Andreia Sofia Silva EventosCinemateca Paixão | Filme nomeado para os Óscares em cartaz A Cinemateca Paixão prossegue com a programação até Março com três novos filmes em cartaz. “Great Freedom”, filme de Sebastian Meise, exibido pela primeira vez no dia de São Valentim, pode ser visto até ao dia 26. Destaque ainda para as películas “My Small Land” e “The Whale” [A Baleia], um dos grandes nomeados para os Óscares Quem não perde a oportunidade de ver um filme fora da sala de estar, na grande tela, tem três opções de escolha na Cinemateca até Março, com histórias que prometem ser envolventes. “Great Freedom”, filme de 2021 do realizador Sebastian Meise, é uma delas. Eis um filme que se passa na Alemanha do pós-II Guerra Mundial. Hitler morre no bunker e termina o período de perseguições que marcou o nazismo, mas isso não significa que as minorias possam ter uma voz plena na sociedade, tal como os homossexuais. “Great Freedom” retrata, assim, a história de Hans, preso várias vezes por ser homossexual ao abrigo do parágrafo 175, uma lei que criminaliza os gays. Ao longo da trama, acaba por desenvolver uma forte ligação, improvável, com Viktor, o seu companheiro de cela. Depois de uma primeira exibição esta terça-feira, no Dia de São Valentim, as exibições continuam hoje, amanhã, no domingo e na próxima semana. Esta é uma co-produção austríaca e alemã, que venceu o prémio do júri “Un Certain Regard” no Festival de Cinema de Cannes em 2021, além de ter sido nomeada, no mesmo evento, para um “Queer Palm”. No mesmo ano, “Great Freedom” foi um dos filmes em cartaz no Festival Internacional de Cinema de Chicago, tendo ganho ainda dois prémios nos Prémios de Cinema Europeu. Ainda no cinema ocidental, a outra opção é “The Whale”, filme do ano passado que conta a história de Charlie, interpretado por Bredan Fraser, um professor de inglês, obeso, preso a uma cadeira de rodas e que tenta restabelecer uma ligação com a sua filha adolescente. “The Whale” é um dos grandes filmes para a edição deste ano dos Óscares, que poderá inclusivamente render o Óscar de Melhor Actor a Brendan Fraser. Este filme marca, aliás, o regresso do actor aos principais papéis e, pois desde “Perseguidos”, filmado em 2013, que Bredan Fraser não era protagonista. No cinema até já há um nome para esse fenómeno: “Brendanaissance”, algo como “o renascimento de Brendan”. Além da nomeação para o Óscar de Melhor Actor, o filme está também nomeado para Óscar de Melhor Actor Secundário e Melhor Caracterização. “The Whale” está ainda nomeado para os BAFTA, para o prémio “Melhor Argumento (Adaptado)”. A cerimónia decorre no próximo domingo. Lugar dos refugiados A trilogia de filmes seleccionados pela Cinemateca Paixão encerra-se com “My Small Land”, película japonesa de Emma Kawawada que nos revela mais uma história familiar intensa. Desta vez conta-se o percurso de Sarya, refugiada curda de 17 anos que vive no Japão com o pai e dois irmãos há muitos anos. Subitamente a vida muda de rumo quando o estatuto de refugiado do seu pai é rejeitado pelas autoridades japonesas. Com este filme, Emma Kawawada aborda o facto de o Japão não ser um país que acolhe refugiados de braços abertos. Segundo o Japan Times, em 2019 apenas 44 pessoas de um total de 10,375 candidatos conseguiram ficar no país ao abrigo deste estatuto. Esta não é a primeira vez que este tema é abordado no cinema, tendo sido escolhido por Akio Fujimoto em “Passage of Life”, filme de 2018, e por Thomas Ash no documentário “Ushiku”, de 2021, sobre a dura realidade dos centros de detenção no país.
Andreia Sofia Silva PolíticaFórum Macau com reunião ordinária em Março Março é o mês escolhido para a realização da próxima reunião ordinária do Fórum Macau. A informação é avançada pela TDM Rádio Macau, que revela ainda que o evento deverá contar com a presença dos embaixadores dos países de língua portuguesa acreditados em Pequim, além de servir para fechar o plano de actividades para este ano. Quanto à Conferência Ministerial, que serve para traçar os objectivos do Fórum Macau para os próximos anos, deverá realizar-se em Outubro deste ano, aponta a TDM Rádio Macau, sem referir uma data concreta. À semelhança do que tem acontecido nos últimos anos, espera-se para a Conferência Ministerial a presença, ao mais alto nível, dos Governos da China e dos países de língua portuguesa. Também em Outubro, deverá realizar-se o fórum internacional da iniciativa “uma faixa, uma rota”, sendo que, nessa altura, “os países que integram a iniciativa devem marcar presença em Pequim e por uma questão de agenda, poderá ser necessário encontrar uma outra data para a conferência ministerial”, avançou também a TDM Rádio Macau. Não ao proteccionismo Entretanto, Ji Xianzheng, secretário-geral do secretariado permanente do Fórum Macau, defendeu ontem, no Almoço de Primavera com os representantes dos meios de comunicação social locais, que os países aderentes ao Fórum “não revelam dissociação”, além de que “não prevalece o isolacionismo”, mesmo com “os riscos acumulados da economia mundial” e a situação “contra corrente do proteccionismo”. Sobre o panorama da economia chinesa, o secretário-geral destacou o facto de, três anos após a pandemia, “o Produto Interno Bruto ter concretizado um crescimento médio de 4,5 por cento por ano”, fazendo com o que o país permaneça no grupo “das principais economias mundiais”. “De acordo com os dados do Ministério do Comércio da China, o mercado de consumo da China do ano 2022 foi semelhante ao ano de 2021. O comércio externo aumentou 7,7 por cento, batendo um novo recorde; o montante efectivo do aproveitamento dos capitais estrangeiros aumentou 6,3 por cento e o investimento estrangeiro directo, não financeiro, registou um crescimento de 7,2 por cento” indicou ainda o responsável. Para Ji Xianzheng, estes indicadores “demonstram que a China continua a ser uma força-matriz de relevância na economia mundial”, contribuindo também “para a criação de um ambiente externo favorável à recuperação económica dos países de língua portuguesa no período pós-pandémico”. Este ano, o Fórum Macau celebra 20 anos de existência, estando prevista a realização da 15.ª Semana Cultural da China e dos Países de Língua Portuguesa.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteMaria Celeste Hagatong, presidente da Fundação Jorge Álvares: “Tenho obrigação de defender a diáspora macaense” Nunca viveu em Macau, mas está emocionalmente ligada a uma terra que é sua. Presidente da Fundação Jorge Álvares desde Abril do ano passado, acumula o cargo com o da presidência do Banco de Fomento e tantas outras actividades de divulgação da cultura e comunidade macaense. Maria Celeste Hagatong diz que a Fundação está financeiramente estável, orgulhando-se da inauguração da nova biblioteca do CCCM É presidente da Fundação desde Abril do ano passado. Que balanço faz deste período? O senhor general [Garcia Leandro] já tinha o seu plano preparado e uma série de iniciativas em curso. Era já da nossa responsabilidade a aprovação do orçamento e do plano de actividades, mas grande parte dos compromissos já estavam assumidos. Neste primeiro ano o nosso grande objectivo foi fazer o que estava previsto e penso que não nos saímos mal em termos financeiros, ficámos abaixo do orçamento na parte operacional e global. Uma das coisas que estava prevista e que me deu muito prazer concluir foi a transferência da biblioteca [do Centro Científico e Cultural de Macau] (CCCM) que estava há 20 anos em instalações provisórias. E era paga uma renda, o que financeiramente não compensava. Não fazia sentido nenhum. É uma coisa importantíssima para quem está na área dos estudos sobre o Oriente e há documentos com histórias muitos interessantes sobre a vida de Macau e a sua história. Era algo que eu, como descendente de macaenses, gostava de ver preservado. Não houve, portanto, derrapagem orçamental. Temos um grande cuidado de que essas coisas fiquem bem feitas. Gosto de ver as coisas a acontecer e a serem concluídas dentro dos prazos e orçamentos, estou muito focada nisso. Um dos grandes objectivos da Fundação é, precisamente, apoiar o CCCM não só em obras deste género, mas em diversas iniciativas. Já temos um projecto previsto para este ano e outro para o próximo, mas não posso avançar já mais detalhes. O papel e actuação do CCCM estão subvalorizados? Por razões orçamentais que compreendemos, mas que são necessárias de ultrapassar, o CCCM precisa de ter um orçamento mais virado para a investigação e desenvolvimento de actividades. Isso é indispensável. Gostava muito que o Centro tivesse mais visibilidade além da comunidade científica, para o público em geral. Há muita gente interessada nos assuntos da Ásia e de Macau com curiosidade em saber mais sobre os seus antepassados, por exemplo. Aliás, da nossa ligação com a Casa de Macau e Fundação Casa de Macau (FCM), uma das coisas que gostávamos imenso era de convidar mais pessoas a darem os seus testemunhos, deixarem as fotografias e espólios para que sejam depositados no CCCM. Acho que há muito património cá [em Portugal] que podia estar ali. Quais são os seus planos para a Fundação além do que já estava traçado? Temos projectos que são feitos de ano para ano e que correm muito bem. Também não temos assim tanto dinheiro. Apenas recebemos uma dotação inicial e acabou. Entretanto, passámos por não sei quantas crises financeiras, é bom saber que vivemos apenas dos rendimentos do nosso património financeiro. Não temos dotações permanentes. A única doação que recebemos foi do maestro Filipe de Souza que tem uma propriedade em Alcainça, mas que não nos rende nada, e um dos projectos é encontrar uma solução que não seja um peso e para que esta moradia possa também ser uma imagem da Fundação. Mas a Fundação, financeiramente, está estável. Sim, no sentido em que só tem os seus fundos aplicados e só recebe dinheiro daí. Como calcula, com a volatilidade dos mercados financeiros é difícil garantir rendimentos para suportar uma Fundação. Por um lado, tivemos uma altura com taxas de juro baixas e depois apanhamos a crise do Lehman Brothers, da Troika e agora uma guerra. Mas temos feito o melhor que podemos com bastante razoabilidade. Portanto, a música é uma das áreas que nos interesse bastante. Temos essa ligação ao Centro e organizamos o festival anual e internacional de música e instrumentos musicais chineses, algo que chama a Portugal muitas pessoas e estudiosos ligados aos instrumentos musicais orientais. Na edição deste ano vamos esperar ter algo sobre o jazz em Xangai. O festival decorre habitualmente entre Lisboa e Mafra. Este ano tivemos e teremos até final de Março a exposição dos instrumentos musicais em Mafra que já teve mais de 20 mil visitantes. Temos algumas actividades culturais no campo da edição de livros, e temos uma parceria com duas autoras, Isabel Alçada e Ana Maria Magalhães. Já lançamos dois livros e este ano queremos lançar mais uma obra [destinada a um público infantil]. Mas o que vamos fazer na Fundação é continuar a actividade que temos vindo a desenvolver nas áreas que estão solidificadas. Mas há alguma área da Fundação na qual gostaria de ver mais inovação? Fizemos uma coisa que foi inovadora, a meu ver, que foi a assinatura do protocolo com a Casa de Macau e a FCM. Isso foi da minha iniciativa. Essas entidades não estavam já ligadas entre si? Não. Quem tem o património da Casa de Macau é a FCM, que também recebeu uma dotação inicial para suportar as despesas. Mas entre estas entidades e a nossa Fundação não havia nenhuma ligação, apesar de eu ser sócia da Casa de Macau e de o meu pai ter sido um dos fundadores. Sou curadora da FCM também. Agora queremos, com este protocolo, trabalhar em conjunto temas que sejam importantes para Macau e para os macaenses, e seguir as actividades de ambos. Descende de uma importante e histórica família macaense. Como é hoje a sua relação com Macau? Nunca vivi em Macau. Mas fui criada na casa de um macaense que é uma coisa fortíssima. Sempre vivi em Lisboa, o meu avô era oriental e a minha avó ocidental. Somos descendentes de três ou quatro famílias de Macau, os Oliveiras, do tempo das guerras Miguelistas. Depois há uma ligação com as famílias Almeida e Azedo. A minha avó era ocidental, com olhos azuis, e o meu avô nasceu em Macau, tendo sido educado em escolas portuguesas. Fez depois toda a sua carreira no Banco Nacional Ultramarino, alguém muito ligado ao meio económico e financeiro. Vem daí a sua ligação à área da economia e da banca. Fui presidente da COSEC, e uma tia disse-me: “Olhe, está como o seu avô, que criou os seguros em Macau”. Não fazia a mínima ideia. Mas a parte financeira está nos meus genes. Sempre adorei esta área e não há nenhum Hagatong que seja mau a matemática. A minha ligação a Macau vem do facto de ter sido educada em Portugal em casa de um macaense amigo de muitos macaenses. É importante para si manter este vínculo emocional? Tenho obrigação de defender a diáspora macaense e tenho pena que não se assuma mais, porque há muita gente como eu que mantém algumas memórias sobre Macau e isso não se pode perder. Uma das grandes questões da diáspora macaense é, precisamente, como atrair jovens para desenvolver actividades. Como é que isso deve ser feito? Sempre foi um problema. Temos de apanhar os jovens, mas também as pessoas que já estão na sua vida activa, e penso que há muitos “faltosos” que temos de conquistar, os que passaram ou não, por Macau. No meu caso, a vivência de Macau faz-se apenas pelas férias, mas eram umas férias fantásticas. É actualmente presidente do Banco de Fomento. Como olha hoje para o desenvolvimento económico de Macau? Acredito numa recuperação rapidíssima. Tomáramos nós [Portugal]. Basta ter à volta de 70 milhões de habitantes [Grande Baía] para ser mais fácil recuperar a economia, ainda para mais com uma actividade económica mais interessante e moderna. Portugal tem sabido aproveitar esta relação privilegiada que tem com a China via Macau? Há dois níveis de relação: a bilateral, Portugal-China, que tem corrido muito bem, mesmo apesar da pandemia. Os dois países têm uma relação muito forte que decorre do nosso passado. O maior investidor do PSI20 é a China e não há mal nenhum. Numa altura de maiores dificuldades quem nos deu maior apoio foi a China. O investimento tem sido alvo de críticas. Não se justificam? Não. Lançamos propostas no mercado e se mais ninguém vem… quem apresenta o preço maior [fica]. O que podemos fazer? Na altura, a Alemanha, que estaria interessada na EDP, apresentou um preço abaixo. O que podemos fazer? É o mercado a funcionar.
Andreia Sofia Silva SociedadeMacau no top 10 das escolhas dos visitantes de HK e China Um estudo da empresa de pagamentos VISA, intitulado “Consumer Payment Attitudes Study 4.0: Travel Consumption Insights Macau”, conclui que Macau está na lista dos dez destinos mais procurados pelos turistas da China e Hong Kong. O estudo, citado pelo portal GGRAsia, coloca Macau na oitava posição de destino mais procurado pelos turistas da China, ficando em sétimo lugar para os turistas de Hong Kong. Por sua vez, os turistas do continente colocaram Hong Kong na terceira posição e a França em primeiro lugar. Já os visitantes de Hong Kong, preferem viajar para o Japão, que ficou no lugar cimeiro do top 10, seguindo-se a China em segundo lugar. Relativamente às razões para escolher determinado destino turístico, os inquiridos afirmaram que preferem Macau pelas opções de gastronomia e restauração que oferece, sendo que 42 por cento dos turistas da China e 52 por cento dos visitantes de Hong Kong deram esta resposta. Cerca de 27 por cento dos turistas da China, disseram escolher Macau pelas opções de entretenimento, categoria que ficou em quarto lugar, enquanto 33 por cento dos turistas de Hong Kong escolheram esta opção, que ficou em segundo lugar da lista. Um certo “entusiasmo” No comunicado divulgado esta terça-feira com os resultados do inquérito, Paulina Leong, chefe do departamento de gestão de relações de clientes da VISA para os mercados de Hong Kong e Macau disse que os visitantes da China e de Hong Kong “mostram um forte entusiasmo” em relação às viagens para a RAEM “pela sua gastronomia única e pelas actividades de lazer disponíveis para amigos e famílias”. Nesta fase, Macau encontra-se “bem posicionada para capitalizar as oportunidades que aumentaram com a recuperação do turismo” no contexto da Grande Baía. O estudo conclui ainda que “uma média de 70 por cento dos inquiridos da China, Hong Kong e Macau expressaram interesse em fazer uma viagem multi-destinos na Grande Baía, com os consumidores da China (77 por cento) e de Hong Kong (55 por cento) a mostrar a vontade de pernoitar seis ou mais dias”, aponta o GGRAsia. Este estudo foi feito com base em entrevistas pessoais e por telefone feitas entre Setembro e Outubro do ano passado a 350 consumidores de Macau, 700 de Hong Kong, 1000 de Taiwan e 2000 da China. O trabalho versou em pessoas dos 18 aos 55 anos, com o mínimo de rendimento mensal de cinco mil patacas, cinco mil dólares de Hong Kong, cinco mil dólares taiwaneses e cinco mil yuan.
Andreia Sofia Silva EventosCinema | Vincent Hoi prepara novo filme sobre liberdade e fuga “Sea of Exodus” é a nova curta-metragem do cineasta local Vincent Hoi que explora as ideias de liberdade individual e vontade de fugir de um lugar onde nos sentimos presos. A referência aos tempos de pandemia é clara num projecto cinematográfico que contou com um orçamento muito baixo Depois de três anos a sentir-se preso em Macau devido à pandemia, Vincent Hoi decidiu pegar nessa sensação e transformá-la em cinema. Filmado nas últimas semanas de Dezembro do ano passado, “Sea of Exodus”, a nova curta-metragem do cineasta de Macau, não é mais do que uma representação daquilo que representa a liberdade de cada um e a vontade de escapar de uma espécie de prisão. A conversa com Vincent Hoi aconteceu pouco tempo antes do levantamento de todas as restrições pandémicas, tendo o cineasta dado o exemplo “das pessoas de Macau e de Hong Kong que pensam emigrar para outras regiões devido às coisas sem sentido que têm acontecido aqui nos últimos anos, tal como a política da covid-19”. “No último ano foi tudo muito absurdo e muito sem sentido. Muitas pessoas deixaram a cidade, e o filme é sobre isso, embora não tenha abordado essa ideia de forma directa. Resolvi representar isso no filme de forma abstrata, onde as personagens têm comportamentos que vão revelando [essa vontade de fuga]”, adiantou. Vincent Hoi confessou que ele próprio se sentiu “encurralado e preso em Macau nos últimos três anos”. “Não saí do território para lado nenhum, nem mesmo para a China. Sobretudo no ano passado, quando se deu o surto no Verão, vivemos numa espécie de quarentena em que mal podíamos sair para a rua. Nessa altura pensei seriamente em ir embora de Macau.” Vincent Hoi é bastante crítico pela forma como as autoridades lidaram com a pandemia. “Em todo o mundo, a partir de certa altura, a pandemia deixou de ter um grande impacto nas pessoas, mas em Macau foi uma coisa enorme, absurda. Penso que foi uma forma do Governo controlar as pessoas. Senti que a minha liberdade me tinha sido tirada. É o sentimento de termos a liberdade pessoal controlada pelo Governo, que entende que o vírus é muito perigoso e depois já não é. Penso que são medidas de teor político e não têm nada a ver com a ciência.” Duas personagens Na primeira abordagem sobre a forma de realizar “Sea of Exodus”, Vincent Hoi pensou em desenvolver o projecto completamente sozinho, quase sem orçamento. Mas depressa percebeu que o filme estava a tomar outro rumo, tendo acabado por contratar dois actores, um director de fotografia e um produtor. “Decidi colocar apenas um actor e uma actriz no filme, e cada personagem representa algo. A personagem masculina representa a autoridade, enquanto a personagem feminina representa esse sentimento de vontade de fuga. No início do filme revelo a autoridade, com a personagem feminina a pensar em formas de escapar de tudo aquilo.” Vincent Hoi não sabe ainda quando é que o filme vai ser exibido, pois ainda falta terminar a edição e percorrer o habitual caminho dos apoios e candidatura a eventos para que este seja apresentado ao público. Acima de tudo, “Sea of Exodus” não é um filme para “grandes festivais de cinema”, mas sim para “festivais de cinema independentes de Hong Kong, Taiwan ou Japão” ou para o mercado cinematográfico local. Neste momento, o realizador está na fase de edição.
Andreia Sofia Silva Entrevista MancheteIvo Carneiro de Sousa, historiador: “Macau é um sítio privilegiado” Acaba de ser editado “Memórias, Viagens e Viajantes Franceses por Macau – 1609-1900”, quatro volumes que reúnem mais de 200 textos de homens que navegaram de França até ao Oriente e que colocaram Macau no mapa. O autor Ivo Carneiro de Sousa, historiador e académico da Universidade Politécnica de Macau, analisou textos históricos que traçam um retrato da sociedade local dos séculos XVIII e XIX Como surge este projecto? Comecei em 2011 quando acabei o livro “A Outra Metade do Sangue”, que é sobre orfandade e escravatura feminina em Macau. Nessa altura, documentei que as embarcações francesas que vinham de Cantão no século XVIII, sazonalmente, carregavam escravos em Macau e depois, a partir de 1721, começam a transportar cules para as ilhas Maurícias. A partir daí interessei-me pela presença francesa em Macau. A primeira embarcação de cules que saiu de Macau foi, precisamente, comandada por franceses. Os franceses dominam 40 por cento do tráfico de cules até à sua extinção. Nessa altura [2011], escrevi um pequeno artigo sobre um escravo das Maurícias preso em França e que se apresenta como sendo de Macau. É enviado para a Bastilha, mas acaba por conseguir sair. Aí comecei a trabalhar as relações entre a França e Macau e a tentar recuperar todos os textos que descreviam Macau ou que tinham memórias sobre o território. Fiz o mesmo em relação aos viajantes espanhóis que passaram por Macau. Acabei esse trabalho, editando 78 textos de espanhóis. Quando sai esse livro sobre as memórias de espanhóis? Ainda este ano. Não publico a totalidade dos textos, apenas as memórias do primeiro feitor da Real Companhia das Filipinas em Macau. Este deixou 20 volumes escritos e fez vários mapas. Em 2024 publicarei o conjunto das memórias dos viajantes norte-americanos. Preciso ainda de trabalhar alguns textos que estão nos EUA, muitos em diários. Em relação aos franceses, o que representa este trabalho? Elogio a obra da Cecília Jorge e Rogério Beltrão Coelho porque a sua “Viagem por Macau” é um trabalho inédito [sobre os 100 viajantes estrangeiros que passaram por Macau], mas não é propriamente um trabalho de historiador. Em Macau, os historiadores contam-se pelos dedos das mãos e aqueles que publicam investigação científica são muitos poucos. O que encontramos é a repetição dos mesmos mitos, histórias e incidentes. Também em língua chinesa? Há dois problemas. Temos a herança da historiografia portuguesa, marcada por um nacionalismo analfabeto, muito ligada ao Salazarismo e à ideia do país que descobriu tudo. Essa ideologia selecciona e manipula a informação do passado, sendo geralmente muito ignorante em termos de capacidade de investigação documental. Depois temos a historiografia em língua chinesa que é muito factual e antiquada. O trabalho que fiz sobre os viajantes estrangeiros não é amador. Primeiro reconstruo, em termos de história global, as relações entre a França e Macau no domínio religioso, militar, económico e cultural. Só depois começo a recuperar obras, e temos algumas importantes para desconstruir mitos importantes de Macau. Como por exemplo? São os franceses que trabalham primeiro o mito da Gruta de Camões, muito antes de isso aparecer em 1824 nos textos de portugueses. Portanto, em tudo isto há um trabalho de historiador que foi feito com uma bolsa do Instituto Cultural (IC) de 200 mil patacas, mas que foi muito curta. Estou a promover ainda uma edição em francês destes quatro volumes. Estes quatro volumes permitem perceber, desde logo, que Macau só se pode investigar segundo uma perspectiva de história global. Macau era o verdadeiro “fim do mundo”, pois todas as rotas comerciais do século XVIII acabavam aqui. Muitos materiais e produtos eram aqui descarregados. Coisas raras, penas de aves, coisas vindas da Califórnia, do Canadá. Aqui, no século XVIII e XIX, havia um dos grandes comércios de animais raros. Temos a rota da prata da América do Sul que desaguava em Manila e entrava na economia chinesa através de Macau. No século XIX, por exemplo, bebia-se mais vinho de Bordéus do que qualquer vinho português. Daí eu dizer que é preciso ter esta perspectiva global e não chega trabalhar a documentação oficial portuguesa e a pouca documentação chinesa que existe. Era necessário ter programas mais sérios [de ensino e investigação em História], mas é difícil. Tenho procurado incentivar alunos a fazerem mais investigação histórica. Reuniu mais de 200 memórias. Quem eram estes viajantes franceses? Missionários, escritores, comerciantes? Os missionários escreviam pouco sobre Macau. Dos 90 a 140 missionários que passaram por Macau, alguns iam para a China e outros para o Vietname, apenas 27 escreveram sobre o território. Eram muito hostis ao Episcopado de Macau, ao bispo, sacerdotes e missionários portugueses. Eram contra o Direito do padroado. Nos textos denota-se essa hostilidade. Procura-se silenciar os problemas do clero e dos missionários portugueses. Temos muitos textos dos grandes navegadores que fazem no século XVIII concorrência aos britânicos pela exploração do Pacífico. Todos passaram por Macau e fazem textos extraordinários. Há muito pessoal da marinha, vários médicos navais que fazem descrições sobre o território. O livro explica que, entre 1857 e 1862, houve um hospital militar francês em Macau, parte do material desse hospital estará na origem da formação do São Januário [hoje Centro Hospitalar Conde de São Januário]. As relações entre Macau e França tornam-se muito importantes, oficiais e estratégicas a partir de 1844, quando se assina o primeiro tratado de amizade e comércio entre a França e a China. Temos textos que chegam a transcrever conversas em patuá. Nessa altura, a França decide estrategicamente que os embaixadores plenipotenciários para a China ficam instalados em Macau ou em Hong Kong e isso dura até 1859 quando os franceses obtêm a concessão em Xangai. Quando discuti com o IC a publicação disse que este livro é muito importante, pelo facto de Macau ser, provavelmente, a única cidade europeia na China e, ao mesmo tempo, uma cidade chinesa muito antiga. É um sítio privilegiado do mundo e que se vende não apenas com casinos, mas também pelo seu património. Macau é a única cidade deste tipo que não tem um centro ou instituto de estudos de literatura de viagens. Isso existe em todas as cidades. Deveria ser o IC a criá-lo? Não, as universidades. Vamos a Bordéus e temos uma entidade desta natureza, em Paris temos três ou quatro. Em portos pequenos como o da Bretanha também temos, em Cádis, Valência. Isso tem muita importância mesmo para a atracção do “turista de património” que quer aprender mais sobre o local que visita, que paga mais caro por isso. Publicar estas memórias é, por isso, importante. Mas voltando ao livro, digo, no quarto volume, que estes textos franceses relocalizam Macau, transformando o território numa coisa que chamam o “lugar do Extremo Oriente”, como o Mónaco do Extremo Oriente. Há textos divertidos, com descrições sobre as mulheres, as macaenses, textos satíricos sobre os macaístas. Alguns textos são capazes de fazer estatísticas da população e comerciais muito importantes. Descreve-se o peso do jogo, dos cules e do ópio na economia, sobretudo do século XIX. Alguns usam documentação que hoje não se conhece, como cópias dos censos militares à população que se perderam. Pode avançar algumas conclusões relativamente ao seu trabalho com os textos dos navegadores espanhóis e norte-americanos? São textos escritos em castelhano e não são todos escritos por espanhóis, porque existem alguns autores que já são hispano-americanos, nascidos no Perú ou México, por exemplo. Fazem comércio com Macau e deixam os seus textos impressos ou manuscritos, as suas impressões sobre a cidade e a sociedade. No caso dos textos de norte-americanos, entre 1756 e 1810, alguns são de pessoas oriundas de Irlanda, Escócia e Inglaterra para os EUA, e que estão ainda a transformar-se em cidadãos norte-americanos. Digo isto porque as nossas concepções de identidade e de nacionalidade não são as mesmas que eram nessa altura. No século XVIII chegam missionários do que é hoje a Bélgica com passaporte francês, e são tratados como franceses. Mas há também memórias dos que queriam visitar Macau e não conseguiram porque o barco naufragou em Hong Kong. [Mas sobre estes quatro volumes das memórias francesas, concluímos que] Macau era um lugar muito importante para a França e um espaço cultural fundamental para aceder ao conhecimento da China. Houve bibliotecas que se formaram no século XIX a partir de Macau. Macau tinha ainda o papel de informar a Corte imperial chinesa da revolução científica europeia, e muitos missionários e comerciantes franceses chegam à China e são aceites na Corte porque são bons astrólogos, matemáticos, fazem cristais e telescópios, por exemplo. Macau tinha também o reverso, que era informar a cultura europeia sobre a China.
Andreia Sofia Silva EventosVenetian | Concerto “The Night of Stars” reúne a nata do cantopop Sammi Cheng sobe ao palco do Cotai Arena no próximo dia 18, juntando-se a cantores bem conhecidos de Taiwan e Hong Kong como William So, Pakho Chau, WeiBird, Dear Jane, Cloud Wan e Janees Wong. O espectáculo promete ser uma mistura de música com diversos elementos artísticos Actriz e cantora, tida como uma das mais bem pagas da indústria, Sammi Cheng Sau-Man é uma das estrelas do espectáculo “The Night of Stars”, que o Venetian oferece aos amantes do estilo cantopop no próprio dia 18, no CotaiArena. Sammi Cheng, nascida em Hong Kong em 1972, é, além de cantora, actriz, tendo feito um enorme sucesso na área da música, tendo atingido o estatuto de diva, com mais de 25 milhões de álbuns vendidos só na Ásia. Nos anos 90, Sammi Cheng passou a ser conhecida como a “nova rainha do cantopop”, tendo conseguido uma fortuna inimaginável de 100 milhões de dólares de Hong Kong em 2000, competindo com outro actor de Hong Kong conhecido no mundo inteiro, Jackie Chan, o homem das artes marciais que, à época, era o mais bem pago. Com “The Night of Stars”, o Venetian promete oferecer uma noite com o melhor da cantopop que se faz em Hong Kong e Taiwan. A Sammi Cheng junta-se nomes que contam já com alguma carreira feita neste estilo musical, como William So, Pakho Chau, WeiBird e Dear Jane, somando-se novos nomes do cantopop, como é o caso de Janees Wong. Todos estes artistas prometem apresentar em palco os grandes êxitos das suas carreiras, correspondendo assim às expectativas dos fãs do cantopop. Toda a produção do espectáculo está pensada para que este não seja um mero concerto, mas sim um espectáculo que combina também a coreografia com diversos outros elementos artísticos. E ainda… Em palco vai estar também William So Wing Hong, outro grande nome da indústria artística de Hong Kong, onde nasceu em 1967. Actor e cantor, William So enveredou pelo mundo da música em 1985, quando participou nos prémios “The New Talent Singing Awards”, vencendo a competição. Depois disso, não mais parou, tendo assinado contrato com a editora Capital Artists e lançado o seu primeiro EP. Também de Hong Kong, chega Pakho Chau que, além de cantor, é compositor e actor. Pakho, com 38 anos, é outro dos grandes nomes da indústria do cantopop, tendo chegado a assinar contrato com a importante editora discográfica Warner Music, de onde saiu em 2017. De Taiwan chega WeiBird, nome artístico de Wei Li-an, que envereda pelos estilos musicais de mandopop e folk-rock. Até à data, WeiBird já lançou seis álbuns de estúdio, um gravado ao vivo e dois EP. Em matéria de prémios, WeiBird venceu, em 2011, o prémio “Golden Melody Award”, quando estava a iniciar a carreira, tendo ganho também um prémio como melhor compositor em 2015. Mas nem só de artistas individuais se faz este espectáculo. Os Dear Jane são a banda presente no “The Night of Stars”, formada por Tim Wong, vocalista, Jackal Ng, baixista, Howie yung, guitarrista e responsável pela parte vocal, e ainda Nice Lai, baterista. Os Dear Jane surgiram em Hong Kong 2003 e, apesar de serem um grupo de cantopop, inspiram-se na música de bandas norte-americanas surgidas a partir dos anos 90, como é o caso dos Blink-182 e Green Day.
Andreia Sofia Silva SociedadeSegurança nacional | Escoteiros com educação cívica reforçada A Associação dos Escoteiros de Macau celebra este ano 40 anos de existência. Os planos de futuro passam pelo reforço da educação cívica dos jovens, nomeadamente no que diz respeito à defesa dos valores patrióticos e da segurança nacional A Associação dos Escoteiros de Macau tem o caminho traçado para reforçar a educação dos jovens em prol dos valores do patriotismo e de defesa do país. No jantar de primavera da entidade, organizado no último sábado, os dirigentes associativos falaram da importância de ter a segurança nacional como base de formação, escreve o Jornal do Cidadão, sobretudo numa altura em que a associação se prepara este ano para celebrar 40 anos de existência. Lawrence Chau Seng Chon, vice-presidente da associação, disse que o plano de formação dos escoteiros inclui elementos como o respeito pela bandeira nacional, o emblema, o hino e a lei de segurança nacional. Desta forma, o responsável espera que todos os escoteiros possam ter mais conhecimentos sobre a identidade chinesa, o respeito pela bandeira e hino do país. Lawrence Chau Seng Chon disse esperar que os membros da associação possam continuar a promover as ideias de amor à pátria e a Macau, a fim de construírem, em conjunto, uma sociedade mais harmoniosa. Para celebrar o aniversário serão realizadas actividades como sessões de doação de sangue, além de se realizar, em Maio, o festival dos escoteiros. Por altura das férias do Verão, em Agosto, deverá realizar-se um acampamento e uma festa. Em jeito de balanço das actividades realizadas até então, Lawrence Chau Chon apontou que, mesmo com a pandemia, a associação conseguiu terminar todos os trabalhos previstos. Defesa de valores Leong Sio Pui, presidente da direcção, apontou que a associação tem dado resposta às políticas definidas pelo Governo, disponibilizando aos jovens treinos e actividades com maior qualidade e diversidade e que possam contribuir para a paz duradora na China e para a manutenção do princípio “Um País, Dois Sistemas”. A Associação dos Escoteiros de Macau é também presidida por Ma Iao Hang, filho do histórico líder da comunidade chinesa Ma Man Kei. Numa reunião com o Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, ocorrida no ano passado, Ma Iao Hang disse que a associação iria “continuar, como sempre, a apoiar o Executivo na execução da acção governativa conforme a lei”, bem como a “orientar os jovens para que estes possam estabelecer um forte sentimento de amor à pátria e a Macau, elevando, assim, o sentido de responsabilidade e de contributo para a sociedade da parte destes”. Ho Iat Seng, por sua vez, disse desejar que a associação possa reforçar a comunicação e o intercâmbio com regiões do Interior da China, orientando os jovens em prol dos valores nacionais e para que possam ser difundidas as ideias que valorizem o crescimento saudável da juventude de Macau.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteÓbito | Julieta Nobre de Carvalho, a esposa do Governador que viveu numa Macau em tumulto Falecida no passado dia 1 de Fevereiro, em Lisboa, aos 103 anos de idade, Julieta Nobre de Carvalho esteve em Macau ao lado do marido, o Governador Nobre de Carvalho, numa altura de grande tensão, em virtude do movimento “1,2,3”, ocorrido em Dezembro de 1966. Tendo presidido à Obra das Mães, Julieta Nobre de Carvalho é o exemplo da grande presença pública assumida pelas mulheres dos Governadores portugueses na altura Julieta Nobre de Carvalho, esposa do antigo Governador Nobre de Carvalho, viveu em Macau entre 1966 e 1974, vivenciando de perto um dos períodos mais conturbados da sua história. Falecida no passado dia 1 de Fevereiro, aos 103 anos, Julieta, mais do que ser uma simples esposa do Governador, marcando presença em eventos sociais, teve de lidar de perto com os acontecimentos do “1,2,3”, a expressão da Revolução Cultural no território, que já se fazia notar quando o casal Nobre de Carvalho chegou a Hong Kong sem quaisquer directrizes de Lisboa sobre como lidar com o caso. Julieta Nobre de Carvalho deixou vários testemunhos sobre estes meses de tensão que quase deitaram a perder a Administração portuguesa de Macau. Em 1996 falou com o jornalista José Pedro Castanheira sobre o “1,2,3” para o livro “Os 58 dias que abalaram Macau”. Nele se lê que o casal Nobre de Carvalho chegou a Hong Kong às 11h30 do dia 25 de Novembro de 1966, “vindo de Manila, num avião da Philippines Airlines”, tendo sido recebidos no aeroporto de Kai Tak pelo então cônsul de Portugal em Hong Kong, António Rodrigues Nunes, e pelo então Governador de Hong Kong, David Trench. Num almoço de boas-vindas oferecido por David Trench, o casal Nobre de Carvalho depressa percebe que tem em mãos um caso bicudo, de ordem diplomática e política, para resolver, sem que dele tivesse prévio conhecimento. David Trench, escreve Castanheira, “procura saber do colega português quais as instruções que traz de Lisboa para resolver o problema criado na ilha da Taipa”. Nobre de Carvalho de nada sabia. “Até então ninguém nos tinha falado nada da trapalhada. Só no hydrofoil é que soubemos verdadeiramente que o caldo estava entornado. Fomos apanhados completamente de surpresa”, contou Julieta Nobre de Carvalho ao jornalista. O seu marido tomou posse como Governador de Macau a 11 de Outubro de 1966, sendo obrigado a lidar com o caso “1,2,3” logo no início de Dezembro. Os tempos foram de grande tensão, com Nobre de Carvalho a ser obrigado a gerir os tumultos nas ruas, a dialogar com os líderes da comunidade chinesa, nomeadamente Ma Man Kei e Ho Yin, e a responder às reivindicações de parte da comunidade chinesa que levou para as ruas de Macau, e para os jornais, a ideologia de Mao Tse-tung. No final, numa decisão quase solitária, Nobre de Carvalho cedeu nas exigências e soube manter a presença portuguesa no pequeno território. De frisar que, à época, Portugal, governado pelo regime do Estado Novo, não tinha relações diplomáticas com a República Popular da China, comunista. Fernando Lima, ex-jornalista e assessor, foi director do antigo Centro de Informação e Turismo entre 1974 e 1976, mas quando chegou a Macau para ocupar o cargo já o casal Nobre de Carvalho tinha deixado o território, no rescaldo do 25 de Abril de 1974 que atribui o cargo de Governador ao General Garcia Leandro. Fernando Lima considera que Julieta Nobre de Carvalho foi “a confidente do marido” num momento tão difícil da sua carreira, tendo estado “sempre presente nos principais acontecimentos”. “É um nome de referência em relação a um certo período de Macau, tendo vivido toda a angústia e ansiedade do marido, que se viu obrigado a resolver aquele assunto depois de ter ido para Macau sem instruções”, acrescentou. Nobre de Carvalho soube resolver “uma situação que parecia de ruptura” e, “para muita gente, foi o homem que salvou Macau”, recorda Fernando Lima, que entende que o Governador “foi sempre respeitado pelos chineses” devido a esse facto. Fernando Lima só conheceu, de forma breve, Julieta Nobre de Carvalho aquando da realização da série televisiva “Macau entre dois mundos”, transmitida em 1999 pela RTP e que deu, mais tarde, origem a um livro. Num dos episódios, “Anos de Agitação – Parte II”, Julieta Nobre de Carvalho confessa que, na viagem de Hong Kong para Macau, à chegada, o marido lhe confidenciou que “ia ter problemas em Macau”. Sobre o “1,2,3”, disse ainda: “No período em que houve o recolher obrigatório, estivemos no edifício militar, mas foi uma questão de três dias.” Papel social Na Macau de hoje são poucos os sinais que restam da passagem de Julieta Nobre de Carvalho pelo território. O mais visível será o edifício de habitação pública que ganhou o seu nome, tendo sido inaugurado em meados da década de 70 na avenida Artur Tamagnini Barbosa, na zona norte da península. Rita Santos, conselheira do Conselho das Comunidades Portuguesas, morava numa casa social do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), situada perto do novo complexo de habitação pública. Ao HM, diz recordar-se “muito bem” da inauguração do edifício e de Julieta Nobre de Carvalho, “uma senhora muito simpática, que andava sempre bem vestida, com o cabelo bem arranjado e que conversava muito comigo nas actividades sociais”. “Eu e as minhas irmãs, bem como os vizinhos, fomos ver a inauguração do edifício onde alguns colegas meus do liceu chegaram a viver. A dona Julieta saiu de um carro grande de cor preta, do Governo, com um sorriso bonito, acenando para o público. Como eu estava perto da porta principal, ela aproximou-se de mim e perguntou-me como eu estava. Eu só lhe disse que ela estava muito bonita”, recordou. Julieta Nobre de Carvalho marcava, assim, presença em diversos eventos sociais, com e sem o marido. Exemplo disso foi a recepção oferecida pelo Consulado do Japão às autoridades portuguesas no restaurante “Portas do Sol”, no Hotel Lisboa, a 5 de Julho de 1973. As imagens a preto e branco, sem som, hoje disponíveis online na plataforma RTP Arquivos, mostram a presença simpática e formal do casal Nobre de Carvalho. Outro exemplo da actividade social de Julieta Nobre de Carvalho, faz-se com a sua presença, a 14 de Março de 1973, na inauguração da loja de antiguidades “Armazém Velho”, que à data funcionava nas arcadas do edifício do Hotel Lisboa. A esposa do Governador esteve também, sozinha, na festa do Centro de Reabilitação de Cegos da Santa Casa da Misericórdia, a 21 de Janeiro de 1973, um evento dedicado aos utentes da instituição. No blogue “Nenotavaiconta”, onde são partilhados diversos episódios da história de Macau, recorda-se o momento em que, a 9 de Dezembro de 1970, Julieta Nobre de Carvalho inaugurou uma exposição de trabalhos de ergoterapia feitos pelos pacientes do Centro Hospitalar Conde de São Januário. Julieta Nobre de Carvalho esteve ainda presente na inauguração de “Uma Exposição de Pintura, Arte e Beneficência”, a 30 de Março de 1974, patente no átrio da então Escola Comercial, hoje Escola Portuguesa de Macau. Julieta Nobre de Carvalho esteve presente “dados os fins assistenciais a que se destinava o produto da venda dos quadros que se viesse a realizar”, lê-se no blogue. Mas a esposa do antigo Governador foi mais do que uma mera “corta-fitas”, tendo presidido à direcção da Obra das Mães. Foi com esse trabalho que tentou “congregar as ‘senhoras’ da sociedade macaense para que pudessem contribuir mais para essa organização, de ajuda aos mais necessitados”, aponta Fernando Lima. João Guedes, jornalista e autor de diversas publicações sobre a história de Macau, destaca o facto de a presidência da “Obra das Mães”, entidade fundada em 1959, estar, habitualmente, destinada às mulheres dos Governadores. Era uma associação que “tinha como missão a promoção de actividades relacionadas com a educação familiar, a qualidade de vida, o apoio às mães e acções de caridade”, congregando “as elites femininas de Macau e assumindo, por vezes, a dinamização de alguns projectos do Governo, sempre que, para a sua realização, se mostrava necessário envolver a sociedade civil no seu pendor feminino.” Rita Santos ia, no dia oito de cada mês, à Obra das Mães buscar bens essenciais com as irmãs mais velhas. “Em alturas de celebração das quadras festivas, ela estava presente na Obra das Mães e entregava os bens a todas as famílias. Quando chegava a minha vez ela dizia ‘Menina Rita, espero que os bens possam ajudar a sua família’. Isto porque, na altura, éramos 12 pessoas”. João Guedes fala ainda de outras actividades ligadas à Igreja católica desenvolvidas por Julieta Nobre de Carvalho, numa altura em que “a comunidade chinesa vivia, em grande medida, apartada da portuguesa”. A esposa do Governador apresentava “uma imagem de simpatia”, mas que se “confinava praticamente à população lusófona”. Questão de imagem Acima de tudo, Julieta Nobre de Carvalho foi o exemplo de presença pública que as mulheres dos Governadores portugueses assumiam, não se limitando a ficar na sombra. Postura bem diferente face às esposas dos Chefes do Executivo da era RAEM. “Essa é uma característica da cultura chinesa. As mulheres dos Governadores tiveram sempre um papel de apoio à acção social, com a preocupação de dar força às organizações locais viradas para esse apoio social e para o bem-estar da população. Hoje mal conhecemos as mulheres dos Chefes do Executivo, que têm uma presença muito discreta. Entende-se que a política é para ser feita pela pessoa que tem a autoridade. Só aparece a mulher do Presidente Xi Jinping [Peng Liyuan] porque este tem uma presença internacional e ela própria é uma figura conhecida na China”, destacou Fernando Lima.
Andreia Sofia Silva EventosCinemateca Paixão | Fevereiro com opções internacionais de qualidade Há filmes cujas exibições estão na recta final, outros que começam a ser apresentados ao público. No curto mês de Fevereiro, a Cinemateca Paixão apresenta um cartaz com filmes internacionais, onde se inclui o já esgotado Tár, protagonizado por Cate Blanchett, e a triologia de “O Padrinho” Aqueles que não perdem um bom filme na pequena, mas acolhedora, sala da Cinemateca Paixão tem, este mês, um leque alargado de opções. Fevereiro é o mês mais curto do ano, mas isso não significa que o cartaz da Cinemateca seja, também ele, curto. “Heavens Above”, filme de Srdjan Dragojevic que começou a ser exibido dia 26 de Janeiro, terá uma última exibição esta sexta-feira. O filme, uma co-produção da Sérvia, Alemanha, Eslovénia, Croácia e Bósnia e Herzegovina, é uma comédia de humor negro, com um pouco de drama à mistura, que conta três histórias de uma família passadas em três períodos distintos, 1993, 2001 e 2026, relacionadas com os conceitos de religião e de vivência numa sociedade pós-comunista. Este filme recebeu, em 2021, no conhecido Festival de Cinema de Locarno, o prémio “Junior Jury Award” na categoria Competição Internacional, além de ter sido nomeado para um Leopardo de Ouro para a categoria de “Melhor Filme”, sendo este considerado o prémio mais importante do mesmo festival. A partir do dia 15 deste mês, e até 2 de Março, será possível assistir ao filme “The Sacred Spirit”, de Chema García Ibarra, uma co-produção de Espanha, França e Turquia que, em 2021, também foi nomeado para um Leopardo de Ouro na categoria de “Melhor Filme”, sem esquecer as nomeações nos festivais internacionais de cinema de Atenas, Grécia, e São Paulo, Brasil. “The Sacred Spirit” revela-nos a história de José Manuel, proprietário de um bar que toma conta da sua mãe Carmina. O filme apresenta um argumento que mistura laivos de ficção científica e comédia, cujo enredo se torna mais denso quando José Manuel se transforma na única pessoa que conhece o segredo que pode alterar o destino da humanidade. Tudo isto depois da morte do líder de uma associação ligada ao mundo dos óvnis. Histórias de Singapura O único filme de produção asiática que pode ser visto na Cinemateca Paixão este mês, já a partir do dia 12 e até ao dia 21, é “Ajoomma”, de Singapura, com realização de Shuming He. Esta é a história de uma viúva de meia-idade coreana, natural de Singapura, que, pela primeira vez, viaja até Seul e se perde. É então que começa um interessante percurso de auto-descoberta sobre o seu lugar na vida além dos tradicionais papéis de mãe, mulher e esposa. Depois de um bom desempenho nos festivais de cinema de Busan e de Taiwan, no Festival de Cinema Cavalo de Ouro, “Ajoomma” recebeu uma nomeação na categoria de “Melhor Filme Estrangeiro” no Festival Internacional de Cinema de Palm Springs. “Summer Survivors”, uma história de 2018 oriunda da Lituânia, é o drama que completa o cartaz de Fevereiro, e que pode ser visto entre os dias 14 e 28 deste mês. A Cinemateca Paixão apresenta ainda, esta quarta-feira, a última exibição de Tár, protagonizado por Cate Blanchett, sendo que já não há bilhetes para esta sessão. Quem não teve a oportunidade de ver a triologia de “O Padrinho”, de Francis Ford Coppola, pode ainda rever estes três clássicos do cinema de Hollywood esta quinta-feira, domingo e sábado. Já há bilhetes esgotados.
Andreia Sofia Silva SociedadeTurismo | Primeiras seis excursões trouxeram 135 turistas da China No primeiro dia do regresso das excursões, entraram em Macau seis grupos, num total de 135 turistas oriundos de Xangai e das províncias de Guangdong e Liaoning. O Governo pondera criar um plano de subsídios para atrair excursões de Hong Kong, Taiwan e estrangeiro O momento era tão solene e esperado que o Governo fez-se representar no primeiro dia que Macau recebeu excursões de visitantes após três anos de pandemia e restrições fronteiriças e de emissões de vistos. O ponto de encontro com representantes da Direcção dos Serviços de Turismo (DST) fez-se na zona do Posto Fronteiriço de Macau no Posto Fronteiriço de Hengqin para dar as boas-vindas aos primeiros grupos de excursionistas oriundos de Guangdong, e no Aeroporto Internacional de Macau, para acolher turistas vindos de Xangai. Segundo o canal chinês da Rádio Macau, os seis grupos trouxeram 135 turistas divididos em duas excursões da província de Guangdong, três de Xangai e uma da província de Liaoning, na zona nortedeste do país. Cheng Wai Tong, subdirector da DST, disse que o programa das excursões é semelhante criado para residentes de Macau, focado nos passeios pelo centro histórico, na descoberta da gastronomia e dos resorts. “Muitos dos percursos organizados pelas agências de viagens incluem os locais mais importantes do projecto ‘Passeios, gastronomia e estadia para os residentes de Macau”, como a visita aos principais monumentos ou a Coloane, realizando uma viagem mais ligada ao meio ambiente”, disse. De Guangdong vieram 27 turistas que passaram uma noite e dois dias em passeio por locais como a vila de Ka-Hó, o centro histórico da vila da Taipa e zonas pedonais junto à avenida da Praia Grande. Por volta do meio-dia, chegou a excursão oriunda de Xangai que trouxe a Macau 17 pessoas, que vão ficar no território quatro noites e cinco dias. Cheng Wai Tong disse esperar que estes grupos apreciem os percursos turísticos realizados em Macau e visitem diversos locais, incentivando a economia dos bairros comunitários. Subsídios a caminho Uma das novidades anunciadas ontem passa pela possível criação de um plano de subsídios para excursões oriundas de Hong Kong, Taiwan e de países estrangeiros, a fim de diversificar a origem dos turistas. O plano prevê que quem durma uma noite em Macau receba um apoio de 350 patacas, enquanto quem pernoitar duas ou mais noites no território terá direito a 500 patacas de desconto. Cheng Wai Tong referiu que está a ser organizada uma excursão de turistas oriundos do Sudeste Asiático para a RAEM ao mesmo tempo que o novo plano de subsídios está ainda a ser analisado. Cheng Wai Tong adiantou ainda que, desde sexta-feira, foram registadas 15 inscrições de novas excursões para Macau, que incluem cerca de 400 turistas. Tendo em conta a necessidade de cumprir certos procedimentos para a realização de excursões, o subdirector da DST disse não conseguir adiantar, para já, quantas excursões vai Macau receber este ano, uma vez que a situação da pandemia e a resposta do mercado turístico ainda estão a ser analisadas.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeUM prevê crescimento económico entre 20 e 44% este ano Investigadores do Centro de Estudos de Macau e do Departamento de Economia da Universidade de Macau (UM) acreditam que a economia local deverá crescer entre 20,5 e 44,1 por cento ainda este ano, com uma maior visibilidade do crescimento a notar-se a partir da “segunda metade do ano”. Numa nota de imprensa ontem divulgada, espera-se ainda que as exportações cresçam entre 35,2 e 82,8 por cento, sendo que as receitas da Administração deverão situar-se entre as 55,4 mil milhões e as 66,1 mil milhões de patacas. Os investigadores basearam-se em “três diferentes cenários” para prever os valores do Produto Interno Bruto (PIB), receitas públicas e exportações, sendo que um dos cálculos aponta para o crescimento do PIB em 20,5 por cento para 211,8 mil milhões de patacas, atingindo 47,7 por cento dos valores registados em 2019. Outro dos cenários, aponta para um crescimento do PIB na ordem dos 44,1 por cento. Cautelas e caldos de galinha As previsões da UM apontam para um aumento do número de visitantes não sem antes considerarem ser importante um cenário de “cautela”, tendo em conta as “diferenças na adaptação da sociedade de Macau e na vontade dos estrangeiros em visitar Macau”. No cenário mais cauteloso, estima-se que o território venha a receber cerca de dois milhões de visitantes no primeiro trimestre, 20 por cento dos níveis de 2019, valor que aumentará para 2,48 milhões de pessoas no segundo trimestre e finalmente 3,22 milhões no último trimestre. Já o segundo cenário sobre o número de turistas é “mais optimista”, apontando para 3,11 milhões de visitantes logo no primeiro trimestre do ano, depois 3,97 milhões e, por fim, 5,52 milhões no quarto trimestre. O terceiro cenário, “ainda mais optimista” do que o anterior, estima um “crescimento mais rápido” do número de turistas na segunda metade do ano, com o número de visitantes a poder chegar aos 7,36 milhões de patacas no quarto trimestre. “Os cenários acima descritos presumem que não haverá grandes mudanças na situação epidémica que levarão a um rápido ajuste das políticas”, lê-se ainda.
Andreia Sofia Silva EventosMúsica | Hon Chong Chan, músico de jazz de Macau, prepara um novo disco Chama-se Hon Chong Chan, é natural de Macau e conta já com um álbum de estúdio na sua curta carreira. “Traveling Coffee”, gravado em 2020 em Nova Iorque, ganhou o nome graças ao seu gato, mas é, acima de tudo, um trabalho virado para dentro, um projecto pessoal. O músico está neste momento a gravar um segundo trabalho discográfico Em pleno ano da pandemia, 2020, Hon Chong Chan, guitarrista de jazz, natural de Macau, teve a ousadia de lançar o primeiro disco. Formado na The Collective School of Music, em Nova Iorque, o músico conta ao HM que este álbum nasceu das muitas composições que já tinha na gaveta. Fazer música, aliás, sempre foi um “hábito” seu. “Quando quis fazer este álbum, escolhi algumas das composições que mais gostava para gravar. Gravei este trabalho no estúdio New Yorker Bunker com Bob Quaranta, Gregory M. Jones e Tobias Ralph. Fizemo-lo em apenas sete horas, com Chris Biesterfeldt a colaborar connosco como produtor executivo.” Agora, três anos depois, o músico local encontra-se a gravar um novo disco, mas não quer avançar, para já, grandes detalhes. “Descobri os melhores músicos do mundo com quem posso trabalhar. Nesta fase já gravámos cerca de metade do álbum”, adiantou. O gato viajante “Traveling Coffee” despertou a atenção do DJ Burnie, também de Macau, que recentemente remixou a faixa “Thursday Samba”, integrante do disco cujo nome tem, afinal, uma origem bastante simples. “Tenho um gato em Macau, que se chama Café. Quando fui estudar para Nova Iorque, o meu gato ficou a cargo de um amigo. Pensei que o Café era como eu, estava a viajar sozinho. Então decidi dar ao álbum o nome de ‘Traveling Coffee’ [Café Viajante].” O músico descreve este disco como tendo “muita improvisação”, em que “cada solo é muito longo”. Mesmo sendo um trabalho já com três anos de existência no mercado, Hon Chong Chan não está preocupado com vendas ou com o sucesso. “Não me preocupa a reacção do público, porque é um álbum muito virado para mim. Devido a este trabalho consegui muitas oportunidades de espectáculos e performances de jazz na China, o que me ajudou imenso como músico”, aponta. Ter ido para Nova Iorque estudar, deixando para trás um território pequeno e com poucas oportunidades para quem quer ser músico, não mudou assim muito a vida de Hon Chong Chan. Viver da música é difícil, mas não é algo exclusivo no território. “Tal como em muitas outras partes do mundo, os músicos de jazz enfrentam muitos dilemas de vida, mas acredito que ainda temos boas oportunidades de ter uma boa vida.” Questionado sobre o panorama do jazz em Macau, o músico considera que há cada vez mais pessoas a tocar. “Para mim não tem a ver com locais para actuar, mas simplesmente se um músico quer criar ou não. Claro que quanto mais criações houver, melhor. Se gostares de música não há qualquer conflito entre ser um músico profissional ou amador”, concluiu.
Andreia Sofia Silva SociedadeBIR | TSI nega residência a filho de cidadão português O Tribunal de Segunda Instância (TSI) decidiu manter a recusa de atribuição do Bilhete de Identidade de Residente (BIR) ao filho de um português e de mãe chinesa, por entender que “não é possível cumular o estatuto de residente permanente do pai, que não tem nacionalidade nem ascendência chinesa, com a nacionalidade chinesa da mãe, que não é residente permanente, para dessa forma se atribuir o estatuto de residente permanente” à criança. O TSI aponta ainda que o menino “não pode ser considerado como filho de pais de ascendência portuguesa e chinesa, uma vez que os seus progenitores não reúnem o requisito de ascendência sanguínea mista”. O menino nasceu em Hong Kong a 30 de Maio de 2019 e é residente permanente da região vizinha, além de ter a nacionalidade chinesa. A mãe é residente permanente de Hong Kong e de nacionalidade chinesa, enquanto o pai nasceu em Portugal e tem, portanto, nacionalidade portuguesa. Além disso, o progenitor da criança é residente permanente de Macau, tendo sido autorizado a residir em Macau em 2001. Em 2009, o homem declarou ter em Macau o seu domicílio permanente e ter ascendência portuguesa. O pedido de residência permanente para a criança foi submetido à Direcção dos Serviços de Identificação a 15 de Outubro de 2019, mas este foi recusado devido ao facto de o pai da criança “ter declarado expressamente que apenas tem ascendência portuguesa e não tem ascendência chinesa”. O pai decidiu então recorrer da decisão junto do Tribunal Administrativo, mas este deu razão ao Governo.
Andreia Sofia Silva Grande Plano MancheteTurismo | Desafios e perspectivas do sector depois da crise pandémica Os números do turismo no Ano Novo Chinês foram animadores. Mas será que o sector retirou ilações dos três anos de crise, ou tudo continua na mesma? Especialistas ouvidos pelo HM dizem que continua a ser importante apostar no turismo sustentável, de qualidade e com mais e melhores infra-estruturas, além de ser fundamental atrair mão-de-obra estrangeira “Depois de atravessarmos o deserto, qualquer água é boa”. É desta forma que Bruno Simões, presidente da Associação de Reuniões, Incentivos e Eventos de Macau, descreve o regresso da economia e do turismo quase à normalidade. Os números de turistas que entraram em Macau durante o período do Ano Novo Chinês foram animadores, com o território a receber, numa semana, mais de 450 mil visitantes, enquanto o Aeroporto Internacional de Macau registou um aumento de passageiros na ordem dos 80 por cento. Por sua vez, as receitas brutas do jogo, relativas a Janeiro, registaram o valor mais alto desde o início da pandemia, de 11,6 mil milhões de patacas. Face a esta realidade, importa aferir se os sectores do turismo, hotelaria e restauração adaptaram os serviços disponibilizados aos turistas, ou se não foram feitas mudanças significativas ao nível operacional. Para Bruno Simões, há ainda pouca inovação da parte do Governo, apesar de ter decidido eliminar as restrições de combate à pandemia. “Continuamos com o que tínhamos, uma falta de visão. O Governo tem de ser mais ágil e pró-activo. A nível do IPIM [Instituto de Promoção do Comércio e Investimento], não passaram qualquer mudança ou política para o turismo de negócios. Continuamos com as promoções que tínhamos antes, com algumas novidades. O que falta em Macau é audácia, projectos que nos diferenciem. Não temos visto nada disso”, defendeu ao HM. O futuro revela-se promissor, mas é ainda cedo para definir grandes objectivos. Bruno Simões assegura que na área de organização de grandes eventos empresariais “ainda não aconteceu nada”. “Nem sequer estão a chegar os primeiros pedidos, pois a abertura foi muito recente. Teremos de esperar um mês ou dois para termos notícias positivas.” O responsável dá conta que, daqui para a frente, a economia vai ter de funcionar com uma menor aposta do jogo VIP e com um maior enfoque no entretenimento. Posição assumida pelo economista José Sales Marques, que acredita que a necessidade de diversificação foi a grande lição aprendida pelo sector. “Aprendemos que, de facto, há que diversificar não apenas a estrutura da actividade económica de Macau, oferecendo coisas diferentes, mas também os mercados. O Governo lançou algumas pistas e fez um esforço para que a procura pelo jogo e turismo de Macau consiga ir além do mercado chinês. Veremos de que forma todas essas ideias são concretizadas. É preciso uma política muito assertiva, de atracção desses novos mercados.” Sales Marques destaca a “resiliência” ganha pela economia local e por muitos operadores durante a pandemia, que levou à extinção de empresas estrutural e financeiramente mais fracas. “Os operadores económicos de Macau adquiriram resiliência e esse é um bom sinal. Mas o ser-se forte depende de como os negócios estão organizados e também da sorte, muitas das vezes. A economia de Macau mostrou bastante resiliência tendo em conta que somos um mercado muito pequenino”, adiantou o economista, que defende o regresso em força à contratação da mão-de-obra não residente, à qual “é preciso dar valor”. “Macau tem de proporcionar condições favoráveis para que essa mão-de-obra regresse. A mão-de-obra que vem para Macau, com raras excepções dos sectores não diferenciados, é especializada e semi-especializada, e o que aconteceu em Macau foi muito mau nesse aspecto. Temos de saber atrair novamente a confiança desses trabalhadores para que contribuam para a nossa economia.” Sustentabilidade precisa-se Glenn Mccartney, especialista em Turismo e docente da Universidade de Macau (UM), diz que é altura de pôr em prática algumas das questões que foram sendo exigidas nos últimos anos, quando o território registava um turismo em massa com possíveis consequências negativas para o património, ambiente e bem-estar social. “Os três anos da pandemia deram-nos uma oportunidade para pensar naquilo que iríamos fazer aquando da reabertura, como podemos oferecer um melhor turismo, com políticas mais sustentáveis. Temos de estar atentos aos próximos tempos, pois a covid não desapareceu, e os sectores do turismo e hotelaria têm de se manter resilientes.” “No passado, tínhamos turismo em massa, com muita gente no território, no limite da capacidade. Isso faz parte da responsabilidade corporativa das empresas, olhar para a protecção do meio ambiente. Estamos a voltar à normalidade e todos querem voltar aos números de 2019, mas gostaria de ver mais reflexão sobre esses pontos, embora entenda a urgência dos sectores económicos para a recuperação das perdas e para que haja mais clientes nas lojas e restaurantes”, adiantou ao HM. Os números do Ano Novo Chinês foram animadores, mas Glenn Mccartney acredita que “vai demorar algum tempo” até que o sector MICE, de exposições e convenções, “volte à normalidade”. “Estamos a virar a página, teremos dez anos com os novos contratos de jogo, teremos de ver como crescer os elementos não jogo, como é o caso do entretenimento e dos eventos. É preciso mais trabalho em termos do número de voos e infra-estruturas, para conseguirmos atrair mais turistas internacionais”, frisou. Mãos à obra Luís Herédia, presidente da Associação de Hotéis de Macau, diz que “houve alguma aprendizagem” com a crise que está gradualmente a chegar ao fim. “Houve a noção de que dependemos muito da mão-de-obra importada para conseguirmos dar resposta à procura que Macau atrai e que temos necessidade de manter os padrões de qualidade, que novo recrutamento implica formação adicional e específica. A noção que sabemos o que fazer e que temos de fazer bem e depressa”. Luís Herédia considera que não existe “necessidade de alterar o produto ou o tipo de serviço” disponibilizado ao turista, pois este procura Macau “pelo produto singular que tem para oferecer, a sua cultura, o património, a gastronomia e o entretenimento”. É nesta área que “há bastante a fazer”, pois “os grandes espectáculos fecharam e não havia um programa geral em curso, o que faz falta na cidade”. “A Direcção dos Serviços de Turismo deu alguma resposta com a organização de paradas e animações de rua, bem como o fogo de artifício, mas, em geral, o programa de entretenimento oferecido pelos diversos players de Macau precisa de mais tempo para ser refeito”, acrescentou. Mesmo com “expectativas animadoras” em relação aos próximos meses, Luís Herédia confessa que “há ainda bastante a fazer em vários sectores”, nomeadamente no que diz respeito aos transportes e acessos a Macau. “É preciso dar um melhor aproveitamento ao aeroporto, reabrir mais rotas aéreas, alargar os horários dos ferries, recrutar mais mão-de-obra em geral e fazer um reinvestimento ao nível da animação e do entretenimento.” É também essencial, segundo o dirigente associativo, “fazer uma aposta redobrada na formação, reactivar a promoção junto dos mercados geradores de turistas e fazer uma aposta no sector MICE”. Para que Macau regresse a 2019 é preciso “trabalhar no vector da qualidade, na reorganização dos acessos e dos transportes, fornecimentos e capacitarmos melhor os nossos recursos humanos, além de atrairmos grandes eventos MICE”. Os números registados no período do Ano Novo Chinês “foram importantes, mas é mais importante conseguir regenerar e melhorar o nosso produto turístico, apostar na qualidade e aumentar o tempo de permanência dos turistas”, concluiu Luís Herédia. Mais turistas Helena de Senna Fernandes, directora dos Serviços de Turismo (DST) disse esperar que Macau possa registar a média diária de 40 mil visitantes em 2023. Para Luís Herédia, esta é “uma estimativa relativamente animadora, que traria 14,6 milhões de visitantes a Macau este ano, cerca de 37 por cento comparando com 2019”. “É difícil prever o comportamento dos mercados e é necessária alguma cautela. Mas se conseguirmos oferecer um produto diversificado, de qualidade e atraente para diferentes mercados e segmentos, se estivermos munidos de recursos suficientes e capazes, seremos capazes de atrair turistas. Possivelmente, iremos atingir um maior número de visitantes a partir de meados deste ano.” Ainda sobre o período do Ano Novo Chinês, Luís Herédia diz que alguns hotéis registaram “quebras significativas de negócio”, tendo-se mantido a actividade mesmo com problemas em matéria de recursos humanos. “Há quase três anos que as taxas de ocupação se mantinham baixas, bem como os preços dos quartos, mas os hotéis mantiveram o negócio. Foram-se ajustando os recursos, dispensaram-se trabalhadores, em algumas áreas cerca de 30 por cento da mão de obra importada, mas manteve-se a actividade. Alguns hotéis sofreram quebras significativas de negócio, outros menos, dependendo da sua dimensão. Todos sofreram e levarão alguns anos para recuperar.”
Andreia Sofia Silva EventosRollout Dance Film Festival | Curta filmada em Coloane apresentada este domingo Alice Leão, residente formada em coreografia, propôs a António Sanmarful fazer “Beyond the Edge”, uma curta-metragem que aborda a noção de limites e dos conceitos de prisão e liberdade com uma dança na praia de Hac-Sá, Coloane. O filme estará em cartaz este domingo inserido no programa do Rollout Dance Film Festival É já este domingo que será apresentada a curta-metragem “Beyond the Edge”, da autoria de António Sanmarful e Alice Leão, residente, coreógrafa e actualmente a estudar Interpretação no Reino Unido. “Beyond the Edge” está inserido no programa “Macau Dance Film Pulse II”, onde se inclui um conjunto de curtas-metragens ligadas a Macau e que serão exibidas na Casa Garden. Ao HM, António Sanmarful, técnico de câmara, relatou o processo criativo por detrás de “Beyond the Edge”, que “não tem propriamente um argumento”. “Nesta fase não faço coisas muito criativas e sentia falta disso, e foi a Alice que me propôs este projecto. Exploramos um pouco as texturas e os ambientes da praia de Hac-Sá, em Coloane. Fomos filmar às quatro ou cinco da manhã para apanhar o nascer do sol, destacando vários elementos, a areia, o mar. Há três músicas a acompanhar os três momentos.” O objectivo em “Beyond the Edge” é que o público faça a sua própria interpretação. “A ideia é descobrir a floresta pela manhã até encontrar o primeiro obstáculo, que é a impossibilidade de dançar na água. Trabalhamos em torno da ideia de encontrar sempre o limite da floresta, que era ultrapassado, e depois o limite da areia e da água, que já não se ultrapassa. Há coisas que não se ultrapassam na vida”, exemplificou António Sanmarful. Praia e música “Beyond the Edge” foi filmado na calada da noite, quando a madrugada termina e um novo dia começa. Antes de trabalhar em coreografia, Alice Leão ouviu músicas que pudessem estar mais ligadas à paisagem de Coloane e da praia de Hac-Sá. No entanto, “durante as filmagens, houve alturas em que me separei da coreografia e permiti-me ter momentos de improvisação”, disse. Ao preparar a coreografia, Alice Leão estava interessada “na dicotomia da prisão e da liberdade”. Na curta-metragem, “há momentos em que a personagem se sente pequena e mexe-se com calma, mas há alturas em que se sente enorme e dança com mais furor e descontrolo”, frisou. Acima de tudo, este foi um projecto feito com poucos recursos e com tempo limitado, dada actividade profissional dos dois autores. “Gosto da curta-metragem e é sempre difícil aplicar todas as ideias que temos, pois é tudo feito com os nossos orçamentos e materiais. Acho que experimentámos técnicas e formas de edição diferentes, pois no meu trabalho lido com técnicas mais corporativas. Foi bom termos sido aceites pela direcção do Festival”, concluiu António Sanmarful.
Andreia Sofia Silva Manchete PolíticaEconomia | Associação Poder do Povo alerta para desemprego jovem A associação Poder do Povo reivindica que seja dada maior atenção ao desemprego jovem e alerta para o perigo da inacção e isolamento dos mais novos. Numa carta enviada à DSAL, a associação diz que se tornou frequente não obter resposta ao envio de currículos e que o subemprego se generalizou A Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) recebeu ontem da associação Poder do Povo que entregou uma carta a alertar para os elevados números do desemprego jovem. Lam Weng Ioi, secretário-geral da associação, apontou que mesmo com a ligeira recuperação da taxa de desemprego registada no último trimestre de 2022, a verdade é que os números são ainda elevados em termos históricos. A carta exige que o Governo preste atenção ao desemprego de longa duração da parte dos jovens, dado o risco de resultar em isolamento, inacção e problemas psicológicos. O secretário-geral recorda que, ao longo dos últimos três anos, muitos jovens têm estado sem trabalho ou em subemprego, causando situações de elevada frustração e desistência de busca de emprego. Como consequência desses factores, registam-se cada vez mais casos de pessoas que se isolam em casa, adiantou Lam Weng Ioi. “Gradualmente, foi-se criando um problema social, pois muitos jovens desistem de procurar viver experiências profissionais e sociais e que acabam por se isolar em casa. Esta situação deve-se ao impacto da pandemia e com o facto de os jovens não conseguirem encontrar trabalho”, frisou. Queixas e mais queixas A Poder do Povo diz que tem recebido várias queixas de jovens que não conseguem arranjar trabalho, embora não tenha especificado quantas. Muitos licenciaram-se durante a pandemia e ainda continuam em busca de um emprego. “Muitos destes jovens enviaram bastantes currículos sem terem resposta. Alguns pura e simplesmente desistiram de procurar emprego e isolaram-se em casa. Não conseguimos ter noção deste fenómeno olhando apenas para a taxa de desemprego”, referiu Lam Weng Ioi. Há quem esteja à procura de trabalho há mais de um ano e verificam-se muitos casos de pessoas que trabalham a tempo parcial como distribuidores de comida. “Voltam a trabalhar um dia e depois regressam ao trabalho dois meses depois. Não me parece que seja uma situação laboral saudável”, defendeu. Lam Weng Ioi sugere que o programa de formação subsidiada disponibilizado pela DSAL aumente a oferta de cursos focados nos mais jovens, para que tenham um maior contacto social. Além disso, pede-se que a DSAL tenha uma “atitude prudente” na aprovação de blue cards para os trabalhadores não-residentes (TNR). “A DSAL só deve começar a pensar na importação de TNR quando a taxa de desemprego apresentar uma maior tendência de declínio”, concluiu.
Andreia Sofia Silva Entrevista ManchetePaulo Duarte, académico: “China molda a economia mundial” Paulo Duarte co-edita o mais recente livro sobre a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” com a chancela da Palgrave, intitulado “The Palgrave Handbook of Globalization with Chinese Characteristics – The Case of Belt and Road Initiative”. Em entrevista, o académico defende que a China já deveria ter estatuto de economia de mercado e que o país vive com a Rússia uma relação puramente estratégica com foco na questão de Taiwan A iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” foi apresentada por Pequim em 2013. Como olha para a sua evolução até aqui? É preciso reconhecer que a economia, sobretudo a chinesa, já não cresce como crescia. Passamos por uma situação menos positiva, não apenas devido à covid-19, mas também devido à guerra [na Ucrânia]. No caso da China, que é a fábrica do mundo, gerou-se muita ambição quando, na prática, a pandemia veio arrefecer esses investimentos e muitos deles ficaram parados. Outros estão em progresso. O que me fascina como investigador é ver como todos estes projectos à escala regional, nacional e transcontinental vão moldando a economia do mundo. Este livro ajudou-me a aprender mais sobre a capacidade de a China incorporar, no seu projecto terrestre e marítimo, a Rota da Seda digital. A China percebeu que não é só o mar que é importante para o comércio, mas as redes digitais também são uma fonte extraordinária de ganhos, tendo lançado, assim, a terceira componente da iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, em 2015. O livro procura uma visão do todo que é essa interdependência entre terra, mar e digital. Focamo-nos se os projectos vão ou não demorar, mas tudo feito e planeado a longo prazo já mudou a fisionomia do mundo e das redes de comunicação, e vai continuar a fazê-lo. De que forma concreta “Uma Faixa, Uma Rota” tem mudado a economia mundial? A China esteve muito tempo fechada ao mundo. Foi Deng Xiaoping, justamente com a ideia de “Um País, Dois Sistemas” que a abriu ao mundo. Curiosamente, introduziu o capitalismo dentro do comunismo, de maneiras que temos hoje uma China voraz, não só em termos de recursos energéticos, mas de aquisição de grandes activos em grandes empresas. Esse é o comportamento tradicional do país, que raramente cria algo do zero e que prefere investir em empresas já existentes onde procura comprar grandes activos, como a EDP em Portugal. A empresa foi considerada um activo estratégico e só assim é que não passou para as mãos de chineses, mas não foi isso que aconteceu com o Porto de Pireu, na Grécia. Vejamos também o caso do porto de Hamburgo, na Alemanha. A China consegue, através do uso dual, fazer descargas e cargas em portos e, ao mesmo tempo, levar a cargo actividades de “intelligence” ao longo dos portos onde vai atracando. Falo de aquisição massiva de infra-estruturas, de recursos energéticos, consenso de Pequim, com a ajuda ao desenvolvimento dos países desprovida de condicionalidades, ao contrário do que é o modelo ocidental, em que primeiro se requerem reformas democráticas e depois ajuda-se ao desenvolvimento. Mas a China já está a aprender com situações que correram mal. Tais como? A queda de Khadafi, na Líbia, como por exemplo. O país vai-se distanciando do princípio da não interferência. O que vamos ver no mundo é uma China que compra muito, vende massivamente. Falávamos da globalização, e a China beneficiou bastante com o facto de ter aderido à Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001. Por esta altura, já deveria ter o estatuto de economia de mercado, mas ainda não tem. Mas isso não impede o país de continuar a ser a fábrica do mundo. Portanto, a China beneficiou da globalização, investe massivamente um pouco por todo o mundo e vai construindo, em paralelo, uma rede portuária para apoiar a sua marinha mercante e servir de abastecimento à sua marinha de guerra. A par desta globalização com características chinesas é possível que vejamos a geoestratégia a acompanhar a geopolítica. A China está a fazer o que os EUA fizeram há muitas décadas, que é construir as bases, com calma, no mundo. A China percebeu que o mar é fundamental numa estratégia de globalização e de protecção das rotas marítimas. Porque é que o país não tem ainda o estatuto de economia de mercado? Para todos os efeitos, estamos a assistir a uma guerra comercial. Os produtos de qualidade média e alta têm dificuldade em competir com os produtos chineses, e a guerra tem essa razão de ser. É um conflito entre os EUA e a China que nos envolve a todos directamente. Se por esta altura a OMC desse o estatuto de economia de mercado à China, seria mais fácil ao país do que já é competir livremente com produtos dos EUA e de outras partes do mundo, nomeadamente da União Europeia, onde os produtos têm uma boa qualidade. Isso é uma espécie de travão que serve para mitigar esses efeitos colaterais do dumping, da competição muitas vezes desleal, as falhas em muitos produtos. A meu ver, é uma forma de proteger os produtos ocidentais. É isso que impede a China de ter neste momento uma economia de mercado enquanto o país não fizer as reformas que o Ocidente espera que faça, nomeadamente ao nível da protecção dos direitos de autor. A China tem vindo a implementar reformas aos poucos, mas acha-se que ainda não é suficiente. De que forma o conflito na Ucrânia alterou a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”? Qualquer conflito, na Ucrânia ou Síria, é importante. A Ucrânia por ter sido o celeiro da União Soviética e a Síria por questões energéticas. A questão alimentar preocupa a China, que não vai ao estrangeiro apenas à procura de recursos energéticos, mas também à procura de alimentos. Os chineses destruíram de forma massiva, ao longo das últimas décadas, o meio ambiente, e hoje temos 28 mil rios que desapareceram e o ar ainda muito poluído, embora a China esteja a adoptar práticas mais amigas do ambiente. Só sete por cento das terras na China são aráveis. A Ucrânia desempenha aqui essa função, como o Brasil e outros países, de grandes produtores alimentares, mas até vou mais longe. A Ucrânia é importante, neste caso pela negativa, pela desproporção das cadeias de abastecimento entre o Oriente e o Ocidente. A China, sendo parceiro da Ucrânia, não tem interesse nenhum nesta guerra que acaba por tocar na economia, mas é uma guerra, acima de tudo, geopolítica. A China precisa de um aliado na construção do mundo que passe por uma alternativa ao mundo ocidental. Esse aliado, para o bem e para o mal, é Putin. Seria um dos poucos que viria ao auxílio da China caso houvesse um confronto em Taiwan. Talvez também o Irão ou a Coreia do Norte. Além de comprarem petróleo mais barato à Rússia, os chineses sabem que, do ponto de vista geopolítico, precisam de aliados. Não é benéfico para ninguém que a guerra se arraste demasiado, inclusivamente para a própria Rússia. Também a China não é alheia a esta perturbação das cadeias de abastecimento. A China está, portanto, a tentar equilibrar vários factores relativos ao conflito ucraniano, mantendo uma posição estratégica com a Rússia, com o foco em Taiwan. Sim, sem dúvida, esse é o principal factor. A Rússia e a China desconfiam um do outro. Os multimilionários e turistas russos não vão propriamente para a China, vão para o Ocidente. É um casamento de conveniência. Que outra saída teria a Rússia se não fossem os chineses a subsidiar esta guerra, uma vez que os europeus fizeram cortes? Se não fosse a grande China a comprar, o que poderia fazer Putin, que está praticamente isolado em todo o mundo? Pouco. Mas essa desconfiança existe e encontra nesta crise uma oportunidade. Sabemos que esta ligação entre a Rússia e a China é meramente conjuntural porque, terminando esta guerra, e ninguém sabe quando vai acontecer, não temo dizer que Putin vai querer retomar os mercados ocidentais. A China, aqui, é meramente circunstancial. É co-autor de um artigo, neste livro, sobre a presença do Atlântico-sul na política de globalização da China, onde se inclui Portugal. No contexto de “Uma Faixa, Uma Rota”, como descreve as relações entre os dois países? Há espaço para inovação? Nesta relação, a questão de Macau é importante e temos também a CPLP. O único senão é o facto de Portugal pertencer ao Ocidente, à NATO, à União Europeia (UE) e com laços transatlânticos com os EUA. Tivemos uma espécie de lua-de-mel da China com Portugal a partir de 2012, na altura da troika, em que a China não tinha propriamente interesse num mercado como o nosso, mas foi investindo ao ponto de tornar Portugal num estudo de caso na UE pela grande receptividade que estávamos a mostrar face à China. Depois da visita a Portugal de Xi Jinping, cerca de 18 acordos foram assinados, fazendo de Portugal uma excepção. Desde emitir dívida pública portuguesa em moeda chinesa, a criar um laboratório com vista à produção de micro-satélites, à própria política dos vistos gold. Houve depois uma pressão intensa dos EUA e a pandemia, bem como a questão da guerra, que fez com que Portugal tenha voltado à sua política externa dita “convencional”, de apoio aos EUA. Todos esses factores levaram ao fim da lua-de-mel que parecia promissora. O conceito de “Globalização com características chinesas” poderá ter influências nos próximos tempos, com o conflito na Ucrânia, por exemplo? Se olharmos para a China como aquele actor que planeia a longo prazo, vão surgir sempre guerras e conflitos, ou crises, mas esse projecto de “Uma Faixa, Uma Rota” continuará no espaço e no tempo. É muito difícil parar a China, sendo que hoje em dia as famílias podem ter até três filhos. Isto não é uma brincadeira. Se o planeta já era escasso em recursos, veremos agora uma deslocalização da China para a zona do Atlântico-Sul, para aqueles países mais distantes, à procura de alimentos e energia. Não é por acaso que se houve falar do interesse da China numa base naval na Argentina ou na Guiné-Equatorial. A China vai negociar com esses estados para ter capacidade de introduzir a sua diáspora. Se há coisa que o país aprendeu é que não pode ter base apenas na China, mas sim em todo o mundo. A China tem de ter bases navais mais perto dos locais de risco. Olhar global “The Palgrave Handbook of Globalization with Chinese Characteristics – The Case of the Belt and Road Initiative” [Manual Palgrave da Globalização com Características Chinesas – O caso da Iniciativa Uma Faixa, Uma Rota” é uma edição conjunta de Paulo Duarte, académico da Universidade Lusófona do Porto, Francisco José Leandro, da Universidade de Macau, e Enrique Gálan, do Asian Development Bank. Com a participação de dezenas de autores de várias nacionalidades, o livro faz o retrato global da iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” nas vertentes diplomática, económica e política e dos vários polos de investimento que se foram formando desde 2013 graças à aposta chinesa em vários países. Destaque para a participação de vários académicos portugueses, como é o caso de Carmen Amado Mendes, Cátia Miriam Costa, Luís Tomé, Jorge Tavares da Silva, entre outros.
Andreia Sofia Silva SociedadeRelatório | Português ainda domina em algumas áreas nos tribunais O relatório do Ano Judiciário de 2021/2022 revela que a língua portuguesa ainda domina em algumas áreas judiciais em relação ao chinês, nomeadamente no Tribunal de Segunda Instância (TSI), onde “o número de acórdãos em chinês redigidos pelo tribunal colectivo, em recursos de processo civil, foi relativamente baixo”. Tal “deve-se a factores estruturais, como a hierarquia do TSI, a afectação dos juízes e as línguas utilizadas pelos advogados”. O documento adianta que “é difícil o TSI utilizar plenamente a língua chinesa no conhecimento dos recursos em processo civil, uma vez que os autos e as decisões em matéria civil dos tribunais de primeira instância são maioritariamente escritos em português”, além de que “os advogados utilizam sobretudo a língua portuguesa nas actividades judiciais”. Uma vez que a base do Direito de Macau é portuguesa, “tecnicamente é mais demorado, custoso e difícil encontrar o vocabulário correspondente e usar a língua chinesa para a expressão”, pelo que “a maioria dos acórdãos [no TSI] são ainda redigidos em português”. Dificuldades linguísticas Ainda assim, o chinês é bastante utilizado pelos tribunais, tendo em conta que esta é a língua mais falada pela população. Ainda relativamente ao TSI, dos 938 acórdãos proferidos no Ano Judiciário de 2021/2022, 583 foram realizados em chinês, com uma taxa de 62,15 por cento, e 355 em português. Dos 547 acórdãos proferidos na secção dos processos em matéria criminal, também no TSI, 79 foram redigidos em português e 468 em chinês, representando estes uma taxa de 85,56 por cento. O português dominou nos acórdãos em processos civis e laborais, pois, da totalidade dos 206 acórdãos proferidos, 156 foram escritos em português e os restantes 50 em chinês. No caso do Tribunal Judicial de Base (TJB) o português continua a estar em minoria. O relatório dá conta que, das 8.999 decisões proferidas pelo TJB, 8.333 foram-no em chinês, o que representa 92,60 por cento, por oposição aos 623 em português, o que representa 6,92 por cento. Em comparação com o ano judiciário de 2020/2021, o número de sentenças proferidas em chinês diminuiu em 1.564 processos, menos 15,80 por cento. O número de sentenças proferidas em português desceu 152, uma queda de 19,61 por cento. Lê-se ainda que, no caso do TJB, “uma vez que a língua materna da maioria dos intervenientes do juízo de instrução criminal, nos últimos anos, ser o chinês, as peças processuais, como os relatórios de inquérito elaborados pelos órgãos policiais, são principalmente redigidas em chinês”. Desta forma, “a utilização da língua chinesa no Juízo de Instrução Criminal atingiu mais de 90 por cento”.
Andreia Sofia Silva EventosCreative | Exposição fotográfica de Hugo Teixeira regressa a Macau Exposta em Outubro de 2020 na galeria da Taipa Village Art Space, “Paisagens Involuntárias”, mostra de fotografia de Hugo Teixeira, regressa ao território, desta vez pela mão da Creative Macau. A partir de sábado, o público poderá ver imagens que retratam as memórias de emigrante do luso-americano, actualmente a residir na Califórnia Está de regresso a Macau a exposição do fotógrafo Hugo Teixeira, luso-americano a viver na Califórnia, EUA, e que não é mais do que um exercício de memória da parte de um emigrante. “Paisagens Involuntárias” estará patente na galeria da Creative Macau a partir deste sábado e até ao dia 4 de Março, depois de ter sido exposta, em Outubro de 2020, na galeria da Taipa Village Art Space. A mostra remete para o exercício de memória, ainda que não incida sobre as memórias em específico de Hugo Teixeira, cuja família emigrou de Portugal para a Califórnia, EUA, em 1970, quando o fotógrafo tinha poucos meses de idade. Estas “Paisagens Involuntárias” lembram, assim, um Portugal pré-revolucionário, atrasado e pouco aberto ao mundo, com as suas paisagens campestres a perder de vista que não são, afinal de contas, muito diferentes do chaparral californiano. Numa entrevista concedida ao HM em Outubro de 2020, a propósito deste projecto, Hugo Teixeira revelou mais detalhes de uma mostra que resulta de 14 mil composições criadas a partir de fotografias capturadas e imagens adquiridas na Feira da Ladra, em Lisboa. “Estas imagens não referenciam memórias específicas, mas diria que cada montagem combina com uma fotografia de paisagem que encontrei. Gosto muito da ideia de viagem, da road trip, que permite fazer muita fotografia de paisagem. Por isso comecei a fazer montagens com o montado alentejano e o chaparral na Califórnia, porque são paisagens muito parecidas e representam aquilo que quero comunicar”, contou. As imagens compradas na Feira da Ladra “fizeram-me lembrar as poucas imagens de família que temos da época da emigração, nos anos 60 e 70. Acabam por representar memórias que não são minhas, mas herdadas. Como filho de emigrantes sempre ouvi histórias da terra, em Portugal, que são uma componente importante da minha identidade”, adiantou. Hugo Teixeira disse na mesma entrevista que “o processo de criar dezenas de milhares de pequenas experiências representa um bocado o caminho do emigrante num país novo ou num país antigo, o não saber bem onde colocar o pé e às vezes enganar-se. É um processo orgânico de descoberta de culturas e de países”. Conceitos e imagens Hugo Teixeira cresceu na comunidade luso-americana de São José, Califórnia. Formou-se em linguística e fotografia, tendo ainda formação na área dos media. O seu trabalho foca-se não apenas na fotografia, mas também no uso de materiais mais comuns e ferramentas que têm como resultado final a criação de imagens conceptuais contemporâneas. Além de “Paisagens Involuntárias”, Hugo Teixeira também trouxe a Macau, em 2017, a mostra “Transcience: Daredevils and Towering Webs”, composta por um conjunto de fotografias que retratam andaimes de bambu e os mestres que os montam. Esta foi a primeira vez que o fotógrafo expôs no território.
Andreia Sofia Silva SociedadeEstoril-Sol | Grupo ganha nova concessão. “Longa” batalha judicial na calha O grupo Estoril-Sol acaba de ganhar uma nova concessão para operar, em Portugal, os casinos Lisboa e Estoril até 2037, mas a concorrente, Bidluck, já apresentou uma providência cautelar para anular a decisão. O advogado Óscar Madureira lamenta que o concurso não tenha conseguido atrair mais concorrentes internacionais Foi anunciada, esta segunda-feira, a atribuição de uma nova concessão para a operação dos casinos Lisboa e Estoril ao grupo Estoril-Sol, que tem Pansy Ho, directora-executiva da MGM China, como presidente do conselho de administração e Ambrose So, vice-presidente e director-executivo da Sociedade de Jogos de Macau, como vogal. Em comunicado, foi declarado que o novo contrato de concessão, com duração até 2037, contou com as assinaturas, esta segunda-feira, do Governo português e da Estoril Sol (III) – Turismo, Animação e Jogo S.A., subsidiária do grupo. Para operar o casino da Figueira da Foz, surgiu apenas um concorrente, a Sociedade Figueira Praia, da Amorim Turismo, actual concessionária. No entanto, esta concessão será contestada nos tribunais pela Bidluck, a outra empresa concorrente, afastada do concurso pelo facto da sua proposta de terreno para albergar um novo casino em Lisboa não ter ido de encontro à vontade das autoridades portuguesas. Segundo a imprensa portuguesa, a Bidluck apresentou uma providência cautelar para anular esta decisão, falando de “cumplicidade entre o Governo e a Estoril-Sol”. Contactado pelo HM para comentar este caso, o advogado Óscar Madureira assegura que iremos assistir a uma “longa” batalha judicial, lamentando que o Estado português não tenha conseguido atrair mais concorrentes internacionais para este concurso. “O Estado português poderia ter aproveitado esta oportunidade e o facto de Portugal ser um destino turístico apetecível para lançar um concurso público que fosse atractivo do ponto de vista económico e financeiro, a fim de atrair grandes empresas e operadoras internacionais. Isso não aconteceu, o que é demonstrativo da falta de interesse que um concurso destes espoletou. Talvez seja um caso raríssimo no mundo tendo em conta as infra-estruturas que Portugal tem e o facto de ser um grande destino turístico.” Óscar Madureira entende que o grupo Estoril-Sol ganhou “por exclusão de partes” e devido à questão específica do terreno, uma vez que a proposta da Bidluck era até melhor do ponto de vista financeiro. O advogado recorda que a anterior concessão terminava em Dezembro e foi prolongada por mais dois anos tendo em conta a pandemia e outros contextos. Ainda assim, na sua visão, o Estado português teve tempo para fazer um concurso “mais apetecível para ter mais entidades interessadas” além do grupo Estoril-Sol, como grandes operadores de jogo americanos ou asiáticos, por exemplo. “Os termos do concurso parecem financeiramente e economicamente pouco apetecíveis para outras empresas além do grupo Estoril-Sol. Tenho esse feeedback de entidades que eu sabia estarem interessadas em concorrer”, declarou. Da estagnação É histórica a ligação do grupo Estoril-Sol em Portugal devido à figura carismática de Stanley Ho, cujo legado é agora seguido pela filha, Pansy Ho. No entanto, Óscar Madureira entende que, nos dez anos que antecederam 2020, a empresa não soube inovar no mercado do jogo. “Nos últimos anos o grupo poderia ter feito mais para tentar adaptar a oferta do produto que opera junto dos clientes. Os tempos não foram fáceis, e não incluo aqui o período da pandemia. Mas antes disso, talvez nos últimos dez anos até 2020, o grupo acabou por não tentar modernizar-se ou oferecer algo diferente. Mas atribuo também alguma responsabilidade ao Estado português por não ter tentado motivar o grupo no sentido de lhes fazer ver que Portugal teria outras possibilidades, rematou.
Andreia Sofia Silva Manchete SociedadeWynn | Associação exige fiscalização do tempo de pausas de croupiers A Wynn decretou a redução do tempo de pausas dos croupiers por cada turno de trabalho, medida que foi, entretanto, suspensa. A Associação Novo Macau pelos Direitos dos Trabalhadores do Jogo, liderada por Cloee Chao, entregou ontem uma carta à Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais a pedir maior fiscalização A operadora de jogo Wynn procurou reduzir o tempo de pausa cumprido pelos croupiers por cada turno de trabalho. Na prática, ao invés de descansarem meia hora por cada 90 minutos numa mesa de jogo, os croupiers passavam a descansar os mesmos 30 minutos, mas depois de duas horas de serviço. Cerca de dois mil trabalhadores queixaram-se à Associação Novo Macau pelos Direitos dos Trabalhadores do Jogo, liderada por Cloee Chao, e a medida foi, entretanto, suspensa. Ainda assim, a dirigente associativa foi ontem à Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) entregar uma carta a pedir fiscalização de forma a impedir que casos semelhantes se repitam. Cloee Chao disse ontem que, até ao momento da entrega da carta, não foi instituída nenhuma redução do período de pausa, mas a associação exige que a proposta da Wynn seja efectivamente abolida e não apenas suspensa. A responsável frisa que não existe um documento escrito sobre esta decisão, tendo os croupiers sido informados verbalmente pelos seus superiores da possível redução das pausas. Além disso, o departamento de recursos humanos da Wynn também não sabia de nada. “Achamos estranho uma empresa lançar esta medida nesta altura, porque há mão-de-obra a mais nesta área. Tendo em conta que há croupiers a mais, porque é que a empresa quer cortar o tempo das pausas, pagando o mesmo salário?”, questionou. Necessidades imparáveis Cloee Chao explicou ainda aos jornalistas que é necessário um croupier cumprir o devido tempo de descanso, tendo em conta a elevada concentração que é exigida durante o jogo. “Temos a história de um croupier que pediu para ir à casa de banho e o pedido foi recusado porque não havia ninguém para o substituir. O croupier acabou por urinar no local, porque não conseguiu aguentar. Parece uma piada, mas esta história é real. Depois disto, mesmo que os gerentes ou superiores não consigam encontrar croupiers de substituição, os pedidos de pausa não podem ser recusados”, contou Cloee Chao. As pausas de 30 minutos após 90 minutos de trabalho é uma prática em vigor há muitos anos e a alteração pode constituir uma violação dos contratos de trabalho. Uma croupier, que acompanhou Cloee Chao nesta acção junto da DSAL, não quis dar o nome, mas disse aos jornalistas que os seus superiores anunciaram a redução do tempo de pausa numa reunião de trabalho, na passada terça-feira, tendo sido explicado que a Wynn queria equiparar o tempo de pausa cumprido noutras concessionárias. Segundo comentários de vários funcionários nas redes sociais, a Wynn é a operadora de jogo que mais tempo de pausa disponibiliza aos croupiers, informação confirmada pela própria Cloee Chao. No entanto, uma funcionária, que não quis ser identificada, disse que a única situação melhor na Wynn para os croupiers, em comparação com outras operadoras, são mesmo os tempos de pausa. “Temos direito a menos de 20 folgas por ano, sendo que as faltas por doença não chegam a uma dúzia, ao contrário do que se verifica noutras empresas. Como podem os nossos benefícios ser iguais aos oferecidos por outras empresas? Trocamos dinheiro pelo tempo das pausas”, apontou.
Andreia Sofia Silva PolíticaEmprego | Ella Lei pede mais contratação no sector hoteleiro Ella Lei disse ontem esperar que mais desempregados possam preencher as vagas existentes no sector hoteleiro e outros com mais postos de trabalho disponíveis. “Os desempregados que deixaram os seus empregos poderão ser recrutados com prioridade”, disse. A deputada comentou ainda a taxa de desemprego que, entre Outubro e Dezembro do ano passado, “foi moderada”, tendo ocorrido, no entanto, um aumento de 13 mil residentes desempregados. “Quando a economia recuperar esperamos que o Governo possa incentivar a cooperação com diversos sectores e com a Federação das Associações dos Operários de Macau a fim de melhorar o recrutamento de residentes. Antes era difícil preencher algumas vagas, pois muitos residentes não tinham vontade de desempenhar certos trabalhos.” Ella Lei salientou também a importância de o Governo organizar mais feiras de emprego, para que quem muda de área de trabalho possa aprender novas técnicas. “Entendemos que os programas de estágios não devem ser apenas destinados aos jovens, mas também para pessoas de meia idade, entre os 50 e 60 anos”, rematou.
Andreia Sofia Silva PolíticaCoutinho quer Governo a pagar despesas de cuidados intensivos O deputado José Pereira Coutinho entende que o Governo deve apoiar os residentes no pagamento das despesas de saúde nas unidades de cuidados intensivos nos hospitais privados sempre que estes não tenham vaga no Centro Hospitalar Conde de São Januário (CHCSJ). A proposta do deputado, expressa numa interpelação escrita, sugere o pagamento das despesas até o doente voltar a ter vaga nos cuidados intensivos do CHCSJ. Pereira Coutinho diz que o gabinete de atendimento aos cidadãos “tem recebido bastantes pedidos de famílias aflitas com o pagamento de dívidas hospitalares”, uma vez que a unidade de cuidados intensivos do CHCSJ “já não tem capacidade para receber nas suas instalações doentes em situações críticas”, tendo em conta a pandemia da covid-19. “Vai o Governo assumir a responsabilidade pelo pagamento das despesas que os residentes têm de assumir para com os seus familiares nas unidades de cuidados intensivos nos hospitais privados, devido à falta de vagas no hospital público?”, questiona o deputado. Medicamentos precisam-se Na mesma interpelação, o deputado questiona quando é que as farmácias podem regressar à normalidade no que diz respeito aos stocks de medicamentos habitualmente usados para curar sintomas de gripes e constipações, como antibióticos ou paracetamol, e que esgotaram devido ao surto de covid-19, tendo em conta o fim repentino da política de zero casos covid. Deu-se “uma afluência inusitada de um grande número de doentes, turistas e residentes, com filas diárias em hospitais e farmácias, o que rapidamente levou ao esgotamento dos stocks. Muitas farmácias fecharam as portas e outras deixaram de vender os medicamentos necessários. Continuam a escassear nas farmácias locais os medicamentos básicos para o combate à covid-19”, acusou. O deputado não deixa também de criticar a forma como as autoridades lidaram com a pandemia nas últimas semanas. “A inesperada mudança da política covid zero para um regime de abertura total adoptada num curto espaço de tempo, sem que a população estivesse previamente ciente e preparada, resultou numa propagação acelerada e descontrolada do vírus entre a população, desencadeando em infecções que resultaram numa grande afluência” a farmácias e hospitais, disse.