mulheres e o universo feminino, é uma peça sobre a configuração humana, o tempo, o que fica, o que vai e o que perdemos.

RM: Esta é uma mulher que está fechada numa casa, mas essa casa somos nós. É sobre o processo de mergulharmos em nós e perceber que, muitas vezes, o que acontece é que estamos fechados em nós próprios. Ainda é mais interessante porque desde 2020 temos vivido a solidão das pessoas, que tentam fugir para a frente, com recurso às redes sociais, do “wannabe”. Aqui, nesta peça, é o inverso, o tentar mergulhar na densidade de uma mulher e perceber como está fechada. Não queremos contar nenhuma história nem deixar uma mensagem, mas simplesmente contar um pedaço daquela pessoa. Esta peça é escrita por mulheres e feita por uma mulher, mas eu vejo esta questão de forma transversal, com homens e mulheres, pobres e ricos que passam por estas “prisões”. Às tantas, somos nós a nossa própria prisão.

Home sweet home antonio mil-homens

VP: Nunca sabemos o que se passa no espaço íntimo de uma casa, mas no caso deste espectáculo é um espaço-prisão, do qual ela nunca consegue sair.

RM: Mas o não sair dali não é uma coisa física. Não consegue sair das suas memórias, coisas, daquilo que gostaria de ter sido e feito, mas que não aconteceu.

Tendo em conta o adiamento da apresentação de “Home Sweet Home” ao público, como foi a evolução do projecto?

VP: Na pandemia tínhamos bastantes restrições, não conseguia ter os actores ou os encenadores em Macau. Mas o distanciamento [temporal] foi bom, porque na altura estávamos muito em cima do que estava a acontecer, e assim conseguimos ter uma certa respiração. O texto foi alterado, transmutado e foi sendo acrescentado, porque tinha uma certa dinâmica que agora já não fazia tanto sentido. Às tantas, a voz desta mulher é a mistura das vozes das mulheres [dos textos de Adília Lopes, Dulce Maria Cardoso e Maria do Rosário Pedreira], mas não se trata de um texto clássico com princípio, meio e fim. Não se percebe o que é da Adília Lopes ou da Maria do Rosário Pedreira, por exemplo.

RM: Nos ensaios, no dia-a-dia, vamos alterando coisas. É o nosso processo de construção. Nós, na nossa companhia, temos uma linha de espectáculo que queremos desenvolver, e que se baseia na ideia de que antes de começar já começou, e quando termina é como se continuasse. Poderíamos continuar numa espécie de espiral.

“d’As Entranhas” é a única companhia a fazer teatro de matriz portuguesa em Macau. Quais têm sido os maiores desafios?

VP: É difícil. Somos a única companhia, ou associação, que, em Macau, faz teatro em português. Não traduzimos as peças porque o espectáculo não é só o texto, mas também a música. Há uma parte plástica muito marcada, é uma obra viva que é muito visual. O facto de assumidamente não traduzirmos as peças faz com que às vezes não seja [fácil]. A comunidade portuguesa em Macau é cada vez mais pequena, mas queremos continuar e vou continuar a insistir. Para este espectáculo integrámos dois actores da companhia em Portugal. Não é fácil a distância, e as pessoas têm as suas vidas. O Ricardo desenvolve projectos pontuais em Portugal, e tentamos manter um intercâmbio. Em 2018 fizemos uma parceria, mas com a pandemia ficámos num hiato imenso. Para o ano iremos continuar com dois projectos, com actores de Macau e de Portugal, e queremos manter este fio condutor.

RM: Os nossos espectáculos vivem muito de um lado mais plástico, com imagens e emoções e daquilo que os actores provocam em nós. Se não existisse texto também seria possível fazer o espectáculo. Às vezes, as pessoas têm medo de arriscar e vir ao espectáculo por causa da barreira linguística. Nos anos em que não pude vir a Macau mantivemos a parceria e desenvolvi uma coisa que nos interessa, que é a junção de culturas. Os projectos que a Vera pensa desenvolver no futuro próximo giram muito em torno disso, em juntar actores de cá e lá. Agrada-me perceber como, face a um tema que queremos tratar, as várias culturas se juntam. Gostaria de trabalhar por Macau num futuro próximo. O próximo espectáculo vai ter bastantes pessoas.

Home sweet home

Como vai ser, em termos concretos?

VP: Programei, para o próximo ano, um dueto com dois actores de Portugal e um colectivo, e vai ser uma espécie de baile.

Como tem sido a ligação “d’As Entranhas” com os restantes grupos de teatro em Macau, de matriz chinesa?

VP: Não tenho forma de chegar aos grupos de teatro chineses. É difícil a barreira e estão fechados nas suas próprias coutadas. Não há associações profissionais, é tudo amador, não existe uma continuidade. Há cada vez mais grupos de teatro com experiência, mas não existem companhias profissionais em Macau. Temos a Comuna de Pedra, a única, creio, que se dedica inteiramente a projectos culturais. Depois temos o Conservatório, existem iniciativas, mas não há uma profissionalização do sector.

Este espectáculo terá algumas limitações em termos de idade. Alguma vez sentiram alguma pressão do Governo em relação aos conteúdos das peças que apresentam?

VP: Este ano, pela primeira vez, a Comissão de Classificação de Espectáculos [do Instituto Cultural] pediu-nos o texto e classificou a imagem do espectáculo, que está aconselhado a maiores de 18 anos e interdito a menores de 13. Mas isso tem mais a ver com a linguagem do que com a imagem. Não sinto pressão. O que sinto é que existe um maior cuidado da parte de quem financia para perceber o que de facto vai financiar.

Porquê o nome “Home Sweet Home”?

VP: Não é um lar nada agradável. O nome original do espectáculo era “Estar em Casa”, com referência à obra de Adília Lopes. Depois adaptei, mas na verdade é mais “Home Bitter Home”, mais ácido que doce. É um nome enganador, mas não tem de ser tudo explicativo e taxativo para as pessoas. Pensei na ideia de que, quando estamos sozinhos, só nós é que sabemos, e o nome remete para isso. Tem várias leituras, e nunca gostamos de dar uma só leitura, para permitir que as pessoas criem as suas próprias histórias.

RM: Para mim, o título surge como a ideia de “meu querido espaço”, o meu querido eu. O processo de isolamento das pessoas pode não ser mau e, às vezes, podemos perceber que temos uma fase boa em que somos nós próprios.

28 Nov 2024

Grande Prémio | Costa Antunes recorda episódios da competição

João Manuel Costa Antunes foi director dos Serviços de Turismo durante muitos anos e vai recordar esses tempos esta quinta-feira num evento no Artyzen Grand Lapa. “Grande Prémio de Macau: Para Além das Corridas” é o nome da “Conversa ao Entardecer” promovida pela Associação Internacional de Publicidade de Macau

 

Foi em 2012 que o engenheiro João Manuel Costa Antunes deixou de dirigir os Serviços de Turismo para se tornar no coordenador a tempo inteiro do Grande Prémio de Macau (GPM). Os anos dedicados ao mundo do turismo e do desporto automóvel serão recordados esta quinta-feira no evento “Talk at Sunset” [Conversas ao Entardecer], que decorre a partir das 18h no bar Vasco do Artyzen Grand Lapa. A palestra terá como nome “Grande Prémio de Macau: Para Além das Corridas”.

O evento, promovido pela Associação Internacional de Publicidade de Macau (IAA, na sigla inglesa), conta, assim, com “uma grande figura lendária de Macau, que irá partilhar as histórias e ideias” sobre o seu trabalho na organização do GPM. Segundo um comunicado da IAA, irá destacar-se “como este lendário espectáculo desportivo serve de catalisador para o desenvolvimento global de Macau e o seu impacto no panorama turístico da região”.

Formado em Engenharia Civil, João Manuel Costa Antunes era estudante universitário em 1974, ano em que caiu o Estado Novo em Portugal, tendo feito parte do quadro do Ministério do Planeamento e Administração do Território, participou na criação de Gabinetes Coordenadores de Obras Municipais e Gabinetes de Apoio Técnico aos Municípios. Porém, Macau chamou-o, tendo chegado ao território ainda nos anos 80, onde começou por ser assessor do secretário-adjunto para o Ordenamento, Equipamento Físico e Infra-estruturas do Governo de Macau. Foi depois vice-presidente do Leal Senado e mais tarde assessor técnico dos Serviços de Marinha de Macau.

De tudo um pouco

A entrada no sector do turismo deu-se em 1987, quando fica encarregue de coordenar o projecto do World Trade Center, edifício de escritórios da autoria do arquitecto português Manuel Vicente. Foi subdirector desse empreendimento, mas em 1989 já era director dos Serviços de Turismo.

João Manuel Costa Antunes esteve ainda à frente do Gabinete de Coordenação da Cerimónia de Transferência, tendo continuado a dirigir o Turismo de Macau já depois de 1999, quando Macau já era RAEM e enfrentava novos desafios e mais turistas. Manteve-se no cargo até 2012, acompanhando sempre de perto o GPM.

Lugar de partilha

A IAA pretende promover as “Conversas ao Entardecer” para se interligar com “todos os especialistas e líderes do sector, bem como a servir de plataforma para educar os novos talentos”. Esta iniciativa consiste numa “série de eventos regulares ao final do dia que conectam profissionais da indústria a nível global para partilharem ideias e inspirarem o público com a sua paixão e dedicação”.

Em declarações à Revista Macau, João Manuel Costa Antunes recordou o período da competição do GPM nos anos 80.

“Tive a grande sorte de chegar em 1983 a Macau, ano em que arranca pela primeira vez a Fórmula 3 e o Ayrton Senna ganha. Todo o ambiente me galvanizou e tornei-me espectador assíduo. Quando passei para o Turismo, tive que aprender e ir buscar pessoas que percebessem aquilo que eu desconhecia. Para pôr a estrutura a funcionar. O meu primeiro GP foi em 1988. Correu tudo muito mal. Nunca me vi tão atrapalhado como na quinta-feira antes do GP, que é quando tudo começa”, recordou.

27 Nov 2024

História | Último governador durante o Estado Novo tomou posse há 58 anos

Chegou a Macau quando o “1,2,3” explodia nas ruas. Deu nome à primeira travessia entre a península e a Taipa e foi o último governador português em Macau durante o Estado Novo. Há 58 anos, José Nobre de Carvalho tomava posse. A sua esposa, Julieta, deu nome à habitação social que está hoje em processo de remodelação

 

1966 foi o ano de viragem no posicionamento da Administração portuguesa em Macau e palco temporal para talvez um dos episódios mais marcantes do século XX nas relações da China com Portugal. O movimento “1,2,3” explodiu a 15 de Novembro de 1966 com um acontecimento banal a servir de argumento para uma questão política muito maior: a falta de licenciamento para a construção de uma escola. Esse seria o rastilho para a expressão da Revolução Cultural em Macau, que quase pôs fim à Administração portuguesa no território.

José Manuel de Sousa e Faro Nobre de Carvalho era o governador português do território nessa altura. O episódio é relatado no livro do jornalista José Pedro Castanheira, “Os 58 dias que abalaram Macau”: o novo governador chega a Hong Kong acompanhado da sua esposa, Julieta, sem fazer a mínima ideia de que, em Macau, a comunidade chinesa protestava.

Nobre de Carvalho tomou posse exactamente dez dias depois do arranque dos protestos, a 25 de Novembro de 1966, fez na passada segunda-feira 58 anos. O Notícias de Macau era um jornal de perfil conservador, dirigido por Herman Machado Monteiro, quando notícia, em manchete, a chegada do “Novo Governador de Macau”.

O tom do texto era elogioso, descritivo, parcial, conforme determinava a censura da época. “Macau recebe hoje, festivamente, o seu novo Governador e comandante-chefe das Forças Armadas – Sua exª o brigadeiro José Manuel de Sousa e Faro Nobre de Carvalho. A hora é de regozijo e de esperança. De regozijo pela chegada de um distinto oficial general do nosso Exército, com uma brilhante folha de serviços e larga experiência do Ultramar, nomeadamente no Estado português da Índia e em Angola, para assumir as rédeas da governação desta histórica parcela de Portugal no Oriente”, podia ler-se.

A parcialidade era tanta que o próprio Notícias de Macau associava-se “ao regozijo da população, fazendo eco dessa sua esperança”, dando “a sua excelência [o governador] e exma. esposa respeitosas saudações de boas-vindas, com votos sinceros por um governo feliz, a bem da Nação e desta província”.

No dia seguinte, o mesmo jornal publicava fotos que destacavam a chegada de Nobre de Carvalho. Nem uma só menção aos protestos na Taipa. “O novo Governador da província e a senhora de Nobre de Carvalho chegaram ontem, pelas 11h30, a Hong Kong vindos de Manila num avião da Philippine Air Lines. No aeroporto de Kai Tak via-se formada uma guarda de honra, constituída por uma força do 1º Batalhão “The Welch Regiment”. Eram 13h30 quando sua exª o Governador de Macau e a senhora de Nobre de Carvalho embarcaram no hidroplanador “Penha”, posto à disposição do ilustre casal pela STDM [Sociedade de Turismo e Diversões de Macau], acompanhados da comitiva de Macau e de individualidades como Teddy Yip, Ip Hon e Henry Fok e José dos Santos Ferreira”.

Conforme era próprio na época, tendo em conta a vigência de uma administração sujeita às regras do Estado Novo, “a juventude da terra marcou a sua presença na recepção através da Mocidade Portuguesa e das escolas de língua portuguesa, chinesa e inglesa”.

O Notícias de Macau destacava que “esta vetusta parcela de Portugal onde, há 400 anos, se entabulou o primeiro diálogo entre o Ocidente e o Oriente, diálogo esse que, não obstante as sucessivas convulsões por que o mundo tem passado, ainda se mantém harmonioso nos seus aspectos espiritual, humano, cultural, social e económico – vestiu ontem as suas melhores galas para receber condignamente o seu novo Governador e comandante-chefe das Forças Armadas”.

Descrevia-se ainda, em jeito de perfil, que Nobre de Carvalho possuía “uma brilhante folha de serviços, tanto na metrópole como no Ultramar, não só no desempenho de altas funções de carácter militar como também em postos de grande responsabilidade na Administração Ultramarina”. Este tinha sido promovido ao posto de Brigadeiro a 15 de Dezembro de 1964, “depois de tirar o curso de altos comandos no Instituto de Altos Estudos Militares com a classificação de muito apto”.

Sessão no Leal Senado

Terminada a festa, foi a vez de Nobre de Carvalho se dirigir à população, realizando-se, no salão nobre do Leal Senado, a “cerimónia de entrega do Governo”. Mas nas ruas continuava a efusão: “Apesar da sua vastidão, o recinto parecia pequeno para conter a multidão das pessoas que ali afluíram para o acto. Como ao desembarque na ponte-cais, pode-se afirmar que ali estavam largamente representadas todas as forças vivas da província. No largo fronteira, incontável multidão contida à distância pela polícia. Um pouco mais ao fundo da Avenida Almeida Ribeiro, para os lados do Hotel Central, prestava a guarda de honra uma companhia da PSP, com bandeira nacional, guião da corporação e banda de música.”

O jovem arquitecto José Maneiras era, à época, vice-presidente do Leal Senado, tendo feito um discurso “na velha casa que tão de perto acompanhou a vida de Macau, nos seus altos ou difíceis momentos históricos”, considerando-a “legítima representante da população portuguesa e chinesa desta cidade”.

Para Maneiras, Macau, já com 400 anos de Administração portuguesa, constituía um testemunho do “glorioso passado histórico”, afirmando-se “como um exemplo vivo de paz e entendimento, de harmonia e respeito mútuo entre duas comunidades que se imanam num esforço comum de valorização, fomento da prosperidade e na promoção do bem-estar geral da população”.

“Esta herança de quatro séculos, vividos numa comunhão de ideais, numa coexistência pacífica (praticada muito antes de estar em voga tal designação) e no culto dos mais elevados valores morais e humanos de duas civilizações distintas, mas não antagónicas (…)”, acrescentou.

Governador “emocionado”

Na hora de falar, o governador Nobre de Carvalho destacou “a grandeza do momento que passa”, sentindo-se “verdadeiramente emocionado [ao evocar] as nobres tradições desta casa e as decisões aqui tomadas, durante séculos, na administração desta terra (…)”.

“Ao saudar a população de Macau, quero aproveitar referir-me especialmente à comunidade chinesa, pois de há muito que admiro o povo chinês, as suas finas sensibilidades, inteligência e qualidade de trabalho, qualidade que tão bem se enquadram com as do povo português e consagram a tradicional solidariedade luso-chinesa”, destacou o governante, que continuou os elogios à comunidade que, entretanto, protestava nas ruas e empenhava palavras de apoio a Mao.

“A comunidade chinesa constitui um dos pilares em que assenta a economia de Macau pelas actividades e a forma que as exerce. Ao longo da história a comunidade chinesa de Macau e as gentes portuguesas sempre viveram verdadeiramente irmanadas por um espírito de compreensão e respeito mútuo, o que evidencia bem as qualidades cívicas dos respectivos povos.”

Nobre de Carvalho destacou também alguns pontos sobre a economia do território. “Uma verdadeira solidez de ordem económica só se pode obter através da expansão do comércio e de certas indústrias básicas, isto, evidentemente, sem descurar o incremento do turismo nos moldes que se encontram já traçados e cujos resultados têm sido bem evidentes. Às importantes obras do Plano de Fomento, algumas já em curso, continuará a dar-se o necessário andamento.”

Obra feita

Nobre de Carvalho ficou para a história como um dos governadores que teve de enfrentar um dos períodos mais difíceis na história de Macau do século XX, em plena Revolução Cultural chinesa. Isto porque tomou a decisão de acatar todos os pedidos de Pequim. Desta forma, não só acalmou a tensão no relacionamento de Portugal com a China, como permitiu a manutenção da presença portuguesa em Macau.

O militar imprimiu o seu nome nalguns grandes projectos de infra-estruturas no território, nomeadamente a primeira travessia entre Macau e a Taipa, erguida há 50 anos, e a habitação social mais dirigida para a comunidade chinesa.

O tempo não perdoa e hoje o velho Edifício D. Julieta Nobre de Carvalho, situado no bairro do Iao Hon e com blocos de apartamentos, deverá ser alvo de requalificação, um projecto que gerou questões por parte do deputado Ngan Iek Hang. “Os blocos A, B e C do edifício D. Julieta Nobre de Carvalho, de habitação social, foram inaugurados entre os anos 60 e 70 do século passado, mas em 1995 o Governo fez alterações para os idosos lá residirem. O Governo mencionou em Abril que os blocos B e C estão em mau estado, estando a planear a sua reconstrução. Estamos em Novembro, mas não há novidades sobre a demolição destes blocos, sendo que o Governo não revelou como ia coordenar os terrenos ou planear as zonas próximas”, referiu.

Para o deputado, os moradores estão preocupados, pois receiam que “sem um planeamento a longo prazo, os terrenos estarão desocupados durante muito tempo, o que pode causar problemas de higiene e segurança”.

Com o 25 de Abril de 1974 e a queda do Estado Novo, Nobre de Carvalho fica com a imagem de governador do regime. Tudo fica resolvido numa questão de meses, sendo substituído pelo general Garcia Leandro logo no final de 1974. Mas a obra com a assinatura do último governador do Estado Novo em Macau ficou feita. (Com Nunu Wu)

27 Nov 2024

China-Portugal | Presidente da APN reúne com figuras do Estado português

Multilateralismo e cooperação económica foram alguns dos pontos discutidos na visita de Zhao Leji a Portugal. O presidente da Assembleia Popular Nacional reuniu com José Aguiar-Branco, Luís Montenegro, e Marcelo Rebelo de Sousa. A visita do político chinês à Europa é uma “operação de charme” e um passo para a “normalização de relações”, dizem analistas

 

Zhao Leji, que preside ao Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional (APN) da República Popular da China, visitou Portugal entre quinta-feira e sábado.

Trata-se de uma viagem realizada no âmbito de um périplo de nove dias pelo sul da Europa, com o político, oficialmente o número dois da hierarquia política chinesa, a deslocar-se também a Espanha e à Grécia.

O presidente da APN foi recebido, na sexta-feira, por José Aguiar-Branco. Os presidentes dos parlamentos de Portugal e China tiveram depois um encontro a sós, antes da reunião que juntou as delegações dos dois países. A visita de Zhao Leji ao parlamento português terminou com uma fotografia oficial tirada na Sala do Senado da Assembleia da República (AR). Durante a visita do “número dois” da hierarquia política chinesa, não houve declarações aos jornalistas.

Na quinta-feira, Zhao Leiji foi recebido em São Bento pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro. No final da visita, na rede social X (antigo Twitter), Luís Montenegro escreveu que “Portugal e a China possuem uma relação de amizade com raízes sólidas, que passam também por Macau”. “Abordei com o presidente do Comité Permanente da Assembleia Popular da República Popular da China, Zhao Leji, oportunidades para o reforço da nossa cooperação bilateral e multilateral em domínios de interesse comum”, adiantou o líder do Executivo português.

Na Xinhua descrevem-se mais detalhes sobre estes encontros. Ao reunir com Luís Montenegro, Zhao Leji “disse que a China sempre encarou e desenvolveu os laços com Portugal numa perspectiva estratégica e de longo prazo”, estando pronta “a trabalhar com Portugal para apoiar firmemente os interesses fundamentais e as principais preocupações de cada um, e para cimentar a confiança política mútua”.

A China espera assim, com Portugal, “uma cooperação mais estreita em domínios como a inteligência artificial, as energias limpas, a inovação tecnológica, a formação de pessoal e os intercâmbios culturais e interpessoais, encorajando as empresas dos dois países a expandir o investimento e a cooperação”.

O primeiro-ministro português terá observado, segundo a Xinhua, que “Portugal adere sempre ao princípio de uma só China”, tendo Montenegro “elogiado a prática de ‘Um País, Dois Sistemas’ na RAEM”.

“Sublinhando que a China é um parceiro económico importante para Portugal e que o seu país atribui importância à atracção de investimentos chineses, o primeiro-ministro português espera mais intercâmbios e cooperação com a China nos domínios da ciência e tecnologia, da economia marítima, da cultura e do desporto”, lê-se na Xinhua.

AR e APN mais juntas

A China tornou-se, na última década, o quarto maior investidor directo estrangeiro em Portugal. Empresas chinesas, estatais e privadas, detêm uma posição global avaliada em 11,2 mil milhões de euros na economia portuguesa, segundo o Banco de Portugal.

A Xinhua escreve ainda que, no encontro com o presidente da Assembleia da República portuguesa, Zhao Leji “afirmou que a APN está pronta a reforçar o intercâmbio de experiências em matéria de legislação e supervisão, a fim de fornecer garantias jurídicas para promover a cooperação bilateral em vários domínios e criar um ambiente empresarial justo, equitativo e não discriminatório”.

O presidente da APN “também expressou a esperança de que os legisladores portugueses no Parlamento Europeu continuem a apoiar a cooperação amigável entre a China e a UE”, sem esquecer “os progressos notáveis” relativamente a Macau nos últimos 25 anos com a prática de “Um País, Dois Sistemas”.

Zhao Leji indicou que Pequim “irá continuar a aplicar de forma plena, fiel e inabalável, o princípio de ‘Um País, Dois Sistemas’, segundo o qual o povo de Macau administra Macau com um elevado grau de autonomia”, apoiando “Macau na integração no desenvolvimento nacional”.

Aguiar-Branco terá afirmado que “os dois países respeitam-se mutuamente, aderindo à ideia de abertura e cooperação vantajosa para ambas as partes, tendo alcançado resultados positivos na cooperação em vários domínios”, referiu Aguiar-Branco.

Uma normalidade

Para a académica Cátia Miriam Costa, investigadora e professora auxiliar convidada do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, a visita de Zhao Leji a Portugal “constitui uma reafirmação de normalidade diplomática entre os dois países”.

“Apesar de ser uma visita de uma alta figura do Estado chinês, tratando-se do representante de um alto cargo chinês, presidência da Comissão Permanente da Assembleia Nacional Popular, é normal que passe despercebida aos meios de comunicação social que se focam em geral em visitas de representantes do poder executivo. Claro que esta visita representa uma oportunidade para reforçar laços, sobretudo, no que toca a aspectos da relação diplomática bilateral.”

Uma vez que a visita decorreu pouco tempo depois da vitória de Donald Trump, Cátia Miriam Costa defende que, neste período, “espera-se alguma mudança na política norte-americana”. Porém, “poderá incrementar o interesse desta visita, nomeadamente, através da tentativa de manutenção de alguns projectos de cooperação comuns ou de reciprocidade de procedimentos como acontece com a ausência de necessidade de vistos para curtas estadas de cidadãos portugueses em território chinês”.

Recorde-se que foi anunciado, na sexta-feira, por Pequim a extensão de 15 para 30 dias do período de estadia sem visto para cidadãos de países com isenção de visto em vigor, uma lista na qual Portugal foi integrado.

Uma “operação de charme”

Para Tiago André Lopes, professor de Relações Internacionais da Universidade Lusíada do Porto, a visita de Zhao Leji a Portugal, Espanha e Grécia “ocorre num tempo muito inteligente, do ponto de vista diplomático”. Trata-se de uma “clara operação de charme para acautelar os interesses económicos da China na Europa” após a vitória de Trump.

“Parece-me que a preocupação de Pequim é compreender as razões pelas quais a União Europeia decidiu assumir uma postura economicamente defensiva face à China, com a discussão política em sede de Comissão Europeia sobre política concreta para a desacoplagem económica da Europa face à China. Ao mesmo tempo, Zhao Leji trará a argumentação de Pequim sobre as vantagens económica de fortalecer os fluxos comerciais dos países do Sul da Europa, com a China”.

Tiago André Lopes destaca também algumas “preocupações” de Pequim no final deste ano, nomeadamente “a discussão, mais no Parlamento Europeu do que na Comissão, sobre a necessidade de ‘punir’ a China pela percepção de apoio, não apenas diplomático, à Rússia na incursão na Ucrânia”.

Neste ponto, o académico crê que Zhao Leji “irá, seguramente, tentar recolher informação sobre que tipo de punição referem os oficiais europeus e se os líderes portugueses, espanhóis e gregos estão dispostos a travar essas medidas, bloqueando-as no Conselho Europeu”.

“Não seria a primeira vez que Lisboa, ou Atenas, usariam o seu poder de veto para trancar decisões europeias avessas aos interesses de Pequim”, acrescentou.

O regresso de Donal Trump à Casa Branca estará também na agenda do presidente da APN. “A equipa de Donald Trump tem vários ‘Falcões Orientais’ que parecem desejar uma confrontação, pelo menos diplomática, com a China. Ora, nesse sentido, é importante aferir se Lisboa, Madrid e Atenas irão seguir e dar respaldo a essa estratégia, ou se o ‘afastamento cauteloso’ com relação à Administração Trump permite uma aproximação a Pequim.”

Destaque ainda para o posicionamento da iniciativa “Faixa e Rota” e os esforços da China de uma “maior inclusão do Sul da Europa”, tema que também estará na agenda de Zhao Leji.

Chá com Marcelo

Além dos encontros com Aguiar-Branco e Montenegro, a passagem de Zhao Leji por Lisboa incluiu uma reunião na quinta-feira com Marcelo Rebelo de Sousa. Na nota oficial deixada no portal da Presidência da República portuguesa, nada é adiantado sobre o conteúdo discutido, mas segundo a agência estatal chinesa Xinhua, Zhao Leji terá dito ao presidente português “que nos últimos anos, sob orientação dos dois chefes de Estado, a parceria estratégica abrangente China-Portugal tem vindo a aprofundar-se e a progredir solidamente, registando progressos constantes na cooperação ‘Uma Faixa, Uma Rota’, bem como ricos intercâmbios culturais e interpessoais.”

No encontro de quinta-feira foi referido que a China “aprecia a longa adesão de Portugal ao princípio de “uma só China” e está disposta a dialogar com Portugal com base no respeito mútuo e na igualdade, reforçando os seus laços como bons amigos que se respeitam e confiam um no outro, parceiros fiáveis para o desenvolvimento comum e companheiros próximos na aprendizagem mútua entre civilizações”.

Zhao Leji terá ainda indicado a Marcelo Rebelo de Sousa esperar que Portugal “continue a desempenhar um papel activo na União Europeia (UE) e a injectar mais energia positiva no desenvolvimento das relações China-UE”.

A agência oficial chinesa refere que Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que “Portugal e a China são bons amigos, com compreensão e afecto mútuos”, e que este ano “se assinala o 45.º aniversário do estabelecimento das relações diplomáticas entre os dois países e o 25.º aniversário do regresso de Macau à pátria chinesa”. Marcelo disse estar disposto “a reforçar os intercâmbios de alto nível com a China, aprofundar as trocas amistosas e fortalecer a cooperação em domínios como o comércio, as novas energias, a economia marítima e a economia digital”.

“Portugal adere firmemente ao multilateralismo, salvaguarda o papel da Organização das Nações Unidas (ONU) e a autoridade do direito internacional. É muito importante que a Europa e a China reforcem o diálogo, e Portugal está disposto a desempenhar um papel activo nesse sentido”, afirmou o presidente português.

25 Nov 2024

António Branco, investigador da área da inteligência artificial: “Macau pode liderar”

Docente da Universidade de Lisboa, e cientista da área da inteligência artificial e processamento de linguagem natural, António Branco está em Macau para o 9º Encontro de Pontos de Rede de Ensino de Português como Língua Estrangeira na Ásia. O académico considera que Macau pode liderar no desenvolvimento de ferramentas de inteligência artificial

 

Quais os riscos e oportunidades do uso da Inteligência Artificial (IA) generativa no ensino de línguas?

É sobejamente conhecido que as novas tecnologias trazem benefícios que anteriores tecnologias não conseguiam assegurar, mas sabe-se também que a introdução de novas tecnologias tem o potencial de aprofundar a desigualdade entre os seus utilizadores se tal efeito não for mitigado com contramedidas. A tecnologia da IA, e em concreto na sua aplicação ao ensino da língua, não é excepção. Tem o potencial de fazer avançar mais rápida e eficazmente a aprendizagem da língua, mas estudos recentes vêm mostrar que pode também levar os alunos a uma desvantagem, que é o facto de não conseguirem ultrapassar essas suas desvantagens se não existir a devida mediação pedagógica na exploração destas tecnologias.

Desta forma, que medidas devem as escolas adoptar para melhor se adaptarem a este salto evolutivo?

Guardadas as devidas distâncias, ainda assim pode ajudar a analogia com o que aconteceu há cerca de duas décadas atrás, com o advento das novas tecnologias digitais e da internet. Nessa altura, e desde então, uma medida das mais importantes tem sido dar formação aos professores para que melhor possam tirar partido da tecnologia. Com o recente advento da IA, um novo impulso de formação dos professores é imperativo.

Além do trabalho como investigador, é também director-geral da PORTULAN CLARIN. De que se trata concretamente?

É uma Infraestrutura de Investigação para a Ciência e Tecnologia da Linguagem e pertence ao Roteiro Nacional de Infraestruturas de Investigação de Relevância Estratégica, sendo o nó nacional [em Portugal] da infra-estrutura internacional CLARIN ERIC. A sua missão é apoiar investigadores e inovadores, mas também professores e estudantes da língua cujas actividades dependem de resultados da Ciência e Tecnologia da Linguagem através da distribuição de recursos científicos, do fornecimento de apoio tecnológico, da prestação de consultoria e da disseminação científica. Os serviços de processamento da língua, por exemplo o conjugador ou os analisadores sintáticos, são disponibilizados gratuitamente e podem ser facilmente experimentados online na bancada da infraestrutura. Assim, fazem parte do portfólio de novos instrumentos de apoio ao ensino e aprendizagem da língua.

Está em Macau para participar num colóquio focado no ensino de português como língua estrangeira. Poderia o território tornar-se numa zona experimental para o desenvolvimento deste tipo de plataformas digitais?
Macau beneficia do efeito combinado da sua herança histórica que lhe confere a vantagem de ser um território que promove o multilinguismo, bem como da sua integração na área da Grande Baía, que o coloca no epicentro da inovação tecnológica. Mais do que uma zona experimental, Macau poderá liderar o desenvolvimento e a exploração da nova tecnologia de IA, e em muito particular a sua aplicação à tecnologia e processamento da linguagem natural.

Acredita que livros e manuais escolares como hoje os conhecemos poderão desaparecer e dar lugar a e-books e conteúdos feitos por IA? Ou haverá espaço para complementaridade?

O passado recente, de exposição a novas tecnologias disruptivas, ensina-nos que devemos ser prudentes a vaticinar a extinção de anteriores formas e práticas sociais e culturais. Por exemplo, o livro em papel foi declarado em extinção acelerada, mas afinal continua connosco com grande vitalidade, em complementaridade com outros tipos de suporte e canais de disseminação. Estou inclinado a pensar que o mesmo se vá passar relativamente aos benefícios da aplicação da IA no ensino. Acima de tudo, o que precisamos urgentemente neste momento é de desenvolver novas formas de mediação pedagógica que ajudem os alunos a tirar o melhor partido possível deste benefício. A IA, por si própria, tal como um navegador da web, não é uma ferramenta pedagógica, também em si mesmo uma chatbot não é um instrumento pedagógico, mas nas mãos e com a orientação dos professores pode certamente transformar-se num dos mais importantes meios de aprendizagem da língua.

Há possibilidade de uma maior conexão dos modelos “Albertina” e “Gervásio” de linguagem IA generativa, sistema por si coordenado em Portugal, com as instituições de Macau e o seu sistema de ensino?

A possibilidade de os modelos de linguagem de IA generativa desenvolvidos pelo nosso grupo de investigação, o “Albertina” e o “Gervásio”, poderem reflectir a realidade linguística e cultural de Macau encontra-se a ser trabalhada. Com o apoio de instituições de Macau, assim como do IILP – Instituto Internacional da Língua Portuguesa, há um corpus de texto de Macau que está a ser recolhido. Esse é um primeiro passo para se poder afinar os modelos. Muito gostaria que este encontro desta semana em Macau sobre o ensino da língua portuguesa na Ásia, possibilitasse encontrar mais parceiros para passos seguintes.

Os modelos “Albertina” e “Gervásio”

Se falarmos do desenvolvimento da IA em Portugal, o nome de António Branco surge nas últimas tendências e projectos. No caso da IA generativa, o cientista é coordenador dos modelos “Albertina” e “Gervásio” que integram o ecossistema dos grandes modelos de linguagem IA generativa. No caso dos modelos “Albertina”, que são codificadores de linguagem, foi acrescentado o modelo “Albertina 1.5B”; enquanto que aos modelos “Gervásio”, descodificadores de linguagem, foi acrescentado o modelo 7B.

Segundo o website da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, António Branco considera que este ecossistema de modelos de linguagem IA generativa “é crucial para a tecnologia da língua portuguesa e esta expansão representa um passo da maior importância na preparação da língua portuguesa para a era da IA”. O cientista acrescentou ainda que “estas classes de modelos estão na base de toda a gama de aplicações de IA generativa, incluindo as mais mediáticas, como os chatbots ou os tradutores automáticos, e sendo maiores, estes novos modelos têm melhor desempenho”.

Ainda segundo o mesmo portal, este ecossistema “é líder mundial em termos de grandes modelos de linguagem desenvolvidos especificamente para a língua portuguesa que são totalmente abertos e documentados”, sendo que o primeiro modelo Albertina foi disponibilizado em Maio do ano passado. Este foi “um marco histórico na preparação tecnológica da língua portuguesa para a era digital, ao ser o primeiro grande modelo de linguagem aberto desenvolvido especificamente para o português, para ambas as variantes”.

António Branco irá falar hoje, a partir das 10h, de todo este universo na sessão inaugural do 9º Encontro, promovido pelo Instituto Português do Oriente (IPOR), e que decorre até amanhã no Auditório Dr. Stanley Ho do Consulado-geral de Portugal em Macau e Hong Kong. O investigador irá partilhar o auditório com João Laurentino Neves, ex-director do IPOR e actual director-executivo do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, que irá discorrer sobre “Tecnologias da língua e língua de tecnologias – O IILP na era dos conteúdos e dos dados”.

22 Nov 2024

Edifício Grande Prémio | TUI afasta indemnização a arquitecto

O arquitecto Mário Duque, autor dos projectos do edifício do Grande Prémio e parque de estacionamento do Novo Terminal Marítimo no Porto Exterior não vai receber indemnização do Governo por violação de direitos de autor.

Segundo um acórdão do Tribunal de Última Instância (TUI), foi considerado que, terminadas as obras, em 1993, e transmitidos os direitos patrimoniais à RAEM, o autor “mantém-se apenas titular do direito pessoal que se manifesta no assegurar a integridade da obra e o direito a ser identificado como autor”. Além disso, “não se verificando nenhum dano, apresenta-se totalmente inviável o pagamento a seu favor de qualquer indemnização”.

O arquitecto decidiu avançar para tribunal por considerar estar em causa uma violação de direitos de autor por, sem a sua autorização, o Governo e o seu representante terem “executado seis réplicas do edifício do Grande Prémio de Macau para actividades promocionais externas”, além de ter sido publicado no website oficial “um acervo de fotografias do edifício sem mencionar o nome do autor”.

O arquitecto exigiu, junto do Tribunal Administrativo (TA), uma indemnização de 102.994,40 patacas e outra de 3.840.103,50 patacas, incluindo uma indemnização por danos morais, e que os réus condenados pagassem as custas e encargos processuais. O autor, ao perder a acção no TA, foi apresentando sucessivos recursos das decisões.

21 Nov 2024

Ensino | Estudo sugere exemplo de Singapura às autoridades de Macau

Um estudo indica que Macau deve apostar na digitalização e fomento da criatividade para melhorar os resultados dos alunos do ensino não superior, tendo por base os dados do PISA 2022. O académico responsável pelo estudo sugere às autoridades da RAEM que aprendam com alguns aspectos do sistema de ensino de Singapura

 

Os estudantes de Macau costumam apresentar excelentes resultados na área da matemática no PISA – Programme for International Student Assessment, que analisa o desempenho dos alunos de vários países consoante os padrões estabelecidos pela OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico. Porém, um estudo do académico Wanying Zhong, do Lyceum of the Philippines University-Batangas, intitulado “Brief Description of the Performance of Tertiary Macau in the PISA 2022 Assessment”, estabelece uma comparação com os resultados dos estudantes de Singapura e conclui que Macau pode e deve aprender com o sistema da Cidade-Estado.

O estudo, publicado no Journal of Education and Educational Research em Setembro, afirma que “Macau pode beneficiar de adaptações a nível pedagógico e de um foco na resolução criativa de problemas verificadas em Singapura e outras nações europeias, melhorando os resultados educativos”.

Para o académico, Macau depara-se, à semelhança de outros países” e territórios, com “obstáculos para colmatar as disparidades e adaptar-se à necessidade mundial de mais mentes inovadoras e adaptáveis”.

O autor entende que deve ser feito um “investimento estratégico” nas áreas da ciência, tecnologia, engenharias e matemática”, a fim de “assegurar a optimização do equipamento nos laboratórios e uma integração de ferramentas científicas e tecnológicas actualizadas no ensino prático”. Sugere-se também a actualização anual dos conteúdos curriculares “para que haja um desenvolvimento contínuo” destas áreas de ensino.

Em termos gerais, as recomendações incidem sobre “o reforço da educação” nas áreas das ciências, tecnologia, engenharias e matemática”, bem como “a melhoria do desenvolvimento profissional dos professores, da equidade educativa e a integração da tecnologia e da formação contínua”.

Apesar das sugestões, o estudo reconhece que as autoridades de Macau têm feito diversos investimentos nos últimos anos. “O currículo educativo de Macau incentiva a integração efectiva de recursos e ferramentas digitais em todas as disciplinas para melhorar as experiências de aprendizagem interactiva dos alunos. No decurso da reforma curricular, o Governo da RAEM começou a tentar integrar as tecnologias da informação noutras disciplinas, como a utilização de material didáctico multimédia ou de vídeo para apresentar várias informações e dados na sala de aula de disciplinas como as ciências geográficas e matemática”.

Maior conexão

A integração tecnológica deve incluir outro tipo de ferramentas para “aumentar a participação dos alunos e promover activamente a aprendizagem experimental”, é indicado no estudo.

Sugere-se também a conexão com entidades exteriores à escola, tendo em conta a ideia de que “as políticas e práticas educativas podem ser continuamente monitorizadas e melhoradas através de avaliações sistemáticas regulares e do incentivo à inovação educativa”.

Assim, “o apoio a projectos-piloto” ou parcerias com empresas de tecnologia irão “ajudar a explorar novos métodos de ensino e ferramentas de aprendizagem que promovam a inovação e o progresso globais do sistema educativo”.

O estudo académico indica também que os resultados do PISA 2022 obtidos por Macau “sugerem uma maior adaptabilidade, abrangência e inovação no que respeita à concepção do currículo e ao quadro educativo geral”. Impõem-se também “maiores exigências aos professores, preparando o terreno para que estes participem em futuras práticas de ensino com o objetivo de obter os mesmos resultados”.

“Um melhor sistema educativo em Macau seria uma forma de reforçar o desempenho académico, assegurando que os estudantes tenham uma boa preparação para serem bem-sucedidos num ambiente que se tornou muito mais desafiante e com inter-relações”, pode ler-se.

Os números do sucesso

Os resultados do PISA 2022 demonstraram que “o desempenho de Macau é superior à média da OCDE em matemática e ciências, mas há ainda margem para melhorias no domínio da leitura”. Macau atingiu, em matemática 552 pontos, um aumento médio de 15,7 pontos numa década, face ao PISA de 2012, é destacado na investigação.

O estudo conclui que “a notável tendência de expansão indica um investimento sustentado e os resultados alcançados pelo sistema educativo de Macau no ensino da matemática”. Porém, há sinais de alerta. “É crucial reconhecer um pequeno decréscimo no último semestre em relação a 2018 (-5,7 pontos), possivelmente indicando o surgimento de novos desafios ou alterações nas políticas ultimamente.”

O sistema de ensino local é descrito no estudo como “robusto e eficaz”, performance conseguida através do estatuto que Macau atingiu a nível internacional.

Porém, na leitura, os resultados não são tão animadores, com Macau a alcançar, no PISA de 2022, “510 pontos na avaliação de competências de leitura”, performance que ainda assim representa uma subida de 4,4 pontos em dez anos. É certo que houve um avanço, mas entre 2018 e 2022 “registou-se uma descida de 14,7 pontos nas classificações de leitura, o que evidencia a luta de Macau para ajustar as abordagens educativas em resposta à evolução do panorama de aprendizagem e das exigências”.

Assim, “o sistema educativo de Macau tem de aprender com a experiência bem-sucedida dos países e regiões que apresentam um excelente desempenho na avaliação do PISA e formular estratégias eficazes de melhoria dos seus problemas”, a fim de “melhorar continuamente a qualidade da educação e atingir o objectivo da equidade educativa e desenvolvimento integral dos estudantes”.

Uma reforma precoce

Ao analisar os dados apresentados pelos alunos de Singapura no PISA 2022, Wanying Zhong explicita que ambas as regiões “destacam-se no domínio da matemática, sendo que Singapura está frequentemente fora do alcance dos rankings mundiais de matemática”.

Porém, o autor destaca o investimento precoce na área das tecnologias e sistemas digitais. “Desde o começo, Singapura tem estado profundamente empenhada na educação das ciências, engenharias, tecnologia e matemática, centrando-se na promoção da inovação e explorações científicas. O seu ambiente cultural nestes domínios é notoriamente mais sólido do que o de Macau, o que pode contribuir para a disparidade” entre os territórios.

Destaca-se que Singapura cedo implementou reformas curriculares, “alcançando resultados notáveis”, com “um forte empenho na resolução de problemas e aplicação de conhecimentos, o que demonstra bem a robustez das suas estruturas educativas”.

O estudo conclui que “o sucesso de Macau depende sobretudo das suas escolas”, pois “a elevada classificação de Singapura em relação a Macau deve-se aos seus métodos de ensino inovadores e à utilização activa da tecnologia na educação, que constituem uma parte essencial dos seus objectivos educativos”.

21 Nov 2024

EPM | “Os Lusíadas” declamados por António Fonseca este sábado

Decorre este sábado, no auditório da Escola Portuguesa de Macau, o espectáculo “Os Lusíadas como nunca os ouviu”, com o actor António Fonseca, que em formato conferência irá falar com o público sobre a obra mais importante do poeta Luís de Camões. Destaque ainda para o arranque de uma conferência sobre língua portuguesa promovida pelo IPOR

 

O auditório da Escola Portuguesa de Macau (EPM) acolhe este sábado o espectáculo, em formato conferência, “Os Lusíadas como nunca os ouviu”, com a participação do actor António Fonseca, que conseguiu a proeza de decorar o livro de Luís de Camões e levá-lo ao palco.

O evento, integrado numa conferência de dois dias sobre língua portuguesa, decorre às 16h este sábado, servindo para o actor fazer uma “introdução leve e divertida à obra e suas circunstâncias”.

“Os Lusíadas como nunca os ouviu” é o nome de um espectáculo que já passou por diversos palcos. Sobre a obra poética que lhe dá vida, o próprio António Fonseca reconheceu que “mais de 50 por cento da população portuguesa tem um historial parecido com o que tinha quando, em 2008, decidi atirar-me à epopeia de Camões: uma obra semi-odiada, quando fui aluno do ensino secundário; apreciada, sem ser conhecida quando cresci; enfim, uma referência histórica perdida no baú de tantas referências históricas e informações da memória, que nunca nos damos ao trabalho de refrescar”.

Assim, em 2008 o actor começou o imenso trabalho de decorar “Os Lusíadas”, por considerar que “uma das razões de ser, entre outras, de um actor é exactamente refrescar o que, fazendo parte do nosso património colectivo, por quaisquer razões, murchou”.

Português a rodos

Esta sexta-feira, terá início a conferência mundial onde se integra este espectáculo. O 9.º Encontro de Pontos de Rede de Ensino de PLE da Ásia (EPR2024), começa às 9h no Auditório Dr. Stanley Ho do Consulado Geral de Portugal em Macau e Hong Kong e tem como tema “Os avanços tecnológicos no ensino-aprendizagem de PLE: estratégias, desafios e perspectivas pedagógicas”.

Destaque para a presença do docente António Branco, investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e Director Geral da PORTULAN CLARIN que abrirá a sessão plenária.

Associa-se igualmente ao Encontro de 2024 o IILP – Instituto Internacional da Língua Portuguesa, com o apoio institucional da organização e a presença do seu Director Executivo, Dr. João Neves, que proferirá uma comunicação na mesma sessão. Haverá um total de 12 sessões com académicos de várias partes do mundo.

Iniciada em 2015, esta conferência propõe-se, “numa perspectiva essencialmente oficinal, partir de experiências concretas nos diferentes contextos presentes para a reflexão sobre abordagens ao ensino da língua e da cultura, favorecendo a partilha de materiais e o desenvolvimento de projetos conjuntos entre participantes”, descreve-se em comunicado.

20 Nov 2024

CE | Balanço com elogios a operadoras e assumpção de cansaço

Ho Iat Seng admitiu estar cansado e que é mesmo altura de outra pessoa com mais energia assumir o cargo que agora ocupa, o de Chefe do Executivo. Na conferência de imprensa de balanço do seu mandato, agradeceu às concessionárias por cumprirem os novos contratos, falou de um orçamento “conservador” para 2025 e assumiu que dorme mal desde a pandemia

 

Foi a conferência do adeus e quase em tom confessional. Ho Iat Seng, Chefe do Executivo, fez o balanço dos cinco anos nas várias áreas, elogiou as operadoras de jogo e assumiu que a saúde o afastou de uma nova candidatura ao cargo.

“Agradeço a vossa compreensão sobre o meu estado de saúde e o facto de não terem ido atrás de mim com perguntas”, declarou aos jornalistas. “A realidade é que estava muito cansado, exausto, sabia que tinha problemas de saúde”, disse Ho Iat Seng, defendendo que Macau precisa de um governante com mais energia.

O ainda líder de Macau agradeceu às seis concessionárias de jogo “porque cumpriram o que foi estabelecido nos contratos”. “Convidaram artistas de alta qualidade e apoiaram o papel de Macau como cidade de espectáculos. No dia 28 de Dezembro será inaugurado um novo espaço para espectáculos ao ar livre com capacidade para mais de 50 mil pessoas”, anunciou.

“Na altura da pandemia as concessionárias sofreram vários prejuízos, mas colaboraram com o Governo para aumentar os elementos não jogo e conseguiram obter receitas de diversas fontes, com concertos”, exemplificou.

O governante lembrou ainda que “o jogo está a restringir o desenvolvimento de outros sectores económicos e isso, a longo prazo, não é saudável para Macau”, referindo as mudanças ocorridas no sector VIP e do turismo.

“A envergadura de turistas vai mudar, com menos excursões e mais turistas individuais e jovens. Dados do ano passado dizem-nos que os turistas que vêm jogar do interior da China representam 60 por cento, sendo que 40 por cento são estrangeiros. Isso é um desenvolvimento saudável”, declarou.

Sobre o jogo VIP, “havia irregularidades e deu-se uma regulamentação, o que levou a essa mudança” em termos de perfil de jogadores. “A pessoa joga um pouco e dá para alcançar os números previstos. No início não havia um acordo, mas agora apoiam [as medidas de reformulação do sector].”

Orçamento “conservador”

Questionado sobre o Orçamento para o próximo ano, Ho Iat Seng defini-o como “mais conservador”. “Em média, até Outubro, obtivemos 19 mil milhões de patacas em receitas brutas. Para o próximo ano não se acrescenta muito a nível orçamental, apenas seis por cento, pelo que podem ser cumpridas as previsões [de receitas do jogo] de 240 mil milhões de patacas. É um orçamento mais conservador”, disse.

Sobre o facto de não estarem previstos, para já, aumentos de salários na Função Pública, Ho Iat Seng disse que o Orçamento para 2025 apresentado agora foi apenas um “trabalho preparatório”. “No próximo mandato serão feitas as Linhas de Acção Governativa e se haverá ou não um aumento [de salários] não consigo responder. No meu mandato houve uma subida salarial, mas como vai ser feito depois não consigo dizer”, esclareceu.

Quanto aos cheques, também dependem do próximo Governo. “Recuperamos a economia e o Produto Interno Bruto, e se o novo Governo decidir alterar ou ajustar o valor de dez mil patacas, pode fazê-lo.”

O medo come a alma

Ho Iat Seng foi parco em palavras a comentar as políticas seguidas pelo próximo Executivo liderado por Sam Hou Fai, mas garantiu ter deixado trabalho feito na gestão da pandemia, construção de habitação e infra-estruturas. Uma coisa é certa: sentiu medo com as constantes mexidas na Reserva Financeira.

“Tive medo porque usei muito dinheiro para combater a pandemia, que surgiu apenas dias depois de começar a exercer funções. Ninguém me ensinou como a poderíamos combater. Conseguimos todos juntos recuperar o PIB e vencer esta batalha. Primeiro achámos que acabaria no primeiro ano, depois no segundo, mas a pandemia só acabou no quarto ano do meu mandato. Mesmo com quatro anos de défice fizemos alguns investimentos. A nossa Reserva é hoje superior à das regiões vizinhas, não temos dívidas internas e externas e temos 617 mil milhões de reserva básica e 230 mil milhões de reserva cambial. Sem uma população elevada, são números bastante satisfatórios”, frisou.

Ainda sobre a pandemia, houve tempo para outro desabafo. “Nestes anos dormimos muito pouco, tal como todos os secretários. Conseguimos ter apenas entre três a quatro horas de descanso durante a noite e mesmo agora continuamos a dormir pouco. Eu e o secretário Raimundo do Rosário não conseguimos ter ainda uma boa qualidade de sono porque estamos sempre preocupados com o trabalho. [O facto de não me recandidatar] não tem a ver com o ciclo económico nem com outras questões”, frisou.

Sem mais cartões

Ho Iat Seng admitiu que as pequenas e médias empresas (PME) enfrentam o problema da falta de negócios, mas que além dos apoios já existentes o Governo não pode fazer muito mais. “Em três anos de pandemia cada um de nós recebeu 32 mil patacas de subsídios, incluindo o cartão de consumo. As pessoas não podiam sair de Macau, usaram o cartão e apoiou-se as PME. Mas com a reabertura de fronteiras será que faz sentido o Governo continuar com a mesma política do cartão de consumo? Mesmo com os apoios que damos as PME têm de ter negócios. Macau está muito dependente do consumo de turistas e sem outras medidas de consumo interno será difícil a sobrevivência das PME”, frisou.

Habitação em resolução

Ho Iat Seng diz que os problemas da habitação em Macau estão já parcialmente resolvidos. “Antes havia muitas pessoas à espera por uma casa, mas agora já não. As plantas e os mapas de futuras habitações estão disponíveis, o novo Governo é que tem de decidir se continua a construir mais. Nos dez anos em que estive na AL sempre houve críticas à habitação, mas agora perguntam é se uma pessoa pode ter um T2. Uma pessoa pode estar num T1 e duas num T2, tem a ver com uma distribuição justa. Quanto à compra de fracções de habitação económica, pedimos apenas o montante que cubra os custos mais básicos de construção.”

20 Nov 2024

Balanço governativo | Ho Iat Seng fala em “cinco anos extraordinários”

Ho Iat Seng foi ontem à Assembleia Legislativa apresentar o balanço da acção governativa deste ano, a cerca de um mês terminar o mandato enquanto Chefe do Executivo. A segurança nacional foi um dos pontos fortes destes “cinco anos extraordinários”, conforme destacou. Quanto à pandemia, o governante afirmou que Macau saiu “sem especiais sobressaltos”

 

Prestes a passar o testemunho a Sam Hou Fai, o Chefe do Executivo ainda em funções foi ontem à Assembleia Legislativa (AL) apresentar o balanço dos trabalhos do Governo durante este ano, mas não esqueceu os “últimos cinco anos extraordinários” enquanto liderou politicamente a RAEM. Para Ho Iat Seng, que foi empresário e deputado, foi “uma grande honra desempenhar o tão nobre cargo de 5º Chefe do Executivo”, tendo destacado os três anos de pandemia que pautaram o seu Governo.

Neste período, deu-se “o impacto mais acentuado desde o retorno de Macau à pátria”, mas Ho Iat Seng destacou uma vez mais a colaboração entre sociedade, Governo e demais entidades, que levaram à “superação dos desafios mais severos trazidos pela pandemia e pela conjuntura externa”. Os esforços conjuntos permitiram a Macau sair “sem especiais sobressaltos dessas árduas dificuldades”.

De resto, no discurso de ontem, a segurança do Estado foi o ponto inaugural do seu discurso. O governante máximo da RAEM destacou que “devido à extrema complexidade da conjuntura da segurança nacional, o V Governo da RAEM assumiu uma maior responsabilidade no estabelecimento efectivo de uma linha de defesa da segurança do Estado” alinhada com Pequim. Houve, assim, “o aperfeiçoamento ordenado do regime jurídico relativo à defesa da segurança do Estado”, com a promoção da “produção legislativa complementar”.

O Chefe do Executivo referiu ainda que “o aperfeiçoamento do regime jurídico do antiterrorismo está basicamente concluído”, e destacou o novo estatuto dos funcionários públicos nos cargos de direcção e chefia, que garante que estes têm de ser patriotas, pois, caso contrário, correm o risco de despedimento.

Estas mudanças “foram elaboradas no sentido de aperfeiçoar os referidos regimes à lei dos juramentos por ocasião do acto de posse, em vigor, e assegurar que os respectivos trabalhadores defendam a Lei Básica da RAEM e sejam fiéis à RAEM”.

Ho Iat Seng salientou também, em matéria de segurança interna do território, que o estudo sobre a sexta fase do sistema de videovigilância “Olhos no Céu” já teve início, sem esquecer as questões da cibersegurança. “Persistindo-se no senso baseado em pressupostos de situações desfavoráveis, foi reforçada a adopção de medidas de prevenção e controlo, a emissão de alertas e a implementação de medidas dispositivas.” Assim, declarou “já foram cumpridos os trabalhos de contra-intervenção e de contra-infiltração”, bem como “reprimidos diversos riscos cibernéticos”.

Tudo está bem

De resto, o balanço de Ho Iat Seng em matéria de emprego, fomento ao consumo em zonas com menos turismo ou apoios sociais foi positivo, tendo apresentado alguns números aos deputados.

Além de destacar o prolongamento do prazo de retorno dos empréstimos para pequenas e médias empresas (PME) para dez anos, o governante recordou a iniciativa “Grande prémio para o consumo na Zona Norte durante os fins-de-semana”, que teve um “resultado frutífero”. Em 20 semanas, a iniciativa contou com a participação de 1.255 estabelecimentos comerciais que disponibilizaram descontos no valor superior a 29,75 milhões de patacas, “tendo-se atingido um total de 150 milhões de patacas em consumo nas lojas da Zona Norte”.

Ho Iat Seng sublinhou também a importância das sessões de emparelhamento de emprego para residentes que a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) tem organizado com frequência desde que a pandemia terminou. “A promoção contínua da ligação entre empresas e candidatos a emprego permitiu o sucesso de integração laboral de 11.054 pessoas até à segunda quinzena do mês de Setembro, um aumento de 4,5 por cento em comparação com 10.581 pessoas no período homólogo em 2023”, referiu.

Ho Iat Seng lembrou ainda que foi alterada a lei do salário mínimo, com vista a aumentar o montante, além de que “foi mantida a proporção dos trabalhadores locais nos quadros de gestão de médio e alto nível” das operadoras de jogo, “num nível superior a 85 por cento”.

Zona que cresce

Na sessão de ontem, Ho Iat Seng destacou a subida “estável” da maioria dos indicadores económicos da Zona de Cooperação Aprofundada em Hengqin nos primeiros três trimestres deste ano: um Produto Interno Bruto (PIB) de 37,349 mil milhões de renminbis, “um aumento homólogo de 7,1 por cento”, e com o valor acrescentado das indústrias de 817 milhões de renminbis. Já as vendas de retalho e bens de consumo “ascendeu a 2,972 mil milhões de renminbis, registando um aumento de 18,8 por cento face ao mesmo período do ano passado”. “É de notar que a taxa de crescimento dos indicadores supramencionados é superior à média nacional, da província de Guangdong e da cidade de Zhuhai”, frisou Ho Iat Seng.

Orçamento 2025 | Ho Iat Seng destaca “consenso” com Sam Hou Fai

Na apresentação geral aos deputados do Orçamento para o próximo ano, Ho Iat Seng declarou “o consenso” obtido relativamente ao Orçamento para o próximo ano, tendo sido considerado que “não obstante competir ao próximo Governo a elaboração do Relatório das Linhas de Acção Governativa para o Ano Financeiro de 2025, caberia ao actual Governo elaborar o programa orçamental para o próximo ano financeiro”.

De resto, o actual Chefe do Executivo lembrou a continuação dos apoios sociais com o orçamento do próximo ano, como a manutenção “das tarifas de autocarro para idosos, estudantes e população”, os subsídios às contas da água e luz, o Programa de Comparticipação nos Cuidados de Saúde e a manutenção dos montantes pagos nos cheques pecuniários distribuídos à população.

Relativamente à injecção de fundos nas contas individuais de previdência aos residentes de Macau, que foi suspensa durante a pandemia, o governante destacou que “haverá a injecção de um incentivo básico único de 10.000 patacas na conta individual de cada residente que satisfaz, pela primeira vez, os requisitos legais”, além de se manter a injecção de 7.000 patacas em cada conta.

Ho Iat Seng apontou também os diversos benefícios fiscais para trabalhadores e na área do imobiliário, nomeadamente a devolução de 60 por cento do imposto profissional relativo a 2023, que irá até às 14.000 patacas, ou ainda a diminuição de 30 por cento desse mesmo imposto.

Além disso, a taxa de contribuição predial urbana dos prédios arrendados terá uma redução de 8 por cento, bem como “a isenção de imposto sobre rendimentos obtidos nos Países de Língua Portuguesa”. Ho Iat Seng lembrou que todas as isenções e reduções de taxas acarretam um montante de 4.833 mil milhões de patacas.

20 Nov 2024

G20 | Xi quer reforçar laços com Brasil e poder para o Sul Global

Termina hoje no Brasil mais uma cimeira do G20 que junta as 20 maiores economias do mundo. O presidente chinês, Xi Jinping, afirmou querer melhorar “ainda mais” as relações com o Brasil, apostar no desenvolvimento das nações do chamado Sul Global, defendendo a reforma do FMI

 

O presidente chinês, Xi Jinping, afirmou ontem que quer “melhorar ainda mais” as relações entre a China e o Brasil, onde chegou no domingo para uma visita de Estado e para a cimeira do G20. Xi planeia abordar com o homólogo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, formas de “melhorar ainda mais as relações entre a China e o Brasil, para promover complementaridades entre as estratégias de desenvolvimento dos dois países e questões internacionais e regionais de interesse comum”, informou a agência noticiosa oficial chinesa Xinhua.

“A visita vai reforçar ainda mais a confiança mútua estratégica entre os dois países e aprofundar os intercâmbios e a cooperação em vários domínios”, disse Xi, citado pela agência.

A China é o maior parceiro comercial do Brasil, absorvendo 30 por cento do total das exportações brasileiras. Semicondutores, telemóveis e medicamentos são os principais produtos chineses exportados para o país sul-americano.

Desde que regressou ao poder em 2023, Lula da Silva tem-se empenhado num delicado acto de equilíbrio, procurando aprofundar os laços com a China ao mesmo tempo que melhora as relações com os Estados Unidos.

Uma das questões da relação bilateral entre a China e o Brasil prende-se com o facto de o país sul-americano não ter aderido à iniciativa chinesa Faixa e Rota. Uma visita do vice-presidente brasileiro Geraldo Alckmin a Pequim, no início deste ano, abordou a possível adesão pelo Brasil ao projecto internacional de infraestruturas lançado por Pequim.

Num artigo de opinião publicado na Folha de São Paulo, Xi Jinping destaca a importância de participar na cimeira do G20, além dos encontros com Lula. “Outro motivo da minha visita ao Brasil é a participação na cimeira do G20, uma importante plataforma de cooperação económica internacional. O Presidente Lula colocou a luta contra a fome e a pobreza no topo da agenda da cimeira e propôs a criação de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. A China elogia vivamente e apoiará activamente esta iniciativa.”

Para Xi Jinping, “a construção de um mundo justo exige que o G20 honre os princípios do respeito mútuo, da cooperação em pé de igualdade e do benefício mútuo, e apoie os países do Sul Global na obtenção de um maior desenvolvimento”. Neste sentido, “o desenvolvimento deve ser colocado no centro da cooperação do G20, e a realização da Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável deve ser uma prioridade máxima”.

Na coluna de opinião, Xi Jinping defendeu ser importante “avançar com a reforma do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial e da Organização Mundial do Comércio e aumentar a representação e a voz do Sul Global”.

Na sua visão, é também “necessário intensificar a coordenação das políticas macroeconómicas e promover a liberalização e a facilitação do comércio e do investimento, a fim de criar um ambiente aberto, inclusivo e não discriminatório para a cooperação económica internacional”.

Sem fome e com clima

Para esta cimeira o Brasil propôs a criação da “Task Force” para a “Aliança Global contra a Fome e a Pobreza”, a fim de “estabelecer uma aliança global para reunir recursos e conhecimentos para a implementação de políticas públicas e tecnologias sociais com eficácia comprovada na redução da fome e pobreza do mundo”.

Além disso, as alterações climáticas são também um dos temas em destaque na agenda. Assim, foi proposta a criação do “Grupo de Trabalho para a Mobilização Global contra as Alterações Climáticas”, que visa “promover um diálogo de alto nível entre governos, instituições financeiras e organismos internacionais para reforçar o alinhamento macroeconómico e financeiro global com vista à implementação dos objectivos da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas e do Acordo de Paris”.

A ideia é juntar Estados, sistemas financeiros e sector ambiental a fim de garantir que as directrizes do Acordo de Paris, focado nas alterações climáticas, sejam cumpridas. Assim, “o grupo de trabalho organizará debates para facilitar o intercâmbio de experiências e a identificação de elementos convergentes para a formulação e implementação de planos abrangentes que visem a transformação económica e sustentável”.

Será também organizado “um painel com notáveis economistas que irão examinar as plataformas nacionais e os quadros de políticas públicas existentes para a transformação ecológica, apresentando um relatório com recomendações sobre esta questão”.

Este grupo de trabalho pretende também “promover um amplo debate sobre o alinhamento do sector financeiro com os objectivos de longo prazo do Acordo de Paris, com a participação de governos, reguladores financeiros, bancos comerciais e de desenvolvimento, instituições financeiras internacionais, investidores institucionais e outros actores financeiros”.

Encontro em Brasília

À margem da cimeira do G20, a comitiva de Xi Jinping vai encontrar-se com Lula da Silva e demais dirigentes políticos brasileiros. Até esta quinta-feira, o Presidente chinês estará no Brasil, estando agendada para amanhã uma visita com Lula a Brasília.

Na mesma coluna de opinião da Folha de São Paulo, Xi explica os objectivos a atingir nos encontros bilaterais com Lula. E a aposta parece fazer-se nos países do chamado Sul Global, para onde Pequim direcciona muitos dos esforços de expansão de comércio. “Apesar da ascensão colectiva, o Sul Global ainda não viu a sua voz e as suas exigências ouvidas de forma plena e reflectidas no actual sistema de governação internacional. Como dois dos principais países em desenvolvimento do mundo, a China e o Brasil devem assumir o manto do dever e das responsabilidades históricas. Devemos trabalhar em conjunto com outros países do Sul Global para salvaguardar resolutamente os interesses comuns das nações em desenvolvimento, enfrentar os desafios globais através da cooperação e promover um sistema de governação global que seja mais justo e equitativo”, pode ler-se no artigo.

Na mesma coluna de opinião, intitulada “Uma amizade que abrange vastos oceanos – Uma viagem em direcção a um futuro partilhado mais brilhante”, Xi Jinping destacou também o facto de a China ser, “há 15 anos consecutivos, o maior parceiro comercial do Brasil”, e “uma das principais fontes de investimento estrangeiro no Brasil”.

“De acordo com as estatísticas do lado chinês, as importações anuais da China oriundas do Brasil, nos últimos três anos, têm-se mantido acima dos 100 mil milhões de dólares americanos. Graças aos nossos esforços conjuntos, a estrutura do comércio está a optimizar-se cada vez mais e o nível de cooperação está a melhorar”, referiu.

A adesão do Sul

Vários países da América do Sul, incluindo o Peru, aderiram à iniciativa Faixa e Rota, que tem sido um pilar da estratégia de Xi para aumentar a influência do país além-fronteiras desde 2013.

No Peru, Xi inaugurou o porto de Chancay, a norte de Lima, na semana passada, no âmbito da participação da China em mais uma edição da APEC – Fórum de Cooperação Económica para a Ásia-Pacífico, que decorreu entre sexta-feira e sábado em Lima, capital peruana.

O porto de Chancay, com um custo de construção estimado em 3,5 mil milhões de dólares, visa servir como centro logístico fundamental na região e um ponto de ligação crucial entre a América do Sul e o Indo-Pacífico.

A infraestrutura é de especial interesse para o Brasil, que pode assim obter acesso ao Oceano Pacífico. O projecto “Rotas de Integração da América do Sul”, iniciativa do Governo de Lula da Silva para ligar o Brasil aos principais centros de comércio e desenvolvimento da região, inclui duas rotas com destino ao porto de Chancay. Com agências

19 Nov 2024

DSEC | Restaurantes japoneses com subida nos negócios

Dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) mostram que o volume de negócios dos restaurantes japoneses tem vindo a registar uma melhoria. Em termos mensais, entre Setembro e Agosto, o volume de negócios de restaurantes com comida japonesa e coreana subiu 0,6 por cento, sendo que em termos anuais, ou seja, entre Setembro deste ano e Setembro do ano passado, a subida foi de 15,5 por cento.

Em termos mensais, o volume de negócios dos restaurantes em Setembro caiu 9,4 por cento face a Agosto, por terem terminado as férias de verão. No mês em análise, a quebra do volume de negócios foi de 5,5 por cento face a Setembro de 2023.

Em relação ao ramo do retalho, a quebra em termos mensais foi de 16,5 por cento, enquanto em termos anuais os negócios contraíram 20,7 por cento. A maior quebra, em termos anuais, foi no volume de negócios na área dos relógios e joalharia, na ordem dos 37,5 por cento, sendo que a venda dos artigos de couro caiu 25,4 por cento. Por sua vez, o volume dos negócios dos automóveis cresceu 1,9 por cento.

A DSEC entrevistou ainda vários proprietários sobre as expectativas de negócio para Outubro, quando ocorreu a Semana Dourada. Cerca de 42 por cento dos proprietários de restaurantes disseram esperar um crescimento dos negócios em Outubro, sendo que “a proporção dos proprietários dos restaurantes chineses e a dos proprietários dos restaurantes ocidentais atingiram 55 e 48 por cento, respectivamente”. Além disso, “cerca de 14 por cento dos proprietários da restauração anteviram decréscimos mensais no volume de negócios para Outubro”.

19 Nov 2024

TUI | Homem condenado a três anos de prisão por usar cartões falsos

O Tribunal de Última Instância (TUI) decidiu manter a pena de três anos e três meses de prisão aplicada a um homem que usou vários cartões de crédito falsos em compras em Macau. O caso remonta a Novembro de 2012, quando o homem usou 18 cartões com o seu nome, falsos, e outros três com outros nomes, também falsos.

O homem só foi descoberto quando, numa casa de penhores, o funcionário desconfiou da autenticidade do cartão e chamou a polícia. O homem foi considerado culpado da prática dos crimes de “passagem de moeda falsa em concerto com o falsificador”, incorrendo numa pena por cúmulo jurídico de três anos e três meses. O arguido recorreu junto do TUI por considerar que a pena era demasiado pesada, pois já tinha cumprido dois anos de prisão num outro processo devido a factos conexos.

Este obteve a liberdade condicional e foi viver para a Malásia por um período de cinco anos. O homem entendeu que a pena devia ser mais curta por “não terem sido considerados plenamente os factos e as circunstâncias que depuseram a favor dele”. Porém, o TUI decidiu manter a pena aplicada pelo Tribunal de Segunda Instância.

19 Nov 2024

Ensino superior | Descobertos alunos com falsos diplomas na MUST

A Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau descobriu que 24 alunos de Hong Kong se matricularam com falsos diplomas de conclusão do ensino secundário. O Governo de Macau confirmou estes dados e a secretária para a Educação de Hong Kong já reagiu, falando em crime grave

 

Um total de 24 alunos de Hong Kong falsificou os diplomas de conclusão do ensino secundário para ter acesso ao ensino superior, nomeadamente para entrar na Universidade de Ciências e Tecnologia de Macau (MUST). A história, avançada pelos media de Hong Kong, já originou, da parte da MUST, uma queixa na polícia de Hong Kong, que está a investigar o caso. Também as autoridades de Macau estão a colaborar neste processo.

À Rádio Comercial de Hong Kong, Christine Choi, secretária para a Educação da região, confirmou a suspeita em torno dos diplomas falsos.

“A MUST recebeu admissões de cerca de 20 alunos mediante os resultados do Exame do Diploma de Ensino Secundário de Hong Kong (HKDSE, na siga inglesa). A universidade suspeitou desses resultados e, por isso, consultou a Autoridade de Exames e Avaliação de Hong Kong para os verificar. Incrível como descobrimos que cerca de 20 candidatos se inscreveram com resultados falsos”, disse.

A responsável fez ainda um apelo para que, caso haja mais suspeitas de diplomas falsos, sejam apresentadas queixas e informações junto da Autoridade de Exames e Avaliação de Hong Kong. O caso, que já está a ser investigado por parte das autoridades policiais da região vizinha. Para Christine Choi, falsificar documentos de avaliação “é um crime sério em que os responsáveis necessitam de assumir as responsabilidades penais”, podendo incorrer numa pena de prisão máxima de 14 anos.

DSEDJ reagiu

Entretanto, a Direcção dos Serviços de Educação e Desenvolvimento da Juventude (DSEDJ) emitiu uma nota a referir que possui mecanismos para verificar falsidades nos currículos académicos e que irá comunicar com as autoridades policiais neste caso.

“As instituições de ensino superior em Macau sempre atribuíram grande importância aos padrões de admissão e controlo das qualificações académicas. A DSEDJ reitera que todas as instituições de ensino superior em Macau irão realizar, de forma rigorosa, o trabalho de recrutamento, registo e verificação dos currículos dos alunos de forma abrangente.”

A DSEDJ esclarece ainda que “qualquer pessoa que se candidate com informações falsas e por meios ilegais às instituições de ensino superior de Macau irá ver cessadas o estatuto de estudante ou o grau obtido, sendo os responsáveis legalmente responsabilizados”

A entidade responsável pela gestão do ensino superior e não superior de Macau esclarece que existe um mecanismo de coordenação e verificação de competências a fim de garantir que não existem ilegalidades.

Em Junho deste ano, foram emitidas novas directrizes sobre o processo de matrícula a fim de se promover uma maior coordenação entre todas as universidades do território. “Todas as universidades implementaram de forma integral as novas directrizes”, é referido.

18 Nov 2024

Cinemateca | Novembro traz clássicos de Hollywood dos anos 90

“De olhos bem fechados”, o último filme de Stanley Kubrick que juntou o então casal Nicole Kidman e Tom Cruise na tela, é um dos destaques da secção “Encantos de Novembro” da Cinemateca Paixão, com a primeira exibição amanhã. “O Sexto Sentido”, de Bruce Willis, é outro clássico apresentado

 

A Cinemateca Paixão decidiu, este mês, ir buscar dois clássicos do cinema de Hollywood de 1999 para enriquecer o ecrã. Um deles é “De olhos bem fechados”, o último filme de Stanley Kubrick, que fez sucesso por juntar o então casal Nicole Kidman e Tom Cruise, separados há vários anos.

O filme, onde a sexualidade e o erotismo estão bem presentes, será exibido este sábado na Cinemateca às 21h30, com repetição na próxima terça-feira às 19h30.

Tom Cruise interpreta o personagem de um médico bem-sucedido, casado e com uma filha pequena, que um dia embarca numa aventura após conhecer um antigo colega de faculdade num bar. Aí começa uma empolgante teia de mistérios que muda a vida do casal para sempre, com o médico a tentar perceber aquilo que viu num palacete.

Do baú de Hollywood foi também retirado outro êxito, “O Sexto Sentido”, com Bruce Willis, que também se exibe este sábado a partir das 19h30, com repetições no domingo à tarde e depois no dia 23.

Neste filme, Bruce Willis é um psiquiatra que começa a tratar uma criança que vê os mortos. Porém, nesta trama cheia de suspense, depressa se percebe que o terapeuta está demasiado envolvido no caso em termos pessoais, não conseguindo desligar-se e dar atenção à família. O filme exibido na Cinemateca é uma cópia restaurada.

Novos asiáticos

Além dos clássicos de Hollywood, “Encantos de Novembro” traz também cinema asiático. Uma das escolhas recai em “Blossoms under somewhere”, da realizadora de Hong Kong Riley Yip, exibido na próxima quinta-feira a partir das 19h30.

Este filme foi premiado pela Iniciativa Primeira Longa-Metragem do Fundo de Desenvolvimento Cinematográfico de Hong Kong e conta a história de Ching, uma rapariga de liceu que quer apaixonar-se por alguém, mas, como é gaga, sente receio em estabelecer contacto com os outros.

Ching gere um negócio de lingerie em segunda mão juntamente com Rachel, uma amiga, tentando aí atrair não só a atenção dos compradores, mas também o seu amor. Neste processo, Ching acaba por perder a sua única amizade.

“Ghost Cat Anzu”, filme japonês de animação, é a aposta da Cinemateca Paixão para amanhã, a partir das 16h30, e para a próxima quarta-feira, às 19h30. A história remete para Karin, uma menina abandonada pelo pai numa pequena cidade onde vive o seu avô, um monge, mas este pede a Anzu, um gato, para tomar conta da neta.

De Taiwan chega-nos “Yen and Ai-Lee”, que teve oito nomeações para os Prémios Cavalos de Ouro deste ano, e que se exibe no próximo domingo, 24, às 21h.

A história gira em torno de Yen, que depois de cumprir oito anos de prisão pela morte do pai regressa à sua aldeia natal, Hakkanese, procurando reconciliar-se com o passado e a sua própria mãe, Ai-Lee.

Porém, o regresso torna-se ainda mais complicado, pois na cidade de Kaoshiung existe uma misteriosa estudante de representação que ronda a família e que tem grandes semelhanças físicas com Yen. Quando os dois se conhecem, o destino parece trazer consigo um segredo partilhado por ambos que leva o telespectador a questionar o que poderá acontecer aos dois. Todos estes filmes asiáticos seleccionados pela Cinemateca Paixão são deste ano.

15 Nov 2024

Rua da Felicidade | Aceites ajustes temporais na zona pedonal

Os moradores e lojistas pediram, e o Governo acedeu. Os ajustes no tempo de duração da zona pedonal na Rua da Felicidade foram feitos mediante consenso e a devida comunicação com quem vive e trabalha na zona, garante o Instituto Cultural. Quanto à renovação de outras zonas antigas com os casinos, os trabalhos prosseguem “segundo o planeamento”

 

Leong Wai Man, presidente do Instituto Cultural (IC) assegura que o consenso foi obtido nos ajustes ao plano de zona pedonal para a Rua da Felicidade, feitos após queixas apresentadas por moradores e comerciantes da zona de que os horários de funcionamento da zona sem carros estariam a prejudicar o negócio.

Numa resposta à interpelação escrita do deputado Lei Leong Wong, a presidente destaca que sempre foi mantida “a comunicação e a troca de opiniões com as empresas de lazer, moradores, comerciantes e associações de moradores da zona”, e que o ajustamento do plano teve em consideração “as opiniões das partes interessadas apresentadas”.

“Visando equilibrar ainda mais as diferentes opiniões dadas e necessidades dos interessados desta zona, em Outubro de 2024, este plano, depois de ter obtido o consenso de várias partes interessadas, foi optimizado ainda mais, com o ajustamento do âmbito e do tempo de execução da zona pedonal provisória. Esta optimização obteve o apoio e o reconhecimento da comunidade em geral”, disse ainda a dirigente.

Para Leong Wai Man, o plano de criação de uma zona pedonal para a Rua da Felicidade, sem a passagem de trânsito, “tem surtido efeitos positivos na promoção do fluxo de pessoas para na zona histórica, na dinamização do ambiente do bairro comunitário e na atracção da chegada de novos comerciantes para na zona histórica”.

Tendo em conta os restantes planos de revitalização de seis bairros antigos ou zonas históricas, feitos em parceria com operadoras de jogo, a presidente do IC diz que “estão a ser desenvolvidos de acordo com o planeamento”.

Novidades nos estaleiros

Um dos exemplos de projectos de revitalização em curso, acontece na povoação de Lai Chi Vun, que outrora albergou uma indústria de construção de juncos de madeira. A presidente do IC adianta que no início do próximo ano haverá novidades em relação a mais dois estaleiros.

“A revitalização dos lotes X11-X15 e X5-X10 dos Estaleiros Navais de Lai Chi Vun divide-se em duas fases. As empresas de lazer estão a proceder à optimização dos terrenos dos lotes X11-X15 da primeira fase, prevendo-se a sua abertura ao público ainda dentro do ano de 2024. Para os lotes X5-X10 da segunda fase, cabe ao IC dar início, em 2025, às obras de recuperação estrutural e da construção de infraestruturas.”

No que diz respeito aos apoios financeiros por parte do Governo, a mesma resposta ao deputado assegura que a Direcção dos Serviços de Turismo (DST) tem prestado apoio financeiro a associações e instituições na realização de actividades turísticas em bairros. Assim, até 30 de Setembro, “nos três planos de apoio financeiro de 2024, foram concretizadas 12 actividades realizadas nas zonas e áreas circundantes, que atraíram no total mais de 58.000 participantes e contaram com a participação de mais de 500 lojas”, é descrito.

15 Nov 2024

Urbanismo | Livro conta intersecção da história de Macau com a arquitectura

Depois do primeiro lançamento em Portugal, “Macau. Arquitectura e mutações no tecido urbano: uma antologia” será lançado hoje na Creative Macau. O mais recente projecto editorial da BABEL – Associação Cultural revela a forma como a história de Macau foi moldando a sua arquitectura e a forma de organização urbanística desde os primórdios do século XX

 

Imagem_Nuno Cera

É hoje lançado na Creative Macau, a partir das 18h30, o novo projecto editorial da BABEL – Associação Cultural, que traz visões de vários autores sobre o tecido urbano de Macau e a história do território. “Macau. Arquitectura e mutações no tecido urbano: uma antologia” é o nome do livro fruto de uma bolsa de investigação académica concedida a Tiago Quadros, arquitecto e co-fundador da BABEL, em 2020. Tiago Quadros, coordenador da obra, declarou ao HM que o estudo procurou “identificar as influências que determinados textos fundamentais, escritos ao longo do século XX, tiveram na arquitectura de Macau e na forma como os arquitectos foram desempenhando a sua actividade”.

Há, assim, três grandes momentos contados no livro: as primeiras décadas do século XX, sobretudo no período da revolução republicana na China, em 1911; depois, o movimento “12,3”, expressão da Revolução Cultural chinesa em Macau, que decorreu entre 15 de Novembro de 1966 e Fevereiro de 1967; e depois o período mais contemporâneo até à transição, em que, segundo Tiago Quadros, “o itinerário pós-modernista do território resultou fundamentalmente do pensamento e da actividade de Manuel Vicente”.

“Nestes e noutros processos, e momentos, Macau foi sempre seguindo as tendências internacionais, ainda que com as adequações naturais e decorrentes das condições climatéricas do território, das condicionantes resultantes do ambiente cultural local e do facto de o território estar na periferia dos debates centrados nos novos programas, tecnológicos e sociais.”

Desta forma, acrescentou Tiago Quadros, o livro “reflecte algum do trabalho realizado ao abrigo da bolsa de investigação académica, mas a partir de uma estrutura de natureza mais antológica”. “No processo de construção do livro pareceu-me importante que essa dimensão antológica prevalecesse, por forma a que o livro pudesse constituir-se também como fonte de consulta, mas sobretudo, e isso é o mais importante, como ponto de partida para outros estudos, para outras investigações sobre o território e a arquitectura de Macau”, frisou.

Mudanças estruturais

À partida, poder-se-á pensar que movimentos políticos ou revolucionários nada têm a ver com a forma de construir e planear uma cidade. Porém, não foi isso que a história de Macau mostrou. Nesta antologia encontram-se textos de autores como os arquitectos José Maneiras ou Mário Duarte Duque, Manuel Graça Dias, Fernando Távora ou Álvaro Siza.

Incluem-se ainda “escritos – seleccionados, compilados e organizados – por arquitectos, professores, investigadores, bem como jornalistas, viajantes e exploradores, provenientes da Ásia, mas também da Europa, América do Norte e Oceania”.

Segundo Tiago Quadros, os três períodos temporais que servem de enquadramento a todo o conteúdo “são históricos e não estão directamente relacionados com a arquitectura ou urbanismo, mas, na sua essência, vão directamente trazer consequências na forma como a cidade passa a ser pensada, desenhada e construída”.

No caso do período de instauração da República na China, e também em Portugal, mas dois anos antes, em 1910, “o que acontece em Macau é a adopção de medidas urbanísticas, como a adopção de planos para a melhoria das vias e a nível de higiene, procurando dotar-se a cidade de uma melhor qualidade de vida e saneamento básico”.

Assim, ocorre “uma pequena revolução na cidade que procura que alguns bairros passem a ter uma melhor qualidade de vida das pessoas”, destacando-se a grande mudança trazida com a abertura da Avenida Almeida Ribeiro. O projecto, segundo Tiago Quadros, obrigou a “grande coragem política, e que teve grande resistência”, pois implicou a ligação da cidade chinesa com a parte cristã da cidade, onde residiam os portugueses e macaenses na sua grande maioria.

Para esse processo se realizar, ocorreram várias expropriações de terrenos. Mas, em termos gerais, “foi concluído com sucesso”, o que faz com que as primeiras décadas do século XX em Macau tenha sido marcado “pela realização de grandes obras públicas, nomeadamente a melhoria do Porto Interior, pois era importante que Macau tivesse um porto que fosse viável, em comparação com os recursos que existiam em Hong Kong”.

Depois, em meados dos anos 60, o “12,3” trouxe, para Tiago Quadros, “a mudança mais interessante no panorama do século XX em Macau, pois coincide com a vinda para o território de uma geração muito jovem de arquitectos, como José Maneiras, Natália Gomes ou Manuel Vicente”. Estes chegam bastante influenciados profissionalmente “pelos estudos que tinham feito na Europa e por todos os movimentos que surgiam nos Estados Unidos da América e na Europa, como o Maio de 68”.

Assim, estes arquitectos chegam a Macau “muito preocupados e atentos à questão da matriz social da arquitectura e a importância que esta poderia ter na vida de uma comunidade e cidade”.

No caso de Manuel Vicente, que chegou a Macau pela primeira vez no início dos anos 60, vem integrado de uma geração que trabalhou em Lisboa com “planos de expansão, urbanísticos e edifícios públicos que eram desenhados em Lisboa e depois enviados para serem construídos em vários destinos diferentes”.

Encontram, à época, “um espaço muito afastado da metrópole [Portugal] que escapava às regras e normas vigentes [em Lisboa], onde havia um espaço relativamente novo, o que lhes permitiu iniciar a sua actividade num espaço de maior liberdade e grande responsabilidade”.

Foi a época dos planos do ZAPE [Zona Aterros do Porto Exterior], por exemplo, ou outros que “do ponto de vista político exigiram decisões importantes não muito bem aceites pela comunidade chinesa”.

Além disso, “o facto de, até 25 de Abril de 1974, Macau ser governada com grande distanciamento por parte do Governo português, com uma Administração reduzida, dificultou o planeamento da cidade”, mas também “permitiu a arquitectos uma liberdade de acção, sobretudo no que diz respeito a processos de maior experimentalismo”.

A época da liberalização

Já na era próxima da transição, em 1999, a decisão de liberalizar o jogo e o crescimento do número de turistas chineses trouxe profundas mudanças em toda a sociedade, com impactos urbanísticos. “A parte mais visível dessa mudança é a zona do Cotai, mas antes deste ser construído a mudança começou a sentir-se na península, com a construção dos primeiros casinos”, nomeadamente o Sands em 2004.

Deu-se, então, “a grande transformação ao nível da arquitectura, com impacto na cidade e na forma como as pessoas começam a viver a partir daí”, pois deu-se o aumento dos valores das rendas, além de que a própria população aumentou.

“Este terceiro momento tem também uma questão relacionada com o impacto que este mercado vai ter nos escritórios de arquitectura de pequena e média escala”, defende Tiago Quadros, chamando a atenção para os ateliers de matriz portuguesa.

Estes passam a “sentir dificuldades porque os casinos entram no mercado e trazem consigo as grandes multinacionais ligadas à arquitectura e design de interiores, ocupando um espaço que não existia e que os ateliers pequenos não conseguem ocupar”.

Acima de tudo, esta obra “não pretende ser uma história da arquitectura e urbanismo”, refere Tiago Quadros que destaca os textos escritos por viajantes, jornalistas ou sinólogos na primeira metade do século XX, pois os textos mais académicos só surgem depois dos anos 60. “São olhares com importâncias e relevâncias diferentes e isso nota-se quando se lê o livro, mas estas diferenças, quer na origem dos textos, quer nos suportes onde foram originalmente colocados, dá-nos a ideia do que é Macau, um espaço de grandes incoerências, de muita informalidade”.

A obra é editada pela Circo de Ideias e trata-se de uma iniciativa da BABEL – Associação Cultural, criada por Tiago Quadros e Margarida Saraiva em Macau, em 2013. A BABEL estabeleceu-se em 2020 em Alcobaça. A apresentação de hoje estará a cargo do arquitecto Diogo Burnay.

Tiago Quadros recorda ainda as palavras do arquitecto Jorge Figueira na primeira apresentação da obra, no Porto. Este “disse, de forma muito generosa, que este livro é um contributo para que se volte a olhar para Macau”. “Ficarei muito feliz se o livro for, de facto, um estímulo para que outros investigadores se interessem por Macau, pela sua arquitectura e urbanismo”, rematou.

13 Nov 2024

Fotografia | UM organiza exposição sobre Angola e Moçambique

No contexto de uma viagem de intercâmbio do Centro de Estudos Jurídicos e Judiciais da Universidade de Macau a Angola e Moçambique, o advogado e docente Miguel Quental retratou o dia-a-dia das populações destes países. As imagens podem agora ser vistas na UM até Dezembro numa mostra promovida pela própria instituição de ensino

 

Retratar a simplicidade e uma realidade bem diferente daquela que se vive em Macau. São estas as ideias transmitidas pelas fotografias tiradas por Miguel Quental, advogado e docente da Faculdade de Direito da Universidade de Macau (FDUM), em Angola e Moçambique, e que podem agora ser vistas pelo grande público numa mostra promovida pelo Centro de Estudos Jurídicos e Judiciais da FDUM.

Ao HM, o causídico, que apenas faz fotografia em lazer, disse ter aceitado o repto do Centro para mostrar estas imagens que fez no contexto de uma visita de intercâmbio e cooperação às Faculdades de Direito da Universidade Eduardo Mondlane, em Moçambique, e Agostinho Neto, em Angola.

“Como gosto de fazer fotografia fui tirando algumas imagens durante essas viagens. Este é um Centro que se dedica ao estudo comparativo do Direito e às publicações que se fazem em língua portuguesa na sua relação com a China, e pensei que fosse interessante dar a conhecer a cultura e a forma de viver de Angola e Moçambique para os alunos da faculdade que nunca tiveram acesso a essa realidade.”

Para Miguel Quental, a ideia é também “levar pessoas à universidade, que é também um espaço de cultura”. E até se pode dizer que a mostra tem tido sucesso, pois logo no primeiro dia cerca de 50 pessoas visitaram o espaço.

Na exposição, inaugurada no passado dia 28 de Outubro e patente na entrada da FDUM, podem ver-se “fotografias com cenas de rua, miúdos a brincar na praia, vendilhões com o comércio tradicional, paisagens com barcos, a ria, o mar, a cidade e o campo”.

“Procurei fazer esse contraste, pois a realidade, em relação a Macau, é bastante diferente a todos os níveis, desde a alimentação, o tipo de comércio e a forma de vender os bens”, realçou.

Boa cooperação

Na inauguração, Miguel Quental destacou “estar longe” de ser fotógrafo, considerando-se apenas “um coleccionador de imagens que reflectem momentos de vida, uns bons, maus e outros mais felizes”.

“Procuro fotografar a vida e a nossa forma de viver, e fotografo o momento na esperança de o tornar eterno, pelo menos um pouco mais eterno. Quantas vezes olhamos e não vemos, ou vemos e não reparamos num pequeno pormenor, numa pequena forma, algo simples ou uma bonita cor”, disse.

Miguel Quental já tinha estado em Moçambique, mas, no tocante a Angola, esta foi a primeira vez. “Sempre tive o fascínio de ir a Luanda. Tive um sentimento misto, pois gostei de lá estar, mas senti muita tristeza, e pensei que talvez as pessoas não sejam realmente muito felizes. Procurei retratar um pouco disso e penso que consegui captar os miúdos na sua essência, a brincar na praia.”

Para o autor das imagens, foram captados “pequenos momentos” bem como a “tristeza” sentida em tantos rostos.

Sobre o resultado da presença do Centro de Estudos na FDUM nestes países, Miguel Quental destacou que “há muito trabalho a fazer” nestas universidades, tendo sido “muito importante” a visita da FDUM.

“Assinámos um protocolo com a Universidade Agostinho Neto e nos próximos anos vamos receber alunos e professores na UM. Vamos dar continuidade ao protocolo que mantemos há 25 anos com Moçambique. Cientificamente foram duas visitas que valeram a pena e procurei, com estas imagens, aliar a parte cultural à parte científica”, rematou.

13 Nov 2024

Óbito | Fundador da Galaxy, Lui Che Woo, morre aos 95 anos

Com agências

Apesar do início humilde e das adversidades sentidas na Hong Kong da 2ª Grande Guerra Mundial, Lui Che Woo ergueu um império bilionário e foi um dos principais protagonistas da indústria do jogo de Macau. O empresário, filantropo e fundador do grupo Galaxy morreu na última quinta-feira

 

O empresário e filantropo Lui Che Woo, fundador e presidente do Galaxy Entertainment Group, morreu aos 95 anos, anunciou a concessionária de jogo na segunda-feira à noite. O grupo empresarial confirmou que o magnata morreu na quinta-feira passada e elogiou a “visão, tremenda liderança e orientação” do empresário, de acordo com um comunicado enviado na segunda-feira à noite à bolsa de valores de Hong Kong.

Lui Che Woo fundou a empresa em 2002, depois de ter conquistado uma concessão para operar casinos em Macau, durante a liberalização do jogo na RAEM. A Galaxy está ligada ao grupo K. Wah, um conglomerado de Hong Kong dedicado ao imobiliário e à venda de material de construção, que Lui Che Woo criou em 1955.

O líder do Governo de Hong Kong, John Lee, lamentou a morte de Lui Che Woo e lembrou o “empresário de sucesso” que “se dedicou activamente à promoção de causas filantrópicas e educativas na China continental, em Hong Kong e em todo o mundo”.

Também o líder do Governo de Macau, Ho Iat Seng, sublinhou, num comunicado divulgado ontem, o “elevado espírito filantrópico” do magnata e recordou a criação em 2015 do Prémio Lui Che Woo – Civilização Mundial.

Além disso, o Chefe do Executivo em exercício disse que o magnata deu “grandes contributos para a diversificação adequada da economia de Macau ao longo dos anos”, e que o prémio filantrópico por si criado “demonstra a sua firme convicção profunda no espírito de fraternidade”.

“O Chefe do Executivo lamenta o falecimento do Doutor Lui Che Woo e apresenta os mais sentidos pêsames à família enlutada”, lê-se ainda na mesma nota.

O Prémio Lui Che Woo, no valor total de 60 milhões de dólares de Hong Kong, é atribuído anualmente a instituições ou pessoas que trabalhem para um futuro sustentável, melhoria do bem-estar social humano e promoção da “energia positiva”. Numa entrevista concedida à Bloomberg News em 2018, o magnata declarou que o prémio “é, até certo ponto, um pouco semelhante ao Prémio Nobel da Paz, mas o conceito é mais amplo”. O prémio premeia contribuições relacionadas com o desenvolvimento sustentável, a melhoria do bem-estar humano e a promoção de atitudes positivas. Os laureados incluem a The Nature Conservancy, o Comité Paralímpico Internacional e o antigo presidente dos EUA, Jimmy Carter.

A Galaxy garantiu que a morte do fundador “não terá qualquer impacto nas operações do grupo” e acrescentou que a empresa vai nomear um novo presidente “em tempo oportuno”.

O actual vice-presidente do Galaxy é Francis Lui Yiu Tung, o filho mais velho de Lui Che Woo.

A criação da riqueza

Lui Che Woo era uma das pessoas mais ricas de Hong Kong, com um património líquido estimado em 14,5 mil milhões de dólares norte-americanos, de acordo com o Bloomberg Billionaires Index. Aquando da liberalização do jogo, conseguiu competir com outros magnatas norte-americanos, nomeadamente Sheldon Adelson, ligado à Sands e também já falecido, e Steve Wynn.

O primeiro casino a abrir em Macau foi o StarWorld, em 2006, seguido do Galaxy Macau na zona do Cotai.

Apesar da fortuna que juntou ao longo da vida, Lui Che Woo percorreu um longo caminho para a obter. Nascido a 9 de Agosto de 1929, na cidade de Jiangmen, Guangdong, Lui foi, como tantos outros nacionais chineses, refugiado na II Guerra Mundial, fugindo em 1934 com a família para Hong Kong para escapar à invasão japonesa. Quando estes invadiram e ocuparam Hong Kong, em 1941, a família de Lui perdeu toda a fortuna que já tinha conseguido.

Lui Che Woo cresceu em Kowloon e estudou numa escola em Yau Ma Tei, mas acabou por desistir no primeiro ano do ensino secundário porque não queria estudar japonês, língua que era obrigatória no decurso da ocupação de Hong Kong pelos japoneses, descreveu numa entrevista, em 2019, à emissora pública Radio Television Hong Kong (RTHK).

Assim, o trabalho apareceu na sua vida logo aos 13 anos, ajudando a família a vender produtos de pastelaria chinesa, juntamente com as cinco irmãs.

Na mesma entrevista à RTHK, o empresário lembrou os tempos em que milhares de refugiados moldavam a sociedade de Hong Kong e se debatiam para sobreviver. “Vi tantas pessoas pobres e em sofrimento na Hong Kong invadida pelo Japão. Tenho isso bem presente na minha mente”, disse Lui, em lágrimas, na entrevista.

Terminada a II Guerra Mundial, em 1945, Lui Che Wo fez fortuna ao comprar excedente norte-americano de equipamentos de construção em Okinawa, no Japão, e importando-o para Hong Kong, que estava a atravessar um boom de construção à medida que as pessoas fugiam da turbulência no Interior da China.

Assim, em 1955, Lui Che Woo fundou a empresa que deu origem à marca Galaxy, o Grupo K. Wah, dedicado, numa primeira fase, à extração de matéria-prima para a construção. Investiu os lucros obtidos na construção de propriedades residenciais e, mais tarde, hotéis em Hong Kong, Xangai, Pequim, Guangzhou, e nos Estados Unidos.

No então, o seu primeiro hotel, que ao princípio parecia destinado a ser um Holiday Inn, começou a ser construído em 1979 em Tsim Sha Tsui East, Kowloon. O hotel acabaria por ser baptizado como InterContinental Grand Stanford e a sua construção custou 300 milhões de dólares de Hong Kong.

Investir no jogo

Em 2002, quando Macau já era RAEM, Lui Che Woo aventurou-se na indústria do jogo. Primeiro colaborou com a Las Vegas Sands Corporation, de Sheldon Adelson, mas, depois de um ano, as duas partes acabariam por dividir a licença de jogo e seguir caminhos diferentes. A Bloomberg escreve que os empresários não se entenderam em relação à estratégia de negócio, pois Adelson queria recriar Las Vegas na China, enquanto Lui queria apelar à satisfação dos gostos asiáticos. Para corresponder aos objectivos do fundador, a Galaxy apostou na abertura de mais restaurantes chineses e instalou sinais claros a indicar saídas. Francis Lui, que herdou o negócio, disse numa entrevista de 2006 à Next Magazine que o seu pai comparava os casinos americanos a labirintos.

Ao HM, Óscar Madureira, advogado ligado ao sector do jogo destaca “uma das mais importantes figuras da indústria do jogo de Macau, no período pós-abertura do mercado do jogo”.

Para o responsável, Lui Che Woo “teve a capacidade de fazer face a uma contrariedade inicial, que foi a separação da Venetian, logo no momento após ter ganho a concessão juntamente com o parceiro americano, e de transformar um grupo que não tinha background na indústria do jogo num dos operadores mais importantes e diferenciadores no panorama de Macau”.

O advogado destaca que o magnata de Hong Kong “teve sempre a capacidade para perceber os gostos e preferências dos clientes locais” e também “saber gerir de forma muito capaz as relações e o contacto com o regulador e as autoridades de Macau”.

Óscar Madureira destaca ainda o papel de filantropo de Lui. “À semelhança de outros empresários do sector teve um papel importante no que respeita a filantropia e as acções de responsabilidade social, tão reclamadas pela comunidade e pelo regulador”, deixando “definitivamente uma marca importante na indústria local”.

Lui Che Woo tinha uma imagem informal, pois era quase sempre visto de boné, sendo adepto de golfe e de caligrafia chinesa. Em relação ao jogo, e segundo a Bloomberg, o empresário apostava mais no tradicional mahjong do que nas mesas de jogo do casino.

13 Nov 2024

AMCM | Empréstimos para habitação e imobiliário a crescer

Dados da Autoridade Monetária e Cambial de Macau (AMCM) relativos ao mês de Setembro revelam que os novos empréstimos hipotecários para habitação (EHHs) e os empréstimos comerciais para actividades imobiliárias (ECAIs) aprovados cresceram face a Agosto, mas houve “um declínio no saldo bruto” dos empréstimos à habitação, enquanto nos empréstimos para o sector imobiliário se registou uma subida.

Em Setembro de 2024, os novos EHHs aprovados pelos bancos cresceram 142,1 por cento em relação ao mês anterior, no valor de 3,05 mil milhões de patacas. Neste tipo de empréstimo, os residentes representaram 98,4 por cento do total, um crescimento de 145,1 por cento, tendo os empréstimos sido de três mil milhões. Por sua vez, os empréstimos a não residentes subiram ligeiramente mais, 145,1 por cento, no valor total de 48,66 milhões.

No tocante aos empréstimos para o imobiliário, registou-se um crescimento de 8,4 por cento face a Agosto, com o valor total de 1,03 mil milhões de patacas. Os residentes locais que pediram este tipo de empréstimo representaram 91,4 por cento, mais 0,5 por cento face ao mês anterior.

12 Nov 2024

Estudo | Meios digitais podem potenciar marca cultural de Macau

Um estudo de académicos da MUST conclui que o uso de meios digitais nas áreas do património, cultura e turismo contribui para a internacionalização e o fomento de Macau como marca cultural. Estas são algumas das conclusões do artigo “O digital irá capacitar Macau e promover intercâmbios culturais internacionais e a aprendizagem mútua”

 

Inteligência artificial, computação em nuvem, “big data” são conceitos tecnológicos transversais a quase todos os domínios da vida nos dias que correm. Dois académicos da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (MUST na sigla em inglês), Jing Zhang e Sheng Nan Pang, analisaram as repercussões das últimas revoluções tecnológicas e o seu uso nas áreas do turismo, cultura e divulgação do património.

No estudo “O digital irá capacitar Macau e promover intercâmbios culturais internacionais e a aprendizagem mútua”, os académicos entendem que Macau está no bom caminho no que diz respeito à crescente digitalização destes sectores, criando uma nova marca global em termos arquitectónicos e culturais.

Segundo o estudo, publicado na plataforma de estudos académicos “EasyChair”, a aplicação de ferramentas digitais na promoção da cultural e do turismo locais tem sido cada vez mais uma realidade, servindo para internacionalizar Macau como marca de turismo e cultura.

Segundo os autores, “a aplicação da tecnologia digital tem desempenhado um importante papel na promoção do desenvolvimento da cultura internacional em Macau, injectando um novo ímpeto na comunicação global das suas marcas culturais”. É também referido o facto de o Governo, nos últimos anos, ter reforçado “o desenvolvimento do turismo cultural, da tecnologia digital, do empreendedorismo juvenil, do lazer, dos negócios e das exposições”, com o objectivo de “realçar o processo de diversificação industrial em Macau”.

Para os autores, “os benefícios da tecnologia digital têm sido notáveis, dando não só um forte impulso ao desenvolvimento global da economia e sociedade de Macau, mas tornando-se também uma força fundamental para promover o processo de internacionalização”.

Ao apostar “numa profunda integração de tecnologias de ponta como o ‘Big Data’, computação em nuvem ou inteligência artificial, Macau deu um salto inovador em muitas áreas-chave, nomeadamente a herança cultural, a promoção do turismo e a cooperação empresarial”. Desta forma, construiu-se “um sistema de desenvolvimento [destas áreas] mais eficiente, inteligente, aberto e inclusivo”.

O artigo dos académicos contém também a ideia de que a digitalização ajudará Macau a dinamizar a sua herança cultural em conjunto com a criação de marcas. “Com a aceleração da globalização, e a diversidade cultural cada vez mais proeminente, Macau vai continuar a defender a relevância do património cultural, aprofundando a sua protecção e investigação e promovendo a integração desse mesmo património na sociedade moderna.”

Assim, através do digital, haverá uma maior expansão “da influência internacional [de Macau] no domínio da proteção do património cultural”.

Os autores destacam os investimentos feitos pela RAEM nos últimos anos em termos tecnológicos, nomeadamente ao nível da rede 5G, a criação de “grandes centros de dados e inteligência artificial”, levando a à “modernização das infra-estruturas em rede e ao forte apoio dado à aplicação diversificada [dessas estruturas] e inovação da economia digital”.

O caso do turismo

O Instituto Cultural (IC) é uma das entidades que mais tem apostado nas novas tecnologias para mostrar a cultura local. Um dos exemplos destacados pelos académicos foi a exposição “Visitando as Ruínas de S. Paulo no Espaço e no Tempo – Exposição de Realidade Virtual nas Ruínas de S. Paulo”, entre 2022 e 2023, uma “experiência de turismo cultural inovadora com realidade virtual digital”.

Nesta mostra, foram utilizadas “pela primeira vez tecnologias de simulação avançadas, como a modelação tridimensional, a realidade virtual ou a autoestereoscopia no Património Mundial de Macau, a fim de realizar a recuperação digital da igreja”.

Desta forma, segundo explicou o IC na altura, “os participantes puderam conhecer o aspecto histórico da Igreja de Madre de Deus do Colégio de S. Paulo há 400 anos, ultrapassando as limitações temporais e espaciais”.

Jing Zhang e Sheng Nan Pang apresentam outro exemplo de uma exposição que pode atrair outro tipo de público a Macau e ajudar na tal criação de uma nova marca: a “Exposição Futura de Artes Digitais de Macau”, planeada pela equipa de licenciados da MUST, em que a arte digital foi “conceito central”, promovendo-se um debate em torno “do poder da integração multidimensional do design, tecnologia, comércio, utilizadores e cultura”. Na mostra apresentou-se “uma perspectiva única da arte digital, integrando-se algoritmos ou estratégias de planeamento de caminhos de inteligência artificial”.

Estes são exemplos de como cada vez mais há uma nova forma de fazer turismo baseado no mundo virtual. “A integração da cultura com meios científicos e tecnológicos tornou-se numa nova forma de turismo. Com o [uso] do formato digital no património cultural tradicional, os museus lançam o modelo de turismo de exposições com recurso a meios científicos e tecnológicos”, pode ler-se.

Desta forma, “através da aplicação da tecnologia digital, é criado o ‘novo cenário turístico, realizando-se a reconstrução dos recursos do turismo cultural e dos serviços integrados das indústrias” desse mesmo turismo.

Assim, os autores entendem, que “Macau não só tem liderado o ritmo do turismo global ao nível da transformação digital, como também estabeleceu um modelo de integração e inovação da ciência e tecnologia no turismo, contribuindo para a construção de uma valiosa experiência em prol do desenvolvimento do turismo internacional”.

Outra ideia deixada no estudo prende-se com o facto de Macau estar “a integrar e aprofundar de forma activa a cooperação internacional no domínio da digitalização”, tendo em conta que a China “está a reforçar o desenvolvimento da economia regional através de meios digitais, promovendo a influência global e o poder de comunicação da cultura chinesa para continuar a crescer”.

Um “posicionamento único”

Os autores do estudo entendem que, no contexto do “rápido desenvolvimento e a ampla aplicação da tecnologia digital”, a RAEM “tem criado gradualmente o seu posicionamento único, em termos de marca, na cena internacional”, ao apresentar “recursos multiculturais”, tendo em conta a “posição geográfica no centro da região Ásia-Pacífico, demonstrando uma influência internacional reforçada de forma significativa”.

Assim, “a aceleração deste processo mostra como a tecnologia digital é pioneira da mudança dos tempos, proporcionando oportunidades e possibilidades para Macau se transformar numa indústria emergente” ao nível da cultura e turismo digitais.

Os autores citam ainda um relatório da Organização Mundial do Turismo que determina que, até 2030, “a aplicação generalizada das tecnologias digitais deverá conduzir a um crescimento significativo de 34 por cento no comércio global”. Tendência que irá “remodelar profundamente a estrutura das cadeias de valor globais, perturbar e optimizar o modo de funcionamento tradicional do comércio mundial”.

Assim, para os autores do estudo, Macau destaca-se neste novo posicionamento, tendo em conta os planos de cooperação regional com Hengqin e toda a província de Guangdong. Existe, portanto, uma “aceleração da transformação das formas tradicionais de comércio na direcção do digital e [plataformas] inteligentes com orientações políticas e afectação de recursos”.

Macau apresenta “uma perspectiva estratégica virada para o futuro com a utilização plena do poder da inovação da tecnologia digital”. Tal servirá não só para “guardar e activar o rico património cultural local, mas também para, com recurso a plataformas digitais de inovação, realizar intercâmbios culturais e de aprendizagem mútua no palco cultural global”.

“A tecnologia digital permitiu a Macau promover o novo processo de intercâmbio cultural internacional e de aprendizagem mútua com um grande impulso”, rematam os autores, que defendem que a tecnologia “rompe as barreiras do intercâmbio cultural tradicional, constrói uma ponte cultural através do tempo e do espaço e promove a partilha e a aprendizagem mútua dos recursos culturais globais”.

12 Nov 2024

Pátio do Espinho | Um museu ao ar livre que acolheu católicos japoneses em fuga

Esther Chan, vice-presidente da Associação de História Oral de Macau, deu ontem uma palestra sobre a história do Pátio do Espinho, situado atrás das Ruínas de São Paulo. A zona tem cerca de dez mil metros quadrados de área e uma história que se relaciona com a fuga de católicos do Japão e a antiga Igreja de São Paulo. Esther Chan participou na recolha de testemunhos orais de moradores do bairro

 

Quem caminhar pelas ruas nas traseiras das Ruínas de São Paulo descobre, escondido atrás de umas pequenas muralhas, um pequeno bairro composto, na sua maioria, por habitações precárias. Este pequeno lugar perdido no tempo chama-se Pátio do Espinho e tem sido alvo do trabalho de pesquisa desenvolvido por Esther Chan, vice-presidente da Associação da História Oral de Macau.

A responsável deu ontem uma palestra, em língua chinesa, intitulada “Memórias de 70 Anos – Pessoas e Acontecimentos no Pátio do Espinho”, tendo ainda protagonizado uma visita guiada ao local. A iniciativa, promovida pela Fundação Macau, visou “aprofundar o conhecimento do público sobre a cultura das aldeias muradas e os pátios de Macau”.

Conversámos com Esther Chan a fim de perceber as origens deste bairro que está situado na zona tampão do Centro Histórico de Macau, protegido pela Lei do Património Cultural. O bairro constitui “a maior e última aldeia murada de Macau, cobrindo uma área de cerca de 10 mil metros quadrados”, estando dividido na zona alta e baixa pela Rua D. Belchior Carneiro, com “diversos estilos arquitectónicos, distintas características históricas e elementos espaciais”.

Em termos históricos, o Pátio do Espinho tem “ligações estreitas com o Colégio de São Paulo”, a primeira universidade ocidental em Macau criada pelos jesuítas e que funcionou junto à Igreja de São Paulo, também conhecida por Igreja da Madre de Deus. Este complexo educacional e religioso, com estreitas ligações aos primórdios da presença portuguesa em Macau, remonta ao ano de 1565.

Esther Chan destaca que “durante a dinastia Ming na China, o Japão era governado por Toyotomi Hideyoshi, que ordenou uma perseguição em larga escala aos católicos no Japão”. Foi aí que se deu a fuga para Macau e o estabelecimento na zona onde hoje se situa o Pátio do Espinho. A responsável destaca que “o velho muro agora situado na zona norte do Pátio do Espinho é parte do Colégio de São Paulo”.

Mas de onde vem o nome pelo qual ficou conhecido este bairro? Segundo Esther Chan, que se baseia em obras já editadas em chinês, a designação terá sido dada pelas plantações de batatas feitas pelos japoneses no local.

Contudo, tendo em conta o nome em chinês e o significado dos caracteres, a vice-presidente da associação considera que o nome “Pátio do Espinho” pode remeter para outra explicação, com eventuais ligações à fuga dos católicos.

“Em primeiro lugar, o caracter chinês “茨” significa colmo; em japonês, “茨” significa espinho ou dificuldade; e ‘Thorn’ também significa ‘espinho’ em português. Tendo em conta as experiências difíceis dos japoneses católicos vividas na altura, penso que “茨林”, que significa ‘Floresta de Espinhos’, faria mais sentido ser descrita como uma situação de um ‘lugar onde se juntaram para sofrer em conjunto'”, explica.

Um lugar de gerações

Saídos os japoneses, foi a vez do Pátio do Espinho se tornar na casa de muitos membros da comunidade chinesa. Primeiro, com os refugiados no contexto da II Guerra Mundial, e depois na fase da chegada dos trabalhadores não-residentes. “No seu pico, o Pátio do Espinho teve cerca de dois mil moradores”, adiantou Esther Chan, que explica que os próprios materiais de construção são um reflexo da passagem do tempo.

“Embora as estruturas habitacionais do Pátio do Espinho não tenham muita qualidade, apresentam alguma estética ligada à cultura popular. Podemos também perceber a passagem de diferentes épocas graças aos vários materiais de construção. Por exemplo, os primeiros edifícios da aldeia eram maioritariamente feitos de tijolo, mas depois, durante a necessidade urgente de habitação, apareceram muitas casas de lata.”

Com a estabilidade económica dos moradores, começaram a surgir pequenos “edifícios de betão armado”. “A mistura perfeita de edifícios antigos e novos na aldeia forma uma paisagem única em Macau”, reflectindo a história do Pátio do Espinho que acompanhou “múltiplas gerações dos residentes de Macau”.

Para a vice-presidente da associação que dinamiza a história de Macau, “quando entramos no Pátio do Espinho parece que regressamos aos anos 80, em que o tempo está parado num lugar”. “Apesar do pátio estar situado no ponto turístico mais movimentado de Macau, tal não perturba a sua tranquilidade. A anterior geração de moradores saiu gradualmente do Pátio do Espinho, mas os antigos residentes ainda guardam boas recordações deste sítio e, frequentemente, regressam à sua casa para se reunirem”, adiantou.

Uma questão de protecção

As estórias dos antigos moradores do Pátio do Espinho foram recolhidas pela Associação da História Oral de Macau, culminando com mais de 600 entrevistas divulgadas em várias publicações. Em 2021, a associação lançou um novo projecto de história oral sobre o lugar, registando as histórias de vida de 20 antigos moradores em 14 artigos. O resultado foi a publicação, em 2022, do livro “A História Oral do Pátio do Espinho”. Este trabalho, escrito em chinês, contou com a participação de Esther Chan.

Questionada sobre a necessidade de preservação do património cultural inerente ao lugar, Esther Chan recorda que, nos últimos anos, os próprios moradores “têm protegido de forma activa a aldeia murada com acções de limpeza e restauro, preservando muitos objectos e relíquias preciosas”.

Além disso, “os residentes do Pátio do Espinho também promovem este lugar de forma activa, na esperança de ali criar uma excelente comunidade cultural”. “Nos últimos dois anos testemunhei pessoalmente os esforços dos residentes, lançando várias actividades como a organização de festas do Festival do Bolo Lunar, workshops sobre ecologia, a realização de mercados de fim-de-semana ou convites a deputados para visitarem o local. Por isso, o Pátio do Espinho é como um museu comunitário que apresenta exposições históricas, em que os moradores mais velhos funcionam como docentes. Como residentes de Macau não podemos ignorar a existência deste lugar precioso”, referiu ainda a responsável, sem esquecer a importância do Templo de Na Tcha como um lugar adorado pelos que ainda ali vivem e por visitantes.

Em Fevereiro do ano passado a necessidade de recuperação do Pátio do Espinho levou o deputado Ngan Iek Hang a interpelar o Governo sobre a matéria. O legislador recordou “a recente cerimónia de reabertura do poço antigo do Pátio do Espinho”, que também terá sido construído por católicos japoneses refugiados.

Segundo Ngan Iek Hang, no Pátio do Espinho viveu a população chinesa “nos finais da dinastia Qing e período republicano”. “As árvores, casas e becos do Pátio albergam memórias da vida dos chineses de Macau, testemunhando a prosperidade e a decadência histórica de Macau, sendo, portanto, o seu valor histórico e cultural extremamente rico”, indicou o deputado da União Geral das Associações dos Moradores de Macau.

O Instituto Cultural tem-se mostrado atento à preservação do bairro, tendo por exemplo realizado, há quatro anos, obras de restauro do muro de taipa na área do Pátio do Espinho.

Além de colaborar com a Associação de História Oral de Macau, Esther Chan é autora do livro “I am Designing my Life”, e é formada em comunicação cultural e de artes visuais, bem como línguas estrangeiras.

11 Nov 2024